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Quarta-feira, 22 de maio de 2024 II Série-A — Número 31
XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 38, 74 e145/XVI/1.ª): N.º 38/XVI/1.ª (Simplifica alargando o prazo de validade do passaporte comum para maiores de 18 anos e acabando com a obrigatoriedade de devolução do passaporte anterior): — Relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 74/XVI/1.ª (Assegura a inclusão no elenco de causas de indignidade sucessória da condenação pelos crimes de
violência doméstica, de ofensa à integridade física, contra a liberdade e autodeterminação sexual praticados contra o autor da sucessão, alterando o Código Civil e o Código Penal): — Relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias. N.º 145/XVI/1.ª (Prevê a redução da taxa de IVA aplicável à eletricidade): — Alteração do texto inicial do projeto de lei.
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PROJETO DE LEI N.º 38/XVI/1.ª
(SIMPLIFICA ALARGANDO O PRAZO DE VALIDADE DO PASSAPORTE COMUM PARA MAIORES DE
18 ANOS E ACABANDO COM A OBRIGATORIEDADE DE DEVOLUÇÃO DO PASSAPORTE ANTERIOR)
Relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I
a) Nota introdutória
A Iniciativa Liberal apresentou à Assembleia da República, em 27 de março de 2024, o Projeto de Lei
n.º 38/XVI/1.ª (IL) – Simplifica alargando o prazo de validade do passaporte comum para maiores de 18 anos e
acabando com a obrigatoriedade de devolução do passaporte anterior.
Esta apresentação foi efetuada nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 167.º da Constituição da República
Portuguesa (CRP) e do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR), reunindo os requisitos
formais previstos no artigo 124.º desse mesmo Regimento.
Por despacho de S. Ex.ª o Presidente da Assembleia da República de 4 de abril de 2024, a iniciativa vertente
baixou à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para emissão do respetivo
parecer.
A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias solicitou pareceres às seguintes
entidades: Ordem dos Advogados; Conselho Superior da Magistratura; Conselho Superior do Ministério Público;
Comissão Nacional de Proteção de Dados.
b) Apresentação sumária da iniciativa
Com a presente iniciativa legislativa os proponentes procedem à alteração do atual regime legal da
concessão e emissão de passaportes aprovado pelo Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de maio, na sua redação
atual, no sentido de que o prazo de validade do passaporte comum para maiores de dezoito anos passe a ser
de dez anos, ao invés dos atuais cinco, e o prazo de validade do passaporte para os menores de dezoito anos
passe a ser de cinco anos.
De igual forma, a IL propõe a alteração da norma (n.º 5 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de
maio) que obriga à devolução do passaporte expirado em virtude da concessão de um novo documento,
permitindo que tal concessão se faça contra a «apresentação e inativação do passaporte anterior».
A Iniciativa Liberal (IL) fundamenta a presente intervenção legislativa com os tempos de espera associados
aos pedidos de agendamento, emissão e entrega do passaporte, assim como os custos para a sua obtenção.
Os proponentes sublinham igualmente a necessidade de «libertar os serviços e a de desonerar os cidadãos
quer do custo quer da burocracia» que está associada à obtenção de um novo passaporte, alinhando-se os
prazos de validade máxima com os de vários outros países europeus (cfr. «Enquadramento jurídico
internacional» in nota técnica em anexo, págs. 8 a 10).
A iniciativa legislativa é composta por três artigos: o primeiro que define o objeto da lei; o segundo que contém
as alterações ao artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11 de maio, que «Aprova o novo regime legal da
concessão e emissão dos passaportes», na sua redação atual, no sentido de alterar a validade do passaporte
para dez anos, no caso de, à data da emissão, o seu titular ter idade igual ou superior a 18 anos e estabelecendo
que, no caso de menores de 18 anos de idade, a validade do passaporte comum é de cinco anos; no artigo
segundo prevê-se igualmente que a concessão de novo passaporte comum se faz contra a apresentação e
inativação do passaporte anterior, eliminando-se a obrigatoriedade da respetiva entrega; o artigo terceiro
estabelece o momento de entrada em vigor da lei com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
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c) Análise jurídica complementar à nota técnica
Nada a acrescentar à análise jurídica constante da nota técnica elaborada pelos serviços (em anexo).
d) Pareceres e contributos1
O Conselho Superior da Magistratura, em 30 de abril p.p., remeteu ofício à Comissão declarando a sua não
pronúncia sobre a iniciativa em epígrafe.
Por seu lado, a Ordem dos Advogados (OA) emite parecer favorável à presente proposta, afirmando que, à
semelhança da anterior pronúncia sobre proposta semelhante da IL (Projeto de lei n.º 906/XV/2.ª)2, «Todas as
medidas que promovam a simplificação, desburocratização e a redução das despesas que pesam sobre os
cidadãos e cidadãs portugueses (as) na aquisição de documentos, e concretizem – por essa via – melhorias das
suas condições de vida, merecem o acolhimento da Ordem dos Advogados».
A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) na sua pronúncia (Parecer n.º 2024/15, de 7 de maio)
conclui pela não existência de reservas no que respeita à compatibilidade das normas respeitantes aos prazos
de validade, ora propostos, com o regime de proteção de dados.
Não obstante, quanto à eliminação da obrigatoriedade da entrega do documento anterior após a emissão de
um novo passaporte, a CNPD salienta a necessidade de se proceder à densificação do conceito de inativação
previsto na iniciativa «por forma a não permitir a utilização indevida de passaportes que, embora já substituídos,
não tenham, ainda, alcançado o seu prazo máximo de validade». Neste sentido, a CNPD propõe a adoção de
medidas que degradem fisicamente aquele documento, manifestando de forma inequívoca a sua invalidade.
À data da elaboração do presente relatório ainda não tinha sido remetida a pronúncia do Conselho Superior
do Ministério Público.
PARTE II
a) Opinião do relator
O signatário do presente relatório exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre as
iniciativas legislativas em apreço, a qual é, de resto, de elaboração facultativa, nos termos do n.º 4 do artigo
139.º do Regimento da Assembleia da República.
b) Posição dos Grupos Parlamentares
Nada a registar.
PARTE III
Conclusões
1 – A Iniciativa Liberal (IL) apresentou à Assembleia da República o Projeto de Lei n.º 38/XVI/1.ª – Simplifica
alargando o prazo de validade do passaporte comum para maiores de 18 anos e acabando com a
obrigatoriedade de devolução do passaporte anterior.
2 – Com a presente iniciativa legislativa os proponentes pretendem alterar o Decreto-Lei n.º 83/2000, de 11
de maio, na sua redação atual, que «Aprova o regime legal da concessão e emissão dos passaportes», propondo
o alargamento do prazo de validade do passaporte para dez anos, no caso de maiores de 18 anos, mantendo o
1 Consultável em: https://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=263537. Nota: O Conselho Superior da Magistratura, nos termos do disposto no artigo 149.º n.º 1, alínea i), do Estatuto dos Magistrados Judiciais, Lei n.º 21/85, de 30 de julho, com as alterações da Lei n.º 67/2019, de 27 de agosto, não se pronunciou sobre a iniciativa legislativa em apreço. 2 Https://portal.oa.pt/media/143035/proposta-de-lei-n%C2%BA-906_xv-2.pdf.
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atual prazo de cinco anos para os menores de 18 anos.
3 – Com o projeto de lei em apreço, pretende-se ainda eliminar a obrigatoriedade de entrega do passaporte
anterior com a concessão de um novo passaporte comum.
4 – Face ao exposto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de
parecer que o Projeto de Lei n.º 38/XVI/1.ª reúne os requisitos constitucionais e regimentais para ser discutido
e votado em Plenário.
PARTE IV
a) Nota técnica
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
b) Outros anexos
Nada a anexar.
Palácio de São Bento, 22 de maio de 2024.
O Deputado relator,Pedro Neves de Sousa —A Presidente da Comissão, Paula Cardoso.
Nota: O relatório foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência da IL, do PCP, do CDS-PP e
do PAN, na reunião da Comissão de 22 de maio de 2024.
———
PROJETO DE LEI N.º 74/XVI/1.ª
(ASSEGURA A INCLUSÃO NO ELENCO DE CAUSAS DE INDIGNIDADE SUCESSÓRIA DA
CONDENAÇÃO PELOS CRIMES DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, DE OFENSA À INTEGRIDADE FÍSICA,
CONTRA A LIBERDADE E AUTODETERMINAÇÃO SEXUAL PRATICADOS CONTRA O AUTOR DA
SUCESSÃO, ALTERANDO O CÓDIGO CIVIL E O CÓDIGO PENAL)
Relatório da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias
PARTE I – Considerandos
a) Nota introdutória
A Deputada do PAN tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de Lei
n.º 74/XVI/1.ª (PAN) – Assegura a inclusão no elenco de causas de indignidade sucessória da condenação pelos
crimes de violência doméstica, de ofensa à integridade física, contra a liberdade e autodeterminação sexual
praticados contra o autor da sucessão, alterando o Código Civil e o Código Penal.
O projeto de lei em apreciação deu entrada a 26 de abril de 2024. Foi admitido a 2 de maio e nesse mesmo
dia baixou, na generalidade, à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, tendo
a signatária deste parecer sido designada como relatora.
O projeto de lei foi apresentado nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 156, do n.º 1 do artigo
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167.º e da alínea g) do n.º 2 do artigo 180.º da Constituição da República Portuguesa (CRP) e da alínea b) do
n.º 1 do artigo 4.º e do n.º 1 do artigo 119.º do Regimento da Assembleia da República (RAR). A iniciativa cumpre
os requisitos formais previstos no n.º 1 do artigo 124.º do Regimento.
Em 3 de maio de 2024 foram solicitados pareceres ao Conselho Superior do Ministério Publico, ao Conselho
Superior da Magistratura, à Ordem dos Advogados e à Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, podendo ser
consultados a todo o tempo na página do processo legislativo da iniciativa, disponível eletronicamente. Até ao
momento em que este parecer foi entregue tinham sido recebidos unicamente os contributos da OA e da APAV.
b) Do objeto, conteúdo e motivação da iniciativa
Nos exatos termos da nota técnica, «a proponente retoma o seu Projeto de Lei n.º 515/XV/1.ª (PAN) –
Assegura a inclusão da condenação pelos crimes de violência doméstica, de ofensa à integridade física, contra
a liberdade e autodeterminação sexual praticados contra o autor da sucessão nas causas de indignidade
sucessória, da anterior Legislatura, pretendendo com a presente iniciativa legislativa incluir no elenco de causas
de incapacidade sucessória por motivo de indignidade a condenação pelo crime de ofensa à integridade física,
ainda que por negligência, por crime de violência doméstica, por crime contra a liberdade e autodeterminação
sexual, por crime de exposição ou abandono, por crime de violação da obrigação de alimentos (…), alterando
para o efeito o Código Civil (CC) e o Código Penal (CP).
Considera a proponente, após um breve enquadramento jurídico e doutrinário, que o instituto da indignidade
sucessória está delineado em «termos estreitos» ao não proteger a vontade do autor da sucessão no caso de
ter sido cometido, contra ele ou familiar próximo, crime «grave e com forte censurabilidade social» e dá o
exemplo da situação em que um crime – de ofensa à integridade física, de exposição ou de abandono e/ou de
violação da obrigação de alimentos – seja cometido contra pessoa idosa e agrave a sua situação de
vulnerabilidade, constatando que a não previsão de indignidade sucessória nesses casos constituiu um «convite
à prática do crime» e premeia o agente criminoso com a transmissão beneficente».
c) Enquadramento legal
A nota técnica enquadra a iniciativa legislativa evidenciando, nomeadamente, os seguintes aspetos:
«De acordo com o disposto no artigo 2031.º do Código Civil, “a sucessão abre-se no momento da morte do
seu autor e no lugar do último domicílio dele”, acrescentando-se no n.º 1 do artigo 2032.º do Código Civil que,
“aberta a sucessão, serão chamados à titularidade das relações jurídicas do falecido aqueles que gozam de
prioridade na hierarquia dos sucessíveis, desde que tenham a necessária capacidade”.
A capacidade sucessória é uma “noção típica de direito das sucessões, que podemos definir como a
idoneidade para ser destinatário de uma vocação sucessória”, ou, dito de outro modo, a “suscetibilidade de
adquirir, como herdeiro ou legatário, as relações patrimoniais de uma pessoa falecida”.
O Código Civil elenca, no seu artigo 2033.º, quem tem capacidade sucessória e prevê dois institutos que
geram incapacidade sucessória, ou seja, que permitem impedir que uma pessoa seja herdeira de outra – a
indignidade, que é regulada no artigo 2034.º e seguintes, e a deserdação, nos artigos 2166.º e 2167.º. A
indignidade aplica-se a todos os tipos de vocação sucessória e a deserdação apenas à sucessão legitimária.
O artigo 2034.º do Código Civil, cuja alteração ora se propõe, tipifica, pois, as causas de incapacidade
sucessória por motivo de indignidade:
a) Ser condenado como autor ou cúmplice de homicídio doloso, ainda que não consumado, contra o autor
da sucessão ou contra o seu cônjuge, descendente, ascendente, adotante ou adotado;
b) Ser condenado por denúncia caluniosa ou falso testemunho contra as mesmas pessoas, relativamente a
crime a que corresponda pena de prisão superior a dois anos, qualquer que seja a sua natureza;
c) Induzir, por dolo ou coação, do autor da sucessão a fazer, revogar ou modificar o testamento, ou disso o
impediu;
d) Dolosamente subtrair, ocultar, inutilizar, falsificar ou suprimir o testamento, antes ou depois da morte do
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autor da sucessão, ou aproveitar-se de algum desses factos.
Os artigos 2035.º a 2038.º regulam outros aspetos da indignidade: momento da condenação e do crime
relevantes para este efeito (artigo 2035.º); prazo e legitimidade para propositura da ação (artigo 2036.º); efeitos
da declaração de indignidade (artigo 2037.º); e reabilitação do indigno (artigo 2038.º).
Como determinado no artigo 2037.º, a indignidade é declarada pelo tribunal, em ação a isso destinada ou
oficiosamente, pelo tribunal, na sentença de condenação penal pelo crime referido na alínea a) do artigo 2034.º
(homicídio doloso). Esta última possibilidade foi introduzida pela Lei n.º 82/2014, de 30 de dezembro, que, a
propósito do crime de violência doméstica, aditou ao Código Penal um novo artigo 69.º-A nesse sentido. Para
além disso, a Lei n.º 82/2014 aditou dois novos números ao artigo 2036.º do Código Civil, atribuindo legitimidade
ao Ministério Público para intentar a ação destinada a obter a declaração de indignidade sempre que o indigno
seja o único herdeiro e determinando a comunicação obrigatória ao Ministério Público, para efeitos de
propositura da ação, da condenação pelo crime de homicídio doloso [nos termos da alínea a) do referido artigo
2034.º], sempre que a indignidade sucessória não seja declarada na sentença penal.
A ação destinada a obter a declaração de indignidade pode ser intentada no prazo de dois anos a contar da
abertura da sucessão ou de um ano a contar da condenação nos crimes que determinam a indignidade ou do
conhecimento das causas previstas nas alíneas c) e d) do artigo 2034.º (dolo ou coação sobre o autor da
sucessão relativamente ao testamento e atos sobre o próprio documento).
O crime de violência doméstica encontra-se tipificado no artigo 152.º do Código Penal, consistindo em infligir,
de modo reiterado ou não, maus tratos físicos ou psíquicos, incluindo castigos corporais, privações da liberdade,
ofensas sexuais ou impedir o acesso ou fruição aos recursos económicos patrimoniais próprios ou comuns, a
pessoas do círculo familiar do agente elencadas naquele artigo, desde logo o cônjuge».
PARTE II – Opinião da relatora
A iniciativa legislativa é muito semelhante ao Projeto de Lei n.º 515/XV/1.ª, apresentado pelo PAN na
Legislatura passada e também próxima, na sua finalidade, do Projeto de Lei n.º 678/XV/1.ª do CH, igualmente
apresentado na Legislatura passada, de cujo parecer fui relatora. Por isso, reitero nesta sede a opinião já antes
manifestada no que respeita à intenção de alargamento das circunstâncias conducentes à indignidade
sucessória através de uma alteração do artigo 2034.º do Código Civil. Tal opção sujeita-se à crítica de que
encurta a liberdade na disposição de bens, parecendo muito duvidoso que por essa via se contribua para a
proteção dos direitos fundamentais das pessoas idosas.
Como bem se sublinhava na pronúncia apresentada pela APAV na Legislatura passada, o propósito,
manifestado pela Associação no relatório Portugal Mais Velho, apresentado em outubro de 2020, deve ser antes
«a criação de uma política de família que passe, entre outras medidas, pela revisão do direito sucessório de
modo a permitir uma maior liberdade na disposição de bens (garantindo que numa situação em que os
descendentes de uma pessoa idosa não a apoiem ou até maltratem possam ser “deserdados”».
Nesse parecer da APAV, apresentado na Legislatura anterior, chamava-se ainda a atenção para um prévio
parecer da Procuradoria-Geral da República a propósito de iniciativa semelhante do Grupo Parlamentar do CDS-
PP (Projeto de Lei n.º 246/XIII/1.ª), «por levantar uma questão que nos parece muito relevante e que acreditamos
ser necessário discutir. Aí se refere estar «em causa uma opção política que eliminará a liberdade de decisão e
a vontade do futuro de cuius, e substituí-la, em nome do interesse público, por uma consequência ope legis
decorrente da indignidade»: ao tornar-se a condenação por violação da obrigação de alimentos ou por exposição
ou abandono uma causa de incapacidade sucessória por indignidade, retirar-se-á ao autor da herança «vontade,
liberdade de assim decidir». Considerou, ainda, a Procuradoria-Geral da República que «a legislar-se deste
modo estará assente que se prescinde, ou se eliminará, o princípio da autonomia e da participação do cidadão
idoso, com direta repercussão na sua capacidade de exercício e de disposição relativamente ao seu património».
Apesar de o parecer agora apresentado pela APAV acabar por concluir que «tudo ponderado, considera-se
ajustado alargar o elenco das situações passíveis de indignidade sucessória nos termos propostos no projeto
de lei ora em análise», não se julga que sejam encontrados argumentos bastantes que permitam ultrapassar as
dificuldades antes evidenciadas. O parecer da Ordem dos Advogados, apesar de incluir algumas sugestões de
melhorias legislativas, considera que a «proposta merece acolhimento».
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A iniciativa suscita, porém, reservas também no que respeita à sua dimensão jurídico-penal, parecendo
questionável a consagração como pena acessória de uma declaração de indignidade sucessória que, por não
ter limites temporais, pode contender com o disposto no artigo 30.º, n.º 1, da Constituição, segundo o qual não
pode haver penas com carácter perpétuo ou de duração limitada ou indefinida.
PARTE III – Conclusões
1 – A Deputada do PAN tomou a iniciativa de apresentar à Assembleia da República o Projeto de Lei
n.º 74/XVI/1.ª (PAN) – Assegura a inclusão no elenco de causas de indignidade sucessória da condenação pelos
crimes de violência doméstica, de ofensa à integridade física, contra a liberdade e autodeterminação sexual
praticados contra o autor da sucessão, alterando o Código Civil e o Código Penal;
2 – A iniciativa legislativa sub judice visa reforçar a proteção das pessoas idosas, aditando novos
fundamentos ao elenco das causas de indignidade sucessória;
3 – A Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias é de parecer que o Projeto
de Lei n.º 74/XVI/1.ª (PAN) reúne os requisitos regimentais e constitucionais para ser discutido e votado em
Plenário.
PARTE IV – Anexos
Anexa-se a nota técnica elaborada pelos serviços ao abrigo do disposto no artigo 131.º do Regimento da
Assembleia da República.
Palácio de São Bento, 22 de maio de 2024.
A Deputada relatora, Cláudia Santos — A Presidente da Comissão, Paula Cardoso.
Nota: O relatório foi aprovado, por unanimidade, tendo-se registado a ausência da IL, do PCP, do CDS-PP e
do PAN, na reunião da Comissão de 22 de maio de 2024.
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PROJETO DE LEI N.º 145/XVI/1.ª (*)
(PREVÊ A REDUÇÃO DA TAXA DE IVA APLICÁVEL À ELETRICIDADE)
Exposição de motivos
Face aos efeitos da inflação na economia e na sociedade, com os preços a escalarem em todo o tipo de
produtos e serviços, torna-se necessário regular definitivamente o IVA da eletricidade, uma vez que a energia é
um dos sectores mais afetados pela subida de preços. Os preços dos bens essenciais estão cada vez mais
insuportáveis para as famílias portuguesas.
É indiscutível que a eletricidade é um bem fundamental para as famílias e para as empresas e,
consequentemente, para o desenvolvimento económico do País.
Portugal é um dos países da UE, com índice de pobreza energética mais elevado. A definição de pobreza
energética não se encontrava consensualizada na UE, tendo vários Estados-Membros adotado uma definição
diferente, tendo em conta a sua realidade nacional.1 Contudo, na Diretiva (UE) 2023/1791, do Parlamento
1 https://www.dgeg.gov.pt/pt/areas-transversais/politicas-de-protecao-ao-consumidor-de-energia/pobreza-energetica
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Europeu e do Conselho, de 13 de setembro, relativa à eficiência energética, é estabelecida pela primeira vez
uma definição comum de pobreza energética, que a determina, como sendo: «a falta de acesso de um agregado
familiar a serviços energéticos essenciais, quando tais serviços proporcionam níveis básicos e dignos de vida e
de saúde, nomeadamente aquecimento, água quente, arrefecimento e iluminação adequados e a energia
necessária para os eletrodomésticos, tendo em conta o contexto nacional, a política social e outras políticas
nacionais pertinentes, causada por uma combinação de fatores, incluindo, pelo menos, a falta de acessibilidade
dos preços, um rendimento disponível insuficiente, elevadas despesas energéticas e a fraca eficiência
energética das habitações».
A mesma conceção foi adotada no enquadramento nacional com a publicação da Estratégia Nacional de
Longo Prazo de Combate à Pobreza Energética 2023-2050 (ELPPE), aprovada em Resolução de Conselho de
Ministros (RCM) n.º 11/2024, de 8 de janeiro.
A principal missão da Estratégia é erradicar a pobreza energética em Portugal até 2050, protegendo os
consumidores vulneráveis e integrando-os de forma ativa na transição energética e climática, que se pretende
justa, democrática e coesa.
A RCM n.º 11/2024 criou também o Observatório Nacional da Pobreza Energética (ONPE-PT), cuja principal
missão é acompanhar a evolução da pobreza energética a nível nacional.
O mecanismo ibérico, se por um lado tende a atenuar a subida dos preços no consumo final, não os anula,
e parte desses custos terão de ser pagos pelos consumidores, o que já ficou refletido nas faturas de
consumidores não particulares, que tinham contrato no mercado livre, com subidas da fatura na ordem dos 50%.
Longe de ser uma questão que afeta apenas o nosso país, o aumento do preço da energia nos últimos
tempos é uma situação que afeta todo o espaço europeu e para a qual vários governos da EU já começaram a
dar respostas.
Em Espanha, o governo baixou o IVA sobre a eletricidade de 10 para 5 %2. E em França, a resposta do
governo está focada na reforma do mercado europeu de eletricidade3, continuando, no entanto, a apostar nas
potencialidades da energia nuclear para resolver o problema.
Por sua vez, Portugal e Espanha, em conjunto, já obtiveram autorização da Comissão Europeia para reduzir
os custos de produção das centrais elétricas. Medida que, no entanto, tarda em atingir os objetivos pretendidos4,
nomeadamente no que diz respeito à diminuição do preço da eletricidade paga pelos consumidores, o que é
empiricamente comprovado todos os meses pelas famílias portuguesas. Há, pois, que colocar em prática
medidas mais eficazes para atingirem esse fim.
Apesar do preço da eletricidade em Portugal se situar próximo da média europeia, a «componente de
“impostos e encargos” em Portugal é das mais elevadas da Europa e praticamente duplica o preço final de
eletricidade face ao valor base no nosso país»5.
Neste contexto, parece-nos ser pela via fiscal que melhor se alcançará o objetivo de desonerar as famílias
do pagamento excessivo do custo da energia elétrica num contexto já de si depressivo em termos de rendimento,
por efeito da inflação.
Neste contexto, a solução que nos parece mais fácil de pôr em prática para reduzir os preços, quer do ponto
de vista prático para os operadores, quer do ponto de vista fiscal, quer em termos de benefício para os
consumidores, é a redução da taxa de IVA aplicável à eletricidade, fixando-a na tabela que em sede do mesmo
imposto se dirige aos bens e serviços sujeitos à taxa reduzida, ou seja, 6 %.
De acordo com a Diretiva Europeia (UE) 2022/542 do Conselho de 5 de abril de 2022, que altera as Diretivas
2006/112/CE e (UE) 2020/285, no que diz respeito às taxas do imposto sobre o valor acrescentado, Portugal,
assim como qualquer outro Estado-Membro da União Europeia (UE), pode baixar o IVA do gás e da luz para a
taxa mínima sem ter de pedir autorização ao Comité do IVA.
Contudo, limita a aplicação da taxa reduzida a uma lista de 24 das 29 categorias elegíveis, em que se
encontram os fornecimentos de eletricidade, gás e arrefecimento urbano.
Assim, torna-se premente a redução da taxa de IVA aplicável à eletricidade para a taxa mínima, de forma a
2 In Diários AS e El País, 22 de junho de 2022 (https://as.com/actualidad/el-gobierno-anuncia-una-rebaja-del-iva-de-la-luz-n/) e (https://elpais.com/espana/2022-06-22/pedro-sanchez-responde-a-la-oposicion-tras-el-reves-de-las-elecciones-andaluzas.html). 3 In Le Monde, 14 de julho de 2022 (https://www.lemonde.fr/politique/article/2022/07/15/afin-de-se-passer-du-gaz-russe-emmanuel-macron-prepare-les-esprits-a-la-sobriete-energetique_6134890_823448.html). 4 A este respeito é de registar a iniciativa da DECO «Energia sem Remendos» (https://www.deco.proteste.pt/acoes-coletivas/energia-sem-remendos), onde se refere: «Combustíveis, eletricidade e gás: é hoje impossível viver sem estes produtos e serviços. Mas os preços têm vindo a aumentar, agravados nas últimas semanas pela guerra na Ucrânia.». 5 In www.edp.pt: «Pagamos mais pela eletricidade em Portugal do que nos restantes Estados-Membros da União Europeia?»; 24/06/2022.
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aliviar o orçamento dos portugueses, em que para além de em Portugal existir uma situação de pobreza
generalizada, segundo dados do Eurostat, revelados no inquérito anual sobre o rendimento e as condições de
vida dos europeus, mostra que Portugal já em 2020 era o quinto país da UE em que os cidadãos registam
maiores dificuldades para suportar os custos associados ao aquecimento das habitações.
Em síntese, grande parte dos portugueses não tem capacidade para aquecer a casa, muito se deve ao facto
de Portugal ter um parque edificado obsoleto e, consequentemente, o que justifica ter um dos níveis de pobreza
energética mais altos da Europa. Apenas 14 % das habitações em Portugal dispõem de aquecimento central e
os aquecedores móveis são os mais usados para combater as baixas temperaturas. Quase um terço das famílias
não utiliza com regularidade qualquer tipo de aquecimento, de acordo com o INE e com os dados dos censos.
Em paralelo, é incompreensível que o Governo venha arrecadando excedentes orçamentais e níveis
elevados de receita fiscal sem que tenha avançado com este tipo de medidas que promovam a sua redução.
Assim, ao abrigo das disposições procedimentais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do Chega apresentam o seguinte projeto-lei:
Artigo 1.º
Objeto
O presente diploma prevê a redução da taxa de IVA aplicável à eletricidade para a taxa mínima, alterando,
para esse efeito, o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 394-B/84, de
26 de dezembro.
Artigo 2.º
Alteração à Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado
A verba 2.12 da Lista I anexa ao Código do IVA passa a ter a seguinte redação:
«2.12 – Eletricidade».
Artigo 3.º
Ações de esclarecimento e sensibilização
O Governo, em articulação com a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos, procede a ações de
sensibilização de âmbito nacional no âmbito da promoção da eficiência energética, mormente no que concerne
aos custos na ótica do consumidor e ainda a utilização e manuseamento de gás e dos inerentes impactes
ambientais e económicos.
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 22 de maio de 2024.
Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Rui Afonso — Eduardo Teixeira — Ricardo Dias Pinto — Marcus
Santos.
(*) O texto inicial da iniciativa foi publicado no DAR II Série-A n.º 28 (2024.05.17) e substituído, a pedido do autor, em 22 de maio de
2024.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.