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Sábado, 31 de Janeiro de 2004 II Série-A - Número 32

IX LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2003-2004)

S U M Á R I O

Resolução:
Viagem do Presidente da República à Noruega.

Projectos de lei (n.os 341, 384, 406 a 408/IX):
N.º 341/IX (Assistência a banhistas):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Defesa Nacional.
N.º 384/IX (Cria a Agência Gestora da Floresta Nacional (AGFN), o Fundo de Reconversão Florestal (FRF) e as Unidades de Gestão Florestal (UGF)):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas.
N.º 406/IX (Promoção da segurança nos locais destinados a banhistas):
- Vide projecto de lei n.º 341/IX.
N.º 407/IX - Estabelece as bases gerais da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência (apresentado pelo PS).
N.º 408/IX - Regime especial para a reparação dos danos provocados pelos incêndios do Verão de 2003 (apresentado pelo PSD e CDS-PP).

Propostas de lei (n.os 100, 101 e 110/IX):
N.º 100/IX (Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais.
N.º 101/IX (Cria o sistema integrado de avaliação do desempenho na Administração Pública):
- Idem.
N.º 110/IX - Possibilita a inscrição no recenseamento eleitoral de nacionais dos novos países aderentes à União Europeia legalmente residentes em Portugal, por forma a assegurar o exercício efectivo do direito de voto na eleição para o Parlamento Europeu a ocorrer em Junho de 2004.

Projectos de resolução (n.os 208 a 213/IX):
N.º 208/IX - (a)
N.º 209/IX - Viagem do Presidente da República a Barcelona (apresentado pelo Presidente da Assembleia da República):
- Texto do projecto, mensagem do Presidente da República e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa.
N.º 210/IX - Sobre a alteração do Programa de Estabilidade e Crescimento - Actualização para o período 2004-2007 e a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento (apresentado pelo Deputado do BE Francisco Louçã).
N.º 211/IX - Revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento (apresentado pelo PS).
N.º 212/IX - Viagem do Presidente da República à Irlanda (apresentado pelo Presidente da Assembleia da República):
- Texto do projecto, mensagem do Presidente da República e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa.
N.º 213/IX - Revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2004-2007 (apresentado pelo PSD e CDS-PP).

(a) Será publicado oportunamente.

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RESOLUÇÃO
VIAGEM DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA À NORUEGA

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, dar assentimento à viagem de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República à República à Noruega, entre os dias 2 e 5 de Fevereiro de 2004.

Aprovada em 22 de Janeiro de 2004. O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.

PROJECTO DE LEI N.º 341/IX
(ASSISTÊNCIA A BANHISTAS)

PROJECTO DE LEI N.º 406/IX
(PROMOÇÃO DA SEGURANÇA NOS LOCAIS DESTINADOS A BANHISTAS)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Defesa Nacional

Relatório

1 - Em 23 de Setembro de 2003 foi admitido, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República e baixou à Comissão de Defesa Nacional para elaboração de relatório e parecer na generalidade, o projecto de lei n.º 341/IX, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Partido Ecologista os Verdes, sobre assistência a banhistas. Posteriormente, em 21 de Janeiro de 2004 foi admitido e baixou igualmente à Comissão de Defesa Nacional o projecto de lei n.º 406/IX, apresentado conjuntamente pelos Grupos Parlamentares do Partido Social Democrata e do Centro Democrático Social-Partido Popular, que visa a promoção da segurança nos locais destinados a banhistas.
2 - Ambas as iniciativas legislativas partem de uma preocupação fundamental: garantir melhores condições de segurança aos muitos milhares de cidadãos que frequentam locais destinados à prática de banhos - praias marítimas, praias fluviais e piscinas -, sendo manifesta a preocupação com o facto de todos os anos muitos cidadãos perderem a vida em actividades balneares, algumas vezes por incúria, mas frequentemente por falta de informação ou falta de assistência aos banhistas. E ambas as iniciativas legislativas partem de um consideração comum: a de que a legislação que ainda hoje regula a segurança das zonas balneares - que remonta ao Decreto n.º 42 305, de 5 de Junho de 1959, e ao Decreto n.º 49 007, de 13 de Maio de 1969 - se encontra hoje manifestamente desactualizada, sendo urgente a sua substituição por nova legislação adequada às realidades actuais.
3 - Os projectos de lei em apreciação reportam-se à garantia de condições de segurança balnear:
- Nas praias marítimas, definidas por portaria do Ministério da Defesa Nacional;
- Nas praias fluviais, definidas por portaria do Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente;
- Nas piscinas, a garantia de condições de segurança é remetida para o Regulamento das Condições Técnicas e de Segurança dos Recintos com Diversões Aquáticas, que consta actualmente do Decreto Regulamentar n.º 5/97, de 31 de Março.
4 - O projecto de lei n.º 341/IX, de Os Verdes, prevê que as portarias que definem as praias sujeitas a assistência a banhistas sejam publicadas até ao dia 1 de Março de cada ano, de forma a possibilitar que, tal como se prevê nesses mesmo projecto de lei, a época balnear nessas zonas se inicie em 1 de Abril e termine em 30 de Setembro. Os Verdes propõem, assim, um aumento significativo do período do ano considerado como época balnear para efeitos de vigilância e assistência nas praias, sem prejuízo de considerar que em piscinas ou em recintos com diversões aquáticas a vigilância deve ser extensiva a todo o período de abertura ao público.
Quanto a esta matéria, o projecto de lei n.º 406/IX, do PSD e do CDS-PP, propõe uma solução diversa. A definição da época balnear é feita para cada praia, em função, designadamente, das condições climatéricas e das características geofísicas de cada zona ou local, das tendências de frequência dos banhistas e dos interesses sociais ou ambientais da própria localização, sendo estabelecida até 31 de Janeiro de cada ano por portaria, sob proposta dos presidentes das câmaras municipais abrangidas. Porém, nas zonas não concessionadas este projecto de lei prevê que a época balnear decorra entre 1 de Junho e 30 de Setembro.
5 - As competências em matéria de assistência aos banhistas aparecem repartidas por diversas entidades. Assim:
Competirá ao Ministério da Defesa Nacional:
- Estabelecer os critérios para o cálculo, por tipologia de praia de banhos, do número de nadadores-salvadores e do demais pessoal encarregado da segurança dos banhistas, regras do patrulhamento e condições gerais para a prestação da actividade;
- Estabelecer os critérios, entidades e métodos competentes para a certificação necessária à contratação dos serviços de nadadores-salvadores e do demais pessoal encarregado da segurança dos banhistas;
- Definir os materiais e equipamentos necessários para o exercício das actividades;
- Fornecer informação aos banhistas, através das capitanias dos portos;
- Definir o regime jurídico das associações de nadadores-salvadores.
Competirá à Autoridade Marítima Nacional, nas praias marítimas:
- Certificar e fiscalizar a actividade de vigilância, salvamento e prestação de socorros aos banhistas através da Direcção-Geral da Autoridade Marítima e do Instituto de Socorros a Náufragos (projecto de lei n.º 406/IX);
- Assegurar a assistência a banhistas, nas funções e serviços de informação através das capitanias dos portos, e nas funções de vigilância, prestação de socorro e salvamento através do Instituto de Socorros a Náufragos (projecto de lei n.º 341/IX).

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O projecto de lei n.º 341/IX propõe que as funções da Autoridade Marítima de vigilância, prestação de socorro e salvamento, desempenhadas através do Instituto de Socorros a Náufragos, sejam extensivas às praias fluviais.
Competirá ao Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente definir por portaria as praias fluviais (projecto de lei n.º 406/IX) e, através do Instituto da Água (INAG), fornecer informação aos banhistas nessas praias.
6 - O projecto de lei n.º 341/IX densifica com algum pormenor as condições de segurança nas praias, não se limitando a remeter essa matéria para a regulamentação governamental. Assim, define directamente qual o tipo de material a utilizar em cada praia para a informação dos banhistas e para a vigilância, a prestação de socorros e o salvamento de banhistas. Para além disso, estabelece directamente que deve ser garantida a presença nas praias de, no mínimo, um nadador-salvador por 100 metros de praia, que um nadador-salvador não deve exercer as suas funções mais de sete horas seguidas e ainda que deve ser assegurada a presença de nadador-salvador nas praias entre as 8 e as 20 horas.
7 - Questão relevante em ambos os projectos de lei é a que se refere às obrigações dos concessionários das zonas balneares. Assim, são estabelecidas diversas obrigações dos concessionários, designadamente:

a) A aquisição, posse e manutenção dos materiais e dos equipamentos destinados à prestação de informação, à vigilância e às operações de socorro de acordo com as especificações emanadas do ISN;
b) A colaboração e a cooperação com todas as entidades envolvidas nas actividades destinadas à garantia da segurança dos banhistas.

Quanto à presença de nadadores-salvadores nas praias, os projectos de lei adoptam soluções diferentes. O projecto de lei de Os Verdes propõe que a presença de nadadores-salvadores seja assegurada pelo Instituto de Socorros a Náufragos, podendo este estabelecer protocolos com associações de nadadores-salvadores, onde elas existam. Nas praias concessionadas os concessionários teriam de pagar uma taxa de assistência balnear ao ISN, a definir por portaria do MDN. O projecto de lei do PSD e do CDS-PP obriga os concessionários a assegurar directamente a presença permanente de nadadores-salvadores nas áreas concessionadas.
O projecto de lei n.º 341/IX estabelece a obrigatoriedade dos nadadores-salvadores estarem habilitados com certificado passado pelo ISN, a quem compete a formação dos mesmos, com diploma de curso de primeiros socorros e com carta de condução de embarcações motorizadas. Antes de cada época balnear os nadadores-salvadores são sujeitos a provas que permitam comprovar a sua aptidão e condições físicas adequadas para o exercício das suas funções.
Ambos os projectos de lei estabelecem deveres dos nadadores-salvadores, designadamente:

a) Vigiar as actividades dos banhistas;
b) Alertar os banhistas, procurando evitar a sua exposição a situações de perigo;
c) Auxiliar os banhistas sobre as formas de prevenir a ocorrência de situações de risco;
d) Prestar auxílio e primeiros socorros aos banhistas sempre que necessário.

8 - Subsiste, porém, a questão das áreas não concessionadas. A este respeito os projectos de lei remetem para o MDD e para o MCOTA a responsabilidade pelo estabelecimento das medidas necessárias à garantia da segurança dos banhistas nessas áreas.

Conclusões

1 - Os projectos de lei n.º 341/IX, de Os Verdes, e n.º 406/IX, do PSD e do CDS-PP, visam criar melhores condições para garantir a segurança dos cidadãos frequentadores das zonas balneares.
2 - Para esse efeito definem as competências governamentais nessa área entre o Ministério da Defesa Nacional e o Ministério das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente e estabelecem os deveres específicos dos concessionários das zonas balneares.
3 - Ambos os projectos de lei consagram medidas de enquadramento da actividade de nadador-salvador e definem critérios mínimos para a garantia da segurança dos banhistas nas praias marítimas e fluviais.
Nestes termos, a Comissão de Defesa Nacional é de

Parecer

Que o projecto de lei n.º 341/IX, de Os Verdes, sobre assistência a banhistas, e o projecto de lei n.º 406/IX, do PSD e do CDS-PP, de promoção da segurança nos locais destinados a banhistas, se encontram em condições constitucionais e regimentais de subirem a Plenário para apreciação na generalidade.

Assembleia da República, 27 de Janeiro de 2004. O Deputado Relator, António Filipe - Pelo Presidente da Comissão, João Rebelo.

Nota: - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.º 384/IX
(CRIA A AGÊNCIA GESTORA DA FLORESTA NACIONAL (AGFN), O FUNDO DE RECONVERSÃO FLORESTAL (FRF) E AS UNIDADES DE GESTÃO FLORESTAL (UGF))

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas

I - Relatório, nota prévia

10 Deputados pertencentes ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 384/IX, relativo à criação da Agência Gestora da Floresta Nacional (AGFN), o Fundo de Reconversão Florestal (FRF) e as Unidades de Gestão Florestal (UGF).
Esta apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República,

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reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do Regimento.

II - Objecto e motivação da iniciativa

O presente projecto de lei tem por objectivo a criação da Agência Gestora da Floresta Nacional, o Fundo de Reconversão Florestal e as Unidades de Gestão Florestal.
Os Deputados signatários da presente iniciativa consideram que "a tragédia que se abateu sobre o País no Verão de 2003 assumiu uma dimensão sem precedentes que exige a tomada de decisões e a adopção de medidas de política tendentes a tudo fazer para evitar a repetição de idêntica calamidade".
Assim, "ao instituir a Agência Gestora da Floresta Nacional, o Fundo de Reconversão Florestal e as Unidades de Gestão Florestal visa criar condições para que, no escrupuloso respeito pela propriedade privada, seja rapidamente possível introduzir em Portugal, em especial nas zonas de minifúndio, as mais fustigadas pelo já denominado "ciclo do fogo", um modelo de gestão profissional da floresta de forma não só a melhorar os rendimentos dos proprietários florestais como também a aproveitar ao máximo as potencialidades sociais, económicas e ambientais da floresta, reduzindo, simultaneamente, ao mínimo as condições favoráveis à ocorrência e propagação de incêndios".

III - Conclusões

O presente projecto de lei reúne os requisitos formais previsto no artigo 138.º do Regimento.

IV - Parecer

Face ao exposto o projecto de lei reúne os requisitos constitucionais, legais e regimentais para subir a Plenário da Assembleia da República, para efeitos de discussão na generalidade, reservando os grupos parlamentares as suas posições de voto para o debate.

Assembleia da República, 27 de Janeiro de 2004. O Deputado Relator, Fernando Penha - O Presidente da Comissão, Álvaro Barreto.

Nota: - O relatório, as conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade.

PROJECTO DE LEI N.º 407/IX
ESTABELECE AS BASES GERAIS DA POLÍTICA DE PREVENÇÃO, HABILITAÇÃO, REABILITAÇÃO E PARTICIPAÇÃO DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

Exposição de motivos

A tutela dos direitos dos cidadãos com deficiência encontra-se consagrada na Constituição da República Portuguesa, com incidência específica no artigo 71.º, que atribui ao Estado a obrigação de " (...) realizar uma política nacional de prevenção e de tratamento, reabilitação e integração dos cidadãos portadores de deficiência e de apoio às suas famílias, a desenvolver uma pedagogia que sensibilize a sociedade quanto aos deveres de respeito e solidariedade para com eles e a assumir o encargo da efectiva realização dos seus direitos..." e reconhece expressamente o direito das organizações de cidadãos portadores de deficiência ao apoio do Estado.
Cabe, pois, ao Estado a responsabilidade de adoptar as medidas necessárias e criar as condições adequadas a garantir às pessoas com deficiência o pleno reconhecimento dos seus direitos, a igualdade de oportunidades e a melhoria da sua qualidade de vida.
A problemática em torno das pessoas com deficiência assume grande relevância no quadro das sociedades modernas, porquanto nela se jogam os mecanismos da promoção da igualdade de oportunidades e da afirmação dos valores da solidariedade, da inserção e da inclusão social das pessoas com deficiência.
A situação que afecta as pessoas com deficiência e suas famílias se não for devidamente acompanhada pelo Estado e pela sociedade em geral e tutelada por instrumentos legais, regulamentares e administrativos adequados às necessidades específicas destes cidadãos encerra um quadro de desvantagens acrescidas que põem em crise o exercício dos direitos constitucionais reconhecidos, desde logo o direito a uma existência digna e feliz, o acesso a oportunidades de realização pessoal e profissional, bem como a uma vida familiar e social dignificante.
O Partido Socialista sempre entendeu a política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência como um dos eixos fundamentais das novas políticas sociais que desempenham um papel fundamental no quadro da afirmação dos valores da solidariedade e da justiça social e do efectivo exercício dos direitos de cidadania destes cidadãos.
Neste contexto, e após ter realizado um conjunto de audições em torno da problemática das pessoas com deficiência, com a participação das organizações representativas destes cidadãos, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresenta o presente projecto de lei que visa contribuir para a valorização e estímulo das políticas de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.
Com efeito, reconhecendo que a Lei n.º 9/89, de 2 de Maio - Lei de Bases da Prevenção e da Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência -, constituiu ao tempo da sua aprovação uma viragem na concepção e no enquadramento das políticas direccionadas para as pessoas com deficiência, entende-se que, volvidos mais de 10 anos de vigência, a mesma pode ser melhorada e aperfeiçoada, quer no plano das soluções normativas que contempla, quer no plano conceptual que encerra face à evolução entretanto ocorrida quer mesmo no plano da sistematização normativa.
O citado diploma legal, enquadrador dos objectivos, dos princípios e das políticas destinadas às pessoas com deficiência, que se afigura positivo e actual em muitos aspectos, cumpriu um importante papel na vertente da promoção e da efectivação dos direitos e interesses destes cidadãos.
Contudo, aproveitando o que de melhor contém, importa proceder à sua actualização e desenvolvimento, apostando em soluções que concorram para o reforço das políticas e instrumentos que favoreçam a igualdade de oportunidades e que promovam a inclusão económica, social e política das pessoas com deficiência.
O projecto de lei vertente, que estabelece as bases gerais da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, tem como desiderato essencial contribuir para a prossecução daqueles

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objectivos. Entre os seus aspectos mais relevantes destacam-se os seguintes:
- Procede à actualização de conceitos como o de pessoas com deficiência, prevenção, habilitação, reabilitação e participação, tendo em conta a evolução operada neste domínio a nível internacional;
- Consagra como princípios da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação o princípio da universalidade, globalidade, igualdade e não discriminação, diferenciação positiva, autonomia, informação, qualidade e inovação, primado da responsabilidade pública, transversalidade, cooperação e solidariedade;
- Propõe uma definição clara dos agentes da política e respectivas incumbências, nomeadamente do Estado, das entidades do sector privado, social e cooperativo, das organizações não governamentais e de uma entidade pública a quem compete assegurar a coordenação, a execução e acompanhamento das políticas;
- Estabelece as orientações de política quer no plano global quer sectorial, prevendo a sua concretização através de um plano nacional integrado plurianual e de planos plurianuais em todas as áreas sectoriais relevantes - o plano nacional integrado deverá fixar as metas e os objectivos a atingir e promover a articulação de todas as áreas sectoriais;
- No plano das orientações globais, o Estado fica incumbido de promover e assegurar a participação das pessoas com deficiência e respectivas organizações representativas, nomeadamente quanto à elaboração da legislação e quanto à definição, concretização, acompanhamento e avaliação da política global e sectorial, devendo, para o efeito, instituir órgãos de consulta e participação e apoiar técnica e financeiramente as organizações representativas destes cidadãos;
- No plano das políticas sectoriais, cumpre destacar os seguintes aspectos:
Política de saúde: compete ao Estado a adopção de medidas que assegurem os cuidados de saúde, ficando os serviços de saúde investidos do dever de promoverem o encaminhamento das pessoas com deficiência e suas famílias para outras áreas relevantes das políticas de prevenção, habilitação, reabilitação e participação;
Política de educação: ao Estado incumbe assegurar o acesso das pessoas com deficiência à educação numa perspectiva inclusiva, bem como assegurar formação adequada ao nível dos recursos humanos docentes e não docentes;
Políticas de trabalho, emprego e formação: impõe ao Estado o dever de adoptar medidas que assegurem às pessoas com deficiência: (i) o direito ao emprego, ao trabalho, à orientação e formação profissionais, habilitação e reabilitação profissionais e a adequação das condições de trabalho; (ii) a conciliação entre a vida familiar e a vida profissional; (iii) a contratação pelas empresas de uma percentagem não inferior a 2% do total de trabalhadores e pelos serviços da Administração Pública de uma percentagem igual ou superior a 5% do total de funcionários, agentes e demais trabalhadores a contratar; (iv) respostas por parte dos serviços de emprego em matéria de oferta formativa e subsequente inserção no mercado de trabalho; (v) um crédito de horas, sem perda de quaisquer direitos ou regalias, incluindo a retribuição, destinado aos dirigentes das associações representativas das pessoas com deficiência para exercício das respectivas funções.
Política de segurança social: incumbe a Estado adoptar medidas destinadas a assegurar a protecção social das pessoas com deficiência, bem como a existência de uma rede de serviços e equipamentos de apoio, privilegiando-se os destinados a grandes dependentes e pessoas idosas com deficiência;
Política de habitação: incumbe ao Estado promover uma política de acesso ao direito à habitação das pessoas com deficiência apropriada às suas necessidades.
Política de urbanismo e transportes: compete ao Estado adoptar medidas que assegurem o acesso das pessoas com deficiência ao meio edificado e à circulação e utilização da rede de transportes públicos em condições apropriadas.
Política de desporto e tempos livres: o Estado fica incumbido de adoptar medidas que promovam o acesso das pessoas com deficiência à prática desportiva, nomeadamente de alta competição, bem como à fruição de tempos livres.
Política fiscal: compete ao Estado adaptar medidas de política fiscal destinadas a promover a plena inserção social e a melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência, a apoiar as famílias de pessoas com deficiência que por este facto tenham despesas acrescidas e a estimular o mecenato.
- Reconhece o carácter de transversalidade das políticas, prevendo, designadamente, que compete ao Estado assegurar a tutela dos interesses das pessoas com deficiência desprovidas de meio familiar; a intervenção precoce com vista a responder de imediato às necessidades das crianças e jovens com deficiência; a investigação com carácter pluridisciplinar de modo a melhorar os meios de prevenção, habilitação e reabilitação; a formação específica de profissionais que actuem neste domínio. Estatui, ainda, o dever das entidades responsáveis pelos programas de formação incluírem, sempre que se afigure necessário, conteúdos e metodologias que contribuam para o processo de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.
Por último, propõe que a Assembleia da República acompanhe e avalie a execução da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, estando o Governo obrigado a enviar ao Parlamento,

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até Março de cada ano, um balanço sobre a avaliação das políticas.
Em suma, o presente projecto de lei, mantendo as traves-mestras da Lei n.º 9/89, de 2 de Maio, introduz um vasto conjunto de alterações qualitativas, quer ao nível conceptual quer no plano das opções normativas, que encerram a política global e sectorial de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, cuja aprovação contribuíra, seguramente, para um reforço e aprofundamento dos direitos das pessoas com deficiência e para uma maior responsabilização, quer do Estado, quer da sociedade, quanto ao seu cumprimento.
Assim, nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Partido Socialista, abaixo assinados, apresentam o seguinte projecto de lei:

Capítulo I
Disposições gerais

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei estabelece as bases gerais da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Artigo 2.º
Conceitos

Para efeitos da presente lei entende-se por:

a) Pessoa com deficiência: a pessoa que por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as psicológicas, apresente uma situação de desvantagem que, em conjugação com outros factores do meio, dificulte ou limite o exercício e a participação em actividades consideradas normais em condições de igualdade com as demais pessoas, tendo em conta a idade, o sexo e os factores sócio-culturais dominantes;
b) Prevenção: conjunto de medidas e acções que têm por finalidade diminuir ou evitar o surgimento ou o agravamento da deficiência e eliminar ou atenuar as suas consequências;
c) Habilitação e reabilitação: conjunto de medidas e acções nos vários domínios sectoriais que têm por finalidade assegurar a aprendizagem e o desenvolvimento de aptidões, promover a autonomia e melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência;
d) Participação: conjunto de medidas e acções que têm por finalidade assegurar e promover a participação das pessoas com deficiência e respectivas organizações representativas, nomeadamente na elaboração da legislação sobre deficiência, definição, execução, acompanhamento e avaliação das políticas globais e sectoriais previstas na presente lei.

Artigo 3.º
Objectivos

Constituem objectivos prioritários da presente lei a realização de uma política global, integrada e transversal de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, assente na promoção do exercício dos direitos previstos na Constituição da República Portuguesa, na criação de condições que assegurem a igualdade de oportunidades e na participação das pessoas com deficiência.

Capítulo II
Princípios de política

Artigo 4.º
Princípios

São princípios da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência o princípio da universalidade, globalidade, igualdade e não discriminação, diferenciação positiva, autonomia, informação, qualidade e inovação, primado da responsabilidade pública, transversalidade, cooperação e solidariedade.

Artigo 5.º
Princípio da universalidade

O princípio da universalidade consiste em assegurar a todas as pessoas com deficiência respostas adequadas às suas necessidades, independentemente do tipo e grau de deficiência, da sua situação económica. e social e da área geográfica onde residam, no pleno reconhecimento das circunstâncias pessoais.

Artigo 6.º
Princípio da globalidade

O princípio da globalidade consiste na garantia de um processo contínuo de respostas sucessivas e simultâneas, de modo a respeitar o processo de evolução das pessoas com deficiência ao longo da vida e respectivas necessidades.

Artigo 7.º
Princípio da igualdade e da não discriminação

O princípio da igualdade e da não discriminação consiste na adopção de medidas de carácter legislativo, regulamentar e administrativo que promovam a igualdade de oportunidades das pessoas com deficiência e impeçam a sua discriminação, directa ou indirecta, por acção ou omissão, com base na deficiência.

Artigo 8.º
Princípio da diferenciação positiva

O princípio da diferenciação positiva consiste na adopção de medidas de acção positiva em função das necessidades e das especificidades sociais das pessoas com deficiência, que tenham por objectivo, nomeadamente, corrigir situações factuais de desigualdade.

Artigo 9.º
Princípio da autonomia

O princípio da autonomia consiste em assegurar às pessoas com deficiência condições adequadas ao exercício do direito de decisão pessoal quanto à definição e condução da sua vida.

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Artigo 10.º
Princípio da informação

O princípio da informação consiste na divulgação a todas as pessoas com deficiência, às suas famílias e respectivas organizações dos seus direitos e deveres, bem como na informação dirigida à sociedade em geral sobre a problemática das pessoas com deficiência.

Artigo 11.º
Princípio da qualidade e inovação

O princípio da qualidade e inovação consiste em assegurar às pessoas com deficiência o acesso aos bens e serviços mais adequados às suas necessidades, designadamente que tenham em conta as suas necessidades pessoais e a evolução técnica.

Artigo 12.º
Princípio do primado da responsabilidade pública

O princípio do primado da responsabilidade pública consiste no dever do Estado de criar as condições necessárias para a execução da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Artigo 13.º
Princípio da transversalidade

O princípio da transversalidade consiste na integração nas políticas públicas sectoriais de respostas para toda a população a que elas se dirigem, incluindo, sempre que necessário, urna adaptação às especificidades das pessoas com deficiência.

Artigo 14.º
Princípio da cooperação

O princípio da cooperação consiste na articulação entre o Estado e as demais pessoas colectivas públicas e as entidades do sector privado, cooperativo e social na concretização da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Artigo 15.º
Princípio da solidariedade

O princípio da solidariedade consiste na responsabilização colectiva dos cidadãos na concretização da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Capítulo III
Dos agentes de política

Artigo 16.º
Intervenção do Estado

1 - Compete ao Estado, em especial:

a) Promover e desenvolver uma política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência em colaboração com toda a sociedade, em particular com pessoas com deficiência, suas famílias, respectivas organizações e autarquias locais;
b) Assegurar a coordenação e articulação das políticas, medidas e acções sectoriais, a nível nacional, regional e local;
c) Fiscalizar o cumprimento do disposto na presente lei.

2 - O Estado pode delegar em pessoas colectivas públicas ou atribuir, mediante a celebração de protocolos, a entidades do sector privado, social e cooperativo, em especial às organizações representativas das pessoas com deficiência, a promoção e o desenvolvimento de medidas de política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Artigo 17.º
Entidade coordenadora

1 - O Estado deve assegurar a existência de uma entidade pública que colabore na definição e coordene a execução e o acompanhamento da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.
2 - A entidade referida no número anterior deve dispor dos meios humanos, técnicos e financeiros adequados ao cumprimento da sua missão e deve integrar na sua orgânica órgãos de consulta que assegurem a participação da sociedade, em particular das organizações representativas das pessoas com deficiência.

Artigo 18.º
Organizações não governamentais

1 - O Estado reconhece e valoriza a acção desenvolvida pela sociedade, na prossecução dos objectivos da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, nomeadamente pelas organizações representativas das pessoas com deficiência e pelas entidades do sector privado, social e cooperativo que colaborem na execução das políticas.
2 - O Estado deve apoiar as acções e projectos desenvolvidos pela sociedade, em especial pelas organizações representativas das pessoas com deficiência, na prossecução dos objectivos da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, nos termos a fixar em legislação especial.
3 - Para efeitos da presente lei, consideram-se organizações representativas das pessoas com deficiência:

a) Organizações constituídas por pessoas com deficiência;
b) Organizações constituídas por familiares ou outros representantes legais das pessoas com deficiência sem capacidade de se organizar e representar autonomamente.

Artigo 19.º
Voluntariado

Compete ao Estado, no âmbito da política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência, criar condições que promovam e valorizem o voluntariado e a participação solidária da sociedade em

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acções que favoreçam a prevenção, habilitação, reabilitação e representação das pessoas com deficiência.

Capítulo IV
Das orientações de política

Artigo 20.º
Orientações globais

1 - A política de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência é concretizada através de um plano nacional integrado plurianual e de planos plurianuais em todas as áreas sectoriais relevantes.
2 - O plano nacional integrado deverá fixar as adequadas metas e objectivos de política, promover a articulação de todas as áreas sectoriais tendo em vista, nomeadamente, o cumprimento dos princípios da globalidade e cooperação.
3 - O plano nacional integrado deverá dedicar particular atenção à fixação de metas e à identificação de medidas que favoreçam a acessibilidade das pessoas com deficiência ao pleno exercício de todos os seus direitos, nomeadamente nas áreas da cultura e ciência através da promoção dos meios de comunicação adequados, designadamente da linguagem gestual, Braille, caracteres ampliados, áudio e tecnologias de informação.
4 - O Estado deve adoptar medidas específicas que promovam e assegurem a participação das pessoas com deficiência e respectivas organizações representativas, nomeadamente na elaboração da legislação sobre deficiência e na definição, concretização, acompanhamento e avaliação da política ao nível global e sectorial.
5 - Compete em especial Estado assegurar o cumprimento do disposto no número anterior através da instituição de órgãos de participação e consulta e da atribuição de apoios técnicos e financeiros de carácter anual e plurianual às organizações representativas das pessoas com deficiência.

Artigo 21.º
Política de saúde

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar os cuidados de saúde, nomeadamente através do diagnóstico e intervenção precoce centrada na família, o tratamento e a habilitação e reabilitação médico-funcional das pessoas com deficiência, bem como o do fornecimento, adaptação, manutenção ou renovação dos meios de compensação que forem adequados.
2 - Compete aos serviços de saúde promover o encaminhamento das pessoas com deficiência e suas famílias para outras áreas relevantes para a concretização das políticas de prevenção, habilitação, reabilitação e participação.

Artigo 22.º
Política de educação

1 - Compete ao Estado adoptar medidas necessárias para assegurar o acesso das pessoas com deficiência à educação numa perspectiva inclusiva, mediante, nomeadamente, a afectação de recursos e instrumentos adequados às necessidades específicas da aprendizagem e da comunicação.
2 - Compete particularmente ao Estado garantir os recursos humanos docentes e não docentes, com a qualificação adequada às diferentes necessidades educativas das pessoas com deficiência.

Artigo 23.º
Políticas de trabalho, emprego e formação

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o direito ao emprego, ao trabalho, à orientação e formação profissionais, habilitação e reabilitação profissionais e à adequação das condições de trabalho das pessoas com deficiência.
2 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas que promovam a conciliação entre a actividade profissional e a vida familiar das pessoas com deficiência, bem como dos trabalhadores com pessoas com deficiência a seu cargo.
3 - Compete ao Estado garantir que as empresas contratem pessoas com deficiência, em percentagem não inferior a 2% do total de trabalhadores.
4 - Os serviços da Administração Pública, independentemente da sua natureza, devem nos processos de recrutamento de funcionários, agentes e demais trabalhadores assegurar a contratação de pessoas com deficiência em percentagem igual ou superior a 5%.
5 - Os serviços de emprego e formação deverão dedicar particular atenção à existência de oferta formativa adaptada às necessidades das pessoas com deficiência, bem como à subsequente inserção no mercado de trabalho.
6 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas que assegurem aos dirigentes das associações representativas de pessoas com deficiência o direito a um crédito de horas, sem perda de quaisquer direitos ou regalias, incluindo a retribuição, destinado ao exercício de actividades das respectivas associações.

Artigo 24.º
Política de segurança social

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar a protecção social das pessoas com deficiência que tenham em vista o seu bem-estar, a autonomia pessoal e uma adequada integração profissional e social.
2 - Compete ao sistema de segurança social assegurar a devida adequação do subsistema previdencial às necessidades das pessoas com deficiência.
3 - Os subsistemas de solidariedade e acção social deverão igualmente adequar as suas medidas de acordo com os princípios da globalidade e da diferenciação positiva.
4 - Compete ao Estado promover a criação de uma rede descentralizada de serviços e equipamentos sociais de apoio às pessoas com deficiência em articulação com as autarquias locais e entidades do sector privado, cooperativo e social, em especial com as instituições particulares e cooperativas de solidariedade social.
5 - A rede a que se refere o número anterior deve privilegiar os equipamentos e serviços destinados a grandes dependentes e pessoas idosas com deficiência.

Artigo 25.º
Política de consumo

Compete ao Estado adoptar medidas específicas que promovam os direitos de consumidor das pessoas com

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deficiência, em especial nos domínios da informação e educação do consumidor, bem como relativamente a bens e serviços destinados em particular às pessoas com deficiência.

Artigo 26.º
Política de habitação

Compete ao Estado promover uma adequada política de promoção do acesso das pessoas com deficiência ao direito à habitação apropriada às suas necessidades.

Artigo 27.º
Política de urbanismo e transportes

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso das pessoas com deficiência ao meio edificado, tanto nos espaços interiores como nos exteriores, nomeadamente através da eliminação de barreiras, na construção, ampliação e renovação desses espaços.
2 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso das pessoas com deficiência, nomeadamente à circulação e utilização da rede de transportes públicos, de transportes especiais e outros meios de transporte apropriados.

Artigo 28.º
Política de desporto e tempos livres

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o acesso das pessoas com deficiência à prática do desporto e à fruição dos tempos livres, mediante, nomeadamente, a criação de estruturas adequadas e formas de apoio social.
2 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar a prática do desporto de alta competição pelas pessoas com deficiência através, nomeadamente da criação de estruturas e estímulos adequados, bem como de apoios às organizações que promovam e colaborem este tipo de prática desportiva.

Artigo 29.º
Política fiscal

1 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar a plena inserção social e a melhoria das condições de vida das pessoas com deficiência de medidas de política fiscal que concretizem o princípio da diferenciação positiva.
2 - A política fiscal deve igualmente apoiar as famílias com pessoas com deficiência e que, por esse facto, possuem despesas acrescidas.
3 - Compete ao Estado adoptar medidas específicas necessárias para assegurar o incentivo do mecenato, mediante, nomeadamente, a criação e a fixação de isenções fiscais.

Capítulo V
Da política transversal

Artigo 30.º
Regime tutelar

1 - Compete ao Estado assegurar a tutela dos interesses das pessoas com deficiência desprovidas de meio familiar, através da adopção de medidas legislativas, regulamentares e administrativas apropriadas.
2 - Para efeitos do disposto número anterior, entende-se por pessoas com deficiência desprovidas de meio familiar, nomeadamente, as que tenham sido abandonadas, as que não possuam familiares ou as que possuindo familiares estes não sejam capazes de assegurar a sua tutela.

Artigo 31.º
Intervenção precoce

Compete ao Estado desenvolver acções de intervenção precoce traduzidas na adopção de medidas integradas de apoio dirigidas às crianças, aos jovens, à família e à comunidade, com vista a responder de imediato às necessidades das crianças e jovens com deficiência.

Artigo 32.º
Investigação

Compete ao Estado promover e apoiar directamente ou em articulação com outras pessoas colectivas públicas e entidades do sector privado, cooperativo e social programas de investigação com carácter pluridisciplinar destinados a melhorar os meios de prevenção, habilitação e reabilitação das pessoas com deficiência.

Artigo 33.º
Formação

1 - Compete ao Estado promover e apoiar a formação específica de profissionais que actuem na área da prevenção, habilitação e reabilitação de pessoas com deficiência.
2 - As entidades responsáveis pela elaboração dos programas de formação devem desenvolver, sempre que se justificar, conteúdos e metodologias que contribuam para o processo de prevenção, habilitação, reabilitação e participação das pessoas com deficiência.

Artigo 34.º
Estatísticas

Compete ao Estado assegurar a recolha, tratamento e divulgação de dados estatísticos relacionados com as pessoas com deficiência.

Capítulo VI
Disposições finais

Artigo 35.º
Avaliação

Até Março de cada ano o Governo enviará à Assembleia da República um balanço sobre a avaliação do cumprimento do disposto na presente lei, em especial no que concerne à execução do plano nacional integrado plurianual e dos planos plurianuais sectoriais a que se refere o artigo 21.º.

Artigo 36.º
Encargos financeiros

Os encargos financeiros decorrentes da concretização do disposto na presente lei são inscritos nos orçamentos dos respectivos Ministérios.

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Artigo 37.º
Regulamentação

O Governo deve aprovar, até 31 de Dezembro de 2004, a regulamentação necessária à concretização do disposto na presente lei.

Artigo 38.º
Revogação

É revogada a Lei n.º 9/89, de 2 de Maio.

Artigo 39.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor trinta dias após a sua publicação.

Palácio de são Bento, 30 de Janeiro de 2004. Os Deputados do PS: Afonso Candal - Vieira da Silva - Luísa Portugal - Ascenso Simões - Rui Cunha - Celeste Correia - Artur Penedos - Custódia Fernandes - Maria do Carmo Romão - Sónia Fertuzinhos - Luís Carito.

PROJECTO DE LEI N.º 408/IX
REGIME ESPECIAL PARA A REPARAÇÃO DOS DANOS PROVOCADOS PELOS INCÊNDIOS DO VERÃO DE 2003

Exposição de motivos

Na sequência dos incêndios ocorridos no Verão de 2003, que resultaram de uma vaga de calor em que se verificaram temperaturas superiores a 40.º centígrados, foi declarada pelo Governo a situação de calamidade pública na área dos distritos de Beja, Bragança, Guarda, Castelo Branco, Coimbra, Santarém, Portalegre, Leiria, Lisboa, Setúbal, e Faro e criada uma linha de crédito especial para apoio à reparação dos danos provocados em equipamentos e infra-estruturas municipais de relevante interesse público e um regime excepcional para a execução, em regime de empreitada, pelos municípios das obras necessárias àquelas reparações.
Foi, também, celebrado com a Comunidade Europeia um acordo relativo à execução da Decisão n.º C (2003) 4349, da Comissão Europeia, de 17 de Novembro de 2003, que concede uma subvenção para o financiamento de operações de urgência no quadro do Fundo de Solidariedade da União Europeia.
Tendo em vista simplificar os mecanismos de adjudicação dos actos e contratos a celebrar no âmbito do mencionado Fundo, devem ficar dispensados de fiscalização prévia do Tribunal de Contas os actos e contratos relativos às obras necessárias à reparação dos danos provocados em equipamentos e infra-estruturas de relevante interesse público, total ou parcialmente destruídos, e à aquisição de estudos técnicos para suporte de projectos de protecção imediata do património cultural e ambiental que, em ambos os casos, venham a ser financiados no âmbito do Fundo de Solidariedade da União Europeia.
Nestes termos, os Deputados abaixo assinados, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º
Objecto

A presente lei visa simplificar os mecanismos de fiscalização prévia dos actos e contratos relativos às obras necessárias à reparação dos danos provocados em equipamentos e infra-estruturas de relevante interesse público, total ou parcialmente destruídos pelos incêndios ocorridos no Verão de 2003, e para a aquisição de estudos técnicos para suporte de projectos de protecção imediata do património cultural e ambiental que, em ambos os casos, venham a ser financiados no âmbito do fundo de solidariedade da União Europeia, adiante designado por Fundo.

Artigo 2.º
Âmbito

O regime previsto no artigo anterior aplica-se às obras de reparação, construção ou reconstrução financiadas com recurso ao Fundo, bem como à aquisição de estudos técnicos para suporte de projectos de protecção imediata do património cultural e ambiental.

Artigo 3.º
Dispensa de fiscalização

Sem prejuízo da fiscalização sucessiva e concomitante da respectiva despesa, os actos e contratos a celebrar pelas pessoas colectivas de direito público beneficiárias do Fundo relativos às obras e aos estudos referidos no artigo 1.º ficam dispensados de fiscalização prévia do Tribunal de Contas.

Artigo 4.º
Entrada em vigor e produção de efeitos

A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação e produz efeitos a partir de 20 de Julho de 2003.

Palácio de São Bento, 28 de Janeiro de 2004. Os Deputados: Luís Marques Guedes (PSD) - Telmo Correia (CDS-PP) - Manuel Oliveira (PSD) - Miguel Paiva (CDS-PP) - Isabel Gonçalves (CDS-PP) - Paulo Veiga (CDS-PP) - Manuel Cambra (CDS-PP) - Nuno Teixeira de Melo (CDS-PP).

PROPOSTA DE LEI N.º 100/IX
(APROVA O REGIME JURÍDICO DO CONTRATO INDIVIDUAL DE TRABALHO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais

I - Do relatório

1.1 - Nota prévia:
O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a proposta de lei n.º 100/IX - vide DAR, Separata n.º 52/IX, de 19 de Novembro de 2003 - que "Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública".

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A apresentação da referida proposta de lei foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
Por despacho do Presidente da Assembleia da República, de 3 de Novembro de 2003, a proposta de lei vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais com a menção expressa "para efeito de serem ouvidos os organismos representativas dos trabalhadores".
A proposta de lei vertente será discutida na reunião do Plenário da Assembleia da República do dia 7 de Janeiro de 2004, em conjunto com a proposta de lei n.º 101/IX - vide DAR, Separata n.º 53/IX, de 19 de Novembro de 2003 -, que "Cria o sistema integrado de avaliação do desempenho da Administração Pública".
1.2 - Do objecto e da motivação:
Através da proposta de lei objecto do presente relatório e parecer visa o Governo generalizar à Administração Pública a possibilidade de recurso ao contrato individual de trabalho, instituindo, na decorrência da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que "Aprova o Código do Trabalho", um enquadramento jurídico especial aplicável aos contratos individuais de trabalho na Administração Pública, designadamente estatuindo normas específicas no que concerne aos deveres que impendem sobre estes trabalhadores, critérios de selecção, limites à contratação, formalidades a observar, contratos a termo, condições de trabalho, despedimento e regime de negociação colectiva.
A proposta de lei vertente encerra, assim, um vasto conjunto de soluções normativas especiais a aplicar no futuro aos contratos individuais de trabalho na Administração Pública, de que, pela sua importância, se destacam as seguintes:

a) Define o regime jurídico do contrato de trabalho nas pessoas colectivas públicas, excluindo do seu âmbito de aplicação algumas entidades (vg. empresas públicas, associações públicas e fundações, entidades administrativas independentes, universidades e politécnicos, Banco de Portugal). Por outro, estatui que não podem ser objecto de contrato de trabalho por tempo indeterminado as actividades que no âmbito da administração directa do Estado impliquem o exercício de poderes de autoridade e que definam situações jurídicas subjectivas de terceiros ou o exercício de poderes de soberania;
b) Determina que aos contratos de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas é aplicável o regime do Código do Trabalho e respectiva legislação regulamentar, com as especificidades constantes do regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública;
c) Impõe aos trabalhadores vinculados pelo contrato de trabalho a observância dos deveres especiais de prossecução do interesse público, de imparcialidade e de isenção perante os cidadãos, assim como a sujeição ao regime de incompatibilidades dos funcionário e agentes da Administração Pública;
d) Sujeita a celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado à realização de um processo prévio de selecção que obedece aos seguintes princípios: (i) publicitação da oferta de trabalho; (ii) garantia da igualdade de condições e oportunidades e; (iii) decisão da contratação fundamentada em critérios objectivos de selecção;
e) Estabelece que as pessoas colectivas públicas que disponham de estruturas com funções dirigentes em regime de contrato de trabalho apenas podem contratar pessoal para essas funções em regime de comissão de serviço;
f) Impõe limites à contratação: (i) o recurso a contratos por tempo indeterminado depende da existência de um quadro de pessoal para esse fim e nos limites desse quadro, sem o que tais contratos serão considerados nulos determinando a responsabilidade civil, disciplinar e financeira dos titulares dos órgãos que os celebraram; (ii) a competência para celebrar contratos cabe, no âmbito da administração directa do Estado, ao dirigente máximo do serviço; (iii) a celebração de contratos de trabalho por pessoas colectivas públicas deve ser comunicada ao Ministro das Finanças e ao membro do Governo que tutela a Administração Pública; (iv) a celebração de contratos de trabalho que impliquem encargos com remunerações globais superiores aos que resultam de regulamentos internos ou de instrumentos de regulamentação colectiva depende de autorização do Ministro das Finanças, sem o que serão tidos como nulos;
g) Determina que os contratos de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas estão sujeitos à observância da forma escrita, estabelecendo taxativamente as indicações que obrigatoriamente devem constar do contrato de trabalho (identificação e domicílio das partes, tipo de contrato, actividade contratada e remuneração do trabalhador, local e período normal de trabalho, data de início da actividade, indicação do processo de selecção adoptado e identificação da entidade que autorizou a contratação). A não redução a escrito ou a falta de referência à identificação e domicílio das partes, do tipo de contrato, da actividade contratada ou da identificação da entidade que autorizou a contratação determinam a nulidade do contrato de trabalho;
h) Estabelece taxativamente as situações em que as pessoas colectivas públicas podem recorrer à contratação a termo certo e incerto, bem como as formalidades a observar, impondo, designadamente, para este tipo de contrato a realização de um processo simplificado de selecção;
i) Consagra regras especiais atinentes aos contratos a termo: (i) a não sujeição a renovação automática; (ii) a impossibilidade total de conversão em contrato por tempo indeterminado, caducando no termo do prazo máximo de duração previsto no Código do Trabalho; (iii) a nulidade dos contratos celebrados com violação do disposto no diploma, situação que gera responsabilidade civil, disciplinar e financeira dos titulares dos órgãos que os celebraram;
j) Permite, por instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, o alargamento dos períodos normais de trabalho previstos no Código do Trabalho, até aos limites previstos para as correspondentes

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carreiras dos funcionários ou agentes da Administração Pública;
k) Estabelece regras relativas à cedência ocasional de trabalhadores, determinando que tal situação não carece de acordo do trabalhador quando ocorra no quadro da colaboração entre pessoas colectivas públicas e seja fundamentada em necessidades prementes das entidades envolvidas ou por razões de economia, eficácia e eficiência na prossecução das respectivas atribuições;
l) Prevê a possibilidade de redução do período normal de trabalho ou de suspensão dos contratos de trabalho quando se verifique uma redução grave e anormal da actividade por razões estruturais ou tecnológicas, pela ocorrência de catástrofes ou por outras razões análogas;
m) Consagra normas aplicáveis aos contratos de trabalho em resultado da transmissão ou extinção das pessoas colectivas públicas;
n) Permite às pessoas colectivas públicas o recurso ao despedimento colectivo ou à extinção de postos de trabalho, para além dos casos previstos no Código do Trabalho, por razões de economia, eficácia e eficiência na prossecução das suas atribuições;
o) Estabelece as regras aplicáveis à negociação colectiva: (i) estrutura as convenções colectivas em vários níveis (contratos colectivos nacionais, contratos colectivos sectoriais, acordos colectivos sectoriais e acordos de pessoa colectiva pública); (ii) consagra normas relativas à aplicação e articulação entre convenções colectivas; (iii) obriga nos processos de negociação colectiva em que intervenham pessoas colectivas públicas à presença de representantes do Ministério das Finanças e dos Ministérios que tenham a tutela da Administração Pública e das relações colectivas de trabalho, sob pena de ineficácia;
p) Consagra normas aplicáveis à cedência especial de funcionários e agentes da Administração Pública a pessoas colectivas públicas;
q) Introduz alterações aos Decretos-Lei n.os 184/89, de 2 de Junho, e 427/89, de 7 de Dezembro, no sentido de adequar as suas normas ao novo regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública, que o Governo pretende instituir.

De acordo com a exposição de motivos que acompanha a proposta de lei vertente, "Desde há muito que vem admitindo-se a opção pelo regime do contrato de trabalho como alternativa ao regime da função pública para enquadrar o trabalho subordinado na Administração Pública", tornando-se "(…) necessário enquadrar o recurso a este instrumento de natureza contratual no âmbito das pessoas colectivas públicas, com carácter sistemático e pressupostos claros (…)".
Os autores da proposta de lei sub judice referem, ainda, que "(…) a utilização do contrato de trabalho no seio da Administração Pública comporta especificidades que decorrem (…) da especial natureza do empregador que prossegue o interesse público e (…) dos princípios constitucionais que vinculam todos os trabalhadores da Administração Pública. Estas especificidades foram já reconhecidas na Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que aprovou o Código do Trabalho, a qual previu a adaptação das suas normas com vista à aplicação aos contratos de trabalho na Administração Pública, em especial aos contratos de trabalho celebrados por pessoas colectivas públicas".
Neste contexto, concluem que a proposta de lei em análise tem por objectivo "(…) a determinação do âmbito de aplicação do regime do contrato de trabalho na Administração Pública e a adequação do regime jurídico do contrato de trabalho aos empregadores públicos que não são necessariamente de natureza empresarial e estão ao serviço do interesse público, bem como concretizar os imperativos constitucionais aplicáveis a todos os trabalhadores da Administração pública, incluindo os sujeitos ao regime do contrato de trabalho".
1.3 - Dos antecedentes parlamentares:
A discussão em torno da problemática do regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública não é nova no quadro parlamentar. Com efeito, embora a iniciativa legislativa vertente comporte em certa medida um carácter inovador dado que visa generalizar a aplicação dos contratos individuais de trabalho na Administração Pública, a existência deste tipo de contratos para alguns sectores da Administração Pública, designadamente no que concerne aos institutos públicos, não é nova entre nós, tendo já sido objecto de ampla discussão no quadro parlamentar.
De sublinhar que ainda recentemente ocorreu a discussão na Assembleia da República da proposta de lei n.º 90/IX - vide DAR II Série n.º 2, de 20 de Setembro de 2003 e Separata n.º 43/IX DAR, de 23 de Setembro de 2003 -, do Governo, que "Aprova a Lei-Quadro dos Institutos Públicos", que incorpora normas relativas à utilização do contrato individual de trabalho nestes entes públicos, que foi aprovada - (vide DAR I Série n.º 18, de 31 de Outubro de 2003), com os votos a favor do PSD e CDS-PP, votos contra do PCP, Os Verdes e BE e a abstenção do PS.
1.4 - Do quadro constitucional e legal:
A Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 266.º os princípios fundamentais que enformam a Administração Pública que, nos termos do n.º 1, "(…) visa a prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos". O artigo 269.º, n.º 1, estipula expressamente que "No exercício das suas funções, os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado e outras entidades públicas estão exclusivamente ao serviço do interesse público, como tal é definido, nos termos da lei, pelos órgãos competentes da Administração".
Por seu turno, o artigo 47.º da Lei Fundamental reconhece a todos os cidadãos " (…) o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade, em regra por via de concurso".
Finalmente, importa ter presente o disposto no artigo 53.º da Constituição da República Portuguesa, que reconhece a todos os trabalhadores, quer integrem o sector privado quer integrem a Administração Pública, o direito à segurança no emprego.
No plano legal, embora coabitem na Administração Pública, nomeadamente em alguns institutos públicos, diversas modalidades contratuais, como sejam a nomeação, o contrato administrativo de provimento e os contratos individuais de trabalho, não existe um enquadramento jurídico que regule de forma sistemática e uniforme o regime do contrato individual de trabalho.

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O Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei n.º 25/98, de 26 de Maio, que estabelece princípios gerais de salários e gestão de pessoal da função pública, prevê expressamente no seu artigo 7.º, como uma das formas de contrato de pessoal admitidas na Administração Pública, o contrato de trabalho a termo certo.
Os princípios atinentes à contratação de pessoal na Administração Pública encontram-se desenvolvidos e densificados através do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de Dezembro, que define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública.
O citado diploma legal estipula expressamente no seu artigo 3.º que a relação de emprego na Administração Pública constitui-se por nomeação e contrato de pessoal. Por seu turno, o artigo 14.º, relativo às modalidades e efeitos do contrato de pessoal, estabelece que o este contrato pode revestir a modalidade de contrato de trabalho a termo certo, não conferindo ao trabalhador a qualidade de agente administrativo e que se rege pela lei geral sobre contratos de trabalho a termo certo, com as especificidades constantes do diploma. Finalmente, o artigo 18.º e seguintes daquele diploma estabelecem as regras especiais aplicáveis ao contrato de trabalho a termo certo.
Assim, o artigo 18.º, para além de consagrar a noção de contrato de trabalho a termo certo, estabelece de forma taxativa os casos em que a Administração Pública pode recorrer à celebração de contratos de trabalho a termo certo (substituição temporária de funcionário ou agente, actividades sazonais, desenvolvimento de projectos não inseridos nas actividades normais dos serviços e aumento excepcional e temporário da actividade do serviço).
O artigo 19.º impõe que a celebração de contratos de trabalho a termo certo seja realizada mediante um processo de selecção de candidatos que implica a publicitação da oferta de emprego; o registo em acta da fundamentação e dos critérios que presidiram à decisão de contratação e que só possa ser contratado pessoal que seja titular das habilitações literárias ou qualificações profissionais adequadas ao desempenho das respectivas funções.
O artigo 20.º do referido decreto-lei estabelece normas relativas à estipulação do prazo, bem como as regras procedimentais a seguir no caso da renovação do contrato de trabalho a termo certo.
Por último, o artigo 21.º do mesmo diploma estabelece os limites à contratação a termo certo, fazendo depender a mesma, à excepção dos contratos destinados a substituir temporariamente funcionários e agentes da Administração Pública e dos contratos relativos a actividades sazonais, de anuência do Ministério das Finanças.
A par deste regime aplicável aos contratos a termo certo na Administração Pública, foram sendo criados regimes parcelares para alguns institutos públicos, aprovados através de diplomas legais avulsos.
É, pois, este o enquadramento legal que agora se pretende modificar e complementar através da proposta de lei n.º 100/IX, que institui o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública, geral e uniforme, a aplicar pelas pessoas colectivas públicas, e que resulta do Código do Trabalho aprovado através da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto.
Com efeito, o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, estatui expressamente no seu artigo 6.º que aos trabalhadores das pessoas colectivas públicas contratados ao abrigo do contrato individual de trabalhado é aplicável o disposto no Código do Trabalho, nos termos previstos em legislação especial, sem prejuízo dos princípios gerais em matéria de emprego público.
1.5 - Do enquadramento da questão:
Através da proposta de lei n.º 100/IX visa o Governo, na decorrência da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, que "Aprova o Código do Trabalho", permitir uma generalização do contrato individual de trabalho na Administração Pública, aprovando para o efeito um enquadramento jurídico específico aplicável aos contratos individuais de trabalho na Administração Pública.
Importa, todavia, não perder de vista que a coabitação entre várias modalidades contratuais, como é o caso da nomeação, dos contratos administrativos de provimento e dos contratos individuais de trabalho, não constitui uma realidade nova na Administração Pública, já que existe presentemente esta dualidade de regimes em alguns institutos públicos.
Na opinião do relator, a utilização do contrato individual de trabalho no quadro da Administração Pública, modalidade contratual mais flexível, pode, se formulada de modo adequado, nalgumas situações, constituir um importante instrumento de gestão, permitindo, nomeadamente, alcançar melhores resultados no plano da prestação dos serviços públicos aos cidadãos.
Com efeito, admite-se como adequado e conveniente, em determinadas circunstâncias, tornar extensível a relações de trabalho na Administração Pública, com as necessárias adaptações, o modelo de relações de trabalho do contrato de trabalho que vigora para o sector empresarial privado.
Contudo, tal opção, não passa claramente, na opinião do relator, pelo modelo desenhado pelo Governo na iniciativa legislativa em apreço, que, ao invés de regular de forma equilibrada os interesses em presença, antes pelo contrário, densifica a dualidade de regimes laborais na Administração Pública, cria desigualdades relativas e precariza ainda mais as relações jurídico-laborais constituídas ao abrigo do contrato individual de trabalho.
Com efeito, a proposta de lei vertente encerra um vasto conjunto de soluções normativas que, salvo melhor e mais qualificado entendimento, não asseguram minimamente aqueles objectivos e, em particular, o imperativo constitucional da segurança no emprego, antes pelo contrário, generaliza a possibilidade de recurso ao contrato individual de trabalho na Administração Pública, densifica a ocorrência de desigualdades relativas, precariza os vínculos laborais na Administração Pública e, inclusive, permite o recurso ao despedimento dos trabalhadores, e daí merecerem total discordância.
As opções normativas plasmadas na iniciativa legislativa em análise, quando comparadas com as constantes do Código do Trabalho, afiguram-se fortemente penalizadoras para os trabalhadores da Administração Pública contratados por via do contrato individual de trabalho. Atente-se apenas nalguns exemplos da proposta de lei:
- Determina a nulidade do contrato de trabalho por tempo indeterminado quando os seus requisitos não forem respeitados, o que representa uma penalização para o trabalhador, facto tanto mais incompreensível e injusto quanto o cumprimento dessas exigências não depende do trabalhador como, em regra, este nem sequer dispõe da informação quanto ao seu cumprimento por parte dos dirigentes da entidade empregadora (artigo 7.º);

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- Determina a nulidade do contrato por tempo indeterminado no caso de não redução a escrito ou por falta de certas menções no contrato, o que se afigura de igual modo muito injusto e gravoso para os trabalhadores (artigo 8.º);
- Quer a interdição de renovação automática do contrato a termo, quer, sobretudo, a interdição absoluta de conversão do contrato a termo em contrato sem termo, quer, ainda, a determinação da nulidade do contrato por incumprimento de certas normas, põem em crise o princípio constitucional da segurança no emprego e instituem um regime claramente mais restritivo que o previsto no Código do Trabalho (artigo 10.º);
- Permite a cedência de trabalhadores independentemente de convenção colectiva e, nalguns casos mesmo contra a vontade do trabalhador, o que constitui uma solução notoriamente mais desfavorável aos trabalhadores do que a fixada pelo Código do Trabalho (artigo 14.º);
- Consagra a possibilidade de despedimento colectivo em termos análogos aos que o Código do Trabalho prevê, sem que, todavia, se especifique em que condições as razões previstas no Código - motivos de mercado, motivos estruturais e motivos tecnológicos - se tornam aplicáveis à Administração Pública (artigo 18.º).
Estes são alguns aspectos da proposta de lei em discussão que manifestamente configuram soluções normativas ainda mais gravosas que as já previstas no Código do Trabalho e que, por isso, penalizam fortemente os trabalhadores da Administração Pública, para além de que não concorrem objectivamente para a melhoria da eficiência do serviço público.
O que se propõe, para conviver com relações de emprego público, inclusive dentro da mesma unidade organizativa da Administração Pública, é um modelo degradado e precarizado de contrato individual de trabalho, modelo esse que nem sequer é admissível em empresas privadas, mesmo depois da entrada em vigor do Código do Trabalho.
O mínimo que se exigiria de quem defendeu - contra a opinião da generalidade dos especialistas nacionais e estrangeiros e contra a solução adoptada pela quase totalidade dos Estados-membros da União Europeia - a existência dum Código de Trabalho, seria que se seguissem as soluções daquela lei, excepto em casos devida e explicitamente fundamentados em especificidades da administração pública, como, aliás, se prevê expressamente no próprio Código do Trabalho (artigo 6.º).
Sublinhe-se que o Código do Trabalho (artigo5.º) determina a aplicação, "com as necessárias adaptações", às relações de emprego público que confira a qualidade de funcionário ou agente da Administração Pública das disposições daquela lei sobre igualdade e não discriminação (artigo 22.º a 32.º), sobre protecção da maternidade e paternidade (artigo 33.º a 52.º), sobre constituição de comissões de trabalhadores (artigo 461.º a 470.º) e sobre direito à greve (artigo 591.º a 606.º), mas não as normas sobre associações sindicais (artigo 475.º a 505.º).
A opção seguida no diploma em apreço é incoerente com a filosofia que o próprio Governo adoptou no Código do Trabalho. Com efeito, não se encontra fundamentada em especificidades da Administração Pública, porquanto generaliza o contrato individual de trabalho. Acresce que degrada direitos individuais e colectivos dos trabalhadores, põe em crise direitos constitucionalmente protegidos de todos os trabalhadores portugueses, e, a ser aprovada, constituirá, seguramente, um foco adicional de tensões entre trabalhadores dos organismos onde for aplicada, o que, evidentemente, não melhora as expectativas quanto aos necessários ganhos de eficiência da Administração Pública.
Em suma, a proposta de lei sub judice, a ser aprovada, criará, na opinião do relator, um regime de emprego na Administração Pública mais precário e degradado comparativamente ao do sector privado, mesmo com o novo Código do Trabalho
É, por todas estas razões, uma proposta de lei globalmente inaceitável.
1.6 - Da discussão pública:
Terminado o período de consulta pública da proposta de lei n.º 100/IX, que decorreu entre os dias 19 de Novembro de 2003 e 18 de Dezembro de 2003, deram entrada na Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais 11 pareceres, dos quais um da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, dois de confederações sindicais, um de federações sindicais e sete de sindicatos.
Importa referir que a generalidade das organizações representativas dos trabalhadores que enviaram à Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais os seus pareceres, manifestam aberta e expressamente a sua oposição à proposta de lei n.º 100/IX, com particular enfoque no que respeita às normas relativas à generalização do recurso ao contrato individual de trabalho no âmbito da Administração Pública, à nulidade dos contratos por tempo indeterminado quando não respeitem os requisitos legalmente impostos, à nulidade dos contratos a termo não reduzidos a escrito ou que não mencionem certos aspectos formais e à possibilidade de recurso no quadro da Administração Pública à aplicação da figura do lay-off e do despedimento colectivo.
Por exemplo, a UGT é desde logo clara ao iniciar o seu parecer referindo que "a proposta apresentada é, no nosso entender, inaceitável suscitando-nos inúmeras questões, muitas das quais de fundo, nomeadamente pela insuficiente consideração dos valores e princípios subjacentes à actividade da Administração Pública". Por seu turno, a CGTP-IN, subscrevendo o parecer da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública, refere que com esta proposta de lei "(…) o Governo (…) quer impor aos trabalhadores de que é empregador aquilo que em conluio com o patronato não conseguiu impor no Código do Trabalho".
Também o Sindicato dos Quadros Técnicos do Estado, assumindo uma frontal oposição às soluções vertidas na proposta de lei n.º 100/IX, é peremptório ao concluir no seu parecer que "o STE considera que não é aceitável esta forma de construção de um qualquer pretenso novo edifício". Por último, veja-se, ainda, a posição do Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, que expressamente refere no seu parecer "(…) resultando da proposta, como primeira intenção, a aplicação do Código do Trabalho, vai-se ainda mais além do que este dispõe, assumindo-se uma regulamentação que trata os trabalhadores da Administração Pública como meros objectos que se usam e deitam fora e que, por isso, o patronato mais retrógrado também gostaria que lhe fosse reconhecida".

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II - Das conclusões

Atentos os considerandos que antecedem, conclui-se no seguinte sentido:
1 - O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República proposta de lei n.º 100/IX, que "Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública".
2 - A apresentação da proposta de lei n.º 100/IX foi efectuada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República e reúne os requisitos formais previstos no artigo 138.º do referido Regimento.
3 - Através da proposta de lei n.º 100/IX visa o Governo instituir um enquadramento jurídico especial aplicável aos contratos individuais de trabalho na Administração Pública e adequar a legislação em vigor relativa aos contratos a termo na Administração Pública àquele regime.
4 - A coabitação entre a figura da nomeação, do contrato administrativo de provimento e do contrato individual de trabalho não é inédita no seio da Administração Pública, designadamente nalguns institutos públicos, onde a dualidade de regimes laborais já é uma realidade.
5 - A proposta de lei n.º 100/IX espelha soluções que apontam para:

a) O recurso ao contrato individual de trabalho pela generalidade das entidades que integram a Administração Pública, modalidade contratual mais flexível que pode, nalgumas situações, constituir um importante instrumento de gestão da Administração Pública;
b) A criação de um modelo de contrato individual de trabalho na Administração Pública, que nalguns aspectos integra relações de emprego mais desfavoráveis para os trabalhadores que as que vigoram nas empresas privadas, mesmo depois da entrada em vigor do Código do Trabalho;
c) Uma degradação das relações laborais na Administração Pública, podendo mesmo algumas das soluções que espelha, maxime as atinentes ao contrato de trabalho a termo, serem susceptíveis de colidir com o princípio constitucional da segurança no emprego.

6 - A proposta de lei n.º 100/IX foi objecto de consulta que decorreu entre o dia 19 de Novembro de 2003 e o dia 18 de Dezembro de 2003, tendo dado entrada na Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais 11 pareceres, dos quais um da Assembleia Legislativa Regional dos Açores, dois de confederações sindicais, um de federações sindicais e sete de sindicatos.
7 - A proposta de lei n.º 100/IX será discutida na reunião do Plenário da Assembleia da República do dia 7 de Janeiro de 2004, em conjunto com a proposta de lei n.º 101/IX, que "Cria o sistema integrado de avaliação do desempenho da Administração Pública".
A Comissão de Trabalho e dos Assuntos Sociais é do seguinte:

III - Parecer

a) A proposta de lei n.º 100/IX, que "Aprova o regime jurídico do contrato individual de trabalho da Administração Pública", preenche, salvo melhor e mais qualificado entendimento, os requisitos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis para poder ser discutida e votada pelo Plenário da Assembleia da República.
b) Os grupos parlamentares reservam as suas posições de voto para o Plenário da Assembleia da República.
c) Para os efeitos tidos por convenientes, o presente relatório e parecer é remetido ao Sr. Presidente da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 5 de Janeiro de 2004. O Deputado Relator, Vieira da Silva - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura.

Nota: - Os pontos 1, 2, 3, 4, 6, e 7 das conclusões foram aprovados por unanimidade.
O ponto 5 foi rejeitado, com os votos contra do PSD e CDS-PP e votos a favor do PS, PCP e BE.
As alíneas b) e c) do parecer foram aprovadas por unanimidade, tendo a alínea a) sido aprovada por maioria, com os votos a favor do PSD, CDS/PP e PS e votos contra do PCP e BE.

PROPOSTA DE LEI N.º 101/IX
(CRIA O SISTEMA INTEGRADO DE AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA)

Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Trabalho e Assuntos Sociais

Relatório

1 - Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República de 3 de Novembro de 2003, foi ordenada a baixa às 1.ª e 8.ª comissões da proposta de lei n.º 101/IX, da iniciativa do Governo, que se encontra em apreciação nos termos do artigo 147.º do Regimento.

Objecto do diploma

2 - Com a presente proposta de lei o Governo pretende criar o Sistema de Avaliação do Desempenho da Administração Pública (SIADAP), propondo o desenvolvimento integrado de um modelo de avaliação.
Invoca-se explicitamente que a Administração Pública possua este tipo de instrumento estratégico para a criação de dinâmicas de mudança de motivação profissional e de eficiência.
Ainda segundo a exposição de motivos, a Administração Pública carece de mecanismos de avaliação efectiva e credível de todos os elementos e unidades orgânicas que a compõem.
Refere-se o princípio da justiça para estabelecer a inclusão do mérito revelado na acção por cada entidade avaliada, com o objectivo de evoluir para uma gestão determinada por objectivos.
Em suma, melhoria da gestão e da prestação de serviços, aumento da responsabilização e controlo e, por último, obtenção de economias e uma redução de custos financeiros dependem da alteração do modelo de avaliação, segundo os autores.

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Análise do diploma

3 - A proposta de lei:

a) Cria um Sistema Integrado de Avaliação de Desempenho, cujas principais características passam pela interacção entre avaliador e avaliado, promoção da diferenciação pelo mérito, instituição de um sistema de quotas de mérito e excelência e reforço dos níveis de responsabilidade e controlo de todos aqueles que exercem funções de direcção e chefia;
b) Este sistema de avaliação pretende abranger todo o universo composto pelos funcionários, agentes e demais trabalhadores, e os dirigentes de nível intermédio dos serviços e organismos da administração directa do Estado e dos institutos públicos, desde que o respectivo contrato tenha sido celebrado por prazo superior a seis meses;
c) Estabelece a aplicabilidade deste sistema de avaliação aos funcionários, agentes e demais trabalhadores da administração local e da administração regional autónoma, condicionando-a, no entanto, às necessárias adaptações a tomar por intermédio de decreto regulamentar e decreto regulamentar regional;
d) Enumera um conjunto de direitos, deveres e garantias dos avaliadores e avaliados;
e) Prescreve as situações em que a avaliação do desempenho é obrigatoriamente considerada;
f) Determina, como regra, que o cumprimento dos objectivos, a competência comportamental e a atitude pessoal são as três componentes essenciais da avaliação do desempenho introduzidas;
g) Estatui dois regimes de avaliação, o ordinário, que terá periodicidade anual, e o extraordinário, salvaguardando, no entanto, casos excepcionais em que poderão ser adoptadas formas de suprimento da avaliação;
h) Confere, como regra, carácter confidencial ao sistema de avaliação;
i) Estabelece as directrizes - objectivos a atingir, competências comportamentais e atitude pessoal - a que deve obedecer o procedimento de avaliação de recursos humanos;
j) Destina aos dirigentes de nível intermédio especificidades no respectivo processo de avaliação, exceptuando-os do critério da atitude pessoal.
k) Estabelece as regras pelas quais se deve reger a avaliação dos serviços e organismos que compõem a Administração Pública, efectuando-se esta através da auto-avaliação, de serviços de controlo e auditoria e por entidades externas;
l) Cria uma base de dados com a finalidade de controlar e avaliar a aplicação da SIADAP, dados esses que serão divulgados em página electrónica a criar;
m) Determina, como característica fundamental deste sistema de avaliação, a flexibilidade, podendo, por isso, designadamente através de decreto regulamentar, tal sistema ser adaptado à situação específica de vários organismos e serviços da Administração Pública, bem como às carreiras de regime especial e corpos especiais.
n) Especifica, como forma de regulamentar o presente diploma, o decreto regulamentar;
o) Revoga o Decreto Regulamentar n.º 44-B/83, de 1 de Junho, a Portaria n.º 642-A/83, de 1 de Junho, o artigo 30.º do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho, o artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 248/85, de 15 de Julho;
p) Derroga todas as normas constantes de diplomas gerais ou especiais, que prevejam classificação de serviço inferior a Bom para progressão ou promoção nas carreiras;
q) Estabelece que todas as promoções e progressões nas carreiras e categorias, a partir de 1 de Janeiro de 2005, tenham em consideração o previsto no presente diploma;
r) Refere que foram ouvidos os órgãos de governo próprio das regiões autónomas e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, e observados os procedimentos decorrentes da Lei n.º 23/98, de 26 de Maio.

Contributos de entidades com interesse na matéria abordada pela presente proposta de lei

4 - No cumprimento do disposto na Lei n.º 23/98, de 26 de Março, foram informadas da intenção do Governo a Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública e a Frente Sindical da Administração Pública (FESAP), a União Geral de Trabalhadores (UGT), o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) e o Sindicato dos Técnicos do Estado (STE), que produziram os respectivos pareceres sobre a presente proposta de lei.
5 - O parecer da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública pronuncia-se desfavoravelmente sobre a proposta de lei, qualificando o sistema de avaliação que o Governo pretende implementar como "extremamente burocrático e que, a ser levado a cabo, desmotivará os trabalhadores".
Como exemplo indicam o artigo 5.º da proposta da lei que, dizem, prevê fases que dificilmente vão ser cumpridas por parte da Administração, pois, por força da burocracia introduzida, os processos de avaliação não estarão terminados até ao final do prazo legalmente previsto, o que se poderá reflectir negativamente na promoção e progressão dos trabalhadores.
O parecer da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública salienta ainda a subjectividade dos critérios estabelecidos nesta proposta de lei e critica a adopção de componentes de avaliação diferenciados, variando estes consoante os grupos profissionais sem que tal diferenciação esteja devidamente fundamentada.
O estabelecimento de quotas, para as classificações de Excelente e Muito Bom, também é considerado de forma negativa, pois pode redundar em flagrantes injustiças para com aqueles que, merecendo a mesma nota, na prática não a podem obter.
Aprecia também negativamente o facto de a presente proposta de lei prever que o processo de avaliação esteja dependente de um único avaliador e à posterior decisão do dirigente máximo do serviço, dado que, ainda que a proposta preveja uma instância de consulta, esta, na prática, nada altera pois é presidida pelo dirigente máximo do serviço.
Também é criticado o exíguo prazo que a proposta de lei prevê para a apresentação de reclamação e de recurso, de natureza peremptória, agravando-se tais críticas pelo facto de os prazos previstos para as decisões por parte da administração serem de natureza meramente ordenadora.

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Por último, o parecer da Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública reprova a redacção dada ao n.º 4 do artigo 7.º da presente proposta de lei, pois olvida as situações de progressão na carreira, prejudicando os trabalhadores nas situações previstas no preceito citado.
6 - A Frente Sindical dos Trabalhadores da Administração Pública (FESAP) considera que a presente proposta de lei, com as modificações introduzidas após esta estrutura sindical ter apresentado propostas de alterações à mesma, é globalmente positiva e merece o seu acordo.
No entanto, esta estrutura sindical mostra-se claramente opositora de alguns aspectos estruturantes da presente proposta de lei, como o sistema de quotas previsto, qualificando-o como sendo um mecanismo de distorção artificial que se revela pernicioso, suscitando, inclusive, questões de índole constitucional por se prever a preterição dos concursos públicos para efeitos de promoção dos trabalhadores a quem foi atribuída a classificação de Excelente.
7 - A União Geral de Trabalhadores (UGT) considera que a proposta de lei não atinge o objectivo principal que esta estrutura sindical almeja, pois o sistema de avaliação proposto, ao não adoptar métodos de avaliação participados que visem quer a recompensa do mérito quer a penalização do desinteresse e do demérito, não motiva os trabalhadores para um melhor desempenho das suas funções.
Esta estrutura sindical concorda com a adopção de medidas tendentes a tornar o sistema de avaliação num sistema mais rigoroso, discordando, no entanto, com a introdução de um sistema de quotas, principalmente por este se encontrar desligado da avaliação de serviço dos dirigentes.
A proposta de lei, ao não prever uma interligação entre a avaliação individual e a avaliação do serviço, com vista a uma maior motivação colectiva, de acordo com esta estrutura sindical, não proporcionará mecanismos para a existência de um melhor trabalho de equipa, essencial para um bom funcionamento da Administração Pública.
A presente proposta de lei, de acordo com a UGT, potencia ou perpetua situações de favorecimento, pois prevê uma diferenciação de avaliação para funcionários e dirigentes intermédios, não regula, pura e simplesmente, a avaliação de dirigentes de topo, introduz quotas de classificação e, sobretudo, pela possibilidade de promoção independentemente de concurso e pela discricionária possibilidade de avaliações extraordinárias.
8 - Para o Sindicato de Técnicos do Estado (STE) a proposta de lei não serve qualquer objectivo de reforma da Administração Pública tendo em vista um melhor serviço dos portugueses.
Consideram que o normativo proposto não introduz na Administração a responsabilidade dos dirigentes por uma gestão com os trabalhadores rumo a objectivos assumidos, claros e mensuráveis;
Que aprofunda a burocratização de uma técnica que devia servir para motivar e gerir com transparência;
Destacam ainda que a proposta de lei ataca os trabalhadores, procurando, administrativamente, reduzir o número das progressões e promoções.
9 - O Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local (STAL) considera que a proposta de lei pretende instituir um sistema de avaliação extremamente burocrático e que, a ser levado a cabo, desmotivará os trabalhadores e desprestigiará a Administração Pública e que, pesem embora os objectivos afirmados pelo Governo, esta iniciativa legislativa pretende, no fundo, restringir ao máximo as progressões e promoções.
Por outro lado, o STAL salienta a subjectividade dos critérios estabelecidos, a adopção de componentes de avaliação diferenciados consoante os grupos profissionais que estiverem em causa, sem que se explicitem devidamente os fundamentos dessa diferenciação, e a adopção de um sistema de quotas para as classificações de Excelente e Muito Bom, que conduziriam a uma notória injustiça e discriminação daqueles que, merecendo a mesma nota, na prática não a podem obter.
Para emitirem um parecer negativo apontam ainda o facto de os dirigentes intermédios não serem abrangidos pelo sistema de quotas, a submissão do processo de avaliação a um único avaliador e à posterior decisão do dirigente máximo do serviço, os reduzidos prazos, de natureza peremptória, para reclamação e recurso das avaliações atribuídas.

Análise dos métodos de avaliação da Administração Pública em Espanha e em França

10 - Com o intuito de melhor compreender a importância e o alcance da presente proposta de lei refere-se em seguida, de forma sucinta, o regime de avaliação da Administração Pública em dois países da União Europeia, Espanha e França, que, quer pela proximidade quer pelas afinidades que têm com o nosso país, podem contribuir para uma discussão profícua.
11 - Em Espanha os postos de trabalho na Administração Pública classificam-se em 30 níveis. Para efeitos de promoção interna a lei espanhola estabelece, como método avaliativo, critérios objectivos.
Assim, estabelece que os funcionários devem, para efeitos de promoção, possuir o grau académico exigido para a função, ter uma antiguidade de, pelo menos, dois anos nas funções a que pertençam, assim como reunir os requisitos e superar as provas estabelecidas pelo Ministério da Administração Pública de Espanha.
Nessas provas deverão ser respeitadas os princípios da igualdade, mérito e capacidade.
O Governo espanhol pode, no entanto, sob proposta do Ministro da Administração Pública, determinar novos corpos e escalas para efeitos de promoção de funcionários que desempenhem funções coincidentes ou análogas às que desempenham, sempre que, com tal procedimento, derivem vantagens para a gestão dos serviços e os funcionários sejam titulares do grau académico exigido para a função e que estes funcionários superem as provas efectuadas para tal efeito.
12 - O Estado francês avalia o desempenho dos funcionários públicos através de um processo conduzido pelo superior hierárquico directo do funcionário avaliado.
Para este processo de avaliação contam, principalmente, os resultados profissionais obtidos pelo funcionário que têm por directriz os objectivos que lhe foram atribuídos de acordo com as condições de organização e funcionamento do serviço que, por sua vez, relevam para o alcance dos objectivos apontados.
Contam para a nota com a qual o superior hierárquico irá avaliar o funcionário, as missões específicas que lhe são concedidas e a auto-avaliação do funcionário em termos de carreira e mobilidade.

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Os funcionários são avaliados num período máximo de dois anos, sendo que a cada funcionário corresponde uma ficha individual de avaliação.
De acordo com a nota atribuída pelo superior hierárquico, é concedida ao funcionário uma redução ou uma majoração referente à antiguidade do funcionário em cada escalão, tendo em vista o acesso ao escalão superior.
A legislação francesa prevê uma comissão administrativa paritária, cujo parecer é obrigatório para efeitos de majoração ou redução da antiguidade requerida por cada escalão, sendo esta comissão paritária a enviar o processo do funcionário para aprovação por parte da autoridade investida do poder de nomeação.
Esta autoridade, para efeitos de definição do quadro de funcionários que compõem o "quadro de subida" (tableau d'avancement), deverá proceder à realização de um exame profundo do valor profissional do funcionário, que tenha em consideração as notas atribuídas ao interessado, as propostas formulados pelo seu chefe de serviço e a avaliação do funcionário tendo em consideração o cômputo geral da avaliação.
O sistema de avaliação francês, salvo derrogação particular, prevê ainda que os candidatos admitidos ao "quadro de subida" não possam exceder os 50% do número de vagas previstas.
Está previsto também um Conselho Superior da Função Pública do Estado, entidade à qual os funcionários podem recorrer no caso em que a autoridade investida do poder de nomeação se recuse, durante dois anos sucessivos, à publicação do "quadro de subida".
Em qualquer dos exemplos comparáveis nos Estados vizinhos, com índole diversa, o papel das chefias é largamente mitigado.

Enquadramento constitucional da proposta de lei

13 - A Administração Pública, de acordo com o artigo 266.º da Constituição da República Portuguesa, está subordinada ao princípio da prossecução do interesse público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, estando os órgãos e agente administrativos subordinados, no exercício das suas funções, aos princípios da igualdade, da proporcionalidade, da justiça e da imparcialidade.
O artigo 269.º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe "Regime da função pública", elenca os princípios a que devem estar subordinados os trabalhadores da Administração Pública e os demais agentes do Estado.
De acordo com Vital Moreira e Gomes Canotilho, em anotação a este artigo, a especificidade do regime da função pública manifesta-se em vários aspectos característicos, tradicionalmente apurados, abrangendo, designadamente, o regime de recrutamento e selecção, o regime de carreiras e promoções, o regime de dependência hierárquica, o regime disciplinar, o regime de remuneração e segurança social e o regime de estabilidade estatuária da relação de emprego.
Os trabalhadores da Administração Pública, quando no exercício das suas funções, estão obrigados a prosseguir o interesse público a título exclusivo.
A Administração Pública está, assim, constitucionalmente vinculada aos princípios da igualdade e imparcialidade, que não pode deixar de reflectir-se no regime legal do recrutamento e da carreira da função pública, privilegiando as formas vinculadas sobre as formas discricionárias.
O artigo 47.º da CRP, sob a epígrafe "Liberdade de escolha de profissão e acesso à função pública", refere, no seu n.º 2, que "todos os cidadãos têm o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso".
Vital Moreira e Gomes Canotilho, apesar de o preceito não fazer uma referência expressa a tal situação, revelam-se assertivos em alargar o âmbito do n.º 2 do artigo 47.º da CRP, abrangendo, pois, para além do direito ao acesso, este preceito normativo igualmente o direito de ser mantido nas funções (jus in officio), e bem assim o direito às promoções dentro da carreira.
A exigência de concurso - quer seja interno, externo, de ingresso ou de acesso - testemunha a progressiva vinculação da administração, com a consequente redução da discricionariedade administrativa nos domínios de recrutamento e selecção de pessoal. Existe uma contiguidade constitucional na percepção de critérios objectivos da avaliação de desempenho.

Conclusões

14 - A presente proposta de lei, a ser adoptada, trará consequências significativas num largo universo de pessoas que trabalham na Administração Pública e nas suas relações e dos serviços com os cidadãos.
Esta proposta de lei pode contender com princípios previstos na Constituição da República Portuguesa para a Administração Pública, dada a preterição de concursos públicos que propugna em certas situações e pelo grau de discricionariedade que estatui para a tomada de decisões, posto que os princípios constitucionais da igualdade e imparcialidade impõem que as decisões da Administração Pública sejam predominantemente apoiadas num poder vinculado.

Parecer

15 - Sem prejuízo da ponderação do mérito das motivações e das consequências desta iniciativa, relativamente aos quais os grupos parlamentares expressarão as respectivas posições nos debates na generalidade e na especialidade, a proposta de lei preenche todos os requisitos regimentais e constitucionais exigíveis, pelo que está em condições de subir a Plenário da Assembleia da República para apreciação e votação na generalidade.

Palácio de São Bento, 5 de Janeiro de 2004. O Deputado Relator, Luís Fazenda - O Presidente da Comissão, Joaquim Pina Moura.

Nota: - As conclusões foram rejeitadas, com os votos contra do PSD e CDS-PP e votos a favor do PS, PCP e BE.
O parecer foi aprovado, com os votos a favor do PSD, CDS-PP, PS, BE e a abstenção do PCP.

PROPOSTA DE LEI N.º 110/IX
POSSIBILITA A INSCRIÇÃO NO RECENSEAMENTO ELEITORAL DE NACIONAIS DOS NOVOS PAÍSES ADERENTES À UNIÃO EUROPEIA LEGALMENTE RESIDENTES EM PORTUGAL, POR FORMA A ASSEGURAR O EXERCÍCIO EFECTIVO DO DIREITO DE VOTO NA ELEIÇÃO PARA O PARLAMENTO EUROPEU A OCORRER EM JUNHO DE 2004

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Exposição de motivos

Nos termos da alínea c) do artigo 3.º da Lei n.º 14/87, de 29 de Abril, com a redacção dada pela Lei n.º 4/94, de 9 de Março, são eleitores dos Deputados ao Parlamento Europeu eleitos em Portugal os cidadãos da União Europeia, não nacionais do Estado português, recenseados em Portugal.
Estes cidadãos podem recensear-se e, se o fizerem até ao 60.º dia que antecede a eleição para o Parlamento Europeu, a ocorrer em Junho de 2004, têm capacidade eleitoral activa nesta eleição
Porém, relativamente aos cidadãos dos novos países aderentes à União Europeia, que são Chipre, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Hungria, Letónia, Lituânia, Malta, Polónia e República Checa, a sua adesão está prevista para 1 de Maio de 2004, como resulta do Tratado de Adesão celebrado em Atenas, em 16 de Abril de 2003, ou seja, em data posterior à suspensão da actualização do recenseamento eleitoral prevista no n.º 3 do artigo 5.º da Lei n.º 13/99, de 22 de Março, uma vez que a referida eleição para o Parlamento Europeu terá lugar em Junho de 2004. Não teriam, assim, estes cidadãos capacidade eleitoral activa aquando desta eleição.
Para evitar essa indesejada situação importa a aprovação pela Assembleia da República de um diploma legal transitório que admita, excepcional e condicionalmente, a inscrição dos cidadãos daqueles países legalmente residentes em Portugal, ainda antes de efectuada a adesão oficial à União Europeia dos citados países. Na hipótese de não se concretizar a adesão de algum ou de alguns desses países na data prevista, as inscrições dos respectivos cidadãos serão eliminadas pelas comissões recenseadoras antes da data prevista no artigo 59.º da citada Lei n.º 13/99, referente ao período de inalterabilidade do recenseamento.
Finalmente, serão tomados os procedimentos necessários a permitir aos destinatários o conhecimento atempado da data e forma de inscrição no recenseamento eleitoral bem como da sua capacidade eleitoral activa nas eleições para o Parlamento Europeu.
Assim, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º
Início de prazo para a inscrição

A partir de 1 de Março de 2004, e tendo em vista a eleição para o Parlamento Europeu a ocorrer em Junho de 2004, são admitidas inscrições no recenseamento eleitoral dos cidadãos legalmente residentes em Portugal nacionais dos países cuja adesão à União Europeia está prevista no Tratado de Adesão celebrado em Atenas, em 16 de Abril de 2003.

Artigo 2.º
Natureza condicional da inscrição

As inscrições a que se refere o artigo anterior são feitas ao abrigo do disposto nos artigos 4.º e 5.º da Lei n.º 13/99, de 22 de Março, na parte aplicável, mas devem ser eliminadas pelas comissões recenseadoras, até ao 15.º dia anterior à data da referida eleição, se algum daqueles países não concretizar a adesão oficial, na data prevista, relativamente aos respectivos cidadãos.

Artigo 3.º
Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 17 de Janeiro de 2004. O Primeiro-Ministro, José Manuel Durão Barroso - O Ministro dos Assuntos Parlamentares, Luís Manuel Gonçalves Marques Mendes.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 209/IX
VIAGEM DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA A BARCELONA

Texto do projecto de resolução, mensagem do Presidente da República e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa

Texto do projecto de resolução

S. Ex.ª o Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º e da alínea b) do artigo 163.º da Constituição, o assentimento da Assembleia da República para se ausentar do território nacional, em viagem de carácter oficial a Barcelona, nos dias 16 e 17 do próximo mês de Fevereiro, para presidir à inauguração "5 Pintores da Modernidade Portuguesa (1911-1965)", comissariada pelo director do Museu do Chiado, Pedro Lapa, e organizada em parceria pelo Gabinete de Relações Internacionais do Ministério da Cultura, Instituto Camões e pela Fundación Caixa Catalunya.
A Comissão Parlamentar de Assuntos Europeus e Política Externa emitiu parecer favorável.
Assim, apresento à Assembleia da República, nos termos regimentais, o seguinte projecto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, dar assentimento à viagem de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República a Barcelona, nos dias 16 e 17 do próximo mês de Fevereiro.

Palácio de São Bento, 28 de Janeiro de 2004. O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.

Mensagem do Presidente da República

Está prevista a minha deslocação a Barcelona nos dias 16 e 17 do próximo mês de Fevereiro, para presidir à inauguração da exposição "5 Pintores da Modernidade Portuguesa (1911-1965)", comissariada pelo director do Museu do Chiado, Pedro Lapa, e organizada em parceria pelo Gabinete de Relações Internacionais do Ministério da Cultura, Instituto Camões e pela Fundación Caixa Catalunya.
Com esta exposição, na qual estarão representados Amadeo de Souza Cardoso, Almada Negreiros, Joaquim Rodrigo, Vieira da Silva e Paula Rego, decorre também o Festival das Artes e Letras de Portugal.

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Assim, venho requerer, nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, e 163.º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.

Lisboa, 16 de Janeiro de 2004. O Presidente da República, Jorge Sampaio.

Parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa

A Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República, relativa à sua deslocação a Barcelona, nos dias 16 e 17 de Fevereiro, para presidir à inauguração da exposição "5 Pintores da Modernidade Portuguesa (1911-1965)", apresenta ao Plenário da Assembleia da República o seguinte projecto de resolução:
"A Assembleia da República, de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, dá o assentimento nos termos em que é requerido."

Palácio de São Bento, 20 de Janeiro de 2004. O Presidente da Comissão, Jaime Gama.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 210/IX
SOBRE A ALTERAÇÃO DO PROGRAMA DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO - ACTUALIZAÇÃO PARA O PERÍODO 2004-2007 - E A REVISÃO DO PACTO DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO

O Governo submeteu às autoridades europeias o Programa de Estabilidade e Crescimento - actualização para o período 2004-2007. O documento analisa a evolução recente da economia portuguesa, registando a recessão que em 2003 conduziu a uma regressão absoluta do produto interno bruto, e assinalando a evolução negativa dos salários reais e o aumento do desemprego. Malgrado esta evolução, o Governo defende no Programa a continuidade das suas orientações fundamentais. Para o período a que se refere o Programa o Governo projecta, assim, o prolongamento das suas políticas, até agora traduzidas nos Orçamentos do Estado, no novo Código Laboral e nas leis de reforma da Administração Pública, na nova Lei de Bases da Segurança Social, e outras modificações no sistema de protecção social, e em transformações importantes nas áreas da saúde e educação.
Justifica o Governo estas opções com o argumento de que "a gradual anulação do défice das contas públicas é condição essencial para o progresso e o desenvolvimento sustentado da economia portuguesa!" e que, desse ponto de vista, "o equilíbrio das contas públicas permanece como um objectivo central que, uma vez atingido, deverá ser mantido de forma sustentada" (p.2). No entanto, esta justificação é contraditória com a experiência dos países desenvolvidos, dado que a consagração da obrigatoriedade de um défice zero como condição da política orçamental implica uma estratégia de anulação da dívida pública como instrumento de política.
Diversos sectores da sociedade portuguesa, como muitos economistas e organizações sociais, têm contestado esta estratégia, tanto por ser inconsistente como por agravar as dificuldades conjunturais, como ainda por enfraquecer uma política europeia de convergência real entre as economias que se encontram em estádios diferenciados de desenvolvimento. Impõe-se a modificação da política económica e social que o País tem seguido, e que tem agravado a sua pior recessão das últimas décadas.
Deve ainda ser considerado que a vigência do Pacto de Estabilidade e Crescimento está posta em causa pela decisão do Ecofin de suspender a aplicação dos seus mecanismos sancionatórios, e que a Comissão Europeia decidiu colocar em discussão os regulamentos que organizam a aplicação do Pacto, como é registado no seu comunicado de 13 de Janeiro de 2004, que assinala que "A Comissão decidiu apresentar no próximo mês uma nova iniciativa para melhorar o quadro de governação económica da União. Esta iniciativa apoiar-se-à no Tratado existente e no projecto de Constituição, mas poderá envolver a modificação dos regulamentos que constituem o PEC. Trata-se, com efeito, de encontrar um bom equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de conservar um quadro de governação económica estável e previsível e, por outro, de melhorar o sistema à luz da experiência adquirida". A experiência adquirida é a de uma recessão europeia e de um Pacto de Estabilidade e Crescimento que se contrapôs a uma política razoável de crescimento e criação de emprego.
Desde o primeiro dia este Pacto tem tido um estatuto irregular. Entrou em vigor como um mero acordo entre governos, impondo-se com legitimidade superior à dos Tratados então assinados e ratificados, e determinando a política orçamental da União. E, desde que o euro começou a circular, os principais proponentes deste Pacto deixaram de o cumprir, como foi o caso da Alemanha e da França. Esse fracasso era inevitável: não era possível manter uma forma de disciplina orçamental que tinha como consequência agravar o ciclo recessivo - e foi o que aconteceu em Portugal, que tem vivido a mais grave recessão entre os países da União.
Neste contexto, é necessário um novo pacto, tanto mais que não pode haver moeda única sem coordenação orçamental. Mas esse novo pacto para o crescimento e emprego deve nascer de duas grandes modificações radicais, e não da recuperação de um pacto técnica, social e politicamente incompetente.
Assim, a Assembleia da República:
1 - Recomenda ao Governo que retire o texto do Programa de Estabilidade e Crescimento - actualização para o período 2004-2007 e que o substitua por um novo programa desenvolvido a partir de novas prioridades:
(a) a criação de emprego e de qualificações;
(b) a convergência real com as restantes economias europeias;
(c) o equilíbrio inter-regional na economia portuguesa.
2 - Recomenda ao Governo que defenda nas instâncias europeias a definição de um novo pacto de disciplina orçamental, incluindo os seguintes princípios:

1) O novo pacto deve determinar um limite para o défice orçamental europeu de conjunto, e definir os limites para cada país atendendo às suas circunstâncias específicas segundo critérios objectivamente determináveis:
a) o investimento público prioritário não deve ser incluído na contabilização do défice;

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b) o défice máximo deve ser determinado considerando o nível de endividamento do país, permitindo maior folga orçamental para os países com menor rácio de dívida pública; c) o défice máximo deve ser determinado considerando o nível dos compromissos futuros com pagamentos de pensões, assegurando a constituição das reservas necessárias.
2) O défice máximo deve ser determinado considerando a necessidade de uma política contra-cíclica, permitindo maior expansão orçamental quando o investimento privado se reduz em recessão.

3 - Recomenda ao Governo que rejeite a proposta de redução do limite do orçamento em percentagem do produto europeu.

Palácio de São Bento, 27 de Janeiro de 2004. O Deputado do BE, Francisco Louçã.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 211/IX
REVISÃO DO PACTO DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO

Considerando que:

a) Há precisamente um ano, no quadro do processo de revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006, foi possível estabelecer um amplo consenso inter-partidário consagrado na aprovação, a 9 de Janeiro de 2003, da Resolução da Assembleia da República n.º 7/2003;
b) A relevância de tal consenso foi, inclusivamente, reconhecida pelo Sr. Presidente da República na recente mensagem que, em 10 de Janeiro de 2004, dirigiu à Assembleia da República quando refere que "a revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento para 2003-2006, aprovada por larga maioria pela Assembleia da República em 9 de Janeiro da 2003, foi o primeiro passo para um entendimento e cooperação na área das finanças públicas";
c) Apesar desse consenso ter incluído o voto favorável, em relação a todos os pontos, dos grupos parlamentares dos partidos que integram a maioria do Governo, nenhuma das suas recomendações foi cumprida, tal como também sublinha a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República ao referir que "infelizmente, o acordo que suportou a resolução não teve a continuidade desejada (...);
d) Com efeito, o Governo:
- Não se empenhou na reavaliação do Pacto de Estabilidade e Crescimento "de modo que este instrumento não comprometa, antes beneficie, o crescimento e a coesão económica e social da União Europeia", como determinava o ponto 1 da Resolução;
- Não promoveu acções no sentido da transparência das contas públicas nem a organização de um processo orçamental plurianual, conforme a Assembleia da República deliberou nos pontos 2, 5e 8 da sua Resolução;
- Não adoptou uma estratégia de consolidação orçamental assente na requalificação da despesa pública e na maior eficácia na arrecadação das receitas, como se impunha nos termos dos n.os 2,6, 7 e 9 da Resolução n.º 7/2003;
- Não articulou o objectivo de equilíbrio das finanças públicas com uma política económica e social no sentido de aumentar a confiança, promover a actividade e o emprego, de assegurar níveis estáveis e significativos de investimento público, garantindo a promoção da convergência real com a União Europeia, como deliberou a Assembleia da República nos n.os 4, 10 e 11 da Resolução n.º 7/2003, de 9 de Janeiro;
e) Este ano o Governo entendeu alterar unilateralmente a metodologia seguida no ano anterior, e, sem qualquer tentativa de consensualização prévia com a oposição, ou sequer de mera audição da Assembleia da República, apresentou em Bruxelas o documento "Actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento" para o período de 2004-2007, tendo-o remetido apenas "para conhecimento" à Assembleia da República em 16 de Dezembro de 2003;
f) Para além desta opção metodológica, o novo documento ignora totalmente as recomendações e princípios constantes da Resolução da Assembleia da República n.º 7/2003, de 9 de Janeiro de 2003;
g) Tal opção foi assumida apesar da actualidade das recomendações constantes dessa Resolução, tal como é reconhecido por S. Ex.ª o Presidente da República na mensagem de 14 de Janeiro de 2004, quando refere " Julgo que a referida Resolução da Assembleia da República mantém plena validade como base de trabalho para a resolução dos problemas das finanças públicas, já que estabelece princípios e orientações largamente aceites e teve o acordo de uma larguíssima maioria parlamentar, onde estão incluídos os dois maiores partidos nacionais";
h) Qualquer apreciação parlamentar do documento "Actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento" para o período de 2004-2007 apenas poderia ser realizada na base de uma reafirmação dos princípios constantes da Resolução da Assembleia da República n.º 7/2003, de 9 de Janeiro de 2003, em relação aos pontos 1 e 2 e 4 a 11;
i) A total desconformidade do documento "Actualização do Programa de Estabilidade e Crescimento" para o período de 2004-2007 com os princípios e orientações consagrados nessa Resolução impede qualquer consenso em torno deste documento.
Considerando, por outro lado, que:

j) Portugal deve assumir uma posição activa e construtiva no debate em curso na União Europeia

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sobre a necessária revisão dos regulamentos que constituem o chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento;
l) A avaliação dos resultados da aplicação dos referidos regulamentos determina uma reponderação dos respectivos conteúdos e alcance: o PEC revelou insuficiente a valorização da dívida pública como critério de aferição da sustentabilidade das finanças públicas, dificuldades de ajustamento ao ciclo económico, desarticulação entre os objectivos de consolidação orçamental e de crescimento económico, discriminação negativa em relação ao investimento, indiferença perante as especificidades nacionais e inoperância perante a "contabilidade criativa";
m) A decisão do ECOFIN de 25 de Novembro de 2003 implicou uma profunda alteração do contexto de aplicação do Pacto de Estabilidade e Crescimento, a qual, tal como também refere o Sr. Presidente da República, terá de ser levada em conta no posicionamento nacional;
n) A incerteza gerada por esta decisão não superou qualquer das deficiências reconhecidas do Pacto de Estabilidade e Crescimento, acrescentando-lhes a ameaça da sua aplicação discricionária, sem respeitar o princípio da igualdade entre os Estados e expondo os países mais pequenos às externalidades negativas do seu incumprimento pelos outros Estados;
o) A Comissão Europeia, pela voz do seu Presidente Romano Prodi, acaba de reconhecer (a 13 de Janeiro de 2004) que "(...) é evidente que os acontecimentos de 25 de Novembro têm implicações políticas. Demonstraram claramente que, no intuito de tirar o máximo partido possível dos benefícios que advierem do euro, carecemos de uma governação económica mais sólida", anunciando, desde já, novas propostas;
p) Neste sentido, "a Comissão decidiu apresentar no próximo mês uma nova iniciativa para melhorar o quadro de governação económica da União. Esta iniciativa apoiar-se-á no Tratado existente e no projecto de Constituição, mas poderá envolver a modificação dos regulamentos que constituem a Pacto de Estabilidade e Crescimento. Trata-se, com efeito, de encontrar um bom equilíbrio entre, por um lado, a necessidade de conservar um quadro de governação económica estável e previsível e, por outro, de melhorar o sistema à luz da experiência adquirida";
q) A Comissão Europeia precisou que a sua iniciativa visará melhorar a articulação da disciplina orçamental com as necessidades de crescimento económico; a valorização do critério da dívida pública como indicador da sustentabilidade das finanças públicas; um maior ajustamento dos critérios ao ciclo económico; uma maior atenção às especificidades nacionais; e a exequibilidade das medidas de aplicação do Pacto;
r) O processo de reenquadramento e a revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento iniciado pela Comissão Europeia constitui uma oportunidade de grande interesse para Portugal - este interesse constituiu mesmo o primeiro ponto da Resolução da Assembleia da República de 9 de Janeiro de 2003;
s) Apesar destes factos, o Governo português assume uma postura de passividade e alheamento, abdicando de qualquer iniciativa política, mesmo no quadro de oportunidade agora aberto.
Considerando ainda que:
t) A vontade política de corresponder positivamente ao sentido da mensagem dirigida à Assembleia da República por S. Ex.ª o Presidente da República deve traduzir-se num conjunto de iniciativas de natureza legislativa, resolutiva ou de recomendação à actuação do Governo;
u) No quadro das iniciativas legislativas impõe-se consagrar, desde já:
- A obrigação do Governo fazer anteceder a apresentação à Comissão Europeia dos Programas de Estabilidade e Crescimento, bem como das suas actualizações anuais, da sua apreciação pela Assembleia da República;
- A alteração da lei de enquadramento orçamental, tendo em vista consagrar uma estrutura orçamental de base plurianual e a dar conteúdo deliberativo e vinculante ao debate sobre a orientação da despesa pública;
- A criação na Assembleia da República, no exercício das suas competências políticas inalienáveis, de uma unidade de apóio técnico-orçamental articulada com um comité consultivo integrando peritos independentes;
v) A par destas iniciativas legislativas, importa reafirmar as linhas orientadoras da política económica constantes da Resolução n.º 7/2003, de 9 de Janeiro, e definir, como recomendação ao Governo, um quadro de princípios estratégicos que devem motivar a sua participação activa na revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento.
A Assembleia da República resolve:
1 - Reafirmar o constante da Resolução n.º 7/2003, de 9 de Janeiro.
2 - Reafirmar, em particular, o princípio consagrado no n.º 1 desta resolução, incentivando o Governo a promover uma participação activa de Portugal no debate europeu em curso a propósito da revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, contribuindo para o seu aperfeiçoamento, bem como para uma maior articulação entre a política de consolidação orçamental e os objectivos de crescimento e coesão económica e social.
3 - Recomendar ao Governo que defenda, no quadro da União Europeia, a revisão dos regulamentos relativos ao Pacto de Estabilidade e Crescimento de acordo com os seguintes princípios estratégicos:

3.1. - A revisão dos regulamentos que constituem o PEC deverá incluir, necessariamente, a valorização relativa do critério da dívida pública numa base plurianual, de acordo com o artigo 104.º do Tratado do União Europeia, em detrimento da actual prevalência do critério do défice anual;
3.2. - Deverá proceder-se a uma clarificação de regras e métodos de contabilização pública que contribuam para a

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melhoria da transparência, comparabilidade e consequente aumento da confiança na fiabilidade das contas públicas.
3.3 - Deverão ser adoptados critérios de cálculo que reflictam a consolidação das responsabilidades repartidas pelas múltiplas entidades que, na prática, envolvem responsabilidade do Estado.
3.4. - Quer na definição dos objectivos e metas quantificadas quer na avaliação dos comportamentos nacionais, deverão ser incluídas margens de flexibilidade e ajustamento face aos ciclos económicos;
3.5. - No processo de revisão em curso deverá ser consagrada a articulação estreita entre os objectivos do Pacto de Estabilidade e Crescimento revisto e os objectivos quer de competitividade internacional da União Europeia quer de materialização do processo de convergência real por parte dos países da coesão;
3.6 - Na prática, nos termos do artig 104.º do Tratado da União Europeia, tal procedimento deverá respeitar a "regra de ouro selectiva" a aplicar em relação quer às contrapartidas nacionais dos apoios comunitários da política de coesão quer ao conjunto de programas e projectos identificados como estruturantes da Estratégia de Lisboa, reforçada no Conselho de Gotemburgo.
3.7. - Deverão também ser incluídas na "regra de ouro", ajustada e selectiva, as verbas correspondentes à concretização de programas plurianuais, detalhados e periodicamente auditados, acordados entre os Estados-membros e a União de acordo com as necessidades de cada país, desde que conducentes à redução, com carácter estrutural, de componentes significativas da despesa corrente, como, por exemplo, os investimentos em novas tecnologias da informação na administração pública.
3.8. - Os regulamentos que constituem o chamado Pacto de Estabilidade e Crescimento deverão, assim, valorizar objectivos directamente associados à componente de "crescimento", quer numa óptica conjuntural quer, e sobretudo, numa óptica estrutural, nomeadamente, os constantes da Estratégia de Lisboa articulados com os da política de coesão, como sejam os relativos a educação, inovação, ciência e tecnologia, requalificação ambiental ou acessibilidades.

Palácio de São Bento, 30 de Janeiro de 2004. Os Deputados do PS: Eduardo Ferro Rodrigues - João Cravinho - António Costa - Elisa Ferreira - Guilherme d'Oliveira Martins - Rosalina Martins - José Magalhães - Joel Hasse Ferreira - Vieira da Silva.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 212/IX
VIAGEM DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA À IRLANDA

Texto do projecto de resolução, mensagem do Presidente da República e parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa

Texto do projecto de resolução

S. Ex.ª o Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º e da alínea b) do artigo 163.º da Constituição, o assentimento da Assembleia da República para se ausentar do território nacional, em viagem de carácter oficial à Irlanda, entre os dias 22 e 24 de Fevereiro, para, a convite do Governo Irlandês e no quadro da Presidência Irlandesa da União Europeia, participar, em Dublin, nos dias 23 e 24, na Conferência Internacional sobre o HIV/SIDA Breaking the Barriers - Partnership to fight HIV/AIDS in Europe and Central Ásia.
A Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa emitiu parecer favorável.
Assim, apresento à Assembleia da República, nos termos regimentais, o seguinte projecto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, dar assentimento à viagem de carácter oficial de S. Ex.ª o Presidente da República à Irlanda, entre os dias 22 e 24 de Fevereiro.

Palácio de São Bento, 29 de Janeiro de 2004. O Presidente da Assembleia da República, João Bosco Mota Amaral.

Mensagem do Presidente da República

Está prevista a minha deslocação à Irlanda entre os dias 22 e 24 do próximo mês de Fevereiro para, a convite do Governo Irlandês e no quadro da Presidência Irlandesa da União Europeia, participar, em Dublin, nos dias 23 e 24, na Conferência Internacional sobre o HIV/SIDA - Breaking The Barriers - Partnership to fight HIV/AIDS in Europe and Central Asia.
Assim, venho requerer, nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, e 163.º, alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.

Lisboa, 23 de Janeiro de 2004. O Presidente da República, Jorge Sampaio.

Parecer da Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa

A Comissão de Assuntos Europeus e Política Externa da Assembleia da República, tendo apreciado a mensagem de S. Ex.ª o Presidente da República relativa à sua deslocação à Irlanda, entre os dias 22 e 24 de Fevereiro, para, a convite do Governo Irlandês e no quadro da Presidência Irlandesa da União Europeia, participar, em Dublin, nos dias 23 e 24 na Conferência Internacional sobre o HIV/SIDA: Breaking the Barriers - Partnership to fight HN/AIDS in Europe and Central Asia, apresenta ao Plenário da Assembleia da República o seguinte projecto de resolução:
A Assembleia da República, de acordo com as disposições constitucionais aplicáveis, dá o assentimento nos termos em que é requerido.

Palácio de São Bento, 27 de Janeiro de 2004. O Presidente da Comissão, Jaime Gama.

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 213/IX
REVISÃO DO PROGRAMA DE ESTABILIDADE E CRESCIMENTO PARA 2004 -2007

Nas suas linhas essenciais o Programa de Estabilidade e Crescimento aprovado em 2003 para o desenvolvimento da economia portuguesa mantém a sua validade integral.

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Naturalmente que, no contexto da evolução entretanto havida, quer nacional quer internacionalmente, há um conjunto de ajustamentos que importa fazer, sem nunca desvirtuar ou pôr em causa os grandes objectivos que nos continuam a nortear - equilíbrio das finanças públicas, requalificação da despesa, melhoria da eficácia na arrecadação da receita, diminuição estrutural e consolidada do défice e aumento da produtividade como forma sustentada de promoção do emprego.
Estes ajustamentos ocorrem num período de desenvolvimento económico internacional, com um claro aumento da confiança na retoma mundial, mas em que subsistem alguns factores de incerteza, nomeadamente a hipotética abertura, no plano comunitário, de um processo de revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento que nos vincula no seio da União Europeia.
Na sequência da apresentação da proposta nacional do Programa para o período 2004-2007, relativamente ao qual tem Portugal até ao próximo dia 10 de Fevereiro a oportunidade de formular propostas de alteração ou rectificação, solicitou o Governo à Assembleia da República a realização de um debate alargado que está marcado para o dia 4 de Fevereiro.
É nesse sentido, na esteira do que esta Assembleia fez, com pleno sucesso, no ano passado e em consonância com o apelo expresso pelo Sr. Presidente da República na mensagem que endereçou ao Parlamento, que os grupos parlamentares da maioria formularam um conjunto de recomendações que devem ser observadas na proposta definitiva do nosso Programa de Estabilidade e Crescimento para 2004-2007.
É um contributo responsável para o debate que vamos travar, contributo que queremos aberto à participação das bancadas da oposição, desde logo e em primeiro lugar ao seu principal partido, que nesta matéria não pode deixar de assumir o papel que lhe cabe enquanto partido com naturais responsabilidades nos destinos colectivos do País.
Nestes termos, a Assembleia da República resolve, ao abrigo do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, o seguinte:
1 - Recomendar ao Governo que, caso seja aberto, por parte da União Europeia, um processo de revisão do Pacto de Estabilidade e Crescimento, a posição de Portugal seja assumida em articulação com a Assembleia da República, fazendo intervir no estudo e formulação de propostas as Comissões de Assuntos Europeus e Política Externa e de Economia e Finanças;
2 - Apoiar as linhas de orientação constantes da revisão do Programa de Estabilidade e Crescimento para o período 2004-2007, que o Governo submeteu à apreciação desta Assembleia;
3 - Defender que o equilíbrio nas finanças públicas deve continuar a ser articulado com uma política económica e social que aumente a confiança, diminua a incerteza, garanta a estabilidade social e promova a competitividade da nossa economia;
4 - Considerar que deve continuar a ser dada prioridade absoluta à prevenção e ao combate à fraude e à evasão fiscais, bem como ao alargamento da base tributária;
5 - Considerar que a política de consolidação orçamental deve continuar a obedecer a uma estratégia precisa, com metas e prioridades definidas, designadamente no campo da intensificação das reformas necessárias à prossecução daquele objectivo, com particular destaque para a reforma da Administração Pública;
6 - Sustentar que o PEC deve continuar a articular-se com as propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento do Estado, integrando um processo orçamental plurianual;
7 - Entender que as políticas sectoriais anunciadas no PEC devem continuar a ter uma lógica integrada em ligação com a estratégia de desenvolvimento e serem articuladas de modo a promover a actividade e o emprego, tendo em vista, designadamente, a prossecução de objectivos de evolução do emprego capazes de mobilizar as necessárias políticas activas;
8 - Reafirmar a necessidade de assegurar níveis suficientes de investimento público, na perspectiva de contribuir para garantir a absorção dos fundos estruturais, acelerar a modernização infra-estrutural do País e promover a convergência real com a União Europeia.

Assembleia da República, 28 de Janeiro de 2004. Os Deputados: Guilherme Silva PSD) - Jorge Neto (PSD) - Diogo Feio (CDS-PP).

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

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