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II SÉRIE — NÚMERO 66

3 — Através do projecto de lei n.° 356/IV visam os deputados do PS regular o regime de «alienação de participações do sector público por negociação particular», o que representa uma alteração adiciona) do regime fixado pela Lei n.° 49/86, que determina como modalidade exclusiva de alienação o concurso público. Revogadas que foram pelo n.° 2 do artigo 88.° da Lei n.° 49/86 as disposições legais que regulavam a alienação por negociação particular (incluindo as constantes da Portaria n.° 275/86, de 30 de Maio), entendem os proponentes que deve voltar a ser admitida como modalidade conducente à alienação a negociação particular.

Pretende-se, porém, acautelar que não venham a ser reinstituídas certas disposições susceptíveis de conduzirem a abusos. Como sublinha a exposição de motivos do projecto em apreço, «o reconhecimento da autonomia e responsabilidade das entidades às quais está confiada a gestão das acções e quotas sociais não pode servir de pretexto para a criação de modalidades de alienação das participações do sector público per-missiveis de situações iníquas tendentes a conferir a alguns privilegiados o acesso à função empresarial sem risco». E acrescenta-se, na mesma linha de pensamento:

A febre negocista que se apoderou de certos sectores não deve ser alimentada por modalidades de alienação de participações do sector público que mais parecem rendições incondicionais ao falso princípio de que o lucro terá sempre de ser privado, cabendo apenas ao sector público correr os riscos e absorver as eventuais perdas. Não se vê razão legitima para permitir modalidades de alienação de participações do sector público que seriam aberrantes nas transacções privadas. Com efeito, só por aberração um empresário privado aceitaria, por exemplo, dar a outrem o direito de gerir os seus negócios, abrindo-lhes os respectivos segredos, facultando-lhes o acesso aos seus clientes e o seu eventual aliciamento a favor de terceiros, permitindo o chamado «desnatamento» da sua empresa em condições tais que ao beneficiário ainda assistisse o direito de devolver pura e simplesmente o negócio sem a correspondente penalização. Por estranho que pareça, essa situação anómala seria possível à luz do disposto na Portaria n.° 275/86, de 30 de Maio.

No sentido de evitar as consequências descritas, o projecto, reinstituindo implictamente a legitimidade da alienação por negociação particular, estabelece duas regras:

a) Veda que em tais casos seja consignada a transferência das partes de capital com salvaguarda da possibilidade de livre resolução peio cessionário de negócio translativo no decurso de um determinado período de tempo;

6) Exclui que os interessados na aquisição possam ser designados como representantes da entidade pública participante na sociedade participada, ainda que já estejam convencionadas as condições e o prazo do negócio de transmissão definitiva de propriedade das participações em causa.

O futuro regime de alienação, a elaborar pelo Governo, mediante decreto-lei, subordinado às bases fixadas no artigo 88.° da Lei n.° 49/86, há-de obedecer, pois, na parte pertinente, às duas regras agora fixadas. Os benefícios contratados ao abrigo de legislação revogada pelo normativo citado não deverão, em qualquer caso — especifica-se —, ser fruídos pelos interessados.

4 — Não sobram dúvidas de que se insere plenamente nos poderes da Assembleia da República ela borar leis quadros, mesmo em matérias que não são da sua competência reservada, nos termos dos artigos 167." e 168.° da Constituição.

Nesses casos poderá o Governo legislar, mediante decreto-lei, sobre a mesma matéria. O diploma governamental haverá, porém, de subordinar-se à correspondente lei (artigo 115.°, n.° 2, da Constituição), devendo, aliás, invocá-la expressamente (artigo 201.°, n.° 3).

Foi o que ocorreu no caso vertente. Considerando necessário redefinir profundamente o quadro legal aplicável à alienação de participações públicas, a Assembleia da República revogou as disposições em vigor e estabeleceu as bases de um novo regime. Fê-lo, porem, num artigo do Orçamento do Estado, lei sujeita a regime especial quanto à iniciativa e alteração:

O que suscita dois tipos de questões:

a) A legitimidade constitucional da inserção no Urçainento ao Estado de normas como a do artigo 88.° referido;

b) O regime de alteração de normas inseridas numa lei, em regime especial quanto à iniciativa.

São essas questões que cumpre apreciar, porquanto os projecios de lei n.M 355/1V e 356/IV visam, explicitamente num caso e implicitamente no outro, alterar um regime jurídico fixado no artigo 88.° do Orçamento do Estado para 1987.

5 — Quanto à primeira questão, reconduz-se, afinal, a saber se o Orçamento do Estado, tal qual é constitucionalmente configurado, pode ser algo mais do que uma consideração complexiva e recíproca das receitas e despesas públicas, um «documento onde são contabilizadas as receitas e despesas do Estado devidamente autorizadas para um período determinado (L. S. Cabral de Moncada, Perspectivas do Novo Direito Orçamental Português, Coimbra, 1984, p. 9). Sendo o Orçamento uma previsão em regra anual das despesas a realizar pelo Estado e dos processos para as cobrar e realizar despesas e limitando os poderes financeiros da Administração em cada ano (cf. Sousa Franco, Direito Financeiro e Finanças Públicas, vol. i, p. 202), pode o Orçamento do Estado incorporar outras disposições, além das estritamente referentes à projecção das receitas e despesas?

Não têm excluído tal solução as sucessivas leis de enquadramento do Orçamento do Estado. Quanto aos concretos orçamentos do Estado, quer no figurino anterior, quer no posterior à revisão constitucional, incluem tradicionalmente numerosas disposições que alteram ou autorizam a alteração de legislação em vigor (e não apenas de carácter fiscal).

A questão foi suscitada aquando da elaboração da Lei n.° 40/83, de 13 de Dezembro. Nessa ocasião, o PCP propôs que se opensse uma expurgação na