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Terça-feira, 9 de fevereiro de 2021 II Série-A — Número 73
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
S U M Á R I O
Projeto de Lei n.º 673/XIV/2.ª (PCP): Regime extraordinário de regulamentação do sector do gás de petróleo liquefeito de uso doméstico. Projetos de Resolução (n.
os 933 a 940/XIV/2.ª):
N.º 933/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda a conclusão urgente das obras de requalificação do edifício do Conservatório Nacional. N.º 934/XIV/2.ª (CDS-PP) — Recomenda a finalização urgente das obras da Sé Patriarcal de Lisboa de modo a garantir a necessária estabilidade e integridade do edifício e a salvaguarda dos vestígios muçulmanos nos claustros. N.º 935/XIV/2.ª (CDS-PP) — Abordagem estratégica e medidas urgentes no combate ao cancro. N.º 936/XIV/2.ª (PAN) — Recomenda ao Governo a suspensão imediata das montarias em todo o território
nacional. N.º 937/XIV/2.ª (Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira) — Recomenda ao Governo o reforço da proteção social e amplificação dos mecanismos de apoio às vítimas de violência doméstica no âmbito da pandemia da COVID-19 e dos sucessivos confinamentos. N.º 938/XIV/2.ª (IL) — Pelo combate efetivo ao cyberbullying. N.º 939/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo que proceda à conservação e recuperação dos ecossistemas marinhos costeiros com grande capacidade de sequestro de carbono. N.º 940/XIV/2.ª (BE) — Recomenda ao Governo a descentralização das juntas médicas para confirmação e graduação de incapacidade em processo de reparação de doença profissional.
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PROJETO DE LEI N.º 673/XIV/2.ª
REGIME EXTRAORDINÁRIO DE REGULAMENTAÇÃO DO SECTOR DO GÁS DE PETRÓLEO
LIQUEFEITO DE USO DOMÉSTICO
Exposição de motivos
O preço do gás, em particular do gás de botija, continua a ser um problema que afeta grande parte da
população, e que põe em causa o conforto térmico, a qualidade de vida, a saúde e as condições económicas
de milhares de famílias. Esta é uma situação que se agrava com a expansão do teletrabalho, com as medidas
de confinamento, decorrentes da pandemia de COVID-19, que promoveram uma maior permanência em casa,
agravando os custos com o aquecimento. Num Inverno que se tem revelado particularmente frio, a
insuficiência de medidas que levem à redução do preço da energia pode originar graves consequências
sociais e de saúde pública, sobretudo em populações mais desprotegidas.
Sabemos que, particularmente em zonas rurais e também nos grandes centros urbanos em zonas mais
desfavorecidas, o uso do gás de botija continua a ser predominante.
O IVA continua a pesar sobre estes consumidores. Mesmo quando a eletricidade e o gás natural eram
taxados à taxa mínima de 6%, o gás engarrafado continuava a ter uma taxa superior.
Mas se a fiscalidade pesa sobre estes consumos, a verdade é que não explica tudo. Não explica, por
exemplo, o diferencial de preços registado entre Portugal e Espanha, no que diz respeito ao gás de botija. A
taxa de ISP em Portugal e em Espanha são iguais; o IVA aplicado é de 23% em Portugal e de 21% em
Espanha, mas o preço médio em Espanha é cerca de 17 euros, ao passo que em Portugal se situa nos 26
euros.
O mesmo se pode dizer sobre a diferença de preço, em Portugal, entre o gás natural e o GPL (canalizado
ou em botija).
O relatório «Análise do Mercado de Propano e Butano engarrafado e sua aproximação aos preços do Gás
Natural», publicado em 2014 pela extinta Entidade Nacional do Mercado dos Combustíveis (ENMC), ajuda a
tirar conclusões sobre as causas para estas discrepâncias: a principal justificação «reside nas margens de
distribuição e logística associada à botija e ao seu transporte».
Justifica-se ainda pela existência de uma estrutura oligopolista entre os comercializadores grossistas ditos
«revendedores de 1.ª linha», constituída pela GALP, BP, REPSOL e OZ Energia, que têm (nas operações de
produção, importação e comercialização grossista) uma margem de 27% do Preço de Venda ao Público.
O diferencial de preços entre Portugal, onde o preço não é regulado, e Espanha, onde o preço é regulado
como em outros países da União Europeia, provoca uma intensa troca comercial (ilegal) nas zonas
fronteiriças, com a compra pelos portugueses das botijas em Espanha. Assinale-se que alguns dos
comercializadores são os mesmos de um e outro lado da fronteira, o que não os impede de praticar preços
maiores em Portugal.
Acresce ainda que a ERSE, no Relatório de Análise do Mercado de Gases de Petróleo Liquefeito (GPL)
Embalado 2018-2020, publicado a 31 de agosto de 2020, «identificou problemas estruturais ao nível do
mercado de GPL engarrafado, assente em elevados níveis de concentração e em ganhos acumulados pelos
operadores ao longo da cadeia de valor, tendo em conta a integração vertical que caracteriza este setor, bem
como os demais vínculos empresariais». Nesse relatório, a ERSE denuncia que os três maiores operadores –
Galp, Rubis e Repsol – apresentarem preços alinhados, para certas tipologias de garrafas, traduzindo-se nas
ofertas dos preços de venda ao público (PVP) mais elevados, tendo solicitado à Autoridade da Concorrência
uma análise a este mercado.
Perante esta realidade, têm surgido várias medidas que não têm passado de «paliativos». O sistema
aprovado no Orçamento do Estado para 2018, de criação da «botija de gás social», para lá de outras
considerações críticas – caso da fraca «capilaridade» da sua distribuição e concorrência desleal com
pequenos distribuidores – não responde à questão das margens excessivas absorvidas até hoje pelas grandes
empresas petrolíferas e aos problemas de preços no GPL canalizado.
Num momento em que a crise económica e social decorrente da pandemia da doença COVID-19 assola
com particular severidade as populações mais carenciadas – que são, em muitos casos, as que usam esta
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fonte de energia – o PCP propõe que se faça este passo indispensável para combater a falta de condições de
acesso à energia e ao conforto térmico. Aliás, o supracitado relatório da ERSE considera que as margens de
comercialização são «particularmente altas e sem fatores estruturais que o justifiquem, no contexto de
fragilidades socioeconómicas decorrentes do estado de emergência decretado».
As medidas, anunciadas pelo Governo, de estabelecimento de um preço máximo durante o período de
confinamento são insuficientes. Mesmo com esse preço fixado, o preço da botija de gás continua a ser
injustificadamente mais elevado em Portugal do que em Espanha.
Dando resposta à situação imediata, mas criando condições para uma solução de mais longo prazo, é
preciso avançar com um regime de margens máximas, que tenha em conta os preços médios antes de
imposto na Zona Euro, os preços finais ao consumidor em Espanha (garantindo um diferencial nunca superior
a 5%).
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece um regime de margens máximas na comercialização grossista e na distribuição
do gás propano, butano e suas misturas, engarrafado ou canalizado, com vista à redução do seu preço.
Artigo 2.º
Regime de margens máximas na comercialização grossista e na distribuição do gás propano,
butano e suas misturas, engarrafado ou canalizado
1 – É estabelecido um regime de margens máximas na comercialização grossista e na distribuição do gás
propano, butano e suas misturas, engarrafado ou canalizado, com o propósito de reduzir o seu preço final ao
consumidor;
2 – O regime previsto no número anterior é publicado pelo Governo em portaria, ouvida a Entidade
Reguladora do Sector Energético (ERSE), no prazo de 10 dias após a entrada em vigor da presente lei;
3 – O regime previsto no n.º 1 tem como referências:
a) O objetivo de harmonizar os preços médios antes de impostos praticados em Portugal com os preços
médios antes de impostos médios na Zona Euro;
b) O objetivo de aproximar o preço final ao consumidor praticado em Portugal e em Espanha,
assegurando uma variação não superior a 5%;
c) O objetivo de harmonizar as margens de comercialização entre os mercados português e espanhol;
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, 9 de fevereiro de 2021.
Os Deputados do PCP: Duarte Alves — Bruno Dias — João Oliveira — António Filipe — Paula Santos —
Diana Ferreira — Ana Mesquita — João Dias — Alma Rivera — Jerónimo de Sousa.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 933/XIV/2.ª
RECOMENDA A CONCLUSÃO URGENTE DAS OBRAS DE REQUALIFICAÇÃO DO EDIFÍCIO DO
CONSERVATÓRIO NACIONAL
Exposição de motivos
A 19 de março de 2016 lia-se em várias manchetes da imprensa nacional «Conservatório Nacional é uma
das prioridades do Governo – O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, garante que o Conservatório
Nacional é uma das prioridades deste Governo e que o edifício irá sofrer obras de recuperação no próximo
ano letivo.»
Dois anos depois, a 6 de junho de 2018, os títulos da imprensa diziam: «Governo abre concurso
internacional para obras no Conservatório Nacional – Nos próximos dias será lançado um concurso público
internacional para as obras no Conservatório Nacional de Lisboa, avançou o ministro da Educação. O
investimento será de 9 milhões de euros.»
Um ano mais tarde, em 24 de abril de 2019, dava-se conta de que «Obras no Conservatório de Lisboa vão
finalmente arrancar em maio – Empreitada de recuperação é exigida há muito por alunos, pais e professores
das duas escolas do conservatório. Tribunal de Contas deu aval ao avanço das obras que implicarão um
investimento de mais de 10 milhões de euros.»
Em março de 2020, em resposta a uma pergunta do Grupo Parlamentar do CDS de janeiro desse ano,
sobre a suspensão das obras de reabilitação do edifício das Escolas Artísticas de Música e Dança do
Conservatório Nacional, em Lisboa, o Gabinete do Ministro da Educação garantia que estas constituíam «uma
prioridade de investimento do Ministério da Educação que, neste sentido, desenvolve um longo trabalho para a
sua concretização, nomeadamente a definição de um programa funcional em conjunto com as direções das
referidas escolas artísticas, o lançamento de um concurso público para a elaboração do projeto de arquitetura
(e especialidades) e, após a conclusão desse trabalho, o lançamento dos necessários concursos públicos
internacionais de empreitada.»
Referia-se também, no mesmo documento, que, à data (março de 2020), a Parque Escolar, EPE, estava «a
envidar todos os esforços no sentido de encontrar uma solução, o mais rapidamente possível, para resolver a
atual situação», e que «atendendo a que a obra foi suspensa, ilegalmente, por iniciativa do empreiteiro, a
retoma da mesma está exclusivamente dependente da demonstração da capacidade por parte daquela
empresa de mobilizar os meios humanos, técnicos e financeiros necessários para o cumprimento do contrato
de empreitada celebrado, bem como um replaneamento dos trabalhos a realizar, identificando
pormenorizadamente os meios a implementar na empreitada com vista à conclusão dos trabalhos.»
A 22 de maio de 2020, o tema regressa às manchetes: «Obras no Conservatório Nacional continuam
suspensas após quatro meses paradas – Parque Escolar afirma que Tomás de Oliveira, S.A., empresa
responsável pela obra, abandonou os trabalhos em janeiro.»
No mês seguinte, junho de 2020, sabia-se que a Parque Escolar tinha avançado para a rescisão do
contrato das obras no Conservatório Nacional, que o Estado queria lançar um novo concurso público, que o
empreiteiro da obra dizia que ainda não havia acordo e que a direção do Conservatório pedia urgência na
resolução do caso.
Lia-se então que fonte da Parque Escolar, citada pela TSF, garantia que o contrato de empreitada do
Conservatório Nacional estava «em processo de resolução, tendo em vista o lançamento de novo concurso
público», sendo que a intenção da Parque Escolar em romper o contrato com o empreiteiro se devia à
paragem e consequente atraso de vários meses nas obras de requalificação do centenário edifício.
No entanto, também na mesma data (junho de 2020) o empreiteiro – Tomás de Oliveira Empreiteiros, S.A.
– garantia que ainda não tinha sido notificada da decisão de rescisão do contrato: «Temos estado a trocar
correspondência, ainda não chegámos a um facto concreto, não chegámos a um acordo de resolução.»
Dois meses mais tarde, a 2 de agosto de 2020, lia-se que «Obras no Conservatório Nacional de Lisboa vão
continuar paradas (pelo menos) até final de 2020 – Alunos são transportados de autocarro entre salas de
lados opostos de Lisboa. Reabertura prevista para 2023.»
Quase no final do ano, a 24 de novembro de 2020, foi publicado no portal Base um contrato para aquisição
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de serviços para a alteração das peças do projeto de execução para o lançamento de novo concurso para a
empreitada de conclusão das obras de reabilitação das escolas artísticas de Música e Dança do Conservatório
Nacional, em Lisboa. O contrato vigora desde dia 10 de novembro e tem um prazo de execução de 181 dias.
Prevê-se o lançamento de um novo concurso de obra para o próximo mês de abril, o que confirma mais dois a
três anos até a obra estar concluída.
Desde o início do ano letivo 2018/19 que a Escola Artística de Música do Conservatório Nacional está a
funcionar integralmente na Escola Secundária do Marquês de Pombal, em Belém, enquanto a Escola Artística
de Dança funciona em quatro locais diferentes. Para compensar as limitações de espaço nas instalações
temporárias que acolhem as duas escolas e o tempo gasto em deslocações, os horários foram sendo
estendidos, quer em número de horas diárias (nalguns casos ultrapassando as 12 horas) quer com aulas aos
sábados.
Com as restrições provocadas pela pandemia fruto da doença COVID-19 surgiram outras preocupações,
como o facto de algumas das salas «temporariamente» ocupadas pelos alunos de música e dança não terem
a ventilação exigida, ou o transporte dos alunos e materiais necessários às aulas ter sofrido limitações
impostas pela Direção-Geral de Saúde.
Acreditando que, tal como referiu na resposta ao CDS, que o Ministério da Educação mantenha, ainda, «o
seu empenho na conclusão deste investimento, no mais breve prazo possível», o CDS entende ser pertinente
recomendar ao Governo que tome todas as medidas necessárias à conclusão deste processo, para que os
alunos da Escola Artística de Música e da Escola Artística de Dança do Conservatório Nacional possam
regressar ao edifício de origem e retomar os seus estudos com as condições que estes exigem.
Neste enquadramento, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo
assinados do Grupo Parlamentar do CDS-PP propõem que a Assembleia da República recomende ao
Governo que:
1 – Com carácter de urgência, promova o Concurso Internacional para a Empreitada de Reabilitação das
Escolas Artísticas de Música e Dança do Conservatório Nacional;
2 – Garanta as dotações financeiras adequadas à obra e à reprogramação do orçamento da Parque
Escolar, S.A.;
3 – Assegure que, até à conclusão da obra, os alunos das Escolas Artísticas de Música e Dança do
Conservatório Nacional têm aulas em instalações dignas e em segurança compatíveis, quer com as exigências
do ensino que frequentam, quer com as atuais limitações impostas pela Direção-Geral de Saúde, fruto da
pandemia causada pela doença COVID-19;
4 – Partilhe com a toda a comunidade escolar os termos e calendário do projeto e da execução da
empreitada.
Palácio de São Bento, 9 de fevereiro de 2021.
Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — João Gonçalves Pereira — Telmo Correia — Cecília
Meireles — João Pinho de Almeida.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 934/XIV/2.ª
RECOMENDA A FINALIZAÇÃO URGENTE DAS OBRAS DA SÉ PATRIARCAL DE LISBOA DE MODO
A GARANTIR A NECESSÁRIA ESTABILIDADE E INTEGRIDADE DO EDIFÍCIO E A SALVAGUARDA DOS
VESTÍGIOS MUÇULMANOS NOS CLAUSTROS
Exposição de motivos
A 2.ª fase das obras de recuperação e valorização e instalação do Núcleo Arqueológico e Recuperação dos
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Claustros inferior e superior da Sé Patriarcal de Lisboa, em curso desde 2018, resultam de um protocolo de
colaboração entre a Direção-Geral do Património Cultural e o Cabido da Sé Patriarcal de Lisboa.
De acordo com o Ministério da Cultura, em resposta a uma pergunta do Grupo Parlamentar do CDS, este
projeto de valorização tem em vista proporcionar não só a salvaguarda do Monumento Nacional classificado
desde 1910 (Decreto de 16-06-1910, DG, n.º 136, de 23-06-1910), mas também a possibilidade de usufruto
dos vestígios arqueológicos descobertos ao longo das últimas décadas sob o claustro da Sé de Lisboa,
vestígios esses até à data inacessíveis ao conhecimento da generalidade dos visitantes.
Em 2020 foram identificadas, entre outras estruturas, o que se crê ser um conjunto de testemunhos que
corresponderão à mesquita aljama de Lisboa – um complexo da mesquita principal da Lisboa muçulmana, com
os banhos, escolas e um espaço dedicado aos mortos, que, na sua totalidade, abrangerá uma área de cerca
de 200 m2, e cuja cronologia de ocupação data desde o início do século XII até à conquista de Lisboa em
1147.
De acordo com especialistas – abundantemente plasmadas na comunicação social –, o valor cultural dos
vestígios não tem paralelo na Península Ibérica, sendo constituídos por três pisos, paredes de mais de cinco
metros, portas e corredores conservados por baixo da Sé de Lisboa. A ser verdade, trata-se de vestígios
únicos a nível peninsular, com paralelo apenas em mesquitas almorávidas na Argélia.
Edifícios semelhantes construídos durante o período almorávida são completamente desconhecidos em
Portugal e em Espanha. Em Marrocos são visíveis alguns vestígios na grande mesquita aljama, em
Marraquexe, e também na mesquita principal de Fez, mas muito alterados e pouco conservados devido às
destruições causadas pelos almóadas que, de acordo com as fontes, destruiriam estas mesquitas construindo
as suas próprias mesquitas.
A 25 de setembro, em comunicado, a Direção-Geral do Património Cultural afirmava que «as estruturas
que foram identificadas e que agora é necessário desmontar através da aplicação da Lei de Bases do
Património Cultural correspondem a um pequeno troço de parede à qual se encontra adoçado um banco
construído em alvenaria de tijolo com dois pequenos arcos, que segundo a direção científica da intervenção
poderá associar-se a uma área de vestiário relacionado com os banhos da mesquita e uma área associada à
base do minarete que terá existido naquele local. Verificou-se que a sua preservação in situ não é compatível
com a execução da obra em curso, colocando em risco a estabilidade estrutural de parte substancial da ala sul
do claustro da Sé Patriarcal (Monumento Nacional), e pondo em causa a própria implementação do projeto
reformulado e o investimento associado».
Retomando a resposta do Ministério da Cultura ao GP do CDS, refere-se no ofício que esta não será a
primeira vez que no decorrer das obras se revelam vestígios arqueológicos de diversas épocas, não sendo
também a primeira vez que o projeto inicial se adapta por forma a que estes vestígios possam ser preservados
in situ.
Posteriormente, aliás, a Sr.ª Ministra da Cultura determinou que os vestígios deveriam ser conservados,
musealizados e integrados no projeto de recuperação e musealização da Sé Patriarcal de Lisboa. E do ponto
de vista da segurança estrutural, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil mostrou preocupação pela
vulnerabilidade sísmica excessiva do edifício, apelando à finalização urgente da estrutura projetada, de forma
a garantir a necessária estabilidade e integridade da Sé de Lisboa e das ruínas.
Finalmente, em janeiro deste ano, a Secção do Património Arquitetónico e Arqueológico do Conselho
Nacional de Cultura defendeu a salvaguarda e integração dos vestígios muçulmanos na Sé de Lisboa e
solicitou alterações ao projeto de recuperação e valorização do monumento, considerando que as ruínas
descobertas são relevantes, mesmo que não exista evidência de que tais vestígios correspondam à mesquita
aljama de Lisboa.
Neste enquadramento, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo
assinados do Grupo Parlamentar do CDS-PP propõem que a Assembleia da República recomende ao
Governo que:
1 – Sejam tomadas as medidas necessárias à finalização urgente das obras de recuperação e valorização
da Sé Patriarcal de Lisboa e instalação do Núcleo Arqueológico e Recuperação dos Claustros inferior e
superior, de forma a garantir a necessária estabilidade e integridade de todo o edificado;
2 – Seja assegurada a salvaguarda dos vestígios alegadamente correspondentes à mesquita aljama de
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Lisboa, a sua investigação arqueológica e manutenção in situ.
Palácio de São Bento, 9 de fevereiro de 2021.
Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — João Gonçalves Pereira — Telmo Correia — Cecília
Meireles — João Pinho de Almeida.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 935/XIV/2.ª
ABORDAGEM ESTRATÉGICA E MEDIDAS URGENTES NO COMBATE AO CANCRO
Exposição de motivos
I – Em Portugal, os dados mais recentes relativos ao cancro reportam a 2018 e são dados preliminares do
Registo Oncológico Nacional. De acordo com o Diretor do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas,
«este primeiro retrato regista o aparecimento de 52 500 novos casos naquele ano. Destes, há a registar 7400
casos de cancro da mama, 4600 de cancro do pulmão, 7600 de cancro do cólon e do reto, 2900 de cancro do
estômago, 2200 da bexiga, 6100 de cancros da próstata e cerca de 3700 de cancros do sangue, ou dos que
chamamos tumores líquidos (linfomas, leucemias, mielomas)».
Segundo o INE (dados de 2018), o cancro é a segunda causa de morte em Portugal, a seguir às doenças
circulatórias e, de acordo com a PORDATA, 24,6% das mortes em Portugal, em 2018, estavam relacionadas
com cancro, num total de cerca de 29 000 mortes.
Têm-se registado muitos e relevantes progressos no tratamento das doenças oncológicas, no entanto, a
Organização Mundial da Saúde estima que uma em cada seis mortes no mundo é consequência de cancro
tendo, em 2018, morrido 9,6 milhões pessoas por cancro.
Apesar deste quadro negro, Portugal estará entre os dez países da Europa com melhores taxas de
sobrevivência às doenças oncológicas.
Importa reforçar que é determinante assegurar, aos doentes oncológicos, cuidados especializados dirigidos
ao conforto e promotores de dignidade até ao final de vida. A oferta de cuidados paliativos, um direito que
assiste também aos doentes oncológicos em sofrimento, é ainda manifestamente insuficiente. Por isso
mesmo, e mais uma vez, o CDS-PP levou ao Parlamento duas iniciativas legislativas relativas ao reforço dos
cuidados paliativos, ambas aprovadas.
Outro dado a reter, retirado de um estudo de 2020 da APIFARMA, é que, em Portugal, o valor per capita
investido no tratamento do cancro é cerca de 57,5% do valor da média europeia.
No que diz respeito à investigação clínica, Portugal também ainda está muito aquém do desejável. O
Diretor do Serviço de Oncologia Médica do Centro Hospitalar Universitário do Porto deixa o retrato: «Quando
um promotor pretende introduzir um ensaio clínico em Portugal, tem de enfrentar uma série de burocracias até
que chegue à administração do hospital e tudo isso demora tempo. Isto cria um entrave muito grande, pois,
quando os ensaios clínicos estão a chegar a Portugal, já estão quase a terminar na Europa. Temos uma
grande dificuldade em recrutar coordenadores de ensaios clínicos em Portugal e todas estas questões
fragilizam-nos muito em comparação com outros países do Norte da Europa».
II – Ciente da urgência em que se tomem medidas concertadas a nível europeu no combate ao cancro, a
Comissão Europeia tem estado atenta e a trabalhar seriamente nesta área tendo apresentado o Plano
Europeu para Vencer o Cancro, em 3 de fevereiro de 2021 – realçando, com agrado, que abrange também o
cancro pediátrico.
De acordo com a Comissária Europeia da Saúde, em 2020 diagnosticaram-se na UE 2,7 milhões de
pessoas com cancro tendo ocorrido 1,3 milhões de mortes e estima-se que, daqui a 15 anos, se verifique um
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aumento de 25% de diagnósticos tornando-se, desta forma, o cancro na primeira causa de morte da UE.
Realçando que o cancro «coloca um fardo pesado sobre os sistemas de saúde e a economia» – com um
impacto económico anual estimado em mais de 100 mil milhões de euros –, a Comissária Europeia destacou
ser determinante apostar na prevenção, no rastreio, no diagnóstico, no tratamento e na sobrevivência de
doentes com cancro tendo, para o efeito, anunciado a reserva de 4 mil milhões de euros para o financiamento
de ações a nível europeu.
Lembrando que a pandemia de COVID-19 «atrasou diagnósticos, interrompeu tratamentos e afetou o
acesso a medicamentos», reconheceu que o impacto foi «profundo no acompanhamento dos doentes e na sua
qualidade de vida».
Recordamos que os problemas descritos pela Comissária Europeia para a Saúde são transversais a todos
os países da UE, aos quais Portugal não escapou.
O Secretário de Estado Adjunto e da Saúde reconheceu que a pandemia causou grandes
constrangimentos à planificação adequada dos rastreios oncológicos, assinalando que «todos os anos, cerca
de 3,5 milhões de pessoas são diagnosticadas com cancro. Em Portugal, numa incidência de 3% ao ano, a
mortalidade é de 2%, o que significa que há sobrevivência, ainda que aumente a pressão sobre os serviços e
sobre a segurança social».
Segundo o Presidente da Liga Portuguesa Contra o Cancro, «o aumento do cancro está relacionado com o
aumento da longevidade. Para diminuir a mortalidade e torná-lo cada vez mais uma doença crónica é preciso
apostar no diagnóstico precoce, na investigação e no tratamento atempado e eficaz em grandes centros
especializados. Consequentemente, é preciso compatibilizar a questão da acessibilidade da população que
não reside perto».
O Diretor do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas já deixou claro que, perante os dados
relativos a 2018, «em primeiro lugar é preciso estarmos todos muito alerta e investirmos sempre no combate
ao cancro, porque compensa. Em segundo, é preciso percebermos que a prevenção ainda é a melhor arma
para tratar ou para impedir que uma situação oncológica apareça. Temos de apostar na prevenção primária,
nos estilos de vida, hábitos dietéticos, exercício físico, e como evitar fatores de risco como o tabaco e o álcool,
porque estes são claramente fatores associados ao surgimento do cancro».
III – Segundo a OMS, a pandemia de COVID-19 está a ter repercussões catastróficas no mundo inteiro,
também, quanto às doenças oncológicas. Algumas já são visíveis, nomeadamente o que diz respeito aos
rastreios, aos diagnósticos, ao adiamento de consultas, de tratamentos, de cirurgias e de reabilitação.
O CDS-PP tem alertado para este problema. Mas, naturalmente, quem está no terreno, tem mais
propriedade para estes alertas. Desde logo, o Diretor do Programa Nacional para as Doenças Oncológicas,
afirmou: «O que mais se nota é o impacto que a pandemia teve nas pessoas, o medo, e na redução de
diagnósticos. Em fevereiro e março do ano passado, tanto centros de saúde como hospitais dedicaram-se só à
COVID-19. Depois abriu-se um pouco e recuperou-se alguma coisa. O que sentimos agora é que a pandemia
fez parar não só os centros de saúde como as unidades de diagnóstico durante a maior parte do ano, e isto
reduziu o número de diagnósticos. Outro ponto é o medo que a pandemia trouxe à população. Antes, quando
sentiam algo que não era normal, as pessoas dirigiam-se ao seu médico para esclarecer o que se passava.
Agora, essa acessibilidade não acontece, e não é porque as portas das unidades estejam fechadas, é porque
há o medo interno de irem e ficarem contaminadas. Estes são os dois fatores que poderão estar a ter mais
impacto, mas para termos a certeza vamos ter de esperar até 2025 e 2026. No cancro é assim, temos de olhar
para trás para termos todos os dados».
Salientamos que só daqui a 4 ou 5 anos conseguiremos ter uma visão completa das consequências que a
pandemia está a deixar, ao nível das doenças oncológicas. Mas há uma que o Diretor do Programa Nacional
afirma já se conhecer: «Uma das consequências foi a Senhora Ministra, com o avanço da infeção da COVID-
19 para níveis astronómicos, ter mandado parar toda a atividade cirúrgica não COVID nos hospitais. E, neste
momento, temos um problema: as cirurgias oncológicas também estão paradas. Estamos a tentar perceber o
que se pode fazer, mas o facto é que foi dada uma ordem para parar e não sabemos quanto tempo vai durar.
Só este exemplo diz tudo sobre o impacto da pandemia nas doenças oncológicas. O impacto é maior na
terapêutica cirúrgica do que na terapêutica clínica, quimioterapia ou radioterapia, mas a cirurgia ainda é a
arma que mais cura. Portanto, o atraso no diagnóstico diminui as probabilidades de cura dos tumores».
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Entendemos que se impõe uma revisão urgente da abordagem estratégica nacional às doenças
oncológicas, que vise contrariar a evolução da realidade existente. Tem de ser adotada uma gestão integrada
da doença oncológica que permita resultados eficazes no diagnóstico e tratamento do cancro, assegurando
mais qualidade de vida e maior sobrevida a estes doentes.
Uma organização eficaz da prestação dos cuidados de saúde oncológicos deve ser composta por uma rede
efetiva de rastreios e deve garantir o acesso atempado a cuidados especializados. Sejam eles no SNS ou,
como temos vindo reiteradamente a defender, nos setores privado e social através de contratualizações.
Assim, há que de realizar amplas campanhas de sensibilização, apostar fortemente na prevenção, os
rastreios de base populacional dos tipos de cancro com maior incidência têm de ser urgentemente retomados
em todo o território nacional e os seus resultados enviados, em tempo real, para as respetivas unidades de
saúde permitindo um diagnóstico precoce, decisões multidisciplinares e encaminhamento imediato do doente.
Os Tempos Máximos de Resposta Garantidos (TMRG) divergem conforme as diferentes patologias, mas
impõe-se que estes prazos sejam rigorosamente cumpridos. Os doentes têm de ter acesso atempado aos
melhores cuidados de saúde, sejam eles meios complementares de diagnóstico e terapêutica, consultas,
tratamentos, cirurgias ou reabilitação. Esse direito não pode continuar a ser-lhes negado, porque são as suas
vidas que estão em causa.
E é imprescindível que se aposte, de uma vez por todas, na investigação: desburocratizar para que
Portugal se torne atrativo e receba cada vez mais ensaios clínicos.
IV – Há muito tempo que o CDS-PP assumiu um compromisso com os doentes oncológicos e com as suas
famílias. Por isso mesmo, nos últimos anos já apresentámos, pelo menos, seis iniciativas legislativas sobre
esta matéria, inclusivamente sobre oncologia pediátrica. Em praticamente todos os casos o PS votou contra.
Numa pesquisa no portal do Parlamento verifica-se que, nos últimos 16 anos, o Partido Socialista não
apresentou uma única iniciativa legislativa relativa à oncologia. Nem uma ideia, nem uma proposta.
E, em plena Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, Portugal tem responsabilidades
acrescidas. Pode e deve dar o exemplo aos restantes Estados-Membros começando, desde já, a desenvolver
medidas concretas e eficazes em matéria de doenças oncológicas e dando cumprimento ao Plano Europeu
para Vencer o Cancro.
Neste sentido, e dada a gravidade do panorama das doenças oncológicas em Portugal – ampliado pela
pandemia de COVID-19 –, o CDS-PP não pode, mais uma vez, deixar de, responsavelmente, apresentar
propostas.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do CDS-PP abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de resolução:
Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento,
a Assembleia da República recomenda ao Governo que adote uma abordagem estratégica e tome medidas
urgentes no combate ao cancro, assentes primordialmente nos seguintes pontos:
1 – Investir em literacia em saúde, para que a população conheça as formas de prevenção do cancro, os
sinais de alerta e procure atempadamente o profissional de saúde adequado sempre que deteta um possível
problema.
2 – Apostar na prevenção do cancro, através da promoção de hábitos de vida saudáveis, da prática de
exercício físico, de uma alimentação equilibrada e alertando, também, para os perigos do consumo de tabaco
e do álcool.
3 – Promover campanhas nacionais de sensibilização para a importância dos rastreios oncológicos,
potenciando, assim, a taxa de adesão.
4 – Retomar urgentemente os rastreios de base populacional dos tipos de cancro com maior incidência,
abrangendo todo o território nacional.
5 – Assegurar que todos os doentes oncológicos têm acesso aos melhores cuidados de saúde, sejam eles
meios complementares de diagnóstico e terapêutica, consultas, tratamentos, cirurgias ou reabilitação,
cumprindo-se os Tempos Máximos de Resposta Garantidos.
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6 – Para cumprimento do número anterior:
a) assegurar consultas atempadas tanto nos cuidados de saúde primários, como nos cuidados
hospitalares, após adequada referenciação;
b) assegurar o acesso a todos os tratamentos e cirurgias indicados;
c) enquanto não estiver ultrapassada a pressão a que o SNS está sujeito em consequência da pandemia
de COVID-19, proceder à contratualização destes cuidados com os setores privado e social.
7 – Aumentar gradualmente o investimento no tratamento do cancro até que se atinja, pelo menos, a média
per capita da União Europeia.
8 – Apostar na investigação e tratamento de cancros raros implementando, para o efeito, programas de
medicina de precisão.
9 – Assegurar investimento efetivo e os recursos humanos em falta na investigação em cancros
pediátricos.
10 – Desburocratizar e agilizar os processos de investigação clínica em doenças oncológicas, promovendo
a atratividade de Portugal na realização de ensaios clínicos.
11 – Assegurar a centralização e acessibilidade aos dados e registos relativos ao cancro, bem como a
interoperabilidade dos diversos sistemas operativos.
12 – Garantir o adequado seguimento e vigilância dos doentes oncológicos sobreviventes.
13 – Através de uma eficaz aplicação do Estatuto do Cuidador Informal, assegurar o devido apoio às
famílias e cuidadores dos doentes oncológicos implementando, também, medidas especialmente direcionadas
aos cuidadores de doentes oncológicos em idade pediátrica.
14 – Promover estudos exaustivos relativos ao impacto da pandemia de COVID-19 nas doenças
oncológicas tentando, desta forma, acautelar a minimização das consequências nefastas que se adivinham
para os próximos anos.
15 – No âmbito da Presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, proceder à promoção, junto
dos Estados-Membros, da adesão ao Plano Europeu para Vencer o Cancro começando de imediato a aplicar
as medidas nele preconizadas.
Palácio de São Bento, 5 de fevereiro de 2021.
Os Deputados do CDS-PP: Ana Rita Bessa — Telmo Correia — Cecília Meireles — João Pinho de Almeida
— João Gonçalves Pereira.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 936/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A SUSPENSÃO IMEDIATA DAS MONTARIAS EM TODO O TERRITÓRIO
NACIONAL
Os acontecimentos ocorridos na Herdade da Torre Bela no concelho de Azambuja, no final do ano
passado, que resultaram na morte de 540 animais de grande porte, trouxeram ao conhecimento público uma
prática que a sociedade tende a desconhecer. Sabemos, porém, que não se tratou de um caso isolado ou de
uma exceção no contexto das montarias que são organizadas anualmente em Portugal.
Existem evidências claras de que foram organizadas várias montarias semelhantes pela mesma empresa,
em território nacional, além de inúmeros exemplos de outras montarias promovidas por outras entidades e
empresas, portuguesas e estrangeiras, que resultam na morte de centenas de animais de grande porte, tais
como veados, gamos, javalis entre outras espécies que são propositadamente criadas e mantidas em terrenos
destinados à realização deste tipo de eventos. Contrariamente ao que o sector quis fazer crer, este não foi um
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caso isolado, sendo que estão já agendadas outras montarias para 2021 em vários pontos do país.
Este episódio teria passado despercebido na sociedade portuguesa há alguns anos, mas o facto de ter
chocado tanto e de forma tão unânime a nossa sociedade atual demonstra que o repúdio por este tipo de
práticas e a sensibilidade para a proteção dos animais e do ambiente tem ganho cada vez mais relevância.
Não deixa de espantar que o sector da caça tente demarcar-se deste episódio, incutindo toda a
responsabilidade para a empresa espanhola que promoveu o evento, acusando-a de já ter praticado chacinas
semelhantes noutros locais do país, mas ao mesmo tempo este sector nada fez para evitar o massacre que se
veio a verificar na Torre Bela, desde logo porque nunca denunciaram este episódio, remetendo-se a um
silêncio cúmplice com o mesmo.
Apesar das limitações impostas pela crise sanitária provocada pela COVID-19 no ano de 2020, as
montarias continuaram a ser permitidas e promovidas em Portugal. Foram anunciados vários eventos deste
género promovidos por empresas e organizações de caçadores em vários pontos do país em todos os fins-de-
semana de janeiro e fevereiro de 2021, antes de ter sido anunciado o confinamento. Para além disso, existem
empresas estrangeiras que oferecem pacotes turísticos de caça que preveem a realização de montarias
semelhantes às da Torre Bela, como é o caso da empresa «Book for Hunt»1 que prevê a realização de
montarias durante 3 dias na região de Castelo Branco a troco de 2053 €2.
Um outro aspeto destas montarias prende-se com a utilização de cães especialmente treinados para este
fim, realidade que é cada vez mais contestada mesmo por alguns grupos de caçadores, não só pelo impacto
que tem e que resulta no extermínio de um número elevado de presas, mas também por não existir qualquer
limite para os efetivos que compõem as matilhas. Normalmente, são matilhas compostas por um número muito
elevado de cães que participam e que acabam eles próprios por ser feridos ou até atingidos a tiro pelos
caçadores e porque, geralmente, este tipo de técnica acaba por resultar em combates sangrentos entre os
cães e os animais selvagens que culminam com a morte agonizantes destes animais.
Importa ainda dar conta de que persistem muitas dúvidas sobre a forma como são adquiridos os selos para
estes eventos e sobre o modo como é fiscalizada a sua utilização, tal como ficou demonstrado no episódio da
Torre Bela. Neste caso, é do conhecimento público que apareceram no local selos vermelhos, selos que são
disponibilizados pelo ICNF para efeitos de correção de densidade populacional, que não foi o caso desta
montaria.
É latente a dificuldade de fiscalizar a realização das montarias e de controlar o impacto que têm sobre as
espécies, como o caso da Torre Bela nos veio evidenciar, desde logo ao não existir qualquer procedimento
administrativo de autorização prévia à sua realização.
Acresce ainda que a fiscalização das montarias está também bastante condicionada pela pandemia da
COVID-19, pelo que o Grupo Parlamentar do PAN entende que não existem condições para que se continue a
permitir este tipo de caçadas sem que sejam esclarecidas todas as dúvidas e, eventualmente, sem que seja
revista a legislação, tal como foi afirmado pelo Ministro do Ambiente e da Ação Climática aquando destes
acontecimentos.
Neste sentido, e tendo em conta os factos que causaram e continuam a causar enorme perplexidade na
opinião pública, e a abertura de inquérito e processos judiciais para apurar responsabilidades pelo ocorrido na
Herdade da Torre Bela, para o Grupo Parlamentar do PAN é fundamental que se tomem medidas firmes e
concretas para salvaguardar a biodiversidade existente no nosso País. Tal não se coaduna com o atual regime
aplicável decorrente da Lei de Bases da Caça que, conforme se referiu, não prevê qualquer tipo de
autorização prévia, o que significa que casos como o da montaria realizada na Torre Bela podem voltar a
acontecer, afetando estas ou outras espécies.
Assim, a Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, por intermédio do
presente projeto de resolução, recomenda ao Governo que:
1 – Determine a suspensão imediata de todas as montarias previstas para o território nacional, até
regulamentação deste modo de caça e garantias de capacidade de fiscalização;
2 – Proceda ao levantamento e divulgação pública de todas as zonas de caça que albergam animais cujas
espécies são consideradas como «caça maior»;
1 https://www.bookyourhunt.com/en/Search?country=Portugal
2 https://www.bookyourhunt.com/en/Tour/17724
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3 – Proceda ao levantamento e divulgação pública de todas as explorações, incluindo agrícolas, que
desenvolvem atividade cinegética através de cercos ou cercões.
Assembleia da República, 9 de fevereiro de 2021.
O Deputado e as Deputadas do PAN: André Silva — Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 937/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO O REFORÇO DA PROTEÇÃO SOCIAL E AMPLIFICAÇÃO DOS
MECANISMOS DE APOIO ÀS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA NO ÂMBITO DA PANDEMIA DA
COVID-19 E DOS SUCESSIVOS CONFINAMENTOS
Fundamentação
A pandemia da COVID-19 tem-nos colocado vários desafios institucionais e até políticos – com a
declaração de sucessivos Estados de Emergência – mas o impacto brutal que tem na vida da população, no
seu desgaste psicológico e emocional, a par da crise social e económica que cresce com o desemprego e o
aumento da pobreza, requer o reforço da proteção social do Estado a vários níveis.
As medidas sanitárias de distanciamento físico, mas também do confinamento da população levou a que
muitas famílias se vissem a braços com dificuldades acrescidas de gestão do quotidiano e da satisfação das
suas necessidades básicas. E neste contexto são as mulheres a quem estas medidas mais impactam, pelo
desemprego, pela dificuldade de conciliação da vida pessoal, familiar e profissional e também pelo aumento de
casos de violência, de que têm sido, frequentemente, as vítimas. O motto «fiquem em casa» é uma sentença
para muitas mulheres: se a casa é o lugar seguro para grande parte das pessoas e famílias, não o é para as
vítimas de violência.
No período relativo ao primeiro confinamento (de 19 de março a 3 maio de 2020), segundo um estudo do
projeto Violência contra as Mulheres e Violência Doméstica em Tempos de Pandemia, promovido pela
Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) foram feitas 683 denúncias de violência, das quais 589 de
violência doméstica. 34,1% dos casos reportam-se a violência no contexto de relações de intimidade, 14,9%
dos casos a violência contra idosos e 12,6% a violência contra crianças. De entre as vítimas, 83% foram
mulheres e 17% foram homens. A faixa etária com maior prevalência de casos é entre os 21 e os 44 anos.
Relativamente aos agressores, a maioria são homens (76,6%), quer quando as vítimas são mulheres (82,3%),
quer quando as vítimas são homens (48%). Os tipos de violência mais comuns são a violência psicológica
e/ou as ofensas à integridade física. No que diz respeito à violência perpetrada, a maior parte ocorre de forma
continuada em 67% das mulheres, sendo que a duração das agressões varia entre 1 mês e 52 anos no caso
das mulheres.
De acordo com os resultados preliminares de um outro estudo recente, VD@COVID19, promovido pela
Escola de Saúde Pública (ENSP), que analisou a violência doméstica psicológica, física e sexual
autorreportada online durante a pandemia, entre abril e outubro de 2020, 15% dos inquiridos reportou a
ocorrência deste crime em casa e um terço das vítimas disse ter sido agredida pela primeira vez durante a
pandemia. Acresce que a violência doméstica é transversal a todos os grupos etários e níveis de escolaridade,
tem especial relevo nos mais jovens, nas pessoas menos escolarizadas e com mais dificuldades económicas
e/ou cuja atividade profissional foi prejudicada pela pandemia. O tipo de violência mais relatada é a
psicológica, seguindo-se a sexual e a física, sendo que podem ocorrer em simultâneo os diferentes tipos de
violência.
Segundo o mesmo estudo, 72% das vítimas não procura ajuda nem faz denúncia, por considerar que esta
não alteraria a sua situação e por se sentirem constrangidas. Há registos de uma redução de denúncias
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nestes meses de pandemia da COVID-19 face ao período homólogo de 2019, o que não se traduz numa
diminuição da violência de facto e especialistas apontam inclusive para o seu aumento exponencial. Isto
requer uma atenção redobrada e o combate ao silenciamento da violência, ao mesmo tempo que revela a
posição de fragilidade em que se encontram as pessoas confinadas em ambientes de tensão, chantagem,
medo e pânico permanente.
A violência doméstica assenta na assimetria de papéis de género e relações de poder e constitui também
uma das mais reiteradas formas de discriminação contra as mulheres, sendo uma grave violação dos direitos
fundamentais. O crime de violência doméstica encontra-se previsto no artigo 152.º do Código Penal, aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, e Portugal ratificou, em 2011, a Convenção de Istambul. Porém,
tal não tem impedido a morte e a permanência de casos de violência, sobretudo sob mulheres e crianças. A
pandemia veio agravar este quadro, sujeitar as mulheres e crianças à coabitação permanente com os
agressores e limitando a sua mobilidade e a possibilidades de auxílio.
Neste sentido, a Assembleia da República, reunida em Plenário, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da
Constituição da República Portuguesa, por intermédio do presente projeto de resolução, recomenda ao
Governo que, face aos desafios impostos pela pandemia COVID-19, reforce a proteção social e amplie os
mecanismos de apoio às vítimas de violência doméstica, nomeadamente através:
1 – Do combate à feminização da pobreza e das desigualdades, facilitando o acesso aos apoios sociais à
população e acelerando o pagamento dos apoios financeiros;
2 – Da criação de um programa de prevenção de violência doméstica focado especificamente nos
agressores, criando uma entidade e um programa de reeducação destinados aos condenados por violência
doméstica, nomeadamente nas prisões masculinas (uma vez que 95% dos condenados são homens). Tal
programa deve refletir nos seus conteúdos a abordagem dos conceitos atualmente usados para analisar o
fenómeno da violência doméstica, nomeadamente de masculinidade tóxica e de masculinidade violenta;
3 – Da criação de mecanismos para a efetiva aplicação da Convenção de Istambul, designadamente
quanto à proteção da vítima após a denúncia, criando planos de segurança que efetivamente protejam a vítima
do agressor, bem como o seu acompanhamento ao longo do processo;
4 – Da inclusão da disciplina de educação para a igualdade e não discriminação (nomeadamente, a não
discriminação de género e a prevenção do abuso sexual) nos curricula das escolas, tendo em conta a
informação e a proteção das crianças e o facto da maioria dos casos de violência doméstica ocorrer entre
pessoas dos 21 aos 44 anos;
5 – Da criação de gabinetes especializados para o atendimento às pessoas vítimas de violência doméstica
fora das esquadras, mas que possam garantir, entre outros técnicos, a presença de agentes especializados e
formados para dar resposta a pessoas vulneráveis vítimas de violência;
6 – Da formação contínua de agentes policiais, agentes judiciários e dos serviços sociais de apoio aos
tribunais sobre a igualdade de género, a violência doméstica e a diversidade cultural;
7 – Da aplicação do Estatuto de Vítima às crianças que testemunhem situações de violência doméstica,
incluindo-as mais objetivamente nas Fichas de Avaliação de Risco;
8 – Da reformulação das Fichas de Avaliação de Risco de violência doméstica, de forma a que se tornem
mais claras e objetivas para as vítimas e para os agentes policiais, discriminando-as também por género, por
forma a facilitar a boa instrução do processo;
9 – Do Reforço das verbas alocadas a associações e outras entidades que combatem a violência
doméstica parcial ou integralmente financiadas pelo Estado;
Assembleia da República, 9 de fevereiro de 2020.
A Deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 938/XIV/2.ª
PELO COMBATE EFETIVO AO CYBERBULLYING
O atual contexto de escola não presencial e de maior utilização de redes sociais e internet em geral pelas
crianças e adolescentes torna-os mais expostos a riscos – a muitos, pela primeira vez. O acompanhamento
deste tema em particular por pais, família e educadores em geral é fundamental, até porque não é um tema
que se aprenda subitamente, sendo necessário um aumento da literacia digital e uma consciência por parte do
indivíduo dos seus direitos e responsabilidades.
Perante a maior exposição a este risco, a comunidade escolar e a escola, como espaço de formação,
devem estar mais preparadas e ter um maior foco neste tema. O que antes poderia fazer parte de um conjunto
formativo, torna-se agora uma proteção essencial, na qual os próprios professores devem ser apoiados para
que possam ser mais interventivos em espaços de trabalho com os alunos.
O cyberbullying pode ser visto como uma forma ou extensão do bullying que é realizado através de meios
digitais, sendo também um comportamento agressivo, intencional e continuado. Pode acontecer em qualquer
local, a qualquer hora, constantemente. A maior presença online potencia a probabilidade de exposição e é
preciso preparar as crianças e adolescentes para esta realidade. A Polícia de Segurança Publica alertou,
inclusivamente, no passado dia 8 de fevereiro de 2021, pais, educadores, professores e alunos para um
possível aumento do cyberbullying no atual contexto da escola online.
O Centro de Internet Segura reporta que as consequências do cyberbullying passam por: diminuição do
rendimento escolar/absentismo, sentimento de raiva, frustração, tristeza ou nervosismo quando utilizam os
telemóveis e computadores, resistência em ir à escola ou sair de casa, parar de usar o
telemóvel/computador/tablet, mostrar-se nervoso e ansioso sempre que surge uma nova mensagem, evitar
discussões sobre o uso do telemóvel/computador/tablet, comportamentos autolesivos, sintomas de depressão
e ansiedade e queixas físicas.
O estudo Cyberbullying em Portugal durante a pandemia da COVID-19, realizado por uma equipa do
Centro de Investigação e Intervenção Social do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa, conclui que durante
o primeiro período de confinamento cerca de 60% dos jovens se disseram vítimas de cyberbullying pelo menos
algumas vezes durante os três meses em que durou o ensino à distância. As vítimas identificadas no estudo
afirmaram terem-se sentido irritadas, tristes, nervosas e inseguras com mais frequência do que os estudantes
que não sofreram ataques online. Esta percentagem é quase o dobro do reportado pela UNICEF. O mesmo
estudo recomenda, a par de medidas mais eficazes no combate ao cyberbullying, que se aumente nos jovens
a consciência «de que aquilo que eles escrevem nas redes sociais tem impacto nos outros».
Os estudos sobre o tema, em geral, reportam que são as crianças com rendimentos familiares mais baixos
as mais atingidas, mas este é um fenómeno transversal nas tipologias e idades. Acresce, uma maior
fragilidade decorrente do atual panorama de restrições que afetam a saúde mental, o que torna mais premente
a necessidade de dar especial foco ao tema de prevenção de cyberbullying nas crianças e adolescentes no
atual contexto.
Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do número 1 do artigo 4.º do
Regimento da Assembleia da República, o Deputado único abaixo assinado da Iniciativa Liberal apresenta o
seguinte projeto de resolução:
Resolução
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera
recomendar ao Governo que:
1 – Desenvolva uma campanha informativa especial e urgente, a nível nacional, sobre cyberbullying junto
das escolas, consistindo em formações para os membros da comunidade educativa e promoção do
desenvolvimento de projetos pelos alunos, de forma continuada, com o objetivo de minimizar a exposição de
crianças e jovens ao risco de cyberbullying, prepará-los para quando estiverem perante riscos e aumentar a
sua literacia nesta matéria;
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2 – Produza e divulgue conteúdos para que as escolas, dentro das autonomias e especificidades de cada
projeto educativo, possam utilizar, nomeadamente para incentivar o trabalho dos alunos sobre o cyberbullying
e a sua participação no combate ao mesmo;
3 – Garanta a cooperação entre as escolas e as entidades atuantes no combate ao cyberbullying, incluindo
o desenvolvimento e aprofundamento de apoio psicológico, procurando a auto capacitação e consciência das
crianças e jovens.
Palácio de São Bento, 9 de fevereiro de 2021.
O Deputado do IL, João Cotrim de Figueiredo.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 939/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À CONSERVAÇÃO E RECUPERAÇÃO DOS
ECOSSISTEMAS MARINHOS COSTEIROS COM GRANDE CAPACIDADE DE SEQUESTRO DE
CARBONO
A grave crise climática que hoje atravessamos resulta não só da queima intensiva de petróleo, gás e
carvão, e a consequente emissão de gases com efeito de estufa (GEE) para a atmosfera, mas também da
destruição, degradação e alteração dos sumidouros naturais de dióxido de carbono.
Os ecossistemas marinhos costeiros estão entre os sumidouros naturais com maior capacidade de
retenção e captura de carbono. De facto, 83 por cento do ciclo global do carbono circula através dos oceanos.
Os ecossistemas costeiros, apesar de representarem apenas dois por cento da área oceânica, retêm e
capturam cerca de 50 por cento de todo o carbono sequestrado nos sedimentos oceânicos.
Portugal, tendo uma grande área costeira, conta com uma grande abundância deste tipo de ecossistemas:
na Ria de Aveiro, na Ria Formosa, em vários estuários (Tejo, Sado, Mondego, Mira, Guadiana, Arade, Alvor,
entre outros), na Lagoa de Óbidos e nas baías abrigadas na costa da Arrábida e do Algarve. São
ecossistemas sensíveis recorrentemente ameaçadas por alterações das condições locais ou por negligência
quando um determinado local necessita de intervenção. Uma das principais ameaças atuais são as dragagens
afetas ao porto de Setúbal que colocam em risco estas áreas no estuário do Sado.
A destruição, alteração e fragmentação destes ecossistemas reduz a capacidade de sequestro de carbono,
agravando a crise climática. Ao mesmo tempo, os efeitos da crise climática, como a subida do nível médio das
águas do mar, as mudanças de temperatura, os fenómenos climáticos extremos mais frequentes, entre outros,
contribuem para a destruição e redução da área destes ecossistemas. É, portanto, um ciclo que deve ser
quebrado. A resposta à crise climática exige a proteção destes ecossistemas marinhos costeiros com grande
capacidade de sequestro de carbono.
Segundo o Relatório Especial sobre o Oceano e a Criosfera num Clima em Mudança, do Painel
Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) das Nações Unidas1, a quantidade de carbono
capturado nos sedimentos dos ecossistemas marinhos vegetados – como as pradarias marinhas, zonas de
sapal e florestas de macroalgas –, pode ascender a 1000 toneladas por hectare: uma quantidade muito
superior à capturada pela maioria dos ecossistemas terrestres. As pradarias marinhas, sapais e florestas de
macroalgas são, portanto, soluções naturais imprescindíveis para regular o clima e para mitigar os efeitos da
crise climática.
Também a adaptação à crise climática é reforçada pelas pradarias marinhas, sapais e florestas de
macroalgas. Estes ecossistemas ajudam a proteger as zonas costeiras das cada vez mais intensas e
frequentes tempestades ao dissipar a energia das ondas e das marés e ao reduzir a erosão costeira; atenuam
os cada vez mais preocupantes efeitos da subida do nível médio das águas do mar na costa portuguesa;
1 https://tinyurl.com/u7onajd
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melhoram a qualidade da água; e contribuem ainda para reforçar a soberania alimentar das populações: são
zonas de reprodução, berçário, abrigo e de alimentação de inúmeras espécies de peixes, crustáceos e
bivalves que sustentam as pescarias portuguesas.
Contrariando o que deveriam ser políticas de defesa do interesse público e da biodiversidade que a todos
nos sustenta, as políticas atuais assentes no modelo socioeconómico vigente permitem, e por vezes
promovem, a depredação e destruição das pradarias marinhas, dos sapais e das florestas de macroalgas no
nosso território. Assim o confirma a diminuição da área destes ecossistemas costeiros a cada ano que passa.
Pradarias marinhas
As pradarias marinhas – um dos ecossistemas mais produtivos do planeta – retêm nos seus sedimentos
elevadas quantidades de dióxido de carbono através da captura de matéria orgânica em suspensão na água e
da remoção de CO2 da atmosfera, sendo mais eficientes que as florestas terrestres a sequestrar carbono.
Contudo, quando destruídos ou degradados, estes ecossistemas passam de sumidouros a emissores de GEE,
ao libertarem o carbono acumulado nos seus sedimentos.
Segundo estimativas recentes2, se a sociedade pagasse alguns dos benefícios gerados gratuitamente
pelas pradarias marinhas, como por exemplo a regulação climática, o controlo da erosão, o ciclo de nutrientes
ou a produção alimentar, teria de desembolsar anualmente cerca de 27 mil euros por hectare deste
ecossistema.
Em Portugal, as pradarias marinhas «enfrentam um declínio sem precedentes da sua distribuição». Assim
o afirmam os autores de um estudo científico3 no qual é analisada a distribuição, entre 1980 e 2010, das
populações de Zostera noltii, Zostera marina e Cymodocea nodosa – as três principais espécies de plantas de
pradarias marinhas presentes em Portugal. Segundo as estimativas dos autores, existem cerca de 2000
hectares de pradarias marinhas em território nacional. As dragagens de estuários, a construção de marinas e
portos, e as descargas de efluentes industriais, agrícolas e urbanos em águas costeiras estão entre os
principais fatores que contribuíram para a degradação, fragmentação e destruição de vastas áreas de
pradarias marinhas no nosso país.
Sapais
Ocorrem em sistemas estuarinos e lagunares parcial ou permanentemente inundados por água salgada.
Conferem proteção costeira, filtram poluentes, controlam a erosão e servem de habitat para a biodiversidade,
albergando inúmeras espécies de aves, peixes, crustáceos e bivalves.
Os sapais desempenham um papel de grande relevo na regulação climática ao capturarem e reterem
elevadas quantidades de GEE na biomassa da vegetação e sedimentos. Estima-se que os sapais sequestrem
anualmente entre 6 a 8 toneladas de CO2eq por hectare4, uma taxa duas a quatro vezes superior à de
sequestro de carbono das florestas tropicais maduras5. Estes e outros benefícios dos sapais, se convertidos
em valor pecuniário, podem ascender a mais de 180 mil euros anuais por hectare.
As zonas de sapal do litoral português estão distribuídas de norte a sul do país. Faltam estudos científicos
sobre as tendências de distribuição nas últimas décadas. No entanto, tendo em consideração que estes
ecossistemas estão situados em zonas litorais sujeitas a uma grande pressão urbanística, agrícola e industrial,
e considerando a artificialização sofrida pelo litoral português nas últimas décadas, não é descabido considerar
que as zonas de sapal têm regredido ao longo dos anos no nosso país.
Florestas de macroalgas
As florestas de macroalgas sustentam comunidades ecológicas diversas e produtivas. São um dos
2 https://tinyurl.com/rh33go4
3 https://tinyurl.com/sbprwel
4 https://tinyurl.com/wlsflzn
5 https://tinyurl.com/rs8hf4r
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sistemas com taxas mais elevadas de produtividade primária por unidade de área, rivalizando com a
produtividade de culturas agrícolas e florestas tropicais. Estes ecossistemas marinhos costeiros contribuem
com inúmeros benefícios para a nossa sociedade. Sustentam as pescarias – são zonas de reprodução,
berçário, abrigo e de alimentação de centenas de espécies; reciclam nutrientes, melhorando a qualidade da
água; e protegem as zonas costeiras das tempestades e da subida do nível médio do mar ao dissiparem a
energia das ondas e das marés.
As florestas de macroalgas podem ainda desempenhar um papel relevante no sequestro de carbono e
consequentemente na mitigação dos efeitos da crise climática. Estes ecossistemas acumulam um nível
substancial de carbono na sua biomassa, contribuindo ainda para a deposição de carbono nos sedimentos
oceânicos.
Muitas das espécies de macroalgas encontram-se distribuídas por toda a costa continental portuguesa,
estando, no entanto, as aglomerações de espécies – ou florestas de macroalgas – limitadas sobretudo a norte
de Portugal continental. Existem ainda registos de florestas de macroalgas em zonas profundas dos Açores e
da Madeira. Alguns especialistas6 apontam para tendências de distribuição e abundância estáveis em
Portugal, contudo são necessários mais estudos e uma análise mais aprofundada para alcançar conclusões
mais definitivas sobre a realidade das florestas de macroalgas no nosso país. Mas é certo que o aumento da
temperatura da água dos oceanos que se verifica é uma ameaça às florestas de macroalgas. Assim como a
sobrepesca de espécies que se alimentam de ouriços-do-mar (predadores naturais de macroalgas), a
eutrofização e a proliferação de espécies invasoras.
Ausência de objetivos e medidas para a conservação e recuperação dos sumidouros marinhos
costeiros nos principais instrumentos de política climática
Apesar da importância das pradarias marinhas, zonas de sapal e florestas de macroalgas na mitigação e
adaptação aos efeitos da crise climática, estes sumidouros naturais de GEE não constam dos principais
instrumentos de política climática em Portugal.
O Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050) não contempla qualquer medida de
conservação e recuperação dos sumidouros marinhos costeiros para a redução das emissões de GEE, não os
incluindo também nas suas trajetórias para a neutralidade carbónica. Apenas sumidouros terrestres como
algumas culturas agrícolas, pastagens, florestas e matos estão contemplados no RNC 2050. Isto apesar de
alguns destes sumidouros – como as florestas e os matos – se transformarem em grandes emissores de GEE
em anos de grandes fogos rurais.
Também o Plano Nacional integrado Energia e Clima 2030 (PNEC 2030) carece de qualquer objetivo para
os ecossistemas marinhos costeiros. Apenas o Programa de Ação para a Adaptação às Alterações Climáticas
2030 (P-3AC) contempla dois objetivos para os ecossistemas marinhos e costeiros, mas de abrangência muito
limitada. Um desses objetivos é mencionado na linha de ação #4 do P-3AC: «monitorizar e gerir os
ecossistemas estuarinos lagunares e marinhos de modo a assegurar atividades de pesca e aquicultura
sustentáveis e o seu bom funcionamento». Este objetivo carece de medidas associadas. Ao outro objetivo,
«manter ou recuperar zonas de transição naturais entre ecossistemas costeiros e terrestres», na linha de ação
#8, está associada a medida «proteção e reabilitação de sistemas costeiros». Um objetivo e uma medida
manifestamente vagos face à necessidade de ações concretas de conservação e recuperação destes
ecossistemas essenciais para a adaptação à crise climática.
O Bloco de Esquerda entende ser necessário e urgente incluir objetivos, medidas e ações concretas nos
instrumentos de política climática, de forma a conservar e a recuperar as pradarias marinhas, as zonas de
sapal e as florestas de macroalgas – ecossistemas essenciais para combater a crise climática. Entendimento,
aliás, corroborado pela decisão da Assembleia Geral das Nações Unidas em declarar o período 2021-2030
como a Década para a Recuperação dos Ecossistemas. Declaração que visa acelerar as metas de
recuperação de ecossistemas degradados – onde se incluem explicitamente os ecossistemas marinhos e
costeiros –, com o intuito de promover o combate à perda massiva de biodiversidade, bem como de acelerar a
mitigação e a adaptação à crise climática.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
6 https://tinyurl.com/sngteks
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II SÉRIE-A — NÚMERO 73
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Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Avalie, até ao final do primeiro semestre de 2022, o estado de conservação das pradarias marinhas,
dos sapais e das florestas de macroalgas, de modo a identificar as áreas degradadas que carecem de
recuperação;
2 – Realize estudos, até ao final do primeiro semestre de 2022, com o intuito de determinar as áreas de
distribuição histórica das pradarias marinhas, dos sapais e das florestas de macroalgas em território nacional;
3 – Proceda à recuperação, até ao final de 2025, das áreas de pradarias marinhas, de sapais e de
florestas de macroalgas destruídas, degradadas e/ou fragmentadas;
4 – Crie e integre objetivos, medidas e ações concretas de conservação e recuperação das pradarias
marinhas, dos sapais e das florestas de macroalgas nos instrumentos de política climática, designadamente no
RNC 2050, PNEC 2030 e P-3AC;
5 – Integre as funções de sequestro (retenção e captura) de gases com efeito de estufa das áreas de
pradarias marinhas, de sapal e de florestas de macroalgas no Inventário Nacional de Emissões de gases com
efeito de estufa;
6 – Atualize as trajetórias para a neutralidade carbónica do RNC 2050, através da inclusão das funções de
sequestro (retenção e captura) de gases com efeito de estufa por parte das pradarias marinhas, dos sapais e
das florestas de macroalgas, o que permitirá antecipar a meta de 2050 para a neutralidade climática do país;
7 – Crie e implemente, até ao final do segundo semestre de 2022, programas de sensibilização para as
autoridades marítimas, profissionais da pesca, operadores marítimo-turísticos, entre outros, sobre a
importância ecológica, climática e socioeconómica das pradarias marinhas, dos sapais e das florestas de
macroalgas;
8 – Reforce os meios humanos, técnicos e financeiros do Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas (ICNF) e outras entidades competentes, de forma a que o estas possam planear, implementar,
monitorizar e avaliar todas ações de conservação e recuperação dos ecossistemas marinhos costeiros
preconizadas no presente projeto de resolução.
Assembleia da República, 9 de fevereiro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Nelson Peralta — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge
Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua —
João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro — Luís Monteiro —
Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 940/XIV/2.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A DESCENTRALIZAÇÃO DAS JUNTAS MÉDICAS PARA
CONFIRMAÇÃO E GRADUAÇÃO DE INCAPACIDADE EM PROCESSO DE REPARAÇÃO DE DOENÇA
PROFISSIONAL
A realização de juntas médicas para confirmação e graduação de incapacidade em processo de reparação
de doença profissional tem vindo a ser concentrada em Lisboa. A justificação dada pela Caixa Geral de
Aposentações para esta concentração é a de que isso resulta de a Lei – no caso, o Decreto-Lei n.º 503/99, de
20 de novembro – requerer a intervenção de um médico do Departamento de Proteção contra Riscos
Profissionais [alínea b) do n.º 1 do artigo 38.º do referido diploma]. Trata-se de uma justificação que não colhe,
atendendo ao facto de as mencionadas juntas médicas se terem realizado, já no quadro desta lei e, pelo
menos, até 2019, também nas instalações da Caixa Geral de Aposentações do Porto e, anteriormente, em
todas as capitais de distrito.
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9 DE FEVEREIRO DE 2021
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A realização destas juntas médicas exclusivamente em Lisboa revela-se altamente lesiva dos interesses e
dos direitos destes trabalhadores e fere manifestamente o princípio da igualdade, ao introduzir um tratamento
de facto desigual em função do local de residência do trabalhador. Com efeito, forçar um trabalhador com uma
doença profissional, muitas vezes com um efeito incapacitante muito gravoso, residente a centenas de
quilómetros de Lisboa a ali se deslocar acarreta custos materiais e pessoais que penalizam seriamente a sua
saúde e o seu rendimento.
Por outro lado, estabelecendo o n.º 4 do artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 503/99 que «Os encargos relativos à
participação do médico indicado pelo sinistrado ou doente não podem ultrapassar um quarto da remuneração
mínima mensal garantida mais elevada», é também evidente que isso dificulta seriamente o cumprimento
efetivo do direito que assiste ao trabalhador de indicar um médico por si escolhido para integrar a Junta
Médica, quando esse médico, tal como o trabalhador, reside longe de Lisboa.
Este efeito de distância discrimina, assim, inaceitavelmente os trabalhadores que residem a maior distância
de Lisboa. E não podem estes trabalhadores, já gravemente penalizados pela doença de que padecem, ser
prejudicados pela falta de devida articulação entre a Caixa Geral de Aposentações e o Departamento de
Proteção contra Riscos Profissionais do Instituto de Segurança Social, IP.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco
de Esquerda propõe à Assembleia da República que recomende ao Governo que:
— Diligencie junto da Caixa Geral de Aposentações e do Departamento de Proteção contra Riscos
Profissionais do Instituto de Segurança Social, IP, para que as juntas médicas para confirmação e graduação
de incapacidade em processo de reparação de doença profissional se passem a realizar em todas as capitais
de distrito.
Assembleia da República, 9 de fevereiro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Manuel Pureza — José Moura Soeiro — Moisés Ferreira —
Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Jorge Costa — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias —
Fabíola Cardoso — Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Maria Cardoso — Luís
Monteiro — Maria Manuel Rola — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Sandra Cunha — Catarina Martins.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.