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Terça-feira, 9 de abril de 2024 II Série-A — Número 7
XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 43 a 45/XVI/1.ª):
N.º 43/XVI/1.ª (PCP) — Combate as «portas giratórias» entre os cargos políticos e os grupos económicos, reforçando o regime de impedimento do exercício de cargos em empresas privadas por parte de titulares de cargos políticos executivos (quinta alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho). N.º 44/XVI/1.ª (PCP) — Proíbe o Estado de recorrer à arbitragem para resolução de litígios em matéria administrativa e fiscal. N.º 45/XVI/1.ª (BE) — Garante o apoio extraordinário à renda,
alterando o Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22 de março.
Projetos de Resolução (n.os 26 e 27/XVI/1.ª): N.º 26/XVI/1.ª (BE) — Recomenda a defesa do património ambiental e a classificação da Quinta dos Ingleses (Cascais) como «paisagem protegida». N.º 27/XVI/1.ª (BE) — Recomenda ao Governo a revogação das normas do Despacho n.º 1668/2023, de 2 de fevereiro, que excluem as e os portugueses no estrangeiro da lista de médico de família e do acesso a uma equipa de saúde familiar.
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PROJETO DE LEI N.º 43/XVI/1.ª
COMBATE AS «PORTAS GIRATÓRIAS» ENTRE OS CARGOS POLÍTICOS E OS GRUPOS
ECONÓMICOS, REFORÇANDO O REGIME DE IMPEDIMENTO DO EXERCÍCIO DE CARGOS EM
EMPRESAS PRIVADAS POR PARTE DE TITULARES DE CARGOS POLÍTICOS EXECUTIVOS (QUINTA
ALTERAÇÃO À LEI N.º 52/2019, DE 31 DE JULHO)
Exposição de motivos
A polémica em torno da intenção de contratação de uma antiga Secretária de Estado por parte de uma
empresa privada que havia obtido benefícios do Estado, sob a sua tutela, suscitou a questão da adequação e
eficácia do regime aplicável ao período imediatamente subsequente à cessação de funções por parte de titulares
de cargos políticos executivos, bem como do respetivo regime sancionatório.
Esta situação acrescentou-se a muitas outras que ao longo do tempo têm levantado dúvidas sobre a eficácia
dos mecanismos legais existentes, incluindo a contratação de ex-Ministros por sociedades de advogados com
vista ao exercício dessa atividade profissional em áreas que coincidem exatamente com o âmbito das áreas por
si tuteladas enquanto membros do Governo, contratações que vieram a ser efetivamente concretizadas
imediatamente após a saída do Governo.
Na verdade, não só o período de inibição de funções privadas após a cessação de funções públicos se
afigura demasiado curto, como o regime sancionatório se afigura inócuo. Constata-se que sancionar o titular
cessante de um cargo político executivo com a inibição do exercício de cargos públicos por um período entre
três e cinco anos por ter assumido funções numa empresa privada é uma sanção praticamente irrelevante, pelo
que, para que aquela proibição seja efetiva é necessário que recaia alguma sanção sobre a própria empresa
que efetua a contratação violadora da lei.
Assim, pela presente iniciativa, o PCP propõe o seguinte:
• A definição de cinco anos do período de inibição do titular de um cargo político executivo para o exercício
de funções numa empresa privada do setor por si tutelado, fixando um período de duração superior ao de
uma legislatura e procurando dessa forma assegurar a quebra temporal com o período em que as funções
governativas foram exercidas;
• A aplicação dessa inibição relativamente a qualquer empresa do setor e não apenas sobre empresas que
tenham sido objeto de operações de privatização, tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de
sistemas de incentivos e benefícios fiscais de natureza contratual, ou relativamente às quais se tenha
verificado uma intervenção direta do titular de cargo político;
• A aplicação da inibição a situações de contratação do próprio ou de entidade em que o próprio detenha
participação ou à qual preste serviços;
• A definição de cinco anos do período de interdição do exercício de cargos públicos por parte do antigo
titular de cargo político que seja contratado por empresa privada em violação da lei;
• A obrigação, nestas situações, de devolução pela empresa dos apoios, benefícios ou fundos que lhe
tenham sido atribuídos por decisão daquele antigo titular de cargo político;
• O impedimento das empresas que contratem titulares de cargos políticos em violação da lei, de celebrar
contratos com o Estado ou com quaisquer entidades públicas, de beneficiar de quaisquer incentivos ou
isenções que envolvam recursos públicos, bem como de aceder a fundos comunitários, por um período
de cinco anos a contar da prática da infração.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresentam o seguinte
projeto de lei:
Artigo 1.º
Alteração à Lei n.º 52/2019, de 31 de julho
Os artigos 10.º e 11.º da Lei n.º 52/2019, de 31 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 69/2020,
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de 9 de novembro, pela Lei n.º 58/2021, de 18 de agosto, e pelas Leis n.os 4/2022, de 6 de janeiro, e 25/2024,
de 20 de fevereiro, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 10.º
Regime aplicável após cessação de funções
1 – Os titulares de cargos políticos de natureza executiva não podem exercer, pelo período de cinco anos
contado a partir da data da cessação do respetivo mandato, por si ou através de entidade em que detenham
participação ou à qual prestem serviços, funções em empresas privadas que prossigam atividades no setor
por eles diretamente tutelado e que, no período daquele mandato, tenham sido objeto de operações de
privatização, tenham beneficiado de incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos e benefícios fiscais de
natureza contratual, ou relativamente às quais se tenha verificado uma intervenção direta do titular de cargo
político.
2 – […]
3 – Os titulares referidos na alínea b) do n.º 2 do artigo 3.º não podem exercer funções nas entidades
adquirentes ou concessionárias nos cinco anos posteriores à data da alienação ou concessão de ativos em que
tenham tido intervenção.
4 – Os titulares de cargos políticos de natureza executiva não podem exercer, pelo período de cinco anos
contado a partir da data da cessação do mandato, quaisquer funções de trabalho subordinado ou consultadoria
em organizações internacionais com quem tenham estabelecido relações institucionais em representação da
República Portuguesa.
5 – […]
Artigo 11.º
Regime sancionatório
1 – […]
2 – […]
3 – A infração ao disposto no artigo 10.º determina a inibição para o exercício de cargos políticos e de altos
cargos públicos por um período de cinco anos.
4 – As entidades ou empresas que contratem antigos titulares de cargos políticos em violação do
disposto no artigo 10.º ficam:
a) Obrigadas a devolver os apoios, benefícios ou fundos que lhes tenham sido atribuídos na
sequência de decisão em que tenha participado, direta ou indiretamente, o titular do cargo político em
causa; e
b) Impedidas de celebrar contratos com o Estado ou com quaisquer entidades públicas, de beneficiar
de quaisquer incentivos financeiros ou de sistemas de incentivos, benefícios ou isenções fiscais de
natureza contratual que envolvam recursos públicos, bem como de aceder a fundos comunitários, por
um período de cinco anos a contar da prática da infração.
5 – […]
6 – […]
7 – […]»
Artigo 2.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação.
Assembleia da República, 9 de abril de 2024.
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Os Deputados do PCP: Paulo Raimundo — Paula Santos — António Filipe — Alfredo Maia.
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PROJETO DE LEI N.º 44/XVI/1.ª
PROÍBE O ESTADO DE RECORRER À ARBITRAGEM PARA RESOLUÇÃO DE LITÍGIOS EM MATÉRIA
ADMINISTRATIVA E FISCAL
Exposição de motivos
Dispõe o n.º 1 do artigo 266.º da Constituição que a Administração Pública visa a prossecução do interesse
público, no respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos. Para tutela desses direitos
e interesses legalmente protegidos dispõe o artigo 268.º, n.º 4, que é garantido aos administrados tutela
jurisdicional efetiva desses direitos e interesses. É através dos tribunais, que administram a Justiça em nome do
povo, que é assegurada a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, que é reprimida a violação da
legalidade democrática e que são dirimidos os conflitos de interesses públicos e privados (artigo 202.º da
Constituição).
No âmbito da definição de competências entre os tribunais, a Constituição atribui aos tribunais administrativos
e fiscais o julgamento das ações e recursos contenciosos que tenham por objeto dirimir os litígios emergentes
das relações jurídicas administrativas e fiscais (artigo 212.º, n.º 3).
É certo que a Constituição admite a existência de formas de composição não jurisdicional de conflitos, o que
sucede designadamente através da possibilidade legal de recurso à arbitragem. Porém, se se afigura admissível,
no plano dos princípios, que em situações em que estejam em causa interesses privados entre partes iguais,
estas entendam, por via contratual, submeter à arbitragem os respetivos litígios, já é inadmissível, para o PCP,
que tal possa suceder em situações em que exista uma manifesta desigualdade entre as partes ou em situações
em que exista um interesse público a defender por parte do Estado.
Nesses casos, só as garantias de imparcialidade dadas pelos tribunais estaduais estão em condições de
garantir a aplicação da Justiça material, ditada pelo direito e respeitadora do interesse público e dos princípios
da legalidade e da igualdade.
Nos últimos anos, vários diplomas legais tornaram admissível o recurso à arbitragem por parte do Estado
como forma de dirimir conflitos decorrentes da aplicação de contratos administrativos, bem como em matéria
tributária.
Em matéria tributária, esta possibilidade viola manifestamente o princípio da legalidade da atividade
administrativa e o princípio segundo o qual todos os cidadãos são iguais perante a lei. Não é admissível que um
cidadão que, por qualquer descuido ou distração, se atrase na apresentação de uma declaração fiscal ou no
pagamento de uma prestação do IMI ou do IUC, seja duramente punido pela administração fiscal sem apelo
nem agravo, e que no caso de um devedor de milhões ao fisco o estado aceite recorrer à arbitragem, acabando
por abdicar de uma grande parte do que lhe é devido, beneficiando claramente o infrator. A Justiça fiscal não
pode tratar os devedores ricos como cidadãos de primeira que negoceiam o que pagam e os devedores pobres
como cidadãos de segunda que pagam o que lhe for exigido.
Por outro lado, em matéria de contratação pública, o Estado, ao abdicar de submeter os litígios emergentes
de contratos públicos aos tribunais, submete-se a uma forma de justiça privada que lhe é invariavelmente
desfavorável, com graves prejuízos para o interesse público e com enormes proventos para os interesses
económicos privados envolvidos.
Em outubro de 2022 os pedidos de reequilíbrio financeiro das PPP ultrapassavam os mil milhões de euros,
todos apontando a uma resolução através de tribunais arbitrais.
A situação é de tal forma grave que o Estado cada vez mais recorre para os tribunais administrativos das
decisões dos tribunais arbitrais, em processos quase sempre perdidos pelo facto de o Estado ter aceitado
previamente o recurso ao tribunal arbitral, e que não têm outro efeito que não seja o adiamento do pagamento
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aos privados. Esta situação, do Estado recorrer para os tribunais de decisões dos árbitros a que decidiu recorrer
até já foi objeto de censura num acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul.
E são cada vez mais as situações onde esta forma de gestão privada da justiça aparece a prejudicar o erário
público e a servir de veículo para a apropriação privada de centenas de milhões de euros.
A situação é especialmente grave no caso da chamada «arbitragem ad-hoc». O Estado aceita submeter os
seus litígios contratuais com empresas privadas, envolvendo milhões de euros, a tribunais arbitrais rodeados do
mais rigoroso secretismo. Não se conhecem os árbitros, nem os critérios da sua nomeação, nem a
fundamentação das decisões, nem os honorários e os interesses a que estão ligados os árbitros envolvidos.
Trata-se de uma situação de todo inaceitável num Estado de direito democrático e um ultraje no que se refere
ao mais elementar dever de salvaguarda do interesse e dos recursos públicos.
Considera o Grupo Parlamentar do PCP que proibir o Estado de recorrer à arbitragem como forma de
resolução de litígios que o envolvam em matéria administrativa e fiscal, e nomeadamente em matéria de
contratação pública, é uma decisão legislativa que se impõe em nome da mais elementar estratégia de
prevenção da corrupção e da decência na defesa do interesse público.
Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados da Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Princípio geral
1 – Os litígios emergentes de relações jurídicas reguladas pelo direito administrativo e fiscal são da
competência exclusiva dos tribunais.
2 – É vedado ao Estado e às demais pessoas coletivas de direito público recorrer a tribunais arbitrais para
dirimir litígios decorrentes de atos ou contratos regulados pelo direito administrativo e fiscal.
Artigo 2.º
Norma revogatória
São revogados:
a) Os artigos 180.º a 187.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (Lei n.º 15/2002, de 22 de
fevereiro, alterada pela Lei n.º 4-A/2003, de 19 de fevereiro, pela Retificação n.º 17/2002, de 6 de abril, pelas
Leis n.º 59/2008, de 11 de setembro, e n.º 63/2011, de 14 de dezembro, pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2
de outubro, pelas Leis n.º 118/2019, de 17 de setembro, n.º 30/2021, de 21 de maio, e n.º 56/2021, de 16 de
agosto);
b) A alínea d) do n.º 1 do artigo 27.º, o n.º 3 do artigo 332.º, o artigo 476.º e o Anexo XII a que se refere o
artigo 476.º, do Código dos Contratos Públicos (Decreto-Lei n.º 18/2008, de 29 de janeiro, alterado pela
Retificação n.º 18-A/2008, de 28 de março, pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, pelos Decretos-Leis
n.º 223/2009, de 11 de setembro, e n.º 278/2009, de 2 de outubro, pela Lei n.º 3/2010, de 27 de abril, pelo
Decreto-Lei n.º 131/2010, de 14 de dezembro, pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro, pelos Decretos-Lei
n.º 149/2012, de 12 de julho, n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, e n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, pelas
Retificações n.º 36-A/2017, de 30 de outubro, e n.º 42/2017, de 30 de novembro, e pelos Decretos-Lei n.º
33/2018, de 15 de maio, n.º 170/2019, de 4 de dezembro, pela Resolução da Assembleia da República n.º
16/2020, de 19 de março, pela Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, pelos Decretos-Lei n.º 78/2022, de 7 de novembro,
e n.º 54/2023, de 14 de julho);
c) O Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro, alterado pelas Leis n.º 10/2011, de 20 de janeiro, n.º 64-
B/2011, de 30 de dezembro, n.º 20/2012, de 14 de maio, n.º 66-B/2012, de 31 de dezembro, n.º 24/2019, de 13
de março, n.º 118/2019, de 17 de setembro, n.º 119/2019, de 18 de setembro, e n.º 7/2021, de 26 de fevereiro
(Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária).
d) O n.º 5 do artigo 1.º e os n.os 2 e 6 do artigo 59.º da Lei n.º 63/2011, de 14 de dezembro (Lei da Arbitragem
Voluntária).
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2 – São revogados todos os regulamentos de execução das normas revogadas pelo número anterior.
Artigo 3.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia imediato à sua publicação, sem prejuízo da conclusão dos processos
arbitrais em curso.
Assembleia da República, 9 de abril de 2024.
Os Deputados do PCP: Paulo Raimundo — Paula Santos — António Filipe — Alfredo Maia.
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PROJETO DE LEI N.º 45/XVI/1.ª
GARANTE O APOIO EXTRAORDINÁRIO À RENDA, ALTERANDO O DECRETO-LEI N.º 20-B/2023, DE
22 DE MARÇO
Exposição de motivos
O apoio extraordinário à renda foi apresentado pelo Governo, através do Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22
de março, como um «apoio eficaz» para fazer face à crise da habitação. Este apoio aplica-se a um conjunto de
cidadãos elegíveis, cujos agregados familiares tenham uma taxa de esforço superior a 35 %, com rendimentos
até ao sexto escalão do IRS (38 632 euros), e com contratos de arrendamento anteriores a 15 de março de
2023.
Um dos primeiros problemas com a atribuição deste apoio prendeu-se com a exclusão dos beneficiários com
taxas de esforço superiores a 100 % – que impediu o acesso ao apoio a pessoas com um histórico recente de
desemprego ou de baixos rendimentos, inclusive beneficiários do RSI, grupos numa situação muito vulnerável.
Ao longo dos meses em que esteve em vigor, verificou-se a exclusão de muitos outros cidadãos por força de
aplicação de critérios de elegibilidade sem sentido ou demasiado restritos, para além de dúvidas e incertezas
quanto aos critérios a ter em conta.
Na tentativa de colmatar este problema, dia 9 de novembro de 2023 foi publicado em Diário da República o
Decreto-Lei n.º 103-B/2023, que traz alterações ao apoio às rendas, «com vista a reforçar as garantias dos
cidadãos e dos beneficiários do apoio extraordinário à renda». Este novo decreto, pretende também «suprimir
qualquer dúvida quanto ao conceito de rendimento empregue no referido apoio».
Seis meses passados, e já depois de o anterior Governo ter decido não impor um travão ao aumento das
renas em 6,94 %, surge um novo problema com este apoio, noticiado pelo jornal Público: entre as centenas de
queixas recebidas pela Deco relativas ao mercado de arrendamento, algumas das mais frequentes dizem
respeito à pressão de senhorios para a cessação ou não-renovação de contratos e celebração de novos
contratos, de forma a poderem aumentar as rendas. «Esta situação é particularmente grave quando os
arrendatários eram beneficiários do apoio extraordinário à renda e, em face da celebração de um novo contrato,
deixam de o ser», resume Mariana Almeida, em respostas enviadas ao jornal.
Sem medidas para controlar os preços de mercado das rendas, resta ao Governo acompanhar estes
aumentos, garantido o apoio a quem dele necessita, independentemente da celebração de novo vínculo
contratual, sobretudo quando este resulta da estrita vontade do senhorio.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de
Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:
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Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22 de março, alterado pelo
Decreto-Lei n.º 103-B/2023, de 9 de novembro, pela Lei n.º 56/2023, de 6 de outubro, e pelo Decreto-Lei
n.º 91/2023, de 11 de outubro, que cria apoios extraordinários de apoio às famílias para pagamento da renda e
da prestação de contratos de crédito, com vista a reforçar as garantias dos cidadãos e dos beneficiários do apoio
extraordinário à renda.
Artigo 2.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22 de março – Cria apoios extraordinários de apoio às
famílias para pagamento da renda e da prestação de contratos de crédito
São alterados os artigos 3.º e 11.º ao Decreto-Lei n.º 20-B/2023, de 22 de março, que passam a ter a seguinte
redação:
«Artigo 3.º
[…]
1 – Os apoios extraordinários criados pelo presente decreto-lei aplicam-se a obrigações emergentes de
contratos celebrados até 15 de março de 2023.
2 – O disposto no número anterior, aplica-se, igualmente, aos novos contratos de arrendamento celebrados
entre as mesmas partes e sobre o mesmo imóvel.
Artigo 11.º
[…]
O pagamento do apoio cessa com a comunicação da cessação do contrato de arrendamento ou
subarrendamento pela AT, salvo nos casos previstos no n.º 2 do artigo 3.º, ou a requerimento de qualquer dos
interessados.»
Artigo 3.º
Entrada em vigor
1 – O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
2 – Os agregados familiares que se encontrem na situação prevista no n.º 2 do artigo 3.º têm direito ao
pagamento retroativo do apoio extraordinário que cessou aquando do fim do contrato de arrendamento.
Assembleia da República, 9 de abril de 2024.
As Deputadas e os Deputados do BE: Mariana Mortágua — Fabian Figueiredo — Marisa Matias — Joana
Mortágua — José Moura Soeiro.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 26/XVI/1.ª
RECOMENDA A DEFESA DO PATRIMÓNIO AMBIENTAL E A CLASSIFICAÇÃO DA QUINTA DOS
INGLESES (CASCAIS) COMO «PAISAGEM PROTEGIDA»
A 7 de abril de 2024 ocorreu uma manifestação com grande mobilização popular contra a destruição da
Quinta dos Ingleses e da orla costeira de Carcavelos. O protesto convocado pelos movimentos cívicos SOS
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Quinta dos Ingleses e Alvorada pela Floresta reclamam a proteção e preservação da última área verde junto ao
mar no município de Cascais, posicionando-se assim contra a construção de prédios de sete andares acima do
solo e cinco no subsolo, num total de 850 apartamentos, um hotel com 308 quartos e um centro comercial. Esta
construção destruiria a área verde implantada de 54 hectares, que ficaria reduzida a 8 hectares.
Este é mais um episódio revelador de como as poucas áreas verdes da região estão a ser substituídas por
edificação para habitação de luxo, não trazendo qualquer resposta social, destruindo espaços verdes e
perigando infraestruturas e a população devido ao risco de cheia.
Note-se que duas semanas antes deste novo protesto, a Câmara Municipal de Cascais deu autorização à
empresa de construção Alves Ribeiro e à Associação do Colégio St. Julian’s para a colocação de uma vedação
em torno da Quinta dos Ingleses, tendo em vista o início da obra.
A tentativa de urbanizar este local já vem de longe. Em 1958, o então proprietário da Quinta dos Ingleses, a
Eastern Telegraph Company, obteve autorização para um estudo urbanístico da quinta. O primeiro plano de
construção para a Quinta dos Ingleses remonta a 1961, embora a Savelos, à data nova proprietária do espaço,
apenas tenha completado um projeto em 1972, que a Câmara de Cascais apenas aprovou em 1982, mas sem
nunca constituir direitos a favor do proprietário à luz do direito vigente, uma vez que nunca chegou a emitir alvará
de loteamento, tendo isso mesmo sido admitido pelo presidente da câmara em fins do ano de 2000. Foi apenas
a partir de 2014 que o projeto começou a ganhar força. Nesse ano, foi aprovado por um voto o Plano de
Pormenor do Espaço de Reestruturação Urbanística de Carcavelos Sul (PPERUCS) pela Assembleia Municipal
de Cascais. O plano contou com os votos favoráveis de PSD e CDS-PP e de presidentes de várias juntas de
freguesia, entra eles a presidente da União de Freguesias de Carcavelos e Parede que votou em sentido
contrário ao deliberado na sua assembleia de freguesia. Foi nesse momento que se constituíram os direitos de
construção a favor do proprietário, não obstante o Bloco de Esquerda ter votado contra o PPERUCS.
Na tentativa de garantir que a população seria chamada a pronunciar-se sobre o projeto apresentado, o Bloco
de Esquerda Cascais propôs a suspensão da deliberação, apresentando uma proposta para realização de
referendo local sobre o tema. Essa proposta foi rejeitada na sua aceitação para deliberação, pelos votos dos
referidos partidos que aprovaram o Plano de Pormenor.
A população de Cascais contesta há décadas o projeto megalómano para a Quinta dos Ingleses. Depois de
inúmeras ações de contestação desenvolvidas ao longo dos anos por movimentos de cidadãos e associações,
deu entrada na Assembleia da República, em abril de 2018, uma petição subscrita por mais de 6500 pessoas
com o intuito de proteger a praia de Carcavelos e preservar um dos últimos espaços verdes da costa de Cascais,
Oeiras e Lisboa para o usufruto da população. Os subscritores manifestaram-se contra o PPERUCS por
entenderem que o plano promove a urbanização do local e a consequente destruição dos valores ambientais e
culturais da Quinta dos Ingleses. O Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda acompanhou essa petição com o
Projeto de Resolução n.º 1249/XIV/2.ª «Pela classificação da Quinta dos Ingleses como “paisagem protegida”».
Apesar de ter obtido declaração de impacte ambiental favorável (condicionada) da Comissão de
Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR-LVT), a mega-urbanização acarreta
um vasto conjunto de riscos para o património natural e cultural da Quinta dos Ingleses. O projeto interfere com
áreas de reserva ecológica nacional (REN) e linhas de água, provoca impactes na fauna e flora locais,
impermeabiliza solos, piora a paisagem, torna a zona mais suscetível aos efeitos locais da crise climática, como
os causados pela subida do nível médio do mar, e impede que a população usufrua plenamente da área verde.
Acrescem ainda os potenciais impactes negativos no património arqueológico. O parecer da Comissão de
Avaliação de Impacte Ambiental revela que «não se deve excluir a possibilidade de ocorrência de impactes
sobre o património arqueológico durante a fase de construção, fase esta potencialmente impactante para
eventuais vestígios arqueológicos que se possam encontrar ocultos, quer pela vegetação, quer pelo solo».
A Quinta dos Ingleses conta com um nível considerável de diversidade biológica. No local, existem pelo
menos 298 espécies de flora, nas quais se incluem espécies protegidas por legislação específica, como a
azinheira (Quercus rotundifolia), protegida pela Diretiva Habitats e pelo Decreto-Lei n.º 169/2001, de 25 de maio.
A área verde conta também com a presença de espécies arbóreas sujeitas a regime especial de proteção do
Regulamento Municipal de Cascais de Espaços Verdes e de Proteção da Árvore, como é o caso do pinheiro-
manso (Pinus pinea), dos ciprestes (Cupressussp.), das araucárias (Araucariasp.), do zambujeiro (Olea
europea), da azinheira (Quercus rotundifolia), da amoreira (Morus alba), dos ulmeiros (Ulmus sp.) e do freixo-
europeu (Fraxinus excelsior). Existe também no local um número considerável de espécies invasoras cuja
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erradicação é necessária. O megaempreendimento projetado para a Quinta dos Ingleses pressupõe impactes
negativos, diretos e permanentes no coberto arbóreo, provocados pela desmatação, escavação, terraplenagem
e movimentação de máquinas sobre a vegetação.
Quanto à fauna, está confirmada a presença no local de espécies de mamíferos como o ouriço-cacheiro
(Erinaceus europaeus), o morcego-anão (Pipistrellus pipistrellus), o morcego-pigmeu (Pipistrellus pygmaeus) e
o coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus), espécie cujo estatuto de conservação está classificado como «Em
Perigo» pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza. Pelo menos 17 espécies
de aves têm presença confirmada na Quinta dos Ingleses (34 espécies com ocorrência provável), das quais se
destaca o peneireiro-de-dorso-malhado (Falco tinnunculus), o pintassilgo (Carduelis carduelis), a toutinegra-de-
cabeça-preta (Sylvia melanocephala), o cartaxo (Saxicola torquata), o chamariz (Serinus serinus) e o verdilhão
(Carduelis chloris). Existem ainda cinco espécies de répteis com ocorrência provável (a osga-comum – Tarentola
mauritanica; a lagartixa-ibérica – Podarcis hispanica; a lagartixa-do-mato – Psammodramus algirus; a cobra-
cega – Blanus cinereus; e a cobra-de-ferradura – Coluber hippocrepis) e três de anfíbios (salamandra-de-pintas-
amarelas – Salamandra salamandra, o sapo – Bufo bufo, e a rã verde – Rana perezi). A urbanização da área
provocaria a perda irremediável do habitat existente, causando alterações incompatíveis com a presença de
muitas das espécies faunísticas que atualmente ocorrem na Quinta dos Ingleses.
A consulta pública do estudo de impacte ambiental (EIA) do megaempreendimento projetado para a Quinta
dos Ingleses demonstrou, mais uma vez, o elevado grau de discordância da população. Mais de 66 por cento
dos 157 participantes demonstraram a sua posição contrária ao projeto. Muitas preocupações relacionam-se
com os danos provocados no património ecológico e na paisagem, assim como no agravamento dos efeitos
causados pela crise climática. Entre os principais fundamentos apresentados pelos participantes encontram-se
a destruição provocada pela intervenção urbanística no espaço verde, o desaparecimento da biodiversidade da
mata, os impactes negativos nos lençóis freáticos, o aumento da erosão costeira, a descaracterização da costa,
os efeitos visuais negativos sobre a paisagem e a densidade habitacional excessiva. Das sugestões
apresentadas pelos participantes, destaca-se a classificação da área como parque natural de âmbito regional e
a alteração do PPERUCS no sentido de manter a área livre de edifícios.
A Quinta dos Ingleses apresenta valores biofísicos, ecológicos, estéticos, paisagísticos, históricos e culturais
que evidenciam a necessidade de salvaguarda por estatuto legal adequado, como o de «paisagem protegida».
Num contexto de crise climática e de perda acelerada de biodiversidade no País, a artificialização da orla
costeira, especialmente em contexto urbano, e a destruição de habitats aumentam a vulnerabilidade da
população, do território e da biodiversidade aos efeitos cada vez mais intensos e frequentes das alterações
climáticas. A classificação da Quinta dos Ingleses e a sua plena recuperação ecológica permitem proteger e
valorizar o seu património, possibilitando o seu pleno usufruto pela população.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
1 – Tome, com carácter de urgência, as diligências necessárias com vista à classificação da Quinta dos
Ingleses como «paisagem protegida», de modo a garantir a preservação e valorização do seu património
biofísico, ecológico, estético, paisagístico, histórico e cultural, bem como o pleno usufruto desse património pela
população;
2 – Interdite a realização de alterações à morfologia do solo e do coberto vegetal na Quinta dos Ingleses,
bem como a execução de operações urbanísticas como a construção ou ampliação de edifícios, excetuando as
ações de conservação, restauro, reparação ou limpeza;
3 – Apoie o desenvolvimento e a concretização de um plano de ação local para o restauro ecológico da
Quinta dos Ingleses, bem como a execução de ações de erradicação de espécies invasoras e de adaptação aos
efeitos da crise climática;
4 – Considere a criação de um polo museológico relativo ao cabo submarino, apoiando para o efeito a
recuperação de edificado existente na Quinta dos Ingleses.
Assembleia da República, 9 de abril de 2024.
As Deputadas e os Deputados do BE: Fabian Figueiredo — Marisa Matias — Joana Mortágua — José Moura
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II SÉRIE-A — NÚMERO 7
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Soeiro — Mariana Mortágua.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 27/XVI/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A REVOGAÇÃO DAS NORMAS DO DESPACHO N.º 1668/2023, DE 2 DE
FEVEREIRO, QUE EXCLUEM AS E OS PORTUGUESES NO ESTRANGEIRO DA LISTA DE MÉDICO DE
FAMÍLIA E DO ACESSO A UMA EQUIPA DE SAÚDE FAMILIAR
O anterior Governo fez com que as cidadãs e os cidadãos portugueses no estrangeiro passassem a ser
considerados «inativos» no seu registo de utente do SNS. Na prática, o Governo fez com que estas cidadãs e
cidadãos deixassem de estar inscritos em médico de família, deixassem de ter acesso a uma equipa de saúde
familiar e deixassem assim de ter direito a um SNS universal e gratuito que é também deles.
A medida foi um artifício óbvio. A braços com 1,7 milhões de utentes sem médico de família e com uma
notória incapacidade de resolver o problema de acesso aos cuidados de saúde, o Governo tentou apagar das
listas de utentes milhares de cidadãs e cidadãos portugueses para disfarçar o rotundo falhanço da sua política
de saúde.
O problema é que este artifício tem impactos sérios na vida de muitas pessoas. Como foi e tem sido dito pela
Associação Nacional de Unidades de Saúde Familiar (USF-AN), muitos utentes, mesmo residindo no
estrangeiro, pretendem continuar a ter a sua equipa de família aqui e muitos aproveitam as suas vindas a
Portugal para consultas e outros atos médicos. Existem outras questões importantes que se colocam, mas que
foram sempre ignoradas pelo anterior Governo. Por exemplo, e os casos de portuguesas e de portugueses que
vivem em países onde os sistemas de saúde não têm qualidade e que também por essa razão pretendem manter
o seu vínculo com o SNS e com a sua equipa de saúde familiar? Retirar-lhes essa oportunidade é negar-lhes
acesso à saúde. Em suma, é negar-lhes um direito.
Foi uma medida de maquilhagem de números que não respeitou nem a lei de bases, nem as cidadãs e
cidadãos portugueses que vivem no estrangeiro.
O Bloco de Esquerda assumiu, no programa eleitoral às legislativas de 2024, a revogação das normas do
Despacho n.º 1668/2023, de 2 de fevereiro, que excluem as e os portugueses no estrangeiro da lista de médico
de família e do acesso a uma equipa de saúde familiar. É isso que fazemos com a atual iniciativa legislativa.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Bloco de
Esquerda propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que:
Revogue as normas do Despacho n.º 1668/2023, de 2 de fevereiro, que excluem as e os portugueses no
estrangeiro da lista de médico de família e do acesso a uma equipa de saúde familiar.
Assembleia da República, 9 de abril de 2024.
As Deputadas e os Deputados do BE: Marisa Matias — Fabian Figueiredo — Joana Mortágua — José Moura
Soeiro — Mariana Mortágua.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.