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Quarta-feira, 31 de maio de 2023 II Série-A — Número 235
XV LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2022-2023)
S U M Á R I O
Resolução: (a) Deslocação do Presidente da República a Londres. Projetos de Lei (n.os 733, 737, 741, 743, 759, 771, 772, 778, 780, 781, 784 e 796/XV/1.ª): N.º 733/XV/1.ª (Reforça o regime de direitos dos profissionais da Guarda Nacional Republicana e de participação das respetivas associações representativas (primeira alteração à Lei n.º 39/2004, de 18 de agosto, segunda alteração à Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro, e primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro, que regulamenta o exercício do direito de associação pelos profissionais da GNR): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 737/XV/1.ª (Consagra o direito à greve dos profissionais da PSP (segunda alteração à Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 741/XV/1.ª (Regime de comparticipação de sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina, de forma a aumentar a qualidade de vida das pessoas com diabetes tipo 1): — Parecer da Comissão de Saúde. N.º 743/XV/1.ª (Cria o tipo legal de crime de assédio sexual e de assédio sexual qualificado, reforçando a proteção legal das vítimas): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
N.º 759/XV/1.ª (Cria o Provedor da Criança): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 771/XV/1.ª (Prevê a criação do Provedor das Crianças e das Gerações Futuras): — Vide Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª. N.º 772/XV/1.ª (Prevê a alteração da composição e funcionamento das comissões de proteção de crianças e jovens): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 778/XV/1.ª (Assegura o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 780/XV/1.ª (Prevê a criminalização da ciberviolência): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 781/XV/1.ª (Cria as respostas de apoio psicológico para vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior e alarga o âmbito de aplicação dos Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio a todos os membros da comunidade académica): — Parecer da Comissão de Educação e Ciência. N.º 784/XV/1.ª (Institui o Provedor da Criança): — Vide Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª. N.º 796/XV/1.ª (Assegurar uma maior celeridade da justiça administrativa e fiscal, alterando diversos diplomas): — Alteração do texto inicial do projeto de lei.
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Propostas de Lei (n.os 74, 76, 89 e 90/XV/1.ª): N.º 74/XV/1.ª (Define os objetivos, prioridades e orientações da política criminal para o biénio de 2023-2025): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 76/XV/1.ª (Completa a transposição da Decisão-Quadro 2002/584/JAI e das Diretivas 2010/64/UE, 2012/13/UE e 2013/48/UE, relativas ao processo penal e ao mandado de detenção europeu): — Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 89/XV/1.ª (GOV) — Transpõe a Diretiva 2011/93/UE relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia infantil, e amplia o âmbito do crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência. N.º 90/XV/1.ª (GOV) — Transpõe a Diretiva (UE)2019/2121, na parte respeitante às transformações, fusões e cisões transfronteiriças. Projetos de Resolução (n.os 673 e 738 a 740/XV/1.ª): N.º 673/XV/1.ª — Recomenda ao Governo que condene a aprovação da legislação anti-LGBTI+ no Uganda, que integre
as questões LGBTI+ na cooperação portuguesa e que crie medidas para acolhimento e integração de refugiados LGBTI+ ugandeses e de outros países de origem em Portugal: — Alteração do título e texto iniciais do projeto de resolução. N.º 738/XV/1.ª (PAR) — Prorrogação do prazo de funcionamento da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. N.º 739/XV/1.ª (PSD) — Recomenda ao Governo o reforço urgente dos meios de policiamento e de emergência e socorro no concelho de Albufeira. N.º 740/XV/1.ª (PAR) — Deslocação do Presidente da República a Palermo: — Texto do projeto de resolução e mensagem do Presidente da República Proposta de Resolução n.º 11/XV/1.ª (Aprova as Emendas de 2016 à Convenção do Trabalho Marítimo, 2006, adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho): — Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas. (a) Publicada em Suplemento.
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PROJETO DE LEI N.º 733/XV/1.ª
(REFORÇA O REGIME DE DIREITOS DOS PROFISSIONAIS DA GUARDA NACIONAL REPUBLICANA
E DE PARTICIPAÇÃO DAS RESPETIVAS ASSOCIAÇÕES REPRESENTATIVAS (PRIMEIRA ALTERAÇÃO
À LEI N.º 39/2004, DE 18 DE AGOSTO, SEGUNDA ALTERAÇÃO À LEI N.º 63/2007, DE 6 DE NOVEMBRO,
E PRIMEIRA ALTERAÇÃO AO DECRETO-LEI N.º 233/2008, DE 2 DE DEZEMBRO, QUE REGULAMENTA
O EXERCÍCIO DO DIREITO DE ASSOCIAÇÃO PELOS PROFISSIONAIS DA GNR)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Índice
Parte I – Considerandos
1. Introdução
2. Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
3. Enquadramento jus-constitucional
4. Enquadramento jurídico na União Europeia e Internacional
5. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei
formulário.
6. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a matéria
7. Consultas
Parte II – Opinião da Relatora
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – Considerandos
1 – Introdução
A iniciativa em apreciação é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP),
ao abrigo do disposto no artigo 156.º, alínea b), e no artigo 167.º da Constituição da República Portuguesa
(doravante, apenas Constituição), bem como nos artigos 4.º, n.º 1, alínea b), e 119.º, n.º 1, ambos do Regimento
da Assembleia da República (doravante, apenas Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei.
A iniciativa deu entrada a 19 de abril de 2023, tendo sido junta a respetiva ficha de avaliação prévia de
impacto de género. Posteriormente, por via de Despacho do Presidente da Assembleia da República, datado de
20 de abril de 2023, foi admitida e baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias (1.ª) para apreciação e emissão de parecer. Foi anunciada em sessão plenária nessa mesma data.
2 – Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
A iniciativa em apreço retoma, entre outros, o impulso legislativo que consubstanciou o Projeto de Lei n.º
729/XIV/2.ª (PCP)1 e visa reforçar o regime de direitos dos profissionais da Guarda Nacional Republicana (GNR)
e de participação das respetivas associações representativas.
Os proponentes sustentam a pertinência da iniciativa no entendimento de que o regime consagrado na Lei
n.º 39/2004, de 18 de agosto2, bem como na respetiva regulamentação, operada pelo Decreto-Lei n.º 233/2008,
de 2 de dezembro, se revelam insuficientes, apontando, também assim, as várias tentativas de alteração daquela
1 O referido Projeto de Lei intitulava-se «Reforça os direitos de participação das associações representativas dos profissionais da Guarda Nacional Republicana (primeira alteração à Lei n.º 39/2004, de 18 de agosto, que estabelece os princípios e as bases gerais do exercício do direito de associação profissional dos militares da GNR, à Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro, que aprova a Lei Orgânica da GNR e ao Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro, que regulamenta o exercício do direito de associação pelos profissionais da GNR)», tendo caducado no decurso da XIV Legislatura. 2 Diploma que estabelece os princípios e as bases gerais do exercício do direito de associação profissional dos militares da GNR.
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lei3, designadamente, através da apreciação parlamentar do Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro, e da
apresentação de iniciativas para regular/alterar o regime legal do direito de associação dos profissionais da
GNR.
O projeto de lei em apreço visa alterar a Lei n.º 39/2004, de 18 de agosto, e Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro,
no sentido de garantir que as associações profissionais legalmente constituídas passem a ter direito a «integrar
o Conselho Superior da Guarda, o Conselho de Ética, Disciplina e Deontologia e demais conselhos consultivos,
comissões de estudo e grupos de trabalho (…)», bem como «o direito de negociação coletiva sobre as questões
do estatuto profissional, remuneratório e social dos seus associados e sobre as condições de exercício da sua
atividade».
A par disso, os proponentes pugnam pela remoção da proibição legal de convocação de manifestações de
carácter político, mantendo, no entanto, as restrições que se referem a atividades de carácter partidário. Sobre
este aspeto os proponentes referem que «negar o carácter político de uma qualquer manifestação é um
contrassenso» porquanto, nas suas palavras, «não o há manifestações, sejam elas quais forem, que não tenham
um carácter político».
Os proponentes pretendem ainda a revogação da restrição que impende sobre os militares da GNR no
sentido da obrigatoriedade de apresentar, sobre assuntos respeitantes à GNR, petições coletivas dirigidas a
órgãos de proteção dos direitos fundamentais antes de esgotada a via hierárquica. Isto, sem prejuízo do direito
individual de queixa ao Provedor de Justiça e da sua legitimidade ativa nos demais meios de impugnação
administrativa e jurisdicional.
A iniciativa em apreciação é constituída por seis artigos: o primeiro define o seu objeto; o segundo altera os
artigos 5.º e 6.º da Lei n.º 39/2004, de 18 de agosto, aditando novos direitos ao conjunto dos direitos das
associações profissionais, bem como alterando, no âmbito das restrições ao exercício de direitos a que estão
sujeitos os militares da GNR, o rol de manifestações ou reuniões que aqueles podem convocar ou participar,
nomeadamente eliminando da redação vigente da alínea c) a referência a manifestações ou reuniões de carácter
político e sindical; o terceiro altera a Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro, prevendo que as associações dos
profissionais da GNR passam a integrar a composição alargada do Conselho Superior da Guarda e a
composição do Conselho de Ética, Deontologia e Disciplina; o quarto altera os artigos 2.º e 11.º do Decreto-Lei
n.º 233/2008, de 2 de dezembro, tendo em vista a alteração do regime das dispensas de serviço; o quinto adita
os artigos 11.º-A e 11.º-B ao Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro, consagrando os direitos dos
delegados associativos e o respetivo regime de crédito de horas; por último, o sexto estabelece o momento de
entrada em vigor do projeto de lei, caso o mesmo venha a merecer aprovação.
3 – Enquadramento Jus-Constitucional
Nos termos das disposições conjugadas constantes do artigo 1.º da Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro (Lei
Orgânica da GNR), e do artigo 272.º da Constituição, a GNR consubstancia uma força de segurança de natureza
militar, constituída por militares organizados num corpo especial de tropas e dotada de autonomia administrativa,
tendo como principais atribuições, no âmbito dos sistemas nacionais de segurança e proteção, defender e
assegurar a legalidade democrática, garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, bem como
colaborar na execução da política de defesa nacional, nos termos do que se encontra vertido na Constituição e
da lei.
Ainda a propósito do seu funcionamento, cumpre referir que a GNR se encontra organizada
hierarquicamente, estando os militares dos seus quadros permanentes sujeitos à condição militar, nos termos e
para os efeitos do previsto na lei das bases gerais do estatuto da condição militar.
Já no que concerne concretamente à liberdade de associação, importa referir que os militares da GNR em
efetividade de funções têm o direito de constituir associações de carácter profissional para promoção dos
interesses dos seus associados. A constituição das referidas associações, a aquisição de personalidade jurídica,
bem como o seu regime de gestão, funcionamento e extinção, encontram-se vertidos na Lei Orgânica n.º 3/2001,
de 29 de agosto, que estabelece o direito de associação profissional dos militares, e ainda no Código Civil.
3 A este propósito cumpre recordar as várias tentativas de alteração daquela lei que ocorreram na X, XI, XII e XIV Legislaturas.
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Os princípios e as bases gerais do direito de associação profissional dos militares da GNR, encontram-se
estatuídos na Lei n.º 39/2004, de 18 de agosto (a este propósito veja-se em especial o artigo 1.º e 6.º), que veio
a ser regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro.
Não obstante a consagração da liberdade de associação, o exercício de atividades associativas encontra-se
sujeito às restrições e condicionalismos previstos no artigo 27.º da Lei de Defesa Nacional, aprovada pela Lei
Orgânica n.º 1-B/2009, de 7 de julho, e em caso algum pode colidir com os deveres e funções legalmente
definidos nem com o cumprimento das missões de serviço, ex vi do disposto no artigo 3.º da Lei Orgânica
n.º 3/2001, de 29 de agosto.
O mesmo resulta do disposto no artigo 270.º da Constituição, que sob a epígrafe «restrições ao exercício de
direitos» estabelece que «a lei pode estabelecer, na estrita medida das exigências próprias das respectivas
funções, restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e petição colectiva
e à capacidade eleitoral passiva por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço
efectivo, bem como por agentes dos serviços e das forças de segurança e, no caso destas, a não admissão do
direito à greve, mesmo quando reconhecido o direito de associação sindical.»
4 – Enquadramento jurídico na União Europeia e Internacional
No que diz respeito ao enquadramento internacional, nomeadamente em Espanha e França, remete-se para
a informação disponível na nota técnica do projeto de lei em apreço, elaborada pelos serviços da Assembleia
da República (cfr. anexo).
5 – Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário.
A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do
Regimento. Ademais, encontra-se redigida sob a forma de artigos, é precedida de uma breve exposição de
motivos e tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, cumprindo desta forma os
requisitos formais previstos nos termos do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Encontram-se também respeitados os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º
do Regimento, uma vez que a mesma parece não infringir a Constituição ou os princípios nela plasmados e
define concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
O título da presente iniciativa legislativa traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se em conformidade
com o disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário.
Ademais, a iniciativa indica o número de ordem de alteração às leis que pretende ver modificadas, bem como
à a única alteração ocorrida até ao momento, cumprindo assim o disposto no n.º 1 do artigo 6.º da lei formulário.
Caso venha a merecer aprovação esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º
da Constituição, pelo que deverá ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade
com o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, entrando em vigor no dia
seguinte ao da sua publicação, conforme previsto no artigo 6.º do articulado da iniciativa e no n.º 1 do artigo 2.º
da lei formulário
6 – Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a matéria
Consultada a base de dados da atividade parlamentar (AP), verifica-se que, sobre matéria conexa com o
projeto de lei em apreço, não está pendente qualquer iniciativa ou petição.
Não obstante, e conforme já ficou dito supra, cumpre reiterar que na XIV Legislatura caducou o Projeto de
Lei n.º 729/XIV/2.ª (PCP), relacionado com a matéria que ora se trata.
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7 – Consultas
Por respeitar a matéria do âmbito laboral, foi deliberado submeter a iniciativa a consulta pública, nos termos
dos artigos 469.º, 472.º e 473.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 2 de fevereiro, por
remissão do artigo 16.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014,
de 20 de junho, e do artigo 134.º do Regimento da Assembleia da República. A apreciação pública decorre de
09/05/2023 a 08/06/2023.
Todos os pareceres e contributos recebidos serão publicitados na página da iniciativa.
PARTE II – Opinião da Relatora
A relatora signatária do presente parecer reserva-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre
o Projeto em apreço, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República.
A Deputada relatora do parecer reserva a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa em sessão
plenária.
PARTE III – Conclusões
1 – O Grupo Parlamentar do PCP tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de
Lei n.º 733/XV/1.ª (PCP) que reforça o regime de direitos dos profissionais da Guarda Nacional Republicana e
de participação das respetivas associações representativas (primeira alteração à Lei n.º 39/2004, de 18 de
agosto, segunda alteração à Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro, e primeira alteração ao Decreto-Lei n.º
233/2008, de 2 de dezembro, que regulamenta o exercício do direito de associação pelos profissionais da GNR).
2 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto de
Lei n.º 733/XV/1.ª (PCP) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
3 – Nos termos regimentais aplicáveis, o presente parecer deverá ser remetido a S. Ex.ª o Presidente da
Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada Relatora, Susana Amador — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram provadas, por unanimidade, tendo-se registado as ausências do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
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PROJETO DE LEI N.º 737/XV/1.ª
(CONSAGRA O DIREITO À GREVE DOS PROFISSIONAIS DA PSP (SEGUNDA ALTERAÇÃO À LEI
N.º 14/2002, DE 19 DE FEVEREIRO)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
Índice
Parte I – Considerandos
1. Introdução
2. Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
3. Enquadramento jus-constitucional
4. Enquadramento jurídico na União Europeia e internacional
5. Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do cumprimento da lei
formulário.
6. Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a matéria
7. Consultas
Parte II – Opinião da Relatora
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – Considerandos
1 – Introdução
A iniciativa em análise é apresentada pelo Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), ao
abrigo do disposto no artigo 156.º, alínea b), e no artigo 167.º daConstituição da República Portuguesa
(doravante, apenas Constituição), bem como nos artigos 4.º, n.º 1, alínea b), e 119.º, n.º 1, ambos do Regimento
da Assembleia da República (doravante, apenas Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei.
O projeto de lei ora em apreciação deu entrada a 21 de abril de 2023, acompanhado da respetiva ficha de
avaliação prévia de impacto de género. Posteriormente, por via de Despacho do Presidente da Assembleia da
República, datado a 24 de abril de 2023, foi admitida e baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias (1.ª), para apreciação e emissão de parecer. Foi anunciada em sessão plenária em 10
de maio de 2023.
2 – Objeto, motivação e conteúdo da iniciativa
A iniciativa legislativa em apreço tem por desiderato introduzir alterações à Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro1, no sentido de ver consagrando o direito à greve dos profissionais da Polícia de Segurança Pública (PSP),
bem como o direito a convocar reuniões ou manifestações de carácter político ou nelas participar, garantindo,
desta forma, o exercício pleno das liberdades sindicais
Os proponentes sustentam a pertinência da iniciativa no entendimento de que é necessário alterar o regime
de restrições ao exercício da liberdade sindical para que este não seja um instrumento que dificulte a ação
reivindicativa dos polícias.
Recordando o teor dos artigos 57.º e 270.º da Constituição, os proponentes consideram que «nada na
Constituição impede o legislador de garantir o direito à greve dos profissionais da PSP, tal como já sucede há
muitos anos com profissionais de outras forças e serviços de segurança».
Os proponentes aduzem que a proibição do direito à greve por estes profissionais constitui um
«anacronismo», fazendo menção, a este propósito, à Petição n.º 211/X/2.ª, intitulada «Solicitam o
1 Diploma que regula o exercício da liberdade sindical e os direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal da PSP.
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reconhecimento legal do direito à greve dos profissionais da Polícia de Segurança Pública», cuja motivação era
idêntica ao objeto da iniciativa em apreço.
Já no que concerne às manifestações de carácter político, os proponentes pugnam pela eliminação da
restrição legal à sua realização, por considerarem que todas as manifestações têm carácter político, mantendo
as restrições que se referem a atividades de carácter partidário.
A iniciativa em apreciação é constituída por três artigos: o primeiro definidor do respetivo objeto; o segundo
alterando a Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro, designadamente revogando a restrição que impede que os
profissionais da PSP exerçam o direito à greve e eliminando a restrição que os impossibilita de convocar
reuniões ou manifestações de carácter político ou nelas participar, exceto, neste caso, se trajar civilmente, e,
tratando-se de ato público, não integrar a mesa, usar da palavra ou exibir qualquer tipo de mensagem; o terceiro
estabelecendo o momento de entrada em vigor da iniciativa, caso esta venha a ser aprovada.
3 – Enquadramento jus-constitucional
A Constituição reconhece aos trabalhadores a liberdade sindical, como «condição e garantia da construção
da sua unidade para defesa dos seus direitos e interesses» (vide artigo 55.º), e garante a todos o direito à greve
(ex vi do artigo 57.º). Como direitos fundamentais que são, estes apenas podem ser restringidos nos casos
expressamente previstos na Constituição (artigo 18.º).
O artigo 270.º determina que «a lei pode estabelecer, na estrita medida das exigências próprias das
respetivas funções, restrições ao exercício dos direitos de expressão, reunião, manifestação, associação e
petição coletiva e à capacidade eleitoral passiva por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes
em serviço efetivo, bem como por agentes dos serviços e das forças de segurança e, no caso destas, a não
admissão do direito à greve, mesmo quando reconhecido o direito de associação sindical.»
Esta norma foi aditada à Constituição na revisão constitucional de 1982, contemplando então apenas os
«militares e agentes militarizados». Após, com a revisão constitucional de 1997 são incluídos os «agentes dos
serviços e forças de segurança», e mais tarde, em 2001, é incluída a «não admissão do direito à greve, mesmo
quando reconhecido o direito de associação sindical», relativamente às forças de segurança.
Nas palavras de J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira2, «É duvidoso se a fórmula linguística – “a lei pode
estabelecer” – pode ser interpretada no sentido de definir uma simples possibilidade ou facultatividade de
restrições ou se a intencionalidade intrínseca é de estabelecer um dever de legislar sobre as restrições
acrescidas ao exercício de direitos». Por outro lado, recordam que «As restrições especiais aqui previstas, além
de estarem sujeitas ao regime geral das restrições dos direitos, liberdades e garantias, estão ainda submetidas
a requisitos especiais, consubstanciados não só na reserva legislativa absoluta da AR [artigo 164.º, alínea o)],
não podendo o Governo ser autorizado a legislar sobre a matéria, mas também na exigência de maioria
parlamentar qualificada para a aprovação das leis que as estabeleçam [artigo 168.º, n.º 6, alínea e)]».
Nos termos do disposto no artigo 272.º da Constituição, compete à polícia defender a legalidade democrática
e garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, remetendo-se para a lei a fixação do regime das forças
de segurança.
A par deste preceito constitucional, a Lei n.º 53/2007, de 31 de agosto, que aprova a orgânica da Polícia de
Segurança Pública (PSP), no seu artigo 1.º, define a PSP como uma força de segurança, uniformizada e armada,
com natureza de serviço público e dotada de autonomia administrativa, tendo como missão assegurar a
legalidade democrática, garantir a segurança interna e os direitos dos cidadãos, nos termos da Constituição e
da lei. Por sua vez o Decreto-Lei n.º 243/2015, de 19 de outubro, que consagra o Estatuto profissional do pessoal
com funções policiais de Polícia de Segurança Pública caracteriza, no seu artigo 4.º, a condição policial.
Ademais, a Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro, cuja alteração é proposta pela iniciativa em apreço, veio
reconhecer aos polícias a liberdade sindical, regulando o seu exercício, bem como o exercício dos direitos de
negociação coletiva e de participação. Antes da sua aprovação, o direito de associação já havia sido reconhecido
ao pessoal da PSP com funções policiais pela Lei n.º 6/90, de 20 de fevereiro, a qual, contudo, lhes vedava a
filiação em associações de natureza sindical (vide o artigo 6.º do referido diploma).
A mencionada Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro, inseriu-se numa linha de reforço das características civis
2 Na sua Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume II, 4.ª ed. revista, Coimbra Editora, 2010, p.846 e 849.
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da PSP, assegurando aos polícias a liberdade sindical (artigo 2.º), mas prevendo, por outro lado, algumas
restrições ao exercício da mesma «atendendo à natureza e missão da PSP» (conforme previsto no artigo 3.º).
4 – Enquadramento jurídico na União Europeia e Internacional
No que diz respeito ao enquadramento internacional, nomeadamente em Espanha, França e Itália, remete-
se para a informação disponível na nota técnica do projeto de lei em apreço, elaborada pelos serviços da
Assembleia da República (cfr. anexo).
5 – Apreciação da conformidade dos requisitos formais, constitucionais e regimentais e do
cumprimento da lei formulário
A iniciativa em apreciação assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do
artigo 119.º do Regimento. Encontra-se redigida sob a forma de artigos, sendo precedida de uma breve
exposição de motivos e tem uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, cumprindo desta
forma os requisitos formais previstos nos termos do n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
O título da iniciativa legislativa traduz sinteticamente o seu objeto, mostrando-se em conformidade com o
disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário.
Encontram-se também respeitados os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º
do Regimento, uma vez que a mesma parece não infringir a Constituição ou os princípios nela plasmados e
define concretamente o sentido das normas.
Não obstante, cumpre mencionar que em sede de admissibilidade se considerou que as alterações à Lei n.º
14/2002, de 19 de fevereiro, previstas na presente iniciativa, são suscetíveis, no plano teórico, de levantar
questões de natureza constitucional (a este propósito veja-se as páginas 3 a 6 da nota técnica).
Apesar disso, não se afigura possível concluir de forma inequívoca, nesta fase, que é inconstitucional que a
lei deixe de impedir o direito à greve por parte dos agentes dos serviços e forças de segurança. Esta questão
poderá, todavia, ser considerada e ponderada no decurso do processo legislativo.
6 – Iniciativas legislativas e petições pendentes sobre a matéria
Consultada a base de dados da atividade parlamentar (AP), verifica-se que, sobre matéria conexa com o
projeto de lei em apreço, está pendente a seguinte iniciativa:
− Projeto de Lei n.º 733/XV/1.ª (PCP) – Reforça o regime de direitos dos profissionais da Guarda Nacional
Republicana e de participação das respetivas associações representativas (primeira alteração à Lei n.º
39/2004, de 18 de agosto, segunda alteração à Lei n.º 63/2007, de 6 de novembro, e primeira alteração
ao Decreto-Lei n.º 233/2008, de 2 de dezembro, que regulamenta o exercício do direito de associação
pelos profissionais da GNR), iniciativa que propõe a revogação da proibição de manifestações de carácter
político pela GNR.
7 – Consultas
A Constituição consagra, em matéria laboral, o direito de as comissões de trabalhadores ou dos sindicatos
participarem na elaboração de legislação do setor ou do trabalho, respetivamente na alínea d) do n.º 5 do artigo
54.º e na alínea a) do n.º 2 do artigo 56.º.
Para esse efeito, a iniciativa sub judice foi colocada em apreciação pública de 13 de maio a 12 de junho de
2023, através da sua publicação na Separata n.º 60/XV do Diário da Assembleia da República, de 13 de maio,
nos termos do artigo 134.º do Regimento, bem como do artigo 16.º da Lei Geral do Trabalho em Funções
Públicas, aprovada em anexo à Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, e dos artigos 469.º a 475.º do Código do
Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro.
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Todos os pareceres e contributos recebidos serão publicitados na página da iniciativa.
PARTE II – Opinião da Relatora
A Constituição da Republica Portuguesa, no seu artigo 270.º, determina que a lei pode estabelecer, na estrita
medida das exigências próprias das respetivas funções, restrições ao exercício dos direitos de expressão,
reunião, manifestação, associação, petição coletiva e à capacidade eleitoral passiva por militares e agentes
militarizados dos quadros permanentes em serviço efetivo, bem como por agentes dos serviços e forças de
segurança e, no caso destas, a não admissão do direito à greve, mesmo quando reconhecido o direito de
associação sindical.
As restrições de direitos previstas no artigo 270.º da Constituição constituem reserva absoluta de
competência legislativa da Assembleia da República, nos termos da alínea o) do artigo 164.º da Constituição, e
carecem de aprovação por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria
absoluta dos Deputado em efetividade de funções [alínea e) do n.º 6 do artigo 168.º da CRP].
Da leitura destes preceitos constitucionais e no que tange à Polícia de Segurança Pública (PSP), que tem
inequivocamente natureza civil, o legislador encontra-se autorizado a reconhecer o respetivo direito de
associação sindical (como veio a ocorrer por força da Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro), podendo nesse caso
não admitir o direito à greve.
Embora a matéria atinente a este parecer seja controvertida e as anotações de Gomes Canotilho e Vital
Moreira ao artigo 270.º (Vd. CRP anotada, II Volume, 4.ª ed. Coimbra Editora, p.845) assim o demonstram
quanto à interpretação do segmento da norma «a lei pode estabelecer…», bem como no tocante às três
dimensões do princípio da proibição do excesso nas restrições de direitos, é importante atermo-nos ao elemento
literal.
Ora, a letra do presente artigo não estabelece uma imposição da proibição do direito à greve mas, sim (e
apenas), uma possibilidade. Concluir no sentido da imposição da proibição pressupõe, cremos, um trabalho de
interpretação da lei que, no caso em concreto, ao ir além da interpretação literal da norma pode acabar por
«sobrelevar a vontade do legislador ou do próprio interprete-aplicador como bem observa António Menezes
Cordeiro (In C.C. Comentado, I Parte geral, Almedina, p.102).
Afigura-se-nos que a não admissão do direito à greve dos profissionais das forças de segurança em caso de
reconhecimento do respetivo direito de associação sindical não surge assim como uma obrigatoriedade
constitucional, mas como uma faculdade conferida ao legislador, que terá sempre que sopesar as exigências
próprias das respetivas funções policiais num quadro de salvaguarda de outros direitos ou interesses
constitucionalmente protegidos onde se inscreve a segurança interna e os direitos dos cidadãos.
A relatora signatária do presente parecer reserva-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre
o Projeto em apreço, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – O Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia
da República o Projeto de Lei n.º 737/XV/1.ª (PCP), que «Consagra o direito à greve dos profissionais da PSP
(segunda alteração à Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro)».
2 – As alterações propostas à Lei n.º 14/2002, de 19 de fevereiro, operadas pelo Projeto de Lei n.º
737/XV/1.ª (PCP) foram na respetiva Nota de Admissibilidade consideradas suscetíveis, no plano teórico, de
levantar questões de natureza constitucional, mas que tal como é reconhecido na mesma não são inequívocas
nem impedem a sua discussão em sede plenária.
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 737/XV/1.ª (PCP) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
4 – Nos termos regimentais aplicáveis, o presente parecer deverá ser remetido a S. Ex.ª o Presidente da
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Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada relatora, Susana Amadora — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado as ausências do
CH, do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
———
PROJETO DE LEI N.º 741/XV/1.ª
(REGIME DE COMPARTICIPAÇÃO DE SISTEMAS HÍBRIDOS DE PERFUSÃO SUBCUTÂNEA
CONTÍNUA DE INSULINA, DE FORMA A AUMENTAR A QUALIDADE DE VIDA DAS PESSOAS COM
DIABETES TIPO 1)
Parecer da Comissão de Saúde
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião da Deputada autora do parecer
Parte III – Conclusões
Parte IV – Anexos
PARTE I – Considerandos
1 – Introdução
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da
República, a 4 de maio de 2023, o Projeto de Lei n.º 741/XV/1.ª que defende o regime de comparticipação de
sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina, de forma a aumentar a qualidade de vida das
pessoas com diabetes tipo 1.
Esta iniciativa foi apresentada, no âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o disposto na
Constituição da República Portuguesa (CRP) – n.º 1 do artigo 167.º e na alínea b) do artigo 156.º – e no artigo
118.º, bem como na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), com a
redação em vigor desde 1 de setembro de 2020.
A iniciativa em apreço respeita também os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e do n.º 1 do
artigo 123.º do RAR, relativamente às iniciativas em geral.
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, foi a mesma admitida e distribuída à
Comissão de Saúde, para emissão de parecer. Foi designada como relatora a Deputada Susana Correia, do
Grupo Parlamentar do Partido Socialista.
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2 – Objeto e Motivação
O Projeto de Lei n.º 741 /XV/1.ª, apresentado pelo Grupo Parlamentar do BE, defende o acesso aos novos
sistemas de perfusão de insulina a todos aqueles que têm diabetes tipo 1, referindo que após a iniciativa
legislativa de 2016, que garantiu o acesso às crianças, até aos dez anos e com diabetes tipo 1, à terapêutica
com sistema de perfusão contínua de insulina, o passo seguinte seria garantir o acesso destes dispositivos a
todos os cidadãos que têm diabetes tipo 1.
Consideram que esta medida permitirá um controlo mais eficaz da glicemia e, consequentemente, trará
melhores resultados na saúde e qualidade de vida das pessoas com a doença, para além de prevenir
complicações de saúde associadas à diabetes (problemas renais, cardíacos e oftalmológicos até amputações
ou perda de anos de vida).
Defendem, por isso, que estes dispositivos híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina devem ser
disponibilizados e comparticipados integralmente pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS) e seguir o circuito
previsto para o medicamento, e que as pretensões e fundamentos aduzidos na Petição n.º 85/XV/1.ª, discutida
já em sede de Comissão Parlamentar de Saúde, mantêm a sua atualidade.
A iniciativa legislativa em apreço tem cinco artigos: o primeiro estabelece o seu objeto, o segundo determina
a comparticipação dos sistemas híbridos de perfusão subcutânea de insulina, o terceiro a dispensa dos
dispositivos, o quarto a regulamentação e o último estabelece a entrada em vigor da lei a aprovar.
3 – Do enquadramento legal, antecedentes e direito comparado
➢ Enquadramento Legal
Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 64.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), «Todos têm
direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover». As alíneas b) e c) do n.º 3 do mesmo artigo
estipulam, ainda, que para assegurar o direito à proteção da saúde incumbe prioritariamente ao Estado,
nomeadamente, «garantir o acesso de todos os cidadãos, independentemente da sua condição económica, aos
cuidados da medicina preventiva, curativa e de reabilitação»; e «orientar a sua ação para a socialização dos
custos dos cuidados médicos e medicamentosos».
De acordo com a nota técnica elaborada, nos termos do artigo 131.º do Regimento da Assembleia da
República (RAR), pelos serviços parlamentares e que aqui se dá por reproduzida, no desenvolvimento deste
preceito constitucional, em 2016, e pela Portaria n.º 35/2016, de 1 de março, foi estabelecido o regime de
comparticipação do Estado no preço máximo dos reagentes (tiras-teste) para determinação de glicemia,
cetonemia e cetonúria e das agulhas, seringas, lancetas e de outros dispositivos médicos para a finalidade de
auto monitorização de pessoas com diabetes, a beneficiários do SNS. Com esta Portaria, ficou também
estabelecido os preços de venda ao público unitários dos dispositivos médicos para determinação de glicose no
sangue.
Pelo Despacho n.º 13 277/2016, de 7 de novembro, do Secretário de Estado Adjunto e da Saúde,
estabeleceu-se que «no âmbito do Programa Nacional para a Diabetes, a estratégia de Acesso a Tratamento
com Dispositivos de Perfusão Subcutânea Contínua de Insulina (PSCI), para os próximos 3 anos, deve
prosseguir, mantendo a atual atribuição anual de 100 dispositivos de PSCI a adultos elegíveis e 30 dispositivos
de PSCI a mulheres elegíveis grávidas ou em preconceção, os seguintes objetivos: a) Atingir uma cobertura,
até ao final do ano de 2017, que abranja todos os utentes elegíveis para tratamento inscritos na Plataforma
PSCI, da DGS, com idade igual ou inferior a 10 anos de idade; b) Alargar a cobertura, até ao final do ano 2018,
aos utentes elegíveis para tratamento inscritos na Plataforma PSCI da DGS, com idade igual ou inferior a 14
anos de idade; c) Assegurar até ao final do ano de 2019, a cobertura de todos os utentes elegíveis para
tratamento inscritos na Plataforma PSCI da DGS, com idade igual ou inferior a 18 anos de idade».
Considerando que em Portugal, a utilização dos dispositivos de PSCI, para administração da insulina às
pessoas com diabetes tipo 1, tem permitido uma melhoria do seu controlo metabólico com redução das
hipoglicemias graves e dos episódios de cetoacidose, foi publicada a Portaria n.º 187/2022, de 22 de julho, que
fixou os preços máximos de aquisição [sem imposto sobre o valor acrescentado (IVA)], para as entidades
tuteladas pelo membro do Governo responsável pela área da saúde, dos dispositivos médicos de perfusão
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subcutânea contínua de insulina (PSCI), dos sistemas de monitorização contínua da glicose intersticial (CGM)
para utilização integrada com PSCI e respetivos conjuntos de consumíveis, a efetuar nos termos previstos no
Programa Nacional para a Diabetes.
Pelo Despacho n.º 13 339/2022, de 17 de novembro, do Ministro da Saúde, foi criada uma equipa para
apresentar uma proposta de atualização da estratégia de acesso a tratamento com PSCI, assim como
desenvolver uma estratégia de disponibilização da nova geração destes dispositivos. De acordo com o ponto 7
deste despacho, a este grupo de trabalho cabia apresentar uma proposta integrada no prazo de 120 dias a
contar da data da sua publicação.
Este regime encontra-se melhor explicitado na já referida nota técnica, e que aqui se dá por integralmente
reproduzido, evitando eventuais redundâncias.
➢ Antecedentes Legislativos
Em termos de antecedentes legislativos, e após consulta à base de dados da atividade parlamentar, constata-
se que a discussão da presente iniciativa se encontra agendada para dia 1 de junho próximo, em conjunto com
as seguintes iniciativas:
• Petição n.º 85/XV/1.ª – Pelo acesso aos sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina
(bombas de insulina) e pela qualidade de vida das pessoas com diabetes tipo 1 em Portugal;
• Projeto de Resolução n.º 582/XV/1.ª (L) – Recomenda ao Governo que disponibilize ao grupo de trabalho,
constituído pelo Despacho n.º 13339/2022, a recomendação do Instituto Nacional de Excelência em
Saúde e Cuidados (NICE) do Reino Unido, que preconiza o acesso a «pâncreas artificial» a pessoas que
vivem com diabetes tipo 1.
• Projeto de Resolução n.º 608/XV/1.ª (PAN) – Pela disponibilização de bombas de insulina a todas as
pessoas com diabetes tipo 1;
• Projeto de Resolução n.º 615/XV/1.ª (BE) – Acesso aos sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua
de insulina, de forma a aumentar a qualidade de vida das pessoas com diabetes tipo 1;
• Projeto de Resolução n.º 620/XV/1.ª (PCP) – Comparticipação total para o Sistema híbrido ou de ajuste de
administração automática de insulina com base na monitorização contínua de glicose;
De notar que também o Projeto de Lei n.º 525/XV/1.ª (PCP) – Regime de comparticipação de medicamentos,
dispositivos médicos e suplementos para alimentação entérica e parentérica, deu entrada na atual Legislatura,
tendo sido discutido e rejeitado, na generalidade, na sessão plenária do dia 12 de maio de 2023.
De referir por fim que, de acordo com a referida Nota Técnica, ao longo das últimas Legislaturas esta matéria
foi amplamente discutida e alvo de um largo conjunto de iniciativas pelos diferentes grupos parlamentares.
➢ Direito Comparado
Também em termos de Direito Comparado, o presente parecer remete para a nota técnica, já aqui referida,
elaborada pelos serviços parlamentares.
PARTE II – Opinião da Deputada autora do parecer
Neste ponto importa atender à constituição do grupo de trabalho, ao abrigo do Despacho n.º 13339/2022, de
17 de novembro, para atualização da estratégia de acesso a tratamento com dispositivos de perfusão
subcutânea contínua de insulina (PSCI), tendo em vista a utilização equitativa dos dispositivos de nova geração,
e, com a missão de, avaliar a estratégia de acesso a tratamento com PSCI, em termos de resultados obtidos,
benefícios para o utente e custos associados, avaliar os benefícios dos novos dispositivos, com adequada
fundamentação técnico científica e avaliação criteriosa do custo-benefício, tendo em conta o potencial impacto
na qualidade de vida das crianças, jovens e adultos atingidos pela doença, bem como das suas famílias,
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desenvolver uma estratégia de disponibilização desses dispositivos, com a avaliação do custo-benefício do
processo, apresentar uma proposta de atualização da estratégia de acesso a tratamento com PSCI.
De acordo com o ponto 7 deste despacho, a este grupo de trabalho cabia apresentar uma proposta no prazo
de 120 dias a contar da data da sua publicação.
Tendo em conta o prolongamento deste prazo e alteração da composição deste grupo de trabalho, Despacho
n.º 3584/2023, de 21 de março, «O grupo de trabalho deve apresentar uma proposta integrada no prazo de 180
dias a contar da data de publicação do presente despacho.»
Face ao exposto, e considerando também o Orçamento do Estado para 2023 (Lei n.º 24-D/2022, no seu
artigo 154.º, «Alargamento do acesso aos sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina»), “O
Governo cria um grupo de trabalho para avaliar a comparticipação e as condições de alargamento do acesso
aos sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina aos doentes diabéticos tipo 1, dando
prioridade a crianças, jovens e a outras pessoas especialmente vulneráveis, e assegurando ainda sessões de
formação para os beneficiários, familiares e cuidadores”, é do entender que as iniciativas a levar a cabo nesta
matéria deverão incorporar a proposta do grupo de trabalho criado para atualização da estratégia de acesso a
tratamento com dispositivos de perfusão subcutânea contínua de insulina (PSCI), tendo em vista a utilização
equitativa dos dispositivos de nova geração.
PARTE III – Conclusões
1 – O Projeto de Lei n.º 471/XV/1.ª, da autoria do Grupo Parlamentar do BE, que pretende estabelecer o
«Regime de comparticipação de sistemas híbridos de perfusão subcutânea contínua de insulina, de forma a
aumentar a qualidade de vida das pessoas com diabetes tipo 1», foi admitido e distribuído à Comissão
Parlamentar de Saúde para elaboração do respetivo parecer, estando a sua discussão em Plenário da
Assembleia da República prevista para dia 1 de junho próximo.
2 – A sua apresentação foi efetuada, no âmbito do poder de iniciativa da lei, em conformidade com o
disposto na Constituição da República Portuguesa (CRP) – n.º 1 do artigo 167.º e na alínea b) do artigo 156.º –
, bem como no artigo 118.º e na alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República
(RAR). A iniciativa em análise respeita também os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 119.º e do n.º 1
do artigo 124.º do RAR, relativamente às iniciativas em geral.
3 – Face ao exposto, a Comissão de Saúde é de parecer que a iniciativa, reúne, em geral, os requisitos
legais, constitucionais e regimentais para ser discutida e votada em Plenário, reservando os grupos
parlamentares as suas posições de voto para esse momento.
Palácio de São Bento, 24 de maio de 2023.
A Deputada autora do parecer, Susana Correia — O Presidente da Comissão, António Maló de Abreu.
Nota: Aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência da IL, na reunião da Comissão de 31 de
maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Para uma melhor análise e compreensão deste parecer deverá constar, como anexo, a nota técnica
elaborada pelos Serviços Parlamentares.
———
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PROJETO DE LEI N.º 743/XV/1.ª
(CRIA O TIPO LEGAL DE CRIME DE ASSÉDIO SEXUAL E DE ASSÉDIO SEXUAL QUALIFICADO,
REFORÇANDO A PROTEÇÃO LEGAL DAS VÍTIMAS)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República
o Projeto de Lei n.º 743/XV/1.ª – Cria o tipo legal de crime de assédio sexual e de assédio sexual qualificado,
reforçando a proteção legal das vítimas.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 28 de abril de 2023. Foi admitido a 4 de maio e, por despacho
do Presidente da Assembleia da República, baixou, na fase da generalidade, à Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), tendo a signatária deste parecer sido designada como
relatora.
O projeto de lei foi apresentado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º, do n.º 1 do artigo
167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do
n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). A iniciativa cumpre
os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Em 10 de maio de 2023 foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Publico, ao Conselho
Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à APAV, podendo ser consultados a todo o tempo na
página do processo legislativo da iniciativa, disponível eletronicamente.
I. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
Nos exatos termos da nota técnica, a presente iniciativa legislativa visa autonomizar o crime de assédio
sexual e tipificar o crime de assédio sexual qualificado, alterando, para o efeito, o Código Penal (CP), com o
intuito de reforçar a proteção legal das vítimas.
Os proponentes recordam que o assédio sexual constitui uma manifestação de violência contra as mulheres,
ocorrendo em diversos contextos – laborais, académicos, na rua e nos transportes públicos, entre outros.
Aludem aos dados estatísticos de um estudo, de 2016, da Comissão para a Igualdade no Trabalho e no
Emprego, que revela que as mulheres são as principais vítimas de assédio moral (16,7 %) e de assédio sexual
(14,4 %) no local de trabalho, bem como de um estudo da Organização Internacional do Trabalho, que concluiu
que a violência e o assédio no trabalho afetam mais de uma em cada cinco pessoas, e aos dados da Associação
Portuguesa Apoio à Vítima (APAV), segundo a qual duas em cada dez pessoas admitiu ter sido vítima de assédio
sexual no local de trabalho, sendo 88 % mulheres.
Apresentam a definição de assédio sexual da Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o
Combate à Violência e observam que decorreram 10 anos da entrada em vigor da Convenção de Istambul e
que o assédio sexual é uma realidade, carecendo de reconhecimento pelo poder político e de providência
legislativa para colmatar o vazio legal que o poder judiciário reclama.
Entendem os proponentes que o crime de importunação sexual, previsto e punido pelo artigo 170.º do CP, é
manifestamente insuficiente para fazer face à realidade do assédio sexual e defendem a autonomização do
crime de assédio sexual, de forma a conferir-lhe a censurabilidade jurídica e a dignidade penal que consideram
devidas, salientando o efeito dissuasor junto da sociedade que uma maior visibilidade no ordenamento jurídico-
penal português potencializará.
Assim, em concreto propõem:
• a alteração da epígrafe do artigo 170.º para «Assédio sexual»;
• a densificação das condutas típicas aí previstas, passando o artigo 170.º a ter a seguinte redação:
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Quem importunar sexualmente outra pessoa:
a) praticando ou dirigindo-lhe atos de carácter exibicionista, pessoalmente ou através de meios digitais;
b) formulando propostas ou dirigindo comentários, verbais ou não verbais, de teor sexual; ou
c) constrangendo-a, física ou verbalmente, a contacto íntimo ou de natureza sexual,
é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, se pena mais grave lhe não
couber por força de outra disposição legal.
• a tipificação do crime de assédio sexual qualificado, aditando um artigo 170.º-A ao CP, com a seguinte
redação:
1 – Se o assédio sexual for praticado em circunstâncias que revelem especial censurabilidade, o agente
é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa, se pena mais grave lhe não couber por força
de outra disposição legal.
2 – É suscetível de revelar a especial censurabilidade a que se refere o número anterior, entre outras, a
circunstância de o agente se encontrar numa relação familiar ou de parentesco com a vítima, de coabitação,
de tutela ou curatela, a condição de superior hierárquico ou de ascendência do agente inerentes ao exercício
de emprego, cargo ou função ou a vítima ser pessoa particularmente vulnerável, em razão de idade,
deficiência, doença ou gravidez.
• e a alteração, em conformidade com o preconizado, ao n.º 2 do artigo 177.º, excluindo os tipos p. e p. pelos
artigos 170.º e 170.º-A da agravação prevista no seu n.º 1».
I. c) Enquadramento legal
Em conformidade com o vertido na nota técnica, «o Código Penal dedica aos crimes contra a liberdade e a
autodeterminação sexual o Capítulo V do Título I (Crimes contra as pessoas) da Parte Especial, dividido em
duas secções que compreendem, respetivamente, os crimes contra a liberdade sexual (Secção I – artigos 163.º
a 170.º) e os crimes contra a autodeterminação sexual (Secção II – artigos 171.º a 176.º-B). Inclui ainda uma
Secção III, que contém disposições comuns aos crimes acima referidos sobre agravação (artigo 177.º) e queixa
(artigo 178.º).
No crime de importunação sexual, previsto no artigo 170.º do CP, cuja alteração se propõe na iniciativa objeto
da presente nota técnica, estão em causa três condutas típicas distintas: a prática perante outra pessoa de atos
de carácter exibicionista, o constrangimento a contacto de natureza sexual e a formulação de propostas de teor
sexual. Este crime é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, a não ser que
lhe caiba pena mais grave por força de outra disposição legal.
(…) Recorde-se que o assédio foi, pela primeira vez, regulado na ordem jurídica portuguesa em 2003, com
a aprovação do Código do Trabalho pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, cujo artigo 24.º o qualificava como
forma de discriminação (n.º 1). Em 2009, com a reforma do Código do Trabalho aprovada pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro (texto consolidado), a norma relativa ao assédio é autonomizada numa divisão própria,
intitulada «proibição de assédio», constituída pelo artigo 29.º, deixando de ficar limitada ao assédio
discriminatório (…)».
PARTE II – Opinião da Relatora
Reconhecendo-se a inegável danosidade do assédio sexual e a sua relevância no plano das incriminações
penais, deve sublinhar-se que o universo dos comportamentos que se podem associar àquele conceito está já
abrangido por diversos tipos legais de crime, que vão desde os menos graves, como a importunação sexual, às
formas mais graves de violação. Na sua pronúncia, a APAV reconhece-o (o assédio sexual, consoante o tipo de
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atos em concreto que estejam em causa, pode configurar a prática de um ou mais de entre vários ilícitos já
previstos, designadamente injúrias, ameaça, perseguição, importunação sexual, coação sexual ou violação)
apesar de, ainda assim, sustentar o «acerto da iniciativa no que respeita à autonomização deste crime» [não
acompanhando, porém, «a forma como (…) foi delineada»)]. Todavia, da opção vertida na iniciativa legislativa
de passar a denominar como «assédio sexual» apenas as condutas subsumíveis no atual (e menos grave) ilícito
de importunação sexual, resulta a intenção de encurtamento conceptual daquilo a que se vem chamando
assédio? Eis a primeira dúvida que se suscita. De forma porventura mais enfática, o parecer do Conselho
Superior da Magistratura sublinha que «não se afigura, nem a exposição de motivos o fundamenta
suficientemente, que a realidade social reclame, para além do quadro legal já vigente, a necessidade de
criminalização de outras condutas para além daquelas que já são passíveis de ser sancionadas, podendo tal
intervenção do direito penal revelar-se excessiva». Retomando ideia antes constante de parecer da ASJP, o
CSM reafirma que «nunca se poderá, contudo, criminalizar condutas de assédio sexual indesejadas que não
ultrapassem a grosseria ou má-educação. Deve ter-se presente ao artigo 18.º da Constituição da República
Portuguesa». E conclui-se, no parecer do CSM, que «uma incriminação com essa amplitude pode revelar-se
excessiva por ofender outros direitos fundamentais e abranger condutas sem qualquer relevância penal, o que
não passará no crivo dos princípios constitucionais da necessidade e da proporcionalidade».
Por outro lado, o projeto de lei em apreço é ainda questionável à luz do princípio da determinabilidade das
normas penais incriminadoras (dimensão inegável do princípio da legalidade), porquanto recorre a conceitos
indeterminados cujas fronteiras parecem de muito difícil concretização (o parecer da Ordem dos Advogados
refere a possibilidade de se tratar de solução «violadora dos princípios jurídicos da legalidade e da tipicidade»;
o parecer do CSM refere os «conceitos de tal modo abrangentes, indefinidos e indeterminados que não
permitirão ao destinatário da norma saber quais são os atos realmente proibidos, o que colidirá com o princípio
da tipicidade enquanto expressão do princípio constitucional da legalidade»).
Em terceiro lugar, as pronúncias recebidas até ao momento enfatizam as críticas à criação de um crime de
«assédio sexual qualificado» num novo artigo 170.º-A, porquanto sempre seria redundante face à solução
atualmente constante do artigo 177.º do Código Penal, introduzindo fatores de perturbação para o aplicador.
Finalmente, o parecer da APAV manifesta-se expressamente sobre a natureza do crime no que respeita à
promoção processual, rejeitando a publicização, em sentido que merece concordância. Nos seus termos, «o
procedimento criminal acaba muitas vezes por submeter a vítima a um penoso e difícil processo de vitimação
secundária, razão pela qual defendemos, para este como para os restantes crimes contra a liberdade sexual,
que não é positiva para as vítimas a publicização tout-court (…) entende-se que ao crime de assédio sexual na
forma simples deverá ser conferida natureza semipública, tal como sucede atualmente com o crime de
importunação sexual. Estando presente alguma circunstância de agravação, admite-se a possibilidade de
mitigação dessa natureza semipública através do alargamento do âmbito de aplicação do artigo 178.º, n.º 2,
atribuindo-se ao Ministério Público a prerrogativa de poder dar início ao procedimento criminal sempre que o
interesse da vítima o aconselhe». Também o parecer do CSM rejeita a atribuição da natureza pública a estes
crimes: «vê-se com dificuldade que se retire à vítima ou ao titular do direito de queixa (…) o poder de decidir
sobre o início da ação penal, sendo-lhe perfeitamente legítimo preferir o esquecimento à estigmatização a que
normalmente está associado este tipo de processos».
PARTE III – Conclusões
1 – O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda (BE) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da
República o Projeto de Lei n.º 743/XV/1.ª (BE) – Cria o tipo legal de crime de assédio sexual e de assédio sexual
qualificado, reforçando a proteção legal das vítimas.
2 – A iniciativa legislativa sub judice visa a autonomização do crime de assédio sexual e a criação de um
crime de assédio sexual qualificado.
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 743/XV/1.ª (BE) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
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Palácio de S. Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada relatora, Cláudia Santos — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
———
PROJETO DE LEI N.º 759/XV/1.ª
(CRIA O PROVEDOR DA CRIANÇA)
PROJETO DE LEI N.º 771/XV/1.ª
(PREVÊ A CRIAÇÃO DO PROVEDOR DAS CRIANÇAS E DAS GERAÇÕES FUTURAS)
PROJETO DE LEI N.º 784/XV/1.ª
(INSTITUI O PROVEDOR DA CRIANÇA)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Iniciativa Liberal, que cria o Provedor
da Criança, deu entrada na Assembleia da República a 28 de abril de 2023. A 8 de maio procederam os autores
da iniciativa à substituição do texto inicialmente apresentado. Foi admitido e distribuído a 9 de maio de 2023 à
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão de parecer, nos termos
do n.º 1 do artigo 129.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
O Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª, apresentado pela Deputada única representante do Pessoas-Animais-
Natureza, que prevê a criação do Provedor das Crianças e das Gerações Futuras, deu entrada na Assembleia
da República a 12 de maio de 2023, sendo admitido e distribuído a 17 de maio de 2023 à Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão de parecer, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º
do Regimento da Assembleia da República (RAR).
O Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª, apresentado pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda, que institui o
Provedor da Criança, deu entrada na Assembleia da República a 12 de maio de 2023, sendo admitido e
distribuído a 17 de maio de 2023 à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
para emissão de parecer, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º do Regimento da Assembleia da República (RAR).
Por anúncio de 10 de maio de 2023, foi o signatário deste parecer designado como relator do parecer relativo
ao Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL) e, por arrastamento, em 18 de maio de 2023, do Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª
(PAN) e do Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª (BE). Optou-se pela elaboração de parecer conjunto, tendo em conta
a similitude de propósitos e de soluções dos projetos de lei.
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Os projetos de lei foram apresentados nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º, do n.º 1
do artigo 167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea
b) do n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), observando
o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento.
Para todos os projetos de lei foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Público, ao
Conselho Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à Provedoria de Justiça. Para o Projeto de Lei
n.º 771/XV/1.ª (PAN) foi promovida, pelo Sr. Presidente da Assembleia da República, audição à Assembleia
Legislativa da Região Autónoma dos Açores, à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, ao
Governo da Região Autónoma dos Açores e ao Governo da Região Autónoma da Madeira.
Ao momento da elaboração deste parecer nenhum das audições promovidas foi enviada à Comissão. No
entanto, sendo-o posteriormente, poderão ser consultados a todo o tempo na página dos processos legislativos
das iniciativas, disponíveis eletronicamente.
A discussão na generalidade destas iniciativas encontra-se agendada para a sessão plenária de 1 de junho
de 2023, conjuntamente com o Projeto de Resolução n.º 638/XV/1.ª (IL), que recomenda ao Governo que permita
às famílias a escolha da creche e melhoria do programa creche feliz, do Projeto de Resolução n.º 660/XV/1.ª
(IL), que recomenda ao Governo a criação de uma campanha de sensibilização para a adoção de crianças e
jovens de diferentes idades, do Projeto de Resolução n.º 661/XV/1.ª (IL), que recomenda ao Governo que
possibilite a conversão de salas de jardim de infância em creches, do Projeto de Lei n.º 647/XV/1.ª (PCP), pelo
reforço dos direitos de maternidade e de paternidade, do Projeto de Lei n.º 770/XV/1.ª (PCP), para a reposição
dos escalões do abono de família para crianças e jovens, com vista à sua universalidade, e do Projeto de Lei
n.º 772/XV/1.ª (PAN), que prevê a alteração da composição e funcionamento das Comissões de Proteção de
Crianças e Jovens.
I b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
As iniciativas legislativas em discussão propõem a criação da Provedor da Criança, ainda que apresentem
diferentes soluções legislativas que, no decorrer deste parecer se procuram escalpelizar. Resumidamente, as
iniciativas n.º 759/XV/1.ª (IL) e n.º 771/XV/1.ª (PAN) propõem alterações à Lei n.º 9/01, de 9 de abril, que aprova
o Estatuto do Provedor de Justiça. A iniciativa do Bloco de Esquerda, ao invés, propõe a instituição do Provedor
da Criança, enquanto órgão singular, dotado de autonomia administrativa e que prossegue a sua missão de
forma isenta, autónoma e imparcial, sem sugerir alteração ou fazer remissão para os diplomas legais hoje em
vigor.
Para cada um dos projetos faz-se abaixo um breve enquadramento da exposição de motivos. No fim, para
melhor apreciação do parecer e discussão das iniciativas, apresenta-se o quadro comparativo, particularmente
para os projetos que propõem uma alteração ao Estatuto do Provedor de Justiça.
Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL)
A iniciativa legislativa da Iniciativa Liberal propõe a criação da figura do Provedor da Criança, como organismo
autónomo e exclusivamente dedicado à defesa das crianças e à promoção dos seus direitos.
Defendem os proponentes que a especial vulnerabilidade das crianças e a necessidade de as proteger
justifica a autonomização desta figura. Como referem no início da exposição de motivos da iniciativa, «as
crianças são, pelos mais diversos fatores, os cidadãos mais vulneráveis e que mais necessitam de proteção por
parte da sociedade. A pobreza infantil e a discrepância de oportunidades no acesso à saúde e à educação são
flagelos que urge combater e que apenas se agravaram pela situação pandémica global, que vincou problemas
como as desigualdades educativas e a dificuldade na recuperação da aprendizagem.»
A instituição de uma provedoria unifuncional torna-se mais evidente, como se refere na nota técnica que dá
suporte à iniciativa, se considerarmos que as estruturas nacionais que procedem à defesa institucional dos
direitos das crianças carecem de autonomia ou especialização suficientes. Entendem os proponentes que
nenhuma das entidades hoje dedicadas à defesa das crianças – o Provedor de Justiça e a Comissão Nacional
de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) – tem a configuração ideal que garanta
a sua defesa. Como se explica na exposição de motivos, a Provedoria de Justiça não é uma entidade
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especializada nos direitos das crianças e a CNPDPCJ não é independente, apesar de ser autónoma,
funcionando no âmbito do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
Os proponentes da iniciativa entendem que a ratificação por Portugal, em 21 de setembro de 1989, da
Convenção sobre os Direitos das Crianças, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas a 20 de
novembro de 1989, convoca à criação de uma entidade que coordene e monitorize a sua aplicação. Com efeito,
Portugal tem sido interpelado a fazê-lo, como recorda a exposição de motivos. O Comité dos Direitos das
Crianças das Nações Unidos recomendava ao Estado português, em 2019, a «criação de um mecanismo
específico, dentro da Provedoria de Justiça, para monitorizar, de forma independente, a aplicação da Convenção
sobre os Direitos das Crianças em Portugal, uma vez que não existe uma estratégia nacional claramente definida
para a implementação da Convenção dos Direitos das Crianças que verificasse a conformidade do
enquadramento legal e institucional português face ao direito internacional e europeu, assim como inexiste uma
estrutura de coordenação a nível nacional neste âmbito, que possa dirigir recomendações às diversas entidades
públicas». Recomendação semelhante, ainda que em lato senso, havia ocorrido já em 2014. Recordam também
os proponentes que, no seu Relatório Final, a Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de
Crianças na Igreja Católica Portuguesa propõe a «criação, se constitucionalmente possível, da figura do
“Provedor da Criança”, enquanto entidade independente, autónoma, em articulação com a Provedoria de Justiça
e outras estruturas julgadas necessárias, mas com atuação específica na área da criança e da família». Esta
recomendação adquire particular importância na discussão que esta e as iniciativas semelhantes convocam,
porquanto a Assembleia da República constituiu, no âmbito da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos,
Liberdades e Garantias, um grupo de trabalho para avaliação da legislação sobre abusos sexuais contra
menores.
Importa também salientar que, como se refere na exposição de motivos, o mecanismo europeu de provedoria
das crianças conta atualmente com 43 instituições de 34 países membros do Conselho da Europa. Pela ausência
de um organismo deste tipo, autónomo e independente, Portugal não pode participar no atual mecanismo
europeu de provedoria das crianças.
Por estes motivos, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal defende a criação de uma estrutura autónoma,
a funcionar junto do Provedor de Justiça e com reconhecimento a nível internacional, particularmente europeu,
que reforce a promoção dos direitos e a proteção das crianças. Propõe, para responder ao objetivo, alterações
à Lei n.º 9/91, de 9 de abril, que aprova o Estatuto do Provedor de Justiça.
O projeto de lei é composto por quarto artigos. O primeiro respeita ao objeto. O segundo, mais amplo,
compreende as propostas de alteração à Lei n.º 9/91, de 9 de abril. Nos artigos 3.º e 4.º propõem os autores da
iniciativa que o início de vigência das alterações legislativas preconizadas tenha lugar com o Orçamento do
Estado subsequente à data da sua aprovação e que o Governo proceda à sua regulamentação no prazo de 90
dias.
Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN)
A iniciativa legislativa do Pessoas-Animais-Natureza propõe «a criação da figura do Provedor das Crianças
e das Gerações Futuras». Esclarece a exposição de motivos que, decorridos mais de 30 anos da ratificação por
Portugal da Convenção sobre os Direitos da Criança, continuam por estar plenamente assegurados os direitos
básicos das crianças e jovens, sobretudo considerando a sua especial vulnerabilidade e as consequências que
a violação dos seus direitos pode acarretar no seu desenvolvimento.
Como refere a proponente, em 2019 o Comité dos Direitos da Crianças das Nações Unidas havia já
recomendado a Portugal a necessidade de existir uma entidade autónoma que fiscalize e garanta a aplicação
da Convenção. Nesse sentido, e para lhe dar cumprimento, propõe a criação, sob a tutela do Provedor de
Justiça, do Provedor da Criança e das Gerações Futuras, garantindo um mecanismo autónomo e de
proximidade, que assegure, de forma concertada e coordenada entre as diversas entidades públicas e privadas
que operam neste domínio, o cumprimento da legislação nacional, comunitária e internacional, emitindo
recomendações e promovendo as alterações que se mostrem necessárias.
Esta iniciativa, diferentemente dos Projetos de Lei n.os 759/XV/1.ª (IL) e 784/XV/1.ª (BE), considera que esta
provedoria deve promover e assegurar também a solidariedade intergeracional, como «princípio que determina
que as gerações presentes têm o dever de manter a integridade do planeta para a vida das gerações futuras,
como premissa fundamental para o cumprimento da premissa de uma sociedade justa e solidária».
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O projeto de lei é composto por oito artigos. O primeiro respeita ao objeto. O segundo, mais amplo,
compreendendo as alterações propostas à Lei n.º 9/91, de 9 de abril. No terceiro artigo define-se a natureza e
finalidade da figura do Provedor da Criança e das Gerações Futuras, para, no quarto artigo, se enumerarem as
suas competências. O quinto é referente à composição e nomeação do Provedor e o sexto artigo define a sua
organização e funcionamento. Nos artigos 7.º e 8.º propõem os autores da iniciativa que o início de vigência das
alterações legislativas preconizadas tenha lugar com o Orçamento do Estado subsequente à data da sua
aprovação e que o Governo proceda à sua regulamentação no prazo de 90 dias.
Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª (BE)
A iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda propõe a instituição da figura Provedor da Criança por considerar
que «uma conceção moderna dos direitos das crianças e das suas especificidades reclama mais do que um
mero enquadramento nos direitos humanos em geral, desde logo porque há determinados direitos que se
aplicam de forma exclusiva às crianças» e que, por essa razão, a União Europeia tem vindo a considerar esta
matéria foco de atenção específica, integrando a proteção e a promoção dos direitos das crianças de forma
transversal em todas as políticas europeias e, subsidiariamente, nas políticas nacionais.
Como refere a exposição de motivos, «a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e a Convenção
das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança prescrevem que as crianças têm o direito de participar nos
processos de tomada de decisão que possam ser relevantes nas suas vidas e de influenciar as decisões
tomadas a seu respeito – na família, na escola ou na comunidade». Esse direito adquire, para os proponentes,
materialização efetiva com a instituição da figura do Provedor da Criança. Na aceção que defendem, «as
crianças há muito que deixaram de ser meros objetos de direitos para passarem a ser sujeitos de direitos,
nomeadamente do direito a serem ouvidas em todas as decisões e nas políticas que lhes digam respeito, o
direito à compreensão dos processos em que estão envolvidas, o direito ao respeito pela vida privada e familiar
e à integridade e dignidade».
Os proponentes da iniciativa referem que Portugal é dos poucos países europeus que não instituiu esta figura
específica e que, por essa razão, lhe foi negada a participação de pleno direito na Rede Europeia de Provedores
da Criança, que integra, atualmente, 34 países Estados-Membros do Conselho da Europa. Em representação
de Portugal, com o estatuto de observador, participa a Presidente da Comissão Nacional de Promoção dos
Direitos e Proteção das Crianças e Jovens.
O projeto de lei é composto por seis artigos. O primeiro define o seu objeto e o segundo descreve a missão
e âmbito de atuação da figura do Provedor da Criança. No terceiro artigo são especificadas as competências do
Provedor da Criança para, no quarto artigo, se definirem as normas respeitantes à publicidade da atividade do
Provedor da Criança e ao acesso a informação sobre os direitos das crianças e a sua defesa. Nos artigos 5.º e
6.º propõem os autores da iniciativa que o início de vigência das alterações legislativas preconizadas tenha lugar
com o Orçamento do Estado subsequente à data da sua aprovação e que o Governo proceda à sua
regulamentação no prazo de 120 dias.
O quadro comparativo das propostas de alteração das iniciativas é apresentado abaixo. O quadro, que
resume as principais alterações à Lei n.º 9/91, de 9 de abril, não considera a iniciativa legislativa do Bloco de
Esquerda, por não configurar, na sua apresentação, qualquer alteração a diplomas legais em vigor.
Lei n.º 9/91, de 9 de abril Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL) Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN)
Artigo 1.º Funções
1 – O provedor de Justiça é, nos termos da Constituição, um órgão do Estado eleito pela Assembleia da República, que tem por função principal a defesa e promoção dos direitos, liberdades, garantias e interesses legítimos dos cidadãos, assegurando, através de meios informais, a justiça e a legalidade do exercício dos poderes públicos.
«Artigo 1.º (…)
1 – (…).
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Lei n.º 9/91, de 9 de abril Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL) Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN)
2 – O Provedor de Justiça pode exercer também funções de instituição nacional independente de monitorização da aplicação de tratados e convenções internacionais em matéria de direitos humanos, quando para o efeito for designado.
2 – (…).
3 – O Provedor de Justiça assegura a cooperação com instituições congéneres e com as organizações da União Europeia e internacionais no âmbito da defesa e promoção dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
3 – (…).
4 – O provedor de Justiça goza de total independência no exercício das suas funções.
4 – O Provedor de Justiça nomeia e tutela o Provedor da Criança e das Gerações Futuras.
5 – (Anterior número 4.)
Artigo 2.º Âmbito de atuação
1 – As ações do Provedor de Justiça exercem-se, nomeadamente, no âmbito da atividade dos serviços da administração pública central, regional e local, das Forças Armadas, dos institutos públicos, das empresas públicas ou de capitais maioritariamente públicos ou concessionárias de serviços públicos ou de exploração de bens do domínio público, das entidades administrativas independentes, das associações públicas, designadamente das ordens profissionais, das entidades privadas que exercem poderes públicos ou que prestem serviços de interesse geral.
Artigo 2.º […]
1 – (…)
2 – O âmbito de atuação do Provedor de Justiça pode ainda incidir em relações entre particulares que impliquem uma especial relação de domínio, no âmbito da proteção de direitos, liberdades e garantias.
2 – (…)
3 – O Provedor de Justiça criará na sua dependência a Provedoria da Criança, tutelada pelo Provedor de Justiça e especializada na promoção e defesa dos direitos das crianças.
Artigo 5.º Designação
1 – O provedor de Justiça é designado pela Assembleia da República por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções.
Artigo 5.º […]
1 – (…)
2 – A designação recai em cidadão que preencha os requisitos de elegibilidade para a Assembleia da República e goze de comprovada reputação de integridade e independência.
2 – (…)
3 – O provedor de Justiça toma posse perante o Presidente da Assembleia da República.
3 – (…)
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Lei n.º 9/91, de 9 de abril Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL) Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN)
4 – O Provedor da Criança é designado pelo Provedor da Justiça.
Artigo 6.º Duração do mandato
1 – O provedor de Justiça é eleito por quatro anos, podendo ser reeleito apenas uma vez, por igual período.
Artigo 6.º […]
1 – (…)
2 – Após o termo do período por que foi designado, o provedor de Justiça mantém-se em exercício de funções até à posse do seu sucessor.
2 – (…)
3 – A designação do provedor deve efetuar-se nos 30 dias anteriores ao termo do quadriénio.
3 – (…)
4 – Quando a Assembleia da República se encontrar dissolvida, ou não estiver em sessão, a eleição tem lugar dentro dos 15 dias a partir da primeira reunião da Assembleia eleita ou a partir do início de nova sessão, sem prejuízo de convocação extraordinária para o efeito.
4 – (…)
5 – O mandato do Provedor da Criança corresponderá ao do Provedor de Justiça.
Artigo 20.º Competências
1 – Ao Provedor de Justiça compete: a) Dirigir recomendações aos órgãos competentes com vista à correção de atos ilegais ou injustos dos poderes públicos ou à melhoria da organização e procedimentos administrativos dos respetivos serviços; b) Assinalar as deficiências de legislação que verificar, emitindo recomendações para a sua interpretação, alteração ou revogação, ou sugestões para a elaboração de nova legislação, as quais serão enviadas ao Presidente da Assembleia da República, ao Primeiro-Ministro e aos ministros diretamente interessados e, igualmente, se for caso disso, aos Presidentes das Assembleias Legislativas das regiões autónomas e aos Presidentes dos Governos Regionais; c) Emitir parecer, a solicitação da Assembleia da República, sobre quaisquer matérias relacionadas com a sua atividade; d) Promover a divulgação do conteúdo e da significação de cada um dos direitos e liberdades fundamentais, bem como da finalidade da instituição do provedor de Justiça, dos meios de ação de que dispõe e de como a ele se pode fazer apelo; e) Intervir, nos termos da lei aplicável, na tutela dos interesses coletivos ou difusos, quando estiverem em causa entidades públicas, empresas e serviços de interesse geral, qualquer que seja a sua natureza jurídica.
Artigo 20.º […]
1 – (…)
2 – Compete ao provedor de Justiça 2 – (…)
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integrar o Conselho de Estado.
3 – Compete ao provedor de Justiça requerer ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade ou de ilegalidade de normas, nos termos do artigo 281.º, n.os 1 e 2, alínea d), da Constituição.
3 – (…)
4 – Compete ao provedor de Justiça requerer ao Tribunal Constitucional a apreciação e verificação de inconstitucionalidade por omissão, nos termos do n.º 1 do artigo 283.º.
4 – (…)
5 – As recomendações à Assembleia da República e às Assembleias Legislativas das regiões autónomas são publicadas nos respetivos jornais oficiais.
5 – (…)
6 – À Provedoria da Criança compete: a) Verificar a conformidade do enquadramento legal e institucional português face ao Direito Internacional e Europeu; b) Dirigir formalmente recomendações às entidades públicas e privadas; c) Divulgar e promover os direitos das crianças e os respetivos meios de defesa disponíveis. d) Assegurar a representação nacional e internacional no que se relacione com a promoção e defesa dos direitos das crianças.
I c) Enquadramento constitucional e legal
As notas técnicas disponibilizada pelos serviços da Assembleia da República, que se anexam, descrevem
com detalhe o enquadramento constitucional e os antecedentes legislativos. As notas técnicas procedem ainda
ao enquadramento internacional da matéria em apreço, avançando com uma análise comparativa no contexto
europeu – especificamente Espanha e França – e detendo-se também na análise de organizações internacionais
como o Conselho da Europa e o Comité dos Direitos das Crianças da Organização das Nações Unidas.
Sem prejuízo da consulta às referidas notas, transcreve-se, com maior acuidade, o enquadramento jurídico
nacional que merecem estas iniciativas, não sem antes se referir que são, no seu detalhe, coincidentes, pelo
que a leitura destes capítulos de uma das notas técnicas dispensa a leitura das restantes.
A discussão do enquadramento constitucional do conjunto das iniciativas convoca dois artigos específicos
da Constituição da República Portuguesa. Por um lado, o artigo 69.º, que prevê o direito das crianças «à proteção
da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de
abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais
instituições». Por outro lado, o artigo 23.º, que consagra a figura do Provedor de Justiça como um órgão
independente, sendo o seu titular designado pela Assembleia da República, pelo tempo que a lei determinar. Ao
Provedor «os cidadãos podem apresentar queixas por ações ou omissões dos poderes públicos, que as
apreciará sem poder decisório, dirigindo aos órgãos competentes as recomendações necessárias para prevenir
e reparar injustiças».
No enquadramento jurídico nacional devemos destacar, como bem referem as notas técnicas que aqui se
decalcam, três instrumentos fundamentais na promoção e defesa dos direitos das crianças:
i) A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidades em
20 de novembro de 1989 e ratificado pela República Portuguesa em 21 de setembro de 1990. Prevê a
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Convenção que «os Estados Partes tomam todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e
educativas adequadas à proteção da criança contra todas as formas de violência física ou mental, dano
ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus-tratos ou exploração, incluindo a violência sexual,
enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos representantes legais ou de
qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada».
ii) A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de
setembro. De acordo com o diploma, considera-se que a criança ou o jovem está em perigo,
designadamente, quando «sofre maus-tratos físicos ou psíquicos» ou «é vítima de abusos sexuais» ou
«está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança ou
o seu equilíbrio emocional». De forma particular, o artigo 18.º atribui à modalidade alargada das
Comissões de Proteção de Crianças e Jovens a competência do desempenho de um papel relevante na
promoção dos direitos da criança ou jovem e respetiva família, bem como na prevenção das situações de
perigo que os possam afetar. O trabalho destas comissões é auditado, por sua vez, como estabelece o
artigo 33.º, pela CNPDPCJ;
iii) O Decreto-Lei n.º 159/2015 de 10 de agosto, com a alteração que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
139/2017, de 10 de novembro, que cria a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das
Crianças e Jovens. Tem por missão a Comissão «contribuir para a planificação da intervenção do Estado
e para a coordenação, acompanhamento e avaliação da ação dos organismos públicos e da comunidade
na promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens», constituindo-se «como entidade de
referência para a efetiva concretização dos Direitos Humanos de todas e de cada uma das crianças em
Portugal».
Salienta-se ainda, no seguimento dos referidos instrumentos jurídicos, a Resolução do Conselho de
Ministros n.º 112/2020, de 18 de dezembro, que aprovou a Estratégia Nacional para os Direitos das Crianças
para o período 2021-2024 (ENDC 2021-2024), tendo sido a Comissão Nacional da Promoção dos Direitos e
Proteção de Crianças e Jovens designada como a entidade coordenadora da ENDC 2021-2024 e dos respetivos
planos de ação.
No quadro da Provedoria da Justiça, como bem resumem as notas técnicas que aqui se transcrevem, o
Provedor de Justiça pode, de acordo com o artigo 16.º do Estatuto aprovado pela Lei n.º 9/91, de 9 de abril, e
alterado pela Lei n.º 30/96, de 14 de agosto, Lei n.º 52-A/2005, de 10 de outubro, e Lei n.º 17/2013, de 18 de
fevereiro, «delegar num dos provedores-adjuntos as atribuições relativas aos direitos da criança, para que este
as exerça de forma especializada». Com efeito, a Provedoria disponibiliza uma linha telefónica especialmente
dedicada aos assuntos relacionados com os mais novos – a Linha da Criança – e que tem sido particularmente
procurada em matérias como o exercício das responsabilidades parentais, maus-tratos e negligência, educação
e problemas escolares e cuidados de saúde e prestações sociais.
No âmbito do trabalho específico da Provedoria da Justiça sobre os direitos das crianças, destacam-se dois
documentos relevantes, cuja análise pode coadjuvar a discussão das presentes iniciativas:
i) A Declaração do Provedor de Justiça, na Pré-Sessão do Comité dos Direitos da Crianças, sobre a
Implementação da Convenção dos Direitos da Criança no processo de avaliação do 5.º e 6.º Relatórios
Periódicos de Portugal (2018);
ii) O Relatório Alternativo do Provedor de Justiça, sobre a Implementação da Convenção dos Direitos da
Criança no processo de avaliação do 5.º e 6.º Relatórios Periódicos de Portugal (2018).
Sem pretensão de exaustividade, devemos referir que a criação de provedorias unifuncionais ou sectoriais é
matéria de ampla discussão. A Ciência Jurídica divide-se, aliás, na reposta à questão de saber se se pode ou
não optar pelo modelo da pluralidade de Provedores no quadro da Constituição da República Portuguesa. É
entendimento de vários autores que no artigo 23.º se prevê a instituição de um Provedor de Justiça com duas
características: a da unicidade e a da plurifuncionalidade. A da unicidade, porquanto a Constituição só prevê um
único Provedor e a da plurifuncionalidade, concatenadamente, porquanto a função que se atribui ao provedor
único é de tutela dos direitos das pessoas sem aceção de matérias ou distinção do tipo de direitos tutelados.
Será, no entanto, uma discussão que, nesta sede, não faremos. Ainda assim, recomenda-se a leitura de O
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Cidadão, o Provedor de Justiça e as Entidades Administrativas Independentes, editado em 2002 pela Provedoria
da Justiça. No capítulo deste trabalho da autoria da Professora Doutora Maria Lúcia Amaral pode ler-se, com o
devido enquadramento, que «i) não há, na Constituição, uma relação necessária entre a atual estrutura do
provedor e a sua função, pelo que ii) não está à partida vedada à lei a criação de provedores sectoriais; iii) tal
criação tem que ser, no entanto, praticamente concordante com o dever de boa administração e com o princípio
da correção funcional, donde que iv) um provedor sectorial só será conforme com a Constituição se se provar
que a necessidade de tutela específica do sector do direito fundamental em causa é tanta que sobreleva os
limites impostos pelas referidas ideias de “boa administração” e de “correção funcional”» (pág. 66). No entanto,
como se disse, não é matéria que gere consenso. Ainda assim, na conclusão do capítulo, a Professora Doutora
Maria Lúcia Amaral concluí, citamos:
«Assim sendo, uma única conclusão se afigura possível. À imagem do que sucede com as autoridades
administrativas independentes, também a lei pode criar provedores plurais, destinados a tutelar sectores
específicos de direitos fundamentais. Mas pode fazê-lo se a decisão de legislar estiver fundada numa correcta
ponderação de bens. Há que ponderar se a necessidade de tutela, por via de mais um órgão independente e
alheio aos mecanismos normais da responsabilidade democrática, justifica os “custos” que daí advêm para o
sistema democrático no seu conjunto.
Se é certo que não existe, no art. 23, uma necessária relação entre a actual estrutura do provedor único e a
função constitucional que lhe é atribuída, a criação por lei de provedores sectoriais tem que ser feita de tal modo
que se prove que a necessidade de tutela dos interesses sectoriais em causa sobreleva a necessidade de deixar
imperturbado o sistema constitucional de distribuição de funções estaduais».
Neste ponto de enquadramento, devemos referir, por último, o Relatório Final da Comissão Independente
para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa. A atualidade deste relatório, o
acompanhamento que mereceu na sociedade portuguesa e a sua semelhança com o trabalho desenvolvido
noutros países europeus, reforçam que aqui se destaque a sua 12.ª recomendação. Essa recomendação propõe
a «criação, se constitucionalmente possível, da figura do «Provedor da Criança», enquanto entidade
independente, autónoma, em articulação com a Provedoria de Justiça e outras estruturas julgadas necessárias,
mas com atuação específica na área da criança e da família».
I c) Enquadramento jurídico internacional
O quadro de reflexão internacional que tem operado na discussão das matérias referentes aos direitos das
crianças e mecanismos de promoção e defesa desses direitos justifica que nos possamos deter, ainda que
sumariamente, no seu enquadramento internacional. De resto, maior detalhe é encontrado nas Notas Técnicas
que constam como anexo deste parecer e que, por isso, nos dispensam a repetição. Mais a mais, e não menos
relevante, importa salientar o estudo comparativo que, em 2020, a Divisão de Informação Legislativa
Parlamentar fez publicar. Esse estudo é dedicado ao enquadramento internacional da figura do Provedor da
Criança. Como aí se refere, foi analisada esta figura no ordenamento jurídico da Alemanha, Áustria, Bélgica,
Croácia, Dinamarca, Estónia, Eslováquia, Eslovénia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Itália, Irlanda, Letónia,
Lituânia, Luxemburgo, Polónia, República Checa, Suécia e Reino Unido. O número de países com figura(s)
equivalente(s) equivalentes ao provedor da Criança era, já em 2020, de 46 no seio dos Estados-Membros do
Conselho da Europa, sendo 22 deles membros da União Europeia. Na mesma data, a European Network of
Ombudspersons for Children (ENOC) integrava 44 instituições.
Ainda assim, transcrevemos, com a devida adaptação, parte do detalhe que mais aturadamente se explana
nas Notas Técnicas, distinguindo as várias instâncias internacionais:
i) A União Europeia (UE) assume como uma das suas bandeiras a proteção dos direitos da criança (artigo
3.º, n.º 3, do Tratado da União Europeia) e promove como valores a «proteção dos direitos do Homem,
em especial os da criança» (artigo 3.º, n.º 5, do Tratado da União Europeia). Esta bandeira encontra
concretização na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, onde se materializam as
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disposições que reforçam o enfoque na criança como prioridade, e na Carta Social Europeia, que impõe
aos Estados-Membros o desenvolvimento das medidas que garantam uma proteção e uma ajuda especial
às crianças ou adolescentes temporária ou definitivamente privados do seu apoio familiar.
ii) o Conselho da Europa protege e promove os direitos humanos de todas as pessoas, incluindo as crianças.
Com base na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, na Convenção Europeia dos
Direitos do Homem e noutras normas jurídicas, o Conselho da Europa promove e protege os direitos das
crianças na Europa. Devemos referir, particularmente, Comité de Lanzarote, que acompanha a aplicação
da Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a Exploração Sexual e os
Abusos Sexuais.
iii) o Comité dos Direitos da Criança, da Organização das Nações Unidas, criado para avaliar e monitorizar
o cumprimento da Convenção sobre os Direitos da Criança pelos Estados Parte. Nas suas Observações
Finais, emitidas na sequência do exame dos terceiro e quarto relatórios periódicos sobre a aplicação da
Convenção, em 2011, recomendou ao Estado Português a adoção de «uma Estratégia Nacional
abrangente para a aplicação da Convenção, incluindo metas e objetivos específicos, quantificáveis e com
prazos definidos, a fim de monitorizar eficazmente os progressos realizados na implementação dos
direitos da criança em todo o território do Estado Parte». Estas recomendações foram reforçadas em
2019, nas Observações Finais ao 5.º e 6.º relatórios periódicos de Portugal.
I d) Consultas e contributos
Para todos os projetos de lei foram solicitados parecer por escrito ao Conselho Superior do Ministério Público,
ao Conselho Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à Provedoria de Justiça. Para o Projeto de
Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN) foi promovida pelo Sr. Presidente da Assembleia da República a audição à Assembleia
Legislativa da Região Autónoma dos Açores, à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, ao
Governo da Região Autónoma dos Açores e ao Governo da Região Autónoma da Madeira.
Ao momento da elaboração foram recebidas as pronuncias da Provedoria de Justiça e da Ordem dos
Advogados. Os restantes poderão vir a ser consultados a todo o tempo na página dos processos legislativos
das iniciativas, disponíveis eletronicamente quando recebidos.
PARTE II – Opinião do Relator
O relator signatário do presente parecer abstém-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre
os Projetos de Lei em apreciação, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo
137.º do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – O Iniciativa Liberal (IL) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª – Cria o
Provedor da Criança.
2 – A iniciativa legislativa sub judice altera o Estatuto do Provedor de Justiça, aprovado pela Lei n.º 9/91, de
9 de abril.
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
4 – O Pessoas-Animais-Natureza (PAN) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º
771/XV/1.ª – Prevê a criação do Provedor das Crianças e das Gerações Futuras.
5 – A iniciativa legislativa sub judice altera o Estatuto do Provedor de Justiça, aprovado pela Lei n.º 9/91, de
9 de abril.
6 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
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Plenário.
7 – O Bloco de Esquerda (BE) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª –
Institui o Provedor da Criança.
8 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 784/XV/1.ª (BE) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
O Deputado relator, Bruno Aragão — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Em anexo ao presente relatório constam a nota técnica referente ao Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL), a nota
técnica relativa ao Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN) e a nota técnica do Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª (BE),
elaboradas pelos serviços da Assembleia da República nos termos do artigo 131.º do Regimento.
———
PROJETO DE LEI N.º 772/XV/1.ª
(PREVÊ A ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO E FUNCIONAMENTO DAS COMISSÕES DE PROTEÇÃO
DE CRIANÇAS E JOVENS)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Projeto de Lei n.º 772/XV/1.ª, apresentado pela Deputada única representante do Pessoas-Animais-
Natureza, que «prevê a alteração da composição e funcionamento das Comissões de Proteção de Crianças e
Jovens», procedendo à alteração à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, deu entrada na Assembleia da República
a 12 de maio de 2023, sendo admitido e distribuído a 17 de maio de 2023 à Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para emissão de parecer, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º
do Regimento da Assembleia da República (RAR). Foi designado relator do parecer que agora se apresenta o
seu signatário, em reunião ordinária da comissão de 17 de maio de 2023.
O projeto de lei foi apresentado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º e do n.º 1 do
artigo 167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea
b) do n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), observando
o disposto na alínea a) do n.º 1 do artigo 123.º do Regimento.
Foi solicitado parecer ao Conselho Superior do Ministério Público, ao Conselho Superior da Magistratura, à
Ordem dos Advogados e à Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens. O
conjunto dos pareceres foi solicitado a 24 de maio de 2023. Ao momento da elaboração deste parecer nenhuma
das audições promovidas foi enviada à Comissão. No entanto, sendo enviados posteriormente, poderão ser
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consultados a todo o tempo na página dos processos legislativos das iniciativas, disponíveis eletronicamente.
A discussão na generalidade desta iniciativa encontra-se agendada para a sessão plenária de 1 de junho de
2023, conjuntamente com o Projeto de Lei n.º 759/XV/1.ª (IL), que cria o Provedor da Criança, o Projeto de
Resolução n.º 638/XV/1.ª (IL), que recomenda ao Governo que permita às famílias a escolha da creche e
melhoria do programa creche feliz, do Projeto de Resolução n.º 660/XV/1.ª (IL), que recomenda ao Governo a
criação de uma campanha de sensibilização para a adoção de crianças e jovens de diferentes idades, do Projeto
de Resolução n.º 661/XV/1.ª (IL), que recomenda ao Governo que possibilite a conversão de salas de jardim de
infância em creches, do Projeto de Lei n.º 647/XV/1.ª (PCP), pelo reforço dos direitos de maternidade e de
paternidade, e do Projeto de Lei n.º 770/XV/1.ª (PCP), para a reposição dos escalões do abono de família para
crianças e jovens, com vista à sua universalidade, do Projeto de Lei n.º 771/XV/1.ª (PAN), que prevê a criação
do Provedor das Crianças e das Gerações Futuras, e do Projeto de Lei n.º 784/XV/1.ª (BE), que institui o
Provedor da Criança e das Gerações Futuras.
I b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
A iniciativa legislativa em discussão propõe a reorganização da composição e funcionamento das Comissões
de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), por alteração à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que aprova a Lei
de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo.
Da exposição de motivos resulta claro que o impulso legislativo que dá origem ao Projeto de Lei n.º 772/XV/1.ª
(PAN) é uma moção apresentada pelo PAN na Assembleia Municipal de Lisboa, com o objetivo de densificar a
garantia de direitos e proteção das crianças e jovens em risco, propondo-se para o efeito a alteração da
composição e funcionamento das Comissões de Proteção de Crianças e Jovens. Não é referida a sessão da
Assembleia Municipal em que a moção foi aprovada, apenas que o foi por unanimidade. De resto, a exposição
de motivos decalca os 25 pontos da moção aprovada, onde se elencam as diversas necessidades de melhoria
na atuação, composição e funcionamento das CPCJ, bem como na legislação que regula tais matérias, no
contexto das quatro CPCJ de Lisboa.
Pela moção apresentada na Assembleia Municipal de Lisboa, o PAN propõe à Assembleia da República a
alteração à Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de setembro,
na sua atual redação, na parte respeitante às competências, composição e funcionamento das comissões de
proteção. O conjunto dessas alterações é apresentado em quatro pontos que aqui se transcrevem:
a) A criação de um quadro de pessoal próprio e permanente com formação e experiência na área da infância
e família, das comissões de proteção na sua modalidade restrita, cujo volume processual assim o exija, e que
consiga dar uma reposta célere e adequada ao volume de processos que lhes são confiados, permitindo o
recrutamento de técnicos nas áreas do serviço social, psicologia, direito, educação, saúde e serviços
administrativos;
b) Que os membros das comissões restritas, nas CPCJ cujo volume processual assim o exija, como é o caso
das CPCJ de Lisboa, passem a exercer as respetivas funções em regime de tempo integral, respeitando o ratio
de processos ativos por comissário de acordo com os tempos de afetação mínima aprovados pelo Conselho
Nacional da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens;
c) Que os técnicos que integrem os quadros de pessoal das comissões de proteção exerçam as respetivas
funções, salvaguardados os princípios da responsabilidade, imparcialidade e independência das suas decisões,
e cujos resultados devem ser medidos através de indicadores previamente fixados, que permitam assegurar
entre outros, a transparência, imparcialidade e a prevenção da discricionariedade na sua avaliação de
desempenho;
d) Que a tutela das CPCJ transite do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social para a
Presidência do Conselho de Ministros.
Importa referir, por último, a proposta de criação de um grupo de trabalho, com uma equipa multidisciplinar,
com a missão de analisar as alterações a introduzir ao Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, que procedeu
à criação da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, de forma a
garantir o reforço das suas atribuições em matéria de poderes de direção e orientação concretas sobre as
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Comissões de Proteção de Crianças e Jovens.
O projeto de lei, expostos os motivos, propõe seis artigos: o primeiro respeitante ao objeto da lei; o segundo
e o terceiro artigos definem as alterações à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que aprova a Lei de Proteção de
Crianças e Jovens em Perigo; o quarto artigo propõe a criação de um grupo de trabalho, com uma equipa
multidisciplinar, com o objetivo de analisar as necessárias alterações ao Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de
agosto, que procedeu à criação da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e
Jovens. Nos artigos 5.º e 6.º propõem os autores da iniciativa que o início de vigência das alterações legislativas
preconizadas tenha lugar com o Orçamento do Estado subsequente à data da sua aprovação e que o Governo
proceda à sua regulamentação no prazo de 90 dias.
I c) Enquadramento constitucional, regimental e formal
A nota técnica disponibilizada pelos serviços da Assembleia da República, que se anexa, descreve com
detalhe a conformidade constitucional e regimental da iniciativa, bem como a verificação do cumprimento da lei
formulário (Lei n.º 43/2014, de 11 de julho). A nota técnica procede ainda ao enquadramento internacional da
matéria em discussão, avançando com uma análise comparativa no contexto europeu – especificamente
Espanha e França – e detendo-se também na análise de organizações internacionais como o Conselho da
Europa e o Comité dos Direitos das Crianças da Organização das Nações Unidas. Sem prejuízo da consulta à
referidas nota técnica, transcreve-se, com maior acuidade, o enquadramento jurídico nacional que merece esta
iniciativa.
I d) Enquadramento jurídico nacional
A discussão do enquadramento constitucional do conjunto das iniciativas convoca dois artigos específicos
da Constituição da República Portuguesa. Por um lado, o artigo 69.º, que prevê o direito das crianças «à proteção
da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente contra todas as formas de
abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da autoridade na família e nas demais
instituições». Por outro lado, o artigo 70.º, que prevê que «a política de juventude deverá ter como objetivos
prioritários o desenvolvimento da personalidade dos jovens, a criação de condições para a sua efetiva integração
na vida ativa, o gosto pela criação livre e o sentido de serviço à comunidade». Prevê ainda que «o Estado, em
colaboração com as famílias, as escolas, as empresas, as organizações de moradores, as associações e
fundações de fins culturais e as coletividades de cultura e recreio, fomenta e apoia as organizações juvenis na
prossecução daqueles objetivos […].»
No enquadramento jurídico nacional, devemos destacar, como refere a nota técnica que aqui se decalca,
três instrumentos fundamentais na promoção e defesa dos direitos das crianças:
i) A Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidades em
20 de novembro de 1989 e ratificado pela República Portuguesa em 21 de setembro de 1990. Prevê a
Convenção que «os Estados Partes tomam todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e
educativas adequadas à proteção da criança contra todas as formas de violência física ou mental, dano
ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus-tratos ou exploração, incluindo a violência sexual,
enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles, dos representantes legais ou de
qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada».
ii) A Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP), aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de
setembro. De acordo com o diploma, considera-se que a criança ou o jovem está em perigo,
designadamente, quando «sofre maus-tratos físicos ou psíquicos» ou «é vítima de abusos sexuais» ou
«está sujeita, de forma direta ou indireta, a comportamentos que afetem gravemente a sua segurança
ou o seu equilíbrio emocional». E forma particular, o artigo 18.º atribui à modalidade alargada das
Comissões de Proteção de Crianças e Jovens a competência do desempenho de um papel relevante
na promoção dos direitos da criança ou jovem e respetiva família, bem como na prevenção das situações
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de perigo que os possam afetar.
De acordo com artigo 3.º preambular «compete à Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens
em Risco, conjuntamente com as entidades e serviços nela representados, tomar as providências
necessárias à reorganização das comissões de proteção de menores», pelo que este diploma releva
particularmente na discussão desta iniciativa.
ii) O Decreto-Lei n.º 159/2015, de 10 de agosto, com a alteração que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º
139/2017, de 10 de novembro, que cria a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das
Crianças e Jovens. Tem por missão a Comissão «contribuir para a planificação da intervenção do Estado
e para a coordenação, acompanhamento e avaliação da ação dos organismos públicos e da comunidade
na promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens», constituindo-se «como entidade de
referência para a efetiva concretização dos Direitos Humanos de todas e de cada uma das crianças em
Portugal».
Salienta-se ainda, no seguimento dos referidos instrumentos jurídicos, a Resolução do Conselho de
Ministros n.º 112/2020, de 18 de dezembro, que aprovou a Estratégia Nacional para os Direitos das Crianças,
para o período 2021-2024 (ENDC 2021-2024). Tendo sido a Comissão Nacional da Promoção dos Direitos e
Proteção de Crianças e Jovens designada como a entidade coordenadora da ENDC 2021-2024 e dos respetivos
planos de ação.
Os instrumentos jurídicos que se debruçam sobre esta matéria não se esgotam, como se depreende, nos
diplomas até aqui referidos, ainda que, como também se compreende, estes últimos lhes sejam diretamente
respeitantes. Há, ainda assim, um conjunto de instrumentos jurídicos que importa considerar e que a nota técnica
detalha, pelo que, dispensando-se a sua reprodução, se remete para a sua leitura.
I e) Enquadramento jurídico internacional
O quadro jurídico internacional é diverso na sua legislação nacional, mas partilha, nesta matéria, o quadro
comum da Convenção sobre os Direitos da Criança, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20
de novembro de 1989 e ratificado por amplo número de países, como são exemplo Espanha e França, cuja
legislação a nota técnica analisa.
O quadro de reflexão internacional que tem operado na discussão das matérias referentes aos direitos das
crianças e mecanismos de promoção e defesa desses direitos justifica que nos possamos deter, ainda que
sumariamente, no seu enquadramento internacional. De resto, maior detalhe é encontrado na nota técnica que
consta como anexo a este parecer e que, por isso, nos dispensa a repetição. Ainda assim, transcrevemos, com
a devida adaptação, parte do detalhe que mais aturadamente se explana na nota técnica, distinguindo as várias
instâncias internacionais:
i) A União Europeia (UE) assume como uma das suas bandeiras a proteção dos direitos da criança (artigo
3.º, n.º 3, do Tratado da União Europeia) e promove como valores a «proteção dos direitos do Homem,
em especial os da criança» (artigo 3.º, n.º 5, do Tratado da União Europeia). Esta bandeira encontra
concretização na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, onde ganham corpo as
disposições que reforçam o enfoque na criança como prioridade, e na Carta Social Europeia, que impõe
aos Estados-Membros o desenvolvimento das medidas que garantam uma proteção e uma ajuda
especial às crianças ou adolescentes temporária ou definitivamente privados do seu apoio familiar.
ii) O Conselho da Europa protege e promove os direitos humanos de todas as pessoas, incluindo as
crianças. Com base na Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, na Convenção
Europeia dos Direitos do Homem e noutras normas jurídicas, o Conselho da Europa promove e protege
os direitos das crianças na Europa. Devemos referir, particularmente, Comité de Lanzarote, que
acompanha a aplicação da Convenção do Conselho da Europa para a Proteção das Crianças contra a
Exploração Sexual e os Abusos Sexuais.
iii) O Comité dos Direitos da Criança da Organização das Nações Unidas, criado para avaliar e monitorizar
o cumprimento da Convenção sobre os Direitos da Criança pelos Estados Parte. Nas suas Observações
Finais, emitidas na sequência do exame dos terceiro e quarto relatórios periódicos sobre a aplicação da
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Convenção, em 2011, recomendou ao Estado português a adoção de «uma Estratégia Nacional
abrangente para a aplicação da Convenção, incluindo metas e objetivos específicos, quantificáveis e
com prazos definidos, a fim de monitorizar eficazmente os progressos realizados na implementação dos
direitos da criança em todo o território do Estado Parte». Estas recomendações foram reforçadas em
2019, nas Observações Finais ao 5.º e 6.º relatórios periódicos de Portugal.
I f) Pareceres e contributos solicitados
Atendendo à matéria objeto desta iniciativa, foi promovida a consulta escrita às entidades referidas na nota
introdutória. O conjunto dos pareceres foi solicitado a 24 de maio de 2023. Ao momento da elaboração deste
parecer nenhum das audições promovidas foi enviada à Comissão. No entanto, sendo-o posteriormente,
poderão ser consultados a todo o tempo na página dos processos legislativos das iniciativas, disponíveis
eletronicamente.
PARTE II – Opinião do Relator
O relator signatário do presente parecer abstém-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o
Projeto de Lei em apreciação, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º
do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – A Deputada única representante do Pessoas-Animais-Natureza (PAN) apresentou à Assembleia da
República o Projeto de Lei n.º 772/XV/1.ª, que prevê a alteração da composição e funcionamento das comissões
de proteção de crianças e jovens.
2 – A iniciativa legislativa sub judice procede à alteração à Lei n.º 147/99, de 1 de setembro, que aprova a
lei de proteção de crianças e jovens em perigo.
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 772/XV/1.ª (PAN) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
O Deputado relator, Bruno Aragão — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Em anexo ao presente relatório consta a nota técnica referente ao Projeto de Lei n.º 772/XV/1.ª (PAN),
elaborada pelos serviços da Assembleia da República nos termos do artigo 131.º do Regimento.
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PROJETO DE LEI N.º 778/XV/1.ª
(ASSEGURA O CUMPRIMENTO DA CONVENÇÃO DE ISTAMBUL REFORÇANDO A PROTEÇÃO DAS
VÍTIMAS EM CASO DE ASSÉDIO SEXUAL)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Grupo Parlamentar do Chega (CH) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto
de Lei n.º 778/XV/1.ª – Assegura o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas
em caso de assédio sexual.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 12 de maio de 2023. Foi admitido a 17 de maio e, por despacho
do Presidente da Assembleia da República, baixou, na fase da generalidade, à Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (1.ª), tendo a signatária deste parecer sido designada como
relatora.
O projeto de lei foi apresentado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º, do n.º 1 do artigo
167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do
n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). A iniciativa cumpre
os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Em 24 de maio de 2023 foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Público, ao Conselho
Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à APAV, podendo ser consultados a todo o tempo na
página do processo legislativo da iniciativa, disponível eletronicamente.
II. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
Nos exatos termos da nota técnica, «a presente iniciativa legislativa visa aumentar as molduras penais
previstas para o crime de importunação sexual no artigo 170.º e, na forma agravada, no artigo 177.º do Código
Penal.
Consideram os proponentes que o Estado português não cumpre a Convenção de Istambul, a qual ratificou
em 2013, e que está «muito aquém» em matéria de prevenção e proteção das vítimas em caso de assédio
sexual (…).
Observam que a maioria dos casos de assédio sexual ocorre contra mulheres e raparigas, aludindo a um
estudo realizado pela Fundação Manuel dos Santos e salientam a ocorrência deste fenómeno quer em contexto
laboral, quer em contexto escolar e universitário.
Criticam as políticas de imigração, considerando que estas promovem desregulação e descontrolo e que o
aumento exponencial de comunidades de países cujas culturas civilizacionais têm presentes um papel
menorizado da mulher contribui para a insegurança das mulheres em Portugal.
Frisam ser imperativo salvaguardar comportamentos que extravasam o mero flirt ou «namorico», defendendo
que «a mulher deve ter a liberdade de gozar a sua feminilidade, tal como um homem a liberdade de a apreciar».
Assim, em concreto, propõem quanto ao crime de importunação sexual:
• o aumento das molduras penais previstas no artigo 170.º do CP, passando de pena de prisão até 1 ano ou
de multa até 120 dias para pena de prisão até 2 anos ou de multa até 240 dias;
• a agravação da pena em um terço, se o crime for cometido conjuntamente por duas ou mais pessoas ou
quando os crimes forem praticados na presença ou contra vítima menor de 16 anos, passando a incluir o
artigo 170.º no elenco constante dos n.os 4 e 6 do artigo 177.º;
• a agravação da pena em metade, se a vítima for menor de 14 anos, passando a incluir o artigo 170.º no
elenco constante do n.º 7 do artigo 177.º; e
• a agravação da pena em um terço, se o crime for cometido em ambiente laboral, escolar ou universitário,
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aditando um novo n.º 8 ao artigo 177.º.
O projeto de lei em apreço contém três artigos: o primeiro definidor do respetivo objeto, o segundo alterando
dois artigos do CP, o terceiro e último determinando a data de entrada em vigor da lei a aprovar».
II. c) Enquadramento legal
Em conformidade com o vertido na nota técnica do Projeto de Lei n.º 743/XV/1.ª, do BE, que partilha com
esta iniciativa o propósito de alteração ao artigo 170.º do Código Penal, «o Código Penal dedica aos crimes
contra a liberdade e a autodeterminação sexual o Capítulo V do Título I (Crimes contra as pessoas) da Parte
Especial, dividido em duas secções que compreendem, respetivamente, os crimes contra a liberdade sexual
(secção I – artigos 163.º a 170.º) e os crimes contra a autodeterminação sexual (Secção II – artigos 171.º a
176.º-B). Inclui ainda uma Secção III, que contém disposições comuns aos crimes acima referidos sobre
agravação (artigo 177.º) e queixa (artigo 178.º).
No crime de importunação sexual, previsto no artigo 170.º do CP, cuja alteração se propõe na iniciativa objeto
da presente nota técnica, estão em causa três condutas típicas distintas: a prática perante outra pessoa de atos
de carácter exibicionista, o constrangimento a contacto de natureza sexual e a formulação de propostas de teor
sexual. Este crime é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias, a não ser que
lhe caiba pena mais grave por força de outra disposição legal.
(…) Recorde-se que o assédio foi, pela primeira vez, regulado na ordem jurídica portuguesa em 2003, com
a aprovação do Código do Trabalho pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, cujo artigo 24.º o qualificava como
forma de discriminação (n.º 1). Em 2009, com a reforma do Código do Trabalho aprovada pela Lei n.º 7/2009,
de 12 de fevereiro (texto consolidado), a norma relativa ao assédio é autonomizada numa divisão própria,
intitulada «proibição de assédio», constituída pelo artigo 29.º, deixando de ficar limitada ao assédio
discriminatório (…)».
PARTE II – Opinião da Relatora
Reconhecendo-se a inegável danosidade do assédio sexual e a sua relevância no plano das incriminações
penais, permanece indemonstrado que a opção pela mera agravação das molduras penais seja idónea à
obtenção de ganhos em matéria de prevenção destes crimes. Acresce que, apesar de o universo dos
comportamentos que se podem associar àquele conceito de assédio sexual estar já abrangido por diversos tipos
legais de crime, que vão desde os menos graves, como a importunação sexual, às formas mais graves de
violação, a iniciativa legislativa se cinge a uma pretensão de agravação da moldura penal do crime de
importunação sexual, sem que se logre compreender tal opção político-criminal.
Em sentido igualmente crítico, o parecer da APAV refere que «ao contrário do que a designação da iniciativa
sugere, não se reconhece contributo significativo nem para o cumprimento da Convenção de Istambul nem para
o reforço da proteção das vítimas, na medida em que a única alteração proposta é ao nível da moldura penal
(…). Há, em suma, que afastar a falácia da relação direta entre a severidade das molduras penais e a proteção
das vítimas. Não só é uma ideia errada como inclusivamente perigosa, na medida em que pode levar a
negligenciar a necessidade de intervenção precisamente nas dimensões em que se poderá, de facto, reforçar a
proteção das vítimas». Por outro lado, enjeita-se com veemência a associação feita na exposição de motivos do
projeto entre o assédio sexual e algumas comunidades migrantes: «insinuar que existe uma relação direta entre
a ocorrência de crimes de assédio e a presença de comunidades migrantes é desprovida de fundamento
estatístico ou científico e, consequentemente, discriminatória». Finalmente, manifesta-se fundada estranheza
relativamente a frase constante da exposição de motivos segundo a qual «a mulher deve ter a liberdade de
gozar a sua feminilidade, tal como um homem a liberdade para a apreciar».
Diversamente, o Parecer da Ordem dos Advogados emite parecer favorável ao projeto de lei sub judice, sem
que se logre compreender, porém, dada a exiguidade da fundamentação, as razões que suportam tal juízo.
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PARTE III – Conclusões
1 – O Grupo Parlamentar do Chega (CH) tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o
Projeto de Lei n.º 778/XV/1.ª – Assegura o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das
vítimas em caso de assédio sexual.
2 – A iniciativa legislativa sub judice visa a agravação das molduras penais previstas para o crime de
importunação sexual.
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 778/XV/1.ª (CH) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada relatora, Cláudia Santos — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
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PROJETO DE LEI N.º 780/XV/1.ª
(PREVÊ A CRIMINALIZAÇÃO DA CIBERVIOLÊNCIA)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Deputado único representante de partido (DURP) Livre tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da
República, em 12 de maio de 2023, o Projeto de Lei n.º 780/XV/1.ª que prevê a criminalização da ciberviolência.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156.º da Constituição
da República Portuguesa e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos
formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, em 17 de maio de 2023, a iniciativa
vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do
respetivo parecer.
Em 24 de maio foram solicitados pareceres às seguintes entidades: Conselho Superior da Magistratura,
Conselho Superior do Ministério Público, Ordem dos Advogados, CNPD – Comissão Nacional de Proteção de
Dados, APAV – Associação Portuguesa de Apoio à Vítima.
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I. b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
Com a presente iniciativa legislativa pretende-se estabelecer a autonomização do crime de ciberviolência,
alterando, para o efeito, o Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, revisto e
republicado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março.
De acordo com o autor, apesar de algumas formas de cibercriminalidade já terem sido vertidas para o Código
Penal e objeto de legislação específica, a nível nacional e europeu, o fenómeno da ciberviolência, definido como
qualquer forma de violência exercida em linha, como a perseguição, intimidação ou assédio online, carece de
consagração legal expressa. (cfr. Exposição de motivos)
Na exposição de motivos faz-se referência a diversos estudos e documentos internacionais, nomeadamente
das Nações Unidas e do Parlamento Europeu, que sustentam a forma como este tipo de violência afeta, em
especial, as mulheres, bem como grupos de pessoas pertencentes a comunidades específicas.
Faz-se igualmente alusão à recente proposta de diretiva da Comissão Europeia para combater a violência
contra mulheres e a violência doméstica, atualmente em discussão, e que pretende criminalizar a ciberviolência1, nas suas diversas formas, e à recomendação do Comité das Nações Unidas para a Eliminação de Todas
as Formas de Violência contra as Mulheres (CEDAW), para que Portugal altere o seu Código Penal e defina
todas as formas de violência com base no género, incluindo a ciberviolência [parágrafo 23. a)]2.
Por último, refere-se ainda o “Parecer sobre a Violência Doméstica”, do Conselho Económico e Social, de 3
de março, que na mesma linha recomenda a “autonomização do crime de ciberviolência, especificando e
incluindo as suas várias manifestações”. 3
A iniciativa legislativa em análise é composta por três artigos: o primeiro definidor do objeto, o segundo que
procede ao aditamento do Código Penal, do capítulo IX “Dos cibercrimes” ao Título Primeiro do Livro II e do
artigo 201.º-A (Ciberviolência), e o terceiro respeitante à entrada em vigor do diploma.
O artigo 201.º-A que se pretende aditar prevê a autonomização do crime de ciberviolência, nos seguintes
termos:
– A punição com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por
força de outra disposição legal a quem adotar, de forma reiterada, comportamentos de ameaça ou coação,
através de tecnologias da informação e da comunicação, contra pessoa ou grupo de pessoas fazendo-a,
justificadamente, temer pela sua segurança ou das pessoas a seu cargo;
– E a punição com pena de prisão até 5 anos, se pena mais grave não lhe couber por força de outra
disposição legal, a quem praticar aquelas condutas, disponibilizando a uma multiplicidade de utilizadores finais,
através de tecnologias da informação e da comunicação, material ameaçador ou insultuoso, com o efeito de
causar danos morais significativos à vítima.
– Prevê-se ainda a agravação da pena em metade, nos seus limites mínimos e máximos, quando as condutas
previstas sejam praticadas contra vítima menor, contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua raça, cor,
origem étnica ou nacional, ascendência, religião, sexo, orientação sexual, identidade de género ou deficiência
física ou psíquica, e a agravação em um terço, nos seus limites mínimos e máximos, das penas previstas nos
artigos 153.º, 154.º-A, 163.º, 167.º, 170.º, 171.º a 176.º-A, 180.º e 181.º, quando estes crimes forem praticados
ou publicitados através de tecnologias da informação e da comunicação.
I. c) Enquadramento constitucional e legal
Nos termos dos n.os 1 e 2 do artigo 26.º da Constituição «a todos são reconhecidos os direitos à identidade
pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à
imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas
de discriminação, sendo que a «lei estabelecerá garantias efetivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou
contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias».
Por sua vez, o n.º 3 do artigo 35.º da Constituição estabelece que «a informática não pode ser utilizada para
1 https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A52022PC0105 2 https://www.ecoi.net/en/file/local/2075375/N2242081.pdf 3 https://ces.pt/wp-content/uploads/2023/03/Parecer-VD-Aprovado-em-Plenario-3-marco.pdf
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tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa,
vida privada e origem étnica, salvo mediante consentimento expresso do titular, autorização prevista por lei com
garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos não individualmente
identificáveis».
De uma forma global, o supramencionado artigo 35.º consagra a proteção dos cidadãos perante o tratamento
de dados informatizados. «A fórmula tratamento abrange não apenas a individualização, fixação e recolha de
dados, mas também a sua conexão, transmissão, utilização e publicação. O enunciado linguístico dados (…)
está utilizado na Constituição no sentido que hoje lhe empresta a ciência informática: representação
convencional de informação, sob a forma analógica ou digital, possibilitadora do seu tratamento automático
(introdução, organização, gestão e processamento de dados). (…) O conjunto de direitos fundamentais
relacionados com o tratamento informático de dados pessoais arranca de alguns «direitos-mãe» em sede de
direitos, liberdades e garantias. É o caso do direito à dignidade da pessoa humana, do desenvolvimento da
personalidade, da integridade pessoal e da autodeterminação informativa. O enunciado «dados pessoais»
exprime logo a estreita conexão entre estes direitos e o respetivo tratamento informático; podendo afirmar-se
que quanto mais os dados relacionam a dignidade, a personalidade e a autodeterminação das pessoas, tanto
mais se impõem restrições quanto à sua utilização e recolha (banco de dados). Existe uma interdição absoluta
de tratamento informático de certos tipos de dados pessoais salvo mediante consentimento expresso do titular,
autorização prevista por lei com garantias de não discriminação ou para processamento de dados estatísticos
não individualmente identificáveis. Trata-se de isentar de todo em todo dos perigos do registo informático
aqueles dados que têm a ver com a esfera de convicção pessoal (religião, filosofia), com a esfera de opção
política e sindical (filiação política e sindical), com a esfera da vida privada e com a origem étnica».4
Em termos de enquadramento legal importa também referir a Lei n.º 27/2021, de 17 de maio (Carta
Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital) que visa reforçar os direitos dos cidadãos em matéria de
cibersegurança, de tratamento de dados pessoais e do respeito pela honra, imagem e bom nome de cada um,
promovendo uma utilização neutra da internet, livre de discursos de ódio e de apologia à violência ou à
discriminação.
Do ponto de vista do nosso ordenamento jurídico destaca-se igualmente a Lei n.º 44/2018, de 9 de agosto,
que procedeu à quadragésima sexta alteração do Código Penal, reforçando a proteção jurídico-penal da
intimidade da vida privada na internet, procedendo à alteração dos artigos 152.º e 197.º do Código Penal.
Cumpre ainda fazer referência aos crimes de difamação e injúria, previstos e punidos, respetivamente, pelos
artigos 180.º e 181.º do Código Penal, que preveem a agravação da pena de prisão ou multa se a «ofensa for
praticada através de meios ou em circunstâncias que facilitem a sua divulgação», nos termos da alínea a) do
n.º 1 do artigo 183.º.
Quanto ao fenómeno do ciberbullying, em concreto, embora não encontre, em Portugal, tipificação legal
autónoma, as condenações pela sua perpetração resultam, muitas das vezes, da aplicação de tipos legais como
a difamação, a injúria, a ofensa à integridade física, a coação, a ameaça, entre outros.
I. d) Antecedentes parlamentares
Sobre matéria conexa com o projeto de lei em apreço regista-se o Projeto de Resolução n.º 683/XV/1.ª (PAN)
que recomenda ao Governo a implementação da lei dos serviços digitais e a promoção de ações de
sensibilização e formação para o combate ao discurso de ódio online e ciberbullying, e a Petição n.º 187/XIV/2.ª
– Contra o ódio e a agressão gratuita na internet.
A discussão na generalidade destas iniciativas, em conjunto com o projeto de lei em apreço, está agendada
para o próximo dia 1 de junho de 2023.
Na presente Legislatura cabe ainda fazer referência ao recente processo legislativo respeitante à partilha não
consentida de conteúdos de natureza íntima ou sexual, cujas iniciativas legislativas que abaixo se identificam
acompanharam a discussão da Petição n.º 209/XIV/2.ª – Solicitam a atribuição da natureza de crime público à
partilha não consentida de conteúdos sexuais:
4 v. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, Volume I, 4.ª edição – janeiro de 2007, págs. 550, 551 e 555.
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– Projeto de Lei n.º 156/XV/1.ª (CH) – Reforça a proteção das vítimas de devassa da vida privada por meio
de partilha não consentida de conteúdos de cariz sexual;
– Projeto de Lei n.º 157/XV/1.ª (PAN) – Prevê o crime de divulgação não consentida de conteúdo de natureza
íntima ou sexual;
– Projeto de Lei n.º 208/XV/1.ª (BE) – Criação do crime de pornografia não consentida (quinquagésimo quinta
alteração ao Código Penal e quadragésima quinta alteração ao Código do Processo Penal);
– Projeto de Lei n.º 347/XV/1.ª (PS) – Reforça a proteção das vítimas de crimes de disseminação não
consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º 7/2004, de 7 de janeiro, que
aprova o Comércio Eletrónico no Mercado Interno e Tratamento de Dados Pessoais.
No âmbito deste processo legislativo foi aprovado um texto de substituição integral, da autoria do PS e do
PSD, que deu origem ao Decreto da Assembleia da República n.º 49/XV – Reforça a proteção das vítimas de
crimes de disseminação não consensual de conteúdos íntimos, alterando o Código Penal e o Decreto-Lei n.º
7/2004, de 7 de janeiro, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Diretiva 2000/31/CE, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 8 de junho, relativa a certos aspetos legais dos serviços da sociedade de informação,
em especial do comércio eletrónico, no mercado interno (enviado para promulgação em 2023-05-18 e entretanto
publicado como Lei n.º 26/2023 de 30 de maio).
PARTE II – Opinião da Relatora
A relatora signatária do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o
presente projeto de lei, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – O Deputado único representante de partido (DURP) Livre tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia
da República, em 12 de maio de 2023, o Projeto de Lei n.º 780/XV/1.ª – Prevê a criminalização da ciberviolência.
2 – Com a presente iniciativa legislativa pretende-se estabelecer a autonomização do crime de
ciberviolência, procedendo, para o efeito, à alteração do Código Penal, através do aditamento do artigo 201.º-A
(Ciberviolência), onde se prevê, designadamente, a criminalização de comportamentos de ameaça ou coação,
através de tecnologias da informação e da comunicação.
3 – Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que o Projeto de Lei n.º 780/XV/1.ª reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido
e votado em Plenário.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada relatora, Sofia Matos — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Nota técnica.
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PROJETO DE LEI N.º 781/XV/1.ª
(CRIA AS RESPOSTAS DE APOIO PSICOLÓGICO PARA VÍTIMAS DE ASSÉDIO E VIOLÊNCIA
SEXUAL NO ENSINO SUPERIOR E ALARGA O ÂMBITO DE APLICAÇÃO DOS CÓDIGOS DE BOA
CONDUTA PARA A PREVENÇÃO E COMBATE AO ASSÉDIO A TODOS OS MEMBROS DA
COMUNIDADE ACADÉMICA)
Parecer da Comissão de Educação e Ciência
Índice
Parte I – Considerandos
1. Introdução
2. Apreciação da conformidade dos requisitos constitucionais, regimentais e formais
3. Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas)
4. Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas)
Parte II – Opinião do Deputado Relator
Parte III – Conclusões e Parecer
PARTE I – Considerandos
1. Introdução
A iniciativa em apreciação é apresentada pelo DURP do Livre, ao abrigo e nos termos do n.º 1 do artigo 167.º
da Constituição da República Portuguesa (Constituição) e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia
da República (Regimento), que consagram o poder de iniciativa da lei. Trata-se de um poder dos Deputados,
por força do disposto na alínea b) do artigo 156.º da Constituição e alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento,
bem como dos grupos parlamentares, por força do disposto na alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição
e da alínea f) do artigo 8.º do Regimento.
A iniciativa assume a forma de projeto de lei, em conformidade com o disposto no n.º 2 do artigo 119.º do
Regimento. Encontrando-se redigidas sob a forma de artigos, são precedidas de uma exposição de motivos e
têm uma designação que traduz sinteticamente o seu objeto principal, cumprindo assim os requisitos formais
previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
São também respeitados os limites à admissão da iniciativa estabelecidos no n.º 1 do artigo 120.º do
Regimento, uma vez que as mesmas parecem não infringir a Constituição ou os princípios nela consignados e
definem concretamente o sentido das modificações a introduzir na ordem legislativa.
A iniciativa Projeto de Lei n.º 781/XV/1.ª (L), que cria as respostas de apoio psicológico para vítimas de
assédio e violência sexual no ensino superior e alarga o âmbito de aplicação dos Códigos de Boa Conduta para
a Prevenção e Combate ao Assédio a todos os membros da comunidade académica, deu entrada a 12 de maio
de 2023, acompanhada da ficha de avaliação prévia de impacto de género. Em 17 de maio de 2023 foi admitida
e baixou, na fase da generalidade, à Comissão de Educação e Ciência (8.ª), por despacho do Presidente da
Assembleia da República. Foi anunciada igualmente em sessão plenária no dia 18 de maio de 2023.
A presente iniciativa visa criar respostas de apoio psicológico (RAP) para vítimas de assédio e violência
sexual no ensino superior, bem como alargar o âmbito de aplicação dos Códigos de Boa Conduta para a
Prevenção e Combate ao Assédio no Trabalho, com as necessárias adaptações, a todos os trabalhadores,
independentemente do vínculo jurídico que detenham, bem como a todos os membros da comunidade
académica.
Não sendo o assédio no ensino superior um fenómeno recente nem nacional argumenta o proponente ser
importante existirem «respostas que envolvam toda a comunidade académica», «que promovam uma mudança
de cultura (…) e que protejam as vítimas».
O proponente considera que as RAP para crianças e jovens vítimas de violência doméstica, no âmbito da
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Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica, podem ser adaptadas para apoiar as vítimas de
assédio e violência sexual no ensino superior, devendo a sua criação ser uma obrigação do Estado.
O projeto de lei concretiza que tais respostas consistem em «serviços de apoio psicológico e
psicoterapêutico, com recurso a metodologias de intervenção individual ou em grupo e baseadas em abordagens
especializadas, como abordagens psicoterapêuticas em trauma, de terapia afirmativa, ou cognitivo-
comportamental» determinando, ainda, que as mesmas devem ser objeto de protocolo de colaboração entre a
Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, a Ordem dos Psicólogos Portugueses e as instituições de
ensino superior, sem prejuízo da criação de protocolos com outras entidades para dinamização de ações de
informação e sensibilização junto da comunidade académica.
A lei formulário1 contém um conjunto de normas sobre a publicação, identificação e formulário dos diplomas
que são relevantes em caso de aprovação da presente iniciativa.
De acordo com a nota técnica dos serviços, o título da presente iniciativa legislativa traduz sinteticamente o
seu objeto, mostrando-se conforme ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º da lei formulário, embora, em caso de
aprovação, possa ser objeto de aperfeiçoamento formal, em sede de apreciação na especialidade ou em
redação final.
Em caso de aprovação, esta iniciativa revestirá a forma de lei, nos termos do n.º 3 do artigo 166.º da
Constituição, pelo que deve ser objeto de publicação na 1.ª série do Diário da República, em conformidade com
o disposto na alínea c) do n.º 2 do artigo 3.º da lei formulário.
No que respeita ao início de vigência, a iniciativa estabelece, no seu artigo 5.º, que a sua entrada em vigor
ocorrerá «na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua publicação», estando em
conformidade com o previsto no n.º 1 do artigo 2.º da lei formulário, que prevê que os atos legislativos «entram
em vigor no dia neles fixado, não podendo, em caso algum, o início de vigência verificar-se no próprio dia da
publicação».
Nesta fase do processo legislativo, a iniciativa em apreço não nos parece suscitar outras questões em face
da lei formulário.
O projeto de lei não suscita igualmente qualquer questão relacionada com a linguagem discriminatória em
relação ao género, tendo, conforme a ficha de avaliação de impacto de género (AIG), um impacto neutro.
2. Apreciação da conformidade dos requisitos constitucionais, regimentais e formais
Para a iniciativa em apreço, Projeto de Lei n.º 781/XV/1.ª (L), deve ser tida em consideração a nota técnica
elaborada pelos serviços, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 131.º do RAR, que subscrevemos, pela sua
competente descrição, e que conclui que a iniciativa reúne os requisitos formais e constitucionais para ser
apreciada em Plenário.
3. Iniciativas pendentes (iniciativas legislativas)
Efetuada uma pesquisa à base de dados da atividade parlamentar, verificou-se que, neste momento, sobre
matéria conexa, estão pendentes as seguintes iniciativas legislativas, as quais estão igualmente agendadas
para o Plenário do dia 2 de junho:
N.º Título Data de Admissão Autor
778 Assegura o cumprimento da Convenção de Istambul reforçando a proteção das vítimas em caso de assédio sexual
2023-05-17 CH
743 Cria o tipo legal de crime de assédio sexual e de assédio sexual qualificado, reforçando a proteção legal das vítimas
2023-05-04 BE
36 Prevê o crime de assédio sexual, procedendo à quinquagésima sexta alteração ao Código Penal e à vigésima alteração ao Código do Trabalho
2022-04-08 PAN
1 Lei n.º 74/98, de 11 de novembro, alterada e republicada pela Lei n.º 43/2014, de 11 de julho, estabelece um conjunto de normas sobre a publicação, a identificação e o formulário dos diplomas.
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N.º Título Data de Admissão Autor
686 Recomenda ao Governo que crie estratégias para debelar as situações de assédio moral e sexual no ensino superior
2023-05-10 IL
657 Criação de códigos de conduta e de uma estrutura independente de apoio à vítima e de denúncia em caso de assédio nas instituições de ensino superior
2023-05-04 BE
4. Antecedentes parlamentares (iniciativas legislativas)
De acordo com a mesma base de dados, identificaram-se como antecedentes conexos os seguintes projetos
de lei que foram rejeitados na generalidade em a 24 de março de 2023:
N.º Título Data de
Admissão Autor
623 Determina o dever de as instituições de ensino superior disponibilizarem serviços de saúde mental aos estudantes
2023-03-08 L
627 Cria uma Rede de serviços de psicologia nas escolas públicas e instituições de ensino superior e uma linha telefónica de apoio no Ensino Superior
2023-03-07 PAN
PARTE II – Opinião do Deputado Relator
O Deputado autor do Parecer, reserva a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa, em sessão
plenária.
PARTE III – Conclusões e Parecer
Face ao exposto, a Comissão de Educação e Ciência conclui e emite o seguinte parecer:
1 – O DURP do Livre apresentou a iniciativa Projeto de Lei n.º 781/XV/1.ª (L) – Cria as Respostas de Apoio
Psicológico para vítimas de assédio e violência sexual no ensino superior e alarga o âmbito de aplicação dos
Códigos de Boa Conduta para a Prevenção e Combate ao Assédio a todos os membros da comunidade
académica.
2 – A presente iniciativa legislativa cumpre todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais em
vigor, pelo que se encontra em condições de ser remetida para apreciação e votação em Plenário, nos termos
do artigo 136.º do RAR;
3 – Nos termos regimentais aplicáveis o presente parecer deve ser remetido a S. Ex.ª o Presidente da
Assembleia da República.
Palácio de S. Bento, 29 de maio de 2023.
O Deputado relator,Gabriel Mithá Ribeiro — O Presidente da Comissão, Alexandre Quintanilha.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD, do CH, da IL e do PCP,
tendo-se registado a ausência do BE, na reunião da Comissão de 30 de maio de 2023.
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PARTE IV – Anexos
A nota técnica referente à iniciativa em análise está disponível na página da mesma.
———
PROJETO DE LEI N.º 796/XV/1.ª (1)
(ASSEGURAR UMA MAIOR CELERIDADE DA JUSTIÇA ADMINISTRATIVA E FISCAL, ALTERANDO
DIVERSOS DIPLOMAS)
Exposição de motivos
Se é verdade que, segundo a Comissão Europeia1, Portugal é o 8.º país da União Europeia que tem um
menor tempo médio de conclusão de casos cíveis e comerciais em todas as instâncias. Não menos verdade é
o facto de, segundo os mesmos dados, o tempo estimado necessário para dirimir na primeira instância os litígios
no âmbito da justiça administrativa e tributária é de 846 dias, o que coloca Portugal no topo do ranking da União
Europeia. A estes dados acresce um conjunto de casos mediáticos, por exemplo, no âmbito dos crimes
económicos, que demoram mais de uma década a terem um desfecho final.
Este estado da justiça no nosso País leva a que estudos de 20202 nos digam que Portugal se destaca na
União Europeia por ser um País em que o grau de confiança no sistema legal é particularmente baixo (4 numa
escala de zero a dez), estando no mesmo patamar que a Polónia e só sendo superado pela Eslovénia e por
Espanha. Estes défices estruturais no funcionamento do sistema de justiça para além de porem em causa a
tutela dos direitos dos cidadãos, representam ainda um custo acrescido para a atividade empresarial, que,
inevitavelmente, penaliza a competitividade da economia do nosso País.
A justiça administrativa é um dos focos que levanta mais preocupações e que mais carece de medidas que
garantam as condições necessárias para o seu funcionamento rápido e eficiente.
Reconhecendo a valia dos avanços dados nos últimos anos com a consagração de diversos mecanismos de
agilização processual no Código de Processo nos Tribunais Administrativos – como o mecanismo dos processos
em massa (artigo 48.º), o mecanismo de diferimento da instrução (artigo 90.º, n.º 4) ou o reenvio prejudicial para
o Supremo Tribunal Administrativo em primeira instância (artigo 93.º) –, com a presente iniciativa o PAN, dando
resposta a um conjunto de apelos provenientes da sociedade civil3, pretende tomar medidas cirúrgicas tendentes
a assegurar uma justiça administrativa e fiscal mais célere.
Em primeiro lugar e em linha com o existente em países como a Alemanha, Espanha, França, Itália e Países
Baixos, prevêem-se um conjunto de propostas tendentes a assegurar uma prolação mais célere e eficiente de
sentenças, na qual se incluem: a criação de um mecanismos de incentivo para que as partes entrem em acordo
quanto à fixação dos factos relevantes para decisão (em que se inclui, nomeadamente, a prolação mais rápida
de uma sentença limitada à matéria de direito em litígio), algo especialmente importante quando a maior fatia
dos litígios apresentados nos tribunais administrativos e fiscais diz respeito às divergências na interpretação e
aplicação de normas jurídicas; mecanismos de simplificação da sentença, nomeadamente da fundamentação e
julgamento da matéria de facto, aplicáveis em casos de manifesta simplicidade da causa ou quando tendo a
causa sido anteriormente apreciada se constate que não existam factos controvertidos e de direito; e a previsão
da possibilidade de limitar o julgamento da matéria de facto e de direito a um determinado vício do ato impugnado
em caso de manifestas simplicidade da causa (de valor inferior ao da alçada do tribunal) e procedência do vício.
Em segundo lugar, propomos a criação de incentivos financeiros à redução de pendências nos tribunais
1 Comissão Europeia, The 2021 EU justice Scoreboard, União Europeia, 2021. 2 Pedro Adão e Silva e Luís Eloy, «Balanço ambivalente para um sistema que não consegue conquistar a confiança dos cidadãos», in Valorizar as Políticas Públicas, IPPC-ISCTE, 2020, página 84. 3 Tiago Serrão e Marco Caldeira (coord.), A justiça Administrativa em Portugal: Diagnóstico presente e perspectivas futuras, AAFDL Editora, 2022.
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administrativos e fiscais, que se traduzem: na isenção total de custas – incluindo taxas de justiça e custas de
parte – sempre que, poupando o sistema de justiça a um prolongamento desnecessário da ação, as entidades
demandadas ou exequentes resolvam imediatamente o litigio pendente com a satisfação integral da pretensão
no prazo de contestação ou resposta (solução similar à existente no ordenamento jurídico espanhol); isenção
quase total de custas (incluindo apenas custas de parte) em caso de transação ou de satisfação da pretensão
do autor na pendência do processo (solução similar à vigente nos ordenamentos jurídicos alemão, espanhol e
italiano); e a isenção parcial de custas pela satisfação parcial na pendência do processo (solução similar à
existente em Espanha e nos Países Baixos).
Em terceiro lugar propõe-se a efetiva implementação da citação eletrónica das entidades públicas, por forma
a reduzir os tempos de decisão dos processos judiciais e aumentar a celeridade e segurança da tramitação
processual.
Em quarto e último lugar propõe-se o aumento em 10 dias do prazo para a apresentação, pela parte
vencedora, da nota de custas de parte após o trânsito em julgado da sentença. Fazemo-lo porque, estando
neste momento resolvido o litígio (com a sua decisão definitiva), o atual prazo poderá levantar problemas de
articulação com os artigos 139.º, n.º 5, alínea c), e 638.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, que por sua vez
poderá gerar incidentes desnecessários – como, por exemplo, situações em que a parte vencedora remete a
nota de custas para a contraparte no prazo fixado e depois se vê confrontada com a notificação de interposição
de recurso, que por si só leva a que não haja trânsito em julgado e que as custas de parte não sejam devidas.
Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada
Deputada do Pessoas-Animais-Natureza, apresenta o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração:
a) Do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aprovado pela Lei n.º 15/2002, de 22 de fevereiro;
b) Do Código de Procedimento e de Processo Tributário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de
outubro;
c) Do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de fevereiro.
Artigo 2.º
Alteração ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos
Os artigos 24.º, 94.º e 95.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, passa a ter a seguinte
redação:
«Artigo 24.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – A citação das entidades públicas é efetuada eletronicamente e, quando não houver lugar a despacho
liminar, de forma automática, nos termos definidos na portaria referida no n.º 1.
5 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […].
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6 – […].
7 – […].
8 – […].
Artigo 94.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Em caso de simplicidade da causa, ou quando os factos estejam plenamente provados por documento,
acordo ou confissão das partes, a discriminação dos factos provados e não provados pode ser feita por mera
remissão para peças processuais onde estejam contidos ou alegados.
6 – Quando a questão de direito seja simples e já tenha sido apreciada por tribunal, ou, sendo mais complexa,
tenha sido apreciada por tribunal de modo uniforme ou reiterado, a fundamentação da decisão pode ser sumária,
com a simples remissão para decisão precedente, através de transcrição ou da junção de cópia.
7 – Se a resolução da causa revestir manifesta simplicidade, e o demandado não tenha apresentado oposição
ao pedido, ou não tenha impugnado especificadamente os factos articulados pelo autor, sem prejuízo do
disposto no n.º 4 do artigo 83.º, a sentença pode limitar-se à parte decisória, precedida da identificação das
partes e do objeto do litígio e da fundamentação sumária do julgado, que pode consistir na adesão e transcrição
dos fundamentos alegados na petição inicial.
8 – Quando as partes tenham apresentado um projeto de base instrutória em que todos os factos relevantes
para a decisão estejam assentes por acordo, nos termos do n.º 2 do artigo 87.º-D, a sentença pode limitar-se à
identificação das partes e do objeto do litígio, aos fundamentos de direito, e à parte decisória.
9 – (Anterior n.º 6.)
Artigo 95.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, quando a causa se afigure simples e tenha valor inferior à
alçada do tribunal, e seja manifesta a procedência de uma das causas de invalidade invocadas em processo
impugnatório, o tribunal pode limitar-se ao julgamento de facto e de direito da mesma ficando prejudicado o
conhecimento das restantes causas de invalidade e respetiva matéria de facto.
5 – (Anterior n.º 4.)
6 – (Anterior n.º 5.)
7 – (Anterior n.º 6.)
8 – (Anterior n.º 7.)»
Artigo 3.º
Aditamento ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos
É aditado o artigo 87.º-D ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, com a seguinte redação:
«Artigo 87.º-D
Projeto instrutório conjunto
1 – O juiz pode convidar as partes a apresentar um projeto instrutório conjunto, pelo prazo de 20 dias, com
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os factos que considerem assentes, e com os controvertidos ou necessitados de prova, nos termos e para os
efeitos dos artigos 89.º-A e 90.º.
2 – Quando as partes apresentem um projeto de base instrutória em que todos os factos relevantes para a
decisão estejam assentes por acordo, o tribunal profere de imediato saneador-sentença, nos termos da alínea
b) do n.º 1 do artigo 88.º e do n.º 8 do artigo 94.º, e as custas do processo são reduzidas a metade.»
Artigo 4.º
Alteração ao Código de Procedimento e de Processo Tributário
Os artigos 123.º e 124.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 123.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Em caso de simplicidade da causa, ou quando os factos estejam plenamente provados por documento,
acordo ou confissão das partes, a discriminação dos factos provados e não provados pode ser feita por mera
remissão para peças processuais onde estejam contidos ou alegados.
4 – Quando a questão de direito seja simples e já tenha sido apreciada por tribunal, ou, sendo mais complexa,
tenha sido apreciada por tribunal de modo uniforme ou reiterado, a fundamentação da decisão pode ser sumária,
com a simples remissão para decisão precedente, através de transcrição ou da junção de cópia.
5 – Quando as partes tenham apresentado um projeto de base instrutória, nos termos do n.º 2 do artigo 113.º-
A, a sentença pode limitar-se à identificação das partes e do objeto do litígio, aos fundamentos de direito, e à
parte decisória.
Artigo 124.º
[…]
1 – […].
2 – […]:
a) […];
b) […].
3 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, quando a causa se afigure simples e tenha valor inferior à
alçada do tribunal, e seja manifesta a procedência de uma das causas de invalidade invocadas em processo
impugnatório, o tribunal pode limitar-se ao julgamento de facto e de direito da mesma ficando prejudicado o
conhecimento das restantes causas de invalidade e respetiva matéria de facto.»
Artigo 5.º
Aditamento ao Código de Procedimento e de Processo Tributário
É aditado o artigo 113.º-A ao Código de Procedimento e de Processo Tributário, passa a ter a seguinte
redação:
«Artigo 113.º-A
Projeto instrutório conjunto
1 – O juiz pode convidar as partes a apresentar um projeto instrutório conjunto, pelo prazo de 20 dias, com
os factos que considerem assentes, e com os controvertidos ou necessitados de prova, nos termos e para os
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efeitos do artigo 114.º.
2 – Quando as partes apresentem um projeto de base instrutória em que todos os factos relevantes para a
decisão estejam assentes por acordo, o tribunal profere de imediato saneador-sentença, nos termos do n.º 1 do
artigo 113.º e do n.º 5 do artigo 123.º, e as custas do processo são reduzidas a metade.»
Artigo 4.º
Alteração ao Regulamento das Custas Processuais
Os artigos 4.º e 25.º do Regulamento das Custas Processuais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26
de fevereiro, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 4.º
[…]
1 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) […];
l) […];
m) […];
n) […];
o) […];
p) […];
q) […];
r) […];
s) […];
t) […];
u) […];
v) […];
x) […];
z) […];
aa) […];
bb) […].
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) (Suprimida pela Declaração de Retificação n.º 22/2008, de 24 de abril.)
f) […];
g) (Revogada.)
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h) […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – […].
8 – Nos processos pendentes nos tribunais administrativos e fiscais, ficam isentos de custas processuais,
incluindo de custas de parte, sem prejuízo da taxa de justiça inicial devida:
a) As partes, em caso de transação;
b) As entidades demandadas ou exequentes, que satisfaçam integralmente a pretensão do autor, oponente
ou requerente, fora dos casos previstos no n.º 9.
9 – Nos processos que devam correr nos tribunais administrativos e fiscais, ficam também isentas de custas
processuais, incluindo custas de parte e da taxa de justiça inicial, as entidades demandadas ou exequentes que
satisfaçam integralmente a pretensão do autor, oponente ou requerente, no prazo de contestação ou resposta,
devendo esta isenção ser expressamente mencionada na respetiva citação ou notificação.
Artigo 25.º
[…]
1 – Até 20 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento
ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o
tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e
justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 10 dias após a
notificação da conta de custas.
2 – […]:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […].
3 – […].
4 – […].»
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor na data de entrada em vigor do Orçamento do Estado subsequente à sua
publicação.
Palácio de São Bento, 26 de maio de 2023.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
(1) O texto inicial foi publicado no DAR II Série-A n.º 233 (2023.05.26) e foi substituído, a pedido do autor, em 31 de maio de 2023.
———
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PROPOSTA DE LEI N.º 74/XV/1.ª
(DEFINE OS OBJETIVOS, PRIORIDADES E ORIENTAÇÕES DA POLÍTICA CRIMINAL PARA O BIÉNIO
DE 2023-2025)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
a) Nota Introdutória
O Governo tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República, em 20 de abril de 2023, a Proposta
de Lei n.º 74/XV/1.ª, que define os objetivos, prioridades e orientações da política criminal para o biénio de 2023-
2025, em cumprimento da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, que aprova a Lei-Quadro da Política Criminal.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição
da República e do artigo 118.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos formais
previstos no artigo 124.º do Regimento.
Por despacho do Sr. Presidente da Assembleia da República de 21 de abril de 2023, a presente iniciativa
baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão de parecer.
A discussão na generalidade da proposta de lei em apreço encontra-se agendada para a reunião plenária de
7 de junho.
b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
A presente proposta de lei pretende aprovar a lei que define os objetivos, prioridades e orientações da política
criminal para o biénio 2023-2025.
Nesse sentido, a presente iniciativa dispõe sobre «os ilícitos de prevenção prioritária, num quadro que tem
em consideração os dados dos Relatórios Anuais de Segurança Interna de 2021 e 2022, as análises prospetivas
internacionais, designadamente da EUROPOL, bem como o impacto dos diferentes fenómenos criminais na vida
das pessoas e na segurança comum (…).» Tem igualmente em consideração as orientações constantes da
Estratégia Nacional Anticorrupção 2020-2024 (Resolução do Conselho de Ministros n.º 37/2021, de 6 de abril),
em articulação com o Mecanismo Nacional Anticorrupção.
Numa lógica de continuidade com a Lei n.º 55/2020, de 27 de agosto, que definiu os objetivos, prioridades e
orientações da política criminal para o biénio de 2020-2022, mantêm-se as diferenças procedimentais para os
crimes de excecional complexidade, para os crimes graves e para os crimes de baixa e média gravidade.
Em termos sistemáticos, retoma-se o bem jurídico como critério da identificação da criminalidade de
prevenção e de investigação prioritárias, tal como originalmente constava das primeiras leis de política criminal
dos biénios de 2007-2009 e de 2009-2011. Releva-se ainda a introdução da expressão «eficácia processual»,
a par com a celeridade processual, como objetivo principal da política criminal.
Afirma-se ainda o Governo que se confere centralidade à vítima atribuindo prioridade à sua proteção e à
reparação dos danos sofridos, com enfoque nas vítimas especialmente vulneráveis: crianças, jovens, mulheres
grávidas, pessoas idosas, doentes, pessoas com deficiência.
Prioriza-se ainda a proteção de imigrantes, onde se incluem os cidadãos estrangeiros sujeitos a redes de
tráfico e de exploração.
E é neste contexto que se realça, por parte do Governo, o «anúncio» de dois novos gabinetes de apoio às
vítimas de violência de género, um por cada um dos anos, articuladas entre o Governo e a Procuradoria-Geral
da República e, ainda no âmbito da Estratégia Nacional para a Igualdade e a Não Discriminação 2018-2030.
Mantém-se o enfoque na recuperação de ativos que visa assegurar a restituição à comunidade dos bens,
valores e patrimoniais subtraídos pelos autores dos ilícitos. Nesse sentido, releva-se o papel do Gabinete de
Recuperação de Ativos e do Gabinete de Administração de Bens.
A prevenção da reincidência, através da reintegração do agente do crime na sociedade, é uma prioridade e
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por isso impõe a disponibilização de programas dirigidos a certas formas de criminalidade ou a fatores
criminógenos específicos, designadamente o desenvolvimento de programas de prevenção da reincidência para
jovens adultos, para condenados por crimes de violência doméstica, contra a liberdade e autodeterminação
sexual, de incêndio florestal e rodoviários. Ao mesmo tempo, incentiva-se alagamento da bolsa de entidades
beneficiárias do trabalho a favor da comunidade.
O Governo realça ainda a colaboração e articulação entre os órgãos de política criminal, «apostando em
ações conjuntas como forma de intervenção particularmente eficaz».
Em cumprimento do disposto no n.º 2 do artigo 5.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, a iniciativa apresenta
a final, sob a forma de Anexo, a fundamentação das prioridades e orientações da política criminal para o biénio
2023-2025.
A proposta respeita os limites impostos pela lei-quadro e optou por retomar a identificação dos crimes de
prevenção e de investigação prioritária por reporte ao bem jurídico, de resto um dos critérios previstos no n.º 1
do artigo 5.º da lei-quadro e que o Governo considera que melhor permite, em termos operacionais, identificar
os crimes prioritários e centrar a atividade preventiva e investigatória.
Assim, a presente proposta define como prioridades e orientações da política criminal para o biénio 2023-
2025:
«Artigo 4.º
Crimes de prevenção prioritária
Tendo em conta a dignidade dos bens jurídicos tutelados e a necessidade de proteger as potenciais vítimas,
são considerados fenómenos criminais de prevenção prioritária, para os efeitos da presente lei:
a) No âmbito dos crimes contra as pessoas, o homicídio, os crimes contra a integridade física praticados
contra ou por agentes de autoridade, os crimes em contexto de violência grupal com uso de armas de fogo e
armas brancas, a violência doméstica, a violência de género, violação de regras de segurança, os crimes contra
a liberdade e a autodeterminação sexual, a violência juvenil e a violência associada ao desporto;
b) No âmbito dos crimes contra o património, o furto em viaturas e o furto qualificado e o roubo em
residências e em edifício comercial ou industrial, a burla com fraude bancária, o abuso de cartão de garantia ou
de cartão, dispositivo ou dados de pagamento e a burla cometida através de meio informático ou comunicações;
c) No âmbito dos crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, a discriminação em razão da
origem racial ou étnica, nacionalidade, ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação
sexual, identidade ou expressão de género, ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião
política ou ideológica, instrução, situação económica ou condição social;
d) No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os crimes de incêndio florestal, contra a natureza e o
ambiente, a condução perigosa de veículo rodoviário e a condução de veículo em estado de embriaguez ou sob
a influência de estupefacientes ou de substâncias psicotrópicas;
e) No âmbito dos crimes contra o Estado, os crimes de corrupção, tráfico de influência, branqueamento,
peculato e participação económica em negócio;
f) No âmbito da legislação avulsa, o terrorismo e a criminalidade conexa, a cibercriminalidade, o auxílio à
imigração ilegal, os crimes fiscais, contra a segurança social e o sistema de saúde, a detenção e uso de armas
proibidas e a condução sem habilitação legal; e
g) A criminalidade violenta, especialmente violenta e altamente organizada, a que for praticada em ambiente
escolar e em ambiente de saúde e ainda contra vítimas especialmente vulneráveis, incluindo imigrantes
Artigo 5.º
Crimes de investigação prioritária
Tendo em conta a gravidade dos crimes e a necessidade de evitar a sua prática futura, são considerados
crimes de investigação prioritária para efeitos da presente lei:
a) No âmbito dos crimes contra as pessoas, os que sejam cometidos de forma organizada ou em contexto
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de violência grupal, o homicídio, os crimes contra a integridade física praticados contra ou por agentes de
autoridade, a violência doméstica, o tráfico de pessoas e os crimes contra a liberdade e a autodeterminação
sexual;
b) No âmbito dos crimes contra o património, os que sejam praticados de forma organizada, o roubo em
residências ou na via pública cometido com arma de fogo ou arma branca e a extorsão;
c) No âmbito dos crimes contra a vida em sociedade, os crimes de incêndio florestal, contra a natureza e o
ambiente, em contexto rodoviário de que resulte a morte ou ofensas à integridade física graves, a condução
perigosa de veículo rodoviário, a condução de veículo em estado de embriaguez ou sob a influência de
estupefacientes ou substâncias psicotrópicas e a associação criminosa;
d) No âmbito dos crimes contra o Estado, os crimes de corrupção, tráfico de influência, branqueamento,
peculato e participação económica em negócio;
e) No âmbito da legislação avulsa, o terrorismo e criminalidade conexa, o tráfico de armas, a
cibercriminalidade, o auxílio à imigração ilegal, a criminalidade económico-financeira, incluindo a fraude na
obtenção de subsídio ou subvenção e o desvio de subvenção, subsídio ou crédito bonificado, o tráfico de
estupefacientes, incluindo em ambiente prisional, os crimes fiscais e contra a segurança social e o sistema de
saúde; e
f) A criminalidade praticada em ambiente escolar e em ambiente de saúde ainda contra vítimas
especialmente vulneráveis, incluindo imigrantes.»
Cumpre ainda referir os aspetos relativos ao «acompanhamento e monotorização» (artigo 7.º da proposta)
determinando o que já estava previsto em anteriores diplomas.
c) Enquadramento constitucional e legal
A presente iniciativa é apresentada pelo Governo, no âmbito do seu poder de iniciativa e da sua competência
política em conformidade com o n.º 1 artigo 167.º e na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da
República e no n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República, que consagram o poder de
iniciativa da lei.
Refira-se ainda que, nos termos do artigo 14.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, o Governo apresenta à
Assembleia da República, até 15 de outubro do ano em que cesse a vigência de cada lei sobre política criminal,
um relatório sobre a execução da mesma em matéria de prevenção da criminalidade e de execução de penas e
medidas de segurança (n.º 1), já entregue pelo Governo à Assembleia da República e (n.º 2) o Procurador-Geral
da República apresenta ao Governo e à Assembleia da República, no prazo previsto no número anterior (15 de
outubro do ano em que cesse a vigência de cada lei sobre política criminal) «um relatório de execução das leis
de política criminal em matéria de inquéritos e de ações de prevenção da competência do Ministério Público,
indicando as dificuldades experimentadas e os modos de as superar.». Relatório este que a Assembleia da
República ainda não recebeu.
d) Da necessidade de serem promovidas audições e/ou pedidos de pareceres
Atendendo ao conteúdo desta proposta de lei, impõe-se a realização de uma audição à Sr.ª Procuradora-
Geral da República, em nome próprio, nos termos do n.º 1 do artigo 9.º da Lei-Quadro da Política Criminal (ainda
não realizada) e, na qualidade de Presidente do Conselho Superior do Ministério Público (parecer recebido pela
Comissão em 12 de maio), a audição do Conselho Superior da Magistratura (parecer recebido em 18 de maio)
e da Ordem dos Advogados (todos solicitados pela Comissão em 26 de abril de 2023).
Dos Pareceres recebidos
Conselho Superior da Magistratura:
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Realça duas reservas ou propostas de alteração:
a) – Relativamente ao artigo 7.º da PPL (acompanhamento e monotorização da execução da efetivação das
prioridades da politica criminal estabelecidas na lei) considera o CSM que, não obstante algumas sugestões
acolhidas, a PPL ainda não está em consonância com os princípios enunciados pelo artigo 94.º da Lei da
Organização do Sistema Judiciário, afinando-se-lhes “mais consentânea com a correta distribuição de
competências legais a redação atual constantes da Lei de política criminal para o biénio 2020- 2022- (Lei n.º 55
/2020, de 27 de agosto, que se transcreve:
«Artigo 7.º
Acompanhamento e monotorização
1 – O presidente do tribunal de comarca que, no exercício da competência de gestão processual a
que se refere a alínea c) do n.º 4.º do artigo 94.º da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aprovada
pela Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, verifique que existem processos enunciados como prioritários nos
termos da presente lei que se encontrem pendentes por tempo considerado excessivo ou que não sejam
resolvidos em prazo razoável informa o Conselho Superior da Magistratura (CSM) e promove as medidas
que se justifiquem.
2 – Compete à Procuradoria-Geral da República (PGR), no exercício das suas competências e de
acordo com o estabelecido na presente lei em matéria de efetivação das prioridades nesta definidas, o
acompanhamento e a monotorização da sua execução.
3 – Para os efeitos do disposto no número anterior, a PGR define os respetivos procedimentos de
acompanhamento e de monotorização.
4 – Sem prejuízo de outros aspetos de execução das prioridades definidas na presente lei que a PGR
entenda dever acompanhar e monitorizar , o magistrado do Ministério Público coordenador da comarca
que, no exercício da competência prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo 101.º da lei da Organização do
sistema Judiciário, e das orientações definidas nos termos do artigo anterior, verifique que se encontram
pendentes por tempo considerado excessivo ou que não sejam resolvidos em prazo razoável processos
enunciados como prioritários adota as providências de gestão que se mostrem adequadas, informando,
por via hierárquica, a PGR.»
b) Quanto à prevenção e combate dos crimes de violência doméstica, dos crimes contra a liberdade e
autodeterminação sexual e dos crimes rodoviários onde a taxa de reincidência é especialmente levada e, diz o
CSM que «a prática judiciária ensina-nos que nesses tipos de crime só prevenindo a reincidência se pode
satisfazer as finalidades da pena, na sua vertente da reintegração do agente na sociedade» assim, «salienta-se
a importância da elaboração e execução de programas específicos, quer a nível da prevenção desta
criminalidade dos Conselhos Municipais de segurança, quer na execução da pena a cargo da Direção-Geral de
Reinserção e Serviços Prisionais». Todavia, importa investir na concretização desta tarefa para que se sintam
os resultados práticas e é nesse sentido que o CSM que «deveria estar prevista a comunicação a uma entidade
que centralizasse esta informação a nível nacional, garantindo a sua divulgação, designadamente aos Tribunais.
Só assim se poderá conhecer os programas existentes a se atender na fase de suspensão do inquérito, de
execução da pena de prisão ou de penas substitutivas».
«Salienta-se de efetiva e grande relevância o objetivo já constante da anterior lei, ainda não conseguido, de
alargar os programas específicos de prevenção da reincidência a todo o território nacional o que impõe o
incremento do investimento em tal propósito.»
Conselho Superior do Ministério Público
Destaca a previsão do n.º 1 artigo 14.º (cooperação entre órgãos de polícia criminal) para possível
ponderação com o objetivo de «evitar divergências interpretativas em matéria de cooperação entre OPC, em
especial no que respeita ao momento em deve operar essa cooperação e a partilha de informações».
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Assim, afirma-se no parecer do CSMP:
Dispõe aquele normativo que «Os órgãos de polícia criminal cooperam na prevenção e na investigação dos
crimes referidos nos artigos 4.º e 5.º, designadamente através da partilha de informações, no mais curto espaço
de tempo possível, nos termos da Lei de Organização da Investigação Criminal, aprovada pela Lei n.º 49/2008,
de 27 de agosto, na sua redação atual, independentemente do prazo máximo de 24 horas nela previsto».
Se bem vemos, a ressalva final – independentemente do prazo máximo de 24 horas nela previsto (prazo
previsto nos artigos 5.º, n.º 2, e 10.º, n.º 2, da Lei de Organização da Investigação Criminal – LOIC), em
conjugação com a previsão de que a cooperação seja efetuada no mais curto espaço de tempo possível, admite
não apenas que tal ocorra até ao limite desse prazo, como, igualmente, para além do mesmo.
O que, correspondendo a uma exceção à regra dos citados preceitos da LOIC e que conjugam o critério do
«mais curto prazo» com o critério da limitação a vinte e quarto horas, poderá introduzir um fator de incoerência
do sistema na medida em que neste regime de exceção estão em causa crimes de prevenção e de investigação
prioritária.
Nessa medida, cremos dever assinalar-se esta questão em vista a que possa ser ponderada a adequação
da solução ora encontrada.»
PARTE II – Opinião da Relatora
A signatária do presente relatório abstém-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a
Proposta de Lei n.º 74/XV/1.ª (GOV), a qual é de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo 137.º do
Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – O Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 74/XV/1.ª que define os
objetivos, prioridades e orientações da política criminal para o biénio de 2023-2025, em cumprimento da Lei n.º
17/2006, de 23 de maio (Lei-Quadro da Política Criminal).
2 – Esta proposta de lei visa aprovar a lei sobre política criminal para o biénio 2023-2025.
3 – Nos termos do n.º 2 do artigo 14.º da Lei n.º 17/2006, de 23 de maio, «o Procurador-Geral da República
apresenta ao Governo e à Assembleia da República, até 15 de outubro do ano em que cesse a vigência de cada
lei sobre política criminal, um relatório de execução das leis de política criminal em matéria de inquéritos e de
ações de prevenção da competência do Ministério Público, indicando as dificuldades experimentadas e os
modos de as superar.». Relatório este que ainda não foi enviado à Assembleia da República para que a lei seja
cumprida.
4 – Tendo em consideração a matéria objeto da Proposta de Lei n.º 74/XV/1.ª, revela-se essencial, por força
da lei-quadro, proceder à audição da Sr.ª Procuradora-Geral da República e ouvir ainda o Conselho Superior do
Ministério Público (parecer recebido em 12 de maio), o Conselho Superior da Magistratura (parecer recebido no
dia 18 de maio) e a Ordem dos Advogados.
5 – Em face do exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que a Proposta de Lei n.º 74/XV/1.ª, apresentada pelo Governo, reúne os requisitos constitucionais e
regimentais para ser discutida e votada em Plenário.
Palácio de S. Bento, 31 de maio de 2023.
A Deputada relatora, Alma Rivera — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
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na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 76/XV/1.ª
(COMPLETA A TRANSPOSIÇÃO DA DECISÃO-QUADRO 2002/584/JAI E DAS DIRETIVAS 2010/64/UE,
2012/13/UE E 2013/48/UE, RELATIVAS AO PROCESSO PENAL E AO MANDADO DE DETENÇÃO
EUROPEU)
Parecer da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
I. a) Nota introdutória
O Governo tomou a iniciativa de apresentar, em 21 de abril de 2023, a Proposta de Lei n.º 76/XV/1.ª –
Completa a transposição da Decisão-Quadro 2002/584/JAI e das Diretivas 2010/64/UE, 2012/13/UE e
2013/48/UE, relativas ao processo penal e ao mandado de detenção europeu.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição
da República Portuguesa e do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República, reunindo os requisitos
formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento, com exceção do previsto no n.º 3 desse artigo,
atendendo a que o Governo não acompanhou esta proposta de lei «dos estudos, documentos e pareceres que
as tenham fundamentado, bem como das tomadas de posição das entidades ouvidas pelo Governo no âmbito
do procedimento da respetiva aprovação».
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, datado de 26 de abril de 2023, a iniciativa
vertente baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, para a emissão do
respetivo parecer.
Na reunião da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias de dia 3 de maio de
2023, a Proposta de Lei n.º 76/XV/1.ª foi distribuída à ora signatária para elaboração do respetivo parecer.
Foram solicitados pareceres, em 5 de maio de 2023, ao Conselho Superior da Magistratura, ao Conselho
Superior do Ministério Público e à Ordem dos Advogados1.
I b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
Através desta proposta de lei (PPL), o Governo pretende alterar o regime jurídico do mandado de detenção
europeu, aprovado pela Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto2, e o Código de Processo Penal, aprovado pelo
1 Por parecer datado de 12 de maio de 2023, a Ordem dos Advogados é do «… entendimento que esta proposta se afigura, no essencial, adequada, ressalvada a garantia do artigo 2.º do CP. Porém, em suma e atento o ora exposto, a Ordem dos Advogados emite parecer favorável à Proposta de Lei em apreço, pese embora as reservas relativas à revogação, tout court do n.º 2 do artigo 2.º do Código Penal» – cfr. Parecer − Ordem dos Advogados. 2 A Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, que aprova o regime jurídico do mandado de detenção europeu (em cumprimento da Decisão Quadro n.º 2002/584/JAI, do Conselho, de 13 de Junho), teve na sua origem a PPL n.º 42/IX/1.ª (GOV), cujo texto final apresentado pela 1.ª Comissão foi aprovado em votação final global em 03/07/2003, com votos a favor do PSD, do PS e do CDS-PP e votos contra do PCP, do BE e do PEV [DAR I Série n.º 141 (IX Leg./1.ª), 2003-07-04, pág. 5931]. Esta lei já foi alterada duas vezes: pela Lei n.º 35/2015, de 4 de maio – na sua origem esteve a PPL n.º 271/XII/4.ª (GOV), cujo texto final apresentado pela 1.ª Comissão foi aprovado em votação final
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Decreto-Lei n.º 78/87, de 17 de fevereiro, de modo a concluir a transposição das seguintes iniciativas europeias
– cfr. artigo 1.º da PPL:
a) Decisão-Quadro 2002/584/JAI, do Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção
europeu e aos processos de entrega entre os Estados-Membros;3
b) Diretiva 2010/64/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de outubro de 2010, relativa ao direito
à interpretação e tradução em processo penal;4
c) Diretiva 2012/13/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de maio de 2012, relativa ao direito à
informação em processo penal;5
d) Diretiva 2013/48/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2013, relativa ao direito
de acesso a um advogado em processo penal e nos processos de execução de mandados de detenção
europeus e ao direito de informar um terceiro aquando da privação de liberdade e de comunicar, numa situação
de privação de liberdade, com terceiros e com as autoridades consulares6.
Considera o Governo que «[e]mbora a lei nacional já assegure os requisitos mínimos relativos a cada uma
destas diretivas, a sua plena conformação com as mesmas exige intervenção legislativa. Para o efeito, clarifica-
se o âmbito do direito à tradução e interpretação em processo penal e garante-se que a pessoa detida no âmbito
de um mandado de detenção europeu é informada sobre o direito de acesso a constituir advogado no Estado
de emissão» – cfr. exposição de motivos.
Refere o Governo que «é ainda necessário ajustar a lei nacional à Decisão-Quadro 2002/584/JAI, do
Conselho, de 13 de junho de 2002, relativa ao mandado de detenção europeu e aos processos de entrega entre
os Estados-Membros (Decisão-Quadro 2002/584/JAI). Promove-se a alteração dos artigos 26.º e 30.º de modo
a atualizar o articulado respetivo com a interpretação do Tribunal de Justiça da União Europeia e da Comissão.
No âmbito dos motivos de não execução obrigatória do mandado de detenção europeu, revoga-se a alínea f) do
artigo 11.º, seguindo imposição da Comissão Europeia sobre a matéria. Sendo a Lei n.º 65/2003, de 23 de
agosto, o instrumento que cumpre a Decisão-Quadro 2002/584/JAI na ordem interna, a dicotomia motivos de
não execução obrigatória versus motivos de não execução facultativa passa a seguir a teleologia daquela
Decisão-Quadro. Nos casos em que não estejam em causa crimes que caibam no âmbito do princípio do
reconhecimento mútuo, se o facto que motiva a emissão do mandado de detenção europeu não cumprir o
princípio da dupla incriminação, de acordo com a Decisão-Quadro 2002/584/JAI o motivo de recusa é
classificado como meramente facultativo e nunca obrigatório. No plano interno, a circunstância de o crime não
constituir infração punível de acordo com a lei portuguesa determina que o âmbito da lei não está preenchido e,
consequentemente, que a execução do mandado de detenção europeu não pode ocorrer por não estar cumprido
o princípio da dupla incriminação» – cfr. exposição de motivos.
global em 20/03/2015, com votos a favor do PSD e do CDS-PP e abstenções do PS, do PCP, do BE e do PEV; e pela Lei n.º 115/2019, de 12 de setembro – na sua origem esteve a PPL n.º 193/XIII/4.ª (GOV),cujo texto final apresentado pela 1.ª Comissão foi aprovado em votação final global em 19/07/2029, com votos a favor do PSD, do PS, do CDS-PP, do PAN e do Deputado não inscrito Paulo Trigo Pereira e abstenções do BE, do PCP e do PEV [DAR I Série n.º 108, XIII/4.ª, 2019-07-20, pág. 116]. 3 Esta Decisão-Quadro foi transposta para a ordem jurídica interna através da referida Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto. Recorde-se que esta Decisão-Quadro tinha de ser cumprida pelos Estados-Membros até 31/12/2003. 4 Importa recordar que, em 23/09/2021, a Comissão Europeia decidiu dar início a um processo de infração contra Portugal, enviando carta de notificação para cumprir, por não ter transposto corretamente as regras da UE relativas ao direito à interpretação e tradução em processo penal (Diretiva 2010/64/UE) – cfr. https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/inf_21_4681. Recorde-se que esta Diretiva deveria ter sido transposta até 27/10/2013 e que Portugal declarou, perante a Comissão, que considerava não ser necessário adotar medidas destinadas a efetuar a transposição desta Diretiva, entendendo que a legislação nacional já cumpria os requisitos mínimos definidos nesta Diretiva. 5 Importa recordar que, em 23/09/2021, a Comissão Europeia decidiu dar início a um processo de infração contra Portugal, enviando carta de notificação para cumprir, pela não conformidade do seu direito nacional com as regras da UE relativas ao direito à informação em processos penais (Diretiva 2012/13/UE) – cfr. https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/pt/inf_21_4681. Recorde-se que esta Diretiva deveria ter sido transposta até 02/06/2014 e que Portugal declarou, perante a Comissão, que considerava não ser necessário adotar medidas destinadas a efetuar a transposição desta Diretiva, entendendo que a legislação nacional já cumpria os requisitos mínimos definidos nesta Diretiva. Não obstante, através da Lei n.º 115/2019, de 12 de setembro, foram reforçados «os direitos de informação à pessoa visada no mandado de detenção europeu, em harmonia com a Diretiva 2012/12/UE», conforme refere a exposição de motivos da PPL n.º 193/XIII/4.ª (GOV), que esteve na origem daquela lei. 6 Esta Diretiva tinha como prazo de transposição até 27/11/2016. Recorde-se que Portugal declarou, perante a Comissão, que considerava não ser necessário adotar medidas destinadas a efetuar a transposição desta Diretiva, entendendo que a legislação nacional já cumpria os requisitos mínimos definidos nesta Diretiva.
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Adianta, ainda o Governo que, nesta iniciativa legislativa, «são ajustadas as normas referentes aos prazos
para proferimento de uma decisão definitiva sobre a execução do mandado de detenção europeu» – cfr.
exposição de motivos.
Neste sentido, o Governo propõe, em síntese, as seguintes alterações ao regime jurídico do mandado de
detenção europeu, aprovado pela Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, alterada pela Leis n.os 35/2015, de 4 de
maio, e 115/2019, de 12 de setembro – cfr. artigos 2.º, 3.º e 5.º da PPL:
− Consagração do direito do detido a ser informado sobre o direito a constituir advogado no Estado-Membro
de emissão:
o No n.º 2 do artigo 17.º, relativo aos direitos do detido, é incluído o direito deste «a ser informado sobre
o direito a constituir advogado no Estado-Membro de emissão, para auxílio do defensor nomeado ou
do advogado constituído em território nacional»;
o No n.º 4 do artigo 18.º, relativo à audição do detido, o juiz relator passa a ter o dever de informar o detido
«sobre o direito a constituir advogado no Estado-Membro de emissão, para auxílio do defensor
nomeado ou do advogado constituído em território nacional»;
o É aditado um novo n.º 7 ao artigo 18.º, prevendo-se que, «[s]empre que, nos termos do n.º 4, o detido
declare pretender exercer o direito a constituir advogado no Estado-Membro de emissão, é
prontamente informada a autoridade competente daquele Estado»;
o Aditamento de um novo artigo 10.º-A, relativo a «Informação sobre direito a constituir advogado”,
segundo o qual “Sempre que seja transmitido pelo Estado-Membro de execução que o detido pretende
exercer o direito a constituir advogado no Estado-Membro de emissão, é transmitida ao Estado-
Membro de execução, sem demora injustificada, informação que ajude o detido a exercer esse direito»;
− Eliminação, no n.º 3 do artigo 26.º (Prazos e regras relativos à decisão sobre a execução do mandado de
detenção europeu), do inciso «nomeadamente por ter sido interposto recurso da decisão proferida»;
− Aditamento de um novo n.º 4 ao artigo 30.º (prazos de duração máxima da detenção), segundo o qual: «A
detenção da pessoa procurada cessa ainda quando tiverem decorrido os prazos referidos nos n.os 2, 3 e
5 do artigo anterior»;
− Revogação da alínea f) do artigo 11.º, que prevê que a execução do mandado de detenção europeu seja
recusada quando: «O facto que motiva a emissão do mandado de detenção europeu não constituir
infração punível de acordo com a lei portuguesa, desde que se trate de infração não incluída no n.º 2 do
artigo 2.º».
O Governo propõe, ainda, as seguintes alterações ao Código de Processo Penal – cfr. artigo 4.º da PPL:
− Alteração do artigo 58.º, relativo à constituição de arguido, introduzindo no seu n.º 5 o inciso «ou sem
demora justificada» e procedendo ao aditamento de um novo n.º 6, segundo o qual: «No caso de arguido
que não conheça ou não domine a língua portuguesa, quando o documento previsto no número anterior
não esteja disponível em língua que este compreenda, a informação é transmitida oralmente, se
necessário com intervenção de intérprete, sem prejuízo de lhe ser posteriormente entregue, sem demora
injustificada, documento escrito em língua que compreenda», com a consequente remuneração dos atuais
n.os 6 a 8, que passam a n.os 7 a 9, e atualização das remissões para este artigo nos artigos 57.º, n.º 3,
59.º, n.º 4, e 336.º, n.º 4;
− Aditamento de uma nova alínea j) ao n.º 1 do artigo 61.º (direitos e deveres processuais), atribuindo ao
arguido o direito de «Tradução e interpretação, nos termos dos artigos 82.º e 93.º»;
− Aditamento dos novos n.os 3 a 6 ao artigo 92.º, relativo a língua dos atos e nomeação de intérprete, com a
consequente remuneração dos n.os seguintes e com a atualização de remissões para n.os deste artigo
(quer o próprio artigo 92.º, quer nos artigos 93.º, n.º 4, e 166.º, n.º 1), prevendo:
o O dever de a autoridade responsável pelo ato processual prover «ao arguido que não conheça ou não
domine a língua portuguesa, num prazo razoável, a tradução escrita dos documentos referidos no n.º
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10 do artigo 113.º7 e de outros que a autoridade julgue essenciais para o exercício da defesa»;
o Que as passagens dos referidos documentos «que sejam irrelevantes para o exercício da defesa não
têm de ser traduzidas»;
o Que, «[e]xcecionalmente, pode ser feita ao arguido uma tradução ou resumo oral dos documentos
referidos», mas«desde que tal não ponha em causa a equidade do processo»;
o Que o arguido possa «apresentar pedido fundamentado de tradução de documentos do processo que
considere essenciais para o exercício do direito de defesa».
É proposto que esta lei entre em vigor «no dia seguinte ao da sua publicação» – cfr. artigo 6.º da PPL.
PARTE II – Opinião da Relatora
A signatária do presente parecer abstém-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre a
Proposta de Lei n.º 76/XV/1.ª (GOV), a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 3 do artigo
137.º do Regimento da Assembleia da República.
PARTE III – Conclusões
1 – O Governo apresentou à Assembleia da República a Proposta de Lei n.º 76/XV/1.ª – Completa a
transposição da Decisão-Quadro 2002/584/JAI e das Diretivas 2010/64/UE, 2012/13/UE e 2013/48/UE, relativas
ao processo penal e ao mandado de detenção europeu.
2 – Esta iniciativa pretende introduzir alterações ao regime jurídico do mandado de detenção europeu,
aprovado pela Lei n.º 65/2003, de 23 de agosto, e ao Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
78/87, de 17 de fevereiro, de modo a concluir a transposição da Decisão-Quadro 2002/584/JAI e das Diretivas
2010/64/UE, 2012/13/UE e 2013/48/UE, relativas ao processo penal e ao mandado de detenção europeu.
3 – De entre as alterações propostas, destaque-se as que são feitas no âmbito do direito à tradução e
interpretação em processo penal, bem como a consagração da garantia de que a pessoa detida no âmbito de
um mandado de detenção europeu é informada sobre o direito de acesso a constituir advogado no Estado de
emissão.
4 – Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que a Proposta de Lei n.º 76/XV/1.ª (GOV) reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser
discutida e votada em plenário.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023
A Deputada relatora, Andreia Neto — O Presidente da Comissão, Fernando Negrão.
Nota: As Partes I e III do parecer foram aprovadas, por unanimidade, tendo-se registado a ausência do CH,
do PCP e do PAN, na reunião da Comissão de 31 de maio de 2023.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
———
7 Refere-se aos seguintes documentos: «à acusação, à decisão instrutória, à contestação, à designação de dia para julgamento e à sentença, bem como as relativas à aplicação de medidas de coação e de garantia patrimonial e à dedução do pedido de indemnização civil».
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PROPOSTA DE LEI N.º 89/XV/1.ª
TRANSPÕE A DIRETIVA 2011/93/UE RELATIVA À LUTA CONTRA O ABUSO SEXUAL E A
EXPLORAÇÃO SEXUAL DE CRIANÇAS E A PORNOGRAFIA INFANTIL, E AMPLIA O ÂMBITO DO CRIME
DE DISCRIMINAÇÃO E INCITAMENTO AO ÓDIO E À VIOLÊNCIA
Exposição de Motivos
A proteção dos menores contra qualquer forma de exploração ou de abuso é um dever do Estado de direito
democrático. Os atos que atentem contra a liberdade e a autodeterminação sexual de menor revestem-se de
particular gravidade e demandam uma reação rigorosa e eficaz. O abuso e a exploração sexual de menores são
crimes particularmente graves, que abalam valores fundamentais inerentes à proteção do ser humano
individualmente considerado, mas também atacam os alicerces da sociedade, nomeadamente a confiança nas
instituições. E a gravidade de tais crimes assume contornos especiais, porque os danos que ocasionam não se
revestem de efeitos meramente imediatos, pois sabe-se que os danos físicos, psicológicos e sociais que
produzem nos menores são duradouros.
O Estado português tem desenvolvido um conjunto de iniciativas, legislativas e de outra natureza, em linha
com a política da União Europeia (UE), no sentido de assegurar o mais elevado grau de proteção contra qualquer
forma de exploração e de abuso sexual de menores. No entanto, para que o quadro legal seja o mais completo
e coerente possível com o direito da UE, revela-se necessária a introdução de ajustes aos artigos 118.º, 119.º,
176.º e 176.º-B do Código Penal, tendo por referência a Diretiva 2011/93/UE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 13 de dezembro de 2011, relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças
e a pornografia infantil, e que substitui a Decisão-Quadro n.º 2004/68/JAI do Conselho, de 22 de dezembro de
2003.
Assim, em matéria de prescrição, consagra-se graduação adicional àquela que já resulta das molduras
penais dos tipos incriminadores, deslocando o início da contagem dos prazos de prescrição do procedimento
criminal nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menor para o momento em que o ofendido
atinge a maioridade. Ao mesmo tempo, o n.º 5 do artigo 118.º assegura prazo para a ação penal após a vítima
atingir a maioridade, obstando à prescrição do procedimento criminal antes de o ofendido perfazer 25 anos.
Altera-se, também, o artigo 176.º, clarificando que os meios usados para a prática do crime de pornografia
de menores contemplam qualquer forma de ameaça, constrangimento ou violência. Finalmente, no que tange
ao crime previsto no artigo 176.º-B, incrimina-se, a par da conduta de organização de viagens para fins de
turismo sexual com menores no contexto de atividade profissional ou com intenção lucrativa, aquela que
extravase tal contexto, diferenciando-se a medida da pena, mais elevada quando o crime for praticado no âmbito
da atividade profissional, por maior o desvalor que vai associado à conduta.
Dever do Estado de direito democrático é também o de garantir a igualdade entre todos os cidadãos. O quinto
relatório sobre Portugal da Comissão Europeia contra o Racismo e a Intolerância, do Conselho da Europa,
adotado a 19 de junho de 2018, recomendou ao Estado português a alteração do artigo 240.º do Código Penal,
através da inclusão da língua e da cidadania como características protegidas e ainda a eliminação da restrição
de que o incitamento à discriminação seja cometido através de uma atividade organizada de propaganda, como
preceitua a alínea a) do n.º 1 deste preceito.
Para além disso, o quinto relatório periódico relativo a Portugal do Comité dos Direitos Humanos da
Organização das Nações Unidas (ONU) sobre a aplicação do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e
Políticos, adotado em 28 de abril de 2020, notou nas observações finais que o artigo 240.º do Código Penal, ao
restringir o tipo incriminador do n.º 1 a «atividades de propaganda organizada», não abrange o incitamento à
discriminação, e que não confere relevância a certas características associadas a atos discriminatórios, como a
língua. Por isso, o Comité exortou a República Portuguesa a considerar a possibilidade de alterar o artigo 240.º
do Código Penal, a fim de assegurar a sua articulação com os artigos 20.º e 26.º do Pacto.
Note-se ainda que, no mais recente exercício de controlo da aplicação da Convenção Internacional sobre a
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial, o Comité da ONU para a Eliminação da Discriminação
Racial expressou a sua preocupação pela persistência de discurso de ódio e de comportamentos racistas em
Portugal, incluindo no contexto desportivo, nos media e na internet, vitimadores de pessoas pertencentes a
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minorias, em especial comunidades ciganas, pessoas muçulmanas, africanas e afrodescendentes e migrantes.
Por outro lado, no âmbito do plano de ação da UE contra o racismo 2020-2025, a Comissão Europeia alertou
para a necessidade de rigorosa incriminação do ódio e do discurso de ódio.
Portugal foi dos primeiros Estados-Membros a adotar um plano de combate ao racismo. Através da
Resolução do Conselho de Ministros n.º 101/2021, de 28 de julho, foi aprovado o plano nacional de combate ao
racismo e à discriminação 2021-2025 – Portugal contra o racismo, contemplando a «Revisão do artigo 240.º do
Código Penal à luz dos instrumentos internacionais que vinculam o Estado português, alargando o tipo
incriminador para acomodar todas as discriminações proibidas» – o que se promove através da presente lei.
Por fim, e considerando que a corrupção e a fraude prejudicam gravemente a economia e a sociedade,
afetando o seu desenvolvimento económico, enfraquecendo a democracia e comprometendo a justiça social e
o Estado de direito, e que esses fenómenos também têm impacto expressivo no orçamento da UE e,
indiretamente, nos contribuintes nacionais, temos que a proteção dos interesses financeiros da UE demanda
uma definição comum do fenómeno de fraude. Nesse sentido, a Diretiva (UE) 2017/1371, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2017, relativa à luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros
da UE através do direito penal [Diretiva (UE) 2017/1371], veio estabelecer uma definição comum que abrange
os comportamentos fraudulentos que afetam as receitas, as despesas e os ativos do orçamento geral da UE,
incluindo atividades de contração e concessão de empréstimos.
Pese embora a execução da Diretiva (UE) 2017/1371 seja assegurada por diversos diplomas,
designadamente pelo Código Penal, pela Lei n.º 15/2021, de 5 de junho, que aprova o Regime Geral das
Infrações Tributárias, e pelo Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro, relativo às infrações antieconómicas e
contra a saúde pública, é necessário introduzir ajustes à sua plena vigência no ordenamento interno,
designadamente de modo a garantir o mais elevado grau de proteção ao orçamento da UE, em linha com a
proteção conferida ao orçamento nacional.
Assim, altera-se o tipo de crime de branqueamento e o conceito de funcionário constantes do Código Penal
e cria-se um tipo legal de crime de utilização indevida de receitas da UE e um tipo contraordenacional no mesmo
âmbito.
Foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior do Ministério Público, a Ordem
dos Advogados e a Autoridade Nacional de Comunicações.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de lei, com pedido de prioridade e urgência:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei:
a) Completa a transposição da Diretiva 2011/93/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de
dezembro de 2011, relativa à luta contra o abuso sexual e a exploração sexual de crianças e a pornografia
infantil;
b) Completa a transposição da Diretiva (UE) 2017/1371, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho
de 2017, relativa à luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da União através do direito penal; e
c) Alarga o âmbito do crime de discriminação e incitamento ao ódio e à violência alterando o Código Penal,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, na sua redação atual.
Artigo 2.º
Alteração ao Código Penal
Os artigos 118.º, 119.º, 176.º, 176.º-B, 240.º, 368.º-A e 386.º do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
400/82, de 23 de setembro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
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«Artigo 118.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menores, bem como no crime de mutilação
genital feminina sendo a vítima menor, o procedimento criminal não se extingue, por efeito da prescrição, antes
de o ofendido perfazer 25 anos.
Artigo 119.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – Nos crimes contra a liberdade e autodeterminação sexual de menor, o prazo de prescrição só corre
desde o dia em que o ofendido atinja a maioridade e, se morrer antes de a atingir, a partir da data da sua morte.
Artigo 176.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – Quem praticar os atos descritos nas alíneas a) e b) do n.º 1 recorrendo a qualquer forma de ameaça,
constrangimento ou violência é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.
4 – […].
5 – […].
6 – […].
Artigo 176.º-B
[…]
1 – Quem organizar, fornecer, facilitar ou publicitar viagem ou deslocação, sabendo que tal viagem ou
deslocação se destina à prática de crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual de menor, é punido
com pena de prisão até 2 anos, se pena mais grave lhe não couber por força de outra disposição legal.
2 – Quando a conduta a que se refere o número anterior for praticada no contexto de atividade profissional
ou com intenção lucrativa, o agente é punido com pena de prisão até 3 anos, se pena mais grave lhe não couber
por força de outra disposição legal.
3 – O disposto nos números anteriores aplica-se ainda que as condutas contra a liberdade e a
autodeterminação sexual de menor praticadas no local de destino não sejam nessa jurisdição punidas ou quando
nesse local não se exerça o poder punitivo.
Artigo 240.º
[…]
1 – […]:
a) Fundar ou constituir organização ou desenvolver atividades de propaganda que incitem ou encorajem à
discriminação, ao ódio ou à violência contra pessoa ou grupo de pessoas em razão da origem racial ou étnica,
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cor, nacionalidade, ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação sexual, identidade ou
expressão de género ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião política ou ideológica,
grau de ensino, situação económica ou condição social; ou
b) Participar nas organizações referidas na alínea anterior, nas atividades por elas empreendidas ou lhes
prestar assistência, incluindo o seu financiamento;
[…].
2 – […]:
a) Provocar atos de violência contra pessoa ou grupos de pessoas por causa da origem racial ou étnica, cor,
nacionalidade, ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação sexual, identidade ou
expressão de género ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião política ou ideológica,
grau de ensino, situação económica ou condição social;
b) Difamar ou injuriar pessoa ou grupo de pessoas por causa da origem racial ou étnica, cor, nacionalidade,
ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação sexual, identidade ou expressão de género
ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião política ou ideológica, grau de ensino, situação
económica ou condição social;
c) Ameaçar pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua origem racial ou étnica, cor, nacionalidade,
ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação sexual, identidade ou expressão de género
ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião política ou ideológica, grau de ensino, situação
económica ou condição social; ou
d) Incitar à discriminação, ao ódio ou à violência contra pessoa ou grupo de pessoas por causa da sua origem
racial ou étnica, cor, nacionalidade, ascendência, território de origem, religião, língua, sexo, orientação sexual,
identidade ou expressão de género ou características sexuais, deficiência física ou psíquica, opinião política ou
ideológica, grau de ensino, situação económica ou condição social;
[…].
3 – Quem produzir, elaborar ou detiver, com o fim de vender ou distribuir material, ficheiro, conteúdo ou
documento que incite ou encoraje a discriminação, o ódio ou a violência contra pessoa ou grupo de pessoas por
causa da sua origem racial ou étnica, cor, nacionalidade, ascendência, território de origem, religião, língua, sexo,
orientação sexual, identidade ou expressão de género ou características sexuais, deficiência física ou psíquica,
opinião política ou ideológica, grau de ensino, situação económica ou condição social, é punido com a pena
prevista no número anterior.
4 – Quando os crimes previstos nos números anteriores forem cometidos através de sistema informático, o
tribunal pode ordenar a eliminação de dados informáticos ou conteúdos.
Artigo 368.º-A
[…]
1 – […].
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […];
g) […];
h) […];
i) […];
j) Contrabando, contrabando de circulação, contrabando de mercadorias de circulação condicionada em
embarcações, fraude fiscal ou fraude contra a segurança social;
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k) […];
l) […];
m) […].
2 – […].
3 – […].
4 – […].
5 – […].
6 – […].
7 – […].
8 – […].
9 – […].
10 – […].
11 – […].
12 – […].
Artigo 386.º
[…]
1 – […].
2 – […].
3 – São ainda equiparados ao funcionário, para efeitos do disposto nos artigos 335.º e 372.º a 375.º:
a) […];
b) […];
c) […];
d) […];
e) […];
f) […].
4 – […].»
Artigo 3.º
Utilização indevida de receitas da União Europeia
1 – Quem utilizar um benefício obtido legalmente, que resulte de receitas da União Europeia distintas das
que sejam provenientes dos recursos próprios do Imposto sobre Valor Acrescentado, para fim diferente daquele
a que se destina e que envolva prejuízo ou vantagem em montante superior a € 100 000, é punido com pena de
prisão até 5 anos.
2 – Quando os factos previstos no número anterior envolvam prejuízo ou vantagem em montante igual ou
superior a € 10 000 e inferior ou igual a € 100 000, o agente é punido com pena de prisão até 2 anos ou pena
de multa até 240 dias.
3 – Nas mesmas penas incorre quem praticar as condutas previstas nos números anteriores por omissão
contrária aos deveres do cargo.
Artigo 4.º
Contraordenação
Quando os factos previstos no n.º 1 do artigo anterior, mesmo que por omissão contrária aos deveres do
cargo, envolvam prejuízo ou vantagem em montante inferior a € 10 000, o agente é punido com coima de € 5000
a € 20 000.
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Artigo 5.º
Responsabilidade das pessoas coletivas e equiparadas
1 – As pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras entidades
equiparadas são responsáveis pelas infrações previstas nos artigos 3.º e 4.º da presente lei quando cometidas
pelos seus órgãos ou representantes, em seu nome e no interesse coletivo.
2 – A responsabilidade das pessoas coletivas, sociedades, ainda que irregularmente constituídas, e outras
entidades equiparadas é excluída quando o agente tiver atuado contra ordens ou instruções expressas de quem
de direito.
3 – A responsabilidade criminal das entidades referidas no n.º 1 não exclui a responsabilidade individual dos
respetivos agentes.
4 – A responsabilidade contraordenacional das entidades referidas no n.º 1 exclui a responsabilidade
individual dos respetivos agentes.
5 – Se a multa ou coima for aplicada a uma entidade sem personalidade jurídica, responde por ela o
património comum e, na sua falta ou insuficiência, solidariamente, o património de cada um dos associados.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor 30 dias após a data da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 25 de maio de 2023.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — A Ministra da Justiça, Catarina Teresa Rola Sarmento
e Castro — Pel’A Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, João Paulo Moreira Correia.
———
PROPOSTA DE LEI N.º 90/XV/1.ª
TRANSPÕE A DIRETIVA (UE)2019/2121, NA PARTE RESPEITANTE ÀS TRANSFORMAÇÕES,
FUSÕES E CISÕES TRANSFRONTEIRIÇAS
Exposição de motivos
A Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, relativa a
determinados aspetos do direito das sociedades (Diretiva 2017/1132), prevê um regime jurídico relativo à fusão
e à cisão de sociedades anónimas, a nível nacional, e às fusões transfronteiriças das sociedades de
responsabilidade limitada, a nível europeu.
Na sequência da avaliação das normas jurídicas consagradas, o Parlamento Europeu recomendou à
Comissão que adotasse regras harmonizadas em matéria de transformações e de cisões transfronteiriças, na
medida em que um regime jurídico harmonizado contribui para a supressão das restrições à liberdade de
estabelecimento e, ao mesmo tempo, proporciona proteção adequada às partes interessadas, designadamente
trabalhadores, credores e sócios. Aquela instância concluiu pela necessidade de proceder ao alargamento do
âmbito de aplicação das fusões transfronteiriças harmonizado com o regime das transformações e cisões
transfronteiriças, a fim de se alcançar uma maior segurança jurídica, de ser assegurado o exercício pleno da
liberdade de estabelecimento ínsita nos artigos 49.º e 54.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia e
de ser garantida a proteção dos trabalhadores, credores e sócios minoritários no mercado europeu.
É neste contexto que surge a Diretiva (UE) 2019/2121, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de
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novembro de 2019, que altera a Diretiva (UE) 2017/1132 na parte respeitante às transformações, fusões e cisões
transfronteiriças (Diretiva 2019/2121).
A Diretiva 2019/2121 impõe ainda a fiscalização da legalidade das seguintes operações transfronteiriças: ( i)
transformações transfronteiriças, (ii) novas fusões transfronteiriças, além das já consagradas na Diretiva agora
alterada, e (iii) cisões transfronteiriças. Esta fiscalização é prévia à produção de efeitos das referidas operações.
O quadro legal interno atual já prevê um conjunto de normas atinentes às fusões transfronteiriças, pelo que
importa, assim, transpor para a ordem jurídica interna o quadro estabelecido pela Diretiva, não só alargando o
âmbito de aplicação das fusões transfronteiriças, como instituindo o regime jurídico das transformações e das
cisões transfronteiriças e, ainda, adaptando outros diplomas aos novos regimes jurídicos consagrados na
Diretiva (UE) 2019/2121.
Em conformidade, para dar cumprimento aos objetivos de transposição destacados, importa transpor para a
ordem jurídica interna normas referentes aos direitos de participação dos trabalhadores conexos com os
respetivos processos de transformação, fusão e cisão transfronteiriça, quer no que concerne ao seu objeto e
extensão, quer no procedimento aplicável ao respetivo exercício.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de lei, com pedido de prioridade e urgência:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei concede ao Governo autorização legislativa para revisão:
a) Da Lei n.º 19/2009, de 12 de maio, que altera o Código das Sociedades Comerciais e o Código do Registo
Comercial, transpondo para a ordem jurídica interna as Diretivas 2005/56/CE, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 26 de outubro, relativa às fusões transfronteiriças das sociedades de responsabilidade limitada, e
2007/63/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro, que altera as Diretivas 78/855/CEE e
82/891/CEE, do Conselho, no que respeita à exigência de um relatório de peritos independentes aquando da
fusão ou da cisão de sociedades anónimas, e estabelece o regime aplicável à participação dos trabalhadores
na sociedade resultante da fusão;
b) Do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, na sua
redação atual;
c) Do Código do Registo Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 403/86, de 3 de dezembro, na sua
redação atual;
d) Do Decreto-Lei n.º 24/2019, de 1 de fevereiro, que estabelece as regras aplicáveis à comunicação
eletrónica entre o registo comercial nacional e os registos de outros Estados-Membros da União Europeia,
transpondo a Diretiva 2012/17/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de junho de 2012, na sua
redação atual.
Artigo 2.º
Sentido e extensão
1 – A autorização legislativa referida no artigo anterior é concedida com o sentido e extensão de, no quadro
da transposição da Diretiva (UE) 2019/2121, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de
2019, que altera a Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, na
parte respeitante às transformações, fusões e cisões transfronteiriças, serem revistos os procedimentos afetos
à participação dos trabalhadores no regime jurídico das fusões transfronteiriças e, bem assim, instituídas as
regras necessárias a garantir a referida participação na disciplina correspondente ao regime jurídico das
transformações e cisões transfronteiriças.
2 – A autorização legislativa referida no artigo anterior abrange a:
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a) A revisão dos direitos de participação dos trabalhadores nos processos de fusão transfronteiriça e a
consagração dos mesmos nos processos de transformação e cisão transfronteiriça;
b) A definição dos direitos dos trabalhadores no que concerne à sua extensão completude e procedimentos
afetos ao respetivo exercício.
Artigo 3.º
Duração
A presente autorização legislativa tem a duração de 180 dias.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 25 de maio de 2023.
O Primeiro-Ministro, António Luís Santos da Costa — A Ministra da Justiça, Catarina Teresa Rola Sarmento
e Castro — Pel’A Ministra Adjunta e dos Assuntos Parlamentares, João Paulo Moreira Correia.
Decreto-Lei Autorizado
Preâmbulo
O presente decreto-lei procede à transposição para a ordem jurídica interna da Diretiva (UE) 2019/2121, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, que altera a Diretiva (UE) 2017/1132, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, na parte respeitante às transformações, fusões e
cisões transfronteiriças.
A mencionada Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017,
relativa a determinados aspetos do direito das sociedades (Diretiva 2017/1132), previu um regime jurídico
relativo à fusão e à cisão de sociedades anónimas, a nível nacional, e às fusões transfronteiriças das sociedades
de responsabilidade limitada, a nível europeu.
Na sequência da avaliação das normas jurídicas consagradas, o Parlamento Europeu recomendou à
Comissão que adotasse regras harmonizadas em matéria de transformações e de cisões transfronteiriças, na
medida em que um regime jurídico harmonizado contribui para a supressão das restrições à liberdade de
estabelecimento e, ao mesmo tempo, proporciona proteção adequada às partes interessadas, designadamente
trabalhadores, credores e sócios. Aquela instância concluiu pela necessidade de proceder ao alargamento do
âmbito de aplicação das fusões transfronteiriças harmonizado com o regime das transformações e cisões
transfronteiriças, a fim de se alcançar uma maior segurança jurídica, de ser assegurado o exercício pleno da
liberdade de estabelecimento ínsita nos artigos 49.º e 54.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia e
de ser garantida a proteção dos trabalhadores, credores e sócios minoritários no mercado europeu.
É neste contexto que surge a Diretiva (UE) 2019/2121, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de
novembro de 2019, que altera a Diretiva (UE) 2017/1132 na parte respeitante às transformações, fusões e cisões
transfronteiriças (Diretiva 2019/2121).
A Diretiva (UE) 2019/2121 impõe a fiscalização da legalidade das seguintes operações transfronteiriças: ( i)
transformações transfronteiriças, (ii) novas fusões transfronteiriças, além das já consagradas na Diretiva agora
alterada, e (iii) cisões transfronteiriças. Esta fiscalização é prévia à produção de efeitos das referidas operações.
A fim de prosseguir este objetivo fiscalizador, impõe-se que os registos comerciais nacionais dos Estados-
Membros da União Europeia envolvidos nas operações transfronteiriças contenham as informações necessárias
dos registos comerciais de outros Estados-Membros, com vista a poder acompanhar o histórico dessas
sociedades.
Esta Diretiva prevê, por um lado, exceções à aplicação das regras relativas às operações transfronteiriças,
atinentes a sociedades que estejam em liquidação e tenham começado a distribuir ativos aos seus sócios, ou a
sociedades que sejam objeto de instrumentos, poderes e mecanismos de resolução previstos no Título IV da
Diretiva 2014/59/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014.
Por outro lado, a Diretiva em apreço deixa na disponibilidade dos Estados-Membros a opção de não aplicar
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este regime em várias situações, designadamente às sociedades sujeitas a: (i) processos de insolvência ou
regimes de reestruturação preventiva, na aceção do direito nacional; (ii) processos de liquidação diferentes dos
referidos na nova alínea a) do n.º 4 do artigo 120.º da Diretiva (UE) 2017/1132, na aceção do direito nacional;
ou (iii) medidas de prevenção de crises na aceção do ponto 101 do n.º 1 do artigo 2.º da Diretiva 2014/59/UE,
do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014.
O quadro legal interno atual já prevê um conjunto de normas atinentes às fusões transfronteiriças, pelo que
importa, assim, transpor para a ordem jurídica interna o quadro estabelecido pela Diretiva, não só alargando o
âmbito de aplicação das fusões transfronteiriças, como instituindo o regime jurídico das transformações e das
cisões transfronteiriças e, ainda, adaptando outros diplomas aos novos regimes jurídicos consagrados na
Diretiva.
Foram ouvidos o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e
Fiscais, o Conselho Superior do Ministério Público, a Comissão Nacional de Proteção de Dados, a Ordem dos
Advogados, a Ordem dos Solicitadores e dos Agentes de Execução, a Ordem dos Notários, a Comissão para o
Acompanhamento dos Auxiliares da Justiça e da Associação Portuguesa de Administradores Judiciais.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pela Lei n.º […] e nos termos das alíneas a) e b) do n.º 1 do
artigo 198.º da Constituição, o Governo decreta o seguinte:
Artigo 1.º
Objeto
1 – O presente decreto-lei transpõe para a ordem jurídica interna a Diretiva (UE) 2019/2121, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 27 de novembro de 2019, que altera a Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, na parte respeitante às transformações, fusões e cisões
transfronteiriças.
2 – Para o efeito da transposição referida no número anterior, o presente decreto-lei procede:
a) À alteração da Lei n.º 19/2009, de 12 de maio, que altera o Código das Sociedades Comerciais e o Código
do Registo Comercial, transpondo para a ordem jurídica interna as Diretivas 2005/56/CE, do Parlamento
Europeu e do Conselho, de 26 de outubro, relativa às fusões transfronteiriças das sociedades de
responsabilidade limitada, e 2007/63/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro, que altera
as Diretivas 78/855/CEE e 82/891/CEE, do Conselho, no que respeita à exigência de um relatório de peritos
independentes aquando da fusão ou da cisão de sociedades anónimas, e estabelece o regime aplicável à
participação dos trabalhadores na sociedade resultante da fusão;
b) À alteração do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de
setembro, na sua redação atual;
c) À alteração do Código do Registo Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 403/86, de 3 de dezembro,
na sua redação atual;
d) À alteração do Decreto-Lei n.º 24/2019, de 1 de fevereiro, que estabelece as regras aplicáveis à
comunicação eletrónica entre o registo comercial nacional e os registos de outros Estados-Membros da União
Europeia, transpondo a Diretiva 2012/17/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de junho de 2012,
na sua redação atual.
e) À alteração do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-
A/2001, de 14 de dezembro, na sua redação atual;
Artigo 2.º
Alteração ao Código das Sociedades Comerciais
Os artigos 97.º, 98.º, 99.º, 100.º, 101.º-A, 117.º-A, 117.º-B, 117.º-C, 117.º-D, 117.º-F, 117.º-G, 117.º-H e
117.º-I do Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, na sua
redação atual, passam a ter a seguinte redação:
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66
«Artigo 97.º
[…]
1 – […]
2 – Sem prejuízo do disposto na alínea a) do n.º 4 do artigo 117.º-A, as sociedades dissolvidas podem
fundir-se com outras sociedades, dissolvidas ou não, ainda que a liquidação seja feita judicialmente, se
preencherem os requisitos de que depende o regresso ao exercício da atividade social.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
Artigo 98.º
[…]
1 – […]
a) […]
b) O tipo, a firma, a sede, o montante do capital e o número de matrícula no registo comercial de cada uma
das sociedades, bem como o tipo, a firma e a sede da sociedade resultante da fusão;
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) As modalidades de proteção dos direitos dos credores, incluindo quaisquer garantias oferecidas pela
sociedade incorporante ou pela nova sociedade;
i) […]
j) As informações sobre a contrapartida da aquisição das participações sociais oferecida pela sociedade
incorporante ou pela nova sociedade aos sócios da sociedade incorporada ou das sociedades a fundir, nos
termos do presente capítulo, bem como os direitos assegurados pela sociedade incorporante ou pela nova
sociedade a sócios da sociedade incorporada ou das sociedades a fundir que possuem direitos especiais;
l) […]
m) […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
Artigo 99.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – Se todas ou algumas das sociedades participantes na fusão assim o desejarem, os exames referidos
no número anterior podem ser feitos, quanto a todas elas ou quanto às que nisso tiverem acordado, pelo mesmo
revisor ou sociedade de revisores; neste caso, o revisor ou a sociedade deve ser designado, a solicitação
conjunta das sociedades interessadas, pela Ordem dos Revisores Oficiais de Contas.
4 – O revisor ou os revisores elaboram relatório do qual consta o seu parecer fundamentado sobre a
adequação e a razoabilidade da relação de troca e da contrapartida da aquisição das participações sociais,
devendo ter em conta, ao avaliar esta última, o eventual preço de mercado das participações sociais das
sociedades participantes na fusão antes do anúncio do projeto de fusão ou o valor das sociedades, excluindo o
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efeito da fusão projetada, determinado segundo métodos de avaliação comumente aceites.
5 – O relatório previsto no número anterior indica, pelo menos:
a) O método ou os métodos utilizados para a determinação da relação de troca das participações sociais
proposta;
b) O método ou os métodos utilizados para a determinação da contrapartida da aquisição das participações
sociais proposta;
c) A justificação da aplicação ao caso concreto dos métodos utilizados para a determinação da relação de
troca e da contrapartida da aquisição das participações sociais, pelo órgão de administração das sociedades ou
pelo próprio revisor, indicando, ainda, os valores obtidos através de cada um desses métodos, a importância
relativa que lhes foi conferida na determinação dos valores propostos e, caso sejam utilizados métodos
diferentes nas sociedades participantes na fusão, se se justificava a utilização de métodos diferentes;
d) A descrição das dificuldades especiais de avaliação eventualmente encontradas.
6 – (Anterior n.º 5.)
7 – (Anterior n.º 6.)
Artigo 100.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – A convocatória contém, pelo menos, os seguintes elementos:
a) A menção de que o projeto e a documentação anexa podem ser consultados, na sede de cada sociedade
participante, pelos respetivos sócios e credores sociais, bem como pelos representantes dos trabalhadores ou,
quando estes não existam, pelos trabalhadores da mesma sociedade participante;
b) O aviso aos sócios e credores sociais da respetiva sociedade participante, bem como aos representantes
dos trabalhadores ou, quando estes não existam, aos trabalhadores da mesma sociedade participante, de que
podem apresentar à sociedade, até cinco dias úteis antes da data designada para a reunião da assembleia
geral, observações sobre o projeto de fusão;
c) A data designada para a reunião da assembleia geral.
4 – […]
5 – A publicação do registo do projeto de fusão e do aviso a que se refere a alínea b) do n.º 3 é promovida
de forma oficiosa e automática pelo serviço de registo e contém a indicação de que os credores se podem opor
à fusão nos termos do artigo 101.º-A.
6 – […]
Artigo 101.º-A
[…]
No prazo de três meses após a publicação do registo do projeto, os credores das sociedades participantes
cujos créditos sejam anteriores a essa publicação podem deduzir oposição judicial à fusão, com fundamento no
prejuízo que dela derive para a realização dos seus direitos, desde que tenham solicitado à sociedade a
satisfação do seu crédito ou a prestação de garantia adequada, há pelo menos 15 dias, sem que o seu pedido
tenha sido atendido.
Artigo 117.º-A
[…]
1 – A fusão transfronteiriça realiza-se mediante a reunião numa só de duas ou mais sociedades, desde que
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uma das sociedades participantes na fusão tenha sede em Portugal e outra das sociedades participantes na
fusão tenha sido constituída de acordo com a legislação de um Estado-Membro, nos termos da Diretiva (UE)
2017/1132, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, e tenha a sede estatutária, a
administração central ou o estabelecimento principal no território da União Europeia.
2 – A fusão transfronteiriça pode revestir qualquer das modalidades previstas no n.º 4 do artigo 97.º,
podendo realizar-se, ainda, mediante a transferência global do património de uma ou mais sociedades para
outra sem a emissão de novas participações sociais por esta última, desde que uma pessoa detenha, direta ou
indiretamente, a totalidade das participações sociais das sociedades a fundir ou os sócios das sociedades a
fundir detenham os seus títulos e participações sociais na mesma proporção em todas as sociedades a fundir.
3 – (Anterior n.º 2.)
4 – O regime estabelecido na presente secção não se aplica:
a) Às sociedades que se encontrarem em liquidação e tiverem iniciado a distribuição de ativos aos seus
sócios;
b) Às sociedades que sejam objeto de instrumentos, poderes e mecanismos de resolução previstos no Título
IV da Diretiva 2014/59/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, e nas
correspondentes disposições da legislação que a transpôs para a ordem jurídica interna.
Artigo 117.º-B
[…]
1 – (Anterior corpo do artigo.)
2 – Para o efeito previsto no número anterior, as garantias prestadas aos credores por sociedade
participante num processo de fusão transfronteiriça, nos termos do n.º 1 do artigo 101.º-B, estão sujeitas à
condição de a fusão produzir efeitos nos termos do artigo 117.º-H.
Artigo 117.º-C
Projeto comum e relatório de fusão transfronteiriça
1 – (Anterior proémio do corpo do artigo.)
a) [Anterior alínea a) do corpo do artigo.]
b) [Anterior alínea b) do corpo do artigo.]
c) [Anterior alínea c) do corpo do artigo.]
d) [Anterior alínea d) do corpo do artigo.]
e) O projeto de alteração a introduzir no contrato e, se for caso disso, nos estatutos da sociedade
incorporante, ou o projeto de contrato e, se for caso disso, de estatutos da nova sociedade.
2 – Sem prejuízo do disposto no n.º 11, as administrações de cada uma das sociedades participantes na
fusão elaboram, ainda, um relatório destinado aos sócios e aos trabalhadores do qual constem os fundamentos
jurídico-económicos da fusão, bem como a explicitação das suas implicações para os trabalhadores e para a
atividade futura de cada uma das sociedades participantes na fusão.
3 – Sem prejuízo do disposto nos n.os 9 e 10, o relatório previsto no número anterior inclui uma secção
destinada aos sócios e uma secção destinada aos trabalhadores, podendo estas secções ser inseridas num
relatório único ou constituir dois relatórios separados destinados, respetivamente, aos sócios e aos
trabalhadores.
4 – A secção do relatório destinada aos sócios a que se refere o número anterior deve, em especial,
explicitar os seguintes aspetos:
a) A contrapartida da aquisição das participações sociais a atribuir aos sócios e o método utilizado para a
sua determinação;
b) A relação de troca das participações sociais e, se for caso disso, o método ou os métodos utilizados para
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a sua determinação;
c) As implicações da fusão para os sócios;
d) Os direitos de que dispõem os sócios, nos termos do presente capítulo.
5 – A secção do relatório destinada aos trabalhadores, a que se refere o n.º 3, deve, em especial, explicitar
os seguintes aspetos:
a) As implicações da fusão para as relações de trabalho, bem como, se for caso disso, as medidas
destinadas a salvaguardar essas relações;
b) Quaisquer alterações importantes das condições de trabalho aplicáveis ou dos locais em que a sociedade
exerce a sua atividade;
c) De que forma os fatores previstos nas alíneas anteriores afetam as filiais da sociedade, caso existam.
6 – O relatório ou os relatórios a que se refere o n.º 3 devem ser disponibilizados eletronicamente,
juntamente com o projeto comum de fusão transfronteiriça, aos sócios e aos representantes dos trabalhadores
ou, quando estes não existam, aos trabalhadores da respetiva sociedade participante, com a antecedência
mínima de seis semanas em relação à data designada para a reunião da assembleia geral prevista no n.º 1 do
artigo 117.º-F.
7 – Se, até à data designada para a reunião da assembleia geral prevista no n.º 1 do artigo 117.º-F, a
administração da sociedade receber um parecer dos representantes dos trabalhadores ou, quando estes não
existam, dos trabalhadores da respetiva sociedade participante, relativo aos aspetos a que se referem os n.os 2
e 5 do presente artigo, informa os sócios deste facto e anexa este parecer ao relatório previsto no n.º 2.
8 – No caso previsto no número anterior, a administração da sociedade dirige, até à data designada para a
reunião da assembleia geral prevista no n.º 1 do artigo 117.º-F, resposta fundamentada ao parecer dos
representantes dos trabalhadores ou dos trabalhadores da respetiva sociedade participante.
9 – A secção do relatório destinada aos sócios, a que se refere o n.º 3, não é exigida se todos os sócios e
portadores de outros títulos que confiram direito de voto de todas as sociedades que participam na fusão a
dispensarem.
10 – A secção do relatório destinada aos trabalhadores, a que se refere o n.º 3, não é exigida em relação à
sociedade participante na fusão que, com as suas filiais, caso existam, não tenha trabalhadores em número
superior ao dos membros do seu órgão de administração.
11 – O relatório previsto no n.º 2 não é exigido no caso de, nos termos dos n.os 9 e 10, serem dispensadas
quer a secção destinada aos sócios, quer a secção destinada aos trabalhadores.
12 – O disposto nos números anteriores não prejudica o exercício pelos interessados dos respetivos direitos
de informação e de consulta legalmente previstos.
Artigo 117.º-D
Fiscalização pericial do projeto comum de fusão transfronteiriça
1 – À fiscalização do projeto comum nas sociedades com sede em Portugal participantes numa fusão
transfronteiriça aplica-se o disposto nos n.os 1, 4, 5 e 6 do artigo 99.º, com as especialidades previstas nos
números seguintes.
2 – Mesmo que a sociedade participante na fusão transfronteiriça tenha um órgão de fiscalização, caso em
que é aplicável também o disposto no n.º 1 do artigo 99.º, a administração de cada sociedade participante na
fusão deve promover o exame do projeto comum de fusão por um revisor oficial de contas ou por uma sociedade
de revisores independente de todas as sociedades intervenientes, para o efeito da elaboração do relatório
previsto no n.º 4 do artigo 99.º.
3 – (Anterior n.º 2.)
4 – (Anterior n.º 3.)
5 – Não é exigido o exame do projeto comum de fusão por revisor oficial de contas ou por sociedade de
revisores, a que se refere o n.º 2, se todos os sócios e portadores de outros títulos que confiram direito de voto
de todas as sociedades que participam na fusão o dispensarem.
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Artigo 117.º-F
Aprovação do projeto de fusão – Proteção dos sócios
1 – Devem ser aprovados pela assembleia geral de cada uma das sociedades participantes na fusão
transfronteiriça, através de deliberação:
a) O projeto comum de fusão transfronteiriça; e
b) O projeto de alteração a introduzir no contrato e, se for caso disso, nos estatutos da sociedade
incorporante, ou o projeto de contrato e, se for caso disso, de estatutos da nova sociedade.
2 – Para o efeito do disposto no número anterior, a assembleia geral de cada uma das sociedades
participantes não pode deliberar sem que tenha tomado conhecimento do relatório da administração destinado
aos sócios e aos trabalhadores, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-C, do relatório do revisor ou das sociedades de
revisores oficiais de contas, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-D e no n.º 4 do artigo 99.º, e das observações a
que se refere a alínea b) do n.º 3 do artigo 100.º, em qualquer dos casos se existirem.
3 – (Anterior n.º 2.)
4 – (Anterior n.º 3.)
5 – Sem prejuízo do disposto no presente Código em matéria de invalidade do contrato de sociedade e das
deliberações dos sócios, não constituem fundamento autónomo de impugnação da aprovação do projeto comum
de fusão transfronteiriça:
a) A fixação inadequada da relação de troca das participações sociais a que se refere a alínea e) do n.º 1 do
artigo 98.º;
b) A fixação inadequada da contrapartida da aquisição das participações sociais a que se refere a alínea j)
do n.º 1 do artigo 98.º;
c) O incumprimento dos requisitos legais nas informações prestadas relativamente à relação de troca das
participações sociais, a que se refere a alínea a), ou à contrapartida da aquisição das participações sociais, a
que se refere a alínea anterior.
6 – Qualquer sócio de sociedade participante com sede em Portugal que considere que a contrapartida da
aquisição das suas participações sociais, oferecida no projeto comum de fusão, é inadequada tem o direito de
pedir ao tribunal, no prazo de seis meses a contar da data da deliberação de fusão, que seja fixada contrapartida
adequada, a qual deve ser calculada nos termos previstos no artigo 105.º e com referência ao momento da
deliberação.
7 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, para além dos casos em que a lei e o contrato de
sociedade atribuem ao sócio o direito de se exonerar da sociedade, o sócio de sociedade participante com sede
em Portugal que tenha votado contra o projeto de fusão transfronteiriça tem, ainda, o direito de exigir, no prazo
de um mês a contar da data da deliberação de fusão, que a sociedade adquira ou faça adquirir a sua participação
social mediante contrapartida adequada, desde que, em virtude da fusão, lhe tenham sido atribuídas
participações sociais na sociedade resultante da fusão regidas pela legislação de um outro Estado-Membro da
União Europeia.
8 – O pedido de exoneração previsto no número anterior pode ser comunicado pelo sócio à sociedade
participante na fusão por correio eletrónico, devendo esta indicar um endereço para a respetiva receção.
9 – À exoneração pedida nos termos do n.º 7 aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no
artigo 105.º.
10 – O sócio que tenha pedido a sua exoneração nos termos dos números anteriores e que considere que
a contrapartida da aquisição das suas participações sociais, oferecida pela sociedade participante na fusão, não
foi adequadamente fixada tem o direito de pedir ao tribunal, no prazo de seis meses a contar da data da
deliberação, uma contrapartida suplementar.
11 – O exercício dos direitos a que se referem os n.os 6 a 10 não impede a inscrição definitiva da fusão no
registo comercial, com os efeitos previstos no artigo 117.º-H.
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Artigo 117.º-G
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – A emissão de certificado referido na alínea a) do número anterior pressupõe a verificação do
cumprimento dos atos e das formalidades prévios à fusão, em face das disposições legais aplicáveis, do projeto
comum registado e publicado, dos relatórios dos órgãos da sociedade e dos peritos que, no caso, devam existir,
bem como dos demais documentos instrutórios previstos no n.º 2 do artigo 74.º-A do Código do Registo
Comercial.
4 – Para o efeito previsto no número anterior, os serviços do registo comercial examinam, ainda, a
informação, comunicada por cada uma das sociedades participantes que tenham sede em Portugal, de que se
iniciou o processo de participação dos trabalhadores.
5 – O controlo da legalidade previsto na alínea a) do n.º 2 é realizado no prazo máximo de três meses, a
contar da receção pelos serviços do registo comercial de todos os documentos previstos no n.º 3, podendo estes
serviços, para esse efeito, consultar outras autoridades competentes nos diferentes domínios abrangidos pela
fusão transfronteiriça, incluindo as do Estado-Membro da sociedade que resultará da fusão, obter dessas
autoridades e das sociedades participantes na fusão as informações e os documentos necessários, bem como
recorrer a um perito independente.
6 – O certificado prévio é emitido se os serviços do registo comercial verificarem que foram cumpridos os
atos e as formalidades prévios à fusão.
7 – O certificado prévio não é emitido sempre que os serviços do registo comercial verifiquem:
a) Que não foi cumprido qualquer ato ou formalidade prévio à fusão, caso em que os serviços do registo
comercial informam as sociedades participantes em causa dos fundamentos da decisão e podem conceder-lhes
um prazo razoável para cumprir os procedimentos e as formalidades necessários; ou
b) Que, nos termos do direito nacional e numa avaliação caso a caso, a fusão prossegue fins abusivos ou
fraudulentos, que conduzam ou visem conduzir à fraude ou à evasão ao direito da União Europeia ou ao direito
nacional, ou prossegue fins criminosos.
8 – Para o efeito previsto na alínea b) do número anterior, se, no decurso do controlo da legalidade, os
serviços do registo comercial tiverem sérias dúvidas que indiciem que a fusão prossegue fins abusivos ou
fraudulentos, ou fins criminosos, devem tomar em consideração os factos e as circunstâncias pertinentes,
nomeadamente, se for caso disso e sem os considerar isoladamente, fatores indicativos que tenham chegado
ao seu conhecimento no âmbito desse controlo da legalidade ou em resultado da consulta a outras autoridades
competentes.
9 – Se, para o efeito do controlo da legalidade a que se refere o número anterior, for necessário ter em conta
informações suplementares ou realizar outras diligências de investigação, o prazo de três meses previsto no n.º
5 pode ser prorrogado por um período máximo de três meses.
10 – Se, devido à complexidade do procedimento transfronteiriço, não for possível efetuar o controlo da
legalidade dentro dos prazos previstos nos n.os 5 e 9, os serviços de registo comercial, antes do termo desses
prazos, informam as sociedades participantes em causa dos fundamentos dessa impossibilidade.
11 – (Anterior n.º 4.)
12 – (Anterior n.º 5.)
Artigo 117.º-H
[…]
1 – (Anterior corpo do artigo.)
2 – No prazo de dois meses a contar da inscrição da fusão transfronteiriça no registo comercial, a sociedade
resultante da fusão deve proceder ao pagamento de todas as contrapartidas da aquisição das participações
sociais oferecidas no projeto comum de fusão aos sócios das sociedades participantes.
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Artigo 117.º-I
[…]
1 – O disposto na presente secção aplica-se, com as exceções estabelecidas nos números seguintes, à
incorporação por uma sociedade de outra ou de outras de cujas quotas ou ações aquela seja a única titular,
diretamente ou por pessoas que, direta ou indiretamente, detenham essas participações por conta dela, mas
em nome próprio, desde que a sociedade incorporante não atribua novas participações sociais no âmbito da
fusão.
2 – Não são aplicáveis, neste caso, as disposições relativas à troca e à contrapartida da aquisição de
participações sociais, ao relatório da administração destinado aos sócios e aos trabalhadores da sociedade
incorporada, nem aos relatórios de peritos da sociedade incorporada, e os sócios da sociedade incorporada não
se tornam sócios da sociedade incorporante.
3 – […]
4 – No caso de ser dispensada a aprovação do projeto comum de fusão pelas assembleias gerais de todas
as sociedades participantes na fusão, nos termos do número anterior, devem ser disponibilizados com a
antecedência mínima de um mês a contar da data em que a sociedade tomar a decisão sobre a fusão:
a) O projeto comum de fusão transfronteiriça;
b) Um aviso aos sócios, credores e representantes dos trabalhadores da sociedade objeto de fusão ou,
quando estes não existam, aos próprios trabalhadores, de que podem apresentar à respetiva sociedade, até
cinco dias úteis antes da data em que a sociedade tomará a decisão sobre a fusão, observações sobre o projeto
comum de fusão transfronteiriça;
c) O relatório da administração destinado aos sócios e aos trabalhadores, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-
C;
d) O relatório do revisor ou das sociedades de revisores oficiais de contas, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-
D e no n.º 4 do artigo 99.º».
Artigo 3.º
Alteração ao Código do Registo Comercial
Os artigos 3.º, 10.º-A e 74.º-A do Código do Registo Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 403/86, de 3
de dezembro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 3.º
[…]
1 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
l) […]
m) […]
n) […]
o) […]
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p) O projeto de fusão interna ou transfronteiriça, o projeto de cisão interna ou transfronteiriça e o projeto de
transformação transfronteiriça de sociedades, bem como o aviso aos sócios, credores e representantes dos
trabalhadores, ou, quando estes não existam, aos próprios trabalhadores, da possibilidade de apresentação de
observações ao projeto de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriças;
q) […]
r) A prorrogação, a fusão interna ou transfronteiriça, a cisão interna ou transfronteiriça, a transformação
interna ou transfronteiriça e a dissolução das sociedades, bem como o aumento, a redução ou a reintegração
do capital social e qualquer outra alteração ao contrato de sociedade;
s) […]
t) […]
u) […]
v) […]
x) […]
z) […]
2 – […]
3 – […]
Artigo 10.º-A
[…]
1 – […]
a) As alterações ao contrato de sociedade registadas, designadamente as relativas à firma ou à
denominação, à sede e à natureza jurídica da sociedade, bem como a designação e a cessação de funções dos
membros dos órgãos sociais;
b) […]
c) […]
2 – […]
Artigo 74.º-A
[…]
1 – […]
2 – O pedido de emissão do certificado previsto no número anterior deve ser instruído com os seguintes
documentos:
a) O projeto comum de fusão transfronteiriça, previsto no n.º 1 do artigo 117.º-C do Código das Sociedades
Comerciais;
b) O relatório da administração destinado aos sócios e aos trabalhadores, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-
C do Código das Sociedades Comerciais, incluindo o parecer dos trabalhadores a que se refere o n.º 7 do
mesmo artigo, em qualquer dos casos se existirem;
c) O relatório do revisor ou das sociedades de revisores oficiais de contas, previsto no n.º 2 do artigo 117.º-
D e no n.º 4 do artigo 99.º do Código das Sociedades Comerciais, se existir;
d) As observações a que se refere a alínea b) do n.º 3 do artigo 100.º do Código das Sociedades Comerciais,
se existirem;
e) A informação sobre a aprovação, pela assembleia geral de cada uma das sociedades participantes na
fusão, dos projetos a que se refere o n.º 1 do artigo 117.º-F do Código das Sociedades Comerciais;
f) A informação sobre o cumprimento das regras relativas à participação dos trabalhadores previstas na lei
nacional, designadamente no Código das Sociedades Comerciais e no Capítulo II da Lei n.º 19/2009, de 12 de
maio, incluindo no que diz respeito aos procedimentos através dos quais são determinados o regime aplicável,
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as disposições pertinentes e as eventuais opções quanto a essas disposições.
3 – […]»
Artigo 4.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 24/2019, de 1 de fevereiro,
Os artigos 6.º, 7.º e 8.º do Decreto-Lei n.º 24/2019, de 1 de fevereiro, na sua redação atual, passam a ter a
seguinte redação:
«Artigo 6.º
[…]
1 – […]:
a) As alterações ao contrato de sociedade registadas, designadamente, as relativas à firma ou à
denominação, à sede e à natureza jurídica da sociedade, bem como a designação e a cessação de funções dos
membros dos órgãos sociais;
b) […]
c) […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
Artigo 7.º
Fusões, cisões e transformações transfronteiriças
1 – O registo comercial nacional notifica, através do Sistema de Interconexão, o registo competente do
Estado-Membro de cada uma das sociedades participantes na fusão, na cisão ou na transformação
transfronteiriça, com sede na União Europeia:
a) Do registo do projeto de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriça, consoante os casos;
b) Da emissão do certificado prévio de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriça, consoante os
casos.
2 – O registo comercial nacional notifica, através do Sistema de Interconexão, o registo competente do
Estado-Membro do início da produção de efeitos de cada uma das sociedades, com sede na União Europeia,
participantes na fusão, na cisão ou na transformação, respetivamente.
3 – O registo comercial nacional, após a receção da notificação feita pelo registo competente do Estado-
Membro, nos termos previstos no número anterior, procede oficiosamente ao registo da fusão, da cisão ou da
transformação transfronteiriça na sociedade incorporada, cindida ou objeto da transformação, respetivamente,
com sede em Portugal e, quando seja o caso, ao subsequente cancelamento oficioso da matrícula.
Artigo 8.º
[…]
1 – […]:
a) […]
b) […]
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c) Alterações ao contrato de sociedade, incluindo a prorrogação da sociedade, bem como a fusão, a cisão
e a transformação transfronteiriças;
d) […]
e) […]
f) […]
g) Projeto de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriças;
h) Aviso aos sócios, credores e representantes dos trabalhadores ou, em caso de inexistência de
representantes, aos próprios trabalhadores, da possibilidade de apresentação de observações ao projeto de
fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriça, até cinco dias úteis antes da data da assembleia geral;
i) Certificado prévio à fusão, à cisão ou à transformação transfronteiriças;
j) [Anterior alínea g).]
k) [Anterior alínea h).]
l) [Anterior alínea i).]
m) [Anterior alínea j).]
n) [Anterior alínea k).]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – Com exceção dos documentos previstos nas alíneas g) e h) do n.º 1, pela disponibilização ao público
da informação prevista no presente artigo são devidos os emolumentos fixados no Regulamento Emolumentar
dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro, na sua redação atual.
6 – O certificado prévio à fusão, à cisão ou à transformação transfronteiriças, previsto na alínea i) do n.º 1,
é também disponibilizado de forma gratuita às autoridades competentes para a fiscalização da legalidade da
fusão, da cisão ou da transformação transfronteiriça, respetivamente, através do Sistema de Interconexão.»
Artigo 5.º
Alteração ao Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado
Os artigos 15.º e 22.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo Decreto-Lei
n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 15.º
(…)
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) Os registos realizados oficiosamente nos termos do artigo 67.º-A, dos n.os 4 e 5 do 67.º-C e do n.º 2 do
67.º-D do Código do Registo Comercial;
h) […]
i) […]
2 – […]:
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
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e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
Artigo 22.º
[…]
1 – […]
2 – […]:
2.1 – […]
2.2 – […]
2.3 – […]
2.4 – […]
2.5 – Fusão, cisão ou transformação:
2.5.1 – Pelo depósito do projeto de fusão, cisão ou transformação –120 €;
2.5.2 – Pela inscrição da fusão, da cisão ou da transformação – 225 €;
2.6 – […]
2.7 – […]
2.8 – […]
2.9 – […]
2.10 – […]
2.11 – […]
2.12 – (Revogado.)
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – […]
12 – […]
13 – […]
14 – […]
15 – […]
16 – […]
17 – Pela emissão dos certificados previstos nos artigos 36.º-A, 74.º-A, 74.º-B ou 74.º-C do Código do Registo
Comercial – 250 €.
18 – […]
19 – […]
20 – […]
21 – […]
22 – […]
23 – […]
24 – […]
25 – […]
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26 – […]»
Artigo 6.º
Aditamento à Lei n.º 19/2009, de 12 de maio
São aditados à Lei n.º 19/2009, de 12 de maio, os artigos 26.º-A e 26.º-B, com a seguinte redação:
«Artigo 26.º-A
Participação dos trabalhadores na cisão e na transformação transfronteiriças
O disposto nas secções anteriores é aplicável, com as necessárias adaptações, à cisão e à transformação
transfronteiriças, realizadas nos termos dos artigos 129.º-A a 129.º-L e 140.º-B a 140.º-N, respetivamente, do
Código das Sociedades Comerciais.
Artigo 26.º-B
Informação e consulta dos trabalhadores
1 – Aos trabalhadores das sociedades objeto de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriça são
assegurados os direitos à informação e à consulta relativamente aos respetivos projetos e documentos conexos,
nos termos do Código do Trabalho e da Lei n.º 96/2009, de 3 de setembro.
2 – Os direitos de informação e de consulta dos trabalhadores são exercidos antes da tomada de decisão
sobre o projeto de fusão, de cisão ou de transformação transfronteiriça, ou relativamente ao relatório do órgão
de administração destinado aos sócios e aos trabalhadores, consoante o que ocorrer primeiro, de modo a dar
uma resposta fundamentada aos trabalhadores antes da assembleia geral de aprovação do respetivo projeto.»
Artigo 7.º
Aditamento ao Código das Sociedades Comerciais
São aditados ao Código das Sociedades Comerciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de
setembro, na sua redação atual, os artigos 122.º-A, 129.º-A a 129.º-L, 139.º-A e 140.º-B a 140.º-N, com a
seguinte redação:
«Artigo 122.º-A
Responsabilidade emergente da cisão
Os membros do órgão de administração de cada uma das sociedades participantes são solidariamente
responsáveis pelos danos causados pela cisão à sociedade e aos seus sócios e credores, desde que, na
verificação da situação patrimonial das sociedades e na conclusão da cisão, não tenham observado a diligência
de um gestor criterioso e ordenado.
Artigo 129.º-A
Noção e âmbito
1 – A cisão transfronteiriça realiza-se mediante a divisão de uma ou mais sociedades, desde que uma das
sociedades participantes na cisão tenha sede em Portugal e outra das sociedades participantes na cisão tenha
sido constituída de acordo com a legislação de um Estado-Membro, nos termos da Diretiva (UE) 2017/1132, do
Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2017, e tenha a sede estatutária, a administração central
ou o estabelecimento principal no território da União Europeia.
2 – É permitido a uma sociedade:
a) Cindir-se parcialmente, transferindo parte do seu património para uma ou mais sociedades beneficiárias,
mediante a atribuição aos sócios da sociedade cindida de títulos e participações sociais em quaisquer das
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sociedades abrangidas pela cisão transfronteiriça e o eventual pagamento de uma quantia em dinheiro não
superior a 10 % do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do pagamento de uma quantia em dinheiro não
superior a 10 % do valor contabilístico dos títulos ou participações sociais;
b) Cindir-se totalmente, transferindo todo o seu património para duas ou mais sociedades beneficiárias,
tendo sido dissolvida sem entrar em liquidação, mediante a atribuição aos sócios da sociedade cindida de títulos
e participações sociais das sociedades beneficiárias e o eventual pagamento de uma quantia em dinheiro não
superior a 10 % do valor nominal ou, na falta de valor nominal, do pagamento de uma quantia em dinheiro não
superior a 10 % do valor contabilístico dos títulos ou participações sociais;
c) Cindir-se por separação, transferindo parte do seu património para uma ou mais sociedades beneficiárias,
mediante a emissão de títulos ou participações sociais das sociedades beneficiárias à sociedade cindida.
3 – Apenas se consideram abrangidas nos números anteriores as sociedades comerciais de algum dos tipos
identificados no Anexo II da Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento e do Conselho, de 14 de junho de 2017.
4 – O regime estabelecido na presente secção não se aplica:
a) Às cisões transfronteiriças que envolvem uma sociedade cujo objeto seja o investimento coletivo de
capitais obtidos junto do público, que funcione segundo o princípio da diversificação dos riscos e cujas
participações sejam, a pedido dos portadores, resgatadas ou reembolsadas, direta ou indiretamente, a partir dos
ativos dessa sociedade;
b) Às sociedades que se encontrarem em liquidação e tiverem iniciado a distribuição de ativos aos seus
sócios;
c) Às sociedades que sejam objeto de instrumentos, poderes e mecanismos de resolução previstos no Título
IV da Diretiva 2014/59/UE, do Parlamento e do Conselho, de 15 de maio de 2014, e nas correspondentes
disposições da legislação que a transpôs para a ordem jurídica interna.
Artigo 129.º-B
Direito aplicável
1 – São aplicáveis às sociedades com sede em Portugal participantes num processo de cisão
transfronteiriça as disposições da presente secção e, subsidiariamente, as disposições relativas às cisões
internas, em especial no que respeita ao processo de tomada de decisão relativo à cisão, e, ainda, o disposto
relativamente à fusão transfronteiriça.
2 – Aos procedimentos e às formalidades a cumprir para a obtenção do certificado prévio à cisão
transfronteiriça aplica-se o direito do Estado-Membro da sociedade cindida, aplicando-se aos procedimentos e
às formalidades posteriores à receção do certificado prévio o direito do Estado-Membro da sociedade
beneficiária.
Artigo 129.º-C
Projeto de cisão transfronteiriça
1 – Compete à administração da sociedade a cindir, ou às administrações das sociedades participantes, em
conjunto, elaborar o projeto de cisão transfronteiriça, do qual constem os seguintes elementos:
a) O tipo, a firma e a sede da sociedade cindida, bem como o tipo, a firma e a sede propostos para a
sociedade ou as sociedades beneficiárias;
b) As regras de atribuição de troca de títulos ou de participações sociais representativos do capital social da
sociedade cindida e das sociedades beneficiárias, bem como o montante de eventuais pagamentos em dinheiro;
c) A proposta de calendário indicativo para a cisão transfronteiriça;
d) As repercussões prováveis da cisão transfronteiriça nas relações de trabalho;
e) A data a partir da qual os títulos, ou as participações sociais, representativos do capital social das
sociedades conferem aos portadores o direito de participação nos lucros, assim como quaisquer condições
especiais relativas a esse direito;
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f) A data a partir da qual as operações da sociedade cindida serão consideradas, para efeitos contabilísticos,
efetuadas por conta das sociedades beneficiárias;
g) Os privilégios especiais atribuídos aos membros dos órgãos de administração, fiscalização ou controlo da
sociedade cindida;
h) Os direitos dos sócios e as regras para o seu exercício;
i) Os atos constitutivos e os estatutos das sociedades beneficiárias, bem como qualquer alteração da
sociedade cindida, em caso de cisão parcial ou por separação;
j) Os direitos de participação dos trabalhadores nas sociedades beneficiárias;
k) Avaliação e informação sobre a repartição ou conservação do património atribuído a cada sociedade
envolvida na cisão transfronteiriça;
l) A data das contas da sociedade cindida utilizadas para estabelecer as condições da cisão transfronteiriça;
m) As garantias oferecidas aos credores.
2 – O disposto nas alíneas b) e f) do número anterior não se aplica à cisão transfronteiriça por separação.
Artigo 129.º-D
Relatório do órgão de administração destinado aos sócios e aos trabalhadores
1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 9, a administração da sociedade a cindir, ou as administrações das
sociedades participantes, em conjunto, elaboram um relatório destinado aos sócios e aos trabalhadores, do qual
constem os fundamentos jurídico-económicos da cisão transfronteiriça, bem como a explicitação das suas
implicações para os trabalhadores e para a atividade futura de cada uma das sociedades resultantes da cisão.
2 – Sem prejuízo do disposto nos n.os 7 e 8, o relatório previsto no número anterior inclui uma secção
destinada aos sócios e uma secção destinada aos trabalhadores, podendo estas secções ser inseridas num
relatório único ou constituir dois relatórios separados destinados, respetivamente, aos sócios e aos
trabalhadores.
3 – A secção do relatório destinada aos sócios, a que se refere o número anterior, deve, em especial, indicar:
a) A contrapartida da aquisição a atribuir aos sócios e o método utilizado para a sua determinação;
b) A relação de troca de participações sociais e, se for caso disso, o método ou os métodos utilizados para
a sua determinação;
c) As implicações da cisão transfronteiriça para os sócios;
d) Os direitos de que dispõem os sócios, nos termos do presente capítulo.
4 – A secção do relatório destinada aos trabalhadores a que se refere o n.º 2 deve, em especial, explicitar
os seguintes aspetos:
a) As implicações da cisão transfronteiriça para as relações de trabalho, bem como, se for caso disso, as
medidas destinadas a salvaguardar essas relações;
b) Quaisquer alterações importantes das condições de trabalho aplicáveis ou dos locais em que a sociedade
exerce a sua atividade;
c) De que forma os fatores previstos as alíneas anteriores afetam as filiais da sociedade.
5 – O relatório ou os relatórios a que se refere o n.º 2 devem ser disponibilizados eletronicamente,
juntamente com o projeto de cisão transfronteiriça, aos sócios e aos representantes dos trabalhadores da
sociedade cindida ou, quando estes não existam, aos trabalhadores da respetiva sociedade cindida, com a
antecedência mínima de seis semanas em relação à data designada para a assembleia geral de aprovação do
projeto de cisão.
6 – Se, até à data designada para a assembleia geral de aprovação do projeto de cisão, a administração da
sociedade receber um parecer dos representantes dos trabalhadores ou, dos trabalhadores da respetiva
sociedade cindida, relativo aos aspetos a que se referem os n.os 1 e 4, informa os sócios deste facto e anexa
este parecer ao relatório previsto no n.º 1.
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7 – A secção do relatório destinada aos sócios, a que se refere o n.º 2, não é exigida se todos os sócios e
portadores de outros títulos que confiram direito de voto da sociedade cindida a dispensarem.
8 – A secção do relatório destinada aos trabalhadores, a que se refere o n.º 2, não é exigida em relação à
sociedade participante na cisão que, com as suas filiais, caso existam, não tenha trabalhadores em número
superior ao dos membros do seu órgão de administração.
9 – O relatório previsto no n.º 1 não é exigido no caso de, nos termos dos n.os 7 e 8, serem dispensadas
quer a secção destinada aos sócios, quer a secção destinada aos trabalhadores.
10 – O disposto nos números anteriores não prejudica o exercício pelos interessados dos respetivos direitos
de informação e de consulta legalmente previstos.
Artigo 129.º-E
Fiscalização pericial do projeto de cisão transfronteiriça
1 – À fiscalização do projeto nas sociedades com sede em Portugal participantes numa cisão transfronteiriça
aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os 1, 4, 5 e 6 do artigo 99.º, com as especialidades
previstas nos artigos seguintes.
2 – A administração da sociedade a cindir, ou as administrações das sociedades participantes, em conjunto,
devem promover, pelo menos um mês antes da assembleia geral da sociedade cindida de aprovação do projeto
de cisão, o exame do projeto de cisão por revisor oficial de contas ou por uma sociedade de revisores
independente de todas as sociedades intervenientes, para o efeito da elaboração do relatório previsto no n.º 4
do artigo 99.º
3 – O relatório é um parecer fundamentado sobre a adequação e a razoabilidade da relação de troca das
participações sociais e da contrapartida da aquisição, devendo ter em conta, ao avaliar esta última, o eventual
preço de mercado das participações sociais das sociedades participantes na cisão antes do anúncio do projeto
de cisão ou o valor das sociedades, excluindo o efeito da cisão projetada, determinado segundo métodos de
avaliação geralmente aceites.
4 – O relatório previsto no número anterior indica, pelo menos:
a) O método ou os métodos utilizados para a determinação da relação de troca de participações sociais
proposta;
b) O método ou os métodos utilizados para a determinação da contrapartida da aquisição proposta;
c) A justificação da aplicação ao caso concreto dos métodos utilizados para a determinação da relação de
troca de participações sociais e da contrapartida da aquisição, pelo órgão de administração das sociedades ou
pelo próprio revisor, indicando, ainda, os valores obtidos através de cada um desses métodos, a importância
relativa que lhes foi conferida na determinação dos valores propostos e, caso sejam utilizados métodos
diferentes nas sociedades participantes na fusão, se se justificava a utilização de métodos diferentes;
d) A descrição das dificuldades especiais de avaliação eventualmente encontradas.
5 – Se todas as sociedades participantes na cisão transfronteiriça assim o desejarem, o exame pericial do
projeto de cisão pode ser feito quanto a todas elas pelo mesmo revisor ou sociedade de revisores, que elabora
um relatório único destinado a todos os sócios das sociedades participantes.
6 – Nos casos previstos no número anterior, recaindo a escolha das sociedades participantes num revisor
português ou numa sociedade de revisores portuguesa, a sua designação fica a cargo da Ordem dos Revisores
Oficiais de Contas, que procede à nomeação, a solicitação conjunta das sociedades participantes.
7 – Não é exigido o exame do projeto de cisão transfronteiriça por revisor oficial de contas ou por sociedade
de revisores, a que se refere o n.º 2, se todos os sócios da sociedade cindida o desejarem.
8 – O disposto no presente artigo não se aplica à cisão transfronteiriça por separação.
Artigo 129.º-F
Aprovação do projeto de cisão transfronteiriço
1 – Devem ser aprovados pela assembleia geral de cada uma das sociedades participantes na cisão
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transfronteiriça, através de deliberação:
a) O projeto de cisão transfronteiriça; e
b) O projeto de alteração a introduzir no contrato e, se for caso disso, nos estatutos da sociedade
beneficiária, ou o projeto de contrato e, se for caso disso, de estatutos da nova sociedade.
2 – Para o efeito do disposto no número anterior, a assembleia geral de cada uma das sociedades
participantes na cisão transfronteiriça não pode deliberar sem que tenha tomado conhecimento do relatório de
administração destinado aos sócios e aos trabalhadores, previsto no artigo 129.º-D, e do relatório do revisor
oficial de contas ou de uma sociedade de revisores, previsto no artigo 129.º-E.
3 – Aplicam-se à aprovação do projeto de cisão transfronteiriça, pelas assembleias gerais das sociedades
participantes com sede em Portugal, as disposições dos artigos 102.º e 103.º.
4 – A assembleia geral de qualquer das sociedades participantes pode subordinar a realização da cisão
transfronteiriça à condição de serem aprovadas, nessa assembleia, as disposições relativas à participação dos
trabalhadores na sociedade beneficiária.
5 – Sem prejuízo do disposto no presente Código em matéria de invalidade do contrato de sociedade e das
deliberações dos sócios, não constituem fundamento autónomo de impugnação da aprovação do projeto comum
de cisão transfronteiriça:
a) A fixação inadequada da relação de troca das participações sociais a que se refere a alínea e) do n.º 1 do
artigo 98.º;
b) A fixação inadequada da contrapartida da aquisição a que se refere a alínea j) do n.º 1 do artigo 98.º;
c) O incumprimento dos requisitos legais por parte das informações prestadas relativamente à relação de
troca das participações sociais, a que se refere a alínea a), ou à contrapartida da aquisição, a que se refere a
alínea anterior.
Artigo 129.º-G
Proteção dos sócios
1 – Qualquer sócio de sociedade participante com sede em Portugal que considere que a contrapartida da
aquisição das suas participações sociais, oferecida no projeto de cisão transfronteiriça, é inadequada tem o
direito de pedir ao tribunal, no prazo de seis meses a contar da data da deliberação de cisão, que seja fixada
contrapartida adequada, a qual deve ser calculada nos termos previstos no artigo 105.º e com referência ao
momento da deliberação.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, para além dos casos em que a lei e o contrato atribuem
ao sócio o direito de se exonerar da sociedade, o sócio da sociedade participante com sede em Portugal que
tenha votado contra o projeto de cisão transfronteiriça tem o direito de exigir, no prazo de um mês a contar da
data da deliberação, que a sociedade adquira, ou faça adquirir, a sua participação social mediante contrapartida
adequada, desde que, em virtude da cisão, lhe tenham sido atribuídas participações sociais na sociedade
beneficiária regidas pela legislação de outro Estado-Membro da União Europeia.
3 – O pedido de exoneração previsto no número anterior pode ser comunicado pelo sócio à sociedade
participante na cisão transfronteiriça por correio eletrónico, devendo esta indicar um endereço para a respetiva
receção.
4 – À exoneração pedida nos termos do n.º 2 aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto no
artigo 105.º.
5 – No prazo de dois meses a contar da inscrição da cisão transfronteiriça no registo comercial, a sociedade
resultante da cisão deve proceder ao pagamento da contrapartida da aquisição aos sócios especificada no
projeto de cisão.
6 – O sócio que tenha decidido exercer o direito de alienar as participações sociais e que considere que a
contrapartida da aquisição oferecida pela sociedade beneficiária não foi adequadamente fixada tem o direito de
pedir ao tribunal, no prazo de seis meses a contar da data da deliberação, uma contrapartida da aquisição
suplementar.
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7 – O disposto no presente artigo não se aplica à cisão transfronteiriça por separação.
Artigo 129.º-H
Proteção dos credores
1 – No prazo de três meses a contar da publicação do projeto de cisão transfronteiriça, os credores que
demonstrem, fundamentadamente, que a cisão compromete a satisfação dos seus créditos e que a sociedade
não lhes ofereceu as garantias adequadas, podem requerer judicialmente a obtenção de garantias adequadas.
2 – A prestação de garantias depende da produção de efeitos da cisão transfronteiriça.
3 – A sociedade beneficiária e, em caso de cisão transfronteiriça parcial ou por separação, a sociedade
cindida são solidariamente responsáveis perante a sociedade à qual é atribuído o elemento passivo do
património para o cumprimento das obrigações, até ao limite do valor líquido dos elementos ativos do património.
Artigo 129.º-I
Certificado prévio à cisão transfronteiriça
1 – As autoridades competentes para o controlo da legalidade da cisão transfronteiriça são os serviços do
registo comercial.
2 – O controlo da legalidade da cisão transfronteiriça é realizado no prazo máximo de três meses a contar
da data de receção pelos serviços do registo comercial dos documentos e das informações sobre a aprovação
da cisão transfronteiriça pela assembleia geral da sociedade cindida.
3 – Os serviços do registo comercial devem analisar os seguintes elementos:
a) Os documentos apresentados nos termos do número anterior;
b) A informação de início do procedimento de participação dos trabalhadores, se aplicável.
4 – O certificado prévio é emitido se os serviços do registo comercial verificarem que foram cumpridos os
atos e as formalidades prévias à cisão.
5 – O certificado prévio não é emitido sempre que os serviços de registo comercial verifiquem:
a) Que não foi cumprido qualquer ato ou formalidade prévia à cisão, caso em que os serviços do registo
comercial informam a sociedade dos fundamentos da decisão e podem conceder-lhe um prazo razoável para
cumprir os procedimentos e as formalidades necessários;
b) Que, nos termos do direito nacional e numa avaliação caso a caso, a cisão prossegue fins abusivos ou
fraudulentos, que conduzam ou visem conduzir à fraude ou à evasão ao direito da União Europeia ou ao direito
nacional, ou prossegue fins criminosos.
6 – O prazo previsto no n.º 2 pode ser prorrogado por um período máximo de três meses, para a obtenção
de informações ou a realização de atividades de investigação suplementares.
7 – Se os serviços de registo comercial não efetuarem a avaliação dentro dos prazos previstos, devido à
complexidade do procedimento transfronteiriço, o requerente é notificado dos motivos antes do termo desses
prazos.
Artigo 129.º-J
Efeitos do registo da cisão transfronteiriça
1 – A partir da data do registo da cisão transfronteiriça no registo comercial, produzem-se os seguintes
efeitos:
a) Em caso de cisão transfronteiriça total:
i) A transferência para as sociedades beneficiárias de todo o património da sociedade cindida, incluindo a
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totalidade dos contratos, créditos, direitos e obrigações, nos termos indicados no projeto de cisão
transfronteiriça;
ii) Os sócios da sociedade cindida tornam-se sócios das sociedades beneficiárias de acordo com a
atribuição das participações sociais indicada no projeto de cisão transfronteiriça, salvo se tiverem
alienado as suas participações sociais nos termos do n.º 1 do artigo 129.º-G;
iii) Os direitos e obrigações da sociedade cindida decorrentes de contratos ou relações de trabalho,
existentes à data em que a cisão transfronteiriça começa a produzir efeitos, são transferidos para as
sociedades beneficiárias;
iv) A sociedade cindida deixa de existir;
b) Em caso de cisão transfronteiriça parcial:
i) A transferência para as sociedades beneficiárias de parte do património da sociedade cindida, incluindo
os contratos, créditos, direitos e obrigações, enquanto a parte restante é conservada pela sociedade
cindida, nos termos indicados no projeto de cisão transfronteiriça;
ii) Alguns dos sócios da sociedade cindida tornam-se sócios da sociedade ou sociedades beneficiárias, de
acordo com a atribuição das participações sociais indicada no projeto de cisão transfronteiriça, salvo se
tiverem alienado as suas participações sociais nos termos do n.º 1 do artigo 129.º-G;
iii) Os direitos e obrigações da sociedade cindida decorrentes de contratos ou relações de trabalho,
existentes à data em que a cisão transfronteiriça começa a produzir efeitos, são transferidos para as
sociedades beneficiárias, nos termos indicados no projeto de cisão transfronteiriça;
c) Em caso de cisão transfronteiriça por separação:
i) Os efeitos previstos nas subalíneas i) e iii) da alínea anterior;
ii) As participações sociais da sociedade ou das sociedades beneficiárias são atribuídas à sociedade
cindida.
2 – Em caso de cisão transfronteiriça parcial ou por separação, se um elemento do património da sociedade
cindida não for expressamente atribuído no projeto de cisão transfronteiriça e não for possível decidir como
reparti-lo, o património ativo, o seu contravalor ou o elemento do património passivo é repartido entre todas as
sociedades beneficiárias e a sociedade cindida, proporcionalmente ao património ativo líquido atribuído a cada
sociedade no projeto de cisão transfronteiriça.
3 – As participações sociais de uma sociedade beneficiária não podem ser trocadas por participações
sociais na sociedade cindida detidas pela sociedade ou por pessoa que atue por conta da sociedade.
Artigo 129.º-K
Fiscalização da legalidade da cisão transfronteiriça
1 – As autoridades competentes para o controlo da legalidade da cisão transfronteiriça, regida pelo direito
das sociedades beneficiárias com sede em Portugal no que diz respeito à sua aprovação e conclusão, são os
serviços do registo comercial.
2 – A sociedade cindida deve apresentar aos serviços de registo comercial o projeto de cisão transfronteiriça
aprovado em assembleia geral.
3 – Os serviços de registo comercial devem aceitar o certificado prévio à cisão como comprovativo da boa
execução dos procedimentos e das formalidades prévios à cisão, aplicáveis no Estado-Membro da União
Europeia da sociedade cindida, sem os quais a cisão transfronteiriça não pode ser aprovada.
4 – Os serviços de registo comercial procedem ao registo definitivo da cisão transfronteiriça quando
concluírem que todas os procedimentos e formalidades foram devidamente preenchidas nos Estados-Membros
da União Europeia das sociedades beneficiárias.
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Artigo 129.º-L
Validade da cisão transfronteiriça
A cisão transfronteiriça que cumpra os requisitos legalmente previstos, e que tenha começado a produzir
efeitos nos termos do artigo 129.º-J, não pode ser declarada nula.
Artigo 139.º-A
Responsabilidade emergente da transformação
Os membros do órgão de administração da sociedade transformada são solidariamente responsáveis pelos
danos causados pela transformação à sociedade e aos seus sócios e credores, desde que, na verificação da
situação patrimonial da sociedade e na conclusão da transformação, não tenham observado a diligência de um
gestor criterioso e ordenado.
Artigo 140.º-B
Noção e âmbito
1 – A transformação transfronteiriça realiza-se através da operação pela qual uma sociedade, sem ser
dissolvida ou liquidada ou entrar em liquidação, mantendo a sua personalidade jurídica, converte:
a) A forma jurídica sob a qual se encontra registada em Portugal para uma forma jurídica prevista no Estado-
Membro para o qual transfere a sua sede estatutária; ou
b) A forma jurídica sob a qual se encontra registada noutro Estado-Membro para uma forma prevista pelo
direito nacional, transferindo a sua sede estatutária para Portugal.
2 – Apenas se consideram abrangidas no número anterior as sociedades comerciais de algum dos tipos
identificados no Anexo II da Diretiva (UE) 2017/1132, do Parlamento e do Conselho, de 14 de junho de 2017.
3 – A presente secção não é aplicável às transformações transfronteiriças que envolvam uma sociedade
cujo objeto seja o investimento coletivo de capitais obtidos junto do público, que funcione segundo o princípio
da diversificação dos riscos e cujas participações sejam, a pedido dos portadores, resgatadas ou reembolsadas,
direta ou indiretamente, a partir dos ativos dessa sociedade.
4 – Para o efeito previsto no número anterior, são equiparadas a resgates ou a reembolsos as medidas
adotadas pela sociedade para garantir que o valor em bolsa das suas unidades de participação não se desvie
sensivelmente do seu valor líquido.
5 – Ficam igualmente excluídas do âmbito de aplicação da presente secção:
a) As sociedades que se encontrarem em liquidação e tiverem iniciado a distribuição de ativos aos seus
sócios;
b) As sociedades que sejam objeto de instrumentos, poderes e mecanismos de resolução previstos no Título
IV da Diretiva 2014/59/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, e nas
correspondentes disposições da legislação que a transpôs para a ordem jurídica interna;
c) As sociedades sujeitas a processos de insolvência ou regimes de reestruturação preventiva; e
d) As sociedades comerciais sujeitas a medidas de prevenção de crises na aceção do ponto 101 do n.º 1 do
artigo 2.º da Diretiva 2014/59/UE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014.
Artigo 140.º-C
Direito aplicável
1 – Aos processos de transformação transfronteiriça aplicam-se as disposições da presente secção e,
subsidiariamente, as disposições relativas às transformações internas, em especial no que respeita ao processo
de tomada de decisão relativo à transformação, à proteção dos credores das sociedades objeto de
transformação, dos credores obrigacionistas e dos direitos dos trabalhadores que não sejam regulados por lei
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especial, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
2 – Aos procedimentos e às formalidades a cumprir para a obtenção do certificado prévio à transformação
transfronteiriça aplica-se o direito do Estado-Membro de partida, ou seja, aquele em que a sociedade se encontra
registada, aplicando-se aos procedimentos e às formalidades posteriores à receção do certificado prévio o direito
do Estado-Membro de destino, ou seja, aquele para o qual a sociedade transfere o seu registo e a sua sede
estatutária.
Artigo 140.º-D
Projeto de transformação transfronteiriça
A administração da sociedade a transformar elabora projeto de transformação transfronteiriça, do qual
constem os seguintes elementos:
a) A forma jurídica, a firma e a sede;
b) A forma jurídica e a denominação propostas para a sociedade transformada no Estado-Membro de destino
e a localização proposta da sua sede estatutária;
c) O ato constitutivo da sociedade no Estado-Membro de destino, se for o caso, e os estatutos, se estes
forem objeto de um ato separado;
d) A proposta de calendário indicativo para a transformação transfronteiriça;
e) Os direitos conferidos pela sociedade transformada aos sócios que gozam de direitos especiais e aos
portadores de títulos diferentes dos representativos do capital social da sociedade, ou as medidas propostas em
relação aos mesmos;
f) Quaisquer garantias oferecidas aos credores;
g) Quaisquer vantagens especiais concedidas aos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização;
h) Quaisquer incentivos ou subsídios recebidos pela sociedade no Estado-Membro de partida nos cinco anos
anteriores;
i) Informações sobre a compensação pecuniária a atribuir aos sócios nos termos do artigo 140.º-I que
votaram;
j) As repercussões prováveis da transformação transfronteiriça nas relações de trabalho;
k) As informações sobre os procedimentos mediante os quais se determinam os regimes de participação
dos trabalhadores na definição dos seus direitos de participação na sociedade transformada, quando aplicáveis.
Artigo 140.º-E
Relatório do órgão de administração destinado aos sócios e aos trabalhadores
1 – O órgão de administração da sociedade elabora um relatório destinado aos sócios e aos trabalhadores,
do qual constem os fundamentos jurídico-económicos da transformação transfronteiriça, bem como a
explicitação das suas implicações para os trabalhadores e para a atividade futura da sociedade.
2 – O relatório previsto no número anterior inclui uma secção destinada aos sócios e uma secção destinada
aos trabalhadores, podendo estas secções ser inseridas num relatório único ou constituir dois relatórios
separados destinados, respetivamente, aos sócios e aos trabalhadores.
3 – A secção do relatório ou o relatório destinado aos sócios deve, em especial, indicar:
a) A compensação pecuniária e o método utilizado para a sua determinação;
b) As implicações da transformação transfronteiriça para os sócios;
c) Os direitos dos sócios, nos termos do artigo 140.º-I.
4 – Não é exigível a secção ou o relatório destinado aos sócios se todos os sócios da sociedade tiverem
deliberado dispensar essa obrigação ou no caso de se tratar de sociedade unipessoais.
5 – A secção do relatório ou o relatório destinado aos trabalhadores deve, em especial, indicar:
a) As implicações da transformação transfronteiriça para as relações de trabalho, bem como, se for caso
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disso, as medidas destinadas a salvaguardar essas relações;
b) Quaisquer alterações importantes das condições de trabalho aplicáveis ou dos locais em que a sociedade
exerce a sua atividade;
c) De que forma os fatores previstos nas alíneas anteriores afetam as filiais da sociedade.
6 – A secção do relatório ou o relatório destinado aos trabalhadores não é exigível se uma sociedade e as
suas filiais, caso existam, não tiverem mais trabalhadores além dos membros do órgão de administração.
7 – O relatório previsto no n.º 1 não é exigido quando se verifiquem cumulativamente as situações previstas
nos n.os 4 e 6.
8 – O relatório ou os relatórios devem ser disponibilizados eletronicamente, juntamente com o projeto de
transformação transfronteiriça pelo menos seis semanas antes da data da assembleia geral a que se refere o
artigo 140.º-G.
9 – Se o órgão de administração da sociedade receber, em tempo útil, um parecer sobre as informações a
que se referem os n.os 1 e 5 apresentado pelos representantes dos trabalhadores ou, quando estes não existam,
pelos próprios trabalhadores, os sócios devem ser informados desse facto e o parecer anexado ao respetivo
relatório.
10 – O disposto nos números anteriores não prejudica o exercício pelos interessados dos respetivos direitos
de informação e de consulta legalmente previstos.
Artigo 140.º-F
Fiscalização pericial do projeto de transformação transfronteiriça
1 – O projeto de transformação transfronteiriça é examinado por um revisor oficial de contas ou por uma
sociedade de revisores independente, que elabora um relatório disponibilizado aos sócios pelo menos um mês
antes da data da assembleia geral a que se refere o artigo 140.º-G.
2 – O relatório referido no número anterior deve incluir o parecer do revisor oficial de contas ou da sociedade
de revisores sobre a adequação e razoabilidade da compensação pecuniária, tendo em conta, designadamente,
o eventual preço de mercado das participações sociais na sociedade antes do anúncio do projeto de
transformação ou o valor da sociedade, excluindo o efeito da transformação projetada, determinado segundo
métodos de avaliação comummente aceites.
3 – Para efeitos do número anterior, relatório deve indicar:
a) O método ou os métodos seguidos para determinar a compensação pecuniária proposta;
b) A declaração sobre se o método ou os métodos seguidos são adequados para o cálculo da compensação
pecuniária, a indicação do valor obtido utilizando esses métodos e a emissão de um parecer sobre a importância
relativa concedida a esses métodos para determinar o valor fixado; e
c) A descrição das dificuldades especiais de avaliação eventualmente encontradas.
4 – O revisor oficial de contas ou a sociedade de revisores têm o direito de obter da sociedade todas as
informações necessárias ao desempenho das suas funções.
5 – Não são exigíveis a análise e o relatório a que se refere o n.º 1 se todos os sócios da sociedade tiverem
deliberado a respetiva dispensa ou no caso de se tratar de sociedade unipessoal.
Artigo 140.º-G
Registo, publicação e consulta do projeto e convocação da assembleia
1 – O projeto de transformação transfronteiriça deve ser registado, sendo de imediato publicado.
2 – O projeto de transformação transfronteiriça deve ser submetido a deliberação dos sócios, sendo a
respetiva assembleia geral convocada para se reunir decorrido, pelo menos, um mês sobre a data da publicação
da convocatória.
3 – A convocatória deve mencionar que o projeto e a documentação anexa podem ser consultados na sede
da sociedade, pelos sócios, credores sociais, representantes dos trabalhadores ou, quando estes não existam,
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pelos trabalhadores.
4 – A convocatória é automática e gratuitamente publicada em simultâneo com a publicação do registo do
projeto, se os elementos referidos no número anterior forem indicados no pedido de registo do projeto.
5 – A publicação do registo do projeto é promovida de forma oficiosa e automática pelo serviço de registo e
contém a indicação de que os sócios, os credores, e os representantes dos trabalhadores, ou, quando estes
não existam, os trabalhadores, podem apresentar à sociedade, até cinco dias úteis antes da data da assembleia
geral, observações sobre o projeto de transformação transfronteiriça.
6 – Os documentos publicados nos termos do presente número devem ser acessíveis pelo sistema de
interconexão dos registos.
7 – À consulta dos documentos relativos à transformação é aplicável, com as necessárias adaptações, o
estabelecido no artigo 101.º.
Artigo 140.º-H
Aprovação do projeto de transformação
1 – A transformação da sociedade deve ser deliberada pelos sócios, nos termos prescritos para o respetivo
tipo de sociedade.
2 – A assembleia geral pode subordinar a realização da transformação transfronteiriça à condição de serem
aprovadas nessa assembleia as disposições relativas à participação dos trabalhadores na sociedade resultante
da transformação.
3 – Sem prejuízo do disposto no presente Código em matéria de invalidade do contrato de sociedade e das
deliberações dos sócios, não constitui fundamento de impugnação da deliberação da assembleia geral:
a) A fixação inadequada da compensação pecuniária oferecida aos sócios, nos termos da alínea i) do artigo
140.º-D;
b) O incumprimento dos requisitos legais nas informações prestadas relativamente à compensação prevista
na alínea anterior:
Artigo 140.º-I
Proteção dos sócios
1 – Para além dos casos em que a lei e o contrato atribuem ao sócio o direito de se exonerar da sociedade,
qualquer sócio da sociedade a transformar que tenha votado contra o projeto de transformação transfronteiriça
tem o direito de, no prazo de um mês a contar da data da deliberação, alienar as suas participações sociais
mediante o pagamento da compensação pecuniária referida na alínea i) do artigo 140.º-D.
2 – O pedido de exoneração previsto no número anterior pode ser comunicado pelo sócio à sociedade por
correio eletrónico, devendo esta indicar um endereço para a respetiva receção.
3 – À exoneração pedida nos termos do n.º 1 aplica-se, com as necessárias adaptações, o disposto nos n.os
1 e 5 do artigo 105.º
4 – No prazo de dois meses após a inscrição da transformação transfronteiriça no registo comercial, a
sociedade transformada deve proceder ao pagamento da compensação pecuniária referida na alínea i) do artigo
140.º-D.
5 – Caso o sócio considere que a compensação pecuniária referida na alínea i) do artigo 140.º-D não foi
adequadamente fixada tem o direito de requerer judicialmente, no prazo de seis meses a contar da data da
deliberação de transformação, a fixação de contrapartida suplementar adequada, aplicando-se, com as
necessárias adaptações, o estabelecido nos artigos 1068.º e 1069.º do Código de Processo Civil.
6 – Os tribunais portugueses serão exclusivamente competentes para as ações respeitantes ao exercício
dos direitos dos sócios, os quais serão regulados pelo direito português.
Artigo 140.º-J
Proteção dos credores
1 – No prazo de três meses a contar da publicação do projeto de transformação transfronteiriça, os credores
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com créditos anteriores que ainda não estejam vencidos nessa data e que considerem insuficientes as garantias
previstas na alínea f) do artigo 140.º-D podem requerer judicialmente a determinação de garantias adequadas,
com fundamento no prejuízo que decorra da transformação transfronteiriça para a satisfação dos seus direitos.
2 – As garantias previstas no projeto de transformação transfronteiriça estão sujeitas à condição de a
transformação transfronteiriça produzir efeitos.
3 – A decisão judicial que ordenar a prestação de garantias adequadas fica sujeita à produção de efeitos da
transformação transfronteiriça.
4 – Os credores cujos créditos sejam anteriores à data de publicação do projeto de transformação
transfronteiriça podem, nos dois anos imediatamente posteriores à produção de efeitos da transformação,
intentar nos tribunais portugueses ações contra a sociedade, sem prejuízo de outras regras de competência
aplicáveis.
5 – O disposto no n.º 1 não afasta a aplicação das normas de direito português em matéria de cumprimento
ou de garantia de obrigações pecuniárias ou não pecuniárias de que sejam titulares o Estado e outras entidades
públicas.
Artigo 140.º-K
Certificado prévio da transformação
1 – As autoridades competentes para o controlo da legalidade das transformações transfronteiriças são os
serviços do registo comercial.
2 – O controlo da legalidade previsto no número anterior abrange a prática dos seguintes atos:
a) A emissão de um certificado prévio à transformação que comprove o cumprimento dos atos e das
formalidades anteriores à transformação no que diz respeito às partes do procedimento que se regem pelo direito
nacional enquanto Estado-Membro de partida;
b) A fiscalização da legalidade da transformação transfronteiriça quando a sociedade vise transferir o seu
registo e a sua sede estatutária para o território nacional.
3 – A emissão de certificado referido na alínea a) do número anterior pressupõe a verificação do
cumprimento das formalidades prévias à transformação e da conformidade dos elementos dos elementos
constantes do n.º 2 do artigo 74.º-C do Código do Registo Comercial, em face das disposições legais aplicáveis.
4 – A verificação a que se refere a alínea a) do n.º 2 é efetuada no prazo de três meses, a contar da data
de receção dos documentos e das informações sobre a aprovação da transformação transfronteiriça, e
determina:
a) A emissão do certificado prévio à transformação; ou
b) A conceção de um prazo para correção dos procedimentos e das formalidades necessários.
5 – O prazo a que se refere o número anterior pode ser prorrogado por um período máximo de três meses
caso resulte necessária avaliação relativa à licitude dos fins visados com a transformação transfronteiriça.
6 – Se, devido à complexidade do procedimento transfronteiriço, não for possível efetuar a avaliação dentro
dos prazos previstos nos n.os 4 e 5, os serviços do registo comercial notificam o requerente dos respetivos
motivos antes do termo desses prazos.
7 – Não é emitido certificado prévio caso se determine que a transformação prossegue fins abusivos,
fraudulentos ou criminosos
8 – Para efeitos do disposto na alínea b) do n.º 2 verificam-se, em especial, os seguintes elementos:
a) A aprovação do projeto de transformação transfronteiriça pela assembleia geral;
b) A fixação das disposições relativas à participação dos trabalhadores, em conformidade com as regras
legais aplicáveis, nos casos em que a mesma seja necessária.
9 – Para o efeito do controlo referido na alínea b) do n.º 2, o pedido de registo da transformação
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transfronteiriça deve ser apresentado ao serviço do registo comercial pela sociedade, acompanhado do
certificado referido na alínea a) do mesmo número e do projeto de transformação transfronteiriça aprovado pela
assembleia geral, no prazo de seis meses após a emissão do certificado.
Artigo 140.º-L
Efeitos do registo da transformação transfronteiriça
A transformação transfronteiriça produz efeitos a partir da data do respetivo registo e determina que:
a) Todo o património da sociedade, incluindo a totalidade dos contratos, créditos, direitos e obrigações,
passa a ser da sociedade transformada;
b) Os sócios da sociedade continuam a ser sócios da sociedade transformada, salvo se tiverem votado
contra a aprovação do projeto de transformação e, em consequência, optado pela alienação da sua participação;
c) Os direitos e as obrigações da sociedade decorrentes de contratos de trabalho ou de relações de trabalho
existentes à data em que a transformação transfronteiriça começa a produzir efeitos passam a ser da sociedade
transformada.
Artigo 140.º-M
Fiscalização da legalidade da transformação transfronteiriça
1 – As autoridades competentes para o controlo da legalidade da transformação transfronteiriça quando
Portugal é o Estado-Membro de destino, no que diz respeito à sua aprovação e conclusão, são os serviços do
registo comercial.
2 – A sociedade transformada deve apresentar aos serviços do registo comercial o projeto de transformação
aprovado em assembleia geral.
3 – Os serviços do registo comercial devem aceitar o certificado prévio à transformação como comprovativo
da boa execução dos procedimentos e das formalidades prévios à transformação, aplicáveis no Estado-Membro
de origem da sociedade transformada, sem os quais a transformação transfronteiriça não pode ser aprovada.
4 – Os serviços do registo comercial procedem ao registo definitivo da transformação transfronteiriça
quando concluírem que todos os procedimentos e formalidades foram devidamente cumpridos.
Artigo 140.º-N
Validade da transformação transfronteiriça
A transformação transfronteiriça que cumpra os requisitos legalmente previstos, e que tenha começado a
produzir efeitos, nos termos do artigo 140.º-L, não pode ser declarada nula.»
Artigo 8.º
Aditamento ao Código do Registo Comercial
São aditados ao Código do Registo Comercial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 403/86, de 3 de dezembro, na
sua redação atual, os artigos 67.º-C, 67.º-D, 74.º-B e 74.º-C, com a seguinte redação:
«Artigo 67.º-C
Registo da cisão
1 – O registo da cisão interna na sociedade cindida determina a realização oficiosa do registo de constituição
das novas sociedades resultantes da cisão.
2 – No caso do registo da cisão transfronteiriça, aplica-se o disposto no número anterior às sociedades
participantes na cisão que tenham sede em território nacional.
3 – O registo de cisão transfronteiriça na sociedade cindida determina a notificação desse facto e do
consequente início de produção de efeitos, através do sistema de interconexão dos registos da União Europeia,
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aos registos competentes dos Estados-Membros da sede das novas sociedades resultantes da cisão ou das
sociedades beneficiárias.
4 – A receção da notificação do início da produção de efeitos de cisão transfronteiriça, prevista no número
anterior, efetuada por registo competente do respetivo Estado-Membro da União Europeia, determina a
realização oficiosa do registo de constituição das sociedades beneficiárias e a notificação desse facto, através
do sistema de interconexão dos registos da União Europeia, ao registo competente do Estado-Membro da
sociedade cindida.
5 – A receção de todas as notificações a efetuar pelos registos competentes dos Estados-Membros das
sociedades beneficiárias, nos termos do número anterior, determina o cancelamento da matrícula da sociedade
totalmente cindida que esteja sediada em território nacional.
Artigo 67.º-D
Registo de transformação transfronteiriça
1 – O registo de transformação transfronteiriça efetuado sobre a sociedade transformada, quando sediada
em território nacional, determina a notificação desse facto e do consequente início de produção de efeitos,
através do sistema de interconexão dos registos da União Europeia, ao registo competente do Estado-Membro
de partida, onde estava sediada a sociedade objeto de transformação.
2 – A receção da notificação do início da produção de efeitos da transformação transfronteiriça, efetuada
por registo competente do Estado-Membro da União Europeia, enquanto Estado-Membro de destino, determina
a realização oficiosa do registo da transformação transfronteiriça e o cancelamento da matrícula da sociedade
objeto de transformação que esteja sediada em território nacional.
Artigo 74.º-B
Certificado prévio à cisão transfronteiriça
1 – A emissão do certificado ou dos certificados comprovativos do cumprimento dos atos e das formalidades
prévios à cisão transfronteiriça, relativamente à sociedade ou às sociedades participantes com sede em território
nacional, pode ser solicitada, após o registo do respetivo projeto, em qualquer serviço de registo com
competência para a prática de atos de registo comercial.
2 – O requerimento para obtenção do certificado prévio à cisão, apresentado pela sociedade cindida, deve
ser acompanhado dos seguintes elementos:
a) Projeto de cisão transfronteiriça;
b) Relatório do órgão de administração destinado aos sócios e aos trabalhadores e relatório de perito, sem
prejuízo do disposto nos n.os 7 a 9 do artigo 129.º-D do Código das Sociedades Comerciais;
c) Informação sobre a aprovação da cisão transfronteiriça pela assembleia geral;
d) Observações sobre o projeto de cisão transfronteiriça.
3 – A apresentação dos documentos referidos no número anterior é dispensada sempre que estes se
encontrem arquivados em serviço de registo nacional.
Artigo 74.º-C
Certificado prévio à transformação transfronteiriça
1 – A emissão do certificado comprovativo do cumprimento dos atos e das formalidades prévios à
transformação transfronteiriça, relativamente à sociedade com sede em território nacional, pode ser solicitada,
após o registo do respetivo projeto, em qualquer serviço de registo com competência para a prática de atos de
registo comercial.
2 – O requerimento para obtenção do certificado prévio à transformação deve ser acompanhado dos
seguintes elementos:
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a) Projeto de transformação transfronteiriça;
b) Relatório do órgão de administração destinado aos sócios e aos trabalhadores e relatório de perito, que,
no caso, devam existir;
c) Informação sobre a aprovação da transformação transfronteiriça pela assembleia geral;
d) Observações sobre o projeto de transformação transfronteiriça.
3 – A apresentação dos documentos referidos no número anterior é dispensada sempre que estes se
encontrem arquivados em serviço de registo nacional.»
Artigo 9.º
Alteração à organização sistemática da Lei n.º 19/2009, de 12 de maio
É aditada ao Capítulo II da Lei n.º 19/2009, de 12 de maio, a Secção VI, com a epígrafe «Disposições
complementares» e composta pelos artigos 26.º-A e 26.º-B.
Artigo 10.º
Alteração à organização sistemática do Código das Sociedades Comerciais
São introduzidas as seguintes alterações à organização sistemática do Código das Sociedades Comerciais,
aprovado pelo Decreto-Lei n.º 262/86, de 2 de setembro, na sua redação atual:
a) A Secção I do Capítulo IX do Título I passa a ter como epígrafe «Fusão interna»;
b) A Secção II do Capítulo IX do Título I passa a ter como epígrafe «Fusão transfronteiriça»;
c) O Capítulo X do Título I passa a estar dividido em duas secções, nos seguintes termos:
i) A Secção I com a epígrafe «Cisão interna» e composta pelos artigos 118.º a 129.º;
ii) A Secção II com a epígrafe «Cisão transfronteiriça» e composta pelos artigos 129.º-A a 129.º-L;
d) O Capítulo XI do Título I passa a estar dividido em duas secções, nos seguintes termos:
i) A Secção I com a epígrafe «Transformação interna» e composta pelos artigos 130.º a 140.º-A;
ii) A Secção II com a epígrafe «Transformação transfronteiriça» e composta pelos artigos 140.º-B a 140.º-
N.
Artigo 11.º
Norma revogatória
É revogado o n.º 2.12 do artigo 22.º do Regulamento Emolumentar dos Registos e Notariado, aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 322-A/2001, de 14 de dezembro, na sua redação atual.
Artigo 12.º
Entrada em vigor
O presente decreto-lei entra em vigor 30 dias após a sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de ….
O Primeiro-Ministro, … — A Ministra da Justiça, ….
———
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 673/XV/1.ª (2)
RECOMENDA AO GOVERNO QUE CONDENE A APROVAÇÃO DA LEGISLAÇÃO ANTI-LGBTI+ NO
UGANDA, QUE INTEGRE AS QUESTÕES LGBTI+ NA COOPERAÇÃO PORTUGUESA E QUE CRIE
MEDIDAS PARA ACOLHIMENTO E INTEGRAÇÃO DE REFUGIADOS LGBTI+ UGANDESES E DE
OUTROS PAÍSES DE ORIGEM EM PORTUGAL
Exposição de motivos
No passado dia 2 de maio o Parlamento da República do Uganda aprovou1 uma das mais restritivas leis
contra pessoas lésbicas, gays, bissexuais, trans e intersexo (LGBTI+) do mundo, com apenas um voto contra.
A legislação aprovada reforça a criminalização das relações entre pessoas LGBTI+, introduzida no período
colonial,2 incluindo através da aplicação da pena de morte em casos específicos como ter relação sexual com
uma pessoa seropositiva, pune a «promoção da homossexualidade» (incluindo a atividade de organizações não
governamentais) e obriga cidadãos e cidadãs a denunciar às autoridades pessoas e entidades que estejam
envolvidas em «atos e atividades homossexuais». Trata-se de uma lei persecutória e violadora dos mais básicos
direitos humanos.
Segundo a Amnistia Internacional, a 3 de agosto de 2022 as autoridades nacionais fecharam a organização
não governamental (ONG) LGBTI+ Sexual Minorities Uganda (SMUG), alegando que a mesma não cumpria os
requisitos de registo previstos na lei sobre as ONG, de 2016, quando, em 2018, e depois de um processo judicial,
o Estado proibiu o seu registo, alegando que o nome da ONG era «indesejável e irregistável». O ataque
institucional contra a SMUG insere-se num contexto de repressão generalizada do espaço cívico3 e de aumento
da perseguição pública contra as pessoas LGBTI+; em maio de 2022 dois funcionários da SMUG foram presos
em Kampala por «promoção da homossexualidade».4
De acordo com as associações locais, a discussão e aprovação desta legislação aumentou o discurso de
ódio, ameaças e agressões contra pessoas LGBTI+ no Uganda.5 Aliás, em março último, não só o Presidente
Museveni afirmou publicamente que a sociedade ugandesa considerava as pessoas LGBTI+ como
«desviantes», com comportamentos «fora da norma», como a Presidente do Parlamento instou os Deputados a
resistir a pressões internacionais para revisão e veto à lei agora aprovada.6
Em 2022, no âmbito dos trabalhos da Revisão Periódica Universal das Nações Unidas, a Áustria, a
Dinamarca e a Irlanda7 expressaram preocupação com a situação das pessoas LGBTI+ no Uganda e 18 países,
incluindo Portugal,8 emitiram recomendações ao Uganda para promoção e defesa dos direitos das pessoas
LGBTI+ e do trabalho de organizações da sociedade civil. Nenhuma destas recomendações foi aceite.9
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Deputado do Livre propõe à
Assembleia da República que, através do presente projeto de resolução, delibere recomendar ao Governo que:
1 – Condene publicamente e em todos os fóruns internacionais, nomeadamente nas Nações Unidas,
instituições europeias e Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a adoção da legislação anti-LGBTI+ no
Uganda;
2 – Integre oficialmente as questões LGBTI+ na política de cooperação portuguesa para o desenvolvimento;
3 – Crie medidas específicas para acolhimento e integração em Portugal de cidadãos LGBTI+ ugandeses e
de outros países de origem, candidatos e beneficiários de proteção internacional.
1 Legislação anti-LGBTQ aprovada pelo Parlamento do Uganda | África | PÚBLICO (publico.pt) 2 Refworld | State-sponsored Homophobia: A world survey of laws criminalising same-sex sexual acts between consenting adults pág 39. 3 A 10 de agosto de 2021 foram encerradas 54 ONG no Uganda: World Report 2023: Uganda | Human Rights Watch (hrw.org) 4 Human rights in Uganda Amnesty International 5 Uganda waters down anti-gay law − BBC News 6 Legislação anti-LGBTQ aprovada pelo Parlamento do Uganda | África | PÚBLICO (publico.pt) 7 G2230083.pdf (un.org) paras. 80, 102 e 122. 8 i.d. paras. 125.76 a 125.94 referentes às recomendações dos seguintes países: Itália, Malta, México, Portugal, Noruega, Espanha, Estados Unidos da América, Uruguai, Argentina, Austrália, Luxemburgo, Canadá, Chile, República Dominicana, Equador, França, Islândia e Irlanda. 9 G2232384.pdf (un.org)
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Assembleia da República, 5 de maio de 2023.
O Deputado do L, Rui Tavares.
(2) O título e o texto iniciais foram publicados no DAR II Série-A n.º 218 (2023.05.05) e foram substituídos, a pedido do autor, em 31 de
maio de 2023.
———
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 738/XV/1.ª
PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE FUNCIONAMENTO DA COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO
CONSTITUCIONAL
De acordo com o disposto no n.º 2 da Deliberação n.º 9-PL/2022 [publicada no Diário da Assembleia da
República, II Série-A, n.º 129 (1.ª Sessão Legislativa/XV Legislatura) 1.º Suplemento, de 14 de dezembro de
2022], o prazo de funcionamento da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional foi fixado em 90 dias,
«prorrogáveis por decisão do Plenário da Assembleia da República e a solicitação da própria comissão». Este
prazo foi, entretanto, prorrogado por mais 90 dias, em 7 de fevereiro de 2023, através da Deliberação n.º 1-
PL/2023.
Tendo em conta o aprofundado debate que cada uma das 393 propostas constantes dos vários projetos de
revisão constitucional, incidindo sobre os 186 artigos da Constituição, tem merecido, de acordo com o
compromisso assumido pelos representantes de todas as forças políticas na Comissão no sentido de uma
análise em qualidade e profundidade sobre todas as matérias, o prazo em curso revela-se manifestamente
insuficiente.
Na verdade, à primeira leitura dos projetos, ainda em curso, seguir-se-á uma fase de audições e audiências,
de apresentação de propostas de alteração e subsequentes votações indiciárias, o que não é passível de ficar
concluído no prazo em vigor, com termo no início de julho, antes exigindo um período temporal não inferior ao
que decorre até ao fim do ano civil.
Assim, na sequência de solicitação da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, a Assembleia da
República delibera prorrogar o prazo de funcionamento da Comissão por 180 dias.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
O Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 739/XV/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO O REFORÇO URGENTE DOS MEIOS DE POLICIAMENTO E DE
EMERGÊNCIA E SOCORRO NO CONCELHO DE ALBUFEIRA
Exposição de Motivos
O concelho de Albufeira tem um registo de população residente, de acordo com os dados do último Censos
de 2021, de 44 164 habitantes, sendo o segundo concelho do Algarve que mais cresceu entre 2011 e 2021
(8,2%).
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Contudo, todos os indicadores apontam que este concelho nunca terá presente menos de 60 000 pessoas,
número que aumenta gradualmente com o chegar do verão, atingindo meio milhão de pessoas em permanência,
diariamente, durante o mês de agosto.
O Algarve, segundo o último relatório do INE (estatísticas do turismo), representa cerca de 30 % das dormidas
nacionais e Albufeira representa cerca 40 % das dormidas no Algarve, logo, cerca de 12 % das dormidas a nível
nacional.
O setor do turismo gerou em 2022, em Portugal, 22 mil milhões de euros de receitas e uma grande fatia
dessa receita, com base no número de dormidas suprarreferidos, foi gerada em Albufeira.
Os concelhos vizinhos de Albufeira, com uma população efetiva semelhante e muito menos afluência
turística, possuem mais meios policiais, humanos e materiais, tendo alguns destes, durante todo o ano uma
força de intervenção policial que marca presença frequente nas zonas de diversão noturna.
Segundo o recente Relatório Anual de Segurança Interna (RASI), o concelho de Albufeira foi em 2022, no
Algarve, o segundo concelho algarvio com mais participações criminais registadas, 3507.
Os recentes e trágicos acontecimentos em Albufeira, que culminaram com a lamentável morte de uma jovem
de 19 anos, no passado mês de abril, poderia ter sido evitada com uma efetiva presença policial na zona do
trágico acontecimento, conhecida pela intensa vida noturna.
O concelho de Albufeira necessita de maior atenção por parte do Governo, em matéria de segurança de
pessoas e bens e de meios de emergência e socorro, sob pena de prejudicar a sua imagem nacional e
internacional como destino turístico de excelência.
Face ao exposto, consideramos que Albufeira não pode esperar até ao próximo mês de julho pelo reforço
policial de verão, à semelhança de anos anteriores, carecendo de medidas urgentes a fim de garantir a
segurança da população residente e turística.
Neste sentido, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do
PSD propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo o seguinte:
1 – Proceda de imediato a um reforço policial significativo em meios humanos e materiais, com especial
atenção para a maior visibilidade e presença nas zonas de diversão noturna, durante o horário de funcionamento
dos bares e discotecas, e horários de encerramento dos mesmos;
2 – Redimensione os meios policias e os meios de emergência e socorro, humanos e materiais, presentes
durante todo o ano em Albufeira, proporcionalmente à importância do concelho enquanto destino turístico que
regista cerca 12 % das dormidas nacionais, e consequentemente gerador de uma muito significativa receita para
o PIB nacional;
3 – Reforce com a maior brevidade os meios de emergência e socorro em Albufeira, no âmbito das suas
competências, em coordenação com os Bombeiros Voluntários de Albufeira e com a Cruz Vermelha Portuguesa;
4 – Desbloqueie de imediato o processo de requalificação/construção do novo posto territorial da GNR em
Olhos de Água, definido como intervenção prioritária na Lei de Programação de Infraestruturas e Equipamentos
das Forças de Segurança e que se encontra por concretizar há pelo menos sete anos.
Palácio de São Bento, 31 de maio de 2023.
Os Deputados do PSD: Luís Gomes — Ofélia Ramos — Rui Cristina.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 740/XV/1.ª
DESLOCAÇÃO DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA A PALERMO
Texto do projeto de resolução
S. Ex.ª o Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 129.º e da alínea b) do artigo 163.º
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da Constituição, o assentimento da Assembleia da República para se deslocar a Palermo, entre os dias 26 e 27
de junho, em Visita Oficial, para participar no XVI Encontro da COTEC Europa.
Assim, apresento à Assembleia da República, nos termos regimentais, o seguinte projeto de resolução:
«A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 163.º e do n.º 5 do artigo 166.º da
Constituição, dar assentimento à deslocação de S. Ex.ª o Presidente da República a Palermo, entre os dias 26
e 27 de junho, em Visita Oficial, para participar no XVI Encontro da COTEC Europa.»
Palácio de São Bento, 1 de junho de 2023.
O Presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva.
Mensagem do Presidente da República
Estando prevista a minha deslocação a Palermo entre os dias 26 e 27 de junho próximo, em Visita Oficial,
para participar no XVI Encontro da COTEC Europa, venho requerer, nos termos dos artigos 129.º, n.º 1, e 163.º,
alínea b), da Constituição, o necessário assentimento da Assembleia da República.
Lisboa, 31 de maio de 2023.
O Presidente da República,
(Marcelo Rebelo de Sousa)
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PROPOSTA DE RESOLUÇÃO N.º 11/XV/1.ª
(APROVA AS EMENDAS DE 2016 À CONVENÇÃO DO TRABALHO MARÍTIMO, 2006, ADOTADAS
PELA CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DO TRABALHO)
Parecer da Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas
Índice
Parte I – Considerandos
Parte II – Opinião do Deputado autor do parecer
Parte III – Conclusões e parecer
PARTE I – Considerandos
1. Nota Introdutória
Ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição da República Portuguesa e do
artigo 198.º do Regimento da Assembleia da República, o Governo tomou a iniciativa de apresentar, a 21 de
abril de 2023, a Proposta de Resolução n.º 11/XV, que aprova as Emendas de 2016 à Convenção do Trabalho
Marítimo, 2006, adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho.
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Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República, de 26 de abril de 2023, a iniciativa em
apreço foi admitida e baixou à Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas, tendo sido
designado como relator o Deputado autor deste parecer, em reunião ordinária da mesma Comissão.
Conforme exarado na respetiva nota de admissibilidade, a presente iniciativa parece cumprir todos os
requisitos formais de admissibilidade previstos quer na Constituição da República Portuguesa, quer no
Regimento da Assembleia da República.
2. Âmbito e objetivos da iniciativa
A proposta de resolução em análise tem por finalidade a aprovação das Emendas de 2016 ao código da
Convenção do Trabalho Marítimo, adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho, na sua 105.ª sessão,
realizada em Genebra, a 9 de junho de 2016.
De acordo com o texto da iniciativa, a Convenção do Trabalho Marítimo (CTM), adotada pela Conferência
Internacional do Trabalho (CIT) na sua 94.ª Sessão, em Genebra, no dia 23 de fevereiro de 2006, foi aprovada
para ratificação pelo Estado português através da Resolução da Assembleia da República n.º 4/2015 e ratificada
pelo Decreto do Presidente da República n.º 7/2015, ambos publicados no Diário da República, 1.ª Série, n.º 7,
de 12 de janeiro, tendo entrado em vigor na ordem jurídica portuguesa a 12 de maio de 2017, conforme Aviso
n.º 118/2016, publicado no Diário da República, 1.ª Série, n.º 236, de 12 de dezembro, e de acordo com o
prescrito no n.º4 do Artigo VIII da CTM.
A Convenção acima referenciada é também conhecida como «Declaração de direitos marítimos» e visa
estabelecer as condições mínimas de trabalho e de vida para os marítimos a bordo de navios da marinha de
comércio, prevendo obrigações para os armadores, para os Estados de bandeira, os Estados do porto e para
os Estados fornecedores de mão-de-obra.
No decorrer da 105.ª sessão da CIT, a 9 de junho de 2016, foram adotadas as Emendas de 2016 ao código
da CTM, cujo objetivo é, segundo a proposta, de eliminar o assédio e a intimidação a bordo dos navios e permitir
a prorrogação da validade do certificado de trabalho marítimo por um período máximo de 5 meses, quando,
após uma inspeção de renovação com resultado favorável, o novo certificado não puder ser logo emitido.
PARTE II – Opinião do Deputado autor do parecer
Sendo a emissão de opinião de carácter facultativo, o Deputado autor deste parecer exime-se de manifestar
a sua opinião nesta sede.
PARTE III – Conclusões e Parecer
1 – O Governo tomou a iniciativa de apresentar, em 21 de abril de 2023, a Proposta de Resolução n.º
11/XV/1.ª, que aprova as Emendas de 2016 à Convenção do Trabalho Marítimo, 2006, adotadas pela
Conferência Internacional do Trabalho;
2 – A proposta de resolução em análise tem por finalidade a aprovação das Emendas de 2016 ao código da
Convenção do Trabalho Marítimo, adotadas pela Conferência Internacional do Trabalho, na sua 105.ª sessão,
realizada em Genebra, a 9 de junho de 2016;
3 – Nestes termos, a Comissão de Negócios Estrangeiros e Comunidades Portuguesas é de parecer que a
Proposta de Resolução n.º 11/XV/1.ª, acima identificada, está em condições de ser votada no Plenário da
Assembleia da República.
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O Deputado autor do relatório, Miguel Iglésias — o Presidente da Comissão, Sérgio Sousa Pinto.
Nota: O parecer foi aprovado, por unanimidade, com votos a favor do PS, do PSD, do CH e do BE, tendo-se
registado a ausência da IL e do PCP, na reunião da Comissão de 30 de maio de 2023.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.