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II Série — Número 26

Quinta-feira, 6 de Dezembro de 1984

DIÁRIO

da Assembleia da República

III LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

SUMÁRIO

Projectos de lei:

N.° 406/111 — Aprova medidas tendentes à supressão da desigualdade de tratamento entre a carreira docente e as demais carreiras médicas e à reposição de condições de equidade entre os docentes das universidades (apresentado pelo PCP).

N.° 407/1II —Aprova medidas tendentes a garantir a existência de instalações para a educação fisica e o desporto nas escolas preparatórias e secundárias (apresentado pelo PCP).

N." 408/III —Revogação do Decreto-Lei n.° 301/84, de 7 de Setembro, que põe em causa os dispositivos constitucionais que asseguram o efectivo cumprimento da escolaridade obrigatória a todos os cidadãos (apresentado pelo PCP).

Projecto de deliberação:

Aprova medidas tendentes a garantir, com carácter de urgência, a apreciação e votação das iniciativas legislativas referentes às bases gerais do sistema educativo (apresentado pelo PCP).

Petição n.° 36/111:

Das Organizações Representativas dos Trabalhadores da Marinha Mercante expondo a situação relativa à criação das empresas de transportes marítimos PORTLINE e TRANSINSULAR, emergente da publicação do Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, em prejuízo da CTM e da CNN, sugerindo o pedido de ratificação do diploma, a sua recusa e a suspensão imediata da sua aplicação.

Grupo Parlamentar do PCP:

Aviso relativo à nomeação de uma secretária para o Gabinete de Apoio ao Grupo Parlamentar.

PROJECTO DE LEI N.c 406/iíS

aprova MEDIDAS TENDENTES A SlíPRESSfiO DA desigualDADE DE TRATAMENTO ENTRE A CARREÜRA DOCENTE E as DEMAIS CARREIRAS MÉDICAS e k REPOSIÇÃO DE CONDIÇÕES DE EQUIDADE ENTOE OS DOCENTES DAS UNIVERSIDADES.

A publicação e a entrada era vigor do Decreto-Lei n.° 312/84, de 26 de Setembro, vieram provocar uma vasta onda de indignação entre os médicos docentes e

não docentes e uma enorme perplexidade e protesto entre os docentes das universidades. Atento o conteúdo e implicações do diploma não poderão estranhar-se nem a indignação (mais do que justa) nem os protestos (pertinentes) que vêm suscitando. Altamente irregular e muito estranho é sim que regime tão polémico tenha podido ser elaborado à revelia da Ordem dos Médicos e dos sindicatos representativos daqueles profissionais — num processo em que igualmente foram marginalizados os restantes docentes das universidades portuguesas que, subitamente e sem aviso prévio, se descobriram alvo de uma enorme discriminação.

1 — A estranha motivação de um diploma discriminatório.

O diploma reclama-se do objectivo de «abrir possibilidades às faculdades de Medicina e de Ciências Médicas de recrutarem os seus docentes de entre os médicos mais habilitados e em idade mais propícia, ao alargar a todo o curso de Medicina as normas especiais para contratação de pessoal docente [...] e ao garantir igualdade de vencimento a médicos com tarefas similares ou proporcionalidade remunerativa a médicos com responsabilidades diferentes».

«A formação dos médicos — reconhece a exposição de motivos governamental — exige cooperação dos Ministérios da Educação e da Saúde, aos quais cabe responsabilidade conjunta que vai ser regulada em legislação genérica, agora em preparação.» Porquê então este diploma? Porque o Governo considerou que carecia de ser aperfeiçoado «com urgência» o actual regime estabelecido pelo Decreto-Lei n.° 172/81, de 24 de Junho, que surgiu em cumprimento do disposto no artigo 105.° do Decreto-Lei n.° 448/79, de 13 de Novembro.

Quais então os defeitos desse regime? O Governo aponta 4:

A forte restrição da base de recrutamento de docentes: a lei só admitia que este se fizesse entre os médicos da instituição ou instituições hospitalares em articulação com a respectiva faculdade;

A inadequação: só os médicos de «idade menos adequada» satisfaziam os requisitos de contratação de assistentes estagiários;

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A inconveniencia: resultante de a tabela de vencimentos prevista no Decreto-Lei n.° 310/82, de 3 de Agosto, proporcionar aos médicos das car-reiras de saúde remunerações mais elevadas do que as atribuídas aos médicos da carreira universitária, conduzindo «à progressiva redução do corpo de docentes de carreira, ainda não doutorados, em virtude da sua opção pelas carreiras médicas, designadamente a carreira médica hospitalar»;

O carácter limitativo: a (aplicação da) limitação do artigo 105.° do Estatuto da Carreira Docente do ciclo clínico veio demonstrar inadequada ao desenvolvimento da formação médica como processo global e sem descontinuidades.

Verifica-se, porém, que o diploma aprovado pelo Governo para substituir o regime assim caracterizado, longe de sanar injustiças as fomentou, em vez de restabelecer equilíbrios, propiciou novas distorções, não só não esbateu conflitos como veio criar um novo e mais polémico factor de conflitos.

2 — Um novo regime discriminatório e injusto.

Com efeito, é hoje pacificamente reconhecida a importância (e as características próprias) da carreira docente universitária. Não são, porém, menos relevantes as carreiras médicas. Justifica-se plenamente que sejam objecto de tratamento legal e equitativo, que nem subalternize uma nem estabeleça em favor de outra regimes que em vez de corrigirem injustiças instituam privilégios.

2.1 — Ora, como sublinharam recentemente os médicos da Zona Sul, reunidos em assembleia geral, o Decreto-Lei n.° 312/84 subalterniza a carreira hospitalar face a carreira docente, viola as atribuições e competências dos médicos das carreiras de saúde (Decreto-Lei n.° 310/82, de 3 de Agosto), estabelece poderes especiais que conferem ao corpo docente universitário poderes indilimitados para assegurar promoções, etc.

Na verdade, o diploma prevê no seu artigo 1.°, n.c 1, que «algumas disciplinas [?] constantes dos planos de estudos de Medicina e Ciências Médicas sejam ministradas em instituições hospitalares ou outros estabelecimentos de saúde mediante protocolo de colaboração entre as faculdades e essas instituições ou estabelecimentos». Para garantir o ensino dessas disciplinas (segundo regime a fixar em protocolos bilaterais sujeitos a homologação ministerial —artigo 1.°, n.°' 2 e 3) é instituído um regime especial de recrutamento e de docentes. O recrutamento fica nesses casos condicionado:

À mera aprovação nas provas de acesso ao internato complementar, no caso dos assistentes hospitalares [artigo 5.°, n.° 1, alínea a)];

À mera obtenção do grau de assistente hospitalar ou de saúde pública ou de clínica geral, no caso de professores auxiliares [artigo 5.°, n.° 1, alínea b)];

À mera obtenção do graa de chefe de serviço hospitalar, de saúde pública ou de consultor de clínica geral, no caso dos professores associados e dos professores catedráticos [artigo 5.°, n.° 1, alínea c)].

Ao contrário, para as disciplinas ministradas ao abrigo do regime geral, o recrutamento de assistentes e assistentes estagiários depende (estabelece o artigo 4.°) dos requisitos previstos na alínea b) do n.° 1 do artigo 12.° do Estatuto da Carreira Docente, na redacção do Decreto-Lei n.° 316/83, de 2 de Julho (hão-de ser titulares do mestrado ou equivalente), e além disso obter colocação em vaga do internato complementar no estabelecimento de saúde designado para funcionar em articulação com a respectiva faculdade, devendo essa vaga corresponder a área profissional que, por portaria conjunta dos Ministros da Educação e da Saúde, seja considerada afim da disciplina ou disciplinas para que os interessados tiverem sido contratados como docentes.

A que fica a dever-se o menor rigor do regime especial aplicável aos docentes de disciplinas integradas nos protocolos? Não certamente à menor importância das disciplinas (que — embora a lei se coíba de o estabelecer— terão de ser, pelo menos, tão importantes, que só em meio hospitalar possam ser adequadamente ministradas).

Por outro lado, o regime especial conduz à subalternização da carreira hospitalar. Com efeito, aos professores auxiliares, associados e catedráticos é assegurado (artigo 8.°, n.° 1) o direito ao provimento como supranumerários nas categorias e em lugares de assistente hospitalar, de saúde pública ou de clínica geral e de chefe de serviço hospitalar de saúde pública ou de consultas de clínica geral, respectivamente.

E, embora, face ao artigo 13.°, n.° 1, do diploma a direcção dos serviços hospitalares referidos nos protocolos caiba «ao médico que, exercendo funções no respectivo serviço, possua o grau mais elevado da carreira hospitalar», como o artigo 13.°, n.° 2, caso exista mais de um médico com um grau mais elevado, concede preferência ao que cumulativamente detenha a categoria mais elevada da carreira docente universitária, médicos de carreira hospitalar podem ser preteridos por (ainda que recém-formados) chefes de serviços que possuam qualquer grau da carreira docente.

O diploma facilita de resto a ocupação das vagas existentes ou até de lugares supranumerários por médicos da carreira docente.

Ao corpo docente universitário são ainda atribuídos amplos poderes especiais (legalmente indelimitados) para fazerem avaliações de que dependem promoções (artigo 5.°, n.° 2).

2.2 — O Decreto-Lei n.° 312/84 tem, noutro ângulo a consequência de criar uma classe privilegiada dentro da carreira docente universitária. As normas relativas às remunerações (artigos 9.° e 10.°) permitem que os docentes de medicina atinjam vencimentos aproximadamente duplos dos outros docentes da universidade. Não admira que em exposições dirigidas à Assembleia da República (ou nas audiências com deputados, designadamente no quadro da preparação da interpelação do Partido Comunista Português sobre política de educação) a questão tenha sido abordada com perplexidade e indignação, interrogando-se os docentes sobre as razões que terão levado a uma opção tão discriminatória (não há notícia de que se ache em preparação legislação equivalente para outras faculdades!).

3 — As medidas a adoptar.

Criticado pelos sindicatos médicos e pela respectiva Ordem, repudiado pelos docentes universitários discri-

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minados, o Decreto-Lei n.° 312/84, de 26 de Setembro, é fome de instabilidades, tensões e equívocos, que vêm perturbar ainda mais a já atribulada situação do ensino e da saúde. O Ministério da Saúde reconhece que o diploma «está a provocar grande tensão» nos hospitais, sucedem-se as reuniões com o Secretario de Estado do Ensino Superior — inspirador e co-autor da medida —, mas não se descortina outra solução que não seja revogar o Decreto-Lei n.° 312/84 e tomar as providências necessárias à adequada reflexão sobre as medidas a tomar para dar réplica às necessidades do ensino da medicina, sem lesão dos direitos de quantos optaram pelas carreiras médicas. O Governo entendeu que a situação seria tal que não consentiria «aguardar a conclusão dos diplomas em estudo, os quais pela sua amplitude exigem reflexão mais demorada». Porém, face aos resultados da «reflexão» (menos demorada e realmente desastrada), feita pelos Ministérios da Educação e da Saúde, não restarão hoje dúvidas que não se teria perdido em reflectir mais demoradamnte e sobretudo em agregar ao processo de reflexão os representantes dos médicos e dos demais docentes, sem os quais não é possível que se chegue a solução legal que substitua adequadamente a prevista pelo Decreto-Lei n.° 172/81, que em má hora se quis revogar desta forma.

Face à estranha inércia governamental importa colocar a Assembleia da República perante o imperativo político de clarificar o que bem necessita de urgente clarificação.

Nestes termos, os depuatdos abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte projecto de lei:

ARTIGO 1." (Norma revogatória)

Ê revogado o Decreto-Lei n.° 312/84, de 26 de Setembro.

ARTIGO 2° (Revisão participada)

O Governo procederá, no prazo de 60 dias, à revisão do regime constante do Decreto-Lei n.° 172/81, de 24 de Junho, e do n.° 2 do artigo 13.° do Decreto-Lei n.° 481/77, de 15 de Novembro, adoptando as providências necessárias e adequadas à participação das organizações representativas dos médicos na elaboração da legislação que haja de ser publicada nos termos da presente lei.

Assembleia da República, 5 de Dezembro de 1984. —Os Deputados do PCP: Zita Seabra —José Magalhães — Jorge Lemos — Vidigal Amaro.

PROJECTO DE LEI N.° 407/111 aprova medidas tendentes a garantir a existência

de instalações para a educação física e 0 desporto nas escolas preparatórias e secundarias.

1 — A Constituição da República Portuguesa estabelece que todos os cidadãos têm direito à cultura física

e ao desporto, incumbindo ao Estado, em colaboração com as escolas e as associações e colectividades desportivas promover, estimular, orientar e apoiar a sua prática e a sua difusão.

Tais objectivos constitucionais estão postos em causa, por se manter em vigor o Despacho n.° 29/81, de 13 de Novembro, da Secretaria de Estado das Obras Públicas, que determina que seja adiada para uma 2.° fase a construção de pavilhões polivalentes ou ginásios em estabelecimentos de ensino.

Dito por outras palavras, determina-se que as escolas a construir não tenham instalações para a educação física e a prática do desporto escolar.

Esta medida tem sido «escrupulosamente» cumprida: assim, no que diz respeito à Direcção-Geral das Construções Escolares, verifica-se que as escolas construídas a partir do plano especial de 1981 não contaram com pavilhões gimnodesportivos; por outro lado, no que respeita à Direcção-Geral do Equipamento Escolar, verifica-se que desde 1983 não foi iniciada a construção de nenhum equipamento deste tipo.

2 — Actualmente existem mais de 280 escolas preparatórias e secundárias num total dos cerca de 800 estabelecimentos desses graus de ensino existentes no País (ou seja, mais de um terço das escolas prepara^-tórias e secundárias, a nível nacional) que não possuem instalações desportivas.

Tal facto impossibilita o cumprimento cabal das exigências curriculares dos alunos, levando à redução dos tempos lectivos na disciplina de Educação Física e à inexistência de desporto escolar.

Por outro lado, não pode deixar de referir-se o elevado grau de degradação das instalações e equipamentos existentes, facto que decorre da escassez de verbas e inexistência de planos para a sua recuperação e ainda da sobreutilização destas instalações, em virtude da superlotação das escolas.

3 — É hoje unanimemente reconhecido que a educação física constitui um factor decisivo para o desenvolvimento global e integral do homem e que a sua prática estimula o desenvolvimento geral da criatividade.

Todas as modernas teorias da pedagogia consideram que, no quadro do processo educativo, a educação física é mais do que uma simples matéria apertada entre várias disciplinas teóricas, constituindo uma dimensão de cultura, uma componente fundamental da educação.

Registam ainda que a prática da educação física na escola se traduz numa economia de tempo, criando nos alunos uma reserva de energia para praticamente todas as outras actividades escolares.

Acresce que quanto ao desporto escolar o incentivo da sua prática é universalmente recomendado como pri-miera prioridade de qualquer política juvenil e desportiva.

4 — O que fica dito deveria ter levado responsáveis governamentais à definição de uma política de construções escolares que privilegiassem a existência de instalações e outros equipamentos para a educação física e a prática do desporto escolar. Porém, a política seguida teve como objectivo precisamente o contrário. Trata-se de um aspecto cuja correcção não pode ser por mais tempo protelada pela Assembleia da República.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assi-

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nados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte projecto de lei:

ARTIGO 1."

1 — Os projectos de construção de estabelecimentos de ensino preparatório e secundário incluirão obrigatoriamente pavilhões gimnodesportivos.

2 — A construção dos pavilhões gimnodesportivos será executada em simultâneo com a construção das restantes instalações escolares.

ARTIGO 2.»

O Governo, no prazo de 90 dias, publicará, através de decreto-lei, o plano de construção de pavilhões gimnodesportivos para os estabelecimentos de ensino preparatório e secundário onde eles não existam.

ARTIGO 3."

São revogadas todas as disposições legais que contrariem o disposto na presente lei, designadamente o Despacho n.° 29/81, de 13 de Novembro, do Secretário de Estado das Obras Públicas.

Assembleia da República, 5 de Dezembro de 1984. — Os Deputados do PCP: Jorge Lemos — Paulo Areosa — Jorge Patrício — Rogério Fernandes — Maria Luísa Cachado — José Magalhães.

PROJECTO DE LEI H.° 408/ISI

REVOGAÇÃO 00 DECRETO-LEI N.° 301/84, DE 7 DE SETEMBRO, QUE PÕE EM CAUSA OS DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS QUE ASSEGURAM 0 EFECTIVO CUMPRIMENTO DA ESCOLARIDADE GSaiSATÚRÍA A TODOS OS CIDADÃOS.

O alargamento e a efectivação da escolaridade obrigatória constituem um dos objectivos nodais de uma política democrática de ensino.

Fruto de uma longa e porfiada luta em prol da formação educacional do povo português, o ensino básico veio ganhando, após a Constituição de 1976 e na vigência do 25 de Abril, um estatuto novo e mais exigente.

O ensino básico com a duração de 6 anos (desde 19b8) constitui o nível mínimo de escolaridade obrigatória, cabendo ao Estado assegurar o seu cumprimento e promover as medidas para que seja universal e gratuito.

É nesta perspectiva que devem ser analisados os vários aspectos que se relacionam com o ensino básico, quer quanto à sua duração, quer quanto ao seu cumprimento.

A passagem de 4 para 6 anos de escolaridade obrigatória peca por insuficiente. Portugal é, a este nível, um dos países mais atrasados da Europa, onde a escolaridade obrigatória se prolonga por 9 a 10 anos. Aliás, aguardam discussão na Assembleia da República vários projectos de lei sobre o sistema educativo e são unânimes em estabelecer 9 anos de escolaridade obrigatória.

Sucede, porém, que os 6 anos actualmente estabelecidos não estão a ser cumpridos. Calcula-se em 11 % a proporção de alunos que, concluindo com êxito o ensino primário, não se inscrevem em nenhum ramo de ensino. Segundo inquérito oficial são os seguintes os dados referentes aos alunos que finalizaram o ensino primário em junho de 1983 e não se matricularam no ensino preparatório no ano lectivo de 1983-1984:

"VER DIÁRIO ORIGINAL"

É igualmente elevada a percentagem daqueles que não cumprem a escolaridade obrigatória, apontando-se para uma taxa superior a 19 %.

Face a esta situação, que põe em evidência que, para um número muito significativo de crianças, a escolaridade obrigatória não existe, abandonando precocemente o sistema de ensino, seria de esperar que legislação sobre esta matéria fosse encaminhada no sentido de dificultar, e não facilitar, as situações de incumprimento que se verificam. Mas o Governo e o Ministério da Educação fazem exactamente o contrário. Publicam o Decreto-Lei n.° 301/84, de 7 de Setembro, que «liberaliza» a dispensa da obrigatoriedade escolar. O confronto entre este diploma e o Decreto-Lei n.° 538/ 79, de 31 de Dezembro, que estabelecia o regime legal de escolaridade obrigatória, é deveras elucidativo.

Em primeiro lugar, enquanto este último só autoriza dispensa da obrigatoriedade escolar quando comprovada a incapacidade física ou mental da criança pelos Centros de Medicina Pedagógica de Lisboa, Porto e Coimbra, pelos Serviços da Direcção-Geral do Apoio Médico ou dos Centros de Saúde do Ministério dos Assuntos Sociais e, mesmo assim, sob despacho ministerial, o Decreto-Lei n.° 301/84 entrega essa autorização ao critério das autoridades sanitária e escolar da zona.

A avaliação da incapacidade física ou mental de uma criança é assunto que exige sempre o parecer de especialistas. Não é qualquer autoridade sanitária ou escolar que está em condições científicas de o fazer.

Admitamos, porém, que tal incapacidade total ou parcial é efectivamente detectada. A ser assim extingue-se, porventura, o direito da criança à educação e o correlativo dever do Estado de a assegurar pelos meios adequados? De forma alguma! O Estado não pode

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isentar-se da obrigação constitucional de proporcionar os meios para que a todas as crianças seja assegurado o acesso à educação, de forma adequada, em função das suas carências específicas.

Por outro lado, certas disposições, anteriormente contempladas pelo Decreto-Lei n.° 538/79, foram suprimidas ou desvirtuadas pelo Decreto-Lei n.° 301/84:

Assegurava-se o direito ao ensino às crianças das escolas especiais e das comunidades portuguesas no estrangeiro, aspecto não previsto actualmente;

Estabelecia-se que a gratuitidade do ensino envolvia isenção de propinas, transportes gratuitos em caso de residência a mais de 3 ou 4 km da escola, suplemento alimentar, concessão de alimentação e alojamento, em condições fortemente bonificadas, auxílios económicos directos, admitindo-se a possibilidade de assegurar a gratuitidade total quanto à alimentação, alojamento e material escolar. Admite-se hoje o não pagamento de propinas, a garantia de instalações escolares adequadas e a isenção do imposto do selo. Quanto a todos os restantes aspectos, a administração central reparte, desde logo, as suas competências com a administração regional e local, desonerando-se, como veio a ver-se, do que considera um pesado fardo.

Prescreviam-se penalizações pecuniárias aos indivíduos ou entidades privadas que acolhessem menores em idade de obrigação escolar em locais de espectáculo ou diversão durante as horas lectivas ou os empregassem durante as mesmas horas. Agora, elimina-se tal disposição.

Mas mais preocupantes ainda são os preceitos do Decreto-Lei n.° 301/84 que se referem ao aproveitamento do aluno e à possibilidade de o sistema de ensino rejeitar todos aqueles que não têm sucesso na aprendizagem. Introduzem-se, nomeadamente, conceitos retrógrados fazendo recair sobre as crianças um «dever de aproveitamento», entendido em termos tais que pe-nalisa as crianças que sofrem já as repercussões das causas fundamentais do insucesso escolar. Este funda-se, reconhecidamente, na situação sócio-económica familiar e nos disfuncionamentos do próprio sistema de ensino.

De acordo com os últimos dados estatísticos fidedignos, a taxa de insucesso no ensino primário é, globalmente, de 18,2 %, afectando 178,2 milhares de alunos em 927,9 milhares. No 5.° e 6.° anos de escolaridade, aumenta para 28,1 %, andando por 86,7 milhares num total de 305,5 milhares. A média global será, pois, de 21,5 %.

Ataca-se o problema do insucesso escolar expulsando as crianças do ensino, «isentando-as» da realização da escolaridade obrigatória. É evidente que as primeiras vítimas serão as crianças de menos recursos económicos, aquelas que, para se deslocarem à escola, têm de percorrer quilómetros a pé, muitas vezes mal alimentadas, e que, necessariamente, não conseguirão acompanhar as exigências dos programas escolares. O Decreto-Lei n.° 301/84 é a resposta de classe do actual Governo às crescentes dificuldades em que tem lançado o País e comprova a disposição de reduzir a procura escolar, reservando o acesso à escola aos filhos daqueles que podem pagá-la.

Revogar o diploma através do qual se pretende consumar tais objectivos é um imperativo de reposição da legalidade democrática, para que não se agrave mais uma situação que envergonha o País e requer urgentes medidas de correcção.

Urge revogar tal diploma.

Nestes termos, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, apresentam o seguinte projecto de lei:

ARTIGO 1.°

É revogado o Decreto-Lei n.° 301/84, de 7 de Setembro, mantendo-se para todos os efeitos em vigor o disposto no Decreto-Lei n.° 538/79, de 31 de Dezembro.

ARTIGO 2°

A presente lei produz efeitos a partir de 1 de Outubro de 1984.

Assembleia da República, 5 de Dezembro de 1984. — Os Deputados do PCP: Jorge Lemos — Rogério Fernandes— Maria Luísa Cachado — Paulo Areosa — Jorge Patrício.

PROJECTO DE DELIBERAÇÃO

aprova medidas tendentes a garantir, com caracter de urgência, a apreciação e votação das iniciativas legislativas referentes as bases gerais

00 sistema educativo.

1 — A interpelação do Partido Comunista Português centrada sobre as questões de política educativa permitiu à Assembleia da República um amplo e pormenorizado exame da situação do sistema de ensino. Durante dois dias foram apreciados pelo Plenário, com a contribuição dos deputados do PCP e de todas as bancadas, os aspectos fulcrais da educação e do ensino em Portugal, tendo sido fornecidos e valorados dados concretos que levam à conclusão de que é necessário e urgente dotar o País de legislação que ponha cobro à situação de indefinição e desagregação que hoje se verifica.

A aprovação de uma lei de bases do sistema educativo constitui uma condição fundamental para a inversão dos rumos da política do sector.

A redução gritante das verbas orçamentais destinadas à educação, a acentuação das restrições do acesso ao ensino, a insignificância da acção social escolar, o incumprimento da já insuficiente escolaridade obrigatória e o aumento do insucesso e precoce abandono escolar em todos os graus de ensino, a falta de resposta às carências no domínio do ensino infantil, a degradação do parque escolar, superlotação, falta de material e regimes escolares diferenciados, a insuficiência da formação de professores e a degradação das suas condições de trabalho, o grassar do analfabetismo e o abandono a que se encontram votados os deficientes — eis alguns dos traços da situação existente, plenamente comprovados ao longo dos debates.

2 — Nos termos do artigo 167.°, alínea e) da Constituição, é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as bases do sistema de ensino. Trata-se de uma competência insusceptível de delega-

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ção no Governo, a exercer com base nos projectos e propostas de lei que sobre a matéria se encontram ou venham a ser apresentados.

É urgente que a Assembleia exerça as competências que nesta esfera lhe cabem.

Nestes termos, os deputados abaixo assinados apresentam o seguinte projecto de deliberação:

A Assembleia da República delibera que seja incluída na ordem do dia do Plenário, nos termos e segundo os trâmites do artigo 67.° do Regimento, a discussão e votação urgentes de todas as iniciativas legislativas referentes às bases gerais do sistema educativo.

Assembleia da República, 5 de Dezembro de 1984. — Os Deputados do PCP: Carlos Brito — Rogério Fernandes— Jorge Lemos — Maria Luísa Cachado — Paulo Areosa — Jorge Patrício.

Petição n.» 36/111

Ex.mo Sr. Presidente da Assembleia da Repú-bbca:

Os abaixo assinados, no uso do direito de petição consignado no artigo 52.° da Constituição da República, vêm junto de V. Ex.a expor e requerer o seguinte:

1 — Recentemente, pelo Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, foram criadas duas empresas de transportes marítimos, a PORTLINE — Transportes Marítimos Internacionais, S. A. R. L., e a TRANSINSULAR— Transportes Marítimos Insulares, S. A. R. L.

2 — Embora aquele diploma legal o não refira, trata-se de um passo decisivo no sentido da extinção das duas maiores empresas do sector, a CTM e a CNN, extinção essa que, aliás, o Ministro do Mar, na reunião de 24 de Outubro de 1984 com a Comissão de Economia dessa Assembleia, confirmou claramente.

Desta forma, não se resolve nenhum dos problemas do sector, antes decididamente os agrava.

4 — Nem sequer se garante a transferência dos trabalhadores da CTM e da CNN para as novas empresas agora criadas, o que significa que, se os postos de trabalho na CTM e na CNN estavam ameaçados ficam agora definitivamente comprometidos com a criação das duas empresas.

5 — Mais uma vez o interesse da economia nacional e o interesse dos trabalhadores coincide na exigência de recuperar a CTM e a CNN e não de as afundar, como se pretende com a medida legislativa em apreço.

6 — Mas o Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, é também inexoravelmente inconstitucional, porquanto:

Estabelece que às duas empresas, PORTLINE e TRANSINSULAR, se não aplicam os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho, salvo quando os órgãos de gestão expressamente o determinem;

Conduzirá, por via da transferência de bens da CTM e da CNN para as novas empresas, à reprivatização de património nacionalizado.

7 — O diploma viola, pois, o direito constitucional das associações sindicais à contratação colectiva de trabalho (artigo 57.° da Constituição da República Portuguesa) e, ainda, o princípio da irreversibilidade das nacionalizações (artigo 83.° da Constituição da República Portuguesa).'

8 — Acresce que ao autorizar-se, pelo Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, a constituição de 2 empresas privadas, não se garantiu, nos termos do artigo 4.° da Lei n.° 46/77, de 8 de julho, a viabilidade e desenvolvimento das empresas públicas do sector, CNN e CTM.

Pelo que se impõe:

Que essa Assembleia da República sujeite a ratificação o Decreto-Lei n.° 336/84, de 18 de Outubro, e, em vista das razões sobreditas, recuse a ratificação de tal diploma, desde já suspendendo de imediato a sua aplicação.

Lisboa, 11 de Novembro de 1984. — Pelas Organizações Representativas dos Trabalhadores da Marinha Mercante, Eugénio Matos de Oliveira (e mais 1429 signatários).

Aviso

Por despacho de 23 de Outubro último do presidente do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP):

Florbela da Luz Teixeira Pires — nomeada secretária do Gabinete de Apoio ao referido Grupo Parlamentar, nos termos dos n.os 3 e 4 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 267/77, de 2 de Julho, e do artigo 15.° da Lei n.° 32/77, de 25 de Maio, com a nova redacção dada pela Lei n.° 5/83, de 27 de Julho, com efeitos a partir de 6 de Dezembro corrente.

(Não são devidos emolumentos.)

Direcção-Geral dos Serviços Parlamentares, 3 de Dezembro de 1984. — O Director-Geral, José António G. de Souza Barriga.

PREÇO DESTE NÚMERO 15$00

Imprensa Nacional - Casa da Moeda, E. P.

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