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Sábado, 24 de Setembro de 2005 II Série-A - Número 51 (*)
X LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2005-2006) (*)
S U M Á R I O
Resoluções:
- Recomenda ao Governo medidas relativas à floresta e aos incêndios de 2005.
- Centrais termoeléctricas de resíduos florestais.
Projecto de lei n.o 155/X (Sobre alteração da moldura penal no caso de crimes de incêndio florestal):
- Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Projecto de resolução n.o 69/X (Propõe a realização de um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez realizada por opção da mulher nas primeiras 10 semanas):
- Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso de admissão interposto pelo CDS-PP.
(*) Artigo 174.º n.º 1 da CRP, Artigo 47.º n.º 1 do RAR e Artigo 171.º n.os 1 e 2 da CRP.
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RESOLUÇÃO
RECOMENDA AO GOVERNO MEDIDAS RELATIVAS À FLORESTA E AOS INCÊNDIOS DE 2005
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.° da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo o seguinte:
- Que num prazo de dois anos o Governo proceda ao inventário florestal nacional, e que para o cadastro da propriedade florestal isente, simultaneamente, os proprietários dos custos de actualização de registo predial, como forma de incentivo a essa actualização. Este incentivo deverá ser amplamente divulgado e deve ser encarado como uma obrigatoriedade de cooperação com o interesse nacional de protecção da floresta, levando, desta forma, a que a não actualização do registo predial possa acarretar para o proprietário sanções a determinar.
- Que o Governo elabore um planeamento nacional de aproveitamento da biomassa para produção energética, integrado também no objectivo concreto de limpeza das matas e dos espaços florestais.
- Que o Governo proceda ao levantamento nacional dos prejuízos decorrentes dos incêndios florestais de 2005 e que paralelamente informe sobre todos os apoios concedidos para fazer face a esses danos.
- Que o Governo proceda à aferição dos níveis de emissão de C02 decorrentes dos fogos florestais de 2005 e sua implicação nos compromissos assumidos no âmbito do Protocolo de Quioto.
- Que o Governo submeta à Assembleia da República o plano de reflorestação de matas e áreas florestais do Estado ardidas em 2005, com um programa específico de intervenção nas áreas protegidas e outras classificadas assoladas pelos incêndios.
Aprovada em 15 de Setembro de 2005.
O Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
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RESOLUÇÃO
CENTRAIS TERMOELÉCTRICAS DE RESÍDUOS FLORESTAIS
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.° da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo a adopção de medidas de aproveitamento energético dos resíduos florestais que contemplem designadamente o seguinte:
a) A abertura de concurso público para a instalação e exploração de centrais térmicas, com uma potência instalada de até 200 MW para a produção de energia eléctrica a partir de resíduos florestais residuais, no regime legal dos procedimentos para pedidos de informação prévia para a atribuição de pontos de interligação à rede pública, regulados pelo Decreto-Lei n.° 312/2001, de 10 de Dezembro;
b) Um ajustamento de 16% da Tarifa Verde aplicável actualmente, para as centrais de menor dimensão, criando as indispensáveis condições de mercado, a exemplo do que o anterior Governo promoveu para outras fontes endógenas e renováveis;
c) Maior agilidade no processo burocrático de ligações à rede eléctrica nacional;
d) A cassação imediata das licenças atribuídas para a instalação e exploração de centrais térmicas que utilizem resíduos florestais como combustível e relativamente às quais se encontre já expirado o prazo para a sua entrada em funcionamento, sem que tal diligência tenha sido observada pelos respectivos titulares.
Aprovada em 15 de Setembro de 2005.
O Presidente da Assembleia da República, Jaime Gama.
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PROJECTO DE LEI N.O 155/X
(SOBRE ALTERAÇÃO DA MOLDURA PENAL NO CASO DE CRIMES DE INCÊNDIO FLORESTAL)
Relatório, conclusões e parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
I - Nota preliminar
Cinco Deputados do CDS-PP tomaram a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o projecto de lei n.º 155/X, sobre alteração da moldura penal no caso de crimes de incêndio florestal.
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Esta apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República de 15 de Setembro de 2005, a iniciativa desceu à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do respectivo relatório, conclusões e parecer.
A discussão na generalidade da iniciativa vertente encontra-se já agendada (trata-se de um agendamento potestativo do CDS-PP) para o próximo dia 22 de Setembro de 2005.
II - Do objecto e motivação da iniciativa
O projecto de lei sub judice tem por principal desiderato proceder ao agravamento da moldura penal em caso de crime de incêndio florestal, elevando de 3 para 4 anos de prisão o limite mínimo da pena aplicável em caso de dolo.
Os proponentes justificam esta medida com a necessidade de condenar os arguidos que pratiquem, com dolo, este tipo de crime a uma pena de prisão efectiva. É que, no caso de o tribunal aplicar ao arguido a pena mínima de 3 anos de prisão, esta pode ser, nos termos do artigo 50.º do Código Penal, suspensa na sua execução. Ora, é exactamente essa possibilidade que a iniciativa em apreço pretende obstar.
Consideram os signatários que este "é um sinal que a Assembleia da República deve dar à sociedade: o de que está atenta e não negligencia a importância que deve ser dada à punição efectiva de quem causa - por vezes aos seus próprios vizinhos - a dor da perda de vidas humanas e de bens materiais, sem que haja (porque não pode haver) motivo compreensível ou aceitável".
O projecto de lei visa ainda proceder à autonomização, no Código Penal (CP), do crime de incêndio florestal, propondo que este ilícito criminal seja destacado do crime de incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas previsto no artigo 272.º do CP para passar a integrar uma disposição própria e específica entre os crimes de perigo comum. Com esta alteração, os proponentes pretendem acentuar o desvalor que o crime de incêndio florestal representa.
Neste sentido, o artigo 2.º do projecto de lei vertente adita um artigo 272.º-A ao Código, subordinado à epígrafe "Incêndios florestais", cuja redacção corresponde na íntegra à desafectação deste ilícito criminal do artigo 272.º, com a novidade de se elevar o limite mínimo da pena em caso de dolo.
As alterações aos artigos 272.º, 273.º, 274.º, 285.º e 286.º do Código Penal, operadas pelo artigo 1.º da iniciativa ora objecto de análise, correspondem a meros ajustamentos de redacção por força da autonomização do crime de incêndios florestais.
Com efeito, na alínea a) do n.º 1 do artigo 272.º do CP é eliminada a expressão "a floresta, mata, arvoredo ou seara", enquanto que as remissões previstas nos artigos 273.º, 274.º, 285.º e 286.º do CP passam a incluir remissão para o novo artigo 272.º-A.
A este propósito, refira-se que se detectaram alguns lapsos e/ou imprecisões no texto do artigo 1.º do projecto de lei em apreço que, sem prejuízo de poderem ser corrigidas em sede de especialidade, não se podem aqui deixar de registar:
- A referência à alteração ao artigo "2895.º" do CP reporta-se obviamente ao artigo 285.º do CP;
- O n.º 1 do artigo 273.º do CP não pode reportar-se aos "factos descritos no n.º 1 do artigo anterior e no n.º 1 do artigo 272.º-A", porque o artigo anterior ao 273.º passará a ser, não o 272.º, mas o 272.º-A;
- O artigo 274.º do CP mantém-se com corpo único, razão pela qual não deve ter n.º 1;
- No artigo 286.º do CP prevê-se um n.º 2 que não faz sentido, já que as alterações operadas nesse artigo e nos artigos 273.º, 274.º e 285.º são feitas precisamente para incluir a remissão para o novo artigo 272.º-A.
Por último, o artigo 3.º do projecto de lei em apreço determina a entrada em vigor das alterações por ele propostas "no dia seguinte ao da sua publicação".
III - Enquadramento legal
Os incêndios florestais, apesar de não constituírem um tipo autónomo de crime, encontram-se actualmente criminalizados no artigo 272.º do CP da seguinte forma:
"Artigo 272.º
Incêndios, explosões e outras condutas especialmente perigosas
1 - Quem:
a) Provocar incêndio de relevo, nomeadamente pondo fogo a edifício ou construção, a meio de transporte, a floresta, mata, arvoredo ou seara;
b) Provocar explosão por qualquer forma, nomeadamente mediante utilização de explosivos;
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c) Libertar gases tóxicos ou asfixiantes;
d) Emitir radiações ou libertar substâncias radioactivas;
e) Provocar inundação, desprendimento de avalanche, massa de terra ou de pedras; ou
f) Provocar desmoronamento ou desabamento de construção;
e criar deste modo perigo para a vida ou para a integridade física de outrem, ou para bens patrimoniais alheios de valor elevado, é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.
2-- Se o perigo referido no número anterior for criado por negligência, o agente é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
3 - Se a conduta referida no n.º 1 for praticada por negligência, o agente é punido com pena de prisão até 5 anos."
O texto deste artigo é resultante da revisão ao Código Penal operada pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, e corresponde, com significativas alterações, ao artigo 253.º da versão originária de 1982.
Pouco tempo após a entrada em vigor do Código Penal de 1982, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, assistiu-se a um aumento exponencial de fogos florestais que evidenciou a insuficiência dos mecanismos deste Código para fazer face à situação. Por esse motivo, a Assembleia da República aprovou a Lei n.º 19/86, de 19 de Julho, que continha sanções penais e contra-ordenacionais em caso de incêndios florestais.
Os artigos 1.º a 4.º da Lei n.º 19/86 tratavam de crimes de natureza florestal, os quais ter-se-ão de considerar revogados por força do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março, que revê o Código Penal de 1982.
É que o n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 48/95 estabelece que "são revogadas as disposições legais avulsas que prevêem ou punem factos incriminados pelo Código Penal" e os artigos 1.º a 4.º da Lei n.º 19/86 mais não eram do que disposições legais avulsas que incriminavam os incêndios florestais, os quais passaram a ser regulados, ainda que de forma não autónoma, pelo artigo 272.º do Código Penal de 1995.
Pela sua relevância histórica, transcreve-se os artigos 1.º a 4.º da Lei n.º 19/86, de 19 de Julho:
"Artigo 1.º
1 - Quem incendiar florestas, matas ou arvoredos que sejam propriedade de outrem ou que, sendo propriedade do agente, tenham valor patrimonial considerável ou possam, pela sua natureza e localização, comunicar o incêndio a florestas, matas ou arvoredos de outrem será punido com prisão de 3 a 10 anos.
2 - Se da conduta referida no número anterior resultar perigo para a vida ou integridade física de outra pessoa, a pena aplicável será a de prisão de 4 a 12 anos.
3 - Se da conduta referida no n.º 1 resultar a morte de uma ou mais pessoas, a pena aplicável será a de prisão de 5 a 15 anos.
4 - As penas previstas nos números anteriores serão agravadas para o dobro no seu limite mínimo em relação à pessoa que incitar ou determinar outrem a prática do crime para obter uma recompensa ou vantagem ou um enriquecimento para si ou para terceiro ou ainda para causar prejuízo a outrem.
5 - Não são abrangidas pelo disposto no n.º 1 a realização de trabalhos e outras operações que, segundo o conhecimento e a experiência da técnica florestal, se mostrem adequadas, desde que sejam efectuadas, de acordo com as regras aplicáveis, por pessoal qualificado ou por outra pessoa devidamente autorizada a combater incêndios, prevenir, debelar ou minorar a deterioração do património florestal ou garantir a sua defesa e conservação.
Artigo 2.º
1 - Quem, por negligência, incendiar florestas, matas ou arvoredos que sejam propriedade de outrem ou que, sendo propriedade do agente, tenham valor patrimonial considerável ou possam, pela sua natureza e localização, comunicar o incêndio a florestas, matas ou arvoredos de outrem será punido com pena de prisão até 3 anos.
2 - Quem, através da conduta referida no número anterior, causar a morte ou lesão corporal grave de outra pessoa será punido com prisão até 5 anos e multa de 100 a 200 dias.
Artigo 3.º
1 - Quem impedir o combate aos incêndios nos bens referidos nos artigos anteriores será punido com prisão de 3 a 10 anos.
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2 - Quem dificultar a extinção dos incêndios nos bens referidos nos artigos anteriores, designadamente destruindo ou tornando inutilizável o material destinado a combater os mesmos, será punido com prisão até 10 anos.
Artigo 4.º
Quando qualquer dos crimes previstos nos artigos anteriores seja cometido por indivíduo inimputável, ser-lhe-á aplicada, nos termos e limites da lei, a medida de segurança prevista no artigo 91.º do Código Penal, sob a forma de internamento intermitente e coincidente com a época normal de fogos."
IV - Antecedentes parlamentares
Na IX Legislatura, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias desencadeou, ao longo de mais de um ano, uma série de audições a entidades institucionais da área da Justiça e de individualidades de reconhecido mérito na área penal e processual penal, com vista a preparar alterações ao Código Penal e ao Código de Processo Penal, não tendo nenhum dos convidados se pronunciado acerca do crime de incêndios florestais, nem da necessidade da sua autonomização.
Nestas audições, foi aflorado, em geral, a temática do agravamento das penas, tendo havido quem se manifestasse contra e defendesse, como foi o caso do Juiz Desembargador Mário Belo Morgado, então Director da PSP, a redução das molduras penais .
A propósito desta matéria, cite-se o Sr. Procurador Geral da República na reunião de 9 de Julho de 2003:
"Aquilo que me parece que se deve evitar, de todo - e aqui já não estamos a falar de medidas processuais, que são mais ligeiras, estamos a falar de direito penal substantivo, de previsões no diploma fundamental, que é o Código Penal para o direito penal -, é uma certa tentação que existe para navegar ao sabor ou de casos polémicos, ou de casos mediáticos, ou daquilo que 'está a dar', passe a expressão, no momento, para alterar as molduras para certo tipo de crimes."
É ainda de referir que, na anterior Legislatura, a Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, criada na sequência da vaga de incêndios registados em 2003, não se pronunciou, no seu relatório final, sobre a necessidade de se agravar a moldura penal dos crimes de incêndio florestal.
Na actual Legislatura, é pertinente referir a Resolução do Conselho de Ministros n.º 138/2005, de 17 de Agosto, que cria a Unidade de Missão para a Reforma Penal (UMRP), com vista à concepção, apoio e coordenação do desenvolvimento das iniciativas de reforma em matéria penal, e que nomeia como seu coordenador o Mestre Rui Santos Pereira.
V - Direito Comparado
Do outro lado da fronteira, em Espanha, tipifica-se especificamente os crimes de incêndio florestal, que são punidos com pena de prisão de 1 a 5 anos e multa de 12 a 18 meses. Mas havendo perigo para a vida ou integridade física das pessoas, a moldura penal já é de 10 a 20 anos de prisão e multa de 12 a 24 meses, sendo certo que o Tribunal poderá impor uma pena de prisão inferior atendendo à menor gravidade do perigo causado e as demais circunstâncias do facto - cfr. artigo 352.º do Código Penal Espanhol.
VI - Dados estatísticos
De acordo com dados recolhidos no site do Gabinete de Política Legislativa e de Planeamento (GPLP) do Ministério da Justiça, é bastante expressivo o número de crimes de incêndios florestais anualmente registados pelas forças de segurança, conforme se pode ver na evolução constante do quadro seguinte:
Crimes registados pela PJ, PSP e GNR
1998 1999 2000 2001 2002 2003
(dados provisórios)
Incêndio/Fogo posto floresta, mata, arvoredo/seara
4277
3752
5225
4951
4807
5209
Muito menos expressivos são depois os processos-crime que chegam à fase de julgamento e que culminam em condenação. Com efeito, segundo as Estatísticas da Justiça de 2002, igualmente disponíveis no
Vide acta da reunião de 14 de Maio de 2003, página 101.
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site do GPLP, só 17 processos por crime de incêndio florestal foram, nesse ano, julgados. E em 20 arguidos, apenas 7 foram condenados, dos quais 4 a uma pena de prisão suspensa.
Segundo dados apontados no relatório final da Comissão Eventual para os Incêndios Florestais, "em 2003 foram detidos mais de uma centena de suspeitos do crime de fogo posto, dos quais 46 ficaram em prisão preventiva, tendo aos restantes sido aplicadas outras medidas de coacção como prisão domiciliária, apresentação periódica e termos de identidade e residência".
O Relatório de Segurança Interna de 2004 regista uma diminuição do número de detenções por incêndios florestais de um total de 63, em 2003, para 48, em 2004.
Conclusões
1. Cinco Deputados do CDS-PP apresentaram à Assembleia da República o projecto de lei n.º 155/X, sobre alteração da moldura penal no caso de crimes de incêndio florestal.
2. Esta apresentação foi efectuada nos termos do artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa e do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais previstos no artigo 138.º do mesmo Regimento.
3. O projecto de lei n.º 155/X, ao mesmo tempo que autonomiza o crime de incêndio florestal, procede ao agravamento da respectiva moldura penal, elevando de 3 para 4 anos de prisão o limite mínimo da pena aplicável em caso de dolo.
Parecer
Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é do seguinte parecer:
O projecto de lei n.º 155/X, apresentada pelo CDS-PP, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário, reservando os grupos parlamentares as suas posições para o debate.
Palácio de S. Bento, 21 de Setembro de 2005.
O Deputado Relator, António Montalvão Machado - O Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.
Nota: As conclusões e o parecer foram aprovados por unanimidade.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.O 69/X
(PROPÕE A REALIZAÇÃO DE UM REFERENDO SOBRE A INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ REALIZADA POR OPÇÃO DA MULHER NAS PRIMEIRAS 10 SEMANAS)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias sobre o recurso de admissão interposto pelo CDS-PP
1 - Ao abrigo do n.º 2 do artigo 140.º do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar do Partido Popular veio, através de requerimento subscrito pelo Sr. Deputado Nuno Teixeira de Melo, recorrer da decisão de admissão do projecto de resolução n.º 69/X, conforme despacho do Presidente da Assembleia da República e anúncio da Mesa em 21 de Setembro de 2005.
2 - O referido recurso invoca a violação das normas constantes do n.º 10 do artigo 115.º e do n.º 4 do artigo 167.º, ambos da Constituição da República Portuguesa (CRP), com base nos seguintes fundamentos:
1) O Projecto de resolução n.º (…)/X tem a seguinte denominação: "Propõe a realização de um referendo sobre a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez realizada nas primeiras dez semanas";
2) Esta denominação é integralmente coincidente com a do projecto de resolução n.º 9/X/1.ª, igualmente da autoria do Partido Socialista, que, após tramitação parlamentar, deu origem à Resolução da Assembleia da República n.º 16-A/2005, de 2 de Abril;
3) Por decisão de S. Ex.ª do Presidente da República, não foi convocado o referendo para o qual apontava a referida Resolução, conforme mensagem publicada no DAR, II série A, n.º 12, de 7 de Maio de 2005, e lida perante o Plenário da Assembleia da República (DAR I Série n.º 16, de 5 de Maio de 2005);
4) Tal facto equivale à rejeição definitiva da proposta de referendo, para efeitos do disposto no n.º 10 do artigo 115.º e no n.º 4 do artigo 167.º, ambos da CRP, pelo que, nos termos das mesmas disposições, não pode haver renovação da proposta de referendo na mesma sessão legislativa;
5) A 1.ª sessão legislativa teve início em 10 de Março de 2005, e só conhecerá o seu termo em 15de Junho de 2006;
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6) O projecto de resolução n.º 69/X constitui uma renovação da proposta de referendo que já foi rejeitada, nesta sessão legislativa, por decisão do Sr. Presidente da República, pelo que,
7) A sua admissão viola o disposto nos referidos artigos da Constituição da República Portuguesa.
3 - Desde logo, cumpre esclarecer uma questão prévia decorrente de um erro contido da petição de recurso, porquanto, ao contrário do afirmado no ponto 2), não existe "integral coincidência" entre a denominação do projecto de resolução n.º 69/X, que "Propõe a realização de um referendo sobre a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez realizada nas primeiras dez semanas" e a denominação do novo projecto de resolução n.º 9/X, que "Propõe a realização de um referendo sobre a interrupção voluntária da gravidez realizada por opção da mulher nas primeiras dez semanas".
4 - Para além de não existir identidade subjectiva de iniciativas, existem igualmente diferenças de substância ao nível da exposição de motivos e da própria pergunta a formular aos eleitores em sede de referendo, sendo certo que existem diferenças técnicas entre os conceitos jurídicos de despenalização e de descriminalização subjacentes a cada um dos projectos.
5 - Em todo o caso, e independentemente da avaliação que se possa fazer da eventual similitude ao nível do objecto das iniciativas, a questão só poderia assumir relevância se se entendesse que ambas as iniciativas foram apresentadas no âmbito da mesma sessão legislativa, questão sobre a qual já esta Comissão se pronunciou, conforme parecer aprovado por maioria em 8 de Setembro de 2005, que aqui se dá por integralmente reproduzido.
6 - Efectivamente, também na sequência de requerimento do Grupo Parlamentar do CDS-PP, o Sr. Presidente da Assembleia da República solicitou parecer à 1.ª Comissão que conclui, em súmula, o seguinte:
1. "A CRP é clara ao considerar que a realização de eleições dá lugar a uma nova legislatura.
2. Da conjugação das normas constitucionais e regimentais supra citadas parece poder concluir-se que as sessões legislativas têm uma duração fixa de um ano e iniciam-se, invariavelmente, a 15 de Setembro de cada ano, independentemente das vicissitudes eleitorais e da eventual mudança de legislatura. A elasticidade da legislatura em termos de duração temporal não abrange portanto as sessões legislativas.
3. Este entendimento parece encontrar acolhimento expresso na letra do n.º 4 do artigo 167.º da CRP, ao determinar que: "Os projectos e as propostas de lei e de referendo definitivamente rejeitados não podem ser renovados na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República", o que equivale a dizer que, em caso de eleição, é possível a renovação de iniciativas previamente apresentadas na mesma sessão legislativa.
4. A ressalva introduzida no final desta norma constitucional não comporta outra interpretação senão a de que a realização de eleições não interrompe a sessão legislativa em curso, que deverá concluir-se no prazo normal.
5. Também o n.º 10 do artigo 115.º da CRP recorre a uma formulação de conteúdo idêntico ao estatuir que: "As propostas de referendo recusadas pelo Presidente da República ou objecto de resposta negativa do eleitorado não podem ser renovadas na mesma sessão legislativa, salvo nova eleição da Assembleia da República, ou até à demissão do Governo." Infere-se assim que a solução normativa contida no n.º 4 do artigo 167.º da CRP não constitui uma formulação avulsa, mas antes a mais uma concretização de um princípio genérico assumido pelo legislador constitucional.
6. Se assim não fosse, estar-se-ia a alargar injustificadamente o âmbito da proibição de repetição de iniciativas legislativas ou referendárias, prevista no n.º 4 do artigo 167.º da CRP. O alargamento da primeira sessão legislativa da X Legislatura pelo tempo necessário para completar o período correspondente à sessão legislativa em curso, implicaria uma violação expressa da letra do n.º 1 do artigo 47.º do RAR e precludiria a possibilidade de reapresentação de qualquer das iniciativas entretanto apresentadas por um período muito superior a um ano e como tal contrário à vontade do legislador constitucional.
7. A taxatividade da redacção do artigo 47.º do RAR não comporta outras interpretações ao afirmar peremptoriamente que a sessão legislativa tem a duração de um ano, iniciando-se a 15 de Setembro (…).
8. A presente solução interpretativa é igualmente a mais vantajosa do ponto de vista da salvaguarda dos direitos da oposição.
9. Deste modo, independentemente da designação jurídica do período que decorre entre 20 de Fevereiro e 14 de Setembro de 2005 - "5.ª sessão legislativa", "sessão legislativa autónoma" ou "período de conclusão da sessão legislativa em curso" - conclui-se, a par com a generalidade da doutrina, que em 15 de Setembro de 2005 se iniciará uma nova sessão legislativa, com todas as implicações que daí advêm.
7 - O Presidente da Assembleia da República ouviu a Conferência de Líderes sobre o parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais relativo ao início da sessão legislativa, o qual recolheu o apoio dos Grupos Parlamentares do PS e do BE e a oposição do PSD, PCP, CDS-PP e Os Verdes. Nessa consonância, o Sr. Presidente da Assembleia da República concluiu que a Conferência de Líderes emitiu, por maioria, opinião favorável ao conteúdo do parecer.
8 - Ainda na sequência da aprovação do parecer emitido pela 1.ª Comissão, outros constitucionalistas se pronunciaram. O Prof. Jorge Miranda, em declarações à TSF de 15 de Setembro de 2005, precisou o sentido
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da sua posição ao considerar: "Na minha opinião não estamos numa nova sessão legislativa. A sessão em curso é a que começou com o início da legislatura".
9 - Por seu lado, o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, em declarações transcritas pelo Diário de Notícias de 20 de Setembro de 2005, juntou-se ao conjunto maioritário dos constitucionalistas, ao afirmar a propósito desta questão: "A posição que eu entendo, juridicamente, é a de que (se) começa uma nova sessão legislativa, então é possível apresentar o projecto. É a minha posição o PS pode apresentar o projecto".
10 - Nestes termos, não tendo havido qualquer alteração significativa de ordem formal ou substancial ao nível dos argumentos que fundaram o anterior parecer emitido, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias mantém a posição anterior relativamente à questão de fundo controvertida, concluindo que os projectos de resolução n.os 9/X e 69/X não deram entrada nem foram admitidos no âmbito da mesma sessão legislativa.
11 - Pelo que não existe qualquer impedimento legal ou constitucional que possa obstar à admissibilidade do projecto de resolução n.º 69/X, não tendo, concomitantemente, fundamento legal o recurso interposto pelo Grupo Parlamentar do Partido Popular, porquanto quer a argumentação de facto, quer a de direito, assentam em pressupostos que não se verificam.
Assembleia da República, 22 de Setembro de 2005.
O Deputado Relator, Vitalino Canas - O Presidente da Comissão, Osvaldo Castro.
Nota: O parecer foi aprovado, com votos a favor do PS e do BE e votos contra do PSD, do PCP e do CDS-PP.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.