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II Série — Número 51
Quinta-feira, 7 de Fevereiro de 1985
DIÁRIO
da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
SUMÁRIO
ACTA DA REUNIÃO DA COMISSÃO DE ECONOMIA, FINANÇAS E PLANO DE 6 DE FEVEREIRO DE 1985
O Sr. Presidente (Joaquim Miranda): — Srs. Deputados, temos quórum pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, de acordo com a metodologia dos trabalhos, vamos agora discutir o orçamento do Ministério do Mar.
Começaria por perguntar ao Sr. Ministro se prefere fazer primeiro uma exposição ou colocar-se, desde já, à disposição dos Srs. Deputados para questões que lhe queiram formular.
O Sr. Ministro do Mar (Carlos Melancia): — Sr. Presidente, caso estivessem todos de acordo e para poder centrar mais a intervenção ou o tempo no esclarecimento dos problemas, reservar-me-ia para dar os esclarecimentos às perguntas que merecessem uma resposta mais alongada, de modo a explicar melhor o enquadramento. Em vez de fazer uma exposição em vazio, aproveitaria as perguntas para melhores esclarecimentos..
No entanto, permito-me dar agora, de entrada, uma pequena informação relativamente a uma dúvida levantada creio que na Comissão do Equipamento Social, quanto ao orçamento de despesas do Ministério. Na rubrica da «Direcção-Geral de Portos», do orçamento de despesas correntes do Ministério, há um salto em relação ao orçamento do ano passado, maior do que é normal. Queria dizer-lhes que isso decorre do facto de, em termos orçamentais, se ter decidido incluir, no orçamento de despesas correntes, uma verba de 184 500 contos que, de uma maneira genérica, era tratada no PIDDAC como investimento, visto não ser consignada a nenhum projecto de investimento. São despesas preparatórias para o lançamento de investimentos que desta vez saíram do PIDDAC e se meteram no orçamento de despesas correntes, portanto, no salto existente entre despesas do ano de 1984 para o ano de 1985 há, pelo menos, uma verba que não pode ser considerada como um diferencial — é qualitativamente diferente, não é um aumento de despesas da Direccão-Geral de Portos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, procurarei ser directo e não muito longo nas questões que lhe pretendo colocar, algumas delas respeitantes ao Algarve.
Começaria por pedir esclarecimentos sobre o que está previsto quanto a algumas obras portuárias que, no Algarve, se têm vindo a arrastar e outras que reclamam melhorias.
Relativamente ao porto de Faro apresentei um requerimento aqui, na Assembleia da República, na semana passada, dado que o assoreamento progressivo tem provocado problemas, sendo o mais grave — o Sr. Ministro já tem disso conhecimento — a recente redução da dimensão dos barcos autorizados a entrar no porto, a qual passou de 140 m para 110 m, daqui resultando que, muitos barcos, designadamente com carregamentos de madeira, não podem entrar tendo de descarregar em Portimão, o que, por carregamento, implica, por exemplo, para uma fábrica de transformação de madeira existente em Faro, um acréscimo de custos na ordem dos 6000 contos.
Trata-se de uma situação complicada. Sei que o Ministério está a tratar do assunto mas, de qualquer forma, conviria que o Sr. Ministro dissesse, por um lado, qual o ponto da situação e, por outro, quais as obras em matéria de dragagem e de apetrechamento do porto — praticamente não existe, há apenas um pequeno cais —, prolongamento do cais e também de infra-estruturas de terra.
Quanto ao porto da Baleeira, em Sagres, a segunda fase das obras não tem avançado, designadamente no que respeita à lota nova, aos armazéns, aos edifícios da administração e também toda a parte de infra--estruturas — água, energia eléctrica, etc.
Quanto ao porto e à barra de Vila Real de Santo António, o assoreamento é extremamente perigoso — também quanto a isto já apresentei um requerimento na Assembleia da República —, condicionando muito a hora e as condições de entrada na barra, entradas estas que por vezes são perigosas.
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Portanto, coloca-se o problema do assoreamento e do aumento da barra existente, que se tem reclamado. Gostaria de saber o que se passa quanto a essa matéria e também quanto ao problema da doca, quer em termos de aumentar a sua dimensão quer em termos daquilo que se tem reclamado e que é a construção de uma doca de recreio, que, penso, terá um interesse acrescido proveniente da construção, também prevista para 1985, da ponte sobre o Guadiana.
O problema do porto de Tavira é extremamente complicado, designadamente o assoreamento que vai do canal de Tavira a Santa Luzia e do canal de Tavira a Cabanas — situação complexa — e consta haver uma certa paragem na construção do molhe nascente. Conviria, pois, saber o que se passa.
Para último deixei a questão do porto de Quarteira, que é quase dramática. Com as condições e a repercussão turística que Vilamoura tem, pôr os pescadores a utilizar esse porto turístico, essa marina, nem é bom para os pescadores nem para o turismo. Trata-se de uma situação que não serve a ninguém.
Falou-se — e penso que se chegou a elaborar um projecto — na construção de um porto de pesca mais a nascente, creio que relativamente perto do antigo forte, mas desde há 2 anos que não se ouve nada sobre isso. O volume da pesca artesanal que tem lugar em Quarteira e a actividade turística que se processa, a construção de um porto de pesca seria um investimento de efectivo interesse e real necessidade.
Passando a outro assunto, há alguns aspectos relacionados com a indústria das conservas, que gostaria de colocar.
Como o Sr. Ministro sabe, a indústria de conservas atravessa fortes dificuldades, maiores no Algarve, por razões que têm a ver não só com a própria produtividade mas também com a aquisição do peixe, que muitas vezes é feita no Norte, isto é, o Algarve compra a maior parte do peixe no Norte e depois o produto acabado tem de seguir novamente para lá para ser exportado. Evidentemente que isto representa um acréscimo de custos terrível. Não vamos pedir um subsídio para problemas decorrentes deste posicionamento geográfico, mas o Algarve, que já foi um dos principais centros de conservas do País, tem, neste momento, apenas 8 conserveiras e dentro de poucos anos terá talvez muito menos. É uma situação preocupante.
Não vamos analisar a fundo toda esta problemática mas, de qualquer forma, há aqui alguns aspectos que merecem destaque.
O primeiro aspecto tem a ver com a garantia da atribuição do subsídio por parte da Secretaria das Pescas quando o preço do peixe baixa ou corre o risco de baixar na lota, a menos de 220$ por caixa — aliás, em Olhão o limite é de 250$ por caixa. A atitude é louvável mas só terá os efeitos positivos que se lhe reconhece se se evitarem os efeitos negativos que estão a ocorrer, se houver um efectivo controle da quantidade e da qualidade do pescado. Isto é, hoje, devido à garantia de escoamento para as fábricas de farinha de peixe, não há preocupação com o que se pesca.
Em minha opinião, é positivo haver esta garantia de escoamento, mas também se deve exigir que as espécies capturadas não desçam abaixo de uma determinada dimensão, senão é a mortandade das espécies que, infelizmente, já se está a verificar e que é diabólica, pondo depois em causa não só a qualidade do produto para consumo corrente mas também a qualidade do
produto para as conservas de peixe, tanto em termos imediatos como em termos de diminuição de quantidade a médio prazo.
Penso que também conviria abordar esta situação.
Ainda continuando com o problema das conservas, o Instituto Português das Conservas de Peixe é uma estrutura pesada, lenta e que não dispõe dos meios adequados para responder às exigências, designadamente ao atestado de estamina exigido e que não se põe em causa — está a ser feito ou pelo menos estava a ser feito na Faculdade de Farmácia do Porto —, mas até há bem pouco tempo ainda eram os próprios consumidores, neste caso, os conserveiros, que tinham de pagar as análises, o que além dos implícitos inconvenientes ainda representa demoras.
Gostaria de saber se, em termos de Instituto Português de Conservas de Peixe, está prevista alguma nova dinâmica, se está prevista a sua descentralização, se está prevista a gestão deste organismo com a participação dos interessados. Conviria que o Sr. Ministro nos desse uma visão desta questão.
Quando aqui esteve presente a Sr.a Secretária de Estado do Comércio Externo perguntei-lhe se não se previa, para este tipo de indústrias, um financiamento a médio prazo. Isto é, a política de «balões de oxigénio» e de subsídios, que não se contesta, que é necessária, que se justifica e que o PSD apoia, deveria ser acompanhada de medidas e de créditos a médio prazo que possibilitassem a reestruturação do sector, designadamente de unidades que garantissem um determinado volume de exportação e que, simultaneamente os componentes importados para essa produção não ultrapassassem um determinado limite, por exemplo, desde que a exportação não fosse inferior a 70 % e desde que os componentes importados fossem inferiores a esse limite.
Este número que adiantei não é rigoroso mas será talvez uma aproximação. Se não for este poderá ser outro mas deverão existir aqui medidas de prazo para pôr fim a esta situação de emergência permanente em que se tem vivido.
Também me parece que seria positivo instituir-se a passagem de certificados de qualidade por parte do Instituto Português de Conservas de Peixe para que não houvesse uma concorrência desleal. Perguntaria ao Sr. Ministro o que tenciona fazer para pôr fim a uma certa concorrência internacional em que, face aos grandes problemas das empresas, se oferece produto a qualquer preço, a preços verdadeiramente suicidas tanto para as empresas como para a concorrência. Isto é, ajuda a afundar as empresas que já estão mal e compromete aquelas que ainda têm alguma viabilidade porque não podem concorrer.
Terminaria com um caso pontual, relativamente ao qual lhe entregarei, mais tarde, um memorando, e que poderá ser considerado como «uma dor de coração». Estive há pouco tempo em Olhão e visitei a fábrica Carapucinha, que é hoje das melhores se não a melhor unidade conserveira da Península Ibérica. Está montada, pronta a funcionar e pensa-se que o seu valor deverá rondar 1 milhão de contos mas acontece que não funciona há 3 meses — o pessoal está em casa, uns fazem malha, outros têm encontrado emprego noutras unidades.
Por que razão não funciona? A empresa tem, neste momento, encargos com a banca, particularmente juros, que rondam os 550 000 contos e para começar a
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funcionar planeou coda a sua acção no mercado das Filipinas. Era, praticamente a única fornecedora desse mercado mas, face aos recentes acontecimentos ocorridos nesse país e a politica de contracção de despesas imposta pelas autoridades monetárias ao governo filipino, as importações tiveram de ser cortadas.
A empresa tem efectiva capacidade de exportar para qualquer país, pois a sua possibilidade de produção anual é de cerca de 200 000 caixas de sardinha, possuindo estruturas para produzir conservas de marisco e molusco, túnel de formigação, etc. É do melhor da Europa. De que é que precisa? Bem, precisará de uma quantia entre 50 000 a 100 000 contos para poder pagar a fornecedores e garantir o fundo de maneio. Temos uma unidade desta ordem paralisada apenas porque não tem dinheiro para garantir o fundo de maneio e para pagar aos fornecedores.
Com efeito, trata-se de uma situação que reputo de interesse nacional, podendo até pô-la em paralelo com a da Torralta.
Não irei falar aqui da Torralta — trata-se de um caso de interesse nacional — e embora seja discutível para algumas forças políticas, creio que a decisão do Governo cuidou e procurou curar desse interesse. Gostaria, pois, que, além disso, este da Carapucinha fosse também — e para mim já é — de interesse nacional.
Deixo-lhes estas notas breves sobre a situação desta unidade conserveira e entregar-lhe-ei, no final, um memorando da situação para que, ao mais alto nível, designadamente com o Sr. Secretário de Estado do Tesouro, se viabilize uma unidade destas para que não corramos o risco — e estamos à beira de que isso aconteça — de a unidade ser adquirida por empresários estrangeiros, o que penso não ser desejado por ninguém. Pedia-lhe, portanto, o cuidado e a atenção que o caso efectivamente merece.
O Sr. Presidente: — O sr. Ministro deseja intervir já ou prefere responder no final das intervenções dos Srs. Deputados inscritos?
O Sr. Ministro do Mar: — Não sei qual é o sistema normalmente seguido, mas é com certeza mais operacional responder no fim, pois é mais fácil balancear a importância efectiva das questões. Isto, é claro, sem prejuízo de cada um apresentar os problemas. Aliás o tempo também não é infinito. Quando, no fim, responder às questões postas pelos Srs. Deputados, peço--lhes que, se me escapar alguma coisa das respectivas intervenções me lembrem.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.
O Sr. Carlos Espadinha (PCP): — Sr. Ministro, queria colocar-lhe, muito rapidamente, algumas questões.
A primeira refere-se às Grandes Opções do Plano, onde, na página 31 e no que diz respeito às pescas, se depara com: medidas políticas para o sector das pescas para 1985. Estas traduzem a continuidade do padrão político definido no Plano Nacional de Pescas e que eu tenha conhecimento, Sr. Ministro, existem apenas alguns documentos que estiveram em análise nalgumas organizações e que passaram depois a Conselho de Ministros. Não tenho, no entanto, qualquer conhecimento de que estes tivessem sido aprovados;
neste sentido não existe, portanto, nenhum Plano Nacional de Pescas.
Ainda nas Grandes Opções do Plano, depara-se, depois, com a intensificação da exploração dos recursos na Zona Económica Exclusiva Nacional (ZEE). O Instituto de Investigação das Pescas (INIP), como sabemos, pouco ou nada tem desenvolvido há já algum tempo. Sabemos, também, que há falta de verbas e isto é do conhecimento público, pois foi denunciado pelo próprio director do Instituto, o que quer dizer que continuamos sem conhecimento profundo do programa da ZEE. A nossa Zona Económica Exclusiva é muito grande, como todos sabemos, e com certeza todos pensamos também que é necessária uma investigação correcta de forma a que os pescdores portugueses possam vir a ter o conhecimento suficiente daquilo que têm.
Passo agora a outra questão, relacionada com as verbas inscritas no orçamento para as pescas, para o ano de 1985. Eu, pessoalmente, já tive oportunidade de dizer ao Sr. Secretário de Estado, antes da discussão na generalidade, que as verbas eram insuficientes, o que coincide, aliás, com o parecer da própria Subcomissão das Pescas, que concluiu por unanimidade serem as verbas insuficientes para o desenvolvimento deste sector, que, na nossa opinião, tem um grande interesse na economia portuguesa. Deparamos com umas verbas baixíssimas, e a resposta que obtivemos do Sr. Secretário de Estado foi a de que elas eram verbas para financiamento a fundo perdido. Consideramos, portanto, que elas são suficientes só para novas construções ou reconversões a fundos perdidos. Por consequência, não podemos deixar de as achar insuficientes. Neste sentido apresentaremos, também, algumas propostas.
Nestas verbas deparamos, no entanto, com uma verba de 2 165 000 contos para construção ou melhoramentos de portos secundários. Acontece que nesses melhoramentos de portos secundários encontramos, no mapa vn, os portos que vão ser objecto de arranjo ou de novas construções no ano de 1985.
Aquando da vinda do Sr. Secretário de Estado, este entregou-nos um documento que continha também um lançamento de verbas para o ano de 1985, destinadas a alguns portos de pesca. Ora acontece que alguns desses portos não constam no mapa vil e vice-versa. O Sr. Secretário de Estado tinha assumido o compromisso de dar, no dia seguinte, uma resposta certa à Subcomissão das Pescas, mas, até ao momento, creio que nenhum membro dessa Subcomissão tem conhecimento da razão do desvio existente no mapa vn em relação ao documento entregue por ele. Desse documento constam, por exemplo, portos, como os de Viana do Castelo, Aveiro, Setúbal e Espinho, que não são referidos no mapa vn, e as verbas que no mesmo mapa vêm indicadas para o ano de 1985 nada têm a ver com a proposta actual, constante no documento entregue pelo Sr. Secretário de Estado.
Neste sentido, Sr. Ministro, deixo-lhe estas questões, para que sejamos esclarecidos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Silva Domingos.
O Sr. Silva Domingos (PSD): — Sr. Ministro, Srs. Deputados: Na última reunião da Comissão de Equipamento Social com o Sr. Secretário de Estado da Marinha Mercante obtivemos bastantes esclarecimentos e, por isso, não irei agora voltar àquilo que ficou devidamente esclarecido nessa reunião.
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Entretanto, houve um ponto ou outro que não ficou claro, ou por o Sr. Secretário de Estado não ter percebido as perguntas, ou por serem muitas as perguntas a que ele só respondeu no fim, ou até por não haver resposta, na altura, para essas mesmas questões.
Assim, segundo os elementos que temos, o activo das empresas em extinção — Companhia Nacional de Navegação (CNN) e Companhia de Transportes Marítimos (CTM) — é, numa avaliação recente, de cerca de 10 ou 11 milhões de contos e o passivo cerca de 42,5 milhões de contos. Como no Orçamento do Estado não constam verbas destinadas à cobertura do total ou mesmo de parte deste saldo negativo, pergunto como pensa o Governo vir a cobri-lo, pois, mais dia menos dia, ele vai aparecer com este processo de liquidação.
Por outro lado, o Governo propõe-se — através de um conjunto de medidas que já faz publicitar e que, estamos disso convencidos, têm viabilidade, em grande parte, de vir a ter êxito — desenvolver a marinha mercante nacional, quer através de iniciativas do Estado quer através de iniciativas privadas. Naturalmente, na área privada o Estado limitar-se-á a criar as condições para que essa iniciativa seja possível, pois ninguém investe sem ter condições de obter a justa compensação para o risco que toma e para os capitais investidos.
Pergunta-se se o Governo pensa criar condições de custos idênticos às das companhias concorrentes estrangeiras e se pensa dotar os armadores de capacidade para ajustarem oportunamente as suas frotas ao mercado. Pergunto concretamente se vai ser finalmente viável atribuir aos armadores a isenção de imposto de capitais nos afretamentos — quer quanto à viagem, quer no tempo, quer em casco nu, quer em locação financeira —, porque nós sabemos que há despachos do Sr. Secretário de Estado do Orçamento isentando alguns destes casos, mas não todos. Por outro lado, todos sabemos, também, que na situação actual o aluguer em casco nu e a locação financeira podem ser elementos importantes para aumentar as frotas disponíveis nos armadores portugueses, ocupando em reparações mão-de-obra nacional e os nossos estaleiros.
Por outro lado, pergunto se há viabilidade de isentar de direitos de importação as unidades que tiverem de ser importadas, pois sabemos que há unidades que não poderão ser construídas em Portugal pelo seu elevado custo e pelos baixos fretes que são praticados em linha, que não permitem uma remuneração adequada e até mesmo o retorno do capital investido e, como sabemos também, no regime anterior ao 25 de Abril havia normalmente a concessão de isenção de direitos de importação nas unidades importadas.
Finalmente, queria só a confirmação de que nas compras de equipamento há uma isenção clara do Imposto de Valor Acrescentado, pois consultando a lei existente parece resultar claramente haver essa isenção. De qualquer forma, gostaria de ter a sua confirmação, Sr. Ministro, e de saber se a minha conclusão é bem tirada. E repito que não é possível haver desenvolvimento da marinha mercante sem darmos aos armadores — quaisquer que eles sejam, do sector público ou do privado — estas condições de isenção de direitos, que os coloquem em igualdade de circunstâncias com os armadores estrangeiros, porque se um navio é adquirido com direitos de importação ou se paga imposto de capitais há um sobrecusto na unidade, quer na exploração quer mesmo depois quando vai ser vendido, sobrecusto que
não é de forma nenhuma recuperável porque a concorrência não o permite.
Por outro lado, o Governo pensa pôr em prática um vasto programa e um plano, aparentemente bem urdido, de encomendas aos estaleiros nacionais. Naturalmente que, a avaliar pelo que o Sr. Ministro tem dito, estas encomendas vão ser colocadas a custos que permitirão aos armadores também aí concorrerem, isto é, o custo de um navio para os armadores nacionais ira ser, e vai ser, igual ao que se obtiver na compra no mercado internacional de um navio novo. Terá de ser assim — e penso que isto está fora de questão — porque se não estaríamos a criar empresas que, mais dia menos dia, iriam à falência, pois a tendência é para que elas entrem no mercado de competição, até porque a liberalização das importações a isso vai conduzir. Para que se perceba melhor, dou um exemplo: a própria concorrência que o País precisa de estabelecer não permitirá à EDP introduzir custos de electricidade muito maiores do que aqueles que existem em países da CEE. Por esta razão, não restam dúvidas de que as condições da entrega dos navios aos armadores terão de ser de forma a que lhes permitam, a longo prazo, razoáveis fretes do mercado internacional.
O Sr. Secretário de Estado disse-nos que se previa, neste ano de 1985, dotar as novas empresas Transinsular e Portline com 10 ou 11 milhões de contos. Pelos estudos que conhecemos, não está previsto dotar cada uma das empresas com um total de dotação de capital correspondente ao valor global de dotações por encomenda, isto é, não se pensa atribuir logo no primeiro ano de encomenda a totalidade das dotações de capital que se prevêm para essa encomenda. Pergunto: se estes 10 ou 11 milhões de contos não são para suportar, logo à partida, estas encomendas, qual será então o seu destino?
É claro que esta minha questão tem subjacente o saber que a experiência nos dá, que é o de sabermos que o risco que corremos com a colocação destas encomendas é o de este ou outro Governo conseguirem, ou não, as dotações de capital suficientes e os financiamentos necessários para os navios avançarem, pois pode acontecer mudar a política económica e financeira e ser, amanhã, sacrificado este conjunto de opções que hoje se tomam, penalizando gravemente não só os estaleiros como os armadores, pois essas encomendas terão de parar. Temos, aliás, uma experiência bem conhecida, que é a dos 3 graneleiros que estão na Setenave.
Finalmente, falarei agora da área dos portos. Penso que merecia a pena o Sr. Ministro fazer uma resumida apresentação dos vários grandes projectos que tem, quer em portos de comércio quer em portos de pesca. A Assembleia da República não tem sido oportunamente esclarecida sobre o ponto da situação dessas obras e sabemos que estão previstas um conjunto de dotações elevadas para as mesmas, mas não temos ideia de quando é que esses portos começam a ter um aproveitamento adequado.
Merecia a pena que, numa intervenção inicial, o Sr. Ministro fizesse uma ligeira referência a esses grandes projectos.
Perguntar-lhe-ia ainda se já está desbloqueado o projecto do porto de pesca de Aveiro, que seria o primeiro exmeplo de uma junta portuária que iria fazer um investimento com auto financiamento. Conheço o seu interesse em desbloquear esse processo mas penso que tem havido dificuldades, que suponho serem burocrá-
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ticas. Pergunto-lhe, pois, se já estão desbloqueadas; se não estão, quando é que espera que isso venha a acontecer e o que é que impede que se faça esse desbloqueamento?
Descendo um pouco mais ao detalhe, tem-se falado ultimamente em obras previstas para a foz do rio Minho tal como se fala também em vários terminais de passageiros de ferry-boat — um em Vila Nova de Cerveira, outro em Caminha. O que é que há sobre isto, Sr. Ministro?
Por outro lado, têm vindo a ser feitas obras de melhoramento no pequeno porto de Vila Praia de Âncora. É uma velha aspiração e pergunto se alguma coisa mais se vai ali continuar a fazer.
Relativamente às pescas vou descer só aos problemas do meu distrito, embora tenha preocupação com os outros mas sei que outros colegas vão aqui pôr questões relativas aos seus distritos. Perguntaria simplesmente se está a ser estudada pelo Governo, e que resposta é que este espera dar-lhe, uma exposição feita* pelos armadores do distrito de Viana do Castelo, especialmente os do Porto, em que expuseram os vários constrangimentos à sua actividade de pesca no distrito, o que os leva, nalguns casos, a encerrar a sua actividade pura e simplesmente.
Também no meu distrito surgiu aqui há tempo um problema complicado num pequeno porto, com o encerramento de uma pequena lota que lá havia, devido à obrigatoriedade de transporte do peixe para o porto principal, neste caso o de Viana do Castelo. Não vou pôr a questão em termos de detalhe porque não me interessa essa resposta,mas pergunto se há alguma política do Ministério do Mar no sentido do encerramento das pequenas lotas nos pequenos portos e qual é a solução que vai ser dada a esse problema — e sabemos como o nosso pescador é adverso e aceita mal a ideia de ter de deslocar-se —, quer fazendo porto de descarga do seu peixe quer transportando o porto para um porto vizinho em melhores condições.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Américo Salteiro.
O Sr. Américo Salteiro (PS): — Sr. Ministro, numa verba para a Administração-Geral do Porto de Lisboa consta, em aquisição de serviços não especificados, 1 188 100 contos. É necessário que esta verba seja especificada, muito embora nós saibamos bem o que isto quer dizer!
Gostaria de referir uma empresa em Almada — a Sociedade de Reparações de Navios — que é uma empresa que em princípio parece ter um estatuto privado mas que na realidade não o tem, uma vez que o seu capital social é 50% da Sociedade Nacional dos Armadores de Bacalhau (SNAB) e 50% da Sociedade Nacional dos Armadores da Pesca do Arrasto (SNAPA), empresas nacionalizadas e uma delas até em extinção. Sucede que esta empresa, que tem 323 trabalhadores, está numa situação bastante difícil e, muito embora tenha uma carteira de encomendas superior a 400 000 contos, está na impossibilidade de fazer os seus trabalhos, uma vez que não tem fundo de maneiro. Recorreu ao Instituto de Emprego e Formação Profissional, com um parecer favorável do IAPMEI e a resposta desse Instituto foi apenas a de que os processos não serão analisados, ficando arquivados a aguardar orientações superiores. Pensamos que estas orientações superiores têm a ver com o Ministério do Mar.
Não quero deixar de salientar que esta empresa tem 5 meses de salários em atraso e os seus trabalhadores têm mostrado uma maturidade impressionante, pois apesar destas condições, não fazem greves e continuam a trabalhar. Estão numa situação desesperada, e é preciso arranjar urgentemente uma solução para isto, até porque uma parte muito grande das suas dívidas é da própria SNAPA que vendeu parte do seu património — três barcos a um Sr. Luís Morais e outro a uma : outra pessoa, que lhe devem bastante dinheiro — sendo
0 débito da SNAPA para com a Sociedade de Reparação de Navios de 90 000 contos. Eu perguntava, e penso que o Sr. Ministro tem conhecimento disto, o que é que se está a pensar fazer para acabar urgentemente com esta situação, uma vez que embora seja uma empresa média tem bastante trabalho mas na realidade só pode ser viabilizada se tiver verbas para fundo de maneio.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, co- 1 meçarei pela questão dos portos, que já aqui foi focada pelo meu camarada Carlos Espadinha. Gostaria de interrogá-lo acerca da divergência, que é bastante grande, entre os portos em relação aos quais o Ministério queria avançar com obras de reparação ou de construção e aqueles que nos aparecem enunciados no orçamento. A diferença é, como referi, grande e, concretamente, dos 17 portos que aparecem no programa e projectos plurianuais apenas 9 estavam previstos na proposta do Ministério.
Parto, obviamente, do princípio de que deve caber ao Ministério a primeira palavra, neste campo, em termos de definição de prioridades. Sendo assim, pergunto-lhe quais os critérios que foram utilizados para esta classificação final dos portos, onde irão ser desenvolvidas obras em 1985.
Ainda em relação com os portos queria pôr-lhe uma questão já antiga, mas que continua a não ter, para nós, explicação. Mais uma vez nos parece que é totalmente olvidado o porto de pesca de Sines, apesar de todas as promessas públicas que têm vindo sucessiva- j mente a ser feitas bem como compromissos assumidos pelos diversos Governos, incluindo o actual — bastaria ir, por exemplo, consultar as actas do ano passado desta Comissão para se ver que assim é — no sentido da sua construção.
Passando dos portos, irei agora para a área das pescas, propriamente dita, sobre a qual gostaria de colocar algumas questões.
Em primeiro lugar, queria saber, se fosse possível, como é que estão a funcionar e a ser concretizados os protocolos dos acordos assinados com países estrangeiros. O protocolo ou o acordo assinado com Marrocos. implicava, entre outras coisas, como contrapartidas por I parte de Portugal, um apoio na formação de pessoal qualificado, de técnicos, designadamente na Escola Infante D. Henrique. Tanto quanto sabemos, por visita feita não há muito tempo àquela escola, não está a ser cumprida essa responsabilidade assumida pelo Governo Português. É evidente que Marrocos pode aceitar isto
1 ano, 2 anos, durante o período de um acordo, mas duvidamos que aceite esta situação para a formalização de novos acordos. Quem fala em Marrocos, fala em acordos celebrados com outros países, pelo que gos-
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tava que o Sr. Minsitro se referisse a esta questão um pouco mais genericamente. É porque o não cumprimento dos compromissos assumidos por Portugal nesses acordos poderá implicar, a curto prazo, que deixemos de ter qualquer possibilidade de fazer acordos de pesca com esses paises.
Ainda neste campo, aparece no orçamento do Ministério do Mar uma verba de 24 489 contos para a constituição de sociedades mistas. Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se esta verba é genérica — pelo número parece não ser — ou, não o sendo, quais as sociedades mistas que estão aqui previstas.
Uma outra verba que aparece aqui no orçamento é de 18 078 contos titulada como «subvenção de encargos para a pesca longínqua». Pedia-lhe um esclarecimento no sentido de saber que subvenção de encargos é esta.
Ainda no âmbito das pescas, embora muitas vezes quando se fala em pescas se pense apenas no mar, gostaria de colocar-lhe uma outra questão. Temos grandes possibilidades de desenvolvimento da aquacultura no nosso país, estando algumas delas exploradas mas a níveis muito baixos em relação às potencialidades efectivas que existem. Julgo que alguém minimamente preocupado com estas questões, mesmo que não seja especialista — e é esse o meu caso —, mas desde que tenha lido alguns estudos, quer relacionados com o caso português quer com países estrangeiros, poderá chegar facilmente à conclusão de que o desenvolvimento da aquacultura no nosso país poderia dar um contributo inestimável, importantíssimo, para o fornecimento do mercado interno em matéria de peixe. Verificamos que as potencialidades estão completamente desaproveitadas e indico, por exemplo, o caso das albufeiras das nossas barragens, que estão quase todas sem utilização em termos de aquacultura. Refiro-lhe um outro exemplo, que é, para utilizar uma expressão há pouco utilizada pelo Sr. Deputado José Vitorino, «uma dor de alma».
O Sr. José Vitorino (PSD): — O que eu disse há pouco foi: «uma dor de coração»!
Risos.
O Orador: — Tem razão, Sr. Deputado. De qualquer modo, o sentido é o mesmo.
Refiro-me ao facto de se estar a concluir a Central Termoeléctrica de Sines. É conhecida a utilização, que em todo o mundo é feita, das águas quentes de refrigeração utilizadas nas centrais termoeléctricas para o desenvolvimento, designadamente, da aquacultura. É evidente que esse aproveitamento serve também para o desenvolvimento da agricultura, mas no nosso caso, devido à natureza do clima, tem mais incidência na aquacultura, embora me pareça — repito — que essas águas também podem ser aplicadas à agricultura. É óbvio que a Central Termoeléctica de Sines, como qualquer outra, não tem nada a ver com o Ministério do Mar. Julgo, no entanto, que numa gestão coordenada, este Ministério poderia, no mínimo, tentar desenvolver acções no sentido de que isto pudesse ser aproveitado antes da obra estar completamente concluída. Pensamos que não será um investimento por aí além e não nos interessa estar a discutir, neste momento, se deve ser um investimento público ou privado. Trata-se simplesmente do aproveitamento de uma coisa que é a água quente a correr, pura e simplesmente, para o mar e que pode ser aproveitada.
Levanto este problema da aquacultura em termos gerais, no Ministério, porque me parece que a verba que nos aparece para o desenvolvimento dela, no valor de 32 100 contos, vai continuar a permitir o mesmo marasmo que se tem verificado neste sector.
Passarei agora para um problema, que já aqui foi levantado pelo Sr. Deputado Américo Salteiro, em relação à AGPL, referente à aquisição de serviços não especificados. A questão está posta, mas queria chamar a atenção do Sr. Ministro para o facto de que esta verba de aquisição de serviços não especificados, para além do seu elevado valor nominal, representar, pura e simplesmente, 33 % do orçamento total da AGPL, o que parece não se coadunar com uma discussão e análise relativamente aprofundadas do Orçamento.
Virar-me-ia, agora, para o sector da marinha mercante, mas antes de nele entrar, propriamente, gostaria de lhe perguntar, Sr. Ministro, o que é que se passa com o Fundo de Renovação e Apoio às Indústrias das Pescas (FRAIP). Foi extinto? Notícias que surgem referem-nos que ele foi extinto, sem se curar de criar os mecanismos necessários para a sua completa extinção, designadamente, para a recepção dos créditos que o FRAIP tem. Tenho à minha frente uma notícia de jornal em que se refere existirem créditos da ordem dos 3 milhões de contos e que têm aparecido desde o princípio do mês passado devedores do FRAIP para tentar pagar as suas dívidas, não se sabendo quem é que as recebe. Mas o Sr. Ministro dirá se isto é ou não verdade!
Em relação à marinha mercante já foram colocadas algumas questões pelo Sr. Deputado Silva Domingos e não as iria repetir. Gostaria, no entanto, de lhe fazer algumas perguntas concretas, independentemente da discussão sobre a política do Governo neste campo. Qual é a distribuição prevista de subsídios e dotações de capital, no orçamento deste ano, para as empresas da marinha mercante? Como vão ser pagos e onde são orçamentados os encargos resultantes da eventual extinção da CNN e da CTM, que serão assumidos pelo Estado? O que é que se passa em relação a decisões a nível governamental sobre a renovação da frota da marinha mercante?
Sabemos que por parte do Ministério da Indústria se põe a questão de a recuperação económica e financeira dos estaleiros, designadamente os da Setenave e os da área centro-norte, estar ligado à renovação da frota da marinha mercante; sabemos que os 3 graneleiros que estão na Setenave, em princípio, serão terminados dentro de pouco tempo, mas não sabemos nada sobre a decisão tomada pelo Governo — se é que já a tomou — em relação à renovação da frota da marinha mercante. Já não em termos de eventuais ideias que existem, e que nos foram expostas pelo Sr. Secretário de Estado, no sentido de uma previsão de aquisição de 58 novos navios, eventualmente metade construídos no País e metade comprados lá fora, gostaria de saber se existe alguma coisa mais concreta.
O Sr. Secretário de Estado da Marinha Mercante informou a Comissão de Equipamento Social de que estava prevista a alteração dos impostos sobre a marinha mercante. Não me recordo se na altura nos foi dito que existiria ainda uma proposta do Ministério no Conselho de Ministros ou se já teria sido por este aprovada. Pergunto-lhe, pois, se essa alteração das taxas, dos impostos que incidem sobre a marinha mercante, já está ou não aprovada pelo Conselho de Ministros.
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Em qualquer dos casos, por que razão é que essa previsão de alterações das taxas, dos impostos sobre a marinha mercante, essa previsão de alteração das receitas não consta do Orçamento do Estado para 85?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Leonel Fadigas.
O Sr. Leonel Fadigas (PS): — Sr. Ministro, desde há muitos anos que temos vindo a assistir a um continuado pedido dos pescadores de certas zonas do País, que têm portos ou, pelo menos, varadouros tradicionais, no sentido de se construírem portos de abrigo, e isto sempre em zonas a que corresponde uma pesca artesanal, isto é, cujo peso económico é importante em termos locais mas relativamente pequeno em termos nacionais.
Temos vindo também a assistir, nalguns casos, ao lançamento e ao desenvolvimento de portos de abrigo na costa atlântica — estou a lembrar-me do caso da Nazaré, um dos últimos investimentos nesta área.
As Grandes Opções do Plano apontam para a renovação da frota pesqueira e reequipamento e modernização das embarcações em actividade.
O que gostaria de perguntar ao Sr. Ministro é se há alguma articulação entre esta renovação e a política de construção, de planeamento, de programação de portos de abrigo para pesca nas nossas águas, porque me parece que corremos o risco de começar a fazer «por-tozinhos» por esse país fora para servirem ou manterem uma actividade de tipo artesanal.
Parece-me que esta questão merecia ser aqui aflorada pelo Sr. Ministro. Seria importante saber se existe ou não uma articulação nestas acçõs e até na definição destas prioridades.
A outra questão que pretendo colocar-lhe tem a ver com o orçamento do Instituto Nacional de Investigação das Pescas. É do conhecimento público que este não chega para as necessidades de funcionamento da instituição, tendo já o seu director assumido essa queixa, publicamente, na televisão. Gostaria de saber em que medida podemos pensar na renovação da frota pesqueira, no reequipamento e modernização das embarcações em actividade sem que, em paralelo, façamos aquilo que é prioritário, isto é, um grande esforço de investigação, de conhecimento, de defesa, de salvaguarda das nossas reservas na Zona Económica Exclusiva.
Penso, aliás, que algumas pessoas terão dificuldade em entender como, tendo nós no mar uma das áreas potencialmente mais ricas para a nossa actividade económica — e tão rica é que está a ser cobiçada por vários outros países — estejamos, talvez, a esquecer o peso e a importância que tem um investimento prioritário na área da investigação.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, durante este período os Srs. Deputados José Vitorino e Américo Sal-teiro inscreveram-se para uma nova intervenção. Não sei se serão complementares das anteriores, o que justificaria que as fizessem desde já, ou se são intervenções para depois das considerações do Sr. Ministro.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Presidente, a minha intervenção é complementar da anterior.
O Sr. Américo Salteiro (PS): — Sr. Presidente, a minha é para depois da resposta do Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Então, para já, temos as intervenções dos Srs. Deputados João Corregedor da Fonseca e José Vitorino e posteriormente à do Sr. Ministro as dos Srs. Deputados Américo Salteiro, Luísa Daniel e Carlos Espadinha.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro, não irei ser muito longo uma vez que muitos dos pontos que gostaria de focar foram já abordados por vários Srs. Deputados. No entanto, gostaria de reforçar uma pergunta relacionada com os acordos de cooperação, nomeadamente os existentes com países africanos de expressão portuguesa.
Temos certos acordos, nomeadamente com Moçambique, que parece não estarem a ser implementados nas suas diversas componentes. Diz-se que as entidades privadas poderão não estar muito interessadas. Por isso, convém saber que tipo de apoios elas têm para poder ser implementado não só esse acordo de cooperação luso-moçambicano como outros.
Tive oportunidade de ir a Maputo juntamente com outros Srs. Deputados e verifiquei o extraordinário interesse existente por parte das autoridades moçambicanas pela participação portuguesa na captura piscícola, no ensino das artes de pesca e noutro tipo de actividades relacionadas com a pesca.
A verdade é que nada está a ser feito. Estamos a perder potenciais mercados e mesmo que as entidades privadas não estejam muito interessadas ainda temos algumas empresas nacionalizadas cujos barcos se estão a perder — e não só — e que podiam ser bem utilizados nessas águas.
Verificamos que em relação a Moçambique existem outros países a trabalhar em pleno, nomeadamente a Espanha que ultimamente reforçou a sua participação, o Japão e outros, que lá estão em força, desenvolvendo os seus acordos de cooperação. Portugal, que teria toda a necessidade e que tem todas as vantagens — ainda por cima as autoridades moçambicanas, a alto nível, disseram-nos que os portugueses seriam privilegiados, e foram — tem estado a perder quotas de pesca, pelo menos nos últimos 2 anos, não está a fazer nada e no Orçamento do Estado também nada se prevê em relação a esta matéria.
Gostaria, pois, de saber se vão ou não ser canalizadas verbas para possibilitar o desenvolvimento dos acordos de cooperação de pesca entre Portugal e países africanos de expressão portuguesa.
Gostaria também de saber, ainda no tocante a estes acordos de cooperação, o que está a ser feito e que dotações existem para jovens pescadores africanos poderem ter a sua instrução na escola de pesca em Portugal.
Numa última informação que eu e outros Srs. Deputados tivemos, verificámos que alguns convites surgidos, muito poucos aliás, nomeadamente a Moçambique, foram feitos em cima da hora, o que levou a que, pelo menos no ano passado, não tenha sido possível aceitá-los, uma vez que foram feitos num prazo extremamente curto.
Numa audiência que tivemos no Gabinete do Sr. Ministro do Mar ficou prometido que este faria esforços no sentido de ajudar esses países com bibliografias — com livros de ensino de pesca e de outros tipos de artes ligados ao mar — uma vez que encontrámos nas
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escolas de pesca desses países livros doutras nacionalidades e uma curtíssima bibliografía. Tinham-nos solicitado livros portugueses e encontrámos lá livros vietnamitas, alemães, espanhóis, mas portugueses nenhum. O Sr. Ministro disse que iria efectuar démarches no sentido de dotar esses países com bibliotecas, que não são caras, e gostaria de saber se alguma coisa foi feita nesse sentido. Creio que estamos realmente a perder uma extraordinária oportunidade de penetrar no mercado dos países africanos de expressão portuguesa através de empresas, nomeadamente nacionalizadas, porque a intenção e a decisão deste Governo são as de, realmente, destruir todo o sector público das pescas. Em relação à CEE e em termos de Orçamento do Estado gostava de saber, Sr. Ministro, o que é que está previsto para investimentos, de forma a fazer face ao choque que vai com certeza existir. Sabemos que a CEE vai dar, possivelmente, 500 000 contos a fundo perdido de apoio à produção e gostaria de saber o que é que temos definido quanto ao sector das pescas em relação a esta matéria, que é extremamente preocupante.
Ainda em relação aos acordos de cooperação, e peço desculpa por voltar um pouco atrás, gostaria de saber o que é que se passa com os créditos e financiamentos para um estaleiro naval, que, ao abrigo desse acordo de cooperação ou servindo-se do mesmo, está a construir embarcações que, ao que se diz, não serão para ser utilizadas nos mares africanos.
Finalmente, em relação à frota comercial — questão a que o Sr. Deputado Octávio Teixeira já se referiu, e muito bem — e a este gravíssimo problema de gastarmos dezenas e dezenas de milhões de contos por ano em afretamento em navios estrangeiros, gostava de saber, em termos de Orçamento do Estado, o que é que está previsto e o que é que vai ser feito de forma a podermos minorar essa extraordinária perda e estarmos dotados com o mínimo de condições para podermos fazer as nossas relações comerciais através dos mares com navios portugueses.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, em complemento das perguntas que fiz há pouco, acrescentaria alguns aspectos de importância.
Em primeiro lugar, porque se tem falado muito sobre as nossas relações com outros países em matéria de actividade pesqueira, perguntava-lhe como é que estão as nossas relações com Marrocos, em termos de efectiva estabilidade, quanto à concessão de licenças a sociedades mistas, etc.
Em segundo lugar, pergunto se, na sequência das últimas e lamentáveis declarações ou insinuações das autoridades espanholas quanto à possibilidade de os barcos «invadirem» a nossa costa, estão em curso alguns contactos e, nomeadamente, se se mantém a posição firme do Governo Português em termos de abertura à negociação de acordos fronteiriços para unidades artesanais mas de uma intransigência absoluta quanto ao exclusivo da pesca para as unidades portuguesas até às 12 milhas.
Em terceiro lugar, queria referir a questão das depuradoras de mariscos bivalves no Algarve, designadamente em Olhão, que estão paralisadas, que não avançam. Pergunto-lhe, portanto, o que é que será feito para que possam entrar em funcionamento.
Ainda quanto à questão do aproveitamento das albufeiras e das rias em matéria de aquacultura e piscicultura, parece justificar-se, de facto, um investimento intenso nessa área porque é previsível que a rentabilidade será, sem dúvida, muito elevada — e escuso de referir mais vantagens daí decorrentes.
Por último queria referir-me à questão da demolição das casas da ria Formosa. É um problema altamente controverso e altamente discutível — entre as discussões algumas casas foram abaixo com evidentes prejuízos para os proprietários — e interessa agora saber quais são as intenções para o futuro. Em primeiro lugar, é preciso assegurar que não haverá mais derrubes de casas e, em segundo lugar, gostaria de saber como é que o Governo encara o facto de, perante a justificação e a necessidade de não fazer mais construções, se avance eventualmente com planos de urbanização que prevejam a construção de novas habitações em ilhas da ria Formosa. É indiscutível que se tenham derrubado casas e que se deva fazer um adequado ordenamento face àquelas que já estão construídas, mas eu diria, no entanto, que é altamente discutível e controverso —para não usar outros adjectivos— que quem quer que seja, sob que argumento for, vá aprovar novos planos de urbanização que, sob a justificação do enquadramento de que está construindo, representam, na prática, a construção de novas habitações. É peciso que, de uma vez por todas, isto fique assente porque enquanto nós falamos e discutimos e estamos de acordo, os planos de urbanização tendem a avançar e as construções a concretizar-se. Tem que haver, portanto, uma política para isto, não pode ser casuístico e era importante que se definisse de uma vez por todas. Julgo que o Sr. Ministro, porque é a entidade mais conhecedora e que mais directamente trata desta área, pode dar-nos algum descanso quanto a uma linha segura de actuação para o futuro nesta matéria.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Sr. Ministro, eu ousaria apenas colocar-lhe uma questão.
Uma das medidas da política do Governo é introduzir nas pescas novas tecnologias. A minha pergunta é muito simples: que tipo de novas tecnologias tenciona o Governo aplicar no sector das pescas e qual a verba prevista para esse efeito?
O Sr. Presidente: — Penso que concluímos o conjunto de pedidos de esclarecimentos nesta primeira volta. Portanto, vou conceder a palavra ao Sr. Ministro do Mar para responder, se assim o entender.
O Sr. Ministro do Mar: — Na linha daquilo que disse inicialmente eu irei tentar responder às intervenções de cada um dos Srs. Deputados, alargando-me, mais ou menos, em relação a algumas perguntas, quando me parecer ter alguma justificação acrescentar, em termos de ordem genérica, algumas coisas.
Começo pela questão do Sr. Deputado José Vitorino, que fez um pedido de esclarecimento em relação à situação dos portos existentes e que estão em funcionamento, quanto à preocupação da manutenção do seu funcionamento ligada a problemas de necessidades de intervenções e de dragagens, designadamente no porto de Faro e no porto de Tavira. Foram as duas
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observações que fez e quanto ao caso de Vila Real de Santo António o problema põe-se de outra maneira.
Realmente, entendo que, quanto à manutenção, em termos de dragagens continuadas, è indispensável que se continuem a fazer, mas não se tem actuado com a celeridade desejável. A criação da Dragapor, no meu ponto de vista, é largamente explicável e tem grandes vantagens, mas a não existência na Direcção-Geral de Portos de um mínimo de capacidade de intervenção para essas pequenas operações tem trazido algumas dificuldades. No entanto, suponho que o problema de Faro está em vias de ser resolvido e que o problema de Vila Real também vai ser resolvido este ano. Já quanto ao problema de Tavira, esse é muito grave e muito complicado e sem um estudo integrado não é possível intervir aí.
Portanto, eu diria que não é possível, a curto prazo, senão resolver o problema de Faro e de Vila Real. Assim, não vejo possibilidade de se poder assegurar que se vai resolver o problema de Tavira sem um estudo global, porque o problema é, neste caso, muito complexo.
Quanto às obras a realizar em portos secundários, como por exemplo o de Baleeira, que foi referido formalmente por um dos Srs. Deputados, devo dizer que está prevista a conclusão das obras que há a realizar. Aproveito para introduzir aqui alguns dados sobre aquilo que é o esforço feito quanto aos portos de pesca principais e até mesmo secundários.
Suponho que é espelho da verdade que nos últimos anos se fez nas áreas dos portos, designadamente na área dos portos com vocações piscatórias, um dos maiores esforços em investimentos que se têm feito nos últimos 10 anos no nosso país.
Embora se possam discutir as prioridades, e se elas teriam sido seguidas da melhor forma, eu diria que em termos globais, sem agora estar a situar isto no tempo, se fez um esforço muito grande.
De facto, usou-se, em pleno e pela primeira vez com uma certa eficácia, um apoio financeiro externo, o que nem sempre acontece.
Na realidade, o Banco de Cooperação Alemão pôs à nossa disposição alguns recursos importantes e eu acrescentaria que neste sector nos últimos 6 anos devem ter sido investidos na ordem de 30 milhões de contos, ao abrigo desta cooperação bilateral. Ora isto é singular em termos de aproveitamento. Mas estes investimentos têm grandes objectivos e não vai ser possível, com certeza, dotar por este meio qualquer aglomerado piscatório do País.
Realmente, percebo que as populações aspiram a ter um porto piscatório — é exemplo o que acontece em Quarteira, que desejaria ter um porto piscatório de imediato — mas não estou a ver que seja possível dar resposta imediata a todas essas solicitações. Citei Quarteira, como poderia ter citado outra povoação e até pode suceder que Quarteira não esteja nessa situação.
Suponho que, em termos concretos, o grande esforço que está a ser feito na área das pescas é o de Olhão, que, como todos sabem, é uma obra extremamente importante.
Penso que a entrada em serviço do porto de Olhão vai permitir desbloquear algumas situações como aquelas que se verificam em Tavira ou em Quarteira, mas compreendo que não as resolverão definitivamente.
No entanto, temos de programar as coisas e não é possível responder a todas as solicitações que aparecem.
Um Sr. Deputado fez-me também algumas perguntas, que anotei, sobre empresas na área das conservas, mas penso que não vale a pena estar agora a falar nisso.
De qualquer forma, creio que algumas situações nessas empresas têm de ser apoiadas e realmente lamento que o sistema bancário, por si só, não seja capaz de as ultrapassar. Mas depois tratarei disso e analisarei o documento que o Sr. Deputado me enviou.
Agora referir-me-ia à posição do Instituto Português das Conservas de Peixe.
Suponho que o Instituto em si, como organismo de intervenção, tem os dias contados, mas terá de ser um instituto de qualidade. Não tenho qualquer dúvida de que é nesse sentido que se deve orientar o Instituto de Conservas de Peixe.
Há um estatuto que está em vias de ser ultimado e espero ter aprovado, para meados de Março, o estatuto do novo Instituto. Este estatuto, em termos directos, para ser objectivo e eficaz tem de ser gerido com a participação dos industriais, pois não vejo outra forma de isso ser conseguido.
Realmente, estou convencido, pelos contactos que já fiz com as associações dos industriais das conservas, de que eles estão disponíveis para apoiar um instituto com esta perspectiva.
Portanto, espero que dentro de 30 dias apareça o novo figurino do Instituto que seja formalmente orientado para objectivos de qualidade, com os meios adequados. Estou convencido de que, se isso for posto em prática, os industriais das conservas serão os primeiros a aderir a esta orientação e até a apoiá-la financeiramente, se for caso disso. O Instituto não poderá manter-se se não puder cobrar os serviços a que justamente tem direito, desde que eles sejam complementares e justificáveis.
O Sr. Deputado falou também em problemas de dumping e outros que são mais complicados de resolver em termos internacionais. Realmente, atribuo ao sector das conservas uma possibilidade de grande expansão na perspectiva da adesão à Comunidade Económica Europeia.
Portanto, tudo quanto for feito para resolver ou possibilitar esse relançamento da actividade das conservas terá de ser apoiado.
No entanto, desejava dar aqui uma indicação quanto a um dos desafios que suponho que temos de ganhar e que é a articulação da actividade vertical entre o armamento e a indústria.
Realmente, esta é uma guerra perdida, pois de uma maneira geral o armamento vira as costas aos industriais e estes, por sua vez, viram as costas aos armadores. Não tenho a pretensão de vir a transformar os industriais em armadores e vice-versa, mas acho que a fronteira onde eles se têm de encontrar — e o Estado tem de ter uma posição supletiva e catalizadora nesse aspecto — é a das redes de frio.
Suponho que as instalações de frio são o segredo para que haja interesse não só da parte dos armadores como dos industriais, isto porque os industriais não podem prescindir das redes de frio nem os armadores no que toca às conservas.
Suponho que temos neste aspecto um desafio que é o da mobilização das verbas da Comunidade Económica Europeia para a organização de produtores.
Embora parecendo que uma coisa não tem a ver com outra — do meu ponto de vista tem — devo dizer que
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este problema não tem tido solução porque tem sido possível organizar, sob o ponto de vista geral e integrado, os produtores. Assim, marquei um conjunto de reuniões para ver como é que se utilizam, de facto, as verbas que estão à nossa disposição desde o dia 1 de Janeiro.
Ainda há pouco um dos Srs. Deputados falou nas ajudas da Comunidade Económica Europeia. Nós temos disponíveis 500 000 ECUs cedidos pela Comunidade e exclusivamente destinados à organização de produtores. Essas verbas estão potencialmente disponíveis desde o dia 1 de Janeiro e por mais que se tenha feito para promover o aparecimento de projectos e de candidatos a estas organizações ainda não consegui ver ninguém tomar, formalmente, essas iniciativas.
Assim vou ter de mudar de estratégia e vai ter de ser o Governo a promover a criação dessas organizações e eventualmente até a promover a constituição de régies cooperativas, pois, se não alterarmos esta situação, perderemos este tipo de apoio.
Realmente gostava que os Srs. Deputados tivessem a noção de que nesse sector a intervenção do Estado é pequena, mas, na realidade, o Estado tem de intervir porque as iniciativas que existem neste tipo de matéria são extremamente timoratas em relação à mudança de situações que hoje se verifica.
Na verdade, a partir deste mês está programado um conjunto de contactos — espero conseguir começar por Matosinhos, por exemplo, e não vale a pena globalizar senão não se ultrapassa a situação — para ver se, pegando em dois ou três exemplos, se consegue lançar o rastilho que levará ao desbloqueamento da questão.
Fiz algum esforço, por exemplo no que respeita a Portimão, de estimular a concessão das novas instalações de frio a industriais locais. A pesca sul tem a concessão. Quis formalmente, digamos, estabelecer um protocolo com alguns desses industriais que estavam até preocupados com a entrega destas concessões a outros industrias de outras áreas, e fi-lo porque penso que sempre que for possível se deve atender, prioritariamente, aos interesses locais. Bom, isto é um pontapé de saída, pois suponho que as redes de frio serão a chave de ligação entre os armadores e os industriais, pois de outra forma não sairíamos desta situação.
Quanto à organização de produtores penso que não é possível continuar a pactuar com esta posição de inanição, que os produtores ou os armadores assumem perante esta matéria. Portanto, irei promover a criação de régies cooperativas descentralizadas e não centralizadas.
Um dos Srs. Deputados focou outros aspectos que agora não abordarei e pediu, na sua segunda intervenção, informações acerca de Marrocos e de Espanha no que toca a relações bilaterais.
No que toca às relações bilaterais com Marrocos devo dizer que têm havido algumas dificuldades em cumprir integralmente o que está previsto no acordo com Marrocos. No entanto, neste campo parece que existem novas perspectivas e irei no dia 20, 21 e 22 a Marrocos em visita de retribuição à visita que o Ministro da Marinha Mercante e das Pescas fez ao nosso país.
Suponho que, à partida, é possível obter mais licenças do que aquelas que obtivemos na primeira visita: acho também que é possível concretizar os acordos que estavam previstos no que diz respeito à formação e nesse momento este aspecto está já desbloqueado.
Contudo devo dizer que as nossas relações com Marrocos têm beneficiado das dificuldades das relações de Marrocos com a Espanha. O Ministro marroquino está extremamente interessado em que se consigam promover as ligações entre, por exemplo, Portimão e Tânger, e declarou também que o seu Governo se mostrava interessado em instalar ou participar na instalação de um pequeno estaleiro de reparações. Dada a situação de crise que atravessamos nesta área penso que poderíamos quase exportar um estaleiro dos pequenos que nos sobra!...
Portanto, penso que por esse lado as relações bilaterais estão bem encaminhadas, as perspectivas são boas e acho que as dificuldades que temos tido são ultrapassáveis e não precisamos de esperar mais 1 ano para que as coisas fiquem no saco.
Quanto ao problema das relações bilaterais com a Espanha, suponho que o ano de 1984 foi o ano-chave para vencer as dificuldades que nos separavam. Neste momento não há nenhum plano de pescas para 1985 e se a nossa adesão à Comunidade Económica Europeia se verificar no dia 1 de Janeiro de 1986 as dificuldades que poderiam decorrer desse facto estão — do meu ponto de vista — ultrapassadas.
É evidente que a Espanha tem um problema sério com a sua adesão e que a Comunidade também tem, por sua vez, um problema sério neste sector com a adesão da Espanha. De facto, há uma certa tentativa, alimentada pela Espanha, de tentar resolver os problemas que a Comunidade tem, à custa de um incremento de relações de Portugal com a Espanha. É óbvio que em termos nacionais isto é inaceitável, mas creio que também ultrapassámos esse «cabo das tormentas» e que podemos assegurar que na situação em que hoje nos encontramos só discutiremos com a Espanha em Bruxelas.
Eu diria que a Espanha será um país comunitário como qualquer outro e terá no quadro comunitário vantagens e desvantagens neste sector, com a sua adesão, e nós estamos disponíveis para discutir o que for preciso em Bruxelas. Mas não se exclui obviamente a possibilidade de celebrar um acordo fronteiriço ou até de colaborar com a Espanha noutras áreas. Não percebo por que é que a Espanha há-de resolver, exclusivamente, as suas dificuldades no sector das pescar só à custa de licenças... Há muitas outras possibilidades e até inclusivamente podem fazer, se quiserem, investimentos em Portugal. Neste momento, não me parece que o problema seja crucial.
De facto, há contactos com a Espanha, mas que só visam outros aspectos de cooperação, nomeadamente acordos fronteiriços e outros, e nunca significarão um recuo da nossa posição de exclusividade no que diz respeito ao recurso, designadamente durante o período transitório. Fora do período transitório, se realmente houver abertura das águas comunitárias às frotas portuguesas, também haverá, obviamente, uma abertura condicionada das águas portuguesas à Espanha.
No entanto, nessa área está para se promulgar um diploma que define e articula as condições de funcionamento das três subáreas da zona económica exclusiva, as zonas estatísticas e todo um conjunto de pro-btemas. Esse diploma permitirá, em relação à Comunidade, pôr em funcionamento a definição de taxas e de licenças, de tal maneira que seja posta em prática a estratégia de, em termos globais e durante o período de transição, salvaguardar esta área,
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exclusivamente para os nossos pescadores, isto porque também não temos nenhuma contrapartida de entrar na Comunidade. E o mesmo acontece à Espanha!...
Um dos outros problemas que me foi levantado está relacionado com a situação de bloqueamento das depuradoras, o que, aliás, suponho estar em vias de resolução.
Quanto à área da aquacultura, que não foi o único que citou, tenho de reconhecer que pouco tem sido feito ou então o que se encontra feito não tem expressão. Acho que na verdade há várias coisas a fazer.
No que toca às verbas disponíveis para a investigação, devo ressaltar que elas se destinam exclusivamente à investigação. Na verdade, tanto as albufeiras como as rias, como as águas quentes das centrais termoeléctricas são, digamos, potencialidades que não nos podemos dar ao luxo de desperdiçar.
Embora reconheça que, na verdade, não havia condições suficientes para poder lançar iniciativas desse tipo, entendo que o Governo e o País têm de aceitar esse desafio e não podem ficar na posição em que têm estado nos últimos tempos e cuja responsabilidade assumo, também, parcialmente.
Mas a preparação do lançamento deste desafio não está ainda completa e, portanto, primeiro terá de ser implementado.
A última questão que o Sr. Deputado José Vitorino colocou diz respeito ao problema da ria Formosa.
Creio que esta matéria é, de facto, controversa e diria que, apesar de todas as controvérsias, desde logo se alcançou uma vitória: não tem havido mais construções clandestinas.
Suponho que nesta lógica dos factos agora está programada, e o prazo está a decorrer, a realização de um plano de ordenamento para a zona. No entanto, não tem qualquer espécie de sentido — e assumo esta responsabilidade perante o Sr. Deputado e a Comissão — que se tenham feito demolições com uma certa orientação pedagógica e agora o plano de ordenamento vá permitir novas construções naquela área, isto porque o que lá existe representa já uma carga excessiva sobre a capacidade da zona.
Portanto, o aparecimento de habitações naquela área só pode ser feito por excepção e, no meu ponto de vista, não é sequer previsível.
Em todo o caso vamos ter em conta o plano de ordenamento, embora não veja qualquer perspectiva de poder visualizar a possibilidade, no final de toda esta situação, de se fazer novas construções depois de ter havido a intervenção que houve.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Ministro, estava previsto, designadamente na ilha da Armona, um plano de urbanização com novas construções e aqui é que está a questão, que sempre coloquei de forma muito clara: o problema não pode ser visto como uma distinção entre zonas desafectadas e zonas não desafectadas. Ou as construções são aceitáveis ou não são.
Se as construções não são aceitáveis tanto faz estarem numa zona desafectada, e entregue aos municípios, como estarem numa zona afectada, e portanto sobre o controle de domínio público marítimo.
Portanto, é preciso que isto fique claro e que o Governo assuma este facto com toda a clareza. E esta garantia tem de ser definitivamente dada.
O Orador: — De facto, há exemplos de áreas que até pertenciam ao domínio público marítimo e que foram
desafectadas e há áreas em que esta situação é mais grave do que noutras. Eu diria, por exemplo, que a situação das construções existentes na zona de Faro são mais graves do que na zona de Olhão e, portanto, não se pode meter tudo no mesmo saco.
Realmente, o exemplo da utilização dos terrenos desafectados do domínio público marítimo que foram entregues à Câmara de Faro é, do meu ponto de vista, catastrófica e não pode ser ignorada.
A forma como a autarquia usou os terrenos que lhe foram concedidos por desafectação ao domínio público marítimo é inaceitável e acho que é preciso evitar de uma maneira integrada que isto volte a acontecer. Estou a falar de uma maneira objectiva e agradeço a intervenção de V. Ex.a, mas não estava, de facto, a responder-lhe àquilo que é um certo abuso na perspectiva da defesa do interesse ecológico da zona e a respectiva utilização que as autarquias possam fazer.
No entanto, estou de acordo com V. Ex.a que acção que vier a desenvolver-se para evitar que isso aconteça tem de ser integrada não só no plano de ordenamento da zona, que está no domínio público marítimo, mas, também, na linha de orientação das autarquias.
O plano de ordenamento vai ser discutido com as autarquias e posso assegurar-lhe que o problema está em vias de ser equacionado.
A título de exemplo, no que toca à região de Olhão há uma concessão provisória que foi atribuída à Câmara de Olhão — e o Sr. Deputado conhece melhor a zona do que eu — onde se impõe que toda a construção que lá se fizer tem de ser previamente aprovada pelo Governo e não somente pela Câmara. Isto já foi estipulado tendo em consideração essa preocupação.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Não há plano de urbanização?
O Orador: — Não há plano de urbanização no sentido de construção.
Em relação ao Sr. Deputado Carlos Espadinha vou responder aos aspectos mais importantes da sua intervenção, a primeira das quais respeita ao plano nacional de pescas. O Sr. Deputado disse que não tem conhecimento, neste momento, de um plano nacional de pescas.
V. Ex.a sabe que houve várias tentativas nesse sentido e neste momento não há acesso a nenhum documento.
No entanto, posso afirmar que realmente aquilo que constitui o primeiro documento de trabalho, a que se chamou plano nacional de pescas, está praticamente reformulado. Portanto, logo que o documento exista, facultá-lo-ei ao Sr. Deputado.
De facto, foi a partir daquilo a que se chamou plano nacional de pescas que a situação foi abordada. O facto de ser esse o título do plano pode levar a supor que existe um plano de pescas, aprovado e completamente pronto, mas não é exactamente assim.
Na verdade, há uma tentativa de fazer um plano nacional de pescas que se encontra em vias de reformulação.
Quanto aos problemas do Instituto Nacional de Investigação das Pescas, há pelo menos duas perguntas que os Srs. Deputados me fizeram sobre o interesse e a indispensabilidade que existe de fazer ou implementar acções de investigação, e sobre as dificuldades orçamentais e suficiência ou insuficiência das dotações orçamentais.
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Na fase final do Orçamento de 1984 houve, na realidade, algumas dificuldades orçamentais que foram ultrapassadas, portanto o Instituto Nacional de Investigação das Pescas não só não fechou como acabou por praticamente realizar os projectos que tinha em curso.
Na verdade, embora tenha sido preciso fazer alguma ginástica orçamental, o problema foi ultrapassado. Quanto a este ano, as dotações orçamentais são consideradas suficientes para o programa que existe, mas já não o será, com certeza, para as nossas necessidades. Isto são duas coisas diferentes.
Realmente, entendo que temos de fazer um esforço muito grande no campo da investigação. Temos investigadores jovens que estão disponíveis para participar neste desafio. E suponho que na realidade o que nós, neste momento, estamos em vias de ultimar é precisamente na área da investigação, pedindo simultaneamente à Comissão que não se limite a conceder apoios financeiros exclusivamente no sector da organização de produtores.
Note-se que na semana passada foram enviados para a Comunidade alguns projectos para tentar obter alguns apoios.
Posso dizer até que os apoios que foram requeridos para este ano somam 2,5 milhões de contos. Não faço é ideia se esses 2,5 milhões de contos poderão aliviar o nosso PI DD AC e outras áreas em termos orçamentais.
Se esses 2,5 milhões de contos nos forem concedidos creio que haveria uma margem maior para realizar outros projectos que nem estão aqui consignados. Estou, designadamente, a pensar na investigação e na actividade de capturas de outras espécies como a do atum. Penso que a actividade da captura do atum é dos desafios mais importantes e a não perder em desprimor de terceiros.
O Sr. Deputado faz-me uma pergunta sobre os desvios que existem no mapa viu e no que aqui está, mas não percebo, assumo a responsabilidade, e faço-lhe o acerto em relação a isso.
Mas eu diria que o que conta em termos globais — porque o arranjo em termos de Orçamento é mais complicado e se houver uma alteração de 10 centavos ela já terá de figurar no Orçamento —, o quadro-guia que deve vigorar por agora, embora eu tenha de responder depois quanto aos desvios, é o quadro que o Sr. Secretário das Pescas, salvo erro, nos deixou como os grandes investimentos, ou as grandes verbas de investimento, dos portos que estão e que se manterão em execução.
Alguns deles, designadamente como acontece com o porto de Vila do Conde, arrancam este ano embora em termos de adjudicação se tenham iniciado o ano passado.
Pegando nesta questão, e atendendo ao pedido do Sr. Deputado Domingues Azevedo, farei uma resumida apresentação dos portos principais. Eu diria que o que está, neste momento, em curso em termos de grandes investimentos e dirigidos prioritariamente para a actividade comercial são os portos de Aveiro e de Portimão.
O porto de Aveiro situa-se no terminal de uma estrada internacional que aponta para Espanha, e é o primeiro projecto de portos financiados pela CEE numa lógica de integração no que diz respeito até ao apoio a redes rodoviárias.
O porto de Portimão está a ser financiado pelo KFW, e são os dois grandes portos que estão a ser implementados, neste momento, com uma vocação essencialmente comercial, embora possam ter outras vocações complementares como, por exemplo, de pesca.
Em relação ao porto de Viana do Castelo diria a mesma coisa.
O porto de Viana do Castelo é um porto misto, que, portanto, possui uma componente comercial e outra piscatória.
Quanto às outras observações que foram feitas pelo Sr. Deputado Silva Domingos sobre as dificuldades da actividade da pesca em Viana do Castelo, devo dizer que têm de ser ultrapassadas e suponho que está programada uma visita a Viana para o próximo mês para poder debater e para sentir melhor quais as dificuldades que existem, mesmo em relação à operação do porto comercial, e estou disposto a discuti-los com as entidades envolvidas.
Tenho a sensação de que às vezes estas obras aparecem desligadas dos interesses locais e não é, digamos, possível fazer este tipo de investimentos, por parte do Estado, não sendo de seguida apoiados e recebidos de mãos dadas pelos interesses locais.
Penso que essa tarefa está para fazer. E neste momento algumas obras estão a ser feitas com planeamentos e programações perfeitamente justificáveis e aceitáveis, mas não estão provavelmente a ser entendidas na sua globalidade e na sua amplitude, em relação aos interesses locais. E acho que temos de fazer essa ligação porque senão as obras, apesar de serem feitas pelo Estado, ficam subaproveitadas pelas entidades locais.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — V. Ex.a dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, julgo que com a afirmação que acaba de fazer nos cria um problema.
Na minha intervenção disse que a orientação de prioridade de pontos deve ser fundamentalmente estabelecida pelo Ministério do Mar.
V. Ex.a diz-nos que deve ser tido em conta fundamentalmente a informação dada pelo Ministério do Mar, mas o que nós teremos de votar é o mapa vn, que vem no Orçamento, e em que, por exemplo, o porto de Aveiro — a que o Sr. Ministro dá prioridade — não está minimamente contemplado.
O Orador: — Sr. Deputado, proponho um esclarecimento para amanhã em Comissão, e espero não ficar na posição do Sr. Secretário de Estado que se comprometeu e depois não respondeu à questão. Portanto, porei amanhã aqui o mapa de conciliação destes projectos. Farei esses esclarecimentos e suponho que à partida o que interessa nesta intervenção é fazer a ligação entre o que estamos a dizer agora e o mapa vn.
Começando pela intervenção do Sr. Deputado Silva Domingues, V. Ex.a pôs-me um problema que se prendia com o saber como é que o Estado vai assumir as responsabilidades do balanço da extinção das duas empresas e com que apoios orçamentais.
Em primeiro lugar, direi que quanto à extinção não é só o Estado o único credor. Embora havendo outros, o Estado é, de facto, o principal credor, pois tem 60 °7o dos créditos que estão aqui em jogo.
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O processo de extinção vai desenvolver-se por 2, 3 ou 4 anos, como é normal, e está assegurado que é o Estado que assume grande parte das dívidas, na ordem externa, pelas repercussões que isso terá.
Está previsto em 1985 que qualquer solução que tenha de vir a ser assumida no concreto terá a efectiva repercussão em 1986 e assim por diante.
Portanto, as assunções são assumidas à medida que elas se vão cumprindo e em cada Orçamento que se segue elas apareceram, digamos, adequadamente.
É óbvio que este ano não está só na provisão e poderá eventualmente ter acesso a qualquer mobilização mas é essa a perspectiva de cobertura orçamental.
No entanto, devo dizer-lhe que segundo os números que disse, a perspectiva do balanço é de 1 para 4. Portanto, os créditos não poderão ser recebidos senão por um quarto, o que significa realmente que no défice em si há pelo menos 25 % das dívidas que serão pagas pela massa falida. No entanto, faltam os outros 75 °Io que serão assim programados.
Outro Sr. Deputado perguntou-me como é que o Governo pensava desenvolver a Marinha Mercante, designadamente no sector privado, para que este plano de actuação possa ser concretizado.
Suponho que o Sr. Secretário de Estado da Marinha Mercante já deu alguns esclarecimentos à Comissão, mas eu acrescentava dois ou três aspectos.
Realmente suponho que não é só a situação de dificuldade em que as empresas do sector público se têm encontrado que tem levado a que não tenha havido condições para que a iniciativa privada ocupasse algum espaço significativo nesta área.
Suponho que a única chave deste problema passa pela existência de contratos continuados de tal maneira que se possa, por essa via, ultrapassar as dificuldades das flutuações de crédito ou da concorrência desenfreada que há no mercado internacional.
A segunda questão diz respeito às observações que o Sr. Deputado fez, e que para mim são um dado adquirido, no sentido de que a isenção não está consignada de uma maneira objectiva de acordo com o programa e não de uma maneira ad hoc, de imposto de capitais, que poderá permitir a importação adequada e concertada entre o programa de unidade de casco nu ou até de unidades em segunda mão. Portanto, sem os programas combinados e sem esse estímulo directo não estou a ver a possibilidade de sair deste impasse em que nos encontramos de falta de interesse do sector privado para este sector.
Quanto ao problema da isenção do IVA confirmo que ela existirá, neste caso.
No que toca ao plano de encomendas aos estaleiros nacionais, penso que não está em causa, nem é possível, a questão do custo competitivo. Temos é que reconhecer o que se entende por competitividade. No mercado internacional existe uma situação de dumping — que toda a gente conhece — naquilo que são os preços de venda de navios novos.
É evidente que entre isso e aquilo que pode ser um preço razoável ou aceitável existe uma certa diferença. No entanto, os preços têm de ser minimamente competitivos e é por isso que no plano de renovações da frota se faz um balanceamento entre navios construídos em estaleiros portugueses, minimamente competitivos, e navios importados. Só a partir desse balanceamento em termos de investimento é que é possível dispor de investimentos — diria eu — rentáveis.
De outra maneira os investimentos têm sobrecustos que são insustentáveis para a exploração das novas empresas ou mesmo de outras já existentes.
Abordou-se também aqui a questão das atribuições de capital.
Na realidade, no Orçamento deste ano está prevista, no PISEE, a atribuição de 4 milhões e mais 3 milhões às novas empresas públicas ou do sector público da marinha mercante, sendo 4 milhões de contos para dotações de capital inicial, que o Estado subscreveu por inteiro e que é de 6 milhões de contos — 1 milhão de contos para a Transinsular e 4 milhões de contos para a Portline —, tendo já realizado 2 milhões de contos e faltando apenas a realização dos restantes 4 milhões de contos.
Estes 4 milhões de contos já estão previstos na dotação deste ano, mas também está prevista a atribuição à companhia de mais 3 milhões de contos para lhe permitir tomar posições no que diz respeito aos activos das antigas companhias.
As antigas companhias vão pôr em praça os seus activos e as novas companhias não podem prescindir de alguns desses activos.
Portanto, essa existência de 3 milhões de contos é para poderem tomar posição nesses leilões e não perderem a oportunidade de tomar posição em relação a alguns activos que venham a ser postos em leilão.
Na realidade, o montante que lá está é de 7 milhões de contos. Mas, para todo este conjunto, há uma outra receita que está previsto venha a ser consignada para poder acorrer a outras prestações de capital ligadas a novos investimentos ou até à atribuição de bonificações de ordem financeira, para que os investimentos sejam competitivos — como o Sr. Deputado referiu. E isso passa pela actualização das imposições marítimas, que permitirá ter acesso a uma receita que se prevê seja, em termos anuais, na ordem dos 6 milhões de contos.
Em termos de 1985, essa receita não será de 6 milhões de contos, visto que já não poderá ser cobrada nos meses de Janeiro e Fevereiro como, de resto, o Sr. Deputado Octávio Teixeira também já referiu. Portanto, a actualização das imposições marítimas vai permitir dispor, anualmente, de 6 milhões de contos. Formalmente, são orientadas para permitir obter 20 % a 30 % de dotações, de capitais próprios e ter as bonificações que os investimentos exigem.
A seguir, o Sr. Deputado fez-me uma pergunta relacionada com o porto de Aveiro e sobre a possibilidade de a Junta, pela primeira vez, em autofinancia-mento, dar o pontapé de saída na concretização do porto de pesca. Posso dizer-lhe que esse problema está ultrapassado e que vai ser concretizado este ano, em situação de autofinanciamento. O porto de pesca de Aveiro —e não a extensão do porto comercial— vai arrancar em autofinanciamento, com a utilização das receitas próprias da Junta que neste momento estão consignadas com esse objectivo e são na ordem dos 200 000 contos.
Depois, o Sr. Deputado fez algumas considerações acerca de terminais existentes em Caminha, num e noutro lado. Suponho que este assunto não está a correr pelo Ministério do Mar, mas sim pelo Ministério do Turismo. Tenho ouvido falar nisso, mas como não passa nenhuma informação pelo meu ministério não sei em que pé está a situação.
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Falou-me também no problema do porto de pesca de Viana do Castelo, questão a que penso já ter respondido, embora de forma sumária. Mas colocou-me um outro problema que, para mim, é muito importante: problema das lotas e das pequenas lotas.
Suponho que o ano de 1985 tem de marcar uma viragem em relação à situação das lotas, porque, do meu ponto de vista, o estatuto pelo qual as lotas têm vindo a ser geridas é inadequado. Portanto, teremos de encontrar soluções e, provavelmente, a organização de produtores permitirá dar o ponto de partida nisto, pois não é possível gerir as lotas de uma maneira centralizada. As lotas têm de ser geridas descentralizadamente, com a participação das entidades locais, como sejam os armadores, os industriais e, eventualmente, e noutro quadro, até os comerciantes. Esta é a única via que vejo para se ultrapassar o problema da fuga às lotas e das dificuldades financeiras das lotas; de outra maneira nunca se conseguirá ultrapassar esses problemas.
É, portanto, um desafio importante: passam anualmente pelas lotas qualquer coisa como 16 ou 17 milhões por ano, e não é possível manter a situação gerindo isto de uma maneira centrada, não descentralizada. Mesmo assim, e como não passa pelas lotas senão cerca de metade das capturas efectuadas, diria que esta situação não pode manter-se e será, com certeza, modificada.
Em seguida, o Sr. Deputado Américo Salteiro colocou-me algumas questões, a primeira das quais relacionada com uma verba inscrita no Orçamento da AGPL. As administrações portuárias e as juntas figuram no orçamento como contas de ordem, em termos das suas despesas correntes, isto é, entram com as receitas e com as despesas equivalentes e que são as despesas e as receitas correspondentes ao seu funcionamento normal. Figuram lá, portanto, despesas correntes.
No meu ponto de vista, as administrações portuárias e as juntas estão a um passo de sair da máquina pública- Gostaria de ver aprovado, pelo Conselho de Ministros, a curto prazo, para as administrações portuárias e juntas um estatuto muito mais próximo do de uma empresa do que do estatuto de um departamento do Estado. Em termos orçamentais, já são tratadas assim e suponho que deveria ser nessa linha que nos devíamos orientar. No entanto, suponho que no Orçamento a que os Srs. Deputados se referiram, a verba mais importante — e não foi só o Sr. Deputado Américo Salteiro que falou no assunto — diz respeito, seguramente, ao recrutamento de mão-de-obra do centro coordenador do trabalho portuário, e é a verba mais importante da AGPL. Suponho que é assim, mas se não for o Sr. Deputado corrigir-me-á, e posso até prestar-lhe um esclarecimento mais atempado e mais detalhado acerca dessa matéria.
Colocou-me também um problema relacionado com a Sociedade de Reparação de Navios. Sobre isto vou agir exactamente como agi em relação às questões levantadas pelo Sr. Deputado José Vitorino, isto é, vou anotar a questão e verei o que se pode fazer em relação a esta empresa. De facto, não foi colocada ao Ministério qualquer situação relativa à Sociedade de Reparações de Navios, e não sei sequer se a empresa tem acesso a um contrato de viabilização ou coisa que o valha.
Vou ver qual é a situação e depois tentarei resolver o problema, mas não tenho, no Ministério, qualquer
posição oficial da empresa para poder responder agora ao Sr. Deputado.
Em relação às perguntas feitas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, a primeira questão colocada prende--se um bocado com a falta de articulação entre o que aqui está e o Orçamento, no que diz respeito a prio-riedades.
A sua grande preocupação dizia respeito ao problema das opções, dos critérios baseados para se poder privilegiar este investimento em detrimento de outro ou colocar este à frente do outro.
Acerca disto, dir-lhe-ei que, em relação a grandes projectos, praticamente com o arranque de Sesimbra e de Vila do Conde...
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Ministro, o meu pedido de esclarecimento acerca dos critérios era nessa perspectiva de haver uma escolha, uma opção, por parte do Ministério do Mar e depois aparecer aqui uma coisa diferente.
O Orador: — Está bem e, nesse caso, julgo que, parcialmente, já respondi a isso.
Quanto ao porto de pesca de Sines — ao que julgo foi a questão levantada a seguir — devo dizer-lhe que a pergunta acabou por aparecer com uma oportunidade total. De facto, estive anteontem em Sines e, em relação à situação, já foi possível, formalmente, perante a autarquia, os pescadores, e com a mobilização do Gabinete de Área de Sines, da EDP, etc, assegurar o seguinte: em primeiro lugar, o problema do arranque da primeira fase do porto de pesca será, sem qualquer dúvida, uma realidade no decorrer deste ano, com a utilização de recursos ligados ao projecto do porto Carvoeiro.
Neste momento, já está tomada a opção de que será o empreiteiro que está em Sines que fará aquelas obras, para se poder dizer que as obras começam, formalmente, este ano como se tivesse havido um concurso e o processo tivesse arrancado. De resto, as propostas existem, a avaliação está a ser feita e eu espero que, dentro de 30 dias — e foi a isso que me comprometi —, ou seja, até ao fim de Março, tenha lugar a adjudicação do adicional desta obra. É a primeira fase.
O porto de pesca de Sines não é um porto de pesca do tamanho do de Olhão, mas está de acordo com aquilo que a população justifica. Por isso, diria que é um bocado pomposo chamar-lhe porto de pesca, mas é qualquer coisa a que as populações aspiram há muito tempo e, pelo menos, a primeira fase será feita.
Depois, o Sr. Deputado fez-me algumas observações sobre Marrocos. Sobre isto tenho a sensação de que já respondi mas, se não for assim, o Sr. Deputado dir-me-á.
Quanto à existência de verbas apontadas para as sociedades mistas, diria que as verbas consignadas no orçamento são verbas para apoio de reconversão ou para apoios a navios que vão ser integrados em sociedades mistas. Formalmente, serão os armadores que vão constituir as sociedades mistas, mas, na perspectiva do acordo celebrado, prevê-se a possibilidade de alargar esse âmbito das sociedades mistas. A verba consignada
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é para apoio a construções, reconstruções ou adaptações de navios que vão ser integrados em sociedades mistas.
Depois interrogou-me sobre aquilo que será o destino de uma verba de 18 078 contos que está consignada no orçamento para a pesca longínqua. Em relação a isso, o principal objectivo da verba é permitir o abate e a reconversão de navios na pesca longínqua. Como o Sr. Deputado sabe, cada vez é mais difícil ter acesso a pesqueiros no exterior, designadamente aos pesqueiros de pesca longínqua, nos quais se vai pescar o bacalhau. Não vamos poder continuar nesta posição de manter algumas unidades numa situação de total ob-soletismo, que não permite a sua manutenção. Portanto, é preciso apoiar essas reconversões e esta verba destina-se a reconversões, designadamente para abate.
Em relação à aquacultura, já emiti aqui a minha opinião, que é coincidente com a preocupação que os Srs. Deputados manifestaram em relação à situação actual, que é insuficiente e pode ser desenvolvida.
Portanto, saltaria por cima dessas observações e continuaria a responder a outras perguntas.
O Sr. Deputado colocou-me também um problema em relação à AGPL, sobre a mobilização de despesa de serviços não especificados e, ao que suponho, é uma pergunta idêntica à do Sr. Deputado Américo Salteiro. Sobre isto, a explicação que dou — e, se for incorrecta, corrigi-la-ei depois — é a seguinte: esta verba destina--se à mobilização de mão-de-obra do centro coordenador do trabalho portuário.
Quanto ao problema da extinção do FRAIP, direi que o FRAIP só tem, neste momento, uma maneira de funcionar... e está extinto desde o dia 1 de Janeiro. O Tesouro assumiu a responsabilidade de continuar a gerir o FRAIP, estando em vias de promulgação um despacho de clarificação desta situação, com a nomeação de uma comissão liquidatária, que a esclarecerá melhor. Mas é o Tesouro que tem a responsabilidade de responder por aquilo que é — digamos — o antigo FRAIP.
Q Sr. Deputado Octávio Teixeira falou-me também em problemas de subsídios e dotações de capital. Suponho que há pouco já tive oportunidade de responder em relação a esses elementos.
Falou-me também dos encargos da situação do Tesouro e da maneira como se irão processar. Penso que também já respondi a esta questão.
A seguir pretendeu que eu esclarecesse mais qualquer coisa acerca da renovação da frota e completasse assim a afirmação do Sr. Secretário de Estado quanto ao «programa a 10 anos». O esforço que vai ser feito no ano de 1985, naquela lógica que ainda há pouco referi, quanto à necessidade de adquirir interna e externamente navios em sintonia, está em vias de negociação uma adjudicação à Setenave — não está ainda concretizada —, que se seguirá aos 3 graneleiros que serão completados este ano. Portanto, vamos negociar no decorrer deste ano uma segunda encomenda para a Setenave, mas este ano concretizar-se-á, com certeza, a aquisição, no mercado externo, de 3 Panamax de ocasião, simultaneamente com a notificação das encomendas. .. Isto é para concretizar a questão, para além do plano a que o Sr. Secretário de Estado já fez referência.
Quanto ao problema das imposições marítimas, suponho que também já esclareci o assunto, mas se assim não for o Sr. Deputado referir-mo-á no fim.
O Sr. Deputado Leonel Fadigas fez-me uma observação de partida quanto às solicitações para as várias comunidades piscatórias e quanto à existência de portos de abrigo, tendo referido, nomeadamente, a existência do primeiro grande investimento em curso, e que é na Nazaré. E referiu-me que haverá uma certa desarticulação entre aquilo que é a política de construção de portos de abrigo e a política de renovação das frotas. Salvo melhor opinião, foi isto que eu entendi das palavras do Sr. Deputado Leonel Fadigas. Mas o problema talvez não se apresente exactamente assim: há, com certeza, desarticulação, e suponho que a criação do Ministério do Mar pretendia resolver parte deste problema de descoordenação. Reconheço que o problema, em si, é um desafio mais complicado: o sector das pescas é um sector extremamente complexo e, na realidade, não é possível dar-mo-nos ao luxo de ter normalizações em termos de concessões. A decisão de termos apoiado o investimento em Vila do Conde, para se poder consolidar um estaleiro de construção em madeira, tem de apontar para a existência de 2 ou 3 navios protótipos destinados à nossa pesca artesanal. Não podemos continuar nesta situação, mas o que é verdade é que os nossos técnicos são todos supercientis-tas, e quando se fala nisto nunca aparecem dois ou três com a mesma opinião e a nossa população piscatória vai no mesmo sentido, isto é, quando um barco serve para um agregado não serve para outro. Mas isto não é possível e a grande falha existente neste momento é, exactamente, a de não termos um plano normalizado para 2 ou 3 navios destinados à pesca artesanal. Enquanto não os tivermos, não podemos obter nem fontes de financiamento nem apoios financeiros e não sairemos desta situação.
O óptimo não será isto que acabo de dizer, mas sim cada pescador ter o barco que quer, mas, como não é possível sairmos disto, teremos de resolver e ultrapassar o problema.
Quanto ao problema do orçamento do INÍP, creio já ter respondido. Não tenho qualquer dúvida de que teremos de fazer um grande esforço na investigação.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca falou, especificamente, no problema do acordo com Moçambique e na sua situação de impasse ou de falta de utilização.
Devo dizer-lhe que nos últimos meses fiz quatro tentativas de apoio a várias iniciativas para irem pescar para Moçambique, a última das quais foi ontem.
Estamos neste momento a apoiar, em termos financeiros, barcos que querem ir pescar para Moçambique, tendo em vista a realização de algumas adaptações nesses barcos.
Na realidade, como o Sr. Deputado sabe — in: dependentemente da possibilidade de se colocar ou não barcos da SNAPA a pescar nessa área —, o que está a acontecer neste momento é que os acordos são negociados e se obtêm licenças de pesca, mas que, se as pessoas não se interessarem ou as condições não forem satisfatórias, esses acordos ficam, em parte, por preencher.
No entanto creio que o acordo com Moçambique é mais largo do que, apenas — e em termos directos —, a actividade da pesca. Se as coisas se concretizarem — eu penso que sim —, é possível que, dentro de 3 meses, estejam a pescar em Moçambique uma dúzia de barcos.
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No que diz respeito à recolha de bibliografia e até à formação e atribuição de bolsas, não sou capaz de lhe responder, instantaneamente, sobre se está ou não concretizado o assunto. Mas terei muito prazer em lhe dar, mais tarde, essa informação.
Suponho, pois, que o problema da bibliografia está arrumado, isto é, se não foi enviado está praticamente concluído.
No que diz respeito às bolsas de pesca, não sei se estão ou não concretizadas, mas era um assunto que fazia parte da nossa estratégia e do nosso objectivo. Por isso, temos de concretizar essas bolsas e, se alguma coisa empanou, temos de o fazer...
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Dá-me licença, Sr. Ministro?
O Orador: — Com certeza, Sr. Deputado.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Ministro, muito rapidamente, a propósito da sua afirmação de que dentro de três meses estarão a pescar em Moçambique uma dúzia de barcos, gostaria que a concretizasse um pouco melhor.
O Orador: — Concretizo, Sr. Deputado, dizendo o seguinte: as iniciativas que tomei, em termos de complemento supletivo — se quiser —, não foram ainda formalmente concretizadas; a primeira foi gorada, mas espero que as duas tentativas em curso neste momento se concretizem. Logo que estas tentativas estejam mais concretizadas dar-lhe-ei informações e, a última de que disponho, é no sentido que há pouco referi.
Mas, em tempo oportuno, clarificarei essa informação, pois penso vir a ter elementos concretos dentro de uma semana.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca colocou-me também problemas relacionados com os investimentos e com a CEE. Já esclareci que a existência desta disponibilidade de 500 000 ECU ê real desde o dia 1 de Janeiro e que, neste momento, não há projectos para a sua utilização. Vamos tentar arrancar com régies cooperativas, nomeadamente, em Matosinhos, tendo em vista o acesso a esta verba em termos de organização de produtores.
Quanto a outros recursos, também já disse que está apresentado, até na área da investigação, na área de apoio à reconversão do porto, etc, e foi enviado para Bruxelas um conjunto de projectos — que posso facultar ao Sr. Deputado para consulta —, totalizando um montante de 2 822 495 contos, para ser preciso. Simultaneamente foi também apresentado em Bruxelas um pedido de apoio financeiro — que não sei se será concedido, mas sem ser pedido não será concedido, com certeza —, tendo até em vista a mobilização de meios para o controle da Zona Económica Exclusiva. Foi também apresentado à CEE um pedido de meios aéreos e de meios de tratamento de informações e de dados para esta zona.
Suponho que a sua última questão era sobre o que iríamos fazer à marinha mercante e creio que, em parte, já lhe respondi.
O Sr. Deputado Alexandre Reigoto questionou-me sobre novas tecnologias e as verbas que lhes estão consagradas.
É evidente que «novas tecnologias» é uma expressão que está, mais ou menos, consignada agora; esta-
mos sempre a falar em novas tecnologias e as novas tecnologias aparecem todos os dias, mas, no fundo, o que me preocupa mais é a possibilidade de tomarmos uma posição na captura do atum, o que não tem nada a ver com outros problemas nem com outras inovações tecnológicas. A adopção de novas tecnologias na pesca do atum é formalmente apoiada.
Nestas circunstâncias e nessa orientação, temos prevista a mobilização de capital através da participação do IPE na primeira empresa que, com algumas dificuldades, que ainda se mantêm, se meteu nessa aventura da exploração do Tunamar. Estão quase prontos dois atuneiros e, portanto, a intervenção em termos financeiros passa pela mobilização de algumas dotações de capital do IPE, numa tentativa de pormos a funcionar três atuneiros, apesar das sérias dificuldades de arranque que a empresa tem vindo a sofrer.
Apesar de não ter respondido de forma exaustiva, parece-me que dei a volta às perguntas, pelo menos, e de acordo com o meu critério, penso que respondi àquilo que me pareceu ser mais importante.
Se alguma coisa tiver ficado para trás, solicito-lhes, Srs. Deputados, que me peçam um esclarecimento adicional.
O Sr. Presidente: — Inscreveram-se novamente para formular pedidos de esclarecimento ao Sr. Ministro do Mar os Srs. Deputados Américo Salteiro, Luisa Daniel, Carlos Espadinha, Alexandre Reigoto e Ilda Figueiredo.
Sr. Ministro, deseja responder a todos os Srs. Deputados no final ou pretende responder a cada um dos Srs. Deputados logo após a respectiva intervenção?
O Sr. Ministro do Mar: — Sr. Presidente, responderei no final das intervenções dos Srs. Deputados, tal como fiz anteriormente.
O Sr. Presidente: — Tem a apalavra o Sr. Deputado Américo Salteiro.
O Sr. Américo Salteiro (PS): — Sr. Ministro, segundo penso, em resolução do Conselho de Ministros, do ano anterior, foi atribuída ao GAS uma verba de 600 000 contos, por transferência de verbas do PIDDAC, que se destinava ao financiamento do terminal nacional de carvão de Sines.
Parece que houve problemas quanto a isto, parece que a Direcção-Geral da Contabilidade Pública teria dito que não e sucede que essa verba não foi mencionada nem no Orçamento de 1984, nem no Orçamento Suplementar nem aparece agora.
Como é que isto se vai passar, Sr. Ministro?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Luísa Daniel.
A Sr.a Luísa Daniel (PS): — Sr. Ministro, apesar das informações que prestou sobre as questões colocadas relativamente a certas verbas de bens não duradouros e aquisição de serviços, gostaria que me dissesse qualquer coisa sobre as seguintes verbas: 70 000 contos atribuídos à Administração do Porto de Sines; uma verba de bens não duradouros de 83 000 contos atribuída à Administração dos Portos do Douro e de Leixões e à aquisição de serviços não especificados, verba no valor de 125 000 contos.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.
O Sr. Carlos Espadinha (PCP): — Sr. Ministro, na minha primeira intervenção, não levantei a questão dos salários dos trabalhadores da CPP que vou levantar mas antes faço também minhas as palavras do Sr. Deputado do PS em relação aos trabalhadores da Sociedade de Reparação de Navios.
Como é conhecido, os trabalhadores da CPP receberam na ordem de 5 e 6 meses de salários e continuam, salvo erro, com 12 meses de salários em atraso.
Acontece que não vemos, nas verbas aqui indicadas, qualquer verba que possa levar ao pagamento destes salários em atraso. Gostava, pois, que o Sr. Ministro me esclarecesse sobre a maneira como estes salários vão ser pagos aos trabalhadores, sabendo nós que a empresa já está extinta.
À volta destes salários levanta-se o problema de, segundo a comissão liquidatária, os trabalhadores não terem direito aos salários compreendidos no período de Maio a Agosto. O que se passa com esta questão, Sr. Ministro?
Outra questão que gostava de colocar, ainda antes de voltar às questões a que o Sr. Ministro já respondeu, está relacionada com o serviço de lotas e vendagem — e o Sr. Ministro já abordou a questão pela rama, numa resposta que deu a um outro Sr. Deputado.
Sabemos que o Governo tem financiado ou emprestado verbas a algumas empresas de pesca através das verbas do serviço de lotas e vendagem. Como o Sr. Ministro disse — e eu anotei — o ano de 1985 vai ser, realmente, 1 ano de arranque na resolução do problema dos serviços de lotas e vendagem e focou também um aspecto — acerca do qual concordo consigo —, e que é a questão de se poder evitar a fuga do pescado à lota. Mas penso que para isso será preciso arranjarem-se as condições necessárias e recordo-me de alguns requerimentos feitos ao Governo, relacionados com algumas pequenas lotas, designadamente, do Norte do País. Posso mesmo dizer-lhe que é precisamente no Norte do País que há maiores fugas de pescado à lota.
Mas, dizia eu, nalgumas lotas e nalgumas praias onde centenas de pescadores exercem a sua actividade, os serviços de lotas e vendagem são fracos, isto é, não dão a segurança necessária para se efectuar a passagem pela lota de todo o peixe que é pescado. A alguns requerimentos que apresentei ao Governo, e em que referi a construção de molhes de abrigo para essas zonas, é--me respondido, pura e simplesmente, que o Governo não tem ideia de fazer lá quaisquer obras, pois quer incentivar os pescadores por forma a que eles possam vir a integrar-se em unidades maiores, que são abrangidas por outros portos de pesca. Creio que isso vai ser muito difícil.
A questão do pequeno pescador artesanal, daquele pescador que pesca com dois ou três homens na mesma embarcação — e eu entendo isto por uma questão de prática pois desde os 10 anos que lá ando — é uma questão que, qualquer governo, terá dificuldades em resolver, ou seja, em acabar com essas comunidades piscatórias porque o pescador, tal e qual como o agricultor, sente aquilo que é seu e terá dificuldades em ir trabalhar por conta de outrem. Neste caso, em nossa opinião, era realmente necessário proceder à segurança da actividade daqueles pescadores. Lembro-me, desig-
nadamente, de praias do distrito do Porto e de outras, por aí a baixo. Aliás, anotei a inscrição no Orçamento de verbas para Vila Nova de Mil Fontes e para o Porto das Barcas, que também é uma comunidade piscatória e, segundo o Governo afirmou, esta reivindicação da população da área, já desde há muito tempo, vai ser lançada durante este ano de 1985.
Sr. Ministro, ainda relacionado com algumas respostas dadas por si, gostava que me esclarecesse o seguinte: pareceu-me que a verba dos 500 000 ECU vindos da CEE só estaria à disposição de organizações de produtores. Isto quer dizer que a verba está à disposição da actividade piscatória, se quiser concorrer?
Sobre isto, levanto aqui uma questão pontual, que é, por exemplo, a questão da Unicopesca, em Peniche. Neste momento, a Unicopesca tem cinco barcos, que estão quase prontos — falta-lhes o quase — mas não lhe tem sido dado apoio de verbas para pôr estes barcos a produzir. Alguns deles estavam até previstos — se vier a concretizar-se o seu acabamento — para um contrato que a Unicopesca está a negociar com o Governo de Moçambique, no sentido de duas destas embarcações poderem actuar nessas águas.
A minha útima informação — se não houver nenhuma mais recente — era a de que não havia financiamento para o acabamento destes barcos. Ora, estes barcos estão hã 2 anos encostados ao cais do porto de Peniche, tendo o casco e o motor prontos, faltando--lhes, no entanto, outras aparelhagens para o que é necessário um financiamento.
Deixo, então, esta pergunta: a Unicopesca, por exemplo, pode recorrer ao financiamento através da verba vinda da CEE?
Outra questão ligada à questão dos portos e já que o Sr. Ministro disse que nos vai fazer chegar uma informação correcta — e esta que está aqui, do Ministério do Mar, está correcta —, deixo-lhe uma pergunta-, por que é que não está aqui prevista qualquer verba para o porto de Peniche, que vinha lançado no mapa vn do orçamento do ano anterior, quando o porto de Peniche está na fase final? Pensávamos que seria este ano, o ano de 1985, o ano da sua fase final e, afinal, não vemos lançada, neste orçamento do Ministério do Mar, nas verbas para os portos, qualquer verba para o porto de Peniche.
Outra questão que também lhe deixo está relacionada com o porto de Sesimbra que, segundo se sabe, vai ter a sua fase inicial neste ano. A verba lançada no orçamento para isto é da ordem dos 200 000 contos.
O Sr. Ministro acha que esta verba vai chegar, durante todo este ano para o trabalho, isto é, a uma obra que começa e não irá parar por falta de verba? Como é que está a ser vista esta situação?
Há outra questão, Sr. Ministro: entregamos uma proposta de alteração relativamente às verbas inscritas no orçamento para o sector da pesca e que irá ser discutida e sobre a qual queria colocar-lhe duas questões. A primeira delas está relacionada com a parte da intensificação da ZEE — este acréscimo que propomos — é a parte do Instituto Nacional de Investigação das Pescas. E isto porque já ouvimos da boca do Sr. Ministro que está de acordo connosco, que as verbas para este Instituto são poucas e que a nossa pesca necessita, para se desenvolver, de uma investigação muito profunda.
Outro assunto — e que pode causar alguma estranheza —é a verba que inscrevemos na nossa proposta
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relativa à pesca da sardinha. É que, Sr. Ministro, nós pensamos que a pesca da sardinha é aquela que, neste momento, mais precisa de ser desenvolvida, não só pela questão das conservas — que já aqui foi referida pelo Sr. Ministro aquando da sua primeira intervenção —, e pela consequente entrada de divisas para o País, como também pensamos, do pouco conhecimento que temos dos stocks, da sardinha é realmente aquele que existe em abundância. Embora seja uma pesca que tem sido, na parte norte do País, um pouco desprezada, reconhecemos que, em relação ao Algarve, a reconversão de algumas traineiras de pesca da sardinha foi realmente um bom princípio.
Pensamos que este procedimento devia ser alargado a todo o Pais, e também não estamos muito de acordo que algumas das verbas, a serem dadas, o sejam a fundo perdido. Estamos mais de acordo que essas verbas sejam postas à disposição de quem queira realmente investir, no sentido de virem a ser pagas com juros muito baixos, através das vendas que as empresas possam depois vir a efectuar.
Eram estas as questões que lhe colocava, Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — A pergunta que queria colocar não é bem dirigida ao Sr. Ministro do Mar. Ela é dirigida ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, e não tem nada a ver com pescas mas, sim, com agricultura porque, quando estivemos aqui cem o Sr. Ministro da Agricultura, fiz-lhe uma pergunta, aliás, muito simples, tendo dito o Sr. Ministro, muito honesta e correctamente, que só o Sr. Secretário de Estado do Orçamento poderia responder a essa pergunta.
A pergunta é muito sucinta, a resposta poderá também ser muito simples, pelo que pediria ao Sr. Presidente, se não visse qualquer inconveniente nisso, que me permitisse fazer a pergunta ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento, uma vez que ele ainda está cá.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, estou certo de que não irá demorar muito, uma vez que o nosso programa é com o Sr. Ministro do Mar. Faça favor de fazer a pergunta e depois o Sr. Secretário de Estado do Orçamento dar-lhe-á a resposta, hoje ou quando tiver oportunidade de o fazer.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Muito obrigado, Sr. Presidente.
Sr. Secretário de Estado do Orçamento, na designação das receitas, mais propriamente nos impostos directos, há uma rubrica que diz: imposto de cadastro — 2000 contos. Suponho que esse imposto de cadastro se refere, essencialmente, ao cadastro das vinhas. Sendo assim, é evidente que só existe um cadastro mais ou menos actualizado, que é o cadastro da Região do Douro.
A minha pergunta vai no sentido de saber se esse imposto tem aplicação em todos os vinhedos, já cadastrados ou não, e nas vinhas, mais antigas ou mais modernas. Por outras palavras: o imposto tem aplicação imediata para todo o vinhedo ou só para aqueles que foram regularizados e legalizados através da última lei respectiva que lhes conferiu essa oportunidade?
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado, j Não sei se o Sr. Secretário de Estado do Orçamento pretende dar já a resposta. i
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento (Alípio Dias): — Sr. Deputado, hoje, lamentavelmente, deixei a minha pasta no carro. Vou mandá-la buscar, porque, de facto, tenho lá um apontamento sobre o imposto de cadastro, que foi um daqueles impostos que tentei eliminar, porque, julgo, estamos na fase de eliminação.
Apenas me lembro, de memória, que a inscrição no orçamento de receitas visa apenas a arrecadação daquilo que durante 5 anos o Estado pode vir a arrecadar. Isso não acontece apenas com este imposto mas também com outros.
Mas, se o Sr. Deputado me permitir, vou mandar buscar a pasta e, julgo que, rapidamente, o poderei esclarecer.
O Sr. Presidente: — Passaria, por conseguinte, à inscrição seguinte que é a da Sr.a Deputada Ilda Figueiredo. Tem a palavra, Sr.a Deputada.
A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro do Mar: Já aqui se falou da zona piscatória da parte norte do País e são conhecidas as dificuldades e os problemas com que se defrontam os pescadores e os inúmeros acidentes que têm vitimado muitos deles — aliás, aconteceu muito recentemente mais um desses gravíssimos acidentes — e, creio que, por parte do Ministro do Mar tem de haver uma atenção especial para com esta situação, nomeadamente em relação às medidas que têm, muito rapi- i damente de ser tomadas e implementadas para ajudar | a resolver esta questão.
Mas, ao lado dessa situação, existia também — e digo existia porque hoje, na sua generalidade, está paralisada ou à beira da paralisação — uma indústria de conservas de peixe com um certo significado, pelo menos regional.
Como o Sr. Ministro sabe, nestes últimos anos, a generalidade dessas empresas tem-se defrontado com inúmeros problemas e, na sua maior parte, estão paralisadas, e há mesmo algumas que encerraram.
Quando neste momento se põe a possibilidade de Haver apoie, via CEE, à produção, pergunto: que hipóteses e que estudos — se é que os há — existem quanto \ à possibilidade de apoio à indústria de conservas, nomeadamente na zona do Grande Porto?
O Sr. Ministro falou há pouco na questão de uma régie cooperativa em Matosinhos. Gostaria que esclarecesse melhor qual é o projecto que está a ser estudado, e a que se referiu na sua intervenção.
Ainda em relação à defesa da costa, tem havido todo um conjunto de problemas, nomeadamente na zona da Póvoa de Varzim, quanto aos terrenos marítimos. Não sei se, por parte do Ministério do Mar, já existe alguma tomada de posições quanto a esta situação que tem a ver com a construção muito próxima da praia e com a apropriação, indevida ou não — refiro-a apenas em termos de dúvida —, desses terrenos por parte de determinadas empresas (em especial uma).
A questão que coloco é a seguinte: qual a posição do Ministério do Mar em relação a esta situação? Aliás, podíamos estender esse problema a outros lugares mais a norte, como Esposende ou, digamos, a toda essa
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parte da costa norte onde estes problemas têm surgido com grande frequência, pondo em causa a defesa do ambiente daquela zona em benefício de algumas empresas privadas que usam esses terrenos de uma forma perfeitamente indevida.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro do Mar.
O Sr. Ministro do Mar: — Começarei, nesta segunda ronda, pelo Sr. Deputado Américo Salteiro que levantou um problema orçamental quanto ao Gabinete da Área de Sines e ao investimento em curso no terminal de carvão.
Aquilo que lhe posso dizer, neste momento, Sr. Deputado é que o Orçamento do Gabinete da Área de Sines para o ano em curso prevê, formalmente, as verbas que são indispensáveis para que o investimento em curso se realize. Mas sublinho que a parcela mais importante que cobrirá este investimento é obtido através do Banco Mundial.
Na realidade, o Banco Mundial vai financiar as obras marítimas que estão em execução (depois falta a segunda fase) em, praticamente, 45% do montante que foi adjudicado. Portanto, neste momento, as cotações deste ano já levam em consideração o acerto das fontes de financiamento (onde a EDP também participa, embora numa parcela pouco significativa), logo, suponho, não há qualquer espécie de problema quanto à concretização — que era a sua grande preocupação visto não ter posto só o problema da afectação das verbas.
Neste momento, só estão no Orçamento do Estado as verbas indispensáveis para não inviabilizar a execução e para permitir o acesso ao financiamento do Banco Mundial. O ano passado houve, de facto, um problema de ajustamento em relação a essa matéria, mas suponho que agora há uma verba de 1 040 000 contos que está inscrita como receita externa.
A Sr.8 Deputada Luísa Daniel pediu esclarecimento acerca de orçamentos das administrações portuárias. O que gostava de lhe dizer, Sr." Deputada, é que faço--Ihe chegar amanhã uma confirmação, que ainda agora foi levantada, acerca da AGPO. O facto de os orçamentos das administrações portuárias terem maior autonomia do que os outros não significa que não tenhamos a obrigação de controlar as coisas.
Suponho que a verba mais importante se prende com a utilização de mão-de-obra e é isso que aqui está justificado. Mas como este problema já se analisou, vou confirmar aqui, na Comissão, se é assim. As grandes verbas que estão previstas como despesas não especificadas correspondem à mobilização de mão-de-obra portuária e é por isso que elas não são especificadas. Contudo, faço cá chegar uma informação acerca dessa situação, que, aliás, é análoga à da AGPL.
O Sr. Deputado Carlos Espadinha quis saber qual era a situação do pagamento de salários aos trabalhadores da Companhia Portuguesa de Pescas. Na realidade, já foi possível pagar 5 meses dos salários em atraso e a indicação que tenho é a de que faltam pagar mais 7. O Sr. Deputado diz que são 12, mas isso é relativamente fácil de quantificar e, portanto, podemos estar a dizer a mesma coisa.
Como sabe, neste momento, no diploma de extinção previa-se que as dívidas de salários em atraso passavam à frente de todos os outros créditos. Aquilo que
se tem estado a fazer é, digamos, a mobilização, em termos de tesouraria, desse dinheiro antes que a massa falida possa responder por isso: mas, neste momento as verbas que têm estado a ser mobilizadas, e que no intervalo continuarão a ser, são do Fundo de Desemprego, logo, em termos orçamentais, só podem sair desse Fundo que, até agora, já mobilizou 5 meses de salários e tentar-se-á que mobilize a parte restante.
Quanto à dúvida que pôs sobre os orçamentos de Maio a Agosto, neste momento não sou capaz de lhe responder, mas vou averiguar e depois logo lhe digo, Sr. Deputado. Não sou capaz é de agora medir o cômputo da situação em si.
Quanto aos serviços de lotas e vendagens, suponho que há uma grande preocupação — e pelos vistos o Sr. Deputado está parcialmente de acordo com o diagnóstico que faço em relação a alguns aspectos das lotas, pelo que não vale a pena falar mais nisto — quanto a um aspecto que conta muito e que é, não só a maneira como as lotas são geridas como, até, o circuito interno.
É evidente que se em algumas das obras novas o circuito facilita a fiscalização em outras áreas onde há lotas instaladas não é possível fazer nenhuma fiscalização. Portanto, à medida que as obras se vão completando em terra o problema não é só a gestão mas é, digamos, a possibilidade de controlar o circuito. Realmente, a grande via de controle é o interesse directo na exploração da lota e não na fiscalização tout court.
Quanto à ideia de que dificilmente as pequenas populações piscatórias migrarão para outros portos, o Sr. Deputado tem disso uma experiência muito maior do que a minha mas, no entanto, acredito que seja assim. Apesar de tudo, tenho a impressão de que o problema não é tão rígido como isso e de que há, de facto, algumas populações — como acontece, por exemplo, na Nazaré, já para não falar noutras — que neste momento começam a voltar para a Nazaré e antes não tinham possibilidade de o fazer, e vice-versa. Esta situação, suponho, também se verifica noutras áreas, por exemplo, na Póvoa de Varzim e noutros sítios.
Reconheço que ela é pouco significativa e que, numa segunda fase — e digo numa segunda fase porque as opções têm de ser tomadas assim, não é possível deixar de optar todos os dias e a primeira grande opção foi realizar os grandes portos secundários, comerciais e de pesca e a segunda fase vai ser fazer obras em pequenas enseadas e portos —, apesar de tudo, haverá alguma capacidade migratória. Não será muito grande mas existirá.
Quanto à pergunta que fez sobre a possibilidade de mobilizar ou não os fundos da CEE (500 000 ECU) para apoiar a construção da Unicopesca, sei que a Unicopesca há muito tempo que tem tentado obter um financiamento da Caixa Geral de Depósitos. O financiamento da CEE a que temos acesso é exclusivamente orientado para a organização de produtores. Quer dizer, é para estimular que os produtores se organizem eles mesmo, para poderem, depois em conjunto, desenvolver planos de acção.
Tenho, portanto, dúvidas que seja possível à Unicopesca, para acabar os barcos que tem em construção, poder ter acesso a isso. De qualquer maneira, não vejo nenhuma razão para que a Unicopesca não tente. Acho que a probabilidade é pequena e que é mais importante que a Caixa Geral de Depósitos acabe por conceder o
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empréstimo que, suponho, ela estará praticamente decidida a conceder, baseado nas últimas condições que foram apresentadas pela Unicopesca.
Depois o Sr. Deputado pôs-me aqui um problema, que era o de saber o montante que estava atribuído a Sesimbra era ou não suficiente para poder realizar o plano de obras. Diria que é suficiente porque, de facto, o adiantamento que foi feito no fim do ano permite, desde logo, assegurar uma parcela de 4 ou 5 meses do trabalho que vai ser realizado este ano.
Como sabe, a adjudicação da obra só foi feita no fim do ano, pelo que utilizámos as verbas do orçamento do ano passado, que correspondem a um aditamento que permite, pelo menos, contar com 4 meses de obras que são realizadas este ano. Portanto, pela avaliação que fazemos a verba chegará.
Depois, o Sr. Deputado fez-me observações sobre a intensificação da actividade do INIP, com as quais estou de acordo. Uma das tentativas de financiamento externo que se requereu à CEE era para reforçar os projectos de investigação do INIP, designadamente os dirigidos ao atum e a outras espécies. Portanto, estou de acordo com o Sr. Deputado no que diz respeito a essa preocupação.
Depois, suponho que foi a Sr.8 Deputada Ilda Figueiredo que me falou nos problemas da segurança dos pescadores e dos seus acidentes. O problema da segurança é um problema de segurança prévia ou de prevenção dos acidentes porque, na realidade, aí, as autoridades marítimas têm um papel muito importante.
De uma maneira geral, os pescadores têm uma certa tentação de arriscar e, realmente, teremos de fazer um esforço no sentido da prevenção. Tenho abordado diversas vezes esta matéria com o Estado-Maior da Marinha e é preciso prevenir esta situação em termos de segurança marítima.
Na realidade, é inevitável que em certas circunstâncias aconteçam acidentes, mas realmente suponho que à medida que vão aparecendo os portos de abrigo as possibilidades de acidentes diminuem, contudo não vão resolver-se em termos definitivos. É uma tarefa, digamos, arriscada.
Quanto ao sector das conservas, suponho que é aí que podemos mobilizar os 500 000 ECU de verba para se poder converter sectores produtivos nesta área. Mas, como sabe, o sector das conservas constitui para a CEE um certo engulho. A CEE olha para a nossa capacidade de exportação com uma certa preocupação.
Para nós, é um ponto de honra não ter um contingente inferior àquilo que hoje sãos as nossas exportações, pagando impostos. Isto, no meu ponto de vista, significa um pontapé de saída muito grande, pelo que devíamos canalizar grande parte da verba dos 500 000 ECU para a organização de produtores, designadamente apoiando as conservas. Devo dizer que faz parte das regras da CEE que isto não seja feito em termos directos de uma maneira, digamos, ostensiva. É preciso gerir essa verba com um certo cuidado, o que faz parte das nossas intenções.
Quanto à defesa da costa, o problema que me põe é igual ao que existe na ria Formosa, em Faro, ou noutros sítios. Na realidade, a defesa do domínio público marítimo está, em si, definida por regras, pelo que não é possível, a quem quiser, ter acesso ao domínio público marítimo. E, realmente, a execução da fiscalização tem vindo a ser iniciada com alguma intensidade desde o ano de 1984, embora com algumas controvér-
sias. Suponho que, neste momento, ela está a caminho do norte vinda da zona de Sesimbra.
As construções clandestinas têm de acabar neste país porque o domínio público marítimo existe para alguma coisa e, portanto, acho que nalguns desses casos — que não explicitou, mas que alguns deles conheço, embora haja outros que, provavelmente, não conhecerei — são capazes de ter de enfrentar uma posição firme e definitiva de defesa do domínio público marítimo que, se existe, é para alguma coisa.
O Sr. Presidente: — Para prestar o esclarecimento que ficou pendente, tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Orçamento.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: —
Sr. Deputado Alexandre Reigoto, relativamente, à questão que me colocou, pela informação que tenho, esse imposto de cadastro, de facto, já não existe e a inscrição que, realmente, há no Orçamento do Estado é apenas para arrecadar processos que se arrastam e só dentro daquele período de vigência de 5 anos. Esta é a informação que lhe posso dar, neste momento.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Sr. Secretário de Estado, posso concluir então que o imposto de cadastro não tem qualquer aplicação.
O Sr. Secretário de Estado do Orçamento: — De
facto, ele não existe, Sr. Deputado. A inscrição feita serve apenas para arrecadar processos que estão em fase de cobrança contenciosa, situação que origina que tenha de haver uma inscrição orçamental.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Muito obrigado, Sr. Secretário de Estado. Fico contente e felicíssimo com essa informação.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado Sr. Secretário de Estado e Sr. Deputado.
Tem, agora, a palavra o Sr. Deputado Carlos Espadinha.
O Sr. Carlos Espadinha (PCP): — Creio que o Sr. Ministro se esqueceu da questão que levantei, referente à não consideração do porto de Peniche no documento do Ministério do Mar. Como sabe o porto está na sua fase final cuja concretização é muito urgente.
O Sr. Ministro do Mar: — Sr. Deputado, no quadro que enviarei, e que visa conciliar o quadro que tem com o outro, visto ter de haver qualquer explicação para ele não ser igual, responderei a essa questão, porque não está programado parar nenhuma obra que esteja em curso.
O Orador: — Uma outra questão, Sr. Ministro, relacionada com a intervenção da minha camarada Ilda Figueiredo, vai no sentido de lhe perguntar se conhece o nosso projecto de lei da segurança no mar a bordo das embarcações de pesca. Conhece-o? Qual é a opinião que tem dele?
O Sr. Ministro do Mar: — Sr. Deputado, conheço o projecto de diploma, acho que eie tem virtualidades muito grandes e, que é importante em outros aspectos
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que, do meu ponto de vista, são de difícil execução. O ideal não é possível realizar e, se estou de acordo com os princípios, suponho que algumas coisas não são possíveis de executar, por razões de ordem vária.
Mas gostava, se estivessem disponíveis, de falar acerca dessa matéria com o Sr. Deputado ou com a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro e Srs. Deputados. Os nossos trabalhos com o Sr. Ministro do Mar terminaram, mas gostava de ouvir a opinião da Comissão, através dos Srs. Deputados, relativamente a uma alteração que me parece ser, mais que o resultado, uma exigência da reprogramação dos trabalhos.
Não tenho aqui os elementos mas procurarei transmiti-los de cor, creio que, rigorosamente, da mesma maneira.
Como sabem há um impedimento manifestado por alguns Srs. Deputados de prosseguir os trabalhos na sexta-feira à noite em virtude do debate televisivo. Existe, também, um impedimento manifestado pelos Srs. Deputados do PSD relativamente a actividades partidárias para sábado.
Sendo assim, e tendo em conta o programa que estava estabelecido, gostaria de saber a opinião da Comissão para a seguinte reprogramação, já, aliás, discutida com os membros do Executivo e indiciariamente aceite por mim, em vosso nome (e era isso que queria que fosse aqui, agora, ratificado). Suspendíamos os nossos trabalhos na sexta-feira, à hora regimental, e iniciá-los-íamos na segunda-feira, às 15 horas.
A ordem de trabalhos para essa primeira reunião da próxima semana seria composta por eventuais esclarecimentos complementares que resultassem da discussão de duas áreas que têm reflexos horizontais em todo o Executivo, ou seja, o Equipamento Social e as Finanças, mais o início do processo global de votações.
Esta mesma ordem de trabalhos, com os ajustamentos devidos, seria também desenvolvida na terça-feira, começando então, obviamente, os trabalhos às 10 horas da manhã e prosseguindo para a tarde. Mas nessa mesma terça-feira teríamos que finalizar — o que não quer dizer que tivéssemos só de o começar na terça--feira — o relatório final da Comissão.
Isto significaria, por conseguinte, que o Plenário passaria a discutir as propostas de lei do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano, só na quarta--feira. O horário da discussão no Plenário, que se realizaria nas quartas-feitas, quintas-feiras e sextas-feiras, naturalmente que compete mais ser definido em conferência de líderes, mas, indicialmente, seria o horário regimental. Esta será uma necessidade de reajustamento por força da evolução dos nossos próprios trabalhos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, julgo que é a força dos factos e que não poderemos estar contra isto, pelo que, de facto, não estaremos.
Simplesmente, quanto à afirmação que o Sr. Presidente fez de isso depender da conferência de líderes, julgo que poderia haver uma sugestão da Comissão de Economia, Finanças e Plano, para que, quando refere para quartas-feiras, quintas-feiras e sextas-feiras os horários normais, se establecesse que, pelo menos, na quinta-feira fosse de manhã e de tarde.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço desculpa pelo erro e agradeço a correcção que me faz porque, de facto, quando estava a dizer horários regimentais estava a imaginar que eram dias inteiros. Essa posição foi já transmitida na conferência que há pouco tivemos com os membros do Executivo e, naturalmente que faremos transmitir isso à conferência de líderes.
Tem a palavra a Sr." Deputada Luísa Daniel.
A Sr.a Luísa Daniel (PS): — Sr. Presidente, há pouco falou-se que poderia surgir o problema de o Sr. Ministro da Indústria e Energia não estar presente. Como é que o Sr. Presidente vai resolver este problema?
O Sr. Presidente: — Sr." Deputada, já estava previsto que o Sr. Ministro da Indústria e Energia não estivesse presente e que vinham os Srs. Secretários de Estado que estariam sempre presentes.
Estava também previsto que, se o Sr. Ministro da Indústria e Energia fosse obrigado a vir a esta Comissão, teríamos de combinar uma hora para isso. É nesse sentido que falo de eventuais situações residuais.
Ficou uma dúvida posta, suponho, pela Sr.a Deputada Luísa Daniel e pelo Sr. Secretário de Estado, sobre se, na quarta-feira o Plenário era mesmo às 10 horas da manhã ou às 15 horas. Estou convicto de que a ideia que prevaleceu foi — mas não quero expressar aqui uma certeza pelo que confirmaremos esta situação — a das 10 horas, o que implica que façamos antes disso o trabalho de preparação do nosso relatório.
Tem a palavra, o Sr. Deputado Alexandre Reigoto.
O Sr. Alexandre Reigoto (CDS): — Sr. Presidente, afigura-se-me difícil com este plano, não trabalhando na sexta-feira nem na segunda-feira de manhã, começar a discussão do Orçamento do Estado e das Grandes Opções do Plano na quarta-feira de manhã. Creio que será quase impossível fazê-lo. Só chamo a atenção do Sr. Presidente para este facto, para de forma a que não aconteça o caso de se marcar o Plenário para quarta-feira às 10 horas e esta Comisão não ter tudo preparado.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, não deixarei de ter presente, como é óbvio, a preocupação que manifestou. Vamos repensar o problema e não fica definitivamente assente — aliás já figurava como dúvida — que a sessão na quarta-feira é às 10 horas, embora a presunção que tenho seja a de que, até por razões de outra ordem, a sessão vai mesmo começar às 10 horas. Contudo, voltaremos a abordar esta questão.
Está suspensa a reunião.
Eram 13 horas e 25 minutos.
A Sr.3 Presidente: (Ilda Figueiredo) — Srs. Deputados, está reaberta a sessão.
Eram 15 horas e 45 minutos.
A Sr.a Presidente: — Estão presentes os Srs. Secretários de Estado da Indústria, da Energia e do Planeamento. Como método de trabalho está a ser sugerido que os Srs. Deputados coloquem aos Srs. Membros do Governo as questões que entenderem, as quais serão posteriormente respondidas.
A partir deste momento a Mesa aceitará inscrições para o debate.
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Para colocar uma questão prévia tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr.a Presidente, quando deu entrada nesta Assembleia a proposta de lei do Orçamento do Estado para 1985, bem como «das Grandes Opções do Plano, realizaram--se várias reuniões em comissões, nomeadamente na reunião de Economia, Finanças e Plano, a qual pretendeu ouvir o Sr. Ministro da Indústria. O Sr. Ministro, solicitado a comparecer pelo Presidente desta Comissão, o Sr. Deputado João Salgueiro, não pôde vir. Mais tarde encontrei o Sr. Ministro da Indústria aqui na Assembleia da República, manifestei-lhe a minha estranheza e disse-lhe esperar vê-lo aqui na Comissão aquando do debate na especialidade das referidas propostas. A verdade é que há pouco tive de entrar em contacto com o Gabinete do Sr. Ministro da Indústria — visto que se está a negar a autorização para que seja requisitado um técnico do Ministério da Indústria para adjunto do Grupo Parlamentar do MDP/CDE, o que não é muito legal —, e foi-me dito que o Sr. Ministro se encontrava no Porto, de onde só chegará ao fim do dia.
Acontece que toda esta calendarização, apesar de ter sofrido algumas alterações, foi sempre combinada entre o Sr. Presidente em exercício, Sr. Deputado Almerindo Marques, e os Srs. Ministros e Secretários de Estado dos diferentes ministérios.
Gostaria de saber exactamente qual a razão péla qual o Sr. Ministro não está presente e inquiro a Comissão se devemos dar efectivamente início aos trabalhos ou se, apenas, e por exemplo, devemos ter uma audiência com o Sr. Secretário de Estado da Energia e transferir tudo o que respeita ao sector da indústria para um momento em que esteja presente o Sr. Ministro da Indústria e respectivos Secretários de Estado. É evidente que poderão dizer que tal facto vai atrasar os trabalhos, mas a verdade é que não temos culpa disso. É, sim, um hábito. O de que os Srs. Ministros estejam todos presentes aquando da discussão de matéria relativa ao seu respectivo ministério, excepto o Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros que por motivos mais ponderosos teve de se ausentar para o estrangeiro há vários dias.
Assim, para nós, é incompreensível a não presença do Sr. Ministro da Indústria, a não ser que, conforme disseram os jornais — e não sei se é verdade —, o Sr. Ministro tenha declarado que jamais viria participar no debate do Orçamento do Estado. Sobre o assunto, gostaria de saber o que se passa, por entender que não estão reunidas condições para iniciarmos o debate sobre o sector da indústria.
A Sr.a Presidente: — Por julgar haver outros Srs. Deputados inscritos para tratar do mesmo assunto, não vou responder desde já à sua questão, pelo que dou a palavra ao Sr. Deputado Portugal da Fonseca.
O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Sr.a Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Perante o ponto de ordem colocado pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, levanta-se, para nós, o grande problema, que é o tempo de que dispomos. E bem verdade que foi alterada a data do debate sobre o sector da indústria. Temos andado, enfim, com um pouco de dificuldade em dialogar com o Sr. Ministro.
Todavia, dada a celeridade que queremos dar aos trabalhos e apesar de o Sr. Ministro não poder estar presente, cocretamente devido a compromissos com o exterior, a minha bancada não pode concordar com o adiamento do debate do Orçamento do Estado. Estão presentes os Srs. Secretários de Estado, que estarão suficientemente informados para responder às questões que coloquemos.
De qualquer forma, não queremos deixar de referir um ponto da situação, relativamente à não presença do Sr. Ministro, visto que este debate estava já programado há 15 dias.
A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.
O Sr. Reis Borges (PS): — Sr.a Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca fez uma pergunta à Mesa. Parece-me ser importante que a Mesa se pronunciasse sobre ela.
Seja como for, o ponto de vista da minha bancada vai no sentido de que continuemos os trabalhos, não obstante se dever esclarecer convenientemente a não presença do Sr. Ministro ou, até mesmo, a Mesa procurou saber da disponibilidade do Sr. Ministro em vir à reunião.
Como já disse, seja como for, tal não deve prejudicar a continuação dos nossos trabalhos nem mesmo sobre o assunto levantaremos qualquer tipo de incidente.
A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues de Azevedo.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Sr.8 Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Encontro-me relativamente ultrapassado nesta questão. Penso ser pertinente a questão colocada pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. No entanto, o Partido Socialista entende que adiar os trabalhos pode, neste momento, criar-nos extrema dificuldade na sua conclusão.
Assim, o PS defende que os trabalhos devem prosseguir com a presença dos Srs. Secretários de Estado que representam o Sr. Ministro, porquanto estarão habilitados a dar as respostas que a Comissão lhes solicitar.
A Sr.8 Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Secretário de Estado da Energia. Penso que irá dar-nos algum esclarecimento sobre a ausência do Sr. Ministro aqui nesta reunião.
O Sr. Secretário de Estado da Energia (Rocha Cabral): — Sr.8 Presidente, Srs. Deputados: Tanto quanto é do meu conhecimento esta reunião estava marcada para as 10 horas da manhã de amanhã. O Sr. Ministro tinha marcada, há largo tempo — e não há 15 dias como aqui foi dito —, uma reunião para hoje, no Porto, com várias organizações, assim como tinha já assumido outros compromissos do Ministério na cidade do Porto. É essa a razão por que não está aqui presente.
Em todo o caso, tanto o meu colega, o Sr. Secretário de Estado da Indústria, como eu estamos habilitados a dar os esclarecimentos que os Srs. Deputados pre-
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tendam, nas áreas que nos dizem respeito. O Sr. Ministro estará, certamente, à disposição para, numa altura em que esteja em Lisboa, vir dar à Comissão alguns esclarecimentos que eu ou o meu colega não possamos prestar.
Num aspecto particular, a sugestão do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca daria a entender que o Sr. Ministro seria unicamente Ministro da indústria. O Sr. Ministro é Ministro da Indústria e da Energia. Portanto, se querem debater a matéria em causa, sem a presença do Sr. Ministro, não será só com o Secretário de Estado da Indústria, mas com o Secretário de Estado da Indústria e com o Sr. Secretário de Estado da Energia.
A Sr.a Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr." Presidente, lamentamos que na discussão do orçamento de um ministério não esteja presente o respectivo responsável máximo. Julgamos, no entanto, que a reunião deve prosseguir com a presença dos Srs. Secretários de Estado, sem prejuízo de podermos ainda marcar uma nova reunião com a presença do Sr. Ministro, se no fim desta reunião como tal for considerado necessário pelos Srs. Deputados.
A Sr." Presidente: — Voltou a inscrever-se o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca. Contudo, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado, desejo referir que eu própria, na Comissão de Economia, Finanças e Plano, antes de se iniciar o debate, tive ocasião de solicitar a vinda do Sr. Ministro a esta Comissão, para que tivéssemos um debate prévio sobre as questões de indústria e energia. Durante o debate em Plenário, na generalidade, o meu grupo parlamentar teve ocasião, também, de abordar esta questão.
De facto, também hoje lamento que o Sr. Ministro não possa estar presente. De qualquer forma, e creio ser essa a posição maioritária dos grupes e agrupamentos parlamentares aqui representados, vamos continuar o debate com os Srs. Secretários de Estado presentes, isto sem prejuízo de que se se considerar necessário, no final do debate, se marque uma nova reunião, combinando o dia e a hora na medida das nossas disponibilidades bem como das do Sr. Ministro, reunião que, a realizar-se, terá de ser feita antes de terça-feira da próxima semana.
Assim sendo, no final da reunião de hoje voltaremos a fazer o ponto da situação e decidiremos se marcamos ou não uma nova reunião com a presença do Sr. Ministro, sem prejuízo da que vamos realizar hoje à tarde.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr." Presidente, é evidente que me submeterei à vontade da maioria. Assim sendo, iniciem-se os trabalhos. Entendo que isto deve ser convenientemente registado: é evidente que o Sr. Ministro terá de vir cá.
Sugeria que, e se fosse possível, se iniciasse o debate pelo sector da energia, uma vez que por volta das 17 horas terei de me ausentar.
A Sr." Presidente: — Srs. Deputados, está a ser sugerido um método de trabalho, o qual ponho à consideração da Comissão.
Pausa.
Visto nenhum Sr. Deputado desejar pronunciar-se, deve a Mesa entender que o método sugerido poderá ser adoptado, pelo que começaremos o debate pelas questões que se prendem com o sector da energia.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Para já, é evidente que não posso colocar a questão que tenho aqui, em primeiro lugar, e que é a de saber se o orçamento de 12 143 000 contos é suficiente para o Ministério da Indústria e Energia. É, também, evidente que esta pergunta deve ser dada pelo Sr. Ministro. Bem, mas como esta também não poderei fazer outras perguntas sobre o orçamento.
No entanto, ao Sr. Secretário de Estado da Energia colocarei algumas perguntas sobre o sector e relativas ao Orçamento do Estado.
Quais os projectos que no domínio da segurança nuclear estão incluídos nos programas sem carácter plurianual, ou seja, nos programas com despesa totai inferior a 50 000 contos, aos quais é atribuído um valor de i 13 546 contos? Não havendo qualquer decisão positiva pela opção nuclear e, ainda menos, pela construção do primeiro grupo nuclear, como se justifica a rubrica «Formação e treino para a avaliação de segurança de centrais nucleares», para a qual é estimada uma verba de 110 309 contos, cuja maior parte será despendida em 1985, 1986 e 1987? Em termos de Orçamento do Estado, como se justifica que no domínio da segurança de centrais nucleares se preveja nos programas plurianuais uma verba de 302 535 contos e que no domínio da conservação energética e na indústria de energia uma verba de 238 475 contos e 56 22C contos, respectivamente? Em termos de Orçamento do Estado o que é que está previsto para a EDP? Como é que esta empresa vai ser dotada e com que verbas? O que é que se vai fazer a nível do estudo da localização de centrais nucleares?
Já agora, a «talhe de foice», gostaria de saber qual é a situação quanto à Central Termoeléctrica a Carvão de Lavos, na Figueira da Foz. Existe alguma decisão clara quanto à sua construção e quanto ao desbloqueamento do local?
Sabe-se que a dependencia energética é um dos aspectos relevantes das condicionantes financeiras externas da nossa economia. Mesmo assim, nas Grandes Opções do Plano, à política energética dedica-se apenas uma frase que, aliás, pode ser considerada controversa. Diz assim: «minimização dos constrangimentos que têm afectado as condições de aprovisionamento energético da indústria». Perante isto, Sr. Secretário de Estado, que pensa fazer o Governo no domínio da racionalização dos recursos energéticos, no recurso a novas tecnologias (energia — intensivas), nas medidas de conservação energética, na redução da dependência do petróleo. Que verbas vão ser dotadas? Que tipo de estudos vão ser feitos perante o orçamento que temos presente? Perante as imensas acções que a Secretaria de Estado da Energia é obrigada a desenvolver, as verbas de que a mesma dispõe são suficientes para levar a bom porto esse tipo de actividades?
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A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Carvalhas.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Sr. Secretário de Estado, vou colocar algumas primeiras questões que se levantam ao meu grupo parlamentar.
Quanto ao PIDDAC e à exiguidade de verbas em relação às cartas geológicas de 1/50 000 e de 1/200 000. Qual o grau de prioridade? Qual o critério destas verbas?
Gostaria igualmente de saber se o Sr. Secretário de Estado nos pode adiantar alguma coisa sobre como está o PISEE, bem como sobre o que pensa em relação aos recursos naturais, ou seja, qual é a filosofia do Governo no que respeita a esta matéria, nomeadamente aos recursos mineiros que são eminentemente nacionais. Assim sendo, o que pensam fazer à Ferrominas, visto que se fala, por vezes, em transformá-la em sociedade anónima para que mais tarde seja integrada na EDMA e, posteriormente, que parte dela seja vendida ao capital privado — que nunca se sabe se é nacional se estrangeiro. Se isso é verdade, porquê essa filosofia? O mesmo questiono em relação à Empresa Carbonífera do Douro. Poderá dizer-nos, ainda, alguma coisa sobre a metalurgia do cobre e da problemática da So-mincor?
A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados: Colocarei algumas questões e começo pelo problema dos contratos de desenvolvimento e inovação tecnológica. Ao longo do ano transacto, e também já este ano, tem vindo a ser anunciada a assinatura de vários contratos de desenvolvimento com múltiplas entidades, desde universidades a laboratórios, empresas, etc, com verbas cuja origem nos custa a perceber. Por conseguinte, quanto à participação financeira do Ministério da Indústria e Energia nesses contratos, não temos clara a proveniência das respectivas verbas, devido aos volumes que atingem. Posso avançar que há tempos li, pelo que gostaria de ter confirmação, que haveria uma participação do Ministério da Indústria e Energia para acções deste tipo no Fundo de Abastecimentos. Já agora, e mais como ponto de curiosidade pergunto se os contratos de desenvolvimento que o Sr. Ministro terá assinado hoje de manhã no Porto são contratos em que a participação financeira corresponde ao orçamento de 1984 ou ao de 1985.
Em relação ao programa de investimentos, isto é, ao PIDDAC, do Ministério, colocarei uma questão um pouco geral. Para nós é clara a insuficiência de verbas para os objectivos que o Ministério se proporia atingir. Concretamente, no campo da energia, embora consideremos que o avanço de programas no sentido do estudo e formação técnica relativa à energia nuclear seja um processo que deva ír avançando para se poder responder, quando for necessário, à opção nuclear, o que mais nos choca e mais dúvidas nos levanta é a compatibilização em termos de equilíbrio.
Estou a olhar para o PIDDAC de 1985, para o desdobramento dos programas, no qual vejo, por exemplo, que a dotação prevista para «Gestão de energia na indústria» — julgo estarmos todos de acordo em que é um campo em que se pode e se deve actuar em
força para reduzir os consumos de energia — não ultrapassa os 5000 contos, o que parece claramente insuficiente. Da mesma forma, a verba dotada para «Energias renováveis», e parto do princípio que este programa seja de aprofundamento de estudos, de eventual lançamento de bases de desenvolvimento, tem outra verba de 5000 contos. Também esta parece igualmente insuficiente.
Por conseguinte, este tipo de desiquilíbrio, para além das verbas serem de um modo geral bastante reduzidas para os diversos programas apresentados, talvez seja mais notória na área da energia.
Por outro lado, gostaria de levantar a questão do apoio à reestruturação do sector têxtil. Já há muito que esta reestruturação é considerada como uma necessidade do País, por diversos governos, designadamente pelo actual Governo. Tem-se falado em verbas bastante elevadas, eventualmente com comparticipação do Banco Mundial, se não me falha a memória. Encontro no PIDDAC do Ministério, uma verba de 20 000 contos para apoio à reestruturação do sector têxtil, que igualmente me parece bastante reduzida. O mesmo se passa relativamente ao problema, já aqui levantado com aproveitamento de recursos mineiros nacionais, em que a «avaliação de jazigos naturais» aparece apenas com uma verba de 50 000 contos, o «estudo sistematizado de jazidos minerais metálicos» tem uma verba de apenas 9000 contos, a verba relativa a «prospecção de minérios não metálicos», que julgo ser virado fundamentalmente para a prospecção de carvão, ascende a 5000 contos. São, em todos os casos, e em nosso entender, verbas muito exíguas.
Uma terceira ordem de questões relaciona-se com o problema do sector empresarial do Estado na área da indústria e energia. Nas grandes Opções do Plano aponta-se para a intenção de «desenvolver programas de reestruturação para as empresas públicas em situação financeira mais degradada». O problema é que isto não tem concretização em termos orçamentais, bem como em termos das declarações de intenção diversas vezes manifestadas pelo Governo nesse sentido. Tem--se falado muito do eventual empréstimo do Banco Mundial, mas vão-se passando os tempos, os meses, as situações vão-se degradando, não existindo uma concretização da declaração de intenção repetidamente afirmada pelo Governo. A questão que coloco muito claramente é esta: para quando essa reestruturação? Para quando a tomada de opções, de iniciativas, com vista a essa reestruturação, designadamente a reestruturação financeira das empresas públicas em pior situação financeira? Finalmente, uma última questão: no âmbito das empresas tuteladas pelo Ministério da Indústria e Energia, qual é a previsão de dotações orçamentais em termos de dotação para capitais próprios e de indemnizações compensatórias?
A Sr.8 Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr.8 Presidente, queira desculpar estes parênteses, mas desejo saber se o Secretário do Estado do Orçamento vai estar ou não presente a esta sessão.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente da Comissão, Almerindo Marques.
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O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, o Sr. Secretário de Estado do Orçamento não tem possibilidade de estar aqui, neste momento, exactamente porque tem compromissos a que não pôde deixar de corresponder esta tarde. Aliás, tendo estado a trabalhar com ele, razão por que cheguei um pouco atrasado, fiquei convicto que o Sr. Secretário ainda cá viria. O que ficou assente foi que faria todos os esforços para vir o mais cedo possível.
Acrescento apenas que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento tinha pedido a colaboração do Sr. Secretário de Estado do Planeamento, por forma a estar também aqui hoje no debate de uma área na qual poderia e deveria dar alguma contribuição a esta Comissão.
Tem a palavra o Sr. Deputado Reis Borges.
O Sr. Reis Borges (PS): — Sr. Secretário de Estado da Energia, conforme ficou acordado, ao iniciarmos o debate pelo sector da energia, na medida em que já foram alinhadas pelos meus colegas perguntas que praticamente tocam todo o problema da energia, pelo menos, na sua forma mais visível, limitar-me-ia, nesta primeira fase, a pedir ao Sr. Secretário de Estado que, em face do que consta do PIDDAC, até porque as verbas são relativamente escassas, nos fizesse um apontamento mais pormenorizado do destino a dar a essas verbas no que toca ao campo da energia. Pedia-lhe, no entanto, a sua atenção, desde já, para um aspecto que creio ter sido já levantado e que se refere ao que se denomina «energia nuclear». Quais são concretamente as intenções da Secretaria de Estado nessa matéria?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues de Azevedo.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A Comissão de Economia, Finanças e do Plano discute, fundamentalmente, verbas.
Analisando os fundos e serviços autónomos na área da responsabilidade do Ministério da Indústria e Energia, constatamos algumas questões que gostaríamos de ver esclarecidas.
Os fundos e serviços autónomos no âmbito do Ministério da Indústria e Energia vão movimentar 24 769 000 contos. Deste montante, 10 151 000 contos são dotações do Orçamento do Estado, representando 40,98%, 14 milhões de contos são, ou seja, dotações próprias, 59,01%. Destas dotações próprias, o recurso a empréstimos exteriores é de 13 milhões e 8 contos. Isto dá uma verba de receitas próprias atingindo apenas uma percentagem de 6,48%, uma vez que há um recurso ao crédito exterior no referido montante de 13 milhões, representando 52,51% do movimento destes fundos. A pergunta que lhe coloco é a seguinte: há ou não, efectivamente, em termos da existência destes fundos, um estudo elaborado no Ministério no que respeita à validade da sua existência, isto é, se eles produzem ou não uma contrapartida pelo seu funcionamento.
Um outro aspecto que me chamou particularmente a atenção é referente à Direcção-Geral de Geologia e Minas, em que, num orçamento de 195 000 contos, 185 000 contos vão para aquisição de serviços não espe-cificados. Isto é, num Orçamento desse valor, 94,87 % do total é «Aquisição de serviços não especificados». Agradecia que os Srs. Secretários justificassem a atribuição desta importância e essa rubrica.
Por outro lado e no Orçamento do Ministério, verifica-se que na Secretaria de Estado da Energia se encontra uma verba afecta à Direcção-Geral de Energia no valor de 194 446 contos. Ora, a pergunta que vou formular é a seguinte: sabendo nós que em Portugal tem sido feito um certo esforço no sentido de se encontrar fontes de energia alternativas àquelas que foram até hoje convencionais, coloca-se a questão de saber se esta verba de 194 000 contos é capaz de dar ou não continuidade a esse espírito, que até hoje se tem mantido como prioritário no respeitante à descoberta de novas fontes de energia para nos libertarmos um pouco das fontes normais de energia. São estas as questões que formulo aos Srs. Secretários de Estado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Telmo Barbosa.
O Sr. Telmo Barbosa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Grande parte das questões que queria formular foram já colocadas, de modo que aguardo pelas respectivas respostas.
No entanto, gostava ainda de formular uma questão bastante concreta, que é a seguinte: qual a dotação orçamental — se é que existe tal — que diz respeito ao apoio a dar à execução de pequenos aproveitamentos hídricos por empresas privadas, ou não, para consumo próprio de energia, lançando aquela que não lhes for necesaria na rede nacional?
O Sr. Presidente: — Não há mais inscrições neste momento e, por conseguinte, os Srs. Secretários de Estado poderão introduzir agora as vossas respostas, consoante a ordem e a conveniência que acharem adequada.
No entanto, antes de dar a palavra aos Srs. Secretários de Estado, comunico à Comissão de Economia, Finanças e Plano a chegada de um ofício da Direcção--Geral da Administração Local que, presumo, fornece os elementos relativos aos aspectos que foram colocados em causa na anterior discussão e que serão necessários para o nosso debate de amanhã à noite.
Sugeria que se distribuísse apenas dois exemplares por grupo parlamentar e um por agrupamento para se evitar a feitura de múltiplas fotocópias.
Como os Srs. Deputados concordam com esta distribuição, vamos recomeçar a nossa discussão.
O Sr. João Amaral (PCP): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, inter-venho somente para precisar o que V. Ex.a acabou de referir e, em jeito de esclarecimento, gostava de saber se se trata de um ofício da Direcção-Geral da Administração Local ou do Governo?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, vou repetir o que disse anteriormente, ou seja, o ofício é proveniente do Director-Geral, que remete ao Presidente da Comissão da Economia e Finanças, por incubência da Sr." Secretária de Estado, um exemplar de um documento contendo os objectivos e metodologia seguidos pela Direcção-Geral das Florestas para a determinação do
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indicador da orografía por concelho. O Sr. Deputado está já esclarecido?
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, estou esclarecido, embora este não seja o documento que estávamos à espera. Naturalmente que o documento que estávamos a aguardar não era aquele que explicasse o que aí está contido, mas antes que substituísse o mapa, visto que este tem de ser, obviamente, alvo de substituição.
De qualquer forma, recomendo ao Sr. Presidente que mande substituir esse documento.
O Sr. Presidente: — Exacto, Sr. Deputado. Depois de o analisarmos, voltaremos com certeza à questão.
Chegou também à Comissão um ofício do Sr. Chefe de Gabinete da Secretaria de Estado da Produção Agrícola, que anexa o Projecto de Desenvolvimento Agrário da Cova da Beira e o seu estudo da viabilidade, bem como o Projecto de Desenvolvimento Agrícola do Baixo-Mondego e o seu estudo de viabilidade. Suponho que estes elementos foram solicitados pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, nomeadamente por um ou mais Srs. Deputados. De qualquer modo, atendendo à dificuldade de reproduzir os referidos elementos, eles ficam na Comissão de Economia, Finanças e Plano para quem tiver interesse em os consultar, podendo ser solicitados aos serviços de apoio.
Dou agora a palavra aos Srs. Secretários de Estado para fazerem a intervenção de resposta às solicitações requeridas.
O Sr. Secretário de Estado da Energia (Rocha Cabral): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Um primeiro comentário que me sugerem as questões formuladas prende-se com o facto de me parecer que nós não nos estamos a referir exactamente ao mesmo documento. Na verdade, foram aqui citadas verbas que não encontro no Orçamento do Estado. De maneira que terei alguma dificuldade, salvo melhor precisão da parte dos Srs. Deputados, em responder a números que não constam do orçamento do Ministério da Indústria e Energia.
No respeitante às perguntas formuladas pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que foi quem suscitou, do meu ponto de vista, mais questões sobre números em relação aos quais nós não temos essa leitura, pois nem sequer estão inscritos desse modo no Orçamento do Estado, agradeceria que mos referisse depois no concreto, para podermos responder de uma forma mais cabal.
No aspecto de formação e treino de segurança nuclear, as verbas que estão escritas no orçamento constam da verba do Gabinete de Protecção e Segurança Nuclear e, como suponho que o Sr. Deputado sabe, essas verbas poderão ter alguma coisa a ver com um programa nuclear português, mas não dizem somente respeito ao dito programa.
Ao citado Gabinete estão cometidas funções de assegurar a protecção e segurança nuclear do território nacional, pois, embora em Portugal não existam centrais nucleares, estas existem na nossa vizinha Espanha. Ora, a principal actividade do Gabinete tem sido orientada no sentido de acompanhar exactamente essas mesmas funções, em particular no que respeita a eventuais incidências que venham a ter nos nossos rios Douro, Tejo e Guadiana as centrais nucleares espanholas.
Um Gabinete com estas funções faz parte da estrutura da Administração Pública. A actividade nuclear não se restringe somente a centrais nucleares, tendo também campos de acção muito mais vastos, desde a saúde à indústria. Portanto, o acompanhamento de todos estes problemas necessita do apoio de uma entidade da Administração Pública e para isso terá de ter técnicos capacitados e formados nas tecnologias e técnicas necessárias.
Respondendo de uma forma genérica a várias questões formuladas devo dizer que, como é do conhecimento público e na medida em que é uma situação que tem já vários anos, em particular no período de vigência deste Governo, tem sido publicada no Diário da República a parte das verbas do Fundo de Abastecimento que é alocada para problemas de conservação e diversificação de energia.
Essas verbas têm sido explicitadas em despachos conjuntos dos Srs. Ministros das Finanças e do Plano e da Indústria e Energia e publicadas no Diário da República, sendo com certeza do conhecimento dos Srs. Deputados. Tais verbas completam as actividades no campo da conservação e diversificação de energia, para além do que está consignado no Orçamento do Estado, quer nos gastos correntes quer no PIDDAC. Daí que as acções que tem sido possível promover nessa área e que, obviamente, têm continuidade em 1985, tinham como fonte de financiamento importante o Fundo de Abastecimento.
Realmente, quando o Sr. Octávio Teixeira refere que há um certo desequilíbrio no sector da energia na parte do PIDDAC, ou seja, que não há verbas suficientes, destinando-se, por exemplo, somente 5000 contos para as alternativas energéticas, é evidente que o contrato publicamente assinado e anunciado, que custava 300 000 contos, não pode ser financiado com esse reduzido montante ou, pelo menos, não pode ser só financiado como tal. Do mesmo modo, o resto do financiamento desse programa é feito com as verbas oriundas do Fundo de Abastecimento.
O Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca colocou ainda questões sobre a EDP, sobre eventuais estudos, sobre sítios — Lavos, por exemplo. Como V. Ex.a sabe, o orçamento da EDP não faz parte do Orçamento do Estado, pois as verbas que essa empresa gasta nessa matéria farão parte do seu próprio orçamento e penso que não é aqui a altura nem o lugar para discutir orçamentos de empresas.
O Sr. Deputado Carlos Carvalhas coloca a questão de saber se as verbas atribuídas para as cartas geológicas são exíguas e se não se podia fazer melhor. Não tenho dados, embora possa fornecer-lhos, pois não vinha preparado para responder num pormenor tão concreto. Na verdade, não posso responder-lhe sobre a percentagem das cartas geológicas que estão por fazer. Estas são ainda significativas, não obstante nos últimos tempos se ter feito um progresso notável, aliás, penso que o programa que está em curso e de que estas verbas são um reflexo, acelerará ainda o levantamento geológico do nosso país. Há a possibilidade de incluir nestas verbas novas tecnologias, utilizando particularmente a colaboração da Força Aérea para uma área relativamente extensa e não coberta geologicamente mas com características geológicas muito uniformes, em que o trabalho de campo é difícil, podendo tal tarefa ser realizada com ajuda de meios mais sofisticados e, naturalmente, com um desenvolvimento mais rápido do que
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aquele que derivaria do trabalho corrente de geólogo de campo.
A opção tomada pela Secretaria de Estado da Energia nesta matéria é de dar o máximo de ritmo a estes trabalhos, tendo, contudo, em conta a nossa capacidade humana nesta matéria. Já não falo da capacidade humana mesmo ao nível dos serviços do Estado, mas de capacidade tout court, pois o número de geólogos no nosso país não é tão grande como talvez fosse desejável e, portanto, temos de utilizar as capacidades que temos.
Em todo o caso e na medida em que esta matéria responde ainda a uma outra questão formulada, devo dizer que a política que a Secretaria de Estado da Energia e a Direcção-Geral de Ecologia e Minas tem vindo a prosseguir é a de utilizar da melhor forma as licenças de concessão para prospecção atribuídas a empresas, quer nacionais quer estrangeiras, que têm feito um levantamento bastante exaustivo das áreas a elas destinadas.
Por essa via, temos conseguido obter informação geológica extremamente útil, que complementa os trabalhos realizados ao nível da Direcção-Geral e Geologia e Minas e, em particular, dos serviços geológicos.
Relativamente ao PISEE, o que posso dizer ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas — como sabe o PISEE só pode ser aprovado após a aprovação do Orçamento — é que as verbas deste último Plano dependem daquelas que ficarem aprovadas no Orçamento. É evidente que o Governo e, particularmente o Ministério da Indústria e Energia, está preparado para, logo que o Orçamento seja aprovado, poder apresentar e desbloquear os PISEEs das empresas públicas que tutela, mas não podemos é colocar «o carro à frente dos bois».
No que concerne à política de recursos naturais e mineiros, penso que esta é muito clara, pois tem sido objectivo deste Governo privilegiar a utilização dos recursos naturais. Quanto aos casos concretos que V. Ex.a citou, julgo ter sido possível, no caso da Empresa Carbonífera do Douro, transformar uma unidade industrial que era um problema numa unidade que não é mais isso. Hoje, funciona normalmente, tem capital, e condições laborais nitidamente melhoradas em relação ao passado e esta é uma situação em que temos algum orgulho.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Posso interrompê--lo, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — A questão colocada não era essa, porque sei efectivamente que a dita empresa foi recuperada. A questão prende-se, antes, com a ideia de saber se, depois de recuperada, há a intenção de vender, por exemplo, 49 % a grupos privados, nacionais ou estrangeiros. Aliás, citei o caso concreto da Empresa Carbonífera do Douro como, do mesmo modo, a Ferrominas, por intermédio da EDMA.
O Orador: — Sr. Deputado Carlos Carvalhas, um problema que se coloca, suponho que não só ao Governo como também ao País, é encontrar as fórmulas de poder desenvolver de forma mais rápida os recursos naturais de que dispõe. Ora, se o Estado não tem
os meios suficientes para isso e se conseguir encontrar modos de captar meios que permitam andar mais depressa, penso que essa será a política que o Governo pretende prosseguir, assegurando nesse sector como, aliás, em todas as realizações levadas a cabo, não só o controle maioritário do Estado como até a definição da política mediante a detenção do capital maioritário.
Não respondo ao Sr. Deputado Carlos Carvalhas sobre o problema da metalurgia do cobre, pois esta é um problema respeitante à indústria e não à energia.
Digo-lhe, apenas, que no sector «minas» a preocupação desta Secretaria de Estado é assegurar que a exploração dos nossos recursos mineiros na área do cobre seja feita da forma que nós consideramos mais conveniente para os interesses nacionais. Isto tentando utilizar os resultados de avanços tecnológicos verificados no passado recente, para que esse desenvolvimento possa ser feito, não só a nivel da Somincor, como referiu, mas também a nível das pirites alentejanas, onde as capacidades e potencialidades de progresso não estão esgotadas face às novas tecnologias entretanto criadas.
Sobre o problema da metalurgia do cobre o meu colega responderá.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Muito rapidamente posso também aferir do que disse de que em relação à Ferrominas via EDMA a filosofia é a mesma? A filosofia que há bocado expendeu para...
O Orador: — A filosofia, enfim ... Não é uma questão filosófica, mas de programa: é procurar desenvolver de modo mais rápido os nossos recursos naturais e, por isso, utilizar os meios disponíveis, quer do Estado, quer de outra qualquer entidade.
O Sr. Carlos Carvalhas (PCP): — Isto é, capital privado nacional ou estrangeiro!
O Orador: — O Sr. Deputado Octávio Teixeira aborda uma questão que em relação a ela o Sr. Ministro terá muito prazer em responder-lhe e em enviar a esta Comissão toda a informação relativa a estes contratos de desenvolvimento, ou seja, a forma como foram elaborados, com quem foram realizados, para que efeito, com que timing e com que financiamento.
Alguns desses projectos são fundamentalmente virados para o campo da conservação da energia ou para a investigação e diversificação energética e para encontrar as fontes de financiamento normal, a partir das verbas do Fundo de Abastecimento, referidas por mim no início.
Portanto, sobre esta matéria, de que tomei nota, é esta a informação que julgo que será conveniente dar nesta altura. O Sr. Ministro, na reunião que terá com a Comissão, terá com certeza oportunidade de desenvolver esta matéria.
Perguntou concretamente se as verbas são do Orçamento de 1984 ou do Orçamento de 1985. Poder-lhe--ia dizer que são dos dois, porque não foi possível desbloquear em 1984 todas as verbas do Orçamento de 1984 do Fundo de Abastecimento, tendo algumas transitado para 1985. Portanto, alguns dos projectos em curso serão — já foram alguns — financiados por verbas de 1984 e outros serão financiados pela verba remanescente de 1984 e a continuação do seu desenvolvimento pelas verbas de 1985.
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Vários Srs. Deputados, nomeadamente o Sr. Deputado Octávio Teixeira, colocaram a questão da insuficiência das verbas que constam do Orçamento do Estado e do PIDDAC para estas acções. Penso que o complemento de informação que dei sobre a fonte de financiamento — complementar derivada do Fundo de Abastecimento — completa e corrige alguns desequilíbrios que poderiam ser aparentes por uma só leitura do documento em apreço.
Como perguntaram se o Ministério considera as verbas suficientes ou insuficientes, penso que só há uma resposta possível: na medida em que o Ministério aceitou este Orçamento, é porque as considera satisfatórias. Se elas são as óptimas, é evidente que também lhe posso dizer que não, mas nós temos de gastar aquilo que temos e não podemos gastar mais do que o que temos.
Sobre a questão que me colocou relativa à reestruturação do sector têxtil, como é também fundamentalmente da área do meu colega, Sr. Secretário de Estado da Indústria, ele depois terá ocasião de tecer alguns comentários sobre essa matéria.
Em relação à última pergunta que colocou — qual é a previsão para capitais próprios e indemnizações compensatórias no sector da indústria —, a verba que aparece no Orçamento do Estado é, como sabe, uma verba global. O que pensamos é que ao sector das empresas públicas tuteladas pelo Ministério da Indústria e Energia caberá, se a verba que consta do Orçamento for aprovada, um valor da ordem dos 20 milhões de contos, dos 58 milhões que estão inscritos no Orçamento do Estado.
O Sr. Deputado Reis Borges colocou-me, fundamentalmente, a questão do destino a dar às verbas do PIDDAC no campo da energia. Penso que, com o complemento de informação que dei, na medida em que no sector da energia todos estes programas do PIDDAC que dizem respeito a recursos naturais e energéticos e à conservação e diversificação da energia são complementados com os fundos libertados do Fundo de Abastecimento, eles tornam-se, talvez, mais claros. É a manutenção de um programa de promoção da conservação da energia e da diversificação de fontes energéticas que está em causa.
Aproveito para responder ao Sr. Deputado Telmo Barbosa, que pergunta sobre o apoio a pequenos aproveitamentos hídricos. É um programa específico que está em curso, através da Direcção-Geral de Energia, que se destina a fazer o estudo da reconversão ou aproveitamento de pequenos aproveitamentos hidroeléctricos abandonados — citando de memória, salvo erro, são 5000 contos. Por estranho que possa parecer ao Sr. Deputado e, se calhar, também a mim, de 20 candidatos potenciais não conseguimos chegar ao fim senão com 6 empresas realmente interessadas em levar a cabo esse estudo; os outros desistiram pelo caminho. Portanto, isto é um estudo específico sobre essa matéria.
No campo das acções de conservação e diversificação energética, está aberto o campo para se analisarem formas de apoio eventuais interessados que possam aparecer. Em todo o caso, Sr. Deputado, para algum desgosto da nossa parte, os interessados não têm sido muitos.
O Sr. Deputado Reis Broges, a quem estou a responder sobre as verbas do PIDDAC, colocou-me também a questão muito concreta de saber quais são as
intenções em relação à energia nuclear. As intenções da Secretaria de Estado da Energia quanto à energia nuclear são relativamente simples e claras. A Secretaria de Estado da Energia preparou um Plano Energético Nacional, onde toda essa problemática é analisada. Há uma proposta em apreciação no Conselho de Ministros, que baixará à Assembleia da República, a qual apreciará o Plano e sobre ele se pronunciará.
Do que for feita sobre essa apreciação e as linhas de política que forem traçadas, a partir daí se estabe-lerá o programa.
Entretanto, é evidente que, num pressuposto de que pode haver a hipótese, que consideramos possível, de o País ter de recorrer à energia nuclear, há matérias que é necessário analisar e estudar, havendo que manter um nível técnico e tecnológico adequado. Esse nível é mantido, até porque, como já referi, temos de nos manter informados e apetrechados nessa matéria, face à posição que os nossos vizinhos espanhóis têm. Portanto, teremos de acompanhar sempre e ter capacidade de intervenção nessa área. Ao nível do Estado, é a manutenção dessa capacidade que está em causa.
O Sr. Deputado Domingues Azevedo colocou-me uma questão, à qual, realmente, não sei mesmo responder. Peço desculpa, mas desconheço fundos e serviços autónomos no Ministério que tenham as verbas que o Sr. Deputado referiu.
O orçamento do Ministério da Indústria e Energia, que eu saiba, não tem fundos autónomos; tem contas de ordem, mas estas contas de ordem somam 735 000 contos. Não sei onde é que o Sr. Deputado foi buscar tantos milhões, mas, já agora, gostaria de saber, porque se o Ministério tivesse não 13 milhões, mas 40 e tal, como o Sr. Deputado disse, talvez fosse interessante. Infelizmente, penso que não corresponde à realidade.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado da Energia?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Senhor Secretário de Estado da Energia, os números não devem estar enganados. Posso lembrar-lhe que só o Gabinete da Área de Sines, que está na área do Ministério da Indústria e Energia, tem um orçamento de 22 milhões de contos. Só este serviço tem este orçamento.
O Orador: — No Orçamento do Estado, Sr. Deputado?
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Não, Sr. Secretário de Estado. A pergunta que coloquei refere-se aos fundos e serviços autónomos na área do Ministério da Indústria e Energia.
O Orador: — Ah! O Sr. Deputado desculpará, mas, então, a resposta tem outro tom.
Em primeiro lugar, é evidente que isso não são fundos e serviços autónomos. O Gabinete da Área de Sin-tes tem no Orçamento do Estado 4 800 000 contos de dotação; essa está no Orçamento do Estado.
Agora é evidente que o orçamento dos sectores dependentes do Ministério da Indústria e Energia tem verbas que ultrapassam todos esses milhões. Se juntarmos aqui, no caso das empresas públicas tuteladas, as
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verbas desses orçamentos, é evidente que não é o Orçamento do Estado que acorre a todas as necessidades de financiamento desses serviços ou sectores. O que está aqui em causa são os serviços do Estado e, portanto, a parte de financiamento normal em actividades deste tipo deriva ou de receitas que as empresas têm ou de recurso a crédito para a realização das suas obras.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Sr. Secretário de Estado da Energia, é evidente — todos nós o sabemos — que estes serviços autónomos e a sua movimentação não estão integrados no Orçamento do Estado. Agora a movimentação dos fundos autónomos é uma despesa pública que está sob a tutela do Sr. Ministro da Indústria e Energia.
Foi nesse âmbito que coloquei a pergunta ao Sr. Secretário de Estado. É evidente que os 22 milhões de contos do Gabinete da Área de Sines não estão incluídos no orçamento do Ministério. Mas estes movimentos, estes orçamentos, são da responsabilidade do Sr. Ministro da Tutela, neste caso o Sr. Ministro da Indústria e Energia.
O Sr. Presidente: — Se me dão licença, Sr. Secretário de Estado da Energia e Sr. Deputado Domingues Azevedo, penso que conviria dar um contributo esclarecedor.
O Sr. Secretário de Estado tem, com certeza, presente o facto de o Gabinete da Área de Sines não estar, em termos orçamentais, inscrito na área do Ministério da Indústria e Energia. Não é assim, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Só uma parte!
O Sr. Presidente: — Exactamente, só uma parte.
Portanto, creio que talvez fosse conveniente o Sr. Deputado reordenar os volumes de fundos que quer equacionar, tendo em conta que, de facto, não está a considerar empresas públicas, como o Sr. Secretário de Estado está a colocar como hipótese — não está com certeza a considerar isso — e que deve considerar em área própria o Gabinete da Área de Sines. Eventualmente, pediria ao Sr. Secretário de Estado do Planeamento que também interviesse aqui, porque julgo que a sua intervenção esclarecedora poderia ultrapassar aqui algum equívoco numérico, ou seja, no sentido de se saber qual é a verba do Gabinete da Área de Sines, como é que ela é articulada e qual é a tutela respectiva, porque, segundo penso, só uma parte é que está na área da indústria...
O Orador: — Só 4 822 000 contos é que estão no Ministério da Indústria e Energia!
O Sr. Presidente: — Exactamente.
Por conseguinte, se o Sr. Deputado não visse inconveniente, reordenaríamos as suas dúvidas em função dos esclarecimentos que acaso o Sr. Secretário de Estado da Energia e, depois, o Sr. Secretário de Estado do Planeamento quiseram fazer o favor de nos facultar.
O Sr. Domingues de Azevedo (PS): — Certo, Sr. Presidente.
O Orador: — Muito obrigado, Sr. Presidente. Penso que isto talvez seja mais esclarecedor.
O nível de resposta que lhe posso dar é este.
Aliás, em relação à questão que coloca sobre a Direcção-Geral de Geologia e Minas, de num orçamento de 287 000 contos haver uma verba quase total sobre serviços não especificados, não nos estamos com certeza a referir ao mesmo documento. O orçamento da Direcção-Geral de Geologia e Minas tem 287 000 contos no Orçamento do Estado, com uma distribuição normal, em que a maior parte diz respeito a remunerações certas e permanentes, e uma dotação de 195 000 contos em contas de ordem, que derivam do contrato existente para a prospecção do carvão na bacia carbonífera do Douro. Esses 195 000 contos são integralmente aplicados nessa actividade e resultam de uma resolução e de um decreto que manda aplicar esta verba para esse efeito, esse fim; portanto, têm a aplicação muito concreta na prospecção da bacia carbonífera do Douro. E os 217 000 contos inscritos no PIDDAC estão devidamente explicitados pelos projectos a que dizem respeito.
Portanto, não há, do meu ponto de vista, falta de clareza na aplicação dos dinheiros que estão orçamentados para a Direcção-Geral de Geologia e Minas. Penso que, com este esclarecimento de que os 195 000 contos para contas de ordem são o resultado das receitas da venda do carvão e da sua aplicação na prospecção da bacia carbonífera do Douro, fica perfeitamente claro o destino que é dado aos dinheiros sobre esta matéria.
Penso que respondi às questões que me foram apresentadas e passaria a pedir ao meu colega Sr. Secretário de Estado da Indústria que completasse estas informações, se o Sr. Presidente assim o permitir.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Indústria.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria (Carvalho Carreira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Vou completar as respostas que foram dadas pelo meu colega.
Começaria por fazer uma referência a uma pergunta relacionada com a metalurgia do cobre propriamente dita, portanto, a parte que se situa a jusante da mina. Têm vindo a ser realizados os estudos prévios de instalação de uma metalurgia de cobre em Sines. Tem sido uma tarefa que, até ao momento, tem sido cometida à Quimigal, pelo menos numa fase mais actual.
Obviamente, não se tem avançado em estudos que comprometam definitivamente a realização deste projecto, até porque só no princípio de 1984 é que o problema mineiro relacionado com as Minas de Neves Corvo começou a sofrer um tratamento que permite esclarecer, de forma concreta, as disponibilidades de concentrados para abastecimento de uma metalurgia nacional.
Efectivamente, em fins de 1983, princípios de 1984, a situação descrita pela mina quanto à possibilidade de obtenção anual de concentrados não era de molde a permitir a instalação de uma metalurgia de cobre em Portugal. Havia concentrados insuficientes para garantir um mínimo de rentabilidade a essa metalurgia.
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A situação evoluiu ao longo do ano de 1984. Pode dizer-se, neste momento, que as perspectivas são incomparavelmente muito mais favoráveis do que eram em Janeiro de 1984. A Quimigal tem instruções para fazer avançar o processo dos estudos relativos à metalurgia até um ponto em que seja ainda possível ou não se concretizar o projecto, envolvendo, portanto, investimentos em. estudos, em escolha do engineering base, em escolha e selecção de empreiteiros gerais, mas sem que isso implique contratos que tornem irreversível o processo de. metalurgia.
Aguarda-se, portanto, um total esclarecimento do problema mineiro para se poder tomar uma decisão sobre a metalurgia, a qual ainda não está tomada — não foi de todo tomada qualquer decisão sobre a metalurgia do cobre.
Relativamente ao ponto da reestruturação do sector têxtil, isto é, efectivamente, um processo que se arrasta neste país há largos anos, diria que o problema de reestruturar o sector têxtil começou, em termos modernos, em 1978, mas já vem de épocas anteriores. O Ministério já preparou dois documentos sobre esta reestruturação, o mais recente dos quais foi distribuído às associações em Outubro de 1984.
Reacções a uma acção destas, por um lado, e o melhor conhecimento que o Ministério tem de actuações na área de reestruturações sectoriais, por outro lado, recomendam neste momento — e é essa a orientação que o Ministério está seguindo — que não se avance para um programa de reestruturação de tipo global. Isto é, o esquema ou tipo de actuação que estava preparado assemelhava-se um pouco a um sistema de incentivos à reestruturação industrial: era quase que um SIII dirigido a um sector, que é o sector de maior importância no País sob o ponto de vista industrial, pelo volume de emprego, pelo volume de vendas, pelo volume de exportações, mas, de qualquer maneira, com carácter geral.
Ora, a nossa convicção, neste momento, é a de que não é útil avançar para uma reestruturação global, tanto mais que o sector têxtil começou a recuperar em fins de 1983, tem vindo a recuperar durante todo o ano de 1984 e as previsões para 1985, se bem que não sejam neste momento tão optimistas como fazia prever a evolução em 1984, de qualquer maneira, situam o sector numa área de franca recuperação, fundamentalmente na área das confecções.
Assim, sem prejuízo de considerar as conclusões e as acções do próprio Plano, quer dizer, sem prejuízo de entender que o plano de reestruturação contém os elementos-chave de uma reestruturação, o Ministério entende que, considerando estes aspectos e considerando também que os meios financeiros e humanos para levar a cabo uma tarefa deste tipo não são ilimitados, mas, infelizmente, extremamente limitados, deveria considerar uma acção de concentração de esforços nalgumas áreas mais críticas deste sector.
Com esse objectivo, está neste momento a preparar um trabalho de actuação mais ao nível empresarial, isto é, mais ao nível de actuação directa junto das empresas e menos ao nível de um sistema baseado num plano e com a abertura de um guichet (desculpem a imagem), à espera que cheguem os projectos que são candidatos a um determinado apoio que esse próprio plano prevê. Prevê uma actuação mais directamente ligada às empresas, mais com uma participação ou envolvimento das empresas, com uma acção dinamizadora do próprio
Ministério em duas áreas: a área dos lanifícios, que é aquela que se sabe hoje que está, por um lado, em pior situação e que, por outro lado, vai ter um efeito mais negativo com a integração na CEE — estamos a falar, portanto, no sector que se situa na zona da Covilhã e da Guarda, na zona da serra da Estrela —, e a área, do algodão, localizada na região do Minho e relacionada, por um lado, com problemas de poluição e, por outro lado, com um problema extremamente grave, que o próprio plano identifica, que é o problema dos acabamentos — acabamentos das telas, a jusante das tecelagens. Essa é uma área extremamente importante, não só pelo problema de qualidade que está implícito no problema dos acabamentos, mas também com o problema da poluição.
Relativamente a este plano, o Ministério vai, portanto, concentrar a sua actuação nestas duas áreas específicas: lanifícios e sector de acabamento na zona do Minho.
Relativamente aos programas de reestruturação, sobretudo de reestruturação financeira das empresas públicas, os grandes problemas, na área do Ministério da Indústria e Energia, situam-se de facto nas empresas industriais e não propriamente nas energéticas ou mineiras. Há 4 empresas com situações distintas, mas qualquer delas complicadas: a Quimigal, a Siderurgia Nacional, a CNP e a Setenave.
A Quimigal é de facto um problema que implica algumas reestruturações internas e algumas modificações, eventualmente algumas modificações estruturais da empresa.
Uma delas, por exemplo, está intimamente ligada com o problema da metalurgia do cobre. Todo o sector de metalurgia dos não ferrosos está ligado ao problema da nova metalurgia dc cobre, porque tem incidência imediata não só sobre a metalurgia, mas também sobre a produção de ácido sulfúrico.
Há problemas com unidades — enfim, não vale a pena estar a repetir — que foram construídas recentemente, investimentos recentes que têm recuperação extremamente difícil, como, por exemplo, a peletização das cinzas de pirite para produção de matéria-prima para a Siderurgia Nacional. Foram projectadas em épocas com custos energéticos diferentes dos actuais e, além disso, em instalações com características não diria piloto, mas quase, e a modificação da conjuntura energética e, até, siderúrgica veio alterar substancia-mente as condições de exploração desta unidade.
Existem outras, pois o plano, que já está em execução, visa fechar ou manter numa situação de stand by instalações que não tenham resultados de exploração positivos.
A Quimigal teve, no ano passdo, um aumento de capital, de longe o maior desde sempre, um aumento de capital que foi superior a 13 milhões de contos e que fazia parte do plano de recuperação que tinha sido previsto para a empresa. Mesmo assim, não se completou a totalidade do programa que estava previsto.
Quanto a essa adequação do capital da empresa, espero — neste momento não posso afirmar nada, porque, como já foi dito pelo meu colega, ainda não estão distribuídas as verbas de dotações de capital para as empresas públicas — que haja verbas disponíveis para continuar a acção de saneamento financeiro que vinha a ser prosseguida.
Em relação à Siderurgia Nacional, o probíema tam-
h¿m é conhecido. Neste momento, o esclarecimento do
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problema do Plano Siderúrgico, em termos de possibilitar uma decisão do Governo, é totai. Não há que elaborar mais estudos ou que proceder a mais análises sobre a situação; existe a necessidade — toda a gente o reconhece e estamo-nos a preparar para isso — de tomar uma decisão se sim ou não sobre o plano.
A posição do Ministério da Indústria e Energia é a de que não se poderá manter a situação de não decisão por mais tempo, até porque isso causa danos às próprias instalações actuais. Isto é, a Siderurgia, na sua configuração actual, tem que saber se avança ou não para um plano de modernização, porque, se de todo não avançar para um plano de modernização, alguma coisa tem de ser feita nas instalações actuais, evidentemente num plano de manutenção dessas instalações e não já de modernização, com aumento de capacidade, com melhoria de qualidade, com custos energéticos inferiores aos actuais, etc.
Portanto, essa é a grande questão da Siderurgia Nacional.
Relativamente a outra empresa que referi — a Sete-nave —, a empresa, neste momento, está funcionando em condições que se podem considerar perfeitamente normais. Atingiu em 1984 uma boa performance em termos de reparação naval, arrancaram finalmente as construções dos graneleiros que estavam bloqueadas de há uns anos a esta parte e, em termos de decisão quanto a futuro, a empresa aguarda uma decisão final — porque decisões parciais já foram tomadas nesse aspecto — sobre o programa de renovação da frota da marinha mercante. Estão, também, em curso acções no sentido de se esclarecer quem vai fazer o quê. Penso que dentro de um a dois meses é possível termos elementos concretos para saber quais são os navios e o programa que vai ser afecto à Setenave.
Em relação à CNP, é uma empresa onde é difícil encontrar formas de actuar para melhoria das condições de exploração, mas a empresa tem vindo a recuperar. É bom não esquecer que a empresa só labora em condições mais ou menos normais. As condições não são normais, uma vez que ela está muito abaixo da capacidade nominal projectada.
A empresa tem vindo a recuperar: recuperou de 1983 para 1984, mas, apesar das previsões feitas no início de 1984, apesar de tudo, a empresa ainda não apresentou resultados positivos de exploração no ano de 1984. Diria que é uma empresa que se encontra num estado de observação permanente, no sentido de se ver quais são as decisões a tomar sobre a mesma.
Julgo que eram estes os aspectos a focar, uma vez que o meu colega já respondeu relativamente ao problema dos capitais próprios. O Ministério pensa poder vir a dispor de cerca de 20 milhões de contos para fazer uma distribuição de capital próprio das empresas, uma vez que neste sector não há propriamente indemnizações compensatórias. Há subsídios à construção naval, de valor significativo — cerca de 4 milhões de contos —, para os estaleiros da Setenave e para os de Viana do Castelo e outros, mas não são propriamente indemnizações compensatórias em termos de prestação de serviços, que são dedicadas às empresas de prestação de serviços.
O Sr. Presidente: — Volto a dar a palavra ao Sr. Secretário de Estado da Energia, que creio que quer dar uma informação complementar.
O Sr. Secretário de Estado da Energia: — Sr. Presidente, estou, realmente em condições de dar uma informação complementar em relação à questão do Sr. Deputado Domingues de Azevedo.
Na realidade, os fundos e os serviços autónomos a que o Sr. Deputado se referia, na sua essência, não são fundos e serviços autónomos. O Ministério tem tido a preocupação de terminar de vez com os serviços que já não tinham existência legal e que não são necessários. O que está aqui em causa, na realidade, é o Gabinete da Área de Sines — e sobre ele direi alguma coisa —, reportando-se o restante ao funcionamento, quer de direcções-gerais, quer das delegações regionais do Ministério, quer de um Centro de Normalização da Direcção-Geral de Qualidade. As receitas para estes serviços encontram-se, na generalidade, consignadas nas contas ou dos gabinetes dos Secretários de Estado — por exemplo, no Gabinete do Sr. Secretário de Estado da Indústria, para o Centro de Normalização —, ou nas verbas do Gabinete do Ministro ou, ainda, nas verbas das contas de ordem das respectivas direcções--gerais onde eles estão integrados, como o organismo, realmente, autónomo e de carácter misto — até porque é participado pelo sector público e também por empresas públicas e privadas —, que é a Comissão Nacional Portuguesa da Convenção Mundial de Energia. É uma comissão que faz o acompanhamento, a nível da Convenção Mundial de Energia, do que se passa em Portugal, estabelecendo a ponte entre as duas organizações e que, por isso, consideramos que é necessária.
Mas os pontos mais significativos dizem respeito ao Gabinete da Área de Sines, que — como é, talvez, do conhecimento dos Srs. Deputados — embora esteja, aqui, inscrita no Ministério da Indústria e Energia, tem uma tutela mista, do Ministério da Indústria e Energia e do Ministério do Mar. As verbas que estão para esse consignadas resultam, por um lado, das que estão inscritas no Orçamento do Estado — e a que eu fiz referência —, e, por outro lado, das que derivam já do funcionamento das próprias instalações — por exemplo, está aqui prevista a transferência, da Administração do Porto de Sines, de 5 600 000 contos e isto é, pura e simplesmente, a cobrança das taxas portuárias que o funcionamento do porto permite e que são consignadas ao Gabinete da Área de Sines para a realização dos seus trabalhos.
Aqui, sim, avulta um empréstimo a médio e longo prazo de 13 milhões de contos, que tem a ver com a construção do porto Carvoeiro — em curso — e que é, digamos, o recurso a crédito externo mais significativo de todo este sector. Isto porque, nas restantes áreas, os números que o Sr. Deputado referiu ou são receitas próprias das direcções-gerais ou são receitas que vêm através do Orçamento do Estado ou da taxa sobre — no caso, por exemplo, da prospecção da bacia carbonífera do Douro — o preço do carvão ou sobre a utilização do porto de Sines que também é significativa.
Penso que, com este complemento de informação, respondi, cabalmente, ao Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado: Começaria pela questão dos programas de desenvolvimento. Foi dada a explicação
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pelo Sr. Secretário de Estado da Energia, de que alguns destes programas não darão a ideia real daquilo que o Ministério pretende fazer durante o ano de 1985, na medida em que haverá outras fontes de receita, designadamente, as do Fundo de Abastecimento.
Julgo que há aqui, logo à partida, uma questão de concepção do Orçamento, na medida em que estes programas me parecem, de qualquer modo, que são programas do Ministério da Indústria e Energia com fontes de receita que não são apenas, digamos, as receitas próprias do Ministério da Indústria. Ora, em termos daquilo que se passa, normalmente, no Orçamento deveria existir, em relação às despesas, a apresentação da verba total de cada programa pelo Ministério da Indústria e Energia. Aliás, se os Srs. Secretários de Estado quiserem ver o chamado mapa vil dos programas e projectos plurianuais, verificar-se-á que aparecem, para cada projecto, duas rubricas: uma, que é o valor total do projecto ou do programa; a outra, que é a parte em que a receita vem do Orçamento. Nalguns casos é a mesma, noutros é substancialmente diferente — porque inclui, por exemplo, empréstimos externos, etc., que não estão incluidos no Orçamento.
Ora bem, o que se passa com os projectos e programas que, concretamente, referi, por um lado, é que a verba que referi — 50 000 contos de um lado, 9000 contos de outro, etc. — é a verba do Orçamento e simultaneamente a verba total do projecto e do programa.
Acresce, além disso, que havendo recursos do Fundo de Abastecimento — e julgamos que pelo menos este ano a questão do Fundo de Abastecimento fica um pouco mais clara do que nos anos anteriores, pois já nos foi feita essa promessa por parte da Secretaria de Estado do Orçamento e analisaremos isso na próxima sexta-feira —, em meu entender, o que deveria aparecer aqui, e julgo que é isto que se deve passar em termos de regras orçamentais, era a despesa por parte do Ministério da Indústria e Energia, bem como registar--se, como contrapartida de receita, uma transferência do Fundo de Abastecimento para o Ministério da Indústria e Energia, porque assim não é possível, de facto, votar um programa que vem aqui referido como sendo de 9000 contos, mas que afinal poderá ser de 30 000 ou 40 000 ou 50 000 contos.
Era esta a primeira questão, uma questão, digamos, de concepção do Orçamento e que me parece que deveria ser considerada.
Em relação a uma expressão que o Sr. Secretário de Estado da Energia usou, relacionada com o problema do PISEE — de o Governo não poder «pôr o carro à frente dos bois» — queria que me elucidasse melhor.
Julgo que o problema não é o de «pôr o carro à frente dos bois», na medida em que não se pede que o Ministério ou o Governo apresentem os Planos de Investimento do Sector Empresarial do Estado aprovados, mas sim os que estão previstos, assim como — e isto fundamentalmente — não se pretende que o Governo nos diga, neste momento, se está aprovado, que das dotações de capital são X milhões de contos para a empresa A, Y para a empresa B, etc. O que se pretende, pois, é saber aquilo que se prevê, porque aparece aqui uma verba global proposta que tem, com certeza, na sua concepção a perspectiva do Governo quanto à aplicação que se vai fazer dessa verba.
É evidente que antes de o Orçamento estar aprovado, toda e qualquer verba que venha aqui absolutamente
especificada — mesmo a verba para remunerações certas a pessoal contratado — é uma previsão, é uma proposta do Governo à Assembleia da República. Não há nenhuma verba que esteja, neste momento, aprovada — incluindo as relacionadas com despesas com pessoal. Mas se formos analisar a questão do «carro à frente dos bois» — e se eu bem ouvi a resposta do Sr. Secretário de Estado a uma questão que lhe coloquei —, poderá, eventualmente, estar isso a suceder no caso concreto do Sr. Ministro da Indústria. Quando perguntei se os contratos assinados hoje no Porto respeitavam a verbas constantes do Orçamento de 1984-1985 e o Sr. Secretário de Estado me disse que umas são de 1984 e outras são de 1985, diria que não pode estar a assinar contratos com verbas do Orçamento de 1985, porque ele ainda não está aprovado. Aí, sim, talvez possa existir «o carro à frente dos bois». Será, também, o caso dos acordos que foram assinados, há poucos dias, sobre o problema dos laboratórios/casas solares?
Se, de facto, isso tem a ver com o Orçamento de 1985 julgo que não poderia haver por parte do Ministério a assinatura desses acordos, pois as verbas ainda não estão aprovadas.
De qualquer modo, gostaria de, neste caso concreto, chamar a atenção para a necessidade de haver uma informação um pouco mais detalhada por parte do Governo. Não farei força, neste momento, até porque poderá o Sr. Secretário de Estado não ter neste momento os elementos exactos, mas como ainda teremos a discussão com o Ministério das Finanças, designadamente em relação à distribuição das verbas para dotações de capital previstas e para indemnizações compensatórias, penso que aquilo que está previsto por parte do Governo, neste momento, deverá ser apresentado à Assembleia.
Em relação ao problema global da reestruturação do sector empresarial do Estado, o Sr. Secretário de Estado da Indústria teve oportunidade de referir aquilo que o Ministério entende sobre alguns dos principais casos de empresas que estão em pior situação financeira no sector da tutela do Ministério da Indústria. Eu tinha posto uma questão um pouco mais global. É que, embora julguemos de todo o interesse as informações prestadas pelo Sr. Secretário de Estado, esta situação vai-se arrastando — o problema da reestruturação financeira das empresas públicas — isto é, a não tomada de decisões por parte do Governo é a questão fundamental. Pessoalmente, posso dizer-lhe que não estou à espera — nem estaria à espera, é lógico, é evidente — que o problema da reestruturação financeira das empresas públicas do Ministério da Indústria e Energia, viesse contemplado em termos orçamentais. Não é essa a questão, embora a distribuição das verbas de dotação de capital possa ter a ver com isso. Daí uma das razões porque nos interessaria ter conhecimento dessas verbas, assim como da própria previsão dos planos de investimento no sector empresarial do Estado.
O problema é outro: é o de haver — e julgo que isto é pacífico para todos — de todos os lados, no caso concreto, do Governo, a afirmação repetida de que são necessárias acções de reestruturação financeira e isto, pelo menos, desde que o Governo entrou em funções. Entretanto, já se passou um ano e meio, não há essas medidas e não temos a perspectiva, em termos de informação, por parte do Governo, de saber se há a possi-
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bilidade de, a curto prazo, se vir eventualmente a assinar o tal acordo de financiamento com o Banco Mundial.
Não há essa perspectiva? Há outras fontes? Como é que se vai resolver o problema? Como é que e quando é que se vão pagar, por exemplo, os atrasados às empresas públicas?
Quando é que se vão resolver todas estas questões?
Era esta problemática que tinha colocado e é ela que me parece que é de interesse debater, na medida em que, mesmo não estando directamente no Orçamento, tem relações muito directas com ele.
Para terminar, em relação à questão da reestruturação do sector têxtil, percebi a perspectiva que o Sr. Secretário de Estado apontou, mas mantendo a minha afirmação de que os 25 000 contos aqui previstos são uma verba por demais insuficiente para as acções a desenvolver pelo Governo neste campo. De qualquer modo, ficou-me uma dúvida e por isso coloco-a como um novo pedido de esclarecimento, Sr. Secretário de Estado.
A acção, agora, será uma acção mais individualizada, por empresa, mais no sentido de dar um apoio técnico, um incentivo, um empurrão para essa reestruturação. De qualquer modo, julgo que isto envolve verbas do Estado bastante elevadas, porque, se não me falha a memória, no princípio deste ano aprovámos aqui um empréstimo externo em que vinha indicado, em termos da sua distribuição — não tome este número como muito exacto —, qualquer coisa como 30 milhões de dólares que seriam para a reestruturação do sector empresarial do Estado. Por conseguinte, há, também aqui, verbas bastante elevadas, do que resulta a minha dúvida, que gostaria que o Sr. Secretário de Estado fizesse o favor de esclarecer.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, uma vez que o Sr. Secretário de Estado não pretende responder já.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado da Energia: Quando se fazem aqui perguntas em relação ao Orçamento do Estado, somos muitas vezes obrigados a focar outros aspectos da política global do Estado, e não só e apenas a cingir-nos aos números. Por sinal fiz perguntas relacionadas mais com números do que com outra coisa.
E, por falar em números, a verdade é que o Sr. Secretário de Estado entendeu que não devia responder a algumas perguntas, dizendo que nem sequer encontrava os números. Ora, terei o prazer, se o Secretário de Estado os não encontrar, de mandar fazer fotocópias dos documentos vindos do Ministério para V. Ex.a então comparar e poder, dessa forma, responder-me — não podendo fazer agora, mais tarde, desde que antes do encerramento do debate na especialidade.
É evidente que se fosse apenas um problema de números, Sr. Secretário de Estado, começaria por lhe perguntar porque é que o Gabinete do Sr. Ministro pretende 102 500 contos para aquisição de serviços não especificados. Como lhe poderia perguntar para que é que o Gabinete da Direcção-Geral de Energia quer 15 000 contos para compras não especificadas e mais 11 000 contos para o Centro de Normalização, mais 590 contos, mais 3280 contos, tudo isto para despesas
não especificadas. Gostava de saber, já agora, porque é que isto se passa na área da Secretaria de Estado da Energia e se o Sr. Secretário de Estado tem alguma informação de para que é esta verba, já que temos de ir ao rigor dos números. Espero, Sr. Secretário de Estado, que não venha dizer como alguns já têm dito, que isto é para pagar a água ou a luz ou para reparações em automóveis ou coisa do género.
Também lhe poderia perguntar, Sr. Secretário de Estado, para que é uma transferência para particulares de 5000 contos e outras que tais que vêm por todo o Orçamento.
Acontece, Sr. Secretário de Estado, que fiz perguntas muito claras, mas a algumas V. Ex.a não me respondeu. Nomeadamente, sobre o que pensa fazer o Governo com este Orçamento no domínio da racionalização dos recursos energéticos, no domínio do recurso a tecnologias novas — energias intensivas — nas medidas de conservação, na poupança energética, na redução da dependência do petróleo.
E por falar de petróleo, Sr. Secretário de Estado, temos um Gabinete de Pesquisa e Exploração do Petróleo que tem uma verba de 29 481 contos. Gostava de saber o que é que este Gabinete vai fazer este ano, se as verbas que tem são suficientes, que tipo de perspectivas temos e, sobretudo, que estudos estão a ser feitos.
Quando perguntei, Sr. Secretário de Estado, quais eram os projectos, no domínio da segurança nuclear, incluídos nos projectos aos quais é atribuído um valor de 113 546 contos, parece que V. Ex.a não encontrou a verba. Está aqui e até lhe posso dizer onde é que a pode encontrar.
Também lhe perguntei como se justifica que no domínio da segurança das centrais nucleares se preveja, nos programas e projectos plurianuais, uma verba de 302 535 contos e que nos domínios da conservação energética e da indústria e energia se preveja uma verba de 238 475 contos e 56 220 contos, respectivamente. O Sr. Secretário de Estado encontra isso na proposta de lei n.° 95/111 (projectos e programas plurianuais — sector do Ministério da Indústria e Energia, pp. 1, 7 e 8).
Sr. Secretário de Estado, gostava, já agora, de saber — pois saltou-me à vista, ao ver agora este mapa VII que vão ser gastos 78 680 contos até 1988 com o estudo dos problemas do impacto com a central de Sayago — que tipo de estudos estão a ser feitos com estas verbas que vão ser gastas até 1988?
Quando lhe perguntei sobre o que se está a fazer na EDP a nível do «estudo de sítio de centrais nucleares», o Sr. Secretário de Estado disse que isso não consta do Orçamento do Estado. Assim ficaremos, está muito bem, só que, Sr. Secretário de Estado, isto diz respeito a toda uma política de energia e, como nós sabemos, existe uma tendência para, daqui até 1990, se optar ou não pela energia nuclear. Gostava de saber se, realmente, o Sr. Secretário de Estado tem informações sobre o que está a fazer-se a nível do «estudo de sítio de centrais nucleares». V. Ex.a optou por não responder, mas se o quiser fazer agora, agradeço.
Também creio que não me respondeu sobre qual é a situação da central termoeléctrica a carvão, em Lavos, na Figueira da Foz. Realmente, gostaria de saber se há já ou não uma decisão sobre a sua construção e quanto ao desbloqueamento do local, se está ou não feito.
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Portanto, Sr. Secretário de Estado, eram perguntas muito claras.
Já agora, Sr. Secretário de Estado, em relação ao gás natural, gostaria de saber que estudos estão a ser feitos sobre o aproveitamento dele, que entidades estão envolvidas, que quantias envolvem, se há ou não dificuldades de verbas para esses estudos, se se abandonou qualquer estudo — creio que não — que esforços estão, realmente, a ser feitos neste sentido e se, realmente, o Ministério tem verbas suficientes para ocorrer a todos estes estudos que me parecem ser vultosos.
Gostaria, para finalizar, em relação às energias alternativas, de saber que esforços têm sido desenvolvidos pelo Ministério da Indústria e Energia, no sentido de sensibilizar o sector das construções, nomeadamente o Ministério do Equipamento Social, de forma a utilizar energia solar, por exemplo, em edifícios e urbanizações do Estado.
Creio que em alguns desses grandes edifícios poderíamos, talvez, poupar boas verbas em termos de energia e poupar, mesmo, energia, desde que se optasse, nomeadamente, pelos colectores solares. Gostava de saber se o Ministério da Indústria e Energia tem feito algum esforço de sensibilização ou se, tendo-o feito, o Ministério do Equipamento Social tem sido insensível a este esforço.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.3 Deputada Helena Bastos.
A Sr.3 Helena Bastos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Secretários de Estado: Ficaram-nos algumas dúvidas em relação às explicações que o Sr. Secretário da Indústria deu, designadamente no campo da metalurgia.
Concretamente, em relação ao projecto do cobre, quanto a nós, não colhe a opinião expressa de que era a indefinição a nível das prospecções que teria impedido o Governo de tomar uma decisão em relação ao projecto de viabilidade do cobre, que foi apresentado há cerca de 1 ano.
Isto porque, de facto, já em finais de 1983 estavam evidenciados 47,7 milhões de toneladas de minério cuprífero com 7,1% — isto em valores médios — de cobre o que, de facto, mostra alguns jazigos extremamente ricos e que já na altura se dizia, e com razão, que correspondiam às descobertas mais importantes, em termos de minérios de cobre, das últimas décadas.
A evolução das prospecções de Montagraço veio ainda reafirmar essa posição, porque aí as ocorrências cupríferas ainda são superiores — como sabe —, pois cifram-se em 10,5% de cobre, o que é o teor mais elevado do mundo, neste momento.
Portanto, não colhe para nós, de facto, o argumento da indefinição das prospecções minerais, porque estas eram reservas provadas e as prospecções indicavam que muito, ainda, havia a descobrir. De facto, isso tem-se vindo a confirmar e, quanto a nós, são pressões internacionais, que são extremamente perigosas, que neste momento dificultam o avanço do projecto exigindo-se, pois, uma clarificação do Governo. Já que sabemos que dentro de 1 mês o Governo tem de tomar uma posição, tem de exercer o seu direito de opção em relação à parte que está a leilão das minas de Neves Corvo; sabemos que o protocolo que foi assinado entre a SOMINCOR e a Peñarroja e BRGM prevê uma protecção á parte minoritária, em que as decisões fundamentais, quer a nível de implementação metalúrgica,
quer a nível de decisão de funcionamento e de cargos de gestão, etc, exigem uma maioria de dois terços.
Portanto, gostaria de saber que medidas vai o Governo tomar, ou para alterar o protocolo ou para, nesse leilão a efectuar, se fazerem as coisas para que nenhuma das partes possa ter os 33,5% que, aliás, a Rio Tinto, numa primeira fase, queria comprar à Penarroja e à BRGM.
Neste momento até já se fala em 49 % e é evidente que se isso for feito não teremos metalurgia do cobre em Portugal e, se calhar, é por isso que o Governo tarda a manifestar a sua decisão, desculpando-se com argumentos que, de facto, quanto a nós, carecem de fundamentação. Aliás, a própria Rio Tinto tem, neste momento, em Portugal enviados com credenciais da Penarroja que andam aí a colher informações, como deve saber, no que diz respeito à parte mineira.
Portanto, qual é a posição do Governo Português, uma vez que a decisão tem de ser tomada no espaço de 1 mês?
Nesse campo, ainda, quais as decisões que estão a ser tomadas em relação ao PAIP, já que funcionam as unidades de flutuação que, em Aljustrel, permitem a incorporação do minério de cobre das pirites nessa metalurgia do cobre — e tão importante é para o desenvolvimento económico do nosso país.
Em relação à Siderurgia Nacional, também tem havido um sistemático protelamento de decisões, desde o Plano Siderúrgico Nacional até ao plano de expansão e agora, até, em relação a um plano de modernização que, de facto, era o mínimo que se poderia fazer. Neste momento, até o próprio «Livro Branco» aponta para a hipótese espantosa de se venderem os equipamentos para sucata, se não for tomada nenhuma decisão em relação ao plano de modernização.
O que é que o Governo pensa fazer — já há mais de 9 meses que tem acabado e nas suas mãos o projecto de modernização: ora 9 meses dão para nascer crianças e não dão para tomar uma decisão no que diz respeito a esta posição! — em relação a isto e qual é o futuro do projecto de Moncorvo.
Para já eram estas as questões que queria colocar.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Vitorino.
O Sr. José Vitorino (PSD): — Sr. Presidente em exercício, Srs. Secretários de Estado: As questões que irei pôr serão uma breve e uma mais profunda — se bem que não vá poder esperar pelas respostas —, mas depois lerei as actas, conforme tenho feito.
A primeira questão é de carácter mais pontual e tem a ver com o parque industrial de Faro.
Pode dizer-se que não é, propriamente, famosa nem brilhante a experiência dos parques industriais em Portugal — pela própria maneira como foram concebidos, pelas próprias responsabilidades ou integração com que, desde o início, foram consideradas as entidades empresariais e outras — mas, de qualquer forma, o que é facto é que com essa filosofia ou com outra, sem dúvida que eles constituem elementos catalisadores importantes para o desenvolvimento de determinada actividade industrial.
No caso concreto do Algarve, o problema tem-se arrastado. Primeiramente, por razões que tiveram a ver com a Câmara Municipal de Faro que, por não ter o seu plano de urbanização aprovado, não pôde pôr o
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terreno à disposição da Empresa Pública dos Parques Industriais. Penso que se isso tivesse acontecido alguns anos atrás o parque já teria alguma existência física.
Como isso não foi possível e como também não foi por culpa da Câmara, mas por atraso na renovação do plano de urbanização, e como houve uma alteração da filosofia do desenvolvimento dos parques industriais e do papel do Estado, a questão está paralisada. Sem dúvida que o Algarve tem condições excepcionais para alguma tecnologia de ponta, sabendo-se, até, que há, a nível internacional, grandes empresas interessadas em instalar-se no Algarve, desde que tenham condições para o efeito. É que, para além disso, o Algarve vive com base na agricultura, na pesca, no turismo — que não é indústria nem deixa de o ser, é uma indústria e um serviço, simultaneamente — e, portanto, o elemento industrial, na perspectiva das indústrias não poluentes, como é óbvio, é um elemento fundamental para a estabilidade da própria região e também para o aproveitamento das potencialidades, designadamente, do solo — e isso pode ter uma influência decisiva no desenvolvimento de certo tipo de indústrias.
Deste modo, a pergunta que formulava é a seguinte: Qual é, em termos gerais e com indicação dos pontos mais característicos da nova filosofia do Governo em matéria de parques industriais, e ainda, nesse âmbito e nesse sentido, o que é que está previsto, já para este ano, quanto à implementação do parque industrial de Faro?
Também queria saber — e isto é um elemento fundamental — qual é a política que vai ser seguida neste aspecto pelo Governo, em termos de fazer uma aproximação, cada vez maior, entre unidades industriais
— parques industriais, pelo que significam de concentração de determinadas actividades industriais — e as instituições superiores, designadamente as universidades, institutos politécnicos e, também, a nível de escolas secundárias.
Bem, sei que há aqui uma certa fronteira entre o Ministério da Indústria e o Ministério da Educação, mas penso que, para além disso, o Ministério da Indústria deverá ter uma sensibilidade, pelo menos, tão grande como a do Ministério da Educação.
Portanto, importava saber qual é o efectivo plano do Governo nesta matéria e em que medida é que se pode pôr fim a esta situação. Por exemplo, sei que na Universidade do Algarve, hoje em dia, os seus alunos, apesar de já terem muitas empresas com as quais podem contactar e muitas experiências no domínio da agricultura, já que existem aí as disciplinas de Horticultura e Fruticultura, e também no domínio das pescas, pois Biologia, Marinha e Pescas são dois dos cursos presentemente aí ministrados, não têm contactos com a actividade real e viva.
Estão, por assim dizer, um pouco numa perspectiva livresca. Isto é, estão numa zona que tem características particulares para este tipo de investigação e estudo
— real e vivo —, mas, por incrível que pareça, não têm esse contacto com a realidade. Estão no «local do crime», mas não contactam nem o criminoso nem o inocente.
Portanto, importa saber qual é o papel que o Ministério da Indústria pode assumir nesta matéria, ou se entende que esse papel deverá ser essencial ou mesmo exclusivamente assumido pelo Ministério da Educação.
Em termos de fundo, eu não iria aprofundar a questão do sector empresarial do Estado, pois o Partido
Social Democrata já teve oportunidade de se pronunciar, através de mim, com bastante clareza sobre a questão. Nós não somos dogmáticos. As empresas públicas não são para nós um inimigo a abater; nunca colocámos a questão nessa perspectiva! O que entendemos, é que essas empresas são fonte ou garantem serviços sociais públicos e o Estado não pode de maneira nenhuma demitir-se, deve assumir os custos desse serviço social, sem obviamente se pedir rentabilidade a essas empresas, dado que ela é simultaneamente económica e social. Portanto, essas empresas devem ser vistas mais em termos de produção e produtividade dos serviços do que em termos de uma determinada conta de exploração ao fim do ano, que é ou não rentável. Temos ideias muito precisas sobre esta questão, e entendemos que o Estado não pode de modo nenhum abdicar de ter um papel activo e predominante em tudo aquilo que são as grandes fontes de riqueza nacional. Isto para equacionar a nossa posição que é muito clara e transparente.
Mas isto não impede que nós tenhamos, naturalmente, as maiores reservas para um conjunto tão grande de empresas que o Estado, pela sua própria estrutura, pelas dificuldades, por estar em parte ultrapassado em termos orgânicos, em termos funcionais, em termos até de equipamento, vai tendo dificuldades em gerir de forma rentável. Assim, pensamos que se poderia conseguir uma maior rentabilidade se parte do todo estivesse entregue à iniciativa privada, garantindo--se deste modo um progresso do País sem se pôr em causa os interesses colectivos, já que não seriam entregues sectores que tivessem possibilidades de se transformarem em monopólio. Aliás, é o que acontece agora nalguns casos de empresas públicas.
Mas a questão era esta, sim ou não o Governo? Sei que esta é uma questão de política geral, de filosofia política, mas o Ministério da Indústria deverá ter uma visão mais concreta da situação. Repito, sim ou não o Governo, enquanto não for revista a Constituição, permitindo a desnacionalização de algumas empresas?
Admite ou não o Governo a possibilidade de vender parte do capital, de fazer concessões de exploração de determinadas empresas, em condições a negociar, à iniciativa privada?
Estas são questões concretas, que nós pensamos que poderiam significar um salto importante, sem comprometer o essencial do papel do Estado na defesa dos interesses públicos e colectivos.
O Sr. Presidente: — Suponho que não há mais oradores inscritos para pedirem esclarecimentos e, assim, darei a palavra aos Srs. Secretários de Estado para fazerem as intervenções que acharem adequadas.
Entretanto, apesar de pensar que não tenho muita legitimidade para o fazer, dado que tenho estado ausente a tratar de outros assuntos dentro da Assembleia, voltava a lembrar aos Srs. Deputados que o que estamos a discutir é o Orçamento e não as políticas do Ministério, sendo, no entanto, certo, volto a sublinhá--lo, que a discussão do Orçamento, isoladamente considerado, também não é uma discussão completa. Apelo, pois, aos Srs. Deputados no sentido de fazerem novas intervenções tendo em conta esta ordem de ideias, bem como, do mesmo modo, pedia aos Srs. Secretários de Estado o favor de responderem dentro desta filosofia.
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O Sr. Secretário de Estado da Energia: — Neste conjunto de questões, que agora foram apresentadas, há uma boa parte que se dirige ao meu colega da Indústria. Quanto à questão geral suscitada pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira e relativa aos programas de desenvolvimento e do «carro à frente dos bois», devo lembrar que falei em orçamento do Fundo de Abastecimento e disse que havia verbas do Orçamento de 1984 que transitavam para 1985. Portanto, penso que no caso concreto destas acções não haverá «carro à frente dos bois», visto que está ainda relacionado com o Orçamento de 1984, o qual não está totalmente esgotado e que tem uma tramitação diferente das verbas do Orçamento do Estado. Como já disse, penso que parte dos esclarecimentos pedidos são também dirigidos ao Sr. Ministro da Indústria. Julgo mesmo que ele terá a possibilidade de apresentar uma perspectiva mais completa e uma informação concreta aos Srs. Deputados e à Comissão sobre os problemas de desenvolvimento. Abstenho-me, assim, de continuar a falar sobre este tema.
Relativamente às questões postas pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, é evidente que eu não posso encontrar no Orçamento de 1985 verbas que são o acumulado até 1990! Havia realmente uma certa dificuldade em eu as encontrar e é evidente que o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, ao citar verbas que são um acumulado de despesas já feitas e de outras a fazer, tornou a minha resposta particularmente mais difícil, obrigando-me a solicitar um esclarecimento para poder responder. Prestado esse esclarecimento, resta-me dizer que as verbas estão previstas, e que, portanto, têm a mesma justificação que eu referi há pouco. Como o Sr. Deputado reparará, as verbas que aparecem mais avolumadas, nos anos posteriores, particularmente, são verbas que vão sendo sucessivamente proteladas para os anos seguintes dado que a construírem-se, realmente, centrais nucleares junto da fronteira portuguesa, nós teremos de intensificar os nossos esforços na perspectiva de isso acontecer.
Por outro lado, as verbas que estão a ser utilizadas têm a ver com estudos que têm aplicações, não só estritamente no campo da energia nuclear, mas, por exemplo, no estudo de modelização e das vinhas do rio Douro, portanto, essas verbas têm aplicação para outros fins que não só a segurança nuclear e foram mesmo consideradas um contributo útil para o conhecimento da região nessa matéria. Penso que este complemento dá cabimento à resposta.
Em relação às questões de política geral, o Sr. Deputado e a sua bancada tiveram ocasião de fazer uma interpelação ao Governo sobre política energética e, nessa altura, todas estas questões foram respondidas.
Por outro lado, penso que — aliás o Sr. Presidente já o referiu — esta não é altura de fazermos aqui uma interpelação ao Governo sobre matérias de política geral. Nem havia sequer tempo físico para o fazer.
A política que está subjacente à utilização das verbas do Orçamento do Estado é, pensamos nós, relativamente clara, principalmente após o complemento de informação que foi aqui prestado. Como foi dito, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, há acções de racionalização dos recursos energéticos, como a diminuição da dependência do petróleo, o recurso à conservação de energia, acções dessas que não são só — e nem nunca o seriam — realizadas com dinheiro do Orçamento do Estado. Elas são realizadas — pois
é aí que têm impacte — ao nível das próprias empresas, ao nível das utilizações e dos investimentos que estão em curso. É aí que nós vamos encontrar as grandes mudanças de utilização do fuelóleo para carvão, as conservações de energia na indústria e mesmo o caso particular que o Sr. Deputado citou — que, aliás, já tinha sido citado pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira —, os despachos conjuntos de implementação de políticas de utilização de energia solar nas habitações, nas escolas e nos hospitais entre o Ministério da Indústria e Energia e o Ministério do Equipamento Social. Trata-se, portanto, de acções que estão em curso e que têm este enquadramento.
Em relação ao gás natural, aí também os estudos são, e continuam a ser, feitos a nível empresarial. O facto de não aparecerem dotações no Orçamento do Estado para esse efeito, não quer dizer que esses estudos, esses trabalhos, não sejam realizados. Nem tudo o que se faz no País no sector empresarial do Estado aparece, obviamente, no Orçamento do Estado, pelo menos, de uma forma explícita.
O Sr. Deputado colocou-me ainda uma questão em relação ao Gabinete de Prospecção e Exploração de Petróleo. Os 29 000 contos que tenho de dotação de capital, em pouco ultrapassa o pagamento dos técnicos e o seu funcionamento e a política que se continua a prosseguir, é uma política que, como eu tive ocasião de a definir em tempos recuados, visa continuar a oferecer condições favoráveis ao desenvolvimento de trabalhos por empresas estrangeiras que possam fazer a prospecção sem encargos significativos para o erário público. Essa acção será intensificada, em particular este ano, através de duas acções: uma já em curso e outra que será apresentada em Abril-Maio, qualquer delas sem encargos para o Estado.
Foi, assim, possível realizar todo o perfil sísmico do off shore português, desde a fronteira norte até Vila Real de Santo António, sem dispêndio para o Orçamento do Estado. Prosseguir-se-á fazendo a promoção dos resultados até agora atingidos e, portanto, promovendo o aparecimento de novos candidatos à prospecção no território nacional, também estes sem recurso ao Orçamento do Estado.
Por último, não queria deixar de lhe dizer, Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que em relação às verbas de aquisições não especificadas que constam das direcções-gerais que estão sobre a minha tutela, elas não se destinam realmente a comprar gasolina nem a pagar telefone. Destinam-se a realizar acções que têm surgido — e que continuarão a surgir —, e que não são directamente previsíveis no Orçamento. Reportam-se a compras de serviços, como, por exemplo, a compra de serviços publicitários para certas campanhas de informação ao público, que, em momentos particulares se justificam; por exemplo, agora justifica-se a reactivação da campanha de publicidade sobre as aplicações do gás e sobre poupança de energia, que já deve ter visto na televisão e em mais meios de comunicação social.
A Sr.3 Deputada Helena Bastos pôs questões ligadas à metalurgia do cobre e penso que o meu colega da Indústria irá responder. Em todo o caso, a Sr.a Deputada fez afirmações sobre o campo mineiro, que eu tenho de comentar.
Aquilo que afirmou sobre o conhecimento das reservas e dos recursos mineiros nos jazigos de Neves Corvo, e Graça Neves, e Zambujal, não é tão completo como
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referiu e não é suficiente para permitir ao Governo tomar uma decisão sobre a metalurgia do cobre, cuja dimensão mínima se estima ser da ordem das 100 000 t.
A existência ou a possibilidade de manutenção de uma produção de 100 000 t durante um número de anos que seja suficiente para amortizar a metalurgia do cobre, não é hoje um dado adquirido com plena confiança. Sabe-se bastante mais do que se sabia no inicio de 1984, as perspectivas são muito favoráveis, a possibilidade de transformar em concentrado de cobre os minérios de Aljustrel também apresenta indícios optimistas, mas tudo isso são indícios. Não há ainda garantias completas de que se possa oferecer à metalurgia do cobre uma produção de concentrados nacionais na quantidade que é necessária — apesar de, como já disse, a visão actual ser muito mais optimista do que era no início de 1984.
A nossa preocupação ao nível da matéria que focou, é a de salvaguardar os interesses nacionais, o que pode ser feito de várias maneiras, dando-nos possibilidade, nomeadamente de renegociação de um contrato de investimento como o que foi feito numa outra altura, mas noutras bases, obviamente.
Penso que em relação a estas matérias já respondi e, portanto, passo a palavra ao meu colega.
O Sr. Secretário de Estado da Indústria: — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente aos pontos que dizem respeito à indústria e em relação às questões que foram postas pelo Sr. Deputado Octávio Teixeira, quanto ao problema de reestruturação das empresas públicas — reestruturação mais financeira do que física, porque essa questão é, infelizmente, a principal e, eventualmente, a mais difícil —, o Ministério da Indústria gere a verba previsível de que dispõe para dotar as suas empresas de acordo com as necessidades destas, mas não se pode, evidentemente, dizer que essas verbas sejam suficientes para libertar a carga financeira que as empresas têm neste momento.
Em relação à QUIM1GAL, referi que o plano previsto para 1984 — que previa uma injecção de capital de um montante que se situava à volta dos 18 milhões de contos —, foi cumprida em 13 milhões de contos, o que se pode considerar um nível bastante aceitável para a prática que vinha a ser seguida até 1984. E de acordo com as disponibilidades que houver em 1985, prosseguir-se-á com esse programa.
Em relação, não à QUIMIGAL mas às outras empresas, os planos de reestruturação financeira estão também muito dependentes do que irá acontecer a essas empresas, por exemplo, do que irá acontecer aos planos de modernização da Siderurgia Nacional e de renovação da frota da marinha mercante da Setenave. Só após conhecimento dos programas que essas empresas puderem desenvolver no futuro, é que será possível ter uma actuação mais concreta, em termos de saneamento financeiro.
Relativamente à CNP, temos um problema que é complicado; a empresa está de tal modo endividada que as soluções têm de ser encontradas, durante os próximos anos no campo de novos financiamentos e de refinanciamentos. Não é possível encontrar formas de saneamento daquela empresa através de dotações de capital! É perfeitamente impossível!
No que respeita ao sector têxtil, o Sr. Deputado focou três pontos. Primeiro, focou a verba inscrita na Direcção-Geral da Indústria de 25 000 contos. Devo
dizer-lhe que essa verba não se destina a acções de apoio directo, em termos financeiros, à reestruturação da Direcção-Geral da Indústria. São verbas previstas para o funcionamento dessa Direcção-Geral, tendo em vista acções concretas a desenvolver pelos serviços da Direcção-Geral da Indústria. Essa verba não vai ser afectada a subsídios ou a funcionamentos destinados à reestruturação. Isso não era possível. Era uma verba demasiado exígua para ter qualquer tipo de acção. O Ministério da Indústria e Energia conta com as verbas inscritas no Fundo de Abastecimento para apoio à reestruturação, para apoio à inovação, para apoio aos tais contratos de desenvolvimento tecnológico. É dessas verbas que serão afectos os montantes necessários — obviamente também limitados pois não são de modo algum ilimitados — para fazer face a um programa de actuação no campo do sector têxtil, na linha que anteriormente referi.
Quanto ao empréstimo do Banco Mundial, devo dizer que ele foi aprovado pela Assembleia da República e estava intimamente ligado ao Plano de Reestruturação do Sector Têxtil. Nesta nova perspectiva, o que o Ministério pensa é que esse empréstimo do Banco Mundial deverá ser transformado numa linha de crédito a ser gerida pelo sistema bancário, sem perder de vista que esses empréstimos feitos pelo sistema bancário ao sector têxtil têm de cumprir as linhas gerais do plano de reestruturação.
Contudo, não deixa de haver uma ligação íntima entre as acções desenvolvidas pelo Ministério da Indústria e Energia no âmbito do plano de reestruturação e o empréstimo do Banco Mundial. Isto, de resto, a exemplos de outros empréstimos do Banco Mundial, que têm sido geridos pelo sistema bancário. Julgo que respondi às questões que colocou.
Em relação às questões postas pela Sr.3 Deputada Helena Bastos e ainda em relação à metalurgia do cobre, uma vez que fui eu que suscitei essa questão em complemento do que disse o meu colega Secretário de Estado da Energia, gostaria ainda de acrescentar o seguinte: o que está em causa não são as reservas provadas, possíveis, ou, às vezes, imaginárias. Aliás, os mineiros costumam dizer que só se sabe quais são as reservas provadas quando a mina está esgotada, porque é um exercício de soma algébrica das quantidades extraídas. Isto é uma graça que os mineiros dizem, obviamente!...
Mas não foi essa a questão que, em finais de 1983, princípios de 1984, nos impediu de tomar uma decisão sobre a metalurgia do cobre, ou, pelo menos, não foi isso que nos levou a actuar junto da empresa mineira, no sentido de um melhor esclarecimento desse problema.
De facto, nessa altura, as reservas estavam estimadas nesses montantes. Só que o plano de extracção, o plano de desenvolvimento mineiro, previa que a mina atingisse o máximo de 65 000 t equivalentes de cobre durante 4 anos. Após os 3 primeiros anos e os 4 anos seguintes, onde se atingia esse plafond de 65 000 t, a produção voltava a cair. Ora, nessas condições — isso é óbvio — não era possível desenvolver um projecto metalúrgico, visto que não tínhamos matéria-prima, mau grado a matéria-prima estar debaixo do solo. Ninguém entendeu a razão por que é que, estando o cobre debaixo da terra, não era possível um plano mineiro que pudesse satisfazer uma metalurgia do cobre. Aquilo
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que fizemos foi instruir a empresa para que ela esclarecesse, e assim foi.
E a partir daí, obviamente que as estimativas de reservas também cresceram, a partir de campanhas de prospecção que, entretanto, foram sendo feitas, mas sobretudo o plano mineiro começou a disponibilizar anualmente quantidades de concentrado de cobre que começarem a dar boas perspectivas à instalação de uma metalurgia do cobre.
Quando falo em pressões internacionais, admito perfeitamente que outros interesses, que não os nossos, perspectivassem para a mina uma produção anual de concentrado de cobre que não permitisse a instalação de uma metalurgia. Não estou aqui a fazer processo de intenções, mas, naturalmente, era isso mesmo. Aliás, isto é uma conversa descomprometida, não posso garantir-lhes que fosse isso.
Agora, que da acção desenvolvida pelo Ministério da Indústria e Energia resultou uma alteração substancial deste quadro, lá isso resultou, a ponto de eu lhe dizer que hoje é possível encarar, com algum optimismo, a instalação de uma metalurgia do cobre em Portugal.
Relativamente ao plano siderúrgico, o Governo, na altura em que preparou o plano de modernização — portanto, o plano já a uma escala mais reduzida —, quando fez a sua apreciação, teve em linha de conta três pontos bem concretos, em que um deles exigia um melhor conhecimento do que iria passar-se, em anos futuros, em termos de investimento do sector empresarial do Estado. Assim, obteve-se a chamada configuração mínima do projecto, que era o tal plano. A partir dessa decisão, fez-se uma confirmação no sentido de saber se seria essa, efectivamente, a configuração mínima, em termos de processo e em termos de íiming, em termos de faseamento de construção, porque também isto influencia os desembolsos necessários para a realização do projecto. Fez-se essa confirmação e chegou-se, mais uma vez, à conclusão de que aquela seria a configuração mínima. Abaixo disso, não havia plano.
A seguir, fez-se um plano de financiamento do projecto. No entanto, havia um último ponto, que é extremamente importante, que é o da compatibilização deste projecto com outros alternativos, a maior parte dos quais fora da área da indústria e da energia. A indústria e energia também têm interesse, por exemplo, no plano de renovação da frota da marinha mercante.
Mas há outros: o plano de renovação na área dos transportes é um plano concorrente e o problema dos investimentos no sector energético é outra área que tem influência em termos de mobilização de meios.
Diria, e está aqui o meu colega Secretário de Estado da Energia que pode confirmar, que só recentemente é que há uma ideia quanto à compatibilidade ou não deste plano de modernização com invetimentos que são seus concorrentes e que, eventualmente, podem ter maiores prioridades do que o plano de modernização.
Relativamente à pergunta feita pelo Sr. Deputado José Vitorino sobre o parque industrial de Faro, direi que a orientação dada à Empresa Pública de Parques Industriais tem implicações a nível da reestruturação da própria empresa. A Empresa Pública de Parques Industriais foi constituída antes de 1974 e já construiu no País cinco parques industriais. E construiu-os dentro de uma filosofia de investimento total. Isto é, comprou o terreno, fez as infra-estruturas, fez os pavilhões e
alugou-os. É evidente que, ao fim de alguns anos, o resultado deste tipo de actuação é um verdadeiro fracasso, porque as rendas recebidas pela utilização dos pavilhões não suportam praticamente nada do serviço da dívida na medida em que são perfeitamente ridículas em relação às necessidades de gerar meios que os investimentos implicaram.
Constatada esta situação, houve até concorrência. A partir de uma certa altura, nomeadamente depois do 25 de Abril, houve uma concorrência muito saudável de iniciativas autárquicas em matéria de zonas industriais. Essa concorrência causou até algumas perturbações e o Ministério da Indústria e Energia entendeu que a Empresa Pública de Parques Industriais, mais do que uma empresa que se dedicava à construção de parques para exploração nas condições que referi, devia ser uma empresa que pudesse funcionar como uma empresa de apoio, de consultadoria das iniciativas autárquicas, podendo até completar, de alguma forma, em termos de participação, o capital de sociedades mistas — como, aliás já tem vindo a fazer —, não desenvolvendo a construção de parques, por iniciativa própria, sem qualquer participação, quer das autarquias, quer dos próprios industriais.
Quanto aos parques industriais que hoje estão em exploração, já foram dadas instruções à empresa para autorizar a construção de novos pavilhões, ou até a ampliação dos existentes, sem aquele rigor que vinha a ser seguido pela empresa — rigor esse que custa dinheiro — de que os pavilhões a construir, ou as ampliações a fazer, têm de ser exactamente nos moldes daquilo que lá está. Importa construir pavilhões adequados e dignos, mas não podem gastar-se centenas de milhares de contos a fazer coisas que são luxos.
Se algum dos Srs. Deputados presente visitar o Parque Industrial de Guimarães constatará que estamos perante um parque industrial que mais parece uma instalação feita na Suíça ou na Áustria do que em Portugal. Portanto, a qualidade é boa — o que, aliás, ninguém contesta — mas diria que é excessiva e inadequada ao nosso país. Ora, é isso que pretendemos modificar, porque senão ficamos bloqueados. A prova disso é que o Sr. Deputado José Vitorino reclama agora pelo parque industrial de Faro. E reclama porque o modelo que estava a ser utilizado era errado e nãc conduzia a nada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Secretários de Estado da Indústria e da Energia:
— que, julgo, é de registar e ficaremos à espera! — que estamos entendidos, visto que as questões já foram colocadas e as respectivas respostas foram dadas. No entanto, gostaria de fazer dois ou três pequenos comentários muito breves.
Aliás, em primeiro lugar, não vou propriamente fazer um comentário, mas registar uma informação dada, há pouco, pelo Sr. Secretário de Estado da Energia
— que, julgo, é de registar e ficaremos à espera! — no sentido de fornecer a esta Comissão os contratos de desenvolvimento. Julgo que isso teria bastante interesse.
A segunda questão está relacionada com o problema energético. Na primeira intervenção que fiz, tive oportunidade de referir que as verbas para programas rela-
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cionados com o nuclear não causam ao meu partido qualquer problema, porque julgamos que as questões devem ser preparadas atempadamente. O que nos preocupa é o desequilíbrio entre os programas, desequilíbrio esse a que o Sr. Secretário de Estado já deu alguma perspectiva de explicação. De qualquer modo, só depois de vermos quais são as verbas que estão afectas a outros programas do sector energético, por parte das verbas vindas do Fundo de Abastecimentos, é que podemos ter uma opinião mais formada.
No entanto, sobre esta questão dos desequilíbrios e entrando um pouco na política energética — embora o que vá dizer não tenha directamente nada a ver com o Orçamento do Estado, mas já tenha a ver com as Grandes Opções do Plano —, dir-lhe-ei que nos causa muitas preocupações a situação em que neste momento se encontra (por exemplo em termos da EDP) o desenvolvimento da energia hídrica.
Se a memória não me falha, neste momento a EDP tem 4 estaleiros, 2 dos quais estão praticamente em fase de desmontagem. Há, portanto, um decrescimento muito grande em relação àquilo que era normal na EDP. Digo isto não pelo facto de ser ou não normal, mas pelo facto de ser necessário. O Sr. Secretário de Estado sabe tão bem ou melhor do que eu que, em alguns desses empreendimentos, não é apenas a componente energética que está em questão, mas o seu aproveitamento, designadamente para fins agrícolas e piscícolas.
Assim, julgamos que o Ministério da Indústria e Energia deve ter uma função e uma acção neste domínio, na medida em que é tutela da Empresa Pública EDP e que um crescimento do número de estaleiros de tal monta não só é preocupante, como também é gravoso para o futuro próximo, mesmo que tenhamos em Jjnha de conta os próprios planos energéticos nacionais que foram sucessivamente apresentados pelo Governo, quer a versão de 1982, quer a versão de 1984.
Um problema que aqui foi levantado pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca e que temos discutido com todos os ministérios, é o da aquisição de serviços não especificados. O Sr. Secretário de Estado poder-nos-á dizer que a verba de 300 000 contos atribuída ao Ministério da Indústria e Energia não é muito elevada. Porém, penso que o é, mesmo em termos absolutos; penso que é uma verba avultada, principalmente porque está inserida num Orçamento que se pretende de austeridade. Mas o principal problema, para nós, não é o valor em si, mas o ritmo de crescimento desta verba.
Repare: comparando a versão inicial do Orçamento do Estado, para 1984 com o Orçamento do Estado para 1985, verifica-se que há um crescimento da ordem dos 115 % relativamente a esta verba. Ela é de longe, a verba que mais cresce neste Ministério, e a verdade é que praticamente não está afecta a nada; poderá servir para múltiplas coisas, mas não está afecta a nada.
Simultaneamente, como já tive oportunidade de dizer, há dotações para programas concretos e reconhecidamente considerados necessários não só por nós, como também pelo Governo — até porque os propõe no PIDDAC — que têm verbas reduzidíssimas e que podiam ser, eventualmente, reforçadas, em detrimento desta verba para aquisição de serviços não especificados.
Mais uma vez em termos de comentário, e isto já tem a ver com o Sr. Secretário de Estado da Indústria, gostaria de referir o problema da reestruturação financeira das empresas públicas. Já tive oportunidade de dizer que não estava à espera de encontrar isso no Orçamento. Julgo que esse problema não pode, nem deve, resolver-se pela via do Orçamento. Só que a indefinição constante, a não tomada de decisão, o não avançar-se com as decisões e sua concretização, vai agravando a situação que, cada vez mais, devido a essa indefinição e indecisão, se repercute no Orçamento do Estado. A própria revisão orçamental de 1984 já mostra, em boa parte, as incidências orçamentais que tem a indecisão e a indefinição. É isso que, em nosso entender, deve ser ultrapassado, o mais rapidamente possível. Não podemos continuar a esperar!...
Já agora, permitam-me um comentário muito concreto, porque o exemplo foi levantado pelo Sr. Secretário de Estado. É o seguinte: o Sr. Secretário de Estado, referindo-se à CNP (Companhia Nacional de Petroquímica), disse que a questão é complicada. A este respeito, eu era capaz — e solicito que entenda isto entre comas — de dizer o seguinte: «O caso da CNP é, de facto, tão complicado que, ao fim e ao cabo, se torna fácil.» De facto, é essa a situação: O caso é tão complicado que se torna fácil. Não está presente o Sr. Deputado José Vitorino e, por conseguinte, não gostaria de entrar nesse campo, mas devo dizer que o problema da CNP não vai, com certeza, resolver-se com a sua transferência para a iniciativa privada; aliás, esta solução também não vai resolver o problema financeiro da generalidade das empresas!
Ainda nesta perspectiva, penso que nenhum de nós tem dúvidas de que os governos anteriores ao actual têm fortes, fortíssimas — direi! — responsabilidades quanto à situação a que se chegou. Por um lado, fundamentalmente pela utilização das empresas públicas, porque se obtiveram financiamentos externos que não se destinavam às empresas públicas (isso é claro) e, por outro lado, pelo funcionamento do próprio Orçamento do Estado através da acumulação de atrasados. Por conseguinte, as responsabilidades são, efectivamente, de governos anteriores ao actual e não deste Governo!
Mas o problema é este, Sr. Secretário de Estado: O actual Governo, com o arrastar das decisões, está a assumir responsabilidades tão grandes ou eventualmente maiores do que as dos outros governos, na medida em que a situação entra em regime de «bola de neve». Ora, isto vai-se agravando ao ritmo que cresce e já não em proporção aritmética, mas em proporção geométrica. Por conseguinte, se essas responsabilidades iniciais não podem ser imputadas ao actual Governo — e isto nada tem a ver com as forças políticas que estão no Governo, pois, essas sim, têm responsabilidade (mas essa é outra questão) —, o Governo está agora a assumir responsabilidades de igual monta ao arrastar decisões.
Para terminar, registo que, mais uma vez — e no, caso concreto, foi, salvo erro, referido o problema da reestruturação do sector têxtil —, foram referidas verbas provenientes do Fundo de Abastecimento. Começo a ficar com curiosidade pela reunião da próxima sexta--feira: É que estou a ver tanta verba, tanta verba, tanta verba a sair do Fundo de Abastecimento!... E o caso não é só com este Ministério!
Se a memória não me falha, já aqui tivemos o Ministério da Agricultura e ouvimos dizer: «Bem, quanto ao orçamento do Ministério da Agricultura, ele não
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pode ser visto apenas pelo orçamento que aqui está; é preciso contar com 19 milhões de contos do Fundo de Abastecimento». Estou a ver o Fundo de Abastecimento a pagar tanto, tanto e tanto, que a única coisa que, neste momento, me admira é que o Fundo de Abastecimento não tenha muito mais dívidas, para além daquelas que tem. O Fundo de Abastecimento vem acumulando dívidas sobre dívidas e talvez esteja a haver aqui uma utilização por parte do Fundo de Abastecimento — e, indirectamente, das empresas públicas a quem o Fundo de Abastecimento fica a dever — para financiar o Orçamento.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.3 Deputada Helena Bastos.
A Sr.a Helena Bastos (PCP): — Srs. Secretários de Estado da Indústria e da Energia, congratulo-me por aquilo que parece ter sido expresso, ou seja, que o Governo tem a vontade política de instalar mesmo a metalurgia do cobre em Portugal. Apesar de tudo, tenho as minhas dúvidas, até porque não obtivemos resposta em relação a um aspecto que quanto a nós é fundamental, que é o que se relaciona com as associações na SOMINCOR da parte estrangeira. Na realidade, temos 1 mês para tomar uma decisão quanto a este aspecto e, quer aquando da discussão na generalidade, quer hoje, nada foi concretizado em relação a este aspecto.
Também gostaria de registar o facto de não ter sido referido nada sobre o PAIP. Se se pensa instalar a metalurgia do cobre em Portugal, para quando é que essa instalação está prevista? Que medidas e que capitais estão desde já disponíveis para que se passe de 400 000 t/ano a 1 200 000 t/ano? Ora, este aspecto já está previsto e aprovado há muito tempo, mas ainda não foi concretizado.
Em relação ao projecto de Moncorvo, gostaria igualmente de saber que verbas é que estão desde já disponíveis. Se vai ser tomada alguma decisão em relação à siderurgia, também gostávamos de a conhecer.
Para além do «Livro Branco» existe mais algum documento no que diz respeito a investimentos de recuperação difícil, nomeadamente nas áreas da indústria petroquímica e da metalurgia?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, agradeço muito o facto de V. Ex.a me ter concedido a palavra, mas as questões que gostaria de colocar nada têm a ver com o sector do Orçamento que está a ser discutido. Portanto, talvez fosse melhor encerrar-se o debate em relação a esta matéria e noutra oportunidade colocaria as questões que pretendo.
O Sr. Presidente: — Com certeza, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Energia.
O Sr. Secretário de Estado da Energia: — Sr. Deputado Octávio Teixeira, V. Ex.a iniciou a sua intervenção dizendo que apenas iria tecer certos comentários, mas a verdade é que acabou por colocar algumas questões. Portanto, sinto-me obrigado a responder às questões que foram colocadas, até porque creio não ter con-
seguido transmitir de uma forma suficientemente clara algumas explicações que dei.
Já comentei aqui o caso da aquisição de serviços não especificados e as verbas específicas das direcções-gerais que estão sob a minha tutela. Porém, e a este propósito devo referir que há uma verba extremamente significativa de 195 000 contos que também aparece englobada nesses 300 000 contos e que diz respeito à prospecção da bacia carbonífera do Douro. Portanto, relativamente aos 300 000 contos creio que o Sr. Deputado já tem alguns esclarecimentos no que respeita a verbas significativas.
Em relação às dotações do Fundo de Abastecimento, elas são publicadas no Diário da República e, portanto, são do conhecimento público. Em 1984 foi transferida do Fundo de Abastecimento para o Ministério da Indústria e Energia uma verba de 4 500 000 contos; no ano de 1985 está previsto que sejam transferidos 3 milhões de contos para o orçamento e o remanescente dos 4 500 000 contos que não foram utilizados em 1984, para além de 1 200 000 contos para cobrir os encargos dos projectos de apoio aos consumidores de combustíveis que estão em curso, cujos projectos estão a correr e estão a ser pagos pelo Fundo de Abastecimento.
Portanto, as verbas do Fundo de Abastecimento destinadas a estas matérias são — como já referi — publicadas no Diário da República e, portanto, são do conhecimento de todos os cidadãos portugueses e em particular dos Srs. Deputados.
Em relação à energia hídrica, estamos de acordo e a visão da redução da actividade de construção de aproveitamentos hídricos que o Sr. Deputado Octávio Teixeira anunciou parece-me um pouco prematura, na medida em que em 1984 foi possível — e pensamos que o mesmo se vai passar em 1985 — manter um nível de investimento no sector energético suficiente para continuar a desenvolver os nossos recursos hídricos a um ritmo financeiramente suportável, dado que ao mesmo tempo temos de manter um ritmo de investimento suficiente para garantir os consumos nacionais.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Dá-me licença que o interrompa, Sr. Secretário de Estado?
O Orador: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Secretário de Estado, gostaria de saber se V. Ex.a tem ideia — e não quero tomar isto como um dado exacto porque a última decisão compete à empresa — de quais serão os novos empreendimentos hídricos a lançar em 1985.
O Orador: — Sr. Deputado, é evidente que tenho ideia de quais os novos empreendimentos hídricos a lançar em 1985, até porque essa decisão cabe também ao Governo. Como V. Ex.a sabe, essa é uma das funções do PISEE.
É natural que este ano seja lançado o aproveitamento de Foz Côa, que ficou deferido do ano passado. Podia ser quase uma ilação, na medida em que a aprovação do PISEE do ano passado deferiu para este ano o lançamento de Foz Côa.
Tanto quanto me é dado a conhecer, a actividade, o número e o programa de estaleiros da EDP em funcionamento mantém-se com o objectivo de 4, no mínimo, tentando-se até ultrapassar esse número.
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Em relação às questões abordadas pela Sr.8 Deputada Helena Bastos, devo dizer que não referi o PAIP porque ele já não existe com esse nome. Hoje há os programas de actuação e de desenvolvimento das empresas Empresas de Desenvolvimento Mineiro do Alentejo, SOMINCOR e Pirites Alentejanas, autonomamente tratados e com actividades próprias, embora a empresa Desenvolvimento Mineiro do Alentejo faça a coordenação das outras duas a esse nível e actue como uma empresa holding. Aliás, foi para isso que ela foi criada.
Na intervenção inicial que produzi, referi os aspectos que a Sr.a Deputada abordou no sentido de haver a possibilidade da utilização das pirites de Aljustrel — isto, se os estudos e os ensaios que estão em curso se mostrarem completamente concludentes — para a produção de concentrados de cobre, embora os quantitativos sejam completamente diferentes dos de Neves Corvo.
A Sr." Helena Bastos (PCP): — Dá-me licença que
0 interrompa, Sr. Secretario de Estado?
O Orador: —Faça favor, Sr." Deputada.
A Sr.11 Helena Bastos (PCP): — Sr. Secretário de Estado, na realidade prevê-se à mesma a produção de
1 200 000 t/ano, que permite atingir concentrados entre 8000 t/ano a 10 000 t/ano com esse ritmo de exploração. Isso está previsto no próprio projecto de cobre, que integra, portanto, o aproveitamento das minas de Aljustrel.
Se, na realidade, há a intenção de se arrancar com a metalurgia do cobre, é natural que o ritmo de exploração tenha de começar desde já a ser intensificado. Assim, gostaria de saber que verbas estão disponíveis para que isso se concretize e se há orientações nesse sentido, já que desde 1977 decorrem estudos de investigação pela Minemet Recherches e tudo indica que, na realidade, será possível atingir, a muito curto prazo, estes concentrados.
Portanto, em que medida é que a exploração mineira vai ser dinamizada para que esses objectivos possam ser atingidos em prazo útil, sob o risco de se tomarem decisões e de, sistematicamente, se perder tempo? O que temos vindo a verificar ao longo destes anos é que o sucessivo adiamento de decisões do Governo, em relação a matérias tão importantes como estas, têm provocado impactes fortemente negativos na rentabilidade dessas empresas, senão mesmo a inviabilização desses projectos.
Em relação ao projecto de Moncorvo também gostaria de saber o que é que está decidido.
O Orador: — Sr.a Deputada, aceito que V. Ex.a repita a sua ideia-chave. Em todo o caso, a sua ideia--chave não se aplica ao caso concreto que estamos a tratar, porque nem sequer chegou a haver retardamento na tomada de decisões. Em 1984 foram asseguradas dotações de capital para a Pirites Alentejanas e espero que em 1985, através da EDMA, também sejam asseguradas as dotações de capital necessárias para a sua manutenção. Aliás, devo dizer que o ano de 1984 foi dos melhores em exploração de pirites alentejanas.
Estão a ser desenvolvidas todas as acções possíveis, mas não há ainda a garantia total — embora haja boas esperanças — de que o tratamento dos minérios de Al-
justrel conduza à produção económica de concentrados. A preparação para que a exploração de Aljustrel se possa fazer com esse objectivo enquadra-se no programa de desenvolvimento da produção de concentrados nacionais. A metalurgia do cobre, se se decidir hoje, não arranca amanhã. Portanto, ninguém tem vantagem em fazer investimentos fora do seu tempo, porque eles acabam por se tornar mais caros! Eles têm de ser feitos quando necessários.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, a questão que gostaria de colocar refere-se ao documento recebido pela Direcção-Geral de Administração Local, que é dirigido ao presidente da Comissão de Economia, Finanças e Plano da Assembleia da República, e é relativo a alguma matéria que tem de ver com a distribuição de verbas pelas autarquias.
Como o Sr. Presidente sabe, na reunião da Comissão de Economia, Finanças e Plano que foi realizada na quinta-feira passada, a questão da distribuição de verbas pelas autarquias foi colocada em termos de o mapa ter uma base de critérios de difícil explicação. A este propósito, gostava de evidenciar os critérios que foram questionados, ou seja, o da orografía, o da emigração, o do turismo e o de carências.
Na sequência da discussão que se travou, a Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica e o Sr. Ministro da Administração Interna ficaram de entregar elementos a fim de se alterar o que estava proposto, pois não tinha sentido.
Ora, há cerca de 1 hora ou pouco mais do que isso, recebeu-se um documento — que foi o que referi — da responsabilidade da Direcção-Geral de Administração Local, que se limita a enviar para esta Comissão de Economia, Finanças e Plano exactamente o mesmo que já aqui estava presente, ou seja, o documento que refere que Aljezure tem 100% de orografía, Portimão tem 89%, Sintra tem 0%, Sobral de Monte Agraço tem 0%, Covilhã tem 70% e Belmonte tem 29%. O documento que aqui está, enviado pelo director-geral da Administração Local, capeia um documento da Direcção-Geral das Florestas, que teve entrada no Ministério da Administração Interna em 6 de Novembro. Ora, um documento que deu entrada em 6 de Novembro de 1984 não poderia demorar 1 semana a chegar aqui!
Esse documento serviu de base para o programa do computador, já ali existia e, portanto, poderia ter chegado aqui em 2 horas! Isto é, discutimos esta matéria por volta das 12 horas de quinta-feira passada e às 15 horas já podíamos possuir este documento!
Admito que da parte do Sr. Ministro da Administração Interna e da Sr.a Secretária de Estado da Administração Autárquica tivesse havido alguns problemas em o enviarem. Porém, por tudo o que naquele dia foi dito, não se esperava que se enviasse um documento que se limita a confirmar de uma forma espectacular o nível de «disparates» — e desculpe a expressão — que está subjacente à aplicação destes critérios!
Resumindo, Sr. Presidente, solicito a V. Ex.a o favor de informar o Sr. Ministro da Administração In--terna no sentido de que continuamos a aguardar a documentação, as justificações necessárias e a alteração
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do mapa, que é obviamente necessária face à ausência de critérios minimamente aceitáveis para a distribuição de verbas pelas autarquias. Ora, ou o Sr. Ministro da Administração Interna não conhecia estes documentos ou, conhecendo-os e mesmo face a eles e à falta de rigor que eles contêm, entende manter essa falta de rigor e não dizer mais nada sobre a questão. Porém, é bom que fique claro se o Sr. Ministro entende ou não responder àquilo que lhe foi solicitado!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, a Mesa recebeu o documento a que V. Ex.a se referiu. Porém, não faz as considerações que o Sr. Deputado faz por uma atitude de expectativa e de prudência. E isto, porque esse documento, tal como foi entregue, pode significar, entre outras coisas, que a metodologia adoptada na fixação das verbas a distribuir pelas várias autarquias do País são essas e que há que as corrigir.
No entanto, pode haver uma outra interpretação no sentido de que a proposta do Ministério da Administração Interna se fundamenta num trabalho feito por outro ministério e então temos aí a confirmação. Como o Sr. Deputado poderá verificar, o ofício a que V. Ex.a fez referência capeia apenas um documento da Direcção-Geral das Florestas.
Por conseguinte, o que a Mesa fez foi solicitar elementos de enquadramento da informação que acaba de chegar à Mesa.
Portanto, logo que a Mesa esteja melhor informada do enquadramento desses documentos, transmiti-los-á à Comissão de Economia, Finanças e Plano. Neste momento não tenho mais informações para dar.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, peço a palavra.
O Sr. Presidente: — Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. João Amaral (PCP). — Sr. Presidente, a posição que a Mesa tomou poderá ser justa e creio que a Mesa esperará tanto que ela tenha correspondência como a generalidade dos deputados da Comissão.
Ora, a questão que se coloca é a seguinte: tendo em conta a programação de trabalhos, se esses elementos não chegarem a tempo — aliás, devo dizer que estamos convencidos de que chegarão —, será aceitável que a discussão se inicie sem a adequada ponderação desses elementos complementares?
Podemos chegar a uma situação em que esse tipo de atraso possa levar a que, de alguma maneira, tenhamos que reformular o sistema de trabalho.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, creio que isso é um risco que existe. Porém, poderíamos ser prudentes mais uma vez e não «morrer de véspera». Vamos ver os elementos que faltam e os que eventualmente complementem esses. Assim, na altura própria voltaremos a equacionar a questão e os problemas que acabou de levantar, nomeadamente as consequências que pode ter a falta ou a incompleta informação para o nosso programa de trabalho.
Terminámos a nossa sessão de trabalhos com o Ministério da Indústria e Energia. Temos que agradecer aos Srs. Secretários de Estado da Energia e da Indústria e, completarmente, ao Sr. Secretário de Estado do Planeamento, que se dispuseram a vir aqui prestar todos os esclarecimentos que lhes foram solicitados.
Penso que não ficou nada pendente e encerramos, assim, a consulta ao Ministério da Indústria e Energia.
Faremos agora um pequeno intervalo, após o qual faremos o ponto da situação relativamente aos nossos trabalhos.
Srs. Deputados, está suspensa a reunião. Eram 18 horas e 35 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 19 horas e 15 minutos.
O Sr. Presidente: — Reiniciamos os nossos trabalhos depois de terminada a fase de discussão do orçamento do Ministério da Indústria e Energia. Como é do conhecimento dos Srs. Deputados, ouviremos ainda hoje, às 21 horas e 30 minutos, o Ministério da Justiça.
Porém, dado que ainda temos disponibilidade de tempo apresentarei à consideração da Comissão duas questões: a primeira diz respeito a elementos que os Srs. Deputados tenham solicitado aò Governo e relativamente aos quais, eventualmente, ainda não tenham tido resposta. Poderíamos fazer a inventariação dessas situações, para facilitar a discussão e até o posicionamento final nas votações que vão seguir-se.
A segunda questão que apresento à vossa consideração é relativa à definição do conjunto de matérias que devem ser votadas nesta Comissão. A Mesa, com a colaboração da Sr.a Deputada Ilda Figueiredo (que foi quem auscultou os vários grupos e agrupamentos parlamentares), conseguiu já apurar que há consenso em relação a uma parte significativa das matérias. Não obstante, há algumas divergências que, sem prejuízo de outras que venham a surgir, se consubstanciam, no essencial, nos artigos 9.° a 12.°. Ou seja, em linhas gerais, os artigos relativos às condições de trabalho e remuneração da função pública e das empresas públicas.
Há quem considere que estes artigos devem ser votados no Plenário e, por outro lado, quem defenda que eles o devem ser na Comissão de Economia, Finanças e Plano.
Gostaria de deixar estes dois pontos à consideração da Comissão para discutirmos, numa primeira aproximação, estes dois problemas —nomeadamente, o segundo! — naturalmente sem prejuízo de voltarmos a eles, uma vez que neste momento não é necessariamente importante que tenhamos já posições definitivas.
Algum dos Srs. Deputados se quer pronunciar sobre estas duas questões que apresentei?
Pausa.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Octávio Teixeira.
O Sr. Octávio Teixeira (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de levantar uma questão referente a um elemento, que não foi propriamente solicitado, mas que o Sr. Secretário de Estado do Orçamento referiu que seria entregue à Comissão na altura da discussão na especialidade. Simplesmente, porque me parece que poderá ter interesse a sua análise com alguma antecedência em relação a sexta-feira, talvez amanhã se pudesse solicitar ao Sr. Secretário de Estado do Orçamento que fizesse a entrega do Orçamento completo e, por conseguinte, com a indicação
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das verbas atribuídas a cada sector e das verbas relativas ao Fundo de Abastecimento.
Em relação à problemática dos artigos 9.° a 12.°, julgo que não é possível debatê-los em sede de Comissão. E gostaria de chamar a atenção para o seguinte: quando se coloca a questão das despesas serem discutidas e votadas em comissão especializada, o que está em causa são as despesas no sentido de dotação orçamental. Julgo que isso é pacífico e pensamos que é esse, de facto, o entendimento que existe entre todos nós e que estava presente no seio da Comissão quando foi aprovada a Lei de Enquadramento do Orçamento. Por conseguinte, relativamente às despesas em termos de dotações orçamentais, estamos de acordo.
Porém, apesar de esses artigos terem como epígrafes o título «Despesas», não me parece que eles estejam relacionados com as dotações orçamentais. Pelo menos, até ao momento, isso não nos foi apresentado assim por nenhum Ministério nem nos foi feito nenhum alerta, em termos de nota explicativa da proposta de lei do Orçamento, no sentido de que havia uma redução de dotações para as despesas com pessoal, provenientes da aprovação dos artigos tal, tal, e tal! Por conseguinte, julgo que não estamos aqui a discutir um problema de dotação orçamental!
Por outro lado, e apenas a título de mero exemplo, chamo a atenção para o n.° 1 do artigo 4.°, que refere que durante o ano de 1985 as remunerações acessórias, incluindo as de pessoal militar e militarizado e as dos titulares de órgãos de soberania e de cargos equiparados, serão congelados ao nível de 1984.
Ora bem: julgo que não é possível discutirmos e votarmos este n.° 1 do artigo 9.° em Comissão na medida em que não me parece que possa competir a esta Comissão congelar, por exemplo, o montante das senhas de presença dos Srs. Deputados, que são uma remuneração acessória. Esta questão pode ser discutida, — não estou a ver se será de congelar ou não essa remuneração acessória— mas, evidentemente, em sede de Plenário pois não estou a ver a hipótese da Comissão vir dizer que o montante das senhas de presença foi congelado ao nível de 1984! Portanto, esta questão terá que ser abordada pelo Plenário!
Ainda mais um exemplo: o n.° 2 do artigo 9.° diz que são eliminadas determinadas remunerações acessórias relativas ao exercício de funções no sector empresarial. Ora, é uma alteração em relação à legislação laboral que existe!
As empresas públicas regem-se, em termos laborais, em termos de remunerações, por legislação laboral extensiva a todas as empresas deste país. Para além de não ter directamente reflexos nas despesas do Orçamento, não me parece possível que a Comissão vá debruçar-se sobre questões de alteração na legislação laboral e votá-las em sede de Comissão!
Isto foram apenas exemplos e poderíamos ir de número a número!
Em relação aos outros artigos a situação coloca-se nos mesmos termos: uma autorização ao Governo ou uma proposta votada nesta Comissão relativa à redução dos vencimentos de determinados trabalhadores da função pública para 90 °7o, é uma alteração à legislação que não tem a ver com o Orçamento! Como é que esta Comissão pode ir votar isso?!
E, para já, ficava por aqui. Estes são apenas dois ou três exemplos que trago, em reforço da minha argu-
mentação de que não me parece possível que esses artigos sejam votados em Comissão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Portugal da Fonseca.
O Sr. Portugal da Fonseca (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Sr. Deputado Octávio Teixeira referiu que seria da competência da Comissão de Economia, Finanças e Plano votar as despesas.
Não tinha bem na memória a articulação da lei do Orçamento mas, felizmente, tenho-a aqui comigo. E o artigo 14.° diz unicamente aquilo que deve ser obrigatoriamente votado no Plenário. Se me permitem, passo a lê-lo:
Artigo 14.°
1 — A Assembleia da República deve votar o Orçamento do Estado até 15 de Dezembro.
2 — O Plenário da Assembleia da República discute e vota obrigatoriamente na especialidade:
a) A criação de novos impostos e a alteração da base de incidência, taxas e regime de isenções dos impostos existentes;
b) A matéria relativa a empréstimos e outros meios de financiamento.
3 — As restantes matérias são votadas na especialidade pela Comissão de Economia, Finanças e Plano reunida em sessão pública, que deve ser integralmente registada e publicada no Diário da Assembleia da República.
Ora, quer isto dizer que a lei expressamente determina a matéria que é obrigatoriamente votada em Plenário.
Se a proposta de lei do Orçamento inclui matérias que não estas «obrigatoriamente votadas», é porque atribui automaticamente competência à Comissão de Economia, Finanças e Plano — e assinalo a palavra competência — para votar as restantes matérias!
Parece-me que seria um pouco desagradável, até para a própria Comissão, abdicarmos — independentemente de outras considerações — da competência que temos de votarmos as matérias. Há meios políticos, legais e regimentais que permitem avançar sobre esta competência. Ora, o que nós não devemos é abdicar dela! Daí que a opinião do meu grupo parlamentar seja no sentido de que esta matéria deve ser votada na Comissão e se alguém está em desacordo, pois, naturalmente, tem outros meios regimentais de superar esta dificuldade. Nós é que não devemos, de maneira nenhuma, abdicar das competências que temos!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.
A Sr.a Ilda Figueiredo (PCP): — Quanto à primeira questão que foi colocada, relativamente aos elementos . pedidos e não entregues, além do documento já refe- ! rido pelo deputado Octávio Teixeira, quanto ao Fundo de Abastecimento, queria lembrar o seguinte: quando discutimos aqui o orçamento da Segurança Social ficou claro que o mapa entregue estava errado. O Sr. Ministro e a Sr." Secretária de Estado comprometeram-se a j enviar um novo mapa de alteração ao mapa v, o que I
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até ao momento ainda não aconteceu. Portanto, aquele que temos não pode ser votado na Comissão ou no Plenário. Aliás, é importante — porque há consenso no sentido de que a sua votação seja feita em Plenário — que até ao final dos debates nesta Comissão o mapa esteja cá, para depois não se atrasarem os trabalhos do Plenário.
Há ainda outros documentos do Ministério do Trabalho e Segurança Social que ficaram de ser enviados pelo Sr. Ministro do Trabalho ou pelo Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional e que também ainda não o foram, nomeadamente documentos que explicitam certas verbas dos fundos autónomos, quer do Fundo de Desemprego quer do Instituto de Emprego e Formação Profissional, quer ainda da Lotaria Nacional e das Apostas Mútuas Desportivas. Portanto, é importante que esses elementos estejam cá antes da votação do Ministério do Trabalho e Segurança Social.
Em relação a este ponto que temos estado aqui a debater, ou seja, no que se refere aos artigos 9.°, 10.°, 11.° e 12.°, gostaria de dizer apenas o seguinte: é, de facto, inadmissível que se insista na votação destes artigos aqui na Comissão quando todos sabemos que eles, não deveriam sequer fazer parte da proposta de lei do Orçamento do Estado.
De facto, esses artigos são alterações profundas à legislação laboral existente e esta é uma forma encapotada, demasiado enviesada e até inconstitucional de tentar introduzir profundas alterações à legislação laboral, que vão afectar essencialmente os trabalhadores.
Creio que os argumentos de que esta Comissão não pode abdicar dos seus direitos não colhem neste caso. Há questões que têm a haver com os direitos desta Comissão — e essas sim merecem todo o nosso apoio — e como seja, por exemplo, o propor que os Srs. Ministros estejam presentes quando fazemos as discussões, e nomeadamente a equipa económica, o que nem sempre tem acontecido, ou exigir que os documentos que solicitamos sejam entregues a tempo e horas e devidamente explicitados, o que também não tem acontecido, como sabemos!
Neste sentido, estamos de acordo em que se exiga o respeito por esta Comissão e em que se tenha em conta todos os direitos dos deputados, nomeadamente daqueles que fazem parte desta Comissão de Economia, Finanças e Plano. Mas não vamos daí querer inferir que esses artigos têm que ser votados aqui, porque é deste modo que estamos a defender os direitos da Comissão de Economia, Finanças e Plano!
O Sr. Presidente: — Sr.a Deputada, desculpe-me interrompê-la, mas, entretanto, e sob pena de partilhar uma injustiça, queria esclarecê-la de que, por parte dos membros do Executivo, tem havido correspondência às solicitações da Comissão de Economia, Finanças e Plano.
No caso concreto da área económica, ela tem estado representada quase sempre nos debates pelo Sr. Secretário de Estado do Orçamento. E quando não está, como é o caso de hoje, transmite essa impossibilidade, por razões supervenientes, por meu intermédio.
Queira fazer o favor de continuar a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo.
A Oradora: — Sr. Presidente, não quero entrar em polémicas nesse campo. Aliás, da nossa parte tem tam-
bém havido total abertura e compreensão para esses problemas e, de tal modo, que nunca pusemos em causa o funcionamento da Comissão, mesmo quando cá não estão os Srs. Membros do Governo que deveriam estar.
De qualquer modo, referi esta questão apenas para fazer um registo em relação a uma matéria que tem a ver, digamos, com a dignidade do funcionamento desta Comissão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Domingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Sr. Presidente, gostaria ainda de me pronunciar quanto à matéria em debate.
O PS entende que, na verdade, estas matérias devem ser discutidas. Assim, no nosso entendimento, as matérias relativas aos artigos 9.° a 12.° devem ser debatidas e votadas na Comissão de Economia, Finanças e Plano. Contudo isto não corta a possibilidade de as pessoas que discordam deste ponto de vista fazerem a avocação ao Plenário desta mesma votação.
O nosso entendimento é aquele que o Sr. Deputado Portugal da Fonseca já exprimiu, daí a nossa posição nesta matéria.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca.
O Sr. João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE): — Sr. Presidente, realmente fiquei um pouco surpreendido com esta questão — talvez porque à última da hora tive que me ausentar — pois contava como dado adquirido que estes artigos iriam ser debatidos e votados no Plenário. Aliás, alerto todos os Srs. Deputados, e no nosso grupo parlamentar estamos mesmo a estudar algumas situações levantadas por estes artigos, porque, como a Sr.a Deputada Ilda Figueiredo já referiu, há possibilidade de algumas deles estarem imbuídos de uma certa inconstitucionalidade. Como estamos atentos a esse problema, creio que nada obsta a que sejam debatidos e votados em Plenário 4 artigos, que têm a ver com muitos aspectos positivos, não nego, mas também com factores extremamente negativos.
O Sr. Deputado Octávio Teixeira expôs também uma opinião que merece o nosso apoio, por isso, Sr. Presidente, a nossa posição era de que se deveriam debater e votar estes artigos no Plenário.
O Sr. Presidente: — Não sei se os Srs. Deputados estão de acordo, mas feita esta apresentação da única área da divergência, feita esta primeira aproximação de cada um dos grupos e agrupamentos parlamentares agora presentes, em vez de estarmos muito mais tempo a discutir este tema, ele ficava como assunto de ponderação e de melhor fundamentação e depois voltaríamos a apresentar os nossos argumentos, quer para a solução A, quer para a solução B.
É evidente que isto não obsta a uma outra solução, que, eventualmente, venha a ser acolhida por todos nós.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
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O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, da nossa parte não questionaremos a metodologia que propôs, mas, de alguma forma, gostava de deixar registados alguns argumentos que servissem também para ponderação.
Devo dizer que ouvi com extrema atenção o que foi dito quer pelo Sr. Deputado Portugal da Fonseca, do PSD, quer pelo Sr. Deputado Domingues Azevedo, do PS, e creio que, apesar de tudo, a questão está mal equacionada. Isto com toda a franqueza!
Não se trata aqui de decidir politicamente se a matéria deve ou não ser discutida em Plenário, trata--se de saber se esta é ou não da competência da Comissão. A invocação do artigo 14.° da Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado não é suficiente, porque o que diz o artigo é que há duas matérias que são obrigatoriamente votadas em Plenário e que as restantes são votadas em Comissão. Mas todo o problema se situa aqui em saber se isto é matéria orçamental ou não.
Srs. Deputados, não vale a pena estarmos a iludir as palavras, pois esta não é matéria estritamente orçamental; e tecnicamente, não é Orçamento! Diria mesmo, em exagero de causa, que um desses artigos — o n.° 6 do artigo 9.° — quando levanta a questão da inscrição na ADSE, levanta um problema não só de despesa mas também de receita. E, isto só para demonstrar até que ponto é que estas normas estão para além já do que é tecnicamente Orçamento. Note--se que refiro um problema de receita, porque, como é óbvio, quem não beneficia, também não desconta e o desconto é uma receita inscrita no respectivo mapa. Ora, se isto representa uma alteração às receitas, obviamente que não pode deixar de ser votado em Plenário! E isto até utilizando a vosssa própria argumentação, a qual não é de fundo!
A argumentação de fundo é que, tecnicamente, não se trata de matéria orçamental e, não o sendo, a Comissão não tem delegação do Plenário, porque não houve uma deliberação do mesmo. Daí não a poder votar! Aliás, algumas dessas normas — como por exemplo a norma do artigo 9.°, n.° 3 — correspondem a uma autorização legislativa que, em termos regimentais, tem de ser votada na generalidade e na especialidade em Plenário.
Por outro lado, Sr. Presidente, suponho que era bom introduzir um certo nível de desdramatização da questão. Não se trata de uma decisão política mas de se saber — sendo certo que as normas aprovadas pela Assembleia podem ser atacadas na sua constitucionalidade por razões materiais, mas também por razões orgânicas e formais — se não é muito mais simples considerar com realismo o que se passa. Ou seja, estes artigos não são normas tecnicamente de Orçamento, não há delegação para a sua votação em Comissão e são normas, algumas delas, com conteúdo de autorização legislativa. Portanto, em globo, devem subir a Plenário, depois de aqui discutidas como foram, para serem votadas.
Não se trata, pois, de sobrecarregar excessivamente o Plenário, que tem de votar muito mais normas, trata-se de um núcleo de normas que têm de ser votadas em Plenário e deste modo a questão ficará resolvida (embora duvide que o fique totalmente, pelo menos no que respeita ao aspecto orgânico de algumas delas).
Aliás, os Srs. Deputados já sabem qual é a nossa opinião, por exemplo a norma do artigo 9.°, n.° 2, sendo uma norma típica de legislação laboral, implicaria participação das organizações dos trabalhadores na sua elaboração; portanto, provavelmente, a norma cairá por essa razão. De qualquer modo, parece-me que não vale a pena levantar esta questão sem este nível de argumentos. Quer dizer, parece-me que não se deve considerar que estas questões podem ficar resolvidas aqui, quando, seguramente, o não podem!
O Sr. Presidente: — Volto a pedir aos Srs. Deputados que tenham em linha de conta a minha sugestão para ponderação final desta matéria em momento posterior.
Tem a palavra o Sr. Deputado Domgingues Azevedo.
O Sr. Domingues Azevedo (PS): — Sr. Presidente, é evidente que atenderei à solicitação de V. Ex.a, sem prejuízo da fórmula que expressou, contudo temos dúvidas em relação a esta matéria.
Efectivamente, a explanação feita pelo Sr. Deputado João Amaral, nâo é assim tão transparente como à primeira visa parece poder sugerir. É que então poderá perguntar-se: estamos a votar aqui o quê? O que não temos dúvidas é quanto à interpretação do artigo 14.°, o qual é taxativo e diz quais são as matérias que são excluídas da competência desta Comissão. Daí o facto de me sentir com dificuldades para acompanhar toda a cristalinidade do seu raciocínio, não obstante, volto a referir, o PS estar aberto à sugestão dada pelo Sr. Presidente, de analisarmos aprofundadamente esta questão e chegarmos a consenso quanto a ela.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Presidente, era só para fazer uma pergunta, se, por exemplo, uma das formas de diminuir a despesa fosse a de considerar que o despedimento de trabalhadores com nomeação definitiva pudesse realizar-se, se existisse aqui uma norma que o dissesse, ou seja, um n.° 9 do artigo 9.° que dissesse que a partir da entrada em vigor do presente Orçamento seria possível proceder ao despedimento sem justa causa de trabalhadores da função pública e sem dependência de processo disciplinar, V. Ex.a entendia essa norma como uma norma de contenção de despesa ou entendê-la-ia, naturalmente, como uma norma que tem a ver com o Estatuto Geral dos Trabalhadores da Função Pública, nada tendo a ver com a questão do que é votado nesta Comissão?
A resposta é óbvia, mas pus-lhes esta pergunta para lhe equacionar o problema do que é votado nesta Comissão. O que é votado nesta Comissão é a despesa, é o que está inscrito por força da lei no contrato e, naturalmente, por força dos diferentes níveis de opção, em todas as rubricas do Orçamento. Quanto a isso, há votação nesta Comissão; quanto ao resto, quanto a alterar a lei ou o contrato, isso é a despesa? Ou isso é alterar os critérios de despesa da função pública, em tais termos que já estamos no domínio da lei e, portanto, num sector totalmente diferenciado?!
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O Sr. Presidente: — Na medida em que não há mais inscrições daríamos agora por encerrada esta primeira fase da nossa discussão quanto à metodologia do trabalho de votação. Quanto aos documentos adicionais solicitados ao Governo, penso que os Srs. Deputados ficaram alertados para a situação e mesmo que ainda não nos tenham sido facultado todos os elementos, suponho que no-los darão numa próxima oportunidade que, gostaria que fosse breve.
Está suspensa a reunião.
Eram-19 horas e 45 minutos.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos reiniciar os nossos trabalhos. Eram 22 horas e 20 minutos.
O Sr. Presidente: — Embora com algum atraso, por razões que o Sr. Ministro apresentou e que, seguramente, exporá à Comissão, vamos iniciar a reunião. Mas, pór uma questão de método perguntaria ao Sr. Ministro se pretende fazer uma introdução à discussão do orçamento do Ministério ou se se dispõe apenas a aguardar as perguntas dos Srs. Deputados da Comissão de Economia, Finanças e Plano?
O Sr. Ministro da Justiça (Rui Machete): — Sr. Presidente, pretendia, em primeiro lugar, pedir desculpa à Comissão e aos Srs. Deputados pela circunstância de ter chegado atrasado, mas infelizmente tive uma reunião em São Bento que se prolongou até depois das 21 horas e 45 minutos, de tal forma que não me foi possível chegar aqui à hora marcada.
Quanto ao orçamento, limitar-me-ia a dizer de uma maneira muito sucinta que é preciso sobretudo ter em conta os desenvolvimentos previsíveis na Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e na Polícia Judiciária, que foram os 2 departamentos privilegiados. Além disso, o referido orçamento sofreu as dificuldades da parcimônia dos meios financeiros que enfrentamos.
Por outro lado, gostaria ainda de referir outra direcção-geral que foi objecto de algum aumento substancial, que é a Direcção-Geral dos Serviços Judiciários. Posto isto, penso que não vale a pena estar a alongar-me. Talvez seja melhor, para ganharmos tempo, responder às perguntas que eventualmente os Srs. Deputados me queiram colocar.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho.
O Sr. Vilhena de Carvalho (ASDI): — Sr. Ministro, iria fazer alguns pedidos de esclarecimento muito breves, rápidos e tão sintéticos quanto possível.
Começaria por assinalar que é com alguma pena que verifico que o orçamento para o Ministério da Justiça é um daqueles que conhece menor aumento de despesas em relação aos demais ministérios. Naturalmente que ao fazer esta afirmação o Sr. Ministro será o primeiro a responder-me que sente igualmente essa diminuição de verbas em relação aos demais ministérios. Pela minha parte quero fazér-lhe saber e sentir que essa observação não me escapa. Lastimo apenas que não tenha sido possível atribuir verbas ao Ministério da Justiça que, do meu ponto de vista, iriam de encontro a uma necessária política, mais aconselhável nesse sector.
O problema do diminuto aumento das verbas vai pôr ou pode pôr algumas questões como sejam, desde logo, as relacionadas com a previsão dos aumentos dos magistrados judiciais.
E aqui se inscreve a primeira pergunta a fazer ao Sr. Ministro. O orçamento que nos foi apresentado, porventura, contém alguma previsão que vá de encontro a uma vontade política que seja manifestada por esta Assembleia, em sentido diverso e mais alargado que o da proposta do Governo em relação aos vencimentos dos magistrados judiciais?
Não estou neste momento a reflectir vagamente e nas nuvens, porque tenho presente que já há propostas apresentadas, nomeadamente pelo PSD, no sentido da elevação dos vencimentos dos juízes, em relação à proposta do Governo. Daí que se justifique o meu pedido de esclarecimento, quanto à questão de saber, se o aumento vier a verificar-se em relação à proposta do Governo, como está prevista a cobertura desse aumento no actual Orçamento.
Por outro lado, gostaria de salientar a V. Ex.a que me parece que os chamados «cofres» — salvo erro hoje, o Gabinete de Gestão Financeira — estão, do meu ponto de vista, a ser altamente sacrificados pelas verbas que lá se vão buscar para fins bem diversos daqueles a que deveriam ser aplicadas em função das receitas ou dos serviços que produzem as receitas que de facto enchem os «cofres». Assim, a minha observação justifica-se sobretudo porque, pelo menos na minha ideia, por um serviço público deve pagar-se o custo do mesmo. E se este der alguma coisa de lucro — mas que não seja com esse objectivo — que o serviço seja prestado. Ora, sabendo nós que os registos e notariado vêm produzindo quantias vultuosas que são desviadas para outros fins, o que acontece é que os utentes dos serviços do registo e notariado estão a suportar despesas que em boa justiça deviam ser suportadas por todo o povo português e não apenas pelos utentes desses serviços. Daí a minha observação relativamente à circunstância de aí se irem buscar receitas, como se vê, por exemplo, para a Polícia Judiciária de 298 500 contos; daí ainda a minha preocupação quanto ao facto dos técnicos do Instituto de Reinserção Social, que transitaram da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais e que eram pagos pelo Orçamento do Estado, deixarem de o ser. Ora perguntaria ao Sr. Ministro, até quando é que os chamados «cofres» hão-de ser a fonte de pagamento de tantas receitas, como de outros destinos que me dispenso neste momento de relembrar, pois são bem conhecidos do Sr. Ministro.
O que me parece que deve estar em causa, é saber se os serviços do registo e notariado e os seus utentes devem ser os pagadores de outros serviços que não aqueles cuja utilização se pede.
Naturalmente que perguntaria a esse respeito se, para cobrir tantas despesas, está prevista, ainda mais uma vez, a subida dos emolumentos dos serviços de registo e notariado, visto que assistimos quase anualmente a subidas de percentagens elevadíssimas.
Finalmente, Sr. Ministro, relativamente aos documentos que teve a gentileza de nos fazer chegar e que se referem ao PIDDAC para 1985, vejo uma relação de edifícios dos tribunais a remodelar, a construir e a adaptar e, quase à cabeça, mais precisamente em segundo lugar, deparo com a construção do tribunal de Almeida.
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Aqui entra a nota regional, como não pode deixar de ser, e perguntar-lhe-ia se o tribunal de Almeida é para 1985 e, no caso afirmativo, se é para construir de raiz ou se é para adaptar algum edifício.
O Sr. Presidente: — Seguidamente, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Também eu, Sr. Ministro da Justiça, começo por constatar aquilo que é óbvio, ou sejam a extrema penúria de verbas do seu Ministério, facto que, apesar de tudo, é passível de enquadramento que não irei produzir de imediato.
Bom teria sido que, na sua intervenção inicial, se tivesse detido, com algum rigor, em tudo quanto concerne à discriminação de verbas. Não o fez, e a verdade é que me poderia ter poupado algumas questões. Assim, terei mesmo de as produzir, e, indo ao concreto de algumas molduras bastantes preocupantes, começarei por abordar os problemas relacionados com os tribunais.
Num dos textos que nos foram fornecidos pelo seu Ministério vem elencado um conjunto de tribunais em curso de edificação, a construir , a remodelar ou a implementar em vários pontos do País e constato que desse elenco não constam alguns que façam face a situações particularmente relevantes, para as quais pedia a sua atenção, no imediato, e uma resposta inteiramente clara, mais tarde.
O que é que se passa, por exemplo, em relação ao Tribunal da Relação do Porto, onde existem gabinetes insuficientes, mobiliário a exigir restauro ou reforma, aquecimento central que não funciona?
Que medidas quanto à construção do Palácio da Justiça de Braga, que tende a ser uma aspiração mais velha do que a Sé da dita cidade, aspiração cada vez mais adiada, pois cada ano que passa continua a não ser correctamente inscrita nos planos do seu Ministério?
Para além do Palácio da Justiça de Braga, que, dir--se-ia, é uma exigência absoluta, há, na área, outros casos de tribunais que se encontram em condições extremamente deficientes em matéria de instalações, como, por exemplo, o de Vieira do Minho e o da Povoa de Lanhoso.
Em Guimarães há casos que roçam os limites do inaceitável. Existiu um tribunal quase em completa degradação em Felgueiras, mas ainda hoje o Tribunal Judicial de Guimarães, apesar da aparência de uma fachada sólida, que poderá iludir alguns incautos viajantes, está, por dentro, numa situação verdadeiramente lastimável.
Bom, e o pior é que desde há muito tempo que tudo isto tem sido comunicado ao Ministério, sem que se tenha obtido qualquer resposta, particularmente desde 1979.
Creio que é elementar que se dêem respostas... quanto mais não seja para dizer: «Não, não queremos nada com Guimarães, não há verbas para Guimarães!»
Talvez o Sr. Ministro responda hoje a esta questão e, como o que se passa nestas reuniões é público, possam depois os Srs. Magistrados e os utentes da justiça naquela cidade do Minho ficar a saber alguma coisa de concreto. Idem em relação a Cabeceiras de Basto.
O equipamento dos Tribunais de Mesão Frio, Resende, Tabuaço, bem como do Tribunal de Trabalho de Lamego, é muito, muito insuficiente, pelo que requereria medidas urgentes por parte do seu Ministério.
Em Bragança, são péssimas as instalações do tribunal, assim como em Moncorvo e Vila-Flor. Está em estado de profunda degradação o Tribunal de Vimioso.
No Porto, péssimas são também as instalações do Tribunal de Menores, do Tribunal de Trabalho e do Tribunal de Instrução Criminal. E, já agora, em matéria de Tribunal de Trabalho, refira-se o que se passa em Vila Nova de Famalicão, onde, de resto, se põem sérios problemas de segurança, quer para quem lá trabalha, quer para quem lá vai.
Péssimas são ainda as instalações dos Tribunais de Melgaço e Caminha, as impróprias instalações de Vila Nova de Gaia. E o mesmo se diga em relação aos Tribunais da Covilhã e do Fundão, onde, para além do mais, a sua exiguidade atinge proporções alarmantes.
Em Viseu, os juízes, advogados e as pessoas que recorrem à justiça, vêm chamando a atenção para o facto de as instalações não corresponderem minimamente às necessidades.
É urgente construir um Tribunal de Menores em Setúbal.
No Seixal há um absoluta carência de infra--estruturas.
Urge a instalação do Tribunal de Polícia no Funchal, impondo-se obras atempadas para a recuperação do Tribunal de Trabalho dessa cidade, pois, como é sabido, parte do tecto ruiu e outras coisas ameaçam ruir se não forem tomadas providências imediatas e adequadas.
Nada disto aparece numa lista que irei referir de seguida e este facto é, no mínimo, preocupante.
O Sr. Ministro da Justiça promete tribunais em Albufeira, Almeida, Armamar, Baião, Braga, Cantanhede, Coimbra, Coruche, Espinho, Estarreja, Loulé, Macedo de Cavaleiros, Mafra, Montemor-o-Velho, Nordeste, Oeiras, Oliveira de Azeméis, Oliveira de Frades, Ourique, Paredes, Paredes de Coura, Penafiel, Peniche, Portimão, Porto, São João da Madeira, Sesimbra, Valpaços, vila da Feira e Vila Nova de Foz Côa.
Do mesmo modo, promete remodelar — sem dizer muito bem como, nem em que aspectos — os Tribunais de Coimbra, e, em Lisboa, e Tribunal da Boa Hora, Palácio da Justiça, Supremo Tribunal Administrativo, Supremo Tribunal de Justiça, tribunais de trabalho, edifício de Santa Catarina, edifício de São Crispim. Refere também o Tribunal de Moncorvo, os Tribunais Criminais do Porto, o de Setúbal, o de Torres Vedras, o de Vinhais e fala ainda na aquisição e adaptação a tribunais na Amadora, Arraiolos, Aveiro, Barreiro, Cascais, Coimbra, Figueira da Foz, Lamego, Leiria, Porto — Tribunal Administrativo e Tribunal de Polícia —, Porto Santo, Praia da Vitória, Resende, Ribeira Grande, Seia e Vila Franca de Xira. Para isto inscreve uma verba global da ordem dos 550 e tal mi! contos.
Várias questões são suscitadas depois desta leitura, as quais gostaria que considerasse.
Estes projectos são, naturalmente, plurianuais; não são para terminar em 1985.
O Sr. Ministro da Justiça: — Conforme!
O Orador: — Conforme... Há outros que o Sr. Ministro promete já ousadamente concluir em 1985. Oxalá seja este um ano, nesse domínio, melhor do que anos anteriores. Mas perguntava-lhe quais em concreto.
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E perguntava-lhe também, em concreto, o que é que vai fazer com esta verba que aqui vem referida, de 555 606 contos, que, segundo uma nota dos serviços
— que o Sr. Ministro conhece —, se encontra já consumida em cerca de 329 100 contos para o tribunais e 22 700 contos para serviços de registo e notariado, pelo que, em bom rigor, o total de 700 000 contos deveria, no mínimo, ser de 1 100 000 contos, nota onde aparece, de resto, a ideia de que este programa poderá vir a ser corrigido em razão de obras em curso não liquidadas. Impunha-se inquirir — e espero possa responder-me — quais são essas obras em curso não liquidadas e que montantes atingem, porque poderemos chegar à constatação de que a previsão de verbas para 1985 é, no fundo, quase só um conjunto de verbas destinadas a pagar aquilo que vem como um ónus de 1984.
A situação dos tribunais é conhecida, é inquietante e não pode deixar de merecer, da parte de quem se preocupa com estas questões, sérias apreensões. De modo que impõe-se que nos diga, com toda a clareza
— e, se possível, longe dos discursos puramente programáticos e emblemáticos —, o que é que vai ser possível fazer e, sobretudo, que reforma judicial é viável com este tipo de infra-estruturas, com este tipo de precariedades que acabo de lhe relatar.
Outra área importante é a que refere os serviços prisionais.
Foi há pouco dito, no início da sua intervenção, que se tratava de uma das áreas que obteve algum altea-mento de verbas em relação aos anos transactos. Mas a verdade é esta: o quadro prisional agravou-se brutalmente. A população prisional é maior em cerca de 2000 presos e a situação prisional, no tocante a estabelecimentos e às próprias condições de aprisionamento, é qualquer coisa de inqualificável, se tivermos em conta as carências, a desumanidade e a completa incapacidade governativa de encontrar saídas e soluções correctas.
De modo que tudo aquilo que nos disse, em termos genéricos, é capaz de não ter nada a ver com as necessidades vitais do sector. A sobrelocação, o esgotamento dos actuais estabelecimentos prisionais, é uma realidade conhecida que traz consigo sequelas gravíssimas do ponto de vista da própria administração da justiça, como bem sabe. Apesar de ter prometido longamente a revisão do decreto-lei dos crimes incaucionáveis não o fez, o que quer dizer que a situação dos preventivos galopa após dia para áreas do impensável.
Entretanto, fala-se na abertura de novas cadeias comarcas. Ouvi falar nas cadeias de Braga, de Monção, de Odemira, de Portimão e, salvo erro, também da Covilhã, mas o Sr. Ministro poderá informar-me correctamente. Porém, há, desde logo, uma questão a levantar, e essa importantíssima: em que condições vão abrir estas cadeias?
O que conhecemos hoje das cadeias portuguesas, em geral, é péssimo e vem reforçar a tese de que o delinquente, o homem que prevarica, aquele que é sancionado pelas leis e detido, vem das prisões bem pior do que quando para lá entrou. Propaga-se toda a espécie de vícios; as condicionantes de existência numa cadeia não fornecem nem salubridade, nem higiene física ou psicológica, nem nada daquilo que é elementar.
Em que condições vão, pois, abrir estas novas cadeias, Sr. Ministro? Olhe que lhe faço esta pergunta com algum conhecimento de causa em relação, por exemplo, a duas das que referi, tendo em conta os edi-
fícios onde, previsivelmente, irão instalar-se e as más características originárias desses estabelecimentos.
O que é que vai fazer no interior desses imóveis para que eles comecem a funcionar e para descongestionar outras cadeias? Por exemplo, no caso de Braga, o que é que vai fazer para descongestionar a Cadeia de Guimarães, onde, de facto, a situação é quase de ruptura, tal como em Monsanto, em Vale de Judeus, na Penitenciária de Lisboa e em várias outras?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?
O Orador: — Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queria apenas pedir-lhe que faça um esforço de orientação para as discussões orçamentais.
O Orador: — Sr. Presidente, como tem visto, é exactamente isso o que tenho feito desde o início.
O Sr. Presidente: — Não creio que seja essa a interpretação pacífica, Sr. Deputado!
O Orador: — Como vê, a polissemia do discurso, mesmo em matéria de orçamento, é bastante estimuladora de interpretações diversas.
Dizia eu, Sr. Ministro, que, para além do referido, a situação se enquadra ainda pelo que aos guardas diz respeito, obrigados a trabalhar de forma excedente em relação ao normal e promovendo, por vezes, maus tratos a granel, de forma completamente incompatível com aquilo que é o estatuído pela Constituição e pelas leis democráticas do nosso país, ostentando grande falta de formação, que não é suprida, antes agravada pela contratação ilegal dos vigilantes tarefeiros, estes guardas apresentam várias reivindicações, que, naturalmente, o Sr. Ministro conhece, uma das quais se cifra na área da insuficiência dos efectivos.
Há, como sabe, um diploma legislativo onde se prevê o aumento de guardas prisionais em mais 2000. Não vou agora contestar os números, não vou dizer se seriam necessários 1800 ou 2700, pois não é essa a questão que está em causa. Queria, concretamente, saber: com que verbas? De facto, não encontrei meio de me auto-responder com os elementos que teve oportunidade de me fornecer.
A questão central é esta: com que verbas? 1600 novos guardas, alguns chefes, subchefes e graduados de vária natureza; mas como é que vai dar cumprimento àquilo que estabelece o diploma legal, se é que se não pretende apenas criar uma figura sem qualquer concretização na realidade?
As verbas para a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais oferecem-nos algumas linhas de análise muito preocupantes. No que concerne à ressocialização de reclusos através da formação profissional, em programas que se prevê acabarem em 1990 e que se iniciaram em 1983, estão previstos 20 870 contos, dos quais 870 contos do Orçamento do Estado e 20 000 do Gabinete de Gestão Financeira — e quanto ao desnatar e à dissecação destes elementos, teremos, mais tarde, oportunidade de dizer qual é o nosso ponto de vista —, aplicados apenas a 200 reclusos, que, com mais os 100 reclusos na área da formação profissional, dá um total de 300 reclusos em 8400 presos. Ou seja, pouco
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mais de 3% da população prisional é abrangida pela reinserção, pela ressocialização e pela formação profissional.
Digamos que isto é nada! E das duas uma: ou se pretende, de facto, dar expressão a estas esferas particularmente sensíveis e correctas de uma política de justiça em Portugal ou não se pretende. Pelas verbas que aqui temos e pelos programas assinalados, é bem capaz de ser verdade que possamos afirmar, sem sermos contraditados, que, de facto, não se pretende mais do que o mínimo, que é zero.
Quanto ao Instituto de Reinserção Social, houve o Sr. Ministro possibilidade de responder a um Sr. Deputado desta Câmara através de um texto onde se fazem afirmações bastante intrigantes:
Em 1984, as despesas totais do Instituto de Reinserção Social foram da ordem dos 127 500 contos, sendo que 75 666 contos foram gastos com o pessoal.
Verba alta, concordará!
O que se prescreve para 1985 é menos do que escasso: são 170 300 contos. O peso percentual dos funcionários transferidos é de 24%. Suponho que não irá desmentir estes números que o senhor mesmo subscreveu, ou alguém do seu Gabinete, ainda há muito pouco tempo.
Este quadro culmina com a constatação de que a reinserção social, tal qual vem sendo concebida, não passa de uma hipócrita ficção, incapaz de uma qualquer incrementação e de uma mínima consistência real.
Não vejo como é que o Sr. Ministro pode continuar a falar no levar por diante, até às últimas consequências, um instituto tão indispensável, com tanta hipótese de realização de projectos, à partida auspiciosos, com as verbas de que dispõe e considerando aquilo que, naturalmente, é indispensável promover.
Quanto ao reequipamento dos serviços centrais e externos da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, estão cá previstos, para 1985, 20 000 contos originários do Gabinete de Gestão Financeira.
A rubrica é ampla: «Reequipamento dos serviços centrais e externos da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais.» As carências múltiplas, para não dizer infindáveis. Estabelecimentos externos são os estabelecimentos prisionais de Lisboa, do Porto, de Tires, de Linho, de Paços de Ferreira, de Vale de Judeus, de Coimbra, de Alcoentre, de Monsanto, de Pinheiro da Cruz, de Sintra, de Santa Cruz do Bispo, de Leiria, de São João de Deus, os Institutos de Criminologia de Lisboa, Porto e Coimbra.
O que é que vai fazer com isto, Sr. Ministro? Isto basta? Ou então não são 20 000 contos e tem de nos dizer onde é que está o resto do dinheiro com que vai fazer face às infinitas necessidades — sublinho-o e reafirmo-o — do sector.
Penso que, para concluir — e deixando bastante feliz o Sr. Presidente —, nestas áreas do concreto com que o confronto, cabe-me ainda lembrar o seguinte: a situação global é, pois, uma situação de arrepiar. Perante esta situação de arrepiar o Sr. Ministro revela-se ataráxico ...
Risos.
..., isto é — eu traduzo, Srs. Deputados —, com nítida insensibilidade e com toda a disponibilidade para nem sequer considerar grave nada disto.
Bom, eu estou profundamente preocupado. O Sr. Ministro está sereno, olimpicamente distante e bastante confiante em relação aos rumos que a «barca» leva.
Antes que a «barca» seja de absoluto naufrágio, dada a «água» que está a meter, diga-nos lá, para nossa tranquilidade e para a tranquilidade pública, que há medidas efectivas, que não são só os juízes que são uns «tipos» calões que não fazem nada, que não é só o aparelho judiciário que está bloqueado, que não é só o conjunto de coisas e loisas que adiantou na televisão, mas que, realmente, há alguma actividade em marcha, há medidas que quer tomar, atitudes que pretende assumir no imediato.
Quais são essas medidas, Sr. Ministro? Se me disser uma, considerarei pouco. Mas como, naturalmente, prevejo que tem muita coisa para dizer, fico à espera das suas palavras e depois voltarei à carga, se o Sr. Presidente mo permitir, bem entendido.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, sinceramente admiro a sua verbe, mesmo que ela não se adapte muito à realidade, como é o caso. De facto, mantenho o mesmo nível de felicidade desde manhã à noite, antes e depois do Sr. Deputado ter intervido.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro da Justiça, começaria por lembrar que foi entendimento unânime da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias que este Orçamento agrava, em termos reais, as restrições impostas às despesas da Justiça, «nomeadamente (...)», diz o parecer da Comissão, «(...) no referente a serviços prisionais e de reinserção social, no referente à expansão territorial da Polícia Judiciária, à instalação de novos tribunais, ao combate à droga, à reforma da assistência judiciária, às condições de trabalho dos magistrados, ao funcionamento e estruturação dos tribunais de instrução criminal e dos serviços tutelares de menores».
O facto de a Comissão dizer isto é bastante grave, embora seja opinião da nossa bancada que isto não peca pelo exagero nem traduz, porventura, em toda a sua dimensão, a profunda crise que a justiça portuguesa . atravessa, o que, naturalmente, não pode ser desligado da gestão que tem sido feita desde que este Governo tomou posse.
Fazendo uma análise frígida dos números, constata-. -se que em 1984 o Ministério da Justiça geria as seguintes verbas: com proveniência do Orçamento do Estado, 4 871 000 contos; provenientes do Cofre dos Conservadores, 4 509 507 contos; a partir do Cofre Geral dos Tribunais, 2 423 472 contos. Este ano tem 6 550 000 contos do Orçamento do Estado; 6 402 955 contos do Cofre dos Conservadores, Notários e Funcionários de Justiça; 2 397 961 contos do Cofre Geral dos Tribunais.
Há, pois, uma passagem global de 11 803 979 contos para 15 350 916 contos, o que significa uma diminuição, em termos reais, na verba do Cofre Geral dos Tribunais e um ligeiro aumento de 10,16 % na verba do Orçamento do Estado e de 16,4 % na verba do Cofre dos Conservadores. O aumento geral está, assim, cifrado numa taxa que é modesta.
O trabalho de cômputo global não é um trabalho simples. Ensaiá-mo-lo em diversas sedes e foi necessário pedir ao Ministério diversos elementos para se chegar a este resultado, que deveria ser tão simples. Vários
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economistas, mesmo no meu grupo parlamentar, nos perguntaram «então não têm as verbas globais?», e nós explicámos que «não, no Ministério da Justiça é tudo diferente; no Ministério da Justiça as coisas nunca são o que parecem prima fade; cada coisa é sempre três». Há o Orçamento do Estado mas isso não quer dizer muito, quer dizer pouco. O que há é uma tristíssima trindade, porque é, porventura, uma ilegalíssima trindade. E eu concretizaria esse ponto de vista.
É verdadeiramente um suplício fazer o cômputo global das verbas. A transparência é perfeitamente nula. E devo dizer que fiz a experiência. Por exemplo, entra--se no gabinete do Sr. Ministro e vê-se que a máquina de fotocópias é paga pelo Cofre Geral dos Tribunais, os tapetes são pagos pelo Orçamento do Estado, os datadores, os furadores e as molduras são pagas pelo Cofre dos Conservadores, certos carros são pagos pelo Cofre Geral dos Tribunais, que também paga, pela verba n.° 36, as deslocações de individualidades estrangeiras, eventualmente convidadas pelo Sr. Ministro. As rendas das bandas de mecanografia da IBM do Gabinete de Gestão Financeira são pagas pela verba n.° 51 do Cofre dos Conservadores. Aliás, este Gabinete, que é como sabem bastante polémico e que tem 192 funcionários do quadro, com os quais gasta 633 620 contos pagos pelo Cofre dos Conservadores, gasta 40 000 contos em deslocações, gasta 67 750 contos em bens vários, duradouros e não duradouros, pagos pelo Cofre dos Conservadores, e ainda gasta 90 500 contos pagos pelo Cofre Geral dos Tribunais, sem falar em despesas com carros, seguros, etc. Ao todo, isto corresponde a mais de 6 vezes o orçamento visível do Gabinete do Sr. Ministro, uma vez que ele também conta com verbas vindas dos cofres, compto esse que não tenho.
Isto é verdadeiramente um icebergue!
Aliás, os orçamentos dos cofres parecem ter ou, melhor, têm — posso afirmá-lo e creio que isso é visível a quem os tenha lido — uma discriminação de despesas insuficientíssima. Estão cheios daquilo a que poderíamos, com justiça, chamar — e chamamos em relação a outros departamentos — «sacos azuis».
Pergunto-lhe, Sr. Ministro, como é que se pode qualificar essa espantosa verba n.° 26 do Cofre Geral dos Tribunais, que é de 631 830 contos, pela qual se paga tudo, desde casas de magistrados, até piassabas, até computadores potentes. Enfim, paga-se de tudo! No entanto, aquilo que figura na memória justificada é apenas «verba n.° 26». Por esta verba se paga «tátá, tátá, tátá», segue-se a discrição de milhentas coisas.
Pergunto-lhe que técnica orçamental é esta. Como é que se pode gerir adequadamente um ministério desta forma (naturalmente nos tempos em que vivemos, porque, porventura, noutras circunstâncias e com outras verbas talvez isso fosse possível).
Idem aspas, quem olhar para a verba n.° 36, para a verba n.° 47 e para outras que figuram nos cofres.
Creio que o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias também aflora um pouco a gestão orçamental do Ministério — porventura com um sentido que seria útil especificar — quando diz que a estrutura orçamental do Ministério é deficiente e carece de reponderação. Isto foi sublinhado por unanimidade, mas creio que talvez se devesse ir um pouco mais longe e dizer que ela é, além de irracional e bastante caduca — só para a fazer é necessário ter um montante enormíssimo de fun-
cionários —, uma coisa complexíssima e inaceitável nos tempos que correm.
A questão que lhe coloco é — e não é despicienda — é esta: como é que se compatibiliza isto com o que actualmente dispõe a Lei de Enquadramento do Orçamento do Estado, cujo artigo 24.°, designadamente, preconiza a integração de estruturas e de fundos com esta natureza e que exige, pelo menos, que eles constem como anexo do Orçamento do Estado a título transitório, coisa que realmente não sucede em relação a estes.
Por outro lado, e esse é um aspecto verdadeiramente bizarro para o qual alertava todos os Srs. Deputados, a Assembleia está a votar este Orçamento em condições que são altamente deficientes. Por exemplo, abrimos o PIDDAC-85 — na versão que nos foi distribuída pelo Governo, a originária — e encontramos na p. 83 a seguinte menção:
Ministério da Justiça: Comos
Sector de modernização da Administração Pública................... 1 550
Informação científica e técnica .... 9 950
Justiça.......................... 18 500
Total....... 30 000
E realmente a primeira pergunta que as pessoas fazem é como é que isto é possível! O que é isto, 30 000 contos para o PIDDAC do Ministério da Justiça? Não pode ser! E realmente não pode; O PIDDAC do Ministério da Justiça em sítio nenhum poderia sobreviver com 30 000 contos. Logo, o PIDDAC está algures, noutro sítio. Então, esse lugar revela-nos que ele é no montante de 1 637 438 contos.
Como é que é possível que a Assembleia da República pudesse discutir séria e minuciosamente 30 000 contos, que estão aqui especificados — página contrária, p. 84, com as designações respectivas, que me dispenso de ler — e deixar de lado aquilo que é precisamente essencial e que só ao fim de porfiados esforços é que nos foi enviado pelo Ministério da Justiça?
Folheando esses elementos — que, aliás, o meu camarada José Manuel Mendes esteve, em certa parte, a comentar — verifica-se então, ai sim, que esses 1 607 438 contos são distribuídos 700 000 contos pela Secretaria-Geral para verbas de instalações, etc., e seguem-se as restantes verbas pelas diversas estruturas do Ministério da Justiça.
Sucede, no entanto, que a Assembleia da República tem de se debruçar sobre isto e seria perfeitamente caricato e até desprestigiante que o fizesse sobre aquilo que nos foi fornecido pelo Ministério, originariamente, e que é o fruto de tal contabilidade tripartida, do tal pensamento do «Espírito Santo» — portanto, triplo — que caracteriza, mal, a gestão do Ministério da Justiça.
Creio que é de fazer votos para que seja este o último ano em que se mantém esta situação anómala porque a estrutura orçamental do Ministério não pode manter-se tal qual está, num estado calamitoso e preocupante.
Não é possível gerir racionalmente nestes termos e a prova está feita pela gestão do ministério e pela incapacidade que este revela em responder a simples perguntas que fazemos, quando outros ministros e outros responsáveis governamentais nos podem responder com um simples relance ou um papel. Creio que o Ministro o poderá fazer pedindo contas agregadas, mas se
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lhe perguntarem quanto é que gasta o Estado Português com os tribunais superiores, terá que fazer as contas somando dispensíssimas verbas, o que é um trabalho labiríntico e verdadeiramente supliciante. Mas acredito que seja possível e que deve estar feito algures, mas infelizmente não nos foi facultado. Seria bastante útil que o tivéssemos.
Em todo o caso, há uma forma simples de acabar com isto: cumprir a Constituição e a Lei de Enquadramento.
Esta era uma questão preliminar, que não poderíamos deixar de colocar nesta circunstância.
Quanto ao Orçamento, e para além daquilo que foi dito, parece-nos que a Comissão exprimiu um pouco a realidade, chame-se-lhe o que se quiser! O Sr. Ministro já exarou publicamente o seu protesto por haver quem diga — e há muito quem o faça e, inclusivamente, o seu parceiro de coligação em documentos públicos não secretos — que os tribunais vivem numa situação de ruptura ou de pré-ruptura, facto que, ao que parece, provocou grande escândalo e motivou uma ida rápida à televisão do Sr. Ministro, com um ar de ralho e de repreensão. Mas a verdade é que o próprio Sr. Ministro diz nesse discurso, se bem me lembro do teor daquilo que afirmou, que se vive — ou que há — numa situação de bloqueamento. É o mínimo que se pode dizer!
O Sr. Ministro falou de «nós de bloqueamento». Ora, que há situações de ruptura salta aos olhos. E o Ministério da Justiça não tem um plano de ataque à crise! Por vezes, até procura iludi-la ao desviar as atenções em relação à responsabilidade da crise — o que me parece bastante pior — e representa intoxicação da opinião pública dizer que os responsáveis são os magistrados, que há uma quebra de produtividade dos mesmos, apontando-se aos cidadãos o bode expiatório das dificuldades que sentimos.
O problema é que os processos crescem em flecha. Sr. Ministro, quanto mais não cresceriam se tivessem acesso aos tribunais todos aqueles que têm essa necessidade? E como não seriam diferentes as coisas se todos aqueles que desejam resolver os problemas pudessem ter apoio, a que têm, de resto, direito? Não o têm na prática, e, portanto, a situação em que vivemos é em certa medida artificial: em termos práticos há situações de injustiça que não chegam todos os dias aos nossos tribunais, que, todavia e apesar disso, estão suficientemente atafolhados de casos.
Face às reclamações, queixas, observações, protestos que a situação dos tribunais está a provocar — e não é por acaso que isso acontece, nem resulta de uma tenebrosa operação de forças secretas e ocultas desta ou daquela coloração — é preciso sublinhá-lo: a imagem da justiça entre os portugueses é péssima!
Recentemente, um cursiosíssimo estudo de opinião veio aprofundar um pouco os contornos dessa insatisfação, que quanto a nós é justa. O grande problema que aqui hoje estamos a debater é que este orçamento, tal qual se encontra gisado e filiando-se na política em que se filia, visivelmente não pode dar resposta nem inverter essa imagem que a justiça tem entre os cidadãos.
Em matéria de instalações e equipamentos, o quadro é aquele que está descrito. Gostaria, aliás, de saber — se possível, naturalmente — qual é o montante dos débitos que o Ministério tem por obras não liquidadas pela gerência em 1984. Só isso e os pedidos de cabi-
mento formulados até 18 de Dezembro de 1984 preencheriam os 700 000 contos, se não estou em erro, que estão orçamentados neste momento, salvo se há outros fundos e saberá o Sr. Ministro se eles existem. A questão é que se saiba onde estão e como é que vão ser utilizados.
Segundo grupo de questões: o que é que tenciona fazer para suster aquilo a que se chama, com uma certa razão, um «maremoto de processos» que desabam sobre os tribunais?
Li há tempos um papel que um director-geral do seu Ministério divulgou num seminário sobre informática, e descobri aí algumas receitas, que devo dizer que me preocupam seriamente. Essas receitas traduzem-se em suster o «maremoto de processos» através da dificul-tação insana do acesso à justiça. Assim, aí estão as subidas de alçadas, das custas, o aumento das distâncias entre a justiça e as populações — através da criação de outras estruturas judiciais mais distantes dos povos! Creio que essa é — e tem uma certa credibilidade porque foi dito pela boca de um director-geral mas pode acontecer que também seja pelo Ministro! — a pior das soluções! Ela poderia sustar a um certo afluxo de processos, mas ao preço de injustiças e da denegação da justiça para milhares de portugueses.
Por outro lado, sabe-se, em relação à famosa questão do «maremoto», que em 1984 terá havido 900 000 processos para cerca de 1040 juízes, contra 120 000 processos em 1973 para 400 juízes da altura; sabemos que há 7 comarcas sem juízes e que há 13 Tribunais de Instrução Criminal com licenciados em Direito, mas não juízes de carreira com formação mais adequada; sabemos que há 12 tribunais não instalados apesar de criados no papel — designadamente, os Tribunais de Trabalho de Oeiras, Vila Franca de Xira e Amadora, todos no círculo de Lisboa —, sabemos que há 90 vagas de juízes e que serão talvez necessários nos próximos 4 anos cerca de 269 magistrados judiciais. Isto sem faiar nos pedidos imediatos de 50 juízes auxiliares, que, de resto, segundo nos informaram atempadamente, ainda que fossem assegurados poderiam não ter neste momento casa ou ter casa e não ter instalações, ou ter instalações e não ter funcionários judiciais, ou não ter qualquer destas coisas.
Creio que as verbas inscritas no Orçamento, Sr. Ministro, não vão dar resposta a estas carências em relação ao volume processual. Em todo o caso, seria bom que pudéssemos ser informados sobre as medidas que tem ensejadas e, designadamente, se se confirmam aquelas que foram anunciadas a certa altura, como sendo política oficial do Ministério, da asfixia do acesso.
Idem quanto às questões das pendências. O Sr. Ministro revelou há dias uns números que me parecem, aliás, desprovidos de significado, porque amalgamam a duração dos processos de bagatelas com processos relativos a questões bastante mais graves, que têm durações muito superiores. Considero que é bastante lamentável que se diga — e não sei quem é que forneceu os números, mas suponho que foram os serviços — que a duração no Cível é de 16 meses, no Penal de 18 e no Trabalho de 26 ou de 28 meses.
Realmente não sei como é que estas contas foram feitas, mas todos sabemos que há processos com grandes durações enquanto as bagatelas são julgadas mais céleremente. E sabemos também que os processos com réus presos vão correndo, naturalmente por ser impôs-
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sível espezinhar excessivamente direitos dos réus presos. Portanto, fazer uma amálgama deste tipo parece--me totalmente pernicioso, até para a opinião pública. As pessoas sabem que em relação, por exemplo, a um processo de acidentes de trabalho não têm a questão resolvida no período que o Sr. Ministro indicou como sendo a duração média. Obviamente que média sendo é sempre alguma coisa que não existe e que alude a um universo ficcionado. Mas é péssimo, creio eu, para a opinião pública ver contrariar evidências — e uma das evidências que os trabalhadores têm é a da duração enorme, desincentivadora e favorável ao patronato que têm os processos em que estão envolvidos, quando chegam aos tribunais. Mas isso há-de ser referido em intervenção adequada.
Há, segundo nos informaram, 600 000 processos pendentes; segundo a Direcção-Geral de Serviços Judiciários do seu Ministério serão 900 000, embora não saibamos como é que essas contas foram feitas, mas talvez tenham outros critérios.
Sabemos, no entanto, que há mais de 10 000 processos pendentes há mais de 5 anos, o que é verdadeiramente grave. E também — e isso deve realçar-se — que em 1984 terão findado 800 000 processos, o que naturalmente só pode ser devido ao esforço feito pelas magistraturas e pelos trabalhadores da justiça para dar resposta à situação de bloqueamento em que se encontram.
Só que sucede que, em nossa opinião — e para isso alertámos a Comissão e gostaríamos de ouvir o Sr. Ministro —, qualquer que seja esse esforço não pode responder à situação que está criada. É óbvio que as bagatelas vão andando, mas ficam pendentes e são lentos os processos dos homicídios, os processos de burla, os processos por infracções económicas, os processos por furtos. Ora, isto tem muita gravidade, cria uma enorme insegurança! E o Governo não pode andar aos «berros», dizendo que a segurança dos Portugueses está em risco e que é preciso restringir as liberdades e, .simultaneamente, não adoptar as medidas que poderiam, na sede própria e da forma adequada, criar um sentimento de segurança aos cidadãos que dela precisam, sem qualquer dúvida, mas dentro do quadro democrático e dos limites constitucionais creio que a eficácia do sistema está a ser posta em causa e o Governo tem nisso responsabilidades gravíssimas. Há nos tribunais criminais, por exemplo, processos com 10 anos. Isto significa, dizia-nos alguém com particular qualificação, que esses processos não puderam sequer ser investigados. É o que isto quer dizer. Há zonas inteiras do País, em matéria de Tribunais de Instrução Criminal, em que as vítimas de crises graves não têm, pura e simplesmente, qualquer tutela, embora tenham todo o direito a ela!
Por outro lado, sabe-se — e ainda há pouco obtivemos confirmação destes números — que nos correccio-nais de Lisboa estão parados 32 000 processos e isto implica a existência de 32 000 vítimas e os correspondentes arguidos à solta! Naturalmente haverá uma amnistia, como forma de «minorar a avalancha» . ..
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, pese embora o risco que vou correr de tornar a ser mal interpretado, gostaria de lembrar ao Sr. Deputado que estamos a discutir as verbas orçamentais do Ministério da Justiça e estou certo que vai fazer os esforços para darmos pon-derância a essa área de discussão.
O Orador: — Certamente, Sr. Presidente, mas como sabe as condições em que o orçamento do Ministério da Justiça é debatido são altamente desfavoráveis. Ao contrário do que sucede com outros ministérios, não podemos propor — ou temos dificuldade em o fazer — uma verba para, por exemplo, ocorrer às necessidades do Tribunal de Polícia de Lisboa — mais x mil contos para esse efeito. Por outro lado, o Governo — e o Ministério em concreto — não nos facultam algumas das quantificações e dos estudos que seriam necessários fazer previamente para se propor um cálculo sério. Atirarmos para o ar uma verba qualquer não faz sentido nenhum. Por outro lado, a expressão e inscrição orçamental dessas verbas é um profundo mistério. O que quer dizer que às vezes as alusões com adequado suporte e expressão financeira, que o Sr. Presidente gostaria de ouvir, não podem ser feitas. Mas isso é uma limitação muito grave, para a qual acabámos, aliás, de alertar e que deveria naturalmente ser corrigida, a bem deste debate, que só é possível após a revisão constitucional. Para a discussão poder ser feita nos termos que a lei de enquadramentro prevê o Orçamento do Ministério é perfeitamente inapto. Mas isto é um vício!
Em certa medida isto constitui uma forma de pedir vénia pela distância que se possa atingir neste tipo de considerações — que resumiria, de resto.
Nos tribunais de Polícia de Lisboa sabe-se que há cerca de 140 000 processos bloqueados — bem como 128 000 no Tribunal de Polícia do Porto! Perguntava ao Sr. Ministro que medidas estão ensejadas nesta matéria.
Há uma outra área que tem uma expressão orçamental mesquinha, que é a da justiça administrativa.
Creio que neste momento um dos aspectos que este debate orçamental permite situar como grave é de que os actos ilegais da Administração estão larguissima-mente impunes — e isto para não falar do caso das regiões autónomas, em que o contencioso administrativo é uma ficção, uma vez que tudo depende de Lisboa e sabe-se o que é que isso significa em termos de acessibilidade. A justiça administrativa está de tal forma bloqueada que se pode dizer que o direito de recurso contencioso em Portugal, neste momento, é uma sombra, ou, em larga medida, uma ficção. Isto tem as suas causas na lei: convém não esquecer os curtos prazos para o recurso, as questões de legitimidade, as regras de apresentação de recurso que o Sr. Ministro anunciou logo após a tomada de posse que iam ser alteradas — medidas fáceis, simples, comezinhas ...! Bem, estamos à espera, mas já se passaram 2 anos e ainda não foi alterada a regra de apresentação do recurso através da entidade recorrida.
Mas há outras causas! O sistema no seu funcionamento estoirou e gostaria de ouvir sobre isso o Sr. Ministro, já que pode qualificadamente pronunciar--se sobre a matéria. Entre 1974 e 1984, os processos do STA passaram de 338 para 2170, e isto é verdadeiramente impressionante. A ratio juízes-processos excede todos os limites da sensatez. Neste momento temos conselheiros assoberbados e sobrecarregados, como estão agora no Supremo Tribunal Administrativo, designadamente na 1.* Secção.
Em Dezembro de 1984 estavam pendentes mais de 3500 processos, contra 344 de 10 anos antes. A nova lei, de que o Sr. Ministro é responsável, está no papel e as verbas para o STA são exíguas. E o STA há dias ia entrando em chamas, e só não ardeu por acaso, por
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sorte ou por intercessão de alguém que não a Administração Pública, que vela lá no alto pelo Supremo Tribunal.
A lei nova está no papel e, porventura, estará a ser aplicada quanto às competências em razão da matéria. Os recursos lá vão para auditorias. Creio que é muito frustrante, para aqueles que estão nisso empenhados, aplicar uma lei orgância sem lei do processo. Sabe-se mal qual a lei dos processos aplicável e os magistrados queixam-se disso. A situação quanto às condições de trabalho mantêm-se inalteráveis e as verbas previstas são verdadeiramente exíguas — e aqui a palavra exígua corre o risco de à força de ser repetida se banalizar, mas é isto mesmo. Os quadros que estão previstos no diploma regulamentar não estão preenchidos, como o Sr. Ministro sabe. Gostava de lhe perguntar quais as suas ideias e que verbas tem para esse efeito! Não as vejo, mas por certo saberá aonde é que estão!
Para Coimbra, que eu saiba, não está nada definido, nem instalações nem quadros, salvo porventura algumas trocas de impressões mais ou menos vagas, cuja expressão orçamental é nula! Não há anteprojecto conhecido da lei do processo, o que vai tornar em breve as coisas mais difíceis. Vivemos em situação de omissão inconstitucional quanto à regulamentação do recurso de plena jurisdição. Portanto, a nossa Administração continua sem poder ser objecto de injunções por parte dos tribunais administrativos, como seria desejável. Ao mesmo tempo, na matéria fiscal falta a regulamentação processual e ninguém sabe o que deve fazer o representante do Ministério Público e o que cabe ao da Fazenda Pública. E nesta confusão não beneficiam senão os infractores!
Terminava, Sr. Presidente, Sr. Ministro e Srs. Deputados, sublinhando o seguinte: a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias pôde este ano examinar o orçamento desenvolvido do Ministério, os orçamentos dos cofres de alguns serviços fulcrais que são dependentes do Ministério; pôde estudar o PIDDAC não na sua versão fragmentária, que nos foi mandada originariamente, mas numa versão mais desenvolvida. Integral não será porque, designadamente, faltam os prazos para tudo e não há conhecimento específico dos projectos, visto as referências serem muito vagas e às vezes, até, desconexas.
Esse trabalho creio que foi positivo nesta sede preparatória, não envolvendo isto, evidentemente, qualquer juízo de mérito político. No quadro de preparação deste debate orçamental, também creio que é de realçar como positivo o facto de a Comissão ter tido reuniões de trabalho com o Sr. Procurador-Geral da República e com o Juiz Conselheiro Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura.
Esse trabalho facilitou e facultou a todos os deputados que nele participaram um retrato, impressionante e altamente preocupante da justiça portuguesa, que nos parece detalhado e bastante rigoroso. Alguns dos factos revelados à Comissão não podem ser revelados nesta sede, designadamente por razões do interesse da República no combate à criminalidade, mas outros não só podem como devem ser revelados, e, alguns deles, eu próprio quis trazer a conhecimento público por esta forma.
Em todo o caso, é nossa opinião —e gostaria de sublinhar isto — que nem que este orçamento fosse o triplo do que é (e 15 milhões é, apesar de tudo, uma verba significativa) continuaria a ser insuficiente face
às necessidades. Não se pode continuar a dizer que o Orçamento do Estado prevê para a Justiça 6 550 000 contos. É falso, não prevê. Prevê muito mais do que isso, ou seja, os tais 15 milhões que já referi, mas isso não diz tudo!
A questão é que, ainda que esta verba fosse o triplo e fosse soberbamente gerida, creio que nunca supriria a falta de uma política inteligente, constitucional, democrática e participada de justiça. Creio que essa política falta.
Não passam pelo Orçamento muitas das medidas necessárias e capazes para enfrentar a crise da justiça ou os «nós de bloqueamento» do sistema, como agora gostam de lhe chamar, o que creio ser correcto, visto referirem-se a áreas-chave em ruptura. Muitas das reformas essenciais a fazer —e com isto não queria chocar o Sr. Presidente Almerindo Marques — não passam pelo orçamento.
Muitas delas — como, aliás, sublinha o relatório da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias— são medidas legislativas e organizativas. Algumas custariam ao Estado Português bem pouco. A reforma dos grandes códigos não tem uma significativa expressão financeira directa, mas, sem dúvida, exige a capacidade e a vontade política que, creio estar hoje cabalmente comprovado, faltam inteiramente ao Ministério da Justiça.
No ano que decorreu — e isto é importante, pudemos medir, de certa maneira, o que se tinha ou não feito. Creio que é também para isso que serve o debate do orçamento. Ora, o Ministério da Justiça multiplicou--se naquilo que poderíamos chamar esforços perniciosos. Investiu esforços, terá suado — infelizmente mal e sem resultado — na elaboração da proposta de lei de Segurança Interna, que o sr. Ministro tempos depois vinha a reconhecer estar cheia de inconstituciona-lidades e dedicou-se à campanha de manipulação da opinião pública e de insegurança dos cidadãos com o que terá gasto verbas lamentáveis.
Dedicou-se também ao sistema de informações e à governamentalização do Ministério Público e da Magistratura Judicial, apresentando as propostas que agora temos na Comissão para verificarmos em que termos e se devem ser aprovadas.
Foi pai da explosão do ilícito de mera ordenação social, que neste momento rebentou todos os tectos e já assume as dimensões do delírio. Passa-se a ilícito de mera ordenação social tudo: os contrabandistas riem-se, sorriem, festejam; o espectro da prisão desaparece e, neste momento, o Governo vem — disse o Sr. Ministro —, sem o aval do Ministério da Justiça (pergunto como é isso possível), propor a submissão ao regime contra-ordenacional do ilícito fiscal. Portanto, teremos agora justiça administrativa para as questões de ilícito fiscal. Pergunto: como é que isto é possível e que sentido de responsabilidade é que poderá haver em sujeitar ao regime contra-ordenacional o ilícito fiscal?
O Ministério da Justiça também se dedicou à reforma dos tribunais fiscais e administrativos, com o lindo resultado que está à vista e com a falta de concretização que também é manifesta.
Simultaneamente, há omissões gritantes em relação à revisão dos grandes códigos; a ruptura do sistema prisional aprofundou-se e, hoje, como já ficou descrito, é preocupantíssima; a reinserção social é a ficção que se sabe. Por outro lado, o abandono da infância é um
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facto de tal ordem que o Sr. Ministro da Justiça descobriu a forma mágica para resolver o problema: «a infância é com os infantes e com as famílias, não é com o Estado, libertai o Estado da infância», o que é, realmente, uma solução original. Não é que sejamos — como é manifesto — contra o instituto da adopção ou contra o seu aperfeiçoamento no sentido de suprir carências de famílias que desejam, e que têm todo o direito de o fazer na insuficiência de filhos ou em qualquer outra circunstância, uma adopção.
Agora, a «atitude liberal» —com muitos sublinhados e pontos de exclamação — de demissão do Estado face à problemática da infância abandonada, Sr. Ministro, é uma concepção lamentável, mas é a isto que de dedica o seu Ministério.
Finalmente, o escândalo da assistência judiciária ultrapassa hoje todos os limites, e o Ministério da Justiça não pode averbar aí nenhuma acção, a não ser, porventura, alguma intenção vaga ou alguma justificada má consciência.
Ao mesmo tempo, o Ministério da Justiça tem uma péssima relação com a Assembleia da República. Constitui comissões para debater os grandes códigos e não dá a mínima informação. Mais: faz-se um requerimento e o Ministério da Justiça responde: «Na altura própria serão enviados aos Srs. Deputados os secos articulados e o mais que entendamos que os justifiquem.» Pedem-se os elementos que instruíram os trabalhos preparatórios e a resposta é: «Não, é impossível.» Pedem-se os relatórios dos magistrados e inspectores, que poderiam ser muito úteis para termos uma imagem de como a reforma se está a processar e a resposta é negativa — mas sem responsabilidade de outrem porque não sei se há supervisão ministerial: «Que não, serão enviadas na altura própria.»
Isto não é forma de tratar, nem com a Assembleia nem com coisa nenhuma, e creio que essa situação de costas voltadas para a Assembleia no que respeita aos grandes códigos é inaceitável e não conduz a sítio nenhum.
Um ano e tal depois de ter mandado suspender o decreto-lei com as alterações ao Código de Processo Civil, o Sr. Ministro dizia-nos na Comissão que pensa agora fazer uma pequena lei, mais modesta, mas dentro das baias e dos estribos daquela que ia entrar em vigor quando o Sr. Ministro a suspendeu. Sr. Ministro, paciência: haja passionalidade, mas não se pode agir desta maneira.
Finalmente, o Ministério tem uma péssima relação com os magistrados, das piores relações imagináveis. Dizia em Dezembro um Deputado do PS que «nunca se esteve tão perto de uma greve de magistrados». É verdade, mas isso não resulta de outra coisa que não seja da conduta política do Ministério em relação ao sector. É também o que se passa em relação às rendas de casa dos magistrados. Não estou a discutir se é este ou aquele regime que deve ser adoptado; estou a dizer que não é maneira de tratar seja o que for com os magistrados, ordenam a dedução compulsiva dos montantes. É uma guerra sem sentido, que só pode conduzir, por um lado, à desmobilização e, por outro, à mobilização em torno de pólos que podem ser dolorosos, que não são motivadores e que são um direito se colocada a questão como o Sr. Ministro a colocou.
Idem quanto à questão da participação emolumentar. Idem quanto à questão do Boletim do Ministério da Justiça, que não é gratuitamente distribuído «por-
que não há dinheiro». Então deve é ser deduzido, compulsivamente, automaticamente, com retenção — diz o Ministro. Creio que esta não é maneira de tratar as questões.
Idem quanto às remunerações, em que se chega ao ridículo de agora um grupo singular de deputados do PSD, tendo naturalmente esse direito, apresentar uma proposta de passagem do vencimento para 60 000S, o que implica um aumento anual de 500 000 contos, ou mais...
O Sr. Luís Saias (PS): — Ou mais! 900 000 contos!
O Orador: — «Ou mais», diz o Sr. Deputado Luís Saias que são cerca de 900 000 contos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro: Isto é excelente. Temos as contas que nos foram fornecidas pela Gabinete de Gestão Financeira para um aumento de 51 400 para 55 000. Até temos para uma actualização de 17%. Sabemos que o Conselho de Ministros recusou tudo isso e que, neste momento, aquilo que propõe não tem discussão. Que forma de actuação é esta, que coligação é esta, que Governo é este que brinca assim com questões que têm uma certa repercussão, para depois ir à televisão dizer que os magistrados ganham isto e aquilo, criando naturalmente um movimento contrário de opinião, e com inexactidões quanto aos montantes indesculpáveis a um responsável pela pasta da Justiça.
Última observação: não cremos que seja possível combater a crise com esta política e com este orçamento. Não é possível combater a crise sem uma estratégia clara de ataque aos nós de bloqueamento do sistema. E o Ministério não a tem, e se a tem, porventura, seria este um momento interessantíssimo para a revelar e não o fazer num pátio alfacinha qualquer ou nos écrans da televisão.
Não é possível resolver a crise sem a mobilização dos magistrados, e o Governo hostiliza, de maneira inaceitável, as magistraturas — até pretende governa-mentalizá-las como se viu, através das lamentáveis propostas que apresentou. E isto ao mesmo tempo que cria, todos os dias, conflitos, alguns perfeitamente indesculpáveis, com essa mesma magistratura.
Finalmente, nada disto é possível sem reformas legislativas democráticas e participadas, que contem designadamente com uma intervenção activa na sede em que devem ser feitas, isto é, na Assembleia da República. Não é para serem aprovadas por autorização legislativa no último dia do mandato da Assembleia!...
Por outro lado, é indesculpável que, em relação à questão do acesso ao Direito, o Ministério marque passo num momento em que a injustiça, essa, não marca passo e avança a galope, de uma maneira que exige prontas medidas, para as quais de resto procurámos contribuir através da apresentação de um projecto de lei.
Em todo o caso, este debate não será inútil, porque do conhecimento das informações que o Sr. Ministro possa fornecer sobre estas e outras matérias, e das que venham a resultar do debate, resultará, pelo menos, uma clarificação das concretas linhas orçamentais em que nos movemos. Isso não será tudo, mas será alguma coisa e depende de o Sr. Ministro ser minimamente informativo e não ser intoxicante. É esse o nosso voto.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, queria fazer um apelo para que houvesse um sentido de justiça na ges-
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tão dos tempos de intervenção dos Srs. Deputados, tendo em linha de conta que, nomeadamente, existe na Assembleia da República uma comissão de especialidade onde se devem discutir, sempre que essas comissões o entendam, as políticas dos ministérios. Não se pode fazer uma simples transferência para a Comissão de Economia, Finanças e Plano, que tem um objectivo concreto, que é o de discutir o Orçamento do Estado de 1985, da política que deve, naturalmente, ser discutida nas outras comissões de especialidade.
Srs. Deputados, fazendo mais uma vez este apelo, para que haja um mínimo de justiça na distribuição dos tempos de intervenção dos nossos trabalhos de hoje, dava a palavra ao Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): — Sr. Presidente, naturalmente que tentarei ser sensível ao seu apelo e procurarei mesmo praticar, pela minha forma, a justiça o mais equitativamente possível, ou seja, neste caso, compensar o excesso de tempo orçamental gasto pelos dois Srs. Deputados do PCP que me antecederam. Prometo ser, realmente, breve.
A primeira questão que queria pôr, que já foi aqui aflorada, mas penso que merecerá contudo uma necessária consideração da minha parte, refere-se à estrutura orçamental.
Já o ano passado tivemos a oportunidade de referir as nossas reservas quanto à circunstância de os Cofres do Ministério da Justiça não estarem integrados no Orçamento do Estado. É a questão que subsiste e que deve merecer a atenção — e está a merecer — da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, mas que tem também aqui o seu natural reflexo, pelo que perguntava ao Sr. Ministro da Justiça quais são as razões que, em seu entender, podem militar a favor da continuação do actual sistema e quais são, pelo contrário, aquelas que poderiam ser aduzidas no sentido de procurarmos caminhar para a integração dos referidos Cofres no Orçamento do Estado.'
Naturalmente que admito que a essência dos Cofres é ainda uma reserva, quase que natural, que o Ministério da Justiça tem perante as próprias dificuldades que o Orçamento do Estado põe num período de tão acentuada crise política como este. Essa será, naturalmente, uma explicação de ordem conjuntural, que tem o seu peso próprio — que compreendo —, mas gostaria de saber se, para além disto, existem razões técnicas de fundo que tornem difícil essa integração.
Também já aqui foi referida a questão do vencimento dos magistrados. Recordo-me de o Sr. Ministro da Justiça ter salientado, numa intervenção que fez a este propósito na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a sua posição de solidariedade para com o Governo quando, por razões de política orçamental, não se julgou haver condições para reforçar a despesa nesta matéria.
Gostaria de perguntar ao Sr. Ministro se continua a ter este entendimento sobre o problema e se, face à previsão de um acentuar de despesa que poderá resultar de uma alteração nos termos daquela que foi proposta, do ponto de vista do Ministro da Justiça e do Governo, considera esse eventual aumento comportável na actual situação orçamental, ou se, pelo contrário, mantém a posição de considerar que esse aumento de despesa seria incomportável nas actuais circunstâncias.
Uma outra questão, que também já não é a primeira vez que aqui é referida, diz respeito ao Gabinete de Planeamento e Combate à Droga. É uma questão, do ponto de vista do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, bastante importante e que tem a ver com os problemas do combate à delinquência juvenil, no sentido da profilaxia dos problemas e não do ponto de vista da repressão.
Justamente com este entendimento, de que fundamentalmente importa fazer a profilaxia e não a repressão, tem-se entendido que, talvez, o Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga não esteja situado da melhor maneira no âmbito do Ministério da Justiça e que deveria ser um gabinete interdepartamental, no qual se pudesse conjugar a política de vários ministérios, designadamente os da Educação, da Saúde e, naturalmente, da Justiça. Gostaria de perguntar se o Sr. Ministro da Justiça tem este entendimento e, se por acaso o tiver, se há previsão de alguma alteração da passagem do Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga para uma estrutura interdepartamental.
Também já aqui se falou das questões relativas à reinserção social — o problema do Instituto de Reinserção Social e as dificuldades de verba para a implementação dos mecanismos previstos. A minha pergunta vai no sentido de saber o que é possível fazer de concreto em 1985 nesta área. E, relacionada com este problema, uma questão melindrosa: perante as grandes dificuldades que se tem sentido na implementação do Instituto de Reinserção Social, o que deverá ser feito deverá ser um esforço de dotação de verba para esse Instituto ou, pelo contrário, no âmbito da Direcção--Geral dos Serviços Prisionais procurar reforçar, tanto quanto possível, os esforços de reinserção?
Uma outra questão, que se prende com isto, é a própria situação dos detidos e um dos problemas que se afigura mais grave é o da comunicabilidade entre os detidos em regime de prisão preventiva e os reclusos em cumprimento de pena.
A prisão e o regime prisional, tal como vem sendo praticado, torna-se uma verdadeira escola de crime para os iniciados. É ou não possível, relativamente à situação prisional, poder-se operar dentro das prisões esta distinção e esta separação entre os detidos que estão em regime de prisão preventiva e os reclusos em cumprimento de pena?
Também gostaria de colocar, ao Sr. Ministro, uma questão relativa aos juízos de instrução criminal. É sabido que vários juízos de instrução criminal se encontram numa situação extremamente difícil — vários deles sem juízes de instrução criminal —, o que levanta enormes problemas já aqui referidos, pelo que me dispenso de os salientar. Gostaria, em concreto, que o Sr. Ministro nos dissesse se é possível, no decurso de 1985, também atacar, em sentido positivo, este sector.
Por outro lado, na política de combate à criminalidade, subsiste o problema da implantação territorial da Polícia Judiciária. Gostaria, também, que o Sr. Ministro nos desse uma palavra sobre qual a possibilidade concreta de promover esse alargamento de implantação territorial na Polícia Judiciária, em 1985. Em que zonas e atendendo a que critérios de prioridade?
Também nos tribunais de Polícia os processos acumulados contam-se às dezenas, porventura às centenas, derivados muitas vezes do problema das bagatelas penais e do próprio funcionamento administrativo
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desses tribunais. Tenho conhecimento de que se vai fazer um esforço no sentido da informatização do trabalho no âmbito dos tribunais de Polícia e gostaria de perguntar ao Sr. Ministro em que é que esses planos de informatização podem perspectivar, no sentido positivo, uma muito maior operacionalidade da actividade administrativa no interior dos tribunais.
Quanto aos tribunais de Trabalho, é ou não possível pensar na necessidade de implementação de tribunais de competência especializada em muito maior número do que os existentes actualmente?
A matéria do Direito do Trabalho tende a ser, cada vez mais, uma matéria com a especialização conhecida, mas com uma relevância sócio-económica acentuada, sobretudo no momento actual de grandes dificuldades e de crise social. E não há dúvida que o retardamento dos processos de trabalho, tantas vezes escandaloso e ultrapassando tudo aquilo que o bom-senso mandaria, afecta sempre inevitavelmente a parte mais fraca. Obviamente, a parte mais fraca é aqui, em princípio, representada pelos trabalhadores.
Pergunto, portanto, se é ou não possível admitir a eventualidade de vir a implementar-se no futuro mais tribunais de competência especializada nestes sector.
Um pouco ligado com esta questão, perguntava ao Sr. Ministro se o instituto da falência, que está certamente em andamento no âmbito dos estudos de reforma do processo civil, e, já agora, os projectos de reforma deste processo, poderão vir efectivamente a ser apresentados no decurso do corrente ano. Esta questão, se não decorre necessariamente de um problema orçamental do Ministério da Justiça, tem implicações evidentes na vida sócio-económica do País, sendo igualmente conhecidos aqui os gravíssimos estrangulamentos para a vida da economia, nesta matéria do instituto da falência, derivados da forma como ele neste momento se encontra.
Ficaria para já por aqui, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Dou agora a palavra à Sr.a Deputada Odete Santos, a quem peço também um esforço de síntese, dado o adiantado da hora.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Folheando o plano de investimento do seu Ministério, reparei que em matéria de tribunais de Trabalho apenas havia referências aos Tribunais de Trabalho de Lisboa, Vila Franca de Xira e Oliveira de Azeméis. Considero que na área da justiça laboral tal é muito pouco, porque há uma frande falta de instalações de tribunais de Trabalho por esse país fora. Queria recordar-lhe uma notícia que a agência Notícias de Portugal distribuiu em relação ao Tribunal de Trabalho de Portalegre, que está praticamente a cair, tendo o juiz confirmado a existência de um parecer técnico já feito há cerca de um ano, dizendo que havia possibilidade de desmoronamento na zona do arquivo. Ora, o Tribunal de Trabalho de Portalegre não vem no PIDDAC.
Dele não consta igualmente — e trata-se de uma reclamação dos trabalhadores do Tribunal de Trabalho do Barreiro — a criação de um tribunal de Trabalho para a área do Montijo, que é uma zona de alguns conflitos laborais, que vão assoberbar os já numerosos processos existentes na área do Barreiro. Não se prevê nada, portanto, em relação a este problema.
Não sei se isto terá ligação com uma afirmação, que creio que o Sr. Ministro fez, no sentido de ter havido
uma recuperação na área da justiça laboral e de que os processos tinham avançado a um ritmo animador. Queria fazer a este respeito umas muito breves considerações, que creio serem importantes para aquilatarmos da necessidade ou não de equipar o País com mais tribunais de Trabalho. Se V. Ex.a atentar nos números que estes tribunais nos fornecem, constatará que não há praticamente recuperação significativa. O que existe é uma menor entrada de processos de indemnização em 1984, sumários ou ordinários, sendo na área dos acidentes de trabalho que se verifica uma entrada praticamente igual. Os processos de indemnização diminuíram, não porque não haja conflitos, mas sim à custa do corte de direitos dos trabalhadores e porque proliferam os contratos a prazo. Entrou agora em moda uma rescisão de contrato por mútuo acordo com indemnização, que é figura desconhecida da legislação laboral, e de que são exemplo, na sua aplicação, a Se-tenave e a Lisnave. Mais grave ainda é o facto de o próprio Governo, na resolução sobre a Lisnave, vir reconhecer essa figura jurídica inexistente. E é isto que faz V. Ex.a dizer que, como transitaram para o ano de 1985 menos processos do que de 1983 para 1984, há uma recuperação. Mas o que é facto é que ela não existe e torna-se, assim, urgente tomar medidas, não só no aspecto da instalação de mais tribunais de Trabalho no País como também noutros capítulos.
Penso também ser bom recordar aqui a necessidade de acabar com as comissões de conciliação e julgamento e as tentativas prévias de conciliação, que são mais uma forma de demorar o processo e de exercer pressão sobre o trabalhador para aceitar «10 réis de mel coado». É ainda necessário introduzir as modificações necessárias no Código de Processo do Trabalho, mas não aquelas que já foram introduzidas, que se cifraram, ao fim e ao cabo, em cortar o recurso dos trabalhadores para os tribunais colectivos e em diminuir as suas garantias. Em relação à área dos tribunais de Trabalho e da justiça laboral era isto o que, muito brevemente, se me oferecia dizer.
Gostaria ainda de tocar mais dois pontos. Um já aqui foi referido e relaciona-se com a questão do combate à droga. Visitei, há pouco, o Centro de Profilaxia de Droga do Sul e pude verificar que ali se desenvolve uma actividade importante na área da prevenção. Mas o que me preocupa, neste momento, é a questão do centro de internamento, que também visitei, o qual julgo, até por entrevistas dadas pelos responsáveis, encontrar-se neste momento encerrado para obras. Uma vez que a verba que vem aqui inscrita no orçamento de cerca de 400 contos, para equipamento e investimentos, me parece bastante exígua, gostava de saber quando é que esse centro de internamento vai ser reaberto e que capacidade é que terá. Isto porque na altura em que o visitei foi-me informado pela responsável que não tinha capacidade para mais de sete ou oito internados, o que é muito pouco, atendendo àquilo que a droga tem vindo a estender-se, nomeadamente no Sul do País. É, por conseguinte, necessário um combate, nessa área, com significado efectivo e que não seja um mero símbolo.
Uma outra questão que queria pôr diz respeito ao artigo 9.° da proposta de lei do Orçamento, cujo n.° 1 diz o seguinte:
Durante o ano de 1985, as remunerações acessórias, incluindo as do pessoai militar e militarizado e as dos titulares de órgãos de soberania e
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de cargos equiparados, serão congeladas no nivel de 1984.
Gostava de perguntar a V. Ex.a a que pessoal da área do seu Ministério se aplica esta disposição e o que se pretende dizer com «remunerações acessórias». O Sr. Ministro dir-me-á se tenho razão ou não, mas não posso deixar de relacionar este artigo 9.° com o comunicado que tenho aqui, do Sindicato dos Trabalhadores do Registo e Notariado, que depois de uma reunião com V. Ex.a, pedida aliás há muito tempo, vieram dizer que lhes foi comunicado que «as participações emolumentares não serão revistas nem actualizadas». Pedia a V. Ex.a que nos esclarecesse se estas remunerações acessórias de que aqui se fala são, de facto, participações emolumentares ou diuturnidades e que pessoal vai ficar com estas remunerações congeladas.
No n.° 2 do artigo 9.° fala-se em prémios destinados a estimular a assiduidade, que serão eliminados com a entrada em vigor da presente lei. Gostava que o Sr. Ministro dissesse se este preceito tem aplicação na área do seu Ministério. Isto porque depois da nova regulamentação do subsídio de refeição — que antes não dependia do trabalho efectivo, mas agora depende — quem não vai trabalhar nesse dia não tem subsídio, nem mesmo as trabalhadoras que estão em casa com licença de parto. Parece-me assim, à primeira vista, que ele é um prémio destinado a estimular a assiduidade. Gostaria, portanto, de saber se na área do seu Ministério isto tem aplicação em relação ao subsídio de refeição ou, em caso negativo, a que é que se aplica.
Por agora, Sr. Ministro, ficar-me-ia por aqui.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Correia Afonso.
O Sr. Correia Afonso (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Justiça: Não vou insistir muito num lugar-comum que tem sido aqui repetido e que se traduz, ao fim e ao cabo, em afirmar a insuficiência das verbas orçamentais destinadas ao Ministério da Justiça. Não quero com isso dizer que não esteja perfeitamente de acordo com esse lugar-comum, porque me identifico com ele e creio mesmo que V. Ex.a também subscreveria a afirmação de que as verbas destinadas ao Ministério da Justiça são insuficientes. Mas tendo presente a escassez de recursos e, portanto, a necessária contenção de despesas, concluo, como todos nós, que esse sacrifício tem de ser repartido por todos os departamentos ministeriais, incluindo o da Justiça.
No entanto, sobre este assunto gostava ainda de dizer que pelo Ministério da Justiça passa, segundo creio, uma componente muito importante da legalidade democrática. Este aspecto talvez levasse a dar uma certa prioridade ao Ministério da Justiça, no reforço das verbas que lhe são destinadas. E foi, precisamente, quase só este aspecto que me levou a propor, na subcomissão, o aumento dos vencimentos dos magistrados judiciais. Creio, efectivamente, que não será muito equitativo ver distribuir verbas a outros departamentos, que têm, na minha perspectiva, menos prioridade e deixar em tempo de secura uma medida que parece que já deveria ter sido aplicada há muitos anos, tal como seja o reforço dos vencimentos dos magistrados judiciais.
Iria agora, seguindo o conselho do Sr. Presidente, propor a V. Ex.a apenas duas medidas: primeiro, a
criação de mais um juízo em cada um dos Tribunais Judiciais das Comarcas de Chaves, Fafe e Vila da Feira; segundo, que o Governo fique autorizado a alterar o imposto do selo nos processos dos tribunais de Trabalho, no sentido de os igualar àquele que é contado nos processos dos tribunais comuns. Nesse sentido, vou entregar ao Sr. Presidente uma proposta de aditamento de dois novos artigos à proposta de lei n.° 95/111 — Orçamento do Estado para 1985 —, cujo teor é o seguinte:
Artigo novo
Fica o Governo autorizado à criação de mais um juízo em cada um dos Tribunais Judiciais das Comarcas de Chaves, Fafe e Vila da Feira.
Artigo novo
Fica o Governo autorizado a alterar o imposto do selo nos processos dos tribunais de Trabalho.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.
O Sr. João Amaral (PCP): — Sr. Ministro, a questão que lhe vou colocar é curta. Estive a consultar o seu PIDDAC pessoal e não encontrei qualquer referência à instalação de alguns tribunais que estão agora aí na berlinda. Refiro-me, concretamente, àqueles que o seu companheiro de partido — julgo que estou a dizer bem, não é?!... — Alberto João Jardim propõe e que são concretamente «um juízo criminal, um tribunal de família, uma auditoria administrativa, um tribunal fiscal aduaneiro de l.a instância e um tribunal de 1." instância de contribuições e impostos», todos no Funchal.
Devo dizer ao Sr. Ministro da Justiça que, na minha opinião e na de muita gente, designadamente na da generalidade das forças políticas com assento na Assembleia Regional da Madeira, o que se passa em matéria de justiça administrativa no arquipélago da Madeira é um escândalo. É de facto escandaloso que seja preciso vir a Lisboa para pôr um processo contra um director-geral, uma câmara, etc, que devia correr os seus termos naquela Região, que fica a umas milhas marítimas largas deste território! Daí a pertinência das questões colocadas pelo seu companheiro de partido Alberto João Jardim à Assembleia Regional e a receptividade que tiveram.
O facto de não encontrar, no seu PIDDAC pessoal, nenhuma referência a este assunto leva-me a perguntar se a proposta de lei aqui apresentada é uma forma de o criticar, ou se corresponde a uma intenção séria, da sua parte e da do Governo, indo nesse caso ter uma resposta séria em termos de concretizar a criação destes instrumentos de acção jurisdicional.
A Assembleia Regional da Madeira entregou esta proposta na Assembleia da República e o Sr. Ministro dirá que esta não discute questões deste tipo em abstracto, mas sim em concreto, não podendo tomar decisões neste âmbito, sem saber se elas vão ser postas em prática. A pergunta que concretamente lhe faço é se o Sr. Ministro vai ou não encarar, favoravelmente, a proposta apresentada pela Assembleia Regional da Madeira. Se sim, por que é que o Governo não a apresentou e qual a razão por que não está a sua existência prevista no seu PIDDAC pessoal?
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Devo dizer que não adopto a postura do Sr. Deputado Correia Afonso, no sentido de propor, em sede de orçamento, a criação de comarcas novas, porque, apesar de tudo, essa novidade constituiria um excesso! Aquilo que pretendo é, tão-só, saber se estão previstas ou não as verbas necessárias, não se tratando de transformar a lei do orçamento na lei de criação de comarcas.
O Sr. Presidente: — Como não há mais inscrições, dou a palavra ao Sr. Ministro da Justiça, para responder às questões que foram formuladas.
O Sr. Ministro da Justiça: — Quero, em primeiro lugar, agradecer aos Srs. Deputados que intervieram, em particular aos do PCP, que se salientaram nesse ponto, o extremo cuidado com que fizeram as suas intervenções e naturalmente o cuidado que todos revelaram em estudar o orçamento do Ministério da Justiça.
Têm razão, em termos genéricos, alguns Srs. Deputados, quando referiram que os problemas da justiça não são exclusiva, nem, porventura, basicamente, problemas orçamentais. Por isso mesmo é que o dramatismo de alguns comentários que foram feitos não tenha tanta justificação como à primeira vista poderia parecer, porque há, efectivamente, muitas mutações qualitativas, umas que já foram, outras que irão ser introduzidas ao longo deste ano e dos anos vindouros, e que poderão modificar substancialmente a situação, sem que isso signifique, necessariamente, mais verbas, embora algumas tenham de ser, evidentemente, utilizadas.
Apesar do patati patata na Televisão e aqui, o que é verdade é que temos de reconhecer que nos encontramos numa situação de dificuldade de meios financeiros, que, como já foi aqui sublinhado, abrange também o sector da justiça. É lamentável que assim aconteça, mas não podemos furtar-nos a esse aspecto. Penso que, no plano global, as verbas sendo insuficientes — e concordo que o são — representam, todavia, uma repartição dos sacrifícios que em todos os sectores do Estado têm vindo a realizar-se.
Perguntou-me o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho se estava previsto no orçamento do Ministério da Justiça verbas para fazer face a um eventual aumento dos magistrados judiciais neste momento, admitido por alguns Srs. Deputados. A resposta é, evidentemente, negativa, visto que a proposta do Governo não previa esses aumentos. Quando discutirmos essa matéria em sede própria, veremos como o problema se põe, mas esse aumento não está incluído nesta questão orçamental. A situação deve ser encarada tendo em consideração que têm sido feitas críticas globais ao excessivo défice que tem o Orçamento do Estado e não penso que seja viável aumentá-lo. O que poderemos é, eventualmente, tirar de uns lados para pôr noutros e penso que o Governo estará aberto, dentro de determinados limites, a esse tipo de transferência de verbas, faltando saber onde e como.
Fez em seguida considerações, que acompanho, aliás, em vários aspectos, acerca dos problemas dos serviços públicos e da maneira como, no fundo, são utilizadas as verbas.
Como V. Ex.a sabe, o problema da distinção entre taxa e imposto tem alguma delicadeza e não será este, até pelo adiantado da hora, o local adequado para entrarmos nesse aspecto. Mas tem sido tradição, desde
há longos anos, que o Ministério da Justiça utilize verbas que colhe no registo e notariado e também nos próprios tribunais, para as utilizar em investimentos e, igualmente, para completar, como remunerações acessórias, os vencimentos dos magistrados e dos funcionários judiciais. Poder-se-ia dizer que essa situação não deveria existir numa organização correcta da Administração Pública, em particular da contabilidade pública e do Orçamento do Estado, mas penso que como meta a atingir — e isto permite-me já responder a outras observações que foram feitas por outros Srs. Deputados — é correcta. Só que o caminho é longo e creio que não nos devemos precipitar, porque na actual situação a perda da autonomia dos cofres significaria um larguíssimo prejuízo para a realização das reformas da justiça e suponho que nenhuma das pessoas que trabalha no âmbito da função judicial e do Ministério da Justiça veria com bons olhos esse tipo de solução, no estado actual em que nos encontramos.
Gostaria, aliás, de acrescentar — e esse ponto foi salientado — que os problemas do planeamento e da administração no seio do Ministério da Justiça, que são complexos, estão a ser objecto, em primeiro lugar, de uma comissão que está a estudar uma reestruturação do Ministério. Em segundo lugar, o próprio PIDDAC é já, este ano, algo diferente do que foi nos anos anteriores, porque, pela primeira vez, foi objecto de uma planificação. É evidente que cabe às oposições serem maximalistas e não reconhecerem, portanto, os esforços feitos, exigindo sempre o máximo. Em todo o caso, vale a pena salientar este ponto, porque há um esforço feito no sentido de começar a ter uma administração da justiça, no sentido de organização administrativa e gestão orçamental, mais eficiente e moderna, com recurso a uma gestão previsional e às técnicas que a informática hoje permite utilizar.
O Sr. Deputado Vilhena de Carvalho fez depois uma pergunta concreta sobre o Tribunal de Almeida. Não posso garantir-lhe inteiramente, porque como sabe as comarcas são muitas, mas a ideia que eu tenho é que as obras desse tribunal se iniciarão ainda este ano. Em todo o caso, gostaria de lhe dar uma informação mais cuidada, porque não gostaria de estar a induzir em erro o seu círculo eleitoral e o Sr. Deputado.
O Sr. Deputado José Manuel Mendes, com o estilo terso que lhe é habitual, numa muito boa linguagem vernácula, fez extensas considerações a propósito do PIDDAC, que outro dos seus camaradas — suponho que é assim que se diz?! — de bancada considerou, gentilmente, que era o meu PIDDAC pessoal. Nessa matéria, referiu algumas coisas que suponho serem inexactidões, resultantes, porventura, dos elementos que lhe foram fornecidos, como, por exemplo, quando falou do Tribunal de Felgueiras.
Por não ter falado para o microfone, não ficaram registadas palavras do Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Orador: — É que tive ocasião de inaugurar o ano passado o Tribunal de Felgueiras, e foi uma coisa bonita! Não percebi bem, portanto, porque é que vinha Felgueiras a talhe de foice.
No que diz respeito aos problemas que pôs, dir-lhe--ia, no que toca a Braga, que se estão a fazer esforços para que seja lançado o projecto da obra do Tribunal de Braga, faltando apenas esclarecer alguns aspectos
com a Câmara Municipal. O Tribunal de Resende está
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a ser construído e o de Caminha está prestes a ser concluído.
Falou em diversos tribunais e limitar-me-ia a dizer--lhe que não é possível fazer tudo ao mesmo tempo com as verbas de que dispomos. Em todo o caso, existem alguns tribunais que se encontram numa situação que reputamos mais difícil. Por exemplo, irão este ano ser retiradas muito em breve as conservatórias do Tribunal de Vila Nova de Gaia, o que vai permitir um certo alargamento da sua capacidade, embora isso não resolva, evidentemente, todos os problemas. Mas o que é certo é que não podemos revolvê-los todos ao mesmo tempo! A mesma situação se passa em relação a Viseu, em que este ano, penso que até fins de Abril, as conservatórias serão transferidas, ficando o tribunal igualmente com melhores" condições para funcionar.
Em relação a Estarreja, que foi mencionado com uma situação difícil, queria dizer que foi há cerca de duas semanas adjudicada a obra para a construção do seu tribunal, o que aliás vem noticiado. O de Paredes está, como sabem, em construção, já na fase final. Em relação ao de Penafiel, já foi adjudicada a obra há mais tempo.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Mas tinha cabimento, Sr. Ministro?! «Adjudicou» como? Com base no Orçamento do ano passado? Sem autorização legal? Será um daqueles «ministros difíceis», que adjudicam sem lei, de que tanto se queixa o Sr. Secretário de Estado do Orçamento?
O Orador: — V. Ex.a perdoar-me-á, mas não vamos estar a discutir aqui esse tipo de problemas, que não têm directamente a ver com a questão.
Quanto ao problema que me pôs, estou a dar-lhe uma explicação em relação ao caso concreto dos tribunais e às verbas que estão previstas.
Não percebi bem a vossa referência a uma verba de 200 000 e tal contos e não tenho aqui os elementos que estão a utilizar. Mas a questão fundamental que lhes queria dizer é que os 500 000 e tal contos, que referiu, estão disponíveis para o investimento deste ano.
O Tribunal de Valpaços também se encontra em construção e quanto ao Tribunal Administrativo do Porto, foi já feito o contrato-promessa para a aquisição das suas instalações.
Também não percebi a referência que fez dos tribunais de Polícia do Porto, pois eles têm uma instalação recente.
Depois, V. Ex." referiu-se às questões relativas aos serviços prisionais e fez considerações, que não subscrevo, acerca daquilo que tem sido o esforço dos funcionários dos serviços prisionais e devo dizer que, aliás, tem sido um esforço extremamente meritório.
As condições nas prisões não são, infelizmente, tão boas como as que desejaríamos, mas, em face da enorme afluência de reclusos e perante a exiguidade das instalações que existem não se pode dizer que o nosso ambiente seja pior, antes pelo contrário, do que aquele que existe em países como a Espanha ou a França.
Vozes não registadas pela gravação.
Não, em todo o caso significa que, perante situações que são relativamente comuns aos países, e que não são uma singularidade portuguesa, a administração prisional portuguesa tem reagido em termos de grande esforço e de grande trabalho.
Como tive oportunidade de referir, houve um propósito de dar, em termos orçamentais, algum apoio — e um apoio privilegiado, digamos, por comparação com outras direcções-gerais do Ministério da Justiça — aos serviços prisionais.
Aliás, V. Ex.a disse que havia muito pouca formação dos presos e que havia uma falta grave, em matéria de trabalho, dos presos, e referiu uma verba do gabinete de gestão financeira. Mas há outras verbas que não têm de estar orçamentadas no Ministério da Justiça porque, designadamente, resultam de acordos com a Secretaria de Estado do Emprego. Esses acordos têm alguma relevância e já no ano passado se realizaram vários cursos que são fundamentalmente pagos pela Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional, mediante acordos celebrados com a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais. Nós não temos o montante global desses acordos porque eles dependem, nalguns casos, das inscrições dos reclusos e, portanto, nem sequer é possível calculá-lo de antemão, e de resto não somos nós que os pagamos.
V. Ex.a também referiu, em matéria de guardas prisionais, embora tendo omitido a publicação do novo estatuto, a insuficiência dos efectivos. Depois, falou na ilegalidade da contratação dos tarefeiros, perguntando também como é que se completavam os quadros.
Bem, a ideia básica é a de se irem substituindo os tarefeiros por pessoas que integrem os quadros, embora esses quadros não tenham de ser preenchidos, na sua totalidade, este ano.
Houve, precisamente nesta matéria, uma controvérsia com o Ministério das Finanças, na medida em que este, pressionado pelas suas próprias dificuldades, teve dificuldade em dar o seu acordo à publicação do estatuto. Finalmente, encontrou-se uma solução que é a de as verbas que neste momento se pagam aos tarefeiros passarem a ser utilizadas, daí para cá, no pagamento dos funcionários que vão ser admitidos. Por outro lado, a solução deste problema está, também, num preenchimento gradual e mediante as necessidades dos quadros, que não têm de ser, todos eles, preenchidos de imediato.
Também é inexacto — e resulta certamente de insuficiência de informação — que não se tenha feito nenhum esforço de formação, pois espera-se que, ainda no final de Fevereiro, se conclua um curso de formação de 70 guardas. Esses novos 70 guardas saem, precisamente, da Escola de Formação da Direcção--Geral dos Serviços Prisionais.
Deve dizer-se, aliás, em relação ao problema da res-socialização, que foi também referido pelo Sr. Deputado Jorge Lacão, que o Instituto de Reinserção Social tem verbas que são limitadas — e, infelizmente, também ele sofre as limitações próprias da época que estamos atravessando —, mas, em todo o caso, registou um aumento significativo. E estas não são as únicas verbas em matéria de reinserção social, visto que algumas dessas reinserções sociais são realizadas também na própria Direcção-Geral de Serviços Prisionais, através, designadamente, deste tipo de trabalhos que há pouco referi dos acordos com a Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional.
V. Ex.a diz que isto é pouco — estou de acordo —, mas, infelizmente, não temos possibilidades de ir muito mais além e, de resto, temos vindo a fazer um esforço muito grande para aproveitar os esquemas dos
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serviços prisionais. Como sabe, estes serviços também têm um fundo que é próprio de cada um dos estabelecimentos e que é utilizado para pagar os trabalhos dos reclusos.
Está em curso, neste momento, um projecto de informatização da gestão das prisões que permitirá a obtenção de números muito mais claros sobre essa matéria, visto que neste momento cada uma das prisões tem a sua própria contabilidade e torna-se muito difícil conseguir antecipadamente números globais.
O Sr. Deputado José Magalhães fez uma referência geral ao problema das verbas de que dispõe o orçamento do Ministério da Justiça, e, aliás, depois acabou por, de algum modo, reduzir a importância das suas observações na medida em que reconheceu que as medidas legislativas são mais importantes do que os problemas das verbas.
V. Ex.a insistiu no problema da lei do enquadramento do Estado, a propósito da resposta a algumas observações feitas ao seu camarada que anteriormente tinha formulado perguntas e a quem tive oportunidade de dar algumas explicações. Depois mencionou o meu discurso na TV, dizendo que eu o tinha feito de uma maneira zangada, o que não é exacto, e que me tinha referido à falta de produtividade dos magistrados.
Não é exacto! O que eu disse é que havia falta de produtividade e que teriam de ser determinadas as razões desse facto, razões essas que podem ser várias. Podem ser resultantes do trabalho dos magistrados mas também podem resultar dos problemas relativos à organização dos tribunais, ao equipamento destes, aos problemas processuais, etc.
Quer dizer, a falta de produtividade é um facto que as estatísticas apontam, mas não significa que resulte, necessariamente — embora eu não exclua esse factor —, da falta de produtividade dos magistrados.
Além disso, mesmo que exista essa falta de produtividade dos magistrados, os números que existem, como sabe, são estatísticos e portanto globais. Mas neste momento nem sequer me é possível chegar a essa conclusão, e nem o disse nem imputei essa falta aos magistrados. Mas, se se verificar que esse facto lhes é imputável, por que não admiti-lo?
Todos nós devemos melhorar a nossa maneira de trabalhar e os magistrados não ficam indemnes em relação a isso, como é óbvio.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, dá--me licença que o interrompa?
O Orador: — Faça favor.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, pedi licença para o interromper, e agradeço-lhe que me tenha permitido a interrupção, porque estamos na Assembleia da República, e, digamos, a uma hora tardia, e o que V. Ex.a disse na TV foi dito à hora de maior audiência, porventura, da televisão. E foi dito em termos que reproduzo e que foram entendidos — não tenho dúvida nenhuma quanto a isso — nos termos e com o sentido que eu aqui lhe resumi de maneira — devo dizer — muito branda.
Segundo o texto que foi distribuído à imprensa e a todos nós pela Direcção-Geral da Comunicação Social — bem ou mal —, o que V. Ex.a disse foi: «No que respeita aos juízes regista-se, em primeiro lugar,
que o seu número passou de 381 em 1974 para 824 no fim do ano passado», o que aliás não corresponde rigorosamente à verdade porque o seu número é de 1040.
O Orador: — Desculpe, isso diz respeito só aos tribunais judiciais, de que eu estava a falar.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Bom, nada indica isso. O discurso está mal escrito, Sr. Ministro, se me permite, porque diz «no que respeita aos juízes».
O Orador: — Não, provavelmente a Comunicação Social é que reproduziu mal.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, então a responsabilidade é da Direcção-Geral da Comunicação Social...
O Orador: — Está certo, mas isso não é da minha responsabilidade.
O Sr. José Magalhães (PCP): — ... e isso deverá ser apurado pois foi ela que veiculou o discurso.
Continuando a leitura do seu discurso temos «o indicador de número de processos entrados, por juiz, era de 588 em 1974, de 794 em 1980 e de 721 em 1983 [...]», vindo, portanto, já a decrescer. «Os elementos estatísticos indicam aliás [...]», e sou incapaz de reproduzir o tom e o ar com que o disse, «[...] uma diminuição de produtividade, cujas causas importa detectar».
O Orador: — Eu não disse que era imputável aos magistrados.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Quando começa o parágrafo dizendo «no que respeita aos juízes [...]» e acaba dizendo «[...] uma diminuição de produtividade cujas causas importa detectar», Sr. Ministro, se V. Ex.a tinha uma intenção pura, louvado seja, mas foi imperfectamente expressa e produziu resultados muito negativos, como aliás sabe.
O Orador: — Bom, essa interpretação é sua.
Depois V. Ex.a fez uma referência à questão do acesso à justiça, e referiu um recente seminário em que se teria afirmado que a maneira de resolver o problema seria diminuir a procura de justiça dificultando-lhe o acesso.
Bom, desejo-lhe dizer, fundamentalmente, que nós temos praticamente pronto um projecto de acesso ao Direito — aliás, outro dia V. Ex.a teve a amabilidade de me fornecer um projecto que o Partido Comunista teria entregue na Assembleia da República e que nós tomamos em consideração como um contributo no que respeita ao nosso projecto, na nossa perspectiva é evidente — e as medidas que preconizamos nesse projecto não vão no sentido que V. Ex." referiu, embora seja óbvio que não tem sentido, face à inflação registada, continuar a ter o tipo de alçadas que temos neste momento. Isso é evidente. Em alguns países até as alçadas são fixadas em função da inflação, como é conhecido.
O Sr. José Magalhães (PCP): — E impõe taxas moderadoras? Isso é que é espantoso!
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O Orador: — Não, não é nada disso!
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Ministro, mas em resposta ao nosso requerimento 95/III/2 fomos informados de que o director-geral dos Serviços Judiciários anunciou em recente seminário restrições ao acesso aos tribunais, incluindo taxas moderadoras, subida das alçadas, alongamento das distâncias entre as populações e os tribunais ... Afinal, quem fala pelo Ministério?! E que valor pode atribuir-se ao que cada responsável diz por seu alvedrio?!
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, desculpe a interrupção.
Sr. Deputado, penso que este tipo de diálogo não conduz nem sequer a efeitos práticos da nossa sessão de trabalho, pois nem sequer fica registado.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente, então inscrevo-me para um protesto.
O Sr. Presidente: — Com certeza, era o que lhe ia sugerir.
O Orador: — Não me importa que me interrompam. O problema não é esse.
O problema é que essa não era, efectivamente, a posição oficial do Ministério da Justiça. Tratou-se apenas de uma posição assumida num seminário, que foi discutida e analisada, mas esse tipo de solução não tem assento no processo de elaboração da lei que está a ser criada.
Em todo o caso, penso que estamos a discutir o orçamento e portanto essa questão não é relevante neste momento.
Depois, V. Ex.a referiu-se ao problema da duração dos processos. De facto é verdade que a duração dos processos é um problema, que é dado através de uma média que traduz, obviamente, apenas uma tendência e para que haja uma média há processos que duram muito mais tempo.
Aliás, infelizmente, é um facto conhecido a existência de processos de trabalho com 10 anos e 12 anos. Mas esses processos estão a ser alvo de uma atenção particular, por parte do Conselho Superior de Magistratura e pelo juízes que estão agora nos tribunais de trabalho, no sentido de se encontrarem as razões destes atrasos tão grandes e que — como V. Ex.a pode calcular — excedem em muito a duração deste Governo.
Trata-se de um problema que nos preocupa, que tem de ser analisado com extrema atenção e, aliás, essa é uma das nossas prioridades em termos de ataque aos nós de estrangulamento da administração da justiça.
A propósito dos tribunais de trabalho, um dos Srs. Deputados referiu que a explicação para a melhoria da situação resultava do facto de terem entrado um menor número de processos. E verdade, mas não se trata só disso.
A situação nos tribunais de trabalho melhorou, mas não de uma maneira uniforme. Temos hoje uma situação francamente melhor no Porto, onde estamos praticamente a caminho da normalização em matéria de tribunais de trabalho, com excepção de um juízo que estava muito atrasado, o que não tem nada a ver com os juízes que foram titulares desse tribunal.
Em Lisboa, encontramo-nos ainda distantes dessa situação, muito embora pense que logo que seja possível afectar novos juízes auxiliares aos tribunais de trabalho de Lisboa — que ainda os não têm — poderá verificar-se uma recuperação idêntica àquelas onde, neste momento, trabalham os juízes auxiliares.
Não pensamos que seja facilmente possível — na actual situação de carência de magistrados em que nos encontramos, e com a existência de outras zonas estratégicas que são muito importantes e que merecem igualmente uma atenção — estarmos a constituir mais tribunais de trabalho para além dos que estão previstos.
Alguns desses tribunais, como V. Ex.a sabe, ainda não se encontram instalados e a primeira prioridade será instalar os tribunais que já se encontram criados.
Ainda antes das férias judiciais, vamos construir uma parte substancial — mas não total — deles.
Os novos tribunais terão de aguardar uma segunda fase.
Depois V. Ex.a referiu os problemas dos Tribunais de Polícia de Lisboa e do Porto e perguntou que medidas estavam a ser adoptadas nesse sentido.
Os tribunais de polícia são uma zona onde, efectivamente, há nós de estrangulamento importantes, e neste momento estão previstas medidas para sanear essa situação.
No entanto, no que diz respeito às razões dos atrasos, a situação de Lisboa é direfente da do Porto.
A situação que se verifica nos tribunais de Polícia do Porto deve-se — segundo parece — muito mais a carências de funcionários judiciais, de agentes do Ministério Público, e de alguns meios materiais, tendo estes últimos sido já em parte, solucionados. No entanto, a solução das carências de pessoal é mais difícil embora estejamos em vias de solucionar o problema.
No que respeita à situação dos Tribunais de Polícia de Lisboa verificam-se algumas dificuldades em matéria de pessoal, sobretudo no que toca a magistrados, por outro lado, há um plano de tentar realizar uma informatização extremamente rápida dos tribunais de polícia.
Pode-se perguntar: porquê os tribunais de polícia? Porque experiências congéneres realizadas noutros países europeus têm revelado que os tribunais de polícia são uma zona facilmente informatizável e não têm o mesmo tipo de dificuldades de informatização que existem noutros tribunais portanto, é possível obter rendimentos muito apreciáveis.
Não é um processo taumaturgo, mas em todo o caso permite avanços muito substanciais e pensamos que — tal como acontece designadamente em França onde os resultados foram verdadeiramente espectaculares —, atacando convergentemente com novos métodos humanos, materiais e de informatização, é possível conseguir resultados apreciáveis.
Depois, V. Ex.a teceu considerações sobre as questões da justiça administrativa dizendo que proliferam os actos ilegais da administração e que são praticamente impunes. Eu não faria um juízo tão severo, mas devo dizer-lhe que foi o reconhecimento das deficiências da justiça administrativa que levou à publicação da lei orgânica dos tribunais civis e fiscais e do seu diploma complementar.
Posso também informá-lo que o projecto de lei de processo contencioso está praticamente pronto, que será submetido às entidades que se interessam e que têm ra-
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zão para se pronunciarem sobre ele antes da sua aprovação pelo Conselho de Ministros.
Estou a pensar, designadamente, nas associações representativas dos magistrados do Ministério Público. Naturalmente, não há nenhuma razão para a não facultar a outras entidades que tenham interesse em a conhecer eque possam dar um contributo válido para o seu aperfeiçoamento. O mesmo se passa com o processo tributário, embora tenha sido basicamente elaborado no Ministério das Finanças e do Plano e não no Ministério da Justiça.
Quanto à matéria referente a instalações, temos, como disse há pouco, um contrato de promessa de compra e venda para a aquisição do Tribunal Administrativo, do círculo do Porto. Há diligências e, praticamente, há já uma resolução no que respeita ao tribunal do círculo de Coimbra, e em Lisboa existem obras nas escadinhas de São Crispim para instalar, da maneira mais condigna, o tribunal de Lisboa.
Infelizmente, têm-se gorado, até agora, as diligências para alargar o Supremo Tribunal Administrativo que, efectivamente, já se encontra numa situação de estrangulamento em termos de espaço. A melhor solução, do ponto de vista do Supremo Tribunal Administrativo, seria podermos adquirir um edifício vizinho que permitisse a extensão dos serviços, mas, até agora, as diligências têm-se vindo a gorar. Em todo o caso algumas obras de restauro e de reparação estão a ser feitas, para evitar que o Tribunal se degrade mais e para aumentar a capacidade das instalações.
O Sr. Deputado Jorge Lacão referiu o problema dos cofres. Já há pouco fiz menção de qual era a posição do Ministério da Justiça sobre o problema, de modo que não vale a pena estar a repetir-me.
Em matéria de vencimentos dos magistrados, também penso que o que disse nesta sede é claro. Não está prevista nenhuma verba e se houver um aumento que venha a ser discutido na sede própria, isso naturalmente significará, na perspectiva do Governo, modificações das verbas orçamentadas globalmente na presente proposta, sob pena de irmos aumentar um défice que tem suscitado, senão críticas, pelo menos, preocupações em diversos sectores desta Assembleia, e naturalmente que o Governo também se apresenta preocupado com a circunstância de ele não poder ser menor.
Depois, V. Ex.a perguntou o que se pensava fazer quanto ao Gabinete de Planeamento e de Coordenação do Combate à Droga e se não seria preferível uma estrutura interdepartamental. A ideia do Ministério é basicamente esta: As acções preventivas e de política legislativa geral em matéria de droga devem permanecer no Ministério da Justiça, embora com a colaboração de outros ministérios; as acções de cura dos tóxicos-dependentes só transitoriamente se justifica que permaneçam no Ministério da Justiça. A vocação do Ministério da Justiça não é, obviamente, para este tipo de acções. Elas cabem, de uma maneira mais clara, no Ministério da Saúde e é essa a solução que preconizamos embora, naturalmente, isso ainda leve algum tempo a ser concretizado.
Quanto ao Instituto de Reinserção Social e à Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, já há pouco referi que, efectivamente, há uma parte do trabalho de reinserção social que é feito através da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais. Aliás, também de algum modo, a reinserção social é a parte educativa que é realizada nas prisões. Há pouco não tive ocasião de o mencio-
nar, mas isto tem alguma importância visto abranger hoje cerca de 1200 presos.
Depois, o Sr. Deputado pôs o problema, que é real i e importante, da prisão preventiva. Houve uma crítica, feita pelo Sr. Deputado José Magalhães, no sentido de I eu ter anunciado que íamos tratar do problema e de ainda o não termos feito, mas, na realidade, gostaríamos de apresentar isso juntamente com a alteração do Código Penal e, se tudo correr bem, será em breve que poderemos ter a honra de apresentar à Assembleia da República essa alteração.
Em todo o caso, tem sido feito um esforço no sentido de evitar misturar os reclusos em situação preventiva com aqueles que já se encontram condenados e, em particular, de evitar que os delinquentes primários apareçam misturados com reincidentes, sobretudo quando os delinquentes primários são muito jovens.
Há, inclusivamente, em estudo, medidas legislativas e administrativas que permitem corporizar esta política, visto que, como sabe, a legislação nessa matéria, em relação aos delinquentes que tenham uma imputabilidade diminuída em função da idade, praticamente ainda não teve realização prática.
Depois, o Sr. Deputado referiu-se aos juízos de instrução criminal, acentuando a sua falta. É verdade, e outro dos nós de estrangulamento é a circunstância de haver juízos de instrução criminal com falta de juízes. Portanto, essas medidas urgentes estão a ser estudadas e vão ser implementadas, pelo que, num próximo movimento judicial, um dos aspectos a considerar é, precisamente, a situação de alguns juízos de instrução criminal, onde existem carências mais manifestas dado o volume dos processos com que têm de se defrontar.
O Sr. Deputado também referiu o problema da implantação territorial da Polícia Judiciária. Este tipo de implantação tem dois tipos de problemas: problemas de ordem material e problemas de formação de pessoal, visto que não interessa nada criar delegações da Polícia Judiciária nas diversas terras se elas não puderem ser providas com pessoal competente.
Houve uma expansão súbita da Polícia Judiciária e registaram-se algumas dificuldades, designadamente no Algarve (particularmente em Portimão, mas também em Faro). Este ano vamos instalar uma delegação em Aveiro, mas há uma outra dificuldade material que importa realçar, que é a de que, na actual situação de carência de habitações ou de rendas extremamente elevadas, torna-se muito difícil assegurar a mobilidade do pessoal e, portanto, em Aveiro, um dos problemas que estamos a enfrentar é o da necessidade de encontrar casas para poder instalar o pessoal em termos compatíveis com as suas possibilidades económicas.
O mesmo se passa em Faro e Portimão onde já existe Polícia Judiciária mas onde os quadros vão ser aumentados. Neste momento estamos a seguir uma política de brigadas móveis, mas gostaríamos de fixar efectivos e, de algum modo, a situação não é diferente em Chaves onde também há uma preocupação, por razões ligadas à luta contra o contrabando, de aumentar os efectivos da Polícia Judiciária.
Quanto aos tribunais de polícia, penso que já os referi, bem como a introdução da informatização como uma das técnicas que devem ser utilizadas nesse capítulo.
Também já tive ocasião de dizer que, embora se justifique, em termos de médio prazo, a criação de novos tribunais de trabalho, neste momento ela não será uma
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prioridade de primeira grandeza, porque temos maiores carências, e a nossa preocupação é prover os tribunais de trabalho já criados e, em particular, os tribunais na zona da Grande Lisboa.
No que respeita ao instituto das falências, está a funcionar uma comissão (que é uma subcomissão da Comissão do Projecto Preparatório do Código de Processo Civil) que, justamente, está encarregada de elaborar um projecto em matéria de falências e de instituições conexas.
A Sr.3 Deputada Odete Santos falou-me numa questão pontual em relação a Portalegre. As informações que tenho são as de que o Tribunal de Portalegre foi ontem visitado e de que a situação não é tão dramática como vem referida nessa informação da ANOP ou da ANP — não sei bem. Há alguns problemas, imediatamente resolúveis, que já estão a ser resolvidos, nomeadamente a parte relativa à questão dos arquivos que era o problema mais preocupante, visto que nas antigas celas, (nunca utilizadas), das prisões do Tribunal de Comarca é possível colocar provisoriamente os arquivos, o que permitirá encarar com mais tempo outras medidas que vão igualmente ser tomadas.
V. Ex.a referiu também o problema das comissões de conciliação. Há um projecto que está já a circular, elaborado pelo Ministério do Trabalho no sentido da eliminação dessas ditas comissões.
Em matéria de Código de Processo de Trabalho, estamos também a proceder ao estudo das alterações. De resto, se pudéssemos beneficiar de algumas sugestões que V. Ex.a quisesse fazer muito gostosamente as ponderaríamos.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Ministro, há um projecto que o PCP tem pendente na Assembleia da República sobre o Código de Processo de Trabalho.
O Orador: — Então, já está feito. Mas, infelizmente, isso leva um certo tempo a chegar aos ministérios o que, na verdade, é mau. No entanto, tal não é evidentemente da responsabilidade dos Srs. Deputados.
Depois, V. Ex.a referiu a questão do Centro de Profilaxia da Droga, e quanto a isto já respondi quando abordei esse problema numa resposta a um outro Sr. Deputado que me formulou perguntas.
V. Ex.a referiu seguidamente o problema de saber qual a interpretação do artigo 9." da proposta de lei do Orçamento do Estado. Como V. Ex.a pode ver, o artigo 9.° não se refere ao subsídio de refeição — isso parece-me claro — mas refere-se a remunerações acessórias de modo efectivo, incluindo a expressão «pessoal militar e militarizado e titulares de órgãos de soberania e de cargos equiparados». Ela abrange todas as remunerações acessórias, como também as dos órgãos de soberania. Portanto, parece muito clara a sua interpretação.
Relativamente às diuturnidades não creio que estas sejam renumerações acessórias.
A Sr.3 Odete Santos (PCP): — Penso também que não se classificam desse modo. Mas o dito preceito abrange também as participações emolumentares.
O Orador: — Essas, sim, Sr." Deputada. Pausa.
No respeitante aos vencimentos dos funcionários do registo e notariado a lei consigna que «são compostas por uma parte fixa e por uma parte variável». A parte fixa corresponde ao vencimento de «categoria» e a variável ao vencimento de «exercício».
Será que, efectivamente, com esta definição legal de remunerações acessórias, o referido artigo 9.° abrange esta situação dos conservadores notários e funcionários de justiça? Penso que não, e, como V. Ex.a sabe, não abarca o «vencimento de exercício» e, de resto, creio que no ano passado, a propósito de uma interpretação sobre a aplicação de um imposto, fixou-se uma doutrina sobre tal problemática.
O Sr. Luís Saias (PS): — Sr. Ministro, queria dar uma pequena achega a isso. É que há um decreto-lei que diz o que são as remunerações acessórias e aquelas que escepciona. Neste momento, não me lembro de qual é o decreto-lei em questão nem, enfim, quais aquelas que são consideradas ou não acessórias. Mas há uma, digamos, definição legal sobre as ditas remunerações não em termos gerais, mas para efeitos daquele decreto-lei, e julgo que é esse o entendimento que tem sido seguido...
O Orador: — Há vários diplomas.. .
A Sr.3 Odete Santos (PCP): — Mas o Sr. Secretário de Estado disse que isto dizia respeito às participações emolumentares.
O Orador: — Sr.a Deputada, do meu ponto de vista como jurista, e V. Ex.a também tem formação jurídica, efectivamente assim é.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Ministro, entendo que a interpretação é realmente essa...
O Orador: — Também eu, Sr.3 Deputada.
A Sr.3 Odete Santos (PCP): — ... e, nesse caso, os juízes, os funcionários de justiça estão abrangidos por esta disposição legal.
O Sr. Lino Lima (PCP): — E tem consequência^ gravíssimas!
O Sr. José Magalhães (PCP): — É uma coisa que não sabiam até à data! É um escândalo!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, pedia-lhes o favor de deixarem o Sr. Ministro terminar a sua alocução, porque se não entramos num diálogo cruzado e, desse modo, nem tão-pouco intervém o Sr. Ministro, que estava no uso da palavra, nem chegamos à finalização dos nossos trabalhos.
O Orador: — Quanto ao Sr. Deputado Correia Afonso, subscrevo aquilo que V. Ex.a refere acerca da ideia de que o orçamento do Ministério da Justiça revela insuficiência de verbas face às necessidades, mas isso é uma situação geral.
Depois, confirmo aquilo que há pouco referi, ou seja, o facto de não estar prevista nenhuma verba em matéria de aumento de vencimentos dos magistrados e, portanto, limito-me a repetir aquilo que há pouco tive ocasião de mencionar.
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Estou de acordo, porque isso corresponde efectivamente a uma necessidade, com a proposta de V. Ex.a no sentido da criação de comarcas. Por outro lado, não me cabe a mim, neste momento, discutir aqui se é apropriado ou não, mas neste ponto o âmbito da discussão foi tão vasto que não posso deixar de estranhar que as pessoas façam reparos ao facto de se inscrever a ideia de uma criação de comarcas numa lei orçamental, na medida em que isso tem alguma importância em termos de execução do orçamento e em relação àquelas que referiu. Por outro lado, parece-me também útil esta ideia de autorizar que o imposto de selo seja cobrado sob a forma de taxa, correspondente a um serviço prestado na administração da justiça aparecendo, no entanto, formalmente sob a forma de imposto. Porque é que isto interessa? Ora, penso que uma das medidas importantes em termos de simplificação é a de integrar o código das custas dos tribunais de trabalho no código geral das custas. Isso será acompanhado por medidas que permitam, justamente, não criar situações gravosas em relação àqueles que têm menores rendimentos; não é esse o objectivo que se procura, ou seja, um aumento de gravames para os que recorrem aos tribunais, mas antes uma simplificação e um tratamento uniforme em matéria de custas judiciais, visto que, pela história dos tribunais de trabalho, e pelo facto de estes terem sido situados no Ministério do Trabalho, tinham um tratamento diferente na referida matéria no respeitante ao destino dos seus fundos do que têm as restantes custas dos tribunais comuns e de outros.
O Sr. Deputado João Amaral colocou-me um problema relativo à proposta apresentada pelo Governo Regional da Madeira e que não teria tradução no PIDDAC. Direi que, em primeiro lugar, como os Srs. Deputados sabem, a justiça não é, nos termos da Constituição, regionalizável...
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sem dúvida!
O Orador: — ... e a nossa ideia é a de que aquilo que for compatível com a filosofia e a estrutura geral da reorganização judiciária, cujos estudos estamos a ultimar, e aquilo que naturalmente for compatível também com as disponibilidades financeiras do Ministério da Justiça, será integrado dentro dessa reorganização.
Não nos parece útil que haja uma lei autónoma sobre a organização judiciária regional e suponho que, aliás, não era essa a intenção, sendo antes mais uma contribuição, apontando a especificidade de certos aspectos da organização judiciária em função da Madeira do que outra coisa. No entanto, a proposta de lei foi enviada à Assembleia da República.
Em todo o caso, a posição do Ministério da Justiça é essa. Nós vamos tomar, naturalmente, em consideração esse aspecto e integrá-lo dentro da lei da organização judiciária, que estamos a ultimar.
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro já terminou?
O Orador: — Sim, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Estão ainda inscritos os Srs. Deputados Lino Lima, José Manuel Mendes e José Magalhães. Tem a palavra o Sr. Deputado Lino Lima.
O Sr. Lino Lima (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados: Vou formular umas ligeiras perguntas ao Sr. Ministro e agradecia que não tomassem a mal o facto de me ausentar logo que o Sr. Ministro me respondesse, visto que, por razões de saúde, não devo deitar-me muito tarde. Por outro lado, penso que a minha presença não será tão necessária para abrilhantar o acto a pontos de colocar em perigo a minha saúde.
Em princípio, subscrevo inteiramente aquilo que um meu camarada já aqui disse, relativamente ao problema da integração das receitas dos cofres no orçamento. Mas compreendo a preocupação que o falar disso causa a muita gente, nomeadamente a nível dos tribunais e dos respectivos serviços, conservatórias e notariados porque, como a justiça é sempre tratada em Portugal de uma maneira tão subalterna em todos os aspectos e, designadamente, no respeitante às receitas e ao orçamento, as pessoas ligadas ao Ministério da Justiça, aos tribunais e às respectivas repartições vêem nesta existência autónoma dos cofres uma salvaguarda para que o Ministério possa fazer algumas coisas que, de outra forma, se o dinheiro caísse nas receitas gerais do orçamento nunca conseguiria, se calhar, que se fizesse. Enfim, é uma situação que vem já muito detrás e tem essa tradição.
Talvez isso seja razoável enquanto — e era isto que queria dizer — não se passe a considerar o sector da justiça e o Ministério da Justiça como uma das áreas mais importantes do Orçamento do Estado; para além de se falar deve actuar-se, por forma a compreender--se que na administração da justiça reside em grande parte a defesa do regime democrático. A propósito disto, perguntava desde já ao Sr. Ministro o seguinte: quais têm sido os critérios para a abertura de novas delegações, integradas na nova implantação territorial, da Polícia Judiciária? Formulo esta questão porque já tenho ouvido dizer — e não sei se essas pessoas têm ou não razão — que se está a fazer uma implantação territorial indiscriminada da Polícia Judiciária, visto que existem já delegações em Faro, Évora, Lisboa, Coimbra e no Porto e que isso seria, porventura, suficiente para a cobertura do País. Não sei se sim, se não; gostaria que me dissesse quais têm sido os critérios que levam a essa implantação territorial e aproveitava a oportunidade para lhe pedir que discriminasse melhor as verbas dos departamentos, nomeadamente dos departamentos centrais da Polícia Judiciária.
Nós não temos grande possibilidade de discutir o orçamento da Polícia Judiciária, visto que não temos elementos concretos quanto ao modo como se distribuem as verbas pelos diferentes departamentos.
Para além disso, gostaria de lhe perguntar o seguinte: O que é que o Sr. Ministro nos pode dizer sobre a formação dos agentes da Polícia Judiciária? Como é que os agentes da referida Polícia estão a ser formados? Quem é que os forma? Qual é a filosofia que os informa?
Na verdade, com demasiada frequência lemos nos jornais sucederem-se casos em que agentes de polícia, e infelizmente não só esses, puxam de armas com uma facilidade enorme, e mais do que puxar atiram, e mais do que atirar matam. Assim, como é que se está a cuidar da formação dos agentes da Polícia Judiciária?
Finalmente, Sr. Ministro, queria dizer-lhe, apesar de não invocar nenhuma razão especial, mas talvez compreenda por que é que vou abordar tal aspecto, que
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a sua intervenção de há dias na televisão me pareceu nada favorável ao prestígio da magistratura em Portugal. Por outro lado, ela ocorreu exactamente no momento em que a magistratura portuguesa está sujeita a uma forte pressão, como seja, desde aparecerem jornais no estrangeiro a dizer que os nossos juízes não são honestos, até à ideia que se generalizou no País de que «os processos não andam porque os juízes não trabalham». Portanto, há uma necessidade imperiosa de desagravar os nossos magistrados, prestigiá-los para que a opinião pública tenha confiança nos magistrados que tem para julgar os seus problemas, as suas questões.
Ora, dentro deste ponto de vista, que é o meu — porventura não será o seu, paciência! —, creio que a sua intervenção na televisão não veio nada favorecer esta política de prestígio da magistratura. Penso que esta é sempre absolutamente necessária, sempre seria e muito mais neste momento. Julgo que V. Ex.a naturalmente já sabe que, na generalidade, os magistrados se sentiram muito vexados com a sua intervenção e, para além do mais, penso também que isso não ajuda a resolver em nada os problemas que afligem a nossa magistratura e antes, pelo contrário, os complica.
E claro que há quem diga que o Sr. Ministro não dirigia tais acusações aos magistrados, mas estava muito mais preocupado com aqueles que querem «endireitar o Direito». Não sei se é isto, mas a verdade é que para a opinião pública o que se passou foi que o Sr. Ministro quis dar uma reprimenda indirecta aos juízes, chamando-lhes a atenção para aquilo que devem fazer e até para a circunstância de que já ganham muito bem e de que não necessitam de ganhar mais.
V. Ex.a não deve tomar a mal isto que estou a dizer--lhe. Não estou a afirmar-lhe isto com acrimonia nenhuma, e talvez até compreenda, sem que eu as tenha de invocar, as razões por que lhe digo isto. Testemunho-lhe isto de uma maneira sincera. Além disso, tenho quase 70 anos e, por conseguinte, posso até, às vezes, dizer umas coisas destas.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro da Justiça: — Sr. Deputado, não levo nada a mal o que V. Ex.a acabou de proferir. Obviamente não estou de acordo consigo, mas isso não significa que me sinta agastado, pois acho que tem todo o direito de sentir e exprimir as suas opiniões.
O meu objectivo não foi o de agravar os juízes e penso que tal não aconteceu. Enfim, isto são questões de opinião e, como tal, não valerá a pena estarmos a discutir esse ponto. Registo, entretanto, obviamente, que esta minha intervenção televisiva mereceu muita atenção ao PCP.
Quanto ao problema que me colocou relativamente à Polícia Judiciária, devo dizer que o critério é este: há um estudo de desenvolvimento da implantação territorial da Polícia Judiciária que atende, essencialmente, à densidade da criminalidade e aos tipos de criminalidade que se estão a desenvolver nas diversas regiões. Esse estudo assenta em dados estatísticos e na interpretação dos mesmos, sendo constantemente actualizado, e é com base nisso que se têm feito os desenvolvimentos da Polícia Judiciária. Porventura, haverá uma instalação que é um pouco mais discutível neste momento, visto que há outras, eventualmente, que poderiam ter sido consideradas prioritárias. Mas isso não foi do meu tempo.
Neste momento, aquilo que está a ser feito obedece rigorosamente a esse critério, apesar de, naturalmente, haver uma grande pressão das populações para que a Polícia Judiciária se estenda o mais rapidamente possível a todo o território. Infelizmente, há limitações de verbas e de formação de pessoal que o impedem, como há pouco tive ocasião de referir.
Neste momento, também, a próxima delegação da Polícia Judiciária será a de Aveiro, que já tem instalações preparadas e que entrará em funcionamento ainda este ano. Aveiro vai permitir fazer a ligação de Coimbra e do Porto, o que é algo extremamente importante numa zona muito populosa e urbanizada.
Quanto à questão da formação de agentes, não tenho dado conta de que tenha havido graves incidentes com agentes da Polícia Judiciária, a não ser que se refira a alguns agentes que foram feridos em algumas operações recentes, o que é precisamente o invés.
Seja como for, como V. Ex.a sabe, há um princípio fundamental em matéria policial que é ensinado a todos os polícias, designadamente aos agentes da Polícia Judiciária, que é o princípio da proporcionalidade. Esse princípio é ensinado não só nos seus aspectos teóricos, mas também nos seus aspectos práticos.
Como digo, a experiência recente, em matéria de judiciária, não me leva a pensar que tenha havido quaisquer casos clamorosos nesse capítulo.
De qualquer forma, a formação dos agentes da Polícia Judiciária é realizada numa Escola da Polícia Judiciária, sita em Loures, que já tive oportunidade de visitar duas vezes. Funciona em termos que me parecem extremamente correctos e procura dar uma formação que inclui a preocupação pelos direitos fundamentais dos investigados e dos arguidos.
É isto que lhe posso dizer.
O Sr. Presidente: — Estão inscritos para usarem da palavra os Srs. Deputados José Manuel Mendes, José Magalhães, António Costa e Odete Santos.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — O Sr. Ministro da Justiça- deu-me, no estilo hirto que lhe é próprio, como facilmente se constatará, uma resposta insuficientíssima às questões que lhe coloquei.
Em matéria de tribunais, disse-me que, relativamente a Braga, «estão a iniciar-se esforços» e que, relativamente a Paredes, está a principiar-se a construção; referiu os casos de Gaia, de Caminha ...
O Sr. Sr. Ministro da Justiça: — Desculpe, mas, relativamente a Paredes, não está a iniciar-se, mas sim já em vias de conclusão.
O Orador: — Certo, Paredes já está em vias de conclusão, Caminha idem, Resende está a ser construído, foi adjudicada a obra para Estarreja. Mas a verdade é que tive oportunidade de proceder a um elenco quase exaustivo. E digo quase pela razão de que, apesar dos estudos a que o PCP procedeu, municiando-se para este debate, me ocorreu há instantes uma situação gravíssima que não referi: a de Anadia.
Penso que ainda estou a tempo de lhe perguntar o que é que se passa, quanto a acções palpáveis, rela-
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tivamente a Anadia, onde se atinge hoje uma degradação que dificilmente poderá tolerar-se por mais tempo, e o que é que se passa também no tocante a quadros preocupantes como os da Marinha Grande e Torres Vedras.
Por outro lado, referi que a verba do PIDDAC de 1985, destinada à construção, aquisição e remodelação dos tribunais, era da ordem dos 555 606 contos e que esta verba estava hipotecada a ónus que vêm do Orçamento do Estado de 1984. O Sr. Ministro disse-me que esta verba está totalmente disponível.
Permitir-me-á que lhe diga que não estou absolutamente nada satisfeito com a resposta, porque não foi provada.
E sabe porquê? Porque, no texto do PIDDAC que nos enviou, diz-se, em nota à página que se segue à referência «Secretaria-Geral», aquilo que vou ler, sem, como é evidente, adulterar absolutamente nada: «Este programa, em que se admite um encargo no valor de 700 000 contos, poderá vir a ser corrigido em razão das obras em curso não liquidadads pela gerência de 1984.» Uma das perguntas a que não deu resposta foi exactamente esta: quais são essas obras em curso não liquidadas pela gerência de 1984?
No mesmo texto, diz-se, entre aspas, o seguinte: «saldos a apurar nos inícios de 1985 e ainda pela evolução das receitas e das despesas deste Gabinete de Gestão Financeira no novo ano. Nesta altura existem já pedidos de cabimento no valor de cerca de 329 100 contos para tribunais e de 22 700 contos para serviços de registo e notariado, valores estes a confirmar pelas fichas de projectos que ainda não constam do dossier.» Este documento vem assinado por um Sr. Director-Geral e datado de 21 de Dezembro de 1984.
Suponho que, a menos que dê uma explicação mais exigente, menos perfunctória, bastante, não pode entender-se que a verba que o Sr. Ministro diz ser disponível seja realmente uma verba disponível. A menos que isto não queira dizer o que diz ou que se queira que isto diga o que não diz.
Essa é uma questão sobre a qual importa imenso ouvi-lo dentro de instantes.
Por outro lado, relativamente às questões da Direcção-Geral dos Serviços Prisionais, o Sr. Ministro fez o favor de adiantar que eu não tinha referido o diploma legal, que é o novo Estatuto dos Guardas e Funcionários Prisionais. Não é verdade. Só, de certa maneira, não chamei o «criaturo» pelo nome. Mas posso chamar: é o Decreto-Lei n.° 399-D/84, de 28 de Dezembro.
Foi exactamente a concretização do seu artigo 36.° aquele que questionei, porque esse artigo é que contém, como de resto bem sabe, o conjunto das vagas a preencher. Lá se diz «durante o primeiro ano de vigência». Portanto, não faz sentido vir responder que é para uma aplicação faseada no tempo. Faseada no tempo, mas durante 1 ano, que é o que aqui se prevê. O artigo refere que «podem ser preenchidos os lugares do quadro» e, mais à frente, «até 22 lugares de chefe de guardas, até 22 lugares de subchefe de guardas ajudantes, até 60 lugares de primeiro-subchefe de guardas, até 80 lugares de segundo-subchefe de guardas, até 200 lugares de guarda de primeira classe, até 1600 lugares de guarda».
A pergunta que formulei e à qual não obtive resposta foi a seguinte: com que verbas vai este pro-
grama ser levado a bom termo? Penso que é fundamental que nos diga alguma coisa sobre isto. Qual é a cobertura orçamental para o que está estabelecido neste artigo 36.°?
É claro que nos debatemos sempre no Ministério da Justiça com uma questão um pouco surrealista, sem que nisto vá qualquer ofensa ao dito movimento estético e literário, que é a de que há sempre mais verbas, vindas não se sabe muito bem de onde, umas vezes da Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional — já lá vou, no que toca à resso-cialização e à formação profissional —, outras vezes vindas não se sabe de que Secretaria de Estado. Parece é que não vêm muitas da Secretaria de Estado do Orçamento — e seria bem necessário que desta Secretaria houvesse reforço em algumas áreas. Mas a Secretaria de Estado do Orçamento tem, de facto, a «técnica da tesoura», que é conhecida e nefasta.
Quanto à questão da ressocialização e formação profissional de reclusos, o Sr. Ministro fez algumas elucubrações sobre o tema, mas não contestou — e eis o que é o cerne de todo o problema — que, em 8400 presos, apenas 300, ou seja, uma fatia exiguís-sima, quase irrelevante, são abrangidos pelo programa.
Disse-me que há verbas que vêm da Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional, que essas verbas completam aquilo que está aqui previsto e que o conjunto de todo este dinheiro chegará para levar a cabo o projecto montado. Mas a questão é outra: é saber se há alguma ressocialização, alguma formação profissional e, já agora, alguma reinserção social dignas desses nomes com os números que citei e que o Sr. Ministro não contestou, pela simples e óbvia razão de que também não está aqui para adulterar os factos e sabe que estes são os números verdadeiros, não contestáveis, que, na sua expressão crua e nua, são altamente preocupantes e põem em causa todo o perfil de uma certa planificação da justiça e, até, de um seu certo entendimento ao nível do Ministério a que preside.
Finalmente, é óbvio, como calculará, que muitas questões ficam por abordar. Mas eu disse, e mantenho, que os esforços de formação dos guardas prisionais não são significativos. E quando digo que nenhum esforço tem sido feito, quero dizer, concretamente, nenhum esforço significativo, pois não ignoro, como qualquer pessoa que debate estes problemas, o que tem sido feito.
Só que isso não é muito atendível e o.que se está a passar nas cadeias não pode ser escamoteado. O Sr. Ministro da Justiça sabe que o que se está a passar, neste momento, nos estabelecimentos prisionais é de uma extrema gravidade e que a formação dos guardas prisionais deixa imenso a desejar.
A subcomissão existente nesta Assembleia, no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tem podido visitar as cadeias, contactar com a realidade in toco, ouvir os presos, ouvir todas as partes, extrair ilações, e, com certeza, sabe que aquilo que eu estou a dizer não foge um milímetro ao rigor de uma análise que não seja apaixonada mas atenta e transformacionista, porque estas coisas têm de ser mudadas.
Apenas uma última nota, uma vez que, como disse há pouco, há problemas infindos que não podem ser tratados. Há momentos esqueci-me de referi-la e, todavia, é importante a questão que se prende com
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os quantitativos para o reapetrechamento e a actualização das bibliotecas dos tribunais. Nas visitas que tenho feito aos tribunais enquanto deputado, e, nos tempos em que andei, quotidianamente, pelos tribunais, enquanto advogado, pude ouvir lamúrias muito justas por parte de magistrados judiciais, de magistrados do Ministério Público e de outros trabalhadores da justiça, no sentido da ridicularia das verbas destinadas ao fornecimento das bibliotecas.
Penso que é altura de, a par dos projectos de informatização, se pensar na necessidade de adequar, convenientemente, os tribunais, com matérias de ordem técnica e de ordem formativa geral. Nesse sentido, atempadamente, faremos chegar à Mesa uma proposta que, suponho eu, não deixará de merecer o aplauso do Sr. Ministro, pelo menos da mesma forma expedita com que o fez em relação às questões colocadas pelo Sr. Deputado Correia Afonso, que pede, neste momento, para me interromper.
Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Correia Afonso (PSD): — Muito obrigado pela permissão, Sr. Deputado.
Pegava no assunto que neste momento está a tratar para lhe dizer que na subcomissão que está neste momento debruçada sobre o Estatuto do Magistrado Judicial já foi aprovado o artigo que prevê a distribuição, não só do Boletim do Ministério da Justiça — como acontece agora — mas também das l.a série, 2.a série e 3.a série, salvo erro, do Diário da República, do Diário da Assembleia da República e do Boletim do Trabalho e Emprego.
Acho que, efectivamente, já é um passo positivo muito largo no sentido que acabou agora de referir.
O Orador: — Sr. Deputado Correia Afonso, agradeço-lhe a pertinente informação que trouxe. Suponho que, de resto, a proposta foi do PCP e da UEDS.
Tivemos, de qualquer maneira, algum empenho originário nisso e houve o apoio dos deputados da subcomissão. Creio que é um passo que não pode substimar-se, mas mantenho as questões que coloquei ao Sr. Ministro, uma vez que julgo ser ainda pouco e impor-se fazer algumas coisas mais.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado já terminou?
O Sr. José Manuel Mendes (PCP): — Sr. Presidente, se quiser posso continuar. Tinha muitas mais questões a formular, mas já me tinha proposto terminar agora.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães que, estou certo, vai fazer também um esforço de síntese para apresentação das múltiplas questões que quer apresentar ainda.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Vou sim, Sr. Presidente.
Creio que este debate, apesar de travado nestas condições — que não serão, realmente, óptimas — tem sido esclarecedor. As respostas não são dispiciendas, e, designadamente, na parte em que procuram aclarar as questões suscitadas, e até noutras questões deduzidas autonomamente pelo Sr. Ministro, podem constituir um contributo útil para que este desastroso orçamento seja bem percebido no seu alcance, até porque
ele é nebuloso em certos aspectos. Isto viu-se, claramente, a propósito da famosa, e que há-de ser mais famosa ainda, questão das remunerações acessórias — a persistirem naquela redacção do artigo 9.° — e, pode ver-se, a propósito de outras questões não menos importantes, situadas noutras esferas.
Creio que o retrato que se desgarra disto, e de que este debate é expressão e cena, é realmente preocupante! Os serviços do Ministério da Justiça vão gerindo, passo a passo, a penúria, encalhando, aqui, ali e acolá. A Secretaria de Estado do Orçamento vai retendo diplomas, vai exigindo verificações, vai fazendo aquilo que supõe que lhe cabe e o que não sabe se lhe caberá. A situação dos tribunais vai-se degradando simultaneamente em progressão geométrica — e isso é inegável. Dizê-lo não é fazer um quadro apocalíptico: é emitir um juízo, de facto, objectivo. Por outro lado, verifica-se que o Ministério tropeça nas reformas. Sobre este aspecto o Sr. Ministro referiu pouco, e eu terei de lhe dizer que se trata de um debate orçamental, mas não é excessivamente pertinente omitir esses aspectos porque o debate orçamental é, afinal de contas, o grande momento do ano para fazer os balanços de tudo. Ora o Ministério tropeça nas reformas grandes, pequenas e médias — é um facto inegável!
A própria reforma dos tribunais administrativos e fiscais foi entregue no último dia do prazo, com a comissão apresentando o texto. E foi graças a isso, e com uma certa tolerância em relação à interpretação da Constituição quanto a prazos, que o diploma veio para o Diário da República nas condições em que se sabe. Depois aguardou-se durante meses a regulamentação, e ainda não está aí, vai estar — acabámos de o saber agora.
Enquanto isso se verificava, o Sr. Ministro da Justiça, usando de uma faculdade que, aliás, é dúbio que tenha, mas que estava prevista, a título transitório, na Lei Orgânica dos Tribunais Administrativos e Fiscais — foi fazendo nomeações para o Supremo Tribunal Administrativo, antecipando-se à gestão a fazer pelo futuro Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais.
Isto também não é bom do ponto de vista da sanidade da justiça, mas o certo é que as reformas grandes marcam passo e as pequenas também. Nem a questão da entidade competente para receber recursos dos tribunais administrativos foi resolvida, e nós estamos pensando bem se não será de colocar a questão na Assembleia da República com carácter de urgência, porque, realmente, constatou-se que a medida de 1977, que, enfim, seria benfazeja, tendente a fazer com que a entidade administrativa reconsiderasse e repensasse face ao recurso, está nos antípodas disto quanto aos seus efeitos e entidades administrativas catrafiam os recursos pura e simplesmente. Há situações de gravíssima ilegalidade. E isto, que seria uma questão de resolução simples se houvesse vontade política e impulso de combate à ilegalidade, não é resolvido!
Realmente, não há orçamento nenhum do mundo, não há milhão nenhum que dê vontade política a quem não a tem nesta esfera. Mas o que sucede nesta esfera sucede também em relação a outras reformas muito mais complexas.
É, realmente, surrealista, sem ofensa — como gostaria de dizer o meu camarada José Manuel Mendes —, que a questão processual penal esteja no estado em que está.
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O nível de gravidade atingido pela situação, neste domínio, é intolerável. É uma disfunção doentia. O sistema não pode funcionar. Não há sistema nenhum que se aguente, nem magistratura nenhuma que, sozinha, tenha arcaboiço para aguentar um sistema com taras e disfunções como este.
O Código Penal é em larga medida letra morta e «bons desejos» do legislador — é a componente onírica do Código Penal. Mas se é em certos aspectos, gratuito (por culpa do Governo) e desprovido de qualquer significado, é noutra parte perigoso porque tem conceitos de malha perfeitamente larga e esta dependente do muito bom senso dos aplicadores. Por outro lado, carece de medidas estruturais — as tais famosas medidas estruturais, caras a uma certa metalinguagem partidária— que não aparecem...
Entretanto, a informática, serve de alívio, enfim, um pouquinho em circuito fechado e de perigo numa outra parte, na medida em que o Ministério, sob gestão do Ministro, vem generalizando o uso da informática em sectores em que seria suposto um certo controle dos cidadãos, e ele não existe, inclusivamente em relação a informações sensíveis.
Há aqui uma progressão, há uma cadência assinalável envolvendo volumes e verbas muito significativas, algumas das quais nós não conhecemos — e não constam discriminadas porque estão naqueles magníficos «sacos azuis» dos cofres, que dão para comprar suportes informáticos diversos, softwares dos mais abraca-dabrantes, maquinetas das mais sofisticadas. O seu Ministério não tem, realmente, plano informático — há-de tê-lo, ou estará em estudo segundo os elementos que nos foram facultados. Em todo o caso, essa progressão dos meios não é acompanhada dos correspondentes instrumentos de garantia dos direitos dos cidadãos.
Portanto, Sr. Ministro, não tem razão em relação à observação que fez de que nós teríamos decaído, nessa parte, da crítica ao Governo.
Ao dizermos que as verbas serão exíguas, mas que a questão essencial não é financeira, não decaímos, Sr. Ministro, em coisa nenhuma! É um juízo normal e é aquilo que se depreende, olhando para a política do Ministério, não fazendo financeirismo, que é a pior forma de não apreender a realidade em toda a sua dimensão. Creio, portanto, que não têm fundamento as observações que nesse ponto deduziu. Neste momento, a justiça é objecto de larga análise. Sentada à volta da mesma mesa, gente que tem posições extremamente diferentes quanto ao futuro do Governo —questão aliás misteriosa—, e quanto à questão da evolução de outras componentes da vida política portuguesa, não tem em relação à questão da justiça —como nós, da nossa parte não temos, de forma alguma—, qualquer pejo em pôr em cima da mesa os indicadores. E esta é a primeira dificuldade, porque o Ministério raramente os faculta em condições adequadas. E procura-se reflectir sobre as saídas, sobre os tais estrangulamentos, sobre os pontos de ruptura ou de bloqueamento.
A verdade é que a justiça sossobra, e a representação social da justiça se degrada.
O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado dá-me licença que o interrompa?
Eu não sei se vai ainda continuar a sua intervenção por mais tempo, ou só por escassos minutos, mas eu queria lembrar o seguinte: A Comissão de Economia
tem estado a funcionar sem aplicar quaisquer limites de intervenção, a quem quer que seja! E tem-no feito numa tentativa de possibilitar a maior e mais larga atitude de esclarecimentos, por parte dos Srs. Deputados, relativamente aos membros do Governo. Acontece que esta Comissão de Economia vai ter de reunir amanhã às 10 horas.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Nós também, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: — Pois, naturalmente.
Gostaria que, mais uma vez, se tivesse em linha de conta que não seria hoje à 1 hora e 20 minutos da manhã que tivéssemos de fazer qualquer apelo à limitação de intervenções —em termos de tempo, obviamente —, porque, de facto, não creio que não seja possível haver um certo método na colocação das questões, sintetizando e sistematizando, rumo a um esforço, reconhecido, de ganho de tempo.
Tem a palavra o Sr. Deputado, a quem peço desculpa pela intervenção que acabei de fazer.
O Sr. José Magalhães (PCP): — De maneira nenhuma, S. Presidente! Aliás, da nossa parte, aceitamos discutir neste quadro, um pouco anómalo, o orçamento do Ministério, que bem justificaria mais tempo e outras condições. Temos procurado limitar ao estritamente essencial as observações.
Em todo o caso, a matéria é bastante complexa, como poderá aperceber-se, e a argumentação deduzida merece, apesar de tudo, alguma consideração. A isso me dedicaria rapidamente.
Creio que é um erro grave de apreciação dizer que, face à actual situação, os protestos, vêm só da parte do PCP! Creio que haveria algumas pessoas que desejariam que assim fosse. Tal não acontece, no entanto! Qualquer olhar isento sobre a forma como os tribunais estão a funcionar, permitirá compreender rapidamente, que é a sua própria situação que segrega e engendra todos os dias tal protesto e não aceitação. Por outro lado, o Ministério ajuda bastante porque a verdade é que não existia precedente de um ministro que fizesse deduções e retenções da fonte, que quebrasse negociações, que interrompesse esquemas, que negasse um certo tipo de coisas — as quais eram tidas um pouco como estabelecidas —, que criasse um mal-estar e mau ambiente que já toca os próprios conselheiros aposentados do Supremo Tribunal de Justiça, e que não sei se considera filiação no PCP, ou em situação similar.
Dizer que qualquer pessoa que não concorda com a política do Ministro é do PCP, é algo que se filia em concepções definitivamente proscritas no nosso sistema democrático, e que além do mais, não diminuem ou não atenuam um milímetro, a situação do Ministério que é, realmente, péssima. E digo péssima na medida em que penso que se vive, para lá de uma situação de ausência de acções desbloqueadoras e de uma falta de um plano de ataque à crise —com sérias mistificações sobre as responsabilidades pela mesma—, numa confusão indescritível. Uma certa sensação de «à deriva»... Disso é exemplo o que o Sr. Ministro há pouco referia das taxas moderadoras, questão que foi suscitada numa intervenção pública por um membro do seu Ministério e foi transmitida à Assembleia da República, capeando a resposta ao requerimento
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n.° 95/III/2 do PCP. É, portanto, um documento oficial. A questão que nós colocamos é a seguinte: quando recebemos um documento do Ministério da Justiça, que significado lhe devemos atribuir? É, na verdade, difícil classificá-los! Seria, aliás, melhor que passassem a vir classificados, como «documento credível», os «documento incredível», «documento inexistente», ou qualquer coisa semelhante! Qualquer classificação clara nos serviria...
Por outro lado, as dificuldades quanto a saber o que é que o Ministério está ou não a querer, são, igualmente, enormes: não se sabe nada sobre o funcionamento das comissões, cada membro opina o que entende, não há, verdadeiramente, qualquer articulação.
Além disso, a acção do Governo na apresentação de propostas de leis é perfeitamente desconexa nesta matéria! Ora apresenta subitamente propostas que não têm nada a ver com o rumo dos trabalhos de reforma do quadro do processo penal —como no caso da segurança interna —, ora muda de agulha quanto ao mo-dus agendi! É realmente espantoso, por exemplo, que se venha propor a criação avulsa de comarcas na lei orçamental! A lei orçamental portuguesa — como o Sr. Presidente Almerindo Marques sabe perfeitamente, do debate da Lei de Enquadramento —, é uma lei um pouco limitada e heterogénea que permite os chevaiiers budgétaires e que não passa de uma grande mistura, embora, reconheça-se, ela seja um passo em frente, em relação ao modelo do regime anterior à revisão constitucional.
Em todo o caso, não se pode levar demasiado longe os tais chevaiiers budgétaires ao ponto de transformar a lei do orçamento numa lei de organização judiciária, que o Ministro da Justiça não é capaz de produzir perante a Assembleia, e que é urgente! É também difícil conceber como é que se pode, avulsamente, e sem qualquer projecção, vir subitamente propor, aquilo que foi proposto pela bancada do PSD, não sei em que termos, com que fundamentos e com que quadros. Por outro lado, é difícil articular aquilo que é proposto por cada um dos partidos da coligação, uma vez que um faz o que faz no Ministério da Justiça e o outro — na tal óptica de «endireitar o Direito» —, propõe-se combater o «perfeccionismo bacoco», o «entorpecimento burocrático», o «debilitamento e desalinhamento ético», a «inflação legislativa» e a «impropriedade de linguagem», que são algumas das características da acção legislativa do Ministério, na actual situação portuguesa. ..
Neste quadro, eu devo dizer, Sr. Ministro, que é impossível com qualquer orçamento levar a cabo a tal acção decidida, de «ataque» e prevenção das causas da crise. No entanto é pelo menos possível, dizia alguém aqui há dias para audição atenta dos deputados, não piorar! E não piorar significa não avançar em certo tipo de direcções, ou não fazer estagnações que coloquem o sistema à beira de situações de ruptura como aquela em que estamos. Nesse sentido, creio que as observações que o Sr. Ministro fez confirmam as piores apreensões!
Com isto dou por terminada a minha intervenção, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Queria apenas informar o Sr. Deputado que a Lei de Enquadramento é do conhecimento de todos os Srs. Deputados.
Deseja usar da palavra, Sr. Deputado Correia Afonso?
O Sr. Correia Sfonso (PSD): — Eu pedia ao Sr. Presidente que me permitisse apenas dar um esclarecimento ao Sr. Deputado José Magalhães, relativamente à referência que fez à proposta que eu apresentei há pouco.
O artigo 18.°, n.° 3, da lei do orçamento diz que nenhuma despesa pode ainda ser efectuada sem que, para lá de satisfazer os requisitos referidos no número anterior, tenha sido previamente justificada quanto à sua eficácia, eficiência e pertinência.
A proposta que foi apresentada — e eu sei que a parte a que o Sr. Deputado se refere é fundamentalmente ao artigo indicado em primeiro lugar —, refere--se à criação de mais um juízo em cada um dos tribunais oficiais das comarcas de Chaves, Fafe e vila da Feira. Isto está, no fundo, dentro da letra e do espírito deste n.° 3.
De qualquer forma, se o Sr. Deputado se socorrer ao artigo 14.°, n.° 3, verificará que as restantes matérias — excluindo as que estão no n.° 2 —, são votadas na especialidade pela Comissão de Economia, Finanças e Plano, reunida em sessão pública, que deve ser integralmente registada e publicada no Diário da Assembleia da República. Portanto, a proposta tem cabimento na sua apresentação. O Sr. Deputado, só poderá rejeitá-la na altura da votação, se fizer parte da Comissão de Economia. Isto, porque uma coisa é votar, outra é apresentar. Neste momento, da sua apresentação, ela cabe na lei orçamental.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, atendendo, entre várias razões, ao seguimento do debate que se estava a fazer, gostaria de encerrar esta questão, tanto mais que a Mesa aceitou a proposta, tendo esta entrado na Mesa e sido distribuída pelos Srs. Deputados.
Se todos tivessem neste entendimento, passaria agora a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães que deseja intervir novamente.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Sr. Presidente creio não ser abusivo — e que pelo contrário poderá ser relevante —, que sobre esta matéria nos possamos pronunciar.
Entretanto, como estava inscrito o Sr. Deputado António Costa, não creio ter o direito de o fazer — salvo sob forma de contraprotesto e eu creio que tal extremo talvez não se justifique.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, creio que quebraremos muito mais o debate se voltarmos a este tema. Portanto, que, sem prejuízo para os Srs. Deputados inscritos — a quem peço desculpa por este atropelo na sequência do debate —, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Certamente!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro, Sr. Deputado Correia Afonso: É perfeitamente óbvio que é possível colocar na lei do orçamento aquilo que ocorra. Isto é, uma vez que a Lei de Enquadramento não estabelece uma noção pura do Orçamento como aglomerado de despesas e receitas — excluindo autorizações legislativas, reformas legislativas, medidas fiscais avulsas e outras coisas do género —, é evidente que há uma margem para introduzir no Orçamento dis-
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posições avulsas! O Governo, introduziu, por exemplo, o famigerado artigo 10.°, e o artigo 9.° — o artigo 10.° que como disse aqui ontem ou anteontem um Sr. Secretário de Estado tinha sido um lapso dáctilo-gráfico ou uma coisa desse género.
Portanto, o Sr. Deputado Correia Afonso poderá introduzir no Orçamento o que, virtualmente, quiser. Quero dizer, «nada» impediria ao Sr. Deputado Correia Afonso de conceder ao Governo — salvo a Constituição que é um pequeno pormenor —, uma autorização legislativa para rever o Código de Processo Penal, uma autorização legislativa para rever o Código de Processo das Contribuições e Impostos, ou o Contencioso Aduaneiro, ou o Código de Notariado, ou o Código de Registo Predial, ou para criar 16 comarcas extinguindo 44, ou para reformular inteiramente a organização judiciária, ou para extinguir o Ministério da Justiça — isto não o poderia fazer dado que é da competência exclusiva do Governo —, ou quiçá para fazer qualquer outra coisa visando uma qualquer reforma legislativa.
O que me parece deveras bizarro é que seja em sede orçamental que se venha propor novos juízos — uma das medidas que poderão revestir-se de carácter urgente, do mesmo modo que é urgente que o Governo crie de pedra e cal os juízos que estão criados na lei! Idem quanto a conservatórias do registo, que estão criadas na lei mas não estão criadas de «pedra e cal». O que me parece surpreendente é que um partido de Governo — que se supunha, tivesse um mínimo de articulação e, digamos, uma perspectivação mínima de como estas coisas se fazem —, venha propor avulsamente, a criação de mais um juízo em uma, duas, três comarcas, quando eu creio que poderíamos aqui, à puridade e com o contributo que estão à volta desta Mesa, chegar rapidamente à conclusão de que aquilo que legitima a criação de mais um juízo nestas comarcas, legitimaria a criação de mais um juízo em muitas e muitas outras. E o que me surge ainda como deveras bizarro, é que se sinta necessidade de fazer isto em relação a estas comarcas e não se sinta necessidade de considerar global e complexivamente a questão das mesmas, para se ver que medidas é que é necessário tomar com carácter urgente. Isto para além da questão muito mais funda da reorganização do território a qual pode supor medidas que não passam por nada disto, antes podem passar por coisas muito diferentes e que o Ministério tem — em certos trabalhos preparatórios de circulação pública —, aventado, devo dizer que não sei com que grau de responsabilidade! Pelos vistos, sem grande impacte junto da bancada do PSD...
Portanto, Sr. Deputado Correia Afonso, não coloque a questão em termos estritos de legalidade. Vista nesse sentido, a questão que eu coloquei foi sobretudo de política! Finalmente, Sr. Presidente, o artigo que foi citado da Lei de Enquadramento, quanto à pertinência e cabimento, é totalmente inaplicável, já que não visa o que o Sr. Deputado julga. O que ele visa é o controle das despesas, uma vez aprovado o Orçamento do Estado, no que diz respeito à execução pelos diversos Ministérios. Foi esse o sentido, com que foi aprovado e é isso que decorre da sua leitura, no contexto adequado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António da Costa.
O Sr. António da Costa (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro da Justiça: Queria apenas introduzir uma nota regional neste debate que, penso, não destoará, até no seguimento do que já fez o Sr. Deputado Vilhena de Carvalho. Mas antes queria dizer que saúdo, com uma certa satisfação, a vontade do Ministério de actualizar as listas de antiguidade dos conservadores, notários e funcionários de justiça que, com a causa que V. Ex.a bem compreende, traz algumas dificuldades graves à classe.
Queria também, assim de relance, dizer que, não tenho, efectivamente, a mesma interpretação do Sr. Ministro quanto às remunerações acessórias dos conservadores e notários. Penso que poderiam estar incluídos no artigo 9.° da lei orçamental pela simples razão de que as remunerações acessórias não funcionam — no caso dos conservadores, notários e funcionários da justiça —, como remuneração, mas sim como vencimento.
Por último, e ainda neste aspecto, gostaria de saber que alguns dos dinheiros produzidos pelos serviços de registos e notariado eram aplicados — em certos casos —, em melhorias das instalações físicas e de mobiliário. Gostaria também que as conservatórias do registo comercial e predial fossem, como a lei prevê — e que não se executa —, alargadas a todos os concelhos. Não seria muito difícil fazê-lo através da criação de serviços anexados.
Mas aquilo a que queria referir-me, era ao meu círculo eleitoral e especialmente à minha cidade: Viseu.
Como V. Ex.a sabe — deve ter apreciado aquando da sua deslocação ali no ano passado, para ver, in loco, algumas situações relativas às instalações dos serviços do tribunal e dos registos e notariado —, há um terreno previsto para a construção desse edifício. Esse terreno pertence, parcial ou totalmente — não tenho a certeza — a um serviço de Estado. É, no entanto, com uma certa mágoa, que eu vejo que não consta do PIDDAC qualquer montante para a aquisição de terrenos com vista à construção de novos tribunais!.. .
V. Ex.a disse há pouco que o problema do tribunal de Viseu iria ser resolvido. O facto de os magistrados judiciais e do Ministério Público se terem reunido em conferência de imprensa permitiu que a sua voz produzisse algum impacte na opinião pública, apesar de toda a gente já saber qual a situação do tribunal, sem sala de testemunhas, com os juízes a trabalhar nas salas de audiências, etc. ...
Creio também, que esteve lá um funcionário do Ministério da Justiça a inteirar-se, in loco, da situação, mas devo dizer que fiquei agora um pouco espantado quando V. Ex.a referiu que o problema do tribunal de Viseu iria ser resolvido com o alojamento em local diferente das conservatórias. Como V. Ex.a bem sabe, há em Viseu uma Secretaria Notarial, uma Conservatória do Registo Predial e uma Conservatória do Registo Civil, alojados no Palácio da Justiça.
Um dos cartórios — o meu — foi separado, mas permanece um outro cartório que, afinal, ocupa o espaço onde se encontrava a secretaria do edifício do tribunal.
Sabemos que, há já uns meses a Conservatória do Registo Civil tem um local destinado. Tanto quanto sabemos, a Conservatória do Registo Predial não tem um local destinado, encontrando-se o outro cartório na mesma situação. Sabemos que o funcionamento para aquisição ou arrendamento das instalações não é muito fácil, demora o seu tempo. O tempo que vai entre o dia do pedido de um local e o dia em que o Ministé-
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rio diz «sim, senhor, esse local serve», é bastante dilatado, o que faz com que, muitas vezes, os empreiteiros não esperem por esse tempo. O problema de Viseu deve ser visto com cuidado e resolvido com interesse. A situação da justiça, em Viseu, é bastante má e penso que o Ministério da Justiça, depois das diligências que fez, está inteirado para resolver esta situação.
Digo isto até porque no PIDDAC a rubrica «Edifícios do registo e notariado» diz «Viseu: arrendamento e adaptação». No entanto, não refere se é de conservatórias, se é de conservatória e cartório. Não diz o que é.
Por outro lado, e finalmente, queria dizer ao Sr. Ministro o seguinte: no ano passado, tive oportunidade de o ouvir quando apresentou o PIDDAC e o orçamento do seu Ministério e fiquei com a ilusão, digamos assim, que para Viseu iriam várias coisas. Tenho ideia de que o Sr. Ministro insinuou qualquer coisa deste género. Este ano, vejo que as coisas não são bem assim e estranho que, depois de ser ter falado, há tanto tempo, na implantação da Polícia Judiciária em Viseu, o PIDDAC seja completamente omisso quanto a isso.
Eram estes os problemas que queria pôr.
O Sr. Presidente: —Tem a palavra A Sr.a Deputada Odete Santos.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Serei brevíssima. Queria só tocar em mais dois ou três pontos, para além daqueles que já foram referidos.
Um deles tem a ver com o anúncio feito pelo Sr. Ministro de aumentar as alçadas como uma consequência necessária da inflação. Sr. Ministro, com o aumento das alçadas não são precisas taxas moderadas. O último aumento das alçadas foi em 1981, no tempo do Dr. Menéres Pimentel; as acções do Estado passaram de 200 001$ para 400 001$. Assim, as partes para irem a tribunal pagar preparos caríssimos, pensam 3 vezes e não vão — mesmo que tenham assistência judiciária —, porque depois, no final, o delegado do Procurador da República vai cobrar-lhes as custas por entender que um aumento de ordenado de 15 % é uma aquisição de bens superviniente e, por isso, têm de pagar as custas. Por isso eu creio que aumentar as alçadas num país com uma taxa média de salário tão baixa, como é o caso do nosso, é a mesma coisa que cortar o acesso ao Direito e a mais um razoável número de cidadãos.
Na minha opinião, isso é altamente reprovável e, creio, seria bom que o Sr. Ministro pensasse bem nisto porque a maneira de resolver a crise dos tribunais não é à custa dos cidadãos, evitando a sua ida aos tribunais, mas, pelo contrário, permitindo-lhes uma justiça realmente célere.
Uma outra questão que foi focada pelo Sr. Ministro é a dos tarefeiros. Em princípio, eu não estava a pensar tratar dessa questão, no entanto há coisas que, quando as oiço, ferem o meu sentido jurídico que, apesar de não ser muito, é algum. Trata-se da questão dos tarefeiros.
O Sr. Ministro afirmou que não é preciso abrir o quadro do pessoal, mas ele pode ser alargado e que agora vamos meter tarefeiros e, mais tarde, esses tarefeiros entrarão para o quadro. Bom, já é muito e escandaloso que se permita que, nas empresas privadas, se façam contratos a prazo, contratos, esses, que são falsos, porque as pessoas são precisas para fazerem tra-
balho efectivo. Agora que o próprio Governo ataque desta maneira as leis, metendo como tarefeiros pessoas que estão a desempenhar uma função para a qual são precisas com efectividade, roça o cúmulo.
Lembro-me que aqui, na Assembleia da República, recebemos umas tarefeiras do Ministério das Finanças, que uma vez por cá apareceram, a reclamar contra a situação em que se encontravam. É que, na realidade, elas faziam o trabalho normal na Repartição de Finanças e, no entanto, eram tarefeiras: não tinham direito a férias; se tinham um parto não tinham direito à licença por maternidade, etc. Penso que estas situações, com a luta das pessoas, foram sendo resolvidas num ou noutro Ministério. Creio que esta é a altura de, em relação aos guardas prisionais, se pôr cobro a uma situação que, penso, é um escândalo.
Por último, ainda em relação ao artigo 9.°, mais uma vez queria frisar que consideramos extremamente gravosa uma disposição deste género. Penso que a participação emolumentar é, tecnicamente, uma remuneração acessória. Discordo do Sr. Deputado António da Costa que me parece confundir gratificação com remuneração. Remuneração é um vencimento, mas pode ser vencimento acessório. Aquilo que não é remuneração, que tem um carácter esporádico, é gratificação. Tanto faz chamar vencimento como remuneração, é acessório. Aliás, é também acessório o subsídio para renda de casa e o subsídio para fixação nas regiões autónomas.
Sinceramente, começo a sentir-me defraudada: pertencendo eu a uma subcomissão que está a tratar do problema do Estatuto dos Magistrados Judiciais onde são aprovadas, por exemplo, coisas como o subsídio de renda de casa, de acordo com os valores no mercado de habitação, perante uma norma deste género, posso verificar que o valor é congelado aos níveis de 1984. Creio que, nestas discussões, os dados estão viciados. O Orçamento traz-nos coisas que vão inutilizar esperanças dos magistrados a nível do seu estatuto.
Aliás, temos perguntado, nesta Comissão, relativamente aos orçamentos dos vários ministérios, a que é que isto diz respeito. Sinceramente, em relação ao n.° 3, ainda estou para decifrar se na área do Ministério da Justiça haverá privilégios que vão acabar. Parece que a gasolina mais barata — privilégio de certos ministérios — vai acabar, mas ainda estou a pensar se, por exemplo, em relação ao transporte urbano gratuito, aos quais os funcionários judiciais têm direito, isso será realmente um benefício em espécie e se também irá acabar por força desta disposição.
O Sr. Presidente: — Não havendo mais inscrições, dou a palavra ao Sr. Ministro da Justiça que, presumo, pretende dar resposta às questões que foram colocadas.
O Sr. Ministro da Justiça: — Vou ser muito rápido.
Em relação à pergunta feita pelo Sr. Deputado José Manuel Mendes, sobre a situação da Anadia, devo dizer-lhe que não sei responder, no entanto, vou informar-me. Aliás, agradeço-lhe a informação que prestou.
Quanto a saber se a formação profissional é ou não significativa, penso que é uma questão subjectiva. Em todo o caso, devo dizer-lhe que o que eu há pouco disse — e pareceu-me que lhe passou despercebido — foi que, também em matéria de educação, que é um problema de informação (não é de formação profissional,
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mas é de educação geral), em colaboração com o Ministério da Educação tem sido feito um grande esforço. Aliás, até citei números.
Quanto às bibliotecas dos tribunais, penso que, nesse capítulo, algum esforço tem sido feito e deve continuar a fazer-se. Não sei se a sugestão apresentada será suficiente, mas é já um caminho. Aliás, as coisas, infelizmente, não poderão ser resolvidas de um dia para o outro, no entanto as publicações do Ministério, essas, são fornecidas aos magistrados a preços muito inferiores aos de custo.
O Sr. Deputado José Magalhães pôs-me um problema em matéria de nomeação do Supremo Tribunal Administrativo. Não deixa de ser um pouco singular e curioso que o faça porque, em primeiro lugar, como V. Ex.8 sabe, a proposta no sentido de que haja um Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais foi da minha iniciativa. Eu tive de vencer algumas resistências e abrir mão de poderes que pertenciam ao Executivo, através do Ministério da Justiça. É, pois, um pouco singular que faça essa referência às nomeações do Supremo Tribunal Administrativo que, aliás, tradicionalmente, como sabe, são feitas sob proposta dos juízes do Supremo Tribunal Administrativo. Aliás, esta é uma proposta livre, não é uma proposta condicionada; ela já não é do meu tempo, é tradição de há já vários anos. Suponho que não quer insinuar isto, de qualquer modo é bom esclarecer que não hove aqui nenhuma utilização de um poder discricionário para nomear pessoas que, eventualmente, contrariassem os desejos do Supremo Tribunal Administrativo.
Em matéria de informática, a referência que faz também não me parece que se justifique. Inclusivamente, como V. Ex.a sabe, existe uma proposta de lei de protecção de dados, que foi aprovada na generalidade e que aguarda a sua discussão e aprovação na especialidade que permitirá salvaguardar, de uma maneira mais eficiente, os direitos fundamentais dos cidadãos. Faz parte daquela incapacidade de vontade política que V. Ex.8 referiu em relação ao Ministério da Justiça.
O Sr. José Magalhães (PCP): — Não percebo a sua dificuldade em distinguir as posições do Ministério.
O Orador: — É a sua opinião, como é óbvio.
O Sr. José Magalhães (PCP): — A dificuldade é determinar quais as posições que vinculam o Ministério!
O Orador: — Ó Sr. Deputado, é evidente que eu não pretendo o seu acordo. Estou apenas a dar-lhe uma resposta que as suas observações merecem.
Vejo também que está extremamente preocupado com as nossas relações com os magistrados. Devo dizer que não penso que elas sejam tão más como isso; pelo contrário, muito recentemente, tivemos ocasião de ter uma conversa extremamente correcta com a Associação dos Magistrados e devo dizer que, em relação a isso, a minha perspectiva é diferente da sua.
Em relação ao significado dos documentos, devo dizer que não percebo muito bem quais são as suas dúvidas. É evidente que, num seminário em que se põem à discussão opiniões, isso não significa um dogma, não significa vincular o Ministério, está precisamente a pôr-se o problema de discutir determinadas matérias. Foi nesse sentido que o Dr. Garcia Marques fez uma exposição, aliás extremamente interessante, à
qual tive oportunidade de assistir. Mas isso não significa que essa seja, ad eternum, a política do Ministério sobre isso. Foi produzida num seminário, era a posição dele que, aliás, foi objecto de um debate extremamente curioso. De resto, chegaram recentemente ao meu conhecimento conclusões sobre esse seminário.
Não percebi, pois, muito bem as suas dificuldades em distinguir o que é um documento num seminário e o que é um documento que traduz a posição oficial do Ministério.
Ao Sr. Deputado António da Costa devo dizer que não ficou claro no meu espírito um ponto. É que, na minha perspectiva, os vencimentos em exercício não são remunerações acessórias. Portanto, pareceu-me que estávamos de acordo e não em desacordo, como a sua pergunta parecia querer inculcar. Aliás, há pouco respondi à Sr.8 Deputada Odete Santos que este número abrange as remunerações acessórias dos juízes. Não estou a dizer-lhe se essa será a posição final. Por exemplo, uma das soluções possíveis era a de passar as remunerações acessórias, integrando-as nos vencimentos. Isso resolvia, desde logo, a questão.
Há vários problemas que podem e devem ser postos. Se me pergunta qual é o âmbito da aplicação deste preceito, tal como está redigido, suponho que, como jurista, facilmente concordará comigo que ele abrange esse tipo de remunerações.
No que respeita às instalações do registo e notariado e às verbas, como V. Ex." sabe, uma parte das verbas que são destinadas aos tribunais incluem também as próprias instalações do registo e notariado. É o caso de Viseu.
Em todo o caso, tem sido feito algum esforço no sentido de dotar as instalações autónomas do registo e notariado. Esse esforço tem vindo a ser acentuado, justamente porque pareceu que era útil corrigir uma orientação do Ministério que, de algum modo, esquecia essas instalações autónomas do registo e notariado, desigandamente nas cidades de Lisboa e Porto. No Porto, a situação é ainda muito carenciada; em Lisboa, já começaram a adquirir-se algumas instalações de conservatórias do registo civil e notariado.
Quanto a Viseu, para a Conservatória do Registo Civil, foi arrendado um andar. As obras deverão estar a fazer-se, porque foi feito um ajuste directo, visto que os concursos levaram imenso tempo e não havia maneira de resolver o problema. Tenciona-se, também, resolver o problema do cartório.
Esta é uma solução transitória. Aguardamos uma proposta da Câmara, que ainda não resolveu o problema com o Ministério do Trabalho e Segurança Social visto que, como sabe, o terreno pertence à Segurança Social. Há algumas questões que ainda não foram devidamente dilucidadas e aguardamos que a Câmara nos faça uma proposta para que, finalmente, se possa ter uma decisão sobre o projecto. Aliás, não nos parece problema difícil lançar o projecto, visto que, em qualquer circunstância, o problema da construção não se fará facilmente este ano. Portanto, a circunstância de estar no PIDDAC não significa, necessariamente, que o projecto ou, pelo menos, o concurso para o projecto não possa ser lançado este ano.
Há um projecto de uma escola de formação de funcionários judiciais e de funcionários das conservatórias dos registos civil e predial que, penso, está situado em Viseu. Para isso é necessário que haja, por parte do município, em termos de instalação, uma contribuição.
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Isso está em estudo. Suponho que era a isso que, há pouco, estava a referir-se. Essa ideia não foi abandonada, mas, no entanto, vai haver necessidade de uma cooperação com a autarquia local para que possa ser realizada.
Em matéria de Polícia Judiciária, há duas dificuldades: uma, resulta da carência de instalações; outra, resultante da formação de pessoal, a que há pouco aludi. Portanto, não é provável, este ano — a não ser eventualmente, no final do segundo semestre — poder encarar-se a hipótese de instalar a Polícia Judiciária em Viseu. Isto porque, como disse, a primeira prioridade vai ser em Aveiro, pois as instalações já estão prontas e, portanto, pode começar a funcionar ainda no primeiro semestre, desde que se resolva o problema das casas para os agentes e inspectores.
A Sr.a Deputada Odete Santos referiu-se ao problema das alçadas e pôs a questão, que é exacta, de que é preciso considerar o problema das acções do Estado, visto que é especificamente aí que a questão se põe. Mas isso não significa que as alçadas não devam ser elevadas; significa que devemos ponderar o problema das acções do Estado.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Ministro, mas para além disso é preciso considerar que, com o aumento das alçadas, corta-se, por vezes, o acesso a outras instâncias, tais como, os recursos. Isso é também importante.
O Orador: — Está bem, mas justamente por isso é que existem alçadas. Realmente, não tem o mesmo sentido ter uma alçada, por hipótese, de 100 contos, por exemplo, em 1950 e ter uma alçada de 100 contos em 1985. É evidente que o significado é completamente diverso, a importância das acções é diversa. Por isso é que tem sentido, e em todos os países isso faz-se, modificarem-na em função da inflação.
O problema que põe é outro e relaciona-se com o acesso ao Direito. Nós pensamos resolvê-lo nesse esquema, regulando, de uma maneira especial, o problema das acções do Estado que, como sabe, estão ligadas às alçadas. Nesse aspecto, a observação da Sr.a Deputada é pertinente, mas creio não haver razões para esse seu temor. ;
Quanto ao problema dos tarefeiros, encontramo-nos perante uma situação de grande afluência de reclusos e não podíamos, como é óbvio, satisfazer as necessidades de fiscalização e vigilância com o número de funcionários que tínhamos. Como as dificuldades resultantes do funcionamento da máquina do Estado e da sua pesada burocracia em matéria de administração pública e Ministério das Finanças e do Plano eram grandes, esta questão não era atempadamente resolúvel. Portanto, perante a situação de não podermos manter a ordem nas prisões nem acolher os presos, a opção foi a de, claramente, cometer uma ilegalidade ...
A Sr.a Odete Santos (PCP): — É grave, Sr. Ministro, porque logo no n.° 6 do artigo 9.°, esse pessoal não pode ser inscrito como subscritor da Caixa Geral de Aposentações ...
O Orador: — Sr.a Deputada, peço-lhe que me deixe acabar o meu raciocínio.
Há problemas em que os valores têm de ser hierarquizados. Simplesmente, isso tem de ser feito com a
ideia de garantir a essas pessoas — foi feita uma pré--selecção — a possibilidade de acesso a cursos de formação para o seu ingresso futuro. Portanto, isso não foi tão escandaloso como a Sr." Deputada apontou.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Mas é ilegal, Sr. Ministro!
O Orador: — Sr.a Deputada, só aparentemente é que é uma ilegalidade porque, perante a necessidade de albergar presos, provavelmente V. Ex.a decidiria como eu, ou então cometeria uma ilegalidade ainda maior face à hierarquia dos valores da Constituição.
A Sr.a Odete Santos (PCP): — Isso é uma gravíssima confissão!
O Orador: — Seja como for, não me importo de ser julgado por isso, Sr.a Deputada.
Quanto à questão levantada acerca do artigo 9.°, suponho que ela já estará suficientemente esclarecida. Aliás, já referi que uma coisa é aquilo que quer dizer o artigo 9.° no projecto e outra é a solução que vier a ser adoptada no Estatuto dos Magistrados, e que teremos de ponderar.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, deu entrada na Mesa uma proposta de alteração que amanhã será distribuída por todos os membros da Comissão de Economia, Finanças e Plano e que também farei chegar ao Sr. Ministro. Devo esclarecer que tal não é feito hoje porque há já algumas horas foi dispensado o pessoal que estava afecto aos serviços de reprodução de documentos.
Em nome da Comissão e em meu próprio nome agradeço ao Sr. Ministro da Justiça os eslcarecimen-tos que nos prestou, agradeço a presença do Sr. Secretário de Estado do Orçamento e aos Srs. Deputados agradeço a colaboração que me deram na condução dos trabalhos.
Amanhã a reunião iniciar-se-á às 10 horas. Está encerrada a reunião.
Eram 2 horas.
Estiveram presentes à reunião os seguintes Srs. Deputados:
Telmo da Silva Barbosa (PSD).
Almerindo da Silva Marques (PS).
Octávio Augusto Teixeira (PCP).
António Neiva Correia (CDS).
Américo Albino da Silva Salteiro (PS).
António Domingues de Azevedo (PS).
António Jorge Duarte Rebelo de Sousa (PS).
António José dos Santos Meira (PS).
José António Borja dos Reis Borges (PS).
José Carlos Pinto da Mota Torres (PS).
Victor Hugo Sequeira (PS).
Maria Luísa Banha Modas Daniel (PS).
Leonel de Sousa Fadigas (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
António da Costa (PS).
Manuel Maria Portugal da Fonseca (PSD).
Mário Martins Adegas (PSD).
Virgílio Higino Gonçalves Pereira (PSD).
José Adriano Gago Vitorino (PSD).
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II SÉRIE — NÚMERO 51
José Silva Domingos (PSD). Fernando José Roque Correia Afonso (PSD). Joaquim António Miranda da Silva (PCP). João António Gonçalves do Amaral (PCP). Maria Ilda da Costa Figueiredo (PCP). Maria Helena Guilherme Bastos (PCP). Carlos Alberto da Costa Espadinha (PCP). Carlos Alberto Gomes Carvalhas (PCP).
José Manuel Antunes Mendes (PCP).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
Maria Odete Santos (PCP).
António Bagão Félix (CDS).
Alexandre Carvalho Reigoto (CDS).
João Corregedor da Fonseca (MDP/CDE).
Joel Eduardo Hasse Ferreira (UEDS).
Manuel Cardoso Vilhena de Carvalho (ASDI).
PREÇO DESTE NÚMERO 222$00
Imprensa Nacional - Casa da Moeda, E. P.