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Quarta-feira, 12 de outubro de 2022 II Série-A — Número 100

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

S U M Á R I O

Resolução: (a) Recomenda ao Governo o licenciamento da arte de pesca denominada «Corrimão». Projetos de Lei (n.os 208, 232, 234, 240, 255, 278 e 347/XV/1.ª): N.º 208/XV/1.ª [Criação do crime de pornografia não consentida (quinquagésima quinta alteração ao Código Penal e quadragésima quinta alteração ao Código do Processo Penal)]: — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 232/XV/1.ª (Procede à alteração dos limites territoriais entre a freguesia de Caranguejeira, município de Leiria, e a União das Freguesias de Matas e Cercal, município de Ourém): — Parecer da Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local. N.º 234/XV/1.ª (Plano Nacional para a Prevenção Estrutural dos Efeitos da Seca e seu acompanhamento): — Parecer da Comissão de Ambiente e Energia. N.º 240/XV/1.ª (Procede à décima terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença da COVID-19):

— Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 255/XV/1.ª (Aplicação do processo sumário ao julgamento dos crimes de resistência e coação sobre funcionário): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 278/XV/1.ª (Abolição das provas nacionais de 9.º ano de escolaridade): — Parecer da Comissão de Educação e Ciência. N.º 347/XV/1.ª (Reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que aprova o comércio eletrónico no mercado interno e tratamento de dados pessoais): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª (Aprova a Lei de Saúde Mental e altera legislação conexa): — Parecer da Comissão de Saúde. Projetos de Resolução (n.os 186, 263 e 268/XV/1.ª): N.º 186/XV/1.ª (Contabilização dos anos de 2013 a 2016 para efeitos de progressão na carreira aos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos):

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— Informação da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão relativa à discussão do diploma ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República. N.º 263/XV/1.ª (Recomenda ao Governo que proceda à contabilização do período compreendido entre os anos de 2013 a 2016 para efeitos de progressão na carreira dos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos):

— Vide Projeto de Resolução n.º 186/XV/1.ª N.º 268/XV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo a implementação de um projeto de valorização ambiental e tecnológica do Parque Natural da Serra da Estrela. (a) Publicado em Suplemento.

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PROJETO DE LEI N.º 208/XV/1.ª

[CRIAÇÃO DO CRIME DE PORNOGRAFIA NÃO CONSENTIDA (QUINQUAGÉSIMA QUINTA

ALTERAÇÃO AO CÓDIGO PENAL E QUADRAGÉSIMA QUINTA ALTERAÇÃO AO CÓDIGO DO

PROCESSO PENAL)]

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

PARTE I – Considerandos

I. a) Nota introdutória

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República

o Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE) – Criação do crime de pornografia não consentida (quinquagésima quinta

alteração ao Código Penal e quadragésima quinta alteração ao Código de Processo Penal).

O projeto de lei foi apresentado ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da constituição e do n.º 1 do

artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República que consagram o poder de iniciativa da lei. Observa o

disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento e assume a forma de projeto de lei, em conformidade

com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do Regimento. Encontra-se redigido sob a forma de artigos, tem uma

designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal e é precedido de uma breve exposição de motivos,

cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.

Observa igualmente os limites à admissão das iniciativas legislativas estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º

do Regimento, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define

concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.

O Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE) deu entrada a 1 de julho de 2022. Foi admitido e baixou na generalidade

à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias (1.ª) ainda nesse dia, por despacho

de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República. Foi anunciado na reunião plenária do dia 6 de julho, tendo

a signatária deste parecer sido designada como relatora.

Foram solicitados pareceres ao Conselho Superior da Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério

Público e à Ordem dos Advogados e os pareceres entretanto recebidos podem ser consultados a todo o tempo

na página do processo legislativo da iniciativa, disponível eletronicamente.

A discussão desta iniciativa em sessão plenária da Assembleia da República encontra-se agendada para o

próximo dia 12 de outubro.

I b) Do objeto, conteúdo e motivação das iniciativas

Nos termos da exposição de motivos do Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE), «a pornografia não consentida é

um fenómeno que ganhou contornos mais graves com a proliferação da fotografia e do vídeo digitais e com a

massificação das redes sociais online. O acesso generalizado aos meios de produção e difusão de conteúdos

online permite que, em poucos minutos, milhares de pessoas tenham acesso, por exemplo, a uma gravação

ilícita de relações íntimas de terceiros, a uma fotografia íntima, com nudez ou seminudez, recebida de alguém

com quem se tem uma relação casual, a um vídeo de caráter sexual consentidamente criado por um casal.

A obtenção lícita destes materiais é matéria da vida privada. Já a sua divulgação sem consentimento ou a

obtenção de mais materiais através da ameaça de divulgação constituem crimes contra a liberdade sexual.

Neste fenómeno incluem-se as situações de pornografia de vingança (‘revenge porn’), em que tipicamente ex-

companheiros divulgam fotografias e vídeos de ex-companheiras em redes sociais ou em sites pornográficos

como retaliação pelo fim da relação».

Na mesma exposição de motivos recorda-se a Petição n.º 209/XIV/2.ª, que solicitava «a atribuição de

natureza de crime público à partilha não consentida de conteúdos sexuais»: «As imagens são vistas pelo público

geral, incluindo a família da vítima, os seus amigos, parceiros românticos e colegas de profissão, por isso as

consequências para as vítimas são dramáticas: humilhação pública, perda de controle sobre o seu próprio corpo,

impacto na autoestima e confiança, dificuldade em encontrar novos parceiros românticos, efeitos na saúde

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mental, como stress, desespero, depressão, ansiedade e trauma, perda do trabalho, assédio e stalkingoffline».

Entende-se que os crimes atualmente previstos são «insuficientes para abarcar esta realidade social. As

características que este crime ganhou com a generalização da socialização online aconselham um tratamento

adequado a este novo tempo. Este é um crime contra a liberdade sexual que deve estar tipificado enquanto tal.

E se, na simples gravação ilícita, a vítima poderá defender-se melhor através da sua própria decisão sobre fazer

ou não queixa, avaliando o seu conforto ou desconforto com a inclusão da gravação como prova de um processo;

o mesmo não sucede quando as fotografias ou vídeos são amplamente divulgados».

Propõe-se, assim, a criação do crime de pornografia não consentida, ao qual se pretende dar natureza

pública, propondo-se um regime especial de suspensão provisória do processo.

I c) Enquadramento legal

O crime de violência doméstica encontra-se tipificado no artigo 152.º do Código Penal: Comete um crime de

violência doméstica quem infligir, de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos

corporais, privações da liberdade e ofensas sexuais, ao cônjuge, ex-cônjuge ou pessoa de outro ou do mesmo

sexo com quem o agente mantenha ou tenha mantido uma relação de namoro ou uma relação análoga à dos

cônjuges, ainda que sem coabitação; a progenitor de descendente comum em 1.º grau; ou a pessoa

particularmente indefesa, nomeadamente em razão da idade, deficiência, doença, gravidez ou dependência

económica.

Quem praticar as condutas acima descritas incorre numa pena de prisão de 1 a 5 anos, «se pena mais grave

lhe não couber por força de outra disposição legal», agravando-se a moldura penal, no seu limite mínimo, para

2 anos quando praticado contra menor, na presença de menor, no domicílio comum ou no domicílio da vítima;

ou difundir através da Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada, dados pessoais,

designadamente imagem ou som, relativos à intimidade da vida privada de uma das vítimas sem o seu

consentimento.

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual encontram-se previstos no Capítulo V do Código

Penal. O Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE) acrescenta um crime ao rol de crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual, através do aditamento do artigo 170.º-A.

Atualmente, a divulgação de imagens de conteúdo sexual, sem autorização da pessoa visada, pode ser

enquadrada como crime de devassa da vida privada, crime previsto e punido pelo artigo 192.º do Código Penal.

Inserido sistematicamente no Capítulo VII, referente a crimes contra a reserva da vida privada, o crime de

devassa da vida privada protege a intimidade da vida privada das pessoas. O legislador entendeu desdobrar a

conduta típica em quatro áreas distintas (n.º 1):

(a) A interceção, gravação, registo, utilização ou divulgação de conversa, comunicação telefónica e

mensagens de correio eletrónico ou a faturação detalhada;

(b) A captação, fotografia, filmagem, registo ou divulgação de imagem de outrem, ou de objetos ou espaços

íntimos;

(c) A observação ou escuta às ocultas de pessoas que se encontrem em lugar privado; e

(d) A divulgação de fatos relativos à vida privada ou doença grave.

O procedimento criminal depende de queixa ou participação (artigo 198.º)

O crime de devassa da vida privada é punido com pena de prisão até 1 ano ou pena de multa até 240 dias.

Esta pena sofre as agravações previstas no artigo 197.º, de um terço nos seus limites máximos e mínimos

quando o facto for praticado para obter recompensa ou enriquecimento, para o agente ou para outra pessoa,

para causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado ou através de meio de comunicação social, da difusão através

da Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada.

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PARTE II – Opinião da relatora

Este projeto de lei do Bloco de Esquerda padece, na opinião da relatora, das três principais dificuldades

apontadas ao Projeto de Lei n.º 267 apresentado na Legislatura passada pela Deputada não inscrita Cristina

Rodrigues, pelo que aqui se reproduzem as considerações nele expendidas:

1. O crime de divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham nudez ou ato

sexual como crime contra a liberdade sexual e não contra a reserva da vida privada.

O primeiro grande problema suscitado por esta iniciativa legislativa prende-se com a neocriminalização como

crime contra a liberdade e autodeterminação sexual de uma conduta até agora subsumível no âmbito dos crimes

contra a intimidade da vida privada. Daqui resulta uma interrogação não despicienda: o bem jurídico-penal que

se pretende tutelar com a criminalização é a liberdade e autodeterminação sexual ou é a intimidade da vida

privada? Existe alguma razão para uma tão significativa alteração do enfoque que vem sendo dado a estas

condutas?

A disseminação não consensual de imagens íntimas – associada à partilha de imagens sexualmente

explícitas ou implícitas sem o consentimento da pessoa fotografada ou filmada – tem sido sobretudo

apresentada, no plano do direito comparado, como conduta violadora do direito ao respeito pela vida privada e

familiar, consagrado no artigo 7.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia – «Todas as pessoas

têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações». Neste

sentido, por exemplo, deve ter-se em conta a resposta da Comissão Europeia, em 2015, depois de ter sido alvo

de uma pergunta parlamentar através da qual se questionava se o direito ao esquecimento podia ser convocado

como fundamento para um apagamento de dados. Em 2017, confrontada com pergunta idêntica, a Comissão

reiterou aquele entendimento, assim como a admissão da possibilidade de requerer a remoção de dados a

motores de busca e websites. Este direito ao esquecimento, por vezes associado ao direito ao apagamento de

dados, chegou a ser apresentado como «remédio ideal» para as vítimas de disseminação não consensual de

imagens íntimas1.

De facto, o efeito porventura mais nocivo da disseminação não consensual de imagens íntimas é a

perpetuação da exposição das imagens de cariz privado, contra a vontade da vítima, tornando-se impossível a

reparação ou a neutralização dos danos sofridos, na medida em que tais danos se produzem continuadamente

ou de forma permanente. A consumação continuada dos danos relaciona-se com uma das principais

características da era digital: a «ascensão meteórica da lembrança» ou «um mundo que é programado para

lembrar»2. Mas talvez se trate de algo pior do que uma consumação continuada de danos – podem estar em

causa verdadeiros danos permanentes para a reserva da vida privada, o bom nome, a honra ou a reputação de

uma pessoa. Uma vez divulgadas online, as imagens íntimas cuja partilha não foi autorizada podem ser

visualizadas por um número indeterminado e crescente de pessoas, sendo extraordinariamente difícil o seu

apagamento porque, mesmo que sejam removidas do servidor, podem ter já sido guardadas por um conjunto

indefinido de pessoas desconhecidas.

Uma das manifestações mais comuns da disseminação não consensual de imagens íntimas é a revenge

porn (pornografia de vingança), relacionada com as hipóteses em que, terminado um relacionamento afetivo, há

divulgação por um dos sujeitos (com mais frequência, um homem) de imagens íntimas do outro (com mais

frequência, uma mulher), sem o seu consentimento, como forma de vingança. A pornografia de vingança é,

porém, apenas uma das manifestações da disseminação não consensual de imagens íntimas, na medida em

que as motivações de quem partilha tais imagens podem ser de outra índole. O agente do crime pode,

nomeadamente, almejar o lucro, a manipulação ou a subjugação da pessoa cujas imagens são divulgadas, a

gratificação sexual sua ou de outros.

As imagens íntimas da vítima podem chegar ao autor da sua divulgação não autorizada por diversas vias.

Se há casos em que é a própria vítima que envia tais imagens ao futuro agressor, com frequência no contexto

de uma relação íntima já existente ou desejada, em outras hipóteses tais imagens são obtidas contra a vontade

1 Cfr. Érica Nogueira Soares D`ALMEIDA, Disseminação Não Consensual da Imagens Íntimas – Uma Análise à Luz do Regulamento Geral de Proteção de Dados, dissertação de mestrado, FDUC: 2020, págs. 8 e 9. 2 Cfr. Viktor MAYER-SCHÖNBERGER, Delete: The Virtue of Forgetting in the Digital Age, New Jersey: Princeton University Press, 2009.

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da vítima, por exemplo através de um acesso indevido ao seu computador ou ao seu telefone móvel ou ainda

graças ao aproveitamento de situações de vulnerabilidade ou inconsciência da vítima, que está sob o efeito de

álcool ou drogas ou a dormir. Em outras hipóteses a pessoa é filmada ou fotografada enquanto está a ser vítima

de um crime como o crime de violação. São ainda conhecidos casos de sobreposição do rosto da vítima a

imagens pornográficas anteriormente produzidas.

As imagens íntimas cuja divulgação não foi consentida podem ser objeto de publicação online, por exemplo

nas redes sociais ou em sites dedicados à pornografia, nomeadamente a de vingança, mas podem também ser

divulgadas por vias mais tradicionais, como a partilha de fotografias ou filmes num determinado círculo de

pessoas, que podem ser próximas da vítima, por exemplo familiares ou colegas de escola ou de trabalho.

Em Portugal, estas condutas podem constituir um crime contra a reserva da vida privada (o crime de devassa

da vida privada está previsto no artigo 192.º do Código Penal e as penas aí previstas podem ser agravadas nos

termos do artigo 197.º) ou podem consubstanciar um crime de violência doméstica, previsto no artigo 152.º do

Código Penal, caso o agente cause danos físicos ou psicológicos, através da divulgação não autorizada de

imagens íntimas, a alguém com quem tenha (ou tenha tido) uma das ligações descritas na norma incriminadora.

O primeiro problema suscitado por esta iniciativa legislativa prende-se, portanto, com a intenção de passar a

subsumir a conduta num tipo legal de crime inserido no capítulo dos crimes contra a liberdade e

autodeterminação sexual. Tal solução contraria, como também já se notou no Parecer do Conselho Superior da

Magistratura apresentado na legislatura passada a propósito de iniciativa semelhante, a tendência «na maioria

dos países europeus da família jurídica a que pertence o direito português», onde a conduta em apreço

«continua a ser classificada como crime de violação de privacidade». Refere-se, aliás, que tanto a Alemanha

como a França ou a Espanha «inserem, nos seus sistemas penais, este tipo de condutas nos crimes de violação

da privacidade/intimidade do indivíduo, vendo como bem jurídico protegido o direito à privacidade, à dignidade

e reputação».

Não se vislumbra de que modo a divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham nudez

ou ato sexual possam ofender em primeira linha o bem jurídico da liberdade sexual, enquanto direito que toda a

pessoa tem à «autoconformação da vida e da prática sexuais (…): cada pessoa adulta tem o direito de se

determinar como quiser em matéria sexual, seja quanto às práticas a que se dedica, seja quanto ao momento

ou lugar em que a elas se entrega ou ao(s) parceiro(s), também adulto(s), com quem as partilha – pressuposto

que aquelas sejam levadas a cabo em privado e este(s) nelas continta(m). Se e quando esta liberdade for lesada

de forma importante a intervenção penal encontra-se legitimada e torna-se necessária». Aquilo que os crimes

contra a liberdade sexual visam proteger é uma «livre e própria conformação da vida (na esfera sexual)»3.

Por ser assim, a divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham nudez ou ato sexual,

sempre que tal ato sexual tenha sido praticado de forma livre, não pode ser enquadrada como crime contra a

liberdade sexual, devendo realçar-se a ideia de que os bens jurídicos ofendidos são os atinentes à

privacidade/intimidade – manifestação do fundamental right to be let alone sobre o qual, já em 1890, escreveram

Warren e Brandeis na Harvard Law Review. O que se pune é a indiscrição, «independentemente da verdade ou

inverdade da imputação e do carácter desonroso dos factos objeto de devassa». O que se pretende proteger é

«a liberdade que assiste a cada pessoa de decidir quem e em que termos pode tomar conhecimento ou ter

acesso a espaços, eventos ou vivências pertinentes à respetiva área de reserva»4.

2. O crime de divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham nudez ou ato

sexual como crime público.

Um segundo e especialmente relevante problema posto por esta iniciativa legislativa prende-se com a opção

feita no sentido de tornar público o crime de divulgação não consentida de fotografias ou vídeos que contenham

nudez ou ato sexual.

Não é, aliás, por acaso que, no direito comparado, por exemplo no direito espanhol, se dispõe

expressamente, no artigo 201.º do Código Penal Espanhol (no Título X – Crimes contra a intimidade, o direito à

3 Cfr. Jorge de FIGUEIREDO DIAS, Anotação ao artigo 163.º do Código Penal, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2012, págs. 715 e 716. 4 Cfr. Manuel da COSTA ANDRADE, Anotação ao artigo 192.º do Código Penal, Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, 2.ª ed., Coimbra Editora, 2012, págs. 1040, 1041 e 1043.

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imagem própria e à inviolabilidade do domicílio), que «para proceder pelos crimes previstos neste capítulo será

necessária a participação) da pessoa ofendida ou do seu representante legal».

Os desvios ao princípio da oficialidade (ou seja, a existência de crimes cujo procedimento criminal depende

de queixa) têm sido explicados fazendo apelo a vários critérios, nomeadamente a menor gravidade de certos

ilícitos, a qual tornaria desnecessária a intervenção punitiva estadual se o ofendido a não reclamar, supondo-se

ainda que o reduzido desvalor da conduta não causa significativo abalo comunitário. Mas, por outro lado e

mesmo em crimes mais graves, a exigência de queixa configura-se ainda como um reconhecimento da

autonomia da vontade do ofendido em não ver expostas no processo penal questões que, por serem

eminentemente atinentes à sua intimidade ou à sua privacidade, poderiam com a sua revisitação num processo

penal indesejado levar a uma intensificação ou a uma revisitação da ofensa. Ou seja: os crimes particulares em

sentido amplo não são, necessariamente, apenas os crimes menos graves. Haverá casos em que se poderá

entender que, apesar da manifesta gravidade do crime, a existência do processo criminal deverá depender da

queixa do ofendido, mormente porque um processo indesejado lhe causará uma desproporcionada vitimização

secundária e porque o seu interesse na modelação da resposta ao crime é preponderante face ao interesse

comunitário na punição.

A opção sobre a natureza processual de vários crimes voltou a ser objeto de controvérsia político-criminal, a

propósito de crimes como a coação sexual e violação, relativamente aos quais se vem assistindo a uma

tendência para o fortalecimento da componente pública ainda que, paradoxalmente, com o argumento da

necessidade de proteção da vítima concreta.

Todavia, de forma propositadamente simplificada, pode afirmar-se que um crime deve ser público quando o

interesse comunitário na persecução penal se sobrepuser ao interesse do concreto ofendido na existência ou

não de um processo penal e que, pelo contrário, um crime deverá ser particular em sentido amplo sempre que

se dever outorgar preponderância à vontade do ofendido quanto à existência do processo penal, secundarizando

o interesse comunitário. Sob este enfoque, parece paradoxal que, para proteção dos interesses das vítimas

adultas de crimes contra a reserva da vida privada ou íntima se outorgue ao crime uma natureza pública. Pior:

acredita-se que há vários motivos para recear que esta se revele uma opção contraproducente à luz dos

interesses das vítimas destes crimes.

Não é por se ver nestes crimes condutas menos graves que se optou por fazer depender de queixa o

procedimento criminal – com algumas exceções, nomeadamente quando tais crimes forem praticados contra

menores. Podem existir crimes graves em que o legislador conclui que a resposta punitiva não deve dar-se com

alheamento pela vontade do ofendido, precisamente porque as características da infração e a sua atinência a

espaços de intimidade são adequadas a gerar uma vitimização secundária que deve considerar-se inaceitável.

A ponderação das vantagens associadas a não atribuir carácter sobretudo público a certos crimes não se funda,

pois, na afirmação da menor gravidade das condutas, mas sim, pelo contrário, na verificação de que tais

condutas muito graves devem merecer a resposta pública alcançada através do processo penal sempre que –

mas apenas quando – as vítimas o não considerarem insuportável.

No âmbito do Conselho da Europa, foi adotada em 2011 a Convenção de Istambul – Convenção para a

Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e a Violência Doméstica5, aprovada através da

Resolução da Assembleia da República n.º 4/2013, de 21 de janeiro. Esta Convenção contém um conjunto de

disposições que parecem indiciar uma preferência pelas soluções punitivas em detrimento de outras respostas

que possam ser mais desejadas pelas vítimas, o que não deixa de ser questionável. Entre essas disposições,

conta-se o artigo 48.º, sob a epígrafe «Proibição de processos alternativos de resolução de conflitos ou de

pronúncia de sentença obrigatórios»: «1. As Partes deverão adotar as medidas legislativas ou outras que se

revelem necessárias para proibir os processos alternativos de resolução de conflitos obrigatórios, incluindo a

mediação e a conciliação em relação a todas as formas de violência abrangidas pelo âmbito de aplicação da

presente Convenção» – a única interpretação que se julga cabida (e que é, para mais, coerente com o argumento

literal) é que esta disposição apenas interdita os processos alternativos de resolução de conflitos que sejam

obrigatórios, ou seja, não queridos pelas vítimas. Também com relevância para a ponderação de um assunto já

referido – o da opção pela natureza pública ou semipública nos crimes tradicionalmente associados à violência

5 Sobre o âmbito desta Convenção e sobre a possibilidade de «levantar algumas questões de compatibilidade constitucional (…) num sistema de Direito Penal dito de intervenção mínima», cfr. Teresa BELEZA, «Consent – it’s as simple as a tea: notas sobre a relevância do dissentimento nos crimes sexuais, em especial na violação», Combate à Violência de Género – Da Convenção de Istambul à nova legislação penal, Coord. Maria da Conceição Cunha, Porto: Universidade Católica Editora, 2016, pág. 18.

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contra as mulheres –, dispõe-se no artigo 55.º da Convenção de Istambul, sob a epígrafe «Processos ex parte

e ex officio», que «1. As partes deverão garantir que as investigações das infrações previstas nos artigos 35.º,

36.º, 37.º, 38.º e 39.º da presente Convenção ou o procedimento penal instaurado em relação a essas mesmas

infrações não dependam totalmente da denúncia ou da queixa apresentada pela vítima, se a infração tiver sido

praticada no todo ou em parte no seu território, e que o procedimento possa prosseguir ainda que a vítima retire

a sua declaração ou queixa». A nova redação dada ao n.º 2 do artigo 178.º do Código Penal – e a possibilidade

de em certas situações o Ministério Público desencadear oficiosamente o processo criminal – parece

salvaguardar o respeito por esta prescrição no que tange aos crimes contra a liberdade sexual.

Na doutrina portuguesa, deve ter-se em conta o entendimento nomeadamente de Pedro Caeiro, muito crítico

quanto «à expropriação de direitos da vítima», com o Estado a arrogar-se «o direito de se substituir às vítimas

em decisões com alto potencial lesivo para as respetivas vidas». O autor pronuncia-se expressamente contra

projetos de lei que «propõem certas soluções que representam objetivamente uma perda de direitos por parte

da vítima, na medida em que – no intuito de a protegerem contra si própria – lhe retiram o poder de decidir sobre

a instauração do procedimento penal (…). Subjacente a estas soluções está a pressuposição – fundada – de

que a vítima destes crimes se encontra muitas vezes fragilizada, quando não pressionada ou coagida, e que,

portanto, o Estado não deve deixar totalmente nas suas mãos direitos cujo exercício, em último termo, pode

impedir a administração da justiça e ser prejudicial para a própria. Todavia, a forma como o Estado pretende

arrogar-se o direito de se substituir às vítimas em decisões com alto potencial lesivo para as respetivas vidas

contrasta flagrantemente com o discurso de empoderamento das mesmas e de promoção da sua autonomia.

Na verdade, estas propostas não nos parecem necessárias, nem legítimas»6.

No parecer do Conselho Superior da Magistratura apresentado na legislatura anterior a propósito de iniciativa

legislativa semelhante, e cuja linha argumentativa se retoma no parecer agora apresentado, apesar de se

reconhecer que a consagração de um crime como público ou particular constitui uma opção de política criminal,

não deixa de se recordar o pensamento de Jorge de Figueiredo Dias sobre os termos em que essa opção deve

ocorrer: «a existência de crimes semipúblicos e estritamente particulares serve a função de evitar que o processo

penal, prosseguindo contra a vontade do ofendido, possa, em certas hipóteses, representar uma inconveniente,

ou mesmo inadmissível, intromissão na esfera das relações pessoais que entre ele e os outros participantes

processuais intercedem». Nesta medida, os crimes semipúblicos servem «a função de específica proteção da

vítima (ofendido) do crime», dando-se como exemplo «os crimes que afetam de maneira profunda a esfera de

intimidade daquela. Quem seja vítima de um crime que penetre profundamente em valores da intimidade (…)

deve poder, em princípio, decidir se ao mal do crime lhe convém juntar o que pode ser o mal do desvelamento

da sua intimidade e a consequente estigmatização processual (…)». Aduz-se, naquele parecer, que «tal não

significa que não possa atribuir-se natureza pública, por exemplo, aos casos em que o crime seja praticado

contra menor ou deles resultar suicídio ou morte da vítima». Também no parecer do Conselho Superior do

Ministério Público se suscitam dúvidas quanto à consagração de uma natureza pública («a vítima, que já tem a

sua esfera de intimidade violada, poderá querer optar por ultrapassar a violação ocorrida de modo extra

processo, evitando segundas vitimizações que a investigação e o desenrolar do processo poderão acarretar»),

apesar de se reconhecer que tais dificuldades surgem mitigadas pela possibilidade de suspensão provisória do

processo.

A criação de um regime de suspensão provisória do processo em moldes semelhantes aos já previstos para

a violência doméstica não considera as especificidades que distinguem a violência doméstica da disseminação

não consensual de conteúdos íntimos que é alheia à existência, presente ou passada, de um relacionamento

afetivo.

3. A desvalorização das medidas necessárias para fazer cessar a divulgação não consentida de

fotografias ou vídeos que contenham nudez ou ato sexual

Um dos principais problemas inerentes a esta conduta desvaliosa é a possibilidade de a intromissão na esfera

de privacidade ou intimidade da vítima se perpetuar através da subsistência das imagens ou gravações em

6 Cfr. Pedro CAEIRO, Observações sobre a projetada reforma do regime dos crimes sexuais e do crime de violência doméstica, Revista Portuguesa de Ciência Criminal, ano 29, n.º 3, 2019, p. 668 e seg. (a publicação tem na base as observações enviadas ao Grupo de Trabalho – Alterações Legislativas – Crimes de Perseguição e Violência Doméstica, da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, da Assembleia da República, como complemento da audição que teve lugar a 31 de maio de 2019.

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plataformas que permitem a reprodução e/ou a partilha. Os danos sofridos pelas vítimas são, portanto,

potenciados pelo não apagamento das fotografias ou dos vídeos. A reparação, pelo menos parcial, dos seus

danos, pressupõe esse apagamento.

O excessivo enfoque que é dado no projeto à dimensão punitiva (ou jurídico-penal) vem acompanhado de

uma certa desvalorização das medidas necessárias para fazer cessar a divulgação não consentida de fotografias

ou vídeos que contenham nudez ou ato sexual como crime público.

Em síntese: A iniciativa legislativa radica no reconhecimento de uma realidade criminal (a exposição não

consentida da intimidade de outrem) que, não sendo nova, adquiriu novos contornos através de uma expansão

dos modos de execução, dos instrumentos e do potencial de chegar a um número mais vasto de destinatários,

prolongando-se no tempo os danos causados às vítimas. Estas condutas são já suscetíveis de punição

sobretudo através do crime de violência doméstica previsto no artigo 152.º do Código Penal (nomeadamente

nos casos de pornografia de vingança contra alguém com quem se teve um relacionamento afetivo) ou através

do crime de devassa da vida privada contemplado no artigo 192. do Código Penal quando a indiscrição tem

vítimas relativamente às quais inexiste o contexto relacional pressuposto na violência doméstica. Apesar de as

condutas não serem, portanto, atípicas e insuscetíveis de punição, reconhece-se a possível insuficiência da

moldura penal prevista para o crime de devassa da vida privada7. Todavia, não se julga que a forma de

ultrapassar este problema, corretamente identificado, consista na criação de um novo crime, para mais

configurado como crime contra a liberdade sexual e como crime público.

Finalmente, deve notar-se que a estas críticas já formuladas relativamente a projetos anteriores, acresce a

esta iniciativa uma dificuldade nova e intransponível, associada à classificação como «pornografia» destas

condutas. Como muito enfaticamente se assinala no parecer do Conselho Superior da Magistratura, «é

eticamente censurável qualificar como pornográficos conteúdos que apenas mostram nudez ou mesmo atos

sexuais praticados em contexto de intimidade e confiança». Concluindo-se, ainda, que «o projeto de lei em

análise parte da inadmissível premissa de que tirar uma fotografia na intimidade, ainda que em nudez parcial ou

total, ou registar em imagem um ato sexual no contexto de uma relação de intimidade, no pressuposto de que o

registo se mantenha privado, é pornografia, o que é enganador».

PARTE III – Conclusões

1. O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresentou o Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE), que visa a

criação de um crime de pornografia não consentida através do aditamento ao Código Penal de um novo crime

contra a liberdade e autodeterminação sexual previsto num artigo 170.º-A.

2. Este projeto de lei, além de aditar um novo artigo 170.º-A ao Código Penal, opta por lhe outorgar a

natureza de crime público, propondo-se ainda uma alteração ao Código de Processo Penal com o intuito de criar

um específico regime de suspensão provisória do processo.

3. A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que ambos os

projetos de lei reúnem os requisitos regimentais e constitucionais para serem discutidos e votados em Plenário.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2022.

A Deputada relatora, Cláudia Santos — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,

7 Como se reconhece no parecer do Conselho Superior da Magistratura, «no quadro atual, existe uma enorme assimetria entre a punição prevista para este tipo de comportamento quando ocorrido em contexto de violência doméstica, ou fora dele, sendo manifestamente branda a punição estatuída para estes últimos casos, o que tornam de facto, imperioso o reconhecimento por parte do legislador da gravidade deste tipo de comportamentos e da necessidade de os punir com acrescida severidade (…)». Acrescenta-se que «face à dimensão do fenómeno, à facilidade de partilha de dados pessoais, documentos, filmes, vídeos, imagens através da Internet e, em particular das redes sociais, bem como aos danos que determinadas condutas provocam na intimidade da vida privada das pessoas e à dificuldade, ou mesmo impossibilidade, em certos casos, de fazer cessar os seus efeitos, se impõe uma intervenção mais robusta do legislador, designadamente ao nível da punição do crime. Todavia, a nosso ver, não se justifica, para alcançar tal desiderato, uma sobreposição de normas, sempre geradora de oscilações interpretativas (…). Não é, portanto, de criar um novo tipo legal de crime, quando, como se viu, o artigo 192.º acautela o bem jurídico que está em causa».

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do PAN e do L, na reunião da Comissão do dia 12 de outubro de 2022.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

PROJETO DE LEI N.º 232/XV/1.ª

(PROCEDE À ALTERAÇÃO DOS LIMITES TERRITORIAIS ENTRE A FREGUESIA DE

CARANGUEJEIRA, MUNICÍPIO DE LEIRIA, E A UNIÃO DAS FREGUESIAS DE MATAS E CERCAL,

MUNICÍPIO DE OURÉM)

Parecer da Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local

I Considerandos

A 20 de julho de 2022 deu entrada na Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 232/XV/1.ª, que procede

à alteração dos limites territoriais entre a freguesia de Caranguejeira, Município de Leiria, e a união das

freguesias de Matas e Cercal, município de Ourém, no distrito de Santarém, da iniciativa do Grupo Parlamentar

do Partido Socialista (PS).

A referida iniciativa foi admitida e anunciada no mesmo dia.

Reunindo todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais, a 20 de julho de 2022, o projeto de lei

em apreço baixou à Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local (13.ª), por

despacho do Presidente da Assembleia da República, para efeitos de elaboração e aprovação do respetivo

parecer, nos termos do disposto do n.º 1 do artigo 129.º do RAR.

O presente projeto de lei pretende, objetivamente, redefinir a delimitação administrativa territorial entre a

freguesia de Caranguejeira, do município de Leiria, no distrito de Leiria, e a união das freguesias de Matas e

Cercal, do município de Ourém, no distrito de Santarém, «que está relacionada com uma operação urbanística

a decorrer no prédio rústico sito em Vinhal do Vale Sobreiro de Cima, Vale Sobreiro e Campina na Caranguejeira,

tendo ambos os municípios verificado existir a necessidade de ajustar a descrição do terreno à realidade predial

e às construções recentes no local».

Os limites administrativos territoriais entre a freguesia de Caranguejeira, do município de Leiria, no distrito de

Leiria, e a união das freguesias de Matas e Cercal, do Município de Ourém, no distrito de Santarém, são os que

constam:

i) Do Anexo I, que estabelece a lista de coordenadas do limite administrativo;

ii) Do Anexo II, que estabelece a representação cartográfica do limite administrativo.

Os três artigos da iniciativa são relativos ao objeto (1.º), limites territoriais (2.º) e entrada em vigor (3.º),

prevista para o primeiro dia do terceiro mês posterior à publicação da lei a aprovar.

Nos termos do disposto no artigo 249.º da Constituição, a criação ou a extinção de municípios, bem como a

alteração da respetiva área, é efetuada por lei, sendo precedida de consulta dos órgãos das autarquias

abrangidas.

O autor da presente iniciativa indica que a proposta de revisão do limite administrativo recebida como impulso

legiferante, foi sujeita a discussão e aprovação pelas Juntas e Assembleias de Freguesia de Caranguejeira

(município de Leiria) e da união de freguesias de Matas e Cercal (município de Ourém), bem como das Câmaras

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e Assembleias Municipais de Leiria e de Ourém.

II Opinião do Deputado autor do parecer

Sendo a opinião do relator de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do RAR, este exime-

se, nesta sede, de emitir quaisquer considerações políticas sobre o projeto de lei em apreço.

III Conclusões

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) apresentou na mesa da Assembleia da República o Projeto

de Lei n.º 232/XV/1.ª, que procede à alteração dos limites territoriais entre a freguesia de Caranguejeira,

município de Leiria, e a união das freguesias de Matas e Cercal, município de Ourém, no distrito de Santarém,

nos termos dos artigos 167.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e 118.º do Regimento da

Assembleia da República (RAR).

O projeto de lei respeita os requisitos formais previstos na Constituição da República Portuguesa e no

Regimento da Assembleia da República.

A Comissão de Administração Pública, Ordenamento do Território e Poder Local (13.ª) tem o parecer de que

o projeto de lei em apreço, ao reunir todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais, e cumprindo o

estipulado na lei formulário, pode ser remetido para discussão e votação em Plenário, nos termos do disposto

no n.º 1 do artigo 136.º do RAR.

Palácio de São Bento, 11 de outubro de 2022.

O Deputado relator, Firmino Marques — A Presidente da Comissão, Isaura Morais.

Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD e do CH, tendo-se registado

a ausência do L, do PCP e do BE, na reunião da Comissão de 11 de outubro de 2022.

IV Anexos

Nota técnica.

———

PROJETO DE LEI N.º 234/XV/1.ª

(PLANO NACIONAL PARA A PREVENÇÃO ESTRUTURAL DOS EFEITOS DA SECA E SEU

ACOMPANHAMENTO)

Parecer da Comissão de Ambiente e Energia

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do relator

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

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PARTE I – Considerandos

a) Nota introdutória

O PCP apresentou à Assembleia da República, em 20 de julho de 2022, o Projeto de Lei n.º 234/XV/1.ª –

«Plano Nacional para a Prevenção Estrutural dos Efeitos da Seca e seu acompanhamento».

Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição

da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos

formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República datado de 21 de julho de 2022, a iniciativa

em causa baixou à Comissão de Ambiente e Energia para emissão do respetivo parecer.

b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

O projeto de lei sub judice tem por objeto a criação do plano nacional para a prevenção estrutural dos efeitos

da seca, assegurando a universalidade de acesso à água, bem como os mecanismos para o acompanhamento

da sua implementação.

O PCP refere que em Portugal, os cada vez mais frequentes períodos de seca, têm provocado efeitos muito

negativos sobre as atividades económicas e a vida das comunidades. As situações de seca têm vindo a criar

diversas dificuldades no que respeita à atividade agrícola e pecuária e no acesso das populações à água, com

a resposta a estes problemas a centrar-se em medidas de emergência, para contingência imediata dos danos.

Salientam ainda que a prevalência no tempo e a maior frequência de ocorrência de condições de seca

traduzem-se em menores volumes de armazenamento das albufeiras e na escassez de água para diferentes

utilizações, com as bacias hidrográficas do Sado, do Mira e do Barlavento Algarvio a apresentarem valores de

disponibilidade hídrica frequentemente inferiores ao valor médio de armazenamento dos últimos 30 anos.

Defendem que neste contexto, para além das medidas excecionais, é preciso também definir medidas de

carácter estrutural, que possibilitem uma maior capacidade de armazenamento de água. É necessário preparar

um plano que vá para além das medidas de mitigação e contingência, um plano que, a partir da realidade

concreta e da previsão das necessidades, planeie os investimentos necessários, definindo inclusivamente os

horizontes temporais para a sua concretização.

O projeto de lei introduz a criação do plano nacional para a prevenção estrutural dos efeitos da seca enquanto

instrumento de planeamento das orientações, das medidas e das ações necessárias, em associação com os

investimentos em infraestruturas indispensáveis para dotar o país de capacidade de armazenamento de água e

de acessibilidade à água, para assegurar o abastecimento do consumo humano e o desenvolvimento das

atividades económicas, agropecuárias e industriais (artigo 2.º).

O plano integra programas destinados à concretização das orientações nas diferentes áreas de interesse no

que se relaciona com a seca, nomeadamente no que respeita ao armazenamento, disponibilidade de recursos

hídricos e utilização sustentada (artigo 3.º). Definem-se o programa de reforço da capacidade de

armazenamento de recursos hídricos (artigo 4.º), o programa de adaptação para as atividades agrícolas (artigo

5.º), programa de adaptação para as atividades ago-pecuárias (artigo 6.º) e ainda critérios no âmbito da

autorização de utilização da água (artigo 7.º) bem como procedimentos elaboração, monitorização e

acompanhamento do plano (artigo 8.º).

São ainda apresentados artigos relativos aos direitos dos beneficiários do estatuto da agricultura familiar

(artigo 9.º), integração no âmbito dos planos de gestão de região hidrográfica (artigo 10.º) e disposições

orçamentais (artigo 11.º), bem como regulamentação (artigo 12.º) e entrada em vigor (artigo 13.º)

c) Enquadramento legal e parlamentar

A Constituição da República Portuguesa consagra o direito ao ambiente como um direito constitucional

fundamental. Neste contexto, atribui ao Estado tarefas fundamentais como defender a natureza e o ambiente,

preservar os recursos naturais e assegurar um correto ordenamento do território. Atribui, também, ao Estado a

tarefa de promover o bem-estar e a qualidade de vida do povo bem como a efetivação dos direitos económicos,

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sociais, culturais e ambientais (artigo 9.º).

A Constituição, no seu artigo 66.º, prevê que todos têm direito a um ambiente de vida humano, sadio e

ecologicamente equilibrado e o dever de o defender. Incumbe ao Estado assegurar o direito ao ambiente, no

quadro de um desenvolvimento sustentável, por meio de organismos próprios e com o envolvimento e a

participação dos cidadãos. Neste âmbito importa salientar o n.º 2, alínea d) Promover o aproveitamento racional

dos recursos naturais, salvaguardando a sua capacidade de renovação e a estabilidade ecológica, com respeito

pelo princípio da solidariedade entre gerações.

A Lei de Bases da Política de Ambiente, Lei n.º 19/2014, de 14 de abril, no Artigo 10.º, alínea b) refere que a

proteção e a gestão dos recursos hídricos compreendem as águas superficiais e as águas subterrâneas, os

leitos e as margens, as zonas adjacentes, as zonas de infiltração máxima e as zonas protegidas, e têm como

objetivo alcançar o seu estado ótimo, promovendo uma utilização sustentável baseada na salvaguarda do

equilíbrio ecológico dos recursos, seu aproveitamento e reutilização e considerando o valor social, ambiental e

económico da água, procurando, ainda, mitigar os efeitos das cheias e das secas através do planeamento e da

gestão dos recursos hídricos e hidrogeológicos. É neste contexto que se situa e enquadra o projeto de lei do

PCP focado sobre os problemas da seca e da gestão de recursos hídricos.

PARTE II – Opinião do relator

O signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto

de Lei n.º 234/XV/1.ª, a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do

Regimento, reservando o seu Grupo Parlamentar a sua posição para debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

1. O PCP apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 234/XV/1.ª plano nacional para a

prevenção estrutural dos efeitos da seca e seu acompanhamento.

2. O presente projeto de lei visa a criação do plano nacional para a prevenção estrutural dos efeitos da seca,

assegurando a universalidade de acesso à água, bem como os mecanismos para o acompanhamento da sua

implementação.

3. Face ao exposto, a Comissão de Ambiente e Energia é de parecer que o Projeto de Lei n.º 234/XV/1.ª

reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário.

Palácio de São Bento, 6 de outubro de 2022.

O Deputado relator, Rui Cristina — O Presidente da Comissão, Tiago Brandão Rodrigues.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, na reunião da Comissão de 12 de outubro de 2022.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

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PROJETO DE LEI N.º 240/XV/1.ª

(PROCEDE À DÉCIMA TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 1-A/2020, DE 19 DE MARÇO, QUE APROVA

MEDIDAS EXCECIONAIS E TEMPORÁRIAS DE RESPOSTA À SITUAÇÃO EPIDEMIOLÓGICA

PROVOCADA PELO CORONAVÍRUS SARS-COV-2 E DA DOENÇA DA COVID-19)

Parecerda Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

PARTE I – Considerandos

I. a) Nota introdutória

Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata (PSD) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da

República o Projeto de Lei n.º 240/XV/1.ª (PSD) – Procede à décima terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19

de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada

pelo SARS-CoV-2 e da COVID-19.

O projeto de lei foi apresentado ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituiçãoe do n.º 1 do

artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República, cumprindo os requisitos formais previstos no n.º 1 do

artigo 124.º do Regimento.

O projeto de lei n.º 240/XV/1.ª (PSD) deu entrada a 22 de julho de 2022, foi admitido e baixou na generalidade

à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias (1.ª) em 25 de julho de 2022, por

despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República.

Foram solicitados pareceres ao Conselho Superior da Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério

Público, ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais e à Ordem dos Advogados, constando os

pareceres das entidades que entenderam pronunciar-se na página do processo legislativo da iniciativa,

disponível eletronicamente.

I b) Do objeto, conteúdo e motivação das iniciativas

Na exposição de motivos da iniciativa em evidência, os proponentes recordam que a Lei n.º 1-A/2020, de 19

de março1, criou um conjunto de medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica

provocada pelo SARS-CoV-2 e pela COVID-19, designadamente, «um regime excecional e transitório relativo

aos prazos e diligências processuais, o qual, apesar das diversas alterações entretanto sofridas, ainda hoje

permanece em vigor».

Estão em causa as seguintes normas excecionais:

 A suspensão do prazo de apresentação do devedor à insolvência;

 A suspensão dos atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a

concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família;

 A suspensão dos atos de execução da entrega do local arrendado, no âmbito das ações de despejo, dos

procedimentos especiais de despejo e dos processos para entrega de coisa imóvel arrendada, quando o

arrendatário, por força da decisão judicial final a proferir, possa ser colocado em situação de fragilidade por falta

de habitação própria ou por outra razão social imperiosa;

 A suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos àqueles processos.

A iniciativa em evidência aponta, especificamente, à revogação dos n.os 7, 8 e 9 do artigo 6.º-E da Lei n.º 1-

A/2020, de 19 de março2, que constitui o regime processual excecional e transitório que se encontra atualmente

em vigor, desde 6 de abril de 2021, questionando a atualidade desse regime excecional, em razão da

1 Alterada pelas Leis n.os 4-A/2020, de 6 de abril, 4-B/2020, de 6 de abril, 14/2020, de 9 de maio, 16/2020, de 29 de maio, 28/2020, de 28 de julho, 58-A/2020, de 30 de setembro, e 75-A/2020, de 30 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 6-D/2021, de 15 de janeiro, e pelas Leis n.os 4-B/2021, de 1 de fevereiro, 13-B/2021, de 5 de abril, e 91/2021, de 17 de dezembro. 2 Aditado pela Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, que entrou em vigor em 6 de abril.

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inexistência de circunstâncias decorrentes da pandemia que justifiquem a «manutenção de medidas excecionais

como as que se foram mantendo na lei, apesar das sucessivas alterações que o diploma sofreu entre 2020 e

2021 e que hoje ainda estão, incompreensivelmente, em vigor». Em aditamento, invocam «entropias várias nos

processos judiciais em curso, dificultando, ou até impedindo, a concretização de diversas diligências processuais

e impossibilitando a conclusão dos processos judiciais», as quais consideram consequência deste regime

excecional, que, para além de injustificado no momento atual, reputam de causador de «injustificados

desequilíbrios entre as partes processuais, nomeadamente entre aqueles exequentes (os credores na relação

jurídica subjacente à ação executiva) e executados (os devedores na mesma relação jurídica)».

Em resumo, consideram a maior parte dessas medidas excecionais totalmente desajustadas e injustificadas,

pelo que propõem a revogação das mesmas.

I c) Enquadramento legal

A situação excecional que se vivia em março de 2020 e a proliferação de casos registados de contágio de

COVID-19 exigia a aplicação de medidas extraordinárias e de caráter urgente. Assim, o Governo aprovou o

Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março, no qual determinou um conjunto de medidas excecionais e

temporárias, designadamente em matéria de contratação pública, de autorizações administrativas, de reforço

dos serviços públicos, bem como medidas destinadas a promover o distanciamento social e isolamento

profilático, cuidando da perceção do rendimento daqueles que sejam colocados nessa situação ou daqueles que

se vejam na situação de prestar assistência a dependentes.

Em matéria de justiça, o Capítulo VI deste diploma era relativo a «Atos e diligências processuais e

procedimentais»; tendo o artigo 14.º como epígrafe «Justo impedimento, justificação de faltas e adiamento de

diligências processuais e procedimentais»; o artigo 15.º «Encerramento de instalações»; e o artigo 15.º-A

«Recolha de assinatura dos juízes participantes em tribunal coletivo».

Na sequência da declaração do estado de emergência, pelo Decreto do Presidente da República n.º 14-

A/2020, de 18 de março, foi aprovada a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, veio aprovar «Medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo SARS-CoV-2 e da COVID-19».

Este diploma sofreu alterações, nomeadamente as atinentes ao objeto da presente iniciativa legislativa, tais

como as introduzidas pelas Leis n.os 4-A/2020, de 6 de abril; 16/2020, de 29 de maio; 4-B/2021, de 1 de fevereiro;

e 13-B/2021, de 5 de abril.

A Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que procedeu à ratificação dos efeitos do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de

13 de março, e, no seu artigo 7.º, atualmente revogado, previa a aplicação do regime de férias judiciais à prática

de atos processuais e procedimentais que devessem ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos

que corressem termos «nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional,

Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz,

entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal (…), até à cessação da situação

excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da

COVID-19». O mesmo artigo previa ainda a suspensão de diversos prazos, entre eles os de prescrição e

caducidade e os dos processos urgentes. Previa-se igualmente a realização de atos processuais e

procedimentais através de meios de comunicação à distância, com exceção dos atos em que estivessem em

causa direitos fundamentais.

Ao revogar este artigo 7.º, a Lei n.º 16/2020, de 29 de maio, aditou um artigo 6.º-A à Lei n.º 1-A/2020, de 19

de março, contendo um regime processual transitório e excecional para a realização de atos e diligências

processuais e procedimentais, ajustado ao aliviar de medidas que se verificou entretanto, com vista a iniciar o

processo gradual de retoma de uma certa normalidade em algumas atividades.

Em novembro de 2020 foi de novo declarado o estado de emergência, através do Decreto do Presidente da

República n.º 51-U/2020, de 6 de novembro, o qual foi sendo sucessivamente renovado.

Com a proliferação de casos, foi apresentada a Proposta de Lei n.º 70/XIV/2.ª, que contempla, de novo, «um

conjunto de medidas relativas à suspensão de prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que

devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais,

tribunais administrativos e fiscais, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais,

Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal»,

bem como a possibilidade de realização de atos e diligências por meios eletrónicos, dando origem à Lei n.º 4-

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B/2021, de 1 de fevereiro, que estabelece um regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais

decorrente das medidas adotadas no âmbito da pandemia da COVID-19, alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de

março.

Esta lei vem aditar à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, os artigos 6.º-B e 6.º-C, ao mesmo tempo que revoga

o artigo 6.º-A, onde constavam as anteriores normas sobre realização de atos processuais e procedimentais,

aditado pela Lei n.º 16/2020, de 29 de maio.

Na sequência da mais recente renovação do estado de emergência, pelo Decreto do Presidente da República

n.º 25-A/2021, de 11 de março, o Governo aprovou o Decreto n.º 4/2021, de 13 de março, o qual contém já

medidas que dão início a um levantamento gradual e faseado das medidas restritivas anteriormente impostas,

de acordo com o plano previsto na Resolução do Conselho de Ministros n.º 19/2021, de 13 de março, que

estabelece uma estratégia de levantamento de medidas de confinamento no âmbito do combate à pandemia da

COVID-19.

O artigo 6.º-A da Lei n.º 1-A/2020, aprova um «regime processual transitório e excecional». O artigo 6.º-B, é

relativo a «prazos e diligências». O artigo 6.º-C, a «prazos para a prática de atos procedimentais». Por sua vez,

o artigo 6.º-E, prevê um «regime processual excecional e transitório». E o artigo 7.º é relativo a «prazos e

diligências».

O último diploma a regular a matéria foi, assim, a Lei n.º 13-B/2021, de 5 de abril, que «Cessa o regime de

suspensão de prazos processuais e procedimentais adotado no âmbito da pandemia da doença COVID-19,

alterando a Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março». Esta lei adita, à Lei n.º 1-A/2020, o já referido Artigo 6.º-E –

Regime processual excecional e transitório. Nos seus artigos 4.º e 5.º dispõe sobre «Prazos administrativos» e

«Prazos de prescrição e caducidade». Por fim, revoga os artigos 6.º-B e 6.º-C da referida lei.

I d) Antecedentes parlamentares

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verifica-se que, já na atual legislatura, a

Comissão de Assuntos Constitucionais apreciou a Petição n.º 32/XV – Levantamento das medidas aplicáveis no

âmbito do combate à pandemia COVID-19, com objeto idêntico ao da iniciativa sub judice. Nesta petição, o único

peticionante assinala que o referido regime processual transitório e excecional, entretanto transposto para o

atual artigo 6.º-E, permite atualmente que, num processo executivo, se um imóvel que deva ser objeto de entrega

constituir casa de morada de família, fiquem «automaticamente» suspensas todas as diligências de entrega

judicial.

Na anterior Legislatura foram apreciadas as seguintes iniciativas legislativas de alteração da Lei n.º 1-A/2020,

de 19 de março, a qual teve origem na Proposta de Lei n.º 17/XIV/1.ª (GOV), aprovada em votação final global

com votos a favor do PS, do PSD, do BE, do CDS-PP, do PAN, do CH e da IL, e a abstenção do PCP, do PEV

e de Joacine Katar Moreira (N insc.):

 Projeto de Lei n.º 375/XIV/1.ª (PSD) – Procede à quarta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que

aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus

SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, isentando de taxa de registo no sistema de registo de estabelecimentos

regulados as entidades responsáveis pela criação e manutenção de «hospitais de campanha» e estruturas afins;

 Projeto de Lei n.º 368/XIV/1.ª (PS) – Procede à terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,

alterada pelas Leis n.os 4-A/2020 e 4-B/2020, ambas de 6 de abril, que aprova medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença

COVID-19;

 Projeto de Lei n.º 597/XIV/1.ª (PSD) – Alargar o âmbito de aplicação da possibilidade de realização de

reuniões por meios telemáticos existente para os órgãos autárquicos, para os órgãos colegiais e para a

prestação de provas públicas, às reuniões das assembleias de condomínio, procedendo à sétima alteração à

Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e temporárias de resposta à situação

epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19;

 Projeto de Lei n.º 594/XIV/2.ª (PS) – Alarga até 30 de junho de 2021 o prazo para a realização por meios

de comunicação à distância das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais,

procedendo à sétima alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARSCoV-2 e da doença

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COVID-19;

 Projeto de Lei n.º 1027/XIV/3.ª (PS) – Alarga até 30 de junho de 2022 o prazo para a realização por meios

de comunicação à distância das reuniões dos órgãos das autarquias locais e das entidades intermunicipais,

procedendo à décima primeira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais

e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARSCoV-2 e da doença

COVID-19.

PARTE II – Opinião do relator

O relator, considerando a natureza facultativa da emissão de opinião (artigo 137.º, n.º 3 do RAR), guarda a

mesma para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

1. O Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata apresentou o Projeto de Lei n.º 240/XV/1.ª (PSD) –

Procede à décima terceira alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, que aprova medidas excecionais e

temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da COVID-19;

2. Este projeto de lei propõe a revogação dos n.os 7, 8 e 9 do artigo 6.º-E da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março,

que constitui o regime processual excecional e transitório que se encontra atualmente em vigor;

3. A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o projeto de

lei em evidência reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em plenário.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2022.

O Deputado relator, Pedro Pinto — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PAN

e da IL, na reunião da Comissão do dia 12 de outubro de 2022.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

PROJETO DE LEI N.º 255/XV/1.ª

(APLICAÇÃO DO PROCESSO SUMÁRIO AO JULGAMENTO DOS CRIMES DE RESISTÊNCIA E

COAÇÃO SOBRE FUNCIONÁRIO)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

PARTE I – CONSIDERANDOS

I. a) Nota introdutória

Os Deputados do Chega tomaram a iniciativa de apresentar, em 14 de agosto de 2022, o Projeto de Lei n.º

255/XV/1.ª – «Aplicação do processo sumário ao julgamento dos crimes de resistência e coação sobre

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funcionário».

Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição

da República Portuguesa e do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos

formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.

Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, datado de 18 de agosto de 2022, a

iniciativa vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para

emissão do respetivo parecer.

Na reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de dia 6 de setembro

de 2022, o projeto de lei em apreço foi distribuído à ora signatária para elaboração do respetivo parecer.

Foram solicitados pareceres, em 6 de setembro de 2022, ao Conselho Superior da Magistratura, ao Conselho

Superior do Ministério Público e à Ordem dos Advogados.

I b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

O Projeto de Lei n.º 255/XV/1.ª, apresentado pelo Chega, pretende alterar o artigo 381.º do Código de

Processo Penal, no sentido de prever expressamente o julgamento em processo sumário, verificados os demais

requisitos legais, dos detidos em flagrante delito pela prática do crime de resistência e coação sobre funcionário,

previsto no artigo 347.º do Código Penal – cfr. exposição de motivos e alteração proposta ao artigo 381.º do

Código de Processo Penal1.

Salientando que, no «Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2021, apenas duas ocorrências

separam os números do crime de resistência e coação sobre funcionário do ano de 2020 (1557) daqueles que

respeitam ao ano de 2021 (1555)», que houve uma «interrupção da tendência decrescente da prática destes

crimes» e que «em causa está a autoridade pública», considera o Chega que, «neste tipo de crime, a rapidez

do julgamento pelo Estado é essencial para criar nos cidadãos a convicção de que resistir à autoridade do

Estado ou coagir os seus agentes é algo que poderá resultar na aplicação de uma pena de prisão de 1 a 5

anos», razão pela qual vem «propor que este tipo de crime seja julgado em processo sumário, obviamente,

reunidos que estejam os requisitos para a aplicação desta forma de processo especial» – cfr. exposição de

motivos.

Nesse sentido, os Deputados do Chega propõem a alteração do n.º 2 do artigo 381.º do Código de Processo

Penal, prevendo expressamente que sejam julgados em processo sumário, nos termos do n.º 1 desse mesmo

artigo, os detidos em flagrante delito pela prática do «crime previsto no artigo 347.º do Código Penal» – cfr. artigo

2.º do projeto de lei.

É proposto que esta alteração ao Código de Processo Penal entre em vigor «no dia seguinte ao da sua

publicação» – cfr. artigo 3.º do projeto de lei.

1 Não obstante, o artigo 1.º deste projeto de lei (PJL), porventura por lapso, refere que «A presente lei consagra a utilização obrigatória do processo abreviado para julgamento do crime previsto no artigo 347.º do Código Penal, procedendo à quadragésima sétima alteração ao Código de Processo Penal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro» (sublinhado nosso), quando certamente os proponentes se quereriam referir, não ao processo abreviado, mas ao processo sumário. De todo o modo, contrariamente ao que é afirmado neste artigo 1.º do PJL, a alteração material proposta pelo Chega à redação do artigo 381.º do Código de Processo Penal – cfr. artigo 2.º do PJL – não torna obrigatória a utilização do processo sumário ao crime de resistência e coação sobre funcionário, como de resto é explicado no parecer do Conselho Superior da Magistratura (CSM) para o qual se remete (o que, a suceder – e não é o caso –, suscitaria questões de constitucionalidade), limitando-se antes a prever expressamente, sem excluir a aplicação ou remessa para outras formas de processo, o julgamento em processo sumário, verificados os demais requisitos legais, dos detidos em flagrante delito pela prática deste tipo de crime, o que não constitui nenhuma inovação legislativa, uma vez que atualmente já são julgados em processo sumário, verificados os demais requisitos legais, os detidos em flagrante delito pela prática do crime previsto no artigo 347.º do Código Penal, decorrente do facto de este crime ser punível «com pena de prisão de 1 a 5 anos» e, portanto, subsumível ao disposto no n.º 1 do artigo 381.º do Código de Processo Penal, que prevê o julgamento sumário dos detidos em flagrante delito «por crime punível com pena de prisão cujo limite máximo não seja superior a 5 anos». No mesmo sentido, o parecer do CSM refere que «a solução proposta no projeto de lei em apreço já decorre do texto legal em vigor, porquanto o n.º 1 do artigo 381.º já permite que o arguido detido em flagrante delito pela prática do crime de resistência e coação de funcionário, mesmo em concurso de crimes, seja submetido, de imediato, a julgamento em processo sumário, sendo, de resto, esta uma prática judiciária de todos os dias», salientando as conclusões deste parecer que «a modificação preconizada nada acrescenta de substancial ao ordenamento jurídico, antes redundando numa referência desnecessária que só potenciará oscilações interpretativas que devem desde já ser atalhadas». Também o parecer do Conselho Superior do Ministério Público salienta que «não se vislumbra qualquer efeito útil no projeto agora apresentado. Isto porque já hoje a utilização do processo sumário para o crime de resistência e coação sobre funcionário está abrangida na previsão da norma cuja alteração se pretende», concluindo que «a alteração proposta, porque em nada acrescenta o regime jurídico vigente, carece de efeito útil e, por isso, de fundamento».

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I c) Enquadramento legal

O artigo 381.º do Código de Processo Penal, que o Chega pretende alterar no projeto de lei em apreciação,

estabelece atualmente o seguinte:

«Artigo 381.º

Quando tem lugar

1 – São julgados em processo sumário os detidos em flagrante delito, nos termos dos artigos 255.º e 256.º,

por crime punível com pena de prisão cujo limite máximo não seja superior a 5 anos, mesmo em caso de

concurso de infrações:

a) Quando à detenção tiver procedido qualquer autoridade judiciária ou entidade policial; ou

b) Quando a detenção tiver sido efetuada por outra pessoa e, num prazo que não exceda duas horas, o

detido tenha sido entregue a uma autoridade judiciária ou entidade policial, tendo esta redigido auto sumário da

entrega.

2 – São ainda julgados em processo sumário, nos termos do número anterior, os detidos em flagrante delito

por crime punível com pena de prisão de limite máximo superior a 5 anos, mesmo em caso de concurso de

infrações, quando o Ministério Público, na acusação, entender que não deve ser aplicada, em concreto, pena

de prisão superior a 5 anos».

Por outro lado, o artigo 347.º do Código Penal, que se refere ao crime de resistência e coação sobre

funcionário, determina o seguinte:

«Artigo 347.º

Resistência e coação sobre funcionário

1 – Quem empregar violência, incluindo ameaça grave ou ofensa à integridade física, contra funcionário ou

membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, para se opor a que ele pratique ato relativo ao

exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao exercício das suas funções,

mas contrário aos seus deveres, é punido com pena de prisão de um a cinco anos.

2 – A mesma pena é aplicável a quem desobedecer ao sinal de paragem e dirigir contra funcionário ou

membro das Forças Armadas, militarizadas ou de segurança, veículo, com ou sem motor, que conduza em via

pública ou equiparada, ou embarcação, que pilote em águas interiores fluviais ou marítimas, para se opor a que

ele pratique ato relativo ao exercício das suas funções, ou para o constranger a que pratique ato relativo ao

exercício das suas funções, mas contrário aos seus deveres, se pena mais grave lhe não couber por força de

outra disposição legal».

PARTE II – Opinião da relatora

A signatária do presente relatório abstém-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto

de Lei n.º 255/XV/1.ª (CH), a qual é, de resto, de «elaboração facultativa» nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do

Regimento da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

1. O Chega apresentou o Projeto de Lei n.º 255/XV/1.ª – «Aplicação do processo sumário ao julgamento dos

crimes de resistência e coação sobre funcionário».

2. Este projeto de lei pretende alterar o artigo 381.º do Código de Processo Penal, no sentido de prever

expressamente o julgamento em processo sumário, verificados os demais requisitos legais, dos detidos em

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flagrante delito pela prática do crime de resistência e coação sobre funcionário, previsto no artigo 347.º do

Código Penal.

3. Em face do exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de

parecer que Projeto de Lei n.º 255/XV/1.ª (CH) reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser

discutido e votado em Plenário.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2022.

A Deputada relatora, Paula Cardoso — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PAN

e do L, na reunião da Comissão do dia 12 de outubro.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

PROJETO DE LEI N.º 278/XV/1.ª

(ABOLIÇÃO DAS PROVAS NACIONAIS DE 9.º ANO DE ESCOLARIDADE)

Parecer da Comissão de Educação e Ciência

Índice

Parte I – Considerandos

Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexos

PARTE I – Considerandos

1.1. Nota introdutória

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o

Projeto de Lei n.º 278/XV/1.ª (BE) com o título «Abolição das provas nacionais de 9.º ano de escolaridade».

A iniciativa em apreciação é apresentada ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da

República Portuguesa (Constituição) e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República

(Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados, por força do

disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, bem como dos

grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição e da alínea f)

do artigo 8.º do Regimento.

A iniciativa respeita os requisitos constitucionais e regimentais.

O projeto de lei em apreciação deu entrada a 9 de setembro de 2022, tendo baixado na generalidade, no dia

12 de setembro, à Comissão de Educação e Ciência, (8.ª), Comissão competente para a elaboração do respetivo

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parecer.

1.2. Âmbito da iniciativa

O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda pretende com a presente iniciativa a eliminação das provas

finais de ciclo, no 9.º ano de escolaridade.

1.3. Análise da iniciativa

A iniciativa é composta por três artigos, os quais: definem o objeto – determina a eliminação das provas finais

de ciclo, no 9.º ano de escolaridade e estabelece que os resultados da avaliação interna do 9.º ano de

escolaridade são os únicos válidos para efeitos de prosseguimento de estudos e certificação de conclusão do

ensino básico (artigo 1.º); norma revogatória – revoga o n.º 3 do artigo 25.º e o n.º 1 do artigo 32.º do Decreto-

Lei n.º 55/2018, de 6 de julho; a alínea a) do artigo 3.º e os artigos 4.º e 5.º do Decreto-Lei n.º 27-B/2022, de 23

de março; a alínea b) do n.º 1 e o n.º 5 do artigo 25.º, o artigo 28.º, o n.º 2 do artigo 31.º, e o n.º 7 do artigo 32.º

da Portaria n.º 223-A/2018, de 3 de agosto, alterada pela Portaria n.º 65/2022, de 1 de fevereiro (artigo 2.º) e

entrada em vigor – o presente diploma entra em vigor a partir do ano letivo de 2022/2023 (artigo 3.º).

1.3.1. Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas e petições)

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que se encontra pendente, neste

momento, uma iniciativa com objeto conexo com o do projeto de lei em análise:

N.º Título Data Autor Publicação

XV/1.ª – Projeto de lei

227 Eliminação dos exames do 9.º ano 2022/07/20 PCP

[DAR II série A n.º 62,

2022/07/19, da 1.ª SL

da XV Leg (pág. 8-9)]

A consulta à AP devolve os seguintes antecedentes sobre matéria conexa com a da presente iniciativa:

N.º Título Data Autor Votação Publicação

XIV/2.ª – Projeto de lei

774

Altera o Decreto-Lei n.º 22-D/2021, de 22 de março, eliminando-se a não realização das provas finais do ensino básico do 9.º ano de escolaridade e dos exames finais nacionais, quando realizados por alunos internos, para

efeitos de aprovação de disciplinas e conclusão do ensino secundário e eliminando a dispensa

da realização de provais finais de ciclo, nos casos em que a respetiva realização se

encontre prevista apenas para efeitos de prosseguimento de estudo

2021/04/01 CH

Rejeitado Contra: PS, BE,

PCP, PAN, PEV e Joacine Katar

Moreira (N insc.) Abstenção: PSD e Cristina Rodrigues

(N insc.) A favor: CDS-PP,

CH e IL

[DAR II série A n.º 108,

2021/03/31, da 2.ª SL da XIV Leg (pág. 15-

17)]

740

Estabelece medidas com vista à eliminação dos exames, fixando um regime transitório para

conclusão do ensino secundário e acesso ao ensino superior no ano letivo 2020/2021

2021-03-19 PCP

Rejeitado Contra: PS, PSD, CDS-PP, CH e IL

Abstenção: Cristina Rodrigues (N insc.) A favor: BE, PCP,

PAN, PEV, e Joacine Katar

Moreira (N insc.)

[DAR II série A n.º 106,

2021/03/29, da 2.ª SL da XIV Leg (pág. 10-14), Alteração do texto inicial]

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1.3.2. Enquadramento jurídico nacional e de legislação comparada

Remete-se, no que tange à análise das matérias de enquadramento jurídico nacional e internacional, para o

detalhado trabalho vertido na nota técnica que acompanha o parecer.

PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer

O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto

de Lei n.º 278/XV/1.ª (BE) com o título «Abolição das provas nacionais de 9.º ano de escolaridade», reservando

o seu Grupo Parlamentar a sua posição para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

O Projeto de Lei n.º 278/XV/1.ª (BE) com o título «Abolição das provas nacionais de 9.º ano de escolaridade»

foi apresentado nos termos constitucionais, legais e regimentais aplicáveis, encontrando-se reunidos os

requisitos formais e de tramitação exigidos para que seja apreciado e votado em Plenário da Assembleia da

República.

Em sede de apreciação na especialidade, tal como é sugerido na nota técnica há alguns aperfeiçoamentos

formais a fazer para que sejam respeitadas integralmente as normas da lei formulário.

Embora não seja de caráter obrigatório, atenta a matéria da presente iniciativa, deverá a 8.ª Comissão,

promover a consulta das seguintes entidades:

• Ministro da Educação;

• CNE – Conselho Nacional de Educação;

• Conselho de Escolas;

• ANDE – Associação Nacional de Dirigentes Escolares;

• ANDAEP – Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas;

• CNIPE – Confederação Nacional de Educação;

• CONFAP – Confederação Nacional das Associações de Pais

• AEEP – Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo;

• IAVE – Instituto de Avaliação Educativa, I.P.

Palácio de São Bento, 11de outubro de 2022.

O Deputado relator, António Cunha — O Presidente da Comissão, Alexandre Quintanilha.

Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade, com os votos a favor do PS, do PSD e do CH, tendo-se

registado a ausência da IL, do PCP e do BE, na reunião da Comissão de 11 de outubro de 2022.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

———

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PROJETO DE LEI N.º 347/XV/1.ª

(REFORÇA A PROTEÇÃO DAS VÍTIMAS DE CRIMES DE DISSEMINAÇÃO NÃO CONSENSUAL DE

CONTEÚDOS ÍNTIMOS, ALTERANDO O CÓDIGO PENAL E O DECRETO-LEI N.º 7/2004, DE 7 DE

JANEIRO, QUE APROVA O COMÉRCIO ELETRÓNICO NO MERCADO INTERNO E TRATAMENTO DE

DADOS PESSOAIS)

Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias

PARTE I – Considerandos

I. a) Nota introdutória

O Grupo Parlamentar do Partido Socialista (PS) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República

o Projeto de Lei n.º 347/XV/1.ª (PS) – Reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual

de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que aprova o

Comércio Eletrónico no Mercado Interno e Tratamento de Dados Pessoais.

O projeto de lei foi apresentadoao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do n.º 1 do

artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República, e cumpre os requisitos formais previstos no n.º 1 do

artigo 124.º do Regimento.

O Projeto de Lei n.º 347/XV/1.ª (PS) deu entrada a 30 de setembro de 2022, foi admitido e baixou na

generalidade à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos Liberdades e Garantias (1.ª) em 4 de outubro

de 2022, por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República. Foi anunciado na reunião da

Comissão do dia 6 de outubro, tendo o signatário deste parecer sido designado como relator.

Foram solicitados pareceres ao Conselho Superior da Magistratura, ao Conselho Superior do Ministério

Público e à Ordem dos Advogados, todavia, ainda não feitos conclusos aos serviços da Comissão.

A discussão desta iniciativa em sessão plenária da Assembleia da República encontra-se agendada para o

próximo dia 12 de outubro.

I b) Do objeto, conteúdo e motivação das iniciativas

A iniciativa legislativa do Partido Socialista visa reforçar a proteção das vítimas de crimes de disseminação

não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal (doravante, CP) e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de

7 de janeiro, que aprova o Regime Jurídico do Comércio Eletrónico no Mercado Interno e Tratamento de Dados

Pessoais.

Fundam os proponentes a necessidade da iniciativa na constatação de que a divulgação não consentida de

aspetos da intimidade privada se agravou com a globalização, a qual contribuiu para a perenidade dos danos

causados às vítimas, dada a dificuldade de apagamento de conteúdos disseminados através de uma

multiplicidade de partilhas.

Constatam igualmente que esta prática atinge sobretudo as mulheres, identificando as diferentes dimensões

que a mesma envolve – desde o círculo íntimo ou familiar aos espaços da sua intervenção pública,

nomeadamente a laboral, a escolar ou a cívica – e concluindo que a mesma implica sempre algum grau de

violência de género.

No entender dos proponentes, os bens jurídicos afetados com a divulgação não consentida de fotografias

que contenham nudez ou ato sexual estão relacionados com a privacidade e a intimidade e não com a liberdade

sexual, uma vez que a recolha dos conteúdos é normalmente consentida, apenas a partilha o não é.

Os proponentes consideram insuficiente a moldura sancionatória prevista para o crime de devassa da vida

privada, previsto e punido pelo n.º 1 do artigo 192.º do CP, pelo que propõem o respetivo agravamento: De pena

de prisão até um ano ou pena de multa até 240 dias para pena de prisão até três anos ou pena de multa até 340

dias. Além disso, propõem o aditamento de um n.º 3 ao artigo 192.º do CP, tipificando a conduta de «quem, sem

consentimento, disseminar ou contribuir para a disseminação, através de meio de comunicação social, da

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Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada, de fotografias ou gravações que devassem a vida

privada das pessoas, designadamente a intimidade da vida familiar ou sexual», prevendo uma pena de prisão

até 5 anos1.

Prevê-se ainda a agravação da moldura penal prevista para o crime de devassa por meio de informática

(193.º) – de pena de prisão até dois anos para pena de prisão até três anos –, pelo facto de ser superior à

agravação que resultaria, por remissão, do artigo 197.º do CP.

Em coerência com esta alteração, foi excluída a devassa por meio informático do elenco de ilícitos típicos

relativamente aos quais o artigo 197.º prevê o agravamento das penas, quando o facto for praticado através de

meios de comunicação social, da internet ou de outros meios de difusão pública ou generalizada.

Por último, propõe-se o alargamento da imposição de deveres de informação e de bloqueio aos prestadores

intermediários de serviços em rede quanto aos crimes de devassa de vida privada praticados através da Internet,

tal como previsto para a pornografia de menores, de forma a reparar os danos causados às vítimas, alterando,

em conformidade, os artigos 19.º-A e 19.º-B do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro.

I c) Enquadramento legal

De acordo com o disposto nos n.os 1 e 2 do artigo 26.º da Constituição «a todos são reconhecidos os direitos

à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e

reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra

quaisquer formas de discriminação, sendo que a «lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e

utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias». Em

particular, a figura do direito ao desenvolvimento da personalidade, introduzida com a revisão constitucional de

1997, «operou um reforço de todos os direitos pessoais ativos (a liberdade de expressão, a liberdade de

consciência, de religião e de culto, a liberdade de criação cultural e artística, as liberdades de manifestação,

associação e reunião, o direito de aprender e de ensinar, a liberdade de escolha de profissão, a liberdade de

iniciativa e até a autonomia de orientação sexual)» – Marcelo Rebelo de Sousa e José de Melo Alexandrino,

Constituição da República Portuguesa Comentada, Ed. Lex, 2000, pág. 110 e 111.

Por sua vez, o n.º 3 do artigo 35.º da lei fundamental consagra a proteção dos cidadãos perante o tratamento

de dados informatizado, estabelecendo que «a informática não pode ser utilizada para tratamento de dados

referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa, vida privada e origem

étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização prevista por lei com garantias de não

discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente identificáveis».

Também a Declaração Universal dos Direitos Humanos prevê no artigo 12.º que «ninguém sofrerá

intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem

ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da

lei».

No mesmo sentido, o artigo 2.º do Tratado da União Europeia determina que a União se funda nos valores

do respeito pela dignidade humana, da liberdade, da democracia, da igualdade, do Estado de direito e do

respeito pelos direitos do Homem, sendo que a proteção dos dados pessoais é consagrada no artigo 8.º da

Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Os crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual encontram-se previstos no Capítulo V, do Título I,

do Livro II, do CP, compreendendo os artigos 163.º e seguintes. Neste capítulo, na Secção I, estão consagrados

vários ilícitos criminais relativos à proteção da liberdade sexual:

✓ Crime de coação sexual (artigo 163.º);

✓ Crime de violação (artigo 164.º);

✓ Crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência (artigo 165.º)

✓ Crime de abuso sexual de pessoa internada (artigo 166.º);

1 Sem prejuízo, contudo, quando a disseminação consensual de conteúdos íntimos ocorrer no contexto de um relacionamento afetivo, atual ou já terminado, de se tornar aplicável o regime jurídico-penal da violência doméstica, crime tipificado no artigo 152.º do Código Penal.

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✓ Crime de fraude sexual (artigo 167.º);

✓ Crime de procriação artificial não consentida (artigo 168.º);

✓ Crime de lenocínio (artigo 169.º); e

✓ Crime de importunação sexual (artigo 170.º).

Já na Secção II estão previstos os seguintes crimes contra a autodeterminação sexual:

✓ Crime de abuso sexual de crianças (artigo 171.º);

✓ Crime de abuso sexual de menores dependentes ou em situação particularmente vulnerável (artigo 172.º);

✓ Crime de atos sexuais com adolescentes (artigo 173.º);

✓ Crime de recurso à prostituição de menores (artigo 174.º);

✓ Crime de lenocínio de menores (artigo 175.º);

✓ Crime de pornografia de menores (artigo 176.º);

✓ Crime de aliciamento de menores para fins sexuais (artigo 176.º-A);

✓ Crime de organização de viagens para fins de turismo sexual com menores (artigo 176.º-B).

Por último, a Secção III estabelece as normas aplicáveis ao agravamento das penas (artigo 177.º) e à queixa

(artigo 178.º).

O crime de devassa da vida privada, previsto e punido pelo artigo 192.º do Código Penal, vem inserido

sistematicamente no Capítulo VII, do Título I, do Livro II, referente a crimes contra a reserva da vida privada. De

acordo com o n.º 1 do mencionado artigo 192.º comete este crime, quem, sem consentimento e com intenção

de devassar a vida privada das pessoas, designadamente a intimidade da vida familiar ou sexual:

✓ Intercetar, gravar, registar, utilizar, transmitir ou divulgar conversa, comunicação telefónica, mensagens

de correio eletrónico ou faturação detalhada [alínea a)];

✓ Captar, fotografar, filmar, registar ou divulgar imagem das pessoas ou de objetos ou espaços íntimos

[alínea b)];

✓ Observar ou escutar às ocultas pessoas que se encontrem em lugar privado [alínea c)]; ou

✓ Divulgar factos relativos à vida privada ou a doença grave de outra pessoa [alínea d)].

Como refere Paulo Pinto de Albuquerque a propósito do artigo 192.º do CP, «o bem jurídico protegido pela

incriminação é a privacidade de outra pessoa física viva, na sua dimensão imaterial: sons, palavras, textos,

imagens e informações dessa pessoa ou sobre essa pessoa. (…) O crime de devassa da vida privada é um

crime de dano (quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido) e de mera atividade (quanto à forma de

consumação do ataque ao objeto da ação). O tipo objetivo consiste (1) na obtenção ou transmissão de

informação constante de conversa, comunicação telefónica, mensagem de correio eletrónico ou mesmo

faturação detalhada, (2) na obtenção ou transmissão de imagem de pessoa, objeto ou espaço íntimos, (3) na

mera observação ou escuta da própria pessoa em lugar privado e (4) ainda na divulgação de factos da vida

privada (…) de outra pessoa. O tipo objetivo está preenchido mesmo que os sons, palavras, textos ou imagens

intercetados, gravados ou transmitidos não sejam identificados com a pessoa a que pertencem, nem possam

ser identificáveis, pois, a devassa consuma-se, não pela identificação da pessoa devassada, mas pela simples

intrusão na privacidade ou transmissão indevida do facto da vida privada de outra pessoa. A revelação da

identidade da pessoa cuja privacidade é devassada não é um requisito típico». Mais refere que «é irrelevante a

parte do corpo humano captada, fotografada ou filmada, desde que se insira num contexto da vida privada do

ofendido»2.

O crime de devassa da vida privada é punido com pena de prisão até um ano ou pena de multa até 240 dias,

pena que sofre os agravamentos previstos no artigo 197.º do CP, de um terço nos seus limites máximos e

mínimos quando o facto for praticado para obter recompensa ou enriquecimento, para o agente ou para outra

pessoa, para causar prejuízo a outra pessoa ou ao Estado ou através de meio de comunicação social, da difusão

através da Internet ou de outros meios de difusão pública generalizada. Tal como no caso dos crimes contra a

2 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário doCódigo Penal, Universidade Católica Editora, 3.ª edição – novembro 2015, págs. 754 e 755.

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liberdade e autodeterminação sexual, também nestes casos, quando aplicada uma pena de prisão ao agente,

esta está sujeita ao regime da suspensão da execução da pena de prisão, prevista nos artigos 50.º e seguintes

do CP, uma vez que a moldura penal abstrata é inferior a cinco anos. É exigido dolo específico – intenção de

devassar – como elemento essencial da conduta penal, sendo que o procedimento criminal depende de queixa

ou participação (artigo 198.º do CP).

No âmbito da aplicação deste crime deliberou o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão proferido no

Processo n.º 3827/16.8JAPRT.p13, de 6 de fevereiro de 2019, que «comete o crime de devassa da vida privada

quem, sem autorização da pessoa visada, e estando ciente do respetivo conteúdo, intencionalmente divulga

fotografias onde aquela se encontra retratada despida, em roupa interior e em poses de natureza sexual».

Já o artigo 193.º do CP prevê que quem criar, mantiver ou utilizar ficheiro automatizado de dados

individualmente identificáveis e referentes a convicções políticas, religiosas ou filosóficas, à filiação partidária ou

sindical, à vida privada, ou a origem étnica, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até

240 dias. Trata-se de um crime público cuja tentativa é punível. O crime de devassa por meio de informática «é

um crime de dano (quanto ao grau de lesão do bem jurídico protegido) e de mera atividade (quanto à forma de

consumação do ataque ao objeto da ação)»4.

O Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, transpôs para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2000/31/CE, do

Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho, relativa a certos aspetos legais dos serviços da sociedade

de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno, bem como o artigo 13.º da Diretiva

2002/58/CE, de 12 de julho, relativa ao tratamento de dados pessoais e a proteção da privacidade no sector das

comunicações eletrónicas, diploma que sofreu, até à data, três alterações: Decreto-Lei n.º 62/2009, de 10 de

março, Lei n.º 46/2012, de 29 e agosto, e Lei n.º 40/2020, de 18 de agosto.

Por sua vez, a Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, veio assegurar a execução, na ordem jurídica nacional, do

Regulamento (UE) 2016/679, do Parlamento e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das

pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados.

A presente iniciativa visa modificar três artigos do CP:

 Artigo 192.º, que só foi alterado uma vez, pela Lei n.º 59/2007, de 4 de setembro;

 Artigo 193.º, que nunca sofreu alterações; e

 Artigo 197.º que apenas foi modificado pela Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto.

Propõe ainda alterações aos artigos 19.º-A e 19.º-B do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que foram

aditados pela Lei n.º 40/2020, de 18 de agosto, diploma que veio reforçar o quadro sancionatório e processual

em matéria de crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores e estabelece deveres de

informação e de bloqueio de sítios contendo pornografia de menores, concluindo a transposição da Diretiva

2011/93/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro.

I.d) Antecedentes parlamentares

Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verifica-se que, sobre mesma matéria, se

encontram pendentes as seguintes iniciativas legislativas:

➢ Projeto de Lei n.º 156/XV/1.ª (CH) – Reforça a proteção das vítimas de devassa da vida privada por meio

de partilha não consentida de conteúdos de cariz sexual;

➢ Projeto de Lei n.º 157/XV/1.ª (PAN) – Prevê o crime de divulgação não consentida de conteúdo de

natureza íntima ou sexual, alterando o Código Penal; e

➢ Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE) – Criação do crime de pornografia não consentida (Quinquagésima

quinta alteração ao Código Penal e quadragésima quinta alteração ao Código do Processo Penal).

3 Referência jurisprudencial retirada do sítio da Internet da DGSI – Divisão de Gestão da Segurança e Infraestruturas, base de dados de jurisprudência a cargo do Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça. Consultas efetuadas a 7/10/2022. 4 Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário doCódigo Penal, Universidade Católica Editora, 3.ª edição – novembro 2015, pág. 760.

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Sobre a mesma matéria, transitou para a atual Legislatura, nos termos do artigo 25.º da Lei de Exercício do

Direito de Petição, a Petição n.º 209/XIV/2.ª – Solicitam a atribuição da natureza de crime público à partilha não

consentida de conteúdos sexuais, a qual foi apreciada, na Legislatura anterior, pela Comissão de Assuntos

Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo sido promovida a audição da primeira subscritora em

12/05/2021 e aprovado o respetivo relatório final em 16/06/2021.

Atento o número de subscritores – 8654, o agendamento do respetivo debate em Plenário realizar-se-á no

dia 12 de outubro de 2022, estando igualmente agendada, por arrastamento, a discussão e votação na

generalidade das iniciativas legislativas acima elencadas, bem como do projeto de lei sub judice.

Na Legislatura anterior foi apreciado, sobre a mesma matéria, o Projeto de Lei n.º 672/XIV/2.ª (N insc. Cristina

Rodrigues) – Reforça a liberdade e autodeterminação sexual criminalizando a divulgação não consentida de

fotografias ou vídeos que contenham nudez ou ato sexual, tendo caducado em 28/03/2022.

PARTE II – Opinião do relator

O relator, considerando a natureza facultativa da emissão de opinião (artigo 137.º, n.º 3 do RAR), guarda a

mesma para o debate em Plenário.

PARTE III – Conclusões

1. O Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou o Projeto de Lei n.º 347/XV/1.ª (PS), que «Reforça

a proteção das vítimas de crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código

Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que aprova o Comércio Eletrónico no Mercado Interno e

Tratamento de Dados Pessoais»;

2. Este projeto de lei, além de alterar os artigos 192.º, 193.º e 197.º do Código Penal, propõe ainda alterações

aos artigos 19.º-A e 19.º-B do Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que transpôs para a ordem jurídica

nacional a Diretiva 2000/31/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 8 de junho, relativa a certos aspetos

legais dos serviços da sociedade de informação, em especial do comércio eletrónico, no mercado interno, bem

como o artigo 13.º da Diretiva 2002/58/CE, de 12 de julho, relativa ao tratamento de dados pessoais e a proteção

da privacidade no sector das comunicações eletrónicas;

3. A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que ambos os

projetos de lei reúnem os requisitos regimentais e constitucionais para serem discutidos e votados em Plenário.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2022.

O Deputado relator , Pedro Pinto — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.

Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do PAN

e do L, na reunião da Comissão do dia 12 de outubro de 2022.

PARTE IV – Anexos

Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República.

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PROPOSTA DE LEI N.º 24/XV/1.ª

APROVA A LEI DE SAÚDE MENTAL E ALTERA LEGISLAÇÃO CONEXA

Parecer da Comissão de Saúde

Índice

Parte I – Considerandos

1) Introdução

2) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

3) Enquadramento legal e constitucional e antecedentes

Parte II – Opinião da Deputada autora do parecer

Parte III – Conclusões

Parte IV – Anexo

PARTE I – Considerandos

1) Introdução

O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª, que

«Aprova a Lei de Saúde Mental e altera legislação conexa».

Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º, da Constituição

da República Portuguesa (CRP) e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), reunindo

os requisitos formais previstos no artigo 124.º do RAR.

A referida proposta de lei deu entrada na Assembleia da República a 22 de julho de 2022, tendo sido admitida

e baixado, por despacho do Presidente da Assembleia da República, no dia 25 do mesmo mês, à Comissão de

Saúde, com conexão à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.

A discussão, na generalidade, da Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª encontra-se agendada para a reunião do

Plenário da Assembleia da República, de dia 13 de outubro de 2022.

2) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

A Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª propõe a substituição da atual Lei de Saúde Mental e a alteração a legislação

conexa, bem como a revisão e atualização dos direitos e deveres das pessoas com necessidade de cuidados

de saúde mental.

No entender do Governo, esta iniciativa legislativa está em linha com o progresso das ciências médicas e de

farmacologia e em consonância com a ordem jurídica internacional e europeia.

A proposta de lei em apreço consagra, designadamente o direito das pessoas com necessidade de cuidados

de saúde mental a:

• Aceder a cuidados de saúde integrados e de qualidade, da prevenção à reabilitação, que incluam respostas

aos vários problemas de saúde da pessoa e sejam adequados ao seu enquadramento familiar e social;

• Ver respeitadas a sua vontade e preferências, expressas no momento ou antecipadamente, sob a forma

de diretivas antecipadas de vontade ou através de procurador de cuidados de saúde ou de mandatário com vista

a acompanhamento;

• Ver promovida a sua capacitação e autonomia, nos vários quadrantes da sua vida, no respeito pela sua

vontade, preferências, independência e privacidade;

• Votar, ressalvadas apenas as incapacidades previstas na lei geral;

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• Não ser sujeito a medidas privativas ou restritivas da liberdade de duração ilimitada ou indefinida;

• Não ser submetido a medidas coercivas, incluindo isolamento e meios de contenção físicos ou químicos,

exceto nos termos previstos na lei;

• Não ser submetido a estimulação magnética transcraniana, sem o seu consentimento escrito.

O diploma em presença reconhece ainda, à pessoa com necessidade de cuidados de saúde mental em

processo de tratamento involuntário, ou em tratamento involuntário, o direito de:

• Participar em todos os atos processuais que diretamente lhe digam respeito, podendo ser ouvida por

teleconferência a partir da unidade de internamento onde se encontre;

• Ser acompanhada por intérprete idóneo, sempre que não conheça ou domine a língua portuguesa, seja

surda ou deficiente auditiva ou muda, caso em que também poderá responder por escrito a perguntas formuladas

oralmente;

• Indicar pessoa de confiança;

• Participar, na medida da sua capacidade, na elaboração e execução do respetivo plano de cuidados, sendo

ativamente envolvida nas decisões sobre o desenvolvimento do processo terapêutico.

3) Enquadramento legal e constitucional e antecedentes

Sendo o enquadramento legal e os antecedentes da Proposta de Lei n.º 24/XV/1.ª expendidos na nota técnica

que a respeito da mesma foi elaborada pelos competentes serviços da Assembleia da República, a 12 de

setembro de 2022, remete-se para esse documento, que consta em anexo ao presente parecer, a densificação

do capítulo em apreço.

PARTE II – Opinião da Deputada relatora

A Deputada relatora exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a proposta de lei em

análise, reservando a sua posição para o debate em reunião Plenária da Assembleia da República.

PARTE III – Conclusões

1. O Governo apresentou à Assembleia da República, em 22 de julho de 2022, a Proposta de Lei n.º

24/XV/1.ª, que «Aprova a Lei de Saúde Mental e altera legislação conexa»;

2. Esta apresentação foi realizada nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da CRP e do

artigo 118.º do RAR, reunindo os requisitos formais do artigo 124.º do RAR;

3. A Comissão de Saúde considera que estão reunidas as condições para que a proposta de lei em análise

possa ser apreciada em Plenário da Assembleia da República;

4. Deve o presente parecer ser enviado à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e

Garantias, para os efeitos tidos por convenientes.

Palácio de São Bento, 7 de outubro de 2022.

A Deputada relatora, Helga Correia — O Vice-Presidente da Comissão, Jorge Seguro Sanches.

Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do BE, na reunião da

Comissão de 12 de outubro de 2022.

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PARTE IV – Anexo

Nota técnica.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 186/XV/1.ª

(CONTABILIZAÇÃO DOS ANOS DE 2013 A 2016 PARA EFEITOS DE PROGRESSÃO NA CARREIRA

AOS TRABALHADORES DA CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS)

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 263/XV/1.ª

(RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À CONTABILIZAÇÃO DO PERÍODO COMPREENDIDO

ENTRE OS ANOS DE 2013 A 2016 PARA EFEITOS DE PROGRESSÃO NA CARREIRA DOS

TRABALHADORES DA CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS)

Informação da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão relativa à discussão do diploma

ao abrigo do artigo 128.º do Regimento da Assembleia da República

1. Os Grupos Parlamentares (GP) do BE e do CH tomaram a iniciativa de apresentar, respetivamente, o

Projeto de Resolução n.º 186/XV/1.ª (BE) – «Contabilização dos anos de 2013 a 2016 para efeitos de progressão

na carreira aos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos» e o Projeto de Resolução n.º 263/XV/1.ª (CH) –

«Recomenda ao Governo que proceda à contabilização do período compreendido entre os anos de 2013 a 2016

para efeitos de progressão na carreira dos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos», ao abrigo do disposto

na alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento da Assembleia da República (RAR).

2. Estes projetos de resolução deram entrada na Assembleia da República, correspondentemente, a 25 de

julho e a 4 de outubro de 2022, baixando a 25 de julho e a 10 de outubro à Comissão de Trabalho, Segurança

Social e Inclusão (CTSSI).

3. Os projetos de resolução aqui em causa contêm cada um a sua exposição de motivos, assim como uma

designação que traduz genericamente o seu objeto.

4. Tendo os autores indicado que pretendiam que a discussão das iniciativas ocorresse em Comissão, nos

termos do artigo 128.º do RAR, a mesma teve lugar na reunião da CTSS de 12 de outubro de 2022, nos seguintes

termos:

• Interveio em primeiro lugar o Deputado José Moura Soeiro (BE), que sublinhou que em 2013 foram

proibidas as valorizações remuneratórias, deixando de ser contabilizado o tempo de serviço. Aliás, o

descongelamento das carreiras, nomeadamente do setor empresarial do Estado e das instituições de crédito

nele integradas, apenas ocorreria em 2017, com o Orçamento do Estado que o seu Grupo Parlamentar votaria

favoravelmente, ficando os trabalhadores com a expectativa e a reivindicação de que os anos de 2013 a 2016

seriam contabilizados para a progressão na carreira, o que não aconteceu na Caixa Geral de Depósitos (CGD),

por oposição a outras empresas públicas, como a Rádio e Televisão de Portugal (RTP). Deu nota ainda que já

não era a primeira vez que os sindicatos levantavam a questão, sem que o Governo se mostrasse sensível ao

assunto, o que no seu entender justificava uma intervenção do Parlamento, com a recomendação proposta.

• Foi então concedida a palavra à Deputada Lina Lopes (PSD), que anunciou a abstenção do seu Grupo

Parlamentar, reconhecendo que se impunha esclarecer a reversão de algumas carreiras.

• Por sua vez, o Deputado Alfredo Maia (PCP) manifestou preocupação com a situação destes

trabalhadores, que não deveriam ser tratados como profissionais de 2.ª, ainda para mais numa empresa com

lucros significativos que encerrava balcões, com prejuízo para os trabalhadores e para as populações em geral.

Nesse sentido, declarou que o GP do PCP acompanhava esta proposta.

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• Usou então da palavra a Deputada Mara Lagriminha Coelho (PS), que recordou que sobre esta temática

haviam sido ouvidos, a 5 de julho, os subscritores da Petição n.º 26/XV/1.ª – «Contabilização na carreira dos

trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos dos anos de 2013 a 2016», da iniciativa do STEC-Sindicato dos

trabalhadores das Empresas do Grupo CGD e outros (2499 assinaturas), vincando que todos tinham percebido

as preocupações então expressas e também que se tratava de um processo complexo, que vinha sendo

abordado ao longo do tempo de forma gradual e mitigada. Ademais, considerou que esta matéria, que

legitimamente preocupava os trabalhadores, deveria abranger a negociação coletiva, envolvendo a

Administração da CGD e os sindicatos. Por último, alvitrou que este assunto podia ser apreciado na Comissão

de Orçamento e Finanças (COF), já que a competência cabia ao Ministério das Finanças, sem, contudo, afastar

a possibilidade de o debate se realizar na 10.ª Comissão, tendo até em conta a tramitação da citada petição.

• De novo no uso da palavra, a Deputada Lina Lopes (PSD) afirmou que o Grupo Parlamentar do PS não

podia enjeitar responsabilidades nesta matéria, dando nota que na aludida audição os trabalhadores tinham

respondido que não conseguiam reunir com a administração, o que também era da responsabilidade do

Governo. Deste modo, defendeu que muito haveria para fazer neste domínio, registando que não fora o seu

partido que promovera a vinda da troika ao nosso País e também que as competências deviam permanecer na

Comissão de Trabalho.

• Também o Deputado Jorge Galveias (CH) procedeu à apresentação da iniciativa do seu Grupo

Parlamentar, começando por referir que concordava com a parte final da intervenção que o antecedera e

também que esta problemática contendia com trabalho e trabalhadores. Posto isto, assinalou que, através das

Leis dos Orçamentos de Estado de 2011 a 2016, havia sido vedada a prática de quaisquer factos que

consubstanciassem valorizações remuneratórias dos titulares dos cargos e demais pessoal nele identificado,

bem como se impôs, imperativamente, que o tempo de serviço prestado durante esse período não fosse

contabilizado para efeitos de progressão, em todas as carreiras, cargos e ou categorias, também para efeitos

de mudanças de posição remuneratória ou categoria nos casos em que estas apenas dependessem do decurso

de determinado período de prestação de serviço.

Deste modo, sinalizou que os trabalhadores do banco público detido pelo Estado tinham sido incluídos nas

reduções salariais e no congelamento de carreiras, à semelhança da generalidade dos trabalhadores em

funções públicas e de todo o setor empresarial do Estado, sendo que a Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro,

que aprovou o Orçamento do Estado para 2018, veio pôr fim ao congelamento de carreiras para estes

trabalhadores, e que apesar de as referidas medidas terem sido revertidas em sede do Orçamento do Estado

para 2018, em que se consagrou a contabilização de todo o tempo anterior a 2018, com efeitos financeiros para

futuro, tal reconhecimento não tinha sido feito em relação aos trabalhadores da CGD, o que consubstanciava

uma tremenda injustiça que deveria ser reparada, como aliás solicitado pelos subscritores da referida Petição

n.º 26/XV/1.ª. Em conclusão, disse que acompanhariam qualquer iniciativa que procurasse solucionar esta

situação.

• A discussão foi gravada em suporte áudio1 e a respetiva gravação constitui parte integrante da presente

informação, dispensando-se assim outro desenvolvimento nesta sede.

5. Realizada a discussão dos Projetos de Resolução n.os 186/XV/1.ª (BE) e 263/XV/1.ª (CH), remete-se esta

informação a S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo

128.º do Regimento da Assembleia da República.

Assembleia da República, 12 de outubro de 2022.

A Presidente da Comissão, Isabel Meireles.

———

1 Entre os segundos 28:40 e 40:20 da gravação áudio da reunião da Comissão de Trabalho, Segurança Social e Inclusão de quarta-feira, 3 de novembro de 2021.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 268/XV/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO A IMPLEMENTAÇÃO DE UM PROJETO DE VALORIZAÇÃO AMBIENTAL

E TECNOLÓGICA DO PARQUE NATURAL DA SERRA DA ESTRELA

Exposição de motivos

O Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) foi a entidade responsável pela elaboração

pelo Programa Especial de Ordenamento do Parque Natural da Serra da Estrela (PEPNSE)1, que tem um âmbito

territorial que coincide com a respetiva área protegida (município de Manteigas e parte dos municípios de

Celorico da Beira, Covilhã, Guarda, Gouveia e Seia).

Desde 2017 que o Governo está para concluir este programa, que representa um importante meio para o

ordenamento e gestão deste território, numa perspetiva de prevenção e minimização de riscos tanto na fauna

como na flora.

Na sequência do fogo que deflagrou no dia 6 de agosto deste ano em Garrocho e que consumiu cerca de

25% (22 mil hectares) do Parque Natural da Serra da Estrela, abrangendo os municípios de Manteigas, Gouveia,

Guarda, Celorico da Beira e Belmonte, o Governo indicou que o ICNF teria no princípio de setembro um relatório

do levantamento de danos causados por este incêndio, que teria como consequência a planificação de um plano

de revitalização até 2032, com o valor de 25 milhões de euros.

Este plano de revitalização do Parque Natural da Serra da Estrela, tem supostamente intenção de promover

a diversificação e a incrementar várias atividades económicas num contexto que passa pela aposta no turismo

da natureza e, por consequência, na proteção deste parque natural através de ações de estabilização de

emergência, restauro de habitats e de linhas hidrográficas, assim como a criação de um hub tecnológico pela

Universidade da Beira Interior, em conjunto com os institutos politécnicos da região.

Para além da questão de prevenção aos incêndios, face à crise energética que está a agravar

exponencialmente os seus custos, o desenvolvimento e implementação de sistemas tecnológicos inovadores a

partir de biomassa proveniente da limpeza de áreas florestais, revelam-se de grande valor económico e

ambiental.

Neste âmbito, nos últimos anos, têm sido elaborados projetos que configuram a implementação de

tecnologias que vinculam a utilização de biomassa lenhosa, nomeadamente para produção de energia térmica,

como são disso exemplos os projetos de aquecimento das escolas do 1.º ciclo do Ensino Básico do Concelho

Vila Real, das escolas primárias de Alcácer do Sal, assim como o sistema híbrido (biomassa/solar) para

aquecimento da Piscina do Torrão, utilizando as escamas de pinhas, ou o sistema centralizado de aquecimento

numa escola primária do Redondo, concebido para queimar sarmentos de videiras.

Atualmente, as caldeiras mais usadas, por exemplo, em hotéis, IPSS e edifícios públicos (hospitais,

universidades, etc.), são caldeiras a gás (natural ou propano) ou a gasóleo, revelando-se como combustíveis

cada mais dispendiosos, pelo que a substituição por sistemas de cogeração de energia a partir de biomassa,

para fazer face às necessidades de energia térmica e elétrica, será altamente vantajosa para indústrias e

serviços que necessitem simultaneamente de calor e eletricidade, quer do ponto de vista económico quer

ambiental. Para além disso, a utilização desta tecnologia está alinhada com as metas de descarbonização

definidos pelo Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC2050)2.

Estas soluções tecnológicas têm como referência uma caldeira a biomassa, capaz de produzir energia

elétrica para autoconsumo enquanto se aquece água ou espaços, tendo como matéria-prima estilha e

desperdícios de madeira provenientes da limpeza de áreas florestais, sendo uma fonte de energia renovável,

limpa e fiável, para além de economicamente muito competitiva.

Em síntese, a implementação deste tipo de sistema integrado de cogeração de calor e eletricidade

incorporando uma caldeira a biomassa, permite não só reduzir a utilização de combustíveis fósseis, mas também

para criar novas cadeias de valor, tais como:

1 Despacho n.º 4907/2017, de 5 de junho, definiu os termos do início do procedimento de elaboração. 2 A Resolução do Conselho de Ministros n.º 107/2019, publicada em Diário da República em 1 de julho de 2019, aprovou o Roteiro para a Neutralidade Carbónica 2050 (RNC 2050), tendo por objetivo a redução de emissões de GEE em Portugal entre 85% e 90% até 2050, face a 2005, assim como a compensação das restantes emissões através do uso do solo e florestas, a alcançar através de uma trajetória de redução de emissões entre 45% e 55 % até 2030, e entre 65% e 75% até 2040, em relação a 2005.

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● Melhor gestão florestal, valorizando os resíduos resultantes da limpeza das áreas florestais e diminuindo

o risco de incêndios florestais, através de redes locais de recolha e consumo de biomassa;

● Maior valorização dos recursos naturais endógenos e a fixação das pessoas em meios predominantemente

mais desfavorecidos pela ruralidade e interioridade.

Assim, ao abrigo das disposições procedimentais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do Chega, recomendam ao Governo que:

1. O Ministério da Ciência, Tecnologia e do Ensino Superior em articulação com a Universidade da Beira

Interior e a ENERAREA (Agência Regional de Energia e Ambiente do Interior)3 priorizem o desenvolvimento de

um sistema tecnológico inovador de cogeração a partir de biomassa proveniente da limpeza das áreas florestais

do Parque Natural da Serra da Estrela;

2. Solicite à CIM-BSE (Comunidade Intermunicipal das Beiras e Serra da Estrela), a inventariação das

consumos e necessidades de energia térmica e elétrica das infraestruturas municipais inerentes às autarquias

que fazem parte da AMCB (associação de municípios, assim como das empresas relacionadas com os setores

dos serviços, pequena e média indústria e agropecuária existentes nos seus concelhos);

3. O CDOS Guarda (Comando Distrital de Operações de Socorro de Guarda) como entidade responsável

pela gestão do GEFRECON – GEstión FoREstal CONjunta4 cofinanciado pelo Fundo Europeu de

Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa Interreg V-A Espanha-Portugal (POCTEP) 2014-

2020, elabore com carácter de urgência um relatório sobre o resultado da sua aplicação, dado que este projeto

foi desenvolvido para a gestão de riscos relacionados com o clima, e mais concretamente, a redução do risco

de incêndios florestais, através da mobilização de recursos e promoção para que se alcance a gestão de

territórios florestais.

Palácio de São Bento, 12 de outubro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel

Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias — Rui Afonso

— Rui Paulo Sousa.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

3 Por iniciativa da Associação de Municípios da Cova da Beira (AMCB), foi criada em 2001 a ENERAREA, que tem como principais objetivos: ● Contribuir para aumentar a eficiência energética através da utilização racional e da conservação da energia; ● Melhorar o aproveitamento dos recursos energéticos endógenos. A área de atuação da ENERAREA abrange toda a área geográfica dos 14 municípios pertencentes à AMCB: Almeida, Belmonte, Celorico da Beira, Covilhã, Figueira de Castelo Rodrigo, Fornos de Algodres, Fundão, Guarda, Manteigas, Meda, Penamacor, Pinhel, Sabugal e Trancoso com cerca de 6.000 km2 e uma população de 220 535 habitantes. 4 Projeto GEFRECON – Centro da Biomassa para a Energia. Projeto cofinanciado em 75% pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER) através do Programa Interreg V-A Espanha-Portugal (POCTEP) 2014-2020, com um orçamento de 1000 324,51€, que tendo sido concluído em março de 2022, aborda a temática da gestão de riscos de incêndios florestais, através da mobilização de recursos e promoção para que se alcance a gestão de territórios florestais. Sendo uma ferramenta que permite uma gestão da biomassa disponível, considerando a escala geográfica territorial abrangida, permitindo estudar os cenários do ponto de vista económico e ambiental, configurando uma medida preventiva e que tende a minimizar os incêndios florestais.

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