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Sexta-feira, 16 de setembro de 2022 II Série-A — Número 85
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Resoluções: (a) — Deslocação do Presidente da República a Luanda. — Deslocação do Presidente da República a Londres. Projetos de Lei (n.os 155 e 288 a 304/XV/1.ª): N.º 155/XV/1.ª (Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros): — Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas. N.º 288/XV/1.ª (PAN) — Prevê a necessidade de avaliação de impacto ambiental da prática agrícola em modo intensivo e superintensivo de espécies arbóreas. N.º 289/XV/1.ª (PAN) — Aprova medidas de alargamento da oferta de alojamento para estudantes do Ensino Superior, alterando a Lei de bases da habitação e o Código do IRS. N.º 290/XV/1.ª (PAN) — Estabelece mecanismos de compensação para docentes deslocados da residência no cumprimento do seu exercício profissional. N.º 291/XV/1.ª (BE) — Programa de atração e fixação de docentes na escola pública. N.º 292/XV/1.ª (BE) — Altera a natureza de financiamento das instituições do Ensino Superior extinguindo o regime fundacional.
N.º 293/XV/1.ª (L) — Alargamento de atribuições da autoridade para as condições do trabalho (alteração ao Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho). N.º 294/XV/1.ª (L) — Estabelece o dever de o Governo proceder ao levantamento e divulgação de dados referentes a creches e estabelecimentos públicos de educação pré-escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 3 anos de idade. N.º 295/XV/1.ª (PAN) — Aumenta as garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras referentes à formação profissional, alterando o Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro. N.º 296/XV/1.ª (BE) — Alarga os acordos de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais na valência de creche a entidades públicas. N.º 297/XV/1.ª (BE) — Cria o Banco Público de Terras Agrícolas. N.º 298/XV/1.ª (CH) — Altera o artigo 78.º-E do Código do Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) no sentido de aumentar a percentagem e os limites da dedução das despesas relativas a habitação. N.º 299/XV/1.ª (CH) — Estabelece medidas de apoio e proteção dos particulares, por motivo do aumento das taxas
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de juros aplicáveis aos contratos de financiamento à aquisição de habitação própria e permanente. N.º 300/XV/1.ª (CH) — Altera a Lei n.º 60/2007, de 10 de setembro, que estabelece o Regime Jurídico das Instituições do Ensino Superior, densificando a necessidade de avaliação do RJIE. N.º 301/XV/1.ª (CH) — Altera o Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, aumentando a proteção dos animais de companhia.
N.º 302/XV/1.ª (PCP) — Medidas de apoio aos estudantes no ensino superior no âmbito da Ação Social Escolar. N.º 303/XV/1.ª (PCP) — Eliminação das propinas, taxas e emolumentos no ensino superior público. N.º 304/XV/1.ª (BE) — Altera o Regime Jurídico Aplicável à Contratação a Termo procedendo à vigésima primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. (a) Publicadas em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 155/XV/1.ª
(REFORÇA A PROTEÇÃO DOS ANIMAIS DURANTE O TRANSPORTE E OPERAÇÕES AFINS E
ESTABELECE O FIM DA EXPORTAÇÃO DE ANIMAIS VIVOS PARA PAÍSES TERCEIROS)
Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas
Índice
Parte I – Considerandos
1. Nota introdutória
2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa
3. Enquadramento legal e antecedentes
4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – Considerandos
1. Nota introdutória
O Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações afins e
estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros» deu entrada a 14 de junho de 2022
tendo sido junta a ficha de avaliação prévia de impacto de género.
Foi admitido a 17 de junho de 2022 e, no mesmo dia, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia
da República, baixou, na generalidade, à Comissão de Agricultura e Pescas.
A 29 de junho, na reunião ordinária n.º 11 da Comissão de Agricultura e Pescas, foi atribuída a elaboração
do parecer ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que indicou como relator, o signatário, Deputado João
Castro.
2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa
A Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN), subscritora do Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a
proteção dos animais durante o transporte e operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos
para países terceiros», justifica a apresentação da iniciativa, com um vasto conjunto de considerações, das quais
se sublinham:
– As referências às disposições preambulares do Regulamento (CE) n.º 1/2005 do Conselho, de 22 de
dezembro de 2004:
1) «Deverá limitar-se, tanto quanto possível, o transporte de animais vivos em viagens de longo curso,
incluindo o transporte de animais para abate (…)»;
2) «Deverá limitar-se as operações de carga e descarga dos animais (…)»;
3) «Qualquer pessoa que manuseie animais durante o transporte deverá ter recebido formação adequada
(…)»;
4) «Os Estados-membros devem estabelecer um quadro de sanções que sejam efetivas, proporcionadas e
dissuasivas (…)»;
5) «É necessário estabelecer medidas e normas específicas para o transporte marítimo (…)».
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– O Decreto-Lei n.º 265/2007, de 24 de julho, que diz, «visou assegurar a execução e garantir o cumprimento
das obrigações decorrentes do regulamento citado, aprovando, ainda, normas específicas destinadas a regular
o transporte rodoviário realizado em território nacional, bem como o transporte marítimo entre os Açores, a
Madeira e o continente, e entre ilhas.» e salienta aspetos que, em seu entender, são relevantes;
– O acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), de 21/12/2011, no âmbito do Processo
C‑316/10, aclarando, com efeitos erga omnes, que «a adoção por parte de um Estado‑Membro de normas que
precisam concretamente, a nível nacional, o âmbito de requisitos formulados em termos gerais pelo
Regulamento n.º 1/2005 é suscetível de reforçar a segurança jurídica, uma vez que essas normas estabelecem
critérios que aumentam a previsibilidade dos requisitos deste regulamento (…)».
É igualmente feita referência à petição apresentada na Assembleia da República, em 15/12/2017, a Petição
n.º 436/XIII/3.ª, subscrita por 7225 cidadãos, solicitando a abolição do transporte de animais vivos por via
marítima para países fora da União Europeia.
São apresentados relatos, denúncias e conclusões que suscitam a leitura da iniciativa.
Conforme síntese apresentada na nota técnica anexa:
– «A proponente afirma que em Portugal a exportação de animais vivos e o respetivo transporte para países
terceiros continua a ser feita, em condições que estão longe de ser aceitáveis, carecendo de implementação de
normas mais apertadas, nomeadamente, no que tange aos tempos de viagem, ao espaço disponível para cada
animal, à exposição a fatores meteorológicos críticos, principalmente temperaturas muito elevadas, à formação
do pessoal, à presença e acompanhamento de médicos veterinários e ao aumento do montante das coimas,
tendo como objetivo final restringir o transporte de animais vivos, visando a prazo a sua abolição, justificando
assim, a apresentação desta iniciativa».
3. Enquadramento legal e antecedentes
O Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª foi subscrito pela Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) ao abrigo
e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da
Republica (RAR), que consubstanciam o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por
força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do RAR, bem
como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da
alínea f) do artigo 8.º do RAR.
De acordo com a nota técnica anexa:
– «A iniciativa em análise toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo
119.º do Regimento, encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente
o seu objeto principal e é precedida de uma exposição de motivos, cumprindo os requisitos formais estabelecidos
no n.º 1 do artigo 124.º do RAR.»;
– «Encontram-se respeitados os limites à admissão das iniciativas, previstos no n.º 1 do artigo 120.º do RAR,
uma vez que este projeto de lei define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem
legislativa e parece não infringir princípios constitucionais.»;
– «O título da presente iniciativa legislativa – ‘Reforça a proteção dos animais durante o transporte e
operações afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros’ traduz sinteticamente
o seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro,
conhecida como lei formulário. Em caso de aprovação, em sede de apreciação na especialidade ou em redação
final, o título poderá ser objeto de aperfeiçoamento formal.»;
– Quanto à entrada em vigor, esta terá lugar no 1.º dia do 2.º mês seguinte ao da sua publicação, nos termos
do artigo 5.º do projeto de lei em análise, e respeitando o disposto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário;
– Em caso de aprovação, a iniciativa em apreço revestirá a forma de lei, sendo objeto de publicação na 1.ª
série do Diário da República, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
Para mais detalhes dever-se-á consultar a nota técnica apresentada em Parte IV – Anexos.
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4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), não se apurou, na atual Legislatura, a existência
de nenhuma iniciativa legislativa ou petição sobre a matéria objeto do projeto de lei vertente ou com ele conexa.
De acordo com a nota técnica anexa registam-se os seguintes antecedentes parlamentares:
– Projeto de Lei n.º 1013/XIV/3.ª (PAN) – Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações
afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros – Caducada;
– Projeto de Lei n.º 1051/XIII/4.ª (BE) – Regula o transporte de longo curso de animais vivos – Rejeitada;
– Projeto de Lei n.º 719/XIII/3.ª (PAN) – Adota medidas mais garantísticas do bem-estar animal no que diz
respeito ao transporte de animais vivos – Rejeitado;
– Petição n.º 436/XIII/3.ª – Abolição do transporte de animais vivos por via marítima para países fora da União
Europeia – Concluída.
PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer
O relator do presente parecer reserva a sua opinião para o debate em plenário da iniciativa, a qual é, de
resto, de elaboração facultativa conforme o disposto no n.º 3 do artigo 137.º do RAR.
PARTE III – Conclusões
A Comissão de Agricultura e Mar aprova o seguinte parecer:
1 – Deputada do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da
República o Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª «Reforça a proteção dos animais durante o transporte e operações
afins e estabelece o fim da exportação de animais vivos para países terceiros»;
2 – A apresentação do Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª foi efetuada nos termos constitucionais, legais e
regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os requisitos formais e de tramitação exigidos;
3 – A Comissão de Agricultura e Pescas é de parecer que o Projeto de Lei n.º 155/XV/1.ª reúne as condições
constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário da Assembleia da República.
PARTE IV – Anexos
Nota técnica elaborada pelos serviços da Assembleia da República, ao abrigo do artigo 131.º do Regimento
da Assembleia da República.
Palácio de São Bento, 5 de setembro de 2022.
O Deputado autor do parecer, João Castro — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH, da IL e do BE, na
reunião da Comissão de 15 de setembro de 2022.
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PROJETO DE LEI N.º 288/XV/1.ª
PREVÊ A NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO AMBIENTAL DA PRÁTICA AGRÍCOLA EM
MODO INTENSIVO E SUPERINTENSIVO DE ESPÉCIES ARBÓREAS
Exposição de motivos
Nas últimas décadas tem-se vindo a verificar uma crescente reconversão de culturas agrícolas tradicionais
em plantações intensivas em grande escala, recorrendo a métodos de cultivo dependentes de fertilizantes,
pesticidas e da utilização de quantidades de água insustentáveis.
Esta expansão de culturas intensivas não tem sido devidamente acompanhada pelas entidades competentes,
não foram identificados atempadamente os impactos negativos nos recursos naturais nem na saúde pública.
De acordo com dados da administração central, a área de produção de olival intensivo e superintensivo tem
vindo a aumentar, principalmente na zona de regadio do Alentejo.
São consideradas culturas intensivas todas as que são sujeitas a regime de regadio e que possuam mais de
200 árvores por hectare (ha), sendo qualificadas como superintensivas, as culturas onde o número de plantas
seja superior a 1000 árvores por ha1.
De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2021 a área total de olival era 380 412 ha, sendo que
a maioria se reporta a olivais intensivos. Só na área do regadio do Alqueva, em 2019, os olivais ocupavam 66
237 ha, representando 55% da área total2. Com o desenvolvimento do regadio, tem-se verificado não só o
aumento de olival intensivo como de outras árvores de fruto, nomeadamente a cultura de abacate e de amêndoa,
sendo que relativamente ao amendoal intensivo, a área de cultivo se encontra em franco crescimento, tendo
aumentando de 1000 ha para 11 448 ha desde 2015.
A falta de regulação e de monitorização na utilização de pesticidas e fertilizantes, aliadas ao objetivo de
aumentar a produtividade, provocam a contaminação dos solos e, consequentemente, dos recursos hídricos
subterrâneos. Esta situação tem impacto não só nos ecossistemas, mas também na saúde das populações das
áreas circundantes, já que é comum as pessoas terem furos e utilizarem essa água para a rega ou para o seu
consumo.
Acresce que a maioria das plantações de olival e amendoal cultivadas de modo intensivo estão localizadas
maioritariamente a sul de Portugal, onde existe maior escassez de água, com tendência a aumentar segundo
os modelos para as alterações climáticas. Parece, por isso, particularmente imprudente permitir e fomentar a
expansão deste tipo de culturas sem que haja uma correta avaliação do impacto no ambiente e na saúde pública.
Conscientes da crescente alteração dos métodos de cultivo de azeitona e dos possíveis impactos que poderia
ter nos recursos naturais, em 2008, terá sido constituído por meio do Despacho n.º 26873/2008, de 23 de
outubro, o Grupo de Trabalho do Olival (GTO) com o objetivo de «realizar as análises consideradas necessárias
ao acompanhamento constante da evolução das características e estado da fertilidade dos solos, e à
apresentação anual de um relatório com as respetivas conclusões».
Destes relatórios, elaborados em 2009, 2010 e 2011, surgiram diversas conclusões, entre as quais é referido
que em 77% dos olivais intensivos não existe controlo do teor da água do solo e 58% não regista o volume de
água utilizado, devido ao facto de não possuírem equipamento de medição, o que revela que a utilização da
água não é feita de modo consciente e racional3.
Este facto é reforçado pelas declarações da responsável pelo Departamento de Recursos Hídricos da
Agência Portuguesa do Ambiente (APA)4, que afirma que licenciaram no passado ano hidrológico «que começou
em outubro de 2018, mais de quatro mil furos de captação de água, resultado da seca, mas também da crescente
intensificação de alguma agricultura».
Já no relatório do Grupo de Trabalho do Olival de 20105 se encontrava o alerta para que os recursos hídricos
1 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 1.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, 2009. 2 https://www.edia.pt/wp-content/uploads/2020/02/AnuarioAgricolaAlqueva2019.pdf. 3 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 1.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas, 2009. 4https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/interior/ha-pesticidas-proibidos-em-aguas-subterraneas-portuguesas-10877980.html?fbclid=IwAR31-Wfr_59gXkxm1uL3tCQpEUbTVWX15uVpu1r_ouLRjBV0qJkz_udDPxc. 5 Análise dos impactos no solo resultantes da introdução de novos olivais regados no Alentejo, 2.º relatório do GTO, Ministério da Agricultura,
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fossem utilizados de forma sustentável, uma vez que a «rega pode promover impactos ambientais significativos,
nomeadamente ao nível do esgotamento dos aquíferos, do risco de erosão dos solos e da salinização ou
contaminação das águas».
A salinidade dos solos é causada pela deficiente drenagem aliada à aplicação excessiva de fertilizantes,
acabando por ser prejudicial para a sua produção, uma vez que quando os sais estão em excesso, as plantas
não conseguem absorver a água do solo devido à elevada pressão osmótica da solução.
Através do recente estudo da APA à qualidade das águas subterrâneas, foi detetada a presença de pesticidas
proibidos por lei em zonas onde a atividade agrícola é mais intensa, sendo que de acordo com a APA «se estas
substâncias já estão a chegar às nossas águas subterrâneas é porque estão a ser usadas em concentrações
bastante elevadas»6.
Visto que o estudo de 2009 do Grupo de Trabalho do Olival referia que os olivais intensivos utilizam em
média, mais do dobro de fertilizantes e fitofarmacêuticos que os tradicionais, e que, na maioria dos casos, não
existem registos sistemáticos das quantidades dos fitofármacos e fertilizantes utilizados, parece que se encontra
estabelecida uma possível correlação entre a contaminação dos aquíferos e a desmedida expansão de culturas
intensivas e superintensivas.
Em suma, a falta de regulação e monitorização na utilização de pesticidas tem também impactos significativos
na saúde da população das regiões onde se encontram estas culturas.
A falta de regulamentação da atividade aliada à permissividade da atual legislação relativamente à aplicação
de fitofarmacêuticos, admite a sua livre aplicação na proximidade de zonas habitacionais. Esta situação é
preocupante para as populações afetadas e deve, também, preocupar o legislador. Verifica-se uma lacuna no
que diz respeito ao estabelecimento de zonas de proteção como medida de redução do risco de contaminação
das populações e do meio ambiente que importa agora suprir.
Também é de referir que plantações intensivas de única espécie, mesmo autóctones, implicam uma
diminuição de biodiversidade, diminuição da resiliência das culturas a infestações, e uma menor capacidade de
adaptação às alterações climáticas por serem dependentes do regadio e dos pesticidas aplicados.
Por isso, apesar de serem constituídas por espécies autóctones, as plantações intensivas de oliveiras e
amendoais comprometem a biodiversidade, estando referido no 2.º relatório do GTO (2010) que «é no olival
superintensivo que se manifesta a acentuada quebra de diversidade», apresentando «tendência para a
dominância de um pequeno grupo de espécies», provocando um desequilíbrio da flora e, consequentemente,
da fauna.
O atual regime jurídico de avaliação de impacte ambiental (AIA), através do Decreto-Lei n.º 152-B/2017 de
11 de dezembro, já determina a obrigatoriedade de ser efetuada AIA em situações onde haja reconversão de
terras não cultivadas há mais de cinco anos para agricultura intensiva, acima dos 100 ha de um modo geral e
em zona sensíveis acima dos 50 ha.
Assim, consideramos que todas as culturas intensivas arbóreas acima de 50 ha, ou que juntamente com
outras áreas contíguas perfaçam mais de 50 ha devam ser sujeitas a AIA independentemente de não estarem
situadas em zonas sensíveis.
Ainda, a Diretiva 2010/75/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de novembro, veio reconhecer a
existência de diferentes abordagens no controlo das emissões para o ar, água e solos que poderia favorecer a
transferência de problemas de poluição de um meio físico para outro, ao invés de favorecer a proteção do
ambiente no seu todo.
Por isso, tornou-se relevante considerar uma «abordagem integrada para a prevenção e o controlo das
emissões com o estabelecer de um quadro geral para o controlo das principais atividades industriais que dê
prioridade a uma intervenção a montante e que garanta uma gestão cuidadosa dos recursos naturais tendo em
conta, sempre que necessário, a situação económica e as especificidades do local em que a atividade industrial
é desenvolvida».
No Decreto-Lei n.º 127/2013, de 30 de agosto, estabelece o regime de emissões industriais aplicável à
prevenção e ao controlo integrado da poluição, descrevendo quais as atividades que são sujeitas a este controlo
e quais a que têm obrigatoriedade de possuírem uma licença ambiental, que determina quais os valores limite
de emissão (VLE) para as substâncias poluentes suscetíveis de serem emitidas em volume significativo, tendo
Desenvolvimento Rural e Pescas, 2010. 6 .https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/ha-pesticidas-proibidos-em-aguas-subterraneas-portuguesas-10877980.html.
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em conta a sua natureza e potencial de transferência para a água, solo e ar.
Assim, as atividades sujeitas à titularidade de licença ambiental têm de monitorizar as emissões das suas
instalações, definir as medidas de prevenção e são obrigadas a comunicar à APA através de relatórios
periódicos.
Atualmente, já são sujeitas a licença ambiental algumas atividades agropecuárias, nomeadamente
matadouros, instalações de criação de aves e suínos e instalações de eliminação e valorização de carcaças de
animais, devido ao impacto negativo das emissões da sua atividade no ambiente.
Contudo, não existe qualquer obrigatoriedade para que as culturas intensivas e superintensivas agrícolas
monitorizem a emissão de poluentes, nomeadamente «biocidas e produtos fitofarmacêuticos» e fertilizantes (em
especial fosfatos e nitratos), apesar destas substâncias constarem no Anexo II do Decreto-Lei n.º 127/2013, de
30 agosto.
Perante o quadro legal existente, o Pessoas-Animais-Natureza considera que as culturas intensivas e
superintensivas arbóreas acima de 50 ha para além de deverem ser sujeitas a AIA, também deverão ser sujeitas
a licença ambiental. Assim, estas atividades passam a ter que monitorizar e reportar as suas emissões às
entidades competentes e fixar as medidas de controlo das emissões.
Com as alterações propostas pretende-se reduzir o impacto negativo que as culturas agrícolas intensivas
representam na saúde pública, na contaminação dos solos e consequentemente dos recursos hídricos.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, a Deputada do Pessoas-Animais-Natureza
apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina a necessidade de avaliação de impacto da prática agrícola em modo intensivo e
superintensivo de espécies arbóreas.
Artigo 2.º
Definições
Para efeitos do disposto no presente diploma, entende-se por:
a) «Culturas arbóreas intensivas» aquelas que estão sujeitas a regime de regadio e que possuam entre 200
a 999 árvores por hectare (ha);
b) «Culturas arbóreas superintensivas» aquelas que estão sujeitas a regime de regadio e que possuam mais
de 1000 árvores por hectare (ha);
c) Áreas sensíveis:
i) Áreas protegidas, classificadas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 142/2008, de 24 de julho;
ii) Sítios da Rede Natura 2000, zonas especiais de conservação e zonas de proteção especial,
classificadas nos termos do Decreto-Lei n.º 140/99, de 24 de abril, no âmbito das Diretivas 79/409/CEE,
do Conselho, de 2 de abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens, e 92/43/CEE, do
Conselho, de 21 de maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora
selvagens;
iii) Zonas de proteção dos bens imóveis classificados ou em vias de classificação definidas nos termos da
Lei n.º 107/2001, de 8 de setembro.
Artigo 3.º
Medidas de redução do risco de contaminação ambiental
1 – A instalação de culturas arbóreas intensivas e superintensivas só é admitida a uma distância superior a
300 metros de zonas habitacionais, de zonas de lazer e de áreas sensíveis.
2 – Os projetos relativos a culturas arbóreas intensivas ou superintensivas devem prever a implementação
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de zonas tampão, com vegetação adequada, entre as áreas de cultivo e as zonas habitacionais e áreas
sensíveis.
3 – O disposto nos números anteriores deve ser regulamentado pelo membro do Governo com a tutela do
Ambiente no prazo de 180 dias após a entrada em vigor da presente lei.
Artigo 4.º
Avaliação de impacto ambiental
Estão sujeitos a avaliação de impacto ambiental as instalações agrícolas arbóreas intensivas e
superintensivas, com área superior a 50 ha ou que juntamente com outras áreas contíguas, possuam área
superior a 50 ha.
Artigo 5.º
Licença ambiental
Os projetos de culturas arbóreas em regime intensivo e superintensivo são sujeitos a licença ambiental, nos
termos do disposto no Decreto-Lei n.º 127/2013 de 30 de agosto.
Artigo 6.º
Nulidades
Todos os atos administrativos praticados em violação da presente lei são considerados nulos.
Artigo 7.º
Fiscalização
Sem prejuízo das competências atribuídas por lei a outras entidades, compete, em especial, à Agência
Portuguesa do Ambiente, à Direção Regional de Agricultura e Pescas, às câmaras municipais e à Guarda
Nacional Republicana assegurar a fiscalização do cumprimento das normas constantes do presente diploma.
Artigo 8.º
Contraordenações
A infração ao disposto nos artigos 3.º, 4.º e 5.º da presente lei constitui contraordenação ambiental grave, e
é punível com coima nos termos da Lei n.º 50/2006 de 29 de agosto na sua redação atual, nos termos a
regulamentar.
Artigo 9.º
Instrução dos processos e aplicação das coimas
Compete às entidades fiscalizadoras instruir os processos relativos às contraordenações referidas nos
artigos anteriores e decidir da aplicação da coima.
Artigo 10.º
Afetação do produto das coimas
1 – Sem prejuízo do disposto no número seguinte, a afetação do produto das coimas faz-se da seguinte
forma:
a) 25% para a autoridade autuante;
b) 25% para a autoridade instrutória;
c) 50% para o Fundo Ambiental.
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2 – O produto das coimas dos processos contraordenacionais instruídos pelo presidente da câmara municipal
constitui receita do município, deduzida de 10%, que serão afetos à entidade autuante se diferente desta.
Artigo 11.º
Relatório
1 – Para efeitos de monitorização da aplicação da presente lei, as direções regionais de agricultura e pescas
produzem os relatórios de gestão do ano anterior, no que diz respeito ao número de licenciamentos, novos e
existentes, número de hectares ocupados, tipo de cultura e outros que considere relevantes.
2 – Com base nos relatórios referidos no número anterior, a Agência Portuguesa do Ambiente elabora e
publicita um relatório anual sobre a situação ao nível nacional relativa à produção arbórea intensiva e
superintensiva, até ao fim do primeiro trimestre de cada ano civil.
Artigo 12.º
Moratória
As culturas agrícolas intensivas e superintensivas existentes previamente à publicação da lei, e apenas no
que diz respeito ao disposto no artigo 3.º, têm o prazo de um ano para se adaptarem.
Artigo 13.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real
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PROJETO DE LEI N.º 289/XV/1.ª
APROVA MEDIDAS DE ALARGAMENTO DA OFERTA DE ALOJAMENTO PARA ESTUDANTES DO
ENSINO SUPERIOR, ALTERANDO A LEI DE BASES DA HABITAÇÃO E O CÓDIGO DO IRS
Exposição de motivos
Uma das componentes que garante a democratização do acesso ao ensino superior é a garantia de que os
estudantes que se encontram deslocados do seu local de residência têm um alojamento condigno e a custos
acessíveis.
De acordo com os dados mais recentes – referentes ao ano letivo 2020/21 – existem apenas pouco mais de
15 mil camas em residências de instituições de ensino públicas para um total de 108 mil estudantes de ensino
superior deslocados. Dados do Ministério do Ensino Superior referentes ao ano de 2018, diziam-nos que na
Universidade de Lisboa existiam camas em residências para apenas 8% dos estudantes deslocados inscritos,
na Universidade de Coimbra esse valor era de 12% e na Universidade do Porto esse valor era pouco inferior a
12%.
Associado à insuficiência da oferta pública está ainda a escassez da oferta no mercado de arrendamento e
a existência de custos proibitivos em tal mercado. De acordo com os dados do portal BQuarto, no início do ano
letivo de 2022/2023, os preços médios mensais de um quarto individual são de 391 euros em Lisboa (+11,90%
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que em 2021), de 335 euros no Porto (+335 euros que em 2021), de 233 euros em Coimbra (+9,60% que em
2021), de 310 euros em Aveiro (+310 euros que em 2021) e de 181,50 euros em Bragança (+21% que em 2021).
Estes dados demonstram-nos que o direito dos estudantes deslocados a alojamento condigno e a custos
acessíveis está longe de ser uma realidade no nosso País, não obstante esta importância que tal direito tem
para se conseguir a democratização do ensino superior.
O Plano Nacional de Alojamento do Ensino Superior, apesar de anunciado em 2018 e de ter objetivos muito
meritórios, devido ao seu insuficiente cumprimento pouco ou nada contribuiu para a solução deste problema,
poucas tendo sido as novas camas criadas desde o seu anúncio.
Assim face à dimensão preocupante deste problema e a insuficiência das medidas tratadas pelo Governo,
com a presente iniciativa o PAN, cumprindo o disposto no seu programa eleitoral, propõe um conjunto de
medidas de alargamento do alojamento para estudantes do ensino superior, que incluem a criação de um
benefício fiscal para os senhorios – por via da redução de 18 pontos percentuais da respetiva taxa de tributação
autónoma em sede de IRS – que celebrem contratos de arrendamento para alojamento de estudantes do ensino
superior com custo a baixo da média da área onde se localizem, a previsão legal da obrigatoriedade de todos
os projetos de habitação pública preverem uma percentagem destinada a jovens até aos 35 anos de idade e ao
alojamento de estudantes do ensino superior e a necessidade de a política nacional de habitação ser articulada
com o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aprova um conjunto de medidas de alargamento da oferta de alojamento para estudantes do
ensino superior, procedendo:
a) À primeira alteração à Lei de bases da habitação, aprovado pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro;
b) À alteração do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo Decreto-
Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro.
Artigo 2.º
Alteração à Lei de bases da habitação
São alterados os artigos 16.º e 27.º da Lei de bases da habitação, aprovado pela Lei n.º 83/2019, de 3 de
setembro, na sua redação atual, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 16.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
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h) […];
i) […];
j) A articulação com o Plano Nacional de Alojamento para o Ensino Superior, sempre que justificado.
6 – […].
7 – […].
Artigo 27.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […].
2 – […].
3 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) Que em todos os programas de habitação ou de cooperação existirá uma percentagem de habitação
destinada aos jovens com idade até aos 35 anos e, sempre que justificado, destinada ao alojamento de
estudantes do ensino superior.
4 – […].»
Artigo 3.º
Alteração ao Código do IRS
É alterado o artigo 72.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 72.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
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5 – É aplicada uma redução de 18 pontos percentuais da respetiva taxa autónoma:
a) Aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para habitação permanente com
duração igual ou superior a vinte anos, bem como aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de direito
real de habitação duradoura (DHD), na parte respeitante ao pagamento da prestação pecuniária mensal;
b) Aos rendimentos prediais decorrentes de contratos de arrendamento para alojamento de estudantes do
ensino superior com custo a baixo da média da área onde se localize o imóvel, na parte respeitante ao
pagamento da prestação pecuniária mensal e nos termos a definir pelos membros do Governo responsáveis
pelas áreas das finanças e do ensino superior.
6 – […]:
a) […]; e
b) […].
7 – […].
8 – [Revogado.]
9 – […].
10 – […].
11 – [Revogado.]
12 – […].
13 – […].
14 – […].
15 – […].
16 – […].
17 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […].
19 – […].
20 – […].
21 – […].
22 – […].»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua
publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 290/XV/1.ª
ESTABELECE MECANISMOS DE COMPENSAÇÃO PARA DOCENTES DESLOCADOS DA
RESIDÊNCIA NO CUMPRIMENTO DO SEU EXERCÍCIO PROFISSIONAL
Exposição de motivos
A educação é um dos mais importantes pilares da sociedade. Os docentes são agentes essenciais para o
desenvolvimento de conhecimento e competências pessoais e interpessoais no seio da comunidade. São um
elo fundamental com as famílias e modelo de referência de muitas crianças e jovens.
A profissão de docente foi sofrendo o desgaste de profundas alterações sociais e tem sido alvo de muitos
obstáculos e dificuldades, seja como resultado de mudanças políticas, seja pelas condições remuneratórias e
de progressão na carreira que não tem permitido a dignificação nem a valorização destes profissionais e os
afasta cada vez mais do sistema educativo, onde já são visíveis carências, particularmente ao nível de algumas
disciplinas. Muito do capital humano especializado que resulta de anos de investimento e formação dos docentes
é canalizado para outras profissões por sentirem falta de condições de segurança e atratividade na docência.
Para além dos desafios educativos e sociais, das condições profissionais, os docentes viram ainda mais
agravadas as condições do seu exercício profissional, no contexto sanitário da COVID-19. Não obstante, os
docentes, bem como a comunidade educativa em geral, tem demonstrado o seu valor e resiliência neste
processo, não deixando de exercer a sua missão da melhor forma possível perante as condições que enfrentam.
Se a situação atual dos docentes já é difícil com todas as questões relacionadas com as condições de
desvalorização salarial e limitada progressão das carreiras, ela torna-se mais grave quando os docentes, para
poderem exercer a sua profissão de educadores qualificados, se veem obrigados, por força dos modelos
concursais vigentes, a concorrer para locais afastados das suas residências fiscais e agregados familiares,
custeando a expensas próprias as despesas de deslocação e/ou residência provisória a que tem que ficar
sujeitos. O problema é mais grave em algumas regiões do País, onde ficam por preencher muitos dos horários
vagos, na medida em que as condições salariais não permitem o pagamento dessas despesas.
No Orçamento do Estado para 2020, foi prevista a criação de um incentivo para a carreira docente em áreas
do País e grupos de recrutamento onde a oferta de profissionais pudesse revelar-se escassa, mas este processo
não chegou a acontecer.
De facto, os docentes têm sido uma das classes profissionais mais prejudicadas na função pública, havendo
desigualdade perante outros profissionais do Estado. A Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, impõe que a deslocação
de trabalhadores da função pública para posto de trabalho a uma distância de mais de 60 km, inclusive, em
relação à sua residência exige o acordo do trabalhador para a mobilidade. A contratação da carreira docente
poderia ser equiparada enquanto se mantiveram as regras de contratação atuais dos docentes, e nesse sentido,
compensar financeiramente os docentes com as despesas de habitação e/ou deslocações, que por imposição
das regras concursais a que tem que estar sujeitos, fiquem colocados num equipamento escolar público com
uma distância equivalente de 60 ou mais km da sua residência fiscal.
As atuais regras concursais não garantem estabilidade, são geradoras de injustiças através das situações
de ultrapassagem, e todos estes fatores têm contribuído para o afastamento de milhares de docentes, para o
não rejuvenescimento da profissão e para a perda de capital humano especializado nas escolas. A contínua
desvalorização dos docentes transmite à sociedade um sinal negativo e errado sobre a importância e dignidade
profissional da classe docente, e por consequência, da escola.
No sentido de trazer maior atratividade de novos docentes, promover o rejuvenescimento da classe, reduzir
o nível de abandono da profissão por parte dos docentes, garantir a estabilidade e condições adequadas ao seu
exercício profissional, sem colocar em risco a continuidade dos projetos educativos e o funcionamento das
escolas, e ainda garantir a existência de recursos humanos especializados em todas as áreas disciplinares e
todo o território nacional, o PAN apresenta o seguinte projeto de lei.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece mecanismos de compensação para docentes deslocados da residência no
cumprimento do seu exercício profissional.
Artigo 2.º
Âmbito de aplicação
Os mecanismos de compensação previstos na presente lei aplicam-se a todos os educadores de infância e
professores dos ensinos básico e secundário da escola pública, independentemente do tipo vínculo e do
respetivo carácter profissionalizado.
Artigo 3.º
Mecanismo de compensação de docentes deslocados
1 – É criado um mecanismo de compensação de docentes deslocados.
2 – O mecanismo previsto no presente artigo assume a forma de compensação pecuniária pelas despesas
de habitação acrescidas que os docentes referidos no artigo 2.º tenham na sequência de colocação em
estabelecimentos de ensino públicos com distância igual ou superior a 50 km da sua residência fiscal, no
respetivo concurso.
3 – A compensação pecuniária referida no número anterior assume a forma de reembolso de despesas e o
seu pagamento está dependente da apresentação de documento comprovativo da realização das despesas
adicionais.
Artigo 4.º
Mecanismo de compensação com custos acrescidos com transportes e deslocações
1 – É criado um mecanismo de compensação com custos acrescidos com transportes e deslocações.
2 – O mecanismo previsto no presente artigo assume a forma de compensação pecuniária e é aplicável aos
docentes referidos no artigo 2.º que, na sequência de colocação em estabelecimentos de ensino públicos com
distância igual ou superior a 60 km da sua residência fiscal, tenham mantido habitação nessa residência e por
causa disso tenham visto agravadas em mais de 25%, a despesa mensal com transportes ou deslocações.
3 – A compensação pecuniária referida no número anterior assume a forma de reembolso das despesas
acrescidas com transportes e deslocações, e o seu pagamento está dependente da apresentação de documento
comprovativo da realização das despesas adicionais.
Artigo 5.º
Regulamentação
No prazo máximo de 90 dias após a publicação da presente lei, o Governo procederá, na sequência de
negociação com as estruturas representativas dos Professores, à regulamentação do disposto na presente lei,
definido designadamente o montante máximo dos mecanismos compensação previstos.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
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A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
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PROJETO DE LEI N.º 291/XV/1.ª
PROGRAMA DE ATRAÇÃO E FIXAÇÃO DE DOCENTES NA ESCOLA PÚBLICA
Exposição de motivos
A falta de docentes na escola pública tem consequências duradouras e causas estruturais: A combinação do
envelhecimento, da precariedade e da desvalorização da carreira docente.
No final do segundo período de 2021/22 eram 30 mil alunos sem professor a pelo menos uma disciplina. Um
estudo realizado para a PORDATA pela antiga diretora da Direção-Geral de Estatísticas da Educação anunciava
que, se nada fosse feito, seriam 110 mil alunos na mesma situação no início do presente ano letivo. A lista de
disciplinas com falta de professores é cada vez maior: Português, Matemática, Biologia e Geologia, Física e
Química, História, Geografia, Inglês, Filosofia e Informática.
À desvalorização sistemática da carreira docente corresponde a diminuição do número de estudantes
interessados nos cursos que formam para o ensino. De acordo com a OCDE, Portugal é dos países em que
menos jovens dizem querer vir a ser professores e professoras.
Para cativar mais jovens para a docência é preciso começar por valorizar os profissionais atuais e conseguir
que muitos dos que abandonaram a profissão sintam o apelo para regressar. Sem vinculação à carreira, os
docentes precários não só vivem na incerteza e sem progressão como frequentemente ficam sujeitos às
flutuações salariais que resultam dos horários incompletos. Esta desvalorização da carreira docente é uma
injustiça para com as professoras, os professores e educadores de infância e causa grandes prejuízos à escola
pública.
Acresce que, a cada ano que passa, o relatório do Conselho Nacional de Educação vem alertar para o
envelhecimento do corpo docente e para a perspetiva de uma aposentação abrupta de uma grande parte dos
docentes. No seminário «Faltam professores! E agora?», organizado pelo Conselho Nacional de Educação no
passado dia 18 de maio de 2022, o coordenador do estudo da NOVA SBE pedido pelo Ministério da Educação
sublinhou que cerca de 40% dos 120 mil professores que estavam a dar aulas em 2018/19 previsivelmente
estarão reformados até ao ano letivo de 2030/31. Só até ao final de 2022 poderão vir a reformar-se mais 2220
docentes.
No imediato, o problema é crítico em determinadas zonas do País, como Lisboa, Setúbal e Algarve, e em
determinadas disciplinas. Mas, a prazo, a tendência é para que o envelhecimento da classe docente provoque
uma carência generalizada de docentes. Em relação a essa tendência estrutural, as medidas de curto prazo
agora tomadas pelo Governo nada podem; pelo contrário, algumas delas como a redução dos destacamentos
e mobilidades para instituições sociais, autarquias e centros científicos, além dos Centros Ciência Viva, assim
como os obstáculos à mobilidade por doença, poderão ter efeitos perversos no sistema educativo.
No essencial, para atrair e fixar professores à escola pública é preciso garantir estabilidade a quem se
candidata a ensinar as gerações futuras, valorizar a profissão e o vínculo à educação pública pela sua missão
constitucional e oferecer condições de trabalho dignas.
Nesse sentido, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda propõe um programa de atração e fixação de
docentes à escola pública que reúne, sem prejuízo da negociação sindical em torno de outras reformas
necessárias, três medidas já identificadas como estruturais e necessárias:
1. Vinculação extraordinária de docentes para combater a precariedade, que afeta sobretudo as gerações
mais novas, impondo salários baixos e uma vida de instabilidade;
2. Criação de regime de compensação a docentes deslocados, para garantir que os professores não têm de
pagar para trabalhar e que conseguem fazer face às despesas de alojamento e transporte;
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3. Medidas para reduzir as desigualdades que afetam os horários incompletos.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei cria um programa de atração e fixação de docentes à escola pública.
Artigo 2.º
Âmbito
A presente lei aplica-se a todos os educadores de infância e professores dos ensinos básico e secundário
da escola pública.
Artigo 3.º
Programa extraordinário de vinculação dos docentes
1 – O programa extraordinário de vinculação dos docentes consiste num conjunto de concursos externos
destinados à vinculação extraordinária de docentes com três ou mais anos de serviço nos termos previstos pelos
artigos 23.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua atual redação.
2 – O programa extraordinário de vinculação de professores não prejudica a aplicação do artigo 42.º do
Decreto-Lei n.º 132/2012, de 27 de junho, na sua redação atual.
Artigo 4.º
Regime de compensação a docentes deslocados
1 – Os educadores de infância, professores do ensino básico e professores do ensino secundário
profissionalizados ou a aguardar profissionalização, contratados ou a contratar, que exerçam funções em
estabelecimento de ensino situado a uma distância de mais de 60 km, inclusive, do seu local de residência
habitual e/ou domicílio fiscal recebem uma compensação pecuniária por despesas acrescidas no exercício da
sua profissão.
2 – Para efeitos do número anterior, serão consideradas elegíveis para reembolso despesas de transportes
e habitação, mediante comprovativo, num montante máximo a ser determinado pelo membro do Governo
responsável pelas áreas da educação e da Administração Pública.
Artigo 5.º
Horários incompletos
1 – As escolas podem por decisão própria determinar a atribuição de atividade letiva de forma a completar
todos os horários incompletos que não foram preenchidos.
2 – Aos docentes cujo contrato a termo resolutivo preveja a laboração em horário inferior a 22 horas letivas
semanais, no caso do 2.º e 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário, ou a 25 horas semanais, no caso
do 1.º ciclo do ensino básico e da educação pré-escolar, o tempo a declarar para os efeitos previstos no artigo
16.º do Decreto Regulamentar n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, corresponde a 30 dias.
Artigo 4.º
Regulamentação
1 – O Governo, mediante negociação com as estruturas sindicais, procederá à regulamentação da presente
lei, nomeadamente no que diz respeito ao calendário do programa de vinculação extraordinária.
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2 – As medidas previstas nos artigos 2.º e 3.º da presente lei serão objeto de negociação e regulamentação
nos 30 dias subsequentes sua aprovação.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeito a partir do orçamento do
Estado subsequente.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Catarina Martins — José Soeiro.
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PROJETO DE LEI N.º 292/XV/1.ª
ALTERA A NATUREZA DE FINANCIAMENTO DAS INSTITUIÇÕES DO ENSINO SUPERIOR
EXTINGUINDO O REGIME FUNDACIONAL
Exposição de motivos
As políticas de liberalização dos serviços públicos em Portugal conhecem já três décadas de insistência e
têm vários agentes políticos envolvidos no processo. No caso do ensino superior, após a implementação da
política de propinas na década de 1990 e a consequente aprovação da Lei n.º 37/2003, de 22 de agosto, que
estabelece as bases de financiamento do ensino superior – consagrou-se um novo modelo de funcionamento
de um serviço que, a partir desse momento, respondia à lógica de mercado e do princípio de utilizador-pagador.
De forma a aprofundar a natureza desse financiamento tripartido (investimento público, propinas e fundos
privados) e acomodar essa alteração, o Governo do Partido Socialista aprovou, em 2007, a Lei n.º 62/2007, de
10 de setembro, que estabelece o regime jurídico das instituições do ensino superior (RJIES). Nele, está
plasmada a possibilidade de uma gestão semiprivada das universidades e politécnicos, conhecido como
«Regime fundacional».
O regime fundacional era, para o então Ministro da Ciência Mariano Gago, o pilar central de um processo de
modernização que se pretendia aplicar a todas as universidades públicas. Encolhendo a democracia na gestão
das instituições, limitando a participação dos estudantes e não docentes, introduzindo uma lógica mercantil, o
RJIES estabeleceu um padrão de funcionamento à medida do mercado, onde a precariedade se tornou regra,
porque a fiscalização democrática diminuiu drasticamente. Há quinze anos, foram criados incentivos financeiros
em função das escolhas de modelo de gestão e condicionando, por essa via, a autonomia das instituições. Esses
incentivos financeiros nunca foram devidamente transferidos para as IES e o modelo fundacional tornou-se,
dessa forma, um presente envenenado, pois trouxe consigo o esvaziamento da responsabilidade pública no
ensino superior público e condenou muitas das IES para uma situação financeira débil.
O modelo fundacional criou um Estado dentro do Estado. Até o ministério que tutela o setor perdeu poder de
decisão sobre matérias fundamentais. Obrigar estas instituições a encontrar 50% de fundos próprios para os
seus orçamentos significa duas coisas: O Estado desresponsabiliza-se de uma das suas obrigações
constitucionais no que toca ao investimento no ensino superior público e coloca sobre as Instituições uma
pressão financeira constante.
Não pretendendo esgotar todos os aspetos que este debate deve merecer, o presente diploma avança com
alterações concretas para resgatar um modelo de financiamento público das IES, eliminando o regime
fundacional e promovendo um enquadramento semelhante para todas as instituições e valorizando-se a sua
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autonomia e a natureza democrática da rede pública de ensino superior.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma altera a Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que aprovou o regime jurídico das instituições
de ensino superior (RJIES), extinguindo o regime fundacional.
Artigo 2.º
Norma revogatória
São revogados os artigos 129.º a 137.º da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro.
Artigo 3.º
Extinção do regime fundacional e transição das instituições
1 – As instituições de ensino superior a funcionar segundo o regime de fundações públicas em regime de
direito privado transitam, sem prejuízo para o seu normal funcionamento, para o regime geral das instituições
de ensino superior público previsto na presente lei, no ano letivo de 2023/2024.
2 – São eliminadas da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, todas as referências relativas a fundações públicas
de direito privado.
Artigo 4.º
Regulamentação e transição das instituições
As instituições de ensino superior que necessitem de introduzir alterações aos respetivos estatutos para
assegurar a sua conformidade com a presente lei devem dar início ao procedimento de revisão estatutária até
31 de dezembro de 2022, de forma a assegurar a entrada em vigor dos novos estatutos no ano letivo de
2023/2024.
Artigo 5.º
Compensação financeira
As instituições de ensino superior públicas que, atualmente, estão abrangidas pelo regime fundacional, serão
compensadas financeiramente pela perda de receitas privadas após o seu processo de transição, anualmente
em sede de Orçamento do Estado.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de são Bento, 16 de setembro de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Catarina Martins — José Soeiro
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PROJETO DE LEI N.º 293/XV/1.ª
ALARGAMENTO DE ATRIBUIÇÕES DA AUTORIDADE PARA AS CONDIÇÕES DO TRABALHO
(ALTERAÇÃO AO DECRETO REGULAMENTAR N.º 47/2012, DE 31 DE JULHO)
Exposição de motivos
De acordo com o relatório de 2019 de atividade de inspeção do trabalho1, «[o] trabalho total ou parcialmente
não declarado à Administração do Trabalho e à Segurança Social, por empresas da economia informal ou da
economia estruturada, e fenómenos como a dissimulação do contrato de trabalho, através de figuras como a
falsa prestação de serviços, os falsos estágios remunerados ou falsas situações de voluntariado constituem
fenómenos que contribuem para a segmentação social (com a constituição de grupos de trabalhadores
afastados da proteção social) e para a insuficiência financeira das receitas públicas, sendo ainda um grave fator
de concorrência desleal para as empresas que cumprem as suas obrigações».
Sabemos que jovens, desempregados e desempregados de longa duração são habitualmente considerados
grupos prioritários nas políticas de combate ao desemprego e à precarização do trabalho. Sem prejuízo, não
deixa de ser verdade que muitas pessoas se veem relegadas a estágios curriculares, profissionais, de
aprendizagem e outros, como medida de aumento de competências para a sua inserção ou reconversão para o
exercício de uma determinada profissão. Parece, aliás, que as diferentes modalidades de estágio se vão
sedimentando enquanto alternativa ao emprego regular – e regulado. De facto, apesar de se reconhecer que
um estágio (inclusive o não remunerado) corresponde efetivamente à prestação de trabalho, também se sabe
que há um recurso indiscriminado à figura de estágios que é discricionário, aproveitando-se das reconhecidas
dificuldades de ingresso de jovens e desempregados no mercado de trabalho.
Segundo dados do mais recente Eurobarómetro sobre questões sociais2, 55% de respondentes em Portugal
considera que é para si importante uma Europa social, que se preocupa com o acesso ao mercado de trabalho
e com condições de trabalho justas. Este mesmo estudo revela que 87% dos inquiridos portugueses considera
que a falta de direitos sociais é um «problema grave neste momento».
A precariedade das relações laborais, que afeta desproporcionalmente jovens e segmentos da população
mais vulneráveis, tem um impacto direto no desenvolvimento pessoal e comunitário, traduzindo-se num
condicionamento da sua participação em todos os aspetos da sociedade e afetando, inclusivamente, a dignidade
de cada pessoa.
Segundo o Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, a Autoridade para as Condições do Trabalho
(ACT) promove a melhoria das condições de trabalho, dá cumprimento a legislação específica de segurança e
higiene no local de trabalho e promove políticas de prevenção de riscos profissionais. Neste sentido, cumpre
evidenciar que, segundo dados de 20163 revelados pelo Centro Interdisciplinar de Estudos de Género do
Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa, quer o assédio sexual quer o
assédio moral no local de trabalho são fenómenos que afetam mais frequentemente mulheres e homens na sua
juventude (até aos 34 anos) e com vínculos laborais marcados pela precariedade e pela instabilidade.
Adicionalmente, o último relatório de atividades4 da autoridade pública competente nesta matéria refere que
«[e]m sede de dissimulação de contrato de trabalho, através de figuras como a falsa prestação de serviços, os
falsos estágios remunerados ou outros tipos contratuais, foram realizadas 1698 visitas inspetivas, com
averiguação de 185 situações irregulares».
O Deputado do Livre considera, assim, que urge reconhecer explicitamente a competência da ACT em
matéria de estágios, alargando as suas atribuições a todas as formas de estágio – incluindo estágios não-
remunerados, curriculares e extracurriculares e estágios profissionais que correspondam a trabalho
independente.
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o seguinte
projeto de lei:
1 Atividade de inspeção do trabalho: Relatório 2019, publicado em 2020. 2 Eurobarómetro Especial 509, publicado em março de 2021. 3 Assédio sexual e moral no local de trabalho em Portugal, CIEG. 4 cfr. nota 1.
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à primeira alteração ao Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho.
Artigo 2.º
Alteração à Lei Orgânica da Autoridade para as Condições do Trabalho
Os artigos 2.º e 4.º do Decreto Regulamentar n.º 47/2012, de 31 de julho, na sua redação atual, passam a
ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
[…]
1 – […].
2 – A ACT prossegue as seguintes atribuições:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) Difundir a informação e assegurar o tratamento técnico dos processos relativos ao sistema internacional
de alerta para a segurança e saúde dos estagiários e trabalhadores, bem como a representação nacional em
instâncias internacionais;
k) […];
l) […];
m) […];
n) […];
o) […];
p) […];
q) […];
r) […];
s) […];
t) Proceder à conservação dos registos e arquivos, relativos a acidentes e incidentes e à avaliação e
exposição aos riscos referentes aos estagiários e trabalhadores em caso de encerramento da empresa;
u) […];
v) […].
3 – A ACT prossegue as atribuições referidas no número anterior em empresas de todos os setores de
atividade, independentemente da sua forma ou natureza jurídica e do regime aplicável aos respetivos
estagiários e trabalhadores, e em qualquer local em que se verifique a prestação de trabalho,
independentemente da existência ou não de vínculo contratual, ou existam indícios suficientes dessa
prestação.
4 – […].
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22
Artigo 4.º
[…]
1 – Sem prejuízo das competências que lhe forem conferidas por lei ou que nele sejam delegadas ou
subdelegadas, compete ao inspetor-geral:
a) […];
b) […];
c) […];
d) Impor, sempre que necessário, a comparência nos serviços de qualquer estagiário, trabalhador ou
empregador e respetivas associações que possam dispor de informações úteis ao desenvolvimento de ação
inspetiva;
e) […];
f) […];
g) […];
h) […].
2 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no início do ano civil seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
O Deputado do L, Rui Tavares.
———
PROJETO DE LEI N.º 294/XV/1.ª
ESTABELECE O DEVER DE O GOVERNO PROCEDER AO LEVANTAMENTO E DIVULGAÇÃO DE
DADOS REFERENTES A CRECHES E ESTABELECIMENTOS PÚBLICOS DE EDUCAÇÃO PRÉ-
ESCOLAR E CONSAGRA A UNIVERSALIDADE DA EDUCAÇÃO PRÉ-ESCOLAR PARA AS CRIANÇAS A
PARTIR DOS 3 ANOS DE IDADE
Exposição de motivos
A Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, que a Portaria n.º 198/2022, de 27 de julho, regulamenta, determina o
alargamento progressivo da gratuitidade das creches e das amas do Instituto de Segurança Social, IP, de modo
que, a partir de 2024, todas as crianças que ingressem no primeiro ano da creche e todas as que prossigam
para o 2.º e o 3.º ano, dela beneficiem.
Recentemente, foi amplamente noticiado que o Governo anunciou o alargamento, a partir de janeiro de 2023,
da gratuitidade das creches privadas, em moldes a negociar com o setor. De facto, na página web do executivo
está escrito que «A partir de janeiro de 2023, as creches do setor privado passam a poder estar incluídas, para
garantir a cobertura da rede, sempre que não haja vaga na rede do setor social», que «o Governo continua a
trabalhar com a associação representativa do setor privado para «preparar o alargamento da medida às creches
do setor privado quando não existe a capacidade de resposta por parte do setor social», que será preciso
estabelecer «um acordo e suportar o custo integral» e ainda que «estão a ser definidos «os requisitos para que
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seja simples para as famílias a operacionalização desta medida nas situações em que não haja capacidade de
resposta do setor social1.»
Sucede que a eficácia destas medidas e o capaz cumprimento do papel destas entidades – sejam creches
do sistema de cooperação ou de iniciativa privada, creches familiares ou amas autorizadas pelo Instituto de
Segurança Social, IP – aconselha, vivamente, a realização de um aturado e fidedigno levantamento que afira as
vagas existentes – qualquer que seja o setor –, as vagas a criar em função da população-alvo, bem como o
estado e o diagnóstico de necessidades das instalações e dos equipamentos que recebem estas crianças. Com
efeito, parte da eficiência e da eficácia das políticas públicas depende de informação – bem como da sua
qualidade e fidedignidade. E de facto, não basta ter vagas para estas crianças, há que acautelar as condições
em que são acolhidas, sabido que delas depende o seu bem-estar e desenvolvimento. Não é de todo por acaso
que o Conselho Europeu emitiu uma recomendação, a 22 de maio de 2019, relativa a sistemas de educação e
acolhimento na primeira infância de elevada qualidade, reconhecendo a importância das primeiras
aprendizagens, a sua relação com o sucesso escolar e o seu contributo para quebrar ciclos de pobreza e
desfavorecimento.
Esta é, ainda, uma oportunidade para alterar para os 3 anos de idade a universalidade da educação pré-
escolar, que atualmente se situa nos 4 anos, o que acaba a deixar desprotegidas muitas crianças com 3 anos
que já não são abrangidas pela gratuitidade das creches prevista na Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro. É que apesar
de a Lei-Quadro da Educação Pré-Escolar, aprovada pela Lei n.º 5/97, de 10 de fevereiro, enunciar que ela se
destina às crianças com idades compreendidas entre os 3 anos e a idade de ingresso no ensino básico, nem
por isso o sistema consagra, para as primeiras, o direito legal à sua frequência. Realça-se, a propósito, que em
2020, o relatório da rede europeia Eurydice com os números-chave sobre a educação pré-escolar e cuidados
para a infância na Europa alertou para a falta considerável de vagas no grupo dos 3 anos2, o que (se) explica
com a existência do direito legal à frequência apenas a partir dos 4 anos e justifica a necessidade de alterar a
Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, na sua versão atual. Tal alteração foi aliás anunciada no programa eleitoral do
Partido Socialista em 20153. Em 2019, o programa eleitoral do mesmo partido decresceu, todavia, a obrigação
a que se havia vinculado para «Expansão da educação pré-escolar nas redes pública, solidária e privada, para
atingir no final da legislatura a cobertura integral das crianças de 5 anos, e de 70 a 75% nos 3 e 4». A importância
do assunto levou a que, já em 2017, através da Resolução n.º 89/2017, de 23 de maio, a Assembleia da
República tenha recomendado ao Governo que estabelecesse a universalidade da educação pré-escolar para
as crianças a partir dos 3 anos de idade. E a 3 de agosto, através da Resolução com o n.º 185/2017, recomendou
ao Governo que garantisse o acesso à educação pré-escolar a todas as crianças a partir dos 3 anos no ano
letivo de 2018/2019 e o alargamento da ação social escolar, no âmbito do combate à pobreza infantil. Chegados
a 2022/2023, a insuficiência de resposta para as crianças neste grupo etário4 é, não obstante, uma realidade
com que diversas famílias se debatem, o que vivamente justifica a alteração da lei em vigor.
Finalmente: A oferta pública de vagas nos estabelecimentos de educação pré-escolar, atenta a sua relação
umbilical com a fase que a precede e com as políticas públicas relacionadas com a infância, o combate à pobreza
e às desigualdades sociais, o apoio às famílias e a educação, é naturalmente matéria que deve integrar o
levantamento a empreender pelo Governo.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre apresenta o seguinte projeto
de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, e da Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto,
na sua redação atual.
1 https://www.portugal.gov.pt/pt/gc23/comunicacao/noticia?i=gratuitidade-das-creches-entra-hoje-em-vigor. 2 https://www.dgeec.mec.pt/np4/%7B$clientServletPath%7D/?newsId=1080&fileName=EC0319375PTN.pt.pdf, pág. 58. 3 .https://ps.pt/wp-content/uploads/2021/03/2015.4.out_Programa.Eleitoral.do_.Partido.Socialista_Eleicoes.Legislativas.2015_Alternativa.de _.Confianca.pdf, pág. 45. 4 https://www.publico.pt/2022/07/28/sociedade/noticia/falta-vagas-preescolar-motivou-54-reclamacoes-portal-queixa-15-2021-2015202.
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Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro
É aditado o artigo 2.º-A à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, com a seguinte redação:
«Artigo 2.º-A
Levantamento e divulgação
1 – Até final do segundo trimestre do ano letivo de 2022/2023, o Governo procede ao levantamento e
divulgação:
– Do número de vagas em creches do sistema de cooperação ou de iniciativa privada, creches familiares e
amas do Instituto de Segurança Social, IP;
– Do diagnóstico sobre o estado dos equipamentos existentes;
– Das carências de equipamentos.
2 – No mesmo prazo, o Governo procede ao levantamento e divulgação do número de vagas existentes nos
estabelecimentos públicos de educação pré-escolar, bem como do número de crianças cuja inscrição que nestes
estabelecimentos não tiveram vaga desde o ano letivo 2018/2019.»
Artigo 3.º
Alteração à Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, na sua redação atual
O título e os artigos 1.º, n.º 2, e 4.º, n.º 1, da Lei n.º 85/2009, de 27 de agosto, passam a ter a seguinte
redação:
«Estabelece o regime da escolaridade obrigatória para as crianças e jovens que se encontram em idade
escolar e consagra a universalidade da educação pré-escolar para as crianças a partir dos 4 anos de idade
Artigo 1.º
[…]
1 – […].
2 – A presente lei consagra, ainda, a universalidade da educação pré-escolar para todas as crianças a partir
do ano em que atinjam os 3 anos de idade.
Artigo 4.º
[…]
1 – A educação pré-escolar é universal para todas as crianças a partir do ano em que atinjam os 3 anos de
idade.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no início do ano civil seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
O Deputado do L, Rui Tavares.
———
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PROJETO DE LEI N.º 295/XV/1.ª
AUMENTA AS GARANTIAS DOS BENEFICIÁRIOS DE PRESTAÇÕES DE DESEMPREGO NO ÂMBITO
DAS REGRAS REFERENTES À FORMAÇÃO PROFISSIONAL, ALTERANDO O DECRETO-LEI N.º
220/2006, DE 3 DE NOVEMBRO
Exposição de motivos
À luz do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, a formação profissional dos beneficiários de prestações
de desemprego e de pessoas inscritas nos centros de emprego tem como objetivo o reforço das condições de
empregabilidade do beneficiário, facilitando o seu regresso rápido e sustentado ao mercado de trabalho.
Naturalmente, esta oferta de formação profissional também deverá ser adaptada às expectativas e as
necessidades do mercado de trabalho.
O regime atualmente em vigor estabelece que a aceitação da oferta de formação profissional é um dever dos
beneficiários de prestações de desemprego e de todas as pessoas inscritas nos centros de emprego,
nomeadamente dos jovens à procura do primeiro emprego. A rejeição de ofertas de formação profissional é
qualificada como uma causa de anulação da inscrição no centro de emprego e impossibilita o desempregado
(beneficiário ou não de prestação de desemprego) de se inscrever novamente no centro de emprego no prazo
de 90 dias. Tal significa que qualquer recusa de formação profissional vai conduzir, em regra, à perda do direito
às prestações de desemprego por parte daqueles que contribuíram para ter esse direito e à perda do direito dos
desempregados (beneficiário ou não de prestações de desemprego) de apoio à procura de emprego
disponibilizado pelos centros de emprego.
Contudo, este quadro legal, pelo modo como está atualmente desenhado, não prevê a distinção entre a
recusa de formação profissional injustificada e a recusa de formação profissional baseada no facto de a oferta
formativa específica não se afigurar como adequada ao perfil, às habilitações escolares, à formação profissional
e aos projetos profissionais do beneficiário.
Chegaram ao conhecimento do PAN situações em que foram oferecidos a jovens recém-licenciados em
Direito, Economia ou Marketing cursos de formação profissional na área de geriatria e cuja recusa implicou a
anulação de inscrição no centro de emprego, não obstante estarem em causa jovens que não eram beneficiários
de quaisquer prestações de desemprego. Situações como estas representam a denegação do direito à proteção
no desemprego, uma das bases do Estado social, e afiguram-se como desadequadas, desproporcionais e
injustas.
Por isso, e sem prejuízo de serem necessárias mudanças mais profundas no que se refere à formação
profissional e no apoio à procura emprego pelos centros de emprego, o PAN com o presente projeto de lei, tendo
em vista o objetivo de assegurar um maior equilíbrio no quadro do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro,
propõe que os trabalhadores só tenham o dever de aceitação de formação profissional nos casos em que esta
seja adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e projetos profissionais do desempregado,
e que só os casos de recusa de tal formação possam ser causa de anulação de inscrição no centro de emprego
e de perda da prestação de desemprego.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei aumenta as garantias dos beneficiários de prestações de desemprego no âmbito das regras
referentes à formação profissional, procedendo para o efeito à décima sétima alteração do Decreto-Lei n.º
220/2006, de 3 de novembro, que estabelece o regime jurídico de proteção social da eventualidade de
desemprego dos trabalhadores por conta de outrem.
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Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro
São alterados os artigos 11.º, 41.º e 49.º do Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro, na sua redação
atual, que passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 11.º
[…]
1 – […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) Aceitação de formação profissional adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e
projetos profissionais do beneficiário;
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […].
3 – […].
4 – […].
Artigo 41.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) Aceitar formação profissional adequada ao seu perfil, habilitações escolares, formação profissional e
projetos profissionais;
d) […];
e) […];
f) [Revogado];
g) […].
2 – […].
Artigo 49.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) Recusa de formação profissional adequada ao perfil, habilitações escolares, formação profissional e
projetos profissionais do beneficiário;
d) […];
e) […];
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f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) [Revogado.]
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
———
PROJETO DE LEI N.º 296/XV/1.ª
ALARGA OS ACORDOS DE COOPERAÇÃO PARA O DESENVOLVIMENTO DE RESPOSTAS SOCIAIS
NA VALÊNCIA DE CRECHE A ENTIDADES PÚBLICAS
Exposição de motivos
As respostas sociais para a infância são protagonizadas pelo setor social privado financiado por acordos de
cooperação com a Segurança Social.
Em Portugal, chega a ser mais caro ter uma criança na creche do que numa universidade privada. Mesmo
quando se trata de creches públicas, o valor das mensalidades pode representar metade do salário médio. Este
quadro limita o acesso das famílias à resposta e ignora que a criança é um sujeito de direitos desde que nasce.
O custo das creches relaciona-se com duas opções de política: a) as creches não estão inseridas no sistema de
ensino, pelo que a oferta está essencialmente sob a gestão do setor privado e do setor social (IPSS), com
acordos de cooperação com o Estado; b) as creches são vistas como assistência às famílias e não no quadro
dos direitos da infância, o que contribui para desresponsabilizar o Estado.
A Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e equipamentos sociais
para a primeira infância, o que no caso das creches não abrange metade das necessidades (48,4%)».
Esta carência é reconhecida no Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) que, reportando-se aos dados
da Carta Social de 2019, salienta «uma insatisfatória cobertura média das respostas e equipamentos sociais
(…) para a 1.ª infância 48,4% (creches)» – uma cobertura insatisfatória que se faz sentir de forma
particularmente aguda nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto. Por essa razão, o PRR incluiu no seu 6.º
Pilar «Políticas para a próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e habilidade» o objetivo de
«[a]umentar a capacidade de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios que ainda têm níveis de
cobertura mais baixos». Para fazer face a este problema, alguns passos já foram dados com a Lei n.º 2/2022 de
3 de janeiro, mas são insuficientes. A lei prevê o alargamento progressivo da gratuitidade das creches e das
amas do Instituto da Segurança Social, IP da seguinte forma: Em 2022, a todas as crianças que ingressem no
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primeiro ano de creche; em 2023, a todas as crianças que ingressem no primeiro ano de creche e às crianças
que prossigam para o 2.º ano; em 2024, a todas as crianças que ingressem no primeiro ano de creche e às
crianças que prossigam para o 2.º e 3.º ano. Este alargamento da gratuitidade, no entanto, só será efetivo com
a ampliação da rede pública de creches, com vista a proporcionar um número de vagas suficiente e bem
distribuído no território.
Com a presente iniciativa, o Bloco de Esquerda pretende tornar possível à semelhança do que já acontece,
por exemplo, na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados, que também entidades públicas,
nomeadamente as autarquias locais, possam celebrar acordos de cooperação para o desenvolvimento de
respostas sociais (PROCOOP) para gestão e desenvolvimento de respostas sociais, na valência de creche,
financiadas pela Segurança Social e que esta possibilidade integre a Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro.
Atualmente, as autarquias locais cedem a IPSS os espaços de que são proprietárias, seja após intervenção
em espaços já existentes, seja através da construção de novos espaços, em ambos os casos financiados por
estas, porque perante a impossibilidade de celebração de acordos de cooperação com o Instituto da Segurança
Social, o custo dessa gestão seria muito dispendioso.
Recentemente, o Governo transferiu várias competências para as autarquias locais na área da ação social.
Alargar às entidades públicas a possibilidade de candidatura ao PROCOOP permite também criar uma rede
unificada de respostas sociais públicas na valência de creche.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei alarga a celebração de acordos de cooperação para a gestão e desenvolvimento de respostas
sociais (PROCOOP), na valência de creche, a entidades públicas, designadamente às autarquias locais,
procedendo para o efeito à primeira alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro.
Artigo 2.º
Alargamento da celebração de acordos de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais
a entidades públicas
1 – As entidades públicas dotadas de autonomia administrativa e financeira, com ou sem autonomia
patrimonial, são consideradas entidades elegíveis à celebração de acordos de cooperação para a gestão e
desenvolvimento de respostas sociais na valência de creche.
2 – Os avisos de abertura para celebração de novos acordos de cooperação com vista à gestão e
desenvolvimento de resposta social na valência de creche devem fazer menção expressa à possibilidade de
candidatura das entidades públicas dotadas de autonomia administrativa financeira, com ou sem autonomia
patrimonial.
Artigo 3.º
Alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro
O artigo 2.º da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
[…]
1 – […]:
a) […].
b) […].
c) […].
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2 – A gratuidade é assegurada pelo ISS, IP, nos termos da regulamentação que define o seu modelo
de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais.»
Artigo 4.º
Regulamentação
O Governo procede à regulamentação necessária da presente lei no prazo de dois meses a contar da sua
entrada em vigor.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos a partir do Orçamento do
Estado subsequente.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana
Mortágua — Catarina Martins.
———
PROJETO DE LEI N.º 297/XV/1.ª
CRIA O BANCO PÚBLICO DE TERRAS AGRÍCOLAS
Exposição de motivos
O território nacional sobre grandes transformações demográficas, de paisagem e de usos. A tendência
mundial para a deslocação da população para centros urbanos agravada por políticas públicas de encerramento
de serviços públicos e de desproteção da pequena agricultura resultaram no abandono de terras agrícolas e
florestais e no envelhecimento da população em várias áreas rurais.
Aos riscos do abandono do território somam-se os riscos em resultado das alterações climáticas agravando
o perigo de incêndio, de erosão dos solos e de degradação dos recursos hídricos. Políticas públicas erradas de
eucaliptização de grande parte do território nacional ocupado anteriormente por floresta autóctone e terrenos
agrícolas contribuí para o agravamento drástico destas ameaças.
A pandemia, a disrupção das cadeias internacionais de abastecimento e, mais recentemente, a inovação da
Ucrânia pela Rússia mostraram a fragilidade da desindustrialização e do abandono da agricultura em países
como Portugal.
Neste contexto, a gestão do território e da conservação da biodiversidade enfrenta enormes dificuldades,
mas também se mostra essencial ao desenvolvimento de um país coeso e solidário. Também a componente
social é descurada com esta gestão do território. A redução da ocupação agrícola tem sido um dos principais
motores do desemprego, envelhecimento e êxodo nas zonas rurais, sem que isso se traduza em melhores
resultados no sector produtivo e na economia portuguesa.
Portugal depende das importações para responder às suas necessidades agroalimentares, o que significa
um défice na balança comercial agroalimentar superior a 3,8 mil milhões de euros, em 2021. É necessário
trabalhar para a segurança e soberania alimentar, criando condições para o aumento da produção agrícola do
país e para uma distribuição mais justa na cadeia da economia agroalimentar. Um sistema económico onde a
distribuição fica com a grande porção dos rendimentos da agricultura esmagando as margens dos agricultores
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não permite a boa gestão e ocupação das terras agrícolas.
A população empregada pelo sector primário caiu drasticamente. Em 1980 este sector empregava 1,1
milhões de trabalhadores, em 1990 empregava 846 milhares, no ano 2000 eram 645 milhares, em 2010
totalizavam 549 milhares e em 2021 situam-se nos 131 milhares. Parte desta quebra deve-se a novos modelos
de agricultura e ao uso de maquinaria, mas a sua dimensão mostra que se deve em muito ao abandono do
território.
O resultado das políticas públicas tem sido catastrófico: entre 1999 e 2009, o número de explorações
agrícolas reduziu-se a um ritmo de 3% ao ano (25% ao fim de 10 anos), tendo desaparecido metade das
explorações com menos de 5 hectares e um quarto das explorações de dimensão superior. Neste período, as
explorações em que o produtor agrícola desempenha a sua atividade a tempo inteiro reduziu-se em 46%. Entre
2000 e 2009, a agricultura portuguesa perdeu 31,6% de trabalhadores, ou seja, mais de 100 mil pessoas.
Ao mesmo tempo, não se apostou no rejuvenescimento do tecido produtivo, o qual é extremamente
envelhecido: entre 1999 e 2009 a população rural envelheceu drasticamente, passando a idade média dos
produtores de 46 anos para os 52 anos, respetivamente; em 2005, os produtores com 65 e mais anos
representavam 47,3%, enquanto em 1989 eram 28,8%. Pelo contrário, os produtores com menos de 35 anos,
que em 1989 representavam 6,7%, passaram em 2005 para apenas 2,2%. Estes números colocam em causa a
manutenção futura da ocupação e produção agrícola, devendo ser motivo de forte preocupação ao nível da
intervenção pública.
Igualmente, entre 1989 e 2005 reduziu-se a superfície agrícola útil (SAL), na ordem dos 8%, ocorrendo uma
profunda alteração na sua composição: as terras aráveis, que representavam 58,6% da SAL em 1989,
diminuíram mais de 1 milhão de hectares, contribuindo em 2005 apenas para 1/3 da SAL. Pelo contrário, a área
de pastagens permanentes aumentou, em termos relativos, de 20,9% para 48,1%, nem sempre correspondendo
a um aumento efetivo da produção agrícola extensiva de herbívoros. Ou seja, o abandono da propriedade agrária
traduz-se numa redução da superfície agrícola útil, com a consequente perda de riqueza de interesse social e
público que um país, ainda mais no contexto atual, não se pode permitir.
Importa, assim, recuperar a ocupação agrícola do País para a criação de emprego, aumento da produção e
rejuvenescimento do tecido produtivo, contrariando por esta via o ciclo de declínio de muitas zonas rurais e
melhorando os indicadores económicos do setor agroalimentar do País.
Disponibilizar as terras agrícolas públicas desocupadas ou as que se encontram em estado de abandono
para responder a estes objetivos é essencial, contrariando um dos principais problemas sentidos por quem se
quer dedicar a esta atividade: a dificuldade no acesso à terra para nova instalação, como é o caso dos jovens
agricultores, ou para ganho de dimensão das unidades produtivas existentes, de forma a melhorarem o seu
desempenho técnico e económico e garantirem viabilidade, tendo em conta a grande fragmentação da
propriedade que caracteriza a maior parte do País.
O Bloco de Esquerda vem, por isso, propor a criação de um banco público de terras agrícolas destinado a
facilitar o acesso a terras por via do arrendamento rural, instrumentos reconhecidos como importantes para
corrigir a dimensão física e económica das explorações, reduzir a dispersão da propriedade e incentivar o início
da atividade agrícola, sobretudo de jovens agricultores.
A evolução legislativa
A existência de bancos de terras constitui ação de estruturação fundiária – cfr. alínea c) do n.º 2 do artigo
35.º e do artigo 37.º da Lei n.º 86/95, de 1 de setembro (Lei de bases do desenvolvimento agrário).
A Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, não acolhe a expressão «banco de terras» (antes acolhendo a,
entretanto criada, bolsa de terras como instrumento de estruturação fundiária – artigo 3.º), mas regula a matéria
da constituição de reserva de terras, no âmbito dos projetos de emparcelamento integral (artigos 31.º a 33.º).
A bolsa de terras é um instrumento criado pela Lei n.º 62/2012, de 10 de dezembro, que tinha por objetivo
facilitar o acesso à terra. Porém, esta medida revelou-se ineficaz, essencialmente porque não continha nenhum
mecanismo eficaz de incentivo para a disponibilização das terras não agricultadas.
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A proposta do Bloco de Esquerda
Em 2017 o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou um projeto de lei sobre o tema em apreço.
A presente iniciativa legislativa corresponde à atualização desse projeto de lei.
O banco de terras é gerido pelo Estado, sendo constituído pelas terras agrícolas de propriedade pública,
pertencentes ao Estado ou às autarquias, como as resultantes da aplicação do direito de preferência ou de
ações públicas, designadamente de estruturação fundiária e de emparcelamento.
Considerando a necessidade premente de combater o abandono dos solos produtivos, é proposta a
penalização fiscal dos prédios rústicos ou mistos com aptidão agrícola em situação de abandono, a não ser que
os mesmos integrem o banco público de terras. Desta forma, é criado um incentivo para a utilização das terras
agrícolas e dá-se uma oportunidade aos proprietários que não querem usar os seus terrenos para os
rentabilizarem por via do seu arrendamento a terceiros, facilitando-se este processo através da existência de
uma base de dados que publicita as terras disponíveis.
Mantendo-se o abandono de determinado terreno após penalização fiscal ao longo de três anos sucessivos,
a entidade gestora do banco de terras pode recorrer à figura do arrendamento compulsivo para que esse terreno
seja integrado no banco de terras.
O recenseamento destes prédios para efeito de aplicação da penalização fiscal irá ainda permitir atualizar os
respetivos registos prediais, sendo um importante contributo para a realização do cadastro rústico, tarefa
complexa que se afigura como urgente.
Quando realizado por concurso público para arrendamento rural, o acesso aos terrenos inscritos no banco
de terras é feito conferindo prioridade a quem já trabalha esses terrenos ou os que são contíguos, ou à instalação
de jovens agricultores, ou a quem se quer dedicar à atividade agrícola como principal fonte de rendimento, com
preferência para famílias monoparentais, para as pessoas vítimas de violência doméstica e para as pessoas
com estatuto de refugiado.
A candidatura é feita mediante a apresentação de um plano de exploração, o qual estabelece a viabilidade
económica do projeto com uma duração de 5 anos, permitindo garantir a sustentabilidade das atividades
agrícolas a instalar e ter informação mais precisa sobre a realidade produtiva do País.
A dinamização do arrendamento rural permite responder de forma ágil à dificuldade no acesso à terra para o
redimensionamento das explorações agrícolas ou para novos projetos de instalação, assim como facilita a
disponibilização das terras, já que não envolve a alteração do título de propriedade e permite a sua
rentabilização. Estipular um valor de renda que tenha em conta a realidade dos vários territórios é fundamental
para combater a especulação fundiária, a qual poderia ser um obstáculo à concretização dos objetivos
subjacentes à criação do banco de terras.
Estas são, no essencial, as propostas do Bloco de Esquerda de criação de um banco público de terras para
arrendamento rural, visando promover a ocupação agrícola através do redimensionamento das unidades
produtivas e da instalação de novos agricultores, sobretudo de jovens. Apresenta-se, assim, como um contributo
para o aumento da viabilidade técnica e económica das explorações, o rejuvenescimento do tecido produtivo, a
melhoria dos indicadores económicos do setor agroalimentar, o combate ao abandono agrícola e ao êxodo rural,
e ainda a promoção da investigação, experimentação, demonstração e desenvolvimento agrários.
Atenta a matéria, devem ser ouvidos no âmbito do processo legislativo os órgãos de governo próprio das
Regiões Autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses e a Associação Nacional de Freguesias.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
CAPÍTULO I
Disposições gerais
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei cria o banco público de terras agrícolas para arrendamento rural, doravante designado por
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banco de terras, com os objetivos de:
a) Promover o redimensionamento das unidades de produção agrícola, melhorando as suas condições de
desempenho técnico e económico;
b) Combater o abandono das explorações agrícolas e o êxodo rural;
c) Promover a produção agrícola e pecuária, e a gestão florestal;
d) Promover a conservação da natureza, da biodiversidade e da paisagem;
e) Facilitar o início da atividade agrícola, nomeadamente por jovens agricultores, rejuvenescendo o tecido
produtivo;
f) Melhorar os indicadores económicos do setor agroalimentar, aumentando a produção;
g) Apoiar a investigação, experimentação, demonstração e desenvolvimento agrários;
h) Promover a ocupação do território e um modelo agrícola e florestal que reduza os riscos das alterações
climáticas e a perigosidade dos incêndios rurais.
2 – A presente lei procede ainda:
a) À alteração do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 287/2003, de
12 de novembro, agravando o imposto municipal de imóveis nos casos de terrenos com aptidão agrícola
declarados em situação de abandono;
b) À alteração da Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, que estabelece o Regime Jurídico da Estruturação
Fundiária.
Artigo 2.º
Definições
1 – Para efeitos do disposto no presente diploma, entendem-se por terrenos com aptidão agrícola os prédios
rústicos e a parte inscrita na matriz rústica dos prédios mistos com boas condições para o desenvolvimento de
atividades agrícolas, florestais, pecuárias ou outras atividades de produção de bens e serviços associadas a
estas atividades.
2 – As definições de «prédio rústico», de «prédio misto» e de «parte inscrita na matriz rústica dos prédios
mistos», são as constantes no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis.
CAPÍTULO II
Banco de terras
Artigo 3.º
Competência
A gestão do banco de terras é da competência da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural
(DGADR), adiante designada de entidade gestora.
Artigo 4.º
Constituição
1 – O banco de terras é constituído pelos terrenos com aptidão agrícola ou florestal:
a) Pertencentes ao domínio público ou privado do Estado e das autarquias, com exceção das matas públicas,
da Companhia das Lezírias e dos baldios, mediante acordos a celebrar com as entidades a que estiverem afetos
e sem prejuízo da legislação que regula a desafetação e cessão de bens sujeitos àquele regime;
b) Adquiridos pelo Estado, designadamente:
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i) No exercício do direito de preferência, nos termos do presente diploma e demais legislação aplicável;
ii) Em anteriores medidas de emparcelamento, no âmbito do processo de intervenção da reforma agrária
ou no âmbito de aproveitamentos hidroagrícolas, desde que não perdure contencioso fundiário;
iii) No quadro de projetos de emparcelamento integral promovidos pelo organismo da Administração
Pública com funções de autoridade nacional do regadio e responsável por promover a gestão
sustentável do território rural, incluindo a reserva de terras.
c) Integrados, voluntariamente, pelos seus proprietários.
2 – A integração no banco de terras de terrenos com aptidão agrícola situados em áreas integradas no
Sistema Nacional de Áreas Classificadas, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º
142/2008, de 24 de julho, carece de parecer favorável vinculativo do Instituto da Conservação da Natureza e
Florestas, IP ou da entidade que o substitua.
3 – Caso a área continua de determinado terreno ou terrenos, os seus valores agrícolas, florestais e/ou de
biodiversidade o justifiquem, o Estado pode constituir um modelo de gestão direta da exploração agroflorestal
dessa área.
Artigo 5.º
Direito de preferência
1 – O Estado goza do direito de preferência na transação onerosa dos prédios rústicos ou mistos com aptidão
agrícola, não concorrendo com outros direitos de preferência já protegidos por lei.
2 – Para efeito do número anterior, os proprietários ficam obrigados a comunicar por escrito à entidade
gestora a intenção de venda do prédio, com indicação das condições pretendidas, exercendo o Estado o seu
direito de preferência mediante comunicação escrita no prazo máximo de 30 dias.
Artigo 6.º
Declaração de abandono
1 – Compete às direções regionais de agricultura e pescas (DRAP), em colaboração com os municípios, as
associações representativas dos agricultores e os serviços de finanças, proceder ao recenseamento de todos
os terrenos com aptidão agrícola em situação de abandono para efeito de aplicação do disposto no artigo
anterior.
2 – O recenseamento é feito a partir da observância de ausência de atividade agrícola, florestal ou pecuária,
por um período superior a três anos consecutivos.
3 – Excluem-se do disposto no número anterior os prédios mistos cuja parte rústica tenha dimensão inferior
a 0,2 hectares.
4 – A DRAP notifica o proprietário que a respetiva propriedade foi recenseada para efeito de projeto de
declaração de abandono, de modo a este exercer o direito de audiência prévia, e da decisão, nos termos e
prazos previstos no Código do Procedimento Administrativo.
5 – A comunicação da identificação dos terrenos com aptidão agrícola considerados abandonados nos
termos do presente diploma e sujeitos ao agravamento do IMI, é efetuada, por transmissão eletrónica de dados,
pela DRAP no mesmo prazo previsto no CIMI para a comunicação da respetiva taxa anual.
6 – A decisão de declaração de prédio abandonado é suscetível de impugnação judicial, nos termos gerais
previstos no Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
7 – As entidades e os serviços da administração direta e indireta do Estado, bem como outras pessoas
coletivas públicas, que possuam informações relevantes para cumprir o disposto no presente artigo,
nomeadamente em termos de cadastro predial, têm o dever de as prestar, mediante solicitação, às DRAP.
Artigo 7.º
Prova de titularidade
1 – Para efeito de aplicação do agravamento do IMI aos terrenos declarados em situação de abandono, as
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matrizes prediais rústicas constituem presunção de titularidade bastante na ausência de cadastro geométrico,
predial ou simplificado.
2 – Os resultados do recenseamento efetuado pelas DRAP, nos termos do artigo anterior, devem ser
considerados na atualização dos respetivos registos matriciais quando subscritos pelos respetivos proprietários.
3 – Os resultados do recenseamento efetuado pelas DRAP, quando homologados pela Direção-Geral do
Território, constituem igualmente presunção de titularidade bastante caso não tenha havido lugar à atualização
das matrizes.
Artigo 8.º
Integração voluntária
1 – A integração voluntária de terrenos no banco de terras realiza-se através de um contrato, entre o
proprietário e a entidade gestora, onde se estipula o prazo da integração, autoriza o seu arrendamento rural a
terceiros e determinam as demais condições, direitos e obrigações das partes, bem como as causas e efeitos
de resolução do contrato.
2 – O modelo a que deve obedecer o contrato referido no número anterior é publicado em portaria do membro
do Governo responsável pela área do desenvolvimento rural.
3 – Durante o período de integração dos terrenos no Banco de Terras, poderão ocorrer alterações da
titularidade do património respetivo, desde que esteja implícita a sub-rogação desta integração.
Artigo 9.º
Arrendamento compulsivo
Os terrenos abrangidos pelo n.º 2 do artigo 7.º podem ser objeto de arrendamento compulsivo,
exclusivamente para integração no banco de terras, conforme o admitido pelo artigo 88.º da Constituição, nas
seguintes condições:
a) Terem sido objeto de aumento do IMI, nos termos do n.º 4 do artigo n.º 112.º do Código do IMI, por três
anos sucessivos;
b) Por sentença do tribunal comum da sua área.
CAPÍTULO III
Cedência
Artigo 10.º
Arrendamento
1 – A entidade gestora procede ao arrendamento rural dos terrenos integrados no banco de terras, a pessoas
singulares ou coletivas, nos termos do regime jurídico aplicável e das disposições constantes no presente
diploma.
2 – O arrendamento rural é realizado mediante concurso público, devendo os candidatos apresentar um
plano de exploração associado à proposta de arrendamento.
Artigo 11.º
Venda ou permuta de prédios rústicos património do Estado
1 – Não havendo lugar ao procedimento referido no artigo anterior, no âmbito de operações de
emparcelamento integral ou valorização fundiária a transmissão de terrenos do banco de terras é realizada por
venda ou permuta nos termos dos respetivos projetos.
2 – Nas situações não abrangidas pelo disposto no número anterior, a cedência de terrenos de propriedade
pública integrados no banco de terras pode fazer-se por ajuste direto aos seguintes candidatos:
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a) A arrendatário do Estado, relativamente ao terreno ou prédio rústico arrendado, desde que se encontre
em situação de cumprimento de todas as suas obrigações decorrentes do seu contrato de arrendamento;
b) A proprietários de terrenos ou prédios rústicos contíguos desde que esteja em causa o aumento da
dimensão dos respetivos prédios rústicos ou o redimensionamento das próprias explorações agrícolas.
3 – Os adquirentes de terrenos provenientes do banco de terras ficam obrigados a proceder à sua gestão
pelo período mínimo de 5 anos contados da respetiva transação.
4 – No caso de terrenos com aptidão florestal ou ocupados com povoamentos florestais, preferem, antes das
pessoas e entidades referidas na alínea b) do n.º 2, as entidades gestoras de zonas de intervenção florestal.
Artigo 12.º
Plano de exploração
1 – O plano de exploração descreve detalhadamente as ações e investimentos a efetuar para o
desenvolvimento da atividade agrícola, definindo etapas e metas específicas, e analisa a respetiva viabilidade
económico-financeira, considerando um período de cinco anos.
2 – Os serviços do ministério com a tutela da agricultura prestam apoio técnico à elaboração do plano de
exploração quando solicitado pelo candidato.
3 – O plano de exploração é apreciado pela entidade gestora no prazo máximo de 60 dias após a sua entrega,
sendo comunicada a decisão ao candidato no prazo máximo de 10 dias após a apreciação estar concluída.
4 – O candidato tem a possibilidade de reapresentar por mais duas vezes o plano de exploração no caso do
mesmo ser rejeitado pela entidade gestora.
5 – O ministério com a tutela da agricultura pública em portaria o modelo a que deve obedecer a elaboração
do plano de exploração e os critérios para a sua apreciação.
Artigo 13.º
Critérios de preferência
A avaliação e seleção das candidaturas à celebração do contrato de arrendamento rural obedecem aos
seguintes critérios de preferência, por ordem de menção:
a) Pequenos agricultores que se candidatem a terrenos incluídos no banco de terras que sejam contíguos à
sua exploração agrícola;
b) Pequenos agricultores que vivam exclusiva ou predominantemente da agricultura;
c) Trabalhadores agrícolas que vivam exclusiva ou predominantemente da agricultura;
d) Jovens agricultores que pretendam iniciar a sua atividade agrícola;
e) Cooperativas de produção agrícola;
f) Agricultores que se candidatem a terrenos incluídos no banco de terras que sejam contíguos à sua
exploração agrícola;
g) Famílias monoparentais ou pessoas vítimas de violência doméstica;
h) Pessoas com estatuto de refugiados;
i) Candidatos, não proprietários de outras terras, que queiram iniciar a atividade agrícola e instalar-se como
agricultores a tempo inteiro.
Artigo 14.º
Valor da renda
1 – O valor da renda a aplicar não pode ser superior ao valor máximo de renda estabelecido por portaria a
publicar pelo membro do Governo responsável pela área do desenvolvimento rural, ouvidas as associações
representativas dos agricultores.
2 – A portaria a que se refere o número anterior fixa os valores máximos de renda para cada região ou zona
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agrária, com base:
a) Nos géneros agrícolas predominantes e evolução dos seus preços correntes;
b) Na diferente natureza dos solos e nas formas do seu aproveitamento;
c) Nos indicadores de desenvolvimento económico e social dos territórios;
d) Nas características ambientais e classificação para proteção em instrumentos de ordenamento do
território;
e) Outros fatores considerados relevantes.
3 – A portaria pode ainda estabelecer o valor máximo de renda de edifícios, dependências, instalações ou
outros equipamentos fixos, reportando tais valores a unidade de área.
4 – Os valores máximos de renda são revistos com intervalos máximos de dois anos.
5 – A entidade gestora pode ainda estabelecer uma comissão por gastos de gestão, de valor nunca superior
a 5% do valor da renda anual por cada prédio arrendado.
Artigo 15.º
Base de dados
1 – A entidade gestora mantém uma base de dados em plataforma eletrónica permanentemente atualizada
dos terrenos disponíveis no banco de terras para arrendamento rural, facilmente acessível ao público e a todos
os interessados, nomeadamente nos serviços competentes das DRAP, dos municípios, juntas de freguesias e
através de Internet, sendo interdita a aplicação de qualquer taxa pelo seu acesso.
2 – A base de dados contém indicação das características da propriedade, dos imóveis e direitos reais
associados, do valor da renda, dos critérios de elaboração e apreciação do plano de exploração, bem como dos
locais de entrega das propostas de arrendamento, com respeito pela privacidade e proteção de dados dos
proprietários nos termos da legislação aplicável.
Artigo 16.º
Fundo do banco de terras
1 – É criado, junto do Instituto de Financiamento da Agricultura e das Pescas, IP (IFAP, IP), o fundo do banco
de terras (FBT), com a missão de, designadamente, proceder, para integração no banco de terras, ao
arrendamento compulsivo, exercer o direito de preferência em transmissões onerosas ou adquirir prédios
exclusivamente ou predominantemente rústicos com aptidão agrícola
2 – O FMT constitui-se como um património autónomo desprovido de personalidade jurídica.
3 – As receitas provenientes da cedência de prédios integrados no banco de terras revertem para o FBT.
4 – Constituem despesas do FBT as que resultem de encargos decorrentes da aplicação da presente lei e
legislação complementar.
5 – O IFAP, IP, enquanto gestor do FBT, é competente para celebrar, em nome do Estado, contratos relativos
a prédios integrados no banco de terras.
6 – No exercício das competências de gestão, o conselho diretivo do IFAP, IP, é auxiliado por uma unidade
de gestão com a seguinte composição:
a) Um representante da entidade gestora do banco de terras, que preside;
b) Um representante do IFAP;
c) Um representante do organismo da Administração Pública responsável pela gestão integrada do
património do Estado.
7 – As normas relativas à gestão do FMT são adotadas por decreto-lei.
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CAPÍTULO IV
Disposições finais
Artigo 17.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 287/2003, de 12 de novembro
É alterado o artigo 112.º do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
287/2003, de 12 de novembro, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 112.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – As taxas previstas no n.º 1 são elevadas ao dobro, anualmente e de forma cumulativa, nos casos de
prédios rústicos e partes rústicas de prédios mistos que sejam, nos termos da lei, declarados em situação de
abandono pelas direções regionais de agricultura, excetuando-se os que são integrados no banco de terras
agrícolas para arrendamento rural.
5 – [Anterior n.º 4.]
6 – [Anterior n.º 5.]
7 – [Anterior n.º 6.]
8 – [Anterior n.º 7.]
9 – [Anterior n.º 8.]
10 – [Anterior n.º 9.]
11 – [Anterior n.º 10.]
12 – [Anterior n.º 11.]
13 – [Anterior n.º 12.]
14 – [Anterior n.º 13.]
15 – [Anterior n.º 14.]
16 – [Anterior n.º 15.]
17 – [Anterior n.º 16.]
18 – O disposto no n.º 5 não se aplica aos prédios que sejam propriedade de pessoas singulares.
19 – [Anterior n.º 18.]»
Artigo 18.º
Alteração à Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto
É alterado o artigo 3.º da Lei n.º 111/2015, de 27 de agosto, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
[…]
1 – […].
a) […].
b) […].
c) […].
d) […].
e) O banco de terras;
f) O fundo do banco de terras.
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2 – […].
3 – […].
4 – Ao banco de terras e ao fundo do banco de terras referidos, respetivamente, nas alíneas e) e f) do n.º 1
aplica-se o regime previsto na lei que cria o banco público de terras agrícolas.»
Artigo 19.º
Regulamentação
O Governo regulamenta o presente diploma no prazo máximo de 120 dias.
Artigo 20.º
Norma revogatória
Procede-se à revogação da Lei n.º 62/2012, de 10 de dezembro, e todos os diplomas que a tenham
regulamentado.
Artigo 21.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana
Mortágua — José Soeiro.
———
PROJETO DE LEI N.º 298/XV/1.ª
ALTERA O ARTIGO 78.º-E DO CÓDIGO DO IMPOSTO SOBRE O RENDIMENTO DAS PESSOAS
SINGULARES (IRS) NO SENTIDO DE AUMENTAR A PERCENTAGEM E OS LIMITES DA DEDUÇÃO DAS
DESPESAS RELATIVAS A HABITAÇÃO
Exposição de motivos
Em consequência da crise pandémica, cujos efeitos na economia ainda se fazem e farão sentir nos próximos
meses/anos, agravados pela situação de guerra na Ucrânia, esta com reflexos diretos na subida dos preços da
energia, combustíveis e bens alimentares, Portugal registou em julho deste ano uma taxa de inflação de 9,4%
(a mais elevada desde outubro de 2011). Na Zona Euro, para o mesmo período, a taxa de inflação fixou-se nos
9,1% (um novo máximo histórico).
Por seu lado, a inflação core, que exclui do cálculo a energia e os alimentos não processados, ou seja, os
bens com preços mais voláteis, situa-se em 6,23%, muito acima das previsões do Banco Central Europeu (BCE).
A agravar esta situação, para a carteira dos cidadãos, prevê-se que o BCE proceda a mais aumentos das
taxas de juro até final do próximo ano, referindo vários analistas que é expectável que estes ascendam, pelo
menos, até aos 4%.
Neste contexto, à compressão do poder de compra provocado pela inflação, junta-se o risco de muitas
famílias entrarem em incumprimento perante as instituições financeiras no tocante ao pagamento dos
empréstimos contraídos para compra de habitação própria e permanente e perante os senhorios pelo não
pagamento das rendas.
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A Constituição da República Portuguesa consagra no seu artigo 65.º o direito à habitação, referindo,
especificamente, que: «Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada,
em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar».
Em momentos de crise, em que se regista um agravamento das condições de vida dos cidadãos, e em que
é previsível que essa situação se estenda no tempo, torna-se necessária a intervenção do Estado para garantir
o suprimento das necessidades básicas dos seus cidadãos, como é o caso, também, da habitação, alocando
para esse efeito os recursos necessários.
Por outro lado, se o Plano de Recuperação e Resiliência, na componente «Habitação», já enfatiza a
necessidade de dar resposta: «(…) às carências estruturais e permanentes ou temporárias no domínio da
habitação (…)», como forma de mitigar o impacto económico e social da crise causada pela pandemia, mais
pertinente se mostra agora essa demanda, em função das consequências advindas da guerra na Ucrânia.
No atual Programa de Governo (o XXIII Constitucional) também a habitação surge identificada como um dos
pilares do Estado social, reconhecendo o Governo que: «(…) é hoje evidente que o número de pessoas que
enfrentam dificuldades em aceder a uma habitação adequada e com um custo comportável face aos seus
rendimentos é muito mais alargado», e concluindo, muito bem, que: «Assistiu-se, assim ao alargamento das
dificuldades de acesso à habitação por parte da população com rendimentos intermédios, que não consegue
aceder a uma habitação sem que isso implique uma forte sobrecarga sobre o seu orçamento».
Não estando ao alcance do Estado a intromissão na gestão das instituições financeiras ou nos acordos
contratualizados entre estas e os seus clientes ou nos acordos firmados entre senhorios e inquilinos, compete-
lhe no entanto, em função do exposto e dos compromissos que, através do Governo, assumiu como seus, criar
os instrumentos e tomar as medidas necessárias para amortizar o risco da perda da habitação própria e
permanente por parte dos cidadãos, evitando o agudizar de um problema que num contexto político, económico
e social bem menos gravoso já estava identificado e se pretendia inverter.
Dentro deste quadro de crise económica e social que estamos a atravessar, de acentuada compressão de
rendimentos dos cidadãos, em que se agrava o risco de muitas famílias serem desalojadas por incapacidade
financeira para pagarem a renda e outras tantas de perderem a habitação própria e permanente por
incumprimento no pagamento dos empréstimos contraídos para esse efeito, o Chega vem propor a alteração do
artigo 78.º-E do IRS, no sentido de aumentar a percentagem e os limites de dedução das despesas suportadas
com o arrendamento e a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação própria e permanente,
e eliminar os prazos limite para efeitos da dedução.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina o aumento da percentagem e dos limites da dedução das despesas suportadas com
o arrendamento ou a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação própria e permanente, e
procede à eliminação dos prazos limite para aceder a essa dedução, procedendo à alteração do Código do
Imposto Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS).
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro
É alterado o artigo 78.º-E, do Decreto-lei n.º 442-A/88, de 30 de novembro, que aprova o Código do Imposto
Sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, e posteriores alterações, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 78.º-E
Dedução de encargos com imóveis
1 – À coleta do IRS devido pelos sujeitos passivos é dedutível um montante correspondente a 20% do valor
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suportado por qualquer membro do agregado familiar:
a) Com as importâncias, líquidas de subsídios ou comparticipações oficiais, suportadas a título de renda pelo
arrendatário de prédio urbano ou da sua fração autónoma para fins de habitação permanente, quando referentes
a contratos de arrendamento celebrados ao abrigo do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo Decreto-
Lei n.º 321-B/90, de 15 de outubro, ou do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006,
de 27 de fevereiro, ou com contratos de direito real de habitação duradoura no ano em que tais importâncias
sejam tributáveis como rendimento do proprietário, até ao limite de 600 €;
b) Com juros de dívidas contraídas com a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação
própria e permanente ou arrendamento devidamente comprovado para habitação permanente do arrendatário,
até ao limite de 600 €;
c) Com prestações devidas em resultado de contratos celebrados com cooperativas de habitação ou no
âmbito do regime de compras em grupo, para a aquisição de imóveis destinados a habitação própria e
permanente ou arrendamento para habitação permanente do arrendatário, devidamente comprovadas, na parte
que respeitem a juros das correspondentes dívidas, até ao limite de 600 €; ou
d) Com importâncias pagas a título de rendas por contrato de locação financeira relativo a imóveis para
habitação própria e permanente efetuadas ao abrigo deste regime, na parte que não constituam amortização de
capital, até ao limite de 600 €.
2 – […].
3 – […].
4 – Não obstante o disposto no n.º 1, o limite da dedução à coleta aí previsto é elevado para 800 € para os
contribuintes que tenham um rendimento coletável igual ou inferior ao valor do primeiro escalão do n.º 1 do artigo
68.º, sendo o rendimento coletável, no caso de tributação conjunta, o que resultar da aplicação do divisor previsto
no artigo 69.º
a) [Revogado];
b) [Revogado].
5 – [Revogado.]
6 – […].
7 – […].
8 – […].
9 – […].»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com a aprovação do Orçamento do Estado subsequente.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso
— Rui Paulo Sousa.
———
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PROJETO DE LEI N.º 299/XV/1.ª
ESTABELECE MEDIDAS DE APOIO E PROTEÇÃO DOS PARTICULARES, POR MOTIVO DO
AUMENTO DAS TAXAS DE JUROS APLICÁVEIS AOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO À AQUISIÇÃO
DE HABITAÇÃO PRÓPRIA E PERMANENTE
Exposição de motivos
Portugal é uma das economias mais endividadas da Zona Euro, o que vale por dizer que o recente aumento
das taxas de juro vem colocar mais pressão sobre todos os agentes económicos. Os particulares que
contrataram com as instituições bancárias empréstimos, ou contratos de locação financeira, para aquisição de
habitação própria e permanente, são dos mais prejudicados com a subida das taxas de juro do financiamento à
habitação.
É do conhecimento geral que a maior parte das famílias portuguesas compra casa recorrendo ao crédito à
habitação, contraindo empréstimos que, regra geral, são contratados com uma taxa de juro variável, indexada
às taxas Euribor a seis meses. Ora, as abruptas subidas da taxa de juro diretora do Banco Central Europeu –
que, de -0,5% em dezembro de 2021, subiu para 0% em junho de 2022, para 1,25% em setembro e deverá,
segundo estimativas credíveis, escalar aos 2% em outubro – já estão a ter impacto nas Euribor, como seria de
esperar. Esse impacto vai repercutir-se sobre as famílias que, estando já a sofrer os efeitos da escalada dos
preços dos bens essenciais e do aumento dos combustíveis, da eletricidade e do gás, veem-se agora a braços
com o agravamento das prestações de crédito à habitação, que pode representar o golpe final para muitos
orçamentos familiares.
Estamos a falar de 1,4 milhões de famílias com crédito à habitação, num valor global de 103 mil milhões de
euros de saldo em dívida, 93% das quais com contratos de taxa variável indexada à Euribor.
Considerando a evolução recente nas taxas Euribor e as expectativas nos mercados financeiros para a sua
evolução nos próximos meses, é de esperar um aumento das prestações mensais do crédito à habitação de
59% no primeiro do ano que vem. Para quem já se deu ao cuidado de fazer as contas1, a previsão é que, num
empréstimo de 150 mil €, por 30 anos, o aumento é de mais 261 € por mês, ao passo que num crédito de 250
mil €, pelo mesmo prazo, o aumento chega aos 436 € mensais.
Do lado das autoridades públicas, contudo, as respostas têm sido pouco consistentes ou, mesmo,
contraditórias.
O Primeiro-Ministro afirma que o efeito da subida das taxas de juro sobre os contratos de financiamento à
aquisição de habitação é matéria em análise no Governo, sendo de admitir a criação futura de apoios para ajudar
as famílias, em articulação com a Associação Portuguesa de Bancos.
A Associação Portuguesa de Bancos, por seu turno, recomenda prudência ao Governo e aconselha-o a evitar
soluções para situações transitórias.
O Governador do Banco de Portugal rema em sentido contrário, afastando publicamente os receios de subida
preocupante no incumprimento no crédito à habitação, mesmo tendo em conta a percentagem de empréstimos
à habitação com taxa variável no total do crédito hipotecário (v. supra), e apesar da redução do rendimento das
famílias e do aumento de juros2. Não deixa de ser surpreendente, contudo, se tivermos em conta que a redução
do rendimento das famílias, a queda do preço das casas e o aumento do malparado das empresas foram os
principais riscos elencados pelo Banco de Portugal no último Relatório de Estabilidade Financeira, de junho de
2022 («A redução do rendimento disponível real devido à inflação e o efeito do aumento das taxas de juro sobre
o serviço de dívida são os riscos mais relevantes para a situação financeira dos particulares» – cf. Sumário
executivo)3.
O Primeiro-Ministro exortou, ainda, as partes interessadas com a responsabilidade de procurarem soluções,
designadamente moratórias e renegociação de créditos.
O Chega entende que os partidos também foram chamados a responder a este apelo do Governo, sobretudo
agora, que a principal associação patronal do setor bancário e a própria supervisão bancária assobiam para o
1 https://expresso.pt/economia/2022-09-15-Juros-vao-trepar-mais-prestacoes-da-casa-sobem-ate-59-em-ano-e-meio-1120741e. 2 https://jornaleconomico.pt/noticias/bdp-rejeita-subida-significativa-do-incumprimento-no-credito-a-habitacao-909206. 3 https://www.bportugal.pt/sites/default/files/anexos/pdf-boletim/ref_06_2022_pt.pdf.
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lado, descartando qualquer ónus que se queira impor sobre a atividade e o setor bancário e silenciando uma
realidade de que todos se aperceberam já: A de que o aumento das taxas de juro vai traduzir-se, a breve trecho,
numa melhoria das margens financeiras dos bancos e, consequentemente, dos respetivos lucros.
É necessária a adoção de medidas urgentes de proteção e apoio às famílias portuguesas, em matéria de
crédito à habitação própria permanente.
O Chega defende a existência de um especial dever de participação neste esforço conjunto por parte do
sistema financeiro, considerada a sua função essencial de financiamento de qualquer economia, particularmente
num período de elevada incerteza quanto à evolução da conjuntura económica mundial.
Assim sendo, propomos a consagração legal de uma moratória, por um período de seis meses, que consistirá
numa proibição da revogação das linhas de crédito contratadas, bem como uma prorrogação ou suspensão dos
créditos até fim deste período, eventualmente prorrogado em função dos desenvolvimentos económicos futuros,
com o objetivo de prevenir eventuais incumprimentos, por parte das famílias, e de lhes permitir encontrar a
solução que o Governo não conseguiu produzir, caso esse incumprimento venha a ocorrer.
Pelo exposto, e nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo-assinados
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
1 – A presente lei estabelece medidas de apoio e proteção aos titulares de empréstimos e de contratos de
locação financeira, destinadas a morigerar o impacto do aumento das taxas de juro sobre tais operações.
2 – As medidas de proteção e apoio à liquidez dos particulares a que alude o número anterior, doravante
designados interessados, têm como finalidade o diferimento do cumprimento das respetivas obrigações perante
o sistema financeiro.
3 – Para os efeitos do presente decreto-lei, a crise inflacionista provocada pela crise energética e guerra no
Leste da Europa é formalmente reconhecida como um evento excecional com consequências graves para a
economia e para os mercados, nos termos do artigo 107.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.
Artigo 2.º
Âmbito objetivo
1 – A presente lei aplica-se a operações de crédito hipotecário, bem como a locação financeira de imóveis,
desde que destinados a habitação própria e permanente do interessado.
2 – A presente lei aplica-se ainda a outras operações de crédito do interessado, desde que subordinadas ao
fim previsto no número anterior, ainda que com diferente denominação ou diferente titulação.
Artigo 3.º
Âmbito subjetivo
Beneficiam das medidas previstas na presente lei os interessados que, à data da entrada em vigor da
presente lei, preencham as seguintes condições:
a) Não estejam em mora ou incumprimento de prestações pecuniárias há mais de 120 dias junto da instituição
de crédito, ou estando, não cumpram o critério de materialidade previsto no aviso do Banco de Portugal n.º
2/2019 e no Regulamento (UE) 2018/1845 do Banco Central Europeu, de 21 de novembro de 2018, e não se
encontrem em situação de insolvência ou naquela data estejam já em execução por qualquer uma das
instituições;
b) Relativamente à situação perante a Autoridade Tributária e Aduaneira e a segurança social:
i) Tenham a situação contributiva regularizada, nos termos previstos no Código de procedimento e
Processo Tributário e do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial da Segurança
Social; ou
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ii) Tenham uma situação irregular de valor não superior a 5000 €; ou
iii) Tenham em curso processo negocial de regularização do incumprimento ou apresentem pedido de
regularização da situação, nos termos legais.
Artigo 4.º
Moratória
1 – Os interessados abrangidos pela presente lei beneficiam das seguintes medidas de apoio, relativamente
às suas exposições creditícias contratadas junto das instituições de crédito:
a) Proibição de revogação, resolução ou denúncia, total ou parcial, de linhas de crédito contratadas e
empréstimos concedidos, nos montantes contratados à data de entrada em vigor da presente lei, durante o
período em que vigorar a presente medida;
b) Prorrogação, por um período igual ao prazo de vigência da presente medida, de todos os créditos com
pagamento de capital no final do contrato, vigentes à data da entrada em vigor da presente lei e, nos mesmos
termos, de todos os seus elementos associados, incluindo juros e garantias;
c) Suspensão, relativamente a créditos com reembolso parcelar de capital ou com vencimento parcelar de
outras prestações pecuniárias, durante o período em que vigorar a presente medida, do pagamento do capital,
das rendas e dos juros com vencimento previsto até ao término desse período, sendo o plano contratual de
pagamento das parcelas de capital, rendas, juros, comissões e outros encargos estendido automaticamente por
um período igual ao da suspensão, sendo igualmente prolongados todos os elementos associados aos contratos
abrangidos pela medida, incluindo garantias.
2 – Os interessados que beneficiem das medidas previstas em b) e c) do número anterior podem, em qualquer
momento, solicitar que apenas os reembolsos de capital, ou parte destes, sejam suspensos.
3 – A extensão do prazo de pagamento de capital, rendas, juros, comissões e demais encargos referidos nas
alíneas b) e c) do n.º 1 não dá motivo a qualquer das seguintes vicissitudes contratuais:
a) Incumprimento contratual;
b) Ativação de cláusulas de vencimento antecipado;
c) Suspensão do vencimento de juros devidos durante o período da prorrogação, que serão capitalizados no
valor do empréstimo com referência ao momento em que são devidos à taxa do contrato em vigor; e
d) Ineficácia ou cessação das garantias concedidas pelas entidades beneficiárias das medidas ou por
terceiros, designadamente a eficácia e vigência dos seguros, das fianças e dos avales.
4 – A prorrogação das garantias, designadamente de seguros, de fianças e de avales não carece de qualquer
outra formalidade, parecer, autorização ou ato prévio de qualquer outra entidade, é plenamente eficaz e oponível
a terceiros, devendo o respetivo registo, quando necessário, ser promovido pelas instituições, com base no
disposto na presente lei, sem necessidade de apresentação de qualquer outro documento e com dispensa de
trato sucessivo.
5 – Os interessados podem beneficiar dos efeitos das medidas previstas no presente artigo por período
inferior à duração da moratória, devendo, para o efeito, comunicar essa intenção à instituição no prazo mínimo
de 30 dias anteriores à data em que pretendem fazer cessar os respetivos efeitos.
Artigo 5.º
Condições de acesso
1 – Para acederem às medidas previstas no artigo anterior, os interessados devem remeter à instituição uma
declaração assinada de adesão à aplicação da moratória, por correio eletrónico ou físico, nos 30 dias seguintes
à entrada em vigor da presente lei.
2 – A declaração é acompanhada pela documentação da regularidade da respetiva situação tributária e
contributiva, da existência de processo negocial de regularização do incumprimento ou do requerimento do
pedido de regularização.
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3 – As instituições aplicam as medidas de proteção previstas no artigo anterior no prazo máximo de cinco
dias úteis após a receção da declaração e dos documentos referidos nos números anteriores, com efeitos à data
da entrega da declaração, salvo se a entidade beneficiária não preencher as condições estabelecidas no artigo
3.º
4 – Caso verifiquem que o interessado não preenche as condições estabelecidas no artigo 3.º, as instituições
devem informá-lo desse facto no prazo máximo de três dias úteis, mediante o envio de comunicação através do
mesmo meio que foi utilizado pelo interessado.
Artigo 6.º
Acesso indevido a medidas de apoio
Os interessados que acederem às medidas de apoio previstas na presente lei sem preencherem os requisitos
nela previstos, são responsáveis pelo ressarcimento dos danos causados por falsas declarações, sem prejuízo
da responsabilidade criminal em que possam ter incorrido.
Artigo 7.º
Supervisão e reporte de informação
1 – O Banco de Portugal é responsável pela supervisão e fiscalização do regime de acesso à moratória
prevista na presente lei.
2 – As exposições abrangidas pela moratória são comunicadas à central de responsabilidades de crédito do
Banco de Portugal.
Artigo 8.º
Duração das medidas
As medidas de apoio previstas na presente lei produzem efeitos durante seis meses, a contar da data da
entrada em vigor da presente lei, sem prejuízo de eventual prorrogação, ou cessação antecipada, por efeito de
diploma legal.
Artigo 9.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 15 de setembro de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso
— Rui Paulo Sousa.
———
PROJETO DE LEI N.º 300/XV/1.ª
ALTERA A LEI N.º 60/2007, DE 10 DE SETEMBRO, QUE ESTABELECE O REGIME JURÍDICO DAS
INSTITUIÇÕES DO ENSINO SUPERIOR, DENSIFICANDO A NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DO RJIE
Exposição de motivos
A Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, estabelece o regime jurídico das instituições do ensino superior
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(RJIES)1. O diploma consagra, no artigo 185.º, que a lei que orienta o rumo do ensino superior seria objeto de
avaliação cinco anos após a sua entrada em vigor, portanto em 2012. Uma década depois, o artigo em causa
continua por cumprir.
Se determinação legal referida foi imposta logo em 2007 é porque o legislador considerou relevante o sentido
da prudência. No contexto de uma sociedade em transformação, as alterações introduzidas pelo RJIES eram
suficientemente relevantes para não se antecipar, na origem, qual seria o rumo efetivo das instituições do ensino
superior.
A quebra do dever de cumprir a lei pelos Governos que se foram sucedendo desde 2012, os Governos do
PSD-CDS/PP (2011/2015) e do PS (2015/2019; 2019/2022; 2022/20…), mas não menos da Assembleia da
República, não podem ficar sem justificação face a uma quebra com consequências sociais significativamente
perniciosas.
Num ciclo iniciado em 2007, por responsabilidades objetivas do poder legislativo e do poder executivo, dois
órgãos de soberania aos quais se exige uma conduta exemplar, que por cima podem ser juízes em causa
própria, nunca foi devidamente ponderada a relação entre os aspetos positivos e negativos introduzidos pelo
RJIES. Apenas aferindo uns e outros, e procedendo aos respetivos reajustamentos do RJIES no tempo
legalmente previsto, poderia ter sido comprovado o sentido de responsabilidade social. Isso por não ser possível
ignorar o impacto profundo, e sem paralelo, do ensino superior no destino coletivo dos portugueses.
Essa falta de sentido de responsabilidade social permitiu e permite que, entre os portugueses, se avolumem
dúvidas sobre em que medida o ensino superior evitou que a crise crescentemente endémica que atinge as
instituições portuguesas (justiça, saúde, ensino, sistema de pensões, segurança, defesa, entre outras) e o bem-
estar social e económico dos cidadãos teve os seus impactos suavizados por causa do desenvolvimento do
ensino superior ou, pelo contrário, se o sentido desse desenvolvimento é ele mesmo responsável por um rumo
que vai colocando Portugal na cauda da Europa.
É de senso comum verificar que a sociedade portuguesa não tem convergido com os níveis de prosperidade
das sociedades mais desenvolvidas do mundo ocidental, e que essa tendência se acentuou justamente no ciclo
histórico em que o ensino superior teve a maior expansão histórica de sempre. Não está jamais em causa o
investimento estratégico do País no setor, apenas que os órgãos de soberania devem ser os primeiros e
principais interessados em aferir se o rumo do ensino superior tem sido o mais ajustado e sustentável face às
ambições da sociedade no seu conjunto. Em democracia, essa aferição pode e deve envolver as mais diversas
instituições e agentes direta e indiretamente envolvidos, de modo a assegurar um debate amplo de avaliação
do RJIES.
Entre as questões que necessitam de ser devidamente ponderadas, é de sublinhar a necessidade do RJIES
assegurar a autonomia institucional efetiva do ensino superior a partir de lógicas mais transparentes dos
financiamentos públicos, e mais relevante ainda no domínio epistemológico da produção, validação e renovação
de conhecimentos científicos, académicos ou qualificados. A tradição científica, intelectual e académica do
mundo ocidental que legitima a existência do ensino superior foi refundada no Século XVIII através da autonomia
inequívoca entre a fé (o campo da igreja) e a razão (o campo da ciência, isto é, da universidade).
Esse caminho garantiu a explosão científica do Século XIX e manteve-se. Porém, a entrada no Século XXI
tem-nos crescentemente confrontado com um regresso à casa de partida, mas desta feita a necessidade
premente de assegurar a autonomia entre a razão (universidades) e o poder (político). O dever de neutralidade
política e ideológica dos saberes académicos é hoje uma questão premente que não pode ser descartada de
qualquer projeto de sustentabilidade do ensino superior.
Assim sendo, a avaliação do RJIES não se pode resumir a uma dimensão jurídica, legal ou instrumental, mas
espoletar também um amplo debate epistemológico sobre a natureza do conhecimento científico e das
condições institucionais e sociais da sua viabilidade. Por aí passa o sucesso ou o fracasso do destino coletivo
dos portugueses.
Assim, ao abrigo das disposições procedimentais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do CH, apresentam o seguinte projeto lei:
1 Lei n.º 62/2007 | DRE.
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Artigo 1.º
O presente diploma altera a Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que estabelece o regime jurídico das
instituições do ensino superior, densificando a necessidade de avaliação do RJIE.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro
É alterado o artigo 185.º, da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 185.º
[…]
1 – A aplicação da presente lei é objeto de avaliação desde a sua entrada em vigor até ao presente devendo,
posteriormente, ser objeto de reavaliação de 5 em 5 anos.
2 – O processo de avaliação previsto no número que antecede envolve compromissos e atividades de cariz
académico das mais diversas instituições e áreas curriculares do ensino superior;
3 – O processo de avaliação é dirigido por uma dupla coordenação, da Assembleia da República, por parte do
poder legislativo, e do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, da parte do poder executivo.
4 – Os processos de avaliação e reavaliação incluem a apresentação de relatório à Assembleia da República.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação em Diário da República.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso
— Rui Paulo Sousa.
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PROJETO DE LEI N.º 301/XV/1.ª
ALTERA O DECRETO-LEI N.º 276/2001, DE 17 DE OUTUBRO, AUMENTANDO A PROTEÇÃO DOS
ANIMAIS DE COMPANHIA
Exposição de motivos
A 15 de outubro de 1978 foi proclamada pela Unesco a Declaração Universal dos Direitos dos Animais. Esta,
embora não seja de carácter vinculativo, foi um marco na proteção dos animais reconhecendo, nomeadamente,
o direito à vida e à alimentação, assim como a sua proteção em situações de maus-tratos e tratamentos cruéis.
Veja-se o artigo 1.º da Declaração que dispõe que «Todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os
mesmos direitos à existência».
Portugal tem dado passos importantes no que diz respeito à garantia do bem-estar animal em Portugal e
neste âmbito importa destacar as alterações ao Código Civil e ao Código Penal.
A Lei n.º 8/2017, de 3 de março, aditou vários artigos, nomeadamente o artigo 201.º-B ao Código civil, com
a epígrafe «Animais» que prevê que «Os animais são seres vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção
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jurídica em virtude da sua natureza.», e ainda, o artigo 493.º-A do Código Civil, que prevê que o detentor do
animal de companhia tenha direito a ser indemnizado em caso de lesão ou morte do seu animal. As alterações
previstas na mencionada lei refletiram algo que já reunia um consenso alargado na nossa sociedade e em vários
países, ou seja, o reconhecimento de que os animais são seres vivos merecedores de proteção contra maus-
tratos infligidos pelos seus detentores ou por terceiros.
Antes das alterações ao Código Civil ocorreram as alterações ao Código Penal, em 2014, com a aprovação
da Lei n.º 69/2014, de 29 de agosto, onde o legislador criminalizou os maus-tratos a animais de companhia. A
aprovação desta lei foi muito importante e representa um passo significativo na proteção dos animais de
companhia no nosso País, a par da Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, que embora já proibindo violências
injustificadas não previa qualquer sanção para o seu incumprimento.
Decorrente da aprovação da referida legislação, que inclusivamente já foi objeto de alterações, ocorreram
milhares de denúncias, em média 2000 por ano12, deixando bem evidente a pertinência da criminalização dos
maus-tratos e do abandono de animais de companhia.
Acontece que, para além da maioria das penas serem de multa3, o Tribunal Constitucional afastou já por três
vezes a aplicação da norma prevista no artigo 387.º, do Código Penal, considerando-a inconstitucional por
violação, conjugadamente, dos artigos 27.º e 18.º, n.º 2, da nossa lei fundamental. Isto significa que há um risco
iminente de em breve se verificar a declaração de inconstitucionalidade da referida norma com força obrigatória
geral. O tribunal considerou que «mostra-se inevitável concluir pela inexistência de fundamento constitucional
para a criminalização dos maus-tratos a animais de companhia, previstos e punidos no artigo 387.º do Código
Penal. Não exprime este juízo de inconstitucionalidade uma visão segundo a qual a Constituição da República
Portuguesa sempre se oporá, por incontornáveis razões estruturais, à criminalização de uma conduta como
essa. Exprime simplesmente uma visão segundo a qual essa criminalização não encontra suporte bastante na
vigente redação da Constituição da República Portuguesa, que é aquela que se impõe ao Tribunal Constitucional
como parâmetro de avaliação das normas aprovadas pelo legislador. Juízo diverso implicaria que este Tribunal
se substituísse ao poder constituinte, exorbitando da esfera de competências que por esse mesmo poder lhe
foram outorgadas». Atendendo ao exposto, conclui-se que a solução para esta problemática parece
necessariamente passar por uma revisão constitucional. Até que isso aconteça, importa acautelar que certos
tipos de condutas não ficam sem qualquer resposta legislativa, como é o caso do abandono ou maus-tratos de
animais de companhia. O facto é que o Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, já prevê como
contraordenação grave as práticas mencionadas, no entanto, não podemos concordar com o valor das coimas
associado a estas condutas, pelo que se propõe o seu aumento para o dobro. Para além disso, acrescenta-se
também como sanção acessória a inibição de detenção de animais de companhia. Reconhecendo que esta não
é a solução ideal, parece ser a necessária para não se deixar absolutamente impune uma conduta que é
censurada pela generalidade das pessoas, que representa uma enorme cobardia e muitas vezes mesmo alguma
perversidade. Por outro lado, e atenta a importância dos médicos veterinários municipais no controlo da
população animal, no seu bem-estar, no combate aos maus-tratos e ao abandono, importa referir explicitamente
a necessidade de cada município ter um.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma procede à alteração do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, aumentando a
proteção dos animais de companhia.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro
São alterados os artigos 21.º, 68.º e 69.º, do Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, e posteriores
1 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt). 2 ficheiro.aspx (portugal.gov.pt). 3 Lei contra maus tratos de animais de companhia declarada inconstitucional pela terceira vez – Animais – PÚBLICO (publico.pt).
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alterações, os quais passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 21.º
[…]
As câmaras municipais devem, sempre que necessário e sob a responsabilidade do médico veterinário
municipal, ou através da celebração de protocolos com centros de atendimento médico veterinário
privados ou com a Ordem dos Médicos Veterinários, incentivar e promover o controlo da reprodução de
animais de companhia, nomeadamente de cães e gatos errantes, o qual deve ser efetuado por métodos
contracetivos preferencialmente cirúrgicos, que causem o mínimo sofrimento aos animais.
Artigo 68.º
[…]
1 – […].
2 – Constitui contraordenação económica muito grave, punível nos termos do RJCE, sendo elevadas para
o dobro as coimas lá previstas:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […].
3 – […].
4 – [Revogado.]
5 – [Revogado.]
6 – […].
Artigo 69.º
[…]
Consoante a gravidade da contraordenação e a culpa do agente, poderão ser aplicadas, simultaneamente
com a coima, as seguintes sanções acessórias:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) Privação do direito de detenção de animais de companhia pelo período máximo de 6 anos.»
Artigo 3.º
Aditamento ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro
É aditado o artigo 4.º-A, ao Decreto-Lei n.º 276/2001, de 17 de outubro, e posteriores alterações, com a
seguinte redação:
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«Artigo 4.º-A
Médico veterinário municipal
1 – O médico veterinário municipal é a autoridade sanitária veterinária concelhia, a nível da respetiva área
geográfica de atuação, quando no exercício das atribuições que lhe estão legalmente cometidas.
2 – É obrigação de cada município contratar pelo menos um médico veterinário municipal ou ter um nomeado
pelo Ministério da Agricultura.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias – Rui Afonso
— Rui Paulo Sousa.
———
PROJETO DE LEI N.º 302/XV/1.ª
MEDIDAS DE APOIO AOS ESTUDANTES NO ENSINO SUPERIOR NO ÂMBITO DA AÇÃO SOCIAL
ESCOLAR
Exposição de motivos
Desde há muito tempo que o PCP vem alertando para o agravamento dos custos de acesso e frequência do
ensino superior e para as consequências que daqui decorrem para milhares de estudantes que ficam impedidos
de frequentar os mais elevados graus de ensino. Esta realidade não é nova, mas, por força da profunda crise
económica e social com que o País foi sendo confrontado e da deterioração brutal das condições de vida, foi-se
agravando. O contexto atual, onde se verifica um aumento brutal da inflação, uma onda especulativa sem
entraves, que reduziu o poder de compra das famílias, o que se exige é a aprovação de medidas de combate à
especulação e de medidas que garantam ao aumento dos rendimentos das famílias.
O facto de sucessivos governos PS, PSD e CDS-PP se terem desresponsabilizado das suas obrigações
constitucionais no financiamento às instituições faz com que hoje estudar no ensino superior não seja para quem
quer, mas para quem pode pagar.
Este retrocesso social pode ser confirmado pelo abandono escolar de milhares de estudantes do ensino
superior, cujos números precisos os sucessivos governos sempre recusaram divulgar, mas a realidade de todos
os dias confirma que cada vez mais jovens têm sido obrigados a abandonar o ensino superior por não terem
dinheiro para pagar os custos exorbitantes com propinas, transportes, alimentação e material.
Apesar de, nos últimos anos, terem ocorrido diversas alterações ao Regulamento de Bolsas do Ensino
Superior, fruto da intervenção e proposta do PCP, a verdade é que essas alterações são insuficientes,
especialmente face ao contexto atual. Urge a aprovação de medidas que realmente alarguem os apoios no
âmbito da ação social escolar mais estudantes. Cumpre garantir que nenhum estudante abandone o ensino
superior por falta de condições económicas.
Considerando fundamental o combate ao fenómeno do abandono escolar e o reforço da ação social escolar
no ensino superior, o PCP entende que é indispensável a apresentação do presente projeto de lei.
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Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à aprovação de um conjunto de medidas de apoio aos estudantes no âmbito da ação
social escolar no ensino superior.
Artigo 2.º
Alargamento dos critérios de elegibilidade para acesso a bolsa de estudo
Efeitos do previsto na alínea g) do artigo 5.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, considera-se
elegível para atribuição de bolsa de estudo o estudante que tenha um rendimento per capita do agregado familiar
em que está integrado, calculado nos termos do artigo 45.º, igual ou inferior a 23 vezes o indexante dos apoios
sociais em vigor no início do ano letivo, acrescido do valor da propina máxima fixada para o 1.º ciclo de estudos
do ensino superior público no ano letivo 2018/2019.
Artigo 3.º
Aumento dos valores do complemento de alojamento
1 – Para efeitos do previsto no n.º 1 do artigo 19.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, o
complemento de alojamento concedido é igual ao valor base mensal a pagar pelos bolseiros nas residências,
até ao limite de 29,2% do indexante dos apoios sociais.
2 — Para efeitos do previsto no n.º 2 do artigo 19.º do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, o
complemento de alojamento concedido é igual ao valor do encargo efetivamente pago pelo alojamento
comprovado por recibo, até ao limite de 60% do indexante dos apoios sociais, sem prejuízo das majorações a
que haja lugar.
Artigo 4.º
Complemento de deslocação
Para efeitos do previsto no artigo 20.º-C do Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de agosto, tem direito ao
complemento de deslocação todos os bolseiros deslocados, sejam ou não beneficiários de complemento de
alojamento.
Artigo 5.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
Os Deputados do PCP: Alfredo Maia — Alma Rivera— Paula Santos— Bruno Dias— João Dias— Jerónimo
de Sousa.
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PROJETO DE LEI N.º 303/XV/1.ª
ELIMINAÇÃO DAS PROPINAS, TAXAS E EMOLUMENTOS NO ENSINO SUPERIOR PÚBLICO
Exposição de motivos
A existência de propinas, agravada por diversas taxas e emolumentos, impossibilita a concretização efetiva
do artigo 74.º da Constituição República Portuguesa, que aponta como incumbência do Estado «estabelecer
progressivamente a gratuitidade de todos os graus de ensino», e coloca em causa o direito de acesso de todos
aos mais elevados graus do conhecimento.
O Governo PSD que implementou o seu enorme aumento, em 1992 – à revelia de qualquer possibilidade de
pronunciamento das associações de estudantes, nem sequer do Conselho Nacional de Educação – fez orelhas
moucas às denúncias de elitização do ensino e de afastamento de milhares de estudantes, designadamente,
dos filhos de quem menos pode: Os trabalhadores em geral.
O objetivo era ideológico e concretizava o retrocesso de uma das conquistas do 25 de Abril. A máscara era
o pretenso «aumento da qualidade de ensino», que nunca se verificou por esta via. Pelo contrário. Inicia-se a
transformação de um direito em bem de mercado transacionável. É por isto mesmo que não basta aumentar a
ação social escolar. Sim, é preciso reforçá-la e garantir, simultaneamente, que as propinas são eliminadas.
PSD, PS e CDS-PP foram mantendo esta realidade ao longo de sucessivos governos, apesar da contestação
dos estudantes e das suas associações ao longo de décadas. De todas as vezes que o PCP apresentou
iniciativas com vista à definitiva eliminação das propinas, os mesmos três partidos rejeitaram os projetos em
causa, perpetuando uma injustiça e um ataque aos direitos de várias gerações.
O PCP salienta a importância da conquista da diminuição do valor das propinas alcançada nas últimas
legislaturas. No entanto, com o agravamento da situação económica de muitas famílias, com o aumento do custo
de vida nos últimos meses, sem o correspondente aumento dos rendimentos, torna-se urgente reduzir os custos
de acesso e frequência no ensino superior público eliminando as propinas, taxas e emolumentos, reforçando-se
ao mesmo tempo os mecanismos de ação social escolar.
O PCP defende que o cumprimento integral da Constituição passa pela revogação das propinas, taxas e
emolumentos no ensino superior público, garantindo-se o acesso e frequência dos estudantes aos mais
elevados graus de ensino. Tal pressupõe, a par do fim do pagamento de daqueles custos, uma política de
investimento e adequado financiamento das instituições de ensino superior, bem como do incremento decisivo
da ação social escolar, que permanece ainda profundamente limitada nos seus termos atuais.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, o Grupo Parlamentar do PCP, apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei estabelece um plano estratégico de investimento no ensino superior público que eleve o
financiamento público das instituições, assegurando a supressão do pagamento de propinas, taxas e
emolumentos e as condições materiais e humanas adequadas ao seu funcionamento.
Artigo 2.º
Âmbito
A presente lei aplica-se a todas as suas instituições do ensino superior públicas, doravante denominadas de
Instituições.
Artigo 3.º
Plano estratégico de investimento no ensino superior público
1 – Compete ao Governo a criação de um plano estratégico de investimento no ensino superior público que
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permita, no prazo de 2 anos, a supressão do pagamento de propinas, taxas e emolumentos em todos os ciclos,
pós-graduações e cursos técnicos superiores profissionais, tendo em conta os seguintes critérios:
a) A supressão em 2023 das taxas e emolumentos cobrados para apresentação de tese ou dissertação;
b) A supressão em 2023, de 50% do valor das propinas praticado no presente ano letivo de 2022/2023;
2 – O plano previsto no número anterior tem em consideração as necessidades de funcionamento das
Instituições, quer a nível de condições materiais e financeiras, quer ao nível da contratação de todos os
trabalhadores necessários com vínculo adequado, procedendo para estas a transferência das verbas
necessárias, através do Orçamento do Estado.
4 – Compete ao Governo a transferência das verbas, correspondentes às propinas, taxas e emolumentos,
reduzidas e/ou eliminadas durante e após o processo de supressão.
5 – O Governo, através do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, procede à alteração do
Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior nos termos previstos nos
números anteriores, salvaguardando o direito de todos os estudantes a serem apoiados no âmbito da ação social
escolar.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com a publicação da Lei do Orçamento do Estado para 2023.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
Os Deputados do PCP: Alfredo Maia — Alma Rivera — Paula Santos — Bruno Dias — João Dias — Jerónimo
de Sousa.
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PROJETO DE LEI N.º 304/XV/1.ª
ALTERA O REGIME JURÍDICO APLICÁVEL À CONTRATAÇÃO A TERMO PROCEDENDO À
VIGÉSIMA PRIMEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 7/2009, DE 12 DE FEVEREIRO
Exposição de motivos
Uma governação que responda pelo País tem a obrigação de colocar o emprego no centro da ação política
e de responder às transformações em curso no mundo do trabalho.
Portugal continua a ser um País precário: Cerca de um quarto da população tem contratos precários, dois
terços da juventude trabalhadora não têm contrato permanente e centenas de milhares de pessoas trabalham
sem contrato (na informalidade absoluta ou com falsos recibos verdes). Os baixos salários condenam as
pessoas a vidas no limiar da pobreza e os vínculos temporários impedem-nas de fazer projetos para o futuro.
Os vínculos não permanentes e, entre eles, os contratos de trabalho a termo permanecem enquanto um dos
maiores flagelos da estabilidade no emprego em Portugal.
De acordo com os dados do Livro Verde sobre as Relações Laborais de 2021, «Portugal tem historicamente
uma percentagem de contratos não permanentes (a termo e outros) mais elevada do que a média da União
Europeia. Apesar da tendência de descida dos últimos anos, esta realidade situava-se perto dos 20% no último
trimestre de 2019 (20,3%), tendo descido abaixo dos 18% ao longo de 2020, mas já no quadro da pandemia,
que afetou mais os empregos não permanentes».
Já em 2015, o grupo de trabalho criado para preparação de um plano nacional contra a precariedade que
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era constituído pelo Bloco de Esquerda, pelo Partido Socialista e pelo membro do Governo que tutela a área
respetiva, produziu um relatório que fez um diagnóstico da contratação a termo, com base em dados da Eurostat
de 2015, segundo os quais Portugal apresenta uma elevada incidência de contratos não permanentes,
sobretudo em termos comparativos, no quadro da União Europeia.
O Livro Verde sobre as Relações Laborais de 2021 trouxe-nos dados sobre os efeitos da pandemia nas
relações laborais, de acordo com os quais sai evidenciada a «fragilidade dos vínculos precários,
tendencialmente mais representados nos setores mais vulneráveis, sendo que mais de metade das novas
inscrições de desempregados resultaram da cessação de contratos de trabalho não permanentes».
A pandemia veio demonstrar, mais vez, a precariedade existente no emprego jovem em Portugal, exatamente
porque é entre os jovens que a incidência de vínculos não permanentes é manifestamente elevada.
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda já apresentou várias iniciativas de combate à precariedade, cujo
um dos temas é a reformulação do regime dos contratos a termo, e que forma rejeitadas pelo Governo.
A agenda para o trabalho digno, apresentada pelo Governo e que se encontra em processo de especialidade
tem algumas alterações sobre o tema dos contratos a termo, como é o caso das compensações por caducidade
do contrato a termo, que já correspondiam a uma preocupação antiga do Bloco de Esquerda e que, por isso,
estão vertidas nesta proposta.
No entanto, tal não é suficiente, motivo pelo qual o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta esta
iniciativa que pretende o seguinte:
• Reformular o artigo 139.º do CT no sentido de clarificar que o regime do contrato de trabalho a termo
resolutivo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva do trabalho;
• Eliminar a alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º do CT, que atualmente prevê como motivo justificativo para a
contratação a termo a contratação de desempregados de muito longa duração;
• Restringir a utilização dos contratos a termo apenas às situações de substituição temporária e de pico ou
sazonalidade de atividade;
• Reduzir a sucessão de contratos de trabalho a termo às situações de sazonalidade da atividade;
• Eliminar o artigo 142.º do CT que prevê os casos especiais de contrato de trabalho de muito curta duração;
• Reformular o n.º 1 do artigo 149.º do CT no sentido de esclarecer expressamente que, no caso de contratos
de trabalho a termo não renováveis, mantém-se o direito à compensação previsto para a caducidade de
contratos a termo;
• Reduzir o limite máximo previsto na alínea a) do n.º 4 do artigo 140.º do CT, que permite justificar a
contratação a termo por dois anos às empresas ou estabelecimentos em início de laboração;
• Reduzir a duração máxima dos contratos de trabalho a termo incerto;
• Aumentar a compensação a receber pelo trabalhador no caso de caducidade dos contratos de trabalho a
termo passando de 18 para 24 dias.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda, apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei altera o regime jurídico aplicável ao contrato de trabalho a termo, procedendo à vigésima
primeira alteração à Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
Artigo 2.º
Alterações ao Código do Trabalho
Os artigos 139.º, 140.º, 149.º, 344.º e 345.º do Código do Trabalho, na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de
12 de fevereiro, com as posteriores alterações, passam a ter a seguinte redação:
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«Artigo 139.º
Regime do termo resolutivo
O regime do contrato de trabalho a termo resolutivo, constante da presente subsecção, não pode ser afastado
ou modificado por instrumento de regulamentação coletiva.
Artigo 140.º
Admissibilidade de contrato de trabalho a termo resolutivo
1 – […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) [Revogado];
d) [Revogado];
e) Atividade sazonal;
f) […];
g) [Revogado];
h) [Revogado].
3 – Só pode ser celebrado contrato de trabalho a termo incerto nas situações mencionadas no número
anterior.
4 – […]:
a) Lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de
estabelecimento pertencente a empresa que empregue menos de 10 trabalhadores, nos termos da alínea a), do
n.º 1 do artigo 100.º;
b) [Revogado].
5 – […].
6 – […].
Artigo 143.º
Sucessão de contrato de trabalho a termo
1 – […].
2 – O disposto no número anterior não é aplicável aos casos de atividade sazonal.
3 – […].
Artigo 148.º
Duração de contrato de trabalho a termo
1 – […].
2 – O contrato de trabalho a termo certo só pode ser celebrado por prazo inferior a seis meses em situação
prevista nas alíneas a), b), e) e f) do n.º 2 do artigo 140.º, não podendo a duração ser inferior à prevista para a
tarefa ou serviço a realizar.
3 – […].
4 – […].
5 – A duração do contrato de trabalho a termo incerto não pode ser superior a três anos.
6 – […].
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Artigo 149.º
Renovação de contrato de trabalho a termo certo
1 – […].
2 – [Novo] O acordo previsto no número anterior não afasta o direito do trabalhador à compensação prevista
no n.º 2 do artigo 344.º
3 – [Anterior n.º 2.]
4 – [Anterior n.º 3.]
5 – [Anterior n.º 4.]
6 – [Anterior n.º 5.]
Artigo 344.º
Caducidade de contrato de trabalho a termo certo
1 – […].
2 – Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo certo por verificação do seu termo, o trabalhador
tem direito a compensação correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo
de antiguidade, calculada nos termos do artigo 366.º, salvo se a caducidade decorrer de declaração do
trabalhador nos termos do número anterior.
3 – […].
4 – […].
5 – […].
Artigo 345.º
Caducidade de contrato de trabalho a termo incerto
1 – […].
2 – Tratando-se de situação prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 140.º que dê lugar à contratação de vários
trabalhadores, a comunicação a que se refere o número anterior deve ser feita, sucessivamente, a partir da
verificação da normal redução da atividade.
3 – […].
4- Em caso de caducidade de contrato de trabalho a termo incerto, o trabalhador tem direito a compensação
correspondente a 24 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade.
5 – […].
6 – […].»
Artigo 3.º
Norma revogatória
São revogadas as alíneas c), d), g) e h) do n.º 2 e a alínea b) do n.º 4 do artigo 140.º, bem o artigo 142.º, do
Código do Trabalho na versão dada pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com as posteriores alterações.
Artigo 4.º
Informação e salvaguarda de direitos
1 – A aplicação da presente lei deve ser precedida de informação prévia às estruturas representativas dos
trabalhadores e aos trabalhadores visados pelas alterações à legislação laboral em apreço, bem como da
afixação sobre as alterações introduzidas, em local visível, com antecedência não inferior a sete dias úteis.
2 – Das alterações introduzidas pela presente lei não podem resultar perdas de quaisquer direitos para os
trabalhadores e as trabalhadoras abrangidas.
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Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor nos 30 dias seguintes à sua publicação.
Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2022.
As Deputadas e os Deputados do BE: José Soeiro — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina
Martins — Joana Mortágua.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.