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II Série — Número 47

Sexta-feira, 1 de Fevereiro de 1985

DIÁRIO

da Assembleia da República

III LEGISLATURA

2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)

SUMÁRIO

ACTA DA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO DE 31 DE JANEIRO DE 1985

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 10 horas e 40 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, como tenho repetido nas outras reuniões, vamos iniciar os nossos trabalhos com algum atraso, pelo que, em relação às intervenções iniciais, peço a mesma disciplina, colaboração e metodologia que até hoje se tem verificado de modo que possamos recuperar parte do tempo perdido.

Dado que se encontra presente a Sr.8 Secretária de Estado da Administração Autárquica, vamos começar por debater o orçamento deste departamento de Estado.

Pergunto, pois, à Sr.a Secretária de Estado se pretende fazer uma intervenção prévia.

A Sr." Secretária de Estado da Administração Autárquica (Helena Torres Marques): — Não vale a pena fazer outra intervenção, Sr. Presidente, visto que já todos me ouviram falar sobre a administração autárquica aquando da discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado em Plenário.

Por outro lado, o Sr. Ministro da Administração Interna, que está em Conselho de Ministros, deve dizer daqui a pouco quando se poderá deslocar à Assembleia da República.

Por tudo isto, creio que seria preferível, desde que o Sr. Presidente concorde, ficar a aguardar as questões que os Srs. Deputados pretendam colocar, respondendo-lhes no final.

O Sr. Presidente: — Muito bem, Sr.8 Secretária de Estado.

Para questionar a Sr.8 Secretária de Estado, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Saias.

O Sr. Luís Saias (PS): — Sr." Secretária de Estado, ninguém ignora, em Portugal, a gravidade e a enorme importância dos problemas de saneamento básico da província do Algarve.

E não só para as populações locais os problemas são de maior importância; eles revestem-se também de grande acuidade pelo facto de o Algarve ser uma província com um desenvolvimento turístico perfeitamente ímpar e excepcional no nosso país.

Está na memória de todos o que sucedeu este ano em Albufeira, com surtos de doenças que, de alguma maneira, prejudicaram o turismo no Algarve, e, por outro lado, todos sabem da existência de problemas da maior gravidade noutros concelhos. Cito, por exemplo, o de Olhão, onde se está a proceder a uma remodelação global da rede de esgotos, que neste momento está, talvez, a meio dos respectivos trabalhos, faltando ainda a outra metade; há também problemas da maior gravidade em Lagos, em Portimão e também um problema candente para todo o Algarve — e que passou mesmo as nossas fronteiras —, que é o do saneamento da ria Formosa.

Neste momento, o Algarve traz para o País divisas na ordem dos 70 milhões de contos por ano. É, pois, uma fonte de receitas em moeda estrangeira que o País, de forma nenhuma, pode dispensar ou pôr em perigo.

Por outro lado, todos sabemos — e o Governo também — que a capacidade de endividamento das câmaras municipais do litoral algarvio está esgotada. E mesmo que houvesse a possibilidade de recorrerem a créditos, não poderiam fazê-lo porque não tinham forma de pagar os juros.

Daí que, até agora, o saneamento básico do Algarve tenha estado a ser facilitado por uma linha de crédito — que foi aberta em 1981 para vigorar durante 4 anos, os quais acabaram, precisamente, no fim do ano passado, se bem que a utilização de uma parcela ainda esteja em curso —, linha de crédito essa que era, como estarão lembrados, de 3 milhões de contos.

Face às enormes carências das Câmaras em matéria de financiamento — carências que as impedem de continuar as obras de saneamento básico e de executar outras —, face às circunstâncias de a linha de crédito que tem vigorado ter terminado o seu prazo e estar esgotada, a pergunta que lhe faço, Sr.8 Secretária de

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Estado, é a seguinte: o que é que está previsto nesta matéria? Prevê o Governo a possibilidade de abrir novas linhas de financiamento? Em caso afirmativo, quais os seus montantes?

A segunda questão refere-se à Comissão de Saneamento Básico do Algarve.

Esta Comissão, que tem 2 ou 3 anos, tem efectuado, como todos sabem, um trabalho meritório, mas os instrumentos jurídicos de que dispõe não lhe proporcionam um trabalho mais aprofundado.

Consta que existe a intenção de promulgar nova legislação relativa àquela Comissão, legislação essa que lhe viria a dar a possibilidade de gerir fundos que sejam postos à sua disposição destinados ao saneamento básico do Algarve. São estes instrumentos jurídicos que não existem actualmente, pois que a Comissão de Saneamento Básico do Algarve apenas se limita a dar pareceres, sendo os financiamentos negociados depois com a Caixa.

Dai que a segunda pergunta seja a seguinte: tem o Governo a intenção de promulgar em breve os instrumentos de que a Comissão de Saneamento Básico do Algarve carece para poder desenvolver a sua acção?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Belchior.

O Sr. António Belchior (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta nossa primeira intervenção destina-se a apresentar várias propostas de substituição, de eliminação e de alteração da proposta de Lei do Orçamento do Estado para 1985, as quais foram entregues na Mesa da Assembleia da República na altura do debate na generalidade daquela proposta de lei.

A primeira proposta de substituição refere-se ao n.° 1 do artigo 53.°, e é do seguinte teor:

O volume global de financiamento do Fundo de Equilíbrio Financeiro para despesas correntes e de capital correspondente ao aumento mínimo de 30 % para cada autarquia, da verba transferida em 1984, no total de 69 899 175 contos, distribuída nos termos do mapa anexo (com 19 folhas).

Esta nossa posição foi anunciada durante a intervenção de fundo que produzimos em Plenário [...]

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, permite-me que o interrompa?

O Orador: — Faça favor, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Vê o Sr. Deputado algum inconveniente em que, previamente à sua intervenção, sejam fotocopiadas e distribuídas as propostas, sendo-lhe dada a palavra em seguida para continuar a apresentação que estava fazendo?

O Orador: — Não, Sr. Presidente, não vejo qualquer inconveniente.

O Sr. Presidente: — Sendo assim, tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): — Dado que o Sr. Deputado Luís Saias já focou alguns aspectos importantes do problema que eu ia levantar, limitar-me-ei a acrescentar apenas algumas notas sobre ele.

A Comissão de Saneamento Básico do Algarve foi criada para resolver uma solução de emergência e a própria estrutura que ela tem e a caracteriza foi montada para esse plano de emergência.

Ora, o nosso entendimento vai no sentido da necessidade de se passar de uma situação de emergência para uma situação de planeamento futuro.

De facto, a Comissão foi criada para tapar os buracos e eliminar as situações mais gravosas. Todavia, penso que logo nessa altura se deveria ter começado a tratar do problema de fundo, mas, no entanto, nunca mais se fez nada nesse sentido.

Julgo que a vida útil da Comissão de Saneamento Básico, na perspectiva do plano de emergência de que estava incumbida, está a chegar ao fim, tendo desempenhado a sua missão de forma satisfatória.

Por isso, torna-se agora necessário fazer uma reprogramação ou reapreciação do que se pretende no domínio do tratamento do saneamento básico do Algarve. Se assim não for, não tenho dúvida em como daqui a 5 anos as situações de ruptura serão tão grandes ou maiores do que as que se verificaram há 4 anos atrás.

A situação é só esta, sem dramatismo mas com o realismo e a importância que o problema justifica. São, de facto, os problemas de Olhão, de Portimão, de Lagos, de Faro, mas são também os problemas de todos os concelhos onde as soluções não foram programadas para as necessidades dos próximos 10, 20 ou 30 anos. Tais soluções serviram para fazer face aos projectos que o antigo planeamento do Algarve possuía, logo após o 25 de Abril, mas não previam as necessidades futuras: essa acção fez-se apenas em função do que estava previsto nessa altura.

A questão agora, mais do que dizer directamente respeito ao Ministério da Administração Interna — pode dizer respeito, mas então têm que ser alteradas algumas estruturas —, tem muito a ver com os Ministérios do Equipamento Social e da Qualidade de Vida, que são os três ministérios que estão muito interligados

nesta matéria.

A pergunta concreta é a seguinte: entende o Governo que o problema do saneamento básico do Algarve se resolve com a concessão de subsídios a câmaras individualmente consideradas ou, pelo contrário — e tal como se tem feito no Sul da Europa —, entende que o problema do saneamento básico daquela região, encarado numa perspectiva de médio e longo prazos, terá de ser equacionado com base num programa e num plano globais destinados ao tratamento dos esgotos do Algarve?

Por mim, não vejo outra solução que não seja a de um plano global. Aliás, já há alguns anos atrás foi aberto um concurso público, a que concorreram várias empresas, destinado à apresentação de projectos de tratamento de todo o saneamento básico do Algarve.

Segunda pergunta: Conseguirá o Governo conciliar a existência, no Algarve, de uma Comissão de Coordenação Regional, de uma Comissão de Saneamento Básico e de uma repartição da Direcção-Geral do Saneamento Básico? Como é que se admite que tudo isto continue a existir, se é certo que todos têm, ou devem ter, os mesmos objectivos?

É evidente que esta é uma situação perfeitamente insustentável. E é tão insustentável que os conflitos que já estão a surgir seriam inevitáveis.

Não se trata aqui de curar quem tem ou não tem razão. O que interessa, sim, é fazer uma definição orgânica.

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Em minha opinião, não vejo motivo para que a Comissão de Coordenação Regional do Algarve não assuma a coordenação de um processo destes.

Para além disto, convirá salientar que a Comissão de Saneamento Básico do Algarve foi criada quando a Comissão de Coordenação Regional ainda não estava praticamente a funcionar. Existia legal e formalmente mas não ainda na prática, razão pela qual se justificou a criação da Comissão de Saneamento Básico. O motivo da criação desta foi, portanto, uma situação de emergência, a par da necessidade de ali levar o poder político directo como forma de «cortar» mais burocracias. A situação é hoje realmente diferente.

Nesta perspectiva, resumo as duas perguntas que fiz: quando é que se lança o programa global de tratamento dos esgotos do Algarve e qual é, na perspectiva orgânica, o entendimento do Governo sobre a maneira mais funcional, dentro da filosofia que o Executivo vem defendendo e que nós apoiamos, de aliminar uma série de serviços que vão proliferando — embora todos possam ter a sua justificação, pois basta estar um indivíduo à sua frente para, ele próprio, vir dizer que o serviço não deve ser extinto, como é óbvio e resulta das regras universais.

Eram estas as questões que conviria ver esclarecidas, Sr.a Secretária de Estado.

O Sr. Presidente: — Vou dar agora a palavra ao Sr. Deputado António Belchior para que possa prosseguir a intervenção interrompida há pouco.

O Sr. António Belchior (PCP): — Em relação à proposta de substituição do n.° 1 do artigo 53.°, lida na minha intervenção anterior, esclareço que já na semana passada havíamos dito em Plenário quais as razões que lhe estavam subjacentes.

Esta proposta não se destina sequer a melhorar a situação das finanças das autarquias locais, mas visa tão-só — e isto é importante — manter a capacidade de resposta das autarquias a um nível idêntico ao de 1984, uma vez que, como é sabido, a inflação atingiu os 29,5 %, quase 30 %. Com esta proposta visa-se, pura e simplesmente, manter a eficácia da resposta das autarquias locais a um nível semelhante ao de 1984.

Relativamente ao artigo 53.°, n.° 4, propomos simplesmente a sua eliminação, com o seguinte fundamento e na sequência do que expusemos anteriormente: se viesse a ficar consagrado este n.° 4 do artigo 53.°, que dá a possibilidade de cativar verbas de algumas autarquias seja a que título for, isso significaria a ruptura financeira a muito breve prazo de algumas autarquias, como é certamente do conhecimento de todos os Srs. Deputados.

Daí a nossa proposta de eliminação do n.° 4 do artigo 53.°

Quanto ao artigo 54.°, fazemos a seguinte proposta de alteração:

Artigo 54.°

(Novas competências)

É integrada no Fundo de Equilíbrio Financeiro uma verba no montante de 3 900 000 contos destinada ao financiamento, em 1985, do exercício, pelos municípios, das competências em matéria de transportes escolares e de acção social escolar.

Como é do conhecimento geral, a verba inscrita na proposta de Lei do Orçamento é de 3 milhões de contos.

Nós agravámos para 3 900 000 de contos, com o seguinte fundamento: consideramos que a verba distribuída no trimestre Outubro/Dezembro foi claramente insuficiente para a grande maioria dos municípios. Posso dar o exemplo da Câmara de Beja, a minha cidade, que recebeu 6150 contos, quando os encargos com os transportes escolares e a acção social escolar ultrapassaram os 10 000 contos. Este é apenas um exemplo mas outros há, embora não os vá citar aqui, por economia de tempo.

Consideramos, portanto, que a verba atribuída pelo Governo, ou seja, os cerca de 775 000 contos, foi claramente insuficiente e que a verba adequada deveria ter sido de 1 milhão de contos.

Daí que, na linha do nosso raciocínio anterior, tenhamos apresentado uma proposta no sentido do agravamento para 3 900 000 contos, verba que consideramos adequada para que as autarquias possam responder com eficácia e atempadamente aos transportes escolares e à ASE.

Relativamente ao artigo 55.°, propomos a seguinte alteração:

Artigo 55.°

(Distribuição do Fundo de Equilíbrio Financeiro)

0 montante global a atribuir a cada município no ano de 1985 não pode ser inferior ao que em 1984 lhe foi atribuído, acrescido de um valor percentual de 30%.

Por ser evidente, esta proposta não carece de qualquer explicação.

Quanto ao artigo 56.°, apresentamos a seguinte proposta de alteração:

Artigo 56.°

[■■•1

No ano de 1985 será afectada uma verba de 300 000 contos destinadas à concessão de auxílio financeiro às autarquias locais que venham a encontrar-se na situação prevista na alínea a) do n.° 2 do artigo 18.° do Decreto-Lei n.° 98/84, de 29 de Março.

Esta proposta visa, portanto, contemplar os casos previstos na alínea a) do n.° 2 do artigo 18.° do Decreto-Lei n.° 98/84.

No que se refere ao artigo 57.°, propomos a seguinte alteração:

Artigo 57.°

(Finanças distritais)

1 — Para além das receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis, os distritos serão dotados de verbas proporcionais às que couberam ao conjunto de municípios da sua área.

2 — No ano de 1985, será transferida do Orçamento do Estado, para efeitos do número anterior, a importância de 300 000 contos.

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3 — 0 plano de distribuição de verbas aos distritos será publicado mediante decreto-lei.

Para o artigo 58.° propomos a seguinte alteração:

Artigo 58.°

(Instalações para municípios e freguesias)

1 — No ano de 1985 o Governo financiará, de acordo com critérios mediante decreto-lei, tendo em conta a distribuição regional de carências a construção de sedes de juntas de freguesia até ao montante de 220 000 contos.

2 — No ano de 1985 o Governo financiará a instalação de novos municípios e freguesias, até ao montante de 200 000 contos.

3 — No ano de 1985 o Governo transferirá a verba de 80 000 contos para o Município da Amadora, institucionalizado pela Lei n.° 45/79, visando a compensação dos custos de instalação do município nos termos daquela lei.

Duas notas relativamente a esta proposta. Primeira, no n.° 2 referem-se os municípios criados ou a criar. Segunda, com esta proposta faz-se uma nova distribuição dos 500 000 contos inscritos na proposta de lei do Orçamento do Estado, distribuição esta que nos parece mais racional.

Em conclusão, devo dizer que este conjunto de propostas visa manter a eficácia e a capacidade de resposta do poder local num nível idêntico ao de 1984, facto que é realmente importante.

Entretanto, assumiu a Presidência a Sr." Vice--Presidente Ilda Figueiredo.

A Sr." Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Avelino.

O Sr. Alberto Avelino (PS): — Parece-me que estamos aqui a fazer alguma «salada» nas intervenções: começámos com o saneamento básico de uma região, assunto que me parece estar mais no âmbito dos Ministérios do Equipamento Social e da Qualidade de Vida, e saltámos agora para um aspecto totalmente diferente, qual seja o do articulado da proposta de lei do Orçamento do Estado referente ao poder local, particularmente às finanças locais.

Quanto ao primeiro caso, naturalmente que devemos reconhecer todo o interesse posto pelos Srs. Deputados Luis Saias e José Vitorino na defesa da sua região algarvia. No entanto, se cada um de nós, de per si, também quiser defender, e apenas ao nivel costeiro, os problemas gravíssimos do saneamento existentes nas nossas costas, então cada qual levantar-se-á e dirá que está nas mesmas condições, embora aceitando que não possa ter uma receita de cerca de 60 milhões de contos. Mas se pretendemos transformar tudo em dinheiro, desperdiçando tudo, certamente melhor será que separemos os turistas (é um pouco caricato, evidentemente), de modo a evitar a poluição da nossa costa!

Se é certo que a situação do Algarve é difícil e que nos finais de Agosto se registaram problemas — certamente fruto de situações dessa natureza —, não é menos certo que aqui na nossa costa, nomeadamente na zona de Lisboa interrogações várias se colocam aos

turistas, e que só a beleza de Lisboa os atrairá e a proximidade os levará a molhar um pé na nossa costa [ • • •]

Tudo isto para dizer que também lamento que a situação actual do saneamento básico tenha voltado a certos aspectos primitivos.

Lembro que os chamados «Núcleos de Saneamento Básico» tiveram um grande efeito, podendo a Comissão de Saneamento Básico do Algarve vir a ser qualquer coisa de semelhante.

No entanto, tais núcleos desapareceram, morreram aos poucos e daí para cá, tirando algum trabalho das autarquias, pouco ou nada se tem feito nessa área, o que é gravíssimo.

Por outro lado, a capacidade financeira das autarquias para obras desta natureza é relativa, tal como a própria capacidade técnica não pode ser muito grande, tudo se limitando ao transporte de esgotos, sem o tratamento devido, para a primeira linha de água, cujo destino é, naturalmente, o mar.

Daqui decorre a afectação bastante grande de toda a nossa zona costeira — só ao nível do esgoto doméstico, sem considerar, portanto, o esgoto industrial.

Por isso, não me parece curial que se faça esta pergunta apenas ao membro do Governo ligado à administração autárquica, antes devendo ser feita a todo o Governo: que política de saneamento para este País (entendendo por saneamento o esgoto e o seu tratamento nas estações depuradoras)?

Por outro lado, enquanto na CEE se debatem, analisam e já estão em franco desenvolvimento os Programas Integrados do Mediterrâneo, os quais vão abordar, em larga escala, aspectos de saneamento em toda a outra componente — a económica —, nós andamos a brincar aos planos integrados de desenvolvimento.

Digo que andamos a brincar porque se nota uma coisa muito engraçada no Orçamento deste ano: certos Ministérios pura e simplesmente retiraram verbas para obras desses chamados «Planos Integrados». E então o que fica? Fica a sigla PIDR, que é muito bonita e difícil — é muito bonito dizer que se trata de um Plano Integrado de Desenvolvimento Regional —, mas no fundo o que se verá são apenas algumas obras daquilo que se supunha vir a poder ser um plano de desenvolvimento integrado.

Uma vez que há Planos Integrados de Desenvolvimento, penso que o saneamento básico seria um dos que mereceria a prioridade quando da elaboração desses Planos Integrados de Desenvolvimento, facto que infelizmente não sucede.

Mais grave me parece ainda que surja no programa de recuperação económica e financeira do Governo qualquer coisa como isto: as zonas costeiras são aquelas que, em princípio, não devem ser beneficiadas em termos de desenvolvimento regional e dos respectivos Programas Integrados. Isto é que é gravoso.

Ora, seria aí, segundo penso, que poderia ter cabimento não só este problema do Algarve, que é importantíssimo, mas toda a questão do saneamento básico do País, nomeadamente o aspecto do salvamento das linhas de água de toda a zona do oceano.

Disse o Sr. Deputado José Vitorino que a Comissão de Coordenação da Região do Algarve deveria assumir todo o processo do saneamento básico.

Mas, Sr. Deputado, por que razão a CCR do Norte, a CCR do Centro, a CCR do Alentejo e a CCR de Lisboa e Vale do Tejo não têm essas mesmas funções?

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Parece-me que não devemos atribuir determinadas funções apenas a uma dada CCR, deixando as outras «descalças» em matéria idêntica.

Quanto às propostas apresentadas pelo Sr. Deputado António Belchior, pronunciar-me-ei oportunamente.

Neste momento, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almerindo Marques.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): — Sr.8 Secretária de Estado, começaria por fazer umas breves considerações, na sequência da intervenção já por mim feita em Plenário e também da que o Sr. Deputado Alberto Avelino acaba de fazer.

O problema tem, de facto, o bonito nome de «Planos Integrados», mas de integração por vezes não se vislumbra nada. Têm o nome de «Integrados» mas estão todos é desintegrados, na medida em que as acções que deveriam ser desenvolvidas, quantas vezes em paralelo, para que se extraísse das várias obras a empreender, o seu real benefício, são feitas por fases tão distanciadas no tempo que há desaproveitamentos, desperdícios, quando não uma inutilidade, decorrido o tempo que separa umas acções das outras.

Entendemos que isto é fruto não só de uma deficiente elaboração dos próprios projectos, mas também do facto de as execuções ficarem exclusivamente na dependência do responsável por cada sector que as vai executando consoante aquilo que entende prioritário.

Quanto a estes Planos Integrados de Desenvolvimento Regional, que são extremamente importantes desde que bem preparados, bem estudados, bem delineados, para resolver os problemas regionais — será resolver gravíssimos e importantes problemas nacionais, pois o todo é constituído pelas varias partes — entendemos que deveriam ser objecto de uma dotação própria, cada um de per si e serem autonomizados.

Quanto aos Planos já em curso concordamos que neste momento será difícil fazer, de repente, uma mutação totaí relativamente a essa situação. No entanto, pensamos que, do que consta das Grandes Opções do Plano e das dotações relativamente às acções preparatórias de novos planos integrados de que se exemplificam 3 — mas admito que outros poderão ser incluídos e se poderão, até, analisar melhor as respectivas prioridades — que essas acções preparatórias — e daríamos, assim, o primeiro passo — deviam ficar concentradas numa só dotação, num só ministério, neste caso concreto e até por força da própria lei orgânica do Ministério da Administração Interna.

Essas acções preparatórias e os respectivos estudos, trabalhos, etc, deveriam ser coordenados e dever-se--ia procurar, no futuro, encontrar a solução para uma boa articulação de modo que pudéssemos falar em Planos Integrados de Desenvolvimento Regional.

Nesse sentido, iremos apresentar uma proposta pois parece-nos que esse será realmente o caminho a seguir, e, no fundo, o que se extrai do seu espírito é o que vem na sequência do documento base de política de desenvolvimento regional, que foi aprovado pelo Governo em Janeiro de 1984 e publicado em Março do mesmo ano.

Entendemos também — e já o referimos — que a verba referente a investimentos intermunicipais deve ser reforçada para aquela que nos foi anunciada relativa

ao empréstimo contraído para diversos fins, um dos quais seria distribuir 24 milhões de contos para investimentos intermunicipais. Portanto, é essa verba que entendemos dever ser incluída nos investimentos do Plano do Ministério da Administração Interna para esses investimentos intermunicipais.

Faremos uma proposta nesse sentido. Aliás, o Sr. Deputado Alberto Avelino subscreve inteiramente o pensamento que lhe está subjacente.

Pretendia ainda fazer umas observações, que, no fundo, serão umas perguntas à Sr.8 Secretaria de Estado, a propósito da proposta de lei n.° 95/111, designadamente quanto aos artigos 57.° e 58.°

No n.° 2 do artigo 57.° diz-se que «(...] no ano de 1985 constituirá receita do Estado, destinada a financiar os encargos referidos no número anterior bem como despesas administrativas de governos civis, o montante correspondente [...]». Se bem entendo, é inscrita no Ministério da Administração Interna uma importância de 300 000 contos para financiar o funcionamento de assembleias distritais, mas dos cofres privativos dos governos civis são transferidos para o Estado 15 %, que vão depois perfazer essa verba de 300 000 contos. Portanto, esses 15 % destinam-se precisamente a cobrir a verba de 300 000 contos.

Gostaria de saber se isto é efectivamente assim e se todos os encargos, designadamente face à nova legislação recentemente publicada sobre os gabinetes dos governadores civis, também estão englobados nesses 300 000 contos ou se esses são exclusivamente suportados pelo que resta dos cofres privativos.

Quanto ao artigo 58.°, atribui-se uma verba de 500 000 contos para financiar a construção de sedes de juntas de freguesia e gostaria de saber se esse montante é para financiar a construção de novas sedes ou se é para completar pagamentos e, neste caso, qual o número aproximado de sedes já em construção. Gostaria, pois, de ser esclarecido relativamente à verba para ficar com a ideia de quanto é o financiamento real de construção de novas sedes de junta de freguesia.

Pediria também à Sr.8 Secretária de Estado que me desse uma ideia dos critérios a que se refere o n.° 2 do artigo 58.°, que estão nos objectivos do Governo para esse financiamento.

Quanto à proposta de alteração apresentada pelos Srs. Deputados do PCP sobre o artigo 57.°, a que me referi, parece-me haver uma inversão total da filosofia constante da proposta de lei. Se bem compreendi, no entendimento dos Srs. Deputdos proponentes esta receita dos cofres privativos fica, na totalidade, nos respectivos distritos e será ainda transferida uma verba de 300 000 contos. Portanto, toda a receita dos cofres privativos mantém-se nos distritos e eles serão ainda dotados de verbas proporcionais às que couberem aos municípios mais os 300 000 contos.

Gostaria que os Srs. Deputados do PCP me dissessem quanto é que isto representa de acréscimo.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.

O Sr. Manuel Fernandes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Pretendia entrar nalgumas questões ligadas às verbas das finanças locais mas as intervenções já surgidas levam-me a apreciar algumas questões, nomeadamente as levantadas em relação ao Algarve pelos Srs. Deputados José Vitorino e Luís Saias.

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As questões levantadas pelos Srs. Deputados têm sido também alvo da nossa preocupação, nomeadamente por parte dos meus camaradas Carlos Brito e Margarida Tengarrinha, deputados pelo Algarve.

Temos ideias claras sobre esses problemas nomeadamente o do saneamento básico do Algarve e o da ria Formosa. Pensamos que, por exemplo, em relação ao saneamento básico há que fazer um grande esforço, um esforço público no sentido de tentar encontrar solução para o problema.

De qualquer forma e em sequência dos trabalhos desta Comissão reservar-nos-íamos para, talvez em sede de discussão do orçamento de outros Ministérios, abordarmos estas questões e a importantíssima questão do saneamento básico do Algarve.

Voz inaudível do Sr. Deputado Luís Saias.

O Orador: — Os Ministérios do Equipamento Social e da Qualidade de Vida abrangem este problema e completam-se nessa preocupação.

Voltando à questão das finanças locais, também na sequência das intervenções que produzimos em Plenário e das preocupações que manifestámos aos Srs. Membros do Governo em reuniões da Comissão da Administração Interna, afirmámos que havia uma diferenciação extremamente grande entre as verbas para os distritos não só se analisarmos isso a nível distrital, isto é, de distrito pra distrito mas também a nível global.

Não é que consideremos esses aumentos demasiados mas, comparando com a situação global, verificamos haver distritos com aumentos na casa dos 31 % e outros com aumentos de 14,9 %, 16,8 % e 17 %, como tive oportunidade de referir em Plenário.

A nível de municípios também detectámos e assinalámos várias situações que conhecemos, algumas delas até discutidas em Plenário como foi a de haver municípios que mesmo com a alteração apresentada pelo Governo na Assembleia da República à última hora, vão ficar com um aumento na casa dos 10 % enquanto outros têm aumentos na casa dos 30 %, 40 %.

A Sr.a Secretária de Estado respondeu-me— e não vou questioná-la nesses termos — que essa situação era resultante da aplicação de novos critérios definidos no Decreto-Lei n.° 98/84, das Finanças Locais. Bem, Sr." Secretária de Estado, há critérios e critérios, há leituras de critérios e leituras de critérios e há também valores atirados como bases para eles que devemos tentar analisar com um pouco mais de profundidade, pois, como disse há pouco, é a primeira vez que estes critérios estão a ser aplicados, pelo menos nestes termos definidos e exactos, como estão a ser agora aplicados, visto haver alterações. Há critérios com alterações relativamente à aplicação feita no Orçamento do ano passado e alguns deles foram pouco testados.

Era precisamente sobre essa questão que gostaria de falar aos Srs. Deputados e colocá-los perante algumas situações que conhecemos.

Não temos os dados de que, com certeza, o Governo dispôs mas duvido — e permito-me levantar esta dúvida pelas razões que irei a seguir colocar — que tenha havido a preocupação de verificar, caso a caso, estes números que várias departamentos do Estado forneceram e que não são, de origem, do Ministério da Administração Interna — este recebeu-os de várias Direcções--Gerais e possivelmente tomou-os como bons — mas, neste momento, com a preocupação que temos de deba-

ter esta gravíssima situação das finanças das autarquias, temos necessidade de os aprofundar.

Em primeiro lugar, e manuseando este documento fornecido pelo MAI sobre os vários índices, colocaria uma dúvida que me ressaltou na tentativa difícil de aprofundar e meter-me dentro deste conjunto de informações, muitas delas bastante áridas. No capítulo iv — índices utilizados para o cálculo do Fundo de Equilíbrio Financeiro — as primeiras alíneas, que são talvez as mais objectivas, pois trata-se da população, da área, dos impostos directos, não deixaram de me suscitar reparos.

Na primeira alínea surgiu-me uma situação relativamente à população. Está definido, pelo próprio Decreto-Lei n.° 98/84, já referido, que a partir de 1985, inclusive, o número de habitantes é substituído pelo número de eleitores. Isso está assim definido, essa indicação é dada aqui, quando se refere na coluna «Indicador calculado» essa situação, só que quando verificamos o mapa do documento que penso poder chamar-se documento «LI 1», constatamos que na coluna 1, onde devia estar o número de eleitores, está o número de habitantes pelo último senso.

Esta é uma das coisas sobre as quais gostaria de explicitações. Claro que qualquer um dos números, quer de habitantes quer de eleitores, é objectivo mas, de todo o modo, fica-me uma dúvida.

Na segunda parte, no documento chamado «L2», os critérios são muito menos objectivos pois trata-se da percentagem da área do município em região de montanha, da percentagem média da população carente de infra-estruturas, da situação do peso do tubismo, do peso da emigração. Aqui já se torna mais difícil tirarmos conclusões mas, de qualquer forma, permitia-me fazer alguns reparos.

Analisando os índices sobre a percentagem de montanha dentro da área de determinados municípios, saltou-me esta situação e fiquei quase com a ideia de que, na realidade, a geografia que estudámos tinha sido profundamente alterada e de que a serra da Estrela se encontrava no Algarve! ...

Em relação ao Algarve — e não estão em causa as verbas deste distrito mas sim a aplicação de um critério de orografia —, por exemplo, o concelho de Tavira está 93% em área de montanha, o de Olhão 55%, o de Lagos 86%, o de Albufeira 39% e o de Portimão 91%. Bem, poderia parecer que o concelho de Portimão apanharia a serra de Monchique, mas existe o concelho de Monchique! ...

O concelho de Portimão tem 91% e o de Lagos 86% [...]. Bem, nem sequer estou neste momento a fazer as contas exactas e a dizer se é 86% ou 40%. Não é isso. Apenas comparo as percentagens de área de montanha destes concelhos do litoral algarvio, Olhão, Tavira, Lagos — e não estou ainda sequer a referir Monchique e outros concelhos que, de facto, estão metidos na área de montanha plena — com as da Covilhã, de Gouveia, de Seia, de Belmonte, de zonas das abas da serra da Estrela, e todas elas, têm menos área de montanha do que os concelhos de Lagos ou de Tavira, no Algarve!

Perante isto, e com os conhecimentos de geografia que tive na escola, fica-me a dúvida: então Tavira tem mais área de montanha do que a Covilhã, ou Seia, ou Gouveia?

Mas há ainda outras situações, como é o caso de Miranda do Douro, que anda na casa dos 50%, ao nível

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de Olhão! Claro que nestas zonas de Bragança, de Vila Real, de Trás-os-Montes, pode haver concelhos mais de planalto e, por conseguinte, zonas menos montanhosas mas verifica-se que, no geral, os índices são baixos. Por exemplo, Miranda do Douro tem 55%, Alfândega da Fé 35%, Mirandela 5% (...]. De facto, Mirandela é um dos concelhos menos montanhosos de Bragança só que se compararmos estes 5% com os 86% de Lagos ou com os 91 % de Portimão não percebemos se esses 91 % de Portimão têm também em conta os arranha-céus do Alvor ou da Praia da Rocha!

O Sr. José Vitorino (PSD): — Qual é a percentagem de Portimão?

O Orador: — É 91 % de área de montanha! O Sr. Deputado José Vitorino, por maior razão do que eu, ficou espantado! ...

O Sr. Luís Saias (PS): — Pode tomar isso como um erro gravíssimo!

O Orador: — Está bem, mas precisamente por isso temos de analisar os erros. É que estes dados podem não ser do MAI. O Ministério recebeu-os, como bons, salvo erro, da Direcção-Geral de Florestas, aplicou-os e essa aplicação deu resultados, resultados esses que a Sr.a Secretária de Estado defende na base dos critérios, e eu estou agora a fazer uma tentativa de análise desses critérios.

Mas não fiquemos entre a serra da Estrela, Trás-os--Montes e Algarve, passemos a outras situações. Antes de mais, repare-se que os valores são dados em percentagens e não em ter ou não ter montanhas, o que poderia ser 0 ou 1, mas são em percentagens, por conseguinte admite-se o 3%, o 5% o 15%, etc. Ora, surge aqui a seguinte situação: Braga e Guimarães 0% de área de montanha! 0 é uma planície completa, 0 é 0! Estão aqui Srs. Deputados das zonas de Braga e de Guimarães, mas a ideia que tenho é de que 0 é impossível de se encontrar em Braga e Guimarães.

O concelho de Tábua, no interior do distrito de Coimbra, na zona interior de montanha desse distrito tem 0% também! ... Bem, aqui podem encontrar-se explicações para alguns concelhos que têm percentagens bastante baixas nas suas receitas.

Mas passemos ao distrito de Lisboa, onde também se verificam situações semelhantes. Por exemplo, Sintra — 0%. Será a serra de Sintra, pura e simplesmente, uma ilusão poética?

Mas não é só Sintra que tem 0%; Torres Vedras tem 0% e Sobral de Monte Agraço, um concelho que em nada é parecido com uma planície, tem 0% também!

Não ponho em dúvida os outros concelhos que têm 20 e tal por cento, como Alenquer, ou 40% como o Cadaval. Estou convencido de que essas percentagens estarão próximas do real e não estou sequer em condições de as questionar, agora estou em condições de duvidar e de pôr em causa que Torres Vedras, Sobral de Monte Agraço ou Sintra sejam 0 em área de montanha! E quanto a Setúbal — a serra da Arrábida é 0? Palmela, é 0 em área de montanha?

Trata-se, de facto, de situações relativamente às quais tem de se fazer uma revisão de critérios para não se cair, nalgumas delas, em ridículo.

Mas ainda há mais concelhos em situação de 0 de montanha como Grândola e Santiago do Cacém. Bem,

sabemos no mínimo, ao fazermos a travessia da serra de Grândola e de Santiago do Cacém e passamos por povoações, que não é de 0 e isto não é a percentagem da população em área de montanha. É difícil compreender o 0 para estas zonas. Poderia ser 5%, poderia ser pouco, mas sempre alguma coisa, pois alguma coisa elas têm.

No Alentejo passa-se o mesmo. Mértola tem 0%, e isso não se pode admitir pois o concelho imediatamente ao lado de uma percentagem elevadíssima e quando uma parte do concelho de Mértola, precisamente a ligação com o Algarve é serra, precisamente a mesma que a outra parte a seguir e que tem percentagens de quase 100% — Alcoutim tem 90% e Aljezur 100%!

Depois há também esta situação dos 100 %. Aljezur, de facto, está colocado numa zona que tem uma parte de montanha a considerar, mas daí a 100 % é mesmo não conhecer a costa algarvia, pois a costa do concelho de Aljezur tem zonas que não permitem dizer--se ser 100 % de montanha da mesma forma que a outras não se pode dizer ser 0 %. E esta análise não é total, fi-la pegando nalguns distritos cujas situações por mais gritantes saltavam à vista. No entanto, se houver o cuidado de se analisar concelho a concelho pode ser que se descubram outras situações.

Foi isto que fundamentou a minha afirmação de haver critérios pouco testados. Penso ser urgente testá--los, averiguar como chegaram ao MAI, como se chegou a estes números, pois pode acontecer que a Direcção-Geral de Florestas os receba parcelarmente e haja no departamento dessa Direcção-Geral, no Algarve, um critério de montanha diferente do critério do departamento dessa Direcção-Geral no distrito da Guarda, por exemplo, pois como estes estão habituados a muita montanha pensam que qualquer coisa é uma planície enquanto que no Algarve, se calhar, habituaram-se às praias e qualquer elevação é uma montanha!

Desculpem ter-me alongado tanto, mas penso que havia aqui dados importantes dos quais alguns dos Srs. Deputados ainda não se tinham apercebido.

Mas passemos agora a outra questão. Em relação ao turismo pretende-se, com a aplicação deste critério, contemplar os concelhos que, não tendo uma população residente, têm uma população elevada que utiliza as infra-estruturas desses concelhos, por conseguinte o turismo pesa nesse campo.

Aqui também surge uma situação estranha. Olhando para o distrito de Lisboa verificamos que Oeiras está ao nível do Cadaval. Bem, Srs. Deputados, nós conhecemos o concelho de Oeiras!... Quando vejo que Oeiras tem como índice 774, número médio, e o Cadaval e Ferreira do Zêzere 676 e 734 respectivamente, surge--me logo uma dúvida. Admito que a Sr.a Secretária de Estado tenha uma explicação para ela mas, de qualquer forma, a questão que coloco é a seguinte: então em Algés, em Paço de Arcos, em Oeiras, não há elevado número de turistas que utilizam as infra-estruturas dò concelho de Oeiras? E isso tem alguma semelhança com o que se passa no concelho do Cadaval, que não tem nem de perto nem de longe o turismo do concelho de Oeiras?

Mas não fiquemos por aqui, pois também no turismo há valores 0 e este valor permite sempre uma certa atenção sobre ele. Por exemplo, o concelho de Vila Viçosa, no que diz respeito a turismo, é 0! Sr." Secretária de Estado, Srs. Deputados, tive o cuidado de tele-

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fonar para o Paço Ducal de Vila Viçosa e a informação que mederam é a de que, aí, por exemplo, e arredondando os números em 1981 houve 59 000 visitantes, em 1982, 56 000 visitantes, em 1983, 66 000 visitantes e em 1984, 66 000 visitantes. Isto é, nestes últimos 4 anos, que foram aqueles que serviram para contemplarmos estes critérios, teve uma média superior a 61 000 visitantes que não são propriamente, na sua totalidade, os moradores e os residentes do concelho de Vila Viçosa. São turistas que lá vão, que podem pernoitar ou não, mas que têm de utilizar as infra-estruturas do concelho que, por sua vez, se tem de adaptar a esta situação de dezenas de milhares de visitas.

Estou apenas a focar o Paço Ducal, embora Vila Viçosa tenha certamente mais algumas coisas para ver. O que penso é que, de qualquer forma, o Paço será passagem obrigatória e por conseguinte este número é significativo. O 0 no índice de turismo em Vila Viçosa é, pois, muito difícil de interpretar.

Podia fazer também algumas cosiderações em relação, por exemplo, à questão da emigração. É um índice extremamente difícil e subjectivo e, por isso mesmo, impõe que se faça a sua interpretação com cuidado porque a emigração é factor da falta de infra-estruturas, e penso ser nesse sentido que aparece este índice. Não estará também na origem da emigração uma situação de deslocação interna e de necessidade de deslocação de certas zonas para outras?

São questões que, no mínimo, aqui deixava, no sentido de verificarmos que, na realidade, estes conjunto de índices e estes resultados que são atribuídos à matemática da aplicação desses índices não se podem pôr dentro de uma redoma, nem dizer-se que não podem ser contestados por serem índices e resultados do computador. Temos de ver quais são os números que colocamos no computador para que se obtenham estes resultados, temos de fazer esta análise com mais profundidade.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Sr. Presidente Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: — Queríamos explicitar, nesta nossa intervenção, alguns dos critérios que se ligam designadamente ao PIDDAC deste Ministério, portanto, à sua conta 50.07, e ao financiamento das comissões de coordenação regional. Este financiamento, como se vê nas folhas desagregadas, indica que o CCR do Alentejo trabalhará em 1985 com 161 000 contos, a CCR do Algarve com 227 000 contos, a CCR do Centro com 320 000 contos, a CCR da Região do Norte com 343 000 contos e a CCR da Região de Lisboa e Vale do Tejo com 664 000 contos, isto integrando 2 vultuosos elementos de contas de ordem na CCR de Lisboa e na CCR do Algarve (a de Lisboa trabalha com 500 000 contos, fora o seu orçamento normal de 164 000 contos).

Em primeiro lugar gostaríamos de ver aqui mais explicitados quais os critérios que, na dotação do Gabinete do Sr. Ministro da Administração Interna, presidem à divisão dos fundos públicos por estas CCR, sabido como é que são valores que têm uma margem de arbítrio.

No detalhe de alguns destes elementos das CCR, volta-se a dizer aquilo que se disse em relação a outros critérios que já foram aqui analisados do Fundo

de Equilíbrio Financeiro e aquilo que dissemos em relação à nossa proposta das Assembleias Distritais, em que defendemos que essas verbas sejam proporcionais às que couberem ao conjunto dos municípios da sua área, ou seja, uma adaptação do FEF à distribuição pelos distritos — poderia ser um dos critérios utilizáveis.

Em relação ao detalhe de alguns dos orçamentos das chamadas comissões de coordenação regional e em relação às aquisições de serviços não especificados existem margens e valores que nos parecem extremamente dispendiosos, fazendo ou podendo fazer, das CCR instrumentos de aquisição de serviços fora, não utilizando, portanto, os técnicos que lá existem e não trabalhando também, como seria natural, com as autarquias da região em formas que poderiam e deveriam ser trabalhadas de modo a que as autarquias tivessem o papel primeiro e principal.

Em segundo lugar, e ainda em relação ao PIDDAC, temos investimentos dos chamados Planos Intermunicipais da ordem dos 2,5 milhões de contos dá para muito e para muita discriminação e, embora com os elementos que possamos reter do desenvolvimento e da desagregação destes 2,5 milhões de contos, gostaríamos de saber qual é o nível do comprometido e da nova realização, por um lado, e, por outro lado, qual a divisão, em termos das CCR, para fazer a aplicação conjunta e para dar um novo FEF de distribuição onde a margem de possibilidade de arbítrio é grande.

Em relação aos Planos Integrados de Desenvolvimento Regional já foram aqui sublinhadas algumas das áreas de penúria que eles contemplam. Para além disso, e para além do problema, que também já foi aqui situado, de quem coordena os PIDRs, queríamos reiterar uma pergunta, já feita em Plenário, e que diz respeito à verba das acções preparatórias. Estas acções têm um valor global de 246 300 contos, a parte de leão das verbas preparatórias é a do Ministério das Finanças e do Plano — 171 500 contos — tendo o Ministério da Administração Interna uma verba de 8000 contos para estas acções. Gostaríamos de saber, em detalhe, a discriminação possível destes 8000 contos do MAI e a maneira como esta verba se conjuga com os 171 500 contos do Ministério das Finanças e do Plano, com os 20 000 contos do Ministério do Mar e com os 46 800 contos do Ministério da Qualidade de Vida e se há ou não alguns novos Programas Integrados de Desenvolvimento Regional na forja, quais são, onde são, com que volumes de investimento.

Queríamos ainda levantar uma questão em relação ao ponto 08 do orçamento do Ministério da Administração Interna, ou seja, o do Gabinete do Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional. O Sr. Secretário de Estado, no seu Gabinete, tem, para a Direcção--Geral do Desenvolvimento Regional, na ordem das verbas correntes 18 250 contos e 2500 contos em capital, e para o chamado Secretariado para a Desconcentração tem para despesas correntes 6240 contos e 670 de capital. Se fosse possível, gostaríamos que nos explicitasse estas verbas, tanto as da Direccão-Geral do Desenvolvimento Regional como aquelas que estão e que dotam o secretariado para a desconcentração.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Presidente, queria fazer apenas um breve complemento à minha in-

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tervenção inicial. Tudo o que eu expus foi na perspectiva dos médio e longo prazos e, obviamente, entendo que à Comissão de Saneamento Básico devem ser garantidos os meios para que termine o processo de emergência em que está envolvida. Dizia, portanto, que haverá um prazo de 1 ou 2 anos para a Comissão de Saneamento Básico terminar essa fase de emergência.

Depois de tudo o que falei, designadamente da orgânica dos serviços — e não estou aqui a discutir se a estrutura deve ser esta ou aquela —, o que me parece é que o que existe é uma estrutura complexa e que não faz sentido.

Em termos dos indicadores, julgo que o meu colega Marques Mendes falará sobre isso. De qualquer forma, em relação ao indicador da emigração, salvo melhor opinião e por aquilo que conheço, não sei se será muito correcto considerar apenas os anos que vão de 1978 a 1980. Penso que não faz muito sentido pôr aqui um indicador desta ordem e, por outro lado, parece-me também, por aquilo que conheço das estatísticas do Instituto de Apoio à Emigração, que foi certamente apenas considerada e emigração legal.

O Ministério da Administração Interna dirá que os números que apresenta são os números de que dispõe e aqueles que lhe são facultados — e não estou também com isto a querer criticar este Ministério — só que, obviamente, isto não pode ser. Penso que terão de ser considerados outros anos para além dos que vão de 1978 a 1980 pois a emigração nesses anos foi até pouco representativa, e terá que ser considerado o valor efectivo e real da emigração e não apenas a emigração legal pois, em muitos casos, a emigração clandestina é superior à legal, estando, portanto, estes valores, formalmente correctos mas desajustados da realidade. Haveria que corrigir a matéria dos indicadores pois parece-me correcto considerá-los, apesar de não ser fácil fazê-lo. Pareceu-me que o Sr. Deputado Manuel Fernandes, do PCP, ao pôr esta questão, fazia uma critica, mas reconhecia também que esta matéria é complexa. Esta questão da emigração tem, portanto, de ser revista, pois é um pouco chocante nalguns casos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que neste orçamento do Ministério da Administração Interna são patentes alguns dos defeitos de toda a proposta orçamental. E começaria por aí, por aquilo que parece a pouca transparência desta proposta, por aquilo que que é uma clara ocultação de algumas verbas e do destino de outras.

Em primeiro lugar, também em relação ao Ministério da Administração Interna, existem verbas que não se traduzem em termos orçamentais e aparece como não tendo qualquer relevância aquilo que são as consequências de acordos internacionais celebrados por Portugal. Nem os subsídios a fundos perdidos figuram como receita, e creio que isto é extremamente grave porque, das duas uma, ou se está a ocultar uma receita real e, portanto, os números de que o orçamento a reveste são números incorrectos, ou então será fácil dizer-se depois que o défice não foi afinal o previsto mas inferior porque logo de entrada se ocultaram receitas. Creio que esta é uma situação que não pode passar desapercebida e que precisa de ser justificada. Todos os apoios concedidos para desenvolvimento regional

não constam como receitas desta proposta do Orçamento, mesmo aqueles que são concedidos a fundo perdido. Gostaria de saber, portanto, se essa lacuna será corrigida, em que termos e quando.

Não queria deixar de salientar que na filosofia que enforma esta proposta, acontece também haver desvios que se vêm acentuando em relação àquilo que é a filosofia aprovada e aquela que decorre da própria Constituição. E dou um exemplo: os cofres dos governos civis e a própria manutenção e reforço da estrutura do governador civil. O sentido de constituição, apontando para a regionalização, é o sentido de extinção dos governadores civis a curto prazo, e, em vez disso, e de modificações estruturais no sentido desse encaminhamento, vemos reforçar-se cada vez mais uma estrutura que se pretende extinguir. Qual é o sentido destas medidas, Srs.'Membros do Governo?

Em que medida é que podemos considerar que caminhamos no sentido constitucional ou, pelo contrário, ao invés da própria Constituição, reforçando estruturas que são criadas de novo e que no fundo deveriam ser transitórias e para desaparecer? Isto não tem sentido, a menos que ele seja o de procurar uma inversão de marcha, o que então, sim, tem um significado político grave pois seria um reforço de centralização e de manifestações que nada têm a ver com a descentralização e a institucionalização de regiões.

Ora, isto tem uma consequência orçamental grave: é que sendo certas as contas que aqui estão, e se 15 % das receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis correspondem aos 300 000 contos destinados a financiar o funcionamento das assembleias distritais, então a aplicação desta percentagem corresponde a dizer-se que as receitas previstas para esses cofres são da ordem dos 2 milhões de contos. Se esta conta não é exacta pediria elementos para que pudesse dispor de números certos. Se ela é de 2 milhões de contos, então temos de considerar que nos estão a ser ocultados e estão a escapar ao controle e à fiscalização da Assembleia da República 2 milhões de contos de receitas que são atribuídas por critérios que dependem das assembleias distritais e dos próprios governadores civis. E pergunto se o Governo considera isto admissível e se corresponde à estrutura do Orçamento que aqui nos deveria apresentar.

Para além deste aspecto, através de uma autorização legislativa que foi justificada com uma urgência que afinal não existia, o Governo alterou critérios em relação às transferências a efectuar para as autarquias locais e estamos a ver agora as consequências de alguns desses enviesados critérios, que não escaparão a uma acusação extermamente fácil, mas também extremamente grave e que gostaria de ver completamente ilidida. Essa acusão é a de que primeiro se procuraram as câmaras a beneficiar e depois os critérios ajustados para esse benefício. É que, de facto, os argumentos encontrados são todos eles arrevesados e nada têm a ver com uma filosofia de correcção das assimetrias de desenvolvimento.

Começando pelo célebre critério orográfico, é evidente que a orografia não se modifica e que, portanto, as suas consequências permanecem, não sendo susceptíveis de ser corrigidas por qualquer acção temporal.

As montanhas não se destroem, embora, pelos indicadores que foram transmitidos, pareça que estas se constroem e que tenham aparecido várias ao longo do País.

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Outro critério é o de emigração. O que é que isto tem a ver com as assimetrias de desenvolvimento? Vão--se fazer maiores infra-estruturas locais, precisamente nas povoações que ficaram abandonadas porque as populações emigraram? O critério não tem qualquer correspondência com os objectivos que se pretendem. Poder-se-ia invocar a mesma argumentação em relação a quase todos os critérios. Não é, nó entanto, agora isso que está em causa. O que está em causa são os defeitos da aplicação desse sistema que, traduzidos na prática, parecem erros evidentes.

E, sob pena de estarmos aqui a ter uma conversa sem sentido, o que o Governo tem de fazer é, rapidamente, rever os números que serviram de base aos seus cálculos, que parece estarem errados, e apresentar-nos aqui uma proposta nova, sob pena de esta discussão não ter qualquer espécie de seriedade. Enquanto continuarmos a jogar com o Algarve mais alto do que a serra da Estrela, estamos a fazer uma discussão perfeitamente inútil e irresponsável.

Pediria, portanto, que esta reunião pudesse prosseguir da parte da tarde com elementos novos apresentados pelo Ministério de Administração Interna, corrigindo os erros evidentes de que esta proposta de Orçamento enferma, sob pena de não estarmos a votar rigorosamente nada ou de estarmos a votar conscientemente uma realidade que sabemos estar profundamente errada. Digo que isto deve ser possível da parte da tarde e que, inclusivamente, poderá ser feito com alguma tranquilidade, visto que vivemos numa situação em que estas coisas são possíveis sem responsabilidade política, pois se essa responsabilidade fosse uma coisa diferente em Portugal teria certamente consequências a apresentação de uma proposta com erros desta natureza.

A última questão que queria colocar diz respeito àquilo que é uma tentativa de evitar a especificação orçamental, e que são as verbas que nos aparecem distribuídas ao longo de variadíssimas rubricas para que não as possamos controlar. É o caso dos Programas Integrados de Desenvolvimento Regional e da sua repartição por variadíssimos ministérios sem que se saiba exactamente qual o programa que vão contemplar nem quais os objectivos que se pretendem, provocando, portanto, falta de controle, e é o caso de aquisição de serviços não especificados, rubrica que aparece ao longo de várias alíneas e que gostaria de conhecer exactamente o que contempla.

O Sr. Presidente: — Antes de passar a palavra ao próximo Sr. Deputado inscrito, talvez fosse conveniente eu dar um esclarecimento ao Sr. Deputado Magalhães Mota.

Como o Sr. Deputado tem presente, nós hoje não iríamos votar, de acordo com o plano que traçámos para os nossos trabalhos, e independentemente do posicionamento do Governo relativamente à intervenção feita. Não queria deixar de lhe dar esta informação associada à dificuldade de não ser possível, numa hora, o Governo estudar estes dados para os apresentar ainda hoje em termos mais definitivos.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Sr. Presidente, é evidente que quanto à votação ontem mesmo decidimos que ela se faria só no final dos nossos trabalhos. O que pergunto é se tem sentido estarmos a pedir esclarecimentos e a debater uma matéria que, à partida,

sabemos ter erros gravíssimos. Parece-me estarmos aqui a perder algum tempo enquanto não é corrigida toda a parte que diz respeito à atribuição de verbas às autarquias, porque os dados que lhe estão subjacentes têm erros primários.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o esclarecimento está dado e vamos prosseguir os nossos trabalhos. Tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.

O Sr. Reis Borges (PS): — Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: — Afigura-se-nos que um dos problemas centrais desta apreciação na especialidade tem, efectivamente, a ver com os Planos Integrados de Desenvolvimento Regional já aqui referidos por vários Srs. Deputados. No nosso ponto de vista, isso tem a ver com a própria filosofia do Governo, de modo que me parece de todo o interesse que o Governo nos esclareça convenientemente em relação a que é que esses planos correspondem e se é a compromissos já assumidos.

Não pretendo, de maneira nenhuma, que o problema se generalize ao ponto de convertermos esta apreciação orçamental numa análise sobre a distribuição espacial do investimento em Portugal, na medida em que todos os problemas relativos ao equipamento social teriam até que ver com aspectos de desenvolvimento regional. Mas aquilo que o Governo entende como Programas Integrados de Desenvolvimento Regional é que estes têm, efectivamente, uma filosofia própria e estão perfeitamente compaginados dentro de um tipo de programa que está neste momento a cargo do MAI, e, sendo assim, os membros do Governo deveriam tentar esclarecer-nos convenientemente em relação a estes Programas.

O outro ponto também já referido, e que me permitiria reforçar, tem a ver com as aquisições de serviços e com as verbas que, de facto, são relegadas em termos de diversos — e refiro-me a este diversos com uma certa ironia na medida em que são, de facto, distribuídas por rubricas que tornam difícil uma apreciação no seu conjunto.

Finalmente, gostaríamos também de ouvir informações mais detalhadas do Governo quanto ao financiamento das CCR, problema que aliás já foi posto.

Referi, pois, apenas aspectos que já foram aqui abordados mas que o Grupo Parlamentar do Partido Socialista gostaria de ver convenientemente esclarecidos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

O Sr. Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Eu corroboraria em parte as palavras do Sr. Deputado Magalhães Mota no sentido de ser possível serem-nos fornecidos elementos mais capazes porque, efectivamente, me impressionaram as palavras do Sr. Deputado Manuel Fernandes e os números que temos à nossa frente.

Não se compreende como é que, por vezes, se atribui um «zero» ou como se atribui um «cem» em orografía. Mas qual é o «cem» e qual é o «zero»? Admito e aceito, em princípio, que o critério geral do indicador da orografía possa ter alguma razão de ser porque, efectivamente, em determinadas zonas mais montanhosas as carências poderão ser, em alguns casos, menores. Depende muito de como encaramos a

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orografía. Em zonas planas pode haver graves problemas de rocha, apesar de este problema não ser já de orografía mas de geología.

Por exemplo, ao concelho da Covilhã, ali na serra da Estrela, foi atribuída uma percentagem do montante de 74 % e há outros concelhos com uma percentagem de 100 %. Pode-se perguntar se, tendo em conta a orografía, essas percentagens obedecem a toda uma extensão da área do concelho ou se obedecem à altitude, sendo tudo isto subjectivo.

Claro que estes elementos foram, certamente, fornecidos ao MAI por outrem. Aliás, este perigo — e já a dada altura tive oportunidade de o referir — é o de que estes indicadores acabam por estar sempre desajustados, desactualizados, e os objectivos que se pretendem ao introduzir um indicador desta natureza vão redundar, quantas vezes, no contrário daquilo que se pretendia.

Foi aqui citado — e eu posso dar testemunho — os casos de Braga e de Guimarães com 0 % de montanha. Poderei recordar — creio que todos conhecem — o Bom Jesus do Monte, em Braga, o Sameiro, também em Braga, ou o Monte da Penha, em Guimarães, que, creio, chegarão para dar um exemplo de como é extremamente difícil compreender o sentido de uma percentagem de 0 °/o nestes concelhos.

Quando há pouco pedi a palavra era, efectivamente, no sentido de perguntar aos Srs. Membros do Governo do Ministério da Administração Interna se é possível fazerem uma revisão destes dados, pois, em caso contrário, não valerá realmente a pena prosseguirmos este debate e temos de aceitar estes critérios, na certeza, porém, de que algo se deve fazer, e rapidamente, no sentido de tudo isto ser revisto, acertado, e de serem, realmente, encontrados os números correctos, rigorosamente exactos, para não estarmos a cavar assimetrias quando o propósito da lei é precisamente acabar com elas.

Não estejamos, portanto, a usar números «viciados». E são viciados por várias razões, isto é, depende, por exemplo, da forma como são fornecidos, se o são distrito a distrito e quais os critérios que presidiram à sua determinação. Não conheço esses critérios. Apenas disponho dos números, mas não sei como é que foram obtidos. É que, por exemplo, ao analisar os números relativos ao meu distrito, parece-me que houve uma grande dose de subjectividade na sua determinação. Na verdade, só através de um critério subjectivo é possível aceitar números como os que constam em relação a alguns dos concelhos do meu distrito. Até dá a impressão que há algum concelho que fica situado num alto e que todos os outros estão numa planície. Isso não é, realmente, assim. Quem o conhece, sabe-o.

Daí a minha sugestão. Se ela for impossível, então há que introduzir qualquer solução que possa, a curto prazo, corrigir estes erros.

O Sr. Presidente: — Para esclarecer estas questões, tem a palavra a Sr.8 Secretária de Estado da Administração Autárquica.

A Sr.8 Secretária de Estado da Administração Autárquica: — Penso que será útil fazê-lo, sobretudo depois de o Ministério ter sido acusado de primeiro escolher as câmaras e só depois considerar os critérios a aplicar.

Ora, penso que é a primeira vez — e o que está a acontecer hoje é uma consequência disso; nesse aspecto

ainda bem que acontece, embora me tenha que penalizar por alguns dos problemas que aqui estão a ser postos — que os Srs. Deputados têm nas mãos os números de base que serviram ao cálculo dos indicadores.

Durante todos os outros anos, os senhores aceitavam--nos ou recusavam-nos em bloco mas sem nunca terem por base esses elementos. De acordo com a Lei n.° 1/79 os Srs. Deputados dispunham dos coeficientes. Ora, eu sei como é que esses coeficientes se calculavam, pois era directora-geral na altura em que se prepararam os primeiros, e como se avançou daí para a frente. Eram coeficientes com números extraordinariamente atrasados, que os senhores não conheciam porque não conheciam os números base, eram ponderados de acordo com a forma como nós decidíamos que deviam ser, e os senhores não conheciam a ponderação, e, além disso, eram números que apareciam como um coeficiente de 7 indicadores cujos índices os senhores também não conheciam.

Quando procedemos à revisão da Lei das Finanças Locais, o objectivo foi o de encontrar critérios objectivos de. modo a que todas as pessoas pudessem saber quais os números que estavam a servir de base aos cálculos e não aparecer mais um índice construído a partir de indicadores desconhecidos. Dois anos depois da aplicação destes novos critérios — não falo dos indicadores, falo dos critérios — podemos concluir que os resultados que queríamos obter, em termos globais, estão correctos. Ou seja, a região do País onde, de acordo com as novas competências dos municípios, as infra-estruturas eram mais carentes era o Algarve, — daí ser a que mais aumenta —, que tem, realmente, uma região interior muito importante. E foram todos os municípios de todos os distritos do interior — estou a falar em termos globais — os mais beneficiados.

Em contrapartida — e aproveito para responder a algumas das perguntas que foram feitas de início sobre este aspecto —, há distritos que, efectivamente, subiram menos que a média. É o caso de Lisboa, do Porto, de Braga, de Leiria, de Aveiro e de Setúbal.

Mas gostaria de chamar a atenção dos Srs. Deputados para o facto de a nova Lei das Finanças Locais aumentar o número de impostos para os municípios. Ora, esses são os grandes municípios que têm, por força das suas receitas próprias, uma contrapartida pára a pouca importância relativa do Fundo de Equilíbrio Financeiro.

Chamo a atenção, por exemplo, para o caso do concelho de Lisboa que tem uma comparticipação do Fundo de Equilíbrio Financeiro de 3 800 000 contos, só por si, superior à grande maioria dos distritos deste país, todos somados, mas que não representa nada em relação ao orçamento que a Câmara se propõe apresentar para este ano que, segundo ouvi dizer, é de 19 milhões de contos. Isto significa que nos municípios grandes existe outro tipo de receitas, para além da comparticipação do Fundo de Equilíbrio Financeiro. Portanto, em termos globais, a proposta que nós fizemos da nova Lei das Finanças Locais foi procurar critérios muito mais objectivos que os senhores possam acompanhar um a um, o que não acontecia antes. Resta ver se vamos ou não conseguir fazê-lo de uma forma correcta.

Como imaginam, já pedi para me trazerem os números que serviram de base ao cálculo da orografía. Espero que cheguem depressa até para que eu própria me possa aperceber do que se está a passar relativa-

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mente aos problemas que levantaram. Foi pena que não se tivessem levantado na reunião de ontem, pois hoje já poderia ter tudo preparado e explicar o que se passou.

Quanto à população, efectivamente, o critério utilizado foi o do número de eleitores. Quando aqui se diz que a população presente é a do 12.° recenseamento eleitoral, isso representa capitações. Sempre que utilizamos capitações, o índice da população é definido através do recenseamento eleitoral.

Quanto à área, é o Instituto Geográfico Cadastral quem nos fornece estes dados. Os dados dos impostos directos cobrados nas autarquias são fornecidos pela Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, com base nos dados de 1983. A capitação dos impostos é obtida em função da população. Este é o dado relativo à população; o número das freguesias, nós temo-lo.

Quanto à orografía, tenho efectivamente de confirmar estes números. Devo penitenciar-me pois não conheço os valores município a município. Vou agora saber, junto dos serviços, porque é que apresentam estes valores. Alguma razão há-de haver. Penso que não se trata de uma razão subjectiva, Sr. Deputado. Também não é só o critério da altitude. Sei que há um índice global que considera as condições geológicas e as condições de altitude.

Este foi um dos aspectos focado sistematicamente pelas câmaras. É muito difícil conseguirmos encontrar indicadores que representem exactamente o que queremos. E quando chegarmos ao turismo, que é um sector que domino bastante bem, poderemos ver como é difícil encontrar um indicador que represente exactamente o que nós queremos.

Mas as câmaras põem-nos, de forma sistemática, o problema de ser completamente diferente construir em planície e contruir na montanha. E nós temos de ponderar esta diferença. O ano passado tínhamos um estudo feito pela CEE, de que ainda hoje nos servimos, que definia áreas de montanha. A Direcção-Geral de Florestas considerou que tinha melhorado o estudo e, este ano, forneceu outros dados que serviram de base. Relativamente a este assunto, peço para responder mais tarde, pois estou à espera que os dados me cheguem.

Em relação ao desenvolvimento sócio-económico também não há qualquer subjectividade. O que nós fizemos foi ponderar a relação entre a população e a carência de infra-estruturas, definida pela percentagem das populações em locais carentes, de acordo com a definição utilizada pelo INE no 12.° recenseamento geral da população. Trata-se de um dado publicado. É o que existe. Tomáramos nós ter melhor!

O Sr. Deputado não esteve presente na reunião de ontem, mas chamo a sua atenção para o facto de só 10% das verbas transferidas o serem em função do desenvolvimento sócio-económico.

Um presidente da câmara que é deputado dizia: «Porque é que eu forneci estes dados? Se não os tivesse fornecido, tinha mais dinheiro!»

Ora bem, nós temos a estatística que temos mas é fundamental que as pessoas saibam que têm de fornecer os dados. Talvez se o fizessem a estatística melhorasse.

Em relação ao turismo, quero chamar a atenção para o seguinte: é perfeitamente patente — todos os Srs. Deputados sabem — que não basta calcular as infra--estruturas para a população residente. É que, quando considerávamos apenas a população residente — como

fazia a Lei n.° 1/79 — estávamos a ignorar um fenómeno que causa perturbações enormes para as câmaras, que é o fenómeno turístico. Simplesmente, também aqui nos temos de ater à estatística disponível. E ela só nos dá hóspedes em hotéis e em parques de campismo.

Ainda ontem, um Sr. Deputado de Viana do Castelo me dizia que Caminha todos os anos no Verão é invadida por uma série enorme de turistas. Mas como não existem estatísticas que me forneçam as dormidas nas casas particulares e como, provavelmente, Vila Viçosa não tem nem estabelecimentos hoteleiros nem parques de campismo a estatística que nos dá esta diferença, que è construir infra-estruturas para determinados empreendimentos turísticos, não apanha tudo.

Em 1983 tivemos de utilizar os indicadores estatísticos que existiam no ministério, durante o ano de 1984 tentámos melhorá-los. É óbvio que continuamos em 1985 a tentar melhorá-los. Há outras formas de o conseguir, embora sejam também passíveis de fornecer elementos distorcidos. Ontem, por exemplo, falava-se na relação entre o consumo de electricidade ou de água no período de Verão e a média anual, isto é, a diferença entre os períodos de utilização máxima e mínima. Há indicadores que iremos estudar nos serviços, de forma a conseguirmos resolver da melhor maneira esta preocupação, que é a mesma relativamente à emigração.

Em todos os casos, dirigimo-nos às Secretarias de Estado e dizemos: «Temos esta preocupação. Queiram informar-nos qual é o indicador disponível que melhor represente esta preocupação.» E a preocupação consiste em as câmaras não terem de construir as suas infra--estruturas apenas para a população residente mas também para um conjunto enorme de casas que os emigrantes estão a construir nos seus municípios de origem. Foi esta tentativa de conseguir medir esta situação que nos levou a pedir à Secretaria de Estado da Emigração que nos fornecesse estes dados, que não actualizou em 1984 por não ter mais dados disponíveis. Daí que, em relação a este indicador, tivéssemos de utilizar exactamente os mesmos dados que tínhamos anteriormente.

Penso que todo o trabalho produzido por muita gente durante um ano e todo um esforço muito grande que foi feito para melhorar esta caracterização não merece ser deitado abaixo da forma completa como foi, como se nada disto valesse absolutamente nada e tudo estivesse errado. Há alguns elementos que forneci aos Srs. Deputados que podia não ter fornecido, porque nada na lei o exige, mas fi-lo porque não queremos trabalhar no Ministério da Administração Interna com pouca transparência e em clara ocultação. O que queremos é trabalhar de uma forma que todos vejam e com o objectivo de fazer o melhor possível. Por isso vos fornecemos os dados.

Espero, entretanto, que cheguem os dados fornecidos pela Direcção-Geral de Florestas. Vou tentar saber o que se passa. Penso que, se realmente houver erros, o que temos de fazer é substituir o indicador.

O Sr. Presidente: — Tínhamos interrompido as inscrições apenas para obtermos esclarecimentos sobre a questão dos critérios.

Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Mendes.

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O Sr. Marques Mendes (PSD): — Relativamente à emigração, a Sr.8 Secretária de Estado disse que pediu os elementos à Secretaría de Estado da Emigração. Mas esses elementos respeitam apenas a emigrantes inscritos na Secretaria de Estado? É que pode levantar-se o problema de haver emigrantes — temos o perigo da emigração clandestina — que podem não estar registados nessa Secretaria de Estado.

A Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica: — O Sr. Presidente dá-me licença que responda ao Sr. Deputado?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr.8 Secretária de Estado. Espero que seja para esclarecer critérios.

A Oradora: — Volto a dizer que o que pedi à Secretaria de Estado da Emigração foi que me desse o indicador que, do seu ponto de vista, melhor representasse esta preocupação, que é a de as câmaras terem de fazer infra-estruturas para toda a população que é originária do concelho embora aí não resida.

E certo que apenas disponho de dados relativos à emigração legal porque só dela consta a origem do emi-grante. Não temos dados — creio eu — que nos permitam saber, em cada município, a origem da emigração ilegal.

Além disso, gostava de dizer que o que utilizámos foi o quociente do número médio de emigrantes sobre a população. Tal como acontece no turismo, a relação é entre o número de turistas que têm instalações para dormir e a população residente. Só isso nos pode indicar a maior quantidade de infra-estruturas que são necessárias para fazer face a estas situações que se verificam nestes municípios.

O Sr. Presidente: — Houve mais 3 Srs. Deputados que se inscreveram para pedir esclarecimentos sobre esta questão concreta. Espero que os outros Srs. Deputados, que estavam antes inscritos, compreendam que é apenas para obter estes esclarecimentos. Peço também aos Srs. Deputados inscritos que sejam o mais sintéticos possível.

Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Manuel Fernandes.

O Sr. Manuel Fernandes (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A intervenção da Sr." Secretária de Estado, na sequência da minha, coloca-me a necessidade de pedir alguns esclarecimentos.

E que, na realidade, ela vem comprovar as dúvidas e as dificuldades de interpretação que demonstrei na minha primeira intervenção. Independentemente do esclarecimento que me deu, em relação ao número de eleitores — que era o mais fácil de compreender — daquilo que surge com carga mais subjectiva — as questões da orografía, do turismo e da emigração — ficamos apenas a saber que se baseia nas estatísticas disponíveis. Também sabemos quais são as nossas estatísticas possíveis e, por conseguinte, comprova-se a carga subjectiva que afecta estes critérios.

Aliás, já no ano passado . . .

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?

O Orador: — Faça favor, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — É que me parece que podemos sistematizar estes pedidos de esclarecimento não fazendo novas intervenções.

O Orador: — Mas trata-se de um pedido de esclarecimento. É que queria confirmar esta questão.

Por outro lado, a Sr.8 Secretária de Estado disse também que os distritos do litoral têm uma percentagem mais baixa. Ora, nem sempre isso se verifica. Por exemplo, Aveiro tem a percentagem média superior a Vila Real.

Uma outra questão, ainda em relação aos índices: no documento que nos distribuiu é referida, em relação aos impostos directos apresentados, a lista dos impostos que servem para obter este número. E diz: «Contrariamente aos valores utilizados em anos anteriores, não foram considerados os impostos sobre veículos nem a contribuição predial, dado que a respectiva fonte de informação — Direcção-Geral das Contribuições e Impostos — não pôde fornecer os respectivos valores.» Ora, isto coloca-me uma dúvida: porque motivo esta Direcção-Geral não pôde fornecer estes valores? Será que estes impostos deixaram de ter qualquer valor para esta Direcção-Geral, tendo em conta que agora as suas receitas são para as autarquias? Sendo esta Direcção-Geral quem continua a fazer a colecta destes impostos, é estranho que não disponha do seu valor em relação ao ano de 1983. É, no mínimo, estranho. E será coincidência que isso aconteça exactamente com aqueles que revertem a favor das autarquias.

Seguindo a sugestão do Sr. Presidente não me vou alongar neste caso, mas pergunto apenas se estes impostos têm tido um crescimento correspondente aos outros.

O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Quero fazer uma brevíssima nota sobre um dos índices considerados, que é o do desenvolvimento sócio-económico. A Sr.8 Secretária de Estado tem dito que, em 1984, trabalharam com o índice fornecido pelo Centro de Estudos de Planeamento com dados de 1977 e que, este ano, trabalharam com os dados do INE relativos ao censo de 1981 e que reflectem a população ponderada segundo a carência de infra-estruturas.

Há, no entanto, aqui, dados — certamente que os viu —, município a município, que causaram surpresa, para não perguntar como é que aparecem estes números. Por exemplo, nestes índices, o concelho de Peniche é considerado totalmente isento de carências. Aparece-nos, no Algarve, Monchique com 3 % de carências enquanto que Tavira tem 43 Estes números surgem com algo de arbitrário. Ainda para mais, é sempre acrescentado, a cada um dos valores, os 10 %, o que valoriza, naturalmente, as grandes aglomerações urbanas. Por exemplo, Lisboa, que tem 0 °7o de carências, segundo os dados do INE — não sei como é que se pode reflectir esse índice, mas refere-se às redes de esgotos, ao saneamento básico, etc. —, tem um número de 80 000 porque são os 10 % da população residente em Lisboa, mas não tem qualquer indicação, por exemplo, da população utilizadora.

Gostaríamos que nos fosse fornecida, posteriormente — certamente que não pode ser já —, a indicação clara

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da justificação destes índices do desenvolvimento e das carências sócio-económicas.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Sr.8 Secretária de Estado, não entendi bem — o defeito é meu, evidentemente! — a explicação que deu relativamente aos emigrantes. É que tenho aqui o documento L-2 em que se diz que a coluna 5 tem como base o número médio anual de emigrantes entre 1978 e 1980. Estes «entre 1978 e 1980» correspondem, segundo penso, ao número de emigrantes saídos dos diversos concelhos durante estes anos. Ora, em meu entender, isto não reflecte a realidade. Todos nós sabemos que foi a partir de 1979 que a saída de emigrantes se retraiu por diversos factores, de entre os quais a crise económica. Mas tenho conhecimento — e a Sr.8 Secretária de Estado também tem — de que há concelhos no nosso país cuja população emigrada é superior à população residente. Há, por exemplo, um desses concelhos em que a população residente é de 9000 e tal habitantes, e só uma cidade dos Estados Unidos da América, do estado de Nova Jérsia, tem 11 000 residentes naturais desse concelho, que permanentemente vêm à sua terra construir as suas habitações, deixar cá o seu dinheiro, em dólares, e que enviam milhões de dólares por ano. Ora, esse concelho tem necessidade de ser protegido pelo esforço dos seus filhos para se desenvolver e beneficiar desse esforço. Acontece que, se eu for ver os indicadores desse concelho, aparece-nos um número irrisório. Parece-me que há aqui uma injustiça de distribuição, por isso gostaria de uma explicação mais correcta.

Outro facto que gostava de referir é que na coluna 2, «indicadores municipais», do documento L-2, alínea e) do n.° 1 do artigo 7.°, se diz que «a percentagem média da população carente de infra-estruturas é calculada com base nas percentagens das populações carentes de electrificação, água, esgotos e recolha de lixo . . .».

Ora, pergunto o que é que se entende por água. Será a água fornecida pelos respectivos serviços ou a água captada dos poços? O que é que se entende por esgotos? São fossas sépticas construídas pelos próprios ou são os esgotos dos serviços?

Eu sei que quando se faz o censo estatístico, os próprios funcionários do INE, desde que a pessoa tenha uma fossa séptica privativa, visto que não há esgotos municipais, dizem que sim, que têm esgotos. Se têm um poço, com uma moto-bomba para recolha de água para a sua habitação, dizem que têm água. Ora, efectivamente, não a têm.

E vem a talhe de foice dizer que sou de uma região em que se está a lutar contra a falta de água potável a nível de todos os concelhos ribeirinhos, em que a salinidade está a invadir o subsolo por causa destes poços. Daqui a pouco, a nossa região não tem água potável. No entanto, se formos consultar os dados do INE, verificamos que a maioria da população é capaz de declarar que tem água.

Há aqui qualquer coisa — desculpe, Sr.8 Secretária de Estado — de subjectivo, não da parte do MAI, mas até da parte de quem presta declarações ao INE. Seria bom que, efectivamente, se reponderassem estes índices.

O Sr. Presidente: — Para interpelar a Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — A interpelação à Mesa surge da discussão que tem estado a decorrer esta manhã sobre a forma de distribuição de verbas pelos diversos municípios e sobre os critérios e indicadores utilizados. Sugeria ao Sr. Presidente e a toda a Comissão que talvez fosse preferível — até pelas próprias palavras da Sr.8 Secretaria de Estado sobre a necessidade de recolher algumas informações que já teria solicitado — que interrompêssemos aqui esta discussão, que às 16 horas procedêssemos à discussão do orçamento do Ministério da Qualidade de Vida, tal como estava previsto, e que se retomasse esta discussão sobre o orçamento do Ministério da Administração Interna às 18 horas, podendo, eventualmente, haver necessidade de, de acordo com os elementos e os esclarecimentos que forem fornecidos pela Sr.8 Secretária de Estado, se proceder ou não a uma revisão do orçamento apresentado pelo Ministério da Administração Interna nas matérias que correspondem ao que se tem estado a discutir.

O Sr. Presidente: — Proponho um momento para ajuizarmos da sua proposta. Na realidade, estão ainda inscritos os Srs. Deputados Abreu Lima, João Abrantes, Bagão Félix, Joaquim Miranda, Raul de Castro e Manuel Fernandes, aos quais tenho de perguntar se querem suspender a sua inscrição independentemente da sugestão apresentada no sentido de voltarmos a discutir esta matéria.

Por outro lado, queria também saber o que pensam os Srs. Secretários de Estado acerca da proposta de reiniciarmos os nossos trabalhos, sobre este tema, às 18 horas.

Entretanto, penso que podemos continuar os nossos trabalhos abordando as outras questões.

Assim, se os Srs. Deputados estiverem de acordo, prosseguimos os nossos trabalhos sobre as outras questões.

Pausa.

Penso que a sugestão foi bem acolhida. Portanto, retomamos este tema às 18 horas. Até à hora regimental, continuamos com as inscrições que foram feitas.

Assim, tem a palavra o Sr. Deputado Abreu Lima.

O Sr. Abreu Lima (CDS): — Sr.8 Secretária de Estado, está prevista uma verba de 3 milhões de contos para a Acção Social Escolar. Esta verba destina-se, segundo penso, a duas finalidades: uma, a dos transportes escolares; outra, é aquilo que as câmaras municipais hão-de gastar com as cantinas escolares, com o fornecimento de leite e julgo que com o fornecimento de livros.

Ora, pergunto qual é a verba, dentro dos 3 milhões de contos, que está prevista para a Acção Social Escolar que não sejam os transportes escolares.

Ainda dentro desta matéria, pergunto: Se chegarmos a determinada altura do ano e verificarmos que esta verba não chega para os transportes escolares — já fiz a pergunta aquando da discussão na generalidade, mas não cheguei a perceber o que é que o Ministério pensava do assunto — como é que se resolve o problema? Será que esta verba terá de ser reforçada, acrescida, ou será que a insuficiência, a verificar-se, vai ser coberta pela parcela que é destinada a outras finalidades que não os transportes escolares, ou, por outra, por receitas próprias das câmaras?

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Faço-lhe esta pergunta — e falo por experiencia própria — porque esta circunstância dos transportes escolares agravou um pouco a situação. É mais grave agora que os transportes escolares estão dependentes das câmaras do que era antes quando estavam dependentes do Ministério da Educação. Temos o exemplo das telescolas — e já tive oportunidade de dizer isto —, cujas pessoas também têm direito aos transportes escolares. As câmaras dos concelhos que têm muitas telescolas agora vêem-se obrigadas a pôr à disposição das pessoas transportes escolares que antes o Ministério da Educação não punha. Isso porque antes as pessoas reclamavam para o Ministério da Educação, mas como ele estava longe, ele situa-se no Terreiro do Paço — aqui há a vantagem da descentralização —, não fazia nada, enquanto que agora, se isso for da competência das câmaras municipais, as pessoas «plantam--se» lá e de lá não saem enquanto não arranjarem transportes para as telescolas.

Por isso é que eu pergunto se quando previram a verba de 3 milhões de contos consideraram a hipótese de ter que se atender aos pedidos de transporte para as telescolas.

Queria pôr um outro problema que não se prende propriamente com o orçamento mas com o problema da descentralização, relacionada com os transportes escolares.

Penso que a nova competência que se deu às câma-raas municipais de serem elas a fornecer os transportes escolares é uma competência que as câmaras não podem exercer em plenitude. Digo isto porque, como V. Ex.a sabe, os transportes escolares têm que ser organizados junto dos transportadores públicos. Assim, quando não há transportes colectivos, o trajecto tem de ser feito por transportes com circuitos especiais.

Ora, há uma coisa que se verifica sempre: a relação entre o preço por quilómetro entre um transporte colectivo e um transporte com circuito especial é de 1 para 10. Isto depende muito da quantidade de transportes colectivos dos respectivos concelhos. E isto porquê? Porque os transportadores que vão fazer os transportes de circuitos especiais sentem-se numa situação de vencedores, uma vez que as câmaras, não podendo intervir junto dos transportadores que fazem os transportes colectivos — concedendo-lhes ou alterando-lhes os alvarás — terão que se sujeitar aos preços que eles fixam. Daí que muitas vezes haja especulação de preços, ficando as câmaras perante esta situação: ou não fornecem os transportes para não serem exploradas e os alunos ficam sem transporte — o que não pode ser — ou, para atender aos alunos, têm de se sujeitar aos preços e às pressões que os transportadores colectivos fazem, fazendo, muitas vezes, cambão.

Nós abrimos concurso público e alguns não aparecem a concorrer, exactamente para depois poderem pressionar. Parece-me, pois, que vai ser feita uma descentralização insuficiente. Este encargo é atirado para as câmaras, mas as câmaras não têm os poderes nem a versatilidade suficientes para irem para preços justos. Sabe Deus os resultados que, de vez em quando, se verificam! Queria deixar este problema que, penso, devia ser ponderado.

Queria também saber da razão por que é que, este ano, não foram atribuídas novas competências às câmaras municipais, que no ano passado, foram atribuídas à Acção Social Escolar. Na Lei de Delimitação de Competências estão previstas outras competências. Por

que é que algumas delas não foram transferidas este ano?

O problema da orografía faz-me um bocado de impressão. É claro que antes isso não havia.

V. Ex.a disse que forneceu, facultativamente, estes elementos e se não os fornecesse estes problemas não se tinham levantado. É verdade! Mas nós continuávamos a ter uma dúvida — dúvida essa que não é muito questionável — no entanto, continuávamos a ter uma dúvida porque o facto de os elementos não serem fornecidos não significa que, pelo menos eu, estivesse de acordo com os números que nos dão.

Realmente, o problema da orografía causa problemas graves. Não vou referir-me a todo o País, mas em relação ao meu distrito, por exemplo em Vila Nova de Cerveira e Caminha, há coisas que são espantosas.

Vila Nova de Cerveira está com um índice de orografía de 70% e Caminha — e estas vilas são pequeníssimas! — está com um índice de 30%, quando uma e outras vilas estão encravadas no meio de duas serras. Mas, como V. Ex.a vai voltar a este assunto, nessa altura falaremos.

Em relação ao problema das carências, porque não entendi bem, queria fazer-lhe uma pergunta. É a seguinte: Para efeitos de turismo, V. Ex.a tomou em linha de conta o número de camas ocupadas e a capacidade dos parques de campismo? Pergunto: Se os parques de campismo não forem utilizados, como é que isto afere da potencialidade de turismo que há? É que, suponho, há muitos parques de campismo que não são utilizados. Tem-se em conta só a capacidade ou o número de pessoas que os ocupam?

Passo a uma outra questão: Este ano não encontrei nenhuma informação sobre a possibilidade de as autarquias terem empréstimos com juros bonificados. Pergunto se isso é ou não verdade e, em caso afirmativo, por que razões é que isso não foi previsto, visto que estava previsto na Lei das Finanças Locais.

Queria ainda pôr o seguinte problema: O artigo 57.°, n.° 2, da proposta de lei do Orçamento do Estado para 1985 diz que: «No ano de 1985, constituirá receita do Estado destinada a financiar os encargos referidos no número anterior, bem como as despesas administrativas dos governos civis, o montante correspondente a 15% das receitas arrecadadas pelos cofres privativos dos governos civis, a qual será entregue mensalmente aos cofres do Estado, até ao dia 10 do mês seguinte àquele a que respeita.»

O problema que vou levantar não tem propriamente a ver com isto, mas já agora aproveito a circunstância para o deixar aqui. É o seguinte: A maior parte das receitas dos cofres privativos dos governos civis é arrecadada à custa dos serviços das câmaras municipais. Por exemplo, no caso das máquinas flippers, as pessoas requerem-nas nas câmaras, que informam se concordam ou não com isso. É também o caso, embora aqui as receitas não vão para os cofres dos governos civis, das licenças de caça.

Ora, as câmaras municipais gastam dinheiro com os impressos, e isso faz com que gastem mais do que aquilo que arrecadam. Tudo isso dá uma trabalheira e as receitas vão todas para os governos civis. Suponho que esta questão é de ponderar. Pois se é um serviço prestado pelas câmaras e constitui receita, essa receita deve ir para as câmaras municipais e não para os governos civis. Os governos civis serão sustentados pelo Orçamento do Estado na totalidade das suas

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necessidades, e não à custa dos serviços que os municípios fazem. Isto não se passa só em relação às máquinas flippers, como em relação às licenças de porta aberta, instalação de bares, snack-bars, etc, em que a quase totalidade da receita vai para os governos civis.

O artigo 58.°, n.° 2, da proposta de lei do Orçamento do Estado diz que: «O Governo definirá os critérios e fixará o plano de distribuição das verbas destinadas ao financiamento das sedes das juntas de freguesia». Pergunto: quanto é que o Governo pensa definir os critérios — e penso que deve ser antes de fazer as distribuições —, e qual é a via por que pensa publicar esses critérios? Será através de decreto-lei? Será através de portaria? Como é que tenciona fazer?

Julgo, também, que foi definida uma verba para satisfazer os encargos das despesas intermunicipais. Pergunto se essa verba foi definida, quais foram os critérios seguidos e, no caso de estar definida, como é que vai ser distribuída.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): — Vou fazer duas perguntas muito rápidas e concretas sobre o relacionamento entre o sistema fiscal e o financiamento das autarquias locais.

A primeira tem a ver com a taxa municipal de transportes. Aliás, é um produto fiscal que muito agrada à Sr.8 Secretária de Estado! ... Tanto quanto sei, e não sei se estarei errado, nenhuma autarquia, daquelas que tinha a possibilidade legal de implementar esta taxa municipal de transportes, o teria feito até agora. A argumentação que, na altura, a Sr.8 Secretária de Estado teve oportunidade de apresentar no Plenário da Assembleia da República, sobre a qual já tomámos uma posição fortemente crítica — mas não é isso que está neste momento em causa —, ia no sentido de, com isso, despenalizar as autarquias que, de um modo indirecto, pela via fiscal ou parafiscal, estão a financiar bonificações sociais dos utentes dos transportes nas autarquias onde, neste momento, é possível, legalmente, instituir uma taxa municipal de transporte.

Se está correcta a presunção de que até agora este sistema ainda não foi instituído em nenhuma autarquia, gostaria de lhe perguntar, então, face à sua argumentação no Plenário, que compensações é que estão previstas para os municípios que não têm esta possibilidade, dado que continuam a ser penalizados.

A segunda e última questão muito concreta, à qual não sei se a Sr.8 Secretária de Estado saberá responder — e, quando digo «não sei se saberá responder», quero dizer «não sei se estará devidamente informada» (de qualquer maneira, deixo-lhe a questão à qual a Sr.8 Secretária de Estado ou o Sr. Secretário de Estado do Orçamento responder-me-ão) —, refere-se ao Imposto de Mais-Valia que, a partir do exercício de 1985, passará a constituir receita da autarquia local. Apesar de tudo, verificamos na proposta de lei do Governo a inclusão de 450 000 contos como receita do Estado. Em meu entender, provavelmente, tratar-se-á de cobranças atrasadas. Gostaria de confirmar isto.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Raul de Castro.

O Sr. Raul de Castro (MDP/CDE): — Sr.8 Secretária de Estado da Administração Autárquica, as obser-

vações que eu tinha a fazer referem-se aos artigos 53.° a 58.° da proposta de lei do Orçamento do Estado.

Em primeiro lugar, quanto ao artigo 53.°, ao fixar a percentagem de 13,6 % como percentagem global das despesas do Orçamento do Estado, com base nas quais é calculado o Fundo de Equilíbrio Financeiro, o poder central está a agir de forma inaceitável. Isto porque esta percentagem, como percentagem da dotação global do Orçamento, é inferior à do ano passado. Que dizer, este ano a percentagem da dotação global do Orçamento é de 5,02 % e o ano passado foi de 5,3

Em relação ao n.° 2 do artigo 53.°, parece que se trata de uma veba consignada a um fim específico, o que não se harmonizaria com os imperativos constitucionais.

Em relação ao n.° 4 do artigo 53.°, já foi apresentada uma proposta de eliminação e nós associamo-nos a ela. Isto porque pensamos que este n.° 4 representa uma intromissão abusiva na esfera da competência das autarquias por parte do poder central.

Em relação ao artigo 54.°, cujo título é «Novas Competências», desconhecem-se — e agradecia que fossem esclarecidos — os critérios da verba de 3 milhões de contos. De qualquer forma, segundo os nossos cálculos, esta verba deve corresponder a cerca de 2/3 daquilo que é necessário.

O artigo 55.° diz que: «O montante global a atribuir a cada município no ano de 1985 em resultado da aplicação do n.° 1 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 98/84, de 29 de Março, deduzido da verba destinada aos transportes escolares e à Acção Social Escolar, não pode ser inferior ao que, em 1984, lhe foi atribuído nas mesmas condições.» Contudo, fala-se numa percentagem de 10 %. A Sr.8 Secretária de Estado sabe perfeitamente que, no ano passado, a taxa de inflação não foi de 10 %, mas foi muito superior. Hoje, é correntemente admitido que a taxa de inflação foi de 29 e qualquer coisa por cento, cerca de 30 %.

Em relação ao artigo 56.°, a verba é de 200 000 contos para auxílios financeiros às autarquias locais. Para auxílios financeiros é, realmente, uma verba diminuta e até ridícula em relação aos objectivos a que se propõe acudir!

Relativamente ao artigo 58.°, pensamos que a redacção permite que o poder central possa usar critérios discriminatórios e beneficiar autarquias mais simpáticas, em prejuízo das menos simpáticas. Foi já apresentada uma proposta pelo Sr. Deputado Belchior Pereira em relação ao n.° 1 do artigo 58.°, e pensamos que ela poderá melhorar o teor daquela que é formulada pelo Governo. Aderimos, portanto, à proposta do Sr. Deputado Belchior Pereira.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.8 Ilda Figueiredo (PCP): — Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica, queria voltar à questão dos indicadores e ao problema que a Sr.8 Secretária de Estado pôs em relação à divulgação ou não dos critérios utilizados.

Desde já, Sr.8 Secretária de Estado, queria lamentar essa sua afirmação, fundamentalmente por duas razões: a primeira, é, desde logo, uma questão de política geral que tem que ver com toda a problemática das autarquias, com toda esta questão importantíssima da distribuição de verbas que, naturalmente, é impôs-

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sível de entender, se não forem conhecidos dos Srs. Deputados, dos autarcas em geral e do País, os critérios efectivamente utilizados para uma distribuição de verbas tão desigual que levantou, como já é conhecido, todo um conjunto de reclamações pelas injustiças que se propõem praticar. Esta é a primeira questão que, naturalmente, já por si, é importantíssima para justificar o lamento em relação à sua afirmação.

Num segundo campo, queria ainda dizer o seguinte: a Sr.a Secretária de Estado sabe que o artigo 159.°, alínea d), da Constituição, depois da revisão, ficou nestes termos: «Constituem poderes dos deputados, além dos que forem consignados no Regimento, requerer e obter do Governo ou do órgãos de qualquer entidade pública os elementos, informações e publicações oficiais que considerem úteis para o exercício do seu mandato.» Assim, se os deputados requereram esses elementos nos termos da Constituição, a Sr.8 Secretária de Estado tem de os divulgar.

Mas, para além deste problema, para além do direito constitucional que os deputados têm, há todo um problema muito mais geral, e esse é importantíssimo. Isto é, a necessidade de esclarecermos o país dos critérios efectivamente utilizados para as desigualdades na distribuição de verbas pelas autarquias.

A Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica: — Sr. Presidente, peço a palavra.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr." Secretária de Estado.

A Sr." Secretária de Estado da Administração Autárquica: — Não vou responder às perguntas que me foram postas. De qualquer modo, não posso deixar de responder ao comentário da Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo, todos os dados que os deputados desta Casa nos têm pedido têm sido fornecidos, como não podia deixar de ser. Aliás, continuaremos a fazê-lo com muito gosto.

O que eu disse — e volto a insistir — foi que tinha sido a primeira vez que o Ministério da Administração Interna tomava a iniciativa de, previamente à discussão, distribuir todos os dados que nos serviram de base aos cálculos. Volto a dizer que fizemos isso não porque a lei o exigisse, mas porque pensamos que a forma clara de trabalharmos e de demonstrarmos que, efectivamente, estamos a trabalhar numa isenção total é distribuirmos previamente os dados.

Era isto o que eu queria dizer.

O Sr. Presidente: — Penso que chegámos ao fim dos trabalhos da manhã, que reabrirão às IS horas. Como sabem, às 16 horas estará presente o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

Digo para reiniciarmos os trabalhos às 15 horas porque temos assuntos a tratar que justificam o reinício dos trabalhos a essa hora.

Sendo assim, agradecia a vossa colaboração para, às 15 horas, recomeçarmos os trabalhos.

Está, então, suspensa a sessão.

Eram 13 horas.

Após o intervalo, assumiu a presidência a Sr." Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.8 Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 16 horas e 20 minutos.

A Sr.8 Presidente: — Srs. Deputados, quero comunicar-vos que o Sr. Presidente desta Comissão, neste momento, está presente numa outra reunião; no entanto, logo que esteja disponível virá para aqui.

Encontra-se connosco o Sr. Ministro da Qualidade de Vida que, creio, vai começar por fazer uma pequena introdução e, seguidamente, os Srs. Deputados poderão inscrever-se para pedir esclarecimentos ou fazer intervenções, se assim o desejarem.

Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Peço a palavra, Sr.8 Presidente.

A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): —Sr.a Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Qualidade de Vida: Trata-se de uma questão de metodologia relativamente à nossa reunião. É que há uma parte substancial do orçamento do Ministério da Qualidade de Vida que tem a ver com questões desportivas, portanto do âmbito da Secretaria de Estado dos Desportos.

A primeira questão que coloco é a de saber se a presença do Sr. Secretário de Estado dos Desportos está ou não prevista.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida (Sousa Tavares): — Sr. Deputado Jorge Lemos, devo dizer que o avisei desta reunião. O Sr. Deputado sabe, com certeza, que fomos avisados desta reunião ontem à tarde e ontem não consegui encontrar o Sr. Secretário de Estado dos Desportos. No entanto, hoje de manhã ele foi avisado e disse que viria cá.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Muito obrigado, Sr. Ministro.

A Sr.8 Presidente: — De qualquer modo, creio que podemos começar, pelo que lhe dou a palavra, Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — O que vou

dizer é muito rápido.

Como sabem, o orçamento do Ministério da Qualidade de Vida é o mais limitado, é muito restrito, atendendo, inclusivamente, aos efectivos dos nossos serviços, que são pequenos. Trata-se de um ministério que, até hoje, tem sido considerado como um ministério horizontal, ou seja, um ministério não propriamente de intervenção directa, mas um ministério propugnador de medidas e, de certa maneira, interceptivo da acção de outros ministérios. Talvez, com o tempo, essa noção possa vir a modificar-se, mas por enquanto não está, de maneira nenhuma, alterada!

Isso faz com que as verbas atribuídas ao Ministério da Qualidade de Vida não possam, de maneira nenhuma, ser consideradas condignas à própria finalidade do Ministério, que devia lutar pelo ambiente, pela antipoluição e também pela defesa do consumidor.

Como sabem, o Ministério da Qualidade de Vida teni a seu cargo toda a área dos desportos e praticamente metade das verbas atribuídas a este Ministério são de-

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dicadas à política desportiva, o que torna extremamente exígua toda a parte destinada à defesa e preservação do ambiente. Oscilará em 1 milhão de contos a parte destinada à política do ambiente, já contando com a verba dos P1DDAC.

Suponho que a verba dos PIDDACs e a do Orçamento perfazem 2 400 000 contos, em números redondos. Desses 2 400 000 contos, mais ou menos 1 200 000 contos deve ser destinado aos desportos, restando para toda a política de ambiente em Portugal cerca de 1 200 000 contos. Estes são os aspectos gerais que posso referir em relação ao orçamento do Ministério.

Por outro lado, os Srs. Deputados sabem que lutamos contra uma dificuldade, que, até agora, se tem mostrado invencível e que representa uma obstinação da parte do Ministério das Finanças no sentido do não reconhecimento inequívoco do Ministério da Qualidade de Vida, ou seja, da sua não institucionalização, o que faz com que o Ministério da Qualidade de Vida não tenha quadros, nem decretos regulamentares aprovados.

Hoje, nenhuma objecção é válida em relação a esse fenómeno, a não ser que venha da vontade do Sr. Secretário de Estado do Orçamento que, obstinadamente, se opõe a isso. Inclusivamente, continua a dar pareceres não fundamentados em relação a todas as tentativas que o Ministério faz de aprovação dos seus quadros. É uma luta que dura há 4 anos, que diz respeito ao próprio reconhecimento político da necessidade ou não de uma política de ambiente — é um ponto que deixo à consideração dos Srs. Deputados.

É, portanto, uma definição de carácter político saber até que ponto se torna necessária a existência de uma secretaria de Estado, ou seja, de um ministério — e emprego o termo «secretaria de Estado» na acepção antiga da lei portuguesa —, repito, de uma secretaria de Estado votada à defesa da Natureza, à preservação dos meios naturais, à defesa do consumidor e a todos os interesses que estão ligados a essa luta. Ou, pelo contrário, deve considerar-se que isso está a mais na nossa Administração Pública e deve apenas confiar--se a cada ministério, desde o Ministério das Obras Públicas ao Ministério da Indústria, passando pelo Ministério do Comércio, etc, a preservação dessas normas de defesa do cidadão e da sociedade?

Penso — e se não pensasse assim não seria, com certeza, neste momento, Ministro da Qualidade de Vida — que é absolutamente necessária a existência, a nível ministerial, de um ministério vocacionado precisamente para esses fins. Assim, tenho obstinadamente seguido esta luta. Ela faz com que o orçamento do ministério apresente, por vezes, rubricas desequilibradas — e darei uma explicação sobre isso logo que as perguntas adequadas forem feitas — que ele seja um pouco informe.

Posta esta introdução, penso que nada mais tenho a dizer, para já.

A Sr.a Presidente: — Para pedir esclarecimentos, inscreveram-se os Srs. Deputados Vilhena de Carvalho, José Vitorino, Anselmo Aníbal, Leonel Fadigas, Jorge Lemos, Bagão Félix, Portugal da Fonseca e João Abrantes.

Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Sr. Ministro da Qualidade de Vida, agradeço a sua exposição, o facto de se colocar à disposição relativamente às per-

guntas que queiramos fazer-lhe, assim como o oferecimento dos esclarecimentos necessários.

A primeira pergunta que quero fazer-lhe é a seguinte: no desenvolvimento do Orçamento, na parte que se refere às despesas, do seu Ministério, vêm rubricas subordinadas a horas extraordinárias, cujas verbas montam a 8294 contos. Gostava que o Sr. Ministro justificasse a razão de ser dessas rubricas.

Concretamente, gostaria de saber se a previsão dessas despesas diz respeito ao trabalho praticado para além das horas normais de serviço pelos funcionários que trabalham no seu Ministério, ou se diz respeito a horas extraordinárias feitas por pessoas que não são trabalhadoras da Função Pública. Aliás, V. Ex.a acabou de referir a obstinação do Sr. Secretário de Estado do Orçamento no sentido da não aprovação dos quadros. Portanto, posso admitir que a previsão dessas verbas de despesa seja, de algum modo, para obviar essas dificuldades acabadas de ser referidas.

Gostaria, pois, que nos desse uma explicação sobre estas verbas, sendo certo que se notam algumas discrepâncias deste género: enquanto, por exemplo, para o gabinete do Sr. Ministro se prevêem despesas da ordem dos 850 contos para horas extraordinárias e para a Secretaria-Geral se prevê uma verba de 5544 contos, e por aí adiante relativamente a outros serviços, já não se prevê nenhuma despesa para horas extraordinárias, por exemplo, para o Gabinete de Estudos e Planeamento ou para o Gabinete de Defesa do Consumidor. Há, de facto, critérios que são diversos na elaboração do orçamento e era, pois, sobre este ponto que desejava pedir explicações ao Sr. Ministro.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almerindo Marques.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sr. Deputado, as verbas destinadas ao pagamento de horas extraordinárias do Gabinete de Defesa do Consumidor e do Gabinete de Estudos e Planeamento são pagas através da Secretaria-Geral, aliás, como o são todas as horas extraordinárias do Ministério.

Quanto ao facto de existir uma verba de cerca de 8000 contos em relação a horas extraordinárias, ela diz respeito a todo o pessoal efectivo do Ministério, que, como se sabe, é exíguo, pois os trabalhadores extras não podem ganhar horas extraordinárias.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Sr. Ministro, gostaria de saber se então se justifica que os funcionários efectivos trabalhem para além das horas habituais de funcionamento das instituições ao ponto de um consumo deste montante de despesas.

O Orador: — Justifica-se sim, Sr. Deputado! Mas esse é um aspecto que só na prática lhe poderei demonstrar. Assim, tenho o maior gosto em o convidar a vir um dia ao meu Ministério a fim de verificar o trabalho extraordinário que lá é prestado. De uma forma geral, nos Gabinetes do Ministro e dos Secretários de Estado é prestado trabalho extraordinário a nível de pessoal de apoio — de chauffeurs, etc. — que têm direito a receber horas extraordinárias praticamente

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todos os dias. Além disso, há algumas direcções-gerais que têm bastante insuficiência de pesoal e, portanto, muitas vezes vêem-se obrigadas a recorrer a trabalho extraordinário.

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, antes de mais, gostaria de informar V. Ex.a de que o método que costumamos usar nestes períodos de pedidos de esclarecimento é o seguinte: em primeiro lugar usam da palavra todos os Srs. Deputados que estão inscritos para formular os pedidos de esclarecimento e depois o Sr. Ministro responderá a todos eles em conjunto.

No entanto, se V. Ex.a desejar responder caso a caso, é evidente que o poderá fazer.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sr. Presidente, em primeiro lugar quero esclarecer V. Ex.a que tenciono ser muito breve nas resposta que vou dar.

Devo ainda acrescentar que prefiro responder caso a caso e à medida que os problemas forem colocados porque, caso contrário, poderei esquecer algumas questões.

O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Ministro. Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.

O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, há aqui uma preocupação profunda que, mais do que preocupação começa a ser um autêntico tormento, porque em determinadas matérias acabamos por não saber quem é que coordena o quê e quem é que tem a responsabilidade orgânica, funcional e política de fazer o quê.

Em relação aos Ministérios da Qualidade de Vida, da Administração Interna e do Equipamento Social, surgem muitas zonas cinzentas em que acabamos por ser atirados de ministério para ministério e não concluímos nada de seguro quanto a decisões em matérias vitais e urgentes. Hoje já colocámos alguns problemas aos representantes do Ministério da Administração Interna, iremos continuar a colocá-los aos representantes do Ministério do Equipamento Social, mas neste momento estamos a tratar com o Ministério da Qualidade de Vida.

Concretamente, o problema põe-se sobre a politica nacional em matéria de saneamento básico e em matéria de água. Quem é que gere, quem é que administra, quem é que define, quem é, ao fim e ao cabo, o responsável por estas questões?

Apesar de estarmos a tratar de questões de ordem geral, vou-me referir a uma questão mais concreta, que é o caso do Algarve, onde o problema se tem colocado de forma particularmente aguda. Gostaria de ser informado sobre o que é que vai acontecer à Comissão de Saneamento Básico do Algarve. Ela vai depender de quem, vai funcionar juntamente a quem? Mais do que isso, o que é que se vai fazer para essa comissão terminar o programa de emergência que se iniciou em 1982?

Contudo, mais do que saber isto, que já é importante, importa saber quem é que assume a coordenação e a liderança do processo para o ataque ao problema de fundo, que é o que diz respeito ao tratamento dos esgotos numa perspectiva de médio e longo prazos — 20 ou 30 anos. Há que prever e que acautelar estes problemas, designadamente tendo em considera-

ção o afluxo de turistas que se prevê para o Algarve, quer por via das obras do aeroporto, quer por via da ponte do Guadiana que se vai iniciar este ano, quer ainda por via do arranjo progressivo que se tem feito na estrada Faro-Lisboa e que ainda este ano vai sofrer melhoramentos desde Sines a Albufeira. Ora, tudo isso nos preocupa e é necessário saber quem é que na realidade é o responsável por estas coisas.

No que diz respeito à água, fala-se na construção de barragens no Algarve — e estamos a favor disso —, mas é necessário saber quem é que gere a exploração racional da água no Algarve. É a Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos do Ministério do Equipamento Social? O Ministério da Qualidade de Vida tem ou não alguma interferência nesse aspecto?

Creio que é muito importante que isso seja esclarecido — importante para nós, deputados, para a opinião pública e até para os próprios ministros, porque quando não se sabe quem é o responsável, todos o somos!

Peço, pois, Sr. Ministro, o favor de nos esclarecer todas estas questões no âmbito das suas competências políticas.

Entretanto, reassumiu a presidência a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.

A Sr.a Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Em primeiro lugar quero dizer que estou um pouco admirado pelas questões que o Sr. Deputado colocou, porque talvez V. Ex.a esteja tão habilitado ou mais do que eu a dar-lhes resposta. Aliás, estas perguntas não dizem directamente respeito às finanças do meu Ministério — só lhe podem dizer respeito indirectamente e no futuro! É evidente que o Ministério não tem nem pretende ter responsabilidades no que se refere às obras.

O Sr. Deputado José Vitorino poderia ter colocado estas mesmas questões aos Ministérios da Saúde, da Educação e da Defesa Nacional. Quem é que define a politica das escolas, dos hospitais, dos quartéis? Creio que o Ministério do Equipamento Social é vocacionado para construir e não para definir políticas. Não é, nunca foi, nem deveria ser um Ministério humanista.'

Portanto, a única resposta que poderia dar quanto à questão da água é a de que ninguém gere a política da água em Portugal. A política da água é inexistente em Portugal, não está definida, não há uma autoridade da água e a sua situação é de tal maneira calamitosa que devo dizer que considero como problema político urgente que se defina uma autoridade nacional da água, que haja um ministério responsável pela definição da política da água como a questão mais ardente. Contudo, creio que esta é uma questão essencialmente política e não deve ser abordada na discussão do Orçamento.

Quanto à questão do equipamento básico do Algarve, devo informar que a única intervenção que o Ministério da Qualidade de Vida teve neste assunto — aliás, como em todos os outros relacionados com este problema — foi uma intervenção solicitada. Quer dizer, de norte a sul do País, praticamente por quase todas as autarquias e entidades, o Ministério da Qualidade de Vida, talvez devido ao seu nome ou à sua preocupação humanista pelo bem-estar do povo, é per-

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manentemente solicitado a intervir em casos de deficiência.

No que diz respeito ao saneamento básico do Algarve, o Ministério da Qualidade de Vida discordou — e já referi isso publicamente — do sistema adoptado. Em 2 palavras vou explicar porquê: toda a política de saneamento básico em qualquer país que tenha a «cabeça no seu lugar» é feita por bacias hidrográficas e por regiões; não pode ser uma solução fragmentada.

Portanto, como Ministro da Qualidade de Vida, não posso concordar com a solução fragmentária que se pretendeu dar à questão do saneamento básico do Algarve. E não concordo por variadíssimas razões: primeiro, porque representa uma fragmentação por 14 autarquias e por 231 planos diferentes, dos quais a respectiva comissão refere, que já apreciou e aprovou 215. Ora, para uma região homogénea como é o Algarve, de um pendor de águas normalmente semelhante, caracterizado por uma linha de montanhas a norte e, portanto, por um deslizar normal de águas em relação à sua vertente sul, para o mar, não parece possível a existência de 231 projectos diversos. Pelo contrário, creio que 10, 12 ou 15 projectos conjuntos resolveriam a questão do saneamento básico do Algarve.

Por isso, o Ministério da Qualidade de Vida não pode abdicar da sua obrigação de dizer aquilo que pensa em interesse das regiões, do povo e das finanças do Estado.

O saneamento básico do Algarve custou até agora 3 500 000 contos e estão pedidos para ele mais 4 milhões de contos, a fundo perdido, para financiamento às autarquias. Portanto, o Ministério da Qualidade de Vida considera que há aí uma dispersão de esforços, e, inclusivamente, uma gaspillage de fundos que poderiam ser melhor utilizados em planos conjuntos. Aliás, é hoje parecer praticamente unânime — pelo menos, a nível de todas as autarquias do País ao norte do Algarve — de que o problema do saneamento básico excede a capacidade das autarquias.

Sei que na Lei das Finanças Locais existe uma disposição que responsabiliza as autarquias pela política de saneamento básico. Simplesmente, o sentimento unânime do País, com excepção do Algarve, é o de que as autarquias não podem cumprir a obrigação legal do saneamento básico. E não o podem por 3 razões fundamentais: geográficas, técnicas e financeiras. Por razões geográficas porque as soluções de saneamento básico ultrapassam sempre e normalmente as dimensões de uma autarquia. Portanto, são sempre soluções que dizem respeito a uma região, a um determinado sistema hidrográfico, enfim, a coisas que ultrapassam geograficamente as autarquias.

Tecnicamente estas questões ultrapassam o âmbito da autarquia porque é impensável que as 300 autarquias municipais do País sejam dotadas com os serviços técnicos necessários para assegurarem um eficiente sistema de saneamento básico. O Sr. Deputado José Vitorino sabe que, depois de um enorme dispêndio financeiro das autarquias, é montado um sistema de saneamento básico que poucos meses depois deixa de funcionar convenientemente por falta de assistência técnica e por falta de capacidade por parte das autarquias de poderem assegurar, uma por uma, essa assistência técnica.

Ora, isto implica a terceira razão, que é o problema do saneamento básico ultrapassar a capacidade financeira das autarquias. Os problemas de saneamento bá-

sico envolvem normalmente um tal dispêndio de capital, tal investimento de dinheiro, que ultrapassa completamente a possibilidade de cada autarquia de per si.

Estou convencido de que se formos para uma coordenação a nível nacional ou regional do problema do saneamento básico se podem obter economias perfeitamente espectaculares e que em vez dos milhões de contos que estão sendo dispendidos, autarquia por autarquia, pelo País inteiro — e muitas vezes com sacrifício de outros benefícios municipais —, se obteria uma enorme economia de custos e uma muito maior eficiência no sistema.

Esta é, pois, a posição do Ministério da Qualidade de Vida e não abdicará dela enquanto tiver os titulares que tem.

O Sr. José Vitorino (PSD): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Ministro?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, concordo com tudo o que V. Ex.a referiu. Contudo, não compreendi se o Ministério da Qualidade de Vida se limita a dar o seu ponto de vista, mas não define a política. Das palavras de V. Ex.a depreendo que é o Ministério do Equipamento Social que define a política e executa as obras.

O Orador: — Exacto, Sr. Deputado. O Ministério da Qualidade de Vida foi encarregado há duas semanas, pelo Conselho de Ministros, de apresentar as suas propostas para uma definição da política nacional de água. Fá-lo-á com os meios restritos que tem, adquiriu — e já estão ao seu serviço — técnicos hídricos para esse efeito e, portanto, prosseguirá uma política de definição nesse sentido.

Quanto ao facto de ser o Ministério do Equipamento Social o que define a política, devo dizer — aliás, já referi esse aspecto — que quanto a mim não é a esse Ministério a quem compete definir a política da escolarização, nem a de defesa, nem a de saúde, nem as diversas políticas fragmentárias que existem.

Portanto, considero perfeitamente defeituoso que seja a entidade que faz as obras a mesma que define a política.

A Sr." Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Sr. Ministro, registámos — embora sem surpresa — as posições de V. Ex.a que acentuam que o Ministério da Qualidade de Vida é limitado por vocações que decorrem fundamentalmente do facto de ser um Ministério que tem poucas verbas e que se definiu na horizontalidade dos seus programas em conjunto com outros ministérios.

Ora, nós temos uma outra perspectiva e um outro entendimento para a «sorte» do seu Ministério, Sr. Ministro, e que é fundamentalmente decorrente do facto de ele ter nascido emblemático, andar frequentes vezes à porta da extinção (quiçá agora!), ter percorrido variadas crises internas — e ainda agora estamos perante um dos membros do Governo aqui presente que está demissionário. Aliás, assiste-se a frequentes conflitos de ordem institucional com outras entidades e mi-

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nistérios, dos quais queria relevar aquele que o opõe a uma direcção-geral dentro do Ministério do Equipamento Social e da Secretaria de Estado do Equipamento Social, em que se joga com problemas como é o do «domínio nas águas».

Daí, a primeira ordem de questões que gostaríamos de lhe colocar, Sr. Ministro, decorre fundamentalmente dos problemas que alguém sintetizou há alguns anos no verbo e na verba. O seu verbo, Sr. Ministro, é conflitual e estende-se. Quanto à verba, seja por «habilidades» do Sr. Secretário de Estado do Orçamento

— como foi aqui referido antes de ele estar presente —, seja por outros motivos, o que é certo é que ela lhe vem escasseando.

Os seus projectos-programas e a forma como eles são salientados nas Grandes Opções do Plano mostram que

— conforme nos foi dito no esclarecimento que V. Ex.a prestou — há uma discrepância entre os seus projectos nas Grandes Opções do Plano e as Grandes Opções do Plano que o Ministério das Finanças e do Plano escolheu.

Em relação aos projectos concretos que o Sr. Ministro refere quando se espraia sobre estas matérias, gostaria de saber se, de facto, com este Orçamento e com este PIDDAC, V. Ex.a ou a Secretaria de Estado do Ambiente procurariam ter alguma intervenção durante o ano de 1985 em problemas tão graves como seja o do estuário do Tejo, em conjunto com as câmaras municipais da margem norte e da margem sul. V. Ex.a pode dar algumas indicações em relação às várias ribeiras de Lisboa, designadamente a do Jamor, a do Trancão, a da Jardas? Pode adiantar-nos alguma coisa sobre os problemas das áreas protegidas, designadamente Sintra e Cascais, da conexão indispensável com os ministérios? Pode adiantar-nos algum tipo de intervenção da Secretaria de Estado do Ambiente e do seu Ministério em matéria dos resíduos sólidos, dos lixos, designadamente nas áreas do Grande Porto e da Grande Lisboa?

Se não existem esses programas no Ministério da Qualidade de Vida, gostaria de saber se o Sr. Ministro conhece — na perspectiva para que vocacionaram o seu Ministério, que é a da horizontalidade e da intercepti-vidade de, como nos definiu aqui — alguns outros programas em outros ministérios.

A segunda ordem de questões que gostaria de colocar dizem respeito a alguns pormenores da pouca verba que há e decorrem fundamentalmente em duas áreas específicas: há direcções-gerais que têm neste Ministério orçamentos que, sobre serem de penúria, são caricatos. A nomenclatura não corresponde minimamente àquilo que elas conseguem fazer e como o Sr. Ministro também diz que a nomenclatura no Ministério lhe causa alguns precalços, diríamos que uma Direcção--Geral de Ordenamento, que tem uma verba como aquela que aqui nos é referida, tem um nome demasiado grandíloquo para a verba que tem.

Entretanto, esta Direcção-Geral de Ordenamento tem cerca de 30 °7o do seu orçamento para aquisição de serviços não especificados. Será uma agência agregadora de estudos feitos por entidades diversas (especializadas, certamente!)?

A aquisição de serviços — que em muitos casos são devidos a carências, naturalmente, dos próprios serviços e à necessidade de recolher pareceres e assessorias especializadas — não pode ser de forma a ter uma incidência tão grande em verbas orçamentais.

Por último, a questão que queríamos colocar diz respeito aos parques e reservas naturais e, no âmbito do PIDDAC, gostaríamos de saber a desagregação dessas verbas. Só temos a desagregação dos 77 000 contos dos serviços de parques e reservas no orçamento privativo, mas não a temos em termos do PIDDAC. São cerca de 103 000 contos e, portanto, gostaríamos de ter essa indicação!

A Sr.a Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Há uma

parte da resposta que deverá ser dada pelo Sr. Secretário de Estado do Ambiente, aqui presente. Quanto ao problema levantado de ele se encontrar demissionário (que penso que não está, mas ele esclarecerá!) e, sobretudo, quanto aos parques e à aquisição de serviços pela Direcção-Geral do Ordenamento, a resposta compete ao Sr. Secretário de Estado.

Devo dizer que o Ministério reclamou sobre as verbas, mas não muito, pois a parte sacrificada do nosso Orçamento foi de 100 000 contos. Não somos ambiciosos e pensamos que se pode fazer uma política eficaz com pouco dinheiro. Aliás, tenho reclamado, sobretudo, uma questão de institucionalização e de definição de competências muito mais do que dinheiro num orçamento que apresenta 335 milhões de contos de défices apenas reclamámos para o Ministério mais 100 000 contos! Portanto, não houve um grande sacrifício das verbas pedidas pelo Ministério da Qualidade de Vida, embora esses 100 000 contos tenham, para nós, um significado muito grande!

De resto, o Ministério da Qualidade de Vida propõe--se intervir no problema do estuário do Tejo, como também no problema das ribeiras de Lisboa. E se não o fez mais eficazmente, foi normalmente por oposição de outras secretarias de estado e ministérios!

Em relação ao estuário do Tejo propusémo-nos continuar o estudo que foi feito com a subvenção do PNUD (Plano das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que produziu um trabalho útil, e que quisemos continuar. Porém, essa intenção do Ministério da Qualidade de Vida — que, aliás, foi levada a decisão do Conselho de Ministros — de prosseguir com o estudo ambiental do estuário do Tejo e, inclusivamente, com uma programação das acções não foi aprovada. Normalmente, o Ministério da Qualidade de Vida tem procurado uma política de definição e, portanto, tem procurado elaborar um conjunto de operações a efectuar por outros ministérios.

Acabámos de criar, por exemplo, neste momento, a Comissão de Gestão da Bacia Hidrográfica do Rio Ave, a pedido de todas as autarquias. Trata-se de um dos rios mais poluídos de Portugal, que se encontra num estado perfeitamente escandaloso, e fizemos isso sem nenhum ónus para o Orçamento do Estado, utilizando instalações de uma das câmaras municipais, com funcionários próprios e procurando apenas definir — com a autoridade que nos advém de ser uma comissão interministerial e, portanto, com a autoridade do próprio Primeiro-Ministro — as acções que cada ministério deve fazer. No caso do rio Ave, por exemplo, a questão é nítida: é necessária a intervenção do Ministério da Indústria, em relação às indústrias poluidoras, a utilização de serviços do Ministério da Saúde, para apuramento da pureza das águas, e do Ministério da

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Agricultura, para saber a quantidade de água que é necessário desviar para a agricultura. Ora, tudo isto é realizado através dos vários ministérios, coordenadamente, através dos seus orçamentos próprios.

Devo dizer-lhe também, quanto às áreas protegidas e sobretudo quanto às áreas de Cascais e Sintra, que a nossa política foi a de simplificar a comissão que existia mas que praticamente não funcionava pela super--abundância de pessoas que a constituía e que eram cerca de 30. Ora, uma comissão de 30 pessoas não pode funcionar e, portanto ela foi reduzida para 5 pessoas: 1 representante do Ministério da Qualidade de Vida; 1 representante do Ministério de Comércio e Turismo; 1 representante do Ministério da Administração Interna; a própria presidente da Câmara de Cascais e 1 representante da Câmara Municipal de Sintra. Essa comissão — como o Sr. Deputado sabe, se está atento aos noticiários dos jornais — tomou posse há 15 dias e está a elaborar, em regime acelerado, o Plano Regional de Ordenamento do Território relativo à região, sem o qual não se pode partir para uma definição efectiva de políticas. Penso que o PROT da região Sintra/Cascais deverá estar terminado até ao dia 15 de Março, pelo menos nos seus princípios fundamentais, e a partir daí, as câmaras podem, então, começar efectivamente a executar a política que tiver sido considerada mais útil.

Quanto à questão da protecção dos solos, tenho uma dificuldade real. Deve-se ao Ministério da Qualidade de Vida — e só a ele e à sua iniciativa — a criação da reserva agrícola nacional. Simplesmente, não temos poderes nem sobre a administração nem sobre a delimitação dessa reserva agrícola nacional, mas podemos levantar problemas, como o temos feito, inclusivamente fi-lo há bem pouco tempo em relação à rede viária que se vai construir no Porto, que, quanto a mim, vai afectar os melhores terrenos hortícolas da região da cidade do Porto!

Por outro lado, o novo regulamento geral de construções urbanas foi publicado apenas há 15 dias e ele ainda não dá ao Ministério da Qualidade de Vida

— há sempre uma menorização do papel essencial que este Ministério deve ter — a capacidade de se opor, por exemplo, à invasão urbana de terrenos que são essenciais do ponto de vista agrícola. Não nos podemos opor

— aliás, isso não é do meu tempo — à destruição prática, por exemplo, de toda a região hortícola de Loures, que era a região fundamental de abastecimento de produtos hortícolas à cidade de Lisboa, e cuja falta é perfeitamente insubstituível!

Mas, quanto a esta questão, devo dizer que só uma acção pedagógica duradoura e profunda poderá, inclusivamente, levar as autarquias e — que são, normalmente, a entidade mais poderosa neste aspecto porque os licenciamentos de construção urbana são, geralmente, dados pelas câmaras — a compreenderem que a política de ordenamento do território e de preservação de solos agrícolas é essencial para toda a comunidade.

Não sei se me esqueci de alguma coisa, mas creio que respondi essencialmente às suas perguntas. Assim, passarei agora a palavra ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Carlos Pimenta): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Acerca da

horizontalidade e da verticalidade do Ministério, efectivamente, pensamos que a sua vocação é essencialmente de síntese, que é feita ao nível — e aqui falo em nome do ambiente — do próprio objecto da sua acção, ou seja, ao nível dos próprios componentes do ambiente. Assim, a razão de se reclamar a água para o âmbito do Ministério da Qualidade de Vida é porque ela já não é apenas um elemento de transporte, um elemento de irrigação, um sistema onde se podem vazar resíduos mas também é — como todos nós aprendemos algures na escola — um elemento vital, que tem um ciclo renovável e que, portanto, entra na área do ambiente. Ora, com o desenvolvimento da ciência e da tecnologia, enfim, com o desenvolvimento das actividades humanas, tem vindo a tornar-se cada vez mais necessária esta abordagem de síntese de todos os elementos do ambiente; logo, é natural que também a água seja chamada a fazer parte desse conjunto e é daqui que advêm um pouco a horizontalidade do Ministério.

Portanto, há com certeza actividades que interferem com os elementos do ambiente, e por isso mesmo se diz que não temos ambições territoriais, que não temos apetência para realização de obras. Porém, temos a vocação para fazer a síntese, a compatibilização das diversas componentes ambientais.

Dentro dos vectores segundo os quais se pode abordar o ambiente, há uns que são relativamente novos. Enquanto a água — por ser uma fonte de energia, um elemento para a irrigação, para o transporte, etc. — foi desde sempre um vector importante da actuação dos ministérios, os resíduos sólidos e o ruído, por exemplo, são elementos relativamente novos a considerar na administração das comunidades, e dentro do edifício da Administração ainda ninguém se tinha candidatado a ocupar-se dessa matéria. Nessa altura, o Ministério terá tendência a ser mais profundo na abordagem dessas questões. Aliás, isso aconteceu, por exemplo, no que diz respeito ao ar: até 1980 havia uns quantos ministérios que, em funções de suplencia, se ocupavam da política atmosférica e a partir desse ano foi possível unificar a política de gestão do ar — definida através do Decreto-Lei n.° 255/80. Portanto, os ministérios que até aí se digladiavam um pouco, viram todas as suas actuações coordenadas e submetidas a essa função de síntese do Ministério.

Em relação à questão da capacidade de intervenção e acerca do montante das verbas estamos um pouco perante um círculo vicioso. É um pouco a questão do ovo e da galinha! Quer dizer, não temos capacidade de intervernção porque não temos quadros, e não temos quadro, porque a nossa acção não é credível. Assim, estamos um pouco neste círculo vicioso e é nele também que se integra a razão pela qual há poucos dias apresentei ao Sr. Primeiro-Ministro o meu pedido de demissão, que não tem nada a ver com as notícias propagadas na comunicação social, pelo menos no que respeita às primeiras justificações.

Efectivamente, para reclamarmos competências teremos necessidade de um certo discurso político, mas, por outro lado, carecemos de um trabalho de base no interior, com os poucos recursos que temos, no sentido de os optimizar, e estaremos aptos a responder a essas competências.

É um pouco na separação desses 2 níveis de intervenção (assumi este segundo, o de housekeeper, perdoem-me o anglicismo) que surgem problemas de

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articulação e de coesão, mas, neste momento, os obstáculos estão aplainados e, portanto, a minha situação de demissionário está resolvida.

Neste momento não é assim tão importante a questão de saber se o dinheiro que o Ministério da Qualidade de Vida tem é muito ou é pouco; a questão que se me põe neste momento — que é mais de consciência, de governante, de cidadão, de técnico e de político — é a de ser ou não capaz, com os meios que tenho disponíveis, de utilizar aquele dinheiro por forma a que a execução material esteja ao nível da execução financeira. E este é, efectivamente, um problema de natureza moral!

Na verdade, o problema relativo aos recursos humanos, e sobretudo ao processo de adiamento da resolução do problema, vem desde o início de 1980, quando se apontava para uma Secretaria de Estado do Ambiente — que tinha já uma orgânica aprovada em que havia decretos regulamentares que estavam prestes a ser aprovados —, que foi substituída, tendo aparecido uma lei orgânica para o Ministério, o que levou a que uma série de pessoas tenham ficado à espera desde Janeiro de 1980. Ora, isto tem levado a uma degradação dos efectivos e a uma certa compensação com a aquisição de serviços.

Quanto aos não especificados há 2 razões básicas para eles: a primeira é a de que não há capacidade humana própria para desempenhar as tarefas que, neste momento, estão programadas e que tem vindo a realizar-se; a segunda é relativa à natureza dos temas, pois muitos deles têm um carácter perfeitamente inovador em relação à actividade normal do aparelho de Estado, o que obriga a recorrer a serviços exteriores, porque não é fácil recrutar técnicos a outros serviços que tenham essa formação.

No que diz respeito, por exemplo, ao grupo de trabalho para o estudo das cheias, as suas verbas são irrisórias: cerca de 80 % dessas verbas — e dou este número sem grande preocupação de precisão — são para estudos pagos ao LNEC, ao Instituto Superior Técnico, ao Instituto Superior de Agronomia, etc, portanto, a instituições que têm, efectivamente, capacidade técnica e científica para desenvolver o trabalho.

Enfim, não vejo um grande mal em que haja esses 2 tipos de actividade, desde que os próprios serviços tenham uma certa capacidade de interpretar aquilo que os técnicos e os especialistas fazem e que façam a aplicação dos seus serviços à actividade quotidiana. Penso que não é necessário ter a preocupação de ter nos serviços — e penso mesmo que essa é uma das razões por que o aparelho de Estado tem muitos funcionários, desde um tipógrafo, a um carpinteiro, a um electricista e por aí fora, para desenvolver todo o tipo de actividades internas!

Desculpem-me, exagerei um pouco no meu exemplo, mas foi para tornar a imagem que pretendia dar porventura mais clara.

Acerca dos parques, houve uma preocupação de estruturar uma determinada actuação. Qual a razão? Em primeiro lugar, os parques são reservas especiais (e cuidado com a palavra «reserva», não são zoos ou museus), áreas onde é desejável, de uma maneira especial, fazer aquilo que se desejaria fazer para todo o território e que não é possível.

Não se trata de conservar no sentido da fotografia, mas antes de ser mais rigoroso na compatibilização entre o desenvolvimento e a conservação dos equilíbrios

ecológicos. E como estas áreas estão perto das populações, a tal ideia de conquistar, de estabelecer instrumentos de credibilidade para o Ministério levava a que nós atacássemos esse problema com mais cuidado. Por isso, nós temos neste momento planos muito concretos para a serra da Estrela, perfeitamente datados e quantificados, temo-los igualmente para a ria Formosa e estamos a trabalhar nessas áreas.

Quanto ao desdobramento do PIDDAC para os parque — como sabem os parques têm, entre PIDDAC e PIDRE, um montante de 158 000 contos, cuja distribuição se faz da seguinte maneira: para os parques naturais, 99 000 contos na totalidade ...

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Sr. Secretário de Estado, podia dar essa verba em detalhe?

O Orador: — Sim, Sr. Deputado. Ora, o Serviço Nacional de Parques tem autonomia administrativa e financeira. Contudo, não tenho comigo essa distribuição de verbas neste momento e, assim, não posso fazer agora a especificação que me pediu por falta de elementos.

Em virtude de ter intervindo sem usar o microfone, não é possível a transcrição da fala do Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Orador: — Com certeza, Sr. Deputado.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Quanto à participação dos PIDRE gostava já agora de ouvir o Sr. Secretário de Estado.

A Sr.a Presidente: — Sr. Deputado, gostaria que se evitasse o diálogo, mas como o Sr. Secretário de Estado permitiu a interrupção da sua alocução, faça favor de o interpelar.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Em relação aos Programas Integrados de Desenvolvimento Regional a participação é da ordem dos 50 000 contos, aproximadamente. Fundamentalmente em que parques é que tal acção intervém?

O Orador: — Intervêm ao nível da ria Formosa, no Algarve, e há somente 5000 contos para a zona crítica alentejana.

A Sr.a Presidente: — O Sr. Secretário de Estado terminou a sua intervenção?

O Orador: — Sim, Sr.a Presidente.

A Sr.a Presidente: — Está inscrito, para intervir em seguida, o Sr. Deputado Leonel Fadigas. Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): — Sr.a Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Gostaria de começar esta série de 2 ou 3 perguntas que aqui pretendo fazer com uma questão que me parece prévia em relação à discussão do orçamento do Ministério da Qualidade de Vida para 1985.

Tem-se falado muito nos problemas do Ministério e o próprio Sr. Ministro, titular do dito Ministério, começou a intervenção aqui na Comissão *dando-nos conhecimento de que o Sr. Secretário de Estado do Or-

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camento tinha inviabilizado a aprovação dos diplomas regulamentares dos serviços do Ministério e os diplomas jurídicos do pessoal. Isso, de certa forma, contraria uma informação que nos tinha sido transmitida pelo Sr. Ministro da Qualidade de Vida quando, na Comissão de Equipamento Social e Ambiente, discutimos algumas questões ligadas ao Orçamento. Nessa altura foi-nos dito que uma proposta então adiantada para eventual alteração das verbas da secretaria-geral tinha sido inviabilizada porque, segundo o Sr. Ministro nos disse, iam ser aprovados os diplomas relativos ao serviço do minstério.

Assim, a primeira questão que coloco é dirigida ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento e prende-se com as razões e os fundamentos dessa atitude, porque para nós tem de ficar claro qual a posição do Governo em relação a estas matérias.

Temos aqui perante nós um Sr. Ministro e um Sr. Secretário de Estado que não têm posição uniforme quanto a isso! Ora, a nossa aprovação do orçamento do Ministério tem de ser clara em relação à questão do destino a dar às verbas afectas a determinadas finalidades e saber o que é que o Governo pensa em termos de politica ambiental; porque uma coisa é termos um órgão da Administração, um Ministério que se preocupa com um conjunto de princípios, que tem um programa de acção e capacidade de intervenção — grande ou pequena agora não importa — e outra coisa é, no seio do próprio Governo, não ser transparente o interesse e a importância da sua existência. É preciso que a Assembleia saiba com o que conta quando aprovar ou não este orçamento.

Na verdade, foi já dito aqui que a situação de instabilidade vivida no Ministério, para além do desânimo que cria em alguns quadros altamente qualificados e daquilo que é o afastamento de pessoas, coloca em risco a viabilidade de algumas acções ou programas que nós próprios venhamos a aprovar.

Que sentido tem falar-se em Grandes Opções do Plano para o Ministério da Qualidade de Vida, quando este último se vê diariamente esvaído da sua capacidade de intervenção?

Qual é a nossa exigência em relação ao Ministério quando daqui por algum tempo lhe perguntarmos o que fez, como cumpriu as Grandes Opções do Plano ou aquilo que se propôs realizar e em que é que aplicou o dinheiro? Ou o dinheiro é apenas para manter alguns funcionários e para ir pagando ainda a outros que se vão entretendo a estar lá e, enfim, do mal o menos, pague-se-lhes o ordenado e que estejam quietos!?

Isto parece-me ser essencial colocar aqui. Na verdade, torna-se fulcral falar da política da água, como o Sr. Ministro falou aqui — e penso que é um debate importante que tem de ser feito neste país —, em termos de saber como é que vamos gerir o recurso essencial que é a água, integrado numa perspectiva de desenvolvimento, de aproveitamento de recursos, de combate à desertificação. Por outro lado, temos também de abordar problemas que têm a ver com a gestão da água dos rios internacionais, com a questão do Alqueva, etc.

No fim de contas, temos de ver como é que vamos criar o quadro de vida para suporte de uma população que é a portuguesa. Não estamos ou não nos podemos estar no domínio das teorias ou da filosofia, antes nos localizamos numa área crítica no respeitante à criação das condições mínimas de subsistência do pró-

prio País e algumas destas questões envolvem problemas de sobrevivência em termos nacionais.

Ora, quando nós temos uma dependência externa relativamente grande, devemos ter a exigência moral de saber quais são os nossos recursos, como se gerem, qual é a nossa capacidade interna para, no fundo, diminuirmos essa nossa dependência.

Esta é uma questão essencial, que ultrapassa este problema dos números; porém, penso que estamos aqui num órgão político e que não é despiciendo sermos informados quanto ao que é o pensamento do Ministério da Qualidade de Vida sobre esta matéria e, enfim, do próprio Ministério das Finanças, já que nós, por tradição, temos também vivido um pouco na dependência do pensamento das finanças naquilo que respeita a toda a política nacional.

Para concluir, e não querendo fazer uma segunda intervenção, irei somente colocar ao Sr. Ministro uma questão marginal àquilo que acabo de proferir para economia dos trabalhos da Comissão.

Já na Comissão de Equipamento Social tive oportunidade de colocar ao Sr. Ministro o problema das verbas do Instituto Nacional de Defesa do Consumidor. Este Instituto tem um conselho geral com competência para aprovar ou propor ao Sr. Ministro a aprovação do seu plano de actividades e orçamento, estando representada nesse órgão directivo a Assembleia da República. Com tempo útil, o conselho-geral, sob proposta do director do Instituto, aprovou um orçamento que correspondia ao desenvolvimento das tarefas e ao preenchimento dos lugares do quadro de pessoal previsto para o Instituto e, agora, no orçamento final do Ministério, aparece uma verba substancialmente reduzida.

Sabemos que na dotação dos 57 000 contos previstos para o referido Instituto há uma falta de um valor na ordem dos 10 000 contos para, no mínimo, o Instituto cumprir as tarefas para que está vocacionado e que lhe incumbem por lei. Isto é, existe uma disposição legal que atribui ao Instituto um conjunto de tarefas, cujo cumprimento exige um reforço da dotação.

Ora, sendo certo que o Sr. Ministro nos disse que a verba da Secretaria-Geral tinha sido calculada ao tostão porque iriam ser aprovados os diplomas do pessoal e, portanto, este último iria ser pago por essa dita Secretaria, e sendo certo que isso não aconteceu, é previsível que a dotação da mencionada Secretaria-Geral esteja empolada relativamente à realidade daquilo que irá pagar. E mesmo que venham a ser aprovados os diplomas, ter-se-á já perdido 1 ou 2 meses em relação ao esgotamento dessa verba.

Nesse sentido, colocava ao Sr. Ministro a questão de saber se é possível ou não transferir das verbas eventualmente excedentárias da Secretaria-Geral para o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor uma dotação de 10 000 contos ou, em alternativa, se esta redução do orçamento do INDC pressupõe do Sr. Ministro alguma intenção de alterar o decreto regulamentar do referido Instituto, quer em termos de competências quer em termos de redução do seu quadro de pessoal tanto mais que ele está numa fase de instalação e não tem o seu quadro de pessoal totalmente preenchido.

Para já, não ocupava mais tempo.

A Sr.8 Presidente: — Entretanto, tinham-se inscrito o Sr. Secretário de Estado do Orçamento e também o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

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Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Sr.8 Presidente, Srs. Deputados: Como já por 2 ou 3 vezes fui citado, gostaria de precisar 2 notas no respeitante aos quadros de pessoal do Ministério da Qualidade de Vida.

A primeira nota que eu queria referir prende-se com o facto de não se tratar de uma posição do Secretário de Estado do Orçamento mas, outrossim, de um parecer do Ministério das Finanças e do Plano.

Isto nada tem de pessoal e, efectivamente, as coisas têm de ser tratadas normalmente no plano institucional.

A segunda nota que eu queria fazer aqui baseia-se no facto de que dentro daquele objectivo de procurar racionalizar, de conter as despesas públicas, ao Ministério das Finanças e do Plano afigura-se-lhe que o quadro proposto para o Ministério da Qualidade de Vida é um pouco amplo. Daí que, a contraproposta que foi feita oportunamente ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida preconizava o repensar da dimensão dos quadros do seu Ministério.

Realmente, achamos que é um pouco de mais, por exemplo, 106 funcionários, entre pessoal dirigente e de chefia, e mais 1000 e não sei quantos funcionários de outro tipo de natureza, como sejam, carpinteiros, etc. Efectivamente, estes números parecem-nos um bocadinho exagerados no quadro do Ministério da Qualidade de Vida. Assim, sugerimos oportunamente ao Sr. Ministro que repensasse o quadro e é esta a fase em que está o problema.

Se o Sr. Ministro acha que não pode repensar o quadro, então deve colocar o problema em sede própria, que julgo que não é aqui, no Parlamento, salvo melhor opinião. Quanto a mim o local apropriado para colocar este problema é no seio do próprio Governo.

A Sr.8 Presidente: — Sr. Secretário de Estado, creio que, ainda para uma interpelação, se inscreveu o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

Deste modo, tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.

O Sr. Leonel Fadigas (PS): — O Sr. Secretário de Estado diz que não é aqui o sítio próprio para abordar o problema do quadro do pessoal, mas pessoalmente, como deputado, penso exactamente que é aqui que tenho de colocar essas questões, porque tenho conhecimento delas. Não sou membro do Governo e não assisto aos Conselhos de Ministros, mas tenho a obrigação de expor e de exigir que o Governo responda aqui às questões formuladas, e para que não haja dúvidas, refiro que fui eu que levantei a questão e não o Sr. Ministro!

Quanto à outra questão, parece-me que as pessoas existem já no Ministério e que o Estado, por intermédio do Ministério das Finanças, paga já a esses funcionários, não garantindo apenas a estabilidade da sua situação profissional.

Gostava que isso fosse esclarecido, isto é, se realmente há aumento de pessoal ou apenas se trata — como penso — de estabilizar a situação do pessoal existente.

A Sr.8 Presidente: — O Sr. Secretário de Estado do Orçamento pretende responder a esta questão ou passo a palavra ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida?

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — Não desejo responder, Sr.8 Presidente.

A Sr.8 Presidente: — Então, tem a palavra o Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Peço desculpa de ter de discordar em absoluto da opinião ex-^ pendida pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento.0

O Ministro pensou e repensou os quadros. Quando assumi a gerência da pasta, recebi alguns quadros de pessoal que já tinham tido a aprovação da Secretaria de Estado da Administração Pública e que tinham sido rejeitados pelo Ministério das Finanças. Por iniciativa própria, reduzi esses quadros em 20 %, isto é, praticamente reduzi todo o pessoal que eu poderia considerar excedentário para uma efectuação, não direi brilhante mas, pelo menos, digna das funções que foram cometidas ao Ministério.

Tive o cuidado orçamental de prever na verba da Secretaria-Geral toda a soma necessária, não para todos os funcionários que estão ao serviço, mas para todos os funcionários que os quadros prevêem. Está lá tudo e não há ninguém de fora, nem uma mulher de limpeza nem um contínuo! Não há, portanto, qualquer razão orçamental que possa justificar a oposição!

Tenho o direito de considerar, depois de tudo o que se passou em relação a estes quadros do Ministério da Qualidade de Vida, que se trata puramente de uma oposição política e isto transcende-me! Se há no Ministério das Finanças uma tese de que este não deve existir, o Ministro tem de tomar conhecimento dela. Até aqui só teve conhecimento dela através dos jornais, que não são propriamente uma fonte oficial nem oficiosa para conhecimento de um membro do Governo. Portanto, o Ministro da Qualidade de Vida tem de dizer que não pode funcionar sem quadros aprovados, que não pode despedir, de maneira nenhuma, pessoal que se encontre efectivamente ao serviço, que não pede ao Ministério das Finanças qualquer reforço de verba da que está orçamentada para pagar a aprovação dos seus quadros. Em suma, nenhuma despesa derivará daí!

Empenhei inclusivamente a minha palavra de honra junto do Sr. Secretário de Estado neste ponto. Estou pronto a uma demonstração efectiva quando ele se quiser debruçar sobre o problema dos quadros, mas não posso admitir, nem considero possível, que ao fim de 2 ou 3 meses de enviar novamente os quadros para o Ministério das Finanças receba uma única observação do Sr. Secretário de Estado que se limita a dizer que os quadros são excessivos e causam muita despesa ao Estado!

Isto não são formas de argumentar nem de tratar esta questão! Ou o Ministério deve existir ou não, mas, então, o Poder que o defina. O Primeiro-Ministro e o Vice-Primeiro-Ministro têm assegurado a permanência do Ministério e disseram-me sempre que não é isso que está em questão e que os quadros serão aprovados. Assim, tenho de colocar o problema político com a violência necessária: ou o Ministério da Qualidade é necessário, devendo cumprir a sua missão e ter quadros de pessoal como todas as Secretarias de Estado, ou não deve existir, por opção do Ministério das Finanças que se revela mais forte que a opção do Governo, levando, neste último caso, o Ministro a pedir a demissão e à extinção do Ministério.

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A Sr.a Presidente: — Colocava à Comissão a seguinte questão: estão ainda inscritos 7 Srs. Deputados e parecia-me importante que, por parte dos elementos do Governo, ou seja, do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado, se reunissem algumas respostas, para tentarmos ser um pouco mais sintéticos.

Estava previsto que este debate terminasse às 18 horas, reiniciando-se o debate com o Ministério da Administração Interna. Esta é apenas uma questão que exponho aqui à consideração da Comissão mas, naturalmente, os Srs. Deputados e os Srs. Membros do Governo farão o que entenderem quanto às perguntas e respostas.

O Sr. Deputado Leonel Fadigas pediu a palavra?

O Sr. Leonel Fadigas (PS): — Não, Sr." Presidente. Fiz uma pergunta em relação à qual o Sr. Ministro não respondeu, mas penso que me irá responder.

A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — O Sr. Deputado tem razão. Respondo-lhe desde já, em duas palavras.

Quanto ao Instituto de Defesa do Consumidor, na medida em que sou obrigado a proceder a economias orçamentais — o último corte que tive no Orçamento de mais ou menos 100 000 contos obrigou-me a isso — e porque considero exactamente que a primeira necessidade do Ministério é a aprovação dos seus quadros, não posso diminuir as verbas da Secretaria-Geral sem colocar em perigo a palavra que dei de a garantia dada ao Ministério das Finanças de que a aprovação dos quadros não representa um tostão de aumento de despesa.

Portanto, esta verba da Secretaria-Geral é uma verba sagrada, porque representa a aprovação dos quadros, bem como a destruição de .qualquer argumento financeiro contra a aprovação dos ditos.

Houve apenas dois serviços que foram substancialmente aumentados de verba, mas um Sr. Deputado aqui presente já considerou esses aumentos ridículos. Refiro-me à Direcção-Geral do Ordenamento, que conta com uma verba de 42 500 contos — e quem conhece o que é o ordenamento do território pode imaginar o ridículo desta verba — e à Direcção-Geral de Qualidade Ambiente, que beneficiou também de aumento substancial.

Não tenho hipóteses de reduzir verbas no Ministério para o Instituto de Defesa do Consumidor.

Devo dizer, aliás, para completar a resposta à questão que me colocou o Sr. Deputado Leonel Fadigas e com a verdade que costumo pôr nas minhas declarações, que considero que o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor é, de certa maneira, uma duplicação do próprio Gabinete de Defesa do Consumidor que funciona no Ministério da Qualidade de Vida ambos cumprem actividades um pouco paralelas, embora o meu Gabinete de Defesa do Consumidor, com a sua verba exígua, apenas se possa dedicar ao aspecto legislativo e de controle da legislação dos outros ministérios, o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor — que não tem esse trabalho e, sim, apenas um trabalho de campo, de procuração dos consumidores — deveria ser um instituto fundamentalmente baseado na iniciativa particular e não ser uma duplicação de um serviço do Estado que é já dedicado a mesma finalidade.

Portanto, se a Assembleia da República, com todo o respeito que me merecem as suas iniciativas, entende que o Instituto Nacional da Defesa do Consumidor se deve desenvolver com a amplitude que a própria Assembleia entende que ele deve ter, julgo que esse acréscimo de despesa, que não posso furtar a nenhuma verba do meu Ministério, deve ser dado como reforço ao orçamento do meu Ministério.

A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Ministro, começaria mesmo por aí, para lhe dizer que, na sequência de propostas que já apresentámos no ano passado, duas das propostas que apresentaremos têm mesmo a ver com as questões relacionadas com a defesa dos interesses do consumidor. De qualquer modo, por agora apenas refiro estas propostas, pois será o meu camarada de bancada Belchior Pereira que fará a sua apresentação concreta.

Entrando na questão que estamos a tratar, uma primeira constatação que faço é a de que o ambiente no Conselho de Ministros não é o melhor e diria mesmo que é algo bizarro termos convocado o Governo para nos esclarecer quanto ao Orçamento do Estado para 1985 e sermos confrontados com uma guerra verbal entre o Sr. Ministro da Qualidade de Vida e o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, a qual pediria aos Srs. Membros do Governo que guardassem para o Conselho de Ministros, tentando agora pôr-se de acordo, para que os Deputados possam saber com rigor o que estão a votar, o que vão votar, ou contra o que vão votar! Isto porque creio ser inaceitável que um Ministro nos venha dizer que tem um Orçamento previsto para um determinado quadro, para logo de seguida um Secretário de Estado dizer que o quadro não está aprovado porque é excessivo, ao que o Ministro responde ainda que o não é porque o fundamentou!

Creio que poderíamos ultrapassar esta questão e que seria bom que os Srs. Membros do Governo se entendessem sobre a matéria pois penso que só assim é possível aos Srs. Deputados saberem com rigor o que vão votar, com que objectivos e para, no fundamental, podermos também assegurar o futuro dos trabalhadores do Ministério da Qualidade de Vida.

Uma segunda questão, Sr. Ministro da Qualidade de Vida, prende-se com números que constam do PID-DAC do seu Ministério e que são díspares em relação ao que aparece nas Grandes Opções do Plano, nos seus respectivos projectos plurianuais, nos quais vem referenciada uma verba para PIDDAC da ordem dos 368 600 contos.

Ora, no orçamento do seu Ministério, ou seja na proposta de lei n.° 95/111, os investimentos do Plano isto é, o PIDDAC, tem um reforço de perto de 60 000 contos, o qual não se encontra especificado. Trata-se de um lapso quanto à inscrição da exacta verba prevista para o PIDDAC no orçamento do seu Ministério, ou tem qualquer outra explicação?

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — A explicação é a de que estão incluídos os PIDRE.

O Orador: — É que, como depois não vem devidamente especificado, tivemos uma certa dificuldade em perceber tal facto.

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Outras questões que não foram ainda aqui focadas e as quais me permitirá levantar, têm a ver com a acção do seu Ministério no campo desportivo. Verificamos que este ano continua a decrescer o peso da verba atribuída à Direcção-Geral dos Desportos no quadro geral do orçamento. Em 1976 essa verba era 0,12 % do Orçamento e em 1985 ela desce para 0,03%. Seria bom que o Sr. Ministro nos pudesse dizer se isso resulta apenas de cortes impostos pelo Sr. Ministro das Finanças ou não.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Resulta da transferência do encargo de pessoal para a secretaria--geral.

O Orador: — Outras matérias, Sr. Ministro, têm a ver com a importância de uma outra verba que se encontra inscrita no orçamento do seu Ministério. Refiro--me às contas de ordem, as quais atingem os 600 000 contos, que provêm na sua globalidade, ao que nos foi dado constatar, do Fundo de Fomento do Desporto. Uma primeira pergunta que lhe colocamos é a de se as verbas daquele Fundo incluem apenas as verbas resultantes do totobola ou se também já estão incluídas as verbas do bingo. E isto porque estão incluídas as verbas do bingo, pensamos que a previsão de 600 000 contos é extremamente reduzida.

Outra explicação que desejamos prende-se com a legalização prevista para breve do loto. Ora, está também previsto na legislação deste jogo que o loto venha a contribuir para o Fundo de Fomento do Desporto e, assim, gostaria de saber se nesses 600 000 contos estão ou não previstas as receitas do bingo e do loto, para além das que possam ser obtidas com o totobola.

Outra questão, Sr. Ministro, tem a ver com os subsídios a atribuir quer no âmbito da Direcção-Geral dos Desportos quer no âmbito do Fundo de Fomento do Desporto, bem como com os critérios para a atribuição desses subsídios. Tivemos oportunidade de verificar que o Sr. Ministro também deve estar preocupado com isso, uma vez que recentemente reduziu a competência do Sr. Secretário de Estado dos Desportos na atribuição de subsídios para um nível máximo de 100 contos. Portanto, se fosse possível, gostaríamos de ter alguma definição de quais os critérios que irão presidir durante o ano de 1985 à concessão de subsídios a clubes, associações desportivas e recreativas.

Uma última pergunta, Sr. Ministro, ainda no âmbito do Fundo de Fomento do Desporto: quando verificamos as despesas a efectuar por este fundo, vemos que há cerca de 410 265 contos que estão referenciados como «transferências para entidades particulares». Gostaríamos de obter um esclarecimento mais rigoroso porque, como entenderá, uma verba de quase meio milhão de contos deverá obedecer a critérios de atribuição e deve haver algum rigor na definição de como essa verba vai ser distribuída.

Não colocando mais questões, solicitava à Mesa que me inscrevesse para apresentação de propostas de alteração a este capítulo.

A Sr.a Presidente: — Fica registado, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): — A questão que colocarei não tem tanto a ver com as funções, atribuições e natureza do Ministério da Qualidade de Vida mas, sim,

com a questão que estamos objectivamente a discutir e que é a questão orçamental. Verificou-se há pouco, e com clareza, a divergência existente entre o Ministério das Finanças e o Ministério da Qualidade de Vida, no que se refere à questão financeira deste último. É evidente que a sensação que temos quando olhamos para o Orçamento é que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não deixou passar, até agora, os decretos regulamentares — e em meu entender, bem —, mas que, por outro lado, a nível da previsão orçamental, a vitória foi do Sr. Ministro da Qualidade de Vida. Efectivamente, as despesas correntes do Ministério aumentaram 44,7%, não os 100 000 contos que o Sr. Ministro referiu mas, sim, e segundo os mapas do Ministério das Finanças, 824 000 contos em relação ao Orçamento inicial de 1985 e mesmo 427 000 contos em relação ao Orçamento previsto do mesmo ano.

Verifica-se também que do aumento dessa verba — que não é muito significativa em termos absolutos no orçamento do Ministério — 78,6% se referem a despesas com o pessoal e a aquisição de bens e serviços e que cerca de 800 000 contos são referentes às despesas inerentes dos Gabinetes do Ministro, dos Secretários de Estado e à Secretaria-Geral.

De facto, o Sr. Ministro referiu a dificuldade e a natureza do défice de 335 milhões de contos e existe mesmo no Orçamento do Estado um artigo — o artigo 9.° — que refere concretamente uma série de — restrições que se limitam ao papel — com o pessoal e com os serviços.

Ora, estando nós em presença de um departamento que tem fundamentalmente características de horizontalidade, de lobby ou, ainda, para utilizar a terminologia do Sr. Secretário de Estado, de um departamento de síntese, talvez se possa começar por fazer determinado tipo de economias num ministério como è o da Qualidade de Vida. Mas, curiosamente, repito, este ministério é daqueles em que o aumento das despesas correntes é mesmo o mais significativo —44,7%, conforme já referi.

A questão que se coloca é sempre a mesma e isto não é uma critica subjectiva ao actual titular deste Ministério, mas uma crítica que se pode fazer normalmente aos ministros sectoriais que são, regra geral, gastadores. Isto é, os ministros fabricam secretários de Estado, que por sua vez fabricam direcções-gerais, que fabricam repartições, que fabricam divisões e assim por diante.

De facto, verificamos que este Ministério, cujo nascimento não é da sua responsabilidade, Sr. Ministro, custou já qualquer coisa como 2 milhões de contos. Penso que, para começar a tomar medidas corajosas, uma medida adequada seria, provavelmente, a extinção deste Ministério, dada não só a natureza inter--departamental de que se reveste, mas até porque alguns institutos e organismos que nele estão incluídos podem subsistir sobre outra óptica. Assim se daria um exemplo de muito maior poupança do que aquele que foi anunciado pelo Conselho de Ministros a semana passada, no qual se diz terem sido extinguidos 40 serviços — que não sabemos quais são —, e uma pergunta que também gostaria de colocar ao Sr. Ministro é se naquele número se inclui algum departamento do Ministério da Qualidade de Vida, designadamente depois de ter referido há pouco a duplicidade relativa e parcial entre o Gabinete de Defesa do Consumidor e o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

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São estas as preocupações que o Grupo Parlamentar do CDS entende vir aqui referir sobre este Ministério, não pelo valor absoluto da verba, que é, efectivamente, bastante diminuta, mas até pela acção pedagógica que este departamento ministerial poderia ter para accionar um conjunto de medidas eficazes de redução das despesas públicas.

A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida, para responder aos dois Srs. Deputados que acabaram de fazer pedidos de esclarecimento.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Em relação às perguntas colocadas pelo Sr. Deputado Jorge Lemos, diria que a diminuição das verbas da Direcção--Geral dos Desportos equivale à transferência das despesas de pessoal para a Secretaria-Geral, dentro da norma que lhe expliquei de a Secretaria-Geral ter a verba necessária para pagar todas as despesas de pessoal do Ministério.

Quanto às «transferências para instituições particulares», trata-se dos subsídios que, por imposição da própria lei do Governo, têm que ter concordância quer do Ministério da Qualidade de Vida quer do Ministério das Finanças.

Quanto às verbas do Fundo de Fomento de Desportos, elas incluem apenas as dotações do Totobola. O bingo não nos dá nada. O loto há-de vir a dar mas ainda não está, de maneira nenhuma, acertada a partilha das respectivas verbas. Portanto, esta verba diz unicamente respeito à repartição da verba do Totobola.

Com estes 500 000 contos não estou preocupado com a política de subsídios. O despacho que fiz deveu-se ao facto de que não gosto de estar à frente de responsabilidade que não conheço ou que não tomo e, para ser totalmente solidário com a política da Secretaria de Estado dos Desportos, entendo que a política de subsídios deve ser visada por mim. Por isso, os subsídios têm que vir a meu conhecimento, muito embora não contrarie as orientações que até aqui têm sido seguidas pelo Sr. Secretário de Estado dos Desportos. De qualquer modo, entendo que me cabe, como Ministro, o direito de definir a política do Ministério, quer em relação ao ambiente como aos desportos. Ora, a política dos desportos é essencialmente uma política de subsídios e de ajudas financeiras e, portanto, estaria completamente a leste dessa politica se não tivesse o conhecimento efectivo e permanente da política de subsídios do Ministério.

Está neste momento em discussão, entre mim e o Sr. Secretário de Estado dos Desportos, a política de subsídios para 1985, a qual penso que será afixada na próxima semana. Tanto quanto possível, dentro das exíguas verbas do Ministério — pois não temos 1 milhão de contos como dispõe a Secretaria de Estado das Obras Públicas e, apesar de responsáveis pela política dos desportos, as nossas verbas são exíguas — a nossa ajuda limitar-se-á a pequenas colectividades, para além de garantir a existência das federações desportivas, garantindo-lhes, inclusivamente, instalações.

Há, de facto, várias federações desportivas que não têm sede neste momento e, portanto, estamos a concluir umas obras de arranjo de um antigo prédio situado perto da Rua do Quelhas, onde funcionaram as instalações da Mocidade Portuguesa, e onde pensamos instalar, da forma mais económica possível, grande parte das federações desportivas.

Para além de se centrar nesses aspectos, a nossa política centra-se, ainda, na política de alta competição que tem interessado, de certa maneira, o País e que motivou, de certa forma, a imposição de Portugal no estrangeiro como potência do atletismo de fundo e de meio-fundo.

Poderá vir a acontecer que determinadas verbas que até hoje têm sido atribuídas a prémios de atletas — o facto que talvez tenha que ser mais vulgarizado, porque não são só os atletas que ganham que merecem amparo — venham a ser discutidas.

Ainda ontem vi no jornal uma queixa, que me parece fundamentada, de um atleta relativamente conhecido, Ezequiel Canário, sobre o facto de só os atletas que ganham medalhas de ouro serem de certa forma amparados ou acarinhados em Portugal. Penso que isso deve ser uma preocupação da política desportiva, pois o desporto não é, pelo menos em meu entender, um instrumento de propaganda do Governo— também o é, mas não deve ser só isso —, deve ser, tanto quanto possível, um instrumento de aperfeiçoamento físico e moral de toda a nossa juventude, sendo uma parte integrante da educação. Assim, na medida do possível ou do tempo que me resta, procurarei integrar a política do desporto como um complemento da política de educação e instrução públicas.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Dá-me licença que faça um comentário às suas palavras, Sr. Ministro?

A Sr.8 Presidente: — Sr. Deputado, gostaria que se evitasse o diálogo. No entanto, esperando que seja sucinto, concedo-lhe a palavra.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Muito obrigado, Sr.8 Presidente.

Sr. Ministro, estas suas últimas palavras, a sua preocupação quanto à integração do desporto na educação dos jovens, é também preocupação do PCP.

Assim, aproveitava para lhe perguntar se estaria de acordo em que na distribuição dessas verbas de cerca de 410 265 contos houvesse um critério que destinasse uma parte dessas verbas para o desporto escolar e uma outra parte para o apoio, por parte da Direcçào-Geral dos Desportos, à construção e ao lançamento de equipamentos gimnodesportivos nas escolas, o que, como sabe, por despacho de 1981, se encontra congelado.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Estou inteiramente de acordo e sou partidário disso. Não sei até que ponto o Ministério da Educação, que é um Ministério, de certa maneira, rico em face do nosso, também estará de acordo. Em todo o caso, na medida em que me for possível, pode ter a certeza de que acompanharei essa política de instalações de equipamentos gimnodesportivos nos institutos de educação. Penso, aliás, que isso é fundamental para uma política de desporto bem conseguida.

Quanto à intervenção do Sr. Deputado Bagão Félix, a única coisa que posso fazer é lamentá-la.

Quanto a mim, trata-se de uma questão de cultura. Quer dizer, num momento em que praticamente todos os países industrializados ou desenvolvidos, inclusivamente os países da Europa a que queremos pertencer, estão a procurar individualizar e dar expressão política a um ministério do ambiente, com força, com expressão e com capacidade de intervenção, talvez nos fique

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bem a nós, dentro daquele nosso espírito de «velhos do Restelo», acabar com o Ministério da Qualidade de Vida. A única coisa que posso responder à sua intervenção é que se trata essencialmente de uma questão de cultura.

Os problemas mais agudos para todas as nações de um determinado tipo de civilização são, neste momento, as questões do ambiente.

Digo-lhe mais, Sr. Deputado: Em Portugal essas questões são tão momentosas que, embora o poder político talvez ainda não as tenha encarado como tal, dentro de S anos elas surgirão na cara do poder político como a primeira necessidade nacional.

Um problema como o da água — dentro de 5 anos todo o litoral oeste estará, possivelmente, privado de água — é um problema que se há-de impor aos políticos, como o Sr. Deputado Bagão Félix, com uma violência tal que talvez nessa altura não discutam a capacidade e a necessidade de um ministério interventor e centralizador de toda a política do ambiente.

Sr. Deputado Bagão Félix, o problema que se coloca é o de que a existência de um Ministério da Qualidade de Vida não interessa. Até lhe digo que, na situação em que se encontra o Ministério, talvez subscrevesse a sua proposta de acabar com ele.

Simplesmente, ponho o problema ao contrário: Quem é que defende os interesses que respresentam o Ministério da Qualidade de Vida? Quem é que, nessa altura, se preocupará com a preservação do meio natural, com os equilíbrios ecológicos, com a defesa da natureza, com a preservação da água, enfim, com todos esses problemas que são os problemas fundamentais da sociedade moderna de hoje, da sociedade a que queremos pertencer?

Esses problemas são fundamentais e não podem, de maneira nenhuma, ser tratados por cada ministério de per si, porque jamais um Ministério da Indústria tomará para si como preocupação fundamental a não poluição industrial; jamais um Ministério da Administração Interna, por muita preocupação que tenha do desenvolvimento regional, terá a preocupação de fazer preceder todo o desenvolvimento regional de uma questão de ordenamento. E isto porque o desenvolvimento não se confunde com o ordenamento nem vice-versa. Aí é que se insere o problema de cultura, que é o saber distinguir o ordenamento do desenvolvimento. Uma coisa é uma sociedade desenvolver-se e outra coisa é uma sociedade ordenar-se ou desenvolver-se ordenadamente.

Esse conjunto de defesas, que são essenciais à persistência de uma sociedade em que nos seja agradável viver e em que os nossos filhos possam continuar a achar que é agradável viver, vão desde a preservação da água, à defesa do consumidor, à defesa dos meios naturais, à política dos parques, e se, a nível governamental, não houver alguém que exprima, resultará numa política completamente desfeita e dissolvida.

Sei que essa tendência e essa mentalidade ainda existe muito em Portugal. Ainda há relativamente pouco tempo um membro do Governo me dizia que a política do ambiente era só para países ricos e que nós éramos um país pobre de mais para termos uma política de ambiente.

Isto, Sr. Deputado, é não ver o problema em termos de futuro!

Ora, pelo menos eu, quando governo, não vejo jamais o próprio dia que passa; procuro que a minha

Pátria se prolongue no tempo e, portanto, que aquilo que existe hoje em Portugal — que é, por exemplo, a destruição total da nossa rede hidrográfica — não possa voltar a acontecer e que seja possível reconstituir aquilo que está degradado. E qual é o ministério vocacionado nesse sentido? É o Ministério da Indústria que o vai fazer? É a Direcção-Geral de Hidráulica e Engenharia Agrícola como fez até agora?

Não temos hoje em Portugal um único rio em estado «decente». Nenhuma água de nenhum rio é utilizável neste momento em Portugal. Mais do que isso, toda a nossa riqueza piscícola foi totalmente destruída. E ela era muito grande!... Mesmo em termos económicos e financeiros, ela representava um elemento importante na economia da Nação. Mas tudo isso tem sido destruído sistematicamente.

Propronho, Sr. Deputado, que, realmente, destruamos o Ministério da Qualidade de Vida. Mas não queiramos ser nessa altura uma nação civilizada!...

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Almerindo Marques.

O Sr. Bagão Félix (CDS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado desculpar--me-á não lhe conceder de imediato a palavra. Vou intervir num momento em que não estive a acompanhar o debate e certamente que vou fazer uma injustiça.

Mas a verdade é que ainda estão inscritos sete Srs. Deputados e estava programado terminarmos esta reunião com o Sr. Ministro da Qualidade de Vida às 18 horas.

Portanto, creio que talvez valesse a pena ponderarmos um pouco sobre o modo como vamos dar seguimento aos nossos trabalhos.

Gostaria, pois, de propor à Comissão que prosseguíssemos com as intervenções dos Srs. Deputados inscritos, tanto mais que o Sr. Ministro da Administração Interna já está presente.

Por outro lado, queria ainda propor a esta Comissão que, se os Srs. Deputados não vissem inconveniente, suspendêssemos os nossos trabalhos por um minuto, para reprogramarmos a continuação da reunião, sem prejuízo de dar de imediato a palavra ao Sr. Deputado Bagão Félix, pedindo-lhe apenas que seja breve.

Tem V. Ex.a a palavra, Sr. Deputado Bagão Félix.

O Sr. Bagão Félix (CDS): — Vou ser mesmo muito breve, Sr. Presidente.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida chamou-me inculto em matéria de qualidade de vida. É evidente que o sou! Porém, talvez já não seja tão inculto em matéria de despesas públicas e de sobrevivência de um país face à dimensão do Estado que tem.

Gostaria de dizer ao Sr. Ministro que coloquei a questão não em termos da existência de uma política de qualidade de vida mas sim da existência de um departamento da qualidade de vida organicamente catalogado e estrito, o que é completamente diferente.

Pode e deve haver uma política de qualidade de vida sem que, necessariamente, tenha que existir um Ministério da Qualidade de Vida. De facto, é essa a sensação que temos. E os Portugueses terão direito de perguntar duas coisas: primeiro, se antes de existir o Ministério da Qualidade de Vida este país não era um Estado na cena do futuro e do progresso. Segundo as

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palavras do Sr. Ministro parece que, na verdade, não era!

Segunda questão: Depois que este Ministério passou a existir — salvo erro foi a partir de 1981 —, já se resolveu substancialmente algum desses problemas que, com toda a razão e com todo o conhecimento o Sr. Ministro fez o favor de referir?

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Quanto à sua última questão, responderia simplesmente que, de facto, dantes não havia questões de ambiente. Jamais alguém na Idade Média pensou nas questões de ambiente e nem era preciso pensar nelas!

Realmente, é triste que um deputado diga isto em 1985!

Aprendi a nadar no rio Ave e desafio o Sr. Deputado a ir lá agora tomar um banho.

Esta questão é uma questão do próprio desenvolvimento civilizacional e conduziu-nos à necessidade de uma política do ambiente. Porque é que a política do ambiente é uma necessidade que existe desde há 10 ou 15 anos em todo o mundo? Foi uma criação dos políticos?

O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, desculpe-me interrompê-lo mas penso que seria melhor suspendermos agora os nossos trabalhos por 1 minuto, para equacionarmos a seguinte questão: tal como já tive oportunidade de dizer, o Sr. Ministro da Administração Interna não tem os elementos que foram considerados convenientes para o prosseguimento do debate. Por outro lado, estamos atrasados nesta discussão sobre o Ministério da Qualidade de Vida, pois, como também já tive oportunidade de referir, ainda estão inscritos alguns Srs. Deputados.

Assim sendo, gostaria que a Comissão de Economia, Finanças e Plano ponderasse a seguinte questão, quanto ao prosseguimento dos trabalhos: terminaríamos hoje esta reunião com o Sr. Ministro da Qualidade de Vida até à hora regimental — se mais cedo não for possível — e à noite, tal como estava indiciado, prosseguiríamos os nossos trabalhos com o Ministério da Administração Interna, eventualmente sobre áreas que não dissessem respeito à questão que está pendente, em virtude de os dados estarem ainda a ser equacionados.

Já ouvi aqui uma opinião e gostaria que os Sr. Deputados se pronunciassem sobre esta questão, isto no pressuposto de o Sr. Ministro poder continuar a reunião.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Parece-me que, efectivamente, a metodologia tem de ser essa.

Não podemos adiar por mais tempo a continuidade dos trabalhos. Não sei se os elementos que o Sr. Ministro da Administração Interna não tem prejudicarão a continuação da parte substancial da discussão do Orçamento do Ministério da Administração Interna mas, no meu entender, julgo que não.

Portanto, penso que poderíamos deixar para discussão posterior a parte dos elementos que o Sr. Mi-

nistro não tem e continuarmos esta noite com aqueles elementos que o Sr. Ministro da Administração Interna possui. Isto para ganharmos tempo, sob pena de nunca mais acabarmos e de chegarmos à Páscoa sem que o Orçamento esteja aprovado.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, penso que é oportuno ouvirmos o Sr. Ministro da Administração Interna antes da intervenção dos Srs. Deputados, a fim de ficarem com todos os dados do problema e o poderem ponderar.

Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.

O Sr. Ministro da Administração Interna (Eduardo Pereira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em primeiro lugar, gostaria de dizer que não pude estar presente nesta Comissão hoje de manhã na medida em que estive numa reunião de Conselho de Ministros.

Só tive conhecimento de que se levantaram aqui esta manhã alguns problemas a respeito de critérios, parâmetros e coeficientes numa reunião onde estive desde as 15 horas e 30 minutos até agora, através de um telefonema que os Srs. Secretários de Estado me fizeram.

Gostava de deixar aqui a ideia de que, sobretudo em relação aos elementos que estão em questão, aplicámos exactamente os dados que nos foram fornecidos pelo Ministério da Agricultura sobre esse ponto. Eu próprio já tinha conversado na altura — e não hoje — com os Srs. Secretários de Estado sobre esse aspecto.

Se, na verdade, aplicámos os elementos que foram fornecidos e se existem diferenças, como essa entre Portimão e Covilhã de que hoje tive conhecimento, não podem os Srs. Deputados esperar que desde as 15 horas — hora em que tive conhecimento disto — até às 18 horas traga aqui qualquer «água benta» para resolver esse problema. Precisamos primeiro de trabalhar os elementos!

Se por acaso os Srs. Deputados entenderem que, para além dessa área de discussão, ainda há matéria com a qual podemos continuar a reunião, então desde já comunico a nossa disponibilidade, até porque não estamos a pedir um adiamento da nossa intervenção sobre toda a matéria mas, sim e fundamentalmente, no que se refere às transferências para as autarquias.

Portanto, também não vejo inconveniente em continuarmos hoje. No entanto, é sobre o que se discutiu esta manhã e sobre a dúvida que se levantou que não me encontro em condições de responder neste momento e, portanto, teremos de falar sobre ela dentro de dias — ou ainda esta semana ou na segunda ou terça--feira. Necessitamos, de facto, de estudar os problemas para podermos dar aos Srs. Deputados as respostas a que têm direito.

O Sr. Presidente: — Creio que agora os Srs. Deputados têm todos os elementos para poderem apreciar esta questão.

Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que é desnecessário fazermos reuniões parcelares com o Sr. Ministro da Administração Interna, uma hoje à noite e outra na próxima semana para clarificação dos probíemas hoje levantados.

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Julgo que seria melhor fazermos uma reunião completa com o Sr. Ministro da Administração Interna quando ele dispuser de todos os elementos que foram solicitados esta manhã, na qual seriam levantados todos os problemas relativos a este Ministério.

Em vez de fazermos uma reunião esta noite e outra na segunda-feira, julgo que o melhor será ponderarmos a calendarização da próxima semana para fazermos uma reunião com a presença do Sr. Ministro, a qual até poderá ter lugar no próximo sábado ou qualquer coisa assim no género.

O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, penso que, para já, a questão que se coloca é a de fazermos uma opção entre sim ou não continuarmos a reunião hoje à noite. Depois, no caso de não a continuarmos esta noite, a marcação do dia será uma segunda questão a ponderar.

Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, perante as informações prestadas pelo Sr. Ministro da Administração Interna, pela nossa parte, julgamos que não há razão para uma continuação da reunião esta noite, até porque é possível que a situação tenha de ser ponderada pela própria equipa ministerial.

Com efeito, perante as questões que aqui foram levantadas esta manhã e a confirmarem-se os desajustamentos que existem em alguns concelhos — que nalguns casos são bastante grandes —, possivelmente o próprio Ministério estará interessado em fazer uma alteração nas próprias propostas que apresentou à Assembleia.

Nessa perspectiva, julgo que é preferível marcarmos uma reunião para a próxima semana e não para esta noite.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Dá-me licença que intervenha, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Administração Interna: — Queria apenas dizer ao Sr. Deputado Octávio Teixeira que o Ministério está interessado em trazer aqui o estudo correcto.

Portanto, se há erros vamos revê-los.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, eu coloquei a questão nestes termos: perante as suas afirmações e se, eventualmente, surgirem grandes discrepâncias, eventualmente o Ministério estará interessado em apresentar uma nova proposta.

Por conseguinte, julgo que a reunião com o Sr. Ministro deverá ficar para a próxima semana.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, a mesa já possui a opinião do Partido Comunista, do MDP/CDE e do PSD.

Não sei se mais algum Sr. Deputado se quer pronunciar sobre esta questão.

Pausa.

Tem a palavra o Sr. Deputado Magalhães Mota.

O Sr. Magalhães Mota (ASDI): — Sr. Presidente, também penso que é inútil prosseguirmos a reunião esta noite.

Gostaria apenas de pedir o seguinte: Uma vez que hoje é quinta-feira, creio que não será possível, em termos realistas — mas o Sr. Ministro o dirá —, dispormos dos elementos corrigidos (se for caso disso) amanhã. Julgo que só será possível que eles nos sejam entregues na segunda-feira.

Portanto, penso que a nossa reunião futura deverá ser marcada para depois disso, até para também nós dispormos de algum tempo para consultarmos os elementos.

O Sr. Ministro da Administração Interna: —

Sr. Deputado Magalhães Mota, na verdade, se se verificar a necessidade de uma revisão e de meter os dados no computador, é claro que antes de segunda-feira não lhe posso dar os elementos — aliás, nem convém.

Portanto, penso que seria mais simpático fazermos um esforço — e até pode acontecer que lhe possa dar os elementos amanhã de manhã, caso segunda-feira de manhã não haja necessidade de fazer alteração — para distribuirmos as folhas na segunda-feira de manhã e na segunda à noite ou na terça à noite estarmos em condições de nos reunirmos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, creio que estamos em vias de chegarmos a uma posição de consenso, a qual vou procurar explicitar para vermos se, de facto, estamos todos de acordo.

Sendo assim, não haveria reunião esta noite e aguardaríamos a entrega dos elementos pelo Ministério da Administração Interna. Procuraríamos encontrar um espaço para a nossa própria apreciação desses elementos e depois marcaríamos a reunião que, em função do calendário marcado, terá de ser à noite.

Quanto ao prosseguimento dos trabalhos de hoje e dado que o Sr. Ministro da Qualidade de Vida já mostrou a sua disponibilidade, prosseguiríamos, por conseguinte, com a ordem de inscrições e a competente intervenção do Sr. Ministro.

Não obstante, penso que seria conveniente suspendermos agora os nossos trabalhos por 10 minutos, os quais gostaria que fossem cumpridos.

Está, pois, suspensa a sessão.

Eram 18 horas e 10 minutos.

O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 18 horas e 30 minutos.

O Sr. Presidente: — Para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida, tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.

O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Tenho seguido com muita atenção o diálogo entre os Membros do Governo e os Srs. Deputados e, quando também entre os Membros do Governo há alguma discrepância, levantam-se-nos algumas dúvidas sobre se deveremos ou não levantar alguns problemas que temos para colocar relativamente ao orçamento do Ministério da Qualidade de Vida.

De qualquer maneira, para cumprimento da nossa missão e dentro da lealdade que costumamos pôr nas nossas intervenções e nas nossas propostas, avançarei imediatamente dizendo ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida — por quem tenho bastante estima — que não foi só ele que aprendeu a nadar no rio Ave, pois eu também aprendi a nadar na ria de Aveiro. E a ria de

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Aveiro, que é um ecossistema dos melhores da Europa, senão do Mundo — ecossistema de sapal salgado —, está, como o Sr. Ministro sabe, em degradação permanente.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Está destruído!

O Orador: — Degradação permanente que é devida a diversos factores: em primeiro lugar, à poluição industrial, com despejo de resíduos industriais, alguns venenosos, principalmente no centro industrial de Estarreja, que clandestinamente são despejados na ria de Aveiro.

Despejados são também os resíduos das fábricas da celulose e papel no rio Vouga, que, como sabem, também os despejam na ria de Aveiro.

O município de Aveiro está a fazer um esforço financeiro gigantesco para eliminar o despejo dos esgotos no canal central da cidade, para eliminar assim um foco tremendo de poluição da ria de Aveiro.

Sr. Ministro, a pergunta que lhe faço, é a seguinte: Apesar dos estudos que a Universidade de Aveiro tem feito, apesar das intervenções que, neste Parlamento, têm feito deputados de todas as bancadas, apesar do que a Associação de Municípios está a fazer dentro da zona ribeirinha da ria de Aveiro, apesar de todas as chamadas de atenção do governador civil e de outras entidades de Aveiro, qual é a política do Ministério da Qualidade de Vida para aquela zona?

Sr. Ministro, queria talvez chamar a sua atenção para o seguinte: consultei o PIDDAC e programas plurianuais e verifico com espanto que, reconhecendo toda a gente a beleza, a utilidade e a necessidade de se defender aquele ecossistema, não está inscrito sequer um tostão para aquela região. Porquê?

Sr. Ministro, ainda relativamente a este assunto, queria chamar a sua atenção para um ponto que, por acaso, V. Ex.a já focou: os recursos hídricos daquela zona, principalmente os de água potável, estão absolutamente esgotados. Fazem-se furos artesianos para captação hídrica para alimentação industrial, poços para alimentação de água ao abastecimento urbano: é um total esbanjamento dos recursos hídricos da zona.

Que medidas, Sr. Ministro, estão previstas para esta zona? O Orçamento é escasso!

Não sou daqueles que não defendem a existência do Ministério da Qualidade de Vida; defendo-o porque entendo que tem um papel a desenvolver no nosso país, já e, principalmente, no distrito de Aveiro. Mas terá de ser rapidamente desenvolvido esse trabalho.

O Sr. Ministro esteve, há pouco tempo, na vila da Feira e já verificou os graves problemas aí existentes, dentro do âmbito do seu Ministério.

Sr. Ministro, eram estas as perguntas a que gostaria que respondesse. Não vou levantar problemas relacionados com a existência, no Orçamento, de verbas indefinidas. Poderia criticá-las, mas sei, pela indefinição que nós aqui intuímos, e até por determinadas expressões referidas, que é muito difícil especificar correctamente as acções a desenvolver neste Ministério.

De qualquer maneira, Sr. Ministro, agradeço que me responda.

O Sr. Presidente: — Penso que os Srs. Deputados inscritos poderão usar agora da palavra e que o Sr. Ministro responderá a todos no final.

Tem, pois, a palavra o Sr. Deputado João Abrantes.

O Sr. João Abrantes (PCP): — Sr. Ministro da Qualidade de Vida, quero colocar-lhe uma questão muito rápida, mas que julgamos ser da máxima importância.

Como certamente sabe, manifestou-se na região de Coimbra um surto de hepatite, que já atacou cerca de 20 jovens. É muito provável que a doença esteja ainda em gestação em muitos indivíduos, sobretudo em pessoas jovens, mas atingiu tal gravidade que as entidades envolvidas no processo não têm sabido dar-lhe andamento por forma a que o problema seja resolvido.

Esta questão prende-se com a poluição do rio Ceira, que é afluente da margem esquerda do rio Mondego.

Certamente que o Sr. Ministro conhece o casó e, por isso, não vou adiantar muito mais. Sabemos que haveria, inclusivamente, da parte de algumas entidades, o desejo de que o Sr. Ministro visitasse essa zona para que se pudesse aperceber dos graves problemas que ali ocorrem. Não sabemos se V. Ex." já visitou a zona — e era esta a primeira questão — e se pôde tirar algumas conclusões do que viu.

Por outro lado, gostaria de saber se, no âmbito do seu Ministério, encara algumas acções tendentes à resolução deste problema e, nomeadamente, se com as magras verbas atribuídas ao seu Ministério — que já referiu e que não valerá a pena aprofundar mais — terá possibilidades de atacar o problema e de que maneira. Ou, pelo contrário, não tendo verbas no orçamento do seu Ministério, pensa pedir um reforço de verba ou uma dotação que possa, especificamente, atender a essa questão?

Pergunto-lhe isto porque, como V. Ex.a certamente saberá, as captações de água para Coimbra situam-se poucos quilómetros abaixo do local onde desagua o rio Ceira e também para que não sejamos obrigados a admitir'que as populações têm razão quando dizem que só se tomarão medidas quando, de facto, o problema atingir a cidade de Coimbra e as suas captações.

Gostaria de saber se já há alguma resposta relacionada com esta questão.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro, ouvi atentamente toda a sua exposição e ressaltou dela uma grande preocupação, com que vou sair daqui. É que os tecnocratas — aqueles que apenas lidam com números — não têm tido, ao longo dos anos, preocupação com a situação da política de ambiente, nem com a qualidade de vida deste país. É evidente que não é por acaso que vão surgindo, um pouco por todo o lado, ameaças de encerramento deste Ministério. É evidente que, se o Ministério da Qualidade de Vida — que não está a actuar como devia actuar, por muitas dificuldades, incluindo a dificuldade de verbas — actuasse decisivamente, iria brigar com poderosos interesses económicos, e não só, com interesses muito concretos; e é evidente que, em determinadas situações, como a que vivemos actualmente no nosso país, de profunda imoralização, o Ministério da Qualidade de Vida não é um Ministério que agrade a muita gente.

Em relação à lei orgânica do Ministério da Qualidade de Vida — que não existe —, devo informar todas as pessoas aqui presentes que, pela minha parte e por parte do MDP/CDE, levantaremos a questão no Plenário, nas primeiras sessões plenárias, após a discussão

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do Orçamento. É que, realmente, já é tempo de sabermos se há um ministério sem lei orgânica — como, de resto, já acontece com a Presidência da República, sem lei orgânica há 10 anos.

Sr. Ministro, gostaria de lhe fazer muitas perguntas. Muitas das que eu tinha assentes já foram formuladas, mas gostaria de saber o que pode fazer o seu Ministério nalguns aspectos. E toco já num comezinho, que diz respeito às cidades: estamos a ver, nas cidades — mas não só nas cidades —, o crescimento de bairros urbanos, alguns deles poderosos, sem a mais pequena defesa do meio ambiental; vemos ruas infindas, prédios construídos de forma arbitrária, sem que haja parques verdes, parques para crianças nem zonas de lazer necessárias em qualquer bairro.

Gostava de saber se o Ministério da Qualidade de Vida tem possibilidades de intervir nestes ambientes.

Este era um aspecto que me interessava particularmente, porque vemos a degradação a que se chegou, nomeadamente na cidade de Lisboa. E já não vou falar na destruição constante de belas peças de arte existentes no País, peças de arquitectura antiga e popular. Parece-me que o Ministério da Qualidade de Vida não tem sido escutado sobre isto, nomeadamente como aconteceu agora em Lisboa, no caso da demolição de um edifício de teatro.

Sr. Ministro, gostava agora que me esclarecesse sobre os números constantes da proposta de Orçamento. V. Ex.a já disse que, nas questões das transferências particulares, há o problema dos subsídios, tendo referido também os subsídios para pequenas colectividades, etc. Gostava de saber se há um plano global para a distribuição dessas verbas.

A Direcção-Geral dos Desportos tem 193 000 contos para transferências a particulares, o Fundo de Fomento do Desporto tem 300 000 contos para distribuição a particulares e 110 265 contos para distribuição a instituições particulares.

Já existe uma proposta para distribuição destas verbas, que, em princípio, merece o nosso acordo. Mas gostaria de saber se, realmente, a Direcção-Geral dos Desportos ou a Secretaria de Estado dos Desportos têm um mapa — um mapa mínimo — que justifique 603 000 contos de distribuição destas verbas, para onde e como.

Como'o Sr. Ministro referiu, também existem verbas — polémicas — para distribuição pela alta competição e, a talhe de foice, referiu o facto de haver distribuição de verbas vultosas a campeões. Ora, o que é verdade é que os campeões, até o serem, passam grandes dificuldades: recordo o campeão do mundo e campeão olímpico, Carlos Lopes, que dizia que, há 7 ou 8 anos tinha de calcorrear a pé de um lado ao outro da cidade porque não tinha dinheiro para ir treinar ao Estádio de Alvalade.

Pergunto-lhe: vai manter-se no Ministério esse estilo de distribuição de verbas a quem já tem o nome feito? É evidente que também precisam de apoio, quer eles, quer os treinadores, quer os clubes. Mas a verdade é que vemos muitos jovens que pretendem enveredar pelo desporto e que, às tantas, terão de travar por falta de apoio.

Quero saber, Sr. Ministro, como é que vão ser distribuídos estes 603 000 contos.

Sr. Ministro, gostava de saber, realmente — o Sr. Secretário de Estado do Orçamento está aqui, mas [...] —, que tipo de Planos Regionais de Ordenamento

do Território vão ser feitos, uma vez que a direcção do Ordenamento para os Planos Regionais do Ordenamento do Território tem apenas 18 650 contos.

Sr. Ministro, gostava de saber que estudos do projecto vão ser feitos, com apenas 22 000 contos, para um problema extremamente grave, que é a ria Formosa.

Gostaria de saber para que servem 22 000 contos.

A Direcção-Geral do Ambiente, a quem compete o controle de produtos químicos nocivos, e que é um dos problemas mais graves, nomeadamente na poluição atmosférica, vai ter 2500 contos, sendo 1300 para aquisição de serviços não especificados.

Gostava de saber e até de ouvir do Sr. Secretário de Estado do Orçamento a resposta a esta pergunta: estas verbas são, realmente, verbas capazes de pôr de pé qualquer Ministério da Qualidade de Vida?

Vejamos, por exemplo, a protecção contra o ruído, que também é um problema muito sério: a dotação é de 5000 contos e destes 5000 contos 2000 são para serviços não especificados.

A protecção e melhoria da qualidade da água tem apenas 14 200 contos, quando todos conhecemos os problemas existentes.

Sr. Ministro, é evidente que também gostaria de saber como é que é possível recuperar os solos e estudar a sua recuperação, nomeadamente a zona crítica do Alentejo, com apenas 5000 contos, sendo 3800 contos ainda não dotados, porque são para aquisição de bens não especificados. Como é possível, realmente, termos um Ministério com verbas desta natureza!

Sr. Ministro, é possível, na distribuição das verbas, dotar algumas destas direcções-gerais com mais verbas, porque o trabalho que têm a desenvolver é extremamente sério e merece todo o nosso apoio?

Sr. Ministro, teria muitas perguntas a formular-lhe sobre a política da água. V. Ex.a já as explicou claramente a colegas meus, de várias bancadas.

Como dizia o Sr. Deputado Leonel Fadigas, é evidente que o problema da água, às tantas, terá de ser debatido muito seriamente por todos nós, por todos os portugueses, nomeadamente na Assembleia da República. E o mesmo se passa em relação à protecção e recuperação dos solos.

São problemas extremamente sérios. Daí que se começássemos a ver uma elencagem de todos os problemas respeitantes a este Ministério, talvez o Ministério das Finanças olhasse com outro realismo este problema e não se circunscrevesse e cingisse apenas aos números.

Sr. Ministro, falou-se de muitos rios, falou-se no rio Ave — que eu conheço bem e onde remava —, no Tejo, no problema do Vouga, que também é um problema extremamente sério. Se for possível, gostava de saber o que se passa com a resistência da celulose de Cacia, que matou um rio — o rio está preto, não tem um único peixe. O que vai ser feito?

Falou-se também em serviço de parques, reservas da Natureza. A propósito de parques naturais, pergunto--lhe se tem conhecimento da tentativa de abertura de uma fronteira, lá em cima, no parque do Gerês: há mesmo o caso notório e público — já veio publicado e já foi discutido — de um presidente da câmara, ainda por cima com formação superior, que manda arrancar marcos romanos — da jeira romana única no mundo — que estão, pura e simplesmente, a ser destruídos. É que este presidente da câmara acha que tem

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de alargar a estrada para depois os automóveis passarem para irem a Espanha buscar rebuçados.

Sr. Ministro, gostaria de lhe fazer muitas perguntas, mas aquelas sobre as quais eu queria que me dissesse claramente o que se vai passar são as perguntas relacionadas com as verbas. Nomeadamente, gostaria que o Sr. Secretário de Estado dos Desportos me dissesse o que se vai fazer na investigação desportiva. Creio que não basta dar dinheiro aos medalhados, mas também à investigação desportiva.

Finalmente, e ainda em relação ao desporto, gostaria que fosse identificado — o Sr. Secretário de Estado não está presente, mas espero que venha — quem dá apoios ao desporto profissional. Será que o desporto profissional merece tantos apoios como isso?

Sr. Ministro e Srs. Secretários de Estado: As obras de fecho do terceiro anel do Estádio do Benfica — que é uma bancada — custam 600 000 e tal contos e li numa entrevista que o Estado vai participar com 60 % desta despesa, quando não temos desporto escolar, não temos ginásios. Tenho 3 filhos que frequentam 3 escolas diferentes e em nenhuma delas há um ginásio; enquanto isso, ouço dizer e vejo publicado nos jornais que o Secretário de Estado das Obras Públicas vai apoiar com 1 500 000 contos o desporto profissional, não esquecendo até os apoios que surgiram agora por decreto — o bingo está menos onerado em impostos para possibilitar mais o desporto profissional, da forma como temos visto.

Gostava de saber, realmente, que tipo de política está ou vai ser desenvolvida neste Ministério, agravado, com certeza, com uma dotação pouco menos que miserável.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro da Qualidade de Vida vai, com certeza, responder aos Srs. Deputados que o questionarem.

Prosseguiremos depois a reunião com as intervenções para os quais estão inscritos os Sr. Deputados José da Silva Domingues, Hermínio de Oliveira, Jorge Lemos, Anselmo Aníbal e Paulo Barral.

Tem, pois, a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Srs. Deputados, nesta intervenção também os Srs. Secretários de Estado tomarão a palavra, pois trata-se de assuntos que lhes dizem directamente respeito.

Suponho que os 3 Srs. Deputados que intervieram, os Srs. Deputados Portugal da Fonseca, João Abrantes e João Corregedor da Fonseca, se referiram, todos eles, a um problema que vive no meu espírito dia-a--dia e sobre o qual me tenho pronunciado muito.

Falaram-me na degradação da ria de Aveiro, e perguntaram qual era a política do Ministério em relação a essa ria. Falou-se também na existência ou na inexistência próxima de recursos hídricos da região.

No entanto, suponho que o caso mais agudo, e que não foi aqui citado, é o caso de vila da Feira — que eu conheço —, onde há neste momento 110 000 pessoas sem água potável. Os Srs. Deputados falaram também no surto de hepatite na região de Coimbra, no rio Ceira, na captação de águas para Coimbra, nos problemas do saneamento básico, na possibilidade de intervenção nas construções urbanas.

Para já, gostaria de me referir de uma forma geral à questão dos rios.

Também já disse, ainda antes dos Srs. Deputados, que a nossa bacia hidrográfica, toda ela e não apenas

rio por rio, se encontra em estado de degradação, nalguns casos mesmo encontra-se em estado de destruição total. Podia adicionar a esta situação casos ainda mais trágicos como o rio Almonda e o rio Alviela. A situação deste último pode até vir a ter repercussões graves no abastecimento de água da cidade de Lisboa.

Devo dizer-lhes que a vila de Alcanena, por exemplo, regista um índice de mortalidade maior do que o resto do País, devido à situação das suas águas e da sua poluição atmosférica. Portanto, tenho vivido esses problemas intensamente.

Perguntaram-me se eu já tinha ido a Coimbra. Está, de facto, programada a minha ida a Coimbra e a toda a região do rio Ceira e esta só não se realizou porque os autarcas não marcaram o dia. Ando um pouco como peregrino!

Agora, quanto à questão que me foi colocada sobre qual seria a política do Ministério neste âmbito, devo dizer-lhe que ela é, em primeiro lugar, pôr este problema ao Governo, pois trata-se de um problema colectivo gravíssimo.

Contudo, o problema torna-se ainda mais grave quando oiço aqui deputados proporem a extinção do Ministério da Qualidade de Vida e quando esse sentimento também tem repercussões — penso eu — no seio do próprio Governo. De facto, esse é um grande problema nacional. É um problema que não se resolve só através de dinheiro.

Devo dizer-lhes, Srs. Deputados, que se eu tivesse de fazer face neste momento aos problemas que me são postos de recursos hídricos e de saneamento básico em todo o País não bastariam nem 10 milhões de contos, nem 20 nem sequer 30 milhões de contos. Seria, sim, preciso ter verbas de centenas de milhões de contos e isso é insuportável pelo próprio País.

Portanto, julgo que temos de pensar numa política hídrica séria. E a política hídrica séria tem de ser uma nacionalização total, quer dos meios disponíveis pelo Estado, quer dos próprios meios das autarquias. Isto porque as autarquias estão a fazer esforços colossais, e muitas vezes inglórios, para resolverem o problema. É necessário, portanto, uma conjugação total destes esforços.

Mas também queria lembrar — e isto é grave — que há departamentos do Estado que têm verbas muito maiores. Por exemplo, a Direcção-Geral dos Recursos Hídricos tem para seu próprio funcionamento uma verba muito maior do que a do Ministério da Qualidade de Vida, em todo o seu conjunto, incluindo a política dos desportos.

Assim, também isto deveria ser abordado na Assembleia da República, porque é por aí que deveria começar a política da Assembleia da República, analisando o critério de despesas. Isto porque, afinal de contas, uma Direcção-Geral que insulta o ministro que se preocupa com a situação, que reclama o direito e até provoca abaixo-assinados de professores universitários nesse sentido e reclama o direito de ter o privilégio dessa política, deixou o País neste estado.

De maneira que pergunto se se deve continuar a política hídrica feita até agora e pelos mesmos responsáveis, ou se se deve inflectir essa política hídrica.

Este é o problema sério que está posto à consciência dos governantes, dos deputados e também do povo. Simplesmente, o povo está a aprender depressa e através das autarquais, os deputados já pensam — pepso eu — seriamente nisso, pelo que suponho que há-de

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chegar o dia era que os governantes pensem no assunto e não discutam a existência de um Ministério da Qualidade de Vida.

Mas sem uma definição de uma política hídrica não há possibilidade de o País equacionar os problemas.

Quando, por exemplo, se gastam 43 milhões de contos nas obras do Baixo Mondego e estão previstos mais 23 milhões de contos para lá se gastarem, sem se saber áo certo o que é que vai sair daquilo, compreendo que o dinheiro que é gasto em recursos hídricos podia talvez sanear imensas dessas situações.

Este é um problema político muito sério e respondo com a verticalidade que sempre usei na minha vida. O dinheiro português é, em muitos casos, mal gasto e há muitas entidades do Estado que não estão fazendo a política que devia ser feita. Por isso, reclamo como resposta possível, aos Srs. Deputados Portugal da Fonseca, João Corregedor da Fonseca e João Abrantes, que a primeira coisa é obrigar a que seja adaptada em Portugal uma política hídrica, uma política da água.

Já tive ocasião, ao pé do Sr. Presidente da República e dos responsáveis, de fazer um discurso no Dia Nacional da Água, no dia 1 de Outubro, em que defini a necessidade da água como uma necessidade urgente de toda a Nação. Só depois de definida essa política se podem equacionar os meios disponíveis, através dos vários ministérios, sabendo qual é o concurso que cada Ministério pode dar para a política centralizada da água. Isto porque, hoje, em toda a parte do mundo civilizado, a política da água é uma política integrada.

Não se pode separar a política de recursos da política de saneamento básico. Portanto, terá de haver uma integração, visto que se trata da mesma política, e isto tem de ser definido ao nível mais alto do Estado.

Assim, tem de haver um ministro responsável pela política da água em Portugal.

Os recursos do Ministério são escassos, mas dentro da magreza do meu orçamento — e esticando por todos os lados — estou procurando reunir todos os meios, inclusivamente em técnicos, que são caros.

Por acaso, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento, citando, há pouco, verbas do Ministério, frisou a pletora de técnicos que temos. O nosso Ministério é um Ministério essencialmente de técnicos. Na revisão dos quadros que fiz procurei, acima de tudo, diminuir o pessoal administrativo e implementar o pessoal técnico, porque não se pode fazer uma política de água sem se ter muitos técnicos hidrológicos à nossa disposição. Não se pode fazer uma política de ambiente e de ordenamento do território sem ter à nossa disposição uma série de arquitectos paisagistas, engenheiros geógrafos e outros técnicos. Os quadros dos Ministério estão previstos para isso. Nós não somos um Ministério de investimento, e não o quero ser, pois não pretendo ultrapassar essa fronteira. Pretendo que os meios que me são dados pelo Orçamento possam ser utilizados numa definição de política, que depois terá de congregar todas as outras forças e todos os outros elementos orçamentais do Estado. Não se pode pedir, de maneira alguma, ao Ministério da Qualidade de Vida e aos seus 2 milhões de contos que respondam por uma política de água em Portugal. Pode responder pela definição dessa política e pode, inclusivamente, dizer quais são os sítios do Estado e do Orçamento do Estado onde se pode ir buscar dinheiro para se implementar essa política. Também o saberia fazer.

Gostaria também de acrescentar que o Ministério da Qualidade de Vida precisa de determinados serviços que andam espalhados por outros Ministérios e que estão inclusivamente a ser mal utilizados. Por exemplo, Direcção-Geral do Saneamento Básico com a lei das autarquias locais perdeu em grande parte a sua expressão e, inclusivamente, há dois ou mais anos que não tem director-geral. Seria absolutamente necessário que o esforço da política da água fosse complementado com os serviços técnicos da Direcção-Geral do Saneamento Básico. Tal como está, verifica-se uma dispersão de esforços que não conduz a parte alguma.

Da mesma maneira, existe no Ministério da Saúde um serviço que é constituído por engenheiros auxiliares sanitários. E esses engenheiros auxiliares sanitários, que aliás estão sendo mal empregados e mal utilizados e que constituem um quadro técnico respeitável de 200 e tal técnicos, já por várias vezes manifestaram a sua vontade de implementar nos quadros a actuação do Ministério da Qualidade de Vida.

É preciso que se faça essa congregação de esforços, essa unificação de uma política que tenha em vista necessidades que são fundamentais e básicas do País. É necessário que a Assembleia da República utilize a sua força e o seu verbo persuasivo neste sentido, não bastando só a crítica.

Os Srs. Deputados têm de compreender que esta mentalidade do ambiente é uma mentalidade que custa a formar. Ainda há pouco um Sr. Deputado me perguntou como era feita anteriormente a política do ambiente, como se há 20 anos fosse necessária a política do ambiente!

Ora bem, as pessoas dificilmente se habituam a mudar de mentalidade. Em países mais civilizados do que nós, por exemplo a Alemanha, só há 5 ou 6 anos é que começou a ser feita, efectivamente, uma política de ambiente e hidrológica razoável. A Holanda está a debater-se com problemas semelhantes ao nosso. A falta generalizada de água na Holanda é extremamente grave, embora talvez não tão grave como no nosso país. Isto porque em Portugal o esgotamento dos recursos hídricos está previsto para breve, nalguns casos prevê-se que isso acontecerá no máximo dentro de 5 anos. Toda a faixa litoral oeste, desde a Póvoa de Varzim até Vila Nova de Milfontes, está condenada a não ter água dentro de 5 anos ou pouco mais. A cidade do Porto está, como os Srs. Deputados sabem, a debater-se com um problema tremendo de fornecimento de água. E a cidade de Coimbra vai ter esse mesmo problema.

Que resposta lhe posso dar, a não ser a de que é preciso mobilizar a Nação e o poder político para esse esforço? É preciso dar força política ao único departamento do Estado que até agora se ralou e se importou verdadeiramente com esse problema, e no qual há uma dedicação, de certo modo sacerdotal, por esses problemas e que não joga com nenhuns interesses. De facto, não existe qualquer ligação a interesses industriais, nem comerciais, nem interesses de fazer obras, pois não queremos fazer obras.

Quanto aos restantes problemas, e porque se trata de problemas mais específicos, acho que os Srs. Secretários de Estado poderão responder-lhes de forma mais satisfatória.

Suponho que o problema da água já está suficientemente ventilado.

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Os Srs. Deputados sabem qual é a minha intenção? Eu não quero responder pela efectuação total da política da água. Acho que o Ministério da Indústria tem aí um papel importantíssimo, na medida em que tem de passar a licenciar de maneira diferente. Não podemos consentir que um rio que é propriedade de todos, porque a água é um bem comum, seja poluído por uma minoria.

Há definições jurídicas que é preciso fazer em Portugal, e uma delas é o «poluidor-pagador». O industrial que utiliza um rio — que é um bem comum, que é um bem da sociedade — em seu proveito próprio e o polui está cometendo um roubo a todos os seus concidadãos. Esta noção jurídica tem de ser introduzida na mentalidade política portuguesa. Sei que demora tempo e que não será, certamente, feita por mim, mas a minha obrigação é desbravar caminho e colocar o problema. E ponho-o com seriedade: temos de introduzir o princípio do «poluidor-pagador». Temos, inclusivamente, de estabelecer o princípio de que a quem polui será imediatamente retirada a licença de fabrico e, portanto, temos de adoptar um regime rigoroso de despoluição dos rios.

O problema da ria de Aveiro é talvez dos problemas mais complexos que temos. Portanto, agradeço que o tenham levantado, pois trata-se, de facto, da extinção da própria ria.

Devo dizer que nós não tínhamos possibilidade orçamental de encarar esse problema. E um problema de tal maneira caro no seu conjunto que a única coisa que podemos fazer — e é o que estamos a fazer — é entabular negociações com o Ministério da Indústria e Energia para uma equação geral do problema, para que dentro de um ou dois anos possa surgir, em equação, a resolução do problema da ria de Aveiro.

Não teremos possibilidade nenhuma, a não ser como caricatura, de resolver o problema da ria de Aveiro. Não passaríamos de tiradas literárias e de demonstrações de boa vontade.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ambiente.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Carlos Pimenta): — Srs. Deputados, quando por vezes se fala em números põe-se a questão da quantidade e nós, este ano, até estamos no ano da qualidade.

Efectivamente, como o Sr. Ministro referiu o Ministério não se considera um Ministério de investimento, razão por que também a composição dos quadros é essencialmente técnica, e quando falamos em horizontalidade imaginamos que uma grande parte da nossa acção é de natureza — diria eu — «gabinetal». Isto significa que aparecemos como apoio.

De facto, há experiências muito interessantes desse apoio técnico, que vimos praticando em relação às autarquias, em que muitas vezes somos — dentro da tal palavra chave que referi há pouco, ou seja, em síntese — os aglutinadores. Dou-lhe, como exemplo, o caso da lagoa de Albufeira que não aparece sequer aqui, digamos, mencionado.

No caso dos clandestinos da lagoa de Albufeira, que tem uma ligação estreita com as autarquias de Sesimbra, é o Ministério da Qualidade de Vida que está a pagar ao gabinete que está a fazer o ordenamento da zona. E foi o Ministério da Qualidade de Vida que obteve da Direcção-Geral do Património — e portanto

dentro desse tal programa congregado — uma verba para fazer a demarcação do domínio público marítimo, do domínio público do Estado, do domínio privado, etc. Portanto, há de facto um efeito agregador.

Um outro exemplo respeita a gestão da qualidade do ar. No Decreto-Lei n.° 255/80, que referi há pouco, foram criadas as comissões de gestão do ar. Elas têm tido dificuldade em serem implantadas pela única e exclusiva razão de não termos quadros. Tem acontecido até que técnicos de grande qualidade acabam por nos deixar por essa razão.

Mas, por exemplo, a Comissão de Gestão do Ar de Sines é praticamente suportada pelo orçamento do Gabinete da Área de Sines. O ano passado até foi divulgado pela imprensa que existiam tarefeiros no Gabinete da Área de Sines e que o Gabinete não tinha verba para lhes pagar. Nessa sutura esse pagamento foi feito pelo Ministério da Qualidade de Vida, que encontrou forma de lhes pagar. Mas, digamos, as grandes verbas de suporte dos equipamentos e das actividades pertenciam ao orçamento do Gabinete da Área de Sines.

Existe ainda o exemplo da Comissão de Gestão do Ar de Estarreja.

Na verdade, trata-se de tarefas pequenas, e não de grandes obras hidráulicas ou de grandes obras públicas.

Mas é necessário, por exemplo na zona de Estarreja, dispor de uma rede de aparelhos para vigilância da qualidade do ar. Assim, para a Comissão de Gestão do Ar dessa zona foi feito um orçamento e uma parte das verbas de investimento, que foram estimadas em 3000 contos para o primeiro ano de 1984. Tendo sido também solicitado dentro dessa actividade organizada a comparticipação das empresas. Cada empresa entrou com uma quota que foi acordada voluntariamente ao nível da Comissão de Gestão do Ar. Isto é só para ilustrar, efectivamente, o efeito multiplicador da importância deste tipo de actuação do Ministério.

No que respeita à poluição atmosférica, uma vez que o Sr. Ministro falou mais da questão da água, fala-se também da inventariação das principais fontes fixas da poluição atmosférica. Vem na sequência de um protocolo com o LNETI. O LNETI em principio deveria ter também uma verba destinada a este efeito. Trata-se de manter uma equipa, pelo menos uma, em permanência com 2 ou 3 técnicos, que percorre o País e que verifica para determinadas fontes poluidoras — em geral as grandes chaminés com estatuto de poluidoras e que são cerca de 50 no nosso país — quais são, in loco, as quantidades. Isto porque efectivamente não podemos dizer só polui muito ou polui pouco. Precisamos de saber e de acompanhar essa evolução e enquanto não arrancarmos deste nível não podemos fazer nada. A própria legislação não terá suporte porque não conhecemos qual a situação precedente.

No que diz respeito ao ruído, a situação é idêntica. É evidente que temos a lei, com o regulamento geral do ruído, em discussão no âmbito do Conselho de Ministros e irá ser aprovada. Surgiu, entretanto, uma disposição geral para o ruído nas discotecas. Temos alguma verba para adquirir equipamentos para formar o pessoal, mas terão de ser os governos civis ou outras entidades a adquirir equipamentos ao nível local.

No que diz respeito à ria Formosa, queria dizer que temos uma verba no PIDDAC para ela, que anda muito perto dos 70 000 contos. Embora não tenha aqui o valor preciso, sei que são 50 000 contos dos PIDRs,

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20 000 que estão na verba da Direcção-Geral do Ordenamento e 20 e tal mil contos que estão na verba do Serviço Nacional de Parques, Reservas e Conservação da Natureza. Isto, como digo, em termos de PIDRs. E depois temos mais vinte e tal mil contos dos PID-DACs dos Parques. Esta verba ronda, por conseguinte, 70 000 contos e não vai ser utilizada como verba do Ordenamento ou dos Parques, mas dentro de um programa que se chama Programa Operacional de Gestão, que vai ser apresentado às autarquias dentro de algumas semanas.

No fundo o que interessa é o objectivo ao nível local e não de onde é que vêm as verbas. São todos projectos pequeninos, mas têm carácter básico e fundamental.

No que diz respeito aos planos regionais de ordenamento a situação é similar. O seu regulamento geral encontra-se agora em cima da minha secretária, porque só agora os serviços mo entregaram. Tem sido bastante difícil, porque se trata de uma área de inovação e o Sr. Ministro já se referiu, há pouco, a uma certa interligação e confusão entre ordenamento e desenvolvimento. Aqui há semanas, promovemos um encontro para tentar esclarecer um pouco mais esses aspectos e trata-se, por conseguinte, de um regulamento difícil de fazer. No entanto, enquanto ele não for feito, não é fácil promover planos de ordenamento com grande amplitude. De maneira que estas verbas que aparecem aqui para estes planos destinam-se, apenas, a iniciar os tais planos regionais de ordenamento e os estudos nesta área, sendo da exclusiva responsabilidade do Ministério da Qualidade de Vida. Mas no fim de 1985, estaremos com certeza ainda na pista, sem termos conseguido descolar! Se me observarem que nesse caso nunca mais lá chegamos, direi que esse é o problema que já discutíamos há pouco. Refiro, a título de exemplo, o Plano Regional de Ordenamento do Vale do Ave, para dizer que é preciso que nele participem as autarquias, a Comissão de Coordenação, e todas as entidades hidráulicas, bem como ter em conta as infra-estruturas existentes, etc. Ora, não é fácil neste momento, sem a legislação estar completa, aparecermos e conseguirmos ser bem sucedidos na congregação de todas essas entidades. De maneira que, como tudo isto leva um certo tempo, a intenção foi iniciar os trabalhos nesse sentido.

Quanto ao Peneda-Gerês, ele é, como sabem, o único Parque Nacional que temos e que é identificado a nível internacional. Os parques têm uma hierarquia: parque nacional, parque natural, reserva natural e área protegida. O Peneda-Gerês nasceu, na história da tomada de consciência destas coisas pela Administração em Portugal, no âmbito do Ministério da Agricultura, sendo isso natural, uma vez que não havia mais nada. O pior surgiu depois, quando apareceu o Ministério da Qualidade de Vida. O problema passou a estar no aceitar pelo Ministério da Agricultura da cissiparidade e da libertação do Parque da Peneda-Gerês para o novo nato. Isso ainda não aconteceu, apesar de, pelas informações que tenho, existir essa disposição por parte do Ministério da Agricultura. Este parque é relativamente difícil de gerir porque tem uma população muito vasta, dispondo de discrepâncias de natureza paisagística e patrimonial muito grandes. No entanto, o Ministério da Qualidade de Vida está obviamente interessado em incluir o Parque da Peneda-Gerês no seu sistema.

Quanto à questão da fronteira, tive ocasião de visitar o Parque há algumas semanas e admito que haja

possibilidades técnicas de encontrar soluções para a abertura da fronteira. Note-se que digo admito e não que haja. Com os dinheiros de quem não sei, mas o que é facto é que existe lá um edifício de fronteira que dá bem, pela dimensão, para dar apoio a TIRs com reboque e tudo o mais.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Posso interrompê-lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Secretário de Estado, existindo essa possibilidade técnica de abertura da fronteira, pergunto-lhe claramente se acha ou não que essa abertura deva ser proibida.

O Orador: — Para mim, essa abertura será possível desde que se salvaguardem determinados valores do parque. Simplesmente, isso exige determinadas soluções técnicas.

Para já, era tudo aquilo que queria dizer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.

O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —

Sr. Presidente, era para muito brevemente, e em relação a esta questão da abertura da fronteira da Portela do Homem, no Parque Nacional da Peneda-Gerês, dizer que obviamente está fora de qualquer hipótese a sua abertura à passagem de TIRs.

Aquilo apenas dá para uma passagem de passageiros, visto que existe lá um posto fiscal que não está habilitado sequer a fazer despachos. Aquele posto dá apenas para os cidadãos passarem e para trazer chocolates e rebuçados, mais nada. Quanto ao resto, destina-se a facilitar a vida aos emigrantes, que porventura tenham acesso por aquela fronteira. Além disso, ela nem sequer está aberta todo o ano, mas apenas em determinados períodos, como no Natal, na Páscoa e na altura das chamadas férias grandes, em que é utilizada mais pelos emigrantes. Neste momento, deve mesmo estar fechada.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Desportos.

O Sr. Secretário de Estado dos Desportos (Miranda Calha): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Foram também colocadas algumas questões pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca em relação aos blocos de apoio financeiro, que estão anunciados nos diversos orçamentos como transferências para instituições particulares. Queria dizer-lhe que o destino dessas verbas constitui-se, no fundo, em 2 grandes blocos. Há uma parte de transferências para instituições particulares, que está no orçamento da Direcção-Geral dos Desportos, que é de cerca de 193 000 contos e que se destina, essencialmente, a ser transferido para as federações e associações desportivas. É a grande componente de apoio ao desporto federado e que é, portanto, distribuído através de um conjunto de critérios para todas as federações, que são, na sua totalidade, 43, excluindo o futebol, porque este recebe directamente da Santa Casa da Misericórdia. Portanto, esta verba de 143 000 contos é destinada, praticamente, para este campo.

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Há depois um outro grande bloco de apoio que está precisamente ligado ao sector do Fundo de Fomento do Desporto, que vem nas «contas de ordem» do Ministério da Qualidade de Vida, onde existe uma divisão que se destina essencialmente a contemplar um conjunto de acções em termos de actividade e depois para comparticipar obras, principalmente as pequenas. Foram aqui propostas, pelo PCP, umas alterações em termos de divisão destes mesmos 600 000 contos. Queria dizer que elas ficaram perto da nossa distribuição. É evidente que não podemos aceitar este tipo de distribuição, visto que temos a nossa planificação e programação próprias. Mas, por acaso, os 110 265 contos pertencentes ao Fomento do Desporto Escolar adicionados aos 150 000 contos para fomento das actividades desportivas dão sensivelmente 260 000 contos, o que é uma verba próxima da que temos prevista para esta área, que é de cerca de 300 000 contos. Embora os valores se aproximem, não podemos aceitar esta divisão porque ela não é a mais adequada para nós.

Esta verba destina-se essencialmente para iniciativas de actividades por parte das colectividades e também para a parte do desporto escolar, do apetrechamento, da documentação, da formação e ainda para o apoio na área da medicina desportiva. Tudo isto dá sensivelmente uma verba de 300 000 contos, o que se aproxima da soma dos 110 e dos 150.

Há depois uma outra parte, que era para obras e que aparece na proposta do PCP para instalações gimno-desportivas nos estabelecimentos de ensino preparatório e secundário. É evidente que isto não pode ser porque são obras que pertencem à parte das construções escolares e que, portanto, não nos dizem directamente respeito. Mas a parte que nos interessa de comparticipação de obras e que fazemos através de uma verba sensivelmente da ordem dos 110 000 contos, vai para os pequenos clubes, colectividades e associações, que têm os balneários e recintos desportivos de pequena dimensão e que através da apresentação dos seus projectos poderão ser comparticipados através desta verba.

São estas, em termos globais, as grandes dotações, que são a nosso ver reduzidas, mas que de qualquer modo ajudam o desporto nacional. É evidente que quer em relação à parte das obras, quer às actividades, como ainda à parte das verbas da Direcção-Geral dos Desportos, tudo é baseado em critérios objectivos, que aliás ainda recentemente tive ocasião de descrever quando fizemos a apresentação global.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Posso interrompê--lo, Sr. Secretário de Estado?

O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, já agora pedia-lhe um esclarecimento. Embora já tenha referido que não há no seu Ministério nenhuma verba desse género, queria perguntar-lhe se aquilo que foi há pouco referido pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, e que veio nos jornais, no sentido de o Estado comparticipar com 60 % para a tal bancada, é verdade.

O Orador: — Eu referi-me e expliquei apenas aquilo que obviamente nos diz respeito e são estas as verbas que apoiamos. Os objectivos dessas verbas são distribuídos pela maneira que acabei de descrever.

Há aqui uma proposta do PCP que propõe uma alteração do Orçamento da DGD, acrescentando-lhe 80 000 contos. É evidente que se trata de uma proposta simpática, mas o nosso Orçamento não pode, obviamente, contar com isso. Penso que tenho a solidariedade governamental e devo ter isso em linha de conta. O ano passado o PCP tinha apresentado 70 000 contos, pelo que esta proposta de alteração de 80 000 contos não acompanhou certamente a inflação!

Risos.

Em relação à alta competição, fez-se uma referência sobre alguns destes valores dados. De facto, instituímos alguns prémios para aqueles resultados de atletas a título individual, que participam, tão-só, em campeonatos mundiais e europeus. E uma prática normal em quase todos os países e que nós, obviamente, também consideramos positiva e necessária. Não destacamos isto do contexto global de criarmos incentivos e estímulos para a apreciação desportiva, motivando também, naturalmente, aqueles que amanhã, ao se destacarem, venham a estar no âmbito da alta competição.

Queria dizer que aprovámos legislação sobre a questão do Gabinete de Alta Competição, que está criado e que tem um programa concreto, que vai ser feito em relação e em colaboração com as federações desportivas para, precisamente, se motivar o desenvolvimento da prática desportiva e, na área da alta competição, apoiarmos aqueles que possam ser valores a despontar a este mesmo tipo de participação. Trata-se de um esquema muito concreto e objectivo, que se faz, aliás como em todas as outras áreas, em colaboração e cooperação directa com as federações desportivas, que são, note-se, as tais instituições particulares que vêm °aí referidas em diversas partes do nosso Orçamento.

Finalmente, quanto à questão daquelas verbas destinadas à comparticipação até 60 queria dizer que não são do nosso sector, mas do âmbito da Secretaria de Estado das Obras Públicas, do Ministério do Equipamento Social, a quem com certeza, na ocasião oportuna, colocarão essas questões. É evidente que tenho conhecimento de que há comparticipações que vão até 60 apresentados consoante os projectos que essas colectividades sugerem em termos de administração central.

Eram estas as respostas que queria dar aos pontos que julgo terem sido referidos.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Era apenas para acrescentar uma pequena nota ao que acabou de dizer o Sr. Secretário de Estado dos Desportos.

É evidente que o Ministério da Qualidade de Vida discorda profundamente que a política de incremento ao desporto seja praticada por outra entidade pública que não seja o Ministério responsável.

O Sr. Presidente: — Antes de prosseguirmos os nossos trabalhos, queria dizer o seguinte: não desejo de modo nenhum condicionar o que quer que seja no esclarecimento. Acontece apenas que são 19 horas e 27 minutos e temos ainda para intervir os Srs. Deputados José Silva Domingos, Hermínio de Oliveira, Jorge Lemos, Anselmo Aníbal, Paulo Barral e Joaquim Miranda. Sendo, assim, o único apelo que faço mais

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uma vez era no sentido de que fizéssemos um esforço de síntese e de anunciação na postura das questões. Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Domingos.

O Sr. Silva Domingos (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sendo minha convicção que o Ministério da Qualidade de Vida não tem podido exercer plenamente as suas competências na área do ordenamento e do ambiente, duvidando-se até que elas estejam devidamente compatibilizadas com as competências de outros ministérios e sendo, por outro lado, previsível que os quadros do Ministério da Qualidade de Vida não venham a ser aprovados a breve prazo, com prejuízo da responsabilização, enquadramento e motivação do seu pessoal, pergunto se se poderá esperar no ano corrente, a manterem-se os actuais condicionalismos, uma maior eficácia e utilidade dos serviços do Ministério, de modo a justificar, económica e socialmente, as verbas previstas no Orçamento do Estado.

Punha agora 2 questões particulares. Já aqui falámos na poluição dos rios e não vou fazer considerações sobre essa matéria. Perguntava, no entanto, se existem programas de acção previstos para intervir nos rios Minho, Lima e Coura, que começaram a ser para nós também uma grande preocupação.

Finalmente, dado que a acção no desporto escolar é realizada, fundamentalmente, através do Ministério do Equipamento Social, que constrói os pavilhões desportivos anexos às escolas, pergunto se o Ministério da Qualidade de Vida tem na sua competência a possibilidade de propor programas de acção nessa matéria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Dir-lhe-ei, Sr. Deputado, que em relação ao rio Minho está em fundação o Instituto Hidrográfico do Rio Minho, que funcionará em Caminha, sob a presidência do Prof. Jacinto Magalhães. Este Instituto foi dotado pelo Ministério da Qualidade de Vida com uma verba inicial de 2000 contos.

Pensamos que poderemos obter o concurso de várias entidades particulares para o prolongamento desse Instituto.

O rio Minho é, por enquanto, dos rios menos poluídos, embora já esteja a sofrer um processo de grande deterioração. Portanto, pensa-se que talvez se possa atalhar a situação com um estudo e uma acção concatenada e económica das autarquias. Em toda a nossa actuação procuramos, contudo, não gastar dinheiro, ou gastar muito pouco, porque não o temos.

Quanto aos rios Lima, Cávado, Minho e Zêzere, passa-se um fenómeno escandaloso, que é o das indústrias de extracção de areias em grande massa. Essas indústrias têm sido autorizadas ou, pelo menos, consentidas passivamente pela Direcção-Geral dos Serviços Hidráulicos — a tal que defende a hidrologia do nosso país.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado dos Desportos.

O Sr. Secretário de Estado dos Desportos: — É só para uma pequena nota, aliás, como já há pouco aqui foi referido, para dizer que, efectivamente, a área do

desporto escolar depende directamente do Ministério da Educação e, portanto, é nesse campo que realmente está situada essa estrutura.

É evidente que temos a percepção — e o Sr. Ministro disse-o com toda a clareza — de que, sendo nós os responsáveis pela política desportiva, obviamente que deveríamos ter intervenção em todos os sectores que, de um ou de outro modo, são protagonistas do desenvolvimento desportivo.

De facto, não tem sido essa a prática no caso da área das construções escolares, pois elas são do âmbito do Ministério do Equipamento Social e é preciso não esquecer que o próprio desporto escolar é precisamente do âmbito do Ministério da Educação.

Temos aqui uma verba prevista para o fomento do desporto escolar e tivemos de traçar um protocolo com o Ministério da Educação, em que procurámos dar uma colaboração da nossa parte no sentido de motivar o desenvolvimento do desporto na área da juventude. Mas, efectivamente, é um esforço de colaboração e cooperação nosso no sentido de ajudarmos, com a nossa própria estrutura, essa mesma implementação do desporto juvenil.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hermínio de Oliveira.

O Sr. Hermínio de Oliveira (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado: Naturalmente que as questões do ambiente são questões que afectam directamente as populações e que as interessam vivamente. Daí que, sendo eu das Caldas da Rainha, vá aqui colocar o problema, a que o Sr. Secretário de Estado se referiu nalguns casos similares, da lagoa de Óbidos.

Quando o Sr. Secretário de Estado fala da congregação de todas as entidades, gostaria que V. Ex." me explicasse uma situação que, por pertencer a um órgão autárquico das Caldas da Rainha, tenho conhecimento. É o caso de 20 organismos que superintendem, ou têm influência directa ou indirecta, na lagoa de Óbidos. É também um ecossistema que urge defender; é uma maravilha natural que se está a deteriorar de dia para dia.

Já tivemos nas Caldas da Rainha o problema do paul de Tornada, que desapareceu, que está morto e que é um cancro que está ali, com maus cheiros, uma fonte poluidora extraordinária, gravosa, e não quereríamos — tenho de reflectir essas preocupações da população que represento — que acontecesse o mesmo à lagoa de Óbidos.

O Sr. Presidente: — Como o Sr. Deputado Jorge Lemos não se encontra presente, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): — Sr. Presidente, queríamos apresentar formalmente as propostas. No entanto, entes disso, queríamos fazer comentários de 2 ordens e, na justificação das propostas, dávamos reflexões sobre o Ministério.

Sublinhou-se aqui que o orçamento do Ministério é um orçamento de penúria em quadros, na definição das próprias competências, na delimitação das suas fronteiras com outros órgãos.

E a forma como o Ministério da Qualidade de Vida se tem vindo a assumir perante outros ministérios e

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outras direcções-gerais tem sido uma forma que o Sr. Ministro apelida de transparente e clara, mas que assume, variadas vezes, a forma conflitual.

Esta forma conflitual tem assumido, em relação a determinadas áreas, formas que até põem em causa as próprias relações, que naturalmente terão de ser sempre garantidas entre órgãos de vocação mais horizontal ou de síntese — como aqui foi adoptado — e aquelas que são, por sua natureza, mais operacionais.

Entretanto, introduzimos aqui, com as nossas propostas, uma variação importante neste Ministério da Qualidade de Vida. Consideramos que este Ministério deve ter um papel importante em relação a determinadas áreas do País que, pelo agravamento sistemático das suas condições, têm necessidade de uma intervenção imediata do aparelho de Estado.

E sem cuidar neste momento de definir exactamente as competências e o cruzamento entre as diversas áreas ministeriais na execução desses programas, propomos, em relação ao Ministério da Qualidade de Vida e aos investimentos do Plano na área da defesa e protecção do ambiente um reforço da dotação para implementação do sistema de defesa do estuário do Tejo, com uma verba que, naturalmente, teria de ser depois plurianua-lizada e de ter a sua repercussão em anos futuros, mas que permitia uma intervenção mais activa e menos verbal do Ministério da Qualidade de Vida.

Por outro lado, tínhamos também uma proposta em relação à implementação do plano de defesa de frente das praias naturais da Costa da Caparica, naturalmente tudo isto numa integração de esforços com outros ministérios, até numa definição mais rigorosa daquilo que compete ao poder central, administração central e daquilo que compete à administração autárquica.

Tínhamos um reforço de verbas relacionado com os parques e reservas naturais — ainda não em relação ao parque nacional, pelas razões que foram aqui apontadas —, em relação aos valores dos investimentos e não aos 77 000 contos das despesas correntes.

Tínhamos também uma intervenção, em termos de reforço de verba, para a implementação do programa de saneamento básico do Algarve que foi aqui objecto de intervenções, tanto da parte da manha, no respeitante à administração interna, como agora na parte da tarde quando se discutiu o ambiente e a qualidade de vida.

Este tipo de intervenções foi ainda complementado com uma nova proposta sobre o rio Ceira e a sua defesa, em termos que foram há pouco expostos pelo meu camarada João Abrantes.

Fizemos também a entrega de 3 propostas de alteração em relação à parte da Direcçâo-Geral dos Desportos e à parte dos investimentos do Plano do Ministério da Qualidade de Vida.

Quanto à Direcção-Geral dos Desportos, tínhamos um reforço de 80 000 contos para as federações. Não é apenas por simpatia, mas é a necessidade de uma intervanção mais activa em relação as 43 federações, embora, naturalmente, com solidariedade governamental entre o Ministério da Qualidade de Vida e a Secretaria de Estado do Orçamento que pela amostra é pequena, mas, de qualquer das formas, em relação à Secretaria de Estado dos Desportos, parece estar consolidada. Apesar disso, consideramos que esta proposta vai adiantar alguma coisa no apoio a essa situação.

Em relação às infra-estruturas e às propostas do Investimento do Plano, falaria o Sr. Deputado Jorge Lemos que acaba de chegar e que as completará.

Temos uma palavra mais para sublinhar a indispensabilidade de uma resolução apontada dos conflitos institucionais que o Sr. Ministro da Qualidade de Vida sublinha na sua forma [...]

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Conflitual!

O Orador: — Conflitual [...], diria até, de alguma forma, conflitualmente assanhada.

Mas, em relação a esta forma institucional, que o Sr. Ministro colocou para as relações com as águas e com os recursos hídricos, importa que, a bem das águas e dos recursos hídricos, os senhores se entendam no Conselho de Ministros, a nível de Governo, e não apareçam aqui com um pé dentro e outro fora de um Governo que, a nosso ver, está descredenciado. Importa que tenham um mínimo de capacidade operativa em relação a estas questões. É lamentável que ano após ano apareçam aqui responsáveis que, nas zonas das suas competências, transmitindo aquilo que são os ecos de corredor do Conselho de Ministros, dos vossos conflitos internos, e que para o País, para os problemas que continuam a incomodar as populaçõs, os senhores tenham uma incapacidade de acção que, além de ser ridícula, é dolorosa para as populações.

O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro deseja intervir neste momento do debate?

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Desejo sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: — Sendo assim, tem a palavra, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sem pôr

o problema em termos conflituais, como o Sr. Deputado, diria que V. Ex." talvez não esteja a ver serena e concretamente a questão.

Em primeiro lugar, não há nenhum conflito no Governo. Devo dizer que tenho com o Sr. Ministro do Equipamento Social um entendimento total e completo e que tenho até tido a solidariedade dele em muitos dos problemas que aqui têm estado a ser tratados.

Não posso, contudo, evitar que existam conflitos a nível mais baixo, devidos a determinados anquiloza-mentos de serviços que já vêm muito de trás, com muitos e muitos responsáveis e, até, as muitas teias de interesses que o tempo foi tecendo e bordando.

Portanto, não posso evitar que ao fim de 6 meses de ofícios repetidos apresentando casos sucessivos à Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hídricos, nunca tenha obtido uma resposta, nem nunca tenha visto ser desencadeada qualquer actuação por parte dessa Direcção-Geral, em relação aos problemas que são expostos pelas populações. Por exemplo, como mesmo agora referi é o problema da exploração de areias nos rios portugueses, que tem continuado impunemente, mesmo com a denúncia pública e queixa por parte das autarquias.

Portanto, o Ministério chega a uma determinada altura e não tem um processo de actuação viável que não seja o de abrir, de certa maneira, conflitos ou, pelo menos, afirmar a existência de um grave problema nacional a que ele está pronto a dar resposta desde que a equação do Poder seja alterada em relação a diversos problemas.

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Como disse, e muito bem, o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, temos por vezes de nos concentrar em pequenas acções, e nós temos procurado fazê-lo.

A resposta que estou a dar aos casos dos rios Ave e Minho, e de outros na mesma situação, cabem dentro das possibilidades de actuação do Ministério. Nestes casos não recuamos e agimos imediatamente.

Se o Sr. Deputado me põe um problema como o do estuário do Tejo, que diz respeito praticamente a todos os departamentos de opinião pública e no qual intervêm 52 entidades públicas — já estudei demoradamente este problema e verifiquei que intervêm 52 direcções--gerais e institutos —, é evidente que só uma lei que defina uma política de água é que pode tornar efectiva qualquer política em relação ao estuário do Tejo, à ria de Aveiro e a vários outros problemas similares.

Por isso, disse no princípio do meu discurso — e volto a repetir —, que tudo isto começa por uma definição política da água. É isso, Sr. Deputado. Não aceito, como Ministro, que isto seja uma crítica dirigida ao Governo porque é antes o resultado de uma mentalidade generalizada, que não está formada e na qual todos os partidos políticos têm uma certa responsabilidade — até o partido do Sr. Deputado —, através de vários representantes que, por exemplo, intervêm na questão dos recursos hídricos.

Penso, assim, que este problema é de todos; é um problema geral da mentalidade do País, é um problema de alteração da visão política em relação aos problemas do ambiente e, inclusivamente, no caso agudo da água, de uma consciencialização da necessidade da definição de uma política e de uma autoridade nacional da água.

Portanto, essa batalha tem de ser travada nesse campo. Não serve de nada falar de colaboração ou de bom entendimento entre as entidades enquanto esses problemas fundamentais de estrutura não estiverem resolvidos. Apenas recordo ao Sr. Deputado que, por exemplo, o problema da água — que considero o problema mais agudo do ambiente em Portugal — é um problema relativamente recente, é um problema de crescimento civilizacional, da densidade da população e, inclusivamente, de crescimento da actividade industrial.

Não foi ainda formada a mentalidade necessária para enfrentar este problema com clareza e decisão. Em todo o caso devo dizer que, através da minha observação política e pela primeira vez, verifico no Governo sintomas de que este problema começa a ser consciente, o que nunca observei até hoje, nem antes, nem depois da revolução do 25 de Abril.

Portanto, não estou de forma nenhuma desanimado. Penso, pelo contrário, que é um combate duro de travar, em que têm de se fazer alguns sacrifícios como, por exemplo, os da minha própria pessoa e de alguns outros, mas o caminho vai-se abrindo e as consciências vão-se esclarecendo.

Por isso, e uma vez que o Sr. Deputado me pregou um sermão, devolvo-o de certa maneira neste sentido: deixe-me ser conflitual porque às vezes é preciso para abrir caminho a uma política que certamente o senhor deseja e que também desejo. E pode ter a certeza de que as populações vão reconhecendo, em grande parte, a boa vontade dessa política e o bem fundamentada que ela é em termos futuros.

Quanto às suas propostas de alteração do orçamento para este Ministério, a única coisa que lhe posso dizer

é que me sinto profundamente reconhecido e profundamente triste por saber que elas não vão ser aceites.

Risos do PCP.

É evidente que isto me poderia abrir algumas perspectivas em campos onde gostaria de intervir com mais incisão e energia. Mas temos de nos limitar e que — e o Sr. Secretário de Estado do Ambiente também referia isto, que é verdade —, de certa maneira, treinar o Ministro para um tipo de actuações mais intervenientes. Ora, esse treino, essa possibilidade de actuação mais viva por parte do Ministério, também tem um problema de estrutura na base, que é o da aprovação fundamental dos quadros.

Enquanto os quadros não forem aprovados e, portanto, enquanto o senhor, como técnico do Ministério — e V. Ex.a sabe que estão no Ministério da Qualidade de Vida alguns dos técnicos mais brilhantes deste país, em várias especialidades, muitos por devoção porque é realmente um Ministério onde se trabalha bastante por devoção —, não sentir uma estabilidade, uma confiança política na existência do Ministério e no prolongamento da sua actuação, é muito difícil contarmos com acções continuadas e, sobretudo, não estar permanentemente a deparar com o esmorecimento e com determinado desânimo, que não pode deixar de cair num Ministério que vê todos os dias os jornais darem--no como extinto, ou em vias de extinção, proporem que deve acabar porque é inútil e, inclusivamente, ver que o Orçamento não aprova os seus quadros — o que é uma necessidade legítima e que há 4 anos está proposta como uma necessidade política. Portanto, o trabalho faz-se com desânimo e as pesssoas perguntam--se: afinal, o que é que estamos aqui a fazer? Se este país não quer qualidade de vida, se não quer política de ambiente, então que não a tenha.

É muito difícil e garanto-lhe que é preciso um esforço pessoal muito grande para resistir a esta pressão que é feita diariamente contra o Ministério da Qualidade de Vida e contra os seus agentes, sem disparar de vez em quando.

É preciso uma obra de paciência muito grande e de autodomínio para não sair à praça pública e dizer de uma vez para sempre tudo quanto se passa em relação à politica de ambiente em Portugal. Pelo contrário, é preciso ter um certo sentido de auto-sacrifício, de vocação e de conversão. Quer isto dizer, que temos de converter a mentalidade política a uma política de ambiente em Portugal.

Finalmente, peço-lhes desculpa por este sermão, mas como apanhei com um não podia deixar de responder com outro.

Contudo, devo ainda dizer que nas propostas que os Srs. Deputados me fizeram há uma que me cala muito fundo, até porque gosto muito desta dos 25 000 contos para a defesa da frente das praias naturais da Costa da Caparica. Além disso, devo dizer como anotação, que sob o ponto de vista de poluição de águas, estas são as melhores praias que temos no País, ainda.

Sob o ponto de vista de urbanização geral da Caparica e, portanto, de defesa de toda aquela região, vai ser agora posta a funcionar a Comissão da Arriba Fóssil da Caparica, região esta que é a segunda área de paisagem paisagística de área protegida que temos, ou seja, a primeira é Sintra-Cascais e a segunda é a Costa da Caparica.

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Em suma, nós vamos implementar isso em estreita ligação com a autarquia de Almada e com a autarquia de Sintra. Sobre esse aspecto pode estar descansado e penso que mesmo sem dotação nenhuma especial para isso, o Ministério da Qualidade de Vida vai desencadear as necessárias acções nesse sentido. Aliás, já está nomeado um responsável, que é o arquitecto Hugo Raposo que vai presidir a essa Comissão.

Resta-me agradecer as boas intenções e quem me dera que isto fosse verdade. Esta é a única coisa que poderia desejar.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos, que há pouco estava ausente da sala, a quem peço que bem como ao Sr. Ministro e aos Srs. Secretários de Estado, que se esforçassem pela síntese, de forma a sermos capazes de terminar a nossa sessão de trabalho, dentro da hora regimental.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): — Sr. Presidente, com certeza que seguirei o seu apelo.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penso que neste momento já estarão criadas condições para que o Sr. Secretário de Estado dos Desportos me dê uma resposta mais global e mais cabal a uma questão que há pouco coloquei ao Sr. Ministro e que, provavelmente, por não ter todos os elementos, não respondeu.

A questão tinha a ver com uma verba que está inscrita no orçamento do Ministério da Qualidade de Vida, designadamente a que advém das contas de ordem em Fundo de Fomento do Desporto, no sentido de, estando previstos cerca de 410 265 contos para entidades particulares, se seria possível dar-nos — ainda que não de maneira exaustiva — os critérios com que esta verba irá ser distribuída. Por outro lado, pergunto se o Sr. Secretário de Estado concordava com algo com que o Sr. Ministro já se mostrou a favor, no sentido de que na atribuição desta verba fosse seguido um conjunto de critérios que nós apresentámos em propostas de alteração, designadamente, o fomento do desporto escolar, o fomento das actividades de carácter desportivo e acções de apoio à formação e actividade de novos clubes e ao associativismo, e ainda a comparticipação em termos de fundo de fomento do desporto no plano de emergência de construção de instalações gim-nodespoctivas nos estabelecimentos de ensino, preparatório e secundário.

O Sr. Secretário de Estado certamente compreenderá este nosso ponto de vista, pela seguinte razão: nós temos assistido com alguma consternação a que quem. manda mais em termos desportivos é a Secretaria dè Estado das Obras Públicas e não a Secretaria de Estado dos Desportos. Neste sentido foi com alguma consternação que verificámos que o Sr. ...

O Sr. Secretário de Estado dos Desportos: — Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: — Com certeza, Sr. Secretário de Estado.

O Sr. Secretário de Estado dos Desportos: —

Sr. Deputado, ainda há pouco tempo estive a falar sobre isso tudo, só que penso que na altura V. Ex.a não estava na sala.

O Orador: — Certo, Sr. Secretário de Estado, tentarei depois obter informações. De qualquer modo creio

que este dado teria interesse que ficasse registado, porque quando se verifica que há uma determinação governamental de suspensão das instalações gimnodespor-tivas nas construções escolares ou escolas do ensino básico e do secundário, verifica-se por outro lado que há um Secretário de Estado das Obras Públicas que anuncia para este ano de 1985, 1 680 000 contos para construções e apoio a construções de instalações desportivas.

Pergunto, pois, a este propósito, se não há nada a dizer sobre isto, e até que ponto é que uma Secretaria de Estado das Obras Públicas é ou não a definidora da política desportiva no nosso país, e se não competirá também em termos de o Sr. Secretário dos Desportos dizer qualquer coisa sobre isso.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Dá-me licença, Sr. Deputado?

O Orador: — Com certeza, Sr. Ministro.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sr. Deputado, já tive ocasião de dizer há pouco a frase mais dura que podia dizer a esse respeito, ou seja, o Ministério da Qualidade de Vida discorda em absoluto que qualquer política de auxílio ao desporto seja prosseguida por uma entidade pública que não seja o Ministério responsável pelos desportos. Aliás, também já tive ocasião de o afirmar publicamente na imprensa. Portanto, a posição do Ministério da Qualidade de Vida nessa matéria é perfeitamente clara, nada tem a ver com a política ou não política que é prosseguida, em relação às grandes agremiações desportivas ou seja o que for, pelo Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas. Inclusivamente, o meu Ministério repudia essa política. Não posso ser mais claro nem ir mais longe, mas creio que os Srs. Deputados deviam colocar esse problema ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento e ao Sr. Secretário de Estado das Obras Públicas e não a mim. Deviam perguntar, como é que é possível ...

O Orador: — Sr. Ministro, se me permite, V. Ex." não me deixou terminar há pouco a minha intervenção. De qualquer maneira, eu próprio e a minha bancada folgamos com a posição do Sr. Ministro e do Sr. Secretário de Estado dos Desportos.

Voltamos, contudo, a reafirmar aquilo que há pouco dissemos, ou seja, é extremamente difícil, como compreenderão, para nós, depuiados, podermos definir grandes parâmetros do Orçamento, quando é a própria equipa governamental que parece não se entender com respeito a questões tão essenciais como esta.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sr. Deputado, não se trata de uma questão de entendimento, é que desconhece...

O Orador: — Desculpe, Sr. Ministro, trata-se de uma questão de falta de entendimento, pois se assim não fosse, certamente tinham delimitado perfeitamente as competências. Contudo, essas questões serão colocadas em sede própria.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Barral.

O Sr. Paulo Barral (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados. Tenho pena que este debate não tenha tido lu-

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gar em sede de Plenário e que se esteja a desenvolver em sede de Comissão...

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Eu também tenho pena!

O Orador: — Mas, Sr. Ministro, é importante, mesmo assim, que ele tenha sucedido porque esta Comissão tem o privilégio de ver registada em acta todas as nossas intervenções.

É nosso pensamento que a política de ambiente é um imperativo do Estado moderno, tal como a política cultural, a política de tempos livres e de desporto e até a política de regionalização.

O reforço da política do ambiente, nos dias de hoje, longe de constituir uma despesa supérflua, como alguns pretendem, é uma economia que tem repercussões no futuro. Repudiamos, por isso — e é pena que não esteja aqui o Sr. Deputado Bagão Félix —, que seja associado ao Ministério da Qualidade de Vida a designação de lobby ao nível da governação do Estado. Quando muito, poderá ser um bastião contra os lobbys que pretendem continuar a degradar a vida dos portugueses. Nessa medida o PS e, nomeadamente, a sua componente mais jovem, exigem que a política de ambiente continue na preocupação de qualquer governo em que o PS participe.

O Estado moderno impõe, como disse, que a sua administração esteja virada para o futuro e não para o passado. Mesmo em crise económica e financeira não pode haver lugar a atitudes discricionárias que não tenham em conta o quadro em que se deve viver, com um ambiente recuperado, um ambiente saudável.

Hoje, tanto ou mais que proteger o ambiente, há que recuperar o que está ou foi degradado. Julgo que não é dispiciendo notar-se que, a manter-se a degradação do ambiente, o próprio turismo, que é uma área que tem uma charneira muito próxima com a qualidade do ambiente e que tantos defendem, entrará em crise, porque ninguém acreditará — quem quer que seja — que estrangeiros venham a Portugal passar os seus tempos livres em zonas onde poderão estar sujeitos a surtos epidêmicos, próprios mais dos países subdesenvolvidos do que de um pais que se pretende moderno.

Sr. Ministro, queria dizer-lhe que a política da qualidade de vida para o PS, longe de se ver constrangida, deverá ser desenvolvida e mais interveniente. Assim, fazemos votos para que a nova geração de políticos que entrarem na nossa cena da administração, tenham isso em conta, como nós esperamos que virão a ter.

Finalmente, Sr. Ministro, queria colocar-lhe uma questão pontual, uma vez que estamos em fase ainda de pedidos de esclarecimento e que diz respeito concretamente a uma área que o Sr. Ministro bem conhece, até porque foi deputado por essa área, aliás, como também eu sou neste momento. Assim, perguntava-lhe se o Ministério da Qualidade de Vida tem presente que é preciso fazer o acompanhamento do processo de extracção de mármores na zona dos mármores. É que o que se tem assistido é à instituição de um conjunto de crateras que ficam abandonadas, constituindo zonas de águas paradas com perigos iminentes para as populações, que residem nessa zona.

Gostaria, pois, Sr. Ministro, de colocar-lhe esta pergunta, ao mesmo tempo que queria dizer-lhe que, pela minha parte, estou perfeitamente de acordo com a posição que tem tomado, porque o nosso país precisa de conflitos deste tipo e não de outro qualquer.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Sr. Presidente, Srs. Deputados, apenas responderá o Sr. Secretário de Estado do Ambiente, porque esta questão dos mármores que o Sr. Deputado levantou é por ele bem conhecida, aliás bem melhor do que eu. Além disso, o Sr. Secretário também queria responder à questão da lagoa de Óbidos, a qual foi também tratada pessoalmente por ele. Daí o poder responder melhor que eu.

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quanto ao caso da lagoa de Óbidos, o que aconteceu foi que a determinado momento histórico havia na lagoa equipas do nosso Ministério, na altura ainda não da Qualidade de Vida, e equipas de outros ministérios. Ora, como isso causava perturbações e o entendimento não era fácil, houve acordo no sentido de uma das equipas abandonar, havendo assim uma espécie de partilha de terreno de actuação. Portanto, se a íagoa de Óbidos neste momento não está bem, a única responsabilidade que o Ministério terá é a de ter aceite retirar-se, o que não quer dizer que pudesse ter trazido grandes soluções, como decorre de toda esta discussão aqui ao longo da tarde.

Em suma, nós afastámo-nos por acordo com os Serviços Hidráulicos, que ficaram a tomar conta da lagoa de Óbidos. No entanto, penso que o problema tem que ser reequacionado no contexto da política da água que o Sr. Ministro aqui referiu. Falarmos nos rios, nas lagoas e nas pedreiras é sempre o mesmo problema, caímos sempre na mesma impossibilidade. E que não se pode pegar no novelo apenas pela ponta, tem que se pegar no novelo pela ponta para se poder resolver essa questão da meada que é o problema da gestão da água em Portugal, em todos os seus aspectos.

No que diz respeito à questão que o Sr. Deputado Paulo Barral colocou, devo dizer que temos preparado, e nisso temos trabalhado, indo mesmo apresentar nos próximos dias ao Sr. Ministro, um projecto de decreto--lei sobre o arranjo das pedreiras, ou seja, utilização e arranjo posterior das mesmas. Evidentemente que isso, no fundo, tem que ver com a utilização de inertes e outras actuações desse género, por forma a que essas utilizações não venham a provocar, como referiu, danos maiores no ambiente.

Em suma, esse projecto de decreto-lei está, digamos, ultimado, irei apresentá-lo ao Sr. Ministro para depois levar a Conselho de Ministros, proximamente.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Barral.

O Sr. Paulo Barral (PS): — Sr. Presidente, apenas para perguntar ao Sr. Secretário de Estado se tem conhecimento de um estudo levado a cabo pela Comissão de Coordenação da Região do Alentejo, sobre o rectângulo dos mármores, em que se apontam medidas concretas e inclusivamente com ligação própria às explorações que estão em curso?

O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Sr. Deputado, pessoalmente não tenho conhecimento do referido estudo.

O Orador: — Então, Sr. Secretário de Estado, terei muito prazer em enviar-lho.

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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Joaquim Miranda.

O Sr. Joaquim Miranda (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Apenas queria colocar uma questão que fosse um pouco ao conjunto e perguntas que têm vindo a ser colocadas. De qualquer maneira, essas mesmas questões suscitaram a minha presente dúvida.

Assim, dá-me ideia que — e até pelo que o Sr. Ministro disse e pelo conhecimento que temos da actuação do Ministério — podemos dividir a sua actuação no campo ambiental em dois aspectos.

Por um lado, tendo em vista a recuperação de situações que hoje se encontram já degradadas ou fortemente degradadas, mas por outro lado também no sentido de prevenção em relação a determinados tipos de situações que hoje poderão não estar em situação crítica, mas a ela chegarão no futuro.

Por outro lado, porque se colocou a questão dos recursos hídricos e a questão da água foi também aqui colocada e porque o Sr. Ministro falou na questão das sanções a indústrias poluidoras, suscitou-se um outro problema, o qual é hoje, segundo penso, da maior gravidade no País e que ainda aqui não foi abordado. Assim, gostaria que o Sr. Ministro lhe dedicasse alguma atenção ou pelo menos alguns momentos, ainda que breves. Tem a ver com a situação da eucaliptização no nosso país.

Nós conhecemos o que tem vindo a acontecer, a política que tem vindo a ser prosseguida, conhecemos os efeitos dessas indústrias altamente poluidoras e até sabemos porque determinados países não querem a instalação desse tipo de indústrias. Conhecemos também as reacções das autarquias, das populações em relação a essa eucaliptização, pelos efeitos que ela tem, naturalmente, sobre a qualidade de vida das próprias populações, nomeadamente, pela falta de água que determina a pequenas populações, pelo que tem a ver com questões de produção com a iluminação mesmo de determinado tipo de arvoredo que é tradicional em determinadas áreas e que desaparece, em detrimento desta florestação para fins industriais.

O Sr. Ministro tem conhecimento, certamente, do que significa no Ministério da Agricultura a verba para eucaliptização, neste momento, que é uma verba assustadora. Diria mesmo — aliás nós já colocámos isto de uma forma mais detalhada em Plenário e em sede do Ministério da Agricultura — que a questão que se coloca é a de como se torna possível falar em política de ambiente, política de qualidade de vida quando verificamos que há ministérios cuja acção primordial é virada precisamente para a implementação deste tipo de cultura, ou seja, eucaliptização em massa com todas as consequências que daí advêm.

Em suma, a questão é saber como compatibilizamos um mesmo Governo com um Ministério da Qualidade de Vida que pretende a defesa do ambiente e a não degradação das condições de vida das populações, quando vemos que um outro Ministério com competência significativa, o da Agricultura, tem como acção primordial o desenvolvimento de uma actividade económica como esta. Assim a questão que lhe coloco, em termos orçamentais, é a seguinte: que estudos existem no Ministério da Qualidade de Vida em relação ao impacto desta questão? Que estudos podem vir a ser feitos? Há verbas para poder ser analisado com realismo o impacte desta política, no sentido de a combater tanto quanto possível?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Belchior Pereira.

O Sr. Belchior Pereira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de apresentar 2 propostas de alteração. Uma delas é relativa ao Gabinete de Defesa do Consumidor e a outra ao Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

Consideramos que qualquer destas entidades pode e deve ter um papel extramamente importante na defesa do consumidor. Consideramos também que as verbas inscritas no Orçamento são claramente insuficientes para que estes dois departamentos possam responder eficaz e atempadamente às questões que diariamente se estão a colocar na esfera de defesa do consumidor.

Todos sabemos que a qualidade de muitos dos produtos que diariamente consumimos está extremamente degradada. Todos sabemos que diariamente pagamos produtos por 10 quando devíamos pagar 7 ou 8. Neste contexto, estes 2 departamentos podem e devem ter uma intervenção muito eficaz na defesa do consumidor.

Por isso, propomos um reforço de verba para o Gabinete de Defesa do Consumidor no valor de 18 SOO contos e para o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor também propomos um reforço de verba de 24 000 contos. Aliás, os Srs. Deputados têm presente estas propostas e, portanto, já tiveram antecipadamente conhecimento delas.

Temos uma outra proposta de alteração, que retira 10 000 contos à Secretaria-Geral e acrescenta essa mesma quantia ao Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

Creio que as propostas que apresentamos são muito mais correctas e justas, visto que se traduzem num aumento de reforço de verbas, pois aumentam a eficácia destes dois departamentos. Quanto a nós, o facto de se retirar 10 000 contos à Secretaria-Geral pode eventualmente vir a criar-lhe problemas, nomeadamente no pagamento de salários.

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Barbosa.

O Sr. Telmo Barbosa (PSD): — Sr. Ministro, nesta rubrica do saneamento básico V. Ex.a incluiu exclusivamente a água, os esgotos domésticos, os esgotos industriais e os lixos.

Devo, pois, dizer-lhe, Sr. Ministro, que concordo em absoluto com aquilo que V. Ex." considera de política geral de saneamento básico. Porém, o meu receio é que V. Ex." tenha muita dificuldade em realizar o seu esquema. Hoje a água e tudo o que com ela está relacionado não tem qualquer espécie de coordenação. A coordenação que havia há alguns anos — embora muito ténue — sempre era alguma porque, por um lado, as obras eram realizadas pela direcçâo-geral do antigo Ministério das Obras Públicas e, por outro lado, havia as comparticipações para as câmaras municipais. Assim, embora de uma forma muito defeituosa, o Estado conseguia um mínimo de coordenação.

Porém, o nosso país — e felizmente — está a sofrer profundas alterações, nomeadamente com a descentralização. Já aqui foi referido o caso da Direcção-Geral do Saneamento Básico, que hoje presta um serviço ao País que é extraordinariamente reduzido, com núcleos em quase todas as sedes de distrito.

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Por outro lado, há outras entidades que não foram aqui referidas, como é o caso da EDP, que tem muitas intervenções nos rios.

As questões que gostaria de colocar ao Sr. Ministro são as seguintes: julgo que num dos últimos conselhos de ministros foi criado um grupo de trabalho ou uma comissão com a finalidade de estudar a extinção de algumas direcções-gerais. Naturalmente que os quadros — e refiro-me, nomeadamente, à Direcção-Geral do Saneamento Básico, técnicos de muita qualidade que lá existem e que sempre trabalharam em águas de esgoto e com uma vida profissional atrás deles de algumas dezenas de anos — irão reforçar aqueles que V. Ex.a pretende, no seu Ministério.

A pergunta que lhe queria fazer era a seguinte: acredita que do trabalho desse grupo ou dessa comissão vai resultar qualquer coisa para a política de saneamento básico do Pais?

Outra questão que lhe punha relaciona-se com a descentralização, nos poderes que hoje — e bem — as autarquias dispõem. O Sr. Ministro não considera que para a sua actividade necessita também de se desconcentrar?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.

O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro, que possibilidades tem o Ministério da Qualidade de Vida de intervir num problema extremamente sério que é o dos depósitos radioactivos, em águas perto das nossas águas territoriais, nomeadamente ao largo dos Açores e de Vigo?

O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro da Qualidade de Vida.

O Sr. Ministro da Qualidade de Vida: — Quanto à eucaliptização, não é justo que não lhe tenha dado atenção! Já várias vezes me referi ao problema, e exactamente nesse discurso que proferi diante do Sr. Presidente da República, no Dia Nacional da Água, referi--me à questão da eucaliptação como um dos problemas graves.

Simplesmente, os Srs. Deputados compreendem que com a pobreza de meios técnicos e financeiros de que disponho não posso atacar todos os problemas ao mesmo tempo.

Por outro lado, também aí se move uma teia de interesses colossal. Não é que tenha medo de lhe fazer frente, mas é uma questão de seriação dos problemas. Além disso, não me sinto neste momento capacitado tecnicamente para examinar cabalmente o problema dos eucaliptos. Os Srs. Deputados sabem que, neste momento, desenvolve-se uma escola intensa — fundamentalmente financiada pelas próprias indústrias de celulose — que sustenta que não há malefícios nenhuns no eucalipto, que não há esgotamento dos lençóis hídricos, que não há esgotamento da terra, que o eucalipto até serve para renovação, que já se têm feito experiências em terras onde houve eucalipto e que dão sementeiras esplêndidas, etc.

Na minha magra esfera de actuação, apenas pude fazer isto: contratei um professor de Agronomia — que não vale a pena dizer o nome, mas que penso que é o melhor técnico que temos de eucaliptos — para fazer um estudo, pago pelo Ministério da Qualidade de Vida, e tentar equacionar séria e cientificamente o problema

dos eucaliptos e dizer ao País a verdade sobre o problema, sem tomar eu nenhuma posição.

Pelo contrário, tenho procurado fazer o seguinte: convidar o Sr. Ministro da Agricultura para um debate sobre o problema dos eucaliptos, um debate de Governo sobre o problema da eucaliptação.

Não posso, por enquanto, de maneira nenhuma, ir mais longe. Não estou habilitado, nem sequer com os meios técnicos que me permitam ir na afirmação

— quanto à política do eucalipto —, mais longe do que aquilo que tenho ido. Já chamei a atenção publicamente que estávamos, possivelmente — a ser verdade tudo quanto se faz de crítica em relação ao eucalipto —, a devorar a terra dos nossos filhos e netos. Estamos a destruir, possivelmente, o País ou a iniciar um processo grave de desertificação.

Preciso, neste momento, do sustentáculo técnico para insistir nesta tecla. Só depois poderei travar uma batalha pública, com o mínimo de autoridade com que agora, por exemplo, trato da água, porque ai já estou fortificado, não só por uma observação pessoal, como até devido ao suporte técnico que possuo para isso.

Quanto à questão da defesa do consumidor, diria que a Direcção-Geral de Defesa do Consumidor, chamada impropriamente Gabinete de Defesa do Consumidor, funciona bastante bem.

Mais uma vez aqui o problema talvez não seja o da ampliação de serviços, nem de mais dinheiro, pois nem tudo se resolve com dinheiro, nem com ampliação de serviços, solucionando-se muitas vezes com atribuições legais que não tenho.

O problema da qualidade dos produtos em Portugal continua falseado por depender da Direcção-Geral de Qualidade do Ministério da Indústria, da Direcção--Geral dos Produtos Agrícolas e não sei quê... Portanto, aí é que nós encontramos a barreira. Além disso, verifica-se também a oposição da Direcção-Geral do Comércio.

Quer dizer, nós encontramos a barreira à nossa acção por parte dos comerciantes, que defendem os seus interesses; pela indústria, que zela pelos interesses dos industriais; pelo Ministério da Agricultura ou a direcção-geral do Ministério da Agricultura, que protege os interesses dos lavradores, restando o Ministério da Qualidade de Vida, que luta contra 3 potentados, ou seja, o comércio, a indústria e a agricultura, a fim de poder impor a defesa do consumidor. Portanto, trata-se de um problema legal e não de dinheiro, porque a nossa Direcção-Geral do Consumidor, isto é, o Gabinete de Defesa do Consumidor, funciona até bem.

Portanto, se estas propostas fossem minimamente aceitáveis até, talvez, agradecesse o não aumento de verba para a Direcção-Geral de Defesa do Consumidor, pois penso que não seria preciso.

Quanto ao Instituto de Defesa do Consumidor, penso

— e aqui talvez discorde um pouco dos Srs. Deputados — que há uma certa duplicação entre as atribuições do Gabinete de Defesa do Consumidor e do Instituto de Defesa do Consumidor.

Acontece que com a maior boa vontade a Assembleia da República criou um organismo, talvez um pouco vistoso no nome, que não consegue ir muito mais longe na sua actuação, nem ter muito mais efeitos práticos do que possui a própria direcção-geral, que é vocacionada para isso, isto é, o Gabinete de Defesa do Consumidor. Ora, tal organismo gasta praticamente

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3 vezes mais do que a Direcção-Geral de Defesa do Consumidor.

Assim, proponho-me a ver o estatuto do Instituto de Defesa do Consumidor. Sei que alguns dos Srs. Deputados pertencem até ao conselho geral do referido Instituto. Não quero prejudicar a vossa actuação e, tanto quanto possível, gosto de colaborar o mais que puder com a Assembleia da República.

Por isso, muito embora ache injusto que um Ministério tão «magro» e tão carecido de verbas tenha ainda de suportar o peso de um organismo exógeno, isto é, criado pela Assembleia da República e «atirado para as costas» do Ministério mais pobre que nós temos, quando devia ter preconizado uma dotação diferente.

Risos.

Não quero, por uma questão inclusivamente de amizade e respeito pelos deputados com quem estou a dialogar, prejudicar completamente essa actuação. De maneira que estaria disposto a aceitar a segunda proposta e por uma única razão. Estou a referir-me àquela de que falaram, baseada na transferência de 10 000 contos da Secretaria-Geral para o Instituto de Defesa do Consumidor e aceitaria porque sei que o mês de Janeiro está «perdido» na questão dos quadros e, como os Srs. Deputados sabem, quero defender nem que seja a «tiro» o problema da verba da Secretaria-Geral ...

Risos.

Desculpem a vivacidade da expressão!

Ora, tal verba é aquela que me dá autoridade para falar como fiz quando estava aqui há bocado o Sr. Secretário de Estado do Orçamento. Na verdade, afirmo peremptoriamente que o Sr. Secretário de Estado deu uma informação que não corresponde à verdade e sem fundamento algum para retardar a aprovação dos quadros, porque o dinheiro está já todo orçamentado e na Secretaria-Geral.

Estou pronto para fazer face à implementação de todos os quadros sem uma única excepção, abrangendo as mulheres de limpeza, contínuos, chauffeurs, etc. De forma que o argumento de que aquilo vai causar um aumento de despesa ao Estado é falso. O argumento de que há uma implementação de quadros é, do mesmo modo, não verdadeiro. O único argumento verídico é político, mas não se pode dizer, pois corresponde a uma corrente que não quer que exista o Ministério da Qualidade de Vida. É a única explicação que posso ver, sendo uma obstinação que dura há 4 anos e à qual foi retirada completamente qualquer razão lógica, na medida em que fiz o sacrifício dos quadros implementei-o dentro do orçamento que deram e criei a verba na Secretaria-Geral para pagar tudo. Neste momento não existe argumento possível por pane do Ministério das Finanças.

Sem sacrifício deste princípio, porque uma vez que já praticamente estão perdidos os meses de Janeiro e Fevereiro, não me importo de transferir 10 000 contos da Secretaria-Geral para o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

Como digo, isto é para ser simpático para com a Assembleia da República, não que esteja profundamente aderente a essa transferência porque de facto custa, num Ministério em que falta dinheiro praticamente para tudo, transferir 10 000 contos para uma instituição que acho ser tangente ao Ministério, mas que não devia pesar sobre ele, visto ser um organismo exógeno, que não

faz parte da nossa identidade. Contudo, atendendo à solicitação, aceito a proposta de transferência da verba de 10 000 contos da Secretaria-Geral para o Instituto Nacional de Defesa do Consumidor.

Quanto ao problema que me foi colocado relativamente ao saneamento, gostaria de referir o seguinte: não quereria jamais desmembrar a unidade de trabalho e a unidade científica que, apesar de tudo, constitui o saneamento básico. O que entendo é que a Direcção-Geral do Saneamento Básico não tem nada que estar colocada no Ministério do Equipamento Social. É um absurdo. Deve antes estar exactamente no Ministério que tem a preocupação do saneamento e, portanto, da defesa da qualidade de vida. De maneira que aqui se deveria dar uma transferência de serviços.

Se os Srs. Deputados quiserem saber o meu pensamento total sobre esta questão do Ministério da Qualidade de Vida, digo: entendo que o Ministério da Qualidade de Vida deveria ser estruturado como ministério profundamente homogéneo, e faltam-lhe elementos fundamentais, tais como o saneamento básico e os serviços de hidrologia da Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos — não esta Direcção-Geral toda, mas os seus serviços de hidrologia. Faltam-lhe os auxiliares de sanidade que andam aos caídos no Ministério da Saúde, os quais seriam um complemento para a situação do Ministério da Qualidade de Vida. Esbarramos, inclusivamente, com o pequeno problema como é o da pessoa que escreve para o Ministério e diz: «O meu vizinho abriu uma fossa debaixo das minhas janelas. O que hei-de fazer?» Eu é que não sei o que hei-de fazer. Remeto o assunto para o Ministério do Equipamento Social, que nada resolve, ou ainda para o Ministério da Administração Interna, que também o não resolve. O Ministério da Qualidade de Vida não tem o serviço técnico operacional que lhe permita intervir imediatamente nesse assunto, proibir a fossa, mandá-la fechar, etc. Este ou o caso do vizinho que abriu o galinheiro debaixo da janela do quarto, são fenómenos que dizem respeito à vida do povo, por quem ninguém se interessa e que são altamente ponderáveis. A actuação de um ministério vivo nesse campo poderia ser extraordinariamente sentida por toda a população porque são pequenas melhorias que são extremamente importantes.

No que jespeita à transferência desses serviços não existe oposição por parte do Sr. Ministro da Saúde, que é uma pessoa que compreende, de certa maneira, as necessidades do Ministério da Qualidade de Vida, peio que estaria disposto a realizar a referida transferência. Mas tudo isto depende da possibilidade de continuação ou não do Ministério. E sobre esse aspecto sei tanto como os Srs. Deputados. Sei o que dizem os jornais, o que diz o Sr. Nuno Rocha, a Sr.8 D. Margarida Borges Carvalho. Mas tirando isso não sei mais nada. Mas, como mesmo esses são inimigos jurados do Ministério, também não me fio muito no que dizem.

Risos.

Outro serviço que penso que criaria homogeneidade neste ministério, tornando simultaneamente homogéneo um outro Ministério, seria a Secretaria de Estado do Desenvolvimento Regional. Aqui, sim, atingiríamos a síntese perfeita da nossa natureza e da nossa vocação, que seria o juntar o desenvolvimento regional com o ordenamento. São duas coisas que não devem estar separadas, nem devem estar de costas viradas uma para

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a outra. Não faz sentido que o desenvolvimento regional esteja no «ministério das polícias», porque o Ministério da Administração Interna há-de ser sempre o «ministério das polícias», da ordem pública das polícias. O desenvolvimento regional é algo extremamente delicado, que devia estar integrado num ministério vocacionado para isso.

Custar-me-ia imenso, sentimentalmente, separar-me do meu amigo Miranda Calha, mas penso que, num ministério integrado desta maneira — que se poderia chamar «ministério do desenvolvimento regional e ambiente» — não teriam lugar os desportos, que integrariam, talvez mais adequadamente, uma secretaria de Estado do Ministério da Educação.

Na minha arquitectura política, penso que isto é que seria um ministério interveniente, forte e com razão de ser.

Quanto à última questão — a questão dos acordos internacionais com a Espanha sobre os rios —, devo dizer que, neste ponto, estamos no zero absoluto. Como os Srs. Deputados sabem, os únicos acordos que temos com a Espanha em matéria de rios são os acordos de aproveitamento hidroeléctrico dos troços internacionais. Fora disso não há nada. Não temos qualquer garantia de caudal, nem de qualidade das águas de nenhum rio.

Penso que talvez a entrada de Portugal na CEE, na medida em que esta obriga todos os países intervenientes a obedecerem às normas sobre a questão de poluição de rios internacionais, nos possa auxiliar um pouco nesta matéria.

Em todo o caso, devo dizer que o Ministério já fez uma diligência nesse sentido. No princípio de Dezembro estavam projectadas umas conferências internacionais entre Portugal e Espanha, de cuja agenda constavam mais ou menos 5 pontos, um dos quais era precisamente a questão dos acordos sobre os rios.

Quando tomei conhecimento disto, telefonei ao Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros e disse-lhe que entendia que o Ministro da Qualidade de Vida devia fazer parte da delegação portuguesa que iria participar nesses debates sobre os acordos dos rios. O Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros reconheceu imediatamente a justiça da minha posição e oficiou para o nosso embaixador em Madrid, a fim de incluir o Ministro da Qualidade de Vida na delegação portuguesa para as conferências com a Espanha.

A resposta espanhola foi negativa. E foi negativa com uma dupla característica muito curiosa. A primeira está relativamente certa: «Não temos ministro equivalente.» A segunda foi esta: «Sempre tratámos da questão dos rios com a Direcção-Geral de Hidráulica e gostaríamos de continuar a fazê-lo.»

Risos.

Evidentemente que continuo a insistir porque entendo que esta política internacional dos rios, na medida em que somos um país a jusante, é fundamental para nós; 5 dos nossos maiores rios têm metade ou mais de metade do curso em Espanha.

É para nós fundamental fazermos uma política [...]

Pausa.

O Sr. Secretário de Estado dos Desportos está aqui a dizer «Educação, não!»

Risos.

Respeitarei a sua opinião, Sr. Secretário de Estado. Risos.

Agradeço a paciência com que me têm estado a ouvir e gostei muito desta troca de impressões. 0$ Srs. Deputados ficaram a conhecer fundamentalmente os problemas básicos do Ministério da Qualidade de Vida.

A única coisa que lhes quero pedir, para fechar este debate, é que me auxiliem, não por mim, porque como disse a minha passagem é perfeitamente breve — é uma questão de meses —, mas porque estou a tentar abrir caminho para quem vier depois, para que, efectivamente, possa haver uma política real de ambiente em Portugal.

Por isso, acho fundamental que não se extinga o Ministério da Qualidade de Vida, porque senão esses interesses serão dispersos por toda a parte e ninguém tratará deles. Por outro lado, penso que devemos forçar a sua possibilidade de actuação, pelo menos, este ano, porque em 1985 não há mais nada a fazer senão a aprovação dos quadros e a utilização ao máximo das verbas do Orçamento que nos foram destinadas.

O Sr. Presidente: — Agradeço ao Sr. Ministro da Qualidade de Vida e aos Srs. Secretários de Estado dos Desportos e do Ambiente a vossa presença aqui nesta Comissão e< os esclarecimentos que nos proporcionaram.

Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 20 horas e 35 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados:

Telmo da Silva Barbosa (PSD).

Almerindo da Silva Marques (PS).

Octávio Augusto Teixeira (PCP).

Alberto Manuel Avelino (PS).

Américo Albino da Silva Salteiro (PS).

António Domingues de Azevedo (PS).

António Jorge Duarte Rebelo de Sousa (PS).

António José dos Santos Meira (PS).

Hermínio Martins de Oliveira (PS).

José António Borja dos Reis Borges (PS).

José Carlos Pinto da Mota Torres (PS).

Leonel de Sousa Fadigas (PS).

Luís Silvério Gonçalves Saias (PS).

Maria Luísa Banha Modas Daniel (PS).

Paulo Manuel de Barros Barral (PS).

António Joaquim Bastos Marques Mendes (PSD).

Guido Orlando de Freitas Rodrigues (PSD).

José Silva Domingos (PSD).

Manuel Maria Portugal da Fonseca (PSD).

Cecília Pita Catarino (PSD).

José Adriano Gago Vitorino (PSD).

Francisco Manuel Costa Fernandes (PCP).

Belchior Alves Pereira (PCP).

João Carlos Abrantes PCP).

Joaquim António Miranda da Silva (PCP).

Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP).

Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP).

António Anselmo Aníbal (PCP).

António Bagão Félix (CDS).

João Gomes de Abreu Lima (CDS).

João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).

Raul Fernandes de Morais e Castro (MDP/CDE).

Joel Eduardo Hasse Ferreira (UEDS).

Joaquim Jorge Magalhães Mota (ASDI).

Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).

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