O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Página 1

Quinta-feira, 8 de Abril de 2010 II Série-A — Número 61

XI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2009-2010)

SUMÁRIO Projectos de lei [n.os 196 a 205/XI (1.ª)]: N.º 196/XI (1.ª) — Estabelece o regime laboral e social dos investigadores científicos e do pessoal de apoio à investigação (apresentado pelo BE).
N.º 197/XI (1.ª) — Disciplina a ocupação urbanística no litoral para prevenir e minimizar os riscos de erosão costeira (apresentado pelo BE).
N.º 198/XI (1.ª) — Cria o observatório da pobreza e da exclusão social (apresentado pelo BE).
N.º 199/XI (1.ª) — Cria o regime de integração excepcional dos docentes contratados (apresentado pelo BE).
N.º 200/XI (1.ª) — Isenção de obrigações contabilísticas gerais por parte das microentidades (apresentado pelo CDSPP).
N.º 201/XI (1.ª) — Garante a vinculação dos professores contratados e promove a estabilidade do corpo docente das escolas (apresentado pelo PCP).
N.º 202/XI (1.ª) — Altera a Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto (Estatuto do Bolseiro de Investigação) e enquadra o bolseiro de investigação no regime geral de segurança social (apresentado pelo CDS-PP).
N.º 203/XI (1.ª) — Consagra o efeito suspensivo dos recursos previstos na Lei de Imigração (apresentado pelo BE).
N.º 204/XI (1.ª) — Cria os gabinetes jurídicos e reforça mecanismos de acesso ao direito nas zonas internacionais (apresentado pelo BE).
N.º 205/XI (1.ª) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, estabelecendo a impossibilidade de suspensão dos serviços públicos essenciais em situações de carência económica (apresentado pelo BE).
Projectos de resolução [n.os 99 a 101/XI (1.ª)]: N.º 99/XI (1.ª) — Recomenda ao Governo que corrija as anomalias detectadas na alienação dos fogos aos moradores dos Bairros das Amendoeiras e dos Lóios, assim como a fixação de um regime de rendas mais justas (apresentado pelo CDS-PP).
N.º 100/XI (1.ª) — Recomenda a ratificação do Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (apresentado pelo BE).
N.º 101/XI (1.ª) — Adopta medidas de reforço do acolhimento e acompanhamento dos alunos imigrantes (apresentado pelo BE).

Página 2

2 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

PROJECTO DE LEI N.º 196/XI (1.ª) ESTABELECE O REGIME LABORAL E SOCIAL DOS INVESTIGADORES CIENTÍFICOS E DO PESSOAL DE APOIO À INVESTIGAÇÃO

Exposição de motivos

A importância da Ciência, da Tecnologia e da Inovação: A Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) constituem domínios de importância decisiva para o desenvolvimento económico e social do País. No entanto, ao nível do investimento em recursos humanos — uma das áreas-chave para uma política estratégica de CT&I — têm sido escassas as medidas concretas capazes de superar o atraso estrutural com que Portugal se defronta e, sobretudo, de conferir neste âmbito consistência, robustez e sustentabilidade ao Sistema Nacional Científico e Tecnológico (SNCT).
Os números falam por si. Em 2005 os recursos humanos afectos em Portugal a actividades de investigação e desenvolvimento (I&D) situavam-se em cerca de 0,9% do emprego total, correspondendo a metade do valor registado na Europa a 27 (1,5% do emprego total)1. Mesmo estabelecendo comparações com outros países do sul, o valor obtido em Portugal é claramente inferior às percentagens registadas em Espanha, Itália ou Grécia, próximas da média europeia. Encontramo-nos, pois, ainda muito longe da União relativamente ao peso dos investigadores na população activa e, também por essa razão, afastados dos seus índices estruturais de desenvolvimento científico.
Sendo certo que Portugal regista um crescimento global das despesas em I&D, situado em cerca de 3,7% entre 2001 e 2007, deve, contudo, assinalar-se que este aumento decorre da maior participação do sector privado (acréscimo de 8,8%), do sistema de ensino superior (2,8%) e de entidades não lucrativas (5,4%), dado que o investimento público registou uma redução de cerca de 5% entre 2001 e 2007.
Esta situação tem paralelo nos dados relativos a recursos humanos afectos a actividades de I&D. Entre 2001 e 2007 a redução de pessoal de investigação a tempo inteiro nos laboratórios do Estado é de cerca de 7%, registando-se um aumento nos restantes sectores: 3,5% nas entidades de investigação não lucrativas e nas instituições de ensino superior e cerca de 12,2% na investigação desenvolvida por empresas.
Para além das questões do financiamento e do contingente de recursos humanos, trata-se igualmente de um problema de qualificação. De acordo com a Comissão Europeia, em 2006 o peso dos trabalhadores altamente qualificados nas áreas da ciência e tecnologia no total da população activa era de apenas 9,8%.
Trata-se do valor mais baixo da União a 27 (a par do registado pela Roménia), situando-se a média europeia em 15,4%, num ranking’ que ç liderado por países como o Luxemburgo, a Dinamarca e a Suécia, e cujos valores representam o dobro face a Portugal.
A aposta nos recursos humanos é, por isso, uma estratégia fundamental para inverter esta situação, sendo necessário não só aumentar significativamente o número de investigadores e os seus níveis de qualificação, mas também — e sobretudo — promover uma consolidação efectiva do emprego científico, apostando claramente na melhoria das condições de exercício de actividades de investigação.

A precariedade como regra: Actualmente as bolsas de investigação são praticamente a única saída para quem quer fazer investigação científica em Portugal. Não existe um mercado de emprego científico consistente e o próprio Estado tem uma responsabilidade muito grande no não reconhecimento dos investigadores científicos enquanto trabalhadores de pleno direito.
O modelo de financiamento das unidades de investigação tem imposto constrangimentos estruturais às instituições de I&D, impedindo a promoção da estabilidade profissional e a consolidação dos seus recursos humanos e das estratégias de investigação. Por isso temos assistido, nos últimos anos, à degradação das condições de trabalho no sistema científico e tecnológico nacional. As restrições impostas à renovação dos quadros de pessoal incentivam a utilização abusiva da figura do bolseiro de investigação para trabalhos que não são de investigação, ou o recurso a bolsas de formação avançada em gestão da ciência para trabalhos de 1 EUROSTAT (2009), R&D Expenditure and Personnel, Eurostat Pocketbooks, Science, Technology and Innovation in Europe.

Página 3

3 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

investigação. Esta política tem conduzido à generalização de situações de emprego não declarado, altamente precário, privado de direitos e desprotegido, que tendem a prolongar-se instavelmente no tempo.
É, por isso, urgente uma dignificação daqueles que exercem actividades científicas. O bolseiro não é apenas um estudante que trabalha, mas um profissional que prossegue a sua formação, desempenhando actividades de investigação.
A Carta Europeia do Investigador, de 2005, é, aliás, inequívoca nesta matéria, considerando na sua definição de investigador todos quantos «se encontram nos primeiros quatro anos de formação, incluindo o período da formação pela investigação». Consagra ainda, nestes termos, que «todos os investigadores que seguem uma carreira de investigação devem ser reconhecidos como profissionais e tratados como tal», devendo «este reconhecimento (») começar no início da sua carreira, nomeadamente a nível pós graduado, e incluir todos os níveis».
A Carta Europeia do Investigador recomenda ainda que «As entidades empregadoras e/ou financiadoras dos investigadores devem garantir que estes beneficiem de condições justas e atraentes de financiamento e/ou salários com regalias de segurança social adequadas e equitativas. Estas condições devem abranger os investigadores em todas as fases de carreira», incluindo as fases de formação, enquanto bolseiros. Significa isto, portanto, que os montantes das bolsas devem ser equiparados às remunerações de trabalhadores de carreira com habilitações equivalentes às dos bolseiros em causa, bem como as respectivas condições de trabalho, contratuais e de protecção social.
Estas recomendações da Comissão Europeia, vertidas na Carta Europeia do Investigador, colocam assim Portugal perante um enorme desafio: um contingente significativo de bolseiros em situação precária, desprovidos de direitos sociais básicos, e nos quais assenta parte fundamental da produção científica nacional. Com efeito, aos trabalhadores científicos das carreiras de docência do ensino superior, de investigação científica e de técnico superior vieram juntar-se na última década bacharéis, licenciados, mestres, doutores, entre outros. O enquadramento em que actualmente desenvolvem a sua actividade é o de bolseiros (na maior parte dos casos) ou o de avençados, contratados e estagiários ou, simplesmente, o de «voluntários», sem qualquer outro tipo de enquadramento laboral e legislativo.
O recurso à bolsa por parte das unidades de I&D tornou-se tão recorrente que, em muitos casos, e contrariando o EBI, os bolseiros passaram a garantir necessidades permanentes destas unidades. Muitos investigadores recebem bolsas consecutivas sem terem a perspectiva de alguma vez virem a obter um vínculo jurídico-laboral cuja natureza lhes assegure um conjunto de direitos sociais elementares. Esta situação, que desde há muito tempo é amplamente conhecida pela comunidade científica, pelo próprio Governo e pela população em geral, tem sido sistematicamente ignorada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, apesar das permanentes promessas de alteração da situação profissional em que se encontram milhares de bolseiros.
A celebração de contratos de trabalho constitui a única via para se pôr fim à utilização abusiva da figura de bolseiro. São os bolseiros que estão a preencher lacunas dos quadros de pessoal das instituições e a satisfazer necessidades permanentes dos serviços. São também utilizados em projectos de investigação que, embora de carácter temporário, configuram verdadeiras relações de trabalho subordinado, independentemente do maior ou menor pendor formativo inerente às funções desempenhadas.
O recurso a contratos de trabalho, por oposição a bolsas, inclusivamente para doutorandos, tem paralelo noutros países da União Europeia, como a Alemanha, Áustria, Dinamarca, Holanda e Noruega. Noutros países ainda, como a Espanha, Grécia e Suécia, existe um sistema misto para os doutorandos: durante os primeiros dois anos beneficiam de uma bolsa e nos restantes anos é celebrado um contrato de trabalho. Sendo evidente a existência de uma componente de formação intrínseca à actividade científica, o contrato de trabalho sublinha o inegável carácter laboral da actividade, garantindo o acesso a mais direitos e a uma maior protecção social aos investigadores.
É inegável reconhecer que o direito à segurança social se encontra fortemente limitado pelo enquadramento aplicável actualmente aos bolseiros, o regime do Seguro Social Voluntário. Este regime temse revelado desadequado face à natureza da actividade do bolseiro, pois confere uma protecção social mínima, muito aquém do que seria justo e necessário face à natureza do trabalho efectivamente realizado.
Esta situação configura uma discriminação injustificada que, estendendo-se aos bolseiros de pósdoutoramento, afecta inclusivamente investigadores que já terminaram a fase formal da sua formação. Tudo

Página 4

4 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

isto contraria as mais recentes recomendações da Comissão Europeia, segundo as quais: «os Estadosmembros devem envidar esforços para garantir que os investigadores beneficiem de uma cobertura adequada em matéria de segurança social».
Reconhecendo as insuficiências actuais, é de resto a própria legislação (o Estatuto do Bolseiro, a Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto) que prevê, em situações específicas como a doença e a maternidade, uma protecção adicional dos bolseiros. Esta protecção prevista na lei é, no entanto, largamente desrespeitada por instituições financiadoras e de acolhimento, o que constitui um incumprimento grave e que tem vindo a ser denunciado. No entanto, mesmo com estas denúncias, a tutela não tem actuado. Acresce ainda que continua por regulamentar o «acesso a cuidados de saúde» por parte dos bolseiros, previsto no artigo 11.º da já citada Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto.
O programa do actual Governo afirma explicitamente, na página 56 relativa ao Compromisso com a Ciência, que «será garantido, a todos os investigadores doutorados, um regime de protecção social idêntico ao dos restantes trabalhadores, incluindo os actuais bolseiros, assegurando-se, ainda, o cumprimento integral, em Portugal, das recomendações europeias relativas às carreiras dos investigadores e às suas condições de mobilidade». O reconhecimento das lacunas existentes em termos de protecção social de muitos trabalhadores altamente qualificados que hoje asseguram a existência do Sistema Nacional Científico e Tecnológico deve, contudo, estender-se a todos os investigadores e a todo o pessoal técnico que assegura o desenvolvimento da actividade científica do nosso país. A garantia de uma protecção social semelhante à dos trabalhadores que beneficiam do Regime Geral da Segurança Social deve resultar do próprio reconhecimento destas pessoas enquanto trabalhadores e trabalhadoras, através dum contrato de trabalho. Por isso, é necessário um novo entendimento e valorização dos investigadores, definindo bolsas para a formação e garantindo contratos de trabalho para a generalidade das situações que hoje, na ausência dessa responsabilidade, se mantêm num regime de precariedade inaceitável.

As propostas do Bloco de Esquerda: Com o presente projecto de lei o Bloco de Esquerda pretende consagrar, entre outros aspectos:

— Regras claras de atribuição de bolsas para os estudantes que iniciam o contacto com a investigação e sempre que esteja associada à actividade de investigação uma componente explícita de formação de carácter curricular, como a realização de disciplinas ou a participação em seminários, correspondentes à proporção de créditos das unidades curriculares; — A celebração de contratos de trabalho para todos os investigadores integrados em projectos de investigação, para todos os investigadores experientes, para os investigadores em formação que não estejam em período explicitamente curricular, bem como para o pessoal que desenvolve actividades de apoio à investigação; — Um regime de protecção social dos trabalhadores por conta de outrem para os investigadores e pessoal de apoio à investigação, bem como a atribuição das prestações sociais, garantidas como direitos, nas eventualidades de doença, parentalidade e adopção, riscos profissionais, desemprego, invalidez, velhice, morte, encargos familiares, entre outras; — A atribuição do subsídio de desemprego com um prazo de garantia de 180 dias de trabalho num período de 12 meses imediatamente anterior à data do desemprego e de subsídio social de desemprego com um prazo de 90 dias de trabalho por conta de outrem num período de oito meses imediatamente anterior à data do desemprego; — A possibilidade de efectuar o pagamento retroactivo de contribuições correspondentes à protecção em caso de desemprego, por parte das entidades a que o trabalhador tenha estado vinculado durante o período relevante para efeitos do preenchimento do prazo de garantia; — A definição de um regime de remuneração para os investigadores em formação compatível com as suas qualificações e com os encargos decorrentes da sua actividade.

Nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o seguinte projecto de lei:

Página 5

5 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Capítulo I Disposições gerais

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma estabelece o regime laboral e social dos investigadores científicos e do pessoal de apoio à investigação, definindo regras de celebração de contratos de bolsa, celebração de contratos de trabalho, regime de segurança social e protecção no desemprego, tendo em consideração a especificidade própria das profissões abrangidas.

Artigo 2.º Âmbito subjectivo

A presente lei é aplicável aos bolseiros de integração na investigação, aos bolseiros de investigação no âmbito de programas de investigação, aos bolseiros que desenvolvem investigação para obtenção de grau académico ou de formação científica de pós-doutoramento, bem como ao pessoal de apoio às actividades de investigação científica, nomeadamente aos bolseiros de gestão de ciência e tecnologia e aos bolseiros técnicos de investigação.

Artigo 3.º Definições

1 — Para efeitos da presente lei são considerados bolseiros de investigação científica:

a) Os estudantes que beneficiam de bolsas de integração na investigação; b) Os investigadores em formação que beneficiam de bolsas para o desenvolvimento de actividades de investigação conducentes à obtenção de grau académico de mestrado ou doutoramento.

2 — Para efeitos da presente lei são considerados investigadores científicos:

a) Os investigadores que desenvolvam actividade de investigação no âmbito de projectos de investigação científica em centros de investigação ou empresas; b) Consideram-se investigadores experientes os investigadores titulares de grau de doutoramento, dedicados a trabalhos avançados de investigação ao abrigo de programas de trabalhos sujeitos a orientação científica, vocacionados para a formação científica e a valorização académica.

3 — Para efeitos da presente lei é considerado pessoal de apoio às actividades de investigação científica:

a) Os técnicos que prestam apoio ao funcionamento e à manutenção de equipamentos e infra-estruturas laboratoriais de carácter científico, ou desenvolvem outras actividades relevantes para o sistema científico e tecnológico nacional; b) Os licenciados, mestres e doutores que exerçam actividades de gestão organizacional e administrativa de programas de ciência, tecnologia e inovação, ou de monitorização do sistema científico, tecnológico ou do ensino superior em instituições de investigação científica.

Artigo 4.º Programas e financiamento

1 — O ingresso de investigadores e pessoal de apoio em programas de investigação científica processa-se mediante a aprovação de candidaturas apresentadas junto das entidades financiadoras, de acordo com os

Página 6

6 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

respectivos regulamentos, e pressupõe a admissão do investigador e do pessoal de apoio numa entidade de acolhimento, de acordo com os respectivos critérios de admissão.
2 — Compete à Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) elaborar e publicitar os regulamentos de acesso e frequência dos programas, planos e actividades de investigação por si financiadas.
3 — As demais entidades financiadoras de programas, planos e actividades de investigação devem submeter os respectivos regulamentos de ingresso e frequência à aprovação da FCT.
4 — As entidades financiadoras, bem como as entidades de acolhimento de programas, planos ou actividades de investigação, devem facultar a todos os interessados informação suficiente e atempada acerca dos regulamentos aplicáveis ao respectivo ingresso e frequência.
5 — Os programas, planos ou actividades de investigação previstos na presente lei têm carácter transitório, visando garantir as condições de iniciação de actividades formativas em contexto de investigação ou de obtenção do grau académico e não se destinam a satisfazer necessidades permanentes de ensino ou investigação das entidades de acolhimento.

Capítulo II Regime de contratação

Secção I Bolseiros e investigadores

Artigo 5.º Contratação

1 — São celebrados contratos de bolsa nos casos abrangidos pelo n.º 1 do artigo 3.º da presente lei.
2 — São celebrados contratos de trabalho nos casos abrangidos pelos n.os 2 e 3 do mesmo artigo.

Artigo 6.º Contratos de bolsa

1 — São celebrados contratos de bolsa com os estudantes que, nos anos iniciais de formação, participam em actividades científicas em equipas de projectos de investigação e quando à actividade de investigação está associada uma componente explícita de formação de carácter curricular, tal como a realização de disciplinas ou a participação em seminários, desde que as unidades curriculares tenham uma carga de créditos igual ou superior a um sexto do total de créditos.
2 — No caso de actividades de investigação científica vocacionados para a formação cientifica e obtenção de grau académico, os contratos de bolsa são celebrados unicamente para efeitos do período correspondente à proporção de créditos das unidades curriculares, sendo aplicável para o restante período o disposto no artigo 7.º.
3 — No âmbito de um contrato de bolsa são concedidos subsídios, que se designam bolsas, e que são atribuídos mediante contrato celebrado entre o bolseiro e uma entidade financiadora.
4 — É proibido o recurso a bolseiros de investigação para a satisfação de necessidades permanentes dos serviços.
5 — Sempre que for violada a disposição prevista no número anterior, a entidade acolhedora é obrigada a integrar o respectivo investigador nos seus quadros.

Artigo 7.º Contrato de trabalho

1 — São obrigatoriamente celebrados contratos de trabalho:

a) Em todas as actividades de investigação desenvolvidas no âmbito de projectos de investigação em instituições científicas e tecnológicas, bem como em empresas;

Página 7

7 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

b) Com os investigadores experientes titulares do grau de doutoramento, em projectos de investigação científica e em projectos de trabalho vocacionados para a formação científica e valorização académica; c) Durante todo o período subsequente ao período de formação correspondente à proporção de créditos das unidades curriculares referido no n.º 2 do artigo anterior.

2 — Os contratos de trabalho a termo celebrados entre os investigadores em formação e as entidades financiadoras têm a duração mínima de seis meses, renováveis, não podendo, porém, exceder a duração de:

a) Três anos, no caso de contratos de iniciação a actividades de investigação científica, desenvolvimento tecnológico, experimentação ou transferência de tecnologia e de saber; b) Quatro anos, no caso de contratos inseridos em programas de obtenção do grau académico de doutoramento.

3 — A estes contratos aplica-se a legislação em vigor, de acordo com as especificidades previstas na presente lei.

Secção II Investigadores experientes

Artigo 8.º Contratos de trabalho

Com os investigadores experientes são celebrados contratos de trabalho, nos termos da legislação em vigor, com as devidas adaptações, salvo nos casos em que estejam previstos vínculos e regimes de contratação mais favoráveis para o investigador.

Artigo 9.º Acesso a carreiras de investigação

1 — Os estatutos e regulamentos internos das entidades de acolhimento de programas, planos ou actividades de investigação em formação devem prever mecanismos de integração nos seus quadros dos investigadores que cessem os respectivos contratos, tendo cumprido os objectivos neles previstos.
2 — O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, através da Fundação para a Ciência e Tecnologia, deve criar mecanismos institucionais e financeiros de apoio à progressiva inserção de recursos humanos qualificados nas unidades de I&D.

Secção III Disposições comuns

Artigo 10.º Regime de dedicação

1 — Os contratos de trabalho com os investigadores devem estabelecer um número de horas semanais de referência consideradas exigíveis para a prossecução das actividades de investigação constantes dos respectivos planos de trabalho, de acordo com informação prestada pela entidade de acolhimento.
2 — Os investigadores em formação podem exercer outras actividades por conta própria ou por conta de outrem que não prejudiquem a prestação das horas de referência exigidas para a prossecução das actividades de investigação e que não sejam consideradas incompatíveis com essas actividades.
3 — O exercício de actividades em acumulação com a investigação deve ser autorizado pela FCT, mediante parecer favorável do orientador do programa de doutoramento.
4 — A organização do trabalho respeita, obrigatoriamente, entre dois períodos de trabalho diário, um período de descanso de duração não inferior a 12 horas.

Página 8

8 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Artigo 11.º Regime de remuneração

1 — A tabela remuneratória dos investigadores em formação é equiparada à das categorias definidas pelo Estatuto da Carreira de Investigação Científica (ECIC), fazendo corresponder esses níveis salariais com as actividades desenvolvidas e a formação académica detida pelo investigador em formação.
2 — São atribuídas aos investigadores em formação as verbas necessárias para fazer face aos seguintes encargos:

a) Inscrição, matrícula ou propinas relativas ao tipo de actividade do investigador em formação; b) Execução gráfica da tese; c) Apresentação de trabalhos em reuniões científicas; d) Actividades de formação complementar em território nacional ou no estrangeiro.

3 — Caso a actividade seja exercida no estrangeiro, o investigador em formação tem ainda direito a:

a) Subsídio de manutenção mensal, para além da remuneração, indexada ao custo de vida do país do destino; b) Subsídio de transporte para a viagem de ida no inicio de actividade e de regresso no final da actividade; c) Subsídio de instalação para estadias iguais ou superiores a seis meses.

Artigo 12.º Local de trabalho

Por local de trabalho entende-se o local habitual onde o investigador desenvolve a sua pesquisa ou realiza a sua prestação ou serviço.

Artigo 13.º Causas de cessação do contrato

1 — São causas de cessação do contrato:

a) O decurso do prazo pelo qual o contrato foi celebrado; b) A revogação por mútuo acordo; c) O incumprimento reiterado das cláusulas contratuais ou regulamentares estabelecidas; d) A prestação de falsas declarações.

2 — No caso de incumprimento por parte da entidade de acolhimento o investigador pode requerer à FCT a cessação do respectivo contrato, tendo nesse caso direito a uma indemnização compensatória.
3 — Caso se verifique o manifesto incumprimento da responsabilidade de supervisão é facultada ao investigador a possibilidade de mudança de orientador, mantendo o contrato de trabalho.

Secção IV Pessoal de apoio à investigação científica

Artigo 14.º Contrato de trabalho do pessoal de apoio às actividades de investigação científica

1 — As instituições de investigação públicas ou privadas celebram contratos de trabalho com os técnicos de apoio à investigação científica, nos termos da legislação em vigor, com as devidas adaptações, salvo nos casos em que estejam previstos vínculos e regimes de contratação mais favoráveis para o trabalhador.

Página 9

9 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 — As instituições de investigação públicas ou privadas proporcionam ao pessoal técnico de apoio à investigação científica um estatuto remuneratório compatível com as suas funções, e o direito à protecção social.
3 — O pessoal de apoio às actividades de investigação científicas é abrangido pelo regime de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem, com as especificidades do capítulo seguinte, salvo no caso de estarem abrangidos por regime de protecção social mais favorável.

Capítulo III Protecção social

Artigo 15.º Regime geral

Os investigadores científicos com contrato de trabalho são abrangidos obrigatoriamente pelo regime de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem, previsto na legislação em vigor, com as adaptações contidas neste diploma, independentemente do seu vínculo.

Artigo 16.º Inscrição obrigatória

1 — É obrigatória a inscrição dos investigadores científicos e das respectivas entidades financiadoras no regime geral da segurança social, sendo estas as responsáveis pela inscrição dos investigadores.
2 — Os investigadores comunicam aos serviços respectivos da segurança social o início da sua actividade profissional ou a sua vinculação a uma nova entidade empregadora.

Artigo 17.º Contribuições

1 — Os investigadores científicos e as respectivas entidades financiadoras são obrigados a contribuir mensalmente para o financiamento do regime geral da segurança social dos trabalhadores por conta de outrem.
2 — As contribuições mensais são determinadas pela incidência das percentagens fixadas sobre as remunerações de acordo com o regime geral aplicável aos trabalhadores por conta de outrem.
3 — As contribuições mensais dos investigadores são descontadas sobre o montante das respectivas remunerações e entregues aos serviços respectivos da segurança social pela entidade financiadora em conjunto com a sua própria contribuição.

Artigo 18.º Condições de atribuição das prestações

A atribuição das prestações do regime geral dos trabalhadores por conta de outrem aos investigadores científicos depende do decurso de um prazo de garantia mínimo de contribuições ou de situação equivalente prevista no presente diploma.

Artigo 19.º Atribuição das prestações

1 — Todos os investigadores científicos têm direito à atribuição de prestações sociais, garantidas como direitos, nomeadamente nas seguintes eventualidades:

a) Doença; b) Parentalidade e adopção;

Página 10

10 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

c) Riscos profissionais; d) Desemprego; e) Invalidez; f) Velhice; g) Morte; h) Encargos familiares; i) Pobreza, disfunção, marginalização e exclusão sociais; j) Ausência e insuficiência de recursos económicos dos indivíduos e dos agregados familiares para satisfação das suas necessidades mínimas e para promoção da sua progressiva inserção social e profissional; l) Outras situações previstas na lei.

2 — Para os efeitos da presente lei considera-se que a união de facto produz os efeitos do casamento.

Artigo 20.º Prestações na eventualidade de desemprego

Constituem critérios fundamentais para a determinação do montante das prestações substitutivas de rendimentos do trabalho de investigação o nível de rendimentos e o período de contribuições.

Artigo 21.º Montante do subsídio de desemprego

1 — O montante diário do subsídio de desemprego é igual a 70% da remuneração de referência e calculado na base de 30 dias por mês.
2 — A remuneração de referência corresponde à remuneração média diária definida por R/360, em que R representa o total das remunerações registadas nos primeiros 12 meses civis que precedem o 2.º mês anterior ao da data do desemprego.
3 — Para efeitos do disposto no número anterior, só são consideradas as importâncias registadas relativas a subsídios de férias e de Natal devidos no período de referência.

Artigo 22.º Prazos de garantia

1 — O prazo de garantia para atribuição do subsídio de desemprego é de 180 dias de trabalho por conta de outrem, com o correspondente registo de remunerações, num período de 12 meses imediatamente anterior à data do desemprego.
2 — O prazo de garantia para atribuição do subsídio social de desemprego é de 90 dias de trabalho por conta de outrem, com o correspondente registo de remunerações, num período de oito meses imediatamente anterior à data do desemprego.

Artigo 23.º Período de concessão das prestações de desemprego

1 — O período de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego inicial é estabelecido em função da idade do beneficiário na determinação do período de concessão e nos acréscimos, nos seguintes termos:

a) Beneficiários com idade inferior a 30 anos: 360 dias, com acréscimo de 30 dias por cada cinco anos com registo de remunerações; b) Beneficiários com idade igual ou superior a 30 anos e inferior a 40 anos: 540 dias, com acréscimo de 30 dias por cada cinco anos de registo de remunerações nos últimos 20 anos;

Página 11

11 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

c) Beneficiários com idade igual ou superior a 40 anos e inferior a 45 anos: 720 dias, com acréscimo de 30 dias por cada cinco anos de registo de remunerações nos últimos 20 anos; d) Beneficiários com idade superior a 45 anos: 900 dias, com acréscimo de 60 dias por cada cinco anos de registo de remunerações nos últimos 20 anos.

2 — Para efeitos do disposto no número anterior são considerados os períodos de registo de remunerações posteriores ao termo da concessão das prestações devidas pela última situação de desemprego.
3 — Nas situações em que o trabalhador não tenha beneficiado dos acréscimos previstos no n.º 1, por ter retomado o trabalho antes de ter esgotado o período máximo de concessão da prestação inicial de desemprego, os períodos de registo de remunerações que não tenham sido considerados relevam, para efeitos de acréscimo do período de concessão de prestações, em posterior situação de desemprego.

Artigo 24.º Subsídio social de desemprego subsequente ao subsídio de desemprego

O período de concessão do subsídio social de desemprego, quando atribuído subsequentemente ao subsídio de desemprego, tem uma duração correspondente a 80% dos períodos fixados no n.º 1 do artigo anterior, tendo em conta a idade do beneficiário à data em que cessou a concessão do subsídio de desemprego.

Artigo 25.º Relevância dos períodos de trabalho

1 — Nas situações em que ocorra a eventualidade de desemprego, o período de trabalho de investigação prestado, ou equivalente, imediatamente anterior à ocorrência da situação de desemprego é considerado para efeitos do cumprimento do prazo de garantia.
2 — A remuneração total relevante, para efeitos de apuramento da remuneração de referência, tem em conta as remunerações pagas durante o período de trabalho imediatamente anterior à ocorrência da situação de desemprego.
3 — Para cálculo da remuneração total relevante, para efeitos de apuramento da remuneração de referência, incluem-se ainda os montantes auferidos pela atribuição de bolsa constantes da presente lei e ao abrigo da Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto, bem como as remunerações auferidas durante o mesmo período.

Artigo 26.º Pagamento retroactivo de contribuições

Pode ser efectuado o pagamento retroactivo das contribuições correspondentes à protecção em caso de desemprego, por parte das entidades às quais o investigador tenha estado vinculado ou a auferir bolsa, durante o período relevante para efeitos do preenchimento do prazo de garantia.

Artigo 27.º Requerimento de pagamento retroactivo

1 — Os investigadores abrangidos pela presente lei podem requerer à instituição processadora do vencimento ou da bolsa o pagamento retroactivo das contribuições para efeitos de verificação dos prazos de garantia e reconhecimento do direito às prestações de desemprego, devendo indicar o período de actividade relativamente ao qual se pretende que a retroacção opere.
2 — O requerimento deve ser instruído com os seguintes elementos:

a) Documento que constitua meio de identificação;

Página 12

12 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

b) Declaração do requerente onde constem a actividade exercida, os períodos de tempo a considerar para efeitos de retroacção e os elementos de identificação das respectivas instituições processadoras dos vencimentos; c) Meios de prova relativos às situações laborais ou concessão da bolsa invocadas.

Artigo 28.º Encargos

Os encargos decorrentes da aplicação do presente diploma são suportados por verbas inscritas nos orçamentos dos organismos e serviços do Estado ou empresas e laboratórios de entidades privadas a que os investigadores tenham estado vinculados.

Capítulo IV Disposições finais

Artigo 29.º Extensão

O regime estabelecido na presente lei aplica-se, com as devidas adaptações, em tudo o que não seja contrariado pelo direito comunitário e pelo direito internacional, aos investigadores científicos portugueses a desenvolver actividade no estrangeiro e aos investigadores científicos estrangeiros a desenvolver actividade em Portugal, sempre que os respectivos contratos sejam celebrados com entidades nacionais.

Artigo 30.º Regulamentação

O Governo deve proceder à regulamentação da presente lei no prazo de 60 dias após a sua publicação.

Artigo 31.º Adaptação de regulamentos de bolsas de investigação científica

Os regulamentos de bolsas de investigação científica em vigor ao abrigo da Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto, devem adaptar-se ao disposto na presente lei, no prazo de 60 dias a contar da publicação da sua regulamentação, sem prejuízo dos direitos e obrigações já constituídos.

Artigo 32.º Regime transitório

O disposto na presente lei é aplicável à renovação das bolsas de investigação já existentes à data da sua entrada em vigor.

Artigo 33.º Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação do Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Assembleia da República, 26 de Março de 2010.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Moura Soeiro — José Manuel Pureza — Luís Fazenda — José Gusmão — Francisco Louçã — Ana Drago — Pedro Soares — Heitor Sousa — Rita Calvário — Mariana Aiveca — Cecília Honório — Pedro Filipe Soares — Helena Pinto — Catarina Martins — Fernando Rosas.

———

Página 13

13 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

PROJECTO DE LEI N.º 197/XI (1.ª) DISCIPLINA A OCUPAÇÃO URBANÍSTICA NO LITORAL PARA PREVENIR E MINIMIZAR OS RISCOS DE EROSÃO COSTEIRA

Exposição de motivos

A erosão costeira é das situações ambientais mais urgentes para Portugal, resultante de uma superfície marítima 18 vezes superior à área terrestre e de 70% da população residir no litoral.
Mais de 1/3 da orla costeira corre risco significativo de erosão, valor que tende a aumentar de forma relevante se as previsões de subida do nível médio do mar devido às alterações climáticas se registarem e pelo agravamento da variabilidade meteorológica.
Segundo o estudo mais completo sobre o impacto das alterações climáticas em Portugal, conhecido como SIAM II, um dos efeitos mais importantes será uma significativa erosão do litoral. Em relação à subida do nível do mar, as previsões apontam para uma subida do nível médio do mar entre 25 a 110 cm até 2100, o que se traduz num risco de erosão para 67% do litoral e numa taxa de recuo da costa médio de 1 metro.
Os invernos mais rigorosos registados nos anos de 2005 e 2006 colocaram em evidência os pontos de maior fragilidade, em concreto na Costa da Caparica e em Aveiro Norte, onde houve necessidade de medidas de emergência para impedir a destruição de agregados habitacionais. Também este ano as condições meteorológicas foram motivo de preocupação no Algarve, na zona da Lagoa de Óbidos e em todo o Norte Litoral, nomeadamente entre a Figueira da Foz e Ovar.
As causas principais da erosão costeira são humanas e estão associadas a alterações a nível das bacias hidrográficas e da dinâmica sedimentar resultantes da construção de barragens, extracção de areias e dragagens; à ocupação humana sobre dunas, praias, arribas e outras zonas vulneráveis; à construção de estruturas rígidas de defesa costeira, como quebra-mares e esporões; à fragilização dos sistemas dunares por acções como terraplanagens, acesso às praias, parques de estacionamento.
A Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável aponta que os «fenómenos de erosão na faixa costeira e de degradação das arribas são de gravidade significativa e têm fundamentalmente três causas:

1 — Diminuição do afluxo de sedimentos, sobretudo a partir dos anos 1950, na sequência da construção de barragens; 2 — Ocupação desordenada da faixa litoral, com construção de habitações e infra-estruturas; 3 — Subida eustática do nível do mar em consequência da expansão térmica oceânica.
Os troços de litoral submetidos a erosão marinha mais intensa no território continental correspondem às áreas de costa baixa arenosa (como os sistemas dunares e as zonas húmidas).»

A importância de prevenir e minimizar os riscos de erosão: Actualmente, é amplamente reconhecido pela comunidade científica e muitas autoridades públicas que o combate eficaz à erosão costeira deve dar prioridade a medidas preventivas e de minimização de riscos através do reforço do ordenamento e planeamento do território.
O recurso a obras de engenharia pesada ou à alimentação artificial de praias é cada vez mais entendido como uma medida de emergência para proteger aglomerados populacionais e evitar a perda de bens no curto prazo, sendo que nenhuma política para a defesa da orla costeira se pode limitar à resposta perante a ameaça de calamidade. Até porque a eficácia destas medidas é frequentemente nula e os seus custos financeiros e impactes ambientais elevados.
Como refere o Professor Veloso Gomes, numa comunicação de 2007, em relação às estruturas de defesa costeira, frequentemente estas «transferem ou antecipam os problemas de erosão para sotomar, como exigem manutenção periódica (»), constituem intrusões paisagísticas e podem transmitir uma falsa sensação de segurança que encoraja a ocupação em zonas de risco». Sobre a alimentação artificial de praias, quando em ambientes marítimos muito energéticos, como é o caso da costa oeste portuguesa, «podem ser completamente ineficazes se não forem realizadas em situações de contenção natural ou artificial da deriva da zona costeira, exigem recargas periódicas e têm impactes negativos locais a nível de turvação e balnear».
É importante, por isso, adoptar medidas preventivas que reduzam os riscos.

Página 14

14 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Disciplinar a ocupação urbanística no litoral, contrariando os processos de artificialização da orla costeira, em especial das zonas mais vulneráveis, é fundamental para conter o avanço do mar e a erosão costeira e proteger pessoas e bens perante estes fenómenos.
A legislação portuguesa já reconhece a necessidade de disciplinar esta ocupação urbanística, como é o caso do Decreto-Lei n.º 302/90, de 26 de Setembro, que «Define o regime de gestão urbanística do litoral», dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC) ou da Lei n.º 54/2005, de 15 de Novembro, que «Estabelece a titularidade dos recursos hídricos».
Acontece que no regime de gestão urbanística do litoral as disposições são vagas e enunciados de princípios. Em relação aos POOC, estes apresentam várias debilidades, como seja não traduzirem um contínuo da orla costeira no conjunto (por exemplo, não abrangem os estuários e as zonas sob jurisdição das administrações portuárias), como não definem com clareza zonas de risco, zonas com restrições à edificabilidade, zonas naturais «tampão» ou não contêm disposições para a responsabilização dos projectistas, promotores e autoridades licenciadoras pela segurança das novas edificações e empreendimentos. Quanto ao regime da titularidade dos recursos hídricos, é previsto que uma área ameaçada pelo mar possa ser classificada como «zona adjacente», a qual estará sujeita a restrições de utilidade pública, nomeadamente pela definição de áreas de ocupação edificada proibida ou edificada condicionada. No entanto, falha em clarificar a forma como se estabelecem os riscos e a vulnerabilidade que permitam a classificação de áreas como de «zona adjacente» e aplicar as adequadas restrições de utilidade pública.
Como resultado, continua-se a verificar uma ocupação desordenada do litoral, de expansão e densificação dos núcleos urbanos ou construção casuística, ignorando a realidade de vulnerabilidade das zonas de implantação.
O objectivo da presente iniciativa legislativa é precisamente o de responder às debilidades da legislação actual, avançando com a necessidade de elaboração de cartas de risco e delimitação de zonas vulneráveis à erosão costeira, tendo em conta a evolução da dinâmica costeira, a que se associam restrições à ocupação urbanística ajustadas aos diferentes níveis de risco e vulnerabilidade identificados. Conhecer os riscos, identificar as zonas vulneráveis, clarificar as restrições à ocupação é fundamental para sustentar o planeamento do território.
A decisão política precisa de ter os instrumentos necessários para conhecer antecipadamente quais os locais de maior risco e vulnerabilidade, programar a adaptação dos territórios às transformações que são previsíveis ou inevitáveis e ajustar os Planos de Ordenamento da Orla Costeira e os Planos Municipais de Ordenamento do Território para que estes reflictam um programa de planeamento consistente com medidas de protecção da costa numa perspectiva de crescente adversidade futura.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Capítulo I Disposições gerais

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma estabelece a obrigatoriedade de elaboração de cartas de risco marítimo e delimitação de zonas vulneráveis ao avanço do mar e erosão costeira, tendo em vista disciplinar a ocupação urbanística no litoral para prevenir e minimizar riscos.

Capítulo II Classificação de risco marítimo

Artigo 2.º Cartas de risco marítimo

1 — As cartas de risco marítimo identificam a vulnerabilidade da orla costeira ao avanço do mar, erosão costeira e demais acções directas ou indirectas do mar sobre a zona costeira, classificando as áreas por zonas de vulnerabilidade baixa, média e alta de acordo com os riscos identificados.

Página 15

15 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 — São consideradas zonas de vulnerabilidade alta as áreas da orla costeira sujeitas a elevados riscos, tais como as zonas de drenagem natural, as zonas em risco de erosão intensa, as zonas susceptíveis de abatimento, escorregamento, avalanches ou outras situações de instabilidade, bem como as zonas de elevado risco perante acontecimentos extremos, tais como galgamentos e inundações.
3 — Para efeito dos números anteriores, as cartas de risco marítimo contemplam a evolução da dinâmica costeira e das condições climáticas, identificando o possível agravamento da ocorrência e intensidade do avanço do mar e processos erosivos no médio e longo prazo nas várias áreas da orla costeira.
4 — As zonas identificadas nas cartas de risco marítimo são integradas nos planos de ordenamento do território, nomeadamente nos planos de ordenamento da orla costeira, nos planos das regiões hidrográficas e nos planos directores municipais.
5 — As cartas de risco marítimo são documentos de acesso público, devendo ser disponibilizadas para consulta livre na internet.
6 — As cartas de risco marítimo são actualizadas a qualquer momento sempre que novos dados científicos relacionados sejam validados e as autoridades públicas competentes identifiquem novos factores ou zonas de risco e vulnerabilidade.

Artigo 3.º Competências

1 — Compete ao Instituto da Água (INAG, IP) a elaboração das cartas de risco marítimo, a sua monitorização e actualização.
2 — Nas zonas de ligação entre o mar e as bacias hidrográficas a classificação dos níveis de vulnerabilidade deve ser articulado entre o INAG, IP e as Administrações das Regiões Hidrográficas.
3 — Nas áreas costeiras protegidas a classificação dos níveis de vulnerabilidade deve ser articulado com o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade.

Capítulo III Restrições de utilidade pública

Artigo 4.º Zonas de vulnerabilidade alta

Nas áreas da orla costeira classificadas como zonas de vulnerabilidade alta é interdita:

a) Toda e qualquer operação de loteamento, urbanização, edificação e qualquer uso privativo que implique nova construção ou instalação de infra-estruturas e equipamentos permanentes; b) A implantação de parques de estacionamento, bem como a construção de estradas, caminhos ou outras acessibilidades; c) A implantação de apoios de praia e de infra-estruturas de náutica e recreio; d) A circulação de quaisquer veículos motorizados; e) A destruição do coberto vegetal ou alterar a morfologia do terreno; f) A implantação de infra-estruturas de água, gás, electricidade, telecomunicações ou resíduos, excepto se estas forem comprovadamente indispensáveis, não existam alternativas de localização e tenham parecer favorável vinculativo do INAG, IP.

Artigo 5.º Zonas de vulnerabilidade média

1 — Nas zonas costeiras classificadas como zonas de vulnerabilidade média é interdita toda e qualquer nova operação de loteamento, urbanização e edificação, com as excepções previstas no número seguinte.

Página 16

16 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 — Carece de parecer favorável vinculativo do INAG a construção de edifícios já devidamente licenciados ou a execução de obras de reabilitação urbana em edifícios já construídos, bem como todas as operações dispostas nas alíneas b) a f) do número anterior.

Capítulo IV Planeamento e actos administrativos

Artigo 6.º Actos administrativos

1 — São nulos e de nenhum efeito os actos administrativos que decidam favoravelmente pedidos de informação prévia em zonas de vulnerabilidade alta e média que contrariem o disposto na presente lei.
2 — Caducam após a entrada em vigor do presente diploma os pedidos de autorização ou licenciamento de operações de loteamento, urbanização ou edificação em zonas de vulnerabilidade alta e média, mesmo com pedido de informação prévia válido, que contrariem o disposto na presente lei.
3 — O disposto no número anterior aplica-se aos pedidos de autorização ou licenciamento de operações de loteamento, urbanização ou edificação decididos favoravelmente à data da entrada em vigor do presente diploma, sem que tenham sido iniciadas obras para a sua execução.

Artigo 7.º Operações urbanas

1 — Quando os terrenos objecto de autorização ou licença de loteamento, de urbanização ou edificação válida se insiram, total ou parcialmente, em zonas da orla costeira, os alvarás devem conter, obrigatoriamente, a menção explícita à classificação de vulnerabilidade constante na carta de risco marítimo.
2 — O titular de autorização ou licença de loteamento, urbanização e edificação em zonas da orla costeira assume um termo de responsabilidade civil e efectua o pagamento de uma caução proporcional à classificação de vulnerabilidade constante na carta de risco.
3 — O termo de responsabilidade e a caução dispostos no número anterior destinam-se a cobrir a eventual ocorrência de acidente grave, catástrofe ou calamidade com prejuízos em vidas, bens ou para o meio ambiente resultante dos riscos marítimos identificados nas cartas de risco.

Artigo 8.º Planos Municipais de Ordenamento do Território

1 — As plantas de síntese dos Planos Municipais de Ordenamento do Território (PMOT) devem incluir a delimitação das zonas de vulnerabilidade e o seu nível de risco, a uma escala adequada.
2 — Os regulamentos dos PMOT devem estabelecer as restrições estabelecidas no presente diploma às operações de loteamento, urbanização e edificação para as zonas de vulnerabilidade, bem como as medidas adicionais que se considerem necessárias para fazer face a riscos naturais ou acontecimentos extremos em toda a faixa costeira, nomeadamente através de normas específicas para a edificação, sistemas de protecção e de drenagem e medidas para a manutenção e recuperação das condições de permeabilidade dos solos.

Capítulo V Fiscalização

Artigo 9.º Contra-ordenações

1 — A violação do disposto nos artigos 4.º, 5.º e 7.º por parte dos proprietários ou de titulares de outros direitos sobre os prédios é punível com contra-ordenação, competindo ao INAG, IP, câmaras municipais e autoridades policiais o levantamento dos autos e a aplicação das coimas.

Página 17

17 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 — O montante das coimas é graduado entre o mínimo e o máximo fixado pela Lei n.º 58/2005, de 29 de Dezembro, na sua redacção actual.

Capítulo VI Disposições finais e transitórias

Artigo 10.º Disposição transitória

1 — Até à entrada em vigor das restrições e interdições nos regulamentos dos PMOT a que se refere o artigo 8.º, e quando esteja em causa a ocupação de solos que se localizem na faixa costeira nos termos do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 302/90, de 26 de Setembro, os requerentes de pedido de informação prévia ou de autorização ou licença de loteamento, urbanização ou edificação devem fazer prova, através de estudo adequado, de que a operação em causa não é susceptível de pôr em perigo a segurança de pessoas e bens.
2 — São nulos os actos administrativos que violem o disposto no número anterior.

Artigo 11.º Regulamentação

O Governo regulamenta o presente diploma no prazo de 180 dias.

Artigo 12.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da publicação da regulamentação.

Assembleia da República, 26 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Rita Calvário — Ana Drago — Luís Fazenda — José Gusmão — Francisco Louçã — José Manuel Pureza — Pedro Soares — Heitor Sousa — Mariana Aiveca — Cecília Honório — Pedro Filipe Soares — Helena Pinto — Catarina Martins — Fernando Rosas — José Moura Soeiro.

———

PROJECTO DE LEI N.º 198/XI (1.ª) CRIA O OBSERVATÓRIO DA POBREZA E DA EXCLUSÃO SOCIAL

Exposição de motivos

Os escassos e, muitas vezes, manifestamente desactualizados indicadores sociais de que dispomos demonstram-nos que a crise social no nosso país irá agudizar-se profundamente nos próximos tempos.
Conforme dados recentemente divulgados pelo Eurostat, existiam, em 2007, 1,9 milhões de cidadãos em Portugal a sobreviver com menos de 414 euros por mês. Os números relativos ao crescimento da taxa de desemprego, ao número de beneficiários de prestações sociais e os testemunhos de inúmeras instituições na área do apoio social deixam adivinhar o agravamento do flagelo da pobreza e da exclusão social.
O número de desempregados inscritos nos centros de emprego voltou a aumentar. No final do mês de Fevereiro de 2010 estavam inscritos, nos centros de emprego do Continente e regiões autónomas, 561 315 desempregados. Estes dados são, contudo, inferiores àqueles apresentados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), que já havia registado 547,7 mil desempregados no terceiro trimestre de 2009, e que, relativamente ao último trimestre de 2009, aponta para uma população desempregada estimada de 563,3 mil indivíduos.
A maioria dos desempregados não tem direito, contudo, ao subsídio de desemprego, e, aqueles a quem é reconhecido esse mesmo direito, têm assistido à diminuição gradual das prestações que lhes são atribuídas.

Página 18

18 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Segundo o Boletim do Ministério do Emprego e da Segurança Social de Novembro, só 353 387 pessoas receberam algum subsídio, incluindo o subsídio de desemprego e o subsídio social de desemprego. Segundo o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), Portugal registará uma taxa de desemprego de cerca de 11% em 2010.
No que respeita ao Rendimento Social de Inserção (RSI), em Janeiro de 2010 existiam 396 270 beneficiários, o que implica um aumento de 17% face ao período homólogo e de 2% face a Dezembro de 2009. Este aumento foi motivado, essencialmente, pelo aumento do desemprego e pela proliferação dos baixos salários. Segundo o Estudo de Janeiro de 2010 da OCDE OCDE Social, Employment and Migration, entre os 26 países da OCDE, «Portugal é o país com um menor rendimento mínimo (RSI) e que equivale, no caso de uma pessoa solteira e sem filhos, a 31 por cento do rendimento médio, um valor que não chega às fronteiras de rendimento que separam um pobre de um não pobre em termos oficiais. E, se forem considerados os apoios dados em vários países para assegurar a habitação (algo que Portugal não faz), o rendimento social de inserção português cai mesmo para o segundo lugar entre os menos generosos». Em Novembro de 2009, cada beneficiário recebia, em média, 93 euros.
Os idosos continuam a ser, igualmente, os mais flagelados pela pobreza. Em Portugal, segundo dados oficiais, um milhão de idosos aufere pensões inferiores a 450 euros mensais. Até 11 de Dezembro de 2009 240 820 idosos recebiam o Complemento Solidário para Idosos, que constitui uma prestação destinada aos casos extremos de pobreza. Deste universo, 65% não chegava a receber 100€ mensais.
Os organismos que se dedicam às áreas sociais têm alertado para o aumento significativo dos pedidos de auxílio e têm alertado, igualmente, para a necessidade de accionar um esforço conjugado no sentido de promover o combate eficaz à pobreza e exclusão social.
Em 17 de Outubro de 2007, Dia Internacional pela Erradicação da Pobreza, deu entrada na Assembleia da República a petição n.º 407/X (3.ª), da iniciativa da Comissão Nacional Justiça e Paz e outros cidadãos, num total de 21 268 subscritores, aos quais acresceram ainda 2015 subscrições on-line. Esta petição visava solicitar à Assembleia da República o reconhecimento da «pobreza como uma violação dos direitos humanos», o estabelecimento de um «limiar oficial» da pobreza e a criação de «um mecanismo parlamentar de observação, acompanhamento e avaliação das políticas públicas para a sua erradicação».
Várias entidades subscreveram este documento, nomeadamente a Caritas Nacional, Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), Associação Nacional de Direito ao Crédito (ANDC), CIVILIS — Associação para a Cidadania e Desenvolvimento, Conselho Português para a Paz e Cooperação, Fórum Abel Varzim, Comissão Justiça e Paz dos Refugiados, entre muitas outras.
O relatório final da petição n.º 407/X (3.ª), para o qual foi nomeada relatora a Deputada do Bloco de Esquerda Helena Pinto, veio reconhecer, na generalidade, a legitimidade das pretensões dos peticionantes.
No sentido de assegurar o cumprimento do disposto na Resolução n.º 10/2008, de 19 de Março, na qual a Assembleia da República estatuiu «assumir a missão específica de observação permanente e acompanhamento da situação da pobreza em Portugal, no âmbito parlamentar», a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (CACDLG) incluiu no seu parecer que deveria ser criado um grupo de trabalho, no âmbito desta Comissão, para esse mesmo efeito.
A CACDLG decidiu ainda apresentar um projecto de resolução, subscrito por Deputados dos Grupos Parlamentares do PS, PSD, PCP, CDS-PP e Bloco de Esquerda, onde estabeleceu como objectivos: declarar solenemente que a pobreza conduz à violação dos direitos humanos; recomendar a definição de um limiar de pobreza em função do nível de rendimento nacional e das condições de vida padrão na nossa sociedade; recomendar a avaliação regular das políticas públicas de erradicação da pobreza; e recomendar que o limiar de pobreza estabelecido sirva de referência obrigatória à definição e à avaliação das políticas públicas de erradicação da pobreza.
Não obstante a unanimidade gerada à volta das considerações presentes neste documento, ainda não foram implementadas as medidas necessárias à sua operacionalização, pelo que o Governo reduziu a deliberação da Assembleia da República a uma mera declaração de intenções, sem qualquer aplicação prática.
É consensual que vivemos um período de profunda crise económica e social. O corte nas verbas afectas a prestações sociais, nomeadamente no RSI, previsto no Orçamento do Estado para 2010, irá agudizar esta crise. Assim como as medidas propostas no Programa de Estabilidade e Crescimento que prevêem, entre

Página 19

19 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

outras, a diminuição de investimento público, a «definição de um tecto de despesa para prestações sociais do regime não contributivo da segurança social, incluindo no Rendimento Social de Inserção»; a alteração do regime de subsídio de desemprego; a «aceleração da convergência do regime de pensões CGA com o regime geral da segurança social».
Neste contexto, torna-se imperativo conhecer a verdadeira amplitude do flagelo da pobreza e exclusão social no nosso país. Os dados de que dispomos, apesar de, já de si, bastante alarmantes, são parcelares e não nos permitem obter uma visão realista da dimensão da situação social e económica em que vive actualmente a população portuguesa.
A definição de indicadores rigorosos, tanto a nível quantitativo como qualitativo, é indispensável não só para traçar um retrato fidedigno da pobreza e exclusão social como também para a construção de políticas e programas estratégicos para o seu combate e para a avaliação dessas mesmas medidas.
Tal como o ex-Presidente do Conselho Económico e Social, Dr. Bruto da Costa, alerta, são necessários, nomeadamente, estudos longitudinais que permitam a percepção de qual a evolução económica e social das famílias portuguesas. Segundo um estudo de uma equipa de investigadores do Centro de Estudos para a Intervenção Social (CESIS), que acompanhou uma mesma amostra durante seis anos, 47% das famílias portuguesas passaram pela pobreza em pelo menos um ano.
O parecer do Conselho Económico e Social, relativamente ao Plano Nacional de Acção para a Inclusão (PNAI) 2006-2008, denunciou, entre outras coisas, a falta da necessária informação de base que tornou o diagnóstico pouco exigente e parcelar, não abordando, por vezes, os verdadeiros problemas. No documento por este órgão foi igualmente apontada a ausência de indicadores estruturais mais amplos que possibilitariam «medir o impacte das acções na pobreza, no emprego, na qualificação dos recursos humanos, na distribuição da riqueza, etc.».
O FNGIS — Fórum Não Governamental para a Inclusão Social — partilha, também no que diz respeito ao PNAI 2006-2008, algumas dessas preocupações, nomeadamente no que concerne à necessidade de «obter uma maior qualificação dos indicadores quantitativos, nomeadamente através da inclusão de mecanismos de participação e observação alargada» e à ausência de «mecanismos evidentes de promoção do conhecimento actualizado e permanente em relação aos fenómenos de pobreza e exclusão social». Verifica-se que o PNAI 2008-2010 padece exactamente dos mesmos defeitos.
A preocupação com esta situação levou o Bloco de Esquerda a defender um conjunto de iniciativas, visando contribuir para a resolução e dos problemas da pobreza e da exclusão social em Portugal.
A criação do Observatório da Pobreza e Exclusão Social que propomos neste projecto de lei terá, nesta perspectiva, uma enorme importância. Este observatório assumirá um papel primordial, constituindo-se, por excelência, como um órgão de observação, investigação pesquisa, recolha e sistematização de dados, partilha de informação relativa à pobreza e exclusão social e promover a reflexão sobre as medidas adequadas à resolução dos problemas, bem como acompanhamento e avaliação das medidas aplicadas. Este organismo deverá, obviamente, assumir-se como um parceiro consultivo privilegiado dos organismos governamentais, nomeadamente do Ministério do Trabalho e Segurança Social, no que diz respeito à elaboração de legislação e à definição de políticas concretas de combate à pobreza e exclusão social.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Âmbito e finalidade

A presente lei cria o Observatório da Pobreza e da Exclusão Social, no âmbito do Ministério com a tutela da segurança social.

Artigo 2.º Atribuições

1 — O Observatório da Pobreza e da Exclusão Social tem como atribuições a observação, investigação, pesquisa, recolha e sistematização de dados, partilha de informação, promover a reflexão sobre as medidas

Página 20

20 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

adequadas à resolução dos problemas relativos à pobreza e exclusão social e de acompanhamento e avaliação das medidas aplicadas no seu combate, bem como apresentar recomendações às entidades com intervenção na área da segurança social.
2 — Para efeito do número anterior, o Observatório da Pobreza e da Exclusão Social pode, através dos seus membros, consultar peritos e parceiros sociais do sector em estudo.
3 — O Observatório da Pobreza e da Exclusão Social deve desenvolver e propor ao Governo uma série de indicadores a serem utilizados na definição da pobreza e exclusão social, sendo que os mesmos devem espelhar, sempre que possível, especificidades regionais, étnicas, de classe etária e de género.
4 — O Observatório da Pobreza e da Exclusão Social deve rege-se pelo princípio de intercâmbio de informação, devendo facilitar a transferência do conhecimento para os vários parceiros sociais que trabalham na área e facilitar a colaboração, em particular com instituições universitárias, centros de pesquisa e outros observatórios.

Artigo 3.º Estudos e relatórios

1 — O Observatório da Pobreza e da Exclusão Social poderá elaborar os estudos e relatórios globais ou sectoriais que entenda necessários para a prossecução das suas atribuições.
2 — O Observatório da Pobreza e da Exclusão Social deverá apresentar até 31 de Março de cada ano um relatório sobre a evolução da pobreza e exclusão social na sociedade portuguesa, relativamente ao ano anterior, à Assembleia da República, para apreciação.
3 — O Observatório deve ainda incluir no relatório anual a apresentar à Assembleia da República as recomendações que considere pertinentes quanto a medidas globais ou sectoriais a adoptar com vista a melhorar o funcionamento do sistema de segurança social.
4 — Anualmente, o grupo de trabalho criado no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (CACDLG), que assume a missão específica de observação permanente e acompanhamento da situação da pobreza em Portugal, deverá, em estreita colaboração com a comissão especializada permanente da Assembleia da República com competência específica na área da segurança social, elaborar, publicar e divulgar um parecer sobre o relatório do Observatório da Pobreza e da Exclusão Social referido no número anterior.

Artigo 4.º Dever de informação

É dever de todas as entidades públicas cooperar com o Observatório da Pobreza e da Exclusão Social na prossecução das suas atribuições e fornecer todas as informações que por este lhes sejam solicitadas.

Artigo 5.º Regulamentação

O Governo regulamentará o presente diploma no prazo de 90 dias, devendo estipular a composição do Observatório, que deverá integrar três personalidades de reconhecido mérito na área da segurança social, o mandato dos seus membros e as regras de funcionamento interno desta entidade, nomeadamente no que respeita às condições de instalação, os recursos humanos, materiais e financeiros indispensáveis ao seu funcionamento e respectivo modo de actuação.

Artigo 6.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da publicação da sua regulamentação.

Assembleia da República, 26 de Março de 2010.

Página 21

21 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

As Deputadas e os Deputados do BE: Helena Pinto — José Manuel Pureza — Ana Drago — Luís Fazenda — José Gusmão — Francisco Louçã — Pedro Soares — Heitor Sousa — Rita Calvário — Mariana Aiveca — Cecília Honório — Pedro Filipe Soares — Catarina Martins — Fernando Rosas — José Moura Soeiro.

———

PROJECTO DE LEI N.º 199/XI (1.ª) CRIA O REGIME DE INTEGRAÇÃO EXCEPCIONAL DOS DOCENTES CONTRATADOS

Exposição de motivos

O sistema educativo português conta há anos com milhares de educadores e professores contratados a prazo. Estes profissionais, que na prática desenvolvem as mesmas actividades dos docentes que se encontram integrados nos quadros, têm-se visto sistematicamente excluídos dos lugares efectivos das escolas.
De facto, em muitos casos a única e enorme diferença dos educadores e professores contratados em relação aos que integram os quadros é a permanente precariedade a que estão sujeitos, não sabendo exactamente onde irão leccionar no ano lectivo seguinte — se irão sequer leccionar no ano lectivo seguinte — e o que será feito dos projectos em que se envolveram no estabelecimento escolar em que prestavam serviço.
Ora, é manifesto que esta instabilidade laboral é prejudicial para o desempenho das suas funções. No exacto momento em que começam a conhecer e a desenvolver projectos no âmbito da sua escola em contacto com uma determinada comunidade educativa, logo são transferidos para outra escola, onde têm que recomeçar tudo de novo.
É também claro que o sistema educativo necessita destes profissionais — as escolas onde leccionam necessitam e contam com o seu trabalho e o seu empenho. Contrariamente à justificação para a existência de milhares de contratados nas escolas, que tem sido avançada por sucessivos responsáveis governamentais, estes não satisfazem necessidades transitórias das escolas, nem se ficam pela substituição de educadores ou professores. As estimativas que apontam para que um quarto dos professores do sistema educativo público são contratados mostram à sociedade como estes, na verdade, asseguram necessidades permanentes das nossas escolas públicas.
Muitos destes profissionais perpetuam a sua condição de contratados — muitas vezes há mais de uma década —, o que constitui uma situação de grande injustiça e a manutenção de uma situação de precariedade laboral inaceitável. Muitos deles apostaram na sua qualificação e profissionalização, mas nem por isso viram o seu esforço recompensado.
O sistema educativo não pode continuar de costas voltadas para estes profissionais, mantendo-os numa situação de precariedade persistente. É necessário e urgente que os educadores e professores contratados sejam integrados nos quadros, usufruindo do direito à estabilidade profissional, à dignidade e reconhecimento das funções que desempenham e aos direitos que advêm da sua real condição laboral.
Apesar do empenho destes docentes contratados na obtenção da sua qualificação profissional, as expectativas que havia em relação ao Ministério da Educação, das quais resulta a publicação do Despacho n.º 6365/2005, foram amplamente frustradas. A seguir à profissionalização não houve qualquer processo de integração nos quadros. De facto, se olharmos para os dados relativos às colocações do último concurso externo, de 2009/2010, verificamos que foram colocados 394 docentes efectivos e cerca de 23 000 contratados (segundo os dados apresentados pelo Ministério da Educação, em http://www.minedu.pt/np3content/?newsId=313&fileName=concurso_professores_2009_1fase.pdf).
No final do segundo governo liderado por António Guterres estava em negociação entre os representantes sindicais dos professores e o então Ministro da Educação um diploma que previa a integração nos quadros dos professores contratados que prestam serviço ao sistema educativo há já vários anos. Sendo certo que esse projecto não chegou a ser publicamente discutido, e sendo certo também que essa proposta pode não responder a todas as situações, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda recupera, contudo, os seus traços principais — com as necessárias adaptações — de modo a dar resposta a uma situação de injustiça e precariedade que se arrasta há demasiado tempo.

Página 22

22 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Dada a urgência no estabelecimento de um novo enquadramento profissional dos educadores e professores contratados dos estabelecimentos de ensino pré-escolar, básico e secundário públicos, o Bloco de Esquerda propõe, através do presente diploma, a vinculação extraordinária dos docentes contratados.
O projecto de lei do Bloco tem assim os seguintes objectivos:

— Integração excepcional dos professores profissionalizados contratados, em funções de docência há mais de 10 anos, de modo a pôr fim a uma situação de precariedade laboral que tem vindo a alastrar-se de forma significativa no sistema de ensino público; — Contagem do tempo de serviço docente para efeitos de integração na estrutura da carreira docente; — Contagem do tempo de serviço docente profissionalizado para efeitos de progressão nos escalões da carreira docente; — Preenchimento efectivo de lugares que constituem necessidades reais e permanentes das escolas, por procedimentos concursais.

Nesse sentido, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei define o regime de integração excepcional dos indivíduos que tenham prestado serviço docente, em regime de contrato de trabalho a termo, em estabelecimentos de ensino pré-escolar, básico e secundário, do Continente, dependentes do Ministério da Educação.

Artigo 2.º Âmbito de aplicação

O processo de integração previsto no presente diploma aplica-se a professores e educadores que cumpram cumulativamente das seguintes condições:

a) Ser portador de qualificação profissional; b) Estar em exercício efectivo de funções docentes em regime de contrato de trabalho a termo resolutivo há mais de 10 anos; c) Ter leccionado em estabelecimento de ensino público pré-escolar, básico ou secundário num dos dois últimos anos lectivos; d) Ter obtido uma classificação de serviço não inferior a Bom.

Artigo 3.º Integração excepcional de docentes contratados

1 — São integrados em lugares de quadro de agrupamento ou de escola não agrupada, no âmbito geográfico de uma direcção regional, os indivíduos que preenchem os requisitos a que se refere o artigo anterior.
2 — Para o efeito devem os docentes requerer o respectivo provimento à Direcção-Geral dos Recursos Humanos da Educação, no prazo de 30 dias úteis após a entrada em vigor do presente diploma, mediante preenchimento de formulário a elaborar pela administração educativa para o efeito.
3 — A integração produz efeitos a 1 de Setembro de 2010, e é feita no quadro de agrupamento ou de escola não agrupada onde se situa o estabelecimento em que os docentes obtiveram colocação no ano 2009/2010.

Página 23

23 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Artigo 4.º Regime de ingresso na carreira

Os professores e educadores providos em lugares de quadro de agrupamento ou de escola não agrupada nos termos do presente diploma são integrados na estrutura da carreira docente.

Artigo 5.º Contagem do tempo de serviço

1 — O tempo de serviço docente prestado na situação de contratado para efeitos de integração na carreira é contabilizado até 31 de Agosto de 2009.
2 — Os docentes abrangidos pela presente lei ingressam no escalão da carreira correspondente à totalidade do tempo de serviço prestado na condição de portador de qualificação profissional.

Artigo 6.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte à sua publicação em Diário da República.

Assembleia da República, 26 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Ana Drago — José Manuel Pureza — Rita Calvário — Pedro Soares — Francisco Louçã — Catarina Martins — Fernando Rosas — Mariana Aiveca — Luís Fazenda — José Gusmão — Heitor Sousa — José Moura Soeiro.

———

PROJECTO DE LEI N.º 200XI (1.ª) ISENÇÃO DE OBRIGAÇÕES CONTABILÍSTICAS GERAIS POR PARTE DAS MICROENTIDADES

Exposição de motivos

Portugal tem necessidade de prosseguir uma política de simplificação de procedimentos, de forma a conseguir reduzir os custos administrativos de todas as empresas no que respeita à prestação de contas, designadamente através da Informação Empresarial Simplificada (IES).
Numa altura em que os níveis de desemprego atingem valores altíssimos, é fundamental que se faça uma aposta decidida nas empresas e no investimento privado. O papel das micro empresas na criação de emprego pode ser absolutamente decisivo e elas devem nesse sentido ser aliviadas de todas as burocracias desnecessárias.
Também no que concerne às pequenas empresas, procedeu-se muito recentemente à revisão das regras contabilísticas com o objectivo de simplificação de procedimentos.
Os domínios da contabilidade e da auditoria são, sem dúvida, fundamentais para reduzir a carga administrativa das sociedades europeias.
O Conselho Europeu de 8 e 9 de Março de 2007 salientou que a redução da carga administrativa constitui uma medida importante para estimular a economia europeia, tendo especialmente em conta os benefícios potenciais para as PME. Salientou ainda que, para reduzir a carga administrativa na União Europeia, é necessário um importante esforço conjunto da União Europeia e dos Estados-membros.
É, pois, essencial assegurar que as microentidades não são excessivamente oneradas com custos associados à prestação anual de contas.
As microentidades estão actualmente sujeitas às mesmas regras que as empresas maiores, mas verificase que as regras extensivas de prestação de informações que lhes são aplicadas não são proporcionais às suas necessidades contabilísticas específicas, dão origem a custos adicionais e podem impedir a utilização eficiente do capital para fins produtivos.

Página 24

24 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Propõe-se, pois, que se excluam as microentidades do requisito de elaboração de contas anuais. O próprio Relatório do Grupo para o Estudo da Política Fiscal propõe que seja estudada a criação de um regime contabilístico simplificado, na linha da proposta de directiva do Parlamento e do Conselho de 26 de Fevereiro de 2009, que altera a Directiva 78/660/CEE, relativa às contas anuais de certas formas de sociedade no que diz respeito às microentidades (COM(2009)0083 final).
Assim, pretende-se uma simplificação das obrigações contabilísticas das microentidades que tenha um impacto positivo na redução da carga administrativa associada à prestação de informações.
Esta medida conduzirá igualmente a uma redução das informações disponíveis para o público. No entanto, o papel das demonstrações financeiras publicadas no que diz respeito às microentidades é limitado, dado, por exemplo, os empregados dessas empresas terem geralmente contacto directo com os órgãos de gestão e o proprietário ou proprietários. No que diz respeito ao grande público, o interesse por informações sobre microentidades é, em geral, muito reduzido.
Não obstante, as microentidades manterão registos das vendas e das transacções para efeitos da sua gestão e da prestação de informações fiscais e deverão continuar a ter a possibilidade, numa base voluntária, de elaborar contas anuais, sujeitá-las a auditoria e enviá-las para o registo nacional.
Relativamente à definição de microentidade, a Recomendação 2003/361/CE, da Comissão, define as micro, pequenas e médias empresas. Contudo, as consultas efectuadas junto dos Estados-membros permitiram identificar a possibilidade de os limiares das microempresas, previstos nessa recomendação, serem demasiado elevados para efeitos contabilísticos.
Assim, considerar-se-ão microentidades as empresas que, à data do balanço, não excedem os limites de dois dos seguintes critérios: total do balanço de 400 000 euros, um volume de negócios líquido de 800 000 euros e/ou um número médio de empregados durante o exercício de 10 pessoas.
Face ao exposto, e ao abrigo das normas constitucionais, o CDS-PP apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Âmbito

A presente lei institui um regime especial que isenta de obrigações contabilísticas gerais as microentidades.

Artigo 2.º Isenção de obrigações contabilísticas gerais

1 – Nos termos da presente lei, ficam as microentidades isentas de obrigações contabilísticas gerais.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, as microentidades manterão registos das vendas e das transacções para efeitos da sua gestão, da prestação de informações fiscais e para o acesso a financiamento bancário.

Artigo 3.º Conceito de microentidades

Para efeitos da presente lei, consideram-se microentidades as empresas que cumpram dois dos seguintes requisitos:

a) Média anual de menos de 10 funcionários; b) Total do balanço inferior a 400 000 euros; c) Volume de negócios anual líquido inferior a 800 000 euros.

Artigo 4.º Exclusão da aplicação

1 – A isenção em causa não seja aplicada relativamente às obrigações de natureza fiscal e às obrigações decorrentes de pedidos de crédito.

Página 25

25 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 – A isenção prevista apenas se aplique às microentidades cujos pagamentos decorrentes de comércio transfronteiriço sejam inferiores ou iguais a 10% do total do volume de negócios anual líquido.

Artigo 5.º Norma de salvaguarda

As microentidades poderão optar pela aplicação do regime geral, podendo continuar, numa base voluntária, a elaborar contas anuais, a sujeitá-las a auditoria e a enviá-las para o registo nacional.

Artigo 6.º Regulamentação e entrada em vigor

1— O Governo regulamentará a presente lei no prazo de 90 dias após a sua publicação.
2 — A presente lei produz os seus efeitos com a entrada em vigor da lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

Palácio de São Bento, 30 de Março de 2010 Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — Paulo Portas — Nuno Magalhães — Abel Baptista — Teresa Caeiro — Hélder Amaral — João Pinho de Almeida — Telmo Correia — Artur Rêgo — Cecília Meireles — Altino Bessa — Michael Seufert — Raúl Almeida — José Manuel Rodrigues — João Serpa Oliva — Assunção Cristas — José Ribeiro e Castro — Filipe Lobo D'Ávila — Isabel Galriça Neto — Pedro Brandão Rodrigues.

———

PROJECTO DE LEI N.º 201/XI (1.ª) GARANTE A VINCULAÇÃO DOS PROFESSORES CONTRATADOS E PROMOVE A ESTABILIDADE DO CORPO DOCENTE DAS ESCOLAS

Exposição de motivos

Desde há décadas que os sucessivos governos PS, PSD, PDS/CDS-PP têm optado por uma política de educação que assenta numa intensificação da precariedade laboral e da instabilidade do corpo docente, nomeadamente no que toca à docência do 1.º, 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário.
As necessidades permanentes do sistema educativo são supridas por contratação anual de professores, sem que ingressem nos quadros de escola ou agrupamento, sendo, assim, mantidos à margem da carreira docente. Além desses professores, que durante o ano lectivo de 2010 representam cerca de 15 000, existe um vastíssimo conjunto de 15 a 20 000 professores a prestar serviço nas chamadas «actividades de enriquecimento curricular», todos sem qualquer garantia de estabilidade ou de acesso aos direitos assegurados pelo Estatuto da Carreira Docente. Ou seja, embora exista um significativo conjunto de necessidades permanentes no sistema educativo, quer seja considerado ao nível de escola, agrupamento ou mesmo regional, essas necessidades não dão lugar à necessária expectável abertura de vagas nos concursos gerais de colocação e recrutamento de professores. Aliás, nos últimos três anos a regra que o Governo adoptou para a Função Pública atingiu proporções absolutamente extraordinárias no recrutamento de professores, verificando-se apenas a entrada de um professor para cada 36 que saem do sistema de ensino.
Torna-se evidente a insuficiência do recrutamento quando observamos que no último concurso nacional geral de professores foram apenas colocados 396 professores em novas vagas para 5000 que saíram do sistema em 2009.
Mesmo neste quadro de insuficiências estruturais, a opção política do Governo do PS tem sido ensaiar ataques ao concurso nacional de colocação e recrutamento, criando cada vez mais espaço para a precariedade e instabilidade que tanto prejudicam o sistema educativo e a sua qualidade, e afectam profundamente a estabilidade familiar, social e emocional destes profissionais. O mesmo governo que se diz

Página 26

26 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

apostado no combate à precariedade laboral é o mesmo que impede objectivamente a estabilidade laboral de uma importante parte do corpo docente português, limitando sistematicamente a abertura das vagas para satisfazer as mais elementares necessidades do sistema educativo. Com esta política o Governo promove a instabilidade, a precariedade e o desemprego docente, enquanto, simultaneamente, aplica a sua política de contenção orçamental a custo da vida de milhares de professores, muitos dos quais prestando serviço há mais de 15 anos, com o mesmo empenho que os professores de carreira, sem que lhes sejam reconhecidos direitos tão fundamentais como o da progressão da carreira.
A estabilidade do corpo docente é uma condição fundamental para a estabilidade do próprio sistema educativo, das escolas e agrupamentos, que, por sua vez, são a condição para a qualidade e dignidade do ensino. A capacidade de gestão dos docentes a longo prazo é também, para as escolas e agrupamentos, uma mais-valia determinante, assim o Governo tivesse vontade política de alcançar esse objectivo. Ao contrário do que tem vindo a ser promovido pelo actual Governo PS, com o apoio tímido do PSD e do CDS-PP, o concurso nacional por lista graduada é a forma mais eficaz e, essencialmente, mais transparente, objectiva e criteriosa de proceder ao recrutamento e colocação de professores, criando comunidades docentes diversificadas mas estáveis. A oferta de escola e a autonomia escolar na contratação de professores revela-se, como já ficou claro nos «Territórios Educativos de Intervenção Prioritária», a pior das opções em todas as escalas e a sua generalização ao território nacional representaria a degradação acentuada da estabilidade do corpo docente e a arbitrariedade nos critérios de recrutamento.
Os professores contratados representam, portanto, uma importante parte do corpo docente e, na sua maioria, não se encontram a preencher tarefas pontuais. Em pergunta dirigida ao Ministério da Educação sobre o número e a situação dos professores contratados no sistema educativo português, o Governo não forneceu uma única informação sobre o universo de professores contratados ou sobre as diferentes situações laborais em que se encontram. Ou seja, é impossível aferir com precisão quantos professores contratados estão em situação justificável à luz da lei e das necessidades pontuais ou efémeras do sistema educativo. Da mesma forma, perante a ausência de resposta do Ministério, é impossível afirmar com rigor quantos professores estão contratados há mais de três anos, há mais de cinco ou há mais de 10.
No entanto, é inegável a existência de cerca de 15 000 professores contratados no ano de 2010 por um período de um ano lectivo completo, situação que reflecte uma tendência que se vem agravando ao longo dos últimos anos.
O Partido Comunista Português entende que não é possível construir uma escola pública cada vez mais capacitada para o cumprimento do seu papel, cada vez mais adequada à realidade económica, social e cultural do País sem que exista uma política laboral deste sector apostada no reconhecimento e valorização dos direitos dos professores. Por isso mesmo, é urgente assumir uma ruptura com esta política de precariedade e desestabilização do corpo docente em todas as vertentes da sua vida profissional e familiar.
Nesse sentido, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

A presente lei estabelece o regime de integração de professores contratados para exercício de funções em escolas públicas e o regime de abertura de vagas a preencher por concurso, correspondentes a necessidades permanentes dos agrupamentos de escolas ou escolas não agrupadas, bem como do sistema educativo.

Artigo 2.º Vagas para supressão de necessidades permanentes dos agrupamentos de escolas ou escolas não agrupadas, bem como do sistema educativo

São colocados a concurso para preenchimento de vagas de quadro que tenham sido preenchidas com recursos a professores contratados dos agrupamentos de escolas ou escolas não agrupadas os lugares correspondentes ao número de horários completos nos últimos três anos.

Página 27

27 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Artigo 3.º Integração dos professores contratados nos quadros do Ministério da Educação

1 — Os professores contratados com três ou mais anos de serviço são integrados em quadro a criar pelo Ministério da Educação.
2 — Aos docentes detentores apenas de habilitação própria, o Governo assegura, no prazo máximo de três anos, o acesso à profissionalização.

Artigo 4.º Quadros concelhios ou distritais

Para efeitos do previsto no n.º 1 do artigo anterior, o Ministério da Educação pode criar quadros de âmbito concelhio ou distrital, com área geográfica máxima correspondente à do distrito, nos termos a definir por decreto-lei.

Assembleia da República, 30 de Março de 2010 Os Deputados do PCP: Miguel Tiago — Rita Rato — Bernardino Soares — João Oliveira — Jorge Machado — António Filipe.

———

PROJECTO DE LEI N.º 202/XI (1.ª) ALTERA À LEI N.º 40/2004 (ESTATUTO DO BOLSEIRO DE INVESTIGAÇÃO) E ENQUADRA O BOLSEIRO DE INVESTIGAÇÃO NO REGIME GERAL DE SEGURANÇA SOCIAL

Exposição de motivos

A Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto de 2004, veio significar um considerável avanço no reconhecimento e valorização do Estatuto do Bolseiro de Investigação, tendo dado respostas assinaláveis a alguns dos problemas mais preocupantes dos bolseiros de investigação científica. Porém, numa altura em que se torna urgente e imperiosa a qualificação acrescida dos recursos humanos disponíveis para o desenvolvimento económico e social de Portugal, há que ter em conta algumas das possíveis lacunas da mesma lei para um sector que precisa de ser fortemente motivado, nomeadamente na sua ligação directa ao tecido empresarial.
De acordo com a recomendação da Comissão Europeia de 11 de Março de 2005, relativa à Carta Europeia do Investigador e ao Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores, recursos humanos suficientes e bem desenvolvidos em Investigação e Desenvolvimento (I&D) constituem a pedra angular do avanço dos conhecimentos científicos e dos progressos tecnológicos, melhorando a qualidade de vida, garantindo o bem-estar dos cidadãos europeus e contribuindo para a competitividade da Europa.
O problema é que, como também lembra a Comissão, a potencial escassez de investigadores identificada, especialmente em determinadas disciplinas-chave, constituirá uma ameaça grave ao poder inovador, ao património de conhecimentos e ao crescimento da produtividade da União Europeia num futuro próximo e poderá prejudicar a realização dos objectivos de Lisboa e de Barcelona.
Em consequência, é necessário que a Europa — e, por maioria de razão, Portugal — se torne muitíssimo mais atraente para os investigadores e reforce a participação das mulheres na investigação, contribuindo claramente para a criação das condições necessárias para carreiras de I&D mais sustentáveis e de maior interesse para os próprios investigadores, garantindo que sejam tratados como profissionais de alta qualidade em ambientes propícios a um desempenho e produtividade eficazes.
Parece óbvio que o que é recomendado pela Comissão a todo o espaço da União Europeia tem acrescida relevância para um país como Portugal, onde se verificam deficiências na aplicação e no respeito do preceituado no actual Estatuto do Bolseiro de Investigação, implicando a manutenção de alguns obstáculos desmotivadores no que diz respeito às perspectivas de carreira para os investigadores.

Página 28

28 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

A estratégia 2020 da União Europeia faz referência ao estado actual do I&D e à importância de melhorar a condições que fomentem o I&D, quando, entre outras, constata que o «I&D na Europa é inferior a 2%, em comparação com 2,6% nos Estados Unidos e 3,4% no Japão, principalmente como resultado dos baixos níveis de investimento privado. Não é apenas o valor absoluto gasto em I&D que conta: a Europa precisa de se concentrar sobre o impacto e a composição das despesas de investigação e melhorar as condições para o sector privado em I&D na União Europeia. A nossa menor proporção de empresas de alta tecnologia explica metade da nossa diferença com os Estados Unidos».
Urge, de facto, apresentar condições sólidas de desenvolvimento do trabalho de investigação científica, contribuindo também para a promoção de uma atitude pública mais positiva no sentido do reconhecimento social e laboral dos bolseiros.
Como recomenda a Comissão Europeia, melhores e mais visíveis perspectivas de carreira contribuem também de modo essencial para a promoção de uma atitude pública positiva em relação à profissão de investigador, encorajando assim mais jovens a enveredar por carreiras no domínio da investigação, incentivo tão necessário tendo em conta o atraso estrutural português neste domínio.
Entre as principais preocupações dos bolseiros de investigação constam pretensões justas e equilibradas que são contempladas nas recomendações da Comissão relativamente ao próprio Estatuto e que não parecem ser inviáveis, bem pelo contrário, tendo até em conta algumas das posições assumidas pelo actual Governo relativamente à necessidade de um maior investimento na promoção das condições de trabalho e progressão na carreira.
Qualquer intervenção legislativa nesta matéria deverá, assim, defender três princípios fundamentais, adoptando a recomendação citada da Comissão Europeia, de 11 de Março de 2005:

1 — Garantir que as entidades empregadoras ou financiadoras dos investigadores desenvolvam e mantenham uma cultura de trabalho e um ambiente propício à investigação, em que os indivíduos e grupos de investigação sejam apreciados, incentivados e apoiados e disponham do material necessário e do apoio intangível que lhes permita atingir os seus objectivos e realizar as suas tarefas. Neste contexto, deve ser dada especial prioridade à organização de condições de trabalho e de formação na fase inicial da carreira dos investigadores, dado que tal contribui para as futuras escolhas e reforça o interesse de uma carreira em I&D.
2 — Garantir que os investigadores beneficiem de uma cobertura adequada em matéria de segurança social de acordo com o seu estatuto jurídico, dando especial atenção ao respeito pelas condições das mulheres, nomeadamente em relação à maternidade.
3 — Garantir, através do Governo, o acompanhamento da aplicação do Estatuto de forma a aferir em que medida as entidades empregadoras ou financiadoras e os investigadores estão a aplicar a Carta Europeia do Investigador e o Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores, daí se consagrando uma norma específica sobre esta matéria que deixa, porém, inteira liberdade para definir a forma como se aplicará na prática.

Nestes termos, os Deputados do Grupo Parlamentar do CDS-PP, abaixo assinados, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Alteração do Estatuto do Bolseiro de Investigação

Os artigos 2.º, 9.º e 10.º do Estatuto do Bolseiro de Investigação, aprovado e publicado em anexo à Lei n.º 40/2004, de 18 de Agosto, passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 2.º Beneficiários do Estatuto

1 — O estatuto de bolseiro de investigação científica previsto no presente Estatuto é concedido:

Página 29

29 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

a) Aos beneficiários de bolsas concedidas por organismos ou serviços colocados na dependência do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior; b) Aos beneficiários de bolsas concedidas por outras entidades, ao abrigo de programas de financiamento da responsabilidade de organismos ou serviços colocados na dependência do Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, observadas as condições previstas no artigo 7.º; c) Aos beneficiários de bolsas concedidas por qualquer entidade, observadas as condições previstas no artigo 7.º.

2 — Independentemente do tipo de bolsa, são sempre exigidos a definição do objecto e um plano de actividades sujeito a acompanhamento e fiscalização, nos termos do Capítulo III.

Artigo 9.º (»)

1 — (»)

a) (») b) Obter da entidade acolhedora o apoio técnico e logístico necessário, no que respeita à organização:

(i) Das condições de trabalho, que deve ser adequada à prossecução do plano de trabalhos; (ii) Da formação inicial dos bolseiros;

c) Beneficiar do regime geral de segurança social; d) (») e) (») f) (») g) (») h) (») i) (») j) (»)

2 — Os bolseiros que sejam titulares de um vínculo jurídico-laboral ou de um vínculo à Administração Pública têm ainda direito à contagem do tempo durante o qual beneficiaram do presente Estatuto como tempo de serviço efectivo, para todos os efeitos legais.
3 — (») 4 — (»)

Artigo 10.º (»)

Os bolseiros de investigação que não se encontrem abrangidos por nenhum regime de protecção social consideram-se abrangidos pelo regime geral de segurança social.»

Artigo 2.º Acompanhamento da aplicação do Estatuto

Incumbe ao Governo o acompanhamento da aplicação do Estatuto do Bolseiro de Investigação, com o objectivo de aferir em que medida as entidades acolhedoras ou financiadoras e os investigadores aplicam a Carta Europeia do Investigador e o Código de Conduta para o Recrutamento de Investigadores.

Assembleia da República, 29 de Março de 2010

Página 30

30 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — Paulo Portas — Nuno Magalhães — João Rebelo — Abel Baptista — Teresa Caeiro — Hélder Amaral — Telmo Correia — Artur Rêgo — Cecília Meireles — Altino Bessa — Raúl Almeida — José Manuel Rodrigues — João Serpa Oliva — Assunção Cristas — José Ribeiro e Castro — Filipe Lobo D'Ávila — Isabel Galriça Neto — Pedro Brandão Rodrigues.

———

PROJECTO DE LEI N.º 203/XI (1.ª) CONSAGRA O EFEITO SUSPENSIVO DOS RECURSOS PREVISTOS NA LEI DE IMIGRAÇÃO

Exposição de motivos

A possibilidade de apresentar um recurso que tenha efeito útil perante uma determinada decisão representa um garante dos direitos de cidadãos e cidadãs.
Porém, em determinadas situações, apesar da consagração do direito ao recurso, o mesmo pode não ter o efeito de garantia dos direitos. E assim é em muitos casos do actual regime de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros de território nacional — a Lei de Imigração.
Em tais casos, apesar do cidadão estrangeiro ter o direito de recorrer das decisões, este recurso tem «efeito meramente devolutivo», que significa que o recurso não suspende a decisão que o interessado está precisamente a contestar. Portanto, mesmo que discorde de uma decisão e que tenha elementos que demonstrem que a mesma possa não estar correcta, o cidadão ou cidadã que apresente o recurso deve cumprir de imediato o que foi determinado, enquanto espera a sentença que irá recair sobre o seu recurso.
Fica claro o que acontece nestes casos. Um imigrante pode recorrer, mas está sujeito a, por exemplo, ter que regressar ao seu país de origem. Pode ter razão no que alega, pode ter provas, pode ver tudo isto confirmado na decisão do seu recurso ao tribunal, mas, entretanto, teve de abandonar o país e desorganizar completamente a sua vida.
O que está estabelecido gera situações de grande gravidade e de menor protecção jurídica dos cidadãos, especialmente numa lei onde existe um forte peso interpretativo da Administração, neste caso o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, sendo que é um dado adquirido pela própria Constituição o da importância do controlo jurisdicional das decisões administrativas.
Por outro lado, o que está consagrado pode desincentivar os cidadãos estrangeiros a apresentar recursos, a contrapor as suas razões, visto que sabem que terão de cumprir uma determinada decisão e que terão de regressar ao país de origem, ainda que considerem que a mesma possa não ser a mais justa. Assim, esta situação deve ser corrigida.
Tendo em consideração esta situação, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o presente projecto de lei, que vem no sentido de corrigir esta situação e alargar mecanismos de garantia dos cidadãos e cidadãs estrangeiros que vivem no nosso país.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma altera a Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho (Regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros em território nacional), com o objectivo de aprimorar as garantias judiciais dos imigrantes, consagrando o efeito suspensivo dos recursos previstos na Lei de Imigração.

Artigo 2.º Alterações à Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho

São alterados os artigos 39.º, 85.º, 96.º, 106.º, 150.º, 158.º, 166.º e 171.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, que passam a ter a seguinte redacção:

Página 31

31 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

«Artigo 39.º (»)

A decisão de recusa de entrada é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.

Artigo 85.º (»)

1 — (»)

a) (») b) (») c) (») d) (»)

2 — (»)

a) (») b) (»)

3 — (») 4 — (») 5 — (») 6 — (») 7 — A decisão de cancelamento é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.

Artigo 96.º (»)

1 — (») 2 — (») 3 — (») 4 — A decisão de indeferimento ou de cancelamento de autorização de residência nos termos da presente secção é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.

Artigo 106.º (»)

1 — (»)

a) (») b) (») c) (»)

2 — (») 3 — (») 4 — (») 5 — (») 6 — (»)

Página 32

32 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

7 — A decisão de indeferimento do pedido de reagrupamento familiar é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.
8 — (»)

Artigo 150.º (»)

A decisão de expulsão proferida pelo director-geral do SEF é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.

Artigo 158.º (»)

1 — Da decisão judicial que determina a expulsão cabe recurso para o Tribunal da Relação com efeito suspensivo imediato.
2 — (»)

Artigo 166.º (»)

Da decisão que determine o reenvio do cidadão estrangeiro para o Estado requerido cabe recurso para o Ministro da Administração Interna, a interpor no prazo de 30 dias, com efeito suspensivo imediato.

Artigo 171.º (»)

1 — (») 2 — (») 3 — A decisão de execução do afastamento é susceptível de impugnação judicial, com efeito suspensivo imediato, perante os tribunais administrativos.
4 — (») 5 — (») 6 — (») 7 — (»)«

Artigo 3.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia da sua publicação.

Assembleia da República, 30 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Cecília Honório — Mariana Aiveca — Luís Fazenda — Helena Pinto — José Gusmão — José Moura Soeiro — Heitor Sousa — Pedro Soares — João Semedo — Catarina Martins — Francisco Louçã — Pedro Filipe Soares — José Manuel Pureza.

———

Página 33

33 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

PROJECTO DE LEI N.º 204/XI (1.ª) CRIA OS GABINETES JURÍDICOS E REFORÇA MECANISMOS DE ACESSO AO DIREITO NAS ZONAS INTERNACIONAIS

Exposição de motivos

O acesso ao direito e tutela jurisdicional efectiva são princípios consagrados na Constituição da República Portuguesa.
No entanto, tais princípios não se aplicam em todos os lugares e para todos. É incompatível com o Estado de direito que existam locais onde o direito não chegue, o que, lamentavelmente, sucede nas zonas internacionais, nos postos de fronteira, nos aeroportos e portos.
Esta é uma situação que poderia estar ultrapassada. A Lei de Imigração — Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho — prevê, no n.º 3 do artigo 40.º, que pode ser celebrado um protocolo entre o Ministério da Administração Interna, o Ministério da Justiça e a Ordem dos Advogados para garantir a assistência jurídica a um cidadão estrangeiro não admitido nos postos de fronteira. A celebração deste protocolo poderia ser um importante passo para amenizar as injustiças nos aeroportos.
No entanto, o certo é que, desde a publicação da Lei de Imigração, este protocolo foi deixado de lado. E o Governo parece estar convencido de que o facto de o protocolo ser facultativo o legitima a não o celebrar, como se a implementação do acesso ao direito pudesse ser considerada uma questão facultativa.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, pelo contrário, tudo tem feito para sensibilizar as diferentes entidades da necessidade de fazer o acesso à justiça chegar a todos os cidadãos. Se, por um lado, a Administração verifica as entradas das pessoas no país, por outro, os cidadãos devem ter acesso a todos os meios de recurso que visem assegurar os seus direitos.
Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda escreveu ao Bastonário da Ordem dos Advogados com a finalidade de obter informações acerca da celebração do protocolo e apelar à urgência na celebração do mesmo. Como resposta foi-nos comunicado pelo Sr. Bastonário que «(») a concluir-se pela indispensabilidade da celebração do protocolo com vista a que seja ―(») garantido em tempo útil, o acesso à assistência jurídica por advogado (») Ao cidadão estrangeiro a quem tenha sido recusada a entrada em território nacional (») a expensas do próprio (») a Ordem dos Advogados colaborará com as restantes entidades — Ministério da Justiça e Ministério da Administração Interna — na concretização do mesmo».
Após esta resposta, que parece demonstrar a disponibilidade da Ordem dos Advogados para a celebração do protocolo, parece bastar para a sua concretização a iniciativa dos Ministérios da Administração Interna e da Justiça. E já por duas vezes na passada legislatura o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda fez chegar a tais Ministérios pedidos de esclarecimento, sob a forma de perguntas ao Governo — as n.os 1269/X (3.ª), 1270/X (3.ª), 1176/X (4.ª) e 1178/X (4.ª) — onde se questionam tais Ministérios quanto à intenção de implementar a assistência jurídica a estrangeiros nos postos de fronteira.
Em resposta às perguntas n.os 1269/X (3.ª) e 1270/X (3.ª) o Ministério da Administração Interna e o Ministério da Justiça responderam, em 8 de Julho de 2008, que «De momento ainda se encontra em estudo a melhor forma de articulação entre as diferentes entidades envolvidas, embora o Governo, através do Ministério da Administração Interna, em conjunto com o Ministério da Justiça, esteja empenhado e continue a promover as acções necessárias para que o protocolo seja estabelecido em breve, desde que em condições equilibradas e justas».
As outras perguntas formuladas em Fevereiro de 2009 não mereceram resposta. Entretanto, o protocolo previsto no n.º 3 do artigo 40.º da Lei de Imigração ainda está por cumprir.
Assim, permanece uma situação em que apenas quem contrate um advogado, às suas expensas, tem garantido o acesso à assistência jurídica. Esta solução, à partida, conhece duas dificuldades: a de que um estrangeiro dificilmente terá acesso a um advogado, por não conhecer os meios para encontrar advogado num país que pode não conhecer, e a de que uma pessoa poderá não ter meios económicos para contratar estes serviços.
Face a tal quadro, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta no presente projecto de lei uma proposta de criação de Gabinetes Jurídicos nas Zonas Internacionais dos Aeroportos e Portos.

Página 34

34 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Outra situação que não se pode manter é a de que, na audição com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras prevista no n.º 1 do artigo 38.º da Lei de Imigração, não é obrigatório que o cidadão estrangeiro esteja acompanhado por um advogado.
Se já em outras sedes é muito importante a presença de um advogado, esta participação é especialmente importante no âmbito da actual Lei de Imigração, onde aliada à grande discricionariedade e ampla margem de interpretação concedidas ao Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, o efeito meramente resolutivo do recurso jurisdicional das decisões retira aos cidadãos estrangeiros a possibilidade de recorrerem das decisões administrativas para o tribunal, com efeito útil.
Assim, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o presente projecto de lei, que vem garantir a assistência jurídica e a tutela jurisdicional efectiva dos cidadãos estrangeiros nas zonas internacionais, prevendo:

— A criação de Gabinetes Jurídicos nas Zonas Internacionais, implementando o acesso ao Direito e à Justiça pelos cidadãos estrangeiros; — A obrigatoriedade da presença de um advogado quando haja audição de um cidadão estrangeiro pelo Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma cria os gabinetes jurídicos e reforça mecanismos de acesso ao direito nas zonas internacionais.

Artigo 2.º Alterações à Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho

Os artigos 38.º e 40.º da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho (Aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional), passam a ter a seguinte redacção:

«Artigo 38.º (»)

1 — A decisão de recusa de entrada só pode ser proferida após audição do cidadão estrangeiro na presença de um defensor oficioso do gabinete jurídico da Ordem dos Advogados ou de advogado convocado pelo cidadão estrangeiro, e vale para todos os efeitos legais, como audiência prévia do interessado, desde que tenha sido garantido o direito à defesa.
2 — A decisão de recusa de entrada é imediatamente comunicada à representação diplomática ou consular do seu país de origem.
3 — A decisão de recusa de entrada é notificada ao interessado e ao seu defensor oficioso, com indicação dos seus fundamentos, redigidos na língua portuguesa e em língua que o cidadão estrangeiro possa entender, dela devendo expressamente constar o direito de impugnação judicial e o respectivo prazo de interposição.
4 — (anterior n.º 3) 5 — (anterior n.º 4)

Artigo 40.º (»)

1 — (»)

Página 35

35 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

2 — Ao cidadão estrangeiro a quem tenha sido recusada a entrada em território nacional é garantido, em tempo útil, o acesso à assistência jurídica por advogado.
3 — Para efeitos da garantia da assistência jurídica ao cidadão estrangeiro não admitido são colocados à sua disposição, gratuitamente, os serviços do gabinete jurídico da Ordem dos Advogados, ou pode o mesmo ser assistido por advogado livremente escolhido por si, competindo-lhe, neste caso, suportar os respectivos encargos.»

Artigo 3.º Aditamento à Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho

É aditado o artigo 8.º-A à Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho (Aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional), com a seguinte redacção:

«Artigo 8.º-A Gabinetes jurídicos

1 — São criados os gabinetes jurídicos da Ordem dos Advogados nas zonas internacionais, com o objectivo de garantir o direito à informação e à defesa dos cidadãos estrangeiros.
2 — Em cada zona internacional serão criadas instalações próprias para a instalação e funcionamento dos gabinetes jurídicos.
3 — A Ordem dos Advogados garante a presença permanente de advogados nos gabinetes jurídicos referidos no n.º 1.
4 — Os serviços prestados pelos gabinetes jurídicos são gratuitos.
5 — O Governo deve estabelecer com a Ordem dos Advogados a compensação pelos serviços prestados nos termos do presente diploma.»

Artigo 4.º Regulamentação

O Governo regulamenta o presente diploma no prazo de 60 dias.

Artigo 5.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da publicação da sua regulamentação.

Assembleia da República 30 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Cecília Honório — Mariana Aiveca — Luís Fazenda — Helena Pinto — José Gusmão — José Moura Soeiro — Heitor Sousa — Pedro Soares — João Semedo — Catarina Martins — Francisco Louçã — Pedro Filipe Soares — José Manuel Pureza.

———

PROJECTO DE LEI N.º 205/XI (1.ª) PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 23/96, DE 26 DE JULHO, ESTABELECENDO A IMPOSSIBILIDADE DE SUSPENSÃO DOS SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS EM SITUAÇÕES DE CARÊNCIA ECONÓMICA

Exposição de motivos

Mediante decisão conjunta do Parlamento e do Conselho Europeu (Decision 1098/2008/EC), de 22 de Outubro de 2008, 2010 foi proclamado o Ano Europeu para o Combate à Pobreza e Exclusão Social. Desta forma, pretende-se alertar a opinião pública para a problemática da pobreza e exclusão social e renovar o

Página 36

36 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

compromisso político da União Europeia e dos seus Estados-membros no que respeita ao combate a este flagelo, que assola cerca de 84 milhões de cidadãos europeus.
Portugal aderiu a esta iniciativa, assumindo o seu compromisso no sentido de reconhecer o direito fundamental das pessoas em situação de pobreza e exclusão social a viver com dignidade e a participar activamente na sociedade. Foi designado como autoridade nacional responsável pela organização e coordenação da participação do nosso país no Ano Europeu para o Combate à Pobreza e Exclusão Social o Instituto de Segurança Social.
Portugal, à semelhança do que acontece noutros países, vive actualmente uma profunda crise económica e social. Todos os indicadores disponíveis apontam para a agudização desta situação.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) registou, no último trimestre de 2009, uma taxa de desemprego de 10,1%. Falamos de 563,3 mil indivíduos. O Eurostat apresenta números mais densos. Segundo esta entidade, já existiam, em Outubro de 2009, 567,7 mil desempregados, o que equivale a uma taxa de desemprego de 10,3%, acima dos 10% da zona Euro e dos 9,5% da Europa dos 27. A realidade será, porém, bastante mais dramática, em consequência da subavaliação das estatísticas do desemprego. Segundo o próprio Fundo Monetário Internacional (FMI), Portugal registará uma taxa de desemprego de cerca de 11% em 2010.
Cada vez é maior o número de cidadãos que recorre às prestações sociais. Em Janeiro de 2010 existiam 396 270 beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI), o que equivale a um aumento de 17% face ao período homólogo e de 2% face a Dezembro de 2009. Até 11 de Dezembro de 2009, 240 820 idosos recebiam o complemento solidário para idosos. Segundo as organizações que se dedicam ao apoio social, o número de pedidos de ajuda também tem aumentado exponencialmente, inclusive no que respeita à solicitação de géneros alimentares.
O número de pessoas que não consegue pagar as suas dívidas e que corre o risco de ficar sem casa, que não tem recursos económicos suficientes para assegurar uma alimentação equilibrada para o seu agregado familiar e que não tem meios para garantir o acesso aos serviços públicos essenciais para a satisfação das suas necessidades básicas é cada vez maior.
O corte no investimento público, previsto no Orçamento do Estado para 2010 e no Programa de Estabilidade e Crescimento, irá agravar a crise social existente. O mesmo efeito terá o desinvestimento nas áreas sociais, nomeadamente com a imposição de um tecto nas «despesas para prestações sociais do regime não contributivo da segurança social, incluindo no Rendimento Social de Inserção», «a alteração do regime de subsídio de desemprego» e a «aceleração da convergência do regime de pensões CGA com o regime geral da segurança social».
A participação do nosso país no Ano Europeu para o Combate à Pobreza e Exclusão Social não deve resumir-se a uma mera declaração de intenções que não tem tradução efectiva no que respeita ao combate às causas da pobreza e à garantia de que todos possam viver em condições de dignidade e desempenhem um papel pleno e activo na sociedade.
Uma das condições de base da justiça social diz respeito à garantia de igualdade no acesso aos serviços públicos essenciais. Aliviar os mais carenciados dos seus encargos com as suas necessidades básicas é uma responsabilidade social. O Estado tem, por isso, um papel importante a desempenhar a estes dois níveis. Sem uma atitude pró-activa que discrimine positivamente os mais carenciados não se garante o princípio da igualdade de acesso aos serviços públicos.
Nesse sentido, o Bloco de Esquerda, assumindo o princípio da diferenciação positiva enquanto instrumento de justiça social, propõe a impossibilidade de suspensão da prestação dos serviços públicos essenciais por falta de pagamento no caso de pessoas que comprovadamente não o tenham conseguido fazer devido a carências económicas.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:

Artigo 1.º Objecto

O presente diploma estabelece a impossibilidade de suspensão da prestação de serviços públicos essenciais a utentes em situação de carência económica.

Página 37

37 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Artigo 2.º Alteração da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho

O artigo 5.º da Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro, e pela Lei 24/2008, de 2 de Junho, passa a ter a seguinte redacção:

«Artigo 5.º (»)

1 — (») 2 — (») 3 — (») 4 — (») 5 — A prestação dos serviços públicos previstos nas alíneas a), b), c), f) e g) do n.º 2 do artigo 1.º não pode ser suspensa em consequência de falta de pagamento no caso de utentes domésticos em situação de carência económica, a qual deve ser comprovada pelo utente junto do prestador do serviço mediante entrega de declaração da segurança social.
6 — Para os efeitos previstos no n.º 5, consideram-se utentes em situação de carência económica:

a) Beneficiários do subsídio social de desemprego; b) Pessoas que deixaram de usufruir do subsídio social de desemprego que permanecem em situação de desemprego ou, no caso de trabalho não subordinado, aufiram por mês um valor inferior a 50% da retribuição mínima mensal garantida; c) Beneficiários do complemento solidário para idosos.»

Artigo 3.º Regulamentação

O Governo regulamenta o presente diploma no prazo de 90 dias após a sua publicação.

Artigo 4.º Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado para o ano subsequente ao da sua publicação.

Assembleia da República, 30 de Março 2010.
As Deputadas e os Deputados do BE: Helena Pinto — Mariana Aiveca — Luís Fazenda — José Gusmão — José Moura Soeiro — Heitor Sousa — Cecília Honório — Pedro Soares — João Semedo — Catarina Martins — Francisco Louçã — Pedro Filipe Soares — José Manuel Pureza.

———

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 99/XI (1.ª) RECOMENDA AO GOVERNO QUE CORRIJA AS ANOMALIAS DETECTADAS NA ALIENAÇÃO DOS FOGOS AOS MORADORES DOS BAIRROS DAS AMENDOEIRAS E DOS LÓIOS, ASSIM COMO A FIXAÇÃO DE UM REGIME DE RENDAS MAIS JUSTAS

O Bairro dos Lóios e das Amendoeiras, situados em Chelas, na zona 1, inicialmente sob gestão do Fundo Fomento de Habitação, e posteriormente do Instituto de Gestão de Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE), foi transferido em Fevereiro de 2005, através de concurso público, para a Fundação D.

Página 38

38 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Pedro IV, num processo conturbado que preocupou desde cedo o CDS-PP, questionando então o Instituto Nacional de Habitação sobre:

— A alteração do regime de renda «fixa» que era aplicada há mais de 30 anos para um novo regime de «renda apoiada», com aumentos abruptos e significativos dessas rendas e por efeito insustentáveis para os moradores dos bairros; — E a possibilidade dos fogos poderem vir a ser adquiridos pelos moradores, como lhe havia sido prometido desde 1974.

No contexto desta e de outras iniciativas movidas pela Assembleia da República, o Governo, reconhecendo o insucesso deste processo, aprovou a recomendação de promover a reversão para o Estado do património do IGAPHE transferido para a Fundação D. Pedro IV, ficando o Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) com a responsabilidade de promover a alienação aos moradores que manifestassem o desejo de adquirir os fogos onde residem. O resultado das vendas seria aplicado na reabilitação desses bairros.
Pensando-se que com estas recentes decisões e uma nova gestão liderada pelo IHRU estariam definitivamente salvaguardados os direitos dos moradores do bairro e reunidas as condições para encerrar um complexo processo que se arrastava há vários anos sem solução, ressurgem um novo conjunto de contrariedades associadas à prossecução do processo de alienação do património, assim como a infeliz retoma da aplicação do regime de renda apoiada.
Trata-se, portanto, de um regresso ao passado e na insistência de políticas de gestão que se demonstraram desadequadas e fora do enquadramento legal que norteou a constituição daqueles bairros, distinto da habitação social tal como hoje se prevê na lei.
Acompanhando esta situação, o CDS-PP não pode deixar passar esta situação em branco. Identificou e detalhou os problemas e preocupações dos moradores dos bairros, voltando a perguntar, no presente mês, à Sr.ª Ministra do Ambiente e Ordenamento do Território se tinha conhecimento dessas situações e como as previa resolver.
Relativamente ao conflituoso processo de alienação, o Ministério já tinha conhecimento da existência das anomalias da sua concretização, concretamente ao nível da avaliação dos imóveis dos referidos bairros, através de denúncias feitas pelos moradores junto do IHRU e do respectivo Secretário de Estado, assim como através de relatórios de técnicos desse Instituto, aquando visitas ao terreno, e como tal não se entende que não tenham sido tomadas quaisquer medidas.
Dentro das anomalias detectaram-se avaliações de casas muito díspares, que, pelas informações que se dispõe, não tiveram em consideração os quatro níveis de categoria dos prédios ou o coeficiente de vetustez.
Identificaram-se, inclusive, situações de fogos totalmente idênticos que apresentavam um diferencial de avaliação superior a 5000€.
Os moradores queixam-se também, e a legislação assim o confere, que aqueles que pretendam adquirir os seus imóveis têm direito a uma redução de 0,8 no valor de construção por metro quadrado, o que aparentemente não se teve em linha de conta.
A título de exemplo, mas que atesta dos problemas existentes neste processo, foi realizada uma amostragem ao conjunto dos fogos sujeitos a alienação por técnicos do IHRU, tendo-se verificado que nos 20 processos analisados 18 continham erros.
Se na alienação das casas houve falhas graves, e ainda que não se aceite a dimensão nem a natureza das mesmas, muito menos se pode aceitar o tempo de resposta de correcção. Tratou-se de uma tentativa de resolver um problema e uma promessa feita desde início aos moradores, pelo que não se entendem as razões pelas quais este Instituto raciocinou de forma inversa na definição do regime de rendas e fez sair um ofício, IHRU, IP, a 14 de Janeiro de 2010, informando os moradores dos bairros que lhes seria aplicado o regime de renda apoiada, a partir de 1 de Abril do corrente ano.
O CDS- PP relembra que o regime da renda condicionada esteve na base do desencadear de todo esta revolta social nos Bairros das Amendoeiras e Lóios, tendo na altura o Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa decretado a suspensão da sua aplicação, pondo cobro às elevadas rendas a que os moradores estavam sujeitos, corroborado pela missiva feita pelo Provedor de Justiça Nascimento Rodrigues, que sugeriu a alteração do valor de cálculo da renda.

Página 39

39 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

Esta questão é de uma profunda injustiça para com os moradores dos bairros, que, não tendo possibilidades nem disponibilidade financeira para exercer a compra do fogo que habitam, pretendam manterse na condição de arrendatários.
O conjunto destas situações anómalas proteladas no tempo sem que haja vontade assumida, por parte deste Ministério, em resolver este assunto, tem conduzido a uma tensão social preocupante entre os vários moradores que convivem dos Bairros das Amendoeiras e Lóios, pelo que urge travar com eficácia.
Pretende-se, assim, que este Ministério proceda a uma análise rigorosa do regime de rendas aplicado aos moradores, que deverá ter em consideração a natureza da constituição daqueles bairros, distintos da habitação social, tal como hoje se prevê na lei, assim como a revisão das condições de base do processo de alienação, corrigindo as anomalias detectadas referidas anteriormente, tendo em conta o empenho revelado pelos moradores na manutenção e requalificação dessas casas, medidas estas que concorrem no sentido de uma gestão mais socialmente responsável.
Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea d) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1 — No que concerne ao processo de alienação dos fogos dos Bairros das Amendoeiras e dos Lóios e fixação do respectivo valor sejam analisadas as anomalias detectadas nesse período, designadamente os critérios utilizados para a distinção das categorias dos imóveis, assim como as obras de beneficiação que voluntariamente os moradores foram desenvolvendo a expensas suas, e se tal foi tido em consideração na fixação dos coeficientes de vetustez e de conservação dos fogos.
2 — Nos casos dos moradores, que por impossibilidade económico-financeira, não puderam ou possam exercer o direito de adquirir as suas casas, e desse modo se mantenham como arrendatários, deverá ser definido um regime jurídico justo para a renda a fixar, o qual tenha em consideração os acordos historicamente existentes com os arrendatários e os direitos que nesse âmbito lhes assistem, assim como as condições socioeconómicas do agregado familiar respectivo.

Palácio de São Bento, 22 de Março de 2010 Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — João Pinho de Almeida — Artur Rêgo.

———

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 100/XI (1.ª) RECOMENDA A RATIFICAÇÃO DO PROTOCOLO FACULTATIVO AO PACTO INTERNACIONAL SOBRE OS DIREITOS ECONÓMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

No dia 24 de Outubro de 2009 o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, assinou, em nome do Estado português, o Protocolo Facultativo (PF) ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (PIDESC).
Este Protocolo prevê que os cidadãos dos Estados-membros possam apresentar reclamações, junto das Nações Unidas (NU), relativas ao desrespeito pelos direitos previstos no PIDESC, nomeadamente no que concerne ao direito ao trabalho, aos cuidados de saúde, à alimentação, à água, à educação, ao sistema de protecção social, à habitação, à protecção da família ou, tão simplesmente, a uma existência condigna.
A possibilidade de queixa perante as instâncias das NU já estava prevista no que respeita à violação de direitos de outra natureza, direitos civis e políticos, designadamente o direito de voto, de liberdade de expressão, situações que envolvem pena de morte ou tortura, entre outros. A existência de duas convenções de direitos humanos — uma relativa aos direitos civis e políticos e outra relativa aos direitos económicos, sociais e políticos — veio, contudo, determinar a secundarização desta última e traduzir-se na inferiorização de direitos fundamentais, e dos quais depende, muitas vezes, a nossa própria sobrevivência.
A ratificação deste Protocolo, cuja criação foi apoiada desde o primeiro momento por Portugal, tornar-se-á num elemento-chave para o reconhecimento da existência destes direitos e para a sua efectiva observância e permitirá o acompanhamento do papel de Portugal no que concerne ao cumprimento dos compromissos

Página 40

40 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

assumidos a nível internacional e das recomendações emanadas da Organização das Nações Unidas (ONU) no que concerne aos direitos humanos.
O Protocolo Facultativo (PF) ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais (PIDESC) constitui um importantíssimo instrumento político no sentido do reconhecimento da obrigação, por parte dos Estados-membros, de adoptarem as medidas necessárias à realização dos direitos económicos, sociais e culturais dos cidadãos e no sentido do reconhecimento de que ninguém pode ser privado do exercício destes direitos por motivos associados à carência económica.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe à Assembleia da República que recomende ao Governo que:

Seja ratificado o Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais.

Assembleia da República, 30 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Helena Pinto — José Gusmão — José Moura Soeiro — Mariana Aiveca — Heitor Sousa — Cecília Honório — Pedro Soares — Catarina Martins — Francisco Louçã — Pedro Filipe Soares — José Manuel Pureza.

———

PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 101/XI (1.ª) ADOPTA MEDIDAS DE REFORÇO DO ACOLHIMENTO E ACOMPANHAMENTO DOS ALUNOS IMIGRANTES

No âmbito do workshop de investigação dedicado ao tema «Jovens descendentes de imigrantes na AML: resultados de um projecto de investigação europeu», de Beatriz Padilla, Alejandra Ortiz e Vera Rodrigues, investigadoras do CIES-ISCTE, que desenvolveram o estudo sobre Portugal no quadro do projecto europeu Toward a Social Construction of an European Youth-Ness: Experience of Inclusion and Exclusion in the Public Sphere among Second Generation Migrated Teenagers (TRESEGY) no período 2006-2009, foram apresentados dados muito preocupantes sobre a integração e sucesso escolares dos descendentes de imigrantes nos bairros críticos das cidades portuguesas.
Os dados comparativos entre as populações escolares descendentes de imigrantes dos bairros críticos das grandes cidades portuguesas e europeias são claros quanto ao maior peso da reprovação no percurso escolar dos nossos alunos. Segundo a investigação, mais de 2/3 dos jovens descendentes de imigrantes dos bairros da Cova da Moura e do Vale da Amoreira reprovaram pelo menos uma vez na escola. Das cidades que integram este estudo (de entre países que incluem Portugal Espanha, França, Holanda, Alemanha e Itália), Lisboa é a cidade que apresenta piores resultados, e onde a taxa de insucesso escolar entre os jovens dos 15 aos 24 anos é maior. Lisboa apresenta, relativamente ao insucesso escolar, valores próximos do dobro face aos bairros críticos de Madrid, acima de Barcelona e do Porto, e perto do triplo de Roma.
As debilidades dos sistemas de ensino dos países de origem — uma vez que estes imigrantes são oriundos, sobretudo, de África — e as dificuldades que encontram no período de transição em Portugal, a falta de coordenação entre programas de Governo, a falta de mediadores de bairro são factores negativos apontados pela investigação.
À revelia das imagens dominantes, quase metade destes jovens sentem-se discriminados por causa da cor da pele (mais de 40%) e sustentam a necessidade da intermediação de pessoas do bairro na aplicação de programas de apoio.
À revelia das imagens dominantes, é igualmente de referir que, segundo dados de 2007, a população escolar imigrante em Portugal está muito longe dos números europeus mais elevados. Se, segundo Chiffres clés de l’éducation en Europe 2009 (Eurydice/Eurostat), a percentagem da população estrangeira face à população total é de 5,8% na EU 27 e em Portugal de 4,1%, a base de dados do Pisa 2006 aponta para 7,9% de alunos de origem imigrante na EU 27 para 5,9% em Portugal.

Página 41

41 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

A necessidade de Portugal responder mais eficazmente a esta realidade obriga a sinais mais claros do que aqueles que, apesar de alguns esforços relevantes, têm sido dados nos últimos anos. É o que sublinha, por exemplo, Elsa Casimiro em «Percursos Escolares de Descendentes de Imigrantes de Origem Cabo-Verdiana em Lisboa e Roterdão, (ACIDI, 2008), reconhecendo o duplo condicionamento destes jovens perante a escola: os choques culturais, particularmente nos bairros degradados, e o peso no insucesso dos jovens do baixo nível de escolarização dos adultos destas minorias e da frustração de expectativas socioeconómicas que motivaram a emigração.
A verdade dos números está ainda expressa, segundo os dados do Censo de 2001, na «hiperconcentração dos cidadãos dos PALOP na região de Lisboa», ao invés do padrão mais disperso dos imigrantes europeus (Maria Lucinda Fonseca, Integração dos Imigrantes: Estratégias e Protagonistas, conferência efectuada no I Congresso Imigração em Portugal, 2003). A verdade destes números traduz-se nos bairros críticos que, por responsabilidade e apesar das políticas urbanas dos últimos anos, não deixaram de constituir mundos com lógicas de isolamento e sobrevivência que escapam à lógica social e cultural, dominantes.
A resposta do Governo tem sido dada do lado dos Territórios Educativos de Intervenção Prioritária. Se bem que se possa reconhecer o reforço de recursos e a maior abertura de ofertas daqui decorrentes, a verdade é que as respostas permanecem insuficientes e que não existem ao momento quaisquer garantias de que estas respostas tenham sido as mais ajustadas à necessidade de responder ao direito destes alunos à igualdade no acesso e no direito ao sucesso.
Por outro, acrescente-se, que para a marginalização destas comunidades contribuiu a desvalorização das variantes de português, pela cultura dominante da escola. A presunção de que um aluno ou aluna oriundo de um país de língua oficial portuguesa tem as aptidões linguísticas, exigidas pelo sistema, conduziu, anos a fio, à desvalorização do período de integração destas crianças e jovens. São disso indicadores a secundarização ou inexistência de apoio a português, a inexistência de mediação e acompanhamento tutorial, a inserção do aluno em anos de estudo equivalentes ao seu nível etário, sem lhes serem asseguradas as condições necessárias ao sucesso.
Neste contexto, a introdução do ensino multilingue é determinante na valorização das identidades destas crianças e jovens, bem como condição de uma perspectiva cultural da missão pública da escola, ajustada às exigências do século XXI. Mas, mesmo num patamar abaixo deste, o da aprendizagem do português como língua segunda, primeiro patamar da integração, muito está por fazer. Com efeito, subscreve-se a actualidade da afirmação: «Urge desmistificar o conceito de lusofonia, para afastar de vez a ideia de se tratar, nesses alunos [oriundos dos PALOP], de indivíduos que, por definição («lusófono» significa «ser de expressão portuguesa»), deviam saber bem o português — de Portugal! Heilmair-Reichenbach, Hans-Peter, (1996) «A desmistificação da ideia da lusofonia: ponto de partida necessário para o ensino do português, como 2.ª língua, nas comunidades africanas» (in Ministério da Educação, DEB, Relatório sobre o ensino da Língua Portuguesa como 2.ª Língua. Fórum de Reflexão sobre a Formação de Professores).
Mas as dificuldades que são muitas vezes detectadas situam-se, muitas vezes, a um nível ainda mais elementar de direitos, tendo o Bloco de Esquerda conhecimento de famílias imigrantes que aguardaram meses pela integração dos seus filhos na escola e que, no quadro em que pai e mãe trabalham, a criança é deixada por sua conta dias a fio, enquanto aguarda que a burocracia do sistema dê resposta.
Nestas condições, o Bloco de Esquerda aposta num conjunto articulado de respostas que permitam encarar de frente a igualdade de alunos e alunas descendentes de imigrantes no acesso e no sucesso, como um desafio de modernidade e democracia.
As medidas apresentadas destinam-se a preservar condições necessárias à igualdade de oportunidades no acesso e no sucesso das crianças e jovens imigrantes e descendentes de imigrantes, favorecendo a qualidade do acolhimento, e debelando situações de potencial discriminação.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de resolução, recomendando ao Governo que legisle no seguinte sentido:

Página 42

42 | II Série A - Número: 061 | 8 de Abril de 2010

1 — A matrícula das crianças e jovens imigrantes é de aceitação obrigatória pelo estabelecimento/s de ensino solicitado/s, e entre a apresentação do requerimento para este efeito e a resposta do estabelecimento, não podem mediar mais do que 15 dias; 2 — Ao abrigo das disposições previstas no Despacho n.º 13170/2009, ou em disposição legal afim e produzida para os mesmos efeitos, as escolas indicadas não podem recusar a matrícula solicitada; 3 — As turmas do ensino pré-escolar e do ensino básico, que integrem uma ou mais crianças ou alunos imigrantes em fase de iniciação do seu percurso escolar no país, não deverão ter mais de 15 alunos no préescolar, 18 no 1.º ciclo, 20 alunos, no 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário; 4 — As turmas integrantes de crianças ou jovens que, já inseridas em contexto escolar, não possuem ainda o nível de proficiência de língua considerado ajustado, estão sujeitas aos limites definidos pela alínea anterior; 5 — A entrada destes alunos no sistema escolar nacional é acompanhada por tutoria e mediação, articulando escola, família e aluno, de forma a criar condições para a integração e sucesso escolar do aluno, verificando ainda a adequação da equivalência escolar efectuada pela escola; 6 — O acompanhamento da criança ou jovem, em iniciação de percurso escolar no país, é efectuado por docente da escola de acolhimento e por um mediador do bairro de inserção da criança ou jovem; 7 — A entrada destes alunos no sistema escolar nacional implica a obrigatoriedade de apoio a língua portuguesa, incluindo aos alunos oriundos de países cuja língua oficial é o português, sendo que deste acompanhamento é efectuado relatório de avaliação no final do ano lectivo; 8 — Sem prejuízo da autonomia das escolas, devem ser equacionadas as melhores opções curriculares ajustadas às expectativas e necessidades destas crianças e jovens, nomeadamente a oferta de ensino multilingue; 9 — As turmas que integram crianças e jovens imigrantes ou descendentes de imigrantes não devem ser constituídas maioritariamente por uma minoria étnica; 10 — O planeamento da rede nas áreas pedagógicas dever ter em conta que o critério de diversidade cultural e social é o mais ajustado às aprendizagens e às exigências de uma escola de democracia; 11 — Nos concelhos onde existam bairros com contextos minoritários hegemónicos, a distribuição das crianças e jovens de minorias, quer em início de percurso quer para potenciar condições de aprendizagem, deverá ser efectuada pela oferta escolar existente, desde que as autarquias assegurem transporte escolar e que a opção acolha o acordo dos encarregados de educação e de mediadores e tutores.

Assembleia da República, 30 de Março de 2010 As Deputadas e os Deputados do BE: Cecília Honório — Mariana Aiveca — Luís Fazenda — Helena Pinto — José Gusmão — José Moura Soeiro — José Manuel Pureza — Pedro Soares — Heitor Sousa — João Semedo — Catarina Martins — Francisco Louçã — Pedro Filipe Soares.

A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.

Descarregar páginas

Página Inicial Inválida
Página Final Inválida

×