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Sexta-feira, 16 de setembro de 2022 II Série-A — Número 85

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

S U M Á R I O

Resoluções: (a) — Deslocação do Presidente da República a Luanda. — Deslocação do Presidente da República a Londres. Projetos de Lei (n.os 155 e 288 a 304/XV/1.ª): N.º 155/XV/1.ª (Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros): — Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas. N.º 288/XV/1.ª (PAN) — Prevê a necessidade de avaliação de impacto ambiental da prática agrícola em modo intensivo e superintensivo de espécies arbóreas. N.º 289/XV/1.ª (PAN) — Aprova medidas de alargamento da oferta de alojamento para estudantes do Ensino Superior, alterando a Lei de bases da habitação e o Código do IRS. N.º 290/XV/1.ª (PAN) — Estabelece mecanismos de compensação para docentes deslocados da residência no cumprimento do seu exercício profissional. N.º 291/XV/1.ª (BE) — Programa de atração e fixação de docentes na escola pública. N.º 292/XV/1.ª (BE) — Altera a natureza de financiamento das instituições do Ensino Superior extinguindo o regime fundacional.

N.º 293/XV/1.ª (L) — Alargamento de atribuições da autoridade para as condições do trabalho (alteração ao Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho). N.º 294/XV/1.ª (L) — Estabelece o dever de o Governo proceder ao levantamento e divulgação de dados referentes a creches e estabelecimentos públicos de educação pré-escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 3 anos de idade. N.º 295/XV/1.ª (PAN) — Aumenta as garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras referentes à formação profissional, alterando o Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro. N.º 296/XV/1.ª (BE) — Alarga os acordos de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais na valência de creche a entidades públicas. N.º 297/XV/1.ª (BE) — Cria o Banco Público de Terras Agrícolas. N.º 298/XV/1.ª (CH) — Altera o artigo 78.º-E do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) no sentido de aumentar a percentagem e os limites da dedução das despesas relativas a habitação. N.º 299/XV/1.ª (CH) — Estabelece medidas de apoio e proteção dos particulares, por motivo do aumento das taxas

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de juros aplicáveis aos contratos de financiamento à aquisição de habitação própria e permanente. N.º 300/XV/1.ª (CH) — Altera a Lei n.º 60/2007, de 10 de setembro, que estabelece o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, densificando a necessidade de avaliação do RJIE. N.º 301/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, aumentando a proteção dos animais de companhia.

N.º 302/XV/1.ª (PCP) — Medidas de apoio aos estudantes no ensino superior no âmbito da Ação Social Escolar. N.º 303/XV/1.ª (PCP) — Eliminação das propinas, taxas e emolumentos no ensino superior público. N.º 304/XV/1.ª (BE) — Altera o Regime Jurídico Aplicável à Contratação a Termo procedendo à vigésima primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. (a) Publicadas em Suplemento.

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PROJETO DE LEI N.º 155/XV/1.ª

(REFORÇA A PROTEÇÃO DOS ANIMAIS DURANTE O TRANSPORTE E OPERAÇÕES AFINS E

ESTABELECE O FIM DA EXPORTAÇÃO DE ANIMAIS VIVOS PARA PAÍSES TERCEIROS)

Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas

Índice

Parte I – Considerandos

1. Nota introdutória

2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa

3. Enquadramento legal e antecedentes

4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

1. Nota introdutória

O Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações afins e

estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros» deu entrada a 14 de junho de 2022

tendo sido junta a ficha de avaliação prévia de impacto de género.

Foi admitido a 17 de junho de 2022 e, no mesmo dia, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia

da República, baixou, na generalidade, à Comissão de Agricultura e Pescas.

A 29 de junho, na reunião ordinária n.º 11 da Comissão de Agricultura e Pescas, foi atribuída a elaboração

do parecer ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que indicou como relator, o signatário, Deputado João

Castro.

2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa

A Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN), subscritora do Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a

proteção dos animais durante o transporte e operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos

para países terceiros», justifica a apresentação da iniciativa, com um vasto conjunto de considerações, das quais

se sublinham:

– As referências às disposições preambulares do Regulamento (CE) n.º 1/2005 do Conselho, de 22 de

dezembro de 2004:

1) «Deverá limitar-se, tanto quanto possível, o transporte de animais vivos em viagens de longo curso,

incluindo o transporte de animais para abate (…)»;

2) «Deverá limitar-se as operações de carga e descarga dos animais (…)»;

3) «Qualquer pessoa que manuseie animais durante o transporte deverá ter recebido formação adequada

(…)»;

4) «Os Estados-membros devem estabelecer um quadro de sanções que sejam efetivas, proporcionadas e

dissuasivas (…)»;

5) «É necessário estabelecer medidas e normas específicas para o transporte marítimo (…)».

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– O Decreto-Lei n.º 265/2007, de 24 de julho, que diz, «visou assegurar a execução e garantir o cumprimento

das obrigações decorrentes do regulamento citado, aprovando, ainda, normas específicas destinadas a regular

o transporte rodoviário realizado em território nacional, bem como o transporte marítimo entre os Açores, a

Madeira e o continente, e entre ilhas.» e salienta aspetos que, em seu entender, são relevantes;

– O acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 21/12/2011, no âmbito do Processo

C‑316/10, aclarando, com efeitos erga omnes, que «a adoção por parte de um Estado‑Membro de normas que

precisam concretamente, a nível nacional, o âmbito de requisitos formulados em termos gerais pelo

Regulamento n.º 1/2005 é suscetível de reforçar a segurança jurídica, uma vez que essas normas estabelecem

critérios que aumentam a previsibilidade dos requisitos deste regulamento (…)».

É igualmente feita referência à petição apresentada na Assembleia da República, em 15/12/2017, a Petição

n.º 436/XIII/3.ª, subscrita por 7225 cidadãos, solicitando a abolição do transporte de animais vivos por via

marítima para países fora da União Europeia.

São apresentados relatos, denúncias e conclusões que suscitam a leitura da iniciativa.

Conforme síntese apresentada na nota técnica anexa:

– «A proponente afirma que em Portugal a exportação de animais vivos e o respetivo transporte para países

terceiros continua a ser feita, em condições que estão longe de ser aceitáveis, carecendo de implementação de

normas mais apertadas, nomeadamente, no que tange aos tempos de viagem, ao espaço disponível para cada

animal, à exposição a fatores meteorológicos críticos, principalmente temperaturas muito elevadas, à formação

do pessoal, à presença e acompanhamento de médicos veterinários e ao aumento do montante das coimas,

tendo como objetivo final restringir o transporte de animais vivos, visando a prazo a sua abolição, justificando

assim, a apresentação desta iniciativa».

3. Enquadramento legal e antecedentes

O Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª foi subscrito pela Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) ao abrigo

e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da

Republica (RAR), que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por

força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem

como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da

alínea f) do artigo 8.º do RAR.

De acordo com a nota técnica anexa:

– «A iniciativa em análise toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo

119.º do Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente

o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais estabelecidos

no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.»;

– «Encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR,

uma vez que este projeto de lei define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem

legislativa e parece não infringir princípios constitucionais.»;

– «O título da presente iniciativa legislativa – ‘Reforça a proteção dos animais durante o transporte e

operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros’ traduz sinteticamente

o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro,

conhecida como lei formulário. Em caso de aprovação, em sede de apreciação na especialidade ou em redação

final, o título poderá ser objeto de aperfeiçoamento formal.»;

– Quanto à entrada em vigor, esta terá lugar no 1.º dia do 2.º mês seguinte ao da sua publicação, nos termos

do artigo 5.º do projeto de lei em análise, e respeitando o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário;

– Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, sendo objeto de publicação na 1.ª

série do Diário da República, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.

Para mais detalhes dever-se-á consultar a nota técnica apresentada em Parte IV – Anexos.

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4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), não se apurou, na atual Legislatura, a existência

de nenhuma iniciativa legislativa ou petição sobre a matéria objeto do projeto de lei vertente ou com ele conexa.

De acordo com a nota técnica anexa registam-se os seguintes antecedentes parlamentares:

– Projeto de Lei n.º 1013/XIV/3.ª (PAN) – Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações

afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros – Caducada;

– Projeto de Lei n.º 1051/XIII/4.ª (BE) – Regula o transporte de longo curso de animais vivos – Rejeitada;

– Projeto de Lei n.º 719/XIII/3.ª (PAN) – Adota medidas mais garantísticas do bem-estar animal no que diz

respeito ao transporte de animais vivos – Rejeitado;

– Petição n.º 436/XIII/3.ª – Abolição do transporte de animais vivos por via marítima para países fora da União

Europeia – Concluída.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O relator do presente parecer reserva a sua opinião para o debate em plenário da iniciativa, a qual é, de

resto, de elaboração facultativa conforme o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do RAR.

PARTE III – Conclusões

A Comissão de Agricultura e Mar aprova o seguinte parecer:

1 – Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da

República o Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações

afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros»;

2 – A apresentação do Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª foi efetuada nos termos constitucionais, legais e

regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos;

3 – A Comissão de Agricultura e Pescas é de parecer que o Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª reúne as condições

constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário da Assembleia da República.

PARTE IV – Anexos

Nota técnica elaborada pelos serviços da Assembleia da República, ao abrigo do artigo 131.º do Regimento

da Assembleia da República.

Palácio de São Bento, 5 de setembro de 2022.

O Deputado autor do parecer, João Castro — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH, da IL e do BE, na

reunião da Comissão de 15 de setembro de 2022.

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PROJETO DE LEI N.º 288/XV/1.ª

PREVÊ A NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL DA PRÁTICA AGRÍCOLA EM

MODO INTENSIVO E SUPERINTENSIVO DE ESPÉCIES ARBÓREAS

Exposição de motivos

Nas últimas décadas tem-se vindo a verificar uma crescente reconversão de culturas agrícolas tradicionais

em plantações intensivas em grande escala, recorrendo a métodos de cultivo dependentes de fertilizantes,

pesticidas e da utilização de quantidades de água insustentáveis.

Esta expansão de culturas intensivas não tem sido devidamente acompanhada pelas entidades competentes,

não foram identificados atempadamente os impactos negativos nos recursos naturais nem na saúde pública.

De acordo com dados da administração central, a área de produção de olival intensivo e superintensivo tem

vindo a aumentar, principalmente na zona de regadio do Alentejo.

São consideradas culturas intensivas todas as que são sujeitas a regime de regadio e que possuam mais de

200 árvores por hectare (ha), sendo qualificadas como superintensivas, as culturas onde o número de plantas

seja superior a 1000 árvores por ha1.

De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2021 a área total de olival era 380 412 ha, sendo que

a maioria se reporta a olivais intensivos. Só na área do regadio do Alqueva, em 2019, os olivais ocupavam 66

237 ha, representando 55% da área total2. Com o desenvolvimento do regadio, tem-se verificado não só o

aumento de olival intensivo como de outras árvores de fruto, nomeadamente a cultura de abacate e de amêndoa,

sendo que relativamente ao amendoal intensivo, a área de cultivo se encontra em franco crescimento, tendo

aumentando de 1000 ha para 11 448 ha desde 2015.

A falta de regulação e de monitorização na utilização de pesticidas e fertilizantes, aliadas ao objetivo de

aumentar a produtividade, provocam a contaminação dos solos e, consequentemente, dos recursos hídricos

subterrâneos. Esta situação tem impacto não só nos ecossistemas, mas também na saúde das populações das

áreas circundantes, já que é comum as pessoas terem furos e utilizarem essa água para a rega ou para o seu

consumo.

Acresce que a maioria das plantações de olival e amendoal cultivadas de modo intensivo estão localizadas

maioritariamente a sul de Portugal, onde existe maior escassez de água, com tendência a aumentar segundo

os modelos para as alterações climáticas. Parece, por isso, particularmente imprudente permitir e fomentar a

expansão deste tipo de culturas sem que haja uma correta avaliação do impacto no ambiente e na saúde pública.

Conscientes da crescente alteração dos métodos de cultivo de azeitona e dos possíveis impactos que poderia

ter nos recursos naturais, em 2008, terá sido constituído por meio do Despacho n.º 26873/2008, de 23 de

outubro, o Grupo de Trabalho do Olival (GTO) com o objetivo de «realizar as análises consideradas necessárias

ao acompanhamento constante da evolução das características e estado da fertilidade dos solos, e à

apresentação anual de um relatório com as respetivas conclusões».

Destes relatórios, elaborados em 2009, 2010 e 2011, surgiram diversas conclusões, entre as quais é referido

que em 77% dos olivais intensivos não existe controlo do teor da água do solo e 58% não regista o volume de

água utilizado, devido ao facto de não possuírem equipamento de medição, o que revela que a utilização da

água não é feita de modo consciente e racional3.

Este facto é reforçado pelas declarações da responsável pelo Departamento de Recursos Hídricos da

Agência Portuguesa do Ambiente (APA)4, que afirma que licenciaram no passado ano hidrológico «que começou

em outubro de 2018, mais de quatro mil furos de captação de água, resultado da seca, mas também da crescente

intensificação de alguma agricultura».

Já no relatório do Grupo de Trabalho do Olival de 20105 se encontrava o alerta para que os recursos hídricos

1 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 1.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, 2009. 2 https://www.edia.pt/wp-content/uploads/2020/02/AnuarioAgricolaAlqueva2019.pdf. 3 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 1.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, 2009. 4https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/interior/ha-pesticidas-proibidos-em-aguas-subterraneas-portuguesas-10877980.html?fbclid=IwAR31-Wfr_59gXkxm1uL3tCQpEUbTVWX15uVpu1r_ouLRjBV0qJkz_udDPxc. 5 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 2.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura,

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fossem utilizados de forma sustentável, uma vez que a «rega pode promover impactos ambientais significativos,

nomeadamente ao nível do esgotamento dos aquíferos, do risco de erosão dos solos e da salinização ou

contaminação das águas».

A salinidade dos solos é causada pela deficiente drenagem aliada à aplicação excessiva de fertilizantes,

acabando por ser prejudicial para a sua produção, uma vez que quando os sais estão em excesso, as plantas

não conseguem absorver a água do solo devido à elevada pressão osmótica da solução.

Através do recente estudo da APA à qualidade das águas subterrâneas, foi detetada a presença de pesticidas

proibidos por lei em zonas onde a atividade agrícola é mais intensa, sendo que de acordo com a APA «se estas

substâncias já estão a chegar às nossas águas subterrâneas é porque estão a ser usadas em concentrações

bastante elevadas»6.

Visto que o estudo de 2009 do Grupo de Trabalho do Olival referia que os olivais intensivos utilizam em

média, mais do dobro de fertilizantes e fitofarmacêuticos que os tradicionais, e que, na maioria dos casos, não

existem registos sistemáticos das quantidades dos fitofármacos e fertilizantes utilizados, parece que se encontra

estabelecida uma possível correlação entre a contaminação dos aquíferos e a desmedida expansão de culturas

intensivas e superintensivas.

Em suma, a falta de regulação e monitorização na utilização de pesticidas tem também impactos significativos

na saúde da população das regiões onde se encontram estas culturas.

A falta de regulamentação da atividade aliada à permissividade da atual legislação relativamente à aplicação

de fitofarmacêuticos, admite a sua livre aplicação na proximidade de zonas habitacionais. Esta situação é

preocupante para as populações afetadas e deve, também, preocupar o legislador. Verifica-se uma lacuna no

que diz respeito ao estabelecimento de zonas de proteção como medida de redução do risco de contaminação

das populações e do meio ambiente que importa agora suprir.

Também é de referir que plantações intensivas de única espécie, mesmo autóctones, implicam uma

diminuição de biodiversidade, diminuição da resiliência das culturas a infestações, e uma menor capacidade de

adaptação às alterações climáticas por serem dependentes do regadio e dos pesticidas aplicados.

Por isso, apesar de serem constituídas por espécies autóctones, as plantações intensivas de oliveiras e

amendoais comprometem a biodiversidade, estando referido no 2.º relatório do GTO (2010) que «é no olival

superintensivo que se manifesta a acentuada quebra de diversidade», apresentando «tendência para a

dominância de um pequeno grupo de espécies», provocando um desequilíbrio da flora e, consequentemente,

da fauna.

O atual regime jurídico de avaliação de impacte ambiental (AIA), através do Decreto-Lei n.º 152-B/2017 de

11 de dezembro, já determina a obrigatoriedade de ser efetuada AIA em situações onde haja reconversão de

terras não cultivadas há mais de cinco anos para agricultura intensiva, acima dos 100 ha de um modo geral e

em zona sensíveis acima dos 50 ha.

Assim, consideramos que todas as culturas intensivas arbóreas acima de 50 ha, ou que juntamente com

outras áreas contíguas perfaçam mais de 50 ha devam ser sujeitas a AIA independentemente de não estarem

situadas em zonas sensíveis.

Ainda, a Diretiva 2010/75/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro, veio reconhecer a

existência de diferentes abordagens no controlo das emissões para o ar, água e solos que poderia favorecer a

transferência de problemas de poluição de um meio físico para outro, ao invés de favorecer a proteção do

ambiente no seu todo.

Por isso, tornou-se relevante considerar uma «abordagem integrada para a prevenção e o controlo das

emissões com o estabelecer de um quadro geral para o controlo das principais atividades industriais que dê

prioridade a uma intervenção a montante e que garanta uma gestão cuidadosa dos recursos naturais tendo em

conta, sempre que necessário, a situação económica e as especificidades do local em que a atividade industrial

é desenvolvida».

No Decreto-Lei n.º 127/2013, de 30 de agosto, estabelece o regime de emissões industriais aplicável à

prevenção e ao controlo integrado da poluição, descrevendo quais as atividades que são sujeitas a este controlo

e quais a que têm obrigatoriedade de possuírem uma licença ambiental, que determina quais os valores limite

de emissão (VLE) para as substâncias poluentes suscetíveis de serem emitidas em volume significativo, tendo

Desenvolvimento Rural e Pescas, 2010. 6 .https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/ha-pesticidas-proibidos-em-aguas-subterraneas-portuguesas-10877980.html.

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em conta a sua natureza e potencial de transferência para a água, solo e ar.

Assim, as atividades sujeitas à titularidade de licença ambiental têm de monitorizar as emissões das suas

instalações, definir as medidas de prevenção e são obrigadas a comunicar à APA através de relatórios

periódicos.

Atualmente, já são sujeitas a licença ambiental algumas atividades agropecuárias, nomeadamente

matadouros, instalações de criação de aves e suínos e instalações de eliminação e valorização de carcaças de

animais, devido ao impacto negativo das emissões da sua atividade no ambiente.

Contudo, não existe qualquer obrigatoriedade para que as culturas intensivas e superintensivas agrícolas

monitorizem a emissão de poluentes, nomeadamente «biocidas e produtos fitofarmacêuticos» e fertilizantes (em

especial fosfatos e nitratos), apesar destas substâncias constarem no Anexo II do Decreto-Lei n.º 127/2013, de

30 agosto.

Perante o quadro legal existente, o Pessoas-Animais-Natureza considera que as culturas intensivas e

superintensivas arbóreas acima de 50 ha para além de deverem ser sujeitas a AIA, também deverão ser sujeitas

a licença ambiental. Assim, estas atividades passam a ter que monitorizar e reportar as suas emissões às

entidades competentes e fixar as medidas de controlo das emissões.

Com as alterações propostas pretende-se reduzir o impacto negativo que as culturas agrícolas intensivas

representam na saúde pública, na contaminação dos solos e consequentemente dos recursos hídricos.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada do Pessoas-Animais-Natureza

apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei determina a necessidade de avaliação de impacto da prática agrícola em modo intensivo e

superintensivo de espécies arbóreas.

Artigo 2.º

Definições

Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por:

a) «Culturas arbóreas intensivas» aquelas que estão sujeitas a regime de regadio e que possuam entre 200

a 999 árvores por hectare (ha);

b) «Culturas arbóreas superintensivas» aquelas que estão sujeitas a regime de regadio e que possuam mais

de 1000 árvores por hectare (ha);

c) Áreas sensíveis:

i) Áreas protegidas, classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho;

ii) Sítios da Rede Natura 2000, zonas especiais de conservação e zonas de proteção especial,

classificadas nos termos do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, no âmbito das Diretivas 79/409/CEE,

do Conselho, de 2 de abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens, e 92/43/CEE, do

Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora

selvagens;

iii) Zonas de proteção dos bens imóveis classificados ou em vias de classificação definidas nos termos da

Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.

Artigo 3.º

Medidas de redução do risco de contaminação ambiental

1 – A instalação de culturas arbóreas intensivas e superintensivas só é admitida a uma distância superior a

300 metros de zonas habitacionais, de zonas de lazer e de áreas sensíveis.

2 – Os projetos relativos a culturas arbóreas intensivas ou superintensivas devem prever a implementação

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de zonas tampão, com vegetação adequada, entre as áreas de cultivo e as zonas habitacionais e áreas

sensíveis.

3 – O disposto nos números anteriores deve ser regulamentado pelo membro do Governo com a tutela do

Ambiente no prazo de 180 dias após a entrada em vigor da presente lei.

Artigo 4.º

Avaliação de impacto ambiental

Estão sujeitos a avaliação de impacto ambiental as instalações agrícolas arbóreas intensivas e

superintensivas, com área superior a 50 ha ou que juntamente com outras áreas contíguas, possuam área

superior a 50 ha.

Artigo 5.º

Licença ambiental

Os projetos de culturas arbóreas em regime intensivo e superintensivo são sujeitos a licença ambiental, nos

termos do disposto no Decreto-Lei n.º 127/2013 de 30 de agosto.

Artigo 6.º

Nulidades

Todos os atos administrativos praticados em violação da presente lei são considerados nulos.

Artigo 7.º

Fiscalização

Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades, compete, em especial, à Agência

Portuguesa do Ambiente, à Direção Regional de Agricultura e Pescas, às câmaras municipais e à Guarda

Nacional Republicana assegurar a fiscalização do cumprimento das normas constantes do presente diploma.

Artigo 8.º

Contraordenações

A infração ao disposto nos artigos 3.º, 4.º e 5.º da presente lei constitui contraordenação ambiental grave, e

é punível com coima nos termos da Lei n.º 50/2006 de 29 de agosto na sua redação atual, nos termos a

regulamentar.

Artigo 9.º

Instrução dos processos e aplicação das coimas

Compete às entidades fiscalizadoras instruir os processos relativos às contraordenações referidas nos

artigos anteriores e decidir da aplicação da coima.

Artigo 10.º

Afetação do produto das coimas

1 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a afetação do produto das coimas faz-se da seguinte

forma:

a) 25% para a autoridade autuante;

b) 25% para a autoridade instrutória;

c) 50% para o Fundo Ambiental.

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2 – O produto das coimas dos processos contraordenacionais instruídos pelo presidente da câmara municipal

constitui receita do município, deduzida de 10%, que serão afetos à entidade autuante se diferente desta.

Artigo 11.º

Relatório

1 – Para efeitos de monitorização da aplicação da presente lei, as direções regionais de agricultura e pescas

produzem os relatórios de gestão do ano anterior, no que diz respeito ao número de licenciamentos, novos e

existentes, número de hectares ocupados, tipo de cultura e outros que considere relevantes.

2 – Com base nos relatórios referidos no número anterior, a Agência Portuguesa do Ambiente elabora e

publicita um relatório anual sobre a situação ao nível nacional relativa à produção arbórea intensiva e

superintensiva, até ao fim do primeiro trimestre de cada ano civil.

Artigo 12.º

Moratória

As culturas agrícolas intensivas e superintensivas existentes previamente à publicação da lei, e apenas no

que diz respeito ao disposto no artigo 3.º, têm o prazo de um ano para se adaptarem.

Artigo 13.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real

———

PROJETO DE LEI N.º 289/XV/1.ª

APROVA MEDIDAS DE ALARGAMENTO DA OFERTA DE ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES DO

ENSINO SUPERIOR, ALTERANDO A LEI DE BASES DA HABITAÇÃO E O CÓDIGO DO IRS

Exposição de motivos

Uma das componentes que garante a democratização do acesso ao ensino superior é a garantia de que os

estudantes que se encontram deslocados do seu local de residência têm um alojamento condigno e a custos

acessíveis.

De acordo com os dados mais recentes – referentes ao ano letivo 2020/21 – existem apenas pouco mais de

15 mil camas em residências de instituições de ensino públicas para um total de 108 mil estudantes de ensino

superior deslocados. Dados do Ministério do Ensino Superior referentes ao ano de 2018, diziam-nos que na

Universidade de Lisboa existiam camas em residências para apenas 8% dos estudantes deslocados inscritos,

na Universidade de Coimbra esse valor era de 12% e na Universidade do Porto esse valor era pouco inferior a

12%.

Associado à insuficiência da oferta pública está ainda a escassez da oferta no mercado de arrendamento e

a existência de custos proibitivos em tal mercado. De acordo com os dados do portal BQuarto, no início do ano

letivo de 2022/2023, os preços médios mensais de um quarto individual são de 391 euros em Lisboa (+11,90%

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16 DE SETEMBRO DE 2022

11

que em 2021), de 335 euros no Porto (+335 euros que em 2021), de 233 euros em Coimbra (+9,60% que em

2021), de 310 euros em Aveiro (+310 euros que em 2021) e de 181,50 euros em Bragança (+21% que em 2021).

Estes dados demonstram-nos que o direito dos estudantes deslocados a alojamento condigno e a custos

acessíveis está longe de ser uma realidade no nosso País, não obstante esta importância que tal direito tem

para se conseguir a democratização do ensino superior.

O Plano Nacional de Alojamento do Ensino Superior, apesar de anunciado em 2018 e de ter objetivos muito

meritórios, devido ao seu insuficiente cumprimento pouco ou nada contribuiu para a solução deste problema,

poucas tendo sido as novas camas criadas desde o seu anúncio.

Assim face à dimensão preocupante deste problema e a insuficiência das medidas tratadas pelo Governo,

com a presente iniciativa o PAN, cumprindo o disposto no seu programa eleitoral, propõe um conjunto de

medidas de alargamento do alojamento para estudantes do ensino superior, que incluem a criação de um

benefício fiscal para os senhorios – por via da redução de 18 pontos percentuais da respetiva taxa de tributação

autónoma em sede de IRS – que celebrem contratos de arrendamento para alojamento de estudantes do ensino

superior com custo a baixo da média da área onde se localizem, a previsão legal da obrigatoriedade de todos

os projetos de habitação pública preverem uma percentagem destinada a jovens até aos 35 anos de idade e ao

alojamento de estudantes do ensino superior e a necessidade de a política nacional de habitação ser articulada

com o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aprova um conjunto de medidas de alargamento da oferta de alojamento para estudantes do

ensino superior, procedendo:

a) À primeira alteração à Lei de bases da habitação, aprovado pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro;

b) À alteração do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-

Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro.

Artigo 2.º

Alteração à Lei de bases da habitação

São alterados os artigos 16.º e 27.º da Lei de bases da habitação, aprovado pela Lei n.º 83/2019, de 3 de

setembro, na sua redação atual, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 16.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

12

h) […];

i) […];

j) A articulação com o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior, sempre que justificado.

6 – […].

7 – […].

Artigo 27.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […].

2 – […].

3 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) Que em todos os programas de habitação ou de cooperação existirá uma percentagem de habitação

destinada aos jovens com idade até aos 35 anos e, sempre que justificado, destinada ao alojamento de

estudantes do ensino superior.

4 – […].»

Artigo 3.º

Alteração ao Código do IRS

É alterado o artigo 72.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo

Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 72.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […].

2 – […].

3 – […].

4 – […].

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16 DE SETEMBRO DE 2022

13

5 – É aplicada uma redução de 18 pontos percentuais da respetiva taxa autónoma:

a) Aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para habitação permanente com

duração igual ou superior a vinte anos, bem como aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de direito

real de habitação duradoura (DHD), na parte respeitante ao pagamento da prestação pecuniária mensal;

b) Aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para alojamento de estudantes do

ensino superior com custo a baixo da média da área onde se localize o imóvel, na parte respeitante ao

pagamento da prestação pecuniária mensal e nos termos a definir pelos membros do Governo responsáveis

pelas áreas das finanças e do ensino superior.

6 – […]:

a) […]; e

b) […].

7 – […].

8 – [Revogado.]

9 – […].

10 – […].

11 – [Revogado.]

12 – […].

13 – […].

14 – […].

15 – […].

16 – […].

17 – […]:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […].

19 – […].

20 – […].

21 – […].

22 – […].»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua

publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

14

PROJETO DE LEI N.º 290/XV/1.ª

ESTABELECE MECANISMOS DE COMPENSAÇÃO PARA DOCENTES DESLOCADOS DA

RESIDÊNCIA NO CUMPRIMENTO DO SEU EXERCÍCIO PROFISSIONAL

Exposição de motivos

A educação é um dos mais importantes pilares da sociedade. Os docentes são agentes essenciais para o

desenvolvimento de conhecimento e competências pessoais e interpessoais no seio da comunidade. São um

elo fundamental com as famílias e modelo de referência de muitas crianças e jovens.

A profissão de docente foi sofrendo o desgaste de profundas alterações sociais e tem sido alvo de muitos

obstáculos e dificuldades, seja como resultado de mudanças políticas, seja pelas condições remuneratórias e

de progressão na carreira que não tem permitido a dignificação nem a valorização destes profissionais e os

afasta cada vez mais do sistema educativo, onde já são visíveis carências, particularmente ao nível de algumas

disciplinas. Muito do capital humano especializado que resulta de anos de investimento e formação dos docentes

é canalizado para outras profissões por sentirem falta de condições de segurança e atratividade na docência.

Para além dos desafios educativos e sociais, das condições profissionais, os docentes viram ainda mais

agravadas as condições do seu exercício profissional, no contexto sanitário da COVID-19. Não obstante, os

docentes, bem como a comunidade educativa em geral, tem demonstrado o seu valor e resiliência neste

processo, não deixando de exercer a sua missão da melhor forma possível perante as condições que enfrentam.

Se a situação atual dos docentes já é difícil com todas as questões relacionadas com as condições de

desvalorização salarial e limitada progressão das carreiras, ela torna-se mais grave quando os docentes, para

poderem exercer a sua profissão de educadores qualificados, se veem obrigados, por força dos modelos

concursais vigentes, a concorrer para locais afastados das suas residências fiscais e agregados familiares,

custeando a expensas próprias as despesas de deslocação e/ou residência provisória a que tem que ficar

sujeitos. O problema é mais grave em algumas regiões do País, onde ficam por preencher muitos dos horários

vagos, na medida em que as condições salariais não permitem o pagamento dessas despesas.

No Orçamento do Estado para 2020, foi prevista a criação de um incentivo para a carreira docente em áreas

do País e grupos de recrutamento onde a oferta de profissionais pudesse revelar-se escassa, mas este processo

não chegou a acontecer.

De facto, os docentes têm sido uma das classes profissionais mais prejudicadas na função pública, havendo

desigualdade perante outros profissionais do Estado. A Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, impõe que a deslocação

de trabalhadores da função pública para posto de trabalho a uma distância de mais de 60 km, inclusive, em

relação à sua residência exige o acordo do trabalhador para a mobilidade. A contratação da carreira docente

poderia ser equiparada enquanto se mantiveram as regras de contratação atuais dos docentes, e nesse sentido,

compensar financeiramente os docentes com as despesas de habitação e/ou deslocações, que por imposição

das regras concursais a que tem que estar sujeitos, fiquem colocados num equipamento escolar público com

uma distância equivalente de 60 ou mais km da sua residência fiscal.

As atuais regras concursais não garantem estabilidade, são geradoras de injustiças através das situações

de ultrapassagem, e todos estes fatores têm contribuído para o afastamento de milhares de docentes, para o

não rejuvenescimento da profissão e para a perda de capital humano especializado nas escolas. A contínua

desvalorização dos docentes transmite à sociedade um sinal negativo e errado sobre a importância e dignidade

profissional da classe docente, e por consequência, da escola.

No sentido de trazer maior atratividade de novos docentes, promover o rejuvenescimento da classe, reduzir

o nível de abandono da profissão por parte dos docentes, garantir a estabilidade e condições adequadas ao seu

exercício profissional, sem colocar em risco a continuidade dos projetos educativos e o funcionamento das

escolas, e ainda garantir a existência de recursos humanos especializados em todas as áreas disciplinares e

todo o território nacional, o PAN apresenta o seguinte projeto de lei.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

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16 DE SETEMBRO DE 2022

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece mecanismos de compensação para docentes deslocados da residência no

cumprimento do seu exercício profissional.

Artigo 2.º

Âmbito de aplicação

Os mecanismos de compensação previstos na presente lei aplicam-se a todos os educadores de infância e

professores dos ensinos básico e secundário da escola pública, independentemente do tipo vínculo e do

respetivo carácter profissionalizado.

Artigo 3.º

Mecanismo de compensação de docentes deslocados

1 – É criado um mecanismo de compensação de docentes deslocados.

2 – O mecanismo previsto no presente artigo assume a forma de compensação pecuniária pelas despesas

de habitação acrescidas que os docentes referidos no artigo 2.º tenham na sequência de colocação em

estabelecimentos de ensino públicos com distância igual ou superior a 50 km da sua residência fiscal, no

respetivo concurso.

3 – A compensação pecuniária referida no número anterior assume a forma de reembolso de despesas e o

seu pagamento está dependente da apresentação de documento comprovativo da realização das despesas

adicionais.

Artigo 4.º

Mecanismo de compensação com custos acrescidos com transportes e deslocações

1 – É criado um mecanismo de compensação com custos acrescidos com transportes e deslocações.

2 – O mecanismo previsto no presente artigo assume a forma de compensação pecuniária e é aplicável aos

docentes referidos no artigo 2.º que, na sequência de colocação em estabelecimentos de ensino públicos com

distância igual ou superior a 60 km da sua residência fiscal, tenham mantido habitação nessa residência e por

causa disso tenham visto agravadas em mais de 25%, a despesa mensal com transportes ou deslocações.

3 – A compensação pecuniária referida no número anterior assume a forma de reembolso das despesas

acrescidas com transportes e deslocações, e o seu pagamento está dependente da apresentação de documento

comprovativo da realização das despesas adicionais.

Artigo 5.º

Regulamentação

No prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, o Governo procederá, na sequência de

negociação com as estruturas representativas dos Professores, à regulamentação do disposto na presente lei,

definido designadamente o montante máximo dos mecanismos compensação previstos.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

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A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

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PROJETO DE LEI N.º 291/XV/1.ª

PROGRAMA DE ATRAÇÃO E FIXAÇÃO DE DOCENTES NA ESCOLA PÚBLICA

Exposição de motivos

A falta de docentes na escola pública tem consequências duradouras e causas estruturais: A combinação do

envelhecimento, da precariedade e da desvalorização da carreira docente.

No final do segundo período de 2021/22 eram 30 mil alunos sem professor a pelo menos uma disciplina. Um

estudo realizado para a PORDATA pela antiga diretora da Direção-Geral de Estatísticas da Educação anunciava

que, se nada fosse feito, seriam 110 mil alunos na mesma situação no início do presente ano letivo. A lista de

disciplinas com falta de professores é cada vez maior: Português, Matemática, Biologia e Geologia, Física e

Química, História, Geografia, Inglês, Filosofia e Informática.

À desvalorização sistemática da carreira docente corresponde a diminuição do número de estudantes

interessados nos cursos que formam para o ensino. De acordo com a OCDE, Portugal é dos países em que

menos jovens dizem querer vir a ser professores e professoras.

Para cativar mais jovens para a docência é preciso começar por valorizar os profissionais atuais e conseguir

que muitos dos que abandonaram a profissão sintam o apelo para regressar. Sem vinculação à carreira, os

docentes precários não só vivem na incerteza e sem progressão como frequentemente ficam sujeitos às

flutuações salariais que resultam dos horários incompletos. Esta desvalorização da carreira docente é uma

injustiça para com as professoras, os professores e educadores de infância e causa grandes prejuízos à escola

pública.

Acresce que, a cada ano que passa, o relatório do Conselho Nacional de Educação vem alertar para o

envelhecimento do corpo docente e para a perspetiva de uma aposentação abrupta de uma grande parte dos

docentes. No seminário «Faltam professores! E agora?», organizado pelo Conselho Nacional de Educação no

passado dia 18 de maio de 2022, o coordenador do estudo da NOVA SBE pedido pelo Ministério da Educação

sublinhou que cerca de 40% dos 120 mil professores que estavam a dar aulas em 2018/19 previsivelmente

estarão reformados até ao ano letivo de 2030/31. Só até ao final de 2022 poderão vir a reformar-se mais 2220

docentes.

No imediato, o problema é crítico em determinadas zonas do País, como Lisboa, Setúbal e Algarve, e em

determinadas disciplinas. Mas, a prazo, a tendência é para que o envelhecimento da classe docente provoque

uma carência generalizada de docentes. Em relação a essa tendência estrutural, as medidas de curto prazo

agora tomadas pelo Governo nada podem; pelo contrário, algumas delas como a redução dos destacamentos

e mobilidades para instituições sociais, autarquias e centros científicos, além dos Centros Ciência Viva, assim

como os obstáculos à mobilidade por doença, poderão ter efeitos perversos no sistema educativo.

No essencial, para atrair e fixar professores à escola pública é preciso garantir estabilidade a quem se

candidata a ensinar as gerações futuras, valorizar a profissão e o vínculo à educação pública pela sua missão

constitucional e oferecer condições de trabalho dignas.

Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe um programa de atração e fixação de

docentes à escola pública que reúne, sem prejuízo da negociação sindical em torno de outras reformas

necessárias, três medidas já identificadas como estruturais e necessárias:

1. Vinculação extraordinária de docentes para combater a precariedade, que afeta sobretudo as gerações

mais novas, impondo salários baixos e uma vida de instabilidade;

2. Criação de regime de compensação a docentes deslocados, para garantir que os professores não têm de

pagar para trabalhar e que conseguem fazer face às despesas de alojamento e transporte;

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16 DE SETEMBRO DE 2022

17

3. Medidas para reduzir as desigualdades que afetam os horários incompletos.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei cria um programa de atração e fixação de docentes à escola pública.

Artigo 2.º

Âmbito

A presente lei aplica-se a todos os educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário

da escola pública.

Artigo 3.º

Programa extraordinário de vinculação dos docentes

1 – O programa extraordinário de vinculação dos docentes consiste num conjunto de concursos externos

destinados à vinculação extraordinária de docentes com três ou mais anos de serviço nos termos previstos pelos

artigos 23.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua atual redação.

2 – O programa extraordinário de vinculação de professores não prejudica a aplicação do artigo 42.º do

Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua redação atual.

Artigo 4.º

Regime de compensação a docentes deslocados

1 – Os educadores de infância, professores do ensino básico e professores do ensino secundário

profissionalizados ou a aguardar profissionalização, contratados ou a contratar, que exerçam funções em

estabelecimento de ensino situado a uma distância de mais de 60 km, inclusive, do seu local de residência

habitual e/ou domicílio fiscal recebem uma compensação pecuniária por despesas acrescidas no exercício da

sua profissão.

2 – Para efeitos do número anterior, serão consideradas elegíveis para reembolso despesas de transportes

e habitação, mediante comprovativo, num montante máximo a ser determinado pelo membro do Governo

responsável pelas áreas da educação e da Administração Pública.

Artigo 5.º

Horários incompletos

1 – As escolas podem por decisão própria determinar a atribuição de atividade letiva de forma a completar

todos os horários incompletos que não foram preenchidos.

2 – Aos docentes cujo contrato a termo resolutivo preveja a laboração em horário inferior a 22 horas letivas

semanais, no caso do 2.º e 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário, ou a 25 horas semanais, no caso

do 1.º ciclo do ensino básico e da educação pré-escolar, o tempo a declarar para os efeitos previstos no artigo

16.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, corresponde a 30 dias.

Artigo 4.º

Regulamentação

1 – O Governo, mediante negociação com as estruturas sindicais, procederá à regulamentação da presente

lei, nomeadamente no que diz respeito ao calendário do programa de vinculação extraordinária.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

18

2 – As medidas previstas nos artigos 2.º e 3.º da presente lei serão objeto de negociação e regulamentação

nos 30 dias subsequentes sua aprovação.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeito a partir do orçamento do

Estado subsequente.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Catarina Martins — José Soeiro.

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PROJETO DE LEI N.º 292/XV/1.ª

ALTERA A NATUREZA DE FINANCIAMENTO DAS INSTITUIÇÕES DO ENSINO SUPERIOR

EXTINGUINDO O REGIME FUNDACIONAL

Exposição de motivos

As políticas de liberalização dos serviços públicos em Portugal conhecem já três décadas de insistência e

têm vários agentes políticos envolvidos no processo. No caso do ensino superior, após a implementação da

política de propinas na década de 1990 e a consequente aprovação da Lei n.º 37/2003, de 22 de agosto, que

estabelece as bases de financiamento do ensino superior – consagrou-se um novo modelo de funcionamento

de um serviço que, a partir desse momento, respondia à lógica de mercado e do princípio de utilizador-pagador.

De forma a aprofundar a natureza desse financiamento tripartido (investimento público, propinas e fundos

privados) e acomodar essa alteração, o Governo do Partido Socialista aprovou, em 2007, a Lei n.º 62/2007, de

10 de setembro, que estabelece o regime jurídico das instituições do ensino superior (RJIES). Nele, está

plasmada a possibilidade de uma gestão semiprivada das universidades e politécnicos, conhecido como

«Regime fundacional».

O regime fundacional era, para o então Ministro da Ciência Mariano Gago, o pilar central de um processo de

modernização que se pretendia aplicar a todas as universidades públicas. Encolhendo a democracia na gestão

das instituições, limitando a participação dos estudantes e não docentes, introduzindo uma lógica mercantil, o

RJIES estabeleceu um padrão de funcionamento à medida do mercado, onde a precariedade se tornou regra,

porque a fiscalização democrática diminuiu drasticamente. Há quinze anos, foram criados incentivos financeiros

em função das escolhas de modelo de gestão e condicionando, por essa via, a autonomia das instituições. Esses

incentivos financeiros nunca foram devidamente transferidos para as IES e o modelo fundacional tornou-se,

dessa forma, um presente envenenado, pois trouxe consigo o esvaziamento da responsabilidade pública no

ensino superior público e condenou muitas das IES para uma situação financeira débil.

O modelo fundacional criou um Estado dentro do Estado. Até o ministério que tutela o setor perdeu poder de

decisão sobre matérias fundamentais. Obrigar estas instituições a encontrar 50% de fundos próprios para os

seus orçamentos significa duas coisas: O Estado desresponsabiliza-se de uma das suas obrigações

constitucionais no que toca ao investimento no ensino superior público e coloca sobre as Instituições uma

pressão financeira constante.

Não pretendendo esgotar todos os aspetos que este debate deve merecer, o presente diploma avança com

alterações concretas para resgatar um modelo de financiamento público das IES, eliminando o regime

fundacional e promovendo um enquadramento semelhante para todas as instituições e valorizando-se a sua

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16 DE SETEMBRO DE 2022

19

autonomia e a natureza democrática da rede pública de ensino superior.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma altera a Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que aprovou o regime jurídico das instituições

de ensino superior (RJIES), extinguindo o regime fundacional.

Artigo 2.º

Norma revogatória

São revogados os artigos 129.º a 137.º da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro.

Artigo 3.º

Extinção do regime fundacional e transição das instituições

1 – As instituições de ensino superior a funcionar segundo o regime de fundações públicas em regime de

direito privado transitam, sem prejuízo para o seu normal funcionamento, para o regime geral das instituições

de ensino superior público previsto na presente lei, no ano letivo de 2023/2024.

2 – São eliminadas da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, todas as referências relativas a fundações públicas

de direito privado.

Artigo 4.º

Regulamentação e transição das instituições

As instituições de ensino superior que necessitem de introduzir alterações aos respetivos estatutos para

assegurar a sua conformidade com a presente lei devem dar início ao procedimento de revisão estatutária até

31 de dezembro de 2022, de forma a assegurar a entrada em vigor dos novos estatutos no ano letivo de

2023/2024.

Artigo 5.º

Compensação financeira

As instituições de ensino superior públicas que, atualmente, estão abrangidas pelo regime fundacional, serão

compensadas financeiramente pela perda de receitas privadas após o seu processo de transição, anualmente

em sede de Orçamento do Estado.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de são Bento, 16 de setembro de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —

Catarina Martins — José Soeiro

———

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

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PROJETO DE LEI N.º 293/XV/1.ª

ALARGAMENTO DE ATRIBUIÇÕES DA AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES DO TRABALHO

(ALTERAÇÃO AO DECRETO REGULAMENTAR N.º 47/2012, DE 31 DE JULHO)

Exposição de motivos

De acordo com o relatório de 2019 de atividade de inspeção do trabalho1, «[o] trabalho total ou parcialmente

não declarado à Administração do Trabalho e à Segurança Social, por empresas da economia informal ou da

economia estruturada, e fenómenos como a dissimulação do contrato de trabalho, através de figuras como a

falsa prestação de serviços, os falsos estágios remunerados ou falsas situações de voluntariado constituem

fenómenos que contribuem para a segmentação social (com a constituição de grupos de trabalhadores

afastados da proteção social) e para a insuficiência financeira das receitas públicas, sendo ainda um grave fator

de concorrência desleal para as empresas que cumprem as suas obrigações».

Sabemos que jovens, desempregados e desempregados de longa duração são habitualmente considerados

grupos prioritários nas políticas de combate ao desemprego e à precarização do trabalho. Sem prejuízo, não

deixa de ser verdade que muitas pessoas se veem relegadas a estágios curriculares, profissionais, de

aprendizagem e outros, como medida de aumento de competências para a sua inserção ou reconversão para o

exercício de uma determinada profissão. Parece, aliás, que as diferentes modalidades de estágio se vão

sedimentando enquanto alternativa ao emprego regular – e regulado. De facto, apesar de se reconhecer que

um estágio (inclusive o não remunerado) corresponde efetivamente à prestação de trabalho, também se sabe

que há um recurso indiscriminado à figura de estágios que é discricionário, aproveitando-se das reconhecidas

dificuldades de ingresso de jovens e desempregados no mercado de trabalho.

Segundo dados do mais recente Eurobarómetro sobre questões sociais2, 55% de respondentes em Portugal

considera que é para si importante uma Europa social, que se preocupa com o acesso ao mercado de trabalho

e com condições de trabalho justas. Este mesmo estudo revela que 87% dos inquiridos portugueses considera

que a falta de direitos sociais é um «problema grave neste momento».

A precariedade das relações laborais, que afeta desproporcionalmente jovens e segmentos da população

mais vulneráveis, tem um impacto direto no desenvolvimento pessoal e comunitário, traduzindo-se num

condicionamento da sua participação em todos os aspetos da sociedade e afetando, inclusivamente, a dignidade

de cada pessoa.

Segundo o Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, a Autoridade para as Condições do Trabalho

(ACT) promove a melhoria das condições de trabalho, dá cumprimento a legislação específica de segurança e

higiene no local de trabalho e promove políticas de prevenção de riscos profissionais. Neste sentido, cumpre

evidenciar que, segundo dados de 20163 revelados pelo Centro Interdisciplinar de Estudos de Género do

Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, quer o assédio sexual quer o

assédio moral no local de trabalho são fenómenos que afetam mais frequentemente mulheres e homens na sua

juventude (até aos 34 anos) e com vínculos laborais marcados pela precariedade e pela instabilidade.

Adicionalmente, o último relatório de atividades4 da autoridade pública competente nesta matéria refere que

«[e]m sede de dissimulação de contrato de trabalho, através de figuras como a falsa prestação de serviços, os

falsos estágios remunerados ou outros tipos contratuais, foram realizadas 1698 visitas inspetivas, com

averiguação de 185 situações irregulares».

O Deputado do Livre considera, assim, que urge reconhecer explicitamente a competência da ACT em

matéria de estágios, alargando as suas atribuições a todas as formas de estágio – incluindo estágios não-

remunerados, curriculares e extracurriculares e estágios profissionais que correspondam a trabalho

independente.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o seguinte

projeto de lei:

1 Atividade de inspeção do trabalho: Relatório 2019, publicado em 2020. 2 Eurobarómetro Especial 509, publicado em março de 2021. 3 Assédio sexual e moral no local de trabalho em Portugal, CIEG. 4 cfr. nota 1.

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à primeira alteração ao Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho.

Artigo 2.º

Alteração à Lei Orgânica da Autoridade para as Condições do Trabalho

Os artigos 2.º e 4.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, na sua redação atual, passam a

ter a seguinte redação:

«Artigo 2.º

[…]

1 – […].

2 – A ACT prossegue as seguintes atribuições:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) Difundir a informação e assegurar o tratamento técnico dos processos relativos ao sistema internacional

de alerta para a segurança e saúde dos estagiários e trabalhadores, bem como a representação nacional em

instâncias internacionais;

k) […];

l) […];

m) […];

n) […];

o) […];

p) […];

q) […];

r) […];

s) […];

t) Proceder à conservação dos registos e arquivos, relativos a acidentes e incidentes e à avaliação e

exposição aos riscos referentes aos estagiários e trabalhadores em caso de encerramento da empresa;

u) […];

v) […].

3 – A ACT prossegue as atribuições referidas no número anterior em empresas de todos os setores de

atividade, independentemente da sua forma ou natureza jurídica e do regime aplicável aos respetivos

estagiários e trabalhadores, e em qualquer local em que se verifique a prestação de trabalho,

independentemente da existência ou não de vínculo contratual, ou existam indícios suficientes dessa

prestação.

4 – […].

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

22

Artigo 4.º

[…]

1 – Sem prejuízo das competências que lhe forem conferidas por lei ou que nele sejam delegadas ou

subdelegadas, compete ao inspetor-geral:

a) […];

b) […];

c) […];

d) Impor, sempre que necessário, a comparência nos serviços de qualquer estagiário, trabalhador ou

empregador e respetivas associações que possam dispor de informações úteis ao desenvolvimento de ação

inspetiva;

e) […];

f) […];

g) […];

h) […].

2 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no início do ano civil seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

PROJETO DE LEI N.º 294/XV/1.ª

ESTABELECE O DEVER DE O GOVERNO PROCEDER AO LEVANTAMENTO E DIVULGAÇÃO DE

DADOS REFERENTES A CRECHES E ESTABELECIMENTOS PÚBLICOS DE EDUCAÇÃO PRÉ-

ESCOLAR E CONSAGRA A UNIVERSALIDADE DA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA AS CRIANÇAS A

PARTIR DOS 3 ANOS DE IDADE

Exposição de motivos

A Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, que a Portaria n.º 198/2022, de 27 de julho, regulamenta, determina o

alargamento progressivo da gratuitidade das creches e das amas do Instituto de Segurança Social, IP, de modo

que, a partir de 2024, todas as crianças que ingressem no primeiro ano da creche e todas as que prossigam

para o 2.º e o 3.º ano, dela beneficiem.

Recentemente, foi amplamente noticiado que o Governo anunciou o alargamento, a partir de janeiro de 2023,

da gratuitidade das creches privadas, em moldes a negociar com o setor. De facto, na página web do executivo

está escrito que «A partir de janeiro de 2023, as creches do setor privado passam a poder estar incluídas, para

garantir a cobertura da rede, sempre que não haja vaga na rede do setor social», que «o Governo continua a

trabalhar com a associação representativa do setor privado para «preparar o alargamento da medida às creches

do setor privado quando não existe a capacidade de resposta por parte do setor social», que será preciso

estabelecer «um acordo e suportar o custo integral» e ainda que «estão a ser definidos «os requisitos para que

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16 DE SETEMBRO DE 2022

23

seja simples para as famílias a operacionalização desta medida nas situações em que não haja capacidade de

resposta do setor social1.»

Sucede que a eficácia destas medidas e o capaz cumprimento do papel destas entidades – sejam creches

do sistema de cooperação ou de iniciativa privada, creches familiares ou amas autorizadas pelo Instituto de

Segurança Social, IP – aconselha, vivamente, a realização de um aturado e fidedigno levantamento que afira as

vagas existentes – qualquer que seja o setor –, as vagas a criar em função da população-alvo, bem como o

estado e o diagnóstico de necessidades das instalações e dos equipamentos que recebem estas crianças. Com

efeito, parte da eficiência e da eficácia das políticas públicas depende de informação – bem como da sua

qualidade e fidedignidade. E de facto, não basta ter vagas para estas crianças, há que acautelar as condições

em que são acolhidas, sabido que delas depende o seu bem-estar e desenvolvimento. Não é de todo por acaso

que o Conselho Europeu emitiu uma recomendação, a 22 de maio de 2019, relativa a sistemas de educação e

acolhimento na primeira infância de elevada qualidade, reconhecendo a importância das primeiras

aprendizagens, a sua relação com o sucesso escolar e o seu contributo para quebrar ciclos de pobreza e

desfavorecimento.

Esta é, ainda, uma oportunidade para alterar para os 3 anos de idade a universalidade da educação pré-

escolar, que atualmente se situa nos 4 anos, o que acaba a deixar desprotegidas muitas crianças com 3 anos

que já não são abrangidas pela gratuitidade das creches prevista na Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro. É que apesar

de a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, aprovada pela Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro, enunciar que ela se

destina às crianças com idades compreendidas entre os 3 anos e a idade de ingresso no ensino básico, nem

por isso o sistema consagra, para as primeiras, o direito legal à sua frequência. Realça-se, a propósito, que em

2020, o relatório da rede europeia Eurydice com os números-chave sobre a educação pré-escolar e cuidados

para a infância na Europa alertou para a falta considerável de vagas no grupo dos 3 anos2, o que (se) explica

com a existência do direito legal à frequência apenas a partir dos 4 anos e justifica a necessidade de alterar a

Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, na sua versão atual. Tal alteração foi aliás anunciada no programa eleitoral do

Partido Socialista em 20153. Em 2019, o programa eleitoral do mesmo partido decresceu, todavia, a obrigação

a que se havia vinculado para «Expansão da educação pré-escolar nas redes pública, solidária e privada, para

atingir no final da legislatura a cobertura integral das crianças de 5 anos, e de 70 a 75% nos 3 e 4». A importância

do assunto levou a que, já em 2017, através da Resolução n.º 89/2017, de 23 de maio, a Assembleia da

República tenha recomendado ao Governo que estabelecesse a universalidade da educação pré-escolar para

as crianças a partir dos 3 anos de idade. E a 3 de agosto, através da Resolução com o n.º 185/2017, recomendou

ao Governo que garantisse o acesso à educação pré-escolar a todas as crianças a partir dos 3 anos no ano

letivo de 2018/2019 e o alargamento da ação social escolar, no âmbito do combate à pobreza infantil. Chegados

a 2022/2023, a insuficiência de resposta para as crianças neste grupo etário4 é, não obstante, uma realidade

com que diversas famílias se debatem, o que vivamente justifica a alteração da lei em vigor.

Finalmente: A oferta pública de vagas nos estabelecimentos de educação pré-escolar, atenta a sua relação

umbilical com a fase que a precede e com as políticas públicas relacionadas com a infância, o combate à pobreza

e às desigualdades sociais, o apoio às famílias e a educação, é naturalmente matéria que deve integrar o

levantamento a empreender pelo Governo.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o seguinte projeto

de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à alteração da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, e da Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto,

na sua redação atual.

1 https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=gratuitidade-das-creches-entra-hoje-em-vigor. 2 https://www.dgeec.mec.pt/np4/%7B$clientServletPath%7D/?newsId=1080&fileName=EC0319375PTN.pt.pdf, pág. 58. 3 .https://ps.pt/wp-content/uploads/2021/03/2015.4.out_Programa.Eleitoral.do_.Partido.Socialista_Eleicoes.Legislativas.2015_Alternativa.de _.Confianca.pdf, pág. 45. 4 https://www.publico.pt/2022/07/28/sociedade/noticia/falta-vagas-preescolar-motivou-54-reclamacoes-portal-queixa-15-2021-2015202.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

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Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro

É aditado o artigo 2.º-A à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, com a seguinte redação:

«Artigo 2.º-A

Levantamento e divulgação

1 – Até final do segundo trimestre do ano letivo de 2022/2023, o Governo procede ao levantamento e

divulgação:

– Do número de vagas em creches do sistema de cooperação ou de iniciativa privada, creches familiares e

amas do Instituto de Segurança Social, IP;

– Do diagnóstico sobre o estado dos equipamentos existentes;

– Das carências de equipamentos.

2 – No mesmo prazo, o Governo procede ao levantamento e divulgação do número de vagas existentes nos

estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, bem como do número de crianças cuja inscrição que nestes

estabelecimentos não tiveram vaga desde o ano letivo 2018/2019.»

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, na sua redação atual

O título e os artigos 1.º, n.º 2, e 4.º, n.º 1, da Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, passam a ter a seguinte

redação:

«Estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade

escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 4 anos de idade

Artigo 1.º

[…]

1 – […].

2 – A presente lei consagra, ainda, a universalidade da educação pré-escolar para todas as crianças a partir

do ano em que atinjam os 3 anos de idade.

Artigo 4.º

[…]

1 – A educação pré-escolar é universal para todas as crianças a partir do ano em que atinjam os 3 anos de

idade.»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no início do ano civil seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

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16 DE SETEMBRO DE 2022

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PROJETO DE LEI N.º 295/XV/1.ª

AUMENTA AS GARANTIAS DOS BENEFICIÁRIOS DE PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO NO ÂMBITO

DAS REGRAS REFERENTES À FORMAÇÃO PROFISSIONAL, ALTERANDO O DECRETO-LEI N.º

220/2006, DE 3 DE NOVEMBRO

Exposição de motivos

À luz do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, a formação profissional dos beneficiários de prestações

de desemprego e de pessoas inscritas nos centros de emprego tem como objetivo o reforço das condições de

empregabilidade do beneficiário, facilitando o seu regresso rápido e sustentado ao mercado de trabalho.

Naturalmente, esta oferta de formação profissional também deverá ser adaptada às expectativas e as

necessidades do mercado de trabalho.

O regime atualmente em vigor estabelece que a aceitação da oferta de formação profissional é um dever dos

beneficiários de prestações de desemprego e de todas as pessoas inscritas nos centros de emprego,

nomeadamente dos jovens à procura do primeiro emprego. A rejeição de ofertas de formação profissional é

qualificada como uma causa de anulação da inscrição no centro de emprego e impossibilita o desempregado

(beneficiário ou não de prestação de desemprego) de se inscrever novamente no centro de emprego no prazo

de 90 dias. Tal significa que qualquer recusa de formação profissional vai conduzir, em regra, à perda do direito

às prestações de desemprego por parte daqueles que contribuíram para ter esse direito e à perda do direito dos

desempregados (beneficiário ou não de prestações de desemprego) de apoio à procura de emprego

disponibilizado pelos centros de emprego.

Contudo, este quadro legal, pelo modo como está atualmente desenhado, não prevê a distinção entre a

recusa de formação profissional injustificada e a recusa de formação profissional baseada no facto de a oferta

formativa específica não se afigurar como adequada ao perfil, às habilitações escolares, à formação profissional

e aos projetos profissionais do beneficiário.

Chegaram ao conhecimento do PAN situações em que foram oferecidos a jovens recém-licenciados em

Direito, Economia ou Marketing cursos de formação profissional na área de geriatria e cuja recusa implicou a

anulação de inscrição no centro de emprego, não obstante estarem em causa jovens que não eram beneficiários

de quaisquer prestações de desemprego. Situações como estas representam a denegação do direito à proteção

no desemprego, uma das bases do Estado social, e afiguram-se como desadequadas, desproporcionais e

injustas.

Por isso, e sem prejuízo de serem necessárias mudanças mais profundas no que se refere à formação

profissional e no apoio à procura emprego pelos centros de emprego, o PAN com o presente projeto de lei, tendo

em vista o objetivo de assegurar um maior equilíbrio no quadro do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro,

propõe que os trabalhadores só tenham o dever de aceitação de formação profissional nos casos em que esta

seja adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e projetos profissionais do desempregado,

e que só os casos de recusa de tal formação possam ser causa de anulação de inscrição no centro de emprego

e de perda da prestação de desemprego.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei aumenta as garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras

referentes à formação profissional, procedendo para o efeito à décima sétima alteração do Decreto-Lei n.º

220/2006, de 3 de novembro, que estabelece o regime jurídico de proteção social da eventualidade de

desemprego dos trabalhadores por conta de outrem.

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

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Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro

São alterados os artigos 11.º, 41.º e 49.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, na sua redação

atual, que passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 11.º

[…]

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) Aceitação de formação profissional adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e

projetos profissionais do beneficiário;

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […].

3 – […].

4 – […].

Artigo 41.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) Aceitar formação profissional adequada ao seu perfil, habilitações escolares, formação profissional e

projetos profissionais;

d) […];

e) […];

f) [Revogado];

g) […].

2 – […].

Artigo 49.º

[…]

1 – […]:

a) […];

b) […];

c) Recusa de formação profissional adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e

projetos profissionais do beneficiário;

d) […];

e) […];

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27

f) […];

g) […];

h) […];

i) […];

j) [Revogado.]

2 – […].

3 – […].

4 – […].

5 – […].

6 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.

———

PROJETO DE LEI N.º 296/XV/1.ª

ALARGA OS ACORDOS DE COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DE RESPOSTAS SOCIAIS

NA VALÊNCIA DE CRECHE A ENTIDADES PÚBLICAS

Exposição de motivos

As respostas sociais para a infância são protagonizadas pelo setor social privado financiado por acordos de

cooperação com a Segurança Social.

Em Portugal, chega a ser mais caro ter uma criança na creche do que numa universidade privada. Mesmo

quando se trata de creches públicas, o valor das mensalidades pode representar metade do salário médio. Este

quadro limita o acesso das famílias à resposta e ignora que a criança é um sujeito de direitos desde que nasce.

O custo das creches relaciona-se com duas opções de política: a) as creches não estão inseridas no sistema de

ensino, pelo que a oferta está essencialmente sob a gestão do setor privado e do setor social (IPSS), com

acordos de cooperação com o Estado; b) as creches são vistas como assistência às famílias e não no quadro

dos direitos da infância, o que contribui para desresponsabilizar o Estado.

A Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e equipamentos sociais

para a primeira infância, o que no caso das creches não abrange metade das necessidades (48,4%)».

Esta carência é reconhecida no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que, reportando-se aos dados

da Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e equipamentos sociais

(…) para a 1.ª infância 48,4% (creches)» – uma cobertura insatisfatória que se faz sentir de forma

particularmente aguda nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto. Por essa razão, o PRR incluiu no seu 6.º

Pilar «Políticas para a próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e habilidade» o objetivo de

«[a]umentar a capacidade de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios que ainda têm níveis de

cobertura mais baixos». Para fazer face a este problema, alguns passos já foram dados com a Lei n.º 2/2022 de

3 de janeiro, mas são insuficientes. A lei prevê o alargamento progressivo da gratuitidade das creches e das

amas do Instituto da Segurança Social, IP da seguinte forma: Em 2022, a todas as crianças que ingressem no

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

28

primeiro ano de creche; em 2023, a todas as crianças que ingressem no primeiro ano de creche e às crianças

que prossigam para o 2.º ano; em 2024, a todas as crianças que ingressem no primeiro ano de creche e às

crianças que prossigam para o 2.º e 3.º ano. Este alargamento da gratuitidade, no entanto, só será efetivo com

a ampliação da rede pública de creches, com vista a proporcionar um número de vagas suficiente e bem

distribuído no território.

Com a presente iniciativa, o Bloco de Esquerda pretende tornar possível à semelhança do que já acontece,

por exemplo, na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, que também entidades públicas,

nomeadamente as autarquias locais, possam celebrar acordos de cooperação para o desenvolvimento de

respostas sociais (PROCOOP) para gestão e desenvolvimento de respostas sociais, na valência de creche,

financiadas pela Segurança Social e que esta possibilidade integre a Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro.

Atualmente, as autarquias locais cedem a IPSS os espaços de que são proprietárias, seja após intervenção

em espaços já existentes, seja através da construção de novos espaços, em ambos os casos financiados por

estas, porque perante a impossibilidade de celebração de acordos de cooperação com o Instituto da Segurança

Social, o custo dessa gestão seria muito dispendioso.

Recentemente, o Governo transferiu várias competências para as autarquias locais na área da ação social.

Alargar às entidades públicas a possibilidade de candidatura ao PROCOOP permite também criar uma rede

unificada de respostas sociais públicas na valência de creche.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei alarga a celebração de acordos de cooperação para a gestão e desenvolvimento de respostas

sociais (PROCOOP), na valência de creche, a entidades públicas, designadamente às autarquias locais,

procedendo para o efeito à primeira alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro.

Artigo 2.º

Alargamento da celebração de acordos de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais

a entidades públicas

1 – As entidades públicas dotadas de autonomia administrativa e financeira, com ou sem autonomia

patrimonial, são consideradas entidades elegíveis à celebração de acordos de cooperação para a gestão e

desenvolvimento de respostas sociais na valência de creche.

2 – Os avisos de abertura para celebração de novos acordos de cooperação com vista à gestão e

desenvolvimento de resposta social na valência de creche devem fazer menção expressa à possibilidade de

candidatura das entidades públicas dotadas de autonomia administrativa financeira, com ou sem autonomia

patrimonial.

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro

O artigo 2.º da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 2.º

[…]

1 – […]:

a) […].

b) […].

c) […].

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29

2 – A gratuidade é assegurada pelo ISS, IP, nos termos da regulamentação que define o seu modelo

de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais.»

Artigo 4.º

Regulamentação

O Governo procede à regulamentação necessária da presente lei no prazo de dois meses a contar da sua

entrada em vigor.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos a partir do Orçamento do

Estado subsequente.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana

Mortágua — Catarina Martins.

———

PROJETO DE LEI N.º 297/XV/1.ª

CRIA O BANCO PÚBLICO DE TERRAS AGRÍCOLAS

Exposição de motivos

O território nacional sobre grandes transformações demográficas, de paisagem e de usos. A tendência

mundial para a deslocação da população para centros urbanos agravada por políticas públicas de encerramento

de serviços públicos e de desproteção da pequena agricultura resultaram no abandono de terras agrícolas e

florestais e no envelhecimento da população em várias áreas rurais.

Aos riscos do abandono do território somam-se os riscos em resultado das alterações climáticas agravando

o perigo de incêndio, de erosão dos solos e de degradação dos recursos hídricos. Políticas públicas erradas de

eucaliptização de grande parte do território nacional ocupado anteriormente por floresta autóctone e terrenos

agrícolas contribuí para o agravamento drástico destas ameaças.

A pandemia, a disrupção das cadeias internacionais de abastecimento e, mais recentemente, a inovação da

Ucrânia pela Rússia mostraram a fragilidade da desindustrialização e do abandono da agricultura em países

como Portugal.

Neste contexto, a gestão do território e da conservação da biodiversidade enfrenta enormes dificuldades,

mas também se mostra essencial ao desenvolvimento de um país coeso e solidário. Também a componente

social é descurada com esta gestão do território. A redução da ocupação agrícola tem sido um dos principais

motores do desemprego, envelhecimento e êxodo nas zonas rurais, sem que isso se traduza em melhores

resultados no sector produtivo e na economia portuguesa.

Portugal depende das importações para responder às suas necessidades agroalimentares, o que significa

um défice na balança comercial agroalimentar superior a 3,8 mil milhões de euros, em 2021. É necessário

trabalhar para a segurança e soberania alimentar, criando condições para o aumento da produção agrícola do

país e para uma distribuição mais justa na cadeia da economia agroalimentar. Um sistema económico onde a

distribuição fica com a grande porção dos rendimentos da agricultura esmagando as margens dos agricultores

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II SÉRIE-A — NÚMERO 85

30

não permite a boa gestão e ocupação das terras agrícolas.

A população empregada pelo sector primário caiu drasticamente. Em 1980 este sector empregava 1,1

milhões de trabalhadores, em 1990 empregava 846 milhares, no ano 2000 eram 645 milhares, em 2010

totalizavam 549 milhares e em 2021 situam-se nos 131 milhares. Parte desta quebra deve-se a novos modelos

de agricultura e ao uso de maquinaria, mas a sua dimensão mostra que se deve em muito ao abandono do

território.

O resultado das políticas públicas tem sido catastrófico: entre 1999 e 2009, o número de explorações

agrícolas reduziu-se a um ritmo de 3% ao ano (25% ao fim de 10 anos), tendo desaparecido metade das

explorações com menos de 5 hectares e um quarto das explorações de dimensão superior. Neste período, as

explorações em que o produtor agrícola desempenha a sua atividade a tempo inteiro reduziu-se em 46%. Entre

2000 e 2009, a agricultura portuguesa perdeu 31,6% de trabalhadores, ou seja, mais de 100 mil pessoas.

Ao mesmo tempo, não se apostou no rejuvenescimento do tecido produtivo, o qual é extremamente

envelhecido: entre 1999 e 2009 a população rural envelheceu drasticamente, passando a idade média dos

produtores de 46 anos para os 52 anos, respetivamente; em 2005, os produtores com 65 e mais anos

representavam 47,3%, enquanto em 1989 eram 28,8%. Pelo contrário, os produtores com menos de 35 anos,

que em 1989 representavam 6,7%, passaram em 2005 para apenas 2,2%. Estes números colocam em causa a

manutenção futura da ocupação e produção agrícola, devendo ser motivo de forte preocupação ao nível da

intervenção pública.

Igualmente, entre 1989 e 2005 reduziu-se a superfície agrícola útil (SAL), na ordem dos 8%, ocorrendo uma

profunda alteração na sua composição: as terras aráveis, que representavam 58,6% da SAL em 1989,

diminuíram mais de 1 milhão de hectares, contribuindo em 2005 apenas para 1/3 da SAL. Pelo contrário, a área

de pastagens permanentes aumentou, em termos relativos, de 20,9% para 48,1%, nem sempre correspondendo

a um aumento efetivo da produção agrícola extensiva de herbívoros. Ou seja, o abandono da propriedade agrária

traduz-se numa redução da superfície agrícola útil, com a consequente perda de riqueza de interesse social e

público que um país, ainda mais no contexto atual, não se pode permitir.

Importa, assim, recuperar a ocupação agrícola do País para a criação de emprego, aumento da produção e

rejuvenescimento do tecido produtivo, contrariando por esta via o ciclo de declínio de muitas zonas rurais e

melhorando os indicadores económicos do setor agroalimentar do País.

Disponibilizar as terras agrícolas públicas desocupadas ou as que se encontram em estado de abandono

para responder a estes objetivos é essencial, contrariando um dos principais problemas sentidos por quem se

quer dedicar a esta atividade: a dificuldade no acesso à terra para nova instalação, como é o caso dos jovens

agricultores, ou para ganho de dimensão das unidades produtivas existentes, de forma a melhorarem o seu

desempenho técnico e económico e garantirem viabilidade, tendo em conta a grande fragmentação da

propriedade que caracteriza a maior parte do País.

O Bloco de Esquerda vem, por isso, propor a criação de um banco público de terras agrícolas destinado a

facilitar o acesso a terras por via do arrendamento rural, instrumentos reconhecidos como importantes para

corrigir a dimensão física e económica das explorações, reduzir a dispersão da propriedade e incentivar o início

da atividade agrícola, sobretudo de jovens agricultores.

A evolução legislativa

A existência de bancos de terras constitui ação de estruturação fundiária – cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo

35.º e do artigo 37.º da Lei n.º 86/95, de 1 de setembro (Lei de bases do desenvolvimento agrário).

A Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, não acolhe a expressão «banco de terras» (antes acolhendo a,

entretanto criada, bolsa de terras como instrumento de estruturação fundiária – artigo 3.º), mas regula a matéria

da constituição de reserva de terras, no âmbito dos projetos de emparcelamento integral (artigos 31.º a 33.º).

A bolsa de terras é um instrumento criado pela Lei n.º 62/2012, de 10 de dezembro, que tinha por objetivo

facilitar o acesso à terra. Porém, esta medida revelou-se ineficaz, essencialmente porque não continha nenhum

mecanismo eficaz de incentivo para a disponibilização das terras não agricultadas.

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31

A proposta do Bloco de Esquerda

Em 2017 o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou um projeto de lei sobre o tema em apreço.

A presente iniciativa legislativa corresponde à atualização desse projeto de lei.

O banco de terras é gerido pelo Estado, sendo constituído pelas terras agrícolas de propriedade pública,

pertencentes ao Estado ou às autarquias, como as resultantes da aplicação do direito de preferência ou de

ações públicas, designadamente de estruturação fundiária e de emparcelamento.

Considerando a necessidade premente de combater o abandono dos solos produtivos, é proposta a

penalização fiscal dos prédios rústicos ou mistos com aptidão agrícola em situação de abandono, a não ser que

os mesmos integrem o banco público de terras. Desta forma, é criado um incentivo para a utilização das terras

agrícolas e dá-se uma oportunidade aos proprietários que não querem usar os seus terrenos para os

rentabilizarem por via do seu arrendamento a terceiros, facilitando-se este processo através da existência de

uma base de dados que publicita as terras disponíveis.

Mantendo-se o abandono de determinado terreno após penalização fiscal ao longo de três anos sucessivos,

a entidade gestora do banco de terras pode recorrer à figura do arrendamento compulsivo para que esse terreno

seja integrado no banco de terras.

O recenseamento destes prédios para efeito de aplicação da penalização fiscal irá ainda permitir atualizar os

respetivos registos prediais, sendo um importante contributo para a realização do cadastro rústico, tarefa

complexa que se afigura como urgente.

Quando realizado por concurso público para arrendamento rural, o acesso aos terrenos inscritos no banco

de terras é feito conferindo prioridade a quem já trabalha esses terrenos ou os que são contíguos, ou à instalação

de jovens agricultores, ou a quem se quer dedicar à atividade agrícola como principal fonte de rendimento, com

preferência para famílias monoparentais, para as pessoas vítimas de violência doméstica e para as pessoas

com estatuto de refugiado.

A candidatura é feita mediante a apresentação de um plano de exploração, o qual estabelece a viabilidade

económica do projeto com uma duração de 5 anos, permitindo garantir a sustentabilidade das atividades

agrícolas a instalar e ter informação mais precisa sobre a realidade produtiva do País.

A dinamização do arrendamento rural permite responder de forma ágil à dificuldade no acesso à terra para o

redimensionamento das explorações agrícolas ou para novos projetos de instalação, assim como facilita a

disponibilização das terras, já que não envolve a alteração do título de propriedade e permite a sua

rentabilização. Estipular um valor de renda que tenha em conta a realidade dos vários territórios é fundamental

para combater a especulação fundiária, a qual poderia ser um obstáculo à concretização dos objetivos

subjacentes à criação do banco de terras.

Estas são, no essencial, as propostas do Bloco de Esquerda de criação de um banco público de terras para

arrendamento rural, visando promover a ocupação agrícola através do redimensionamento das unidades

produtivas e da instalação de novos agricultores, sobretudo de jovens. Apresenta-se, assim, como um contributo

para o aumento da viabilidade técnica e económica das explorações, o rejuvenescimento do tecido produtivo, a

melhoria dos indicadores económicos do setor agroalimentar, o combate ao abandono agrícola e ao êxodo rural,

e ainda a promoção da investigação, experimentação, demonstração e desenvolvimento agrários.

Atenta a matéria, devem ser ouvidos no âmbito do processo legislativo os órgãos de governo próprio das

Regiões Autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

CAPÍTULO I

Disposições gerais

Artigo 1.º

Objeto

1 – A presente lei cria o banco público de terras agrícolas para arrendamento rural, doravante designado por

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32

banco de terras, com os objetivos de:

a) Promover o redimensionamento das unidades de produção agrícola, melhorando as suas condições de

desempenho técnico e económico;

b) Combater o abandono das explorações agrícolas e o êxodo rural;

c) Promover a produção agrícola e pecuária, e a gestão florestal;

d) Promover a conservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem;

e) Facilitar o início da atividade agrícola, nomeadamente por jovens agricultores, rejuvenescendo o tecido

produtivo;

f) Melhorar os indicadores económicos do setor agroalimentar, aumentando a produção;

g) Apoiar a investigação, experimentação, demonstração e desenvolvimento agrários;

h) Promover a ocupação do território e um modelo agrícola e florestal que reduza os riscos das alterações

climáticas e a perigosidade dos incêndios rurais.

2 – A presente lei procede ainda:

a) À alteração do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de

12 de novembro, agravando o imposto municipal de imóveis nos casos de terrenos com aptidão agrícola

declarados em situação de abandono;

b) À alteração da Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, que estabelece o Regime Jurídico da Estruturação

Fundiária.

Artigo 2.º

Definições

1 – Para efeitos do disposto no presente diploma, entendem-se por terrenos com aptidão agrícola os prédios

rústicos e a parte inscrita na matriz rústica dos prédios mistos com boas condições para o desenvolvimento de

atividades agrícolas, florestais, pecuárias ou outras atividades de produção de bens e serviços associadas a

estas atividades.

2 – As definições de «prédio rústico», de «prédio misto» e de «parte inscrita na matriz rústica dos prédios

mistos», são as constantes no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis.

CAPÍTULO II

Banco de terras

Artigo 3.º

Competência

A gestão do banco de terras é da competência da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural

(DGADR), adiante designada de entidade gestora.

Artigo 4.º

Constituição

1 – O banco de terras é constituído pelos terrenos com aptidão agrícola ou florestal:

a) Pertencentes ao domínio público ou privado do Estado e das autarquias, com exceção das matas públicas,

da Companhia das Lezírias e dos baldios, mediante acordos a celebrar com as entidades a que estiverem afetos

e sem prejuízo da legislação que regula a desafetação e cessão de bens sujeitos àquele regime;

b) Adquiridos pelo Estado, designadamente:

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i) No exercício do direito de preferência, nos termos do presente diploma e demais legislação aplicável;

ii) Em anteriores medidas de emparcelamento, no âmbito do processo de intervenção da reforma agrária

ou no âmbito de aproveitamentos hidroagrícolas, desde que não perdure contencioso fundiário;

iii) No quadro de projetos de emparcelamento integral promovidos pelo organismo da Administração

Pública com funções de autoridade nacional do regadio e responsável por promover a gestão

sustentável do território rural, incluindo a reserva de terras.

c) Integrados, voluntariamente, pelos seus proprietários.

2 – A integração no banco de terras de terrenos com aptidão agrícola situados em áreas integradas no

Sistema Nacional de Áreas Classificadas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º

142/2008, de 24 de julho, carece de parecer favorável vinculativo do Instituto da Conservação da Natureza e

Florestas, IP ou da entidade que o substitua.

3 – Caso a área continua de determinado terreno ou terrenos, os seus valores agrícolas, florestais e/ou de

biodiversidade o justifiquem, o Estado pode constituir um modelo de gestão direta da exploração agroflorestal

dessa área.

Artigo 5.º

Direito de preferência

1 – O Estado goza do direito de preferência na transação onerosa dos prédios rústicos ou mistos com aptidão

agrícola, não concorrendo com outros direitos de preferência já protegidos por lei.

2 – Para efeito do número anterior, os proprietários ficam obrigados a comunicar por escrito à entidade

gestora a intenção de venda do prédio, com indicação das condições pretendidas, exercendo o Estado o seu

direito de preferência mediante comunicação escrita no prazo máximo de 30 dias.

Artigo 6.º

Declaração de abandono

1 – Compete às direções regionais de agricultura e pescas (DRAP), em colaboração com os municípios, as

associações representativas dos agricultores e os serviços de finanças, proceder ao recenseamento de todos

os terrenos com aptidão agrícola em situação de abandono para efeito de aplicação do disposto no artigo

anterior.

2 – O recenseamento é feito a partir da observância de ausência de atividade agrícola, florestal ou pecuária,

por um período superior a três anos consecutivos.

3 – Excluem-se do disposto no número anterior os prédios mistos cuja parte rústica tenha dimensão inferior

a 0,2 hectares.

4 – A DRAP notifica o proprietário que a respetiva propriedade foi recenseada para efeito de projeto de

declaração de abandono, de modo a este exercer o direito de audiência prévia, e da decisão, nos termos e

prazos previstos no Código do Procedimento Administrativo.

5 – A comunicação da identificação dos terrenos com aptidão agrícola considerados abandonados nos

termos do presente diploma e sujeitos ao agravamento do IMI, é efetuada, por transmissão eletrónica de dados,

pela DRAP no mesmo prazo previsto no CIMI para a comunicação da respetiva taxa anual.

6 – A decisão de declaração de prédio abandonado é suscetível de impugnação judicial, nos termos gerais

previstos no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

7 – As entidades e os serviços da administração direta e indireta do Estado, bem como outras pessoas

coletivas públicas, que possuam informações relevantes para cumprir o disposto no presente artigo,

nomeadamente em termos de cadastro predial, têm o dever de as prestar, mediante solicitação, às DRAP.

Artigo 7.º

Prova de titularidade

1 – Para efeito de aplicação do agravamento do IMI aos terrenos declarados em situação de abandono, as

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matrizes prediais rústicas constituem presunção de titularidade bastante na ausência de cadastro geométrico,

predial ou simplificado.

2 – Os resultados do recenseamento efetuado pelas DRAP, nos termos do artigo anterior, devem ser

considerados na atualização dos respetivos registos matriciais quando subscritos pelos respetivos proprietários.

3 – Os resultados do recenseamento efetuado pelas DRAP, quando homologados pela Direção-Geral do

Território, constituem igualmente presunção de titularidade bastante caso não tenha havido lugar à atualização

das matrizes.

Artigo 8.º

Integração voluntária

1 – A integração voluntária de terrenos no banco de terras realiza-se através de um contrato, entre o

proprietário e a entidade gestora, onde se estipula o prazo da integração, autoriza o seu arrendamento rural a

terceiros e determinam as demais condições, direitos e obrigações das partes, bem como as causas e efeitos

de resolução do contrato.

2 – O modelo a que deve obedecer o contrato referido no número anterior é publicado em portaria do membro

do Governo responsável pela área do desenvolvimento rural.

3 – Durante o período de integração dos terrenos no Banco de Terras, poderão ocorrer alterações da

titularidade do património respetivo, desde que esteja implícita a sub-rogação desta integração.

Artigo 9.º

Arrendamento compulsivo

Os terrenos abrangidos pelo n.º 2 do artigo 7.º podem ser objeto de arrendamento compulsivo,

exclusivamente para integração no banco de terras, conforme o admitido pelo artigo 88.º da Constituição, nas

seguintes condições:

a) Terem sido objeto de aumento do IMI, nos termos do n.º 4 do artigo n.º 112.º do Código do IMI, por três

anos sucessivos;

b) Por sentença do tribunal comum da sua área.

CAPÍTULO III

Cedência

Artigo 10.º

Arrendamento

1 – A entidade gestora procede ao arrendamento rural dos terrenos integrados no banco de terras, a pessoas

singulares ou coletivas, nos termos do regime jurídico aplicável e das disposições constantes no presente

diploma.

2 – O arrendamento rural é realizado mediante concurso público, devendo os candidatos apresentar um

plano de exploração associado à proposta de arrendamento.

Artigo 11.º

Venda ou permuta de prédios rústicos património do Estado

1 – Não havendo lugar ao procedimento referido no artigo anterior, no âmbito de operações de

emparcelamento integral ou valorização fundiária a transmissão de terrenos do banco de terras é realizada por

venda ou permuta nos termos dos respetivos projetos.

2 – Nas situações não abrangidas pelo disposto no número anterior, a cedência de terrenos de propriedade

pública integrados no banco de terras pode fazer-se por ajuste direto aos seguintes candidatos:

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a) A arrendatário do Estado, relativamente ao terreno ou prédio rústico arrendado, desde que se encontre

em situação de cumprimento de todas as suas obrigações decorrentes do seu contrato de arrendamento;

b) A proprietários de terrenos ou prédios rústicos contíguos desde que esteja em causa o aumento da

dimensão dos respetivos prédios rústicos ou o redimensionamento das próprias explorações agrícolas.

3 – Os adquirentes de terrenos provenientes do banco de terras ficam obrigados a proceder à sua gestão

pelo período mínimo de 5 anos contados da respetiva transação.

4 – No caso de terrenos com aptidão florestal ou ocupados com povoamentos florestais, preferem, antes das

pessoas e entidades referidas na alínea b) do n.º 2, as entidades gestoras de zonas de intervenção florestal.

Artigo 12.º

Plano de exploração

1 – O plano de exploração descreve detalhadamente as ações e investimentos a efetuar para o

desenvolvimento da atividade agrícola, definindo etapas e metas específicas, e analisa a respetiva viabilidade

económico-financeira, considerando um período de cinco anos.

2 – Os serviços do ministério com a tutela da agricultura prestam apoio técnico à elaboração do plano de

exploração quando solicitado pelo candidato.

3 – O plano de exploração é apreciado pela entidade gestora no prazo máximo de 60 dias após a sua entrega,

sendo comunicada a decisão ao candidato no prazo máximo de 10 dias após a apreciação estar concluída.

4 – O candidato tem a possibilidade de reapresentar por mais duas vezes o plano de exploração no caso do

mesmo ser rejeitado pela entidade gestora.

5 – O ministério com a tutela da agricultura pública em portaria o modelo a que deve obedecer a elaboração

do plano de exploração e os critérios para a sua apreciação.

Artigo 13.º

Critérios de preferência

A avaliação e seleção das candidaturas à celebração do contrato de arrendamento rural obedecem aos

seguintes critérios de preferência, por ordem de menção:

a) Pequenos agricultores que se candidatem a terrenos incluídos no banco de terras que sejam contíguos à

sua exploração agrícola;

b) Pequenos agricultores que vivam exclusiva ou predominantemente da agricultura;

c) Trabalhadores agrícolas que vivam exclusiva ou predominantemente da agricultura;

d) Jovens agricultores que pretendam iniciar a sua atividade agrícola;

e) Cooperativas de produção agrícola;

f) Agricultores que se candidatem a terrenos incluídos no banco de terras que sejam contíguos à sua

exploração agrícola;

g) Famílias monoparentais ou pessoas vítimas de violência doméstica;

h) Pessoas com estatuto de refugiados;

i) Candidatos, não proprietários de outras terras, que queiram iniciar a atividade agrícola e instalar-se como

agricultores a tempo inteiro.

Artigo 14.º

Valor da renda

1 – O valor da renda a aplicar não pode ser superior ao valor máximo de renda estabelecido por portaria a

publicar pelo membro do Governo responsável pela área do desenvolvimento rural, ouvidas as associações

representativas dos agricultores.

2 – A portaria a que se refere o número anterior fixa os valores máximos de renda para cada região ou zona

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agrária, com base:

a) Nos géneros agrícolas predominantes e evolução dos seus preços correntes;

b) Na diferente natureza dos solos e nas formas do seu aproveitamento;

c) Nos indicadores de desenvolvimento económico e social dos territórios;

d) Nas características ambientais e classificação para proteção em instrumentos de ordenamento do

território;

e) Outros fatores considerados relevantes.

3 – A portaria pode ainda estabelecer o valor máximo de renda de edifícios, dependências, instalações ou

outros equipamentos fixos, reportando tais valores a unidade de área.

4 – Os valores máximos de renda são revistos com intervalos máximos de dois anos.

5 – A entidade gestora pode ainda estabelecer uma comissão por gastos de gestão, de valor nunca superior

a 5% do valor da renda anual por cada prédio arrendado.

Artigo 15.º

Base de dados

1 – A entidade gestora mantém uma base de dados em plataforma eletrónica permanentemente atualizada

dos terrenos disponíveis no banco de terras para arrendamento rural, facilmente acessível ao público e a todos

os interessados, nomeadamente nos serviços competentes das DRAP, dos municípios, juntas de freguesias e

através de Internet, sendo interdita a aplicação de qualquer taxa pelo seu acesso.

2 – A base de dados contém indicação das características da propriedade, dos imóveis e direitos reais

associados, do valor da renda, dos critérios de elaboração e apreciação do plano de exploração, bem como dos

locais de entrega das propostas de arrendamento, com respeito pela privacidade e proteção de dados dos

proprietários nos termos da legislação aplicável.

Artigo 16.º

Fundo do banco de terras

1 – É criado, junto do Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas, IP (IFAP, IP), o fundo do banco

de terras (FBT), com a missão de, designadamente, proceder, para integração no banco de terras, ao

arrendamento compulsivo, exercer o direito de preferência em transmissões onerosas ou adquirir prédios

exclusivamente ou predominantemente rústicos com aptidão agrícola

2 – O FMT constitui-se como um património autónomo desprovido de personalidade jurídica.

3 – As receitas provenientes da cedência de prédios integrados no banco de terras revertem para o FBT.

4 – Constituem despesas do FBT as que resultem de encargos decorrentes da aplicação da presente lei e

legislação complementar.

5 – O IFAP, IP, enquanto gestor do FBT, é competente para celebrar, em nome do Estado, contratos relativos

a prédios integrados no banco de terras.

6 – No exercício das competências de gestão, o conselho diretivo do IFAP, IP, é auxiliado por uma unidade

de gestão com a seguinte composição:

a) Um representante da entidade gestora do banco de terras, que preside;

b) Um representante do IFAP;

c) Um representante do organismo da Administração Pública responsável pela gestão integrada do

património do Estado.

7 – As normas relativas à gestão do FMT são adotadas por decreto-lei.

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CAPÍTULO IV

Disposições finais

Artigo 17.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro

É alterado o artigo 112.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º

287/2003, de 12 de novembro, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 112.º

[…]

1 – […].

2 – […].

3 – […].

4 – As taxas previstas no n.º 1 são elevadas ao dobro, anualmente e de forma cumulativa, nos casos de

prédios rústicos e partes rústicas de prédios mistos que sejam, nos termos da lei, declarados em situação de

abandono pelas direções regionais de agricultura, excetuando-se os que são integrados no banco de terras

agrícolas para arrendamento rural.

5 – [Anterior n.º 4.]

6 – [Anterior n.º 5.]

7 – [Anterior n.º 6.]

8 – [Anterior n.º 7.]

9 – [Anterior n.º 8.]

10 – [Anterior n.º 9.]

11 – [Anterior n.º 10.]

12 – [Anterior n.º 11.]

13 – [Anterior n.º 12.]

14 – [Anterior n.º 13.]

15 – [Anterior n.º 14.]

16 – [Anterior n.º 15.]

17 – [Anterior n.º 16.]

18 – O disposto no n.º 5 não se aplica aos prédios que sejam propriedade de pessoas singulares.

19 – [Anterior n.º 18.]»

Artigo 18.º

Alteração à Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto

É alterado o artigo 3.º da Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

[…]

1 – […].

a) […].

b) […].

c) […].

d) […].

e) O banco de terras;

f) O fundo do banco de terras.

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2 – […].

3 – […].

4 – Ao banco de terras e ao fundo do banco de terras referidos, respetivamente, nas alíneas e) e f) do n.º 1

aplica-se o regime previsto na lei que cria o banco público de terras agrícolas.»

Artigo 19.º

Regulamentação

O Governo regulamenta o presente diploma no prazo máximo de 120 dias.

Artigo 20.º

Norma revogatória

Procede-se à revogação da Lei n.º 62/2012, de 10 de dezembro, e todos os diplomas que a tenham

regulamentado.

Artigo 21.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana

Mortágua — José Soeiro.

———

PROJETO DE LEI N.º 298/XV/1.ª

ALTERA O ARTIGO 78.º-E DO CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS

SINGULARES (IRS) NO SENTIDO DE AUMENTAR A PERCENTAGEM E OS LIMITES DA DEDUÇÃO DAS

DESPESAS RELATIVAS A HABITAÇÃO

Exposição de motivos

Em consequência da crise pandémica, cujos efeitos na economia ainda se fazem e farão sentir nos próximos

meses/anos, agravados pela situação de guerra na Ucrânia, esta com reflexos diretos na subida dos preços da

energia, combustíveis e bens alimentares, Portugal registou em julho deste ano uma taxa de inflação de 9,4%

(a mais elevada desde outubro de 2011). Na Zona Euro, para o mesmo período, a taxa de inflação fixou-se nos

9,1% (um novo máximo histórico).

Por seu lado, a inflação core, que exclui do cálculo a energia e os alimentos não processados, ou seja, os

bens com preços mais voláteis, situa-se em 6,23%, muito acima das previsões do Banco Central Europeu (BCE).

A agravar esta situação, para a carteira dos cidadãos, prevê-se que o BCE proceda a mais aumentos das

taxas de juro até final do próximo ano, referindo vários analistas que é expectável que estes ascendam, pelo

menos, até aos 4%.

Neste contexto, à compressão do poder de compra provocado pela inflação, junta-se o risco de muitas

famílias entrarem em incumprimento perante as instituições financeiras no tocante ao pagamento dos

empréstimos contraídos para compra de habitação própria e permanente e perante os senhorios pelo não

pagamento das rendas.

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A Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 65.º o direito à habitação, referindo,

especificamente, que: «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada,

em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar».

Em momentos de crise, em que se regista um agravamento das condições de vida dos cidadãos, e em que

é previsível que essa situação se estenda no tempo, torna-se necessária a intervenção do Estado para garantir

o suprimento das necessidades básicas dos seus cidadãos, como é o caso, também, da habitação, alocando

para esse efeito os recursos necessários.

Por outro lado, se o Plano de Recuperação e Resiliência, na componente «Habitação», já enfatiza a

necessidade de dar resposta: «(…) às carências estruturais e permanentes ou temporárias no domínio da

habitação (…)», como forma de mitigar o impacto económico e social da crise causada pela pandemia, mais

pertinente se mostra agora essa demanda, em função das consequências advindas da guerra na Ucrânia.

No atual Programa de Governo (o XXIII Constitucional) também a habitação surge identificada como um dos

pilares do Estado social, reconhecendo o Governo que: «(…) é hoje evidente que o número de pessoas que

enfrentam dificuldades em aceder a uma habitação adequada e com um custo comportável face aos seus

rendimentos é muito mais alargado», e concluindo, muito bem, que: «Assistiu-se, assim ao alargamento das

dificuldades de acesso à habitação por parte da população com rendimentos intermédios, que não consegue

aceder a uma habitação sem que isso implique uma forte sobrecarga sobre o seu orçamento».

Não estando ao alcance do Estado a intromissão na gestão das instituições financeiras ou nos acordos

contratualizados entre estas e os seus clientes ou nos acordos firmados entre senhorios e inquilinos, compete-

lhe no entanto, em função do exposto e dos compromissos que, através do Governo, assumiu como seus, criar

os instrumentos e tomar as medidas necessárias para amortizar o risco da perda da habitação própria e

permanente por parte dos cidadãos, evitando o agudizar de um problema que num contexto político, económico

e social bem menos gravoso já estava identificado e se pretendia inverter.

Dentro deste quadro de crise económica e social que estamos a atravessar, de acentuada compressão de

rendimentos dos cidadãos, em que se agrava o risco de muitas famílias serem desalojadas por incapacidade

financeira para pagarem a renda e outras tantas de perderem a habitação própria e permanente por

incumprimento no pagamento dos empréstimos contraídos para esse efeito, o Chega vem propor a alteração do

artigo 78.º-E do IRS, no sentido de aumentar a percentagem e os limites de dedução das despesas suportadas

com o arrendamento e a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação própria e permanente,

e eliminar os prazos limite para efeitos da dedução.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o

seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei determina o aumento da percentagem e dos limites da dedução das despesas suportadas com

o arrendamento ou a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação própria e permanente, e

procede à eliminação dos prazos limite para aceder a essa dedução, procedendo à alteração do Código do

Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro

É alterado o artigo 78.º-E, do Decreto-lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, que aprova o Código do Imposto

Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, e posteriores alterações, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 78.º-E

Dedução de encargos com imóveis

1 – À coleta do IRS devido pelos sujeitos passivos é dedutível um montante correspondente a 20% do valor

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suportado por qualquer membro do agregado familiar:

a) Com as importâncias, líquidas de subsídios ou comparticipações oficiais, suportadas a título de renda pelo

arrendatário de prédio urbano ou da sua fração autónoma para fins de habitação permanente, quando referentes

a contratos de arrendamento celebrados ao abrigo do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-

Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, ou do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006,

de 27 de fevereiro, ou com contratos de direito real de habitação duradoura no ano em que tais importâncias

sejam tributáveis como rendimento do proprietário, até ao limite de 600 €;

b) Com juros de dívidas contraídas com a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação

própria e permanente ou arrendamento devidamente comprovado para habitação permanente do arrendatário,

até ao limite de 600 €;

c) Com prestações devidas em resultado de contratos celebrados com cooperativas de habitação ou no

âmbito do regime de compras em grupo, para a aquisição de imóveis destinados a habitação própria e

permanente ou arrendamento para habitação permanente do arrendatário, devidamente comprovadas, na parte

que respeitem a juros das correspondentes dívidas, até ao limite de 600 €; ou

d) Com importâncias pagas a título de rendas por contrato de locação financeira relativo a imóveis para

habitação própria e permanente efetuadas ao abrigo deste regime, na parte que não constituam amortização de

capital, até ao limite de 600 €.

2 – […].

3 – […].

4 – Não obstante o disposto no n.º 1, o limite da dedução à coleta aí previsto é elevado para 800 € para os

contribuintes que tenham um rendimento coletável igual ou inferior ao valor do primeiro escalão do n.º 1 do artigo

68.º, sendo o rendimento coletável, no caso de tributação conjunta, o que resultar da aplicação do divisor previsto

no artigo 69.º

a) [Revogado];

b) [Revogado].

5 – [Revogado.]

6 – […].

7 – […].

8 – […].

9 – […].»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso

— Rui Paulo Sousa.

———

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PROJETO DE LEI N.º 299/XV/1.ª

ESTABELECE MEDIDAS DE APOIO E PROTEÇÃO DOS PARTICULARES, POR MOTIVO DO

AUMENTO DAS TAXAS DE JUROS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO À AQUISIÇÃO

DE HABITAÇÃO PRÓPRIA E PERMANENTE

Exposição de motivos

Portugal é uma das economias mais endividadas da Zona Euro, o que vale por dizer que o recente aumento

das taxas de juro vem colocar mais pressão sobre todos os agentes económicos. Os particulares que

contrataram com as instituições bancárias empréstimos, ou contratos de locação financeira, para aquisição de

habitação própria e permanente, são dos mais prejudicados com a subida das taxas de juro do financiamento à

habitação.

É do conhecimento geral que a maior parte das famílias portuguesas compra casa recorrendo ao crédito à

habitação, contraindo empréstimos que, regra geral, são contratados com uma taxa de juro variável, indexada

às taxas Euribor a seis meses. Ora, as abruptas subidas da taxa de juro diretora do Banco Central Europeu –

que, de -0,5% em dezembro de 2021, subiu para 0% em junho de 2022, para 1,25% em setembro e deverá,

segundo estimativas credíveis, escalar aos 2% em outubro – já estão a ter impacto nas Euribor, como seria de

esperar. Esse impacto vai repercutir-se sobre as famílias que, estando já a sofrer os efeitos da escalada dos

preços dos bens essenciais e do aumento dos combustíveis, da eletricidade e do gás, veem-se agora a braços

com o agravamento das prestações de crédito à habitação, que pode representar o golpe final para muitos

orçamentos familiares.

Estamos a falar de 1,4 milhões de famílias com crédito à habitação, num valor global de 103 mil milhões de

euros de saldo em dívida, 93% das quais com contratos de taxa variável indexada à Euribor.

Considerando a evolução recente nas taxas Euribor e as expectativas nos mercados financeiros para a sua

evolução nos próximos meses, é de esperar um aumento das prestações mensais do crédito à habitação de

59% no primeiro do ano que vem. Para quem já se deu ao cuidado de fazer as contas1, a previsão é que, num

empréstimo de 150 mil €, por 30 anos, o aumento é de mais 261 € por mês, ao passo que num crédito de 250

mil €, pelo mesmo prazo, o aumento chega aos 436 € mensais.

Do lado das autoridades públicas, contudo, as respostas têm sido pouco consistentes ou, mesmo,

contraditórias.

O Primeiro-Ministro afirma que o efeito da subida das taxas de juro sobre os contratos de financiamento à

aquisição de habitação é matéria em análise no Governo, sendo de admitir a criação futura de apoios para ajudar

as famílias, em articulação com a Associação Portuguesa de Bancos.

A Associação Portuguesa de Bancos, por seu turno, recomenda prudência ao Governo e aconselha-o a evitar

soluções para situações transitórias.

O Governador do Banco de Portugal rema em sentido contrário, afastando publicamente os receios de subida

preocupante no incumprimento no crédito à habitação, mesmo tendo em conta a percentagem de empréstimos

à habitação com taxa variável no total do crédito hipotecário (v. supra), e apesar da redução do rendimento das

famílias e do aumento de juros2. Não deixa de ser surpreendente, contudo, se tivermos em conta que a redução

do rendimento das famílias, a queda do preço das casas e o aumento do malparado das empresas foram os

principais riscos elencados pelo Banco de Portugal no último Relatório de Estabilidade Financeira, de junho de

2022 («A redução do rendimento disponível real devido à inflação e o efeito do aumento das taxas de juro sobre

o serviço de dívida são os riscos mais relevantes para a situação financeira dos particulares» – cf. Sumário

executivo)3.

O Primeiro-Ministro exortou, ainda, as partes interessadas com a responsabilidade de procurarem soluções,

designadamente moratórias e renegociação de créditos.

O Chega entende que os partidos também foram chamados a responder a este apelo do Governo, sobretudo

agora, que a principal associação patronal do setor bancário e a própria supervisão bancária assobiam para o

1 https://expresso.pt/economia/2022-09-15-Juros-vao-trepar-mais-prestacoes-da-casa-sobem-ate-59-em-ano-e-meio-1120741e. 2 https://jornaleconomico.pt/noticias/bdp-rejeita-subida-significativa-do-incumprimento-no-credito-a-habitacao-909206. 3 https://www.bportugal.pt/sites/default/files/anexos/pdf-boletim/ref_06_2022_pt.pdf.

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lado, descartando qualquer ónus que se queira impor sobre a atividade e o setor bancário e silenciando uma

realidade de que todos se aperceberam já: A de que o aumento das taxas de juro vai traduzir-se, a breve trecho,

numa melhoria das margens financeiras dos bancos e, consequentemente, dos respetivos lucros.

É necessária a adoção de medidas urgentes de proteção e apoio às famílias portuguesas, em matéria de

crédito à habitação própria permanente.

O Chega defende a existência de um especial dever de participação neste esforço conjunto por parte do

sistema financeiro, considerada a sua função essencial de financiamento de qualquer economia, particularmente

num período de elevada incerteza quanto à evolução da conjuntura económica mundial.

Assim sendo, propomos a consagração legal de uma moratória, por um período de seis meses, que consistirá

numa proibição da revogação das linhas de crédito contratadas, bem como uma prorrogação ou suspensão dos

créditos até fim deste período, eventualmente prorrogado em função dos desenvolvimentos económicos futuros,

com o objetivo de prevenir eventuais incumprimentos, por parte das famílias, e de lhes permitir encontrar a

solução que o Governo não conseguiu produzir, caso esse incumprimento venha a ocorrer.

Pelo exposto, e nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados

apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

1 – A presente lei estabelece medidas de apoio e proteção aos titulares de empréstimos e de contratos de

locação financeira, destinadas a morigerar o impacto do aumento das taxas de juro sobre tais operações.

2 – As medidas de proteção e apoio à liquidez dos particulares a que alude o número anterior, doravante

designados interessados, têm como finalidade o diferimento do cumprimento das respetivas obrigações perante

o sistema financeiro.

3 – Para os efeitos do presente decreto-lei, a crise inflacionista provocada pela crise energética e guerra no

Leste da Europa é formalmente reconhecida como um evento excecional com consequências graves para a

economia e para os mercados, nos termos do artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

Artigo 2.º

Âmbito objetivo

1 – A presente lei aplica-se a operações de crédito hipotecário, bem como a locação financeira de imóveis,

desde que destinados a habitação própria e permanente do interessado.

2 – A presente lei aplica-se ainda a outras operações de crédito do interessado, desde que subordinadas ao

fim previsto no número anterior, ainda que com diferente denominação ou diferente titulação.

Artigo 3.º

Âmbito subjetivo

Beneficiam das medidas previstas na presente lei os interessados que, à data da entrada em vigor da

presente lei, preencham as seguintes condições:

a) Não estejam em mora ou incumprimento de prestações pecuniárias há mais de 120 dias junto da instituição

de crédito, ou estando, não cumpram o critério de materialidade previsto no aviso do Banco de Portugal n.º

2/2019 e no Regulamento (UE) 2018/1845 do Banco Central Europeu, de 21 de novembro de 2018, e não se

encontrem em situação de insolvência ou naquela data estejam já em execução por qualquer uma das

instituições;

b) Relativamente à situação perante a Autoridade Tributária e Aduaneira e a segurança social:

i) Tenham a situação contributiva regularizada, nos termos previstos no Código de procedimento e

Processo Tributário e do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança

Social; ou

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43

ii) Tenham uma situação irregular de valor não superior a 5000 €; ou

iii) Tenham em curso processo negocial de regularização do incumprimento ou apresentem pedido de

regularização da situação, nos termos legais.

Artigo 4.º

Moratória

1 – Os interessados abrangidos pela presente lei beneficiam das seguintes medidas de apoio, relativamente

às suas exposições creditícias contratadas junto das instituições de crédito:

a) Proibição de revogação, resolução ou denúncia, total ou parcial, de linhas de crédito contratadas e

empréstimos concedidos, nos montantes contratados à data de entrada em vigor da presente lei, durante o

período em que vigorar a presente medida;

b) Prorrogação, por um período igual ao prazo de vigência da presente medida, de todos os créditos com

pagamento de capital no final do contrato, vigentes à data da entrada em vigor da presente lei e, nos mesmos

termos, de todos os seus elementos associados, incluindo juros e garantias;

c) Suspensão, relativamente a créditos com reembolso parcelar de capital ou com vencimento parcelar de

outras prestações pecuniárias, durante o período em que vigorar a presente medida, do pagamento do capital,

das rendas e dos juros com vencimento previsto até ao término desse período, sendo o plano contratual de

pagamento das parcelas de capital, rendas, juros, comissões e outros encargos estendido automaticamente por

um período igual ao da suspensão, sendo igualmente prolongados todos os elementos associados aos contratos

abrangidos pela medida, incluindo garantias.

2 – Os interessados que beneficiem das medidas previstas em b) e c) do número anterior podem, em qualquer

momento, solicitar que apenas os reembolsos de capital, ou parte destes, sejam suspensos.

3 – A extensão do prazo de pagamento de capital, rendas, juros, comissões e demais encargos referidos nas

alíneas b) e c) do n.º 1 não dá motivo a qualquer das seguintes vicissitudes contratuais:

a) Incumprimento contratual;

b) Ativação de cláusulas de vencimento antecipado;

c) Suspensão do vencimento de juros devidos durante o período da prorrogação, que serão capitalizados no

valor do empréstimo com referência ao momento em que são devidos à taxa do contrato em vigor; e

d) Ineficácia ou cessação das garantias concedidas pelas entidades beneficiárias das medidas ou por

terceiros, designadamente a eficácia e vigência dos seguros, das fianças e dos avales.

4 – A prorrogação das garantias, designadamente de seguros, de fianças e de avales não carece de qualquer

outra formalidade, parecer, autorização ou ato prévio de qualquer outra entidade, é plenamente eficaz e oponível

a terceiros, devendo o respetivo registo, quando necessário, ser promovido pelas instituições, com base no

disposto na presente lei, sem necessidade de apresentação de qualquer outro documento e com dispensa de

trato sucessivo.

5 – Os interessados podem beneficiar dos efeitos das medidas previstas no presente artigo por período

inferior à duração da moratória, devendo, para o efeito, comunicar essa intenção à instituição no prazo mínimo

de 30 dias anteriores à data em que pretendem fazer cessar os respetivos efeitos.

Artigo 5.º

Condições de acesso

1 – Para acederem às medidas previstas no artigo anterior, os interessados devem remeter à instituição uma

declaração assinada de adesão à aplicação da moratória, por correio eletrónico ou físico, nos 30 dias seguintes

à entrada em vigor da presente lei.

2 – A declaração é acompanhada pela documentação da regularidade da respetiva situação tributária e

contributiva, da existência de processo negocial de regularização do incumprimento ou do requerimento do

pedido de regularização.

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3 – As instituições aplicam as medidas de proteção previstas no artigo anterior no prazo máximo de cinco

dias úteis após a receção da declaração e dos documentos referidos nos números anteriores, com efeitos à data

da entrega da declaração, salvo se a entidade beneficiária não preencher as condições estabelecidas no artigo

3.º

4 – Caso verifiquem que o interessado não preenche as condições estabelecidas no artigo 3.º, as instituições

devem informá-lo desse facto no prazo máximo de três dias úteis, mediante o envio de comunicação através do

mesmo meio que foi utilizado pelo interessado.

Artigo 6.º

Acesso indevido a medidas de apoio

Os interessados que acederem às medidas de apoio previstas na presente lei sem preencherem os requisitos

nela previstos, são responsáveis pelo ressarcimento dos danos causados por falsas declarações, sem prejuízo

da responsabilidade criminal em que possam ter incorrido.

Artigo 7.º

Supervisão e reporte de informação

1 – O Banco de Portugal é responsável pela supervisão e fiscalização do regime de acesso à moratória

prevista na presente lei.

2 – As exposições abrangidas pela moratória são comunicadas à central de responsabilidades de crédito do

Banco de Portugal.

Artigo 8.º

Duração das medidas

As medidas de apoio previstas na presente lei produzem efeitos durante seis meses, a contar da data da

entrada em vigor da presente lei, sem prejuízo de eventual prorrogação, ou cessação antecipada, por efeito de

diploma legal.

Artigo 9.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 15 de setembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso

— Rui Paulo Sousa.

———

PROJETO DE LEI N.º 300/XV/1.ª

ALTERA A LEI N.º 60/2007, DE 10 DE SETEMBRO, QUE ESTABELECE O REGIME JURÍDICO DAS

INSTITUIÇÕES DO ENSINO SUPERIOR, DENSIFICANDO A NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DO RJIE

Exposição de motivos

A Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, estabelece o regime jurídico das instituições do ensino superior

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(RJIES)1. O diploma consagra, no artigo 185.º, que a lei que orienta o rumo do ensino superior seria objeto de

avaliação cinco anos após a sua entrada em vigor, portanto em 2012. Uma década depois, o artigo em causa

continua por cumprir.

Se determinação legal referida foi imposta logo em 2007 é porque o legislador considerou relevante o sentido

da prudência. No contexto de uma sociedade em transformação, as alterações introduzidas pelo RJIES eram

suficientemente relevantes para não se antecipar, na origem, qual seria o rumo efetivo das instituições do ensino

superior.

A quebra do dever de cumprir a lei pelos Governos que se foram sucedendo desde 2012, os Governos do

PSD-CDS/PP (2011/2015) e do PS (2015/2019; 2019/2022; 2022/20…), mas não menos da Assembleia da

República, não podem ficar sem justificação face a uma quebra com consequências sociais significativamente

perniciosas.

Num ciclo iniciado em 2007, por responsabilidades objetivas do poder legislativo e do poder executivo, dois

órgãos de soberania aos quais se exige uma conduta exemplar, que por cima podem ser juízes em causa

própria, nunca foi devidamente ponderada a relação entre os aspetos positivos e negativos introduzidos pelo

RJIES. Apenas aferindo uns e outros, e procedendo aos respetivos reajustamentos do RJIES no tempo

legalmente previsto, poderia ter sido comprovado o sentido de responsabilidade social. Isso por não ser possível

ignorar o impacto profundo, e sem paralelo, do ensino superior no destino coletivo dos portugueses.

Essa falta de sentido de responsabilidade social permitiu e permite que, entre os portugueses, se avolumem

dúvidas sobre em que medida o ensino superior evitou que a crise crescentemente endémica que atinge as

instituições portuguesas (justiça, saúde, ensino, sistema de pensões, segurança, defesa, entre outras) e o bem-

estar social e económico dos cidadãos teve os seus impactos suavizados por causa do desenvolvimento do

ensino superior ou, pelo contrário, se o sentido desse desenvolvimento é ele mesmo responsável por um rumo

que vai colocando Portugal na cauda da Europa.

É de senso comum verificar que a sociedade portuguesa não tem convergido com os níveis de prosperidade

das sociedades mais desenvolvidas do mundo ocidental, e que essa tendência se acentuou justamente no ciclo

histórico em que o ensino superior teve a maior expansão histórica de sempre. Não está jamais em causa o

investimento estratégico do País no setor, apenas que os órgãos de soberania devem ser os primeiros e

principais interessados em aferir se o rumo do ensino superior tem sido o mais ajustado e sustentável face às

ambições da sociedade no seu conjunto. Em democracia, essa aferição pode e deve envolver as mais diversas

instituições e agentes direta e indiretamente envolvidos, de modo a assegurar um debate amplo de avaliação

do RJIES.

Entre as questões que necessitam de ser devidamente ponderadas, é de sublinhar a necessidade do RJIES

assegurar a autonomia institucional efetiva do ensino superior a partir de lógicas mais transparentes dos

financiamentos públicos, e mais relevante ainda no domínio epistemológico da produção, validação e renovação

de conhecimentos científicos, académicos ou qualificados. A tradição científica, intelectual e académica do

mundo ocidental que legitima a existência do ensino superior foi refundada no Século XVIII através da autonomia

inequívoca entre a fé (o campo da igreja) e a razão (o campo da ciência, isto é, da universidade).

Esse caminho garantiu a explosão científica do Século XIX e manteve-se. Porém, a entrada no Século XXI

tem-nos crescentemente confrontado com um regresso à casa de partida, mas desta feita a necessidade

premente de assegurar a autonomia entre a razão (universidades) e o poder (político). O dever de neutralidade

política e ideológica dos saberes académicos é hoje uma questão premente que não pode ser descartada de

qualquer projeto de sustentabilidade do ensino superior.

Assim sendo, a avaliação do RJIES não se pode resumir a uma dimensão jurídica, legal ou instrumental, mas

espoletar também um amplo debate epistemológico sobre a natureza do conhecimento científico e das

condições institucionais e sociais da sua viabilidade. Por aí passa o sucesso ou o fracasso do destino coletivo

dos portugueses.

Assim, ao abrigo das disposições procedimentais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do CH, apresentam o seguinte projeto lei:

1 Lei n.º 62/2007 | DRE.

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Artigo 1.º

O presente diploma altera a Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que estabelece o regime jurídico das

instituições do ensino superior, densificando a necessidade de avaliação do RJIE.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro

É alterado o artigo 185.º, da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, o qual passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 185.º

[…]

1 – A aplicação da presente lei é objeto de avaliação desde a sua entrada em vigor até ao presente devendo,

posteriormente, ser objeto de reavaliação de 5 em 5 anos.

2 – O processo de avaliação previsto no número que antecede envolve compromissos e atividades de cariz

académico das mais diversas instituições e áreas curriculares do ensino superior;

3 – O processo de avaliação é dirigido por uma dupla coordenação, da Assembleia da República, por parte do

poder legislativo, e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, da parte do poder executivo.

4 – Os processos de avaliação e reavaliação incluem a apresentação de relatório à Assembleia da República.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação em Diário da República.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso

— Rui Paulo Sousa.

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PROJETO DE LEI N.º 301/XV/1.ª

ALTERA O DECRETO-LEI N.º 276/2001, DE 17 DE OUTUBRO, AUMENTANDO A PROTEÇÃO DOS

ANIMAIS DE COMPANHIA

Exposição de motivos

A 15 de outubro de 1978 foi proclamada pela Unesco a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. Esta,

embora não seja de carácter vinculativo, foi um marco na proteção dos animais reconhecendo, nomeadamente,

o direito à vida e à alimentação, assim como a sua proteção em situações de maus-tratos e tratamentos cruéis.

Veja-se o artigo 1.º da Declaração que dispõe que «Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os

mesmos direitos à existência».

Portugal tem dado passos importantes no que diz respeito à garantia do bem-estar animal em Portugal e

neste âmbito importa destacar as alterações ao Código Civil e ao Código Penal.

A Lei n.º 8/2017, de 3 de março, aditou vários artigos, nomeadamente o artigo 201.º-B ao Código civil, com

a epígrafe «Animais» que prevê que «Os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção

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jurídica em virtude da sua natureza.», e ainda, o artigo 493.º-A do Código Civil, que prevê que o detentor do

animal de companhia tenha direito a ser indemnizado em caso de lesão ou morte do seu animal. As alterações

previstas na mencionada lei refletiram algo que já reunia um consenso alargado na nossa sociedade e em vários

países, ou seja, o reconhecimento de que os animais são seres vivos merecedores de proteção contra maus-

tratos infligidos pelos seus detentores ou por terceiros.

Antes das alterações ao Código Civil ocorreram as alterações ao Código Penal, em 2014, com a aprovação

da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, onde o legislador criminalizou os maus-tratos a animais de companhia. A

aprovação desta lei foi muito importante e representa um passo significativo na proteção dos animais de

companhia no nosso País, a par da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que embora já proibindo violências

injustificadas não previa qualquer sanção para o seu incumprimento.

Decorrente da aprovação da referida legislação, que inclusivamente já foi objeto de alterações, ocorreram

milhares de denúncias, em média 2000 por ano12, deixando bem evidente a pertinência da criminalização dos

maus-tratos e do abandono de animais de companhia.

Acontece que, para além da maioria das penas serem de multa3, o Tribunal Constitucional afastou já por três

vezes a aplicação da norma prevista no artigo 387.º, do Código Penal, considerando-a inconstitucional por

violação, conjugadamente, dos artigos 27.º e 18.º, n.º 2, da nossa lei fundamental. Isto significa que há um risco

iminente de em breve se verificar a declaração de inconstitucionalidade da referida norma com força obrigatória

geral. O tribunal considerou que «mostra-se inevitável concluir pela inexistência de fundamento constitucional

para a criminalização dos maus-tratos a animais de companhia, previstos e punidos no artigo 387.º do Código

Penal. Não exprime este juízo de inconstitucionalidade uma visão segundo a qual a Constituição da República

Portuguesa sempre se oporá, por incontornáveis razões estruturais, à criminalização de uma conduta como

essa. Exprime simplesmente uma visão segundo a qual essa criminalização não encontra suporte bastante na

vigente redação da Constituição da República Portuguesa, que é aquela que se impõe ao Tribunal Constitucional

como parâmetro de avaliação das normas aprovadas pelo legislador. Juízo diverso implicaria que este Tribunal

se substituísse ao poder constituinte, exorbitando da esfera de competências que por esse mesmo poder lhe

foram outorgadas». Atendendo ao exposto, conclui-se que a solução para esta problemática parece

necessariamente passar por uma revisão constitucional. Até que isso aconteça, importa acautelar que certos

tipos de condutas não ficam sem qualquer resposta legislativa, como é o caso do abandono ou maus-tratos de

animais de companhia. O facto é que o Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, já prevê como

contraordenação grave as práticas mencionadas, no entanto, não podemos concordar com o valor das coimas

associado a estas condutas, pelo que se propõe o seu aumento para o dobro. Para além disso, acrescenta-se

também como sanção acessória a inibição de detenção de animais de companhia. Reconhecendo que esta não

é a solução ideal, parece ser a necessária para não se deixar absolutamente impune uma conduta que é

censurada pela generalidade das pessoas, que representa uma enorme cobardia e muitas vezes mesmo alguma

perversidade. Por outro lado, e atenta a importância dos médicos veterinários municipais no controlo da

população animal, no seu bem-estar, no combate aos maus-tratos e ao abandono, importa referir explicitamente

a necessidade de cada município ter um.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o

seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma procede à alteração do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, aumentando a

proteção dos animais de companhia.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro

São alterados os artigos 21.º, 68.º e 69.º, do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, e posteriores

1 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt). 2 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt). 3 Lei contra maus tratos de animais de companhia declarada inconstitucional pela terceira vez – Animais – PÚBLICO (publico.pt).

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alterações, os quais passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 21.º

[…]

As câmaras municipais devem, sempre que necessário e sob a responsabilidade do médico veterinário

municipal, ou através da celebração de protocolos com centros de atendimento médico veterinário

privados ou com a Ordem dos Médicos Veterinários, incentivar e promover o controlo da reprodução de

animais de companhia, nomeadamente de cães e gatos errantes, o qual deve ser efetuado por métodos

contracetivos preferencialmente cirúrgicos, que causem o mínimo sofrimento aos animais.

Artigo 68.º

[…]

1 – […].

2 – Constitui contraordenação económica muito grave, punível nos termos do RJCE, sendo elevadas para

o dobro as coimas lá previstas:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […];

h) […].

3 – […].

4 – [Revogado.]

5 – [Revogado.]

6 – […].

Artigo 69.º

[…]

Consoante a gravidade da contraordenação e a culpa do agente, poderão ser aplicadas, simultaneamente

com a coima, as seguintes sanções acessórias:

a) […];

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) Privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período máximo de 6 anos.»

Artigo 3.º

Aditamento ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro

É aditado o artigo 4.º-A, ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, e posteriores alterações, com a

seguinte redação:

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«Artigo 4.º-A

Médico veterinário municipal

1 – O médico veterinário municipal é a autoridade sanitária veterinária concelhia, a nível da respetiva área

geográfica de atuação, quando no exercício das atribuições que lhe estão legalmente cometidas.

2 – É obrigação de cada município contratar pelo menos um médico veterinário municipal ou ter um nomeado

pelo Ministério da Agricultura.»

Artigo 4.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias – Rui Afonso

— Rui Paulo Sousa.

———

PROJETO DE LEI N.º 302/XV/1.ª

MEDIDAS DE APOIO AOS ESTUDANTES NO ENSINO SUPERIOR NO ÂMBITO DA AÇÃO SOCIAL

ESCOLAR

Exposição de motivos

Desde há muito tempo que o PCP vem alertando para o agravamento dos custos de acesso e frequência do

ensino superior e para as consequências que daqui decorrem para milhares de estudantes que ficam impedidos

de frequentar os mais elevados graus de ensino. Esta realidade não é nova, mas, por força da profunda crise

económica e social com que o País foi sendo confrontado e da deterioração brutal das condições de vida, foi-se

agravando. O contexto atual, onde se verifica um aumento brutal da inflação, uma onda especulativa sem

entraves, que reduziu o poder de compra das famílias, o que se exige é a aprovação de medidas de combate à

especulação e de medidas que garantam ao aumento dos rendimentos das famílias.

O facto de sucessivos governos PS, PSD e CDS-PP se terem desresponsabilizado das suas obrigações

constitucionais no financiamento às instituições faz com que hoje estudar no ensino superior não seja para quem

quer, mas para quem pode pagar.

Este retrocesso social pode ser confirmado pelo abandono escolar de milhares de estudantes do ensino

superior, cujos números precisos os sucessivos governos sempre recusaram divulgar, mas a realidade de todos

os dias confirma que cada vez mais jovens têm sido obrigados a abandonar o ensino superior por não terem

dinheiro para pagar os custos exorbitantes com propinas, transportes, alimentação e material.

Apesar de, nos últimos anos, terem ocorrido diversas alterações ao Regulamento de Bolsas do Ensino

Superior, fruto da intervenção e proposta do PCP, a verdade é que essas alterações são insuficientes,

especialmente face ao contexto atual. Urge a aprovação de medidas que realmente alarguem os apoios no

âmbito da ação social escolar mais estudantes. Cumpre garantir que nenhum estudante abandone o ensino

superior por falta de condições económicas.

Considerando fundamental o combate ao fenómeno do abandono escolar e o reforço da ação social escolar

no ensino superior, o PCP entende que é indispensável a apresentação do presente projeto de lei.

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Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à aprovação de um conjunto de medidas de apoio aos estudantes no âmbito da ação

social escolar no ensino superior.

Artigo 2.º

Alargamento dos critérios de elegibilidade para acesso a bolsa de estudo

Efeitos do previsto na alínea g) do artigo 5.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, considera-se

elegível para atribuição de bolsa de estudo o estudante que tenha um rendimento per capita do agregado familiar

em que está integrado, calculado nos termos do artigo 45.º, igual ou inferior a 23 vezes o indexante dos apoios

sociais em vigor no início do ano letivo, acrescido do valor da propina máxima fixada para o 1.º ciclo de estudos

do ensino superior público no ano letivo 2018/2019.

Artigo 3.º

Aumento dos valores do complemento de alojamento

1 – Para efeitos do previsto no n.º 1 do artigo 19.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, o

complemento de alojamento concedido é igual ao valor base mensal a pagar pelos bolseiros nas residências,

até ao limite de 29,2% do indexante dos apoios sociais.

2 — Para efeitos do previsto no n.º 2 do artigo 19.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, o

complemento de alojamento concedido é igual ao valor do encargo efetivamente pago pelo alojamento

comprovado por recibo, até ao limite de 60% do indexante dos apoios sociais, sem prejuízo das majorações a

que haja lugar.

Artigo 4.º

Complemento de deslocação

Para efeitos do previsto no artigo 20.º-C do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, tem direito ao

complemento de deslocação todos os bolseiros deslocados, sejam ou não beneficiários de complemento de

alojamento.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

Os Deputados do PCP: Alfredo Maia — Alma Rivera— Paula Santos— Bruno Dias— João Dias— Jerónimo

de Sousa.

———

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PROJETO DE LEI N.º 303/XV/1.ª

ELIMINAÇÃO DAS PROPINAS, TAXAS E EMOLUMENTOS NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO

Exposição de motivos

A existência de propinas, agravada por diversas taxas e emolumentos, impossibilita a concretização efetiva

do artigo 74.º da Constituição República Portuguesa, que aponta como incumbência do Estado «estabelecer

progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino», e coloca em causa o direito de acesso de todos

aos mais elevados graus do conhecimento.

O Governo PSD que implementou o seu enorme aumento, em 1992 – à revelia de qualquer possibilidade de

pronunciamento das associações de estudantes, nem sequer do Conselho Nacional de Educação – fez orelhas

moucas às denúncias de elitização do ensino e de afastamento de milhares de estudantes, designadamente,

dos filhos de quem menos pode: Os trabalhadores em geral.

O objetivo era ideológico e concretizava o retrocesso de uma das conquistas do 25 de Abril. A máscara era

o pretenso «aumento da qualidade de ensino», que nunca se verificou por esta via. Pelo contrário. Inicia-se a

transformação de um direito em bem de mercado transacionável. É por isto mesmo que não basta aumentar a

ação social escolar. Sim, é preciso reforçá-la e garantir, simultaneamente, que as propinas são eliminadas.

PSD, PS e CDS-PP foram mantendo esta realidade ao longo de sucessivos governos, apesar da contestação

dos estudantes e das suas associações ao longo de décadas. De todas as vezes que o PCP apresentou

iniciativas com vista à definitiva eliminação das propinas, os mesmos três partidos rejeitaram os projetos em

causa, perpetuando uma injustiça e um ataque aos direitos de várias gerações.

O PCP salienta a importância da conquista da diminuição do valor das propinas alcançada nas últimas

legislaturas. No entanto, com o agravamento da situação económica de muitas famílias, com o aumento do custo

de vida nos últimos meses, sem o correspondente aumento dos rendimentos, torna-se urgente reduzir os custos

de acesso e frequência no ensino superior público eliminando as propinas, taxas e emolumentos, reforçando-se

ao mesmo tempo os mecanismos de ação social escolar.

O PCP defende que o cumprimento integral da Constituição passa pela revogação das propinas, taxas e

emolumentos no ensino superior público, garantindo-se o acesso e frequência dos estudantes aos mais

elevados graus de ensino. Tal pressupõe, a par do fim do pagamento de daqueles custos, uma política de

investimento e adequado financiamento das instituições de ensino superior, bem como do incremento decisivo

da ação social escolar, que permanece ainda profundamente limitada nos seus termos atuais.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP, apresenta o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece um plano estratégico de investimento no ensino superior público que eleve o

financiamento público das instituições, assegurando a supressão do pagamento de propinas, taxas e

emolumentos e as condições materiais e humanas adequadas ao seu funcionamento.

Artigo 2.º

Âmbito

A presente lei aplica-se a todas as suas instituições do ensino superior públicas, doravante denominadas de

Instituições.

Artigo 3.º

Plano estratégico de investimento no ensino superior público

1 – Compete ao Governo a criação de um plano estratégico de investimento no ensino superior público que

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permita, no prazo de 2 anos, a supressão do pagamento de propinas, taxas e emolumentos em todos os ciclos,

pós-graduações e cursos técnicos superiores profissionais, tendo em conta os seguintes critérios:

a) A supressão em 2023 das taxas e emolumentos cobrados para apresentação de tese ou dissertação;

b) A supressão em 2023, de 50% do valor das propinas praticado no presente ano letivo de 2022/2023;

2 – O plano previsto no número anterior tem em consideração as necessidades de funcionamento das

Instituições, quer a nível de condições materiais e financeiras, quer ao nível da contratação de todos os

trabalhadores necessários com vínculo adequado, procedendo para estas a transferência das verbas

necessárias, através do Orçamento do Estado.

4 – Compete ao Governo a transferência das verbas, correspondentes às propinas, taxas e emolumentos,

reduzidas e/ou eliminadas durante e após o processo de supressão.

5 – O Governo, através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, procede à alteração do

Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior nos termos previstos nos

números anteriores, salvaguardando o direito de todos os estudantes a serem apoiados no âmbito da ação social

escolar.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado para 2023.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

Os Deputados do PCP: Alfredo Maia — Alma Rivera — Paula Santos — Bruno Dias — João Dias — Jerónimo

de Sousa.

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PROJETO DE LEI N.º 304/XV/1.ª

ALTERA O REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À CONTRATAÇÃO A TERMO PROCEDENDO À

VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO

Exposição de motivos

Uma governação que responda pelo País tem a obrigação de colocar o emprego no centro da ação política

e de responder às transformações em curso no mundo do trabalho.

Portugal continua a ser um País precário: Cerca de um quarto da população tem contratos precários, dois

terços da juventude trabalhadora não têm contrato permanente e centenas de milhares de pessoas trabalham

sem contrato (na informalidade absoluta ou com falsos recibos verdes). Os baixos salários condenam as

pessoas a vidas no limiar da pobreza e os vínculos temporários impedem-nas de fazer projetos para o futuro.

Os vínculos não permanentes e, entre eles, os contratos de trabalho a termo permanecem enquanto um dos

maiores flagelos da estabilidade no emprego em Portugal.

De acordo com os dados do Livro Verde sobre as Relações Laborais de 2021, «Portugal tem historicamente

uma percentagem de contratos não permanentes (a termo e outros) mais elevada do que a média da União

Europeia. Apesar da tendência de descida dos últimos anos, esta realidade situava-se perto dos 20% no último

trimestre de 2019 (20,3%), tendo descido abaixo dos 18% ao longo de 2020, mas já no quadro da pandemia,

que afetou mais os empregos não permanentes».

Já em 2015, o grupo de trabalho criado para preparação de um plano nacional contra a precariedade que

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era constituído pelo Bloco de Esquerda, pelo Partido Socialista e pelo membro do Governo que tutela a área

respetiva, produziu um relatório que fez um diagnóstico da contratação a termo, com base em dados da Eurostat

de 2015, segundo os quais Portugal apresenta uma elevada incidência de contratos não permanentes,

sobretudo em termos comparativos, no quadro da União Europeia.

O Livro Verde sobre as Relações Laborais de 2021 trouxe-nos dados sobre os efeitos da pandemia nas

relações laborais, de acordo com os quais sai evidenciada a «fragilidade dos vínculos precários,

tendencialmente mais representados nos setores mais vulneráveis, sendo que mais de metade das novas

inscrições de desempregados resultaram da cessação de contratos de trabalho não permanentes».

A pandemia veio demonstrar, mais vez, a precariedade existente no emprego jovem em Portugal, exatamente

porque é entre os jovens que a incidência de vínculos não permanentes é manifestamente elevada.

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda já apresentou várias iniciativas de combate à precariedade, cujo

um dos temas é a reformulação do regime dos contratos a termo, e que forma rejeitadas pelo Governo.

A agenda para o trabalho digno, apresentada pelo Governo e que se encontra em processo de especialidade

tem algumas alterações sobre o tema dos contratos a termo, como é o caso das compensações por caducidade

do contrato a termo, que já correspondiam a uma preocupação antiga do Bloco de Esquerda e que, por isso,

estão vertidas nesta proposta.

No entanto, tal não é suficiente, motivo pelo qual o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta esta

iniciativa que pretende o seguinte:

• Reformular o artigo 139.º do CT no sentido de clarificar que o regime do contrato de trabalho a termo

resolutivo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva do trabalho;

• Eliminar a alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º do CT, que atualmente prevê como motivo justificativo para a

contratação a termo a contratação de desempregados de muito longa duração;

• Restringir a utilização dos contratos a termo apenas às situações de substituição temporária e de pico ou

sazonalidade de atividade;

• Reduzir a sucessão de contratos de trabalho a termo às situações de sazonalidade da atividade;

• Eliminar o artigo 142.º do CT que prevê os casos especiais de contrato de trabalho de muito curta duração;

• Reformular o n.º 1 do artigo 149.º do CT no sentido de esclarecer expressamente que, no caso de contratos

de trabalho a termo não renováveis, mantém-se o direito à compensação previsto para a caducidade de

contratos a termo;

• Reduzir o limite máximo previsto na alínea a) do n.º 4 do artigo 140.º do CT, que permite justificar a

contratação a termo por dois anos às empresas ou estabelecimentos em início de laboração;

• Reduzir a duração máxima dos contratos de trabalho a termo incerto;

• Aumentar a compensação a receber pelo trabalhador no caso de caducidade dos contratos de trabalho a

termo passando de 18 para 24 dias.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera o regime jurídico aplicável ao contrato de trabalho a termo, procedendo à vigésima

primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.

Artigo 2.º

Alterações ao Código do Trabalho

Os artigos 139.º, 140.º, 149.º, 344.º e 345.º do Código do Trabalho, na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de

12 de fevereiro, com as posteriores alterações, passam a ter a seguinte redação:

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«Artigo 139.º

Regime do termo resolutivo

O regime do contrato de trabalho a termo resolutivo, constante da presente subsecção, não pode ser afastado

ou modificado por instrumento de regulamentação coletiva.

Artigo 140.º

Admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo

1 – […].

2 – […]:

a) […];

b) […];

c) [Revogado];

d) [Revogado];

e) Atividade sazonal;

f) […];

g) [Revogado];

h) [Revogado].

3 – Só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto nas situações mencionadas no número

anterior.

4 – […]:

a) Lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de

estabelecimento pertencente a empresa que empregue menos de 10 trabalhadores, nos termos da alínea a), do

n.º 1 do artigo 100.º;

b) [Revogado].

5 – […].

6 – […].

Artigo 143.º

Sucessão de contrato de trabalho a termo

1 – […].

2 – O disposto no número anterior não é aplicável aos casos de atividade sazonal.

3 – […].

Artigo 148.º

Duração de contrato de trabalho a termo

1 – […].

2 – O contrato de trabalho a termo certo só pode ser celebrado por prazo inferior a seis meses em situação

prevista nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 2 do artigo 140.º, não podendo a duração ser inferior à prevista para a

tarefa ou serviço a realizar.

3 – […].

4 – […].

5 – A duração do contrato de trabalho a termo incerto não pode ser superior a três anos.

6 – […].

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Artigo 149.º

Renovação de contrato de trabalho a termo certo

1 – […].

2 – [Novo] O acordo previsto no número anterior não afasta o direito do trabalhador à compensação prevista

no n.º 2 do artigo 344.º

3 – [Anterior n.º 2.]

4 – [Anterior n.º 3.]

5 – [Anterior n.º 4.]

6 – [Anterior n.º 5.]

Artigo 344.º

Caducidade de contrato de trabalho a termo certo

1 – […].

2 – Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo certo por verificação do seu termo, o trabalhador

tem direito a compensação correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo

de antiguidade, calculada nos termos do artigo 366.º, salvo se a caducidade decorrer de declaração do

trabalhador nos termos do número anterior.

3 – […].

4 – […].

5 – […].

Artigo 345.º

Caducidade de contrato de trabalho a termo incerto

1 – […].

2 – Tratando-se de situação prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 140.º que dê lugar à contratação de vários

trabalhadores, a comunicação a que se refere o número anterior deve ser feita, sucessivamente, a partir da

verificação da normal redução da atividade.

3 – […].

4- Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo incerto, o trabalhador tem direito a compensação

correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.

5 – […].

6 – […].»

Artigo 3.º

Norma revogatória

São revogadas as alíneas c), d), g) e h) do n.º 2 e a alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º, bem o artigo 142.º, do

Código do Trabalho na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com as posteriores alterações.

Artigo 4.º

Informação e salvaguarda de direitos

1 – A aplicação da presente lei deve ser precedida de informação prévia às estruturas representativas dos

trabalhadores e aos trabalhadores visados pelas alterações à legislação laboral em apreço, bem como da

afixação sobre as alterações introduzidas, em local visível, com antecedência não inferior a sete dias úteis.

2 – Das alterações introduzidas pela presente lei não podem resultar perdas de quaisquer direitos para os

trabalhadores e as trabalhadoras abrangidas.

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Artigo 5.º

Entrada em vigor

O presente diploma entra em vigor nos 30 dias seguintes à sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.

As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina

Martins — Joana Mortágua.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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