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Sábado, 6 de Dezembro de 2003 II Série-A - Número 19
IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)
SUPLEMENTO
S U M Á R I O
Projecto de resolução n.o 194/IX:
Sobre a Constituição Europeia (apresentado pela Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa):
- Texto do projecto de resolução.
- Relatório da Comissão referente aos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa e sobre o projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 194/IX
SOBRE A CONSTITUIÇÃO EUROPEIA
Considerando o Relatório sobre os Trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa e sobre o Projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa, da autoria do Deputado António José Seguro;
Considerando o desenvolvimento dos trabalhos da Conferência Intergovernamental e a realização, em Dezembro, de uma reunião do Conselho Europeu;
a Assembleia da República, no respeito pelas normas constitucionais e legais, delibera que:
Sobre o método Convenção
1 - O método Convenção deve ser utilizado, em futuras revisões do Tratado Constitucional, na fase de preparação, com uma composição semelhante e assegurando sempre a representação da dimensão parlamentar nacional e europeia;
2 - A Convenção deve ser dotada de meios que possibilitem aos seus membros reunir-se em condições tais (designadamente com maior periodicidade ou mesmo em permanência), que a falta de tempo não constitua razão, ou até mesmo álibi, para o não aprofundamento da revisão, como aconteceu no presente caso;
3 - O método de deliberação da Convenção deve assegurar a expressão livre dos seus membros, de modo a reflectir as diferentes sensibilidades presentes;
Participação da Assembleia da República
4 - A designação dos representantes da Assembleia da República em futuras Convenções deverá ser feita através de eleição em Plenário e tendo por base um mandato cujo conteúdo (grandes princípios orientadores e objectivos de participação) deverá ser debatido e aprovado sob a forma de Resolução;
5 - A Assembleia da República deverá promover debates regulares de acompanhamento dos trabalhos de futuras Convenções, em sessão plenária, tendo por base relatórios escritos dos respectivos representantes;
Projecto de Tratado Constitucional
6 - O projecto de Tratado Constitucional corresponde no essencial aos desafios enunciados na Declaração sobre o Futuro da Europa anexa ao Tratado de Nice, nomeadamente:
- A existência de personalidade jurídica da União;
- A integração da Carta dos Direitos Fundamentais adquirindo força vinculativa;
- A clarificação de competências entre a União e os Estados-membros;
- A simplificação dos actos legislativos e não legislativos;
- A existência de um só texto constitucional integrando todo o articulado;
- As referências aos objectivos da coesão social, económica e territorial;
- O envolvimento dos Parlamentos nacionais no processo de decisão da União;
7 - O actual projecto de Tratado Constitucional deve continuar a ser a base dos trabalhos da Conferência Intergovernamental;
8 - Em caso algum, o resultado final da Conferência Intergovernamental deverá ficar aquém do alcançado pela Convenção;
9 - É fundamental promover-se um amplo debate público no nosso país, com o propósito de os portugueses serem esclarecidos sobre o sentido e o conteúdo do projecto de Tratado Constitucional. É importante que o debate se faça, que os portugueses participem, que a nossa sociedade não passe ao lado das opções essenciais para o seu futuro;
10 - A Assembleia da República, nomeadamente através da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, deverá prosseguir o processo de audições adequadas dos diferentes pontos de vista da sociedade portuguesa, antes da aprovação do Tratado Constitucional;
11 - É desejável que se faça em Portugal um referendo sobre a nossa posição face à evolução da União Europeia.
Sem prejuízo do que se vem concluindo, o Governo, no quadro das negociações da CIG, deve ainda ter em conta:
12 - O benefício para o melhor funcionamento e compreensão do quadro institucional que resultaria da autonomização do Conselho Legislativo;
13 - A adopção da dupla maioria simples ou qualificada (com igual ponderação de Estados e de população, mas nunca superior a 60%), como regra de deliberação no Conselho de Ministros, acabando com o sistema de votos ponderados;
14 - Qualquer alteração da composição da Comissão deverá respeitar, quanto ao acesso e ao estatuto, o princípio da igualdade dos Estados;
15 - A lista de nomes a apresentar por um Estado-membro ao Presidente da Comissão para este escolher um Comissário deverá, em qualquer circunstância, incluir representantes dos dois sexos e que idêntico princípio deverá ser verificado na composição final da Comissão;
16 - Em caso algum os critérios de eficácia poderão revogar o princípio de utilização da língua portuguesa como língua oficial e de trabalho da União, para falar, ouvir, ler e escrever;
17 - Os recursos próprios da União são manifestamente insuficientes para que esta execute com êxito, no âmbito das suas competências, os objectivos determinados no Projecto de Tratado Constitucional;
18 - O governo económico da União e a coordenação de políticas económicas deverão ser objecto de aperfeiçoamento no sentido de garantir que a estabilidade
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e o crescimento sejam prosseguidos no seio da União;
19 - A possibilidade de os parlamentos legislativos regionais poderem recorrer ao Tribunal de Justiça, em matérias que lhe digam exclusivamente respeito, em termos a regular pelo direito constitucional de cada Estado-membro;
20 - Seja consagrada explicitamente a igualdade entre mulheres e homens com um dos valores sobre os quais assenta a União;
21 - As várias propostas de alteração quanto às políticas sectoriais que constam do presente relatório e dos seus anexos, nomeadamente a que propõe a integração de uma base jurídica para o Turismo de modo a que a União possa desenvolver acções de apoio, coordenação ou de complemento.
Face à desejável adopção do Tratado Constitucional, deve a própria Assembleia da República proceder de imediato a uma reflexão sobre o seu modo de acompanhamento da construção europeia e de fiscalização do Governo, de modo a dotar-se de normas e de meios humanos e técnicos correspondentes às suas competências constitucionais.
Lisboa, 25 de Novembro de 2003. - O Presidente Comissão de Assuntos Europeus e de Política Externa, Jaime Gama.
COMISSÃO DE ASSUNTOS EUROPEUS E POLÍTICA EXTERNA
Relatório da Comissão referente aos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa e sobre o projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa
INDÍCE
Exposição de motivos
Razão deste relatório e fases da sua preparação
A análise do Método Convenção
A análise da participação da Assembleia da República
A análise do projecto de Tratado Constitucional
Análise da Parte I
Análise da Parte II
Análise da Parte III
Análise da Parte IV
Conclusões e parecer
EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS
Após o desmoronamento das ditaduras comunistas no Centro e Leste do Continente Europeu, os líderes da União Europeia (União) decidiram, durante a reunião do Conselho Europeu de Copenhaga [Em Dezembro de 2003], iniciar um processo de alargamento e de aprofundamento da União, tendo para tal fixado quatro critérios: três a cumprir pelos Estados candidatos a membros da União e um "quarto critério" desafiando a capacidade dos actuais quinze Estados-membros, para aperfeiçoarem o funcionamento das instituições e tornar mais eficazes os métodos de decisão comunitários.
Decorrente deste "quarto critério", foram elaborados dois novos Tratados: o de Amesterdão (aprovado em 1997, tendo entrado em vigor em Maio de 1999) e o de Nice (concluído em Dezembro de 2000, assinado em Fevereiro de 2001 e que entrou em vigor em Fevereiro de 2003); e iniciou-se e concluiu-se um processo de alargamento da União a mais doze países, dos quais dez serão membros da União em 1 de Maio de 2004 (Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Polónia, República Checa) e dois a partir de 2007 (Bulgária e Roménia).
No momento da aprovação do Tratado de Nice, os líderes dos quinze Estados-membros europeus aprovaram também, uma Declaração Respeitante ao Futuro da União a Incluir na Acta Final da Conferência anexa ao Tratado, conhecida inicialmente por Anexo IV e posteriormente intitulada Declaração 23, que abaixo se cita, com sublinhados da autoria do relator:
"1. Foram decididas em Nice reformas importantes. A Conferência congratula-se pelo facto de a Conferência dos Representantes dos Governos dos Estados-membros ter sido concluída com êxito e comete aos Estados-membros a tarefa de levar rapidamente a bom termo a ratificação do Tratado de Nice.
2. A Conferência concorda que a conclusão da Conferência dos Representantes dos Governos dos Estados-membros abre caminho ao alargamento da União Europeia e salienta que, com a ratificação do Tratado de Nice, a União terá completado as alterações institucionais necessárias à adesão de novos Estados-membros.
3. Tendo aberto caminho ao alargamento, a Conferência apela a um debate mais amplo e profundo sobre o futuro da União Europeia. Em 2001, as Presidências sueca e belga, em cooperação com a Comissão e com a participação do Parlamento Europeu, fomentarão um amplo debate que associe todas as partes interessadas: representantes dos Parlamentos Nacionais e todos os que repercutem a opinião pública, ou seja círculos políticos, económicos, universitários, representantes da sociedade civil, etc. Os Estados candidatos serão associados a este processo segundo formas a definir.
4. Na sequência do relatório a apresentar em Göteborg, em Junho de 2001, o Conselho Europeu aprovará uma declaração, na sessão de Bruxelas/Laeken de Dezembro de 2001, que incluirá as iniciativas apropriadas para dar seguimento a este processo.
5. O processo deverá abordar, nomeadamente, as seguintes questões:
- Estabelecimento e controlo de uma delimitação mais precisa das competências entre a União Europeia e os Estados-membros, que reflicta o princípio da subsidiariedade.
- Estatuto da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia proclamada em Nice, de acordo com as Conclusões de Colónia.
- Simplificação dos Tratados, a fim de os tornar mais claros e mais compreensíveis, sem alterar o seu significado.
- Papel dos Parlamentos nacionais na arquitectura europeia.
6. A Conferência reconhece a necessidade de, na abordagem das questões acima referidas, se melhorar e controlar a legitimidade democrática e a transparência da União e das suas Instituições, por forma aproximá-las dos cidadãos dos Estados-membros.
7. A Conferência decide que, na sequência destes passos preparatórios, será convocada para 2004 uma nova Conferência de Representantes dos Governos dos Estados-membros, para tratar dos pontos supramencionados, tendo em vista as alterações com eles relacionados.
8. A Conferência dos Representantes dos Governos dos Estados-membros não constituirá qualquer tipo de obstáculo ou de condição prévia ao processo de alargamento. Além disso, os Estados candidatos que tiverem concluído as negociações de adesão com a União serão convidados a participar na Conferência. Os Estados candidatos que não tenham concluído as respectivas negociações de adesão serão convidados a título de observadores."
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O Tratado de Nice e a citada Declaração sobre o futuro da União originou, como é do nosso conhecimento, acesos debates nos parlamentos nacionais, no Parlamento Europeu e na opinião pública dos diversos Estados-membros e Estados candidatos, muito fomentados, na perspectiva da construção europeia, pela desilusão dos resultados da Conferência de Nice. Muitas foram as vozes que se ouviram questionando o funcionamento, a transparência e a eficácia política das Instituições da União após o alargamento aos Estados candidatos, e receando mesmo pela sua paralisação. As escolhas pareciam oscilar entre duas posições: a não ratificação do Tratado de Nice, originando um inevitável atraso no alargamento; e a ratificação do Tratado de Nice "condicionada politicamente" ao compromisso de início de uma nova Conferência, tal como constante da Declaração 23, encurtando prazos e assente num novo modelo de preparação.
Por esta segunda opção se pronunciou o Parlamento Europeu, em 31 de Maio de 2001 através da aprovação de uma Resolução [Tendo por base o Relatório Mendes de Vigo/Seguro sobre o Tratado de Nice - ver anexo 1] tendo defendido "a convocação de uma nova CIG assente num processo radicalmente diferente, transparente e aberto à participação do Parlamento Europeu, dos Parlamentos Nacionais e da Comissão"; e exigido, entre outros, a "criação de uma Convenção (cujos trabalhos deverão começar no inicio de 2002) … encarregada de apresentar à CIG uma proposta constitucional assente nos resultados do amplo debate público, o qual deverá servir de base para os trabalhos da CIG"; e manifestando-se "favorável à convocação da CIG para o segundo semestre de 2003".
Em 14 e 15 de Dezembro desse mesmo ano, o Conselho Europeu reunido em Laeken, e tal como previsto na Declaração 23 de Nice, aprova uma Declaração sobre o futuro da União Europeia - Declaração de Laeken [Ver anexo 2] - em que refere os desafios e as reformas numa União renovada, a saber:
- Uma melhor repartição e definição das competências da União;
- A simplificação dos instrumentos da União;
- Mais democracia, transparência e eficácia na União;
- A caminho de uma Constituição para os cidadãos europeus;
e convoca uma Convenção sobre o futuro da Europa, para assegurar uma preparação tão ampla e transparente quanto possível da próxima CIG.
A esta Convenção foi-lhe fixada:
- uma missão: "debater os problemas essenciais colocados pelo futuro desenvolvimento da União e analisar as diferentes soluções possíveis".
- a sua composição: para além de um Presidente (Valéry Giscard d´Estaing) e de dois Vice-Presidentes (Giuliano Amato e Jean-Luc Dehaene) designados pelo Conselho Europeu, a Convenção seria composta por um representante de cada um dos Governos dos Estados-membros da União, 30 membros dos Parlamentos Nacionais, 16 membros do Parlamento Europeu e dois representantes da Comissão. Os países candidatos à adesão participaram plenamente nos trabalhos da Convenção através de um representante do Governo e dois representantes dos respectivos Parlamentos Nacionais.
- um calendário: início dos trabalhos a 1 de Março de 2002 e completados no prazo de um ano, a tempo do Presidente da Convenção poder apresentar os respectivos resultados ao Conselho Europeu.
- o método de trabalho: assente no papel impulsionador do Praesidium e na obrigação do Presidente da Convenção informar regularmente o Conselho Europeu do progresso dos trabalhos.
- o documento final a apresentar: ao Conselho Europeu (como ponto de partida para os trabalhos da CIG) e que poderia compreender quer diferentes opções, indicando o apoio que as mesmas obtiveram, quer recomendações, em caso de consenso.
A Convenção iniciou os seus trabalhos em 28 de Fevereiro de 2002, que terminaram no dia 10 de Julho do presente ano. Desses trabalhos resultou um Projecto de Tratado Constitucional que institui uma Constituição para a Europa, cuja primeira versão foi aprovada por consenso pela Convenção em 13 de Junho de 2003, e apresentada no Conselho Europeu reunido em Salónica (Grécia); e a segunda e definitiva versão, aprovada também por consenso pela Convenção em 10 de Julho de 2003 e entregue ao Presidente do Conselho Europeu, reunido em Roma (Itália), em 18 de Julho de 2003.
RAZÃO DESTE RELATÓRIO E FASES DA SUA PREPARAÇÃO
A Constituição da República Portuguesa determina que compete ao Governo a negociação dos Tratados Internacionais, competindo à Assembleia da República (AR) a sua aprovação e ao Presidente da República a respectiva ratificação.
Face à natureza das matérias que têm sido objecto de negociação no espaço da Europa comunitária, os sucessivos Governos desenvolveram iniciativas informais com os partidos políticos com representação parlamentar e mantiveram o Parlamento regularmente informado.
Este processo tem vindo a aperfeiçoar-se desde a negociação do Tratado de Maastricht, melhorando com o Tratado de Amesterdão e com o Tratado de Nice. Por um lado os Governos sentem maior necessidade de garantirem uma ampla base de apoio para o Tratado negociado, e por outro lado, a Assembleia da Republica tem expressado a sua exigência em não se ver confrontada com factos consumados e transformar-se numa espécie de tabelião. Este fluxo de "cooperação" tornou-se mais evidente quando os Governos não dispunham de uma base maioritária de apoio parlamentar ou quando a aprovação de um Tratado justificou uma revisão constitucional [Casos da aprovação do Tratado de Amesterdão da União Europeia e, supra União Europeia, do Tribunal Penal Internacional].
Acontece que na presente revisão dos Tratados europeus, o Conselho Europeu decidiu inovar o processo ao criar uma fase preparatória, convocando para tal uma Convenção, onde pela primeira vez os Parlamentos Nacionais foram chamados a participar em pé de igualdade com os governos.
Esta nova fórmula proporcionou um maior envolvimento da Assembleia da República, pela informação que obtinha dos seus representantes, pela transparência dos debates
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ocorridos na Convenção e pela indispensável presença do Governo nos trabalhos parlamentares, aspectos que mais à frente serão analisados em detalhe.
Este novo dinamismo, conduziu a que a Comissão dos Assuntos Europeus e de Política Externa (CAEPE), no âmbito das competências que lhe estão cometidas pelo Regimento da AR e pela Lei n.º 20/94 de 15 de Junho, não aceitasse remeter-se a uma interpretação estática quanto ao seu envolvimento constitucional na aprovação dos Tratados internacionais.
Deste modo, findos os trabalhos da Convenção, apresentado o Projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa e nas vésperas do início de uma nova Conferência Intergovernamental (CIG), a CAEPE [Por iniciativa do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, aprovada por unanimidade em 1 de Julho de 2003] entendeu - na sequência do acompanhamento regular dos trabalhos da Convenção - que deveria proceder à elaboração de um relatório de análise dos trabalhos efectuados e do Projecto de Tratado Constitucional e que das suas conclusões deveria resultar um projecto de resolução através do qual o Parlamento expressaria as suas posições que o Governo deveria ter em conta durante a negociação na CIG.
Esta deliberação viria ainda ao encontro da decisão política do Governo ao propor à Assembleia da República, através de declaração do Sr. Primeiro-Ministro [Vide sessão plenária de 12 de Junho de 2003, a propósito do debate mensal], a constituição de um Grupo de Contacto [Ficou estabelecido, por sugestão do Presidente da CAEPE, do Ministro dos Negócios Estrangeiros e do Ministro dos Assuntos Parlamentares, que o Grupo de Contacto seria composto pela própria Comissão dos Assuntos Europeus e de Política Externa] entre os dois Órgãos de Soberania.
Através desta decisão, a CAEPE manifestou o seu inequívoco desejo de não ser remetida para uma tarefa de "aprovação formal" do documento final. Este facto que desejamos constitua um exemplo a seguir no futuro, reflecte bem a consciência política de que a natureza deste Tratado exigia e exige uma atitude prepositiva e permanente de fiscalização da acção do Governo, na sua qualidade de negociador em nome do Estado Português.
Assim em 8 de Julho de 2003, a CAEPE deliberou encarregar o Deputado António José Seguro, por interesse manifestado pelo próprio, da elaboração do referido relatório.
Com o objectivo de envolver o maior número de portugueses no processo de debate do novo Tratado e de modo a que o Relatório reflectisse a maior diversidade possível de opiniões, o Relator solicitou [Ver anexo 3] ao Presidente da CAEPE, Deputado Jaime Gama, que fossem endereçados convites às organizações mais representativas dos diferentes sectores sociais, económicos, culturais, ambientais e outros da sociedade portuguesa, para que se pronunciassem sobre as matérias em causa.
Simultaneamente foram solicitados pareceres às demais Comissões Especializadas (à excepção da Comissão de execução orçamental) da AR de modo a enriquecer a análise dos objectos definidos e a procurar um envolvimento desejável de todos os Deputados perante um processo de grande importância para os nossos destinos colectivos.
Por todo este processo de consultas ter decorrido durante o período tradicional de férias, decidiu-se aceitar o envio dos referidos contributos até ao final do mês de Outubro.
A CAEPE debateu o calendário e a metodologia de elaboração do presente Relatório em duas reuniões (16 e 23 de Setembro) e a sua estrutura na reunião de 28 de Outubro.
A CAEPE decidiu, nesta última reunião, que o projecto de relatório deveria ser objecto de apresentação e de debate na reunião de 18 de Novembro.
Em 18 de Novembro, o deputado relator entregou e apresentou o projecto de relatório na reunião ordinária da CAEPE. No final do debate, a CAEPE deliberou que a votação se faria no dia 25 de Novembro, e que as propostas de alteração deveriam ser entregues até ao dia 21 de Novembro.
Os contributos para o relatório
Das contribuições [Ver anexo 4 para consultar todos os contributos na íntegra] propositadamente solicitadas foram recebidas vinte e duas respostas dos parceiros e seis das comissões especializadas da Assembleia da República, a saber:
Lista, por ordem de chegada, das entidades que enviaram contributos
1. Região Autónoma dos Açores,
2. Associação Empresarial de Portugal,
3. Associação Industrial Portuguesa [O contributo foi elaborado em conjunto com a Associação Portuguesa de Bancos; a Associação Portuguesa de Seguradoras; a Confederação de Agricultores de Portugal; a Confederação da Indústria Portuguesa e a Confederação do Turismo de Portugal];
4. Ordem dos Farmacêuticos;
5. Associação Nacional das Farmácias;
6. Associação Nacional de Municípios Portugueses;
7. Confederação do Turismo Português;
8. Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP);
9. Instituto de Defesa Nacional;
10. Associação de Reflexão e Intervenção na Política Educativa das Escolas Superiores de Educação (ARIPESE);
11. Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM);
12. Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável;
13. NGD - Plataforma Portuguesa; QUERCUS;
14. Associação para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES);
15. LEM - Lobby Europeu de Mulheres e AFEM - Associação de Mulheres da Europa Meridional;
16. Conselho Nacional de Juventude (CNJ);
17. União Geral dos Trabalhadores (UGT);
18. Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado (APESP);
19. Ordem dos Engenheiros;
20. Civitas.
21. Plataforma Portuguesa das Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD).
22. Instituto Superior da Maia (ISMAI).
O Conselho Económico e Social e o Conselho Nacional de Educação responderam dizendo
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não ter condições para se pronunciar dentro dos prazos fixados.
Lista, por ordem de chegada, dos contributos [Ver anexo 5] das comissões especializadas:
Comissão Parlamentar do Trabalho e dos Assuntos Sociais;
Comissão Parlamentar de Defesa Nacional;
Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura;
Comissão Parlamentar de Economia e Finanças;
Comissão Parlamentar de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas;
Comissão Parlamentar de Obras Públicas, Transportes e Comunicações [Entregue depois da apresentação do presente Relatório à CAEPE, no dia 18 de Novembro, o que impossibilitou a incorporação, salvo algumas excepções, no texto principal do presente Relatório, como seria nosso desejo. O parecer integral pode ser consultado no Anexo 5];
Comissão Parlamentar de Poder Local, Ordenamento do Território e Ambiente [Entregue depois da apresentação do presente Relatório à CAEPE, no dia 18 de Novembro, o que impossibilitou a incorporação, salvo algumas excepções, no texto principal do presente Relatório, como seria nosso desejo. O parecer integral pode ser consultado no Anexo 5];
Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias [Entregue depois da apresentação do presente Relatório à CAEPE, no dia 18 de Novembro, o que impossibilitou a incorporação, salvo algumas excepções, no texto principal do presente Relatório, como seria nosso desejo. O parecer integral pode ser consultado no Anexo 5];
Para além dos contributos solicitados, recebemos - com agrado - a contribuição do Dr. Tiago Fonseca Machado [Ver anexo 6] que ao ter tido conhecimento, através da Imprensa, da elaboração do Relatório quis participar no debate enviando as suas posições.
Recebemos também as posições do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda [Ver anexo 6].
Para a elaboração do presente Relatório tivemos sempre presente, os relatos que os representantes da AR na Convenção foram efectuando ao longo do seu mandato, as posições do Governo português, bem como toda a actividade parlamentar muito em particular a desenvolvida pela CAEPE como adiante se detalha.
A análise
A análise será estruturada em três partes: análise do método Convenção; análise da participação da AR; e a análise do Projecto de Tratado Constitucional que institui uma Constituição para a Europa.
A ANÁLISE DO MÉTODO CONVENÇÃO
Como vimos na exposição de motivos, a convocação da Convenção visou dar resposta à necessidade de se assegurar uma preparação ampla e transparente da CIG, constatada a falência do método "exclusivamente CIG" para a revisão dos tratados europeus.
De facto, o secretismo das negociações ao clássico estilo diplomático, a exclusão dos parlamentos nacionais e do Parlamento Europeu do processo, a ausência de transparência quanto ao debate realizado pelos líderes europeus e o fracasso dos resultados obtidos em Nice, constituíram argumentos sólidos para a reivindicação de um outro processo.
A este facto acrescem os bons resultados obtidos pela Convenção encarregue de elaborar a Carta dos Direitos Fundamentais da União.
Foi assim que a Convenção foi convocada, inaugurando uma nova fase no processo de revisão: a da preparação pública das propostas para a CIG.
Em nossa opinião, não foi alheia a esta deliberação a vontade política dos Estados-membros da União que desejavam, e continuam a desejar, que desta CIG, não resulte apenas mais um tratado europeu, mas sim uma Constituição, como expressamente foi prevista na Declaração de Laeken [Quando nesta se refere "a caminho de uma Constituição para os cidadãos europeus" como um dos desafios e das reformas a efectuar].
Para que tal aconteça tornava-se necessário constituir um espaço, onde os principais protagonistas nacionais e europeus titulares dos órgãos de soberania, se reunissem num debate público e por consequência transparente, e que mobilizasse as opiniões públicas dos Estados-membros de modo a que o produto final saído da Convenção se transformasse num impulso político dificilmente rejeitável pela CIG.
Os membros da Convenção e os seus representados - em particular os parlamentos e os governos - não podem alegar desconhecimento deste ambiente político, responsável (em nossa opinião) pela interpretação dinâmica que a Convenção fez da sua missão e pelo conteúdo e forma do documento final apresentado, como facilmente se constata.
Missão
A Convenção tinha por missão "debater os problemas essenciais e analisar as diferentes soluções possíveis". Fê-lo de facto, mas no nosso entender de forma desequilibrada, tendo presente os quatro desafios que lhe tinham sido colocados pela Declaração de Laeken.
Em nossa opinião a Convenção, trabalhou sobre propostas concretas de simplificação dos instrumentos da União e abriu claramente o caminho de uma Constituição para os cidadãos europeus. Já no que concerne aos desafios de uma melhor repartição e definição de competências e de mais democracia, transparência e eficácia da União, a resposta não pode ser tão categórica como foi a primeira.
Com efeito, a Convenção absteve-se de tratar das políticas sectoriais e apesar de ter dedicado bastante tempo às chamadas "questões institucionais" não abordou com profundidade o modo de financiamento e o volume dos recursos financeiros, indispensáveis à eficácia das políticas da União, em vésperas do maior alargamento de sempre na sua História.
Já quanto aos quatro desafios formulados na Declaração 23, anexa ao Tratado de Nice, a Convenção deu uma resposta bastante satisfatória ao estabelecer uma delimitação mais precisa das actuais competências entre a União e os seus Estados-membros, ao enunciar claramente o princípio da subsidiariedade; ao incluir a Carta dos Direitos Fundamentais no futuro tratado; ao simplificar os tratados
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e ao definir um papel, ainda que pouco ambicioso, para os parlamentos nacionais na arquitectura europeia.
Composição
Desde logo, a composição da Convenção foi um reflexo formal da procura de superação do método intergovernamental.
Parece-nos meritória a sua composição, sublinhando mais uma vez a inclusão, pela primeira vez, da dimensão parlamentar aos níveis nacional e europeu no processo de preparação da revisão dos Tratados europeus.
A diversidade dos representantes que compunham a Convenção conferiu a esta uma maior legitimidade quanto aos seus trabalhos e ao valor dos resultados finais.
Não obstante, essa diversidade teve como consequência que o número total de membros da Convenção tivesse ultrapassado a centena (105 membros).
Tal facto, combinado com o número necessariamente escasso de reuniões plenárias, 25 no total, deslocou para a estrutura permanente (o Praesidium) [O Praesidium era composto por um Presidente e dois Vice-Presidentes designados pelo Conselho Europeu, três representantes dos Parlamentos Nacionais, três representantes em representação dos Governos, três representantes do Parlamento Europeu e dois membros da Comissão Europeia] e para o seu Presidente uma parte importante do seu trabalho.
Apesar de a Declaração de Laeken não o ter fixado, consideramos positiva a participação, como observadores, de seis representantes do Comité das Regiões, três representantes do Comité Económico e Social e três representantes dos parceiros sociais europeus.
Calendário
A Convenção iniciou os seus trabalhos em 28 de Fevereiro de 2002 e terminou-os em 10 de Julho de 2003, ou seja quatro meses mais do que o prazo fixado.
Apenas referimos estas datas atendendo à natureza, também didáctica, deste Relatório, dado que o prolongamento dos trabalhos - ao contrário do que se poderia inferir - resultou numa melhor preparação da CIG.
Aliás a convocação da CIG estava prevista acontecer no ano de 2004 [Ver Declaração 23 anexa ao Tratado de Nice] e o Conselho Europeu decidiu antecipá-la para 4 de Outubro do corrente ano, fruto do trabalho da Convenção.
Neste caso o "atraso" introduziu um ganho de tempo no processo.
Método de trabalho
Na análise da composição da Convenção já nos referimos à forma como esta teve repercussões no método de trabalho originariamente fixado na Declaração de Laeken.
Com efeito, o papel impulsionador do Praesidium ganhou uma dimensão reforçada pelo facto exposto anteriormente, acrescida da maior facilidade de reflexão e de produção de propostas, dado o reduzido número dos seus membros.
E quando o Praesidium não conseguia alcançar o consenso desejável, o papel impulsionador foi frequentemente utilizado pelo Presidente da Convenção.
Recordamos que as referências explícitas, na Declaração de Laeken, ao papel do Presidente da Convenção se circunscreviam a presidir à Convenção e a informar regularmente o Conselho Europeu do progresso dos trabalhos da Convenção.
Formalmente a Convenção funcionou em três fases:
Inicialmente, debatendo em sessões plenárias temas globais que correspondiam aos desafios e tarefas descritas nas duas Declarações que vimos citando;
Posteriormente foram criados 11 grupos de trabalho (Carta dos Direitos Fundamentais - competências complementares - defesa - domínio social - espaço de liberdade, segurança e justiça - governação económica - parlamentos nacionais - personalidade jurídica - relações externas - simplificação dos procedimentos legislativos - subsidiariedade - e mais tarde alguns "círculos de reflexão" (nomeadamente sobre o Tribunal de Justiça, questões orçamentais e recursos próprios). Cada grupo de trabalho elaborou as conclusões da sua reflexão que posteriormente foram debatidas em sessão plenária;
Finalmente, a Convenção debruçou-se sobre projectos de articulados apresentados pelo Praesidium;
No que respeita a esta última fase, tem muita pertinência o que o membro da Convenção, Deputado Alberto Costa afirmou a este propósito "Na última fase da Convenção, os debates desenrolaram-se já sobre projectos de articulados apresentados pelo Praesidium, divulgados com a antecedência mínima para permitir a apresentação de propostas de alteração por parte dos membros da Convenção (que ocorreu efectivamente em larga escala). Após as sessões, os trabalhos eram ponderados pelo Praesidium, que introduzia as alterações que julgava justificadas. Neste método de trabalho, o Praesidium constituía a verdadeira instância de apuramento, já que nas reuniões plenárias, tal como nas das componentes, nunca se votava" [in Relatório e Intervenções sobre a Convenção Europeia sobre o futuro da Europa, páginas 11 e 12].
O facto de nunca se ter procedido a uma votação nas sessões plenárias, inclusive sobre o próprio Projecto de Tratado Constitucional agora em análise, exige, no mínimo uma reflexão aprofundada, mesmo atendendo à natureza e aos objectivos precisos dos trabalhos da Convenção.
Outro ponto de enorme relevo para a nossa análise recai sobre a constatação do facto das matérias referentes às questões institucionais não terem sido tratadas pelos grupos de trabalho, ao contrário do que tinha sido recomendado. Neste caso, foi o próprio Praesidium que preparou as propostas e as remeteu para a sessão plenária, sob a forma de articulado.
Somos de opinião que em futuras convocações da fórmula Convenção, caso venha a ser adoptada, esta deverá ser munida de recursos necessários para que o método de trabalho não seja deslocado do plenário da Convenção. Será decerto um método de trabalho mais exigente, que obrigará à realização de mais sessões plenárias mas a que corresponderá um maior envolvimento de cada um dos membros da Convenção. Ora, este envolvimento é desejável e muito enriquecedor do debate e da proposta final.
Documento final
De acordo com a Declaração de Laeken, o documento final poderia ter duas naturezas distintas: compreender as diferentes opções com a menção dos apoios correspondentes ou efectuar recomendações em caso de consenso.
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Ao optar pela elaboração e apresentação de um Projecto de Tratado Constitucional que institui uma Constituição para a Europa, a Convenção efectuou aquilo a que poderemos designar por uma recomendação única, adoptada por consenso.
É este documento que mais adiante analisaremos e que serve de base aos trabalhos da CIG, iniciados em 4 de Outubro de 2003.
ANÁLISE DA PARTICIPAÇÃO DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
Os representantes parlamentares na Convenção
Os representantes efectivos da Assembleia da República na Convenção foram os Deputados Maria Eduarda Azevedo (PSD) e Alberto Costa (PS), que tiveram por suplentes, respectivamente, os Deputados António Nazaré Pereira (PSD) e Guilherme d'Oliveira Martins (PS). Embora a sua nomeação tivesse sido efectuada pela Conferência de Líderes (numa altura de transição entre legislaturas) todos estes deputados, à excepção do Deputado Guilherme d'Oliveira Martins (que substituiu o Deputado Osvaldo Castro em Julho de 2002) são membros da CAEPE, o que facilitou o acompanhamento por esta Comissão dos trabalhos da Convenção.
Os representantes parlamentares participaram nas reuniões plenárias da Convenção, nas reuniões dos grupos de trabalho, dos círculos de reflexão, da componente Parlamentos Nacionais, das famílias políticas, dos grupos informais, tendo ainda participado em dezenas de debates organizados por universidades, associações empresariais, confederações sindicais e sindicatos, municípios, escolas (nomeadamente, no âmbito da iniciativa "Primavera da Europa" que decorreu no dia 21 de Março de 2003), estações de rádios e jornais; bem como em reuniões de outras Comissões Parlamentares que, pontualmente, foram acompanhando os trabalhos ou procederam à sua análise final.
O conjunto das intervenções efectuadas no plenário da Convenção bem como todas as propostas e demais contributos apresentados pelos representantes parlamentares, encontram-se disponíveis tanto no site da Convenção como no site do parlamento português que foi criado especialmente para o efeito (http://www.parlamento.pt/destaques/forum_futuro_europa/index.html) e que continha a possibilidade de receber contributos da sociedade civil.
A Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa
No decorrer da Convenção a CAEPE realizou reuniões nos dias 19 de Junho e 20 de Novembro de 2002, 15 de Abril, 12 de Maio, 3 e 30 de Junho de 2003 com os representantes da Assembleia da República e com os representantes do Governo na Convenção, Professor Ernâni Lopes (efectivo) e Dr. Manuel Lobo Antunes (suplente).
Na primeira reunião do dia 19 de Junho de 2002 os representantes na Convenção deram conta das suas opiniões sobre o trabalho que estava a ser desenvolvido até à data, sendo esta mais uma reunião de informação do que de debate.
A Deputada Maria Eduarda Azevedo apresentou duas dimensões da Convenção, qualificando-as como a dimensão adjectiva e a dimensão substantiva. No que diz respeito à dimensão adjectiva, considerou a Convenção como um modelo inovador, embora se baseasse na anterior experiência da Convenção para a Carta dos Direitos Fundamentais, tendo em comum a sua composição. Assim sendo, existia uma legitimação democrática manifesta e o modelo foi bem escolhido para esta mega reflexão sobre o futuro da Europa que não foi conseguida com o Tratado de Nice, o qual, pelas suas insuficiências, talvez tenha descrebilizado um pouco o funcionamento da União Europeia. No que diz respeito à dimensão substantiva, tratava-se de se saber o que se pretende de uma União alargada: um amplo mercado interno ou uma organização de integração política.
É necessário ter em conta que a Convenção não é a CIG (onde não existe a transparência que existe na Convenção), não é uma assembleia constituinte (já que não está mandatada para fazer uma constituição), não é uma conferência de sábios, nem um think tank de académicos (porque é composta por representantes eleitos).
É importante explicar que se trata de identificar o que os cidadãos pretendem da União, afastando-se a ideia de que a Convenção será um fracasso se não conseguir uma constituição ou um qualquer outro resultado muito claro e simples, promessas perigosas que, se não forem cumpridas, poderão contribuir para aumentar ainda mais o défice democrático e para agravar um sentimento de rejeição dos cidadãos em relação à União.
Até ao momento a Convenção tem identificado os princípios/valores da União, que são a democracia, a igualdade entre os Estados e a coesão económica e social; tem identificado as tarefas procurando saber quem deve fazer o quê, de acordo com os princípios da atribuição de competências, da subsidiariedade e da proporcionalidade, e as novas missões que constam dos segundo e terceiros pilares; e tem identificada a necessidade de uma simplificação dos textos dos tratados e dos processos decisórios, que são pouco céleres e opacos.
No que diz respeito aos parlamentos nacionais, cujo grupo de trabalho integra, a Convenção tem procurado uma via de combate ao défice democrático, já que os Parlamentos Nacionais não se podem limitar a ratificar os Tratados, abdicando de competências legislativas que vão para os governos e não para o PE. O debate tem-se centrado sobre a forma mais eficaz de fiscalizar os respectivos governos e na criação de uma segunda câmara (na qual o PE e os Estados que estão mais avançados na fiscalização do executivo não estão interessados); e no reforço da cooperação com o PE.
Como nota final referiu que, nas sessões plenárias, têm dominado os discursos dos membros da Convenção, sem possibilidade de contraditório, o que inviabiliza confrontos de ideias ou formação de consensos. Nestes termos, parece ser mais fácil chegar-se a um texto com diversas opções em aberto do que a um texto único, sendo essa também a melhor opção para que a futura CIG, tenha margem de negociação.
O Deputado Alberto Costa procurou dar outra visão da Convenção, considerando que a anterior oradora já tinha descrito a situação dos trabalhos em curso.
Referiu depois algumas ambiguidades relativamente a uma série de conceitos, dando o exemplo da subsidiariedade (grupo que a deputada integra), que está a ser analisada apenas do ponto de vista descendente e não ascendente e da constituição europeia, que é vista por uns como um avanço para a formação dos Estados Unidos da Europa mas que também pode ser vista como um garante contra avanços injustificados da integração.
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Curiosamente poder-se-á fazer um paralelo entre o que foi dito sobre as missões da União e o que está escrito na constituição portuguesa sobre o mesmo assunto: relações internacionais regidas pelo princípio da liberdade, democracia e igualdade entre os Estados (revisão constitucional de 1989), a coesão económica e social (revisão constitucional de 1992), e a criação de um espaço de segurança, liberdade e justiça (revisão constitucional de 2001).
O debate baliza-se pelo binómio Estado liberal (ordoliberalismo, regulamentação negativa para eliminar discrepâncias nos mercados e limitar o poder regulamentador dos Estados que criam essas discrepâncias) e Estado social europeu (que tem responsabilidades sociais e se rege pelo princípio da solidariedade). Em sua opinião, a União só tem razão de existir se a sua opção for a segunda.
Pronunciou-se ainda sobre o recente debate relativo à justiça e assuntos internos, dizendo que a União se deve concentrar na criminalidade transfronteiriça e deve ser selectiva na sua actuação, sendo necessário uma maior eficácia nas decisões, utilizando-se os instrumentos comunitários do tipo dos regulamentos e directivas adoptados por maioria qualificada e não convenções que demoram anos a ser ratificadas.
Por fim aludiu ao problema do Conselho ter um grupo de representantes pessoais que está a trabalhar sobre a reforma do seu funcionamento, paralelamente à Convenção e sem nenhuma espécie de articulação com esta.
O Prof. Ernâni Lopes dividiu a sua intervenção em quatro pontos: o que está em jogo na União; tópicos da posição que irá defender na Convenção; vectores em que está a trabalhar; e uma nota colateral.
Em primeiro lugar disse que o que estava em jogo é uma releitura da União (enquanto projecto, quadro e processo), obrigatória com o desaparecimento do modelo bipolar (Ocidente/Espaço Comunista), efeito directo da implosão do império soviético. O alargamento ocorrerá exactamente por isso e a União tem de responder às realidades do século XXI com uma abordagem progressiva e em bloco que abrange a Convenção, a CIG e o próprio alargamento.
Em segundo lugar, referiu os tópicos da posição que irá defender na Convenção e que são: a igualdade entre EMs; a confiança entre EMs e as sociedades; o equilíbrio institucional (onde se inclui a preservação do papel da Comissão); e a coesão económica e social/solidariedade. Não está em causa o interesse de Portugal mas o interesse de todos os Estados e da União. Nos próximos 25 anos, para Portugal, será decisivo o vector Convenção/CIG e Alargamento, por um lado, e a capacidade de articulação entre Portugal, Europa, África e Brasil, por outro.
De seguida, explicou os vectores em que está a trabalhar no âmbito da promoção do debate em Portugal. São eles: a comunicação social (com conferências de imprensa após cada sessão plenária da Convenção), os partidos políticos (tendo efectuado reuniões com todos eles), os parceiros sociais (faltando-lhe ainda reunir com as confederações sindicais e patronais) e a sociedade civil (tendo programado a participação em 2/3 de eventos públicos).
Por último, deixou uma nota colateral, que diz respeito ao próximo discurso que fará na Convenção e que será sobre economia e sociedade. A Europa precisa de mudança, que é a palavra chave em virtude da incontornável pressão da globalização e essa mudança é necessária para a reestruturação de empresas, sectores e economias. A visão americana da Europa é que o modelo social não pode ser mexido, que a população está envelhecida, que não existe renovação, que não somos um parceiro a ter em conta. Esta visão tem de ser alterada e a relação entre a economia e a sociedade é a pedra de toque do papel da Europa no mundo.
O Presidente da Assembleia da República que também participava nesta reunião, disse que as expectativas que tinha em relação à mesma tinham sido altamente excedidas e elogiou o trabalho dos representantes portugueses na Convenção. Referiu ainda que, na recente reunião da Conferência dos Presidentes dos Parlamentos, se tinha sublinhado a necessidade dos parlamentos nacionais acompanharem as questões europeias e disse que esse acompanhamento tem de ter um maior prioridade nos trabalhos parlamentares. Torna-se imprescindível que os parlamentares tenham uma melhor relação com a sociedade civil e que a mobilizem para os assuntos europeus.
Na segunda reunião do dia 20 de Novembro de 2002, o Prof. Ernâni Lopes centrou a sua intervenção inicial nos seguintes pontos:
Com a Convenção configura-se uma nova abordagem metodológica da construção europeia em que não há tanta documentação mas mais vivências, o que se reflecte na composição da Convenção e na sua abertura à sociedade civil e à multiplicidade de contactos entre os mais diversos actores, não existindo uma Europa mas várias Europas: a das elites, a dos partidos, a dos burocratas, a dos académicos, a dos diplomatas, etc.; começa-se a perceber que os aspectos político-institucionais que são os que estão no Mandato de Laeken não serão a resolução dos problemas fundamentais da Europa mas sim os aspectos políticos e sociais; no que diz respeito ao papel dos parlamentos nacionais ele sairá reforçado com a fiscalização da acção dos respectivos executivos, no empenhamento directo das decisões comunitárias através do controlo da subsidiariedade e no estreitamento das relações com o PE, existindo uma preocupação constante de aproximar a Europa dos cidadãos.
Sobre as posições que tem defendido na Convenção, referiu que se pronunciou a favor da manutenção da designação "União Europeia", da continuação da existência de um Comissário por Estado-membro e do equilíbrio institucional (onde se inclui a preservação do papel da Comissão e do método comunitário). A ideia da eleição de um Presidente do Conselho em detrimento da manutenção da presidência rotativa do Conselho, que tem merecido a preferência do Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Espanha, põe em jogo a própria filosofia da União, que assenta na igualdade entre os Estados e na colegialidade.
Finalmente, pronunciou-se contra a existência de um catálogo de competências que, a ser aceite, pode diminuir a capacidade de intervenção da União. Sobre o Congresso dos Povos da União, lembrou que são poucos os que apoiam esta ideia e muitos os críticos que afirmam tratar-se um órgão sem competências e, portanto, sem qualquer justificação para ser criado.
Por fim, lançou um desafio para que se promova um debate sobre um conjunto de expressões que são muito utilizadas, mas cujo significado deve ser tornado claro, sendo elas a simplificação, a visibilidade, a inteligibilidade e a aproximação aos cidadãos dos procedimentos e das regras comunitárias.
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A Deputada Maria Eduarda Azevedo começou exactamente por expressar o seu acordo com a ideia que, apesar destas quatro expressões serem mencionadas desde Maastricht, ainda não se ter conseguido dar-lhes um conteúdo preciso.
Referiu-se depois ao arranque, na próxima sessão plenária, do Grupo sobre a Europa Social, que considerou muito importante para Portugal, em especial pela coesão económica e social, lamentando não se continuar com esta experiência de GT, que tem resultados positivos, por oposição às sessões plenárias em que todos falam durante 2/3 minutos, não havendo contraditório nem possibilidade de se gerarem conclusões. Neste sentido, considerou ser difícil nas 7/8 sessões plenárias que ainda restam, conseguir-se debater conclusivamente alguma coisa, o que poderia ser ultrapassado pela criação de mais GT.
Relativamente à apresentação pelo Presidente Giscard d'Estaing do ante-projecto de Tratado Constitucional, que será a base dos futuros artigos, lembrou que a par deste anteprojecto já tinham sido apresentados outros que serão considerados como meros contributos, existindo uma posição de sobranceria por parte do Presidente relativamente a estes projectos.
Sobre este anteprojecto concordou com a eliminação da estrutura dos pilares (resta saber como ela será efectuada e como será mantido o equilíbrio institucional nos dois ex-pilares) e com a inclusão da Carta dos Direitos Fundamentais no Tratado. Manifestou ainda a sua discordância com a ideia da criação do Congresso dos Povos que não tem conteúdo, não sendo possível ser a favor de algo que não se sabe para o que servirá, "um sobrescrito criado sem se ter uma carta", disse, citando um membro da Convenção.
O Deputado Alberto Costa referiu que a ideia mais ambiciosa da Convenção era a de uma constituição europeia, que é uma ideia merecedora de acolhimento, tudo dependendo da concepção, conteúdo e limites, já que não basta chamar constituição a um texto para que este o seja. Se se tratar de uma fonte de garantia de direitos e liberdades, de limites e organização do poder politico e de um factor de integração da comunidade, então a constituição poderá ser positiva para a União.
Passando depois para o particular, perguntou qual o lugar do princípio da coesão e do social na constituição, que não está ainda claro, considerando-os como dois princípios fundamentais da integração, qual o limite da União "cada vez mais estreita", qual o lugar do princípio da igualdade dos Estados, e de que forma se pode reformar a função legislativa para que possa existir uma relegitimação da lei europeia (que é base de 60% de toda a legislação).
Neste último ponto, valorizou a requalificação dos instrumentos legislativos, a associação mais estreita dos parlamentos nacionais e a publicidade das reuniões do Conselho quando este actua como legislador.
No que diz respeito à metodologia adoptada, disse que este anteprojecto deixa transparecer uma visão directorial e tutoral, não sendo correcto que outros textos constitucionais já apresentados não sejam debatidos em iguais circunstâncias.
O Deputado António Nazaré Pereira referiu que quando a Convenção começa a falar de poderes e instituições, começa a reproduzir as tensões da CIG e a posição de Portugal torna-se mais delicada. É curioso verificar que em Portugal o trabalho da Convenção é mal compreendido mesmo na AR (com algumas excepções como o PAR e a CAEPE).
Por outro lado, o papel dos representantes parlamentares na Convenção está cumprido se este for apenas o de assegurar a participação dos parlamentos nacionais na discussão. Contudo, esse papel não é suficiente e verificando-se que embora os representantes parlamentares estejam em maioria, as suas propostas não são tidas em consideração da mesma forma das dos representantes dos governos e dos eurodeputados que estão mais organizados e funcionam em blocos.
Para que esta situação mudasse seria necessário uma alteração institucional e uma mudança nas relações entre o governo e o parlamento que, em Portugal, ainda não foi efectuada. No futuro, o papel dos parlamentos nacionais tem de ser reforçado, não através da criação de um Congresso, mas através de um mais estreito acompanhamento dos respectivos governos, acompanhamento esse que deve envolver todo o parlamento e não apenas alguns Deputados.
O Deputado Guilherme d'Oliveira Martins disse que o método da Convenção era o correcto e adequado, apesar do peso particular dado aos representantes dos governos, no que parecia uma antecipação da CIG e que era indispensável que a AR tivesse uma atenção redobrada ao que se está a passar. No que diz respeito ao método comunitário, referiu que o documento apresentado pelos Comissários Barnier e Vitorino definia com clareza a sua importância.
Quanto ao papel dos parlamentos nacionais, considerou haver avanços significativos no GT da subsidiariedade, dependendo agora da vontade de trabalhar dos parlamentares nacionais, estando aqui a pedra de toque desta questão, que não se resolve com regras mas com vontade política. Neste domínio, acrescentou ser necessária a criação de uma segunda câmara legislativa onde a representação dos Estados fosse igualitária, sendo igualmente necessário introduzir maior transparência no processo legislativo europeu.
Na reunião do dia 15 de Abril de 2003, a Deputada Maria Eduarda Azevedo informou estarem em análise as propostas de articulado relativas à Carta dos Direitos Fundamentais, ao Protocolo sobre a subsidiariedade e proporcionalidade, ao Protocolo sobre o papel dos parlamentos nacionais, ao Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça, e aos aspectos financeiros. Apontou algumas falhas técnicas graves e de articulação, assim como uma certa falta de coerência e de visão conjunta na elaboração destes textos.
Notou igualmente a posição cada vez mais dominante do Praesidium no desenrolar trabalhos, recordando que o regulamento era omisso sobre os métodos de trabalho para as sessões plenárias. A regra tem sido a do Praesidium não levar em conta as conclusões dos grupos de trabalho, apontando ainda uma má gestão do tempo. Mencionou, por fim, que cada membro da Convenção verifica se as suas propostas de alterações foram ou não acolhidas e se constatar que na maioria das vezes não foram, pode começar mesmo, a colocar mesmo em causa a sua presença na Convenção.
O Deputado Alberto Costa sublinhou várias questões no que respeita ao método da Convenção. A primeira dessas questões é relativa às propostas do Praesidium consagrarem uma interpretação discutível dos resultados apresentados pelos grupos de trabalho; para além disso as deliberações do Praesidium reflectiam, sobretudo, as
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posições do seu presidente, considerando também este facto como limitativo em termos democráticos; por outro lado e graças à função redutora do Praesidium nos debates, retendo apenas o que considerava ser consensual, torna-se muito difícil garantir que se critique com êxito uma disposição apresentada pelo Praesidium.
A questão do método era o primeiro "calcanhar de Aquiles" democrático da Convenção, notando que só a componente da Convenção formada pelos parlamentos nacionais se manifestou contrária ao método do consenso. No entanto, esta componente constitui o conjunto mais fragmentado, tendo por isso dificuldades acrescidas, resultando num acentuado conformismo por parte do grupo em maioria na Convenção. Esta situação já não se verifica na componente do PE, que se une na defesa de uma proposta, nem na componente dos governos, questionando-se sobre qual a melhor forma de exercer alguma influência no Praesidium, já que ela dificilmente poderá ser efectuada nas sessões plenárias.
A este respeito, apresentou como exemplo o artigo primeiro, que reflectia uma discutível visão de federalismo, consagrando a ideia da UE como entidade que exerce competências de coordenação relativamente aos Estados-membros e algumas competências em moldes federais. Mencionou o facto dos representantes portugueses na Convenção terem proposto uma fórmula que reproduzisse a ideia de que a União Europeia exerce em comum as competências atribuídas pelos Estados-membros "necessários à construção da União Europeia".
Referiu também que matérias como a cláusula de auxílio mútuo deveriam constar da primeira parte do texto constitucional, o que não foi conseguido até agora. Por outro lado, optou-se por integrar a Carta dos Direitos Fundamentais na primeira parte, em vez de a remeter para um Protocolo anexo, o que é positivo.
Especificamente sobre o papel dos parlamentos nacionais, lamentou existirem poucos indícios relativos à possibilidade dele vir a ser parte integrante do Tratado, deixando de constituir um Protocolo anexo, permanecendo, assim, os parlamentos nacionais relativamente à margem do sistema político europeu. Constatou a vertente "individualista" e negativista do controlo da aplicação do princípio de subsidiariedade, uma vez que terá de ser accionado por cada parlamento individualmente e por apenas se possibilitar a sua intervenção numa óptica descendente, e não se podendo ainda apreciar a substância das iniciativas legislativas.
Chamou igualmente a atenção para o facto dos parlamentos nacionais não poderem controlar áreas como a Europol, a PESC, etc.
O Presidente da Comissão comentou a originalidade e falta de transparência do método, representando o oposto do que usualmente serve à génese democrática de um texto político. Considerou ainda existir um forte risco do Praesidium estar comprometido com um conhecido grupo de Estados-membros e de aos restantes apenas restar aplaudir ou resignar-se, podendo mesmo constituir uma oportunidade de poder acrescido para os Estados-membros de maiores dimensões. Sendo assim, considerou que um sistema federal acabaria por oferecer aos Estados-membros de média e pequena dimensões maiores garantias, pela clareza das regras e dos mecanismos instituídos.
Prosseguiu ainda, dizendo que se uma instância não se encontra legitimada, não se pode considerar democrática, e recordou não existir, paralelamente, uma CIG onde se possa vetar alguma disposição menos favorável, considerando que as conclusões da Convenção constituirão uma forma de pressionar a CIG que reunirá de seguida.
Finalmente comentou a ideia do presidente da Convenção acerca do Congresso dos Povos, com as funções de contribuir para uma maior visibilidade externa dos trabalhos da UE; de acolher o debate anual sobre o Estado da União, presidido pelo presidente do Conselho, perante o PE e os parlamentos nacionais; e de eleger o presidente do Conselho Europeu.
Na reunião do dia 12 de Maio de 2003, o Dr. Manuel Lobo Antunes começou por fazer uma descrição do método de trabalho que estava a ser seguido com a apresentação das propostas de articulado do Praesidium e com o envio de propostas de alteração de cada um dos membros da Convenção. Até à data o Praesidium já tinha apresentado as suas propostas para as partes I e III e, na próxima reunião, a discussão seria centrada sobre duas das questões mais importantes que seriam as instituições e a acção externa. Relativamente às instituições tinha havido uma concertação prévia entre 16 países a que se juntaram mais dois e que tinham expresso a sua posição no documento de 28 de Março de 2003.
Os 16 chefes de Estado e de Governo, entre eles Portugal, tinham realizado uma reunião, à margem do Cimeira de Atenas, com o Presidente da Convenção para lhe apresentarem estas posições, tendo-se por isso verificado com surpresa que as propostas apresentadas pelo Praesidium não respeitavam os princípios expressos no referido documento e com as quais ele parecia ter concordado. Esses princípios não são compatíveis com a eleição do Presidente do Conselho Europeu, com a presidência dos conselhos sectoriais, com a eliminação do comissário por Estado membro, com a redução do número de eurodeputados, com a forma como está enunciada a maioria qualificada e com a forma como está prevista a eleição do Presidente da Comissão Europeia.
Nas propostas de alteração entretanto já apresentadas deixou-se claramente expressa a rejeição da eleição do Presidente do Conselho Europeu e a eliminação do comissário por Estado membro. Se a opção for entre a actual proposta do Praesidium e o que foi acordado em Nice, é preferível o acordo de Nice, deixando a Convenção um texto aberto com várias hipóteses.
Relativamente à acção externa, considera-se positivo que o MNE seja escolhido de entre os membros da Comissão Europeia e que a extensão do voto por maioria qualificada no Conselho seja por proposta do MNE e da Comissão. No que diz respeito à PESD pronunciou-se a favor da Agência de Armamento e da cláusula de solidariedade, mas já não da cláusula de assistência mútua. Aceitam-se as cooperações reforçadas se os critérios forem decididos pela União no seu todo e a expansão das missões de Petersberg, se existir a possibilidade de um grupo de países ter uma acção mais desenvolvida nestas missões.
A Deputada Maria Eduarda Azevedo afirmou comungar da análise e das propostas (que subscreveu) apresentadas nestas matérias pelo representante do governo, considerando polémicas e provocatórias as propostas apresentadas pelo Praesidium que vão num sentido intergovernamental e não no comunitário. Neste âmbito o menor denominador comum não é o ideal e se não houver um consenso alargado mais vale um cenário de ruptura e passar-se para a CIG. O método da Convenção é um bom
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método mas os seus trabalhos poderiam ser conduzidos de uma melhor forma. Estando em sintonia com as propostas do governo, não quis deixar de salientar a não concordância com o artigo relativo ao Congresso dos Povos que não se sabe para o que serve e o reforço de controlo parlamentar sob a forma de uma Conferência Interparlamentar nas matérias de PESC e PESD.
O Deputado Alberto Costa apresentou as propostas de alteração do seu partido nestas matérias, considerando que elas aperfeiçoam a separação de poderes, a matriz da dupla representação, o controlo parlamentar e a democratização do processo legislativo, o que envolve o princípio da igualdade de Estados.
No que diz respeito às instituições preconiza-se o regresso à concepção unitária do Conselho, com a autonomização única do Conselho Legislativo que seria o correspondente estadual do PE, e a aceitação dos conselhos sectoriais, mas não a do Conselho Europeu nem a ideia da eleição do seu Presidente; a forma de eleição do Presidente da Comissão parece boa; apresenta-se uma forma de se manter um comissário por Estado membro; pretende-se que o MNE seja escolhido entre os membros da Comissão mas não se concorda que ele presida ao Conselho de Negócios Estrangeiros; sugere-se a substituição da ideia do Congresso de Povos por uma Conferência Interparlamentar europeia; e não se concorda com a redução do número de eurodeputados.
Considerou ainda existirem cinco domínios em que existe um impasse (uma maioria de 16 Estados contra uma minoria de Estados que representa ¾ da população): sendo eles a presidência do Conselho, o número de comissários e a igualdade entre comissários, a forma de nomeação o MNE, a definição de maioria qualificada e a forma de pôr em prática as cooperações reforçadas que são fundamentais para se vencerem as actuais paralisias.
O Presidente da Comissão questionou a articulação entre o MNE, o Presidente da Comissão e o Presidente do Conselho Europeu, traçando a evolução em termos de representação externa da União e afirmando existirem riscos de desequilíbrios.
Os três representantes na Convenção concordaram com a existência desses riscos, afirmando que só na prática se poderia avaliar a forma de se compatibilizarem as suas actuações, mas o mal menor seria o MNE ser escolhido de entre os comissários.
Na reunião do dia 3 de Junho de 2003, o Prof. Ernâni Lopes lembrou que a Convenção apresentaria a sua proposta de Constituição para a Europa ao Conselho Europeu (CE) de Salónica, de 20 de Junho, e desmistificou a ideia de que só agora a Convenção estaria a tentar reunir consensos.
Esclareceu que, apesar de não existir ainda um texto, havia um conjunto de temas em relação aos quais não se tinham levantado objecções relevantes, imperando o princípio de que tudo será objecto de acordo com a condição de se chegar a um entendimento global no fim. Afirmou que nas últimas semanas de trabalho da Convenção se procurarão obter mais resultados, considerando que a Convenção não falhará se não apresentar uma proposta de Tratado completo e capaz de reunir o acordo de todos, por não ter sido esse o mandato de Laeken.
Referiu a questão metodológica, assinalando que, ao contrário de uma votação que é inequívoca, o consenso implicava maior complexidade na tomada de decisão por pressupor o apoio expresso e por ter de gerir muitas divisões. Explicou que o consenso requeria, conceptualmente, a existência de várias opções, reunindo, cada uma delas, os seus apoios, pelo que nada obrigava a Convenção a apresentar um texto unívoco e completo. Recordou caber à CIG a definição das matérias sobre as quais pretenderá decidir, e não à Convenção.
Precisou que se verificavam divergências no que concerne ao desenho e às competências das instituições, aludindo a que a UE não necessitava de copiar modelos de organização estatal, nem sucumbir a uma solução aparentemente simples, por constituir um projecto de União original e único, sob pena de perder o seu carácter sui generis, assente numa dupla legitimidade.
Considerou a ideia da eleição de um presidente da UE uma ameaça ao princípio da igualdade entre os Estados-membros, colocando em causa a noção colegial própria à UE, reflexo de quinze séculos de história e contrária à clássica ideia imperial.
Por outro lado, mostrou-se favorável à extensão do voto por maioria qualificada e da co-decisão, e à instituição de actos jurídicos mais simples. Mencionou que Portugal tem mostrado uma total abertura na revisão e simplificação do processo de decisão desde que sejam respeitados o princípio da igualdade entre os Estados, o equilíbrio institucional e o método comunitário.
No tocante à Carta dos Direitos Fundamentais da UE, Portugal também se tem mostrado favorável à sua inclusão no Tratado, assim como à adesão, por parte da UE, à Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
Precisamente sobre o projecto de articulado do Tratado, informou que, na Parte III, o Governo português defenderá a inclusão de uma base jurídica que inclua o sector do Turismo; a alteração do voto por maioria qualificada em matéria de coesão económica e social depois de aprovadas as perspectivas financeiras para 2007/2013; a manutenção do estatuto de ultra periferia para as regiões dos Açores e da Madeira; e a salvaguarda da possibilidade de intervenção dos Estados-membros no que respeita a celebração de Tratados Internacionais.
No que se refere à Parte IV, demonstrou uma satisfação global com as propostas discutidas.
O Deputado Alberto Costa recordou a agenda relativamente minimalista da Convenção apresentada em Laeken, fazendo um balanço positivo dos resultados conseguidos relativamente aos quatro pontos: a melhoria da eficiência do processo decisório e do funcionamento das instituições da UE; a inclusão da Carta dos Direitos Fundamentais no Tratado e a questão da adesão da União Europeia à Convenção Europeia dos Direitos do Homem; a legitimidade democrática e a transparência das instituições europeias e o reforço do papel dos parlamentos nacionais; e, por fim, a simplificação dos Tratados existentes, sem alterar o seu conteúdo. Para lá disso, a Convenção parece querer dotar a União de um texto constitucional.
No que se prende com o reforço do papel dos parlamentos nacionais, considerou que, apesar das inovações positivas, a Convenção poderia ter sido mais ambiciosa na estruturação da acção colectiva dos parlamentos.
Sublinhou que as maiores dificuldades sentidas pela Convenção disseram respeito a um ponto que não se encontrava expressamente inscrito na sua ordem de trabalhos, a reforma institucional. Sobre esta matéria, mostrou-se igualmente
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contra a extinção das presidências rotativas da UE, contra uma Comissão onde não tenham assento nacionais de todos os Estados-membros, contra um MNE que também presida ao Conselho dos Negócios Estrangeiros e que tutele um tão vasto conjunto de matérias, incluindo a Defesa.
Elaborou uma crítica ao Governo português pela atitude passiva que tem assumido, referindo a dinâmica negocial de alguns Estados-membros, nomeadamente a Espanha, na procura de espaço político para fazer valer as suas pretensões, activando a sua estrutura negocial inserida em grupos de Estados-membros com capacidade para apresentar propostas novas e não apenas reafirmando posições já conhecidas.
Chamou a atenção para a necessidade de se começar a trabalhar na criação de uma atmosfera preparatória das opiniões públicas, tendo em mente possíveis referendos, no sentido de não se correr o risco de todo o processo empreendido pela Convenção e pela CIG poder vir a ser colocado em causa.
Constatou a coincidência genérica entre as posições defendidas pelo governo português e pelo maior partido político da oposição e a positiva fluidez de informação que tem ocorrido, chamando, contudo, a atenção para a necessidade de, nos momentos finais dos trabalhos da Convenção, se imprimir outro dinamismo. Considerou, no entanto, o risco de perda de capacidade negocial, caso a posição portuguesa afunile demasiado, fixando-se apenas na defesa das presidências rotativas e na manutenção do princípio de um Comissário por Estado-membro.
O Prof. Ernâni Lopes informou que o Governo português tem trabalhado em pleno, (incluindo todo o aparelho diplomático) e por todos os meios para defender o que o Governo entende serem os interesses nacionais. Relativamente às posições do Governo e do maior partido na oposição, assinalou comungarem do mesmo desejo e de convergirem na acção.
No que concerne à dicotomia da presidência rotativa da UE / princípio de um Comissário por Estado-membro, referiu estarem a desenhar-se movimentos de várias frentes, nomeadamente a ideia de uma Comissão com 25 comissários, na base de uma rotação de mandatos entre comissários operacionais e comissários sem pasta, desde que essa divisão fosse pré-determinada e desde que os comissários sem pasta passassem no mandato seguinte a comissários operacionais e vice-versa, considerando a questão do número de comissários um falso problema, omitindo o verdadeiro problema, que se relaciona com o respeito pelo princípio da igualdade.
Procedeu a uma separação entre aquilo que a Convenção tratava - questões político-institucionais - e aquilo que a Convenção não tratava - questões económico-sociais -, acreditando ser destas últimas que surgirão as grandes questões da Europa do futuro.
Perguntou em que instância estavam a ser debatidas as importantíssimas questões do financiamento do sistema de segurança social, do fundo social europeu, do orçamento da UE, de respostas estruturais à globalização, etc.
Opinou que não havia PESC porque os Estados-membros ainda não o tinham decidido, referiu a banalização do Estado democrático e o artifício de simplificar os Tratados através de um Tratado Constitucional e reflectiu sobre a trilogia poder, legitimidade e confiança.
Por último questionou o mérito da organização de debates de três horas sobre a Convenção destinados a informar os cidadãos, concordando com a ideia de que não se está a progredir relativamente à aproximação da UE aos cidadãos.
Na reunião do dia 30 de Junho de 2003 fez-se o balanço dos trabalhos da Convenção já que o Projecto de Tratado Constitucional tinha sido apresentado ao Conselho de Salónica de 20 de Junho embora se tivessem realizado mais duas reuniões da Convenção em Julho.
O Presidente da Comissão perguntou se os representantes parlamentares e o Governo iriam apresentar relatórios escritos sobre a sua participação na Convenção.
O Prof. Ernâni Lopes optou por se referir ao discurso que tinha preparado para a sessão de encerramento da Convenção mas que não tinha apresentado, cuja tónica era a ausência de consensos sobre um conjunto de matérias e cujo tom não era laudatório. Salientou depois que o grupo dos 16 se tinha mantido coeso até ao fim.
De seguida, referiu-se ao catálogo de competências que tinha sido vertido no Projecto de Tratado Constitucional e contra o qual se tinha pronunciado por uma objecção metodológica, embora a União não tenha perdido nenhuma competência (pretende-se ainda tentar inserir o turismo nas competências complementares). Considerou, em nota final, que as questões institucionais não resolvem um dos maiores problemas da Europa que é o da reforma do modelo social e económico europeu.
Em relação ao relatório da participação na Convenção, disse que o Governo o estava a preparar.
A Deputada Maria Eduarda Azevedo disse que a mensagem que se deve transmitir é que se trata apenas de uma primeira fase de um processo composto pela Convenção e pela CIG. Não se deve pôr em causa o trabalho já feito mas este deve ser limado, já que no decorrer dos trabalhos assistiu-se a uma mudança para pior. Se compararmos esta Convenção com a da Carta dos Direitos Fundamentais, salvaguardadas as devidas diferenças, verificamos que o método é bom mas a condução foi má, embora se deva reconhecer que sem a mão, ora de veludo ora de ferro, do Presidente talvez não se tivesse chegado ao fim, o que não significa que, enquanto membro, tivesse gostado das suas atitudes.
Em termos substantivos foi lamentável que a dimensão social continue a ser o parente pobre da construção europeia e que tenham vingado as teses franco-alemãs em termos de defesa.
Em relação ao relatório da sua participação na Convenção, disse que o iria entregar ao Sr. Presidente da Assembleia da República.
O Deputado Alberto Costa disse que a expressão da Declaração de Salónica que classifica o Projecto de Tratado Constitucional como uma "boa base de trabalho" é a expressão mais adequada.
No que diz aos parlamentos nacionais, a Convenção não foi ousada e não foi feliz: o papel dos parlamentos ficou uma vez mais em protocolo e não entrou para o articulado, o controlo da subsidiariedade é apenas negativo e não se devem depositar demasiadas esperanças neste controlo.
A inserção da Carta dos Direitos Fundamentais no articulado é a única inovação que justifica a linguagem constitucional embora alguns preceitos sejam depois obscurecidos por ressalvas e explanações interpretativas.
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Em termos de reforma legislativa considerou estar-se no início já que o Conselho passa a discutir e a votar em "público", à semelhança de um parlamento, embora falte a autonomização do Conselho Legislativo como tinha sido proposto. A definição da maioria qualificada no Conselho com uma maioria de Estados e 60% da população é menos clara do que num sistema federal clássico, não havendo suficiente compensação entre o Conselho e o PE (onde existe uma proporcionalidade degressiva). Substitui-se o sistema híbrido de Nice por um sistema igualmente híbrido. Melhor seria 50% - 50%, ou seja a dupla maioria inicialmente defendida.
Nos domínios JAI, o Procurador Público fica adiado para uma decisão do Conselho Europeu e verifica-se um gradualismo na evolução do controlo de fronteiras. No âmbito do governo económico não se verificaram alterações significativas.
Um dos problemas que se irá levantar com a noção de constituição é o do primado sobre o direito interno, por não se referir o respeito pelo direito constitucional dos Estados membros com toda a clareza e extensão exigíveis.
Finalmente, e mais uma vez em relação ao método da Convenção, entendeu que esta forma de funcionamento não foi, sob certos aspectos, a mais recomendável, que o consenso é difuso e não é democrático. Do seu ponto de vista é mais democrático o sistema de apuramento de maiorias através de votações e de declarações de voto. Desta forma acabou-se por não se saber nunca qual o suporte efectivo de cada consenso e a única estrutura deliberativa era o Praesidium. Espera-se que na CIG se efectue uma correcção dos resultados alcançados, em especial em relação à parte institucional.
Em relação ao relatório da sua participação na Convenção disse que o tencionava entregar proximamente.
O Deputado António Nazaré Pereira começou por lamentar que quem critica a falta de debate sobre os trabalhos da Convenção, sejam jornalistas ou deputados, não esteja presente nestas reuniões, sendo necessário reforçar o envolvimento de todos no debate parlamentar sobre as questões europeias, não bastando criticar por criticar.
Prosseguiu, dizendo que a maior parte das propostas de alteração apresentadas na Convenção não tiveram vencimento mas marcou-se uma posição e o trabalho efectuado dignificou a representação parlamentar. Frisou que seria interessante fazer uma publicação com todo esse trabalho (intervenções, propostas de alteração e restante trabalho). O problema agora para todos os membros da Convenção é que são autores de um texto no qual ninguém se revê. Referiu-se depois às preocupações manifestas em reunião da Assembleia Parlamentar do Conselho de Europa sobre a sobreposição de jurisdições entre o Tribunal dos Direitos do Homem e o Tribunal de Justiça.
O Deputado Guilherme d'Oliveira Martins concordou com o Deputado Alberto Costa relativamente ao papel dos parlamentos nacionais, já que se ficou aquém do que se esperava. Contudo, a sua intervenção não depende do que ficar escrito em tratados mas sim do que fazem na prática, do esforço que fizerem para acompanharem as matérias, agora do ponto de vista da subsidiariedade, e nada os impede de apreciarem o conteúdo das propostas. Relativamente ao problema da prevalência do direito comunitário sobre o direito nacional, era algo já consagrado na jurisprudência que passou a estar no Projecto de Tratado Constitucional constitucional mas que é um falso problema porque a constituição europeia não ocupa o espaço das constituições nacionais.
Em relação ao relatório da sua participação na Convenção disse que o estava a preparar.
O Presidente da Comissão teceu algumas criticas ao preâmbulo do Projecto de Tratado Constitucional do ponto de vista histórico e filosófico que mereceram o acolhimento dos restantes membros da convenção e que geraram algum debate.
A Comissão realizou ainda reuniões sobre os Conselhos Europeus com o Ministro dos Negócios Estrangeiros nos dias 17 de Dezembro de 2002, 18 de Fevereiro, 1 de Abril e 25 de Junho de 2003 e com o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus nos dias 22 e 28 de Outubro e 10 de Dezembro de 2002 e 18 de Março e 18 de Junho de 2003, onde os trabalhos da Convenção foram igualmente abordados.
Para além disso, a CAEPE reuniu, no dia 17 de Dezembro de 2002, com representantes das Regiões Autónomas dos Açores e Madeira e com o Secretário de Estado dos Assuntos Europeus, o Secretário de Estado da Agricultura e o Secretário de Estado das Pescas e recebeu, no dia 19 de Fevereiro de 2003, a Deputada inglesa Gisela Stuart, Presidente do Grupo de Trabalho sobre o papel dos parlamentos nacionais e no dia 4 de Março de 2003, o Comissário Europeu, Michel Barnier (para ambas as reuniões foram convidados os embaixadores dos Estados-membros e dos países candidatos ao alargamento).
Na reunião do dia 19 de Fevereiro de 2003, a Deputada Gisela Stuart considerou estar-se perante um momento histórico na construção europeia por todos estarem de acordo com a ideia da redacção de um Projecto de Tratado Constitucional europeia após 50 anos da elaboração dos tratados.
Em relação aos parlamentos nacionais, numa altura em que 60% da legislação europeia é comunitária, afirmou ser necessário o seu envolvimento no processo de tomada de decisão e que não se pode reduzir o debate à dicotomia entre método comunitário ou intergovernamental porque eles não são envolvidos nem num nem noutro. Na sua óptica, os parlamentos devem efectuar um efectivo escrutínio em relação aos seus próprios executivos para além de dever existir um intercâmbio de informações entre parlamentos - se todos eles receberem e apreciarem o programa legislativo e de trabalho da Comissão Europeia poderá criar-se uma rede parlamentar que funcione e que facilite o escrutínio individual. Isto porque não é suficiente ter uma representação na Convenção ou uma participação bianual na COSAC.
A Comissão, o Parlamento Europeu e os governos estão organizados para participarem na decisão europeia e é esse o seu trabalho. Os parlamentos nacionais não o estão, mas se perguntarmos aos cidadãos quem os representa, eles podem responder que são os parlamentos nacionais. Para se poder representar os cidadãos não basta receber informação, é necessário apreciá-la e envolver nessa apreciação os cidadãos.
O Deputado Alberto Costa referiu-se uma vez mais ao controlo parlamentar da subsidiariedade que lhe parece limitado e à ausência de controlo parlamentar nos domínios PESC e JAI.
O Deputado António Nazaré Pereira questionou a possibilidade dos parlamentos nacionais poderem apresentar temas que pudessem vir a ser objecto de regulamentação
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europeia, lamentando que estes tenham estado há demasiado tempo afastados dos assuntos europeus.
O Presidente da Comissão considerou existir alguma timidez em termos de propostas para a intervenção dos parlamentos, não lhe parecendo suficiente o escrutínio individual, tanto mais que não se está a conseguir reestruturar os órgãos colectivos que são múltiplos. Questionou de seguida a falta de entusiasmo pela ideia do Congresso para a eleição do Presidente do Conselho e para se responder ao intergovernamental com um órgão interparlamentar.
A Deputada Gisela Stuart disse que os parlamentos nacionais conseguiam fazer muita coisa individualmente se colectivamente tiverem vontade de o fazer, dando como exemplo o mecanismo de alerta precoce para o controlo da subsidiariedade, onde cada parlamento tem um voto, existindo o princípio da igualdade. Manifestando-se contra a criação de um órgão colectivo composto por parlamentares nacionais, disse que a Assembleia da UEO produz excelentes relatórios mas ninguém os toma em consideração, e que a COSAC limita-se a ser uma forma de os parlamentares se conhecerem uns aos outros (sempre que o PE teme que a COSAC tome alguma decisão imediatamente se intromete para a boicotar), não sendo por isso sensato criar-se uma outra instituição/Congresso dos Povos, destituída de funções, apenas para dar a ideia que os parlamentos estão envolvidos.
Para trocar informações entre parlamentos nacionais e entre estes e o PE; para solicitar informações aos governos e às instituições europeias não é necessário criar nenhuma instituição, nem é precisa nenhuma autorização. A Convenção não foi uma prenda dos governos aos parlamentos, foi criada pela pressão dos resultados de Nice. Aliás, os representantes dos governos ficaram algo "aborrecidos" com a apresentação dos primeiros 16 artigos apresentados pelo Praesidium, queixando-se que não tinham sido consultados sobre a sua redacção, o que demonstra que a Convenção não é uma CIG.
O Presidente da Comissão disse que, apesar de ser politicamente correcto afirmar-se que não deve ser criada uma segunda câmara, não é proibido equacionar um PE composto por 2 câmaras, uma com representantes eleitos e outra com representantes emanados dos parlamentos nacionais. Isto porque o Conselho não é uma segunda câmara: isso é ficção não é realidade, e não há nenhuma instituição em que todos os Estados estejam em igualdade. Para além disso seria uma alternativa aceitável à não rotatividade da Presidência do Conselho sem se ir para o sufrágio directo e universal. Nestas matérias institucionais tudo deve ser questionável.
A Deputada Gisela Stuart disse que existe o perigo de complicar ainda mais o esquema decisório. O eleitorado quer coisas simples, quer saber quem decide, de que forma e quais as decisões que o afectam. Há que encontrar um meio-termo entre uns EUA e uma zona de comércio livre. Relatou uma conversa com o Presidente da Convenção em que ele disse que se estava perante um tratado refundador e que os que o aceitavam ficavam dentro e os que não o aceitavam saíam e estabeleciam um acordo de comércio livre. Isto é algo absolutamente inaceitável.
O Deputado Alberto Costa disse que quando se fala em acabar com as presidências rotativas e com o princípio de um comissário por Estado está a desequilibrar-se o princípio da igualdade de Estados que devia ser compensado por alguma forma e essa forma poderia ser um órgão com uma representação estadual igualitária.
A Deputada Gisela Stuart disse que no controlo da subsidiariedade cada parlamento terá dois "votos". Quanto à rotatividade, argumentou tratar-se de uma ilusão já que numa União a 25, cada Estado só terá a presidência em cada 13,5 anos, e a contínua alteração das prioridades de cada presidência faz com que a União não tenha um rumo a longo prazo. No entanto poderá manter-se uma presidência rotativa em termos de lugar/espaço físico onde se celebram as cimeiras e outras reuniões para que se dê a conhecer às administrações nacionais e europeia os diferentes países e para que haja um intercâmbio de culturas que considerou imprescindível à criação de um espaço europeu.
O Presidente da Comissão retorquiu que a presidência rotativa nunca afectou negativamente a condução dos trabalhos da União e foi sempre até um bom estímulo para os Estados e para as administrações nacionais. Aliás, nem sequer é correcto dizer-se que a presidência rotativa acaba por causa do alargamento porque pode ser entendido como um sinal de desconfiança nos novos países aderentes. Por último, dever-se-ia explorar mais o papel da troika e tomar em consideração a prestação de contas por parte do Presidente do Conselho ao PE, o que no projecto actual não está previsto.
Na reunião do dia 14 de Março de 2003, o Comissário Michel Barnier começou por aludir à delicada situação política internacional que centrava todas as atenções na altura. Referiu-se depois ao método da Convenção como uma grande inovação que prepara a CIG e cuja importância se revela no número de ministros de negócios estrangeiros que nela tomam parte, o que é igualmente uma vantagem porque assim estes ministros já estão envolvidos no projecto para quando começar a CIG.
Em termos substantivos, descreveu o que a Convenção tinha feito até à data, salientando a procura de um equilíbrio e respeito mútuo entre os Estados grandes e os pequenos, os mais povoados e os menos povoados. Esta procura verifica-se em vários domínios, nomeadamente na necessidade de se arranjar uma alternativa para o funcionamento do Conselho. A rotatividade da presidência do Conselho tem a vantagem do envolvimento de todos os Estados mas não é muito eficaz pelo que se podia encontrar uma fórmula mista de presidência fixa para o Conselho Europeu e Conselho Assuntos Gerais (desde que isto não conduza a um duplo executivo) e presidência rotativa para os restantes Conselhos.
Em relação à Comissão, que é um governo colectivo independente, esses problemas não se colocam mas é preciso fixar um limite máximo ao número de comissários e um critério para a sua nomeação que tem de incluir o pluralismo político e nacional e a igualdade de Estados.
A criação do MNE, que deve ser um comissário, embora se subtraía à colegialidade quando represente o Conselho, com uma dupla função, é um progresso bem como a criação de uma diplomacia europeia.
Para além disso, procura-se saber se se pode ir mais longe em matérias JAI, PESC/PESD (cláusula de solidariedade em caso de ataque terrorista, agência de armamento europeia, actualização das missões de Petersberg), de coordenação de políticas económicas e orçamentais e de flexibilidade para a cooperação reforçada.
O Deputado Alberto Costa perguntou como se passava da linguagem constitucional para a matéria constitucional.
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A Deputada Maria Eduarda Azevedo disse que a União tinha encerrado o ciclo da integração económica e que se lançava agora no ciclo da integração politica. Neste âmbito uma constituição tem uma determinada simbologia, mas manifestou dúvidas sobre se a Convenção estaria consciente de que o texto que estava a elaborar teria um carácter duradouro ou seria objecto de sucessivas alterações.
O Comissário Michel Barnier concordou que este Projecto de Tratado Constitucional não pode ser feito a pensar desde logo na sua revisão e que uma constituição europeia não contém a mesma essência das constituições nacionais, não se podendo pensar nos mesmos moldes.
Convenção dos Jovens
Nos dias 28 e 29 de Novembro de 2002, a Assembleia acolheu a Convenção dos Jovens, com a participação de 63 jovens de todo o país (3 por distrito, Regiões autónomas dos Açores e da Madeira e luso-descendentes) que aprovou o documento final que se anexa [Ver anexo 7].
Debates em Plenário
Em 21 de Junho de 2002, realizou-se um debate sobre o processo de construção europeia, fazendo-se o ponto da situação dos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Construção Europeia.
Em 26 de Junho de 2002, em debate mensal sobre a Europa, o Primeiro-Ministro (Durão Barroso), após uma intervenção inicial, respondeu a questões colocadas.
Em 26 de Fevereiro de 2003, em declaração política, o Sr. Deputado António Nazaré Pereira (PSD) falou do trabalho desenvolvido ao longo de um ano de existência da Convenção sobre o Futuro da Europa e, depois, respondeu a pedidos de esclarecimento dos Srs. Deputados António José Seguro (PS) e João Rebelo (CDS-PP).
Em 14 de Março de 2003, procedeu-se ao debate sobre o andamento dos trabalhos da Convenção para o Futuro da Europa, no qual intervieram, além do Secretário de Estado dos Assuntos Europeus (Carlos Costa Neves), os Deputados Maria Eduarda Azevedo (PSD), Alberto Costa (PS), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes) e Guilherme d'Oliveira Martins (PS).
Em 12 de Junho de 2003, em debate mensal nos termos do artigo 239.º do Regimento, sobre o futuro da União Europeia na perspectiva da próxima Conferência Intergovernamental, o Primeiro-Ministro (Durão Barroso), após uma intervenção inicial, respondeu a questões colocadas pelos Srs. Deputados Eduardo Ferro Rodrigues (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Luís Fazenda (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), António José Seguro (PS), António Nazaré Pereira (PSD), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Honório Novo (PCP), Capoulas Santos (PS) e Almeida Henriques (PSD).
(excertos)
O Primeiro-Ministro (Durão Barroso): Tem existido em Portugal um grande consenso europeu. Esta é uma mais valia da máxima importância. Devemos manter e aprofundar este consenso. Isso é bom para o reforço da posição de Portugal na Europa. Dentro de poucos dias, com a apresentação ao Conselho Europeu de Salónica do resultado dos trabalhos da Convenção sobre o Futuro da Europa, concluir-se-á uma etapa no processo de revisão institucional da União Europeia. Portugal esteve sempre na linha da frente dos que defenderam a preservação das características que estão na base do sucesso do projecto europeu.
Cabe aqui destacar que foi o representante do Governo português na Convenção que apresentou o documento que viria a ser aprovado por 16 representantes de Governos e no qual estão claramente patentes os principais princípios que norteiam o posicionamento de uma maioria de Estados-membros da União. Tratam-se de três princípios essenciais: o princípio da igualdade entre os Estados-membros; o princípio do equilíbrio institucional; o princípio do método comunitário no processo decisório da União.
Assume particular importância uma proposta já assumida pela Convenção: a criação de um mecanismo que permita um maior envolvimento dos parlamentos nacionais na fiscalização do princípio da subsidiariedade.
Relativamente ao desequilíbrio do sistema institucional da União, Portugal é contra a criação de um poderoso Presidente do Conselho Europeu rodeado de uma máquina administrativa própria, que remeta a Comissão para o papel de simples secretariado do Conselho ou que crie uma situação de permanente conflito interinstitucional. Registo, aliás, com satisfação que a Comissão que consta da última versão do ante-Projecto de Tratado Constitucional corresponde às nossas propostas: uma Comissão em que a presença de Portugal estará sempre assegurada e em que se observará rigorosamente o princípio da igualdade entre os Estados-membros. Ou seja, há a garantia de que todos os Estados-membros estarão sempre representados, o que é importante para um país como Portugal, mas admite-se a hipótese de terem direito de voto apenas alguns Comissários, mas sempre na observância estrita de um princípio de rotatividade igualitária entre os Estados-membros. Contudo, não recusaremos discutir nenhuma ideia, nem mesmo a de um Presidente do Conselho Europeu, a da figura de um Ministro dos Negócios Estrangeiros europeu, etc.
No que se prende com o acompanhamento da Assembleia da República, proponho desde já, a criação de um grupo de contacto com o Governo, de modo a que o Parlamento possa acompanhar, em permanência, todas as negociações da próxima Conferência Intergovernamental. É desejável que a ratificação do próximo Tratado da União seja precedida de um referendo nacional que envolva todos os portugueses neste debate e nesta decisão.
O Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS): Consideramos que só se deve admitir o compromisso de reduzir o número de Comissários desde que se assegure a rotatividade numa base de estrita igualdade entre todos os Estados-membros. Concordamos que o Presidente da Comissão seja eleito pelo Parlamento Europeu, a seguir às eleições europeias e sob proposta do Conselho Europeu.
De igual modo, apoiamos a nomeação de um único representante da União para a Política Externa e de Segurança Comum, que exercerá o cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros europeu, sendo Vice-Presidente da Comissão e designado pelo Conselho Europeu, com o acordo do Presidente da Comissão. O PS apoia a incorporação, no futuro Tratado, da Carta dos Direitos Fundamentais da União para a tornar legalmente vinculativa, apoia a adesão da União à Convenção Europeia dos Direitos Humanos e quer ver aprofundada e consagrada a coesão territorial, económica e social, nomeadamente a protecção específica das regiões ultraperiféricas por via da constitucionalização do seu estatuto. O PS quer uma política europeia de defesa e, entretanto, somos favoráveis à possibilidade
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de participação de Portugal em núcleos de cooperações reforçadas que possam desenvolver-se entre membros da União Europeia.
O Primeiro-Ministro: Continuamos de acordo, no essencial, quanto a esta matéria. Aliás, hoje mesmo, foram apresentadas na Convenção algumas reservas sobre questões institucionais numa declaração conjunta dos 16 dos Governos da Áustria, de Chipre, da República Checa, da Estónia, da Finlândia, da Hungria, da Irlanda, da Letónia, da Lituânia, do Luxemburgo, de Malta, da Polónia, da Eslováquia, da Eslovénia, da Suécia e, naturalmente, de Portugal.
O Deputado Telmo Correia (CDS-PP): O preâmbulo da futura constituição europeia, referindo-se à herança clássica e da Antiguidade e depois ao Século das Luzes, parece omitir qualquer referência ao Cristianismo, ou seja, às raízes cristãs da própria Europa. É sobre esta questão que lhe pedia a sua opinião.
Este Parlamento tem de assumir mais responsabilidade no acompanhamento dos actos europeus. A Europa tem, entre outros, um problema: a relação entre os cidadãos e os eleitos e os órgãos e as instituições. E esse problema, do meu ponto de vista, só se pode resolver se os parlamentos nacionais, que estão mais próximos dos cidadãos, que respondem mais directamente perante os cidadãos, tiverem mecanismos de informação, mecanismos de apreciação e mecanismos de consulta.
O Primeiro-Ministro: Sobre o preâmbulo da futura constituição europeia e as referências à génese cultural da Europa, penso que quando se fala nas fontes culturais da Europa é um erro histórico clamoroso excluir-se o Cristianismo. O Cristianismo é uma das principais fontes daquilo a que hoje chamamos Europa. Podemos e devemos reconhecer o papel da Antiguidade Clássica, da Grécia e de Roma, mas falar da Europa do ponto de vista cultural sem falar da herança judaico-cristã é, pura e simplesmente, um erro histórico de palmatória. E eu lutarei para que haja uma referência ao Cristianismo no preâmbulo do futuro Tratado constitucional da União Europeia.
No que concerne o tema da União democrática, importa dizer que a Europa não é apenas a Europa dos cidadãos, é também a Europa dos Estados-membros. E relativamente às relações com o Parlamento, o Governo tem vindo a fazer nas suas presenças constantes em Plenário e nas Comissões, neste caso na Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, a estudar com o Parlamento como é que podemos reforçar o seu papel. Aliás, do Projecto de Tratado Constitucional em curso consta o reforço dos Parlamentos nacionais, nomeadamente no controlo do chamado "princípio da subsidiariedade".
O Deputado Carlos Carvalhas (PCP): É certo que a Assembleia tem estado associada, através de alguns Deputados, em nome de todos os grupos parlamentares, à Convenção sobre o Futuro da Europa; é certo, também, que tem havido debate na Comissão dos Assuntos Europeus e Política Externa, mas também é certo que há um défice democrático, nomeadamente na sociedade portuguesa.
É inadmissível que a proposta de Tratado da Convenção estabeleça a primazia da constituição europeia sobre o nosso texto constitucional.
O Primeiro-Ministro: A própria Constituição já permite a recepção no direito português do direito internacional geral e já hoje se aceita esse primado do direito comunitário sobre o direito interno.
O Deputado Luís Fazenda (BE): Temos uma fundada dúvida não sobre a legalidade mas sobre a legitimidade política deste processo da Convenção, independentemente da solução que se vem encontrando, e até sobre a legitimidade política da Conferência Intergovernamental. Na realidade, não houve nenhum processo de consulta e os cidadãos estão muito afastados de todo este debate, o que vai marginando a cidadania na União Europeia e vai aumentando o défice de cidadania e o défice democrático.
Relativamente à discussão em torno do Preâmbulo, é de recordar que não há qualquer referência religiosa na esmagadora maioria das constituições dos Estados membros à excepção da Grécia e da Irlanda.
Faço parte de uma corrente política que, já aquando da adesão de Portugal às comunidades europeias, reclamou o referendo e, em todas as alterações aos Tratados da Comunidade, mais tarde da União, fui sempre favorável à existência de um referendo.
A Deputada Heloísa Apolónia (Os Verdes): De acordo com o Eurobarómetro, Portugal tem sido sistematicamente um dos países onde o sentimento de informação entre os cidadãos sobre a União Europeia regista a média mais baixa. A grande maioria dos portugueses sente-se pouco ou nada informada, e quase metade dos inquiridos que respondeu nunca ouviu falar da convenção sobre o futuro da Europa. Isto não lhe parece extremamente preocupante?
O Deputado António Nazaré Pereira (PSD): Relembro, Sr. Primeiro-Ministro, que o texto final da Convenção é, em meu entender, um sucesso, e, nesse sentido, questiono o Governo se também assim o considera.
O Deputado Honório Novo (PCP): A chamada Convenção sobre o Futuro da Europa é uma concepção que é muito mais a da sua presidência, o chamado Praesidium da Convenção, que recolhe o pensamento de uma dúzia de pessoas e que elimina, internamente até, propostas e ideias de muitos, de um número significativo dos mais de 100 membros da sua Convenção. É um trabalho que dá voz ao núcleo federalista mais duro e radical da Convenção, o núcleo que defende o directório dos grandes países. Já falámos aqui das presidências rotativas, que, de facto, desaparecem; já falámos aqui dos comissários por país, que, de facto, também desaparecem, sendo criados "comissários de primeira e de segunda" por um esquema mais ou menos burocrático, de facto, o trabalho final resolve o problema com a criação de uns Estados "mais iguais" do que outros.
O Primeiro-Ministro: Perguntam-me qual a avaliação que o Governo faz dos trabalhos da Convenção e da posição dos representantes portugueses nessa Convenção. Acho que a avaliação foi globalmente muito positiva. Estavam lá representantes dos vários partidos, mas no essencial convergiram, e convergiram também com as posições do representante do Governo, o Prof. Ernâni Lopes.
Perante aquela ameaça que havia inicialmente (e que se mantém ainda, não está afastada) de um directório, dando peso dos Estados de maior dimensão, o nosso representante esteve na primeira linha dos que combateram essa tendência. Não foi por ser menos europeísta, porque o Governo não é menos europeísta ao dizer isso, foi porque entendeu que, a coberto de algumas soluções pretensamente federalistas, na realidade, estavam a querer fazer valer o peso do maior número e a diminuir o peso de um Estado como Portugal!
Por isso, aquilo em que acredito é que vamos manter no essencial uma convergência em relação a uma visão articulada do interesse nacional na Europa.
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Em 17 de Setembro de 2003, ao abrigo do n.º 2 do artigo 84.º do Regimento, o Ministro dos Assuntos Parlamentares (Luís Marques Mendes) deu conta à Câmara da participação do Governo nos trabalhos que irão ter lugar na Conferência Intergovernamental da União Europeia. Seguiu-se um debate, no qual intervieram, a diverso título, os Deputados Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Francisco Louçã (BE), Bernardino Soares (PCP), Isabel Castro (Os Verdes) e Fausto Correia (PS).
(excertos)
O Ministro dos Assuntos Parlamentares: A CIG começa no próximo dia 4 de Outubro. Esta Conferência exige de Portugal uma clareza de posições e o reforço do importante consenso europeu que há anos tem existido no nosso País. Afirmar o projecto europeu e defender o interesse nacional exige um debate público mais profundo, mais alargado e mais participado do que tem sido habitual no tratamento das questões europeias.
No debate do dia 12 de Junho o Sr. Primeiro-Ministro já propôs a criação de um grupo de contacto entre a Assembleia da República e o Governo para o acompanhamento dos trabalhos da Conferência Intergovernamental e esse grupo de contacto vai avançar.
Para além dessa iniciativa e do trabalho altamente meritório já realizado nesta Assembleia, é importante que um amplo debate nacional se faça, que os Portugueses participem, que a sociedade não passe ao lado de opções essenciais para o seu futuro. Neste quadro, o Governo está totalmente disponível para, em conjunto com a Assembleia da República, organizar um vasto conjunto de debates que, de forma descentralizada, ao longo de todo o País, e com forte envolvência da sociedade civil, possa fomentar a discussão e mobilizar a opinião pública nacional. O debate é essencial e deve ser imediato e prévio à decisão.
A cultura de opacidade deve dar lugar a um espírito de verdadeira participação; a discussão deve-se fazer sem complexos, sem secretismos, sem linguagens cifradas, de forma séria, responsável, aberta e transparente. Só assim os portugueses podem escolher na altura própria e em consciência o caminho que pretendem percorrer na União Europeia. Dessa forma se defende o projecto europeu, dessa forma se afirma o interesse nacional.
O Deputado Telmo Correia (CDS-PP): Gostaria de saber a opinião do Governo sobre se deverá ou não existir, num determinado momento, uma consulta aos portugueses sobre a questão europeia.
O Deputado Francisco Louçã (BE): A constituição europeia muda a Constituição Portuguesa e, pior do que isso, altera os próprios limites materiais que a Constituição Portuguesa não permite que sejam alterados. O que é que o Governo nos diz? Na Europa, este Governo nada quer fazer, não tem uma ideia europeia, não sabe que política económica quer para a Europa, fica à espera de ordens. Queremos saber, por isso, se este debate é referendário, e referendário útil. Ou seja, se em tempo certo ele permite que os portugueses decidam e não que os portugueses se submetam a um plebiscito que pode não ter 50% e que esvazia todos os conteúdos da decisão governamental.
O Deputado Bernardino Soares (PCP): Tem razão o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares quando refere que, sobre a questão europeia, o debate e o esclarecimento são indispensáveis. Entendo essa afirmação como um certo mea culpa pelas responsabilidades que o partido que o Sr. Ministro integra tem tido na não existência desse debate e desse esclarecimento quando, noutros momentos, fatias importantes da nossa soberania foram transferidas para a União Europeia e em que, ou recusando ou inviabilizando na prática, por este ou aquele expediente, nunca houve possibilidade de o povo português se pronunciar cabalmente e com consequências sobre o comprometimento do Estado português na evolução da União Europeia.
A questão que se coloca, estando de acordo com a necessidade de debate e de esclarecimento, é a de saber que consequências o Governo está disposto a retirar do pronunciamento dos portugueses. O que queremos saber é se estamos perante uma vontade de debate, certamente útil mas sem consequências práticas, porque o Governo não alterará a sua posição ou tomará a posição que muito bem entender, ou se o Governo julga que este debate e o eventual referendo devem ser feitos por forma a que a opção dos portugueses condicione a opção do Estado português no âmbito da União Europeia. Esta, sim, é que é a questão fundamental.
O Ministro dos Assuntos Parlamentares: No passado dia 12 de Junho o Sr. Primeiro-Ministro disse que se houver mudanças profundas decorrentes da Conferência Intergovernamental é desejável a existência de uma consulta popular, ou seja, de um referendo nacional. O que acrescentei hoje, aqui, de novo, reafirmando tudo o que anteriormente foi dito, foi que durante a realização da Conferência Intergovernamental é útil e importante que se faça um grande debate nacional. Aqui, no Parlamento, também noutras sedes, um debate nacional de forma descentralizada, nos vários pontos do País. Para que os temas sejam conhecidos dos portugueses e para que estes participem.
Em 1 de Outubro de 2003, ainda em declaração política, o Deputado Luís Fazenda (BE), lembrando que a Conferência Intergovernamental de Roma se realizará em breve, abordou questões relativas à importância do debate da futura constituição europeia, tendo criticado a posição do Governo.
Em 8 de Outubro de 2003, o Deputado Guilherme Silva (PSD), também em declaração política, deu conta das conclusões do Conselho Nacional do PSD no sentido de se proceder a um referendo sobre questões europeias e a uma revisão constitucional, e, no fim, respondeu aos pedidos de esclarecimento dos Deputados Isabel Castro (Os Verdes), Telmo Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), Francisco Louçã (BE) e António Costa (PS).
Em 10 de Outubro de 2003, em debate mensal sobre a posição de Portugal face ao futuro da União Europeia no quadro da Conferência Intergovernamental, o Primeiro-Ministro, após uma intervenção inicial, deu resposta a questões colocadas pelos Deputados Eduardo Ferro Rodrigues (PS), Guilherme Silva (PSD), Telmo Correia (CDS-PP), Carlos Carvalhas (PCP), Francisco Louçã (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Augusto Santos Silva (PS), António Nazaré Pereira (PSD), Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP), Bernardino Soares (PCP), António Costa (PS) e João Moura (PSD).
(excertos)
O Primeiro-Ministro (Durão Barroso): Iniciou-se, no passado dia 4 de Outubro, a Conferência Intergovernamental para a revisão dos Tratados da União Europeia. Há três princípios fundamentais que orientam a posição de Portugal
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e que devem ser sublinhados nesta nova fase da construção europeia.
Primeiro, o princípio da igualdade entre todos os Estados-membros da União. É um princípio que releva do facto indiscutível de, na base da União Europeia, estar a vontade de Estados que constituem a primeira organização política para nações que não prescindem da sua identidade. Segundo, o princípio da coesão e da solidariedade, sem o qual não pode haver qualquer forma de integração política. O projecto europeu não é meramente técnico ou económico. Sem coesão e sem solidariedade, a União Europeia careceria de sentido. Terceiro, o princípio do método comunitário, verdadeiro motor do processo de integração europeia.
À luz destes princípios fundamentais, consideramos uma boa base de trabalho o Projecto de Tratado Constitucional constitucional recentemente aprovado pela Convenção Europeia, mas desejamos esclarecer, debater e aperfeiçoar matérias que, legitimamente, nos suscitam ainda dúvidas ou reservas.
Desde logo, a questão da figura do futuro Presidente do Conselho Europeu. São legítimas algumas apreensões iniciais à consagração deste novo cargo. Trata-se agora de procurar assegurar que a Presidência do Conselho Europeu seja uma mais-valia para o bom funcionamento da União Europeia. Por essa razão, bater-nos-emos para que as funções do Presidente do Conselho Europeu fiquem claramente definidas por forma a minimizar potenciais conflitos inter-institucionais e de modo a evitar qualquer deriva no sentido de um directório europeu.
Parece-nos essencial que o titular deste novo cargo seja eleito de acordo com o princípio de "um Estado um voto" e não por maioria qualificada. É uma questão de respeito pela igualdade entre todos os Estados-membros, mas é também uma questão de respeito pela igualdade entre todos os cidadãos da União Europeia.
Os mesmos princípios enformam a posição de Portugal em relação à criação de um Ministro dos Negócios Estrangeiros da União. Esta figura poderá trazer maior coerência à acção externa da União Europeia, mas é essencial que fique dependente não só do Conselho Europeu como também da Comissão. Assim se preservará a sua natureza de modo a estar ao serviço da União Europeia e dos Estados-membros.
A repartição do poder entre os Estados-membros no processo da tomada de decisão é outra questão essencial e é mesmo aquela que tem dominado o debate europeu em alguns dos nossos parceiros. É importante relembrarmos a verdadeira natureza da União: uma União de Estados, mas também uma União de cidadãos. Sejam quais forem os critérios utilizados, a verdade é que o poder relativo de Portugal não permanecerá o mesmo. É uma evidência: a União Europeia vai passar de 15 para 25 Estados-membros. Se quisermos pôr a questão assim, "as fatias" de poder a distribuir serão necessariamente menores, mas ganhamos com o acréscimo de poder no seu conjunto.
Mas, atenção, o poder não é uma questão quantitativa, o poder não é uma questão aritmética; é uma questão política! Mas mais importante que o cálculo ou ponderação de votos em que os ganhos ou perdas de um país com a nossa dimensão são, ao fim e ao cabo, marginais, é a qualidade da nossa influência no processo de decisão. Temos a dimensão demográfica que temos, não podemos ser maiores, mas podemos e devemos ser melhores. É assim no plano externo, afirmando o reforço do projecto europeu e evitando uma posição marginal ou periférica, estando sempre no eixo de formação da vontade do plano europeu, mas é também assim no plano interno, porque aqui também se joga a questão do nosso poder no âmbito europeu, fazendo de Portugal um país credível, um país realmente moderno, um país verdadeiramente competitivo.
A composição da Comissão é outra questão de especial relevância. É essencial garantirmos um Comissário para Portugal. Estamos abertos a todos os aperfeiçoamentos, há várias soluções que nos servem, mas não podemos prescindir da consagração deste princípio elementar: o princípio da representação de todos os Estados-membros na Comissão Europeia.
Na área da política de segurança e defesa somos igualmente claros. Esta é uma dimensão da União Europeia que queremos ver reforçada. Queremos uma Europa aberta ao Mundo, nunca uma Europa fechada sobre si própria. Todos os Estados-membros que o queiram devem poder participar em cooperações com um número limitado de parceiros, tanto quanto possível segundo o modelo conhecido por cooperação reforçada. A União Europeia deve ser um pólo de inclusão e de aglutinação e nunca o seu contrário.
Por último, entre muitas outras questões que poderia invocar, e que, com certeza, durante o debate haverá tempo para tratarmos, quero fazer uma consideração sobre o preâmbulo do novo Tratado. Consideramos importante uma referência à herança judaico-cristã na formação da identidade europeia. É uma questão de verdade e de rigor histórico.
As mudanças que se antevêem na União Europeia são, de facto, profundas e este tipo de mudanças exige debate público e legitimação popular. É importante que o debate se faça, que os Portugueses participem, que a nossa sociedade não passe ao lado de opções essenciais para o seu futuro. Mas não basta debater; chegará o momento de os portugueses serem chamados a decidir. É desejável que se faça em Portugal um referendo sobre a nossa posição face à Europa.
Em primeiro lugar, porque as eleições europeias são o momento, por excelência, do grande debate europeu. Em segundo lugar, porque essa é a forma mais eficaz de garantir uma ampla participação popular no referendo, assim criando as condições para o seu carácter vinculativo. E também por uma questão de elementar bom senso, sobretudo num ano - 2004 - em que Portugal terá, pelo menos, dois actos eleitorais: as eleições europeias e as eleições regionais dos Açores e da Madeira.
Mas para que isto possa ser assim, não haja qualquer dúvida ou ilusão, é necessário um consenso no sentido da alteração da Constituição. Fazer o referendo europeu no mesmo dia das eleições europeias só depende do apoio do Partido Socialista. Por isso, faço aqui um apelo ao maior partido da oposição: é, de facto, importante o seu espírito de abertura e de cooperação. Poucos compreenderiam a sua recusa.
E não me digam que é menos transparente ou menos democrática a solução de fazer coincidir num mesmo dia referendo europeu e eleições europeias. É a solução que será adoptada por vários países europeus, por exemplo na nossa vizinha Espanha, que, justamente, está a alterar a lei (uma lei orgânica) de modo a tornar possível tal simultaneidade. Por isso, eu disse - e penso que, ao dizê-lo, reforcei muito a capacidade negocial de Portugal -, agora, no início dos trabalhos da Conferência Intergovernamental,
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em Roma, que em Portugal, provavelmente, haverá um referendo europeu.
Quero que a nossa adesão convicta ao projecto europeu não seja feita nas "costas" dos portugueses, quero sentir, quando assinar esse Tratado, em nome de Portugal, que os portugueses nos apoiam e que directamente exprimiram o que sentiam acerca do futuro de Portugal na Europa.
O Deputado Eduardo Ferro Rodrigues (PS): Reafirmamos a avaliação positiva global que fazíamos do Projecto de Tratado Constitucional e chamámos a atenção para algumas melhorias, algumas das quais o Sr. Primeiro-Ministro também aqui citou: a necessidade de eleição do Presidente do Conselho Europeu por consenso; a clarificação das suas competências, para evitar confusões com o Presidente da Comissão e o Ministro dos Negócios Estrangeiros; a Comissão Europeia se composta por um comissário por cada membro; as presidências rotativas em todas as formações do Conselho de Ministros, numa base igualitária; a valorização do princípio da igualdade entre os Estados, na definição da maioria qualificada, de forma a evitar que a democracia tenha um peso excessivo e a evitar qualquer caminho que conduzisse à redução do número de Deputados portugueses no Parlamento Europeu.
Ora, até à semana passada, curiosamente, as posições que o Governo, através do Sr. Primeiro-Ministro e de altos responsáveis do Governo, referia iam no seguinte sentido: o Sr. Primeiro-Ministro dizia que o referendo pode reforçar a posição portuguesa na negociação, tendo já verificado que em Portugal não só as forças que integram o Governo, como o maior partido da oposição, defendem publicamente que deve haver um referendo no caso de o tratado constitucional se traduzir numa mudança importante - é aquilo que nós continuamos a dizer; outras questões, como o tempo, o modo e o conteúdo concreto, dizia o Sr. Primeiro-Ministro que ainda era prematuro referir, mas tratavam-se de ideias que seriam apresentadas e que deveriam ser assumidas no diálogo com outras forças políticas e democráticas. Nós também somos a favor do referendo.
O Primeiro-Ministro: Na verdade, nós iniciámos um processo inovador no relacionamento do Governo com a Assembleia da República em matéria europeia. Por nossa proposta, foi criado um grupo de contacto permanente para acompanhar a Conferência Intergovernamental e propusemos também a realização de debates conjuntos, em todo o País, organizados pelo Governo e pela Assembleia da República. Quero sublinhar este aspecto porque, no nosso país, é comum a crítica de que não há debate, como se o debate devesse resultar de uma directiva do Governo. Não é essa a minha visão da relação do Governo com a sociedade. Na minha opinião, não é o Governo quem tem de dirigir o debate, o debate deve estar na sociedade.
De qualquer modo, o Governo está a procurar dar impulso a esse debate, dar o exemplo na sua iniciativa. Desejo sinceramente esse debate por uma razão muito simples: a de que, só assim, os portugueses poderão compreender aquilo que está verdadeiramente em jogo no actual momento europeu.
O Deputado Telmo Correia (CDS-PP): A Europa é uma Europa de cidadãos, é uma Europa de povos e é também uma Europa de Estados. Contudo, do ponto de vista de Portugal, o que é que nos interessa? É evidente que a cidadania é importante, é relevante, mas se seguirmos o conceito da cidadania ou estritamente o conceito dos povos, essa, no limite, será a vitória da demografia. Se seguirmos a lógica dos povos, obviamente que há mais espanhóis, mais alemães, mais franceses do que portugueses.
Por isso, o conceito que nos interessa é, natural e logicamente, o conceito dos Estados e de uma Europa de Estados e a consagração do princípio da igualdade dos Estados. Existem, nesta matéria, divergências de opinião. Há, por exemplo, quem entenda que um sistema rotativo entre comissários pode até ser mais vantajoso para Portugal, porque teríamos, de quatro em quatro anos, um comissário com mais peso, por assim dizer.
O CDS-PP considera que "cada país/um comissário" é o que interessa a Portugal. É nessa matéria que nos devemos posicionar e é esse o princípio que devemos defender.
Por outro lado, sabemos que todas estas matérias são negociais e dependem de alianças. Nesse sentido pergunto-lhe qual a visão que tem sobre as alianças existentes neste momento no contexto europeu. É que as alianças e até as posições relativas dos países vão mudando. Há uns tempos atrás, pertencíamos a um grupo, no qual se integravam, logicamente, a Espanha e a Irlanda, que era visto como um grupo de coesão, por assim dizer. É evidente que hoje, quer a Espanha quer a Irlanda, estão numa situação diferente da nossa. Qual é, então, a lógica de alinhamentos, e, nessa lógica, a relação dos pequenos países?
Por último, refiro a questão do referendo, que é, para nós, importante e fundamental. Sempre dissemos que mudanças substanciais implicariam a realização do referendo. Sobre este tema, gostaria ainda de sublinhar que a oposição, designadamente a extrema-esquerda, que há pouco tempo atrás escrevia uma carta dizendo "Referendo o mais cedo possível", agora não quer o referendo; ou seja, quer o referendo desde que não seja proposto nem defendido por nós.
O Primeiro-Ministro: Em relação ao preâmbulo, um preâmbulo deve servir para unir e não para dividir, e a verdade é que hoje há um debate na Europa por causa do preâmbulo. Tive ocasião de dizer, na reunião de Roma, que era preferível não haver preâmbulo a haver um com uma omissão tão significativa à herança cultural cristã. Isto não quer dizer que estejamos a favor de uma instituição europeia com qualquer carácter confessional.
Defendemos, naturalmente, o carácter laico das instituições, mas entendemos, do ponto de vista da história e da cultura, que seria faltar ao rigor e objectividade não afirmar com clareza o património cultural cristão na formação da identidade europeia.
Quanto à questão atlântica, somos a favor de um reforço da identidade europeia de segurança e defesa, porque sem esta identidade Portugal também perde, pois é um país europeu. Parece-nos que não é prudente duplicar estruturas numa matéria tão sensível, porque isso poderá enfraquecer a solidez do vínculo transatlântico. Por isso, é que vemos o reforço da identidade europeia de segurança e defesa no quadro de um pilar europeu mais forte, para reforçar também a própria relação transatlântica. É esta a orientação que estamos a defender no âmbito da Conferência Intergovernamental.
No que diz respeito aos comissários, a minha posição é inequívoca: todos os países deverão estar representados na Comissão. Portugal não abdica de ter um comissário permanente na Comissão Europeia. Agora, quanto ao desenho concreto, há várias hipóteses com as quais, sinceramente, penso que Portugal pode trabalhar, porque uma Comissão Europeia com, pelo menos, 25 membros obviamente
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que poderá ter problemas de funcionalidade, e queremos que as instituições funcionem.
Devemos ser pragmáticos e construtivos. O modelo apresentado pela Convenção não me agrada, mas não objectaria a um modelo em que existisse alguns comissários com poder executivo, desde que houvesse uma rotação igualitária de todos os comissários nessa responsabilidade. Ao fim e ao cabo, seria um modelo como o que existe em muitos conselhos de administração de empresas, onde todos votam mas só alguns têm, naquele momento, pasta ou pelouro directamente atribuído.
Uma outra modalidade é a de terem todos também esse próprio pelouro, mas neste caso há um risco de estratificação da Comissão. Por isso, a nossa preocupação ao longo deste processo será garantir não só que todos os Estados-membros tenham um comissário na Comissão (Portugal terá o seu comissário) mas também que, enviesadamente, não se proceda a uma estratificação, ou seja, a comissários de primeira e de segunda categoria.
Quanto à questão das nossas alianças no âmbito desta negociação, vou ser totalmente franco com os Srs. Deputados. A verdade é que não há, hoje, um acordo generalizado entre os chamados pequenos e médios países. Há diferentes percepções, o que, aliás, se explica por várias razões, nomeadamente pelo facto de, quando entraram para a União Europeia, serem países neutros ou não, de serem países relutantes no processo europeu ou não. Neste aspecto, tenho de dizer, com alguma mágoa, que os Estados de maior dimensão conseguiram conciliar posições melhor do que a generalidade dos outros países.
Durante a Convenção, Portugal, várias vezes, esteve na linha da frente, em termos de conjugar a vontade de todos aqueles que evitaram a formação de um directório europeu. E, hoje, se os resultados da Convenção são aqueles e não outros, deve-se, em grande parte, ao esforço dos representantes de Portugal nos trabalhos da convenção - e incluo não apenas os representantes do Governo mas também os diferentes representantes portugueses na convenção.
Por isso, a questão que se coloca agora é a de saber, em termos de estratégia, o que é melhor: colocarmo-nos numa posição de frente na recusa de qualquer esforço de integração - uma posição, por assim dizer, marginal ou periférica - ou, pelo contrário, procurar construtivamente, a partir daquilo que é o acquis da Convenção, melhorar aquilo que podemos melhorar. A nossa estratégia está a ser esta, porque queremos continuar a estar no centro da decisão, no núcleo duro da decisão no âmbito europeu.
O Deputado Carlos Carvalhas (PCP): Quanto à União Europeia e à CIG, estamos de acordo com os princípios que enunciou, mas, em relação aos comissários, não ficou bem clara a posição do Governo português, ou seja, não sabemos se defende, com toda a clareza, que não haja de facto comissários de primeira e de segunda.
Por outro lado, nada nos disse sobre a língua, que é uma questão que começa agora a ser suscitada, e gostaríamos também de o ouvir sobre a mesma.
Já quanto à votação, parece-nos que o Governo parte com uma posição de vencido, com a argumentação de que o que conta não é o número de votos mas, sim, o peso político, a possibilidade política, o enquadramento político. Isto é dizer o seguinte: nós vamos aceitar aquilo que os grandes resolveram propor na CIG - entre França e Alemanha - e não aquilo que tinha sido decidido em Nice.
Relativamente ao referendo, o Sr. Primeiro-Ministro acabou por dizer que não tem qualquer convicção quanto ao referendo. Veio aqui dizer-nos, inclusivamente, que decidiu o referendo para aumentar o poder negocial na CIG, não porque entenda que os portugueses devam ser consultados. Por isso, Sr. Primeiro-Ministro, a questão que lhe coloco é a seguinte: o senhor quer, de facto, um referendo a sério, ou quer uma paródia de referendo?
E, já que os senhores bloquearam o referendo sobre um tratado, porque não é possível fazer um referendo sobre um tratado, diga-nos também, Sr. Primeiro-Ministro, quais são as consequências de uma resposta a este referendo. Isto é, que consequências políticas e práticas tem uma resposta que diga "sim" ou "não"? Ou seja, se ganhar o "sim" no referendo, ou se ganhar o "não" no referendo, quais são as consequências?
O Deputado Francisco Louçã (BE): Anuncio-lhe, Sr. Primeiro-Ministro, que será trazido a voto nesta Assembleia da República o projecto de resolução do Bloco de Esquerda sobre um referendo, em tempo útil, acerca das questões fundamentais, sem esperar por uma impossibilidade política e inconstitucional que é o que o Senhor propõe. É que, Sr. Primeiro-Ministro, acuso-o de não querer o referendo a não ser que o mesmo se possa efectuar na única data impossível. O senhor sabe que não vai haver referendo se mantiver essa proposta, e quer mantê-la porque não quer referendo. Isto é uma absoluta falta de seriedade.
Votaremos "não!" à actual proposta de tratado de Giscard d'Estaing, por muitas e boas razões: não foi um processo constituinte, não se baseou num processo democrático e o texto é inaceitável. O Sr. Primeiro-Ministro, aliás, veio-nos dizer aqui que não o aceitava em alguns pontos fundamentais. E a clarificação política que deve resultar deste debate é sabermos se, sim, ou não, vota a favor: esta é a dúvida.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): Quanto à questão da União Europeia, eu gostaria de dizer o seguinte: um Governo, neste caso, o português, que, logo à partida, leva para a Conferência Intergovernamental a ideia de que contestar princípios, contidos num dito tratado constitucional, é deixar de estar no eixo da formação europeia, é reservar-se a uma posição de periferia, a uma posição marginal, é, desde logo, admitir que não tem absolutamente força alguma para orientar seja o que for naquela Conferência Intergovernamental. Um Primeiro-Ministro e um Governo que consideravam que era inadmissível aceitar um presidente para o Conselho Europeu, que era inadmissível aceitar o fim das presidências rotativas e, agora, acaba por aceitar tudo isto, de uma forma incondicional...!
Relativamente à questão das maiorias qualificadas e ao fim da unanimidade em muitas matérias, o Sr. Primeiro-Ministro parece que leva também já uma posição extremamente fragilizada.
No que concerne ao número de comissários, também sem direito de voto, o Sr. Ministro também já está completamente fragilizado pelas sucessivas posições que tem tido, em relação à questão da composição da Comissão. Por isso, a nossa grande preocupação prende-se com a fragilidade da posição, ou da defesa das posições, no que respeita ao interesse de Portugal, nomeadamente, no processo decisório da União Europeia que, agora, está em causa.
Sobre o referendo, em concreto, gostava de dizer: não tenha dúvidas, absolutamente nenhumas, Sr. Primeiro-Ministro, de que Os Verdes defendem o referendo, nesta matéria, como o defenderam, no passado.
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Mas aquilo que o Sr. Primeiro-Ministro pretende, com esta simultaneidade das eleições e do referendo é procurar associar esse objectivo para que, depois, procure, com as já célebres histórias das inevitabilidades referir que, caso exista um refendo, ou não, que Portugal necessariamente estará numa posição de desintegração, o que não é obviamente o caso. Portanto, o que se pede, relativamente a esta negociação que está em causa na Conferência Intergovernamental, é força.
E a pergunta concreta que faço ao Sr. Primeiro-Ministro, para ver também se, afinal, concorda ou não com o referendo, é esta: e se o referendo não for em simultâneo com as eleições europeias, concorda, ou não, com o referendo?
O Primeiro-Ministro: Vou responder a algumas questões concretas. Perguntou-me a Sr.ª Deputada se somos a favor ou contra as maiorias qualificadas e eu digo-lhe que, regra geral, sou a favor, porque quero que a União Europeia funcione. É evidente que, se fosse a favor da decisão por unanimidade, paralisava a União Europeia. É muito demagógico vir defender a unanimidade, dizer que Portugal tem sempre de dar o seu acordo. Portugal vai perder, muitas vezes, em votações da União Europeia, não tenha a menor dúvida!
Como quero que a União Europeia funcione, porque entendo que é bom para Portugal que a União Europeia funcione, sou a favor, regra geral, das maiorias qualificadas.
No que diz respeito à questão do referendo, a Sr.ª Deputada saberá, com certeza, que a decisão final é do Presidente da República e que, contudo, a iniciativa é do Governo ou da Assembleia da República. Ora, falando como líder do Governo e como líder da maioria da Assembleia da República, posso adiantar qual é a proposta que queremos que seja aprovada. E, quando se faz uma proposta, do ponto de vista democrático, não faz qualquer sentido estar a responder a questões hipotéticas com julgamentos de intenção!
Faço uma proposta e agora estou atento à vossa resposta. A vossa resposta - já se sabia - é sempre "não"; aliás, antes de ouvirem qualquer proposta, a vossa resposta é "não", sempre "não". Fiquei com interesse na posição do Partido Socialista, porque apesar de haver diferenças no Partido Socialista… - e há muitas, não em relação à data! A diferença no Partido Socialista é se são contra ou a favor do referendo, porque há grandes personalidades do Partido Socialista, designadamente os Drs. Almeida Santos e Jaime Gama, que, pura e simplesmente, são contra o referendo.
O Deputado Miguel Anacoreta Correia (CDS-PP): Na passada sexta-feira tive ocasião de referir a posição do meu partido e que foi sintetizada em cinco pontos que eu resumiria: primeiro, somos pela discussão do texto apresentado pela Convenção; segundo, somos favoráveis à igualdade jurídica dos Estados e a um comissário por país; terceiro, estamos na posição de entender que o actual preâmbulo não serve a verdade técnica ao não pôr em evidência o legado do cristianismo na Europa; em quarto lugar, somos adeptos de que, efectivamente, a segurança e a defesa da Europa não podem ser feitas "apesar de" ou "contra" os nossos aliados de sempre, os Estados Unidos da América.
Somos firmemente atlantistas nesta matéria. Uma quinta questão, não teve ainda, da parte do Sr. Primeiro-Ministro, embora o Governo já tenha dado uma resposta induzida quando propôs a criação de um grupo de acompanhamento da CIG, que é a do reforço do papel dos parlamentos no controlo da subsidiariedade e da proporcionalidade no processo europeu. Sr. Primeiro-Ministro, penso saber qual é a sua resposta mas como hoje foi o dia em que houve muitas questões que se tornaram claras e, a partir de agora, entramos no tal debate e na acção pedagógica que nos interessa para a preparação do referendo que tem de ser exercido com responsabilidade, eu perguntar-lhe-ia se, além destas quatro questões de que hoje aqui tivemos o conforto das posições do Governo, na quinta questão o Governo também vai defender o reforço do papel dos parlamentos no controlo da proporcionalidade e da subsidiariedade.
O Primeiro-Ministro: No que diz respeito à questão concreta que me coloca, do reforço do papel dos parlamentos, aqui está exactamente a minha posição: a de valorizar o Parlamento português - como, aliás, tenho feito em todas as ocasiões. Portanto, Sr. Deputado, o Governo português vai continuar a defender o reforço do papel dos parlamentos nacionais em tudo aquilo que tenha a ver com o processo de construção europeia, nomeadamente no controlo da subsidiariedade e da proporcionalidade.
Reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia
Por iniciativa do Presidente da Assembleia da República realizou-se, em Lisboa, nos dias 25 e 26 de Abril, uma reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Alargamento da União Europeia (Bulgária, Eslováquia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Polónia, Portugal, República Checa, Roménia) com o Presidente do Parlamento Português. Nesta reunião participaram, a convite do Presidente da Assembleia da República, o Presidente da CAEPE, deputado Jaime Gama e o deputado Nazaré Pereira.
Nas conclusões [Ver anexo 8] que resultaram desta reunião os representantes dos Parlamentos nacionais defenderam a necessidade de a Convenção sobre o Futuro da Europa propor a definição do papel que eles devem vir a desempenhar no futuro.
A crescente transferência de poderes legislativos dos Parlamentos nacionais para os Governos reunidos em Conselho, verificada no processo de integração europeia, tem tido como consequência o afastamento dos Parlamentos nacionais do processo decisório comunitário. O envolvimento dos Parlamentos nacionais, incluindo o dos países candidatos, no processo de integração europeia, nomeadamente mediante o controlo dos seus próprios governos, melhora a qualidade democrática da decisão comunitária e fortalece a ligação entre os cidadãos e o ideal europeu.
A reunião acolheu, favoravelmente, a ideia de incentivar o relacionamento dos Parlamentos nacionais dos presentes e futuros Estados Membros entre si e destes com o Parlamento Europeu.
Nas mesmas conclusões os Presidentes dos Parlamentos apelaram para que fosse garantida a igualdade de direitos dos países candidatos na Convenção bem como na Conferência Intergovernamental que adoptará o novo Tratado Constitucional da União Europeia. Todos concordaram que o Tratado Constitucional não deverá ser assinado sem a total aceitação dos vinte e cinco países.
Todos os Presidentes dos Parlamentos nacionais defenderam que a União Europeia alargada não deve defraudar as expectativas dos novos Estados Membros. Seria lamentável
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que esses Estados se vissem confrontados, após a adesão, com uma realidade diferente daquela a que pensavam aderir, na qual as palavras solidariedade e coesão já tivessem perdido o sentido.
Por isso, a preservação e a consolidação da componente comunitária da União, e nomeadamente da Comissão, devem constituir o verdadeiro motor e ponto de equilíbrio entre os interesses das diferentes partes. Os Estados-Membros, independentemente da sua dimensão, devem estar conscientes de que é absolutamente vital exorcizarem-se as veleidades de directórios e respeitarem-se as sensibilidades e a dignidade de todos os restantes parceiros, sempre que sejam definidos objectivos comuns e tomadas decisões com implicações para o conjunto da União.
Análise do Projecto de Tratado Constitucional que estabelece uma Constituição para a Europa
Pela primeira vez na história da construção europeia, um Projecto de Tratado Constitucional expressa claramente a ambição política de dotar a União Europeia de uma Constituição. Com efeito, e ao contrário dos últimos Tratados a sua designação não fará referência a um aspecto particular da cooperação europeia, nem ao nome da localidade que serviu de palco à sua aprovação, mas sim ao todo da construção europeia, encimado pelos direitos fundamentais e de cidadania e expressando o contrato que é estabelecido entre os Estados nacionais e os povos, por um lado e com a União Europeia, pelo outro.
Afasta-se do pensamento do relator a ideia de que estamos na presença de uma lei fundamental para o povo europeu, ou que estejamos a construir um super-estado europeu.
O que está em causa, como bem assinalou o Deputado Guilherme d'Oliveira Martins, representante da AR à Convenção, "é a criação de uma democracia supranacional de natureza sui generis diferente da democracia dos Estados e de uma mera lógica intergovernamental. Trata-se de dar ênfase a uma legitimidade europeia autónoma entre as soberanias dos Estados partilhada dos povos e dos cidadãos europeus". [In Martins, Guilherme d'Oliveira Que Constituição para a União Europeia?, Gradiva, Lisboa, 2003, p. 6].
Com o assumir da designação de Constituição, o Projecto de Tratado Constitucional (para sermos rigorosos juridicamente) expressa inequivocamente uma vontade: a de a União abandonar o sentido funcionalista da sua construção, para se transformar numa União política assente na dupla legitimidade de Estados e de Povos.
A esta vontade, junta o relator a sua satisfação por aquela optar pela via da integração política da construção europeia, na convicção profunda de que tal opção resultará em melhores benefícios para os cidadãos europeus, do que a simples cooperação intergovernamental. Com efeito, a soberania dos Estados-Nação tal como os conhecemos desde a sua formação, tem vindo a transformar-se em crescentemente formal perante fenómenos, como o da globalização. Os Estados vão perdendo instrumentos nacionais, que no passado eram suficientes para solucionar problemas. Imaginar que Portugal poderia subsistir isoladamente num Mundo com as características do actual, seria - com todo o respeito - tão só um exercício de imaginação.
O Projecto de Tratado Constitucional em análise, vem em grande medida dar forma à "Constituição material" que já existe, fruto dos diversos tratados europeus.
Doravante referimo-nos a ele pela designação de Projecto de Tratado Constitucional.
Deve-se realçar que o Projecto de Tratado Constitucional substitui por um texto único, o conjunto dos tratados existentes. Tratava-se simultaneamente de um objectivo formal antigo que se integra na preocupação de legibilidade, transparência e clareza dos textos oficiais, o que não tinha sido conseguido em anteriores revisões; e de um propósito político de dotar a União Europeia de uma Constituição.
O projecto de Tratado Constitucional está estruturado em quatro partes:
- A primeira parte contém as disposições que definem a União, os seus objectivos, competências, processos de decisão e instituições.
- A Carta dos Direitos Fundamentais, solenemente proclamada no Conselho Europeu de Nice, em Dezembro de 2000, foi incorporada no Projecto de Tratado Constitucional Europeia, de que constitui a parte II.
- A terceira parte do Projecto de Tratado Constitucional trata das políticas e das acções da União e retoma um grande número de disposições dos tratados actuais.
- A quarta parte contém as cláusulas finais, nomeadamente os procedimentos de adopção e revisão da Constituição.
Acrescem a estas quatro partes, fazendo parte integrante do respectivo Tratado, cinco Protocolos: Protocolo Relativo ao Papel dos Parlamentos Nacionais na União; Protocolo Relativo à Aplicação dos Princípios de Subsidiariedade e da Proporcionalidade; Protocolo Relativo à Representação dos Cidadãos no Parlamento Europeu e à Ponderação de Votos no Conselho Europeu e no Conselho de Ministros; Protocolo Relativo ao Eurogrupo e Protocolo que Altera o Tratado Euratom.
Para maior facilidade de acompanhamento da análise vamos seguir a estrutura do próprio Projecto de Tratado Constitucional.
Análise da parte I
Definição e objectivos da União
O Projecto de Tratado Constitucional "institui" a União fundada na sua dupla legitimidade de União de Estados da Europa e dos Cidadãos, expressando a sua abertura à inclusão de mais Estados europeus que respeitem os valores enunciados, nomeadamente, o respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do respeito pelos direitos humanos.
A União garante as liberdades fundamentais e proíbe qualquer discriminação, sendo claramente explícita, quanto à proibição da discriminação em razão da nacionalidade.
Estes valores são comuns aos Estados-membros, numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, a tolerância, a justiça, a solidariedade e a não discriminação.
Ao longo do articulado em apreciação fazem-se também referências à promoção de um espaço de liberdade, segurança e justiça, sem fronteiras internas e a um mercado único em que a concorrência é livre; ao empenho no desenvolvimento sustentável da Europa, assente num crescimento económico equilibrado, numa economia social de mercado competitiva que tenha como meta o pleno emprego e o progresso social, e num elevado nível de protecção
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e de melhoramento da qualidade do ambiente; ao progresso cientifico e tecnológico; ao combate à exclusão social; à promoção da justiça e da protecção social; à promoção da igualdade entre mulheres e homens; à promoção da solidariedade entre as gerações; e à promoção dos direitos das crianças; à promoção da coesão económica, social e territorial; ao respeito pela diversidade cultural e linguística e pelo desenvolvimento do património cultural europeu; e nas suas relações com o resto do Mundo, a União afirma e promove os seus valores na rigorosa observância do direito internacional, incluindo o respeito pelos princípios da Carta das Nações Unidas.
Torna-se evidente que o valor declarativo destes valores e objectivos só assumirá significado para os cidadãos europeus se para tal existirem políticas e recursos adequados para a sua aplicação.
A enunciação destes valores e objectivos gera uma expectativa que em nossa opinião não é, apesar de alguns progressos, completamente acompanhada nos Títulos referente às políticas sectoriais e às finanças da União, como adiante comprovaremos.
Partilhando alguma preocupação, a Associação Portuguesa do Ensino Superior Privado (APESP) refere que "devem ser encarados mais como princípios do que como metas".
Apesar de quase todas as contribuições, com destaque para a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) pelas referências à coesão territorial e à autonomia local e regional, para o presente Relatório se referirem de modo satisfatório a esta parte do Projecto de Tratado Constitucional, vale a pena recuperar algumas sugestões de melhoria:
Do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (CNADES) no sentido de ser referido no articulado "as responsabilidades para com as gerações futuras" bem como "a consagração da referência ao património natural (e, eventualmente também ao património construído, incluindo o histórico e o subaquático".
Do lobby Europeu das Mulheres e Associação de Mulheres da Europa Meridional (LEM e AFEM) no sentido de ser "consagrada explicitamente a igualdade entre mulheres e homens como um dos valores sobre os quais assenta a União. Sendo certo que as fontes que constituem as referências fundamentais do direito internacional, a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, fazem referência à igualdade entre mulheres e homens nos respectivos Preâmbulos é absolutamente inaceitável a recusa obstinada da Convenção em consagrar a igualdade de mulheres e homens como um dos valores sobre os quais assenta a União." Aliás, essa expressão que já se encontra consagrada no Tratado de Amesterdão.
Da Ordem dos Farmacêuticos (OF) com o objectivo de que "a promoção da melhoria do nível de saúde dos cidadãos" seja considerado um objectivo da União.
Uma inovação que consideramos bastante positiva é a norma que atribui personalidade jurídica à União, amplamente apoiada quer nos contributos da sociedade civil, quer nos pareceres das Comissões Parlamentares da AR.
De notar também que logo no artigo primeiro do Projecto de Tratado Constitucional, é referido que "a União está aberta a todos os Estados europeus", que não deve ser interpretada, como um conceito geográfico stricto senso, mas antes como um significado político de quem não se pretende fechar sobre si próprio, mas disposto a abrir-se aos países vizinhos.
Direitos fundamentais e cidadania da União
Consideramos bastante positivo e de significado político profundo que os direitos fundamentais e a cidadania surjam no início do articulado do Projecto de Tratado Constitucional. O caminho iniciado há anos, para que a Carta dos Direitos Fundamentais (proclamada em 8 de Dezembro de 2000) adquirisse valor jurídico e fosse vinculativa, conhece nesta sede o seu êxito, ao ver expressamente reconhecida pela União os princípios que nela - Carta - são consagrados.
Se se tivesse agido de modo contrário, o sentido político da Constituição cujo Projecto de Tratado Constitucional vimos analisando, careceria de significado e a União ficaria privada de uma das suas fundações estruturantes: a dos Povos.
Em sentido idêntico se pronuncia com bastante felicidade a Civitas quando afirma que "A constitucionalizção dos direitos fundamentais, na dimensão universal e na dimensão universal e indivisível que a Carta lhes reconheceu, coloca os valores da dignidade humana no centro do projecto político europeu".
De assinalar o propósito expresso da União, dotada de personalidade jurídica, para aderir à Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma em 4 de Novembro de 1950 e ratificada por todos os Estados-Membros da União.
Estas novas vinculações acrescem à protecção de direitos fundamentais e de cidadania dos cidadãos europeus. A cidadania europeia é complementar às cidadanias existentes. E ainda bem que assim se interpreta dado que na Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, esta se limita ao reconhecimento dos direitos civis e políticos (limite que também se verifica no artigo 8º referente à cidadania da União), enquanto a Carta dos Direitos Fundamentais abrange outros domínios, como o direito a uma boa administração, os direitos sociais dos trabalhadores, a protecção de dados pessoais ou a bioética.
Um dos direitos que merece ser destacado, é o que confere aos cidadãos da União a possibilidade de se dirigirem às Instituições da União numa das línguas da Constituição e de obter resposta nessa mesma língua. Este reconhecimento deve ser valorado como elemento constituinte da diversidade e da riqueza cultural da União e prevalecer sobre quaisquer propósitos de eficácia, em particular quando se analisarem os métodos de trabalho das Instituições da União.
Competências da união
A clarificação de quem faz o quê na União transformou-se numa tarefa urgente, quer do ponto de vista da eficácia do seu funcionamento, quer da própria concepção política da natureza da União.
Assim sendo, e dando resposta a uma das principais preocupações de Nice e de Laeken, o Projecto de Tratado
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Constitucional procede à classificação das competências em três categorias, a saber:
Competências exclusivas da União - relativamente às quais a União age sozinha e apenas ela pode legislar e adoptar actos juridicamente vinculativos. Estas competências aplicam-se aos domínios do estabelecimento das regras de concorrência necessárias ao funcionamento do mercado interno; da política monetária para os Estados-Membros que tenham adoptado o euro; da política comercial comum; da União Aduaneira; e da conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum de pescas.
Competências partilhadas - relativamente às quais a acção da União acrescenta valor às acções dos Estados-Membros. Aqui se incluem dez domínios de políticas, expressamente referidas no artigo 13.º do Projecto de Tratado Constitucional. Ficam excluídas destas competências as mencionadas nos artigos 12.º (exclusivas) e 16.º (de apoio).
Competências de Apoio - relativamente às quais a União só actua em apoio, coordenação ou em complemento das acções dos Estados-membros. Estão aqui incluídos os domínios da indústria, da saúde humana, da educação, formação profissional, juventude e desporto, da cultura e da protecção civil. Refira-se ainda que os actos juridicamente vinculativos adoptados pela União, com base nas disposições da Parte III, não podem implicar a harmonização das legislações nacionais.
Este sistema de classificações beneficia de uma Cláusula de Flexibilidade que permite que eventuais lacunas sejam solucionadas pelo Conselho de Ministros, mas desde que o faça por unanimidade, após aprovação pelo Parlamento Europeu e por iniciativa da Comissão Europeia. Este é claramente o exemplo de um campo onde a vigilância da aplicação do princípio da subsidiariedade, exige a intervenção dos Parlamentos nacionais.
Ora, esta clausula de flexibilidade mais poderia chamar-se de "Cláusula de Rigidez", porque para ser aprovada exige uma maior concordância de instituições europeias e de órgãos nacionais do que a exigida para a aprovação de um Tratado Europeu.
A delimitação de competências entre a União e os Estados-membros apenas procedeu a uma melhor e mais nítida clarificação das mesmas, não tendo provocado qualquer alargamento ou redução significativa.
Deste modo, nos domínios das políticas económicas e de emprego, o Tratado apenas prevê a adopção de medidas que garantam a sua coordenação, de modo a que todos os Estados-membros se esforcem para alcançarem os objectivos fixados. É positivo que o Projecto de Tratado Constitucional tenha incluído a ideia subjacente à Estratégia de Lisboa [Aprovada em Março de 2000, no decorrer do exercício da Presidência Portuguesas da União], mas deveria ter-se ido mais longe, o que reforça a nossa atitude critica por não se ter procedido ao aprofundamento da dimensão económica e social da União.
A política externa e de segurança comum tem também um tratamento específico mas exclusivamente declaratório, particularmente quando se refere à definição gradual de uma política comum de defesa poder conduzir a uma defesa comum.
Neste âmbito das competências insere-se o famoso artigo 10.º referente ao direito da União. Famoso porque se tornou, em Portugal, num dos artigos mais falados e transformou-se no motivo mais invocado para a realização de uma revisão constitucional, para a realização de um referendo nacional e até, na óptica de alguns, para a rejeição do próprio Projecto de Tratado Constitucional.
Na nossa análise, este artigo deve der interpretado de acordo com o que se diz no artigo 5º e jogar com os princípios de atribuição fixados no artigo 9º do mesmo Projecto.
Na opinião do relator, faz todo o sentido que as esferas de competências livremente e soberanamente transferidas do nível nacional para o europeu, e numa base de reciprocidade entre os Estados-membros, sejam reguladas pelo direito europeu.
Esta opinião encontra conforto nas decisões do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, desde os anos sessenta, as quais integram o acervo comunitário que aceitámos desde a nossa adesão em 1986.
Assim, o artigo 10.º não constitui propriamente uma novidade, nem fornece qualquer argumento sólido quanto a uma suposta hierarquização de Constituições. Os tratados europeus vinculam os Estados-membros por livre decisão de cada um e no respeito de cada uma das suas respectivas Constituições.
Portugal não pode vincular-se a este ou a qualquer outro Tratado Constitucional se tal for contrário à Constituição da Republica Portuguesa e quem aprova as revisões da nossa Constituição é a Assembleia da República, como sabemos.
Em caso limite, e para sossego dos mais atormentados com o artigo 10.º, o Projecto de Tratado Constitucional prevê, no seu artigo 59.º, e pela primeira vez, a saída voluntária da União por parte de qualquer Estado-membro.
Não constitui nossa intenção efectuar uma abordagem jurídico-constitucional deste artigo (outros o farão com maior competência e profundidade) mas tão só dar conta da análise política que nos compete.
A este propósito, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias efectuou um interessante debate e dedicou parte do seu parecer ao referido artigo que, independentemente da nossa posição e dado o natureza pedagógico e plural da análise que estamos a efectuar, entendemos por benéfico reproduzir na íntegra:
"1. O projecto de Tratado afirma no seu artigo 10.º, n.º 1, que a 'Constituição e o direito adoptado pelas instituições da União no exercício das competências que lhe são atribuídas primam sobre o direito dos Estados-membros'.
A análise da relação entre normas exige um enfoque na análise da relação entre competências. É necessário ter em conta o modo como se repartem as competências entre a União e os Estados-membros.
O artigo 9.º estabelece que o princípio que preside a essa repartição é o princípio da atribuição. Quer dizer: a União dispõe apenas das competências que os Estados-membros lhe tenham atribuído, permanecendo as restantes nos Estados-membros.
2. Lembremos as categorias de competências de que dispõe a União: as exclusivas, no âmbito das quais só a União pode legislar e adoptar actos juridicamente vinculativos; as partilhadas, em que quer a União quer os Estados-membros
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podem legislar e adoptar actos juridicamente vinculativos.
Quanto às competências exclusivas da União:
A exclusividade da competência da União implicará que o seu exercício e a forma e o conteúdo dos actos emitidos nesse exercício sejam integralmente regidos pelo direito europeu, seja ele constitucional ou ordinário. Quanto a essas competências, pode colocar-se a questão de saber se é juridicamente possível formar-se um verdadeiro conflito ou uma colisão de normas de direito interno e de direito europeu que tenha de ser resolvida através da regra do primado. Porque o primado só se aplica quando duas ou mais normas de proveniência distinta (umas europeias, outras nacionais) apresentam uma pretensão juridicamente válida para regular uma determinada questão Por natureza, a possibilidade de conflito estará afastada.
Quanto às competências partilhadas da União:
O domínio das competências partilhadas tem contornos diversos. Aqui, os Estados-membros não transferiram incondicionadamente o poder de legislar ou de agir. Limitam-se a atribuir à União a faculdade de decidir se deve ou não exercer aquela competência. Se o fizer, os Estados devem abster-se. Enquanto não decidir se o faz e após ter decidido que não o faz, os Estados podem tomar medidas. Nestas circunstâncias de transferência condicionada é teoricamente possível o surgimento de várias normas (internas e europeias) em relação às quais se pode colocar, pelo menos, a dúvida sobre se é válida a pretensão de elas regularem uma certa matéria. E nesse caso o primado do direito europeu seria convocado.
3. Questão relevante é a de saber como o direito europeu se relaciona com o direito ordinário dos Estados-Membros e com o seu direito constitucional.
Sendo clara a ordenação do direito ordinário dos Estados-membros ao direito europeu, já a relação de sentido entre as normas do artigo 10.º, n.º 1 e do artigo 5.º, n.º 1 do projecto de Tratado suscita uma clarificação.
Se o artigo 10.º, n.º 1, determina que "a Constituição e o direito adoptado pelas instituições da União no exercício das competências que lhe são atribuídas primam sobre o direito dos Estados-membros", não estabelecendo sobre este "direito" qualquer distinção, o artigo 5.º, n.º 1 afirma que 'a União respeita a identidade nacional dos Estados-membros, reflectida nas estruturas políticas e constitucionais fundamentais de cada um deles (…)'.
O que são estas estruturas constitucionais? São estruturas normativas? São as estruturas sociológicas criadas por um efeito de integração constitucional? São os princípios estruturantes das constituições nacionais que, afinal, já hão-de manifestar uma concordância de base para que os Estados possam pertencer à União?
Exige-se assim, uma clarificação do sentido dos artigos 5.º, n.º 1 e 10.º, n.º 1 e da sua relação.
O sistema de normas é um sistema articulado como é o sistema de competências, suscitando a pergunta de se o primado não deve ser substituída afinal por uma ideia de harmonização necessária de competências e actos normativos. Uma coisa é certa: a relação de normas e os critérios de validade definidos nessa relação estão em conexão estreita com o sistema de distribuição - articulação de competências.
Seja como for, a questão de emergência de uma Constituição da União, com o seu sistema próprio de instituições e normas, haverá de resolver-se sobre um consentimento necessário das Constituições nacionais.
Na nossa ordem jurídica, a abertura constitucional ao Tratado caberá na forma plástica e aberta da norma do artigo 8.º da Constituição. Isso não afasta ulteriores adaptações constitucionais induzidas por uma exigência de funcionalidade dos órgãos e de eficácia das normas da União".
Tendo por base esta interpretação, a referida Comissão aprovou um conjunto de conclusões que podem ser consultadas em Anexo, e que devido à sua pertinência reproduzimos as sete primeiras:
1. O "Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa" radica-se numa convergência constitucional de base que era já condição originária de pertença dos Estados à União.
2. O Tratado constrói uma rede constitucional, estruturando uma entidade jurídica - a União - assente num sistema de valores - a Carta - e numa arquitectura institucional que articula competências da União e competências dos Estados-membros.
3. Não se trata de um processo clássico de formação de uma Constituição, e também não se trata de uma Constituição em sentido clássico. A estrutura institucional mostra que se está entre uma lógica de Direito Comunitário e uma lógica de Direito Constitucional. Além disso, o princípio da subsidiariedade é típico de uma arquitectura jurídico-política de "concorrência" de centros de decisão.
4. Este sistema constitucional em rede, com uma Constituição Europeia em relação de comunicação com as Constituições nacionais, tem o impulso fundacional de uma representação de Estados e cidadãos: adopção pelo Conselho Europeu, aprovação pelo Parlamento Europeu, ratificação pelos Estados-membros, de acordo com as suas normas constitucionais.
5. Aliás, no extenso e complexo sistema institucional da União, os processos decisórios têm a marca de uma cadeia de legitimidades que está bem patente na fórmula do artigo 45.º, n.º 2:- "Os cidadãos estão directamente representados a nível da União no Parlamento Europeu. Os Estados-membros estão representados no Conselho Europeu e no Conselho de Ministros pelos respectivos governos, que são eles próprios responsáveis perante os Parlamentos nacionais, eleitos pelos seus cidadãos."
6. Para o Tratado é decisiva a legitimidade democrática das partes contratantes e o seu procedimento constitucional [no sentido da constituição interna] de adesão. A representação dita a base da legitimidade das decisões políticas.
7. Na nossa ordem jurídica, a abertura constitucional ao Tratado caberá na forma plástica e aberta da norma do artigo 8.º da Constituição. Isso não afasta ulteriores adaptações constitucionais induzidas por uma exigência de funcionalidade dos órgãos e de eficácia das normas da União.
Ainda no âmbito das competências, o CNADES revela que "o reconhecimento do principio de integração do ambiente surge muito fragilizado quando percorremos com atenção toda a extensão do articulado do Tratado. As referências
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ao ambiente, quando o Tratado foca a iniciativa dos Fundos de Coesão ou os objectivos da política de energia, não são suficientes para fazer esquecer a total omissão da vertente ambiental quando se aborda a politica de 'agricultura e pescas' (artigo III - 121.º a 128.º), ou a politica de transportes (artigo III - 133.º a 143.º) Tal omissão é ainda mais grave quando é sabido que a conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da politica comum de pescas (artigo 12.º) constitui uma das "competências exclusivas da União, sendo neste contexto, de notar o processo em fase avançada de formulação de políticas para a zona costeira e para os oceanos."
O princípio da subsidiariedade, tal como enunciado, merece o apoio da ANMP ao mencionar explicitamente os níveis local e regional, bem como o da Assembleia Legislativa Regional dos Açores dado que "representa o reconhecimento e o reforço do papel dos órgãos de governo próprio regionais no processo de construção europeia, sendo que a aplicação desse princípio é regulamentada através de um protocolo anexo à Constituição, relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade que assegura, no seu artigo 5.º, a participação dos parlamentos regionais com competências legislativas no processo de decisão".
A Associação Nacional das Farmácias vê como muito positiva a referência expressa à protecção e saúde humana como um dos domínios em que a União poderá (deverá) desenvolver acções de apoio, de coordenação e de complemento, sem no entanto poder promover a harmonização das disposições legislativas e regulamentares dos Estados-membros".
A Confederação do Turismo Português (CTP) defende que também o Turismo seja expressamente previsto como um "domínio de acção de apoio, de coordenação ou de complemento", sendo integrado na previsão do artigo 16.° do Título III da Parte I do Projecto de Tratado Constitucional.
Instituições da união
Quadro Institucional
Nos mais de 50 anos das Comunidades Europeias/União Europeia a estrutura e equilíbrio institucional foram os menos afectados pela sua evolução económica e política e pelos sucessivos alargamentos. Nenhuma revisão alterou profundamente o quadro institucional, tendo antes estas sido o reflexo de alterações que se tinham já verificado na prática por actos ou decisões tomadas fora do quadro de uma CIG (veja-se o caso da institucionalização do Conselho Europeu e do progressivo aumento de competências do Parlamento Europeu). Nos mesmos termos, o Projecto de Tratado Constitucional não revolucionou a estrutura institucional, retomando, no essencial, as disposições existentes, ao mesmo tempo que introduziu duas novas figuras institucionais: uma presidência mais duradoura do Conselho Europeu e um Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O quadro institucional da União viu reconhecido constitucionalmente a instituição do Conselho Europeu. Quanto ao mais não se verificaram alterações. O Projecto de Tratado Constitucional integra:
O Parlamento Europeu,
O Conselho Europeu,
O Conselho de Ministros,
A Comissão Europeia, e
O Tribunal de Justiça.
O quadro institucional compreende ainda outras instituições e órgãos, os quais são:
O Banco Central Europeu,
O Tribunal de Contas,
O Comité das Regiões, e
O Comité Económico e Social.
Este quadro é fortemente criticado pela SEDES que entende dever proceder-se à sua correcção, de modo a evitar conflitos e bloqueios. Em sentido contrário expressam-se as outras contribuições ao manifestarem uma concordância geral, sem no entanto - parte delas - se pronunciarem no sentido de uma ou outra clarificação.
O Parlamento Europeu
O Parlamento Europeu representa os cidadãos europeus e é a única instituição cuja composição é eleita directamente pelos povos europeus. Os deputados europeus são eleitos por um período de cinco anos e o seu número foi fixado, no máximo, em 736 (no Tratado de Nice o número máximo de deputados europeus foi fixado em 732, e no Tratado de Amesterdão o mesmo número foi fixado em 700). O número de membros atribuídos a Portugal, mantendo-se a distribuição do Tratado de Nice, é percentualmente superior ao peso da população portuguesa na União [A população portuguesa representa 2,3% da população da União e o numero de deputados a eleger por Portugal para o Parlamento Europeu representa 3,3% do total].
A representação dos cidadãos é assegurada de modo degressivamente proporcional, sendo fixado um limiar mínimo de quatro deputados por Estado-membro.
O poder e as competências do Parlamento Europeu não são similares ao poder e às competências dos parlamentos nacionais.
Actualmente e apenas em parte das matérias, o Parlamento tem uma função de co-legislador; o Parlamento constitui também a autoridade orçamental - ao lado do Conselho - e exerce ainda funções de controlo político da Comissão.
Só progressivamente, os Governos dos Estados-membros têm partilhado poderes com o Parlamento Europeu.
Deste modo, à medida que a União tem procedido à revisão dos seus tratados, o Parlamento Europeu tem vindo a receber cada vez mais competências, tal como acontece com o Projecto de Tratado Constitucional em análise.
O Projecto de Tratado Constitucional em análise, reforça os poderes de co-legislador do Parlamento Europeu alargando a novos domínios o âmbito de aplicação do denominado procedimento de co-decisão, agora designado procedimento legislativo, através do qual o Parlamento decide em conjunto com o Conselho.
O Parlamento Europeu passa a eleger o Presidente da Comissão, sob proposta do Conselho Europeu. A Comissão continua a ser investida, colegialmente, pelo Parlamento Europeu e a responder perante este.
De assinalar que o Parlamento Europeu continua a surgir formalmente, como a primeira das instituições da União.
O Conselho Europeu
Como anteriormente referimos, o Conselho Europeu tem pela primeira vez consagração no texto dos Tratados, apesar de já existir e ser, devido à sua composição, a mais mediática de todas as instituições europeias.
O Conselho Europeu é responsável por dar à União o impulso político indispensável ao seu desenvolvimento e define as suas prioridades políticas gerais.
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O Conselho Europeu não tem competências legislativas, pronuncia-se por consenso (salvo disposição em contrário) e reúne uma vez por trimestre (desde o seu início e até há três anos atrás a periodicidade das reuniões era semestral).
O Conselho Europeu é composto pelos Chefes de Estado ou de Governo dos Estados-membros, pelo Presidente da Comissão, e o Projecto de Tratado Constitucional assim o prevê, pelo novo Presidente do Conselho Europeu e pelo novo Ministro dos Negócios Estrangeiros.
O Presidente do Conselho Europeu
Actualmente, o Conselho Europeu, como todas as instâncias do Conselho, é presidido pelo Estado-membro que exerce durante seis meses a Presidência da União, segundo uma ordem estabelecida.
O Projecto de Tratado Constitucional estabelece a criação de um cargo permanente de Presidente do Conselho Europeu eleito, por maioria qualificada, pelo Conselho Europeu por um período de dois anos e meio, renovável uma vez.
Este presidente teria a missão de presidir e animar os trabalhos do Conselho Europeu. Exerceria igualmente funções de representação da União, a alto nível, no domínio da política externa e de segurança comum.
A Presidência do Conselho de Ministros será assegurada num regime de rotação anual, em total respeito pela rotatividade simples dos Estados-membros.
Na opinião do relator, as funções (legislativa e executiva) do Conselho de Ministros deveriam ser autonomizadas.
A Presidência do Conselho de Ministros (função legislativa) deveria ser exercida nos termos previstos no actual Projecto de Tratado Constitucional; a Presidência do Conselho de Ministros (função executiva) deveria ser exercida pelo Presidente da União (ou com outra designação) que deveria presidir também à Comissão Europeia.
Assim, o Presidente da União presidiria aos dois executivos (Comissão Europeia e Conselho de Ministros), garantindo a coerência e a coordenação da acção política, em particular da dimensão da representação externa.
O Instituto de Defesa Nacional (IDN) considera que se deve proceder à clarificação das competências do Presidente do Conselho Europeu, do Presidente da Comissão e do Ministro dos Negócios Estrangeiros, no sentido de evitar sobreposições.
Mais afastada é a posição da SEDES para quem "a institucionalização de um Conselho Europeu e, sobretudo, de um Presidente por um mandato que pode ir até cinco anos, iria sem dúvida criar factores de bloqueamento, retirando visibilidade e protagonismo ao Presidente da Comissão Europeia".
No Projecto de Tratado Constitucional, o Presidente do Conselho Europeu assegurará a representação externa da União nas matérias do âmbito da política externa e de segurança comum, sem prejuízo das competências do Ministro dos Negócios Estrangeiros da União.
A Ordem dos Engenheiros pronuncia-se a favor da manutenção das presidências rotativas da União.
O Conselho de Ministros
O Conselho de Ministros exerce, juntamente com o Parlamento Europeu, a função legislativa e a função orçamental, como atrás referimos. Exerce também funções de definição de políticas e de coordenação, com particular destaque para as relativas aos domínios da política externa e de segurança comum.
O Conselho de Ministros é composto por um representante governamental por cada Estado-Membro de acordo com as matérias a tratar.
Actualmente, todas as instâncias do Conselho são presididas durante seis meses, rotativamente, por um único Estado-membro.
O Projecto de Tratado Constitucional prevê que a presidência de uma formação do Conselho seja assegurada pelo ministro de um Estado-membro, segundo um sistema de rotação idêntico, por um período de um ano. Caberá ao Conselho Europeu fixar as regras de aplicação dessa rotação entre os Estados-Membros, tendo em conta, nomeadamente, os equilíbrios geográficos europeus. A excepção vai para o Conselho de Ministros dos Negócios Estrangeiros que deverá ser presidido pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros da União/Vice Presidente da Comissão.
Somos de opinião que o Conselho de Ministros deverá autonomizar com total clareza as suas duas funções: legislativa e executiva. Assim sendo, o Conselho Legislativo deverá reunir de acordo com as regras próprias de um parlamento; e o Conselho de Ministros (Executivo) de acordo com as regras de trabalho dos executivos.
As presidências serão assumidas de acordo com a opinião expressa no ponto referente à Presidência.
A maioria qualificada
O Projecto de Tratado Constitucional institui como processo legislativo normal, o actual processo de co-decisão que passará a denominar-se processo legislativo. Em alguns casos, todavia, existirão leis especiais, exclusivamente adoptadas pelo Conselho, ou, mais raramente apenas pelo PE. Geralmente, o Conselho toma agora as suas decisões por unanimidade ou por maioria de votos, calculada segundo um sistema de ponderação que tem, até certo ponto, em conta a população dos Estados-membros.
O Projecto de Tratado Constitucional introduz, a partir de Novembro de 2009, uma nova definição [Actualmente vigora um sistema de deliberação muito complexo, assente numa ponderação de votos (que vão de 3 a 29 votos). O Conselho de Ministros só delibera quando se verificarem três condições: Maioria dos Estados-Membros, uma maioria de votos ponderados (72,3%), desde que representem 62% ou mais da população europeia], simplificada, de maioria qualificada para as deliberações no Conselho: a maioria de Estados-membros que represente pelo menos 60% da população da União (3/5 da população).
Não se entende, no âmbito de uma perspectiva conceptual e racionalista, qual o motivo para se exigirem maiorias diferentes. Somos de opinião que se deveria adoptar a dupla maioria simples, ou seja: maioria de Estados e maioria da população.
A esta simplificação do sistema de deliberação do Conselho de Ministros, regista-se como positivo, (embora a posição da UGT se pronuncie em sentido contrário), a extensão da votação por maioria qualificada relativamente a cerca de trinta disposições (a maior parte integra o domínio da justiça e dos assuntos internos) que adiante se reproduzem, e para as quais está actualmente prevista a unanimidade. Estas alterações contribuirão para um melhor funcionamento e eficácia da União, face ao alargamento que se verificará no próximo ano, traduzido num inegável beneficio para os cidadãos.
Uma parte destas matérias, que passa a exigir a maioria qualificada, insere-se no âmbito das competências reservadas da Assembleia da Republica, o que obrigará a uma especial reflexão, e consequente procedimento de alteração
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da fiscalização da acção do Governo, por parte dos parlamentares portugueses.
Contudo, ainda se verifica a exigência da unanimidade para mais de meia centena de bases jurídicas, nomeadamente nos domínios da fiscalidade ligada ao mercado interno ou de prescrições mínimas de segurança social.
Estão ainda previstas disposições decisórias específicas no que respeita à política externa e de segurança comum, incluindo a PESD, por um lado, e o espaço de liberdade, segurança e justiça, por outro lado.
Nos termos do Projecto de Tratado Constitucional, só à Comissão incumbirá adoptar os regulamentos delegados que completam e/ou alteram os elementos não essenciais da lei, sob o controlo dos co-legisladores.
Foi ainda introduzido no Projecto de Tratado Constitucional três artigos com listagens de competências exclusivas da União, concorrentes e complementares mas para que o sistema conserve alguma flexibilidade, uma cláusula permite que as eventuais lacunas nas competências atribuídas à União sejam colmatadas pelo Conselho, caso seja necessário agir a nível da União para realizar um dos objectivos da Constituição. O Conselho delibera, então, por unanimidade, após aprovação pelo Parlamento Europeu.
Lista das matérias que passaram a decisão por maioria qualificada
- Aproximação das legislações em matéria de procedimentos, sanções e infracções penais (artigo III-166.°, n.° 2, e 167.°, n.° 1: ex-artigo 31.° UE)
- Asilo, imigração (artigo III-162.° e 163.°: ex-artigo 67.°)
- Assistência financeira urgente aos países terceiros (artigo III-217.°: ex-artigo 208.º)
- Atribuição de competência ao Tribunal de Justiça no domínio da propriedade industrial (artigo III - 265.°: ex-artigo 229.°-A)
- Comitologia (artigo I 36.°, n.° 3: ex-artigo 202.°) .
- Controlo nas fronteiras (artigo III-161.°: ex-artigo 67.°)
- Cooperação administrativa e luta contra a fraude fiscal (no seguimento de uma decisão do Conselho deliberando por unanimidade) (artigo III-59.°, n.° 2: ex-artigo 93.°)
- Cooperação administrativa no domínio da Justiça e Assuntos Internos (artigo III-159.°: ex-artigo 66.°)
- Cooperação judiciária em matéria penal (artigo III-166.°, n.° 1: ex-artigo 31.° UE)
- Cooperação policial (excepto cooperação operacional (n.° 2)) (artigo III-171°, n.° 1: ex-artigo 30.°, n.°, 1)
- Criação de tribunais especializados (artigo III-260.°: ex-artigo 225.°-A)
- Cultura (artigo III-176.°, n.° 5: ex-artigo 151.°, n.° 5)
- Derrogações no domínio dos transportes (artigo III-129.°: ex-artigo 71.°, n.° 2)
- Estatuto e sede da Agência Europeia dos Armamentos (artigo III-207.°, n.° 2)
- Eurojust (artigo III-169.°: ex-artigo 31.º, n.° 2 UE )
- Europol (artigo III-172.°: ex-artigo 30.°, n.° 2)
- Iniciativas do Ministro dos Negócios Estrangeiros no âmbito da PESC a pedido do Conselho Europeu (artigo III-196°, n.° 2)
- Liberdade de estabelecimento, acesso às actividades não assalariadas (artigo III-23.°: ex-artigo 47.°)
- Livre circulação dos trabalhadores, segurança social (artigo III-18.°: ex-artigo 42.°)
- Modalidades dos recursos próprios (em parte) (artigo I-53.°, n.° 4: ex-artigo 269.°)
- Modificação do estatuto do BEI (artigo III-295.°: ex-artigo 266.°)
- Modificação do estatuto do SEBC (artigo III-76.°, n.° 5: ex-artigo 107.°, n.° 5)
- Modificação do estatuto do Tribunal de Justiça (artigo III-285.°: ex-artigo 245.°)
- Novas tarefas do BCE (artigo III-74.°, n.° 6: ex-artigo 105°, n.° 6)
- Propriedade intelectual (excepto o regime linguístico) e outros procedimentos centralizados (artigo III-65.°: ex-artigo 308.º)
- Protecção civil (artigo III-179°: ex-artigo 308.º)
- Protecção diplomática e consular (artigo III-8.°: ex-artigo 20.°)
A Comissão Europeia
A Comissão promove os interesses comuns dos europeus, agindo com total independência face aos interesses particulares de quem quer que seja, incluindo o dos Estados-Membros individualmente considerados. A Comissão não aprova qualquer acto legislativo, mas é a instituição que detém, regra geral, o monopólio da iniciativa legislativa.
A Comissão é responsável pela execução do Orçamento, pela aplicação das políticas comuns e pela gestão dos fundos comunitários, apoiando-se neste caso nas administrações nacionais dos Estados-membros e reparte com o Conselho de Ministros as funções executivas da União.
A Comissão assegura a representação externa da União, com excepção da Política Externa e de Segurança Comum que é da competência do Presidente do Conselho Europeu. É por exemplo à Comissão que compete a negociação dos acordos internacionais de comércio no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
A Comissão é actualmente composta por dois Comissários da nacionalidade dos cinco Estados-Membros mais populosos e por um Comissário da nacionalidade de cada um dos restantes dez Estados-Membros. O Tratado de Nice alterou a composição da Comissão para um Comissário oriundo de cada Estado-membro, o que acontecerá a 1 de Novembro de 2004. O Projecto de Tratado Constitucional procede a nova alteração: a partir de 1 de Novembro de 2009, a Comissão será constituída por um Presidente, pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros (na qualidade de Vice-Presidente) e por treze Comissários europeus, escolhidos com base num sistema de rotação igualitária entre os Estados-membros. Após esta composição, o Presidente da Comissão nomeia Comissários provenientes de todos os restantes Estados-Membros, mas sem direito a voto.
O Projecto de Tratado Constitucional fixa que "Cada um dos Estados-membros determinados pelo sistema de rotação elabora uma lista de três pessoas, na qual estarão representados os dois sexos" para posterior selecção do Presidente da Comissão.
Trata-se de uma norma positiva em favor da igualdade de género, mas tal não garante que esse princípio se reflicta na composição final da Comissão. Acresce a esta nossa preocupação o facto de o Projecto de Tratado Constitucional nada referir quanto à obrigatoriedade de a nomeação dos Comissários sem direito a voto ser feita a partir de uma mesma lista de três pessoas, na qual estarão representados os dois sexos.
A Comissão é colegialmente responsável perante o Parlamento Europeu. É perante o Parlamento Europeu que a
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Comissão se apresenta com o seu programa de legislatura e os comissários escolhidos são sujeitos a audições. A Comissão só é investida depois de um voto favorável do Parlamento Europeu e pode ser demitida com a aprovação de uma moção de censura contra ela [Tal situação aconteceu pela única vez no ano de 1999 e conduziu à demissão da Comissão Santer].
O Presidente da Comissão Europeia passa a ser eleito, por maioria simples, pelo Parlamento Europeu, sob proposta do Conselho Europeu (por maioria qualificada), tendo em conta os resultados das eleições europeias.
Esta eleição reforça os poderes do Parlamento Europeu, mas não deixa de ser estranho que decorra um período aproximado de 150 dias entre a realização das eleições europeias e a tomada de posse da nova Comissão. Somos de opinião que a entrada em funcionamento da Comissão bem poderia ser antecipada em cerca de dois meses.
Por outro lado, pensamos que a composição da Comissão não pode ser analisada numa lógica aritmética nacional, expressa na reivindicação de que todos os Estados-Membros tenham sempre uma representante na Comissão. Tal reivindicação insinuaria, no mínimo, que a Comissão representaria, tal como o Conselho, os Estados-Membros.
Ora quem representa os Estados-Membros é o Conselho e não a Comissão, como às vezes se poderá fazer querer.
A Comissão Europeia representa os interesses da União no seu conjunto e para os executar com eficácia não pode, em nossa opinião, ter uma composição pesada, que paralise o seu funcionamento, como previsivelmente acontecerá com 27 ou mais membros.
Da mesma forma se expressa a SEDES ao considerar "que o interesse nacional será melhor servido por uma Comissão forte, do que por um Conselho com mais poderes. Uma Comissão forte e com independência em relação aos governos dos Estados-Membros poderá permitir dar maior prioridade aos interesses da União como um todo do que aos interesses nacionais dos países mais poderosos".
Expressando a nossa opinião (que sabemos ser minoritária), a Comissão deverá ser composta por quinze membros, designados em respeito pelo princípio da rotatividade simples entre todos os Estados-membros, independentemente da sua dimensão, população ou contribuição para o orçamento da União. Neste caso, em cada década, cada Estado-membro teria um nacional como comissário europeu e com direito a voto, ou seja, todos os Estados-membros seriam tratados em rigoroso pé de igualdade. A OE, a ANF, o IDN pronunciaram-se em sentido contrário.
A criação do cargo de Ministro dos Negócios Estrangeiros é uma das principais inovações trazidas pela Constituição. O Ministro/Comissário terá aquilo a que se chamou durante os trabalhos da Convenção uma "dupla função" já que será, simultaneamente representante do Conselho para a política externa e de segurança comum e um dos vice-presidentes da Comissão. Trata-se de reunir num só cargo as funções que actualmente são exercidas pelo Alto-Representante Solana e o Vice-Presidente Patten.
O Ministro dos Negócios Estrangeiros será designado, por maioria qualificada, pelo Conselho Europeu, com o acordo do Presidente da Comissão.
Para a Comissão Parlamentar de Defesa Nacional é de opinião que "a figura do Ministro dos Negócios Estrangeiros da União Europeia carece de melhor clarificação e recorte das suas funções".
Tribunal de Justiça
O Projecto de Tratado Constitucional determina que o Tribunal de Justiça inclui o Tribunal de Justiça Europeu, o Tribunal Superior (actualmente denominado Tribunal de Primeira Instância) e tribunais especializados.
O Tribunal de Justiça garante o respeito pela lei na interpretação e aplicação da Constituição.
As suas competências abrangem os litígios entre Estados-Membros, entre a União e os Estados-Membros, entre as instituições, entre as pessoas singulares e a União. É igualmente competente para responder a questões de interpretação do direito comunitário apresentadas por um juiz nacional, no âmbito de um litígio pendente perante um tribunal nacional.
"O Projecto de Tratado Constitucional permitirá que os cidadãos contestem mais facilmente os regulamentos comunitários que servem de fundamento à adopção de sanções, mesmo que não os afectem pessoalmente (como os Tratados exigem presentemente).
Além disso, a pedido da Comissão, as infracções dos Estados-Membros poderão ser, em alguns casos, mais rapidamente sancionadas pelo Tribunal, que, com maior facilidade, lhes poderá infligir sanções pecuniárias fixas ou progressivas, em caso de não transposição do direito da União ou de não execução dos seus acórdãos" [In Guião da Comissão Europeia sobre o Projecto de Tratado Constitucional].
Outras instituições e órgãos
Banco Central Europeu
O Banco Central Europeu (BCE) tem desde 1 de Janeiro de 1999, a função de aplicar a política monetária europeia definida pelo Sistema de Bancos Centrais, de que faz parte o Banco de Portugal.
Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas assegura o controlo das contas da Comunidade através da análise da legalidade e da regularidade das receitas e despesas do orçamento comunitário e vela pela boa gestão financeira.
O Projecto de Tratado Constitucional não procede a alterações.
Comité de Regiões
O Comité das Regiões é composto por representantes das autoridades locais e regionais. É consultado pelo Conselho, o Parlamento e a Comissão em domínios que afectam os interesses regionais e locais, nomeadamente a educação, a saúde pública, a coesão económica e social.
O número de membros do Comité das Regiões foi fixado em 350, no máximo, que são nomeados por cinco anos, pelo Conselho.
O Projecto de Tratado Constitucional não procede a alterações, o que motiva o desagrado da ARLA que "que se deveria ter ido mais além, uma vez que as Regiões são e poderão vir a ser, de forma muito vincada, no futuro, os instrumentos mais adequados de ligação entre os cidadãos e as instituições europeias. Concretizando, a ARLA é de opinião que nas negociações que se seguirão, se atente às propostas apresentadas pelo Comité das Regiões quanto à evolução do seu papel, nomeadamente a consagração do estatuto de instituição comunitária, a possibilidade de questionar o Conselho e a Comissão, a emissão prévia de pareceres, a participação no diálogo interinstitucional e o acesso ao Tribunal de Justiça, tentando garantir que estas propostas ganhem força na versão final do Tratado."
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Comité Económico e Social
O Comité Económico e Social é composto por representantes das organizações económicas e sociais e da sociedade civil. Dá pareceres consultivos às instituições, nomeadamente no âmbito do processo legislativo. O CES é consultado antes da adopção de muitos actos relativos ao mercado interno, à educação, à protecção dos consumidores, ao ambiente, ao desenvolvimento regional e ao domínio social.
O número de membros do Comité Económico e Social foi fixado em 350 no máximo. Estes membros são nomeados pelo Conselho, por um período de cinco anos.
O Projecto de Tratado Constitucional não procede a alterações, o que motiva as criticas da UGT que deseja ver reforçadas as competências do Comité e as da Plataforma Portuguesa das ONG por entendem que este deverá incluir a dimensão social onde as Organizações Não-Governamentais se inserem.
Exercício das competências da União
Disposições comuns
Os instrumentos jurídicos da União sofreram uma alteração quanto à sua designação no sentido da sua simplificação [Simplificação que se terminou com a divisão em três pilares que existia desde Maastricht] e melhor compreensão por parte dos cidadãos, de acordo com o solicitado nas Declarações de Nice e de Laeken.
São seis os instrumentos jurídicos [A lei determinará os elementos essenciais de um domínio, podendo a definição dos aspectos mais técnicos ser delegada na Comissão sob o controlo dos dois co-legisladores, o que permitirá aliviar os trabalhos destes últimos, que poderão concentrar-se nos aspectos mais importantes da vida dos cidadãos], divididos em duas categorias: actos legislativos e actos não legislativos e hierarquizados do seguinte modo.
Actos legislativos são adoptados conjuntamente pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho de Ministros, sob proposta da Comissão, de acordo com o processo legislativo. Exceptua-se os casos previstos no artigo III-165.º.
A lei europeia [Substitui o Regulamento europeu], é geral e obrigatória
A lei-quadro europeia [Substitui a Directiva europeia], vincula todos os Estados-membros destinatários quanto ao resultado a alcançar, deixando a cada Estado-membro a escolha da forma e dos meios.
Actos não legislativos
O regulamento europeu é um acto não legislativo de carácter geral destinado a dar execução a actos legislativos, entre outros, que pode ser adoptado (de acordo com o estipulado no Projecto de Tratado Constitucional) pelo Conselho de Ministros, pela Comissão e pelo Banco Central Europeu.
A decisão europeia é um acto não legislativo obrigatório que quando identifica destinatários só para estes é vinculativo. Podem adoptar decisões europeias o Conselho de Ministros, a Comissão, o Conselho Europeu e o Banco Central Europeu.
As recomendações e os pareceres, não produzem efeito vinculativo.
Neste âmbito registam-se as contribuições interessantes da Plataforma das ONG e da Comissão de Mercados e Valores Mobiliários que dado a sua especificidade e o profundo grau de aprofundamento não se transcreverem, mas que se encontram em anexo ao presente Relatório.
Disposições específicas
Aplicam-se à execução das três políticas que actualmente integram o segundo e o terceiro pilares dos Tratados Europeus: Política Externa e de Segurança Comum, Política Comum de Segurança e de Defesa e Espaço de Liberdade, Segurança e de Justiça.
Na PESC e na PESD, o Conselho Europeu define os objectivos, o Conselho de Ministros adopta as decisões europeias necessárias ao cumprimento dos objectivos e o Ministro dos Negócios Estrangeiros e os Estados-Membros executam.
As decisões europeias relativas à execução da Política Comum de Segurança e de Defesa, serão adoptadas pelo Conselho de Ministros sob proposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
As decisões do Conselho Europeu e do Conselho de Ministros são tomadas por unanimidade, mantendo assim os Estados-membros o seu direito de veto.
Nestas políticas o Parlamento Europeu apenas é regularmente consultado o que exige um redobrado esforço de acção dos Parlamentos Nacionais, e no caso da Assembleia da Republica, o controlo democrático exerce-se através da fiscalização parlamentar.
Acção que é expressamente prevista, embora em moldes distintos de associação e de controlo, previstos nos artigos 41.º; III-174.ª e III-177.º.
Já no âmbito do Espaço de Liberdade, Segurança e de Justiça, os Estados-Membros dispõem do direito de iniciativa, desde que representem no mínimo 25 por cento do total de Estados-membros. Neste âmbito também a Comissão tem direito de iniciativa.
De realçar a introdução de uma Clausula de Solidariedade que prevê a actuação conjunta da União e dos seus Estados-membros, caso um dos Estados for alvo de uma acção terrorista ou de uma catástrofe natural ou de origem humana.
A respeito da cooperação entre os Serviços de Informações, (ou se vier a ser criado entre nós, como sucede noutros países, entre as Altas Autoridades Nacionais de Informações no Reino Unido o Joint Intelligence Committee), o IDN sugere que esta cooperação embora esteja implícita no artigo 42.º - Cláusula de Solidariedade deveria constar explicitamente do artigo 41.º Disposições específicas de execução do espaço de liberdade, segurança e justiça.
Cooperações reforçadas
As cooperações reforçadas surgiram com o Tratado de Amesterdão, com o propósito de proporcionar aos Estados-membros que pretendam ir mais longe na integração europeia num determinado domínio, o poderem efectuar num quadro institucional no interior da própria União.
As cooperações reforçadas, com excepção para a Política Externa e de Segurança Comum, só podem ser desenvolvidas em último recurso e depois de verificado que não foi possível fazê-lo com todos os Estados-membros, de acordo com os preceitos previstos e desde que não se incluam nas competências exclusivas da União.
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O Projecto de Tratado Constitucional determina que as cooperações reforçadas devem incluir, no mínimo, um terço dos Estados-membros e devem estar abertas à participação de todos os Estados-membros, em qualquer momento.
O Projecto de Tratado Constitucional prevê que o desejo dos respectivos Estados-membros deve ser comunicado à Comissão Europeia, e esta pode apresentar ao Conselho de Ministros, uma proposta para o efeito. A autorização para dar início à cooperação reforçada é concedida por uma decisão europeia do Conselho de Ministros, sob proposta da Comissão e após aprovação pelo Parlamento Europeu.
No que diz respeito à Política Externa e de Segurança Comum, o processo é semelhante, exercendo o Ministro dos Negócios Estrangeiros neste domínio, a competência que a Comissão Europeia possui nos restantes. Neste âmbito o Parlamento Europeu apenas é informado e a Comissão somente emite parecer.
Os critérios estabelecidos para a cooperação reforçada fizeram com que ela raramente tenha sido utilizada. Este processo tem vantagens, porque obriga a participar no processo as principais instituições europeias, e desvantagens porque o seu eventual bloqueio, poderá deslocar a sua formação para o exterior da União.
As cooperações reforçadas expressam o princípio de que os Estados-membros que o desejem possam cooperar mais entre si, sem obrigar os restantes a fazê-lo. Assim deve ser entendido, desde que não se transformem em clubes fechados, perigo que está claramente afastado pela abertura das respectivas cooperações a todos os Estados-membros.
As cooperações reforçadas não constituem acervo para os Estados candidatos à adesão, como acontece actualmente com o euro.
Vida democrática da União
Aqui são enunciados os princípios que sustentam a vida democrática da União, tais como o princípio da igualdade dos cidadãos face às Instituições da União; da democracia representativa (os cidadãos representados no Parlamento Europeu e os Estados-membros representados no Conselho Europeu e no Conselho de Ministros) onde se reconhece o papel dos partidos políticos a nível europeu; da democracia participativa onde se reconhece, entre outros, o direito à iniciativa legislativa dos cidadãos da União (desde que subscrita, no mínimo por um milhão de cidadãos oriundos de um número significativo de países) de convidar a Comissão a apresentar propostas de actos jurídicos.
Reconhecem-se o papel dos parceiros sociais, a protecção dos dados pessoais e o respeito pelo estatuto das Igrejas e das organizações não confessionais.
É ainda nesta sede que se estabelece a continuação do cargo de Provedor de Justiça Europeu, designado pelo Parlamento Europeu, que com independência analisa as queixas dos cidadãos face a eventuais actos de má administração.
É também aqui que o Projecto de Tratado Constitucional se refere aos princípios de abertura e de transparência dos actos das Instituições e das Administrações, onde se aplaude a abertura pública das sessões do Conselho de Ministros quando legisle, tal como acontece em todos os parlamentos da União.
Finanças da União
O Orçamento da União assenta nos princípios da orçamentologia dos orçamentos dos Estados-membros. À Comissão compete a sua elaboração (e posterior execução) e ao Parlamento Europeu e ao Conselho de Ministros a sua aprovação.
O Conselho continua a fixar, sozinho, o limite máximo das despesas agindo o Parlamento Europeu apenas na estrutura das despesas consideradas não fixas.
O Orçamento é integralmente financiado por recursos próprios, no essencial provenientes de uma parte do IVA e pela retenção de uma percentagem do Produto Nacional Bruto dos Estados-membros.
Para se proceder à alteração aos limites dos recursos é necessária a ratificação dos Estados-membros e exigida unanimidade para a deliberação do Conselho de Ministros.
Entende-se a delicadeza deste assunto, mas nem por isso deixamos de expressar a nossa preocupação pela rigidez do processo decisório numa União a 25 Estados-membros. A introdução de uma maioria especialmente qualificada para o efeito afigurasse-nos mais adequada.
União e os Estados vizinhos
A inclusão de um artigo referente à boa vizinhança expressa um significado político de alcance profundo, dado que contribui para desmistificar a ideia de uma União fortaleza.
Esse significado é ainda mais interessante porque não se limita a considerar os Estados vizinhos ao continente europeu.
Qualidade de membro da União
Os critérios de adesão de um Estado à União, bem como o respectivo processo não conhecem alterações.
O que é novo é a possibilidade expressa da saída voluntária de um Estado-membro e da suspensão de direitos de membro da União, de acordo com os procedimentos previstos nos artigos 59.º e 58.º respectivamente.
A inclusão destes dois novos artigos não é alheio o debate que a este propósito se produziu, sobre a violação ou não dos valores da União, aquando da constituição do novo Governo da Áustria saído das eleições de 2000.
ANÁLISE DA PARTE II
A Carta dos Direitos Fundamentais
No decurso da Presidência alemã, o Conselho Europeu de Colónia, em Junho de 1999, convocou uma instância constituída por representantes dos Chefes de Estado e de Governo e da Comissão Europeia, bem como por deputados do PE e dos parlamentos nacionais. Esta instância, que se auto-intitulou de "Convenção", teve como mandato elaborar uma Carta dos Direitos Fundamentais da União a ser apresentada ao Conselho Europeu de Nice, de Dezembro de 2000. A primeira reunião realizou-se a 17 de Dezembro de 1999 e os trabalhos foram concluídos a 2 de Outubro de 2000, tendo sido aprovado um texto com 54 artigos.
A Convenção decorreu paralelamente à CIG que levou à adopção do Tratado de Nice, no pressuposto de que esta iria efectuar uma reforma dos Tratados que autonomizasse um texto constitucional, no qual seria integrado o texto da Carta, pressuposto esse que não se verificou.
O Conselho de Nice limitou-se a congratular-se com a proclamação conjunta pelo Conselho, pelo Parlamento Europeu e pela Comissão, da Carta dos Direitos Fundamentais, considerando que a questão do alcance da Carta seria analisada numa fase posterior. Esta última frase significa
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que não foi possível dar um conteúdo vinculativo à Carta através da sua inserção nos Tratados ou através de uma remissão clara, expressa num dos seus artigos. Nestes termos, a Carta não faz parte dos Tratados da União nem tem força jurídica vinculativa.
O Projecto de Tratado Constitucional acolhe totalmente a Carta [Constitui a Parte II do Projecto de Tratado Constitucional] precedida de pequenas alterações formais, mas sem alterações quanto ao seu conteúdo. Ao fazê-lo, os direitos enunciados na Carta, tornam-se vinculativos e obrigatoriamente respeitados pelas instituições e os órgãos da União. As mesmas obrigações são impostas aos Estados-membros quando aplicam o direito comunitário, competindo ao Tribunal de Justiça velar pelo respeito da Carta.
O Projecto de Tratado Constitucional consegue, assim, um avanço importante, ao permitir que a União se dote da sua própria lista de direitos mais vasta do que os direitos enunciados na Convenção Europeia dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDHLF).
Para além dos direitos civis e políticos fixados na CEDHLF, a Carta dos Direitos Fundamentais inclui outros domínios, como o direito a uma boa administração, os direitos sociais dos trabalhadores, a protecção dos dados pessoais ou a bioética.
A LEM/AFEM propõem que sejam eliminadas as adaptações redaccionais introduzidas pela Convenção e a CMVM defende que "se inclua uma referência à economia financeira e aos mercados financeiros como garantias do pluralismo liberal das sociedades modernas".
ANÁLISE DA PARTE III
Políticas e funcionamento da União
Esta foi a parte onde se observaram as alterações menos significativas e que no essencial reproduzem os artigos existentes nos actuais Tratados.
Não obstante, algumas políticas beneficiam de novas bases jurídicas que permitirão a acção da União em situações particulares e especiais, nos domínios da saúde pública, da energia, da protecção civil e do desporto.
De notar o comentário da ANF ao assinalar a complexidade e extensão da Parte III, que muito dificultam a leitura, compreensão e aceitação da Constituição da União pelo cidadão comum, acrescida da sugestão de que seria preferível deixar na Constituição apenas o essencial e remeter para a legislação tudo o que não seja verdadeiramente constitucional.
A LEM/AFEM sugerem a inclusão de um novo Título: Igualdade entre Homens e Mulheres e a introdução de uma disposição sobre a horizontalidade da igualdade de género equivalente à que já se encontrava no n.º 2 do artigo 3.º do Tratado de Amesterdão, e a uma outra cláusula geral de não-discriminação idêntica à que já se encontrava no artigo 13.º do mesmo Tratado.
Políticas e Acções Internas
Mercado Interno
A Confederação do Turismo Português sustenta que "também o Turismo seja expressamente previsto como um "serviço", para efeitos de subsunção ao regime da liberdade de prestação de serviços, sendo expressamente previsto no artigo III 30.° da Subsecção 3, da Secção 2 do Capítulo I, do Título III, da Parte III do Projecto de Tratado Constitucional;
Também aqui se mostra essencial esclarecer que a consideração do Turismo como um "serviço" tem por lógica basilar uma ponderação da actividade turística do ponto de vista comercial".
Política económica e monetária
Para a análise deste domínio utilizamos como critério a transcrição de partes do parecer da Comissão Parlamentar de Economia e Finanças de acordo com a metodologia escolhida aquando das fases de preparação do relatório. Assim, aquela Comissão Parlamentar é de opinião que "a Convenção não se propôs alterar substancialmente o modelo de governação económica e financeira da União o que, sendo necessário, dificilmente poderia ser logrado nesta fase, dada a extraordinária dificuldade de se produzir um texto de consenso sobre as matérias que integram as Partes I e II.
A parte da governação económica não teve a inovação e a densificação que se justificaria.
Em particular, nos domínios assinalados mais adiante, e nos artigos aí sublinhados, poder-se-ia ter ido mais além, robustecendo alguns pontos, com especial ênfase para as políticas estruturais e de coesão, na sua conexão com as políticas económicas e com os princípios orientadores do orçamento comunitário.
Noutros casos, sugere-se o contrário, especialmente no domínio da política monetária e dos poderes e funções do BCE em que se manifesta uma preferência por respeitar tanto quanto possível os princípios orientadores plasmados nos seus Estatutos.
Estipula o artigo III-69.º que será adoptada uma política económica baseada numa estreita coordenação das políticas económicas dos EM, o que, numa interpretação objectiva, significa que se preconiza o reforço, em extensão e em densificação, do actual nível de coordenação dessas políticas, o que se afigura adequado.
Estipula ainda este artigo a definição de uma política monetária e cambial únicas o que requer, também, uma clarificação.
É que, em primeiro lugar, a política monetária, do Euro, está actualmente definida como uma verdadeira política federal, sendo definida e executada, com independência, por um órgão próprio, o BCE; todavia, assim não acontece, exactamente, com a política cambial, domínio em que os EM detêm alguma competência na sua formulação.
Esta questão é relevante e conexa com os princípios orientadores a observar.
Nota-se, por exemplo, que neles faltará um princípio orientador, porventura mais fundamental para a política cambial do que para a política monetária - o de uma política de rendimentos, designadamente em matéria salarial, em linha com a competitividade externa dos EM e da própria União.
Com efeito, parece ser indispensável suprir esta omissão, sobretudo porque a verificação da condição de Bela Balassa (que diz que a variação da produtividade, deduzida da variação salarial, não deve ser inferior à das zonas concorrentes, sob pena de se perder competitividade e quota no mercado global) se tornou ainda mais imperiosa no mundo actual, marcado pela globalização e também, na Europa, pelo alargamento em curso.
A preocupação por uma coordenação mais estreita surge confirmada na redacção do n.º 3 do artigo 71.º. E estipula
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mesmo o n.º 4 um procedimento sancionatório sempre que um determinado EM conduza as suas políticas de forma incompatível com aquelas orientações gerais.
Seria no entanto desejável uma clarificação porquanto o termo políticas económicas é demasiado abrangente, abarcando políticas com diferentes intensidades de coordenação comunitária ou, dito de outro modo, diferentes graus de liberdade dos EM.
Por outro lado, o critério quantitativo adoptado para fixar a existência de uma maioria qualificada, para efeitos de decisão do Conselho de Ministros, não parece ser o mais adequado.
Seria preferível conferir maior destaque à legitimidade representativa dos EM aceitando que para a formação de uma qualquer votação maioritária se teria que verificar, simultaneamente, a adesão de um número de EM superior a metade mais um, e um critério de representatividade da população superior a 3/5 que poderia ser, por exemplo, de 2/3.
Os artigos III-73.º e III-74.º envolvem matérias que respeitam aos poderes de intervenção do BCE, defendendo-se, como atrás se disse, que a respectiva redacção deve estar em sintonia com o actualmente previsto nos Estatutos do BCE.
O artigo III-76.º reporta-se aos défices excessivos e remete para um Protocolo o respectivo procedimento, bem como a definição dos limites a observar em matéria do défice das administrações públicas e do seu nível de endividamento, ambos expressos em rácios do PIB do respectivo EM.
Sublinha-se no entanto que, em caso de incumprimento, a Comissão elaborará um relatório em que será tida em conta a regra de ouro das finanças públicas, isto é, se o défice não excede a despesa de investimento público, o que se afigura apropriado".
Estranha-se, todavia, que não se mencione o PEC (Pacto de Estabilidade e Crescimento) tanto mais que se faz referência ao Protocolo e que grande parte da matéria tratada nos treze números do artigo tem com aquele uma relação manifesta.
Em relação ao artigo III-77.º, que inicia a secção 2 consagrada à política monetária, são válidas as considerações anteriores sobre a independência do BCE e o carácter federal desta política. Assim, a redacção do n.º 1 deste artigo não se afigura ser a melhor.
E, igualmente, não se afigura apropriada a redacção da alínea a) do n.º 6 do artigo III-78.º.
"Na secção 3, Disposições institucionais, merece destaque o artigo III-86.º que define as funções do Comité Económico e Financeiro, sublinhando-se todavia que no n.º 4 se referem os EM que sejam objecto de uma derrogação (na acepção do artigo III-91.º, isto é que não preencham os requisitos para aderir ao Euro) mas não se mencionam os EM que, preenchendo tais requisitos, não queiram a ele aderir (como é hoje o caso do Reino Unido, Suécia e Dinamarca e mais tarde poderão ser outros) os quais deveriam ser objecto da mesma atenção por parte do Comité em apreço.
Na secção 3-A que apenas respeita aos EM que integram a Zona Euro, diz-se, no artigo III-88.º, que serão adoptadas, designadamente, medidas para reforçar a coordenação da respectiva disciplina orçamental e a supervisão desta.
Sugere esta disposição que, para estes EM, a disciplina orçamental deverá ser mais exigente do que para os demais EM (objecto de derrogação ou que recusaram aderir à zona Euro).
Esta orientação não parece ser a melhor, afigurando-se preferível submeter todos os EM à disciplina dos défices excessivos e às respectivas regras sancionatórias previstas no PEC, explicitando-se as diferenças transitoriamente consentidas aos países com derrogação, de acordo como o quadro dos respectivos programas de estabilidade, como hoje acontece na UE-15.
Esta observação entronca no disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo III-91.º a qual exime os EM objecto de uma derrogação da obrigatoriedade de pôr termo aos respectivos défices excessivos.
Fixa o artigo III-92.º os critérios através dos quais será aferido se os EM objecto de derrogação realizaram progressos com vista à sua futura inserção na Zona Euro. Aí se estabelece (alínea b) do n.º 1) o princípio, correcto, de porem termo aos défices excessivos, o que parece validar a observação acima feita sobre o assunto.
Fixa-se também, o princípio igualmente correcto (na alínea c) do n.º 1) de que estes EM deverão observar as margens normais de flutuação previstas no mecanismo de taxas de câmbio, sem desvalorizarem a moeda nacional em relação ao Euro.
Deve observar-se ainda que é apenas na parte final deste n.º 1 do artigo III-92.º que, pela primeira vez, se menciona a importância da evolução dos custos unitários de trabalho para avaliar se as políticas económicas dos EM são adequadas.
Isso reforça a sugestão acima feita de lhe conferir o relevo adequado na avaliação em geral da qualidade dos policy mix.
A matéria fiscal ocupa a curta secção 6 que se distribui pelos artigos III-59.º a III-63.º.
De sublinhar o disposto no artigo III-62.º, em que se preconiza o estabelecimento de uma lei ou lei-quadro europeia visando a harmonização das legislações relativas aos impostos sobre o volume de negócios, impostos especiais de consumo e outros impostos indirectos, desde que a harmonização seja necessária para assegurar o funcionamento do mercado interno e evitar distorções de concorrência.
Um caso especial, a reter atenção prioritária, será porventura o IA (Imposto Automóvel) cuja harmonização recebe por esta via um impulso, tanto mais que, no corrente ano, foi imposta a igualização dos preços de venda de cada marca e modelo antes de impostos, no mercado interno.
No domínio dos impostos directos apenas se prevê que, por força da fraude e evasão fiscais, o Conselho de Ministros possa aprovar uma lei ou uma lei-quadro europeia que lhe dê combate.
Esta norma apresenta-se, contudo, redigida de forma incompleta e deficiente. Por outro lado, não se afigura que a matéria dessa lei ou lei-quadro se deva esgotar naquele combate, devendo abranger também os procedimentos ligados ao branqueamento de capitais e detecção de capitais ligados a movimentos criminosos ou terroristas.
Não surge portanto como necessário ou prioritário, no âmbito do modelo de governação da União, o avançar-se na direcção da harmonização ou da convergência fiscal dos impostos directos e, em particular, dos que incidem sobre as sociedades e seus sócios.
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Esta prudência encontra justificação reforçada com o presente Alargamento o qual trará à União também uma diversidade aumentada nestes regimes de tributação.
Acresce que, dada a natureza da coordenação das políticas económicas que actualmente é feita e o quádruplo desafio de convergências enunciadas no topo do projecto de Tratado Constitucional, uma certa concorrência fiscal neste tipo de impostos entre os EM é até desejável, contribuindo para melhorar a afectação de recursos produtivos no mercado global da União."
Políticas noutros domínios específicos
Política social
O Projecto de Tratado Constitucional estabelece um conjunto de objectivos sociais a prosseguir pela União, nomeadamente a promoção do pleno emprego (em vez do emprego, como actualmente se verifica), a melhoria das condições de vida e do trabalho, uma protecção social adequada, o diálogo entre parceiros sociais e a luta contra as exclusões.
Estes e os demais objectivos da política social devem concorrer para a concretização de um objectivo maior que é o da coesão social, expressamente enunciado no artigo 3.º do Projecto de Tratado Constitucional.
Deve-se ainda salientar de forma muito positiva a menção feita ao método aberto de coordenação, inegável contributo da Estratégia de Lisboa, como forma de trabalho entre os Estados-membros, de modo a proporcionar uma melhor qualidade de vida aos trabalhadores europeus.
Mas não há bela sem senão: o que o texto final "introduz algumas referências (solidariedade, igualdade, pleno emprego, serviços de interesse económico geral, diálogo social, parceiros sociais); a verdade é que não incorpora modificações significativas no domínio da aplicação da maioria qualificada, o que permite concluir que este não foi seguramente um dos campos em que ocorreu deslocação do centro de gravidade das competências dos Estados-membros para o centro" [In Relatório de participação na Convenção, do Deputado Alberto Costa].
No mesmo sentido se pronuncia a Comissão de Trabalho, Assuntos Sociais da AR quando afirma que "afigura-se, de facto, importante a introdução expressa do conceito de 'pleno emprego' nos objectivos da União, embora este conceito não seja curiosamente depois reflectido na parte relativa às políticas da União, onde se mantém a referência que actualmente consta dos tratados em vigor a um 'nível elevado de emprego' (artigos 3.º e 99.º)".
Esta mesma Comissão Parlamentar desenvolve uma interessante análise quanto ao conceito de modelo social europeu, à dimensão social e, por fim, aos métodos e aos instrumentos de acção que a seguir de transcreve:
"O conceito de 'Modelo Social Europeu'
No domínio do trabalho e dos assuntos sociais, as duas principais questões à luz das quais há que questionar o Projecto de Tratado Constitucional em apreço, são as seguintes:
- A forma como é entendido o chamado "modelo social europeu";
- As responsabilidades que se atribuem aos diferentes agentes e, em particular, o modo como se repartem as responsabilidades entre a União e os Estados membros.
Convém, porém, esclarecer desde já que não há que confundir duas acepções diferentes associadas ao Modelo Social Europeu.
A primeira designa um conjunto de valores, entre os quais sobressaem:
- A associação do progresso económico à democracia política e à participação dos cidadãos nas decisões;
- A igualdade de oportunidades;
- O reconhecimento e a protecção dos direitos dos mais fracos; o direito ao trabalho e à protecção social;
- A protecção dos direitos humanos, dos direitos sociais dos cidadãos e dos direitos dos trabalhadores, incluindo a liberdade sindical, o direito de negociação colectiva e o direito à greve;
- A promoção do diálogo social e a procura do consenso social.
O segundo entendimento do conceito designa um conjunto de normas, legais e contratuais, que organizam as sociedades europeias e regulam, entre outros, os mercados de trabalho, a cobrança de impostos e de contribuições sociais e a redistribuição de rendimentos, e, em geral, as políticas sociais.
Partilha-se do entendimento largamente maioritário dentro e fora do nosso País, de que, sendo inteiramente legítimo falar de Modelo Social Europeu no primeiro dos sentidos mencionados, há que reconhecer a relevância das diferenças que, à luz da segunda asserção, separam os diferentes modelos sociais que organizam as sociedades que integram a União.
A dimensão social europeia
É bem sabido que, do Tratado de Roma até `a Carta Europeia dos Direitos Humanos Fundamentais vai, no que à dimensão social europeia respeita, um caminho cujos marcos fundamentais se julga dever recapitular:
- A consagração dos princípios da liberdade de circulação dos trabalhadores, da coordenação dos sistemas de segurança social e de igualdade de tratamento entre homens e mulheres (Tratado de Roma, 1957);
- A adopção do primeiro programa de acção social comunitário (1974);
- A possibilidade de fixação de padrões mínimos no domínio da saúde e segurança no local de trabalho e de reforço do diálogo entre os representantes dos trabalhadores e dos empregadores (Acto Único Europeu, 1987);
- A criação do quadro de referência da dimensão social do mercado interno europeu feita pela Carta Comunitária dos Direitos Sociais dos Trabalhadores (Declaração solene dos Chefes de Estado e de Governo, 1989);
- A definição das modalidades e do alcance do diálogo social entre os parceiros sociais europeus bem como a inclusão de normas sobre saúde e segurança, condições de trabalho, informação e consulta dos trabalhadores e combate à exclusão do mercado de trabalho feitas pelo Protocolo Social anexo ao Tratado de Maastricht (1991);
- A definição do Programa de Acção sobre Política Social para os anos de 1995 a 1997, feita na sequência do Livro Branco sobre Política Social (Comissão Europeia, 1994);
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- A inclusão nos Tratados do Protocolo Social anexo ao Tratado de Maastricht e do capítulo 'Emprego' (Tratado de Amesterdão, 1997);
- A definição da Estratégia Europeia para o Emprego (Luxemburgo, 1997);
- A definição do Método Aberto de Coordenação e do "triângulo estratégico" de orientação da política europeia até 2010: crescimento económico, promoção do emprego, redução das desigualdades sociais (Conselho Europeu Especial de Lisboa, 2000);
- A centragem da Agenda de Política Social nos problemas e oportunidades da sociedade do conhecimento e decisão de aplicar o método aberto de coordenação à promoção da inclusão social e ao combate à pobreza (Nice, 2000);
- A codificação do Modelo Social Europeu feita, apesar do seu carácter não vinculativo, pela Carta Europeia dos Direitos Humanos Fundamentais (2000).
Os métodos e os instrumentos de acção
O percurso acima sintetizado implicou, como se sabe, a adopção de quatro tipos de métodos e instrumentos de intervenção na dimensão social, que hoje coexistem, e que, no essencial, são os seguintes:
- O chamado 'método comunitário', centrado na produção de legislação comunitária de padrões mínimos, de iniciativa da Comissão Europeia, ao qual se deve a criação e a manutenção do chamado acervo comunitário, indispensável para evitar o dumping social e garantir um mínimo de harmonização social comunitária;
Os meios financeiros da União - de que sobreleva, no plano social, o Fundo Social Europeu -, indispensáveis para promover a realização de objectivos comuns no domínio social;
- O 'método aberto de coordenação' - definição e adopção periódica de orientações políticas e de objectivos comuns, definição de metas quantificadas para as políticas, informação regular aos parceiros e avaliação de e por estes e emissão periódica de recomendações individualizadas para cada Estado-membro sobre a eficácia das políticas adoptadas - que permite a realização dos objectivos comuns europeus nos domínios em que as competências para decisão são dos Estados membros, cujo uso no domínio do emprego deu resultados generalizadamente saudados como positivos, cuja aplicação ao domínio da inclusão social tem originado avaliações menos categóricas e cuja extensão ao domínio das pensões está a dar os primeiros passos;
- As actividades de 'acompanhamento' - investigação, definição e divulgação de indicadores comuns, divulgação de boas práticas, promoção de redes, apoio à formação de especialistas - que potenciam os outros três métodos."
A propósito deste domínio a referida Comissão Parlamentar é bastante afirmativa quando conclui que "do Projecto em apreço não apenas não decorrem riscos para a promoção da cidadania social na União Europeia, como, da sua adopção, resultará a afirmação constitucional dos valores que integram o Modelo Social Europeu, sem que seja posta em causa a autonomia com que cada Estado-membro define, no respeito por aqueles valores e pelas suas próprias tradição e necessidades, as normas legais e contratuais que o adaptam à realidade. Porém, não se pode deixar de constatar que, apesar dos passos muito significativos dados, o espaço definido pelo Projecto de Tratado Constitucional para a política social é menor do que o definido para a política económica e o desta menor do que o da política monetária."
Idêntica perspectiva é partilhada pela União Geral de Trabalhadores (UGT) que "considera de forma clara e inequívoca, que o Projecto de Tratado Constitucional é um avanço no que concerne às questões sociais e que (…) sem dúvida as principais reivindicações do Movimento Sindical Europeu consubstanciado na CES foram acolhidas", para concluir afirmando que "não nos esquecemos que estamos em sede de um Tratado Constitucional e não de políticas concretas".
Contudo, a UGT lamenta profundamente que um maior número de objectivos mais ambiciosos não pudesse ter sido atingido, em particular no que se, refere à extensão do voto por maioria qualificada, nomeadamente em matéria de política social e fiscalidade e ao contributo de novos utensílios e procedimentos para a governação económica da União, de forma a habilitar a Europa a explorar melhor o seu potencial e promover o crescimento e o emprego. Seria particularmente interessante que a CIG permitisse avanços nestas matérias.
A integração, com valor jurídico, da Carta dos Direitos Fundamentais no Tratado, o reconhecimento dos valores e objectivos de dimensão social, nomeadamente o pleno emprego, a instauração de uma base jurídica para os serviços de interesse geral, o mandato da União em matéria de coordenação económica, social e de emprego e por último, mas não menos importante o reconhecimento do papel dos parceiros sociais e do seu diálogo social constituem outros tantos avanços saudados pela UGT e pela Confederação Europeia de Sindicatos como contribuindo positivamente para o reforço da dimensão social da União.
Estes progressos devem ser confirmados por uma revisão da Parte III do Projecto de Tratado Constitucional para garantir a sua coerência com os princípios e objectivos inovadores apresentados na Parte I.
A revisão da parte III não foi realizada pela Convenção Europeia essencialmente por falta de tempo, pelo que a sua introdução na CIG não põe em causa o compromisso geral obtido pela Convenção.
A LEM/AFEM volta a insistir na necessidade de se manter os articulados existentes no Tratado de Amesterdão, no artigo 137.º, relativos à igualdade de oportunidades e tratamento no mercado de trabalho e ao trabalho e ao princípio da igualdade de remuneração, artigo 141.º.
Agricultura e Pescas
O Projecto de Tratado Constitucional que estabelece uma Constituição Europeia integra políticas em domínios específicos (capítulo III) sendo a secção 4 dedicada à Agricultura e Pescas.
São descritos os objectivos da Política Agrícola Comum (PAC) e, com vista a concretizá-los, definem-se Organizações Comuns de Mercados Agrícolas (OCM's) cujas acções comuns promovem a formação profissional, a investigação, o consumo de certos produtos e a concessão de auxílios quer para explorações em situação desfavorável quer no âmbito de programas de desenvolvimento económico.
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A Comissão apresentará propostas relativas à elaboração da PAC, incluindo a substituição das organizações nacionais por uma das formas de organização comum dos mercados agrícolas. Se for criada uma organização comum para matérias-primas, sem que exista, ainda, uma organização comum para produtos transformados correspondentes, essas matérias-primas, quando utilizadas em produtos transformados destinados à exportação para países terceiros, podem ser importadas do exterior da União.
O Projecto de Tratado Constitucional, segundo a Comissão Parlamentar de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, tem implicações para todos os EM e poderá levar a alterações em políticas comuns já existentes.
A PAC, que é das políticas que mais dinheiro absorve, poderá ver o seu modo de financiamento alterado devido ao novo modelo de financiamento da União [In Parecer da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas].
A Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP) sugere que se acrescente aos objectivos da PAC mencionados no artigo III - 123.º, ponto 1, três novas alíneas: a garantia da protecção do ambiente e o bem-estar animal; e o fomento do desenvolvimento económico e social sustentável das zonas rurais; a garantia de um equilíbrio populacional em todo o território da União através de apoios específicos à agricultura em zonas menos favoráveis. No ponto 2, na elaboração da PAC e dos Métodos especiais que ela possa implicar, deve-se ainda considerar a necessidade de inverter as tendências de envelhecimento do activo agrícola, promovendo e apoiando a instalação de jovens no sector.
A AJAP sugere ainda que se deve adicionar ao artigo III - 125.º, alínea a): Uma coordenação eficaz dos esforços empreendidos nos domínios da formação profissional, da instalação de agricultores, da investigação e da divulgação da agronomia, que pode incluir projectos ou instituições financiadas em comum; e ao artigo III - 126.º, ponto 2, alínea a), deve-se adicionar: Para a protecção de explorações em situação desfavorável devido a condições estruturais (a nível técnico, económico e humano) ou naturais.
A terminar relembramos recordamos a posição do CNADES, plasmada no início da análise do Projecto de Tratado Constitucional, quando se refere à fragilidade da inclusão do princípio de integração ambiental nas diversas políticas.
Ambiente
A Quercus considera como aspectos positivos do Projecto de Tratado Constitucional:
"A integração dos princípios jurídicos até agora dispersos num só documento constitucional, permitindo uma leitura porventura mais acessível e facilitada da legislação que rege/ irá reger a União Europeia; a integração no Tratado das questões ambientais fundamentais já contempladas em anteriores etapas fundamentais da construção jurídica europeia, nomeadamente no que respeita à necessidade de desenvolver uma política ambiental integrada no quadro da União Europeia e dos diversos sectores de actuação, bem como a consideração do desenvolvimento sustentável como meta final da Europa, a par de outras vertentes patentes nos seus objectivos.
Tal é reconhecido através da referência à necessidade de conjugar as dimensões ambiental, social e económica no contexto da decisão ao nível da União Europeia, numa perspectiva integrada de melhoria da qualidade de vida e do ambiente, com base num trabalho que assenta numa estratégia comum, apesar do respeito por princípios de subsidiariedade, próprios de realidade diferentes."
Quanto aos aspectos negativos a Quercus refere que apesar do referido anteriormente, não deixa de ser importante verificar a importância política que é ou não dada ao ambiente e ao desenvolvimento sustentável no Projecto de Tratado Constitucional. Assim, apesar da menção feita, verifica-se que a mesma surge com um protagonismo inferior ao que seria desejável, ao ser ponderadamente efectuada não nos artigos do Projecto de Tratado Constitucional, mas sim na fase introdutória do mesmo.
Outra questão relevante, prende-se com o reconhecimento da importância da integração do ambiente em todas as políticas, que é citado de forma genérica, mas que depois surge inconsequente na abordagem específica de áreas como os transportes, a agricultura e pescas, energia e mesmo outras aparentemente mais distantes como a política de segurança e de defesa. O ambiente e o desenvolvimento sustentável merecem ser devidamente contemplados na actuação sectorial das políticas Europeias e não serem alvo de uma mera abordagem superficial nos objectivos mais genéricos, conclui.
Espaço de Liberdade, Segurança e justiça
Recordemos que neste domínio se verificou uma passagem significativa de matérias que passam a ser decididas por maioria qualificada, o que por si só representa a importância política que lhe foi destinada.
Fronteiras, asilo, imigração
O Projecto de Tratado Constitucional estabelece a possibilidade de a União poder, gradualmente, gerir de forma integrada, se para tal existir vontade política, as fronteiras externas, dado que "as fronteiras internas" estão ausentes de controlos, excepto nos casos expressamente previstos no Acordo de Schengen.
O texto agora em análise enuncia a instituição de um sistema comum de asilo (um estatuto uniforme para os refugiados e procedimentos comuns), ao contrário dos actuais tratados europeus.
Referência ainda à possibilidade de se estabelecerem medidas relativas à política comum de vistos e de outros títulos de estadia de curtas durações, essenciais para a edificação de uma política comum de imigração, que regule os fluxos migratórios, assegure um tratamento igual para os imigrantes e possibilite um combate mais eficaz à imigração ilegal e ao tráfico de seres humanos, que segundo dados recentes da Comissão atingem o milhão por ano.
Cooperação judicial em matéria civil
Desde que as matérias a tratar sejam de natureza transnacional, a União poderá continuar a intervir desde que tal acção se inscreva na cooperação judicial.
Ao contrário do que acontece actualmente, o Parlamento Europeu e o Conselho de Ministros detêm competências para adoptar actos legislativos, afim de assegurar um nível elevado de acesso à justiça.
Cooperação judicial em matéria penal
Actualmente a União já pode agir no domínio da cooperação judiciária, desde que delibere por unanimidade, característica geral do método de decisão intergovernamental.
O Projecto de Tratado Constitucional procede a algumas alterações, designadamente conferindo à União a possibilidade
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de adoptar actos legislativos referentes aos direitos das vítimas e aos direitos das pessoas no processo penal e definir sanções comuns para um conjunto de crimes transnacionais como o terrorismo, o tráfico de droga, o tráfico de seres humanos, o racismo e a xenofobia, a exploração sexual de crianças e os crimes contra o ambiente
Em termos de procedimento institucional e das deliberações, a unanimidade é, numa parte considerável, substituída pela regra da maioria qualificada; o Parlamento Europeu intervém na sua capacidade de co-legislador e o Tribunal de Justiça procede ao controlo das medidas adoptadas.
Neste domínio o direito de iniciativa da Comissão Europeia é partilhado por um número de Estados-Membros, nunca inferior a um quarto do total.
Nesta sede, o Relator volta aconselhar a leitura do aprofundado e minucioso parecer da CMVM quanto à cooperação judiciária e administrativa em matéria penal, cuja extensão não permite a transcrição, mas que se encontra em anexo.
Cooperação judicial
No Projecto de Tratado Constitucional continua a prever-se a cooperação judicial entre os Estados-membros, através da Europol (Serviço Europeu de Polícia), nos domínios da prevenção e da luta contra a alta criminalidade internacional organizada.
O Projecto de Tratado Constitucional prevê que a Europol esteja sujeita ao controlo do Parlamento Europeu e dos parlamentos nacionais. Mais um domínio que obriga a um acompanhamento cuidado e atento da Assembleia da República.
O Eurojust deverá progressivamente dar lugar a uma verdadeira Procuradoria Europeia, tal como ficou estabelecido no Projecto de Tratado Constitucional, embora a sua criação efectiva dependa de mais uma decisão unânime do Conselho.
Domínios em que a União pode conduzir uma acção de coordenação, de complemento ou de apoio
A Confederação do Turismo Português, em coerência com o que tem vindo a propor, sugere a alteração da redacção do Capitulo V do Titulo III da Parte III do Projecto de Tratado Constitucional, sendo incluída uma nova Secção dedicada ao Turismo e que seja expressamente regulado como "domínio autónomo em que a União pode decidir conduzir uma acção de coordenação, de complemento ou de apoio", e desse modo lhe seja dedicada uma secção específica.
A UGT também se refere "à necessidade de que sejam asseguradas as condições necessárias ao desenvolvimento da competitividade do Turismo da União".
No que diz respeito à análise do Projecto de Tratado Constitucional, transcrevemos as partes que para esse efeito consideramos relevantes do parecer da respectiva Comissão Parlamentar, cuja estrutura é bastante elucidativa da evolução das normas europeias e da sua comparação com as da legislação nacional.
Cultura
No Projecto de Tratado Constitucional, as menções à cultura constam na Carta dos Direitos Fundamentais da União, onde se garante o respeito à diversidade cultural, religiosa e linguística e se consagra a liberdade de expressão e de informação, e na Parte III, dedicada às políticas e funcionamento da União, onde é estabelecido o modo de actuação da União relativamente à política cultural. A norma que o estabelece tem redacção idêntica à que vigora actualmente, através do Tratado de Nice.
No domínio da cultura, destaca-se a intenção de que a União Europeia contribua para o desenvolvimento das culturas dos Estados-Membros, mas respeitando sempre a sua diversidade nacional e regional. Esta disposição assegura, pois, o direito à cultura, garantido pela CRP, e acompanha a norma constitucional nacional que estabelecese como tarefa fundamental do Estado proteger e valorizar o património cultural do povo português [in Parecer da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura].
Educação, formação profissional, juventude e desporto
Sobre as políticas e acções da União, definidas na Parte III do Projecto de Tratado Constitucional, as disposições dedicadas à educação, formação profissional mantém a sua redacção idêntica às normas do Tratado de Nice, que actualmente vigora.
O Projecto de Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa garante, a todas as pessoas, o direito à educação, bem como o acesso à formação profissional e contínua, e estipula que aquele direito inclui a possibilidade de frequentar gratuitamente o ensino obrigatório. Também a Constituição da República Portuguesa (CRP) e a Lei de Bases do Sistema Educativo (LBSE) consagram o direito à educação e atribuem ao Estado a responsabilidade de promover a democratização do ensino, garantir a igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolares e a liberdade de aprender e ensinar.
A CRP desenvolve ainda, nas normas que dedica ao direito à educação e ao ensino, o papel do Estado na efectivação deste direito e as suas incumbências na realização da política de ensino. Nesta matéria, como acima se mencionou, a União Europeia apenas tem competências de apoio, de coordenação ou de complemento, pelo que as normas constitucionais nacionais desenvolvem o regime estipulado no Projecto de Tratado Constitucional.
Como já foi indicado, não existe uma política educativa comum aos Estados-Membros da União Europeia. De igual modo, não o haverá com a entrada em vigor de uma Constituição Europeia nos termos do Projecto de Tratado Constitucional. Com efeito, a União preservará as prerrogativas de cada Estado-Membro e a organização dos seus sistemas educativo. Este princípio está bem explícito no n.º 2 do artigo II - 14.º, que consagra o direito à educação: "São respeitadas, segundo as legislações nacionais que regem o respectivo exercício, a liberdade de criação de estabelecimentos de ensino, no respeito pelos princípios democráticos, e o direito dos pais de assegurarem a educação e o ensino dos filhos de acordo com as suas convicções religiosas, filosóficas e pedagógicas".
Outra preocupação assumida no Projecto do Tratado é a contribuição da União para o desenvolvimento de uma educação de qualidade e a sua intervenção através do incentivo à cooperação entre Estados-membros e, se necessário, através de uma actuação que vá no sentido de apoiar e complementar a acção destes, sempre respeitando a responsabilidade dos Estados-membros pelo conteúdo do ensino e a organização do sistema educativo.
Dignas de nota são também as referências feitas ao incentivo à mobilidade dos estudantes e dos professores, à
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promoção da cooperação entre estabelecimentos de ensino e ao desenvolvimento do intercâmbio de informações e experiências sobre questões comuns aos sistemas educativos dos Estados-Membros, enquanto objectivos da acção da União Europeia. É ainda de salientar a sua relevância no âmbito da incrementação do Processo de Bolonha, que tem em vista a coordenação das políticas educativas de vários países da Europa, de modo a estabelecer uma área europeia de ensino superior e promover o sistema europeu de ensino superior pelo mundo inteiro.
No que diz respeito à juventude, estabelece-se como um dos objectivos da União, no âmbito da sua acção, o incentivo ao desenvolvimento do intercâmbio de jovens e animadores sócio-educativos e à participação dos jovens na vida democrática da Europa. Para além disso, prevê-se um regime especial para os jovens trabalhadores, com vista a que os mesmos beneficiem de condições de trabalho adaptadas à sua idade e de uma protecção contra a exploração económica e contra todas as actividades susceptíveis de prejudicar a sua segurança, saúde ou desenvolvimento físico, mental, moral ou social, ou de pôr em causa a sua educação.
É no tocante ao desporto que o Projecto de Tratado Constitucional se mostra mais inovador. Com efeito, para além de a palavra "desporto" passar a constar da epígrafe da secção, foi introduzida, no artigo III-182.º, uma alínea que determina que a acção da União tem como um dos seus objectivos o desenvolvimento da dimensão europeia do desporto, promovendo a equidade nas competições e a cooperação entre os organismos desportivos e protegendo a integridade física e moral dos desportistas, nomeadamente dos jovens. Para além disso, é estabelecido que a União tem de contribuir para a promoção dos aspectos europeus do desporto, atendendo à sua função social e educativa [in Parecer da Comissão Parlamentar de Educação, Ciência e Cultura].
O Conselho Nacional de Juventude sugere uma melhor redacção dos artigos III - 182.º e 183.º. Assim:
2. A acção da União tem por objectivos:
a) Desenvolver a dimensão europeia na educação, nomeadamente através da aprendizagem e divulgação das línguas dos Estados-membros;
b) Incentivar a participação dos jovens na vida democrática da Europa;
c) Incentivar a mobilidade dos estudantes e dos professores, bem como promover a cooperação entre estabelecimentos de ensino;
d) Incentivar o reconhecimento académico de diplomas e períodos de estudo;
e) Desenvolver o intercâmbio de informações e experiências sobre questões comuns aos sistemas educativos dos Estados-Membros;
f) Incentivar o desenvolvimento do Intercâmbio de jovens e animadores sócio-educativos;
g) Estimular o desenvolvimento da educação à distância;
h) Desenvolver a dimensão europeia do desporto, promovendo a equidade nas competições e a cooperação entre os organismos desportivos e protegendo a integridade física e moral dos desportistas, nomeadamente dos jovens.
Quanto ao artigo III-183.º 2. A acção da União tem por objectivos:
a) …
b) Melhorar a formação profissional inicial e a formação contínua, de modo a facilitar a inserção e a reinserção profissional no mercado de trabalho, nomeadamente aos jovens.
No que respeita à investigação e desenvolvimento tecnológico (I&DT), as disposições do Projecto de Tratado Constitucional sobre este domínio são similares às do Tratado de Nice. Existe, porém, uma norma de carácter inovador que estabelece a definição, pela União, de uma política espacial europeia, com o intuito de favorecer o progresso científico e técnico, a competitividade industrial e a execução das suas políticas.
De entre as normas do Projecto de Tratado Constitucional dedicadas à I&DT, relevam aquelas que se referem ao programa-quadro plurianual, do qual constam todas as acções da União Europeia neste âmbito. Estes programas desenham os contornos de um verdadeiro espaço europeu de investigação, dotados de meios cada vez mais importantes e construídos a partir de prioridades identificadas na sequência de uma ampla consulta às instâncias políticas competentes, aos meios científicos e industriais e aos representantes dos utilizadores.
ACÇÃO EXTERNA DA UNIÃO
Política Europeia de Segurança Comum
Neste domínio a coerência norteou as alterações efectuadas. Deste modo as acções (económicas, humanitárias e políticas) relativas à Política Externa e Segurança Comum foram agrupadas num único título e foi removida a estrutura em pilares. E a inovação mais importante, de natureza institucional, traduz-se na "fusão" das funções do Alto Representante para a PESC e das do Comissário para as Relações Externas, com a criação do Ministro dos Negócios Estrangeiros.
Este novel Ministro dos Negócios Estrangeiros irá dirigir um serviço diplomático europeu em cerca de 125 países.
Assiste-se, assim, a uma tentativa de introduzir maior coerência à acção externa da União, de modo a que esta possa exprimir-se de modo próprio, através de posições comuns e contribuir para que as suas posições ganhem importância e sejam ouvidas no Mundo.
Não obstante, não escondemos a nossa desilusão por não se ter conseguido ir mais longe, nomeadamente ao manter as decisões por unanimidade na maior parte dos casos, o que torna quase impossível uma posição europeia comum, em tempo útil, perante uma nova situação de emergência mundial. Em matéria de Política Externa e de Segurança Comum, a União poderá estar a assemelhar-se ao Conselho de Segurança das Nações Unidas, com uma dificuldade acrescida: no Conselho de Segurança das Nações Unidas só cinco Estados em 15 têm direito de veto, na União serão 27 Estados em 27, a poder usá-lo.
Com efeito, o ambiente envolvente motivado pela guerra do Iraque deveria ter auxiliado a União a ser mais ambiciosa, de modo a desempenhar um papel útil no Mundo.
Temos consciência de que este domínio é de muita sensibilidade e que toca fundo na soberania de cada Estado,
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mas face à globalização do terrorismo e ao desrespeito pela dignidade humana, a soberania ajuda muito pouco para a solução dos problemas.
O IDN considera, como conclusão do seu extenso e profundo contributo [O texto do contributo do IDN encontra-se na íntegra no Anexo], que o Projecto que estabelece uma Constituição para a Europa, no que concerne aos âmbitos da segurança e defesa prevê um modelo de desenvolvimento da PESC e da PESD coerente e mais integrador do que os documentos estruturais da União até aqui produzidos, o que servirá para uma operacionalização mais eficaz das políticas relativamente aos intentos práticos esboçados até ao presente. Todavia, creio que este mesmo modelo enferma de uma visão excessivamente cautelosa nos prazos a alcançar, nomeadamente para a PESD, mercê de uma cedência muito clara a uma ideia de Europa de pátrias soberanas, já ultrapassada noutros domínios onde vigoram as competências exclusivas da União, ou as competências partilhadas. Por outro lado, os objectivos para a PESD que decorrem da PESC alcandoram-se a modalidades muito limitadas de intervenção que não se coadunam, com a ideia de uma União como interlocutor internacional de primeira grandeza. Estou, em crer, que um modelo federalista não só permitiria ultrapassar as dificuldades dos prazos de implementação das políticas e catalizar a tendência integradora, porque obrigaria a considerar a própria defesa da União e dos seus Estados, seria favorável a uma afirmação mais pungente em termos internacionais. Todavia, não estou certo que à perspectiva federalista implicasse necessariamente uma PESC e uma PESD mais maximais em termos de intervenção externa.
Política de Defesa
Aplicamos nesta sede o mesmo critério utilizado para todos os domínios que receberam pareceres das respectivas Comissões Parlamentares. Para a Comissão de Defesa Nacional "a União dispõe de competência para definir e implementar uma política externa e de segurança comum, inclusive para definir gradualmente uma política comum de defesa". Essa competência da UE em matéria de PESC "abrange todos os domínios da política externa, bem como todas as questões relativas à segurança da União, incluindo a definição gradual de uma política comum de defesa, que poderá conduzir a uma defesa comum".
O apoio activo e sem reservas dos Estados-membros à PESC, "num espírito de lealdade e de solidariedade mútua", implica o respeito pelos actos adoptados e a abstenção de toda e qualquer acção que lhe seja contrária.
A condução da PESC baseia-se "no desenvolvimento da solidariedade política mútua entre os Estados-membros, na identificação das questões de interesse geral e na realização de um grau de convergência crescente das acções dos Estados-membros". Esta asserção, constante do n.º 1 do artigo I-39.º, parece situar num mais distendido plano de uma natural evolução histórica, para além do mero voluntarismo político, o desenvolvimento desta política comum.
No quadro institucional da UE, o primeiro actor PESC é o Presidente do Conselho Europeu, que assegura a representação externa. Mas é o Ministro dos Negócios Estrangeiros quem conduz a Política Externa e de Segurança Comum da União. Ele contribui, com as suas propostas, para a definição da Política Externa Comum, executando-a na qualidade de mandatário do Conselho de Ministros. Actua do mesmo modo no que se refere à Política Comum de Segurança e Defesa. É uma acumulação que merece reflexão, já que tal não se verifica ao nível da organização governativa dos Estados.
As disposições específicas de execução da Política Comum de Segurança e Defesa (art. I-40.º), definem-na como parte integrante da PESC que "garante à União uma capacidade operacional apoiada em meios civis e militares. A União pode empregá-los em missões no exterior a fim de assegurar a manutenção da paz, a prevenção de conflitos e o reforço da segurança internacional, de acordo com os princípios da Carta das Nações Unidas. A execução destas tarefas assenta nas capacidades fornecidas pelos Estados-membros".
A Política Comum de Segurança e Defesa possui uma dupla faceta, agregadora e distintiva. Agregadora, porque inclui a definição gradual de uma política de defesa comum da União (a qual conduzirá a uma defesa comum por deliberação unânime do Conselho Europeu). Distintiva, porque não afecta o carácter específico da política de segurança e defesa de determinados Estados-Membros (que consideram que a sua defesa comum se realiza no quadro da NATO e é compatível com a Política Comum de Segurança e Defesa adoptada nesse quadro), como é o caso de Portugal.
O último dos dispositivos específicos de execução desta política comum determina que os EM coloquem à disposição da União capacidades civis e militares de modo a contribuir para os objectivos definidos pelo Conselho de Ministros. Os EM que constituam entre si forças multinacionais poderão também colocá-las à disposição da Política Comum de Segurança e Defesa. Não parece que este tipo de estatuição seja polémico, se se aceitarem como bons os princípios que a enformam.
Importa também salientar a instituição de uma Agência Europeia de Armamento, Investigação e Capacidades Militares. A sua missão é a de identificar as necessidades operacionais, promover as medidas necessárias para as satisfazer, contribuir para identificar e, se necessário, executar todas as medidas úteis para reforçar a base industrial e tecnológica do sector da defesa, participar na definição de uma política europeia de capacidades e de armamento e prestar assistência ao Conselho de Ministros na avaliação do melhoramento das capacidades militares.
A criação desta Agência pode ser, a prazo, um dos principais contributos para colmatar o fosso que separa a Europa e a América em matéria de avanço tecnológico militar e que ameaça, mesmo, a capacidade de interoperabilidade de equipamento. É´ uma estatística bem conhecida a de que os aliados europeus gastam cerca de 50% do que os EUA gastam em Defesa, mas que apenas obtêm 10-15% da capacidade por estes adquirida. Parte da razão para este baixo retorno do investimento é a falta de economias de escala. Os americanos fazem-nas com a sua US Defense Advanced Research Projects Agency. Partilhando recursos e fazendo aquisições de um modo mais coordenado, os europeus poderiam, teoricamente, aumentar as suas capacidades sem grandes aumentos nas suas despesas de Defesa.
A especial sensibilidade da Política Comum de Segurança e Defesa levou a que o projecto de texto constitucional considere que as decisões europeias pertinentes sejam tomadas por unanimidade. Serão adoptadas pelo Conselho de Ministros, deliberando por unanimidade sob proposta do Ministro dos Negócios Estrangeiros da União ou sob
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proposta de um Estado-Membro. O Ministro dos Negócios Estrangeiros da União pode propor um recurso aos meios nacionais e aos instrumentos da União, eventualmente em conjunto com a Comissão, de que é, recorda-se, Vice-Presidente. O Conselho de Ministros pode, por seu turno, confiar a realização de uma missão, no âmbito da União, a um grupo de Estados-membros, a fim de preservar os valores da União e servir os seus interesses. Prevê-se, ainda, o estabelecimento de cooperações estruturadas entre os EM de maiores capacidades militares e que entre si tenham assumido compromissos mais vinculativos nesta matéria, tendo em vista a realização de missões mais exigentes.
A defesa mútua europeia prevê uma cooperação mais estreita, segundo a qual, se um dos Estados que nela participa for alvo de agressão armada no seu território, os outros Estados participantes prestar-lhe-ão ajuda e assistência por todos os meios ao seu alcance, militares e outros, em conformidade com o disposto no artigo 51.º da Carta das Nações Unidas. Ao estreitarem a sua cooperação no domínio da defesa mútua, os Estados-membros participantes cooperarão estreitamente com a Organização do Tratado do Atlântico Norte. O texto constitucional acolhe, expressamente, o sistema de aliança militar a que historicamente pertence parte significativa dos seus membros e a sua principiologia.
A acção externa da União na cena internacional assenta nos princípios que presidiram à sua criação, desenvolvimento e alargamento e que é seu objectivo promover em todo o mundo. Dispõe-se no artigo III-193.º do capítulo I do título V da parte III que esses princípios são a democracia, o Estado de direito, a universalidade e a indivisibilidade dos direitos humanos e das liberdades fundamentais, o respeito da dignidade humana, a igualdade e solidariedade e respeito do direito internacional, em conformidade com os princípios da Carta da ONU. A União diligencia salvaguardar os seus valores e interesses fundamentais e a sua segurança, independência e integridade, preservando a paz, prevenindo conflitos e reforçando a segurança internacional.
É com base nestes princípios que o Conselho Europeu identifica os interesses e objectivos estratégicos da União.
É no quadro dos princípios e objectivos da sua acção externa que a União define e executa uma política externa e de segurança comum extensiva a todos os domínios da política externa e de segurança. O Conselho Europeu define as orientações gerais da Política Externa e de Segurança Comum, incluindo as matérias com implicações no domínio da defesa e o Conselho de Ministros executa-as.
O MNE da UE consulta o Parlamento Europeu sobre os principais aspectos e opções fundamentais da PESC, incluindo a Política Comum de Segurança e Defesa e vela por que as suas opiniões sejam tidas em conta. O PE é ainda regularmente informado pelo MNE da UE sobre a evolução da PESC e da PCSD e procede duas vezes por ano a um debate sobre os progressos realizados na execução destas políticas. A situação internacional nos domínios pertencentes à PESC é acompanhada por um Comité Político e de Segurança.
As missões no âmbito da Política Comum de Segurança e Defesa, nas quais a União pode utilizar meios civis e militares, incluem as acções conjuntas em matéria de desarmamento, as missões humanitárias e de evacuação, as missões de aconselhamento e de assistência em matéria militar, as missões de prevenção de conflitos e de manutenção de paz, as missões das forças de combate para a gestão de crises, incluindo as missões de restabelecimento da paz e as operações de estabilização no termo dos conflitos. Todas estas missões podem contribuir para a luta contra o terrorismo, inclusive mediante o apoio prestado a Estados terceiros para combater o terrorismo no seu território.
O artigo III-212.º define as missões da Agência Europeia do Armamento, Investigação e Capacidades Militares, colocada sob autoridade do Conselho de Ministros, entre as quais se assinalam as de promover a harmonização das necessidades operacionais e a adopção de métodos de aquisição eficazes e compatíveis, bem como a identificação dos objectivos de capacidades militares dos EM, a propositura de projectos multilaterais para cumprir os objectivos em termos de capacidades militares, o apoio à investigação em matéria de tecnologia de defesa, e a identificação e execução de todas as medidas úteis ao reforço da base industrial e tecnológica do sector da defesa, aumentando a eficácia das despesas militares. A Agência está aberta a todos os Estados-membros que nela desejem participar.
A definição de cooperações estruturadas em matéria de segurança e defesa consta do artigo seguinte, que estabelece que os Estados-membros cujas capacidades militares preencham critérios mais elevados e que tenham assumido entre si compromissos mais vinculativos nesta matéria, tendo em vista a realização das missões mais exigentes, podem realizá-las. De notar que caso um EM deseje participar a posteriori numa cooperação estruturada, na pertinente deliberação do Conselho de Ministros só tomarão parte na votação os membros que representem os Estados-membros nela participantes. Do mesmo modo, sempre que o Conselho de Ministros adopte as decisões europeias relativas ao objecto da cooperação estruturada, só tomam parte nas deliberações e na adopção dessas decisões os membros do Conselho de Ministros que representem os Estados-membros participantes na cooperação estruturada. O MNE da UE assistirá às deliberações e será ele quem informará, devida e regularmente, os representantes dos restantes Estados-membros.
A cooperação mais estreita em matéria de defesa mútua (prevista no n.º 7 artigo I-40.º) está aberta a todos os Estados-membros da União. De acordo com o artigo III-214.º , um EM que participe nessa cooperação que seja alvo de uma agressão armada no seu território informará da situação os outros Estados participantes e poderá solicitar a sua ajuda e assistência. Os Estados-membros participantes reunir-se-ão a nível ministerial, sendo assistidos pelos respectivos participantes no Comité Político e de Segurança e no Comité Militar. Ressalva-se que o ora disposto não afecta os direitos e obrigações decorrentes do Tratado do Atlântico Norte.
As cooperações reforçadas exercem-se, nomeadamente, no âmbito da Política Externa e de Segurança Comum. Como se dispõe no artigo III-325.º, os EM que pretendam instituir entre si uma cooperação reforçada na área PESC devem dirigir um pedido nesse sentido ao Conselho de Ministros. Esse pedido será transmitido ao MNE da UE, que emitirá parecer sobre a coerência da cooperação reforçada
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e a PESC da UE, bem como à Comissão, que emitirá parecer, nomeadamente, sobre a coerência da cooperação reforçada prevista com as outras políticas da União. O PE será informado.
A Comissão de Defesa Nacional considera positiva a actualização e extensão do conteúdo das missões de Petersberg e como um passo da maior relevância a constituição de forças multinacionais integradas por exércitos dos Estados-membros como instrumentos decisivos da Política Comum Europeia de Segurança e Defesa. Assinale-se, aliás, que a PESD tem vindo a ganhar um suporte progressivamente mais amplo nas opiniões públicas europeias, que encaram hoje com maior naturalidade o desempenho comum de certas tarefas de defesa europeia, em particular a partir do 11 de Setembro.
Política comercial
A política comercial é uma das políticas comuns da União e assenta em princípios uniformes, designadamente no que diz respeito às modificações pautais, à celebração de acordos relativos ao comércio de mercadorias e serviços, aos aspectos comerciais da propriedade intelectual, aos investimentos estrangeiros directos, à uniformização das medidas de liberalização, à política de exportação.
Já dissemos anteriormente que compete à Comissão Europeia a representação externa em matéria de comércio externo. Tal competência é válida tanto no âmbito da Organização Mundial do Comércio como para a celebração de Acordos Bilaterais.
Neste domínio, o Projecto de Tratado Constitucional reforça o papel do Parlamento Europeu, que é quase colocado em pé de igualdade com o Conselho.
As regras de decisão do Conselho também são clarificadas, a fim de permitir que a União continue a ser um agente incontornável na regulação da economia mundial.
Cooperação e ajuda humanitária
A eliminação da pobreza constitui o principal objectivo das políticas de cooperação e de desenvolvimento, em clara sintonia com as preocupações manifestadas pelas Nações Unidas, e muito em particular na sua Agenda 2000.
Segundo dados da própria Comissão Europeia, a União e os Estados-membros que a integram asseguram mais de 50% da ajuda pública mundial.
O procedimento institucional é simples: a Comissão, ou o Ministro dos Negócios Estrangeiros, negoceia as ajudas e o Parlamento Europeu e o Conselho aprovam, com ou sem alterações.
A Plataforma Portuguesa das ONG elaboram sugestões quanto ao controlo orçamental deste domínio que como é sabido é da responsabilidade do Parlamento Europeu e do Conselho de Ministros. Na opinião da Plataforma, os Fundos Europeus para o Desenvolvimento deverão ser previstos e incluídos no Orçamento Geral da União e não em outro qualquer. Acções Externas em todas as outras áreas (cooperação com os Países dos Balcãs, com os da região do Mediterrâneo, países da Ásia e da América Latina) estão sob a alçada do Orçamento da União Europeia. Os países ACP são a única excepção: não estão rubricados naquele Orçamento geral. A inclusão dos Fundos Europeus para o Desenvolvimento no Orçamento da União Europeia, suprimiria a referida excepção anómala. Assim incluídos no referido Orçamento Geral, os Fundos Europeus para o Desenvolvimento estarão também sujeitos à avaliação e aprovação por parte do Parlamento Europeu. Deste modo confere-se à criação de tais fundos (e, sobretudo, à sua execução e gestão) um controle mais eficaz, mais democrático e mais transparente.
A Plataforma apresenta também outras sugestões referentes aos domínios dos princípios das parcerias entre Governos e a Sociedade Civil, das políticas de desenvolvimento e da ajuda humanitária, para além de se pronunciar pela adopção do critério da OCDE para a definição do conceito de Países em Desenvolvimento.
Funcionamento da União
Disposições financeiras
Já nos referimos anteriormente às regras e procedimentos orçamentais, de todo o modo não será demais referir que o Projecto de Tratado Constitucional determina a elaboração de um quadro financeiro plurianual por um período nunca inferior a cinco anos. O Orçamento anual da União deverá respeitar o limite das despesas aí fixadas.
Não obstante estarmos na sede de um Projecto de Tratado Constitucional não nos coibimos de explicitar as nossas perplexidades por o financiamento da União parecer caminhar em sentido oposto ao do alargamento da União, ao da definição de mais competências e ao do desenvolvimento de mais políticas.
Disposições comuns
Regiões ultraperiféricas
O Projecto de Tratado Constitucional faz referência expressa à situação económica e social da Madeira, dos Açores, das Canárias e dos departamentos franceses ultramarinos, motivada pela insularidade, relevo, clima e à forte dependência económica de um pequeno numero de produtos.
Assim, e tendo em conta aquela situação especifica o Conselho de Ministros delibera, sob proposta da Comissão e após consulta ao Parlamento Europeu, actos não legislativos que visam em especial estabelecer as condições de aplicação da Constituição nas regiões, em domínios das políticas aduaneira e comercial, da política fiscal, das zonas francas, da agricultura e das pescas, de auxílios estatais e de condições de acesso aos fundos estruturais.
ANÁLISE DA PARTE IV
Símbolos
Consideramos positivo que a União dê expressão política e jurídica aos seus símbolos formais. Lamentamos que não tenha ido mais longe na escolha do dia 9 de Maio (Dia da Europa), para a realização das eleições europeias.
Para além do significado simbólico, removeria no caso português alguns obstáculos à participação dos eleitores.
Entrada em vigor do Tratado Constitucional
À data da entrada em vigor do presente Tratado, são revogados os presentes Tratados Europeus.
O Projecto de Tratado Constitucional não fixa uma data para a entrada em vigor da Constituição, optando por o deixar em branco no artigo IV-8.º. Mas prevê a obrigatoriedade da análise da situação, caso no prazo de dois anos a contar da data da assinatura, pelo menos quatro quintos dos Estados-membros o tenham ratificado, mas os restantes não o tenham feito.
Ao prever essa situação e ao não fixar um procedimento, o Projecto de Tratado Constitucional reflecte um cuidado
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político justificado, pois de outro modo a conjugação deste artigo com o da continuidade jurídica originaria poderia originar a não inclusão na União dos 15+10 Estados.
Trata-se de uma questão merecedora de aturado acompanhamento político.
Continuidade Jurídica
A União Europeia sucede à Comunidade Europeia e à União em todos os seus direitos e obrigações.
Processo de revisão do Tratado
Actualmente o processo de revisão dos Tratados inicia-se por iniciativa e deliberação do Conselho. No presente Projecto de Tratado Constitucional a iniciativa é alargada ao Parlamento Europeu e à Comissão, que dela devem dar conhecimento aos parlamentos nacionais dos Estados-membros.
A validação do método Convenção como forma de preparação da revisão está assumida no articulado do presente Projecto, que será convocada pelo Presidente do Conselho Europeu e cuja missão será a de analisar os respectivos projectos e de adoptar por consenso uma recomendação.
Apesar de a obrigatoriedade de convocação da Convenção, constituir um inegável avanço rumo à transparência das futuras revisões, já o método de deliberação utilizado pela Convenção carece de maior reflexão.
Protocolos
O papel dos Parlamentos Nacionais
O preâmbulo do Projecto de Tratado Constitucional assinala a necessidade de "reforçar a democracia, a transparência e a eficácia da União Europeia, desenvolvendo o contributo dos parlamentos nacionais para a legitimidade do projecto europeu, simplificando o processo decisório, tornando o funcionamento das instituições europeias mais transparente e mais compreensível".
A evolução da formulação acima enunciada vem contribuir para uma relevância acrescida do trabalho em curso no seio da CAEPE, pelo que se optou por integrar no presente Relatório algumas notas que pretendem passar em revista, ainda que sumariamente, as alterações mais relevantes.
O direito à informação e transparência
No "Protocolo relativo ao papel dos Parlamentos Nacionais na União Europeia", anexo à proposta de Constituição Europeia, estabelece-se que as resoluções do Parlamento Europeu e as posições comuns do Conselho passarão a ser enviadas aos Parlamentos Nacionais; o Tribunal de Contas passará a enviar o seu Relatório anual e a Comissão Europeia enviará também (para além de todos os seus documentos de consulta) o Relatório anual sobre a aplicação do artigo I-9.º da Constituições (princípios fundamentais).
Imbuído do mesmo espírito de transparência está o n.º 5 do mesmo Protocolo que prevê que as ordens do dia e os resultados das sessões do Conselho passarão a ser transmitidas directa e simultaneamente aos Governos e aos Parlamentos Nacionais bem como o n.º 2 do artigo I-49.º que prevê: "as sessões do Parlamento Europeu são públicas, assim como as do Conselho, sempre que este delibere sobre uma proposta legislativa e proceda à sua adopção".
Informação sobre propostas de conteúdo legislativo ou outras
O ponto 6 do Protocolo refere a obrigatoriedade do Conselho Europeu consultar o Parlamento Europeu e informar os Parlamentos Nacionais antes de tomar qualquer decisão (por unanimidade) sobre o recurso ao processo do artigo I-24.º, n.º 4.
O recurso a esta disposição passerelle, prende-se com a passagem ao processo legislativo ordinário (por maioria qualificada) de matérias da Parte III da Constituição que, num prazo de seis meses, não foram adoptadas pelo Conselho por processo legislativo especial.
Os Parlamentos Nacionais serão igualmente informados, no mínimo quatro meses antes do Conselho Europeu decidir autorizar (por iniciativa própria e por unanimidade) o Conselho a deliberar por maioria qualificada em domínios da Parte III da proposta de Constituição que requeiram deliberação por unanimidade.
De igual forma, a Comissão deverá chamar a atenção dos Parlamentos Nacionais sempre que o Conselho proponha (deliberando por unanimidade) autorizar a UE a realizar um dos objectivos fixados pela Constituição, sem que esta lhe tivesse conferido poderes de acção no quadro das políticas definidas na Parte III (n.º 2 do Artigo I-17.º - cláusula de flexibilidade).
Também o n.º 2 do artigo I-57.º prevê que, tanto o Parlamento Europeu, como os Parlamentos Nacionais deverão ser informados sempre que um país apresente a sua candidatura de adesão à União Europeia.
Por fim, a proposta de Constituição apresentada pela Convenção Europeia prevê (artigo IV-6, n.os 1 e 2) que os Parlamentos Nacionais sejam notificados da submissão ao Conselho de projectos de revisão do Tratado que institui a Constituição, assim como que os Parlamentos Nacionais sejam parte da Convenção que o Conselho Europeu possa decidir convocar para essa revisão.
Aplicação da subsidiariedade e da proporcionalidade
Os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade constituem princípios fundamentais da União, nomeadamente no que se refere ao exercício das suas competências, por cuja observância os Parlamentos Nacionais são chamados a velar, de acordo com o artigo I-9.º da proposta de Constituição.
A proposta de Constituição destacou como papel fundamental dos Parlamentos Nacionais em matéria europeia a sua intervenção directa na verificação do cumprimento da divisão de competências entre a União e os Estados-membros de acordo com o "Protocolo relativo à aplicação dos princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade", anexo ao Projecto de Tratado Constitucional. Esta verificação passará a ser realizada através de um escrutínio prévio da devida aplicação do princípio da subsidiariedade às propostas da Comissão Europeia, designado como "mecanismo de alerta precoce".
Este mecanismo da subsidiariedade é uma importante inovação e consubstancia-se na possibilidade dos Parlamentos Nacionais - num prazo de seis semanas (excepto em casos de urgência) a partir do momento em que a proposta legislativa é transmitida pela Comissão Europeia - apresentarem a sua posição directamente aos presidentes do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, sempre que considerem que a referida proposta desrespeita o princípio de subsidiariedade.
De referir que os Parlamentos Nacionais poderão "consultar, nos casos pertinentes, os parlamentos regionais com competências legislativas" que, no caso português, são as assembleias legislativas dos Açores e da Madeira.
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Note-se ainda que, no caso deste mecanismo ser accionado por, pelo menos, um terço dos Parlamentos Nacionais dos Estados-membros da UE, a Comissão deverá reconsiderar a sua proposta. O n.º 7 do supra citado Protocolo abre ainda a possibilidade, aos Estados-Membros, a pedido dos respectivos Parlamentos Nacionais, de interporem uma acção junto do Tribunal de Justiça, caso considerem que um acto legislativo viola o princípio de subsidiariedade.
Espaço de liberdade, segurança e justiça
No que se refere à área da justiça e dos assuntos internos, os Parlamentos Nacionais receberão os documentos através do reenvio da informação por parte do Conselho, assim como poderão participar nos mecanismos de avaliação das políticas referentes ao espaço de liberdade, de segurança e de justiça e no controlo político das actividades da Eurojust e da Europol (n.º 2 do artigo I-41.º e artigos 161.º, 174.º e 177.º da Parte III da proposta de Constituição Europeia).
Nesta matéria, também está previsto um mecanismo de alerta rápido sempre que um quarto dos Parlamentos Nacionais se pronunciar desfavoravelmente em relação a uma proposta da Comissão ou a uma iniciativa de um grupo de Estados-membros. Neste caso, a Comissão reexaminará a proposta, podendo, no entanto, mantê-la, alterá-la ou retirá-la.
A Conferência Intergovernamental
Iniciou-se em 4 de Outubro e está previsto concluir os seus trabalhos até ao final da Presidência Italiana.
Compõem a CIG um representante dos governos dos quinze Estados-Membros e dos dez Estados que aderirão em Maio de 2004; e como observadores um representante dos três países candidatos (Bulgária, Roménia e Turquia), a Comissão o Parlamento Europeu.
Foram previstas três reuniões da Cimeira de Líderes e seis reuniões do Conselho de Assuntos Gerais, a que acrescem diversas reuniões consideradas técnicas.
A Presidência Italiana continua empenhada em proceder à finalização do Tratado Constitucional, até ao final do ano de 2003.
CONCLUSÕES E PARECER
Considerando a análise efectuada, a Comissão dos Assuntos Europeus e da Política Externa, conclui que:
Sobre o Método Convenção
1. O método Convenção deve ser utilizado, em futuras revisões do Tratado Constitucional, na fase de preparação, com uma composição semelhante e assegurando sempre a representação da dimensão parlamentar nacional e europeia;
2. A Convenção deve ser dotada de meios que possibilitem aos seus membros reunir-se em condições tais (designadamente com maior periodicidade ou mesmo em permanência), que a falta de tempo não constitua razão, ou até mesmo álibi, para o não aprofundamento da revisão, como aconteceu no presente caso;
3. O método de deliberação da Convenção deve assegurar a expressão livre dos seus membros, de modo a reflectir as diferentes sensibilidades presentes;.
Participação da Assembleia da República
4. A designação dos representantes da Assembleia da Republica em futuras Convenções, deverá ser feita através de eleição em Plenário e tendo por base, um mandato cujo conteúdo (grandes princípios orientadores e objectivos de participação) deverá ser debatido e aprovado sob a forma de Resolução;
5. A Assembleia da República deverá promover debates regulares de acompanhamento dos trabalhos de futuras Convenções, em sessão plenária, tendo por base relatórios escritos dos respectivos representantes;
Projecto de Tratado Constitucional
6. O projecto de Tratado Constitucional corresponde no essencial aos desafios enunciados na Declaração sobre o Futuro da Europa anexa ao Tratado de Nice, nomeadamente:
- A existência de personalidade jurídica da União;
- A integração da Carta dos Direitos Fundamentais adquirindo força vinculativa;
- A clarificação de competências entre a União e os Estados-membros;
- A simplificação dos actos legislativos e não legislativos;
- A existência de um só texto constitucional integrando todo o articulado;
- As referências aos objectivos da coesão social, económica, e territorial;
- O envolvimento dos Parlamentos Nacionais no processo de decisão da União.
7. O actual projecto de Tratado Constitucional deve continuar a ser a base dos trabalhos da Conferência Intergovernamental;
8. Em caso algum, o resultado final da Conferência Intergovernamental deverá ficar aquém do alcançado pela Convenção;
9. É fundamental promover-se um amplo debate público no nosso país, com o propósito de os portugueses serem esclarecidos sobre o sentido e o conteúdo do projecto de Tratado Constitucional. É importante que o debate se faça, que os portugueses participem, que a nossa sociedade não passe ao lado das opções essenciais para o seu futuro;
10. A Assembleia da República, nomeadamente através da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa, deverá prosseguir o processo de auscultações adequadas dos diferentes pontos de vista da sociedade portuguesa, antes da aprovação do Tratado Constitucional
11. É desejável que se faça em Portugal um referendo sobre a nossa posição face à evolução da União Europeia.
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Sem prejuízo do que se vem concluindo, o Governo, no quadro das negociações da CIG, deve ainda ter em conta que:
12. O benefício para o melhor funcionamento e compreensão do quadro institucional que resultaria da autonomização do Conselho Legislativo;
13. A adopção da dupla maioria simples ou qualificada (com igual ponderação de Estados e de população, mas nunca superior a 60%), como regra de deliberação no Conselho de Ministros, acabando com o sistema de votos ponderados;
14. Qualquer alteração da composição da Comissão deverá respeitar, quanto ao acesso e ao estatuto, o principio da igualdade dos Estados;
15. A lista de nomes a apresentar por um Estado-membro ao Presidente da Comissão para este escolher um Comissário, deverá em qualquer circunstância incluir representantes dos dois sexos e que idêntico principio deverá ser verificado na composição final da Comissão;
16. Em caso algum os critérios de eficácia, poderão revogar o princípio de utilização da língua portuguesa como língua oficial e de trabalho da União, para falar, ouvir, ler e escrever;
17. Os recursos próprios da União são manifestamente insuficientes para que esta execute com êxito, no âmbito das suas competências, os objectivos determinados no Projecto de Tratado Constitucional;
18. O governo económico da União e a coordenação de políticas económicas deverão ser objecto de aperfeiçoamento no sentido de garantir que a estabilidade e o crescimento sejam prosseguidos no seio da União;
19. A possibilidade de os parlamentos legislativos regionais poderem recorrer ao Tribunal de Justiça, em matérias que lhe digam exclusivamente respeito, em termos a regular pelo direito constitucional de cada Estado-Membro;
20. Seja consagrada explicitamente a igualdade entre mulheres e homens com um dos valores sobre os quais assenta a União;
21. As várias propostas de alteração quanto às políticas sectoriais que constam do presente Relatório e dos seus Anexos, nomeadamente a que propõe a integração de uma base jurídica para o Turismo de modo a que a União possa desenvolver acções de apoio, coordenação ou de complemento.
Face à desejável adopção do Tratado Constitucional, deve a própria Assembleia da Republica proceder de imediato a uma reflexão sobre o seu modo de acompanhamento da construção europeia e de fiscalização do Governo, de modo a dotar-se de normas, e de meios humanos e técnicos correspondentes às suas competências constitucionais.
PARECER
Tendo presente o Relatório sobre a avaliação da Convenção sobre o Futuro da Europa e sobre o Projecto de Tratado que estabelece a Constituição para a Europa, a CAEPE aprova as conclusões e é de parecer que as mesmas devem subir a sessão plenária, sob a forma de Projecto de Resolução, para apreciação e aprovação em tempo útil.
Lisboa, 25 de Novembro de 2003. - O Deputado Relator, António José Seguro - O Presidente da Comissão, Jaime Gama.
Nota: O projecto de resolução foi aprovado, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra de Os Verdes, tendo-se registado a ausência do PCP e do BE.
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