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II Série — Suplemento ao número 61
Sexia-feira, 1 de Março de 1985
DIÁRIO
da Assembleia da República
III LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1984-1985)
SUMÁRIO
Provedor de Justiça (9.* Relatório do):
À Assembleia da República, relativo ao ano de 1984.
9.° RELATÓRIO 00 PROVEDOR DE JUSTIÇA A ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA -1984
CAPITULO I
Introdução
1 — Este é o último relatório que nos termos do artigo 21.° do Estatuto do Provedor de Justiça me cumpre apresentar à Assembleia da República, ou seja, o relativo ao ano de 1984.
O mandato para que fui eleito em reunião plenária de 3 de Fevereiro de 1981 (cf. Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 26, de 4 de Fevereiro, p. 909) termina no dia 11 de Fevereiro de 1985 (data da minha posse). V. ainda suplemento ao Diário da República, 1." série, n.° 29, de 4 de Fevereiro de 1981.
Ê, pois, altura de fazer um rápido balanço do que foi a actividade do Serviço do Provedor de Justiça durante este último quadriénio (1981-1984).
2 — Como resulta do disposto no artigo 23." da Constituição da República, conjugado com o artigo 1.° do Estatuto aprovado pela Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, o Provedor de Justiça tem por missão principal a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, bem como dos seus interesses legítimos quando postergados por acções ou omissões dos poderes públicos.
Cumpre-lhe, segundo a lei, assegurar o respeito pela legalidade e a realização da justiça, objectivo que deverá alcançar por meios informais e independentemente dos meios graciosos e contenciosos previstos na Constituição.
Exercendo, como exerce, uma verdadeira acção de controle sobre a Administração Pública, ainda que sem qualquer poder decisório, assume a qualidade de um verdadeiro defensor público envolvendo a sua actuação o carácter de uma autêntica magistratura de persuasão.
3 — Posso afirmar que no desempenho das funções que me foram confiadas encontrei, de uma maneira geral, receptividade ao nível de quase todos os órgãos da Administração Pública (civil e militar) sendo essa receptividade indício da compreensão que. por parte dos titulares respectivos e dos funcionários ou agentes da função pública, se vai radicando como corolário do dever legal de colaboração previsto no artigo 27.° do citado Estatuto.
Encontra-se, no entanto, por regulamentar ainda o disposto no artigo 33° da Lei n.° 28/82, de II de Dezembro (Lei da Defesa Nacional das Forças Armadas) quanto às acções ou omissões dos poderes públicos responsáveis pelas Forças Armadas.
4 — Por outro lado, e através da acção desenvolvida, verifica-se que a instituição do Ombuàsman tem vindo a enraizar-se e a progredir na medida em que vai sendo cada vez mais conhecida entre os cidadãos.
E, precisamente, foi a divulgação do Serviço do Provedor de Justiça que constituiu uma das preocupações dominantes da acção desenvolvida.
5 — Muito contribuiu para tanto as frequentes referências que foram sendo feitas pelos órgãos de comunicação social às actividades desenvolvidas pelo Provedor de Justiça e à difusão do âmbito da sua competência, tendo em vista a defesa dos direitos e liberdades fundamentais, conseguida, quer através de encontros com a imprensa, rádio e televisão, quer através do contacto directo com as populações em visitas que se foram sucessivamente realizando, designadamente ao Porto e às capitais dos distritos da Estremadura, Trás-os-Montes e Alentejo, com a finalidade de proporcionar um mais fácil acesso dos interessados ao próprio Provedor de Justiça.
6 — Relativamente à Assembleia da República, e durante estes últimos 4 anos, será de reconhecer que dela não partiu o apoio ou estímulo que seria legítimo esperar relativamente a uma instituição nova como é, entre nós, a do Ombuàsman.
Assim, o relatório referente ao ano de 1981 não chegou a ser apreciado e só por ofício n.° 1036/GAR/ 84, de 29 de Novembro, que se deve à dinâmica acção do actual Presidente da Assembleia da República, Ex.mo Sr. Dr. Fernando do Amaral, foi comunicado ao Provedor que o relatório referente ao ano de 1982 se encontrava em apreciação na Comissão Parlamentar
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para os Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e que o relativo ao ano de 1983 iria ser distribuído à mesma Comissão para ser apreciado em Plenário com a maior brevidade possível.
Abre-se, assim, uma expectativa nova e estimulante que cumpre deixar registada com reconhecimento.
7 — No que concerne à revisão do^ Estatuto do Provedor de Justiça e da sua orgânica, já'na anterior legislatura (que terminou, como se sabe, em 4 de Fevereiro de 1983) havia sido apresentado um estudo (sugestão para projecto de lei) de conformidade com o disposto na alínea b) in fine do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, tendo por objecto regular unitariamente as matérias constantes do actual Estatuto e da Lei Orgânica do Serviço do Provedor de Justiça aprovada pela Lei n." 10/78, de 2 de Março, com o qual se tinha em vista remover alguns aspectos negativos das leis actualmente em vigor (cf. Ofício n.° 14 499, de 18 de Novembro de 1982).
No entanto, com a dissolução da Assembleia, não logrou esse estudo a possibilidade de ser apreciado.
Por isso, e por ofício n.° 1845/GP, datado de 20 de Fevereiro de 1984, dirigido ao Presidente da Assembleia da República, de novo foi apresentado o mesmo estudo embora com ligeiras alterações que se tiveram por convenientes.
Pretende-se com o novo Estatuto conceder não só meios que assegurem maior eficácia à instituição do Provedor de Justiça, como proporcionar um mais fácil conhecimento do seu regime jurídico tanto aos cidadãos como aos próprios órgãos, funcionários ou agentes da Administração Pública.
Mas também em relação ao referido estudo não surgiu, até este momento, qualquer oportunidade para a sua apreciação.
8—Acresce que, desde 22 de Junho de 1981, o Provedor de Justiça vem evidenciando a situação de disparidade que existe em consequência da não aplicação ao pessoal do Serviço do Provedor de lustiça do regime estabelecido pelo artigo 21.° da Lei n.° 32/ 77, de 25 de Maio (Regimento da Assembleia da República), para o pessoal da Assembleia da República, situação que, relativamente, se afigura tanto mais injusta quanto é certo que com a publicação da Lei n.° 5/83, de 27 de Julho, foi tornado extensivo tal regime aos membros do gabinete do Presidente da Assembleia da República e ao dos gabinetes dos grupos parlamentares. Correspondentemente, ainda se atribuiu uma gratificação ao pessoal da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Republicana em serviço junto desse órgão.
A referida lei não abrangeu, porém, o pessoal do serviço do Provedor de Justiça, não obstante a natureza especial das funções que lhe são cometidas, o que — haverá que reconhecê-lo— não deixa de ferir o princípio da igualdade de tratamento dos funcionários de uma instituição que verdadeiramente é uma emanação da Assembleia da República e cujo orçamento corresponde a uma parte do seu próprio orçamento.
Não obstante terem sido dirigidos ao Presidente da Assembleia da República os ofícios n.m 6443/GP, de 22 de Junho de 1981, 1014/GP, de 25 de Janeiro de 1983, 8223/GP, de 11 de Julho de 1985, e 12032/GP, de 22 de Novembro de 1983, nada se concretizou quanto a esta legítima aspiração do pessoal do Serviço do Provedor de Justiça.
Apenas, por ofício n.° 266, datado de 2 de Setembro de 1983, foi recebida a comunicação de que o assunto exposto no ofício n.° 823/GP, de 11 de Julho de 1983, iria ser posto à consideração dos líderes dos grupos parlamentares. No entanto, e até ao presente, nenhum desses grupos chegou, como se fazia mister, a tomar a iniciativa indispensável para alcançar o adequado tratamento legislativo.
Não se afigura justificável, no caso concreto, a passividade que tem vindo a verificar-se no que concerne à apreciação da pretensão exposta tanto mais que não está propriamente em causa a criação de uma remuneração acessória, mas tão-somente o suprimento de uma lacuna no Estatuto do Provedor de lustiça que se pretendia remover por aplicação subsidiária do citado artigo 21.° ao pessoal do seu Serviço.
Esta situação tem hoje efeitos agravados, em termos de justiça relativa, face ao regime de remunerações acessórias estabelecido também para o pessoal da Alta-Autoradade contra a Corrupção (cf. Decreto-Lei n.° 369/83, de 6 de Outubro, e Decreto Regulamentar n.° 3/84, de 12 de Janeiro, artigo 16.°).
9 — O mérito da instituição do Provedor não deverá, porém, ser afectado ou ensombrado por actos ou omissões que possam contribuir para desmotivar o sentido de missão com que, é de reconhecer, o seu pessoal vem desempenhando as suas funções.
O objectivo fundamental prosseguido pelo Provedor de Justiça foi — pode dizer-se — o de proporcionar, antes de mais, a todos quantos se lhe dirigiram, ao longo do último quadriénio, um acolhimento essencialmente humano e compreensivo ante a esperança, por vezes a última, que cada um dos reclamantes ou queixosos pôs no resultado das suas cartas ou exposições de que, com a intervenção do Provedor, poderia ver resolvido o seu problema ou a sua situação, aliás, em muitos casos aflitiva ou mesmo dramática.
Em relação a muitos casos não foi possível alcançar o resultado favorável, que talvez fosse esperado pelos próprios interessados. Mas o Serviço do Provedor de Justiça mesmo nesses casos não deixou de realizar uma função social da maior utilidade, porque de informação ou esclarecimento dos interessados, como se encontra comprovado através dos vários capítulos que se compreendem nos relatórios anualmente apresentados ao longo do meu mandato.
10 — Não posso, contudo, deixar de acentuar que os resultados obtidos, se foram encorajadores, tal ficou a dever-se, em grande parte, ao esforço, competência e zelo de todos quantos coadjuvaram o Provedor de Justiça, com o sentido de contribuir para que a sua actuação fosse, tanto quanto possível, célere, eficaz e justa.
Cumpre, por isso, expressar aqui, e no âmbito dos serviços técnicos, o melhor reconhecimento e louvor pelo modo como todos e cada um — adjunto do Provedor de Justiça, coordenadores e assessores — se houveram no desempenho das suas específicas funções, nas quais evidenciaram elevada preparação jurídico--administrativa, muito mérito e elevado sentido de equidade e de justiça.
Do mesmo modo, e no âmbito dos serviços administrativos, a todos, director de serviços e funcionários, deixo uma palavra de muito apreço pelo desempenho dedicado e zeloso das actividades que lhes foram distribuídas.
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Por último, deixo expressa a minha especial gratidão pelo proficiente trabalho de secretariado no gabinete do Provedor, sendo de assinalar a muita dedicação, assiduidade e eficiência das secretárias que ali prestaram serviço durante o meu mandato.
11 — A terminar, não será demais voltar a acentuar que não detendo o Provedor de Justiça poderes decisórios, nem poderes executórios e não possuindo institucionalmente poderes mais amplos, jamais poderá interferir na actuação da Administração ou pronunciar--se quanto à oportunidade e conveniência da sua actividade. E que apenas lhe cabe quando seja posta em causa a ilegalidade ou injustiça dos seus actos, fazer recomendações quanto à revisão desses actos, no sentido da sua revogação, modificação ou reforma, de harmonia com os princípios de boa e sã administração.
Dada a ausência de quaisquer poderes daquela natureza, só será possível encontrar uma contrapartida válida através de uma conscienciosa colaboração de todas as entidades públicas, assim contribuindo todos para a dignificação da função do Provedor de Justiça, que, actuando sempre acima de qualquer interesse político, apenas pugna para que sejam respeitados os direitos fundamentais da pessoa humana, constitucionalmente assegurados.
Este o apanágio de um verdadeiro Estado de direito democrático.
CAPITULO II Dados estatísticos e sua análise
QUADRO N.° 1 Movimento geral dos processos
I — Número de processos organizados
Queixas escritas ............................................... 1 976
Queixas verbais ............................................... 455
Total .......................... (a) 2 431
Iniciativas do Provedor .................................... 112
Total geral................... (o) 2 545
Das quais correspondera a processos de declaração de inconstitucionalidade:
Queixas ................................................... 78
Iniciativas do Provedor .............................. 3
Total ......................._81
(o) Dos quais 4 foram anulados por nSo conterem matéria para processo.
II — Número de processos reabertos
Reabertos em 1984:
De 1976 .........................................................
De 1977 .........................................................
De 1978 .........................................................
De 1979 ......................................................... 1
De 1980 .........................................................
De 1981 ......................................................... 1
De 1982 ......................................................... 3
De 1983 ......................................................... 6
Total.........................._11
III — Número de processos apensados
Processos apensados a outro já pendente, por idêntica
reclamação ........................................................ 166
Processos incluídos em iniciativas do Provedor........... 14
Total ............................. 180
IV — Número de processos movimentados e a movimentar
a) Processos que transitaram de 1976 a 1979 .............. 372
b) Processos que transitaram de 1980 ....................... 99
c) Processos que transitaram de 1981 ....................... 164
d) Processos que transitaram de 1982 ....................... 387
e) Processos que transitaram de 1983 ....................... 1 280
/) Processos que transitaram dos meses anteriores ......
g) Processos reabertos ............................................ 11
h) Processos organizados em 1984 ........................... 2 539
Total ............................. 4 852
i) Processos terminados em 1984:
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
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j) Processos que transitaram para 1983:
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
QUADRO N.' 2 Queixas rejeitadas
I — Rejeitadas liminarmente
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
II — Rejeitadas após estudo, mas sem diligências
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
Ill —Rejeitadas com estudo e após diligências
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
QUADRO N." 3 Pro caw o» arquivados
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
d) Processos com conclusão final:
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
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QUADRO N." 4 Classificação doa processos por Mtunto
1) Administração da Justiça:
Processo penal:
Instrução ............................................... 3
Prisão preventiva.................................... 5
Questões diversas .................................. 132
Outros processos judiciais:
Demoras ............................................... 1°2
Questões diversas ................................... '2
Questões gerais ............................................_1
Total ........................._321
2) Administração local .......................................... 27
3) Administração Pública ...................................... 13
4) Agricultura:
Reforma Agrária .......................................... 15
Questões diversas ........................................._7
Total ........................._22
5) Aguas ............................................................ }2
6) Bancos ........................................................... '*
7) Comércio externo............................................. 23
8) Comércio interno ............................................. 7
9) Contribuições e impostos ................................... 118
10) Crimes ........................................................... -
11) Descolonização ................................................ 32
12) Direitos humanos:
Direito ao ambiente e qualidade de vida........... 54
Direito ao ensino.......................................... 30
Liberdade de informação.............................. 3
Outros ........................................................_73
Total ........................._162
13) Direitos políticos ............................................. 1
14) Empresas:
Autogestão .................................................. 4
Intervenção estadual ......................................
Nacionalização ............................................. 1
Questões diversas ........................................._8
Total ........................._13
15) Ensino ........................................................... 19
16) Expropriações ................................................. 24
17) Habitação:
Arrendamento ............................................. 22
Despejos ..................................................... 7
Ocupações .................................................. -
Questões diversas ........................................_27
Total ............................._56
18) Indústria ........................................................ -
19) Jogo .............................................................. -
20) Obras:
Construção e obras ilegais ........................... 38
Licenciamento ............................................. 22
Obras coercivas .......................................... H
Obras públicas ............................................. 8
Questões diversas ........................................_2
Total ............................._81
21) Polícia ........................................................... 33
22) Processo administrativo .................................... 3
23) Regime prisional ............................................. 59
24) Registos e notariado ......................................... 15
25) Saúde pública ................................................ 2
26) Segurança social:
Abono de família ......................................... 1
Aposentação e reforma ................................. 280
Pensio de sobrevivência................................ 55
Questões diversas ........................................ 153
Total ............................._489
27) Seguros .......................................................... 22
28) Trabalho:
a) Administração local:
Adidos ................................................ -
Admissões .......................................... -
Carreiras ............................................. 3
Concursos............................................ 8
Demissões e despedimentos..................... 2
Disciplina ............................................ 8
Provimento.......................................... 1
Reintegrações ....................................... 1
Remunerações....................................... 8
Saneamentos ........................................
Questões diversas ................................. 23
Total ............................._54
b) Administração central e regional:
Adidos................................................ 82
Admissões ........................................... -
Carreiras ............................................. 91
Concursos ........................................... 82
Demissões e despedimentos..................... -
Disciplina ............................................ 26
Provimento.......................................... 45
Reintegrações ....................................... 1
Remunerações ...................................... 90
Saneamentos ........................................ 3
Questões diversas ................................. 236
Total ............................. 656
c) Empresas públicas...................................._52
d) Sector privado: ~~~
Despedimentos ..................................... 5
Inspecções ........................................... 8
Questões diversas ................................._21
Total ............................._34
29) Transportes e comunicações .............................. 30
30) Urbanização ................................................... 4
31) Diversos ......................................................... 136
32) Assunto incompreensível ..................................._3
Total geral ..................... 2539
QUADRO N.° 5 Entidades visadas nos processos
I — Administração central
Governo .............................................................. 95
Primeiro-Ministro .................................................. 1
Vice-Primeiro-Minstro e Ministro da Defesa Nacional 6 Ministro de Estado e Ministro dos Assuntos Parlamentares ................................,............................... 2
Presidência do Conselho de Ministros ..................... 3
Secretaria de Estado do Fomento Cooperativo ......... -
Secretaria de Estado da Administração Pública ......... 106
Ministério da Administração Interna ..................... 77
Ministério dos Negócios Estrangeiros ..................... 27
Ministério da lustiça ............................................ 124
Ministério das Finanças e do Plano ........................ 275
Ministério da Educação ....................................... 274
Ministério do Trabalho e Segurança Social ............ 234
Ministério da Saúde........................................... 151
Ministério da Agricultura, Florestas e Alimentação ... 68
Ministério da Indústria e Energia .......................... 25
Ministério do Comércio e Turismo........................ 27
Ministério da Cultura .......................................... 7
Ministério do Equipamento Social .......................... 57
Ministério da Qualidade de Vida ........................... 4
Ministério do Mar ................................................_9
Total ............................. 1 572
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II — Administração regional
Governo Regional dos Açores ................................. 9
Governo Regional da Madeira ................................ 3
Total ............................._12
III — Administração local
Governos civis..................................................... 4
[untas distritais ................................................... -
Assembleias distritais ............................................. 5
Federações de municípios ....................................... 1
Câmaras municipais ............................................. 210
Assembleias municipais .......................................... 4
Serviços municipalizados ....................................... 12
[untas dc freguesia ............................................... 24
Assembleias de freguesia ....................................... -
[untas de turismo ................................................_1
Total ............................._261
IV — Empresas públicas, nacionalizadas e intervencionadas
Empresas públicas e nacionalizadas ........................ 248
Empresas intervencionadas ..................................... -
Total ............................._248
V — Outras entidades
Presidência da República ....................................... 1
Conselho da Revolução.......................................... 1
Assembleia da República .................................. 16
Serviço do Provedor dc Justiça .............................. 1
Conselho Superior da Magistratura .......................... 1
Tribunais ............................................................ 298
Ministério Público ................................................ 4
Forças Armadas ................................................... 36
Comissão Nacional de Eleições .............................. 1
Comissões de recenseamento .................................. -
Entidades particulares .......................................... 84
Indefinidas ..........................................................._3
Total ............................. 446
QUADRO N.° 6 Características das queixas
I — Situação sóclo-profissional dos reclamantes 1—Queixas individuais
Anónima............................................................. 1
Agricultor ............................................................ 27
Aposentado ou reformado ...................................... 345
Comerciante ......................................................... 27
Deficiente ............................................................ '6
Desempregado ...................................................... 78
Doméstica ............................................................ 76
Emigrante............................................................ 25
Estudante............................................................. 13
Industrial ............................................................ 28
Militar ................................................................. "
Profissão liberal .................................................... '8
Profissão não declarada .......................................... 429
Proprietário.......................................................... "
Recluso ............................................................... 1^4
Sem profissão ....................................................... 1°
Trabalhador da administração central ..................... 550
Trabalhador da administração regional .................... 3
Trabalhador da administração local....................... 39
Trabalhador de empresa pública ou nacionalizada ... 64
Trabalhador do sector privado .............................. 109
Total ............................• 2082
2 — Queixas colectivas
Associações profissionais ....................................... 29
Comissões de moradores ....................................... -
Comissões de trabalhadores .................................... 10
Entidades públicas ................................................ 19
Outros ............................................................... 95
Partidos políticos .................................................. 1
Sindicatos e associações sindicais ........................... 150
Sociedades............................................................ 41
Total ............................. 345
I) — Origem geográfica das queixas I — Distritos continentais
Aveiro ................................................................. 62
Beja .................................................................... 43
Braga .................................................................. 137
Bragança ............................................................. 38
Castelo Branco...................................................... 35
Coimbra ............................................................... 148
Évora.................................................................. 50
Faro .................................................................... 70
Guarda................................................................ 25
Leiria.................................................................. 52
Lisboa ................................................................. 981
Portalegre ............................................................ 43
Porto .................................................................. 341
Santarém ............................................................. 60
Setúbal ................................................................ 145
Viana do Castelo................................................... 38
Vila Real............................................................. 42
Viseu .................................................................. 53
Total ............................. 2 363
2 — Regiões autónomas e território de Macau
Açores ................................................................. 21
Madeira............................................................... 15
Macau ................................................................. 1
Total ............................. 37
3 — Estrangeiro e não identificada
Estrangeiro........................................................... 25
Não identificada.................................................... 2
Total ............................._27
III — Sexo, entidades colectivas, não Identificado
Feminino ............................................................. 635
Masculino ............................................................ 1 521
Entidade colectiva ................................................. 271
Não identificado ................................................... -
Total ............................. 2 427
IV—Intermediário
Assembleia da República ....................................... -
Ministério Público ................................................ -
Total ............................. -
V — Interesse/natureza
Individual ............................................................ 1 964
De grupo ............................................................ 405
Geral .................................................................._58
Total ............................. 2 427
VI — Duração dos processos
Menos de 15 dias ................................................ 360
1 mês ................................................................. 398
2 meses ............................................................... 194
3 meses ............................................................... 238
4 meses ............................................................... 205
5 meses ............................................................... 180
6 meses ............................................................... 130
7 meses ............................................................... 115
8 meses ............................................................... 78
9 meses ............................................................... 90
10 meses .............................................................. 77
11 meses .............................................................. 65
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12 meses .............................................................. 127
18 meses .............................................................. 170
24 meses .............................................................. 78
30 meses .............................................................. 56
36 meses .............................................................. 25
42 meses .............................................................. 39
48 meses .............................................................. 24
54 meses ............................................................. 7
60 meses.............................................................. -
Total ............................. 2 655
QUADRO N.° 7 Funcionamento administrativo do SPJ
I — Correspondência
Número de ofícios recebidos.................................... 7 123
Número de ofícios expedidos ................................. 15 757
II — Atendimento do público
Número de pessoas atendidas pelo Provedor ............ 118
Número de pessoas atendidas pelo adjunto do Provedor 28 Número de pessoas atendidas pelo Sector de Relações
Públicas ............................................................ 2 510
Das quais:
Queixas ................................................... 390
Aditamentos ............................................. 117
Informações sobre o andamento das queixas ... 1 260
Pedidos de arquivo das queixas .................. 5
Pedidos de audiência ................................. 18
Questões fora da competência do SP) ......... 193
Outros assuntos ....................................... 527
Número de contactos telefónicos estabelecidos pelo Sector de Relações Públicas ................................. 437
Dos quais:
Da iniciativa do público ........................... 424
Da iniciativa do Serviço ........................... 13
Insistência na resposta a ofícios do SPJ -
III — Diligências pessoais
Do Provedor ........................................................ 65
Do adjunto do Provedor ....................................... -
Do Sector de Relações Públicas .............................. 8
IV — Reuniões
Reuniões de trabalho internas ................................. -
Reuniões do conselho administrativo ........................ 4
Reuniões de todos os trabalhadores do SPJ sobre assuntos de trabalho e de pessoal ...........................
Reuniões no Serviço com representantes das entidades
visadas ............................................................. 2
Assistência às reuniões do Conselho Superior da Magistratura .............................................................. 9
Assistências às reuniões do Conselho de Estado ......... 2
Participação em congressos, cursos e seminários ......... -
QUADRO N.° 8 Actividades públicas I — Esclarecimento público
Conferências de imprensa ....................................... 2
Entrevistas concedidas à imorensa ........................... 4
Entrevistas concedidas à rádio................................. 3
Entrevistas concedidas à televisão ........................... -
Notas oficiosas ..................................................... -
Palestras proferidas pelo Provedor ........................... -
Palestras proferidas pelo adjunto do Provedor, coordenadores e assessores .......................................... -
II — Visitas técnicas ao serviço Visitas técnicas ao Serviço .................................... 2
GRAFICO N.° 1 Evolução da organização de processos durante o ano
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
GRAFICO ti." 2 Número de processos organizados
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
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GRAFICO N.o 3 Número de processos terminados
"VER DIÁRIO ORIGINAL"
Comentário aos dados estatísticos
1 —O número total de processos abertos em 1984 (2543) foi inferior, em cerca de oito dezenas, ao do ano anterior — no qual também já se verificara, aliás, um decréscimo da mesma ordem.
Aponte-se, de todo o modo, que no ano em análise se utilizara critério diferente do que antes vinha a ser aplicado para o cômputo de queixas exactamente iguais, e relativas a uma mesma situação, embora apresentadas por pessoas diversas. Na verdade, passou a organizar-se, para cada tipo destes casos, apenas um processo. Em 1984, foram recebidas mais de centena e meia de cartas nestas condições.
2 — A distribuição das queixas, entre escritas (1976) e verbais (455) não diferiu essencialmente da que tem vindo a verificar-se. As queixas verbais perfizeram, assim, cerca de 18 % do total das mesmas.
3 — Os processos de iniciativa do Provedor (112) registaram, em relação a 1983, uma diminuição assinalável — cerca de 28 %.
Isto ficou a dever-se, em parte, ao propósito de não dispersar excessivamente o Provedor com situações de importância relativamente menor.
4 — O número global de processos referentes & questões de inconstitucionalidade (81) voltou a subir, cifrando-se em 22 % o seu aumento em relação ao ano precedente.
5 — Foram movimentados 4852 processos, quantitativo da mesma ordem do do período anual anterior.
Assim, cada assessor do Provedor tratou, em média, 323 processos no ano em referência.
6 — Encerraram-se, em 1984, 2708 processos — cerca de centena e meia mais do que ano transacto.
Verificou-se, assim, no ano em questão, um saldo positivo de 169 processos, o que significa uma alteração relevante face à situação ocorrida no ano que imediatamente o precedeu.
7 — Para 1985, transitaram 2144 processos.
8 — Foram rejeitadas, sem decisão sobre o fundo da questão, 584 queixas — percentagem (24 %) correspondente ao habitual.
Nos processos em que o Provedor tomou posição sobre o mérito, verifica-se ter ele formulado 3! recomendações legislativas, 69 recomendações administrativas e 21 reparos. Se o total de reparos se mantém no nível do de 1983, os das recomendações, tanto legislativas como administrativas, reflecte um aumento muito considerável.
O Provedor apresentou, neste ario, 13 pedidos de declaração de inconstitucionalidade.
9 — No ano em causa, alcançou-se solução favorável aos interessados, por virtude da intervenção do Provedor, em 390 processos.
Este número representa 15 % dos processos abertos e 19,9 % do total daqueles em que o Provedor tomou posição sobre o fundo das matérias tratadas.
10 — A seriação dos principais assuntos tratados reproduz com assinalável precisão as tendências dos anos anteriores, e, em particular, do de 1983.
Assim, as matérias mais versadas foram: trabalho (796 — 31,3 % do total), com especial relevo para a Administração Pública, central, regional e local (710 — 27,9%); segurança social (489— 19,2 %); administração da justiça (321 — 12,6 %); direitos fundamentais (162 — 6,3 %); contribuições e impostos (118 — 4,6%).
11 — No tocante à administração central, o elenco dos departamentos mais visados continua a apresentar grande semelhança com o dos anos anteriores.
Aponte-se, de todo o modo, em confronto com 1983, o aumento relativo dos casos respeitantes à área das Finanças e do Plano, e o decréscimo aparente dos atinentes a matéria da Segurança Social e da Saúde (aparente, frise-se, por derivar da repartição de competências, antes unificadas, por dois Ministérios diferentes).
Assim, os Ministérios em relação aos quais se organizaram mais processos foram, em 1984: Finanças e Plano (275— 10,8 %); Educação (274—10,8 %); Trabalho e Segurança Social (234 — 9 %); Seúde (151 —5,9%); Justiça (124 —4,9%).
Quanto à administração local, a maioria dos casos reporta-se, como é natural, dado o âmbito relativo da sua competência, às câmaras municipais (210 — 8,2 %).
Continuam a merecer realce, no que respeita a outras entidades, os quantitativos de casos relativos a empresas públicas e nacionalizadas (248 — 9,8 %) e a tribunais (298— 11,7 %).
Apesar de a sua expressão percentual ser ainda muito reduzida assinale-se, de todo o modo, o acréscimo de processos atinentes à Forças Armadas (36 — 1,4 %).
Continua, enfim, a ser mínimo o conjunto de casos suscitados em relação às regiões autónomas — 9 para os Açores, 3 para a Madeira.
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12 — Quanto à situação sócio-profissional dos queixosos, subsistem as posições relativas que se vêm observando praticamente desde o início destes relatórios.
Anote-se, apenas, em confronto com 1983, e em valores absolutos, uma subida no quantitativo de queixas de aposentados e reformados, e uma descida nas provindas de trabalhadores da função pública e de desempregados (este último dado é, porém, em parte, explicável pela desagregação, de acordo com os critérios preconizados pelo Instituto Nacional de Estatística, da anterior rubrica «Desempregados e sem profissão»).
Assim, receberam-se os seguintes totais de queixas: 765 (31,5 %) de trabalhadores por conta de outrem com especial relevo para os da administração central (550 — 22,6 %); 345 (14,2 %) de aposentados e reformados; 134 (5,5 %) de reclusos; 78 (3,2 %) de desempregados: 78 (3,2 %) de membros de profissões liberais; 76 (3,2 %) de domésticas.
Merece referência, ainda, o número de queixas formuladas por associações sindicais (150 — 6,1 %), bastante mais relevante que o das oriundas de associações patronais (29 —1,1 %) ou de empresas sob forma de sociedades (41 — 1,6 %).
13 — No que concerne à origem geográfica das queixas, os 5 distritos que maior número delas forneceram foram, uma vez mais, os de Lisboa (981 —40,4 %), Porto (341 — 14%), Coimbra (148 — 6,1%), Setúbal (145 — 6,1 %) e Braga (137 — 5,6%).
De entre os distritos de onde são recebidas menos queixas, a subida relativa de Évora, Beja e Portalegre (e muito embora as diferenças sejam, a esse nível, pouco expressivas) ficou decerto a dever-se à des-locação que, em 1984, o Provedor fez às respectivas capitais, com vista a atender as reclamações de cidadãos aí residentes.
As queixas remetidas das regiões autónomas continuam a assumir valores muito modestos (21 dos Açores, 15 da Madeira).
E as obtidas do estrangeiro de novo se situaram entre as duas e três dezenas (25).
14 — O total de reclamantes do sexo feminino (635 — 29,4 %) de novo não atingiu metade do dos sexo masculino (1521 — 70,6 %).
15 — Um importante número de processos teve por objecto interesses supra-individuais.
Assim, 405 (15,9 %) referiram-se a interesses de grupo e 58 (2,2 %) a interesses gerais dos cidadãos.
16 — Considerando, enfim, a duração dos processos encerrados em 1984 (melhor: daqueles em relação aos quais é possível fazer este apuramento, pois os correspondentes dados só passaram a ser organizados a partir de 1979), verifica-se que 760 (28,5 %) foram concluídos dentro de 1 mês; 1709 (64,1 %) no prazo de 1 semestre; e 2292 (84,9 %) no período de 1 ano.
Em confronto com 1993 houve, assim, um acréscimo de mais de 4 % tanto nos processos terminados dentro do 1 ° semestre como nos finalizados no I decurso do ano em referência.
A duração média dos processos acabados em 1984 foi de 7, 6 meses. Este aumento de quase 1 mês, em comparação com o ano precedente, resulta do facto de, no período em análise, se ter concluído maior inúmero de processos transitados de anos anteriores.
CAPITULO III
Processos relativos a questões de Inconstitucionalidade
Em 1984, o Provedor apresentou ao Tribunal Constitucional 13 pedidos de declaração de inconstitucionalidade.
Num destes casos, o Tribunal Constitucional pronunciou-se negativamente em relação ao solicitado.
Os restantes não tinham, no termo do ano, sido ainda decididos.
A) Principais processos que não deram origem a pedido de declaração de inconstitucionalidade
1 — Propriedade da farmácia
Processo n.° 83/R-788-B-1
1 — Uma associação de profissionais da actividade farmacêutica suscitou ao Provedor o problema da inconstitucionalidade do regime em vigor relativamente à propriedade de farmácias, na medida em que não faculta o acesso a esta a todos e quaisquer cidadãos.
2 — O Provedor entendeu, porém, que as normas da base n da Lei n.° 2125, de 20 de Março de 1968 (Exercício da actividade de farmácia) e dos artigos 39.°, 45.°, 76.° e 83.° do Decreto-Lei n.° 48 547, de 27 de Agosto de 1968 (Exercício da profissão farmacêutica), que limitam a propriedade de farmácias aos farmacêuticos não ofendem as disposições da Constituição, designadamente as dos seus artigos 13.°, 47.°, n.° 1, e 62.°
3 — A posição assumida pelo Provedor de Justiça baseou-se no parecer do assessor encarregado do processo, que a seguir se transcreve.
4 — Entretanto a Associação Nacional de Farmácias achava por bem enviar ao Provedor de Justiça um parecer do Prof. Freitas do Amaral emitido, sobre o assunto a seu pedido.
Também a Ordem dos Farmacêuticos remeteu fotocópia de parecer do Prof. Jorge Miranda relativo ao assunto em questão. Com ambos estes pareceres se concluiu também pela constitucionalidade do regime da propriedade de farmácias contemplado na Lei n.° 2125 e no Decreto-Lei n.° 48 547.
5 — Parecer do assessor:
1 — A Associação Portuguesa dos Técnicos de Farmácia (APTF) suscitou perante o Provedor de Justiça a questão da inconstitucionalidade do regime de propriedade de farmácias estabelecido na Lei n.° 2125, de 20 de Março de 1965, alegando, basicamente, o seguinte:
a) A base it da citada lei, ao restringir a propriedade das farmácias a farmacêuticos, norteou-se por princípios corporativos, ao tempo vigente, sem qualquer eficácia nos dias de hoje;
b) O objectivo daquela disposição foi o de proteger, economicamente, uma categoria profissional, que não a saúde pública — uma vez que esta não passa pela questão da propriedade do estabelecimento, mas sim por uma boa e efectiva direcção técnica do mesmo;
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c) Tanto assim é que a lei se não preocupa com a saúde pública quando a farmácia não é propriedade de farmacêutico (base xii da citada lei);
d) O argumento da necessidade de garantir a independência profissional do farmacêutico não colhe porque profissionais liberais há que prestam os seus serviços técnicos na dependência de outras pessoas; e mesmo nas farmácias que são legalmente propriedade de não farmacêuticos nunca constou que tenham surgido problemas;
é) Mesmo que pudessem surgir questões nesse âmbito, a solução das mesmas passará pela aprovação de normas que garantam o exercício da profissão de director técnico;
f) O regime vigente ofende assim o princípio da igualdade do artigo 13.°, o direito de livre escolha de profissão do n.° 1 do artigo 47.° e o direito de propriedade privada garantido pelo artigo 62.°, todos da Constituição da República.
2 — A Lei n.° 2125, que aprovou as bases para o exercício da actividade farmacêutica, determina no n.° 1 da sua base ii que «as farmácias só poderão funcionar mediante alvará passado pela Direcção-Geral de Saúde e que este é 'pessoal' apenas podendo 'ser concedido a quem é permitido ser proprietário de farmácia'».
No seu n.° 2 acrescenta que «o alvará apenas poderá ser concedido a farmacêuticos ou a sociedades em nome colectivo ou por quotas, se todos os sócios forem farmacêuticos e enquanto o forem». E no seu n.° 3 esclarece que «a nenhum farmacêutico ou sociedade poderá ser concedido mais de um alvará e que nenhum farmacêutico poderá pertencer a mais de uma sociedade ou pertencer a ela e ser proprietário individual de uma farmácia», fixando, paralelamente, incompatibilidade entre a propriedade de uma farmácia ou a gerência técnica de uma sociedade e o desempenho de funções inconciliáveis com o exercício efectivo da actividade farmacêutica.
Essas bases foram regulamentadas pelo Decreto-Lei n.° 48 547 (Exercício de profissão farmacêutica), designadamente nos seus artigos 39.°, 45.°, 76.° e 83.°
De acordo com as disposições em causa, constata-se ter a lei estabelecido o princípio da indivisibilidade da propriedade de farmácia e da sua exploração e gerência técnica, em ordem a assegurar que a propriedade de tal estabelecimento seja exclusivamente reservada a farmacêuticos e a «que a gestão do farmacêutico seja, ao mais alto grau pessoal, livre e inteiramente independente— condição necessária para uma melhor salvaguarda da saúde pública» ('). Tal regime
(') Transcrição do parecer da Câmara Corporativa sobre o projecto de proposta de lei que originou a Lei n.° 2125, in Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Oeral da Renública, n.° 140/82, de 25 de Novembro, publicado no Diário da República, 2.* série, n.° 150, de 2 de Julho de 1983.
restritivo da propriedade será conforme às regras e princípios da Constituição da República?
3 — Sem pôr em causa que a Lei n.° 2125 e o Decreto-Lei n.° 48 547 hajam sido aprovados na vigência da Constituição de 1933, cujo artigo 5.° dispunha que o Estado Português era uma República unitária e corporativa, o certo é que a inspiração corporativa desses diplomas não implicará, de maneira automática, a desconformidade das respectivas disposições perante o actual ordenamento constitucional. Dito de outro modo; não é pelo facto de terem sido inspirados pelo corporativismo que esses diplomas (e o regime da propriedade que consagram) se revelara inconstitucionais. A inconstitucionalidade derivará, sim, do eventual desrespeito por esse regime de propriedade das normas e princípios consagrados na actual Constituição.
Ê que, a não se entender assim, todos os organismos de coordenação económica (comissões reguladoras, juntas nacionais e institutos) criados pelo Decreto-Lei n.° 26 757, de 8 de Tulho de 1936, teriam também de ser considerados inconstitucionais, hipótese que se revela absurda. E inconstitucionais seriam as próprias ordens profissionais.
4 — Quanto ao objectivo visado pelo regime posto em crise pela associação, não poderá concluir-se que residirá na protecção económica de uma determinada classe profissional.
Com efeito, as disposições da Lei n.° 2125 e do Decreto-Lei n.° 48 547 são elucidativas quando considerem que a actividade de farmácia é de interesse público e que os farmacêuticos exercem porfissão liberal (base i, n.M 1 e 3), mas não como meros comerciantes (artigo 12.° do Decreto-Lei n.° 48 547). Por outro lado, as normas referidas no n.° 2 são concludentes relativamente à mens legis: o princípio da indivisibilidade da propriedade da farmácia e da sua exploração e gerência técnica pretendem assegurar que a propriedade da farmácia seja reservada exclusivamente a farmacêuticos para que a gestão destes seja pessoal, livre e independente e, desta maneira, se defenda melhor a saúde pública. O escopo da lei não deixa margem a dúvidas.
Ao restringir a propriedade da farmácia aos licenciados em farmácia, a lei não se preocupou em privilegiar os farmacêuticos. Embora estes retirem, reflexa e objectivamente, um benefício de tal regime restritivo (2), este busca acautelar mais eficazmente a saúde pública. Todo aquele regime restritivo encontra-se, pois, submetido à necessidade de defender aquele interesse colectivo e não à situação económica dos farmacêuticos. Daí o não poder sustentar-se que a saúde pública não passa pela propriedade mas apenas pela direcção boa e efectiva do estabelecimento. Ê que a propriedade da farmácia e a exploração e gerência técnica da mesma estão indissociavel-mente ligadas para salvaguardar a saúde pública — não podendo autonomizar-se, face ao descrito quadro legal, o elemento ou factor di-
O Porque não se trata de actividade consentida a todos os cidadãos, mas sim a uma certa categoria de profissionais e, portanto, com concorrência perfeitamente limitada.
É.
\
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recção técnica e conceder-lhe um relevo decisivo que a lei lhe não confere.
Assim, e contrariamente ao que sustenta a reclamante o escopo da lei não é a protecção económica dos farmacêuticos —hipótese que, a admitir-se, ofenderia a Constituição no seu artigo 13.°, porque representaria a consagração de uma prática discriminatória— mas a saúde pública. E isto, através de um esquema específico da propriedade do estabelecimento e da respectiva exploração e gerência técnica, conforme ficou referido.
Ora o argumento da reclamante para além de partir de um pressuposto errado quanto ao objectivo da própria lei, levaria à consagração de um regime de dependência funcional, que a seu tempo será apreciado, o qual poderia fazer perigar a autonomia que a lei confere aos farmacêuticos no exercício de uma profissão que se quer liberal.
5 — Não colhe o argumento da alínea c) do n.° 1 do presente parecer, porque se trata de norma de carácter transitório e de índole excepcional. Com efeito, a Lei n.° 2125 não deixa de preocupar-se com a saúde pública quando excepciona do respectivo âmbito de aplicação as farmácias que à data da sua publicação não fossem propriedade de farmacêuticos.
O n.° 2 da base xrr da Lei n.° 2125 determina que «continuam sujeitas ao disposto no ar-artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 23 422, de 29 de Dezembro de 1933, as farmácias que à data da publicação desse diploma não fossem propriedade de farmacêuticos». Por sua vez, o artigo em causa dispõe que «as farmácias que actualmente não são propriedade de farmacêutico ou farmacêuticos podem continuar a laborar nas condições da legislação anterior à publicação deste decreto, enquanto não mudem de proprietário por venda, doação, cedência ou qualquer outra forma».
Da letra das disposições transcritas resulta, sem equívocos, a natureza necessariamente transitória dos n.os 2 e 3 da base xn da Lei n.° 2125. Aliás, o próprio Decreto-Lei n.° 23 422 já consagrava (artigo 1.°) o princípio da indivisibilidade e a reserva da propriedade das farmácias aos farmacêuticos.
6 — O argumento da alínea d) do n.° 1 também não procede — pois a profissão liberal caracteriza-se, essencialmente, pela independência no respectivo exercício. De outro modo não seria liberal. Daí que se mostre contraditória a afirmação da Associação, de que há profissionais liberais a prestar serviço na dependência de outras pessoas, ê que, a existir dependência, es-tar-se-á em presença de trabalhador por conta de outrem, mas não, seguramente, de profissional liberal. Ora já vimos que a Lei n.° 2125 impõe o regime restritivo a fim de garantir que a gestão do farmacêutico seja pessoal, livre e inteiramente independente. E também se constatou que com esse tipo de gestão se procura salvaguardar mais eficazmente a saúde pública.
Com a indivisibilidade da propriedade da farmácia e da sua exploração e gerência procura a lei, pois, defender a saúde pública.
Tal objectivo poderá ser conseguido, na óptica da reclamante, através da dependência profissional dos farmacêuticos, pois haverá profissionais liberais que «prestam serviços técnicos na dependência de outras pessoas» e mesmo farmácias propriedade de não farmacêuticos, nas quais não consta que tenha havido problemas.
Começamos por referir que a definição dos meios para a prossecução de certo interesse público (neste caso a saúde pública, através da actividade das farmácias) envolverá uma certa dose de discricionariedade. Saber se, em certo momento, a saúde pública resulta melhor defendida por este ou aquele regime de propriedade e gestão é uma tarefa que poderá implicar a concessão à administração de uma margem de discricionariedade na escolha das vias que melhor possam garantir tal objectivo.
Ora, nem isso sucedeu com a Lei n.° 2125, uma vez que esta fixou, à partida, regras e princípios que vinculam a administração no tocante ao regime de propriedade, de exploração e gestão de farmácias.
Tratar-se-á, pois, de normas de interesse e ordem pública interna estabelecidas pela lei que aprovou as bases para o exercício da actividade de farmácia. Daí que as normas e princípios da Lei n.° 2125 relativos às matérias em questão sejam absolutamente imperativos, e inderrogá-veis pela vontade dos particulares, uma vez que se inserem nos «quadros fundamentais do sistema» nos quais se alicerça a ordem económico--social (3).
Por outro lado, e como já foi salientado, é contrário ao conceito de profissional liberal a subordinação deste a um terceiro no exercício da respectiva actividade, sabido que o carácter liberal advém, precisamente, da independência no exercício da profissão. Para além disso, seria discutível, no presente quadro de valores, legalmente fixado, defender a tese da reclamante, uma vez que esta associação não logrou demonstrar, sequer, que a sujeição do farmacêutico investido apenas nas funções de director técnico da farmácia (sem ser simultaneamente proprietário do estabelecimento) servirá melhor o objectivo de defesa da saúde pública visado pela base h da Lei n.° 2125. Aliás, o ponto de vista da reclamante merece a este propósito sérias reservas. Desde logo, porque a dependência funcional pretendida poderia, através de pressões de vária ordem da entidade proprietária, neutralizar a acção do farmacêutico como profissional liberal. E não seria através do estatuto específico de director técnico que tal dependência deixaria de existir e de se reflectir na gestão do estabelecimento. Pense-se, por exemplo, na possibilidade de idudir o objectivo visado por lei por meio de pressões de carácter económico e de criação de ambiente ao despedimento do farmacêutico empregado por conta de outrem.
7— O regime de propriedade com as restrições apontadas aproxima-se bastante do vigente,
O Lições de Direito Internacional Privado, do Prof. f. B. Machado, p. 254.
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por exemplo, no direito francês, no qual é proibido a não farmacêuticos o acesso à propriedade de farmácias (sem prejuízo do regime transitório e excepcional de a farmácia poder ser propriedade de não formacêuücos em caso de falecimento do respectivo proprietário farmacêutico) e está consagrado o princípio da indivisibilidade (4). Também no tocante ao direito comparado a reclamante não ultrapassou a mera afirmação de que «são muito raros os países que consagram limitações».
8 — O regime de propriedade de farmácias posto em causa pela associação reclamante não se revela ofensivo da lei fundamental, porquanto:
o) Para se verificar procedimento discriminatório (artigo 13.°, será indispensável o tratamento desigual do que é essencialmente igual, ou tratamento igual de realidades essencialmente distintas, sendo certo que a qualificação das situações como iguais ou desiguais depende do carácter idêntico ou distinto dos seus elementos essências (5);
b) No caso descrito não se conclui pela existência de procedimento discriminatório, uma vez que não são essencialmente iguais, perante a lei, as situações dos farmacêuticos e dos ajudantes de farmácia, submetidos que estão a regimes de estudo e de estatutos profissionais completamente diferentes;
c) A lei não quis privilegiar os primeiros em relação aos segundos, mas sim limitar o acesso da propriedade de farmácia aos farmacêuticos, por considerar que estes oferecerão maiores garantias para a defesa do interesse colectivo (saúde pública), mercê da sua mais cuidada preparação profissional e do estudo que rege o exercício da actividade de farmacêutico;
d) Não resulta violado o preceito do n.° 1 do artigo 47." da Constituição, sabido que se não está em presença de uma disposição (base n da Lei n.° 2125) que obste ao direito de livre escolha de profissão, mas que restringe a propriedade dos estabelecimentos de farmácia aos titulares de uma determinada qualificação profissional, isto é, aos licenciados em farmácia;
c) Os cidadãos continuam a poder escolher livremente a profissão ou género de trabalho na vigência da disposição em causa da Lei n.° 2125, a qual não afecta a faculdade de opção;
O Ver Droit de la Santê, de Jean Marie Auby, p. 137, edições PUF, colecção «Themis».
(5) Ci. Constituição da República Portuguesa, anotada por Vital Moreira e J. Gomes Canotilho. Ver tamhém o «Regime dos Direitos. Liberdades e Garantias», do Prof. Jorge Miranda, in Estudos sobre a Constituição, vol. 3, pp. 56 e seguintes e o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria--Geral da República, n.° 160/79, in Diário da República, 2.' série. n.° 84, de 10 de Abril de 1980.
/) O artigo 47.°, no seu n.° 1, prevê, aliás, restrições legais ao direito de livre escolha de profissão decorrentes do interesse colectivo ou inerentes à própria capacidade das pessoas;
g) O artigo 63.° da Constituição (direito de propriedade privada) não é ofendido pela Lei n.° 2125, a qual proíbe o acesso à propriedade privada das farmácias, mas tão-somente limita sse acesso aos cidadãos que sejam titulares de uma qualificação profissional específica;
h) O artigo 62.° não fornece, aliás, apoio algum para definição de um conteúdo mínimo da propriedade, uma vez que se limita a salvaguardr a titularidade de um direito (*);
i) A Lei n.° 2125, na sua base n, e o De-creto-Lei n.° 48 547, reconhecem o direito de propriedade privada sobre as farmácias com as restrições já apontadas na mira de defender mais eficazmente a saúde pública no domínio da venda de medicamentos num regime de autêntico monopólio O-
Termos em que, por se não justificar o uso, pelo Provedor de Justiça, da faculdade que lhe é conferida pela alínea a) do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição da República, se nos afigura de arquivar o processo.
2 — Regulamentação do Imposto de turismo
Processo n.° 83/R-929-0I-14-B
1 — A Comissão Regional de Turismo do Algarve trouxe ao Provedor o problema da apreciação da constitucionalidade do Decreto-Lei n.° 134/83, de 19 de Março, que estabeleceu a regulamentação do imposto de turismo.
Alegava, por um lado, que esse diploma era organicamente inconstitucional, por emanado já fora do prazo de validade da autorização legislativa em que se baseara, e, por outro, que era ofensivo do princípio da descentralização o modo como nele se operava a distribuição das receitas do imposto de turismo.
2 — Sobre a questão elaborou a assessora encarregada do caso o seguinte parecer:
í — Em execução da autorização legislativa concedida pelo artigo 55." da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, e nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição, foi, em 19 de Março de 1983, publicado o Decreto-Lei n.° 134/83, que aprova o Regulamento do Imposto de Turismo.
2 —O artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, com a epígrafe «Imposto de turismo» dispõe que:
Fica o Governo autorizado a rever a incidência, isenções, taxa, garantias dos contribuintes e regime de cobrança do imposto de turismo.
O Cf. A Tutela Constitucional da Autonomia Privada, de Ana Prata, pp. 192 e seguintes.
(') Cf. Auby. Droit de la Santê, pp. 181 a 183.
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3— De acordo com o artigo 168.°, n.° 1, da Constituição, é reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República:
i) Criação dos impostos e sistema fiscal.
4 — Conforme dispõe ainda o artigo 168.°, n.° 4, da Constituição da República Portuguesa:
4 — As autorizações caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas, com o termo da legislatura ou com a dissolução da Assembleia da República.
5 — Vem a Comissão Regional de Turismo do Algarve solicitar ao Provedor de Justiça que, ao abrigo do n.° 1, alínea a), do artigo 281.° da Constituição da República Portuguesa, promova a declaração de inconstitucionalidade «de todo o Decreto-Lei n." 134/83, ou, pelo menos, do disposto no n.° 4 e no n.° 5 do artigo 36.° do mesmo diploma».
O Decreto-Lei n.° 134/83, de 19 de Março, foi aprovado pelo Governo «nos termos das alíneas a) e b) do n.° 1 do artigo 201.° da Constituição da República Portuguesa», isto é, no exercício de funções legislativas «em matérias não reservadas à Assembleia da República» [alínea a)] e «em matérias de reserva relativa da Assembleia da República, mediante autorização desta» [alínea 6)J.
6 — A primeira questão que se me afigura ter de ficar resolvida é a de verificar quais as disposições do Regulamento do Imposto de Turismo, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 134/83, que cabem na competência legislativa do Governo ou na reserva legislativa relativa da Assembleia da República, visto só poder ser pedida a declaração de inconstitucionalidade, por violação do n.° 1, alínea b), do artigo 201." da Constituição da República Portuguesa, de disposições concretamente indicadas e não de um diploma total, que contenha eventualmente também disposições [porque legisladas ao abrigo da alínea g) do mesmo normativo constitucional], compatíveis com a lei fundamental.
7 — Como já referido, o artigo 168.°, n.° 1, alínea /), da Constiuição da República Portuguesa, inclui na reserva relativa da competência legislativa da Assembleia da República a «criação de impostos e sistema fiscal».
Estando já criado o imposto de turismo, interessa verificar se as disposições do regulamento aprovado pelo Decreto-Lei n.° 134/83 cabem no «sistema fiscal» referido naquele normativo.
8 — O artigo 106.° da Constituição da República Portuguesa, com a epígrafe «Sistema fiscal», determina, no seu n.° 2, que:
2 — Os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes.
Como se escreve no parecer da Comissão dos Assuntos Constitucionais, votado por unanimidade e publicado no suplemento ao Diário da Assembleia da República, n.° 59, de 27 de Dezembro de 1976:
A Constituição não se limita a referir que a criação dos impostos e o sistema fiscal constituem matéria da exclusiva competência da Assembleia da República, mas, num claro intuito de definir a extensão dessa competência e simultaneamente garantir os cidadãos, vai mais longe e especifica os pontos que têm obrigatoriamente de ser regulados pela lei da Assembleia:
A criação de impostos;
A incidência destes;
A sua taxa;
Os benefícios fiscais;
As garantias dos contribuintes.
9 — Deste modo, qualquer decreto-lei sobre essas matérias, quando aprovado pelo Governo, sem autorização legislativa da Assembleia da República, é organicamente inconstitucional.
10 — O Decreto-Lei n.° 134/83 que vem proceder «à reformulação do regime jurídico do imposto de turismo, antes regulamentado pelo Decreto-Lei n.° 279/80, de 14 de Agosto», que expressamente revoga, é evidente conter normativos que, face ao disposto no artigo 168.°, n.° 1, alínea i), conjugado com o artigo 106.°, n.° 2, e o artigo 201.°, n.° 1, alínea ò), da Constituição da República Portuguesa, só cabem na competência legislativa do Governo se esta lhe for autorizada pela Assembleia da República (designadamente os artigos 1.°, 2." e 4.° do regulamento que lhe é anexo e dele faz parte integrante e todos os restantes que, sem sombra de dúvida, estão abrangidos pela competência exclusiva da Assembleia da República, embora relativa e não absoluta).
Algumas outras disposições daquele regulamento que caibam dentro da competência legislativa do Governo, nos termos da alínea a), n° 1, do artigo 201.° da Constituição da República Portuguesa, embora constitucionais, a virem aqueles outros a ser reconhecidos como inconstitucionais, não poderão, também, de qualquer forma, manter--se em vigor, por falta de conteúdo, que os torne exequíveis —nomeadamente, por exemplo, os constantes da «Determinação da matéria colectável» — artigos 5.° e seguintes, se for reconhecida a inconstitucionalidade dos artigos 1.° e 2.° do regulamento em questão.
11 — Assente, assim, esta primeira questão, há agora que se averiguar se o Governo, ao aprovar o Decreto-Lei n.° 134/83, estava ainda no uso da autorização legislativa que lhe foi concedida pelo artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, que invoca, e cujo normativo se transcreve no n.° 4.
12 — Como já referido, o artigo 168.°, n.° 4, da Constituição da República Portuguesa entendeu que «as autorizações caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas [...]»
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A disposição correspondente (artigo 168.°, n.° 3) da Constituição da República Portuguesa de 1976, estipulava, diferentemente, que:
3 — As autorizações caducam com a exoneração do Governo.
Assim, e como se escreve em Constituição da República Portuguesa, de António Nadais, António Vitorino e Vitalino Canas, p. 195:
[...] passou a dizer-se que as autorizações caducam com a demissão do Governo a que tiverem sido concedidas (artigo 168.°, n.° 4), em vez de se dizer que caducam com a exoneração desse Governo (artigo 168.°, n.° 3, do texto anterior); face ao texto de 1976, a doutrina era da opinião de que a demissão do Governo pela Assembleia da República também implicava a caducidade das autorizações legislativas concedidas a esse Governo, até porque essas autorizações pressupõem unia certa confiança da Assembleia da República no Governo, confiança que é posta em causa, decisivamente, com a demissão do Governo pela Assembleia da República, portanto, face ao texto original da Constituição, devia entender-se que as autorizações caducavam (entre outras causas que se mantêm no texto actual) com a exoneração do Governo pelo Presidente da República (com rigor, exoneração do Primeiro-Ministro) (v. artigos 136.°, alínea /), e 189.°] e com a demissão do Governo pela Assembleia da República (cujas causas vinham referidas no artigo 198.°, n.° 1); aceitando-se este entendimento do texto anterior (que parece correcto) não há, no texto actual, qualquer alteração do regime, uma vez que já vimos que, neste texto actual, a demissão do Governo inclui o «derrube» do Governo pelo Presidente da República, como resulta dos artigos 136.°, alínea g), e 198.°, n.° 2. Portanto, a partir do momento em que o Governo é «derrubado» caducam as autorizações legislativas que lhe tenham sido concedidas. A única eventual diferença em relação ao texto anterior reside na determinação do momento em que se verifica aquela caducidade; face ao texto de 1976, era defensável que só se verificava com a cessação de funções do Governo, o que, nos casos de demissão pela Assembleia da República (n.° 4 do anterior artigo 189.°), e também, segundo parte da doutrina, nos casos de exoneração pelo Presidente da República, só se verificava com a tomada de posse do novo Governo; actualmente as autorizações caducam com a demissão do Governo e não no momento da sua cessação (v. quanto a este, o novo artigo 189.°).
ê interessante citar ainda que em Constituição da República Portuguesa, de J. G. Gomes Cano-tilho e Vital Moreira, p. 337, se opina, em relação às disposições do texto de 1976, que as autorizações legislativas caducavam com a demissão do Governo pela Assembleia da República e não com a sua cessação de funções.
¡3 — Pelo Decreto n.° 136-A/82, de 23 de Dezembro, publicado no suplemento ao Diário da República, 1." série, n.° 295, de 23 de Dezembro (distribuído em 31 desse mês), foi pelo Presidente da República «demitido o Governo, por efeito da aceitação do pedido de demissão apresentado pelo Primeiro-Ministro, Dr. Francisco José Pereira Pinto Balsemão».
14 — Conforme se lê em Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Fevereiro de 1983 (v. Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, n.° 257, ano xxn, pp. 579 e seguintes):
Conforme jurisprudência do Tribunal, no caso de divergência entre a data do jornal oficial (no caso em apreço o suplemento ao Diário da República, n.° 295, de 23 de Dezembro de 1982) e a da efectiva colocação do mesmo à disposição do público (no caso em questão, conforme informação dada pela Imprensa Nacional, em 31 de Dezembro de 1982) é a esta que se atende para todos os efeitos ligados à publicação (cf., como os nele citados, o Acórdão de 8 de Março de 1979, nos Acórdãos Doutrinais, n.° 211, p. 569; veja-se, no mesmo sentido, o parecer da Procuradoria-Geral da República, n.° 23/ 79, no Diário da República, 2.a série, de 30 de Maio).
15 — Deste modo, afigura-se-me facto assente que o Governo na vigência do qual foi concedida a autorização legislativa dada pela Assembleia da República pelo artigo 55." da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezmbro, estava demitido pelo Presidente da República a partir de 31 de Dezembro de 1982.
16 — Este é, também, segundo penso, o limite da data da vigência da autorização legislativa concedida pela Assembleia da República, no artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro de 1981 (Orçamento Geral do Estado para 1982).
17 — Conforme dispõe o n.° 2 do artigo 168.° da Constituição da República Portuguesa:
As leis de autorização legislativa devem definir o objecto, o sentido, a extensão e a duração da autorização, a qual pode ser prorrogada.
18 — Acontece, porém, que a autorização legislativa em causa está inserida na lei orçamental para 1982 e, como tal, embora no artigo 55.° daquela lei, que confere tal autorização, se não explicite, como impõe a disposição do n.° 2 do artigo 168.° da Constituição da República Portuguesa, a duração da autorização conferida, é óbvio que a mesma terá a duração anual da vigência da lei em que se insere.
Esta posição é, aliás, a definida no já citado Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10 de Fevereiro de 1983, onde, no «Sumário» se lê:
IV — As autorizações contidas na lei orçamental, para o Governo legislar sobre ma-
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térias fiscais, como instrumentos da politica financeira global nela definida para o ano económico a que respeita a lei, não carecem de fixação de prazo específico de duração, exigido para as autorizações legislativas em geral, pelo n.° 1 do artigo 168.° da Constituição (texto original), por a duração daquelas autorizações estar naturalmente implícita na sujeição da lei orçamental, em que se integram as mesmas, ao princípio da anualidade.
Como no mesmo acórdão se escreve ainda:
Sendo assim, parece de aceitar que, salvo disposições em contrário, a duração das autorizações legislativas da espécie em análise resulta automática e implicitamente do prazo de vigência da própria lei orçamental em que se integram, limitada a mesma, como se viu, ao ano económico a que tal lei respeita, e que, nos termos do artigo 2.° da citada Lei n.° 64/ 77, de 26 de Agosto (Lei de Enquadramento do Orçamento Geral do Estado), coincide com o ano civil.
19 — Conclui-se, assim, também em 31 de Dezembro de 1982, caducou a autorização legislativa conferida pelo artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, ao Governo que a partir daquela data ficou demitido pelo Presidente da República.
20 — Acontece, porém, que o Decreto-Lei n.° 134/83 foi publicado em 19 de Março daquele ano.
Será, assim, este diploma organicamente inconstitucional, por ter já caducado na data da sua publicação a autorização legislativa que pela Assembleia da República foi conferida, até 31 de Dezembro de 1982, ao Governo que naquela mesma data foi também demitido?
21—Nos termos do artigo 122.°, n.° 4, da Constituição da República Portuguesa de 1976, a falta de publicação no Diário da República dos decretos e regulamentos do Governo implicava a sua inexistência jurídica. «Ao aludir a decretos e regulamentos do Governo [n.° 2, alínea /)] a Constituição abrange, quer decretos-leis, quer os decretos regulamentares» [cf. Lei n.° 8/77, artigo 3.u, n.° 1, alínea c)], quer os decretos simples, quer ainda os decretos de aprovação de tratados [artigos 200.°, alínea a), e 277.°, n.u 1] (').
Consequência que se tem perfilhado como inevitável daquela disposição é a de que como se lê na já citada obra, p. 336:
Os decretos-leis autorizados devem ser publicados durante o período da autorização, pois só a publicação lhes dá existência e não é possível controlar o momento da aprovação.
E na mesma citada obra, de seguida, se escreve:
A solução pode, porém, dar lugar a consequências pouco razoáveis, uma vez que a data da publicação não depende do Governo.
(') Constituição da República Portuguesa, anotada por /. G. Gomes Canotilho e Vital Moreira, p. 277.
22 — No texto da Constituição, segundo a Lei Constitucional n.° 1/82. de 30 de Setembro, a citada disposição do artigo 122.°, n.° 4, foi alterada, dispondo-se agora no n.° 2 do artigo 122.°, que lhe corresponde, que a falta de publicidade daqueles diplomas «implica a sua ineficácia».
23 — Assim, e como se lê em Constituição da República Portuguesa, anotada por António Nadais, António Vitorino e Vitalino Canas, p. 196:
Problema que o novo texto constitucional deixa em aberto é o de saber em que momento é que se considera que a autorização legislativa é utilizada: no momento da promulgação do decreto pelo Presidente da República, no momento da referenda a essa promulgação ou no momento da aprovação desse decreto? A Constituição não o diz. A favor da tese do momento da promulgação ou da referenda poder-se-á dizer que, sem esses actos, não há decreto-lei, e, portanto, não há utilização da autorização (v. artigos 140.° e 143.°, n.° 2, sobre os efeitos da falta de promulgação e de referenda); saliente-se que o mesmo se não poderá dizer do momento da publicação, uma vez que, face ao novo artigo 122.°, n.° 2, a falta desta implica apenas a ineficácia jurídica do decreto-lei e não a sua inexistência jurídica, como acontecia anteriormente (v. artigo 122.°, n.° 4, do texto de 1976); a favor da tese do momento da aprovação poder-se-á dizer que o exercício da competência legislativa do Governo consiste na aprovação, por este, de decretos-leis e não na sua promulgação ou referenda (o que, aliás, também se passa cora a Assembleia da República, cujo exercício da competência legislativa se manifesta na aprovação de leis), além de que, a não ser adoptada esta tese, o Presidente da República, como órgão de promulgação, poderia obstar ao cumprimento do prazo estabelecido na lei de autorização, o que não parece correcto.
A argumentação usada a favor de que o uso da autorização legislativa deve ser aferida ao momento em que pelo Governo é aprovado o diploma legal em que se faz uso daquela autorização — e que é a que se perfilha — afigura-se-me que se pode aditar ainda o seguinte:
Se a autorização legislativa pela Assembleia da República é conferida ao Governo, parece-me que a mesma pode dirigir-se aos momentos em que daquela o Governo pode fazer uso, isto é, até ao último momento em que o Governo pode intervir no acto de uso daquela autorização.
Dizer que um decreto-lei é organicamente inconstitucional, embora o Governo nele tenha exercido toda a acção que lhe competia no prazo em que a Assembleia da República lhe conferiu autorização legislativa para o fazer, só porque depois, na tramitação seguinte — e em que o Governo já não pode intervir— aquela autorização —dada ao Governo— caducou, afigura-se-me absurdo.
Se os actos praticados pelo Governo para a emanação do deoreto-lei em questão vêm posteriormente a não ter existência jurídica, porque outros requisitos de validade para perfeição do
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decreto-lei se não efectivaram (a promulgação ou a referenda), não pode alegar-se que o uso atempado da competência legislativa pela Assembleia da República conferida ao Governo (obviamente só para os actos que este possa praticar) é susceptível de gerar uma situação de desconformidade cora a lei fundamental.
24 — E porque a autorização legislativa da Assembleia da República é conferida ao Governo — àquele Governo— é que a mesma caduca quando o mesmo é demitido. Seria absurdo e contra toda a filosofia orientadora do regime fixado, vir a concluir-se que, embora aquele Governo tenha usado a autorização legislativa que lhe foi conferida, no tempo de validade da mesma, o não fez atempadamente, porque, posteriormente, e quando já não tinha intervenção no processo, ela caducou.
O uso da autorização legislativa ficaria, afinal, e na prática, absurdamente condicionado à verificação de outros factores totalmente estranhos ii vontade do Governo —a quem é concedida — nomeadamente ao tempo e à vontade do Presidente da República na promulgação do diploma (o Presidente da República poderá aguardar, para o fazer, a caducidade do prazo de concessão da autorização) ou à vontade ou oportunidade na publicação deste no Diário da República.
25 — Deste modo, sou de parecer que só pode admitir-se como momento em que a autorização legislativa é utilizada o último momento em que o Governo a quem aquela autorização é dada a poder utilizar: a data em que o decreto-lei era elaboração é «visto e aprovado pelo Conselho de Ministros».
26 — 0 Decreto-Lei n.° 134/83, de 19 de Março, foi «visto e aprovado em Conselho de Ministros» em 30 de Dezembro de 1982. Tendo, como já opinado, a autorização legislativa que lhe foi conferida pelo artigo 55.° da Lei n.° 40/81 caducado em 31 de Dezembro de 1982, e ainda, só naquela data, sido demitido o mesmo Governo, sou assim, e por todo o exposto, levada a concluir que, tal como aliás expressamente se refere no citado decreto-lei, o mesmo foi pelo Governo decretado no uso atempado da autorização legislativa que para o efeito a Assembleia da República lhe conferira pelo artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro.
27 — Nestes termos, e em conclusão:
Nos termos do artigo 168.°, n.° 1, alínea 0. conjugado com o artigo 106.°, n.° 2, e o artigo 201.°, n.° 1, alínea b), da Constituição da República Portuguesa, todas as matérias respeitantes à incidência, taxa, benefícios e garantias dos contribuintes quanto ao imposto de turismo, contidos nos normativos do Regulamento do Imposto de turismo, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 134/83, de 19 de Março, de que faz parte integrante, carecem de prévia autorização legislativa da Assembleia da República ao Governo que o decretou.
Aquela autorização legislativa foi conferida pelo disposto no artigo 55.* da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, e a sua validade caducou em 31 de Dezembro de 1982.
O Governo a quem foi conferida pela Assembleia da República a referida autorização legislativa foi demitido pelo Presidente da República pelo Decreto n.° 136-A/82, de 23 de Dezembro, publicado no suplemento ao Diário da República, 1." série, n.° 295, de 23 de Dezembro de 1982, só distribuído em 31 de Dezembro de 1982.
Nestes termos, o Governo foi demitido em 31 de Dezembro de 1982, isto é, a data em que o referido suplemento foi efectivamente colocado à disposição do público, conforme doutrina e jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo assentes.
O momento em que a autorização legislativa conferida ao Governo foi por este usada foi o da data em que o Decreto-Lei n.° 134/83, de 19 de Março, foi «visto e aprovado pelo Conselho de Ministros» — isto é, em 30 de Dezembro de 1982.
Estavam, assim, naquela data, em plena vigência, quer a autorização legislativa conferida ao Governo, pelo artigo 55.° da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, quer aquele Governo, tendo a primeira caducado e o segundo sido demitido pelo Presidente da República só em 31 de Dezembro de 1982, não enfermando o Decreto-Lei n.° 134/83 de inconstitucionalidade, por violação da alínea í)> n.° 1 do artigo 168.° da Constituição da República Portuguesa.
28 — Já mais duvidosa e difícil se me afigura a questão de saber se enfermam de inconstitucionalidade orgânica ou material os n.M 4 e 5 do artigo 36." do mesmo Decreto-Lei n.° 134/83, na medida em que vem alterar o disposto na alínea a) do artigo 5.° da Lei n.° 1/79, de 2 de Janeiro (Lei das Finanças Locais), sem que a Assembleia da República tenha conferido ao Governo autorização legislativa para tanto.
Com efeito (aliás, já em repetição do que dispunha o Código Administrativo), o artigo 5.° da Lei n.° 1/79, dispõe que:
Constituem receitas fiscais a arrecadar pelos municípios:
a) A totalidade da cobrança dos seguintes impostos:
4.° Imposto de turismo.
29 — O n.° 3 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 134/83 dispõe que o produto do imposto de turismo constitui receita dos municípios que discrimina, vindo, de seguida, o seu n.° 4 determinar a forma como pela repartição de finanças do respectivo município aquela receita deverá ser distribuída:
a) 50 % as câmaras municipais;
b) 25 % às comissões regionais de turismo;
c) 25 % à Direcção-Geral do Turismo.
30 — As disposições legais sobre a forma da distribuição da receita dos impostos não são, pela alínea 0, n." 1, do artigo 168.", conjugada com o disposto no artigo 106.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa, matéria da competência exclusiva da Assembleia da República.
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Mas, tratando-se de autarquias locais, não passará a sê-lo, ao abrigo do disposto na alínea r) do n.° 1 do artigo 168." daquela Constituição da República Portuguesa, pois se inclui no «regime das finanças locais»?
31 —A admitir-se esta hipótese, ser-se-á levado a concluir que o Governo, com vista a poder legislar sobre a distribuição e o destino do imposto de turismo, como o faz nos n.08 4 e 5 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 134/83, teria de ter prévia autorização legislativa da Assembleia da República, visto a autorização que lhe foi conferida pek> artigo 55.° da Lei n.° 40/81 não abranger a matéria.
E, a admitir-se ainda essa opinião, poderá concluir-se que a Assembleia da República, quando conferiu ao Governo autorização legislativa para legislar sobre o imposto de turismo, não fez propositadamente referência àquela matéria, por entender que sobre a mesma não havia que alterar o statu quo legal existente.
32 — O artigo 240.° da Constituição da República Portuguesa estabelece que:
2 — O regime das finanças locais será estabelecido por lei e visará a justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias e a necessária correcção de desigualdade entre autarquias do mesmo grau.
e o artigo 255.° da Constituição da República Portuguesa dispõe ainda que:
Os municípios participam, por direito próprio e nos termos definidos pela lei, nas receitas provenientes dos impostos directos.
33 — Em Constituição da República Portuguesa, anotada por J. G. Gomes Canotilho e Vita) Moreira, p. 453, em comentário a este artigo 255.° (que existia integralmente igual na Constituição da República Portuguesa de 1976) lê-se:
A participação nas receitas dos impostos directos do Estado é uma manifestação do principio da «justa repartição dos recursos públicos pelo Estado e pelas autarquias» (artigo 240.°, n.° 2). O «direito próprio» dos municípios tanto pode incidir sobre os impostos directos cobrados na respectiva circunscrição, como sobre a receita global nacional dos impostos directos de acordo com critérios a definir por lei.
34 — Por todo o exposto —embora reconhecendo ser assunto sujeito a dúvidas e a opinião contrária — afigura-se-me que, dentro do «regime das finanças locais», matéria da exclusiva competência (embora relativa) da Assembleia da República, conforme o disposto na alínea r) do n.° 1 do artigo 168.° da Constituição da República Portuguesa, cabe o estabelecimento legal da participação e modo como é feita, pelas autarquias locais, dos impostos directos (entre os quais se inclui o imposto de turismo).
35 — A assim ser, parece-me que será possível defender-se que o disposto nos n.M 4 e 5 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 134/83 enfermam
de inconstitucionalidade orgânica, visto o Governo não estar autorizado pela Assembleia da República a legislar sobre a matéria, e a autorização que lhe foi conferida pelo artigo 55." da Lei n.° 40/81 não abarcar a matéria.
3 — Não chegou, porém, a formular-se o pedido assim proposto porque — e em virtude de atraso no seguimento do processo neste serviço, não imputável à autora do parecer— veio entretanto a ser publicado o Decreto-Lei n.° 420/83, de 30 de Novembro, que, devidamente autorizado pela Lei n.° 15/83, de 25 de Agosto, conferiu nova redacção aos n.05 4 e 5 do artigo 36.° do Decreto-Lei n.° 134/83.
3 — Subsidio de doença relativo aos administradores, gerentes e outros gestores de sociedades
Processo n.° 83/R-1222-OI-28-A
1 — O contabilista de uma empresa invocou a inconstitucionalidade, por violação das normas da lei fundamental, relativas à Segurança Social, do regime em vigor respeitante ao subsídio de doença de administradores, gerentes e outros gestores de sociedades.
Contestava, designadamente, o facto de o Decreto Regulamentar n.° 18/83, de 28 de Fevereiro, ter vindo equiparar tal regime ao dos trabalhadores independentes (e não ao dos trabalhadores por conta de outrem), estipulando que o subsídio citado só seria abonado após 90 dias de doença.
2 — O Provedor considerou não se poder qualificar de inconstitucional o regime em questão, com base nos pareceres, que a seguir se transcrevem, do assessor e do coordenador a que o processo esteve afecto:
Parecer do assessor:
a) A regulamentação do subsídio de doença foi intencionalmente retardada, como se alcança do ponto 2 da parte preambular do Decreto Regulamentar n.° 18/83, de 28 de Fevereiro, apesar de se reconhecer a necessidade de alargamento dos regimes de protecção a todos os trabalhadores independentes e de alinhamento das prestações destes trabalhadores com as dos trabalhadores por conta de outrem por forma a alcançar-se igualdade de tratamento.
b) Perante os condicionalismos de carácter financeiro subjacentes, não se nos afigura defensável a tese da inconstitucionalidade. Tanto mais que a própria Administração reconhece que a atribuição daquele subsídio constitui um passo a caminho da desejada igualdade de tratamento, inatingível na fase actual.
c) Arquivaria, pois, o processo após a elucidação.
Parecer do coordenador:
a) O condicionalismo existente pode reconduzir-se aos seguintes tópicos:
O Decreto-Lei n> 8/82, de 18 de Janeiro, criou o regime de segurança social para os independentes e englobou no seu âmbito os administradores, gerentes de sociedades, etc.
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Neste diploma, foi previsto que os trabalhadores independentes ficariam a descontar — bem como as sociedades — nos termos do regime geral (') e teriam direito às prestações nos termos do mesmo regime geral, excepto no tocante ao subsídio de doença, cuja regulamentação se previa para futuro.
Entretanto, o despacho n.° 9/82 veio esclarecer que, transitoriamente, os administradores, gerentes, etc, passariam a receber subsídio de doença nos termos do regime geral.
Posteriormente, o Decreto Regulamentar n.° 18/83 veio regulamentar o subsídio de doença dos trabalhadores independentes e revogou aquele despacho passando os administradores e gerentes a ter o subsídio de doença nos termos dos restantes independentes.
6) Perante este contexto, também não encontro razões para intervenção do Provedor de Justiça em sede de eventual inconstitucionalidade.
De todo o modo não deixaria de colocar a . questão abordada na reclamação à Secretaria de Estado da Segurança Social.
3 — Embora entendendo não estar em causa um problema de constitucionalidade, o Provedor resolveu, porém, concordando com a proposta do coordenador, auscultar a Secretaria de Estado da Segurança Sócia] acerca das razões do sistema vigente, designadamente no tocante à sujeição dos gestores de sociedades, em termos de subsídio de doença, às regras aplicáveis aos trabalhadores independentes.
4 — A entidade visada respondeu que:
Correspondendo à solicitação transmitida por V. Ex.a através do ofício acima identificado esclareço que a problemática referente às condições de atribuição de subsídio de doença aos sócios gerentes ou administradores de empresas é uma das questões que irá ser objecto do estudo em curso nesta Secretaria de Estado para a reformulação do sub-regime de protecção social dos trabalhadores independentes a partir dos dados de experiência retirados da vigência do Decreto--Lei n.° 8/82 e legislação regulamentar subsequente.
De facto, o esquema contributivo daqueles profissionais é igual ao dos trabalhadores subordinados o que, em parte, justifica as suas reivindicações.
Importa, no entanto, referir que a especificidade que reveste o exercício das funções de gestão ou administração condicionam, de forma marcante, o efectivo controle das situaçães de doença de curta duração pelo que sempre haverá que ponderar este aspecto na revisão da lei actualmente em vigor.
(') Ou seja, 29 % — 21 % para as sociedades e S % para os trabalhadores (administradores, gerentes, etc.).
5 — Face a esta resposta, e assegurada a reapreciação do problema — cuja especialidade não deixou de reconhecer— o Provedor deu por encerrado o processo.
4 — Umfte de idade para admissão ao Centro de Estudos Judiciários
Processo n.° 83/R-1320-OI-30
1 — Um grupo de licenciados, substitutos de juízes de instrução criminal, veio reclamar para o Provedor da precaridade da situação em que se encontravam.
Protestaram, por um lado, pelo facto de a lei não permitir a duração das respectivas funções para além do prazo de 2 anos.
E insurgiram-se pelo facto de, em termos gerais, estar facultado o acesso à magistratura, através do Centro de Estudos Judiciários, aos elementos nas suas condições, a lei em vigor afinal o vedar a todos aqueles que tivessem mais de 35 anos de idade.
Pretendiam, ainda, que tendo em conta as funções exercidas, esse acesso lhes fosse proporcionado sem terem de ser para tanto sujeitos a provas de aptidão.
2 — Na verdade, a alínea c) do n.° 1 do artigo 29.° do Decreto-Lei n.° 374-A/79, de 10 de Setembro, estabelecia o mencionado limite etário para o ingresso no Centro de Estudos Judiciários.
3 — Ao Provedor pareceu este regime, em princípio, violador da regra de igualdade consagrada no artigo 13.° da Constituição.
Porque, todavia, admitia a hipótese de poderem ser apresentads razões explicativas do mencionado regime, resolveu, antes de tomar posição definitiva, ouvir o Ministério da Justiça sobre a questão.
4 — Reapreciando o problema, o próprio Executivo veio a alterar o regime em causa.
De facto, o Decreto-Lei n.° 146-A/84, de 9 de Maio, modificou a disposição contestada, prescrevendo que podiam candidatar-se a estagiários os maiores de 23 anos e eliminando qualquer limite de idade máximo para o efeito.
5 — Reposto, assim, o respeito pelas regras constitucionais, o Provedor decidiu arquivar o processo sem mais.
Na realidade, o limite de idade mínima estabelecido afigurou-se objectivamente razoável, considerada a natureza das funções a desempenhar pelos futuros magistrados.
E não tinha cabimento preconizar a pura e simples dispensa de provas de aptidão para os candidatos nas condições dos queixosos, visto estar em causa opção de política legislativa, não tendo o Provedor motivos para a considerar menos acertada.
S— Proibição, para os juízes, de permanecerem no mesmo tribunal por mato de seis finos
Processo n.° 83/R-2161 -D 1-55-A
I — Um grupo de juízes pediu ao Provedor que solicitasse a declaração de inconstitucionalidade do artigo 7.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.° 85/77, de 13 de Dezembro), na medida em que estabelece que os juízes não podem permanecer por mais de 6 anos no mesmo tribunal, juízo ou círculo judicial.
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Entendiam que essa norma ofende a regra constitucional da inamovibilidade dos juízes.
2 — O Provedor, contudo, considerou não dever dar seguimento a essa pretensão, por concordar com o parecer que, sobre o assunto, foi elaborado pelo assessor encarregado do processo, e cujo teor essencial se transcreve:
O conceito da inamovibilidade encontra-se ligado, em termos gerais, ao direito ao lugar, que a lei reconhece aos funcionários públicos providos por nomeação vitalícia ou por tempo indeterminado. E, por isso, uma garantia da estabilidade ligada à qualidade de funcionário.
Mas essa garantia pode não se limitar ao lugar nos quadros e abranger, também, o cargo exercido e a localidade onde o funcionário está colocado; e em termos que, em princípio, deveriam ser absolutos (cf. Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, 8." ed., vol. n, p. 735).
Essa seria a forma ampla daquele conceito.
Não é, porém, esta forma de inamovibilidade que se encontra consignada na Constituição a propósito dos magistrados judiciais —artigo 221.°, n.° 1 —, onde não se diz que os «juízes são inamovíveis», pura e simplesmente, mas se lhe acrescenta «não podendo ser transferidos, suspensos, aposentados ou demitidos senão nos casos previstos na lei».
O acrescentamento desta expressão revela que o legislador constitucional quis dizer o que deveria ser entendido como inamovibilidade e que a situação considerada não era em termos daquela inamovibilidade concebida em termos amplos, mas, antes, relativos.
Ê, de resto, a linha de pensamento tradicional na matéria, como se depreende da seguinte passagem do parecer publicado na Revista da Ordem dos Advogados, relativa a Maio-Agosto de 1981, citado nos processos n.os 82/R-815-DI-12 e 82/R-1052-DI-18:
Hoje a ideia substancial que a inamovibilidade envolve é a de estabilidade do cargo, mas estabilidade relativa, definida e limitada pela lei e não estabilidade absoluta, que vincula indissoluvelmente o magistrado ao lugar.
Tanto basta para concluir que a regra do sexenio não é inconstitucional.
Da literatura que me foi possível consultar extraí a conclusão de que o princípio da inamovibilidade, concebido em termos absolutos, não se encontra consagrado na grande maioria dos países do mundo, mas sim o da inamovibilidade relativa, tal como no sistema português (cf. Cunha Rodrigues, A Constituição e os Tribunais, entre outros autores).
Os problemas pessoais que os reclamantes põem e decorrentes do actual sistema, são igualmente válidos para os juízes que, por força da inamovibilidade absoluta, nunca poderiam vir a ser colocados nas comarcas dos grandes centros populacionais.
A «erosão», sob os mais diversos aspectos, que a permanência por tempo indefinido, ou até por uma dezena de anos, de um juiz numa mesma comarca, necessariamente provoca, é inconve-
niente que tem sido ressaltado variadíssimas vezes, designadamente, num processo deste Serviço, em que um sindicato se queixava pelo facto de o juiz do Tribunal do Trabalho, embora íntegro, sabedor e trabalhador, permanecer há longos anos em determinada comarca.
A diversificação de critérios, e, até, de procedimentos, é coisa salutar, pela renovação que acarreta.
Não me parece, pois, que a abolição da regra do sexénio, seja o procedimento mais correcto.
A serem exactas as informações que recolhi, é» porém, nesse sentido, que se orienta a actual política do Governo.
E tanto assim, que no projecto do novo Estatuto dos Magistrados Judiciais, estaria consagrado o conceito de inamovibilidade absoluta.
Resta saber se a Assembleia da República considera ser essa a melhor solução.
6 — Contribuição Imposta sobre o papel, cartolina ou cartão transaccionados ou integrados no fabrico de outros produtos
Processo n.° 83/R-2253-0I-58-A
1 — Uma associação profissional pediu ao Provedor que fosse invocada a inconstitucionalidade da alínea b) do artigo 1." do Decreto-Lei n.° 181/82, de 15 de Maio, na medida em que criou «a taxa de 20$ por tonelada de papel, cartolina ou cartão transaccionados ou integrados no seio do mesmo ciclo produtivo».
Entendia, com efeito, que, apesar da designação legal, se tratava de verdadeiro imposto, já que o Instituto dos Produtos Florestais, para o qual essa contribuição reverte, não prestaria quaisquer serviços específicos ao sector, que utiliza como matéria-prima «desperdícios e papéis velhos, cartões e cartolinas que são recuperados várias vezes».
O Governo teria, assim, legislado em matéria da exclusiva competência da Assembleia da República.
Assim, o Decreto-Lei n.° 181/82 não poderia, ao contrário do afirmado no seu preâmbulo, ter-se por emanado ao abrigo da Lei n.ü 40/81, de 31 de Dezembro, cujo artigo 58.° apenas se reportaria à criação ou alteração de taxas dos organismos de coordenação económica.
2 — O Provedor optou, todavia, por não solicitar a pretendida declaração, com base no seguinte parecer do assessor incumbido do processo:
As receitas a que se referem as diferentes alíneas do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 181/82, de 15 de Maio, não obstante terem a designação de taxas, parece configurarem verdadeiros impostos.
Pelo menos a «taxa» a que se reporta a alínea b) «taxa de 20$ por tonelada de papel, cartolina ou cartão transaccionados ou integrados no fabrico de outros produtos no seio do mesmo ciclo produtivo», na medida em que o seu beneficiário, o Instituto de Produtos Florestais, não presta qualquer serviço específico, uma vez que a matéria-prima é o aproveitamento de desperdícios e papéis velhos, cartões e cartolinas que são recuperadas diversas vezes, não pode ser qua-
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lificado como taxa. Apresenta, antes, a natureza de um imposto.
Porém, tal imposto integra-se no domínio da parafiscalidade, isto é, no conjunto de «receitas da administração central» que não são previstas no Orçamento do Estado (Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, i, 1974, p. 65).
Escreveu-se no acórdão da Comissão Constitucional n.° 341, apêndice ao Diário da República, de 18 de Janeiro de 1983, a p. 12 que «quanto às receitas parafiscais, tem sido já entendido no domínio da Constituição de 1976, que o princípio da reserva de lei formal (artigo 106.°, alínea a), não abrange tais receitas, «contrariamente ao que seria desejável, designadamente pela dimensão que atingem» (assim Manuel Pires, «A Constituição de 1976 e a Fiscalidade», in Estudos sobre a Constituição, 1978, vol. n, p. 442)».
Ainda que se admita que a criação de um imposto não cabe na autorização legislativa do artigo 58." da Lei n.° 40/81, de 31 de Dezembro, dada a natureza parafiscal do previsto na alínea n) do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 181/82, esta norma não está ferida de inconstitucionalidade orgânica, por o Governo ter legislado sobre matéria da exclusiva competência da Assembleia da República (artigo 168.°, n.° 1, alínea 0, da Constituição).
Cremos, porém, que os termos amplos em que está redigido o artigo 58.° da Lei n.° 40/81, autoriza o Governo a criar impostos.
Com efeito, lê-se nesta disposição:
Fica o Governo autorizado a criar ou rever receitas a favor dos organismos de coordenação económica e a estabelecer a incidência, as isenções, as taxas, as garantias dos contribuintes e o regime de cobrança das mesmas.
7 — Desconto, por via informática, de quolfaacooa slmBcafa nas remunerações de trabalhadores por conta de outrem
Processo n.° 84/R-77-01-3-B
1 — Uma empresa privada sustentou, perante o Provedor, que se verifica uma inconstitucionalidade por omissão, relativamente à falta de legislação ordinária que torne exequível o artigo 35.°, n.° 3, da Constituição na medida em que impediria a realização, por via informática, de descontos de quotizações sindicais nas remunerações dos trabalhadores por conta de outrem.
Sugeriu, pois, que o Provedor invocasse essa omissão junto do Tribunal Constitucional.
2 — Assim não veio a suceder, por o Provedor ter feito sua a argumentação do seguinte parecer da assessora a que o processo fora afecto.
a) Face ao parecer da Procuradoria-Geral da República, publicado no Diário da República, 2." série, n.° 147, de 29 de Junho de 1983, que concluiu não ser possível .o desconto automático da quotização sindical utilizando o processamento informático dos vencimentos, por isso se opor ao disposto no artigo 35.°, n.° 3, da Constituição da República, a empresa [...] remeteu
aos sindicatos representativos dos seus trabalhadores uma carta a informar que, a partir de 1 de Janeiro de 1984, deixam de proceder ao desconto da quotização sindical, visto que o processamento informático não era constitucionalmente permitido.
b) Em resposta, os diversos sindicatos salientam que o referido parecer da Procuradoria-Geral da República só vincula os serviços do âmbito do Secretário de Estado do Orçamento, que o homologou, não tendo a empresa que o acatar.
Acrescentam que se, apesar disso, a empresa entender que deve seguir a orientação daquele parecer, tal não a liberta, no entanto, das obrigações que para ela decorrem da conjugação da Lei n.° 57/77, de 5 de Agosto, que prevê que os sistemas de cobrança de quotas sindicais possam resultar de acordo entre as associações ou entidades patronais e as associações sindicais (como a alínea e) da cláusula 18.a do ACTV para a indústria açucareira, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.* série, de 22 de Outubro de 1978, que impõe às entidades patronais o envio aos sindicatos, até ao dia 10 de cada mês, do produto das quotizações dos trabalhadores sindicalizados, caso estes o autorizem).
c) Ê neste contexto que a empresa [...], considerando que não existe na lei ordinária dispositivo que torne exequível o disposto no citado preceito constitucional, solicita ao Provedor de Justiça que, ao abrigo do artigo 283.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa, suscite ao Tribunal Constitucional a apreciação e verificação do não cumprimento do referido artigo 35.°, n.° 3, por omissão das medidas legislativas necessárias.
d) Para concluir sobre a pretendida inconstitucionalidade por omissão há que começar por atentar na formulação do citado n.° 3 do artigo 35.°:
3 — A informática não pode ser utilizada para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa ou vida privada, salvo quando se trate do processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis.
Atendendo a que a «inconstitucionalidade por omissão» só se pode verificar em relação a normas que não são exequíveis por si próprias, as quais se distribuem por dois grandes grupos, o das normas programáticas e o das normas preceptivas, há pois que analisar se o preceito era causa se enquadra em algum desses grupos.
Contendo as normas programáticas directivas de natureza política que devem levar os órgãos do poder político a providenciar pela sua exequibilidade, é evidente que o n.° 3 do artigo 35.° não assume esta essência.
Também não se trata de uma norma preceptiva que necessite da emanação de normas jurídicas ordinárias para poder ser excutada.
Com efeito, a não utilização de informática para o tratamento de dados referentes a qualquer dos aspectos referidos é uma conduta que pode ser observada independentemente de qualquer outra norma jurídica.
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Concluiu-se, assim, que não existe a inconstitucionalidade por omissão invocada pela reclamante (').
e) Se esta empresa não fosse da índole privada, caberia agora averiguar se, efectivamente, o n.° 3 do artigo 35.° da Constituição impede o desconto da quotização sindical mediante processamento informático.
Isto, tendo em vista uma eventual recomendação a fazer à empresa.
Como, porém, tal não sucede, torna-se desnecessário o estudo dessa questão.
Assim, julga-se de arquivar o processo, com esclarecimento dB reclamante em conformidade.
8 —Estatuto Disciplinar dos Funcionários a Agentes da Administração Central, Regional e Local
Processo n.° 84/R-248-0MJ-A
1 — Um sindicato representativo de trabalhadores da função pública apresentou ao Provedor a questão da alegada inconstitucionalidade orgânica do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 24/84, de 16 de Janeiro.
Trata-se de matéria da competência legislativa da Assembleia da República.
Mas, embora este órgão de soberania tivesse, através da Lei n.° 10/83, de 13 de Agosto, conferido ao Govemo autorização para legislar sobre a matéria, dentro de 120 dias, este prazo teria sido, no entender do sindicato, desrespeitado, pois o Decreto-Lei n.° 24/ 84 só viera a ser publicado em 16 de Janeiro seguinte.
2 — Ponderado o problema, o Provedor entendeu não se verificar a inconstitucionalidade invocada, havendo concordado com o seguinte parecer do assessor incumbido do caso:
A) Argumentação do sindicato: Em apoio da sua pretensão alega, em síntese, •> sindicato, que:
a) Quer a promulgação, quer a referenda, enquanto requisitos da existência jurídica do diploma em causa, tiveram lugar em momentos posteriores à data em que caducou a autorização legislativa (11 de Dezembro de 1983) concedida ao Governo pela Lei n.° 10/83, de 13 de Agosto;
b) «Quando foi dada existência jurídica ao acto do Governo praticado em 29 de Novembro de 1983 (aprovação em Conselho de Ministros do que viria a ser o Decreto-Lei n.B 24/84, de 16 de Janeiro, e ao Estatuto Disciplinar ao mesmo anexo e que dele faz parte integrante) já tinha caducado a autorização legislativa conferida ao Governo.»
(') isto, tanto mais quanto é certo que pode ser dada execução ao disposto na alfnea e) da cláusula 18.* do aludido ACTV por via diversa da informática, já que esse preceito não refere qualquer processo especial para o efeito, não se colocando também em relação a ele um problema de inconstitucionalidade.
B) Apreciação dos argumentos invocados pelo sindicato:
a) Nos termos do disposto no n." 1, alínea b), e n.° 3, ambos do artigo 1.° da Lei n.° 10/83, o Governo foi autorizado a legislar em matéria de regime disciplinar da função pública, com vista à redefinição de factos ilícitos ou à definição de novas formas de ilícito de corrupção passíveis de sanção disciplinar, a corrigir a dosimetria das penas em vigor e ainda a ultrapassar dificuldades de execução e a integrar lacunas do Estatuto Disciplinar aprovado pelo Decreto-Lei n.° 191-0/79, de 25 de Junho;
6) A autorização tinha a duração de 120 dias, a contar da data da sua entrada em vigor, ou seja, de 14 de Agosto de 1983, de acordo com o estipulado no artigo 3.° da Lei n.° 10/83. Expirou, portanto, no dia 12 de Dezembro de 1983 e não, como pretende o sindicato, no dia 11 de Dezembro de 1983;
c) Conforme admite o sindicato, o Govemo utilizou a autorização conferida, ao aprovar o Decreto-Lei n.° 24/84, em Conselho de Ministros do dia 29 de Novembro de 1983, dentro do prazo marcado pela Lei n.° 10/83. Note-se que a menção da aprovação em Conselho de Ministros em em 29 de Novembro de 1983 deu cumprimento ao estabelecido no n.° 4 do artigo 10.° da Lei n.° 6/83, de 29 de Julho, relativa à publicação, identificação e formulário dos diplomas legais. O mesmo sucede com a menção das datas da promulgação (16 de Dezembro de 1983) e da referenda (2 de Dezembro de 1983);
d) Segundo a orientação defendida pela ex-Comissão Constitucional (') no seu Acórdão n.° 212, de 27 de Maio de 1980 (m apêndice ao Diário da República, de 16 de Abril de 1981) «a função legislativa exercida pelo órgão de soberania competente esgota-se no momento em que a declaração de vontade se manifesta pela forma prescrita e o órgão soberano dá como finda a sua actividade a tal respeito, quando muito integrada ainda pela colaboração do Presidente da República (promulgação)». O referido órgão consultivo viria, porém, a reconhecer a autonomia das fases do processo legislativo no mesmo acórdão, isto é, a da aprovação ou deliberação em Conselho de Ministros, a da promulgação a cargo de outro órgão de soberania (o Presidente da República) e a da publicação inserida numa actividade administrativa de execução;
e) Ora, a aprovação do Decreto-Lei n.° 24/ 84 ocorreu no Conselho de Ministros de
(') Foi a orientação mais recente da Comissão como se alcança da íe.oira do seu parecer n.° 23/80, in Pareceres, 13* volume, pp. 99 e seguintes.
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29 de Novembro de 1983, ou seja, no decurso do prazo concedido pela lei de autorização legislativa. O Executivo exercitou, pois, os poderes conferidos pela Assembleia da República ao abrigo da Lei n.° 10/83 dentro do prazo dos 120 dias previsto no seu artigo 2.°
Assim sendo, não poderá arguir-se o citado diploma de inconstitucionalidade orgânica originária, sabido que as demais fases do processo legislativo não dependem do Governo e que a autorização se reporta tão-somente à alteração do regime disciplinar, nas condições já indicadas, pelo Governo, em determinado prazo.
A função legislativa do Governo foi exercida em devito tempo;
f) A não se entender assim, teria de admitir-se a possibilidade de a Assembleia da República, através do mecanismo das autorização legislativas, restringir, à margem da própria Constituição, o prazo de 40 dias fixado ao Presidente da República para proceder a promulgação dos decretos do Governo (Constituição, artigo 139.°, n.° 4). Com efeito,.tendo expirado a eficácia da lei de autorização em
12 de Dezembro de 1983 e havendo o Governo aprovado o diploma em questão em 29 de Novembro de 1983, o Presidente da República disporia apenas de
13 dias para promulgá-lo, na óptica do sindicato. Só que tal entendimento não é sufragado pela Lei Constitucional (artigo 139.°, n.° 4), nem se ajusta aos mecanismos do processo legislativo iniciado com uma autorização legislativa;
g) Tocantemente à referenda do diploma, caberá referir que a mesma era exigível no caso do Decreto-Lei n.° 24/84 ex vi da alínea b) do artigo 137° da Constituição (cf. artigo 143.°), enquanto meio de corresponsabilizar o Governo e de atestar a colaboração entre o Presidente da República e o Executivo em exercício no momento da promulgação (J). Trata-se também do um momento posterior à aprovação do diploma pelo Governo no exercício da função legislativa (3) recebida da Assembleia da República pela via da lei de autorização.
Momento que, fazendo parte do processo de formação do diploma, ou, se se preferir, do processo legislativo, não depende do Executivo, em termos de que este terá de o observar no prazo da autorização. Aliás, a referenda não só no plano temporal não depende do Governo, como não requer a intervenção deste. Funciona como fase complementar de
O V: Parecer n.° 5/80. de 26 de Fevereiro, da Comissão Constitucional, in Boletim do Ministério da fustiga, n." 295, p. 648.
(') Função que é completamente distinta do acto da promulgação.
certificação política posterior à promulgação e ao momento nuclear do processo legislativo, que é o da manifestação de vontade pelo órgão de soberania competente segundo o formalismo prescrito; h) Relativamente à publicação, ocorrida em 16 de Janeiro de 1984, diz a mesma respeito a uma fase administrativa de execução, conforme resulta do artigo 4.° da Lei n.° 6/83, ao atribuir a incumbência da publicação dos textos legais, identificadas no seu artigo 1.", aos serviços competentes dos órgãos donde provenham;
í) Não se contesta que a ausência de promulgação e de referenda envolvam a inexistência jurídica dos actos que os requeiram, pois essa é a sanção prevista pela Constituição nos seus artigos 140." e 143°, n.° 2.
Em relação à publicação, determina o n.° 2 do artigo 122." da lei fundamental que a falta de publicidade envolve ineficácia jurídica e o n.° 1 do artigo 1.° da Lei n.° 6/83 que a eficácia de qualquer diploma depende da publicação;
j) Só que nenhuma dessas fases foi omitida no processo legislativo que originou o Decreto-Lei n.° 24/84, publicado em 16 de Janeiro findo. Essas fases tiveram lugar em momento posterior ao do exercício da função legislativa pelo Governo, pela forma e no tempo legalmente estabelecidos— ou seja, ao abrigo da autorização legislativa constante da Lei n.° 10/83. O facto de terem tido lugar após o decurso do prazo da autorização não envolve a verificação de inconstitucionalidade orgânica, sabido que a função legislativa foi exercitada em termos perfeitamente regulares pelo Executivo e que os actos complementares da formação do diploma em questão não dependiam do Governo. E não é menos seguro que a autorização se reportava ao exercício da função legislativa pelo Executivo e não à prática de determinados actos inseridos no processo de formação legislativa no prazo de tal autorização. Daí a inve-rificação da pretendida inconstitucionalidade.
O Conclusões:
l.a Não se mostram procedentes as razões invocadas pelo sindicato relativamente à inconstitucionalidade orgânica do Decreto-Lei n.° 24/84, por ofensa das normas da alínea d) do n." 1 do artigo 168.° e n.° 1 do artigo 277.° da Constituição, uma vez que o Governo exercitou, atempadamente, os poderes legislativos que lhe foram concedidos pela Assembleia da República a coberto da Lei n.° 10/83;
2* As fases de promulgação, referenda e publicação, embora posteriores aô termo do prazo da autorização legislativa concedida ao Governo, e por este exercida antes daquele termo, não envolvem a in-
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constitucionalidade orgânica do citado diploma considerando que a função legislativa foi exercitada regularmente pelo órgão de soberania competente, o qual é responsável pelas fases posteriores e complementares do processo legislativo em causa;
3.° O argumento do reclamante redundaria na inaceitável restrição do prazo de promulgação fixado no n.° 4 do artigo 139.° da Constituição e na atribuição à referenda de um alcance que a lei fundamental lhe não atribui;
4." Face às precedentes conclusões, não se justifica o uso, pelo Provedor de Justiça, da faculdade que lhe é conferida pelo n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, por se não verificar a pretendida violação das normas constantes da alínea d) do n.° 1 do artigo 168.° da Constituição, razão pela qual se propõe o arquivamento dos autos após elucidação ao sindicato.
9 — Lei de Bases da Reforma Agrária Processo n.° 84/R-807-DM2-A
1 — Uma associação de agricultores suscitou ao Provedor a questão da inconstitucionalidade da Lei de Bases da Reforma Agrária (Lei n.° 77/77, de 29 de Setembro).
Em sua opinião, este diploma ofenderia o princípio constitucional da igualdade, na medida em que se aplica apenas à chamada «zona de intervenção» da Reforma Agrária (e não a todo o território nacional).
E desrespeitaria também a proibição constitucional do confisco, pois que as indemnizações previstas para os proprietários de terras expropriadas ou nacionalizadas seriam tão irrisórias que não se poderiam considerar como compensação minimamente adequada à desapropriação sofrida.
Enfim, mereceria ainda revisão, por injusto, o regime de tratamento unitário, naquela lei, dos prédios indivisos.
2 — O Provedor não concordou, porém, com esta argumentação, pelas razões seguintes:
a) Relativamente à circunstância de a reestruturação fundiária, com todas as limitações da propriedade privada que ela implica, se ter cingido à zona de intervenção, não sendo, assim, aplicável a todo o território nacional, afigura-se-nos que ela deixa incólume o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei, não sendo legítimo afirmar que, face aos latifundiários da zona do Douro, ela concede a estes um privilégio em razão do território.
Senão vejamos.
O princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei é unanimemente concebido pela doutrina como admitindo excepções sempre que razões de relevância objectiva o justifiquem.
Logo, há que averiguar se as restrições à propriedade privada previstas na Lei n.° 77/77 e que se circunscrevem à zona de intervenção têm na sua origem especificidades da região que, objectivamente, sejam de respeitar.
Para o efeito, há que começar por atentar em que o artigo 96.° da Constituição inclui na enumeração dos
objectivos da política agrícola, não só o aumento da produção e da produtividade da agricultura, mas também a melhoria da situação económica e social dos trabalhadores rurais, pela transformação das estruturas fundiárias.
Constata-se, deste modo, que a Constituição impõe que a política agrícola vise aspectos tanto de natureza económica como social.
Sucede que a Lei n.° 77/77, ao integrar as bases da reforma agrária, a qual, por seu turno, é considerada, no n.° 2 do artigo 96.° da Constituição, como um dos instrumentos fundamentais da realização dos objectivos da política agrícola, veio dar execução às aludidas finalidades de natureza económica e social. Isto se infere do facto de, no artigo 6.°, aquela lei elevar a objectivo geral do fomento agrário a melhoria da situação económica, social e cultural dos trabalhadores rurais e dos pequenos e médios agricultores.
Ora, não se podendo negar que um latifúndio na zona de intervenção tem um significado económico--social diverso do de um latifúndio ao norte do Tejo, é pois legítimo concluir que, por essa razão, a reestruturação fundiária que se operou unicamente na zona de intervenção não violou, nessa medida, o princípio constitucional da igualdade dos cidadãos perante a lei.
b) Pelo que concerne à denominada «Lei dos Indivisos», há que determo-nos no teor dos n.os 2 e 3 do artigo 32.° da Lei n.° 77/77.
Essas normas, ao preceituarem, por um lado, que os grupos de contitulares não são tratados unitariamente sempre que explorem áreas correspondentes a estabelecimentos agrícolas distintos ou se comportem como empresas agrícolas distintas, e, por outro lado, que não são igualmente tratadas unitariamente as pessoas singulares que, no ano agrícola em curso à data da expropriação ou da ocupação que eventualmente a tenha precedido, dependam economicamente do rendimento dos prédios expropriados e exerçam na respectiva empresa agrícola a sua principal actividade, deixam transparecer que houve por parte do legislador a intensão de desfavorecer o absentismo e de premiar o investimento e o trabalho, finalidades estas que com nitidez se inserem no princípio constitucional da eliminação dos latifúndios, consagrado no artigo 97.° da Constituição.
Não se pode, pois, concluir que as expropriações que estiveram na sequência da aplicação da «Lei dos Indivisos» não obedeceram ao interesse nacional da melhor utilização da terra.
c) Pelo que respeita ao valor reduzido dos «papéis ou títulos de crédito» que foram entregues como indemnização, e que, dado estarem muito aquém do valor real das terras, configuram, na opinião dessa Associação, não uma expropriação mas um confisco, entende-se que tal temática já se não enquadra propriamente na lei das bases gerais da reforma agrária, ou seja, não é uma consequência necessária da sua aplicação, antes assumindo a natureza de actuação de política econó-mico-financeira do Governo, cuja apreciação está fora do âmbito das atribuições do Provedor de Justiça.
Considera-se que o meio adequado de atacar tais actos será a via judicial relativamente a cada caso concreto.
Nestes termos, e dado que o Governo já anunciou a revisão da Lei de Bases da Reforma Agrária, determinei o arquivamento do assunto neste Serviço.
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10 — Serviço Nacional de Saúde Processo n.° 82/R-1B68-DI-32-A
1 — Uma confederação de associações sindicais pediu ao Provedor que suscitasse a questão da inconstitucionalidade do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 254/82, de 29 de Junho, na parte em que revogou normas da Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde.
E isso, fundamentalmente, por considerar que não competiria ao Governo fazê-lo e que tal revogação implicava um retrocesso quanto à instituição do Serviço Nacional de Saúde constitucionalmente previsto.
2 — Sobre o problema foram elaborados pelo assessor e pelo coordenador a que o processo foi afecto, os seguintes pareceres:
Parecer do assessor:
1 — Através de carta dirigida ao Provedor de Justiça, acompanhada de exposição, o Secretariado Nacional da Confederação veio solicitar o «accionamento dos mecanismos tendentes à declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, do artigo 17." do Decreto-Lei n.° 254/82, de 29 de Junho, na parte que revoga os artigos 18.° a 61.°, 64." e 65.° da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde)» alegando, relativamente ao citado artigo 17.°, a existênoia de inconstitucionalidade material, formal e orgânica.
2 — Em relação ao assunto, cumpre informar o seguinte:
2.1 — O primeiro projecto de Lei de Bases do Serviço Nacional de Saúde (SNS) foi elaborado no Ministério dos Assuntos Sociais durante a vigência do 2." Governo Constitucional quando era Ministro dos Assuntos Sociais o Dr. António Ar-nault, projecto que na altura não se converteu em decreto-lei em virtude, principalmente, de entretanto ter tomado posse o 3.° Governo Constitucional (em Setembro de 1978), com nomeação de novo ministro.
2.1.1 — Saliente-se, portanto, que o Govemo de então poderia ter aprovado aquele projecto, que, a ser promulgado, seria publicado sob a forma de decreto-lei.
Chama-se a atenção para este aspecto por se tratar de um dos pontos importantes focados na exposição: o de o presente assunto constituir matéria da competência reservada da Assembleia da República e ter, portanto, o diploma respectivo de revestir a forma de lei.
A seguir se verá que o presente assunto não constitui, de modo algum, matéria da competência reservada da Assembleia da República, tendo, pois, o Governo tido a possibilidade de legislar sobre ele.
Com efeito, nos termos da Constituição (de 1976), conforme o preceituado no artigo 167.", era da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias:
c) «Direitos, liberdades e garantias»; direitos liberdades e garantias que constituíssem . como é sabido, o título u da parte i daquela lei fundamental, sendo os artigos 25.° a 49." que tratavam dos mesmos, não constando, portanto, daqueles direitos a matéria em análise (a da saúde).
Esta matéria fazia parte de outra categoria de direitos (direitos e deveres económicos, sociais e culturais) que constituíam o título ui, sendo o artigo 64.° que expressamente consignava tal direito:
ARTIGO 64.° (Saúde)
1 — Todos têm direito à protecção da saúde e o dever de a defender e promover.
2 — O direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito, pela criação de condições económicas, sociais e culturais que gararítam a protecção da infância, da juventude e da velhice e pela melhoria sistemática das condições de vida e de trabalho, bem como pela promoção da cultura física e desportiva, escolar e popular e ainda pelo desenvolvimento da educação sanitária do povo.
3 — Para assegurar o direito à protecção à saúde, incumbe prioritariamente ao Estado:
a) Garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação;
b) Garantir uma racional e eficiente cobertura médica e hospitalar de todo o País;
c) Orientar a sua acção para a socialização da medicina e dos sectores médico-medicamentosos;
d) Disciplinar e controlar as formas empresariais e privadas da medicina, articulando-as com o serviço nacional de saúde;
e) Disciplinar e controlar a produção, a comercialização e o uso dos produtos químicos, biológicos e farmacêuticos e outros meios de tratamento e diagnóstico.
Assim, não se tratando de matéria sobre «direitos, liberdades e garantias» tal como se contém na Constituição, não era, pois, matéria da competência reservada da Assembleia da República.
Refere-se que isto se reporta à Constituição de 1976 na sua redacção originária.
Todavia, quanto ao texto posterior à revisão de 1982, já a posição é diferente.
Com efeito, lê-se no actual artigo 168.°:
1 — E da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo:
/) Bases do sistema de segurança social e do serviço nacional de saúde.
A partir da vigência do texto revisto, já a matéria em causa passou a ser da competência reservada da AR, pelo menos no que respeita às bases do Serviço Nacional de Saúde.
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2.1.2 — Tendo-se verificado que a presente matéria não constituía, na altura (em 1978-1979), matéria da competência reservada da Assembleia da República, terá interesse saber como e porquê foi apreciada e votada na Assembleia da República.
Foi-nos esclarecido pelos serviços jurídicos do Ministério dos Assuntos Sociais, que foi o próprio Dr. António Arnault que, tendo cessado as funções de Ministro e pelo facto de ter tido, enquanto membro do Governo a «paternidade» do projecto, que decidiu que ele fosse apresentado na Assembleia da República, sendo transformado em projecto de lei submetitdo à Assembleia da República pelo Grupo Parlamentar do Partido Socialista, passando desde então a ser conhecido por projecto Arnault (projecto de lei n.° 157/1).
Salientou na altura o Grupo Parlamentar do Partido Socialista, ao apresentar o projecto, que o mesmo emanava da Assembleia da República, não por se tratar de matéria da competência reservada na Assembleia, mas «por se pensar que um diploma de tão largo significado e alcance social só teria vantagem em ser discutido e assumido pelo órgão de soberania onde se espelham os principais quadrantes políticos do País».
A par do referido projecto Arnault, o grupo parlamentar do Centro Democrático Social apresentou também em fins de 1978 na Assembleia da República um projecto sobre a mesma matéria (projecto de lei n.° 173/1).
O projecto de lei n.° 157/1 foi, no dizer do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, inspirado no modelo inglês, caso do National Health Service, em que o «Estado assegura a todos os cidadãos, através da rede oficial dos serviços, a satisfação de todas as necessidades de saúde da comunidade, sem encargos para os utentes». A medicina livre seria permitida, mas funcionando como complementar ou até como supletiva.
Era um projecto nitidamente contra a medicina convencionada — principalmente, conforme alegaram deputados do Partido Socialista, por ofender frontalmente o disposto no artigo 64.° da Constituição, atrás transcrito.
Defendeu-se naquele projecto, ainda conforme os deputados do Partido Socialista, a criação de um Serviço Nacional de Saúde unificado, de forma a obter um novo clima gerido pelos actuais conceitos e estruturas técnicas dos Estados modernos e pelos direitos inalienáveis dos doentes, «que não podem mais estar sujeitos às arbitrariedades, erros e demagogias de um governo que não os represente».
Por seu turno, o projecto do Centro Democrático Social continha, no dizer dos respectivos deputados, a garantia de que o sistema que viesse a ser implantado deveria sobretudo defender e viabilizar a livre escolha do médico pelo doente e a humanização da medicina (relação directa entre médico e doente) e não a actuação de um médico qualquer em grupo ou em equipa, como mero funcionário público num centro de saúde local, tal como se defendia no projecto do Partido Socialista.
Tal projecto do Partido Socialista, concluíam os deputados do Centro Democrático Social, «servi-
ria as instituições colectivas da esquerda, existindo nele a intenção de fazer desaparecer a medicina privada em Portugal».
Verifica-se, assim, que, para além de se tratar de matéria altamente técnica e especializada, é assunto com enorme carga política.
O projecto do Partido Socialista foi aprovado na Assembleia da República em 29 de Junho de 1979 e converteu-se na Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro. Os seus artigos 18.° a 61.°, 64.° e 65.° foram revogados pelo artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 254/82, e é concretamente este artigo 17.° que a Confederação considera inconstitucional.
2.2 — Dando concretização ao previsto na Lei n.° 56/79, e precisamente no fim do 5." Governo Constitucional (Primeiro-Ministro Maria de Lourdes Pintasilgo), foram publicados os seguintes diplomas:
Decreto-Lei n.° 513-11/79, de 27 de Dezembro:
Criou, conforme o previsto no artigo 30.° da Lei n.° 56/79, o Departamento de Gestão Financeira dos Serviços de Saúde, que visa a gestão unificada dos recursos financeiros globais afectos ao conjunto dos Serviços.
Decreto-Lei n.° 513-V/79, de 27 de Dezembro:
Criou, nos termos do artigo 33.° da Lei n.° 56/79, o Departamento de Recursos Humanos da Administração Central de Saúde.
Decreto-Lei n.° 519-N1/79, de 29 de Dezembro:
Criou, na sequência do previsto na Lei n.° 56/79, o ramo de clínica geral e reestruturou o de saúde pública na carreira médica.
Decreto-Lei n.° 519-02/79, de 29 de Dezembro:
Reorganizou as administrações distritais de saúde, nos termos da Lei n.° 56/ 79.
Decreto-Lei n.° 530/79, de 31 de Dezembro:
Criou, nos termos do artigo 33.° da Lei n.° 56/79, o Departamento de Cuidados Primários da Administração Central de Saúde.
Decreto Regulamentar n." 85/79, de 31 de Dezembro:
Criou, nos termos da Lei n.° 56/79, os Centros Comunitários de Saúde e regulamentou os órgãos locais do Serviço Nacional de Saúde.
Portaria n.° 26-T1/80, de 9 de Janeiro:
Definiu geograficamente as administrações distritais de saúde criadas pelo Decreto-Lei n.° 428/75, de 4 de Setembro, cuja orientação foi confirmada pela Lei
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n.° 56/79 no que respeita à descentralização da administração dos serviços de saúde criando, a nível distrital, órgãos administrativamente autónomos dotados de amplos poderes.
2.3 — Em laneiro de 1980, tomou posse o novo Governo (o 6.° Governo Constitucional — Pri-meiro-Ministro Sá Carneiro) e logo em Abril é publicado o Decreto-Lei n.° 81/80, que revogou os principais diplomas publicados sobre esta matéria pelo Governo anterior: revogou os Decre-tos-Leis n.°' 519-N1/79 e 519-02/79, ambos, de 29 de Dezembro, o Decreto-Lei n.° 530/79. de 31 de Dezembro, e o Decreto Regulamentar n.° 85/ 79, de 31 de Dezembro, diplomas estes que nem chegaram a ter qualquer execução, o que dá bem ideia do peso político que o assunto tem assumido.
2.4 — Em Maio de 1981, o 7.° Governo Constitucional submeteu à Assembleia da República uma proposta de lei com vista à revogação da Lei n.° 56/79, com a seguinte fundamentação:
Em conformidade com o Programa do Governo e de acordo com as orientações publicamente assumidas pelos responsáveis pela condução política da saúde, é tarefa urgente e prioritária a reformulação da Lei do Serviço Nacional de Saúde.
A inflexão do «caminho doentio para a saúde» passa, necessariamente, pela revisão da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro, e por medidas de carácter institucional e reorgani-zativo que o Governo, através do Ministério dos Assuntos Sociais, tem prontos a ser executados. Ê o caso da criação do Instituto Nacional dos Cuidados de Saúde, da criação das administrações regionais de saúde, da nova regulamentação da medicina convencionada e da nova orgânica da Secretaria de Estado da Saúde.
A urgência dos problemas a resolver não é compatível com a normal interrupção da actuação da sessão legislativa, pelo que se solicita a presente autorização legislativa, cujo uso é sempre aconselhável a Assembleia da .República fiscalizar.
Na sequência desta proposta de lei foi publicada a Lei n.° 17-A/81, de 8 de Agosto, com a seguinte redacção:
Artigo 1.° Ê concedida ao Governo autorização para alterar a legislação sobre o Serviço Nacional de Saúde, com revogação da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro, sua substituição por nova lei do Serviço Nacional de Saúde e mais legislação complementar.
Art. 2.° A autorização concedida pela presente lei caduca 90 dias após a sua entrada em vigor.
Ora, não se pode deixar de estranhar primeiramente o facto de o Governo vir solicitar autorização à Assembleia da República para legislar em tal matéria e depois a circunstância de a Assembleia vir a aprovar um diploma concedendo aquela autorização.
Na verdade, tratava-se, como se viu, de matéria da competência não reservada da Assembleia da República, e somente em matéria de competência reservada é que se encontra prevista na Constituição a concessão pela Assembleia de autorização ao Governo para legislar.
Com efeito, quanto a autorizações legislativas, o artigo 168." da Constituição estabelecia o seguinte:
1 — A Assembleia da República pode autorizar o Governo a fazer decretos-leis sobre matérias de sua exclusiva competência, devendo definir o objecto e a extensão da autorização, bem como a sua duração, que poderá ser prorrogada.
Assim, não se tratando, como se concluiu, de matéria da competência reservada da Assembleia da República, não fazia sentido o Governo solicitar tal autorização, nem a Assembleia da República concedê-la, de mais a mais invocandose o artigo 168.°, tal vem consignado na própria Lei n.° 17-A/81.
E foi neste entendimento que o Governo de então deixou passar os 90 dias previstos no artigo 2." daquela lei, sem cuidar do uso da autorização concedida, concluindo que, relativamente ao Governo ou à Assembleia da República, a competência era concorrente quanto à matéria, e, sendo a competência concorrente, nada impediria o Governo de legislar sobre tal matéria, quer inovando, quer alterando, ou mesmo revogando, se fosse caso disso.
A não ser este o entendimento, chegar-se-ia ao extremo de, em matéria da sua competência, o Governo se ver impossibilitado de legislar segundo a sua política, apenas porque existia legislação anterior diferente ou antagónica emanada de outro órgão com competência concorrente quanto à mesma matéria, o que seria absurdo.
A nós também nos parece ser defensável tal entendimento, até porque o Governo estaria plenamente à vontade em legislar naquela base, na medida em que sabia que a Assembleia da República, na missão de fiscalização que a Constituição lhe conferia, poderia não ratificar os decretos--leis que viesse a publicar (').
E, quanto à presente questão, sabe-se que a Assembleia da República não usou de tal poder constitucional, encontrando-se ratificado o diploma em causa (o Decreto-Lei n.° 254/82). Nem tão--pouco se tem conhecimento de que qualquer deputado tivesse requerido a sujeição do diploma à ratificação conforme estabelece, para o efeito, o artigo 172.° da Constituição!2).
(') «Artigo 165." Compete à Assembleia da República, no exercício de fiscalização:
c) Ratificar os decretos-leis do Governo [...]»
(') «Artigo 172.°— 1 —No caso de dccrctos-leis publicados pelo Governo durante o funcionamento da Assembleia da República, considerar-se-á concedida a ratificação se, nas
primeiras 15 reuniões posieriores à publicação do diploma, 5 deputados, pelo menos, não requererem a sua sujeição à ratificação.»
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2.5 — No caso de decretos-leis publicados pelo Governo fora do funcionamento da Assembleia da República ou no uso de autorizações legislativas, considerar-se-á concedida a ratificação se, «nas primeiras 5 reuniões posteriores à publicação do diploma, .20 deputados, pelo menos, não requererem a sua sujeição à ratificação».
Importa, todavia, realçar, ainda quanto a tal entendimento, um aspecto que à primeira vista poderá parecer chocante: é o facto de o Governo, legislando como se referiu, vir revogar uma lei da Assembleia da República ou várias disposições dela por um simples decreto-lei, o que concretamente se verificou no citado Decreto-Lei n.° 254/ 82 que revogou nada menos do que 46 artigos de um total de 65 da Lei n.° 56/79.
E isto, em sede de hierarquia das leis, ou da sua validade, poderá afigurar-se aberrante.
Mas, relativamente a este aspecto, cumpre salientar que, tal problema, a ter existindo, se encontra completamente ultrapassado com a entrada em vigor do texto constitucional revisto, que inclui uma disposição especial que veio consagrar o entendimento atrás expresso:
ARTIGO 115."
2 — As leis e os decretos-leis têm igual sem prejuízo da subordinação às correspon dentes leis dos decretos-leis publicados no uso de autorização legislativa e dos que desenvolvam as bases gerais dos regimes jurídicos.
Assim, e na base do referido entendimento, tem vindo o Governo a publicar diplomas sobre a matéria de saúde, entre os quais figura o Decreto-Lei n.° 254/82, de que consta a disposição focada (artigo 17.°) pela Confederação na exposição em análise.
Relativamente à mesma, e em consequência do que ficou informado, concluiu-se que:
2.5.1 —O assunto em reclamação não era, ao tempo da publicação do Decreto-Lei n.° 254/82 (de que faz parte o artigo 17.° em causa), matéria da competência reservada da Assembleia da República.
2.5.2 — Era defensável no plano jurídico, e totalmente compreensível por razões de lógica, * existência de decretos-leis revogando disposições da Lei n.° 56/79 e de decretos-leis publicados com base naquela lei, em virtude, principalmente, de se tratar de matéria da competência concorrente da Assembleia da República e do Govemo.
2.5.3 — Mesmo que ainda subsistam dúvidas quanto à conclusão expressa em 2.5.2, presentemente a questão encontra-se totalmente ultrapassada com a publicação de nova disposição (artigo 115.°, n.° 2) da Constituição, resultante da revisão de 1982, que expressamente consagra a mesma validade relativamente às leis e àqueles decretos-leis.
2.5.4 — Não existe, pois, qualquer das alegadas inconstitucionalidades (material, orgânica e formal), pelo que o Provedor de Justiça não terá de fazer uso da sua competência tal como é solicitado na exposição da Confederação.
3 — Somente como mero apontamento à margem da presente informação, cumpre notar que os dois últimos governos, legislando como legislaram sobre esta matéria, deixaram em vigor uma lei em que anteriores governos pretenderam pôr de pé um Serviço (o Serviço Nacional de Saúde), lei que, embora alvo de críticas fundadas, havia criado um serviço estruturando-o e organizando-o; e, tal como a mesma ficou (com 46 dos seus 65 artigos revogados), é um diploma desconexo e até sem sentido, o que, sem envolver qualquer crítica à actuação destes dois últimos governos em assunto de tão grande carga política (crítica que não nos compete) não pode deixar de se salientar como actuação legislativa susceptível de reparo, reparo este talvez inconsequente na medida em que estará certamente fora das atribuições do Provedor de Justiça formulá-lo.
Parecer do coordenador:
1 — Veio a Confederação solicitar ao Provedor de Justiça que suscitasse a inconstitucionalidade (orgânica, formal e material) do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 254/82, de 15 de Setembro, na base dos argumentos constantes da sua exposição que se dão por integralmente reproduzidos.
No seu bem elaborado parecer, concluiu o Ex.mo Assessor no sentido da inverificação das apontadas inconstitucionalidades.
Também se me afigura dever concluir-se pela inexistência da inconstitucionalidade orgânica e formal.
Não assim no tocante à invocada inconstitucionalidade material, que apresenta, a meu ver, uma tonalidade propícia à concessão de resposta positiva.
Ê o que, de seguida, se buscará analisar.
2 — A delicadeza do caso transparece desde logo dos próprios considerandos finais expendidos pelo Ex.mo Assessor na parte final do seu parecer, se bem que as reservas críticas ali assinaladas não apontem no sentido da inconstitucionalidade, mas tão-só no de assinalarem a ocorrência de uma actuação de prática legislativa susceptível de reparo — vivo reparo, acrescentaria eu, se mais não houvesse como, de facto, bem parece que haverá.
3 — Assim:
A inconstitucionalidade material, na sequência do pensamento expressado pela Confederação, resultaria no fundo, da circunstância de o citado artigo 17.° ter revogado 46 artigos da Lei n.u 56/ 79, de 15 de Setembro (Lei do Serviço Nacional de Saúde), revogação essa que, por ocasionar ura esvaziamento do conteúdo e dos meios de actuação previstos naquele diploma, tornaria difícil, senão impossível, a execução pragmática dos princípios centrados no artigo 64." da Constituição da República (antes e após a revisão) com incidência especial nos seus n.os 2, 3 e 4 (as restantes disposições constitucionais a que alude a exponente parecem-me, ou referidas com menos propósito, ou sem relevância para a análise do problema nos moldes em que se levanta e se me afigura dever ser tratado).
Ora, face ao condicionalismo fáctico-juridico ora em apreço, trata-se de uma afirmação justificativa de toda a atenção.
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4 — Em geral, entende-se por inconstitucionalidade material o não cumprimento (inacatamento) da Constituição (por acção ou omissão) por parte dos órgãos do poder político, mas não deve, consabidamente, emprestar-se a tal noção o sentido — demasiado amplo— de equivalência a toda e qualquer mera descorrespondência entre ura acto ou uma omissão, sejam quais forem, e uma norma constitucional.
Ê que «inconstitucionalidade como conceito jurídico relevante é apenas a inconstitucionalidade directa, ou seja, aquela que afecta um acto que esteja já por si em relação directa com a Constituição e que a Constituição regule, a título, senão exclusivo, pelo menos principal» (v. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, t. li, p. 577).
Mas no que toca ao presente caso logo se poderá falar, em tese, de inconstitucionalidade material por acção (a revogação dos preceitos que constituíram a essência da execução pragmática do preceito constitucional, por si só tradutora da intenção de obstacular àquela execução) como também, e sobretudo, de inconstitucionalidade material por omissão (a revogação criaria um vazio que se tornaria inevitável e consumado por sequente inércia); e, a optar-se por esta última qualificação, poderia até dizer-se que a norma ora arguida de inconstitucional premeditaria mesmo a impossibilidade de se atingir o objectivo inserto no correspondente parâmetro constitucional.
5 — Uma visão do Decreto-Lei n." 254/82 onde se insere a disposição em causa, em cotejo com o que se dispunha na Lei n.° 56/79, pode, sem dúvida, ocasionar, pelo menos, a hesitação sobre se o desaparecimento dos órgãos que no âmbito desta última se destinavam a assegurar o cumprimento da lei constitucional e a sua não substituição por outros de estrutura ou escopo similares não significará, no campo das actuações práticas, uma subversão nos caminhos que se apontavam como devendo ser percorridos.
E decorrerá, até, a permissão de se pensar que a lei fundamental, pretendendo, como se alcança do espírito informador do seu artigo 64.°, possibilitar uma ampla facilidade de acesso dos seus destinatários aos benefícios de um Serviço Nacional de Saúde, facilidade essa que seria a melhor garantia do respeito pelo direito à protecção da saúde, desejaria a existência de um complexo orgânico de actuação prática pautado fundamentalmente pelo encarecimento dos organismos de base (proximidade, celeridade, desburocratização), em suma, por umas tanto quanto possível maiores descentralização e participação.
isso é o que, de resto, resulta de uma leitura atenta do n.° 3 do artigo 64.° da Constituição e aparece mesmo como indiscutível e inquestionavelmente consagrado no n.° 4 do preceito:
O Serviço Nacional de Saúde tem gestão descentralizada e participada.
Ora algumas das normas revogadas integravam-se no enquadramento traçado pelo diploma constitucional e nas descentralização e participação que na Constituição se eregem como factores
determinantes ou traves mestras para a gestão do Serviço Nacional de Saúde.
Assinalam-se, ainda assim, como exemplos porventura mais expressivos, entre outros, os das normas revogadas dos artigos 21.°, 22.° e 23.° da Lei n.° 56/79 (aquela última a consagradora da participação dos utentes e dos profissionais de saúde no planeamento e na gestão dos serviços), das integradas no capitulo iv — dos serviços particulares dos cuidados de saúde e as do título vil— da articulação com o sector privado.
O desaparecimento dessas regras, dos princípios que assegurariam poder executar e dos órgãos que estariam adequados à prossecução do escopo constitucionalmente idealizados, não foi, por outro lado, no âmbito do Decreto-Lei n.° 254/82, colmatado: antes e ao contrário se insinua na própria nota preambular do diploma uma profunda reserva (profunda e algo preocupante) quanto ao ' êxito de um ensaio de regionalização sem uma definição prévia de estruturas horizontais «que coordenem técnica, funcional e organicamente os departamentos centrais da Secretaria de Estado da Saúde».
Da análise do diploma —em cujo contexto ou ideia— a norma do artigo 17." aparece logicamente inserida e justificada — resulta a conclusão de que a descentralização da gestão, tal como constitucionalmente se comanda, só será pragmáticamente encarada em estádio ulterior (temporalmente, porém, indefinido) e a de que a participação na gestão para que constitucionalmente se aponta terá de adiar-se em função daquela, para que possa realmente ocorrer em termos curiais, uma vez que não é fácil conceber a participação numa gestão que, visivelmente permanece, persiste ... centralizada.
6 — Em constituições programáticas, ou onde se inserem normas de tipo programático — como é a do artigo 64.°—, nem sempre é fácil esperar adequação entre os comandos constitucionais e as normas legislativas hierarquicamente secundárias que hão-de prosseguir aqueles comandos e regular as acções em conformidade aos parâmetros constitucionais.
O que deriva do inelutável facto de o legislador constitucional estabelecer princípios, escopos, tendências, e o legislador ordinário jogar com situações, possibilidades, soluções.
A consequência desta contraposição entre o dever ser constitucional e o que pode ser num momento dado, resulta na existência tíe momentos de inadequação — que podem vir a ter a mais diversa duração— conducentes ou não a situações de aparente inconstitucionalidade.
Tal aparência radicarse, a maior parte das vezes, na carência de meios de actuação imediatos susceptíveis de propiciarem uma adaptabilidade célebre dos condicionalismos disponíveis aos comandos constitucionais.
Tais momentos de hiato — quer se traduzam na preparação da formação de normas que correspondam à realização da orientação constitucional, quer se imponham por uma necessária análise dos dados de facto permissivos cfaqueías preparações e formulação— podem, assim, en-
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contrar uma justificação não só compreensível como, até, inevitável.
Indispensável é, porém, que o condicionalismo motivador de tais momentos de hiato não conduza a situações que aproveitem (ou que sirvam) a uma predisposição para medidas legislativas tendentes a determinarem retrocesso no caminho do preenchimento do escopo constitucional.
Por outras palavras, as normas intermédias, as normas que — ainda que provisoriamente — preparem regimes definitivos, haverão de apontar, desde logo e sintomaticamente, para o horizonte constitucionalmente aprazado: assim, terão de se assumir, por contexto e espírito, como normas tradutoras de progressiva aproximação aos princípios da lei fundamental.
Se retrocederem — como se legitima apontar-se à norma do artigo 17.° agora em causa—, por eliminatórias, mediata ou imediatamente, de mecanismos que, esses sim, poderiam assegurar adequação aos objectivos constitucionais, a situação é susceptível de equivaler, ou a uma predisposição para a passividade ou à própria passividade elle--même, o que logo contraria e se opõe aos comandos da Constituição, configurando inconstitucionalidade material por omissão.
7 — Poderá argumentar-se que, para se assentar, em termos inequívocos, nesta conclusão, se careceria, no momento, da demonstração directa de que, por força da revogação imposta pelo preceito visado, se teriam eliminado os órgãos ou mecanismos necessários e imprescindíveis à execução — ao menos tendencial — do princípio contido no artigo 64.° da Constituição.
E que essa demonstração não está feita, nem é provável que se consiga fazer a curto ou mesmo médio prazo.
Poderá também dizer-se que ainda que se não repudie a hipótese de ocorrer -inconstitucional-lidade material nos moldes enunciados, ela só seria detectável se a dinâmica de actuação do regime a nascer (ou instituído) na base do Decreto--Lei n.° 254/82 viesse a demonstrar que a revogação determinada pelo artigo 17.° teria ocasionado a inviabilização prática da regra constitucional, e daí que, no momento e em estática, não seria possível avançar na senda da propugnada inconstitucionalidade.
Pese à sua eventual bondade, tais asserções estão longe, a meu ver, de serem decisivas ou mesmo relevantes.
8 — Não fixando geralmente os preceitos constitucionais os limites de tempo adentro dos quais se deverão ultimar os regimes legislativos que lhes dêem corpo e os pragmatizem ou que com eles se coadunem, o «toque dramático» —passe a expressão— das chamadas inconstitucionalidades materiais por omissão reside precisamente na inconcretízação do momento preciso e específico em que o legislador será forçado a consubstanciar em normas o que a lei fundamental prescreve e aponta ou que lapso temporal deverá presidir à formulação dessas normas sem que aquele legis lador possa ser acusado de, por passividade ou inércia, se estar escusando a caminhar no sen-titdo de atingir o objectivo constitucionalmente programado.
O critério aferidor terá assim de ser —bem parece — o da indicação, por todos os meios sintomáticos, a respeito do modo como os órgãos do poder político se comportam relativamente a um dado preceito ou a uma certa orientação constitucionais.
Terá de ser assim, sob pena de se eternizar indefinidamente a actuância prática dos princípios constitucionais — uma forma óptima de os inviabilizar— e de, face à sua específica natureza, tornar inverificável a existência de uma inconstitucionalidade material... por omissão.
A luz desse critério —tornado inevitável — parece claro, sempre salvo melhor opinião, que o artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 254/82, revogando as normas da Lei n.° 56/79 que correspondiam a uma adequação, pelo menos, progressiva ou tendencial, ao princípio constitucionalmente consagrado no artigo 64.°, constitui uma autêntica norma negativa ou de retrocesso (no sentido já atrás apontado) ou, se se preferir, uma norma penalizante dos meios mais ajustados a lograr aquela adequação.
De resto, todo o diploma em que tal preceito se insere não revela predisposição alguma para servir o aludido comando constitucional, nem mesmo para preparar, ainda que a longo prazoc os seus desideratos.
9 — Neste momento, pois, é possível convir na ausência manifesta de elementos minimamente indicativos de que se pretenderia seriamente prosseguir na rota encetada pela Lei n.° 56/79 — ainda deixada estranhamente de pé como uma «árvore seca»— ou seja, na estruturação de um Serviço Nacional de Saúde baseado em esquemas de descentralização e participação, tónicas constitucionais que o citado artigo 17." não contempla, ou de que se afasta, não sugerindo, por outro lado, o próprio Decreto-Lei n.° 254/82 normas ou mecanismos sucedâneos da Lei n.° 56/ 79.
E não vem ao caso dizer que o complexo orgânico que aquela lei pretendeu pôr de pé não provou na prática, ou que na prática não funcionou como deve ser.
É isso factor que não pode pesar na análise que se pede ao jurista, como na mesma não podem pesar os factores de natureza política.
10 — Nestes termos, e em conclusão:
Concordando em que se não verificam, pelas mesmas razões do parecer do Ex.mo Assessor, as alegadas inconstitucionalidades formal e orgânica, entendo, contudo, na base das considerações antecedentemente expostas, e nas que se alinham na exposição inicial apresentada pela reclamante (aliás, merecedora de menção pelo cuidado com que se mostra elaborado), que ocorre inconstitucionalidade material (por omissão) do artigo 17.° do Decreto-Lei n.° 254/82, de 29 de Junho, por ofensa do preceituado no artigo 64.° da- Constituição da República, assim se justificando o uso, pelo Provedor de Justiça, da faculdade prevista no artigo 283.°, n.° 1, da lei fundamental.
3 — Por demora no andamento do processo neste Serviço, posterior à elaboração destes pareceres —e
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portanto não imputável a nenhum dos seus autores — o Provedor não teve oportunidade de tomar posição sobre a questão antes da emanação do Acórdão n.° 38/ 84 do Tribunal Constitucional (Diário da República, 1.a série, de 5 de Maio de 1984), cuja fundamentação e conclusão coincidaram, na essência, com as da posição preconizada pelo Sr. Coordenador.
4 — Tendo em conta, porém, o interesse doutrinário dos dois aludidos pareceres, considerou-se ser justificada a sua integral publicação neste relatório.
11 — Regime das associações públicas Processo n.° 83/R-192-OI-2-A
1 — Um revisor oficial de contas interrogou-se, em exposição dirigida ao Provedor de Justiça, sobre a conformidade constitucional das disposições do Decreto--Lei n.° 519-L2/79, de 29 de Dezembro, que permitem ao conselho directivo da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas inibir estes profissionais do exercício da sua actividade, por diversas razões, entre as quais avultam a simples falta de pagamento de quotas àquela Câmara.
2 — Sobre o assunto foi, pelo assessor, incumbido do processo, formulado o seguinte parecer:
I
1 — O exponente não formulou as suas dúvidas sob a forma de pedido, nem identificou claramente as normas legais de cuja constitucionalidade suspeitava. Contudo, prescindindo de requintes formais, compreende-se perfeitamente o problema que expõe e infere-se que, no caso de o Provedor de Justiça concordar com as suas dúvidas, deseja que este solicite ao Tribunal Constitucional a apreciação e declaração das normas do Decreto--Lei n.° 519-L2/79 que contrariarem preceitos constitucionais.
Passa-se, pois, a apreciar o problema.
II
Normas legais em questão:
2 — O exercício da actividade de revisor oficial de contas está condicionado a prévia inscrição na «Lista dos revisores oficiais de contas» a que se refere o artigo 56.° do Decreto-Lei n.° 519-L2/ 79. Esta lista é elaborada por uma comissão composta por 3 magistrados judiciais, 1 funcionário do Ministério das Finanças e do Plano e 1 representante da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas (artigo 57.°).
Da articulação do artigo 73.°, n.° 1, alínea e), com o artigo 87.°, n.° 2 e com o artigo 74.°, resulta que o revisor oficial de contas pode ser suspenso por falta de pagamento de quotas, ficando inibido de exercer as suas «funções específicas». Esta suspensão é deliberada pelo conselho directivo da Câmara (artigo 134.°).
Ê precisamente esta possibilidade de um órgão da Câmara impedir o exercício da actividade profissional do revisor oficial de contas que tem de ser confrontada.com a lei fundamental.
III
Normas constitucionais:
3 — As disposições constitucionais que têm de servir de parâmetros de análise deste problema são os artigos 47.°, ri.° 1, que garante a liberdade cie escolha de profissão, e 46.°, n.° 3, que assegura não poder ninguém «ser obrigado a fazer parte de uma associação nem coagido por qualquer meio a permanecer nela».
IV
Natureza jurídica da Câmara:
4 — Para se poderem apreciar as normas legais controversas é mister determinar que tipo de entidade colectiva é a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas. E isto porque, desde logo, a garantia estabelecida no n.° 3 do artigo 46.° da Constituição apenas parece abranger as pessoas colectivas privadas de tipo associativo. Se a Câmara aqui se puder incluir será, por certo, mais provável concluir-se no sentido da inconstitucionalidade material das disposições legais em causa do que na hipótese inversa.
Por outro lado, a tutela das «restrições legais impostas pelo interesse colectivo», a que faz referência o n.° 1 do artigo 47.° da Constituição, poderá mais facilmente enquadrar-se nas atribuições da Câmara se esta puder justificar a qualificação como entidade pública.
5 — A Câmara dos Revisores Oficiais de Contas foi criada pelo Decreto-Lei n.° 1/72, de 3 de Janeiro. O artigo 21.° deste diploma legal qualifica-a como «organismo corporativo», determinando do mesmo passo a «inscrição oficiosa» dos revisores. O artigo 111.° dispõe sobre a constituição da Câmara e o artigo 49.° possibilita o recurso para o Supremo Tribunal Administrativo das deliberações do Conselho de Disciplina.
O Decreto-Lei n.° 1/72 foi revogado pelo Decreto-Lei n.° 519-L2/79. Nos termos do artigo ! 14.° deste diploma, a Câmara é uma «pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública», mantendo a lei o princípio de inscrição oficiosa dos revisores. A lei conserva igualmente a possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo das deliberações do Conselho Disciplinar (artigo 105.°, n.° 1). Como inovação, o n.° 3 do artigo 114." refere que «as deliberações do Conselho Directivo e as decisões do Conselho Disciplinar têm força de actos definitivos e executórios». O mesmo artigo, no seu n.° 2, estabelece que «a Câmara depende do Ministro da Justiça para efeitos de tutela».
6 — Não pode deixar de surpreender a qualificação, feita pela lei, da Câmara como «pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública». E isso por razões de natureza diversa que seguidamente se enumeram.
Em primeiro lugar, a lei que instituiu a Câmara chamava-lhe «organismo corporativo». Sendo embora controversa a natureza jurídica destes entes (v. Sérvulo Correia, «Natureza jurídica dos organismos corporativos», in Estudos Sociais e Corporativos, ano n, Outubro de 1983, n.° 8, pp. 9 a 25), a doutrina dominante considerava os de
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constituição obrigatória pessoas colectivas de direito público. Os traços da obrigatoriedade eram, para o Prof. Doutor Marcelo Caetano, a criação «por lei especial ou ao abrigo de lei geral que permita impor a obrigação de inscrição neles de quantos exerçam a actividade ou profissão representada» (Manual de Direito Administrativo, t. i, 9.° ed., Lisboa, 1970, p. 374).
É patente que daqui resultava ser a Câmara, à face da legislação anterior ao Decreto-Lei n.° 519-L2/79, uma pessoa colectiva de direito público.
7 — Em segundo lugar, é francamente habitual, entre nós como no estrangeiro, a qualificação das ordens e colégios profissionais como entidades públicas.
Em Itália, Giannini chama-lhes «entes públicos independentes», salientando que exercem poderes públicos, designadamente disciplinares, de natureza administrativa (Diritto Amministrativo, vol. i, Milão, 1970, p. 188). Para Zanobini, as ordens profissionais são «associações obrigatórias», modalidade das pessoas colectivas de direito público {Corso di Diritto Amministrativo, vol. m, 6." ed., Milão, 1958, pp. 235 a 237).
Na República Federal da Alemanha, Wolff e Bachof, apreciando a natureza da Ordem dos Advogados, qualificam-na como «corporação de pessoas de direito público» ou «associação de inscrição obrigatória», acrescentando ser tal natureza compatível com a liberdade negativa de associação garantida pelo artigo 9.° da lei fundamental de Bonn (Verwaltungsrecht, vol. n, Munique, 1976, p. 335). Rudolf considera as ordens profissionais «corporações pessoais», espécie das pessoas colectivas de direito público de tipo associativo. Estas «corporações pessoais» prosseguem fins públicos e praticam actos autoritários de definição e aplicação do direito, como pessoas colectivas de direito público que são, dependendo a qualidade de sócio do exercício de certa actividade profissional ou de outros factos voluntários (Allgemeines Verwaltungsrecht, Badura e outros, 5.° ed., Berlim, 1981, pp. 537 a 539).
8 — Para a doutrina portuguesa a questão também não parece levantar grandes dúvidas.
Apreciando a natureza jurídica das ordens profissionais, o Prof. Doutor Manuel de Andrade considera-as «pessoas colectivas de direito público, dada a autoridade ou força vinculativa que a lei reconhece a certas deliberações destas entidades» (Teoria Geral da Relação Jurídica, 1966, vol. i, p. 79).
O Prof. Doutor Marcelo Caetano, sem referir especificamente as ordens e câmaras profissionais, ao contrapor as pessoas colectivas de direito público que, «criadas por acto do poder público, existem para a prossecução necessária de interesses públicos e exercem em nome próprio poderes de autoridade», às pessoas colectivas de direito privado, que se devem a iniciativa particular e têm possibilidade de modificar o seu fim, aponta claramente no sentido da qualificação daqueles entes como pessoas colectivas de direito público (Manual de Direito Administrativo, vol. i, 9.a ed., 1970, pp. 180 e 189-190).
Para o Prof. Doutor Freitas do Amaral, as ordens profissionais são associações públicas de entidades privadas (Direito Administrativo, 1983-1984, edição policopiada da AAEFDL, pp. 485-486).
As associações públicas, por sua vez, são «pessoas colectivas públicas, de tipo associativo, criadas para assegurar a prossecução de interesses públicos determinados, mediante a união de entidades públicas, ou o agrupamento de particulares interessados, ou a participação de umas e outras» (op cit., p. 483).
Também o Dr. Sérvulo Correia considera as ordens profissionais associações públicas, pessoas colectivas de direito público de tipo associativo que integram a administração autónoma (Noções de Direito Administrativo, t. i, 1982, Lisboa, pp. 144 a 147).
9 — E não é apenas a doutrina que se inclina neste sentido. A antiga Comissão Constitucional pronunciou-se, pelo menos por duas vezes, no sentido da personalidade pública das ordens e câmaras profissionais: no Parecer n.° 1/78 (Pareceres, vol. iv, p. 143), a propósito da Câmara dos Despachantes Oficiais e no Parecer n.° 2/78 (Idem, pp. 160-161).
No primeiro dos citados pareceres, afirma-se expressamente que «as ordens e câmaras (solicitadores, despachantes oficiais, etc.)» são pessoas colectivas de direito público. No segundo, afirma-se não ser a Ordem dos Médicos uma associação privada, por quatro razões:
A personalidade é-lhe atribuída por lei;
Dispõe de poder regulamentar;
Alguns dos seus actos estão sujeitos ao contencioso administrativo;
A dissolução, bem como a revisão dos seus estatutos, não dependem exclusivamente da vontade dos associados.
10 — No que se refere à Ordem dos Médicos, o Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República sustenta a mesma posição.
No Parecer n.° 91/82 (Diário da República, 2." série, n.° 70, de 25 de Março de 1983), afirma-se que a Ordem não é uma associação mas «um organismo criado à margem da vontade dos interessados a quem se impõe, por diploma legal que lhe confere personalidade jurídica e aprova os respectivos estatutos e nela são obrigatoriamente inscritos todos os profissionais de medicina, quer a exerçam liberalmente, quer como trabalhadores subordinados, dependendo até dessa inscrição o próprio exercício da medicina».
11 — Ainda a mesma posição fez vencimento no Acórdão de 23 de Junho de 1981 do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (caso «Le Compte»), onde, a propósito da Ordem dos Médicos belga, se afirma tratar-se de «uma instituição de direito público, criada pelo legislador e integrada nas estruturas do Estado» e não uma associação, no sentido do artigo 11.° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, pelo que a obrigatoriedade de inscrição não ofenderia este preceito.
12 — Em terceiro lugar, é de acentuar que, relativamente a outra câmara profissional, a dos
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Despachantes Oficiais, legislação posterior ao Decreto-Lei n.° 519-L2/79 —os estatutos anexos ao Decreto-Lei n.° 450/80, de 7 de Outubro — a qualifica expressamente como «pessoa colectiva de direito público» (artigo 1.°).
Ora, a verdade é que se não descortinam entre as duas câmaras diferenças susceptíveis de fundar uma diversa natureza jurídica:
a) Ambas são organismos de inscrição obrigatória [artigos 1.°, § 2.°, e 38.°, n.° 2, alínea b), dos estatutos, anexo ao Decreto-Lei n.° 450/80 e artigos 73.°, n.° 1, alínea é), 74.° e 87.°, n.° 2, do Decreto--Lei n.° 519-L2/79];
6) Ambas existem por força de acto do poder público (artigos 1.° dos estatutos anexos ao Decreto-Lei n.° 450/80 e 21.° e 111.0 do Decreto-Lei n.° 1/72);
c) Ambas detêm a possibilidade legal de obstar ao exercício pelos seus associados da respectiva actividade profissional [artigos 47.°, n.° 1, alíneas d) e e), e 38.°, n.° 2, alínea b), do Decreto-Lei n.° 450/ 80, e 87.°, n.° 2, e 102.°, n.° 1, alíneas e) e /), do Decreto-Lei n.° 519-L2/79];
d) Ambas estão sujeitas a tutela .do Governo (artigos 1.° e 30.° do Decreto-Lei n.° 450/ 80 e 114.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 519-L2/79);
e) Ambas as câmaras têm atribuições de defesa dos interesses de classe, de aperfeiçoamento profissional, de fiscalização do exercício das funções e atribuições de carácter público, consubstanciadas no envolvimento em operações aduaneiras (despachantes oficiais) e de fiscalização contabilística (revisores oficiais) (cf. artigos 3.° do Decreto-Lei n.° 450/80 e 119.° e preâmbulo do Decreto-Lei n.° 519-L2/ 79).
13 — Registe-se ainda que em ambas as entidades as decisões em matéria disciplinar podem ser apreciadas, por via de recurso contencioso, pelo SupremoTribunal Administrativo (1.° secção). Com uma diferença: das decisões proferidas no âmbito da Câmara dos Despachantes Oficiais cabe recurso necessário (a que a lei chama «hierárquico», mas que se afigura ser tutelar, dado envolver duas pessoas colectivas diversas, a Câmara e o Estado) para o Ministro das Finanças e do Plano, cabendo deste recurso contencioso nos termos gerais (artigo 55.°, n.°* 2 e 3, do Decreto--Lei n.° 450/80); ao passo que das decisões proferidas no âmbito da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas se interpõe recurso directo de anulação (artigo 105.° do Decreto-Lei n.° 519-L2/ 79).
14 — Todavia, em matéria de câmaras profissionais, não se esgotam aqui as dúvidas. E que há outra, a Câmara dos Solicitadores, que o artigo 673.° do Estatuto Judiciário considerava um «Sindicato Nacional», uma das espécies de organismos corporativos.
O actual Estatuto dos Solicitadores, anexo ao Decreto-Lei n.° 483/76, de 19 de Junho, não
qualifica expressamente a Câmara, limitando-se a afirmar que ela «é dotada de personalidade jurídica e representa todos os que no País exercem a profissão de solicitador» (artigo 1.°, n.° 1).
Como traços essenciais da Câmara podem apontar-se:
o) A obrigatoriedade de inscrição como condição do exercício da actividade profissional (artigo 63.° do Estatuto);
b) A Câmara tem a possibilidade legal de impedir o exercício da actividade profissional pelos seus associados (artigos 56.°, 59.° e 63.°, n.° 2, do Estatuto);
c) A Câmara exerce sobre os solicitadores jurisdição disciplinar exclusiva (artigc 8.° do Estatuto), não estando, legalmente prevista qualquer via de recurso, quer gracioso, quer contencioso, e nem sequer a apreciação da legalidade dos seus comportamentos pelos tribunais comuns (');
d) O único aspecto da acção da Câmara sujeito a tutela do Governo é a alteração do Estatuto do Solicitador, sujeito a apreciação do Ministro da Justiça (artigo 120.°, n.6 4, do Estatuto);
e) A Câmara tem essencialmente atribuições de defesa dos interesses de classe dos solicitadores (artigo 2.° do Estatuto), embora a lei não deixe de referir que a Câmara «defende a Justiça e o Direito» e vela pela «realização dos interesses dos Portugueses» (artigo 3.° do Estatuto);
f) A Câmara foi instituída pelo artigo 804* do Estatuto Judiciário de 1927 (Decreto n.° 13 809, de 22 de Junho de 1927).
Como se vê, a Câmara dos Solicitadores apresenta algumas diferenças relativamente às outras duas câmaras, consubstanciadas essencialmente na reduzida amplitude da tutela administrativa sobre ela exercida pelo Governo, na não sujeição dos seus actos ou contencioso administrativo e na menor vinculação à prossecução de finalidades de interesse público.
15 — Relativamente às 3 Câmaras profissionais temos, por conseguinte, esta situação, ao nível da qualificação legislativa:
1.° A Câmara dos Solicitadores é uma pessoa colectiva, outrora qualificada como «sindicato nacional»;
2.° A Câmara dos Despachantes Oficiais é uma pessoa colectiva de direito público;
3.° A Câmara dos Revisores Oficiais de Contas é uma pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública.
Torna-se agora necessário verificar o rigor destas qualificações, designadamente da atribuída à
(') Nem sempre, porém, foi assim: nos termos do artigo 40.' do Regimento aprovado pelo Decreto n." 17 438, de 1! de Outubro, das decisões que aplicavam sanções disciplinares cabia recurso para o Presidente da Relação (e da decisão deste para o Ministro da Justiça e dos Cultos).
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Câmara dos Revisores Oficiais de Contas. Para tanto, haverá que confrontar as características essenciais das associações públicas, enquanto pessoas colectivas de direito público, com as das pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública administrativa.
16 — Acreditamos que as diferenças essenciais entre estes 2 entes colectivos são 3.
Em primeiro lugar, as pessoas colectivas de direito privado e utilidade pública administrativa resultam da atribuição da personalidade jurídica, pelo Estado, a um substrato associativo ou fundacional preexistente que prossegue fins desinteressados e coincidentes com os fins do Estado — ou de outra pessoa colectiva de direito público— e ao qual, por isso, este reconhece, expressamente, utilidade pública (}).
O Estado não cria as pessoas colectivas de direito privado —reconhece-as, declarando, em certas condições, a sua utilidade pública administrativa. Por isso, estas podem modificar os seus fins e alterar os seus estatutos, sem que tal possa implicar mais do que a revogação da declaração de utilidade pública (cf. artigo 13.°, n.° 1, alínea b), do Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro). Também, por isso, estas pessoas colectivas podem extinguir-se (J).
Quanto às pessoas colectivas de direito público, a situação é bem diversa: o Estado promove a criação do próprio substracto, quer partindo do nada, quer aproveitando organizações já existentes às quais modifica a estrutura e o estatuto jurídico (transforma um serviço num instituto público, nacionaliza um conjunto de empresas privadas e funde-as numa empresa pública, cria uma fundação pública, etc).
Resultando a criação do substracto de acto do Estado, de acto de poder, não está nas mãos da pessoa colectiva de direito público alterar os seus estatutos ou extinguir-se.
17 — Ê que — e aí temos a segunda diferença— as pessoas colectivas de direito público são criadas e existem para a prossecução necessária de interesses colectivos. Elas prosseguem fins do Estado, fins que não podem deixar de ser assegurados, directa ou indirectamente, pelo Estado. Compõem, por isso, a administração estadual indirecta (cf. Freitas do Amaral, op. cit., pp. 377 a 382). Esta, por sua vez, integra dois tipos de entes públicos: os institutos públicos e as associações públicas, que se distinguem entre si pela natureza do substracto — institucional, nos primeiros, associativo (conjunto de indivíduos ou entes colectivos), nas segundas.
O O reconhecimento da utilidade pública pode fazer-se individualmente, precedendo solicitação da entidade interessada (artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 460/77), ou genericamente, para todas as pessoas colectivas de determinada categoria, como sucede com as instituições particulares de solidariedade social (artigo 8." do Estatuto anexo do Decreto-Lei n." 119/83, de 25 de Fevereiro).
O Isto só é verdade para as pessoas colectivas de direito privado cuja declaração de utilidade pública depende de solicitação individual. Para as outras [v. nota (')]. existem normas limitadoras das alterações estatutárias e do processo de extinção (artigos 11.° e 27." do estatuto anexo ao Decreto-Lei n.° 119/83, de 25 de Fevereiro, por exemplo).
Convém salientar que o fenómeno da devolução de poderes, característico da administração indirecta, atinge maior amplitude no caso das associações públicas, pois abrange a faculdade de escolha dos titulares dos órgãos da pessoa colectiva. Embora existam relevantes diferenças, esta característica das associações públicas aproxima-as das autarquias locais (e com estas o Dr. Sérvulo Correia, op. cit., p. 145, inclui-as na administração autónoma, a que se refere a alínea d) do artigo 202.° da Constituição).
Diversamente, as pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, sendo entes privados, prosseguem fins coincidentes com os do Estado, mas por opção dos instituidores ou dos associados. Daí que, em princípio, possam modificar os seus fins ou extinguir-se.
18 — A terceira grande diferença — do maior relevo para o problema em análise— traça, a nosso ver, a fronteira entre as associações públicas c as associações privadas a que for reconhecida utilidade pública (administrativa): a estas últimas, como associações privadas que são, aplica-se claramente o disposto no n.° 3 do artigo 46.° da Constituição — a liberdade negativa de associação.
Resulta daqui que, tratando-se de associações profissionais ou de classe, da conjugação do citado preceito com o disposto no n.° 1 do artigo 47.° — e ainda com o preceituado na alínea 6) do n.° 2 do artigo 56.°— não parece possível, à face da nossa lei fundamental, obrigar uma certa profissão a associar-se numa entidade privada como condição do respectivo exercício profissional, conferindo do mesmo passo a tal entidade, por razões disciplinares ou outras, o poder de impedir aquele exercício.
Por outro lado, relativamente às entidades privadas de natureza associativa, funciona o princípio da representação associativa e não o da representação corporativa: daí que as associações de classe, designadamente os sindicatos, apenas representem aqueles que neles livremente se inscrevem e não o conjunto de todos quantos exercem determinada actividade profissional (forçados à inscrição ou, ao menos, à quotização).
Já assim não será —ou assim poderá não ser — relativamente às associações públicas: existindo por força do acto do poder e não por vontade dos associados, é admissível, em princípio, que o legislador, tendo em consideração as finalidades de interesse público prosseguidas, considere obrigatória a inscrição nelas e lhes atribua representatividade de tipo corporativo, permitindo-lhes assim condicionar o exercício da actividade profissional em causa.
19 — Ora bem: qualquer das Câmaras em causa foi criada por acto do poder público; todas elas prosseguem, necessariamente embora não exclusivamente e com graus de intensidade diversos (4), fins de interesse público (não po-
(') A prossecução de fins de interesse público atinge intensidade máxima na Câmara dos Despachantes Oficiais e minima na Câmara dos Solicitadores, encontrando-se a Câmara dos Revisores Oftciais de Contas entre as duas, mas mais perto da primeira.
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dendo deixar de exercê-los por decisão própria, nem modificar livremente os seus estatutos, nem extinguir-se); a inscrição é obrigatória, em cada uma delas, para a respectiva classe profissional, como condição sine qua non do exercício da actividade, podendo todas elas excluir de tal exercício os seus representados.
Impõe-se uma conclusão: as 3 Câmaras profissionais são pessoas colectivas de direito público. A Câmara dos Revisores Oficiais de Contas, designadamente, é-o, apesar de a lei, a nosso ver erradamente, lhe chamar outra coisa.
20 — Dissemos que a qualificação das câmaras profissionais como associações públicas pode afastar as objecções resultantes do disposto na Constituição, nomeadamente nos artigos 46°, n.° 3, e 47.°, n.° 1. Neste sentido subscrevemos as palavras do Dr. Sérvulo Correia:
Nós pensamos que a disciplina constitucional da liberdade de associação incide sobre as associações de direito privado, cuja constituição se baseia num acto negocial de exercício da autonomia individual, o mesmo sucede com os subsequentes actos individuais de adesão ou de exoneração (op. cit., p. 146).
Não estamos, pois, de acordo com aqueles que consideram a obrigatoriedade de inscrição nas associações públicas contrária ao n.° 3 do artigo 46.° da Constituição (neste sentido, Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 1978, p. 128) (5).
Em nosso entender, por conseguinte, a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas —como, de resto, as outras câmaras profissionais e as ordens— é uma pessoa colectiva de direito público, do tipo associação pública, o que afasta as suspeitas de desconformidade constitucional atrás apontadas.
V
Questões complementares:
21 — Subsistem, porém, duas questões, sendo a primeira a de saber se a nossa conclusão pode valer contra legem, isto é, contra a expressa qualificação legal da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas como pessoa colectiva de direito privado e utilidade pública, feita pelo n.° l do artigo !14.° do Decreto-Lei n.° 519-L2/79.
Trata-se, cremos, de uma questão duvidosa: poderá o intérprete «desautorizar» o legislador, discutindo as qualificações jurídicas por este feitas? Depois, não terá isso inconvenientes práticos, sabido que da qualificação feita pelo legislador decorre muitas vezes a aplicação de um
(!) No mesmo sentido, veja-se a já célebre sentença do 14.° Juízo Cível do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, datada de 4 de Outubro de 1982 (caso Pires de Lima), que considerou contrária à Constituição a obrigatoriedade de inscrição dos advogados na respectiva Ordem.
regime específico, como sucede precisamente com a qualificação de um ente privado como pessoa colectiva de utilidade pública (6)7
Vamos supor que nos tínhamos de resignar a aceitar a qualificação legal. Em tal caso, a obrigatoriedade de inscrição como condição do exercício profissional seria inconstitucional, devendo o Provedor de Justiça solicitar ao Tribunal Constitucional a apreciação e declaração da inconstitucionalidade das disposições em causa do Decreto-Lei n.° 519-L2/79.
Para quem, como nós, entende que os preceitos constitucionais sobre liberdade de associação se não aplicam às associações públicas, tal pedido não deixaria de intrigar: afinal, normas idênticas — as que tornam obrigatória a inscrição na Câmara dos Revisores Oficiais de Contas e as que a tornam obrigatória na Câmara dos Despachantes Oficiais— justificariam um diferente juízo de conformidade constitucional, apenas (o que não significa que a diferença seja irrevelante) por se referirem a entidades a que a lei, não obstante a idêntica criação por acto do poder e a similitude de atribuições, confere qualificação jurídica diversa.
Suponhamos então que rejeitamos a qualificação legal. Não implicará tal rejeição pôr era causa a aplicação à Câmara dos Revisores Oficiais de Contas do regime previsto no Decreto-Lei n.° 460/77 para as pessoas colectivas de utilidade pública?
22 — Resta a segunda questão: o artigo 105.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 519-L2/79 estabelece que das deliberações do conselho disciplinar da Câmara dos Revisores Oficiais de Contas cabe recurso para a 1." Secção do Supremo Tribunal Administrativo.
Acontece, porém, que o reclamante viu a sua inscrição suspensa por falta de pagamento das quotizações e não por motivos disciplinares. Nos termos do artigo 134.° daquele diploma legal, tal deliberação é da competência do conselho directivo. Ora nenhuma disposição do Decreto--Lei n.° 519-L2/79 prevê qualquer recurso das deliberações daquele órgão. Poderia até inferir-se, «a contrário», da disposição expressa do n.° 1 do artigo 105.°, que todas as deliberações em matéria não disciplinar seriam contenciosamente irrecorríveis.
Só que, a ser assim, e tendo em consideração que sustentámos ser a Câmara uma associação pública, portanto um ente integrado na Administração Pública estadual (indirecta) (7), estaríamos confrontados com uma ofensa ao artigo 268.°, n.° 3, da Constituição, isto é, da garantia de recurso contencioso.
Mas não cremos que seja assim: é que o n.° 3 do artigo 114." do Decreto-Lei n.° 519-L2/79 afirma que as deliberações do conselho directivo «têm força de actos definitivos e executórios».
(s) Esse regime jurídico específico consta, essencialmente, dos artigos 9." e 12." do Decreto-Lei n.° 460/77. (') Freitas do Amaral, op. cit., p. 399.
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Parece, pois, que, independentemente da verdadeira natureza jurídica da Câmara, se poderá recorrer contenciosamente das deliberações do conselho directivo, vista a própria letra do preceito constitucional.
Claro que esta conclusão depara com uma dificuldade: qual a finalidade do n.° 1 do artigo 105.°, se é certo que o n.° 3 do artigo 114.° também considera definitivas e executórias as deliberações do conselho disciplinar?
VI
Conclusões:
1." Não obstante a qualificação legal, a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas deve ser considerada uma pessoa colectiva de direito público, do género associação pública;
2." A liberdade negativa de associação, garantida pelo n.° 3 do artigo 46.° da Constituição, não se aplica às associações públicas, que são criação do poder, e nas quais, por isso, pode ser obrigatória a inscrição;
3." Sendo a Câmara dos Revisores Oficiais de Contas —como as outras câmaras profissionais e as ordens— uma pessoa colectiva de direito público, as deliberações dos seus órgãos têm de ser contenciosamente recorríveis, sob pena de ofensa do n." 3 do artigo 268." da Constituição.
4." Vistas as obscuridades existentes em matéria de estatuto jurídico das ordens e câmaras profissionais, e tendo em conta que estão em causa importantes direitos fundamentais dos cidadãos —liberdades de associação e de trabalho — sugerimos que se dê conhecimento do problema à Assembleia da República — Comissão Parlamentar dos Direitos, Liberdades e Garantias.
3 — Concordando cora o parecer transcrito, o Provedor optou por não suscitar a questão de inconstitucionalidade invocada, mas resolveu expor a situação à Assembleia da República, para efeitos de apreciação em termos de revisão legislativa.
4 — O Presidente da Assembleia da República afectou o assunto à 1." Comissão Especializada Permanente.
B) Pedidos de declaração de inconstitucionalidade
1 — Competência dos sindicatos para a passagem de carteiras profissionais
Processo n.° 82/R-1344-DI-23-B
1 — Uma associação representativa do pessoal de enfermagem veio pôr em causa a constitucionalidade do despacho do Secretário de Estado do Trabalho, de 17 de Março de 1982 (publicado no Diário da República, 2." série, n.° 31 do mesmo mês), que
criou a carteira profissional dos profissionais de enfermagem, tornando-a «obrigatória para o exercício da profissão em qualquer entidade empregadora pública bu privada, ou no exercício liberal».
Aos enfermeiros que já exercessem a profissão concedera o despacho (artigo 12.°) um prazo de 90 dias para se habilitarem com a referida carteira, a passar pelo Sindicato de Enfermeiros da respectiva zona, nos termos do Decreto-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939.
A associação reclamante protestava contra a aplicabilidade deste despacho aos enfermeiros do sector público, considerando-o, aliás, incompatível, em geral, com o princípio da liberdade de associação sindical.
2 — A questão da constitucionalidade do regime do Decreto-Lei n.° 29 931, na medida em que atribui aos sindicatos a faculdade de concessão de carteiras profissionais, mesmo aos que não sejam seus sócios, já fora objecto de apreciação neste serviço.
O Provedor considerou tal regime — característico do sistema corporativo existente na data da publicação do diploma em causa— incompatível com a liberdade de associação garantida pela Constituição de 1976.
Pretendendo, porém, evitar que eventual declaração de inconstitucionalidade das normas em questão originasse uma situação de vazio legislativo, passando a não existir quailquer entidade com competência jurídica e meios institucionais apropriados à passagem das carteiras profissionais, o Provedor optou por recomendar ao Governo a emanação de nova legislação sobre a matéria, revogatória do aludido regime, ora institucionalmente (relatório do Provedor de Justiça de 1978, pp. 48-49).
3 — Apesar de ter sido elaborado projecto de diploma nesse sentido, que chegou mesmo a ser publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, para efeitos de discussão pública, a verdade é que o mesmo não veio a ser aprovado como texto legal.
4 — Face a esta situação, e tendo em conta que a mencionada recomendação legislativa fora formulada já há mais de 5 anos, sem ter tido, afinal, seguimento, o Provedor entendeu que se justificava intervir de novo a este respeito.
5 — Assim, começou, tendo em atenção o prazo fixado no despacho citado no n.° 1, por sugerir ao Ministro do Trabalho e ao Secretário de Estado da Saúde que não desse execução ao respectivo conteúdo antes de sobre o mesmo ele poder tomar posição.
6 — O Ministério da Saúde aceitou esta sugestão, tendo resolvido, a propósito, ouvir a Procuradoria--Geral da República, pois entretanto também se lhe haviam suscitado dúvidas acerca da constitucionalidade do despacho acima indicado e, designadamente, da sua aplicabilidade aos enfermeiros do sector oficial.
7 — O Provedor considerou, além disso, que se impunha agora tomar posição explícita quanto à constitucionalidade do regime do Decreto-Lei n.° 29 931.
8 — Foi, assim, elaborado sobre a questão, pelo assessor encarregado do processo, o seguinte parecer:
I
A conformidade constitucional do § 1do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939, é a questão levantada no presente
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processo, pela Associação na sequência do despacho de 17 de Março de 1982, do Secretário de Estado do Trabalho ('), proferido ao abrigo daquele preceito e que regulamenta, em novos termos, a carteira profissional dos profissionais de enfermagem (2). è do seguinte teor o mencionado § 1.°:
As carteiras profissionais são passadas pelos sindicatos nacionais e visadas pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência (s), depois de aprovados os respectivos regulamentos pelo Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social (4).
II
Circunscreveremos a análise' a levar a cabo no presente processo à primeira parte do preceito em apreço, que comete aos sindicatos a passagem das carteiras profissionais.
Na verdade, a exigência de carteira profissional para o exercício de certas profissões e a consequente necessidade da sua regulamentação (previstas no corpo do artigo e parte final do § 1.°), em si mesmas, são consideradas, pelos nossos constitucionalistas, como decorrência do interesse colectivo subjacente àquelas profissões e compreendidas, por isso, nas restrições ao direito de escolher livremente a profissão prevista na parte final do n.° 3 do artigo 51.° da Constituição (5).
Concretamente, no Parecer n.° 1/78, de 3 de Janeiro, da Comissão Constitucional, escreve-se:
A preparação, v. g., universitária, liceal, os estágios, concursos, experiência em certas actividades, etc, podem, pois, ser legalmente exigidas, pêlo próprio interesse colectivo, quer para permitir que certas pessoas possam desempenhar determinadas profissões, quer por virtude dos interesses fundamentais que as dominam e justificam.
E no Parecer n.° 2/78, de 5 de Janeiro, da mesma Comissão:
Há, com efeito, profissões que apresentam como traços distintivos um elevado grau de formação científica e técnica, regras de exercício ou de prática de actos extremamente relevantes e exigentes, necessidade de confiança pública ou social tão marcada, que se torna indispensável uma disciplina capaz de abranger todos os profissionais, tra-
duzida não apenas em normas técnicas e deontológicas, mas também em verdadeiras normas jurídicas.
III
0 Decreto-Lei n.° 29 931, de 1939, surge, naturalmente, na lógica do sistema corporativo, onde as organizações sócio-profissionais representavam legalmente toda a categoria da mesma profissão, independentemente de incrição (°), e, como pessoa colectiva de direito público (7), exerciam funções de interesse público (artigo 42.° do Estatuto do Trabalho Nacional, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 23 048, de 23 de Setembro de 1933).
Com a revolução, os sindicatos (ao contrário do que, em certa medida, se passou com as Ordens) libertaram-se de quaisquer vínculos corporativos, prefigurando-se como associações privadas, emanadas do direito geral de associação e tendentes a «defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representam» (artigo 58.°, n.° 1, da Constituição).
A esta luz, as discordâncias entre a solução legal em análise e a actual Constituição surgem como inevitáveis.
IV
1 — Assim é que, ao cometer-se aos sindicatos a passagem das carteiras profissionais, é violado, em vários aspectos, o princípio da liberdade sindical, consagrado no artigo 57.° da Constituição.
á) Desde logo, pode perigar a liberdade de inscrição ln.° 2, alínea 6)1, na sua configuração negativa — que garante o direito de não inscrição no sindicato e o direito de o abandonar (8) — porquanto o receio de que a carteira seja denegada pelo sindicato pode funcionar como elemento de pressão suficientemente forte para que o trabalhador se sindicalize, ou não abandone o sindicato.
Receio que, por um lado, se potencia pelo facto de o diploma em apreço não definir os objectivos que são prosseguidos com o condicionamento das profissões à titularidade da carteira profissional ('). e que, por outro, nada tem, na prática, de infundado, já que os próprios serviços do Ministério do Trabalho «têm conhecimento de casos de recusa de passagem de carteiras profissionais a trabalhadores não sindicalizados, por parte de sindicatos» (,0).
(') Diário da República, 2." série, n.c 75, de 31 de Março de 1982.
(') Idêntica questão foi suscitada pelas alterações introduzidas, em 1977, ao Regulamento da Carteira Profissional dos Técnicos de Prótese Dentária (relatório do Provedor de Justiça de 1978, p. 48).
(J) Substituído, no aludido despacho, pelo «Ministério do Trabalho ou suas delegações da área da sede dos sindicatos» (artigo 6°).
(') Hoje Ministro do Trabalho ou Secretário de Estado do Trabalho.
O Questão diferente, que adiante equacionaremos, é a de saber se tais restrições podem ser reguladas pelo Governo e pela via regulamentar.
(') Veja-se o artigo 2." do próprio Decreto-Lei n.° 29 931.
(') Do tipo para-estadual, na classificação de Manuel de Andrade {Teoria Geral da Relação Jurídica, s, 1966, p. 76).
(*) Cf. G. Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa, anotada, 1978, p. 152.
(') Boletim do Trabalho e Emprego, separata 1, de 11 de Junho de 1979, p. 63.
(10) Resposta da Secretaria de Estado do Trabalho a um requerimento de um deputado, publicada no Diário da Assembleia da República, 2.* série, n.° 82, de 16 de Julho de 1980, p. 1397. E acrescenta-se: «é nossa convicção de que alguns sindicatos utilizam a passagem da carteira profissional como instrumento de pressão junto dos trabalhadores, com vista a sua sindicalização».
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b) Depois, ao atribuir-se aos sindicatos a prossecução do interesse público que está na base da exigência, para o exercício de certas profissões, de carteira profissional, do mesmo passo em que se lhes confere funções que excedem os interesses e prevalecem sobre a vontade dos seus associados, ou por isso mesmo, integram-se aqueles, ainda que indirectamente, no domínio da administração pública —o que não pode deixar de comprometer o princípio da independência das associações sindicais em face do Estado, consagrado no n,° 4 do artigo 57.° da Constituição.
2 — Pensamos, finalmente, que a atribuição a uma entidade privada da passagem das carteiras profissionais comportará um risco para a liberdade de exercício da profissão escolhida,, integrante do direito de escolher livremente a profissão que a Constituição consagra no seu artigo 51.°, n.° 3 ("). Comprova-o o comportamento atrás aludido, de certos sindicatos denegarem as carteiras sem motivo justificado, mediante apreciação, aliás não seguramente objectiva, pelo também já referido silêncio do regime quanto às finalidades prosseguidas com a exigência de carteira profissional ('*).
V
Tais desvios integram-se no direito anterior contrário à Constituição, previsto no artigo 293.°, n.° 1, do texto fundamental, o que, de acordo com a jurisprudência dominante na Comissão Constitucional, não obsta ao uso, pelo Conselho da Revolução, da faculdade que lhe é atribuída pelo artigo 281.°, n.° 1.
VI
Em face de tudo o exposto, propõe-se que, ao abrigo do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição, se solicite ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade do artigo 3.°, § 1.° do De-certo-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939, na parte em que comete aos sindicatos a passagem das carteiras profissionais, por violação da alínea b) do n.° 2 (liberdade de inscrição) e n.° 4 (independência em relação ao Estado) do artigo 57.° e do n.° 3 do artigo 51.°, ambos da Constituição.
(") G. Canotilho e Vital Moreira, ob. cit. p. 138.
(") Não consideramos no texto a possibilidade de o artigo em apreço, na parte em que remete para utcriores regulamentos, ser também materialmente inconstitucional, por violação dos artigos 167.°, alínea c), e 18.°, n.° 3, da Constituição — que reservam para a Assembleia da República a produção legislativa e regulamentar sobre direitos, liberdades e garantias — pelas dúvidas que suscita. O problema põc-se também em relação ao direito de escolha da profissão, pelas restrições admitidas no n.° 3 do artigo 51." da Constituição. Aquelas dúvidas emergem de não ser liquido que este direito se integre nos «Direitos, liberdades e garantias» e, por outro lado, da existência da figura da deslegalização (cit. Parecer n.° 2/78 e, quanto a esta figura, G. Canotilho. Direito Constitucional. 1977, p. 358, e Parecer da Comissão Constitucional n.° 30/81, de 27 de Outubro, n.° 21).
9 — Tendo, entretanto, sido criado o Tribunal Constitucional, o Provedor, concordando com aquele parecer, dirigiu-lhe o seguinte requerimento, em 19 de lunho de 1984:
1° O Provedor de Justiça vem, ao abrigo das disposições combinadas do artigo 281.°, n.° 1, alínea a), da Constituição da República, e artigos 51.° e seguintes e 62° e seguintes da Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro, requerer a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade do § 1.° do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939, nos termos e com os fundamentos seguintes.
2.° Eis o teor daquele § 1.°:
As carteiras profissionais são passadas pelos sindicatos nacionais e visadas pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, depois de aprovados os respectivos regulamentos pelo Subsecretário de Estado das Corporações e Previdência Social.
3.° Circunscreve-se o objecto do presente requerimento à parte deste preceito que comete aos sindicatos a competência para a passagem de carteiras profissionais.
4.° Ê que, a exigência de carteiras profissionais para o exercício de certas profissões e a consequente necessidade da sua regulamentação (previstas na parte final do parágrafo em apreço, em conjugação com o corpo do artigo respectivo) são, em si mesmas, consideradas pelos constitucionalistas como decorrência do interesse colectivo subjacente àquelas profissões e, por isso, compreendidas nas restrições ao direito de escolher, livremente, a profissão, previstas na parte final do n.° 1 do artigo 47.° da Constituição (Pareceres da Comissão Constitucional n.OT 1/78 e 2/78, de 3 e 5 de Janeiro).
5.° Retomando o âmbito, diremos que o Decreto-Lei n,° 29 931 surge, naturalmente, na lógica do sistema corporativo, onde as organizações sócio-profissionais representavam legalmente a categoria da mesma profissão, independentemente de inscrição (v. artigo 2.°) e, como pessoas colectivas de direito público, exerciam funções de interesse colectivo (artigo 42.° do Estatuto do Trabalho Nacional, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 23 048, de 23 de Setembro de 1933).
6.° Actualmente, os sindicatos (ao contrário do que, em certa medida, se passou com as ordens) libertaram-se de quaisquer vínculos corporativos, perfigurando-se como associações privadas, emanadas do direito geral de associação e tendentes a «defender e promover a defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que representam» (artigo 57.°, n.° 1 da Constituição).
7.° A esta luz, as discordâncias entre a solução legal em análise e a actual Constituição surgem como inevitáveis.
8.° Assim é que, ao cometer-se aos sindicatos competência para a passagem das carteiras profissionais, é violado, em vários aspectos, o princípio da liberdade sindical, consagrado no artigo 56.° da lei fundamental.
9.° Desde logo, porque pode perigar a liberdade de inscrição [n.° 2, alínea b)], na sua configuração negativa — que garante o direito de não inscrição
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no sindicato e o direito de o abandonar—, porquanto o receio de que a carteira seja denegada pelo sindicato pode funcionar como elemento de pressão suficientemente forte, para que o trabalhador se sindicalize, ou abandone o sindicato.
10.° Receio, aliás, que, por um lado, se potencia pelo facto de o diploma em apreço não definir os objectivos que são prosseguidos com o condicionamento do exercício de profissões à titularidade profissional (v. Boletim do Trabalho e Emprego, separata n.° 1, de 11 de Junho de 1979, p. 63) e que, por outro lado, nada tem, na prática, de infundado, já que os próprios serviços do Ministério do Trabalho «têm conhecimento de casos de recusa de passagem de carteiras profissionais a trabalhadores não sindicalizados, por parte de sindicatos» e a «convicção de que alguns sindicatos utilizam a passagem de carteira profissional como instrumento de pressão junto dos trabalhadores, com vista à sua sindicalização» (resposta da Secretaria de Estado do Trabalho a um requerimento de um deputado, publicada no Diário da Assembleia da República, 2.a série, n.° 82, de 16 de Julho de 1980, p. 1397).
11 ° Depois, ao atribuir-se aos sindicatos a prossecução do interesse público que está na base da exigência, para certas profissões, de carteira, profissional, do mesmo passo que se lhes conferem funções que excedem os interesses e prevalecem sobre a vontade dos seus associados, ou por isso mesmo, integram-se aqueles, ainda que indirectamente, no domínio da administração pública — o que não pode deixar de comprometer o princípio da dependência das associações sindicais em face do Estado, consagrado no n.° 4 do aludido artigo 56.° da Constituição.
12." Finalmente, acentua-se que a atribuição a uma entidade privada da competência em apreço envolverá também um risco para a liberdade de exercício da profissão escolhida, integrante do direito de escolher livremente a profissão, que a Constituição consagra no seu artigo 47.°, n.° 1. Comprova-o, igualmente, o que supra se deixou escrito, sob o n.° 8.°
13." Tais desvios integram-se no direito anterior à entrada em vigor da Constituição, o que, de acordo com a jurisprudência até agora dominante, não obsta à apreciação e declaração da sua inconstitucionalidade, com força obrigatória geral.
14.° Nestes termos e em face de tudo o exposto, o Provedor de Justiça requer a esse Tribunal Constitucional, ao abrigo das disposições conjugadas da alínea a) do n.° 1 do artigo 281.° da Constituição e do n.° 2 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a apreciação e declaração, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade do artigo 3.°, § 1.°, do Decreto-Lei n.° 29 931, de 15 de Setembro de 1939, na parte em que comete aos sindicatos a competência para a passagem das carteiras profissionais, por violação da alínea b) do n.° 2 (liberdade de inscriçpi) e do n.° 4 (independência em relação ao Estado) do artigo 56.°, bem como do n.° 1 do artigo 47.°, todos da Constituição.
10 — O Provedor informou deste pedido o Ministério do Trabalho, com vista a poder proporcionar
eventual revisão legislativa antes da decisão do Tribunal Constitucional.
11 — Entretanto, o Governo fez publicar, em 13 de Novembro de 1984, o Decreto-Lei n.° 358/84, que revogou o Decreto-Lei n.° 29 931 e atribuiu a competência para passar carteiras profissionais ao Estado, através dos serviços do Ministério do Trabalho e Segurança Social e das Secretarias Regionais do Trabalho dos Açores e da Madeira.
12 — O Tribunal Constitucional já de resto se pronunciara, em recurso, no sentido da inconstitucionalidade do referido diploma, ora revogado.
Essa decisão teve, porém, nos termos constitucionais, apenas eficácia para o caso concreto que fora objecto do recurso.
Continua a poder, porventura, vir a ter relevância, designadamente em relação ao período anterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 358/84, a tomada de posição do Tribunal Constitucional, com eficácia geral e abstracta, acerca da constitucionalidade do diploma por este substituído.
2 — Necessidade de pagamento prévio de certa quantia, para contraprova de suspeita de condução sob influência do álcool
Processo n.° 82/R-2379-DI-54
1 — Com fundamento em que o n.° 2 do artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 87/82, de 19 de Novembro, diploma que desenvolve os princípios gerais do regime jurídico da condução sob influência do álcool, infringe os artigos 20.°, n.° 2. e 32.°, n.° 1, da Constituição, na medida em que faz depender garantias essenciais à defesa dos arguidos de recursos económicos e além disso, imediatamente disponíveis, um advogado solicitou que o Provedor de Justiça suscitasse a declaração da respectiva inconstitucionalidade.
2 — Sobre a matéria formulou a assessora incumbida do processo o parecer seguinte:
a) Para se ter uma exacta percepção da problemática em causa há que aproximar o citado n.° 2 do artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 87/82, dos preceitos da Lei n.° 3/82, de 29 de Março, que estão na sua origem.
Para o efeito, os passamos a transcrever:
Lei n.° 3/82
ARTIGO 1." (Condução sob influência do álcool)
1 — Ê proibida a condução de veículos com e sem motor, em via pública ou equiparada, por indivíduos sob a influência do álcool.
2—...............................................
ARTIGO 2.°
(Fiscalização da condução sob a influência do álcool)
1 — O exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizada por agente da autori-
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dade, que, para o efeito, deve dispor de material adequado.
2 — Se os resultados forem positivos, e sem prejuízo do disposto no artigo 7.°, o suspeito será impedido de conduzir, cessando este impedimento decorridas 12 horas, a menos que antes se verifique a inexistência de qualquer suspeita de influência de álcool através de exame requerido pelo condutor.
3 —...............................................
4—..............................................
ARTIGO 4.° (Contraprova)
1 — O condutor impedido de conduzir nos termos dos n.05 2 e 3 do artigo 2.° pode requerer de imediato a contraprova.
2 —...............................................
3 —...............................................
4—..................:............................
5 —...............................................
Decreto Regulamentar n.° 87/82
Art. 5.°—1 —.................................
2 — O suspeito, ao requerer a contraprova, tem de entregar, contra recibo, ao agente da autoridade, 5000$, para pagamento dos exames a realizar para determinar o estado do influenciado pelo álcool.
3—...............................................
4 —...............................................
Art. 9.° — 1 —.................................
2—...............................................
3 —...............................................
4 —...............................................
5 —...............................................
6 — Em nenhum caso, porém, o condutor submetido a exame de ar expirado que apresente resultados positivos poderá continuar a conduzir qualquer veículo, ainda que seja para o arrumar convenientemente, enquanto durar o impedimento previsto nos n.08 2 e 3 do artigo 2.° da Lei n.° 3/82.
7 — O exame a que faz referência o n.° 2 do artigo 2.° da Lei n.° 3/82 só pode ser requerido pelo condutor 4 horas após o exame de pesquisa de álcool no ar expirado; se os resultados deste ainda forem positivos, o condutor poderá requerer novos exames, de 2 em 2 horas, até que se verifique a inexistência de qualquer suspeita de influência de álcool.
Do articulado que acaba de se expor, interessa reter as seguintes facetas:
O condutor que for detectado como estando sob a influência do álcool fica impedido de conduzir durante 12 horas;
Esse impedimento pode contudo cessar antes de decorridas as 12 horas se o arguido, através de exame por ele requerido, comprovar que não existe qualquer suspeita de ele estar sob o influência do álcool;
Para beneficiar dessa contraprova, é o interessado obrigado, ao requerê-la, a entregar ao agente de autoridade a quantia de 3000$.
A vinculação a este pagamento de 5000$ para efeito de se fruir do benefício de contraprova, o que é o mesmo que dizer da possibilidade de voltar a conduzir antes de decorridas as 12 horas após a detecção de álcool no sangue, não traduz propriamente uma infracção aos artigos 20.°, n.° 2, e 30.°, n.° 1, da Constituição, invocados pelo reclamante.
Estabelecendo o princípio desses preceitos que a todos é assegurado o acesso aos tribunais para defesa dos seus direitos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos, entende-se que o mesmo não é pois afectado pelo regime em questão, uma vez que este não põe cm causa o recurso aos tribunais, limitando-se a restringir um meio de defesa ainda no âmbito de um processo meramente administrativo desencadeado por uma autoridade policial.
Pelo que concerne ao artigo 3C.°, n.° 1, é válida uma argumentação semelhante, dado que esta disposição tem igualmente em vista o arguido em tribunal, ainda que se cinja ao processo-crime.
b) Conquanto se não trate, como acabamos de acentuar, de uma infracção de normas expressas da Constituição, deve todavia analisar-se se o regime contestado pelo reclamante não viola a Constituição nalgum dos princípios gerais que ela consigna, o que, a ter lugar, configurará igualmente uma inconstitucionalidade prevista no artigo 277.°, n.° 1, da mesma Constituição.
De entre esses princípios, aquele que efectivamente se revela atingido pelo regime em causa, é o princípio da necessidade de garantias de defesa a favor de todo aquele contra quem seja movido um processo sancionatório, tenha ele natureza criminal, disciplinar, administrativa ou análoga. Princípio este a que se chega por indução feita a partir dos artigos 20.°, n.° 2, 28.°, n.° 1, 52.°, n.° 1, e 269.°, n.° 3.
Sucede que este princípio do direito de defesa do arguido é, no caso vertente, violado por uma norma, não de direito penal ou disciplinar, mas de direito de ordenação social, ramo que no artigo 282.°, n.° 3, da Constituição, tem um afloramento em pé de igualdade com aqueles.
Com efeito, o regime de condução sob a influência do álcool, ao fazer defender a fruição do benefício de contraprova do pagamento de 5000$ aquando do requerimento desse benefício pelo condutor impedido de conduzir durante pelo menos 12 horas, restringe o direito de defesa do arguido no âmbito de um processo em que, caso se venha a comprovar que ele apresentava uma alcoolemia igual ou superior a 0.8 e/l, lhe será aplicada, entre outras sanções, aquilo a que, segundo o Decreto-Lei n.° 433/82, de 27 de Outubro, se denomina uma «coima».
Neste contexto, concluímos pela inconstitucionalidade do regime em causa, afigurando-se-nos
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que a sua declaração deve ser suscitada no Tribunal Constitucional.
3 — Concordando com esta argumentação, o Provedor formulou ao Tribunal Constitucional, em 15 de Fevereiro de 1984, o seguinte pedido:
1.° Decorre da conjugação dos artigos 1.°, 2.°, n.OT 1 e 2, e 4.°, n.° 1, da Lei n.° 3/82, de 29 de Março, com o artigo 5.°, n.° 2, do Decreto Regulamentar n.° 87/82, que:
O condutor que for detectado como estando sob influência do álcool fica impedido de conduzir durante 12 horas;
Esse impedimento pode, contudo, cessar antes de atingidas as 12 horas se o arguido, através de exame por ele requerido, comprovar que não existe qualquer suspeita de ele estar sob influência do álcool;
Para beneficiar dessa contraprova, é o interessado obrigado, ao requerê-la, a entregar ao agente de autoridade a quantia de 5000$.
2.° Conquanto o regime referido não infrinja qualquer norma expressa da Constituição, já o mesmo se não verifica pelo que respeita aos princípios nela consignados.
Assim, de entre esses princípios, aquele que efectivamente se revela atingido é o princípio da necessidade de garantias de defesa a favor de todo aquele contra quem seja movido um processo sancionatório, tenha ele natureza criminal, disciplinar, administrativa ou análoga, princípio esse a que se chega por indução feita a partir dos artigos 20.°, n.° 2, 28.°, n.° 1, e 269.°, n.° 3.
3.° O princípio de direito de defesa do arguido é, no caso vertente, violado por uma norma, não de direito penal ou disciplinar, mas de direito de ordenação social, ramo de direito que no artigo 282.°, n.° 3, da Constituição tem um afloramento em posição de igualdade com qualquer daqueles.
4.° O regime de condução sob a influência do álcool, ao fazer depender a punição do benefício da contraprova do pagamento de 5000$ aquando do requerimento desse benefício pelo condutor impedido de conduzir durante 12 horas, restringe, com efeito, o direito de defesa do arguido no âmbito de um processo em que, caso venha a comprovar-se que ele apresentava uma alcoolemia igual ou superior a 0,8 g/l, lhe será aplicada, entre outras sanções, aquilo a que segundo o Decreto-Lei n.° 433/82, de 27 de Outubro, se denomina uma «coima».
5.° Neste contexto se revela a inconstitucionalidade do n.° 2 do artigo 5." do Decreto Regulamentar n.° 87/82, o que deverá ser declarado para todos os efeitos legais por esse Venerando Tribunal.
3 — Regime de perda e eventual conservação ou concessão de nacionalidade, aplicável aos nascidos nas ex-cotóráas
Processo n.° 83/R-158B-DM0-B
1 — Um ex-militar e ex-funcionário do Estado Português, nascido em Moçambique, veio arguir a incons-
titucionalidade do Decreto-Lei n.° 308-A/75, de 24 de Junho, por força da qual ele e muitos milhares de indivíduos nascidos nas antigas colónias perderam a cidadania portuguesa, sem que lhes fosse sequer possível por esta optar. Alegava, designadamente, que:
O Governo não tinha competência para legislar
sobre tal matéria; O diploma em causa seria discriminatório, por
conter regime mais favorável para os oriundos
do antigo Estado da Índia; Teria sido violado o direito à nacionalidade, na
medida em que esta não poderia ser retirada
por mero acto unilateral dos poderes públicos.
2 — 0 conteúdo do Decreto-Lei n.° 308-A/75 já fora objecto de apreciação neste Serviço (v. relatório do Provedor de Justiça, 1980, pp. 23-24), por iniciativa do Provedor, suscitada por variadas queixas recebidas contra os efeitos da sua aplicação.
Essa análise conduziu o Provedor a recomendar à Assembleia da República a revisão do citado diploma, nomeadamente no sentido da instituição da faculdade, peto menos, para os residentes ou domiciliados em Portugal, de opção pela nacionalidade portuguesa.
Tal recomendação não veio, porém, a ter seguimento.
Designadamente, não foi tida era conta na elaboração da actual Lei da Nacionalidade (Lei n.° 37/81, de 3 de Outubro).
3 — Estudado o Decreto-Lei n.° 308-A/75 sob a perspectiva da sua compatibilidade ou não com a lei fundamental, o Provedor concluiu pela negativa, o que o levou a formular ao Tribunal Constitucional, em 5 de Julho de 1984, o seguinte requerimento:
1.° Com o acesso à independência dos territórios ultramarinos sob administração portuguesa, houve que regular a situação em termos de nacionalidade daquelas cidadãos que neles haviam nascido e que até aí tinham a nacionalidade portuguesa.
2.° Para tal fim foi publicado o Decreto-Lei n.° 308-A/75, de 24 de Junho.
3." Em tal diploma, e em síntese, o legislador decidiu conservar a nacionalidade aos residentes em território ultramarino, mas cuja origem era outra parcela do território nacional, e, ainda, àqueles que, embora originários dos territórios ultramarinos, estavam domiciliados em Portugal ou ilhas adjacentes.
4.° Pretendia-se, assim, que mantivessem a nacionalidade os cidadãos portugueses ou de nacionalidade portuguesa que com o Estado Português mantivessem uma ligação séria.
5.° Por outro lado, em sede de nacionalidade procurou-se respeitar a vontade dos interessados.
Para tanto se deixou expresso no preâmbulo do Decreto-Lei n.° 308-A/75 que haveria que possibilitar a manutenção da nacionalidade portuguesa nos casos em que uma inequívoca manifestação de vontade apontasse nesse sentido.
6.° Todavia, o articulado do diploma veio contrariar tal princípio contido no preâmbulo, respeitando a vontade dos cidadãos apenas no caso de os mesmos terem nascido no antigo Estado da índia [artigo !/t n.° 1, alínea c)].
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7." Pode compreender-se o princípio de política legislativa que norteou tal distinção: o caso da índia estava longe, e havia que impedir que, pela opção dos interessados, o Estado Português viesse a receber no seu seio cidadãos naturalmente susceptíveis de se tornarem nacionais dos novos países independentes. Para um País em crise, a avalanche dos nacionais próprios e dos novos nacionais poderia ser um catástrofe.
8.° Só que, no entanto, tal «princípio de opção» é internacionalmente aceite como princípio positivo em caso de desmembramento de territórios (v., nesse sentido, Rui Moura Ramos, Revista de Direito e Economia, Coimbra, ii, 2, pp. 331 e segs.).
9.° E se é certo que o legislador do Decreto-Lei n.° 308-A/75 apontou na direcção que levava ao seu respeito, a verdade é que acabou por perfilar um sistema incoerente e equívoco, e, porque não dizê-lo, inteiramente discriminatório,
10." Na verdade, ao conservar a nacionalidade aos nascidos no antigo Estado da Índia, e retirando-a aos demais nascidos nos restantes territórios ultramarinos, impedindo estes de, através da sua opção, declararem querer conservar a nacionalidade portuguesa, é evidente que o legislador privilegiou os nascidos na Índia e privou do direito de cidadania nacional os nascidos nos demais territórios ultramarinos.
11." Do exposto resulta, pois, que o disposto no artigo 1.°, n.° 1, alínea c), do Decreto-Lei n.° 308-A/75, está em manifesta desconformidade com o conteúdo do artigo 13.°, n.° 2, da Constituição da República Portuguesa de 1976, como já o estava com o disposto no artigo 5.°, § 2.°, da Constituição da República de 1933.
12.° Está, assim, o preceito em causa ferido do vício de inconstitucionalidade material indicado.
13." Sucede, por outro lado, que, após a primeira revisão constitucional — Lei Constitucional n.° 1/82, de 30 de Setembro— foi introduzido um novo princípio na Constituição — artigo 26.°, n.° 3 — onde se expressa que a privação da cidadania (leia-se também nacionalidade) não pode ter como fundamento motivos políticos.
14.° Tal princípio teria decorrido da recepção no nosso direito interno do artigo 15.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem, onde se consagrava «que ninguém podia ser arbitrariamente privado da sua nacionalidade [...]», princípio esse que durante muito tempo se entendeu não constituir uma regra de direito vinculativo para os Estados (v. Moura Ramos, ob. cit., p. 339).
15.° Mas pergunta-se: sendo o diploma em em causa de 1975, isto é, anterior à Constituição de 1976, e, por maioria de razão, à Lei da Revisão Constitucional, deverá o mesmo conformar-se com os princípios constitucionais indicados?
16.° Desde há muito que a maioria da doutrina (v. por todos Jorge Miranda, A Constituição de 1976, pp. 120 e seguintes) e, mesmo, a antiga Comissão Constitucional vinham caracterizando tais situações como de inconstitucionalidade superveniente, competindo ao órgão encarregado de fiscalizar a constitucionalidade das normas a apreciação da conformidade do direito anterior com
os princípios constitucionais vigentes ao tempo da apreciação.
17.° Todavia, ainda aqui se pode colocar um problema: não será o Decreto-Lei n.° 308-A/75 um diploma que se esgotou instantaneamente com a sua publicação, ao definir quem conserva a nacionalidade e quem, a contrario sensu, a perdeu no momento exacto da mesma publicação?
18.° Pareceria, assim, que, sendo ta! diploma uma «lei-medida» de eficácia instantânea, já não vigoraria na data de entrada em vigor da Constituição e sua 1revisão, e, consequentemente, só deveria ser apreciado à luz dos princípios constitucionais vigentes na matéria de discriminação ao tempo de sua publicação.
19.° Ainda que assim seja, a verdade é que a norma em causa não deixaria de ser inconstitucional por violar o princípio de igualdade ínsito no artigo 5.°, § 2.°, da Constituição de 1933, princípio esse mantido em vigor pela Lei n.° 3/74, de 19 de Maio.
20.° Todavia, na esteira da Comissão Constitucional — Parecer n.° 3/78, Pareceres, 4.° vol., p. 232 — perfilhamos a opinião de que os efeitos do Decreto-Lei n.° 308-A/75, e, mais concretamente, os dos seus artigos 1.°, n.° 1, alínea e), e 4.°, não se esgotam com a sua publicação.
21.° E isto porque a verdade é que os cidadãos que não conservaram a nacionalidade em consequência de terem nascido nos territórios ultramarinos, que não na Índia, conservam ou mantêm a perda da nacionalidade portuguesa.
22." E, assim, nesta óptica, o diploma em causa continua em boa verdade a produzir os seus efeitos, e daí que se mantenha a conexão com os princípios da lei fundamental com que se há-de conformar, isto é, a sua actualidade.
23.° Afigura-se, assim, que, além do mais, o diploma em causa, e mais concretamente as disposições que determinaram por forma indirecta a perda da nacionalidade de cidadãos nascidos em territórios ultramarinos, que não na India, e fazendo-o inevitavelmente por razões de política económica, violam o disposto no artigo 26.°, n.° 3, da Constituição da República, o que gera o vício de inconstitucionalidade material.
Nestes termos, e nos mais de direito, deve ser considerada procedente a arguição constante do presente requerimento e, consequentemente, declarada (com força obrigatória geral) a inconstitucionalidade material do artigo 1.°, n.° I, alínea é), e do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 308-A/ 75, de 24 de Junho.
4 — Concomitantemente, e com vista a que pudesse ser prevenido, por via legislativa o «vazio legislativo» que poderia ser causado por eventual declaração de inconstitucionalidade no sentido solicitado, o Provedor deu conhecimento à Assembleia da República e ao Governo da posição que sobre o assunto assumira.
5 — Em 16 de Novembro de 1984, o Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias da Assembleia da República informou que a comunicação do Provedor fora distribuída a todos os grupos e agrupamentos parlamentares.
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II SÉRIE — NÚMERO 61
4 — Imposto extraordinário orlado pela Lei n.° 37/83 Processo n.° 83/R-2020-DM8-B
1 — Foram recebidas várias queixas protestando contra o facto de, através da Lei n.° 37/83, de 21 de Outubro, ter sido criado um imposto extraordinário incidindo sobre rendimentos auferidos anteriormente à sua publicação.
2 — Embora o Tribunal Constitucional já se houvesse pronunciado, no âmbito da fiscalização preventiva da constitucionalidade, no sentido de esse diploma legal não violar o regime da lei fundamental, o Provedor considerou que esse facto não impediria, juridicamente, uma reapreciação do problema, agora em sede de controle superveniente da constitucionalidade.
E, porque entendeu que o conteúdo da lei em referência contradizia princípios informadores da Constituição, ponderou que se justificaria apresentar o correspondente pedido ao Tribunal Constitucional, o que fez, em 27 de Fevereiro de 1984, nos termos seguintes:
1) Questão prévia — Admissibilidade do pedido
1.° Em 21 de Outubro de 1983, foi publicada a Lei .° 37/83, cujo artigo 1.° criou um imposto extraordinário, cujo produto reverterá integralmente para o Estado, incidindo sobre rendimentos colectáveis respeitantes a 1982 sujeitos a contribuição predial, imposto de capitais, secções A e B, e imposto profissional pelo exercício de certas actividades por conta própria, bem como, ainda, sobre um determinado elenco de remunerações certas e permanentes auferidas de Janeiro a Setembro de 1983.
2." As restantes normas da Lei n.° 37/83 desenvolvem o regime deste imposto extraordinário, relativamente a isenções, taxas, liquidação e cobrança, reclamações, recursos e penalidades.
3.° Solicitado a pronunciar-se, em sede de fis^ calização preventiva da constitucionalidade, sobre o Decreto n.° 32/1II da Assembleia da República, que esteve na origem daquela Lei, o Tribunal Constitucional entendeu, no seu Acórdão n.° 11/83, de 12 de Outubro (publicado no Diário da República, 1.° série, de 20 de Outubro de 1983), não se pronunciar pela inconstitucionalidade dos artigos 1.° e 3.° do mencionado instrumento.
4.° Embora esta tomada de posição do Tribunal Constitucional haja assumido a forma de acórdão, afigura-se que ela possui eficácia jurídica diferente da que é própria das suas decisões proferidas ao abrigo do artigo 281.° da Constituição, ou seja, assume o valor de mero parecer.
E daí que o facto de o Tribunal Constitucional já se haver pronunciado, preventivamente, acerca da Constitucionalidade de um decreto enviado ao Presidente da República para promulgação não obsta a que, uma vez publicada a lei (no caso a Lei n.° 37/83), de novo possa ser solicitado o Tribunal a tomar posição sobre essa questão, agora em sede de fiscalização sucessiva ou superveniente da constitucionalidade.
5.° Aponta nesse sentido, desde logo, o próprio confronto entre as redacções diferenciadas dos preceitos constitucionais nos quais se caracterizam
cada um destes tipos de actuação do Tribunal Constitucional.
6.° Assim, ao delinear a fiscalização preventiva, o artigo 278.°, n.° 1, da lei fundamental refere que o Tribunal Constitucional procede à «apreciação» da constitucionalidade dos instrumentos que para o efeito lhe são enviados pelo Presidente da República.
E o n.° 1 do artigo seguinte, ao mencionar os efeitos dessa tomada de posição do Tribunal Constitucional, fala de este se «pronunciar pela inconstitucionalidade».
7.° Pelo contrário, ao tratar da fiscalização sucessiva ou superveniente, a Constituição é clara em determinar que, verificada a existência de inconstitucionalidade, a actuação do Tribunal Constitucional culmina num acto decisório, com eficácia sobre a própria subsistência jurídica das normas sobre que incide.
Na verdade, o artigo 281.°, n.° 1, da Constituição (logo complementado pelo preceito subsequente) estabelece que, neste âmbito, o Tribunal Constitucional «aprecia e declara, com força obrigatória geral», a inconstitucionalidade de quaisquer normas.
8.° Estas divergências de configuração literal dos dois institutos correspondem, aliás, à real diferença de natureza e objectivos entre eles existentes.
9.° Na realidade, o artigo 281.°, n.° 1, da Constituição prescreve que a declaração de inconstitucionalidade das normas, na fiscalização sucessiva ou superveniente, tem força obrigatória geral, esclarecendo de resto o n.° 1 do artigo seguinte que ela produz, em regra, efeitos desde a entrada em vigor da norma sobre que incide.
10." Ao invés, o pronunciamento do Tribunal Constitucional, em sede de fiscalização preventiva, no sentido da inconstitucionalidade de certo instrumento, produz apenas, segundo o artigo 279.° da Constituição, o efeito de obrigar o Presidente da República ou o Ministro da República (conforme os casos) a vetar o diploma e a remetê-lo ao órgão que o tiver aprovado.
11.° Mas, se este órgão, tratando-se do que detém a competência legislativa normal, confirmar o diploma por maioria de dois terços, o Presidente da República ou o Ministro da República terão de o promulgar.
12.° Isto revela, pois, que os acórdãos que o Tribuna] Constitucional profere em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade não têm a força própria das decisões judiciais, podendo a sua eficácia — aliás não geral, mas dirigida à entidade competente para a promulgação — ser sobrelevada pela de uma deliberação de um órgão legislativo.
13.° Não haverá obstáculo, pois, a meu ver, para que, apesar de o Tribunal Constitucional já se haver pronunciado, preventivamente, pela não inconstitucionalidade de certo decreto legislativo, o mesmo venha, uma vez publicado esse instrumento como diploma legal, a ser solicitado, agora em termos de fiscalização sucessiva ou superveniente, a apreciar e declarar a eventual inconstitucionalidade de uma ou mais das normas nele contidas.
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II) Questão de fundo — Inconstitucionalidade material
A) Inadmissibilidade constitucional da retroactividade da lei fiscal
14.° Considero, antes de mais, que o artigo 1.° da Lei n.° 37/83, de 21 de Outubro, se revela inconstitucional, por criar um imposto extraordinário incidente, retroactivamente, sobre rendimentos percebidos antes da sua publicação — e relativamente aos quais, aliás já haviam sido liquidados e cobrados, na maioria dos casos, os correspondentes impostos normais.
15." Ê certo que a Constituição não contém, mesmo após a revisão de 1982, uma norma que expressamente proíba a retroactividade das leis fiscais.
16.° Mas, em meu entender, nem precisaria de o ter feito, precisamente e sobretudo na medida em que, através da referida revisão, a Constituição passou a consagrar e assumir, no seu conteúdo preceptivo, os princípios do Estado de direito democrático [artigos 2° e 4.°, alínea 6)].
17.° É que entre os princípios materiais confi-guradores do Estado de direito democrático encontram-se, decerto, em sede de fiscalidade, os do respeito pela confiança e capacidade • contributiva dos cidadãos.
18.° E viola esses princípios um preceito que, como o artigo 1.° da Lei n.° 37/83, cria um novo imposto de aplicação retroactiva (intencionalmente retroactiva, como o próprio Tribunal Constitucional o reconhece), em termos de os particulares não terem podido prevê-lo nem tomá-lo em conta na orientação da sua actividade produtora de rendimentos no período atingido.
19.° De resto, estes princípios, arredando a legitimidade constitucional das disposições que estabeleçam impostos em moldes retroactivos, encontram até directa expressão no âmbito das normas da lei fundamental que estruturam o sistema fiscal.
20.° Na verdade, quando o n.° 2 do artigo 106.° prescreve que «os impostos são criados por lei», ele não está senão a explicitar que as leis fiscais devem ter apenas eficácia para o futuro.
O termo «criado» implica, lógica e etimologicamente, o facto de, em dado momento, se gerar algo, que passa então a existir, mais ou menos duradouramente, para o futuro — e não para o passado.
B) Violação, de qualquer modo, dos princípios do Estado de direito democrático
21.° Mas mesmo que se entenda que a Constituição não contém uma proibição absoluta da retroactividade da lei fiscal, ainda assim haverá que concluir, no caso da Lei n.° 37/83, que o modo por que a retroactividade desta se concretiza ofende, efectivamente, os princípios norteadores de um Estado de direito democrático.
22.° De facto, num Estado de direito democrático, a lei deve dispor, em regra, para o futuro — e isto por consideração dos valores da confiança dos seus destinatários e da necessidade de estes pautarem a sua conduta de acordo com regras de que possam previamente ter conhecimento.
23.° A retroactividade da lei, num Estado de direito democrático, sempre será uma excepção.
24.° Este princípio manifesta-se, designadamente, no artigo 12.° do Código Civil — preceito que, embora contido em lei ordinária de Direito Privado Comum, assume relevância de princípio geral de Direito e reflectem uma característica da própria configuração constitucional do Estado Português.
25.° Tendo carácter excepcional, as leis retroactivas terão, para não violar os princípios constitucionais próprios de um Estado de direito democrático, de satisfazer pelo, menos dois requisitos:
a) O desvio, neles materializado, à regra geral da irretroactividade, deverá ser fundamentado, e não arbitrário;
b) Os efeitos dessa aplicação retroactiva sobre os direitos e interesses dos particulares deverão ser razoáveis, respeitando a exigência da proporcionalidade.
26." Ora, por um lado, a Lei n.° 37/83 não apresenta, no seu conteúdo, preambular ou preceptivo — nem tão-pouco isso transparece nos seus trabalhos preparatórios — qualquer fundamentação plausível da rectroactividade nela imposta.
Independentemente da discussão da necessidade, ou não, para o Estado, de poder dispor da receita assim gerada, a verdade é que o legislador não forneceu quaisquer motivos para a opção feita no sentido da retroactividade da incidência do imposto extraordinário — designadamente, em confronto com outras eventuais formas de arrecadação do mesmo montante de receitas, sem desvio à regra da irretroactividade.
27.° Por outro lado, o artigo 1.° da Lei n.° 37/ 83 não respeita o princípio da proporcionalidade, antes produzindo sobre os sujeitos ao imposto extraordinário assim criado efeitos inadmissíveis e intoleráveis.
28.° Na realidade, para a maior parte dos atingidos pela Lei n.° 37/83 já se haviam esgotado, pelo pagamento, quando ela foi publicada, as relações jurídicas tributárias respeitantes aos rendimentos sobre os quais tal imposição fiscal incidiu (rendimentos concernentes à contribuição predial, ao imposto de capitais de 1982 e ao imposto profissional de Janeiro a Setembro de 1983).
29.° A este propósito, não se afigura que ponha em causa a afirmação constante do artigo anterior a alegação de que o imposto extraordinário é um tributo diferente de cada um dos impostos «normais» aí referidos.
30.° É que, antes de mais, a verdade é que o imposto extraordinário não apresenta uma estrutura unitária, antes se desdobrando, afinal, em vários impostos parcelares, consoante a natureza dos rendimentos sobre que incidiram.
Tanto assim é, de resto, que o artigo 7.° da Lei n.° 37/83 manda aplicar, supletivamente, nesta matéria, consoante a natureza dos rendimentos afectados, as regras constantes de cada um dos diplomas relativos aos impostos «normais» a estes correspondentes.
31.° Além disso —e sobretudo— o que revela é que os contribuintes que já haviam pago tais
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impostos parcelares «normais» podiam legitimamente confiar em que sobre os mesmos rendimentos não viriam a recair novas imposições fiscais.
32.° Procedendo de modo diverso, o artigo 1,° da Lei n.° 37/83 gerou consequências inadmissíveis e intoleráveis, ao fazer frustrar as decisões de orientação da vida económica pessoal e familiar dos que, tendo já pago os impostos parcelares «normais» relativos aos rendimentos também por esse preceito atingidos, haviam legitimamente confiado em que poderiam dispor do respectivo remanescente, e que sobre este o Estado (de direito) Português lhes não iria aplicar mais imposições fiscais.
33.° Estas consequências intoleráveis de âmbito generalizado resultaram ainda agravadas para certas categorias de contribuintes, ilustrados por diversas queixas recebidas pelo Provedor de Justiça nesta matéria.
34.° Oe entre as situações mais flagrantes, refira-se a dos que — sobretudo emigrantes e mutuários de empréstimos concedidos por instituições de crédito à habitação—, tendo obtido isenção temporária de contribuição predial relativa a casas adquiridas para residência sua e da família, viram incidir o imposto extraordinário sobre tais imóveis ainda no decurso do prazo de isenção [visto, por o artigo 2.°, n.° 1, da Lei n.° 37/83 só estender a isenção de imposto extraordinário em relação aos rendimentos de imóveis contemplados na alínea a) do artigo 1.° ao prédios que gozem de isenção permanente de contribuição predial].
35.° E mencionam-se também aqueles que, tendo trabalhado (e porventura pago imposto profissional) durante parte do período abrangido pelo artigo 1.°, alínea c), da Lei n.° 37/83, se encontravam desempregados à data da publicação desta.
Para grande parte destes, a incidência do imposto extraordinário sobre rendimentos do trabalho acabou por apresentar-se como mera ficção.
Tendo em conta a natureza alimentar dos ordenados e salários, destinados a prover ao sustento dos trabalhadores e suas famílias, o imposto extraordinário, na modalidade da alínea c) do artigo 1.° da Lei n.° 37/83, acabou, em relação aos então desempregados, por incidir realmente sobre o eventual subsidio de desemprego, ou, até, sobre bens de capital.
C) Destino da receita do Imposto extraordinário
36.° Além disso, o artigo 1.° da Lei n.° 37 dispõe que o imposto extraordinário aí criado «reverte integralmente» para o Estado.
37.° Essa determinação está em contradição com o artigo 229.°, alínea /), da Constituição, na medida em que este estabelece que compete às regiões autónomas «dispor das receitas fiscais nelas cobradas [...] e efectuá-las às suas despesas».
38.° O aludido preceito não se coaduna, também, com o artigo 255.° da lei fundamental, quando este prescreve que os municípios «participam, por direito próprio e nos termos definidos pela lei, nas receitas provenientes dos impostos directos».
39.° Não parece, pois, legítimo, para afastar a inconstitucionalidade indicada nos artigos 37.° e 38.° deste requerimento, alegar-se que se. está perante um imposto de natureza extraordinária.
40.° De facto, nem o artigo 229.°, alínea /), nem o artigo 255." da Constituição impõem ou permitem, a este respeito, qualquer distinção.
As regras neles contidas valem, respectivamente, para a generalidade das receitas fiscais e dos impostos directos, não se admitindo qualquer excepção ou reserva para os que, porventura, se apresentem como tendo natureza extraordinária (v. Teixeira Ribeiro, Revista de Legislação e jurisprudência, n.° 3713, anotação ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 11/83, pp. 250-251).
41.° E, especificamente, quanto aos municípios, não será aceitável entender-se que a expressão «nos termos definidos pela lei» tenha, no artigo 255.° da Constituição, a relevância de poder excluir totalmente a participação dessas instituições locais nas receitas, provenientes de impostos directos.
42.° De outro modo, aliás, essa norma constitucional resultaria vazia de sentido próprio.
A referida expressão remete para a lei ordinária a definição de modo ou processo da afectação dos impostos directos aos municípios.
Mas não pode arredar totalmente tal participação — aliás «por direito próprio» —, em todos e cada um dos impostos directos (mesmo que extraordinariamente) com incidência na respectiva área.
43.° Em conclusão:
O artigo 1.° da Lei n.° 37/83, de 21 de Outubro, violou, pois, os artigos 2.°, 9.°, alínea b), 106.°, n.0 2, em conjugação com o artigo 168.°, alínea i), 229.°, alínea /), e 255." da Constituição — pelo que a sua inconstitucionalidade deverá ser declarada, com força obrigatória geral, por esse Venerando Tribunal, dessa declaração resultando a insubsistência dos demais preceitos do citado diploma.
3 — O Tribunal Constitucional não acolheu, porém, esta argumentação decidindo, no seu Acórdão n.° 39/ 84, de 3 de Julho, não se pronunciar pela inconstitucionalidade do diploma em referênica.
5 — Imposto extraordinário criado, em 1983, oobre lucras sujeitos a contribuição Industrial
Processo n.° 83/R-2090-DI-50-A
! — Uma confederação de associações patronais veio pôr em causa a criação, em 1983, de um imposto extraordinário incidindo sobfe lucros recebidos e sujeitos, no ano anterior, a contribuição industrial.
Insurgia-se, nomeadamente, contra a retroactividade que, assim, caracterizaria tal imposição fiscal.
2 — Sobre o assunto foram elaborados os seguintes pareceres, respectivamente do assessor incumbido do caso e do adjunto do Provedor:
Parecer do assessor:
a) A Confederação [...] suscita a questão da conformidade constitucional dos artigos 38.° da Lei n.° 2/83, de 18 de Fevereiro, 33.° do
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Decreto-Lei n.° 119-A/83, de 28 de Fevereiro e do Decreto Regulamentar n.° 66/83, de 13 de Julho, todos relativos ao imposto extraordinário sobre os lucros.
Aquele artigo 38.° da Lei n.° 2/83 autoriza a criação do imposto e é do seguinte teor (n.° 1):
1 — Fica o Governo autorizado a criar um imposto extraordinário, cujo produto reverterá integralmente para o Estado, que incidirá sobre os rendimentos colectáveis relativos ao ano de 1982 sujeitos a contribuição industrial, acrescidos das deduções efectuadas por investimentos, reinvestimentos e incentivos à exportação, cuja taxa não poderá exceder 5 %.
O mencionado artigo 33.° do Decreto-Lei n.° 119-A/83 procede à criação do imposto e dele se transcrevem as passagens mais relevantes:
1 — É criado um imposto extraordinário cujo produto reverterá integralmente para o Estado e que incidirá sobre os rendimentos colectáveis relativos ao ano de 1982 sujeitos a contribuição industrial, acrescidos das deduções efectuadas por investimentos, reinvestimentos e incentivos à exportação.
4 — A taxa deste imposto é de 5 %.
7 — Dentro do prazo de 30 dias, a contar da publicação deste decreto-lei, será publicado o respectivo regulamento.
Este regulamento veio a ser, precisamente, o mencionado Decreto Regulamentar n.° 66/83, cujo artigo 1.° se limita a reproduzir aquele n.° 1 do artigo 33.° do Decreto-Lei n.° 119-A/83.
b) Trata-se, mais uma vez, da debatida questão da possibilidade constitucional da tributação retroactiva, já que o imposto criado se aplica a factos verificados antes da entrada em vigor daqueles preceitos, concretamente a rendimentos sujeitos a contribuição industrial produzidos integralmente — e, em alguns casos, até liquidados (') — antes da criação do imposto.
c) Já tivemos oportunidade de nos pronunciar, em termos gerais, sobre aquela questão, em diversos processos, com especial relevo para o Processo n.° 76/DI-8-A-3. Aí, já no domínio da actual Constituição, mas antes da sua revisão, escrevemos o seguinte, citando Alberto Xavier (J):
Entendemos que o Direito Tributário contém um critério próprio [...] para apreciar a legitimidade da norma retroactiva f...] Tal critério decorre, em nosso parecer, do próprio artigo 70.° da Constituição (correspondente, na parte com relevo para o
(') Ê o caso, pelo menos, dos rendimentos dos contribuintes do grupo C, sujeitos assim a uma retroactividade do i.° grau (artigo 87." do Código da Contribuição Industrial). A questão, de qualquer modo, assume idêntica gravidade em relação à retroactividade de 2.° grau (Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, i, 1974, pp. 197 e seguintes).
(J) Ob. cit., pp. 191 e seguintes.
problema, ao n.° 1, primeira parte, e 2 do artigo 106.° da actual Constituição).
Já se viu, na verdade, que o artigo 70.° da Constituição, ao consagrar uma reserva absoluta da lei formal [...], fê-lo por razões de segurança jurídica [...]
Também já se esclareceu que a ideia de segurança jurídica, posta em contacto com a matéria tributável [...], se traduz num princípio de protecção de confiança, que o Tribunal Constitucional alemão declarou — e bem— como um imperativo constitucional de qualquer Estado de direito. O princípio da protecção da confiança é, assim, do mesmo passo, fundamento e corolário do princípio da legalidade e consiste na possibilidade dada ao contribuinte de conhecer e computar os encargos tributários, com base directa e exclusivamente na lei [...]
Se o princípio da legalidade se compadecesse com a simples exigência de uma lei formal, ainda que esta se pudesse reportar a factos passados, a garantia que pretende oferecer aos cidadãos ficaria em grande parte esvaziada de conteúdo.
Do próprio fundamento político-filosófico do princípio da legalidade resulta a necessidade de se interpretar o artigo 70.° da Constituição no sentido de que contém implícita uma proibição constitucional de retroactividade em matéria de impostos [...]
Nem se diga que foi diversa a atitude do . legislador constitucional português, enquanto proclama expressamente a proibição das leis penais retroactivas (artigo 8.°, n.° 9, da anterior Constituição, correspondente ao 29.° da actual), omitindo qualquer referência à retroactividade das leis fiscais. O legislador constitucional não se refere, na verdade, à proibição constitucional da retroactividade das leis fiscais no artigo 8.°, pela simples razão de que tal proibição se encontra já consagrada no artigo 70.°
E, pois, no princípio da legalidade que deve ver-se o fundamento da proibição constitucional da retroactividade das leis fiscais [...]
d) Mantemos esta posição, no contexto em que a ela aderimos (conquanto não tenha merecido a concordância do então Provedor de Justiça (').
Mas será que a ulterior revisão constitucional impõe diversa conclusão?
Em sentido negativo, poderá argumentar-se com a manutenção do princípio da legalidade dos impostos nos precisos termos em que se encontrava consagrado, já que a revisão não alterou o artigo 106.°, nem o teor literal da alínea o) do artigo 167.°, reproduzida na alínea /) do n.° 3 do actual artigo 168.°
No mesmo sentido pode, ainda, argumentar-se com o relevo acrescido dado ao princípio do Estado de direito democrático — também ele abran-
(') Relatório de 1977, pp. 115 e seguintes.
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gendo aquela exigência de protecção da confiança dos cidadãos, face à actuação do Estado —, que passou, de simples objecto de referência no preâmbulo do diploma, ao próprio texto [artigos 2.° e 9.°, alínea b)].
No sentido oposto, não poderá, porém, ser ignorado o peso do argumento decorrente de a revisão não ter introduzido um princípio expresso de proibição da retroactividade da lei fiscal, conhecidas como eram a controvérsia gerada em torno da questão e a existência de propostas nesse sentido.
é) Perante impasses interpretativos desta natureza e a dúvida deles decorrente sobre matérias — como a presente— de tão relevante interesse e consequências práticas, pensamos não dever, em princípio, o Provedor de Justitça, como titular da função ímpar de defesa dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos dos cidadãos (artigo 1." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro), abster-se de usar da competência que lhe é atri buída «pela alínea á) do n.° 1 do artigo 281." da Constituição.
/) Não se ignora que as nossas mais altas instâncias constitucionais já se pronunciaram, quer antes, quer depois da revisão da Constituição, sobre o problema da retroactividade das leis fiscais.
E que o fizeram concluindo que o princípio da protecção da confiança, que integra a ideia de Estado de direito democrático, umas vezes a proibirá e, outras, a permitirá, consoante se esteja ou não «perante uma retroactividade intolerável, que afecte de forma inadmissível e arbitrária os direitos e expectativas legitimamente fundadas dos cidadãos contribuintes» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 11/83, de 12 de Outubro de 1983, Diário da República, 1." série, de 20 desse mês (').
Pensamos, porém, que, ao remeter-se, assim, para o intérprete a apreciação da questão, e ao relegá-la para planos meramente quantitativos, se deixa a mesma em aberto, e se permite que seja resolvida casuisticamente, ao sabor de critérios insusceptíveis daquele mínimo de objectividade que é postulado pelas garantias dos contribuintes — note-se bem, de todos os contribuintes.
Por isso mantemos, se não potenciada, a posição que assumimos no número antecedente.
g) Este o nosso parecer jurídico — emitido da óptica, também jurídica, da instituição que servimos. A ele não terão, naturalmente, que se reconduzir as considerações de ordem prática e da experiência que, porventura, apontem no sentido da improbabilidade de o órgão jurisdicional competente se vir a pronunciar, sobre a matéria, em termos diferentes dos que já perfilhou (relativamente a imposições fiscais, note-se, não menos gravosas do que as aqui em apreço).
Parecer do Adjunto:
a) Concordo com a proposta de pedido de declaração de inconstitucionalidade das normas em causa, por razões similares às feitas valer a res-
(') V. também Pareceres da Comissão Constitucional n.'" 25/81 c 14/82, naquele citados.
peito do imposto extraordinário criado pela Lei n.° 37/83, com as observações seguintes.
b) Também os preceitos aqui em discussão estabelecem que o imposto extraordinário sobre os rendimentos da indústria constitui integralmente receita do Estado — entrando assim em contradição com o artigo 229.°, alínea /), da Constituição, no tocante às regiões autónomas.
c) Igualmente a retroactividade deste imposto carece de qualquer fundamentação nos diplomas que o previram e criaram, no sentido de se concluir pela sua necessidade ou razoabilidade, face a outras alternativas possíveis.
d) Quanto ao fundo, parece poder referir-se aqui apenas um tipo de situação específica de in-tolerabilidade da incidência deste imposto, por razões análogas às apontadas a propósito da Lei n.° 37/83: o da sua aplicação até aos que se encontrassem, em 1982, a coberto de isenções temporárias (na verdade, o imposto em causa só não atingiu os beneficiários de isenção permanente de contribuição industrial — artigo 38.°, n.° 2, da Lei n.° 2/83, artigo 33.°, n.° 3, do Decreto-Lei n.° 119-A/83, e artigo 3.° do Decreto Regulamentar n.° 66/83).
é) Não parece, enfim, poder apresentar-se aqui com força idêntica à feita valer naquele outro processo o argumento, tendente à demonstração da intolerabilidade material do imposto extraordinário, relativo à eventual extinção, pelo pagamento, das relações tributárias em questão.
Na verdade, à data da publicação do Decreto--Lei n.° 119-A/83 (que se pode considerar como o diploma criador do imposto extraordinário sobre os rendimentos sujeitos a contribuição industrial), poucos teriam sido os casos em que as dívidas de contribuição industrial referentes a 1982 já se encontrassem pagas.
/) De todo o modo, não deixa de subsistir, a meu ver, um outro aspecto de intolerabilidade, a nível geral, do imposto ora em questão.
Ê que a legislação que o previu e criou foi emanada em 1983, e os rendimentos sobre que ele incidiu foram os auferidos em 1982.
Assim, embora as dívidas de contribuição industrial relativas a 1982 ainda se não encontrassem, pelo menos na sua maioria, pagas à data da publicação de tais diplomas, a verdade é que esta ocorreu numa altura em que a generalidade dos sujeitos à contribuição industrial podia legitimamente confiar em que os rendimentos correspondentes, respeitantes àquele ano, já não seriam objecto de mais qualquer tributação.
E isto pelo facto de o apuramento da matéria colectável e a concretização da liquidação da contribuição industrial (como, aliás, as da generalidade dos impostos) se fazer em referência a cada ano fiscal ou civil.
Assim, terminado o ano de 1982, os que receberam rendimentos, durante esse ano, sujeitos a contribuição industrial, podiam legitimamente confiar em que sobre estes não viriam a incidir mais tributos para além dos exigidos pela legislação em vigor até ao fim do mesmo ano.
3 — Concordando com o sentido destes pareceres, o Provedor em 20 de Março de 1984, requereu ao
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Tribuna] Constitucional, do modo seguinte, a declaração de inconstitucionalidade das normas em análise:
1.° Estes textos legais autorizam a criação, criam e regulamentam um tributo sobre os rendimentos colectáveis relativos ao ano de 1982 sujeitos a contribuição industrial, determinando que o mesmo, que é rotulado de «imposto extraordinário sobre os lucros», reverta integralmente para o Estado.
2.° Assim e desde logo, considero que tal imposto é inconstitucional, por incidir, retroactivamente, sobre rendimentos percebidos antes da sua criação e relativamente aos quais, aliás, já se encontra vm definidos os correspondentes impostos normais.
3.° Com efeito, do princípio da legalidade fiscal, consagrado nos artigos 106.°, n.° 2, e 168.°, n.° 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa, resulta, como corolário, a proibição implícita da retroactividade da lei tributária, sob pena de ser posta em causa a garantia da certeza e segurança que o referido princípio visa assegurar aos contribuintes.
4.° Mas mesmo quando assim não se entenda, há que considerar que a República Portuguesa 6 um Estado de direito democrático, fundamentando-se, pois, o Estado na legalidade democrática [artigos 2.°, 3.°, n.° 2, e 9.°, alínea b), da Constituição] .
5.° Ora, um dos sentidos do valor material do princípio da legalidade democrática é a possibilidade de conhecimento prévio das exigências das normas legais, enquanto normas de conduta: sob este aspecto, o citado princípio salvaguarda o valor da segurança jurídica dos cidadãos, evitando que sejam surpreendidos por valoração, de actividades suas, posterior à realização destas.
6." É dizer que do valor material daquele princípio, face ao qual as leis retroactivas serão sempre excepcionais, decorrem duas exigências positivas, para que tais leis possam ter-se por constitucionalmente legitimadas:
a) Que a necessidade da retroactividade seja devidamente fundamentada;
b) Que a medida da retroactividade seja proporcionadamente ajustada aos fins cuja prossecução a fundamenta.
7.° Diferente posição sobre o problema da retroactividade — e, nomeadamente, a que, rele-gando-a para planos predominantemente quantitativos, deixa ao intérprete a sua livre apreciação— mantém o mesmo em aberto e permite decisões casuísticas, desprovidas daquele mínimo de objectividade que é postulado pelas garantias dos cidadãos — de todos os cidadãos.
8.° Ora, voltando ao imposto em apreço, verifica-se que, apesar de previsto e criado em 1983 para incidir sobre rendimentos auferidos em 1982, não encontra nos mencionados diplomas qualquer fundamentação para a sua retroactividade, que permita concluir pela necessidade, ou razoabilidade, da mesma, face a outras alternativas possíveis.
9.° Tanto bastará, em face do exposto, para concluir pela inconstitucionalidade de tais diplomas, na parte em que se referem àquele imposto.
10.° E as razões enunciadas potenciam-se perante a solução legal de sujeitar ao imposto era causa os próprios contribuintes temporariamente isentos de contribuição industrial, os quais vêem o seu direito à isenção afectado em termos claramente imprevisíveis e intoleráveis (citados artigos 38.° e 33.°, respectivamente, n.os 2 e 3, e artigo 3.° do Decreto Rgulamentar n.° 66/83).
11.° Além disso, como se viu, os citados preceitos estabelecem que o produto do imposto extraordinário «reverterá integralmente para o Estado».
12.° Essa determinação está em contradição com o artigo 229.°, alínea f) da Constituição, na medida em que este estabelece que compete às regiões autónomas «dispor das receitas fiscais nelas cobradas [...] e afectá-las às suas despesas».
13.° Como não se coaduna, também, com o artigo 255.° da lei fundamental, quando este prescreve que os municípios «participam», por direito próprio e nos termos definidos pela lei, nas receitas provenientes dos impostos directos.
14.° Não parece, pois, legítimo, para afastar a inconstitucionalidade indicada nos artigos 12." e 13.° deste requerimento, alegar-se que se está perante um imposto de natureza extraordinária.
15.° De facto, nem o artigo 229.°, alínea /), nem o artigo 255.° da Constituição impõe ou permitem, a este respeito, qualquer distinção.
As regras neles contidas valem, respectivamente, para a generalidade das receitas fiscais e dos imposto directos, não se admitindo qualquer excepção ou reserva para os que, porventura, se apresentem como tendo natureza extraordinária (V. Teixeira Ribeiro, Revista de Legislação e Jurisprudência, n.° 3713, anotação ao Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 11/83, pp. 250-251).
16.° E, especificamente, quanto aos municípios, não será aceitável entender-se que a expressão «nos termos definidos pela lei» tenha, no artigo 255." da Constituição, a relevância de poder excluir totalmente a participação dessas instituições locais nas receitas provenientes dos impostos directos.
17.° De outro modo, aliás, essa norma constitucional resultará vazia de sentido próprio.
A referida expressão remete para a lei ordinária a definição do modo ou processo de afectação dos impostos directos aos municípios.
Mas não pode arredar totalmente tal participação — aliás «por direito próprio» — em todos e cada um dos impostos directos (mesmo que extraordinários) com incidência na respectiva área
Em conclusão, e ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 51.° da Lei n.° 28/82, de 15 de Novembro, e 281.°, n.° 1, alínea a), da Constituição, requeiro a V. Ex.a que o Tribunal Constitucional aprecie e declare, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade material do artigo 38.° da Lei n.° 2/83, de 18 de Fevereiro, do artigo 33.° do Decerto-Lei n.° 119-A/83, de 28 de Fevereiro, e do Decreto Regulamentar n.° 66/ 83, de 13 de Julho, concretamente dos seus artigos 1.° a 6." (com a consequente insubsistência
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dos demais preceitos deste diploma) por violação dos artigos 2.°, 3.°, n.° 2, 9.°, alínea b), 106.°, n.° 2, 168.°, alínea i), 229.°, alínea /), e 255.°, todos da Constituição da República Portuguesa.
6 — Desigualdade no cálculo de Juros de mora em mataria
flscaS
Processo n.° 84/R-68-01-2-A
1 — Um associação de advogados invocou a inconstitucionalidade da Portaria n.° 1044/83, de 16 de Dezembro, na medida em que da sua aplicação resultaria uma desigualdade entre constituintes em condições de facto idênticas.
Assim, embora essa portaria estabelecesse que a taxa de juros de mora em matéria fiscal passaria a ser de 3 %, e passaria a ser aplicada «a partir de 1 de Dezembro de 1983», a verdade é que, por tal diploma só ter sido publicado em 16 desse mês, os contribuintes que liquidassem a dívida em mora na quinzena anterior gozariam do privilégio, fortuito e discriminatório, de só pagarem tais juros à taxa anterior de 2 %.
2 — Sobre a questão elaborou o assessor encarregado do caso o seguinte parecer, sobre o qual se solicitou ao Secretário de Estado do Orçamento que tomasse posição:
1—A Associação [...] solicita ao Provedor de Justiça que seja promovida a declaração de inconstitucionalidade material da Portaria n.° 1044/ 83, de 16 de Dezembro, «por resultar desse diploma uma manifesta desigualdade de tratamento dos cidadãos perante a lei (artigo 13.° da Constituição)».
Explicita aquela Associação que «resulta daquela portaria que o contribuinte ou devedor fiscal em mora que tenha procedido à liquiação da dívida até 15 de Dezembro de 1983 goza acidentalmente do privilégio (ilegítimo) de por ela pagar segundo uma taxa de 2 %, quando um outro (constitucionalmente investido nos mesmos direitos), que tenha procedido ao pagmento um dia mais tarde deve pura e simplesmente 3 % pelo período concidente entre 1 e 15 de Dezembro».
2 — O texto da portaria em causa é o seguinte:
A taxa de juros de mora, a que se refere o n.° 1 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 49 168, de 5 de Agosto de 1969, é fixada em 3 % e passa a ser aplicada a partir de 1 de Dezembro de 1983.
A portaria foi publicada em 16 de Dezembro de 1983, e, portanto, o seu comando somente teve eficácia a partir dessa data, e não a partir de 1 de Dezembro, conforme se preceitua no seu texto, do que resultou que quem pagou as suas dívidas ao fisco, com mora, entre 1 e 15 de Dezembro, beneficiou de 1 % de diferencial na respectiva taxa relativamente aos que efectuaram tais pagamentos entre 16 e 31 de Dezembro, desigualdade de tratamento que a associação reclamante considera inconstitucional.
3.1 —A portaria em causa remete para o n.° 1 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 49 168, de 5 de Agosto de 1969, que se transcreve:
Art. 5.°— 1 — A taxa de juros de mora é de 1 %, se o pagamento se fizer-dentro do
mês de calendário em que se verificou a sujeição aos mesmos juros, aumentando-se uma unidade por cada mês de calendário ou fracção- se o pagamento se fizer posteriormente.
Analisando detidamente o estabelecido neste preceito, conclui-se que é aqui fixado um princípio: pagamento de igual taxa (1 %), quando se verifique a sujeição aos juros de mora, dentro de todo o mês de calendário (todo o primeiro mês de mora), aumentando uma unidade por cada mês de calendário ou fracção.
3.2 — A taxa referida em 3.1 passou para 1 'A %, por força do disposto no Decreto-Lei n.° 452/75, de 21 de Agosto, reiterando-se expressamente o princípio de que tal taxa se mantinha dentro do mês de calendário em que se verificasse a sujeição a tais juros.
3.3 — Pelo estabelecido no Decreto-Lei n.° 353-L/77, de 29 de Agosto, a mesma taxa foi elevada para 2 %, mantendo-se só o princípio expresso da manutenção de taxa durante o primeiro mês de calendário em que se verificasse a sujeição àqueles juros.
3.4 —Pelo Decreto-Lei n.° 429/78, de 27 de Dezembro, a taxa de mora passou a ser calculada em Vi2 do somatório da taxa básica de desconto do Banco de Portugal com 6 %, mantendo-se também expresso o aludido princípio da manutenção da taxa durante o primeiro mês de mora (mês de calendário).
3.5 —Pelo Decreto-Lei n.° 318/80, de 20 de Agosto, a taxa de mora foi novamente reposta em 2 %, conservando-se também expresso o citado princípio da sua manutenção no referido período.
Ê o seguinte o texto deste diploma:
Artigo 1.° O artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 49 168, passa a ter a seguinte redacção:
Art. 5.°—1—A taxa de juros de mora é de 2 %, se o pagamento se fizer dentro do mês de calendário em que se verificar o início da mora, aumentando-se de 2 % em cada mês ou fracção, se o pagamento se fizer posteriormente.
2 —........................................
3 — A taxa de juros de mora poderá ser alterada por portaria do Ministro das Finanças e do Plano.
Art. 2° O presente diploma entra em vigor no mês seguinte ao da sua publicação.
Verifica-se que, por força do preceito transcrito, passou a taxa de juros de mora a poder ser alterada por simples portaria do Ministro das Finanças. Note-se, porém, que tal possibilidade se limita à alteração da taxa de juros de mora, e a nada mais.
Chama-se também a atenção para o artigo 2.° do diploma transcrito no respeitante à sua entrada em vigor (apenas no mês seguinte ou da sua publicação).
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4 — Conforme se fez notar em 3, foi estabelecido por decreto-lei (Decreto-Lei n.° 49 168) o princípio de que durante o primeiro mês de mora (mês de calendário) a taxa de mora é igual, princípio que outros diplomas de igual força confirmaram, alterando apenas o quantitativo da taxa.
Ora, a Portaria n.° 1044/83, objecto da presente reclamação, violou, tal como foi publicada, aquele princípio contido nos citados decretos-leis.
Na verdade, com a publicação da portaria, em 16 de Dezembro de 1983, resultou que durante
0 mês de Dezembro de 1983, ao longo daquele mês de calendário, se cobraram taxas diferentes aos devedores caídos em mora (2 % de 1 a 15 de Dezembro e 3 % de 16 a 31 de Dezembro), e isto por força da existência da portaria que, tal como foi publicada, além de alterar o quantitativo da taxa (único objectivo que pretendia e poderia atingir), acabou também por ferir um princípio constante de diplomas com maior força legal, parecendo, assim, estar-se em presença de um caso de inconstitucionalidade formal.
Ê certo que o legislador pretendeu que durante todo o mês de Dezembro se cobrasse a mesma taxa de 3 %, fixando expressamente no texto da portaria que a mesma seria aplicada a partir de
1 de Dezembro de 1983. Mas, para que isso fosse possível, dado que a assinatura da mesma teve lugar em 30 de Novembro, teria de ser publicada em 30 de Novembro, o que não aconteceu.
Foi por tal razão que os citados Decretos-Leis n." 353-L/77, 429/78 e 318/80, incluíram nos seus articulados a referência expressa a que tais diplomas entrariam em vigor no mês seguinte ao da sua publicação, evitando assim que se verificasse a situação provocada pela portaria em causa.
5 — Finalmente, e quanto aos devedores caídos em mora, não há dúvida de que se verificou uma desigualdade de tratamento, consoante o pagamento das respectivas dívidas em mora se concretizou de 1 a 15 de Dezembro de 1983 ou de 16 a 31 do mesmo mês. E também não restam dúvidas de que, por força do estabelecido nos decretos-leis citados, tais devedores deveriam estar onerados com a mesma taxa de mora durante todo o mês de Dezembro, para o que se deveria, tal como já foi referido em 4, processar-se a publicação do diploma de alteração da taxa (neste caso a portaria) com a indicação expressa de que entraria em vigor apenas no mês seguinte ao da publicação.
E, como assim não aconteceu, resultou, conforme refere a associação reclamante, que, por força da portaria em causa, tal como foi publicada, foi desrespeitado o artigo 13° da Constituição, dada a desigualdade de tratamento dos cidadãos perante a lei, verificando-se, portanto, a alegada inconstitucionalidade material.
3 — O Subsecretário de Estado do Orçamento respondeu mediante o envio de parecer, com o qual concordou, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.
Nesse parecer, sustentou-se a legalidade da portaria em questão, embora se informasse que, apenas por razões de simplificação administrativa, não se proce-
dera, como seria legalmente possível, à aplicação da taxa de 3 % no período de 1 a 15 de Dezembro de 1983.
4 — O Provedor não aceitou esta argumentação, que não se reportou especificamente aos problemas de constitucionalidade levantados por este Serviço.
E mais lhe pareceu muito discutível a alegada legitimidade de aplicação retroactiva, em matéria fiscal, de um mero diploma regulamentar como a Portaria n.° 1044/83.
5 — Por isso, solicitou ao Tribunal Constitucional, em 22 de Outubro de 1984, a declaração de inconstitucionalidade da citada portaria, pelas razões seguintes:
1.° Por violar o princípio contido nos Decretos--Leis n.os 49 168, de 5 de Agosto de 1969, 452/75, de 21 de Agosto, 353-L/77, de 29 de Agosto, 429/78, de 27 de Dezembro, e 318/80, de 20 de Agosto, princípio de que durante o primeiro mês de mora, mês de calendário, a taxa de mora é sempre igual.
Com efeito, com a publicação da Portaria n.° 1044/83, resultou que, durante o mês de Dezembro de 1983, ao longo daquele mês de calendário, se cobrassem taxas diferentes aos devedores caídos em mora (2 % de 1 a 15 de Dezembro e 3 % de 16 a 31 de Dezembro).
Assim, a referida portaria, tal como foi publicada, além de alterar o quantitativo da taxa (único objectivo que pretendia e que poderia atingir), acabou também por ferir um princípio constante de diploma com maior força legal. Está-se, assim, em presença de um caso de inconstitucionalidade formal.
ê certo que o legislador pretendeu que durante todo o mês de Dezembro se cobrasse a mesma taxa de 3 %, fixando expressamente no texto da portaria que a mesma seria aplicada a partir de 1 de Dezembro de 1983. Mas, para que isso fosse possível, dado que a assinatura da mesma teve lugar em 30 de Novembro, teria de ser publicada em 30 de Novembro, o que não aconteceu.
Foi por tal razão que os citados Decretos-Leis n.05 355-L/77, 429/78 e 318/80. incluíram nos seus articulados a referência expressa a que tais diplomas entrariam em vigor no mês seguinte ao da sua publicação, evitando assim que se verificasse a situação provocada pela portaria em causa.
2." Finalmente, e quanto aos devedores caídos em mora. não há dúvida de que se verificou uma desigualdade de tratamento, consoante o pagamento das respectivas taxas em mora se concretizou de 1 a 15 de Dezembro de 1983, ou de 16 a 31 do mesmo mês.
E também não restam dúvidas de que, por força do estabelecido nos decretos-leis citados, tais devedores deveriam estar onerados com a mesma taxa de mora durante todo o mês de Dezembro, para o que se deveria, tal como referido em 1.", processar a publicação do diploma de alteração da taxa (neste caso a portaria) com a indicação expressa de que entraria em vigor no mês seguinte ao da publicação. E. como assim não aconteceu, resultou que. por força da mesma portaria, tal como foi publicada, foi desrespeitado o artigo 13.° da Constituição, dada a desigual-
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dade de tratamento verificada, constatando-se, portanto, inconstitucionalidade material.
5.° A Portaria n.° 1044/83, de 16 de Dezembro, tal como foi publicada, ofende, pois, o disposto nos artigos 13.° e 115.° da Constituição da República, o que deverá ser declarado, para todos os efeitos legais, por esse Venerando Tribunal e com força obrigatória geral.
7 — Actualização de rendas de prédios arrendados para fins não habitacionais
Processo n.° 84/R-113-DM-A
1 — Uma associação de proprietários suscitou ao Provedor a questão da inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 436/83, de 19 de Dezembro, que estabeleceu um novo regime de actualização de rendas de prédios arrendados para fins não habitacionais.
2 — Estudado o assunto, o Provedor invocou, em 13 de íulho de 1984, a aludida inconstitucionalidade, nos termos seguintes:
1,° Constitui objecto do Decreto-Lei n.° 436/83, de 19 de Dezembro, um sistema de actualizações anuais de renda nos «contratos de arrendamento para comércio, indústria, exercício de profissões liberais e ainda em todos os contratos de arrendamento para fins não habitacionais» (artigo 1.°).
2.° A alínea h) do n.° 1 do artigo 168.° da Constituição preceitua que é da exclusiva competência da Assembletia da República —salvo autorização do Governo— legislar em matéria de «regime geral do arrendamento rural e urbano».
3.° Não diz a íei fundamental o que seja o «regime geral do arrendamento urbano», como, de resto, também não se refere o que seja o «regime geral de punição das infracções disciplinares» [alínea d)) ou o «regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado [...]» [alínea p)].
Cabe, pois, ao intérprete encontrar traves mestras de cada instituto e os princípios fundamentais que enformam o seu «regime geral».
4.° Sendo o arrendamento urbano um contrato, constituem elementos essenciais integrativos do seu regime geral os seguintes:
1) A obrigação de proporcionar a outrem o gozo de um bem imóvel urbano (artigos 1022.°, 1023.° e 1086.° do Código Civil);
2) A temporalidade do gozo do bem (artigos 1022.° e 1087." do Código Civil;
3) A retribuição (artigo 1022.° do Código Civil).
5.° Igualmente deverão integrar o regime geral do arrendamento urbano as formas de extinção do contrato (artigos 1093.°, 1095.° e 1098.° do Código Civil, designadamente).
6.° Ora, o diploma em apreço trata exclusivamente de actualizações de rendas, isto é, da retribuição nos contratos de arrendamento urbano para fins não exclusivamente habitacionais. Tanto basta para que seja susceptível de enquadramento na alínea h) do n." 1 do artigo 168." da Constituição e, como tal, viciado de inconstitu-
cionalidade orgânica, por não haver emanado da Assembleia da República.
7.° E, contra esta conclusão, não se diga que o Decreto-Lei n.° 436/83, de 19 de Dezembro, não contém matéria inovatória, visto a legislação anterior já prever a actualização periódica das rendas.
8," ê que, por um lado, o diploma em causa estabelece um princípio inteiramente «novo» — o da actualização anual indexada, regime a que o próprio preâmbulo também qualifica de «novo», por contraposição àquilo que designa por «regime prescrito na legislação anterior», impondo, ao mesmo tempo, «um novo método de cálculo de avaliação fiscal extraordinária».
9." Por outro lado, e ainda que se entendesse que o diploma não inovava relativamente à legislação anterior —e inova— a verdade é que se não vê como é que isso obstaria à sua inconstitucionalidade orgânica: sendo certo que, a partir da revisão de 1982, a competência para legislar em matéria de regime geral de arrendamento passou a pertencer em exclusivo à Assembleia da República, não podia o Governo, sem autorização legislativa, exercer uma competência que já não tinha.
10." A inconstitucionalidade orgânica é um vício do acto normativo, o que significa que as normas constitucionais em matéria de competência só dispõem para futuro (não há inconstitucionalidade orgânica superveniente).
II.0 Daí a validade das normas revogadas pelo Decreto-Lei n.° 436/83, constantes de diplomas dimanados embora do Governo, mas anteriores a Outubro de 1982, e desde que não sejam materialmente inconstitucionais.
12.° Mas tal não leva a concluir que possamos partir daqui para sustentar que o juízo sobre a constitucionalidade orgânica (de um acto normas tivo) depende de uma análise do conteúdo da norma produzida (por comparação com o da norma derrogada).
13.° A partir do momento em que a Constituição retira ao Governo competência para legislar sobre cada matéria, este órgão de soberania deixa de o poder fazer (sem autorização legislativa, pelo menos), seja para modificar normas anteriores — muito ou pouco —, seja para as substituir, seja, pura e simplesmente, para as revogar.
Nestes termos, os nos demais de direito aplicáveis, requeiro a V. Ex.a a apreciação e declar ração da inconstitucionalidade com força obrigatória geral do Decreto-Lei n.° 436/83, de 19 de Dezembro, por violação do disposto na alínea h) do n.° 1 do artigo 168.° da Constituição; e, nomeadamente, dos seus artigos 1.° a 12.°
8—Interrupção voluntária da gravidez Processo n.° 84/R-647-0I-36-B-1
1 — Um conjunto de cidadãos veio arguir de inconstitucionalidade a Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, na medida em que admite a legalidade de certos casos típicos de interrupção voluntária da gravidez.
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2 — Embora o Tribunal Constitucional já se tivesse pronunciado pela não declaração de inconstitucionalidade desse diploma, no âmbito da fiscalização preventiva (Acórdão n.° 25/84, de 19 de Março, publicado no Diário da República, 2.a série, de 4 de Abril seguinte), o Provedor considerou, de acordo com entendimento que antes sustentara, a propósito da legislação sobre criação do chamado «imposto extraordinário» que isso não obstaria à possibilidade de invocação da inconstitucionalidade em sede de fiscalização superveniente.
3 — Assim, e uma vez analisado o fundo da questão, o Provedor, em 18 de Junho de 1984, pediu ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 140.° e 141.° do Código Penal, na redacção dada pelo artigo 1.° da Lei n.° 6/84, bem como a dos artigos 2.° e 3.° deste último diploma, nos moldes seguintes:
I) Questão prévia
1.° Solicitado a pronunciar-se, em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade, sobre o Decreto n.° 41/III da Assembleia da República, que originou a Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, esse Venerando Tribunal Constitucional pronunciou-se, por Acórdão n.° 25/84, (publicado no Diário da República, 2." série, de 4 de Abril de 1984), no sentido da não inconstitucionalidade das normas em causa.
2.° O facto de o Tribunal Constitucional se haver pronunciado preventivamente sobre o projecto não obsta, no entanto, a que, uma vez promulgada e publicada a lei, possa vir a ser solicitada a fiscalização concreta da constitucionalidade dessa mesma lei.
Na verdade, afigura-se, com efeito, que o acórdão inicialmente emitido tem a natureza de mero parecer, nos termos do n.° 1 do artigo 278.° da Constituição da República Portuguesa, nada obstando a que o Tribunal Constitucional, então em termos de fiscalização superveniente, possa de novo apreciar e declarar a inconstitucionalidade com forca obrigatória geral de uma ou mais normas da lei publicada.
II) Constitucionalidade material
1.° Analisando a questão de fundo, conclui-se que o artigo 140." do Código Penal, na forma constante do artigo 1.° da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, viola vários dispositivos da Constituição da República Portuguesa.
2.° Ao despenalizar o aborto terapêutico, o aborto eugénico e o criminológico, o preceito em causa viola, antes de mais, o artigo 24.° da Contituição, porque exclui e ilicitude de uma conduta que se traduz na destruição de uma vida humana, que aquela disposição qualifica como inviolável.
Na verdade, no próprio relatório do acórdão se reconhece que esta disposição constitucional protege toda a vida humana, incluindo a intra--uterina. Cito: «Cremos, porém, que se pode e deve concluir que também essa vida humana intra-uterina está abrangida nesses preceitos e
princípios que lhe subjazem» (n.° vu do acórdão).
3.° Ofende também o preceituado na alínea b) do artigo 9.°, pois, ao invés de garantir um direito fundamental (consignado no artigo 24.°), desrespeita-o.
4.° Também se tem de considerar violado o n.° 2 do artigo 18.°, na medida em que se restringe um direito —o direito à vida—, o qual só poderia ser restringido «nos casos expressamente previstos na Constituição».
5° Ê certo que o mencionado n.° 2 do artigo 18.° permite a restrição de direitos desde que se limite «ao necessário para salvaguardar outros direitos ou intereses constitucionaJmente protegidos»; mas só no caso do aborto terapêutico, isto é, quando estão em causa a vida da grávida ou a do feto, se enfrenta uma situação de conflito de interesses equiparados.
Nesta hipótese, porém, deverá levantar-se o problema da natureza e da função do direito penal e dos meios que deve utilizar para alcançar os fins que lhe cabe realizar.
Como pertinentemente se põe em evidência no voto de vencido do Ex.1™ Conselheiro Fernandes Afonso (Diário da República, 2.° série, de 4 de Abril de 1984, p. 2993):
[...] o legislador não podia subsumir a interrupção voluntária da gravidez a causa de justificação do facto. Na verdade, tal interrupção, na medida em que representa a eliminação de uma vida humana, a que, obviamente, não pode imputar-se qualquer culpa no surgir do conflito, deve considerar-se ilícita, podendo eventualmente verificar-se apenas, isso sim, a existência de estado de necessidade desculpante, de previsão do artigo 35.° do Código Penai.
Acresce, como se refere ainda, no mesmo voto, «que, considerando que o compromisso deontológico dos médicos lhes confere o direito de praticarem o aborto terapêutico nas condições estabelecidas no seu código deontológico, não se vislumbra a mínima razão de necessidade de es-tatuição de tal causa de exclusão da licitude do aborto».
6.° Faltando por completo no conflito de direitos — quando exista — os requisitos de proporcionalidade, necessidade e adequação que justifiquem a primazia que foi dada à mulher grávida, situação relativamente à qual o douto parecer não deixa de expressar dúvidas «cruciantes», não se vê como possa reconhecer-se como constitucionais as normas em apreciação, visando a protecção de situações meramente eventuais em troca do sacrifício da vida de quem vai nascer.
7.° Nestes termos, tendo em conta os fundamentos doutamente expressos em todos os votos de vencido, e ainda a que Portugal é um Estado de direito democrático, que respeita como valor supremo a dignidade da pessoa humana» (artigo 1.° da Constituição) e se baseia na «garantia dos direitos e liberdades fundamentais» (artigo 2.°), requeiro que esse Venerando Tribunal declare, com força obrigatória geral, a inconstitu-
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cionalidade dos artigos 140.° e 141.° do Código Penal com a redacção que lhes foi introduzida pelo artigo 1.° da Lei n.° 6/84, de 11 de Maio, e, como consequência dessa declaração, a insubsistência dos artigos 2.° e 3.° da mesma lei, dado o seu carácter instrumental.
9 — Integração forçada em empresas públicas dos fundoná-itos adidos netos uiestaiido serviço como regutettados
Processo n.° 84/R-821-01-39-B
1 — Um grupo de funcionários adidos a prestarem serviço como requisitados na empresa pública ANA, E. P., alegaram a desconformidade com a Constituição dos n.M 1 e 5 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 42/84, de 3 de Fevereiro, que estabeleceram um sistema de integração forçada (isto é: sem dependência de opção dos interessados), dos trabalhadores nas suas condições, nos organismos e empresas públicas que nessa data estivessem requisitados.
2 — Ponderado o problema, o Provedor opiniou que se confirmava essa inconstitucionalidade, tendo-a invocado, perante o Tribunal Constitucional, em 22 de Outubro de 1984, da seguinte forma:
1.° O artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84, de 3 de Fevereiro, dispõe no seu n." 1, que:
Consideram-se integrados nos serviços e organismos públicos ou nas empresas públicas e nacionalizadas, a partir de 1 de Mato de 1984, os funcionários e agentes do quadro geral de adidos que àquela data se encontrem requisitados junto dos mesmos há mais de 6 meses.
E no seu n.° 5, que:
O regime estabelecido nos n.091 a 3 poderá ser igualmente aplicável aos adidos em actividade há menos de 6 meses junto dos serviços e organismos requisitantes e por iniciativa destes.
Por sua vez, o seu n.° 6 prescreve que:
Os adidos requisitados que não sejam integrados até à data prevista no n.° 1 consideram-se, para todos os efeitos, como fazendo parte das entidades requisitantes a partir daquela data.
2.° Importará referir que aquele diploma legal foi aprovado com base em autorização legislativa concedida ao governo pela Lei n.° 14/83, de 25 de Agosto. Segundo esta, o Executivo foi autorizado a legislar em matéria referente ao descongestionamento e subsequente extinção do quadro geral de adidos, incluindo os excedentes constituídos ao abrigo do Decreto-Lei n.° 294/76. de 24 de Abril, e legislação complementar [alínea b) do n.° 1 do artigo 1." da citada lei]. Tal autorização, como se alcança do n.° 2 do mesmo preceito, visava a «adopção de medidas de aposentação obrigatória, quando for caso disso, e ainda medidas que abranjam os funcionários e agentes na situação de licença sem vencimento, nos termos do artigo 28.° do Decreto-Lei n.° 294/76».
I) As normas do artigo 3.* do Decreto-Lei n.° 42/84 estão feridas de inconstitucionalidade orgânica
3.° Com efeito, do objecto, sentido e extensão da autorização legislativa se conclui que a Assembleia da República conferiu poderes ao governo para descongestionamento e extinção do quadro geral de adidos, através da utilização do mecanismo da aposentação compulsória e de medidas que abrangessem os funcionários e agentes na situação de licença sem vencimento. Ê o que resulta, sem equívocos, dos n.05 1, alínea b), e 3 do artigo 1.° da Lei n.° 14/83.
4.° Todavia, o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/ 84, ao proceder à pretendida extinção e consequente definição do destino do pessoal adido, terá exorbitado do campo da falada autorização, ao determinar expressa e forçadamente a integração nas empresas públicas e nacionalizadas, cujo pessoal é regido pelo contrato individual de trabalho (artigo 30.° do Decreto-Lei n.° 260/76, de 8 de Abril), de funcionários e agentes, isto é, de pessoal com o estatuto de funcionário público. Ora, uma alteração tão significativa no regime de prestação de serviço não estaria, seguramente, inserida no âmbito da autorização legislativa.
5.° Daí que o governo não tivesse poderes para retirar o estatuto de funcionário público ao pessoal adido titular desse mesmo estatuto no quadro geral de adidos e, paralelamente, impor o ingresso desse pessoal nas empresas públicas e nacionalizadas junto das quais se encontravam a prestar serviço em regime de requisição. Ou, se assim se preferir, impor o ingresso forçado nas empresas públicas e estatizadas do pessoal adido, com a subsequente perda da qualidade de funcionário público desse mesmo pessoal.
6.° Ao legislar nos termos já descritos, o Executivo desrespeitou os limites da autorização legislativa que lhe foi concedida e, por isso, ofendeu o disposto na alínea n) do n.° 1 do artigo 168.° da Constituição da República.
II) As normas do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84, estão afectadas de inconstitucionalidade material, por ofensa aos artigos 47.", n.° I, 50.°, 53.° e 266.° da Constituição.
7.° É ponto assente o de que os funcionários públicos se encontram em situação estatutária derivada de lei ou de regulamento (').
Esta situação jurídica objectiva (l) é livremente modificável pelo legislador no tocante a categorias, designações funcionais e letras de vencimento. Porém, registando-se uma remodelação de serviço ou alteração de quadros, deverão respeitar-se os direitos subjectivos dos funcionários, entre os quais se conta o de às novas categorias em que sejam posicionados não corresponder menor vencimento. A modificação unilateral do estatuto funcional não vai, contudo, ao ponto de
(') Jurisprudência constante do Supremo Tribunal Administrativo (v. Acórdão de 18 de Janeiro de 1979, in Acórdãos Doutrinais, n.° 210, pp. 726 e seguintes).
(*) V. Direito Administrativo, vol. I (pp. 403 e seguintes), do Dr. Mário Esteves de Oliveira.
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legitimar a substituição de um estatuto profissional por outro, como decorre da jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, da doutrina e da praxe administrativa (3).
Pelo menos sem que aos interessados seja concedida a faculdade de optar pelo novo estatuto, uma vez que se encontram a prestar serviço em regime de requisição, ao abrigo do qual se não pode operar a perda da qualidade de funcionário público (cf. artigo 25.° do Decreto-Lei n.° 41/84, de 3 de Fevereiro, que reproduz o artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 165/82, de 10 de Maio).
8.° Repare-se que o ingresso no quadro geral de adidos de agentes não sujeitos a regime de direito público ficou dependente da prévia atribuição, por via legal, da qualidade de trabalhador da função pública (artigo 22.° do Decreto-Lei n.° 294/76), e que aos funcionários e agentes adstritos ao mesmo quadro apenas foi consentida a prestação de serviço, em regime de destacamento, pelo Decreto-Lei n.° 615/76, de 27 de Julho. Esse regime viria a ser convertido em requisição pelo n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 389/78, de 12 de Dezembro. Por isso que, até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 615/76, os funcionários públicos apenas podiam prestar serviço nas empresas públicas em comissão de serviço, conforme resultava do artigo 32.° do Decreto-Lei n.° 260/76, de 8 de Abril, que aprovou as Bases Gerais das Empresas Públicas.
9.° Ora, o pessoal destas rege-se pelo regime do contrato individual de trabalho, excepção feita ao pessoal das empresas que explorem serviços públicos, para o qual poderá ser definido um regime de Direito Administrativo (n.° 1 do artigo 30.° do Decreto-Lei n.° 260/76). Mas, no caso da ANA, E. P. (Decreto-Lei n.° 246/79, de 25 de Julho) foi ressalvada a situação do pessoal originário de serviços e organismos do Estado, quando, no artigo 6.° do mesmo diploma, se determinou que esse pessoal exerce as suas funções em regime de requisição, com direito a optar definitiva e individualmente pelo regime do contrato individual de trabalho (4), ao qual está submetido o pessoal não oriundo dos serviços e organismos estatais (n.° 2 do artigo 38.° do Estatuto da empresa anexo ao citado diploma legal).
10.° Sem pôr em causa os objectivos visados com a extinção do quadro geral de adidos, o certo é que tais objectivos não parecem ser viáveis à custa de integrações forçadas de pessoal, com perda da qualidade de funcionário público, à marçem de qualquer manifestação de vontade dos destinatários de tais medidas de integração em empresas públicas e nacionalizadas. E o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84 prescindiu de qualquer aceitação dos interessados, ao considerá-
O V. Droit Administratif, 2." cycle, de Jean Soto (edições Montchrestien), pp. 190 e seguintes, e Les Relations du Travail dans le Secteur Public, de Yves Saint-Jours, pp. 202 e seguintes v., também, La Fonction Publique et ses problèmes actuels, de Victor Silveira e Serge Salou. pp. 417 e seguintes.
(') E significativo o regime fiscal do pessoal requisitado ou destacado nas empresas públicas (artigo 26." do Decreto-Lei n.° 41/84, de 3 de Fevereiro, segundo o qual a sujeição a imposto profissional depende da opção, pelos funcionários públicos, pelo regime do contrato de trabalho.
-los integrados naquelas empresas, a partir de 1 de Maio de 1984. E isto, apesar de a supressão de emprego público não determinar automaticamente a perda do estatuto de funcionário público.
11.° Com efeito, o termo da relação de serviço público apenas poderá resultar da morte, do termo do tempo da nomeação ou do contrato, do limite de idade, da exoneração, da demissão e da extinção do cargo quando o funcionário não esteja provido difinitivamente e não seja possível colocá-lo noutro lugar de igual categoria.
Era a enumeração constante do artigo 132.° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, que se mantém actualizada, excepção feita à matéria de supressão de empregos, a qual sofreu profundas alterações, especialmente na sequência do processo de descolonização.
12." Do que vem de ser dito parece poder concluir-se pelo evidente desacerto da medida de integração ope legis de funcionários do quadro geral de adidos nos quadros de empresas públicas, sabido que se não verificam alguns dos factos determinantes da cessação do vínculo de serviço público.
Integração, que à partida, ofenda o n.° 1 do artigo 47.° da Constituição, relativo à liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública, enquanto representa a supressão de um estatuto profissional com dispensa absoluta de intervenção dos interessados. Estes são obrigados a aceitar a integração e, com ela, a perda de um estatuto (de funcionário) e a aquisição de outro (trabalhador de empresa pública) submetido a regime de direito privado. Ora, o direito de escolha de uma profissão é completamente desrespeitado pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84 quando, nos seus n.°* 1 e 5, impõe a integração nas empresas públicas de pessoal com o estatuto de funcionário público, prescindindo de qualquer opção dos respectivos destinatários. E a situação não seria diferente se, por exemplo, o legislador resolvesse substituir, unilateralmente, os estatutos dos magistrados, docentes ou militares.
13.° Ê que se o Estado se deve abster de qualquer discriminação na escolha dos eventuais candidatos a funções públicas, com base nas razões alinhadas no n.° 2 do artigo 13." da Constituição, respeitando a liberdade de escolha de profissão e a garantia do direito ao trabalho [artigos 47.°, 53." e 59.°, n.° 3, alínea b), da Constituição, não poderá deixar de, por igualdade de razão, observar a proibição de despedimentos sem justa causa ou por razões ideológicas (5), por força do disposto no artigo 18.°, n.° 1. Daí a defensabilidade do direito ao exercício de funções públicas como direito fundamental (6), o qual resulta, inquestionavelmente, ofendido pela já referida integração ope legis.
14.° E no que diz respeito à «Uberdade de acesso» à função pública, a Constituição (artigo 50.°) poderá ter querido reportar-se também à voluntariedade de aceitação ou cessação de
(') A relação de emprego público na Constituição. Algumas notas, de José Lufs P. Coutinho, in Estudos sobre a Constituição, vol. m. pp. 689 e seguintes.
(♦) P. Coutinho, ob. cit., p. 697.
flfl '
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funções ('), ressalvados os casos em que o teimo de funções públicas resulta de algum facto que prescinda da aceitação do funcionário, conforme ficou referido em 12.
15.° Não parece assim possível, sem violar os direitos fundamentais dos cidadãos enquanto funcionários públicos (Constituição, artigo 269.° e 271.°), determinar, por via legal, a substituição do estatuto de funcionário público por outro. Aliás, prosseguindo a Administração Pública o interesse público no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, não se vê bem como poderá a Administração atingir tal objectivo com a integração imposta pelo artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84, uma vez que este ofende, simultaneamente, direitos dos cidadãos funcionários.
16.° Pelas razões vindas de expor, afigura-se de concluir que os n.os 1 e 5 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 42/84 ofendem as normas dos artigos 47.°, n.° 1, 50.°, 53.° e 266.°, n.° 1, com referência ao artigo 18.° da Constituição da República, pelo que requeiro que esse Venerando Tribunal declare com força obrigatória geral a inconstitucionalidade dos mencionados preceitos legais.
10 — Estatuto do Pessoal Civil dos Serviços Departamentais das Forças Armadas
Processo n.° 84/R-883-OM0
1 — Uma federação de sindicatos do funcionalismo suscitou a questão da inconstitucionalidade do artigo 11do Estatuto do Pessoal Civil dos Serviços Departamentais das Forças Armadas (aprovado pelo Decreto-Lei n.° 380/82, de 15 de Setembro), por entender que ele viola os direitos e liberdades dos trabalhadores consagrados nos artigos 57." e 58.° da Constituição.
Essa violação decorreria, por um lado, da circunstância de nessa norma se remeter para mero despacho do chefe do Estado-Maior respectivo a regulamentação das formas de participação do pessoal civil nos organismos em que preste serviço; e, por outro, das limitações desde logo previstas no n.° 2 da mesma regra ao âmbito de tal participação.
2 — Analisada a questão, o Provedor considerou que se justificaria mesmo o pedido de declaração de inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 380/82, na medida em que aprovou o Estatuto em causa.
Fê-lo tendo em conta, designadamente, que através do Acórdão n.° 31/84 (publicado no Diário da República, 1." série, de 17 de Abril), o Tribunal Constitucional declarara entretanto a inconstitucionalidade do Decreto-Lei n.° 381/82, que, publicado na mesma data do diploma em apreciação, aprovara o Estatuto do Pessoal Civil dos Estabelecimentos Fabris das Foiças Armadas.
Essa declaração assentava no facto de, na elaboração de tal diploma, se ter desrespeitado o direito de participação dos trabalhadores, através das suas organizações representativas.
(') Idem, p. 697.
4 —Tendo o Decreto-Lei n.° 380/82 por afectado pelo mesmo vício, o Provedor suscitou, em 20 de Julho de 1984, a declaração da sua inconstitucionalidade, em pedido assim formulado:
1.° Os artigos 56.°, alínea d), e 58.°, n.° 2, alínea a), do texto originário da Constituição reconheciam, como reconhecem actualmente os artigos 55.°, alínea d), e 57.°, n.° 2, alínea a), às comissões de trabalhadores e às associações sindicais o direito de participarem na elaboração da legislação do trabalho.
2.° E não há dúvida de que o Decreto-Lei n.° 380/82, de 15 de Setembro, como estatuto jurídico-laboral que é, constitui, a esta luz, «legislação do trabalho», dado que regula direitos fundamentais dos trabalhadores reconhecidos na Constituição e, por outro lado, se subsume nos critérios definidores de «legislação de trabalho» constantes do artigo 2.° da Lei n.° 16/79, de 26 de Maio. Aliás,
3.° Foi exactamente este o entendimento do Tribunal Constitucional no seu douto Acórdão n.° 31/84, de 27 de Março, in Diário da República 1.a série, de 17 de Abril de 1984, a propósito de diploma congénere (Decreto-Lei n.° 381/ 82, também de 15 de Setembro, que aprovou o Estatuto do Pessoal Civil dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas).
4.° Ora, na elaboração do ora questionado Decerto-Lei n.° 380/82 não participaram — nem, de resto, lhes foi possibilitado participar— as comissões de trabalhadores e as associações sindicais representativas dos trabalhadores abrangidos por tal diploma legal.
Neste sentido,
5.° Basta ler o preâmbulo do diploma em causa (aliás igual ao do Decreto-Lei n.° 381/82), em que nenhuma referência se faz à participação dos trabalhadores, para se concluir deste modo.
6.° Com fundamentação idêntica (falta de participação das entidades referidas no artigo 4." supra), já o Tribunal Constitucional declarou, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade de diploma semelhante —o Decreto-Lei n.° 381/82, da mesma data, dimanado do mesmo órgão de soberania (o extinto Conselho da Revolução) e aprovando também um estatuto de pessoal civil das Forças Armadas.
Concluindo:
a) O Decreto-Lei n.° 380/82, de 15 de Setembro, violou o disposto nos artigos 56.°, alínea d), e 58.°, n.° 2, alínea a), do texto primitivo da Constituição, preceitos que, de resto, se encontram reproduzidos nos artigos 55.°, alínea d), e 57.°, n.° 2, alínea a), do novo texto constitucional;
b) A razão de decidir no sentido ora pedido é a mesma que levou à declaração da inconstitucionalidade (formal) de diploma quase idêntico (Decerto-Lei n.° 381/82), mesmo que viesse a admitir-se que os sei vicos departamentais cias Forç;is Armadas são serviços públicos (v. citado acórdão);
c) Consequentemente, deverá ser declarada, com força obrigatória geral, por esse Ve-
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netando Tribunal a inconstitucionalidade Jas normas constitutivas do Decreto-Lei n.° 360/8.:. de 15 de Sciembro, na parte em que aprovou o Estatuto de Pessoal Civil dos Serviços Departamentais das Forças Armadas.
11—Promoção a escrivão de direito do Supremo Tribunal Administrativo
Processo n.° 84/H-1512-D1-59-A
1 — Um funcionário judicial colocado nos tribunais comuns protestou, perante o Provedor, a inconstitucionalidade dos artigos 5.° e 6.° do Decreto-Lei n.u 233/ 80, de 18 de lulho, na medida em que prevêem, respectivamente, que o lugar de escrivão então existente no quadro do Supremo Tribunal Administrativo seria provido apenas de entre ajudantes de escrivão que, preenchendo certos requisitos, estivessem ao serviço desse órgão judicial, e que ao funcionário escolhido seria atribuída a categoria de l.a classe.
Entendia, com efeito, que este diploma desrespeitou o princípio da igualdade constitucionalmente consagrado.
2 — O Provedor resolveu, para maior segurança na sua tomada de posição, auscultar o Ministério da Justiça, para indagar das razões que teriam baseado o regime especial posto em causa.
Na sua resposta, este departamento indicou que tais normas teriam resultado da necessidade de dotar o Supremo Tribunal Administrativo de pessoal já com experiência do seu tipo específico de actividades, diversa da dos tribunais comuns.
3 — Não considerando esta justificação bastante para fundamentar objectivamente a diversidade de situações assim gerada, o Provedor opinou no sentido da inconstitucionalidade do n.° 1 dos preceitos citados, tendo pedido a correspondente declaração ao Tribunal Constitucional, em 22 de Outubro de 1984, nos moldes seguintes:
1." O artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 233/80, de 18 de Julho, determina no seu n.° 1 que aos funcionários providos em lugares de escrivão de direito pela lista normativa a que se refere o seu artigo 5." é atribuída a categoria de 1.° classe. E no seu n.° 2 que aos funcionários providos nos lugares de chefe de secretaria das antigas auditorias administrativas, nos termos do número anterior, c atribuída a categoria de escrivão de direitt de 2.° classe.
2.° Na sequência dos contactos mantidos com o Ministério da Justiça visando a obtenção de esclarecimentos relativos à ratio do n.° 1 do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 233/80, foi, pelo Gabinete do titular daquela pasta, enviada fotocópia do parecer emitido pela respectiva auditoria jurídica, o qual mereceu a concordância do Sr. Ministro.
3." Na óptica daquela auditoria jurídica, a ratio dos preceitos legais postos em causa pelo queixoso (artigos 5.° e 6.° do Decreto-Lei n.° 233/80) apenas poderá residir na «necessidade de dotar o pessoal do Supremo Tribunal Administrativo cora pessoal experiente nos serviços específicos daquele Tribunal, que sem dúvida diferem bastante dos tribunais judiciais».
4.° Tal concepção parece, todavia, ultrapassada com a aprovação do estatuto dos funcionários de justiça —para utilizar a terminologia da parte preambular do Decreto-Lei n.° 450/76 — através do qual se procurou uniformizar e equiparar situações de vária ordem que se verificavam nos diferentes tribunais. E, assim, o próprio Decreto--Lei n.° 233/80 anunciou a necessidade de reparar uma situação atentatória do princípio legal da equiparação criada pelo Decreto-Lei n.° 450/78, estabelecendo, logo no seu artigo 1.°, que os funcionários das secretarias dos tribunais administrativos têm as mesmas categorias, direitos, deveres, incompatibilidades, vencimentos e outros abonos que competem aos funcionários de justiça. Até aqui nenhum reparo merece o Decreto-Lei n.° 233/80.
5." O mesmo já não sucede, segundo o esquema uniftcador/equiparador, com o regime de promoção excepcional que o referido diploma legal consagra nos seus artigos 5.° e 6.°, n.° 1, através dos quais se opera a promoção a escrivão de 1 .a classe de ajudantes de escrivão, à margem das regras do Decreto-Lei n.u 450/78 — que viria a ser ratificado pela Lei n.° 35/80, de 29 de Julho.
6.° Ê que, por mais necessidade que haja de dotar o Supremo Tribunal Administrativo de pessoal experiente, tal objectivo não parece susceptível de ajustar-se a situações que implicam, como contrapartida, promoções pela via legislativa, quando já vigoravam normas reguladoras da carreira dos funcionários de justiça. Por outro lado, a especificidade das atribuições cometidas às secretarias dos tribunais administrativos não constituirá, só por si, fundamento aceitável para as faladas promoções, sobretudo depois da plena equiparação estabelecida pelo artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 233/80. Note-se, aliás, que o preâmbulo e toda a economia do Decreto-Lei n.° 233/80 revelam que o seu propósito foi o de aplicar aos funcionários do Supremo Tribunal Administrativo o regime dos demais funcionários judiciais — e isto, precisamente, com a invocação do princípio da igualdade.
7.° As normas do artigo 5.° e 6.°, n.° 1, atas-tam-se assim completamente do regime geral consagrado no Decreto-Lei n.° 450/78, sem que para tanto sejam conhecidas razões aceitáveis nos planos da legalidade e da justiça. Tal situação constituirá tratamento discriminatório em relação aos demais escrivães de direito, a qual envolve inconstitucionalidade material dos preceitos em causa, por ofensa ao princípio de igualdade consagrado no artigo 13.° da Constituição.
Termos em que deverá ser declarada a inconstitucionalidade material, dos citados preceitos, com força obrigatória geral, por esse Venerando Tribunal Constitucional.
12 — Taxas moderadoras nos serviços de saúde
Processo r».° 82/R-427-OI-9-B
l — Uma associação de aposentados e reformados alegou perante o provedor a inconstitucionalidade dos diplomas regulamentares que criaram taxas moderadoras relativas a diversos serviços de saúde e isto por as considerarem incompatíveis com a gratuitidade
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constitucionalmente consagrada como característica do Serviço Nacional de Saúde.
2 — Sobre o assunto elaborou a assessora incumbida dc o estudar o seguinte parecer:
1—A Comissão [...] solicitou ao Provedor de fustiça a análise da constitucionalidade dos despachos do Ministro dos Assuntos Sociais nr 57/80 e 58/80, de 29 de Dezembro, bem como dos despachos datados de 18 de Janeiro de 1982, que oneram gravemente o custo da prestação de cuidados de saúde e criam novas taxas, contrariando, assim, a gratuitidade fixada no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição.
Embora a pretensão seja omissa sobre tal aspecto, pretende certamente a requerente essa apreciação para efeitos da eventual utilização, pelo Provedor de Justiça, da competência prevista no n.° 1 do artigo 281." da Constituição.
2 — Os despachos cuja arguição de inconstitucionalidade é suscitada, reportam-se aos seguintes aspectos:
2.1 — Despacho n.° 57/80, de 29 de Dezembro (Diário da República, 2.a série, n.° 6, de 8 de Janeiro de 1981).
Ajusta o regime de comparticipação das consultas asseguradas através das unidades prestadoras dos cuidados de saúde dos Serviços Médico--Sociais, tendo em atenção o desajustamento dos valores do ponto de vista monetário (') como também a modificação dos pressupostos que presidiram à adopção de taxas moderadoras.
Foram fixadas as seguintes taxas moderadoras: consultas (25$); consultas nos postos de atendimento permanente (SAP) 50$; visitas domiciliárias (100$); visitas domiciliárias asseguradas pelo SAP (100$).
2.2 — Despacho n.° 58/80 de 29 de Dezembro (Diário da República, 2.a série, n.° 6, de 8 de Janeiro de 1981).
Fixa as taxas moderadoras para os utentes dos Serviços Médico-Sociais no acesso a meios complementares de diagnóstico, tratamentos de radioterapia e tratamentos de medicina física e de reabilitação, nos seguintes montantes: análises clínicas ou químico-biológicas (20$); análises anátomo--patológicas (100$); exames radiológicos de valor K igual ou inferior a 3 (50$); requisições para radioterapia (100$), e requisições para medicina física e de reabilitação (75$).
Ambos os despachos (n.os 57/80 e 58/80) isentaram do pagamento das referidas taxas: mulheres na assistência pré-natal e no puerperio; filhos de utentes até 12 meses de idade; pensionistas da pensão social; pensionistas da pensão de invalidez, velhice, sobrevivência e orfandade; beneficiários do abono complementar a crianças e jovens deficientes, e beneficários do subsídio mensal vitalício.
2.3 — Despacho sem número de 18 de Janeiro de 1982 (Diário da República, 2." série, n.° 25, de 30 de Janeiro de 1982).
Actualiza as taxas moderadoras fixadas no despacho n.° 57/80 para os seguintes montantes: consulta (30$); consulta nos SAP (100$); visitas
(') A última fixação reportava-se a Janeiro de 1971.
domiciliárias (120$), e visitas domiciliárias do SAP (150$). Alarga o regime de isenção, para além das pessoas já previtas no despacho n.° 57/ 80, aos internados em estabelecimentos oficiais ou instituições privadas de solidariedade social sem fins lucrativos.
2.4 — Despacho sem número de 18 de Janeiro de 1982 (Diário da República, 2.a série, n.° 25, de 30 de janeiro de 1982).
Actualiza as taxas moderadoras fixadas no despacho n.° 58/80, para os seguintes montantes: análises clínicas ou químico-biológicas (25$); análises anátomo-patológicas (120$); exames radiológicos de valor K igual ou inferior a 3 (60$); exames radiológicos de valor K superior a 3 (120$); requisições de radioterapia (120$), e requisições para medicina física e de reabilitação (150$).
Fixa taxas moderadoras para electrocardiogramas (100$); electroencefalogramas e electromio-gramas (100$); restantes traçados e provas funcionais (100$); tomografias axiais computorizadas. (2000$), e exames de radiodiagnóstico de preço superior a 100 K (— K = 50$) comparticipação do utente em 10 % do custo. Alarga o regime de isenção do Despacho n.u 58/80 também aos internados em estabelecimentos oficiais ou instituições privadas de solidariedade social sem fins lucrativos.
2.5 — Despacho sem número de 18 de Janeiro de 1982 (Diário da República, 2.a série, n.° 25, de 30 de Janeiro de 1982).
Estabelece as comparticipações dos Serviços Médico-Sociais em determinados tipos de aparelhos — próteses dos membros superiores e inferiores, ortóteses e aparelhos para marcha de adultos e crianças diminuídas físicas.
2.6 — Despacho sem número de 18 de Janeiro de 1982 (Diário da República, 2.a série, n.° 34, de 10 de Fevereiro de 1982).
Estabelece taxas moderadoras para a prestação de cuidados em hospitais oficiais centrais, distritais e concelhios nas modalidades de internamento, consultas, meios complementares de diagnóstico e urgências.
As taxas moderadoras a pagar pelos utentes de internamentos variam consoante os escalões anuais de rendimentos do agregado familiar, sendo a taxa mais baixa de 10 % aplicável a rendimentos anuais até 350 contos e a mais elevada de 50 % aplicável a rendimentos superiores a 840 contos (*).
Para as consultas foi fixada a taxa de 100$, o mesmo sucedendo quanto às urgências, também pagas por taxas fixas, cujo montante só varia em função da qualidade do hospital: centrais (300$), distritais (250$) e concelhios (150$).
Pela utilização de meios auxiliares de diagnóstico, fixaram-se as seguintes taxas: exames laboratoriais (40$); exames radiológicos (100$); electrocardiogramas (100$); electroencefalogramas
(!) Estas taxas incidem sobre os valores-padrão das diárias hospitalares fixadas por despacho de 18 de Janeiro de 1982 e estão sujeitas ao limite máximo de 20 dias de internamento em cada período de 12 meses.
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(250$), e tomografias axiais computorizadas (2000$).
No elenco das isenções ao pagamento das taxas moderadoras ficaram abrangidos os seguintes utentes: grávidas na assistência pré-natal e em situações de parto; crianças até 12 meses de idade; beneficiários do abono complementar a crianças e jovens deficientes; beneficiários do subsídio mensal vitalício; pensionistas da pensão social, internados em estabelecimentos oficiais ou instituições privadas de solidariedade social sem fins lucrativos; pensionistas da pensão de sobrevivência; pensionistas de invalidez beneficiários do suplemento de pensão a grandes inválidos; pensionistas da pensão de velhice e seus cônjuges, e agregados familiares com rendimentos inferiores a 280 contos.
Para efeitos da aplicação das taxas moderadoras os doentes são identificados em quatro grandes grupos:
a) Isentos;
b) Inscritos na Segurança Social;
c) Independentes;
d) Beneficiários de subsistemas de saúde, incluindo acidentados.
Só os doentes incrítos na Segurança Social e os independentes pagam, efectivamente, taxas moderadoras, já que aos beneficiários de subsistemas de saúde O os custos totais de internamento, consulta externa, urgência e meios auxiliares de diagnóstico são facturados directamente à entidade responsável.
2.7 — Despacho sem número de 18 de Janeiro de 1982 (Diário da República, 2." série, n.° 29, de 4 de Fevereiro de 1982).
Neste despacho fixam-se tabelas de diárias de internamento em regime de enfermaria (3000$ nos hospitais centrais, 2300$ nos distritais, 1500$ nos concelhios e várias tabelas diversificadas para hospitais especializados), tabelas de preços de consulta externa (variáveis consoante o tipo de hospital), tabelas de meios complementares de diagnóstico e tabelas de urgência (variáveis consoante o tipo de hospital).
Nos termos do despacho, as tabelas foram fixadas tendo em atenção os custos reais apurados e serão actualizadas anualmente em função desses mesmos custos.
Por outro lado, a fixação destes preços ou tabelas tem também em vista transferir para os subsistemas de saúde e outras entidades públicas ou privadas responsáveis por assistência médica dos seus beneficiários o pagamento das despesas hospitalares destes.
Nesta linha de considerações, pode encontrar-se alguma explicação para os factos de os beneficiários dos subsistemas não pagarem taxas moderadoras e de a facturação da totalidade do custo de todas as suas intervenções hospitalares caber aos subsistemas respectivos.
(') Sem prejuízo de enumeração exaustiva, incluem-se nestes subsistemas de saúde e ADSE, a Assistência na Doença às Forças Armadas (ADFA) e a Assistência aos Bancários (SAMS).
3 — Posteriormente à abertura deste processo, foi suscitado por uma confederação sindical, junto do Provedor de Justiça, o pedido de utilização da competência prevista no artigo 281.°, n.° 1 da Constituição para accionamento da declaração de inconstitucionalidade de:
a) Despacho do Ministro dos Assuntos Sociais de 18 de Janeiro de 1982, que fixa as tabelas de preços nos hospitais referido em 2.7);
b) Despacho do Ministro dos Assuntos Sociais sobre «taxas moderadoras» na prestação de cuidados hospitalares nas modalidades de internamento, consulta, meios complementares de diagnóstico e urgência (referido em 2.6);
c) Despachos do Ministro dos Assuntos Sociais sobre taxas moderadoras no acesso aos cuidados de saúde nos Serviços Mé-dico-Sociais e no que se refere a análises clínicas, exames anátomo-patológicos, exames radiológicos, de radioterapia e de medicina física e de reabilitação (referidos em 2.3, 2.4 e 2.5).
3.1 — A exponente fundamenta o seu pedido nos seguintes argumentos:
a) Os despachos em causa incluem-se no conceito de «quaisquer normas» utilizado no artigo 281.°, n.° 1, da Constituição por revestirem características de «generalidade» e «abstracção», sendo também este o entendimento da Comissão Constitucional, expresso nos pareceres n.os 19/ 79 (Pareceres, vol. ix, pp. 3 e seguintes) e 6/78 (Pareceres, vol. iv, pp. 303 e seguintes);
b) Os despachos violam o espírito e a letra da Constituição, não só em matéria de segurança social, mas também em matéria de saúde, ao introduzir uma perspectiva lucrativa implícita no intuito de fazer onerar os cidadãos com custos directos ou indirectos dos cuidados de saúde, que são encargo do Estado e expressa na famosa afirmação do Ministro dos Assuntos Sociais de que, neste país, «quem quer saúde, paga-a»;
c) A prestação de cuidados de saúde, quer directamente através do Estado, quer de serviços personalizados, deve ter a perspectiva de «serviço público», prestado a todos os cidadãos, independentemente do grau de fortuna, devendo ser suportada pela fiscalidade geral em que se fundamenta o Orçamento Geral do Estado;
d) O artigo 7.° da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (Lei do Serviço Nacional de Saúde), permite o estabelecimento de «taxas moderadoras» diversificadas tendentes a racionalizar as prestações, mas os despachos publicados em sua execução desvirtuam os objectivos visados com a fixação daquelas taxas ao introduzirem o factor rentabilização na prestação de
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cuidados de saúde e serviços hospitalares, violando simultaneamente o princípio da gratuitidade expresso no texto constitucional (artigo 64.°) e no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde (inconstitucionalidade e ilegalidade);
e) Embora as medidas consubstanciadas nos despachos em análise constassem do programa do Governo aprovado na Assembleia, tal facto não faz subtrair essas medidas de controle da constitucionalidade de acordo com os mecanismos constitucionais;
f) Igualmente é irrelevante para a apreciação da inconstitucionalidade o facto de o Governo ter obtido da Assembleia da República autorização legislativa (já caducada), para revogar a Lei do Serviço Nacional de Saúde;
g) Nem se diga, também, que já anteriormente existiam tabelas de preços hospitalares e taxas moderadoras, designadamente as aprovadas pelos despachos n.°s 57/80, e 58/80, de 29 de Dezembro, já que o que está em causa é o facto de, através do agravamento imoderado das taxas se pretender revogar na prática e por mero despacho, disposições legais com força constitucional e legai;
h) Em conclusão, os despachos visados enfermam de inconstitucionalidade material, por disporem contra os artigos 63.° e 64.° da Constituição e artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde, pretendendo subtrair a lógica da gratuitidade dos serviços de saúde, que lhes está subjacente, pela obtenção do lucro na prestação dos serviços de saúde, independentemente de fazer melhorar a sua qualidade.
— Antes de entrar na apreciação dos pedi-convém delimitar o seu âmbito: limitare-a nossa análise aos despachos descritos nos 2.3 a 2.7, já que os despachos n.°* 57/80 to 2.1) e 58/80 (ponto 2.2) não se encon-já em vigor, estando definida pela Comissão
o direito à saúde (artigo 64.°) devem ser considerados, pela sua inserção sistemática na parte i, como direitos fundamentais. No entanto, e diferentemente do que sucede noutros sistemas constitucionais, o direito à saúde tem um tratamento autónomo, o que significa que se perfilhou concepção diferente da aplicada noutros países, em que o direito à saúde é um dos direitos compreendidos no regime geral de segurança social. Embora não só o n.° 1 do artigo 63." como também o n.° 1 do artigo 64.° atribuam a todos o direito à segurança social e o direito à saúde, só o artigo 64.° — especificamente no seu n.° 2 — determina que o direito à saúde é realizado pela criação de um serviço nacional de saúde universal, geral e gratuito.
Ê sabido que, em tese geral, há três concepções básicas do direito à segurança social (5): a concepção universalista, em que os direitos são atribuídos a todos os cidadãos ou residentes num país, independentemente da sua situação económica, a concepção assistencialista, em que os direitos só são atribuídos aos mais desfavorecidos; e, finalmente, a concepção laborista em que a efectivação do direito depende de prestações de carácter pecuniário, calculadas de modo a manterem um certo nível dos rendimentos do trabalho, quer através de quotizações pagas pelas pessoas protegidas ou em seu nome, por via de pagamentos directos ou de seguros.
No nosso sistema constitucional o direito à segurança social (apesar da utilização da expressão «todos») cifra-se num compromisso entre a concepção assistencalista e a concepção laborista (6). Ao invés, já quanto ao direito à saúde, a concepção informadora é a universalista.
O direito à segurança social é um direito distinto do direito à protecção da saúde reconhecido no n." 1 do artigo 64.° O direito à protecção da saúde está consagrado numa base universal. O Serviço Nacional de Saúde que, por força do mesmo artigo, é criado e não organizado pelo Estado é um serviço estatal e, em qualquer caso, organicamente separado do sistema de segurança social, por mais estreitas que devam ser as relações entre ambos (7).
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Constitucional orientação quanto à apreciação de disposições caducas ou revogadas que torna inútil a apreciação daqueles despachos (4).
Igualmente, para facilidade de exposição e unidade de tratamento de matérias, há que introduzir um factor classificativo nos depachos elencados nos pontos 2.3 a 2.7, que passarão a ser denominados: despachos 2.3 a 2.5 —«taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais»; despacho 2.6 — «taxas moderadoras dos hospitais», e despacho 2.7 — «tabelas de preços dos hospitais».
5 — Nos termos da Constituição em vigor, tanto o direito à segurança social (artigo 63.°) como
(') Cf. sobre a utilidade prático-normativa do conhecimento actual de normas caducas ou revogadas os pareceres n.°' 27/78 (vol. vi. p. 454), n." 35/79 (vol. x, p. 138) e n.° 1/80 (vol. xi, pp. 28-29), todos da Comissão Constitucional.
A perspectiva constitucional dicotômica do direito à saúde versus direito à segurança social foi o facto determinante da desintegração dos Serviços Médico-Sociais da antiga estrutura da Previdência Social (entendida numa perspectiva globalizante), consubstanciada no artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 17/77, de 12 de Janeiro (8), que transferiu os Serviços Médico-Sociais da Previdência para o âmbito da Secretaria de Estado
(5) Para este efeito, o entendimento de segurança social é o globalizante, abrangendo também o direito à saúde.
(') Cf. António da Silva Leal, Estudos sobre a Constituição, vol. li, «O direito à Segurança Social», p. 364.
(') Idem, ibidem, p. 369.
(') V., também, os Decretos Regulamentares n.°' 12/77, de 7 de Fevereiro, e 65/77, de 21 dc Setembro.
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7 — O carácter universalista (1S) do direito à protecção da saúde decorre não só da utilização da expressão «todos» no n.° 1 do artigo 64.°, como também das características apontadas no n.° 2 do mesmo artigo do serviço a implementar para a respectiva execução: um serviço de saúde universal, geral e gratuito.
Grosso modo, pode dizer-se que os sistemas de saúde podem assumir duas modalidades, em matéria de financiamento:
a) O sistema do serviço nacional de saúde, que se caracteriza pelo financiamento do serviço através da colectividade (quer pelo sistema exclusivo do Orçamento Geral do Estado, quer por participações de entidades públicas ou locais) ('), em que desaparece qualquer relação financeira entre o doente e o prestador de cuidados;
b) O sistema do terceiro garante, em que a instituição de protecção indemniza, total ou parcialmente, o prejuízo financeiro causado pelo beneficiário (").
da Saúde, com vista à sua integração no futuro Serviço Nacional de Saúde.
6 — O direito à saúde, como todos os direitos sociais previstos na Constituição, exige, para a sua efectiva realização, uma concretização da parte do legislador, aspecto sobre o qual não há divergências doutrinais.
Onde as posições se começam a dividir é na matéria da qualificação dos direitos sociais como verdadeiros direitos subjectivos ('), pretensões jurídicas 0°) ou direitos de carácter pragmático (")•
A falta de concretização imediata dos direitos sociais coloca-os «sob reserva do legislador» (u), motivo por que o tipo de inconstitucionalidade por ocorrência mais frequente nestes direitos é a por omissão.
Outro aspecto a considerar na realização ou concretização dos direitos sociais são as condicionantes que lhes podem ser introduzidas, dependentes sempre de um determinado estádio de evolução económica e social, sendo geralmente aceite que a sua realização assuma carácter gradativo, porque limitada aos recursos financeiros disponíveis.
Porém, alguns outros vão mais longe, defendendo que o carácter gradativo e progressivo de realização dos direitos sociais imporia mesmo a proibição de retrocesso (13), na medida em que as normas constitucionais atributivas de direitos sociais têm, pelo menos, uma função de garantia dos graus de realização atingida, em cada momento, por esses direitos.
Com a óptica da realização gradual dos direitos de carácter social pode ainda relacionar-se a questão de saber se o gradualismo ou o condicionalismo económico-financeiro podem justificar a inexequibilidade temporária desses direitos (por ausência de medidas legislativas de concretização) ou a disponibilidade de o legislador poder dar execução (mesmo que temporária) a esses direitos sociais, com modificação do seu conteúdo constitucional O4).
(') Neste sentido Vital Moreira/Canotilho, Constituição da República Portuguesa, anotada, fls. 63-64 e fl. 168.
('") Jose Carlos Vieira de Andrade, Direito Constitucional — Direitos Fundamentais, p. 185. Segundo este autor os direitos sociais s<5 serão direitos subjectivos uma vez emitida a legislação destinada a executar os preceitos constitucionais.
(") M. Bethe, Os Conceitos Fundamentais do Direito à Saúde, Ln Colóquio «O Direito à Saúde como Direito do Homem», pp. 11, 17 e 18. Neste autor é referida uma posição crítica frequentemente assumida no sentido da inoportunidade da inclusão de direitos sociais nas constituições porque provocariam falsas esperanças c, sendo aplicáveis, poriam em causa a credibilidade da Constituição. Por um lado há o desejo de que a Constituição seja o reflexo de todas as funções e tarefas do Estado moderno e, por outro, o voto de que estes mesmos sejam imediatamente aplicáveis.
(") A expressão é de Vital Moreira, ob. cit. p. 64.
(") Neste sentido, Vital Moreira/Canotilho, ob. cit. p. 64, defende a inconstitucionalidade material da norma que contrarie a realização legal já atingida.
(") Em termos muito lineares de teoria geral do direito, a realização de um direito social em termos diferentes dos constitucionalmente previstos só não geraria inconstitucionalidade material em situações de aplicação bastante restrita, como sejam o estado de necessidade e o estado de sitio.
A primeira questão que pode colocar-se num sistema constitucional que adopte o tipo de serviço nacional de saúde, com carácter de gratuitidade para o beneficiário da protecção de saúde é o de saber se esse sistema é compatível cora quaisquer pagamento de interessados, quer por via directa no acto de prestação e à entidade prestadora de cuidados, quer ainda por via indirecta a uma entidade que funcionaria como garantia do pagamento O8). Na primeira das hipóteses assinaladas o pagamento poderia constituir uma quebra do princípio de gratuitidade do sistema e, na segunda, uma quebra do princípio da universalidade, na medida em que direitos idênticos não seriam atribuídos a todos os cidadãos.
8 — Para dar execução ao artigo 64.° da Constituição foi publicada a Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro (Serviço Nacional de Saúde). Desta lei destacam-se os seguintes princípios gerais, cora interesse para a matéria em análise:
a) O direito à protecção da saúde previsto na Constituição é assegurado através do Serviço Nacional de Saúde (artigo 1.°);
b) O acesso ao Serviço Nacional de Saúde é garantido a todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica e
(") No sentido apontado no ponto 5.
(") Este é o sistema geralmente adoptado em países socialistas e na Inglaterra, Nova Zelândia e Dinamarca, (of. fean-Marie Auby, Le droit de la santé, pp. 212-213).
(") Neste si tema ainda se poderiam subdistinguir diferentes modalidades de quotizações ou prémios de seguros pagos obrigatoriamente pelos interessados (Alemanha, Bélgica, França) ou sistemas de seguro facultativo completo por soluções favoráveis pana categorias sociais necessitadas (EUA, com os sistemas de cuidados gratuitos Medicare ou Dedicaid para idosos e indigentes) [cf. autor e ob. cit. em ('")].
(") Neste último caso, também seria de colocar o problema da admissibilidade de celebração de contratos de seguro facultativos ou obrigatórios ou da exigência do pagamento de contribuições a terceiras entidades, que assumissem a responsabilidade do pagamento perante a entidade prestadora de cuidados médicos.
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social (artigo 4.°) — princípio universalista;
c) Esse acesso compreende todas as prestações abrangidas pelo Serviço Nacional de Saúde e só sofre as restrições impostas pelo limite de recursos humanos, técnicos e financeiros disponíveis (artigo 6.°);
d) O acesso ao Serviço Nacional de Saúde é gratuito, sem prejuízo do estabelecimento de taxas moderadoras diversificadas tendentes a racionalizar a utilização das prestações (artigo 7.°);
e) Ao Estado incumbe a mobilização dos recursos financeiros indispensáveis ao Serviço Nacional de Saúde, de modo a assegurar a sua progressiva implantação e realização, devendo a dotação orçamental em cada ano tomar em consideração a evolução do produto nacional bruto (artigos 50.° e 51.°);
f) A entrada em funcionamento do Serviço Nacional de Saúde é gradual, devendo dar-se possibilidade aos distritos mais carecidos; nas restantes zonas deverão ser promovidas acções de planeamento e medidas destinadas à melhoria das estruturas existentes e à sua integração no Serviço Nacional de Saúde (artigo 58.°);
g) Os beneficiários de esquemas de protecção na doença privativa de sectores de actividades ou de determinados estratos profissionais integrar-se-ão no esquema de prestações do Serviço Nacional de Saúde à medida que a sua estrutura entre em funcionamento nos vários distritos (artigo 59.°);
k) A regulamentação do exercício do direito e o acesso às prestações, a estrutura interna, a competência, o modo e o regime de funcionamento dos órgãos e serviços, bem como a regulamentação do estatuto do pessoal deverão constar de decretos-leis (artigos 54.°, n.° 1, e 65.°, n.° 1).
A regulamentação do exercício do direito e acesso às prestações não foi, até ao momento, objecto de medida legislativa adequada, tal como prevista na lei do Serviço Nacional de Saúde Ç9). Seria em sede desta lei que deveriam ter ficado definidas as faculdades compreendidas no direito à protecção da saúde, os requisitos e formas do seu exercício, as relações com outros direitos e
(") Em execução da Lei do Serviço Nacional de Saúde foram apenas publicados os seguintes diplomas: Decreto-Lei n.° 513-V/79, de 27 de Dezembro—Departamento de Recursos Humanos (artigo 33." da Lei do Serviço Nacional de Saúde); Decreto-Lei n.° 519-02/79, de 29 de Dezembro — Administrações Distritais de Saúde, órgãos regionais do Serviço Nacional de Saúde (artigos 38.°, n.° 1, e 64• da Lei do Serviço Nacional de Saúde); Decreto Regulamentar n.° 85/79. dt 31 de Dezembro — Centros Comunitários de Saúde e órgãos locais do Serviço Nacional de Saúde, e Decreto-Lei n.° 503/79, de 31 de Dezembro — Departamento de Cuidados Primários da Administração Central de Saúde (artigo 33.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde). Destes .diplomas apenas se mantém em vigor o respeitante ao Departamento de Recursos Humanos.
até a fixação das situações em que haveria lugar ao pagamento das taxas moderadoras previstas no artigo 7.° da lei do Serviço Nacional de Saúde.
Na ausência de tal lei verifica-se um «salto» da Lei do Serviço Nacional de Saúde para os despachos normativos, já que estes, para além da simples fixação de taxas, entram em matéria de regime.
9 — A consagração da possibilidade do estabelecimento de taxas moderadoras no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde apenas teve objecção frontal dos deputados do Grupo Parlamentar do PCP e UDP (**), por contrária ao princípio constitucional da gratuitidade, tendo cabido ao Partido Socialista a sua justificação como processo de racionalização do sistema (21) e ao CDS e PSD a contestação da sua eficácia (2). Apesar das objecções levantadas, o PCP e a UDP juntaram-se ao PS na votação da Lei do Serviço Nacional de Saúde, que veio a ser aprovada com voto contra do CDS e a abstenção do PSD e Sociais-Democratas Independentes (cf. Diário da Assembleia da República, cit. n.° 61, p. 2149).
Embora os trabalhos preparatórios da Lei do Serviço Nacional de Saúde não forneçam elementos muito conclusivos (a) sobre o objectivo que presidiu à previsão das taxas moderadoras, de qualquer modo parece-nos lícito poder concluir que se destinariam a evitar o excessivo afluxo de doentes que um sistema sem quaisquer pagamentos propiciaria.
10 — As taxas moderadoras previstas no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde são compatíveis com o sistema de gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde fixado no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição? A resposta a esta questão só poderá ser dada após indagação prévia sobre a natureza jurídica daquelas taxas.
Como consideração prévia dir-se-á, no entanto, que o mesmo artigo 7.*, que previu o estabeleci-
(*) Vejam-se intervenções dos deputados Zita Seabra e Acácio Barreiros sobre a discussão da Assembleia da República (v. Diário da Assembleia da República, 1." série, n.° 58, de 11 de Maio de 1979. n.° 60, de 17 de Maio de 1979, n.° 61, de 18 de Maio de 1979, e n.° 77, de 29 de Maio de 1979).
(") António Arnaut (p. 2132):
A gratuitidade do serviço não significa, como se sabe, que não haverá qualquer pagamento directo pelo utente. O doente não terá de puxar pela carteira quando recorrer ao Serviço Nacional de Saúde. As taxas moderadoras só podem admitir-se transitoriamente, em certos casos e, mesmo assim, apenas como meio de racionalizar a utilização de certas prestações.
Idem (p. 2137):
Na Bélgica foram os próprios médicos a pedir o estabelecimento de taxas moderadoras —e trata-se de de medicina convencionada — para evitar grande bAuxo.
(*) Moreira da Silva (PSD) (p. 2136):
Se as taxas forem pouco significativas, como, aliás, acontece presentemente nas caixas de previdência, com longas bichas de doentes, a moderação a esse acesso não será contida. Por outro lado, se elas forem significativas, deixam de ter o carácter de gratuitidade.
(°) As declarações feitas sobre a matéria revestem mais carácter político do que jurídico, já que esta lei não foi discutida na Assembleia artigo a artigo —baixou à Comissão respectiva— e as declarações referidas reportam-se apenas às sessões de apresentação e votação da lei.
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mento de taxas moderadoras, reitera o carácter da gratuitidade do acesso ao Serviço Nacional de Saúde, especificando que a finalidade visada por aquelas taxas seria a racionalização da utilização das prestações.
Por outro lado, a busca que fizemos sobre os vários sistemas de saúde permite-nos concluir que, quer os sistemas inspirados no modelo do Serviço Nacional de Saúde, quer os vazados no princípio do terceiro garante, comportam procedimentos vários, tendentes a refrear ou reprimir as despesas sanitárias, que vão desde apertados requisitos para o recurso a especialistas até a taxas moderadoras (24). O sistema do ticket modérateur existe, pelo menos, no sistema belga (K) e no sistema francês O sistema inglês do NHS, que é um sistema gratuito e inspirador da Lei n.° 56/ 79, comporta também no seu regime a existência de taxas moderadoras, pelo menos a partir da sua segunda fase ("), embora a percentagem advinda para o orçamento da NHS destes pagamentos seja quase irrelevante (2 % do total), correspondendo as despesas britânicas em matéria de saúde í28) a 5 % do rendimento nacional.
11 — Feitas estas considerações prévias, cabe agora entrar directamente na análise da natureza jurídica das «taxas moderadoras» previstas no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde com vista a, numa primeira linha, indagar se se trata de um «preço», de uma «figura tributária» ou de um tertium genus e, numa segunda ordem de considerações, verificar se a figura classificada é compatível com o sistema constitucional de gratuitidade na prestação de cuidados de saúde.
A taxa moderadora, tal como prevista np artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde, é figura diferente de um preço que, mesmo nos chamados «preços políticos» exige, para a sua fixação, uma relacionação com custos e rendimentos (w) a que a previsão daquela taxa é alheia.
Será então a taxa moderadora uma figura tributária, e, na hipótese afirmativa, qual?
Nas sociedades modernas, em que o sistema fiscal e as várias figuras tributárias que o integram são* chamadas não só à satisfação de necessidades financeiras do Estado, mas também ao preenchimento de objectivos subsidiários, como sejam a realização de determinada política social ou até finalidades concretas de política económica, torna-se, em certos casos, difícil verificar se estamos perante uma figura tributária ou uma prestação coactiva de natureza não tributária.
(") Sobre a admissibilidade da existência de taxas moderadoras nos vários sistemas (v. Jean-Marie Auby, Le Droit de la Santé, p. 212-213).
(") Pode ir até 25 % do custo dos cuidados correntes e do preço dos produtos farmacêuticos (cf. Pierre Denis, Droit de la Sécurité Sociale, p. 297).
{*) Guy de la Jardinerie e Nicolas Floréal, Droit Social, n.0' 9-10, Setembro-Outubro de 1978, pp. 28 e 31.
(") No ano de 1978-1979 estas taxas subsidiaram o orçamento do NHS em 2%, La Santé Rationée?, Jean de Ker-vosdoné (v. o estudo de Célia Davies e outros Avenirs possibles d'un Service Nationale de Santé, p. 136).
(a) Jacques Doublet, Sécurité Sociale, p. 736.
C) Sobre os critérios distintivos entre «preços» e «taxas» v. António Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, pp. 762-763.
De qualquer modo, é ponto assente que todos os sistemas fiscais têm como objectivo imediato a angariação de receitas para satisfação de necessidades financeiras do Estado. Mesmo na nossa Constituição, em que a finalidade imediata aparece em último lugar, é possível defender ter sido o sistema fiscal gizado com o objectivo imediato de angariar receitas públicas
Nesta linha de considerações, tem sido entendido que os tributos se definem não só pela estrutura como também pela sua função ou finalidade. Assim, seria essencial à noção de tributo que «a prestação patrimonial objecto de uma obrigação ex lege tenha sido criada com o fim imediato de contribuir para os encargos públicos, para a realização de despesas públicas (M). De acordo com esta concepção, que é a geralmente aceite, não revestiriam natureza tributária determinadas prestações pecuniárias que, não obstante ingressarem nos cofres do Estado e poderem ser aplicadas à satisfação de despesas públicas, foram criadas com diferentes objectivos imediatos (3J).
A indagação dos objectivos imediatos, se é fácil no citado caso das multas, torna-se mais complexa quando se está era presença de determinadas taxas, já que a sua fixação não obedece apenas a simples critérios de distribuição de encargos pelos utentes ("), pretendendo atingir também outras finalidades.
No caso concreto das taxas com natureza tributária, o elemento qualificador que.as permitiria distinguir de outros tributos, nomeadamente os impostos, seria o seu carácter sinalagmático ou de contraprestação, ligada individualizadamente, quer à prestação de uma actividade pública, quer à utilização do domínio público, quer ainda à remoção de um limite jurídico (*).
(") O artigo 106.°, n.° 1, da Constituição dletermina que:
1 — O sistema fiscal será estruturado por lei, com vista à repartição igualitária da riqueza e dos rendimentos e a satisfação de necessidades financeiras do Estado.
(") Alberto Xavier, Manuel de Direito Fiscal, i, p. 40.
(") Ê este, por exemplo, o caso das multas criadas para sancionarem a violação de certos deveres, não obstante constituírem parcela de receitas públicas.
(") António Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, vol. I, pp. 762-763 — O critério de fixação das taxas assenta nas seguintes ideias basilares:
1 — Facilitar ou dificultar o acesso aos serviços públicos, segundo um critério puramente político;
2 — Proceder à distribuição de encargos públicos nomeadamente com o funcionamento de determinado serviço, de harmonia com critérios de justiça.
(*) A noção da taxa, em confronto com os impostos, tem construção suficientemente solidificada, quer na doutrina, quer na jurisprudência. Sobre a matéria referem-se:
Pessoa Jorge, Lições de Direito Fiscal — taxa é a prestação pecuniária que o particular paga ao Estado ou a entes públicos em retribuição de um serviço individualmente prestado.
António de Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, i, p. 345 — taxa é a prestação tributária que pressupõe ou dá origem a uma contraprestação específica, constituída por uma relação concreta entre o contribuinte e um bem ou serviço público. A taxa pressupõe financeiramente certo tipo de utilização de um serviço
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Neste momento pode dar-se já como adquirido que todas as taxas com natureza tributária deverão ter sido criadas com o fim principal ou imediato de angariar receitas públicas; que em todas há um nexo sinalagmático, de bilateralidade ou de contraprestação de um serviço público individualmente prestado; e que os critérios de fixação da maioria delas pretendam atingir fins que não são exclusivamente os da repartição de encargos públicos.
De acordo com o exposto, serão as «taxas moderadoras» previstas no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde subsumíveis no conceito de taxa, no seu exacto sentido tributário? A resposta afigura-se-nos negativa, em virtude de aquelas taxas terem sido previstas para preenchimento de objectivos imediatos diferentes —racionalização das prestações de saúde— de um simples financiamento dos serviços de saúde; do mesmo modo, se destas taxas poderão advir receitas públicas, este resultado é secundário em relação ao fim principal visado com o seu estabelecimento. E igualmente se nos afigura, no caso concreto, de arredar o conceito de bilateralidade ou sinalagma, já que se o seu pagamento é efectuado por ocasião da prestação do serviço, ele não se destina a compensar, total ou parcialmente, o seu custo (*).
ou bem público. Se não estiver definida uma utilização ou relação concreta com o funcionamento de um serviço não há taxa, mas imposto.
Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, vol. i, p. 42.
As figuras de imposto e taxa correspondem à contraposição de meios de financiamento de serviços públicos indivisíveis e divisíveis.
O fundamento da taxa é a prestação de actividade pública, a utilização do domínio público ou a remoção do limite jurídico e. por isso, estas realidades e a taxa que lhes corresponde encontram-se entre si ligadas por um nexo sinalagmático, em termos de uma se apresentar como contraprestação da outra.
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 15 de Outubro de 1969 — Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, ano ix, n* 98, pp. 234-239 — a taxa consiste numa prestação pecuniária estabelecida a favor de um ente público como contrapartida de utilidades ou serviços por este individualmente prestados.
Veja-se também orientação semelhante nos pareceres n.° 53/78 da Procuradoria-Geral da República (Boletim do Ministério da Justiça. n.° 281, pp. 122-123) e n.° 130/58, de 30 de Maio de 1959.
(") Antunes Varela, Das Obrigações em Cerai. vol. i, pp. 280-286:
O carácter da bilateralidade ou sinalagma existiria na união das obrigações uma à outra por um vínculo de reciprocidade ou interdependência, de tal modo que a obrigação assumida por cada uma das partes constituiria a razão de ser da obrigação contraída pela outra. Um efeito importante do nexo sinalagmático, que não ocorre na situação em apreciação seria o de que se uma das prestações se toma impossível por facto não imputável ao devedor, fica o credor desonerado da respectiva contraprestação. Se já a tiver realizado, assistir--lhe-á o direito a exigir a sua restituição nos termos do enriquecimento sem causa (artigo 795." do Código Civil).
O carácter gratuito ou oneroso das obrigações, embora possa ter alguma associação com a noção de sinalagma (confusão que. segundo o mesmo autor se fazia no artigo 642." do Código Civil de 1867), é noção diferente do aspecto sinalagmático, pois assenta na articulação psicológico-juridica estabelecida entre as obri-
As «taxas moderadoras» do artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde, que com as taxas fiscais têm de comum a designação, deverão qualificar-se como prestações coactivas de natureza não tributária, para utilizar a nomenclatura adoptada por Alberto Xavier para a classificação de figuras de conteúdo semelhante. As mesmas taxas não ofendem o princípio da gratuitidade da prestação de actividades de saúde prevista na Constituição, dada a ausência das características do carácter compensatório de despesas feitas ou de finalidade principal de comparticipação em custos.
12 — Sendo conhecido que os despachos normativos, cuja constitucionalidade é impugnada, têm o seu substracto legal ou fundamento no artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde, já apreciado, de que constituem em termos jurídicos disposições regulamentares, caberá agora entrar na apreciação da compatibilização dos referidos despachos — na dupla perspectiva de forma e fundo — quer com a lei regulamentada, quer com a Constituição, o que constitui objecto dos números seguintes.
13 — Tabelas de preços nos hospitais.
O critério utilizado para a aprovação das tabelas de preços hospitalares (diárias de internamento em regime de enfermaria, consultas externas, meios complementares de diagnóstico e urgência) baseou-se nos custos reais apurados nos estabelecimentos hospitalares; as mesmas tabelas deverão ser revistas e actualizadas anualmente, em função desses custos reais.
Com a nova estrutura de preços, pretendeu criar-se um sistema de mais fácil aplicação e também fazer participar nos pagamentos todas as entidades públicas e privadas responsáveis pelos pagamentos aos hospitais das despesas decorrentes da assistência prestada aos seus beneficiários que, em virtude da desactualização de preços, estariam a ser subsidiadas indirectamente pelo orçamento dos serviços de saúde.
Segundo se supõe, são duas as finalidades visadas pelo despacho (%):
a) Constituir um quadro de referência para a aplicação subsequente das taxas moderadoras (");
gações que integram a relação; ao invés, o carácter oneroso e gratuito das obrigações refere-se à sua função económica.
Nas obrigações com carácter oneroso, a atribuição patrimonial efectuada por uma das partes tem por correspectivo, compensação ou equivalente a atribuição proveniente de outra. Nas obrigações gratuitas, segundo comum intenção das partes, uma delas proporciona uma vantagem patrimonial à outra sem qualquer correspectivo ou contraprestação.
(*) Poderá ainda descortinar-sc um terceiro objectivo, qual seja o de definir anualmente, para efeitos de gestão financeira, o custo real de várias prestações de saúde, mas nem este objectivo é relevante para a análise do problema nem exigiria, para o efeito, o conhecimento público dado ao despacho.
(") Este objectivo é directo desde logo para efeitos de incidência; das taxas moderadoras do internamento hospitalar e indirecto, podendo fornecer percentagens de comparticipação das taxas nos custos totais que, por exemplo, no caso das urgências dos hospitais centrais correspondem a um quinto, como também nas consultas externas destes mesmos hospitais
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b) Definir o custo real das varias intervenções para efeitos da sua exigência, na integralidade, aos vários subsistemas de saúde e outras entidades públicas e privadas responsáveis em relação à assistência prestada aos respectivos beneficiários.
Não se detectam quaisquer irregularidades quanto à forma de fixação das tabelas de preços, já que essa fixação não está sujeita a forma típica constitucional ou legal, constituindo, na sua essência, um acto regulamentar.
Já quanto à apreciação de fundo são de colocar dúvidas quanto à fixação de preços para a prestação de serviços, cuja gratuitidade ficou constitucional (artigo 64.°, n.° 2) e legalmente garantida (artigo 7." da Lei do Serviço Nacional de Saúde) e ainda quanto às exigências do pagamento integral das prestações pelos subsistemas, que pode pôr em causa o princípio da universalidade prevista no citado n.° 2 do artigo 64.° da Constituição.
A fixação de preços de prestação de cuidados médicos num sistema gratuito coloca desde logo aspectos de compatibilização entre a filosofia geral informadora do princípio da gratuitidade e a determinação de preços baseados em custos reais, tal como apresentados no despacho, contra os quais não poderão aduzir-se argumentos baseados no carácter de execução gradualista dos direitos sociais ou nas condições excepcionais de emergência económica, já que o carácter gradualista não poderá ser invocado para uma concretização do direito com conteúdo ou natureza diferente do gizado na Constituição.
O gradualismo tem mais a ver com o faseamento ou timing da execução ou com obstáculos ao começo de execução —por condicionalismos económico-financeiros — do que propriamente com uma concretização desconforme com a Constituição. Nesta medida, julgamos que o despacho relativo às tabelas de preços dos hospitais é materialmente ilegal por ofensa do disposto no artigo 7.° da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro e materialmente inconstitucional, por ofensa do disposto no artigo 64.° n.° 2 da Constituição.
O mesmo despacho, na medida em que estabelece um tratamento desigual (M) para os beneficiários dos subsistemas de saúde, viola também o princípio da universalidade estabelecido, quer no n.° 1 do artigo 4.° da Lei n.° 56/79, quer no n.° 2 do artigo 64." da Constituição; e viola igualmente o artigo 59.° da Lei n.° 56/79, que determina a integração dos vários subsistemas de saúde no Serviço Nacional de Saúde à medida que este entre em funcionamento nos vários distritos, regime donde parece decorrer o princípio da paridade de tratamento de todos os beneficiários nos sucessivos momentos de aplicação do Serviço Nacional de Saúde.
(") Mais adiante, a propósito das taxas moderadoras, trataremos com maior desenvolvimento esta matéria.
14 — Taxas moderadoras nos hospitais.
O despacho que fixou as taxas moderadoras para os vários tipos de cuidados de saúde prestados nos hospitais não refere a norma legal que o fundamenta; no entanto, a justificação que é dada para a figura no preâmbulo do mesmo despacho— «reserva das áreas hospitalares aos doentes que efectivamente delas careçam» e os fundamentos invocados pelo Ministro dos Assuntos Sociais para a sua implantação (M), apontam no sentido de se tratar de norma regulamentar do artigo 7.° da Lei n.° 56/79.
No despacho em apreciação, para além da fixação dos montantes das taxas diversificadas a pagar pela prestação de cuidados nos hospitais nas várias modalidades já assinaladas —internamento, consulta externa, meios complementares de diagnóstico e urgências — estabelecem-se também normas do regime legal respeitante ao exercício do direito e acesso às próprias prestações, das quais destacamos as seguintes:
a) Classificação dos doentes em 3 categorias (inscritos na Segurança Social); independentes e beneficiários de subsistemas de saúde;
b) Definição do elenco das pessoas inscritas na Segurança Social e independentes que beneficiam de isenção do pagamento de taxas moderadoras;
c) Determinação da aplicação das taxas de internamento hospitalar em percentagens crescentes em função dos escalões de rendimentos anuais do agregado familiar;
d) Não exigência de qualquer pagamento das várias modalidades de taxas moderadoras aos beneficiários dos subsistemas de saúde aplicando-lhes a tabela hospitalar total,
(") Discussão do Orçamento Geral do Estado para 1982 — proposta de lei n.° 73/11.
Intervenção do Ministro dos Assuntos Sociais, Dr. Luís Barbosa (Diário da Assembleia da República, p. 27, de 15 de Dezembro de 1981, pp. 946-951):
No clima de constrangimento orçamental em que o Governo se empenhou não se configurou possível atribuir à saúde mais de 58 milhões de contos. Temos nesta altura 3600 médicos para colocar cm todo o País durante o ano de 1982; 24 centros dc saúde para abrir; vários hospitais distritais em fase de arranque; os hospitais centrais carecendo de obras de conservação e reparação dispendiosas [...] a estimativa das despesas de saúde, tendo em conta todos estes desenvolvimentos, é de 65,7 milhões. Ou parávamos ou pedíamos taxas moderadoras mais elevadas a uma parte dos utentes, aquela que dispõe de maior capacidade económica.
Escolhemos a segunda hipótese.
Em todo o caso, o artigo 6." da Lei n." 56/79 diz que a garantia de acesso aos cuidados de saúde não sofre restrições, salvo as impostas pelo limite de recursos humanos, técnicos e financeiros disponíveis.
Ê o caso presente.
A mesma Lei n." 56/79 diz no seu artigo 7* que o acesso ao Serviço Nacional de Saúde é gratuito, sem prejuízo do estabelecimento de taxas moderadoras diversificadas tendentes a racionalizar a utilização das prestações.
Ê nesta filosofia que nos inspiramos, dentro dos limites financeiros, técnicos e humanos disponíveis.
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a facturar directamente à entidade responsável.
14.1 — Vários aspectos devem ser considerados na apreciação da forma utilizada — despacho simples — para o estabelecimento das medidas contidas no despacho.
Decorre do artigo 201.°, n.° 1. alínea c), da Constituição que a forma típica de desenvolvimento dos princípios ou bases gerais dos regimes contidos em leis é o decreto-lei. Ainda que possa haver regulamento, este tem de ser mediatizado através de decreto-lei. Para além das garantias que a forma de decreto-lei representa para o cidadão, há também a assinalar que só os decretos-leis estão sujeitos a fiscalização da Assembleia da República, através do instituto de ratificação (cf. artigo 172.° da Constituição).
Por outro lado, a própria Lei do Serviço Nacional de Saúde determina no n.° 1 do seu artigo 54.° que o exercício do direito e acesso às prestações «constará de diploma especial», estipulando o n.° 1 do seu artigo 65.° que esse diploma especial, necessário à sua execução, é o decreto-lei.
Do que atrás ficou referido parece possível concluir que o despacho, pelo menos na parte em que estabelece normas do regime legal respeitante ao exercício do direito e acesso às próprias prestações, está inquinado de inconstitucionalidade formal por ofensa ao disposto no artigo 201.°, n.° 1, alínea c), da Constituição e de ilegalidade, na modalidade de vício de forma, por ofensa ao disposto nos artigos 54.°, n.° 1, e 65.°, n.° 1, da Lei n.° 56/79.
Poderá, em contraponto, contra-argumentar-se que todos os aspectos de regime constituem um mero desenvolvimento ou complemento necessário a uma adequada aplicação do regime das taxas moderadoras. Tal posição não nos parece de aceitar, pois embora se aceite a necessidade do estabelecimento de normas do regime de exercício do direito à protecção à saúde, em sede do despacho de fixação de montantes das taxas moderadoras, tal situação ocorre apenas por falta de publicação do diploma formalmente adequado para o efeito, não sendo também defensável que se degrade, a simples normas complementares de um despacho de fixação de taxas, normas substancialmente qualificáveis como normas de regime.
14.2 — A apreciação dos aspectos de fundo do despacho comporta uma pluralidade de perspectivas.
14.2.1—O primeiro aspecto a realçar é que o regime de fixação de taxas moderadoras aparece desligado dos princípios que nortearam a criação do Serviço Nacional de Saúde, vazados na Lei n.° 56/79, nomeadamente quanto aos seguintes pontos:
Implantação de uma série de órgãos e serviços destinados a dar cabal execução à Lei do Serviço Nacional de Saúde (cf. artigos 24.° a 43.°);
Entrada gradual em funcionamento, com início nos distritos mais carenciados (cf. artigo 58.°);
Integração dos beneficiários dos sistemas nos vários distritos, à medida que a estrutura do Serviço Nacional de Saúde neles entre em funcionamento (cf. artigo 59.°).
A fixação das taxas moderadoras e a correspondente definição aparece, assim, desligada do espírito do sistema da lei e até, nalguns casos, em contradição com medidas de política concreta nela determinadas. Nesta medida, não parece excessiva a conclusão de que a fixação de taxas moderadoras não teve em vista propriamente pôr em execução a Lei do Serviço Nacional de Saúde, tendo antes visado a tutela de uma determinada situação conjuntural, cujo objectivo será analisado de forma específica.
14.2.2 — Atrás ficou referido que o critério distintivo essencial para a qualificação de determinada figura como tributária assentava no fim imediato de criação de receitas públicas, teríamos um tributo, embora com este fim imediato pudessem coexistir fins subsidiários ou complementares; se, ao invés, o fim imediato fosse de diferente natureza, mas com ele pudesse coexistir, como resultado, a angariação de receitas públicas, estaríamos perante uma prestação coactiva de natureza não tributária.
Segundo supomos, a verdadeira natureza das taxas moderadoras fixadas no despacho deve ser apreciada recorrendo, quer à análise do seu regime, quer às justificações dadas pelas entidades responsáveis pela sua fixação. As dificuldades que o problema apresenta • resultam de nestas taxas moderadoras coexistirem finalidades mistas de angariação de receitas públicas com objectivos e montantes predeterminados [cf. declarações do Ministro dos Assuntos Sociais, citadas na nota (J*)] e de contenção ou racionalização de consumos (cf. preâmbulo do despacho: «as áreas hospitalares, pelos seus pesados investimentos e elevados custos, devem ser reservadas aos doentes que efectivamente delas careçam»).
Apesar das dificuldades expostas, afigura-se-nos que, neste caso, não será difícil defender terem estas taxas sido fixadas com a finalidade principal de angariar receitas públicas. E que, quando o fim principal de uma prestação coactiva de natureza não tributária não é a criação de receitas públicas, nunca aparece como justificação financeira da figura um défice ou insuficiência orçamental. Embora as receitas provenientes destas figuras constem na descrição e estimativa orçamental das receitas públicas, a sua afectação às despesas públicas é meramente subsidiária, não podendo argumentar-se que determinados objectivos de política financeira do Estado ficam comprometidos com a sua falta de cobrança (*),
No sistema do despacho, aliás, só aparecem com a natureza de taxa tributária as chamadas taxas moderadoras pagas pelos inscritos na segurança social e independentes, pela comparticipação
("). Tomando, como exemplo, o caso das multas, ninguém com bom-senso poderá vir alegar que a sua não cobrança põe em causa a realização de determinadas despesas públicas.
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no custo da prestação de cuidados de saúde por aquelas duas categorias de utentes.
Já quanto aos beneficiários dos subsistemas de saúde, os pagamentos pela prestação de cuidados de saúde revestem a função de um verdadeiro preço. Com efeito, quer da tabela de preços já analisada, quer do sistema do despacho relativo a taxas moderadoras resulta que aos beneficiários dos subsistemas 6 facturada a tabela hospitalar total (4I). Afigura-se-nos dispiciendo, neste caso, contra-argumentar que os beneficiários dos subsistemas efectivamente nada pagam já que a tabela hospitalar total é facturada directamente à entidade responsável. É que, para a qualificação da figura é irrelevante que a prestação seja integralmente paga pelo próprio beneficiário ou por um terceiro garante — quem efectivamente paga, fá-lo de acordo com um preço baseado em custos reais.
O regime de taxas moderadoras (criado com a finalidade principal de angariar receitas públicas, como comparticipação de custos) e a fixação de preços para os beneficiários dos subsistemas ofendem o disposto no artigo 7." da Lei do Serviço Nacional de Saúde, podendo neste caso defender-se que se está perante uma violação material da lei na modalidade de desvio de poder regulamentar — ou seja. execução concreta da lei para fins diferentes dos nela previstos.
Há também violação directa do despacho (e não da Lei do Serviço Nacional de Saúde) ao princípio da gratuitidade da prestação de cuidados de saúde previsto no n.u 2 do artigo 64.° da Constituição, já que aquele princípio não se coaduna com a cobrança de taxas de natureza tributária nem, obviamente, com o pagamento de preços. A modalidade do vício é a inconstitucionalidade material.
14.2.3—Relacionado com a perspectiva dicotômica informadora do despacho entre o pagamento de taxas ou preços caberá ainda questionar se esta diversidade de tratamento entre os utentes não porá em causa também o princípio da igualdade previsto genericamente no artigo 13.° da Constituição e da mesma feição específica no próprio n.° 2 do seu artigo 64." ao consagrar o princípio da universalidade.
Já atrás, a propósito da natureza do direito à prestação de cuidados de saúde foi referido que a aplicação do princípio da universalidade parte da ideia básica da existência de necessidades, sem cuidar da situação económica dos necessitados.
Numa fase transitória poderia justificar-se que uma determinada componente do custo das prestações de saúde (o custo total deduzido da taxa moderadora a pagar por cada utente) fosse transferido das despesas dos serviços de saúde hospitalares para serem suportadas pelos subsistemas respectivos.
(") No preâmbulo do despacho sobre tabelas hospitalares consta que os preços dele constantes correspondem aos custos reais apurados.
A justificação lógica da existência de taxas moderadoras (contenção ou racionalização de consumos) e o princípio da universalidade constitucionalmente consagrado admitirão que determinadas categorias de utentes sejam subtraídas ao pagamento daquelas taxas só porque um terceiro garante esses pagamentos?
Julgamos que não, pelas razões que passam a expôr-se:
a) Em primeiro lugar, os motivos psicológicos que deveriam estar subjacentes à contenção ou racionalização de consumos devem aplicar-se a todos os utentes dos serviços hospitalares sem distinção, ou as distinções feitas devem bascar-sc em critérios diferentes da possível cobertura financeira total desses pagamentos por terceiros (4J);
b) A subtracção de um determinado elenco de utentes ao pagamento de taxas moderadoras (os beneficiários de subsistemas) corrobora o critério puramente financeiro que presidiu à fixação das taxas moderadoras, já que, nestes casos, o Estado se desinteressa de qualquer objectivo de contenção de consumos pelos utentes porque o pagamento do preço ou custo total do serviço é pago integralmente por terceiro.
Do exposto é possível concluir que o estabelecimento de taxas moderadoras apenas para os inscritos no regime da Segurança Social e para os independentes teve como objectivo chamar à comparticipação nos custos aqueles utentes não beneficiários do sistema de terceiro garante. Em todos os casos em que o terceiro garante existe, o objectivo de contenção foi esquecido.
A situação exposta viola o princípio da universalidade consagrado no n.° 1 do artigo 4.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde — violação da lei de fundo.
Viola igualmente o princípio da igualdade expresso no artigo 13.° da Constituição c a sua aplicação particular no que toca ao direito à protecção da saúde, que consta do n." 2 do seu artigo 64.° (princípio da universalidade) — inconstitucionalidade material. De acordo com entendimento generalizado a apreciação do prin-
(") Nesta linha de considerações poderiam justificar-se taxas moderadoras só para os beneficiários da Previdência relativamente a consultas externas c meios auxiliares de diagnóstico dos hospitais oliciais com o objectivo de desviar o seu consumo nos hospitais, por estas áreas já estarem cobertas no sistema próprio que lhes c aplicável nos Serviços Médico--Sociais. Mas será admissível fazê-lo, diserimiiiando-os dos utentes abrangidos pelos subsistemas de saúde relativamente a áreas e prestações de cuidados não cobertos pulo esquema dos SMS?
Admite-se também que num sistema dc pagamento universal de taxas moderadoras se estabeleçam isenções relativamente a determinados utentes em precária situação económica com base no principio dc compensação ou igualização da situação económica, harmónico com o principio da igualdade social ou dc facto.
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cípio da igualdade na sua projecção normativa ou já de aplicação concreta exigiria não só a tutela idêntica de situações de base igual (*3) como o tratamento desigual de situações desiguais, «de modo a que a disciplina jurídica prescrita seja igual quando uniformes as condições objectivas das previsões reguladas e desigual quando falte tal uniformidade» (**).
15 —Taxas moderadoras dos Serviços Médico--Sociais.
As denominadas taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais constituem um desenvolvimento ou actualização do regime de comparticipação de consultas iniciado em 1950, alterado em Janeiro de 1971, revisto pelos despachos n.us 57/80 e 58/80 e novamente alterado por vários despachos sem número do Ministro dos Assuntos Sociais datados de 18 de Janeiro de 1982 {Diário da República, 2? série, n." 25, de 30 de Janeiro de 1982) (45).
A instituição de comparticipações ou taxas moderadoras nos Serviços Médico-Sociais não constituem realidade que vá buscar o seu fundamento legal ao artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde, nem devem ser apreciados num contexto de Serviço Nacional de Saúde, ele próprio comi nativo da integração progressiva dos esquemas de protecção na doença privativos do sector de activdades (cf. artigo 59." da Lei n.u 56/79) dentro daquele Serviço Nacional à medida que a sua estrutura entre em funcionamento nos vários distritos.
Estas comparticipações ou taxas foram criadas num contexto legal anterior à Constituição de 1976, no sistema do antigo regime da Previdência, em que a prestação de cuidados de saúde se considerava como um dos aspectos cobertos pelo regime de Segurança Social lato sensu.
O seccionamento dos direitos à Segurança Social (artigo 63.°) e do direito à saúde (artigo 64.°)
(") Cf. Vital Moreira/Canotilho — Constituição da República Portuguesa, pp. 68-69:
O princípio da igualdade contém uma directiva essencial dirigida ao próprio legislador: trata por igual aquilo que é essencialmente igual e desigualmente «quilo que é essencialmente desigual. A qualificação das várias situações como iguais ou desiguais depende do carácter idêntico ou distinto dos seus elementos essenciais. Do que se trata, desde logo, é de uma proibição do arbítrio legislativo, ou seja, de uma inequívoca falta objectiva de apoio material-constitucional para a diferenciação ou não diferenciação efectuada pela medida legislativa.
(") Vejam-se, neste sentido, pareceres n.°" 1/76, 2/77 (vol. i, p. 5, e vol. li, p. 27) e H/78 (vol. v, p. 105) da Comissão Constitucional, onde também se defende que as diferenciações de tratamento de situações aparentemente iguais sc hão-de justificar, no mínimo, por qualquer fundamento material ou razão de ser que se não apresente arbitrária ou desrazoável, por isto ser contrário à justiça e, portento, à igualdade [...) a exigência do preenchimento de objectivos impostos pela Constituição ou outras razões imporão, por vezes, que a lei não seja aparentemente igual para todos os cidadãos, desde que tais desvios aparentes se não possam apresentar como expressão de privilégios ou de encargos ligados às pessoas como tais.
(") Cf. preâmbulo do Despacho n.° 57/80.
operado pela Constituição —com regimes e na-tureza diferenciados — só teve, até ao momento, como consequência a separação das estruturas de apoio médico e a criação dos Serviços Médico--Sociais (cf. artigo I.° do Decreto-Lei n.° 17/77, de 12 de Janeiro), que passaram a estar dependentes da Secretaria de Estado da Saúde, com vista à sua integração no futuro Serviço Nacional de Saúde. Toda a matéria do regime do acesso e exercício do direito à prestação de cuidados de saúde continua a ter a sua tutela legal em dispositivos legais anteriores à Constituição de 1976.
Nesta linha de considerações deve enxertar-se a apreciação das taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais que não constituem propriamente um desenvolvimento da Lei do Serviço Nacional de Saúde nem uma execução do disposto no artigo 64.°, n.° 2 da Constituição, mas antes um regime transitório, cuja subsistência só é permitida por falta de adequada execução da Lei do Serviço Nacional de Saúde. Embora os Serviços Médico--Sociais revistam a natureza de serviços públicos dotados de personlidade jurídica e autonomia administrativa (cf. artigo 1.° do Decreto-Lei n.u 12/77, de 7 de Fevereiro) e o respectivo pessoal esteja já neste momento abrangido pelo estatuto em vigor para os funcionários públicos (cf. artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 124/79, de 10 de Maio) a sua não integração formal no esquema do Serviço Nacional de Saúde impossibilita a aplicação do princípio da gratuitidade que é característica só reconhecida pela Constituição ao Serviço Nacional de Saúde. Aliás, a não integração dos Serviços Médico-Sociais no sistema do Serviço Nacional de Saúde nem sequer poderá ser qualificada de inconstitucionalidade por omissão já que, estando em vigor a Lei do Serviço Nacional de Saúde prevista no artigo 64.°, n.° 2, da Constituição, quando muito o que poderá dizer-se é que estamos perante uma ilegalidade por omissão ou uma ausência de regulamentação de uma lei em vigor.
Em face de tudo o exposto, afigura-se-nos que o sistema de taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais não pode ser apreciado à luz do princípio da gratuitidade consagrado no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição, constituindo resquícios de legislação anterior à sua vigência que nem sequer poderá ser arguida de inconstitucionalidade superveniente em virtude daquela característica constitucional ter sido conferida apenas num contexto de Serviço Nacional de Saúde e não a todos os sistemas vigentes na altura em que a Constituição foi publicada.
Termos em que se entende não levantar a questão relativa à inconstitucionalidade das taxas moderadoras ou comparticipações dos Serviços Médico-Sociais.
16 — Antes de concluir, caberá ainda analisar de forma específica alguns aspectos relacionados com o processo de arguição das ilegalidades e inconstitucionalidades já analisadas.
16.1 — Atrás concluiu-se peia conformidade da Lei n.Q 56/79 (Lei do Serviço Nacional de Saúde)
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com a Constituição e pela desconformidade dos despachos relativos às tabelas de preços dos hospitais e taxas moderadoras dos hospitais, quer com a Constituição, quer com a lei.
Nalguns casos, como veremos a seguir, há violação simultânea, quanto aos mesmos aspectos, de normas constitucionais e de normas da Lei do Serviço Nacional de Saúde conformes com a Constituição; noutros, apenas violação de normas da Lei do Serviço Nacional de Saúde.
Assim:
Despacho relativo às tabelas de preços.
A filosofia em que assenta este despacho, que baseia as tabelas de preços nos custos reais viola simultaneamente o princípio da gratuitidade constante do artigo 64.°, n." 2 da Constituição e o artigo 7.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde (violação de lei de fundo).
.0 tratamento desigual estabelecido como privilégio para os beneficiários dos subsistemas viola simultaneamente o princípio da universalidade estabelecido no artigo 64.°, n.° 2, dá Constituição e o artigo n." 1 da Lei n.° 56/79 (violação de lei de fundo).
A discriminação contida no mesmo despacho quanto à não execução do regime de paridade de tratamento dos beneficiários de esquemas de protecção na doença privativos de sector de actividades viola apenas o disposto no artigo 59.° da Lei do Serviço Nacional de Saúde (violação de lei de fundo).
Despacho sobre taxas moderadoras dos hospitais.
A inclusão neste despacho de matérias relativas ao exercício do direito e acesso às prestações de saúde viola o disposto no artigo 54.°, n.° 1, conjugado com o artigo 65.°, n." 1, da Lei n.° 56/ 79, que determinou dever a definição desse regime constar de decreto-lei (violação de lei de forma). Há também violação do disposto no artigo 201.°, n." 1, alínea c), da Constituição na medida em que dispõe ser o decreto-lei a forma típica de desenvolvimento dos princípios ou bases gerais dos regimes contidos em leis.
Pode também invocar-se que este despacho viola o espírito do sistema da Lei do Serviço Nacional de Saúde por a fixação das taxas moderadoras estar desligada da execução cabal da lei nomeadamente quanto à implantação das estruturas adequadas (artigos 24." a 43."). entrada gradual em funcionamento nos distritos mais carenciados (artigo 58.°) e integração dos beneficiários do regime geral da previdência no sistema geral,, à medida que as estruturas do Serviço Nacional de Saúde entrem em funcionamento (artigo 59.") — violação de lei de fundo.
A fixação de taxas moderadoras com características fiscais e de verdadeiros preços viola o princípio da gratuitidade estabelecido no artigo 7." da Lei do Serviço Nacional de Saúde (violação de lei de fundo) e o princípio da gratuitidade previsto também no artigo 64.", n.° 2, da Constituição.
O regime fixado para o pagamento daquelas taxas, com carácter discriminatório entre beneficiários da Previdência e independentes de um lado, e beneficiários de subsistemas de saúde, de outro, viola simultaneamente o princípio da universalidade estabelecido no artigo 7.° da Lei n.° 56/ 79 (violação de lei de fundo) e no artigo 64.°, n.° 2, da Constituição.
Nos casos erh que os vícios assumem a natureza mista de inconstitucionalidade e ilegalidade, entende-se que o segundo vício será convolável no primeiro, pela sua maior relevância.
Nos restantes casos, em que há apenas ilegalidade, e dado não existir, no nosso contencioso administrativo, o sistema da fiscalização abstracta da ilegalidade (a fiscalização incide sobre actos e exige-se sempre interesse directo, pessoal e legítimo), entende-se que só por via de recomendação ao Ministro competente tais aspectos poderão ser expostos. ,. '
16.2 — No caso concreto em apreciação também não será de colocar o problema da inconstitucionalidade indirecta dos despachos dado que neste caso não há lei interposta, ela própria violando também a Constituição.
Os despachos em causa incluem-se no conceito de «quaisquer normas» utilizado no artigo 281.°, n,° 1,-da Constituição por revestirem características de generalidade e abstracção (cf. pareceres n."-19/79, vol. (x, p. 53. e 6/78, vol. iv, p. 303. da Comissão Constitucional).
17 — Conclusão e propostas. 17.1 — De todo o exposto, há que concluir o seguinte:
a) O despacho do Ministro dos Assuntos Sociais relativo à fixação de tabelas de preços nos hospitais tendo como base os custos reais apurados nos estabelecimentos hospitalares viola o disposto no n.° 2 do artigo 64." da Constituição (princípio da gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde) pela incompatibilidade lógica existente na fixação de preços num sistema gratuito (inconstitucionalidade material). O mesmo despacho ao estabelecer nos seus n.os 5 e 6 um regime diferenciado para os beneficiários dos subsistemas de saúde, em confronto com os restantes utentes, dado aqueles nada pagarem e o custo integral das prestações ser debitado aos subsistemas respectivos, viola também o princípio da universalidade estabelecido no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição (inconstitucionalidade material).
b) O despacho do Ministro dos Assuntos Sociais, relativo à fixação de taxas moderadoras nos hospitais viola o disposto no artigo 201.°, n.° 1, alínea c), da Constituição (inconstitucionalidade formal) por nele se estabelecerem normas do regime legal respeitante ao exercício do direito e acesso às prestações de cuidados de saúde, cuja consagração deverá revestir o formalismo de de-creto-Ici.
O mesmo despacho, ao estabelecer pagamentos para a prestação de cuidados de saúde que, nuns casos, revestem a natureza de taxa tributária (inscritos na Segurança Social e independentes) e, noutros, a natureza dc verdadeiros preços basea-
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dos em custos reais (beneficiários de subsistemas de saúde), viola o princípio da gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde previsto no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição (inconstitucionalidade material).
A dicotomia estabelecida no mesmo despacho entre utentes que pagam laxas moderadoras e utentes que nada pagam (por o custo total ser suportado por um terceiro garante) viola o princípio da igualdade estabelecido genericamente no artigo 13." da Constituição (inconstitucionalidade material), bem como a feição específica daquele princípio expresso no princípio da universalidade no acesso às prestações de saúde constante do n." 2 do artigo 64.° da Constituição (inconstitucionalidade material), dado que, se as razões invocadas para o estabelecimento das taxas tem como base a contenção e racionalização de consumos, deveriam aquelas ser aplicadas sem discriminação a todos os utentes.
c) Os despachos relativos à fixação de taxas moderadoras dos Serviços Médico-Sociais (ou das chamadas comparticipações) correspondem a actualizações ou desenvolvimentos de um sistema que vigora desde 1950, constituindo um resquício de um sistema transitório ainda não integrado no esquema do Serviço Nacional de Saúde, sendo o carácter de gratuitidade apenas reconhecido a este Serviço. Por outro lado, a manutenção daquele regime transitório não enferma de inconstitucionalidade superveniente em virtude de o princípio da gratuitidade não ter sido constitucionalmente atribuído a todos os sistemas de saúde existentes, mas apenas ao SNS.
Nestes termos, propomos a não arguição de inconstitucionalidade destes despachos.
17.2 —Em face do exposto, propõe-se que pelo Provedor de Justiça seja solicitada ao Conselho da Revolução a apreciação e declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, dos despachos do Ministro dos Assuntos Sociais de 18 de Janeiro de 1982 relativos à fixação de tabelas de preços nos hospitais e à fixação de taxas moderadoras, com base nos preceitos constitucionais violados referidos em 17.1, alínea a), e 17.1, alínea b).
3 — Concordando com esta apreciação, o Provedor, cm 8 de Outubro de 1984, solicitou ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade dos despachos em causa, nos moldes a seguir transcritos:
1." Os despachos em causa incluem-se no conceito de «quaisquer normas», utilizado no artigo 281.°, n.° 1, alínea a), da Constituição, por revestirem características de generalidade e abstracção (cf. Pareceres da Comissão Constitucional n.08 6/78, vol. iv, p. 303, e 19/79, vol. ix, p. 53).
2." O artigo 64.°, n." 2, da Constituição estabelece que o direito à protecção da saúde é realizado pela criação de um Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito; o mesmo carácter gratuito é mantido na Lei n.° 56/79. de 15 de Setembro, cujo artigo 7." permite, contudo, o estabelecimento de taxas moderadoras diversificadas tendentes a racionalizar a utilidade das prestações.
3.° Os despachos dos Ministros dos Assuntos Sociais de 18 de Fevereiro de 1982 e da Saúde de 27 de Fevereiro de 1984 fixam tabelas de preços das várias intervenções hospitalares (internamentos em enfermarias, consultas externas, meios complementares de diagnóstico e urgências), com base em custos reais (cf. ponto 7 do despacho de 18 de Fevereiro de 1982); tal fixação de preços viola o disposto no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição (princípio da gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde) pela incompatibilidade lógica decorrente da fixação de preços num sistema gratuito, inconstitucionalidade material (cf. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. i, pp. 280-286).
O mesmo despacho do Ministro dos Assuntos Sociais de 18 de Fevereiro de 1982. prevê, nos seus n.os 5 e 6, um regime diferenciado para os beneficiários dos subsistemas de saúde, em confronto com os restantes utentes, donde resulta que os primeiros nada pagam, por o custo integral ser debitado aos subsistemas respectivos, o que também viola o princípio da universalidade estabelecido no n.° 2 do artigo 64.° da Constituição— inconstitucionalidade material (cf. António da Silva Leal, Estudos sobre a Constituição, vol. li, p. 364).
4.° O despacho do Minitro dos Assuntos Sociais de 18 de Janeiro de 1982, que fixou taxas moderadoras para os utentes dos hospitais centrais, distritais, gerais e especializados, tem como objectivo assinalado no seu preâmbulo «reservar as áreas hospitalares aos doentes que efectivamente delas careçam», o que poderia indicar no sentido de o mesmo se destinar a estabelecer as taxas moderadoras previstas no artigo 7.° da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro, tendentes a racionalizar a utilização das prestações.
5." Ê geralmente admitida a compatibilização entre a gratuidade dos sistemas de saúde e a fixação de taxas moderadoras, desde que estas tenham como objectivo principal a contenção dos consumos (sobre a admissibilidade de taxas moderadoras nos vários sistemas de saúde (v. Jean Maric Auby, Le Droit de la Santé, pp. 212-213, Pierre Denis, Dro/7 de la Securité Sociale, p. 297, Jean Kervasdové, La Santé Rationée, p. 136, e Jacques Doublet, Securité Sociale, p. 736). Nos sistemas de saúde gratuitos, a taxa moderadora deve ser qualificada como uma «prestação coactiva de natureza não tributária» (cf., sobre o conceito, Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, vol. i, p. 40), dada a ausência da finalidade principal de angariar receitas públicas (ou por via de carácter compensatório de despesas feitas ou por via de comparticipação em custos).
6.° A análise do regime constante do despacho em apreciação e dos motivos que foram invocados para o estabelecimento de taxas moderadoras (cf. discussão do Orçamento Geral do Estado para 1982 —proposta de lei n.° 73/II— Intervenção do Ministro dos Assuntos Sociais Dr. Luís Barbosa, Diário da Assembleia da República, l.a série, n.° 27, de 15 de Dezembro de 1981, pp. 946-951) conduz à conclusão de que aquelas
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taxas revestem, nuns casos, a natureza de «taxa tributária» (situação dos inscritos na segurança social e independentes), e, noutros, a natureza de «verdadeiros preços» baseados em custos reais (situação dos beneficiários dos subsistemas), cujo fim principal consiste, no primeiro caso, na angariação de receitas públicas mediante comparticipação dos interessados e, no segundo, no pagamento do preço de um serviço com base em custos reais, situações em ambos os casos incompatíveis com o princípio de gratuitidade do Serviço Nacional de Saúde previsto no artigo 64.°, n.° 2, da Constituição — inconstitucionalidade material (sobre os critérios distintivos entre «preços» e «taxas», v. António de Sousa Franco, Finanças Públicas e Direito Financeiro, pp. 762-763).
7.° Aliás, a conclusão de que o despacho de fixação das taxas moderadoras não teve em vista pôr em execução a Lei do Serviço Nacional de Saúde, mas antes tutelar determinada situação conjuntural de falta de receitas públicas, resulta ainda mais clara pelo facto de o mesmo despacho aparecer desligado do espírito do sistema da Lei do Serviço Nacional de Saúde, que exigiria a publicação anterior das normas do regime legal respeitante ao exercício do direito e acesso às prestações de unidades de saúde (artigo 54.°, n.° 1, da Lei n.° 56/79, de 15 de Setembro); a ausência de tais normas legais implicou que o despacho, em contravenção do disposto no artigo 201.°, n.° l, alínea c), da Constituição (que exige a forma de decerto-lei para desenvolvimento de bases gerais dos regimes contidos em leis), tivesse a necessidade de incluir não só a fixação dos montantes das taxas em concreto mas também toda a necessária matéria do regime de acesso às prestações, o que determina inconstitucionalidade formal do despacho.
8." A dicotomia estabelecida no mesmo despacho respeitante a taxas moderadoras entre utentes que as pagam efectivamente (os inscritos na Segurança Social e os independentes) e os utentes que nada pagam (os beneficiários dos subsistemas, em que o custo total das prestações de saúde é facturado directamente e efectivamente suportado por um terceiro garante) viola o princípio da igualdade estabelecido genericamente no artigo 13.° da Constituição (inconstitucionalidade material), bem como a formulação concreta deste principio em matéria de prestações de saúde, expressa no princípio da universalidade do acesso, previsto no artigo 64.", n.° 2, da Constituição, o que determina, por esse motivo também, a inconstitucionalidade material do despacho.
Nestes termos e nos demais de Direito aplicáveis, requeiro a V. E\.u a apreciação e declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, dos despachos relativos à fixação de tabelas de preços nos hospitais (despachos do Ministro dos Assuntos Sociais de 18 de Janeiro dc 1982 c do Ministro da Saúde de 27 de Fevereiro de 1984) e à fixação dc taxas moderadoras no acesso à prestação de unidades hospitalares (despacho do Ministro dos Assuntos Sociais de 18 de Janeiro de 1982).
13 — Direitos de petição e de defesa em processo disciplinar militar
Processo n.° 83/R-1710-0M4-B
1 — A análise de uma queixa apresentada por oficial da Guarda Fiscal que fora punido disciplinarmente constituiu ensejo para uma apreciação cuidada das normas do Regulamento de Disciplina Militar cuja aplicação nesse caso tivera lugar.
Esta ponderação teve sobretudo em vista estudar a compatibilidade de tais regras com os direitos de petição e de defesa constitucionalmente consagrados.
2 — Sobre o assunto elaborou o assessor encarregado do processo o seguinte parecer:
1 — Dispõe o artigo 74." do Decreto-Lei n.° 142/77, de 9 de Abril, que:
A todo o militar assiste o direito de queixa contra superior quando por este for praticado qualquer acto dc que resulte para o inferior lesão dc direitos prescritos na lei e nos regulamentos.
Esta norma não é mais do que a concretização dá contida no artigo 52.", n.° 1, da Constituição que estabelece que:
Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individualmente [...] a quaisquer autoridades reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos [...J
Porém, o artigo 76." daquele diploma legal estatui que:
Quando manifestamente se reconheça que não houve fundamento para a queixa [...) será o militar que tiver usado deste meio punido disciplinarmente [...]
Esta norma, pelo receio que pode causar ao militar de instauração dc ulterior processo disciplinar movido contra si, é de molde a limitar o exercício do direito de queixa.
Deste modo, entendemos que a mesma está ferida de inconstitucionalidade material, por ofensa do artigo 52.ü. n.° 1, do diploma fundamental.
2 — A natureza e os fins de alguns tipos de penas criminais e até medidas de segurança ajudam a caracterizar as sanções não criminais como as penas administrativas e em especial as penas disciplinares (Eduardo Correia, Direito Criminal, vol. i, pp. 20 e seguintes e pp. 35 e seguintes). Estas últimas estão, até, numa relação mais íntima com as penas criminais, como consequência histórica de originariamente o direito disciplinar ter constituído uma parte do direito penal especial. Mantêm-se, ainda hoje, no direito disciplinar militar certas penas do tipo criminal (sanções privativas da liberdade).
Ora, se pode ser defendido — c é o entendimento maioritário da doutrina nacional e estrangeira — que o princípio da não retroactividade em matéria penal {nullum crimen sine lege et nulla poena sine lege) não pode ser estendido
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automaticamente ao direito disciplinar, quer porque a infracção disciplinar não é obrigatoriamente tipificada, quer porque, em princípio, a infracção disciplinar pode ser punida com qualquer pena da escala legal, consoante.o respectivo grau de gravidade (Parecer da Comissão Constitucional n." 3/78, Pareceres, vol. iv, p. 225; Pietro Grasso, // principio nullutn crimen sine lege nella costituzione, Milão, 1972, p. 311), fica uma margem bastante extensa da aplicabilidade do direito penal e consequentemente do processo penal ao direito disciplinar.
Nesta linha escreveram Vital Moreira e Gomes Canotilho, A Constituição da República Portuguesa Anotada, p. 468:
Ao direito fundamental de audiência e defesa em processo disciplinar, devem ser aplicadas, na medida do possível, as regras de defesa constitucionalmente estabelecidas para o processo penal. Assim deverá ser reconhecido ao arguido o direito de assistência de defensor (cf. artigo 32.°, n.° 3) [..J
O artigo 82." do DecretO-Léi n.° 142/77, ao dispor que «O processo disciplinar não admite qualquer forma da representação, excepto nos casos de incapacidade do arguido, por anomalia mental ou física, bem como dê doença que impossibilite de organizar a defesa, casos em que não havendo defensor escolhido, será nomeado pelo chefe competente um oficial, como defensor oficioso», viola a norma do artigo 32.", n.° 3, da Constituição, pelo que está ferido de inconstitucionalidade material.
3 — A aplicação de sanções no âmbito do Decreto-Lei n.° 142/77 fáz-se por Via administrativa — sendo constitucional, por força das normas do artigo 27.", n."s 2 e 3, alínea c), da Constituição — cominação de penas de prisão disciplinar.
O artigo 20.°, n.° 2, do diploma fundamental, consagra o direito de acesso aos tribunais para defesa, dos direitos.
Em desenvolvimento deste princípio, o artigo 268.°, n." 3, da Constituição, vein estatuir que:
Ê garantido aos interessados recurso contencioso, com fundamento em ilegalidade, contra quaisquer actos definitivos e executórios [...]
É, pois, inequívoco que a Constituição admite o recurso contencioso contra os actos administrativos definitivos e executórios que, com base em ilegalidade, tenham aplicado sanções disciplinares a militares.
E a referência feita na.'última parte do artigo 27.°, n.° 3, alínea'c)', à garantia de recurso para o tribunal competente da iriedida de prisão disciplinar imposta a militar — forçosamente por acto administrativo e não por sentença judicial condenatória— reporta-se ao recurso contencioso previsto no artigo 268.°, n.° 3.
Dispõe o artigo 114.° do Decreto-Lei n.° 142/77, no seu n.° 1, que:
Quando a reclamação não for no todo ou em parte julgada procedente, assiste ao reclamante o direito de recorrer para o chefe imediato da autoridade que o puniu, no prazo de 5 dias, contados daquele em que foi notificado da decisão de indeferimento.
O artigo 119.°, n.° 1, vèm estabelecer que:
O chefe que julgar o recurso decidirá se o mesmo procede, através de despacho fundamentado, exarado no próprio processo, podendo revogar, alterar ou manter a decisão recorrida no todo ou em parte.
E o n.° 2 do mesmo artigo vem referir que:
A decisão proferida nos termos do número anterior é definitiva.
Com a imposição de um único grau hierárquico de recurso, fica, em regra, fechada a cadeia que conduziria à prática, por um chefe de estado-maior, de um acto definitivo e executório em matéria disciplinar, o único passível de recurso contencioso peio Decreto-Lei n.° 142/77. Com efeito, este diploma apenas vem permitir o recurso contencioso nos casos previstos no artigo 120.°, norma que dispõe que:
Das decisões definitivas e executórias dos chefes dos estados-maiores dos ramos das Forças Armadas proferidas em matéria disciplinar cabe recurso contencioso para o Supremo Tribunal Militar, com fundamento em ilegalidade.
. Assim, teremos de concluir que a norma do artigo U9.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 142/77 é materialmente inconstitucional por violar o artigo 20.°, n.° 2, e a última parte do artigo 27.°, n.° 3, alínea c), da Constituição da República Portuguesa.
4 — Assim, propomos que seja requerida ao Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 281.°, n.° 1, alínea a), da Constituição da República, a declaração de inconstitucionalidade das referidas normas do Decreto-Lei n.° 142/77, de 9 de Abril.
3 — Concordando com esta argumentação, o Provedor, em 22 de Outubro de 1984, pediu ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade dos artigos 76.°, 82." e 119.°, n.° 2, do Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 142/77, de 9 de Abril, nos termos seguintes:
1.° Dispõe o artigo 74.° do Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 142/77, de 9 de Abril, que:
A todo o militar assiste o direito de queixa contra superior quando por este for praticado, qualquer acto de que resulte para o inferior lesão de direitos prescritos na lei e nos regulamentos.
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Esta norma concretiza a contida no artigo 52.°, n.° 1, da Constituição que estabelece que:
Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individualmente [...] a quaisquer autoridades reclamações ou queixas para a defesa dos seus direitos [...]
Porém, o artigo 76.° daquele diploma legal estatui que:
Quando manifestamente se reconheça que não houve fundamento para a queixa [...] será o militar que tiver usado deste meio punido disciplinarmente [...]
A presente norma, pelo receio que pode causar ao militar de ver instaurado contra si ulterior processo disciplinar, é de molde a limitar o exercício do direito de queixa.
Assim, estará a mesma ferida de inconstitucionalidade material, por ofensa do artigo 52.°, n.° 2, do diploma fundamental.
2.° Estabelece o artigo 82.° do mesmo Regulamento que:
O processo disciplinar não admite qualquer forma de representação, excepto nos casos de incapacidade do arguido, por anomalia mental ou física, bem como de doença que o impossibilite de organizar a defesa, casos em que, não havendo defensor esco-colhido, será nomeado pelo chefe competente um oficial, como defensor oficioso.
Muito embora se venha entendendo maioritariamente nas doutrinas nacional e estrangeira que o princípio de não retroactividade em matéria penal (nullum crímen sine lege et nulla poena sine lege) não pode ser automaticamente estendido ao direito disciplinar, fica uma margem bastante extensa de aplicabilidade dos direitos penal e processual penal àquele direito, designadamente em matéria de direito de assistência de defensor.
Deste modo, a norma do artigo 82.° do Regulamento de Disciplina Militar, está em contradição com o disposto no artigo 32.°, n." 3, da Constituição da República, pelo que está do mesmo modo ferida de inconstitucionalidade material.
3.° Lê-se no artigo 114.", n." 1, do Regulamento de Disciplina Militar que:
Quando a reclamação não for no todo ou em parte julgada procedente, assiste ao reclamante o direito de recorrer para o chefe imediato da autoridade que o puniu, no prazo de 5 dias, contados daquele em que foi notificado da decisão dc indeferimento.
O artigo 119.", n.° 1, vem estabelecer que:
O chefe que julgar o recurso decidirá se o mesmo procede, através de despacho fundamentado, exarado no próprio processo, podendo revogar, alterar ou manter a decisão recorrida no todo ou em parte.
Eon'2 do mesmo artigo refere que:
A decisão proferida nos termos do número anterior é definitiva.
O Regulamento de Disciplina Militar apenas permite o recurso contencioso nos casos previstos no artigo 120.°, o qual dispõe que:
Das decisões definitivas e executórias dos chefes dos estados-maiores dos ramos das Forças Armadas proferidas em matéria disciplinar cabe recurso contencioso para o Supremo Tribunal Militar, com fundamento em ilegalidade.
Ora, a não ser que a decisão caiba a um chefe de estado-maior, fica vedado pela norma do artigo 119.", n.° 2, do diploma em causa o recurso contencioso do acto de julgamento do recurso hierárquico, pelo que a mesma é materialmente inconstitucional por contradição com os artigos 20.°, n.° 2, e 27.°, n.*> 3, alínea a), última parte do diploma fundamental.
Em conclusão:
Os artigos 76.ü, 82." e 119.°, n." 2, do Regulamento de Disciplina Militar, aprovado pelo De-creto-Lei n.° 142/77, de 9 de Abril, deverão ser declarados por esse venerando Tribunal, feridos de inconstitucionalidade material pelos fundamentos acima expostos, declaração essa com força obrigatória geral.
C) Evolução de pedidos de declaração de inconstitucionalidade de anos anteriores
1 — Exoneração e transferência de trabalhadores da função
pública nomeados no exercício de poder discricionário
Processo n.° 8Q7R-1747-DI-50-A-2
O Tribunal Constitucional, pelo seu Acórdão n.° 84/ 84, de 24 de Julho de 1984, decidiu não se pronunciar pela inconstitucionalidade do Decreto-Lei n." 356/ 79, de 31 de Agosto (Relatório do Provedor de Justiça de 1983, cap. iii-B—1), que admitira a exoneração e transferência, por mera conveniência dc serviço, c sem necessidade de fundamentação concreta, dos trabalhadores da função pública nomeados no exercício de poderes discricionários.
2 — Limitações à afixação de propaganda politica
Processo n.° 81/R-2092-DI-25-B
Em 11 de Setembro de 1984, foi publicado —no Diário da República, 1." série, n." 211 — o Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 74/84, de 10 de |ulho deste ano, declarando inconstitucional o n." 2 da Postura de 21 de Fevereiro de 1978, da Câmara Municipal de Vila do Conde, estabelecendo restrições à afixação de propaganda política na área deste concelho (Relatório de 1983, cap. iii-B-2).
3 — Extinção da Sociedade Nacional dos Armadores de Pesca
de Arrasto (SNAPA)
Processo n.° 82/R-lB27-DJ-3-A
O Acórdão n.° 11/84 do Tribunal Constitucional, de 7 de Fevereiro do mesmo ano — publicado no Dia-
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rio da República, 2.a série, n.° 106, de 8 de Maio seguinte—, não se pronunciou pela inconstitucionalidade do Decreto-Leí n.° 161/82, de 7 de Maio, que extinguira a SNAPA (Relatório de 1983, cap. iu-B-3).
4 — Aplicação do factor residência como critério de preferência em concursos para clínicos gerais
Processo n.° 82/1715-DI-34-8
Através do Acórdão n.° 44/84, de 22 de Maio deste ano — publicado no Diário da República, 2.a série, n.° 159, de 11 de Julho seguinte—, o Tribunal Constitucional não aceitou o pedido de declaração de inconstitucionalidade que o Provedor formulou quanto às regras do artigo 36." do Decreto-Lei n.° 310/82, de 3 de Agosto, que atribuem à residência a natureza de factor preferencial nos concursos para clínicos gerais (Relatório de 1983, cap. iit-B-4).
S — Regime jurídico aplicável à Universidade Livre, S. C. A. R. L.
Processo n.° 82/R-1732-DI-35-B
O Tribunal Constitucional, no seu Acórdão n.° 38/ 84, de 11 de Abril — publicado no Diário da República, 1." série, n.° 105, dc 7 de Maio— declarou inconstitucionais vários preceitos do Decreto-Lei n.° 426/80, de 30 de Setembro, por violação da liberdade de associação (Relatório de 1983. cap. iii-B-5)
6 — Atribuição, à empresa pública EPAC, de diferencieis de preço de venda de cereais
Processo n.° 82/R-2212-OI-47-B
Discordando da posição do Provedor, o Tribunal Constitucional — Acórdão n.° 7/84, de 24 de Janeiro deste ano, publicado no Diário da República, 2.3 série, n.° 102, de 3 de Maio seguinte— não se pronunciou no sentido da inconstitucionalidade dos preceitos que, inseridos nos artigos 25.° c 27.° do Decreto-Lei n." 70/ 78, de 7 de Abril, regulam a atribuição, à empresa pública EPAC, de diferenciais dc preço de venda de cereais (Relatório de 1983, cap. m-B-7).
7— Contribuição fiscal fixa apBcada a cada medicamento adquirido com base em receituário dos Serviços Módico-•Sociais
Processo n.° 82/IP-123-Dh48-A
Em 19 de Janeiro de 1984 —Diário da República, 1.a série, n.° 16— foi publicado o Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 24/84, de 23 de Novembro de 1983, que, como já mencionado no Relatório dc 1983 (cap. ni—B—8), declarou a inconstitucionalidade dos n.05 1.° e 2.° da Portaria n.° 1023-B/82, de 6 de Novembro, na parte em que instituíram uma contribuição fiscal fixa a pagar por cada medicamento comprado com base em receita passada por clínicos dos Serviços Médico-Sociais.
8 — Encargos com instalações e equipamento das delegações
escolares
Processo n.° 82/R-1199-01-20
Em 31 de Janeiro de 1984 —Diário da República, 2." série, n.° 26 — foi publicado o Acórdão n.° 17/83, de 3 de Novembro de 1983, no qual o Tribunal Constitucional decidiu não tomar conhecimento do pedido de declaração de inconstitucionalidade do n.° 2 do artigo 44.° do Decreto-Lei n.° 211/81, de 13 de Julho, que fizera incidir sobre as autarquias locais os encargos com a instalação e equipamento das delegações escolares, visto esta norma ter, entretanto, sido revogada (Reiatórios de 1982. p. 71, e de 1983, cap. ni-G).
9 — Regime de classificação de serviço dos trabalhadores da
função pública
Processo n.° 81/DI-11-A-2
Em 19 de Abril de 1984 —Diário da República, 2." série, n." 92 — foi publicado o Acórdão do Tribunal Constitucional n.° 25/83, de 29 de Novembro, onde este decidiu não sc pronunciar pela inconstitucionalidade do Decreto Regulamentar n.° 57/80, de
10 de Outubro, respeitante ao regime de classificação de serviço do pessoal da função pública (Relatório de 1981, p. 31).
CAPÍTULO IV
Principais recomendações
A) Recomendações legislativas
I) Assunto: Vencimento de exercício. Classificação de comportamento exemplar
Processo n." 83/R-1544-A-2
Secretário de Estado da Administração Pública:
O artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1933, concede ao funcionário, em situação de doença prolongada, que tenha «comportamento exemplar e boas informações de serviço, prestadas pelos respectivos chefes», a possibilidade de requerer o abono do vencimento de exercício durante um período, excedente a 30 dias, que corresponda a tantos dias quantos forem os anos de serviço multiplicados por 30.
Recentemente, uma reclamação apresentada alertou--me para o facto de, em determinado serviço público, não haver um critério uniforme acerca da atribuição de «comportamento exemplar», tendo-se passado a considerar exclusivamente como merecedores desse qualificativo os funcionários classificados com Muito bom, quando, anteriormente, bastava a classificação de Bom.
Confirmada a alteração do critério, só se pode concluir que a disposição permita necessariamente um certo grau de subjectivismo.
Nestes termos, tendo conhecimento de que o sistema de protecção dos funcionários na doença se encontra em estudo, para revisão, afigura-se-me de sugerir que seja analisado o teor do referido artigo 9.°, de modo a que a disposição correspondente, se vier a ser elaborada, tenha uma forma mais objectiva.
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tt) Assunto: Liberdade condicionada. Relevância de perdão
Processo n.° 81/R-1485-B-1
Ministro da Justiça:
Em processo aberto neste Serviço, constatei que que havia disparidade de critério, nos tribunais de execução de penas, quanto à relevância dos perdões na determinação de metade da pena a cumprir por um recluso para obter liberdade condicional.
Suscitei o problema à Procuradoria-Geral da República, que sobre ele emitiu o Parecer n.° 77/83, de 28 de Abril, já homologado por V. Ex.a
Sugeri ao Sr. Procurador-Geral da República que — se isso não foi feito já — seja ponderada a conveniência de, por circular, serem instruídos os magistrados do Ministério Público, designadamente os que funcionam junto dos tribunais de execução de penas, no sentido de actuarem com exacta observância da doutrina fixada pelo referido Parecer n.° 77/83.
Sem embargo, permito-me recomendar a V. Ex.° que, para o futuro, a doutrina do mesmo parecer seja considerada, em ordem à sua consagração normativa, em futura alteração ou revisão da legislação relativa ao instituto de liberdade condicional.
Jti) Assunto: Declaração dos direitos dos mimais
Processos n.05 83/R-1759-B-1 e 83/R-2334-B-1
Presidente da Assembleia da República: Não obstante Portugal não ter ainda ratificado a Declaração Universal dos Direitos do Animal, afiguram-se dignos de consagração legal os princípios da mesma constantes, pelo que me permito recomendar que nesse sentido venha a legislar-se, após audiência prévia das associações legalmente constituídas que têm como finalidade a defesa ou protecção dos animais.
Sobre o assunto tem a Liga Portuguesa dos Direitos do Animal vindo a manifestar-se junto deste Serviço.
IV) Assunto: Contribuição para o Fundo de Socorro Social
Processo n.° 82/R-2279-DI-51-A
Presidente da Assembleia da República:
Em 23 de Novembro de 1982, deu entrada neste Serviço a reclamação cuja fotocopia e documentos anexos se juntam.
Com vista a poder dar o devido seguimento ao respectivo processo, foi enviado em 1 de Fevereiro de 1983, ao Ex.mo Presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, o ofício n.° 1477. Em resposta, foi por aquele Instituto enviado o ofício n.° 1792, de 17 de Março de 1983 (juntam-se igualmente fotocópias).
Pelos esclarecimentos prestados verifica-se a injustiça relativa do sistema vigente quanto à contribuição de 10 % sobre o consumo de vinhos espumosos e licorosos e de bebidas espirituosas nos hotéis, restaurantes, cafés, cervejarias, confeitarias e estabelecimentos congéneres, visto só ser colectável nos concelhos de Lisboa, Porto, Ca.scais e Oeiras. Pelo próprio Instituto
de Gestão Financeira da Segurança Social já foram até feitas tentativas para alteração do actuai regime sem que, no entanto, haja logrado qualquer êxito.
Verifica-se, por outro lado, que a limitação de taxas relativamente a estabelecimentos situados nos referidos concelhos, já nem corresponde à razão que a determinou, pois, como o próprio Instituto também evidencia, foram entretanto surgindo novos estabelecimentos de elevada categoria noutros concelhos, o que veio tornar mais acentuada a desigualdade de tratamento tributário estabelecido pelo artigo 2.°, n.° 4 do Decreto-Lei n.° 47 500. de 18 de Janeiro de 1967, cuja aplicação ao Fundo de Socorro Social foi mantida por força da Lei n.° 19/77, de 5 de Março, emanada da Assembleia da República.
Nestes termos, afigura-se correcta a nova redacção que pelo referido Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social foi proposta, em Março de 1981, para o n.° 4 do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 47 500 e que passaria a ser do seguinte teor:
4.° 10 % sobre o consumo de vinhos espumosos, licorosos e bebidas espirituosas nos restaurantes de hotéis de 3, 4 e 5 estrelas e nos restaurantes, cafés, cervejarias, confeitarias e estabelecimentos congéneres de 2.a, 1.a e luxo, não incluídos no número anterior.
Com efeito, com essa redacção:
a) Pôr-se-á cobro à situação de injustiça relativa que hoje não tem a mínima justificação e resultante da actual redacção do n." 4 do artigo 2." do Decreto-Lei n.° 47 500;
6) Deixarão de ser abrangidos os estabelecimentos de mais baixas categorias dos concelhos até agora sujeitos à taxa do Fundo de Socorro Social, o que, além dc se tratar de medida justa e ao encontro do ratio legis determinante do normativo em questão, não importará (face à inclusão dos estabelecimentos de lodos os concelhos) diminuição de receita para o Fundo de Socorro Social, antes envolverá o seu aumento.
Pelo exposto, tenho a honra de levar à consideração da Ex.ma Assembleia da República a questão suscitada, para o efeito de ser ponderada a conveniência da alteração, nos termos propostos, da redacção do aludido n.° 4 do artigo 2.° do Decrcto-Lci n.° 47 500, mantida em vigor por força da Lei n.° 19/ 77, de 5 de Março.
V) Assunto: Documentos exigíveis a pessoas residentes em Timor
Processo n.° 83/IP-158-8-1
Ministro da Justiça:
Pendem neste serviço algumas reclamações formuladas por familiares de portugueses naturais dc Timor que se queixam de estarem impossibilitados dc receber pensões e outros benefícios a que aqueles portu-
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gueses que residem nesse território têm direito, e isso em virtude de estarem impedidos de apresentar os documentos exigidos para o efeito em Portugal, designadamente procurações devidamente autenticadas.
Assim, ouviu-se sobre o assunto o Ministério dos Negócios Estrangeiros, com vista a averiguar se no seu âmbito estará a ser considerada alguma solução para tal dificuldade.
Em resposta, foi recebida cópia da informação n.° 433/82 enviada àquele departamento pela Pro-curadoria-Gera) da República, documento cuja fotocópia se junta, na qual se conclui que só mediante diploma legislativo» adequado se torna viável dar satisfação às exiguKius das leis gerais da República que regem quanto à forma dos actos, força probatória dos documentos e respectivo ónus da prova.
Neste contexto, permito-me formular a seguinte recomendação":
Que seja providenciado no sentido de vir a ser emitido um diploma legal que consagre um sistema, destinado a suprir a impossibilidade de os naturais de Timor-Leste recorrerem às autoridades da Indonésia para efeito de dar satisfação às exigências legais relativas à forma dos actos, força probatória dos documentos e respectivo ónus da prova;
Que essa medida legislativa tenha efeitos retroactivos à data da ocupação de Timor.
VI) Assunto: Prémio d» colocação
Processo n.° 84/R-207-B-1
Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional:
1 — Deu entrada neste Serviço uma reclamação formulada pelo trabalhador a quem foi dirigido o ofício do Centro de Emprego de Lisboa de que se envia fotocópia, em que este se queixa de lhe ter sido indeferido o pedido de «prémio de colocação» com fundamento em a nova colocação ter tido lugar na mesma empresa ao serviço da qual estava quando se desempregou.
2 — Verifica-se que o indeferimento da pretensão do interessado se alicerçou na circular n." 3/DT/ DSC-AC/82 do Instituto do Emprego e Formação Profissional, de que também se anexa fotocópia, circular que veio esclarecer dúvidas suscitadas pelo n.° 2 do Despacho Normativo n.° 372/79, quando refere que:
O prémio dc colocação será atribuído a trabalhadores que se encontrem a receber o subsídio de desemprego e que pelos seus próprios meios obtenham uma nova colocação.
Assim, entende-se na aludida circular que, «quando o legislador refere 'nova colocação', não pode deixar de entender 'novo emprego' em que elementos essenciais dessa 'novidade' se reúnam, a saber: nova entidade patronal, novo local de trabalho e novo período de duração».
3 — Sucede, porem, que tal entendimento só teria força legal se constasse de despacho normativo, e isso em virtude de o Decreto-Lei n.° 445/79, de 9 de Novembro, presentemente revogado pelo Decreto-Lei
n.° 297/83, de 24 de Junho, estabelecer, no seu artigo 4.", o seguinte:
Art. 4.°—1—Ê criado um prémio de colocação a atribuir aos subsidiados que se reem-preguem pelos seus próprios meios.
2 — As condições, montantes, processamento e demais aspectos regulamentares do prémio de reemprego serão objecto de despacho normativo do Ministro do Trabalho.
Foi precisamente em execução do disposto neste n." 2 que foi emitido o Despacho Normativo n.° 372/ 79, que suscitou as dúvidas que na circular citada foram esclarecidas.
Todavia, não constando o conteúdo dessa circular de despacho normativo, afigura-se-nos que ele não pode ser aplicado aos casos concretos, sob pena de infracção do mencionado artigo 4.°, n.° 2, do Decreto--Lei n.° 445/79.
4 — Por outro lado, há que ter em atenção o facto de o despacho normativo que suscitou as dúvidas em causa ter como finalidade, segundo se infere do seu preâmbulo, estimular as iniciativas individuais tendentes à extinção da situação de desemprego e premiar o esforço dos trabalhadores na consecução desse objectivo.
Atentando, pois, naquele preâmbulo e na parte dispositiva do respectivo despacho, pode concluir-se que, com a instituição do «prémio de colocação», se pretendeu que os subsidiados no desemprego diligenciem no sentido de se reempregarem, a fim de ser obtida uma economia em matéria de concessão do subsídio de desemprego.
Ora, tal objectivo é conseguido mesmo nos casos em que o desempregado consegue colocação na empresa em que ultimamente prestou serviço.
Conclui-se, deste modo, que a ratio legis do n.° 2 do Despacho Normativo n.° 372/79 é compatível com o sentido que admite que «nova colocação» seja sinónimo de novo contrato de trabalho, independentemente de se tratar de nova empresa.
5 — E a circunstância de se ter adjectivado de «nova» o vocábulo «colocação» revela-se puramente gratuita, isto é, desprovida de qualquer intenção especial. Isto, sobretudo, quando nos detemos num caso paralelo, qual seja o do n.° 1, alínea a) do artigo 13° do Decreto-Lei n.° 183/77, de 5 de Maio. cujo teor é o seguinte:
1 — O direito ao subsídio extingue-se:
fl) Quando o novo contrato de trabalho perdure para além de 6 meses.
Reporta-se este preceito ao contrato de trabalho celebrado por um desempregado que se encontra a auferir o respectivo subsídio de desemprego.
Ora, tratando-se de um contrato de trabalho em que é parte uma pessoa na situação de desemprego, é evidente que não pode estar em causa um contrato já celebrado, pois, de contrário, o subsidiado não estaria desempregado.
Logo, tem de inferir-se que o adjectivo «novo» usado naquela alínea a) é perfeitamente irrelevante em termos de interpretação desse preceito.
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Irrelevância idêntica se regista, a nosso ver, no emprego da palavra «prova» no n.° 2 do Despacho Normativo n.° 372/79.
6— Com base nas considerações que acabam de ser expendidas, permito-me formular a seguinte recomendação:
a) Que o caso concreto seja revisto de harmonia com a orientação que acima se deixa exposta;
b) Que, a terem-se por pertinentes e adequadas as regras da circular n.° 3/DT/DSC-AC/82 do Instituto do Emprego e Formação Profissional, sejam as mesmas estipuladas em despacho normativo, de acordo com o exigido no n.u 2 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 445/79, hoje substituído pelo n.° 2 do artigo 13.°-A, introduzido no Decreto-Lei n.° 183/77, de 5 de Maio, pelo Decreto-Lei n.° 297/83.
VII) Assunto: Subsídio por morto
Processo n.° 84/IP-28-B-1
Ministro das Finanças e do Plano:
1 — A propósito de diversos processos abertos neste Serviço com base em reclamações relativas a pedidos de subsídio por morte, tem-se tomado contacto com a legislação que rege este tipo de benefício, o que nos permitiu constatar que o regime que nesta matéria vigora para os trabalhadores do sector privado se apresenta acentuadamente mais justo do que aquele que respeita aos funcionários públicos.
Assim, enquanto o artigo 97.° do Decreto n.° 45 266, de 23 de Setembro de 1963, atribui metade do subsídio por morte ao cônjuge do trabalhador e a outra metade aos descendentes ou equiparados que confiram direito ao abono de família, se houver simultaneamente uns e outros, o Decreto-Lei n.° 42 947 de 27 de Abril de 1960, estabelece que o subsídio nele instituído é concedido às pessoas de família a cargo dos servidores do Estado por eles previamente indicadas em declaração depositada no serviço processador e, na falta desta, aos seguintes familiares, de harmonia com a seguinte ordem de precedência:
1.° Cônjuge sobrevivo [...]; 2.a O mais velho dos descendentes de grau mais próximo;
2 — Neste contexto, permito-me formular a seguinte recomendação:
Que seja providenciado no sentido de, por via legislativa, se aproximar o regime do subsídio por morte que contempla os familiares dos servidores do Estado do regime que rege esse benefício do sector privado.
VHI) Assunto: Gratificação do chefia
Processo n.° 80/R-l 178-B-4
Ministro da Administração Interna:
Corre seus termos neste Serviço um processo organizado com base na reclamação apresentada por
que exerceu as funções de director-delegado dos Serviços Municipalizados da Câmara Municipal da Figueira da Foz até 31 de Dezembro de 1979, data em que transitou para a Empresa Pública Electricidade de Pc-tugal — EDP.
Sucede que, pelo Decreto-Lei n.° 3/79, de 11 de Janeiro, foram uniformizadas as gratificações de chefia dos cargos de dirigentes da Administração Pública.
Em tal diploma consagrou-se a possibilidade de o regime das gratificações vir a ser estendido a dirigentes da administração local e regional, por portaria (artigo 1.°, n.° 3), a publicar no prazo dc 90 dias (artigo 2.°, n.° 2), produzindo efeitos desde 1 dc Junho de 1978 (artigo 2.°, n.tt 1).
Todavia tal diploma viria a ser revogado expressamente pelo Decreto-Lei n.° 204-A/79, de 3 dc Julho.
A verdade é que, por razões burocráticas ou outras, o pessoal dirigente da administração regional e local não veio a beneficiar da atribuição de gratificações, pelo menos, entre 1 de Junho de 1978 e l de Julho de 1979, data esta última a partir da qual as gratificações atribuídas por força do Decreto-Lei n.° 3/79, de 11 de Janeiro, foram extintas (artigo 2.°, n." 2 do Decreto-Lei n.° 209-A/79, de 3 de Julho).
Ora, tal situação traduziu-se numa flagrante injustiça do pessoal dirigente da administração local c regional relativamente ao pessoal de igual classe c nível da administração central.
Compreende-se que haja boas razões para não repor em vigor normas hoje já revogadas.
É, no entanto, de inteira justiça, que através de uma providência legislativa se reponha a situação dc equiparação que deveria ter existido no período transitório de 1 de Junho de 1978 a 1 de Julho dc 1979.
Nestes termos, tenho por bem formular a seguinte recomendação:
Que seja adoptada um providência legislativa no sentido de o pessoal dirigente da administração regional e local poder beneficiar da gratificação de chefia da administração central, re/ati-vamente ao periodo que mediou entre 1 dc Junho de 1978 e 1 de Julho de 1979.
IX) Assunto: Licença de uso « porte de arma. Atestado de sanidade física e mental
Processo n.° 84/IP-43-B-4
Ministro da Administração Interna:
Correu seus termos neste Serviço um processo respeitante à concessão de licença para o uso c porte de arma de caça, matéria esta regulada pelo Decreto-Lei n.° 37 313, de 21 de Fevereiro de 1949.
Na secção n do citado diploma, mais concretamente nos artigos 57.° e seguintes, vêm indicados os documentos cuja apresentação se torna necessária para a concessão da licença.
Em nenhuma das disposições da referida secção se exige, no entanto, documento médico comprovativo de que os requerentes não apresentam sintomas de anomalia psíquica ou deficiência orgânica ou fisiológica que torne perigosa a utilização da arma de caça.
Contudo, tal exigência encontra-se expressamente consagrada no Decreto-Lei n.° 47 847, de 14 de Agosto
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de 1967, relativamente ao exercício venatorio, sendo indispensável para a obtenção da carta de caçador a junção de atestado médico do tipo indicado [artigo 22.°, n.° 1, alínea c)|, além de se prever no artigo 39.° do mencionado diploma a possibilidade de sujeição a exame médico em caso de fundadas suspeitas de anomalia psíquica ou deficiência orgânica.
Afigurando-se que o grau de perigosidade num e noutro caso é idêntico, e que importa prevenir a segurança de terceiros contra os portadores de armas de fogo, impõe-se uma providencia legislativa que torne extensivo o regime fixado no Regulamento de Caça [artigo 22.°, n.° 1, alínea c), e artigo 39.°] ao licenciamento de uso e porte de arma previstos nos artigos 57.° e seguintes do Decreto-Lei n.° 37 313.
Ê neste sentido que tenho por bem expor o assunto a V. Ex.a, solicitando se digne determinar a análise do problema e a realização das diligencias consideradas necessárias para que venha a ser emanada medida legislativa adequada.
X) Assunto: Oficiais oriundos do quadro do complemento. Contagem de tempo de serviço
Processo n.° 83/R-1900-B-1
Ministro da Defesa Nacional:
1 — Varios oficiais do Exército e da Força Aérea oriundos do quadro de complemento suscitaram perante este Serviço a questão da contagem do tempo dc serviço prestado no comando de tropas em campanha, nos termos do disposto no n.° 4 do artigo 37.° da Lei n.° 2135. de 11 de Julho de 1968.
2 — Recolhidas as posições dos Estados-Maiores do Exército e da Força Aérea, foi a propósito emitido pelo Ex.mo Assessor do processo o parecer ¡unto, o qual mereceu a minha concordancia.
3 — Nestes termos, e ao abrigo do que dispõe a alinea a) do n.° 1 do artigo 18.° e o n." I do artigo 34.°, ambos da Lei n.° 81/77. de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que pelo Ministério da Defesa Nacional seia solucionada, pela via legislativa, a questão da contagem de tempo de serviço prestado em campanha celos oficiais do quadro permanente oriundos do quadro de complemento, com a finalidade de se pôr termo à persistencia da situação discriminatória resultante da inadequada aplicação dos n.0' 4 e 5 do artigo 37.° da Lei n.° 2135.
XI) Assunto: Direito de preferência. Arrendatário de fracção autónoma rfe prédio
Processo n.° 84/IP-53-B-4
Presidente da Assembleia da República:
Corre seus termos neste Serviço um processo em que se colocou o problema do sentido e alcance do direito de preferência na alienação onerosa de prédios urbanos regulada pela Lei n.° 63/77, de 25 de Agosto.
Do teor actual do artigo 1.° da Lei n.° 63/77 paree* poder concluir-se que o locatário de parte do imóvel
pode exercer o direito de preferência em relação a todo o imóvel, direito esse de que gozará o locatário, quer seja locatário de fracção autónoma, quer seja locatário de parte do imóvel que não reúna as características de fracção autónoma, isto é, quando o prédio não esteja submetido ao regime da propriedade horizontal.
Porém no caso de o inquilino pretender exercer o seu direito de preferência relativamente à fracção autónoma de que é locatário, e o prédio for vendido globalmente, parece que o locatário tem ao seu alcance a acção de arbitramento prevista no artigo 1459 ° do Código do Processo Civil.
Sucede, no entanto, que a lei não atribui ao locatário de parte do imóvel o direito de preferência relativamente à parte do prédio por si ocupado, no caso de venda do mesmo imóvel.
Neste caso, o inquilino ver-se-á obrigado a exercer o direito relativamente a todo o imóvel, o que tornará, as mais das vezes, tal direito em mera ilusão, face à exiguidade de meios económicos.
Perante a desigualdade existente entre o locatário de fracção autónoma e o locatário de parte do imóvel não autonomizada, considero de sugerir a V. Ex.a que se digne dar conhecimento do problema exposto a todos os grupos parlamentares, em ordem a eventualmente vir a ser tomada providência legislativa sobre o tema em questão, sendo certo que esse órgão de Soberania detém competência legislativa exclusiva sobre matéria de arrendamento (alínea 4) do artigo 168.° da Constituição da República Portuguesa.
XII) Assunto: Professores com habilitação superior não licenciados. Acesso à 4.* fase
Processo n.° 81/R-1859-B-DI-21
Ministro da Educação:
Várias queixas foram apresentadas por professores com habilitação própria para o ensino, mas que não possuem como habilitações literárias a licenciatura ou grau equivalente.
Consideram os referidos docentes ser inconstitucional o artigo 11.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 513-M1/79, de 27 de Dezembro, por não lhes permitir o acesso à 4." fase. violando, assim, esta norma o princípio de igualdade consignado no artigo 13.° da Constituição da República Portuguesa.
Ouvida sobre esta questão a Direccão-Ceral de Pessoal pronunciou-se nos termos constantes do Parecer n.° 213/82/GETJ.
Embora não se afigurando inconstitucional a norma em questão, no entanto não tenho por correcta a actuação desse Ministério ao vedar o acesso à 4.a fase aos professores integrados no mesmo escalão.
De acordo com a informação elaborada neste Serviço, de que se junta cópia integral, e ponderado o assunto, permito-me formular a seguinte recomendação:
O artigo 11.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 519-M1/ 79, de 27 de Dezembro, deverá ser revogado;
Em sua substituição, deverá ser elaborado diploma legal, criando novo escalão de vencimentos autónomo, englobando o pessoal docente com habilitação própria que não possua como habilitações literárias a licenciatura ou grau equivalente.
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XIII) Assunto: Estacionamento de veículo em local de paragem proibida
Processo n.° 84/R-691-B-4
Secretário de Estojo dos Transportes:
Fm processo que corre seus termos neste Serviço constata-se que a violação do sinal 56 previsto no artigo 4.°, n.° 2, do Regulamento do Código da Estrada é punida com a multa de 400$, por força da Portaria n u 501/82. de 15 de Maio.
Sucede, no entanto, que no n.° 6 do artigo 4." do citado diploma se estabelece uma multa de 1000$ a 5000$ no caso de estacionamento em local sinalizado de paragem yroibida.
A verdade, no entanto, é que o sinal 56 — n.° 28 do artigo 4.", n.° 2, do Regulamento do Código da Estrada — se traduz na indicação de proibição permanente de parar ou estacionar.
Parece, pois, haver uma certa convergência para a situação fáctica que dá lugar a essas distintas penas de muita.
Nestes termos, afigura-se de formular a seguinte recomendação:
Que na próxima revisão da legislação estradai seja eliminada a ambiguidade normativa acima descrita.
XIV) Assunto: Bolsas de estudo. Teses de mestrado
Processo n.° 83/R-1915-B-4
Presidente do instituto Nacional de Investigação Científica:
Tendo em vista o ofício n.° 2823, processo n.° 22 831/DI, de 15 de Maio de 1984, foi elaborada neste Serviço a seguinte informação:
O n.° 2 da Portaria n.° 957/81, de 7 de Novembro, determina:
2 — As bolsas de estudo destinar-se-ão a permitir a prossecução de actividades de investigação pedagógica, científica e tecnológica, no País e ou no estrangeiro, conducentes à obtenção de um grau superior à licenciatura.
O n.° 51 da mesma portaria determina igualmente que:
51 —O INIC comparticipará nas despesas de impressão de tese, nos termos da legislação em vigor.
Da conjugação dos dois preceitos resulta que o INIC comparticipa nas despesas de impressão de tese, desde que tenha sido atribuída uma bolsa de estudo conducente à obtenção de um grau superior à licenciatura.
O mestrado é um grau superior à licenciatura, logo o INIC devia comparticipar nas despesas de impressão das teses de mestrado.
Ora, o INIC entende que, sendo insuficiente as verbas de que dispõe para esse fim, prefere concedê-las exclusivamente para impressão de teses de doutoramento.
Afigura-se ilegal a solução, uma vez que as verbas desiinarn-se aos bolseiros que se propõem obter um grau superior à licenciatura (n.° 2 da portaria). Se a lei rião estabelece qualquer distinção, não parece ie-gal a acluação do INIC, ao decidir que apenas as teses de doutoramento podem set comparticipadas.
Ainda que tal decisão possa ser resultan.e de uma política dc incentivo à obtenção do grau de doutor, não sendo os bolseiros motivados a se ficarem pelo mestrado, o facto é que nada na lei reguladora permite essa distinção.
0 próprio n.° 51 menciona a comparticipação na impressão das teses sem distinguir graus
Assim, e se o INIC pretende incentivar os candidatos a bolseiros a obterem o doutoramento, através da concessão de maiores benefícios, deverá providenciar no sentido de estabelecer legalmente tal distinção.
Nestes lermos, parece que se justificará dirigir ao INIC recomendação no sentido de que deve introduzir alterações ao regulamento de atribuição de bolsas, estabelecendo em que casos as concede e quais os benefícios atribuídos para o grau de mestrado e para o grau de doutor, distinguindo as situações, tornando assim possível uma distribuição mais equitativa dc verbas.
Caso contrário, sempre se afigurará ilegal e discricionária ou, melhor, arbitrária, a concessão de benefícios preferencialmente para o doutoramento, muiio embora existam factores razoáveis que ponderam nas decisões dos dirigentes do INIC.
Com base na informação que antecede, e porque ela vale também para o período de duração das bolsas de estudo, permito-me formular a seguinte recomendação:
Oue seja alterada a legislação que regulamenta a concessão de bolsas e dc benefícios para impressão dc teses, a fim de que possa ser estabelecida, legalmente, a distinção entre candidatos à obtenção de grau de doutor e à obtençfio do grau de mestre.
XV) Assunto: Trabalhadores bancários das ex-colónias
Processo n.° 79/R-2482-A-3
Secretário de Estado do Tesouro:
1 — Na sequência de recomendação minha dirigida a V. Ex.° acerca da integração dos trabalhadores de seguros regressados das ex-colónias, foi recebida do Instituto Nacional de Seguros fotocópia do despacho n.° 2014/84, determinando que, em igualdade de condições, seja dada preferência, na admissão, aos ainda desempregados provindos da actividade seguradora das ex-colónias.
Sendo certo que tal preferência é significativa, a verdade é que a mesma não contempla, na prática, os desempregados mais idosos, precisamente os que deram maior contributo àquelas seguradoras e que mais dificuldades encontram na obtenção de novo emprego.
Assim e dado que em anterior despacho do Sr. Secretário de Estado do Tesouro (despacho n.° 1104/80) já se previa que a idade e a falta de habilitações não seriam elementos impeditivos das admissões da-
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queles trabalhadores, permito-me, junto de V. Ex.tt, formular a seguinte recomendação:
Que seja reposto em vigor, pelo menos, por período de tempo limitado, o despacho n.° 1104/ 80, de 4 de Setembro, despacho este que na altura não pôde ser cumprido, resolvendo-se, deste modo, a situação dos referidos trabalhadores desempregados, alguns dos quais vêm defrontando graves problemas de carência económica.
XVI) Assunto: Internamento compulsivo de doentes mentais
Processo n.° 82/1P-129-B-1
Presidente da Assembleia da República:
1 — Suscitado por diversas situações irregulares de internamento de doentes mentalmente perturbados que chegaram ao meu conhecimento, tomei a iniciativa de mandar abrir processo para análise do cumprimento, pelos estabelecimentos psiquiátricos oficiais e particulares, do disposto na Lei n.ü 2118, de 3 de Abril de 1963 (que promulgou as bases para a promoção da saúde mental), nomeadamente do estipulado nas suas bases x, xxiv c xxv.
2 — Após consulta do Instituto de Assistência Psiquiátrica e inquérito realizado pelo mesmo junto das suas delegações das zonas norte, centro e sul, concluiu-se que, no essencial, estaria a ser dado cumprimento ao disposto na Lei n.° 2118, embora, com a entrada em vigor da Constituição, se tivessem colocado problemas de compatibilização da lei com o sistema constitucional, nomeadamente no respeitante ao internamento e tratamento compulsivos em regime fechado, pois que. atendendo ao disposto nos artigos 27.°, n.° 2, 30.°, n." 2, e 19.°, n." 1, da Constituição, que só admitem a aplicação de medidas de segurança por via judicial, deveriam considerar-se como revogadas todas as normas da Lei n.° 2118 que admitem internamentos autorizados pelo centro de saúde mental competente (cf. base xxiv).
3—Por outro lado. para além do aspecto acima assinalado, releva também o facto de a Lei n.° 2118 estabelecer um procedimento moroso e pouco eficaz relativamente a internamentos e tratamentos compulsivos em regime fechado, o que constituiria uma justificação acrescida no sentido da revisão da mesma lei, tendente ao estabelecimento de um sistema simplificado de intervenção do Ministério Público e do juiz da comarca competente, mas em estreita obediência ao sistema constitucional, tal como aliás sucede para o internamento de doentes de Hansen previsto no Decreto-Lei n.° 547/76, de 10 de Junho (cf. artigo 5.°, n.° 5), e tomando também como orientação as regras recentes contidas na recomendação n.° R (83) 2 do Comité de Ministros do Conselho da Europa.
4 — Em face do anteriormente exposto, cumpre-me levar ao conhecimento de V. Ex.a a situação existente, para os efeitos que sejam tidos por convenientes, e, nomeadamente, para que a Assembleia da República venha a ponderar sobre a necessidade de reformulação do regime constante da Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963, tendo em atenção a competência prevista no artigo 168.°, n.° 1, alínea b), da Constituição.
5 — Permito-me solicitar a V. Ex.a que se digne dar conhecimento a todos os grupos parlamentares do teor
deste ofício c que, ulteriormente, me seja dada notícia das providências que venham a ser tomadas por essa Assembleia.
XVII) Assunto: Taxa de radiotelevisão
Processo n.° 84/IP-55-A-3
Presidente do conselho de gerência da Radiotelevisão Portuguesa, E. P.
1 — Foi recebida neste Serviço a reclamação cuja fotocópia se junta, referindo um caso em que não é possível a utilização de televisor, porquanto as emissões não são captáveis na localidade (Arnozelo, concelho de Vila Nova de Foz Côa).
0 reclamante, que é proprietário de um aparelho adquirido quando vivia anteriormente noutra localidade onde as emissões eram visíveis, sempre pagou taxa pela utilização do aparelho (em 1981 e 1982), e considera que, a partir de 1983, desde que passou a viver em Arnozelo, não tem de continuar a pagar tal taxa, em virtude de não ter possibilidade de fazer uso do seu televisor.
2 — Nesta conformidade, e dado que, como é sabido, nos termos da lei, o reclamante é obrigado ao pagamento de taxa por ser detentor de televisor (artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 401/79, de 21 de Setembro), afigura-se, todavia, manifestamente injusta tal exigência de pagamento no caso presente, por não ser possível ao reclamante a utilização do serviço em causa apenas por razões imputáveis à entidade prestadora do mesmo serviço, pelo que venho junto de V. Ex.a formular a seguinte recomendação:
Que, em próxima legislação a publicar sobre pagamento de taxa de televisão, ou com esta relacionada, se inclua uma disposição que permita casos de detenção de televisores como o presente sem a concomitante obrigatoriedade de pagamento de taxa, designadamente quando se verifique a não prestação do serviço apenas por razões imputáveis à entidade prestadora do mesmo.
XVFII) Assunto: Cartas da condução passadas nas ex-colónías
Processo n.° R4/R-1308-B-4
Ministro do Equipamento Social:
1 — O Decreto Regulamentar n." 73/83, de 19 de Novembro, veio determinar que as cartas de condução emitidas nas ex-colónias fossem trocadas, em certos prazos e sem encargos, por cartas portuguesas.
A troca abrangia mesmo as que tivessem sido substituídas ou revalidadas em território nacional.
2 — E verdade que a ignorância da lei não pode ser invocada pelos cidadãos. E que à necessidade de troca das faladas cartas foi dada publicidade nos meios de comunicação social.
3 — Sucede, porém, que a menção de um prazo de validade nas cartas induz em erro quem, na realidade, não tenha tido conhecimento da lei.
E que muitas situações novas continuam a veri-íicar-se com a chegada de pessoas vindas dos novos países de expressão portuguesa.
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4 — Razões pelas quais me permito dirigir a V. Ex." a seguinte recomendação:
Seja elaborado e publicado diploma legal no qual se consagre a prorrogação do prazo previsto no artigo 1.° do supra mencionado Decreto Regulamentar n.° 73/83.
XIX) Assunto: Preferências em concurso de pessoal da Diree-ção-Geral das Contribuições e Impostos. Regime das recomendações do Provedor de Justiça
Processo n.° 82/R-271-A-2
Primeiro-M inistro:
1 — A coberto do ofício n.° 9351, de 23 de Julho de 1984, formulei recomendação a S. Ex." o Ministro das Finanças e do Plano, visando, por um lado, a revisão do regime de preferências contemplado na Portaria n." 531/81, de 20 de Agosto, e no Decreto Regulamentar n.° 42/83, de 20 de Maio, por absoluta carência da indispensável base legal, e, por outro, a necessidade de prestação, em prazo razoável, de informações requeridas pelo Serviço do Provedor de Justiça aos serviços e organismos dependentes do respectivo departamento ministerial.
2 — Em resposta e endereçado ao «Ex.mo Sr. Provedor de Justiça» recebi o ofício n.° 3772, de 11 de Setembro de 1984, subscrito pelo chefe do Gabinete de S. Ex.a o Secretário de Estado do Orçamento, no qual me foi dado conhecimento da informação a respeito prestada pela Direcção-Geral das Contribuições e impostos (n.° 8989, de 31 de Agosto de 1984), a qual mereceu a concordância daquele membro do executivo.
3 — Nos termos do disposto na Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, que aprovou o Estatuto do Provedor de Justiça, compete a este dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correcção dos actos ilegais ou injustos ou à melhoria dos serviços da Administração [artigo 18.u, n.° 1, alínea a)] e assinalar as deficiências de legislação que verificar, formulando recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro e ao ministro directamente interessado e, igualmente, se for caso disso, aos presidentes das assembleias regionais e presidentes dos governos das regiões autónomas [artigo 18.°, n.° 1, alínea b)].
As recomendações são sempre dirigidas ao órgão competente para corrigir o acto ou situações irregulares (Constituição, artigo 23.°, n.° 1, e Lei n.° 81/77, artigo 34.°), podendo o Provedor, caso não obtenha a colaboração devida, dirigir-se ao superior hierárquico competente, ex-vi do n.° 2 do artigo 34.° da citada lei.
Tais poderes decorrem aliás do direito de queixa por acções ou omissões dos poderes públicos, reconhecido, pela lei fundamental, aos cidadãos.
As respostas às recomendações do Provedor de Justiça devem, pois, ser dadas pelo órgão competente ao qual foram dirigidas, e não por entidade diferente do mesmo departamento —a menos que se verifique delegação de poderes para o efeito—, por ser esse o regime legal, e não por razões de mera cortesia para
com o Provedor de Justiça face à ordem de precedências a observar nas solenidades oficiais e à equiparação estatutária aos ministros (artigo 8.° da Lei n." 81/ 77).
4 — Este normativo dispõe que o Provedor de Justiça tem honras, direitos, categoria, remunerações e regalias idênticas às de ministro, razão pela qual a correspondência oficial que seja directamente enviada pelos gabinetes ministeriais ao Provedor de Justiça deverá dispensar a este órgão o tratamento que lhe é devido — «Senhor Provedor de Justiça — Excelência».
5 — Relativamente à questão de fundo suscitada pelo não acatamento da recomendação em causa, li-mitar-me-ei a juntar, para elucidação de V. Ex.a, fotocópia do ofício endereçado a S. Ex.a o Ministro das Finanças e do Plano, da informação do Sr. Director--Geral das Contribuições e Impostos com data de 31 de Agosto de 1984, que obteve a concordância de S. Ex.a o Secretário de Estado do Orçamento. É que do exame desses documentos ressalta a manifesta insustentabilidade da posição assumida pela Administração num domínio tão delicado como é o das preferências nos concursos: regulamentou-se uma matéria sem que, para tanto, a lei (Decreto-Lei n.° 353/78) tivesse conferido os indispensáveis poderes.
6 — Restará referir a questão dos atrasos —habituais no que tange a alguns departamentos ministeriais — no fornecimento de informações e de documentação requeridas pelo Provedor de Justiça nos termos do disposto no artigo 27.° da Lei n.° 81/77. Trata-se de um normativo que consagra um dever de colaboração e não uma mera faculdade de obtenção do concurso dos entes contemplados na respectiva previsão.
Note-se que no caso sob apreciação formulei recomendação ao Sr. Director-Geral das Contribuições e Impostos (ofício n.° 10 617, de 18 de Agosto de ¡982) e somente obtive informação acerca do resultado da mesma através do ofício n.° 4776, de 12 de Abril de 1984, depois de sucessivas insistências efectuadas em 1982, 1983 e 1984.
Termos em que, ao abrigo do disposto na alínea 6) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, me permito solicitar a V. Ex.a que:
1.° Sejam transmitidas aos membros do Governo indicações a respeito do regime legal vigente em matéria de respostas às recomendações formuladas pelo Provedor de Justiça, bem como acerca do tratamento a dispensar à mesma entidade na correspondência que lhe venha a ser directamente endereçada pelos respectivos gabinetes;
2." Que, pelo Ministério das Finanças e do Plano, seja determinada a revisão do regime de preferências contemplado na Portaria n.° 531/83, de 20 de Agosto, e no Decreto Regulamentar n.° 42/83, de 20 de Maio, atendendo a que a matéria em questão não foi relegada para regulamento pelo Decreto-Lei n.° 363/78, de 28 de Novembro, carecendo, por isso, do indispensável apoio legal;
3.° Que pelo titular da pasta das Finanças e do Plano se chame a atenção da Dírecção-Geral das Contribuições e Impostos para o dever de colaboração para com o Provedor de Justiça consignado no artigo 27.° da Lei n.° 81/77.
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XX) Assunto: Andamento, em férias judiciais, de processos de réus presos
Processo n.° 84/R-1730-B-1
Ministro da Justiça:
Junto envio a V. Ex.° as adjuntas fotocópias, para o efeito de esse Ministério eventualmente tomar a iniciativa das alterações legais que sejam tidas por convenientes, no sentido de os processos de réus presos, incluindo os respectivos recursos, correrem termos mesmo em férias judiciais nos tribunais de 2.° instância c no Supremo Tribunal de Justiça (aliás, como sucede nos tribunais de 1.a instância).
XXI) Assunto: Reparação de erros na colocação de professores
Processo n.° 84/R-1080-B-4
Ministro da Educação:
Embora no caso concreto o erro da Administração tenha sido reparado através do destacamento da professora reclamante para a Direcção-Geral de Pessoal, cm Lisboa, venho reiterar junto de V. Ex.a a recomendação que várias vezes tem vindo a ser formulada:
Quando forem detectados erros (designadamente de digitação) da exclusiva responsabilidade dos serviços desse Ministério, devem aqueles ser reparados através da colocação como supranumerários dos docentes lesados;
Impõe-se assim que seja emanada legislação tendente a resolver definitivamente situações deste tipo.
XXII) Assunto: Ordem dos Engenheiros. Regime de votação
Processo n.° 84/R-1629-B-1
Primeiro-M inistro:
1 — O presidente do Conselho Directivo da Região Centro da Ordem dos Engenheiros apresentou-mc uma exposição em que solicitava a minha intervenção junto das entidades competentes no sentido da interpretação autêntica do artigo 29.°, n.° 7 do Decreto-Lei n.° 352/ 81, de 28 de Dezembro, que aprovou o Estatuto da Ordem dos Engenheiros.
2 — Analisado o assunto, concluiu-se o seguinte: 2.1 —Ê entendimento geral da doutrina e jurisprudência, quer nacional, quer estrangeira, que as ordens e colégios profissionais são entidades públicas, na modalidade de associações públicas (cf., entre outros. Pareceres n.°5 1/78 e 2/78 da Comissão Constitucional e Parecer n.° 91/82 publicado no Diário da República, 2.a série, de 25 de Março de 1983); a Ordem dos Engenheiros não pode desviar-se dessa qualificação, pese embora o facto da ambiguidade da sua qualificação como «instituição de interesse e utilidade pública» (cf. artigo 2." do Decreto-Lei n.° 352/81, de 28 de Dezembro), exercendo importantes funções em matéria profissional, como sejam a obrigatoriedade de inscrição na Ordem para o uso do título e exercício da função dc engenheiro (cf. artigo 8.°) com acção disciplinar sobre os seus membros (cf. artigos 88.° e 95.°). aplicando sanções que podem ir até à expulsão (cf. ar-
tigo 92.") e que implicam ipso facto a inibição do exercício da função de engenheiro em território nacional e das quais cabe recurso para aos tribunais competentes (cf. artigo 32.°, n.° 6).
2.2 — Nos termos do artigo 267.", n.° 3, da Constituição (após a última revisão constitucional) as associações públicas foram integradas na «estrutura da Administração», no título viu dedicado à Administração Pública, o que as submete, por aplicação conjugada daquele preceito, do artigo 23.°, n.° 1, da Constituição e ainda dos artigos 1.°, 2.° e 18." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, à acção do Provedor de Justiça.
2.3 — A norma cuja interpretação autêntica é solicitada, respeita essencialmente a matéria de funcionamento de órgãos da Ordem dos Engenheiros, mas a sua interpretação unívoca assume relevância suficiente, por poder de qualquer modo interferir nos direitos dos membros da Ordem dos Engenheiros e ainda porque a Constituição, no já citado artigo 267.", n.° 3, estabelece, de forma expressa, que as associações públicas têm de ter «organização interna baseada no respeito dos direitos dos seus membros e na formação democrática dos seus órgãos».
2.4 — Com efeito, o artigo 29.°, n.° 7, do Decreto-Lei n." 352/81, de 28 de Dezembro, foi objecto de duas interpretações divergentes:
o) A do Conselho Directivo Nacional, que entende que a palavra «conforme» constante do preceito estaria «a mais», pois a lei pretendia apenas definir regras de quórum, podendo qualquer proposta ser votada com votos conformes a ela ou à mesma contrários, e a posição mais votada é a que democraticamente terá de ser considerada vencedora;
6) Em contraponto, o Conselho Directivo da Região Centro entende que a palavra «conforme» não respeita a uma simples exigência de quórum, estabelecendo antes uma norma de deliberação com maioria qualificada, de acordo com a qual só seriam válidas as deliberações que, em sentido positivo ou em sentido negativo, tivessem a apoiá-los o voto de, pelo menos, metade e mais um dos membros constitutivos da assembleia.
2.5 — O entendimento veiculado pelo Conselho Directivo da Região Centro afigura-se mais correcto em termos jurídicos, porque só é permitido ao intérprete manipular, em sentido diferente do expresso, a letra da lei quando a mesma conduz a soluções incongruentes, o que não é o caso; é também certo que o adjectivo «conforme» qualifica o voto que incide sobre determinada proposta e não esta, devendo entender-se que o voto conforme incidente sobre uma proposta positiva significa aceitação e sobre uma proposta negativa significa rejeição.
3 — Em face do exposto, ao abrigo da competência que me é conferida pela alínea b) do artigo 18." da Lei n." 81/77, de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que o Governo, através do decreto-lei interpretativo, como é hoje exigido pelo artigo 115.°, n.° 5, da Constituição, interprete de forma autêntica o artigo 29". n." 7, do Decreto-Lei n.° 552/81. de 28 de Setembro (Estatuto da
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Ordem dos Engenheiros), no sentido de que o «voto conforme» previsto naquela norma significa «voto idêntico».
B) Recomendações administrativas
I) Assunto: Horário semanal
Processo n.° 82/R-603-8-4
Presidente da junta de Freguesia de Belas:
1 — Estabelece o n.° 1 do despacho do Ministro da Administração Interna de 2 de julho de 1975, publicado no Diário do Governo, l.a série, n.° 187, de 14 de Agosto do mesmo ano, que:
O limite máximo da duração do trabalho no âmbito da Administração [...] local [...] é fixado em 45 horas.
2 — A Junta de Freguesia de Belas, ao impor ao trabalhador F. ... a prestação de 48 horas semanais dc trabalho, viola a supramencionada disposição normativa.
3 — Assim, formulo a seguinte recomendação:
Que o órgão autárquico de que V. Ex." é muito digno presidente dê cumprimento ao estabelecido no despacho em causa.
4 — Solicito se digne comunicar-me o que sobre o objecto da presente recomendação vier a ser decidido.
II) Assunto: Reforma agrária. Restituição de alfaias agrícolas
Processo n.° 83/R-9-A-2
Secretário de Estado da Estrutração e Recursos Agrários:
Com referência, ainda, ao assunto do ofício deste Serviço em epígrafe e não obstante o teor do despacho do Sr. Secretário de Estado da Estrutração e Recursos Agrários, datado de 28 de Novembro de 1983, transmitido pelo ofício n.° 5027, de 28 de Novembro de 1983, e considerando:
1) Que essa Secretaria de Estado tem conhecimento da dívida da UCP «Tem que ir» ao reclamante F..., e da proveniência da mesma;
2) Que, assim, a atribuição por essa Secretaria de Estado de bens — nomeadamente de maquinaria ainda em nome daquele (cf. reclamação dirigida a este Serviço) — a pessoas diferentes do reclamante, a co-responsabiliza numa situação de locupletamento à custa alheia, afigura-se-me de dirigir a V. Ex.a, ao abrigo do artigo 18.°, n.° 1, da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:
Que os bens referidos supra, eventualmente deixados no prédio pela UCP e cuja destinação caiba ao Ministério da Agricultura, venham a ser atribuídos ao reclamante, até à concorrência com o montante daquela dívida.
Solicito a V. Ex.a se digne informar do seguimento dado à presente recomendação.
Ill) Assunto: Pensão de aposentação. Nexo de causalidad*. Doença. Morte
«
Processo n.° 81/R-826-B-1
Presidente do conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos:
1 — Pende neste Serviço uma reclamação apresentada pela viúva de um cantoneiro da Câmara Municipal de Oeiras, falecido em 7 de Abril de 1980, na situação de desvinculado do serviço desde Fevereiro desse ano por atingir o período de um ano de licença por doença, que se queixa de não ter sido atribuída ao marido pensão de aposentação, não obstante ele ter requerido para o efeito junta médica extraordinária, a que não chegou a ser submetido por entretanto ter falecido.
Cabe salientar neste ponto que, tendo o referido funcionário sido reputado como desvinculado do serviço à data da morte, não pode a viúva auferir pensão de sobrevivência.
2 — Reconhece-se que a redacção dos artigos 7." e 8.° do Decreto-Lei n.° 49 031. de 27 de Maio de 1969. conjugados com o artigo 99.° do Estatuto da Aposentação, parece conduzir à conclusão de que ao referido funcionário não poderia ser abonada pensão transitória, a cujo pagamento pudessem depois da sua morte habilitar-se os seus herdeiros.
De facto, a junta médica dessa Caixa não chegou a confirmar a incapacidade do funcionário para regressar ao trabalho finda a licença por doença e o parecer positivo dela é condição para a atribuição da pensão.
3 — Afigura-se, contudo, bastante injusto que assim suceda numa situação como a presente — em que a incapacidade era tal que até o médico-chefe da Caixa Nacional de Previdência admitiu como muito provável ter a morte sindo consequência da afecção de que sofria o servidor e que o obrigou a atingir o limite de faltas (v. documentos anexos).
4 — Decerto que o legislador não quis negar pensão transitória em situações destas, em que tal pensão poderia ser o único meio financeiro ao dispor do interesado para garantir, além do seu sustento e de sua família, o seu tratamento no período correspondente à doença, que, por ser tão prolongada, excedeu o prazo máximo da licença por doença.
5 — Em favor da concessão de pensão no presente processo interessa invocar, pelo seu paralelismo, alguma jurisprudência que, com base na presunção de que a morte resultou de determinada doença, entendeu como verificada a relação de causalidade entre a doença e a morte.
O Acórdão de 17 de Julho de 1959 (Diário do Governo, apêndice de 15 de Setembro de 1960, recurso n.° 5271) entendeu que a circunstância de não ser possível, pelo atraso dos conhecimentos científicos, afirmar ou negar que certa morte resultou de determinada doença, não é impeditiva de ser dada como existente a relação de causalidade se a ciência ensinar e no caso concreto se provar que a doença foi presumivelmente a causa provável da morte.
Por outro lado, o Acórdão de 4 de Maio de 1967 do Supremo Tribunal Administrativo, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, ano vi, n.° 70, foi igualmente no sentido de
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que quando os conhecimentos científicos não permitam afirmar a existência da relação causai exigida pela alínea a) do artigo 2.° do Decreto n.° 17 335, de 10 de Setembro de 1939, mas a admitam como possibilidade, tal relação deve ter-se como apurada, desde que seja razoável aceitar que a morte derivou efectivamente da doença adquirida em campanha.
Neste contexto, permito-me formular a V. Ex.° a seguinte recomendação:
Que o caso vertente seja objecto de revisão, em termos de vir a ser reconhecido que, à data da morte do referido funcionário, lhe assistia o direito a pensão de aposentação com efeitos retroactivos ao momento em que atingiu o limite máximo de licença por doença.
Agradeço que a este Serviço seja comunicado o seguimento que este assunto venha a ter.
IV) Assunto: Tratamentos termais. Reembolso
Processo n.° 82/R-2096-B-1
Presidente da Comissão Integradora Central dos Serviços Mêdko-Sociais Centrais:
1 — No meu ofício n.° 1096, de 26 de Janeiro de 1983, inquiri esses Serviços sobre a aplicação ao utente F..., abrangido pelos Serviços Médico-Sociais do distrito do Porto, das tabelas de Junho de 1982 no que respeita ao reembolso das despesas com os tratamentos termais que tiveram lugar já após a entrada em vigor dessas tabelas.
1 — Em resposta, recebi o ofício n.° 102 904, de 14 de Abril de 1983, em que se declara que as comparticipações são calculadas na base das tabelas aprovadas em 1979, acrescidas de 20%, «conforme acordo entre os Serviços Médico-Sociais e a Associação Nacional dos Industriais de Aguas Minero-Medicináis e de Mesa em 29 de Maio de 1980».
3 — Posteriormente, no ofício n.° 116 896, de 22 de Dezembro de 1983, refere-se que esse acordo apenas estabeleceu compromissos para a época termal de 1980 e que de então para cá, conforme instruções dimanadas desses Serviços, «em cumprimento de orientação superior, aquele acordo não tem qualquer significado, pois os aquistas são reembolsados com base em tabelas de 1979 acrescidas de 20 %».
4 — Face ao exposto, somos levados a concluir que os utentes, como é o caso do reclamante atrás citado, não tiveram possibilidade de conhecer, posteriormente ac Despacho Normativo n.° 93/82, publicado no Diário da República, 2.a série, de 12 de Junho de 1983, que estabeleceu as novas tabelas dos tratamentos termais em vigor nos Serviços Médico-Sociais, que seriam reembolsados não por aquelas tabelas mas pelas de 1979, acrescidas de 20%, isso porque não existe qualquer despacho normativo a instituir esta medida de reembolso que tenha sido publicado no Diário da República já depois da publicação do Despacho Normativo n.° 93/82.
5 — A circunstância que acaba de ser apontada, aliada ao despacho de 18 de Janeiro de 1982, publicado no Diário da República, 2." série, de 30 de Janeiro de 1982, que estipula que os utentes são reem-
bolsados de harmonia com as tabelas em vigor para os Serviços Médico-Sociais, impõe, sob o ponto de vista jurídico, que o reembolso a fazer ao reclamante se baseia nas novas tabelas, constantes do Despacho Normativo n.° 93/82.
6 — Neste contexto, permito-me formular a seguinte recomendação:
1) Que seja proferido um despacho a publicar no Diário da República que estabeleça as tabelas com base nas quais aos utentes passam a ser reembolsados das despesas com tratamentos termais, caso se considere que as contidas no Despacho Normativo n.° 93/82 não são financeiramente aconselháveis;
2) Que a caso do reclamante F... seja revisto, em termos de o reembolso ter por base as tabelas do citado Despacho n.° 93/82, já que o critério que lhe foi aplicado não teve consagração normativa publicada no Diário da República.
Agradeço a V. Ex.a que me seja informado o andamento dado a esta recomendação.
V) Assunto: Pensão do aposentação. Junta médica
Processo n.° 82/R-1545-B-1
Ministro da Justiça:
1 — O aposentado F ..., ex-segundo-ajudante da Conservatória dos Registos Civil, Predial e de Automóveis do concelho da Horta (Açores), demitido das suas funções em 8 de Março de 1984, reclamou para este Serviço do facto de a pensão de aposentação lhe ter sido atribuída com efeitos a partir apenas da data em que foi julgado incapaz pela respectiva junta médica, 13 de Dezembro de 1981, quando, por força do n.° 2 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-A/79, de 25 de Junho, esses efeitos se deveriam ter reportado à data da entrada em vigor daquele diploma, uma vez que, em 26 de Outubro de 1979, ele remeteu ao Ministério da Justiça o respectivo requerimento, conforme sc comprova pela fotocópia que se junta.
2 — Na sequência de tal reclamação inquiriu-se a Caixa Geral de Aposentações sobre o motivo da decisão reclamada pelo interessado, tendo esta informado que a pensão tinha sido atribuída com efeitos a partir da data em que ele foi julgado incapaz pela junta médica, dado que o seu requerimento lá tinha dado entrada somente em 28 de Janeiro de 1981, posteriormente ao prazo concedido pelo citado n.° 2 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-A/79. Isto consta do ofício daquela instituição de que se anexa igualmente fotocópia.
3 — Face a este último dado, ouviu-se a Direcção--Geral dos Registos e do Notariado sobre a razão de o aludido requerimento do reclamante, remetido a esse Ministério em 26 de Outubro de 1979, não ter sido oportunamente enviado à Caixa Geral de Aposentações.
4 — Em resposta, recebeu-se o ofício n.° 6400, de 29 de Setembro de 1983, daquela Direcção-Geral (fotocópia do qual também se envia), por onde se conclui que aquele requerimento, ao contrário do que deveria
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ter sucedido, nunca foi enviado à Caixa Geral de Aposentações, tendo sido solicitado ao interessado um novo requerimento, este dirigido à própria Caixa, documento em que se baseou a pensão atribuída, mas que privou o seu titular do benefício de essa pensão se reportar à data da entrada em vigor do Decreto--Lei n.° 191-A/79.
5 — Neste contexto, permito-me formular a seguinte recomendação:
Que o requerimento de pensão de aposentação que o interessado enviou a esse Ministério em 26 de Outubro de 1979 seja, com a brevidade possível, remetido oficiosamente à Caixa Geral de Aposentações, salientando-se que o mesmo deu entrada dentro do prazo concedido pelo n.° 2 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-A/79, de 25 de Junho, pelo que se torna justo que o aposentado venha a beneficiar de os efeitos da sua pensão serem reportados à data de entrada em vigor daquele diploma.
Agradeço a V. Ex.3 que me seja oportunamente transmitida a posição desse Ministério relativamente à presente recomendação.
VI) Assunto: Pensão de invalidez. Junta médica. Novo ole-mento de informação clínica
Processo n.° 83/R-1122-B-1
Presidente do conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos:
1 — Deu entrada neste Serviço uma reclamação da viúva do militar F .... cujo processo de invalidez tem o n.° 7579, em que a mesma se queixa de a junta médica que no âmbito dessa Caixa observou seu marido ter considerado que a doença que o atingiu não ter sido contraída em serviço.
Fundamenta tal reclamação na circunstância de os serviços de gastrenterologia dos Hospitais da Universidade de Coimbra terem fornecido os seguintes dados:
Informação clínica: o doente F ... esteve internado neste serviço por duas vezes, com o diagnóstico "de hepatite crónica de evolução cirró-gena. Será difícil afirmar se a doença em causa foi adquirida em serviço, mas é muito natural que o doente tenha contraído hepatite virusal na Guiné, aquando da sua comissão militar nesse território. Pela sua história pregressa, e pelos dados clínicos colhidos no processo clínico dos Serviços Médico--Sociais'(caixas de previdência), e ainda análises que o doente tinha na sua posse (da consulta externa do Hospital Militar Principal), leva a pensar que o processo sc arrasta desde Novem-vembro de 1983. — Jorge Alberto de Melo Águas Dias, médico.
2 — Refere também a reclamante que seu marido não recorreu atempadamente da decisão da junta médica dessa Caixa (só o fez em 10 de Novembro de 1981) por desconhecer a existência de prazo para o efeito.
3 — Sucede, porém, que, após aquela junta médica se ter pronunciado, surgiu um elemento novo, que
é precisamente a certidão de que se junta fotocópia e que contém a informação clínica atrás transcrita, onde se admite como natural o militar ter adquirido a doença na Guiné.
4 — Face a tal elemento novo, permita-me V. Ex.° invocar, com vista a uma eventual revisão do processo, a seguinte jurisprudência.
0 Acórdão de 17 de Julho de 1959, do Supremo Tribunal Administrativo (Diário do Governo, apêndice de 15 de Setembro de 1960, recurso n.° 5271) entendeu que a circunstância de não ser possível, pelo atraso dos conhecimentos científicos, afirmar ou negar que certa morte resultou de determinada doença, não é impeditiva de se dar como existente a relação de causalidade, se a ciência ensinar e no caso concreto se provar, que a doença foi presumivelmente a causa provável da morte.
Por outro lado, o Acórdão de 4 de Maio de 1967 do Supremo Tribunal Administrativo, publicado em Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, ano vi, n.° 70, foi igualmente no sentido de que, quando os conhecimentos científicos não permitirem afirmar a existência da relação causal exigida pela alínea a) do artigo 2° do Decreto-Lei n.° 17 335, de 10 de Setembro de 1939, mas a admitam como possibilidade, tal relação deve ter-se como apurada, desde que seja razoável aceitar que a morte resultou efectivamente de doença adquirida em campanha.
Neste contexto, formulo a seguinte recomendação:
Que o processo da pensão de invalidez do aludido militar seja revisto em termos de atender aos elementos que acabam de se expor.
Agradecia a V. Ex.a que oportunamente me informasse sobre o resultado desta recomendação.
VFI) Assunto: Integração ou readmissão de ex-empregados do BNU
Processo n.° 83/R-183-A-3
Presidente do conselho de gestão do Banco Nacional Ultramarino:
1 — Relativamente ao assunto em epígrafe, foi recebida neste Serviço uma reclamação da Comissão ...
Exposta a questão ao Sr. Secretário de Estado do Tesouro, foi recebida a informação de que o conteúdo da carta publicada por esse Banco no Correio da Manhã traduz a síntese dos critérios efectivamente utilizados no tratamento do caso concreto.
2 — Nesta altura, os reclamantes queixaram-se, especialmente, da discriminação etária a que se refere o n." 7 da aludida carta (não admissão a concurso daqueles reclamantes com idade superior a 40 anos).
Assim, e dado que o número daqueles ex-empregados desse Banco com idade superior a 40 anos é apenas de cerca de 40, e considerando que os mesmos são precisamente os que deram a essa instituição mais anos do seu labor, venho formular a seguinte recomendação:
Que sejam admitidos a concurso os referidos ex-empregados, muitos dos quais se encontram em situação de carência económica manifesta por não conseguirem emprego noutra instituição, eliminando-se a discriminação etária
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focada, a qual poderá ser tida como menos correcta.
3 — Solicito a V. Ex.3 que se digne transmitir-me o seguimento que venha a ter a presente recomendação.
WH) Assunto: Abono do família. Interrupção da estudos
Processo n.° 84/R-1878-B-1
Director-geral da Contabilidade Pública:
Foi dirigida ao Provedor de Justiça a reclamação cuja fotocópia se anexa, com a posição dos serviços expressa em documentos igualmente juntos.
Se bem que o procedimento dos CTP seja francamente apoiado pelas instruções que referem, afigura--se-me merecer imediata revisão a interpretação dada ao artigo 6.°, alínea b), segundo a qual os descendentes só terão abono de família até aos 14 anos, se tiverem completado o ensino escolar obrigatório e não exercerem profissão remunerada; se tiverem deixado de estudar antes de completados os 14 anos e o ensino obrigatório, cessará o direito ao abono a partir do mês seguinte ao da cessação dos estudos.
Tal procedimento, que decorrerá logicamente das situações especiais previstas nas alíneas b), c) e d) do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 197/77, de 17 de Maio, não pode aplicar-se à alínea a) do mesmo diploma, que constitui a regra geral da concessão do abono de família sem outros condicionalismos que não sejam a idade (14 anos) e o não exercício de profissão remunerada.
Aliás, o referido limite etário coaduna-se com o que se estabelece noutros diplomas, referentes à idade mínima para ingresso no trabalho e ao limite da escolaridade obrigatória (cf. os Decretos-Leis n.08 49 408, de 24 de Novembro de 1969, e 538/79, de 31 de Dezembro).
Deste modo, a interpretação da referida norma corresponderá a uma verdadeira alteração da lei, feita por via regulamentar, o que representa, neste momento e face ao artigo 115.° da Constituição da República, uma flagrante violação do diploma fundamental, quanto à hierarquia dos actos normativos.
Por esta razão, solicito a V. Ex.a se digne providenciar, com urgência, no sentido de ser reposta a legalidade e dada à alínea a) do artigo 6.° do decrcto--lei citado a interpretação correcta que decorre da sua letra e do seu espírito e que se harmoniza com os diplomas acima indicados.
IX) Assunto: Funções de chefia. Remuneração
Proceso n.° 83/R-2384-A-2
Ministro das Finanças e do Plano:
1 — Do exame da documentação apresentada pelo queixoso pude verificar que no desempenho dc funções de chefia (subdirector tributário) o funcionário cm causa vem percebendo, efectivamente, remuneração inferior àquela que lhe caberia se se limitasse a exercer as funções correspondentes ao respectivo lugar de origem, ou seja, o de perito tributário de l.a classe.
2 — Tal situação revela-se, manifestamente, anómala, não apenas pelo facto de à maior responsabili-
zação do funcionário não corresponder um aumento de remunerações, mas também pelo que de desmotivador comporta, ao traduzir-se no tratamento menos vantajoso de quem se vir chamado a desempenhar funções de nível superior e apesar disso menos remunerado do que aqueles que dele dependam hierarquicamente.
3 — Trata-se, pois, de uma situação inaceitável pela Administração, sabido que esta se encontra submetida, constitucionalmente, aos princípios da igualdade, legalidade e justiça (Constituição da República, artigos 13.°, n.° 2, e 266.°, n.° 2), aspecto que parece ter escapado à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, ao indeferir o pedido do funcionário para lhe ser dado por finda a substituição ou para lhe serem abonadas as remunerações acessórias como chefe do 3.° serviço— com base em argumentos de ordem formal. Aliás, da mesma posição não comunga a Direcção de Finanças do Distrito de Bragança, como se alcança do último parágrafo do n.° 4192, de 15 de Junho de 1983, junto por fotocópia.
4 — Pelo que fica exposto, permito-me formular a V. Ex.a, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 18° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro a seguinte recomendação:
Que seja revista a situação de F.perito tributário de 1.a classe a exercer, em regime de substituição, o cargo de subdirector tributário, por forma a que, no exercício de funções de chefia, não venha a auferir remuneração inferior àquela que é percebida pelos funcionários dele dependentes hierarquicamente.
Agradeço que me seja comunicada a sequência que for dada à presente recomendação.
X) Assunto: Urbanização. Falta de plano
Processo n.° 82/R-1738-B-4
Presidente da Câmara Municipal de Mafra:
Em consequência da diligência realizada por um assessor deste serviço junto dos serviços técnicos dessa edilidade, no passado dia 24 de Fevereiro, foi-me presente uma informação com a qual concordo, e onde eram formuladas as seguintes considerações:
1 — A casa do reclamante está situada nas traseiras da Igreja da Misericórdia e a cerca de 30 m do pelourinho, isto é, na parte antiga da vila.
Tal casa é composta de 3 pisos (v. fl. 49), sendo certo que o 3.° piso é já resultado de uma alteração ao projecto inicial, de tal forma que assenta no telhado do 2." piso.
Confinante com a casa do reclamante e à esquerda da mesma existem duas casas (fls. 49—C e 49-B) mais altas que a casa do reclamante, sendo certo que em ambas, no último piso, estão implantadas águas-furtadas plenamente inestéticas.
2 — Ê inexistente qualquer uniformidade urbanística no conjunto em que se insere a casa do reclamante.
A Câmara Municipal de Mafra não dispõe de plano de urbanização para a Ericeira.
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A casa do reclamante é já no seu aspecto actual uma construção sobreposta sem o mínimo de estética, como aliás o são as casas circundantes.
Face à inexistência de condicionamentos urbanísticos por falta de plano de urbanização, e face à inexistência de controle estético do conjunto em que se insere a casa do reclamante, não se me afigura que o alteamento pretendido deixe de se enquadrar no aspecto degradado esteticamente das construções circundantes.
Pude aperceber-me de que as razões dominantes do indeferimento do licenciamento assentam sobretudo em razões estéticas [artigo 121.° do Regulamento Geral das Edificações Urbanas e artigo 15.°, alínea c), do Decreto-Lei n.° 166/70, de 15 de Abril].
3 — Do que me foi dado ver e deixo transparecer do número anterior, é indubitável que o alteamento pretendido constitui uma monstruosidade do ponto de vista estético.
Tal alteamento, por parte do reclamante, que ali não habita, visa a obtenção de maior rendimento, sobretudo na época balnear.
Devo, aliás, dizer de passagem que este aspecto sócio-económico tem também algum peso no critério de apreciação da Câmara, o que, aliás, do meu ponto de vista é aceitável, como critério acessório de ponderação dos licenciamentos.
A verdade, porém, é que, segundo me apercebi, a medida estética não é igual para todos os cidadãos, tais os «mamarrachos» já construídos nas imediações e aqueles que se encontram já em construção.
Daí que me incline a considerar que as preocupações estéticas devem ser gerais e abstractas, não podendo, pois, funcionar como critério de indeferimentos e licenciamentos apenas em casos restritos como o caso dos autos.
Face às conclusões alcançadas tenho por bem formular a seguinte recomendação:
Que essa Câmara Municipal perfilhe uma política de urbanização coerente e não discriminatória relativamente à vila da Ericeira, não podendo, pois, ser considerados procedentes os fundamentos estéticos como recusa do licenciamento, e isto porquanto nos edifícios circundantes, construídos e em construção, tem estado totalmente ausente tal preocupação estética.
Assim, deverá consequentemente, à luz destes considerandos, ser repensada a pretensão do reclamante.
Agradeço que me seja comunicado o teor da deliberação que recair sobre a presente recomendação.
XI) Assunto: Atestado médico. Apresentação depois do período de férias
Processo n.° 83/R-1215-A-2
Presidente do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas:
Em resposta ao ofício dirigido a V. Ex.a, em 21 de Setembro passado, foi recebida uma comunicação remetida a este Serviço, pelo Sr. Director dos Serviços
de Coordenação Económica e Financeira, que vinha acompanhada de vários elementos referentes ao processo respectivo.
Através da análise do processo extraíram-se as conclusões que comunico a V. Ex.":
a) No que se refere à contagem do prazo para apresentação do atestado médico, afigura-se existirem divergências entre os serviços públicos na interpretação do artigo 8.° do Decreto n.° 19 478, designadamente sobre a justificação, oficiosa ou não, das primeiras faltas ao abrigo do artigo 4.° Esta disposição, que tinha sido revogada pelo Decreto-Lei n.° 219/83, de 26 de Maio, volta a vigorar por força do disposto no Decreto-Lei n.° 467/ 83, de 31 de Dezembro, pelo que vai ser levantado o problema à Secretaria de Estado da Administração Pública.
No caso concreto, o problema já está solucionado, uma vez que as faltas foram consideradas justificadas;
b) Não se encontra base legal para a orientação seguida pelos serviços do Instituto no que respeita à justificação, por atestado comprovado pelo delegado de Saúde, das faltas dadas por doença após o período de férias;
c) Quanto às faltas por doença, causada por interrupção do estado de gravidez, dado o tempo decorrido e já terem sido publicadas as listas de antiguidade respeitantes aos respectivos anos de serviço, não há interesse prático no aprofundamento desta questão.
Nestes termos, determinei o arquivamento do respectivo processo, agradecendo a colaboração prestada neste caso.
Entretanto afigura-se de formular a V. Ex.° a seguinte recomendação:
Que deixe de ser exigida a apresentação de atestado médico comprovado pelo Delegado de Saúde aos funcionários que adoeçam depois do gozo do período de férias no seu domicílio oficial, por falta de apoio legal.
Ê que o § 2.° do artigo 8." do Decreto-Lei n.° 19 478, citado pelos serviços, só estabelece que o estado de doença do funcionário poderá ser mandado verificar por um dos médicos da junta médica respectiva e, nos termos da Portaria n.° 7456, de 7 de Novembro de 1932, o atestado deverá ser passado pela autoridade sanitária da área onde o funcionário estiver residindo se adoecer fora da sua residência oficial.
XII) Assunto: Diplomas legais. Linguagem acessível
Processo n.° 81/IP-30-B-1
Primeiro-Ministro:
Através de diversos casos que me têm sido apresentados, venho constatando que muitos são os cidadãos que se vêem impedidos do acesso a determinados benefícios sociais em virtude de, por desconhecimento das leis que os instituem, terem deixado decorrer os
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prazos nelas fixados para os requererem, sem que o tenham feito. \
Assim, há que atentar em que a generalidade da população não tem contacto com o Diário da República, e parte dela nem com os jornais, principalmente nas zonas mais desfavorecidas do interior.
Isto para além da significativa percentagem de analfabetismo que ainda existe em Portugal, o que está em nítida contraposição com o estilo demasiado técnico da redacção de certos diplomas.
Várias vezes tem o Provedor de Justiça chamado a atenção, através dos órgãos de comunicação social, para diplomas que fixam prazos para o exercício de certos direitos — o que, todavia, se não revelou plenamente eficaz.
Estas considerações valem, também, em termos semelhantes, em relação a diplomas que estabeleçam obrigações ou outras imposições aos particulares.
Enfim, é inegável que, durante o período das férias de Verão, uma apreciável parte dos cidadãos mantém reduzidos contactos com a sua residência habitual e com a informação veiculada pelos órgãos de comunicação social.
Por estas razões, entendo oportuno formular as seguintes recomendações:
1) Que, na medida do possível, se utilize nos diplomas legais uma linguagem acessível à generalidade dos cidadãos;
2) Que se evite a publicação, nas férias grandes, de diplomas que, para o exercíco de direitos ou cumprimento de obrigações, estabeleçam prazos que, no todo ou na maior parte, se esgotem no decurso das mesmas.
Vou, dentro desta mesma linha de preocupações, recomendar à RTP e à RDP o estudo da eventual criação de programas periódicos em que, por forma acessível à generalidade dos cidadãos, se alertem estes para os seus direitos e deveres, nomeadamente para aqueles cujo exercício ou cumprimento tenham de efectivar-se em prazos certos.
Agradecia a V. Ex.a que me fosse transmitida a posição do Governo relativamente às sugestões feitas.
Xlíü) Assunto: Divulgação de diplomas legais. Programas na RDP
Processo n.° 8J/IP-30-B-1
Presidente do conselho de gerência da Radiodifusão Portuguesa, E. P.:
Através de diversos casos que me têm sido apresentados, venho constatando que muitos são os cidadãos que se vêem impedidos de acesso a determinados benefícios sociais em virtude de, por desconhecimento das leis que os instituem, terem deixado decorrer os prazos nelas fixados para os requererem, sem que o tenham feito.
Assim, há que atentar em que a generalidade da população não tem contacto com o Diário da República e parte dela nem com os jornais, principalmente nas zonas mais dasfavorecidas do interior.
Isto para além da significativa percentagem de analfabetismo que ainda existe em Portugal, o que está em nítida contraposição com o estilo demasiado técnico da redacção de certos diplomas.
Várias vezes tem o Provedor de Justiça chamado a atenção, através dos órgãos de comunicação sociaE, para diplomas que fixam prazos para o exercício de certos direitos — o que, todavia, se não revelou plenamente eficaz.
Estas considerações valem, também, em termos semelhantes, para diplomas que criem, para os particulares, obrigações ou outras imposições, nomeadamente se o respectivo cumprimento tiver de efectuar-se dentro de prazos certos.
Entendo, pois, oportuno formular a seguinte recomendação:
Que seja estudada a possibilidade de criação de programa radiofónico em que, periodicamente e por forma acessível à generalidade dos cidadãos, estes sejam elucidados acerca dos seus principais direitos e deveres, em particular dos resultantes de diplomas recentes e daqueles cujo exercício ou cumprimento tenham de verificar-se em prazos certos.
Muito agradeço indicação do seguimento que esta sugestão venha a ter.
XIV) Assunto: Aposentação. Antigos administradores de concelho das ex-colónias
Processo n.° 81 /R-2475-A-3
Administração da Caixa Geral de Depósitos:
1 —A antigo administrador de concelho dos Serviços de Administração Civil da ex-colónia de Angoia, dirigiu-me, em 25 de Novembro de 1981, a exposição que vai fotocopiada em anexo (documento n.° 1).
2 — Foi decidido, na altura, que não havia fundamento para a intervenção solicitada, uma vez que pendia recurso para o pleno do Supremo Tribunal Administrativo, interposto pelo Ministério Público, da decisão da 1." Secção daquele Tribunal, que ditara a interpretação a dar ao § único do artigo 5." do Diploma Legislativo de Angola n.° 2929, de 22 de Outubro de 1958, na redacção que lhe foi dada pelo artigo 1." do Diploma Legislativo n.° 3125, de 14 de Junho de 1961, e que o reclamante pretendia que fosse tida em conta, também, no seu caso.
3 — Por Acórdão de 9 de Novembro de 1983, do mesmo Supremo Tribunal, proferido no recurso n.° 12 639, foi confirmado o anterior acórdão da 1 Secção, de 4 de Dezembro de 1980, nele se estabelecendo que aquele preceito legal deve ser interpretado no sentido de que não havia uma acumulação de cargos, propriamente dita, no exercício, nas ex-colónias, das funções de administrador de concelho e de presidente de um corpo administrativo, desde que a gratificação a incluir na pensão de aposentação não fosse superior à que seria devida quando os administradores não exercessem tais funções (fotocópia anexa n.° 2).
4 — Sabe-se que o pleno do Supremo Tribunal Administrativo funciona como tribunal de revista em contencioso administrativo, pelo que as suas decisões constituem caso julgado material, limitado, subjectivamente, às respectivas partes, e, objectivamente, ao próprio acto administrativo directamente impugnado e só a ele, isto é, apenas no processo a que dizem respeito.
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ê que no Direito Administrativo Português vigente não existe o instituto da uniformização da jurisprudência dos tribunais civis ou criminais, por via de assentos, nos termos dos artigos 763.° a 770.° do Código de Processo Civil, assentos esses que têm força obrigatória geral (artigo 2.° do Código Civil).
0 problema da aplicação genérica daquela interpretação a casos idênticos não cobertos pela força de caso julgado não pode, por isso, pôr-se no campo da legalidade estrita, mas, sim, em sede da justiça da Administração, que tudo deverá fazer para que casos iguais recebam igualdade de tratamento em face dos mesmos textos legais.
£ afigura-se ser a interpretação indicada em 3 a mais correcta, e, até, a única razoável e legítima, pelas razões que se indicam naqueles arestos e dos quais devem existir cópias ou fotocópias no processo de aposentação de B ...
Nestes termos, e porque ao Provedor de Justiça incumbe assegurar, além da legalidade, a justiça da Administração Pública —artigo 1.° da Lei ri.° 81/77, de 22 de Novembro—, tenho a honra de, ao abrigo da alínea o) do artigo 18.° da mesma lei, formular a seguinte recomendação:
Que sejam reanalisados, à luz da jurisprudência fixada no Acórdão de 9 de Novembro de 1983, do Supremo Tribunal Administrativo, funcionado em tribunal pleno, e proferido no processo de recurso contencioso n.° 12 369, respeitante a B..., todos os processos de aposentação (provisória ou definitiva) de antigos administradores de concelho das ex-colónias em que haja sido excluída, para efeitos de cálculo das respectivas pensões, a gratificação por eles recebida pelo exercício de funções de presidentes dos corpos administrativos, procedendo-se, se for caso disso, às rectificações que forem devidas em concordância com aquela jurisprudência.
5 — Muito agradeço que essa administração me in-informe da resolução que a este assunto vier a ser dada.
XV) Assunto: Recrutas militares. Reserva territorial. Acto revogatório
Processos n.°s 82/R-2213-B-1 e 83/R-291-B-1
Chefe do Estador-Maior do Exército:
1 — Em resposta aos ofícios n."5 4924, de 8 de Abril de 1983, e 6394, de 16 de Maio de 1983, o Gabinete do Chefe do Estado-Maior do Exército esclareceu, a coberto dos ofícios n.ÜS 2683, de 10 de Maio de 1983, e 3626, de 23 de Junho de 1983, o seguinte:
1) O recruta A... transitou indevidamente para a reserva territorial em 1 de Janeiro de 1981;
2) Foi incorporado no Regimento de infantaria do Porto em 8 de Outubro de 1982;
3) Está abrangido pelo despacho do general aju-dante-general do Exército de 12 de Maio de 1982, encontrando-se na situação de licença registada até à decisão dos processos de justiça.
4) O recruta B... passou à situação de reserva territorial em 1 de Janeiro de 1981 e foi incorporado após o despacho de 12 de Maio de 1982.
2 — Com base nas informações prestadas, constata-se que aqueles recrutas transitaram para a reserva territorial em 1 de Janeiro de 1981, transição essa que reveste a natureza de acto constitutivo de direitos.
3 — Mesmo a admitir-se que o acto de transição em causa foi lavrado com manifesto erro de facto sobre os pressupostos, ou seja, que ficou afectado por algum vício que o tornou ilegal, a revogação do mesmo acto apenas poderia ter validamente lugar no prazo fixado pela lei para a interposição de recurso contencioso ou até à interposição dele, prazo esse que é de 1 ano, nos termos do disposto no artigo 18.°, n." 2 da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo e nos artigos 51.°, n.° 4 e 52.°, § 4.°, ambos do Regulamento do Supremo Tribunal Administrativo.
4 — Ora, sucede que o acto de transição de 1 de Janeiro de 1981 apenas foi revogado no seguimento do despacho do general ajudante-general datado de 12 de Maio de 1982, e os recrutas A... e B... incorporados depois de Maio de 1982. A revogação do alegado acto de transição ilegal operou-se, portanto, depois de expirado o prazo legalmente estipulado (1 ano) para a revogação dos actos constitutivos ilegais, conforme, expressamente, reconhece o Estado-Maior do Exército nos ofícios de 10 de Maio e 23 de Junho de 1983.
Nestes termos, permito-me formular a V. Ex.\ ao abrigo do disposto no artigo 18.°, n.° 1, alínea o), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:
Que sejam revistas as situações militares dos recrutas A... e B..., em virtude de se ter apurado que o despacho revogatório do acto de transição ilegal dos mesmos para a reserva territorial foi proferido depois de decorrido o prazo de 1 ano previsto na lei para a revogação dos actos constitutivos de direitos afectados de ilegalidade.
Agradeço me seja informado sobre a sequência que merecer a presente recomendação.
XVI) Assunto: Direito de reunião. Igreja Evangélica
Processo n.° 82/R-1852-B-1
Presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim:
1 — Em referência à matéria exposta no ofício dessa Câmara Municipal n." D-l/85, de 9 de Fevereiro de 1984, e expediente anexo, comunico que, após análise do assento, se concluiu o seguinte:
a) O artigo 14.° do Decreto-Lei n.° 406/74, dc 29 de Agosto, define a competência dos tribunais ordinários para a apreciação das decisões das autoridades tomadas com violação do diploma, mas tal não significa falta de competência do Provedor de Justiça para a análise do caso, já que, nos termos da lei, a sua actuação é independente dos meios graciosos e contenciosos (artigo 3.° da Lei n.° 81/77, de
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22 de Novembro) e tem como atribuições a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos (artigo 1.° do citado diploma) cabendo-lhe também dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correcção dos actos administrativos ilegais ou injustos [artigo 18.°, n.° 1, alínea a), do diploma citado];
b) A falta de resposta atempada da Câmara Municipal à carta da Igreja Evangélica de 5 de Agosto de 1982, a qual só obteve resposta em 13 de Agosto de 1982, determinou, nos termos do artigo 3.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 406/ 74, de 29 de Agosto, que os reclamantes poderiam realizar as reuniões nos locais e horas pelos mesmos indicados; se os mesmos não usufruíram dos direitos conferidos pela lei, tal não significa que a Câmara pudesse, fora do prazo estipulado (24 horas), formular quaisquer objecções, quer referentes aos aspectos constantes dos artigos 1.°, 6.°, 9." ou 13.°, quer aos aspectos de irregularidade formal do pedido constantes do artigo 2.°, n.° 2; a deliberação da Câmara neste caso enferma de incompetência ratione temporis;
c) As objecções extemporaneamente colocadas pela Câmara Municipal quanto a dois dos locais indicados também não se conformam com o regime definido do artigo 45.° da Constituição e Decreto-Lei n.° 406/74, de 29 de Agosto, quanto ao exercício do direito de reunião, já que da letra e espírito dos normativos legais decorre que o mesmo não depende de qualquer autorização, podendo apenas ser formuladas objecções nos restritos termos previstos nos artigos 1.°, 6.°, 9.° e 13.* do Decreto--Lei n.° 406/74; aos invés, os motivos apresentados pela Câmara baseiam-se em puras razões de conveniência e não se indicam os preceitos legais em que se apoiam nem se justificam os fundamentos que terão levado a considerar tais reuniões como perturbadoras da ordem e tranquilidade públicas.
2 — Embora a questão tenha perdido interesse actual, não posso deixar de formular um reparo à actuação da Câmara Municipal neste caso.
3 —"Em face de tudo o exposto, e tendo em atençãc a competência que me confere o artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, considero de formular a seguinte recomendação:
Que para o futuro essa Câmara Municipal seja mais rigorosa no cumprimento das disposições constitucionais e legais em matéria de direito de reunião, tendo em vista as considerações que se deixam formuladas.
♦
XVII) Assunto: Pensão de sobrevivência. Reversas
Processo n.° 84/R-661-B-1
í
Presidente do conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos:
Verifica-se, pelo teor do ofício cuja fotocópia se junta, que essa Caixa, ao justificar a não reversão desde Junho de 1983 da pensão de sobrevivência era causa, se apoia em dois fundamentos: por um lado,
o facto de só em Novembro daquele ano ter recebido o atestado de matricula da descendente que, em partes iguais com sua mãe, irá beneficiar da reversão; por outro, a circunstância de os serviços estarem ocupados com o processamento da actualização das pensões, o que determina que a referida reversão só venha a ter lugar após o próximo mês de Julho.
Considerando que é norma dos serviços escolares emitirem os atestados de matrícula no início de cada ano lectivo — Outubro e Novembro;
Considerando que o decurso de 1 ano é tempo demasiado para a espera da reversão de uma pensão de sobrevivência;
Considerando que estão em jogo benefícios de ordem social que visam necessidades, na maioria dos casos, de grande premência e que por isso se não compadecem com morosidade de ordem administrativa;
Considerando que a desvalorizaçdo galopante da moeda agrava em grande medida os efeitos negativos da mora nos pagamentos.
Permito-me formular a seguinte recomendação:
1) Que o caso vertente seja atendido o mais brevemente possível;
2) Que sejam tomadas providências no sentido de, para o futuro, os casos que se não integrem nas alterações gerais de regime sejam resolvidos atempadamente, não ficando na dependência do movimento inerente à alteração da generalidade das pensões.
Agradeço a V. Ex.a que me seja comunicada a posição dessa Caixa relativamente à presente recomendação.
XVIII) Assunto: Comissão de serviço. Renovação Processo n.° 84/R-222-A-2
Ministro da Cultura:
Em referência à matéria tratada nos ofícios desse Gabinete n.° 1032, de 27 de Fevereiro de 1984, e n.° 1806, de 9 de Abril de 1984, cabe-me informar V. Ex.a que, após análise da situação, se concluiu o seguinte:
1) F... tomou posse do lugar de chefe de divisão do quadro de pessoal da Biblioteca Nacional em 5 de Fevereiro de 1981, em comissão de serviço, pelo período de 3 anos, a qual findaria em 5 de Fevereiro de 1984, nos termos do n* 2 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-F/ 79, de 25 de Junho, embora a mesma se devesse considerar automaticamente renovada, segundo o mesmo preceito legal, se até 30 dias antes do seu termo a Administração ou a interessada não tivessem manifestado expressamente a intenção de a fazer cessar;
2) Independentemente da posição que se possa tomar sobre o entendimento a dar à expressão «manifestação expressa» (a reclamante aceita-a apenas como forma escrita, e tendo a data de 31 de Janeiro de 1984, e os serviços dependentes de V. Ex.a invocam a forma oral, que teria ocorrido em 16 de Janeiro de 1984), O certo é que, em qualquer das datas, a manifestação de vontade da Administração no sen-
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tido de fazer cessar a comissão de serviço em causa ocorreu em data posterior à legalmente prevista;
3) Nos termos da lei, a falta de manifestação atempada da vontade da Administração em fazer cessar determinada comissão de serviço determina a sua renovação automática, pelo que deverá entender-se ferido de ilegalidade, quer na modalidade de incompetência ratione temporis, quer na de vício de forma, o despacho de V. Ex." de 25 de Janeiro de 1984, que fez cessar a comissão de serviço da reclamante, numa altura em que a mesma já se presumia renovada, por falta de cumprimento oportuno de uma formalidade essencial.
Em face do exposto, e atendendo à competência que me é conferida pelo artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que seja revogado o despacho de 25 de Janeiro de 1984, com efeitos à data do termo da comissão de serviço inicial de F...
Solicito me seja, oportunamente, informado do seguimento que vier a ser dado a esta recomendação.
XIX) Assunto: Licença de uso e porte de arma de- caça. Carta de caçador
Processo n.° 84/R-8-B-1
Presidente da Câmara Municipal de Olhão:
Informo V. Ex.a de que após análise da reclamação apresentada por F..., residente no sítio de Bela Curral, freguesia de Pechão, concelho de Olhão, concluí ser a mesma procedente, pelas razões que seguidamente enuncio.
Como prescreve o artigo 2." do Decreto-Lei n.° 37 313, de 21 de Fevereiro de 1949, as armas de caça podem ser destinadas a exercícios venatórios ou a outros permitidos por aquele regulamento, aprovado pelo citado diploma legal.
Ora, os artigos 44.° e 60.° do citado regulamento claramente inculcam a ideia de que as armas de caça podem ser utilizadas na defesa de propriedades rurais.
E para tanto os seus donos deverão ser portadores da licença de uso e porte de arma de caça (artigo 58.°, § 1.°, do regulamento em análise).
Mas tal licença de uso e porte de arma de caça não se confude com a licença de caça.
Esta última é exigida para o exercício da caça, como prescreve o artigo 44.° do Decreto n.° 47 847, de 14 de Agosto de 1967, e, ao contrário da licença de uso e porte de arma de caça, que é válida por 5 anos (artigo 58.° do Decreto-Lei n.° 37 313), é apenas válida por época venatória (artigo 19.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 354-A/74, de 19 de Agosto).
Por outro lado, como flui do disposto nos artigos tl.°, 16.° e 18.° do Decreto n.° 47 847, de 14 de Agosto de 1967, só o exercício venatório exige a titularidade da carta de caçador.
Como o reclamante não pretende praticar actos de caça (artigo 3.° do Decreto n.° 47 847), é óbvio que não está obrigado a ser titular da carta de caçador.
Por outras palavras, nada na lei obriga a que se condicione a emissão da licença de uso e porte de arma de caça à posse da carta de caçador.
E que assim é pode ainda concluir-se do disposto no artigo 105.° do citado Decreto n.° 47 847, que prescreve:
Os guardas particulares com direito ao uso de espingarda de caça para guarda das propriedades [...] embora possuam licença de caça [...] só poderão ser portadores [...].
Na verdade, de tal preceito só pode resultar que o uso e porte de arma de caça nada tem a ver com a condição de ser caçador, isto é, com a posse de licença de caça, pois neste caso ele está condicionado apenas a utilização de determinado tipo de munições, o que faz subentender necessariamente que, quando se é possuidor apenas da licença de uso e porte de arma de caça, não se poderá exercer a actividade venatória, e que é, pois, perfeitamente distinto da actividade venatória o simples direito ao uso de espingarda de caça destinada à guarda de propriedades rurais.
Não se afigura, pois, que a actuação de V. Ex.a, ao exigir ao reclamante carta de caçador, esteja conforme às disposições legais citadas.
Nestes termos, tenho por bem formular a seguinte recomendação:
Que V. Ex.a não crie quaisquer obstáculos à renovação da licença de uso e porte de arma de caça requerida pelo reclamante F...
Agradeço que a este Serviço seja comunicado o teor da deliberação que recair sobre a presente recomendação.
XX) Assunto: Regime do chefias. Substituição Processo n.° 83/R-1139-A-2
Presidente do conselho directivo dos Serviços Médico-Sociais:
Em referência à matéria tratada no ofício desse conselho directivo n.° 102 889, de 7 de Março de 1984, comunico que, após análise do assunto, se concluiu o seguinte:
1) O acto de designação de técnico superior de 1classe para chefiar técnicos superiores principais exprime uma forma de gestão de pessoal desconforme com regras normais, por subverter princípios básicos de hierarquia;
2) O mesmo acto representa, também, ofensa a diversos princípios e regras do regime das chefias constante do Decreto-Lei n.° 191—F/ 79, de 26 de Junho (aplicável ao pessoal dos Serviços Médico-Sociais, em todas as matérias não especificadamente reguladas no Decreto--Lei n.° 124/79, de 10 de Maio, nos termos do seu artigo 1.°, n.° 1), quanto aos seguintes pontos:
Se não existia no serviço em causa técnico superior principal vocacionado para o exercício de funções de chefe de divisão a título permanente (pois é requisito necessário mas não suficiente a designação dever recair em técnicos de categoria mais elevada), poderia ter sido utilizada a pro-
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vidência excepcional de alargamento de área de recrutamento, a efectuar por portaria conjunta do ministro competente, sob parecer da Secretaria de Estado da Administração Pública [cf. artigo 2.°, alínea b), n.° 4];
Se o objectivo era apenas suprir uma ausência temporária da respectiva chefia por via de substituição, então a mesma deveria ter sido atribuída ao técnico superior de categoria mais elevada [cf. artigo n.° 5, alínea &)];
Dos princípios gerais informadores do De-creto-Lei n.° 191—F/79 decorre também terem sido estabelecidas formas típicas para o provimento em cargos de chefia (comissão de serviço) ou para a sua suplencia em situações de vacatura, ausência ou impedimento (substituição), não se admitindo a investidura ou o exercício de funções dc chefia em situações diferentes das indicadas;
3) Por outro lado, na perspectiva do funcionário chamado a exercer funções de chefia de grau equivalente a chefe de divisão mas sem a remuneração correspondente ao cargo (pois continua a ser abonado das remunerações relativas a técnico superior de 1.a classe), é de acentuar também a violação do princípio constitucional de que a retribuição do trabalho deve ser feita de acordo com a natureza, qualidade e quantidade do trabalho [cf. artigo 60.°, n.° 1, alínea a), da Constituição].
Em face do anteriormente exposto, e tendo em atenção a competência que me confere o artigo 18.°, n." 1. alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, não posso deixar de exprimir um reparo à actuação seguida por esse conselho directivo no tratamento deste caso e de formular a seguinte recomendação:
Que no mais curto prazo possível seja assegurada, a título permanente ou transitório, uma forma de investidura ou exercício de funções de chefe de divisão conforme com a legislação em vigor.
Solicito a V. Ex.a que se digne manter-me informado sobre as diligências que venha a tomar para a execução desta recomendação.
XXI) Assunta: Administração de condomínio
Processo n.° 83/R-2118-B-1
Presidente da Junta Autónoma de Estradas:
Após análise da reclamação apresentada pela administração do condomínio do lote 28, Impasse Ilha das Flores, Cacém, concluiu-se ser a mesma inteiramente procedente.
E isto porque a administração do condomínio nenhuma reiação jurídica tem com os inquilinos de qualquer fracção.
Os encargos com a conservação e fruição das partes comuns do prédio são pagos pelos condóminos (artigo 1424.°, n.° 1, do Código Civil).
É, por outro lado, obrigatório o seguro do prédio contra risco de incêndio (artigo 1429.°, n.° 1, do Código Civil) e não de cada fracção, devendo cada condómino pagar a sua quota-parte do seguro, nos termos do artigo 1424.°, n.° 1, do Código Civil.
A Junta Autónoma de Estradas, relativamente ao prédio em causa, é apenas titular de um direito real privado, e não se conhece e nem se aceita que exista qualquer disposição que a isente de pagar a quota-parte do encargo com a contribuição do seguro do prédio e pagamento dos prémios devidos.
0 que vem de dizer-se não impede obviamente que a Junta Autónoma de Estradas celebre contrato cora os seus inquilinos em que estes assumam a obrigação de pagar as despesas comuns perante a administração do condomínio.
Enquanto tal não acontecer, o devedor da obrigação de pagar os encargos é a Junta Autónoma de Estradas, como proprietária da fracção.
Nestes termos tenho por bem formular a seguinte recomendação:
Que a Junta Autónoma de Estradas proceda ao pagamento das dívidas que tem com a administração do condomínio reclamante.
Agradeço que me seja comunicada a sequência que o caso venha a ter.
XXJI) Assunto: Chefe do secretaria municipal. Substituição
Processo n.° 83/R-911-B-4
Presidente da Assembleia Distrital de Aveiro:
Acuso a recepção do ofício de V. Ex.a acima referenciado, ponderando simultaneamente o seguinte: renciado, ponderando simultaneamente o seguinte:
1 — Segundo constava do parecer emitido pelo chefe da secretaria da Assembleia Distrital de Aveiro acerca do problema em causa, «a requerente estava já ocupando desde 2 de Outubro de 1979 o cargo de chefe de secretaria, ao abrigo das disposições do artigo 15.° do Decreto-Lei n." 76/77, de 1 de Março, se bem que não se tenha conhecimento de qualquer despacho ordenando tal substituição [...]».
E embora se tivesse adiantado no referido parecer que «[...] embora nos pareça que desde 1 de Julho de 1979 esta legislação é que deveria predominar sobre o Decreto-Lei n.° 76/77, entende-se que mesmo ao abrigo deste deveria ter existido despacho autorizando a prorrogação de tal regime (n.° 6 daquele artigo) e que a substituição deveria recair no funcionário de maior categoria existente na secretaria, o que não foi o caso», não deixou de se pôr em evidência que «de qualquer modo foram abonados à requerente os vencimentos do cargo de chefe de secretaria tendo até sido abonada da subida de letra prevista no Decreto-Lei n.° 379/79, de 13 de Setembro».
No mencionado parecer se concluía, aliás, que:
Face aos antecedentes citados, à aprovação tácita que parece ter havido do preenchimento das funções de chefia pela requerente em continuidade de outros funcionários que já haviam desempenhado as mesmas, parece de atender o pedido formulado.
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2 — Posto o que antecede, afigura-se pouco curial o argumento invocado peia Assembleia Distrital de Aveiro no seu ofício n.° 162, de 29 de Fevereiro de 1984, no sentido de que:
Em virtude de não existir nenhum despacho autorizando a substituição de F.como substituto legal do chefe de secretaria, no período compreendido entre 1 de Julho e 22 de Outubro de 1979, não lhe foram pagas as remunerações compreendidas naquele reforço de tempo.
Na realidade, com observância ou inobservância das disposições do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março (cujo artigo 15.° não aludia expressamente à exigência de despacho de designação do substituto dos titulares dos cargos de direcção e chefia), e com respeito ou desrespeito das normas do ulterior Decreto-Lei n.° 191—F/ 79, de 26 de Junho, parece indesmentível que a reclamante substituiu o chefe de secretaria no exercício das respectivas funções, no período decorrido de 1 de Julho a 22 de Outubro de 1979, e que por isso mesmo lhe foram então abonados os correspondentes vencimentos, havendo-lhe sido paga, inclusivamente, a importância correspondente à subida de letra do cargo de chefe de secretaria, prevista no Decreto-Lei n." 379/79, de 13 de Setembro.
Assim, e havendo o Decreto-Lei n.° 405/79, de 27 de Setembro, alterado as remunerações dos chefes de secretaria das assembleias distritais, com efeitos relroactivos, lógico parece que venham a ser abonadas à reclamante as importâncias correspondentes a tal diferença de remunerações, consoante opinou, aliás, o chefe de secretaria da Assembleia Distrital de Aveiro.
3 — Face ao que antecede, e tendo em vista o disposto no artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/ 77, de 22 de Novembro, recomendo que seja adoptado o procedimento a que alude a parte final do n.° 2 do presente ofício e solicito, simultaneamente, que seja transmitido a este Serviço esclarecimento acerca da deliberação que venha a ser tomada pela Assembleia Distrital de Aveiro para adequada resolução do problema pendente.
KKIí!) Assunto: Aposentação. Acréscimo de 25 % a pensionis-uas criundos do quadro gorai de adidos
Processo n.° 84/R-823-B-1
Ministro das Finanças e do Plano:
1 — De harmonia com o disposto no n.° 4 do artigo 49.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abrií, os adidos que preenchessem determinadas condições beneficiavam, uma vez aposentados, de um acréscimo nas suas pensões correspondente a 25 % do quantitativo das mesmas.
2 — Por outro lado, o Decreto-Lei n.° 106-A/83, de 18 de Fevereiro, ao introduzir melhorias nas pensões, estabeleceu como limite não poderem tais melhorias dar origem a pensões que •excedessem as que seriam calculadas com base nas remunerações líquidas fixadas no próprio diploma para as respectivas categorias funcionais.
3 — Ao dar execução a este último normativo, a Caixa Geral de Aposentações, com vista a não protelar a atribuição dos respectivos aumentos à maioria dos
pensionistas oriundos do quadro geral de adidos (in-teressa aqui acentuar que essa maioria foi contemplada com o acréscimo de 25 % referido no ponto 1), tratou, para efeitos de determinar a aludida limitação constante do Decreto-Lei n.° 106-A/83, genericamente, os aposentados, como se todos tivessem beneficiado, aquando do cálculo da pensão, do acréscimo atrás referido.
4 — Dessa actuação resultou que os aposentados cujas pensões não beneficiaram inicialmente do acréscimo de 25 % receberam melhorias superiores àquelas a que efectivamente tinham direito, sem que disso tivessem conhecimento.
Assim, vem agora a Caixa Geral de Aposentações exigir-lhes a reposição das importâncias que deliberadamente foram pagas a mais, importâncias que por vezes orçam a algumas dezenas de contos, e cujo pagamento, não obstante poder ser realizado em prestações, que contudo não podem ser inferiores a 10 % do valor da pensão, se torna gravoso para os titulares de pensões mais exíguas.
5 — Neste contexto, conclui-se que tinha constituído solução socialmente mais adequada ter a Caixa pago à generalidade dos aposentados, não por excesso, mas por defeito, isto é, não levando em conta a qualquer deles o acréscimo de 25 %, vindo posteriormente a liquidar os necessários ajustamentos àqueles que a eles tivessem direito.
Deste modo, ao abrigo do artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito--me dirigir a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que, com base no artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 324/80, de 25 de Agosto, seja determinada a relevação do pagamento das quantias em causa.
Solicito a V. Ex.a que me seja comunicada a. posição desse departamento relativamente à presente recomendação.
XXIV) Assunto: Pensão de sobrevivência. Duração otíatEs d® casamento
Processo n.° 84/R-2102-B-1
Director dos Serviços da Caixa Nacional de Previdência:
1 — Pelo ofício cujo fotocópia se junta, verifica-se que essa Caixa entende que a remessa que o artigo 9." do Decreto n.° 52/75, de 8 de Fevereiro, ¿az para o artigo 41.° do Decreto-Lei n.° J42/73, de 30 de Março, não permite levar em conta para esse efeito a versão que o Decreto-Lei n.° 191-B/79, de 25 de Junho, veio dar a esse mesmo artigo 41.°, sendo de aplicar a redacção antiga.
Resulta dessa posição que, enquanto os cônjuges viúvos de servidores civis do Estado que prestaram serviço no continente e ilhas adjacentes recebem pensão de sobrevivência independentemente do tempo durante o qual estiveram casados e da existência de filhos, os cônjuges viúvos de servidores das ex-províncias ultramarinas, no caso de não haver filhos, só auferem aquele benefício social se tiverem estado casados pelo menos 1 ano.
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2 — Consideramos, porém, que o Decreto n.° 52/75 consente que se atenda à nova redacção do artigo 41,° do Decreto-Leí n.° 142/73.
A esta convicção nos conduz o seu preâmbulo.
Acentua-se nesse preâmbulo o objectivo de «harmonizar», em determinados aspectos, os regimes da aposentação e da pensão de sobrevivência dos servidores civis do Estado em serviço nos territórios ultramarinos com os vigentes no continente e ilhas adjacentes.
Ora, tendo o regime de sobrevivência contido no artigo 41.° do Decreto-Lei n.° 142/73, para o qual o artigo 9° do Decreto n.° 52/75 remete, sido alterado pela nova redacção que o Decreto-Lei n.° 191—B/79 imprimiu àquele preceito, para que a referida harmonização continue a ter lugar torna-se, pois, necessário proceder a uma interpretação actualista desse artigo 9.°, de modo a reputar a remissão que nele se prescreve como feita para a nova redacção.
3 — Por outro lado, a aplicação, neste campo, do artigo 41." do Decreto-Lei n.° 142/73 na sua primitiva redacção, sem que haja uma razão de facto com substancial relevância a justificá-la, produzirá uma discriminação dos familiares dos servidores do Estado nos territórios ultramarinos relativamente aos familiares de servidores do Estado no continente e ilhas adjacentes, o que parece consubstanciar uma violação do princípio da igualdade consignado no artigo 13.° da Constituição.
4 — Neste contexto, ao abrigo da alínea cr) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77. de 22 de Novembro, formulo a seguinte recomendação:
Que, tendo em atenção os argumentos atrás expendidos, e para efeito de aplicação do artigo 9.° do Decreto n." 52/75, se considere o artigo 41.° do Decreto-Lei n.° 142/73 na sua actual redacção.
XXV) Assunto: Importação de veículo automóvel. Benefícios concedidos a deficientes
Processo n.° 83/R-2327-A-2
Ministro das Finanças e do Plano:
1 — Na sequência de queixa apresentada neste Serviço por F... acerca do indeferimento, pela Alfândega do Porto, do pedido de importação de veículo automóvel ligeiro com o bilhete de importação n.° 15 024, de 2 de Março de 1983. aquela estância aduaneira informou, através do ofício n.° 4090, de 7 de Março de 1984, que a posição assumida resultou do facto de o veículo a importar não poder ser considerado «como de modelo utilitário», de acordo com o despacho do Secretário de Estado do Orçamento de 8 de Julho de 1982, comunicado pela nota n.° 21771, processo n.° 3.1.3.0. (257) 1/82, de 9 de Julho.
2 — Apreciados os elementos fornecidos pela Alfândega do Porto, pude constatar que, para efeitos de concessão de benefícios fiscais previstos na Lei n.° 11/78, de 20 de Março, se estabeleceu, com base no falado despacho, a orientação de não considerar veículos utilitários aqueles cuja cilindrada seja superior a 1600 cm3, até 8 de Julho de 1982.
E a partir desta data, e até ao fim do ano em questão, a de considerar utilitários, para efeitos da citada lei, aqueles veículos cujo preço de venda ao público, incluindo o respectivo imposto, não ultrapassar os
950 contos, e não tenham cilindrada superior a 1700 cm3 e potência que não ultrapasse 75 cv din ou 55,2 kW.
3 — Acontece que a Lei n.° 11/78, de 20 de Março (artigo 1.°), e o Decreto-Lei n.° 235-D/83. de 1 de Junho (que a revogou), estabelecem um critério de índole objectiva (automóveis ligeiros de passageiros, para uso próprio, de modelo utilitário, com cilindrada não superior a 1600 cm5/1700 cm3, quando de motor a gasolina, e a 2500 cm3 quando de moto a gasóleo) com vista ao reconhecimento da isenção de direitos aduaneiros e demais encargos fiscais.
Aqueles diplomas não só não definiram o conceito de veículo utilitário como não forneceram — porque desnecessárias — indicações a tal respeito. Muito menos concederam poderes à administração fiscal para o efeito.
4 — Por outro lado, a Lei n.° U/78 não conferiu poderes ao Ministro das Finanças para esclarecer dúvidas suscitadas na aplicação da mesma lei. Tal competência foi conferida, conjuntamente, aos titulares das pastas das Finanças, Assuntos Sociais e Defesa, conforme resulta do seu artigo 4.° Logo, o despacho já referenciado do Secretário de Estado do Orçamento ficou afectado de incompetência material.
Nestes termos, e ao abrigo do disposto nos artigos 18.°, n.° 1, alínea a), e 34.°, n.° 1, da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, formulo a V. Ex.° a segujnte recomendação:
Que seja revisto o processo de importação do veículo automóvel em que figura como requerente F..., a fim de este poder beneficiar, como é de lei, dos benefícios fiscais reconhecidos aos deficientes.
Agradeço ser informado do seguimento que for dado à presente recomendação.
XXVI) Assunto: Imposto complementar. Apresentação da declaração. Encerramento antecipado do^ posto
Processo n.° 83/R-1432-A-2
Ministro das Finanças e do Plano:
Junto fotocópias da reclamação apresentada por F..., relativa ao encerramento antecipado do posto de recepção de declarações do imposto complementar, sito na Junta de Freguesia da Costa da Caparica, bem como da correspondência trocada, sobre o caso, entre este Serviço e a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos.
Entre esta correspondência consta a «recomendação» que formulei (ofício n.° 1118, de 2 de Fevereiro de 1984) àquela Direcção-Geral e a sua ulterior comunicação de não acatamento da mesma (ofício n.° 1401, de 15 de Março de 1984).
Considerando:
a) Que mantenho e aqui dou por reproduzidas, na íntegra, as razões com que fundamentei a recomendação;
b) Que, mesmo aceitando a tese da Direcção--Geral das Contribuições e Impostos, de que «o funcionamento dos postos de recepção significa uma atitude de ajuda da Administração para facilitar as obrigações dos contribuintes», a inobservância dos termos e con-
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dições divulgadas para tal «ajuda» —com especial relevo para o horário— bem pode convertê-la em prejuízo: ilustra-o o caso do reclamante, que, se soubesse que encontraria a porta do posto «encerrada às 21 horas e 50 minutos», apesar do horário «das 19 horas às 22 horas ali estabelecido» (ofício n.° 5349, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos), poderia ter evitado a multa, pela tempestiva apresentação da declaração na Repartição de Finanças (é, porém, evidente que não lhe era exigível prever que o horário «estabelecido» não seria respeitado); c) Que, quanto às deduções feitas no penúltimo parágrafo do aludido ofício da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos n.° 1401, o teor da carta do reclamante de 5 de Março de 1984, também junta, parece contrariá-las.
Venho de novo formular, agora junto de V. Ex.°, directamente, a citada recomendação, do teor seguinte:
Que não seja aplicada multa ao reclamante — ou lhe seja restituída a já aplicada— com o alegado fundamento de não ter apresentado a declaração em causa rio prazo respectivo, facto que não ocorreu, e, a ter-se por ocorrido, dever, no caso, considerar-se imputável à Administração.
Solicito a V. Ex.3 se digne informar-me do seguimento dado à presente recomendação.
XXVII) Assunto: Tratamento termal e heliomarítimo. Reembolso de despesas
Processo n.° 83/R-1763-B-1
Presidente do conselho de administração dos Correios e Telecomunicações de Portugal:
1 —No nosso ofício n.° 4337, de 4 de Abril de 1984, solicitou-se que nos fossem indicadas as razões que estiveram na origem do «indeferimento» do pedido de pagamento da despesa que a operadora dos CTT F... suportou com os tratamentos termal e heliomarítimo que lhe foram prescritos pelo médico que por conta dessa empresa a está a assistir, em consequência do acidente em serviço que sofreu.
2 — Em resposta foi recebido o ofício n.° 5494, de 7 de Maio de 1984, n.° 10 505, em que se afirma que a posição assumida no caso se baseou no parecer da junta médica dos CTT, emitido em 8 de Junho de 1983, segundo o qual os aludidos tratamentos não eram imprescindíveis à recuperação da trabalhadora, embora fossem necessários e adequados.
Salienta-se no mesmo ofício que, nos termos do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 38 522, de 23 de Novembro de 1951, só há obrigação de proporcionar meios ou agentes terapêuticos aos funcionários vítimas de acidentes em serviço relativamente aos quais esses tratamentos se revelem imprescindíveis.
3 — Também consideramos que o regime a que acaba de se fazer referência é aquele que efectivamente vigora.
Todavia, não deriva daí imediatamente que a solução dada ao caso vertente tenha sido a correcta. Isto
porque há que ter em conta outros factos que, sob o ponto de vista jurídico, ditam uma solução diversa.
A eles nos passamos a referir.
Estando o médico que prescreveu os tratamentos à reclamante a actuar por incumbência dessa empresa, isso teve como efeito ficar a trabalhadora com a obrigação de observar aquela prescrição, uma vez que, segundo a base xni da Lei n.° 2127, de 3 de Agosto de 1965, e o artigo 18.° do citado Decreto-Lei 38 522, as vítimas de acidentes devem submeter-se ao tratamento e observar as prescrições clínicas e cirúrgicas do médico designado pela entidade responsável e necessárias à cura da lesão ou doença e à recuperação da capacidade de trabalho.
Para que esta obrigação deixasse de existir teria sjdo necessário que essa empresa tivesse comunicado à interessada que, por força do parecer posterior da junta médica, a prescrição de tais tratamentos ficava sem efeito.
Ora essa comunicação só foi feita à trabalhadora em 22 de Julho de 1983, posteriormente à realização dos mesmos tratamentos e à entrega que ela fez dos documentos de despesa.
Logo, conclui-se que, à face da lei, a reclamante, ao realizar os tratamentos, estava a cumprir uma obrigação e que essa empresa está vinculada ao reembolso das respectivas despesas.
Neste contexto, ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito-me fazer a seguinte recomendação:
Que o caso da trabalhadora em causa seja revisto de harmonia com as considerações atrás expostas.
Solicitando que me seja comunicada a sequência que esta recomendação venha a ter.
XXVIII) Assunto: Promoções e reclassificações. Inquérito
Processos n.os 82/R-2086, 82/R-2349 e 83/R-1088
Ministro do Comércio e Turismo:
1 —Nos anos de 1982, 1983 e 1984 foram apresentadas queixas neste Serviço relacionadas com promoções e reclassificações efectuadas no Instituto do Comércio Externo de Portugal.
2 — Por razões diversas, o Instituto do Comércio Externo de Portugal não conseguiu satisfazer os pedidos de esclarecimento que a respeito lhe têm sido formulados, com a finalidade de habilitar-me a tomar posição no assunto em questão. Entre esses motivos figura o do alegado assalto ao gabinete do director do Departamento de Organização e Pessoal.
3 — Porque se mostra indispensável ultrapassar a situação de impasse à qual se chegou, perante as dificuldades acrescidas que têm surgido na obtenção de elementos de apreciação dos casos que mc foram apresentados, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que se instaure processo de inquérito destinado ao apuramento de factos relacionados com as promoções e reclassificações levadas a cabo no organismo em causa, enviando, para o efeito, toda a documentação relativa ao assunto.
Agradeço ser informado do seguimento que for dado à presente recomendação.
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XXOX) Assunto: Hospital de Santana. Readmissão de médicos-
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Processos n.°s 83/R-660-A-2 e 83/R-1455-A-2
Ministro da Saúde:
1—Na sequência dos meus ofícios n.w 12 124 e 4842, dirigidos a V. Ex.a em 30 de Novembro de 1984 e 12 de Abril de 1984, junto remeto cópia do ofício n.° 86, de 9 de Julho de 1984, do Sr. Provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, donde decorre não ter sido acatada a recomendação que foi feita àquela entidade no sentido da reanálise do processo que levou à transferência de 3 médicos-chefes de serviço do Hospital de Santana para o Hospital de José de Almeida, em Carcavelos, tendo em vista a sua readmissão ao serviço no primeiro dos hospitais.
2 — Esta recomendação tinha como subjacente o facto de o processo de transferência dos 3 médicos--chefes ter sido conduzido com quebra dos princípios de justiça, imparcialidade e proporcionalidade; acresce ainda que no processo não ficou demonstrada a necessidade de utilização imediata ou futura dos 3 médicos no hospital de destino e, ao invés, a sua colocação como excedentes no quadro do Hospital de losé de Almeida confirma a falta de causa do acto de transferência.
3 — Em face do exposto, porque se me afigura que a situação deverá ser reparada, permito-me formular a V. Ex.a, ao abrigo da competência que me é conferida pelo artigo 18.°, n.° 7, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:
Que se digne providenciar no sentido da readmissão dos 3 médicos-chefes no Hospital de Santana, com eventual publicação de adequada medida legislativa, se tal se tornar necessário.
4 — Nesta data formulei idêntica recomendação a S. Ex.a a Secretária de Estado da Segurança Social e solicito que se digne manter-me informado sobre as diligências que venha a tomar em sua sequência.
XXX) Ãsscrato: Tabela de equivalências funcionais. Reclassificação o reintegração de funcionários
Processo n.° 83/R-2159-A-3
Director-Geral de Integração Administrativa:
1 — Reporto-me ao ofício de V. Ex." n.° 24 186/ Div. Cont./84, de 20 de [unho do ano em curso, de que, para mais fácil localização, junto, em anexo, uma xerocópia (documento n.° 7).
2 — A reclassificação em primeiro-oficial do queixoso, para efeitos de integração no quadro do pessoal da Direcção-Geral do Pessoal do Mar e Estudos Náuticos, partiu, segundo tudo leva a crer (documento n.° 4 e informação n.° 8959/Div. Cont./84, anexa àquele ofício), do pressuposto de que a categoria de origem — subchefe de secção administrativa, letra I — não poderia ser reconhecida em Portugal por se tratar de caso abrangido pela alínea a) do n.° 1 do artigo 19." do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril — actual redacção—, já que não corresponderia a normal expectativa de promoção, e que o acto administrativo que a determinara, praticado pelo Governo
Provisório de Angola (de transição é que não poderia ser, dado o disposto na Lei n.° 1/75, de 3 de Janeiro), não seria conforme com as normas do Decreto n.° 46 982, de 27 de Abril de 1966, e dos diplomas orgânicos dos Serviços de Portos e Caminhos de Ferro de Angola.
Esse pressuposto afigura-se não ser correcto, porquanto:
2.1 —O acto administrativo —lista nominativa—, que atribuiu ao queixoso a designação funcional de subchefe de secção, com a categoria da letra J do artigo 91° do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, é datado de 4 de Outubro de 1974 e foi publicado no Boletim Oficial, 2? série, n.° 238, de 12 do mesmo mês (documento n.° 6).
Não se trata, por isso, de acto praticado pelo Governo Provisório de Angola, pois esta forma de governo da antiga colónia do mesmo nome só foi instituída pela Lei n.° U/74, de 27 de Novembro de 1974 (seu artigo 4.°).
Trata-se, sim, de acto administrativo emanado da Junta Governativa de Angola, instituída pela Lei n." 6/74, de 24 de Julho, Junta essa que detinha os mesmos poderes e exercia as mesmas funções do, até aí, chamado Governador-Geral de Angola.
Poderes e funções estas que, após a Revolução de 25 de Abril de 1974, não foram alterados, como decorre da Lei Constitucional n.° 3/74, de 34 de Mais (seu artigo 23.°).
Está-se, pois, em presença de um acto que, perante o Governo Central, tinha a mesma força vinculativa daqueles que tivessem sido praticados pelos antigos gover-nadores-gerais, ao abrigo da Lei Orgânica do Ultramar Português — Lei n.° 5/72, de 23 de Junho— e Estatuto Político-Administrativo de Angola, aprovado peio Decreto n.° 544/72, de 22 de Dezembro.
2.2 — Esse acto administrativo não violou as normas do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, relativas a promoções, porquanto os Caminhos de Ferre de Angola (como, também, os de Moçambique) se regiam, nessa matéria, por normas específicas (cf. justificação preambular do Decreto n.° 458/73, de 13 de Setembro, e artigo 3° deste mesmo diploma legal — as admissões e promoções do pessoal eram realizadas caso a caso, segundo normas aprovadas pelo Governador-Geral, sob proposta dos serviços).
E isto porque as rígidas normas do Estatuto do Funcionalismo Ultramarino, e seus consequentes formalismos e burocracia, não se compadeciam com a gestão eficaz de um serviço que, embora público, era, no fundo, uma verdadeira empresa industriai.
Mas nem as providências legislativas daquele decreto (que permitiam as promoções a lugares imediatos da mesma hierarquia, independentemente de concurso e outras formalidades) se revelaram, na prática, suficientes para resolver o problema.
Daí o Diploma Legislativo Ministerial n.° 6, de 25 de Maio de 1974, ter vindo permitir a distribuição do pessoal pelos lugares e categorias do mapa A, a e!c anexo, independentemente de qualquer condicionalismo, a não ser a pertinente proposta do conselho de administração.
Afigura-se-me, por isso, ter sido inteiramente \e%z\s porque conforme à letra e ao espírito desse diploma legislativo, a colocação do reclamante como subchefe de secção, letra J.
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E não interessa a forma de provimento em comissão de serviço no lugar em que até aí se achava investido — primeiro-oficial —, já que a lei fala em pessoal existente, independentemente, portanto, da natureza do respectivo vínculo.
De salientar que o queixoso foi seleccionado para o lugar de subchefe de secção, precedendo curso de formação (verso do documento n.° 8).
Mas mesmo que se tratasse de acto violador de qualquer disposição legal, designadamente das constantes do referido diploma legislativo ministerial, ele convalidou-se, posteriormente, pelo decurso do tempo, tornando-se caso decidido ou resolvido, nos termos gerais de direito, situação que terá de ser reconhecida em Portugal, uma vez que se trata de hipótese não abrangida pela alínea a) do n.° 1 do acima referido artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 dc Abril.
3 — Assim, e ainda porque considero inteiramente válidas e pertinentes as considerações feitas a propósito da tabela de equivalências aprovada pela Portaria n.° 430/83, de 14 de Abril —2." parte do ponto 3 do meu ofício n.° 2338, de 27 de Fevereiro de 1984—, tenho a honra de, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 18." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, formular a V. Ex.° a seguinte recomendação:
Que o processo de reclassificação da categoria de origem do reclamante, para efeitos de integração dele no quadro do pessoal da Direcção--Geral do Pessoal do Mar e Estudos Náuticos, seja revisto à luz das considerações acima relatadas e que, a menos que existam outras circunstâncias impeditivas (que de resto não me foram indicadas), se providencie para que venha a ser rectificada a tabela de equivalências anexa à informação n.° 270/GT/77, de 10 de Novembro (documento n.° 4), de modo que ao queixoso seja atribuída a categoria de chefe de secção, para efeitos de integração naquele quadro, como, aliás, é de opinião o Sr. Direc-tor-Geral do Pessoal do Mar e Estudos Náuticos (documento n.° 3).
4 — Muito agradeço que V. Ex.° me informe do seguimento e resolução que vierem a ser dados a esta minha recomendação.
XXXI) Assunto: Serviço Central de Acolhimento. Execução do programa de acção
Processo n.° 81/IP-38-B-1
Primeiro-Ministro:
1 — Com base no artigo, publicado na imprensa, cuja fotocópia se junta, determinei a abertura de um processo neste Serviço, com vista a averiguar o que efectivamente se passava no tocante ao Serviço Central de Acolhimento a pessoas em situação social de emergência e à institucionalização e funcionamento de equipas móveis para detectar a mendicidade, em especial dc crianças, que se está a tornar um autêntico flagelo social nos principais centros urbanos, sobretudo na cidade de Lisboa.
2 — No âmbito desse processo, foram ouvidos sobre o assunto a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e o Ministério dos Assuntos Sociais.
Pelo que respeita à Santa Casa da Misericórdia, foi-nos informado que se encontrava a funcionar o Serviço Central de Acolhimento da Cidade de Lisboa, para onde são encaminhadas, com a colaboração da Polícia de Segurança Pública, as situações de risco social detectadas na via pública.
Só que a insuficiência de uma estrutura de apoio não permite melhorar a capacidade de resposta do referido Serviço Central de Acolhimento, nem possibilita soluções de tratamento adequadas e eficientes.
Mais nos comunicou a Santa Casa da Misericórdia que tinha sido criado um grupo de trabalho com técnicos dos seus serviços e do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa, com o objectivo dc elaborar um programa de acção no âmbito específico da mendicidade, em que fosse prevista a acção integrada de cutros departamentos.
3 — Sucede que, não obstante esse grupo dc trabalho ter definido um programa de acção, com objectivos, âmbito de acção, prioridades, recursos e projectos de acções a desenvolver, não teve o mesmo seguimento, em virtude de falta de recursos humanos e materiais e de dispositivos legais que tornassem possível a co-responsabilização de diferentes entidades e serviços, quer da administração central, quer da administração local. Isto se afere do ofício do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa cuja fotocópia também se junta.
4 — Neste contexto, permito-me dirigir a V. Ex.°, com base na alínea a) do n.° I do artigo 18." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:
Que sejam tomadas —o mais urgentemente possível, face à premência da situação—, providências no sentido de virem a ser instituídos meios humanos, materiais e legais que permitam dar execução ao programa de acção referido no ponto 3.
XXXII) Assunto: Cláusulas de exclusividade de contratação. Associação Nacional de Farmácias
Processo n.° 84/R-1229-B-1
Primeiro-Ministro:
1 — Na sequência da queixa apresentada neste Serviço, cm laneiro de 1981, pelo Sindicato .... formulei recomendação ao então titular da pasta das Finanças e do Plano no sentido de ser suprimida a cláusula constante do acordo para fornecimento de medicamentos firmado entre a Assistência na Doença aos Servidores do Estado e a Associação Nacional de Farmácias, em 1 de Março dc 1976, segundo a qual a primeira outorgante sc comprometia a não celebrar com nenhuma entidade oficial ou particular qualquer contrato para aquisição de medicamentos pelos seus beneficiários.
2 — A recomendação em causa fundamentou-se no regime jurídico de concorrência estabelecido no Decreto-Lei n.° 215-C/75. de 30 de Abril (artigos \." e 5.°, n.° 2), no Decreto-Lei n." 48 547. de 27 de Agosto de 1969 (artigos 34.° e 62.°, n.° 1), na Lei n." í/72, de 24 de Março, senão no próprio Tratado de Roma (artigos 85.° e 94.°), e tendo em vista a projectada adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia.
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3 — O acatamento daquela recomendação veio a concretizar-se por ocasião do último acordo (de 25 de Janeiro de 1984) entre a Assistência na Doença aos Servidores do Estado e a Associação Nacional de Farmácias, homologado em 1 de Fevereiro de 1984, em cujo texto já não figura a falada cláusula de exclusividade de contratação.
4 — Entretanto, o mesmo Sindicato apresentou, em 7 de Junho de 1984, nova queixa, alegando que nos novos acordos da Associação Nacional de Farmácias com a Administração-Geral do Porto de Lisboa, a Radiodifusão Portuguesa, a Caixa de Previdência da Companhia dos Telefones, os Serviços Sociais do Ministério da Justiça e os Serviços Sociais das Forças Armadas consta uma cláusula de exclusividade de contratação com frontal violação das normas de liberdade de associação e concorrência.
5 — Tendo em vista a viabilidade de estender a solução encontrada no acordo entre a Assistência na Doença aos Servidores do Estado e a Associação Nacional de Farmácias aos acordos entre esta Associação e os organismos e empresas já referenciadas, sem perder de vista as novas regras internas relativas à concorrência (Decreto-Lei n." 422/83, de 3 de Dezembro), afigura-se oportuno formular, nos termos do que dispõe a alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77. de 22 de Novembro, a seguinte recomendação:
Que pelo Governo sejam tomadas providências visando a supressão, nos acordos para fornecimento de medicamentos outorgados com a Associação Nacional de Farmácias, de cláusulas de exclusividade de contratação com a mesma associação patronal, em virtude de tais cláusulas se revelarem ofensivas das regras da concorrência consagradas, quer na legislação interna, quer na específica da CEE.
Esta recomendação vale, com as necessárias adap tacões, para o acordo que os Serviços Sociais da Caixa Geral de Depósitos celebraram em 4 de Junho de 1982 com a Associação Nacional dos ópticos, no qual se previu e regulamentou o fornecimento de artigos de óptica, em condições especiais, pelas empresas nesta associadas, aos beneficiários daquela instituição.
Agradeço ser informado a respeito do seguimento da presente recomendação.
XXXIM) Assunto: Despojo de prédio adquirido pela Caiu Gerai de Depósitos
Processo n.° 84/R-1093-B-4
Presidente do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos:
Após análise do processo organizado neste Serviço com base na reclamação apresentada por F..., chegou--se às conclusões enunciadas de seguida:
O reclamante F... é inquilino do 4.° andar direito do prédio sito na Rua do Arco do Cego, 90, nesta cidade de Lisboa;
Tal prédio foi adquirido pela Caixa Geral de Depósitos em data indeterminada de 1983;
Em 29 de Dezembro de 1983, a proprietária do andar denunciou o arrendamento, apoiando-se nos artigos 8.° e 9.° do Decreto n.° 138-A/79, de 24 de Dezembro.
Entre os factos relevantes, pelo que passamos dt imediato à análise da questão jurídica.
Até à entrada em vigor do Decreto n.° 139-A/79, dúvidas não existiam de que a legislação sobre arrendamentos de prédios do Estado era aplicável aos arrendamentos da Caixa Geral de Depósitos.
Nesse sentido, o artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 693/ 70, de 31 de Dezembro, dispunha expressamente que:
À Caixa e suas instalações anexas continuam a ser aplicáveis em matéria de arrendamento as disposições dos Decretos-Leis n.05 23 465 e 23 931, respectivamente de 18 de Janeiro e 31 de Maio de 1934.
Sucede, porém, que o Decreto n.° 139-A/79, de 24 de Dezembro, passou a ser o único regime de arrendamento dos bens imóveis do domínio privado do Estado, o que determina necessariamente a revogação da legislação anterior e, consequentemente, o desaparecimento da ordem jurídica dos Decretos-Leis n.os 23 465 e 23 931.
E que a concepção estreita de Estado, no sentido de pessoa colectiva de direito público que tem o Governo como órgão, é a utilizada pelo Decreto n.° 139-A/79, resulta do facto de toda a economia processual do diploma assentar num departamento do Ministério das Finanças e do Plano — Direcção-Geral do Património.
Ora, a Caixa Geral de Depósitos é inquestionavelmente uma pessoa colectiva de direito público com património próprio (artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 639/ 70, de 31 de Dezembro), distinta do próprio Estado, embora por ele tutelada.
E por ser uma pessoa colectiva distinta do Estado houve necessidade de, através do Decreto-Lei n.° 23 931, de 18 de Janeiro de 1934, e do Decreto-Lei n.° 693/70, de 31 de Dezembro, lhe tornar extensivo o regime de arrendamento aplicável aos bens imóveis do Estado.
Neste momento, porém, não há qualquer norma legal que concretamente estenda à Caixa Geral de Depósitos o regime de arrendamento dos bens imóveis do Estado.
Na verdade, não se pode entender que a remissão que o artigo 24.° do Decreto-Lei n.° 693/70, de 31 de Dezembro, faz para o Decreto-Lei n.° 23 465, de 18 de Janeiro de 1934, se deva considerar feita na actualidade para o Decreto n.° 139-A/79, de 24 de Dezembro.
Ê que o regime de arrendamento dos prédios do Estado é um regime excepcional ao regime-regra regulado no Código Civil [artigo 1083.°, n.ü 2, alínea a), do Código Civil], e, como tal, não pode ser aplicado pela via analógica (artigo 11.° do Código Civil).
De resto, para que a situação sub judice fosse regulada por normas diferentes do regime geral, necessário seria que o regime específico estivesse regulado em legislação autónoma [artigo 1083.°, n.° 2, alínea d), do Código Civil] — neste sentido veja-se a anotação n.° 3 ao artigo 1083.° do Código Civil Anotado dos Profs. Doutores Antunes Varela e Pires de Lima.
Não pode esquecer-se, por outro lado, que o Decreto n.° 139-A/79 é um diploma que restringe sobremaneira o direito à habitação e o direito de acesso aos tribunais por parte dos inquilinos do Estado, e por isso mesmo é socialmente reprovável que, quer pela
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via analógica, quer pela vía de interpretação extensiva, tal regime seja tornado extensivo a situações fora da sua previsão legal.
Por tudo o exposto, afigura-se que a pretensão da Caixa Geral de Depósitos, de denunciar o arrendamento, não poderá ter apoio legal no Decreto n.° 139-A/79, que não é aplicável a essa instituição.
Nestes termos, permito-me formular a seguinte recomendação:
Que a Caixa Geral de Depósitos abandone o seu propósito de denunciar o contrato, e deixe, consequentemente, de proceder ao despejo através das autoridades policiais, por tal envolver ilegalidade face ao regime actualmente vigente, pelo que deverá ser tentada antes a solução do caso por via conciliatória.
Agradeço que me seja comunicada a sequência que for dada à recomendação ora formulada.
XXXIV) Assunto: Polícia Judiciária. Admissão no curso para inspector
Processo n.° 84/R-491-A-2
Primeiro-Ministro:
1 — No seguimento da queixa junta por fotocópia, que me foi apresentada por F. .... em 5 de Março de 1984, solicitei esclarecimento à Direcção-Geral da Polida Judiciária a respeito do andamento dado ao pedido do queixoso para ser admitido no curso para inspector, tendo em vista que a promoção do interessado ao cargo de subinspector produziu efeitos retroactivos a 3 de Maio de 1976, segundo consta do despacho ministerial publicado na p. 8953 do Diário da República, 2." série, n.° 247, de 26 de Outubro de 1983.
2 — Em resposta, a Polícia Judiciária informou, através do ofício n.° 7359, de 2 de Maio de 1984, que a promoção do queixoso foi efectuada de acordo com o Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria--Geral da República n.° 12/83, homologado por despacho de 12 de Julho de 1983 de S. Ex." o Ministro da Justiça, mas não publicado, não se mostrando viável a admissão do agente em causa ao curso de formação ao qual se refere o n.° 1 do artigo 106.° do Decreto-Lei n.° 458/82, por não ter desempenhado as funções de subinspector durante um triénio com a classificação de Muito bom, conforme a conclusão 8." do citado parecer.
3 — Da análise deste ressalta que está basicamente em causa, não apenas uma questão de legalidade, conforme decorre dos fundamentos dos votos de vencidos apostos no Parecer n.° 12/83, mas também de justiça no desenrolar de uma carreira. Assim sendo, afigura-se razoável que seja revista a situação do queixoso à luz do regime jurídico indicado nos expressivos e não menos bem fundados votos de vencidos, sabido que do deferimento da pretensão não advirá qualquer prejuízo para a Administração ou para terceiros.
Nestes termos, e ao abrigo do que dispõe a alínea a) do n.° 1 do artigo 18.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, permito-me formular a V. Ex.a a seguinte recomendação:
Que seja revista a situação do subinspector da Polícia Judiciária F..., por forma a viabilizar-se
a participação do mesmo no curso para inspector, atendendo não só ao facto de a promoção ao cargo de subinspector se reportar a 3 de Maio de 1976, mas também aos argumentos constantes dos votos de vencido apostos no Parecer n.° 12/83 do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República.
Agradeço que me seja comunicada a sequência que for dada à presente recomendação.
XXXV) Assunto: Execução do Decreto-Lei n.° 271/81, de 25 de Setembro
Processo n.° 84/R-244-A-2
Chefe do Estado-Maior do Exército:
No processo em análise neste Serviço, a que se refere o ofício n.° 4833 da Direcção do Serviço de Pessoal (Repartição do Pessoal Civil), chegou-se ao conhecimento de que ainda não havia sido dada plena execução ao disposto no Decreto-Lei n.° 271/81, de 25 de Setembro, no que diz respeito às nomeações do respectivo pessoal civil afecto a esse ramo das Forças Armadas.
Deste facto resultam prejuízos para os funcionários, que não podem progredir nas respectivas carreiras profissionais, pois ainda nem sequer estão nomeados para as categorias a que respeitam os vencimentos que estão a receber e a que têm direito a partir de 1979, conforme aquele diploma estabelece.
Nestes termos, ainda que tenha determinado o arquivamento do processo, por não poder ser satisfeita a pretensão de promoção apresentada, permito-me recomendar a V. Ex.a que, no mais breve prazo possível, seja mandado executar cabalmente o Decreto-Lei n.° 271/81, de 25 de Setembro, no que se refere à nomeação do pessoal para as respectivas categorias e ainda se digne mandar tomar as medidas necessárias para que o processo de promoções se lhe possa seguir, de modo a minorar os prejuízos sofridos pelos funcionários, com o atraso verificado nas suas nomeações.
XXXVI) Assunto: Gestores públicos. Utilização de veiculas para fios particulares
Processo n.° 83/R-1897-A-3
Primeiro-Ministro:
1 — Foi recebida nestes serviço uma reclamação
subscrita por F.....salientando ser inadmissível que os
gestores das empresas públicas, valendo-se da sua posição de topo na linha hierárquica e da relativa autonomia de que aquelas empresas gozam, por necessidade de eficiência, utilizem para fins pessoais, e até partidários, viaturas das citadas empresas, gerando situações de manifesto abuso e até de injustiça, porquanto a remuneração adicional não declarada resultante da utilização de viaturas para fins particulares é uma verdadeira fuga aos impostos.
2 — Nesta conformidade, e dado que nem nos estatutos das empresas públicas nem no Estatuto do Gestor Público se estabelecem quaisquer restrições à utiliza-
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ção pelos gestores públicos das viaturas que lhe são atribuídas, utilização que se encontra regulamentada quanto às viaturas do Estado, no Decreto-Lei n.° 50/78, de 28 de Março, permito-me, junto de V. Ex.a, formular a seguinte recomendação:
Que sejam transmitidas aos ministérios que tutelam empresas públicas directivas análogas às que constam do Decreto-Lei n.° 50/78 com vista a serem cumpridas pelos respectivos gestores, ou, no caso de as mesmas se revelarem inadequadas, se introduza no estatuto das empresas públicas ou no Estatuto do Gestor Público disposições especiais visando expressamente a disciplina da utilização dos veículos em causa.
XXXVII) Assunto: Pensão de sobrevivência. Coa torren cia da conjuga a filhos
Processo n.° 83/R-2087-B-1
Ministro das Finanças e do Plano:
1 — Deu entrada neste Serviço uma reclamação em que a sua autora realça a feição injusta que o regime da pensão de sobrevivência constante da convenção colectiva de trabalho do sector bancário assume, ao excluir desse benefício os filhos menores do trabalhador falecido, quando exista cônjuge sobrevivo em condições de o poder usufruir.
Queixa-se a interessada de, por força de tal regime, a pensão de sobrevivência que contemplou a viúva do trabalhador de quem ela se encontrava divorciada não ter sido extensiva ao seu filho menor, relativamente ao qual aquele trabalhador, na sua qualidade de pai, estava à data do falecimento obrigado, por sentença judicial, a pagar pensão de alimentos.
2 — No âmbito do estudo que se elaborou sobre o objecto desta reclamação, teve-se oportunidade de constatar que tanto o regime da pensão de sobrevivência que beneficia os trabalhadores do sector privado em geral, como o que vigora para os funcionários públicos, se apresentam bastante mais justos, porquanto o cônjuge sobrevivo e os descendentes auferem, de harmonia com eles, pensão de sobrevivência, simultaneamente.
Igual disparidade se verifica quanto ao subsídio por morte.
3 — Neste contexto, permito-me dirigir a V. Ex.a a seguinte recomendação:
1) Que seja providenciado no sentido de as instituições de crédito virem a propor aos respectivos sindicatos a revisão da cláusula contratual que regula a concessão de pensão de sobrevivência e subsídio por morte, de forma a aproximá-la da regulamentação desses benefícios em sede do regime geral de Segurança Social, aplicável à generalidade dos trabalhadores do sector privado;
2) Que, a fim de se colmatar a injustiça verificada nos casos já resolvidos em que os filhos que se encontravam a receber pensão de alimentos não beneficiaram de pensão de sobrevivência, venha a ser ponderado um sistema de contemplar na medida do possível esses casos passados.
XXXVIH) Assunto: Advocada
Processo n.° 84/R-1656-B-1
Director-geral da Polícia Judiciária:
Como é voz corrente, parece que grande número de advogados que trabalham em processos penais serão indicados aos arguidos, sobretudo na fase de instrução preparatória e quando se encontram na situação de prisão preventiva, pelos próprios agentes encarregados das diligências de instrução.
Tendo em conta que tal prática transparece, ainda que de forma pouco notória, nalguns processos pendentes neste Serviço, por falta de concretização dos funcionários envolvidos, e porque se me afigura tal conduta, sem dúvida, reprovável, dados os subjacentes inconvenientes, tenho por bem levar ao conhecimento de V. Ex.a esta minha preocupação no sentido de V. Ex.a, pelos meios que julgar convenientes, poder providenciar para que seja eliminado, tanto quanto possível, tal comportamento dos funcionários sobre a sua direcção.
XXXIX) Assunto: Serventes. Atribuição de funções relativas a outras categorias de pessoal
Processo n.° 84/R-1372-A-2
Presidente da comissão instaladora da Direcção Regional de Cuidados de Saúde de Viseu:
Relativamente ao assunto constante do ofício referenciado informo que determinei o arquivamento do processo, tendo em conta as informações recebidas.
Entretanto, afigura-se de recomendar a V. Ex.B que sejam tomadas as medidas necessárias de modo a que não sejam exigidas às trabalhadoras que têm a categoria de serventes, actividades que integrem o conteúdo funcional da categoria de técnicos auxiliares de laboratório.
XU) Assunto: Abertura de concursos. Vagas a não preencher
Processo n.° 84/R-138-A-2
Director-geral de Geologia e Minas:
Em referência à matéria exposta no ofício dessa Direcção-Geral n.° 1070/111, de 10 de Abril de 1984, comunico que, após análise da situação, se concluiu o seguinte:
1) Embora o n.° 3 do aviso de abertura do concurso mencionasse expressamente que «o preenchimento dos lugares será feito à medida que se mostrar necessário» e a classificação no mesmo concurso não conferisse o direito subjectivo ao provimento, mas tão-só o direito a que nos provimentos a efectuar devesse ser respeitada a ordem de graduação dos candidatos, não podem desconhecer-se as legítimas expectativas da reclamante ao provimento numa das vagas existentes, já que ficou classificada em primeiro lugar;
2) Por outro lado (e sem pôr em causa a isenção dos responsáveis dessa Direcção-Geral no tratamento deste caso), o sistema utilizado de abrir concurso para vagas existentes, que só são preenchidas à medida das necessidades, é
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propiciador de actuações arbitrárias e gerador de suspeições sobre as mesmas, motivos suficientes para recusar, em tese geral, o sistema; 3) Acresce ainda, para além dos aspectos já assinalados, que a realização de concursos para vagas que se entende não deverem ser providas durante o respectivo período de validade cor responde a uma mobilização de esforços realizada em pura perda, quer pelos concursados, quer pelos componentes dos respectivos júris.
Em face do exposto, usando da faculdade que me confere o artigo 18.°, n.° 1, alínea a), da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, considero de formular a V. Ex." a seguinte recomendação:
Que, para o futuro, se utilizem métodos de gestão previsional de pessoal em termos de evitar a abertura de concursos para vagas cujo preenchimento se não revele necessário durante o respectivo período de validade.
Solicito a V. Ex.° que se digne manter-me informado sobre o seguimento que vier a ser dado a esta minha recomendação.
CAPITULO V
Apreciação na especialidade de alguns processos concluídos em 1984
Administração da justiça
Processo n.° 84/R-668-B-1
Sumário — Administração da justiça. Alimentos a menor.
Objecto — Demora no andamento de pedido de alimentos devidos a menor.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Em 23 de Março de 1984, dirigiu-se ao Provedor a mãe de um menor, protestando pelo facto de ainda não ter sido satisfeito o pedido de alimentos que, em favor deste, entregara em Abril de 1983, na Direcção-Geral dos Serviços Judiciários, em virtude de o seu ex-marido e pai do interessado se encontrar a residir ná Noruega.
Formulara o pedido ao abrigo da Convenção sobre Cobrança de Alimentos no Estrangeiro assinada em Nova Iorque em 20 de Junho de 1956. Mas estava convencida de que não lhe fora dado o devido seguimento, pois que em 8 de Março de 1984 recebera uma carta do Ombudsman da Criança (Barneombudet) norueguês, cuja intervenção entretanto pedira, informando-a de que o processo teria sido indevidamente encaminhado para a Embaixada de Portugal em Oslo, quando o deveria ter sido para o Ministério dos Negócios Estrangeiros norueguês.
2 — Ouvida a Direcção-Geral dos Serviços Judiciários, enquanto a autoridade expedidora portuguesa, nos termos da citada Convenção, apurou-se que enviara o pedido em Junho de 1983, para a Secretaria--Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros, com vista ao seu encaminhamento pela via diplomática.
E verificava-se que a Secretaria-Geral do Ministério dos Negócios Estrangeiros o remetera para a Embaixada Portuguesa em Oslo, que o apresentava, em Agosto de 1983, ao Ministério da Justiça norueguês.
Face a várias insistências da aludida Direcção-Geral, o Ministério dos Negócios Estrangeiros foi informado que de novo solicitara a intervenção da Embaixada em Oslo.
3 — Finalmente, o Ministério dos Negócios Estrangeiros recebeu informação de que, em Abril de 1984, o pai do menor fora convocado para comparecer perante a competente autoridade judicial norueguesa, com vista a pronunciar-se acerca da situação financeira— mas que não o fizera por «falta de tempo».
Aliás, comentando o atraso verificado, o Ministério dos Negócios Estrangeiros norueguês referia que este deveria ter tido origem no facto de o Governador da Província de Oslo e Akershus, entidade competente para decidir o caso, se encontrar excessivamente sobrecarregado.
Esperava-se, porém, a resolução do caso, prescindindo, se necessário, da audição do pai do menor.
4 — Foi, então, dirigido pelo Provedor de Justiça ao Embaixador de Portugal na Noruega um ofício solicitando os seus altos ofícios no sentido de serem contactados os serviços noruegueses envolvidos de forma a ser concluído o processo e decretados os alimentos devidos ao filho do visado.
5 — Em resposta, o Embaixador de Portugal informou que fora proferido, em 8 de Maio de 1984, pelo Governador de Província de Oslo e Akershus sentença condenando o pai do interessado ao pagamento de uma pensão mensal de 1200 coroas norueguesas, decisão essa cujo texto em norueguês, acompanhado da respectiva tradução, já havia sido enviado ao Ministério dos Negócios Estrangeiros, com o fim de ser contactada a mãe dele, para acertamento de forma e local do pagamento da pensão requerida.
Processo n.° 83/IP-3-B-1
Sumário — Administração da justiça. Notificação.
Objecto — Situação decorrente da notificação em processo judicial, a advogado entretanto falecido.
Decisão — Recomendação legislativa.
Síntese:
1 — Pela leitura de um artigo publicado, em 6 de Janeiro de 1983, num vespertino lisboeta, sob o título «Justiça e Surrealismo», o Provedor tomou conhecimento de um Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 18 de Março de 1982, entretanto sumariado no Boletim do Ministério da justiça, n.° 317, a p. 312, que havia considerado válidas e eficazes as notificações postais enviadas ao mandatário de uma das partes num processo judicial, mesmo depois do seu falecimento.
2 — A referida decisão judicial, tomada com um voto de vencido, apoiava-se, designadamente, nos artigos 277.°, 278.°, 283.° e 284.° do Código do Processo Civil.
Da conjugação desses preceitos extraíra o Tribunal da Relação a consequência da irrelevância, para o
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II SÉRIE — NÚMERO 61
processo, do falecimento do advogado de uma das partes, já que, em seu entender:
Tal falecimento não fora do conhecimento do tribunal, recaindo sobre a parte o ónus de comunicar esse facto em juízo;
A instância não fora, por isso, suspensa;
Assim, as notificações enviadas para o escritório do advogado falecido haviam sido regularmente feitas;
Não se estaria perante nenhum dos casos de inexistência ou nulidades de actos processuais, taxativamente definidos na lei.
3 — O Provedor não excluiu que a lei vigente pudesse ser objecto de interpretação mais flexível.
Não podia, contudo, discutir o acerto da decisão judicial em questão — aliás confirmada por Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 23 de Novembro de 1982.
4 — Mais pareceu indesejável que pudesse vir criar-se corrente jurisprudencial no sentido das decisões mencionadas, sobrepondo-se a justiça formal à material.
De facto, o teor dos acórdãos em questão parecia, por um lado, compatibilizar-se dificilmente com a própria lógica, ao aceitar a relevância de notificações feitas a pessoas falecidas.
Mas —e sobretudo— o Provedor entendeu que eles conduziam a soluções menos justas, pois que, sendo perfeitamente possível que a parte se não aperceba em tempo útil da morte do seu advogado, não se afigura equitativo que seja ela a suportar o risco da perda do processo por virtude desse facto, a ela estranho.
5 — Por estas razões, o Provedor resolveu abrir um processo de sua iniciativa, no âmbito do qual se procedesse ao estudo da questão.
6 — Findo esse estudo, o Provedor houve por bem, para dissipar quaisquer dúvidas, recomendar ao Ministro da Justiça que promovesse a alteração do artigo 278.° do Código de Processo Civil, conferindo-lhe a redacção seguinte (ou equivalente):
1." No caso da alínea b) do n.° 1 do artigo 276.°, uma vez feita a prova do facto, ou sendo este facto do conhecimento do juiz, este suspenderá imediatamente a instância com efeitos a partir da data do falecimento [...]
2." No caso da alínea b) do n.° 1 do artigo 276.°, uma vez feita a prova do facto, por iniciativa das partes ou do juiz se este tiver conhecimento daquele, a instância será imediatamente suspensa com anulação de todos os actos processuais praticados depois da data do falecimento do mandatário forense, independentemente das notificações que a partir de então lhe hajam sido dirigidas.
7 — O Ministro da Justiça remeteu a recomendação à Comissão de Revisão do Código de Processo Civil, para que o seu teor fosse ponderado no âmbito da reestruturação desse diploma legal.
Processo n.° 83/R-1307-B-1
Sumário — Administração da justiça. Processo judicial. Demora processual.
Objecto — Demora na decisão judicial de uma acção proposta por uma companhia de seguros contra um sinistrado. Suspensão arbitrária do pagamento da pensão na falta da decisão judicial.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese
1 — Um sinistrado de trabalho beneficiava de pensão atribuída pelo tribunal do respectivo processo.
O acidente verificara-se em Fevereiro de 1969.
Em 1973, com o fundamento de que o acidente em questão fora simultaneamente de viação, tendo o sinistrado, entretanto, sido indemnizado ao abrigo da garantia de responsabilidade civil automóvel, a Companhia de Seguros Mundial/Confiança, responsável pela pensão de acidente de trabalho, instaurou uma acção destinada a obter a suspensão do pagamento desta última até 7 de Maio de 1994, data até à qual se entendia que a indemnização recebida a título de acidente de viação cobria o valor da pensão de acidente de trabalho.
A partir de Janeiro de 1979, não havendo ainda decisão judicial sobre a acção instaurada 6 anos antes, a seguradora suspendeu o pagamento da pensão de acidente de trabalho.
O interessado pediu a intervenção do Provedor para apressar o andamento da acção judicial.
2 — Não pareceu, de qualquer modo, haver base legal para a aludida suspensão por parte da seguradora.
Assim, não só se procurou conhecer das razões do atraso do andamento do processo em questão, como, concomitantemente, se inquiriu a companhia de seguros acerca dos fundamentos da suspensão que determinara.
3 — A entidade visada veio informar que, revista a situação, verificou que só por lapso tomara aquela atitude antes da decisão judicial que a sancionasse.
Esse lapso ter-se-ia devido ao facto de os seus serviços terem tratado o caso, a partir da apresentação, no tribunal, do requerimento de suspensão, como se esta houvesse sido já ordenada.
Detectado o erro, a seguradora prontificou-se espontaneamente a pagar as prestações vencidas, acrescidas de juros à taxa de 2 % ao mês e sob a forma de juros compostos — atitude que se considerou acertada.
Administração local
Processo n.° 82/R-1901-B-4
Sumário — Administração local. Fornecimento de água.
Objecto — Falta de execução das obras necessárias ao abastecimento de água a uma habitação, a partir da rede pública.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Determinado cidadão dirigiu ao Provedor uma reclamação contra a Câmara Municipal e os Serviços
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Municipalizados de Electricidade, Água e Saneamento de Gondomar, alegando o seguinte:
A habitação de que era arrendatário vinha sendo abastecida de água para consumos domésticos através de um poço existente no logradouro e pertencente ao senhorio. Todavia, em Janeiro de 1981 o senhorio proibira a continuação do abastecimento de água à mencionada habitação a partir do aludido poço;
Como a rede pública de abastecimento domiciliário de água passava junto da habitação em apreço, o interessado solicitara aos ditos Serviços Municipalizados que fosse executada a ligação daquela rede geral à referida habitação. E, para seguimento da sua pretensão, havia requerido ulteriormente à Câmara Municipal de Gondomar (por indicação dos próprios Serviços Municipalizados) a realização de uma vistoria de salubridade à habitação de que era arrendatário;
Porém, apesar de já ter sido oportunamente efectuada a vistoria, e sem embargo do dilatado lapso de tempo entretanto decorrido, o problema da ligação da rede geral de abastecimento de água à habitação continuava por resolver, tendo o interessado de ir buscar água a casa de um vizinho, todos os dias.
2 — Inculcando-se na reclamação que a habitação em referência se localizava em zona servida pela rede pública de abastecimento domiciliário de água, solicitaram-se à Câmara Municipal de Gondomar os esclarecimentos considerados úteis acerca do assunto.
Em resposta, o citado órgão autárquico comunicou que deliberara remeter o processo nos Serviços Municipalizados de Electricidade, Água e Saneamento de Gondomar, a fim de, em conformidade como o resultado da vistoria de salubridade oportunamente efectuada à habitação em causa, se proceder à execução das obras necessárias à resolução do problema do abastecimento de água à mesma habitação a partir da rede pública, nos termos estabelecidos no Regulamento do Serviço de Abastecimento de Água ao Concelho.
3 — Posteriormente, este Serviço pediu à Câmara Municipal de Gondomar novo esclarecimento acerca da posição do caso, havendo recebido a informação de que, segundo comunicação dos Serviços Municipalizados, já tinham sido executadas as obras, e a habitação de que o reclamante era arrendatário já estava a ser abastecida de água a partir da rede pública.
Administração pública
Processo n.6 82/IP-53-B-1
Sumário — Administração Pública. Acesso do público a documentos da Administração.
Objecto — Acesso dos cidadãos a documentos da Administração que versem assuntos de interesse público. Alcance do artigo 48.°, n.° 2 da Constituição.
Decisão — Reclamação improcedente, face à lei actual. Síntese:
1 — Na sequência de uma reclamação em que o seu autor se queixava de, na sua qualidade de cidadão
português, não lhe ter sido reconhecida legitimidade para tomar conhecimento de um contrato de pesquisa e prospecção mineira assinado entre a Billiton Portuguesa e o Governo, e que, segundo ele, continha uma cláusula prejudicial para o Povo Português, o Provedor de Justiça tomou a iniciativa de abrir um processo com vista ao estudo da questão que consiste em saber se o n.° 2 do artigo 48.° da Constituição da República Portuguesa confere aos cidadãos o direito de ter acesso aos documentos da Administração que versem sobre gestão de assuntos públicos.
Não estava em causa, pois, o problema do eventual acesso, por parte dos administrados, a processos relativos a interesses particulares seus.
2 — No âmbito deste estudo, compulsaram-se os sucessivos artigos da Constituição, tendo-se verificado que o n.° 2 do artigo 48.° é precisamente o preceito, que, pelo seu teor, suscita o problema enunciado, isto é, o do acesso dos particulares aos dossiers públicos.
Com efeito, atribuindo-se ao cidadão o direito de ser informado e esclarecido sobre a gestão dos assuntos públicos, é perfeitamente justificado que se coloque a questão de saber se esse direito, que está concebido na Constituição como fundamental, confere aos interessados a possibilidade de consultarem os processos referentes a gestão pública.
3 — A forma tão geral que a letra de tal preceito assume não aponta, porém, para qualquer solução.
Assim, entende-se que só mediante a regulamentação do regime nele contido, feita em lei ordinária» o assunto poderá ser esclarecido.
Há que ter em atenção, contudo, que se trata de matéria de grande delicadeza, porquanto, se não for cuidadosamente regulada, o direito de acesso aos dossiers de gestão pública poderá pôr em perigo a celeridade e a eficácia que devem assistir à administração pública.
4 — Face ao exposto e sendo convicção do Provedor de Justiça a de que o Governo se encontra certamente alertado para o problema dado o teor da Recomendação n.° (81) 19 do Comité de Ministros do Conselho da Europa, procedeu-se ao arquivamento do processo.
Contrato-promessa
Processo n.° 83/R-1927-B-1
Sumário — Contrato-promessa. Execução específica.
Objecto — A aplicação do Decreto-Lei n.° 236/80, de 18 de Julho, a situações anteriores mas não abrangidas por sentenças transitadas em julgado.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — O queixoso celebrara contrato-promessa de compra e venda de um imóvel, em 1976, com referência ao preço de 600 000$.
O promitente vendedor começou, porém, a protelar a realização do contrato definitivo, exigindo sucessivos aumentos para o mesmo se concretizar.
Face à actuação dilatória do promitente vendedor, o reclamante intentou acção judicial, invocando o regime do Decreto-Lei n.° 236/80, de 18 de Julno.
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II SÉRIE — NÚMERO 61
O Tribunal da Relação de Lisboa, decidindo em recurso, negou, porém, a aplicação deste diploma ao caso em vista, pois o incumprimento da promessa ocorrera antes da publicação deste.
O interessado insurgiu-se contra esta situação, pois que só obtivera do tribunal, como indemnização, a restituição do sinal em dobro. E, estando necessitado de adquirir a casa, o promitente vendedor lhe exigia agora o preço de 3 000 000?, muito superior ao inicialmente estipulado, mesmo que acrescido da indemnização fixada judicialmente.
2 — O Provedor não podia, naturalmente, intervir no litígio entre particulares, nem discutir a decisão do Tribunal.
Mas considerou que, de facto, situações destas eram extremamente injustas, revelando autêntica especulação por parte dos promitentes vendedores.
Fora, de resto, com base em razões deste tipo que o Decreto-Lei n.° 236/80 instituíra um conjunto de medidas destinadas a obviar à verificação de tais casos, entre os quais a da possibilidade de execução específica do contrato-promessa — ou seja, a de o tribunal se substituir ao promitente vendedor relapso, celebrando em vez dele o contrato de compra e venda.
Só que o artigo 2.° desse diploma previa este regime apenas para as hipóteses de incumprimento de contratos-promessa ocorrido posteriormente à sua entrada em vigor.
3 — Assim, o Provedor recomendou ao Ministro da Justiça, em 24 de Janeiro de 1984, a preparação do diploma legal que estendesse a aplicação do sistema consignado no Decreto-Lei n.° 236/80 também a casos de incumprimento de promessa a eles anteriores, desde que sobre os mesmos não houvesse ainda sido proferida decisão judicial com trânsito em julgado.
Recordou, ao fazê-lo, que este tipo de aplicação retroactiva de legislação nova se justifica em zonas especialmente relevantes da vida social, como a da habitação — tendo aliás já antes sido utilizado na Lei n.° 55/79, de 15 de Setembro, e no Decreto-Lei n.° 420/76, de 28 de Maio.
4 — A Auditoria Jurídica do Ministério da Justiça, chamada a pronunciar-se sobre a questão, salientou tratar-se de matéria de política legislativa, mas que, do ponto de vista jurídico, não suscitava objecções.
5 — O Ministro da Justiça, porém, em despacho de 10 de Setembro de 1984, decidiu que:
Não parece curial introduzir em 1984 a alteração sugerida.
6 — Recusado, assim, o acatamento da recomendação feita, vem o Provedor, através do presente relatório, expor a situação à Assembleia da República.
Dmtribuieôes e impostos
Processo n.° 83/R-1988-A-2
Sumário — Contribuições e impostos. Fundo de De-emprego. Pagamento por cheque.
Objecto — Exigência de cheque visado para pagamento de contribuições para o Fundo de Desemprego.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — O titular de uma pequena empresa apresentou reclamação, insurgindo-se pela perda de tempo que acarretava contra a exigência, por «recente legislação», de, quando se utilizasse o cheque como meio de pagamento de contribuições devidas ao Fundo de Desemprego, o cheque ter de ser visado.
2 — Embora se compreendessem as razões de segurança que teriam estado na origem dessa alteração legislativa, pareceu que a mesma podia, de facto, originar uma relevante complicação administrativa, porventura desproporcionada em relação a muitas (fas correspondentes contribuições, aquando de reduzido montante.
Mas, sobretudo, não se alcançara a razão da disparidade entre esse regime e o do pagamento, da generalidade dos demais impostos.
Por isso se auscultou o Ministério das Finanças e do Plano nos termos seguintes:
Reclamações apresentadas neste Serviço e posições de associações patronais, que a imprensa tem divulgado, vêm sublinhando os transtornos e a incongruência, relativamente ao que se passa com o pagamento por cheque dos demais impôs, tos, da redacção dada ao artigo 7.° do Decreto--Lei n.° 45 080, de 20 de Junho de 1963, pelo artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 240/83, de 9 de Junho, na parte em que exige que sejam visados os cheques para liquidação das quotizações para o Fundo de Desemprego.
Em face do exposto, solicita-se indicação da posição desse Ministério sobre o caso, nomeada-mente quanto às razões da aludida disparidade de soluções e viabilidade de, através da correspondente alteração legislativa, lhe ser posto termo, restaurando, aliás, o regime vigente, no aspecto em causa, até à publicação do citado Decreto--Lei n.° 240/83.
3 — Em resposta a Secretaria de Estado do Orçamento remeteu parecer da Auditoria Jurídica do respectivo Ministério e que merecera a concordância do titular daquela Secretaria de Estado.
Nesse parecer, começando por se sublinhar que se estava perante opção legislativa tomada no quadro da reformulação do regime geral das quotizações para o Fundo de Desemprego — aprovada, através do Decreto-Lei n.° 240/83, de 9 de Junho, pelo Conselho de Ministros— acabava-se por propor que aquele ofício «fosse remetido ao Gabinete do membro do Governo que propôs aquele decreto-lei, para ele se pronunciar sobre a oportunidade da pretendida alteração.
4 — E assim é que, na nova redacção dada ao citado artigo 7." do Decreto-Lei n.° 45 080, peio artigo 1." do Decreto-Lei n.° 233/84, de 12 dê Julho, foi eliminada a exigência de que os cheques para os efeitos em causa fossem visados.
Processo r¡.° 84/R-320-A-2
Sumário — Contribuições e impostos. Imposto complementar.
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1 DE MARÇO DE 1985
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Objecto — Falta de dedução de encargos por extravio de documento comprovativo.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Foi recebida reclamação contra a 2." Repartição de Finanças do Concelho de Valongo (Ermesinde), com fundamento em o seu autor ter sido avisado para pagamento de impoto complementar, apesar de, segundo alegava, resultar da respectiva declaração de rendimentos e dos documentos que a acompanharam a inexistência de matéria colectável.
Mais esclarecia o interessado que, após a recepção do 1.° aviso, o informaram naquela Repartição de que a tributação resultara da não comprovação dos encargos com a aquisição de habitação própria, tendo--lhe sido dado o prazo de 1 mês para junção do respectivo documento.
E concluía sublinhando que:
Antes de decorridos os 30 dias, quis entregar naquela Repartição, pessoalmente, o documento exigido, no entanto recusaram-se-me a receber o documento, o qual enviei via correio, registado com aviso de recepção.
Acabara, por isso, por pagar o imposto liquidado, com juros de mora.
2 — Pareceu necessário, por um lado, averiguar o que se passara acerca do alegado extravio.
E, por outro, causou estranheza a referência à recusa de recebimento do documento exigido pela própria Repartição de Finanças.
Por isso se ouviu a mesma acerca do caso.
3 — O chefe da Repartição, em resposta cuja correcção e justeza é de realçar, veio referir que:
A declaração do imposto complementar do queixoso fora recebida por funcionário «algo inexperiente, pelo seu pouco tempo de serviço», que, visto que aquele exibira o documento comprovativo correspondente, preenchera pelo seu próprio punho a rubrica «juros e encargos de dívida», que havia sido deixada em branco;
Porque, todavia, ao fazer-se a liquidação, não constasse do processo o documento em causa, naquela não se considerou a declaração que o mesmo se destinava a comprovar;
Tendo o interessado reagido, perante a Repartição de Finanças, foi aconselhado a apresentar reclamação escrita, instruída com o documento comprovativo em questão, que por erro lhe teria sido devolvido;
O contribuinte exibira, de facto, tal documento, no prazo indicado, mas sem apresentar reclamação escrita — o que de novo fora então solicitado a fazer (esta, pois, a explicação para a não recepção, isolada, do documento em questão);
Mais tarde, o queixoso remetera, por via postal, o que referia ser «2.a via» do documento comprovativo original.
Face a este circunstancialismo, a Repartição aceitava ter havido lapso dos seus serviços — ou por ex-
travio do documento original (hipótese que, porém, lhe pareceria menos plausível), ou por indevida devolução do mesmo ao contribuinte, por ocasião da apresentação da declaração.
4 — Em conclusão, a entidade visada, suscitada assim a reapreciar o caso, decidiu, por sua iniciativa, proceder à anulação da liquidação contestada.
Processo n.° 83/R-2201-A-2
Sumário — Contribuições e impostos. Imposto especial sobre veículos (Lei n.° 34/83, de 21 de Outubro).
Objecto — Forma de contagem da antiguidade dos veículos.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Pelo proprietário de um veículo automóvel matriculado em 1979 foi apresentada reclamação onde manifestava a sua discordância em relação ao entendimento da 6.a Direcção de Serviços da Direcção--Geral das Contribuições e Impostos, segundo o qual «em conformidade com o n.° 2 do artigo 8.° do Regulamento do imposto sobre veículos ficarão sujeitos (por força do artigo 7.° da Lei n.° 34/83, de 21 de Outubro) ao imposto, no ano em curso, os automóveis matriculados a partir do ano de 1979, inclusive, dado que no dia 1 de Janeiro último tais veículos têm menos de 5 anos civis de antiguidade, considerando-se com mais de 5 anos os matriculados no ano anterior».
O reclamante juntou fotocópia de um ofício da Direcção de Finanças do distrito do Porto para os chefes das Repartições de Finanças do mesmo distrito, onde se procedia à difusão de tal entendimento.
2 — Ouvida a Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, esta começou por enviar resposta que praticamente se limitava à reprodução das normas legais vigentes, sem se pronunciar acerca da forma como as mesmas estavam a ser interpretadas e aplicadas.
3 — De novo se insistiu por uma melhor explicitação da posição da Direcção-Geral.
Para além de contacto telefónico com o director da 6." Direcção de Serviços, que não contribuiu para esclarecimento do caso, expôs-se à Direcção-Geral a interpretação que a este Serviço pareceria correcta do artigo 8.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 143/78, de 12 de Junho, mandado aplicar supletivamente pela Lei n.° 34/83.
Ponderou-se, a propósito, que essa norma, para efeitos de integração dos veículos nos correspondentes escalões de tributação, distingue os de antiguidade «até 6 anos» e com «mais de 6 anos» e manda reportar esta, contada por anos civis, a 1 de Janeiro de cada ano.
Sendo assim, sustentou-se que «um veículo matriculado em 1977 teria, em 1983, 6 anos e não mais de 6 anos, caindo, por isso, no 1.a escalão».
4 — A Direcção-Geral das Contribuições e Impostos discordou da sugestão interpretativa deste Serviço quanto ao sentido do artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 143/78.
Mas reconheceu que a reclamação apresentada «é fundamentada, não estando os proprietários de veículos
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automóveis matriculados no ano de 1979 sujeitos ao imposto criado pela Lei n.° 34/83». Fundamentou tal conclusão no facto de o legislador ter utilizado nesta lei, «a expressão inferior a 5 anos e não até 5 anos (como teria feito caso pretendesse um total paralelismo com o Decreto-Lei n.° 143/78)».
Considerou, pois, que não haveria, nesta matéria, correspondência entre as expressões utilizadas na Lei n.° 34/83 e no Decreto-Lei n.° 143/78, não podendo, por isso, ser aqui supletivamente aplicado.
5 — E por isso foi dada razão ao queixoso, o que levou ao arquivamento do processo.
Processo n.° 84/R-481-A-2
Sumário — Contribuições e impostos. Imposto sobre sucessões.
Objecto — Opção .pelo pagamento a pronto. Perda de desconto e da possibilidade de pagamento em prestações por liquidação fora do prazo.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Pelo procurador de dois herdeiros foi apresentada, uma reclamação com fundamento em que, tendo optado pelo pagamento a pronto de ambas as correspondentes colectas de imposto sobre as sucessões e doações e pago, no prazo legal da respectiva cobrança, «o que lhe apresentaram», viera a ser, posteriormente notificado do relaxe do imposto devido por um dos herdeiros.
Juntava, ainda, certidão passada (depois daquele pagamento, mas antes desta notificação) pela Repartição de Finanças onde corria o processo — a do 18.° Bairro Fiscal de Lisboa— certificativos do pagamento do imposto por ambos os herdeiros.
2 — A Repartição de Finanças, ouvida sobre o caso, alegou que o reclamante fora pessoal e pormenorizadamente esclarecido, por um seu funcionário, do regime jurídico aplicável, bem como dos condicionalismos respeitantes a cada uma das formas de pagamento do imposto por que optasse.
A Repartição desconhecia o que depois ocorrera, em termos de pagamento, entre o interessado e a tesouraria competente.
Mas como, tempos depois, ele precisasse de certidão comprovativa de ter realizado esse pagamento, o funcionário que já antes o atendera passara, de boa-fé, tais documentos, confiado na afirmação daquele de que tudo pagara.
3 — Estas explicações não pareceram muito decisivas para se poder concluir pelo acerto da actuação da Repartição de Finanças.
Verificava-se, sobretudo, que, quanto a um dos herdeiros, não fora, no termo a que se refere o § 2.° do artigo 87.° do Código da Sisa e do Imposto sobre Sucessões e Doações, dado cumprimento ao ofício n.° 2269, de 21 de Julho de 1982, da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, que contém instruções no sentido de, em tal documento, se esclarecer o contribuinte «quanto à impossibilidade (quando se opte pelo pagamento a pronto) de obter, depois, a divisão em prestações ou à perda do direito ao desconto,
se (o imposto) não for satisfeito no mês de cobrança à boca do cofre».
4 — Exposto o problema à Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, esta considerou que a solução acertada seria a de repetir, a notificação do herdeiro em causa, agora com integral cumprimento das directivas aplicáveis.
Parecendo correcto este procedimento, foi o caso dado por encerrado.
Processo n.° 83/R-1889-B-4
Sumário — Contribuições e impostos. Tarifas telefónicas.
Objecto — Montante exagerado cobrado por chamada telefónica para o estrangeiro.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A reclamante dirigiu-se ao Provedor de Justiça insurgindo-se contra a exigência, pelos Correios e Telecomunicações de Portugal, de uma importância tida por exagerada, dada a duração da chamada, de um contacto telefónico estabelecido com os Estados Unidos, importância que, todavia, tinha pago.
Apesar de por várias vezes ter reclamado da quantia exigida, os seus protestos não tinham obtido qualquer resposta.
2 — Apresentada a questão, por este Serviço, à mencionada empresa pública, esta informou que já não lhe era possível proceder à verificação do verbete daquela comunicação internacional, pois que este tinha já sido destruído, como aliás era de regra, passados 6 meses sobre a realização da correspondente chamada.
Todavia, tendo em consideração o facto de a assinante asseverar que a chamada não tivera a duração relativa ao montante exigido, o conselho de administração dos Correios e Telecomunicações de Portugal resolveu cobrar-lhe apenas o correspondente ao mínimo de 3 minutos, devido por qualquer chamada internacional.
E, em consequência, devolveu à interessada a diferença entre esse valor e a quantia que pagara.
Processo n.° 83/R-119-B-4
Sumário — Contribuições e impostos. Taxas municipais. Direito de petição.
Objecto — Cobrança de uma taxa genérica de «Prestação de serviço e concessão de documentos» e sua acumulação com outras taxas específicas.
Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Situação parcialmente regularizada.
Síntese:
1 — Um munícipe de Estarreja protestou por a respectiva Câmara Municipal vir a exigir o pagamento de uma «tax« de requerimento de interesse particular», no valor de 50$, «por toda e qualquer simples formalidade» solicitada pelos particulares.
2 —Ouvida sobre o assunto, a Câmara Municipal
respondeu que a imposição fiscal em causa respeitava
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à «Prestação de serviço e concessão de documentos» e estava prevista na Tabela de Taxas e Licenças Municipais, aprovada pela Assembleia Municipal de Estarreja.
3 — Apreciado o assunto, considerou-se que, face ao estatuído no artigo 13.°, n.° 1, alínea ;), da Lei n0 1 /79, de 2 de Janeiro, e à semelhança do que se achava consagrado na Tabela de Taxas e Licenças anteriormente aprovada pelo Decreto-Lei n.° 48 439, de 11 de Dezembro de 1969 (diploma este revogado pela referida Lei n.° 1/79), parecia fora de dúvida que, ao lado das taxas concretamente aplicáveis à prestação de determinados serviços ou ao fornecimento de certos documentos expressamente individualizados, poderiam os municípios fixar uma taxa genericamente aplicável a outras pretensões de interesse particular ou prestações de serviços ao público, diferentes das especificamente mencionadas e para as quais não estivessem fixadas, pois, quaisquer outras taxas concretas.
Preferível se julgou, entretanto, que no caso em apreço a questionada taxa genérica de «Prestação de serviço e concessão de documentos» prevista na Tabela de Taxas e Licenças Municipais em vigor no concelho de Estarreja, figurasse na mesma Tabela sob a designação de «Outros requerimentos (ou pretensões) de interesse particular», visto corresponder ao remanescente, não especificado, das prestações de serviços ou dos fornecimentos de documentos ao público por parte das repartições ou dos funcionários do município.
O que já não se afigurou muito curial é que a aludida taxa de «requerimentos de interesse particular» fosse aplicável não só «às pretensões de interesse particular ou prestações de serviços ao público» para as quais não existissem taxas concretamente fixadas, mas incidisse também, cumulativamente, sobre as «prestações de serviços» e os «fornecimentos de documentos» para os quais se achassem definidas taxas específicas naquela Tabela de Taxas e Licenças Municipais.
E que, se aquelas últimas «prestações de serviços» ou «fornecimentos de documentos» ao público tinham as suas contraprestações estabelecidas através de taxas expressamente fixadas para os actos a que diziam respeito, não parecia existir fundamento lógico ou razoável para que a essas mesmas taxas concretas acrescesse uma outra taxa genérica prevista para «pretensões de interesse particular» ou «prestações de serviços ao público» que, por não se acharem individual izadamente enunciadas não tinham correspondência em quaisquer taxas que também individuali-zadamente lhes fossem aplicáveis.
De outro modo, a acumulação de taxas acabaria por representar uma sobretaxa (ou uma espécie de adicional) sobre aquelas que já se encontrassem concretamente estabelecidas para a prestação de determinados serviços ou o fornecimento de certos documentos especificamente individualizados. E, nesse caso, mais adequado se julgaria que fossem reajustadas as taxas que se verificasse estarem expressamente definidas (e cuja fixação fosse da competência da autarquia), libertando-as da incidência cumulativa da taxa genericamente estabelecida para as «pretensões de interesse particular» ou «prestações de serviços ao público» que não se encontrassem individualizadamente discriminadas.
Aliás, aquilo que verdadeiramente legitimaria a cobrança de todas as taxas em referência seria a prestação dos serviços, ou o fornecimento dos documentos solicitados pelo público, bem como a satisfação de quaisquer outras pretensões de interesse particular apresentada pelos cidadãos, e não propriamente a mera formulação, pelos interessados, de todos e quaisquer requerimentos ao município de Estarreja com vista à satisfação de objectivos particulares, ainda que, pela sua natureza ou pelos condicionalismos da situação em jogo, não pudessem ou não viessem tais requerimentos a dar lugar à prestação dos serviços, ao fornecimento dos documentos ou ao seguimento das pretensões que neles se houvesse solicitado.
4 — O estudo elaborado neste Serviço acerca do problema em causa veio a merecer a inteira concordância da Inspecção-Geral da Administração Interna, havendo sido ulteriormente transmitido à Câmara Municipal de Estarreja com o pedido de esclarecimento a respeito do procedimento que fosse adoptado pelo município para adequada resolução do assunto.
A Câmara Municipal concordou com a posição defendida pelo Provedor e informou que no novo Código de Posturas e Tabela de Taxas, cuja discussão estava em curso, fizera consagrar a solução por ele preconizada.
Processo n.° 83/R-893-A-3
Sumário — Contribuições e impostos. Taxa de radiotelevisão.
Objecto — Exigência de pagamento de taxa de televisão respeitante a 2 aparelhos de televisão, quando, afinal, o visado possuía apenas 1 aparelho.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Uma associação de reformados do Sul do País dirigiu-se, em Julho de 1983, ao Provedor de Justiça referindo que os serviços da Radiotelevisão Portuguesa, E. P., vinham a exigir a um dos seus associados o pagamento de taxa relativa a 2 televisores, o que não correspondia à realidade, porquanto tal associado dispunha apenas de 1 televisor, desde 1980.
2 — Exposta a questão à RTP, esta empresa pública informou que o interessado chegara a possuir 3 televisores.
Todavia, procedera já ao cancelamento dos registos referentes a 2 deles, ficando apenas em vigor o último registo efectuado.
Encontrando-se, portanto, corrigida a situação apontada, foi o caso dado por encerrado.
Processo n.° 83/R-1684-A-3
Sumário — Contribuições e Impostos. Taxa de radiotelevisão.
Objecto — Exigência de pagamento de taxa de televisão, referente a 1977, já efectuado pelo reclamante, tendo este, todavia, destruído o respectivo documento de prova.
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Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um cidadão dirigiu-se, em Agosto de 1983, ao Provedor de Justiça referindo ter pago oportunamente a taxa de televisão respeitante a 1977, havendo já destruído, porém, a prova de tal pagamento, por considerar que estaria esgotado o prazo de 5 anos de prescrição do pagamento das dívidas ao Estado.
Assim, alegou ter ficado surpreendido por haver recebido do Tribunal de 1." Instância das Contribuições e Impostos do distrito de Lisboa um aviso para pagamento da taxa relativa àquele ano, acrescido de juros desde 1 de Dezembro de 1977.
2 — Foi exposta a questão ao conselho de gerência da Radiotelevisão Portuguesa com o pedido de reanálise do caso.
3 — Reapreciada a questão pela RTP, esta informou que havia mandado arquivar o processo de execução pendente no referido Tribunal, relativamente ao suposto débito.
4 — Assim se regularizou a situação, mesmo apesar de já estar pendente processo de execução fiscal.
Processo n.° 84/R-570-A-3
Sumário — Contribuições e impostos. Taxa de radiotelevisão.
Objecto — Exigência de pagamento de taxa de televisão, referente a 1977, já efectuado pelo reclamante, tendo este conservado o respectivo documento de prova.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um cidadão dirigiu-se ao Provedor de Justiça, em Março de 1984, em virtude de ter recebido do Tribunal de 1Instância das Contribuições e Impostos um aviso de pagamento da taxa de televisão respeitante a 1977, acrescido de juros desde 1 de Janeiro de 1978, o que o surpreendeu, dado que já havia efectuado há muito tal pagamento, tendo até em seu poder o talão do vale de correio comprovativo do mesmo.
2 — Assim, foi exposta a questão à RTP, tendo sido recebida, em Maio de 1984, a informação de que fora mandado arquivar o processo de execução pendente no citado Tribunal, uma vez que' se verificou ter havido lapso na banda magnética referente às «taxas não pagas» fornecida pela entidade encarregada da cobrança, lapso que aquela empresa pública referiu lamentar.
Direitos fundamentais
Processo n.° 82/R-1662-B-4
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ambiente e qualidade de vida. Indústria incómoda.
Objecto — Funcionamento de uma indústria metalúrgica num imóvel destinado a habitação, com o consequente incómodo para os seus moradores.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — O reclamante insurgiu-se junto do Provedor de Justiça contra a instalação e funcionamento de uma indústria metalúrgica num prédio de habitação contíguo àquele onde tinha a sua residência, do que resultava inúmeros incómodos para os habitantes dessa área do lugar de Mosteiro (Trofa, Santo Tirso).
Acrescentava que, apesar de essa unidade fabril ter sido intimada a transferir-se para outro local dentro de 3 meses e, entretanto, apenas laborar das 9 horas às 20 horas, ela permanecera no mesmo local após o esgotamento daquele prazo, funcionando das 8 horas às 24 horas.
2 — Ouvida sobre a situação a Delegação Regional do Porto do Ministério da Indústria e Energia, esta confirmou que intimara o proprietário da fábrica a transferir as instalações, mas acrescentou que este apresentara .recurso dessa decisão, o qual viera a ser deferido.
3 — O Provedor de Justiça, não se conformando com a comprovada manutenção da situação de incómodo para os vizinhos da aludida instalação fabril, insistiu, porém, pela reapreciação do caso —o que veio, de facto, a conduzir à decisão e posterior efectivação da transferência das instalações em questão.
Processo n.° 82/R-1924-B-4
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ambiente e qualidade de vida.
Objecto — Instalação irregular em prédio urbano, de uma unidade industrial de tratamento de peixe.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Os moradores de um prédio urbano sito na Rua de São Cristóvão, em Cascais, dirigiram-se ao Provedor de Justiça insurgindo-se contra a instalação, numa das garagens do imóvel, de uma indústria clandestina de congelamento de peixe, cujo funcionamento produziria continuamente ruído ensurdecedor e maus cheiros.
2 — No curso da instrução do processo foram contactadas a Delegação de Saúde de Cascais e a Direcção Regional do Ribatejo e Oeste do Ministério da Agricultura e Pescas.
Este último departamento mandou proceder a vistoria, tendo detectado, não só que a instalação fabril não estava devidamente licenciada, como, ainda, que ela produzia «ruídos, maus cheiros e proliferação de mosquitos», além de que na garagem em que funcionava haviam sido ilegalmente construídas dependências para habitação, sem condições de salubridade.
A Delegação era, pois, de parecer que a laboração da fábrica devia imediatamente cessar, procedendo-se ao despejo dos produtos existentes nas suas câmaras frigorificas, com vista à selagem dos respectivos motores.
3 — Por outro lado, este Serviço solicitou à Câmara Municipal de Cascais que exercesse o poder de despejo sumário atribuído pelo artigo 165° do Regu-
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lamento Geral das Edificações Urbanas caso se confirmasse não se encontrar a unidade industrial de acordo com o projecto aprovado e a licença de utilização respeitante à fracção do imóvel onde se encontrava instalada — poder que o referido órgão autárquico deliberou exercer.
4 — A Câmara Municipal entendeu, porém, não dever ordenar o despejo imediato, para não pôr em causa os postos de trabalho dos empregados da empresa, resolvendo antes diligenciar no sentido da obtenção de um terreno para aí ser montada a indústria em causa.
5 — O processo deste Serviço foi, pois, arquivado, por a situação estar em vias de resolução, de acordo com critério de actuação que se afigurou aceitável e equilibrado.
Processo n.° 83/R2086-B-4
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ambiente e qualidade de vida. Saneamento básico.
Objecto — Prejuízo para a saúde dos vizinhos decorrente da acumulação de detritos num quintal particular.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1—Queixou-se uma cidadã do facto de nas traseiras da sua residência, sita na Rua da Conceição da Glória, em Lisboa, existir um quintal particular onde se amontoavam os mais diversos detritos, que originavam maus cheiros e geravam a acumulação de vermes e insectos susceptíveis de afectar a saúde dos moradores vizinhos.
2 — Este Serviço ouviu a Delegação de Saúde e a Câmara Municipal de Lisboa, chamando a atenção para a necessidade de serem tomadas as providências que o caso requeria.
De facto, embora a situação ocorresse numa propriedade privada, os efeitos que estava a produzir na vizinhança podiam justificar a intervenção dessas instituições no âmbito dos poderes públicos, que lhes incumbem.
3 — A chamada de atenção viria a ser coroada de êxito com a intervenção da Direcção dos Serviços de Salubridade e Transportes da Câmara Municipal de Lisboa que promoveu a limpeza do local, tendo sido a sua intervenção acompanhada de acção policial dado ter havido alguma resistência à operação de limpeza.
4 — Com tal intervenção se defendeu a saúde pública e se alcançou o objectivo da reclamação.
Processo n.° 83/R-421-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direito de asilo.
Objecto — Demora no reconhecimento da qualidade de refugiado.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 —O reclamante viera de Angola em 1977 e tentara manter ou obter a nacionalidade portuguesa. Vira,
porém, indeferido o seu pedido nesse sentido, nos termos do Decreto-Lei n.° 308-A/75, por não ter qualquer ascendente nascido em Portugal.
2 — Requerera, então, ao abrigo da Lei n.° 98/80, de 1 de Agosto, o Estatuto de Refugiado Político, para obter a autorização necessária à instalação de uma oficina de reparação de automóveis.
3 — Em 1 de Março de 1983 (data da exposição dirigida ao Provedor de Justiça) ainda não tinha sido proferida qualquer decisão no processo de asilo, organizado em 1980.
4 — Foram por isso pedidas informações à Comissão Instaladora do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa, entidade à qual competia o apoio aos requerentes do estatuto de refugiado, de acordo com o Despacho n.° 11/81, de 20 de Julho, do Secretário de Estado da Segurança Social.
5 — Em resposta, esta entidade esclareceu que vinha dando ao agregado familiar do queixoso o necessário apoio, mas que o processo referente ao pedido de asilo deveria estar no Serviço de Estrangeiros do Ministério da Administração interna.
6 — Ouvido este Serviço, obteve-se, em Julho de 1983, a informação de que o processo do reclamante se encontrava na Comissão Consultiva para os Refugiados desde 24 de Junho de 1982, aguardando parecer, de acordo com o artigo 18.° da Lei n.° 38/80, não dependendo do Serviço de Estrangeiros c despacho final.
7 — Estranhando-se a demora, e sem que houvesse sequer indicação da data previsível da remessa do processo para despacho final, oficiou-se, de novo, em Agosto seguinte, pedindo-se, não apenas informação acerca daquela data, como, ainda, das causas de tamanha morosidade de actuação.
8 — A resposta tardou, e só depois de nova insistência se recebeu, em Junho de 1984, a indicação de que fora concedido asilo político ao interessado, por despacho conjunto dos Ministros da Administração Interna e da Justiça, de 5 de Janeiro de 1984.
O Serviço de Estrangeiros esclareceu que o processo só ali dera entrada em 11 de Janeiro de 1984 e que o parecer da Comissão Consultiva tinha e data de 2 de Fevereiro de 1983.
A demora teria ocorrido na tramitação entre os dois Ministérios competentes: o processo fora enviado primeiro ao Ministério da Administração Interna, e, em Março seguinte, ao Ministério da Justiça; deste voltara para o Ministério da Administração Intema, sem despacho (para reapreciação da Comissão), em 8 de Junho de 1983; em 26 desse mês, fora entregue à Comissão e só em 23 de Novembro de 1983 fora elaborado novo parecer, aliás concordante com o anterior, no sentido da concessão do asilo político.
9 — Em 14 de Fevereiro de 1984 o requerente tomou conhecimento do despacho, tendo recebido o cartão de identidade de refugiado e a autorização para a oficina que pretendia instalar.
Processo n.° 82/IP-27-A-3
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao bom nome e reputação. Gestores públicos.
Objecto — Instauração de inquérito ao conselho de gestão da Companhia de Seguros Bonança, apesar do arquivamento de inquérito preliminar.
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Decisão — Arquivamento por não se provar qualquer das imputações feitas.
Síntese:
1 — Um sindicato pedira a intervenção do Provedor no sentido da reabertura de processo de inquérito que tinha sido mandado instaurar aos membros do conselho de gestão da Companhia de Seguros Bonança, e que fora mandado arquivar.
O sindicato protestava contra este arquivamento, ordenado por despacho do Ministro das Finanças e do Plano n.° 108/81, de 16 de Abril, entendendo que a investigação feita fora insuficiente e que haveria graves indícios de irregularidades praticadas por aqueles gestores públicos.
2 — Foi pedido, para análise, o inquérito em questão.
3 — Antes da tomada de posição do Provedor sobre a questão, o Ministro das Finanças e do Plano, mediante o despacho n.° 17/82, de 17 de Março (publicado a 30 desse mesmo mês), determinou à Inspecção--Geral de Seguros «em seguimento do inquérito preliminar efectuado, a investigação da actuação do conselho de gestão da Companhia de Seguros Bonança, E. P., à luz dos factos denunciados».
Isto, apesar de na própria fundamentação desse despacho se reconhecer que o anterior responsável pelo Ministério em questão ordenara o arquivamento do inquérito inicial, «sem necessidade de mais actuações específicas da Inspecção-Geral de Seguros sobre este caso», pois, apresentado o respectivo relatório, concluiu-se «pela inveracidade e inincompatibilidade das acusações».
Para justificar a ordem de novo inquérito, o despacho n.° 17/82 alegava, nomeadamente «não se compadecer, sem esforço a posição interna e externa do conselho de gestão da Companhia de Seguros Bonança, E. P., com a manutenção persistente de juízos negativos sobre a sua actuação, enquanto apoiado em resultados apurados em inquérito meramente preliminar».
4 — Considerando esta decisão atentatória da sua dignidade pessoal e profissional, a maioria dos membros do conselho de gestão pôs os seus lugares à disposição do Governo — tendo efectivamente sido exonerados pela Resolução do Conselho de Ministros n.° 77/ 82, publicada em 30 de Abril.
5 — Analisado o primeiro inquérito, verificou-se que nenhuma das acusações feitas aos gestores em causa se comprovava.
Essas acusações provinham, de resto, praticamente todas, de dois ex-trabalhadores da Companhia, pai e filho, que agora geriam uma sociedade de mediação de seguros.
E pôde constatar-se até que no despacho que ordenara o arquivamento desse processo o Ministro salientou expressamente que este não só provara a falta de veracidade das acusações como viera «realçar toda uma evolução favorável», que me apraz registar, na qualidade e nos resultados da gestão da Bonança, E. P.
6 — O Provedor decidiu, assim, encerrar o processo originado na queixa do sindicato.
7 — Mas resolveu abrir processo de sua iniciativa para apreciar dos fundamentos da abertura de novo inquérito contra os gestores da empresa pública etn referência.
Considerou, na verdade, que esta decisão, seguida de exoneração dos gestores (ainda antes dá conclusão do
segundo inquérito), podia afectar gravemente a reputação pessoal e profissional deles.
E não lhe parecia ter havido fundamento plausível para a instauração do segundo inquérito, face às conclusões alcançadas, no primeiro, pela Inspecção-Geral de Seguros.
8 — Pediu, por isso, não só que um dos assessores deste Serviço pudesse participar no segundo processo de inquérito, como, também, a especificação das concretas razões que, perante as conclusões do primeiro, justificaram a instauração do aludido segundo inquérito.
9 — Apesar de várias insistências, nunca foi possível obter o esclarecimento relativo à motivação desta decisão, nem resposta ao pedido de participação na condução do novo inquérito.
10 — Mas da apreciação do segundo inquérito pôde conctuir-se, uma vez mais, pela completa ausência de fundamento das acusações de que os gestores exonerados da Companhia de Seguros Bonança foram alvo.
Pelo contrário: de todas as renovadas e completas indagações feitas pela Inspecção-Geral de Seguros ressaltava, sim, a prática de diversas condutas incorrectas por parte dos ex-trabalhadores da empresa que os haviam causado.
11 — Havendo, entretanto, mudado o Governo, não parecia ter sentido qualquer censura ou reparo em relação às decisões postas em causa.
Mas, porque se tratou de questão que teve ampla divulgação, na altura, desde logo através da publicação, no jornal oficial, das decisões que atingiram os ex-gestores da empresa pública mencionada, e tendo em conta os seus reflexos no bom nome dos visados, o Provedor entende justo e necessário, através do presente relatório, dar conhecimento à Assembleia da República, e ao público, em geral, das conclusões a que chegou neste caso.
Processo n.° 83/R-2048-A-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direito à cultura. Associações culturais.
Objecto — Não intervenção do Ministro da Cultura em determinados aspectos da gestão de associações culturais.
Decisão—Reclamação improcedente. Síntese:
1 — Um grupo de associados de uma associação cultural pretendia que o Provedor de Justiça interviesse junto do Ministro da Cultura no sentido da intervenção deste membro do Governo para averiguar das implicações da alienação de bens, por parte da direcção da associação, bem como para promover uma acção de fiscalização, em termos de auditoria, à mesma instituição.
2 — Ouvido sobre o assunto, o Ministro da Cultura remeteu parecer do Instituto Português do Património Cultural, no qual se concluía que a associação em causa era uma pessoa colectiva de utilidade pública, mas que nunca tinha sido declarada de utilidade pública administrativa. Ora, como apenas estes últimos estão sujeitos à tutela do Estado, a alienação de bens do património da associação não estava sujeita a autorização prévia do Estado, apenas havendo a ressalvar a declaração de nulidade da venda na hipótese de os
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bens alienados se situarem em zona de protecção, por falta de parecer prévio do Instituto Portugués do Património Cultural, nos termos do artigo 26.° do Decreto n.° 20 985, de 7 de Março de 1932, e Decreto Regulamentar n.° 34/80, de 2 de Agosto.
3 — Analisada a questão neste Serviço, considerou-se que a associação em causa deveria ser qualificada como pessoa colectiva de utilidade pública, como tal reconhecida antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 460/77, de 7 de Novembro (artigo 14.°).
Mas essa situação apenas a sujeitava aos deveres previstos no artigo 12.° do mesmo diploma legal, e a mais nenhuma obrigação.
Entendeu-se também que toda a matéria regulada nos artigos 416.° e seguintes do Código Administrativo, relativa à intervenção do Estado em pessoas colectivas de utilidade pública administrativa, deveria ser confrontada com a garantia da não interferência das autoridades públicas nas associações expressamente prevista no artigo 46.°, n.° 2, da Constituição em vigor, de onde resultava apenas ser possível intervenção orientadora ou tutelar do Estado nas ex-pessoas colectivas de utilidade pública administrativa com fins de saúde e assistência (actualmente designadas por instituições privadas de solidariedade social, por força do artigo 88.° do Decreto-Lei n.° 519-G2/79, de 29 de Dezembro), já que expressamente prevista no artigo 63.°, n.° 3, da Constituição (e regulamentada pelos artigos 1.°, 88.* e 43.° a 55.° do Decreto-Lei n.° 519-G2/79, de 29 de Dezembro, actualmente substituído pelo Decreto-Lei n.° 119/83, de 25 de Fevereiro, e complementado pelos Decretos-Leis n.° 467/80, de 14 de Outubro, e n.° 298/ 82, de 29 de Julho).
4 — Nestes termos, concluiu o Provedor que o Ministério da Cultura não podia ser censurado por alegada inércia de intervenção tutelar neste caso, já que não dispõe de poderes legais para tanto.
Processo n.° 83/R-2088-B-4
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ensino. Acesso ao ensino superior.
Objecto — Ingresso no ensino superior.
Decisão — Reclamação procedente.
Síntese:
1 — Vários alunos candidatos ao ensino superior no curso de Estudos Portugueses e Franceses queixaram--se ao Provedor, em 3 de Novembro de 1983, por se sentirem lesados pela actuação do Ministério da Educação, uma vez que o ponto 1 do n.° 13." da Portaria n.° 387/83, de 7 de Abril, lhes impossibilitava o ingresso naquele curso, por não possuírem a habilitação da disciplina de Latim.
Salientavam que, ao inscreverem-se no curso complementar do ensino secundário, não haviam sido informados da necessidade de tal habilitação, aliás relativa a uma disciplina de opção, e nem sequer obrigatória.
Acrescia que, por falta de professores, não era possível, em muitas escolas, frequentar tal disciplina.
Argumentavam ainda que se sentiam vítimas de tratamento discriminatório, dado que nos anos anteriores teriam sido publicados despachos do Secretário de Estado do Ensino Superior resolvendo a questão.
2 — Analisada a questão, verificou-se que a exigência da aprovação na disciplina de Latim, para o acesso ao curso em causa, tinha, de facto, base legal.
Confirmava-se, porém, não só a dificuldade na obtenção dessa habilitação, como o facto de, nos anos anteriores, o próprio Ministério ter prescindido de tal exigência — o que teria decerto gerado expectativas nos candidatos nas condições dos queixosos.
3 — Expostas estas considerações à Secertaria de Estado do Ensino Superior, obteve-se desta a informação de que, embora estes candidatos houvessem sido inicialmente excluídos, estava-se a proceder à revisão, caso a caso, das suas situações, por forma a concretizar--se o seu acesso ao curso pretendido, prescindindo da habilitação em discussão.
Processo n.° 83/R-2249-B-4
Sumário — Direitos fundamentais. Direito ao ensino. Acesso ao ensino superior. Numerus Clausus.
Objecto — Recusa de mudança de curso superior.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um aluno da Universidade do Porto frequentara, no ano lectivo de 1960-1961, o curso de Ciências Geológicas.
Em 1980-1981 efectuou os exames necessários para poder mudar para o curso de História ou de Filosofia da Faculdade de Letras da mesma Universidade.
No ano seguinte, tal acesso foi-lhe recusado por «falta de elementos».
Nos 2 anos seguintes voltara a candidatar-se, não alcançando, porém, colocação.
Agora, porém, a sua candidatura (embora instruída com a mesma documentação) não fora rejeitada; sucedera, sim, que a graduação que lhe fora atribuída não lhe facultou o pretendido ingresso.
O interessado pediu a intervenção do Provedor por considerar que a graduação de que fora objecto resultaria de deficiente apreciação da documentação comprobatória das suas classificações e idade, pois que fora admitido candidato que, detentor de igual classificação, deveria ter sido por ele preterido, em função da idade.
2 — Exposta a questão nestes termos à Universidade do Porto, esta veio informar que, «em face dos dados agora apurados», ia ser deferida a mudança de curso requerida pelo reclamante.
Ter-se-á, pois, confirmado a versão deste, no sentido de uma menos exacta apreciação da sua candidatura, nos anos anteriores.
Processo n.° 82/IP-129-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direito à liberdade. Doentes mentais. Internamento, Controle judicial.
Objecto — Controle da correcta aplicação, pelos estabelecimentos psiquiátricos oficiais e particulares, da Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963, que promulgou as bases para a promoção da saúde mental.
Decisão — Recomendação legislativa à Assembleia da República.
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II SÉRIE — NÚMERO 61
Síntese:
1 — Alertado por diversas situações de alegada irregularidade no internamento de doentes mentalmente perturbados que chegaram ao seu conhecimento, quer através de reclamações de particulares, quer por notícias publicadas em jornais, o Provedor de Justiça tomou a iniciativa de mandar abrir processo para análise do cumprimento, pelos estabelecimentos psiquiátricos oficiais e particulares, do disposto na Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963 (que promulgou as bases para a promoção da saúde mental), nomeadamente do estipulado nas suas bases x, xxtv e xxv.
2 — Solicitou-se ao Instituto de Assistência Psiquiátrica informação circunstanciada sobre o cumprimento do disposto na Lei n.° 2118 pelos estabelecimentos psiquiátricos oficiais, com especial incidência para as suas bases x, xxiv e xxv e, na hipótese de falta de cabal execução desse diploma, pediu-se indicação concreta dos fundamentos de facto e de direito de tal atitude.
O Instituto de Assistência Psiquiátrica ouviu sobre o assunto as suas delegações das zonas norte, centro e sul. Oas respostas recebidas se concluiu que, no essencial, estaria a ser dado cumprimento ao disposto na Lei n.° 2118; a delegação da zona sul acrescentou ainda que os internamentos em estabelecimentos psiquiátricos na sua área de influência estavam a efectuar--se no regime aberto, com excepção dos internamentos determinados pelos tribunais de execução de penas.
O Instituto de Assistência Psiquiátrica formulou algumas críticas ao sistema em vigor. Assim, em matéria de constitucionalidade, referiu que, se «as normas respeitantes à legitimidade para pedir a admissão em regime fechado, de pessoas feridas de anomalia psíquica não contradizem em nada os princípios constitucionais, mantendo-se em vigor nos termos do artigo 292.° da Constituição, já as normas respeitantes ao processo legal a utilizar no internamento estão revogadas pela Constituição, pois se a Lei de Saúde Mental admitia o internamento autorizado pelo centro de saúde mental competente, depois confirmado judicialmente, a Constituição muito claramente só admite a aplicação de medidas de segurança por via judicial (artigo 27.°)». Em matéria de celeridade processual, o Instituto propôs uma reformulação da Lei n.° 2118, no sentido de se criar um mecanismo mais simplificado do processo de internamento e tratamento compulsivo em regime fechado, semelhante ao gizado para os doentes de Hansen pelo Decreto-Lei n.° 547/76, de 10 de Julho, e com respeito do texto constitucional em vigor. E terminou por sugerir que na nova regulamentação fossem tidas em conta as regras contidas na Recomendação n.° R(83)2 aprovada, na reunião de 12 de Fevereiro de 1983, pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa e dirigida aos Estados membros.
3 — Analisado o assunto, concluiu-se serem pertinentes as criticas formuladas ao sistema em vigor pelo Instituto de Assistência Psiquiátrica em matéria de internamento e tratamento compulsivos e regime fechado, pois que, atendendo ao disposto nos artigos 27.°, n.° 2, 30.°, n.° 2, e 19.°, n.° 1, da Constituição, que só admitem a aplicação de medidas de segurança por via judicial, deveriam considerar-se como revogadas todas as normas da Lei n.° 2118 que permitem internamentos autorizados pelo centro de saúde mental competente (cf. base xxtv).
Por outro lado, entendeu-se também que o sistema em vigor é moroso e pouco eficaz em matéria de inter-
namento e tratamentos compulsivos em regime fechado, o que constitui uma justificação acrescida no sentido da revisão da Lei n.° 2118, tendente ao estabelecimento de um sistema simplificado de intervenção do Ministério Público e do juiz da comarca competente, embora em estreita obediência ao texto constitucional — como sucede, aliás, com o previsto no artigo 5.°, n.° 3, do Decreto-Lei n.° 547/76, de 10 de Junho, para o internamento de doentes de Hansen.
Enfim, opinou-se que as regras constantes da Recomendação R(83)2 do Comité de Ministros do Conselho da Europa, relativa à protecção jurídica das pessoas portadoras de doenças mentais internadas independentemente da sua vontade, constituiria também uma base útil de trabalho para a reformulação do regime constante da Lei n.° 2118.
4 — Nesta sequência, o Provedor de Justiça deu a conhecer ao Presidente da Assembleia da República a situação, existente, nas várias vertentes anteriormente analisadas, para que a Assembleia viesse a ponderar sobre a necessidade de reformulação do regime constante da Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963, tendo em atenção a competência prevista no artigo 168.°, n.° 1, alínea b), da Constituição, e com o pedido de que a mesma fosse dada a conhecer a todos os grupos parlamentares.
5 — Em 8 de Agosto de 1984, o Gabinete do Presidente da Assembleia da República comunicou que o assunto fora enviado à 1Comissão e, por intermédio desta, ao conhecimento de todos os grupos e agrupamentos parlamentares, não tendo até essa data sido suscitada qualquer discussão perante o Plenário da mesma Comissão.
Processo n.° 79/R-2650-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direito à saúde. Tratamento hospitalar.
Objecto — Danos físicos resultantes de deficiente tratamento hospitalar.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 —Em 3 de Agosto de 1977, um encadernador, de 22 anos de idade, fora internado no Hospital de Santo António, no Porto, com sintomas, não identificados, de afecção neurológica.
Como o doente tivesse convulsões, foi o mesmo ligado à cama pelo pessoal auxiliar. Quando, horas depois, o médico responsável o observou, verificou que, por causa das convulsões, as ligaduras que prendiam as suas mãos à cama haviam cortado tendões de ambas.
Embora o Hospital se tivesse prontificado a tratá-lo e procurar reabilitá-lo, o interessado, considerando que isso não estava a suceder em termos aceitáveis, escreveu a queixar-se ao Provedor, em 3 de Dezembro de 1979.
2 — Ouvido o Ministério dos Assuntos Sociais, e depois de algumas insistências, obteve-se a informação de que o Secertário de Estado da Saúde, por despacho de 29 de Fevereiro de 1980, determinara que, reconhecida a responsabilidade dos serviços hospitalares, se prestasse ao interessado toda a assistência necessária, quer em termos de tratamento, quer de recuperação.
Em execução dessa decisão, ele fora internado no Hospital de Santo António e, além disso, operado, por
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conta do Estado, por um especialista estrangeiro que na altura se encontrava em Portugal.
Infelizmente, porém, a recuperação fora mínima, podendo-se mesmo considerar que as mãos do doente perderam a sua capacidade funcional normal, designadamente para efeitos do exercício da sua profissão.
3 — Apesar de a Administração revelar o propósito de reparar o erro cometido, o Provedor não teve por integralmente satisfatória a resposta recebida.
Por um lado, não se informava se fora organizado inquérito sobre o caso, e quais as suas eventuais conclusões, no âmbito disciplinar.
Por outro, o Ministério, embora se responsabilizasse pelo tratamento do interessado, não se pronunciava acerca da justa indemnização pelos prejuízos a este causados.
Solicitou-se, pois, em 5 de Fevereiro de 1981, a definição de uma posição sobre estas questões, por parte do departamento ministerial em causa.
4 — Das indagações feitas recebeu-se um conjunto de documentos, com várias informações jurídicas e pareceres técnicos, mas que de modo algum constituíam um processo, disciplinar ou de inquérito.
Pareceu, porém, que quaisquer eventuais responsabilidades disciplinares já não poderiam ser efectivadas, por o procedimento correspondente ter entretanto prescrito.
5 — Quanto à indemnização, a entidade visada informou que estava a tentar compensar o queixoso através da sua admissão no Hospital de Santo António, como contínuo.
A não se concretizar essa hipótese, pôr-se-ia a alter nativa de reparação pecuniária.
6 — O Provedor continuou insistindo pela materialização desta reparação, quer por escrito, quer pessoalmente, na ocasião da visita que, em Outubro de 1981, realizou ao estabelecimento hospitalar em questão.
Salientou, a propósito, que, reconhecendo a Administração a sua responsabilidade nos danos produzidos, deveria ser ela a, espontaneamente, procurar entrar em acordo com o queixoso.
7 — Tempos depois, o Hospital veio a informar que não se pudera concretizar a admissão do interessado ao seu serviço, em virtude das limitações decorrentes da legislação em vigor sobre acesso à função pública.
8 — Tomou-se conhecimento, enfim, no início de 1984, do facto de o Ministério da Saúde e o reclamante terem chegado a acordo na estipulação de uma indemnização, no valor de 3400 contos, tendo em consideração, nomeadamente, os danos causados pelo sucedido a carreira profissional daquele.
9 — Esta solução pareceu adequada, sendo de realçar que o Ministério da Saúde concordou em atribuir uma reparação extrajudicial de montante apreciável.
Processo n.° 82/1P-18-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direitos à saúde. Tratamento hospitalar. Deveres dos médicos.
Objecto — Falecimento de doente por impossibilidade de contacto com os médicos especialistas em regime de prevenção.
Decisão — Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um jornal vespertino de 18 de Fevereiro de 1982 publicou uma noticia relatando a morte, 3 dias
antes, no hospital de Oliveira de Azeméis, de uma mulher de 48 anos, por ocasião do parto do seu 15.* filho (já tivera, ainda, 7 abortos).
O marido da falecida acusava de negligência os serviços do hospital, e, em especial, uma parteira que não teria dado à mulher a assistência devida, por estar a assistir à emissão da telenovela.
2 — Muito embora as condições da parturiente envolvessem decerto considerável risco de acidente durante o parto, o Provedor decidiu —até para apurar se essa situação especial tinha sido levada em conta — abriu processo de sua iniciativa para analisar o caso.
3 — Pedido à Inspecção-Geral dos Serviços de Saúde o inquérito que sobre o caso fora organizado, pôde verificar-se que neste se concluíra que:
a) Pelas 18 horas do referido dia, e tendo-se iniciado o trabalho de parto, a parteira de serviço tentou contactar o médico responsável pelo serviço de obstetrícia, que se encontrava em regime de prevenção e residia no Porto — sem, todavia, conseguir encontrá-lo;
b) O parto foi difícil, tendo a criança sofrido uma lesão numa omoplata e começando a mãe a ter grande hemorragia;
c) A parteira tentou de novo contactar —sem êxito — os dois obstetras em situação de prevenção, ambos residentes no Porto;
d) Chamou, então, a médica a trabalhar no serviço de urgência, que medicou a doente e a mandou transferir para o Porto, dada a gravidade da situação;
e) A doente faleceu, porém, no caminho;
/) Do início do trabalho de parto ao falecimento decorreram cerca de 2 horas, tempo suficiente para se ter salvo a doente, se tratada a tempo por especialista.
Perante estes resultados, os instrutores do processo haviam proposto o arquivamento deste, por entenderem que tanto a parteira como a médica da clínica geral tinham agido correctamente.
Mas surgeriram que a questão da situação dos médicos de prevenção residentes no Porto fosse posta à Direcção-Geral dos Hospitais, para eventual orientação futura.
4 — Não parecera possível comprovar actuação indevida do pessoal que acompanhou o parto da doente falecida.
Mas afigurou-se inaceitável a situação de os dois especialistas de obstetrícia em prevenção residirem no Porto, a cerca de 30 km do hospital, tendo dep para a este se deslocarem, percorrer trajecto em que o trânsito é, frequentemente, muito intenso.
5 — Por isso o Provedor recomendou à Direcção--Geral dos Hospitais que procedesse a rigorosa fiscalização dos casos em que tivessem sido dadas «autorizações para residência fora das localidades das sedes dos serviços, tendo em vista verificar a sua compatibilidade com uma eficaz e atempada assistência aos doentes, não só nos casos gerais, como ainda nas situações de urgência ou prevenção».
6 — O director-geral dos Hospitais, no seguimento desta recomendação, emitiu a circular normativa n.° 5/ 84, de 26 de Abril, chamando, por um lado, a atenção dos hospitais para a necessidade de cumprimento do regime legal vigente quanto à residência dos funciona-
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rios fora da localidade em que trabalham, e, por outro, determinando que estes estabelecimentos lhe comunicassem todas as situações desse tipo existentes e a sua compatibilidade com as necessidades do serviço.
Processo n.° 83/R-853-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Direito de sigilo da correspondência de funcionários.
Objecto — Abertura, em serviço público, de carta pessoal dirigida a um funcionário.
Decisão — Reclamação procedente. Reparo. Recomendação.
Síntese:
1 — Uma funcionária do Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas queixou-se ao Provedor de Justiça de que, por ordem do presidente deste organismo, fora aberta uma carta pessoal para si dirigida por investigador estrangeiro, mas remetida para o Instituto, e na qual lhe eram solicitados diversos elementos estatísticos.
A carta fora respondida pelo Instituto e só algum tempo depois viera a ser dado conhecimento à reclamante, quer do seu teor, quer da resposta remetida.
2 — O Instituto de Apoio à Emigração e Comunidades Portuguesas, ascultado acerca do caso, veio argumentar com o facto de existir norma genérica de actuação no sentido da abertura de missivas oriundas de organismos estrangeiros e dirigidas a funcionários do Instituto na sua qualidade funcional, no caso concreto, relevava ainda o facto de no envelope da missiva não ter sido aposta a menção de «particular».
3 — Analisada a situação, concluiu-se que, em termos abstractos, nada havia de criticável na orientação seguida no sentido da abertura de missivas oriundas de organismos estrangeiros e dirigidas a funcionários do instituto na sua qualidade funcional (e a que não seja aposta a menção de «particular»), dado que a correspondência que dá entrada num organismo público beneficia da presunção de respeitar a «matéria de serviço». Contudo, tal presunção é ilidível por prova em contrário e, se não é censurável o acto de abertura da missiva, já passa a ser censurável a não entrega imediata ao destinatário de carta que, a posteriori vem a verificar-se como de teor pessoal. Ora, no caso em apreciação, a missiva era de nítido conteúdo pessoal e o Instituto, abusivamente, respondeu-lhe, só depois tendo dado conhecimento à interessada do conteúdo da carta e da aludida resposta.
4 — A actuação do serviço violou, assim, o direito de sigilo da correspondência particular dos funcionários, pois, verificado o teor da missiva, passou esta a estar abrangida pelo regime dos Direitos do Homem (artigo 12." da Declaração Universal, publicada no Diário da República, 1.* série, de 9 de Março de 1981, e artigo 8.° da Convenção Europeia — Lei n.° 65/78, de 13 de Outubro) e pelo regime de direitos, liberdades e garantias previsto no título li da Constituição, com especial incidência para os artigos 34.° n.°* 1 e 4, 17.° e 18.°
O direito de sigilo da correspondência dos funcionários, na hipótese de se tratar de missivas pessoais, não pode ser restringido por orientações burocráticas, pois
a Constituição apenas permite a sua restrição por lei formal (artigos 18.° e 16.°, n.° 1); as relações de dependência hierárquica também não justificam tratamento específico e menos favorável dos funcionários nesta matéria, pois a Constituição não abre qualquer excepção à garantia do sigilo da correspondência particular dos funcionários no âmbito das «relações especiais de poder».
4 — O Provedor de lustiça formulou um reparo à actuação da presidência do Instituto em funções na data da ocorrência da situação (período compreendido entre 25 de Março e 27 de Maio de 1983), não tendo deixado de recomendar que esse organismo, para o futuro, respeitasse as normas de direito internacional e as regras constitucionais aplicáveis em matéria de direito ao sigilo da correspondência particular dos seus funcionários.
Do teor deste reparo e recomendação foi dado conhecimento à Secretária de Estado da Emigração e das Comunidades Portuguesas.
Processo n.° 82/R-1852-B-1
Sumário — Direitos fundamentais. Liberdade religiosa. Liberdade de reunião. Prática de culto.
Objecto —r Impossibilidade de a Aliança Evangélica Portuguesa realizar na Póvoa de Varzim diversas reuniões durante os meses de Verão, por recusa da câmara municipal.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação.
Síntese:
1 — A Aliança Evangélica Portuguesa apresentou ao Provedor de lustiça uma exposição em que solicitava a sua intervenção no sentido de recomendar ao presidente da Câmara Municipal da Póvoa de Varzim o cumprimento do Decreto-Lei n.° 406/74, de 29 de Agosto, que teria sido violado pela câmara relativamente a um pedido formulado pela reclamante, em 1982, para a realização de diversas reuniões ao ar livre, durante os meses de Verão, a fim de difundir a Boa-Nova do Evangelho de Cristo, e que teriam lugar em diversos lugares públicos daquela cidade, em várias tardes e noites de sábados e domingos.
2 — A realização dessas reuniões fora impedida por despacho do presidente da Câmara Municipal, invocando razões de inconveniência que não haviam sido especificadas.
A Aliança Evangélica Portuguesa procurou esclarecer-se junto do plenário camarário sobre as razões de inconveniência invocadas e ainda sobre os fundamentos de ordem legal justificativos dos obstáculos levantados à realização das reuniões. Alegava em seu favor, nomeadamente, o regime constante do Decreto--Lei n.° 406/74, de 29 de Agosto, e o facto de as mesmas reuniões não constituírem impedimento para o trânsito nem provocarem distúrbios.
Porém, a câmara municipal reiterou a anterior posição do seu presidente, justificando que as reuniões eram inconvenientes para as pessoas que estavam de visita à cidade, tendo mantido a anterior posição favorável apenas para um dos locais indicados pela reclamante. A Aliança Evangélica Portuguesa não recorreu da decisão para os tribunais comuns, por os mesmos
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se encontrarem então fechados, por motivo de férias judiciais.
3 — Solicitou-se informação sobre o caso à Câmara Municipal da Póvoa de Varzim, a qual, em síntese, comunicou a seguinte posição:
a) A entidade competente para dirimir o litígio existente, nos termos do artigo 14.°, n.° 1, do Decreto-Lei n." 406/74, de 29 de Agosto, seria o tribunal de comarca e não o Provedor de Justiça;
6) O requerimento entregue pela Aliança Evangélica Portuguesa apresentava um formalismo irregular, dado que, sendo aquela uma pessoa colectiva, deveria ter sido assinado pela direcção e não por três promotores, conforme exigido pelo artigo 2.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 406/74, de 29 de Agosto;
c) Relativamente ao aviso recebido na Câmara, e uma vez que não fora dada qualquer resposta no prazo de 24 horas, as reuniões deviam considerar-se automaticamente autorizadas.
4 — Analisado o assunto, concluiu-se o seguinte:
a) O artigo 14.* do Decreto-Lei n.° 406/74, de 29 de Agosto, define a competência dos tribunais ordinários para a apreciação das decisões tomadas com violação desse diploma, mas tal não significa falta de competência do Provedor de Justiça para a análise do caso, já que, nos termos da lei, a sua actuação é independente dos meios graciosos e contenciosos (artigo 3.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro), tendo esta instituição como atribuições a defesa dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos (artigo 1 ° do diploma citado), e competindo-lhe também dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correcção dos actos administrativos ilegais ou injustos [artigo 18.°, n.° 1, alínea o), diploma citado];
b) A falta de resposta atempada da Câmara Municipal à carta da Igreja Evangélica de 3 de Agosto de 1982, só recebida a 13 desse mês, determinou, nos termos do artigo 3.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.u 406/74, de 29 de Agosto, que os reclamantes poderiam realizar as reuniões nos locais e horas pelos mesmos indicados. Se os mesmos não usufruíram dos direitos conferidos pela lei, tal não significa que a Câmara pudesse, fora do prazo estipulado (24 horas), formular quaisquer objecções, quer referentes aos aspectos constantes dos artigos 1.°, 6.°, 9.° ou 13.°, quer aos de alegada irregularidade formal do pedido, face ao disposto no artigo 2.°, n.° 2, do mesmo diploma; a deliberação da Câmara enfermou, sob este aspecto, de incompetência ratione temporis;
c) As objecções extemporaneamente colocadas pela Câmara Municipal quanto a dois dos locais indicados também não se conformavam com o regime definido no artigo 45.° da Constituição e no Decreto-Lei n.° 406/74, quanto ao exercício do direito de reunião. De facto, da letra e espírito desses normativos decorre que a efectivação do referido direito não depende de qualquer autorização e que a interven-
ção das câmaras nestas situações corresponde ao exercício de um poder vinculado de veto ou de objecção apenas nos casos expressos e especificamente enumerados nos artigos 1.°, 6.°, 9.° e 13.°, o qual deve ser alheio a quaisquer considerações de «conveniência ou oportunidade», características próprias da autorização no uso de um poder discricionário. Ao invés, os motivos apresentados pela Câmara em questão baseavam-se em puras razões de conveniênca, sem apoio nos preceitos legais que ela invocava. E, de resto, nem pareciam justificadas as alegações de que tais reuniões seriam perturbadoras da ordem e tranquilidade públicas.
3 — Na sequência desta análise, e embora a questão tivesse perdido interesse actual, o Provedor de Justiça formulou um reparo à actuação da Câmara Municipal, recomendando-lhe também que, para o futuro, aplicasse correctamente as disposições constitucionais e legais vigentes em matéria de direito de reunião.
Domínio publico Procasso n.° 82/IP-48-B-4
Sumário — Domínio público. Águas minerais. Exploração.
Objecto — Inadequação do Decreto n.° 15 401, de 20 de Abril de 1928, regulador da exploração de águas minerais e minero-medicinais.
Decisão — Revisão legislativa em curso.
Síntese:
1 — A apreciação de uma queixa relativa a um caso de exploração de águas minerais levou o Provedor a questionar se não mereceria ser revisto o respectivo regime jurídico vigente, ainda constante do Decreto n.u 15 401, de 20 de Abril de 1928.
Na situação em análise, uma empresa privada, que pretendia realizar a pesquisa e exploração das referidas águas minerais, protestava pelo facto de se lhe depararem para tanto obstáculos postos, quer pelas autarquias locais da zona, quer pela assembleia de compartes do baldio em que a nascente se situava— umas e outra alegando que as águas em causa eram necessárias para o abastecimento das populações da área.
2 — Não parecendo de questionar o princípio, tradicional no nosso Direito, segundo o qual as águas minerais e minero-medicinais pertencem ao Estado, integrando-se no seu domínio público, já não se afigurava tão indiscutível, que, tal como decorre do regime do Decreto n.° 15 401:
Qualquer particular possa registar tais águas em seu favor, e, depois, pesquisá-las, sem possibilidade de oposição do proprietário do terreno, seja essa entidade de natureza privada, pública ou comunitária (já que a falta de autorização destes pode ser suprida, mediante o pagamento de indemnização);
A decisão sobre a concessão caiba à administração central, sem qualquer intervenção das au-
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toridades locais ou entidades comunitárias interessadas.
3 — O Provedor resolveu, pois, expor estas questões aos Ministérios da Justiça, da Administração Interna e da Indústria e Energia.
4 — O Ministro da Justiça pediu o parecer da Pro-curadoria-Geral da República, que, embora sem se pronunciar sobre as opções de política legislativa a tomar, confirmou a necessidade de revisão de todo o sistema do Decreto n.° 15 401.
No tocante ao regime actual, e conquanto reconhecesse que compete exclusivamente à administração centraJ decidir da concessão ou não da licença de pesquisa e exploração de águas minerais e minero--medicinais, a Procuradoria-Geral da República entendeu que sempre seria aconselhável ouvir previamente as autarquias locais e as entidades responsáveis pelos baldios (em que aquelas porventura nascessem ou corressem), por forma a conseguir-se uma solução tão consensual quanto possível.
5 — O Ministério da Indústria e Energia informou estarem já em curso trabalhos preparatórios de uma nova legislação sobre a matéria — o que levou o Provedor a encerrar este processo, já que considerou que mais lhe não caberia do que suscitar os problemas acima apontados, para devida ponderação na elaboração da nova lei.
Empreitadas
Processa n.° 8Q/R-910-B-4
Sumário — Empreitada. Preço.
Objecto — Recusa, por autarquia local, do pagamento de preço de empreitada.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada por conciliação.
Síntese:
! — Em 23 de Maio de 1980, um empreiteiro queixou-se ao Provedor pelo facto de a Câmara Municipal da Feira não proceder ao pagamento de certa quantia relativa a trabalhos suplementares que tivera de levar a cabo no âmbito da execução de empreitada que, em 1978, lhe fora adjudicada para reparação de uma estrada.
2 — Só em 6 de Julho de 1981 obteve este Serviço a primeira resposta da Câmara Municipal — depois de múltiplas insistências nesse sentido.
Nesse documento aquele órgão autárquico veio afirmar que:
O assunto é deveras melindroso para um envio de provas documentais, pois a esta Câmara assistem razões que só em situação litigiosa deverá revelar. Em face do exposto, deverá o empreiteiro recorrer aos tribunais judiciais para fazer valer os seus direitos, pois esta Câmara entende assistir-lhe razão e, portanto, nada dever ao Sr. Empreiteiro.
3 — O Provedor não pôde aceitar esta tomada de posição.
Embora admitisse que, afinal se tivesse dc chegar à conclusão de que a questão teria de resolver-se pe-
rante os tribunais, designadamente por poder envolver matéria de facto controversa, não era admissível que a autarquia local se recusasse a prestar ao Provedor a colaboração a que legalmente estava obrigada, for-necendo-lhe a documentação pedida e informando-o da sua posição sobre o assunto, como lhe fora solicitado.
Isso se fez, pois, ver à entidade visada,, insistindo-se por que correspondesse ao que este Serviço pedira.
4 — Após novo período de reiteradas solicitações, a Câmara Municipal da Feira comunicou, enfim, em 13 de Abril de 1984, que o assunto fora solucionado, por acordo com o empreiteiro.
5 — Assim se encerrou o processo, não deixando de se registar que, afinal, a edilidade em referência aceitara resolver a situação através da conciliação, não se confirmando, pois, a sua inicial posição, de que o caso só pela via judicial poderia ser dirimido.
Empresas
Processo n.° 84/R-1392-A-3
Sumário — Empresas. Contabilidade. Balanços.
Objecto — Extensão aos balanços de 1984 da possibilidade, dada relativamente aos de 1983, de inclusão da reavaliação dos elementos do activo imobilizado corpóreo das empresas.
Decisão — Reclamação procedente. Situação em vias de regularização.
Síntese:
1 — Uma empresa de comércio e turismo dirigiu-se ao Provedor de Justiça, em Agosto de 1984, referindo que, devido à publicação tardia do Decreto--Lei ti.0 134/84, de 9 de Maio, as empresas não puderam beneficiar da autorização concedida no seu artigo 1.° (possibilidade de fazer constar dos balanços de 1983 a reavaliação dos elementos do activo imobilizado corpóreo).
2 — Analisada a questão, verificou-se que aquele diploma veio possibilitar às empresas que ainda não tinham efectuado a reavaliação do referido activo a realização do mesmo em 1983, por forma a que tal reavaliação viesse a constar dos balanços referidos a 31 de Dezembro daquele ano. Mas, devido ao facto de o citado decreto-lei ter sido publicado em 9 de Maio de 1984 e de as empresas serem obrigadas a ter os balanços aprovados até 31 de Março (artigo 137.° do Decreto n.° 16 731, de 13 de iAbril de 1929), as mesmas não puderam beneficiar daquela autorização.
Ficavam, assim, favorecidas as empresas que não deram cumprimento ao aludido Decreto n.° 16 731, o que se não considerou justo, nem correcto.
3 — Por estas razões, foi exposta a questão ao Ministério das Finanças e do Plano, tendo sido recebida, em Outubro de 1984, a informação de que estava sendo preparado um projecto de diploma que permitirá às empresas a reavaliação dos seus activos imobilizados durante o exercício de 1984, diploma que resolverá o problema das empresas que não puderam aproveitar as vantagens concedidas pelo Decreto-Lei n.° 134/84.
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Ensino
Processo n.° 84/R-375-B-4
Sumário — Ensino. Instalações escolares.
Objecto — Demora na formalização de compra de edifício para estabelecimento de ensino.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Os proprietários de um estabelecimento de ensino particular, sito em Tomar, reclamaram, em 27 de Fevereiro de 1984, por nessa data ainda não ter sido efectivada a compra, pelo Estado, das respectivas instalações, transacção essa cujos termos haviam sido acordados por eles com o Governo, através do Secretário de Estado das Finanças, em Agosto de 1982.
2 — Pareceu, de facto, que o relevante atraso verificado na concretização desta compra acarretava inegáveis prejuízos para os vendedores, designadamente atendendo à desvalorização do correspondente preço, resultante da inflação entretanto verificada.
Este Serviço expôs, portanto, estas considerações ao Ministro da Educação, em 27 de Março de 1984.
3 — A questão veio a ser solucionada por Resolução do Conselho de Ministros de 3 de Julho seguinte, a qual não só ordenou a formalização da compra, como estabeleceu que o preço acordado seria acrescido de uma percentagem destinada a ter em conta a desvalorização monetária e atribuir aos vendedores uma compensação pela utilização das instalações, que vinham já, havia largo tempo, constituindo o suporte de uma escola oficial.
Forças Armadas
Processo n.° 77/R-236-B-1
Sumário — Forças Armadas. Promoção de militares. Reintegrações.
Objecto — Não atribuição de efeitos retroactivos ao Decreto-Lei n.° 45 016, que veio permitir a promoção de militares antes ilegalmente passados à reserva.
Decisão — Reclamação procedente. Situação em vias de regularização.
Síntese:
l — Um capitão reformado do Exército reclamou, em 7 de Fevereiro de 1977, contra a forma como as Forças Armadas tinham, em termos de remuneração, aplicado os efeitos da sua promoção, verificada em 1963.
Concretamente, ele fora preso, demitido do Exército e deportado para Angola em 1928, por haver, enquanto sargento, tomado parte no movimento revolucionário de 20 de Julho desse ano.
Reintegrado em 1930, viveu, durante alguns anos, com residência fixa em Trás-os-Montes, e sem poder regressar às suas antigas funções.
Tendo, entretanto, por frequência do respectivo curso, completado os requisitos para ascender a alferes, essa promoção verificara-se em 1937 — mas directamente para a situação de reserva.
Considerando ilegal esta decisão, contra ela foi protestando até que, em 1969, o Ministro do Exército o reintegrou.
Em 1963, e por força do Decreto-Lei n.° 45 016, de 9 de Maio, desse ano, foi promovido a capitão, contando-se-lhe a antiguidade desde Dezembro de 1950.
A essa contagem retroactiva de antiguidade não correspondeu, porém, o pagamento dos vencimentos de capitão em relação ao período correspondente.
Embora de novo tivesse vindo a insurgir-se contra essa situação, ela ainda não fora reparada até ao momento em que se dirigiu ao Provedor.
2 — Analisado o assunto, verificou-se que o Decreto--Lei n.° 45 016 procurara, de facto, reparar as consequências das decisões ilegais de que os militares nas condições do queixoso haviam sido alvo, permitindo a sua promoção ao posto a que teriam ascendido se não tivessem sido colocados na reserva.
Esse diploma só produzia, contudo, quanto a remuneração, efeitos para o futuro.
Assim, não podia nele encontrar apoio a pretensão de pagamento das diferenças de vencimento correspondentes às promoções assim operadas, nem tão-pouco a da consideração destes para efeitos do cálculo das pensões daqueles que, como o reclamante, se encontravam agora já reformados.
3 — O Provedor de Justiça não podia, na altura, face ao Decreto-Lei n.° 212/75, intervir em relação às Forças Armadas, mas não deixou de, por considerai a situação injusta, enviar os elementos constantes do processo ao Conselho da Revolução, para possível iniciativa legislativa deste — única via capaz de resolver o problema.
4 — Porque o Conselho da Revolução não se ocupou do assunto, o queixoso, em 9 de Fevereiro de 1983, voltou de novo a solicitar ao Provedor de Justiça uma intervenção no caso.
Visto que o actual Estatuto do Provedor de Justiça já não contém a proibição de este actuar em relação às Forças Armadas, foi o problema em causa posto ao Ministro da Defesa Nacional, nos mesmos termos em que o tinha sido ao ex-Conselho da Revolução.
5 — Em 6 Setembro de 1984, o Gabinete daquele membro do Governo comunicou que, após ter sido obtido parecer do Estado-Maior do Exército, o Ministro da Defesa Nacional decidira mandar estudar legislação que eventualmente contemplasse estas situações, preparando-se projecto de diploma, após determinação do número de casos deste tipo, e dos encargos envolvidos por uma tal medida.
Obras
Processo n.° 77/R-436-B-4
Sumário — Obras coercivas. Restituição de pagamento.
Objecto — Restituição da importância indevidamente paga pela realização de obras coercivas.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um munícipe do Barreiro fora intimado pela Câmara Municipal respectiva, a proceder a obras de reparação num prédio de sua propriedade — intimação que cumpriu.
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Todavia, por denúncia de um inquilino, novas obras, de amplitude parcialmente superior às primeiras, foram realizadas por iniciativa da Câmara Municipal, que posteriormente notificou o reclamante para pagar o correspondente custo.
Apesar de ter liquidado essa quantia, o interessado considerou injustificada a actuação da edilidade, pelo que dela se queixou ao Provedor, em Março de 1977.
2 — Analisada a reclamação, concluiu-se assistir razão ao reclamante, porquanto, uma vez feitas as obras pelo proprietário, se impunha a verificação no sentido de apurar se as mesmas estavam ou não de acordo com o mandato de intimação.
Provava-se, de resto, que os serviços camarários tinham conhecimento de que o proprietário realizara as obras a que fora intimado — embora com atraso provocado por dificuldades levantadas pelo inquilino referido, com o qual entrara em litígio.
3 — Não tendo havido a necessária vistoria com aquela finalidade, tinha de entender-se que a execução coerciva das obras pela Câmara fora ilegal, por não estarem observados os pressupostos prescritos nos ar tigos 10.° e 166." do Regulamento Geral das Edificações Urbanas.
0 incumprimento do prazo indicado na intimação não se podia imputar ao senhorio, e não era, mesmo, de excluir que as obras suplementares que a Câmara depois ainda efectuara não tivessem sido tomadas necessárias precisamente devido ao atraso resultante dos obstáculos suscitados pelo inquilino à realização das primeiras.
4 — Por isso, o Provedor recomendou à Câmara Municipal a restituição ao interessado da quantia referente às obras que ela promovera.
5 — Depois de múltiplas insistências, escritas e telefónicas, não só junto da edilidade do Barreiro, como do Governador Civil de Setúbal, enquanto entidade tutelar, aquele órgão autárquico comunicou, em 10 de Dezembro de 1983, que restituirá ao interessado a quantia em discussão — explicando o atraso pelo facto de o processo de obras ter estado extraviado.
Processo n.° 81/R-1518-B-4
Sumário — Obras. Prédios degradados. Subsídio.
Objecto — Falta de pagamento de subsídio atribuído para reparação de prédio degradado.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Em 1976, o Governo Civil da Guarda concedera subsídios, a pessoas carenciadas, para reparação de edifícios degradados, através de verbas atribuídas pelo Gabinete de Gestão do Fundo de Desemprego.
2 — Inventariados os candidatos ao subsídio, a um deles foi concedido o montante de 50 000$, tendo o Governo Civil da Guarda emitido uma credencial que facilitou o beneficiário a contratar um empreiteiro para a execução das obras.
3 — Efectuadas as obras, o cidadão em causa, pretendeu receber o subsídio o que não conseguiu em virtude de, por descontrolo administrativo, se terem esgotado as verbas respectivas.
4 — Apresentada a reclamação ao Provedor, e uma vez interpelado o Governador Civil da Guarda, veio a confirmar-se o esgotamento das verbas em questão.
5 — Entretanto, o reclamante havia sido accionado judicialmente, pela empresa que executara as obras, por falta de pagamento das mesmas.
6 — Estudado o assunto, considerou-se que a atribuição do subsídio em referência, havia constituído o Estado em dívida para com o reclamante, consolidando na esfera jurídica deste o correspondente direito subjectivo de crédito.
Por isso, o Provedor recomendou ao Governador Civil da Guarda que solicitasse do Governo o reforço da verba necessária para satisfazer os compromissos assumidos.
Ao fazê-lo, o Provedor salientou que a situação criada era desprestigiante para a imagem da Administração Pública, face aos particulares, e não deixou de apontar os prejuízos materiais e morais que para o queixoso haviam resultado da falta de cumprimento, pelo Estado, da obrigação face a ele assumida.
7 — Esta recomendação levou a que o Ministro da Administração Interna intercedesse junto da Secretaria de Estado do Emprego e Formação Profissional, no sentido de ser afectada a verba necessária ao Governo Civil da Guarda, por força do orçamento do Gabinete de Gestão do Fundo de Desemprego.
8 — Assim, veio, de facto, a suceder, deste modo se satisfazendo a justa pretensão do queixoso.
Processo n.° 83/R-1410-B-4 Sumário — Obras coercivas.
Objecto — Imposição de vultosas obras de reparação e de beneficiação num imóvel arrendado ao próprio município, por uma renda diminuta.
Decisão — Reclamação parcialmente procedente. Arquivamento do processo por alteração das circunstâncias.
Síntese:
1 — A queixosa e um irmão tinham herdado recentemente um imóvel que estava arrendado há muitos anos à Câmara Municipal do Sardoal, para habitação do comandante do posto da GNR, sendo a renda anual de 1800$.
Ora, apesar da exiguidade da mencionada renda, o referido órgão autárquico pretendia que os proprietários do imóvel lhe fizessem diversas obras de reparação e beneficiação, para cujo custeio os visados afirmavam não dispor de adequados recursos económicos.
2 — Apreciado o assunto, notou-se que não eram raros os casos em que os proprietários de imóveis reclamavam contra a imposição, pelas câmaras municipais, de obras de conservação ou beneficiação, alegando que as baixas rendas pagas pelos inquilinos não permitiam (ou tornavam muito difícil) suportar o custo das obras em vista.
E não pareceria certamente razoável deixar de atribuir ao aspecto focado a atenção que ele merecia, j mormente quando estivesse em jogo a execução de obras de conservação ou reparação tendentes a assegurar a mera comodidade ou o simples conforto dos i inquilinos dos imóveis em causa. ,
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Mas quando tais obras visassem, fundamentalmente, eliminar os riscos que para os inquilinos dos referidos imóveis, ou até para o público em geral, pudessem advir da falta de adequadas condições de salubridade, solidez ou segurança das edificações, já não se afigurava curial que deixasse de ser efectivamente encarada a realização das obras em vista, dado o manifesto interesse público de que se revestiria, então, a eliminação das deficiências apontadas.
Aliás, o Decreto-Lei n.° 294/82, de 27 de Julho, permitiria repercutir no valor das rendas habitacionais o custo das obras de conservação ou beneficiação executadas pelos senhorios, em consequência de imposição legal, regulamentar ou administrativa, ou a pedido por escrito da totalidade dos inquilinos habitacionais dos imóveis, ou realizados pelos municípios em substituição dos senhorios, quando o valor das citadas obras ultrapassasse o rendimento colectável do prédio.
3 — Independentemente, porém, da questão geral focada, entendeu-se necessário ouvir a Câmara Municipal do Sardoal acerca do problema exposto pela reclamante, tanto mais que, para além da acentuada < desproporção que se inculcava existir entre a diminuta renda paga pelo município aos proprietários do imóvel e o volume das obras cuja execução era pretendida, se suscitavam algumas dúvidas quanto ao fundamento normativo da imposição de diversas daquelas obras.
Na realidade, não parecia que algumas das obras em vista se enquadrassem verdadeiramente no âmbito dos artigos 9.° e 10.° do Regulamento Geral de Edificações Urbanas, ou do artigo 62.°, n.° 2, alínea h), da Lei n.° 79/77, de 25 de Outubro, já que, tendendo embora à melhoria de certas condições de espaço, iluminação, comodidade e conforto da edificação, não visavam, porém, remediar deficiências provenientes da utilização normal do imóvel, nem se destinavam, propriamente, a corrigir más condições de salubridade, solidez ou segurança contra o risco de incêndio (condições essas que o imóvel houvesse adequadamente possuído e tivesse deixado de apresentar com o decurso do tempo), e também não tinham por objectivo a eliminação da ameaça de ruína ou de perigo para a saúde e segurança das pessoas.
4 — Entretanto, em resultado da diligência efectuada por este Serviço junto da Câmara Municipal do Sardoal, esta esclareceu que estava a envidar todos os seus esforços no sentido de arranjar alojamento para o comandante do posto da GNR numa moradia pertencente à autarquia, o que, a concretizar-se, daria origem e que se tornassem desnecessárias as obras cuja realização fora anteriormente prevista.
Por isso, a Câmara Municipal não se pronunciara especificamente sobre a questão enunciada pelo Provedor.
5 — A Câmara informou, posteriormente, que resolvera denunciar o contrato de arrendamento com os queixosos, pois sempre se concretizara o alojamento do comandante da GNR em imóvel pertencente ao município.
6 — Assim se encerrou o processo, que teve o interesse de permitir uma definição geral de critérios de actuação a propósito de obras coercivas em prédios de renda reduzida.
Processo n.° B4/R-78D-B-4
Sumário — Obras. Licenciamento.
Objecto — Demolição de construção, quer por não estar licenciada, quer por não respeitar a distância mínima ao limite da plataforma da estrada nacional.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um emigrante queixou-se pelo facto de o acesso a uma sua propriedade, sita em Mafómedes (Santa Marta de Penaguião) estar prejudicada com a construção clandestina de um barracão situado junto à estrada nacional n.° 304.
2 — O assunto não se resolvia, por se ter gerado um conflito negativo de competência entre a Câmara de Santa Marta de Penaguião e a Junta Autónoma de Estradas.
De facto, embora tanto a Camara como a Junta reconhecessem ser ilegal a construção em causa, elas devolviam-se reciprocamente a competência para ordenar a sua eventual demolição.
3 — Analisada a reclamação, concluiu-se que qualquer uma das entidades era causa tinha competência própria para a resolução da situação e isto porque, por um lado, cabe às câmaras municipais exercer o poder de fiscalização quanto às construções edificadas sem licenciamento e, por outro, incumbem à Junta Autónoma de Estradas os poderes de inspecção relativos a construções erigidas junto às plataformas das estradas nacionais.
4 — Exposta às entidades visadas a posição deste Serviço, veio a ser a Junta Autónoma de Estradas a ordenar a demolição do barracão, uma vez que a localização do mesmo violava o disposto no artigo 8.°, n.° 1, alínea d), do Decreto-Lei n.° 13/71, de 23 de Janeiro, visto não guardar a distância mínima de 10 m ao limite da plataforma da estrada nacional.
Polícia
Processo n.° 84/R-8-B-1
Sumário — Polícia. Armas. Licenciamento.
Objectivo — Recusa de concessão de licença de uso e porte de arma de caça por falta de titularidade dc licença de caça.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um munícipe de Olhão reclamou pelo facto de a Câmara Municipal respectiva lhe recusar a concessão de licença de uso e porte de arma de caça enquanto não fosse possuidor da carta de caçador.
2 — Analisada a reclamação, concluiu-se assistir razão ao reclamante, e isto porque a edilidade não vinha dando às normas legais aplicáveis a interpretação mais correcta.
3 — Ê que o artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 373/3, de 21 de Fevereiro de 1969, permite que as armas de caça possam ser destinadas a outros fins que não
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somente os venatórios, designadamente o de defesa de propriedades rurais (artigos 44.° e 60.°).
E, para tanto, os interessados têm de ser portadores tão-somente da licença de uso e porte de arma de caça (artigo 58.°, § 1.°).
4 — Diferente é a licença de caça, exigida para o exercício venatório e para cuja concessão se torna necessária a titularidade da carta de caçador (artigos 11.°, 16.°, 18.° e 44.° do Decreto n.° 46 847, de 19 de Agosto de 1967).
5 — Ora, como o reclamante não pretendia praticar actos de caça —ele queria poder usar a arma para defesa da sua casa, isolada, e de terrenos de cultura de que era proprietário — parecia óbvio que não estava obrigado a ser titular da carta de caçador.
6 — Com base na argumentação atrás aduzida foi formulada recomendação à Câmara Municipal de Olhão no sentido de o facto de o interessado não possuir licença de caça não dever obstar a que lhe pudesse ser concedida a licença de uso e porte de arma de caça.
7 — A entidade visada acatou a recomendação, atribuindo a licença requerida.
Reforma Agrária
Processo n.° 83/R-3-A-2
Sumário — Reforma Agrária. Alfaias agrícolas.
Objecto — Recusa de restituição de alfaias agrícolas a antigo rendeiro de terreno.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — O reclamante era antigo rendeiro de um prédio rústico situado no concelho de Odemira. Havendo sido ocupado por uma cooperativa o imóvel em questão, ele passara a fazer parte da direcção desta — forçado, segundo a sua versão, pelos serviços regionais do Ministério da Agricultura.
Tendo-se o queixoso afastado, posteriormente, da cooperativa, pretendeu, sem o obter, a restituição das alfaias agrícolas que lhe pertenciam antes da ocupação, e que passaram a ser utilizadas por esta.
Não conseguindo essa restituição, o interessado pediu a intervenção do Provedor.
2 — Posta a questão à Secretaria de Estado das Estruturas e Recursos Agrários, esta remeteu informação da Direcção Regional de Agricultura do Alentejo, segundo a qual o queixoso, ao entrar para a cooperativa, lhe teria vendido as alfaias em causa.
Se, agora, queria discutir a validade dessa venda, teria de o fazer perante os tribunais, por se tratar de questão entre duas entidades privadas, e na quaí o Ministério da Agricultura não poderia legalmente intervir. Aliás, o interessado até já teria recebido da cooperativa parte do preço das alfaias que lhe vendera, estando em causa, sim, a falta de pagamento do remanescente, no valor de cerca de 800 000$.
A Direcção Regional esclarecia ainda que estava a proceder-se a concurso para atribuição, a rendeiros, do terreno em referência e que a preocupação do interessado advinha da circunstância de a cooperativa vir por isso procedendo à venda das alfaias.
Acrescentava, enfim, este departamento regional que não tinha poderes legais para obstar a esta venda — mas admitia que, uma vez consumada a distribuição do imóvel pelos rendeiros contemplados no concurso, o Estado poderia «responsabilizar-se pela satisfação do débito» ao queixoso, «quer através da devolução dos bens eventualmente devidos no prédio e que ihe tenham pertencido, quer através do pagamento de uma indemnização».
3 — O Provedor entendeu por bem solicitar ao Secretário de Estado que se pronunciasse expressamente sobre esta última sugestão, salientando, designadamente, que eventual demora em tomada de decisão sobre ela poderia comprometer os objectivos com a mesma tidos em vista.
4 — O Secretário de Estado respondeu que a alegada falta de cumprimento do acordo entre o queixoso e a cooperativa consubstanciava litígio entre particulares, que só pela via judicial podia ser dirimido.
5 — Não considerou o Provedor de aceitar, sem mais, esta situação.
De facto, ponderou que a eventual atribuição a terceiras pessoas, pela Secretaria de Estado, através do concurso para rendeiros, de maquinaria que ainda estaria em nome do queixoso poderia corresponsabili-zá-la na criação de um locupletamento à custa alheia.
Por isso recomendou que os bens eventualmente deixados no prédio pela cooperativa, e cuja destinação coubesem ao Ministério, fossem atribuídos ao reclamante, até à concorrência com o montante da dívida que aquela ainda tinha para com este.
6 — O Secretário de Estado retorquiu que o Ministério não podia dispor dos bens em questão, por não ter ocorrido requisição deles ou expropriação do prédio a que estavam afectos.
Por outro lado, entendia que não podia ter lugar qualquer devolução de alfaias ao queixoso, com base no facto da entrega de reserva, pois, na data em que esta ocorrera, este já celebrara com a cooperativa o contrato da respectiva venda.
7 — O Provedor decidiu, face a esta resposta, encerrar o caso, ponderando que era de facto difícil encontrar, sob o estrito ponto de vista legal, razões para censurar a actuação da Administração ou para a demover dela.
Não deixou, porém, de registar que a inadequação do regime jurídico aplicável a estas situações pode conduzir a soluções menos correctas e justas.
Respoasabilidadt contratual
Processo c.° 80/R-1785-B-1
Sumário — Responsabilidade contratual do Estado. Depósito. Indemnização.
Objecto — Falta de restituição de quantia depositada por um miliciano na sua companhia, em cumprimento de normas regulamentares.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1—Eni fins de Agosto de 1980, um médico que prestava serviço como oficial miliciano na ex-coiónia
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de Moçambique solicitou a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de apressar a restituição de mais de 50 000$ que confiara, em 5 de Abril de 1975, à guarda dos serviços de contabilidade da sua unidade, em cumprimento de disposições regulamentares sobre o regime de economias pessoais dos militares.
2 — Regressado a Portugal, procurara, em vão, e por todos os meios, obter a restituição do seu dinheiro, tendo-lhe sido argumentado que o indivíduo que recebera o dinheiro e passara o respectivo recibo estaria apenas a substituir o primeiro-sargento da companhia, a quem ajudava. Tratava-se de um então também primei ro-sargento, mas que se encontrava na situação de recluso, e que não fizera entrega nos cofres da companhia da quantia em questão.
3 — Não competindo ao interessado investigar a situação de quem se apresentava no local e nas funções adequadas ao recebimento do depósito afigurou-se, estudado o caso, que caberia ao Estado responder por uma importância confiada, por imposição legal, à guarda de um serviço público.
4 — Não se demoveu perante estes argumentos os serviços do Estado-Maior do Exército, respondendo com a informação de que o 1.° Tribunal Militar Territorial de Lisboa, havia, por acórdão de 9 de Junho de 1980, declarado extinto o procedimento criminal instaurado contra o mencionado primeiro-sargento, por falecimento do réu, em Janeiro desse ano.
5 — Face a esta posição, foi o problema posto ao Gabinete do Chefe do Estado-Maior do Exército, sa-lientando-se que o que estava agora em causa era, não a responsabilização de quem recebera o dinheiro depositado pelo qeixoso, mas sim a obrigação de o Estado, como depositário, dever restituir tal quantia.
6 — O Estado-Maior do Exército respondeu que considerava que apenas poderia estar em causa a aplicação do Decreto-Lei n.° 48 051, de 21 de Novembro de 1967, regulador da responsabilidade extracontratual do Estado.
Entendia, porém, que o caso concreto não podia ser por esse diploma abrangido, já que se trataria de acto que não podia ser qualificado como de gestão pública, «uma vez que a entrega da importância foi feita a uma pessoa não investida de poderes nem no exercício de funções públicas».
Opinando, assim, que «é portanto, no mínimo, duvidoso que na situação presente se possa invocar a responsabilidade extracontratual do Estado», o Chefe do Estado-Maior do Exército concluía que a única forma de o ex-miliciano poder fazer valer os seus interesses seria a da instauração de acção de indemnização, a intentar em tribunal.
7 — Este Serviço não pôde deixar de discordar desta resposta, tendo-se retorquido que:
Na verdade, remeter para os tribunais, com base em mera responsabilidade extracontratual, um assunto que desde 1975 está pendente, sem qualquer culpa do reclamante, e tão clara e linear como será a restituição de uma quantia confiada por um militar à guarda dos serviços da unidade em cumprimento de regulamento superior, parece denunciar má vontade ou errada interpretação da legislação aplicável.
A prova da entrega da quantia está feita pelo recibo respectivo e não é posta em dúvida sequer. Se o recebedor não foi o agente para tal designado, não poderia ao «depositante» exigir-se especial cautela, já que entregou as suas economias no serviço designado para o receber e à pessoa que nele se encontrava e ¡he passou recibo.
Se o «falso agente» entretanto faleceu e não pode ser criminalmente accionado, não é ao «depositante» que deve ser imputado o risco.
Parece, aliás, pouco curial a forma como o Estado-Maior do Exército pretende invocar o Decreto-Lei n.° 48 051, de 21 de Novembro.
Dispensando-nos de uma aprofundada argumentação jurídica e tendo a situação de ser reportada a data da entrega da quantia, não se compreende como o reclamante é tratado como terceiro (integrado como estava na unidade onde era obrigado a entregar as suas economias), e como se classifica o acto como de gestão privada.
Em todo o caso, o que parece inequívoco é a necessidade de se resolver o problema em termos de direito moral e justiça.
Assim sendo, este Serviço solicita que V. Ex.a se digne providenciar para que o assunto seja devidamente apreciado, crente como está de que ele não deixará de ser solucionado, ordenando-se a restituição da quantia depositada* e dos juros de mora devidos desde 1975.
8 — Embora afirmando a sua «total disponibilidade e abertura face às recomendações do Provedor de Justiça, tendo em vista a prevenção e resolução das questões formuladas pelos cidadãos», a entidade visada não alterou a sua anterior opinião, voltando a declarar que, estando-se (em seu entender) perante acto de gestão privada, outra forma de resolução do caso não haveria senão a do recurso à via judicial.
9 — Revelando-se infrutífera mais qualquer troca de ofícios, pareceu, contudo, que haveria vantagem numa troca de impressões directa sobre o enquadramento jurídico do caso — não abrangida pelo regime da responsabilidade extracontratual do Estado, mas sim pelo das normas gerais reguladoras do depósito e da responsabilidade contratual das pessoas colectivas pelos actos dos seus agentes ou dos que como tais são legitimamente considerados pelos outros contratantes.
10 — Assim, a assessora encarregada do processo contactou, pessoalmente, em 25 de Novembro de 1983, a Repartição da Auditoria do Departamento de Finanças do Estado-Maior do Exército, com vista ao esclarecimento das divergências existentes.
11 — Desta diligência resultou o reconhecimento, pela entidade visada, do acerto da posição do Provedor, mostrando-se por isso, enfim, disposta a cumprir a obrigação que perante o queixoso assumira ao receber o depósito.
12 — Esta posição foi sancionada por despacho de 7 de Março de 1984 do Vice-Chefe do Estado-Maior do Exército, que mandou restituir ao interessado a soma que em 1975 depositara.
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II SÉRIE — NÚMERO 61
Segurança social
Processo n.° 83/R-892-B-1
Sumário — Segurança Social. Aposentação. Equivalência de categorias.
Objecto — Equivalência da categoria de inspector--chefe da lnspecção-Geral de Finanças não à de pessoal dirigente, mas à de inspector de finanças principal.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um aposentado pela Caixa Geral de Aposentações reclamou para o Provedor de Justiça do facto de a categoria de inspector-chefe da lnspecção-Geral de Finanças ter sido equiparada, na Portaria n.° 490/ 83, de 28 de Abril, para efeito de actualização das pensões degragadas, não a pessoal dirigente, mas a Inspector de finanças principal.
2— Face a tal reclamação, ouviu-se a Dlrecçâo--Geral da Administração e da Função Pública sobre as razões que estiveram na origem da equiparação de categorias contestada pelo reclamante.
Em resposta, aquele departamento informou que:
1 — A carreira dos inspectores de finanças foi objecto de várias alterações com vista à atribuição de designações mais adequadas ao tipo e funções de cada categoria, bem como das letras correspondentes.
2 — Nesta sequência, à categoria de inspector--chefe da lnspecção-Geral de Finanças têm vindo, ao longo do tempo, a ser atribuídas as designações de inspector técnico chefe; depois inspector técnico principal e presentemente a de inspector de finanças coordenador (letra D) (cf. artigo 4.°, n.° 3, e artigo 10° do Decreto-Lei n.° 539/73, de 23 de Outubro, e artigo 54.° do Decreto n.° 125/77, de 24 de Setembro, e n.° 2 do artigo 3.° do Decreto Regulamentar n.° 63/79, de 5 de Dezembro).
3 — Por outro lado a carreira dos inspectores de finanças encontra-se estruturada nos termos do Decreto Regulamentar n.° 63/79, de 5 de Dezembro, e inserida no quadro de pessoal técnico superior, conforme mapa anexo ao Decreto--Lei n.° 513-Z/79, de 27 de Dezembro, pelo que se pode concluir que a categoria em apreço não faz parte do quadro de pessoal dirigente.
4 — Mais se informa que a categoria de inspector-chefe da lnspecção-Geral de Finanças foi equiparada, para efeitos de aposentação, pela Portaria n.° 490/83, de 28 de Abril, a inspector de finanças principal (letra E).
Segundo esclarecimento colhido junto do grupo de trabalho para a Segurança Social da Função Pública, a equiparação constante da referida portaria ficou a dever-se a lapso, pelo que irá ser publicada a respectiva rectificação.
5 — Nesta conformidade solicita-se a V. Ex.° se digne aguardar a publicação do referido diploma.
3 — Não sendo esta resposta elucidativa quanto ao concreto conteúdo da rectificação da Portaria n.° 490/83 na mesma anunciada, insistiu-se junto da aludida Direcção-Geral no sentido de explicitar esse aspecto.
4 — Recebida resposta no sentido de que a equiparação em causa iria ser feita em relação à categoria de inspector de finanças coordenador —solução tida por aceitável— foi o processo deste Serviço mandado arquivar.
Processo n.° 83/R-275-B-1
Sumário — Segurança Social. Pensão de aposentação. Pagamento.
Objecto — Demora no pagamento da pensão de aposentação, por recusa de prioridade de tratamento.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Em Fevereiro de 1983 deu entrada no Serviço do Provedor de Justiça uma reclamação em que o seu autor, que fora funcionário público nas ex-colônias, se queixava de o processo de aposentação que tinha pendente na Caixa Geral de Aposentações, ao abrigo do Decreto-Lei n.° 23/80, de 29 de Fevereiro, e com base em requerimento formulado em Janeiro de 1981 e devidamente instruído, ainda lhe não ter proporcionado o recebimento da pensão. Isto, não obstante haver comprovado que se encontrava desempregado. Aliás, em Setembro de 1982, a Caixa comunicara-lhe que fora indeferido o seu pedido de concessão de prioridade ao respectivo processo de pensão.
2 — Face a tal reclamação, inquiriu-se, em Abril de 1983, a Caixa Geral de Aposentações acerca da data aproximadamente prevista para o início do pagamento da pensão e, bem assim, sobre se essa instituição adoptava, quanto ao processamento de pensões, algum critério de prioridades em atenção às carências dos requerentes.
3 — Em resposta, a Caixa Geral de Aposentações comunicou em Agosto de 1983 que, quanto ao caso concreto, tinha sido pedida ao Centro Nacional de Pensões informação sobre se o reclamante estava recebendo alguma pensão. Isto para efeito de, em caso negativo, lhe ser eventualmente reconhecida prioridade no seu processo. Verificou-se, pois, por parte da entidade em questão, uma revisão da sua primeira posição acerca da prioridade de tratamento desta pensão.
Pelo que respeitava à questão de ordem geral colocada, a Caixa esclareceu que, em princípio, os processos eram estudados segundo a ordem cronológica da sua entrada.
Contudo, havia casos «em que essa ordem era alterada a pedido dos interessados quando provem não exercer qualquer profissão remunerada, carência de meios, existência de agregado familiar numeroso, nomeadamente de menores a cargo, ou doença que lhes não permita o exercício de actividade remunerada».
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Acrescentava ainda aquela Caixa que «igualmente quando a idade dos requerentes é avançada —superior a 65 anos — os seus processos são estudados com precedência».
4— Afiguraram-se ajustados e aceitáveis os critérios gerais de actuação utilizados pela Caixa nesta matéria.
5 — Face ao exposto quanto ao caso vertente, dirigiu-se em Novembro de 1983 um ofício ao Centro Nacional de Pensões em que se solicitava que fossem encetadas diligências no sentido de, com a brevidade possível, ser dada resposta à pergunta formulada pela Caixa Geral de Aposentações relativamente ao interessado, invocando-se para o efeito estar o processo de aposentação a arrastar-se desde 1981, com a agravante de aquele ser pessoa muito carecida de pensão de aposentação.
0 Centro Nacional de Pensões, por ofício datado de Março de 1984, transmitiu ter já respondido à Caixa em Dezembro de 1983.
6 — Finalmente, em Maio seguinte, o reclamante remeteu ao Provedor de Justiça uma carta em que salientava ter obtido já a conclusão do seu processo de aposentação na Caixa Geral de Aposentações e reconhecia o contributo que para o efeito tinha representado a sua actuação.
Processo n.° 82/R-1683-B-1
Sumário — Segurança Social. Pensão de Sobrevivência. União de facto.
Objecto — Recusa de concessão de pensão de sobrevivência, com base em união de facto terminada, pelo falecimento de um dos seus membros, funcionário, antes da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 191-B/79, de 25 de Junho.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação legislativa.
Síntese:
1 — Dirigiu-se ao Provedor de Justiça, pedindo a sua intervenção, uma mulher que vivera em comunhão de mesa e habitação com um funcionário público e que, tendo invocado o Decreto-Lei n.° 191-B/79, de 25 de Junho, para obter pensão de sobrevivência, vira indeferido o seu pedido, pelo facto de a morte daquele ter ocorrido antes de 1 de Julho, data da entrada em vigor deste diploma, que passou a contemplar tal tipo de situações.
2 — Não obstante a recusa dos serviços da Caixa Nacional de Previdência resultar de uma interpretação correcta da lei, considerou-se que, tanto o espírito do Estatuto das Pensões de Sobrevivência, como o do noSso ordenamento jurídico em geral, apontarão para uma certa protecção jurídica das «uniões de facto» que, pela sua estabilidade, correspondam a casamentos não legalizados. No caso concreto, a interessada vivera cerca de 22 anos em tal situação.
3 — Nesta perspectiva, os artigos 2019.° e 2020.° do Código Civil, resultantes da reforma de 1977, conferem aos sobreviventes de uniões de facto direito
a alimentos a exigir da herança e, se for caso disso, a pagar pelos herdeiros legítimos, ou até legitimarios.
4 — Nesses casos, também o Estatuto das Pensões de Sobrevivência prevê a concessão da pensão respectiva.
5 — Tendo em conta que existiriam decerto situações semelhantes à da queixosa, em que e apenas a data do falecimento do funcionário, anterior a 1 de Julho de 1979, determina a exclusão de benefícios concedidos a pessoas em condições absolutamente idênticas, resolveu o Provedor recomendar ao Ministro das Finanças e do Plano que fossem tornados igualmente extensivos os benefícios do n.° 1 do artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 191-B/79, às pessoas que antes da sua entrada em vigor se encontrassem já nas situações previstas pelo artigo 2020.° do Código Civil, com vista a poderem beneficiar da aplicação da alínea a) do n.° 1 do artigo 40.° e do n.° 3 do artigo 41.° daquele diploma.
6 — Quanto ao caso concreto, foi recebida, da Caixa Geral de Aposentações, a resposta de que estava em curso o processo de apuramento de tempo de serviço prestado pelo funcionário com quem a queixosa vivera— o que fez presumir que a sua passada situação de união de facto iria ser considerada para efeitos de concessão de pensão de sobrevivência.
7 — No que concerne ao problema geral posto, veio a ser apresentado na Assembleia da República, pelo Partido Comunista Português, projecto de lei no sentido preconizado pelo Provedor.
8 — A questão mereceu, também, análise de vários departamentos governamentais, que de um modo geral se mostraram contrários à emanação de normas legais que alargassem o regime do Decreto-Lei n.° 191-B/79, acerca das uniões de facto, aos casos de funcionários falecidos antes da sua entrada em vigor.
Sobre ela tomara, de resto, o Secretário de Estado das Finanças, em 29 de Julho de 1983, a seguinte posição:
Independentemente das questões de princípio e de direito, que a Assembleia da República apreciará à luz da Constituição e em representação da Nação, importa ter presente o seguinte:
1." A necessidade de assegurar um período mínimo significativo de vigência da união de facto para se poder considerar a inscrição no sistema;
2.° A conveniência em se evitar a constante flutuação de situações, com as inerentes cargas burocráticas de cancelamento e de inscrição de novos membros;
3.° A possibilidade de acesso ao sistema de protecção geral, como alternativa preferível do ponto de vista de organização e funcionamento.
Esta informação e despacho serão comunicados a S. Ex." o Secretário de Estado para os Assuntos Parlamentares e completados a seu tempo quando recebido o parecer da Caixa Geral de Aposentações sobre os outros pontos do projecto.
9 — O Provedor encerrou o processo, por o problema genérico suscitado estar afecto aos órgãos de soberania com competência legislativa.
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II SÉRIE — NÚMERO 61
Processo n.° 83/R-199-B-1
Sumário — Segurança Social. Pensão de sobrevivência.
Objecto — Definição da data relevante para a verificação da invalidez justificativa do direito a pensão de sobrevivência.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — Ao abrigo do Decreto-Lei n.° 191-B/79, de 25 de Junho, foi pedida pensão de sobrevivência para uma inválida, filha de funcionário público falecido antes de 1 de Março de 1973. Tratava-se, pois, de situação que só poderia ser contemplada ao abrigo daquele diploma, e não já do texto originário do Estatuto das Pensões de Sobrevivência.
2 — O Montepio dos Servidores do Estado recusou-a, porém, com o fundamento de que a junta médica a que fora submetida a inválida reconhecia a sua actual incapacidade permanente e total para o trabalho, mas abstivera-se de o fazer no sentido de que essa incapacidade se reportava a 8 de Abril de 1964, data da morte do pai da interessada, «como seria necessário para ter direito à pensão que requereu». Sugeriu, enfim, que se pedisse uma junta de revisão com base em elementos clínicos justificativos.
3 — De novo foi recusada a pensão, com idêntico fundamento, após os novos exames a que a interessada se submeteu.
4 — Foi então pedida a intervenção do Provedor de Justiça, em virtude de um irmão da deficiente considerar iníqua e ilegal a posição da Caixa, face à manifesta incapacidade dela.
5 — Ouviu-se sobre o assunto o director dos serviços do contencioso do Montepio, ponderando-se desde logo que a situação deveria ser encarada à luz do diploma que criara o direito à pensão de sobrevivência, isto é, a partir de 1979.
6 — A resposta foi lacónica, referindo apenas o n.° 4 do artigo 40." do Decreto-Lei n.° 142/73 de 31 de Março (Estatuto das Pensões de Sobrevivência), de acordo com o qual «a qualidade de herdeiro hábil se define em relação à data da morte do contribuinte».
7 — Não parecendo sem mais satisfatória esta resposta, pediu-se a reapreciação da questão à administração da Caixa Geral de Aposentações, com base nas seguintes razões:
a) Atendendo a que, com base em tal argumento (o de que a invalidez da requerente deve reportar-se à data do falecimento do funcionário), cairíamos no absurdo de considerar (hoje) hábil um descendente que fosse menor e estivesse a cargo do funcionário falecido em 8 de Abril de 1964, afigura-se-nos que o caso carece de mais cuidada análise e de fundamentação convincente, extraída da interpretação dos preceitos legais indicados no nosso anterior ofício (artigos 41.° e 42.° do citado Decreto-Lei n.° 191-B/79), com especial atenção para o facto de tal diploma criar ex novo direitos não existentes à data do falecimento dos funcionários e que dele decorrem sem carácter retroactivo;
b) Isto é, na data do falecimento dos funcionários, os seus familiares não beneficiavam de qualquer pensão, a qual só a partir do novo diploma lhes é reconhecida, verificados certos requisitos.
Assim, e sob pena de retroactividade da lei, tem de considerar-se o novo direito à pensão de sobrevivência consignando a relação actual entre o beneficiário e o falecido e as condições também actuais que conferem, ou não, direito à pensão de sobrevivência, designadamente quanto à menoridade ou invalidez no caso dos descendentes e à viuvez, ou situação equiparável, quando esteja em causa a relação matrimonial, ou uma união de facto com o funcionário falecido;
c) Este entendimento parece ter, portanto, justificação e apoio legal bastante para requerer um estudo e cuidado parecer que permita manter convincentemente, ou modificar, & posição reiteradamente assumida pelos serviços do Montepio dos Servidores do Estado.
Na medida em que a relação filial é estável e a matrimonial é sujeita a vicissitudes, bem se compreenderá a diferença de requisitos exigíveis, segundo os citados artigos 41.° e 42.° do Decreto--Lei n.° 191-B/79.
Assim se solicita que V. Ex.n se digne, com urgência, determinar a elaboração de parecer jurídico e tomar sobre ele posição para a resolução correcta do caso concreto deste reclamante e de outros que, em circunstâncias idênticas, têm visto denegado o direito à pensão de sobrevivência requerida.
8 — Depois de várias insistências, e mais de 1 ano depois daquele pedido de reapreciação, um ofício assinado pelo chefe dos serviços da Caixa Nacional de Previdência informava que o assunto ainda se encontrava, para parecer, na respectiva Consultadoria Jurídica.
9 — Afigurando-se inaceitável este procedimento, o Provedor dirigiu-se ao presidente do conselho de administração da Caixa nos moldes seguintes:
São constantes as reclamações chegadas a este Serviço sobre atrasos de processamento e pagamento de pensões de aposentação ou de sobrevivência e é habitual também a demora de pareceres pedidos ao serviço de contencioso.
Julgo, no entanto, que o caso relatado no ofício deste Serviço n.° 6561, de 20 de Maio de 1983, cuja fotocópia se junta, requereria a especial atenção de V. Ex.° pela demora e pelo procedimento dos serviços dessa instituição.
Apesar de, decorrido 1 ano, sem ainda ter sido dada qualquer resposta e como se de impertinência se tratasse, a insistência de 26 de Março (ofício n.° 3681) correspondeu a remessa, com referência errada, de um duplicado de ofício anterior, de 20 de Janeiro, que obviamente já fora recebido (igualmente se juntam as respectivas fotocópias).
Solicito, pois, a pronta intervenção de V. Ex.°, não só para resolução deste assunto, como no sentido de ser dada orientação que obsíe, no futuro, a procedimento idêntico.
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E agradeço que a este Serviço seja indicado o seguimento que o problema em causa venha a ter.
10 — Depois de novas insistências, foi outra vez recebida resposta assinada pelo chefe do serviço acima citado, dizendo que a questão «já foi objecto de parecer do Gabinete Técnico-Iurídico desta direcção», que se pronunciou no sentido de que «um familiar do subscritor falecido, para ser considerado herdeiro hábil, carece de reunir os requisitos que o consideram hábil desde a data em que faleceu o servidor e até (pelo menos) ao dia do pedido da pensão», pois o n.° 4 do artigo 40.°, bem como o artigo 47.° do Estatuto das Pensões de Sobrevivência não sofreram qualquer alteração.
A Ex.™ Administração concordou com o citado parecer.
11 — Não parecendo viável qualquer outra intervenção útil, resolveu o Provedor arquivar o caso, elucidando o queixoso sobre a situação e aconselhando-o a requerer outra junta médica, desde que conseguisse obter novos elementos susceptíveis de comprovar a invalidez da irmã à data do falecimento do pai.
12 — Mas o Provedor entendeu justificar-se a especial menção deste caso no presente relatório, para apreciação, pela Assembleia da República, do procedimento que a Caixa assumiu, não só no tocante à desatenção pelos insistentes pedidos no sentido de uma tomada de posição, perante ele, por parte da administração daquela instituição, como pela recusa de discussão cuidadosa e aprofundada dos argumentos que este Serviço apresentara.
Processo n.° 82/R-470-B-I
Sumário — Segurança Social. Serviço militar. Equivalência a período com entrada de contribuições.
Objecto — Devolução da declaração comprovativa da prestação de serviço militar e do requerimento da equivalência à entrada de contribuições com o fundamento de que os mesmos devem apenas ser apresentados aquando do requerimento da pensão de invalidez, velhice ou sobrevivência.
Decisão—Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um beneficiário da, ao tempo, Caixa de Previdência e Abono de Família da Indústria do Distrito de Lisboa, reclamou para o Provedor de Justiça de lhe ter sido devolvida a declaração da prestação de serviço militar que oportunamente apresentara para efeito de lhe ser reconhecida a equivalência a período com entrada de contribuições. A referida devolução fora baseada na circunstância de tal declaração ser apenas necessária para efeito de determinação do quantitativo dás pensões, pelo que a mesma só deveria ser entregue aquando do requerimento da pensão de invalidez, velhice ou sobrevivência.
2 — Face a esta reclamação e ao teor do artigo 4.°, n.° 1, do Decreto Regulamentar n.° 17/81, de 28 de Abril, que prevê que a equivalência em causa seja so-
licitada pelo interessado até à data em que for requerida a pensão —o que legitimava o requerimento do reclamante que, porém, lhe fora devolvido—, :nqui-riu-se a citada Caixa sobre o motivo que levara ao não reconhecimento ao requerente da pretendida equivalência à entrada de contribuições.
3 — Em resposta foi recebido do então Departamento de Regimes de Segurança Social — Indústria — do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa a seguinte comunicação:
O aludido beneficiário foi transferido da Caixa de Previdência e Abono de Família da Indústria do Distrito de Lisboa (hoje Departamento de Regimes de Segurança Social — Indústria, do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa), com o último desconto em Junho de 197!, para a Caixa de Previdência da CUF e Empresas Associadas e, posteriormente para a Caixa de Previdência e Abono de Família do Comércio do Distrito de Lisboa (hoje Departamento de Regimes de Segurança Social — Comércio, do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa) com o primeiro desconto em Outubro de 1981.
Estas transferências seriam justificativas para que não fossem estes serviços a receber a declaração a que o beneficiário se refere.
No entanto, entendeu-se dever esclarecer o interessado de que a referida declaração só produziria efeitos no cálculo de pensões de reforma, invalidez e sobrevivência pelo que a deveria fazer acompanhar do respectivo requerimento, se então nãc tivesse ainda atingido 35 anos (hoje 36 anos) de contribuições para a Segurança Social. São estes serviços de Opinião que a expressão «até à data em que for requerida a pensão», se deve entender «até à data», em tempo útil.
Não parece curial que um organismo haja que estabelecer um controle de documentos (que poderão ou não vir a ter utilidade) por um período de tempo que varia entre vários meses e dezenas de anos, ou seja, entre o vencimento do período de garantia para os benefícios diferidos e o tempo limite para o máximo da pensão.
Aliás, ao inscrever-se no regime de Segurança Social, o beneficiário adquire, potencialmente, o direito à prestação de invalidez ou reforma. Todavia, só requer este benefício quando se julga profissionalmente incapacitado ou atingir a idade de reforma.
Ora, o que se pede ao beneficiário é que, nessa altura, junte ao requerimento da pensão a declaração militar, se for útil a sua junção.
Alegava ainda aquele Departamento o seguinte:
Acresce que com a computadorização da conla--corrente dos beneficiários e a criação da base de dados como meio de identificação dos mesmos, torna-se impraticável a anotação de documentos com as características da declaração que se vem tratando.
4 — Tendo esta posição sido transmitida ao reclamante, veio este chamar a atenção para a existência de casos de pensão de sobrevivência requerida relativamente a funcionários que faleceram no activo, sem que lhes tivesse sido reconhecida a dita equivalência.
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E sublinhou o risco de esta equivalência não vir, nessas hipóteses, a ser levada em conta no cálculo de pensão, por poder tratar-se de aspecto desconhecido pelo titular da pensão de sobrevivência.
5 — Neste contexto, o Provedor de Justiça solicitou a reapreciação da questão ao director do Departamento dos Regimes de Segurança Social — Indústria, do Centro Regional de Segurança Social de Lisboa, nos termos seguintes:
Tendo em conta, pelo que respeita ao processamento de pensão de sobrevivência relativamente a beneficiários falecidos no activo, que casos pode haver em que os respectivos herdeiros hábeis desconheçam que o trabalhador, em atenção ao qual ■ a pensão é concedida, tinha direito a invocar o tempo dè serviço militar, considefa-se que o critério adoptado por esse Departamento de não permitir o registo oportuno desse facto poder vir a traduzir-se num prejuízo para os titulares da pensão de sobrevivência no que concerne ao montante desta.
Nestas condições, solicito a V. Ex.B a revisão do assunto, em termos de tal prejuízo vir a ser evitado.
6 — A entidade visada aceitou este ponto de vista, e, tendo revisto a sua posição, remeteu aos serviços uma circular do seguinte teor:
Para os devidos efeitos, informamos que, tendo em vista?a inclusão no Banco de Dados de Segurança Social da informação que possibilite a garantia dos benefícios decorrentes do Decreto Regulamentar n.° 17/81, de 28 de Abril, deverá esse Centro Regional comunicar a este Centro os respectivos períodos de equivalência, através de registos de período contributivo (códigos 23 e 231), com o preenchimento do campo 52/52 (C2-Caixa de entrada) com 124 (número da CNP), que serve de código.
E, quanto ao caso concreto, sugeriu que o interessado que suscitara a questão enviasse o documento comprovativo do tempo de serviço militar à última instituição de Segurança Social para que descontara, com vista a que o mesmo fosse tratado ao abrigo da circular transcrita.
Processo n.° 81/R-1457-B-1
Sumário — Segurança Social. Subsídio de desemprego.
Objecto — Exigência de reposição de subsídio de desemprego por cessação da presunção de involunta-riedade de desemprego.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — Uma trabalhadora queixou-se ao Provedor de Justiça pelo facto de o Centro de Emprego da Amadora, após lhe ter concedido o subsídio de desemprego, lhe haver exigido a devolução dos quantitativos recebidos a este título.
O subsídio fora-lhe concedido com base na presunção de involuntariedade de desemprego prevista no n.° 6 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 183/77, de 8 de Maio, por estar pendente pedido de conciliação apresentado pela interessada.
A decisão de o fazer cessar assentara no facto de que, tendo-se gorado a conciliação, a trabalhadora não interpusera, no prazo de 30 dias que o Centro lhe indicara, a acção judicial definitiva contra o despedimento de que fora alvo.
2 — Não parecendo acertada esta decisão, o Provedor dirigiu ao Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional recomendação para revisão da mesma, com base, essencialmente, nas seguintes razões:
a) O n.° 6 do artigo 5." do Decreto-Lei n.° 183/ 77 estabelece uma presunção de involuntariedade do desemprego. Como qualquer presunção, destina-se a dispensar a prova da situação por parte de quem dela beneficia;
b) Por outro lado, tal disposição legal não pode ser interpretada como definidora dos requisitos necessários para a qualificação de desemprego involuntário, já que a involuntariedade do desemprego se poderá provar quando se não beneficie da presunção, pelos meios
, normais de prova, com a particularidade de a declaração da entidade patronal não constituir prova bastante daquela involuntariedade (n.° 5 do artigo 6.°);
c) Significa isto que do facto de não estar pendente conciliação ou acção judicial não decorre, inevitavelmente, a voluntariedade do desemprego, mas tão-somente que o requerente do subsídio tem de provar que o desemprego foi involuntário; a atitude dos serviços de emprego transforma a norma do n.° 6 do artigo 5.°, de benefício para os desempregados, em injustificada restrição;
d) Quando o subsídio de desemprego foi retirado e foram ordenadas as reposições dos subsídios já recebidos, ainda estava a correr o prazo legal para a reclamante intentar acção judicial onde poderia provar a involuntariedade do seu desemprego;
e) No que diz respeito à imposição das referidas reposições, os serviços de emprego violaram o disposto no n.° 2 do artigo 29.° do citado Decreto-Lei n.° 183/77, já que tal imposição foi feita à interessada antes de ter sido proferida decisão final na acção judicial respectiva.
3 — A esta recomendação respondeu o presidente do conselho directivo do Instituto do Emprego e Formação Profissional, argumentando, nomeadamente, que:
a) A interpretação feita neste caso pelos serviços de emprego era a mesma que vinha a ser utilizada há cerca de 10 anos;
b) Ela teria sido consagrada pela nova redacção dada ao n.° 9 do artigo 5.° do Decreto-Lei n.0 185/77 pelo Decreto-Lei n.° 297/83, de 24 de Junho, segundo o qual «cessa a pre-
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sunção [...] se o trabalhador não prossegue a acção judicial no prazo de 60 dias [•••]»; c) A interessada tinha podido recorrer da de* cisão contestada.
4 — Não pareceu admissível que à recomendação do Provedor ao Secretário de Estado não fosse este a responder.
E tão-pouco pareceram convincentes as novas razões aduzidas, não só porque o Decreto-Lei n.° 297/83 foi posterior aos factos em discussão, como, sobretudo, pela razão de que continua a subsistir o problema da relevância própria da presunção aqui em causa.
Por isso, o Provedor reiterou de novo a sua posição face ao Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional.
5 — O Secretário de Estado não aceitou a recomendação, voltando a dizer que se tratava de interpretação consagrada pelos serviços há 10 anos.
E chegou mesmo a afirmar que esta interpretação «escapa à indagação» do Provedor, e que a insistência deste perante o Secretário de Estado, «alheando a questão formal de ser o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional a responder só pelo facto de o Serviço Provedor de Justiça a ele se dirigir, seria de entender «como lapso».
6 — Visto esta recusa, o Provedor não teve remédio senão arquivar o processo.
Mas não pôde deixar de expor a situação à Assembleia da República, não só pelo facto de continuar convencido de a sua interpretação ser a materialmente correcta, como, também, pela falta de cabimento da posição da Secretaria de Estado quanto à natureza e poderes da instituição do Provedor de Justiça.
Processo n.° 84/R-482-B-1
Sumário — Segurança Social. Subsídio de desemprego.
Objecto — Cessação de subsídio de desemprego com base em desistência da acção por parte do trabalhador despedido, contratado a prazo.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A reclamante fora contratada a prazo em 1 de Março de 1980 por período de 6 meses, renováveis.
Em 30 de Novembro de 1982, a entidade patronal despediu-a, sem processo disciplinar nem invocação de justa causa.
Por este facto, a interessada intentou acção nos tribunais de trabalho, com vista a serem-lhe pagos os salários até ao termo do período de renovação do contrato a prazo então em vigor.
Havendo a entidade patronal pago a quantia pedida, ainda na pendência desta acção, a autora desistiu da mesma, pois fora alcançado o seu objecto.
Ora ela estava a receber subsídio de desemprego desde a propositura da dita acção, com fundamento no artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 183/77, de 5 de Maio, que dispõe que se presume involuntário o despedi-
mento quando a apreciação do motivo deste estiver comprovadamente pendente de acção judicial.
Tendo ela desistido da acção, o Centro de Emprego de Lisboa decidiu a extinção do subsídio de desemprego a partir dessa data, com base no entendimento de que tal desistência afastava a presunção de involun-tariedade do desemprego.
Apesar de ter reclamado desta decisão, a interessada não conseguira demover a Administração da posição que assumira.
E foi desta situação que veio queixar-se ao Provedor.
2 — Estudada a questão, afigurou-se que o Centro de Emprego não interpretara correctamente o regime jurídico aplicável.
Na verdade, tratando-se de um contrato a prazo não renovado, a acção proposta não tivera por objecto a reintegração, que nunca seria possível para além do termo do período de renovação contratual em curso, mas sim, e apenas, o pagamento dos salários a vencer até esta data.
Sendo assim, era lógico que, havendo a entidade patronal pago espontaneamente tal quantia ainda no decurso da acção, a trabalhadora despedida tivesse desistido desta, por a sua única finalidade ter sido alcançada.
Só que esta desistência não poderia, para os efeitos do artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 197/77, ser interpretada como implicando a voluntariedade do desemprego— até porque a acção não tinha por objectivo a reintegração da trabalhadora.
Expôs-se, pois, esta posição ao Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, solicitando--se-lhe a reapreciação do caso.
3 — E assim veio, de facto, a suceder.
Em 1 de Outubro de 1984, o Secretário de Estado, concordando com o parecer jurídico dos serviços, cujas conclusões coincidiam com a tese sustentada pelo Provedor, mandou que fosse retomado o subsídio de desemprego que estava sendo pago à queixosa.
Apenas entendeu —e correctamente— que esse subsídio não deveria ser atribuído em relação ao período correspondente aos salários que, na pendência da acção, a entidade patronal acabara por pagar à reclamante.
Seguros
Processo n.° 83/R-1447-B-1
Sumário — Seguros. Responsabilidade civil por acidente de viação.
Objecto — Imobilização do veículo sinistrado.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um cidadão apresentou reclamação contra a Aliança Seguradora, E. P„ com fundamento em que esta companhia não lhe facultara um veículo durante o período de imobilização do seu automóvel, nem pagara todo o período de aluguer de um automóvel a que, por sua iniciativa, se vira obrigado a recorrer.
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Isto, não obstante ela reconhecer que toda a culpa no acidente era do seu segurado.
Mais concretamente, aquela empresa pública prontificava-se a pagar o aluguer durante 4 dias — tempo que considerou «tecnicamente necessário à reparação do veículo» —, quando a imobilização durara 22 dias e se comprovava não ter havido negligência do reclamante em tal demora.
2 — Interpelada a seguradora sobre o caso, acabou a mesma por definir a sua posição alegando fundamentalmente que:
Apesar de o acidente ter ocorrido em 7 de Abril de 1983, a participação respectiva só fora re-becida na companhia em 13 desse mês;
Tendo o reclamante informado que o seu automóvel daria entrada na oficina, para reparação, no dia 12, nessa mesma data fora marcada a peritagem, que apenas viria a poder realizar-se, porém, em í8 de Abril;
A peritagem tivera de assumir natureza condicional, pois, quando foi marcada, ainda não tinha sido recebida a participação;
Elaborado o orçamento em 18 de Abril, bem podia o interessado ler logo mandado reparar o carro, reparação que não teria durado mais de 4 dias;
O lesado poderia, concomitantemente, ter procurado esclarecer, pessoal ou telefonicamente, as razões da atribuição de natureza condicional à peritagem — em vez de haver, como o fez, escolhido a via mais morosa, da exposição da questão por escrito;
A esta demora se deveria o facto de só em 21 de Abril a companhia de seguros ter comunicado à oficina que a reparação seria de sua custa.
Em conclusão, a entidade visada declarara estar pronta «a indemnizar o lesado pelas despesas resultantes da imobilização durante os 4 dias da reparação, só não aceitando responder pelo agravamento das despesas de aluguer por factos apenas imputáveis ao próprio lesado».
3 — Não tendo por convincentes estes argumentos, o Provedor formulou à companhia de seguros a seguinte recomendação:
Considerando:
l.° Que a culpa no acidente em causa é exclusivamente do segurado dessa companhia;
2.° Que, tendo o acidente ocorrido em 7 de Abril de 1983, essa seguradora só transmitiu à oficina ordem de reparação em
21 desse mês, encontrando-se o veículo na mesma oficina a aguardar tal ordem;
3.° Que, assim, entre a data do acidente e 29 de Abril de 1983, dia em que o veículo se encontrava reparado, decorreram
22 dias;
4.° Que a demora na participação do acidente é questão que só às relações entre o segurado e essa companhia podem interessar e a que, por isso, o lesado é totalmente alheio;
5.° Que o preceituado no artigo 562.° do Código Civil faz impender sobre as seguradoras o dever de reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação; afigura-se não ser excessivo o período de indemnização de 19 a 29 de Abril de 1983, durante o qual o reclamante recorreu a um veículo de aluguer, e infundado afirmar que houve «agravamento das despesas de aluguer por factos apenas imputados ao próprio lesado».
Por tudo o exposto, recomendo:
Que ao reclamante sejam pagas, por essa companhia, as despesas documentadas, nomeadamente as suportadas com o aluguer de um veículo durante o período de 19 a 29 de Abril de 1983.
4 — Conquanto tal recomendação não tenha merecido resposta, o reclamante informou que a mesma fora acatada.
Processo n.° 81/R-2448-A-2
Sumário — Seguros. Seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel.
Objecto — Denúncia do contrato pela seguradora.
Decisão i— Reclamação procedente. Prescrição de pro-decimento contravencional.
Síntese:
1—Em 30 de Novembro de 1981, um cidadão reclamou contra a Sociedade Portuguesa de Seguros, por a mesma ter alegadamente denunciado um contrato de responsabilidade civil automóvel com ele outorgado em 27 de Dezembro de 1966, com fundamento na participação de dois acidentes, um em 1980 e o outro em 1981.
Foi junta ao processo uma carta datada de 24 de Novembro de 1981, em que a seguradora afirmava:
Ê de nossa preferência não renovar o contrato em epígrafe para a anuidade a iniciar em 27 de Dezembro de 1981.
2 — Apesar de a seguradora não se encontrar nacionalizada — escapando, por isso, ao poder de controle directo do Provedor de Justiça—, não se deixou de procurar ouvi-la sobre o caso, o que se fez ao abrigo do artigo 28.° da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro.
Isto, com vista a apurar se se justificaria suscitar intervenção tutelar do Instituto de Seguros de Portugal.
3 — Não se tendo obtido resposta, decidiu-se então solicitar ao Instituto de Seguros de Portugal indicação da sua posição sobre a reclamação e «informação sobre as diligências que, eventualmente, desencadeie, considerando o preceituado nos n.üs 1 e 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 408/79, de 25 de Setembro».
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4— Entretanto, e após o contacto inicial deste Serviço com o Instituto, a seguradora veio sustentar que:
Pela carta que dirigimos ao nosso segurado, é manifesta a prova de que a mesma não rescinde
0 contrato;
Expressamos, apenas e só, o nosso interesse em não renovar o contrato, pedindo que o segurado ao registar o facto nos comunicasse se desejava ou não mantê-lo;
Nunca o segurado o fez, quer por escrito, quer de viva voz.
5 — Em 14 de Março de 1983, foi recebida a resposta do Instituto, comunicando a instauração de um inquérito e o levantamento à Sociedade Portuguesa de Seguros de um auto de transgressão por violação do artigo 9.° do Decreto-Lei n." 408/79, de 25 de Setembro.
Logo em 20 de Abril seguinte o Instituto informou, porém, que o auto de transgressão fora mandado arquivar, por prescrição do procedimento criminal.
6 — E, em 25 de Maio desse ano, já a seguradora comunicava ao reclamante «encontrar-se o assunto encerrado» dado que «o contrato não foi renovado na anuidade que se iniciaria em 27 de Dezembro de 1981, nos termos da nossa carta de 24 de Novembro de 1981».
7 — Verificando-se, assim, que a companhia «persistia em negar-se a aceitar o contrato de seguro», de novo o Provedor de Justiça ouviu, sobre esse aspecto, o Instituto de Seguros de Portugal.
8 — Tendo-se este limitado a transmitir a informação da seguradora, agora no sentido de que celebraria novo contrato «na data e a partir do dia em que o referido candidato (o reclamante) se apresentar a um representante desta empresa», dirigiu o Provedor de Justiça ao Instituto o seguinte ofício:
Ainda com referência ao assunto dos ofícios em epígrafe, e afigurando-se que a Sociedade Portuguesa de Seguros assumiu, no caso, uma conduta defraudatória dos poderes de fiscalização e sancionatórios que a esse Instituto competem — e dos direitos dos seguradores subjacentes a tais poderes—, crê-se dever tal conduta ser objecto de uma mais cuidada ponderação.
Nomeadamente, tem-se por duvidoso que haja decorrido o prazo prescricional de 1 ano, referido no § 2.° do artigo 125.° do Código Penal, pelas seguintes razões:
1 — Parece evidente que só poderá ter-se por transgredido o preceituado no n.° 1 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 408/79, de 25 de Setembro, quando a seguradora expresse com suficiente clareza a sua decisão de não renovar o contrato (fora dos casos previstos na lei), pois que só nesse momento se pode considerar materializada a transgressão.
2 — Ora, no caso, crê-se que a não renovação não pode ter ocorrido com a carta que a seguradora dirigiu ao reclamante em 24 de Novembro de 1981 (ou na sequência da mesma), já que é a própria Sociedade Portuguesa de Seguros, na carta que em 29 de Dezembro de 1981 me envia,
a atribuir-lhe, tão-só, o alcance de proposta de não renovação. Ora, nunca o segurado deu o seu acordo, como, aliás, o reconhece a própria seguradora, na parte final desta última carta. £ dizer que o contrato se renovou, efectivamente, em 27 de Dezembro de 1981 (artigo 218.° do Código Civil).
3 — A não aceitação desta consequência jurídica — determinante, além de responsabilidade civil, da violação do mencionado artigo 9.°, n.° I, do Decreto-Lei n." 408/79 — só a Sociedade Portuguesa de Seguros a veio expressar (depois, aliás, de conhecido o arquivamento do processo que pendera nesse Instituto) na carta que endereça ao reclamante em 25 de Maio de 1983, onde escreve que o contrato «não foi renovado na anuidade que se iniciaria em 27 de Dezembro de 1981, nos termos da nossa carta de 24 de Novembro de 1981».
4 — O que vimos de concluir não é prejudicado pelo não pagamento medio tempore, dos respectivos prémios, dado o incumprimento não ser imputável ao reclamante— que sempre terá oferecido a prestação—, mas exclusivamente à seguradora, que, aliás, não comprova ter dado cumprimento à formalidade prevista, para a mora do devedor, no artigo 13.°, n.° 4, do Decreto-Lei n.° 408/79. Diferente versão nunca foi provada, nem sequer alegada, pela Sociedade Portuguesa de Seguros.
De tudo o exposto afigura-se de concluir que a transgressão em causa só se terá consumado com a referida carta de 25 de Maio de 1983, a partir da qual terá começado a correr aquele prazo prescricional, assim ainda em curso.
Em conformidade, e antes de tomar, na sequência desta posição que tenho por correcta — especialmente da perspectiva de uma entidade fiscalizadora —, as medidas que a lei me faculta, solicito que sobre ela se pronuncie, com a urgência possível, esse Instituto, informando-nte, nomeadamente, se, pela reabertura do processo ou levantando novo auto considere viável dar sequencia ao respectivo processo de transgressão.
9 — O Instituto retorquiu nos moldes que se transcrevem:
1 — Em relação à questão contida no ofício de V. Ex.a, acima referenciado, cumpre-nos esclarecer que é também entendimento deste Instituto que «só poderá ter-se por transgredido o preceituado no n.° 1 do artigo 9.° do Decreto-Le: n.° 408/79, de 25 de Setembro, quando a seguradora expresse com suficiente clareza a sua decisão de não renovar o contrato (fora dos casos previstos na lei), pois que só nesse momento se pode considerar materializada a transgressão».
2 — Sucede que, no caso em apreço, este instituto entendeu que a Sociedade Portuguesa de Seguros transgrediu o artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 408/79, de 25 de Setembro, exactamente na data em que o contrato se deveria ter renovado, isto é, em 27 de Dezembro de 1981, momento em que, segundo se julga, a seguradora foi suficientemente clara na sua decisão de não renovar o contrato, pelo que nesse momento se pode consi-
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derar materializada a transgressão. A tal conclusão se chegou pelas seguintes ordens de razões:
a) Em 27 de Dezembro de 1981 a seguradora transgride, por omissão, o preceituado na lei por não ter, como devia, emitido e posto à cobrança o recibo do pré mio correspondente à anuidade que nessa data se iniciava, bem como por não ter emitido também o respectivo cartão de responsabilidade civil, indícios claros de não renovação do contrato;
b) Na inspecção a que, após a comunicação de V. Ex.a de 2 de Dezembro de 1982, se procedeu junto da Sociedade Portuguesa de Seguros, foram recolhidos dados que inequivocamente comprovam a anulação, pela seguradora, do contrato era causa e que nos permitimos juntar em anexo (anexos i e u).
3 — Nestes termos, face ao que se refere nas alíneas do número anterior, parece inequívoco a este Instituto que em 27 de Dezembro de 1981 a Sociedade Portuguesa de Seguros transgrediu o n.° 1 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 408/79, de 25 de Setembro, pois nesse momento estava perfeitamente materializada a transgressão em causa.
Obviamente que foi aquela a data que foi tida em consideração para efeitos de contagem do prazo prescricional de 1 ano e não a de 24 de Novembro de 1981, como parece inferir-se do n.° 2 do ofício de V. Ex.a Assim, quando, recebido o ofício de V. Ex.° n.° 15 186, de 2 de Dezembro de 1982, e após a indispensável inspecção preliminar, os serviços competentes deste Ins tituto deduziram a acusação contra a seguradora já o aludido prazo de prescrição havia decorrido, pelo que foi o respectivo processo mandado arquivar e do facto dado conhecimento a V. Ex.° e à própria seguradora, permitindo-nos também juntar fotocópia da carta que então lhe foi enviada (anexo ni).
4 — Em face do exposto, não vê este Instituto como viável a reabertura do processo ou o levantamento de novo auto, a menos que, evidentemente, surjam factos novos que possam ser levados em consideração.
5 — Para finalizar, e independentemente da análise da questão, sob o ponto de vista cível, contida no douto parecer do Serviço que V. Ex.a superiormente dirige, permitimo-nos salientar que as considerações por nós aduzidas se circunscrevem à actuação no âmbito do processo de transgressão, sendo, obviamente, da competência dos tribunais eventual pedido cível que o segurado julgue de seu direito intentar contra a seguradora.
10 — Não pareceu viável qualquer outra intervenção útil neste caso, pelo que o mesmo foi dado por encerrado.
Mas o Provedor não deixou de fazer este reparo ao Instituto de Seguros de Portugal:
Com referência ao assunto dos ofícios em epígrafe, informo que determinei o arquivamento do respectivo processo.
Não deixarei, porém, de sublinhar que entendo que uma entidade com poderes de fiscalização não deve, nos casos que considere duvidosos, deixar de formular a acusação ou de dar seguimento ao processo: para relevar os aspectos que porventura aproveitam ao arguido há a defesa, e para ponderar as posições que se contraponham existe o juiz, a quem cumpre a decisão final.
Ora, a tese defendida no ofício de V. Ex.a, em referência, integra a questão em apreço, quando muito, naqueles casos duvidosos, pois que, além do mais (ou corroborando) que escrevi no meu último ofício, conduz às seguintes consequências, dificilmente compatíveis com uma função fiscalizadora:
a) Dá cobertura a manobras dilatórias que a seguradora use — como usou no caso — nas relações com o seu segurado, quanto à renovação do contrato: mesmo que no âmbito interno tenha já decidido no sentido negativo, o decurso do tempo conseguido com aquela indefinição joga a seu favor;
b) Dificulta, ou pode dificultar, que o segurado — que, obviamente, não tem acesso à documentação interna da seguradora — desencadeie atempadamente, no seu interesse e no interesse geral subjacente à norma incriminadora, a acção repressiva dos órgãos aos quais a lei comete, para tutela daqueles interesses, esse poder--dever.
11 — O Instituto veio ainda, ao processo, afirmar que achava não dever ter sido objecto do aludido reparo, alegando, nomeadamente, que:
A posição que tomara alicerçara-se numa convicção (e não em dúvidas) acerca da prescrição do procedimento;
O facto de ter salientado à seguradora que só por causa da prescrição não procederia contra ela revelaria que não teria deixado de reagir à atitude dilatória desta;
Enfim, não seria responsável pelo facto de só ter tido conhecimento do caso depois de já decorrido o prazo prescricional.
Serviço militar
Processo n.° 83/R-291-B-1
Sumário. — Serviço militar. Incorporação.
Objecto. — Incorporação no serviço militar, em resultado de renovação da passagem à reserva territorial, mais de 1 ano após a prática deste acto.
Decisão. — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — 2 jovens apresentaram queixa ao Provedor de Justiça, porque, tendo transitado ambos para a reserva territorial, em 1 de Janeiro de 1981, haviam acabado
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por vir a ser, em 8 de Outubro de 1982, incorporados no serviço militar activo, em execução de despacho do general Ajudante-General do Exército, de 12 de Maio anterior.
2 — Ouvido o Estado-Maior do Exército, apurou-se que a decisão contestada tivera por base a ocorrência de erro de facto na passagem destes e de outros jovens à reserva territorial.
Esse erro derivara, aliás, da ilícita deturpação, por parte de um funcionario, dos dados, destinados a tratamento computorizado, relativos a assinalável número de jovens em idade militar.
3 — Analisada a situação, o Provedor considerou ilegal a decisão do Estado-Maior do Exército.
Na verdade, a passagem à reserva territorial consubstancia um autêntico acto constitutivo de um direito — o de não ter de prestar serviço militar, salvo nas hipóteses excepcionais era que se pode recorrer aos elementos em tal situação.
Ora os actos constitutivos de direitos ilegais (como estes) não podem ser revogados no prazo fixado pela lei para a interposição de recurso contencioso ou até a interposição dele, prazo esse que é de 1 ano, nos termos do disposto no artigo 18.°, n.° 2, da Lei Orgânica do Supremo Tribunal Administrativo e nos artigos 51.°, n.° 4, e 52.°, ambos do Regulamento do mesmo Tribunal.
4 — Assim, tendo os actos de transição para a reserva territorial ocorrido em 1 de Janeiro de 1981, a revogação dos mesmos poderia operar-se apenas até 31 de Janeiro do ano seguinte.
Daí que a revogação decidida com base no despacho de 12 de Maio de 1982 haja tido lugar, manifestamente, fora do prazo legal de 1 ano, razão que levou o Provedor de Justiça a recomendar a revisão das situações militares dos queixosos.
E fê-lo, de resto, não apenas por essa razão, por assim dizer formal.
Ê que a incorporação dos interessados causara-lhes relevantes prejuízos, já que, convencidos de que não teriam de prestar serviço militar, haviam obtido empregos que, agora, se viam na iminência de perder.
5 — A recomendação do Provedor veio a ter a concordância do Estado-Maior do Exército, que fez os queixosos regressar à anterior situação de reservistas.
Trabalho — Administração local
Processo n.° 80/R-181-B-4
Sumário. — Trabalho. Administração local. Quadros.
Objecto. — Falta de integração de trabalhador eventual no quadro de pessoal de uma assembleia distrital embora tivesse sido declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, a regra (constante de um despacho normativo), que obstara anteriormente à atempada integração dele.
Decisão. — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — O exponente, desenhador eventual de 2." classe dos Serviços Técnicos de Fomento da Assembleia Distrital de Lisboa, não havia sido oportunamente inte-
grado no novo quadro de pessoal deste órgão autárquico, aprovado nos termos do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, e da Portaria n.° 787/77, de 24 de Dezembro, dada a restrição constante da parte final do n.° 1 do Despacho Normativo n.° 135-A/77, de 30 de Maio, dos Secretários de Estado da Administração Pública e da Administração Regional e Local.
Entretanto, a parte final do n.° 1 do invocado despacho normativo fora (por solicitação do Provedor de Justiça) declarada inconstitucional, com força obrigatória geral, pela Resolução do Conselho da Revolução n.° 161/79, de 28 de Maio.
Por isso, o interessado entendia assistir-lhe o direito de vir a ser integrado no quadro de pessoal da Assembleia Distrital de Lisboa, na categoria de topógrafo (função que sempre desempenhara), nos termos do n.° 4 do mesmo despacho normativo, independentemente do facto de já se acharem esgotados, na altura, os prazos que haviam sido definidos no artigo 2.° do referido Decreto-Lei n.° 76/77 e no n.° 3 da citada Portaria n.° 787/77.
Todavia, a sua pretensão ainda não fora atendida pela Assembleia Distrital de Lisboa, que resolvera consultar o Gabinete de Apoio às Autarquias Locais a propósito do assunto.
2 — Embora a solução não fosse prática, este Serviço aceitou o entendimento de que a declaração pelo Conselho da Revolução, com força obrigatória geral, da inconstitucionalidade da parte final do n.° 1 do Despacho Normativo n.° 135-A/77 teve efeitos retroactivos (v., a propósito, a Constituição da República Portuguesa, anotada, por J. J. Canotilho e Vital Moreira, pp. 487 e 503).
E admitiu-se, igualmente, o pensamento de que, na hipótese em apreço, a eficácia retroactiva da mencionada declaração de inconstitucionalidade não depararia com qualquer obstáculo decorrente da existência de caso julgado que houvesse de ser respeitado por força do estatuído na parte final do artigo 281.°, n.° 2, da Constituição, na redacção então em vigor.
Porém, ainda que dada por assente a ilegalidade ex trunc da parte final do n.° 1 do referido despacho normativo, bem como a consequente ilegalidade, em idênticos termos, da falta de oportuna integração do reclamante no novo quadro de pessoal cuja adaptação fora promovida pela Autarquia Distrital de Lisboa ao abrigo do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, e da Portaria n.° 787/77, de 24 de Dezembro, nem por isso ficaria imediatamente solucionado o problema do impetrante, uma vez que as premissas mencionadas não pareceriam susceptíveis de operar, por forma automática, a integração do interessado.
Bem ao contrário, afigurou-se que a referida integração pressuporia necessariamente uma resolução expressa da administração autárquica que a determinasse, corrigindo desse modo a situação decorrente da ilegal exclusão do reclamante do quadro de pesosal adaptado pela Assembleia Distrital de Lisboa, nos termos dos diplomas legais antecedentemente invocados.
3 — Considerando, entretanto, que a pretensão exposta pelo reclamante já dera origem a uma consulta formulada pela Assembleia Distrital de Lisboa ao Gabinete de Apoio às Autarquias Locais, entendeu-se conveniente averiguar, antes de mais, qual a posição que fora assumida pelo dito Gabinete acerca da mesma consulta.
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Na sequência de várias diligências para o efeito realizadas junto da Direcção-Geral da Acção Regional e Local, veio a obter-se informação de que, perante a posição deste Serviço e a do Gabinete de Apoio às Autarquias Locais, o reclamante viera a ser de facto integrado na carreira de topógrafo no quadro de pessoal da Assembleia Distrital de Lisboa.
Processo n.° 83/R-112S-B-4
Sumário. — Trabalho. -Administração local. Faltas.
Objecto. — Injustificação de faltas dadas por funcionária de autarquia distrital, apesar de cobertas por atestado médico.
Decisão. — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Por se encontrar na situação de doente, uma funcionária de estabelecimento de Segurança Social dependente da Assembleia Distrital de Aveiro fora submetida a junta médica, que confirmara a doença, sem, todavia, considerar esta incompatível com o exercício das funções.
2 — Face ao parecer da junta médica, a funcionária foi notificada para se apresentar ao serviço, o que fez no dia imediato.
3 — Porém, passado um dia, voltou a faltar ao serviço, tendo apresentado um atestado médico que comprovava a situação de doença do foro neurológico e impossibilidade de cumprir os seus deveres profissionais.
4 — O presidente da Assembleia Distrital, sob proposta do chefe da secretaria, considerou, porém, as faltas dadas como injustificadas, com o fundamento de que o atestado médico não podia ilidir o parecer formulado pela junta médica. Teve, além disso, em conta o facto de a funcionária ter vindo a registar, nos últimos anos, elevado nível de absentismo, sempre com base na situação de doença.
5 — Analisada a reclamação, considerou-se a mesma procedente, face à lei, porquanto o parecer da junta médica só relevava para a situação clínica anterior à observação feita e não poderia ter virtualidade suficiente para infirmar o valor do atestado médico, que se reportava a uma situação posterior.
6 — Na verdade, o que os serviços da Assembleia Distrital poderiam (e, porventura, deveriam) ter feito era mandar verificar a doença logo após a apresentação do atestado médico, faculdade que a lei expressamente consagra (artigo 510.°, § 3.°, do Código Adnünistra-tivo).
Não o tendo feito, nem havendo sido suscitado o incidente da falsidade do atestado, não podia considerar-se legal o despacho que considerou as faltas como injustificadas.
7 — O Provedor formulou, assim, recomendação com vista à revogação da decisão de injustificação das faltas em causa.
8 — O presidente da Assembleia Distrital concordou com a recomendação, tendo considerado justificadas as faltas abrangidas pelo atestado.
Processo n.° 80/R-1B81-B-4
Sumário — Trabalho. Administração local. Remunerações.
Objecto — Não aplicação, por câmara municipal, do regime legal relativo a abonos por doença.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um trabalhador do Município de Santo Tirso protestou, em 10 de Setembro de 1980, contra o facto de, encontrando-se impossibilitado de comparecer ao trabalho por motivo de doença devidamente comprovada, lhe ter sido apenas pago o salário correspondente ao primeiro mês de ausência (a qual ocorria desde há 6 meses).
2 — Ouvida sobre o assunto, a Câmara Municipal informou que o trabalhador tinha sido admitido ao seu serviço «como tarefeiro, a 10 de Janeiro de 1977, situação em que se manteve até 8 de Abril de 1980, data em que, precedendo deliberação municipal foi assalariado a título eventual».
3 — Pedido esclarecimento sobre se o reclamante continuara, após a referida deliberação, a prestar serviço com o mesmo conteúdo funcional do realizado no período anterior, foi respondido afirmativamente.
4 — Estudada a situação, entendeu-se que, desde Janeiro de 1977, mais que com base num contrato de prestação de serviços (artigo 1154.° do Código Civil, que abrange as convenções tendentes a proporcionar a outrem certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual), no qual se incluiria o de tarefa, tinha o interessado vindo a desempenhar funções com fundamento em efectivo contrato de trabalho [definido como «aquele pelo qual uma pessoa se obriga mediante retribuição a prestar a sua actividade intelectual ou manual a outra pessoa sob a autoridade e orientação desta» (artigo 1152.° do Código Civil)].
Assim, ser-lhe-ia aplicável o artigo 660.° do Código Administrativo, uma vez que, tendo na realidade a posição de assalariado, preenchia as condições previstas no mesmo artigo para a atribuição de abonos por doença.
Deveria, nessa qualidade, receber quantias correspondentes:
a) Ao salário completo nos primeiros 20 dias de doença;
b) A 50 % do 21.° dia ao 40.° dia;
c) 25 % do 40.° dia ao 60.° dia.
Considerando que apenas lhe havia sido entregue o montante correspondente ao salário pelo primeiro mês de ausência ao trabalho, estaria ainda em divida a correspondente diferença de remunerações.
5 — Colocada a questão nestes moldes à Câmara Municipal de Santo Tirso, em 28 de Setembro de 1981, e depois de múltiplas insistências, escritas e telefónicas, esta edilidade veio a informar, em 30 de Janeiro de 1984, que aceitara a posição do Provedor de Justiça tendo regularizado a situação do trabalhador mediante o pagamento do montante em dívida.
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Processo n.° 83/R-911-B-4
Sumário — Trabalho. Administração locai. Remune-ções. Substituição.
Objecto — Falta de pagamento da importância correspondente à revalorização do cargo de chefe de secretaria de uma assembleia distrital, exercido em regime de substituição.
Decisão — Reclamação procedente. Reclamação acatada.
Síntese:
De 1 de Julho a 22 de Outubro de 1979, a queixosa, então terceiro-oficial da secretaria da Assembleia Distrital de Aveiro, exercera em regime de substituição as funções de chefe de secretaria desse lugar, que se achava vago em virtude de o seu anterior titular haver tomado posse de idêntico cargo noutra autarquia, e, bem assim, de ter ficado deserto o concurso aberto para provimento do mesmo lugar.
Durante o referido período de tempo, a interessada recebera o vencimento correspondente ao citado lugar de chefe de secretaria, e, na sequência da publicação do Decreto-Lei n.° 379/79, de 13 de Setembro, haviam-lhe sido pagos os retroactivos correspondentes à revalorização do cargo em apreço, operada pelo dito diploma legal.
Entretanto, após a publicação do Decreto-Lei n.° 406/82, de 27 de Setembro, e face ao estatuído no seu artigo 12.°, alínea a), a impetrante solicitara à Assembleia Distrital de Aveiro o pagamento dos retroactivos correspondentes à nova revalorização do cargo de chefe de secretaria, operada pelo mesmo diploma normativo, sem que, no entanto, lhe houvesse sido dada qualquer resposta, até à data em que expôs o caso ao Provedor.
2 — Ouvida a entidade visada, recebeu-se, em resposta, uma informação elaborada pelo chefe de secretaria do referido órgão autárquico, informação essa na qual se assinalava, designadamente, que: a interessada exercera as funções de chefe de secretaria desde 2 de Outubro de 1978, ao abrigo das disposições do artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 76/77, de 1 de Março, embora não se tivesse conhecimento de qualquer despacho que ordenasse o regime de «substituição»; outros funcionários já haviam desempenhado, também, iguais funções em regime de «substituição», possivelmente ao abrigo das invocadas disposições legais; embora se afigurasse que, a partir de 1 de Julho de 1979, as normas do artigo 2.° do Decreto-Lei n.° 191-E/79, de 26 de Junho, e do artigo ll.6 do Decreto-Lei n.° 191-F/79, de 25 de Junho, deveriam prevalecer sobre as disposições do Decreto-Lei n." 76/77, no tocante ao regime de substituição, ainda assim se entendia que mesmo ao abrigo das normas do Decreto-Lei n.° 76/77 deveria ter existido um «despacho» autorizando a prorrogação de tal regime; enfim, a substituição deveria recair no funcionário de maior categoria existente na secretaria da Assembleia Distrital de Aveiro, o que não sucedera.
De qualquer modo, frisava a mencionada informação, haviam sido abonados à funcionária os vencimentos competentes ao cargo de chefe de secretaria, tendo-lhe sido paga, até, a importância correspondente à revalorização do mesmo cargo, decorrente do Decreto-Lei n.° 379/79.
Considerando, pois, os antecedentes do problema em causa, e atendendo à aprovação tácita que parecia ter existido quanto ao exercício de funções de chefia pela interessada, na continuidade, aliás, de outros funcionários que também haviam desempenhado as ditas funções, orientara-se a invocada informação no sentido de se afigurar atendível a pretensão da reclamante.
3 — A verdade, porém, é que esta informação não teve seguimento.
De facto, tendo este Serviço indagado se a Assembleia Distrital actuara nos termos aí preconizados, obteve-se a resposta de que:
Em virtude de não existir nenhum despacho autorizando a substituição da Sr." D. como substituto legal do chefe de secretaria, no período compreendido entre 1 de Julho e 22 de Outubro de 1979, não lhe foram pagas as remunerações compreendidas naquele espaço de tempo.
4 — Perante a comunicação acima citada, opinou-se à Assembleia Distrital de Aveiro ponderando que o argumento invocado para não pagar à interessada as importâncias por ela pretendidas parecia pouco aceitável, face ao teor e às conclusões da informação anteriormente elaborada pelo chefe da secretaria.
Na realidade, com observância ou não das disposições do Decreto-Lei n.° 76/77 (cujo artigo 15." não aludia expressamente à exigência de despacho de designação do substituto dos titulares dos cargos de direcção e chefia), e com respeito ou não das normas do ulterior Decreto-Lei n.° 191-F/79, parecia indesmentível que a reclamante substituíra o chefe de secretaria no exercício das respectivas funções, no período de 1 de Julho a 22 de Outubro de 1979, e por isso mesmo lhe haviam sido abonados os correspondentes vencimentos, tendo-lhe sido paga, inclusivamente, a importância correspondente à subida de letra do referido cargo, operada pelo Decreto-Lei n.° 379/79.
Assim, e havendo o Decreto-Lei n.° 406/82 alterado as remunerações dos chefes de secretaria das assembleias distritais, com efeitos retroactivos, lógico se afigurava que viessem a ser abonadas à reclamante as importâncias correspondentes a tal diferença de remunerações.
Por tais razões, o Provedor recomendou que fossem pagas à interessada as importâncias em causa.
5 — A recomendação foi aceite pela Assembleia Distrital de Aveiro, que assim mandou liquidar ò funcionária as diferenças de remuneração pretendidas.
Processo n.° 83/R-1663-B-4
Sumário — Trabalho. Administração local. Remunera-rações.
Objecto — Falta de pagamento de remunerações correspondentes à prestação de trabalho nocturno.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
l — O interessado neste processo trabalhara no Município de Vila Nova de Famalicão como cantoneiro de limpeza, com um horário que ia, ininterruptamente,
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das 5 horas às 12 horas e 30 minutos, sem que lhe fosse paga qualquer importância correspondente a trabalho nocturno.
O interessado já solicitara oportunamente tal pagamento à Câmara Municipal daquele concelho, mas sem êxito.
2 —Para apreciação do problema, solicitaram-se esclarecimentos à Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão, havendo-se recebido, em resposta, a comunicação de que, segundo informação prestada pelos serviços a que o reclamante pertencera, não vinha sendo processada a importância correspondente à diferença entre trabalho diurno e trabalho nocturno (2 horas) aos cantoneiros de limpeza do quadro de pessoal do município, mas, em compensação, também não estava a ser exigido aos mesmos trabalhadores o cumprimento de 45 horas semanais, em conformidade com o determinado na Resolução n.° 142/79, de 11 de Maio de 1979, do Conselho de Ministros.
3 — Face ao teor da mencionada comunicação, pediu-se à Câmara Municipal que indicasse a duração semanal do trabalho dos cantoneiros de limpeza do quadro de pessoal do município, e, bem assim, que elucidasse concretamente se o facto de os aludidos cantoneiros de limpeza iniciarem o seu trabalho às 5 horas da manhã decorria necessariamente da natureza das respectivas funções (e por que razões, na hipótese afirmativa), ou se, pelo contrário, a actividade desses trabalhadores podia ser integralmente exercida dentro do período de trabalho diverso.
Em resultado desta diligência, veio a ser recebido o esclarecimento de que a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão já comunicara ao impetrante, ex-cantoneiro de limpeza do quadro de pessoal do município, que o mesmo tinha à sua disposição, na Câmara Municipal, a importância reclamada.
4 — Foi assim arquivado o caso, pois que a entidade visada, perante a forma como o assunto (he foi exposto por este serviço, tem espontaneamente reconhecido que ao queixoso assiste o direito às remunerações que reclamara.
c) Transferência de um jornalista, apesar do arquivamento de processo disciplinar contra ele instaurado.
2 — Dada a variedade de assuntos expostos, e a necessidade, para os averiguar, de ouvir considerável número de pessoas, o assessor encarregado do processo realizou uma investigação directa nos serviços da empresa pública visada.
Após essa investigação — para a qual, assinale-se, a RTP concedeu todas as facilidades—, o assessor apresentou relatório do qual se transcreve a parte essencial:
I
No que respeita à admissão de jornalistas já sabíamos qual era a posição da RTP: considerando incompatíveis as normas da cláusula 23." do Acordo Colectivo de Trabalho da RTP, que impõe a admissão por concurso, e da alínea b) do n.° 2 do artigo 14.° da Lei da Televisão, que considera obrigatória a audição do conselho de redacção previamente à admissão de qualquer jornalista, a RTP recusa cumprir a primeira, por ser de dignidade inferior.
Acontece que não existem conselhos de redacção em Lisboa, tendo o do 1.° canal sido declarado extinto pelo próprio director-coordenador de informação.
Quanto ao do Porto, existe e funciona, só que os seus pareceres, segundo informação de um dos seus membros, jamais são tomados em consideração (note-se que são pareceres não vinculativos).
Quer isto dizer:
a) Concursos, não há (e nunca houve, como pude confirmar), porque os seus resultados poderiam ser postos em causa pelos pareceres dos conselhos de redacção;
b) Conselhos de redacção, ou não há, ou os seus pareceres são encarados como uma formalidade a preencher.
Traba lho—Empresas públicas
Processo n.° 82/R-922-B-1
Sumário — Trabalho. Empresa pública.
Objecto — Irregularidades de gestão de pessoal na Radiotelevisão Portuguesa.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação parcialmente acatada.
Síntese:
1 — O Sindicato dos Jornalistas apresentou ao Provedor, em 19 de Abril de 1982, uma queixa em que referia a existência de alegadas irregularidades de gestão de pessoal no âmbito da Radiotelevisão Portuguesa.
Especificava, nomeadamente:
a) Ausência de concursos na admissão de jornalistas;
b) Não funcionamento dos conselhos de redacção;
Resultados: os novos jornalistas «caem» nas redacções sem que, em muitos casos, os seus colegas saibam quem são ou de onde vêm, sendo a competência de alguns, no mínimo, duvidosa.
Esta a situação, que a generalidade dos jornalistas ouvidos considera lamentável. Perante a total ausência de normas, as acusações de tráfico de influências e compadrio político chovem, naturalmente feitas off the record, e repercutem-se nos próprios ambientes de trabalho.
II
Em Lisboa, como referimos, não há conselhos de redacção.
As vicissitudes que atribularam a curta vida do conselho de redacção do I.° canal justificam uma menção, ainda que resumida.
As eleições deram a vitória a determinada lista, nas primeiras reuniões gerou-se um ambiente de contestação ao então recém-nomeado director-coordenador da informação, o que terá levado à renúncia dos elementos eleitos pela lista vencida (as eleições seguiam o método de Hondt). Em face
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desta situação, o referido director, que era também o presidente do conselho por inerência de funções, resolveu extingui-lo, não parecendo atribuir grande relevo ao facto de os conselhos de redacção haverem sido criados pela própria lei [...].
Chamado a pronunclar-se sobre a situação, o departamento jurídico da RTP viria a considerar ilegal a composição do conselho, acentuando contudo:
a) A intangibilidade do órgão em si;
b) A possibilidade de o presidente decidir a «cessação antecipada dos actuais mandatos, com imediata abertura de novo processo eleitoral» (parecer de 2 de Outubro de 1980, fls. 54-55).
O Sr. Director-Coordenador de Informação, inquirido sobre o caso, esclareceu-me que entendia não lhe competir desencadear novo processo eleitoral. O que não pode deixar de causar estranheza, atendendo a que era o seu presidente e nunca pôs em dúvida a sua competência para o extinguir.
Quanto ao conselho de redacção do 2.° canal, o seu proceso foi menos animado: o seu presidente, o dlrector-coordenador de informação, deixou de convocar reuniões, não respondendo às interpelações dos seus membros.
Claro que tudo isto tem hoje um sabor a história triste visto que os mandatos dos jornalistas eleitos para ambos os conselhos já expiraram.
De qualquer modo, parece indiciar-se que a estrutura e funções dos conselhos de redacção necessitarão de ser revistas, devendo também procurar-se equilíbrios minimamente estáveis entre as competências dos conselhos e as do director--coordenador de informação. Revisão e procura que não podem impedir, obviamente, o desencadear de novos processos eleitorais.
III
O «caso» merece, sem dúvida, uma análise detalhada.
O jornalista A, então colocado na redacção do extinto serviço informativo País, Pais, foi objecto de dois processos disciplinares, ambos no ano de 1981:
a) Num, foi acusado de haver excluído de
uma emisão uma reportagem oriunda do correspondente da RTP em Portimão, sobre a barragem de Silves;
b) Noutro, foi, conjuntamente com o seu colega B, acusado de variados casos de incumprimento do horário de trabalho.
Ambos os processos foram arquivados sem consequências disciplinares. Contudo, alguns aspectos merecem realce.
Relativamente ao primeiro processo A foi transferido do País, País para o intercâmbio regional, espécie de «prateleira» onde, segundo o seu responsável, não há trabalho jornalístico para o referido trabalhador realizar. A decisão.
datada de 27 de Novembro de 1981, ou seja, 2 dias após o envio pelo responsável do País, País, ao director-coordenador de informação do «Boletim de apreciação de filmagens», apresenta fundamentação de natureza disciplinar: «condenável demonstração da falta de profissionalismo e de falta de respeito», atitude que «prejudicou gravemente a empresa», «recusa [...] passível de procedimento disciplinar», demonstra «incapacidade para o exercício das suas funções», etc.
Não obstante o arquivamento do processo disciplinar, A lá continuou afastado do País, País, numa espécie de política do facto consumado a que, de resto, o próprio instrutor do processo faz referência, com a naturalidade de quem a ela está habituada, no penúltimo parágrafo do seu relatório final.
IV
Durante as trocas de impressões que mantive com os jornalistas da RTP, ficou-me a convicção de que o regime de prestação de trabalho daqueles trabalhadores, bem como dos que os acompanham nas saídas —operadores de câmaras e de som, motoristas etc. — não deve ser o mais adequado. O cumprimento de um número certo de horas diárias — 6 horas e 30 minutos — embora com localização temporal variável, adapta-se mal ao trabalho de informação, provocando elevado» nível» de trabalho extraordinário.
Em larga medida esta situação resulta de pelas normativas, já que a actividade de todos estes trabalhadores está sujeita às limitações constantes do regime jurídico da duração do trabalho (Decreto-Lei n.° 409/71). Mas as enormes diferenças entre trabalhadores da mesma categoria, no que concerne à remuneração por trabalho extraordinário, parecem também apontar no sentido de uma deficiente gestão dos trabalhadores da informação. Senão, veja-se (mapa 3):
No mês de Maio, há jornalistas que não fizeram trabalho extraordinário —n." 6 e 7— e um jornalista recebeu de trabalho extraordinário quase o dobro da retribuição base e uma retribuição total superior à do chefe de redacção do 1.° canal— n.° 3;
Há trabalhadores que, no conjunto dos meses de Maio, Agosto e Outubro, auferiram remuneração de trabalho extraordinário superior à soma das retribuições normais — n.05 2, 8 e 14 — ao lado de trabalhadores que, no mesmo período, não auferiram o equivalente a 1 mês de retribuição normal — n.°5 4, 7 e 15.
Note-se que estes dados, como de resto todos os usados, foram fornecidos pela RTP (secretaria--geral). A própria escolha dos meses é da responsabilidade da empresa.
Os números constantes dos mapas 1 e 2 também causam alguma admiração:
Entre 1976 e 1981, o número de horas de emissão de toda a RTP passou de 4414 para 4678 (aumento de cerca de 6 %);
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No mesmo período, o número de horas de emissão da responsabilidade da direcção de informação baixou de 846 para 731 (redução de cerca de 14 %);
O número de jornalistas ao serviço da RTP em 1978 era de 38, entre os quais 7 chefes de redacção e 4 subchefes de redacção;
Em 31 de Agosto de 1982 esse número subira para 165, entre os quais 23 chefes de redacção e 33 subchefes de redacção, o que representa um aumento de 430 %;
Só entre 4 de Agosto de 1980 —data da tomada de posse do actual conselho de gerência— e 31 de Agosto de 1982 foram admitidos 51 jornalistas, não obstante de 1980 para 1981 o número de horas de emissão da responsabilidade da direcção de informação ter baixado de 861 para 731 (cerca de 15 %).
Como é compreensível, não estamos em condições de comentar estes números.
Apenas temos difícudade em compreender uma evolução destas (a discrepância motivada pelo facto de o número de jornalistas ser o total da empresa e o número de horas de emissão não tomar em consideração os centros de produção dos Açores e da Madeira, não tem relevo, segundo informação da própria RTP, dado o reduzido volume de produção própria destes centros).
V
Supomos que do exposto se podem extrair as seguinte conclusões:
1.° Ê injusta e desrazoável a situação do jornalista A, devendo recomendar-se ao conselho de gerência da RTP que o coloque em serviço onde possa desenvolver um trabalho jornalístico normal;
2.° Os circuitos de informação interna da RTP não funcionaram bem no caso do processo disciplinar movido aos jornalistas A e B. Ê lamentável que o relatório final do processo não tenha sido dado a conhecer ao participante e ao director-coordenador da informação e que o mesmo haja sucedido, no que se refere ao não conhecimento do director--coordenador de informação, ao texto completo do despacho que determinou o arquivamento do processo (referência à descoordenação das chefias no tocante ao controle de ponto dos jornalistas). Deverá recomendar-se ao conselho de gerência da RTP que evite a repetição de casos destes;
3.° A inexistência de conselhos de redacção eleitos apresenta desvantagens, a menor das quais não será a situação reinante em matéria de admissão de jornalistas. Deverá recomendar-se ao conselho de gerência da RTP que conceda as facilidades indispensáveis à eleição de novos conselhos, cometendo ao director-coordenador de informação o encargo de
desencadear o respectivo processo eleitoral;
4.° A admissão de novos jornalistas deverá fazer-se por concurso, nos termos da cláusula 23." do Acordo Colectivo de Trabalho da RTP.
Enquanto não existirem, em Lisboa, conselhos de redacção, sugere-se que as redacções sejam ouvidas previamente à concretização das admissões;
5.° Valerá a pena rever, dentro dos limites permitidos pela lei, e tendo em conta que está em curso a revisão da regulamentação colectiva de trabalho da RTP, as condições de prestação de trabalho dos jornalistas e demais trabalhadores afectos à informação televisiva, particularmente no que respeita aos horários de trabalho.
Paralelamente, será de recomendar-se ao conselho de gerência que promova acções tendentes a averiguar eventuais irregularidades no preenchimento e controle das folhas de ponto dos jornalistas e a apurar os motivos das distorções relativas em matéria de trabalho extraordinário.
3 — O Provedor, concordando com as conclusões do relatório, formulou à RTP as recomendações nela sugeridas.
4 — O conselho de gerência da RTP respondeu, porém, em 30 de Junho de 1983, que não aceitava as 4 primeiras recomendações feitas.
Considerava, respectivamente, que:
a) A transferência do jornalista A ocorrera no âmbito do exercício de um poder discricionário, não tendo tido origem disciplinar;
6) Nada na lei obrigava à comunicação integral aos interessados das decisões disciplinares;
c) Nada impediria os jornalistas de eleger novo conselho de redacção;
d) As normas jurídicas aplicáveis não exigiriam a realização de concurso para a admissão de jornalistas.
5 — O Provedor não pôde concordar com esta posição, tendo insistido, designadamente, em que:
a) A própria fundamentação do despacho de transferência do jornalista A revelava que na sua base tinham estado considerações disciplinares;
b) O Provedor não sustentara que a lei obriga à comunicação integral das decisões disciplinares, mas recomendou que assim se fizesse;
c) Mantinha a sua posição acerca da impossibilidade legal de extinção dos conselhos de redacção e da necessidade de admissão de jornalistas por concurso.
6 — Em 26 de Abril de 1984, o novo conselho de gerência da RTP disse que iria ter em consideração o teor geral das recomendações do Provedor, embora algumas delas já tivessem perdido actualidade.
Nomeadamente, o jornalista em causa /ora requisitado para outra instituição.
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Mas o conselho de gerência não deixou de declarar expressamente que concordava com a posição do Provedor acerca da comunicação das decisões disciplinares.
Processo n.° 83/R-2208-A-3
Sumário — Trabalho. Empresa pública. Adidos. Integração.
Objecto — Integração de adidos que vêm prestando serviço em regime de requisição na Radiodifusão Portuguesa, E. P.
Decisão — Reclamação improcedente, do ponto de vista legal. Situação parcialmente regularizada, em termos de justiça.
Síntese:
1 — Um grupo de 6 agentes adidos solicitou a intervenção urgente do Provedor de Justiça no sentido de ser sustado o processo, então em curso, do regresso ao quadro geral de adidos, dos cerca de 30 agentes deste quadro que vinham prestando serviço em regime de requisição na RDP, alguns há mais de 8 anos.
2 — A análise do problema levou à conclusão de que o Decreto-Lei n.° 182/80, de 3 de Junho, regulador da integração dos adidos nos organismos em que prestavam serviço, não abrange, na sua previsão, as empresas públicas, como resulta do seu artigo 1." De resto, o Decreto-Lei n.° 615/76, de 27 de Julho, permitindo embora que as empresas públicas recorram a efectivos do quadro geral de adidos, não previa a integração, nos respectivos quadros, desses efectivos.
Poderia, é certo, recorrer-se às disposições genéricas, na matéria, do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, e demais legislação complementar (designadamente, o Decreto-Lei n.*» 175/78, de 13 de Julho); mas, para tanto, seria necessário que a colaboração desses elementos correspondesse a necessidades permanentes de serviço, o que, no caso concreto da RDP, parecia Aão suceder.
3 — Embora não tivesse sido detectada qualquer ilegalidade no procedimento da RDP, entendeu-se dever ser tentada a sensibilização da sua comissão administrativa para a situação daqueles agentes, sugerindo-se t» procura de uma solução que, não contrariando os superiores interesses da empresa, satisfizesse os legítimos anseios daqueles funcionários.
E assim se conseguiu que todos os agentes do quadro geral de adidos, a prestar serviço na RDP, com excepção de 3, viessem a ser integrados no quadro dessa empresa pública.
Processo n.° 84/R-493-A-3
Sumário — Trabalho. Empresa pública. Licença de maternidade.
Objecto — Descontos salariais e de antiguidade praticados pela TAP relativamente às suas assistentes de bordo em estado de gravidez.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — Um sindicato representativo do pessoal de voo queixou-se ao Provedor pelo facto de a TAP (Air Portugal) estar a proceder a reduções nas remunerações das suas assistentes de bordo transferidas para serviço de terra por motivos de gravidez. Isto, com base no Regime Sucedâneo das Relações de Trabalho que, por a empresa ter sido declarada em situação económica difícil, lhe fora mandada aplicar.
Posta em causa a legalidade dessa actuação, a TAP informou o Provedor, em 9 de Dezembro de 1983, de que negociara com o sindicato em causa um acordo de princípio no sentido de vir a constar do acordo da empresa que os trabalhadores nessas condições manteriam as suas remunerações normais.
O processo aberto neste Serviço fora, perante esta resposta, mandado arquivar.
2 — Todavia, em 20 de Fevereiro de 1984, o mesmo sindicato dirigiu-se de novo ao Provedor de Justiça, comunicando que, não obstante a situação se poder considerar sanada a partir de Agosto de 1983, havia toda uma série de descontos salariais e de antiguidade efectuados anteriormente na vigência do Regime Sucedâneo das Relações de Trabalho, aprovado por despacho publicado no Diário da República, 2." série, de 12 de Agosto de 1981, e bem assim no período entre a caducidade desse Regime — 17 de Agosto de 1982 — e Agosto de 1983, descontos esses que considerava ilegais.
3 — Face a esta segunda reclamação, foi aberto o presente processo, no domínio do qual o Provedor de Justiça expôs à empresa pública o seguinte entendimento:
a) Atentando no Decreto-Lei n.° 49 408, de 24 de Novembro de 1969, verifica-se que no n.° 1 do seu artigo 118.° é assegurado às mulheres:
Não desempenhar, sem diminuição de retribuição durante a gravidez, e até 3 meses após o parto, tarefas clinicamente desaconselháveis para o seu estado.
Ora, como o Decreto n.° 47 475, de 31 de Dezembro de 1966, especial para a TAP, não se refere à matéria regulada no citado artigo 118.°, tem de concluir-se que o regime deste constante se lhe aplica.
E o facto de essa empresa ter estado sujeita ao Regime Sucedâneo das Relações de Trabalho, na sequência de ter sido declarada em situação económica difícil, não altera aquela conclusão, porquanto, segundo o artigo 5.°, n.° 2, do Decreto-Lei n.° 353-H/77, de 2 de Agosto, essa situação não pode afectar «os benefícios sociais e as restantes garantias mínimas fixadas na lei».
Constata-se, assim, que aquele Regime Sucedâneo, se, por um lado, dá execução a parte do disposto no n.° 1 do citado artigo 118.°, preceituado que o pessoal navegante feminino em estado de gravidez deve ser colocado temporariamente em serviço de terra compatível com as suas aptidões profissionais e categorias, por outro lado infringe esse mesmo normativo, ao prever que tal pessoal, quando em terra, sofra uma redução no vencimento;
b) Neste contexto, considera-se que, sob o ponto de vista jurídico, é líquido que assiste razão ao
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sindicato, pelo que me permito solicitar a V. Ex." a revisão do caso de harmonia com a lei aplicável, dispensando, assim, as interessadas de recorrer ao tribunal para os efeitos pretendidos.
4 — No entanto a TAP não acatou tal orientação, vindo informar que:
Esta empresa, sem deixar de prestar a melhor atenção às considerações expendidas por esse Serviço, entende não ser adequado estar agora a anular, com efeitos retroactivos, o regime das A/B na situação de gravidez resultante de uma cláusula oportuna e livremente negociada com o sindicato representativo das interessadas e que, mais do que isso, foi depois também determinada por acto de administração pública através do Regime Sucedâneo/81, publicado no Diário da República.
A difícil situação económica da empresa, que se mantém, já aponta para a contenção de despesas normais.
Tratando-se de despesas que, precisamente, foram evitadas num determinado contexto económico, e como contrapartida de outros benefícios — como foi a elevação da componente fixa do vencimento do pessoal de cabine —, menos ainda se compreenderá sejam agora assumidas.
Sobre a génese desta questão e a boa fé com que a empresa sempre a encarou, renova-se aqui o que foi dito no nosso ofício n.° 10 610, de 6 de Maio de 1983, dirigido a V. Ex.°
Perante a natureza das razões invocadas, não pareceu viável conseguirse a alteração da situação, pelo que o processo foi dado por encerrado.
Isto, tendo em conta, designadamente, que, para o futuro, o problema ficará solucionado de acordo com os princípios legais.
Processo n.° 83/738-A-3
Sumário — Trabalho. Empresas públicas. Remunerações.
Objecto — Recusa de pagamento de subsídio de refeição aos trabalhadores candidatos aos órgãos das autarquias locais, durante o período da respectiva campanha eleitoral.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A comissão de trabalhadores dos Telefones de Lisboa e Porto reclamou para o Provedor de fustiça dizendo que aquela instituição se recusava a pagar o subsídio de refeição, instituído por acordo de empresa, aos seus trabalhadores que tinham sido candidatos aos órgãos das autarquias locais durante o período da respectiva campanha eleitoral (eleições de Novembro de 1982).
2 — Face a tal recusa, o Provedor de Justiça oficiou ao conselho de administração dos TLP, defendendo a seguinte posição:
a) Até prova em contrário, presume-se consrituh-retribuição toda e qualquer prestação da enti-
dade patronal ao trabalhador (artigo 82.e, n.° 3, da Lei do Contrato de Trabalho);
6) No dizer autorizado de Monteiro Fernandes {Noções Fundamentais de Direito do Trabalko, t. i, 4." ed., Coimbra, 1981, p. 262), «é necessário que se possa detectar uma contrapartida específica —diferente da disponibilidade da força de trabalho— para certa prestação do trabalhador, a fim de que esta se coloque à margem do salário global»;
c) Ainda que se pudesse considerar não ter o subsídio de refeição carácter retributivo, parece que não deixaria de estar abrangido pelo disposto no artigoe 5.°, n.° 5, do Deere to-Lei n." 701-B/76, de 29 de Setembro, na expressão «para todos os efeitos».
3 — Exposta esta posição aos TLP, a respectiva administração comunicou que entendeu ser tal posição mais conforme com o espírito do referido diploma, pelo que deliberou alterar a sua orientação inicial sobre o assunto.
Processo n.° 83/R-1BB9-A-3
Sumário — Trabalho. Empresa pública. Remunerações,
Objecto — Desconto do subsídio de almoço no salário de um trabalhador, correspondente ao dia em que o mesmo fez parte de uma mesa de voto.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese: .
1 — O reclamante pediu a intervenção do Provedor de Justiça pelo facto de a sua entidade patronal (Crédito Predial Português) lhe ter descontado o subsídio de almoço relativo ao dia 26 de Abril de 1983, por ele haver feito parte de uma mesa de voto nas eleições, realizadas no dia anterior, para a Assembelia da República.
2 — Face a várias reclamações de objecto idêntico entretanto recebidas, o Provedor enviou aos órgãos de comunicação social uma nota oficiosa, em que, resumidamente se diz:
a) Vários trabalhadores de empresas públicas têm protestado contra a recusa de pagamento aos trabalhadores envolvidos nos processos eleitorais para a Assembelia da República e para as autarquias locais — membros das mesas e candidatos, designadamente— de prestações pecuniárias fundadas no contrato de trabalho (subsídio de refeição, prémios de produtividade e de presença, etc.) nos dias em que se encontram ausentes das empresas;
b) O fundamento da recusa do pagamento assenta, nomeadamente, na falta de efectividade de serviço congregada com as regulamentações de trabalho aplicáveis;
c) O Provedor de Justiça entende que, para além de ser de presumir a natureza remuneratória de todas aquelas prestações, por força do n.° 3 do artigo 82.° da Lei do Contrato de Trabalho, elas sempre seriam abrangidas, independentemente da sua natureza, pelas expressões «para todos os efeitos», do n.° 5 do
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artigo 5.° do Decreto-Lei n.° 701-B/76, de 29 de Setembro (eleições autárquicas), e «sem prejuízo de todos os seus direitos e regalias», do n.° 5 do artigo 48.° da Lei n.° 14/79. de 16 de Maio (eleições legislativas); d) O Provedor de Justiça considerará procedentes todas as reclamações relativas a estas situações, recomendando desde já a todas as empresas públicas, e sugerindo às entidades patronais em geral, que não deixem de proceder em conformidade.
3 — Da remessa desta nota oficiosa foi dado conhecimento ao conselho de gestão do Crédito Predial Português, e solicitou-se-lhe que transmitisse ao Serviço do Provedor de Justiça a sua posição sobre o assunto.
4 — O Crédito Predial Português, em resposta, comunicou que, de acordo com a recomendação feita, satisfez, em devido tempo, a reclamação apresentada.
5 — Teve-se conhecimento, de resto, de que outras empresas públicas —designadamente a Radiodifusão Portuguesa— decidiram espontaneamente, face à comunicação pública do Provedor, passar a seguir o critério preconizado por este.
Trabalho—roseto públla
Processo n.° 81/R-188B-A-3
Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Categoria de integração.
Objecto — Rectificação da categoria de integração de agente adido em quadro de serviço do Estado, operada para categoria inferior à antes atribuída, em consequência de reclassificação anterior, pelo quadro geral de adidos.
Decisão — Reclamação improcedente.
Síntese:
1 — Uma enfermeira-parteira puericultora de 1 .• classe, originária dos Serviços de Saúde e Assistência de Angola, ingressou, com essa mesma categoria, no quadro geral de adidos, vindo, posteriormente, a ser reclassificada para a categoria de enfermeira de 1." classe, letra i.
2 anos mais tarde foi integrada no quadro de pessoal da Maternidade do Dr. Alfredo da Costa, não com essa categoria reclassificada, mas, sim, com a de enfermeira de 2." classe, letra j.
Por considerar esse procedimento atentatório não só de direitos adquiridos, como, também, violador do disposto no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 182/80, de 3 de Junho, pediu a intervenção do Provedor de Justiça.
2 — Solicitados os necessários esclarecimentos ao, na altura, Ministério dos Assuntos Sociais, só decorridos cerca de 2,5 anos, e após numerosas insistências, o director-geral do Departamento de Recursos Humanos do Ministério da Saúde informou que a interessada não pudera ser integrada na carreira de enfermagem hospitalar daquele Ministério por não possuir o curso geral de enfermagem, ou equivalente, não obstante ter sido reclassificada pelo quadro geral de adidos para a categoria de enfermeira de l.a classe.
3 — Pareceria, à primeira vista, estar-se perante um caso de ofensa de direitos adquiridos.
Analisada a questão, porém, concluiu-se que o procedimento do Ministério dos Assuntos Sociais fora correcto, por as reclassificações de categoria de origem, feitas no âmbito do quadro geral de adidos, não garantirem, de per si, a correspondente integração em quadros de serviços e organismos do Estado, mas, apenas, se destinarem a facilitar tal integração, nos termos do disposto na alínea 6) do n.° 1 do artigo 19.° do Decreto-Lei n.° 294/76, de 24 de Abril, na redacção que a este artigo deu o Decreto-Lei n.° 819/76, de 22 de Novembro. Além disso, é de ter em conta que o n.° 2 do artigo 43.° do mesmo diploma ressalva, expressamente, o respeito pelos requisitos de provimento estabelecidos na lei geral ou na lei orgânica dos respectivos serviços, quando se trate de integração em vagas de quadros da Administração Pública, resultantes de reorganização de serviços ou de aumentos de quadros de pessoal, como era o caso.
Ao reclasslficar-se, no quadro geral de adidos, a categoria de origem da reclamante para a de enfermeira de 1.° classe, não se deve ter atendido a essa disposição legal, esquecendo-se também que, em Angola, os enfermeiros auxiliares podiam ascender à categoria de enfermeiros, Independentemente da posse do pertinente curso geral de enfermagem, por prática de enfermagem em estabelecimentos hospitalares, desde que tivessem perdurado no tempo por certo número de anos, e fosse devidamente qualificada e certificada.
Considerou-se, pois, que só mediante a obtenção da habilitação adequada poderia a queixosa alcançar a categoria pretendida.
4 — Entretanto, a interessada obteve de facto aprovação no Curso de Promoção Profissional dos Enfermeiros de 3." classe, criado pela Portaria n.° 107/75, de 17 de Fevereiro, equivalente ao curso geral de enfermagem, e veio a ser integrada na categoria de enfermeira de 1." classe, como desejava.
Processo n.° 83/R-I302-A-3
Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos.
Objecto — Rectificação da data fixada para a produção de efeitos do ingresso de um agente no respectivo quadro.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Uma antiga segundo-oficial da Junta Provincial de Habitação de Angola foi admitida no quadro geral de adidos com efeitos a partir de 4 de Janeiro de 1983.
Alegando ter requerido em Marco de 1977 esse ingresso, não obstante o respectivo processo lhe have? sido devolvido em fins desse mesmo ano, com fundamento no facto de se encontrar insuficientemente instruído, a interessada pediu a intervenção do Provedor de Justiça no sentido de a anomalia vir a ser corrigida.
2 — Pelos elementos recolhidos do processo, verificou-se não se encontrar registada no livro de entradas do então Serviço Central de Pessoal o requerimento que a interessada dizia ter entregue em Março de 1977.
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Mas conseguiu-se localizar o duplicado da nota através da qual aquele Serviço procedera à devolução do processo incompleto.
Embora ela se apresentasse sem data, apurou-se que tal nota teria sido expedida em Novembro de 1977.
Parecia, pois, confirmar-se a versão da reclamante.
3 — Com base nestes factos, conseguiu-se a solução do problema, pela alteração, para 29 de Novembro de 1977, data a partir da qual o ingresso da interessada no quadro geral de adidos produziria efeitos.
A Direcção-Geral da Integração Administrativa reportou-se a esta data, por ela corresponder ao último dia do prazo fixado, na alínea d) do n.° 2 do artigo 1.° do Decreto-Lei n.° 356/77, de 31 de Agosto, para requerer aquele ingresso.
Processo n.° 83/R-1482-A-3
Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação.
Objecto — Restituição da categoria de origem, exclusivamente para efeitos de aposentação.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um antigo serralheiro mecânico possuía, no seu serviço de origem —Caminhos de Ferro de Moçambique —, a categoria da letra N, que obtivera por subida de letra de vencimento ao fim de 5 anos de bom e efectivo serviço.
Ingressou no quadro geral de adidos com a categoria reclassificada de operário de 1.° classe (serralheiro mecânico), letra P, em 15 de Março de 1977.
Em 1980 pediu a sua aposentação e, simultaneamente, a restituição da categoria de origem (letra N), para efeitos dessa mesma aposentação, e ao abrigo do disposto no n.° 2 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 175/78, de 13 de Julho.
O pedido de aposentação foi deferido, mas a categoria restituída foi a da letra O, com o fundamento de a letra N ter sido obtida por tempo de serviço, com base no disposto no n.° 5 do despacho do Secretário de Estado da Administração Pública, publicado no Diário da República, 1.a série, de 7 de Dezembro de 1977.
Inconformado com esta decisão, pediu a intervenção do Provedor de Justiça.
2 — Posto o problema ao Director-Geral de Integração Administrativa, conseguiu-se dar satisfação à pretensão do interessado, rectificando a categoria de ingresso no quadro geral de adidos para a de operário qualificado de 1." classe (serralheiro mecânico), letra N, com efeitos a partir de 1 de Julho de 1979, com base no disposto no artigo 14." do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 26 de Junho, conjugado com a Portaria n.° 739/79, de 31 de Dezembro, diplomas legais estes mandados aplicar aos agentes do quadro geral de adidos pelo Despacho Normativo n.° 335/79, de 9 de Novembro.
3 — De facto, a legislação que baseara a decisão de que o queixoso fora alvo encontrava-se ultrapassada pelo regime geral de reestruturação de carreiras
estabelecido no citado Decreto-Lei n.° 191-C/79 e diplomas complementares, mandado aplicar também aos funcionários do quadro geral de adidos.
E, segundo este regime, a ascensão na carreira a que o queixoso pertencia opera-se em função do tempo de serviço, cabendo ao interessado, segundo este critério, a letra N da escala geral do funcionalismo.
Processo n.° 83/R-1575-A-3
Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Reclassificação de categorias.
Objecto — Alteração, na pendência de recurso para
0 Supremo Tribunal Administrativo da categoria resultante de reclassificação no acto de ingresso no quadro geral de adidos.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um antigo adjunto de administrador de concelho dos Serviços de Administração Civil da ex-coló-nia de Moçambique, que foi admitido no quadro geral de adidos com efeitos a partir de 26 de Junho de 1977, na categoria reclassificada de primeiro-oficial, com indicação de tratar-se de agente oriundo do Instituto de Investigação Agronómica da mesma ex-co-lónia, não se conformando com esse acto administrativo, na parte em que lhe atribuiu a categoria reclassificada de primeiro-oficial e o considerou como oriundo daquele Instituto, interpôs recurso contencioso para o Supremo Tribunal Administrativo.
Porque o respectivo processo se vinha arrastando no tempo sem que se vislumbrasse uma decisão final rápida, devido às questões prévias levantadas pela entidade recorrida e à demora, por parte desta, do envio àquele Tribunal de elementos complementares pedidos, o funcionário solicitou a intervenção do Provedor de Justiça.
2 — Pela análise da documentação junta ao processo, verificou-se que o interessado não era agente originário do Instituto de Investigação Agronómica de Moçambique, mas sim do quadro administrativo dos Serviços de Administração Civil dessa mesma ex-colónia, porquanto, em 25 de Junho de 1975 — data da independência de Moçambique — mantinha o vínculo a esses mesmos Serviços, com a categoria de adjunto de administrador de concelho. O facto de, posteriormente e em cumprimento de um contrato de cooperação, ter ido prestar serviço no Instituto de Investigação Agronómica, não alterou, em nada, a natureza desse vínculo, como decorre claramente do acordo celebrado em Maio de 1975, designadamente dos seus artigos 7.° e 11.°
Apurou-se, ainda, que, quer na data a partir da qual o ingresso no quadro geral de adidos produziu efeitos —26 de Junho de 1977—, quer no dia em que o despacho permissivo foi proferido —16 de janeiro de 1978 —, o queixoso contava já mais de 6 anos de serviço efectivo naquela categoria.
3 — Face a estes elementos, considerou-se que o queixoso estava, ao ingressar no quadro geral de adidos, a receber na categoria de chefe de secção, como,
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aliás, teria acontecido a outros funcionários em situação análoga.
O facto de pender processo contencioso no Supremo Tribunal Administrativo não devia obstar à reparação da flagrante ilegalidade detectada — até porque nesse recurso a Administração apenas alegara a extemporaneidade da respectiva interposição.
0 Provedor recomendou, pois, ao Director-Geral de Integração Administrativa que, apesar da pendência do aludido recurso, se procedesse à revisão da categoria 4 — Esta entidade prontamente reconheceu a razão do reclamante e reformulou o acto administrativo em crise. Processo n.° 84/R-430-A-3 Sumário — Trabalho. Função pública. Adidos. Diuturnidades. Objecto — Cessação de abono de diuturnidades a agente de organismo extinto, posteriormente ingressado no quadro geral de adidos. Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese: 1 — Um agente do antigo Gabinete de Planeamento para a Região do Algarve, extinto em 1981, transitou para o quadro geral de adidos, tendo sido, posteriormente, integrado no quadro da Direcção-Geral de Viação. Todavia, as diuturnidades a que adquirira direito deixaram de lhe ser abonadas, situação que se manteve durante cerca de 3 anos. 2 — Analisada a situação, concluiu-se pela existência do direito às diuturnidades reclamadas e que o encargo respectivo deveria ser suportado por força de dotações próprias do quadro geral de adidos. De facto, a argumentação apresentada por este quadro —tratou-se de excedente de pessoal, e não, propriamente, de agente que nele tivesse ingressado— era, manifestamente, improcedente. 3 — Transmitida esta posição ao director-geral de Integração Administrativa, esta entidade ordenou, de pronto, que a quantia em dívida fosse liquidada e paga. E a Direcção-Geral de Viação, uma vez certificado que o queixoso recebera as diuturnidades que lhe competiam em relação ao período em que estivera no quadro geral de adidos, passou, também, a aboná-lo dessas remunerações, a partir da data do ingresso dele no respectivo quadro. Processo n.° 81/R-92-A-2 Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras Objecto — Preterição na promoção a assessor. Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada. Síntese: 1 — Um engenheiro principal do Ministério da Agricultura e Pescas protestou, em 20 de Janeiro de 1981, por não ter sido abrangido pela reclassificação para assessor que, efectuada em 1979, teria abrangido vários colegas seus, em seu entender menos graduados para o efeito. Concretamente, considerava que o Despacho Nor mativo n.° 206/79, de 22 de Agosto, ao abrigo do qual essa reclassificação se operara, estabelecia dois contingentes para a promoção em causa, um ordenado segundo a antiguidade, outro em função do mérito Ora, na lista de promoções a assessor por antiguidade teriam sido contemplados engenheiros principais mais modernos do que ele. Além disso, insurgia-se contra todo o processo que antecedera esta reclassificação, o qual decorrera — afirmava— à revelia dos interessados e sem que estes tivessem podido reagir contra as respectivas deficiências. 2 — Ouvido o departamento visado, veio a respectiva Secretaria-Geral responder que: a) O Despacho n.° 206/79 não consagrava o sistema de graduação por antiguidade; b) Segundo critério estabelecido pela Secretaria--Geral, só tinham sido considerados susceptíveis de promoção os engenheiros com mais de 25 anos de serviço na carreira e 12 anos numa ou ambas as categorias das letras E e F; c) O interessado, embora tivesse 34 anos de carreira, só prestara 8 anos de serviço nas categorias das letras apontadas. 3 — Não pareceu aceitável esta explicação, pois: a) Embora o Despacho n.° 206/79 tivesse uma redacção extremamente deficiente, parecia claro, todavia, que a graduação primeira dos engenheiros a promover a assessores se faria por antiguidade: í...] ordenação" do pessoal [...] sendo as condições de antiguidade na categoria e na carreira com observância e sem prejuízo de se efectuarem provimentos por escolha em percentagem a fixar [...] 6) Não se vislumbrava base legal para o critério restritivo que a Secretaria-Geral teria utilizado para seleccionar os funcionários a promover; c) E, de todo o modo, o interessado exibia documentos que provavam ter ele prestado mais de 12 anos de serviço nas letras E e F (relativos, em parte, a trabalho efectuado em serviço diverso daquele em que ora estava). 4 — Assim, perguntou-se à Secretaria-Geral: a) Qual o apoio legal do critério restritivo que aplicara; 6) Por que razão não atendera ao documento que provava ter o funcionário preenchido, em qualquer caso, esses requisitos utilizados pela própria Secertaria-Geral. E pediu-se também cópia da lista de antiguidades de todos os promovidos. 5 — A Secretaria-Geral retorquiu que: a) A base legal do critério que aplicara consistia no despacho ministerial de 26 de Setembro de 1979, que operara as promoções em causa; 6) Não considerara o documento agora fornecido pelo queixoso, pois tivera de elaborar com grande urgência os processos de promoção, e,
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na consulta telefónica que fizera ao serviço daquele, fora-lhe indicado apenas o tempo de 8 anos nas categorias das letras E e F.
6 — Tãopouco se pôde admitir esta argumentação,
pois:
a) O despacho ministerial de 26 de Setembro de 1979 não se referia de modo algum ao critério aplicado pela Secretaria-Geral, antes se afirmando expressamente, no seu preâmbulo, que os promovidos eram os engenheiros com maior antiguidade;
b) Apesar da urgência do processo, a Secretaria--Geral deveria ter tido o cuidado, se necessário por contacto com os interessados, de verificar se eles não teriam tempo de serviço relevante prestado noutros organismos;
c) Aliás, no próprio processo de promoção fora inserida uma fase de reclamações. No âmbito desta, o queixoso apresentara reclamação, comprovando o seu real tempo de serviço. Mas a comissão encarregada de apreciar as reclamações declarara-se incompetente para analisai as deste e de outros interessados [...];
d) Enfim — e sobretudo— do exame da lista de promoções resultava que tinham sido nestas abrangidos elementos nQo só com menos antiguidade que a do queixoso, mas que nem sequer preenchiam os requisitos mínimos que o Secretorla-Gernl declarara ter aplicado.
7 — Por todas estas razões, o Provedor recomendou ao Ministro da Agricultura, Comércio e Pescas, em 11 de Outubro de 1982, a promoção do interessado a assessor.
3 — Em 29 de Dezembro seguinte, o Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro remeteu, sem tomar directamente posição sobre a questão, uma informação da Direcção-Geral da Organização e Recursos Humanos, em que se defendia que a promoção em causa já não seria possível, pois o movimento operado em 1979 consistia num processo de primeiro provimento no novo quadro do Ministério, não podendo efectuar-se quaisquer outras nomeações para os lugares correspondentes.
9 — Este Serviço procurou, ainda, encontrar solução que, em termos legais, permitisse a reparação da irregularidade detectada.
10 — O processo só foi arquivado quando se concluiu ser isso de todo em todo Impossível, por estar legalmente ultrapassado o processo de promoções em questão, com dispensa de concurso.
Mas não deixou de se lamentar a verificação da série de irregularidades detectada.
Processo n.° 84/R-1913-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras.
Objecto — Desigualdade de tratamento na reclassificação de funcionários.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 —Um conjunto de técnicos auxiliares de laboratório de 2.° classe, a prestar serviço na Estação Agronó-
mica Nacional, apresentou reclamação em 1 de Outubro de 1984, por se considerar alvo de tratamento desigual por parte da Administração.
Os queixosos afirmavam exercer, desde há longos anos, funções correspondentes a técnicos auxiliares de laboratório de 1." classe.
Não obstante, não foram colocados na 1classe, por ocasião da aplicação do artigo 52." do Decerto-Lei n." 221/77, de 28 de Maio, e legislação complementar, segundo o qual o provimento do pessoal do Ministério da Agricultura nos novos quadros deste se faria de acordo com «as funções efectivamente exercidas».
Consideravam-se discriminados por apenas alguns funcionários nessas condições terem transitado para a 1.° classe, ao contrário da maioria deles, em que os reclamantes se integravam.
E a disparidade ter-se-ia tornado mais flagrante pelo facto de o Supremo Tribunal Administrativo ter dado provimento a todos os 7 recursos de trabalhadores nesta situação que haviam reagido contenciosamente contra a posição da Administração.
O Ministério dera execução aos acórdãos relativos a estes funconários, provendo-os na 1* classe.
Mas nüo procedera de igual modo em relação aos demais elementos nos mesmas condições, mas que nlo haviam interposto recurso contencioso.
2 — O Provedor ponderou, por um lado, quo a Administração não estaria vinculada a aplicar a doutrina dos acórdãos em questão ao9 restantes casos (teme* lhantes nfle trazidos a apreciação do Supremo Tribunal Administrativo.
Mas considerou que clu poderia, legalmente, fazô--lo — já que estavam em causa actos contitutivos de direitos, e certo, mas cuja eventual modificação teria a óbvia concordância dos interessados.
E entendeu — alies, segundo critério já aplicado a anteriores situações deste tipo— que a justiça, valor que à Administração Pública incumbe realizar (designadamente por força do artigo 266.°, n.° 2, da Constituição), apontaria no sentido da generalização, a todas as situações destes funcionários, da solução que já para alguns deles fora efectivada, em cumprimento de decisões judiciais.
Atitude diversa poderia, mesmo, redundar no desfa-vorecimento daqueles que dispusessem de meios honorários— por isso não tendo enveredado pela via contenciosa.
3 — Posta a questão nestes termos ao Gabinete do Ministro da Agricultura, este comunicou, em 10 de Dezembro de 1984, que, por considerações de «equidade e justiça», o referido responsável governamental despachara no sentido de a doutrina dos mencionados acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo ser generalizada a todos os funcionários nas mesmas condições dos recorrentes, assim se operando, pois, a sua passagem à 1classe.
Processo n.° 84/1P-22-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Carreiras. Promoção. Habilitações. Direitos adquiridos. Desigualdade de tratamento.
Objecto — Eliminação de desigualdade de tratamento.
Decisão — Recomendação legislativa. Situação em vias de ser regularizada.
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Síntese:
1 — Relacionada com a apreciação de um caso concreto, em relação ao qual não foi possível dar satisfação ao pedido da interessada por falta de instrumento legal adequado, o Provedor de Justiça tomou conhecimento de que o pessoal técnico do Ministério da Indústria provido em categorias extintas (nomeadamente em técnico de 3." classe) beneficiava de um sistema mais favorável de enquadramento nas novas carreiras do que o pessoal em idêntica situação dos restantes ministérios.
Tal benefício resultava de o Decreto-Lei n.° 548/77, de 31 de Dezembro, que aprovou a orgânica do Ministério da Indústria e Tecnologia, ter determinado que os técnicos providos na categoria de técnico de 3." classe (que foi extinta) poderiam transitar para a carreira técnica superior.
2 — O Provedor de Justiça tomou a iniciativa de mandar abrir processo para apreciação da viabilidade da publicação de medida legal genérica tendente a aplicar o regime em vigor no Ministério da Indústria ao pessoal em idênticas condições dos restantes ministérios.
3 — Tendo-se concluído pela necessidade de superar a desigualdade de tratamento existente, o assunto foi levado à consideração da Secretaria de Estado da Administração Pública que informou ter o assunto merecido atenta ponderação, havendo sido elaborada medida legal adequada que, a breve prazo, seria submetida à consideração do Governo e na qual se resolveria, a nível de toda a Administração, o problema da transição para a carreira técnica superior, ao abrigo do artigo 25." do Decreto-Lei n.° 191-C/79, de 25 de Junho, do pessoal antes integrado na carreira técnica e não possuidor de licenciatura ou curso superior.
Processo n.° 80/R-1640-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Concursos.
Objecto — Excessiva exigência de documentação, e insuficiente publicidade, em relação aos concursos de pessoal de apoio dos estabelecimentos de ensino.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada, por alegada inoportunidade.
Síntese:
1 — Foi apresentada, em 8 de Setembro de 1980, uma reclamação relativa ao modo como estavam a ser organizados os concursos para contínuos dos estabelecimentos de ensino.
De facto, se os candidatos pretendiam concorrer a várias escolas, tinham necessidade de apresentação repetida de todos os documentos em cada um desses estabelecimentos, o que envolvia despesas relevantes e assinalável complicação burocrática.
Por outro lado, o queixoso considerou curto o prazo de 10 dias para apresentação dos documentos, dada a sua quantidade, e reduzida a publicidade dada à abertura dos concursos, apenas divulgada através de avisos afixados nas próprias escolas.
2 — Apreciada a questão, pareceram, na verdade, fundamentados os critérios suscitados a este sistema de concursos.
Aliás, a própria Direcção-Geral de Pessoal do Ministério da Educação reconheceu algumas dessas deficiências, mostrando-se receptiva a que se operasse uma modificação do regime em discussão.
3 — Em consequência, o Provedor recomendou que fossem alteradas as normas relativas a estes concursos, por forma a que, por um lado, a sua divulgação se passasse a fazer, também, através da publicação de avisos em jornais das localidades das escolas em que eles seriam abertos e, por outro, que fosse possível a apresentação da documentação instrutória da candidatura apenas num estabelecimento em causa, edmi-tindo-se que os interessados em concorrer ainda a outros prestassem, nestes, declarações, sob palavra de honra, de ter procedido àquela citada entrega.
4 — O Ministério, embora não discordando quanto ao fundo desta recomendação, resolveu aguardar, primeiro, a decisão sobre um pedido de declaração de inconstitucionalidade pendente acerca de algumas das regras jurídicas aplicáveis aos concursos em análise.
5 — Resolvida negativamente a aludida questão de inconstitucionalidade, o Ministério promoveu a preparação de novo despacho normativo regulado; destes concursos — o qual não obteve, porém, a concordância do Ministério da Reforma Administrativa, por o não considerar conforme com a legislação geral relativa a admissões e concursos na função pública.
Tendo este Serviço continuado a insistir, periodicamente, pela revisão das normas regulamentares em questão, o Gabinete do Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário veio a informar, em 9 de Outubro de 1984, que o Ministério considerava que o Despacho Normativo n.° 345/80, de 29 de Setembro, em que elas se integravam, precisava de alterações «muito profundas», havendo mesmo necessidade de modificar o próprio diploma legal (Decreto-Lei n.° 57/, 80) que ele viera regulamentar.
Por isso ainda não fora viável ter em conta a recomendação do Provedor.
6 — Face a esta prevista revisão de todo o regime jurídico em causa, o Provedor decidiu encerrar o presente processo, confiante em que as recomendações nele feitas não deixarão de ser ponderadas na preparação dos diplomas em que aquela se materializar.
Processo n.° 83/R-1932-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Concursos.
Objecto — Falta de abertura de concurso, apesar de legalmente obrigatório.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Uma primeira-oficial do Quadro de Pessoal dos Serviços da Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores apresentou queixa em que expunha que:
a) Tomara posse da categoria de prúneiro-oficial em 21 de Janeiro de 1980;
b) Tendo, em 14 de Fevereiro de 1983, apresentando candidatura ao lugar de chefe de secção, esta fora-lhe recusada, com o motivo
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de que ela só perfazia 3 anos na categoria em 21 desse mês.
Teria, por isso, de aguardar a publicação do Regulamento de Concursos a que se refere o Decreto-Lei n.° 171/82, de 10 de Maio, face à doutrina expressa no Despacho Normativo n.° 51/83, publicado no Diário da República, 1." série, n.° 37, de 14 de Fevereiro;
c) Na contagem do tempo de serviço da reclamante, tinham sido descontadas todas as faltas dadas nos últimos 3 anos, incluindo todas as faltas que dera por doença;
d) Face a posterior parecer da Procuradoria-Geral da República emitido sobre a legalidade destes descontos, homologado pelo Ministro da Justiça, em 2 de Março de 1983, fora modificada a lista de antiguidades, passando, assim, a reclamante a não ter qualquer desconto por faltas no ano de 1982;
e) Em 20 de Abril de 1983, requereu de novo o provimento do cargo de chefe de secção, sendo o mesmo indeferido, de novo com base na falta de Regulamento de Concursos;
f) Ora o certo é que em 14 de Março desse ano, fora publicado, no Diário da República, o Regulamento de Concursos para a Secretaria--Geral do Ministério da Justiça e para as carreiras comuns aos serviços do Ministério, vindo o cargo de chefe de secção mencionado no n.ü 2 do citado Regulamento;
g) Havendo 3 vagas na categoria em causa e já tendo sido publicado o Regulamento de Concursos em falta, não haveria razões para tal indeferimento;
h) A reclamante requereu, em 29 de Julho de 1983, a abertura do aludido concurso.
Não tendo obtido qualquer resposta a esta solicitação, pediu, em 7 de Outubro, a intervenção do Provedor.
2 — Apreciada a situação, concluiu-se que, existindo 3 vagas de chefe de secção, a abertura do correspondente concurso era mesmo obrigatória, face ao n.° 2 do artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 171/82, de 10 de Maio.
3 — Por isso se indagou do Gabinete do Ministro da Justiça qual a posição deste departamento sobre o caso.
4 — O Gabinete respondeu, em 20 de Janeiro de 1984, que o assunto já «fora accionado» para despacho ministerial, estando em andamento o processo de abertura do pretendido concurso.
Processo n.° 79/R-2793-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Disciplina.
Objecto — Demora na recolocação após cumprimento de pena disciplinar.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação legislativa.
Síntese:
1 — Um primeiro-oficial da Escola Secundária da Régua apresentou reclamação em 18 de Dezembro de 1979, por não ter ainda sido recolocado, passados
alguns meses após o cumprimento da pena de inactividade por 1 ano que lhe havia sido aplicada.
De facto, o cumprimento da pena cessara em 13 de Agosto desse ano, mas a Administração ainda não efectivara o seu regresso ao serviço, apesar de ele o vir a requerer insistentemente.
2 — Ouvida a Direcção-Geral de Pessoal, esta referiu que, quer a Escola a cujo quadro o queixoso pertencia, quer outra, na qual ele pedira para ingressar, se recusavam a recebê-lo.
De facto, em qualquer delas ele seria o oficial administrativo mais antigo, cabendo-lhe por isso, nos termos da lei em vigor, a chefia da respectiva secretaria.
Ora ambos os estabelecimentos a tal se opunham, não só por isso afectar expectativas de outros funcionários, mas, sobretudo, por não desejarem ver a dirigir os seus serviços de secretaria um elemento que sofrera punição tão relevante.
3 — O Provedor não deixou de reconhecer serem compreensíveis estas preocupações das escolas em questão.
Mas insistiu com a Direcção-Geral em que a situação do funcionário era ilegal, pois, uma vez terminada a execução da pena, ele não podia, legalmente, continuar afastado do serviço, desprovido de remuneração.
4 — Em 24 de Janeiro de 1980 o Ministério acabou por colocar de novo em funções o queixoso.
Mas entendeu que, tendo-o feito no quadro de escola diferente daquela a que ele pertencia, só após a posse deste novo lugar ele podia voltar a perceber remuneração.
5 — O Provedor não pôde concordar com esta solução.
De facto, o funcionário estaria assim, na prática, a sofrer pena mais extensa do que aquela que lhe fora aplicada — inactividade, sem vencimentos, por 1 ano.
Por isso, recomendou, em 10 de Dezembro de 1981, ao Secretário de Estado da Administração Escolar, que fossem pagos ao interessado os vencimentos desde a data em que terminara o cumprimento da pena — 17 de Agosto de 1979.
Aliás, o Estatuto Disciplinar em vigor determina expressamente a recolocação do punido com inactividade no seu originário lugar, logo que cumprida essa sanção.
6 — A entidade visada aceitou, em 10 de Dezembro de 1981, esta recomendação.
7 — Mas o Provedor não deixou de ponderar que a situação, assim reparada, resultava de imperfeição da lei vigente, revelando-se compreensível a relutância das escolas envolvidas em ter como chefe de secretaria um elemento que sofrera punição deste tipo.
Recomendou, por isso, que se estudasse alteração legislativa em que se estabelecessem requisitos mais apertados para o acesso à chefia das secretarias escolares, designadamente concernentes à prestação de bom serviço durante certo período imediatamente anterior a tal provimento.
8 — O processo veio a encerrar-se quando, em 3 de Abril de 1984, o Secretário de Estado dos Ensinos Básico e Secundário comunicou que fora elaborado projecto de diploma legal em que se acolhia a sugestão do Provedor.
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Processo n.° 81/R-1190-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Disciplina.
Objecto — Excessiva duração de processo de revisão
de decisão disciplinar.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Em 1978, o Provedor de Justiça recomendara ao Ministro dos Transportes e Comunicações, apesar de estar pendente recurso contencioso contra pena disciplinar de 2 anos de suspensão aplicada a um alto funcionário do departamento, que não deixasse de decidir acerca do pedido de revisão de processo disciplinar por aquele formulado (Processo n.° 78/R--413-A-2).
Trata-se, com efeito, de dois remédios jurídicos distintos, com fundamentos e finalidades diferentes também.
Essa recomendação não foi, porém, acatada pelo então responsável daquela pasta governamental.
2 — Em 17 de Abril de 1979, porém, e, muito provavelmente, em resultado da especial menção feita ao caso no relatório do Provedor de Justiça de 1978 (p. 146), veio a ser ordenada a revisão do processo pedida por este.
3 — Decorridos, porém, mais de 2 anos sem que essa revisão fosse concluída, o funcionário de novo pediu, em 17 de Junho de 1981, a intervenção do Provedor.
4 — Ouvido o departamento visado, o Gabinete do Ministro dos Transportes e Comunicações informou que, em 2 de Janeiro de 1981, o processo de revisão fora devolvido ao respectivo instrutor, para ser devidamente completado, pois que este se limitara a apreciar, face aos documentos juntos no pedido de revisão, a prova produzida no processo disciplinar e o correspondente relatório —omitindo uma diligência essencial— a da audição do arguido, requerente da revisão.
5 — Depois de novas perguntas sobre o andamento do assunto, quer escritas, quer telefónicas, obteve-se, em 26 de Agosto de 1982, a comunicação de que o instrutor do processo de revisão fora, por limite de idade, desligado do serviço para aposentação, pelo que houvera que ser designado novo instrutor.
6 — Tendo-se continuado a insistir pela necessidade de breve resolução de um caso que já se arrastava havia demasiado tempo, soube-se que em Março de 1983 fora submetido à apreciação ministerial o relatório do novo instrutor do processo de revisão.
A auditoria jurídica do Ministério entendeu, porém — e bem—, que mais uma vez esse relatório não estava em condições de fundamentar a adequada decisão.
É que, embora concluísse que, «em revisão do processo disciplinar não deve ser imputada nenhuma responsabilidade a [...] e daí nenhuma pena lhe deve ser aplicada, arquivando-se o processo disciplinar», o instrutor terminou o relatório afirmando que «tendo o arguido (...] sofrido já pena correspondente a 2 anos sem vencimento, a revisão do processo disciplinar deve concluir pela não acumulação de qualquer outra pena ao arguido, além da já sofrida».
De facto, se se demonstrava que, afinal, não devia ser imputada ao arguido a prática de qualquer infracção disciplinar, a conclusão não podia ser a da manutenção da pena originariamente aplicada.
7 — Por isso, mais outra vez o processo foi reme-lído, agora ao segundo instrutor, para elaboração de conclusões que se apresentassem congruentes.
8 — E foi assim que, finalmente, em 12 de Julho de 1984, o Ministro do Equipamento Social veio a dar provimento ao pedido de revisão, revogando a punição que o interessado sofrera.
Processo n.° 82/R-1205-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Faltas.
Objecto — Injustificação de faltas, por apresentação tardia de atestado médico, relativas a doença de funcionária de um hospital nele mesmo internada.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese.-
1 — Uma funcionária do Hospital Distrital da Guarda dera entrada no serviço de obstetrícia deste mesmo estabelecimento, em 22 de Abril de 1980, aí se tendo mantido com hemorragias constantes, até 14 do mês seguinte, data em que fora transferida para os Hospitais da Universidade de Coimbra, onde, dada a gravidade do seu estado, fora afecta, quando entrou, à unidade de «alto risco».
Ao ser internada a interessada teria —segundo a sua versão— solicitado ao seu médico assistente que passasse atestado comprovativo da doença e o fizesse chegar ao estabelecimento hospitalar, do qual era, como se disse, funcionária.
Mas o médico só teria entregue o atestado ao Hospital no dia 1 de Maio de 1980, convencido de que isso não afectaria a doente internada nessa instituição. Esclareceu que fizera esse pedido ao médico pois o seu marido não podia incumbir-se da entrega do atestado, já que trabalhava, então, no Barreiro.
Assim não sucedeu, porém. A direcção do Hospital considerou injustificadas as faltas dadas desde a data do internamento à da apresentação do atestado, com o fundamento em que fora desrespeitado o prazo de 3 dias estabelecido no artigo 8." do Decreto com força de lei n.° 19 478, de 18 de Março de Í93Í.
Embora a funcionária tivesse reclamado dessa decisão, a direcção do Hospital mantivera-a — razão porque ela veio queixar-se ao Provedor.
2 — Ouvido o Hospital, este respondeu que agira nos termos previstos na lei. E acrescentou, por ura lado que, «mesmo que possam considerar-se verídicas as razões apresentadas», o atestado teria podido ser entregue mais cedo; e, por outo, que a funcionária já nesse ano e em anos anteriores dera grande número de faltas a coberto de atestados médicos.
3 — Não se afigurou admissível esta argumentação, pois:
a) As faltas anteriormente dadas pela queixosa não podiam relevar para a apreciação das dadas no período em referência.
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E estas correspondiam a situação de doença grave real e comprovada, não só pelo atestado como pela própria história clínica do internamento da queixosa;
b) A situação descrita poderia —a corifirmar-se a versão da funcionária — consubstanciar auténtico «justo impedimento», capaz de, nos termos do princípio geral reflectido no artigo 146." do Código de Processo Civil, tornar juridicamente irrelevante o atraso no cumprimento do prazo legal para entrega do atestado.
Na realidade, a funcionária teria sido internada de urgencia, sem poder contactar o marido e ter-se-ia mantido em todo esse periodo, nos Hospitais da Guarda e de Coimbra, em situação de risco. E estaria fora do seu alcance evitar a demora da apresentação do atestado por parte do médico assistente;
c) Enfim —e sobretudo— apesar de a lei não prever expressamente a situação (deveras excepcional), era de todo em todo inaceitável que, por atraso na entrega do atestado médico, não se considerasse justificada uma situação de doença obviamente comprovada pelo facto de a interessada, funcionária do Hospital da Guarda, se encontrar nesse período internada nos próprios serviços deste estabelecimento (!).
4 — Para completa segurança, solicitou-se ao Procurador da República no Círculo Judicial da Guarda que ouvisse o médico assistente da reclamante.
Este confirmou integralmente a versão dela, esclarecendo que pensava não haver inconveniente na remessa tardia do atestado, pois a doente fora internada no próprio hospital em que trabalhava.
5 — Fundado nestas razoes, o Provedor recomendou a revogação da decisão de injustificação das faltas em causa.
6 — A direcção do Hospital acabou por concordar com esta recomendação, mandando considerar justificado tal período de ausência.
Processo n.° 82/R-2143-B-4
Sumário — Trabalho. Função pública. Faltas.
Objecto — Marcação de faltas injustificadas, devido a ausência do domicílio por ocasião do controle da situação de doença.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A uma professora efectiva do ensino primário de Arcos de Valdevez foram marcadas 22 faltas injustificadas de 6 a 27 de Outubro de 1981, «por não ter sido verificada a doença, dado que segundo comunicação do Sr. Delegado de Saúde não foi encontrada em casa aquando da sua visita».
Ela apresentara, em 28 de Setembro de 1981, atestado médico justificativo de faltas por se encontrar em período de gestação.
No controle da situação de doença, efectuado em 19 de Outubro seguinte, o delegado de saúde não a encontrara, porém, em casa.
E fora na base desta comunicação que o director escolar de Viana do Castelo lhe marcara as aludidas faltas injustificadas, apesar de a professora ter entretanto apresentado uma declaração do médico assistente segundo a qual ela se deslocara ao seu consultório, para controle de gestação, nos dias 6, 12 e 19 de Outubro de 1981.
Inconformada com a decisão, a professora queixou--se ao Provedor.
2 — Ouvido o director escolar, este apoiou a sua posição no § 2." do artigo 8." do Decreto com força de lei n.° 19 478, que dispõe que serão consideradas injustificadas as faltas dadas por funcionário na situação de doente que não seja encrontrado no domicílio pelo delegado de saúde, aquando do controle dessa situação.
E acrescentou que não considerava a declaração do médico assistente da professora, pois que as datas por ele referidas não coincidiam com qualquer das constantes de recibos de consultas enviados por ela aos serviços da ADSE.
3 — Afigurou-se discutível o acerto desta decisão, tanto mais que não era posta em dúvida a real situação de doença da professora, nem a necessidade de controle médico frequente da gestação em causa.
4 — Pôs-se, assim, a questão à Direcção-Geral de Pessoal, para a qual a interessada, de resto, também entretanto recorrera.
5 — O subdirector-geral de Pessoal veio a decidir a justificação das faltas em questão, por entender que não devia ser posta em causa a realidade da doença, comprovada por atestado.
Processo n.° 83/R-630-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Faltas.
Objecto — Injustificação de faltas, devido a ausência do domicílio na ocasião do controle da situação de doença por parte do delegado de saúde.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Uma contínua da Escola Preparatória de Benavente queixou-se ao Provedor em 6 de Abril de 1983, do facto de lhe terem sido marcadas faltas injustificadas em relação ao período de 12 de Novembro a 10 de Dezembro de 1980, com base na circunstância de se não encontrar em casa quando, no dia 25 daquele primeiro mês, o delegado de saúde realizara a visita de controle domiciliário.
A interessada recorrera desta decisão para o di-rector-geral de Pessoal, afirmando que naquela ocasião se deslocara à farmácia, pára comprar remédios que o médico lhe receitara.
Mas este recurso fora indeferido, em 1 de Abril de 1981.
Havendo recorrido para o Ministro desta decisão, não obtivera qualquer decisão deste, até à data em que se dirigiu ao Provedor.
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2 — Sabe-se que são raros os casos em que funcionários que, encontrando-se a faltar a coberto de atestado médico, mas sem estarem realmente doentes, apresentam justificação de variada ordem para explicar a sua ausência de casa por ocasião da visita domiciliária do delegado de saúde.
Mas ponderou-se também que o § 2.° do artigo 8.° do Decreto com força de lei n.° 19 478 estabelece, para a situação em que o funcionário não é encontrado em casa pelo delegado de saúde, uma mera presunção, ilidível, de inexistência da situação de doença.
E bem pode haver explicações reais e plausíveis para que o funcionário, mesmo doente, tenha de sair de casa por períodos breves.
3 — Pediu-se, pois, que a Direcção-Geral de Pessoal indagasse, com precisão, do que se passara, e comunicasse a sua posição final ao Provedor.
4 — Pôde, assim, apurar-se que, na data da visita do delegado de saúde, ela se deslocara à farmácia para adquirir os medicamentos que o médico neurologista lhe receitara.
E resolvera iniciar logo de seguida o respectivo tratamento, ficando por algumas horas em casa de seu irmão, pois receara quaisquer efeitos secundários desses remédios e não podia esperar ajuda efectiva de sua mãe, já idosa, única pessoa com quem vivia.
A Direcção-Geral considerou indiscutível a situação de doença da queixosa — que até fora tratada de urgência, em 12 de Novembro de 1980, no Hospital de Benavente — e teve por concludente a justificação por ela apresentada para a circunstância de não ter sido encontrada na residência pelo delegado de saúde.
Fundado nestas razões, o director-geral de Pessoal decidiu, em 27 de Abril de 1984, revogar a marcação de faltas injustificadas de que a reclamante fora alvo.
Processo n.° 84/IP-14-A-2
'Sumário — Trabalho. Função pública. Licença por doença.
Objecto — Abono de vencimento de exercício na situação de licença por doença.
Decisão — Recomendação legislativa aceite.
Síntese:
1 — O artigo 9.° do Decreto-Lei n.° 19 478, de 18 de Março de 1933, concede ao funcionário, em situação de doença prolongada, que tenha «comportamento exemplar e boas informações de serviço, prestadas pelos respectivos chefes», a possibilidade de requerer o abono do vencimento de exercício durante um período, excedente a 30 dias, que corresponda a tantos dias quantos forem os anos de serviço multiplicados por trinta.
2 — Uma reclamação apresentada alertou para o facto de em determinado serviço público não haver um critério uniforme acerca da atribuição de «comportamento exemplar», tendo passado a considerar-se exclusivamente como abrangidos por esse qualificativo os funcionários classificados com Muito Bom, quando anteriormente para tanto bastava a classificação de Bom.
3 — Analisado o caso, o Provedor entendeu que não podia, em rigor, censurar a posição da Administração, dado que a referida disposição legal permite necessariamente um certo grau de subjectivismo.
4 — Não pareceu, todavia, desejável uma tal oscilação de critérios, susceptível de gerar disparidades de tratamento.
5 — Por isso, o Provedor resolveu, em processo de sua iniciativa, e visto ter conhecimento de que estava a ser revisto o regime de protecção dos funcionários na situação de doença, sugerir à Secretaria de Estado da Administração Pública a reapreciação do referido artigo 9.°, de modo a que, a manter-se uma disposição a este correspondente na nova legislação, ela assumisse formulação mais objectiva e precisa.
6 — A Secretaria de Estado respondeu estar de facto em fase de revisão um projecto de diploma legal sobre férias, faltas e licenças na função pública, sendo sua intenção «contemplar» o problema levantado por esse Serviço, de molde a obviar ao subjectivismo de que a formulação do normativo atrás citado se reveste, caso no aludido projecto de diploma venha a inserir-se norma idêntica à mencionada.
Processo n.° 82/R-940-B-4
Sumário — Trabalho. Função pública. Provimento.
Objecto — Demora na integração na carreira de técnico superior.
Decisão — Reclamação improcedente.
Síntese:
1—Desde 1976 que uma funcionária, licenciada em Farmácia, vinha prestando funções correspondentes às de técnica superior no Laboratório da Faculdade de Farmácia de Lisboa, não sendo, porém, remunerada como técnico-experimentador.
Porque a situação se não alterasse, não se concretizando o seu provimento em lugar correspondente às habilitações possuídas e às funções de facto exercidas, a interessada pediu, em 23 de Abril de 1982, a intervenção do Provedor.
2 — À Faculdade de Farmácia foi enviado o primeiro ofício, por este Serviço, em 18 de Maio desse ano.
Seguiu-se um longo período de quase 2 anos sem se alcançar qualquer resposta daquela escola superior, apesar da realização de 8 insistências escritas.
3 — A Faculdade informou, enfim, em 13 de Abril de 1984, que a queixosa fora integrada no quadro como técnica superior principal, em 31 de Março de 1982.
4 — Analisada a situação, o Provedor entendeu não poder apoiar a pretensão da queixosa, de ser remunerada como técnica superior desde 1976.
De facto, o seu provimento nessa categoria só ocorrera em 1982. E a sua anterior situação assentava em contrato, por ela expressamente aceite, para a categoria de técnico-experimentador.
5 — Mas não deixa de se apontar este caso, como protótipo de processo em que a atempada resposta da entidade visada teria evitado que o mesmo pendesse por 2 anos, envolvendo trabalho e despesas, sem qualquer utilidade.
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Processo n.° 83/R-810-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Provimento.
Objecío — Nomeação do reclamante para lugar ainda não criado e consequente exoneração do lugar de origem.
Decisão — Declaração procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Um médico queixou-se de que, por despacho de 14 de Março de 1983, fora exonerado de 1 lugar de chefe de clínica dos Hospitais Civis de Lisboa (que exercia a tempo parcial e em acumulação, devidamente autorizada, com o lugar de técnico superior principal do quadro de pessoa! do Centro de Saúde Distrital de Lisboa), em virtude de ter sido nomeado, nessa mesma data, chefe do serviço de saúde pública da Direcção-Geral de Saúde.
Estas exoneração e nomeação foram publicadas no Diário da República, 2.a série, n.° 96, de 27 de Abril de 1983.
2 — No entretanto, já antes, no Diário da República, 2.a série, n.° 83, de 11 de Abril de 1983, fora publicada a nomeação de outro médico para o lugar de que o queixoso fora exonerado.
3 — Por outro lado, o lugar para que fora nomeado ainda não tinha existência legal, por falta de publicação da respectiva portaria de criação.
4 — O interessado pediu, pois, a intervenção do Provedor, com vista a definir-se a sua situação funcional, em termos de não resultar prejudicado pela situação criada.
5 — Este serviço auscultou pois o Ministro da Saúde, designadamente sobre:
a) Circunstâncias da nomeação de outro médico para lugar que o queixoso preenchia, e em data anterior à da publicação da respectiva
exoneração;
b) Previsão acerca da emanação da portaria criadora do quadro a que pertencia o lugar para que o reclamante fora nomeado.
6 — Em 30 de Julho de 1983, veio a ser publicada a Portaria n.° 807-Z2/83, alterando o quadro de pessoal do Centro de Saúde Distrital de Lisboa, do qual passou a constar o lugar de chefe de serviço de saúde pública para o qual o queixoso fora designado.
Era, assim, de esperar a resolução da situação.
6 — O interessado voltou, porém, a contactar telefonicamente este Serviço, em 6 de Dezembro de 1983, dizendo que a proposta para a sua nomeação se encontraria havia meses «a aguardar».
7 — Depois de novas diligências deste Serviço junto do Gabinete do Ministro da Saúde e da Administração Regional de Saúde de Lisboa, veio a ser publicada, em 3 de Julho de 1984, a nomeação do reclamante como chefe de serviço do Centro de Saúde Distrital.
E, para que o médico em causa não resultasse prejudicado, este despacho de nomeação estipulou a sua eficácia retroactiva, sob todos os aspectos, incluindo o remuneratório, à data da exoneração de que ele fora objecto.
Processo n.° 84/IP-2-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Recrutamento. Testes psicológicos. Sigilo profissional.
Objecto — Apreciação do regime em vigor em matéria de testes psicológicos, face à garantia do direito ao recurso constitucionalmente consagrado e também previsto no artigo 4.°, alínea /), do Decreto--Lei n.° 44/84, de 3 de Fevereiro.
Decisão — Arquivamento do processo por o sistema em vigor e a sua execução oferecerem garantias adequadas.
Síntese:
1 — O principal escopo deste processo, de iniciativa do Provedor, consistia em averiguar se o direito geral de recurso constitucionalmente consagrado, e também previsto no regime geral em vigor em matéria de concursos — Decreto-Lei n.° 44/84, de 3 de Fevereiro [artigo 4.°, alínea /)], pode exercer-se, nos termos gerais, quanto aos resultados dos testes psicológicos, já que os mesmos constituem um método de selecção com influência bastante condicionadora do resultado final, nos termos do artigo 31.°, n.° 2, do mesmo diploma legal.
Em especial, pretendia-se resposta para as questões relativas: à compatibilização do princípio do sigilo profissional dos psicólogos com a garantia do direito efectivo de recurso dos interessados contra as decisões tomadas com base em pareceres destes, nomeadamente nos casos previstos no n.° 3 do artigo 31." do Decreto-Lei n.° 44/84, aos meios postos à disposição dos interessados para accionar o direito ao recurso contra os resultados dos testes psicológicos, designadamente através da eventual repetição dos testes, quer por diferentes psicólogos, quer por comissão mista em que participem psicólogos indicados por cada uma das partes e psicólogo independente escolhido por ambas; aos obstáculos legais à divulgação prévia (antes da realização do concurso) dos critérios abstractos informadores da realização dos respectivos testes psicológicos, bem como dos meios através dos quais se realizariam.
Esta iniciativa do Provedor foi suscitada pela análise de várias queixas em que os candidatos a concursos (ou outras formas de recrutamento de pessoal) para entidades públicas que integravam a realização de testes psicológicos protestavam pelo facto de não disporem, na prática, de processos efectivos de reacção contra os resultados dos mesmos.
2 — Sobre a matéria foi consultada a Direcção--Geral de Recrutamento e Formação que, em síntese, sustentou a seguinte posição:
a) Não existe incompatibilidade entre o regime constante do artigo 31.°, n.° 3, do Decreto--Lei n.° 44/84 e o artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento Deontológico dos Psicólogos, já que a garantia da privacidade dos resultados do exame psicológico perante terceiros é idêntica;
b) O artigo 14.°, n." 3, do Regulamento Deontológico dos Psicólogos estabelece que «se o examinado o desejar, deverá ser-lhe dado conhecimento do resultado dos seus exames», pelo que, podendo o classificado conhecer,
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quer as conclusões gerais (conhecimento das várias dimensões da pessoa do candidato), quer as conclusões particulares (apreciação global escrita transmitida aos organismos interessados), encontra nesse direito os meios suficientes e necessários para defender os seus interesses e accionar os seus direitos;
c) A repetição dos testes por outros psicólogos, entendida como meio de recurso de resultados anteriores desfavoráveis, contraria uma das características fundamentais do teste psicológico como instrumento científico (a precisão ou fiabilidade ou grau de constância), e, por outro lado, não garantiria o princípio da igualdade assegurada a todos os candidatos;
d) Para preservar a objectividade e garantir a constância dos resultados, os testes realizados pela Direcção-Geral de Recrutamento e Formação ficam sempre a cargo de um grupo de psicólogos em posição neutral em relação ao organismo interessado e ao candidato concorrente, o que permite o distanciamento necessário para melhor avaliar os vários as pectos da situação;
e) Finalmente, não haverá disposição de ordem legal ou deontológica que obste à divulgação prévia dos objectivos, meios e critérios estabelecidos para o exame psicológico, considerando-se até tecnicamente aconselhável a actuação daquela Direcção-Geral ao tomar a iniciativa de preparar folheto informativo para ser distribuído aos candidatos a exame psicológico.
3 — Analisado o assunto, acolheu-se, no essencial, a posição veiculada pela Direcção-Geral de Recrutamento e Formação.
Com efeito, quer o artigo 31.°, n.° 3, do Decreto--Lei n.° 44/84 (é garantida a privacidade dos resultados do exame psicológico e do exame médico, sendo transmitida aos organismos interessados apenas uma apreciação global referente às aptidões dos candidatos), quer o artigo 14.°, n.° 2, do Regulamento Deontológico dos Psicólogos (os resultados serão transmitidos à entidade ou organização sob a forma de parecer final de que o interessado deverá ter conhecimento prévio) gizam o dever de sigilo dos testes psicológicos como um meio de defender o candidato da intrusão de terceiros em dados pessoais, pelo que não é extensível à pessoa do candidato, ao qual poderão ser comunicados todos os resultados, o que lhe garante a possibilidade de recurso.
Entenderam-se como justificados os motivos invocados pela Direcção-Geral de Recrutamento e Formação para afastar a possibilidade de o recurso ser apreciado por psicólogos diferentes dos iniciais.
Igualmente se julgou correcta a actuação tomada pela Direcção-Geral de Recrutamento e Formação, de esclarecimento prévio dos candidatos à realização de testes psicológicos, o que constitui para os mesmos uma garantia adicional de uma defesa esclarecida dos seus direitos.
Finalmente, concluiu-se que o regime constante do Decreto-Lei n.° 44/84 e a prática seguida pela Di-
recção-Geral de Recrutamento e Formação para a realização de testes psicológicos nos termos do seu artigo 33.°, n.° 2, não sugeriam quaisquer reparos em termos de direito de defesa, direito de informação e garantia de sigilo.
4 — Por estes motivos, o Provedor de Justiça determinou o arquivamento do processo relacionado com a temática das garantias dadas aos candidatos submetidos a testes psicológicos.
Esta iniciativa permitiu, de qualquer modo, a definição dos critérios gerais de apreciação e actuação a utilizar no tratamento de casos deste tipo que futuramente venham a surgir.
Processo n.° 78/R-1702-A-2
Sumário — Trabalho.Função pública. Remunerações.
Objecto — Revisão do pagamento das remunerações dos tesoureiros da Fazenda Pública quando da sua transferência de tesouraria.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 —Em Julho de 1978, um tesoureiro da Fazenda Pública dirigiu-se ao Provedor de Justiça reclamando pelo facto de as remunerações que lhe foram pagas por mudanças de tesourarias corresponderem apenas à remuneração principal, não concordando o mesmo com tal abono, alegando, baseado no disposto nos artigos 1.° e 3.° do Decreto n.° 6496, de 1 de Abril de 1920, que os tesoureiros na fase de transição de tesourarias têm direito a todos os vencimentos e proventos, devendo ser-lhes pago em cada dia, até à véspera daquele em que o sucessor o substituir, o equivalente àqueles vencimentos e proventos, dividindo-se para isso por 365 a totalidade do que não é emolumento pessoal, uma vez que a lei (artigo 3.° do referido diploma) manda expressamente excluir do cômputo apenas os emolumentos pessoais.
2 — Deste modo, foi exposta a questão à Secretaria de Estado do Orçamento, tendo sido recebida a informação de que a remuneração dos tesoureiros em transição de tesouraria deveria considerar-se abrangida pelo artigo 4.° do Decreto-Lei n.° 42 046, de 23 de Dezembro de 1958 (que indica a forma de calcular, na generalidade, o vencimento diário dos funcionários públicos), o que fez suscitar neste Serviço a dúvida de saber se, aplicando tal disposição legal ao caso do reclamante, o mesmo não teria recebido inferior remuneração à que perceberia se se tivesse aplicado o preceituado no Decreto n.° 6496, tanto mais que este diploma, que está em vigor, é especial para os tesoureiros da Fazenda Pública e determina expressamente no seu artigo 1.° que estes tesoureiros têm o direito a todos os vencimentos e proventos desde o dia em que entram em exercício até à véspera da substituição.
3 — Aquela dúvida foi posta à Secretaria de Estado do Orçamento, tendo o Gabinete Técnico Jurídico da Direcção-Geral da Contabilidade Pública emitido parecer no sentido de que a expressão vencimentos do artigo 3.° do Decreto n.° 6496, tal como no àis-
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posto do artigo 1.° do mesmo diploma, deve ser entendida no sentido amplo (todos os vencimentos e proventos, com exclusão apenas dos emolumentos pessoais) até porque, caso não fosse assim entendido, e tal como o Serviço do Provedor de Justiça já havia chamado a atenção, os tesoureiros da Fazenda Pública na fase de transição teriam as suas remunerações substancialmente diminuídas.
Opinou ainda a Direcção-Geral da Contabilidade Pública que haveria conveniência em que a Secretaria de Estado do Tesouro promovesse a elaboração de diploma concretizando a interpretação alcançada e que, até lá, poderia proceder-se à rectificação dos abonos efectuados ao reclamante de acordo com o parecer.
0 Secretário de Estado do Orçamento, por despacho de 31 de Dezembro de 1979, manifestou a sua concordância com este procedimento, pelo, que o Provedor de Justiça, após ter comunicado ao reclamante o que procede, determinou o arquivamento da reclamação. De facto, afigurou-se legal e correcta a posição assim definida pela Administração.
4 — Todavia, em Fevereiro de 1980, o reclamante voltou junto do Provedor de Justiça, alegando que ainda não lhe tinha sido efectuada a rectificação em causa, havendo, então, sido reaberto o processo e solicitado informação à Direcção-Geral do Tesouro sobre a razão por que não havia sido feito o referido acerto.
Durante todos os sucessivos anos de 1980, 1981, 1982 e 1983 o Serviço do Provedor de Justiça insistiu com a Secretaria de Estado do Tesouro com vista à regularização daquele pagamento sem que o mesmo tivesse sido concretizado. Apenas em Março de 1984 foi, finalmente, recebida informação, do director--geral do Tesouro, de que haviam sido dadas instruções para tal pagamento às direcções de finanças por onde se efectuaram as transferências do reclamante.
Processo n.° 81/R-989-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Recusa de pagamento de gratificação de chefia a funcionário designado para exercer tais funções, embora sem investidura legal.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — A Direcção-Geral dos Serviços Prisionais designara, ainda que por ordem de serviço interna e a título meramente provisório ou experimenta!, o reclamante, primeiro-oficial do quadro paralelo daquele departamento, para desempenhar o cargo de director do Estabelecimento Prisional de Lamego no período de 14 de Agosto de 1979 a 11 de Março de 1980.
2 — Apreciada a situação, o Provedor recomendou
que ao interessado fosse paga a remuneração reclamada, pois que efectivamente exercera, por ordem superior, as funções respectivas.
Nesta última data o funcionário tomou posso do aludido cargo de chefia.
A Direcção-Geral recusava-se, porém, a pagar-lhe a gratificação correspondente ao exercício da direcção do Estabelecimento Prisional, relativamente ao período anterior a essa posse. Por isso ele veio pedir a intervenção do Provedor.
3 — A Direcção-Geral dos Serviços Prisionais recusou-se, porém, a aceitar tal recomendação, escudan-do-se no facto de só em 21 de Março de 1980 o interessado ter sido formal e legalmente investido nas funções de director do Estabelecimento Prisional de Lamego.
4— Não podendo concordar com esta situação, o Provedor reiterou a sua recomendação, agora ao Ministro da Justiça, e ponderando, designadamente, que:
a) Embora tivesse podido nomear o interessado logo como director a título definitivo, a Direcção-Geral optara por o designar, primeiro, provisoriamente e em acumulação;
b) Não existia, porém, qualquer fundamento legal para a ordem de serviço interna que operara tal designação, nem para o período experimental nela previsto.
Por outro lado, o próprio texto dessa ordem de serviço não deixa margem para dúvidas sobre o acto de que o cargo em questão seria desempenhado em «regime de acumulação».
Para além disso, o eventual incumprimento dessa ordem de serviço pelo reclamante poderia sujeitá-lo a procedimento disciplinar;
c) A Administração, ao tomar a iniciativa de determinar o suprimento do exercício de funções valendo-se daquele regime, não poderia nem deveria razoavelmente desconhecer os pressupostos da figura de acumulação de funções. A responsabilização disciplinar do funcionário pelo eventual não acatamento de ordem de serviço que lhe foi oportunamente comunicada e o efectivo proveito que a Administração retirou do exercício do cargo de director do Estabelecimento, sem qualquer contrapartida, constituem outros aspectos não menos significativos da questão.
Aliás, tais aspectos justificavam que o despacho relativo à acumulação levasse em linha de conta o período de exercício efectivo de funções naquele regime, sob pena de termos de admitir a existência de um caso de enriquecimento sem causa provocado pela Administração e nitidamente à margem do princípio de legalidade ao qual a mesma está, aliás, constitucionalmente vinculada (cf. o artigo 267.° da Constituição da República);
d) Encarada a questão pelo prisma do mero exercício de facto de funções em «regime de acumulação», a solução não deixaria de ser a mesma, considerando que a actuação do funcionário e ora reclamante se processou de boa fé e em resposta a uma ordem da própria Direcção-Geral à qual pertence.
Se alguma situação irregular existiu foi gerada pela Direcção-Geràl, que não pelo reclamante. Todavia, e ao contrario do que sucede com a situação jurídica dos agentes putativos, o ora reclamante não chegou a perceber al-
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guma importância a título de retribuição pelo desempenho do cargo acumulado.
Se tivesse recebido alguma importância (concretamente, a gratificação de [..'.] por mês contemplada no artigo 8.° do Decreto-Lei n.° 49040) não teria de proceder a qualquer reposição, em virtude de ter agido de inteira boa fé, em cumprimento de ordem de serviço emanada do superior hierárquico, dada por escrito, em matéria de serviço e com vista a satisfazer interesses da Administração; e) Concordando a lei, a jurisprudência e a doutrina quanto à não reposição e quantias recebidas por agentes putativos naquelas circunstâncias, outro não deveria ser o tratamento a dispensar ao queixoso.
5 — O Ministro da Justiça veio a dar o seu assentimento à solução preconizada pelo Provedor, mandando pagar ao reclamante a gratificação de direcção também em relação ao perfodo.de efectivo exercício de funções anterior à posse.
Processo n.° 81/R-144B-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Falta de actualização do subsídio de transporte para o pessoal médico dos Serviços Médico--Sociais.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Em 24 de Julho de 1981, um grupo de médicos dos Serviços Médico-Sociais do Distrito de Lisboa queixou-se ao Provedor pelo facto de o subsídio de transporte que lhes cabia não ter sido actualizado desde 1978, ao invés do que teria sucedido em relação ao pessoal administrativo e de enfermagem.
Esta falta de actualização prejudicava-os relevantemente, sobretudo tendo em conta os aumentos dos preços de combustíveis entretanto operados.
Acessoriamente, protestavam também pelo facto de o número de visitas domiciliárias que lhes era exigido não ter ainda sido reduzido, proporcionalmente à diminuição verificada em relação às consultas.
2 — Solicitados, em 12 de Agosto de 1981, esclarecimentos ao Gabinete do Secretário de Estado da Saúde, foi informado, em 26 de Fevereiro seguinte, que, no seguimento de despacho, de 12 de Agosto de 1981, daquele responsável governamental, ia ser actualizado o valor do subsídio de transportes relativo aos queixosos, o qual seria já pago conjuntamente com o vencimento do mês de Outubro de 1981, com efeitos reportados a Setembro de 1979.
3 — Só em 14 de Maio de 1984, todavia, e depois de novos e insistentes pedidos de esclarecimento, o Gabinete do Ministro da Saúde comunicou que, por efeito do mesmo citado despacho ministerial de 12 de Agosto de 1981, o número de visitas domiciliárias exigíveis a estes médicos fora reduzido para 6, 4 e 3 visitas
diárias, com referência, respectivamente, a áreas urbanas, suburbanas e rurais.
4 — A demora na prestação destas informações obrigou a que se mantivesse pendente um processo relativo a factos afinal já solucionados havia quase 3 anos.
Processo n.° 82/R-1383-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Indeferimento de pedido de reversão do vencimento de exercício por falta de autorização prévia e de publicação no jornal oficial.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Uma segunda-oficial do Centro de Educação Especial de Lisboa, exercera, por conveniência e determinação dos serviços, as funções de outro segundo--oficial, de 1 de Janeiro de 1980 a 15 de Maio seguinte, período durante o qual este estivera doente.
Fora-lhe recusado, porém, o abono da reversão do vencimento de exercício correspondente, que oportunamente requerera.
2 — Ouvida a entidade visada, apurou-se que a recusa, por despacho do Secretário de Estado da Segurança Social, com data de 27 de Abril de 1982, do pedido de reversão do vencimento de exercício feito pela queixosa, se ficara a dever à inobservância das formalidades prescritas no artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 191-E/79, de 26 de Junho, ou seja, à falta de autorização prévia e da respectiva publicação no jornal oficial.
3 — Porém, como do exame da documentação se comprovasse que a funcionária em causa tinha exercido de facto, cumulativamente, as funções do outro segundo-oficial que se achava doente, o Provedor indagou, junto do Centro de Educação Especial, da possibilidade de se solucionar a questão, perante a comprovação do exercício de funções nas condições indicadas, aliás, com reconhecimento expresso da parte dos serviços envolvidos.
4 — Em virtude de o problema não ter encontrado solução adequada junto dos serviços, o Provedor de Justiça recomendou ao Secretário de Estado da Segurança Social a reparação da situação criada à queixosa fundamentando-se para o efeito nos seguintes argumentos:
a) A funcionária foi chamada a desempenhar, em regime de acumulação, as funções de outro segundo-oficial, por conveniência de serviço, ou seja, no interesse da Administração;
b) Para além disso, apura-se que foi o serviço que não solicitou, em devido tempo, autorização prévia para a falada acumulação.
A queixosa, dando cumprimento a instruções do •respectivo director, exerceu, efectivamente, as funções próprias do seu cargo e as do colega.
Actuou, pois, em cumprimento de instruções legítimas de superior hierárquico, em matéria de serviço e no evidente interesse da Administração;
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c) O despacho do director-gera! da Organização e Recursos Humanos, que recusara a pretensão da queixosa, a6gurava-se, em boa medida, contraditório; ao pretender transferir para a funcionária as consequências do incumprimento das disposições legais relativas à necessidade de despacho prévio de autorização do regime de acumulação de cargos;
d) Esta Direcção-Geral não considerou possível satisfazer a pretensão apenas porque os serviços não cumpriram as determinações legais em vigor.
5 — O Secretário de Estado veio a dar o seu acordo a esta posição, ordenando o pagamento, à reclamante, das remunerações pretendidas.
Processo n.° 83/R-641-B-1
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Descida de categoria e remunerações aplicada a enfermeira, por falta de habilitações.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação não acatada.
Síntese:
1 — A queixosa celebrara, em 1976, contrato de trabalho com a Caixa de Previdência e Abono de Família do Distrito de Coimbra, para prestar serviço como enfermeira e recebendo o vencimento correspondente à letra J.
Pediu a intervenção do Provedor porque, quando aquela Caixa foi integrada nos Serviços Médico-Sociais, a comissão de gestão destes, entendendo que a categoria de enfermeira lhe fora incorrectamente atribuída, ordenou a sua passagem para a letra L, com reposição de vencimentos de cerca de 150 000$.
2 — Ouvida a Administração Regional de Saúde de Coimbra, esta justificou a decisão contestada pelo facto de, apesar de ter exibido, ao ser contratada, uma carteira profissional como enfermeira, a funcionária só tinha, afinal, a habilitação de parteira.
Aliás, instada a apresentar o diploma do curso de enfermagem, jamais o fizera.
3 — Afigurou-se discutível esta posição. De facto, quando a reclamante foi admitida na Caixa de Previdência a sua relação de trabalho não era regida pelas normas aplicáveis à função pública. No que se refere à baixa de categoria, era condicionada ao assentimento do trabalhador — cf. artigo 5.°, alínea é), da CCT dos trabalhadores da Previdência (Boletim do Ministério do Trabalho, n.° 13, de 15 de Tulho de 1976, p. 1062), e antes da entrada em vigor da convenção, artigos 21.°, n 0 1, alínea d), da lei do contrato de trabalho, aplicável por força do artigo 3.° do Estatuto aplicável ao pessoal a que a queixosa pertencia (Portaria n.° 235/71, de 4 de Maio, com as alterações introduzidas pela portaria de 6 de Agosto de 1973). O mesmo se diga da diminuição da retribuição [artigo 5.°, n.° 1, alínea c), da CCT e artigo 21.°, n.c 1, alínea c), da lei do contrato de trabalho).
Quando o pessoal afecto aos serviços clínicos da Previdência, como era o caso da reclamante, foi trans-
ferido para os Serviços Médico-Sociais — Decreto Regulamentar n.° 12/77, de 7 de Fevereiro— manteve «todas as regalias e direitos adquiridos», nos termos do n.° 1 do artigo 8." Aí se incluía, naturalmente, a categoria profissional.
O Decreto-Lei n.° 124/79, de 10 de Maio, tornou o estatuto da função pública aplicável aos trabalhadores dos Serviços Médico-Sociais.
Nos termos do artigo 34.° «o pessoal que é integrado no regime geral da função pública através do presente diploma mantém a categoria que actualmente possui, com as excepções constantes dos números seguintes» (onde se não inclui o pessoal de enfermagem).
4 — Para melhor segurança na posição a tomar, pediu-se ainda, à queixosa, cópia da sua carteira profissional, e à Administração Distrital dos Serviços de Saúde de Coimbra, especificação das funções por ela exercidas.
5 — A interessada forneceu cópia da carteira profissional com o título de enfermeira, passado em 4 de Novembro de 1975 pela Direcção-Geral do Trabalho.
6 — A Administração Regional, por seu turno, informou que, enquanto a reclamante lá trabalhou (pois fora, entretanto, transferida) «as funções que exerceu, uma vez que não se efectuavam partos, eram injecções, pensos e chamada de doentes para consultas, actividade que qualquer parteira sabe desempenhar».
7 — Teve-se em consideração que, segundo a Classificação Nacional de Profissões (versão de 1980), as funções das enfermeiras consistem em «fazer tratamentos e administrar medicamentos, dar injecções, fazer e substituir pensos e executar outros tratamentos terapêuticos prescritos pelo médico e exercer outras funções similares».
Enquanto que às parteiras cabe «dispensar cuidados e dar conselhos a grávidas e parturientes com o fim de as auxiliar durante o período de gravidez, no momento do parto e durante o período do pós-parto e exercer outras funções similares».
8 — Perante estes elementos, e considerando que, independentemente das habilitações possuídas, a queixosa sempre fora enfermeira e exercera as funções correspondentes, o Provedor recomendou à Administração Regional de Saúde de Coimbra, com conhecimento do Ministro da Saúde, que revogasse a ordem de reposição de vencimentos que àquela fora dada.
9 — A Administração Regional não aceitou a recomendação.
Respondeu que a decisão cabia agora ao Ministro das Finanças e do Plano, ao qual a interessada pedira a relevação da reposição.
Mas comunicou que, ouvida acerca do assunto pela Direcção-Geral da Contabilidade Pública, definira a sua posição nos termos seguintes:
1—A funcionária ... sabia, ou tinha obrigação de saber que não possuía a categoria profissional — enfermeira— que sempre alegou possuir.
2 — A funcionária tinha conhecimento de que lhe era impossível fazer prova das habilitações profissionais que, por várias vezes, lhe foi pedida.
10 — Face a esta recusa, o Provedor considerou de expor o caso à Assembleia da República, através do presente relatório.
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Processo n.° 83/R-1764-A-3
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações
Objecto — Falta de despacho conjunto regulador de várias remunerações acessórias de trabalhadores civis das Forças Armadas.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada. Síntese:
\ — Um dirigente do Sindicato dos Trabalhadores Civis dos Estabelecimentos Fabris das Forças Armadas reclamou, em 16 de Setembro de 1983, para o Provedor de Justiça da inexistência de regulamentação e de quantificação dos subsídios de turno e por trabalho nocturno, bem como da remuneração especial por horas extraordinárias.
Isto, apesar de tal regulamentação estar prevista desde 1980.
De facto, já o Estatuto aprovado pelo Decreto-Lei n.° 33/80, de 13 de Março, previa a regulamentação, por despacho, do trabalho por turnos.
Regime semelhante foi consignado no Estatuto que substitui aquele, aprovado pelo Decreto-Lei h.° 381/ 82, de 15 de Setembro.
Salientava-se, na queixa, o relevante prejuízo monetário que desta situação decorria para os trabalhadores em questão.
2 — Contactara-se, pois, o Gobinete do Ministro da Defesa Nacional, no sentido de o problema ser resolvido com a brevidade possível.
3 — Em resposta, o referido Gabinete comunicou, em 6 de Agosto de 1984, que o assunto já estava a ser objecto de regulamentação, mediante a publicação de adequado despacho conjunto o qual já estava referendado pelo Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Defesa Nacional e pelo Ministro do Trabalho e Segurança Social, encontrando-se o mesmo, finalmente, no Ministério das Finanças e do Plano para referenda do respectivo titular.
4 — Encerrou-se, pois, o caso, por se verificar que estava enfim encaminhada a solução do problema.
Processo n.° 83/R-2384-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Atribuição a funcionário nomeado, em substituição, para cargo de chefia, de remuneração global inferior à que perceberia no lugar de base.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um perito tributário de 1classe, colocado como chefe de serviço distrital, apresentou queixa ao Provedor de Justiça alegando que:
a) Por despacho de 24 de Março de 1983, fora designado para, em regime de substituição, desempenhar o cargo de subdirector tributário com efeitos reportados a 1 de Fevereiro desse ano;
6) Passara, por conseguinte, a receber, durante os primeiros 6 meses, o vencimento correspon-
dente àquele cargo e remunerações acessórias equivalentes a 30 % do vencimento do mesmo cargo;
c) Findo aquele prazo passou a receber, por força do disposto no n.° 4 do artigo 11* do Decreto-Lei n.° 191-F/79, de 26 de Junho, o vencimento da categoria de origem e as remunerações acessórias indicadas em b);
d) Com a publicação do Decreto Regulamentar n.° 42/83, de 20 de Maio, cuja vigência foi reportada a 1 de Janeiro anterior, o funcionário passou a receber, no total, como substituto do subdirector de serviços, remunerações inferiores às que lhe caberiam na posição de origem.
De facto, por força deste diploma, as remunerações acessórias dos chefes de serviços distritais passaram a ser mais elevadas do que as correspondentes aos subdirectores de finanças.
2 — Esta situação prejudicava-o, em termos significativos, uma vez que a respectiva pensão de aposentação seria inevitavelmente afectada — ele se aproximava do limite de idade.
Apesar de o interessado ter reclamado para a Di-recção-Geral das Contribuições e Impostos, esta en; tendeu que, face à lei, a solução não podia ser outra.
3 — Apreciada a situação, o Provedor recomendou a sua reapreciação, entendendo que:
fl) Se estava perante uma situação anómala, não apenas pelo facto de à maior responsabilização do funcionário não corresponder um aumento de remuneração, mas também pelo que dc desmotivador ela comportava, ao traduzir-se no tratamento menos vantajoso de quem se vira chamado a desempenhar funções de nível superior, acabando mesmo por receber remuneração menor do que a daqueles que dele dependiam hierarquicamente;
b) Face aos princípios constitucionais da igualdade, legalidade e justiça, aos quais a Administração está submetida — (Constituição, artigos 13.°, n.° 2, e 266.°, n.° 2), não se mostrava viável manter tal estado de coisas.
4 — O Secretário de Estado do Orçamento, a quem a recomendação fora dirigida, acabou por aceitá-la e deu-lhe execução.
Processo n.° 84/R-l 138-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Remunerações.
Objecto — Não atribuição do subsídio de turno ao pessoal feminino da Inspecção-Geral de Finanças em serviço na Tabaqueira, E. P.
Decisão — Reclamação não procedente.
Síntese:
1 — O pessoal feminino da Inspecção-Geral de Finanças em serviço na Tabaqueira, E. P., apresentou queixa o Provedor de Justiça alegando sentir-se discriminado em relação aos colegas do sexo masculino, em virtude de não lhe ser atribuído subsídio de turno,
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mas apenas o de trabalho nocturno, entre as 20 horas e as 24 horas.
2 — Ouvida sobre o assunto, a Inspecção-Geral de Finanças prestou, a respeito, informação circunstanciada, na qual afirmava a insubsistência da pretensão dos queixosos argumentando, para o efeito, que os agentes fiscais femininos, por não trabalharem em todos os períodos sucessivos de trabalho diário —conforme exigência dos n." 5 e 6 do artigo 7.° do Decreto--Lei n.° 198/83, de 18 de Maio—, não têm direito ao subsídio de turno, da mesma forma que a este abono não têm direito os agentes masculinos quando não percorram em regime de escala todos os turnos estabelecidos, por forma e verificar-se o factor «penosidade» que aquela remuneração visa compensar.
3 — Do exame da questão, o Provedor de Justiça concluiu pela não verificação da alegada prática discriminatória por entender que:
a) A atribuição do subsídio de turnos não é automática, só a ele tendo direito os agentes fiscais que, trabalhando em regime de escala, percorram em cada mês, todos os períodos sucessivos de trabalho diário (cf. n." 5 e 6 do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 198/83);
b) Os agentes fiscais femininos, dadas as características das funções que lhes estão cometidas — revista das operárias à saída 'das fábricas— apenas integram os períodos de trabalho correspondentes à laboração das mesmas e não também aqueles em que as fábricas fecham, designadamente das 0 horas às 8 horas. Nesses períodos apenas funcionam os serviços de vigilância, efectuada exclusivamente por homens, sendo os «piquetes» de fiscalização feitos nesses períodos por um só agente fiscal masculino;
e) Ê a especificidade de funções que determina a distribuição do pessoal —masculino e feminino — pelos respectivos turnos, de acordo com o n.° 4 do artigo 7.° do Decreto-Lai n.° 198/83;
d) Os agentes fiscais femininos não trabalham, em todos os períodos sucessivos de trabalho diário e, por isso, não têm direito à atribuição do subsídio de turno, da mesma forma que os agentes fiscais masculinos o não têm quando não percorrem em regime de escala todos os turnos estabelecidos.
Processo n.° 78/R-2048-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Saneamento.
Objecto — Aplicação, a medida de saneamento, de efeitos não legalmente previstos.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação parcialmente acatada.
Síntese:
1 — O qiíeixoso, primeiro-oficial, a exercer funções de chefe de secretaria num estabelecimento dependente da Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, fora suspenso, em 13 de Março de 1975, por se ter presumido que estaria abrangido pela alínea d)
do artigo 7.° do Decreto-Lei n.° 123/75, de 11 de Março, diploma relativo ao saneamento de funcionários implicados com o regime deposto em 25 de Abril de 1974.
Posteriormente, em 27 de Dezembro do mesmo ano, a Comissão Interministerial de Saneamento demitira-o, com base na mesma legislação.
Em 15 de Abril de 1977, porém, a Comissão de Análise encarregada de rever estes casos substituiu a pena de demissão pela de suspensão de exercício e vencimentos por 6 meses.
Em execução desta decisão, porém, a Direcção-Geral colocou o queixoso como primeiro-oficial, sem funções de chefia, e em serviço diverso do anterior, por entender que lhe seria aplicável, por analogia, o n.° 4 do artigo 13.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, então em vigor, que obrigava & transferência de quem houvesse sofrido pena daquela natureza.
E considerou como período de suspensão o semestre posterior à decisão de reintegração.
Desta situação se queixou o interessado ao Provedor.
2 — Não pareceu, por um lado, legal a aplicação de transferência, com efeito secundário da pena de suspensão.
Na verdade, tratando-se de medida sancionatória, ela não poderia ser aplicada por analogia, já que a legislação específica relativa ao saneamento não a previa.
Por outro lado, a suspensão teria de reportar-se ao período imediatamente subsequente à demissão, pois viera substituir esta pena.
A localização da suspensão em 1977 (como a Direo-ção-Geral o fizera), e não em 1975, prejudicou o queixoso, pois incidira em período em que os vencimentos eram superiores — maior, sendo, pois, a perda decorrente da suspensão destes.
Enfim, devendo o queixoso, finda a suspensão, ter regressado ao seu originário lugar, fora ilegal a recusa de pagamento, desde essa data, da gratificação que lhe cabia como chefe de secretaria, até ao momento em que veio a ser provido no cargo de chefe de secção, em Julho de 1980.
3 — Com base nas mencionadas razões fez o Provedor as correspondentes recomendações, em 31 de Julho de 1980, ao Ministério da Justiça.
4 — Depois de múltiplas insistências, o Ministério respondeu que aguardava decisão do Supremo Tribunal Administrativo, para o qual o interessado entretanto recorrera.
5 — O Provedor retorquiu que isso não obstaria à possibilidade de intervenção do Provedor e à atenção de que a sua recomendação era merecedora, até por o seu âmbito exceder o do aludido recurso contencioso.
6 — O Supremo Tribunal Administrativo veio, entretanto, a anular a transferência de que o queixoso fora alvo — assim corroborando, pois, a opinião que o Provedor já expressara sobre o assunto
7 — Porque o Ministério tardava em dar cumprimento a este acórdão, de novo teve o Provedor de intervir, insistindo na reposição da situação anterior à transferência e pela reparação, em termos de indemnização, das remunerações que o queixoso ilegalmente deixara de receber.
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8 — Estes vários aspectos foram sendo considerados pela Administração (na medida em que ainda o podiam ser, face à reorganização dos serviços entretanto operada) e o processo foi, enfim, encerrado, quando, em 22 de Novembro de 1984, se obteve informação de que «o funcionário havia recebido, a título de indemnização, a gratificação de chefia que deixara de auferir entre 10 de Julho de 1977 e 1 de Julho de 1980.
Processo n.° 77/R-1098-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Suspensão de funções e vencimentos.
Objecto — Suspensão de funções e de vencimentos desde 30 de Dezembro de 1974, em processo de inquérito solicitado pelo reclamante.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Em 30 de Junho de 1977, deu entrada neste Serviço uma reclamação em que um director de serviços do hospital de Cascais protestava pelo facto de se encontrar suspenso de funções, sem vencimentos, desde 3 de Dezembro de 1974.
Na verdade, tendo a sua actuação como director de serviços sido contestada no âmbito do Hospital, o reclamante pedira um inquérito aos seus actos e fora em relação a este inquérito, a cargo da Inspecção dos Serviços de Saúde, que o Secretário de Estado da Saúde decretara a sua suspensão preventiva «para melhor curso de averiguações».
Ficara o reclamante a aguardar a evolução do processo, até que, em 26 de Abril de 1977, escreveu ao inspector superior dos Serviços de Saúde, que lhe respondeu que, desde 5 de Setembro de 1975, o processo de inquérito realizado por aquela Inspecção fora, por despacho ministerial, enviado para a Direc-ção-Geral dos Hospitais.
Assim, em 4 de Maio de 1977, o reclamante solicitara informações à Direcção-Geral dos Hospitais acerca do andamento do citado processo, acentuando que, continuando desde o início da suspensão sem qualquer provento económico, as suas reservas económicas se encontravam extintas pelo que já tivera de recorrer a um empréstimo; a isto acrescia o prejuízo moral e profissional que o estava afectando, face a esta situação, que já se arrastava havia 3 anos.
Apesar de ter insistido por uma resposta, continuara sem qualquer comunicação sobre o desenlace do caso — por isso tendo pedido a intervenção do Provedor.
2 — Depois de numerosas diligências, quer junto da Direcção-Geral dos Hospitais, quer junto do Gabinete do então Ministro dos Assuntos Sociais, quer ainda junto do hospital distrital onde o reclamante exercia funções, só em 4 de Dezembro de 1979, através de cópia de um ofício enviado pela Direcção-Geral dos Hospitais ao inspector superior dos Serviços de Saúde, pôde enfim chegar-se ao apuramento concreto da situação do queixoso, que aquele próprio serviço
reconhecia «lamentavelmente arrastar-se há tanto tempo sem justificação possível)»:
a) O reclamante era, em 1974, director de serviços do Hospital Distrital de Cascais;
b) Em 3 de Dezembro de 1974, fora suspenso preventivamente de funções e vencimentos por despacho do então Secretário de Estado da Saúde, em processo de inquérito, aliás solicitado pelo interessado;
c) Aquela suspensão fora prorrogada só em 11 de Junho e 9 de Setembro de 1975;
d) O reclamante não tinha sido nunca afastado do seu cargo, pelo que continuava dele titular, embora ainda suspenso de funções e vencimentos, em 4 de Dezembro de 1979 (5 anos passados);
e) No ofício da Direcção-Geral dos Hospitais para a Inspecção Superior dos Serviços de Saúde, apontava-se para a solução do caso, «a seguinte Unha de actuação»:
1) Que se mande abrir processo disciplinar ao reclamante com base nas acusações constantes do auto de inquérito que levantam fortes suspeitas de incompetência e incúria;
2) Que, de acordo com o Estatuto Disciplinar, o processo seja conduzido pelo hospital distrital onde exercia funções;
3) Que sejam dadas, ao hospital, instruções, no sentido de concluir o processo no prazo máximo de 3 meses, determinando S. Ex.a o Secretário de Estado que durante o decurso do mesmo se mantenha a suspensão do exercício de funções;
4) Que se paguem ao reclamante os vencimentos correspondentes à categoria que possuiria no caso de ter sido integrado durante todo o período de elaboração do processo disciplinar;
5) Que se estude, imediatamente, a forma de se definir em termos inequívocos a posição contratual do médico perante o Hospital.
3 — No seguimento dos factos apurados, o Provedor de Justiça dirigiu em 5 de Fevereiro de 1980, ao então Secretário de Estado da Saúde, um ofício onde se escrevia:
13 — Nestes termos e pelo exposto, é-se de parecer que:
13.1 — Em conformidade com o que telefonicamente hoje me foi informado pela Secretaria do Hospital Distrital de Cascais, e ao contrário do que se escreve na informação em referência da Direcção-Geral dos Hospitais, não se têm quaisquer dúvidas quanto à posição actual do reclamante relativamente àquele Hospital:
O queixoso continua a ser director de serviços naquele Hospital, embora suspenso de funções e de vencimento, preventivamente, em processo de inquérito, àquele Hospital instaurado em 1974 e ainda pendente.
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13.2 — Aquela suspensão, nos períodos de Março de 1974 a 11 de Junho de 1975 e de 11 de Dezembro de 1975 até à data, é ilegal, por nos termos do artigo 45.° do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, não ter sido determinada por despacho ministerial adequado.
13.3 — A não ter de facto cobertura legal a suspensão de funções e vencimentos imposta ao reclamante de Março de 1974 a 11 de Junho de 1975 e de Dezembro de 1975 até à data, deverá o mesmo ser devidamente indemnizado pelos prejuízos que lhe advieram da actuação ilegal da Administração, sendo-lhe pagos na totalidade os vencimentos correspondentes àqueles períodos.
14 — Por outro lado e quanto ao que é sugerido pela Direcção-Geral dos Hospitais no parecer em causa, não se me afigura possível instaurar agora processo disciplinar ao reclamante.
15 — Creio, com efeito, que o respectivo procedimento está prescrito:
a) De facto, o artigo 2.°, alínea a), do De-creto-Lei n.° 191-D/79, de 25 de Junho, estabelece que as normas incriminatórias e de qualificação do novo Estatuto Disciplinar por ele aprovado se aplicam mesmo aos processos pendentes, desde que favoráveis ao arguidp;
b) Ainda que se considerassem as normas relativas à prescrição como sendo de natureza processual, a solução seria a mesma, em face da alínea b) do mesmo artigo, que manda aplicá-las imediatamente;
c) Ora o artigo 4.°, n.° 1, do Estatuto dispõe que o procedimento disciplinar prescreve passados 3 anos sobre os factos a que respeita — os atribuídos ao queixoso ter-se-ão dado em datas, não precisadas, do ano de 1975;
d) E, mesmo que se tenha por suspenso o prazo de prescrição durante o inquérito, este estaria concluído em Outubro de 1975 — e mesmo o artigo 4.°, no seu n.° 4, dispõe que em tal caso o prazo
. de 3 anos se conta a partir da última diligência instrutória efectivada.
Nestes termos e por tudo o exposto, recomendo a V. Ex.°, no uso da competência que a lei me confere, que determine que:
d) Seja mandado regressar imediatamente ao exercício das funções no Hospital Distrital de Cascais o reclamante, por, face à lei, não ser actualmente passível de qualquer procedimento disciplinar, visto estar ultrapassado o prazo dentro do qual seria possível instaurá-lo;
b) Vindo a verificar-se que, com efeito, a suspensão de exercício e vencimentos imposta ao reclamante de Março de 1974 a 11 de Junho de 1975 e de Dezembro de 1975 até à data actual, não tem despacho ministerial que lhe dê cobertura legal, nos termos do Estatuto Disciplinar dos Funcionários Civis do Estado, que o
reclamante seja indemnizado pelos prejuízos que lhe advieram daquela ilegal actuação da Administração, eventualmente com o pagamento, na totalidade, dos vencimentos correspondentes àqueles períodos, e de que foi privado, sem apoio legal que o fundamentasse.
Solicito a V. Ex.a que me sejam comunicados o seguimento e a decisão que o assunto venha a ter, tomando a liberdade de chamar a atenção de V. Ex." para a urgência da sua definitiva resolução, visto que inequalificavelmente, e por culpa exclusiva da Administração, o mesmo se arrasta desde 1974.
4 — Como em 31 de Março de 1981 ainda se não obtivera, apesar de múltiplas insistências, qualquer resposta a esta recomendação, o Provedor de Justiça voltou a oficiar ao Secretário de Estado da Saúde, solicitando «os bons ofícios de V. Ex.a no sentido de se solucionar urgentemente este assunto, cujo adiamento sucessivo em nada depõe a favor da Administração e em especial dos serviços dessa Secretaria de Estado».
5 — Embora se continuasse, em sucessivos ofícios a insistir por uma resposta, só em 7 de Abril de 1982, a Direcção-Geral de Organização e Recursos Humanos informou que «o processo relativo ao médico mencionado foi remetido ao Serviço do Contencioso do Ministério dos Assuntos Sociais, de acordo com o despacho de 4 de Fevereiro de 1982, do Sr. Secretário de Estado da Saúde».
6 — Apesar de novos pedidos de informação acerca do seguimento do assunto, feitos em vários ofícios, dirigidos, quer à Direcção-Geral de Organização e Recursos Humanos, quer directamente ao Secretário de Estado da Saúde. Só em 14 de Março de 1984 a Secretaria-Geral do Ministério da Saúde informou ter enfim sido determinada a resolução do caso, a nível ministerial, nos seguintes termos:
Sobre o assunto em epígrafe elaboraram estes Serviços de Contencioso uma informação com a qual S. Ex.° o Ministro da Saúde se dignou concordar por despacho de 10 de Fevereiro de 1984.
A seguir se transcrevem as propostas contidas na referida informação:
a) Que V. Ex.;> determine o reinício de funções do reclamante, no Hospital Distrital;
b) Que, para esse efeito, o presente processo transite para o Departamento de Recursos Humanos, o qual, em colaboração com o Hospital Distrital, estudará e proporá superiormente as medidas necessárias à execução da decisão anterior, designadamente preparando uma portaria de alteração ao quadro de pessoal médico do Hospital Distrital, se tal se revelar necessário;
c) Que, posteriormente, seja calculado pelos serviços competentes (Hospital Distrital e Departamento de Gestão Financeira) o montante das remunerações a pagar ao reclamante, respeitantes ao período de tempo compreendido entre a data de cessação do prazo de prorrogação da sus-
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pensão preventiva a que aquele médico esteve sujeito e o seu efectivo reinício de funções no Hospital Distrital de Cascais;
d) Que, para a realização do previsto em b) e c), V. Ex.a determine um prazo limitado, o qual se propõe não seja superior a 60 dias para cada uma das tarefas.
Em execução do despacho de S. Ex.a o Ministro e conforme o acima proposto, o processo é enviado nesta data ao Departamento de Recursos Humanos.
7 — Assim se encerrou este processo, protótipo de um tipo de situações que não deveriam poder ocorrer num Estado de Direito, já que o queixoso esteve ilegalmente suspenso de exercício de funções e de remunerações por cerca de 9 (!) anos.
Isto, claro, independentemente do apuramento de eventuais responsabilidades disciplinares — que, afinal, no caso concreto, acabou por não ocorrer atempadamente.
Processo n.° 83/R-919-B-4
Sumário — Trabalho. Função pública. Tempo de serviço.
Objecto — Recusa para a integração no ensino oficial, da contagem de tempo de serviço docente prestado no ensino particular.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A reclamante ensinara Religião e Moral, numa escola particular, de 1977 a 1982.
Quando o estabelecimento de ensino particular em questão deu lugar a uma escola de ensino oficial, o pessoal docente que aí prestava serviço foi integrado no quadro deste novo estabelecimento, mantendo-se na docência, desde que possuísse habilitações adequadas, ou passando ao sector administrativo, no caso contrário.
A queixosa pediu a intervenção do Provedor porque vira recusada a sua integração como professora, apesar de a ter requerido ao abrigo do Decreto-Lei n.° 469/82, de 14 de Dezembro.
2 — Ouvida a Direcção-Geral de Pessoal, esta veio sustentar a sua anterior decisão, por entender que o mencionado diploma, ao estipular que a nova habilitação fixada, para os professores de Religião e Moral, no Decreto-Lei n.° 519-E2/79, de 29 de Dezembro (curso complementar do ensino secundário, ou equivalente), não seria exigível aos que leccionaram essa disciplina em alguns dos anos de 1976-1977 a 1981-1982, era apenas aplicável aos que o houvessem feito no âmbito do ensino oficial.
3 — Não se afigurou aceitável esta posição.
Por um lado, o Decreto-Lei n.° 469/82 reportava-se apenas aos «agentes de ensino que leccionaram a disciplina de Religião e Moral em qualquer dos anos [-..], etc», sem consignar a distinção sustentada pela Direcção-Geral.
Por outro, a interpretação por esta preconizada gerava uma desigualdade de tratamento, desigualdade essa que surgia contrária a todo o sistema do recente Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo, que procura consagrar a correlação entre a docência no sector privado e no público.
4 — Exposta a questão nestes termos ao Secretário de Estado do Ensino Básico e Secundário, ele veio a concordar com a posição do Provedor, mediante despacho de 29 de Maio de 1984, no qual deixou todavia expresso (aliás por força do n.° 2 do artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 469/82) que a queixosa, mandada integrar como professora de Religião e Moral, deveria, para nesta situação se manter, adquirir no prazo de 4 anos a habilitação do curso complementar do ensino secundário.
Processo n.° 83/IP-78-8-4
Sumário — Trabalho. Função pública. Tempo de serviço.
Objecto — Contagem, para efeitos de progressão na carreira, do tempo de serviço prestado em quadros da administração central e local.
Decisão — Recomendação legislativa acatada. Síntese:
1 — O Provedor recebeu várias queixas de funcionários que, tendo transitado dos quadros da administração local para os da administração central, ou vice-versa, não viram computado, para efeitos de progressão na carreira, o tempo de serviço prestado no quadro diverso daquele em que se encontravam.
2 — Ao apreciarem-se esses casos, verificou-se que a situação de que os interessados se queixavam derivava do facto de o Tribunal de Contas recusar sistematicamente o seu visto a provimentos para os quais a Administração invocava, como pressuposto, períodos de serviço constituídos pela soma do tempo prestado em quadros da administração central e da local.
3 — Embora não parecesse indiscutível esta doutrina do Tribunal de Contas quanto à interpretação do sistema de carreiras constante do Decreto-Lei n.° 191—C/ 79, de 25 de Junho, a verdade é que o Provedor não podia discutir as suas decisões, enquanto provindas de um órgão judicial.
4 — Mas afigurou-se que este entendimento jurisprudencial não se coadunava com o espírito geral do sistema legislativo referente ao funcionalismo.
E isto atendendo-se, designadamente, ao regime de mobilidade de pessoal entretanto criado —e que parece corresponder às exigências de uma adequada gestão de pessoal— no âmbito do qual se previa expressamente, por exemplo, a permuta entre funcionários da administração central e da local (Decreto-Lei n.° 165/82, artigo 8.°, e Decreto Regulamentar n.° 68/80, artigo 53.°).
Acresce que este último diploma permite que o pessoal do Ministério da Administração Interna se candidate a concursos para o quadro geral administrativo das autarquias (artigo 58.° e estabelece como uma das preferências nos concursos para pessoal autárquico o maior tempo de trabalho prestado em «ser-
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viço público», sem distinção [artigo 25.°, n.° 1, alínea d)].
5 — Por isso o Provedor recomendou, aos Ministros de Estado e dos Assuntos Parlamentares e da Administração Interna, em 8 de Agosto de 1983, a emanação de diploma que expressamente permitisse o cômputo global dos períodos de tempo de serviço em causa.
6 — E, com efeito, o Decreto Regulamentar n.° 82/ 83, de 30 de Novembro, ao definir princípios gerais para a contagem de tempo de serviço, veio admitir (artigo 4.°), para efeitos de progressão na carreira, a consideração de períodos de trabalho prestados em quadros diferentes, desde que se verifique identidade de conteúdo funcional nos cargos em questão e não tenha havido «interrupção de funções com quebra de vínculo».
Processo n.° 82/R-1291-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Transferência.
Objecto — Transferência com desvio de poder e sem anuência do funcionário.
Decisão — Reclamação procedente. Recomendação acatada.
Síntese:
1 — Um engenheiro da Direcção-Geral dos Recursos e Aproveitamentos Hidráulicos apresentou reclamação porque, sem audição prévia e por motivos que só em processo disciplinar deveriam ser apreciados, ter sido transferido, do seu local de trabalho no Fundão, onde exercia funções de engenheiro residente da Brigada de Fiscalização da Cova da Beira, para a sede do departamento, em Lisboa.
Alegava que durante cerca de 5 anos exercera, em acumulação por conveniência de serviço as funções de engenheiro residente em relação a mais outras 5 obras da responsabilidade da divisão de obras, a que pertencia.
O queixoso atribuíra a transferência ao facto de, em 13 de Abril de 1982, ter declarado, por escrito, aos seus superiores, que declinava «qualquer responsabilidade técnica no desenrolar dos trabalhos da barragem das Corgas (uma das obras que fiscalizava, em acumulação)».
E isto pelo facto de considerai impossível garantir uma eficaz fiscalização da sua parte, quer por falta de pessoal técnico e de fiscalização que com ele pudesse colaborar nessa tarefa, quer em virtude da distância entre essa obra e a sua residência e sede profissional, obrigando-o a longas e penosas deslocações.
Só teria, aliás, apresentado aquela declaração depois de, sem resultado, haver exposto superiormente este problema à hierarquia, tanto por escrito como pessoalmente.
2 — Ouvida sobre o assunto, a Direcção-Geral respondeu que considerava preenchido o requisito da audição do funcionário pelo facto daquela sua citada declaração, que em seu entender significaria que ele não desejava continuar a desempenhar as funções de responsável pela obra.
A transferência teria, assim, tido por fundamento, não só essa declaração do interessado, como a grande
falta de pessoal existente na sede da Direcção-Geral. E fora decidida com base no artigo 21.° do Decreto--Lei n.° 383/77, de 10 de Setembro.
3 — Não pareceu sustentável a posição da Direcção--Geral:
a) Por um lado, o n.° 4 do artigo 21.° do Decreto--Lei n.° 383/77, permitindo distribuir o pessoal do departamento em questão por mero despacho, e sem mais formalidades, não contemplava uma transferência propriamente dita.
E, mesmo que assim fosse, sempre teria, à data da decisão em causa, sido afastado pelo regime do Decreto-Lei n.° 140/81, de 30 de Maio, que exige a anuência do funcionário para a transferência que implique mudança de residência;
6) Ora a declaração que o reclamante fizera não podia ter-se por equivalente à concordância com uma tal transferência.
Para que uma declaração possa ter tal sentido, ela terá necessariamente de ser proferida sobre a concreta proposta ou sugestão de transferência — inexistente, no caso concreto.
E, aliás, o funcionário em questão declinara a sua responsabilidade, não quanto à sua função especifica, mas em relação a uma das obras que fiscalizava em regime de acumulação, determinada pelos serviços;
c) Por outro lado, indiciava-se mesmo desvio de poder, na medida em que a decisão de transferência, de 11 de Abril de 1983 fora tomada sobre uma Informação dos serviços onde se Ha, designadamente, que:
Se não houver outras razões —que as há e em número razoável— o conteúdo e os termos da presente informação do engenheiro [...] levam esta divisão a considerar dispensável a sua colaboração.
4 — Fundado nestas razões o Provedor recomendou a revogação da transferência do queixoso — ou, se se considerasse que a sua actuação envolvera aspectos antidisciplinares, que lhe fosse então instaurado o competente processo, no âmbito do qual se pudesse defender.
5 — A Direcção-Geral, em resposta, referiu que o reclarante se encontrava então na situação de licença ilimitada, a seu pedido.
6 — O Provedor reiterou a sua anterior posição, realçando que o facto de o queixoso estar em licença ilimitada não devia obstar à reapreciação da decisão de que fora alvo.
7 — A Direcção-Geral ripostou, então, que o interessado recorrera contenciosamente para o Supremo Tribunal Administrativo, pelo que aguardaria o veredicto deste.
8 — O Provedor de novo insistiu para que fosse tida em conta a sua recomendação, salientando que a tanto não obstava o facto de pender recurso contencioso.
Na verdade, estando em causa um acto não constitutivo de direitos, que considerava claramente ilegal, o aguardar-se pela decisão do Supremo iria agravar desnecessariamente o interessado, em demora e despesas.
9 — O Secretário de Estado das Obras Públicas revogou, enfim, em 20 de Junho de 1984, a contestada
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transferência, sobre parecer da Direcção-Geral em que esta, apesar de continuar a afirmar-se convicta do acerto da posição que tomara, sugeriu a aceitação da recomendação do Provedor, tendo em atenção a «muita consideração» que este lhe merecia.
Processo n.° 83/R-355-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Transferência.
Objecto — Não deferimento de um pedido de transferência, apesar de considerado viável pelos respectivos serviços.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — Uma funcionária da carreira administrativa apresentara reclamação, em 23 de Fevereiro de 1983, por não ter sido ainda decidido o pedido de transferência que, em 3 de Agosto do ano anterior fizera, com vista a transitar do Centro de Saúde de Vila Pouca de Aguiar para os Serviços Médico-Sociais do Porto, visto ter necessidade, de vir residir para esta cidade, para poder acompanhar o tratamento do marido, gravemente doente.
2 — Os motivos invocados para a mudança de local de trabalho, pareciam de atender, e os serviços em causa, consideravam a transferência possível por haver vaga na respectiva categoria, e até aconselhável, por se verificar falta de pessoal no departamento para a qual aquela fora requerida.
3 — Não se vislumbrando, assim, razões para a denegação ou sequer demora na decisão da transferência em causa, expôs-se este ponto de vista ao Departamento de Recursos Humanos do Ministério da Saúde, entidade competente para a promover.
4 — Depois de uma insistência, obteve-se informação de que a pretensão da queixosa fora enfim deferida, por despacho de 3 de Fevereiro de 1984.
Procosso n.° 83/R-1464-A-2
Sumário — Trabalho. Função pública. Transferência.
Objecto — Revogação de transferência já autorizada, por posterior verificação de não existência de vaga.
Decisão — Reclamação procedente. Reparo.
Síntese:
1 — Uma contínua de 2.° classe do quadro da escola primária de Serpins reclamou ao Provedor de Justiça alegando que:
Ingressou na função pública como servente eventual da Escola Preparatória da Lousã-,
Foi exonerada, a seu pedido, em 1973, mas requerera, em 1976, o seu reingresso na mesma Escola;
Embora a sua pretensão tivesse sido indeferida, a Direcção-Geral de Pessoal propôs que à primeira admissão que se viesse a fazer contemplasse a reclamante;
.Não conseguindo o seu ingresso na pretendida Escola, a reclamante foi admitida como servente do quadro da escola primária de Serpins, transitando para a categoria de contínua de 2." classe;
Continuando, no entanto, interessada na sua colocação na Escola Preparatória da Lousã, a funcionária requereu, em 22 de Janeiro de 1982, a sua transferência para a mesma;
Tendo sido comunicado que existia vaga para tanto, o conselho directivo da Escola Preparatória da reclamante enviou ao director-geral de Pessoal do Ministério da Educação o diploma de provimento, acompanhado da necessária documentação;
Reunidos assim todos os requisitos legais exigidos, a reclamante ficara a aguardar, com natural confiança, a publicação da sua transferência;
Porém, ao fim de mais de 1 ano de espera acabou por ser informada pela Direcção-Geral de Pessoal que o seu despacho de transferência iria ser anulado.
2 — Solicitados esclarecimentos à Direcção-Geral de Pessoal esta comunicou que, ao contrário do que fora inicialmente comunicado, não existia afinal a vaga em questão, na Escola Preparatória da Lousã.
Ainda tentara proceder à transferência para a escola secundária da mesma localidade, mas a funcionária só pretendia colocação naquela.
3 — Face aos esclarecimentos obtidos, e considerando, por um lado, que a transferência não constitui objecto de um direito, dependendo sempre de vaga e de conveniência de serviço e, por outro, que, não havendo vaga, não poderá legalmente operar-se a transferência, foi mandado arquivar o processo.
O Provedor formulou, no entanto, ao director-geral de Pessoal, o reparo de que não se afigurava correcto o procedimento havido, iniciando-se o processo de transferência da queixosa, e criando-se-lhe consequentemente legítimas expectativas, sem se ter a certeza da existência de estar vago o lugar para onde esta se efectuasse.
No mesmo ofício recomendou-se ainda ao director--geral de Pessoal que, quando viesse a ocorrer qualquer vaga de contínua de 2.a classe na Escola Preparatória pretendida pela reclamante, se deveria concretizar a transferência desta.
Transportes e comunicações
Processo n.° 81/R-480-B-4
Sumário — Transportes e comunicações. Circulação ferroviária. Passagem de nível.
Objecto — Encerramento de passagem de nível aos fins de semana.
Decisão — Reclamação procedente. Situação regularizada.
Síntese:
1 — A Junta de Freguesia de Souselas veio, em representação da população do lugar de Ribeiro, pôr ao Provedor o problema a estes criado pelo facto de c
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conselho de gerência da CP ter determinado o encerramento de uma passagem de nível no período compreendido entre as 20 horas de sexta-feira e as 8 horas de segunda-feira seguinte.
Tal situação seria extremamente lesiva para os habitantes circunvizinhos da linha férrea, que deixavam de ter acesso às suas residências com os respectivos veículos, além de resultar também comprometida a passagem, nesse período, de viaturas de bombeiros eventualmente chamados a combater incêndios deflagrados na zona.
Além disso, a situação prejudicaria a realização de trabalhos agrícolas, já que havia proprietários residentes numa das margens da via férrea e cujas propriedades se situavam exactamente na margem oposta. E a Junta de Freguesia chamava a atenção para o facto de muitos destes habitantes, tendo outras profissões, só se ocuparem do amanho das suas terras precisamente durante os fins-de-semana.
2 — Pareceram relevantes as razões expostas pela Junta de Freguesia. E o Provedor entendeu que, apesar de a questão lhe ter sido apresentada por uma entidade pública — aliás no interesse de um grupo de particulares— isso não o impedia de intervir no caso, usando da sua faculdade de iniciativa própria.
3 — Suscitadas à CP, por este Serviço, as desvantagens decorrentes da situação em causa, a referida empresa pública decidiu rever a situação.
Assim, procedeu à reclassificação da passagem de nível em questão, que passou a estar aberta também nos fins-de-semana, embora (por razões financeiras) sem cancela nem guarda.
Processo n.° B3/1P-113-B-4
Sumário — Transportes e comunicações. Correios. Responsabilidade civil.
Objecto — Desactualização do regime de limites de indemnização por perda, deterioração ou extravio de correspondência e de encomendas postais.
Decisão — Publicação de nova legislação.
Síntese:
1 — Um artigo publicado num vespertino de Lisboa, em 14 de Julho de 1983, chamava a atenção para a desactualização das indemnizações em vigor para o caso de perda, deterioração ou extravio de correspondência e de encomendas postais, qualificando-as de «ridículas».
2 — O Provedor decidiu abrir sobre o assunto um processo de sua iniciativa.
Reconheceu-se, por um lado, que o sistema em vigor, de estabelecimento de limites para as referidas indemnizações, é o habitualmente praticado, nos vários países — e como excepção ao regime geral da responsabilidade civil —, designadamente em função da dificuldade de prova que sempre existe acerca do real valor do conteúdo de correspondência ou de encomendas postais que não haja sido previamente declarado.
Mas verificou-se também que os .quantitativos em vigor, fixados em 1978 (Despacho Normativo n.° 86/ 78, de 31 de Março) não só se apresentavam excessivamente rígidos, como surgiam claramente desactualizados.
Estava nomeadamente em causa o montante de 450$, fixado naquele diploma como máximo para a indemnização em caso de perda de correspondência ou de encomenda postal de valor não declarado.
E isto, até, face ao gradual aumento entretanto sofrido, pelas tarifas postais, cuja taxa de registo deve influenciar o montante da indemnização.
3 — O Provedor decidiu, pois, expor estas considerações aos Correios e Telecomunicações de Portugal, sugerindo, em particular:
a) A divulgação junto do público do sistema de envio de encomendas e correspondência com «valor declarado» — sistema que permite uma adequada correspondência, a este, do montante das indemnizações a pagar;
b) A alteração do regime de determinação do quantitativo das indemnizações por perda, deterioração ou extravio de correspondência ou encomendas postais de valor não declarado;
c) Em qualquer caso, a actualização do limite máximo em vigor para tais indemnizações, tendo em conta a evolução operada no montante das tarifas postais.
4 — Os Correios e Telecomunicações de Portugal responderam que a sugestão de divulgação do sistema de envio de correspondência e encomendas com «valor declarado» estava a ser «devidamente ponderada».
E que ia publicar diploma revendo o sistema de indemnização aplicável na falta da referida declaração de valor.
5 — Com efeito, em 26 de Maio de 1984 foi publicada a Portaria n.° 320/84 que, embora ainda sem consagrar valores ao nível dos praticados internacionalmente, veio estabelecer um regime na linha do preconizado pelo Provedor.
Assim, e para além da afirmação da regra de que a reparação em causa deve, em princípio, corresponder «à importância real da perda, espoliação ou avaria», esse diploma estipulou um sistema de limites máximos de indemnização calculados em função da taxa de registo paga, e, também, no caso das encomendas postais, do peso destas.
Processo n.° 83/IP-133-B-4
Sumário — Transportes e comunicações. Transportes colectivos. Bilhetes.
Objecto — Perda de validade de bilhetes pré-compra-dos para transportes colectivos.
Decisão — Recomendação legislativa. Síntese:
1 — Alguns artigos publicados na imprensa deram conta de dúvidas e problemas surgidos com a alteração de tarifas de transportes colectivos verificados em 1983.
Tratava-se, designadamente, do facto de os bilhetes pré-comprados antes desse aumento não manterem a sua validade, tendo de ser trocados, dentro de certo prazo, por bilhetes já sujeitos aos novos preços — isto, por força da Portaria n.° 852/83, de 24 de Agosto.
2 — Posta a questão aos Ministérios do Comércio e Turismo e do Equipamento Social, por parecer que
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deste modo se estava a desrespeitar o estipulado nos contratos de transporte titulados por tais bilhetes, o primeiro destes departamentos veio contestar este entendimento.
Sustentou, com efeito, que a citada disposição de troca de bilhetes pré-comprados encontrava apoio no n.° 3.° da Portaria n.° 1339/82, de 31 de Dezembro (em vigor no período em que haviam sido adquiridos), segundo o qual o respectivo prazo de validade era igual ao da vigência das tarifas por esse mesmo diploma estabelecidas, sem prejuízo da sua futura troca, por ocasião de revisão tarifária.
3 — O Provedor não pôde concordar com esta opi-nião.tendo por isso formulado, em 23 de Maio de 1984, ao Ministério do Equipamento Social, com vista aos futuros diplomas reguladores de novas tarifas de transportes colectivos, a seguinte recomendação:
1 — Dispõe o n.° 3.° da Portaria n.° 852/83, de 24 de Agosto , que o valor dos bilhetes pré--comprados adquiridos na vigência da Portaria n.° 1339/82, de 31 de Dezembro, poderá ser descontado na aquisição de bilhetes pré-comprados emitidos de acordo com as novas tarifas no prazo de 45 dias, contados a partir de 1 de Setembro de 1983.
2 — O contrato de transporte encontrava-se expressamente previsto e regulamentado no Código de Seabra.
Ao mesmo não se refere, porém, o Código Civil de 1966. E, contudo, uma modalidade do contrato de prestação de serviços, que o artigo 1156.° define como aquele em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição.
«Pelo contrato de transporte obriga-se uma das partes a transportar pessoas ou coisas por terra, por água ou pelo mar» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. n, p. 465).
Nesta figura negocial há que destacar os contratos relativos aos transportes públicos ou colectivos — «todos aqueles que não sejam realizados em veículo de propriedade singular ou colectiva, da sua exclusiva conta e sem direito a qualquer remuneração directa ou indirecta» (Acórdão da Relação de Lisboa, de 14 de Dezembro de 1955, Dr. Albano Cunha, Jurisprudência das Relações, n.° 5, p. 994).
3 — Estes contratos têm um regime essencialmente de direito privado, com certos aspectos, contudo, submetidos ao direito público.
E assim que aos mesmos, em tudo o que não implique uma intervenção autoritária da Administração — designadamente no processo de fixação de tarifas —, se aplicam as regras de direito privado respeitantes ao consentimento, à causa, à execução, à responsabilidade contratual, etc.
4 — Por obediência ao princípio da legalidade, a Administração intervirá sempre no âmbito das disposições legais que lhe atribuam poderes. Não existe qualquer espaço fora da lei em que a Administração possa actuar como um poder jurídico livre. Ê este o entendimento que transparece do n.° 2 do artigo 266.° do diploma fundamental:
Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à Constituição e à lei [...].
5 — A Portaria n.° 852/83 prevê que a compra do título de transporte se não faça obrigatoriamente na ocasião em que o transportador forneça o serviço.
E a modalidade dos bilhetes pré-comprados ou de cadernetas.
Com a respectiva aquisição celebram-se diversos contratos de transporte .tornados logo perfeitos— ficam definidos os direitos e obrigações deles emergentes.
Porém, o exercício do direito ao transporte não fica subordinado a qualquer prazo (o que não acontece, por exemplo, com os contratos realizados pelos Caminhos de Ferro Portugueses), podendo o utente, quando o entender, exigir ao transportador o cumprimento da obrigação que surgiu na esfera jurídica deste aquando da celebração do contrato — com a venda das cadernetas.
6 — Veio, porém, a disposição dó n.° 3.° da portaria impor, em dada altura, a extinção de contratos de transporte validamente celebrados.
Ora, a não ser que normas contidas em lei ou decreto-lei atribuam esse poder à Administração, o n.° 3." da Portaria n.° 852/83 será ilegal.
O Decreto-Lei n.° 16/82, de 23 de Janeiro, estabelece a intervenção tutelar do Governo em contratos de transporte de passageiros e mercadorias.
Mas nenhum artigo deste diploma ou de qualquer outro com a mesma força lhe atribui o poder de interferir na duração dos contratos de transporte.
Assim, o n.° 3.° da Portaria n.° 852/83, de 24 de Agosto, apresenta-se como ilegal e, consequentemente, nulo ou inexistente (cf. Ernst Forsthoff, Traité de droit administratif allemand, p. 226):
a) Por respeitar a matéria não incluída na esfera de atribuição da Administração relativamente a contratos de transporte público.
Estar-se-á perante um caso de usurpação de funções não administrativas pela Administração;
b) Por ofender o artigo 12.° do Código Civil.
Ao contender com direitos adquiridos resultantes de contrato é, hoc sensu, retroactivo.
E a não ser que lei ou decreto-lei o contrarie, os efeitos dos contratos são regulados pela lei em vigor ao tempo da sua celebração e não por norma ou acto administrativo posteriores;
c) Por violar contratos em vigor.
A este respeito escreveu Leon Duguit, Les transjormations du droit public, p. 163, que o contrato dá origem a uma regra de direito que a Administração deve respeitar.
7 — E nem se venha invocar o n.° 3.° da Portaria n." 1339/82, de 31 de Dezembro, que estabeleceu que o período de validade dos bilhetes pré-comprados era igual ao da vigência das tarifas estabelecidas pela portaria, sem prejuízo de sua
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troca em condições a definir no diploma legal que operasse nova revisão tarifária, o que veio a suceder com a Portaria n.° 852/83, de 24 de Agosto.
É verdade que essa norma pretendeu actuar sobre a duração dos contratos de transporte surgidos no período de validade do diploma de que fazia parte.
Só que tal norma, por estar incluída em diploma regulamentar, e não existir, como se viu, qualquer disposição constante de lei ou decreto--lei que atribua ao Governo o poder de interferir na duração dos contratos de transporte colectivo, é nula ou inexistente e, por conseguinte, insusceptível de produzir quaisquer efeitos jurídicos sobre os contratos que foram sendo validamente celebrados.
8 — Pelo exposto, entendo dever dirigir recomendação a V. Ex.°, no sentido de que, em diplomas regulamentares que venham a estabelecer novas tarifas para transportes públicos de passageiros, não sejam inseridas disposições limitando o período de validade dos bilhetes anteriormente adquiridos.
4 — Neste próprio dia 23 de Maio de 1984 foi publicada a Portaria n.° 309-E/84 que, estabelecendo novo aumento das tarifas em causa, não teve em conta a mencionada recomendação — o que se compreende, pelo facto de esta última não ter podido ser recebida antes da emanação daquela.
5 — O Provedor espera que em futuros diplomas deste tipo a sua recomendação seja considerada.
CAPÍTULO VI
Sequência de processos terminados em anos anteriores
A) Legislação
1 — Regime de pessoal do Instituto de António Aure Ho da Costa Ferreira
ProcBsso n.° 81/IP-45-A-3
Em 17 de Janeiro de 1984 foi finalmente publicado o Decreto-Lei n.° 4/84, estabelecendo novo regime de pessoal para o Instituto de António Aurélio da Costa Ferreira (estabelecimento de formação de professores de ensino especial), diploma cuja urgente emanação o Provedor recomendara em 1980 (v. relatório do Provedor de Justiça de 1980, p. 188).
2— Designação de representantes doo trabalhadores como membros dos conselhos de adrntnMracèo das emproe—
públicas
Processo n.° 81/IP-45-A-3
O Decreto-Lei n.° 29/84, de 20 de Janeiro, conferindo nova redacção ao artigo 8.° do Estatuto das Empresas Públicas, viabilizou e regulou a participação
dos representantes dos trabalhadores nos conselhos de administração dessas entidades.
Assim ficou satisfeita a recomendação do Provedor (relatório de 1981, p. 43) no sentido de, se necessário pela via legislativa, se tornar efectiva tal participação, prevista na Lei n.° 46/79, de 12 de Setembro.
3 — Suspensão da liquidação de contribuição predial na pen-
dência de apreciação de pedido de isenção
ProcBsso n.° 807R-95-A-2
O Decreto-Lei n.° 73/84, de 2 de Março, veio introduzir um artigo 224.°-A no Código da Contribuição Predial, o qual passa a permitir que, ao fazer-se um pedido de isenção deste tributo, se requeira concomitantemente a suspensão da respectiva liquidação até decisão final sobre aquele.
Este regime vem ao encontro da posição sustentada pelo Provedor sobre a matéria (relatório de 1981, p. 70).
4 — Tributação dos cônjuges em imposto complementar
Processo n.° 78/R-1118-A-3
Um dos aspectos em que o Decreto-Lei n.° 192/84, de 11 de Junho, modificou o regime do Código do Imposto Complementar foi o do relativo desagravamento da tributação dos cônjuges casados, através do estabelecimento para eles de taxas e escalões de rendimentos diversos dos aplicados aos contribuintes solteiros.
O Provedor vinha insistindo desde 1977 pela reapreciação da situação tributária dos cônjuges face ao imposto complementar, em seu entender injusta — senão mesmo inconstitucional—, quando confrontada com a dos contribuintes não casados (relatório de 1977, p. 75, e de 1982, p. 105).
5 — Regime dos actos das Instituições públicas de Segurança
Social
Processo n.° 81/1P-41-B-1
A Lei n.° 28/84, de 14 de Agosto, veio, nos seus artigos 39.° e seguintes, ao definir as bases legais da Segurança Social, definir o regime aplicável aos actos das instituições públicas nela integradas.
Fê-lo, aliás, nos termos que haviam sido recomendados pelo Provedor — ou seja, aplicando a tais actos o regime geral dos actos da Administração, e assim facultando aos particulares, designadamente, os meios de garantia e defesa genericamente vigentes para os actos definitivos e executórios:
E —tal como o Provedor também entendera adequado— aquela lei estabeleceu também, no seu artigo 22.°, uma diferença de regimes acerca da inscrição ilegal em instituições de Segurança Social, consoante a mesma se traduza na violação de normas materiais, por um lado, ou processuais ou formais, por outro: no primeiro caso, tal acto é cominado com a sanção de nulidades, enquanto que no segundo ele será, nos termos gerais, meramente anulável.
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B) Administração
1 — Desconto, na antiguidade dos funcionários, de faltas por doença e do período de licença para férias
Processo n.° 81/IP-60-A-2
O Provedor defendera, nesta matéria, posição divergente da que era normalmente adoptada pela Administração (relatório de 1981, p. 51).
A interpretação preconizada pelo Provedor veio a ser assumida também pelo Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, em parecer homologado pelo Ministro da Justiça (relatório de 1983, cap. vi-A-1).
Tendo-se gerado assim uma disparidade de actuação no seio da Administração Pública, pois o despacho do referido Ministro só vinculava os serviços do seu departamento, o Provedor recomendara ao Primeiro-Mi-nistro a homologação da doutrina do parecer da Procuradoria-Geral da República, por forma a torná-la obrigatória para todos os serviços e organismos dependentes do Governo.
Assim veio de facto a suceder, por força de despacho do Primeiro-Ministro de 16 de Fevereiro de 1984 (Diário da República, 2.a série, n.° 51, de 29 desse mês).
2 — Recusa de posse e exoneração de chefe de divisão da Direcção-Geral das Pescas
Processo n.° 81/R-2299
Em 19 de Novembro de 1984, o queixoso no processo em epígrafe e o Ministério do Mar celebraram acordo fixando em 1900 contos o valor da indemnização a pagar-lhe em consequência da anulação, pelo Supremo Tribunal Administrativo, da ilegal exoneração do cargo de chefe de divisão cuja tomada de posse antes lhe havia sido recusada.
Esta reparação —em cujo montante foram tidas em conta não só as diferenças de vencimentos não recebidas, como o respectivo reflexo na pensão de aposentação, as despesas do processo contencioso e os prejuízos morais e profissionais causados ao funcionário — bem poderia ter sido evitada se o departamento em questão houvesse acatado a recomendação que o Provedor fizera sobre o caso, e cuja doutrina veio a ser corroborada pelo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (relatório de 1983, cap. v, rubrica «Trabalho. Função pública. Posse»).
CAPÍTULO VII
Visitas a outros centros urbanos
Consciente de que o contacto directo e pessoal com os cidadãos bem como com as entidades que dirigem os departamentos, em que a sua actividade mais frequentemente interfere, reveste extraordinária importância e no pressuposto de que tal inegavelmente suscita e facilita a necessária e desejada colaboração, o Provedor de Justiça, acompanhado de um coordenador e de um assessor, visitou, nos dias 4, 5, 6 e 7 de Junho de 1984, as cidades de Portalegre, Évora e Beja.
Com efeito, tem-se verificado, estatisticamente, que exceptuando os distritos de Lisboa, Porto, Coimbra, Braga e Setúbal, os demais distritos têm apresentado um índice reduzido de queixas ao Provedor de Jus* tiça.
Daí que no prosseguimento da orientação que vem sendo seguida, o Provedor de Justiça tenha continuado a fazer a divulgação da instituição através de deslocações aos distritos de onde o afluxo de reclamações tem sido menor.
No ano de 1984 coube a vez aos distritos do Alentejo.
Não deixará, no entanto, de se fazer notar que o baixo número de queixas desses distritos bem como dos de Trás-os-Montes se explica também, em grande parte, não tanto por desconhecimento da existência do Serviço do Provedor de Justiça, mas pela própria idiossincrasia das próprias populações de índole mais pacífica e porventura conformada com o estilo de vida, sem dúvida, menos conflituoso, menos agitado que é característico nas zonas rurais.
Com tais deslocações, de uma maneira geral, foi possível o atendimento directo de reclamantes pelo Provedor, audiências com governadores civis e presidentes das câmaras e, ainda, em visitas a instituições que prosseguem fins de natureza social.
I) Visita à cidade de Portalegre (dias 4 e 5 de Junho de 1984)
a) Atendimento de reclamantes
Tendo a imprensa local anunciado a visita do Provedor de Justiça a esta cidade, encontravam-se inscritos para apresentarem pessoalmente os seus casos 6 reclamantes, os quais foram recebidos numa sala do Tribunal Judicial, cedida para o efeito pelo M.mo Juiz de Direito da Comarca.
Posteriormente, ainda foram atendidos mais 2 reclamantes não inscritos previamente.
b) Audiência com o Presidente da Câmara
Acima de tudo procurou-se nesta audiência colher informações, ainda que sumárias, sobre eventuais carências verificadas a nível social bem como identificar os organismos mais representativos sob o ponto de vista da cobertura de tais carências.
O Presidente da Câmara limitou-se a fazer uma breve descrição dos problemas locais.
c) Audiência com o Governador Civil
Deslocou-se, ainda, o Provedor de Justiça ao Governo Civil onde se abordaram, igualmente, alguns problemas de maior relevância para o distrito.
d) Visita ao Hospital Distrital
Funciona desde Dezembro de 1974 e encontra-se instalado em excelente edifício construído para o efeito, composto de 7 pisos, o último dos quais se encontra fechado para obras.
Presta assistência a cerca de 145 000 habitantes, desde Ponte de Sor e Montargil até Elvas, cidade que
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já possui um hospital e uma maternidade que, ainda, não se encontra a funcionar. Provavelmente, Ponte de Sor passará a ficar abrangida pelo hospital de Abrantes.
De salientar que este hospital foi criado para abranger uma área maior, tendo sido posteriormente criados os hospitais de Elvas e Abrantes.
Especialidades existentes:
Medicina interna;
Clínica geral;
Obstetrícia;
Pediatria;
Anestesia;
Cardiologia;
Otorrinolaringologia;
Oftalmologia;
Neurologia, e
Serviço de sangue.
No antigo sanatório, situado a 2 km de distância, funcionam os serviços de neurologia e de medicina interna, bem como os Serviços de Administração Regional de Saúde, prevendo-se que nas mesmas instalações venha a funcionar um centro de hemodiálise.
É gerido por um conselho, compôs'.:) por 1 director, 1 administrador e 1 enfermeiro.
Os principais cuidados urgentes são prestados no campo da pediatria e, também, relativamente a acidentes de trabalho.
Pessoal médico e de enfermagem:
Médicos. — Das 52 vagas do quadro apenas se encontram preenchidas 25, sendo necessário conseguir o preenchimento completo do quadro médico. De notar que existem, unicamente, dois anestesistas do quadro, sendo um deles já idoso e, para as urgências um único médico, o que é manifestamente insuficiente.
Enfermagem. — Há nesta cidade uma escola de enfermagem que não consegue responder às necessidades do distrito, pelo que o hospital carece de pessoal de enfermagem, isto não obstante alguns lugares se encontrarem preenchidos por profissionais de outras escolas. Está, porém, previsto que até Dezembro do corrente ano se verifique um certo alargamento do respectivo quadro.
Pediatria. — Neste sector há a salientar:
Trabalham nele 3 pediatras;
Relativamente a internados menores de 10 anos não se verificam condições para que estes possam ser acompanhados pelas mães, dado que não se previa que tal prática viesse a ser permitida;
Também não há educadora infantil, como seria indispensável, sendo certo que se encontram internadas 18 crianças;
Nota-se falta de material, designadamente de incubadoras.
Obstetrícia. — A partir de 1982 os doentes deixaram de ser distribuídos por valências, ficando indiferenciados.
No ano de 1983 tiveram lugar 865 partos, sendo 407 de primeiros filhos e 458 de segundos.
São ministrados cursos de planeamento familiar.
O número de abortos tem vindo a decrescer. Ocorreram, no entanto, algumas mortes em consequência de aborto provocado, sendo conhecidos 3 casos.
Em relação a cerca de 100 partos, verifica-se uma média de 10 abortos espontâneos.
e) Visita eo Centro Regional de Segurança Social
Possui este Centro cerca de 210 trabalhadores nos quais se incluem os dos infantários oficiais que estão integrados no Centro Regional.
Tem os seus serviços dispersos por 5 edifícios na cidade, possuindo, ainda, pequenas delegações de Serviço Social em Elvas, Castelo de Vide e Ponte de Sor. Deve, porém, iniciar-se brevemente a construção da nova sede, provavelmente ainda no corrente ano.
Despesas. — Nos 4 primeiros meses de 1984 há a
salientar as seguintes: Contos
Subsídios de desemprego..................... 200
Abonos de família ........................... 100
Instituições privadas de solidariedade social ........................................... 45
Casas do Povo ................................. 29
Vencimentos do pessoal do Centro Regional de Segurança Social e centros infantis ........................................ 28
Anexa-se uma relação de despesas com benefícios efectuadas em 1982 bem como de outros elementos fornecidos pelo presidente do conselho directivo da instituição.
Contribuições. — As dívidas de contribuições à Segurança Social têm vindo a diminuir sensivelmente, estando até a verificar-se uma certa recuperação relativamente a contribuições vencidas, designadamente no tocante às unidades colectivas de produção (UCPs) e cooperativas agrícolas.
Pensões. — Há algumas reclamações quanto ao atraso das pensões de velhice, sendo certo, porém, que a demora não é atribuível ao Centro Regional mas sim ao Centro Nacional de Pensões.
Quanto a pensões provisórias, já foram concedidas 31.
No tocante ao Regime Especial dos Trabalhadores Rurais existiam, em Março de 1984, 1000 pedidos de suplemento de grande invalidez.
Subsídios eventuais. — A verba afecta a tais subsídios é de cerca de 1000 contos mensais, sendo sempre gasta na totalidade.
Até ao valor de 5000S são tais benefícios atribuídos logo pelos serviços, mas dependem de decisão do conselho directivo quando de valor superior.
í) Visita ao estabelecimento prisional regional (sito em Elvas)
Encontra-se instalado em edifício inadequado para o efeito por ser uma construção de relativamente pequena dimensão. Daí o agravamento da situação, dado o facto de se encontrar superlotado.
Sendo a lotação oficial de 24 reclusos, encontram-se presentemente detidos ou a cumprir pena 48, sendo 43 em prisão preventiva, dos quais muitos são menores e provenientes de outras localidades, designadamente de Faro, cidade cujas instalações prisionais não comportam o grande número de detidos que se verifica, presentemente, existir no Algarve.
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Dos que aguardam julgamento os crimes dominantes são: furto, droga, passagem de cheques sem cobertura e, ainda, dois casos de tentativa de homicidio.
Pessoal:
1 subchefe, transitoriamente responsável pela direcção do estabelecimento em virtude de o director se encontrar há meses a prestar funções na Direcção-Geral dos Serviços Prisionais;
1 funcionario administrativo (segundo-oficial);
1 guarda feminino;
13 guardas masculinos.
Na visita foi o Provedor de Justiça acompanhado pelo referido subchefe que prestou os esclarecimentos adequados na presença dos reclusos que, por sua vez, apresentaram as suas queixas, estas essencialmente respeitantes aos longos meses de detenção, sem culpa formada e, ainda, às más condições de instalação.
No campo da higiene foi referido que há banho obrigatório uma vez por semana e no Verão duas vezes.
Quanto à alimentação foi considerada satisfatória.
A assistência médica é assegurada por um médico contratado.
li) Visita à cidade de Évora (dias 6 e 7)
a) Atendimento de reclamantes e jornalistas
Após a apresentação de cumprimentos, no edifício do Tribunal da Relação, pelos magistrados ali em serviço, procedeu-se ao atendimento de 22 reclamantes, em salas para o efeito cedidas pelo Ex.mo Presidente do Tribunal.
No mesmo local concedeu o Provedor de Justiça entrevistas a vários jornalistas, sendo de salientar as dadas aos representantes do Diários de Notícias e Notícias de Évora.
b) Visita ao Centro Regional de Segurança Social
Procurou-se nesta visita, acima de tudo, colher informações., ainda que sumárias da actividade desenvolvida por esta instituição, bem como conhecer as dificuldades com que a mesma luta na prossecução dos objectivos que visa.
Assim, apurou-se, essencialmente, o seguinte:
No distrito só duas localidades (Mourão e Alandroal) ainda não se encontram cobertas por jardins-de-infância;
O Centro presta apoio a 36 instituições privadas de solidariedade social (além do elevado número de jovens e de idosos a cargo das mesmas, há ainda que assinalar os 278 jovens da Casa Pia e os 88 idosos de outra instituição oficial da cidade);
O apoio domiciliário dá resposta a 30 idosos;
Está programado que, a curto prazo, a protecção à terceira idade abranja todo o distrito, já que no próximo ano a vila de Arraiolos deverá ficar integrada no plano de protecção;
Verifica-se haver um reduzido número de requerentes à concessão de pensões provisórias;
Existe em contrapartida elevado número de queixas relativamente a demoras na concessão de pensões;
Concessão de subsídios eventuais principalmente a pessoas em situação de desemprego mas que não reúnem as condições necessárias para a concessão de subsídio de desemprego (casos principalmente verificados em famílias numerosas);
Constatou-se, ainda, existir uma assinalável carência de pessoal de serviço social.
c) Visita ao Estabelecimento Prisional Regional
Na visita foi o Provedor de Justiça acompanhado por um subchefe que, na ausência da directora, assumia provisoriamente a direcção do estabelecimento e que, nessa qualidade, prestou os esclarecimentos que lhe foram solicitados, a saber:
Encontravam-se, ao todo, 52 detidos, dos quais 17 já condenados e 35 em regime de prisão preventiva;
Há 35 celas para homens e 5 para mulheres,
havendo celas com 2 homens; Entre as principais causas de delinquência é de
assinalar, em primeiro lugar, o crime de furto
e, em segundo, o crime de homicídio (6 frustra-
tados e 4 consumados).
Foram ouvidos quase todos os reclusos, tendo alguns deles apresentado queixas que foram reduzidas a escrito, na sua maioria relacionadas quer com a dificuldade na obtenção de transferência para outras cadeias quer relativas à duração de prisão preventiva.
íll) Visita à cidade de Beja (dia 7)
a) Atendimento de reclamantes e de jornalistas
Depois de apresentados cumprimentos aos magistrados em serviço na Comarca e que se encontravam no edifício do Tribunal Judicial de Beja, foram atendidos 26 reclamantes, tendo sido muitas das queixas reduzidas a escrito.
Recebeu, ainda, o Provedor de Justiça a visita do Governador Civil, após ter deixado cartões no edifício do Governo Civil em ocasião em que o Governador estava ausente.
Foram-lhe, igualmente, apresentados cumprimentos por outras entidades (notário, conservador, etc).
Concedeu audiência a um grupo de funcionários judiciais e deu entrevistas a um jornalista da Rádio Renascença e a outro do Diário Popular.
b) Visita ao Estabelecimento Prisional Regional
Possui aquele edifício 42 celas masculinas e igual número de celas para mulheres. Não se encontrava, porém, detida qualquer reclusa.
O número de condenados era de 17 e o de preventivos 33, sendo alguns deles provenientes da cadeia de Faro.
Como principais causas de detenção figuram a droga e o furto.
A assistência médica é-lhes assegurada por uma médica e por uma enfermeira (missionária de Maria que desempenha gratuitamente a sua actividade). Existe ainda uma assistente social.
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Além de doentes que já o eram anteriormente à reclusão, outros adquiriram na cadeia perturbações do foro psiquiátrico. No entanto, só lhes são administrados soporíferos em casos extremos.
Quanto a higiene os reclusos só de 9 em 9 dias tomam banho, por vezes em grupos de 4, dada a escassez da água. Não existe instalação de água quente.
A alimentação é bem confeccionada a avaliar pelo almoço, que o Provedor de Justiça teve ocasião de provar, constituído por sopa, peixe frito com batatas cozidas, pão e uma peça de fruta.
Quanto às instalações verifica-se que é reduzido o espaço de convívio, quer interior, quer, em especial, o exterior que é constituído por um pequeno pátio, manifestamente insuficiente para a prática de qualquer exercício físico ou desportivo.
De viva voz foram expostas pelos detidos ao Provedor de Justiça as suas principais reivindicações, a saber:
Autorização para verem televisão, em especial o próximo campeonato de futebol da Europa;
Concessão mais abundante de produtos de higiene (papel e pasta de dentes, em especial) bem como banhos mais frequentes.
Também foi abordado o problema das prisões preventivas muito prolongadas (muito tempo a aguardar a pronúncia ou julgamento), bem como a questão da demora na concessão de transferências para outros estabelecimentos prisionais.
c) Visita ao Hospital Distrital
Foi o Provedor de Justiça recebido por um membro do conselho de gerência do Hospital (economista com graduação em gestão hospitalar) que, conjuntamente com alguns médicos e enfermeiros, o acompanharam na visita e foram fornecendo todos os esclarecimentos que se pediam.
Tem este hospital lotação para 224 doentes, sendo a taxa de ocupação de 90 %.
Podem ser atendidos ainda doentes das especialidades de cirurgia, ginecologia e cardiologia, tendo como valências externas serviços de otorrino e de ortopedia.
O serviço de urgência funciona durante 24 horas.
Não existe, porém, quadro de anestesiología, assunto de que se está a tratar.
Igualmente não existe serviço de neurocirurgia nem J de hemodiálise, podendo, segundo indicação dada, Évora assegurar assistência a toda a zona.
No campo da pediatria não existem instalações para os acompanhantes das crianças.
Quanto a fornecimento de sangue tudo se passa na base de dadores voluntários.
Problema grave é o do elevado número de urgências, cerca de 55 000 por ano.
O número de partos ronda os 2000 por ano.
CAPITULO VIII
Assembleia da República e Provedor de Justiça
A) Recomendações legislativas
O Provedor de Justiça apresentou, em 1984, 4 recomendações legislativas à Assembleia da República,
transcritas, as 3 primeiras, no cap. vi, e a última no capítulo v deste relatório.
1 — Protecção dos animais Processo n.° 83/FH759-B-1
Este Serviço tem recebido assinalável número de queixas relativas, não só a casos concretos de maus tratos infligidos a animais, como também à deficiência da protecção legal destes na nossa ordem jurídica — queixas essas sobretudo provindas de associações de defesa dos animais.
Embora não intervindo quando as entidades visadas são de natureza privada, nem em diversos problemas de menor relevância que lhe têm sido trazidos nesta matéria, o Provedor vem considerando a sua competência legal em termos de abranger, não só a conduta de instituições públicas, como também os aspectos gerais postos em causa — e isto no entendimento de que o tratamento desumano de animais afecta o direito do ambiente e à qualidade de vida.
Foi sob esta perspectiva que, não tendo sido ainda ratificada por Portugal a Declaração Universal dos Direitos do Animal, o Provedor recomendou, em 17 de Fevereiro de 1984, à Assembleia da República, que os princípios dela constantes fossem consagrados na legislação interna portuguesa, após audição das associações de defesa do animais regularmente constituídas.
Embora se desconheça o concreto seguimento dado na Assembleia da República a esta recomendação, sabe-se que existe nela pendente, sobre a matéria, um projecto de lei.
2— Contribuição para o Fundo de Socorro Social
Processo n.° 82/R-2279-DI-51-A
Um grupo de proprietários de pequenos restaurantes de Lisboa pediu ao Provedor que suscitasse o problema da inconstitucionalidade do regime em vigor sobre a incidência da contribuição para o Fundo do Socorro Social — isto pelo facto de a esta tributação, que recai sobre o consumo de vinhos espumosos e licorosos e de bebidas espirituosas em hotéis, restaurantes, cafés e estabelecimento similares, só vigorar para os concelhos de Lisboa, Porto, Cascais e Oeiras.
Ouvido sobre o assunto o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, este respondeu que não considerava justo nem acertado o regime vigente — pelo que já propusera a sua modificação, embora sem êxito.
Analisada a questão, entendeu-se que o tributo em questão afectava o princípio da igualdade — até porque a evolução social e económica ocorrida, desde a sua criação, várias décadas atrás, e, designadamente, o incremento do tuirsmo, fizeram com que em muitas outras zonas, além daquelas, passasse a haver estabelecimentos em que se verificava um importante consumo de tais bebidas.
Parecia, pois, justificar-se a generalização, do ponto de vista geográfico, da contribuição em referência. Mas importava também, de acordo com os seus pró-
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prios objectivos e natureza, não a fazer incidir sobre as empresas de menor categoria e rendimentos.
O Provedor optou por formular, neste sentido, em 21 de Fevereiro de 1984, recomendação legislativa à Assembleia da República, por ter ponderado que even-tuail pedido de declaração de inconstitucionalidade das nomas legais em vigor sobre a matéria não permitiria, por si só, alcançar estes desidratos, antes podendo gerar um situação de impasse neste sector do sistema fiscal.
Em 20 de Agosto de 1984, o Gabinete do Presidente da Assembleia da República informou que a recomendação fora encaminhada para os grupos e agrupamentos parlamentares.
3 — Direito de preferência na alienação de prédios urbanos Processo n.° 84/IP-53-B-4
A análise de uma queixa apresentada ao Provedor conduziu à conclusão da inadequação parcial, face à realidade social, do regime legal em vigor quanto à preferência dos inquilinos na compra da parte de prédios urbanos em que habitam.
De facto, se a legislação aplicável — Lei n.° 63/77, de 25 de Agosto — admite, no caso dos prédios em regime de propriedade horizontal, que o inquilino exerça o direito de preferência na compra da fracção em que habita, já o mesmo não se afigura possível em relação ao locatário de um andar de imóvel que não se encontra naquela situação.
Parece, pois, que, nesta segunda hipótese, o inquilino só pode efectivar o seu direito de preferência em relação à totalidade do prédio — o que em regra tornará tal direito ineficaz, por falta de interesse ou de recursos económicos dele para tal operação.
Considerando que esta situação, em termos de Direito, não corresponde com justiça aos interesses sociais em jogo, o Provedor recomendou, em 11 de Julho de 1984, à Assembleia da República, a emanação de diploma legal que passe a atribuir aos locatários nestas condições o direito de preferência em relação à compra do andar em que residam.
Em 7 de Agosto de 1984, o Gabinete do Presidente da Assembleia da República deu conhecimento de que a recomendação fora enviada à 1." Comissão Parlamentar e aos grupos e agrupamentos parlamentares.
4 — Internamento compulsivo de doentes mentais Processo n.° 82/IP-129-B-1
A análise de algumas queixas concretas levou o Provedor a apreciar o regime vigente para o internamento compulsivo de doentes mentais, face às exigências da actual Constituição e às recomendações da Resolução, do Comité de Ministros do Conselho da Europa n.° (83) 2, de 22 de Fevereiro de 1983.
Afigurou-se que esse regime, estabelecido na Lei n.° 2118, de 3 de Abril de 1963 —e apesar de se não tratar, pois, de diploma recente —, é, de um modo geral, aceitável e compatível, tanto com a lei fundamental, como com os princípios preconizados pelo Conselho da Europa.
Verificou-se, porém, a necessidade de colmatar uma lacuna no sistema em causa, já que — aliás de acordo com a opinião dos próprios serviços da administração competentes — deve hoje considerar-se revogada, pela imposição constitucional de todas as medidas de segurança terem de ser judicialmente determinadas, a possibilidade, prevista naquela lei, de internamento compulsivo de doentes mentais em regime fechado mediante mera decisão ou autorização dos centros de saúde mental.
E pareceu que seria de aproveitar mesmo o ensejo para consagrar, para tais internamentos, um processo menos complicado que o constante do aludido diploma, embora com a garantia de intervenção do magistrado do Ministério Público e do tribunal competente.
Neste sentido fez, pois, o Provedor, em 2 de Maio de 1984, recomendação legislativa à Assembleia da República.
Em 8 de Agosto de 1984, o Gabinete do Presidente da Assembleia da República comunicou que esta recomendação fora remetida aos grupos e agrupamentos parlamentares.
8) Rslatório especial
Marcação de faltas injustificadas a funcionário não encontrado no domicílio por ocasião do controle da situação de doença
Processo n.° 81/R-1216-A-2
1 — Um funcionário da Junta Autónoma de Estradas encontrava-se na situação de doente, faltando ao serviço a coberto de atestado médico atempadamente apresentado.
Não foi, porém, encontrado em casa na data em que se realizou a visita médica para efeitos de controle daquela situação.
Foram-lhe, por isso, consideradas injustificadas todas as faltas que nessa ocasião deu, num total de cerca de 2 meses, com o correspondente desconto nos vencimentos — apesar de ele haver, uma semana após o controle, exibido declaração do seu médico assistente segundo a qual ele se encontraria no seu consultório na data em que aquele tivera lugar.
2 — Inquirida a Junta acerca das razões por que não atendera a esta declaração, ela respondeu que o fizera por o funcionário ter dado, em anos anteriores, apreciável número de faltas e tendo em conta que a justificação ou não das ausências seria legalmente objecto de um poder discricionário.
3 — Não pareceram atendíveis estas razões.
Por um lado, para a justificação ou não das faltas em causa não poderiam relevar as ausências do funcionário em ocasiões passadas.
Por outro, constitui doutrina sancionada pelo Supremo Tribunal Administrativo a de que a ausência do trabalhador de sua casa, na data do controle da doença, tem o valor de mera presunção de inexistência desta, a qual pode ser ilidida por prova em contrário. E no caso concreto não surgiram razões bastantes para pôr em causa a declaração do médico tendente a explicar tal ausência.
4 — Apesar de, expondo estes argumentos, o Provedor ter sucessivamente recomendado à Junta Autónoma
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de Estradas e ao Ministro da Habitação, Obras Públicas e Transportes, a revogação da injustificação das mencionadas faltas, nenhuma destas entidades aceitou esta solução.
5 — Designadamente, o Secretário de Estado das Obras Públicas respondeu, em 30 de Março de 1984, que o fazia, não só porque o responsável que tomara a decisão contestada já se encontrava desligado do serviço para efeitos de aposentação, mas também porque ele decerto tivera em consideração, ao decidir, a irregular assiduidade que o trabalhador antes revelara.
E terminou afirmando que:
O funcionário teve sempre a faculdade de apresentar, no prazo devido, os recursos —hierárquico ou contencioso— que a lei faculta. Se o não fez, não parece que deva haver lugar agora a recursos diferentes daqueles que a lei confere (sic).
6 — O Provedor considerou inadmissível esta posição, não só quanto à questão jurídica de fundo, como, sobretudo, pelo desconhecimento que nela transparece acerca das atribuições que, constitucional e legalmente, cabem ao Provedor de Justiça.
7 — Por isso apresentou relatório especial sobre o caso à Assembleia da República, em 22 de Maio de 1984.
8 — Em 8 de Agosto seguinte, o Gabinete do Presidente deste órgão de soberania comunicou que o relatório fora dado a conhecer a todos os grupos e agrupamentos parlamentares, no seio da 1.a Comissão.
CAPITULO IX
Outros aspectos da actividade do Provedor de Justiça
A) Conselho de Estado
Durante o ano de 1984 o Provedor de Justiça participou nas duas reuniões do Conselho de Estado que foram convocadas por S. Ex.a o Presidente da República, e que tiveram lugar em 30 de Março e 7 de Novembro de 1984, tendo-se destinado esta última à revisão do Regimento Provisório do Conselho de Estado, em consequência da publicação do Estatuto do mesmo Conselho, constante da Lei n.° 31/84, de 6 de Setembro.
B) Conselho Superior da Magistratura
Tendo continuado a aguardar-se a publicação da legislação a que se reporta o artigo 240.° da Lei n.° 1/82, dada a composição do Conselho Superior da Magistratura definida pelo artigo 140.° do Decreto-Lei n.° 269/78, de 1 de Setembro, o Provedor de Justiça participou como membro desse órgão em todas as reuniões mensais que tiveram lugar durante o ano de 1984.
C) 3." Conferência Internacional dos ((Ombudsmen))
1 — De 25 a 28 de Junho de 1984 realizou-se, em Estocolmo, a 3.a Conferência Internacional dos Om-
budsmen, seguida de um Seminário Internacional de Ombudsmen que teve lugar em Helsínquia, de 29 de Junho a 1 de íulho.
2 — Nestas duas reuniões internacionais, que se efectuam de 4 em 4 anos (as próximas terão lugar em 1988, na Austrália), participaram o Provedor de Justiça e o seu adjunto.
Além de várias intervenções do Provedor e do adjunto, na discussão oral dos temas, o Serviço do Provedor de Justiça apresentou observações escritas a respeito de todas as matérias abordadas na Conferência e no Seminário, com excepção, por falta de experiência nesse campo, da relativa à utilização de computadores para processamento de dados nos próprios serviços dos Ombudsmen.
3 — A Conferência, que reuniu Ombudsmen e titulares de cargos similares de todos os continentes, subordinou-se ao tema geral «O Ombudsman e a Sociedade em Desenvolvimento».
Nela se não teve em vista chegar a quaisquer conclusões ou recomendações finais, mas, antes, proceder à análise e debate alargados de algumas das questões que com maior premência, nas actuais sociedades em evolução, se vêm pondo às instituições do tipo Ombudsman.
Discutiram-se, nesse âmbito, os seguintes assuntos:
«O Ombudsman e os Direitos do Homem»; «O Ombudsman e a Política»; «O Ombudsman e a Comunicação Social»; «O Ombudsman e a Administração Computorizada»;
«O Ombudsman e o Exercício de Poderes Discricionários»;
«O Ombudsman e a Audição Formal»;
«O Ombudsman Recebe as Queixas que Deveria— ou as que Merece?»
4 — O Seminário, especialmente destinado aos auxiliares directos dos Ombudsmen, mas no qual intervieram também grande parte destes últimos, destinou-se sobretudo ao intercâmbio de experiências e troca de impressões acerca de vários aspectos práticos do funcionamento das respectivas instituições.
Sob esta perspectiva se abordaram os seguintes temas:
A utilização de processamento electrónico de dados nos serviços dos Ombudsmen;
Como tratar os reclamantes crónicos;
O recurso, pelo Ombudsman, a peritos externos;
O Ombudsman e as queixas contra a polícia e organizações similares;
A publicidade no serviço do Ombudsman.
5 — Tanto a Conferência como o Seminário — cada qual do seu ponto de vista próprio— proporcionaram um amplo debate acerca de problemas de fundo e de questões concretas com que hoje se deparam os Ombudsmen.
Permitiram, ainda o estabelecimento de múltiplos contactos entre Ombudsmen de vários recantos do Mundo e —o que não é o menos— desenvolveram-se num ambiente de amizade que decerto deixará marcas em todos os que neles participaram.
6 — Para o alto nível dos trabalhos, a eficácia da organização e o calor humano que caracterizaram a
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1 DE MARÇO DE 1985
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Conferência e o Seminário foi decisiva a actuação dos seus principais responsáveis — respectivamente o Ombudsman-Cheie da Suécia, Sr. Per-Erik Nilsson e o Ombudsman da Finlândia, Sr. forma Aalto.
D) Participação em colóquios, seminários e iniciativas similares
Em 28 de Janeiro, o adjunto do Provedor participou no Colóquio sobre Defesa do Consumidor, organizado pelo Instituto Progresso Social e Democracia.
O Provedor de Justiça fez parte da mesa da sessão que, sob a presidência de S. Ex.a o Presidente da República, a Amnistia Internacional — Secção Portuguesa organizou, em 26 de Abril, para lançamento da sua Campanha contra a Tortura.
O Provedor de Justiça fez parte da Comissão de Honra do I Simpósio Internacional sobre Processo Civil e Organização Judiciária, que teve lugar a partir de 21 de Maio, em Coimbra, sob a égide da Faculdade de Direito da respectiva Universidade.
Neste Simpósio participou também o coordenador deste serviço, juiz de Direito Dr. Carlos Vaz Serra Lima.
O adjunto do Provedor interveio, em 31 de Maio e 1 de Junho, no Colóquio sobre Direitos da Criança, realizado pelo Instituto de Apoio à Criança.
Em 7 e 8 de Junho, os assessores Dr. Reinaldo Fragoso e Dr.ü Maria José Iria participaram no Colóquio sobre «Concorrência em Portugal nos Anos 80» promovido pela revista Assuntos Europeus.
O Provedor de Justiça e o adjunto tomaram parte no XIV Colóquio de Direito Europeu, organizado em Lisboa, de 26 a 28 de Setembro, pelo Conselho da Europa, tendo por tema «O Direito e as Tecnologias da Informação na Sociedade de Amanhã».
O adjunto do Provedor participou no seminário sobre «Representação Social da Justiça em Portugal» organizado, de 10 a 12 de Outubro, pelo Instituto de Damião de Góis.
O Provedor de Justiça e o adjunto estiveram presentes nas Tornadas sobre Justiça Constitucional que a Associação para o Progresso do Direito e a Ordem dos Advogados organizaram, em 12 e 13 de Outubro.
O adjunto do Provedor assistiu ao Seminário realizado, na Ordem dos Advogados, de 15 a 17 de Outubro, sobre «Informática Jurídica e Gestão Judicial».
Em 24 e 25 de Outubro, as assessoras Dr.35 Branca Amaral, Maria Helena Carvalho Fernandes e Teresa Zinke dos Reis frequentaram o Seminário organizado pelo Instituto Nacional de Administração sobre o tema «Reforma da Segurança Social numa Óptica Internacional».
O Provedor de Justiça participou na sessão comemorativa do 36.° aniversário da Declaração Universal dos Direitos do Homem organizado pela associação «Direito e Justiça» e pela Ordem dos Advogados.
O adjunto do Provedor tomou parte, em representação deste, na mesa da sessão comemorativa do mesmo evento, organizado pela Amnistia Internacional — Secção Portuguesa,
£) Visitas recebidas pelo Provedor de Justiça
Em 23 de Janeiro, o novo Chefe do Estado-Maior do Exército, general Salazar Braga, veio, em visita de cumprimentos, ao Serviço do Provedor de Justiça.
Em 28 de Fevereiro, no âmbito da visita a Portugal, a convite do Conselho de Imprensa, do Ombudsman para a imprensa sueca Sr. Thorsten Cars, foi este recebido no Serviço do Provedor de Justiça e informado do modo como este se encontra organizado e funciona. O Provedor de Justiça acompanhou-o, conjuntamente com os representantes do Conselho de Imprensa, na visita ao Presidente da Assembleia da República e aos grupos parlamentares.
Em 12 de Março, recebeu-se a visita do adjunto do Ombudsman da Escócia, Sr. Kenneth Bratton, autor de um estudo sobre a organização e funcionamento deste Serviço.
Em 19 de Março, visitou este Serviço o Dr. Celso Barroso Leite, um dos primeiros autores brasileiros que se debruçaram sobre o estudo da instituição do Om-busman, no interessante livro intitulado O Corregedor Administrativo.
Em 2 de Abril, foi este Serviço visitado pelo Prof. Udo Kempf, da Universidade de Friburgo, o qual está a preparar um estudo sobre os novos Ombudsmen na Europa.
Em 19 de Junho, o Embaixador do México foi igualmente recebido pelo Provedor de Justiça, com o objectivo de se informar acerca da instituição do Ombudsman em Portugal.
Em 4 de Julho, recebeu-se a visita do Sr. Jacob Levav, Ombudsman da cidade de Haifa, em Israel, que se inteirou do modo como certos problemas de administração local são tratados e recebidos neste Serviço.
Em 9 de Julho, o Secretário de Estado da Justiça do Rio de Janeiro, Sr. Vivaldo Barbosa, visitou o Provedor para tomar contacto com o modo de funcionamento da instituição do Ombudsman em Portugal.
F) Protocolo com a Alta Autoridade contra a Corrupção
Em 22 de Março de 1984, foi celebrado, entre o Provedor de Justiça e o Alto-Comissário contra a Corrupção, o seguinte Protocolo:
Tendo em conta que entre as competências do Provedor de Justiça, tal como são enunciadas no artigo 19." da Lei n.° 81/77, de 22 de Novembro, e as da Alta Autoridade contra a Corrupção, definidas nos termos do artigo 9.° do Decreto--Lei n.° 369/83, de 6 de Outubro, existe uma apreciável margem de sobreposição;
Considerando a imperiosa necessidade de não duplicar diligências e procedimentos, mas antes de implementar formas de coordenação que assegurem uma acção eficaz de ambas as instituições nos respectivos domínios de intervenção;
Tendo sempre presente a diferente natureza das duas instituições — o Provedor de Justiça, mais voltado para a defesa dos direitos dos cidadãos; a Alta Autoridade, mais virada para a protecção do interesse público;
0 Provedor de Justiça e o Alto Comissário contra a Corrupção estabelecem o seguinte esquema de colaboração:
1 — Sempre que, em exposição dirigida à Alta Autoridade, ou durante a sua instrução, se revelar claramente matéria da competência do Provedor de Justiça — designadamente, violações de direi-
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II SÉRIE — NÚMERO 61
tos dos cidadãos, irregularidades administrativas e má administração— o Alto-Comissário poderá remetê-la, para os devidos efeitos, ao Provedor de Justiça;
1.1 —Por cópia, se se indicar também matéria da competência da Alta Autoridade;
1.2 — Através do envio do original, se tal não suceder.
1.3 — A Alta Autoridade dará conhecimento do facto ao exponente.
2 — Sempre que, em reclamação dirigida ao Provedor de Justiça, ou durante a sua instrução, se revelar claramente matéria também da competência da Alta Autoridade — designadamente corrupção, crimes contra bens públicos, crimes de favorecimento pessoal, de peculato, de administração danosa e ofensas ao princípio da imparcialidade da Administração —, o Provedor de Justiça poderá remetê-la, para os devidos efeitos, ao Alto-Comissário;
2.1 —Por cópia, ou através do envio do original.
2.2 — O Provedor de Justiça dará conhecimento ao reclamante, se considerar tal comunicação conveniente.
G) Participação em actividades de outras instituições
1 — Comissão da Condição Feminina — em representação do Serviço do Provedor faz parte da referida Comissão a assessora Dr.° Maria Teresa Zinke dos Reis.
2 — Comité de Peritos de Direito Administrativo do Conselho da Europa — a representação neste Comité continuou a ser assegurada pelo adjunto do Provedor de Justiça Dr. Luís Silveira, a quem coube, em 1984, a presidência do mesmo; o Comité teve, no ano em referência, duas reuniões, dedicadas à preparação de instrumento internacional sobre processos administrativos e contenciosos relativos a grande número de interessados.
H) Encontros com órgãos da comunicação social o entrevistas
No prosseguimento da linha de orientação fixada desde o início do meu mandato, realizaram-se semestralmente encontros com os órgãos de comunicação social —imprensa, rádio e televisão— através dos quais se deu conhecimento público do modo como tem vindo a decorrer a actividade do Provedor de Justiça, tendo sido anunciados dados estatísticos, descritos casos de maior interesse geral e fornecidas outras informações, muitas delas em resposta a perguntas formuladas por jornalistas.
O Provedor de Justiça foi entrevistado, em 21 de Julho, no programa da Radiodifusão Portuguesa Ver, Ouvir e Contar.
No programa de onda curta da Radiodifusão Portuguesa para emigrantes, foram entrevistados, em 8 de Fevereiro, o Provedor de Justiça e o adjunto, e este último de novo em 17 de Outubro.
Revelou-se, no ano de 1984, um maior interesse por parte dos órgãos da imprensa escrita acerca do Provedor de Justiça, interesse esse reflectido, designada-
Depósito legal n.° 8819/85 Imprensa Nacional-Casa da Moeda, E. P.
mente, em alguns artigos de fundo sobre a instituição e na descrição de diferentes casos mais relevantes tratados neste Serviço.
INDICE
CAPÍTULO I pâ8-
Introdução................................................... 2125—(1)
CAPITULO II
Dados estatísticos e sua análise ....................... 2125—(3)
CAPITULO III
Processos relativos a questões dc inconstitucionalidade.................................................. 2125-(9)
A — Principais processos que não deram origem a pedido de declaração de inconstitucionalidade .................................................. 2125-(9)
B — Pedidos de declaração de inconstitucionalidade .................................................. 2125-Í35)
C — Evolução de pedidos de inconstitucionalidade dos anos anteriores ......................... 2125—(71)
CAPITULO IV
A — Recomendações legislativas ...................... 2125—(72)
B — Recomendações administrativas ................. 2125—(81)
CAPÍTULO V
Apreciação na especialidade de alguns processos
concluídos em 1984 ................................... 2125-(99)
Administração da justiça .......................... 2125-(99)
Administração local................................. 2125-(100)
Administração Pública ............................. 2125—(101)
Contrato-promessa ................................... 2125-(101)
Contribuição c impostos ........................... 2125—(102)
Direitos fundamentais ............................. 2125-006)
Domínio público ..................................... 2125-013)
Empreitadas ........................................... 2125-014)
Empresas .............................................. 2125-014)
Ensino .................................................. 2125-(115)
Forças Armadas ...................................... 2125-015)
Obras ................................................... 2125-015)
Polícia .................................................. 2125-(117)
Reforma Agrária .................................... 2125-018)
Responsabilidade contratual ...................... 2125-018)
Segurança Social ..................................... 2125-0 20)
Seguros ................................................. 2125-025)
Serviço militar ....................................... 2125-028)
Trabalho — Administração local ................ 2125-029)
Trabalho — Empresas públicas .................. 2125—(132)
Trabalho — Função pública ...................... 2125-037)
Transportes e comunicações ..................... 2125-057)
CAPITULO VI
Sequência de processos terminados cm anos anteriores ..................................................... 2125-060)
CAPITULO Vil
Visitas a outros centros urbanos ...................... 2125-061)
CAPITULO VIII
Assembleia da República e Provedor de Justiça 2125-064)
CAPÍTULO IX
Outros aspectos da actividade do Provedor de
Justiça ..................................................... 2125-066)
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