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Sexta-feira, 11 de Fevereiro de 2011 II Série-A — Número 84
XI LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2010-2011)
SUMÁRIO Projectos de lei [n.os 515 a 517/XI (2.ª)]: N.º 515/XI (2.ª) — Estabelece uma nova Lei de Bases do Ambiente (apresentado pelo BE).
N.º 516/XI (2.ª) — Revê o regime laboral dos ajudantes familiares (apresentado pelo PCP).
N.º 517/XI (2.ª) — Proíbe a cobrança a munícipes, utentes ou consumidores de encargos sobre o uso do subsolo do domínio público (apresentado pelo PCP).
Projectos de resolução [n.os 392 a 396/XI (2.ª)]: N.º 392/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo propor alterações na estrutura tarifária praticada pela Águas da Região de Aveiro (apresentado pelo BE).
N.º 393/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo a não introdução de portagens na A23 (apresentado pelo PCP).
N.º 394/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que revogue o Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro, e que proceda, com carácter de urgência, à revisão do enquadramento legal do transporte de doentes não urgentes, de acordo com princípios de equidade social, financeira e territorial (apresentado pelo CDS-PP).
N.º 395/XI (2.ª) — Recomenda ao Governo que efectue uma revisão urgente ao sistema de atribuição de bolsas de estudo aos alunos do ensino superior (apresentado pelo PSD).
N.º 396/XI (2.ª) — Revogação do Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro, que procede aos cortes no transporte de doentes não urgentes (apresentado por Os Verdes).
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PROJECTO DE LEI N.º 515/XI (2.ª) ESTABELECE UMA NOVA LEI DE BASES DO AMBIENTE
Exposição de motivos
A Constituição da República Portuguesa de 1976 define como uma das tarefas fundamentais do Estado «proteger e valorizar o património cultural do povo português, defender a natureza e o ambiente, preservar os recursos naturais e assegurar um correcto ordenamento do território».
Quanto aos direitos e deveres sociais, a Constituição da República Portuguesa refere que «todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender», incumbindo ao Estado «assegurar o direito ao ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável».
Apenas no ano de 1987 é publicada uma Lei de Bases do Ambiente (LBA) para efectivar o preceituado na Constituição. É nesta lei que se definem os princípios básicos da protecção do ambiente e da promoção do bem-estar e qualidade de vida das populações, bem como os direitos e deveres do Estado e dos cidadãos, ou seja, as linhas mestras por que se rege toda a política do ambiente.
Passados mais de 20 anos sobre a publicação da LBA, e tendo representado para a época um importante incentivo e contributo à regulação pública ambiental, hoje encontra-se desactualizada perante os novos desafios ambientais, as novas ameaças que se colocam e os novos instrumentos de acção existentes.
É, por isso, pertinente proceder à sua actualização profunda, integrando novos conceitos e novas realidades, com vista a afirmar princípios modernos de protecção do ambiente e sua compatibilização com as actividades humanas e o desenvolvimento socioeconómico.
Existem hoje três desafios fundamentais da política de ambiente:
— Acolher o crescente reconhecimento global da importância do equilíbrio ecológico para o desenvolvimento humano e a qualidade de vida das gerações actuais e futuras; — Lidar com os limites do planeta, postos em causa por uma economia predadora dos recursos naturais e ecossistemas, poluente e geradora de desperdício, promotora das desigualdades sociais no acesso a bens vitais, convivendo lado a lado abundância e escassez; — Prevenir os riscos crescentes de catástrofes naturais e impactes sobre a saúde pública e condições de vida das populações.
No centro destes desafios estão o aquecimento global e as alterações climáticas, reflexo de um desenvolvimento socioeconómico insustentável e cujas possíveis consequências exigem acções imediatas e estruturais ao longo deste século para travar repercussões dramáticas para a humanidade. O clima é, sem sombra de dúvidas, um desafio civilizacional para os tempos correntes e futuros.
A dimensão ambiental deve ser, por isso, cada vez mais entendida como transversal a todos os domínios do desenvolvimento socioeconómico, recolocando a resposta às necessidades sociais e ao equilíbrio ecológico como funções primordiais da economia e da definição dos modelos de sociedade para as gerações actuais e futuras.
O Bloco de Esquerda propõe uma revisão aprofundada da LBA para responder a estes desafios, visando promover as acções mais necessárias ou imediatas de protecção ambiental e assegurar um desenvolvimento socioeconómico sustentável que assegure os direitos sociais e o equilíbrio ecológico, tendo em conta o longo prazo.
Para concretizar estes objectivos, a política de ambiente deve assegurar:
— A adequação dos «sistemas de produção para responder às necessidades das populações, promovendo o seu bem-estar e qualidade de vida e garantindo a satisfação dos seus direitos básicos e o acesso aos serviços públicos essenciais, bem como para evitar as actividades poluentes e que produzem bens socialmente supérfluos»; — O ordenamento das actividades produtivas para privilegiar «as relações de proximidade entre o produtor e o consumidor, bem como o recurso a modos de transporte menos poluentes»;
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— O «aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e não esgotamento, bem como a partilha equitativa dos seus benefícios»; — O desenvolvimento de uma «economia não dependente dos combustíveis fósseis e neutra em carbono» e a «adopção de tecnologias limpas e a redução dos parâmetros de poluição»; — A adaptação do «território e a localização das actividades aos ciclos naturais, nomeadamente aos efeitos verificados ou esperados das alterações climáticas»; — O apoio «à educação ambiental e a participação activa da sociedade na formulação e execução das políticas de ambiente», bem como quanto à investigação científica.
Defender o interesse público: Para o Bloco de Esquerda os recursos e a qualidade ambiental devem ser entendidos «bens de interesse público» e, como tal, as políticas e acções sobre o ambiente «são de utilidade pública e servem o interesse geral, visando satisfazer as necessidades de desenvolvimento e saúde das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras em responder às suas». Deste modo, os danos causados ao ambiente devem ser considerados como «danos ao interesse público» e os direitos privados devem ser ponderados face aos direitos ambientais.
Especialmente importante é a introdução do princípio da precaução na política do ambiente, assegurando que «a falta de certeza científica não pode ser alegada como razão suficiente para não adoptar medidas preventivas e eficazes nas actividades que podem ter especiais impactes negativos no ambiente e na saúde humana».
Afirmamos o primado de que a execução da política de ambiente é tarefa do Estado, das regiões autónomas e das autarquias, sem possibilidade de delegação ou transferência de competências, «de acordo com o interesse público e no respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos», devendo «acautelar os efeitos que as demais políticas prosseguidas possam, aos diversos níveis, envolver para o ambiente».
Neste âmbito, são ainda reforçados os direitos e deveres dos cidadãos no acesso à informação e à participação pública «nos procedimentos de elaboração, execução, avaliação e revisão dos instrumentos de política de ambiente», elemento fundamental para a eficácia da política de ambiente e promoção da cidadania na defesa do ambiente.
Reforçar a protecção do ambiente: O Bloco de Esquerda actualiza os regimes específicos de protecção dos espaços, recursos e valores ambientais, considerando:
— Todo o quadro legal de política de ambiente entretanto criado desde 1987; — A necessidade de reforço da defesa do interesse público na gestão ambiental, de modo a garantir o equilíbrio ecológico, a assegurar a resposta aos direitos sociais das populações e a enfrentar os novos riscos e ameaças ambientais; — A integração de actividades novas que são mais presentes ou previsíveis no território, como os equipamentos de energia renovável.
Em relação à política da água, o Bloco defende que se deve «consagrar a administração e gestão pública dos recursos hídricos e dos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento», pois a água não pode ser entendida como uma mercadoria e uma oportunidade de negócio para distribuir dividendos aos accionistas.
Afirmamos o objectivo de se garantir o acesso universal aos serviços de água «para satisfazer as necessidades humanas básicas», não podendo os mesmos «ser denegados por insuficiência económica, condição social ou localização geográfica dos cidadãos».
A artificialização das linhas de água, nomeadamente com barragens ou outras infra-estruturas hidráulicas, deve ser minimizada tendo em conta os riscos que podem colocar para a degradação da qualidade das águas e dos ecossistemas hídricos e ribeirinhos, a navegabilidade dos rios, o agravamento da erosão hídrica ou dos fenómenos extremos, como as cheias ou secas.
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Quanto à política de solos, o Bloco considera que esta deve «defender e valorizar a função social do solo, visando a sua gestão satisfazer o interesse público e garantir a sua preservação e perenidade ao longo das gerações e o pleno desempenho das suas potencialidades ecológicas, culturais e socioeconómicas».
A política de solos deve ainda determinar que «o planeamento do território, o ordenamento dos usos permitidos e a programação da ocupação e uso do solo são da exclusiva competência da Administração Pública», o que define «as faculdades e os deveres compreendidos no direito de propriedade do solo».
Considerando a realidade actual, a política de solos deve também:
— «Prevenir e combater a especulação do solo, definindo a cativação pública das mais-valias urbanísticas geradas por actos administrativos ou por efeito de obras públicas»; — Incluir a «adopção de medidas para a prevenção e combate ao abandono dos solos agrícolas e à manutenção de prédios urbanos devolutos»; — «Prever que a nova construção, em especial para fins habitacionais, responde às carências das populações, combatendo o excesso de construção».
Relativamente às áreas protegidas, a política de conservação da natureza e da biodiversidade deve «assegurar que as actividades de planeamento, ordenamento, gestão e fiscalização incumbem ao Estado», sem possibilidade de «concessão» ou «parcerias público-privadas», devendo ser privilegiada a proximidade entre os serviços competentes e os territórios e populações e ser garantidos «adequados meios humanos e logísticos, bem como suficientes recursos financeiros» para a execução da política.
Consideramos também que esta política deve «proibir a cobrança de taxas pelo acesso às áreas protegidas» e aos residentes, assim como promover o desenvolvimento local sustentável e contrariar os processos de desertificação humana.
O Bloco de Esquerda inclui três novos domínios de protecção específica — o litoral, o espaço marítimo e os recursos marinhos, os recursos energéticos, tendo em conta as ameaças crescentes que se colocam aos mesmos ou o crescimento de actividades que a eles se associam.
A política do litoral deve considerar o problema grave da erosão costeira e dos efeitos das alterações climáticas, incluindo medidas para identificar as zonas mais vulneráveis, disciplinar a ocupação urbanística e criar um sistema de alertas para protecção do ambiente, pessoas e bens.
A política do espaço marítimo e recursos marinhos deve visar, entre outros, o planeamento e ordenamento dos usos permitidos, a avaliação do estado dos oceanos e ecossistemas marinhos e evitar o esgotamento dos recursos, bem como prever a criação de um sistema de vigilância marítima em todo o território para prevenção dos riscos de poluição e acidente grave, condicionando-se as actividades extractivas que possam trazer um acréscimo desses riscos.
Quanto aos recursos energéticos, é importante promover o seu aproveitamento sustentável. Neste âmbito, consideramos que deve ficar explícita a proibição do «desenvolvimento da energia nuclear pelos riscos colocados ao ambiente, segurança de pessoas e bens, bem como para as gerações futuras», assim como a proibição da «produção de biocombustíveis resultantes do cultivo de culturas alimentares». O fomento das energias renováveis deve dar «especial atenção à energia de origem solar, como recurso abundante do país», devendo ser garantido «o acesso democrático à energia, promovendo a descentralização da produção e transporte, dando especial relevo, pelas suas potencialidades, à microgeração e redes locais».
Prevenir a poluição, os riscos e emergências: Para o Bloco de Esquerda, no planeamento socioeconómico e na instalação de actividades, deve ter-se em conta a susceptibilidade das mesmas em causar dano ou colocar em perigo o ambiente e as populações e ser ponderados critérios de sustentabilidade, como seja o uso de tecnologias limpas, a contenção da poluição na origem, a avaliação dos prejuízos e vantagens da actividade, tendo em conta todos os seus impactes e a avaliação de outras alternativas para concretizar os mesmos fins.
Ao nível dos resíduos deve ser promovida a adopção de comportamentos de carácter preventivo e práticas de reutilização e reciclagem, evitando-se a deposição em aterro ou a incineração. Portugal deve garantir a auto-suficiência no tratamento dos resíduos que produz, evitando a sua exportação, sendo a mesma interdita para países com normas ambientais menos exigentes. A localização das infra-estruturas deve também
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minimizar os riscos para o ambiente e pessoas e deve ser proibida a co-incineração de resíduos perigosos em instalações situadas nas proximidades de aglomerados urbanos ou em áreas naturais sensíveis.
Ao nível das águas residuais devem ser definidos parâmetros de localização e qualidade do tratamento elevados, evitando os maus cheiros e a contaminação dos recursos hídricos. Deve ser ainda promovida a reutilização das águas após tratamento, a redução da entrada de águas pluviais nos sistemas de saneamento, que frequentemente inviabilizam o tratamento dos esgotos, bem como prever-se a requalificação dos sistemas mal concebidos, degradados ou envelhecidos que no país vão sendo responsáveis por prejudicar a qualidade dos rios e a saúde pública.
A estes dois níveis devem ser incentivadas a criação de comissão de acompanhamento local junto de aterros, incineradoras e ETAR.
O Bloco de Esquerda entende também que a radiação gerada por fontes artificiais é uma forma de poluição. Incluímos, por isso, um novo artigo na LBA sobre a radiação, considerando que deve ser aplicado o princípio da precaução para proteger as populações, em especial no ordenamento de subestações e linhas aéreas de alta e muito alta tensão de energia.
Em relação aos novos riscos, é importante considerar os riscos climáticos e os riscos biotecnológicos, bem como ter em conta as acções de desenvolver de política de ambiente para prevenir e combater as emergências naturais e tecnológicas.
A política de mitigação e adaptação às alterações climáticas deve permitir enfrentar os riscos climáticos, dos mais importantes neste século. Deste modo, esta deve prever a redução das emissões poluentes e a promoção dos transportes sustentáveis, o fomento das energias renováveis e da eficiência energética, a promoção do consumo responsável das boas práticas agrícolas e florestais. Ao nível da adaptação é importante proceder à identificação das zonas mais vulneráveis aos fenómenos extremos, ordenando melhor o território e estabelecendo planos de contingência para proteger as populações.
Prevenir os riscos biotecnológicos significa, em relação aos organismos geneticamente modificados, aplicar o princípio da precaução perante a incerteza científica e os riscos para o ambiente e saúde humana, permitindo apenas o cultivo para fins científicos e uma rotulagem exigente de informação ao consumidor.
Fortalecer os instrumentos de política de ambiente: O Bloco de Esquerda considera que são instrumentos fundamentais da política de ambiente o planeamento, a inventariação e cartografia, o controlo prévio e posterior das actividades susceptíveis de degradar o ambiente através do licenciamento, da avaliação ambiental de planos, programas e projectos e da monitorização e fiscalização.
Relativamente ao licenciamento ambiental e à avaliação ambiental, sendo estes instrumentos preventivos da política de ambiente, o Bloco considera que não deve ser permitido o deferimento tácito na decisão, uma vez que só assim se garante a aplicação do princípio da prevenção. Esta medida vai ao encontro de vários acórdãos já emanados pelo Tribunal de Justiça no sentido da absoluta necessidade de erradicação da técnica de valoração positiva do silêncio da administração em sede de procedimentos autorizativos ambientais, em virtude da demissão ponderativa que tal implica nas decisões de ordem ambiental e social que devem ser feitas por razões de interesse público e competem à Administração Pública.
No caso da avaliação ambiental, definimos ainda a obrigatoriedade da sua realização para todas as actividades susceptíveis de terem efeitos significativos no ambiente ou qualidade de vida das populações, mesmo que não enquadráveis nos critérios ou limiares estabelecidos para as situações gerais.
Nos processos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA) consideramos que os pareceres técnicos quando negativos devem ser vinculativos da decisão, evitando-se as decisões meramente políticas que viabilizam actividades impactes significativos no ambiente, não minimizáveis ou compensáveis. Para o Bloco também é fundamental garantir a isenção e qualidade dos estudos de impacte ambiental, através da acreditação e avaliação regular das entidades que os realizam, assim como acabar com a subjectividade hoje praticada na dispensa do procedimento de AIA.
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Valorizar a participação pública: O acesso à informação por parte dos cidadãos e a participação pública são elementos fundamentais para a credibilidade e eficácia da política de ambiente, consagrando-se também assim o seu dever de colaborar na criação e defender um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado.
O Bloco de Esquerda reforça os direitos e deveres dos cidadãos, nomeadamente quanto ao acesso à documentação, à participação na elaboração e execução das políticas de ambiente e nos procedimentos administrativos relacionados, à denúncia das agressões e ameaças ao ambiente, ao associativismo ambiental enquanto expressão colectiva e organizada da defesa dos interesses ambientais.
Compete ao Estado «estabelecer e manter um sistema de informação de ambiente», de modo a facilitar a divulgação pública sobre o estado do ambiente e dos mecanismos de regulação e defesa existentes, bem como contribuir para a investigação científica e a análise dos resultados da política de ambiente. Também o acesso a todos os documentos administrativos por parte dos cidadãos, gratuito e em tempo útil, deve estar consagrado na Lei de Bases do Ambiente, assim como a promoção das acções de sensibilização e educação ambiental, nomeadamente pelos meios de comunicação social.
A participação pública deve ser valorizada, prevendo-se que ocorra «em todas as fases da política e dos instrumentos de ambiente, através da difusão de informação simples e compreensível ao público afectado e interessado, por meio de audiências públicas e demais acções interactivas, inclusivas e equitativas, sendo os resultados da participação tidos em consideração na tomada de decisão». Ao nível da consulta pública, os contributos devem ser ponderados de acordo com a representatividade dos participantes, tendo em conta que uma plataforma de associações de ambiente agrega mais pessoas do que um contributo individual.
Reforçar os mecanismos de acção perante os danos ambientais: O Bloco de Esquerda propõe a simplificação e clarificação do regime de embargo administrativo, segundo o qual as autoridades públicas podem pôr fim a condutas lesivas para o ambiente, introduzido na LBA de 1987.
A incerteza jurídica da aplicação deste regime levava frequentemente à sua total ineficácia, o que é agora corrigido.
Introduz-se a noção de responsabilidade ambiental, segundo o qual o infractor assume a obrigação de reparar o dano causado, afirmando-se a importância do princípio da reparação em espécie, ou seja, da reposição da situação existente antes da produção do dano ou da indemnização quando tal não seja possível.
Reforçam-se ainda os mecanismos de tutela jurisdicional e das providências cautelares, para assegurar a defesa dos interesses particulares e difusos do ambiente por parte do Estado e dos cidadãos.
O Bloco consagra também a possibilidade de recurso a mecanismos de resolução extra-judicial de conflitos para questões ambientais. A regulamentação deste princípio deve, no entanto, merecer a devida ponderação, de forma a assegurar o respeito pela especificidade dos bens em causa, em especial quando estão em causa bens públicos, de interesse público ou interesses difusos. No entanto, este é mais um sinal que se pretende dar para uma maior agilidade da justiça ambiental, de forma a torná-la mais efectiva e menos onerosa para os cidadãos.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projecto de lei:
Capítulo I Princípios e objectivos
Artigo 1.º Âmbito
A presente lei estabelece as bases da política ambiente, em cumprimento do disposto nos artigos 9.º e 66.º da Constituição da República Portuguesa.
Artigo 2.º Objecto
Constitui objecto da presente lei:
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a) A definição dos princípios e objectivos para a gestão do ambiente, no quadro do desenvolvimento sustentável, como direito e dever fundamental do Estado e da sociedade, visando garantir níveis elevados de protecção da saúde e segurança humanas, de bem-estar e qualidade de vida da população e contribuir para a sustentação do planeta, no interesse da humanidade; b) O desenvolvimento das garantias e direitos constitucionais dos cidadãos a um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado, consagrando ainda o dever de o defender; c) A definição do quadro orientador da política de ambiente, bem como dos instrumentos de ambiente que a concretizam; d) A regulação, no âmbito da política de ambiente, das relações entre os diversos níveis da Administração Pública, desta com as populações e com os diferentes interesses económicos e sociais.
Artigo 3.º Fins
Constituem fins da política do ambiente:
a) Assegurar a existência de um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado, propício à saúde e bem-estar das pessoas, ao desenvolvimento social e cultural das comunidades, bem como à melhoria da qualidade de vida; b) Promover uma relação equilibrada e harmoniosa entre o desenvolvimento socioeconómico, a estabilidade ecológica e a salvaguarda e valorização dos recursos naturais e ecossistemas; c) Integrar no planeamento socioeconómico, na instalação e exercício das actividades económicas as respectivas externalidades ambientais; d) Adequar o desenvolvimento socioeconómico e os sistemas de produção para responder às necessidades das populações, promovendo o seu bem-estar e qualidade de vida e garantindo a satisfação dos seus direitos básicos e o acesso aos serviços públicos essenciais, bem como para evitar as actividades poluentes e que produzem bens socialmente supérfluos; e) Prever no planeamento socioeconómico e no ordenamento das actividades produtivas a redução das necessidades de transporte, privilegiando as relações de proximidade entre o produtor e o consumidor, bem como o recurso a modos de transporte menos poluentes; f) Ordenar e promover o ordenamento do território, tendo em vista uma correcta localização das actividades, um equilibrado desenvolvimento socioeconómico e a valorização da paisagem; g) Assegurar o aproveitamento racional dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e de não esgotamento, bem como a partilha equitativa dos seus benefícios, com respeito pelo princípio da solidariedade dentro e entre gerações; h) Promover a adopção de tecnologias limpas e a redução dos parâmetros de poluição, assim como a reutilização de elementos residuais provenientes dos processos produtivos e o uso eficiente e aproveitamento integral dos recursos naturais; i) Prevenir, regular e controlar as actividades capazes de degradar o ambiente, bem como eliminar ou reduzir as fontes de poluição que possam causar prejuízo ou colocar em perigo a saúde humana e o ambiente; j) Prevenir e combater os riscos potenciais de danos sérios ou irreversíveis para o ambiente, património cultural ou saúde pública; k) Fomentar e estimular a educação ambiental e a participação activa da sociedade na formulação e execução das políticas de ambiente e qualidade de vida, bem como o estabelecimento de fluxos contínuos de informação entre os órgãos da Administração por elas responsáveis e os cidadãos; l) Promover e fomentar a investigação quanto aos factores naturais, ao estudo dos riscos naturais e da acção humana sobre o ambiente, às orientações técnicas e tecnológicas para a mitigação e adaptação aos impactes prejudiciais e para a melhoria da qualidade ambiental; m) Elaborar e desenvolver estratégias para remover e tratar os passivos ambientais, restaurar os ecossistemas degradados, reabilitar a paisagem e o património natural e cultural; n) Desenvolver uma economia não dependente dos combustíveis fósseis e neutra em carbono, assegurando políticas para prevenir o aquecimento global e mitigar as alterações climáticas;
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o) Adaptar o território e a localização das actividades aos ciclos naturais, nomeadamente aos efeitos verificados ou esperados das alterações climáticas; p) Criar incentivos económico e financeiros para promover comportamentos e acções que melhorem a qualidade do ambiente.
Artigo 4.º Dever de defender o ambiente
1 — O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais devem promover, de forma articulada, políticas activas na área do ambiente, nos termos das suas atribuições e das competências dos respectivos órgãos, de acordo com o interesse público e no respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
2 — O disposto no número anterior envolve as obrigações de zelar pela efectiva consolidação de instrumentos da política de ambiente e de acautelar os efeitos que as demais políticas prosseguidas possam, aos diversos níveis, causar no ambiente.
Artigo 5.º Definições
Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) Ambiente: conjunto ou sistema de elementos de natureza física, química, biológica ou sociocultural, em constante transformação dinâmica pela acção humana ou natural, que rege e condiciona a existência dos seres humanos e demais organismos vivos, que interactuam permanentemente num espaço e tempo determinado; b) Ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado: quando os elementos que o integram se encontram numa relação equilibrada e harmoniosa que tornam possível a existência, a transformação e desenvolvimento da espécie humana e demais seres vivos; c) Bem-estar social: condição que permite ao ser humano a satisfação das suas necessidades básicas, intelectuais, culturais, individuais e colectivas, num ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado; d) Capacidade de carga: máximo valor possível de elementos ou agentes internos ou externos que um espaço geográfico ou lugar determinado pode aceitar ou suportar por um período ou tempo determinado, sem que se produzam danos e degradação ou se impeça a recuperação natural, em prazos e condições normais, ou se reduzam significativamente as suas funções ecológicas; e) Conservação da natureza: o conjunto das intervenções físicas, ecológicas, sociológicas ou económicas orientadas para a manutenção ou recuperação dos valores naturais e para a valorização e uso sustentável dos recursos naturais; f) Continuum naturale: sistema contínuo de ocorrências naturais que constituem o suporte da vida silvestre e da manutenção do potencial genético e que contribui para o equilíbrio e estabilidade do território; g) Dano ambiental: toda a alteração que cause perda, diminuição, degradação, deterioração, detrimento ou prejuízo ao ambiente ou a algum dos seus elementos; h) Desenvolvimento sustentável: processo de transformação contínuo e equitativo para atingir o máximo bem-estar social e qualidade de vida, mediante o qual se procura o desenvolvimento integral, com fundamento em medidas apropriadas para a conservação dos recursos naturais e o equilíbrio ecológico, satisfazendo as necessidades das gerações presentes sem comprometer as gerações futuras; i) Ecossistema: os complexos dinâmicos constituídos por comunidades vegetais, animais e de microrganismos, relacionados entre si e com o meio envolvente, considerados como uma unidade funcional; j) Educação ambiental: processo contínuo, interactivo e integrador, mediante o qual o ser humano adquire conhecimentos e experiências, os compreende e analisa, os internaliza e os traduz em comportamentos, valores e atitudes que o preparem para participar activamente na gestão do ambiente e no desenvolvimento sustentável; k) Ordenamento do território: processo integrado da organização do sistema biofísico, tendo como objectivo o uso e a transformação do território, de acordo com as suas capacidades e vocações, e a permanência dos
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valores de equilíbrio biológico e de estabilidade geológica, numa perspectiva de aumento da sua capacidade de carga; l) Paisagem: é a unidade geográfica, ecológica e estética resultante da acção do ser humano e da reacção da natureza, sendo primitiva quando a acção daquele é mínima e sendo natural quando a acção humana é determinante, sem deixar de se verificar o equilíbrio biológico, a estabilidade física e a dinâmica ecológica; m) Património natural: o conjunto dos valores naturais com reconhecido interesse natural ou paisagístico, nomeadamente do ponto de vista científico, da conservação e estético; n) Planeamento ambiental: processo dinâmico que tem por finalidade conciliar as necessidades de desenvolvimento socioeconómico com a conservação dos ecossistemas, dos recursos naturais e com a manutenção de um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado; o) Política de ambiente: conjunto de princípios e estratégias que orientam as decisões do Estado, mediante instrumentos pertinentes para alcançar os fins da gestão do ambiente, no quadro do desenvolvimento sustentável; p) Poluente: toda a matéria, energia ou combinação destas, de origem natural ou antrópica, que, ao libertar-se ou actuar sobre a atmosfera, água, solo, flora, fauna ou qualquer outro elemento do ambiente, altere ou modifique a sua composição natural ou a degrade; q) Poluição: libertação ou introdução no ambiente de matéria, em qualquer dos seus estados, que cause modificação no ambiente na sua composição natural ou a degrade; r) Qualidade ambiental: características dos elementos e processos naturais, ecológicos e sociais, que permitem o desenvolvimento, o bem-estar individual e colectivo do ser humano e a conservação da diversidade biológica; s) Qualidade de vida: resultado da interacção de múltiplos factores no funcionamento das sociedades humanas e traduz-se na situação de satisfação do bem-estar físico, mental e social e na satisfação e afirmação culturais, bem como em relações autênticas entre o indivíduo e a comunidade, dependendo da influência de factores inter-relacionados, que compreendem, designadamente, a capacidade de carga do território e dos recursos, a garantia dos direitos básicos à alimentação, habitação, saúde, educação, mobilidade e transportes, cultura, ocupação dos tempos livres e o acesso a um sistema social que assegure as necessidades e posteridade de toda a população; t) Recursos naturais: os componentes ambientais naturais com utilidade para o ser humano e geradores de bens e serviços, incluindo a fauna, a flora, o ar, a água, os minerais e o solo; u) Risco ambiental: probabilidade de ocorrência de danos no ambiente, por efeito de uma acção ou omissão de qualquer natureza; v) Utilização racional: processo orientado para a utilização dos recursos naturais e demais elementos dos ecossistemas, de maneira eficiente e socialmente útil, respeitando a integridade funcional e a capacidade de carga dos mesmos, de tal forma que a taxa de uso seja inferior à capacidade de regeneração.
Artigo 6.º Princípios gerais
1 — Os componentes ambientais, como sejam o ar, a água, o litoral, o solo, o espaço marítimo, as espécies animais e vegetais, os habitats, o subsolo, o sistema climático, as paisagens e espaços naturais, a diversidade e equilíbrios biológicos, bem como a qualidade ambiental, são considerados bens de interesse público, gozando de protecção acrescida.
2 — A protecção, conservação, regeneração, transformação e gestão das componentes ambientais e demais acções de gestão do ambiente são de utilidade pública e servem o interesse geral, visando satisfazer as necessidades de desenvolvimento e saúde das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras em responder às suas.
3 — Incumbe ao Estado, por meio de organismos próprios e por apelo a iniciativas populares e comunitárias, definir e implementar a política de ambiente, nas suas diversas vertentes, desde a gestão dos espaços e recursos naturais à fiscalização ambiental, não sendo possível a delegação ou transferência de competências na sua execução.
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4 — A política de ambiente funda-se nos princípios estabelecidos na Constituição, na presente lei e demais normas que a desenvolvam, de acordo com os compromissos internacionais assinados pelo Estado português.
5 — Compete ao Estado, por meio das autoridades competentes, garantir a incorporação da dimensão ambiental nas políticas, planos, programas e projectos, tendo em conta a transversalidade da política de ambiente.
Artigo 7.º Princípios específicos
A política do ambiente obedece aos seguintes princípios específicos:
a) Avaliação ambiental: todos os planos, programas e actividades susceptíveis de ter efeitos no ambiente devem ser previamente avaliados como factor determinante da decisão da administração pública sobre os mesmos; b) Cooperação internacional: determina a procura de soluções concertadas com outros países ou organizações internacionais para os problemas do ambiente e de gestão dos recursos naturais; c) Co-responsabilidade: dever do Estado, da sociedade e das pessoas em conservar um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado; d) Da unidade de gestão e acção: deve existir um órgão nacional responsável por propor, desenvolver e acompanhar a execução das políticas de ambiente, nomeadamente nos seguintes âmbitos:
i) Integração da dimensão ambiental no planeamento socioeconómico e diversas políticas globais e sectoriais; ii) Normalização e controlo da actividade dos agentes, públicos ou privados, interventores; e iii) Monitorização e divulgação de dados ambientais e dos resultados da execução de políticas e medidas tomadas, demonstrativos do estado e das pressões a que o ambiente está sujeito;
e) Danos ambientais: os danos causados ao ambiente são considerados lesivos do interesse público; f) Educação ambiental: a conservação de um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado deve ser um valor cidadão, incorporado na educação formal e não formal; g) Equilíbrio: devem criar-se os meios adequados para assegurar a integração das políticas de desenvolvimento socioeconómico e de ambiente e ordenamento do território, tendo como finalidade o desenvolvimento integrado, harmonioso e sustentável; h) Informação e participação pública: direito de todos os cidadãos de acesso à informação e à intervenção nos procedimentos de elaboração, execução, avaliação e revisão dos instrumentos da política de ambiente; i) Investigação: deve ser promovida a investigação científica para conhecer as potencialidades e limitações dos recursos naturais e ecossistemas, bem como desenvolver, transferir e adequar as tecnologias compatíveis com o desenvolvimento sustentável; j) Ponderação dos direitos individuais: os direitos ambientais devem ser ponderados face aos direitos individuais, limitando-os nos termos estabelecidos na Constituição e leis especiais; k) Norma ambiental: especificação técnica, método ou parâmetro científico, tecnológico ou de qualidade, que estabelece requisitos, condições, procedimentos de cumprimento obrigatório por diversas actividades, nomeadamente ao nível do uso de matérias-primas, emissões poluentes ou produção de resíduos; l) Poluidor-pagador: o poluidor é obrigado a corrigir ou recuperar o ambiente, suportando os encargos daí resultantes, não lhe sendo permitir continuar a acção poluente; m) Precaução: a falta de certeza científica não pode ser alegada como razão suficiente para não adoptar medidas preventivas e eficazes nas actividades que podem ter especiais impactes negativos no ambiente e na saúde humana; n) Prevenção: as actuações com efeitos imediatos ou a prazo no ambiente devem ser consideradas de forma antecipada, reduzindo ou eliminando as causas, prioritariamente à correcção dos efeitos dessas acções ou actividades susceptíveis de alterarem a qualidade do ambiente, sendo um princípio que prevalecerá sobre qualquer outro critério na gestão do ambiente;
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o) Procura do nível mais adequado de acção: implica que a execução das medidas de política de ambiente tenha em consideração o nível mais adequado de acção, seja ele de âmbito internacional, nacional, regional, local ou sectorial; p) Recuperação: devem ser tomadas medidas urgentes para limitar os processos degradativos nas áreas onde actualmente ocorrem e promover a recuperação dessas áreas, tendo em conta os equilíbrios a estabelecer com as áreas limítrofes; q) Responsabilidade nos danos ambientais: a responsabilidade de dano ambiental é objectiva e a sua reparação cabe ao responsável da actividade ou do infractor; r) Responsabilização: aponta para a assunção pelos agentes das consequências, para terceiros, da sua acção, directa ou indirecta, sobre os recursos naturais e o ambiente; s) Tutela efectiva: toda a pessoa tem o direito a exigir acções rápidas e efectivas perante a administração pública e os tribunais, em defesa dos direitos ambientais.
Capítulo II Componentes ambientais
Artigo 8.º Regimes específicos de protecção
1 — Para efeitos da presente lei, são componentes ambientais sujeitos a regimes específicos de protecção:
a) Ar e atmosfera; b) Luz e luminosidade; c) Água; d) Litoral; e) Espaço marítimo e recursos marinhos; f) Solo; g) Recursos biológicos e património natural; h) Paisagem; i) Recursos geológicos; j) Recursos energéticos; k) Património construído.
2 — Em ordem a assegurar a defesa da qualidade apropriada dos componentes ambientais, pode o Estado, através do Ministério da tutela competente, proibir ou condicionar o exercício de actividades e desenvolver acções necessárias à prossecução dos mesmos fins, nomeadamente a adopção de medidas de contenção e fiscalização que levem em conta, entre outros, os custos económicos, sociais e culturais da degradação do ambiente em termos da obrigatoriedade de análise prévia dos prejuízos e benefícios.
Artigo 9.º Ar e atmosfera
1 — A qualidade do ar ambiente e interior devem obedecer a níveis que garantam a protecção da saúde humana, do bem-estar individual e colectivo, do ambiente em geral.
2 — A política para a qualidade do ar ambiente e interior deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Estabelecer os objectivos e medidas para prevenção, limitação e redução da poluição atmosférica e dos odores incómodos, com o fim de evitar, prevenir ou limitar os efeitos nocivos sobre as pessoas, o ambiente e demais bens em geral, bem como para a melhoria da qualidade do ar ambiente e interior; b) Proibir ou condicionar a emissão atmosférica de quaisquer substâncias, seja qual for o seu estado físico, susceptíveis de afectarem de forma nociva a qualidade do ar e o equilíbrio ecológico ou que impliquem risco, dano ou incómodo grave para as pessoas e bens em geral;
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c) Dotar todas as instalações, máquinas e meios de transporte, cuja actividade possa afectar a qualidade do ar, de dispositivos ou processos adequados para prevenir, reter ou neutralizar as emissões atmosféricas poluidoras e os odores incómodos, prevendo a adopção das melhores tecnologias e técnicas disponíveis; d) Realizar a monitorização regular e avaliação sistemática, com base em métodos e critérios comuns, da qualidade do ar ambiente em todo o território nacional, através de uma rede de medição de base geográfica e instalada nos principais focos de poluição, cuja informação é disponibilizada ao público em regime de livre acesso; e) Definir as condições mínimas de qualidade do ar interior para os edifícios, nomeadamente no que diz respeito à concentração de poluentes, microorganismos, radão, assim como das taxas mínimas de renovação de ar, adoptando-se princípios de arquitectura e utilização de materiais em obras de construção ou requalificação que promovam a melhoria da qualidade do ar; f) Os cidadãos têm o direito a ser informados sempre que os níveis de qualidade do ar ambiente e interior sejam susceptíveis de riscos para a saúde humana, o bem-estar e a qualidade de vida, bem como tomar conhecimento das medidas imediatas a adoptar; g) Devem ser estabelecidas medidas tendentes a prevenir, limitar e reduzir o uso de substâncias que destroem a camada de ozono.
3 — Na autorização ou licenciamento da instalação de equipamentos de energia eólica é tida em conta a interferência na paisagem e os impactes sobre a biodiversidade e a qualidade dos ecossistemas.
Artigo 10.º Luz e luminosidade
1 — Todos têm o direito a um nível de luminosidade conveniente à sua saúde, bem-estar e conforto na habitação, no local de trabalho e nos espaços livres de recreio, lazer e circulação.
2 — O nível de luminosidade para qualquer lugar deve ser o mais consentâneo com a promoção do conforto, bem-estar e qualidade de vida das populações, privilegiando-se os sistemas de iluminação natural através do ordenamento e arquitectura dos espaços e dos edifícios para a poupança energética.
3 — Para efeito dos números anteriores, ficam condicionados:
a) O volume dos edifícios a construir ou alterar, de modo a não prejudicar a qualidade de vida dos cidadãos e a vegetação pelo ensombramento dos espaços públicos e privados; b) O regulamento e as normas específicas respeitantes à construção de fogos para habitação, escritórios, fábricas e outros locais de trabalho, escolas e restante equipamento social; c) O volume das construções a erigir ou alterar na periferia de espaços verdes existentes ou a construir; d) Os anúncios luminosos só são permitidos nas áreas urbanas e são condicionadas as suas cores, formas, intensidade luminosa, localização e intermitência, por regulamentação própria.
4 — Os anúncios luminosos, fixos ou intermitentes, não devem perturbar o sossego, a saúde e o bem-estar dos cidadãos.
Artigo 11.º Água
1 — O presente artigo abrange as águas superficiais, designadamente as águas interiores, de transição e costeiras, e as águas subterrâneas, incluindo os respectivos leitos e margens, bem como as zonas adjacentes, zonas de infiltração máxima e zonas protegidas.
2 — A água deve ser protegida de modo a se garantir a sua disponibilização em qualidade e quantidade suficiente para satisfazer as necessidades humanas básicas, garantir o equilíbrio ecológico e o bom estado dos ecossistemas e promover o bem-estar das populações.
3 — A política da água deve cumprir os seguintes objectivos:
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a) Promover uma utilização racional de água, baseada numa protecção a longo prazo dos recursos hídricos disponíveis, evitando os desperdícios e promovendo a reutilização e o aproveitamento de águas pluviais; b) Consagrar a administração e gestão pública dos recursos hídricos e dos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento; c) Garantir o acesso universal aos serviços públicos de abastecimento de água e saneamento para satisfazer as necessidades humanas básicas, não podendo ser denegado por insuficiência económica, condição social ou a localização geográfica dos cidadãos; d) Prevenir e reduzir a poluição e degradação dos ecossistemas hídricos e melhorar o seu estado, através da proibição ou condicionamento à instalação de actividades susceptíveis de poluir ou degradar o meio hídrico, bem como da adopção de medidas específicas para a redução, cessação ou eliminação de descargas, emissões e perdas de substâncias prioritárias; e) Definir o sistema integrado de planeamento e gestão das águas, assumindo como unidade principal de planeamento e gestão a região hidrográfica, tendo por base a bacia hidrográfica; f) Ordenar e hierarquizar os usos permitidos, bem como estabelecer as condições e objectivos de qualidade a respeitar pelos mesmos, visando assegurar o bom estado dos recursos hídricos, o equilíbrio ecológico, a segurança e saúde humanas, o bem-estar e qualidade de vida das populações; g) Promover a conservação e reabilitação da rede hidrográfica, da zona costeira, dos estuários e das zonas húmidas e a protecção na origem, das zonas de infiltração máxima e zonas vulneráveis; h) Garantir a monitorização, a nível nacional, de parâmetros qualitativos e quantitativos dos recursos hídricos, e criar um sistema de alertas para situações de riscos para a saúde pública por deficiente qualidade da água para abastecimento humano, situações de riscos de secas, cheias e inundações, acidentes graves de poluição e de rotura de infra-estruturas hidráulicas; i) Estabelecer critérios e procedimentos a adoptar para garantir caudais mínimos que assegurem o equilíbrio ecológico, a qualidade dos recursos hídricos e os diversos usos permitidos, bem como para assegurar a recarga dos aquíferos; j) Proibir ou condicionar a artificialização das linhas de água, em especial com barragens e outras infraestruturas hidráulicas, tendo em conta os impactes negativos na qualidade das águas, nos ecossistemas hídricos e zonas envolventes, bem como na paisagem ou navegabilidade dos cursos de água; k) Prevenir e proteger contra os efeitos da erosão de origem hídrica, em especial as resultantes de alterações a nível das bacias hidrográficas e da dinâmica sedimentar resultantes da construção de barragens, extracção de areias e dragagens; l) Proibir ou condicionar a impermeabilização das bacias de drenagem, minimizando os riscos naturais; m) Renaturalizar e valorizar em termos ambientais e paisagísticos as linhas de água, a vegetação ripícola e as zonas envolventes; n) Proibir ou condicionar a eliminação da vegetação das margens dos cursos de água, com excepção das espécies exóticas ou prejudiciais aos ecossistemas ribeirinhos.
4 — A autorização ou licenciamento da instalação de actividades de extracção de areias e dragagens fica condicionada às necessidades de desassoreamento dos cursos de água para reposição da estabilidade ecológica, dos recursos biológicos e das condições de navegabilidade, podendo ser concedida noutros casos legalmente previstos desde que fique salvaguardada a protecção dos ecossistemas hídricos.
Artigo 12.º Litoral
1 — O litoral e os ecossistemas costeiros devem ser protegidos, não podendo ser impedido o livre acesso de pessoas à orla costeira, salvo por razões estritas de necessária protecção ambiental.
2 — A política para o litoral e as zonas costeiras deve:
a) Prevenir, limitar e combater as principais causas naturais e humanas de erosão costeira, tanto no litoral como nas bacias hidrográficas, minimizando os riscos para a segurança de pessoas e bens em geral;
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b) Ponderar devidamente a instalação de estruturas fixas de defesa costeira, tendo em conta os benefícios e riscos de longo prazo para a dinâmica costeira e a intrusão ambiental e paisagística; c) Estabelecer uma faixa de protecção contínua ao longo da orla costeira, incluindo estuários, com o estatuto non aedificandi; d) Disciplinar a ocupação humana no litoral, contrariando os processos de artificialização da zona costeira, em especial nas dunas, praias, arribas e outras zonas vulneráveis, interditando ou condicionando a construção e edificação nas zonas com elevado e médio risco de erosão; e) Monitorizar e estudar a evolução da dinâmica costeira, identificando zonas de especial possível agravamento da ocorrência e da intensidade de processos erosivos e de fenómenos de galgamento do mar, tomando em consideração a evolução das condições climáticas; f) Planear o litoral para uma gestão integrada e ordenar os usos permitidos, tendo em conta as dinâmicas costeiras, o avanço e recuo da linha de costa, a ocorrência de fenómenos climáticos extremos e a prevenção da intrusão salina das águas subterrâneas; g) Garantir a monitorização a nível nacional e criar um sistema de alertas para salvaguarda de pessoas e bens, nomeadamente em caso de risco de galgamento do mar e inundações, avanço da linha de costa, abatimento ou outras situações de instabilidade das arribas, acidentes graves de poluição e de rotura das estruturas de defesa costeira.
Artigo 13.º Espaço marítimo e recursos marinhos
1 — O presente artigo aplica-se aos espaços marítimos sob soberania ou jurisdição portuguesa, compreendidos entre o limite exterior da Plataforma Continental e o limite terrestre da máxima meia-praia de águas vivas equinociais, incluindo o leito das águas do mar e o seu subsolo, as águas sobreajacentes, a superfície e o espaço aéreo sobreajacente.
2 — A política para o espaço marítimo deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Planear o espaço marítimo para uma gestão integrada e ordenar os usos permitidos, em estreita articulação com a gestão da zona costeira, garantindo a protecção dos recursos e ecossistemas marinhos; b) Definir as condições a cumprir pelos usos marítimos permitidos, de forma a respeitar a qualidade dos recursos e ecossistemas marinhos, o equilíbrio ecológico, a segurança e saúde humanas, o interesse e qualidade de vida das populações, criando instrumentos de avaliação e monitorização do seu desempenho sustentável; c) Proibir ou condicionar os usos marítimos susceptíveis de afectarem de forma nociva o equilíbrio ecológico ou que impliquem risco, dano ou incómodo grave para o ambiente, as pessoas e bens, tendo em conta o médio e longo prazo; d) Avaliar e monitorizar o estado do oceano, dos recursos e ecossistemas marinhos, definindo os parâmetros de qualidade adequados à sua conservação, recuperação e melhoria; e) Promover o bom estado ambiental do meio marinho, a conservação da biodiversidade marinha e a adaptação às alterações climáticas; f) Criar uma rede de áreas marinhas protegidas e salvaguardar o património geológico, arqueológico, cultural, incluindo o subaquático e imaterial; g) Prevenir e minimizar os riscos para o ambiente e a segurança de pessoas e bens em geral, como derrames e acidentes graves de poluição, criando um sistema de vigilância marítima em todo o território nacional e de alertas para informação pública e adopção de medidas imediatas; h) Sujeitar os usos marítimos a avaliação de impactes ambientais, incluindo dos efeitos cumulativos e adaptação às alterações climáticas, como critério prévio para a sua autorização ou licenciamento.
3 — São estabelecidas medidas para regular a actividade piscatória e a aquicultura em espaço marítimo, de modo a proteger os recursos marinhos, evitar o esgotamento das suas reservas e assegurar a sua capacidade de regeneração, salvaguardar a qualidade dos ecossistemas e prevenir os riscos de poluição e acidente grave.
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4 — Na autorização ou licenciamento da instalação de equipamentos de produção de energia a partir das ondas ou outras fontes renováveis em espaço marítimo é tida em conta a afectação dos factores, recursos e ecossistemas marinhos.
5 — Na autorização ou licenciamento da instalação de equipamentos de extracção de matérias no subsolo para fins energéticos é tida em conta a afectação dos factores, recursos e ecossistemas marinhos, bem como os riscos de poluição e acidente grave.
Artigo 14.º Solo
1 — O solo deve ser protegido como recurso natural, como meio fundamental para o equilíbrio ecológico, a sustentação da biodiversidade e ecossistemas, a produção de alimentos e como suporte físico dos estabelecimentos humanos.
2 — A política de solos deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Definir as orientações para planear, ordenar e programar a ocupação, uso e transformação do solo, estabelecendo o conteúdo das faculdades e deveres dos cidadãos e da Administração Pública e quanto ao direito da propriedade do solo; b) Defender e valorizar a função social do solo, visando a sua gestão satisfazer o interesse público, garantir a sua preservação e perenidade ao longo das gerações e o pleno desempenho das suas potencialidades ecológicas, culturais e socioeconómicas; c) Adoptar medidas para a utilização racional do solo, de modo a impedir a degradação das suas características, melhorar a sua fertilidade e regeneração e promover o melhor aproveitamento das suas potencialidades; d) Prever, prevenir e reduzir os riscos de erosão, diminuição do teor em matéria orgânica, compactação, salinização, contaminação, redução da biodiversidade, encharcamentos e inundações, desabamentos de terras e impermeabilização do solo; e) Determinar que o planeamento do território, o ordenamento dos usos permitidos e a programação da ocupação e uso do solo são da exclusiva competência da Administração Pública, não sendo susceptíveis de transferência ou delegação, e definem as faculdades e os deveres compreendidos no direito de propriedade do solo; f) Estabelecer que o processo de ocupação, urbanização, construção, edificação e uso do solo, tanto por entidades públicas como privadas, está sujeito à direcção e controlo da Administração Pública, nos termos das atribuições e competências dos seus vários órgãos; g) Definir as condições a cumprir para uma ocupação e transformação do solo que, de acordo com os usos permitidos, salvaguarde os recursos naturais e os ecossistemas, satisfaça as necessidades de alojamento, infra-estruturas, equipamentos e serviços das populações, promova a coesão social e o equilibrado desenvolvimento urbano e das actividades económicas; h) Condicionar as ocupações e usos do solo, como sejam as urbanas, industriais, turísticas, agrícolas, ou implantação de equipamentos e infra-estruturas, em função das características do solo e da sua localização, nomeadamente tendo em conta a afectação das componentes ambientais; i) Prevenir e combater a especulação sobre o solo, definindo a cativação pública das mais-valias urbanísticas geradas por actos administrativos ou por efeito de obras públicas; j) Garantir que os solos se destinam aos usos programados e os mesmos são devidamente cumpridos, incluindo a adopção de medidas para a prevenção e combate ao abandono dos solos agrícolas e à existência de prédios urbanos devolutos; k) Assegurar que as novas construções, em especial para fins habitacionais, respondem às carências quantitativas e qualitativas das populações, combatendo o excesso de construção; l) Promover a elaboração do cadastro predial, rústico e urbano, bem como a actualização das matrizes prediais.
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3 — Aos proprietários dos terrenos ou seus utilizadores podem ser impostas medidas de defesa e regeneração dos solos, nomeadamente a obrigatoriedade de execução de trabalhos técnicos, agrícolas ou silvícolas.
4 — Os solos agrícolas de elevada fertilidade são classificados para protecção e incluídos na Reserva Agrícola Nacional (RAN), sendo proibido o seu uso para fins não agrícolas, excepto em casos absolutamente excepcionais e de relevante interesse público.
5 — Os solos de elevado interesse ecológico e necessário à prevenção de riscos naturais, como cheias, inundações, desabamentos, são classificados para protecção e incluídos na Reserva Ecológica Nacional (REN), sendo proibida ou fortemente condicionada a sua ocupação e impermeabilização.
6 — A delimitação geográfica dos solos a incluir na RAN e na REN, bem como qualquer pedido de alteração da mesma, é da competência exclusiva do Ministério com a tutela do ambiente, em colaboração com o Ministério com a tutela da agricultura no caso da RAN.
7 — O uso de fertilizantes e fitofármacos, bem como a sua produção e comercialização, são objecto de regulamentação especial, com a finalidade de prevenir a poluição dos componentes ambientais, nomeadamente dos recursos hídricos, e evitar os riscos à saúde pública.
8 — Compete ao Estado promover e apoiar as boas práticas agrícolas e florestais, evitando os sistemas intensivos e monoculturais com efeitos nocivos para o ambiente e a perenidade dos recursos naturais.
9 — São adoptadas medidas específicas para a recuperação de solos contaminados, nomeadamente os resultantes da actividade agrícola, industrial ou da extracção de recursos geológicos.
Artigo 15.º Recursos biológicos e património natural
1 — Os recursos biológicos devem ser protegidos para salvaguardar a biodiversidade, o potencial genético e os serviços ecosistémicos, pelo seu valor intrínseco e contributo para o equilíbrio ecológico e bem-estar das populações, como sejam o fornecimento de alimentos, água, medicamentos ou regulação do clima.
2 — O património natural é protegido em virtude do seu interesse para a conservação da natureza e da biodiversidade, dos seus valores estéticos, da sua raridade, da sua importância científica, cultural e social ou da sua contribuição para o equilíbrio biológico e estabilidade ecológica das paisagens.
3 — A política de conservação da natureza e biodiversidade deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Prever, prevenir e combater o declínio da biodiversidade, o desaparecimento de espécies animais e vegetais e habitats, a diminuição da diversidade genética e a deterioração dos ecossistemas biológicos; b) Estabelecer uma intervenção antecipativa ou cautelar perante os riscos de degradação do património natural e dos recursos biológicos, privilegiando a acção sobre as respectivas causas; c) Proibir, condicionar ou eliminar os processos degradativos para o património natural e os recursos biológicos, bem como adoptar medidas de salvaguarda e requalificação das áreas afectadas; d) Identificar e aperfeiçoar as medidas adequadas de salvaguarda, gestão, recuperação ou valorização de espécies ou habitats, sobretudo os mais significativos ou ameaçados de extinção; e) Realizar a monitorização do estado das espécies, habitats e ecossistemas; f) Aprofundar o conhecimento sobre os componentes do património natural e da biodiversidade, sobretudo os mais significativos, ameaçados de extinção ou menos conhecidos e inventariar a sua distribuição, com o recurso a sistemas de informação geográfica; g) Aprofundar o conhecimento sobre os organismos vivos geneticamente modificados e avaliar os riscos para a biodiversidade, para a segurança alimentar e para a saúde pública associados à sua utilização; h) Promover o conhecimento sobre o impacte das alterações ambientais globais, nomeadamente as decorrentes das alterações climáticas, no equilíbrio dos ecossistemas e na biodiversidade; i) Avaliar os impactes das actividades económicas e das práticas tradicionais na conservação da natureza e na biodiversidade e estabelecer soluções respeitadoras do equilíbrio com os valores naturais, induzindo uma utilização sustentável dos recursos biológicos;
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j) Classificar as áreas com interesse para a conservação da natureza e biodiversidade, abrangendo áreas terrestres, águas interiores e marítimas e outras ocorrências naturais distintas, podendo essa classificação ser de âmbito nacional, regional ou local; k) Criar uma rede nacional contínua que abranja as áreas classificadas para protecção e as áreas inseridas em Reserva Agrícola Nacional, Reserva Ecológica Nacional e no domínio público hídrico; l) Planear as áreas classificadas para protecção e ordenar os usos permitidos, em estreita articulação com a gestão sobre o território, garantindo a protecção dos recursos e ecossistemas biológicos; m) Definir e salvaguardar os corredores ecológicos nos instrumentos de gestão territorial, de forma a manter ou estabelecer a ligação entre áreas de conservação e promover a continuidade espacial e conectividade da biodiversidade em todo o território, bem como uma adequada integração e desenvolvimento dos usos permitidos; n) Proteger a fauna migratória, através da sua inventariação, classificação para protecção e salvaguarda dos habitats, dando especial atenção às zonas de montado, bem como às zonas húmidas, ribeirinhas e costeiras; o) Contribuir para o combate à desflorestação, aos incêndios florestais, à exploração intensiva dos solos, à poluição, às espécies invasoras e às alterações climáticas; p) Controlar a importação das espécies exóticas; q) Prever, planear e promover a visitação das áreas classificadas e o turismo da natureza numa perspectiva sustentável e que não ponha em causa o equilíbrio ecológico, a protecção e estudo dos ecossistemas naturais e a preservação dos valores de ordem científica, cultural, social e paisagística.
4 — Em relação às áreas protegidas, estas políticas devem ainda:
a) Promover o conhecimento, a monitorização, a conservação e a divulgação dos valores ambientais existentes, bem como a preservação e valorização do património cultural e das actividades tradicionais, numa perspectiva de promoção do desenvolvimento local sustentável; b) Assegurar que as actividades de planeamento, ordenamento, gestão e fiscalização das áreas protegidas incubem ao Estado e seus órgãos competentes, sem possibilidade de concessão ou estabelecimento de parcerias público-privadas para a sua concretização; c) Proibir a cobrança de taxas pelo acesso às áreas protegidas, bem como pela prática de actos administrativos legalmente obrigatórios aos residentes e às actividades tradicionais locais ou às que contribuem para o desenvolvimento sustentável das áreas protegidas; d) Aperfeiçoar o modelo de atendimento dos visitantes das áreas protegidas, nomeadamente no que diz respeito a infra-estruturas e equipamentos, à prestação directa de serviços de visitação e turismo da natureza, à edição de material de apoio e divulgação; e) Promover a desconcentração e descentralização dos serviços e organismos competentes pelas áreas protegidas, assegurando relações de proximidade com os territórios e as populações; f) Garantir adequados meios humanos e logísticos, bem como suficientes recursos financeiros, para o planeamento, ordenamento, gestão e vigilância das áreas protegidas; g) Planear e ordenar os usos em cada área protegida, assegurando a compatibilização entre conservação da natureza e da biodiversidade com o desenvolvimento local sustentável, contrariando os processos de abandono humano das áreas protegidas; h) Programar as acções de prevenção dos fogos florestais para cada área protegida, reforçar os meios de primeira intervenção no combate ao fogo e implementar planos de recuperação das áreas ardidas.
Artigo 16.º Paisagem
1 — A paisagem deve ser protegida enquanto componente fundamental do ambiente humano, do património natural e cultural e da formação de culturas e identidades locais, sendo essencial para o bem-estar e qualidade de vida das populações.
2 — A política de paisagem deve cumprir os seguintes objectivos:
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a) Definir os princípios gerais, estratégias e medidas específicas para a protecção, gestão e ordenamento da paisagem, implicando direitos e responsabilidades para os cidadãos e o Estado; b) Identificar, inventariar e cartografar as paisagens em todo o território nacional, analisar as suas características, dinâmicas e pressões para a sua transformação, bem como acompanhar essas transformações, atendendo em cada nível à percepção social e aspirações das populações sobre as suas características; c) Traçar objectivos de qualidade paisagística para áreas específicas e respectivos instrumentos de acção, bem como para projectos de investimento, qualquer que seja a sua escala, para melhoria da paisagem ou não degradação da existente; d) Prever a avaliação dos impactes negativos na paisagem dos programas e projectos, bem como definir normas e instrumentos correspondentes a prevenir ou minimizar os mesmos; e) Recuperar as paisagens degradadas, dando especial relevo à requalificação das paisagens primitivas e notáveis; f) Integrar a dimensão paisagística nas políticas de ordenamento do território e de urbanismo, bem como em quaisquer outras políticas com eventual impacte directo ou indirecto na paisagem; g) Proibir ou condicionar a implantação de infra-estruturas, como sejam as viárias e hidroeléctricas, de aglomerados urbanos, de empreendimentos turísticos, entre outras construções, que, pela sua área de influência, dimensão, volume, silhueta, cor, materiais utilizados, provoquem significativas transformações negativas na paisagem; h) Proibir ou condicionar a exploração de minas e pedreiras, vazamento e acumulação de resíduos, o corte de arvoredo ou demais actividades com fortes implicações negativas na paisagem; i) Classificar paisagens para protecção, tendo em conta os seus valores naturais, estéticos, históricos ou culturais, adoptando medidas adequadas para salvaguarda e melhoria das suas características; j) Envolver as autarquias, populações e associações na defesa dos valores paisagísticos e promoção de actividades a eles associados.
3 — O planeamento e gestão urbanística devem promover a qualidade da paisagem urbana, através da organização e coerência estética entre edifícios, construções e espaços urbanos, da protecção e valorização dos sistemas de vistas naturais, bem como da implantação de espaços públicos e adequadas áreas verdes.
Artigo 17.º Recursos geológicos
1 — O aproveitamento dos recursos geológicos deve respeitar as limitações impostas pela necessidade de:
a) Conservar a natureza e biodiversidade, os recursos naturais e a estabilidade ecológica; b) Proteger as reservas de água subterrâneas, as águas de nascente e as águas minerais naturais; c) Salvaguardar e valorizar o património geológico e a sua diversidade, bem como o seu interesse para a ciência ou actividades de recreio; d) Garantir a regeneração dos factores naturais e evitar o esgotamento das reservas; e) Garantir a segurança, saúde e qualidade de vida das populações; f) Prever e prevenir riscos de acidentes graves ou contaminação.
2 — A exploração de recursos geológicos é condicionada à:
a) Avaliação prévia dos seus impactes para o ambiente e as populações; b) Adopção de medidas preventivas ou minimizadoras de impactes; c) Fixação de perímetros de protecção para garantir a disponibilidade e qualidade dos recursos extraídos ou evitar a afectação do ambiente ou populações pela actividade extractiva; d) Integração paisagística da actividade na área envolvente; e) Recuperação ambiental após o encerramento da actividade.
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3 — É proibida ou fortemente condicionada a exploração de massas minerais em zonas de terreno que circundem edifícios, obras, instalações, monumentos, acidentes naturais, áreas ou locais classificados de interesse natural, científico ou paisagístico.
4 — Devem ser adoptadas medidas para a recuperação ambiental de minas degradadas, bem como para a monitorização e avaliação do estado do ambiente e da saúde de trabalhadores e populações.
5 — Devem ser adoptadas as acções adequadas para prevenir e minimizar os riscos para a saúde humana da radioactividade natural de reservas geológicas.
6 — Na autorização ou licenciamento da instalação de equipamentos de produção de energia a partir da geotermia é tida em conta a afectação dos factores, recursos e ecossistemas naturais.
7 — Na autorização ou licenciamento da instalação de equipamentos de extracção de matérias no subsolo para fins energéticos é tida em conta a afectação dos factores, recursos e ecossistemas naturais, bem como os riscos de poluição e acidente grave.
Artigo 18.º Recursos energéticos
1 — Compete ao Estado administrar e gerir os recursos energéticos, adoptar instrumentos de planeamento e decisão sobre o seu aproveitamento e decidir sobre a instalação das respectivas infra-estruturas e equipamentos.
2 — A política de aproveitamento dos recursos energéticos visa:
a) Reduzir a dependência do exterior, garantir a segurança do abastecimento e atingir uma economia de baixa intensidade energética e neutra em carbono; b) Cumprir objectivos exigentes de redução das emissões de gases de efeito de estufa e contribuir para o combate às alterações climáticas; c) Reduzir o desperdício e o consumo inútil de energia, bem como aplicar medidas para a conservação e eficiência energética; d) Promover a prestação de serviços de energia para promover a utilização racional de energia e a poupança energética; e) Garantir o acesso democrático à energia, promovendo a descentralização da produção e transporte, dando especial relevo, pelas suas potencialidades, à microgeração e redes locais; f) Fomentar o crescimento das energias renováveis, diversificando as várias fontes, dando especial atenção à energia de origem solar, como recurso abundante no país; g) Proibir o desenvolvimento da energia nuclear pelos riscos colocados ao ambiente, segurança de pessoas e bens, bem como para as gerações futuras; h) Proibir a produção de biocombustíveis resultantes do cultivo de culturas alimentares e condicionar a mesma a critérios estritos de sustentabilidade, nomeadamente quanto à ocupação do solo e contributo para a redução de emissões poluentes; i) Limitar o aproveitamento da biomassa para a produção de energia aos resíduos florestais, devendo ficar garantida a protecção do solo, da biodiversidade e do ciclo da água.
Artigo 19.º Património construído
1 — O património é objecto de medidas especiais de defesa, salvaguarda e valorização pelo seu valor histórico-cultural, estético-social e técnico-científico.
2 — A política de património deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Definir os princípios gerais, estratégias e medidas específicas para a protecção e gestão do património, implicando direitos e responsabilidades para os cidadãos e o Estado; b) Inventariar e classificar o património, em cooperação com as autarquias locais e com as associações locais de defesa do património e do ambiente;
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c) Prever medidas de protecção e requalificação do património, bem como planificar acções a empreender numa perspectiva de animação e utilização criativa; d) Proibir ou condicionar a construção na envolvente do património classificado; e) Promover a recuperação dos centros históricos em zonas urbanas e rurais, dos edifícios e conjuntos monumentais, tendo também em conta a necessidade de salvaguardar e melhorar a área envolvente; f) Envolver autarquias, populações e associações locais de defesa do património na defesa dos valores patrimoniais e promoção de actividades a eles associados.
Capítulo III Prevenção da poluição, riscos e emergências
Artigo 20.º Da prevenção
1 — A política de ambiente estabelece normas e instrumentos para prever, prevenir e reduzir a poluição, os riscos naturais ou tecnológicos e as situações de emergência, de modo a proteger o ambiente, a segurança e saúde humanas, o bem-estar e qualidade de vida das populações.
2 — No planeamento socioeconómico e de ordenamento das actividades no território, bem como nos processos de autorização ou licenciamento para a sua instalação, é tida em conta a susceptibilidade da actividade em causar dano, prejuízo ou colocar em perigo o ambiente e as populações, devendo ainda ser ponderados outros critérios de sustentabilidade, nomeadamente:
a) A baixa pegada ecológica da actividade e dos produtos, tendo em conta o seu ciclo de vida; b) A utilização de tecnologias limpas e de métodos produtivos que minimizem o uso de recursos naturais, promovam a sua utilização racional, evitem ou reduzam os impactes negativos sobre o ambiente e as populações; c) A avaliação das características dos bens e produtos resultantes da actividade, privilegiando os que são úteis ao bem-estar e qualidade de vida das populações, bem como os que são duráveis, reutilizáveis e biodegradáveis sem prejuízo para o ambiente; d) A utilização de resíduos, em especial dos gerados pela actividade, como matérias-primas secundárias e o reaproveitamento dos efluentes; e) O uso eficiente de energia, o recurso a energias renováveis e o nível de auto-abastecimento energético; f) A contenção da poluição na origem, mediante a adopção de sistemas de tratamento ou correcção o mais próximos possível da fonte; g) O cumprimento de normas técnicas, de objectivos de qualidade, de valores-limite para o ruído, as emissões, a produção de resíduos e de efluentes; h) A adequação da localização da actividade à necessidade de conservação da natureza, salvaguarda dos recursos naturais e ecossistemas, assegurar o bem-estar e qualidade de vida das populações, tendo em conta, nomeadamente, a avaliação de localizações alternativas; i) A redução das necessidades de transporte da actividade, privilegiando-se as relações de proximidade tanto para o abastecimento de matérias-primas usadas na produção, como para o escoamento dos bens produzidos, bem como o recurso a transportes menos poluentes; j) A ponderação da avaliação dos prejuízos e dos benefícios da actividade, tendo em conta todos os seus impactes ambientais, sociais, económicos, onde se inclui o ciclo de vida dos produtos e a consideração de todos os custos da degradação ambiental, bem como a ponderação da avaliação de alternativas à actividade para concretizar os mesmos fins ou similares.
3 — Para a autorização ou licenciamento da instalação ou exercício das actividades susceptíveis de causar dano ou colocar em perigo o ambiente e as populações, é requerida:
a) A monitorização regular das emissões, efluentes e resíduos, a análise dos resultados, a informação periódica aos serviços competentes da administração pública e a disponibilização desses dados ao público;
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b) A elaboração de planos de prevenção ou redução da poluição e da susceptibilidade de causar dano ou colocar em perigo o ambiente e as populações, sendo a actividade interdita sempre que as medidas não assegurem a eficaz protecção da segurança e saúde humanas, a estabilidade ecológica ou a protecção dos recursos naturais e ecossistemas sensíveis; c) A elaboração de planos de segurança e a adopção de medidas para fazer face a situações de emergência é obrigatória para as actividades que utilizam ou gerem substâncias consideradas perigosas.
Artigo 21.º Proibição de poluir
1 — São factores de poluição do ambiente e degradação do território todas as acções e actividades que afectam negativamente a saúde, o bem-estar, a qualidade de vida e as diferentes formas de vida, o equilíbrio e a perenidade dos ecossistemas naturais e transformados, assim como a estabilidade física, biológica e paisagística do território.
2 — São causas da poluição do ambiente todos os produtos, substâncias e radiações lançadas no ar, na água, no solo e no subsolo que alterem, temporária ou irreversivelmente, a sua qualidade ou interfiram na sua normal conservação e evolução.
3 — É proibido lançar, depositar ou, por qualquer outra forma, introduzir nas águas, no solo, no subsolo, no mar ou na atmosfera, bem como incinerar, efluentes, resíduos, compostos químicos, substâncias radioactivas ou demais produtos ou microorganismos que possam alterar as características ou tornar impróprios para as suas aplicações os componentes ambientais e contribuam para a degradação do ambiente.
4 — O transporte, a manipulação, o depósito, bem como a reciclagem e deposição de quaisquer produtos susceptíveis de causar poluição são regulamentados por legislação especial.
5 — O Ministério com a tutela do ambiente e os seus serviços e organismos competentes podem determinar a redução ou suspensão temporária ou definitiva das actividades geradoras de poluição, de forma a manter as emissões, resíduos ou efluentes dentro dos limites estipulados, nos termos em que for estabelecido em legislação própria, bem como a salvaguardar a saúde humana e ambiente e a prevenir os riscos naturais e tecnológicos.
6 — As actividades e instalações que alterem as condições normais de salubridade, segurança e qualidade do ambiente definidos por lei podem ser obrigados a transferir-se para local mais apropriado.
Artigo 22.º Da poluição, riscos e emergências
São formas de poluição, riscos e emergências, alvo de medidas específicas:
a) O ruído; b) Os resíduos; c) Os efluentes; d) A radiação; e) Os riscos químicos e radioactivos; f) Os riscos climáticos; g) Os riscos biotecnológicos; h) As emergências naturais e tecnológicas.
Artigo 23.º Ruído
1 — O conforto acústico é sujeito a medidas de protecção, visando prevenir e controlar os riscos para a saúde humana, comodidade e qualidade de vida das populações e ambiente provocados pelo excesso de ruído ambiental.
2 — A política em matéria de ruído deve cumprir os seguintes objectivos:
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a) Definir limites para a exposição ao ruído, tendo em conta o seu carácter temporário ou permanente, a tipologia das actividades geradoras de ruído, as características das zonas de incidência, dando especial atenção à protecção das áreas vocacionadas para uso habitacional, para escolas, hospitais ou similares, dos espaços de lazer e recreio ou das áreas naturais sensíveis; b) Planear a distribuição adequada dos usos do território, de modo a adequar a localização das actividades causadoras de ruído à boa qualidade do ambiente sonoro, bem como estabelecer os modos de prevenção e redução do ruído; c) Introduzir nos licenciamentos e autorizações de construção de edifícios, utilização de equipamentos ou exercício de actividades, em especial na instalação e exercício de actividades ruidosas de carácter permanente, a obrigatoriedade de eliminação ou redução do nível de ruído na fonte, no meio de propagação do ruído e no receptor sensível, bem como das trepidações; d) Estabelecer limites específicos de emissão de ruído nas infra-estruturas de transporte e zonas industriais, prevendo a instalação de barreiras acústicas e delimitação de zonas tampão na sua envolvente, nas quais não é permitida a edificação; e) Obrigar os fabricantes de máquinas, electrodomésticos e outros equipamentos a apresentar informações detalhadas, homologadas, sobre o nível sonoro dos mesmos nas instruções de uso; f) Normalizar os métodos de medida do ruído; g) Prever a homologação e controlo do ruído produzido por veículos motorizados, incluindo as embarcações, aeronaves e transportes ferroviários e equipamentos electromecânicos, bem como quanto às características das vibrações acústicas produzidas pelos avisadores sonoros; h) Sensibilizar as populações para os problemas associados ao ruído.
Artigo 24.º Resíduos
1 — É objectivo prioritário da política de gestão de resíduos evitar e reduzir a sua produção e o seu carácter nocivo, visando garantir a preservação dos recursos naturais e minimizar os impactes negativos sobre a saúde pública e o ambiente.
2 — A política de gestão de resíduos deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Assegurar que a produção e gestão de resíduos não constituem perigo ou causem prejuízo para a saúde humana e o ambiente; b) Estabelecer uma hierarquia das operações de gestão de resíduos assente na prevenção, reutilização, reciclagem ou regeneração, por fileiras ou fluxos, considerando que a eliminação definitiva de resíduos, nomeadamente a sua deposição em aterro e incineração, constitui a última opção de gestão; c) Promover a adopção de comportamentos de carácter preventivo em matéria de produção de resíduos, bem como práticas que facilitem a respectiva reutilização e reciclagem ou regeneração, por parte dos cidadãos e das actividades geradoras de resíduos, nomeadamente a nível industrial, urbana, agrícola e hospitalar; d) Garantir a auto-suficiência nas operações de gestão de resíduos, reduzindo ao mínimo os movimentos transfronteiriços e interditando a exportação de resíduos para países que tenham normas ambientais menos exigentes; e) Considerar a gestão do resíduo como parte integrante do seu ciclo de vida, sendo da responsabilidade do respectivo produtor ou detentor, com excepção dos resíduos urbanos, cuja gestão é assegurada pelos municípios; f) Planear a gestão dos resíduos, de âmbito nacional e em cada área específica de actividade geradora de resíduos, nomeadamente industrial, urbana, agrícola e hospitalar, prevendo a sua aplicação a nível local; g) Desenvolver sistemas integrados de recolha, transporte, armazenagem, triagem, tratamento, valorização e destino final de resíduos, por fileira ou fluxo, fomentando a separação na origem; h) Planear a localização das infra-estruturas de forma a evitar ou minimizar efeitos prejudiciais ao bemestar e qualidade de vida das populações e ao ambiente; i) Incentivar a compostagem de resíduos orgânicos, nomeadamente no local de produção, no respeito pela protecção do solo, recursos biológicos e ciclo da água;
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j) Reduzir a produção de resíduos perigosos e prever o encaminhamento destes para centros de tratamento específicos; k) Proibir a co-incineração de resíduos perigosos, ou dos resíduos cuja queima é susceptível de gerar riscos para o ambiente e saúde humana, em instalações situadas nas proximidades de aglomerados urbanos ou áreas naturais sensíveis; l) Definir limites de emissões às operações de incineração e co-incineração de resíduos, tendo em consideração as características de perigosidade dos mesmos, e proceder à sua monitorização; m) Criar um sistema de informação sobre resíduos, garantindo a recolha, registo e disponibilização pública de toda a informação relevante sobre o seu ciclo de vida; n) Incentivar o aproveitamento dos resíduos enquanto matérias-primas secundárias e a adopção das novas e melhores tecnologias disponíveis para a sua gestão; o) Promover a criação de comissões de acompanhamento, nomeadamente de âmbito municipal e local, junto das estruturas de tratamento de resíduos, como sejam os aterros e incineradoras; p) Inventariar e monitorizar a produção de resíduos, bem como dos sistemas de recolha, tratamento e eliminação; q) Proceder à recuperação ambiental e paisagística dos locais de deposição de resíduos após a sua selagem e efectuar a sua monitorização regular, de modo a garantir a protecção do ambiente e da saúde humana.
3 — No âmbito da política de prevenção de resíduos, são tomadas medidas específicas para, nomeadamente, incentivar:
a) O recurso a tecnologias limpas; b) A reintegração no processo produtivo dos resíduos nele gerados; c) A produção de bens duráveis e biodegradáveis sem impactes no ambiente; d) A adopção de acções de educação ambiental e de incentivos económicos que visem a redução, reutilização e reciclagem dos resíduos; e) A redução do desperdício na Administração Pública através da criação de um sistema de compras públicas ecológicas.
Artigo 25.º Efluentes
1 — É objectivo prioritário da política de gestão de efluentes evitar e reduzir a sua produção e o seu carácter nocivo, visando garantir a preservação dos recursos naturais e minimizar os impactes negativos sobre a saúde pública e o ambiente.
2 — A política de gestão dos efluentes deve cumprir os seguintes objectivos:
a) Atingir níveis elevados de protecção da saúde pública e do ambiente; b) Garantir a cobertura de todo o território nacional com sistemas públicos de saneamento de águas residuais urbanas, bem como assegurar o adequado tratamento dos efluentes agro-pecuários e agroindustriais; c) Planear a localização das infra-estruturas de forma a evitar ou minimizar efeitos prejudiciais ao bemestar e qualidade de vida das populações e ao ambiente; d) Definir parâmetros de qualidade exigentes para o tratamento, rejeição e descarga de efluentes em meio hídrico, bem como ao nível da produção de odores; e) Promover a reutilização de águas residuais tratadas, compatibilizando a qualidade do efluente com os usos previstos; f) Instituir mecanismos de controlo e erradicar as descargas directas de efluentes não tratados, incluindo águas pluviais, no meio receptor;
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g) Reduzir a produção de lamas através do uso de tecnologias eficientes, realizar o seu tratamento adequado e incentivar a utilização de lamas tratadas como matéria-prima secundária, composto agrícola ou noutras utilizações compatíveis; h) Controlar as descargas de efluentes industriais nas redes públicas de drenagem, assegurando o seu adequado pré-tratamento ou mesmo tratamento final no local de produção; i) Eliminar ou reduzir a entrada de caudais pluviais nos sistemas de saneamento, promovendo a separação da rede de drenagem de águas residuais e águas pluviais e a aplicação de soluções locais de renaturalização do ciclo de águas pluviais, especialmente em meio urbano; j) Requalificar os sistemas de drenagem e saneamento mal concebidos, degradados ou envelhecidos, assegurando níveis elevados na qualidade do tratamento dos efluentes e na minimização dos odores; k) Erradicar as ligações indevidas aos sistemas de drenagem e saneamento e assegurar a execução das ligações obrigatórias; l) Reduzir os consumos energéticos nos sistemas de saneamento, aproveitando o biogás e a hidroelectricidade potenciada pelas infra-estruturas hidráulicas; m) Inventariar e monitorizar a produção de efluentes, e assegurar o cumprimento dos parâmetros de qualidade na entrada no sistema de drenagem e saneamento e na sua rejeição em meio hídrico; n) Promover a constituição de comissões de acompanhamento local dos sistemas de saneamento.
Artigo 26.º Radiação
1 — A exposição humana e ambiental às radiações de campos electromagnéticos gerados por fontes artificiais está sujeita a limites, estabelecidos através da aplicação do princípio da precaução, tendo em conta as evidências científicas, a percepção do risco para as populações e a especial protecção de grupos vulneráveis, tais como as crianças.
2 — A instalação de subestações e linhas aéreas de transporte de energia de alta e muito alta tensão está sujeita a regulamentação específica, visando cumprir os seguintes objectivos:
a) Minimizar a interferência na estética da paisagem, no património natural e cultural, bem como proteger a avifauna; b) Planear e ordenar a rede eléctrica e as operações urbanísticas, estabelecendo distâncias mínimas entre as subestações e linhas aéreas e os estabelecimentos de ensino e saúde, áreas verdes e de lazer, parques infantis, lares, edifícios residenciais, demais áreas e construções onde a permanência humana seja superior a quatro horas por dia; c) Proibir a instalação de subestações e linhas aéreas dentro de áreas urbanas consolidadas e aglomerados populacionais; d) Realizar o cadastro geográfico das linhas e instalações eléctricas em todo o território nacional e monitorizar a exposição humana às radiações e ao ruído, avaliando os seus efeitos para a saúde e qualidade de vida das populações; e) Prever e prevenir riscos sobre o ambiente, saúde humana e valor dos edifícios, incluindo a criação de mecanismos extrajudiciais para uma célere indemnização ou compensação pecuniária por perdas e danos; f) Definir a obrigatoriedade de reconversão da rede eléctrica para cumprir os limites de exposição e distâncias mínimas definidas, dando especial atenção aos locais frequentados pela população infantil ou outros grupos vulneráveis.
Artigo 27.º Riscos climáticos
1 — As alterações climáticas devem ser mitigadas para prevenir os riscos de catástrofe natural ou fenómenos meteorológicos extremos que causem danos ou coloquem em perigo o ambiente, as pessoas e os bens de qualquer natureza, ou que degradem o bem-estar e qualidade de vida das populações e das gerações vindouras.
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2 — A política de mitigação das alterações climáticas deve cumprir, entre outros, os seguintes objectivos:
a) Reduzir a intensidade energética e as emissões de gases de efeito de estufa (GEE), estabelecendo metas vinculativas globais que tenham como mínimo os compromissos internacionais assumidos e as exigências científicas actualizadas; b) Definir metas vinculativas de redução das emissões de GEE e de poupança energética para o sector industrial, o sector da oferta de energia, o sector dos transportes e o sector dos edifícios; c) Prever objectivos, medidas e instrumentos para o cumprimento das metas de redução e poupança nos sectores referidos na alínea anterior, bem como para a redução das emissões e a poupança energética nos demais sectores poluentes, como sejam a agricultura, pecuária e floresta e os resíduos; d) Definir mecanismos de monitorização e controlo eficazes da redução da intensidade energética e das emissões, da melhoria da conservação e eficiência energética, bem como instrumentos de divulgação pública dos resultados; e) Estimular a transferência modal do transporte individual para o colectivo, assegurando uma rede de transportes públicos de qualidade e acesso universal em todo o território nacional, apoiada na ferrovia e demais modos colectivos de transporte, bem como incentivar os modos suaves, em especial na mobilidade urbana; f) Substituir as fontes de energia fósseis pelas renováveis no sector de oferta de energia, reduzir as necessidades de transporte e distribuição de energia entre o produtor e o consumidor, implementar medidas de gestão da procura para a redução do consumo e o uso eficiente da energia; g) Implementar medidas de combate à desflorestação e de promoção de boas práticas na gestão agrícola, pecuária e florestal; h) Promover o consumo responsável, desincentivando o desperdício energético, a produção de resíduos e a produção de bens supérfluos.
3 — Compete ao Estado adoptar medidas específicas para adaptação dos territórios e actividades aos efeitos verificados ou esperados das alterações climáticas, visando concretizar, entre outros, os seguintes objectivos:
a) Prever, prevenir e reduzir os efeitos das alterações climáticas sobre o ambiente, as populações e a economia, reduzindo a vulnerabilidade dos vários sectores potencial ou efectivamente afectados e aumentando a capacidade de resposta a impactes, em particular a fenómenos meteorológicos extremos; b) Identificar e cartografar as zonas mais vulneráveis aos efeitos das alterações climáticas, implementando acções para evitar ou reduzir as suas consequências para o ambiente, pessoas e bens, como sejam a proibição ou condicionamento da construção e instalação de actividades, a sua retirada controlada em zonas de maior risco, a remoção dos factores de agravamento do risco, a contenção dos efeitos verificados ou esperados e o ajustamento dos sistemas de resposta a emergências; c) Promover um ordenamento do território e das actividades adaptado às alterações climáticas, evitando formas de ocupação do solo que acentuem a exposição aos efeitos prejudiciais das alterações climáticas regionais ou locais e dificultem as respostas de prevenção e contenção, ou potenciando ocupações que permitam tirar partido de efeitos climáticos que se revelem vantajosos; d) Estabelecer padrões exigentes para as edificações, infra-estruturas e configuração dos aglomerados populacionais para uma maior resistência a novas características climáticas e a fenómenos extremos; e) Considerar a evolução climática no processo de planeamento e gestão dos recursos hídricos, tomando acções para evitar a ocorrência ou agravamento de situações de cheias ou secas, bem como de degradação da qualidade das águas; f) Prever medidas para a protecção dos recursos biológicos e do património natural e demais componentes ambientais dos efeitos das alterações climáticas; g) Desenvolver planos de emergência para a protecção de pessoas, bens e o ambiente ajustados à previsão dos efeitos climáticos, bem como criar sistemas de alerta precoces para accionamento da protecção civil e demais organismos competentes e informação das populações;
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h) Adaptar os sistemas de saúde para uma resposta eficiente aos efeitos das alterações climáticas com incidência na saúde humana.
4 — É promovido o estudo e investigação científica, com envolvimento das universidades públicas e dos laboratórios do Estado, no domínio das alterações climáticas para, entre outros, prever a evolução do clima, elaborar e actualizar os cenários climáticos e socioeconómicos, identificar riscos e respostas de adaptação, elaborar sistemas de indicadores para monitorização das mudanças climáticas e capacidade de resposta da política de mitigação e adaptação.
5 — A dimensão da mitigação e adaptação climática deve ser introduzida nas políticas de desenvolvimento socioeconómico, nos instrumentos de gestão territorial e demais políticas sectoriais.
Artigo 28.º Riscos químicos e radioactivos
1 — Devem ser prevenidos os riscos para a saúde humana e o ambiente resultantes da produção, manuseamento, transformação, acondicionamento, transporte e utilização de compostos químicos ou substâncias radioactivas.
2 — Em relação aos compostos químicos, são adoptadas medidas para:
a) Proibir ou condicionar a produção e uso de substâncias consideradas perigosas para a segurança e saúde humanas e o ambiente, bem como definir normas para o seu manuseamento e utilização; b) Prevenir a contaminação química, utilizando tecnologias limpas, substituindo contaminantes, isolando a fonte ou neutralizando a perigosidade da substância, bem como actuando sobre o meio de difusão do contaminante e adoptando normas para proteger utilizadores e meios receptores; c) Estabelecer limites máximos admissíveis de poluição e de exposição humana ao amianto, metais pesados e demais substâncias tóxicas; d) Definir valores-limite para os contaminantes químicos nos alimentos, como sejam os resultantes de aditivos, resíduos de pesticidas e medicamentos veterinários, bem como controlar e monitorizar a qualidade destes; e) Obrigar os produtores a implementar sistemas de avaliação dos bens produzidos, antes da sua comercialização, com vista a identificar propriedades nocivas ao ambiente e saúde humana; f) Homologar e rotular os compostos químicos, tais como os pesticidas, solventes, tintas, vernizes e outros tóxicos, incluindo informação para o seu utilizador sobre as propriedades, riscos e medidas preventivas que deve adoptar para um controlo adequado; g) Avaliar de forma sistemática os efeitos potenciais dos compostos químicos sobre o ser humano e o ambiente, bem como homologar os laboratórios de ensaio destinados a este estudo.
3 — Em relação às substâncias radioactivas, são adoptadas medidas para:
a) Fixar normas de emissão para os efluentes físicos e químicos radioactivos resultantes de actividades de extracção, de transporte, de transformação, de utilização e de armazenamento de material radioactivo; b) Planear medidas preventivas necessárias para a actuação imediata em caso de poluição radioactiva; c) Avaliar e controlar os efeitos da poluição transfronteiriça e cooperação internacional para a sua prevenção; d) Proibir o transporte e deposição em território nacional, nas águas marítimas territoriais e na zona económica exclusiva de material radioactivo proveniente de países terceiros; e) Proibir a exploração mineira de substâncias radioactivas junto a aglomerados urbanos e zonas ambientais sensíveis, bem como estabelecer medidas preventivas nos locais onde esta seja permitida para salvaguardar o ambiente e a saúde pública; f) Estabelecer valores-limites para a exposição humana ao radão, inventariar as zonas críticas e monitorizar os níveis de exposição, informar as populações nas zonas de maior risco para a adopção de medidas preventivas, bem como proibir ou condicionar a construção em zonas críticas, exigir que a produção de bens à
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base de granito tenha um baixo teor em radão e prever a aplicação de barreiras entre o solo e os edifícios nas zonas mais afectadas; g) Avaliar os efeitos das substâncias radioactivas nos ecossistemas receptores e na saúde das populações.
Artigo 29.º Riscos biotecnológicos
1 — A manipulação genética dos seres vivos por via laboratorial para obtenção de produtos alimentares está sujeita a legislação específica, de forma a salvaguardar a biodiversidade e a saúde humana.
2 — No caso dos organismos geneticamente modificados (OGM), são tomadas medidas para:
a) Prevenir os riscos de contaminação de culturas agrícolas e outros seres vivos, sendo apenas permitido a produção de OGM para fins de índole científica, sujeita a normas de controlo que evitem esses mesmos riscos; b) Interditar a comercialização de sementes e materiais de propagação vegetativa de OGM, bem como de rações constituídas, no todo ou em parte, por OGM; c) Garantir a rastreabilidade e rotulagem dos OGM destinados a comercialização, incluindo as rações para animais, bem como dos produtos que foram obtidos por meio do uso de OGM.
Artigo 30.º Emergências naturais e tecnológicas
1 — Incumbe ao Estado adoptar medidas específicas para prever, prevenir e minimizar a ocorrência de situações de emergência causadas por factores naturais ou tecnológicos que possam colocar em perigo pessoas, bens e o ambiente, bem como para limitar os seus efeitos.
2 — São factores naturais, nomeadamente, os sismos, cheias e inundações, secas, incêndios florestais, ondas de calor, vagas de frio, nevões, erosão costeira e tsunamis.
3 — São factores tecnológicos, nomeadamente, a ruptura de barragens, derrame ou explosão de substâncias perigosas, contaminação química e biológica da água e alimentos.
4 — A prevenção e controlo de emergências naturais e tecnológicas requer, nomeadamente:
a) O ordenamento da ocupação e usos do território, bem como o planeamento e gestão dos recursos naturais e ecossistemas, ajustados aos riscos; b) A identificação das zonas mais vulneráveis, a promoção da educação cívica, nomeadamente quanto às medidas de segurança a adoptar; c) A elaboração de planos de emergência e a criação de sistemas de alerta; d) A adaptação das construções para uma maior resiliência aos riscos; e e) Medidas de compensação das populações afectadas.
Artigo 31.º Declaração de zonas críticas e de situações de emergência
1 — O Governo declara como zonas críticas todas aquelas em que os níveis de poluição e de riscos naturais ou tecnológicos atinjam, ou se preveja que venham a atingir, valores ou situações que possam pôr em causa a saúde humana ou o ambiente, ficando sujeitas a medidas especiais e a acções a estabelecer pelo organismo do Estado responsável pela protecção civil, em conjugação com as demais autoridades da administração central, regional ou local.
2 — Quando os índices de poluição ou a probabilidade de risco natural ou tecnológico, em determinada área, ultrapassarem os valores ou graus admitidos pela legislação que regulamenta a presente lei ou, por qualquer forma, puserem em perigo a qualidade do ambiente e a saúde e segurança humanas, pode ser declarada situação de emergência, devendo ser previstas actuações específicas, administrativas ou técnicas,
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para lhes fazer face, por parte da administração central, regional e local, acompanhadas do esclarecimento da população afectada.
3 — É feito o planeamento das medidas imediatas necessárias para ocorrer a casos de acidente sempre que estes provoquem aumentos bruscos e significativos dos índices de poluição permitidos ou que, pela sua natureza, façam prever a possibilidade desta ocorrência.
Capítulo IV Instrumentos da política de ambiente
Artigo 32.º Instrumentos
1 — A política de ambiente assenta em instrumentos de planeamento, inventariação e cartografia, avaliação, licenciamento, monitorização e fiscalização.
2 — São instrumentos específicos de política de ambiente, nomeadamente:
a) O sistema de gestão territorial de âmbito nacional, regional, municipal ou sectorial, e demais instrumentos de intervenção no ordenamento do território e urbanismo; b) As restrições e servidões administrativas sobre o território, nomeadamente a Reserva Agrícola Nacional, a Reserva Ecológica Nacional, o domínio público hídrico ou marítimo; c) A classificação e criação de áreas, sítios ou paisagens sujeitas a estatutos especiais de protecção; d) O estabelecimento de critérios, objectivos e normas de qualidade para as emissões, efluentes, resíduos e para os meios receptores; e) O sistema nacional de vigilância e controle da qualidade do ambiente; f) O sistema nacional de defesa da floresta contra incêndios; g) A normalização e homologação de métodos e aparelhos de medida; h) O sistema de incentivos financeiros e económicos para alteração dos processos produtivos e criação e transferência de tecnologias que visem a redução da poluição e a melhoria da qualidade do ambiente; i) O estudo e investigação sobre as potencialidades e as limitações dos recursos naturais, assim como o desenvolvimento, transferência e adequação de tecnologias compatíveis com o desenvolvimento sustentável; j) A criação de órgãos próprios da Administração Pública, com meios capazes, para executar as políticas de ambiente, especialmente em domínios específicos.
Artigo 33.º Planeamento ambiental
1 — O planeamento do ambiente tem por finalidade conciliar o desenvolvimento socioeconómico com a gestão do ambiente, no quadro de um desenvolvimento sustentável.
2 — O planeamento do ambiente inclui estratégias, planos e programas de âmbito nacional, regional, local ou sectorial, estabelecendo orientações, objectivos, metas e medidas para a gestão do ambiente.
3 — Todas as estratégias, planos, programas e projectos de desenvolvimento socioeconómico, sejam de carácter nacional, regional, local ou sectorial, devem integrar a dimensão ambiental e ser elaborados ou adequados às disposições contidas nesta lei, bem como com as políticas, princípios, estratégias, planos e programas de ambiente, gerais ou sectoriais, estabelecidos pelo Ministério com a tutela do ambiente.
4 — As pessoas singulares ou colectivas, públicas e privadas, devem programar e executar as suas actividades de acordo com o planeamento de ambiente e as disposições contidas na presente lei e demais instrumentos legais aplicáveis.
5 — O planeamento ambiental aplica-se aos domínios específicos, nomeadamente do desenvolvimento sustentável, da mitigação e da adaptação às alterações climáticas, da saúde e ambiente, da qualidade do ar, da conservação da natureza e da biodiversidade, do ordenamento do território e do urbanismo, da conservação do solo e do combate à desertificação, dos recursos hídricos e do uso eficiente da água, dos sistemas de abastecimento e saneamento de água, das zonas costeiras e do meio marinho, dos produtos
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químicos e da prevenção de acidentes graves, da prevenção e da gestão de resíduos, do ruído, dos recursos energéticos e do uso eficiente da energia, da prevenção e do controlo integrado da poluição, das compras públicas ecológicas e da rotulagem ecológica.
Artigo 34.º Inventariação e cartografia ambiental
1 — Compete ao Estado proceder à recolha, identificação, caracterização, análise, classificação e sistematização de dados sobre as componentes ambientais e as várias formas de poluição e riscos naturais e tecnológicos, bem como de demais informações de carácter iminentemente ambiental e ligadas ao uso e ocupação do território.
2 — Os dados recolhidos e tratados são traduzidos espacialmente em informação geográfica, a uma escala apropriada ao estudo e apoio à tomada de decisão, permitindo registar a localização, forma e demais atributos que caracterizem os elementos em causa.
3 — A informação ambiental e geográfica é disponibilizada ao público de forma acessível, nomeadamente através de bases de dados e cartográficas criadas para o efeito.
Artigo 35.º Controlo ambiental
1 — O Estado, através de entidade pública competente, exerce o controlo ambiental sobre as actividades e os seus efeitos susceptíveis de degradar o ambiente, sem prejuízo das competências de outras entidades públicas ou privadas previstas na lei, desenvolvendo e promovendo instrumentos de apoio à tomada de decisão, de medição e avaliação da qualidade ambiental e de prevenção e combate ao ilícito ambiental, exercendo ainda o controlo e avaliação dos resultados das políticas de ambiente.
2 — São actividades susceptíveis de degradar o ambiente e estão sujeitas a controlo ambiental, nomeadamente:
a) As que directa ou indirectamente poluam ou deteriorem a atmosfera, água, fundos marinhos, solo e subsolo ou incidam desfavoravelmente sobre a fauna, flora e habitats, entre outras componentes ambientais; b) As que acelerem os processos erosivos ou incentivem os movimentos morfodinâmicos, como desmoronamentos, movimentos de terra, entre outros; c) As que produzam alterações nocivas no ciclo da água, incluindo a geração de sedimentação nos cursos e reservas, alterem as suas dinâmicas físicas, químicas e biológicas; d) As que afectem os equilíbrios das zonas húmidas, estuarinas, e demais zonas naturais sensíveis; e) As relativas à geração, armazenamento, transporte, tratamento, importação e exportação de substâncias minerais, resíduos perigosos, radioactivos e sólidos; f) As relacionadas com a introdução e utilização de produtos ou substâncias não biodegradáveis; g) As que produzam ruídos, vibrações ou odores desagradáveis ou nocivos; h) As que contribuem para a destruição da camada de ozono; i) As que contribuem para as alterações do clima; j) As que produzam radiações térmica, energia térmica, energia luminosa ou campos electromagnéticos; k) As que promovam a acumulação de resíduos; l) A que produzam eutrofização dos recursos hídricos; m) A introdução de espécies exóticas; n) As actividades relativas à libertação de organismos geneticamente modificados, derivados e produtos que os contenham; o) As que alterem as cadeias tróficas, fluxos de matéria e energia das comunidades animais e vegetais; p) As que afectem a sobrevivência de espécies ameaçadas, vulneráveis ou em perigo de extinção; q) As que alterem ou gerem alterações significativas nos ecossistemas de especial importância; r) Quaisquer outras que possam causar dano ao ambiente ou incidir negativamente sobre as comunidades biológicas, a saúde humana e o bem-estar colectivo.
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3 — O Estado, através de entidade pública competente, exerce o controlo prévio ambiental, através dos seguintes instrumentos, sem prejuízo de outros a definir em lei própria:
a) Licenciamento ambiental; b) Avaliação ambiental de planos, programas e projectos.
4 — É permitida a coordenação procedimental dos vários instrumentos de controlo prévio ambiental, com vista ao incremento da eficácia, desde que não se diminua a ponderação, desrespeite o princípio da legalidade da competência ou se prejudiquem as garantias de participação pública.
5 — O Estado, através dos seus órgãos e serviços competentes, exerce o controlo subsequente das actividades susceptíveis de degradar o ambiente, acompanhando a sua execução e operação através do instrumento de monitorização e fiscalização, visando, nomeadamente, assegurar o cumprimento das condições estabelecidas nos projectos e nos instrumentos de controlo prévio ambiental e prevenir ilícitos ambientais.
Artigo 36.º Licenciamento ambiental
1 — As actividades, públicas ou privadas, potencial ou efectivamente poluidoras ou capazes de afectarem significativamente a paisagem, definidas de acordo com a natureza ou capacidade de produção da instalação, estão sujeitas a uma licença ambiental, sem prejuízo de outras autorizações ou licenças exigíveis, nos termos definidos em legislação própria.
2 — Para obtenção de licença ambiental, a actividade tem de assegurar que:
a) É explorada de acordo com as melhores técnicas disponíveis, entre outras medidas de prevenção da poluição; b) Não é susceptível de causar poluição significativa; c) Previne e controla o ruído e a produção de emissões, resíduos e efluentes; d) Utiliza os recursos naturais, a energia e a água de forma eficiente; e) Adopta as medidas necessárias para prevenir os acidentes e limitar os seus efeitos, bem como para evitar qualquer risco de poluição; f) A sua localização é adequada para a actividade em causa e não causa prejuízos para o ambiente e as populações, tendo em conta, entre outros, os impactes cumulativos com outras actividades ou projectos a instalar; g) Repõe o local da exploração em estado ambientalmente satisfatório na fase de desactivação da actividade; h) Realiza a monitorização da actividade e disponibiliza informação ao público.
3 — No procedimento de licença ambiental é garantido o acesso à informação e a participação por parte do público, em todas as fases, devendo os resultados dessa participação ser tidos em consideração na tomada de decisão.
4 — A licença ambiental estabelece medidas destinadas a evitar ou reduzir as emissões dessas actividades para o ar, a água ou o solo, bem como a prevenir e controlar o ruído e produção de resíduos, estabelecendo graus de exigência no mínimo iguais ou mais elevados aos constantes das disposições legais e regulamentares aplicáveis, nomeadamente no que diz respeito aos valores-limite das emissões.
5 — Nas actividades que envolvam substâncias perigosas o operador é abrigado a adoptar as medidas de segurança e planos de emergência necessários para a prevenção de acidentes graves e os seus efeitos, sendo a informação prestada pelo operador no âmbito do pedido de licenciamento ambiental utilizada para efeito da classificação do seu nível de perigosidade e vice-versa.
6 — A atribuição da licença ambiental é insusceptível de deferimento tácito, em virtude do princípio da prevenção da política de ambiente.
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7 — Podem ser introduzidas alterações na licença ambiental ou ser exigida a sua renovação pela entidade pública responsável pelo licenciamento ambiental, quando, em resultado de uma auditoria ou inspecção ambiental ou por denúncia, se verifique que, nomeadamente:
a) A actividade funciona com processos já obsoletos ou geradores de insegurança; b) Os valores-limite de emissões fixados devem ser revistos, incluindo por força de legislação mais recente; c) Existem riscos para o ambiente ou para as populações, nomeadamente por alteração das circunstâncias locais.
Artigo 37.º Avaliação ambiental
1 — Os planos, programas e projectos, públicos ou privados, que possam afectar o ambiente, o território e a qualidade de vida dos cidadãos estão sujeitos a avaliação ambiental, antes da sua aprovação, com a finalidade de prever, analisar e interpretar os prováveis prejuízos e benefícios ambientais, económicos, sociais e culturais, tendo em conta, entre outros, o estado do território, dos locais de incidência e do ambiente, as modificações introduzidas, os impactes cumulativos com outras actividades programadas ou implementadas e a avaliação entre alternativas e o cenário de base.
2 — A avaliação ambiental inclui os instrumentos de:
a) Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), no caso de avaliação de impactes de planos e programas, durante a sua elaboração e antes da sua aprovação, através da integração global das considerações biofísicas, económicas, sociais, culturais e políticas relevantes que possam estar em causa; b) Avaliação de Impacte Ambiental (AIA), no caso de avaliação de impactes de projectos, antes da sua aprovação, através da integração global das considerações biofísicas, económicas, sociais, culturais e políticas relevantes que possam estar em causa.
3 — São definidas em lei própria as condições em que a AAE e a AIA são efectuadas, o seu conteúdo, bem como as entidades responsáveis pela análise das suas conclusões e pela sua aprovação final, sendo a AAE e AIA condição necessária para a autorização ou licenciamento das actividades nela estipuladas e para o início de obras, mesmo que estas sejam preparatórias.
4 — Para efeitos do número anterior, deve garantir-se que os planos, programas e projectos que, em funções das suas características, dimensão, natureza, localização ou efeitos cumulativos com outros planos, programas ou projectos, implementados ou programados, são susceptíveis de ter efeitos significativos no ambiente ou qualidade de vida das populações estão obrigatoriamente sujeitos a avaliação ambiental, independentemente das condições ou limiares estabelecidos para as situações gerais.
5 — O procedimento AIA tem por base a realização de estudos de impacte ambiental (EIA), pluridisciplinares e abrangentes, incluindo, entre outros, os elementos naturais, sociais e patrimoniais, a análise de alternativas, considerando o cenário de base, compreendendo uma efectiva participação pública.
6 — O EIA tem por objecto a recolha de informação, identificação e previsão dos efeitos ambientais e sociais de determinados projectos, bem como a identificação e proposta de medidas que evitem, minimizem ou compensem esses efeitos, tendo em vista uma decisão sobre a viabilidade da execução do projectos e respectiva pós-avaliação.
7 — O parecer elaborado pela entidade responsável por avaliar o EIA e demais documentos relevantes, nos casos em que é negativo por atestar a previsível ocorrência de impactes significativos no ambiente, não minimizáveis ou compensáveis, é vinculativo da decisão final sobre o projecto.
8 — Deve ser garantida a isenção e qualidade dos EIA, através da sua exclusiva realização por entidades credenciadas pelo organismo público do Ministério com a tutela do ambiente responsável pelo procedimento de AIA, estando as mesmas sujeitas a formação e avaliação periódica por este mesmo organismo.
9 — A dispensa, total ou parcial, do procedimento de AIA, apenas pode ser concedida em casos bem definidos de emergência civil, prevendo-se a realização de outros tipos de avaliação dos efeitos ambientais e sociais desses mesmos projectos.
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10 — Nos procedimentos de AAE e AIA é assegurado o acesso à informação e a participação do público, em todas as fases, sendo os resultados dessa participação tidos em consideração na tomada de decisão.
11 — A decisão sobre os processos de avaliação ambiental pelo incumprimento dos prazos fixados para os actos administrativos é insusceptível de deferimento tácito, em virtude do princípio da prevenção da política de ambiente.
12 — A decisão da AIA pode ser alterada ou anulada pelo organismo público do Ministério com a tutela do ambiente responsável pelo procedimento de AIA, a fim de minimizar ou compensar significativos efeitos ambientais ou sociais negativos, não previstos ou incorrectamente estimados ou insuficientemente estudados, ocorridos ou que se prevê venham a ocorrer, durante a construção, funcionamento, exploração ou desactivação do projecto.
13 — A coordenação procedimental entre a AAE e a AIA não dispensa o cumprimento de todas as obrigações relativas ao procedimento de AIA, incluindo a participação pública a tomada de decisão final para cada projecto, elementos essenciais para a monitorização destes projectos e eficácia de autorizações posteriores.
Artigo 38.º Monitorização e fiscalização
1 — O Ministério com a tutela do ambiente assegura um organismo próprio de controlo, auditoria e fiscalização, de âmbito nacional, com a finalidade de assegurar o cumprimento das condições estabelecidas nas licenças ambientais, decisões de AIA e demais instrumentos de controlo prévio, prevenir o ilícito ambiental e exercer funções na área contra-ordenacional e de polícia criminal em matérias de incidência ambiental, apreciar a legalidade e regularidade dos actos praticados pelos serviços e organismos do Ministério ou sujeitos à sua tutela, bem como a sua gestão e resultados técnicos, de desempenho e financeiros, e demais atribuições definidas por lei.
2 — O Ministério com a tutela do ambiente assegura um corpo unificado de vigilantes da natureza, de âmbito nacional, para exercer funções de vigilância, fiscalização, monitorização e sensibilização nas áreas classificadas para protecção, nos termos definidos por lei.
3 — Os serviços e organismos regionais do Ministério com a tutela do ambiente têm ainda competências de controlo e fiscalização nas áreas da sua competência.
4 — O Governo garante adequados meios humanos, logísticos e financeiros para o desempenho eficaz, em todo o território nacional e na rede de áreas protegidas, dos organismos de fiscalização do Ministério com a tutela do ambiente.
5 — O Ministério com a tutela do ambiente assegura um laboratório de referência para, entre outros, monitorizar e controlar a qualidade dos componentes ambientais e prestar apoio aos órgãos e serviços públicos competentes no domínio do ambiente.
Capitulo V Responsabilidades das entidades públicas
Artigo 39.º Competências
1 — Compete ao Governo desenvolver as disposições presentes nesta lei, através da condução de uma política global nos domínios do ambiente, da qualidade de vida e do ordenamento do território, da integração da dimensão ambiental nas políticas de desenvolvimento socioeconómico, bem como da coordenação das políticas de ambiente nos seus âmbitos nacionais, regionais, locais ou sectoriais, e ainda da adopção de medidas adequadas à concretização dos instrumentos da política de ambiente.
2 — O Governo e a administração regional e local articulam entre si a implementação das medidas necessárias à prossecução dos fins previstos na presente lei, nos termos das suas competências.
3 — O Estado é responsável por criar, estabilizar e dar condições de funcionamento, nomeadamente em termos de recursos humanos, meios logísticos e níveis adequados de financiamento, a organismos e serviços
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próprios, pelo menos de âmbito nacional e regional, com a missão de promover, coordenar, apoiar e participar na execução da política de ambiente, em estreita colaboração com demais serviços da administração central, regional e local, nos termos dos princípios e normas estabelecidas na presente lei.
4 — O Estado assegura a existência, a nível nacional, de uma agência pública do ambiente, dotada de personalidade jurídica e autonomia administrativa, destinada, nomeadamente, a:
a) Estudar e propor ao Governo a definição de políticas e a execução de acções de defesa do ambiente; b) Recolher, analisar e disponibilizar ao público, com regularidade, dados sobre o ambiente e a execução da política de ambiente; c) Promover acções no domínio da qualidade do ambiente, incluindo ao nível da formação, informação e participação dos cidadãos na formulação de políticas e nos processos decisórios, do apoio às associações de defesa do ambiente, da monitorização das medidas de combate às alterações climáticas e da aplicação das medidas necessárias ao nível das emergências e riscos ambientais; d) Assumir funções de autoridade nacional em domínios específicos, tais como ao nível dos processos de avaliação ambiental, dos resíduos, da prevenção e controlo integrado da poluição; e) Exercer as competências próprias de licenciamento, qualificação, produção de normas técnicas e uniformização de procedimentos; f) Desenvolver, aplicar e colaborar na acreditação das metodologias analíticas no domínio do ambiente, através de um laboratório de referência próprio; g) Promover e divulgar da informação técnica documental e educativa de carácter ambiental, facilitando o acesso à mesma e definindo estratégias permanentes para a sua difusão.
Artigo 40.º Embargos administrativos
1 — O Estado e demais entidades públicas, no âmbito das respectivas atribuições e competências, gozam do direito de, oficiosamente, ou a requerimento de qualquer interessado, fazer cessar de imediato qualquer violação à presente lei e respectiva regulamentação.
2 — Para tal, a autoridade administrativa competente notifica os agentes responsáveis pela infracção para se absterem, de imediato, da conduta causadora do dano.
Artigo 41.º Regime de invalidade dos actos administrativos
São nulos os actos administrativos que violem o disposto na presente lei e respectiva regulamentação.
Capítulo VI Direitos e deveres dos cidadãos
Artigo 42.º Direitos e deveres
1 — É dever dos cidadãos colaborar na criação de um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado e na melhoria do bem-estar e qualidade de vida, promovendo o progresso social e ambiental.
2 — Os cidadãos têm o direito a informação sobre o ambiente, incumbindo ao Estado o seu cumprimento e difusão, e gozam do direito de participação pública na elaboração, alteração, revisão decisão, execução e controlo das políticas, planos, programas, projectos e acções dirigidas ao ambiente, ordenamento do território e qualidade de vida.
3 — Os cidadãos têm o direito de denunciar às entidades competentes qualquer intenção ou acção que atente contra um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado.
4 — Às iniciativas populares no domínio da melhoria do ambiente e da qualidade de vida, quer surjam de forma espontânea quer por via de um apelo da administração central, regional ou local, deve ser dispensada
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protecção adequada, através dos meios necessários à prossecução dos objectivos do regime previsto na presente lei.
5 — Os cidadãos directamente ameaçados ou lesados no seu direito a um ambiente seguro, sadio e ecologicamente equilibrado podem pedir, nos termos gerais do direito, a cessação das causas de violação, a sua reparação e devida indemnização, sendo assegurada a isenção de preparos nos processos para reparação de perdas e danos.
6 — Os cidadãos têm o direito de se constituir em associações, organizações ou plataformas de defesa do ambiente, formais ou informais, gerais ou sectoriais, com o objectivo de defesa do ambiente, do património, do ordenamento territorial ou dos consumidores, de âmbito internacional, nacional, regional ou local, podendo estas associar-se entre si.
7 — As associações, organizações ou plataformas de ambiente gozam de direitos procedimentais, administrativos e judiciais, bem como de participação especial, nos termos regulados pela presente lei e por legislação especial.
8 — As associações, organizações e plataformas de defesa do ambiente gozam do direito de participação nos processos decisórios da política de ambiente.
Artigo 43.º Informação e participação pública
1 — Compete ao Estado estabelecer e manter um sistema de informação de ambiente, no qual estão disponíveis os dados biofísicos, económicos e sociais, a análise de indicadores ambientais, bem como vários recursos documentais e toda a informação legal relacionada com o ambiente e o território.
2 — Os dados referidos no número anterior são de livre consulta e, caso sejam de interesse geral, devem ser difundidos periodicamente através de meios eficazes.
3 — Os cidadãos e associações gozam do direito de livre acesso aos documentos administrativos relativos a matérias ambientais, gratuitamente, e em tempo útil, nos termos que vierem a ser regulamentados.
4 — Os meios de comunicação social e difusão devem incorporar na sua programação os temas ambientais que propiciem informação e formação sobre o ambiente e relação com processos de desenvolvimento socioeconómico, fomentando a educação ambiental.
5 — A participação pública é realizada em todas as fases da política e dos instrumentos de ambiente, através da difusão de informação simples e compreensível ao público afectado e interessado, por meio de audiências públicas e demais acções interactivas, inclusivas e equitativas, sendo os resultados da participação tidos em consideração na tomada de decisão.
6 — Nos procedimentos de consulta pública, o contributo de um conjunto de associações é ponderado tendo em conta o número de associações e o contributo de uma associação é ponderado de acordo com o número de associados.
Capítulo VII Danos ambientais
Artigo 44.º Responsabilidade ambiental
1 — Os danos causados ao ambiente constituem o agente na obrigação de reparar, a expensas suas, o dano causado.
2 — Existe obrigação de reparar os danos, independentemente da culpa, quando estes sejam resultado de conduta perigosa do agente, ainda que este tenha agido de acordo com as normas aplicáveis.
Artigo 45.º Princípio da reparação em espécie
1 — Os danos causados ao ambiente são reparados através da reconstituição da situação anterior à produção dos danos, a expensas do agente responsável.
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2 — Quando não for possível a reposição da situação anterior, por irreversibilidade dos danos causados, o agente fica obrigado à realização das prestações e obras necessárias à minimização dos danos provocados e ao pagamento de uma indemnização especial, nos termos a definir em legislação especial.
Artigo 46.º Incumprimento
1 — O incumprimento de decisão judicial que ponha termo ao processo, ou cujo recurso não tenha efeitos suspensivos, em processo principal ou cautelar, constitui o agente visado na obrigação de pagamento de sanção pecuniária compulsória, a fixar na respectiva decisão, nos termos gerais.
2 — As entidades públicas competentes, nos casos de incumprimento previstos no número anterior, podem substituir-se ao agente responsável, efectuando todas as prestações e obras necessárias à reposição da situação anterior ao dano, a expensas do deste.
Artigo 47.º Seguro de responsabilidade civil
O exercício de actividade de risco para o ambiente obriga o responsável pela actividade a segurar a sua responsabilidade civil.
Artigo 48.º Tutela jurisdicional
1 — Têm legitimidade para propor acções e outros processos judiciais para assegurar e reagir contra condutas e actos que ponham em causa os direitos e interesses legalmente protegidos pela presente lei, e pelas leis que a regulamentam:
a) O Ministério Público; b) As autarquias locais e respectivas associações; c) As organizações de moradores; d) As associações de defesa do ambiente; e) Todos os cidadãos, independentemente de possuírem interesse pessoal e directo na demanda.
2 — O Ministério Público tem o dever funcional de propor as acções a que se refere o número anterior.
Artigo 49.º Procedimentos cautelares
1 — A tutela cautelar dos direitos e interesses legalmente protegidos pela presente lei, e pelas leis que a regulamentam, assegura a efectivação judicial do princípio da precaução.
2 — A interposição de processo cautelar para assegurar os direitos e interesses legalmente protegidos pela presente lei e respectiva regulamentação suspende, após a notificação aos requeridos, todos os actos administrativos, negócios jurídicos e actuações susceptíveis de pôr em causa tais direitos e interesses legalmente protegidos até à decisão final no procedimento cautelar.
3 — Quando o procedimento cautelar não seja da autoria do Ministério Público, os requeridos, por ponderosas razões de interesse público, ou invocando a violação do princípio da proporcionalidade, podem requerer ao tribunal que afaste o regime do número anterior, decidindo o tribunal no prazo de cinco dias.
4 — Apenas poderá haver lugar à condenação em indemnização aos requeridos e contra-interessados, pelos danos resultantes da proposição de procedimento cautelar quando, cumulativamente:
a) O procedimento cautelar não dê origem a decisão que decrete medida cautelar; b) A decisão de não decretamento de medida cautelar se funde no interesse público; e
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c) Os requerentes tenham sido condenados em litigância de má fé.
Artigo 50.º Custas e encargos judiciais
Os autores dos processos estão isentos de custas, preparos e quaisquer encargos judiciais com os processos que proponham, excepto quando sejam condenados, nos termos gerais, por litigância de má fé.
Artigo 51.º Mecanismos extra-judiciais de resolução de conflitos em matéria ambiental
1 — É criado um sistema de mediação ambiental, de âmbito nacional, tendo em vista uma resolução célere e eficaz dos conflitos na área do ambiente.
2 — É assegurada uma rede de centros de arbitragem em matéria ambiental, visando a composição equitativa dos litígios e uma ponderação proporcional entre os interesses das partes.
3 — Os julgados de paz têm competência em matéria ambiental nas áreas especificamente previstas por lei.
4 — Os mecanismos previstos nos números anteriores devem assegurar a especial protecção dos bens ambientais e do interesse público.
5 — É assegurada a adequada participação dos titulares de interesses legalmente protegidos, incluindo de direitos difusos, em matéria ambiental, nos mecanismos previstos nos números anteriores.
Capítulo VIII Responsabilidade penal e contra-ordenacional
Artigo 52.º Crimes ambientais
1 — A lei define como crime as condutas que violem a presente lei e respectiva regulamentação e que, pela sua gravidade, mereçam tal qualificação.
2 — Os crimes ambientais são punidos com pena principal e com penas acessórias, incluindo a perda de subsídios e a impossibilidade de recorrer a outros apoios públicos.
3 — A tentativa e a negligência são puníveis.
4 — Quando a mesma conduta constitua crime e contra-ordenação, o infractor é punido de acordo com a responsabilidade criminal, sem prejuízo da aplicação do regime das sanções acessórias previstas para as contra-ordenações, quando não estejam previstas sanções acessórias para a prática do crime.
Artigo 53.º Contra-ordenações ambientais
1 — A lei prevê define contra-ordenação as condutas que violem a presente lei e respectiva regulamentação que, pela sua gravidade, mereçam tal qualificação.
2 — As contra-ordenações ambientais são punidas com coima e com penas acessórias.
3 — A tentativa e a negligência são puníveis.
Artigo 54.º Regime de prescrições
O regime de contra-ordenações ambientais está sujeito a um regime de prazos especial, a definir por lei, com vista a uma efectiva protecção aos bens jurídicos e direitos e interesses legalmente protegidos pela presente lei e respectiva regulamentação.
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Capitulo IX Disposições finais
Artigo 55.º Avaliação da política de ambiente
1 — O Governo apresenta à Assembleia da República, juntamente com as Grandes Opções do Plano de cada ano, um relatório sobre o estado do ambiente e o ordenamento do território em Portugal referente ao ano anterior.
2 — O Governo apresenta à Assembleia da República, de três em três anos, um livro branco sobre o estado do ambiente em Portugal, no qual é feito um balanço da execução das políticas de ambiente nacionais, da sua articulação com as políticas europeias e as convenções e acordos internacionais, e são discutidos os princípios orientadores e as formas de articulação das políticas e instrumentos sectoriais com incidência ambiental.
Artigo 56.º Convenções e acordos internacionais
A regulamentação, as normas e, de um modo geral, toda a matéria incluída em matéria especial que regulamentará a aplicação da presente lei terão em conta as convenções e acordos internacionais aceites e ratificados por Portugal e que tenham a ver com a matéria em causa, assim como as normas e critérios aprovados multi ou bilateralmente entre Portugal e outros países.
Artigo 57.º Norma revogatória
É revogada a Lei n.º 11/87, de 7 de Abril.
Artigo 58.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 11 de Fevereiro de 2011.
Os Deputados e as Deputadas do BE: Rita Calvário — Pedro Soares — José Manuel Pureza — José Moura Soeiro — José Gusmão — Pedro Filipe Soares — João Semedo — Francisco Louçã — Heitor Sousa — Ana Drago — José Duarte Costa — Luís Fazenda — Mariana Aiveca — Cecília Honório — Helena Pinto — Catarina Martins.
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PROJECTO DE LEI N.º 516/XI (2.ª) REVÊ O REGIME LABORAL DOS AJUDANTES FAMILIARES
A prossecução das funções sociais do Estado tem-se vindo a desenvolver e aperfeiçoar em diversas vertentes, nomeadamente nas modalidades de apoio social a famílias e indivíduos que se encontram em situação de isolamento, dependência ou marginalização social, designadamente a idosos e deficientes.
Uma das formas que tem contribuído para a concretização daquele objectivo é a ajuda prestada no domicílio às famílias cujos membros, por razões de vária ordem, não podem assegurar com normalidade as tarefas inerentes à vida pessoal e familiar.
Verifica-se, porém, que o enquadramento jurídico consagrado para os designados «ajudantes familiares» não se coaduna com a realidade laboral em que prosseguem as suas funções.
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Trata-se, na verdade, de trabalho subordinado e com cumprimento de horário e não trabalho independente como a lei, datada de 1989, prevê.
De facto, estes trabalhadores enquadram-se no regime dos trabalhadores dependentes, uma vez que a actividade é realizada em local pertencente ao seu beneficiário ou por ele determinado, os equipamentos e instrumentos de trabalho utilizados pertencem ao beneficiário da actividade, o prestador de actividade observa horas de início e de termo da prestação, determinadas pelo beneficiário da mesma, e é paga, com determinada periodicidade, uma quantia certa ao prestador de actividade, como contrapartida da mesma.
Todos estes factores são presunções da existência de um verdadeiro contrato de trabalho nos termos do artigo 12.º do Código do Trabalho.
Estes trabalhadores têm visto os seus direitos negados, nomeadamente o direito a férias, subsídio de férias e de natal, descontos para a segurança social com garantia de protecção nas diversas eventualidades previstas para os trabalhadores por conta de outrem, quando, no fundo, são, de facto e de direito, trabalhadores dependentes, importando corrigir esta injustiça.
Artigo 1.º Alteração ao Decreto-lei n.º 141/89, de 28 de Abril
Os artigos 9.º, 10.º, 14.º e 16.º passam a ter a seguinte redacção:
«Artigo 9.º Ajuda familiar
Após o decurso do período de formação com aproveitamento dos interessados, a realização da ajuda domiciliária é ajustada com instituições de suporte, nos termos dos artigos seguintes.
Artigo 10.º (…) A formalização do contrato de trabalho obedece aos requisitos e normas estabelecidas na Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprova o Código do Trabalho, sobre o contrato de trabalho sem termo.
Artigo 14.º Requisitos especiais
Devem constar do documento previsto no artigo 10.º as regras a que obedece a ajuda familiar, nomeadamente quanto ao número de pessoas ou famílias a apoiar.
Artigo 16.º (…) Os ajudantes familiares ficam obrigatoriamente enquadrados no regime de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem.»
Artigo 2.º Norma revogatória
São revogados os artigos 13.º, 15.º e 17.º do Decreto-Lei n.º 141/89, de 28 de Abril.
Artigo 3.º Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no primeiro dia após a publicação do Orçamento do Estado posterior à sua publicação.
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Assembleia da República, 9 de Fevereiro de 2011 Os Deputados do PCP: Jorge Machado — Rita Rato — Bernardino Soares — António Filipe — Bruno Dias — Paula Santos — João Ramos — Miguel Tiago — João Oliveira — Agostinho Lopes.
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PROJECTO DE LEI N.º 517/XI (2.ª) PROÍBE A COBRANÇA A MUNÍCIPES, UTENTES OU CONSUMIDORES DE ENCARGOS SOBRE O USO DO SUBSOLO DO DOMÍNIO PÚBLICO
Preâmbulo
A Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicações Electrónicas), veio criar, genericamente, a taxa municipal de direitos de passagem e estabeleceu a possibilidade de os municípios a criarem em concreto para ter aplicação nos seus territórios.
Esta taxa, tanto pela forma de cálculo, e, em consequência, pela sua total independência da contraprestação oferecida pelos entes públicos titulares do direito à sua arrecadação, como pelos sujeitos da relação tributária, não os directos beneficiários do direito a dispor de parcelas do domínio público municipal, mas os utilizadores finais, os cidadãos em geral que e porque façam uma comunicação telefónica através da respectiva rede fixa, é, em verdade, um imposto da mais duvidosa constitucionalidade.
Por outro lado, a sua aplicação ficou, desde logo, inquinada e, mesmo nos casos em que certos municípios dela lançaram mão, há sinais de recuo recente.
É justa a reivindicação de há muito dos municípios, aliás consagrada na Lei das Finanças Locais, no sentido de serem ressarcidos dos ónus gerados sobre os seus territórios e da livre utilização do seu domínio público pelas concessionários de serviços que utilizem infra-estruturas de subsolo. Nesse sentido, há que tomar as medidas adequadas para que a taxa de direitos de passagem se conforme minimamente com o quadro constitucional e se transforme em algo que os municípios possam aplicar sem reservas outras que não sejam as suas opções de políticas financeiras.
Alterar a estrutura da taxa parece ser uma necessidade a satisfazer a prazo tão breve quanto possível, restabelecendo uma relação mais directa com a fonte que legitima a sua cobrança, mas, necessitando maior ponderação, não se coaduna com a urgência no saneamento do quadro descrito e, além disso, não é imperioso para que ela se possa manter no ordenamento jurídico venha a obter mais ampla concretização e cessem os justos protestos de que tem sido alvo.
Basta, para tanto, repor a relação tributária nos seu precisos termos, a saber consagrar que o seu sujeito é quem, de facto, directamente beneficia da apropriação parcial do domínio público municipal, cuja natureza, a este respeito, não difere da do proprietário de um estabelecimento de restauração com esplanada em espaço público — ele é o devedor efectivo da taxa e esta será, quando muito, um custo da sua actividade.
As concessionárias dos serviços que utilizam infra-estruturas no subsolo, após anos de processos em tribunal, até ao Supremo Tribunal Administrativo, foram condenadas a pagar a taxa municipal de direito de passagem, mas, no entanto, conseguiram do Governo a inserção nos contratos de concessão da introdução de mecanismos que permitem repercutir os montantes pagos sobre o consumidor final, conforme fixado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 98/2008, de 8 de Abril. Os consumidores não só pagam o serviço que lhes é prestado, como também os custos internos associados, da responsabilidade dos próprios concessionários.
Algumas concessionárias de serviços essenciais estão já a cobrar aos consumidores, na respectiva facturação, uma taxa referente à utilização do subsolo, responsabilizando os municípios. Não é aceitável que, por exemplo, concessionárias de serviços como a PT ou a EDP, que anualmente obtém lucros escandalosos, cobrem a taxa municipal de direito de passagem aos consumidores, exigindo um maior esforço no acesso a serviços essenciais.
Assim, o PCP propõe que seja proibido repercutir sobre os consumidores os custos associados à actividade das concessionárias de serviços e proibir a cobrança de qualquer outro encargo,
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independentemente da sua designação, que permita às concessionárias a obtenção de receitas pela utilização do uso do subsolo do domínio público.
Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte projecto de lei:
Artigo 1.º Objecto
A presente lei tem como objecto:
a) Proibir que recaiam sobre os utentes e consumidores a cobrança de Taxas Municipais de Direitos de Passagem (TMDP) devidas aos municípios por entidades e empresas que ofereçam redes e serviços essenciais; b) Proibir a cobrança de qualquer outro encargo que vise a obtenção de vantagem pecuniária por parte das entidades ou empresas referidas na alínea anterior pelo encargo da utilização do uso do subsolo do domínio público no âmbito da sua actividade e prestação de serviço.
Artigo 2.º Cobrança
É vedado às entidades ou empresas que ofereçam redes e serviços essenciais cobrar aos utentes e consumidores qualquer tipo de taxa ou encargo relativo à taxa municipal de direitos de passagem ou de qualquer uso do subsolo do domínio público devida por estes ao município.
Artigo 3.º Responsabilidade contra-ordenacional
1 — A violação do disposto na presente lei é punida com coima nos montantes e nos limites referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na sua redacção actual.
2 — A tentativa e a negligência são puníveis, sendo, nesses casos, reduzidos a metade os limites mínimo e máximo das coimas previstas no número anterior.
Artigo 4.º Fiscalização e aplicação das coimas
1 — A fiscalização do disposto na presente lei, a instrução dos processos de contra-ordenação e a aplicação das respectivas coimas são da competência da Autoridade da Concorrência.
2 — O valor das coimas reverte 60% para o Estado e 40% para a Autoridade da Concorrência.
Artigo 5.º Direito subsidiário
Em tudo o que não se encontra previsto na presente lei é aplicável o Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro, na sua redacção actual, que aprovou o regime geral das contra-ordenações.
Artigo 6.º Alteração à Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro
É alterado o artigo 106.º da Lei n.º 5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicações Electrónicas), que passa a ter a seguinte redacção:
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«Artigo 106.º (… )
1 — (… ) 2 — (… ) 3 — Nos municípios em que seja cobrada a taxa municipal de direitos de passagem (TMDP) as empresas que oferecem redes e serviços de comunicações electrónicas acessíveis ao público em local fixo são responsáveis pelo seu pagamento, não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.
4 — (… )»
Artigo 7.º Aditamentos à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, e à Lei n.º 24/96, de 31 de Julho
1 — É aditado o artigo 10.º-C à Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, alterada pela Lei n.º 12/2008, de 26 de Fevereiro (Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais), com a seguinte redacção:
«Lei n.º 23/96, de 26 de Julho Cria no ordenamento jurídico alguns mecanismos destinados a proteger o utente de serviços públicos essenciais
(…) Artigo 10.º-C Taxa municipal de direito de passagem ou de uso do subsolo do domínio público
Nos municípios em que seja cobrada a Taxa Municipal de Direitos de Passagem (TMDP), ou qualquer encargo pelo uso do subsolo do domínio público, as empresas ou entidades concessionárias, que oferecem redes e serviços essenciais, são responsáveis pelo encargo e respectivo pagamento, não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.»
2 — É aditado o artigo 9.º-A à Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, alterada pela Lei n.º 8/98, de 16 de Dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril (Lei de Defesa do Consumidor), com a seguinte redacção:
«Lei n.º 24/96, de 31 de Julho Lei de defesa do consumidor
(…) Artigo 9.º-A Taxa municipal de direito de passagem ou de uso do subsolo do domínio público
Nos municípios em que seja cobrada a Taxa Municipal de Direitos de Passagem (TMDP), ou qualquer encargo pelo uso do subsolo do domínio público, as empresas ou entidades concessionárias, que oferecem redes e serviços essenciais, são responsáveis pelo encargo e respectivo pagamento, não podendo, por nenhuma forma, fazê-lo repercutir sobre os munícipes, utentes ou consumidores.»
Assembleia da República, 9 de Fevereiro de 2011 Os Deputados do PCP: Paula Santos — João Ramos — Bruno Dias — Bernardino Soares — Honório Novo — Rita Rato — Miguel Tiago — Jorge Machado.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 392/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO PROPOR ALTERAÇÕES NA ESTRUTURA TARIFÁRIA PRATICADA PELA ÁGUAS DA REGIÃO DE AVEIRO
Portugal enfrenta uma grave crise económica e social, a exemplo do que acontece noutros países. O aumento da pobreza disparou a par com o aumento da taxa de desemprego. A actividade económica tem diminuído e o tecido económico encontra-se também em enormes dificuldades.
O Instituto Nacional de Estatística (INE) registou, no terceiro trimestre de 2010, uma taxa de desemprego de 10,9%. Falamos de 609,4 000 indivíduos. O Eurostat apresenta números mais densos. Segundo esta entidade, já existiam, em Novembro de 2010, 615 000 desempregados, o que equivale a uma taxa de desemprego de 11%, acima dos 10,1% da Zona Euro e dos 9,6% da Europa dos 27. Os últimos dados do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) sobre o distrito de Aveiro dão conta da existência de 38 451 desempregados. A realidade destes números será, porém, bastante mais dramática, em consequência da subavaliação das estatísticas do desemprego.
O preço de bens essenciais assume ainda maior relevância em tempo de crise. O peso dos bens essenciais, nos orçamentos familiares cada vez mais curtos, constitui um factor a ter em conta nas políticas públicas. O preço da água na região de Aveiro é um dos exemplos de um bem essencial cujas alterações de preço poderão ter um enorme reflexo nos orçamentos das famílias e na economia. Por outro lado, não cumpre a recomendação da ERSAR — Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos —, que indicou às autarquias a criação de uma tarifa especial para os mais carenciados, situação não prevista no actual regime tarifário da AdRA — Águas da Região de Aveiro, SA.
Os aumentos propostos pela empresa AdRA — Águas da Região de Aveiro, SA, criarão um novo foco de pressão sobre o orçamento das famílias e das empresas da região. Os aumentos propostos estão entre os 2,5% e os 21,4%, conforme o concelho. Estes aumentos são inaceitáveis e colocam o preço da água na região de Aveiro bastante superior ao que se verifica em Lisboa, a região mais rica do País. Esta política de preços tem de ser alterada, sob o perigo de acrescentar ainda mais crise à crise já existente. O Governo, através da empresa AdP — Águas de Portugal, SGPS, SA, detentora de 51% do capital social da AdRA, poderá propor a suspensão dos aumentos propostos.
O Bloco de Esquerda, não esquecendo que a competência para a fixação dos preços de abastecimento de água é uma competência das autarquias, considera que a AdP — Águas de Portugal, SGPS, SA, nesta situação em concreto, poderá ser o motor de uma alteração tarifária que beneficie os utentes.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
Através da participação que a AdP — Águas de Portugal, SGPS, SA — detém na AdRA — Águas da Região de Aveiro, SA — proponha a revisão do contrato de gestão, tendo em conta as seguintes linhas políticas para a determinação do preço da água na região de Aveiro:
a) Que o aumento do preço da água por metro cúbico para cada concelho não seja superior à taxa de inflação; b) Que não exista aumento do preço da água nos concelhos que já praticam tarifas superiores à tarifa média dos concelhos servidos pela AdRA — Águas da Região de Aveiro, SA; c) Que seja tomado como referência a progressividade do tarifário de água pelo modelo actualmente existente no concelho de Águeda; d) Que seja criado um tarifário social para utentes domésticos em situação de carência económica, o qual deve ser comprovada pelo utente junto do prestador do serviço mediante entrega de declaração da segurança social.
Palácio de São Bento, 11 de Fevereiro de 2011 Os Deputados e as Deputadas do BE Pedro Filipe Soares — Rita Calvário — José Manuel Pureza — Mariana Aiveca — Cecília Honório — Helena Pinto — Catarina Martins — José Moura Soeiro — José Gusmão
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— João Semedo — Francisco Louçã — Heitor Sousa — Ana Drago — Jorge Duarte Costa — Pedro Soares — Luís Fazenda.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 393/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO A NÃO INTRODUÇÃO DE PORTAGENS NA A23
Em nome da aplicação do princípio do «utilizador-pagador», o Governo PS, com o apoio do PSD, tenciona aplicar, a partir de Abril de 2011, um regime de portagens na auto-estrada A23, entre a saída da A1 em Videla/Torres Novas e a A25 nas proximidades da Guarda. A aplicação desse princípio conduz a situações de manifesta injustiça e a aplicação de portagens na A23 é um exemplo flagrante disso mesmo.
A não aplicação de portagens nas chamadas SCUT foi sempre justificada pelo Governo, justamente, com a necessidade de compensar as regiões do interior do País com medidas de discriminação positiva tendo em conta as manifestas assimetrias regionais existentes. O propósito de manter tais vias sem portagens foi, aliás, assumido expressamente no programa do actual Governo.
Porém, na sequência de um processo lamentável de negociação entre o PS e o PSD, ambos os partidos conduziram à decisão governamental de aplicar o princípio do «utilizador-pagador» a todo a País, de forma cega, incluindo as concessões consideradas SCUT e outras que nunca o foram e que foram sempre consideradas como vias sem portagens. Estão neste caso os troços da A23 entre Videla/Torres Novas e Abrantes Oeste, que nunca estiveram integrados na concessão da Scutvias e cuja manutenção é assegurada directamente pela empresa Estradas de Portugal.
Acontece que a introdução de portagens na A23 terá consequências profundamente negativas para as populações e para o tecido económico das regiões atingidas. Trata-se de uma dupla discriminação das regiões do interior. Com efeito, essas portagens vão onerar de uma forma desproporcionada e injusta as populações e as empresas dos distritos de Santarém, Portalegre, Castelo Branco e Guarda. Para além de agravar as dificuldades económicas dos utentes, já duramente afectados por cortes salariais, pelo aumento do custo de vida, por situações de desemprego e precariedade e por baixos níveis de rendimentos, esta medida conduzirá ao agravamento da situação económica de muitas empresas, podendo levar mesmo ao encerramento de muitas delas, assim como dificultará em muito a vida de inúmeras pessoas que utilizam esta via para se deslocar diariamente para o trabalho. A introdução de portagens na A23 não será uma medida para combater a crise, mas, pelo contrário, só virá contribuir para agravar a crise.
Acresce que não há alternativas à A23. Em diversos troços, a A23 foi construída sobre os anteriores itinerários, tornando inevitável a sua utilização. Em outros troços, a não utilização da A23 obriga à circulação pelo interior das localidades. Em outros troços, ainda, evitar a A23 obriga a circular em estradas quase intransitáveis. O trajecto entre Torres Novas e a Guarda sem passar pela A23, utilizando a EN 118, o IP2 e a EN 18, obriga a percorrer 231 km e demora seguramente mais de quatro horas. Pela A23 a distância é de 207 km e tem uma duração média de 2,10 horas. Não há, como é evidente, nenhuma alternativa viável à A23. A introdução de portagens na A23 representa um retrocesso de décadas nas acessibilidades dos distritos de Santarém, Portalegre, Castelo Branco e Guarda.
Por outro lado, com a aplicação do princípio do «utilizador-pagador», o Governo transfere o esforço financeiro colectivo e solidário do País para as populações que são obrigadas a custear a utilização desta infra-estrutura, estruturante para as respectivas regiões. Desta forma, estará a aumentar o custo por utilização, diminuindo gravemente os índices de eficiência desta via e gerando elevadas perdas de competitividade das empresas e o agravamento da qualidade de vida das populações afectadas.
Sob o argumento da consolidação orçamental o Governo está a garantir a manutenção de rendas para os grupos económicos e financeiras através da portagem paga pelos utilizadores e pelas transferências da Estradas de Portugal, em compensação pelos défices de exploração hoje existentes e que tenderão a agravarse, no futuro.
A introdução de portagens na A23 tem suscitado um generalizado repúdio por parte das populações, autarquias e associações empresariais afectadas. O PCP associa-se a esse justo protesto, fará tudo o que estiver ao seu alcance para evitar a imposição dessa injusta medida e considera que esse objectivo é
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perfeitamente atingível se todos os deputados eleitos pelos círculos eleitorais atingidos mantiverem na Assembleia da República as posições que têm manifestado junto das populações que os elegeram.
O Grupo Parlamentar do PCP, ao apresentar o presente projecto de resolução, pretende dar à Assembleia da República a possibilidade de se pronunciar de forma clara sobre a introdução de portagens na A23 aprovando uma recomendação que o Governo, enquanto órgão que responde politicamente perante a Assembleia da República, não pode deixar de cumprir.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, Os Deputados abaixo assinados, do Grupo Parlamentar do PCP, propõem que a Assembleia da República adopte a seguinte resolução:
A Assembleia da República recomenda ao Governo a não aplicação de portagens na A23.
Assembleia da República, 9 de Fevereiro de 2011 Os Deputados do PCP: António Filipe — Paula Santos — João Oliveira — Bernardino Soares — Miguel Tiago — João Ramos — Bruno Dias — Rita Rato — Jorge Machado — Agostinho Lopes — Honório Novo.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 394/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO QUE REVOGUE O DESPACHO N.º 19 264/2010, DE 29 DE DEZEMBRO, E QUE PROCEDA, COM CARÁCTER DE URGÊNCIA, À REVISÃO DO ENQUADRAMENTO LEGAL DO TRANSPORTE DE DOENTES NÃO URGENTES, DE ACORDO COM PRINCÍPIOS DE EQUIDADE SOCIAL, FINANCEIRA E TERRITORIAL
O transporte de doentes não urgentes está regulado pelo Decreto-Lei n.º 38/92, de 28 de Março, que reconhece a «grande relevância na prestação dos cuidados de saúde» que esta actividade assume, «independentemente de quem a exerce». Na verdade, e embora muito menos sujeita à exposição pública e escrutínio mediático do que o transporte de doentes urgentes, o transporte de doentes não urgentes constitui um eixo central no acesso equitativo dos cidadãos a cuidados de saúde.
O número crescente de doentes crónicos, a necessidade de tratamentos continuados e prolongados e as assimetrias na distribuição geográfica de unidades de saúde especializadas são apenas alguns dos factores que tornam um sistema de transporte adequado uma actividade instrumental ao cumprimento da Lei de Bases da Saúde, nos termos da qual é objectivo fundamental da política de saúde «obter a igualdade dos cidadãos no acesso aos cuidados de saúde, seja qual for a sua condição económica, e onde quer que vivam».
De igual modo, a Lei de Bases da Saúde determina que é dever do Serviço Nacional de Saúde «garantir a equidade no acesso dos utentes, com o objectivo de atenuar os efeitos das desigualdades económicas, geográficas e quaisquer outras no acesso aos cuidados».
Convém, também, relembrar que a melhoria da rede de transporte de doentes foi a contrapartida anunciada pelo Governo socialista para o encerramento de maternidades e de outros serviços (nomeadamente serviços de atendimento permanente e serviços de urgência) pelo País fora.
No entanto, já no Relatório do Orçamento do Estado para 2011 aprovado pelo PS e pelo PSD, o Governo anunciava, como uma das medidas a adoptar com vista à consolidação da despesa, a «revisão da legislação do transporte de doentes não urgentes». Tendo em conta os antecedentes do Governo no que se refere à aleatoriedade e insensibilidade das medidas de contenção da despesa, não seria, pois, de estranhar que a «revisão da legislação» seguisse o mesmo rumo: o da mera restrição do acesso por parte dos utentes, independentemente de questões que possam conferir gravidade e prioridade clínica a determinadas situações.
Assim foi. O Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro, veio enunciar as «orientações referentes ao direito de transporte de doentes não urgentes e a sua articulação com a condição de recursos», remetendo para uma «fase posterior um quadro normalizador global através de um regulamento geral».
Para o efeito, determina-se que «o pagamento do transporte de doentes não urgentes é garantido aos utentes nas situações que preencham simultaneamente os seguintes requisitos:
a) Em caso que clinicamente se justifique;
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b) Em caso de insuficiência económica.»
Mais determina o Despacho n.º 19 264/2010 que a insuficiência económica seja aferida e demonstrada nos termos do Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, que procede à harmonização dos critérios para acesso a apoios sociais não contributivos cujo acesso tenha subjacente a verificação de condição de recursos.
A actual regulação tem-se revelado, é certo, inadequada e insuficiente, carecendo de actualização, harmonização e adaptação a vários níveis. Mas o Despacho n.º 19 264/2010 gera uma série de perplexidades inaceitáveis.
Em primeiro lugar, não se compreende que o Governo emita um despacho que enuncia meras «orientações» que deverão ser desenvolvidas, em momento posterior, através de um regulamento geral.
Menos ainda se compreende que estas «orientações» tenham entrado em vigor no dia 1 de Janeiro de 2011, sem o referido regulamento geral.
Em segundo lugar, é inaceitável a exigência dos dois requisitos cumulativos para que o pagamento do transporte seja garantido. Desde logo, porque se o transporte dos doentes é uma «actividade instrumental à prestação de cuidados de saúde» não poderá, sem mais, estar sujeita a condição de recursos. Por mero despacho, o Governo introduziu um entrave à universalidade do SNS.
Depois, o despacho que entrou em vigor no dia 1 de Janeiro p.p. não define o que considera «insuficiência económica» para efeitos de garantia de pagamento do transporte pelo SNS. Nos termos do artigo 2.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 70/2010, de 16 de Junho, «a condição de recursos de cada prestação de segurança social ou apoio social consta do respectivo regime jurídico». Como ainda não está definido o regime jurídico, será o rendimento per capita de 1 IAS (419,22 euros) do agregado familiar? Ou 2 IAS? Ou 3…? E ainda que fosse determinado, em abstracto, o limiar da insuficiência económica, este acarretaria enormes injustiças. Como comparar a deslocação, por exemplo, ao IPO do Porto de um doente oncológico residente em Gaia com a deslocação de um doente residente em Bragança? Quando se tem de pagar regular ou permanentemente 0,48 euros por km para um trajecto de 400 quilómetros, a suficiência económica fica muito questionável.
Perante a perturbação gerada, a Administração Central dos Sistemas de Saúde (ACSS) emitiu uma circular administrativa de legalidade duvidosa na medida em que suspende a aplicação parcial do despacho governamental no que se refere ao critério da insuficiência económica, gerando, assim, uma situação de contornos pouco claros.
Por outro lado, desenquadrado de um «quadro harmonizador global», o requisito acertado da justificação clínica pode gerar — como, aliás, já aconteceu — grandes disparidades interpretativas, iniquidades e perturbações no sistema. Convém lembrar que o transporte de doentes não urgentes não ocorre só na sequência de uma credencial das ARS. O transporte não urgente é, também, requisitado diariamente para serviços de atendimento permanente, para situações não programadas mas que não sejam urgentes/emergentes ou transferência entre unidades do SNS (nomeadamente, para exames complementares de diagnóstico e terapêutica não disponíveis na unidade de origem).
Uma última perplexidade prende-se com o facto de o Governo não ter auscultado e coordenado estas «orientações» com os agentes prestadores envolvidos, nomeadamente a Liga dos Bombeiros Portugueses, no sentido de se avaliar o impacto nas associações de bombeiros voluntários de todo o País. Estas, por sinal, são grandes credoras do Estado em mais de 10 milhões de euros, e ocorrem actualmente prazos de pagamento claramente superiores aos 50 dias contratualizados.
Tão pouco foram ouvidas as associações representantes dos utentes que mais recorrem ao transporte não urgente, como os transplantados, os insuficientes renais, os doentes oncológicos e vítimas de traumatismos.
Seguramente que a administração descentralizada, nomeadamente os organismos locais e regionais, as ARS e os ACES, não interveio nesta decisão.
Estamos perante mais uma demonstração da crescente insensibilidade social e ausência de critério nas medidas de consolidação orçamental. Mais uma vez, o Governo opta por penalizar, cegamente, os mais vulneráveis, no lugar de fazer as reformas que exigem coragem. Mais uma vez, o Governo potencia as injustiças, no lugar de promover a igualdade de oportunidades. Mais uma vez, o Governo gera situações inaceitáveis de descriminação no acesso aos cuidados de saúde.
Face ao exposto, nos termos das disposições legais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:
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1 — Proceda à revogação imediata do Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro; 2 — Proceda, com urgência, à revisão do enquadramento legal do transporte de doentes não urgentes, de acordo com princípios de equidade social, financeira e territorial; 3 — Assegure uniformidade de critérios para o acesso ao transporte de doentes.
Palácio de São Bento, 9 de Fevereiro de 2011 Os Deputados do CDS-PP: Pedro Mota Soares — Paulo Portas — Nuno Magalhães — João Rebelo — Abel Baptista — Teresa Caeiro — Hélder Amaral — João Pinho de Almeida — Telmo Correia — Artur Rêgo — Michael Seufert — Durval Tiago Ferreira — Cecília Meireles — Raúl de Almeida — João Serpa Oliva — José Manuel Rodrigues — Filipe Lobo d' Ávila — Isabel Galriça Neto — Assunção Cristas — José Ribeiro e Castro — Pedro Brandão Rodrigues.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 395/XI (2.ª) RECOMENDA AO GOVERNO QUE EFECTUE UMA REVISÃO URGENTE AO SISTEMA DE ATRIBUIÇÃO DE BOLSAS DE ESTUDO AOS ALUNOS DO ENSINO SUPERIOR
Motivação
Nenhum estudante deve ser impedido de aceder e frequentar o ensino superior por razões económicas.
Este é um princípio basilar, de concretização do princípio da igualdade de oportunidades, que a nossa sociedade não deve trair.
Paralelamente, todos os estudos apontam para uma conclusão comum: o definhamento da economia nacional e a incapacidade de Portugal criar riqueza, entre outros motivos, deve-se em muito à reduzida qualificação da população, nomeadamente no que se refere à percentagem da mesma com formação superior.
Importa evoluir rapidamente na formação de capital humano capaz de liderar o futuro do País, numa situação que coloca tremendos desafios ao ensino superior, pois nele encontramos, simultaneamente, o seguinte conjunto de realidades:
1 — Necessidade de ver duplicada, ao longo de uma década, a percentagem da população com idades compreendidas entre os 30 e os 34 anos que é detentora de formação superior, por forma a alcançar até 2020 o valor ambicionado de 40%, em alinhamento com a estratégia EUROPA 2020; 2 — Uma realidade evidenciada por todos os estudos internacionais, nomeadamente aqueles que são periodicamente conduzidos pela OCDE, traduz-se no facto de Portugal ser um dos países onde as propinas de frequência do ensino superior têm valores mais elevados, ao mesmo tempo que o contributo das famílias para o financiamento do ensino superior é muito apreciável, e, ainda assim, também onde a percentagem de alunos que contam com apoio da acção social escolar é das mais reduzidas, sendo o valor anualmente investido em bolsas de estudo diminuto face à generalidade dos Estados-membros da União Europeia; 3 — As famílias enfrentam ao longo do presente ano lectivo, 2010/2011, pelas razões que são conhecidas, momentos de especial dificuldade económica, decorrentes de máximos históricos registados na taxa de desemprego, aumentos de impostos, diminuições salariais, subidas de preços e redução dos apoios sociais disponibilizados; 4 — Neste contexto, porventura mais do que nunca, importa reforçar todos os mecanismos direccionados para garantir que efectivamente nenhum aluno deixa de frequentar o ensino superior por razões económicas, assegurando que os compromissos nesse sentido assumidos pelo Governo são integralmente concretizados na prática.
Esta conjugação de factores impunha que matéria tão sensível, como é sempre o caso da acção social escolar no ensino superior, fosse alvo de redobrada atenção, prioridade e aposta, devendo a atribuição de bolsas de estudo ter sido alvo de especial atenção, gestão atempada, eficaz e competente, atendendo às circunstâncias vividas no País.
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Situação actual
Infelizmente, ao contrário daquilo que acima se referiu, todo o processo de redefinição do sistema de atribuição de bolsas de estudo a alunos do ensino superior, ao longo do ano lectivo 2010/2011, foi conduzido de forma desastrosa, traduzindo-se até ao momento numa significativa perturbação, com especial incidência junto das camadas da população mais necessitadas, numa redução significativa do número de bolseiros, bem como no valor médio das bolsas atribuídas. Ou seja, justamente o inverso daquilo que era o mínimo exigível face à situação nacional.
Apesar dos inúmeros alertas e constantes insistências efectuadas, nomeadamente na Assembleia da República, pelo PSD, bem assim como por outros partidos, o Governo demonstrou ser incapaz de gerir este processo com um mínimo de competência, eficiência ou eficácia, sendo possível constatar que nenhum dos compromissos que assumiu, nomeadamente em sede da Comissão de Educação e Ciência, se viria a concretizar.
Em particular, são de salientar os seguintes atrasos, lacunas e incongruências:
1 — Apesar de o Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior totalizar já mais de 4500 dias de funções governativas, nessa mesma qualidade, e de vir anunciando, pelo menos desde o ano de 2006, ser sua intenção proceder a uma revisão do sistema de atribuição de bolsas de estudo, aparentemente nenhum trabalho minimamente consistente sobre esta matéria, que seja do domínio público, foi efectuado; 2 — Apenas a aprovação do Decreto-Lei n.º 70/2010 em Conselho de Ministros, que teve lugar a 13 de Maio de 2010, parece ter determinado o início de iniciativa conducente à definição de novas regras associadas à atribuição de bolsas de estudo no ensino superior; 3 — Apesar de inúmeras insistências efectuadas, nomeadamente pelo PSD, alertando para a necessidade de ver planeada atempadamente a atribuição de bolsas de estudo no ano lectivo 2010/2011, antes do arranque do mesmo, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior só tardiamente começou a preocupar-se com este assunto; 4 — Em sede da Comissão de Educação e Ciência, o Sr. Ministro afirmou que teria finalmente pronto um novo regulamento de bolsas até meados de Agosto de 2010, o que não veio a suceder, pois optou-se por fazer um regulamento com princípios gerais, seguido de normas técnicas que só viriam a ser aprovadas em meados de Outubro, portanto já em pleno desenrolar do ano lectivo 2010/2011; 5 — Em sede da Comissão de Educação e Ciência o Sr. Ministro assumiu que o novo sistema de atribuição de bolsas estaria totalmente implementado nos meses de Novembro e Dezembro de 2010, o que não sucedeu, uma vez que no final de Janeiro de 2011 havia ainda cerca de 20 000 candidaturas de alunos por analisar, existindo instituições que só no mês de Março de 2011, com o segundo semestre a decorrer, irão terminar o processo de apreciação das mesmas; 6 — Em sede da Comissão de Educação e Ciência o Sr. Ministro informou que a generalidade dos bolseiros ao longo do ano lectivo 2009/2010 manteria o estatuto de bolseiro no presente ano lectivo, a menos das situações em que não fossem verificadas as condições de recurso, por integrarem agregados familiares com patrimónios superiores a 100 000 euros, pelo que o número de bolseiros existente deveria ser próximo do registado em 2009/2010 (ano em que houve cerca de 73 000 bolseiros). A aplicação do novo sistema de atribuição de bolsas tem-se traduzido numa realidade bem diferente, pois as taxas de exclusão de candidatos subiram para 30-35% das candidaturas apresentadas, e nem mesmo as disposições de regime transitório evitam que o número de bolseiros venha a sofrer uma quebra superior a 10 000 alunos — isto num ano de fortes carências das famílias e em que se pretende ter mais 20 000 alunos a frequentar o ensino superior.
Verifica-se ainda que, contrariamente ao afirmado pelo Governo, a esmagadora maioria das candidaturas não aprovadas fica a dever a sua exclusão a aspectos que nada se relacionam com o incumprimento das condições de recurso; 7 — O Governo assegurou que os valores das bolsas de estudo atribuídas não sofreriam qualquer corte significativo, mas o que se regista é uma diminuição no valor médio das bolsas concedidas, que se cifra numa quebra de 5-10% face ao valor equivalente relativo ao ano lectivo 2009/2010; 8 — Após bastante insistência, o Sr. Ministro garantiu em sede da Comissão de Educação e Ciência que o valor destinado a bolsas de estudo de acção social escolar, no âmbito do ensino superior, para o presente ano
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lectivo seria exactamente igual ao verificado no ano lectivo 2009/2010, totalizando 147 milhões de euros. Tal não se está a concretizar, uma vez que se assiste simultaneamente a uma redução situada em pelo menos 10-15% do universo total de bolseiros do ensino superior, bem como a uma redução de 5-10% do valor médio das bolsas concedidas, o que corresponde a uma diminuição real estimada em 20-30 milhões de euros, face ao valor inicialmente apontado de 147 milhões de euros a disponibilizar para bolsas de estudo; 9 — O Sr. Ministro afirmou, em sede da Comissão de Educação e Ciência, que não iria ser solicitada a devolução dos valores pagos antecipadamente a candidatos que depois, ao abrigo das novas normas técnicas, vieram a ver recusada a atribuição de uma bolsa de estudo, mas sabe-se que estas devoluções estão a ser solicitadas, não sendo de todo claro qual é a base legal que suporta uma eventual não devolução dos valores recebidos; 10 — O Sr. Ministro, em sede da Comissão de Educação e Ciência, foi manifestamente incapaz de justificar todas estas incongruências, lacunas e incompetências, de reconhecer os erros cometidos, que são agora manifestamente evidentes, ou de indicar formas concretas de ultrapassar as situações de manifesta injustiça decorrentes do modo como o Governo abordou esta questão.
Recomendações
De tudo quanto ficou acima dito, decorre que estamos num ano em que se torna especialmente relevante dar uma adequada e redobrada atenção à atribuição de bolsas de estudo aos alunos do ensino superior, desde logo por se tratar de um ano lectivo em que as famílias se confrontam com especiais dificuldades, em paralelo com um aumento do número de alunos que frequentam cursos superiores, estimado pelo próprio Governo na existência de mais 20 000 estudantes, pelo que a diminuição estimada de mais de 10 000 bolseiros dificilmente se compagina com o objectivo de garantir que nenhum aluno possa ser excluído do ensino superior por motivos económicos.
Face à manifesta incapacidade evidenciada pelo Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, tanto no que diz respeito a uma adequada e atempada resolução dos problemas, quer no cumprimento dos objectivos por si próprio assumidos quer ainda no fornecimento de respostas concretas no que toca a justificar o ocorrido ou apresentar as soluções que pensa adoptar para ultrapassar os problemas criados, entende a Assembleia da República ser oportuno apresentar um conjunto de recomendações ao Governo sobre esta matéria.
Nestes termos, a Assembleia da República resolve, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, com base na argumentação já exposta, recomendar ao Governo que proceda à introdução de um conjunto de alterações urgentes na atribuição de bolsas de estudo da acção social escolar destinadas a alunos do ensino superior, que seguidamente se enunciam:
1 — O Governo deve garantir que o valor aprovado pela Assembleia da República, através do Orçamento do Estado, e complementado por fundos comunitários, se traduz, conforme assumido pelo Sr. Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, na efectiva afectação de um volume financeiro não inferior a 147 milhões de euros em bolsas de estudo da acção social escolar para alunos do ensino superior no ano lectivo 2010/2011; 2 — O Governo deve rever urgentemente as normas técnicas, de modo a que os rendimentos decorrentes de pensões e prestações sociais sejam alvo de um tratamento idêntico ao que é aplicado aos rendimentos do trabalho, com uma base de incidência situada igualmente em 85% do respectivo valor; 3 — O Governo deve rever urgentemente as normas técnicas, de modo a eliminar situações onde o modo como os critérios de apuramento do aproveitamento escolar, para efeitos da atribuição de bolsas, facilmente se mostra ser desadequado, através da consideração de uma combinação de valores absolutos e percentuais de ECTS na definição de critérios de aproveitamento escolar mínimo para o presente ano lectivo, bem como da consideração de situações onde se registaram mudanças de curso ou de ciclo de estudos; 4 — O Governo deve rever urgentemente as normas técnicas, nelas contemplando devidamente a existência de complementos aos valores das bolsas de estudo que sejam adequados, nomeadamente no que se prende com despesas de alojamento ou apoios específicos ao transporte para alunos não deslocados;
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5 — O Governo deve rever urgentemente as normas técnicas, de modo a clarificar inequivocamente, dando com isso o devido suporte legal, as condições em que não vai ser solicitada qualquer devolução de verbas atribuídas a alunos que posteriormente vieram a ficar excluídos da atribuição de qualquer bolsa de estudo; 6 — O Governo deve iniciar desde já um trabalho aprofundado, com envolvimento activo de todos os parceiros relevantes, incluindo a secção especializada de acção social do Conselho Coordenador do Ensino Superior, e tendo em consideração a iniciativa da Assembleia da República, de apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 70/2010, no sentido de ver redefinido um novo sistema de atribuição de bolsas, a ser aplicado no ano lectivo 2011/2012, onde sejam feitas as melhorias, correcções e alterações decorrentes das lacunas actualmente existentes, que o Governo foi incapaz de evitar, e que se tornaram evidentes com a correspondente atribulada aplicação, ao longo do presente ano lectivo de 2010/2011, com isso corrigindo também manifestas situações de injustiça social, como aquelas que decorrem de situações decorrentes dos rendimentos e patrimónios de sociedades comerciais que se interligam com determinados agregados familiares, bem como garantindo uma efectiva estabilidade plurianual de atribuição de bolsas ao longo de um ciclo de estudos completo.
Palácio de São Bento, 8 de Fevereiro de 2011 Os Deputados do PSD: Miguel Macedo — Pedro Duarte — Pedro Saraiva — Emídio Guerreiro — João Prata — José Ferreira Gomes — Vânia Jesus — Amadeu Soares Albergaria — Paulo Cavaleiro — Pedro Rodrigues — Raquel Coelho — Margarida Almeida — Luís Montenegro — Teresa Morais — António Almeida Henriques — Pedro Lynce.
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PROJECTO DE RESOLUÇÃO N.º 396/XI (2.ª) REVOGAÇÃO DO DESPACHO N.º 19 264/2010, DE 29 DE DEZEMBRO, QUE PROCEDE AOS CORTES NO TRANSPORTE DE DOENTES NÃO URGENTES
O Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro, do Secretário de Estado da Saúde, e a Circular Informativa da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS) n.º 2, de 7 de Janeiro de 2011, vieram materializar a decisão do Governo em efectuar cortes profundos no transporte de doentes não urgentes, o que está a causar situações graves e dramáticas na vida de milhares de doentes, utentes do Serviço Nacional de Saúde (SNS).
As orientações aí inscritas reflectem um corte generalizado e quase integral da atribuição de credenciais de transporte aos utentes que necessitem deslocar-se a consultas e tratamentos, o que abre o caminho a grandes injustiças sociais e impossibilita a universalidade e acessibilidade dos serviços de saúde públicos, contrariando uma imposição constitucional.
Estas medidas, que entraram em vigor no passado dia 1 de Janeiro, fazem com que o SNS apenas garanta o pagamento do transporte de doentes não urgentes nos casos em que, simultaneamente, se verifiquem dois pressupostos, a justificação clínica e a insuficiência económica, o que põe claramente em causa a acessibilidade das populações ao SNS.
Ora, milhares de utentes, em todo o País, são afectados por esta medida, deixando de ter acesso ao direito aos cuidados de saúde, por não terem condições para assegurar os custos deste serviço, vendo-se agora obrigados ao pagamento desse transporte, que pode chegar a atingir valores bastante elevados e incomportáveis.
De salientar que o acesso a estes cuidados de saúde é ainda mais escasso e difícil em regiões onde as condições socioeconómicas das populações são inferiores e as distâncias impõem maiores dificuldades, o que tende a agravar a situação.
Ou seja, um número considerável de utentes não detém recursos económicos nem meios de transporte e, mesmo assim, é-lhes negada a atribuição da credencial de transporte, fazendo com que não se possam deslocar ao serviço de saúde.
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É, ainda, de referir que o Governo encerrou dezenas de Serviços de Atendimento Permanente (SAP), garantindo que reforçaria significativamente os meios de transporte aos utentes, mas a realidade está à vista e, actualmente, os SAP estão encerrados e o transporte não está minimamente assegurado.
Tendo em conta que o acesso aos cuidados de saúde está inscrito na Lei n.º 48/90, de 24 de Agosto, que determina como objectivo fundamental da política de saúde o acesso aos cuidados de saúde, garantindo o SNS a equidade a fim de «atenuar os efeitos das desigualdades económicas, geográficas e quaisquer outras», e tendo em conta que é um direito fundamental consagrado na Constituição da República Portuguesa que confere a sua universalidade, este direito deve ser urgentemente restituído às populações.
Por outro lado, e para além das repercussões que afectam directamente as populações, esta medida está a criar cenários de graves dificuldades financeiras nas associações humanitárias de bombeiros, o que poderá levar a despedimentos de bombeiros e outros funcionários, pondo em causa a capacidade para efectuarem o referido transporte, mas também a capacidade necessária à realização de outras actividades.
Acresce a esta situação que, em 2009, a Liga dos Bombeiros Portugueses celebrou um contrato, definindo as normas do transporte de doentes em ambulância, nunca chegaram a ser totalmente aplicadas no território nacional, uma vez que seriam admitidas diferentes aplicações segundo o entendimento dos responsáveis de cada Administração Regional de Saúde (ARS).
De facto, nos últimos tempos as corporações de bombeiros têm manifestado a sua crescente preocupação relativamente a esta matéria devido às medidas assumidas pelo Governo.
Face a esta situação inadmissível, Os Verdes consideram urgente que o Governo revogue rapidamente as medidas adoptadas relativamente ao corte no transporte de doentes não urgentes, garantindo uma efectiva acessibilidade dos utentes do SNS aos serviços públicos de saúde, e garanta o rigoroso cumprimento do contrato assinado com a Liga dos Bombeiros Portugueses; Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar Os Verdes propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 — Revogue urgentemente as medidas de corte no transporte de doentes não urgentes, que constam do Despacho n.º 19 264/2010, de 29 de Dezembro, do Secretário de Estado da Saúde.
2 — Garanta, na revisão da legislação sobre a matéria, a acessibilidade e a universalidade no acesso dos utentes aos serviços de saúde, tal como imposto pela Constituição da República Portuguesa.
3 — Garanta o cumprimento do contrato celebrado com a Liga dos Bombeiros Portugueses relativamente ao transporte de doentes não urgentes e proceda à definição, ouvindo a Liga dos Bombeiros, das normas essenciais à sua aplicação.
Assembleia da República, 9 de Fevereiro de 2011 Os Deputados de Os Verdes: José Luís Ferreira — Heloísa Apolónia.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.