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Segunda-feira, 16 de setembro de 2024 II Série-A — Número 92
XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)
S U M Á R I O
Resoluções: (a) — Eleição de um membro para o Conselho de Fiscalização da Base de Dados de Perfis de ADN. — Deslocação do Presidente da República a Tenerife e a Las Palmas. — Deslocação do Presidente da República a Dublin. Projetos de Resolução (n.os 293 a 295/XVI/1.ª): N.º 293/XVI/1.ª (PAN) — Propõe a realização de um refe
rendo sobre a abolição das touradas em Portugal. N.º 294/XVI/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo medidas de reforço no âmbito da Ação Social Escolar no ensino superior. N.º 295/XVI/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo a criação de uma rede de postos de atendimento nas cidades de maior densidade de emigração portuguesa.
(a) Publicadas em Suplemento.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 293/XVI/1.ª
PROPÕE A REALIZAÇÃO DE UM REFERENDO SOBRE A ABOLIÇÃO DAS TOURADAS EM
PORTUGAL
Em Portugal, as touradas ainda são permitidas por força de uma exceção à lei de proteção aos animais (Lei
n.º 91/95, de 12 de setembro), não obstante ser hoje uma evidência científica incontornável que os animais, tal
como o ser humano, são capazes de sentir e como tal, de sofrer.
É consensual que, nas touradas, os animais são sujeitos a diversas agressões que lhes provocam ferimentos
graves, sangramento e sofrimento que se inicia no momento do transporte para a praça de touros e só termina
(no caso português) no matadouro.
O bem-estar animal é hoje um valor consolidado na sociedade portuguesa e um princípio sobre o qual
assentam as políticas europeias.
O artigo 13.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), na redação introduzida pelo
Tratado de Lisboa, reconhece um dever de proteção por parte dos Estados-Membros aos animais, enquanto
seres sensíveis.
Em Portugal, desde 2017, por força da Lei n.º 8, de 3 de março, que alterou o Código Civil, é reconhecido
aos animais um estatuto jurídico próprio, dissociando-os do regime das coisas e reconhecendo que «são seres
vivos dotados de sensibilidade e objeto de proteção jurídica em virtude da sua natureza» (vide artigo 201.º-B do
Código Civil). Nesse mesmo sentido, o Código Penal prevê e pune os crimes contra animal de companhia, cfr.
artigos 387.º e 388.º do Código Penal.
A lei de proteção aos animais estabelece que «são proibidas todas as violências injustificadas contra animais,
considerando-se como tais os atos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e
prolongado ou graves lesões a um animal».
Este princípio choca claramente com o ritual de «lide» de animais em espetáculos tauromáquicos e que
consiste em agredir os animais, de forma gradual, e com recurso a vários tipos de armas letais, provocando-
lhes intenso sofrimento, ferimentos profundos e hemorragias, quase até à morte, e a perda de cerca de cinco
litros de sangue.
Mesmo que, em Portugal, as touradas não incluam o ritual de morte do animal na arena (com exceção de
Barrancos e Reguengos de Monsaraz), isso não significa que este espetáculo seja menos cruel ou que provoque
menor sofrimento nos animais.
Em Portugal, depois de lidados na arena, os touros são recolhidos vivos para os currais da praça de touros,
onde se inicia um bárbaro processo de remoção das bandarilhas, que acrescenta mais sofrimento e dor aos já
exaustos animais. Os touros são amarrados e imobilizados para que os «emboladores» possam arrancar as
bandarilhas cravadas nos animais. Como este processo decorre durante o espetáculo, não está presente
nenhum médico veterinário nos curros para proceder ao arranque das farpas. Os «emboladores» utilizam uma
faca, ou um pequeno canivete, para cortar a carne do animal e conseguir arrancar as farpas em forma de arpão.
Após este doloroso processo, os animais são mantidos nos currais até ao final do espetáculo. Mais tarde,
são transportados para o matadouro onde se procede ao seu abate.
O atual regulamento tauromáquico (Decreto-Lei n.º 89/2014, de 11 de junho), também designado de RET,
estabelece que, nas praças de touros fixas, os touros devem ser abatidos após a lide em salas criadas para o
efeito, por um médico veterinário ou segundo a sua orientação e supervisão. No entanto, não há registo de
nenhum abate de touros realizado em salas de abate nas praças de touros em Portugal desde 2014.
Isto porque a mesma legislação prevê que só são abatidos nas salas de abate das praças os animais que
«tenham como destino a introdução da carne no consumo humano» e que, caso não existam salas de abate, os
animais são encaminhados para abate em matadouro, tendo de ser obrigatoriamente abatidos no período
máximo de cinco horas, a contar do fim do espetáculo. Os animais lidados nas praças de touros ambulantes
também são transportados para abate no matadouro.
Ou seja, na prática, todos os animais são encaminhados para o matadouro, especialmente no matadouro de
Mafra, exceto aqueles que são «indultados» e aproveitados para ser reprodutores, o que raramente acontece,
e os que são reaproveitados para as largadas de touros, situação que tem sido documentada nos últimos anos
e que constitui um sofrimento extra para os animais.
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Esta situação viola claramente a legislação comunitária que proíbe expressamente o transporte de animais
feridos. O Regulamento (CE) n.º 1/2005, do Conselho, de 22 de dezembro de 2004, relativo à proteção dos
animais durante o transporte, estabelece no Capítulo I do Anexo I (Aptidão para o transporte) estabelece que
«não pode ser transportado nenhum animal que não esteja apto a efetuar a viagem prevista, nem as condições
de transporte podem ser de molde a expor o animal a ferimentos ou sofrimento desnecessários» (n.º 1).
Não podem ainda ser transportados «os animais feridos ou que apresentem problemas fisiológicos ou
patologias não podem ser considerados aptos a serem transportados, nomeadamente, se forem incapazes de
se deslocar autonomamente sem dor ou de caminhar sem assistência ou apresentarem uma ferida aberta grave
ou um prolapso» (n.º 2).
O mesmo regulamento determina que animais feridos ou doentes podem ser considerados aptos a serem
transportados se estiverem ligeiramente feridos ou doentes, desde que o seu transporte não provoque
sofrimento adicional, e no âmbito de uma série de exceções que não incluem a atividade tauromáquica.
É consensual que o transporte dos touros feridos numa tourada, da praça até ao matadouro, é um momento
de intenso sofrimento e stresse para os animais, sendo que, alguns morrem durante esta viagem que pode ser
bastante demorada, dependendo do local onde se realizou a tourada e do horário de funcionamento do
matadouro.
Ao sofrimento dos touros há que acrescentar o sofrimento dos cavalos utilizados nestes espetáculos, cujo
bem-estar é completamente ignorado pelo Decreto-Lei n.º 89/2014, de 11 de junho (RET).
O regulamento não prevê condições para o alojamento destes animais, nem regras para o seu
manuseamento ou a utilização de substâncias dopantes ou de instrumentos que lhes provoquem sofrimento
adicional. Não há nenhuma medida que garanta a assistência veterinária aos cavalos de toureio no caso de
acidente ou colhida, situação que ocorre com alguma frequência, havendo ainda registo de vários cavalos que
morrem de forma súbita nas arenas portuguesas.
Só entre 2011 e 2023 há registo da morte de 13 cavalos a tourear em Portugal que sucumbiram de forma
súbita durante a lide perante o pânico dos espectadores nas bancadas.
A extrema violência da «tourada à portuguesa» e o elevado grau de maus-tratos a que os animais são sujeitos
nestes espetáculos tem motivado uma crescente contestação da população que, na sua maioria, não se revê
neste tipo de tradição.
Atualmente, os dados da IGAC (Inspeção-Geral das Atividades Culturais) indicam que as touradas estão
praticamente confinadas às regiões de Lisboa e Vale do Tejo e a algumas zonas do interior do Alentejo.
Na temporada de 2023 atingiu-se o número mais baixo de sempre de touradas realizadas em Portugal (166)
e os valores têm vindo sempre a descer, desde 2009.
Na região norte as touradas praticamente desapareceram nos últimos anos com o fim da atividade
tauromáquica em Viana do Castelo e na Póvoa de Varzim, onde as autarquias decidiram investir na reconversão
das praças de touros em equipamentos destinados à prática desportiva e à cultura, sendo vistos
internacionalmente como exemplos de evolução civilizacional.
Na temporada de 2023 só se realizou uma tourada numa praça de touros fixa em toda a região Norte do
País, na localidade de Urrós (concelho de Mogadouro).
Também no Algarve as touradas desapareceram com o encerramento da praça de touros de Albufeira em
2020. A praça de Albufeira era a que mais touradas promovia em Portugal, mas era também a que tinha a mais
baixa média de público.
Antes de Albufeira, já outros municípios algarvios tinham abdicado de touradas, nomeadamente, Castro
Marim (desde 2011), Loulé (desde 2010), Vila do Bispo (desde 2008), Vila Real de Santo António (desde 2011),
Faro (desde 2009), Silves (desde 2013), Lagoa (desde 2010), Tavira (desde 2014), Monchique (desde 2012),
Portimão (desde 2010).
Durante anos, a dimensão do público das touradas foi inflacionado pelas estimativas publicadas pela IGAC,
situação que foi corrigida em 2021, quando passou a ser o Instituto Nacional de Estatística a contabilizar os
bilhetes vendidos e oferecidos para os espetáculos tauromáquicos. A diferença era significativa. Por exemplo,
em 2019, a IGAC contabilizou 383 938 espectadores, enquanto os dados do INE indicam um total de 284 000
espectadores.
O decréscimo significativo de touradas realizadas e de público reflete-se nas sondagens recentemente
realizadas que indicam claramente que a maioria da população portuguesa é contra a realização de touradas.
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Em 2020 foi publicado um estudo na revista científica Animals intitulado Uma Avaliação da Opinião da
Sociedade Portuguesa sobre a Prática da Tauromaquia que foi redigido por seis investigadores das
Universidades de Santiago de Compostela (Espanha), Universidade de Évora, Instituto Piaget, Universidade de
Guelph (Canadá) e do Instituto Politécnico de Portalegre.
Segundo este estudo, 67 % da população portuguesa considera que as touradas não devem ser permitidas,
principalmente pela questão do bem-estar animal. Apenas 30,3 % consideram que as touradas devem ser
mantidas e 2,8 % dos inquiridos neste estudo não responderam à questão.
O estudo revelou ainda que 56 % dos portugueses consideram que as touradas não favorecem a economia,
62,3 % consideraram que não favorecem o turismo e 67,2 % acham que as touradas não favorecem a cultura.
Setenta e um vírgula quatro porcentos consideraram que as touradas não devem ser financiadas com fundos
públicos e a esmagadora maioria (84,7 %) referiu que os touros sofrem durante as touradas.
Mais recentemente, em 2024, uma sondagem realizada pela Ipsos I&O Public, entre os dias 20 de março e
3 de abril de 2024, confirmou que a maioria da população portuguesa não se identifica com as touradas e
defende que esta tradição deve ser proibida no nosso País.
A sondagem foi realizada em Portugal, Espanha e França, entrevistando um total de 7500 pessoas (2500
portugueses), e revelou que 60 % da população portuguesa defende a abolição das touradas enquanto 71 %
dos portugueses consideram que não deve ser gasto dinheiro público para apoiar a tauromaquia e 74 %
consideram que a União Europeia deve proteger o bem-estar animal no âmbito das tradições culturais.
Entre os 3 países avaliados na sondagem, os portugueses são os que mais concordam com a abolição das
touradas (a par dos franceses), os que mais discordam com o gasto de fundos públicos com as touradas e os
que mais defendem que a União Europeia deve proteger o bem-estar animal nas tradições culturais.
O repúdio da sociedade portuguesa pela violência da tauromaquia tem vindo a manifestar-se, por exemplo,
no meio académico, onde foram abolidas várias «garraiadas académicas», como em Vila Real, Porto, Coimbra,
Évora, Tomar, Viseu ou no Algarve. No caso de Coimbra, em 2018 a Associação Académica promoveu um
referendo no qual 70,7 % dos estudantes votaram contra a realização da garraiada na praça de touros da
Figueira da Foz.
Como forma de tentar perpetuar a tradição tauromáquica, tem sido feito um investimento na promoção das
touradas junto dos mais jovens, quer através da oferta de bilhetes quer com a criação de «escolas de toureio»,
onde se ensinam as crianças a agredir animais.
Os efeitos negativos da exposição de crianças e jovens à violência da tauromaquia, uma atividade que além
da violência contra animais, inclui acidentes de grande impacto com feridos e mortos, estão solidamente
demonstrados.
A Ordem dos Psicólogos já se pronunciou sobre o «impacto psicológico da exposição das crianças aos
eventos tauromáquicos», em junho de 2016, através de um parecer enviado à Assembleia da República,
considerando que a exposição das crianças à violência «não é benéfica para as crianças ou para o seu
desenvolvimento saudável, podendo inclusivamente potenciar o aparecimento de problemas de saúde
psicológica». (sublinhado nosso)
Também a Amnistia Internacional se pronunciou sobre este tema em 2015. A instituição de direitos humanos
emitiu um parecer onde considera que as crianças e jovens não podem participar em touradas por se tratar de
uma atividade violenta e que coloca em risco a sua segurança e saúde. Neste sentido, advertiu a Assembleia
da República e os seus constituintes que «considerem e fundamentem sempre o superior interesse da criança
nos documentos que a estas digam respeito e que façam cumprir tratados e convenções internacionais
assinados pelo Governo da República e ratificados por esta Assembleia».
O carácter violento e sangrento dos espetáculos tauromáquicos realizados em Portugal também foi
reconhecido e contestado internacionalmente pelo Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas, que no
último relatório de avaliação de Portugal, publicado em 27 de setembro de 2019, reservou um capítulo à
«violência da tauromaquia» advertindo o Estado português a estabelecer «a idade mínima para participação e
assistência em touradas e largadas de touros, inclusive em escolas de toureio, em 18 anos, sem exceção, e
sensibilize os funcionários do Estado, a imprensa e a população em geral sobre efeitos negativos nas crianças,
inclusive como espectadores, da violência associada às touradas e largadas».
Apesar deste pronunciamento, em maio de 2022, uma criança de apenas 15 anos morreu de forma
extremamente violenta numa largada de touros em Portugal, sendo perfurada na garganta, sem que ninguém
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tenha assumido a responsabilidade por esta morte, nem sequer cancelado as largadas de touros em respeito à
vítima e à sua família.
O mesmo Comité da ONU considerou no seu Comentário Geral n.º 26, no passado dia 22 de agosto de 2023,
que os países subscritores da Convenção dos Direitos da Criança (onde Portugal se inclui) devem «proteger as
crianças de todas as formas de violência física e psicológica e da exposição à violência, como a violência
doméstica ou a violência infligida aos animais».
Atualmente em Portugal, crianças de todas as idades continuam expostas ao perigo e à violência, nas
bancadas das praças de touros, nas largadas e nas escolas de toureio que são financiadas com fundos públicos.
A utilização de fundos públicos para perpetuar a atividade tauromáquica é uma das questões mais
contestadas pela população portuguesa nas sondagens realizadas. Atualmente, estima-se que sejam gastos
cerca de 19 milhões de euros na promoção da atividade tauromáquica, grande parte deste dinheiro com origem
nas câmaras municipais onde persiste a atividade tauromáquica.
O Estudo sobre o financiamento público das touradas em Portugal, realizado pela plataforma cívica «Basta
de touradas», indica que, além dos fundos gastos pelas autarquias na compra de bilhetes, publicidade,
organização de festejos tauromáquicos, reabilitação e manutenção de praças de touros, financiamento de
escolas de toureio e subsídios a associações tauromáquicas, são canalizados mais de 15 milhões de euros de
fundos comunitários para a criação de touros de lide e cavalos de toureio.
É incompreensível como fundos da PEPAC, que deviam ser investidos na modernização da nossa agricultura
e em garantir o bem-estar animal, sejam desviados para a criação de touros para touradas.
Neste sentido, e sendo evidente que o caminho natural da sociedade portuguesa é na direção da abolição
definitiva das touradas, sendo este um passo civilizacional inevitável num País civilizado, que promove o bem-
estar animal e que é membro da União Europeia, o PAN propõe que, finalmente, a sociedade seja ouvida através
da realização de um referendo nacional sobre a utilização de financiamento público a esta atividade e a abolição
das touradas.
O referendo pode ser convocado por decisão do Presidente da República, mediante proposta da Assembleia
da República, em matérias das respetivas competências e nos termos previstos na Constituição e na lei e o seu
objeto deve ser uma questão de relevante interesse nacional que deva ser decidida pela Assembleia da
República ou pelo Governo.
Assim, e subsumindo-se o tema a um tema de relevância nacional, não excluído expressamente na lei,
poderá o mesmo ser referendado, sendo as perguntas formuladas com objetividade, clareza e precisão, para
respostas de «sim» ou «não».
A Assembleia da República resolve, nos termos e para os efeitos do artigo 115.º e da alínea j) do artigo 161.º
da Constituição da República Portuguesa, apresentar a S. Ex.ª o Presidente da República a proposta de
realização de um referendo em que os cidadãos eleitores recenseados no território nacional sejam chamados a
pronunciar-se sobre a pergunta seguinte:
«Concorda com a abolição das touradas em Portugal?»
Assembleia da República, 14 de setembro de 2024.
A Deputada do PAN, Inês de Sousa Real.
–——–
PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 294/XVI/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO MEDIDAS DE REFORÇO NO ÂMBITO DA AÇÃO SOCIAL ESCOLAR NO
ENSINO SUPERIOR
Segundo a UNESCO, podemos considerar que os sistemas de ensino superior equitativos são aqueles que
garantem que «os únicos fatores que definem o acesso, a participação e os resultados de um indivíduo no ensino
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superior são a sua capacidade inata e o seu esforço (…), garantem que o potencial de sucesso de um indivíduo,
em níveis mais avançados de educação, não tem por base as suas circunstâncias pessoais e sociais, tais como
a sua condição socioeconómica, o seu género, a sua origem étnica, a sua condição imigrante num dado País,
o seu local de residência, a sua idade, ou mesmo o facto de ser portador de algum tipo de deficiência»1.
Neste segmento, nos últimos anos, de forma consistente e continuada, garantiu-se a promoção da qualidade
e da equidade no ensino superior, através de melhor formação, mais oportunidades e mais apoios. Desta forma,
os anteriores Governos, liderados pelo Partido Socialista2, assumiram, desde 2016, o compromisso em
aumentar o financiamento da ação social e das instituições de ensino superior, de forma a garantir um
investimento com mais estabilidade, transparência, coesão e sustentabilidade.
O reforço da ação social é a garantia que todos os estudantes que assim o desejem possam prosseguir os
seus estudos, independentemente das suas origens socioeconómicas e/ou geográficas. Para a prossecução
destes objetivos, é fulcral a eficiência do sistema de ação social e da previsibilidade e da rapidez da atribuição
de apoios.
Em 2023, o sistema de acesso ao ensino superior foi revisto e atualizado, nas suas múltiplas vertentes,
estimulando a democratização e diversificação do seu acesso, tendo sido introduzido um amplo conjunto de
alterações e inovações3.
Destas medidas, destaca-se, desde logo, a criação de um contingente prioritário para os candidatos
beneficiários de escalão A da Ação Social Escolar. Este contingente disponibilizou um mínimo de duas vagas
por curso4, correspondendo a mais de 2000 vagas para colocação prioritária desses estudantes. Assim, ao
abrigo deste contingente, foram colocados 1031 estudantes, contrariando o desequilíbrio no acesso aos cursos
mais procurados. Sem este contingente prioritário não teria entrado nenhum estudante carenciado em 80 % dos
cursos que tiveram nota de ingresso mais elevada, apesar das suas médias serem muito aproximadas.
Em 2024, o Fundo da Ação Social foi reforçado em 70 milhões de euros de receitas de impostos que
representa um aumento de mais de 25 % em relação a 2023. Este aumento de receitas de impostos, associados
a 141 milhões de euros de fundos comunitários, perfazendo um orçamento total de 211 milhões de euros no
Fundo de Ação Social, permitiu a concretização do reforço dos apoios aos estudantes bolseiros, dos quais se
destaca:
⎯ Alargamento das condições de acesso a bolsa, com o aumento do limiar de elegibilidade de 9484,27 € de
rendimento per capita anuais para 11 049,89 € de rendimento per capita anuais, permitindo aumentar o
número de bolsas de estudo.
⎯ Aplicação de um limiar de elegibilidade mais elevado, para trabalhadores-estudantes e estudantes que
comprovem ter auferido rendimentos pontuais, passando de 9484,27 € para 12 569,89 €.
⎯ Aumento do valor máximo da bolsa de estudo – 5981,73 € – crescendo 7 % face ao ano letivo 2022-2023.
⎯ Aumento do valor mínimo de bolsa de estudo para estudantes inscritos em mestrado.
⎯ Aumento dos complementos de alojamento fora de residência, de modo que estes reflitam a evolução dos
custos de arrendamento suportados pelos estudantes deslocados que careçam de recorrer ao
alojamento privado para frequentar o ensino superior.
⎯ Alargamento das Bolsas + Superior5 a mais estudantes (nomeadamente aos que frequentem mestrados
e todos os inscritos que não tenham requerido o apoio no ano da sua colocação).
⎯ Atribuição automática de bolsas de estudo na fase de colocação dos candidatos ao ensino superior que
beneficiem do 1.º, 2.º ou 3.º escalões de abono de família.
⎯ Alargamento dos apoios sociais aos estudantes em situação de emergência humanitária, provenientes da
Síria, bem como a refugiadas afegãs e renovação dos apoios aos estudantes em situação de proteção
1 UNESCO – «Six ways to ensure higher education leaves no one behind», pág. 4, disponível em Six ways to ensure higher education leaves no one behind – UNESCO Digital Library 2 XXI Governo Constitucional, XXII Governo Constitucional e XXIII Governo Constitucional. 3 Estas alterações produziram já alguns dos seus efeitos no acesso ao ensino superior para o ano letivo de 2023/24, embora a totalidade das alterações seja feita de forma gradual, concluindo-se no ano letivo de 2025/26. 4 Ou 2 % das vagas quando o curso tenha mais de 100 vagas. 5 O Programa +Superior é uma medida que visa incentivar e apoiar a frequência do ensino superior em regiões do País com menor procura e menor pressão demográfica por estudantes economicamente carenciados que residem habitualmente noutras regiões.
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temporária provenientes do conflito militar na Ucrânia, sendo atribuída a bolsa máxima e eventuais
complementos.
Com estas medidas, verifica-se que entre 2014/15 e 2023/24 o limiar de elegibilidade aumentou 59 % para
estudantes não trabalhadores e 81 % para trabalhadores-estudantes; e que entre 2014/15 e 2023/24 a bolsa de
estudo máxima (que indexa todas as demais) aumentou 5 % para estudantes de licenciatura e 42 % para
estudantes de mestrado.
Assim, registou-se já no ano letivo 2023/2024, uma aceleração da atribuição e pagamento de bolsas de
estudo, largamente superior a qualquer outro ano letivo, com cerca de 6000 processos decididos no dia da
colocação dos estudantes e com o número mais elevado de sempre de pagamentos ao fim do primeiro mês de
aulas (mais de 32 mil bolseiros a receberam bolsa de estudo em setembro). Este valor representa um
crescimento de mais de 19 mil bolseiros pagos face a setembro de 2022 (aumento de 153 % no número de
bolsas pagas).
Adicionalmente, no que diz respeito à questão do alojamento, o qual constitui atualmente a principal barreira
no acesso ao ensino superior, foi implementado o Plano Nacional para o Alojamento no Ensino Superior
(PNAES)6 – construção, aquisição, adequação e renovação de residências para estudantes de ensino superior,
no âmbito do PRR7. O PNAES concretiza o maior investimento de sempre no alojamento no ensino superior,
sendo possível, fruto do mesmo, passar de 157 para 243 residências e de 15 073 para 26 772 camas,
contribuindo, de modo significativo, para uma maior equidade e justiça social no ensino superior, através da
redução dos custos de frequência do ensino superior.
A par do PNAES, destacamos, ainda, o reforço do complemento de alojamento para os estudantes bolseiros
deslocados do ensino superior público, que careçam de recorrer ao alojamento privado para frequentar o ensino
superior, garantindo que os complementos pagos estão de acordo com o preço médio do alojamento privado
praticado nas diferentes cidades do País, refletindo, assim, a sua evolução.
Com este reforço, os estudantes bolseiros deslocados, alojados fora de residência pública, passaram a
receber anualmente entre 2642,40 € e 5020,5 € de apoio para custear as suas despesas de alojamento.
De realçar que, o complemento de alojamento desde setembro de 2022, foi aumentado, por quatro vezes,
tendo crescido entre 17 % a 63 %, acima do aumento dos preços do alojamento privado.
Ademais, nesta legislatura, o Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentou o Projeto de Lei n.º
131/XVI/1.ª – Aprova o regime jurídico de complemento de alojamento, alargando-o a estudantes deslocados
não-bolseiros provenientes de agregados familiares de rendimento anual inferior aos constantes do limite do 6.º
escalão de IRS.
Assim, todas estas medidas foram desenvolvidas com base na promoção da equidade e da diversificação do
perfil dos estudantes, através do alargamento das vias de acesso; na redução da desigualdade de oportunidades
entre candidatos com as mesmas características; no aumento da representação de grupos vulneráveis e sub-
representados no sistema de ensino superior; na incrementação da autonomia das IES na gestão das vias de
acesso, sem sacrificar os princípios fundamentais do sistema; na agilização e simplificação do sistema de acesso
ao ensino superior; e nas respostas mais equilibradas para a transição dos alunos entre o final do ensino
secundário e o ensino superior.
Estas medidas têm sido cruciais para democratizar o acesso ao ensino superior em Portugal, refletindo,
inequivocamente, o compromisso contínuo com a promoção da igualdade de oportunidades na educação.
Contudo, e apesar de todos os esforços concertados ao longo dos últimos oito anos, é fundamental
prosseguir com aumento de bolsas e complementos, reforçando, constantemente, o Fundo de Ação Social,
6 Criado em 2018 e regulamentado em 2019, o PNAES assenta numa matriz incremental, dinâmica e evolutiva, convocando o envolvimento ativo de diferentes atores – entre instituições de ensino superior, autarquias e outras entidades públicas e de solidariedade social – e enquadra a construção de novas residências de estudantes, a reabilitação das estruturas de alojamento já em funcionamento e a utilização de disponibilidades de entidades públicas, privadas e de solidariedade social, fomentando o estabelecimento de parcerias entre instituições. 7 Para impulsionar a execução do PNAES, o anterior Governo lançou um programa de financiamento, no âmbito do PRR, para candidaturas de entidades públicas que incluiu um montante de 375 milhões de euros de apoio financeiro em subvenções à construção, adaptação e renovação de alojamento para estudantes a preços acessíveis. Atendendo à forte mobilização das entidades elegíveis como beneficiários finais, o anterior Governo reforçou a dotação inicial em 72 milhões de euros, de modo a financiar todas as candidaturas aprovadas por mérito e a garantir a disponibilização de mais 2343 camas novas, num investimento total previsto de 447 milhões de euros. Com a reprogramação do PRR o financiamento de 447 milhões de euros já atribuídos para financiamento para construção e reabilitação de residências são revistos e ascendem agora a 517,4 milhões de euros.
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assegurando, para o efeito, as condições de frequência do ensino superior e de conclusão dos ciclos de estudos
para estudantes carenciados. Só assim será possível continuar a contribuir para a redução das desigualdades
sociais, promovendo o desenvolvimento sustentável e as políticas de coesão social e territorial do País.
Nesta senda, destacamos ainda o complemento de deslocação, introduzido no Regulamento de Atribuição
de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior (RABEES), pelo Despacho n.º 9619-A/2022, de 4 de
agosto.
Esta medida, proposta pelo Grupo Parlamentar do PS e pela Juventude Socialista (JS), no Orçamento do
Estado para 2022, visou a criação de um complemento de deslocação, num valor de 25 € mensais e 250 €
anuais, a ser atribuído aos estudantes deslocados beneficiários de bolsa de ação social, de forma a apoiar as
suas deslocações entre a localidade da sua residência habitual e a localidade das instituições de ensino que
frequentam. Já no Orçamento do Estado para 2024, novamente por proposta do GP PS e da JS, foi aumentado
o valor do complemento de deslocação para 40 € mensais, num valor anual de 400 €.
Contudo, nos termos do Regulamento de Atribuição de Bolsas de Estudo a Estudantes do Ensino Superior,
estipulado no artigo 20.º-C, somente os estudantes bolseiros deslocados que sejam beneficiários de
complemento de alojamento, nos termos do disposto nos artigos 18.º e seguintes do RABEES, têm direito à
atribuição do complemento de deslocação. Ora, esta interpretação restritiva prejudica os estudantes bolseiros
que se encontram nas residências universitárias, já que o espírito do complemento de alojamento seria,
logicamente, aplicar-se tanto aos estudantes a quem tenha sido concedido alojamento em residência dos
serviços de ação social, como aqueles que não o tendo obtido, tenham de encontrar alojamento no mercado
habitacional. Esta situação carece de ser resolvida com a máxima urgência, em prol da equidade dos estudantes
beneficiários da ação social.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados
do Grupo Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República
Portuguesa, recomendar ao Governo que:
a) Reforce o número de bolsas de estudo e complementos até 100 mil bolseiros, aumentando o valor da
bolsa de referência.
b) Reforce gradualmente o Fundo de Ação Social, procurando atingir, no final da legislatura, o valor de 150
milhões de euros.
c) Alargue o complemento de deslocação a todos os alunos deslocados bolseiros, revendo, também, o
modelo do complemento de deslocação (40 €/mês), para majorar o valor do apoio consoante a distância entre
a residência e o local de frequência de ciclo de estudos.
d) Termine com a reposição de bolsas por pagamento em excesso, equiparando a redução do valor da bolsa
ao indeferimento da bolsa, onde também não há lugar a reposição.
e) Prossiga e reforce os mecanismos que asseguram a frequência do ensino superior e de conclusão dos
ciclos de estudos por estudantes carenciados.
f) Continue o reforço das condições de alojamento estudantil, garantindo a plena execução do Plano
Nacional para o Alojamento no Ensino Superior, procurando atingir em 2028 as 30 mil camas em oferta pública
de alojamento.
Palácio de São Bento, 13 de setembro de 2024.
Os Deputados do PS: Alexandra Leitão — Isabel Ferreira — Rosário Gambôa — Miguel Matos.
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16 DE SETEMBRO DE 2024
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 295/XVI/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO A CRIAÇÃO DE UMA REDE DE POSTOS DE ATENDIMENTO NAS
CIDADES DE MAIOR DENSIDADE DE EMIGRAÇÃO PORTUGUESA
Exposição de motivos
Portugal conta uma das mais importantes diásporas do globo – em números absolutos e, mais ainda, em
termos relativos. Mesmo ignorando as largas dezenas de milhões de lusodescendentes de ancestralidade
portuguesa mais recuada, que a generalidade dos estudos coloca entre os 35 e os 50 milhões, entre emigrantes
recentes e seus descendentes diretos contam-se mais de cinco milhões de portugueses. Trata-se de um dos
mais relevantes ativos estratégicos ao serviço do Estado português: reserva demográfica impressionante e fator
de divulgação da língua, da história e da cultura nacionais, a diáspora é a mais eficaz das nossas embaixadas
e porta segura de Portugal para o mundo.
Persiste difícil, no entanto, a ligação de muitos emigrantes portugueses à pátria-mãe. A rede consular mostra-
se insuficiente para atender às suas necessidades: para demasiados compatriotas, recorrer-lhe significa
enfrentar, não raro, distâncias de centenas de quilómetros; envolve navegar burocracias, horários de
atendimento inamistosos, agendamentos difíceis e frequentes desmarcações. Resulta tudo isso na eternização
de processos e em prejuízo grave para os emigrantes.
Constitui indeclinável dever do Estado garantir a todos os portugueses – façam eles vida onde fizerem,
residam onde residirem – o pleno acesso à vida comum da Nação. Passo importantíssimo a dar, nessa direção,
seria a criação de uma rede de postos de atendimento para emigrantes, semelhantes no perfil e nas atribuições
às lojas do cidadão e espalhadas pelo mundo. No modelo proposto, seria estabelecido um destes postos em
todas as cidades e/ou regiões metropolitanas estrangeiras onde residam pelo menos 30 000 portugueses,
15 000 deles eleitores recenseados. Naquelas de mais relevante presença portuguesa – realidade de que são
exemplo Paris, São Paulo ou Londres – garantir-se-ão estes postos à razão de um por cada 100 000
portugueses residentes e 50 000 eleitores recenseados.
Medida de indiscutível justiça, a rede que se propõe facilitaria para milhões de compatriotas a relação com o
País, alargaria o número de eleitores recenseados e estimularia a participação eleitoral. Esta ponte com as
comunidades portuguesas, sendo para elas gesto de relevo e para o Estado passo estratégico, não representaria
para o erário mais que um peso simbólico. Com efeito, nas condições apresentadas, bastariam para cobrir
adequadamente todo o continente europeu entre quarenta e cinquenta destes balcões; esta rede não exigiria,
pois, mais de cem funcionários. Seria isto o equivalente, em média, aos que servem um município português de
pequena dimensão – é dizer, com menos de 30 000 habitantes. Dos 308 concelhos portugueses, 223
enquadram-se nesta categoria. Débeis, portanto, seriam os argumentos que quisessem apresentar como
farónica ou irrealizável iniciativa que é tão modesta nos recursos que requer como ambiciosa nas consequências
que produziria.
Assim, perante as razões expostas e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis,
recomendam os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega ao Governo que:
1 – Dê início à criação de uma rede de postos de atendimento ao emigrante, semelhantes nas atribuições
às lojas do cidadão, onde possam os portugueses que vivem fora do País lidar com todas as exigências
administrativas hoje realizadas presencialmente em consulados;
2 – Garanta a facilidade de acesso das comunidades emigrantes a estes postos de atendimento por via da
sua justa distribuição geográfica, criando para o efeito critérios que determinem a criação desses postos;
3 – Se comprometa a dar início ao suprarreferido plano por meio de um projeto-piloto a desenvolver em
Paris, França, em cuja região metropolitana reside mais de um milhão de cidadãos portugueses;
4 – Aja no sentido de subordinar organicamente, numa fase inicial, estes postos às secções consulares
relevantes, laborando os primeiros como extensão dos segundos, nas áreas que se entenda melhor favorecerem
o fácil acesso das comunidades portuguesas aí residentes.
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II SÉRIE-A — NÚMERO 92
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Palácio de São Bento, 16 de setembro de 2024.
Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Ricardo Dias Pinto — Diogo Pacheco de Amorim — José Dias
Fernandes — Manuel Magno.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.