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24 DE OUTUBRO DE 1997

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Conforme se lê na exposição de motivos, a liberdade de circulação é um direito fundamental consagrado constitucionalmente no artigo 27.°, com tutela reforçada conferida pelo artigo 18." da Constituição e cujas excepções são igualmente fixadas na lei fundamental. São elas, nos termos da recente revisão constitucional, as seguintes:

a) Detenção em flagrante delito;

¿7) Detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos;

c) Prisão, detenção ou outra medida coactiva sujeita a controlo judicial, de pessoa que tenha penetrado ou permaneça irregularmente no território nacional ou contra a qual esteja em curso processo de extradição ou de expulsão;

d) Prisão disciplinar imposta a militares, com garantia de recurso para o tribunal competente;

e) Sujeição de um menor a medidas de protecção, assistência ou educação em estabelecimento adequado, decretadas pelo tribunal judicial competente;

f) Detenção por decisão judicial-em virtude de desobediência a decisão tomada por um tribunal ou para assegurar a comparência perante autoridade judiciária competente;

g) Detenção de suspeitos, para efeitos de identificação, nos casos e pelo tempo estritamente necessários;

h) Internamento de portador de anomalia psíquica em estabelecimento terapêutico adequado, decretado ou confirmado por autoridade judicial competente.

J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira definem o direito à liberdade, decorrente do contexto global do artigo 27.°, como o «direito à liberdade física, à liberdade de movimentos, ou seja, direito de não ser detido, aprisionado, ou de qualquer modo fisicamente confinado a um determinado espaço ou impedido de se movimentar [...]» (J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 3.° ed., p. 184).

Lê-se adiante que «o direito à liberdade engloba, fundamentalmente os seguintes subdireitos: a) direito de não ser detido ou preso pelas autoridades públicas, salvo nos casos e termos previstos neste artigo; b) direito a não ser aprisionado ou fisicamente impedido ou constrangido por parte de outrem [...]» e ainda que «no plano exterior às relações cidadão-Estado, a violação do direito à liberdade consubstancia os crimes de sequestro, rapto, coacção física, etc. [...]».

A liberdade, máxime a liberdade de circulação, pode ser restringida quando imperativos da sociedade assim o exijam e estritamente nos casos tipificados na Constituição. • A aplicação em concreto de qualquer restrição à liberdade de movimentação deverá não só ser adequada à situação em causa, como proporcional ao perigo ou dano que se pretende prevenir. Assim, qualquer privação da liberdade dos cidadãos fora dos casos previstos e permitidos por lei, serão claramente ilegais e mesmo inconstitucionais.

No entanto, só consubstanciam crimes as práticas expressamente tipificadas como tal, razão pela qual, em face da gravidade e do prejuízo causado à sociedade, a presente, uúciativa legislativa se propõe criminalizar os mais graves atentados à liberdade de circulação.

Em confronto com o direito de circulação nas situações objecto da iniciativa em análise, encontramos os direitos fundamentais da «liberdade de expressão e informação» (artigo 37.° da Constituição) e o «direito de reunião e de manifestação» (artigo 45.° da Constituição), gozando ambos da mesma tutela reforçada conferida pelo artigo 18.° da Constituição, logo, preceitos directamente aplicáveis.

O direito de expressão, enquanto «direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio» (n.° 1 do artigo 37.°), é desde logo, e em primeiro lugar, a liberdade de expressão, isto é, o direito de não ser impedido de exprimir-se. Esclarecem, mais uma vez, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira que, enquanto «direito negativo ou direito de defesa, a liberdade de expressão é uma componente da clássica liberdade de pensamento, que tem outras dimensões [...], em certa medida, na liberdade de reunião e manifestação» (idem, ibidem, p. 225).

O artigo 54.°, n.° I, da Constituição determina que «os cidadãos têm o direito de reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização».

Mais especificamente, o n.° 2 do artigo 54." dispõe que «a todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação». Conforme explicam os autores supramencionados, o direito de manifestação, ao contrário do direito de reunião, não é, necessariamente, um direito colectivo, tem de revestir uma forma de exercício público, supõe a expressão de uma mensagem dirigida contra ou em direcção a terceiros e serve normalmente propósitos ou motivações políticas.

Não carecendo de autorização prévia, as manifestações devem, no entanto, obedecer a determinados requisitos, como sejam a comunicação prévia, por forma a «permitir à autoridades públicas fazer o que delas dependa para que a manifestação que decorra sem incidentes (v. g. regularizar o trânsito, prevenir contramanifestações e garantir a segurança)» (idem, ibidem, p. 254).

Admite-se inclusivamente a manifestação espontânea como uma das formas mais comuns de exercício do direito de manifestação, mas a todo o tipo de exteriorizações de opiniões está sempre e inabalavelmente subjacente a exigência do carácter pacífico e da ausência de armas como único limite substancial à liberdade de manifestação.

Contrapondo os dois direitos fundamentais, verificamos que ambos podem ser objecto de restrições perante situações taxativamente previstas na lei e que, por outro lado, se pode dar o caso de essas liberdades fundamentais se cercearem e restringirem mutuamente.

Procedendo-se a uma hierarquização, se é que tal é possível, destes direitos e liberdades, podemos concluir que a liberdade de expressão e manifestação, numa democracia, nunca deverá sobrepor-se à liberdade de circulação dos demais cidadãos.

Nestes termos, somos do seguinte

Parecer

A proposta de lei n.° 125/VII preenche os requisitos constitucionais e regimentais necessários para subir a Plenário.

Lisboa, 20 de Outubro de 1997. — O Deputado Relator, Jorge Ferreira. — O Presidente da Comissão, Alberto Martins.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.