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27 DE NOVEMBRO DE 2019

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vem afirmando e que sustenta a imprescritibilidade das ações de investigação de paternidade, acompanhando

o que já acontece em vários ordenamentos jurídicos como os da Holanda, de Itália, do Brasil, de Espanha, da

Alemanha, da Áustria, entre outros.

No que à ordem jurídica portuguesa diz respeito, permitir que as ações de investigação de paternidade e

maternidade possam, como regra, ser propostas a todo o tempo será o culminar de um longo caminho.

Lembramos que o Código Civil de 1966 estabeleceu prazos para este efeito mais limitados do que os que

haviam sido consagrados pela legislação de 1910. A reforma do Código Civil operada em 1977 deixou este

sistema de prazos quase inalterado, consagrando-se um prazo de caducidade de dois anos após a maioridade

ou emancipação para que o filho intentasse a ação de investigação de paternidade e de maternidade contra o

alegado pai. As alterações aprovadas em 2009 (Lei n.º 14/2009, de 1 de abril), na sequência de um acórdão

do Tribunal Constitucional que declarou a inconstitucionalidade do prazo de dois anos após a maioridade

(Acórdão n.º 23/2006), trouxeram mais justiça e aproximaram este regime da verdade material, já que o prazo

geral passou de dois para dez anos e ficaram salvaguardados casos em que se pode recomeçar a contar um

novo prazo a partir do conhecimento de factos ou circunstâncias que justifiquem a investigação.

No entanto, dez anos passados, confirma-se, que essa alteração legislativa foi insuficiente. Como refere

Joaquim de Sousa Ribeiro, «o que está em causa é saber se a ação de reconhecimento judicial da

paternidade satisfaz ou não o imperativo de tutela que exigem os direitos fundamentais» (Joaquim de Sousa

Ribeiro, A inconstitucionalidade da limitação temporal ao exercício do direito à investigação da paternidade,

RLJ, Ano 147.º, N.º 4009, março-abril, 2018). Também os Tribunais – desde o Tribunal da Relação (ver, entre

outros, Acórdão de 09/05/2019 do TR de Guimarães, Acórdão de 26/10/2017, do TR da Lisboa, Acórdão de

17/10/2017 do TR de Coimbra), ao Supremo Tribunal de Justiça, passando pelo Tribunal Constitucional – têm

julgado esta norma inconstitucional. A título exemplificativo, o Acórdão n.º 488/2018 do Tribunal Constitucional,

de 4 de outubro, estabelece que «a norma que estipula um prazo de caducidade constitui, assim, uma

restrição desproporcionada dos direitos fundamentais a constituir família, à identidade pessoal e ao livre

desenvolvimento da personalidade, bem como do direito a conhecer a ascendência biológica e a ver

estabelecidos os correspondentes vínculos jurídicos de filiação (…); as ações de investigação da paternidade

devem poder ser instauradas a todo o tempo, sendo constitucionalmente ilegítima qualquer limitação temporal

para o exercício destes direitos».

Na verdade, os argumentos que, no passado, eram referidos para justificar um prazo para exercício deste

direito, revelam-se hoje totalmente anacrónicos: o avanço da ciência permite que, através da recolha de

material genético, se chegue a conclusões com 99,5% de certeza. Também não colhe o argumento da

segurança jurídica, já que mal andaria uma sociedade que privilegiasse a segurança jurídica contra um

corolário da igualdade entre todos os seres humanos.

É tempo, pois, de o poder legislativo tornar o direito ordinário conforme com o texto constitucional. No

entendimento do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, essa harmonização passa por estabelecer com

clareza que o direito fundamental a saber quem sou e qual a minha história deve poder ser cumprido a todo o

tempo, sem estar sujeito a prazos legais, que ignoram os motivos, profundamente subjetivos, que devem

nortear a decisão de cada pessoa numa matéria tão sensível. Esta é a solução que politica e juridicamente se

impõe.

Em suma, porque o estabelecimento de um prazo, que será sempre arbitrário, consiste numa restrição

injustificada e desproporcionada ao direito fundamental do conhecimento das origens genéticas e da

historicidade pessoal, propõe o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda que a ação de investigação da

maternidade possa ser proposta a todo o tempo. Esta alteração repercute-se sobre o prazo para a proposição

de ação de investigação de paternidade, por força da remissão constante do artigo 1873.º do Código Civil.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente Lei procede à 71.ª alteração do Código Civil, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 47 344, de 25 de

novembro de 1966, alterado pelos Decretos-Leis n.os 67/75, de 19 de fevereiro, 261/75, de 27 de maio, 561/76,

de 17 de julho, 605/76, de 24 de julho, 293/77, de 20 de julho, 496/77, de 25 de novembro, 200-C/80, de 24 de

junho, 236/80, de 18 de julho, 328/81, de 4 de dezembro, 262/83, de 16 de junho, 225/84, de 6 de julho, e

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