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0014 | II Série A - Número 056S | 09 de Janeiro de 2003

 

- do princípio da proibição do retrocesso social - por considerar não se poder afirmar ter-se por autonomamente atingido "o núcleo essencial dá existência mínima inerente ao respeito pela dignidade da pessoa humana", nem pela violação do princípio da igualdade, só de forma incoerente se poderá ter concluído que a não previsão dos jovens como titulares do direito ao rendimento social de inserção viola o conteúdo mínimo do direito a uma existência condigna postulado pelo princípio do respeito pela dignidade humana. Muito embora aceitando poder o princípio da dignidade humana constituir fonte constitucional autónoma de um direito a exigir do Estado uma prestação positiva, que poderá assumir as mais diversas formas, desde que funcionalmente adequadas a poder salvaguardar a existência física e psíquica humanas - atenta a circunstância de esse princípio ser um princípio estruturante de todo o sistema constitucional e do próprio Estado - nunca tal direito será definido como um direito categorial ou respeitante a certo círculo de pessoas, mas antes um verdadeiro direito subjectivo constitucional que só existirá onde esse mínimo de existência possa ser surpreendido. Ora, esse mínimo é, por natureza diferente, de pessoa para pessoa e de idade para idade, e mormente nas idades que estão em causa. Nesta perspectiva e considerando que os menores de 25 anos tendem a estar ainda integrados na família e que as suas necessidades são essencialmente de inserção na comunidade de emprego, não se vê terreno para poder afirmar-se a necessidade de salvaguarda de um direito subjectivamente categorial a um mínimo de existência traduzido na atribuição de uma prestação pecuniária.
A tudo acresce que existem já alguns instrumentos jurídicos, como são aqueles de que o próprio acórdão dá conta, que, em concreto e relativamente a uma parte dos jovens, dão já alguma satisfação à necessidade de inserção na comunidade do trabalho.
Por outro lado, o acórdão nem sequer equacionou o facto bem conhecido da realização de muitas prestações, inseridas neste âmbito material, que são realizadas pelas organizações não governamentais.
Finalmente, o acórdão sofre de uma petição de princípio, pois deixa por demonstrar quais as utilidades ou feixes de utilidades e a sua expressão positiva, mormente de natureza quântica, que devam integrar o núcleo do direito a um mínimo de existência e que o rendimento de inserção a que se refere o artigo 4.º do Decreto da Assembleia da República, cuja constitucionalidade se sindicou, corresponda a esse mínimo que tenha de ser necessariamente garantido de forma categorial. - Benjamim Rodrigues.

Declaração de voto

1 - Não obstante os termos sintéticos da fórmula decisória, é óbvio - como, de resto, resulta à evidência dos termos em que a questão foi posta ao Tribunal e dos fundamentos do precedente acórdão - que o juízo de inconstitucionalidade neste emitido se cinge ao facto de o preceito em apreço, que define a titularidade do "rendimento de inserção social", não abranger, em geral, os cidadãos de idade compreendida entre os 18 e os 25 anos: está-se, pois, diante de uma inconstitucionalidade parcial "qualitativa", a qual radica, no fundo, e num certo sentido, numa "omissão" do legislador.
Mas - emerge isso ainda, clara e expressamente, da fundamentação do acórdão - tal inconstitucionalidade (ou omissão) não reside sequer, e sem mais, na circunstância de os cidadãos antes referidos não poderem ser, em regra, beneficiários do dito rendimento: reside mais precisamente, e tão-só, no facto de não poderem ser beneficiários dele nem lhes estar garantida, pelo conjunto da ordem jurídica, qualquer outra prestação "alternativa" (pecuniária ou em espécie) que lhes assegure o "direito a um mínimo de existência condigna".
No juízo de inconstitucionalidade assim emitido pelo Tribunal, destacarei, pois, dois aspectos:

- Que ele se fundamenta na violação, não de um princípio de "proibição do retrocesso social", mas antes do direito (a um mínimo de existência condigna) acabado de referir; e
- Que, no tocante à concreta modelação da prestação que há-de ser garantida aos jovens entre os 18 e os 25 anos, em geral, o Tribunal a deixa ao "poder de conformação" ou "autonomia" de escolha do legislador. O que significa - sem margem para qualquer dúvida - que o expurgo da inconstitucionalidade agora reconhecida não tem de passar necessariamente pelo alargamento do "rendimento de inserção social" (tal como regulado no diploma em que se insere a norma em apreço) àquele universo de pessoas (através de uma reformulação, em conformidade, dessa norma): pode perfeitamente ser obtido percorrendo outros caminhos.

2 - Pese o fundamento do juízo de inconstitucionalidade, a que o Tribunal chegou, ser o referido (e não um princípio de "proibição do retrocesso social", que continua a merecer-me as maiores reservas, à luz da "teoria constitucional" que logo na declaração de voto aposta ao Acórdão n.º 39/84, por exemplo, evoquei, e à qual me mantenho fiel) e pese, por outra banda, o alcance - afinal, limitado - desse juízo, não pude acompanhá-lo. As razões do meu dissentimento convergem, no essencial, com as que constam das declarações de voto dos Ex.mos. Juízes Conselheiros que igualmente não subscreveram a decisão do Tribunal. Apenas sublinharei, por isso, o seguinte:

-Também comungo da ideia de que há um dever do Estado de promover as condições (de assegurar, se se quiser) a realização do limiar mínimo da existência condigna de todas e cada uma das pessoas concretas que integram a comunidade política: um Estado que se confessa baseado, antes de mais, na "dignidade da pessoa humana" e se pretende "ao serviço da pessoa" (um Estado que existe propter nos homines et propter nostram salutem) há-de hoje, certamente, inscrever aquele objectivo entre os fins primários da sua actuação. Mas construir, a partir daí, logo ao nível constitucional, um direito, no sentido estrito e dogmático do conceito (sublinho o ponto), com identidade e consistência bastantes, ainda que mínimas, para dele se extrair a conclusão a que o Tribunal chegou (e, afinal, como creio estar implicitamente contida na lógica do acórdão, também a de que, antes do diploma instituidor do "rendimento mínimo garantido", haveria nessa área uma vasta "omissão legislativa"), vai um largo e arrojado, mas problemático passo;