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Sexta-feira, 1 de outubro de 2021 II Série-A — Número 10
XIV LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2021-2022)
S U M Á R I O
Resoluções: (a) — Eleição de quatro juízes para o Tribunal Constitucional. — Deslocação do Presidente da República às Canárias.
Projetos de Lei (n.os 955 a 974/XIV/3.ª): N.º 955/XIV/3.ª (BE) — Repõe o valor do trabalhosuplementar e o descanso compensatório, aprofundando a
recuperação de rendimentos e contribuindo para a criação deemprego, procedendo no setor público e privado.N.º 956/XIV/3.ª (BE) — Alterações ao Regime Jurídico-
Laboral e Alargamento da Proteção Social dos Trabalhadorespor Turnos e Noturnos (vigésima primeira alteração aoCódigo do Trabalho).
N.º 957/XIV/3.ª (BE) — Consagra as 35 horas como períodonormal de trabalho no setor privado (vigésima primeiraalteração ao Código do Trabalho).
N.º 958/XIV/3.ª (BE) — Revoga as alterações ao Código doTrabalho introduzidas no período da troika que vieram facilitaros despedimentos e reduzir as compensações devidas aos
trabalhadores, procedendo à vigésima primeira alteração àLei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.N.º 959/XIV/3.ª (BE) — Reconhece o direito a 25 dias de
férias no setor privado (vigésima primeira alteração ao à Lein.º 7/2009, de 12 de fevereiro).
N.º 960/XIV/3.ª (BE) — Reforça a negociação coletiva, orespeito pela filiação sindical e repõe o princípio dotratamento mais favorável ao trabalhador (vigésima primeiraalteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro).N.º 961/XIV/3.ª (CH) — Agravamento das molduras penaisprivativas de liberdade para as condutas que configurem os
crimes de abuso sexual de crianças, abuso sexual demenores dependentes e atos sexuais com adolescentes.N.º 962/XIV/3.ª (CH) — Altera o código penal no seu artigo
164.º (violação) agravando as molduras penais aplicáveis aossujeitos que preencham os requisitos desta condutacriminosa, passando a considerar os crimes contra a
liberdade e autodeterminação sexual como crimes denatureza pública.N.º 963/XIV/3.ª (CDS-PP) — Programa de incentivo à criação
e flexibilização dos horários das creches.N.º 964/XIV/3.ª (PAN) — Estabelece o reforço e avaliação daimplementação e execução do Programa de Apoio à Redução
do Tarifário dos Transportes Públicos (PART) e do Programade Apoio à Densificação e Reforço da Oferta de TransportePúblico (PROTRANSP).
N.º 965/XIV/3.ª (BE) — Cria o Programa Rede de CrechesPúblicas.
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N.º 966/XIV/3.ª (BE) — Permite o acesso a um conjunto de
dados pessoais por parte de estudantes de medicina einvestigadores científicos, para fins académicos, de arquivode interesse público fins de investigação científica ou histórica
ou fins estatísticos (primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de2021).N.º 967/XIV/3.ª (PAN) — Procede à prorrogação do prazo do
processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegale garante mecanismos de transparência neste processo,alterando a Lei n.º 91/95, de 2 de setembro.
N.º 968/XIV/3.ª (PAN) — Alarga os prazos de prescrição decrimes contra a liberdade e autodeterminação sexual demenores e do crime de mutilação genital feminina,
procedendo à quinquagésima quarta alteração do CódigoPenal.N.º 969/XIV/3.ª (PAN) — Consagra a terça-feira de carnaval
como feriado nacional obrigatório, procedendo à décimasétima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lein.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
N.º 970/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —Determina a proibição das corridas de cães com finscompetitivos.
N.º 971/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —Altera o Código do Trabalho e a Lei Geral do Trabalho emFunções Públicas, reconhecendo o direito a 25 dias úteis deférias.
N.º 972/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —
Altera o Código do Trabalho, estabelecendo as 35 horassemanais como limite máximo do período normal de trabalho.N.º 973/XIV/3.ª (Deputada não inscrita Cristina Rodrigues) —
Altera o Código do Trabalho, determinando a obrigatoriedadede inclusão nos anúncios de emprego de aspetos relevantesda prestação de trabalho.
N.º 974/XIV/3.ª (PS) — Alteração à Lei n.º 2/3013, de 10 dejaneiro, e à Lei 53/2015, de 11 de junho, com vista ao reforçodo interesse público, da autonomia e independência da
regulação e promoção do acesso a atividades profissionais.
Projetos de Resolução (n.os 1460 e 1461/XIV/3.ª):
N.º 1460/XIV/3.ª (BE) — Pela proteção ambiental e social noPerímetro de Rega do Mira.N.º 1461/XIV/3.ª (PS) — Recomenda ao Governo que no
quadro da diplomacia do clima, promova as necessáriasdiligências para que a Organização das Nações Unidasreconheça o clima estável como Património Comum da
Humanidade.
Proposta de Resolução n.º 29/XIV/3.ª (GOV):
Aprova o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
(a) Publicadas em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 955/XIV/3.ª
REPÕE O VALOR DO TRABALHO SUPLEMENTAR E O DESCANSO COMPENSATÓRIO,
APROFUNDANDO A RECUPERAÇÃO DE RENDIMENTOS E CONTRIBUINDO PARA A CRIAÇÃO DE
EMPREGO, PROCEDENDO NO SETOR PÚBLICO E PRIVADO
Exposição de motivos
Durante o período da troika, a desvalorização dos rendimentos de quem vive do seu trabalho fez-se por
múltiplas vias. Por via tributária (aumentos de impostos, alteração dos escalões do IRS, sobretaxa), pelas
alterações na proteção social (cortes nos apoios sociais, congelamento de pensões, alteração das regras do
subsídio de desemprego), por cortes salariais, pelo congelamento de carreiras e pela alteração da legislação
laboral. As alterações ao Código do Trabalho introduzidas pelo Governo PSD/CDS-PP (designadamente pela
Lei n.º 23/2012, de 25 de junho) traduziram-se na diminuição dos rendimentos dos trabalhadores, numa ofensiva
que teve uma especial repercussão no que toca às matérias relativas ao tempo de trabalho.
Esta desvalorização do trabalho pelas alterações da legislação laboral operou quer pelo aumento do tempo
de trabalho (com a eliminação de 4 feriados, de 3 dias de férias e do descanso compensatório), quer pela
redução do valor pago pelo trabalho realizado. Só por esta via, PSD e CDS, levaram a cabo uma transferência
de rendimentos do trabalho para o capital de cerca de 2,3 mil milhões de euros.
Uma das matérias em que estes cortes foram mais significativos, tendo, para além do mais, um efeito
negativo do ponto de vista da criação de emprego, foi o trabalho suplementar. Com efeito, por cada dia de
trabalho suplementar, o trabalhador tinha direito a 25% das horas em descanso compensatório. Com as
alterações introduzidas pelo PSD e pelo CDS em 2012, este descanso foi eliminado. Ou seja, se num ano um
trabalhador fizer 160 horas de trabalho suplementar, passou, desde 2012, a trabalhar mais 5 dias sem receber
nada por isso. Por outro lado, foi também reduzido o valor pago pelo trabalho realizado, com a diminuição para
metade da remuneração do trabalho suplementar: por cada hora de trabalho suplementar, o trabalhador passou
a receber, na primeira hora, um acréscimo de 25%, em vez de 50% e, nas horas seguintes, um acréscimo de
37,5%, em vez dos anteriores 75%. Por cada hora de trabalho suplementar em dia feriado, a majoração passou
a 50%, em vez de 100%. Também a majoração em caso de isenção de horário de trabalho foi diminuída para
metade.
Segundo dados oficiais do INE, há cerca de meio milhão de trabalhadores que realizam horas extraordinárias
no nosso País, numa média de 315 horas por ano. O corte para metade do seu valor tem assim um efeito duplo.
Por um lado, diminuiu os rendimentos destes trabalhadores. Por outro, o embaratecimento do trabalho
suplementar e a eliminação do descanso compensatório é uma medida contrária à criação de emprego e é um
incentivo ao preenchimento de postos de trabalho com horas extraordinárias. Ora, ao Estado incumbe, até por
imperativo constitucional, a promoção do pleno emprego e não políticas que inibam a distribuição do emprego
existente.
Em Portugal, contabilizam-se por ano cerca de 134 505 000 horas de trabalho suplementar. Ou seja, se
acaso todo o trabalho suplementar fosse transformado em postos de trabalho, isso corresponderia a 64 665
postos de trabalho. Contrariar o embaratecimento do trabalho suplementar é, pois, uma medida relevante para
incentivar a criação de emprego.
As recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º
93/2019, de 4 de setembro, não reverteram estas regras gravosas para os trabalhadores, regras estas que, à
data, foram inclusivamente encaradas como circunstanciais e transitórias, sendo certo que o único impacto foi
o de fragilizar a posição dos trabalhadores numa relação marcadamente desigual.
Assim, o objetivo do presente projeto de lei é repor o direito ao descanso compensatório por trabalho
suplementar, remunerar com justiça o trabalho extraordinário e desincentivar o abuso das horas extras e do
prolongamento de horários, expurgando o Código do Trabalho das medidas impostas durante o período da
intervenção da troika e do Governo das direitas relativas a estas matérias.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto e âmbito de aplicação
1 – A presente lei repõe o direito ao descanso compensatório por trabalho suplementar e os valores da
compensação pela prestação de trabalho suplementar, no âmbito das relações de trabalho abrangidas pelo
Código do Trabalho ou consagrados em instrumento de regulamentação coletiva.
2 – O presente diploma aplica-se, igualmente, ao regime do trabalho suplementar previsto na Lei n.º 35/2014,
de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, com as necessárias adaptações.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
Os artigos 229.º, 230.º e 268.º do Código do Trabalho, na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
e alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho,
47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015,
de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de
agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de
abril, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 229.º
[…]
1 – O trabalhador que presta trabalho suplementar em dia útil, em dia de descanso semanal complementar
ou em feriado tem direito a descanso compensatório remunerado, correspondente a 25% das horas de trabalho
suplementar realizadas, sem prejuízo do disposto no n.º 3.
2 – O descanso compensatório a que se refere o número anterior vence-se quando perfaça um número de
horas igual ao período normal de trabalho diário e deve ser gozado nos 90 dias seguintes.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – O disposto nos n.os 1 e 2 pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que
estabeleça a compensação de trabalho suplementar mediante redução equivalente do tempo de trabalho,
pagamento em dinheiro ou ambas as modalidades.
7 – […].
Artigo 230.º
[…]
1 – […].
2 – O descanso compensatório de trabalho suplementar prestado em dia útil ou feriado, com exceção do
referido no n.º 3 do artigo anterior, pode ser substituído por prestação de trabalho remunerada com acréscimo
não inferior a 100%, mediante acordo entre empregador e trabalhador.
3 – Em microempresa ou pequena empresa, por motivo atendível relacionado com a organização do trabalho,
o descanso compensatório a que se refere o n.º 1 do artigo anterior, com ressalva do disposto no n.º 3 do mesmo
artigo, pode ser substituído por prestação de trabalho remunerada com um acréscimo não inferior a 100%.
4 – […].
5 – […].
Artigo 268.º
[…]
1 – […]:
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a) 50% pela primeira hora ou fração desta e 75% por hora ou fração subsequente, em dia útil;
b) 100% por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado.
2 – […].
3 – O disposto nos números anteriores pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de
trabalho nos termos do n.º 6 do artigo 229.º
4 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —
Mariana Mortágua — Alexandra Vieira— Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua
— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —
Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 956/XIV/3.ª
ALTERAÇÕES AO REGIME JURÍDICO-LABORAL E ALARGAMENTO DA PROTEÇÃO SOCIAL DOS
TRABALHADORES POR TURNOS E NOTURNOS (VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO
TRABALHO)
Exposição de motivos
O trabalho por turnos remete para um modo de organização do horário laboral no qual diferentes equipas
trabalham em sucessão durante um período alongado. Em alguns casos, os horários prolongam-se até 24 horas
por dia e 365 dias por ano, como em hospitais, aeroportos ou serviços de hotelaria. A extensão dos horários
também se verifica em alguns setores industriais, devido à continuidade do processo produtivo, tendo a sua
utilização vindo a ser cada vez mais comum também em grandes superfícies comerciais. De facto, nos últimos
anos, a Europa tem assistido a uma liberalização dos horários de trabalho, levando, por exemplo, à maioria dos
espaços comerciais a funcionar até mais tarde e a abrir ao domingo, estando mais de 20% dos trabalhadores
enquadrados por este regime. Este prolongamento dos horários não pode deixar de ser problematizado.
Em Portugal, o trabalho em regime noturno e por turnos abrange vastas áreas da produção, assegurando o
funcionamento de sectores fundamentais da sociedade. A produção, transporte e distribuição de energia, o
sistema de saúde, a distribuição de água e alimentos, as telecomunicações, a segurança (das pessoas, da
cadeia de logística e dos bens), os transportes públicos e de mercadorias e os espaços comerciais são alguns
exemplos de setores de atividade onde o trabalho noturno e por turnos assume uma expressão significativa. O
trabalho por turnos está a aumentar e é uma realidade cada vez mais presente nas organizações laborais,
abrangendo, no nosso País, mais de 750 mil pessoas, perto de 16% do total da população empregada. Entre
outras consequências sociais, ele comporta custos elevados na dinâmica social e familiar dos trabalhadores.
Em Portugal, a trivialização das autorizações para a laboração contínua têm permitido uma expansão muito
pouco criteriosa de regimes de trabalho que passam por horários cada vez mais alargados.
A 11 de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde qualificou a emergência de saúde pública
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ocasionada pela COVID-19 como uma pandemia internacional, constituindo uma calamidade pública.
A crise pandémica é também uma crise económica e social que exige medidas capazes de assegurar às
famílias que o rendimento proveniente do seu trabalho é protegido, mas também capazes garantir que as
condições de trabalho – tantas vezes já tão precárias – não são alvo de abusos por parte da entidade
empregadora.
O tema do trabalho por turnos e noturno tem sido sucessivamente relegado para um momento posterior,
sem que nada de concreto aconteça para garantir melhores condições de trabalho e maior proteção social a
estes trabalhadores. A pandemia transformou estas relações laborais em alvos fáceis, permitindo a
implementação de períodos contínuos de trabalho à margem da lei. Isto porque, apesar de na Lei do
Orçamento do Estado para 2020 – por pressão do Bloco de Esquerda – ter ficado inscrita, no artigo 250.º, a
necessidade de realização de um estudo sobre o impacto do trabalho por turnos, tendo em vista o reforço da
proteção social destes trabalhadores até hoje – tanto quanto se sabe – esse estudo não existe e os
trabalhadores por turnos não viram nenhuma melhoria concreta acontecer.
Aliás, investigações de âmbito académico (nomeadamente da autoria de Isabel Soares da Silva1, da
Universidade do Minho) têm já demonstrado que o horário de trabalho por turnos, especialmente quando
envolve a realização de trabalho noturno e/ou períodos muito valorizados familiar e socialmente, pode
representar para o/a trabalhador/a dificuldades acrescidas do ponto de vista biológico, psicológico e/ou
familiar e social. Boa parte das dificuldades experienciadas resulta, por um lado, da necessidade de inversão
do ciclo sono-vigília (i.e., ter de dormir de dia e de trabalhar à noite) e, por outro, do desfasamento entre a
estruturação do tempo social e certos horários de trabalho, donde se salienta os períodos ao final do dia e
aos fins de semana. Embora os diferentes efeitos tendam a interrelacionar-se, podem ser agrupados em três
grandes dimensões: saúde (perturbações na saúde física e psicológica, incluindo perturbações nos ritmos
circadianos); efeitos sociais (interferência na vida familiar e social) e ocupacionais (em especial, as
perturbações circadianas do desempenho e a sua relação com a segurança ocupacional).
Diversos estudos científicos sobre a realidade do trabalho por turnos e o trabalho noturno têm dado um
contributo inestimável para um mais profundo conhecimento deste fenómeno e das suas consequências
humanas (designadamente, perturbações do sono, gastrointestinais, cardiovasculares, do humor, fadiga
crónica, problemas metabólicos, sociais e familiares, acidentes de trabalho por vezes mortais e catastróficos,
absentismo, diminuição da capacidade laboral e envelhecimento precoce). Por isso mesmo, esses estudos
têm vindo a interpelar os poderes públicos sobre a necessidade de uma maior regulação desta modalidade
de organização do trabalho. Apesar de as empresas garantirem que cumprem a lei, verifica-se, por exemplo,
que aspetos básicos da regulação do trabalho por turnos, como o intervalo de pelo menos 11 horas nas
mudanças entre os turnos, como recomendado na Diretiva Europeia 93/104/CE, não são, de facto,
respeitados. Assim, tem vindo a ser sugerido, nomeadamente pela equipa de Isabel Silva, que se intervenha
com vista a garantir: (i) a contratação de recursos humanos suficientes para impedir a sobrecarga horária;
(ii) a disponibilização de um serviço de cantina noturno para assegurar uma alimentação saudável; (iii) a
cedência de transporte, sobretudo em horários muito matinais; (iv) a autorização a realização de sestas
durante a noite sobretudo em horários noturnos longos, como acontece no Japão; (v) o envolvimento dos
trabalhadores na seleção dos turnos, apoiando-os aquando da «troca de horários»; e (vi) a aposta no
aconselhamento personalizado tendendo a aumentar o bem-estar destes funcionários.
A negociação e a contratação coletiva são um espaço privilegiado para regular estas matérias. Sucede
que as sucessivas revisões do Código do Trabalho em matéria de negociação e contratação coletiva,
nomeadamente pela imposição da sua caducidade, tiveram como efeito desequilibrar, a favor do patronato,
a legislação laboral, diminuir a capacidade de negociação dos sindicatos, reduzir a abrangência das
convenções e individualizar as relações laborais. No campo da organização do trabalho por turnos, noturno
e em folgas rotativas, este processo de individualização e precarização tem feito da entidade empregadora
o único determinante na relação laboral, proliferando situações de desfavorecimento do trabalhador. Por isso
mesmo, sem prejuízo da regulação de aspetos específicos que deve ser feita em cada setor e atendendo às
suas particularidades por instrumentos de regulação coletiva de trabalho, a lei geral tem o dever de definir
patamares mínimos para todos os trabalhadores.
1 Silva, I. S. (2012). Trabalho por turnos. In A. L. Neves & R. F. Costa (Coords.), Gestão de recursos humanos de A a Z, Lisboa: RH Editora, pp., 619-622.
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O Bloco de Esquerda, na anterior Legislatura, apresentou um projeto de lei sobre o trabalho por turnos, ao
qual se juntaram outros projetos, e foi criado, no âmbito da Comissão de Trabalho e da Segurança Social, um
grupo de trabalho para apreciar essas iniciativas. Foram realizadas, nesse âmbito, dezenas de audições a
diversas entidades, tendo sido de reconhecimento geral a necessidade de melhorar o enquadramento normativo
desta forma de organização do trabalho. Contudo, contrariamente aos sinais dados publicamente pelo PS, às
necessidades reconhecidas em várias das audições, as propostas da esquerda acabaram por ser todas
chumbadas.
Já nesta Legislatura, o número 1 do artigo 250.º da Lei do Orçamento do Estado para 2020 estabelecia que
«em 2020, o Governo apresenta um estudo sobre a extensão, as características e o impacto do trabalho por
turnos em Portugal, tendo em vista o reforço da proteção social destes trabalhadores». Quase dois anos depois
e uma crise pandémica instalada que trouxe a nu as debilidades já existentes do ponto vista social e laboral, o
referido estudo nunca foi dado a conhecer e a proteção social dos trabalhadores por turnos e em regime noturno
mantém-se inalterada. É urgente conferir dignidade ao trabalho desenvolvido pelos trabalhadores por turnos e
em regime noturno, combatendo a sua utilização indevida e conferindo proteção acrescida em virtude do
reconhecimento da penosidade do trabalho desenvolvido.
O presente projeto de lei visa dotar a lei de instrumentos que, assegurando os serviços e produções normais
das diferentes organizações, diminuam as consequências nefastas deste tipo de trabalho, nomeadamente na
saúde dos trabalhadores e trabalhadoras. Este projeto pretende, ainda, abrir espaço à negociação e à
contratação coletiva, em particular nos aspetos de complementaridade e adequação concreta às empresas. Os
seus aspetos essenciais são os seguintes:
1 – Clarificar os conceitos de trabalho por turnos, trabalho noturno e trabalhador noturno, e introduzir o
conceito de trabalhador por turnos, garantindo um enquadramento mais protetor dos trabalhadores.
2 – Definir regras sobre a organização por turnos que possibilitem uma menor perturbação dos ritmos
circadianos, uma acumulação de sono diminuída e uma maior sincronização com a vida social.
3 – Valorizar a participação dos trabalhadores e das suas estruturas representativas na definição dos turnos
e definir prazos mínimos para mudança de horário programado.
4 – Garantir um período mínimo de 24 horas de descanso na mudança de horário de turno e pelo menos dois
fins-de-semana de descanso em cada 6 semanas de trabalho por turnos, tendo em conta que o trabalho por
turnos afeta negativamente a vida familiar e empobrece as relações sociais e de amizade (75% dos
trabalhadores e trabalhadoras por turnos têm alterações na vida familiar e no relacionamento com os filhos e
lamentam a perda de amigos).
5 – Definir um máximo de 35 horas semanais de trabalho para quem trabalha por turnos ou é trabalhador
noturno.
6 – Alargar o acesso a exames médicos e a cuidados de saúde por parte dos trabalhadores por turnos e
trabalhadores noturnos e garantir que determinados grupos de trabalhadores são dispensados desta forma de
organização do trabalho.
7 – Consagrar o direito a mais um dia de férias por cada 2 anos de trabalho noturno ou por turnos.
8 – Definir o valor dos acréscimos retributivos pagos por trabalho por turnos e trabalho noturno (entre 25% a
30%).
9 – Conferir o direito à antecipação da idade legal de reforma sem penalizações, em 6 meses por cada ano
de trabalho por turnos ou noturno, considerando que o trabalho em regime noturno e em turnos é seguramente
o mais penoso e desgastante de todos os regimes de trabalho e que a idade e a antiguidade em trabalho noturno
constituem fatores fortemente agravantes, sendo o envelhecimento precoce uma das consequências dos
trabalhadores em regime de turnos.
10 – Tendo em conta os encargos resultantes do regime especial criado pelo presente diploma, propõe-se
que esses custos sejam suportados pelo acréscimo na contribuição das entidades patronais que utilizem estes
regimes de trabalho.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados e Deputadas do Bloco de Esquerda
apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado
pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012,
de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de
14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de
agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8
de abril, na parte relativa à organização do trabalho, em regime noturno e por turnos, e define para os
trabalhadores noturnos e por turnos a redução da idade da reforma, sem penalização.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
1 – O disposto no presente diploma aplica-se aos trabalhadores a laborar em regime noturno e por turnos,
no âmbito das relações de trabalho abrangidas pelo Código do Trabalho ou consagrados em instrumento de
regulamentação coletiva.
2 – O presente diploma aplica-se, igualmente, com as necessárias adaptações, ao regime de trabalho por
turnos e noturno previsto na Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que aprova a Lei Geral do Trabalho em Funções
Públicas, com as posteriores alterações.
Artigo 3.º
Alterações ao Código do Trabalho
Os artigos 58.º, 74.º, 220.º, 221.º, 223.º, 224.º, 225.º, 238.º e 266.º do Código do Trabalho, aprovado pela
Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 58.º
[…]
1 – A trabalhadora grávida, puérpera ou lactante tem direito a ser dispensada de prestar trabalho em
horário de trabalho organizado de acordo com regime de adaptabilidade, de banco de horas, de horário
concentrado ou de trabalho por turnos.
2 – O direito referido no número anterior aplica-se a qualquer dos progenitores em caso de aleitação ou
para acompanhamento de filho ou outro dependente a cargo menor de 12 anos ou,
independentemente da idade, com deficiência ou com doença crónica, e ainda a trabalhador a quem
seja atribuído o estatuto de cuidador não principal de pessoa dependente nos termos da lei, quando
a prestação de trabalho nos regimes nele referidos afete a sua regularidade.
3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 74.º
[…]
1 – Os menores, são dispensados de prestar trabalho em horário organizado de acordo com o regime de
adaptabilidade, banco de horas, horário concentrado, trabalho noturno ou por turnos, quando o mesmo
afetar a saúde ou segurança no trabalho.
2 – […].
3 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.
Artigo 220.º
[…]
1 – (Anterior corpo do artigo.)
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2 – Os turnos podem ser totais, ou parciais, consoante, respetivamente, o trabalho diário seja dividido em
três turnos ou dois turnos.
Artigo 221.º
[…]
1 – Devem ser organizados turnos de pessoal diferente sempre que, de forma continuada, o período de
funcionamento ultrapasse as 20 horas e se inicie antes das 7 horas.
2 – Os turnos devem, na medida do possível, ser organizados de acordo com os interesses e as preferências
manifestados pelos trabalhadores, mediante acordo com a comissão de trabalhadores ou, na ausência
desta, com os sindicatos em que os trabalhadores se encontrem filiados, de acordo com os artigos 425.º
e 426.º do Código do Trabalho.
3 – O empregador deve ter registo separado dos trabalhadores incluídos em cada turno e respetivos horários
de trabalho, que será enviado ao ministério que tutela o trabalho, à comissão de trabalhadores e aos
sindicatos que declarem ser filiados na respetiva entidade empregadora.
4 – A duração trabalho de cada turno é de 35 horas semanais, calculado numa média máxima de seis
semanas consecutivas de trabalho.
5 – A mudança do horário programado é comunicada com a antecedência mínima de 15 dias.
6 – Os turnos no regime de laboração contínua e dos trabalhadores que assegurem serviços que não possam
ser interrompidos devem ser organizados de modo que os trabalhadores de cada turno gozem, na mudança de
horário de turno, de pelo menos, 24 horas de descanso e lhes seja concedido pelo menos dois fins-de-semana
completos de descanso em cada seis semanas consecutivas sem prejuízo do período excedente de descanso
a que tenham direito.
7 – Aos trabalhadores por turnos não é aplicável o disposto nos artigos 203.º a 211.º, quanto à adaptabilidade
do horário de trabalho.
8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto no presente artigo.
Artigo 223.º
[…]
1 – Considera-se trabalho noturno o prestado num período que compreenda o intervalo entre as 20 horas
de um dia e as 7 horas do dia seguinte.
2 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho podem estabelecer regimes mais favoráveis ao
trabalhador relativamente ao período de trabalho noturno, com observância do disposto no número anterior.
Artigo 224.º
[…]
1 – Considera-se trabalhador noturno o que presta, pelo menos, duas horas de trabalho normal noturno
em cada dia.
2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno não pode ser superior ao período normal
de trabalho de um trabalhador em horário diurno nem superior a 8 horas por dia.
3 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno é de 35 horas calculado num período máximo
de referência de quatro semanas consecutivas de trabalho.
4 – Aos trabalhadores noturnos não se aplica o disposto nos artigos 203.º a 211.º, quanto à adaptabilidade
do horário de trabalho.
5 – Os trabalhadores noturnos cuja atividade implique riscos especiais ou uma tensão física ou mental
significativa não podem prestá-la por mais de sete horas e trinta minutos num período de vinte e quatro horas
em que executem trabalho noturno:
a) De natureza monótona, repetitiva, cadenciada ou isolada;
b) Em obra de construção, demolição, escavação, movimentação de terras, ou intervenção em túnel, ferrovia
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ou rodovia sem interrupção de tráfego, ou com risco de queda de altura ou de soterramento;
c) Da indústria extrativa;
d) Da indústria química;
e) De fabrico, transporte ou utilização de explosivos e pirotecnia;
f) Que envolvam contacto com corrente elétrica de média ou alta tensão;
g) De produção ou transporte de gases comprimidos, liquefeitos ou dissolvidos ou com utilização
significativa dos mesmos;
h) Que, em função da avaliação dos riscos a ser efetuada pelo empregador, assumam particular
penosidade, perigosidade, insalubridade ou toxicidade.
6 – (Anterior n.º 5).
7 – O disposto nos números anteriores não é igualmente aplicável quando a prestação de trabalho
suplementar seja necessária para prevenir ou reparar prejuízo grave para a empresa ou para a sua
viabilidade devido a acidente ou a risco de acidente iminente.
8 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto nos n.os 2, 4 ou 5.
Artigo 225.º
[…]
1 – […].
2 – Para efeitos do número anterior, e ainda para a prevenção de doenças profissionais o empregador
deve garantir o acesso, sem qualquer custo para o trabalhador, a todas as consultas necessárias,
nomeadamente nas áreas gastrointestinal, do sono, cardiovascular, psicológica, cronobiológica, ortopédica
bem como a exames de rastreio de cancro da mama.
3 – (Anterior n.º 2).
4 – (Anterior n.º 3).
5 – (Anterior n.º 4).
6 – Sempre que indicação médica o exija, o empregador deve assegurar a trabalhador que sofra de
problema de saúde relacionado com a prestação de trabalho noturno a afetação a trabalho diurno que esteja
apto a desempenhar, mantendo o direito ao respetivo subsídio.
7 – (Anterior n.º 6).
8 – (Anterior n.º 7).
Artigo 238.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – O trabalhador noturno adquire, por cada dois anos como trabalhador noturno, o direito a um dia de
férias.
7 – O trabalhador por turnos adquire, por cada dois anos de trabalho como trabalhador por turnos, o direito
a um dia de férias.
8 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 1 a 7.
Artigo 266.º
[…]
1 – O trabalho noturno é pago com acréscimo de 30% relativamente ao pagamento de trabalho
equivalente prestado durante o dia.
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1 DE OUTUBRO DE 2021 11
2 – […]:
a) […];
b) […].
3 – […]:
a) […];
b) […];
c) […].
4 – […].»
Artigo 4.º
Aditamentos ao Código do Trabalho
São aditados os artigos 220.º-A, 222.º-A, 222.º-B e 266.º-A ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, com a seguinte redação:
«Artigo 220.º-A
Noção de trabalhador por turnos
Considera-se trabalhador por turnos qualquer trabalhador cujo horário se enquadre no âmbito do trabalho
por turnos.
Artigo 222.º-A
Condições de laboração no regime de turnos
1 – O trabalho em regime de turnos pressupõe a audição das estruturas representativas dos trabalhadores,
Comissão de Higiene, Segurança e Saúde no Trabalho, e o parecer prévio da comissão de trabalhadores e o
acordo dos trabalhadores envolvidos, devendo o respetivo parecer acompanhar o pedido de aprovação do
respetivo ministério que tutela o trabalho.
2 – O início da prática do regime de turnos carece do prévio acordo informado e escrito do trabalhador, sendo
obrigatoriamente precedido de:
a) Informação quanto às consequências do trabalho por turnos para a saúde e bem-estar do trabalhador e
dos serviços de segurança e saúde disponibilizados pela entidade empregadora;
b) Informação das responsabilidades da entidade empregadora quanto às questões de ordem jurídico-
laborais relativas ao trabalho por turnos nomeadamente as constantes da presente lei.
3 – Os trabalhadores com mais de 55 anos de idade ou 30 anos, consecutivos ou intercalados, de trabalho
em regime de turnos podem solicitar a passagem ao regime de trabalho diurno, mantendo o direito ao acréscimo
retributivo contemplado nos n.os 1 e 2 do artigo 266.º-A.
4 – O regime previsto no artigo anterior é aplicável aos trabalhadores noturnos, em igualdade de
circunstâncias e em conformidade com o disposto no n.º 4 do artigo 266.º-A.
Artigo 222.º-B
Antecipação da idade de reforma
1 – O trabalho por turnos e noturno confere o direito à antecipação da idade de reforma na proporção da
contagem de seis meses por cada ano em trabalho de turnos e noturno e sem qualquer penalização.
2 – Para a antecipação da idade de reforma acresce ainda a contagem do tempo de trabalho suplementar
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na proporção do referido no número anterior.
3 – O disposto nos números anteriores será regulamentado em legislação especial.
Artigo 266.º-A
Pagamento de trabalho por turnos e noturno
1 – O trabalho por turnos parcial é pago com acréscimo de 25%.
2 – O trabalho por turnos total é pago com acréscimo de 30%.
3 – O acréscimo referido nos números anteriores é pago também no subsídio de férias, de Natal, na
remuneração referente ao período de férias, em situação de baixa devido a acidente de trabalho ou em
períodos de mudança temporária para horário diurno a solicitação da empresa.
4 – O trabalho noturno prestado no período compreendido entre as 20 horas e as 7 horas é pago com
acréscimo de 30% relativamente ao pagamento de trabalho equivalente prestado durante o dia.
5 – Constitui contraordenação muito grave a violação do disposto neste artigo.»
Artigo 5.º
Financiamento
1 – As regras de financiamento dos encargos resultantes do regime criado pelo presente diploma são
definidas em legislação especial.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior os encargos da aplicação deste regime são suportados
pelo acréscimo na contribuição das entidades empregadoras que recorram ao regime de turnos e trabalho
noturno.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa
— Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana
Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria
Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 957/XIV/3.ª
CONSAGRA AS 35 HORAS COMO PERÍODO NORMAL DE TRABALHO NO SETOR PRIVADO
(VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO)
Exposição de motivos
A redução do horário de trabalho é uma medida comprovadamente eficaz do ponto de vista económico e
justa do ponto de vista da distribuição do emprego existente. É, também, uma ferramenta para melhorar as
condições de trabalho, para permitir uma melhor conciliação entre as várias esferas da vida (libertando tempo
para atividades pessoais, familiares e associativas) e, se bem conduzida, para promover uma distribuição mais
igualitária do trabalho reprodutivo e doméstico, combatendo a desigualdade de género na distribuição do
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trabalho na esfera privada.
Em Portugal, trabalham-se horas a mais. De acordo com o Eurostat, os portugueses trabalham 41,3 horas
semanais (média de trabalho prestado a tempo inteiro), enquanto a média da União Europeia é de 40,4 horas.
Os portugueses trabalham mais uma hora por semana (54 minutos) do que a média dos parceiros da União
Europeia. Os países onde o horário de trabalho é mais curto são a Suécia (39,9 horas), França (39,4 horas),
Holanda (39 horas) e Itália (38,7 horas). Mas se isto é assim relativamente ao horário legal de trabalho, o número
real de horas semanais dedicadas ao trabalho é bem superior, tendo em conta todo o trabalho suplementar e
as horas extraordinárias não remuneradas, as várias formas de flexibilidade da organização do tempo de
trabalho, os períodos de deslocação entre a casa e o trabalho – alongados pela periferização geográfica dos
trabalhadores com salários mais baixos –, ou a invasão do tempo de descanso dos trabalhadores através de
dispositivos móveis e da exigência (ilegal) de uma conectividade permanente.
No período da troika, a orientação que predominou foi a de cortar rendimento e, simultaneamente, aumentar
o tempo de trabalho, particularmente o tempo de trabalho não pago. Isso aconteceu aumentando o horário de
trabalho na Administração Pública (um aumento entretanto revertido na anterior legislatura), estimulando pela
lei o trabalho suplementar através do seu embaratecimento (que permanece na lei), da eliminação de 3 dias de
férias no setor privado (corte que continua também a constar do Código do Trabalho) e do aumento anual da
idade de reforma, que prolonga o tempo de vida dedicado ao trabalho.
Como se sabe, e ficou comprovado no período austeritário, o alongamento de horários não se traduz em
acréscimos de produtividade. Pelo contrário, como vêm afirmando vários estudos, designadamente da OIT,
«horários de trabalho longos reduzem potencialmente a produtividade e a performance das empresas (…). Por
outras palavras, horas adicionais tendem a produzir efeitos decrescentes em termos de produtividade» (World
of Work 2014: Developing With Jobs, da responsabilidade da Organização Internacional do Trabalho),
Na Legislatura anterior foi possível, entre outras medidas, reverter cortes salariais, aumentar o salário mínimo
e repor as 35 horas na Administração Pública. Não se justifica, pois, que se continue a adiar a redução do horário
de trabalho para o conjunto dos trabalhadores.
A experiência portuguesa e internacional de outros processos de redução do horário de trabalho faculta-nos
o conhecimento suficiente para perceber como é que um processo deste tipo pode ser conduzido. Em Portugal,
a redução para as 40 horas, em 1996, permitiu a criação de 5% de emprego líquido no primeiro ano e 3% no
segundo. Em França, a aplicação das Leis Aubry (a primeira de 1998 e a segunda de 2000) que reduziram o
horário de trabalho paras as 35 horas, foi objeto, em 2014, de uma «Comissão de Inquérito sobre o impacto
societal, social, económico e financeiro da redução progressiva do tempo de trabalho», aprovada por
unanimidade e presidida por Thierry Benoit, Deputado UDI (partido de centro-direita). Desse relatório, constam
várias conclusões:
• «A redução do tempo de trabalho decidida pela lei de 1998 contribui para que a economia francesa criasse
mais empregos do que teria criado sem esta lei. O número de 350 mil é o mais comummente admitido»,
do total de 2 milhões de empregos criados entre 1997-2001;
• «Esta redução não coincidiu com uma degradação da competitividade do nosso País – nomeadamente
porque ela foi acompanhada de uma aceleração dos ganhos de produtividade. A França permanece assim
atrativa e localiza-se regularmente no trio dos países com mais investimento direto estrangeiro»;
• «A redução do tempo de trabalho, comparada com outras políticas públicas desenvolvidas para estimular
o emprego, nomeadamente aquelas que assentam na redução das quotizações sociais sem condições,
aparece como menos dispendiosa para as finanças públicas, tendo em conta o número de empregos que
permitiu criar»;
• A redução para as 35 horas «permitiu o relançamento e o dinamismo do diálogo social»;
• As Leis Aubry conduziram «a uma melhoria da articulação entre o tempo passado no trabalho e o tempo
consagrado a atividades pessoais, familiares e associativas».
O mesmo relatório identifica também os problemas da condução desse processo naquele país, com um
quarto dos ativos a relatarem uma degradação das condições de trabalho pela intensificação dos ritmos e com
empresas que reduziram recorreram à compressão de tempos acordados de pausas ou da transição entre
turnos, intensificando o trabalho e aumentando o sofrimento profissional, para dissimular a redução do tempo
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de trabalho.
Há várias razões para que, em Portugal, se reduza o período normal de trabalho para as 35 horas nesta
Legislatura, garantindo que a essa redução não corresponde nenhuma redução de salário, nem de condições
de trabalho.
Uma outra razão que podemos acrescentar são os impactos e as respostas a que pandemia causada pela
COVID-19 obrigou no mundo do trabalho. Na sequência das restrições à mobilidade, operou-se uma transição
abrupta para o teletrabalho, sem mecanismos de preparação e de negociação coletiva. De realidade
relativamente residual, este passou a ter uma expressão massiva, comportando uma alteração em grande
escala na organização do trabalho. Uma das principais preocupações é a necessidade prever expressamente
um dever de desconexão por parte da entidade empregadora e que deve ser transversal ao Código do Trabalho
e não apenas em matéria de teletrabalho. Essa proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda está a ser
debatida em conexão com a regulação do teletrabalho. O teletrabalho reforça a necessidade de disciplinar o
respeito pelo horário de trabalho e os mecanismos de controlo (como aqui se propõe relativamente aos mapas
de horário e à intervenção da ACT), já que faz com que a prestação do trabalho como que «acompanhe» o
trabalhador onde quer que ele esteja, potenciando a ideia de uma conexão permanente, de uma escravização
pela hiperdisponibilidade para responder às solicitações do empregador, comprometendo a harmonia social,
familiar e o período de descanso.
Do ponto de vista económico, a redução do período normal de trabalho trata-se de uma medida coerente
com a lição dos últimos anos: É a recuperação de rendimentos e a melhoria das condições de trabalho que
permite estimular a economia e promover o crescimento. É também uma questão de justiça relativa, alargando
ao conjunto dos trabalhadores uma alteração que já foi concretizada na Administração Pública. Constitui, ainda,
um passo na direção certa do ponto de vista da organização da sociedade, porque liberta mais tempo para viver.
É, finalmente, uma medida essencial para combater o desemprego: um patamar de 6% de criação líquida de
emprego pela redução do período normal de trabalho significaria a criação em Portugal de mais de 230 mil
postos de trabalho.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei define as 35 horas de trabalho como limite máximo semanal dos períodos normais de trabalho,
procedendo à alteração do Código do Trabalho, aprovado em anexo à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
São alterados os artigos 203.º, 210.º, 211.º e 224.º do Código do Trabalho aprovado em anexo à Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pela Lei n.º 105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de
outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013, de 30
de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 8 de maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14
de abril, pela Lei n.º 120/2015, de 1 de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, pela Lei n.º 28/2016, de 23
de agosto, pela Lei n.º 73/2017, de 16 de agosto, pela Lei n.º 14/2018, de 19 de março, pela Lei n.º 90/2019, de
4 de setembro, pela Lei n.º 93/2019, de 4 de setembro, e pela Lei n.º 18/2021, de 8 de abril, que passam a ter a
seguinte redação:
«Artigo 203.º
[…]
1 – O período normal de trabalho não pode exceder as 7 horas por dia e as 35 horas por semana.
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15
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
Artigo 210.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […].
2 – Sempre que a entidade referida na alínea a) do número anterior prossiga atividade industrial, o período
normal de trabalho é de trinta e cinco horas por semana, na média do período de referência aplicável.
Artigo 211.º
[…]
1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 203.º a 210.º, a duração média do trabalho semanal, incluindo
trabalho suplementar, não pode ser superior a quarenta e duas horas, num período de referência estabelecido
em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não ultrapasse 12 meses ou, na falta deste, num
período de referência de quatro meses, ou de seis meses nos casos previstos no n.º 2 do artigo 207.º
2 – […].
3 – […].
4 – […].
Artigo 224.º
[…]
1 – […].
2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno, não deve ser superior a sete horas diárias,
em média semanal, sem prejuízo do disposto em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho.
3 – […].
4 – O trabalhador noturno não deve prestar mais de sete horas de trabalho num período de vinte e quatro
horas em que efetua trabalho noturno, em qualquer das seguintes atividades, que implicam riscos especiais ou
tensão física ou mental significativa:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […].
5 – […].
6 – […]:
a) […];
b) […].
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7 – […].»
Artigo 3.º
Salvaguarda de direitos
Da diminuição do tempo de trabalho não pode resultar a redução de remuneração nem a perda de quaisquer
direitos.
Artigo 4.º
Publicidade e dever de informação
1 – As entidades empregadoras ficam obrigadas a, no prazo de 6 meses após a publicação da presente lei,
definirem um plano de reorganização do tempo de trabalho e de contratação de efetivos de acordo com o
disposto no presente diploma.
2 – Do plano previsto no número anterior fará parte integrante um novo mapa de horários de trabalho e uma
calendarização do processo de recrutamento e seleção com vista a assegurar as contratações a efetuar em
consequência da redução do tempo de trabalho.
3 – O plano referido nos n.os 1 e 2 deve ser remetida à Direção-Geral do Emprego e das Relações de
Trabalho, à ACT e às estruturas representativas dos trabalhadores.
4 – Para efeitos do disposto no número anterior estabelece-se a meta de um mínimo de 6% de criação líquida
de emprego em relação ao número de efetivos abrangidos pela redução do horário de trabalho.
5 – O novo mapa de horários de trabalho constante do n.º 2 deve ser afixado em local bem visível com a
antecedência mínima de sete dias relativamente ao início da sua aplicação.
6 – É aplicável ao disposto no n.º 2 do presente artigo o n.º 3 do artigo 212.º do Código do Trabalho relativo
à consulta prévia da consulta da comissão de trabalhadores ou, na sua falta, as comissões intersindicais, as
comissões sindicais ou os delegados sindicais.
7 – Constitui contraordenação grave a falta de cumprimento do disposto no n.º 2 e no n.º 5.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
1 – O presente diploma entra em vigor 60 dias após a sua aprovação.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior as entidades empregadoras dispõem do período transitório
de um ano para adaptarem a organização do tempo de trabalho, o recrutamento e seleção de trabalhadores e
o início de funções dos trabalhadores admitidos na data de início da sua vigência com vista a dar cumprimento
ao previsto no presente diploma.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —
Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua
— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —
Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
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PROJETO DE LEI N.º 958/XIV/3.ª
REVOGA AS ALTERAÇÕES AO CÓDIGO DO TRABALHO INTRODUZIDAS NO PERÍODO DA TROIKA
QUE VIERAM FACILITAR OS DESPEDIMENTOS E REDUZIR AS COMPENSAÇÕES DEVIDAS AOS
TRABALHADORES, PROCEDENDO À VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE
FEVEREIRO
Exposição de motivos
O poder de despedir, decorrência do poder diretivo da entidade empregadora, é uma das principais
manifestações da desigualdade que impera na relação laboral. A Constituição da República Portuguesa baliza
este poder da entidade empregadora, através do preceito constitucional da segurança no emprego, consagrado
no artigo 53.º, que proíbe os despedimentos sem justa causa ou por motivos políticos ou ideológicos.
A Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, que sucedeu às duas versões dos memorandos de entendimento da troika
de maio de 2011, introduziu alterações fundamentais ao Código do Trabalho com o objetivo de desequilibrar em
favor dos empregadores a regulação do trabalho, de precarizar e reduzir o custo do trabalho e de facilitar e
embaratecer o despedimento.
Por sua vez, a Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, foi ainda mais longe, aprofundando a tendência introduzida
pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, que diminuiu de 30 para 20 dias a base de cálculo das compensações
pela cessação dos contratos de trabalho para quase todas as modalidades de cessação, exceto os
despedimentos ilícitos. A partir de 1 de outubro de 2013, as compensações decorrentes da caducidade dos
contratos a termo e trabalho temporário, da denúncia, da revogação (acordo mútuo), da resolução do contrato
com justa causa pelo trabalhador e do despedimento, nas suas várias modalidades, passou a ter uma base de
cálculo das compensações de 20 dias para 12 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano de trabalho.
Não é demais recordar que, numa relação laboral, o trabalhador se encontra juridicamente subordinado ao
empregador e, na maior parte dos casos, economicamente dependente dos rendimentos do trabalho para
satisfazer as suas necessidades mais elementares (bem como as do respetivo agregado familiar). A fragilidade
do trabalhador despedido resulta, como é óbvio, exponencialmente acrescida e dela decorre a importância desta
compensação pecuniária ao trabalhador. Com efeito, um trabalhador que foi despedido, isto é, que perdeu
involuntariamente o seu emprego em virtude de uma decisão extintiva unilateral da entidade empregadora, é
um cidadão que perdeu o seu principal, por vezes único, meio de sustento. A diminuição do valor das
compensações agrava enormemente a fragilidade da situação em que este trabalhador se encontra. Ao
embaratecer os despedimentos, facilita também esse tipo de práticas por parte das empresas.
Desde março de 2020 que Portugal assiste a milhares de despedimentos e de cessações de contratos
precários. A crise pandémica que atravessamos é também uma crise económica e social que exige medidas
capazes de assegurar às famílias que o rendimento proveniente do seu trabalho – muitas das vezes o único que
assegura as necessidades do agregado – será protegido e o seu emprego garantido. A manutenção das
alterações legislativas introduzidas no período da troika – como o embaratecimento dos despedimentos – são o
paradoxo da proteção do emprego e da garantia de direitos aos trabalhadores.
Por isso mesmo, importa repor os valores devidos aos trabalhadores como compensação da cessação do
contrato de trabalho, valores esses que foram reduzidos para menos de metade, recuperando-se a fórmula de
cálculo adotada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e o objetivo fundamental da compensação: ressarcir o
trabalhador/a pelos danos resultantes da perda de emprego.
As recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º
93/2019, de 4 de setembro não reverteram estas regras gravosas para os trabalhadores, regras estas que, à
data, foram inclusivamente encaradas como circunstanciais e transitórias, sendo certo que o único impacto foi
o de fragilizar a posição dos trabalhadores numa relação marcadamente desigual.
Neste sentido, o Bloco de Esquerda apresenta o presente projeto de lei com o objetivo de intervir numa
matéria essencial que resultou das alterações legislativas realizadas no período da troika operando, assim, uma
repristinação do regime legal da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e repondo o valor da compensação em caso
de cessação por contrato de trabalho que não resulte de despedimento ilícito em um mês de retribuição base e
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diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à reposição dos 30 dias de retribuição base e diuturnidades, para efeitos de cálculo
da compensação por cessação de contrato de trabalho que não resulte de despedimento ilícito.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
O artigo 366.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado pelas Leis
n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de
agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de abril,
120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto, 14/2018,
de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, 8 de abril, passa a ter a
seguinte redação:
«Artigo 366.º
[…]
1 – Em caso de despedimento coletivo, o trabalhador tem direito a compensação correspondente a um mês
de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
2 – Em caso de fração de ano, a compensação é calculada proporcionalmente.
3 – A compensação não pode ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades.
4 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto nos n.os 1 ou 2.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
1 – A presente Lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
2 – Este regime é aplicável a todos os contratos cuja cessação ocorra após a entrada em vigor da presente
lei.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa —
Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua
— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso —; Luís Monteiro — Maria Manuel Rola —
Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
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PROJETO DE LEI N.º 959/XIV/3.ª
RECONHECE O DIREITO A 25 DIAS DE FÉRIAS NO SETOR PRIVADO (VIGÉSIMA PRIMEIRA
ALTERAÇÃO AO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO)
Exposição de motivos
O direito a férias está consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da Constituição da República Portuguesa,
na sua dimensão de direito ao repouso e ao lazer, e nos artigos 237.º e seguintes do Código do Trabalho.
O desiderato do direito a férias, conforme aliás resulta da letra da lei, é o de proporcionar ao trabalhador a
recuperação física e psíquica, bem como condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e
participação social e cultural, pelo que, e de forma a cumprir esse objetivo fundamental, é um direito
irrenunciável.
O direito a férias adquire-se no momento da celebração do contrato e o trabalhador tem direito a um período
de férias retribuídas em cada ano civil. As férias vencem-se no dia 1 de janeiro de cada ano civil e reportam-se,
em regra, ao trabalho prestado no ano anterior.
Por força das alterações introduzidas ao Código do Trabalho de 2009 pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho,
o período de férias tem a duração mínima de 22 dias úteis. Na versão do código de 2003, mantida pela Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, foi revogado o preceito que previa a majoração das férias em função da assiduidade.
O artigo 7.º, n.º 3, da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, estabelecia ainda a exclusão da majoração de dias de
férias previstas em instrumento de regulamentação coletiva. Esta norma foi declarada inconstitucional pelo
Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 602/2013, por violação do princípio da reserva constitucional de
contratação coletiva, bem como dos princípios da proporcionalidade, adequação e necessidade. Assim sendo,
mantém-se a possibilidade de aplicação da referida majoração sempre que a mesma se aplique a trabalhadores
abrangidos por instrumento de regulamentação coletiva que a preveja.
Em suma, atualmente e independentemente da efetividade do serviço ou assiduidade e do momento em que
o trabalhador tenha sido contratado no dia 1 de janeiro do ano seguinte vencem-se 22 dias de férias.
Na Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, na linha do memorando de entendimento com a troika, a lógica
conservadora e ultrapassada era a de alongar os tempos de trabalho com vista a alcançar um aumento da
produtividade. É precisamente com esse espírito que se introduz a eliminação do regime de majoração do
período de férias em função da assiduidade do trabalhador, criado pelo código de 2003 e mantido na revisão de
2009 que firmavam uma estratégia, também ela pouco falaciosa, de combate ao absentismo. Assim, também
não podemos concordar com essa opção. Na redação do código de 2003 a duração do período de férias era
aumentada no caso de o trabalhador não ter faltado ou na eventualidade de ter apenas faltas justificadas, no
ano a que as férias se reportam, nos seguintes termos:
a) Três dias de férias até ao máximo de uma falta ou dois meios dias;
b) Dois dias de férias até ao máximo de duas faltas ou quatro meios dias;
c) Um dia de férias até ao máximo de três faltas ou seis meios dias.
Ora, esta redação deu origem a várias interpretações abusivas que se consubstanciavam na restrição do
acesso à majoração do direito a férias, por parte de trabalhadores e trabalhadoras mesmo quando estes se
limitavam a exercer os seus direitos. A título de exemplo, uma situação que foi denunciada por organizações
sindicais em que o exercício do direito de reunião no local de trabalho foi considerado pelas entidades
empregadoras, indevidamente, como falta.
Das recentes alterações introduzidas ao Código do Trabalho, designadamente as que resultaram da Lei n.º
93/2019, de 4 de setembro, não resultaram alterações nesta matéria.
Note-se que falamos de faltas justificadas, faltas essas que têm um regime próprio e cujos critérios estão
elencados no Código do Trabalho de forma clara, sendo que apenas são consideradas faltas justificadas aquelas
que sejam admitidas pela lei ou autorizadas pelo empregador e que, determinam, em várias situações, a
consequente perda de retribuição o que, naturalmente, penaliza o trabalhador. O regime das faltas injustificadas,
já de si gravoso, não releva para aqui, tanto mais que as faltas injustificadas podem consubstanciar justa causa
de despedimento, em virtude da violação do dever de assiduidade.
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Assim, a majoração, subordinada às faltas justificadas para efeitos da sua atribuição, implica aceitar que, por
exemplo, um trabalhador assíduo, que faltasse por motivo de falecimento do seu cônjuge, durante 5 dias,
conforme a lei prevê, fosse penalizado face a outro trabalhador que, felizmente, não se viu confrontado com
esta situação dramática.
Por outro lado, os estudos académicos e os dados estatísticos que têm vindo a ser divulgados nos últimos
anos comprovam que o maior absentismo laboral é feminino e tem na sua base a maternidade e o custo social
que representa para as mulheres, fortemente penalizadas no acesso ao trabalho, salarialmente e também por
soluções legislativas que desvalorizam esta realidade, atropelando o direito constitucional à família e à proteção
da paternidade e da maternidade.
A majoração das férias é uma opção errada que não serve os interesses dos trabalhadores, não garante
qualquer aumento da produtividade e apresenta-se como uma solução injusta e discriminatória.
A consagração dos 25 dias úteis de férias no setor privado, sem subordinação a quaisquer critérios, como o
da assiduidade, que tornem este direito disforme e discriminatório apresenta-se como uma solução de elementar
justiça. Trabalhadores restabelecidos física e psicologicamente, produzem mais e produzem melhor. É tempo
de abandonar paradigmas ultrapassados e modelos que assentam numa lógica de degradação das relações
laborais e que não são próprios de um País que se quer desenvolvido. O aumento do tempo de trabalho em
nada contribui para um mercado de trabalho que se pretende que ofereça condições laborais dignas no quadro
de uma economia competitiva e voltada para o futuro.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei visa reconhecer o direito a 25 dias úteis de férias.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
O artigo 238.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado pelas Leis
n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de 29 de
agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de abril,
120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto, 14/2018,
de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, passa a ter a
seguinte redação:
«Artigo 238.º
1 – O período anual de férias tem a duração mínima de 25 dias úteis.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no prazo de 30 dias após a sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
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As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa; —
Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana Mortágua
— João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro —Maria Manuel Rola —
Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
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PROJETO DE LEI N.º 960/XIV/3.ª
REFORÇA A NEGOCIAÇÃO COLETIVA, O RESPEITO PELA FILIAÇÃO SINDICAL E REPÕE O
PRINCÍPIO DO TRATAMENTO MAIS FAVORÁVEL AO TRABALHADOR (VIGÉSIMA PRIMEIRA
ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO, APROVADO PELA LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO)
Exposição de motivos
O esvaziamento da contratação coletiva é um ataque à democracia. Sem negociação coletiva, os
trabalhadores são colocados numa relação de total fragilidade em relação aos empregadores. Ora, o atual
Código do Trabalho favorece escandalosamente a parte mais forte na relação laboral, nomeadamente no que à
contratação coletiva diz respeito.
Em 2011 havia mais de 1 milhão e 200 mil trabalhadores abrangidos por convenções coletivas de trabalho.
Em 2014, passaram a ser menos de 250 mil. Como foi possível? Entre outras coisas, porque a lei, ao contrário
do que sucedia no passado, permite que as convenções coletivas caduquem por decisão unilateral e que lhes
suceda o vazio. Esta instituição de um processo mais rápido e fácil para as entidades patronais determinarem a
caducidade das convenções coletivas, bem como as alterações feitas em 2012 às regras das portarias de
extensão, desequilibraram profundamente as relações laborais, instituíram uma dinâmica de chantagem nas
negociações, contribuíram para degradar o conteúdo das novas convenções e limitaram o número de
trabalhadores protegidos pela contratação coletiva.
Em 2008, havia 1 milhão 825 mil trabalhadores abrangidos pela contratação coletiva. Em 2014, passaram a
ser menos de 250 mil. Em 2019, o número subiu para 900 mil – uma melhoria importante, mas longe, ainda
assim, dos números anteriores à crise e às políticas de austeridade. Contudo, a proporção de contratos a prazo,
por exemplo, mantém-se no essencial. Além disso, apesar do aumento do número de convenções publicadas
em 2017 – cerca de 208 convenções coletivas com uma cobertura potencial superior a 820 mil trabalhadores –
o acréscimo mais significado verificou-se ao nível dos acordos de empresa, sendo certo que o volume de
trabalhadores abrangidos, segundo resulta dos dados da Direção-Geral de Emprego e das Relações de
Trabalho (DGERT) e do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS), está longe dos
cerca de dois milhões anuais que se chegou a atingir. Por outro lado, não está afastado o risco de uma
degradação dos conteúdos de convenções negociadas em condições de profundo desequilíbrio, além de que a
tendência de diminuição da cobertura de trabalhadores por convenções vigentes, com algumas oscilações,
merece preocupação, sobretudo atento o aumento da publicação de portarias de extensão, em particular em
2017.
Na ausência de contratação coletiva, os novos trabalhadores contratados posteriormente ficam abrangidos
pelo contrato individual de trabalho. Ora, nos termos do n.º 8 do artigo 501.º, após a caducidade e até à entrada
em vigor de outra convenção ou decisão arbitral, mantêm-se os efeitos acordados pelas partes ou, na sua falta,
os já produzidos pela convenção nos contratos individuais de trabalho em algumas matérias como a retribuição,
a duração do tempo de trabalho, a categoria profissional e respetiva definição. No entanto, a convenção coletiva
de trabalho não é constitucionalmente desenhada para ser funcionalizada em ordem a ser incorporada nos
contratos individuais.
É necessário tomar medidas urgentes tendentes ao reequilíbrio do Código do Trabalho que passam por
reinscrever o princípio do tratamento mais favorável na sua plenitude e pela revitalização da contratação coletiva.
O próprio Governo reconheceu, em sede de Comissão Permanente de Concertação Social, que a lei é tão
desequilibrada que propôs que se acordasse uma moratória para a utilização da figura da caducidade para evitar
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que fosse utilizada de forma abusiva pelas entidades patronais. Decorre da argumentação do Governo que
a consequência a tirar dessa proposta é que a lei não tem de ser apenas suspensa, mas alterada. No entanto,
as sucessivas iniciativas legislativas apresentadas pelo Bloco de Esquerda sobre o tema foram rejeitadas
pelo Governo com o apoio da direita.
Importa clarificar que este abuso não é apenas resultado de uma prática errada: é autorizado pela lei.
Com efeito, a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho de 2009, já tinha
consubstanciado um retrocesso nos direitos laborais. As alterações introduzidas pela Lei n.º 23/2012, de 25
de junho, agudizaram violentamente esse processo. Um dos principais alvos deste ataque a direitos
fundamentais, consagrados na Constituição da República Portuguesa, foi justamente o direito à contratação
coletiva, plasmado no artigo 56.º. É de salientar que o Acórdão n.º 602/2013 do Tribunal Constitucional veio
declarar a inconstitucionalidade de várias normas da Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, por as considerar
violadoras daquele direito fundamental.
O decaimento do princípio da vigência da convenção até à sua substituição, bem como do princípio da
não ingerência do Estado e do poder político na autonomia coletiva e da contratação laboral assumiu uma
especial expressão com o regime transitório de sobrevigência e caducidade de convenção coletiva,
contemplado no artigo 10.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. O n.º 2 do artigo 10.º fez operar, à data da
sua entrada em vigor, ainda que de forma condicionada, isto é, verificados determinados factos, a caducidade
de convenções coletivas.
O memorando da troika e o acordo da Comissão Permanente de Concertação Social, que mereceu forte
oposição da CGTP, vieram acentuar a desigualdade própria das relações laborais, esvaziar o poder negocial
dos sindicatos e congelar a publicação de portarias de extensão, contribuindo para a individualização das
relações laborais. Posteriormente ao memorando, e sempre no mesmo sentido, foi apresentado um conjunto
de iniciativas legislativas: A Resolução Conselho de Ministros n.º 90/2012, de 31 de outubro; e a Resolução
Conselho de Ministros n.º 43/2014, de 27 de junho, e a Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto. Aquelas duas
resoluções, cujas consequências foram graves e cuja constitucionalidade era duvidosa, foram, entretanto,
revogadas no verão de 2017.
Por seu turno, a Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, veio estabelecer duas outras regras. Primeiro,
estabeleceu a caducidade, decorridos três anos (onde anteriormente eram cinco), da cláusula de convenção
que faça depender a cessação de vigência desta pela substituição por outro IRCT. No caso de denúncia,
estabeleceu a manutenção da convenção em regime de sobrevigência durante o período de negociação,
num mínimo de 12 meses. A interrupção da negociação por um período superior a 30 dias implica a
suspensão do prazo de sobrevigência. O período de negociação, com suspensão, não pode exceder os 18
meses. Segundo, determinou que a convenção coletiva, ou parte desta, pode ser suspensa temporariamente,
por acordo escrito entre as associações de empregadores e sindicais, na observância das seguintes
situações: crise empresarial por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos, catástrofes ou outras
ocorrências com impacto na atividade normal da empresa.
O resultado da conjugação destes instrumentos foi minar uma das traves mestras das relações de
trabalho: a confiança entre as partes. Consequentemente, assistiu-se à diminuição das atualizações das
convenções, à degradação do sistema de relações de trabalho e ao ataque direto aos sindicatos, a quem a
Constituição atribui o exclusivo direito de contratação coletiva.
As alterações sucessivas ao Código do Trabalho nos últimos anos colocaram em causa a dimensão
individual e coletiva dos direitos dos trabalhadores, configurando alterações paradigmáticas de sentido muito
negativo ao regime laboral em Portugal. Com efeito, reconduzir os direitos coletivos para a esfera individual,
ficcionando, de uma forma artificial e falaciosa, a paridade entre trabalhadores e empregadores opera uma
transfiguração que fragiliza ainda mais a posição do trabalhador que ocupa o lugar de parte mais débil no
seio da relação laboral.
O legislador português colocou, de facto, em crise o princípio do tratamento mais favorável ao trabalhador,
que se assume como um princípio essencial com vista a assegurar um maior equilíbrio no quadro das
relações laborais.
O princípio do tratamento mais favorável do trabalhador, enquanto forma de determinar a norma
concretamente aplicável, permite a escolha, de entre várias normas aptas a regular uma relação laboral,
daquela que fixe condições mais favoráveis ao trabalhador, ainda que se trate de uma norma de hierarquia
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inferior. Ora, este princípio tem sido delapidado em nome de uma alegada necessidade de flexibilização das
relações laborais, o que tem contribuído para uma fragilização das garantias dos trabalhadores.
Na nossa doutrina, o designado princípio do favor laboratoris tinha assento no artigo 13.º da Lei do Contrato
de Trabalho (LCT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de novembro de 1969, conjugado com o artigo
6.º, n.º 1, alínea c) do Decreto-Lei n.º 519-C1/79. Deste princípio decorria que, a menos que se estivesse perante
normas imperativas absolutas, isto é, de que resultasse uma proibição de derrogação por fonte inferior ou, no
caso de normas supletivas ou dispositivas, em que houvesse a permissão de afastamento independentemente
de maior ou menor favorabilidade, seria possível através de instrumento de regulamentação coletiva (com
exceção da portaria de condições de trabalho) estabelecer regime diferente do legal desde que mais favorável
ao trabalhador.
Este princípio, norteador da aplicação das normas laborais, é considerado como basilar no direito do trabalho,
sendo vital no reequilíbrio das posições dos sujeitos do contrato de trabalho, desenvolvendo-se como critério de
prevalência na aplicação de normas, tendo-se autonomizado como um «princípio de norma mínima», isto é,
como forma de garantir normas mínimas de tutela do trabalhador.
Nas palavras de Jorge Leite, a norma típica do ordenamento jus laboral era constituída «por uma regra
jurídica explícita impositiva e por uma regra jurídica implícita permissiva, vedando aquela qualquer redução dos
mínimos legalmente garantidos e facultando esta a fixação de melhores condições de trabalho…». Foi
exatamente essa norma que o Código do Trabalho, na Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, veio subverter,
ignorando a evolução do direito do trabalho ao longo do século XX, bem como a matriz constitucional que entre
nós consagra essa mesma evolução.
Com o Código do Trabalho de 2003, exceto no caso das normas imperativas, passou a vigorar a regra de
que os preceitos legais poderiam ser afastados por instrumentos de regulamentação coletiva quer em sentido
mais favorável, quer em sentido menos favorável ao trabalhador. Tal alteração, constante do artigo 4.º, n.º 1 do
CT, suscitou, na doutrina, muitas dúvidas quanto à sua constitucionalidade.
Ora, o n.º 3 da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, não recuperou o princípio do tratamento mais favorável e,
nesse sentido, em coerência, mudou-se a epígrafe para «Relações entre fontes de regulação». O n.º 3 do artigo
3.º limita-se a indicar, expressamente, um elenco de normas laborais semi-imperativas conforme já acontecia,
em relação a algumas delas, no código de 2003. Assim sendo, a necessidade de recuperar o princípio do
tratamento mais favorável, na aceção da revogada LCT, mantém-se.
Por último, o princípio da filiação, resultante da aceção do artigo 496.º do CT é uma projeção da autonomia
coletiva, em sede de contratação coletiva, ainda que a regra base da filiação comporte exceções ou distorções,
nomeadamente por via das portarias de extensão, mas também em resultado da aplicação do artigo 497.º do
CT. O artigo em apreço relativo à escolha da convenção aplicável determina que caso sejam aplicáveis, no
âmbito de uma empresa, uma ou mais convenções coletivas ou decisões arbitrais, o trabalhador que não seja
filiado em qualquer associação sindical pode escolher qual daqueles instrumentos lhe passe a ser aplicável
Esta norma revela-se, na prática, como uma norma antissindical, desincentivando a filiação sindical, ao
permitir a aplicação do regime de uma convenção coletiva quer a filiados quer a não filiados. Este desvirtuamento
do princípio da filiação deve ser expurgado do Código do Trabalho.
A crise sanitária provocada pela COVID-19 veio reforçar o que tem sido sucessivamente proposto e defendido
pelo Bloco de Esquerda, nas várias sessões legislativas, e que tem sido chumbado pelo Governo com o apoio
da direita: A urgência no reequilíbrio da lei do trabalho. A pandemia agudizou as relações de trabalho e, numa
relação de si já tão desigual, foi possível colocar os trabalhadores numa situação pior do que aquela em que se
encontravam, porque mais precários e com horários mais desfasados. Se o alargamento do período
experimental – ainda que parcialmente inconstitucional – contribuiu para esse efeito, o mesmo aconteceu com
a previsão da caducidade das convenções coletivas por decisão unilateral.
Equilibrar a lei do trabalho é uma condição fundamental de justiça social na própria resposta à crise e no tipo
de emprego e de País que nós queremos ter.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo
Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
Altera o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado pela Lei n.º
105/2009, de 14 de setembro, pela Lei n.º 53/2011, de 14 de outubro, pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho,
pela Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto, pela Lei n.º 69/2013, de 30 de agosto, pela Lei n.º 27/2014, de 8 de
maio, pela Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto, pela Lei n.º 28/2015, de 14 de abril, pela Lei n.º 120/2015, de 1
de setembro, pela Lei n.º 8/2016, de 1 de abril, pela Lei n.º 28/2016, de 23 de agosto, pela Lei n.º 73/2017,
de16 de agosto, Lei n.º 14/2018, de 19 de março, pela Lei n.º 90/2019, de 4 de setembro, pela Lei n.º 93/2019,
de 4 de setembro, e pela Lei n.º 18/2021, de 8 de abril, impedindo a caducidade das convenções coletivas e
procedendo à revogação da Lei n.º 55/2014, de 25 de agosto.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
Os artigos 3.º, 139.º, 476.º, 478.º, 482.º, 483.º, 486.º, 491.º a 493.º, 498.º a 502.º e 505.º do Código do
Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
[…]
As fontes de direito superiores prevalecem sobre fontes inferiores, salvo na parte em que estas, sem
oposição daquelas, estabeleçam tratamento mais favorável para o trabalhador.
Artigo 139.º
[…]
O regime do contrato de trabalho a termo resolutivo, constante da presente subsecção, pode ser afastado
por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho de sentido mais favorável ao trabalhador.
Artigo 476.º
[…]
1 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem implicar para o trabalhador
tratamento menos favorável do que o estipulado por lei.
2 – As condições de trabalho fixadas por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho só podem
ser substituídas por nova convenção coletiva de trabalho ou decisão arbitral com caráter globalmente mais
favorável reconhecido pelos seus subscritores.
3 – As disposições dos instrumentos de regulamentação coletiva só podem ser afastadas por contrato de
trabalho quando este estabeleça condições mais favoráveis para o trabalhador.
Artigo 478.º
[…]
1 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem:
a) Limitar o exercício dos direitos fundamentais constitucionalmente garantidos;
b) Contrariar as normas imperativas;
c) Incluir qualquer disposição que importe para os trabalhadores tratamento menos favorável do que o
estabelecido por lei;
d) Estabelecer regulamentação das atividades económicas, nomeadamente no tocante aos períodos de
funcionamento das empresas, ao regime fiscal e à formação dos preços e exercício da atividade de empresas
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de trabalho temporário, incluindo o contrato de utilização;
e) Conferir eficácia retroativa a qualquer das suas cláusulas, salvo tratando-se de cláusulas de natureza
pecuniária de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial.
2 – […].
Artigo 482.º
[…]
1 – Sempre que numa empresa se verifique concorrência de instrumentos de regulamentação coletiva, serão
observados os seguintes critérios de prevalência:
a) Sendo um dos instrumentos concorrentes um acordo coletivo ou um acordo de empresa será esse o
aplicável;
b) Em todos os casos não contemplados na alínea a), prevalecerá o instrumento que for considerado, no seu
conjunto, mais favorável pelo sindicato representativo do maior número dos trabalhadores em relação aos quais
se verifica a concorrência desses instrumentos.
2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, o sindicato competente deverá comunicar por escrito
à entidade patronal interessada e à Autoridade para as Condições de Trabalho, no prazo de trinta dias a contar
da entrada em vigor do último dos instrumentos concorrentes, qual o que considera mais favorável.
3 – Caso a faculdade prevista no número anterior não seja exercida pelo sindicato respetivo no prazo
consignado, tal faculdade defere-se aos trabalhadores da empresa em relação aos quais se verifique
concorrência, que, no prazo de trinta dias, devem, por maioria, escolher o instrumento mais favorável.
4 – A declaração e a deliberação previstas no n.º 2 são irrevogáveis até ao termo da vigência do instrumento
por eles adotado.
5 – Na ausência de escolha, quer pelos sindicatos quer pelos trabalhadores, será aplicável o instrumento de
publicação mais recente.
6 – No caso de os instrumentos concorrentes terem sido publicados na mesma data, aplica-se o que regular
a principal atividade da empresa.
Artigo 483.º
[…]
1 – Sempre que existir concorrência entre instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho de natureza
não negocial, a portaria de extensão afasta a aplicação da portaria de condições de trabalho.
2 – Em caso de concorrência entre portarias de extensão, aplica-se o que contiver um tratamento mais
favorável ao trabalhador.
Artigo 486.º
[…]
1 – […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) (Revogado.)
3 – A proposta deve ser apresentada na data da denúncia da convenção em vigor, sob pena de esta não ter
validade.
4 – Das propostas, bem como da documentação que deve acompanhá-las, nomeadamente, a
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fundamentação económica, são enviadas cópias ao Ministério que tutela a área laboral.
Artigo 491.º
[…]
1 – […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […].
3 – (Revogado.)
4 – (Revogado.)
Artigo 492.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […].
h) (Revogado.)
3 – […].
4 – […].
Artigo 493.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – A pedido da comissão, pode participar nas reuniões, sem direito a voto, um representante do ministério
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que tutela a área laboral.
Artigo 498.º
[…]
1 – Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, do estabelecimento ou de parte
de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, o instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho que vincula o transmitente é aplicável ao adquirente, salvo se, entretanto, outro instrumento
de regulamentação coletiva de trabalho negocial passar a aplicar-se ao adquirente.
2 – […].
Artigo 499.º
[…]
1 – A convenção coletiva vigora pelo prazo que delas constar expressamente.
2 – A convenção coletiva mantém-se em vigor enquanto não forem substituídas por outro instrumento de
regulamentação coletiva.
Artigo 500.º
[…]
1 – A convenção coletiva pode ser denunciada, no todo ou em parte, por qualquer das entidades que a
subscreveram, mediante comunicação escrita dirigida à outra parte, desde que seja acompanhada de uma
proposta negocial.
2 – As convenções coletivas não podem ser denunciadas antes de decorridos dez meses após a data da sua
entrada em vigor.
3 – A denúncia pode ser feita a todo o tempo quando:
a) As partes outorgantes acordem no princípio da celebração da convenção substitutiva, em caso de cessão
total ou parcial, de uma empresa ou estabelecimento;
b) As partes outorgantes acordem na negociação simultânea da redução da duração e da adaptação da
organização do tempo de trabalho.
Artigo 501.º
[…]
Decorrido o prazo de vigência, e desde que o preveja expressamente, a convenção renova-se
sucessivamente por iguais períodos.
Artigo 502.º
[…]
1 – A convenção coletiva apenas pode cessar mediante revogação por acordo das partes.
2 – Aplicam-se à revogação as regras referentes ao depósito e à publicação de convenção coletiva.
3 – A revogação prejudica os direitos decorrentes da convenção, salvo se na mesma forem expressamente
ressalvados pelas partes.
4 – O serviço competente do ministério responsável pela área laboral procede à publicação no Boletim do
Trabalho e Emprego de aviso sobre a data da cessação da vigência de convenção coletiva, nos termos do artigo
anterior.
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28
Artigo 505.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – A decisão arbitral produz os efeitos da convenção coletiva, vigora pelo prazo que dela constar
expressamente e mantêm-se em vigor enquanto não for substituída por outro instrumento de regulamentação
coletiva.
4 – […].»
Artigo 3.º
Norma revogatória
1 – São revogados os artigos 5.º, 10.º, 497.º, 501.º-A e 508.º a 513.º do Código do Trabalho, aprovado
pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
2 – São revogados a alínea c) do n.º 2, do artigo 486.º, os n.os 3 e 4 do artigo 491.º, a alínea h) do n.º 2
do artigo 492.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
3 – É revogada a Lei n.º 55/2014 de 25 de agosto.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Isabel Pires — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa
— Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Joana
Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria
Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 961/XIV/3.ª
AGRAVAMENTO DAS MOLDURAS PENAIS PRIVATIVAS DE LIBERDADE PARA AS CONDUTAS QUE
CONFIGUREM OS CRIMES DE ABUSO SEXUAL DE CRIANÇAS, ABUSO SEXUAL DE MENORES
DEPENDENTES E ATOS SEXUAIS COM ADOLESCENTES
Exposição de motivos
O Estado de direito democrático, mormente pelos avanços iluministas progressivamente alcançados no
términus dos grandes conflitos armados, passou a assentar os seus valores identitários em princípios até então
grosseira e reiteradamente violados, os denominados direitos, liberdades e garantias, onde encontramos entre
outros, o direito à vida, à integridade física, à autodeterminação sexual, à liberdade e à segurança.
Na verdade, e ainda que a multidisciplinaridade dos tempos modernos apresente às sociedades atuais, aos
governantes e ao próprio Direito, uma vasta panóplia de novas condutas criminais que a todos exige uma
redobrada atenção a fenómenos outrora diminutos, não pode ainda assim o legislador negligenciar os princípios
supramencionados que ilustram os seus valores fundadores.
Fazê-lo é negligenciar, no seu âmago e equilíbrio, toda a unidade da ordem jurídica e inclusivamente o bem
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jurídico da paz pública.
Nos últimos anos, não porque outrora não existissem, mas porque da sua existência se tinha
indubitavelmente menos conhecimento, acentuou-se a preocupação e a necessidade de reflexão sobre a
criminalidade exercida sobre crianças e menores, destacando-se dentro desta os crimes de natureza sexual.
Nesta matéria, muito acentuado tem sido o debate sobre a eficácia do quadro legislativo vigente em prevenir
e responder aos casos de abuso sexual de menores existentes, e evitar que os mesmos ou outros similares se
continuem a verificar um pouco por todo o mundo, debate a que Portugal não ficou, como de resto nunca poderia
ficar, indiferente.
Considera-se hoje inequívoco que, por muitos avanços que se tenham feito no combate à mesma, todas as
alterações que foram preceituadas para reforçar a tutela das crianças ou adolescentes vítimas de crimes
sexuais, bem como para reforçar a luta e o combate à pedofilia, continuam ainda muito aquém do necessário, o
que é facilmente comprovável pelos números avassaladores deste tipo de criminalidade que todos os anos são
conhecidos na União Europeia.
Desta forma, a pedofilia, transtorno que é sempre encarado num prisma patológico, e que por isso tem sido
preferencialmente enfrentado e combatido com programas assentes em pretensos planos de prevenção,
acompanhamento e recuperação do agente criminoso, olvida no entanto que por muito que os mesmos sejam
movidos pelas melhores intenções e crenças de recuperação médica e ressocialização social, os índices de
reincidência da conduta criminal em causa, muitas vezes pelo mesmo agente criminoso punido e julgado, são
absolutamente inaceitáveis.
Com este projeto de lei, vem o Chega, no cumprimento de uma das suas promessas eleitorais, defender a
agravação das molduras penais previstas para quem abuse sexualmente de crianças.
Não obstante a complexidade que se admite estar ligada a este fenómeno, o debate desta matéria deve
primeiramente procurar responder a uma interpelação legítima que se deve dirigir ao legislador sobre se as
soluções hoje existentes para estas condutas criminais, em grande medida assentes em penas privativas de
liberdade, muitas vezes de duração ridiculamente curta para a gravidade da conduta punida, serão suficientes
para sanar o dano causado à vítima, ressocializar o agente criminoso, e acautelar que não mais por si ou por
qualquer outro, a mesma volte a ser cometida, na mesma ou em vítima distinta.
As posições maioritárias parecem querer apontar a pedofilia como integrante de um domínio patológico,
corrente doutrinária que encontra até sustento pelas considerações do Código Internacional de Doenças, que
coloca a pedofilia na esfera das graves patologias, encarando-a como uma parafilia caracterizada pela
incapacidade do controlo do agente criminoso sob os seus impulsos sexuais compulsivos1.
Daqui resulta desde logo, que sendo encarada a pedofilia como uma doença, então, nesse caso, de entre as
três primordiais funções que estão sempre adstritas à punibilidade criminal, não se compreendem cumpridas as
funções de prevenção e de ressocialização, na medida em que a mera aplicação de penas privativas de
liberdade, como supra se mencionou na esmagadora maioria das vezes demasiado curta para a conduta em
causa, não garante as funções preventiva e ressocializante do agente criminoso.
Face à Constituição da República Portuguesa e ao quadro legal atualmente em vigor, o Chega entende que,
não obstante a necessidade imperiosa de realização da justiça e de prevenção – geral e especial – o horizonte
da reabilitação e da reinserção social dos criminosos tem de se manter sempre vivo e preponderante.
Ora, por todos os considerandos que acima viemos expondo, considera o Chega que já é hora de serem
tomadas as medidas necessárias, com a coragem que se deve exigir a quem governa, para que as nossas
crianças estejam de uma vez por todas protegidas do flagelo nocivo da criminalidade sexual contra elas dirigida.
O aumento das molduras penais aplicáveis não resolverá, por si só, os problemas da criminalidade sexual contra
menores. Mas é um passo dado no sentido de aumentar os níveis de eficácia na prevenção e punição deste
sombrio fenómeno que deixa marcas indeléveis e vitalícias nas suas vítimas e nos responsabiliza a todos pela
proteção das nossas crianças.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Chega, abaixo assinado,
apresenta o seguinte projeto de lei:
1 Ver neste sentido o CID, código internacional de doenças, publicado pela Organização Mundial de Saúde. Disponível em
http://www.who.int/classifications/icd/en/ (Acesso em 25 de novembro de 2019)
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à quinquagésima alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82,
de 23 de setembro, delimitando e integrando à codificação vigente o agravamento das penas de prisão previstas
para as condutas supramencionadas e as que configurem atos sexuais com adolescentes.
Artigo 2.º
Alterações ao Código Penal
Os artigos 171.º, 172.º e 173.º do Código Penal, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 171.º
Abuso sexual de crianças
1 – Quem praticar ato sexual de relevo com ou em menor de 14 anos, ou o levar a praticar com outra pessoa,
é punido com pena de prisão de dois a dez anos.
2 – Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito anal, coito oral ou introdução vaginal ou anal de
partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão de cinco a doze anos.
3 – Quem:
a) Importunar menor de 14 anos, praticando ato previsto no artigo 170.º; ou
b) Atuar sobre menor de 14 anos, por meio de conversa, escrito, espetáculo ou objeto pornográficos;
c) Aliciar menor de 14 anos a assistir a abusos sexuais ou a atividades sexuais;
é punido com pena de prisão até cinco anos.
4 – Quem praticar os atos descritos no número anterior com intenção lucrativa é punido com pena de prisão
de dois a cinco anos.
5 – A tentativa é punível.
Artigo 172.º
Abuso sexual de menores dependentes
1 – Quem praticar ato descrito nos n.os 1 ou 2 do artigo anterior, relativamente a menor de 14 anos que lhe
tenha sido confiado para educação ou assistência, é punido com pena de prisão de dois a doze anos.
2 – Quem praticar ato descrito nas alíneas do n.º 6 do artigo anterior, relativamente a menor compreendido
no número anterior deste artigo e nas condições aí descritas, é punido com pena de prisão até oito anos.
3 – Quem praticar os atos descritos no número anterior com intenção lucrativa é punido com pena de prisão
até dez anos.
4 – A tentativa é punível.
Artigo 173.º
Atos sexuais com adolescentes
1 – Quem, sendo maior, praticar ato sexual de relevo com menor entre 14 e 16 anos, ou levar a que ele seja
praticado por este, com outrem, abusando da sua inexperiência, é punido com pena de prisão até três anos.
2 – Se o ato sexual de relevo consistir em cópula, coito oral, coito anal ou introdução vaginal ou anal de
partes do corpo ou objetos, o agente é punido com pena de prisão até cinco anos.
3 – A tentativa é punível.»
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Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
O Deputado do CH, Diogo Pacheco de Amorim.
———
PROJETO DE LEI N.º 962/XIV/3.ª
ALTERA O CÓDIGO PENAL NO SEU ARTIGO 164.º (VIOLAÇÃO) AGRAVANDO AS MOLDURAS
PENAIS APLICÁVEIS AOS SUJEITOS QUE PREENCHAM OS REQUISITOS DESTA CONDUTA
CRIMINOSA, PASSANDO A CONSIDERAR OS CRIMES CONTRA A LIBERDADE E
AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL COMO CRIMES DE NATUREZA PÚBLICA
Exposição de motivos
A criminalidade sexual não tem tido o devido tratamento jurídico-penal em Portugal, na nossa perspetiva.
Desde a proteção das vítimas à punição dos agressores, passando pela reparação da respetiva danosidade
social e individual do ilícito, regime repressivo dos crimes sexuais ainda tem um longo caminho para percorrer
no ordenamento jurídico português.
Segundo os dados disponíveis, os crimes de violação e abuso sexual de menores têm considerável
expressão entre 2013 e 2018, registando-se um aumento de cerca de 130% na sua ocorrência.
Há, no entanto, duas dimensões que merecem correção no curto prazo, atendendo ao seu impacto na vida
pública, à proteção das vítimas e à dissuasão da prática do crime: transformar o crime de violação em crime
público e alinhar, de forma mais equilibrada, as penas máximas possíveis para este tipo de crime com os
ordenamentos jurídicos mais próximos do nosso, nomeadamente Espanha e França.
São estes os principais objetivos deste projeto de lei, atendendo à necessidade de promover, com
considerável impacto social, mecanismos de dissuasão do crime e reforçar a proteção pública das vítimas.
Não se ignora, de forma alguma, as pertinentes e sérias questões em torno da natureza pública do crime de
violação colocada por eminentes penalistas e constitucionalistas. Assume particular importância o direito das
vítimas à reserva da sua vida privada e o impacto social que a participação na justiça pode ter nas suas vidas
pessoal e familiares. São aspetos que devem, naturalmente, ser tidos em conta.
É nosso entendimento que o bem jurídico protegido – a liberdade sexual – merece proteção reforçada no
ordenamento jurídico português, mesmo que tal possa comprimir, direta ou indiretamente, alguns direitos,
liberdades e garantias. Na verdade, o crime de violação não se estende apenas, em termos de impacto, sobre
a vítima, alargando efeitos devastadores (embora incomparáveis) à família da mesma, aos coletivos sociais
envolventes e à própria sociedade, onde provoca um significativo alarme social. São, por isso, diversos e
complexos, na sua relação, os bens jurídicos e interesses a defender pelo legislador, devendo naturalmente dar
primazia à proteção e defesa da própria vítima.
Com o presente projeto de lei, o Chega pretende não apenas transformar a natureza do crime de violação
em crime público, mas também reforçar os limites sancionatórios para a sua penalização, aumentando
consideravelmente as penas aplicáveis, em linha com outros ordenamentos jurídicos da União Europeia, como
o espanhol ou o francês. Em Espanha, por exemplo, a pena aplicável ao crime de violação é de seis a doze
anos, podendo chegar aos quinze anos em determinadas situações.
É evidente que um crime com a complexidade e a especificidade daquele que aqui é tratado não se combate
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apenas pela alteração jurídica da respetiva natureza penal ou com o aumento de penas, mas estas alterações
podem ser um sinal importante em termos da sua dissuasão e de acordo com as finalidades de proteção do bem
jurídico que, nos termos do n.º 1 do artigo 40.º do Código Penal, devem enformar a legislação penal.
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Código Penal, no seu artigo 164.º (violação) agravando as molduras
penais aplicáveis aos sujeitos que preencham os requisitos desta conduta criminosa e no seu artigo 178.º
atribuindo a natureza de crime público aos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual.
Artigo 2.º
Alteração aos artigos 164.º e 178.º do Código Penal, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 164.º
Violação
1 – Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou
posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa:
a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou
b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos;
é punido com pena de prisão de seis a doze anos.
2 – Quem, por meio não compreendido no número anterior, constranger outra pessoa:
a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou
b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos;
é punido com pena de prisão de 3 a 10 anos.
Artigo 178.º
Queixa
1 – (Revogado.)
2 – (Revogado.)
3 – (Revogado.)
4 – […].
5 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
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O Deputado do CH, Diogo Pacheco de Amorim.
———
PROJETO DE LEI N.º 963/XIV/3.ª
PROGRAMA DE INCENTIVO À CRIAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO DOS HORÁRIOS DAS CRECHES
Exposição de motivos
De acordo com os resultados preliminares dos Censos 2021, Portugal tem hoje menos 214 286 pessoas do
que em 2011.
No primeiro semestre deste ano, a natalidade atingiu o valor mais baixo dos últimos 30 anos (nasceram
apenas cerca de 37 000 bebés, o valor mais baixo desde 1989). Neste sentido, importa adotar políticas de
promoção da natalidade, nomeadamente no que respeita à oferta e às condições de funcionamento de creches
e jardins de infância, de forma a permitir às famílias uma melhor conciliação entre a vida profissional e a vida
familiar.
Por outro lado, a recente realidade pandémica veio reforçar a necessidade, defendida há muito pelo CDS,
de aprofundar a qualificação da rede de creches e estabelecimentos de ensino, adaptando o seu funcionamento
às novas realidades e necessidades das famílias, salvaguardando-se sempre o superior interesse da criança,
facilitando uma maior flexibilização dos horários das creches.
Neste sentido, o CDS entende ser preciso adequar os horários às necessidades efetivas e reais das famílias,
especialmente aos pais que trabalham aos fins-de-semana, por turnos ou em horário noturno.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do CDS-
PP abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à constituição de um programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das
creches.
Artigo 2.º
Adequação do modelo de financiamento das creches sem fins lucrativos
No âmbito do programa referido no artigo anterior, o Governo procede à adequação do modelo de
financiamento das creches sem fins lucrativos, de forma a incentivar o estabelecimento de horários flexíveis e
alargados, sempre que se verifique necessidade evidente das famílias em virtude dos horários de trabalho das
entidades empregadoras da comunidade.
Artigo 3.º
Promoção da constituição de Instituições Particulares de Solidariedade Social por iniciativa de
empresas
No âmbito do programa referido no artigo 1.º, o Governo procede à promoção da constituição de Instituições
Particulares de Solidariedade Social, sem finalidade lucrativa, por iniciativa de empresas, de modo a garantir o
acesso à celebração de acordos com a Segurança Social para financiar o funcionamento de creches que
pratiquem um horário flexível e adequado às necessidades dos seus funcionários.
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Artigo 4.º
Fomentação da celebração de acordos entre estabelecimentos de infância e entidades
empregadoras
No âmbito do programa referido no artigo 1.º, o Governo procede ao fomento da celebração de acordos entre
estabelecimentos de infância e entidades empregadoras, visando o estabelecimento de horários e outras
condições de acesso, de maneira a conceder mais alternativas aos pais, apoiando a dinâmica familiar.
Artigo 5.º
Regulamentação
No prazo de 90 dias, contados desde a entrada em vigor da presente lei, o Governo aprova os diplomas
necessários à efetivação do programa de incentivo à criação e flexibilização dos horários das creches.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
Os Deputados do CDS-PP: Telmo Correia — Pedro Morais Soares — Cecília Meireles — João Pinho de
Almeida — Ana Rita Bessa.
———
PROJETO DE LEI N.º 964/XIV/3.ª
ESTABELECE O REFORÇO E AVALIAÇÃO DA IMPLEMENTAÇÃO E EXECUÇÃO DO PROGRAMA DE
APOIO À REDUÇÃO DO TARIFÁRIO DOS TRANSPORTES PÚBLICOS (PART) E DO PROGRAMA DE
APOIO À DENSIFICAÇÃO E REFORÇO DA OFERTA DE TRANSPORTE PÚBLICO (PROTRANSP)
Exposição de motivos
O Roteiro de Neutralidade Carbónica para 2050, aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º
107/2019, de 1 de julho, aponta como potencial de redução de emissões em 2030 neste setor, face a 2005,
entre 43 e 46% e afirma que «A descarbonização do setor dos transportes será alicerçada fundamentalmente
no reforço do papel do sistema de transporte público e na substituição dos atuais veículos a combustíveis
fósseis por uma frota essencialmente elétrica».
A necessidade e urgência na descarbonização do setor dos transportes tem como solução, em grande
medida, e conforme salientado no Roteiro de Neutralidade Carbónica para 2050, a aposta no aumento da
utilização dos transportes coletivos. O Programa de Apoio à Redução do Tarifário dos Transportes Públicos
(PART) e o Programa de Apoio à Densificação e Reforço da Oferta de Transporte Público (PROTRANSP)
pretendem, precisamente, atrair pessoas para o uso do transporte coletivo com abandono do transporte
particular.
O PART, ao permitir a redução do preço de utilização dos transportes coletivos, constitui um incentivo ao
seu uso. Contudo, o país necessita de tornar o uso de transportes coletivos mais atrativo, através do aumento
da oferta e melhoria da qualidade e intermodalidade dos mesmos, objetivo a que o PROTRANSP pretende
responder.
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Para que os objetivos de descarbonização do setor sejam efetivamente ambiciosos e alcançados já em 2030,
é fundamental, nesta fase, avaliar os resultados do PART e do PROTRANSP de forma a que se possa saber
como melhorar ambos os programas e alcançar os objetivos de reforço do uso de transportes coletivos e redução
do uso de transportes privados. A referida avaliação deve ponderar a evolução do uso de transportes coletivos
e de transportes privados, a correlação dessa evolução com os programas PART e PROTRANSP, bem como
os recursos financeiros afetos aos programas. Esta avaliação deve contemplar as políticas de intermobilidade
nomeadamente na conjugação dos transportes públicos, com a mobilidade ativa ou suave, assim como a
existência de parques dissuasores nas imediações dos transportes públicos.
Em função da avaliação efetuada, o Governo deverá propor, à Assembleia da República, a adoção de
medidas, devidamente fundamentadas, que permitam aumentar a eficácia dos programas PART e
PROTRANSP.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o Deputado do PAN apresentam
o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece o reforço e a avaliação da implementação e execução do Programa de Apoio à
Redução do Tarifário dos Transportes Públicos (PART) e do Programa de Apoio à Densificação e Reforço da
Oferta de Transporte Público (PROTRANSP).
Artigo 2.º
Avaliação do PART e do PROTRANSP
Num prazo de 9 meses após a entrada em vigor da presente lei, o Governo apresenta à Assembleia da
República um relatório elaborado por um grupo de trabalho, composto personalidades de reconhecido mérito no
domínio dos transportes, do ambiente e da economia, que avalie o PART e o PROTRANSP, ao nível da sua
eficácia, demonstrando, nomeadamente, a evolução do uso de transportes coletivos e de transportes privados,
a correlação dessa evolução com estes programas, bem como os recursos financeiros afetos aos programas e
respetivos indicadores de custo-eficácia.
Artigo 3.º
Medidas de reforço do PART e do PROTRANSP
Num prazo de 90 dias após a entrega do relatório referido no artigo anterior, o Governo propõe à Assembleia
da República a adoção de medidas, devidamente fundamentadas, para o reforço e aumento da eficácia do PART
e do PROTRANSP.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
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PROJETO DE LEI N.º 965/XIV/3.ª
CRIA O PROGRAMA REDE DE CRECHES PÚBLICAS
Exposição de motivos
A educação e os cuidados da primeira infância são, cada vez mais, considerados uma base para a
educação e para a formação ao longo da vida.
O Parecer n.º 8/2008, do Conselho Nacional de Educação, sobre «A Educação das Crianças dos 0 aos
12 anos» salienta que «[a] educação dos 0 aos 6 anos é decisiva como pilar para o desenvolvimento
educativo das crianças e é fator de equidade». No mesmo sentido, o Seminário da «Educação das crianças
dos 0 aos 3 anos» (realizado no CNE em 18 de novembro de 2010) concluiu que «o direito à creche» é um
direito a ser reconhecido «enquanto serviço educativo» que tem «um valor intrínseco e pode contribuir para
o desenvolvimento das crianças» (CNE, 2011).
E a Recomendação n.º 3/2011 do CNE sobre «A educação dos 0 aos 3 anos» considera que a
concretização do direito das crianças à creche é «um fator de igualdade de oportunidades, de inclusão e
coesão social». O mesmo documento sustenta que a responsabilização primeira pela educação dos 0 aos 3
anos pertence às famílias, não devendo a frequência da creche ser obrigatória, mas devendo «ser universal,
de modo a que as famílias disponham de serviços de alta qualidade a quem entregar os seus filhos, serviços
esses que devem estar geograficamente próximos da respetiva residência ou local de trabalho» (2.ª
recomendação). E, no mesmo sentido, defende que «o Ministério da Educação deve assumir
progressivamente uma responsabilização pela tutela da educação da faixa etária dos 0-3» (3.ª
recomendação).
Conforme o Estado da Educação 2019 (CNE, 2020), o número de respostas sociais para a primeira
infância tem vindo a decrescer desde 2014 ao mesmo tempo que a procura de creche tem aumentado. A
falta de vagas e a escassa oferta pública fazem com que frequentemente seja mais caro ter uma criança na
creche do que um jovem numa universidade privada. Este quadro limita o acesso das famílias à creche e
ignora que a criança é um sujeito de direitos desde que nasce. O custo das creches relaciona-se com duas
opções de política: a) as creches não estão inseridas no sistema de ensino, mas na Segurança Social, pelo
que a oferta está essencialmente sob a gestão do setor privado e do setor social (IPSS); b) as creches são
vistas como assistência às famílias e não no quadro dos direitos da infância, o que contribui para
desresponsabilizar o Estado.
Esta falta de creches é reconhecida pelo Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), que, reportando-se
aos dados da Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e
equipamentos sociais (…) para a 1.ª infância 48,4% (creches)» – uma cobertura insatisfatória que se faz
sentir de forma particularmente aguda nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Por essa razão, o
PRR incluiu no seu 6.º Pilar «Políticas para a próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e
habilidade» o objetivo de «[a]umentar a capacidade de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios
que ainda têm níveis de cobertura mais baixos».
A criação de um Programa Rede de Creches Públicas, a iniciar em 2022, permitirá responder a essa
debilidade social do país e concretizar o direito à creche como parte dos direitos constitucionais das crianças
ao desenvolvimento integral (artigo 69.º) e à Educação (artigo 73.º). Para além do levantamento das
necessidades e do reforço da oferta, esse programa terá como objetivo garantir a gratuitidade de frequência
de creche a todas as crianças.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei cria o Programa Rede de Creches Públicas.
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Artigo 2.º
Programa Rede de Creches Públicas
1 – O Programa Rede de Creches Públicas tem como objetivo promover o acesso à creche, assegurando
o direito das crianças à educação e ao seu desenvolvimento integral.
2 – Em 2022, o Governo procede ao alargamento da gratuitidade de frequência de creche a todas as
crianças que frequentem creche pública ou abrangida pelo sistema de cooperação e cujo agregado familiar
pertença ao 3.º escalão de rendimentos da comparticipação familiar.
3 – No primeiro semestre de 2022, o Governo inicia o levantamento das necessidades de resposta de
creches públicas e de educação pré-escolar, sendo apurado o número de vagas existentes na valência de
creche, as necessidades de recursos materiais, designadamente de meios e instalações, bem como dos
concursos ou bolsas de recrutamento com vista a suprir as necessidades de recursos humanos identificadas.
4 – A partir do segundo semestre de 2022, o Governo dá início a uma requalificação das creches já
existentes e à construção de novas creches em função do levantamento das necessidades, nos termos do
número anterior, de forma a garantir gradualmente o acesso universal e gratuito à creche para todas as
crianças dos zero aos três anos, independentemente do escalão de rendimento.
5 – A manutenção, qualificação e alargamento da oferta pública é acompanhada por uma equipa de
monitorização sob a tutela conjunta do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e Segurança
Social.
Artigo 3.º
Inclusão da Rede de Creches no Sistema Educativo
1 – Em 2022, o Governo inicia um processo com vista à inclusão das creches no sistema educativo.
2 – O tempo de serviço dos educadores de infância afetos às creches é contabilizado para todos os
efeitos do Estatuto da Carreira Docente.
Artigo 4.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação necessária da presente lei no prazo de dois meses a contar da sua
entrada em vigor.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeito a partir do Orçamento do
Estado subsequente.
Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Alexandra Vieira — José Moura Soeiro — Pedro
Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana Mortágua — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso
— Isabel Pires — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — Luís Monteiro — Maria
Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
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PROJETO DE LEI N.º 966/XIV/3.ª
PERMITE O ACESSO A UM CONJUNTO DE DADOS PESSOAIS POR PARTE DE ESTUDANTES DE
MEDICINA E INVESTIGADORES CIENTÍFICOS, PARA FINS ACADÉMICOS, DE ARQUIVO DE INTERESSE
PÚBLICO FINS DE INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA OU HISTÓRICA OU FINS ESTATÍSTICOS (PRIMEIRA
ALTERAÇÃO À LEI N.º 58/2019, DE 2021)
Exposição de motivos
A pandemia do COVID-19 alertou o mundo para a necessidade imperiosa de apostar no conhecimento
enquanto garantia de desenvolvimento sustentável, robustez da nossa economia e, acima de tudo, viabilidade
da nossa existência e saúde enquanto seres humanos e comunidade.
O papel da comunidade científica ganhou uma nova centralidade no debate social. A corrida às vacinas que
vieram responder à crise da pandemia foi assunto diário e, também cá em Portugal, houve quem se tenha
organizado nos seus laboratórios, centros de investigação e hospitais universitários para dar uma resposta
humanitária e científica ao vírus. Para essa e outras tarefas futuras, é necessário ter acesso a um conjunto de
dados que as autoridades de saúde possuem, nomeadamente a Direção-Geral de Saúde (DGS), os Serviços
Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do Sistema de Saúde, IP.
Se é verdade que a experiência da pandemia criou a possibilidade administrativa de acesso a alguns dados
por parte de vários laboratórios de investigação na área biomédica, relativamente ao fornecimento de grandes
dados e metadados para análise por cientistas de dados não se encontra ainda resolvido.
Ouvimos com atenção o Senhor Primeiro Ministro António Costa que, num dos debates parlamentares que
tiveram lugar durante o primeiro confinamento geral a que o país esteve sujeito, garantiu que seriam fornecidos
esses dados às instituições académicas e aos grupos das instituições da administração central que se
encontram a trabalhar o tema do ponto de vista científico. Independentemente dessa decisão ter conhecido
efeitos práticos no caso específico da pandemia da COVID-19, importa salientar a importância dessa prática
para merecer um tratamento mais duradouro no tempo e estrutural para o futuro da investigação científica em
Portugal.
A possibilidade deste alargamento na análise científica pode ser crucial na gestão de futuras crises de saúde
pública, desde a alocação de recursos, seleção da aplicação dos testes ou deteção precoce de doentes com
potencial de agravamento, entre outras matérias. A preocupação, que ganhou dimensão pública nos meses em
que enfrentamos a pandemia, como é exemplo um apelo publicado pelo jornal Público logo no início do
confinamento geral de março de 20201.
No mesmo sentido de alargar a possibilidade de acesso a dados para otimização de processos e
aprendizagens, uma das medidas que gera consenso entre as várias entidades envolvidas é a abertura dos
sistemas de informação de dados clínicos aos estudantes de medicina.
No final de 2020, a Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa já havia tentado resolver esse
problema, quando deu entrada de um pedido de parecer à Comissão Nacional de Proteção de Dados (doravante
CNPD) sobre o protocolo entre aquela entidade, o Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, EPE, e os
Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS). O objetivo principal desse protocolo era uma
equivalência entre médicos e estudantes de medicina no que toca ao acesso ao software Sclínico.
Após essa tentativa, a Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD), através de uma comunicação
oficial, informou que apenas os profissionais inscritos na Ordem dos Médicos podem aceder ao software que
agrega os dados clínicos dos doentes internados e em consulta.2 Este impasse gerado após o conhecimento
dessa posição só poderá ser resolvido com uma clarificação legal que garanta, em primeira instância, o acesso
dos estudantes de medicina a estes sistemas de informação (software SClínico) e, em segunda instância,
mencione em que moldes é que esse acesso é permitido. Esse passo, se dado, representará uma efetiva
melhoria na formação médica em Portugal.
O presente projeto de lei do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta dois objetivos concretos:
1https://www.publico.pt/2020/03/26/ciencia/noticia/resposta-cientistas-continuam-apelar-acesso-imediato-dados-covid19-portugal-1909511 2https://www.publico.pt/2021/01/09/sociedade/noticia/cnpd-impede-acesso-estudantes-medicina-dados-clinicos-doentes-1945670
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• Em primeiro lugar, é necessário garantir o acesso a um conjunto de dados clínicos por parte da
comunidade científica e, para isso, propomos um regime de acesso a um conjunto de dados detidos pela Direção
Geral de Saúde, os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do
Sistema de Saúde, IP., num modelo que garanta a sua encriptação e anonimato. Esta medida tem como fim
melhorar a investigação científica e aproximar as várias realidades da administração da saúde em Portugal com
os vários centros de produção de conhecimento científico que o país detém.
• Em segundo lugar, a fim de eliminar os obstáculos burocráticos que impedem os estudantes de Medicina
a acederem aos dados clínicos dos estudantes de medicina, propomos uma alteração Lei n.º 58/2019, de 8 de
agosto, que assegura a execução do Regulamento Geral de Proteção de Dados, de forma a permitir esse
acesso.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à primeira alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que assegura a execução do
Regulamento Geral de Proteção de Dados, permitindo o acesso a um conjunto de dados clínicos por parte de
estudantes de medicina e investigadores científicos.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
São abrangidos pela presente lei:
a) Os estudantes de medicina a frequentar cursos de Medicina em hospitais universitários;
b) Os investigadores pertencentes a laboratórios e centros de investigação pertencentes ao perímetro legal
e administrativo das Instituições de ensino superior públicas.
Artigo 3.º
Alteração à Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto
São alterados os artigos 29.º e 31.º da Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 29.º
(…)
1 – ............................................................................................................................................................ .
2 – ............................................................................................................................................................ .
3 – (Novo) O acesso aos sistemas de informação que apoiam a prestação de cuidados e tratamentos de
saúde ou de serviços de diagnóstico por parte dos médicos é alargada aos estudantes de Medicina nos
estabelecimentos em que decorrer a sua formação.
4 – (Novo) Para efeitos do número anterior, é criado um perfil próprio para estudantes nas plataformas nos
quais são registados dados de saúde dos utentes, garantindo igual grau de segurança aplicável aos demais
perfis.
5 – (Novo) O acesso aos dados a que alude o n.º 2 é feito exclusivamente de forma eletrónica, salvo
impossibilidade técnica ou expressa indicação em contrário do titular dos dados, sendo vedada a sua divulgação
ou transmissão posterior.
6 – (Atual n.º 5.)
7 – (Atual n.º 6.)
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8 – (Atual n.º 7.)
Artigo 31.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – (Novo) – Para facilitação, efetivação e maior celeridade na obtenção de dados para fins de arquivo de
interesse público, fins de investigação científica ou histórica ou fins estatísticos, devem ser celebrados protocolos
entre as instituições de investigação científica e os organismos estatais responsáveis pela produção,
preservação e tratamento desses dados, nomeadamente a Direção Geral de Saúde (DGS), os Serviços
Partilhados do Ministério da Saúde, EPE (SPMS) e a Administração Central do Sistema de Saúde, IP.
6 – (Novo) – Para o disposto no número anterior, o Governo regulamenta, num prazo de trinta dias após a
publicação da presente lei em Diário da República, o enquadramento legal desses protocolos e ainda uma lista
das instituições de investigação científica acreditadas para o efeito.
7 – (Atual n.º 5).»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação em Diário da República.
Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Luís Monteiro — Pedro Filipe Soares — Jorge Costa — Mariana
Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso — Isabel Pires —
Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José Moura Soeiro —
Maria Manuel Rola — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Ricardo Vicente — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 967/XIV/3.ª
PROCEDE À PRORROGAÇÃO DO PRAZO DO PROCESSO DE RECONVERSÃO DAS ÁREAS
URBANAS DE GÉNESE ILEGAL E GARANTE MECANISMOS DE TRANSPARÊNCIA NESTE PROCESSO,
ALTERANDO A LEI N.º 91/95, DE 2 DE SETEMBRO
Exposição de motivos
As áreas urbanas de génese ilegal (AUGI) correspondem a aglomerados de construções que surgiram antes
do Decreto-Lei n.º 46 673, de 29 de novembro de 1965, em que a generalidade das construções foi erigida sem
licença, ou posteriormente sem a tenha sido obtida a necessária licença de loteamento.
A manutenção de áreas urbanas de génese ilegal é algo que não cumpre plenamente o direito à habitação
consagrado na Constituição da República Portuguesa e na Lei de Bases da Habitação, aprovada pela Lei n.º
83/2019, de 3 de setembro, pelo que urge tomar medidas para assegurar a sua reconversão. O enquadramento
legal desta reconversão consta da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, que, apesar de ter sido alterado ao longo
dos últimos anos, estabelece o regime excecional para a legalização das AUGI.
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De acordo com a versão atualmente em vigor da Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, o prazo legal para o fim
da reconversão das áreas urbanas de génese ilegal terminou no passado dia 30 de junho de 2021. Tal situação
é especialmente preocupante quando é sabido que este processo está longe de estar concluído visto que, de
acordo com os dados do relatório da Direção-Geral do Território1, em janeiro de 2020, apesar de o universo
potencial de municípios do território continental abrangidos por este processo de reconversão ser de 278
municípios, apenas 14 municípios (5%) submeteram os levantamentos das AUGI (que totalizam 453
levantamentos).
Tendo em conta o claro atraso na execução do processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal
(também justificado pelo contexto de crise sanitária que estamos a viver) e tendo em vista a realização plena do
direito à habitação em Portugal, com a presente iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN pretende assegurar a
prorrogação do prazo do processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal previsto na Lei n.º
83/2019, de 3 de setembro, de forma a permitir que as AUGI disponham de comissão de administração
validamente constituída até 31 de dezembro de 2023 e de título de reconversão até 30 de junho de 2026, e que
as câmaras municipais possam delimitar as AUGI até 31 de dezembro de 2023. Em nossa opinião esta
prorrogação assegurará uma maior articulação com o programa 1.º Direito cujo prazo termina em 2024.
Paralelamente procuram-se assegurar duas medidas adicionais. Por um lado, propõe o Grupo Parlamentar
do PAN que se assegure uma maior capacitação e esclarecimento dos municípios quanto ao processo de
reconversão urbanística das áreas urbanas de génese ilegal, por via da previsão da possibilidade dos membros
dos órgãos deliberativos e executivos dos municípios poderem frequentar as ofertas formativas da Direção-Geral
do Território (algo que poderá dar o tão necessário impulso político que tem faltado neste processo), e da criação
de um gabinete de apoio aos processos de reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, que garanta o
esclarecimento de dúvidas relativamente às disposições legais da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro. Por outro
lado, propõe o presente projeto de lei que se crie um mecanismo de transparência neste processo que envolva
a Assembleia da República na monitorização da execução do processo de reconversão, assegurada por via de
um relatório anual da Direção-Geral do Território, que apresente o estado de execução dos processos de
reconversão em curso e, sempre que necessário, de eventuais recomendações e medidas que possam
contribuir para a sua conclusão dentro do prazo previsto.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à prorrogação do prazo do processo de reconversão das áreas urbanas de génese
ilegal e garante mecanismos de transparência neste processo, procedendo para o efeito à sexta alteração à Lei
n.º 91/95, de 2 de setembro, que cria o processo de reconversão das áreas urbanas de génese ilegal, alterada
pelas leis n.os 165/99, de 14 de setembro, 64/2003, de 23 de agosto, 10/2008, de 20 de fevereiro, 79/2013, de
26 de novembro, e 70/2015, de 16 de julho.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro
São alterados os artigos 56.º-A, 56.º-B e 57.º da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, na sua redação atual, que
passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 56.º-A
[…]
1 – […].
2 – Os municípios devem elaborar o levantamento das AUGI nos termos e condições publicitados pela
Direção-Geral do Território, no seu sítio da Internet, até 31 de janeiro de 2022, e devem comunicar esses
1 Direção-Geral do Território (2020), Relatório dos processos de reconversão das AUGI com o diagnóstico, página 8.
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levantamentos às entidades referidas no número anterior, no prazo de um ano a contar dessa publicitação.
3 – A Direção-Geral do Território publicita, ainda, no seu sítio da Internet, no prazo de 90 dias após o termo
do prazo para a comunicação dos levantamentos pelos municípios, um relatório com o diagnóstico dos
processos de reconversão das AUGI e define eventuais medidas que devam ser adotadas para a sua conclusão
e, sempre que possível, o cronograma para a sua execução.
Artigo 56.º-B
[…]
1 – A Direção-Geral do Território, em articulação com a Direção-Geral das Autarquias Locais, as comissões
de coordenação e desenvolvimento regional e a Associação Nacional de Municípios Portugueses, promove um
plano de formação, de frequência facultativa, para os membros dos órgãos deliberativos e executivos dos
municípios e para os trabalhadores em funções públicas da administração central do Estado e das autarquias
locais, com vista a garantir a aplicação uniforme das disposições legais atinentes à reconversão urbanística de
áreas de génese ilegal.
2 – O plano de formação referido no número anterior visa capacitar a intervenção nos processos de
reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, e, bem assim, promover a disseminação de boas práticas
para a resolução célere destes processos.
Artigo 57.º
[…]
1 – Para efeitos de aplicação da presente lei, devem as AUGI dispor de comissão de administração
validamente constituída até 31 de dezembro de 2023 e de título de reconversão até 30 de junho de 2026.
2 – A câmara municipal pode delimitar as AUGI, fixando como respetiva modalidade de reconversão a
iniciativa municipal sem o apoio da administração conjunta até 31 de dezembro de 2023.
3 – […].»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 91/95, de 2 de setembro
São aditados os artigos 57.º-C e 57.º-D da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, na sua redação atual, que passa
a ter a seguinte redação:
«Artigo 57.º-B
Gabinete de apoio técnico
A Direção-Geral do Território, em articulação com a Direção-Geral das Autarquias Locais e as comissões de
coordenação e desenvolvimento regional, procede à criação de um gabinete de apoio aos processos de
reconversão urbanística de áreas de génese ilegal, que garanta o esclarecimento de dúvidas relativamente às
disposições legais do presente diploma.
Artigo 57.º-C
Monitorização dos processos de reconversão das AUGI
A Direção-Geral do Território apresenta anualmente à Assembleia da República, até ao dia 30 de março, o
relatório de monitorização dos processos de reconversão das AUGI, que preveja o estado de execução do
processo e, sempre que necessário, eventuais recomendações e medidas que possam contribuir para a sua
conclusão dentro do prazo previsto.»
Artigo 4.º
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Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e o deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 968/XIV/3.ª
ALARGA OS PRAZOS DE PRESCRIÇÃO DE CRIMES CONTRA A LIBERDADE E
AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL DE MENORES E DO CRIME DE MUTILAÇÃO GENITAL FEMININA,
PROCEDENDO À QUINQUAGÉSIMA QUARTA ALTERAÇÃO DO CÓDIGO PENAL
Exposição de motivos
A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (Convention on the Rights of the Child1), de
20 de novembro de 1989, determina, no seu artigo 19, que os Estados-Membros devem aprovar as medidas
legislativas, administrativas, sociais e educativas necessárias a proteger a criança contra todas as formas de
violência física e mental, agressões ou abuso, negligência, maus tratos ou exploração, incluindo abuso sexual,
enquanto se mantenha ao cuidado de progenitores, tutores ou outras pessoas que tenham a criança a seu cargo,
cabendo, de acordo com o artigo 34 desta Convenção, aos Estados-Membros diligenciar no sentido de proteger
a criança contra todas as formas de exploração e abuso sexuais.
Também a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia dispõe, no n.º 1 do seu artigo 24.º, que as
crianças têm direito à proteção e aos cuidados necessários ao seu bem-estar, sendo sempre aplicável o princípio
da inviolabilidade da dignidade do ser humano.
Foi adotada a Diretiva da UE sobre o Combate ao Abuso Sexual e à Exploração Sexual de Crianças e a
pornografia infantil2, em 2011, referindo que o abuso sexual e a exploração sexual de crianças constituem
violações graves dos direitos fundamentais, em especial do direito das crianças à proteção e aos cuidados
necessários ao seu bem-estar, tal como estabelecido na Convenção das Nações Unidas de 1989 sobre os
Direitos da Criança e na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.
Esta Diretiva refere, no seu ponto 26, que «a investigação dos crimes e a dedução da acusação em processo
penal deverão ser facilitadas, tendo em conta não só as dificuldades que as crianças vítimas destes crimes
enfrentam para denunciar os abusos sexuais (…). Para que a investigação e a ação penal relativas aos crimes
referidos na presente diretiva possam ser bem-sucedidas, a sua promoção não deverá depender, em princípio,
de queixa ou acusação feita pela vítima ou pelo seu representante. Os prazos de prescrição da ação penal
deverão ser fixados de acordo com a legislação nacional».
É na sequência da obrigatoriedade acima descrita que o PAN trouxe este tema ao debate no início do
presente ano, com a apresentação do Projeto de Lei n.º 771/XIV/2.ª, e que, pela sua enorme importância, ora
reforça, na medida em que ainda não se deu cabal cumprimento à pretensão da Diretiva.
O constrangimento causado por este tipo de crimes na vítima, ao qual acresce a especial dificuldade em
integrar o sucedido, o receio de ter de voltar a enfrentar o agressor, a exposição pública da sua intimidade
perante as autoridades públicas e policiais e o receio da lógica de revitimização associada ao processo levam a
que, nestes casos, a/o ofendida/o acabe por preferir o silêncio e a impunibilidade da/o agressor/a à denúncia do
1 OHCHR – Convention on the Rights of the Child 2 Diretiva 2011/93/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 13 de dezembro de 2011 relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração
sexual de crianças e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro 2004/68/JAI do Conselho.
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crime e impulso do processo penal.
Comprovativo desta realidade são os dados apresentados pela Associação Quebrar o Silêncio que nos refere
que os homens que em crianças ou jovens foram vítimas deste tipo de abuso apenas denunciam o crime e
procuram ajuda, no mínimo, 20 anos após o abuso, encontrando-se a maioria dos homens na casa dos 35-40
anos.
No atual quadro legal, muito embora a prescrição nunca ocorra antes de a vítima perfazer 23 anos, estes
crimes estão prescritos, em alguns casos, há décadas.
Acresce ainda o facto de a esta idade e dependendo da relação que a vítima tenha com o/a agressor/a,
por exemplo, sendo o/a agressor/a progenitor/a da vítima, poderá esta ainda ser dependente do/a primeiro/a.
Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e o processo penal que lhe está
associado são extremamente traumáticos para a vítima do ponto de vista físico e psicológico. Atendendo a
isto, no âmbito Projeto CARE – Rede de apoio especializado a crianças e jovens vítimas de violência sexual3,
assinalou-se que o tempo que passa entre a perpetração do crime e a sua revelação pode variar em função
do impacto que o crime teve na criança ou jovem, sendo que em 63,6% dos casos a revelação destes crimes
acontece um ano ou mais depois de o abuso ter acontecido, situação que pode acontecer por diversas
razões, entre as quais se encontra, por exemplo, a relação da vítima com o/a agressor/a, a não perceção
dos factos como crime, a autoculpabilização, a falta ou insuficiência de provas, ou o síndrome da
acomodação da criança vítima de abuso sexual.
A última alteração estrutural às regras de prescrição destes crimes ocorreu em 2007, sendo que volvidos
14 anos é mais do que urgente que se assegure um quadro legal capaz de proteger estas vítimas. É premente
que se assegure que a vítima se sente preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e
para lidar com todos os aspetos relacionados com o seguimento do procedimento criminal.
O PAN propõe a alteração dos prazos de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação
sexual de menores e do crime de mutilação genital feminina, de forma a que se passe a assegurar que
quando o/a ofendido/a for menor de 14 anos o procedimento criminal nunca se extinga antes de este/a
perfazer 40 anos, e que quando o/a ofendido/a for maior de 14 anos passe a haver um prazo de prescrição
de 20 anos que nunca poderá, no entanto, ocorrer antes de este/a perfazer 35 anos.
Esta proposta é apresentada com vista a colmatar o injustificado atraso que se verifica face a outros
países da União Europeia.
Em Espanha, quando a vítima é menor de 18 anos, o referido prazo prescricional só iniciará a sua
contagem a partir do momento em que a vítima perfaz 35 anos de idade.
Em França, nos termos do article 7 do Code de procédure pénale, a ação penal prescreve no prazo de
20 anos contado da data da prática do crime. Contudo, no caso de violação ou agressões sexuais contra
menores de 15 anos, o crime prescreve no prazo de 30 anos a contar da maioridade das vítimas (article 7 e
article 706-47 do Code de procédure pénale).
Em Itália, de acordo com o Art. 609-bis do Codice Penale, qualquer pessoa que, através de violência,
ameaças ou abuso de autoridade, forçar alguém a realizar ou a sofrer atos sexuais é punido com pena de
prisão de 6 a 12 anos, acrescendo que, nos termos do Art. 609-ter, a pena de prisão é agravada em um
terço, no caso de a vítima ser menor de 18 anos, sendo aumentada em metade se a vítima for menor de 14
anos e no dobro se a vítima for menor de 10 anos.
É urgente fazer face ao conhecido silêncio das vítimas e aos efeitos traumáticos destes crimes, permitindo,
com a redação que ora se propõe, diferenciar entre a altura da vida da criança em que o crime é praticado,
não esquecendo que esse é um facto com consequências potencialmente distintas, na medida em que se
verificam maiores implicações ao desenvolvimento da criança do ponto de vista físico e psicológico quando
um crime desta natureza é praticado em vítimas com diminuta idade.
Desta forma, é necessário abrir no nosso País o debate sério sobre o alargamento dos prazos de
prescrição destes crimes, como já previsto em outros países, de forma a assegurar que a vítima se sente
preparada, do ponto de vista emocional, para a revelação do crime e para lidar com todos os aspetos
relacionados com o seguimento do procedimento criminal.
Assim, com o presente projeto de lei o PAN pretende alterar o Código Penal de forma a alargar os prazos
3 Projeto CARE (2017), Manual CARE – Apoio a crianças e jovens vítimas de violência sexual, páginas 53 e 54.
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de prescrição de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e do crime de mutilação
genital feminina.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aprova a quinquagésima quarta alteração do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
400/82, de 23 de setembro, alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de maio, pelos Decretos-Leis n.os 101-A/88, de 26
de março, 132/93, de 23 de abril, e 48/95, de 15 de março, pelas Leis n.os 90/97, de 30 de julho, 65/98, de 2 de
setembro, 7/2000, de 27 de maio, 77/2001, de 13 de julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de
agosto, e 108/2001, de 28 de novembro, pelos Decretos-Leis n.os 323/2001, de 17 de dezembro, e 38/2003, de
8 de março, pelas Leis n.os 52/2003, de 22 de agosto, e 100/2003, de 15 de 3 novembro, pelo Decreto-Lei n.º
53/2004, de 18 de março, e pelas Leis n.os 11/2004, de 27 de março, 31/2004, de 22 de julho, 5/2006, de 23 de
fevereiro, 16/2007, de 17 de abril, 59/2007, de 4 de setembro, 61/2008, de 31 de outubro, 32/2010, de 2 de
setembro, 40/2010, de 3 de setembro, 4/2011, de 16 de fevereiro, 56/2011, de 15 de novembro, 19/2013, de 21
de fevereiro, 60/2013, de 23 de agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 6 de agosto, pelas Leis n.os 59/2014,
de 26 de agosto, 69/2014, de 29 de agosto, e 82/2014, de 30 de dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 8
de janeiro, e pelas Leis n.os 30/2015, de 22 de abril, 81/2015, de 3 de agosto, 83/2015, de 5 de agosto, 103/2015,
de 24 de agosto, e 110/2015, de 26 de agosto, 39/2016, de 19 de dezembro, 8/2017, de 3 de março, 30/2017,
de 30 de maio, 94/2017, de 23 de agosto, 16/2018, de 27 de março, 44/2018, de 9 de agosto, 101/2019 e
102/2019, ambas de 6 de setembro, 39/2020, de 18 de agosto, 40/2020, de 18 de agosto, 58/2020, de 31 de
agosto e 57/2021, de 16 de agosto.
Artigo 2.º
Alteração ao Código Penal
É alterado o artigo 118.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, que
passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 118.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, bem como no crime de mutilação
genital feminina sendo a vítima menor, o procedimento criminal:
a) não se extingue, por efeito da prescrição, antes de o ofendido perfazer 40 anos, quando ofendido seja
menor de 14 anos;
b) extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática tiverem decorrido 20 anos, não podendo
tal prescrição ocorrer antes de o ofendido perfazer 35 anos, quando ofendido seja maior de 14 anos.»
Artigo 3.º
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Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 969/XIV/3.ª
CONSAGRA A TERÇA-FEIRA DE CARNAVAL COMO FERIADO NACIONAL OBRIGATÓRIO,
PROCEDENDO À DÉCIMA SÉTIMA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO TRABALHO, APROVADO PELA LEI
N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO
Exposição de motivos
O carnaval é, em Portugal, uma época festiva de grande importância. Com origem no reinado de D. Afonso
III, ainda no Século XIII, a festa portuguesa é diferente daquela que ocorre em outros países que também
assinalam esta data, uma vez que é marcada pela preocupação em preservar ao máximo a identidade cultural
e a tradição associada a estas festividades.
O carnaval é festejado a nível nacional, com particular importância, nomeadamente, para as localidades de
Torres Vedras, Ovar, Estarreja, Mealhada, Madeira, Loulé, Loures e Sesimbra, que todos os anos aplicam largos
milhares de euros em despesas associados a estes festejos. De acordo com a imprensa, em 2013, os 15
principais corsos de carnaval representaram um investimento de 2,1 milhões de euros, menos do que o registado
em 2012 (2,5 milhões de euros), tendo sido o de Ovar o mais dispendioso, no valor de 450 mil euros. Pelo
carácter especialmente tradicional, destacam-se ainda o carnaval de Cabanas de Viriato e de Podence.
A festa e os desfiles do carnaval mexem com vários setores e dinamizam as economias locais. É preciso
construir os carros alegóricos, fazer fatos e acessórios e criar músicas, algo que leva a meses de trabalho das
comunidades. Além disso, os turistas nacionais e estrangeiros que vão assistir aos desfiles e participar nas
comemorações também geram receitas, através de estadias em hotéis ou pousadas, aquisição de bens no
comércio local e consumo de produtos na área da restauração.
A título de exemplo, de acordo com um estudo realizado pela Escola Superior de Turismo e Tecnologia do
Mar de Peniche, tendo por base uma estimativa de cerca de 350 mil visitantes, o carnaval de Torres Vedras
gera um retorno na ordem dos 9 milhões de euros para a economia local, durante os cinco dias e quatro noites
do evento. Este retorno de investimento só é possível se existirem visitantes que, ainda que possam ser locais,
regra geral são turistas, oriundos de vários pontos do País. Ora este potencial de dinamização económica nem
sempre é totalmente conseguido pelo facto de a terça-feira de carnaval não ser considerada como um feriado
obrigatório, mas apenas facultativo.
Apesar disso, salvo neste ano que ficou marcado pelas contingências da crise sanitária, tradicionalmente o
Governo, mediante despacho, tem concedido tolerância de ponto na terça-feira de carnaval aos trabalhadores
que exercem funções públicas nos serviços da administração direta do Estado, sejam eles centrais ou
desconcentrados, e nos institutos públicos, exatamente por considerar que existe em Portugal «uma tradição
consolidada de organização de festas neste período».
Mais, a não concessão de tolerância de ponto pelo XIX Governo Constitucional, de PSD/CDS-PP, foi uma
medida bastante contestada especialmente pelos municípios com maior tradição carnavalesca, que
argumentaram que a decisão iria penalizar as receitas com os festejos daquela altura do ano. Por este motivo,
a grande maioria dos municípios por sua iniciativa concederam, naqueles anos, tolerância de ponto aos seus
funcionários. A título de exemplo, em 2013, quase 200 autarquias concederam tolerância de ponto, existindo um
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aumento do número de municípios a conceder este benefício de 2014 para 2015.
Acresce ainda referir que embora para o setor privado este feriado seja facultativo, uma parte significativa
das empresas adicionam a terça-feira de carnaval à lista de feriados obrigatórios, por via de instrumentos de
regulamentação coletiva, como contratos coletivos e acordos de empresa.
O calendário escolar encontra-se também organizado no pressuposto que a terça-feira de carnaval é
considerada feriado, tanto que está previsto um período de férias para esta época. Por esse motivo, muitas
famílias aproveitam esta data para agendarem férias juntos, facto de grande importância tendo em consideração
que tal é árduo ao longo do ano pela difícil conciliação entre o calendário escolar e os períodos de férias dos
pais. Na sociedade moderna, os pais veem-se submetidos a um ritmo alucinante, trabalhando todo o dia, com
exigências profissionais cada vez maiores, deixando pouco tempo e disponibilidade para estarem com os filhos.
Por este motivo, numa época em que as famílias estão cada vez mais distanciadas, é preciso incentivar e criar
condições efetivas que permitam o aumento do número de períodos de lazer em família, sendo a época de
carnaval um ótimo período para tal.
De acordo com o Relatório da Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE),
publicado em 7 de julho 2016, tendo como base o Inquérito Europeu às Forças do Trabalho, Portugal ocupa a
décima posição, numa lista composta por 38 países, com a maior carga horária laboral. Os trabalhadores
portugueses trabalham 1868 horas por ano, mais 102 horas que a média dos países da OCDE. Contudo, são
vários os estudos que indicam que à medida que aumentamos o número de horas de trabalho a produtividade
diminui, estando inclusive associado ao aumento de produtividade a existência de maiores períodos de
descanso e lazer, pelo que é preciso promover o aumento destes períodos, nomeadamente pelo aumento do
número de dias de férias e feriados.
Em conclusão, pelos motivos anteriormente enunciados, nomeadamente a necessidade de medidas que
garantam aos trabalhadores mais tempo para lazer, a premência de pôr fim a uma discriminação que se tem
verificado quanto aos trabalhadores do setor privado face aos do setor público e por forma a assegurar a
verificação nas economias locais dos impactos positivos associados a estas festividades, com a presente
iniciativa o Grupo Parlamentar do PAN pretende consagrar no Código do Trabalho a terça-feira de carnaval
como feriado obrigatório.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e o
Deputado do PAN abaixo assinados apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei consagra a terça-feira de carnaval como feriado nacional obrigatório, procedendo para o efeito
à décima sétima alteração ao Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, e alterado
pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de
29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de
abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,
14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
Os artigos 234.º e 235.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, na sua
atual redação, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 234.º
[…]
1 – São feriados obrigatórios os dias 1 de janeiro, de terça-feira de carnaval, de Sexta-Feira Santa, de
Domingo de Páscoa, 25 de abril, 1 de maio, de Corpo de Deus, 10 de junho, 15 de agosto, 5 de outubro, 1 de
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novembro, 1, 8 e 25 de dezembro.
2 – […].
3 – […].
Artigo 235.º
[…]
1 – Além dos feriados obrigatórios, pode ser observado a título de feriado, mediante instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho ou contrato de trabalho, o feriado municipal da localidade.
2 – Em substituição do feriado municipal da localidade, pode ser observado outro dia em que acordem
empregador e trabalhador.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e o Deputado do PAN: Bebiana Cunha — Inês de Sousa Real — Nelson Silva.
———
PROJETO DE LEI N.º 970/XIV/3.ª
DETERMINA A PROIBIÇÃO DAS CORRIDAS DE CÃES COM FINS COMPETITIVOS
Exposição de motivos
A Declaração Universal dos Direitos dos Animais, redigida pela Liga Internacional dos Direitos do Animal, foi
proclamada em 15 de outubro de 1978 no seio da UNESCO. Trata-se de um documento que, embora com um
cariz não vinculativo, tem a importância de conter normas gerais de proteção do bem-estar animal, assentes
numa relação de coexistência harmónica entre os seres humanos e os animais e reconhece direitos aos animais,
nomeadamente o direito à vida e à alimentação, assim como a sua proteção de situações de maus-tratos e
tratamentos cruéis. Veja-se o artigo 1.º da Declaração que dispõe que «Todos os animais nascem iguais perante
a vida e têm os mesmos direitos à existência».
Apesar da antiguidade da referida Declaração sabemos que ainda há muito a fazer nesta matéria. É
importante destacar que o legislador tem percorrido um caminho importante no reforço das medidas de proteção
dos animais de companhia. Para além da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que marca a aprovação da designada
primeira lei de proteção de animais, em 2014, com a aprovação da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, que altera
o Código Penal, o legislador criminalizou os maus-tratos a animais de companhia, alteração que reuniu um
consenso parlamentar alargado.
Mais tarde, com a alteração operada pela Lei n.º 8/2017, de 3 de março, foi aditado o artigo 201.º-B ao Código
Civil, com a epígrafe «animais» que prevê que «Os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto
de proteção jurídica em virtude da sua natureza.» Prevendo-se, ainda, no artigo 493.º-A do Código Civil, o direito
do detentor do animal de companhia a ser indemnizado em caso de lesão ou morte. Esta alteração veio pôr na
lei algo que já reunia um consenso na nossa sociedade e em vários países, ou seja, o reconhecimento de que
os animais são seres vivos sensíveis e a necessidade de prever medidas específicas de proteção destes contra
maus-tratos infligidos pelos seus detentores ou por terceiros.
Para além disso, era evidente que o Código Civil, ao não prever um tratamento autónomo dos animais não
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humanos, estava desatualizado face às alterações ocorridas em 2014 no âmbito jurídico-penal.
Todas estas alterações vão ao encontro do reconhecido na Declaração de Cambridge sobre a consciência
animal, proclamada em 2012 por um proeminente grupo internacional de especialistas das áreas de
neurociência cognitiva, neurofarmacologia, neurofisiologia, neuroanatomia e neurociência computacional, que
conclui que: «A ausência de um neocórtex não parece impedir que um organismo experimente estados afetivos.
Evidências convergentes indicam que animais não humanos têm os substratos neuroanatômicos, neuroquímicos
e neurofisiológicos dos estados de consciência juntamente com a capacidade de exibir comportamentos
intencionais. Consequentemente, o peso das evidências indica que os humanos não são os únicos a possuir os
substratos neurológicos que geram a consciência. Animais não humanos, incluindo todos os mamíferos e aves,
e muitas outras criaturas, incluindo os polvos, também possuem esses substratos neurológicos.»
Pelo que em 2017 se deu o importantíssimo passo de reconhecer legalmente que os animais se distinguem
das coisas, sendo sim, seres sensíveis e, por isso, suscetíveis de proteção. Note-se que o artigo do Código Civil
não faz qualquer distinção sobre se se refere meramente a animais de companhia, portanto, o seu âmbito
extravasa essa classificação.
Face a estas alterações legislativas importa agora completar o nosso ordenamento jurídico, passando a
prever situações específicas que não estavam antes previstas, harmonizando-as com este novo estatuto.
Carla Amado Gomes em «Desporto e Proteção de Animais por um Pacto de Não Agressão»1, faz uma análise
da legislação portuguesa aplicável aos animais, onde acaba por concluir, no que diz respeito à relação entre a
proteção dos animais e o desporto, que a Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, é ambígua. A autora refere que, por
exemplo, no seu artigo 1.º, é possível extrair um entendimento de que as práticas desportivas (com ou sem
componente de espetáculo) que impliquem sofrimento gratuito para os animais – leia-se: sofrimento que não
seja justificado por uma finalidade alimentícia ou científica humana, são já proibidas. No entanto, refere decisões
judiciais cuja interpretação demonstra que o julgador decidiu de forma diferente, deixando evidente a
necessidade de clarificação. A referida autora defende que a interpretação da Lei n.º 92/95 deve ser mais
consentânea com o contexto normativo global e com o sentimento de uma comunidade cada vez mais motivada
para uma reavaliação da relação entre o homem e os restantes componentes do ecossistema. Interpretação
com a qual concordamos, no entanto, havendo dúvida, cabe ao legislador clarificar e, é isso que se pretende
com o presente projeto.
Para chegar àquela conclusão, Carla Amado Gomes refere que «(…) um desporto que implique uma
utilização gratuita de um ser vivo, não sobrevive ao teste da necessidade, lido à luz do 'respeito pelos valores
do ambiente'. As tradições formam-se, perdem-se, recuperam-se, banem-se, como fenómenos
culturais/temporais que são. Os desportos/espetáculos, ainda que tradicionais, devem ser revistos de acordo
com as alterações de conceções sociais dominantes: não é despiciendo que atualmente não haja lutas de
gladiadores ou que as lutas de cães sejam proibidas (cfr. o Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de outubro). Os
animais são companheiros do homem na aventura da vida e como tal e na sua condição de seres sensíveis,
devem ser resguardados de práticas que, desnecessariamente, lesem a sua integridade.»
Veja-se o exemplo, precisamente, da corrida de galgos. Podendo ser considerado uma um desporto (tradição
não é certamente), não cumpre os requisitos elencados por Carla Amado Gomes.
Tal como os subscritores da Iniciativa Legislativa de Cidadãos, que visa a «proibição da corrida de cães em
Portugal», referem, «Múltiplos estudos científicos, desenvolvidos, designadamente, pela American Society for
the Prevention of Cruelty to Animals (ASPCA), pela People for the Ethical Treatment of Animals (PETA), pela
Royal Society for the Prevention of Cruelty to Animals (RSPCA), pela Animals Australia, entre outras
organizações com atuação mundial, assim como investigadores na área do bem-estar animal, alertam para os
riscos que advêm da utilização de cães em corridas, tais como: excesso de criação de animais, podendo resultar
em abandono; instalações inadequadas para manutenção dos animais; ausência de enriquecimento ambiental
e falta de socialização com outros animais e humanos, resultando e, podendo resultar em problemas
comportamentais graves como compulsões, comportamentos repetitivos, apatia, latidos em excesso, ansiedade
de separação, entre outros; utilização de métodos de treino com recurso à força, ao excesso e à violência,
promovendo maus-tratos e esforço físico excessivo, muitas vezes resultando na morte do animal; altos índices
de taxas de mortalidade, baixos índices de esperança média de vida; utilização de isco vivo (recorrentemente
lebres), que resulta em mortes agónicas dos mesmos e em ferimentos nos cães; administração de substâncias
1 https://www.icjp.pt/sites/default/files/papers/cej-animais_revisto.pdf
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proibidas ou não registadas, promovendo o tráfico de estupefacientes; ferimentos e fraturas resultantes das
diversas práticas existentes antes e durante as corridas; tratamentos e atos médicos efetuados por indivíduos
sem formação médico-veterinária e cédula profissional, pondo em risco a vida do animal e em causa a ética e
deontologia profissional; importação e exportação de animais sem assegurar os requisitos de certificação
veterinária para o bem-estar e a sanidade animal, podendo colocar em risco a saúde pública através da
transmissão de zoonoses: raiva, leptospirose, dermatofitose, sarna sarcótica, borreliose, erliquiose, bordetella
bronchiseptica, vírus da parainfluenza canina, herpes vírus, parasitoses gastrointestinais, entre outras; apontam
ainda altos índices de taxas de mortalidade nestes animais e baixos índices de esperança média de vida.»
O presente projeto não visa impedir os cães de correrem livremente, em local apropriado, mas tão somente
aquelas corridas organizadas com fim competitivo, para as quais os animais têm um treino específico, que
envolvem um isco e que sabemos que colocam em causa o bem-estar dos animais envolvidos.
Face ao exposto, cremos que não é aceitável que o ordenamento jurídico português, que reconhece a
senciência dos animais; que prevê normas específicas de proteção destes, regulando, inclusive, o direito de
propriedade e obrigando o detentor a assegurar o bem-estar do animal; que criminaliza os maus-tratos contra
animais e que reconhece a dor associada à perda destes, permita que os animais sejam usados para práticas
que impliquem o seu sofrimento, como é o caso da corrida de cães.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues
apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina a proibição de corridas de cães com fins competitivos.
Artigo 2.º
Definição
«Corridas de Cães», para efeitos do presente diploma entende-se por «corridas de cães» todos os eventos
que envolvam a instigação à corrida, por via de isco vivo ou morto (recorrentemente lebres), ou mesmo sem
isco, de animais da família Canidae em pistas, amadoras ou profissionais, instalações, terrenos ou outros tipos
de espaço, públicos ou privados, com fins competitivos.
Artigo 3.º
Corridas de cães
1 – Quem promover, divulgar, vender ingressos, fornecer instalações, prestar auxílio material ou qualquer
outro serviço inerente à sua realização, treinar ou participar com cães em corridas é punido com pena de prisão
até 2 anos ou com pena de multa de multa até 200 dias.
2 – A tentativa é punível.
Artigo 4.º
Contraordenações
Constitui contraordenação punível, pelo Presidente do ICNF, com coima cujo montante mínimo é de (euro)
500 e máximo de (euro) 3740 ou (euro) quem assistir a corridas de cães.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 1 de outubro de 2021.
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A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
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PROJETO DE LEI N.º 971/XIV/3.ª
ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO E A LEI GERAL DO TRABALHO EM FUNÇÕES PÚBLICAS,
RECONHECENDO O DIREITO A 25 DIAS ÚTEIS DE FÉRIAS
Exposição de motivos
O direito a férias é um direito constitucionalmente protegido, previsto no artigo 59.º, n.º 1, alínea d), da
Constituição da República Portuguesa, que determina que «Todos os trabalhadores, sem distinção de idade,
sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito ao repouso
e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas».
Este direito está, igualmente, previsto nos artigos 238.º do Código do Trabalho e 126.º da Lei Geral do
Trabalho em Funções Públicas, que preveem que o período anual de férias tem a duração de 22 dias úteis.
Veja-se que o artigo 238.º, na redação inicial, previa que o trabalhador tinha direito a 22 dias úteis de férias,
os quais seriam aumentados no caso de o trabalhador não ter faltado ou ter apenas faltas justificadas no ano a
que as férias se reportam, nos seguintes termos: Três dias de férias, até uma falta ou dois meios dias; dois dias
de férias, até duas faltas ou quatro meios dias e um dia de férias, até três faltas ou seis meios dias. Esta
majoração foi revogada pela Lei n.º 23/2012, de 25 de junho, mantendo-se apenas os 22 dias úteis de férias.
Ora, as férias visam proporcionar ao trabalhador a sua recuperação física e psíquica, permitindo uma maior
disponibilidade pessoal e incentivando a integração na vida familiar, bem como uma maior participação social e
cultural. Ajudam a diminuir o stress, aumentam os níveis de energia e permitem que o trabalhador possa
participar em atividades sociais, culturais e desportivas, algo que é difícil atendendo às longas jornadas de
trabalho.
Importa ter em conta que em Portugal o número de horas de trabalho registadas é superior ao da maioria
dos países da União Europeia.
A título de exemplo, de acordo com o relatório Working time in 2017-2018, do Eurofound1, Portugal está entre
os países com maior número de horas efetivamente trabalhadas, tendo-se registado uma média de 40,8 horas
em 2018, enquanto que a média da União Europeia se situava nas 40,2 horas.
Igualmente, segundo dados do Eurostat de 20192, Portugal está no topo dos países da União Europeia onde
se registam mais horas de trabalho semanais. Em 2018, a semana habitual de trabalho em Portugal foi de 39,5
horas, muito acima da média da União Europeia que se situava nas 37,1 horas e da dos países da Zona Euro
que se situava nas 36,5 horas.
Ora, as longas jornadas constituem um entrave à conciliação da vida pessoal e familiar com a vida
profissional. A isto acresce o facto de, frequentemente, os empregadores contactarem os trabalhadores fora do
horário de trabalho, interrompendo os seus períodos de descanso, o que torna esta conciliação ainda mais difícil.
Ao não conseguir fazer esta conciliação de forma equilibrada, o trabalhador acaba por descurar a sua vida
pessoal, pois sente que precisa de estar permanentemente disponível num mercado de trabalho altamente
competitivo. Em consequência, os tempos de lazer são cada vez menos e com melhor qualidade.
Esta situação tem reflexos na sua vida profissional, nomeadamente ao nível do absentismo e produtividade,
o que cria problemas às organizações laborais, quer pela sobrecarga dos colegas de trabalho presentes quer
pela potencial perda de clientes. Por isso, é fundamental garantir a existência de períodos de descanso e lazer
para aumentar o nível de satisfação dos trabalhadores, permitindo que estes sejam mais produtivos e exerçam
a sua atividade com maior segurança.
Importa, ainda, mencionar que ao nível da União Europeia, todos os Estados-Membros preveem um período
1 https://www.eurofound.europa.eu/publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 2 https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugal-no-topo-da-europa-em-horas-de-trabalho-510643#lg=1&slide=0.
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mínimo legal de férias anuais remuneradas que varia entre 20 e 25 dias. A Dinamarca, França, Luxemburgo,
Áustria e Suécia têm um mínimo de 25 dias e em Malta o período de férias corresponde a 24 dias3.
Ora, atendendo a que, conforme demonstrado pelos dados acima indicados do Eurostat e Eurofound, em
Portugal o número de horas efetivamente trabalhadas é superior ao da média dos países da União Europeia,
consideramos fundamental que sejam reforçados os períodos de descanso e lazer dos trabalhadores, medida
essencial para melhorar a conciliação da vida pessoal e familiar com a vida profissional.
Face ao exposto, com o presente projeto de lei, alteramos o Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º
7/2009, de 12 de fevereiro, e a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de
20 de junho, consagrando o direito a 25 dias úteis de férias.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues
apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
na sua redação atual e da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de
junho, na sua redação atual, consagrando o direito a 25 dias úteis de férias.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
É alterado o artigo 238.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado
pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de
29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de
abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,
14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, o
qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 238.º
[…]
1 – O período anual de férias tem a duração mínima de 25 dias úteis.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].»
Artigo 3.º
Alteração à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas
É alterado o artigo 126.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de
20 de junho, alterada pelas Leis n.os 82-B/2014, de 31 de dezembro, 84/2015, de 7 de agosto, 18/2016, de 20
de junho, 42/2016, de 28 de dezembro, 25/2017, de 30 de maio, 70/2017, de 14 de agosto, 73/2017, de 16 de
agosto, 49/2018, de 14 de agosto, 71/2018, de 31 de dezembro, 6/2019, de 14 de janeiro, 79/2019, de 2 de
setembro, 82/2019, de 2 de setembro, e 2/2020, de 31 de março, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 126.º
[…]
3 Cfr. Working time developments in the 21st century: Work duration and its regulation in the EU, do Eurofound
(https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef1573en.pdf) e Working time in 2017–2018, do Eurofound (https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef19030en.pdf).
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1 – […].
2 – O período anual de férias tem a duração de 25 dias úteis.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no prazo de 60 dias a contar da sua aprovação.
Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.
A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.
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PROJETO DE LEI N.º 972/XIV/3.ª
ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO, ESTABELECENDO AS 35 HORAS SEMANAIS COMO LIMITE
MÁXIMO DO PERÍODO NORMAL DE TRABALHO
Exposição de motivos
Em Portugal, nos termos do artigo 203.º do Código do Trabalho, o período normal de trabalho não pode
exceder 8 horas por dia e 40 horas por semana.
Ao nível da União Europeia, a generalidade dos países estabelece como período máximo semanal de
trabalho as 40 horas, com exceção da Bélgica com 38 horas e da França com 35 horas1.
No entanto, na prática, aquilo que se verifica é que o número de horas efetivamente trabalhadas é muito
maior em Portugal do que na maioria dos países da União Europeia.
A título de exemplo, de acordo com o relatório Working time in 2017-2018, do Eurofound2,Portugal está entre
os países com maior número de horas efetivamente trabalhadas, tendo-se registado uma média de 40,8 horas
em 2018, enquanto que a média da União Europeia se situava nas 40,2 horas.
Igualmente, segundo dados do Eurostat de 20193, Portugal está no topo dos países da União Europeia onde
se registam mais horas de trabalho semanais. Em 2018, a semana habitual de trabalho em Portugal foi de 39,5
horas, muito acima da média da União Europeia que se situava nas 37,1 horas e da dos países da Zona Euro
que se situava nas 36,5 horas.
Ainda, importa ter em conta que, no que diz respeito ao número médio de horas de trabalho semanais na
União Europeia, Portugal registou um aumento de 1,5 horas no período compreendido entre 2002 e 2014,
passando de 40,2 para 41,7 horas, como revela o relatório Working time developments in the 21st century: Work
duration and its regulation in the EU, do Eurofound4.
Assim, ainda que o limite máximo do período normal de trabalho seja idêntico ao dos restantes países
europeus, os dados demonstram que os portugueses trabalham mais horas, o que é consequência,
nomeadamente, do trabalho suplementar e dos mecanismos de desregulamentação do horário de trabalho
1 CfrWorking time in 2017–2018, publicado em 2019 pelo Eurofound, que pode ser consultado em https://www.eurofound.europa.eu/
publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 2 https://www.eurofound.europa.eu/publications/report/2019/working-time-in-2017-2018. 3 https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/portugal-no-topo-da-europa-em-horas-de-trabalho-510643#lg=1&slide=0. 4 https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef1573en.pdf.
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II SÉRIE-A — NÚMERO 10
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previstos na legislação laboral.
Apesar dos portugueses serem dos que mais horas trabalham, são, no entanto, dos que menos recebem,
sendo o salário mínimo nacional em Portugal inferior ao da generalidade dos países da Europa. Veja-se o caso
de Espanha com 1108 €; da Eslovénia com 1110 €; da França com 1555 €; da Alemanha com 1610 €; da Bélgica
com 1626 €; da Holanda com 1685 €; da Irlanda com 1724 €; do Reino Unido com 1903 € e o do Luxemburgo
com 2202 €, conforme resulta do relatório Minimum wages in 2021: Annual review, do Eurofound5.
Para além disto, apesar dos portugueses trabalharem mais horas do que na generalidade dos países da
Europa, tal não conduz necessariamente a uma maior produtividade, como demonstram os estudos já
realizados.
Eva Pereira e Guida Nogueira, no estudo Produtividade do trabalho em Portugal – Análise comparada ao
nível da empresa6, destacam que «Durante o período recente de recuperação económica, que se verificou
depois da crise de 2008, Portugal continuou a apresentar níveis de crescimento da produtividade do trabalho
comparativamente inferiores à generalidade dos países da União Europeia (UE). Como resultado, em 2017,
a produtividade do trabalho em Portugal correspondia a 76,6% da média da UE e 71,9% da Área Euro (a 4.ª
mais baixa deste grupo)».
De acordo com dados da Pordata, Portugal é o 8.º País da União Europeia com menor produtividade por
hora de trabalho7.
Ou seja, fazendo a ligação entre os níveis de produtividade e o número de horas trabalhadas,
nomeadamente os dados do Eurostat acima mencionados que revelam que Portugal tem uma carga horária
(39,5 horas por semana) acima da média da UE (37,1), conclui-se que os países da União Europeia que têm
maiores índices de produtividade são os que têm cargas horárias menos pesadas, o que demonstra que não
se consegue maior produtividade com mais horas de trabalho.
Pelo contrário, é fundamental garantir que o trabalhador goza do seu direito ao repouso e lazer, direito
constitucionalmente protegido e previsto igualmente no Código do Trabalho, para recuperação do seu
desgaste físico e psicológico, bem como para usufruir de atividades extralaborais, com família ou amigos.
Por isso, garantir a existência destes períodos é essencial para aumentar o nível de satisfação dos
trabalhadores, permitindo que estes sejam mais produtivos e exerçam a sua atividade com maior segurança.
Neste sentido, consideramos fundamental reduzir o horário de trabalho no sector privado para o limite
máximo das 35 horas semanais, à semelhança do que já foi feito para o sector público.
A Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, prevê no
seu artigo 105.º que o período normal de trabalho é de 7 horas por dia e 35 horas por semana, enquanto que
no sector privado o limite máximo são 8 horas por dia e 40 horas por semana.
Em consequência, se compararmos os diferentes períodos normais de trabalho existentes em Portugal
com o que se passa nos restantes países europeus, verificamos que, de acordo com dados do Eurofound,
Portugal é o que surge com maior diferença na comparação do horário normal do público e do privado, com
35 horas semanais no público e 39,4 horas no privado, não contabilizando estes dados o trabalho
suplementar8.
Face ao exposto, por considerarmos que não se justifica esta diferenciação entre o sector público e
privado e por entendermos que é fundamental reforçar os períodos de descanso e lazer dos trabalhadores,
propomos uma alteração ao Código do Trabalho, estabelecendo as 7 horas diárias e as 35 horas semanais
de trabalho como limite máximo do período normal de trabalho.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues
apresenta o seguinte projeto de lei:
5 https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef21015en.pdf. 6https://conselhoprodutividade.files.wordpress.com/2020/12/numero-11-produtividade-do-trabalho-em-portugal-analise-comparada-ao-nivel-da-empresa.pdf. 7 https://www.pordata.pt/Retratos/2020/Retrato+de+Portugal+na+Europa-87. 8 Cfr. Working time in 2017–2018, publicado em 2019 pelo Eurofound, que pode ser consultado em https://www.eurofound.europa.eu/ publications/report/2019/working-time-in-2017-2018.
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
na sua redação atual, estabelecendo as 35 horas semanais de trabalho como limite máximo do período normal
de trabalho.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
São alterados os artigos 73.º, 203.º, 210.º, 211.º e 224.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro, alterado pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012,
de 25 de junho, 47/2012, de 29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de
agosto, 28/2015, de 14 de abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto,
73/2017, de 16 de agosto, 14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e
18/2021, de 8 de abril, os quais passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 73.º
[…]
1 – O período normal de trabalho de menor não pode ser superior a sete horas em cada dia e a trinta e
cinco horas em cada semana.
2 – […].
3 – No caso de trabalhos leves efetuados por menor com idade inferior a 16 anos, o período normal de
trabalho não pode ser superior a seis horas em cada dia e trinta horas em cada semana.
4 – […].
Artigo 203.º
[…]
1 – O período normal de trabalho não pode exceder as sete horas por dia e as trinta e cinco horas por
semana.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
Artigo 210.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […].
2 – Sempre que a entidade referida na alínea a) do número anterior prossiga atividade industrial, o período
normal de trabalho não deve ultrapassar trinta e cinco horas por semana, na média do período de referência
aplicável.
Artigo 211.º
[…]
1 – Sem prejuízo do disposto nos artigos 203.º a 210.º, a duração média do trabalho semanal, incluindo
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II SÉRIE-A — NÚMERO 10
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trabalho suplementar, não pode ser superior a quarenta e duas horas, num período de referência
estabelecido em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que não ultrapasse 12 meses ou, na
falta deste, num período de referência de quatro meses, ou de seis meses nos casos previstos no n.º 2 do
artigo 207.º
2 – […].
3 – […].
4 – […].
Artigo 224.º
[…]
1 – […].
2 – O período normal de trabalho diário de trabalhador noturno, quando vigora regime de adaptabilidade,
não deve ser superior a sete horas diárias, em média semanal, sem prejuízo do disposto em instrumento de
regulamentação coletiva de trabalho.
3 – […].
4 – O trabalhador noturno não deve prestar mais de sete horas de trabalho num período de vinte e quatro
horas em que efetua trabalho noturno, em qualquer das seguintes atividades, que implicam riscos especiais
ou tensão física ou mental significativa:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […].
5 – […].
6 – […]:
a) […];
b) […].
7 – […].»
Artigo 3.º
Garantia de direitos
Da redução do tempo de trabalho prevista neste diploma não pode resultar a redução do nível
remuneratório ou qualquer alteração desfavorável das condições de trabalho.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
1 – A presente lei entra em vigor no prazo de 60 dias a contar da sua aprovação.
2 – As entidades empregadoras dispõem do período transitório de seis meses para criarem as condições
necessárias para garantir o cumprimento do disposto no presente diploma.
Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.
A Deputada não inscrita, Cristina Rodrigues.
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PROJETO DE LEI N.º 973/XIV/3.ª
ALTERA O CÓDIGO DO TRABALHO, DETERMINANDO A OBRIGATORIEDADE DE INCLUSÃO NOS
ANÚNCIOS DE EMPREGO DE ASPETOS RELEVANTES DA PRESTAÇÃO DE TRABALHO
Exposição de motivos
Com o fomento das novas tecnologias, a internet passou a ser o mecanismo principal de divulgação de
anúncios de emprego pelas entidades empregadoras, existindo inclusive sites específicos para a sua publicação.
Contudo, quando consultamos os anúncios publicados, verificamos que, na maioria dos casos, as
informações elencadas são claramente insuficientes para o candidato a emprego decidir se pretende ou não
candidatar-se à vaga disponibilizada. Por exemplo, nem sempre é identificada a entidade empregadora, o local
de trabalho, o tipo de vínculo laboral ou o valor da retribuição.
Ora, estes elementos têm obviamente relevância para quem procura emprego. É normal que o candidato
queira saber onde irá prestar funções e se trabalhará sempre no mesmo local ou em locais diferentes porque
isso terá necessariamente impacto na sua dinâmica familiar.
É, ainda, relevante saber qual o vínculo contratual e, portanto, se será contratado a termo, por tempo
indeterminado ou a recibos verdes, isto porque para determinados candidatos pode ser fundamental que o
vínculo seja estável e outros podem querer prestar serviços para várias entidades, enquanto freelancer.
Depois, é comum encontrarmos anúncios em que é totalmente omissa a questão da remuneração ou que
incluem expressões vagas como «remuneração adequada à função». Constituindo a remuneração a
contrapartida pela prestação de trabalho, é relevante que o candidato conheça este valor para saber se tal
corresponde ou não às suas expectativas.
Importa mencionar que a inclusão destas informações é importante para o candidato, mas tem igualmente
relevância para o empregador. Imaginemos uma situação em que o anúncio não inclua todos àqueles elementos.
O candidato, que pode ter interesse na proposta tendo em conta as informações disponibilizadas, envia o seu
currículo que será depois apreciado pela empresa que colocou o anúncio. O candidato é chamado para
entrevista e é naquele momento que toma conhecimento de todas as informações relevantes para a contratação.
Suponhamos que o candidato não gosta das condições propostas, porque, por exemplo, o vínculo é precário ou
porque a remuneração é, na sua perspetiva, insuficiente e, por isso, recusa o emprego. Ora, se o candidato
tivesse tido conhecimento de todos os elementos essenciais à contratação inicialmente, porque o próprio
anúncio disponibilizava estas informações, nunca teria enviado currículo. A ausência de elementos vitais no
anúncio levou a que tanto o candidato como o potencial empregador perdessem tempo, ou seja, no caso do
candidato o tempo relacionado com a candidatura, deslocação para entrevista e a própria entrevista e, no caso
da empresa, o tempo gasto na análise da candidatura e entrevista com o candidato.
Não podemos esquecer que o candidato pode estar em situação de desemprego, inclusivamente pode já
não estar a receber subsídio, e pode ter que se deslocar para entrevistas, suportando os custos com a
deslocação, sem que depois tenha interesse em aceitar o emprego porque as condições propostas não
correspondem às suas expectativas.
Em suma, se garantirmos que os anúncios de emprego contêm todas as informações relevantes para a
contratação conseguiremos que as candidaturas sejam apenas realizadas por aqueles que têm efetivo interesse
nas condições apresentadas, o que ajuda as empresas no momento da seleção das pessoas a contratar.
Ora, o artigo 106.º do Código do Trabalho, com a epígrafe «dever de informação», determina que «O
empregador deve prestar ao trabalhador, pelo menos, as seguintes informações: A respetiva identificação,
nomeadamente, sendo sociedade, a existência de uma relação de coligação societária, de participações
recíprocas, de domínio ou de grupo, bem como a sede ou domicílio; o local de trabalho ou, não havendo um fixo
ou predominante, a indicação de que o trabalho é prestado em várias localizações; a categoria do trabalhador
ou a descrição sumária das funções correspondentes; a data de celebração do contrato e a do início dos seus
efeitos; a duração previsível do contrato, se este for celebrado a termo; a duração das férias ou o critério para a
sua determinação; os prazos de aviso prévio a observar pelo empregador e pelo trabalhador para a cessação
do contrato, ou o critério para a sua determinação; o valor e a periodicidade da retribuição; o período normal de
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trabalho diário e semanal, especificando os casos em que é definido em termos médios; o número da apólice
de seguro de acidentes de trabalho e a identificação da entidade seguradora; o instrumento de regulamentação
coletiva de trabalho aplicável, se houver, bem como a identificação do fundo de compensação do trabalho ou
de mecanismo equivalente, bem como do fundo de garantia de compensação do trabalho, previstos em
legislação específica».
Por sua vez o artigo 107.º estabelece que esta informação deve ser prestada por escrito, considerando-se
cumprido este dever quando a informação em causa constar de contrato de trabalho reduzido a escrito ou de
contrato-promessa de contrato de trabalho.
Ou seja, o legislador considerou, e bem, que existe um mínimo de informações que devem ser prestadas ao
trabalhador antes da assinatura do contrato, por consubstanciarem aspetos relevantes na prestação de trabalho.
Ora, são exatamente estes elementos, ou seja, os elencados no artigo 106.º, que consideramos que devem
constar já do anúncio de emprego, contribuindo tal para o reforço da transparência e do direito dos candidatos
à informação. Anúncios mais completos e detalhados permitem não só atrair mais candidatos como garantem
que aqueles que concorrem têm verdadeiramente interesse em fazê-lo porque concordam com as condições
propostas, tendo por isso benefícios claros para o empregador e para os candidatos.
Face ao exposto, propomos uma alteração ao Código do Trabalho, determinado que os aspetos relevantes
na prestação de trabalho elencados no artigo 106.º devem constar do anúncio de emprego divulgado, por
qualquer meio, pela entidade empregadora.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada não inscrita Cristina Rodrigues
apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro,
na sua redação atual, definindo os elementos que devem constar nos anúncios de emprego, garantindo o reforço
do direito à informação dos candidatos.
Artigo 2.º
Alteração ao Código do Trabalho
É alterado o artigo 106.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, alterado
pelas Leis n.os 105/2009, de 14 de setembro, 53/2011, de 14 de outubro, 23/2012, de 25 de junho, 47/2012, de
29 de agosto, 69/2013, de 30 de agosto, 27/2014, de 8 de maio, 55/2014, de 25 de agosto, 28/2015, de 14 de
abril, 120/2015, de 1 de setembro, 8/2016, de 1 de abril, 28/2016, de 23 de agosto, 73/2017, de 16 de agosto,
14/2018, de 19 de março, 90/2019, de 4 de setembro, 93/2019, de 4 de setembro, e 18/2021, de 8 de abril, o
qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 106.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
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h) […];
i) […];
j) […];
l) […];
m) […].
4 – […].
5 – Os anúncios de emprego divulgados, por qualquer meio, pelo empregador devem conter
obrigatoriamente as informações previstas no n.º 3 do presente artigo, com exceção do disposto nas
alíneas a), f), g), h), j) e m), salvo o disposto no artigo seguinte.
6 – A identificação do empregador e o valor certo ou estimado da retribuição deve ser indicado no
anúncio de emprego ou posteriormente ao candidato no contacto que precede a entrevista.
7 – Constitui contraordenação grave a violação do disposto em qualquer alínea do n.º 3 e no n.º 5 do
presente artigo.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no prazo de 30 dias a contar da sua aprovação.
Palácio de São Bento, 3 de setembro de 2021.
A Deputada não inscrita Cristina Rodrigues.
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PROJETO DE LEI N.º 974/XIV/3.ª
ALTERAÇÃO À LEI N.º 2/2013, DE 10 DE JANEIRO, E À LEI 53/2015, DE 11 DE JUNHO, COM VISTA
AO REFORÇO DO INTERESSE PÚBLICO, DA AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA REGULAÇÃO E
PROMOÇÃO DO ACESSO A ATIVIDADES PROFISSIONAIS
Exposição de motivos
Desde há muitos anos que a União Europeia alerta para a necessidade de os Estados-Membros identificarem
e eliminarem entraves no acesso a profissões reguladas, de forma a criar oportunidades de emprego e aumentar
o potencial de crescimento económico na Europa. Neste contexto, em 2017 a Comissão Europeia adotou uma
Comunicação relativa às recomendações para a reforma da regulação dos serviços profissionais [COM (2016)
820, de 10 de janeiro de 2017], onde identifica uma série de entraves resultantes da regulamentação dos
serviços profissionais pelos Estados-Membros, que não visam necessariamente a consecução de objetivos de
interesse geral ou, quando os visam, não são adequados, necessários ou proporcionais. Nesta Comunicação a
Comissão Europeia faz apelo a diversos estudos que demonstram que a redução de entraves pode aumentar a
produtividade e eficiência da economia, bem como o emprego. Assim, a Comissão faz várias recomendações
aos Estados-Membros, incluindo Portugal, no sentido de eliminaram restrições injustificadas e criarem um
quadro regulamentar que promova crescimento, inovação e emprego.
Também a Diretiva 2018/958, de 28 de junho de 2018, transposta para o ordenamento jurídico nacional pela
Lei n.º 2/2021, de 21 de janeiro, sobre o regime de acesso e exercício de profissões e atividades profissionais,
tem como objetivo assegurar que as regras nacionais de organização do acesso às profissões reguladas não
constituam um obstáculo injustificado ou desproporcionado ao exercício do direito fundamental à livre escolha
de uma atividade profissional.
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No âmbito do Semestre Europeu, a União Europeia considera que os esforços de Portugal para reduzir a
carga regulamentar das profissões reguladas, que tiveram tradução na Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que
estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações públicas profissionais,
foram travados ou mesmo revertidos pelos estatutos das diferentes ordens. Alertou, igualmente, para a falta de
resposta às recomendações da Comissão sobre a regulação dos serviços profissionais, bem como à análise da
OCDE de 2018 sobre a concorrência no domínio das profissões autorreguladas em Portugal, recomendando
expressamente a redução de restrições nas profissões altamente reguladas.
De entre as recomendações da OCDE a Portugal (Economic Outlook2019) consta a redução de barreiras
regulatórias nas profissões reguladas e, especificamente, a alteração de regras ao nível da supervisão do acesso
a estas profissões, que deve estar a cargo de um órgão independente. Já em 2018, a OCDE, em cooperação
com a Autoridade da Concorrência (AdC), realizou uma avaliação de impacto concorrencial da regulamentação
de uma série de profissões autorreguladas (advogados, solicitadores, agentes de execução, notários,
engenheiros, engenheiros técnicos, arquitetos, auditores, contabilistas certificados, despachantes oficiais,
economistas, farmacêuticos e nutricionistas). De entre as recomendações formuladas pela OCDE e AdC,
destacam-se a necessidade de separar a função regulatória da função representativa e de as mesmas serem
dotadas de um órgão de supervisão independente, de forma a contribuir para uma melhor regulação e criar
incentivos à inovação em prol dos consumidores. Uma outra recomendação, prende-se com a necessidade de,
nas sociedades profissionais, abrir o acesso a parcerias, propriedade e gestão de empresas profissionais a
indivíduos de outras profissões e permitir que empresas multidisciplinares atuem nos vários setores
profissionais, de forma a que diferentes modelos de negócios surjam no mercado e respondam à procura de
serviços multidisciplinares.
Tendo em consideração este contexto, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista realizou, entre março e
julho de 2020, audições com representantes das ordens profissionais, associações representativas dos
diferentes profissionais e associações de estudantes para analisar estas e outras recomendações.
O presente projeto de lei visa introduzir alterações ao regime jurídico das associações públicas profissionais,
cuja inestimável missão de regulação e representação oficial de amplos setores de atividade em nome do
interesse público deve ser reforçada através de medidas que garantam uma maior independência e isenção da
sua função regulatória e a eliminação de restrições não justificadas pelo interesse público. Por isso, é objetivo
deste diploma reforçar as competências regulatórias do órgão de supervisão das associações profissionais e
garantir a sua independência e isenção, densificando o regime jurídico em vigor que já prevê a obrigatoriedade
deste órgão independente. Por outro lado, tendo em consideração que uma das principais missões das
associações públicas profissionais é a defesa dos interesses gerais dos destinatários dos serviços, propõe-se
que o Provedor do cliente passe a ser obrigatório, ao mesmo tempo que se reforça os poderes de fiscalização
das associações. Para eliminar restrições injustificadas ao acesso às profissões reguladas, estabelecem-se
limites claros quanto aos estágios profissionais e eventuais cursos de formação e exames, que não devem incidir
sobre matérias já lecionadas e avaliadas pelas instituições de ensino superior, que estão sujeitas a processos
de avaliação e acreditação rigorosos, que envolvem as associações públicas profissionais.
Por fim, com o objetivo de dar pleno cumprimento ao artigo 25.º da Diretiva 2006/123/CE, relativa aos serviços
no mercado interno é proposta uma densificação das condições de constituição e funcionamento das sociedades
profissionais multidisciplinares, já previstas na lei em vigor, para que possam fornecer serviços multidisciplinares
e inovadores, com claros benefícios para os seus beneficiários.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo assinados
do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração:
a) Da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e
funcionamento das associações públicas profissionais;
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b) Da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das
sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 2/3013, de 10 de janeiro
Os artigos 3.º, 5.º, 8.º, 15.º, 16.º, 18.º, 20.º, 21.º, 24.º, 25.º, 26.º, 27.º, 30.º, 46.º e 48.º da Lei n.º 2/2013, de
10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação, organização e funcionamento das associações
públicas profissionais, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
Constituição
1 – […].
2 – A constituição de novas associações públicas profissionais é sempre precedida dos seguintes
procedimentos:
a) […];
b) Audição das associações representativas da profissão e emissão de parecer de outras partes
interessadas, nomeadamente reguladores de serviços prestados pelas profissões em questão, Conselho
de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), Conselho Coordenador dos Institutos Superiores
Politécnicos (CCISP), associações científicas ou profissionais das áreas abrangidas, Autoridade da
Concorrência e representantes dos consumidores;
c) […].
3 – […].
Artigo 5.º
Atribuições
1 – São atribuições das associações publicas profissionais, nos termos da lei:
a) A representação e defesa dos interesses gerais da profissão, no respeito dos direitos e interesses
gerais dos destinatários dos serviços;
b) [Anterior alínea c)];
c) [Anterior alínea d)];
d) [Anterior alínea e)];
e) [Anterior alínea f)];
f) [Anterior alínea g)];
g) [Anterior alínea h)];
h) A fiscalização sobre a atuação dos seus membros no âmbito das suas funções, para efeitos de
exercício do poder disciplinar, podendo estabelecer protocolos com os competentes serviços de
fiscalização e inspeção do Estado;
i) […];
j) […];
k) […];
l) […];
m) […];
n) […];
2 – As associações públicas profissionais estão impedidas de exercer ou de participar em atividades de
natureza sindical ou que se relacionem com a regulação das relações económicas ou profissionais dos seus
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membros, bem como exercer atividades de natureza comercial, sem prejuízo da comercialização de
artigos institucionais.
3 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, seja ato ou regulamento,
estabelecer restrições à liberdade de acesso e de exercício da profissão, nem infringir as regras da
concorrência na prestação de serviços profissionais, nos termos do direito nacional e da União Europeia.
Artigo 8.º
Estatutos
1 – Os estatutos das associações públicas profissionais são aprovados por lei e devem regular, com os
limites definidos na presente lei:
a) […];
b) […];
c) Estágios profissionais ou outros, previstos em lei especial que sejam justificadamente necessários para o
acesso e exercício da profissão, apenas quando o estágio profissional não faça parte integrante do curso
conferente da necessária habilitação académica;
d) Número de períodos de inscrição por ano, nos casos em que esteja prevista a realização de estágio
profissional ou exame, devendo, pelo menos, haver um período de inscrição por ano.
e) […];
f) […]
g) […];
h) […] ;
i) […];
j) […];
k) […];
l) […];
m) […];
n) […];
o) […];
p) […];
q) Provedor dos destinatários dos serviços.
2 – Para os efeitos das alíneas c) e d) do número anterior, os estatutos estabelecem o regime do estágio de
acesso à profissão ou, sendo o caso, do período formativo correspondente, nomeadamente, quanto aos
seguintes aspetos:
a) Duração máxima do estágio, que não pode exceder os 12 meses, a contar da data de inscrição e incluindo
as fases eventuais de formação e de avaliação;
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […].
3 – A organização das fases eventuais de formação e de avaliação dos estágios profissionais referidos no
número anterior é da responsabilidade das associações públicas profissionais respetivas, sem prejuízo de a
lei definir o envolvimento de entidades públicas nos procedimentos de implementação ou de execução do
estágio profissional ou regimes de financiamento das entidades formadoras públicas e, sendo caso disso, o
envolvimento de entidades empregadoras públicas na realização dos estágios.
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4 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, a definição das matérias a lecionar no período
formativo e, eventualmente, a avaliar em exame final deve garantir a não sobreposição com matérias ou
unidades curriculares que integram o curso conferente da necessária habilitação académica, devendo
as eventuais fases de formação ser também disponibilizadas na modalidade de ensino à distância com
taxas reduzidas.
5 – [Anterior n.º 4.]
6 – As taxas cobradas durante o estágio profissional ou eventual período de formação obedecem aos
critérios da adequação, necessidade e proporcionalidade.
7 – Os estágios profissionais são remunerados nos termos a definir nos estatutos das respetivas
associações públicas profissionais.
8 – A avaliação final do estágio é da responsabilidade de um júri independente, que deve integrar
personalidades de reconhecido mérito, que não sejam membros da associação pública profissional.
9 – Nos termos do disposto na alínea o) do número 1, as associações públicas profissionais não
podem recusar o reconhecimento de habilitações académicas e profissionais obtidas no estrangeiro que
estejam devidamente reconhecidas em Portugal ao abrigo da lei, do Direito da União Europeia ou de
convenção internacional.
Artigo 15.º
Órgãos
1 – […].
2 – Constituem órgãos obrigatórios das associações públicas profissionais:
a) […];
b) […];
c) Um órgão de supervisão, nos termos do artigo 15.º-A.
d) Um órgão disciplinar, eleito pela assembleia representativa, que exerce o poder disciplinar,
devendo integrar personalidades de reconhecido mérito que não sejam membros da associação pública
profissional.
e) [Anterior alínea d).]
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – A assembleia representativa é eleita por sufrágio universal, direto, secreto e periódico.
8 – […].
9 – […].
10 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções.
11 – […].
12 – […].
13 – As listas de candidatos aos órgãos eletivos das associações públicas profissionais devem
promover a igualdade entre homens e mulheres, assegurando que a proporção de pessoas de cada sexo
não seja inferior a 40%, salvo se no universo eleitoral existir uma percentagem de pessoas do sexo
menos representado inferior a 20%.
Artigo 16.º
Elegibilidade
1 – […].
2 – Os estatutos podem condicionar a elegibilidade para o cargo de membro dos órgãos com competências
executivas à verificação de um tempo mínimo de exercício da profissão, nunca superior a cinco anos, e para o
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cargo de presidente, de bastonário ou de membro dos órgãos com competência disciplinar e de supervisão,
nunca superior a 10 anos.
3 – […].
4 – Não são elegíveis para os órgãos das associações públicas profissionais os profissionais que
tenham desempenhado cargos em órgãos dos sindicatos do setor nos últimos quatro anos.
Artigo 18.º
Poder disciplinar
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – O exercício das funções disciplinares das associações públicas profissionais é definido nos respetivos
estatutos, competindo ao órgão disciplinar com recurso para o órgão de supervisão.
8 – […].
9 – Têm legitimidade para participar factos suscetíveis de constituir infração disciplinar ao órgão disciplinar
e para recorrer das decisões para o órgão de supervisão, designadamente:
a) […];
b) O provedor dos destinatários dos serviços;
c) […];
d) […];
Artigo 20.º
Provedor dos destinatários de serviços
1 – Sem prejuízo do estatuto do Provedor de Justiça, as associações públicas profissionais designam uma
personalidade independente com a função de defender os interesses dos destinatários dos serviços profissionais
prestados pelos membros daquelas.
2 – O provedor dos destinatários dos serviços é designado pelo Bastonário ou Presidente da
associação pública profissional de entre três candidatos propostos pela entidade pública responsável
pela defesa do consumidor e não pode ser destituído, salvo por falta grave no exercício das suas
funções.
3 – Sem prejuízo das demais competências previstas na lei ou nos estatutos, compete ao provedor analisar
as queixas apresentadas pelos destinatários dos serviços e fazer recomendações para a sua resolução, bem
como em geral para o aperfeiçoamento do desempenho da associação.
4 – O cargo de provedor é remunerado nos termos do estatuto ou do regulamento da associação
pública profissional.
5 – […].
Artigo 21.º
Referendo interno
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
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5 – Os referendos só são vinculativos se neles participar mais de metade dos membros da associação pública
profissional, salvo se a proposta submetida a referendo obtiver mais de 66% dos votos e a participação for
superior a 40%.
Artigo 24.º
Acesso e registo
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […]:
a) Verificação das capacidades profissionais pela sujeição a estágio profissional ou outro, previstos em lei
especial, nos termos e com os limites definidos na presente lei;
b) […];
c) Realização de exame final de estágio com o objetivo de avaliar os conhecimentos e as competências
necessárias para a prática de atos de confiança pública a realizar por um júri independente nos termos e
com os limites definidos na presente lei.
7 – […].
8 – […].
Artigo 25.º
Inscrição
1 – Têm direito a inscrever-se nas associações públicas profissionais todos os que preencham os requisitos
legais para o acesso à profissão e a desejem exercer, individualmente, em sociedade de profissionais ou em
sociedade multidisciplinar.
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
Artigo 26.º
Exercício da profissão em geral
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – Os prestadores de serviços profissionais, incluindo as sociedades de profissionais, as sociedades
multidisciplinares ou outras formas de organização associativa de profissionais referidas no n.º 4 do artigo 37.º
e os demais empregadores ou subcontratantes de profissionais, ficam sujeitos aos requisitos constantes dos
n.os 1 e 2 do artigo 19.º e dos artigos 20.º e 22.º do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, e ainda, no que se
refere a serviços prestados por via eletrónica, ao disposto no artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de
janeiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 62/2009, de 10 de março, e pela Lei n.º 46/2012, de 29 de agosto.
5 – […].
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Artigo 27.º
Sociedades de profissionais e multidisciplinares
1 – Podem ser constituídas sociedades de profissionais que tenham por objeto principal o exercício de
profissões organizadas numa única associação pública profissional.
2 – Podem ainda ser constituídas sociedades multidisciplinares de profissionais para exercício de
profissões organizadas em associações públicas profissionais, juntamente com outras profissões
organizadas ou não em associações públicas profissionais, desde que:
a) A sociedade garanta a aplicação do regime de incompatibilidades e impedimentos aplicável, bem
como de prevenção de conflitos de interesses, devendo, na ausência de medidas que garantam a
inexistência de tais conflitos, a prestação de serviços ser recusada ou cessada.
b) Os responsáveis pela orientação e execução de funções de interesse público sejam profissionais
qualificados;
c) Seja garantida a independência técnica, a proteção de informação de clientes e a observância dos
deveres deontológicos aplicáveis a cada atividade profissional desenvolvida;
d) A sociedade seja dotada de um sistema interno de salvaguarda de sigilo profissional, sempre que
aplicável.
3 – As sociedades profissionais referidas nos números anteriores, constituídas em Portugal, podem ser
sociedades civis ou assumir qualquer forma jurídica admissível por lei para o exercício de atividades comerciais.
4 – Podem ser sócios, gerentes ou administradores das sociedades referidas no número anterior
pessoas que não possuam as qualificações profissionais exigidas para o exercício das profissões
organizadas na associação pública profissional respetiva, ficando vinculados aos deveres
deontológicos e de sigilo aplicáveis ao exercício das profissões abrangidas.
Artigo 29.º
Incompatibilidades e impedimentos
Os estatutos podem prever regras relativas incompatibilidades e impedimentos no exercício da profissão,
desde que respeitem o disposto na presente lei e se mostrem necessárias e proporcionais ao objetivo de
garantir a independência, imparcialidade e integridade da profissão e, caso se justifique, o segredo profissional,
e não possam ser substituídas por alternativas menos restritivas da liberdade profissional.
Artigo 30.º
Reserva de atividade
1 – Sem prejuízo do disposto na alínea b) do artigo 358.º do Código Penal, as atividades profissionais
associadas a cada profissão só lhe são reservadas quando tal resulte expressamente da lei, fundada em razões
imperiosas de interesse público constitucionalmente protegido, segundo critérios de adequação, necessidade e
proporcionalidade, com enumeração taxativa das atividadesreservadas.
2 – As associações públicas profissionais não podem, por qualquer meio, estabelecer atividades
reservadas.
3 – [Anterior n.º 2].
4 – [Anterior n.º 3].
Artigo 46.º
Controlo jurisdicional
1 – Os regulamentos e as decisões das associações públicas profissionais praticadas no exercício de
poderes públicos estão sujeitos ao contencioso administrativo, nos termos das leis do processo administrativo.
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2 – Têm legitimidade para impugnar a legalidade dos atos e regulamentos das associações públicas
profissionais:
a) […].
b) […].
c) […].
d) […].
e) O provedor dos destinatários dos serviços.
Artigo 48.º
Relatório anual e deveres de informação
1 – As associações públicas profissionais elaboram anualmente um relatório sobre o desempenho das suas
atribuições, em especial sobre o exercício do seu poder regulatório e do poder disciplinar, o qual deve ser
apresentado à Assembleia da República e ao Governo, até 31 de março de cada ano.
2 – […].
3 – […].»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 2/3013, de 10 de janeiro
É aditado o artigo 15.º-A da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, que estabelece o regime jurídico de criação,
organização e funcionamento das associações públicas profissionais, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 15.º-A
Órgão de Supervisão
1 – O órgão de supervisão é independente no exercício das suas funções, vela pela legalidade da atividade
exercida pelos órgãos da associação e exerce poderes de controlo, nomeadamente em matéria disciplinar e em
matéria de regulação do exercício da profissão.
2 – Sem prejuízo de outras estabelecidas por lei, são competências do órgão de supervisão:
a) O exercício das atribuições previstas na alínea c) do artigo 8.º, em especial a determinação das regras de
estágio, incluindo a avaliação final, bem como a fixação de qualquer taxa referente às condições de acesso à
inscrição na associação profissional;
b) O reconhecimento de habilitações e competências profissionais obtidas no estrangeiro;
c) O exercício de poderes de controlo em matéria disciplinar, mediante recurso das decisões do órgão
disciplinar;
d) A supervisão da legalidade e conformidade estatutária e regulamentar da atividade exercida pelos órgãos
da associação;
e) A pronúncia, em sede de consulta, sobre propostas de atos legislativos que fixem reservas de atos da
profissão.
3 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, o órgão de supervisão é composto pelos seguintes
membros, eleitos por maioria de 2/3 da assembleia representativa:
a) Três representantes da profissão, inscritos na associação pública profissional;
b) Dois membros oriundos dos estabelecimentos de ensino superior que habilitem academicamente o acesso
à profissão organizada em associação pública profissional, não inscritos na associação profissional;
c) Uma personalidade de reconhecido mérito, não inscrita na associação pública profissional.
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4 – O Provedor dos destinatários dos serviços é, por inerência, membro de pleno direito do órgão de
supervisão, com direito de voto em todas as matérias, salvo em relação aos recursos de decisões disciplinares
por si interpostos.
5 – Os membros do órgão de supervisão elegem o Presidente de entre os membros não inscritos na
associação pública profissional.»
Artigo 4.º
Alteração à Lei n.º 53/2015, de 11 de junho
É alterado o artigo 7.º da Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e
funcionamento das sociedades de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais, que
passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 7.º
Objeto social
1 – […].
2 – […].
3 – Sem prejuízo do disposto nos números anteriores, podem ainda ser constituídas sociedades
multidisciplinares de profissionais para exercício de profissões organizadas em mais do que uma
associação pública profissional nos termos dos n.os 2 a 4 do artigo 27.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de
janeiro.»
Artigo 5.º
Norma revogatória
É revogado o n.º 1 do artigo 33.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, o n.º 2 do artigo 9.º e o artigo 55.º da
Lei n.º 53/2015, de 11 de junho, que define o regime jurídico da constituição e funcionamento das sociedades
de profissionais que estejam sujeitas a associações públicas profissionais.
Artigo 6.º
Norma transitória
1 – O regime previsto na presente lei aplica-se às associações públicas profissionais já criadas e em processo
de criação.
2 – As associações públicas profissionais já criadas devem adotar as medidas necessárias para o
cumprimento do disposto na presente lei.
3 – No prazo de 120 dias, o Governo apresenta uma proposta de lei de alteração dos estatutos das
associações públicas profissionais já criadas e demais legislação aplicável ao exercício da profissão, que os
adeque ao regime previsto na presente lei, devendo expressamente avaliar se os regimes de reserva de
atividade em vigor cumprem o disposto no artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, na redação dada pela
presente lei.
4 – Para efeitos do disposto na parte final do número anterior, a Autoridade da Concorrência envia ao
Governo, no prazo de 60 dias após a entrada em vigor da presente lei, um relatório sobre o cumprimento dos
critérios estabelecidos no n.º 1 do artigo 30.º da Lei n.º 2/2013, de 10 de janeiro, bem como na Lei n.º 2/2021,
de 21 de janeiro, com uma recomendação quanto à manutenção, alteração ou revogação dos regimes de reserva
de atividade em vigor.
Artigo 7.º
Reexame
No prazo de três anos a contar da data de entrada em vigor da presente lei, a Autoridade da Concorrência
deve apresentar à Assembleia da República um relatório sobre a aplicação e eficácia da presente lei, podendo
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ser acompanhado de propostas adequadas.
Artigo 8.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos no prazo de 90 dias após
a sua publicação.
Palácio de São Bento, 3 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do PS: Ana Catarina Mendonça Mendes — Constança Urbano de Sousa —
Joana Sá Pereira — Rita Borges Madeira — Maria Begonha — Ascenso Simões — Carlos Pereira — Cláudia
Santos — Hortense Martins — Isabel Oneto — Luís Capoulas Santos — Miguel Matos — Paulo Porto — Eduardo
Barroco de Melo — Francisco Rocha — Filipe Pacheco — Lúcia Araújo Silva — Susana Amador — Ana Passos
— Sofia Araújo — Clarisse Campos — José Manuel Carpinteira — Cristina Sousa — Elza Pais — Joana Bento
— Fernando José — Palmira Maciel — Cristina Mendes da Silva — Jorge Gomes — Sílvia Torres — Norberto
Patinho — Nuno Fazenda — Maria da Graça Reis — Alexandra Tavares de Moura — Eurídice Pereira — Olavo
Câmara — José Rui Cruz — Pedro Sousa — João Azevedo Castro — Romualda Fernandes — Rosário Gambôa
— Martina Jesus — Francisco Pereira Oliveira — Vera Braz — Susana Correia — Lara Martinho.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1460/XIV/3.ª
PELA PROTEÇÃO AMBIENTAL E SOCIAL NO PERÍMETRO DE REGA DO MIRA
O Perímetro de Rega do Mira está localizado nos concelhos de Odemira e Aljezur e possui uma área
beneficiada de 12 000 hectares inseridos no Parque Natural do Sudoeste Alentejano e Costa Vicentina
(PNSACV). Esta área destinada à agricultura de regadio ocupa cerca de 20 por cento da área total do parque
natural. Como tal, dada a magnitude considerável da área de agricultura na área protegida, as explorações
agrícolas deste aproveitamento hidroagrícola devem estar sujeitas a rigorosos critérios ambientais e
paisagísticos, com vista à minimização dos impactes negativos que as explorações provocam no solo, na água,
no ar e, consequentemente, nos habitats e nas populações de espécies, muitas delas ameaçadas. O Governo
deve pôr em prática os instrumentos que tem ao seu dispor para salvaguardar o superior interesse da proteção
e conservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem do PNSACV. Mas não é isso que tem acontecido.
Em maio de 2017, uma avaliação da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento
do Território (IGAMAOT) relativa ao cumprimento das normas aplicáveis às atividades agrícolas integradas no
Perímetro de Rega do Mira previstas no Plano de Ordenamento do PNSACV encontrou um vasto conjunto de
irregularidades e atropelos à gestão do parque natural. A IGAMAOT identificou zonas de agricultura intensiva
que ameaçam os valores naturais da área protegida – nomeadamente «habitats importantes e locais de
ocorrência de espécies muito raras» – reconheceu a degradação de massas de água superficiais e subterrâneas,
e alertou para o incumprimento de normas ambientais. A situação tem sido provocada pela proliferação de um
«mar de plástico» de estufas, túneis elevados e estufins para a produção de hortofrutícolas, que, segundo dados
do Ministério da Agricultura, já atinge cerca de 1600 hectares no Perímetro de Rega do Mira.
Face à gravidade das conclusões da avaliação da IGAMAOT e a crescente ameaça aos valores naturais do
PNSACV, o governo piorou a situação. Ao invés de fortalecer os instrumentos e as ações para a conservação
da natureza e da biodiversidade na área protegida, o governo criou, através da Resolução do Conselho de
Ministros n.º 179/2019, de 24 de outubro, um regime especial para o Perímetro de Rega do Mira que possibilita
a instalação do triplo da área impermeabilizada por estufas, túneis elevados e estufins, até um máximo de 4.800
hectares. Além disso, o diploma do governo normalizou os problemas sociais associados às explorações
agrícolas do Perímetro de Rega do Mira. Em vez de procurar soluções habitacionais dignas para os
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trabalhadores migrantes que vivem em contentores, o diploma do governo criou um regime especial feito à
medida dos promotores das explorações agrícolas, promovendo a atual situação guetizante, precária e indigna,
ao equiparar os contentores a «estruturas complementares à atividade agrícola», por um período de 10 anos. A
nova Resolução do Conselho de Ministros n.º 69/2021, de 4 de junho, que «adapta» o regime especial, vem
simplificar o procedimento para a instalação de contentores, agravando assim a existência de condições de
habitação indigna.
O grupo parlamentar do Bloco de Esquerda entende que as Resoluções do Conselho de Ministros n.º
179/2019 e 69/2021 devem ser revogadas. Defende também que deve ser impedida a instalação e ampliação
de áreas de explorações agrícolas no Perímetro de Rega do Mira impermeabilizadas por estufas, túneis
elevados, estufins e outras estruturas de plástico. A interdição da proliferação destas explorações agrícolas deve
vigorar até que estejam reunidas as condições adequadas para a proteção da natureza e da biodiversidade da
área protegida, e garantidas condições laborais e habitacionais dignas para quem vive e trabalha nas estufas
da região, conforme recomendado pelo Bloco de Esquerda nos Projetos de Resolução n.os 225/XIV/1.ª e
820/XIV/2.ª.
Outra situação que preocupa o grupo parlamentar do Bloco de Esquerda diz respeito à gestão dos recursos
hídricos da área de influência do Perímetro de Rega do Mira. A água que beneficia o aproveitamento
hidroagrícola é captada na albufeira de Santa Clara, em Odemira, e gerida pela Associação de Beneficiários do
Mira (ABM), uma entidade privada dominada pelos grandes produtores agrícolas em estufas. Num contexto de
crescente escassez hídrica na região, a ABM foi autorizada pelo governo a ampliar a área elegível para rega
das suas explorações agrícolas em estufas, através do regime especial criado pela Resolução do Conselho de
Ministros n.º 179/2019.
Passados dois anos, em 2021, e perante a crescente escassez hídrica da albufeira de Santa Clara, a ABM
decidiu cortar a água aos pequenos produtores ditos «precários», alegando que estes dispõem de alternativas.
Mas esse não é o entendimento de centenas de utentes que por falta de abastecimento de água de que
usufruíram – e pagaram – durante décadas, veem hoje em risco os seus pequenos negócios de produção de
hortícolas e animais. Além disso, durante os meses de maio e junho, a ABM também não garantiu o necessário
caudal ecológico a jusante da albufeira. A situação provocou danos na fauna e flora ribeirinhas e impediu a
população local de usufruir do espelho de água garantido pela água da albufeira. Quando contactada pela Junta
de Freguesia de Santa Clara-a-Velha para a reposição do caudal ecológico, a ABM informou que poderia garantir
a recarga do espelho de água, entre 15 de junho e 15 de setembro, a troco de 13 738 euros, mais IVA.
A concessão da captação de água da albufeira de Santa Clara foi atribuída pela Direção-Geral de Agricultura
e Desenvolvimento Rural à ABM. A atribuição da concessão foi um erro do governo. O superior interesse público
de abastecimento de água às populações e aos seus pequenos negócios, bem como a manutenção e caudais
ecológicos, não está garantido pela gestão privada da ABM. Como tal, só a gestão pública, responsável, justa e
eficiente pode garantir que a água chega a quem dela mais precisa. Os donos das grandes explorações agrícolas
do Perímetro de Rega do Mira não são detentores dos recursos hídricos da região e não podem geri-los como
se fossem. A concessão da utilização da água da albufeira de Santa Clara deve ser revogada e devolvida à
esfera pública, conforme recomendado pelo Bloco de Esquerda no Projeto de Resolução n.º 1224/XIV/2.ª
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda considera que o crescente número e tamanho de explorações
agrícolas impermeabilizadas por estufas, túneis elevados, estufins e outras estruturas de plástico no Perímetro
de Rega do Mira lesa o ambiente, a paisagem, a biodiversidade e os recursos hídricos, contrariando o interesse
público. A gestão privada da utilização da água na região tem agravado os efeitos negativos da expansão
agrícola permitida pelo governo ao impedir o acesso dos pequenos produtores a um bem essencial e ao negar
caudais ecológicos no rio Mira. As crises ecológica e climática em curso e as projeções de escassez de água
em vastas áreas do território aumentam a urgência da aplicação de instrumentos que travem a expansão de
culturas em regime intensivo e superintensivo, e que protegem a natureza, a biodiversidade, os recursos naturais
e a vida das populações.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Impeça a instalação e ampliação de áreas de explorações agrícolas no Perímetro de Rega do Mira
impermeabilizadas por estufas, túneis elevados, estufins e outras estruturas de plástico, até que esteja
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salvaguardada a proteção da natureza, da biodiversidade, dos recursos hídricos e da saúde humana;
2 – Revogue a Resolução do Conselho de Ministros n.º 179/2019, de 24 de outubro, alterada pela Resolução
do Conselho de Ministros n.º 69/2021, de 4 de junho;
3 – Impossibilite o recurso a apoios públicos para aquisição de contentores e outras formas de alojamento
precário destinados à habitação de trabalhadores agrícolas;
4 – Reverta para a gestão pública a concessão da utilização dos recursos hídricos da área de influência do
Perímetro de Rega do Mira.
Assembleia da República, 1 de outubro de 2021.
As Deputadas e os Deputados do BE: Maria Manuel Rola — Ricardo Vicente — Pedro Filipe Soares — Jorge
Costa — Mariana Mortágua — Alexandra Vieira — Beatriz Gomes Dias — Diana Santos — Fabíola Cardoso —
Isabel Pires — Joana Mortágua — João Vasconcelos — José Manuel Pureza — José Maria Cardoso — José
Moura Soeiro — Luís Monteiro — Moisés Ferreira — Nelson Peralta — Catarina Martins.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 1461/XIV/3.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE NO QUADRO DA DIPLOMACIA DO CLIMA, PROMOVA AS
NECESSÁRIAS DILIGÊNCIAS PARA QUE A ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS RECONHEÇA O
CLIMA ESTÁVEL COMO PATRIMÓNIO COMUM DA HUMANIDADE
Exposição de motivos
As alterações climáticas são um dos temas mais debatidos da atualidade. E são, no universo das
preocupações ambientais, o que pode ter maiores e mais diversificados impactos. Muitos desses efeitos já são
evidentes. Dispomos hoje, do maior o conhecimento acumulado de sempre sobre os diferentes fatores que
influenciam o clima e as suas consequências que requerem, desde já, um grande esforço global de antecipação,
planeamento e de adoção de medidas de adaptação com o respetivo e vultuoso financiamento.
A concentração de dióxido de carbono na atmosfera tem vindo a aumentar significativamente, em resultado,
no que respeita às emissões antropogénicas, do consumo de energias de origem fóssil para corresponder aos
crescimentos económico e demográfico. As emissões de gases com efeito de estufa já aumentaram mais de
50% desde 1990 e continuam a crescer, apesar dos esforços de alguns países, como os Estados-Membros da
União Europeia. O aumento da temperatura média da superfície do planeta está a aproximar-se rapidamente
dos 1,5 ºC e, nalgumas regiões, está próximo dos 7 ºC.
O vapor de água, o dióxido de carbono e o metano são os principais gases com efeito de estufa presentes
na atmosfera e os mais preocupantes para os investigadores. O aumento da temperatura resultante da maior
evaporação e de maiores concentrações de vapor de água na atmosfera, bem como a aceleração do degelo ou
da libertação do metano acumulado nas regiões frias não podem surpreender e o efeito cumulativo destes
processos é inequívoco.
A média anual do crescimento da concentração de dióxido de carbono passou de 0,85 ppm na década de
60, para 1,5 ppm na década de 90 e 2,5 ppm na última década. A este ritmo, e sem contar com as contribuições
dos outros gases com efeito de estufa e múltiplos efeitos de retorno, a temperatura média à superfície da Terra
será muito superior à meta estabelecida no Acordo de Paris e ultrapassar-se-á o limite da irreversibilidade.
O relatório do Grupo de Trabalho I do IPCC, divulgado em agosto do presente ano, indica que a União
Europeia, ao estabelecer a meta coletiva da neutralidade carbónica em 2050 no regulamento «Lei Europeia do
Clima» assumiu a trajetória adequada para impedir um aumento da temperatura média da superfície terrestre
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superior a 1,5 ºC. Contudo, esta meta do Acordo de Paris não é atingível apenas com o esforço europeu; é
necessária a adesão de todos os países do mundo.
Apesar das expectativas criadas em relação à COP26 que se realizará em Glasgow, entre 30 de outubro e
13 de novembro de 2021, a grande maioria dos Estados parte da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre
as Alterações Climáticas ainda não apresentaram contribuições nacionalmente determinadas com metas
concretas de neutralidade carbónica ou de redução de emissões de gases com efeito de estufa até 2030. Por
outro lado, os países desenvolvidos ainda não conseguiram mobilizar o montante anual de 100 mil milhões de
dólares americanos para apoio aos países menos avançados, sendo cada vez mais consensual que o esforço
financeiro necessário para concretizar a transição ecológica em todo o mundo terá de provir de capitais públicos
e privados.
Efetivamente, e como tem alertado o Secretário-Geral das Nações Unidas, tudo indica que estamos perante
uma situação de emergência climática, na qual os efeitos dramáticos, que ocorrem com frequência crescente,
podem transformar-se em devastadores para toda a vida na Terra.
A Assembleia da República, através dos vários grupos parlamentares e das deputadas não inscritas,
encontra-se neste momento a trabalhar numa lei do clima. Para o efeito, foram auscultados muitos stakeholders
e recebidas múltiplas contribuições e recomendações da sociedade civil.
Entre as múltiplas recomendações recebidas, o Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento
Sustentável (CNADS) considera que «a regulação futura destas atividades deve ser garantida no quadro
internacional». E sugere que a noção de «Clima Estável como Património Comum da Humanidade» deve
constituir «o padrão de funcionamento estável do Sistema Climático reconhecido como um bem comum global
intangível, juridicamente indivisível, cujo bom estado de funcionamento é limitado e exaurível». Acrescenta ainda
o CNADS que «um Sistema Climático a funcionar dentro dos limites de variabilidade natural que foi observada
após a última glaciação é um património comum a toda a Humanidade e a todas as gerações». Trata-se de uma
visão realista a qual merece a concordância dos deputados subscritores.
Assim, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República
Portuguesa recomendar ao Governo que, no quadro da diplomacia do Clima, promova diligências para que a
Organização das Nações Unidas reconheça o Clima Estável como Património Comum da Humanidade.
Palácio de São Bento, 29 de setembro de 2021.
Os Deputados do PS: Alexandre Quintanilha — Nuno Fazenda — Hugo Pires — Miguel Matos — João Miguel
Nicolau — Joana Bento — Raquel Ferreira — Fernando Paulo Ferreira — Filipe Pacheco — José Manuel
Carpinteira — Joana Lima — André Pinotes Batista — Luís Graça — Lúcia Araújo Silva — Alexandra Tavares
de Moura — Rosário Gambôa — João Azevedo — Francisco Pereira Oliveira — Joaquim Barreto — Lara
Martinho — Paulo Porto — Hortense Martins — Sofia Araújo — Cristina Mendes da Silva — Maria da Graça
Reis — Clarisse Campos — Marta Freitas — José Rui Cruz — Telma Guerreiro — Cristina Sousa — Elza Pais
— Rita Borges Madeira — Eurídice Pereira — Francisco Rocha — Jorge Gomes — Pedro Sousa — Susana
Amador — Vera Braz — Ana Passos — Anabela Rodrigues — Maria Joaquina Matos — Romualda Fernandes
— Palmira Maciel — Susana Correia — Martina Jesus — João Azevedo Castro — Sílvia Torres — Norberto
Patinho.
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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 29/XIV/3.ª
APROVA O ACORDO SOBRE A MOBILIDADE ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS DA COMUNIDADE
DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA
A República Portuguesa, a República de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo
Verde, a República da Guiné-Bissau, a República da Guiné Equatorial, a República de Moçambique, a República
Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de Timor-Leste assinaram o Acordo sobre a
Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em Luanda,
em 17 de julho de 2021.
O Acordo vem permitir o estabelecimento de um quadro de cooperação em matéria de mobilidade dos
cidadãos dos Estados-Membros da CPLP e entre esses mesmos Estados, através de um sistema flexível e
variável que atende às particularidades relativas a cada Estado.
O referido Acordo representa um contributo para o reforço das relações de amizade e de cooperação entre
os Estados-Membros da CPLP.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de resolução:
Aprovar o Acordo sobre a Mobilidade entre os Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua
Portuguesa (CPLP), assinado em Luanda, em 17 de julho de 2021, cujo texto, na versão autenticada, na língua
portuguesa, se publica em anexo.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 30 de setembro de 2021.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — Pel' O Ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros,
Ana Paula Baptista Grade Zacarias — O Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, José Duarte Piteira
Rica Silvestre Cordeiro.
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ACORDO SOBRE A MOBILIDADE ENTRE OS ESTADOS-MEMBROS DA COMUNIDADE DOS PAÍSES DE LÍNGUA PORTUGUESA (CPLP)
Preâmbulo
Considerando que a mobilidade é um dos principais meios de fortalecimento dos vínculos entre pessoas que integram uma comunidade, e que, por isso, a mobilidade dos cidadãos nos territórios que a compõem deve ser tão livre quanto possível, exceto quando razões de interesse público imponham restrições razoáveis;
Recordando que a mobilidade no âmbito da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa é uma aspiração antiga dos seus Estados-Membros, que vem sendo objeto de reiteradas menções nas Declarações de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, desde a Declaração de Brasília de 2002 até à Declaração sobre Pessoas e Mobilidade, de Santa Maria, em 2018, cuja materialização, no presente Acordo, contribuirá de forma significativa para uma maior proximidade entre os cidadãos dos Estados-Membros da CPLP e para o incremento das relações de cooperação em todos os domínios, nomeadamente, social, cultural e económico;
Ressaltando que na Declaração sobre Pessoas e Mobilidade na CPLP, aprovada na Cimeira de Santa Maria, em 2018, os Chefes de Estado e de Governo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa reafirmaram que "a mobilidade e a circulação no espaço da CPLP constituem um instrumento essencial para o aprofundamento da Comunidade e a progressiva construção de uma Cidadania dn CPLP";
Ressaltando ainda, que na Declaração sobre as Pessoas e a Mobilidade, os Chefes de Estado e de Governo dos Estados-Membros sublinharam a "premência da criação progressiva de condições que visem a facilitação da mobilidade entre os países que compõem a CPLP, tendo em atenção as especificidades de cada país, nos seus mais variados domínios, nomeadamente normativos, institucionais e de inserçiio regional, de sorte a garantir que as soluções adotadas sejam sólidas, seguras e factíveis";
Recordando que, através da Resolução de Mindelo sobre a Mobilidade na CPLP, de 2019, o Conselho de Ministros da CPLP renovou a determinação no sentido da criação de "um sistema flexível e variável que confira aos Estados-Membros um leque de soluções que lhes permitam assumir os compromissos decorrentes da mobilidade de uma forma gradual e progressiva, e com níveis diferenciados de integração, de modo a ajustarem os respetivos impactos às suas próprias especificidades internas, na sua dimensão política, social e administrativa";
Recordando que o nível mínimo de mobilidade que deve existir entre os cidadãos dos EstadosMembros da CPLP - circulação, com dispensa de visto, dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço - já se encontra traduzido nos instrumentos firmados entre os Estados-Membros;
Verificando que, para conferir maior substância ao ideário comunitário, a mobilidade no âmbito da CPLP deve ter como finalidade abranger, não apenas algumas categorias profissionais, mas todos os cidadãos dos Estados-Membros da CPLP, concorrendo assim para o fortalecimento da identidade comum da CPLP, nos termos indicados na Declaração de Santa Maria e na Resolução de Mindelo;
ANEXO
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Considerando que faz todo o sentido colocar à disposição dos Estados um conjunto de instrumentos de mobilidade, de sorte a que a escolha possa corresponder de forma mais ajustada possível aos interesses e particularidades próprias dos Estados, sem perda do conteúdo essencial da mobilidade;
Considerando ainda que o Acordo institucionaliza um sistema flexível e variável que permite aos Estados-Membros, a partir de uma base mínima obrigatória que consiste na livre circulação dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço, a escolha da categoria ou categorias de pessoas em função da profissão ou da área de atividade que exercem, bem assim a escolha do Estado ou Estados-Membros com os quais se querem vincular;
Ressaltando igualmente que o presente Acordo permite aos Estados-Membros, se tal se mostrar necessário, condicionar, num quadro de razoabilidade, a efetivação do acesso ao seu território ao preenchimento de certos requisitos que sejam essenciais para a salvaguarda do interesse público e dos fins para os quais foram estabelecidos;
E considerando, por fim, que o presente Acordo salvaguarda os compromissos internacionais dos Estados-Membros em matéria de mobilidade decorrentes dos Acordos de integração regional nos quais sejam Parte;
A República de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo Verde, a República da Guiné-Bissau, a República da Guiné Equatorial, a República de Moçambique, a República Portuguesa, a República Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de TimorLeste, acordam o seguinte:
Capítulo I Disposições Gerais
Artigo 1. 0
Objeto O presente Acordo estabelece o quadro de cooperação em matéria de mobilidade dos cidadãos dos Estados-Membros da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) e entre esses mesmos Estados, através de um sistema flexível e variável que atende às particularidades relativas a cada Estado.
Artigo 2.º Âmbito de Aplicação
O presente Acordo aplica-se aos Estados-Membros da CPLP.
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Artigo 3. 0
Definições
Para os efeitos do presente Acordo, deve entender-se como: a) Mobilidade CPLP, a entrada de um cidadão de uma Parte no território de oub-a Parte;b) Estada de Curta Duração CPLP, a entrada e permanência de cidadão de uma Parte no
território de outra Parte, com dispensa de autorização administrativa prévia, por um curtoperíodo de tempo, nos termos da legislação interna da Parte de acolhimento;
c) Visto de Estada Temporária CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de umaParte para entrada e estada de duração superior às estadas de curta duração no território deoutra Parte e não superior a doze meses;
d) Visto de Residência CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de uma Partepara a entrada no território de outra Parte com a finalidade de, nesta Parte, requerer e obterAutorização de Residência CPLP;
e) Autorização de Residência CPLP, a autorização administrativa concedida ao cidadão de umaParte que lhe permite estabelecer residência no território da Parte emissora;
f) Instrumentos adicionais de parceria são acordos posteriores, estabelecidos entre duas ou maisPartes, para a concretização da mobilidade para além do mínimo que resulta do disposto naal. a) do n.º 2 do artigo 4.0 do presente Acordo.
Artigo 4.º Princípios Estruturantes
1. O Acordo confere às Partes um leque de soluções que lhes permite assumir compromissosdecorrentes da mobilidade de forma progressiva e com níveis diferenciados de integração, paraajustar os impactos do Acordo às suas próprias especificidades internas, na sua dimensão política,social e administrativa.
2. O Acordo é estruturado com base nos seguintes princípios:a) Isenção de vistos a favor dos titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de
serviço, para estadas de duração até 90 dias;b) Mobilidade de cidadãos de uma Parte, detentores de passaporte ordinário, no território das
demais Partes, sem prejuízo da aplicação do disposto no presente Acordo em matéria decredibilidade e autenticidade dos documentos, de acordo com o grau de compromissoassumido pelas Partes, no âmbito do princípio da flexibilidade variável;
c) Liberdade das Partes na escolha das modalidades de mobilidade, das categorias de pessoasabrangidas e das Partes com os quais estabelece parcerias para além do limite mínimo, emconformidade com o disposto nos artigos 6.º e 7.0 e os demais termos e condições previstos nopresente Acordo;
d) Salvaguarda dos compromissos internacionais das Partes em matéria de mobilidadedecorrentes dos Acordos regionais de integração nos quais sejam Partes.
Artigo 5. 0
Aplicação de regime mais favorável Da aplicação das disposições do presente Acordo não podem resultar limitações ao regime mais favorável previsto no Direito interno da Parte de acolhimento.
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Artigo 6. 0
Modalidades de Mobilidade CPLP A Mobilidade CPLP, entendida como o regime de entrada e permanência de cidadão de uma Parte no território de outra Parte, pode revestir as seguintes modalidades:
a) Estada de Curta Duração CPLP;b) Estada Temporária CPLP;c) Visto de Residência CPLP;d) Residência CPLP.
Artigo 7. 0
Categorias de Pessoas 1. A mobilidade CPLP, nos termos do artigo anterior, abrange:
a) Os titulares de passaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço;b) Os titulares de passaportes ordinários.
2. Com vista à facilitação do incremento da mobilidade e ao seu ajustamento às realidades internasdas Partes, é-lhes permitido ainda, nos instrumentos adicionais de parceria, subdividir os titularesde passaportes ordinários em grupos, em função de atividades que exerçam ou da situação em quese encontrem, ou de qualquer outro critério relevante, nomeadamente:
a) Docentes de estabelecimentos de ensino superior; investigadores em centros deespecialidade reconhecidos; e técnicos altamente qualificados;
b) Docentes de estabelecimento de ensino não superior;c) Empresários, entendida a expressão como pessoas que exercem profissionalmente uma
atividade económica organizada para a produção e circulação de bens ou de serviços,através de um estabelecimento estável reconhecido na Parte da sua nacionalidade ou dasua residência habitual, com contabilidade instituída em conformidade com as prescriçõeslegais e administrativas e regularmente inscrito nessa condição no sistema tributário dessamesma Parte;
d) Agentes culturais, entendida a expressão como a categoria que abrange artistas,desportistas e representantes de órgãos da comunicação social, escritores, músicos,promotores e organizadores de eventos culturais e desportivos;
e) Estudantes no âmbito de programas de intercâmbio reconhecidos entre estabelecimentosde ensino da Parte da nacionalidade dos visitantes e os da Parte de acolhimento.
3. As Partes podem fazer escolhas per saltum nas categorias de pessoas referenciadas no númeroantecedente, ou escolher outras não referenciadas, em conformidade com os respetivos interessesnacionais.
Artigo 8. 0
Certificação A certificação das condições em que se apresentam as pessoas abrangidas pelas categorias referidas nas alíneas b), c), d) e e) do n.º 2 do artigo 7.0, bem como os procedimentos a serem adotados para o efeito, serão estabelecidos em instrumento adicional, aprovado pelas Partes.
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Artigo 9.º Segurança Documental
1. Incumbe às Partes a obrigação de assegurar, para além de qualquer dúvida razoável, averacidade das informações atestadas nos documentos que emitem e que relevem para efeitos damobilidade.
2. As Partes devem proceder à avaliação rigorosa das condições, designadamente de segurança,que cada Parte possui relativamente aos seus respetivos documentos de viagem e de identificaçãocivil.
3. As Partes obrigam-se, no âmbito do presente Acordo, a facultar reciprocamente espécimes oucópias dos seus respetivos documentos de viagem e de identificação civil, para efeitos de consultae exame.
Artigo 10.º Restrições de entrada e permanência
1. Sem prejuízo do disposto no presente Acordo, é permitido às Partes restringir a entrada oupermanência dos cidadãos da outra Parte no seu território por razões ligadas à necessidade desalvaguarda da ordem, segurança ou saúde pública.
2. É permitido às Partes restringir a entrada ou condicionar a permanência dos cidadãos da outraParte no seu território por fundadas suspeitas sobre a credibilidade e autenticidade dosdocumentos que atestam a qualidade exigida para a mobilidade, tal como determinado peloDireito interno dessa Parte.
Artigo 11.º Meios de subsistência
1. Às Partes de acolhimento é reservado o direito de exigir ao cidadão solicitante prova de meiosde subsistência suficientes, nos termos do seu Direito interno.
2. Em alternativa, a Parte de acolhimento poderá aceitar termo de responsabilidade, subscritopor cidadão nacional ou estrangeiro habilitado com título de residência.
3. As disposições deste artigo não se aplicam a titulares de passaportes diplomáticos, oficiais,especiais e de serviço.
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Artigo 12. 0
Compromisso de incremento 1. Com base nos princípios da flexibilidade e da variabilidade, as Partes assumem ocompromisso de criar as condições legais e institucionais que visem o incremento progressivo eordenado da mobilidade dos cidadãos das Partes, tendo em conta as especificidades de cada Parte.
2. As Partes podem assumir as suas obrigações de forma gradual e com ruveis diferenciados deintegração, por meio da adesão a uma ou mais modalidades de mobilidade ou da aceitação de urnaou mais categorias de pessoas, de modo a ajustá-las às suas especificidades internas.
3. Às Partes não é exigível o cumprimento de obrigações que se mostrarem incompatíveis com oscompromissos internacionais assumidos no quadro dos Acordos regionais de integração de quesejam igualmente Parte.
Capítulo II Estada de curta duração
Artigo 13.0
Estrutura e fins 1. A Estada de Curta Duração não depende de autorização administrativa prévia e destina-se atodos os cidadãos das Partes titulares de passaportes comuns ou ordinários e titulares depassaportes diplomáticos, oficiais, especiais e de serviço.
2. A duração da Estada de Curta Duração é regulada pela legislação interna da Parte deacolhimento, com ressalva do disposto na parte final da alínea a), do n.0 2 do artigo 4.0 do presenteAcordo.
3. O disposto na primeira parte do n.º 1 não impede as Partes de optar, se assim o consideraremnecessário, pela aplicação desta modalidade de forma gradual e progressiva, por ruveis ecategorias de pessoas nos termos do disposto no artigo 7.0•
Capítulo III Estadas temporárias
Artigo 14. 0
Estrutura e fins 1. A Estada Temporária depende de autorização administrativa prévia concedida pela Parte deacolhimento, na forma de Visto de Estada Temporária para cidadãos das Partes, por período nãosuperior a doze meses.
2. O Visto de Estada Temporária CPLP tem por destinatários os titulares de passaportesordinários.
3. É aplicável ao regime de Estada Temporária o disposto no n.0 2 do artigo 7.0•
4. O Visto de Estada Temporária CPLP permite múltiplas entradas, e a Estada pode serprorrogada por idênticos períodos, caso o Direito interno da Parte o permita.
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Artigo 15. 0
Prazos e cancelamento do Visto de Estada Temporária CPLP 1. O pedido de Visto de Estada Temporária CPLP deve ser decidido num prazo não superior a90 dias, contados da apresentação do pedido.
2. O Visto de Estada Temporária CPLP tem validade mínima de 90 dias, sem prejuízo de prazosmais alargados fixados por cada uma das Partes.
3. O Visto pode ser cancelado sempre que o seu titular deixar de reunir as condições previstaspara a sua concessão.
Artigo 16.º Aplicabilidade das regras gerais da mobilidade
No regime de Visto para as Estadas Temporárias de cidadãos das Partes são aplicáveis as regras gerais adotadas para a mobilidade no que respeita ao estabelecimento de condições especiais, designadamente quanto à certificação da condição requerida e à segurança documental, no respeito pelo direito interno de cada Parte.
Capítulo IV Visto de Residência CPLP e Residência CPLP
Artigo 17. 0
Estrutura e fins 1. Os cidadãos de uma Parte podem residir no território de outra Parte mediante umaautorização administrativa prévia, nas condições previstas no presente Acordo.
2. A autorização administrativa referida no número antecedente é emitida, numa primeira fase,por meio de Visto de Residência, o qual permite a entrada no território de outra Parte para fins deobtenção de Autorização de Residência da CPLP, título que confere ao requerente o direito aresidir no território dessa Parte, nos termos e com os efeitos previstos no presente Acordo.
Artigo 18. 0
Categorias
O Visto de Residência CPLP e a Autorização de Residência CPLP podem ser concedidos a todos os cidadãos de qualquer das Partes, nos termos e condições previstos no presente Acordo.
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Artigo 19.º Requisitos para a concessão e meios de prova
1. Podem ser concedidos Vistos de Residência e Autorização de Residência a cidadãos das Partesdesde que reúnam cumulativamente os seguintes requisitos:
a) Inexistência de medidas de interdição de entrada do requerente na Parte de acolhimento,tal como determinado pelo Direito interno deste; e,
b) Inexistência de indícios de ameaça por parte do requerente à ordem, segurança ou saúdepública da Parte de acolhimento, tal como determinado pelo Direito interno deste.
2. Cada uma das Partes define, nos termos da sua legislação, a documentação que deve serapresentada para efeitos de verificação do preenchimento dos requisitos definidos no númeroanterior.
3. É aplicável ao regime de Visto de Residência e Autorização de Residência o disposto no n.0 2do artigo 7.0.
Artigo 20.º Fins do Visto de Residência CPLP
O Visto de Residência CPLP permite ao seu titular a entrada no território da Parte emissora, com a finalidade de obtenção da Autorização de Residência CPLP.
Artigo 21.0
Prazos e cancelamento do Visto de Residência CPLP 1. O pedido de Visto de Residência CPLP deve ser decidido num prazo não superior a 60 dias,contados da apresentação do pedido, sem prejuízo de prazo mais favorável previsto no Direitointerno da Parte de acolhimento.
2. O Visto para fixação de Residência CPLP é válido por um período de 90 dias, sem prejuízo deprazo mais favorável previsto no Direito interno da Parte de acolhimento.
3. O Visto pode ser cancelado sempre que o seu titular deixe de reunir as condições previstaspara a sua concessão.
Artigo 22.º Autorização de Residência CPLP
1. A Autorização de Residência CPLP permite a residência no território da Parte emissora, com aduração inicial de um ano, renovável por períodos sucessivos de dois anos, sem prejuízo derenovações por período superior em conformidade com o Direito interno dessa Parte.
2. A Autorização de Residência CPLP pode ser cancelada se o seu titular deixe de reunir ascondições previstas para a concessão, ou caso seja dado como culpado de violação de normainterna da Parte de acolhimento que comine o cancelamento.
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Artigo 23.0
Prazos para o pedido e decisão da Autorização de Residência CPLP O pedido de Autorização de Residência para cidadãos das Partes é requerido no prazo máximo de 90 dias contados da primeira entrada do titular de Visto de Residência para cidadãos das Partes no território da Parte de acolhimento, e decidido no prazo de 60 dias, contados da data da apresentação do requerimento.
Artigo 24.º Taxas e Emolumentos
1. Os cidadãos das Partes, residentes em outras Partes, estão isentos do pagamento de taxas eemolumentos devidos na emissão e renovação de autorizações de residência, com exceção doscustos de emissão de documentos.
2. As taxas e emolumentos devidos nas demais autorizações administrativas para a MobilidadeCPLP, incluindo as suas prorrogações, são reguladas pelos instrumentos adicionais de parceria oupelo Direito Interno das Partes.
3. Em caso de cobrança de taxas e emolumentos, estes não podem ser superiores aos valoresestabelecidos para as autorizações administrativas ordinárias equiparáveis, emitidas a favor decidadãos dos Estados que não fazem parte do presente Acordo.
Artigo 25.º Efeitos da Autorização de Residência CPLP
Ao titular da Autorização de Residência CPLP são reconhecidos os mesmos direitos, liberdades e garantias que aos cidadãos da Parte de acolhimento e o gozo de igualdade de tratamento relativamente aos direitos económicos, sociais e culturais, em particular no que respeita ao acesso ao ensino, ao mercado de trabalho e a cuidados de saúde, com ressalva dos direitos que o Direito interno das Partes reserve aos seus cidadãos.
Artigo 26.º Período transitório
1. É permitido às Partes a opção por um período transitório de aplicação do regime deresidência, no qual pode ser exigido aos requerentes do Visto de Residência e Autorização deResidência da CPLP para cidadãos das Partes o comprovativo de um dos seguintes elementos:
a) Qualificação em áreas que o habilitem a exercer a curto prazo atividade profissional porconta própria ou por conta de outrem; ou,
b) Titularidade de projetos de empreendimento credíveis que assegurem a aquisição dosmeios de subsistência.
2. O período transitório referenciado no número antecedente tem a duração máxima de 5 anos,aplicando-se, findo este período, automaticamente o regime ordinário das condições de Visto deResidência para cidadãos das Partes, tal como definido no presente Acordo.
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Capítulo V Disposições Finais
Artigo 27.0
Regimes Complementares As matérias de tributação, regimes de segurança social, totalização de contribuições, totalização de períodos de seguro e exportações das prestações sociais, bem como de reconhecimento dos níveis de ensino e exercício de profissões reguladas, são tratadas em instrumentos específicos, ou, na ausência destes, pelo Direito interno da Parte de acolhimento.
Artigo 28.º Pontos Focais
Com o depósito do instrumento de ratificação, aceitação, aprovação ou adesão, as Partes comunicam ao Secretariado Executivo da CPLP o seu Ponto Focal com responsabilidade de acompanhamento da execução do presente Acordo.
Artigo 29.º Assinatura
O presente Acordo está aberto à assinatura dos Estados-Membros da CPLP.
Artigo 30.º Entrada em vigor
1. O presente Acordo entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data em que trêsEstados-Membros tenham depositado na sede da CPLP, junto ao seu Secretariado Executivo, osrespetivos instrumentos de ratificação, aceitação ou aprovação.
2. Para cada um dos Estados-Membros que vier a depositar posteriormente na sede da CPLP,junto ao Secretariado Executivo, o respetivo instrumento de ratificação, aceitação ou aprovaçãoque o vincule, o Acordo entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte à data do depósito.
3. O Secretariado Executivo, na qualidade de depositário do presente Acordo, notifica as demaisPartes das ratificações, aceitações ou aprovações ao Acordo.
Artigo 31.º Vigência
O presente Acordo permanece em vigor por tempo ilimitado.
Artigo 32.º Adesão
1. Podem aderir ao presente Acordo todos os Estados-Membros da CPLP mediante o depósitodo respetivo instrumento de adesão na Sede da CPLP junto do Secretariado Executivo da CPLP.
2. O presente Acordo entra em vigor, para os Estados-Membros que adiram ao mesmo, no
primeiro dia do mês seguinte à data do depósito do seu instrumento de adesão.
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Artigo 33.º Denúncia ou Retirada
1. Qualquer Parte pode deixar de ser Parte do presente Acordo mediante notificação escrita, dirigida ao depositário, da intenção de denunciar o Acordo ou retirar-se do mesmo, feita com antecedência mínima de doze meses.
2. A denúncia ou retirada não prejudica qualquer direito, obrigação ou situação jurídica dasPartes criados pelo cumprimento do presente Acordo em momento anterior à cessação da suavigência.
Artigo 34.0
Suspensão da aplicação 1. Qualquer das Partes pode suspender temporariamente a aplicação do presente Acordo, totalou parcialmente, por fundadas razões de ordem pública, saúde pública ou segurança nacional.
2. A suspensão da aplicação do presente Acordo, assim como o termo da suspensão, devem sernotificados ao Depositário, por escrito e por via diplomática e os seus efeitos produzem-se nomomento do recebimento da notificação.
3. Em casos excecionais justificados pela urgência, a suspensão produzirá efeito na data daemissão da notificação, que o deverá referir expressamente.
Artigo 35.º Resolução de Diferendos
Qualquer controvérsia relativa à interpretação ou aplicação do presente Acordo será solucionada através de negociação, por via diplomática, entre as Partes.
Artigo 36.º Revisão
1. Qualquer Parte pode apresentar, por escrito, propostas de emenda, enviando para efeitos de
revisão, ao Secretariado Executivo da CPLP, uma notificação contendo as propostas de emenda.
2. O Secretariado Executivo da CPLP regista as propostas de emenda recebidas nos termos donúmero anterior e, a pedido de duas ou mais Partes, através das suas autoridades competentes, outrês anos após a data da receção da primeira notificação, submete as propostas pendentes aoConselho de Minisb·os da CPLP para análise e aprovação.
3. Qualquer emenda aprovada pelo Conselho de Ministros da CPLP está sujeita a aprovação,ratificação ou aceitação pelas Partes.
4. As emendas entrarão em vigor nos termos do n.º 2 do artigo 32.0 do presente Acordo.
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Artigo 37.ºDepositário
O presente Acordo será depositado na Sede da CPLP junto do Secretariado Executivo.
Artigo 38. 0
Aplicação
1. A aplicação a cada uma das Partes das modalidades de cooperação previstas no artigo 6.0 dopresente Acordo depende sempre de consentimento, expresso por via diplomática.
2. Cada Parte comunicará ao depositário, por escrito e a qualquer momento, quais asmodalidades previstas no artigo 6.0, e categorias previstas no artigo 7.0 e os demais termos econdições previstos no presente Acordo que aceita lhe sejam aplicáveis e a Parte ou Partes com asquais se vincula na parceria.
Artigo 39.ºRegisto
Após a entrada em vigor do presente Acordo, o depositário submete-o para registo junto doSecretariado das Nações Unidas, nos termos do artigo 102.0 da Carta das Nações Unidas, devendonotificar as Partes da conclusão deste procedimento e indicar-lhes o número de registo atribuído.
éte António,Ministro das Relações Exteriores
Pela República de Cabo Verde �k-�-Ç-
Rui Alberto de Figu�!� Soares,Ministro dos Negócios Estrangeiros,Cooperação e Integração Regional
Luanda, 17 de julho de 2021
Carlos Alberto Fran o França,Ministro das Relações Exteriores
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0w _)�(�� Suzi C9 la Barbosa,Ministra de Estado, dos NegóciosEstrangeiros, da Cooperação Internacional edas Comunidades
1 DE OUTUBRO DE 2021 _____________________________________________________________________________________________________________
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Cópia certificada conforme o original depositado no Arquivo Diplomático.
Lisboa, 13 de Agosto de 2021Chefe de Divisão de Arquivo e BibliotecaMinistério dos Negócios Estrangeiros
Margarida LagesAssinado de forma digital por Margarida Lages Dados: 2021.08.13 11:30:27 +01'00'
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.
II SÉRIE-A — NÚMERO 10 _____________________________________________________________________________________________________________
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