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Quarta-feira, 16 de novembro de 2022 II Série-A — Número 116

XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)

S U M Á R I O

Resolução: — Aprova, para ratificação, o Tratado de Amizade e Cooperação entre a República Portuguesa e o Reino de Espanha, assinado em Trujillo, em 28 de outubro de 2021. Projetos de Lei (n.os 367 e 368/XV/1.ª): N.º 367/XV/1.ª (IL) — Altera o Código de Processo Civil, clarificando a revisão de decisões administrativas estrangeiras. N.º 368/XV/1.ª (IL) — Pela igualdade na disponibilização dos manuais escolares. Proposta de Lei n.º 46/XV/1.ª (GOV): Aprova o Programa Nacional de Habitação para o período 2022-2026.

Projetos de Resolução (n.os 284 e 288 a 296/XV/1.ª): N.º 284/XV/1.ª (Pela condenação das violações dos direitos humanos no Catar e na organização do Mundial 2022 de futebol): — Alteração do texto inicial do projeto de resolução. N.º 288/XV/1.ª (PCP) — Pelo fim dos voos noturnos, pelo direito ao descanso e bem-estar das populações. N.º 289/XV/1.ª (IL) — Pela defesa do ensino do Português como língua materna para portugueses e lusodescendentes fora de Portugal. N.º 290/XV/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que reforce o ensino de português no estrangeiro nas suas diferentes dimensões e intensifique o uso das tecnologias digitais para o tornar mais atrativo, interativo e ajustado ao perfil dos alunos.

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N.º 291/XV/1.ª (L) — Recomenda ao Governo que desenvolva uma taxa sobre os voos de jatos privados. N.º 292/XV/1.ª (L) — Recomenda a progressiva diminuição do horário de trabalho, com a instituição das 35 horas por semana, e o progressivo aumento do período de férias, com a instituição imediata dos 25 dias de férias. N.º 293/XV/1.ª (L) — Replanear o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência). N.º 294/XV/1.ª (L) — Recomenda a eliminação das posições intermédias nas categorias dos enfermeiros especialistas e

gestores colocados na 1.ª e 2.ª posições remuneratórias e a respetiva atualização salarial. N.º 295/XV/1.ª (CH) — Pelo incentivo à criação de medidas de recuperação de rastreios do cancro da mama e à aprovação do financiamento de terapêutica por Lynparza® (Olaparib). N.º 296/XV/1.ª (CH) — Aprovação de tabela com valores atuariais específicos para praticantes desportivos profissionais, aplicáveis à remição de pensões por acidente de trabalho.

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RESOLUÇÃO

APROVA, PARA RATIFICAÇÃO, O TRATADO DE AMIZADE E COOPERAÇÃO ENTRE A REPÚBLICA

PORTUGUESA E O REINO DE ESPANHA, ASSINADO EM TRUJILLO, EM 28 DE OUTUBRO DE 2021

A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea i) do artigo 161.º e do n.º 5 do artigo 166.º da

Constituição, aprovar, para ratificação, o Tratado de Amizade e Cooperação entre a República Portuguesa e o

Reino de Espanha, assinado em Trujillo, em 28 de outubro de 2021, cujo texto, nas versões autenticadas nas

línguas portuguesa e espanhola, se publica em anexo.

Aprovada em 7 de outubro de 2022.

O Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.

Anexo

Vide Resolução da Assembleia da República n.º 77/2022 — Diário da República n.º 221/2022, Série I de

2022-11-16.

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PROJETO DE LEI N.º 367/XV/1.ª

ALTERA O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL, CLARIFICANDO A REVISÃO DE DECISÕES

ADMINISTRATIVAS ESTRANGEIRAS

O número de cidadãos brasileiros com residência em Portugal é hoje de 233,122, constituindo a maior

comunidade estrangeira residente em Portugal (29,3% de todos os imigrantes). Por outro lado, o número de

portugueses com residência no Brasil ultrapassa hoje os 185 489 cidadãos.

Face ao elevado fluxo de pessoas entre os dois países, afigura-se relevante assegurar que os entraves

legais ou burocráticos à circulação de pessoas e à celebração de negócios jurídicos nos dois países são

reduzidos ao estritamente necessário.

Para os cidadãos de cidadania brasileira ou portuguesa que se divorciem ou estabeleçam uma «união-

estável» no Brasil, existem atualmente graves entraves ao reconhecimento dos referidos atos jurídicos em

Portugal. Alguns tribunais portugueses têm entendido que estes cidadãos têm necessariamente de recorrer à

ação especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira, prevista no artigo 978.º do Código de

Processo Civil, para que os referidos atos produzam os seus efeitos jurídicos em Portugal.

Esta exigência processual, com os custos associados à mesma, nomeadamente no pagamento de custas

taxas de justiça e honorários do mandatário judicial, apresenta-se como um obstáculo ao livre

desenvolvimento da vida pessoal destes cidadãos, sendo que, no caso do reconhecimento do divórcio

efetuado no Brasil, constitui um obstáculo à celebração de um novo matrimónio em Portugal, nos termos do

artigo 1601.º, alínea c), do Código Civil.

Relativamente ao reconhecimento do divórcio, têm existido interpretações díspares por parte dos tribunais

nacionais quanto à exigência legal da ação especial de revisão e confirmação de sentença estrangeira,

prevista no artigo 978.º do Código de Processo Civil.

De acordo com a decisão do Tribunal da Relação do Porto, de 22/10/2020:1

1 Disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/36e8eb48cbb7f3c980258645003408b6?OpenDocument&Highlight=0,241%2F20.4YRPRT%20

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«O divórcio consensual celebrado no Brasil pelos cônjuges por escritura pública não é passível de revisão

e confirmação entre nós através da ação de revisão de sentença estrangeira.» (negrito nosso)

Por outro lado, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido a 25 de junho de 2013,2 foi entendido

que as referidas decisões carecem de revisão para produzir efeitos em Portugal:

«I – As escrituras públicas prevista no artigo 1124.º-A do Código de Processo Civil Brasileiro (Lei n.º

5869, de 11-01-1973), através da qual se pode realizar a separação consensual dos cônjuges, e prevista

no artigo 1580.º do Código Civil Brasileiro, através da qual passado um ano da separação se poderá converter

o mesmo em divórcio», têm força igual à das sentenças que decretam a separação consensual ou a

conversão da separação judicial dos cônjuges em divórcio, uma vez que foi proferida pela entidade brasileira

legalmente competente para o efeito.

II – A decisão de uma autoridade administrativa estrangeira sobre direitos privados deve ser considerada

como abrangida pela previsão do artigo 1094.º, n.º 1, do CPC, carecendo de revisão para produzir efeitos

em Portugal.» (negrito nosso)

Quanto ao reconhecimento da «união-estável», figura equiparável ao conceito de união de facto previsto no

ordenamento jurídico português, existe também incerteza jurídica quanto à necessidade da ação especial de

revisão e confirmação de sentença estrangeira.

Existem várias decisões jurisprudenciais que negam a equiparação a sentença da figura prevista na

legislação brasileira da escritura pública declaratória da «união-estável», sendo rejeitado o reconhecimento da

mesma nos termos do artigo 978.º do CPC:

«A declaração exarada numa "Escritura Pública de Declaração de União Estável", perante uma

autoridade administrativa estrangeira (tabelião), limita-se a confirmar as declarações prestadas pelos

outorgantes, sem que o Tabelião tenha sobre elas feito incidir qualquer juízo vinculativo, com força de caso

julgado, e que, enquanto tal, tivesse competência para emitir, daí que, não se poderá reconhecer que

aquele documento, conquanto apelidado de "escritura pública" esteja compreendida, enquanto

"decisão", pelo normativo adjetivo civil decorrente do citado artigo 978.º, n.º 1, do Código de Processo

Civil, devendo apenas ser valorado como meio probatório, sujeito à livre apreciação do julgador, não

possuindo, por, isso, força de caso julgado, não tendo virtualidade para poder ser confirmada/revista

pelos Tribunais portugueses.» (negrito nosso), (Acórdão do STJ 20-1-22, Processo n.º

151/21.8YRPRT.S1).3

Tendo também sido proferidas decisões jurisprudenciais em sentido contrário, consagrando a necessidade

legal da revista e confirmação por tribunal português, através da ação prevista no artigo 978.º do CPC, da

referida escritura pública:

«I – A escritura pública, lavrada em cartório do registo civil situado no Brasil, que reconhece a

"união estável e de endereço comum" entre uma pessoa com nacionalidade brasileira e outra com

nacionalidade portuguesa, tem no ordenamento jurídico brasileiro força idêntica a uma sentença.

II – Verificados os requisitos previstos no artigo 980.º do CPC, e não relevando saber se a referida escritura

é suficiente para atribuir nacionalidade portuguesa ao membro com nacionalidade brasileira, como pretendido,

deve a mesma ser revista e confirmada por tribunal português.» (negrito nosso), (Acórdão do STJ

29/01/2019, proc. 896/18.0YRLSB.S1).4

Face à incerteza jurídica atual, decorrente da interpretação díspar do artigo 978.º do Código de Processo

Civil pelos tribunais portugueses, impõe-se ao legislador ordinário que proceda à elaboração de norma

interpretativa, nos termos do artigo 13.º, n.º 1, do Código Civil.

2 Disponível em https://www.direitoemdia.pt/search/show/c10f403b9c3ba82411979a748c1e2ebde0b7f356bccb89e8e9b5d0303bf329ab 3 Disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/7238be29bd3a8fd4802587d1005fbd74?OpenDocument 4 Citado no Acórdão do STJ de 12-11-2020, Proc. 95/20.0YRPRT.S1, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/9791bb614861ab028025863700014659?OpenDocument

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Consagra-se assim uma solução de direito que elimina a exigência legal do recurso à ação especial de

revisão e confirmação de sentença estrangeira, prevista no artigo 978.º do Código de Processo Civil, nos

casos de reconhecimento de decisões administrativas de países estrangeiros não abrangidos pela Convenção

de Haia de 1970 ou pelo Regulamento Bruxelas II, como é o caso do Brasil.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b) do n.º

1 do Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte

projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à décima segunda alteração ao Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º

41/2013, de 26 de junho, e alterado pelas Leis n.os 122/2015, de 1 de setembro, 40-A/2016, de 22 de

dezembro, e 8/2017, de 3 de março, pelo Decreto-Lei n.º 68/2017, de 16 de junho, pelas Leis n.os 114/2017, de

29 de dezembro, 49/2018, de 14 de agosto, e 27/2019, de 28 de março, pelo Decreto-Lei n.º 97/2019, de 26

de julho, pela Lei n.º 117/2019, de 13 de setembro, pela Lei n.º 55/2021, de 13 de agosto, e pela Lei n.º

12/2022, de 27 de junho.

Artigo 2.º

Aditamento ao Código do Processo Civil

É aditado ao Código do Processo Civil o artigo 978.º-A, com a seguinte redação:

«Artigo 978.º-A

Norma interpretativa

O disposto no artigo anterior não se aplica às decisões de autoridades administrativas estrangeiras sobre

direitos privados.»

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados da IL: Rodrigo Saraiva — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães Pinto —

Joana Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Patrícia Gilvaz — Rui Rocha.

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PROJETO DE LEI N.º 368/XV/1.ª

PELA IGUALDADE NA DISPONIBILIZAÇÃO DOS MANUAIS ESCOLARES

O Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal pretende estender a gratuitidade dos manuais escolares a todos

os alunos independentemente do estabelecimento de ensino que frequentem. Atualmente, apenas os alunos

matriculados nas escolas da rede pública e em estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com

contratos de associação são abrangidos pela gratuitidade e reutilização dos manuais escolares.

No n.º 1 do artigo 74.º da Constituição da República Portuguesa pode ler-se que «todos têm direito ao

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ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar». Segundo a

Constituição da República Portuguesa, é da responsabilidade do Estado «assegurar o ensino básico universal,

obrigatório e gratuito», «garantir a educação permanente e eliminar o analfabetismo» e ainda «garantir a todos

os cidadãos, segundo as suas capacidades, o acesso aos graus mais elevados do ensino, da investigação

científica e da criação artística».

A Petição n.º 262/XIV/2.ª – «Pela defesa da gratuitidade dos manuais escolares em todos os tipos de

ensino nos moldes da Constituição da República Portuguesa» recolheu mais de onze mil assinaturas o que

demonstra a importância do tema e que existem, efetivamente, vários princípios que não estão a ser

respeitados, nomeadamente, o princípio da igualdade, a liberdade de aprender e de ensinar e o direito ao

ensino. Com efeito, o sistema de ensino contempla os setores público, privado e cooperativo, que se

complementam para garantir, simultaneamente, uma educação universal e liberdade de escolha às famílias,

pelo que não se pode admitir que os alunos do ensino privado e cooperativo sejam discriminados no acesso a

manuais escolares pela simples característica de não frequentarem a rede pública de educação.

Já em 2020, a Provedora da Justiça recomendou o alargamento da medida a todos os alunos

comprovadamente carenciados. Esta recomendação surgiu na sequência da receção de mais de uma dezena

de queixas, apresentadas por cidadãos, associações e instituições, que vieram contestar a constitucionalidade

da opção de limitar a disponibilização gratuita de manuais escolares apenas aos alunos que frequentem

escolas da rede pública do Ministério da Educação.

Entretanto, os alunos matriculados em estabelecimentos de ensino particular e cooperativo com contratos

de associação foram abrangidos pela gratuitidade e reutilização dos manuais escolares continuando a deixar

todos os restantes alunos que frequentam o ensino privado sem contratos de associação de fora.

O Governo insiste num preconceito ideológico em relação ao ensino privado. Nem todos os alunos que

frequentam o ensino privado são economicamente privilegiados, como nem todos os alunos que frequentam o

ensino público são carenciados. Continua a não haver argumentos para manter esta situação manifestamente

inadequada.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei estabelece a distribuição gratuita de manuais escolares a todos os alunos na escolaridade

obrigatória, para tal procedendo à quarta alteração à Lei n.º 47/2006, de 28 de agosto, alterada pelas Leis n.os

72/2017, de 16 de agosto, e 96/2019, de 4 de setembro, e pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de janeiro, que

define o regime de avaliação, certificação e adoção aplicável aos manuais escolares e outros recursos

didático-pedagógicos do ensino básico e do ensino secundário, bem como os princípios e objetivos a que deve

obedecer o apoio socioeducativo relativamente à aquisição e ao empréstimo de manuais escolares.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 47/2006, de 28 de agosto

O artigo 2.º da Lei n.º 47/2006, de 28 de agosto, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 2.º

[…]

1 – O regime de avaliação, certificação e adoção dos manuais escolares assenta nos seguintes princípios

orientadores:

a) Disponibilização gratuita dos manuais escolares a todos os alunos na escolaridade obrigatória que

frequentem estabelecimentos de educação públicos, particulares ou cooperativos;

b) […];

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c) […];

d) […];

e) […];

f) […].

2 – O papel do Estado na prossecução dos princípios definidos no número anterior concretiza-se nas

seguintes linhas de atuação:

a) Distribuição gratuita a todos os alunos na escolaridade obrigatória que frequentem estabelecimentos

de educação públicos, particulares ou cooperativos;

b) […];

c) […];

d) […];

e) […];

f) […];

g) […].»

Artigo 3.º

Regulamentação

O Governo regulamenta a presente lei no prazo de 30 dias a contar da data da sua publicação.

Artigo 4.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados da IL: Carla Castro — Rui Rocha — Bernardo Blanco — Carlos Guimarães Pinto — Joana

Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Patrícia Gilvaz — Rodrigo Saraiva.

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PROPOSTA DE LEI N.º 46/XV/1.ª

APROVA O PROGRAMA NACIONAL DE HABITAÇÃO PARA O PERÍODO 2022-2026

Exposição de motivos

O Programa Nacional de Habitação (PNH), previsto no artigo 17.º da Lei de Bases da Habitação, aprovada

pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, é o instrumento programático da política nacional de habitação que

estabelece, numa perspetiva plurianual, os seus objetivos, prioridades, programas e medidas, substituindo,

nestes termos, a Estratégia Nacional para a Habitação (ENH), aprovada pela Resolução do Conselho de

Ministros n.º 48/2015, de 15 de julho.

Deste modo, a consolidação de um novo paradigma de políticas públicas de habitação implica,

necessariamente, não apenas a identificação das principais carências e dos principais problemas e bloqueios

existentes (que condicionam, quando não impedem, um efetivo e universal exercício do direito à habitação),

mas também, e de forma prospetiva, a identificação dos instrumentos e objetivos para a sua progressiva

superação.

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O PNH assume-se como um instrumento de valorização das políticas públicas de habitação no quadro das

políticas sociais em Portugal e reflete uma consciente e efetiva prioridade nacional no quadro plurianual 2022-

2026.

Este novo instrumento assume uma rutura com a filosofia e princípios plasmados na ENH, de 2015, ao

mesmo passo que mantém e reforça o rumo assumido com a aprovação da Nova Geração de Políticas de

Habitação (NGPH), pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, de 2 de maio.

A recuperação registada no mercado imobiliário, na sequência da crise financeira internacional e do

processo de «ajustamento», cuja opção pela liberalização do arrendamento acentuou ainda mais a

desregulação do mercado, foi maioritariamente orientada para os segmentos mais elevados de preço e

centrou-se essencialmente no escoamento da oferta habitacional privada disponível.

Por outro lado, em termos de nova oferta, resultante da reabilitação de edifícios ou frações, este processo

de liberalização nem sempre acautelou as necessárias normas de qualidade construtiva e ambiental e teve

como resultado final o continuado desajustamento entre os valores de renda praticados e os rendimentos

médios das famílias.

Foi com base nesta realidade, caracterizada por uma situação de crise habitacional grave e uma total

ausência de instrumentos e medidas de política pública de habitação, e tendo ainda presente a necessidade

de romper com a tradicional visão de direcionar as respostas apenas para a população mais carenciada, que

se avançou, em 2018, com uma profunda reforma do setor da habitação em Portugal, através da aprovação da

NGPH, pela referida Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, de 2 de maio.

A NGPH constitui, de facto, um documento estruturante e que estabelece o sentido estratégico, objetivos e

instrumentos para a salvaguarda do direito à habitação, assumindo a importância de encontrar respostas

diferenciadas e robustas, através de um conjunto amplo e coerente de diplomas legais que procuram garantir

que este domínio da política social pública não volta a ser negligenciado, tendo como desígnios fundamentais

a garantia do acesso de todos a uma habitação adequada, entendida no sentido amplo de habitat e de

comunidade.

A NGPH assume, pois, esse caráter inovador, desde logo na ambição de construir uma política pública de

habitação de vocação universalista, concretizando um direito que é de todos e rompendo com lógicas de apoio

do Estado que se limitam a respostas para os mais carenciados, de índole assistencialista.

Foi de facto com a NGPH que o Governo rompeu com a visão minimalista da promoção habitacional direta

e assumiu, claramente, que uma política pública de vocação universal não se faz sem a existência de um

parque público de dimensão adequada, que garanta a resposta às necessidades mais prementes de

habitação, mas também o acesso ao arrendamento público acessível, que, nessa medida, reforce a

capacidade de regulação do mercado, pelo peso relativo que a oferta passa a deter, no conjunto do parque

habitacional.

É neste quadro de mudança das políticas de habitação que foi igualmente aprovada a primeira Lei de

Bases da Habitação (LBH), pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, que representa, antes de mais, um avanço

importante na tarefa de construir os alicerces de uma política pública de habitação que seja estável, duradoura

e capaz de subsistir às diferentes conjunturas, aprofundando o ciclo de progressivas conquistas sociais,

iniciado em abril de 1974, nomeadamente nas áreas da saúde, da segurança social e da educação.

Com a LBH e a NGPH estão criadas as condições para assumir efetivamente a habitação como um direito

universal, de todos, no quadro de um Estado social pleno, garantindo-se a equidade e igualdade de acesso em

todo o território nacional e não deixando ninguém para trás.

Por sua vez, com a aprovação do PNH estabelece-se um quadro de referência estável para o

desenvolvimento das políticas públicas de habitação, garantindo que esta área fundamental não volta a ser

secundarizada no quadro das políticas sociais públicas, consagrando o direito de todos a uma habitação digna

e adequada. É este, em suma, o propósito último que se reafirma com o PNH.

Foram ouvidos os órgãos de governo próprio da Região Autónoma dos Açores, a Associação Nacional de

Municípios Portugueses e a Comissão Nacional de Proteção de Dados.

Foi promovida a audição dos órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira.

Ademais, em face do disposto no artigo 17.º da Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, foi promovida a consulta

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pública e a audição do Conselho Nacional de Habitação.

Assim:

Nos termos do n.º 2 do artigo 17.º da Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, e da alínea d) do n.º 1 do artigo

197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da República a seguinte proposta de lei:

Artigo 1.º

Objeto

É aprovado o Programa Nacional de Habitação (PNH), que consta do anexo à presente lei e da qual faz

parte integrante, que estabelece os objetivos, prioridades, programas e medidas da política nacional de

habitação para o período temporal 2022-2026.

Artigo 2.º

Âmbito temporal e geográfico

1 – O PNH tem natureza plurianual, devendo ser revisto de cinco em cinco anos, sem prejuízo das

atualizações extraordinárias que se venham a mostrar necessárias, a concretizar por proposta de alteração do

Governo à presente lei.

2 – O PNH aplica-se a todo o território nacional, sem prejuízo das competências próprias das regiões

autónomas e dos municípios.

Artigo 3.º

Políticas públicas de habitação

1 – A execução das políticas públicas de habitação deve ter em consideração os objetivos e prioridades

definidas na presente lei, sem prejuízo da sua revisão, nos termos previstos no n.º 1 do artigo anterior.

2 – A concretização das medidas preconizadas no PNH é assegurada através de financiamento público,

com recurso a fundos nacionais e europeus, dentro das dotações orçamentais disponíveis, sem prejuízo do

recurso a outras fontes adicionais de financiamento.

Artigo 4.º

Promotores do Programa Nacional de Habitação

1 – Incumbe ao Governo o acompanhamento e execução dos eixos de intervenção inscritos no PNH,

nomeadamente através do Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP (IHRU, IP).

2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, e no que respeita ao aumento das respostas

habitacionais previstas nos eixos de intervenção inscritos no PNH, as entidades promotoras são:

a) Os organismos da administração central com competência em matéria de habitação;

b) Os organismos públicos da administração central com competência em matéria de gestão do património

imobiliário;

c) As autarquias locais e as entidades intermunicipais;

d) As entidades do setor social, cooperativo e colaborativo;

e) As entidades do setor privado.

3 – O disposto nos números anteriores não prejudica as competências próprias das autarquias locais e

das regiões autónomas.

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Artigo 5.º

Acompanhamento, monitorização e avaliação do Programa Nacional de Habitação

1 – O Governo procede às diligências necessárias a garantir o acompanhamento, a monitorização e a

avaliação permanente da concretização do PNH, nomeadamente junto do Conselho Nacional de Habitação e

do Observatório da Habitação, do Arrendamento e da Reabilitação Urbana (OHARU).

2 – Para efeitos do disposto no número anterior e no artigo 18.º da Lei de Bases da Habitação, aprovada

pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro, o IHRU, IP, solicita a informação relevante sobre a execução do PNH,

às entidades referidas no n.º 4, até ao dia 15 de dezembro, tendo estas o dever de remeter, até ao dia 31 de

janeiro seguinte, a informação solicitada e disponível para a data mais atual possível, com vista à elaboração,

pelo OHARU, do relatório anual da habitação, a apresentar ao Governo e, por este, à Assembleia da

República, até ao fim do primeiro semestre do ano a que respeita.

3 – Entre a informação relevante, o relatório anual da habitação deve conter a informação relativa ao peso

do investimento público em habitação a custos acessíveis, com base em dois indicadores distintos:

a) Número de fogos de promoção pública;

b) Número de fogos no restante parque habitacional, que beneficiem da aplicação de regimes de apoio

público ao arrendamento.

4 – Para cumprimento das obrigações legalmente previstas de acompanhamento, produção e reporte da

informação em matéria de habitação, arrendamento habitacional e reabilitação urbana, e considerando o

disposto na Lei n.º 58/2019, de 8 de agosto, e demais legislação aplicável, pode o IHRU, IP, em relação às

matérias referidas:

a) Promover inquéritos, em articulação com o Instituto Nacional de Estatística, IP (INE, IP), e solicitar a

informação estatística oficial deste instituto;

b) Solicitar e receber os dados que considere necessários para efeito de produção da informação junto de

outras entidades e serviços da administração direta e indireta do Estado, em especial da Autoridade Tributária

e Aduaneira, ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 64.º da Lei Geral Tributária, aprovada em anexo ao

Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de dezembro, na sua redação atual, e do Instituto dos Registos e do Notariado,

IP, podendo, para o efeito, celebrar protocolos com as mesmas, articulando, sempre que relevante, com o INE,

IP; e

c) Solicitar informação às administrações local e regional, incluindo às entidades dos respetivos setores

empresariais, articulando, sempre que relevante, com o INE, IP.

Artigo 6.º

Norma revogatória

É revogada a Resolução do Conselho de Ministros n.º 48/2015, de 15 de julho.

Artigo 7.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de novembro de 2022.

O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — A Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares,

Ana Catarina Veiga dos Santos Mendonça Mendes — O Ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro

Nuno de Oliveira Santos.

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ANEXO

(a que se refere o artigo 1.º)

Programa Nacional de Habitação

Introdução

O Programa Nacional de Habitação (PNH), no seguimento da aprovação da Nova Geração de Políticas de

Habitação, pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, de 2 de maio (NGPH), e da Lei de Bases

da Habitação, pela Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro (LBH), é o instrumento que congrega, num único

documento e numa perspetiva plurianual, o quadro de políticas para o setor da habitação, em desenvolvimento

nos últimos anos, identificando as principais carências, bem como os instrumentos e objetivos para a sua

progressiva eliminação, substituindo, nestes termos, a Estratégia Nacional para a Habitação, aprovada pela

Resolução do Conselho de Ministros n.º 48/2015, de 15 de julho.

Enquadrando o trabalho em curso, que parte de um diagnóstico de terreno, plasmado no levantamento de

necessidades e na identificação quantitativa e qualitativa dos problemas em matéria de habitação, o PNH

assume-se como um instrumento de valorização deste setor no quadro das políticas sociais em Portugal,

reconhecendo as efetivas prioridades da política habitacional pública, no quadro plurianual 2022-2026.

De facto, até à aprovação da NGPH, e apenas com a exceção das soluções específicas e geograficamente

delimitadas do Programa Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, a

promoção de habitação em Portugal assentou num conjunto reduzido, episódico e disperso de programas de

apoio, com uma atuação desarticulada dos vários atores públicos, em resultado da ausência de uma

orientação política clara e de um modelo de governação integrado e consistente.

Em paralelo, assistimos a uma liberalização do arrendamento que veio acentuar ainda mais a desregulação

do mercado e o desajustamento entre os valores de renda praticados e os rendimentos médios das famílias.

A recuperação registada no mercado imobiliário, na sequência da crise financeira internacional e do

processo de «ajustamento», foi maioritariamente orientada para os segmentos mais elevados de preço e

centrou-se essencialmente no escoamento da oferta habitacional privada disponível e, quando relacionada

com nova oferta, resultante da reabilitação de edifícios ou frações, nem sempre acautelando as necessárias

normas de qualidade construtiva e ambiental.

Foi com base nesta realidade, caracterizada por uma situação de crise habitacional grave e uma total

ausência de instrumentos e medidas de política pública de habitação, e tendo ainda presente a necessidade

de romper com a tradicional visão de direcionar as respostas apenas para a população mais carenciada, que

se avançou, em 2018, com uma profunda reforma do setor da habitação em Portugal, através da aprovação da

NGPH, pela referida Resolução do Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, de 2 de maio.

A NGPH constitui, de facto, um documento estruturante e que estabelece o sentido estratégico, objetivos e

instrumentos para a salvaguarda do direito à habitação, assumindo a importância de encontrar respostas

diferenciadas e robustas através de um conjunto amplo e coerente de diplomas legais que procuram garantir

que este domínio da política social pública não volta a ser negligenciado, tendo como desígnios fundamentais

a garantia do acesso de todos a uma habitação adequada, entendida no sentido amplo de habitat, de

comunidade.

A NGPH assume, pois, esse caráter inovador, desde logo na ambição de construir uma política pública de

habitação de vocação universalista, concretizando um direito que é de todos e rompendo com lógicas de apoio

do Estado que se limitam a respostas para os mais carenciados, de índole assistencialista.

A NGPH é por isso uma escolha política. E por essa razão assume como objetivo primordial o reforço

progressivo do parque habitacional público (incluindo a habitação com apoio público), de 2 % para 5 %, tendo

em vista uma aproximação gradual à média europeia e invertendo, desta forma, o ciclo de desinvestimento

registado nas últimas décadas, marcado não só pelo declínio da promoção pública, mas também pela

alienação e redução do parque habitacional existente, colocando à disposição da administração pública,

central e local, instrumentos concretos de defesa do direito à habitação.

Foi de facto com a NGPH que o Governo rompeu com a visão minimalista da promoção habitacional direta

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e assumiu, claramente, que uma política pública de vocação universal não se faz sem a existência de um

parque público de dimensão adequada, que garanta a resposta às necessidades mais prementes de

habitação, mas também o acesso ao arrendamento público acessível e que, nessa medida, reforce a

capacidade de regulação do mercado, pelo peso relativo que a oferta passa a deter, no conjunto do parque

habitacional.

É neste quadro de mudança das políticas de habitação que foi igualmente aprovada a LBH, que

representa, antes de mais, um avanço importante na construção dos alicerces de uma política pública de

habitação que seja estável, duradoura e capaz de subsistir às diferentes conjunturas, aprofundando o ciclo de

progressivas conquistas sociais, iniciado em abril de 1974, nomeadamente nas áreas da saúde, da segurança

social e da educação.

Com a LBH e a NGPH estão criadas as condições para assumir efetivamente a habitação como um direito

universal, de todos, no quadro de um Estado Social pleno, garantindo-se a equidade e igualdade de acesso

em todo o território nacional e não deixando ninguém para trás.

A NGPH consubstancia, além disso, uma política pública com competências claramente definidas entre os

diferentes níveis de governação e que, por isso, responsabiliza cada um deles e estabelece condições para o

empenho de todos os atores públicos neste domínio, incentivando a cooperação e articulação entre o setor

público e o setor social, cooperativo e privado e a sociedade em geral. Trata-se, assim, de uma política que

passa a ter maiores garantias na dotação de recursos e de meios de intervenção adequados para a sua

persecução.

Com a aprovação do PNH estabelece-se um quadro de referência universal estável para o

desenvolvimento das políticas públicas de habitação, garantindo que esta área fundamental não volta a ser

secundarizada no quadro das políticas sociais públicas, consagrando o direito de todos a uma habitação digna

e adequada. Para além disso, o enquadramento do PNH permitirá o melhor desenvolvimento das Cartas

Municipais de Habitação, enquanto instrumento municipal de planeamento e ordenamento territorial em

matéria de habitação que, em articulação com o Plano Diretor Municipal e os restantes instrumentos de gestão

do território, garantirão a correlação entre as carências de habitação de cada município e as respostas e

recursos locais, nomeadamente de solo urbanizado.

I. Dinâmicas recentes da habitação em Portugal

Quando comparado com a generalidade dos países europeus, e face à génese tardia e imperfeita do

Estado social português (que relegou para segundo plano a concretização do pilar relativo ao direito à

habitação no quadro dos direitos sociais), o nosso país enquadra-se nos modelos de política habitacional

focados em públicos-alvo específicos e, nesse âmbito, no conjunto de países com políticas de promoção direta

residuais (que, entre outros critérios, detém um parque público inferior a 5 % do total).1

Este perfil minimalista da política habitacional, seguido durante décadas, teve como exceção relativa

apenas dois momentos. Ao nível da promoção direta, no período do pós-25 de Abril de 1974, em que se

atingiram os valores mais relevantes de promoção pública direta de alojamentos (a que se junta, mais tarde, a

promoção associada ao Programa Especial de Realojamento nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto).

Ao nível da promoção indireta, com a generalização do acesso à aquisição de casa própria (essencialmente

orientada para segmentos da classe média), a partir de finais dos anos oitenta. Aliás, é sobretudo no decurso

desta política de promoção indireta (mediante apoios públicos à aquisição de casa própria), que se foi

instalando na sociedade portuguesa a ideia de que o problema da habitação – no sentido da capacidade das

famílias para aceder a um alojamento – estava no essencial ultrapassado.

Esta noção, que perdurou até há relativamente pouco tempo, encontra suporte em diversos indicadores,

sendo de destacar, entre eles, a elevação do rácio de alojamentos por família, que em vinte anos (1991 a

2011) passou de 1,3 para 1,5, mantendo-se sensivelmente neste patamar em 2021.

Por outro lado, no mesmo período, a percentagem de agregados familiares a residir em casa própria

registava um aumento de quase 10 pontos percentuais, passando de 65 % para 73 %), com uma ligeira

descida para os 70 % em 2021, que não coloca em causa a clara prevalência desta forma de ocupação no

1 European Parliament (2013), Social Housing in the UE, Directorate-Generale for Internal Policies, Brussels.

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total de alojamentos.

Podendo igualmente ser interpretado como um indício de melhoria generalizada da situação habitacional

do país a partir dos anos noventa, pelo maior volume da oferta de habitação, o número de fogos devolutos

registava um acréscimo de 67 % entre 1991 e 2011 (passando de cerca de 440 mil para 735 mil, e para cerca

de 723 mil em 2021) e o número de alojamentos precários (barracas e outros) reduzia-se em cerca de 76 %

(de 27,3 mil para 6,6 mil) no mesmo período, a que acresce uma nova redução, em 2021, para cerca de quatro

mil fogos.

A ideia de superação da situação estrutural de crise habitacional viria, porém, a esbater-se nos anos mais

recentes, sensivelmente a partir de meados da segunda década do Século XXI. Isto é, num contexto marcado

por três processos essenciais: o impacto económico e social da crise financeira de 2008; as reorientações

políticas no setor da habitação, nomeadamente no quadro do processo de «ajustamento» estrutural (2011-

2015); e, por último, a relevância de novas dinâmicas habitacionais nas principais cidades, como as que se

associam ao aumento do investimento imobiliário estrangeiro e à intensificação da procura turística.

Quadro 1

Principais indicadores da habitação em Portugal (1970-2021)

1970 1981 1991 2001 2011 2021

Alojamentos por família 1,17 1,16 1,32 1,37 1,45 1,44

Casa própria 49,3% 56,6% 64,7% 75,7% 73,2% 70,0%

Fogos devolutos 373 950 190 331 440 271 543 777 735 128 723 214

Habitações precárias (barracas e outras)

34 860 46 391 27 642 27 319 6 612 4 042

Fonte: INE, IP.

No seu conjunto, estes processos contribuiriam para uma tendência de subida dos valores de aquisição e

arrendamento, sobretudo a partir de 2013, tendência essa que se tem vindo a acentuar nos últimos anos e que

nem durante a crise pandémica se inverteu, sem que o Estado fosse capaz de dar resposta cabal às

necessidades com o escasso parque público existente.

Por isso, e dado o quadro de crescente dificuldade de acesso das famílias a uma habitação digna e a

preços compatíveis com os seus rendimentos, num contexto particularmente complexo como o atual, importa

refletir sobre as respostas necessárias e delinear uma política habitacional consistente e duradoura, capaz de

enfrentar de forma estratégica as questões habitacionais com que o país se confronta.

1. O paradigma dos apoios públicos à aquisição de casa própria

Com a liberalização do sistema bancário e a descida das taxas de juro, a par dos benefícios fiscais e da

bonificação do crédito, a aquisição de casa própria converteu-se, sobretudo a partir dos anos noventa, no

principal eixo das políticas de habitação e na opção preferencial de acesso ao alojamento por parte das

famílias.

Na génese deste processo, e a par da relativa debilidade das políticas habitacionais seguidas até então,

encontram-se fatores de natureza externa, associados à integração europeia e à crescente influência dos

mercados financeiros na atividade das famílias, das empresas e do próprio Estado2.

No caso da habitação, as dinâmicas de financeirização económica e social traduziram-se num impulso

muito expressivo das políticas com incidência na procura, suportadas por crédito a baixo custo e abundante e

reforçadas pelos apoios públicos à aquisição, nomeadamente com as bonificações de juros.

É também este contexto, marcado por condições favoráveis, e de incentivo, à aquisição de casa própria,

2 Cf. Santos, Ana Cordeiro; Teles, Nuno; Serra, Nuno (2014), Finança e Habitação em Portugal, Cadernos do Observatório, n.º 2. Observatório das Crises e Alternativas. CES, Lisboa. [https://www.ces.uc.pt/observatorios/crisalt/documentos/cadernos/CadernoObserv_II_julho2014.pdf].

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que impede a revitalização do mercado de arrendamento, já liberto, nessa altura, dos constrangimentos

associados ao congelamento das rendas.

De facto, se a partir de 1981 passou a ser possível optar por um regime de renda livre ou condicionada em

todos os novos contratos, após 1990 assistiu-se à liberalização do mercado de arrendamento, tanto em termos

de valor de renda como de duração. Ou seja, todos os fogos construídos a partir de 1990 passaram a poder

ser colocados no mercado em regime de renda livre. Aliás, e ao contrário do que muitas vezes se supõe, o

universo de rendas congeladas será hoje ainda mais residual do que em 2011,3 não devendo portanto ser

encontrado neste fator – mas sim na preferência «racional» pela casa própria, em resultado da facilidade de

acesso ao crédito, por via do endividamento das famílias – a persistente crise do mercado de arrendamento

em Portugal.

É também este contexto que leva a que, sobretudo no período entre 1995 e 2005, a despesa pública com

habitação passe a situar-se em valores anuais superiores a 300M€ (quase atingindo os 700 M€ no início dos

anos 2000), cabendo a maior fatia desses montantes (73 % do orçamento executado entre 1987 e 2015) a

encargos com a bonificação de juros. Bem acima, portanto, dos encargos com outras medidas de política

habitacional, e em particular os relacionados com a promoção direta de alojamentos.

Quadro 2

Política de habitação: dotações orçamentais por tipo de medida (1987-2011)

Orçamentado Executado Taxa

execução Valor% Valor %

Bonificação de juros no crédito à habitação

6 672 508 895€ 65,9% 7 046 685 146€ 73,3% 106%

Realojamento e subsídios de renda da Segurança Social

1 852 539 523€ 18,3% 1 382 649 504€ 14,4% 75%

Incentivos ao arrendamento 739 632 917€ 7,3% 803 874 566€ 8,4% 109%

Promoção direta (incluindo CDH) 461 421 655€ 4,6% 207 813 110€ 2,2% 45%

Reabilitação de edifícios 392 242 731€ 3,9% 166 594 609€ 1,7% 42%

TOTAL 10 118 345 720€ 100% 9 607 616 935€ 100% 95%

Fonte: IHRU, IP (2015)

Aliás, como ilustra o quadro anterior, são precisamente as medidas orientadas para a procura (bonificação

de juros e incentivos ao arrendamento) as únicas que registam, no período de 25 anos considerado, níveis de

execução acima do orçamentado (106 % e 109 %, respetivamente).

Em termos globais, e tomando devida nota da relevância desta opção pelo apoio ao acesso à habitação,

sublinhe-se que o crédito à aquisição de casa própria representa cerca de 80 % do total de crédito concedido a

particulares neste período (Santos, 2013), num contributo muito expressivo para o endividamento das famílias

portuguesas (para além do endividamento do setor da construção e, em última instância, da própria banca no

exterior).

Face às dinâmicas geradas, não surpreende, portanto, o aumento muito significativo de fogos produzidos

neste período. De facto, dos cerca de 2,5 milhões de fogos construídos entre 1970 e 2019 (quase 50 anos),

mais de metade (63 %) são edificados apenas em 19 anos (entre 1990 e 2009), chegando a atingir-se uma

média anual acima de 100 mil fogos entre 2000 e 2004 (o dobro da média da série temporal, a rondar os 50

mil fogos ano).

3 De acordo com os dados do Inquérito às Rendas de Habitação, realizado pelo INE, IP em 2015, do total de arrendamentos existentes «apenas 33 % dizem respeito a contratos celebrados antes de 1990 e, desse universo, apenas 22 % têm rendas inferiores a 100€. (…) E se desse universo excluirmos ainda o setor público e cooperativo (cujo menor valor das rendas é social, não resultando do congelamento), então o peso relativo das rendas congeladas passa a ser de apenas 14 %» (Santos e Serra, 2020).

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Quadro 3

Número de fogos construídos (1970-2019)

1970/74 1975/79 1980/84 1985/89 1990/94 1995/99

Fogos 189 928 167 697 195 996 215 708 306 706 411 908

% no total 7,7% 6,8% 7,9% 8,7% 12,4% 16,6%

Média anual 37 986 33 539 39 199 43 142 61 341 82 382

2000/04 2005/09 2010/14 2015/19 Total

Fogos 520 243 319 521 102 317 46 461 2 476 485

% no total 21,0% 12,9% 4,1% 1,9% 100,0%

Média anual 104 049 63 904 20 463 9 292 49 530

Fonte: INE, IP

A ideia de que os apoios à procura gerariam um incremento da oferta, tornando a habitação mais acessível

para a generalidade das famílias, constitui o pressuposto base desta opção por uma política centrada no apoio

à aquisição de casa própria (ou seja, de promoção habitacional indireta). Isto é, a crença de que as lógicas do

mercado (oferta e procura), acabariam por se traduzir numa redução generalizada do preço da habitação.

Mas não foi isso, todavia, que se verificou ao longo deste período de forte investimento, público (benefícios

fiscais e bonificação do crédito) e privado (facilidades de acesso a empréstimos para aquisição de casa

própria) na habitação. De facto, desde o início dos anos noventa (e até à crise financeira de 2008), o valor

médio dos prédios urbanos transacionados não deixou de aumentar, passando de cerca de 33,8 M€ em 1992

para cerca de 126 M€ em 2008, e só depois começando a diminuir, até 2014 (altura em que, como veremos,

volta a aumentar).

Quadro 4

Valor médio dos prédios urbanos transacionados (1970-2019)

(milhares de euros)

1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Valor (€) 33,8 35,6 36,9 41,5 42,9 45,5 52,6

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

Valor (€) 58,4 62,7 67,0 71,4 81,5 96,6 111,3

2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012

Valor (€) 121,3 124,4 126,0 115,4 118,3 100,7 95,3

2013 2014 2015 2016 2017 2018 2019

Valor (€) 99,9 114,7 118,1 119,2 136,1 136,0 142,2

Fonte: INE, IP.

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Não negando que a opção por um quadro de incentivos à aquisição de casa própria permitiu níveis inéditos

de acesso das famílias a uma habitação, e em condições financeiramente compatíveis com os seus

rendimentos, a verdade é que tal opção não salvaguardou uma política universal de acesso à habitação, nem

parece ter tornado a habitação – do ponto de vista do seu preço – menos onerosa e, nessa medida, mais

acessível.

O que significa que, do ponto de vista dos apoios públicos (sob a forma de benefícios fiscais e bonificação

do crédito), se tratou no essencial de transferir, para o Estado, uma parte dos encargos de parte das famílias

com a aquisição de casa própria, sem que o preço da habitação, e os resultados do setor imobiliário, se

tenham alterado. Por outras palavras, as políticas de apoio à aquisição de casa própria contribuíram para um

maior acesso à habitação por parte das famílias, mas não asseguraram, como seria expectável, uma maior

desmercadorização desse bem, ao contrário do que sucedeu, a partir de 1974, com os setores da saúde ou da

educação.

Aliás, uma dinâmica idêntica, e que no essencial se limita ao financiamento público da oferta (sem que daí

resulte a redução de valores), tende a verificar-se também no caso dos incentivos e apoios ao arrendamento.4

2. Do «ajustamento» estrutural à nova crise de habitação

A crise financeira de 2008, cuja genealogia é indissociável da crescente imbricação, à escala global, entre

a habitação e o setor financeiro – pelas perspetivas que o imobiliário oferece em termos de rentabilização dos

investimentos e aplicação de fundos – teve um impacto assinalável nas finanças públicas e na dívida soberana

de diferentes países, conduzindo à implementação de programas de austeridade.

No caso português, e no que diz respeito ao setor da habitação, o Memorando de Entendimento assinado

com a troika5 estabeleceu um compromisso assente em três vertentes essenciais: a adoção de medidas

orientadas para a liberalização do mercado habitacional, o incremento da reabilitação e do arrendamento

urbano e a redução do endividamento privado que a aquisição de casa própria tinha alavancado.

Nestes termos, foram adotadas neste período quatro medidas essenciais. Por um lado, e visando um

aumento de colocação de fogos no mercado, a aprovação, em 2012, de uma reforma do Novo Regime de

Arrendamento Urbano (NRAU) e a redução das exigências na reabilitação do edificado (2013).6 Por outro, em

2014, a aprovação de legislação orientada para a liberalização dos usos da habitação (numa perspetiva de

enquadramento do Alojamento Local, para fins turísticos), a que acresce a criação de condições para a

captação de investimento estrangeiro no mercado imobiliário português, nomeadamente com o regime dos

Vistos Gold e o estatuto de Residentes Não Habituais. O défice de oferta habitacional pública, que já na altura

colocava Portugal na cauda da Europa, não foi, portanto, encarado pela troika, por exclusão de partes, como

um problema e uma prioridade da política de habitação, num contexto de «ajustamento» estrutural.

O facto é que estas alterações contribuíram, a par das maiores dificuldades no acesso ao crédito neste

período e da intensificação posterior da procura – especialmente da procura estrangeira e turística, em

particular nas grandes cidades – para a tendência de aumento dos encargos com a habitação. Com efeito, se

o respetivo índice de preços regista uma descida até 2013, em boa medida explicado pelo contexto de crise e

da retração do setor, a partir desse ano inicia-se uma trajetória de subida que distancia o país, cada vez mais,

do valor registado à escala da União Europeia (UE27).

De facto, as dinâmicas de internacionalização do investimento no imobiliário (com políticas ativas de

incentivo a esse investimento), a par do impacto associado ao aumento da procura turística do nosso país,

desencadearam uma pressão sobre os preços que tornaria a habitação num bem cada vez menos acessível a

um número crescente de famílias. E isto sem que a resposta ao nível das políticas habitacionais,

4 De que é exemplo, neste período, o Incentivo ao Arrendamento Jovem (IAJ), criado em 1992 e que seria mais tarde substituído pelo programa «Porta 65 – Arrendamento por Jovens», aprovado em 2007. 5 Cf. Memorandum of Understanding on Specific Economic Policy Conditionality [https://ec.europa.eu/economy_finance/eu_borrower/mou/2011-05-18-mou-portugal_en.pdf]. 6 O NRAU tinha essencialmente em vista, mediante restrição dos direitos dos inquilinos, facilitar e dar celeridade aos despejos e, desse modo, dinamizar o mercado de arrendamento. Na mesma linha, a suavização das regras de na reabilitação do edificado tinha em vista, essencialmente, tornar as operações menos onerosas e menos morosas, incentivando a melhoria do parque habitacional e a disponibilização de fogos devolutos.

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nomeadamente as associadas à NGPH, cujos resultados são, por natureza, de tempo longo, pudessem

começar a surtir o seu efeito.

Quadro 5

Índice de preços na habitação em Portugal e na UE27 (2008-2021)

(ano 2015=100,0)

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Portugal 107,5 106,5 107,4 102,1 94,9 93,1 97,0

UE27 101,9 97,3 98,4 98,8 96,9 95,8 97,3

2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

Portugal 100,0 107,1 117,0 129,0 141,5 154,3 168,8

UE27 100,0 104,7 109,6 114,8 119,7 126,9 137,4

Fonte: Eurostat

Tanto na Europa como em Portugal,7 esta subida dos preços, indissociável das dinâmicas atrás descritas,

tem efetivamente conduzido a uma crescente dificuldade de acesso das famílias a uma habitação adequada e

compatível com os seus orçamentos. No caso português, este desfasamento tem vindo a acentuar-se de

modo significativo desde 2015, mesmo com a melhoria dos rendimentos registada desde então.

Quadro 6

Índice de preços na habitação e rendimento médio disponível das famílias em Portugal (2008-2021)

(ano 2015=100,0)

2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014

Preços habitação 107,5 106,5 107,4 102,1 94,9 93,1 97,0

Rendimento famílias 106,3 105,9 106,9 102,8 99,9 99,0 97,2

2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021

Preços habitação 100,0 107,1 117,0 129,0 141,5 154,3 168,8

Rendimento famílias 100,0 103,8 106,6 110,0 115,0 115,6 128,6

Fonte: Eurostat, Pordata

Do ponto de vista dos preços, sublinhe-se que os recentes aumentos se registam tanto ao nível do

arrendamento como na aquisição. No primeiro caso, e considerando os dados disponíveis, o acréscimo ronda

os 36 % entre 2017 e 2020 (média dos três primeiros trimestres de cada ano, ou seja, mais 1,6 € de renda

mensal por m2), numa variação que é idêntica à registada na venda, no mesmo período, com um aumento a

rondar os 35 % (média dos três primeiros trimestres do ano), que significa mais 316,4 € por m2, na aquisição.

7 Cf. Housing Europe (2021), The state of housing in Europe [https://www.stateofhousing.eu/#p=1].

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Quadro 7

Alojamentos familiares: valor mediano das vendas (últimos 12 meses) e das rendas de novos

contratos de arrendamento (2016-2021)

(€/m2)

2016 2017 2018 2019 2020 2021 (*)

Vendas (€/m2) 848,3 € 905,3 € 974,8 € 1 044,3 € 1 150,5 € 1 221,7 €

Rendas (€/m2) —— 4,4 € 4,8 € 5,3 € 5,6 € 6,0 €

(*) O valor mediano das vendas em 2021 resulta do cálculo da média dos três primeiros trimestres do ano.

Fonte: INE, IP

E se é certo que, no período pós-troika, a taxa de esforço das famílias com o pagamento das rendas

diminuiu face aos anos anteriores, nomeadamente face ao período entre 2012 e 2015 (em que se atingiram

percentagens superiores a 35 %, associadas ao aumento do desemprego e à perda de rendimentos), também

é certo que, tendo havido uma redução da taxa de esforço a partir de 2015, a mesma ainda não estabilizou,

nesta forma de ocupação das habitações, nos valores pré-crise.

Quadro 8

Taxa de esforço no pagamento da renda, a preços de mercado (2008-2020)

(% famílias com encargos superiores a 40 % do rendimento disponível)

2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013

Taxa esforço 23,7% 18,6% 19,3% 17,6% 25,5% 35,8% 35,2%

2014 2015 2016 2017 2018 2019 2020

Taxa esforço 33,8% 35,4% 31,9% 28,2% 25,8% 26,3% 19,7%

Fonte: Eurostat

Como já referido, diferentes fatores ajudam a compreender esta dinâmica de subida dos preços da

habitação, tanto na compra e venda como no arrendamento. Entre eles, destaca-se de facto a crescente

internacionalização do investimento no setor imobiliário português, que amplia e consolida o processo de

financeirização da habitação em Portugal, gerando dinâmicas especulativas. Bem como, por outro lado, a

intensificação do fenómeno turístico, com impactos relevantes na habitação, sobretudo nas grandes cidades, e

nomeadamente na reconversão de uma parte do arrendamento de longa duração em Alojamento Local, no

âmbito de dinâmicas de turistificação e gentrificação urbana.

Aliás, um dos aspetos centrais desta «nova crise de habitação» é precisamente o de a mesma afetar uma

parte da classe média ou de famílias com rendimentos intermédios (Drago, 2021), para lá das carências de

habitação propriamente ditas, num contexto em que o acesso à aquisição de casa própria se converteu numa

solução habitacional inacessível para muitos agregados (e de forma particular para agregados familiares mais

jovens).

3. Oferta pública de alojamento e carências de habitação

A política de apoio ao crédito à aquisição de casa própria, num quadro de financeirização da economia aos

mais diferentes níveis, é concomitante com o desinvestimento crescente do Estado nas políticas de promoção

direta de alojamentos, desinvestimento esse que foi acentuando o peso residual do parque público de

habitação, a rondar em 2015 os 2 % do total de alojamentos.

De facto, das cerca de 112 mil habitações promovidas por organismos públicos entre 1970 e 2019, cerca

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de 61 % foram construídas em apenas 15 anos (entre 1970 e 1984), sendo exíguos os níveis de promoção

registados desde 2010. Concretamente, são cerca de 1700 alojamentos construídos em dez anos, numa

média a rondar os 170 fogos por ano, quando os níveis de promoção pública entre 1970 e 1984 rondavam os

4500 fogos por ano.

Quadro 9

Número de fogos construídos por organismos públicos (1970-2019)

1970/74 1975/79 1980/84 1985/89 1990/94 1995/99

Fogos 18 467 19 387 29 960 10 149 10 156 6 786

% no total 16,5% 17,3% 26,8% 9,1% 9,1% 6,1%

Média anual 3 693 3 877 5 992 2 030 2 031 1 357

2000/04 2005/09 2010/14 2015/19 Total

Fogos 9 320 5 847 1 389 296 111 757

% no total 8,3% 5,2% 1,2% 0,3% 100%

Média anual 1 864 1 169 278 59 2 235

Fonte: INE, IP

A reorientação das políticas habitacionais, ao longo das últimas décadas, no sentido do apoio à aquisição

de casa própria, assenta na aposta de resolução da questão da habitação através do mercado (seja pelos

apoios à procura, diretamente às pessoas, seja pelos incentivos à promoção privada). E esta reorientação

enquadra-se num esvaziamento generalizado dos mecanismos de intervenção pública, que não se esgota na

redução da promoção direta de alojamentos.

De facto, e um pouco por toda a Europa, assistiu-se à tendência, desde os anos oitenta, não só para a

quebra da promoção pública, mas também para lógicas de alienação de habitação social (que acentuou a

perda de relevância do setor público de alojamento no total), bem como ao enfraquecimento de mecanismos

de regulação das rendas, tanto do ponto de vista de uma maior desproteção dos inquilinos como na perspetiva

da supressão de instrumentos públicos de controlo do seu valor (Drago, 2021).8

No caso português, esta reorientação de política habitacional fica inscrita nas mudanças institucionais, ao

nível da própria nomenclatura dos organismos do Estado nesta área da habitação. De facto, o Fundo de

Fomento da Habitação, criado no ano de 1969 e extinto em 1982, desenvolveu uma atividade centrada na

promoção direta para arrendamento social a estratos mais desfavorecidos. Com a sua extinção, parte das

competências de financiamento do Fundo de Fomento da Habitação foram atribuídas ao, então criado, Fundo

de Apoio ao Investimento para a Habitação-FAIH que, por seu turno, seria extinto em 1984, em simultâneo

com a criação do Instituto Nacional de Habitação, IP (INH), este com competências reforçadas de intervenção

financeira no setor da habitação e de concessão de apoios à construção de habitação social por cooperativas,

municípios, Instituições Particulares de Solidariedade Social e privados, em resposta às carências mais

prementes de habitação. As restantes competências do extinto Fundo de Fomento da Habitação, em especial

no domínio da administração do seu parque habitacional, viriam a ser assumidas pelo Instituto de Gestão e

Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE), criado em 1987, que tinha entre as suas

atribuições, como explicita o próprio nome, a alienação de parte do património habitacional existente, num

claro processo de desinvestimento e retração do parque público de habitação.9

Em 2007, no âmbito do PRACE – Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado,

aprovado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 124/2005, de 4 de agosto, o INH seria reestruturado e

redenominado Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana, IP (IHRU, IP), sendo neste integradas as

8 Cf. Drago, Ana (2021), Habitação entre crises: partição das classes médias, políticas de habitação acessível e o impacto da pandemia em Portugal. Cadernos do Observatório, n.º 2. Observatório das Crises e Alternativas. CES, Lisboa [https://www.ces.uc.pt/ficheiros2/files/crisalt/Caderno%2315_Habitacaoentre%20crises_fev2021.pdf]. 9 IHRU (2018), Habitação; cem anos de políticas públicas em Portugal, 1918-2018. [Cf. https://www.portaldahabitacao.pt/opencms/export/sites/portal/pt/portal/100anoshabitacao/af_IHRU_Habitacao_Social.pdf].

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atribuições do IGAPHE, então extinto.

A comparação entre os níveis de promoção habitacional efetuada por organismos públicos e o stock de

fogos propriedade pública, registado nos sucessivos Censos da População e da Habitação, permite

estabelecer uma aproximação ao contributo da alienação de alojamentos sociais na reduzida expressão do

atual parque público de habitação.

Quadro 10

Evolução do número de fogos construídos por organismos públicos e dos fogos propriedade de

organismos públicos contabilizados nos Censos (1981-2011)

1981 1991 2001 2011

n.º % no total

n.º % no total

n.º % no total n.º % no total

Fogos existentes (Censos)

121 564 4,4% 134 273 4,4% 114 293 3,2% 123 158 3,1%

Fogos existentes (em 1981) e construídos

121 564 4,4% 155 577 5,1% 171 605 4,8% 183 558 4,6%

Diferença entre fogos existentes e

construídos 0 -21 304 -57 312 -60 400

Fonte: INE, IP

Nestes termos, e considerando o período entre 1981 e 2011, observa-se que a diferença entre os dois

indicadores se acentua ao longo do tempo, traduzindo uma perda potencial de cerca de 60 mil fogos. O que

significa que, se esta parcela da promoção pública direta não tivesse sido alienada (e tivesse sido

devidamente conservada e disponibilizada), teríamos hoje um parque habitacional público composto por cerca

de 180 mil fogos (e não 120 mil), que faria com que o peso relativo desse mesmo parque público rondasse já

os cerca de 4,6 % do total.

Por outro lado, do ponto de vista das carências de habitação mais recentes, nomeadamente as que se

relacionam com a necessidade de realojamento de população residente em barracas e outras edificações

precárias, o levantamento efetuado pelo IHRU, IP, em 2018, identificou cerca de 26 mil situações, 74 % das

quais localizadas nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

Quadro 11

Levantamento IHRU, IP: núcleos, edifícios, fogos e famílias a realojar (2018)

Núcleos Edifícios Fogos Famílias a realojar

N.º %

Áreas Metropolitanas 1 937 8 975 24 943 19 050 73,9%

Lisboa 472 5 987 16 284 13 828 53,7%

Porto 1 465 2 988 8 659 5 222 20,3%

Outras regiões 964 5 773 6 583 6 712 26,1%

Total 2 901 14 748 31 526 25 762 100%

Fonte: IHRU, IP

Em suma, perante a incapacidade de o mercado, por si só, dar resposta às necessidades de habitação, a

par da prevalência das políticas que apostam na procura, nomeadamente através dos apoios à aquisição de

casa própria, num contexto de crescente financeirização e internacionalização do investimento imobiliário, é

preciso repensar o papel do Estado, nomeadamente recuperando mecanismos de intervenção direta, de modo

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a encontrar respostas capazes de suprir não só as carências mais pronunciadas, mas também os problemas

de acesso, para agregados com rendimentos intermédios, a um alojamento digno e acessível. O que passa,

necessariamente, por medidas de reforço e diversificação, nas modalidades de oferta, do parque habitacional

público português. Um parque habitacional público robusto, não condicionado pelas lógicas de mercado, é o

que nos garante universalidade no acesso, garantia de equidade e não discriminação e capacidade de a todo

o tempo responder às mudanças sociais e acontecimentos imprevistos.

4. A qualidade da habitação a promover no âmbito do Programa Nacional de Habitação

O desígnio do aumento da oferta habitacional, essencialmente com o reforço do parque habitacional

público, não pode ficar desfasado do desígnio da qualidade e sustentabilidade da resposta habitacional.

Para isso, é importante a manutenção e o reforço de programas que contrariem os atuais índices de

pobreza energética, seja por via da reabilitação do património habitacional existente (público e privado), seja

por via da criação de novas respostas ambientalmente sustentáveis. Com efeito, Portugal é hoje um dos

países com maior percentagem de famílias em situação de pobreza energética, conforme quadro infra.

Quadro 12

Percentagem de famílias com dificuldade de aquecer a habitação (2020)

(Total e com rendimentos abaixo e acima de 60 % da mediana do rendimento equivalente)

Total < 60% > 60% Total < 60% > 60%

Alemanha 7,0 16,0 5,3 Hungria 4,2 14,9 2,7

Áustria 1,5 4,2 1,0 Irlanda 3,3 6,1 2,9

Bélgica 4,1 12,6 2,7 Itália 8,3 17,2 6,1

Bulgária 27,5 49,2 20,7 Letónia 6,0 13,2 4,0

Chipre 20,9 41,6 17,5 Lituânia 23,1 33,6 20,4

Croácia 5,7 17,5 3,1 Luxemburgo 3,6 5,8 3,2

Dinamarca 3,0 10,9 1,9 Malta 7,2 14,9 5,6

Eslováquia 5,7 19,2 4,0 P. Baixos 2,4 8,8 1,5

Eslovénia 2,8 9,8 1,9 Polónia 3,2 8,9 2,2

Espanha 10,9 22,3 7,9 Portugal 17,5 33,8 14,3

Estónia 2,7 5,5 2,0 R. Checa 2,2 6,8 1,8

Finlândia 1,8 2,6 1,7 Roménia 10,0 23,4 5,9

França 6,5 15,8 5,0 Suécia 2,7 6,9 1,9

Grécia 17,1 39,2 12,4 UE27 7,4 17,8 5,4

Fonte: Eurostat

Temos de ser capazes de tornar as áreas urbanas residenciais mais eficientes no uso da energia,

contribuindo ao mesmo tempo para a proteção do ambiente e para a mitigação de emissões de gases com

efeito de estufa e, consequentemente, para a redução dos consumos e da fatura paga pelos consumidores.

Depois do Programa Casa Eficiente 2020, estão hoje em curso novos instrumentos públicos para a

promoção de eficiência energética nas habitações privadas, nomeadamente o Programa de Apoio Edifícios +

Sustentáveis, do Fundo Ambiental (FA) e o Programa Vale Eficiência, que pretende chegar a cerca de 100 000

famílias economicamente vulneráveis, garantindo o conforto térmico das respetivas habitações.

Em complemento, no Programa 1.º Direito está também previsto o princípio da sustentabilidade ambiental,

na promoção das intervenções de reabilitação e construção, aplicável também aos proprietários residentes,

com carência económica, para melhoria das condições de habitabilidade e de combate à pobreza energética.

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No que respeita à habitação pública, para além dos instrumentos a aplicar nas respetivas intervenções no

edificado (Plano Nacional Energia e Clima 2021-2030; Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos

Edifícios; Estratégia Nacional de Longo Prazo de Combate à Pobreza Energética 2021-2050), no âmbito do

Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), o investimento em construção nova implica, regra geral, o

cumprimento de rigorosos critérios de eficiência energética. Assim, a promoção de construção nova deve

proporcionar um patamar de necessidades de energia, no mínimo, 20 % mais exigente que os requisitos NZEB

(Nearly Zero Energy Building), no que respeita ao consumo de energia primária.

À qualidade da habitação subjaz também a necessidade de garantir soluções arquitetónicas com

qualidade. A degradação progressiva das cidades, e o crescente abandono de património disperso pelo país,

torna imprescindível o desenvolvimento de processos de reabilitação urbana integrada, capazes de devolver

esse património à cidade, mas também à população.

A prioridade dada à reabilitação urbana na reforma estrutural em curso deve, pois, ser complementada com

a manutenção de instrumentos que permitam mais e melhores intervenções no edificado, público e privado,

não desassociando, ao mesmo tempo, essa intervenção da promoção do interesse público e da necessidade

de novas respostas habitacionais.

Assim, é fundamental diversificar soluções e disseminar boas práticas, nomeadamente em termos de

integração socio-espacial das intervenções e valorização do «habitat», requalificando e revitalizando as

nossas cidades.

II. Objetivos gerais do programa nacional de habitação

Como já referido, sendo um domínio integrante do Estado social, desde logo do ponto de vista

Constitucional, a habitação foi persistentemente negligenciada no quadro das políticas sociais em Portugal.

Dada a ausência de respostas públicas claras e substantivas, e a incapacidade de provisão acessível pelo

mercado, as carências habitacionais em Portugal, sentidas quer pelas famílias de rendimentos mais baixos,

quer pelas famílias de rendimentos intermédios, foram-se acumulando ao longo de décadas e agudizaram-se

sempre em momentos de crise, como sucedeu com a crise financeira internacional ou, mais recentemente,

com a pandemia COVID-19. Por isso, é hoje inegável não só a urgência em colmatar as carências que

persistem, mas também de assegurar, de modo efetivo, o acesso universal a uma habitação a preços

acessíveis, assim cumprindo um direito fundamental como é o Direito à Habitação.

Para inverter a situação a que se chegou, resultante de défices e carências estruturais, ampliadas e

agravadas pelas situações de crise, o nosso país dispõe hoje – graças à prioridade política que foi finalmente

dada ao setor da habitação – de dois instrumentos centrais que balizam a atuação do Estado nesta área:

1. Nova Geração de Políticas de Habitação

2. Lei de Bases da Habitação

É nestes dois instrumentos que está definido o sentido estratégico, os objetivos e os meios de atuação,

bem como as bases do direito à habitação e as incumbências fundamentais do Estado na efetiva garantia

deste direito a todos os cidadãos. E são também estes os instrumentos em que assenta o presente PNH e os

objetivos e metas nele inscritos.

Um maior investimento na salvaguarda do direito à habitação implica priorizar o reforço do parque

habitacional público existente e a criação de novas respostas, que garantam de forma efetiva o acesso

universal a uma habitação adequada. É essencial que se encare a questão do acesso à habitação como um

direito de todos, o que implica criar e desenvolver respostas públicas às necessidades existentes. Esta

priorização deve ser compatibilizada com um conjunto de instrumentos que permitam, complementarmente,

incentivar o setor privado a redirigir parte da sua operação para o arrendamento acessível e redinamizar o

setor cooperativo e colaborativo, tão importante nas últimas décadas na criação de respostas acessíveis de

habitação.

Contudo, os múltiplos desafios que hoje se colocam às políticas de habitação carecem não só de um

efetivo serviço público de habitação que responda aos défices estruturais do setor em Portugal mas também

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da capacidade para enfrentar os desafios de natureza mais conjuntural, com vista essencialmente a:

• Superar de modo extensivo as situações mais prementes de carência habitacional, designadamente às

situações de habitação indigna;

• Reforçar o volume de oferta de habitação a preços acessíveis, nomeadamente para agregados

familiares com rendimentos intermédios, designadamente incentivando a recuperação e recolocação de

imóveis devolutos no mercado habitacional de imóveis devolutos, mediante uma avaliação custo-benefício;

• Garantir a existência de uma rede de respostas, com cobertura nacional, a situações de emergência e

de transição, tendo em vista públicos muito diversos e em situação de particular vulnerabilidade;

• Revitalizar e reforçar o mercado de arrendamento, a preços compatíveis com os rendimentos das

famílias, melhorando as condições de investimento e acesso e reequilibrando, deste modo, o peso relativo do

arrendamento, enquanto modalidade de ocupação;

• Adotar medidas que contribuam, a par do reforço da promoção pública direta de alojamentos, para um

papel mais ativo do mercado privado na adequação da resposta habitacional às necessidades das famílias, no

quadro de uma regulação do mercado mais robusta e condicente com a necessária resposta às práticas

especulativas existentes, reconhecendo e assumindo a função social da habitação;

• Promover medidas de política habitacional e de política urbanística integradas, que contrariem lógicas

de segregação socio-espacial, de gentrificação, de despovoamento dos centros urbanos e periferização

habitacional. Assegurando, ao mesmo tempo, e numa lógica de intervenção transversal, o devido

acompanhamento social dos processos de acolhimento e inclusão.

O debate sobre o caminho a fazer para vencer estes desafios e resolver os problemas estruturais da

habitação parece hoje estar assente num consenso razoável quanto às metas a alcançar e que, no seu

conjunto, contribuirão para melhorar o acesso à habitação e regular o funcionamento do mercado.

Os défices estruturais da habitação em Portugal, a par dos desafios de natureza conjuntural, que marcam a

atual crise de habitação no nosso país, exigem de facto um papel ativo e relevante por parte do Estado, não só

enquanto agente de políticas públicas de promoção direta, mas também enquanto regulador do mercado,

tendo em vista um processo, de tempo longo, de crescente desmercadorização da habitação, à semelhança

do que se passou, no pós-25 de Abril, nos domínios da saúde e da educação.

Este propósito e estas linhas orientadoras não nos devem, contudo, demover de reagir a situações mais

imediatas e tendentes a mitigar efeitos decorrentes de momentos conjunturais inesperados. No mesmo sentido

da capacidade de reação e adaptação apresentada perante as particulares consequências do período

pandémico, é importante também, quanto ao momento atual, executar um conjunto de medidas, já em curso, e

que visam responder a situações mais imediatas, resultantes da inflação e do consequente impacto nas taxas

de juro, intervindo, nos limites impostos ao aumento automático das rendas, mitigando o impacto, nos créditos

à habitação, do aumento das taxas de juro e criando um regime de revisão extraordinária de preços nas

empreitadas públicas, considerando esses aumentos das matérias-primas nos investimentos públicos em

curso.

III. Entidades competentes para o acompanhamento e a concretização das medidas inscritas no

Programa Nacional de Habitação

1. Acompanhamento do Programa Nacional de Habitação

O IHRU, IP, é a entidade pública promotora que, direta ou indiretamente, garantirá a concretização do PNH

e da política nacional de habitação, tendo por isso um papel fundamental no desenvolvimento da NGPH e

respetivos instrumentos, e no acompanhamento da Lei de Bases de Habitação.

Para melhor poder desempenhar este papel, o IHRU, IP, foi objeto de um reforço significativo de

competências, associado a um conjunto de medidas com vista à salvaguarda da sua efetiva atuação.

Os objetivos de política pública dos próximos anos dependem desta valorização do trabalho do IHRU, IP, e

dos seus trabalhadores, por forma a garantir a sua presença em todo o território.

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Assim, procedeu-se, em primeiro lugar, à alteração da lei orgânica do IHRU, IP, através do Decreto-Lei n.º

81/2020, de 2 de outubro, com vista à definição do IHRU, IP, enquanto entidade pública promotora da política

nacional de habitação e ao alargamento das suas competências (criação do Observatório da Habitação, do

Arrendamento e da Reabilitação Urbana (OHARU) e respetivas competências, bem como reforço do papel do

IHRU, IP, no acompanhamento e fiscalização do setor da habitação e do mercado de arrendamento

habitacional, na decorrência do Decreto-Lei n.º 82/2020, de 2 de outubro, na realização do inventário do

património imobiliário público com aptidão para uso habitacional e na gestão de uma bolsa de imóveis públicos

destinados a habitação).

Em complemento, a organização interna do IHRU, IP, teve também de ser reorientada e reforçada no

mesmo sentido, tendo a Portaria n.º 114-A/2021, de 27 de maio, determinado uma reorganização interna, mas

também o acréscimo de 8 unidades de 1.º e 2.º Nível (são agora 9 Unidades de 1.º Nível e 21 Unidades de 2.º

Nível) e a criação de 8 unidades de 3.º Nível que permitem uma maior distribuição geográfica do IHRU, IP, no

território.

Finalmente, e com vista a compatibilizar as novas competências e organização interna com o mapa de

pessoal, está em curso um processo de recrutamento, com vista a garantir a concretização das novas

competências do IHRU, IP, salvaguardando o preenchimento do mapa de pessoal (tendo em conta, entre

outros aspetos, as previsíveis saídas em função da idade média dos trabalhadores), a par com o recrutamento

excecional ao abrigo do PRR.

2. Concretização das principais medidas e programas do Programa Nacional de Habitação

Os programas e medidas em desenvolvimento e a desenvolver no âmbito do PNH assentam,

maioritariamente, numa estreita articulação entre o Governo, através do IHRU, IP, e os municípios, principais

interlocutores de proximidade junto da população.

Com efeito, os municípios, desde 2018, viram alargadas as suas competências na área da habitação, com

a previsão de transferência de competências efetuada através da Lei n.º 50/2018, de 16 de agosto, e

regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 105/2018, de 29 de novembro.

É nessa estreita articulação que, no âmbito do PNH, serão implementadas as principais medidas e

programas, mormente nos eixos de intervenção referentes à reforma estrutural em curso, quer na definição

das necessidades, quer na concretização prática dessas políticas.

Isto, sem prescindir do envolvimento de outras entidades, identificadas na tabela seguinte, que garantam

uma maior complementaridade de respostas habitacionais, maior escala, e, sobretudo, maior estabilidade e

justiça no acesso ao direito à habitação.

Uma nota final para as Regiões Autónomas e os seus órgãos próprios, nomeadamente aqueles que têm

competências na área da habitação, e que são parte integrante da generalidade dos instrumentos do PNH,

mas que, mais do que isso, são parte complementar no esforço de concretização da política pública de

habitação, através de programas específicos para os seus territórios. Esta complementaridade é evidente

nomeadamente com o investimento no PRR, com a promoção de duas medidas autónomas para o «reforço da

oferta de habitação apoiada na Região Autónoma da Madeira» e para «aumentar as condições habitacionais

do parque habitacional da Região Autónoma dos Açores».

Entidades promotoras das medidas inscritas no Programa Nacional de Habitação

Entidade Medidas

IHRU, IP (direta ou indiretamente) 1_2_3_4_5_6_13_14_15_16_17_21

Outras entidades da Administração Central 1_3_22

Autarquias Locais e entidades intermunicipais 1_2_5_6_9_10_14_17_18_19

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Entidade Medidas

Fundiestamo, SGOIC, S.A. 2

Entidades do Terceiro setor 1_2_5_9_10_18_20

Promoção (arrendamento) privado 7_8_9_10_11_12_18

(*) Nota: de acordo com a numeração do ponto V do Anexo

IV. Linhas estratégicas do Programa Nacional de Habitação

O PNH estabelece os objetivos, prioridades, programas e medidas da política nacional de habitação num

prazo plurianual, com referência ao enquadramento legislativo e orçamental.

Para a sua concretização, é importante ter em consideração o objetivo traçado em 2018 e corporizado na

Resolução do Conselho de Ministro n.º 50-A/2018, de 2 de maio, bem como os instrumentos legislativos

entretanto criados e que se encontram em vigor e em execução.

A promoção de políticas públicas de habitação não deve ser estática, antes assumindo a necessidade de

criar respostas que se adaptem às necessidades sentidas em cada momento pela população, e a uma escala

nacional, com o objetivo último de:

• Garantir que todos têm acesso a uma habitação digna e adequada aos rendimentos e à dimensão dos

diferentes agregados familiares;

• Garantir que, a médio prazo, o peso da resposta pública no mercado habitacional é capaz de dar resposta

às necessidades existentes e contribuir para a regulação do mercado no seu todo, equilibrando a oferta

e tornando a habitação mais acessível.

O reforço do papel do Estado, na promoção direta de respostas habitacionais, é fundamental para inverter

um paradigma de resposta pública fundamentalmente centrado no mercado privado e que foi incapaz de

assegurar a provisão e acesso à habitação para todos. Tal como é essencial para garantir uma aposta robusta

na reabilitação urbana.

Esta necessidade de robustecer o parque habitacional público não invalida nem substitui, mas antes

complementa, um mercado privado saudável, sendo fulcral adotar mecanismos de articulação com o mesmo,

seja através de instrumentos que incentivam a deslocação da oferta existente para as políticas de

arrendamento acessível, seja através de instrumentos orientados para a criação de um mercado de

arrendamento estável e acessível, seja mantendo e reforçando instrumentos já existentes neste âmbito, como

o Porta 65, o PAA, a certificação de Habitação a Custos Controlados ou os benefícios fiscais aos contratos de

longa duração.

De facto, a resolução da crise de habitação, que passa estruturalmente pelo reforço do parque habitacional

público, contribuindo para uma maior regulação da oferta, não dispensa a adoção de medidas e incentivos de

curto e médio prazo, como os referidos, por forma a encontrar respostas mais céleres para as atuais

dificuldades de acesso de muitas famílias, e jovens, a uma habitação a preços compatíveis com os seus

rendimentos.

É por isso fundamental, na definição dos eixos de intervenção e das medidas a promover neste quinquénio,

que sejam consideradas, no essencial, duas linhas estratégicas de atuação, assentes em dois momentos

temporalmente distintos:

• A concretização de uma reforma estrutural e perene, que mobiliza essencialmente o património devoluto,

para reforçar o parque habitacional público;

• A concretização de uma resposta conjuntural e mais imediata, que mobiliza essencialmente o património

habitacional existente para promoção de rendas a custos compatíveis com os rendimentos das famílias.

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1. Da reforma estrutural

Este objetivo estratégico, assente, essencialmente, na promoção de novas respostas de habitação pública

e na qualidade das respostas já existentes, com a mobilização do património devoluto do Estado com aptidão

habitacional, concretiza a visão da Habitação como pilar integrante e efetivo do Estado social que determina a

continuação e aprofundamento da reforma estrutural em curso, que se traduz no modo como construímos as

políticas públicas, e, neste caso, a política pública de habitação.

Nestes termos, a prioridade na mitigação progressiva dos défices estruturais e na criação de um efetivo

serviço público de habitação passa necessariamente pelo incremento do parque habitacional público, seja

para a garantia de respostas de emergência, seja para a garantia de um stock de alojamento estável e a

preços acessíveis, capaz de dar resposta a todos os que dele necessitam e que não o encontram no mercado.

É por isso importante criar uma resposta pública suficientemente abrangente e capaz de, tal como se fez

na saúde, na educação e na segurança social, dar uma resposta universal às necessidades.

O Governo desenvolve atualmente uma política de habitação transversal, que privilegia a reabilitação e o

arrendamento, num quadro de clara aposta no reforço do parque habitacional público, acessível a todos os

que dele precisam.

Para alcançar este objetivo primordial, de reforço, diversificação e qualificação, da oferta pública de

habitação, concorrem essencialmente quatro medidas de intervenção, suportadas por um assinalável volume

de investimento público, o qual integra e articula dotações do Orçamento do Estado e fundos comunitários,

como são o Programa 1.º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação, a Bolsa de imóveis do Estado

para habitação, a Bolsa Nacional de Alojamento Urgente e Temporário e o Parque Habitacional Público já na

esfera do IHRU, IP.

2. Da resposta conjuntural

Como referido supra, em paralelo com as políticas de reforço do parque habitacional público, que constitui

uma efetiva reforma estrutural e plurianual (não subsumível a uma legislatura) e que assenta nesta visão

universal de acesso à habitação, é fundamental salvaguardar medidas conjunturais que permitam respostas

mais imediatas para intervir no mercado de arrendamento e garantir que todos têm acesso a uma habitação

digna e adequada aos rendimentos e à dimensão dos diferentes agregados familiares.

A dimensão e urgência de atuação neste domínio deve por isso ser capaz de conciliar uma visão estrutural

das políticas da habitação com o desenho de um conjunto de instrumentos que convoque todos os atores

desta área, para este desígnio nacional, incentivando a cooperação e articulação entre o setor público e o

setor social, cooperativo e privado e a sociedade em geral.

Para o efeito, e para lá da prossecução e melhoria dos instrumentos já existentes, há um conjunto de

medidas e ações a concretizar no curto e médio prazo, orientadas para aumentar a oferta de arrendamento a

preços compatíveis com o rendimento das famílias. Neste sentido, trata-se essencialmente de trabalhar em

dois planos. Por um lado, procurando colocar no mercado de arrendamento muitos dos fogos atualmente

devolutos e, na medida do possível, habitações de residência secundária. Por outro, criando incentivos para

que a promoção habitacional privada adira de forma mais significativa a soluções de arrendamento acessível.

Assim, e na senda do trabalho já em curso com os representantes dos vários setores envolvidos, seja no

movimento colaborativo e cooperativo, seja na promoção imobiliária, é importante continuarmos a trabalhar em

prol de uma melhor articulação entre os objetivos do setor e as prioridades do governo em matéria de acesso

à habitação.

A estas duas linhas estratégicas, devemos ainda juntar:

• A criação de novas respostas a preços acessíveis e compatíveis com os rendimentos das famílias, no

mercado habitacional privado e cooperativo, a par com as já existentes;

• A garantia de programas e investimentos públicos que permitam aos proprietários a garantia de condições

dignas e adequadas de habitabilidade;

• A sedimentação de medidas que protejam e regulem o mercado de arrendamento;

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• A promoção da reabilitação, enquanto veículo de regeneração urbana e promoção da pluralidade do

tecido social;

• A garantia de soluções habitacionais sustentáveis e de qualidade.

V. Eixos e medidas – Desenvolvimento das linhas estratégicas

Os eixos de intervenção previstos no PNH assentam essencialmente no cumprimento das linhas

estratégicas, priorizando a intervenção pública direta, mas sem descurar o papel do mercado privado e

cooperativo na promoção de respostas adequadas de habitação.

As medidas a promover neste quinquénio, corporizam-se assim em seis eixos de intervenção:

• Reforçar e qualificar o parque habitacional público enquanto resposta permanente;

• Garantir respostas de emergência;

• Incentivar a oferta privada e do terceiro setor de arrendamento a custos acessíveis;

• Reforçar a estabilidade e confiança no mercado habitacional;

• Qualificar os espaços residenciais e promover uma maior coesão territorial;

• Promover a sustentabilidade e inovação das soluções habitacionais.

Eixo 1 – Reforçar e qualificar o parque habitacional público, enquanto resposta permanente

Medida 1 Programa 1.º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação

Medida 2 Criação de uma bolsa de imóveis do Estado para habitação

Medida 3 Execução do plano de reabilitação do parque habitacional público

Medida 4 Processo aquisitivo de imóveis

Eixo 2 – Garantir respostas de emergência para situações de risco e emergência social

Medida 5 Bolsa Nacional de Alojamento Urgente e Temporário – BNAUT

Medida 6 Programa Porta de Entrada

Eixo 3 – Incentivar a oferta privada de arrendamento a custos acessíveis

Medida 7 Programa de Apoio ao Arrendamento (PAA)

Medida 8 Programa Porta 65 – Jovem

Medida 9 Reabilitar para arrendar – Habitação Acessível

Medida 10 Habitação a custos controlados

Eixo 4 – Reforçar a estabilidade e confiança no mercado habitacional

Medida 11 Promoção de contratos de longa duração

Medida 12 Direito Real de Habitação Duradoura

Medida 13 Proteção dos Arrendatários

Medida 14 Fiscalização do arrendamento

Medida 15 Estudo dos modelos internacionais de regulação do mercado de habitação

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Eixo 5 – Qualificar os espaços residenciais e promover uma maior coesão territorial

Medida 16 Da Habitação ao Habitat

Medida 17 Programas de mobilidade habitacional

Medida 18 IFRRU 2030 – Instrumento Financeiro para a Reabilitação e Revitalização Urbanas

Medida 19 Acompanhamento do regular funcionamento dos instrumentos de política habitacional junto dos municípios

Eixo 6 – Promover a sustentabilidade e inovação das soluções habitacionais

Medida 20 Promoção de novos modelos de habitação cooperativa e colaborativa

Medida 21 Inovação e sustentabilidade – Projeto-piloto de habitação pública

Medida 22 Codificação das normas técnicas de construção

VI. Objetivos e metas

Medidas Objetivos

Medida 1 (Programa 1.º Direito – Programa de Apoio ao Acesso à Habitação)

Objetivo: Garantia de acesso a uma habitação condigna às pessoas que não dispõem de capacidade financeira para aceder através do mercado. Metas até 2026:

• Obter a aprovação das Estratégias Locais de Habitação (ELH) por todos os municípios;

• Concretizar 26 000 soluções habitacionais ao abrigo do PRR, sem prejuízo da continuidade do investimento via Orçamento do Estado nos termos calendarizados nas ELH e nos correspondentes Acordos assinados com as entidades beneficiárias;

• Garantir a articulação dos municípios com entidades públicas com património habitacional que deva enquadrar-se no âmbito das respetivas ELH;

• Avaliar a aplicação do regime e acompanhar eventuais alterações que se mostrem necessárias à prossecução dos objetivos calendarizados pelos municípios.

Medida 2 (Criação de uma bolsa de imóveis do Estado

para habitação)

Objetivo: Mobilização do património público para programas habitacionais destinados ao arrendamento acessível. Metas até 2026:

• Concretizar 6 800 soluções habitacionais, ao abrigo do PRR;

• Avaliar os imóveis inventariados, identificando os que têm aptidão habitacional e calendarizando a respetiva intervenção;

• Iniciar a promoção de projetos habitacionais que, pela sua dimensão, vão para além de 2026, e projetos habitacionais que decorram da inventariação em curso ou da articulação com os municípios;

• Definir novas fontes de financiamento para a intervenção no património com aptidão habitacional que venha a integrar a Bolsa de Imóveis criada para o efeito.

Medida 3 (Execução do plano de reabilitação do parque habitacional público.)

Objetivo: Melhoria das condições de habitabilidade e reforço das relações entre senhorio e inquilinos e com associações de moradores. Metas até 2026:

• Reabilitar os fogos em más condições no parque habitacional público do IHRU, IP, incluindo nos lotes com propriedade mista;

• Reforçar as relações com as associações de moradores, mediante a celebração de protocolos de colaboração;

• Melhorar o sistema de atendimento e resposta aos moradores;

• Concretizar as oito equipas de gestão local para uma gestão de maior proximidade.

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Medidas Objetivos

Medida 4 (Processo aquisitivo de

imóveis)

Objetivo: Aquisição, pelo IHRU, IP, de imóveis prontos a habitar. Metas até 2026:

• Reforçar a curto prazo o parque habitacional público com imóveis prontos a habitar, fruto de procedimentos aquisitivos através do exercício do direito de preferência ou através de procedimentos de aquisição diretamente no mercado privado;

• Identificação, no âmbito do Relatório Anual da Habitação a apresentar no primeiro semestre de 2023, dos territórios com falta ou desadequação da oferta, nos termos previstos no artigo 2.º-A do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto, na sua redação atual, complementar à identificação das zonas de pressão urbanística por parte dos municípios;

• Promover a transição de imóveis atualmente afetos ao Alojamento Local para resposta habitacional a trabalhadores deslocados em setores públicos fundamentais, nomeadamente professores, médicos e enfermeiros.

Medida 5 (Bolsa Nacional de

Alojamento Urgente e Temporário – BNAUT)

Objetivo: Efetivação de uma bolsa de alojamentos para responder a situações de emergência e transição de pessoas em situação de risco. Metas até 2026:

• Avaliar a sua concretização no terreno, nomeadamente no que respeita à resposta social de transição que se pretende alcançar;

• Promover 2 000 alojamentos, ao abrigo do PRR;

• Inventariar as respostas já existentes, para inclusão na Bolsa.

Medida 6 (Porta de Entrada)

Objetivo: Dar resposta a necessidades de alojamento urgente, em resultado de acontecimento imprevisível ou excecional. Metas até 2026:

• A concretização dos protocolos existentes;

• A garantia de resposta às especificidades de cada situação, nomeadamente sempre que as mesmas decorram de fluxos migratórios inesperados;

• A revisão da relação entre o IHRU, IP (enquanto entidade financiadora), os municípios (enquanto entidades que acionam as respostas), as famílias (enquanto beneficiárias do apoio) e os promotores (enquanto entidades que contratualizam as soluções de arrendamento ou alojamento).

Medida 7 (PAA)

Objetivo: Atribuição de benefícios fiscais ao arrendamento privado promovido a preços compatíveis com os rendimentos das famílias. Metas até 2023:

• A adaptação do regime fiscal aos organismos de investimento coletivo que invistam em PAA;

• O alargamento das situações excecionais de duração do contrato, aplicando-se nomeadamente aos profissionais deslocados com vínculos inferiores a 5 anos;

• A simplificação do modelo de verificação das candidaturas, reforçando o automatismo da plataforma.

Medida 8 (Programa Porta 65 –

Jovem)

Objetivo: Apoio financeiro (subvenção mensal de parte da renda) ao arrendamento, para jovens até aos 35 anos. Metas até 2026:

• Concretizar a autorização legislativa, prevista no Orçamento do Estado para 2022, garantindo a sua cumulação e articulação, no que respeita aos tetos, com o PAA;

• Duplicar, até final de 2026, o número de jovens apoiados pelo Programa, em comparação com o ano de 2021 (sendo expetável que a partir daí esse equilíbrio já se possa fazer por via da oferta pública de habitação).

Medida 9 (Reabilitar para Arrendar – Habitação Acessível)

Objetivo: Promover investimento em reabilitação de edifícios com mais de 30 anos para arrendamento habitacional. Metas até 2026:

• Dar continuidade ao programa, através da negociação de uma nova linha de financiamento, em condições favoráveis face às de mercado;

• Adaptação da nova linha às operações promovidas pelas administrações de condomínio;

• Garantir que a nova linha pressupõe um prazo de amortização mais compatível com o retorno das operações e uma taxa de juro competitiva, tornando-o mais compatível com o custo do financiamento de construção nova ou de reabilitações profundas;

• Promover a nova linha junto dos putativos beneficiários.

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Medidas Objetivos

Medida 10 (Habitação a Custos

Controlados)

Objetivo: Aplicação de apoios estatais para a criação de oferta de habitações para venda a custos controlados ou para arrendamento acessível. Metas até 2026:

• Mobilizar os setores social, cooperativo e privado para novos projetos com base nestes requisitos;

• Continuar a trabalhar com o setor na concretização do regime, com vista ao reforço da promoção de Built To Rent em Portugal.

Medida 11 (Promoção de contratos

de longa duração)

Objetivo: Aplicação de taxas autónomas diferenciadas para os contratos de arrendamento habitacional em função da sua duração. Metas até 2026:

• Adaptação da atual duração dos contratos, de acordo com o NRAU;

• Reforço dos incentivos aos contratos mais estáveis.

Medida 12 (Direito Real de

Habitação Duradoura)

Objetivo: Garantia de uma resposta habitacional estável e duradoura, através da aquisição de um direito real vitalício de residência permanente. Metas até 2026:

• A promoção ativa do Programa, perante o setor e as famílias;

• A garantia de dados estatísticos mais sólidos, através da alteração do registo predial, para melhor monitorização deste instrumento pelo OHARU;

• A avaliação da sua aplicação, a promover pelo OHARU.

Medida 13 (Proteção dos Arrendatários)

Objetivo: Garantir a proteção efetiva dos arrendatários, sem prejuízo da garantia do regular e saudável funcionamento do mercado. Metas até 2026:

• Concretizar a norma prevista no Orçamento do Estado para 2022 para os contratos anteriores a 1990, salvaguardando uma solução definitiva que garanta a proteção do arrendamento e o equilíbrio da relação contratual, nomeadamente com:

– A análise, através do OHARU, dos dados definitivos disponibilizados dos Censos 2021, em

articulação com os dados já existentes da Autoridade Tributária e Aduaneira, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 64.º da Lei Geral Tributária (LGT), para identificar o número de agregados abrangidos pelo regime de proteção;

– A promoção de medidas necessárias para o regular funcionamento do mercado de arrendamento urbano;

– A concretização do subsídio de renda, previsto no Decreto-Lei n.º 156/2015, de 10 de agosto, com as alterações que venham a considerar-se necessárias;

• Estudar a abrangência deste subsídio, nomeadamente no que respeita a famílias com quebras extraordinárias de rendimentos, encontrando, neste âmbito, mecanismos de proteção legal das partes face às bolsas de informalidade no mercado habitacional.

Medida 14 (Fiscalização do arrendamento)

Objetivo: Concretização dos novos instrumentos de fiscalização e, consequentemente, com vista à promoção de uma maior proteção do arrendamento urbano. Metas até 2026:

• Garantir a articulação entre a Autoridade Tributária e Aduaneira e o IHRU, IP, no combate à informalidade, nos termos da alínea b) do n.º 2 do artigo 64.º da LGT, podendo ser solicitada a colaboração do INE, IP, no âmbito das respetivas atribuições;

• Promover, através do OHARU, um relatório que analise o atual mercado de arrendamento, promovendo as recomendações necessárias à concretização das atuais funções de fiscalização das entidades públicas;

• Concretizar as ações necessárias ao regular funcionamento do mercado, garantindo, com isso, a salubridade dos locados e ainda a proteção das partes através dos instrumentos criados e melhor identificados no PNH.

Medida 15 (Estudo dos modelos

internacionais de regulação de mercado)

Objetivo: Análise de práticas internacionais em matéria de regulação de mercado, e dos respetivos resultados no mercado habitacional. Metas até 2026:

• Avaliação independente das várias medidas em curso e os resultados das mesmas no território;

• Promoção das medidas que venham a mostrar-se necessárias em função desse estudo.

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Medidas Objetivos

Medida 16

(Da Habitação ao

Habitat)

Objetivo: Promover a coesão e integração socioterritorial dos bairros públicos de arrendamento e dos

respetivos agregados familiares.

Metas até 2023:

• Dar continuidade ao Programa no terreno até final de 2022;

• Implementar as soluções no terreno e apresentar um relatório que consubstanciará um guia de boas práticas para a execução de programas em curso (Programa Bairros Saudáveis e Investimento RE-C03-i06 do PRR, que prevê a promoção de operações integradas em comunidades desfavorecidas nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto), bem como para a sua aplicação prática no património público gerido pelo IHRU, IP, e pelas autarquias locais.

Medida 17

(Programas de

mobilidade habitacional)

Objetivo: Identificação das necessidades territoriais e melhoria dos instrumentos para promover a

fixação e atração para os territórios do interior.

Metas até 2026:

• Promover programas de mobilidade habitacional, compatibilizando o programa Chave na Mão com os programas específicos para promover a mobilidade para o interior;

• Concretizar os projetos-piloto definidos no âmbito do Grupo de trabalho «Habitar no interior»;

Concretizar os projetos identificados como «Pinhal Interior Habita» e «Pinhal Interior Reabilita», no

âmbito da Resolução do Conselho de Ministros n.º 131-A/2021, de 10 de setembro, que aprova os

projetos transformadores das economias locais para a revitalização da região do Pinhal Interior.

Medida 18

(IFRRU 2030 –

Instrumento Financeiro

para a Reabilitação e

Revitalização Urbanas)

Objetivo: Promoção de reabilitação e revitalização urbanas, em particular a reabilitação de edifícios, e

garantia de eficiência energética.

Metas até 2026:

• Concretizar os projetos ainda em curso, no âmbito do atual instrumento;

• Aprovar o novo instrumento financeiro «IFRRU 2030», com o objetivo de o tornar mais compatível com os objetivos de política pública, avaliando a redefinição das áreas territoriais de incidência, uma maior flexibilidade na atribuição dos apoios, a reavaliação da tipologia dos beneficiários finais, tendo em conta os objetivos do presente diploma, uma maior adequação às especificidades territoriais e uma maior abrangência das fontes de financiamento.

Medida 19

(Acompanhamento do

regular funcionamento

dos instrumentos de

política habitacional

junto dos municípios)

Objetivo: Densificação dos instrumentos criados ao abrigo da LBH e da respetiva regulamentação,

por forma à sua aplicação prática no território.

Metas até 2026:

• Continuar a promover uma regular articulação com a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) e a Associação Portuguesa da Habitação Municipal (APHM) na concretização das políticas de habitação, definindo estratégias supramunicipais, divulgando a informação, o conhecimento e o acesso aos programas e instrumentos de apoio à habitação e à reabilitação, e adequando a resposta às especificidades locais, garantindo uma resposta integrada à população;

• Acompanhar, em articulação com a ANMP, a concretização da LBH, nomeadamente no que respeita à concretização da Carta Municipal da Habitação;

• Promover ações conjuntas de densificação e capacitação na aplicação de instrumentos importantes de fiscalização e de resposta a situações de necessidade de alternativa habitacional, nomeadamente com base nas alterações previstas no Decreto-Lei n.º 89/2020, de 3 de novembro.

Medida 20

(Promoção de novos

modelos de habitação

cooperativa e

colaborativo)

Objetivo: Redinamização do setor cooperativo e colaborativo.

Metas para 2023:

• Fomentar a concretização de projetos do terceiro setor nas ELH promovidas pelos municípios;

• Definir o apoio público, nomeadamente em espécie, para a criação de respostas cooperativas, preferencialmente para arrendamento a custos acessíveis e garantir mecanismos que salvaguardem a sustentabilidade financeira dos projetos e evitando o recurso à banca comercial como forma principal do financiamento dos projetos;

• Promoção de projetos-pilotos de Cooperativas de Inquilinato ou similares, como alternativa à propriedade individual dos fogos;

• Proceder às alterações legais que se mostrem necessárias para a redinamização do setor.

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Medidas Objetivos

Medida 21

(Inovação e

sustentabilidade –

Projeto-piloto de

habitação pública)

Objetivo: Promoção de um projeto que concilie as novas formas de habitar, as novas soluções

urbanas e habitacionais, as novas formas de construir e a sustentabilidade ambiental.

Meta até 2026: Criação de um grupo de trabalho orientado para a construção de um parque

habitacional público que, olhando para exemplos recentes, concretize um modelo no terreno assente

em:

• Salvaguarda de novas formas de habitar;

• Capacitação dos municípios envolvidos;

• Requalificação dos espaços públicos, promovendo uma resposta articulada com a envolvente e contribuindo para a coesão social das comunidades e a qualidade urbana;

• Promoção de novas formas de construir, novos sistemas construtivos e novos materiais, orientados para a qualidade da habitação, que incorporem o ciclo de vida dos edifícios, os novos desafios da crise climática e que privilegiem a produção local e a economia circular;

• Mobilização dos agentes relevantes: IHRU, IP, Direção-Geral de Energia e Geologia, ADENE – Agência para a Energia, Autarquias Locais, Ordens Profissionais, Universidades, Institutos Politécnicos, Laboratório Nacional de Engenharia Civil, IP, e os próprios cidadãos, para promover maior partilha de dados e experiência.

Medida 22 (Codificação das

normas técnicas de construção)

Objetivo: Diminuir a extensão, dispersão e complexidade do quadro regulamentar Metas até 2026, em três fases complementares:

• Diagnóstico do quadro normativo;

• Harmonização e simplificação do quadro normativo;

• Codificação das normas técnicas de construção.

VII. Enquadramento financeiro das medidas

Enquadramento dos eixos de intervenção

As necessidades existentes em matéria de habitação tornam fundamental o início, desde já, da

identificação de fontes de financiamento adicional, nomeadamente no que respeita aos dois primeiros eixos de

intervenção referidos supra.

É por isso importante, a par com o financiamento nacional e do PRR, avaliar a prossecução destes pilares

de intervenção na política pública de habitação através da eventual elegibilidade de financiamento

complementar disponível nos seguintes instrumentos de financiamento:

• No âmbito do Quadro Financeiro Plurianual (QFP) da União Europeia para o período de 2021-2027 (QFP

2021-2027);

• No âmbito do Banco Português de Fomento;

• No âmbito de novas linhas de financiamento junto do Banco Europeu de Investimento (BEI) e do Banco

de Desenvolvimento do Conselho da Europa (CEB).

Assim, no âmbito temporal do presente PNH, e sem prejuízo do eventual acréscimo de verba a partir de

fundos comunitários para a habitação, e tendo em conta as estimativas temporais dos acordos assinados com

os municípios no âmbito do 1.º Direito e de reforço das verbas em função das reais necessidades identificadas

neste período, o enquadramento financeiro programado (a operacionalizar por portaria de extensão de

encargos) para os principais eixos de intervenção, anteriormente referidos, é o seguinte:

Medida Dotação global

PRR Outras fontes (*) Justificação

Medida 1 1 311 M € 1 211 M€ 100 M€ Estimativa de investimento dos fogos previstos até 2026 (contabiliza a totalidade do PRR desde 2021) e os fogos a executar no mesmo período fora do PRR

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Medida Dotação global

PRR Outras fontes (*) Justificação

Medida 2 860 M € 775 M€ 85 M€ Estimativa de investimento dos fogos previstos até 2026 (contabiliza a totalidade do PRR desde 2021) e os fogos a executar no mesmo período fora do PRR

Medida 3 48 M€ —— 48 M€ Estimativa de investimento para a intervenção integral no património e para as obras de conservação corrente

Medida 4 159 M€ —— 159 M€ O objetivo é reforçar com cerca de 500 novas habitações públicas

Medida 5 176 M € 176 M€ —— Numa primeira fase, será financiado apenas pelo PRR (contabiliza a totalidade do PRR desde 2021)

Medida 6 21,3 M€ —— 21,3 M€ Estimativa de investimento de acordo com as atuais necessidades, sendo que o valor para o Programa depende das necessidades que venham a existir

Medida 7 —— —— —— Implica o custo inerente ao benefício fiscal próprio

Medida 8 182,8 M € —— 182,8 M€ Aumento gradual da verba com vista a garantir a duplicação, até 2026, do n.º de jovens abrangidos, em comparação com 2021 (estimativa)

Medida 9 50 M€ —— 50 M€ Negociação de nova linha de financiamento até 2026, diretamente junto da Banca

Medida 10 —— —— —— Implica o custo inerente ao benefício fiscal próprio e possível recurso a empréstimos bonificados à respetiva promoção.

Medida 11 —— —— —— Implica o custo inerente ao benefício fiscal próprio

Medida 12 —— —— —— Implica o custo inerente ao benefício fiscal próprio

Medida 13 Por definir —— —— A orçamentação do subsídio de renda, previsto no Decreto-Lei n.º 156/2015, de 10 de agosto, depende do leque de famílias abrangidas

Medida 14 —— —— —— Não pressupõe nenhum encargo direto ao IHRU, IP

Medida 15 Até 200 000 € —— Até 200 000 € A promoção pelo IHRU, junto de entidades de reconhecida competência técnica, com um mandato de 18 meses

Medida 16 220 000 € —— 220 000 € Dotação para assegurar a gestão dos projetos-piloto a implementar

Medida 17 —— —— —— A enquadrar nos instrumentos já existentes e com a orçamentação deles decorrente

Medida 18 14,6 M€ —— 14,6 M€ Estão considerados os custos de gestão até 2026 e a contrapartida do atual instrumento, não dispondo ainda de elementos quanto à contrapartida no próximo QFP

Medida 19 —— —— —— Não pressupõe nenhum encargo direto ao IHRU, IP

Medida 20 —— —— —— A enquadrar nos instrumentos já existentes e com a orçamentação deles decorrente

Medida 21 —— —— —— A enquadrar nos instrumentos já existentes e com a orçamentação deles decorrente

Medida 22 —— —— —— Não pressupõe nenhum encargo direto para as entidades envolvidas.

(*) Consideram-se outras fontes, as verbas provenientes do Orçamento do Estado ou de fundos comunitários (exemplo do Banco

Português de Fomento, BEI ou CEB).

VIII. Relatório da participação pública na conceção do Programa Nacional de Habitação

No decurso da consulta pública promovida no final do ano de 2021 e da primeira audição junto do Conselho

Nacional de Habitação (CNH) foram promovidas alterações significativas ao PNH, em linha com as principais

preocupações identificadas:

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• Concentração excessiva do PNH no Plano de Recuperação e Resiliência;

• Insuficiente referência e evidência do papel complementar do terceiro setor, latu sensu, e do setor

privado;

• Inexistência de qualquer referência ao normativo aplicável ao setor da construção e às consequências do

mesmo na urgência da solução;

• Necessidade de atualização dos dados estatísticos;

• Défices do modelo de acompanhamento, monitorização e avaliação da aplicação;

• Escassez de referências à salvaguarda da qualidade e sustentabilidade das soluções construtivas.

Forma de Participação Data Informações

Consulta Pública promovida no Portal ConsultaLEX

de 29-11-2021 a 15-12-2021 22 Participações

Audição do Conselho Nacional de Habitação

21-12-2021 Discussão do PNH

Promovida aquando da discussão publica

21-09-2022 Discussão e votação do PNH

Promovida depois das alterações decorrentes da discussão pública e da discussão no Conselho Nacional de Habitação. O Programa foi aprovado em CNH por maioria, com a abstenção da ANMP e da APHM e os votos a favor das restantes entidades presentes

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 284/XV/1.ª (*)

(PELA CONDENAÇÃO DAS VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS NO CATAR E NA

ORGANIZAÇÃO DO MUNDIAL 2022 DE FUTEBOL)

De 20 de novembro a 18 de dezembro, irá decorrer o Mundial 2022, no Catar, torneio de futebol para o qual

a seleção nacional se encontra qualificada, integrando o Grupo H. Uma investigação de vários jornalistas

revelou em 2015 a notícia de que responsáveis máximos da FIFA teriam favorecido a atribuição das

candidaturas do Mundial 2018 e 2022 à Rússia e Catar respetivamente. O escândalo, que envolveu também

outras acusações de fraude e lavagem de dinheiro, levou ao afastamento e julgamento de muitos elementos

da FIFA, afetando seriamente a credibilidade da organização.

Não obstante esses factos serem do conhecimento público, a organização manteve a realização do torneio

no Catar, país governado por uma monarquia formalmente constitucional mas na prática absolutista em que o

responsável máximo político é o Emir Tamim bin Hamad Al Thani. Devido à sua localização junto ao Golfo

Pérsico, região sujeita a elevadas temperaturas, o calendário dos jogos do Mundial foi alterado, de forma

inédita, de modo a permitir que os jogos decorram pela primeira vez no inverno, com temperaturas mais

suportáveis para as equipas e adeptos. Estima-se que o valor investido pelo Catar, um dos países mais ricos

do mundo, na construção de sete estádios e megainfraestruturas é cerca de 200 mil milhões de dólares,

naquele que é considerado o Mundial mais caro de sempre, num país em que só uma minoria catari

pertencente à elite é adepta de futebol.

Desde que foi anunciado que o Catar acolheria o torneio, várias organizações humanitárias têm

denunciado, de forma veemente, as inúmeras violações de direitos humanos no país, em especial os direitos

dos trabalhadores migrantes que foram contratados para construir os estádios e infraestruturas. O país indicou

ter contratado cerca de dois milhões de trabalhadores, a maioria oriunda de países como o Bangladesh,

Filipinas, Nepal e Índia, estando grande parte deles sujeitos a exploração laboral. O Catar é um dos países

que adota o sistema Kafala, uma prática comum no Médio Oriente e Golfo Pérsico de trabalho forçado, que

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16 DE NOVEMBRO DE 2022

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permite que entidades patronais confisquem a documentação e passaportes de trabalhadores migrantes,

limitando a sua circulação de movimentos e quaisquer reivindicações laborais. A Kafala tem sido denunciada

como uma das práticas mais ignóbeis por organizações humanitárias. Apesar de o Catar ter anunciado um

acordo em 2017 com a Organização Internacional do Trabalho para reformar o sistema Kafala, tanto a

Amnistia Internacional como a Human Rights Watch denunciaram que as práticas ilegais de exploração laboral

continuaram, mesmo após o Governo ter introduzido restrições ao número de horas de trabalho e exposição

ao calor. Estima-se que terão morrido cerca de 6750 trabalhadores, embora o número real possa ser mais

elevado uma vez que o governo catari não realiza autópsias aos trabalhadores migrantes, indicando que

muitos terão falecido de «causas naturais».

Para além de já ser um reconhecido desastre humanitário, o torneio promete ser também um desastre

ambiental. Apesar das promessas da FIFA de que este seria o primeiro Mundial neutro em carbono, o Catar é

um dos maiores países emissores de dióxido de carbono per capita, agravado pela construção de novos

estádios, assim como novas cidades e meios de transporte em torno dos estádios. Várias organizações

ambientais têm acusado o Catar da prática de «Greenwashing», providenciando informações enganosas sobre

emissões poluentes de modo a ocultar do público o verdadeiro impacto ambiental do Mundial 2022.

É preciso também relembrar as falhas no Catar no campo da desigualdade. De acordo com um relatório da

Human Rights Watch de 2021, as mulheres catari têm de obter permissão dos seus guardiões legais

masculinos para casar, estudar no estrangeiro, trabalhar na função pública, viajar ou para terem acesso a

planeamento familiar. É um sistema que discrimina fortemente as mulheres e as sujeita por completo à

autoridade dos homens, naquilo que constitui uma violação do direito internacional.

Para além das desigualdades de género, as leis do Catar são claras e apelam à total discriminação e

violência contra a comunidade LGBTQI+. O país não permite relações sexuais ou casamento entre pessoas

do mesmo sexo e quaisquer manifestações de apoio a pessoas da comunidade LGBTQI+ são punidas com

penas de prisão. Embora a organização do torneio destaque que todos serão bem-vindos independentemente

do seu sexo, género, etnia, orientação sexual, religião ou nacionalidade, as autoridades catari não deram

quaisquer garantias de seguranças a adeptos LGBTQI+ que se desloquem ao país e desencorajam

manifestações públicas de afeto.

O futebol é uma prática desportiva global que gera as paixões mais intensas e inspira sonhos em muitos

jovens que procuram dedicar-se profissionalmente à prática. Associar este torneio a um país com um historial

de graves violações de direitos humanos é permitir que fechemos os olhos ao racismo, à xenofobia, à

discriminação e preconceito que tanto temos vindo a combater em Portugal e no seio da União Europeia.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à

Assembleia da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo

que:

1 – Condene, com veemência, as violações de direitos humanos que ocorreram no Catar, em particular as

cometidas no âmbito da organização do Mundial 2022;

2 – Não se faça representar no Mundial 2022;

3 – Utilize a publicidade institucional que tem ao seu dispor para realizar uma campanha publicitária

positiva e inclusiva que apela ao fim do preconceito e discriminação na prática do desporto;

A Assembleia da República resolve ainda:

4 – Não se fazer representar no Mundial 2022;

5 – Enviar mensagem à Federação Portuguesa de Futebol (FPF) a instar a FPF a tomar uma posição

pública contra o historial de violação de direitos humanos no Catar, no âmbito da realização do Mundial 2022.

Assembleia da República, 16 de novembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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(*) O texto inicial da iniciativa foi publicado no DAR II Série-A n.º 115 (2022.11.15) e foi substituído a pedido do autor em 16 de

novembro de 2022.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 288/XV/1.ª

PELO FIM DOS VOOS NOTURNOS, PELO DIREITO AO DESCANSO E BEM-ESTAR DAS

POPULAÇÕES

As populações, a TAP e a economia nacional continuam a sofrer as negativas consequências da

privatização da ANA, da subserviência dos sucessivos governos do PS, do PSD e do CDS aos interesses da

Vinci, que continua a pressionar para evitar a saída do aeroporto de Lisboa dos terrenos da Portela.

As consequências pesam todos os dias na vida de quem trabalha, estuda e vive nos concelhos

circundantes, particularmente agravada nos concelhos de Lisboa, Loures e Odivelas, mas sentida também

pelas populações da margem sul do Tejo. A poluição, nomeadamente o ruído provocado pela operação das

aeronaves, tem consequências para a saúde e bem-estar destas populações e não é aceitável que se

continue a adiar a resolução do problema ou levar o problema também às populações do Seixal, Barreiro,

Moita e Montijo.

A solução definitiva para salvaguardar e saúde e o bem-estar da população de Lisboa é a construção

faseada do novo aeroporto e a saída do aeroporto da Portela.

A Vinci não avança com a construção do novo aeroporto no Campo de Tiro de Alcochete porque não serve

os seus interesses. A Vinci chantageia diariamente o País sem que o Governo assuma a defesa dos

interesses nacionais e ponha a saúde das populações e a economia nacional em primeiro lugar.

O aumento do número de voos em períodos que frontalmente violam a lei é uma das medidas que tem

permitido à Vinci continuar a adiar a construção do Novo Aeroporto. A passividade perante estas violações da

Vinci é mais um sinal da opção tomada pelos sucessivos governos: do lado da Vinci, contra as populações.

O recente entendimento entre PS e PSD, consagrado na Resolução do Conselho de Ministros n.º 89/2022,

de 14 de outubro, é mais um entrave à resolução do problema, sendo na prática um novo adiamento. A

decisão de promover nova «análise estratégica» para a localização do novo aeroporto é um capote para

esconder que os reais objetivos de PS e PSD são ditados e, por isso, convergentes com os interesses da

Vinci.

O Aeroporto Humberto Delgado, em plena cidade de Lisboa está sujeito a adicionais restrições de

operação no período noturno. Ainda assim, são permitidos por lei a realização de 13 voos diários no período

entre as 00h e as 06h. No entanto, nem estas restrições são cumpridas nem a Vinci se importa com o prejuízo

que o ruído representa para as populações ao não realizar os investimentos de requalificação dos edifícios

sitos nas imediações do aeroporto.

Recentemente, a necessidade (há muito defendida pelo PCP) da NAV em atualizar o sistema de gestão de

tráfego aéreo na região de Lisboa levou à aplicação de mais um regime excecional à operação de aeronaves,

alargando o número de voos noturnos autorizados. Mas o problema de fundo não está na exceção de mês e

meio. O problema está no sucessivo incumprimento da lei que condena as populações ao ruído dos voos no

período noturno em número muito acima do que é recomendado pela própria Agência Portuguesa do

Ambiente (APA). O problema existe todas as noites, sem que o Governo tome iniciativa de lhe pôr fim.

Ora essa competência é, em primeiro lugar, do Governo, que à luz do Decreto-Lei n.º 293/2003, de 19

de novembro, já as deveria ter proposto e implementado.

Neste sentido, o PCP defende a proibição de voos no período compreendido entre as 00h e as 06h, nos

termos propostos pela APA e como defendido pela Câmara Municipal de Lisboa a 20 de fevereiro de 2020,

condicionando os voos no período entre as 23h00 e as 00h00 e entre as 06h e as 07h00, assegurando a

efetiva fiscalização com consciência que a resolução definitiva para a salvaguarda do direito das populações à

saúde e ao descanso, só será plenamente possível com a construção do novo aeroporto internacional de

Lisboa no Campo de Tiro de Alcochete.

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Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a

seguinte:

Resolução

A Assembleia da República, nos termos n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomenda ao

Governo que:

1 – Proceda ao acompanhamento do cumprimento dos limites de operações de aeronaves definidos na

Portaria n.º 303-A/2004, de 22 de março, na sua redação atual, impedindo o aumento de voos no período

noturno sistematicamente verificado no Aeroporto Humberto Delgado;

2 – Limite as operações de aeronaves no Aeroporto Humberto Delgado entre as 23h00 e as 00h00 e entre

as 06h e as 07h00;

3 – Proíba a realização de voos no período entre as 00h00 e as 06h00, salvo por motivos de segurança

aeronáutica;

4 – Fiscalize e exija o cumprimento das obrigações assumidas pela ANA para minimização dos impactos

do ruído, designadamente nas obras de requalificação das infraestruturas circundantes ao Aeroporto

Humberto Delgado;

5 – Proceda à recuperação do controlo público da ANA Aeroportos por motivos de interesse público e

assegure uma gestão dos aeroportos nacionais conforme a defesa da soberania e o interesse nacional;

6 – Proceda de imediato ao cumprimento do estabelecido na Resolução do Conselho de Ministros n.º

13/2008, de 23 de janeiro, e avance com a construção faseada do novo aeroporto internacional de Lisboa no

Campo de Tiro de Alcochete, desenvolvendo todas as ações necessárias a esse fim.

Assembleia da República, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados do PCP: Paula Santos — Bruno Dias — Alma Rivera — Alfredo Maia — João Dias.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 289/XV/1.ª

PELA DEFESA DO ENSINO DO PORTUGUÊS COMO LÍNGUA MATERNA PARA PORTUGUESES E

LUSODESCENDENTES FORA DE PORTUGAL

O ensino de português como língua materna para os portugueses e lusodescendentes residentes no

estrangeiro tem vindo a ser ameaçado ao longo da última década através de decisões políticas que minam o

cumprimento de uma das funções primordiais do Estado, o ensino da língua portuguesa aos seus cidadãos.

Apesar da Constituição da República Portuguesa instituir, no seu artigo 74.º, o dever de assegurar o ensino do

português como língua materna aos filhos dos cidadãos portugueses no estrangeiro, a realidade da última

década tem demonstrado que este direito se encontra cada vez mais desprotegido.

Apesar de se ter verificado um investimento no ensino de português como língua estrangeira, num esforço

saudável de promoção das oportunidades do espaço lusófono, verifica-se que isto apenas aconteceu em

detrimento do ensino como língua materna, colocando de fora das prioridades os próprios cidadãos

portugueses. Por mais louvável e estrategicamente necessária que seja a difusão do português entre

comunidades estrangeiras, é importante que esteja assegurado o ensino aos próprios portugueses e seus

descendentes pelo mundo fora, sendo inaceitável que seja privilegiado o ensino como língua estrangeira e não

como materna, conforme é a necessidade mais básica de educação dos filhos dos emigrantes portugueses.

A crescente limitação do acesso ao ensino do português a portugueses e lusodescendentes através de

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várias alterações ao Decreto-Lei n.º 165/2006, de 11 de agosto (Estabelece o regime jurídico do ensino

português no estrangeiro) ao longo dos últimos anos, nomeadamente, a implementação do Quadro de

Referência para o Ensino de Português no Estrangeiro (QuaREPE) implicou a sua desvalorização e

desinvestimento contínuo.

A introdução, no âmbito do ensino de português no estrangeiro, de taxas de inscrição na forma de propinas

obrigatórias em cursos frequentados exclusivamente por alunos portugueses, a adoção de programas de

português como língua estrangeira e, inclusive, do uso obrigatório de materiais didáticos dessa vertente, com

custos acrescidos, têm resultando na queda significativa e sistemática de alunos portugueses a frequentar a

rede oficial do Ensino Português no Estrangeiro, sendo que se em 2008 existiam 60 000 alunos portugueses a

frequentar a rede de ensino, atualmente existe apenas cerca de metade.

Ao abdicar de investir cerca de 1 milhão de euros na defesa do uso do português entre as comunidades de

emigrantes, o Estado corre o risco de perder irremediavelmente o elo de ligação destas comunidades a

Portugal. Este investimento, recordamos, representa um potencial de retorno cultural e económico

considerável, atendendo à comunidade crescente de lusodescendentes que, ao manter o elo com Portugal,

podem decidir fazer negócios ou investir em Portugal. Para além disso, tendo em conta o alto fluxo de

emigração dos últimos anos, que pode ser muitas vezes temporária, é preciso agilizar soluções que

assegurem que os filhos dos emigrantes não ficam para trás em relação à sua geração.

Um Estado que falha no ensino da língua dos seus próprios cidadãos, renegando a extensa comunidade de

emigrantes e seus descendentes que procuram manter o vínculo cultural com o seu país de origem, contribui

para a deterioração dos laços que unem a comunidade nacional além-fronteiras, que tanto deram e dão a

Portugal na promoção da cultura e tradições portuguesas e serão sempre peça essencial na afirmação do

potencial da língua portuguesa nas suas diversas dimensões.

Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento

da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte projeto de

resolução:

Resolução

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera

recomendar ao Governo que:

1 – Adote políticas para o ensino de português no estrangeiro nos ensinos básico e secundário em que

seja feita a devida distinção entre a) as políticas de língua e educação no contexto da difusão internacional

através do ensino de português como língua estrangeira e b) as políticas de língua e educação destinadas às

comunidades portuguesas através do ensino de português como língua materna, assegurando aos pais

liberdade de escolha na escolha das vertentes, mediante prova prévia da capacidade linguística dos alunos, se

necessário, nomeadamente garantindo que:

a. São revogadas taxas de inscrição para todos os portugueses e lusodescendentes que frequentem ou

venham a frequentar o Ensino Português no Estrangeiro, vertente de língua materna.

b. Disponibilize gratuitamente os manuais necessários à frequência do Ensino Português no Estrangeiro,

vertente de língua materna.

2 – Expanda a rede do Ensino Português no Estrangeiro, vertente de língua materna, para portugueses e

lusodescendentes, dentro e fora da Europa, reforçando a rede de escolas por via da celebração ou reforço de

protocolos bilaterais que agilizem o desenvolvimento destes programas, do desenvolvimento de mecanismos

de intermediação, por via do Instituto Camões, que facilitem o desenvolvimento deste currículo em mais

escolas e, finalmente, estudando a possibilidade de criação de uma modalidade online para os casos em que

a disponibilidade do curso não esteja assegurada.

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Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados da IL: Rodrigo Saraiva — Joana Cordeiro — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos

Guimarães Pinto — João Cotrim Figueiredo — Patrícia Gilvaz — Rui Rocha.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 290/XV/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE REFORCE O ENSINO DE PORTUGUÊS NO ESTRANGEIRO NAS

SUAS DIFERENTES DIMENSÕES E INTENSIFIQUE O USO DAS TECNOLOGIAS DIGITAIS PARA O

TORNAR MAIS ATRATIVO, INTERATIVO E AJUSTADO AO PERFIL DOS ALUNOS

O ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro constitui um vetor fundamental da ligação das

nossas comunidades ao país e um dos elementos estratégicos da afirmação de Portugal no mundo. Daí que, a

valorização de todos os graus de ensino da língua e da cultura portuguesas no estrangeiro, do ensino básico

ao universitário, será sempre central no âmbito da política externa nacional.

A vasta presença de portugueses e lusodescendentes em todos os continentes, e a ambição que existe

para a língua portuguesa como língua global e de trabalho nas instituições internacionais, impele naturalmente

ao reforço das políticas públicas que permitam a afirmação da língua e da cultura portuguesas nos vários

graus de ensino no estrangeiro.

Também têm existido períodos mais difíceis, como aconteceu no auge da crise económica e financeira de

2010-2014, quando se registou um retrocesso no Ensino Português no Estrangeiro (EPE), com a supressão de

122 professores da rede pública, sendo que 49 foram retirados do ensino já depois do início do ano letivo, em

2012, deixando alguns milhares de alunos sem aulas em França, Suíça e Espanha. Desde 2015, a aposta no

robustecimento do Ensino Português no Estrangeiro (EPE) tem sido clara, não obstante o período da

pandemia ter provocado dificuldades, regista-se novamente um aumento no número de inscrições de alunos.

O EPE deve ser devidamente analisado à luz das especificidades de cada país, fator que cria uma

diversidade no tipo de oferta de cursos para os alunos, que passa pelos chamados ensino paralelo, integrado

e complementar, bem como pelo ensino bilingue, pelo ensino associativo e pela rede apoiada, criando

realidades muito distintas, num contexto de grande heterogeneidade quanto ao domínio da língua.

Esta diversidade exige uma pedagogia adaptada aos níveis de desempenho linguístico na sala de aula,

com professores devidamente formados e motivados, para formar turmas homogéneas ao nível da proficiência

linguística, com contextos familiares muito distintos. Deste modo, o EPE é mais eficiente perante as realidades

sociológicas diversas em que existe.

Com efeito, o EPE também se caracteriza pela sua capacidade de adaptação às condições da oferta e à

cultura educativa e às práticas administrativas de cada país e, não menos importante, à grande dispersão das

nossas comunidades pelos países de acolhimento.

A verdade é que houve uma mudança de paradigma na perceção da importância da língua portuguesa, que

começou a distanciar-se a partir do início deste século da sua condição de língua de emigração e a fazer o seu

caminho como língua global, a quarta mais falada no mundo como língua materna, a mais falada no hemisfério

sul e com grande margem de progressão, particularmente devido ao crescimento demográfico em África.

Com a vantagem de poder contar com a intervenção da rede diplomática e consular nacional para

prosseguir os seus objetivos, o EPE adapta-se ao sistema de ensino de cada país, afirmando a língua

portuguesa como língua de projeção internacional.

Em 2007 surgiu o primeiro estudo que fundamenta o valor económico da língua portuguesa, permitiu a

valoriza como língua de trabalho, de comércio, de cultura e de ciência. Um ano antes, em 2006, foi feita a

alteração legislativa ambiciosa que consubstancia esta mudança de paradigma com a aprovação do Decreto-

Lei n.º 165, sublinhando não apenas a centralidade do EPE, mas também o objetivo de fomentar a difusão

internacional da língua portuguesa.

Refere o diploma que existia então «a perceção generalizada de que é necessário desenvolver uma política

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mais ambiciosa para a Língua portuguesa, baseada num esforço persistente de promoção do seu ensino e do

seu estudo à escala mundial, dado o seu estatuto de língua de comunicação internacional».

Para que estes objetivos ambiciosos fossem alcançados, o Governo de então procurou desenvolver os

meios para valorizar e qualificar o ensino e a aprendizagem da língua portuguesa no estrangeiro, adotando as

melhores práticas internacionais do ensino das línguas, designadamente as que seguem o Quadro Europeu

Comum de Referência para as Línguas: Aprendizagem, ensino, avaliação (QECR), de 2001, elaborado pelo

Conselho da Europa, QuarEPE, de 2011, desenvolvido a partir do QECRL, e o Referencial Camões, Instituto

da Cooperação e da Língua, IP (Camões, IP), desenvolvido a partir dos outros dois referenciais aludidos e

com abordagens no domínio da língua de herança.

Foi a partir daqui que se desenvolveu verdadeiramente um processo de constante valorização do ensino da

língua portuguesa no âmbito da elaboração e avaliação de programas, linhas de orientação curricular e

escolha de materiais pedagógicos e didáticos, que procuravam assim «o pleno reconhecimento, acreditação e

certificação dos cursos do Ensino Português no Estrangeiro».

Desde 2015, tirando o hiato da pandemia, que se verifica uma nova evolução favorável, ao nível do número

de alunos, professores e escolas e presença no ensino superior.

Ora, é esta ambição que deve continuar presente no que concerne ao EPE, procurando ser sempre cada

vez mais valorizado e reconhecido, mas igualmente mais atrativo e abrangente, consolidando a certificação

das aprendizagens para terem um valor acrescido em termos pessoais e profissionais.

Para isso, certamente que as verbas agora destinadas à digitalização do EPE, oriundas do PRR e inscritas

no Orçamento do Estado para 2023, permitirão dar um salto qualitativo muito relevante na modernização do

ensino, que certamente criará maior motivação para a aprendizagem, além de ter potencial para chegar a

novos públicos e aos alunos que agora estão mais dispersos e longe dos centros onde existe grande

concentração de portugueses e lusodescendentes.

Por outro lado, o recurso à utilização das tecnologias digitais aplicadas ao ensino, mais adaptadas à cultura

tecnológica que acompanha os jovens de hoje, possui todo o potencial para tornar o ensino da língua

portuguesa mais atrativo, dinâmico, interativo e ajustado ao perfil dos alunos residentes no estrangeiro.

Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados abaixo

assinados apresentam o seguinte projeto de resolução:

Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa, a Assembleia da

República resolve recomendar ao Governo que:

1 – Continue o caminho da valorização do EPE, reforçando designadamente a sua oferta e a sua

integração enquanto língua curricular nos sistemas de ensino, de modo a conseguir cativar mais alunos,

particularmente os que residem em zonas mais afastados das cidades onde existe uma maior concentração de

portugueses e lusodescendentes;

2 – Promova o alargamento do âmbito dos sistemas de certificação de língua portuguesa no quadro do

EPE, nas suas diferentes modalidades e que adote estratégias para atrair novos públicos, incluindo adultos;

3 – Intensifique o uso das tecnologias digitais para tornar o ensino mais atrativo, dinâmico, interativo e

ajustado ao perfil dos estudantes, adaptando o respetivo regime jurídico às necessidades contemporâneas, de

forma a dar a melhor resposta à necessidade de manter a ambição para a língua portuguesa como língua

global, incluindo neste objetivo todos os graus de ensino, do básico ao universitário.

Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados do PS: Paulo Pisco — Natália Oliveira — Francisco César — Edite Estrela — Jamila

Madeira — Gil Costa — Anabela Real — Susana Correia — Miguel Iglésias — Diogo Leão — Tiago Brandão

Rodrigues — Maria João Castro — Romualda Nunes Fernandes — Francisco Pereira de Oliveira — Pedro

Delgado Alves.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 291/XV/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE DESENVOLVA UMA TAXA SOBRE OS VOOS DE JATOS

PRIVADOS

O transporte aéreo, pelas suas especificidades, tem um grande impacto ambiental, tanto ao nível das

emissões (CO2 e não CO2) como ao nível de poluição sonora. Se, à escala global, a contribuição das

emissões de CO2 do setor da aviação é inferior a 5 % do total, é expectável que este valor aumente

substancialmente nas próximas décadas devido ao aumento do tráfego aéreo e das dificuldades de

descarbonização do setor. Para além disso, o transporte aéreo é profundamente desigual, com uma pequena

parte da população a ser responsável por um grande número de voos e das emissões a estes associada.

Ainda mais desigual é o recurso a jatos privados, apenas disponível a uma ínfima minoria da população, e com

um impacto por passageiro desproporcional em termos de emissões.

O Livre entende que o crescimento do setor da aviação deve ser contido e que a necessidade de expansão

da capacidade aeroportuária nacional deve ser criticamente avaliada, considerando-se alternativas de

investimento noutros modos – como a ferrovia – para substituição de voos, nos trajetos onde esta substituição

for pertinente. Esta posição enquadra-se no combate às alterações climáticas a que o Livre dá a necessária

prioridade. Mais, o Livre considera que, em paralelo com o reforço de outros setores de transporte mais

sustentável, o setor da aviação deve também dar o seu contributo, reduzindo o seu impacto ambiental, para o

qual medidas como a taxação do querosene, atualmente a ser discutida a nível europeu, bem como a procura

de fontes energéticas alternativas e sem emissões de CO2 são de apoiar.

De modo a assegurar que a transição para modos de transporte mais sustentável se faz de um modo justo,

é essencial que aqueles que recorrem a modos de transporte mais poluentes sejam aqueles que mais

contribuem. Nesse sentido, os voos em jatos privados devem ser alvo de particular atenção. Países como

Itália têm já em prática uma taxa especial sobre este tipo de transporte, com valores variáveis de acordo com a

distância.

Ainda assim, pela sua dimensão, os jatos privados poderão operar sem emissões poluentes num período

de tempo substancialmente mais curto que os aviões comerciais, servindo assim de plataforma de teste para

novas tecnologias. São vários os protótipos presentemente em fase de desenvolvimento e que poderão operar

num curto espaço de tempo, razão pela qual se deva apostar na limitação de jatos privados com emissões

poluentes num curto espaço de tempo.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe que a

Assembleia da República recomende ao Governo que:

1 – Institua uma taxa que se aplique aos voos de jatos privados que parta ou aterre em território nacional,

diferenciada consoante a distância do voo nos seguintes valores:

a) 50 euros por passageiro para voos até 100 km;

b) 200 euros por passageiro para voos até 1500 km;

c) 400 euros por passageiro para voos a partir de 1500 km.

2 – A partir de 2030, apenas voos de jatos privados sem emissões de CO2 sejam autorizados no espaço

aéreo nacional.

3 – Promova, junto da Comissão Europeia, uma política europeia alinhada com os dois anteriores pontos.

Assembleia da República, 14 de novembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 292/XV/1.ª

RECOMENDA A PROGRESSIVA DIMINUIÇÃO DO HORÁRIO DE TRABALHO, COM A INSTITUIÇÃO

DAS 35 HORAS POR SEMANA, E O PROGRESSIVO AUMENTO DO PERÍODO DE FÉRIAS, COM A

INSTITUIÇÃO IMEDIATA DOS 25 DIAS DE FÉRIAS

Exposição de motivos

A luta pelas 40 horas de trabalho, pelo direito a férias pagas, pelo direito ao subsídio de desemprego, pela

semana de 5 dias e por tantos outros direitos laborais marcou de forma indelével os Séculos XIX e XX como

sendo das conquistas que mais fizeram avançar o bem-estar nas sociedades que, nessa época, construíram e

foram moldando o Estado social à imagem daquilo que hoje conhecemos. Temos para com quem travou essas

lutas uma enorme dívida de gratidão, porque é nelas que estão alicerçados muitos dos direitos que

consideramos essenciais ao nosso bem-estar e qualidade de vida e que tantas vezes damos como adquiridos.

Importa também ter bem presente que a conquista destes direitos foi isso mesmo: uma conquista. Nada foi

dado de mão beijada aos trabalhadores que reivindicaram estes direitos para si e é também por isso que lhes

devemos tanto.

Honrar esta dívida que temos para com as lutas trabalhistas dos últimos séculos, passa por continuarmos –

nós, no nosso tempo – a lutar por estes direitos que tanto custaram a conquistar. Passa também por não

termos apenas uma postura de defesa destes direitos, mas também de procurar alargar e reforçá-los,

adaptando-os àquela que é a realidade dos tempos que hoje vivemos. Para o Livre, não devemos recuar, nem

um milímetro, na defesa do Estado social clássico que conhecemos, mas devemos também, isso sim, procurar

formas de continuar a construir o Estado social, de reforçar estes direitos e de os alargar na sua profundidade

e na sua abrangência.

O Livre entende que devemos ser ambiciosos naquilo que almejamos como sendo um Estado social

moderno, que priorize o bem-estar e o tempo de todas as pessoas e que tenha como premissa que o ser

humano não existe apenas para nascer, estudar, trabalhar e morrer. É nesse espírito que procuramos lançar

debates como o da redução da semana de trabalho para uma semana de 4 dias, ou o da reforma 30/30 – 30

horas de trabalho semanais, 30 dias de férias anuais – e foi nesse espírito que propusemos o alargamento do

subsídio de desemprego a quem se despede sob determinadas condições, na forma de proposta de alteração

ao Orçamento do Estado para 2022, proposta essa que foi aprovada.

Sabemos, também, que nenhum destes direitos foi conquistado de forma precipitada e demasiado célere.

Defendemos as 30 horas de trabalho semanais, mas sabemos que o caminho para esse direito tem muitas

etapas.

Da mesma forma que não pretendemos saltar passos essenciais na luta por estes direitos, entendemos

também que é mais do que tempo de alargar aquele que já é um direito de alguns trabalhadores a todos e

todas, sendo esse o direito às 35 horas semanais de trabalho, já consagradas para trabalhadores em funções

públicas, mas ainda por implementar no setor privado. É tempo de repor a paridade nos tempos de trabalho

entre o setor público e privado, completando um passo no caminho de modernização e reforço do Estado

social, garantindo uma semana de trabalho de não mais que 35 horas a todos os trabalhadores, com os olhos

postos a que, num futuro não muito distantes, possamos avançar para as 30 horas e para uma semana de

trabalho de 4 dias.

Defendemos os 30 dias de férias pagos, mas sabemos que o caminho tem de ser feito. Entendemos que é

mais do que tempo de repor aquele que já era um direito de alguns trabalhadores e alargá-lo a todos e todas,

sendo esse o direito ao mínimo de 25 dias úteis de férias pagas.

Honrar aqueles e aquelas que tanto sacrificaram para que hoje pudéssemos gozar dos direitos de que

dispomos, passa por nos empenharmos em defender essas conquistas e em alargá-las para aqueles que vêm

depois de nós.

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à

Assembleia da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo

que:

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1 – Institua de forma imediata que o período normal de trabalho em Portugal não pode exceder sete horas

por dia e trinta e cinco horas por semana.

2 – Se comprometa em continuar o caminho de redução do horário de trabalho em Portugal, aprofundando

a experiência da semana de 4 dias e provendo o debate junto da concertação social para a adoção das 32

horas semanais e, posteriormente, das 30 horas semanais.

3 – Institua como período mínimo de férias os 25 dias úteis.

4 – Se comprometa em continuar o caminho para o alargamento do período de férias com vista a 30 dias

úteis.

Assembleia da República, 16 de novembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

———

PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 293/XV/1.ª

REPLANEAR O PRR (PLANO DE RECUPERAÇÃO E RESILIÊNCIA)

A propósito da Proposta de Lei n.º 38/XV/1.ª, que visa aprovar o Orçamento do Estado para 2023, o

Governador do Banco de Portugal, em intervenção levada a cabo na Ordem dos Economistas no dia 9 de

novembro, afirmou que «A taxa de execução do PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) tem estado muito

abaixo do previsto, prejudicada, também, pela inflação do custo dos projetos.» e que «Para 2023, espera-se

que a prossecução das reformas no âmbito do PRR venha acelerar a utilização efetiva e eficaz dos fundos e a

potenciar o investimento.»1

Por outro lado, no documento denominado «Orçamento do Estado 2023: Estabilidade, Confiança e

Compromisso», o Ministério das Finanças reconhece a diminuída taxa de execução do PRR, quando afirma

que «Em 2023, o crescimento assentará num maior dinamismo do investimento (3,6%), onde pontuará uma

mais forte efetivação dos investimentos previstos no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).» e,

otimisticamente, que se espera «em 2023, o impacto favorável da entrada em pleno da implementação dos

projetos de investimento associados ao PRR com o respetivo efeito multiplicador no tecido económico.» 2

Ora, sem prejuízo de ser inegável que a guerra que se trava na Europa (e que se sucedeu à pandemia por

COVID-19, realidade que também deixou uma forte marca nas economias), está a ter um impacto muito

relevante nas economias dos países, facto é também que a execução do Plano de Recuperação e Resiliência

está aquém do previsto, o que aliás torna pertinente ponderar em que termos pode e deve ser reconfigurado,

tendo em conta os pressupostos que lhe presidem. Mas, mais, reconhecida a emergência climática, de um

lado, e a dependência dos combustíveis fósseis russos, de outro, a Comissão Europeia, no âmbito do seu

plano de ação designado REPowerEU, que se destina, sumariamente, a adaptar a indústria e as

infraestruturas a diferentes fontes e fornecedores de energia, convidou os Estados-Membros da União «a

acrescentarem aos seus planos de recuperação e resiliência existentes um capítulo específico com novas

ações para concretizar os objetivos de diversificação do aprovisionamento energético e redução da

dependência dos combustíveis fósseis previstos no REPowerEU.», mais dizendo que «Para esse efeito, os

Estados-Membros podem dispor de assistência técnica ao abrigo do Instrumento de Assistência Técnica.»3

O que vem a se dizer, em toda a sua extensão, conduz à conclusão de que se justifica inteiramente que se

introduzam modificações ao PRR, desde logo deslocando – em função da sua taxa de execução e de

1 https://www.bportugal.pt/intervencoes/intervencao-do-governador-mario-centeno-na-ordem-dos-economistas-orcamento-de-estado 2 «Orçamento do Estado 2023: Estabilidade, Confiança e Compromisso – Relatório», Ministério das Finanças, páginas 31 e 36. 3 Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões, Plano REPoweEU {SWD(2022) 230 final}, página 18, disponível em https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:52022DC0230&from=EN

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compromisso –, os saldos existentes para projetos que, não tendo sido inicialmente contemplados, o contexto

torne relevantes: ou porque decorrem de processos que a guerra acelerou, ou porque a sua importância e

pertinência se evidenciou. Pense-se, por exemplo, na ineficiência energética de uma parte considerável do

edificado, pelo que de uma parte importante da população, com consequências na saúde, na mortalidade, no

rendimento escolar e laboral, que urge ajudar a combater, na medida em que as condições económicas de

fatia substancial das famílias não são suficientes4.

Reprogramar, prorrogando-os, os investimentos5, tal como foi recentemente solicitado pelo Governo

português à Comissão Europeia, não basta pois.

Atento o disposto no artigo 21.º do Regulamento (UE) 2021/241, do Parlamento Europeu e do Conselho, de

12 de fevereiro de 2021, que cria o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, é possível não só ao Estado-

Membro solicitar à Comissão Europeia a apresentação de uma proposta de alteração, como também propor

um plano de recuperação e resiliência alterado ou um novo plano, para o qual pode também requerer

assistência técnica.

Uma vez que o PRR, em Portugal, regista uma taxa de execução deficitária, de um lado, e havendo

projetos não contemplados, necessariamente alinhados com os pilares fundamentais política europeia, para os

quais faz total sentido canalizar os fundos disponíveis, a Assembleia da República recomenda ao Governo

que:

1 – Proponha à Comissão Europeia, fundado nas consequências da guerra na Ucrânia, na inflação

generalizada, na subida das taxas de juro de referência e do preço dos combustíveis e da energia, ao abrigo

do artigo 21.º do Regulamento (UE) 2021/241, do Parlamento Europeu e do Conselho, e tendo em conta a

taxa de execução e a taxa de compromisso do PRR, um plano de recuperação e resiliência alterado;

2 – Que o plano alterado a apresentar contemple a transferência de saldos para projetos que tenham como

meta o progresso social, científico e tecnológico, o pleno emprego, o combate à exclusão social e a todas as

discriminações, bem como um elevado nível de proteção e de melhoramento da qualidade do ambiente.

Assembleia da República, 16 de novembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 294/XV/1.ª

RECOMENDA A ELIMINAÇÃO DAS POSIÇÕES INTERMÉDIAS NAS CATEGORIAS DOS

ENFERMEIROS ESPECIALISTAS E GESTORES COLOCADOS NA 1.ª E 2.ª POSIÇÕES

REMUNERATÓRIAS E A RESPETIVA ATUALIZAÇÃO SALARIAL

Exposição de motivos

A aplicação da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de fevereiro, que estabelece os regimes de vinculação, de carreiras

4 Recupera-se o relatório de 2020, levado a cabo pela EUROSTAT, sobre o rendimento e as condições de vida dos cidadãos europeus para suportar os custos relacionados com o aquecimento adequado da sua habitação, que conclui como se cita: «De acordo com o inquérito realizado, em 2018, 7% da população da União Europeia não dispunha de capacidade financeira para aquecer a sua habitação. (…) Portugal encontra-se no grupo de países com as percentagens mais altas neste inquérito, situando-se no quinto lugar com 19% das pessoas com dificuldades financeiras em aquecer suficientemente a sua habitação.»: https://www.gee.gov.pt/pt/en/daily-indicators/list-gee-daily-indicators/29778-eurostat-rendimento-e-as-condicoes-de-vida-dos-cidadaos-europeus-aquecimento-habitacional-2 A este propósito, o Livre formulou e sugeriu, aquando da discussão da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2022, a criação do Programa 3C – Casa, Conforto e Clima, cuja configuração melhorou e alargou, agora em sede da Proposta de Lei n.º 38/XV/1.ª, que visa aprovar o Orçamento do Estado para 2023. 5 «Bater-se por uma flexibilização quanto ao ritmo e prazo de concretização do Mecanismo de Recuperação e Resiliência (MRR)»; «(…) flexibilização do calendário de concretização dos investimentos aí previstos» – Nota Explicativa da Secretaria de Estado dos Assuntos Europeus para o OE2023, página XII.

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e de remunerações dos trabalhadores que exercem funções públicas, e entretanto parcialmente revogada pela

nova Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho),

originou uma incongruência salarial nas posições intermédias nas categorias de enfermeiros especialistas e

enfermeiros gestores.

Pese embora as mais recentes negociações entre os sindicatos dos enfermeiros e o Ministério da Saúde,

potencialmente frutíferas em matéria de contagem integral do tempo de serviço para efeitos de progressão na

carreira, esta é uma questão que subsiste e que criará uma inversão remuneratória na qual enfermeiros mais

qualificados se encontrarão em posição remuneratória inferior à de colegas menos qualificados.

Atendendo ao número circunscrito de profissionais afetados e, portanto, ao impacto limitado que a

regularização destas posições remuneratórias terá no orçamento do estado, entende o Livre que urge a

correção desta realidade pelo que, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o

Deputado do Livre propõe que a Assembleia da República, através do presente projeto de resolução,

recomende ao Governo que:

1 – Elimine as posições intermédias nas categorias de enfermeiros especialistas e enfermeiros gestores

que se encontram, respetivamente, nas 1.ª e 2.ª posições remuneratórias;

2 – Atualize a progressão salarial destes profissionais, passando-os para a posição remuneratória

imediatamente a seguir à intermédia atual.

Assembleia da República, 16 de novembro de 2022.

O Deputado do L, Rui Tavares.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 295/XV/1.ª

PELO INCENTIVO À CRIAÇÃO DE MEDIDAS DE RECUPERAÇÃO DE RASTREIOS DO CANCRO DA

MAMA E À APROVAÇÃO DO FINANCIAMENTO DE TERAPÊUTICA POR LYNPARZA® (OLAPARIB)

Exposição de motivos

Portugal, de acordo com os últimos dados conhecidos, conta com uma população feminina de 54331

milhões. A segunda causa de morte, na mulher, é por cancro, sendo o cancro da mama o tipo mais comum.

Estima-se que nos países desenvolvidos, 12,5 % das mulheres irá desenvolver esta patologia, o que significa

que uma em cada oito mulheres será, durante a sua vida, afetada pelo cancro da mama.

Em 2020 e 2021, consequência dos ajustamentos do Sistema Nacional de Saúde (SNS) que foram

considerados necessários na resposta à emergência de saúde pública de combate e controlo da pandemia

COVID-19, muitas doenças foram desvalorizadas e passaram para um plano secundário.

Milhares de portugueses viram, a partir de 2020, as suas consultas, rastreios e tratamentos serem adiados

ou anulados por impossibilidade de resposta do SNS. Segundo os dados disponibilizados pelo Portal da

Transparência do SNS, que permitem realizar uma análise do impacto da pandemia COVID-19 na prestação

de cuidados de saúde em Portugal, há que destacar o facto de que em janeiro de 2020 realizavam-se em

média 33 485,65 consultas presenciais por dia, e em abril desse mesmo ano vimos esse número reduzir para

8116,32, ou seja, uma descida de 75,8 %2.

Acresce referir que, atualmente ainda estamos longe de atingir os números verificados no período pré-

pandemia, ou seja, verifica-se que em setembro deste ano realizaram-se em média 26 116,05 consultas

presenciais, ou seja -22 % do que em janeiro de 2020.

1 Portugal: População residente, média anual: total e por sexo | Pordata 2 Consultas Médicas nos Cuidados de Saúde Primários — Transparência (sns.gov.pt)

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Neste seguimento, e segundo estudos3 realizados com base nos dados do Portal da Transparência do SNS

e do BI dos Cuidados de Saúde Primários, recolhidos entre 14 e 29 de outubro de 2021 estima-se que em

2021 ainda tenham ficado por realizar -148 845 mamografias comparativamente a 2019 e -1868 diagnósticos

de «neoplasia maligna da mama feminina».

Sabendo que quanto ao cancro da mama, a taxa de incidência está em desenvolvimento e a aumentar

rapidamente, pese embora as mortes por esta patologia tenham diminuído nas últimas décadas, consequência

de tratamentos mais eficazes e deteção da doença em estágios mais precoces, é também de elevada

importância considerar o necessário melhoramento da qualidade de vida dos doentes, e incluir

continuadamente novas terapêuticas, alternativas à quimioterapia tradicional, que permitam condicionar o

agravamento da doença, elevar as taxas de sobrevivência e cumulativamente aligeirar reações adversas.

Relativamente a novas terapêuticas que ainda não são comparticipadas pelo SNS, destacamos o

Lynparza4. Este fármaco está indicado para o tratamento de diversos tipos de cancro e particularmente em5:

• «Monoterapia ou em associação com terapia endócrina para o tratamento adjuvante de doentes adultos

com mutações BRCA1/2 germinativas, que têm cancro da mama precoce de alto risco HER2-negativo

previamente tratado com quimioterapia neoadjuvante ou adjuvante»;

• E em «Monoterapia para o tratamento de doentes adultos com mutações BRCA1/2 germinativas, que têm

cancro da mama metastático ou localmente avançado HER2 negativo».

Em 2014, a Agência Europeia do Medicamento (EMA) concedeu Autorização de Introdução no Mercado

para este medicamento em toda a União Europeia, referindo que o mesmo se mostrou eficaz num estudo que

incluiu 302 doentes com cancro da mama. De acordo com a EMA, «as doentes tratadas com Lynparza

viveram, em média, sete meses sem agravamento da doença, em comparação com quatro meses, em

doentes tratadas com outro medicamento», nomeadamente a quimioterapia tradicional, facto ao qual acresce

que as reações adversas são manifestamente mais ligeiras permitindo um uso continuado do tratamento e

melhorias significativas na qualidade de vida das doentes.

Apesar de já existir, conforme referido, Autorização de Introdução no Mercado emitida, o financiamento

deste fármaco requer aprovação individual e deferimento pela Autoridade Nacional do Medicamento e

Produtos de Saúde (INFARMED). Porém, os indeferimentos sucedem-se e com isso várias mulheres perdem

tempo, perdem qualidade de vida e sobretudo perdem esperança.

Foi o caso da autora da Petição n.º 229/XIV/2.ª6, Tatiana Zezola Bond, doente com cancro da mama

metastático, subscrita à data da sua entrada, em 7 de abril de 2021, por 11 011 cidadãos. Os peticionários

afirmam que «(…) os pedidos submetidos pelos oncologistas (…) são rejeitados pelo INFARMED com a

justificação de que existem ainda alternativas terapêuticas, nomeadamente a quimioterapia». Na mesma

exposição, consideram «(…) quase negligente que as recomendações dos oncologistas (…) não sejam as

principais conducentes das decisões terapêuticas adequadas a cada doente. É também inconcebível que o

INFARMED considere que a quimioterapia clássica seja uma alternativa terapêutica realista demonstrando

assim um completo menosprezo pela qualidade de vida dos doentes.»

Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do Chega recomendam ao Governo que:

1 – No âmbito do cancro da mama, proceda à realização de diagnóstico urgente da situação atual, com

levantamento do número total de atos médicos, que foram adiados ou cancelados;

2 – Proceda ao desenho e implementação das Medidas de Recuperação de Rastreios do Cancro da

Mama;

3 – Diligencie no sentido de aprovação do financiamento de terapêutica por Lynparza® (Olaparib) a todas

as doentes de cancro da mama com diagnósticos clínicos declarados elegíveis por médico especialista.

3 PowerPoint Presentation (saudeemdia.pt) 4 Comprar Lynparza (olaparib) Online – Preço & Custos | Everyone.org 5 Lynparza, INN-olaparib (europa.eu) 6 doc.pdf (parlamento.pt)

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Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 296/XV/1.ª

APROVAÇÃO DE TABELA COM VALORES ATUARIAIS ESPECÍFICOS PARA PRATICANTES

DESPORTIVOS PROFISSIONAIS, APLICÁVEIS À REMIÇÃO DE PENSÕES POR ACIDENTE DE

TRABALHO

Exposição de motivos

O praticante desportivo profissional é aquele que, estando registado, desenvolve a prática desportiva nos

limites da capacidade do ser humano e que, por maioria de razão, tem riscos agravados, quer no seu treino,

quer em competição, estando sujeito a um maior número de lesões. Os acidentes de trabalho dos praticantes

desportivos profissionais, por tal motivo, diferem dos acidentes de trabalho mais comuns, quer pela geralmente

baixa incapacidade permanente parcial (IPP) que lhes é arbitrada, quer pelo facto – principalmente, no caso

dos jogadores profissionais de futebol – de estar em causa, por vezes, um valor de vencimento anual muito

superior ao do comum trabalhador por conta de outrem, quer ainda pela curta carreira do desportista, que não

ultrapassa, em regra, os 35 anos de idade.

Reconhecendo essa realidade, o legislador nacional criou um regime específico para a reparação dos

danos emergentes de acidentes de trabalho dos praticantes desportivos profissionais, primeiro, com a Lei n.º

8/2003, de 12 de maio, e, depois, com a Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, que revogou aquela. Também esta,

contudo, já necessita de ajustamentos, por forma a consagrar soluções mais justas e equitativas, que não se

traduzam em encargos desproporcionados por parte das entidades responsáveis pelo ressarcimento dos

danos.

A especificidade dos acidentes de trabalho destes trabalhadores determinou que a legislação que lhes é

própria integrado uma tabela de comutação específica que atende à curta duração da carreira e à maior

gravidade que importam as lesões no corpo do atleta.

Essa tabela, prevista no artigo 6.º da Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, determina que, ao grau de

incapacidade resultante da aplicação da tabela nacional de incapacidades por acidente de trabalho e doenças

profissionais, corresponde um grau de incapacidade previsto na tabela de comutação específica para a

atividade de praticante desportivo profissional, sempre que a IPP seja de valor igual ou superior a 6 %. Tal

bonificação varia em função do grau de IPP, como é natural, que se combina com a idade do desportista à

data do acidente, para produzir o valor final da IPP a considerar para efeitos de fixação da pensão anual

vitalícia.

Sucede que, de acordo com o disposto no artigo 75.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro (Regulamenta o

Regime de Reparação de Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais – LAT), existem casos em que a

remição da pensão anual vitalícia é obrigatória, existindo igualmente a possibilidade de remição parcial

daquela mesma pensão, em determinadas circunstâncias.

Ora, o regime jurídico constante da Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, não foi acompanhado de uma portaria

específica, que aprovasse as bases técnicas e tabelas práticas aplicáveis ao cálculo do capital de remição das

pensões anuais vitalícias dos praticantes desportivos profissionais, bem como os valores do seu

caucionamento – ou seja, uma tabela que traduzisse a já identificada especificidade destes acidentes de

trabalho, que fosse pensada para uma vida ativa que, em regra, não ultrapassa os 35 anos, cujos beneficiários

auferem retribuições muito superiores à retribuição auferida pelo restantes sinistrados e cujo desgaste,

decorrente da sua atividade profissional, encurta significativamente o período de vida ativa, a tal ponto que, na

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própria Lei n.º 27/2011, de 16 de junho, se sentiu a necessidade de estabelecer formas de cálculo de pensão

diferentes, até à data em que o praticante desportivo profissional complete 35 anos de idade, e após essa

data.

Todavia, a Portaria n.º 11/2000, de 13 de janeiro (Aprova as bases técnicas aplicáveis ao cálculo do capital

de remição das pensões de acidentes de trabalho e aos valores de caucionamento das pensões de acidentes

de trabalho a que as entidades empregadoras tenham sido condenadas ou a que se tenham obrigado por

acordo homologado), está pensada para uma vida ativa muito superior aos 35 anos, pois a maioria dos

trabalhadores por conta de outrem trabalha até aos 60 ou 66 anos (e alguns meses).

Significa isto, em suma, que ainda não foram criadas tabelas atuariais específicas que tenham em conta,

no cálculo do capital de remição de pensões de acidente de trabalho, a circunstância de que estas profissões

se configuram como profissões de desgaste rápido, de baixa média etária, com carreiras cuja duração é

bastante inferior à das demais carreiras profissionais.

A consequência de uma remição que não toma em consideração a curta carreira do sinistrado, portanto, é

dar origem a cálculos de capital de remição de montante significativamente elevados, porque assentes nos

elevados salários que tais sinistrados auferem durante a sua carreira profissional, que, em regra, não

ultrapassa os 35 anos de idade e, por isso mesmo, se situa nos valores mais altos da taxa aplicável à remição.

Esta solução é manifestamente pouco equitativa – face às tabelas atuariais aprovadas pela referida

Portaria –, pois não podemos esquecer que a IPP sobre a qual vai ser aplicada a taxa prevista para a remição

já é uma IPP bonificada pela tabela de comutação aplicável aos praticantes desportivos profissionais.

Nestes termos, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da

República recomenda ao Governo que tome todas as medidas necessárias à aprovação e publicação de ato

regulamentar que aprove as bases técnicas aplicáveis ao cálculo do capital de remição das pensões de

acidentes de trabalho e aos valores de caucionamento das pensões de acidentes de trabalho a que as

entidades empregadoras tenham sido condenadas ou a que se tenham obrigado por acordo homologado, que

tenha em conta a especificidade decorrente do regime jurídico de reparação dos acidentes de trabalho de

praticantes desportivos profissionais.

Palácio de São Bento, 16 de novembro de 2022.

Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo —

Gabriel Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto —

Rita Matias — Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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