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Quinta-feira, 12 de janeiro de 2023 II Série-A — Número 145
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 235, 416, 423 e 486/XV/1.ª): N.º 235/XV/1.ª (Regime de preços dos bens alimentares essenciais): — Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas. N.º 416/XV/1.ª (Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto): — Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas. N.º 423/XV/1.ª (Cria mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens alimentares essenciais): — Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas. N.º 486/XV/1.ª (CH) — Altera o Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, no sentido de isentar de custas os funcionários públicos, em processo penal por ofensa sofrida no exercício
das suas funções, ou por causa delas. Projetos de Resolução (n.os 376 a 380/XV/1.ª): N.º 376/XV/1.ª (PSD) — Pela instalação de centrais de dessalinização com planeamento, fundamentação e transparência. N.º 377/XV/1.ª (BE) — Reforço do apoio sustentado às artes 2023-2026. N.º 378/XV/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo o fim dos apoios e lucros perversos no âmbito do comércio de carbono. N.º 379/XV/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo que proceda à atualização salarial dos professores e correspondência com os elevados níveis de exigência que a profissão docente implica. N.º 380/XV/1.ª (IL) — Reforma do regadio.
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PROJETO DE LEI N.º 235/XV/1.ª
(REGIME DE PREÇOS DOS BENS ALIMENTARES ESSENCIAIS)
Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas
1. Nota introdutória
O PCP apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 235/XIV/1.ª – Regime de preços dos bens
alimentares essenciais – a 20 de julho de 2022, tendo sido admitido e baixado à Comissão de Agricultura e
Pescas (CAPes), comissão competente, a 21 de julho de 2022.
Foi disponibilizada nota técnica, que é parte integrante do presente parecer.
2. Objeto
A iniciativa do PCP em análise pretende criar um regime de preços máximos, a aplicar a um cabaz alimentar
essencial. O objetivo pretendido é a existência de um preço de referência para produtos alimentares, sujeitos à
taxa reduzida de IVA de 6 %, através da construção de um preço de referência para cada um dos produtos,
evitando, assim, a especulação e a prática de preços de venda «sem justificação atendível», argumentam os
proponentes.
De acordo com o artigo 3.º do projeto de lei em apreço, a definição do preço de referência efetua-se através
de uma fórmula que incorpore diversos custos [alínea a) a g)], uma margem de lucro não especulativa [alínea
h)], e impostos e taxas [alínea i)]. Adicionalmente, o diploma proíbe a venda especulativa definida como a venda
a um preço superior ao preço de referência, sem justificação atendível (artigo 5.º).
De acordo com o artigo 1.º (Objeto), o projeto de lei em análise «cria o regime de controlo de preços sobre
os produtos do Cabaz Alimentar Essencial (RCPCAE), que garante o controlo das margens dos operadores do
setor da distribuição alimentar e logística».
Como âmbito de aplicação subjetiva (artigo 2.º) do diploma, ou seja, do regime de controlo de preços, o PCP
determina que são as atividades com: «comércio por grosso de produtos alimentares e bebidas, e respetivos
agentes»; «comércio a retalho de produtos alimentares e bebidas, em estabelecimentos especializados ou não
especializados, e respetivos agentes»; e «atividades de logística, transporte e armazenagem, associados às
atividades (…)». Adicionalmente, o projeto de lei exclui do regime as atividades com área de venda inferior a
500 m2; as atividades cuja faturação seja inferior a 1 milhão de euros, ou as atividades classificadas como
cooperativas de consumidores, ao abrigo do Código Cooperativo.
A execução e fiscalização (artigo 7.º) do regime de controlo de preços sobre os produtos do cabaz alimentar
essencial (RCPCAE) é determinada como sendo responsabilidade dos Ministérios da Agricultura e Alimentação
e da Economia, «que podem nomear uma entidade para a sua operacionalização».
O PCP define ao nível do regime sancionatório (artigo 9.º) coimas entre 5000 euros e 2 500 000 euros, e o
regime sancionatório deve ser aplicado a cada uma das lojas onde seja detetado o incumprimento.
A motivação do PCP na apresentação do Projeto de Lei n.º 235/XV/1.ª é intervir nas margens de lucro
especulativas da grande distribuição, que, segundo o PCP, aproveita «oportunisticamente a guerra e as sanções
para aumentar de forma significativa os preços de muitos bens alimentares essenciais, com vista a aumentar a
sua margem de lucro».
3. Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimentos da lei
formulário
A presente iniciativa legislativa é apresentada pelo PCP no âmbito do poder de iniciativa da lei, em
conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da
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República Portuguesa e no artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). Respeita os requisitos
formais relativos às iniciativas em geral e aos projetos de lei, em particular, previstos no artigo 124.º do
Regimento.
De acordo com a nota técnica, que é parte integrante do presente parecer, e caso a aprovação da iniciativa
se verifique, o título da mesma deve ser objeto de aperfeiçoamento formal.
4. Enquadramento legal
A nota técnica que é parte integrante do presente parecer detalha e enquadra detalhadamente a questão em
termos legislativos nacionais e comunitários, razão pela qual se remete o enquadramento legal e jurídico para a
referida nota.
Sem prejuízo, recorda-se que estão agendadas para discussão em Plenário da Assembleia da República de
dia 12 de janeiro de 2023, as seguintes iniciativas:
• Projeto de Lei n.º 235/XV/1.ª (PCP) – Regime de preços dos bens alimentares essenciais.
• Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e
de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto.
• Projeto de Lei n.º 417/XV/1.ª (PAN) – Cria incentivos fiscais à doação de alimentos e combate ao
desperdício alimentar, procedendo à alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código do IRC.
• Projeto de Lei n.º 418/XV/1.ª (PAN) – Possibilita a aplicação de IVA zero à aquisição de bens alimentares
essenciais durante o ano de 2023.
• Projeto de Lei n.º 423/XV/1.ª (BE) – Cria mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens
alimentares essenciais.
• Projeto de Lei n.º 436/XV/1.ª (CH) – Isenta de IVA os bens alimentares essenciais.
5. Opinião do relator
O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto
de Lei n.º 235/XV/1.ª, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, reservando o seu grupo parlamentar a sua
posição para o debate em Plenário.
6. Conclusões
A Comissão de Agricultura e Pescas é de parecer que o Projeto de Lei n.º 235/XV/1.ª – Regime de preços
dos bens alimentares essenciais –, reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido e votado
em Plenário.
Palácio de São Bento, 5 de janeiro de 2023.
O Deputado relator, Paulo Ramalho — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD, do CH, da IL e do PCP,
tendo-se registado a ausência do BE, na reunião da Comissão de 10 de janeiro de 2023.
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7. Anexos
Nota técnica, elaborada ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.
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PROJETO DE LEI N.º 416/XV/1.ª
(APROVA MEDIDAS DE PROMOÇÃO DA DOAÇÃO DE GÉNEROS ALIMENTÍCIOS E DE COMBATE
AO DESPERDÍCIO ALIMENTAR, ALTERANDO A LEI N.º 62/2021, DE 19 DE AGOSTO)
Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas
Índice
I. Considerandos
1. Nota introdutória
2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa
3. Enquadramento e antecedentes
4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
II. Opinião da relatora
III. Conclusões e parecer
1. Conclusões
2. Parecer
IV. Anexos
I. Considerandos
1. Nota introdutória
O Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e
de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto – deu entrada a 15 de
dezembro de 2022, acompanhado da respetiva ficha de avaliação prévia de impacto de género.
O Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) foi admitido a 16 de dezembro de 2022 e, no mesmo dia, por despacho
de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República baixou, na fase da generalidade, à Comissão de Agricultura
e Pesca.
A 20 de dezembro, na reunião ordinária da Comissão de Agricultura e Pescas, foi atribuída a elaboração do
parecer ao Grupo Parlamentar do Partido Socialista, que indicou como relatora a signatária Deputada Clarisse
Campos.
2. Objeto e motivação da iniciativa legislativa
O Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e
de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto –, apresentado pela Deputada
única representante do Pessoas-Animais-Natureza (DURP PAN), tem por objeto proceder à alteração da Lei n.º
62/2021, de 19 de agosto, com a introdução de algumas medidas adicionais que visam a promoção da adoção
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de boas práticas na prevenção do desperdício alimentar.
A proponente, DURP PAN, justifica a apresentação da iniciativa, entre outros, com os seguintes argumentos:
- «(…) pretende-se clarificar as regras sobre o destino dado aos géneros alimentícios que não estejam em
condições para doação (…) uma questão omissa no atual regime. Desta forma (…) pretende que, para
evitar o desperdício destes géneros alimentícios, os mesmos tenham de ser encaminhados para a
utilização como subproduto noutro setor industrial ou, enquanto resíduo, para soluções de valorização
orgânica».
- «(…) pretende-se estabelecer obrigações para os supermercados e empresas similares, relativamente aos
géneros alimentícios habitualmente considerados como «fruta feia», «imperfeita» ou «inestética». (…)
prevê-se a consagração da obrigação destas entidades – (…) passarem a ter de dispor de secções de
vendas para os géneros alimentícios ditos «feios», «imperfeitos» ou «inestéticos».
- «(…) pretende-se reforçar o compromisso do Governo no combate ao desperdício alimentar e criar medidas
de sensibilização dos cidadãos e das empresas (…) prevê-se neste projeto de lei que o Governo tenha
de elaborar guias de boas práticas com o objetivo de melhorar a gestão alimentar e de reduzir perdas e
desperdício de alimentos e que leve a cabo ações de promoção do consumo de produtos sazonais, locais,
orgânicos e ambientalmente sustentáveis (…)».
3. Enquadramento e antecedentes
i. Apreciação de requisitos constitucionais, regimentais e formais
O Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e
de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto – foi subscrito por DURP
PAN, ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º da Constituição e do artigo 119.º do Regimento da
Assembleia da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei.
De acordo com a nota técnica anexa:
- «A iniciativa em análise toma a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo
119.º do Regimento».
- «A iniciativa encontra-se redigida sob a forma de artigos, tem uma designação que traduz sinteticamente o
seu objeto principal e é precedida de uma breve exposição de motivos, cumprindo, assim, os requisitos
formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do RAR».
- «Observa igualmente os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do
Regimento, uma vez que parece não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e define
concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa».
ii. Verificação do cumprimento da lei formulário
Ainda conforme a nota técnica anexa:
- «O título da presente iniciativa legislativa, traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se conforme ao
disposto no n.º 2 do artigo 7.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro (lei formulário)».
- «A iniciativa pretende alterar a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto, e elenca o número de ordem de alteração,
previsto no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário».
- «Em caso de aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade
com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário».
Para mais detalhes dever-se-á consultar a nota técnica apresentada em Parte IV – anexos.
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4. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a mesma matéria
Consultada a base de dados da Atividade Parlamentar (AP), verificou-se, que na atual Legislatura, apenas
foi identificada a seguinte iniciativa:
− Projeto de Lei n.º 417/XV/1.ª (PAN) – Cria incentivos fiscais à doação de alimentos e combate ao
desperdício alimentar, procedendo à alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código do IRC.
Contudo, registam-se as seguintes iniciativas legislativas que, embora não incidam sobre a mesma matéria,
estão indiretamente relacionadas e se encontram agendadas, para a discussão na generalidade, na mesma
data que o projeto de lei em análise, em 12/01/2023:
− Projeto de Lei n.º 235/XV/1.ª (PCP) – Regime de preços dos bens alimentares essenciais;
− Projeto de Lei n.º 418/XV/1.ª (PAN) – Possibilita a aplicação de IVA zero à aquisição de bens alimentares
essenciais durante o ano de 2023;
− Projeto de Lei n.º 423/XV/1.ª (BE) – Cria mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens
alimentares essenciais;
− Projeto de Lei n.º 436/XV/1.ª – Isenta de IVA os bens alimentares essenciais.
Ainda, em termos de antecedentes parlamentares, sinalizam-se as seguintes iniciativas da XIV Legislatura,
incidindo sobre matéria conexa com a da presente iniciativa:
− Projeto de Lei n.º 487/XIV/1.ª (PAN) – Aprova o regime jurídico aplicável à doação de géneros alimentares
para fins de solidariedade social e medidas tendentes ao combate ao desperdício alimentar – deu origem
à Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto.
- Projeto de Lei n.º 537/XIV/2.ª (PCP) – Consagra medidas de promoção do escoamento de bens alimentares
da pequena agricultura e agricultura familiar e cria um regime público simplificado para aquisição e
distribuição de bens alimentares provenientes da pequena e média agricultura e pecuária nacional e da
agricultura familiar, combatendo o desperdício alimentar – caducado.
− Projeto de Lei n.º 544/XIV/1.ª (PEV) – Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar em Portugal, que
deu origem à Lei n.º 51/2021, de 30 de julho, referente ao Inquérito nacional sobre o desperdício alimentar
em Portugal – aprovado por unanimidade.
Na XIII Legislatura, destacam-se os projetos de lei que tratam de matérias conexas com a da presente
iniciativa:
− Projeto de Lei n.º 932/XIII/4.ª (PAN) – Estabelece o regime legal aplicável à doação de géneros alimentares,
para fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal –
caducado a 24/10/2019.
− Projeto de Lei n.º 266/XIII/1.ª (PAN) – Estabelece o regime aplicável à doação de géneros alimentares, para
fins de solidariedade social, por forma a combater a fome e o desperdício alimentar em Portugal – rejeitado
a 22/12/2016.
II. Opinião da relatora
Nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento a opinião do relator é de elaboração facultativa, pelo que
a Deputada relatora se exime, nesta sede, de emitir considerações políticas, reservando a sua posição para a
discussão em sessão plenária.
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III. Conclusões e parecer
1. Conclusões
- A DURP PAN apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova
medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e de combate ao desperdício alimentar,
alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto –, tendo sido admitido a 29 de setembro de 2022;
- O Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios
e de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto – cumpre os
requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º, no n.º 1 do artigo 123.º e no n.º 1 do artigo 124.º do
RAR.
2. Parecer
- A Comissão de Agricultura e Pescas é de parecer que o Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova
medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e de combate ao desperdício alimentar,
alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto – reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser
discutido e votado em Plenário da Assembleia da República.
Palácio de São Bento, 10 de janeiro de 2023.
A Deputada relatora, Clarisse Campos — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo.
Nota: O parecer foi aprovado por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD, do CH, da IL e do PCP,
tendo-se registado a ausência do BE, na reunião da Comissão de 10 de janeiro de 2023.
IV. Anexos
Nota técnica elaborada pelos Serviços da Assembleia da República, ao abrigo do artigo 131.º do Regimento
da Assembleia da República.
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PROJETO DE LEI N.º 423/XV/1.ª
(CRIA MECANISMOS DE INTERVENÇÃO E FIXAÇÃO DE PREÇOS NOS BENS ALIMENTARES
ESSENCIAIS)
Parecer da Comissão de Agricultura e Pescas
1. Nota introdutória
O Bloco de Esquerda (BE) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 423/XIV – Cria
mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens alimentares essenciais –, a 16 de dezembro de 2022,
tendo sido admitido e baixado à Comissão de Agricultura e Pescas (CAPes), comissão competente, a 20 de
dezembro de 2022.
Foi disponibilizada nota técnica que é parte integrante do presente parecer.
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2. Objeto
A iniciativa do Bloco de Esquerda (BE) em análise, em formato de projeto de lei, apresenta-se de forma
simples com três artigos.
Pretende-se a criação de um mecanismo de intervenção e fixação de preços nos bens alimentares essenciais
(artigo 1.º) no qual é definido o preço máximo de comercialização de bens alimentares integrantes de um cabaz
de bens alimentares para «alimentações completas», garantindo preços não especulativos e o desagravamento
do custo de vida (artigo 2.º).
De acordo com o Bloco de Esquerda (BE) a regulamentação fica a cargo do Governo, «sendo sujeitos a
publicação no site do governo a composição e os preços máximos respeitantes aos bens alimentares», e a sua
entrada em vigor prevista para 90 dias após a sua «aprovação».
A motivação do Bloco de Esquerda (BE) na apresentação da iniciativa em apreço relaciona-se com a atual
situação, que se carateriza por uma inflação elevada, com aumentos consecutivos nos preços dos alimentos. O
BE descreve o retrato da atual crise de inflação como: «lucros milionários das grandes empresas à custa de
esmagarem, com os preços que fixam, os salários dos trabalhadores e a sobrevivência dos produtores».
Indica ainda na exposição de motivos do Projeto de Lei n.º 423/XV que no mercado nacional se verifica
«fixação de preços, em regime similar a cartel» e que tal «tem sido amplamente usada pelas grandes superfícies
em benefício dos seus lucros e em prejuízo dos consumidores».
3. Conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e cumprimentos da lei
formulário
A presente iniciativa legislativa é apresentada pelo Bloco de Esquerda (BE) no âmbito do poder de iniciativa
da lei, em conformidade com o disposto no n.º 1 do artigo 167.º e da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da
Constituição da República Portuguesa e no artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
Respeita os requisitos formais relativos às iniciativas em geral e aos projetos de lei, em particular, previstos nos
artigos 124.º do Regimento.
De acordo com a nota técnica, que é parte integrante do presente parecer, e caso a aprovação da iniciativa
se verifique, sugere-se o estabelecimento de um prazo a contar da sua publicação, conforme é mais usual.
4. Enquadramento legal
O presente parecer remete este capítulo para a nota técnica que é parte integrante deste parecer.
Sem prejuízo, recorda-se que está agendada para discussão em Plenário da Assembleia da República de
dia 12 de janeiro de 2023, a iniciativa em análise bem como os seguintes:
• Projeto de Lei n.º 235/XV/1.ª (PCP) – Regime de preços dos bens alimentares essenciais.
• Projeto de Lei n.º 416/XV/1.ª (PAN) – Aprova medidas de promoção da doação de géneros alimentícios e
de combate ao desperdício alimentar, alterando a Lei n.º 62/2021, de 19 de agosto.
• Projeto de Lei n.º 417/XV/1.ª (PAN) – Cria incentivos fiscais à doação de alimentos e combate ao
desperdício alimentar, procedendo à alteração do Estatuto dos Benefícios Fiscais e do Código do IRC.
• Projeto de Lei n.º 418/XV/1.ª (PAN) – Possibilita a aplicação de IVA zero à aquisição de bens alimentares
essenciais durante o ano de 2023.
• Projeto de Lei n.º 423/XV/1.ª (BE) – Cria mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens
alimentares essenciais.
• Projeto de Lei n.º 436/XV/1.ª (CH) – Isenta de IVA os bens alimentares essenciais.
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5. Opinião do relator
O signatário do presente parecer exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o Projeto
de Lei n.º 423/XV, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do Regimento
da Assembleia da República n.º 1/2020, de 31 de agosto, reservando o seu grupo parlamentar a sua posição
para o debate em Plenário.
6. Conclusões
A Comissão de Agricultura e Pescas (CAPes) é de parecer que o Projeto de Lei n.º 423/XV – Cria
mecanismos de intervenção e fixação de preços nos bens alimentares essenciais –, reúne os requisitos
constitucionais e regimentais para ser discutido e votado em Plenário.
Palácio de São Bento, 9 de janeiro de 2023.
O Deputado relator, Paulo Ramalho — O Presidente da Comissão, Pedro do Carmo.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD, do CH e do PCP, tendo-
se registado a ausência, da IL e do BE, na reunião da Comissão de 10 de janeiro de 2023.
7. Anexos
Nota técnica, elaborada ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da Assembleia da República.
———
PROJETO DE LEI N.º 486/XV/1.ª
ALTERA O REGULAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS, APROVADO PELO DECRETO-LEI N.º
34/2008, DE 26 DE FEVEREIRO, NO SENTIDO DE ISENTAR DE CUSTAS OS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS,
EM PROCESSO PENAL POR OFENSA SOFRIDA NO EXERCÍCIO DAS SUAS FUNÇÕES, OU POR CAUSA
DELAS
Exposição de motivos
O Regulamento das Custas Processuais teve como objetivo a concentração das normas relativas às custas
processuais no mesmo diploma, por oposição à dispersão que se verificava antes da sua aprovação. Conforme
se pode ler no próprio preâmbulo da lei «a presente reforma procurou concentrar todas as regras quantitativas
e de procedimento sobre custas devidas em qualquer processo, independentemente da natureza judicial,
administrativa ou fiscal num só diploma – o novo Regulamento das Custas Processuais – mantendo algumas
regras fundamentais, de carácter substantivo, nas leis de processo». Mas, para além disso, o preâmbulo aponta
outros objetivos, nomeadamente: «a) Repartição mais justa e adequada dos custos da justiça; b) Moralização e
racionalização do recurso aos tribunais, com o tratamento diferenciado dos litigantes em massa; c) Adoção de
critérios de tributação mais claros e objetivos; d) Reavaliação do sistema de isenção de custas; e) Simplificação
da estrutura jurídica do sistema de custas processuais e unificação da respetiva regulamentação; f) Redução do
número de execuções por custas».
É precisamente o sistema de isenção de custas que se pretende alterar, através do presente projeto de lei.
A regra plasmada no artigo 1.º do RCP «é a de que todos os processos estão sujeitos a custas, nos termos
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fixados por esse regulamento, que se aplica a todos os processos, quer eles corram nos tribunais judiciais,
administrativos e fiscais ou no balcão das injunções (artigo 2.º do RCP), abrangendo as custas a taxa de justiça,
os encargos e as custas de parte (artigos 3.º, n.º 1, do RCP e 529.º, n.º 1, do CPC)»1. Acontece que o mesmo
diploma prevê exceções à regra, no artigo 4.º do RCP, sob a epígrafe «isenções», dispondo logo no seu n.º 1
uma série de entidades (são as designadas isenções subjetivas), e no n.º 2 uma série de processos (designadas
isenções objetivas) que se encontram, ab initio, isentas do pagamento de custas. Podemos, assim, verificar que
há lugar a isenção do pagamento de custas para «Os agentes das forças e serviços de segurança, em processo
penal por ofensa sofrida no exercício das suas funções, ou por causa delas». Estamos perante uma isenção
objetiva, no entanto limitada, visto que para ser aplicada temos que estar perante um agente das forças e
serviços de segurança, apenas em matéria penal (portanto excluindo a isenção de custas para processos de
outra natureza) e, para além disso, que diga respeito a ofensa e essa tenha sido sofrida no exercício das suas
funções ou devido ao exercício das suas funções. O Chega é absolutamente favorável à referida isenção e
considera que a solução encontrada tem a sensatez necessária, no entanto, a verdade é que não são só as
forças de segurança que sofrem ofensas no âmbito da sua atividade profissional, pelo que é fundamental alargar
o âmbito da referida norma também a outros funcionários públicos como é o caso dos professores, médicos,
enfermeiros, oficiais de justiça, juízes, etc.
O País e o Estado não podem esquecer casos como o da professora e assistente operacional agredidas na
Escola Básica da Bela Vista em Setúbal (pela mãe de um aluno); da médica agredida na urgência do Hospital
de São Bernardo em Setúbal; do médico agredido no Centro de Saúde de Moscavide em Lisboa (por não ter
prolongado a baixa do agressor); vários bombeiros agredidos no quartel de Borba; da professora primária
grávida agredida numa escola de Marvila em Lisboa; da juíza agredida a soco por uma mulher no Tribunal de
Família e Menores de Matosinhos; de uma enfermeira agredida por um casal no Hospital Santa Maria em Lisboa,
por aí fora. Todas estas pessoas têm duas coisas em comum: são funcionárias públicas ou a exercer funções
de interesse público e estavam a exercer as suas profissões quando sofreram as referidas ofensas.
Ora não se vê razão para que determinados funcionários públicos estejam isentos do pagamento de custas
e outros não, sendo que as situações são semelhantes.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega
apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à vigésima primeira alteração ao Regulamento das Custas Processuais, aprovado
pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro, no sentido de isentar de custas os funcionários públicos ou
outros que estejam a exercer funções de interesse público, em processo penal por ofensa sofrida no exercício
das suas funções, ou por causa delas.
Artigo 2.º
Alterações ao Regulamento das Custas Processuais
É alterado o artigo 4.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de
26 de fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 43/2008, de 27 de agosto, Decreto-Lei n.º 181/2008,
de 28 de agosto, Decreto-Lei n.º 181/2008, de 28 de agosto, Lei n.º 64-A/2008, de 31 de dezembro, Lei n.º 3-
B/2010, de 28 de abril, Decreto-Lei n.º 52/2011, de 13 de abril, Lei n.º 7/2012, de 13 de fevereiro, Lei n.º 66-
B/2012, de 31 de dezembro, Decreto-Lei n.º 126/2013, de 30 de agosto, Lei n.º 72/2014, de 2 de setembro, Lei
n.º 7-A/2016, de 30 de março, Lei n.º 42/2016, de 28 de dezembro, Lei n.º 49/2018, de 14 de agosto, Decreto-
Lei n.º 86/2018, de 29 de outubro, Lei n.º 27/2019, de 28 de março, Lei n.º 2/2020, de 31 de março, Lei n.º 7/2021,
de 26 de fevereiro, e Lei n.º 9/2022, de 11 de janeiro, que passa a ter a seguinte redação:
1 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra (dgsi.pt).
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«Artigo 4.º
Isenções
1 – Estão isentos de custas:
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
l) […]
m) Os agentes das forças e serviços de segurança, ou quaisquer outros funcionários públicos ou que estejam
a exercer funções de interesse público, em processo penal por ofensa sofrida no exercício das suas funções, ou
por causa delas;
n) […]
o) […]
p) […]
q) […]
r) […]
s) […]
t) […]
u) […]
v) […]
x) […]
z) […]
aa) […]
bb) […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor após a aprovação do Orçamento do Estado posterior à sua aprovação.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2023.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
———
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II SÉRIE-A — NÚMERO 145
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 376/XV/1.ª
PELA INSTALAÇÃO DE CENTRAIS DE DESSALINIZAÇÃO COM PLANEAMENTO, FUNDAMENTAÇÃO
E TRANSPARÊNCIA
A dessalinização tem vindo a ganhar maior destaque enquanto solução de abastecimento de água, estando
em curso o processo que levará à construção de uma central no Algarve. O Governo também deixou em aberto
a possibilidade de instalar centrais nas regiões do Oeste e do Alentejo Litoral.
Contudo, há múltiplos aspetos a ponderar que não se compadecem com anúncios políticos. Importa garantir
o devido planeamento e fundamentação técnica, sob pena de termos custos excessivos e desperdício de
recursos.
A adoção de soluções de dessalinização não é novidade, nem a futura central do Algarve será pioneira.
Importa referir que a primeira central de dessalinização em Portugal entrou em funcionamento em 1980, na ilha
do Porto Santo, Madeira, fornecendo água potável à população.
Há, porém, um contexto de agravamento da redução da disponibilidade hídrica que justifica esta opção,
existindo também uma oportunidade de financiamento comunitário que deve ser aproveitada ao abrigo do PRR,
em linha com o previsto no Plano de Eficiência Hídrica do Algarve.
A dessalinização é sem dúvida uma solução a reforçar no portfolio de medidas de eficiência hídrica a nível
nacional, sobretudo em regiões costeiras com maior densidade populacional, onde as alternativas de
abastecimento sejam mais limitadas, como é o caso do Algarve. O PSD é a favor da dessalinização, mas devem
ser acautelados alguns aspetos fundamentais.
É necessário não criar a ideia de que por esta via teremos água inesgotável, que se resolverão todos os
problemas, que poderemos consumir sem restrições.
A dessalinização tem de ser complementar a outras formas de abastecimento, sejam águas subterrâneas ou
superficiais, implicando sempre um uso racional e eficiente. Doutra forma, para além de um problema de
recursos naturais, teremos um problema económico-financeiro.
Estes processos implicam consumos elevados de energia, que pode estar disponível ou não por eletricidade
renovável, a preços que podem ser mais baixos ou elevados, consoante o contexto. Estes custos podem fazer
disparar a fatura, mesmo que em processos intermédios haja recuperação de eletricidade, mas tal não se traduz
num saldo neutro ou positivo.
Importa não esquecer que Portugal terá de caminhar para uma maior cobertura de custos por parte dos
sistemas de abastecimento de água, dado que em muitas regiões e municípios não é pago o real custo da água,
havendo um nível de subsidiação insustentável. Nesta perspetiva, a futura aprovação do plano estratégico para
o abastecimento de água e gestão de águas residuais e pluviais 2030 (PENSAARP 2030) prevê um agravamento
das tarifas ao nível nacional.
A dessalinização pode trazer custos acrescidos gerando um agravamento do preço da água num cenário em
que será mais difícil de mitigar administrativamente.
A dessalinização também não pode ser uma desculpa para não se investir noutras soluções de eficiência
hídrica. No caso do Algarve há um plano regional por implementar e não se pode usar a central de dessalinização
como manobra de distração política.
Olhando para a forma como o processo tem sido conduzido nesta região, tem faltado transparência em vários
aspetos. Destaque para a seleção da localização onde não se conhecem os critérios subjacentes à escolha, que
deviam ser públicos e orientar o processo de avaliação de impacte ambiental.
Face à discricionariedade, abundam na imprensa declarações de políticos locais ou regionais a privilegiarem
localizações que podem não ser as mais adequadas. Esta situação poderá contaminar o processo e gerar
conflituosidade caso as populações não compreendam as razões da futura localização.
Por exemplo, a 12 de outubro de 2022, uma notícia referia: «O estudo do impacto ambiental da Central de
Dessalinização no Algarve começou com 12 localizações, mas, agora, Albufeira parece estar mais perto de ser
o local escolhido. A garantia é dada pelo Presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve»1. Este tipo de
declarações públicas correm o risco de gerar conflituosidade caso não sejam explicados os seus fundamentos.
Noutra dimensão, declarações do Ministro do Ambiente e Ação Climática, de 29 de novembro de 2022,
referiam: «Tomámos a decisão de aumentar a capacidade [da central dessalinizadora do Algarve] tendo em
1 https://rr.sapo.pt/noticia/pais/2022/10/19/albufeira-perto-de-acolher-central-de-dessalinizacao/304256.
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conta aquilo que têm sido as discussões que temos tido no território…»2. Contudo, ficam por explicar quais as
razões que justificam este aumento de capacidade e porque é que tinha sido subestimada anteriormente.
A 10 de novembro de 2022, em contexto de audição no âmbito do Orçamento do Estado para 2023, o Ministro
do Ambiente e Ação Climática abriu a possibilidade de instalação de uma central de dessalinização no Alentejo
Litoral, gerando várias notícias na comunicação social3. Contudo, este projeto deveria estar contemplado em
sede de planeamento, tendo por base previsões de consumo de água e disponibilidades existentes. Infelizmente
a apresentação do plano de eficiência hídrica do Alentejo, várias vezes prometido, tem sofrido sucessivos
adiamentos. Mais uma vez a propaganda sobrepôs-se ao planeamento, o projeto antecipou-se ao programa de
conjunto, a fundamentação foi desvalorizada.
Processos de decisão enviesados geram más decisões e custos acrescidos. No caso do Alentejo Litoral ou
até da região Oeste, pode fazer sentido a instalação de centrais de dessalinização, mas importa conhecer quais
os seus contornos. Anúncios políticos com o mero objetivo propagandístico podem acarretar riscos para a
concretização destes projetos, sobretudo porque também ocultam custos inerentes e privilegiam uma
mensagem ilusória de futura abundância de água (que não será barata).
A gestão da água vai implicar cada vez mais inovação, diversificação de fontes e reforço da eficiência hídrica,
olhando às especificidades de cada região e aos seus consumos. A dessalinização tem muitas vantagens, mas
a tecnologia não dispensa processos de decisão, planeamento e participação pública feitos com competência e
transparência.
Assim, vem o Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata, nos termos da Constituição e do Regimento
da Assembleia da República, recomendar ao Governo que:
1 – Divulgue informação atualizada sobre a evolução dos processos de instalação das centrais de
dessalinização no portal de Internet da Agência Portuguesa do Ambiente, tendo em conta o acompanhamento
feito pelas administrações de região hidrográfica e incluindo estudos técnicos, critérios de localização ou outros
elementos produzidos ao abrigo dos procedimentos de avaliação de impacte ambiental.
2 – Apresente o plano regional de eficiência hídrica do Alentejo fundamentando a decisão de instalar uma
central de dessalinização no Alentejo Litoral e explicando qual o seu modelo de financiamento.
3 – Desenvolva os planos e os estudos necessários para fundamentar devidamente a eventual instalação de
centrais de dessalinização noutras regiões do País, nomeadamente na região Oeste, identificando as respetivas
soluções de financiamento.
4 – Acelere a concretização de medidas que contribuam para o reforço da eficiência hídrica e promovam a
sustentabilidade do setor do abastecimento de água.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2023.
Os Deputados do PSD: Hugo Patrício Oliveira — Bruno Coimbra — Hugo Martins de Carvalho — Rui Cristina
— Alexandre Simões — Carlos Cação — Cláudia André — João Marques — Jorge Salgueiro Mendes — Luís
Gomes — Ofélia Ramos — Sónia Ramos — Duarte Pacheco — João Barreiras Duarte — Olga Silvestre —
Alexandre Poço — António Prôa — António Topa Gomes — Cláudia Bento — Patrícia Dantas — João Moura —
Paulo Ramalho.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 377/XV/1.ª
REFORÇO DO APOIO SUSTENTADO ÀS ARTES 2023-2026.
A Direção-Geral das Artes lançou em maio de 2022 os concursos de apoio sustentado às artes. Os apoios
previstos eram claramente insuficientes, conforme foi denunciado pelo setor. Reconhecendo essas limitações,
2 https://eco.sapo.pt/2022/11/29/governo-quer-aumentar-capacidade-da-central-de-dessalinizacao-do-algarve. 3 https://eco.sapo.pt/2022/11/10/governo-estuda-inaugurar-central-de-dessalinizacao-no-litoral-alentejano/.
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o Governo decidiu reforçar o orçamento previsto para os concursos, os quais passaram de 81,3 milhões de
euros para 148 milhões de euros.
No entanto, este reforço foi duplamente ineficaz. Em primeiro lugar porque continua a deixar de fora projetos
com boa avaliação que apenas não são financiados por falta de verba. Em segundo lugar porque o reforço foi
todo direcionado para os projetos quadrienais (2023-2026). Desta forma, as entidades que apresentaram bienais
(2023-2024) foram prejudicadas, com uma taxa de sucesso completamente desproporcionada. Exemplo gritante
das consequências desta decisão do Ministério da Cultura é o caso da dança: das 21 entidades que concorreram
a apoio no concurso de dança a 2 anos, apenas 8 serão contempladas, ao passo que 11 das 12 que tinham
projetos a 4 anos serão financiadas. Havendo duas modalidades de financiamento, as entidades que
concorreram a uma delas foram discriminadas.
Este problema afetou todos os concursos. Houve entidades com provas dadas com muitos anos de trabalho
que ficaram sem financiamento apenas pelas limitações do orçamento. Esta situação preocupante para a cultura
levou o Bloco de Esquerda a propor para o Orçamento do Estado para 2023 um reforço do apoio sustentado às
artes 2023-2026. A iniciativa do Bloco de Esquerda não foi aprovada, teve os votos contra do PS e da IL e a
abstenção do PSD. Conforme foram saindo os resultados provisórios, o problema confirmou-se.
No próprio dia da votação final do Orçamento do Estado, o Bloco de Esquerda apresentou um requerimento
para que o Ministro da Cultura fosse chamado à Comissão de Cultura, Comunicação, Juventude e Desporto
para uma audição sobre a situação crítica vivida pelas entidades da cultura que ficaram sem financiamento nos
concursos de apoio sustentado às artes. O ministro não só tardou em ir ao Parlamento responder sobre esta
matéria, como na audição de dia 11 de janeiro de 2023, mesmo com protestos do setor artístico nas ruas, não
apresentou qualquer solução viável. É dever da Assembleia da República dar voz aos apelos do setor das artes.
Entidades apoiadas e entidades não apoiadas reconhecem que será nocivo para o setor pôr em causa tantos
projetos relevantes. Há bons projetos, com boa avaliação, que ficam pelo caminho. Há companhias com anos
de trabalho, cuja massa crítica será desperdiçada se tiverem de fechar por falta de financiamento.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Através dos mecanismos orçamentais à sua disposição, transfira para a Direção-Geral das Artes as
verbas necessárias ao apoio a todas as estruturas consideradas elegíveis ao apoio quadrienal ou bienal nos
concursos do Programa de Apoio Sustentado 2023/2026.
2 – Abra uma negociação com as entidades do setor para uma revisão do modelo de financiamento que
promova a sustentabilidade dos projetos e os direitos laborais dos profissionais da cultura.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Joana Mortágua — Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua —
Catarina Martins — José Soeiro.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 378/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO O FIM DOS APOIOS E LUCROS PERVERSOS NO ÂMBITO DO
COMÉRCIO DE CARBONO
No âmbito dos apoios estatais a empresas de uso intensivo de energia por custos indiretos de carbono
incorridos em 2021, a Agência Portuguesa do Ambiente autorizou o Fundo Ambiental a realizar pagamentos no
valor de 24,6 milhões de euros a 26 unidades industriais. As unidades da Navigator recebem grande parte destes
apoios, amealhando 9,95 milhões de euros, correspondendo a 40 % do total deste apoio validado pela Comissão
Europeia.
Estes apoios aos custos indiretos de carbono destinam-se a empresas abrangidas pelo comércio europeu
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de licenças de emissão (CELE) e, de acordo com a justificação oficial, destinam-se a apoiar a indústria europeia
que é forçada a competir com empresas de outros países onde alegadamente as preocupações europeias e as
exigências de redução de emissões são mais reduzidas.
A Navigator Paper da Figueira da Foz receberá 4,6 milhões de euros, a Navigator Pulp Figueira 926 mil
euros, a Navigator Tissue Ródão 257 mil euros, a Navigator Pulp Aveiro 552 mil euros, a Navigator Tissue Aveiro
242 mil euros, a Navigator Pulp Setúbal 841 mil euros e a Navigator Paper Setúbal 2,44 milhões de euros.
Já a Siderurgia Nacional receberá 4,4 milhões pela sua unidade na Maia e 4,3 milhões pela fábrica do Seixal.
A Bondalti Chemicals receberá 1,37 milhões, a DS Smith Paper 1,1 milhões e a Celbi 1,2 milhões. A refinaria da
Galp em Sines receberá 203 mil euros.
Verificando que os principais beneficiários deste apoio são as empresas de celulose e papel, o argumento
de que o País oferece exigências ambientais mais exigentes que países terceiros para esta indústria cai por
terra. Aliás, Portugal oferece condições únicas na Europa, e mesmo no mundo, para a indústria da celulose já
que organizou grande parte do seu território para a produção intensiva de eucalipto. Essa organização do
território contribuiu para o despovoamento do interior e de áreas rurais e colocou um maior risco de incêndio
sobre as populações que vivem junto a áreas florestais, agora agravado com os efeitos das alterações climáticas.
Note-se que até o Governo do Partido Socialista reconhece que a indústria da celulose beneficia de
condições ímpares e desiguais em Portugal para a sua atividade e que beneficia da organização que o Estado
permite ao território. Apesar de reconhecer essa excecionalidade, o Governo ainda não concretizou a medida a
que se comprometeu já no Orçamento do Estado para 2020 de introduzir uma contribuição especial para a
conservação dos recursos florestais. A medida foi-se arrastando sem concretização e é agora prometida no
Orçamento do Estado para 2023, no prazo de 90 dias. De igual modo, o Governo não se compromete com uma
necessária diminuição significativa da área de eucalipto no país e da sua reconversão em solos produtivos ou
em floresta diversa sustentável.
Estes apoios, ao abrigo do comércio de carbono, são mais uma prova dos mecanismos de desigualdade que
a financeirização da resposta climática introduziu na economia. Recorde-se que, de acordo com um relatório da
Carbon Market Watch, a atribuição gratuita de licenças de emissão de gases com efeito de estufa no âmbito do
CELE permitiu, entre 2008 e 2019, lucros especulativos de 50 mil milhões de euros à indústria de uso intensivo
de energia na Europa. Esses lucros abusivos na União Europeia foram alcançados com recurso a três
mecanismos:
i. Enquanto poluidores históricos receberam licenças de emissão de forma gratuita e venderam a parte em
excesso com elevados lucros (3,1 mil milhões de euros no setor do cimento e 600 milhões no setor
petroquímico);
ii. Compraram compensações internacionais mais baratas (até 2020) para abater nas suas emissões e
venderam licenças que lhes foram atribuídas gratuitamente com lucro no mercado, novamente com lucros
avultados (850 milhões de euros no setor do aço e 630 milhões nas refinarias);
iii. Ou repassaram os custos associados às licenças de emissão – obtidas gratuitamente – para o preço dos
produtos pagos pelos consumidores, com lucros astronómicos (12 a 16 mil milhões de euros nos setores
do aço e ferro e 7 a 12 mil milhões nas refinarias).
Em Portugal esse valor ascendeu praticamente a 975 milhões de euros, sendo assim o terceiro país com
mais destes lucros abusivos por unidade de PIB. No caso português, a esmagadora maioria desses lucros foram
obtidos pelo mecanismo descrito no terceiro ponto, ou seja, repassaram para os consumidores um total de 731
milhões de euros de custos. Já 188 milhões de euros foram obtidos através da venda de licenças que receberam
gratuitamente por terem o estatuto de poluidores históricos. No País, as principais empresas beneficiadas foram
a Cimpor com 315 milhões de euros, a Petrogal com 236 milhões e a Secil com 102 milhões.
Deste modo, o Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda apresenta o presente projeto de resolução para
impedir que mais este apoio seja atribuído às empresas historicamente poluidoras e exigir que essas verbas
sejam atribuídas à transformação do País com eficiência energética nas habitações e combate à pobreza
energética. Propõe ainda que Portugal abandone mecanismos de comércio de carbono que permitam avultados
lucros perversos e que na verdade são um entrave à descarbonização da sociedade. Por último, propõe que,
finalmente, a contribuição especial para a conservação dos recursos florestais seja concretizada.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
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Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Rejeite a perversidade do mecanismo de apoio às empresas de uso intensivo de energia por custos
indiretos de carbono e aplique essas verbas no combate à pobreza energética e a programas de eficiência de
edifícios.
2 – Abandone mecanismos de comércio de carbono que atribuam licenças de emissões gratuitas a
poluidores históricos, que permitam medidas de compensação para abater nas suas emissões e venderam
licenças que lhes foram atribuídas gratuitamente ou que permitam a repassagem dos custos associados às
licenças de emissões – obtidas gratuitamente – para o preço dos produtos pago pelos consumidores.
3 – Garanta a criação e efetivação da contribuição especial para a conservação dos recursos florestais nos
prazos definidos pelo Orçamento do Estado para 2023.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2023.
As Deputadas e os Deputados do BE: Pedro Filipe Soares — Mariana Mortágua — Catarina Martins — Joana
Mortágua — José Soeiro.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 379/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À ATUALIZAÇÃO SALARIAL DOS PROFESSORES E
CORRESPONDÊNCIA COM OS ELEVADOS NÍVEIS DE EXIGÊNCIA QUE A PROFISSÃO DOCENTE
IMPLICA
Exposição de motivos
Há cada vez menos professores da educação pré-escolar ao ensino superior, é uma realidade incontornável.
As razões estão há muito identificadas e para milhares de docentes, vítimas diretas das más opções políticas
que não resolvem o problema da precariedade laboral, a solução passa por deixar a profissão em definitivo.
Os indicadores1 mostram-nos isso mesmo. Se em 2010 tínhamos quase 180 000 docentes em exercício nos
ensinos pré-escolar, básico e secundário, em 2021 temos pouco mais de 150 000. Uma perda de
aproximadamente 30 000 docentes, que se estima dividir-se entre aposentações e desistências. Citando o
Secretário-Geral da FENPROF, Mário Nogueira, «(…) entre 10 a 12 mil professores abandonaram a profissão
na última década, porque não saíram da precariedade (…) muitos destes docentes tinham mais de uma década
de experiência em sala de aula, tinham corrido o país inteiro»2.
Esta precariedade permanece há tempo demais em cima da mesa entre debates, meias medidas e tentativas
de negociações, continua por resolver a regularização de vínculos laborais precários, mas sobretudo a
desvalorização sem precedentes da carreira docente.
Portanto, desde professores colocados em escolas distantes a dezenas e até centenas de quilómetros da
sua residência, horários incompletos, que se traduzem em salários que, muitas vezes, não permitem sequer
pagar a habitação e dificuldades em estabilizar e constituir família, somam-se as dificuldades de progressão na
carreira e remunerações desadequadas do nível de exigência que a profissão exige, cada vez mais
burocratizada.
A atualização salarial proposta por este Governo e que produziu efeitos a partir de 1 de janeiro de 2023, que
apesar de prever uma variação nos valores dos vencimentos base de 52,11 € do 1.º até ao 7.º escalão, 55,03 €
no 8.º escalão, 62,58 € no 9.º escalão e 68,10 € no último escalão, continua sem colmatar as assimetrias salariais
relativamente a outras profissões de semelhante exigência. Na verdade, expressam aumentos entre os 3,4 % e
1 Portugal: Docentes em exercício nos ensinos pré-escolar, básico e secundário: total e por nível de ensino – Pordata. 2 Professores exigem fim dos vínculos precários reconhecidos pelo Governo – Observador.
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os 2 %, ou seja, perda de poder de compra transversal a toda a classe, já que este aumento em percentagem é
manifestamente inferior à taxa de inflação. A atualização considerada está em linha com o proposto para os
restantes trabalhadores da administração pública, e em nada corrige a perda de dignificação que a profissão de
docente tem vindo a sofrer.
Não se vislumbra qualquer estratégia para rejuvenescer a classe docente, dignificar a docência, reter e atrair
jovens para a profissão. Os cursos da área de educação foram os que registaram maior quebra de inscritos3,
em 2003 formaram-se 5621 professores, em 2021 apenas 1593, menos 72 %. A continuar esta tendência, só
ingressarão nos cursos de formação inicial de professores jovens cuja nota não lhes permita o acesso a outros
cursos.
A falta de professores nos diversos ciclos de ensino faz-se sentir e agrava-se a cada ano. Estimando-se que
até 2030 vão sair do sistema educativo 20 mil professores e que mais de 15 % dos professores do ensino público
têm 60 ou mais anos de idade, é da maior premência que se inverta esta tendência, garantido aos professores
estabilidade e remunerações justas.
Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do Chega recomendam ao Governo que:
– Proceda à atualização salarial dos professores, em correspondência com os elevados níveis de exigência
que a profissão docente implica, procedendo a uma variação positiva nos valores dos vencimentos base
na ordem dos 5 %, aplicável a todos os escalões da carreira de docente.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2022.
Os Deputados do CH: André Ventura — Bruno Nunes — Diogo Pacheco de Amorim — Filipe Melo — Gabriel
Mithá Ribeiro — Jorge Galveias — Pedro dos Santos Frazão — Pedro Pessanha — Pedro Pinto — Rita Matias
— Rui Afonso — Rui Paulo Sousa.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 380/XV/1.ª
REFORMA DO REGADIO
A reforma do regadio deve ser uma prioridade na agenda política nacional, em virtude de este assumir um
papel fundamental na garantia da sustentabilidade e eficiência dos sistemas de produção agrícola, no
abastecimento de água às populações e às indústrias e ser indispensável à garantia da autonomia alimentar do
nosso país. No entanto, sem prejuízo dos fins dos aproveitamentos hidroagrícolas poderem ser múltiplos, o
regadio tem um enorme potencial dinamizador do desenvolvimento económico, estimulando a competitividade
do setor agroalimentar, garantindo a coesão territorial e contribuindo para o ordenamento do território,
incentivando a implementação de estratégias de eficiência hídrica e energética.
Por isso, no entender da Iniciativa Liberal, a reforma do regadio deve ser uma prioridade na agenda política
nacional, já que ao assumir-se como um instrumento estratégico decisivo para a conciliação e concretização
destas diferentes dimensões das políticas públicas, sobretudo em regiões com menor índice de desenvolvimento
económico-social, será igualmente fundamental como instrumento orientado para a mitigação dos efeitos das
alterações climáticas que já se fazem sentir na Europa, em particular, em Portugal, com a alternância sazonal
de fenómenos de seca extrema e de cheias.
Cerca de dois terços do território nacional é ainda essencialmente rural. A reforma do regadio proposta pela
Iniciativa Liberal, assente nesta visão estratégica integradora de várias dimensões das políticas públicas, terá,
sobretudo, impacto nas regiões que apresentam um menor índice de desenvolvimento económico-social,
promovendo a criação de valor nessas regiões, otimizando o potencial económico da agricultura e indústria
3 Portugal: Diplomados nos cursos de formação de professores – Pordata.
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alimentar com impacto no panorama nacional, ao mesmo tempo que permitirá inverter as tendências de
desertificação e despovoamento desses territórios, tornando-as mais atrativas para a fixação de populações.
Por outro lado, Portugal está ciente que um dos maiores desafios que terá de enfrentar nas próximas
décadas, desde a erosão costeira à subida da água do mar e à maior prevalência de fenómenos climáticos
extremos, é a seca e a consequente escassez hídrica, cenário que vem instar os poderes públicos a encontrar
soluções que fomentem o uso racional, responsável, eficiente e sustentável deste recurso valioso, mas tão
escasso, que é a água. Este problema é exacerbado pela circunstância de Portugal viver numa situação em que
o seu abastecimento de água se encontra numa situação de dependência externa face a Espanha, já que as
suas principais bacias hidrográficas -– bacias do Douro, do Tejo, do Guadiana e do Minho – correspondem a
rios que nascem em Espanha, país que enfrenta a situação de maior stress e pressão hídrica da União Europeia
e que, como tal, tem adotado várias medidas de transvase para reter a água no seu território.
Aliado a este contexto, acresce, ainda, a falta de vontade política do nosso Governo em solucionar outros
problemas crónicos, registados há já várias décadas nas infraestruturas de regadio público, e que,
incompreensivelmente se encontram por resolver, com prejuízos inestimáveis para o nosso País. Conforme se
encontra demonstrado, a performance atual das infraestruturas de regadio encontra-se longe de ser positiva,
registando-se ainda perdas de água numa ordem superior a 30 % e constatando-se que a capacidade atual de
Portugal para reter a água disponível é de apenas 20 %; tudo isto quando é sabido que a cultura de regadio é
muito mais eficiente e produtiva que o sequeiro, que se encontra em risco no contexto climático português.
Este diagnóstico, traçado por vários intervenientes no setor, denuncia outros problemas de raiz, como (i) a
falta de planeamento ao nível dos sistemas de gestão e armazenamento da água, (ii) a falta de manutenção das
infraestruturas de regadio existentes, (iii) a falta de vontade em modernizar essas estruturas através da
implementação de sistemas de rega de precisão, conforme as melhores práticas da União Europeia, (iv) a falta
de promoção da transição digital e tecnológica neste setor, (v) a falta de estratégia para a implementação
planeada de novas estruturas de regadio, (vi) a falta de vontade de encontrar soluções para aproveitar o excesso
de água resultante de fenómenos mais intensos de pluviosidade, água que, ao invés, é encaminhada para o
mar através de sarjetas, quando poderia ser retida e devidamente canalizada para a rega urbana,
armazenamento do excedente para combate aos incêndios rurais nas épocas mais críticas, ou mesmo tratada
para consumo.
Deste modo, a Iniciativa Liberal considera que é necessário traçar um diagnóstico preciso e rigoroso sobre o
«estado da arte» atual das infraestruturas de regadio no nosso País, identificar cabalmente as suas fragilidades
e encontrar soluções integradas suscetíveis de potenciar não só uma performance eficiente, mas também a sua
modernização através da utilização das tecnologias de precisão mais avançadas da União Europeia e promoção
das melhores práticas de produção agrícola e rega, para que Portugal possa estar em condições de competir
com os restantes países europeus. Não basta prever, em termos isolados, projetos de reforma da rede de
infraestruturas de regadio, sem antes termos uma visão estratégica integrada definida, que tenha em conta não
só a realidade das diferentes regiões do nosso País – região Norte, região Centro, região de Lisboa e Vale do
Tejo, região Oeste, Alentejo e Algarve –, mas que possa ser exequível no curto e médio prazo, tendo em conta
a estratégia de financiamento a alocar ao regadio, delineada nos diferentes instrumentos jurídicos financeiros
nacionais e europeus, e respetivos prazos previstos para a sua execução.
A Iniciativa Liberal considera também que urge inovar, fazendo uma análise comparada da execução de
políticas públicas de regadio de sucesso noutros países e ponderando que soluções, com resultados positivos
já demonstrados, poderão ser implementadas no nosso País. Merecerá, por isso, reflexão o caso paradigmático
das designadas «autoestradas da água» em Itália, em que a água proveniente do degelo nas regiões
montanhosas é aproveitada e canalizada para fins de produção agrícola. Tendo em conta a realidade
portuguesa, bem como a sazonalidade, seria importante investir em soluções que pudessem canalizar, de forma
eficiente, a transferência de água dos pontos de armazenamento e/ou barragens que registem excedentes – por
exemplo, no outono e no inverno, em que a pluviosidade é maior – para as bacias hidrográficas mais carenciadas
– especialmente, atingidas na primavera e no verão –, construindo infraestruturas de ligação hidráulica
destinadas a otimizar o aproveitamento da água.
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Quadro 1: Estimativa do investimento em regadio, elaborada com base nos dados constantes do estudo Regadio 2030 (EDIA) e contributo para uma Estratégia Nacional para o Regadio (FENAREG).
Tanto quanto se sabe, segundo dados disponibilizados pela FENAREG, o PEPAC prevê cerca de 100
milhões de euros para apoiar o investimento no regadio público – representando, sensivelmente, menos de 74 %
que o anterior Programa de Desenvolvimento Rural (PDR2020) – e cerca de 624 milhões de euros em regadio
privado, no âmbito das medidas destinadas ao apoio do investimento nas explorações agrícolas –
representando, sensivelmente, metade do previsto para a implementação de tais medidas no quadro do PDR
2020. Mais tarde, num estudo realizado em conjunto pela FENAREG e pela Agroges, em abril de 2022, estas
entidades denotaram também que as necessidades de investimento em regadio público constam identificadas
no estudo Regadio 2030, apresentado pelo Ministério da Agricultura e da Alimentação, em 2022, o qual
apresenta um valor estimado de investimento de cerca de 2257 milhões de euros, ao que acrescem 197 milhões
de euros de investimentos complementares nos regadios coletivos e privados, num valor global de 2454 milhões
de euros. Contudo, conforme sublinhado no estudo citado da FENAREG e da Agroges desses investimentos,
«apenas uma parte já possui um grau de maturidade (existência de estudos e projetos e aprovação pela
Autoridade Nacional de Regadio) que lhes permite uma execução garantida até ao final de 2030, num valor
global de 1254 milhões de euros», tal como se pode verificar no quadro 1.
Quadro 2: Despesa pública prevista para apoio ao investimento em regadio, do Documento de Orientação: Financiamento do regadio público em Portugal no horizontal 2030, de abril de 2022, elaborado pela FENAREG e pela Agroges.
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Tendo em conta as origens de financiamento disponíveis, a despesa pública total prevista para apoio ao
investimento em regadio é contabilizada no valor de 421 milhões de euros, a executar entre 2022 e 2030. No
entanto, conforme denotado nesse estudo, esse valor corresponde apenas a cerca de «34 % das necessidades
de investimento anteriormente identificadas como condições asseguradas para serem implementados até 2030
(1254 M€)», sendo que se se considerar a totalidade das necessidades de investimento em regadio público
(2454 M€) «as origens de financiamento permitem apenas cobrir 17 % das necessidades».
Este desencontro entre as necessidades aparentes do setor, o financiamento europeu alocado para estes
investimentos e a necessidade de melhor monitorização dos resultados e da execução destes programas
expõem a necessidade premente de uma reconsideração das prioridades e medidas necessárias para apoiar o
regadio, estimulando a competitividade da agricultura portuguesa. É, por isso, desejável que o próprio Governo
realize uma avaliação, pública e sindicável, dos recursos necessários à modernização deste setor que, em
virtude da própria incapacidade financeira, pública e privada, do nosso País, necessita de uma gestão criteriosa
e de uma execução eficiente e eficaz do financiamento europeu. Nesse sentido, precisamos também de melhor
monitorização por parte do Governo.
Por todas as razões elencadas, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal considera ser este o momento
adequado para a apresentação do projeto de resolução que recomende ao Governo uma reforma profunda e
estruturada do regadio em Portugal alicerçadas nas seguintes prioridades estratégicas:
a) Otimização da eficiência do funcionamento das infraestruturas de regadio, desde a captação à distribuição
de água, reduzindo, ao mínimo possível, as perdas de água verificadas;
b) Otimização da capacidade de armazenamento de água das infraestruturas hídricas;
c) Modernização das infraestruturas de regadio existentes, bem como criação de novas estruturas;
d) Criação de infraestruturas de ligação hidráulica destinadas a otimizar o aproveitamento da água e à sua
transferência dos pontos de armazenamento e/ou barragens para as bacias hidrográficas mais carenciadas;
e) Criação das condições necessárias à expansão das áreas regadas;
f) Promoção da transição digital do setor e da adoção das melhores práticas de rega ao nível da União
Europeia, designadamente através do incentivo à utilização de tecnologias mais eficientes do ponto de vista
hídrico e energético, à implementação de tecnologia da agricultura 4.0.(agrotech) e à utilização de sistemas de
rega de precisão, nas explorações;
g) Criação de um regime jurídico que preveja procedimentos de monitorização, contabilização e fiscalização
das perdas de água verificadas nas infraestruturas de regadio, bem como revisão do regime jurídico aplicável
aos aproveitamentos hidroagrícolas;
h) Otimização da estratégia aplicável às regiões que enfrentam uma situação de maior stress hídrico, ao nível
dos projetos a implementar e respetiva estratégia de financiamento;
i) Definição de uma visão estratégica integrada de reforma do regadio, que tenha em conta não só a realidade
e os índices de desenvolvimento económico e social das diferentes regiões do nosso País – Norte, Centro,
Lisboa e Vale do Tejo, Oeste, Alentejo e Algarve –, mas que possa ser exequível nos curto e médio prazos,
tendo em conta os instrumentos jurídicos de financiamento disponíveis e respetivos prazos de execução.
Assim, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento
da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte projeto de
resolução:
Resolução
Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera
recomendar ao Governo que proceda a uma reforma da rede de regadio público, englobando a adoção das
seguintes medidas:
1 – Criação das condições necessárias à monitorização global e pública da execução dos programas do
Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), do Plano de Desenvolvimento Rural (PDR) e do Plano Estratégico
da Política Agrícola Comum (PEPAC), garantindo transparência e um debate público mais informado sobre a
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execução dos mesmos.
2 – Publicação dos resultados de execução até à data, bem como das verbas do PRR e do PDR alocadas
aos projetos de obras de manutenção e modernização das infraestruturas de regadio público, bem como
identificação das infraestruturas que aguardam a aprovação de projetos destinados à realização desse tipo de
intervenções;
3 – Promoção de uma articulação entre o Ministério da Agricultura e da Alimentação e as autoridades
responsáveis pela gestão dos programas operacionais do Portugal 2020, no sentido de procederem à
identificação dos projetos de regadio que não possuem capacidade para serem executados no horizonte
temporal do atual quadro financeiro das verbas afetas a esses projetos para financiar outros projetos de
investimento nas infraestruturas de regadio público, em condições de serem implementados nesse horizonte
temporal, por forma a garantir uma execução integral dos fundos europeus atribuídos a Portugal;
4 – Criação de um regime jurídico que preveja procedimentos de monitorização, contabilização e
fiscalização das perdas de água verificadas nas infraestruturas de regadio público;
5 – Revisão do regime jurídico dos aproveitamentos hidroagrícolas, adaptado à realidade atual das obras
de rega, bem como adaptação da demais legislação aplicável à rede de regadio público à realidade atual, numa
perspetiva integrada e multidisciplinar dos setores agrícola, silvícola, pastoril, ordenamento do território,
ambiente e conservação da natureza;
6 – Elaboração, conclusão ou publicação expedita dos planos regionais de eficiência hídrica aplicáveis a
todas as regiões que apresentem uma situação de escassez de água ou risco grave de escassez de água, numa
perspetiva de médio prazo;
7 – Elaboração de um mapeamento regional das perdas de água contabilizadas nas infraestruturas de
regadio público e, em conformidade, elaboração de planos de intervenção regionais destinados a mitigar as
perdas de água verificadas e a otimizar o funcionamento das infraestruturas;
8 – Elaboração de planos regionais que visem o aumento da capacidade de armazenamento de água e de
regularização interanual;
9 – Elaboração de planos regionais que prevejam a criação de infraestruturas de ligação hidráulica
destinadas ao melhor aproveitamento da água e à sua transferência dos pontos de armazenamento e/ou
barragens para as bacias hidrográficas mais carenciadas;
10 – Expansão das áreas regadas, bem como revisão dos limites das áreas dos aproveitamentos
hidroagrícolas, de forma a garantir a sua sustentabilidade;
11 – Criação de incentivos à adoção das melhores práticas de rega e à modernização das infraestruturas
de regadio existentes, apostando na utilização de equipamento de rega de precisão e em tecnologia da
Agricultura 4.0;
12 – Criação, simplificando, de incentivos à instalação de unidades de produção de energia de fonte
renovável nos aproveitamentos hidroagrícolas e nas explorações agrícolas com instalações de rega, bem como
à adoção de outras medidas que incentivem a eficiência energética e a eficiência hídrica dos sistemas de rega;
13 – Adoção de projetos-piloto regionais destinados a implementar estruturas suscetíveis de aproveitar a
água proveniente das chuvas (pluviosidade);
14 – Promoção da implementação de sistemas que permitam uma utilização mais racional da água,
designadamente sistemas de regadio coletivo;
15 – Construção da barragem de Alvito/Ocreza, de modo a permitir a regularização hídrica dos caudais na
bacia hidrográfica do Tejo.
Palácio de São Bento, 12 de janeiro de 2022.
Os Deputados da IL: Rui Rocha — Bernardo Blanco — Carla Castro — Carlos Guimarães Pinto — Joana
Cordeiro — João Cotrim Figueiredo — Patrícia Gilvaz — Rodrigo Saraiva.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.