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II SÉRIE-A — NÚMERO 1

PROJECTO DE LEI N.° 1/VI

REGULARIZAÇÃO EXTRAORDINÁRIA DE ESTRANGEIROS NÃO COMUNITÁRIOS EM SITUAÇÃO IRREGULAR

Portugal é um espaço onde se cruzam múltiplas culturas, raças e gentes. Daqui partiram naus para todas as partes do mundo, no que foi um processo complexo e contraditório de encontro, confronto e miscigenação de povos e culturas.

Como escreveu o escritor Fernando Dacosta:

Em todas as paragens deixámos descendentes, nas horas de retorno outros povos, pretos, mulatos, indianos, orientais vêm connosco, acrescentam-nos, aprendem o frio e a geografia, ajudam no erguer de casas, no amanho de baldios, inovam a cozinha, a música, o imaginário, dissipam o isolamento.

Tendo sido desde há muitos séculos um país de emigrantes, Portugal tornou-se também um país de imigrantes.

A grande maioria dos imigrantes são, aliás, provenientes dos países lusófonos, e alguns deles chegaram a Portugal como portugueses antes da independência dos seus países de origem.

Os cabo-verdianos que chegaram há cerca de 30 anos vinham substituir os emigrantes portugueses que muitas vezes, de forma ilegal, emigravam na esperança de melhores condições de vida, bem como os milhares de jovens mobilizados para a guerra colonial.

A experiência dolorosa por que têm passado muitos milhares de emigrantes portugueses não deve ser esquecida quando analisamos a situação em que vivem os imigrantes em situação ilegal em Portugal. Há dores que não devemos desejar a ninguém.

As carências económicas e os conflitos políticos e sociais que têm marcado o quotidiano dos países lusófonos, bem como as afinidades, culturais, espirituais e sociais, explicam a imigração verificada nos últimos anos.

Independentemente da reflexão ponderada sobre a revisão da política de concessão de vistos para o futuro, é indispensável para assegurar uma maior coesão social e evitar tensões evitáveis na sociedade portuguesa.

É do interesse de todos que os imigrantes estejam integrados na sociedade portuguesa com os seus direitos e obrigações bem definidos.

«Uma inserção social conseguida, ou seja, fundada na igualdade de direitos e oportunidades, é condição para evitar a formação de bolsas de marginalidade social e para não alimentar o trabalho ilegal, a economia subterrânea e mesmo a criminalidade.» Neste sentido se pronunciou recentemente o Comité Económico e Social da Comunidade Europeia no seu parecer sobre o estatuto dos trabalhadores migrantes de países terceiros {JO, n.° C159).

A regularização da situação dos que se encontram «sem papéis» é, por maioria de razão, condição indispensável para a integração harmoniosa na sociedade e para a responsabilização pela resolução dos próprios problemas. A manutenção em situação irregular alimenta a irresponsabilização e empurra para a inserção num processo de marginalização progressiva.

A não regularização dos imigrantes impede o seu acesso aos cuidados de saúde com graves consequências para a saúde pública e impede os seus filhos, muitas vezes sem existência civil, de frequentar regularmente as escolas e de verem concretizado o direito a

aprender que a Convenção Universal dos Direitos da Criança reconhece a todas as crianças.

Condenados ao insucesso escolar e educativo, sem outro horizonte que os bairros, vilas e cidades de Portugal, que futuro poderão ter?

0 Comité Económico e Social, no seu parecer já citado e após advertir para os riscos de uma integração mal feita, refere que há que «contrariar e prevenir os efeitos negativos da não integração social dos imigrantes, especialmente dos jovens, para o desenvolvimento económico, social e cultural numa Europa multiétnica e multicultural».

Torna-se, por isso, urgente e indispensável proceder a uma regularização extraordinária dos imigrantes que já cá se encontram e que estão profundamente ligados à sociedade portuguesa, como vem sendo prometido de há muito pelo Goveno e é reclamado por associações representativas dessas comunidades, comunidades religiosas, sindicatos e embaixadas de países lusófonos.

É altura de arrumar a casa para enfrentar solidariamente os desafios ao futuro.

Vários países europeus procederam, nos últimos anos, a regularizações extraordinárias de imigrantes ilegais. Portugal nunca o fez, tendo-se as autoridades limitado a regularizações pontuais ao sabor das conjunturas.

Recorde-se que a Itália, por exemplo, criou condições para permitir a regularização extraordinária de milhares de pessoas em situação ilegal no seu território. Através do Decreto-Lei n.° 416/89, de 31 de Dezembro, o Governo de Roma permitiu aos cidadãos não comunitários a regularização da sua situação. Em 28 de Fevereiro de 1990, esse decreto foi convertido em lei, tendo sido alargado até 30 de Julho de 1990 o prazo para requerer a autorização de permanência.

Em Espanha está a decorrer um processo de regularização extraordinária com base na Resolução de 7 de Junho de 1991. Este processo visa completar o processo de regularização já realizado em 1985.

Não podemos perder mais tempo em concretizar uma medida que contribuirá para uma maior solidariedade entre todos os cidadãos e residentes no nosso país e para uma inserção harmoniosa dos imigrantes na vida nacional.

Neste sentido, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.°

Quem pode requerer

1 — O presente diploma é aplicável aos estrangeiros não comunitários que tenham entrado em Portugal até 4 de Novembro de 1991 e aqui permaneçam a residir em situação irregular e que:

a) Sejam cidadãos de qualquer pais lusófono; ou

b) Tenham comprovadamente capacidade de se exprimir oralmente em língua portuguesa e comprovem documentalmente o desempenho de actividade profissional remunerada no território nacional por um período consecutivo ou interpolado superior a um ano.

2 — A comprovação da nacionalidade poderá ser feita pelo passaporte, ou por qualquer outro documento de identificação emitido pelo Estado de que são nacionais, designadamente pela sua representação diplomática em Portugal.