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Terça-feira, 17 de setembro de 2024 II Série-A — Número 93
XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)
S U M Á R I O
Projetos de Lei (n.os 262 a 265/XVI/1.ª): N.º 262/XVI/1.ª (CH) — Altera a Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, o Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril, procedendo à inclusão de medidas especiais que permitam a criação de equipas municipais de socorro animal. N.º 263/XVI/1.ª (CH) — Atribuir aos sapadores florestais e aos bombeiros de associações humanitárias a qualificação de profissão de desgaste rápido bem como a atribuição de subsídio de risco. N.º 264/XVI/1.ª (PS) — Procede à terceira alteração à Lei n.º 16/2017, de 17 de abril, alterando alguns dos requisitos para a realização da interrupção voluntária da gravidez não punível e densificando o regime de exercício do direito individual de objeção de consciência. N.º 265/XVI/1.ª (PCP) — Repõe os procedimentos de autorização de residência assentes em manifestações de interesse e revoga o Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de junho
(décima sexta alteração à Lei n.º 23 /2007, de 4 de julho). Proposta de Lei n.º 20/XVI/1.ª (Procede à segunda alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, que aprova medidas especiais de contratação pública): — Alteração do texto inicial da proposta de lei. Projetos de Resolução (n.os 296 e 297/XVI/1.ª): N.º 296/XVI/1.ª (PS) — Recomenda ao Governo que denuncie ao Tribunal Penal Internacional como crime contra a humanidade o ataque aos direitos das mulheres no Afeganistão. N.º 297/XVI/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo que defenda, junto do Irão e da comunidade internacional, os direitos das mulheres iranianas. Projeto de Deliberação n.º 11/XVI/1.ª (PAR): Concessão de processo de urgência.
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PROJETO DE LEI N.º 262/XVI/1.ª
ALTERA A LEI N.º 27/2006, DE 3 DE JULHO, O DECRETO-LEI N.º 45/2019, DE 1 DE ABRIL,
PROCEDENDO À INCLUSÃO DE MEDIDAS ESPECIAIS QUE PERMITAM A CRIAÇÃO DE EQUIPAS
MUNICIPAIS DE SOCORRO ANIMAL
Exposição de motivos
A proteção animal tem assumido, nos últimos anos, especial relevância político-normativa e social, quer em
Portugal, como em toda a Europa e por todo o mundo.
Assim o revela, aliás, o Eurobarómetro publicado em março de 2023, que, centrado nas condutas dos
cidadãos europeus relativamente ao bem-estar animal, apresentou entendimentos de 84 % dos cidadãos no
sentido de urgir aumentar substancialmente a proteção e bem-estar dos animais de criação1.
Nesse sentido, tem conjeturado o legislador europeu e português regimes legais de proteção aos animais,
com especial expressão no que concerne aos estatutos e reconhecimento dos animais de companhia.
Com efeito, já previne o legislador europeu, ex vi da Diretiva 2010/63/EU, do Parlamento Europeu e do
Conselho, de 22 de setembro de 2010, que consagra o regime relativo à proteção dos animais utilizados para
fins científicos, a salvaguarda do bem-estar dos animais utilizados ou destinados a ser utilizados.
Do mesmo modo, também o legislador português instituiu no Código Penal a criminalização de condutas
prejudiciais ao bem-estar dos animais, especificamente consagrando os crimes de maus-tratos e abandono de
animais de companhia.
Inexiste, todavia, um regime planeado e articulado com a proteção civil que regule os procedimentos de
resgate e auxílio a animais em situação de emergência, como incêndios ou outras catástrofes. Tais situações,
em rigor, afetam não só populações e bens como também, de forma devastadora animais de várias tipologias –
selvagens, assilvestrados, de pecuária ou de companhia.
No entanto, até à data, todas as iniciativas que fundamentaram a necessidade de um plano nacional de
resgate animal ou medidas adicionais ao Plano Nacional de Emergência e Proteção Civil foram rejeitadas.
Consequência dos inúmeros incêndios ocorridos de norte a sul do País, os últimos cinco anos ficaram
marcados pela confirmação de que existe uma total ausência de respostas programadas quer de socorro em
caso de emergência, quer de resposta àqueles que mesmo resgatados sofreram graves ferimentos.
Em 2017, ano que será recordado como o ano dos grandes incêndios do Pinhal Interior, primeiramente em
junho em Pedrógão Grande2, distrito de Leiria, e, posteriormente, em outubro, na região centro e norte do País,
assistimos ao sofrimento de milhares3 de animais feridos pelas chamas, à recolha de milhares de cadáveres, à
destruição de ecossistemas e aos pedidos de ajuda de clínicas veterinárias, associações e voluntários para dar
resposta. Meio milhão de animais perderam a vida.
O ano de 2018 ficou marcado pelo grande incêndio da serra de Monchique a sul do País, que correspondeu
a 75 %4 da área total ardida nesse ano. Alastrou para concelhos vizinhos, essencialmente explorações
suinícolas e de pecuária, e atingiu o Centro Nacional de Reprodução do Lince-Ibérico, obrigando à retirada de
29 felinos para Espanha. Resultaram deste incêndio, mortos ou feridos, 17375 animais de criação, a morte de
centenas de animais de companhia, a destruição de milhares de colmeias e um número incalculável de animais
selvagens perderam também a vida.
Em 2020, em Santo Tirso, um incêndio propagou-se atingindo dois abrigos ilegais, resultando na
carbonização de 736 animais. Muitos populares, voluntários e associações de defesa dos animais acusam a
GNR de não ter permitido que se salvassem os animais, em nome da propriedade privada.
Em 2021 o incêndio que deflagrou em Castro Marim e que se alastrou a outros dois concelhos consumiu a
vida de pelo menos 147 animais que se encontravam num abrigo ilegal em Vila Real de Santo António.
1 Cfr. Barómetro da União Europeia, «Attitudes of Europeans towards animal welfare», disponível in https://europa.eu/eurobarometer/surveys/detail/2996 2 Centenas de animais terão morrido no incêndio de Pedrógão Grande – Tragédia em Pedrógão Grande – Público (publico.pt) 3 Morreram mais de 500 mil animais nos incêndios de outubro – Agricultura e Pescas – Jornal de Negócios (jornaldenegocios.pt) 4 Incêndios: Maior fogo de 2018 foi em Monchique há seis meses e lavrou oito dias (dn.pt) 5 1737 animais feridos ou mortos pelo fogo de Monchique – Portugal – Correio da Manhã (cmjornal.pt) 6 Tudo o que se sabe sobre o incêndio que matou 73 animais em Santo Tirso (dn.pt) 7 Incêndio de Castro Marim. Câmara desconhecia abrigo onde morreram animais no Algarve – Renascença (sapo.pt)
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No ano de 2022, os fogos foram devastadores, sobretudo na serra da Estrela. Ao número incalculável de
animais carbonizados, acrescenta-se a devastação de comunidades pastoris, resultando na necessidade de
apoio alimentar de emergência a mais de 5000 animais. Valeu a boa vontade e dedicação daqueles que se
sensibilizaram com a causa em defesa da continuidade da pastorícia e das comunidades de montanha, que
distribuíram 123,2 toneladas de alimentação.
Comum a todas as supramencionadas ocorrências foi a incapacidade de o Estado dar resposta ao socorro
animal. Revelaram-se erros de décadas de um país que arde repetidamente, mas inerte na execução de
medidas preventivas, onde impera a descoordenação, as falhas de comunicação, a insuficiência de meios e
uma crónica sensação de impotência vivida pelas populações que ficam ano após ano sem auxílio. Em todas
as situações foi a sociedade civil que se uniu, organizou e deu a resposta possível às lacunas de um Estado
que falhou em toda a linha com os seus cidadãos e animais.
Destarte, Espanha e França preveem regimes em cuja estrutura da proteção civil, não obstante não
contemplar a presença de veterinários municipais, definem as figuras, respetivamente, de veterinário oficial e do
profissional veterinário, concebidas ao abrigo das Ley 8/2003 e Ley 10/2019 e o Decrét n.º 2013-728, du 12
août8, os quais preconizam o dever do médico veterinário empenhar esforços e uma atuação idêntica à do
agente de proteção civil, nomeadamente de assistência em virtude da ocorrência de uma emergência ou da sua
prevenção, com a finalidade de evitar danos, resgatar e proteger as pessoas, os bens e os animais.9
Pelo exposto, é imperativo estruturar medidas de resgate animal, que permitam a criação, ao nível municipal,
de equipas especiais de socorro animal e incluir a obrigatoriedade de constituição destas equipas no plano
municipal de proteção civil, alargando as competências da proteção civil no que ao resgate e auxílio de animais
diz respeito, em estreita articulação com municípios, adaptando estas medidas às necessidades locais com base
no seu contexto específico, atendendo ao conhecimento da fauna e da especificidade geográfica, numa
abordagem intersectorial e multidisciplinar, nomeadamente através dos planos municipais de proteção civil.
Ao nível municipal, o médico veterinário municipal deverá, obrigatoriamente, estar envolvido na preparação
ou revisão desses planos municipais de proteção civil e deverá ser reconhecido como agente de proteção civil.
Na base do sucesso de qualquer medida estará a análise de risco, o planeamento, a necessária formação aos
agentes de proteção civil, uma estratégia de comunicação, integração e coordenação interdisciplinar, os
simulacros, assim como uma efetiva cooperação com partes interessadas do sector privado e não
governamentais.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Chega apresenta o
seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei altera a Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, que aprova a Lei de Bases da Proteção Civil, e o
Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril, que aprova a orgânica da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção
Civil, procedendo à inclusão de medidas especiais que permitam a criação de equipas municipais de socorro
animal e reconhecendo os médicos veterinários municipais como agentes de proteção civil.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 27/2006, de 3 de julho
São alterados os artigos 46.º e 50.º da Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2011,
de 30 de novembro, e pela Lei n.º 80/2015, de 3 de agosto, os quais passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 46.º
[…]
1 – […]
8 Cfr. www.interieur.gouv.fr. 9 Ley 10/2019, disponível in interior.gob.es.
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a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) Os médicos veterinários municipais e, na sua impossibilidade, médico veterinário que exerça funções ao
serviço do município.
2 – […]
3 – […]
4 – […]
Artigo 50.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – […]
8 – […]
9 – […]
10 – […]
11 – Os planos de emergência de proteção civil de âmbito municipal devem prever, obrigatoriamente, as
medidas especiais aplicáveis ao resgate, socorro e assistência a animais de companhia e de espécies pecuárias,
nomeadamente a definição da constituição e organização das “equipas municipais de socorro animal”.
12 – Os parques e as reservas naturais devem ter planos de emergência e socorro para animais selvagens,
os quais devem ser articulados entre a ANEPC, os municípios, o ICNF e os centros de recuperação de animais
selvagens.»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 27/2006, de 3 de julho
É aditado o artigo 43.º-A à Lei n.º 27/2006, de 3 de julho, alterada pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de
novembro, e pela Lei n.º 80/2015, de 3 de agosto, com a seguinte redação:
«Artigo 43.º-A
Equipa municipal de socorro animal
As comissões municipais de proteção civil devem determinar a existência de uma equipa municipal de
socorro animal, a respetiva constituição, objetivos e domínios de atuação, nomeadamente procedimentos em
caso de emergência, devendo esta incluir obrigatoriamente médicos veterinários, preferencialmente
municipais.»
Artigo 4.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril
É alterado o artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 45/2019, de 1 de abril, alterado pelo Decreto-Lei n.º 43/2020, de 21
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de julho, o qual passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 8.º
[…]
1 – […]
2 – […]
3 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
K) As autarquias locais, os seus serviços de segurança e socorro, incluindo as suas equipas municipais de
socorro animal;
l) Os médicos veterinários municipais e, na sua impossibilidade, os médicos veterinários que exerçam
funções ao serviço das autarquias locais.
4 – […]
5 – […]»
Artigo 5.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor após a aprovação do Orçamento do Estado subsequente.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Cristina Rodrigues — Manuel Magno — Vanessa Barata.
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PROJETO DE LEI N.º 263/XVI/1.ª
ATRIBUIR AOS SAPADORES FLORESTAIS E AOS BOMBEIROS DE ASSOCIAÇÕES HUMANITÁRIAS
A QUALIFICAÇÃO DE PROFISSÃO DE DESGASTE RÁPIDO BEM COMO A ATRIBUIÇÃO DE SUBSÍDIO
DE RISCO
Exposição de motivos
Todas as profissões têm características diferentes, sendo que as respetivas características fazem com que
existam profissões de desgaste físico e psicológico mais rápido do que outras.
O trabalho dos bombeiros e sapadores florestais está intrinsecamente associado ao risco e à perigosidade.
Ao que se associarmos ao desgaste emocional e físico as condições extremamente difíceis onde é executado
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o trabalho, à pressão vivida por altura dos incêndios florestais, impõem a necessidade de se qualificar estas
profissões no grupo das profissões de desgaste rápido.
São sobejamente conhecidos os episódios dramáticos que ocorrem quase todos os anos em Portugal com
os profissionais desta área, no combate aos incêndios florestais.1
O Programa de Sapadores Florestais (PSF) surgiu em 1999, enquanto instrumento da política florestal, com
vista a contribuir para a diminuição do risco de incêndio e a valorização do património florestal. Este foi
concretizado com a publicação do Decreto-Lei n.º 179/99, de 21 de maio, que estabeleceu para o território do
continente, as regras e os procedimentos a observar na criação e reconhecimento de equipas de sapadores
florestais e regulamentou os apoios à sua atividade.
Tendo como objetivo a proteção da floresta contra incêndios, este programa pretendia garantir, conforme se
pode ler no preâmbulo do decreto-lei acima mencionado, a «existência de estruturas dotadas de capacidade e
conhecimentos específicos adequados, que ao longo do ano desenvolvam, com carácter permanente e de forma
sistemática e eficiente, ações de silvicultura preventiva e simultaneamente funções de vigilância e de apoio ao
combate de incêndios florestais».
Tal como os bombeiros, os sapadores florestais representam uma força inigualável em matéria de defesa da
floresta contra incêndios, desenvolvendo um valioso trabalho durante o período crítico ao nível da vigilância,
como em ações de combate, apoio ao combate, rescaldo e consolidação pós-incêndio.
Apesar de executarem diariamente tarefas de elevado risco de forma insegura, dado que são efetuadas em
terrenos de difícil acesso e em condições meteorológicas adversas seja de inverno ou de verão, estes
profissionais auferem o salário mínimo nacional, sendo os únicos agentes de proteção civil que se encontram
nesta situação. Para além disto, não recebem subsídio de risco, o que seria justo atendendo ao perigo associado
às funções desempenhadas.
Há mais de 22 anos que os sapadores florestais lutam pelo direito a ter a sua profissão regulamentada
através da criação da carreira e do estatuto profissional, que reconheça a profissão de sapador florestal e que
a classifique como profissão de rápido desgaste face à realidade e aos perigos inerentes a que todo os dias
estão expostos.
É reconhecido o trabalho e o esforço dos sapadores florestais que, de norte a sul do País, todos os dias, seja
em associações privadas ou em entidades públicas, dão o seu melhor, em múltiplas funções para defender a
nossa floresta.
A atividade de sapadores florestais e de bombeiros tem de ser considerada de desgaste rápido, à
semelhança das que já existem, face ao descrito e à semelhança dos critérios objetivos qualificativos para tal
necessários.
Existem estudos que demonstram que o trabalho que estes profissionais se sujeitam pode ter consequências
negativas para a sua saúde geral, não só pelo facto de estarem sujeitos à utilização constante de máquinas,
como a das motosserras cujo peso estimado é de 7 kg, ou o das motorroçadoras, cujo peso estimado é de 13 kg,
associado às condições dos terrenos com inclinações muito acentuadas e sob condições meteorológicas
adversas.
Portanto, devemos atentar sobre qual a idade e em que condições deverão estes profissionais usufruir das
suas reformas.
Em Portugal, presentemente, a idade legal para requerer a reforma sem qualquer tipo de penalização é aos
66 anos e 7 meses, uma idade que tem aumentado, acompanhando o aumento da esperança média de vida.
A segurança social elenca uma lista de profissões que permitem o acesso à reforma antecipada. De resto
não parece difícil a inclusão nesta lista, da profissão dos sapadores florestais e dos bombeiros de associações
humanitárias, que é precisamente o que se pretende com o presente projeto de lei, até porque os designados
bombeiros profissionais já gozam da possibilidade de antecipação de reforma.
O trabalho de silvicultura, o combate aos incêndios e todas as ações de socorro justificam a necessária
imposição da redução do tempo de reforma, salvaguardando os trabalhadores cuja idade já atingiu os 60 anos,
e pela qual estão mais suscetíveis a contrair lesões permanentes de difícil recuperação e outras doenças físicas
resultantes da atividade laboral.
Atente-se que a designação de «profissão de desgaste rápido» aparece, desde logo, no Código de Imposto
1 Nos últimos 40 anos morreram 229 bombeiros em serviço – Observador
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sobre o Rendimento de Pessoas Singulares (CIRS), mais concretamente, nas epígrafes dos artigos 27.º e 32.º-
A, sendo que o n.º 2 do artigo 27.º estipula que «[…] consideram-se profissões de desgaste rápido as de
praticantes desportivos, definidos como tal no competente diploma regulamentar, as de mineiros e as de
pescadores». Na verdade, esta disposição apenas elenca algumas (poucas!) profissões de desgaste rápido,
mantendo por esclarecer as características ou condições necessárias subjacentes a esta classificação.
Já se se analisar o Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, que define e regulamenta o regime de proteção
nas eventualidades invalidez e velhice dos beneficiários do regime geral de segurança social, verifica-se que o
artigo 20.º, n.º 1, alínea c), consagra a possibilidade de antecipação da idade de pensão de velhice, por motivo
da natureza especialmente penosa ou desgastante da atividade profissional exercida, expressamente
reconhecida por lei. Aqui, o legislador não refere «profissão de desgaste rápido», mas, sim, atividade profissional
de natureza penosa ou desgastante, contudo parece apenas uma mera falha e não uma diferenciação
propositada.
Sobre a temática em apreço, existem três critérios para classificar uma profissão como profissão de rápido
desgaste, como sejam; a pressão e stress; o desgaste emocional e físico; e as condições de trabalho, que é
exatamente o que se encontra na profissão dos bombeiros de associações humanitárias e na dos sapadores
florestais.
Na verdade, e pese embora a legislação não tenha um conceito jurídico para profissões de desgaste rápido,
este termo encaixa perfeitamente na profissão dos bombeiros (tanto que já está prevista para os bombeiros
profissionais) e na dos sapadores florestais pelo que devem estar sujeitos a igual tratamento para efeitos de
antecipação de reforma sem penalizações. Estas propostas têm sido reivindicadas pelo sector, nomeadamente
através de organizações sindicais como o SINFAP, tendo em sede de audição na Comissão de Assuntos
Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias apresentado a proposta de antecipação da reforma e atribuição
de subsídio de risco como prioridades.
Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo
Parlamentar do Chega apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei determina que a profissão de bombeiros e de sapadores florestais sejam consideradas de
desgaste rápidoe, consequentemente,regula a atribuição do direito a um suplemento remuneratório de risco,
penosidade e insalubridade, bem como no âmbito do regime geral da segurança social, as condições especiais
de acesso à pensão de velhice e de invalidez dos bombeiros e de sapadores florestais.
Artigo 2.º
Idade de acesso à pensão de velhice
A idade de acesso à pensão de velhice dos bombeiros e de sapadores florestais é de 60 anos.
Artigo 3.º
Aplicação da lei geral do regime de pensões de velhice
1 – O montante da pensão por velhice é calculado nos termos do regime geral da segurança social.
2 – O não exercício do direito previsto no presente diploma não prejudica o acesso à pensão, nos termos
gerais.
Artigo 4.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 70/2020, de 16 de setembro
São alterados os artigos 2.º e 3.º do Decreto-Lei n.º 70/2020, de 16 de setembro, os quais passam a ter a
seguinte redação:
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«Artigo 2.º
[…]
O presente decreto-lei aplica-se aos seguintes regimes de antecipação da idade de pensão de velhice:
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) […]
f) […]
g) […]
h) […]
i) […]
j) […]
k) Quanto aos bombeiros e de sapadores florestais, conforme previsto em legislação específica.
Artigo 3.º
[…]
1 – A idade de acesso à pensão de velhice dos trabalhadores abrangidos pelos regimes de antecipação
previstos nas alíneas a), b), c), e), f), i), j) e k) do artigo anterior, corresponde à idade de acesso para cada um
daqueles regimes à data de produção de efeitos do presente decreto-lei, atualizada de acordo com a evolução
da esperança média de vida aos 65 anos de idade, nos termos do n.º 3 do artigo 20.º do Decreto-Lei
n.º 187/2007, de 10 de maio, na sua redação atual, refletindo anualmente a variação verificada na idade normal
de acesso à pensão de velhice.
2 – […]»
Artigo 5.º
Alteração ao Decreto-Lei n.º 106/2002, de 13 de abril
São alterados os artigos 19.º e 29.º do Decreto-Lei n.º 106/2002, de 13 de abril, na sua redação atual, que
passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 19.º
[…]
1 – […]
2 – Com fundamento nas particulares condições de exigência relacionadas com o concreto exercício das
suas funções, os bombeiros profissionais gozam do estatuto de profissão de risco e de desgaste rápido, que
lhes confere, designadamente, o direito à atribuição de um suplemento remuneratório de risco, penosidade
e insalubridade, nos termos previstos no artigo 29.º, e o direito a condições especiais de acesso e cálculo
das pensões, previstas no Decreto-Lei n.º 87/2019, de 2 de julho.
3 – (Anterior n.º 3.)
Artigo 29.º
[…]
1 – […]
2 – O valor do suplemento pelo ónus específico da prestação de trabalho e disponibilidade permanente
atribuído aos bombeiros sapadores é integrado na escala salarial da respetiva carreira.
3 – A escala salarial dos bombeiros municipais integra uma componente correspondente ao suplemento pelo
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ónus específico da prestação de trabalho e disponibilidade permanente.
4 – […]
5 – […]
6 – […]
7 – Sem prejuízo dos suplementos remuneratórios referidos nos n.os 2 e 3, os bombeiros profissionais têm
direito à atribuição de um suplemento remuneratório de risco, penosidade e insalubridade
correspondente a um acréscimo de 15 % relativamente à respetiva remuneração base.»
Artigo 6.º
Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
Os Deputados do CH: André Ventura — Pedro Pinto — Cristina Rodrigues — Manuel Magno — Vanessa
Barata.
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PROJETO DE LEI N.º 264/XVI/1.ª
PROCEDE À TERCEIRA ALTERAÇÃO À LEI N.º 16/2017, DE 17 DE ABRIL, ALTERANDO ALGUNS
DOS REQUISITOS PARA A REALIZAÇÃO DA INTERRUPÇÃO VOLUNTÁRIA DA GRAVIDEZ NÃO
PUNÍVEL E DENSIFICANDO O REGIME DE EXERCÍCIO DO DIREITO INDIVIDUAL DE OBJEÇÃO DE
CONSCIÊNCIA
Exposição de motivos
A aprovação da interrupção voluntária da gravidez, por opção da mulher, até às 10 semanas, foi uma
conquista cruelmente tardia na nossa democracia. O aborto clandestino era, até então, a terceira causa de morte
materna em Portugal. A chamada «lei da IVG» é um marco de progresso, de acesso a saúde sexual e reprodutiva
e de respeito pela autonomia da mulher.
O direito à IVG, como todos os direitos, deve ser efetivamente assegurado. É ao Estado que compete verificar
se dever de proteção relativamente a este direito merece reparos e se há razões para ajustes legislativos para
que nenhum direito fique na letra da lei.
Como é público, as auditorias simultâneas levadas a cabo pela Inspeção-Geral de Saúde (IGS) e pela
Entidade Reguladora da Saúde (ERS) concluíram que o direito ao acesso à interrupção de gravidez no SNS é
violado em várias unidades de saúde, com prazos desrespeitados em pelo menos 20 % dos pedidos. Quanto
aos objetores, as auditorias contradizem-se.
Certo é que, lendo os dados da IGAS ou os da ERS, Portugal tem uma percentagem de médicos objetores
altíssima, de tal forma que o número de hospitais que não efetuam IVG impede, de facto, em vários casos, o
exercício desse direito. A discriminação socioeconómica e territorial de várias mulheres é evidente e, em casos
paralelos, o Comité Europeu dos Direitos Sociais entendeu-o como violação do direito à saúde das mulheres.
De acordo com o Processo de Inspeção aos Estabelecimentos de Saúde Oficiais no âmbito da Interrupção
da Gravidez da Inspeção-Geral das Atividades em Saúde, datado de agosto de 2023, «27 estabelecimentos
oficiais de cuidados de saúde hospitalares (de Portugal continental) realizam todos os atos respeitantes à
interrupção da gravidez previstos [no artigo 142.º do Código Penal (Interrupção de gravidez não punível)] e sete
realizam apenas os atos previstos nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 142.º» (ou seja, efetuam todos os tipos
de IG menos a prevista na alínea e) do artigo: «A interrupção de gravidez que for realizada, por opção da mulher,
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nas primeiras 10 semanas de gravidez». Ora, isto acontece porque a objeção de consciência é exercida muitas
vezes apenas quanto à IVG até às 10 semanas, consubstanciando um juízo sobre a consciência da mulher.
Quando os profissionais de saúde manifestam objeção de consciência apenas em relação ao aborto por
opção da mulher, estando disponíveis para o realizar noutras situações, tal, para vários autores, consubstancia,
na verdade, obstrução de consciência, porque discorda-se da decisão das mulheres e tenta-se impedi-las de
exercer o seu direito.
A objeção de consciência corresponde ao exercício de um direito com guarida constitucional, que
respeitamos, mas não pode servir de fundamento para privar as mulheres de um direito cuja negação ou atraso
pode colocar as suas vidas em risco.
O grupo de trabalho do Conselho de Direitos Humanos da ONU sobre a discriminação prática da mulher na
lei espanhola alerta que a deficiente regulação da objeção de consciência constitui um obstáculo para as
mulheres quando exercem o seu direito de aceder a todos os serviços de saúde sexual e reprodutiva.
Deve, também por isso, ficar claro que o direito de objeção de consciência é um direito individual e não
institucional.
Um dos elementos apontados pelos inquéritos e estudos efetuados à lei como dilatórios de uma decisão
individual da mulher é a intervenção de dois médicos antes da IVG, bem como o período de reflexão, o qual, de
resto, é paternalista. As mulheres, quando agendam uma IVG, sabem o que querem e por que o querem fazer.
Não encontramos qualquer argumento válido para a intervenção de dois médicos em vez de um só nem para a
manutenção de uma «reflexão» forçada.
Finalmente, o prazo legal máximo de dez semanas para a realização da IVG em Portugal é o mais restritivo
de toda a Europa, o que desconsidera as recomendações da Organização Mundial de Saúde. É também por
causa deste limite raro, e historicamente traçado nos termos conhecidos, que há tantos relatos traumáticos em
que exercer o direito a uma IVG é uma corrida contra o tempo, acabando muitas vezes por se verificar que não
se consegue aceder à IVG dentro do período gestacional legal. Entendemos, também, que à semelhança do
exercício de outros direitos, e acompanhando, nomeadamente, a nossa vizinha Espanha, não faz sentido que
aos 16 anos uma mulher seja obrigada a continuar uma gravidez por falta de consentimento alheio.
Pretende-se manter o essencial da lei atual, alterando apenas aquilo que os estudos e a prática têm
demonstrado ser de alteração urgente, sob pena de um direito que pode decidir da vida das mulheres não
passar, em muitos casos, de uma enunciação vazia.
Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Grupo
Parlamentar do Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à alteração:
a) Do Código Penal, revendo alguns dos requisitos para a realização da interrupção voluntária da gravidez
não punível;
b) Da Lei n.º 16/2017, de 17 de abril, densificando o regime de exercício do direito individual de objeção de
consciência.
Artigo 2.º
É alterado o artigo 142.º do Código Penal, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 142.º
[…]
1 – […]
a) […]
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b) Se mostrar indicada para evitar perigo de morte ou de grave e duradoura lesão para o corpo ou para a
saúde física ou psíquica da mulher grávida e for realizada nas primeiras 14 semanas de gravidez;
c) […]
d) […]
a) For realizada, por opção da mulher, nas primeiras 12 semanas de gravidez.
2 – A verificação das circunstâncias que tornam não punível a interrupção da gravidez é certificada em
atestado médico, que comprova que a gravidez não excede as 12 semanas.
3 – (Revogado.)
4 – […]
a) […]
b) No caso referido na alínea e) do n.º 1, em documento assinado pela mulher grávida ou a seu rogo, o qual
deve ser entregue no estabelecimento de saúde até ao momento da intervenção.
5 – Se a mulher grávida ainda não completou 16 anos ou é psiquicamente incapaz, respetiva e
sucessivamente, conforme os casos, o consentimento é prestado pelo representante legal, por ascendente ou
descendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes da linha colateral.
6 – […]
7 – […]»
Artigo 3.º
São alterados os artigos 2.º e 6.º da Lei n.º 16/2017, de 17 de abril, que passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 2.º
Consulta, informação e acompanhamento
1 – […]
2 – […]
a) […]
b) […]
c) A disponibilidade de acompanhamento psicológico.
d) A disponibilidade de acompanhamento por técnico de serviço social.
3 – Os estabelecimentos de saúde, oficiais ou oficialmente reconhecidos, para além de consultas de
ginecologia e obstetrícia, devem dispor de serviços de apoio psicológico e de assistência social dirigidos às
mulheres grávidas que assim o requeiram.
4 – […]
Artigo 6.º
Objeção de consciência
1 – É assegurado aos médicos e demais profissionais de saúde o direito à objeção de consciência, sem que
o exercício desse direito individual possa pôr em causa o direito à vida, à saúde e à liberdade das mulheres que
decidem interromper a gravidez.
2 – Os médicos ou demais profissionais de saúde que invoquem a objeção de consciência relativamente à
interrupção voluntária da gravidez não podem participar na consulta prevista na alínea b) do n.º 4 do artigo 142.º
do Código Penal
3 – A objeção de consciência é uma decisão sempre individual do médico ou do profissional de saúde
diretamente envolvido na realização da IVG.
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4 – (Anterior n.º 4.)
5 – O acesso ao direito à interrupção voluntária da gravidez e à qualidade do serviço de saúde prestado não
pode ser afetado pelo exercício individual do direito à objeção de consciência.
6 – Os serviços públicos organizam-se de forma que se garanta a todo o tempo o número de profissionais
de saúde necessários ao acesso efetivo e atempado à interrupção voluntária da gravidez ou quando tal seja
impossível, a existência de resposta no próprio serviço com recurso a prestador externo.
7 – A objeção de consciência não inclui a recusa de assistência médica ou outra a mulheres antes ou depois
de uma interrupção voluntária da gravidez.»
Artigo 4.º
Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no primeiro dia do mês seguinte ao da sua publicação.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
As Deputadas e os Deputados do PS: Pedro Nuno Santos — Alexandra Leitão — Isabel Alves Moreira —
Pedro Delgado Alves — Miguel Matos — Tiago Barbosa Ribeiro — João Torres — Marina Gonçalves — Mariana
Vieira da Silva — Isabel Ferreira — Luís Graça — Maria Begonha — Hugo Costa — Mara Lagriminha Coelho
— Elza Pais — António Mendonça Mendes — Patrícia Faro — Raquel Ferreira — Ana Sofia Antunes — André
Rijo — Eurídice Pereira — Pedro Vaz — Ana Abrunhosa — Jamila Madeira — Susana Correia — Irene Costa
— Manuel Pizarro — Fátima Correia Pinto.
———
PROJETO DE LEI N.º 265/XVI/1.ª
REPÕE OS PROCEDIMENTOS DE AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA ASSENTES EM
MANIFESTAÇÕES DE INTERESSE E REVOGA O DECRETO-LEI N.º 37-A/2024, DE 3 DE JUNHO (DÉCIMA
SEXTA ALTERAÇÃO À LEI N.º 23 /2007, DE 4 DE JULHO)
Exposição de motivos
Através do Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de junho, o Governo PSD/CDS eliminou a possibilidade de os
cidadãos estrangeiros que trabalhem ou pretendam vir a trabalhar em Portugal possam obter as respetivas
autorizações de residência por via da apresentação de manifestações de interesse para a concessão de
autorização de residência para o exercício de uma atividade profissional subordinada ou independente.
Esta medida, anunciada no quadro da necessidade da resolução de mais de 400 000 processos de
regularização da situação de cidadãos estrangeiros que se acumularam devido à inoperância da Agência para
a Interação, Migrações e Asilo (AIMA), resultante em larga medida da forma desastrada como se processou a
extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) pelo anterior Governo do PS não só não permite resolver
qualquer problema como terá consequências profundamente negativas, não só para os imigrantes e as suas
famílias, mas para a economia, o mercado de trabalho e a comunidade nacional em geral.
Na verdade, a possibilidade de obtenção de autorização de residência para trabalhar em Portugal por via da
apresentação de manifestação de interesse para o efeito, foi uma medida reivindicada por boa parte do tecido
empresarial nacional a braços com uma gritante falta de mão-de-obra que os trabalhadores nacionais, só por si,
não estavam em condições de colmatar. Em setores como a hotelaria e restauração, construção civil, agricultura
ou em diversas indústrias, grande parte da força de trabalho é garantida por cidadãos não nacionais.
Independentemente de discursos inconsequentes sobre se a legislação deve ser de «portas abertas» ou de
«portas fechadas», ou de discursos irracionais e fascizantes que procuram semear o ódio aos estrangeiros entre
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a comunidade nacional invocando uma relação entre a imigração e a criminalidade que todas as estatísticas
desmentem, a necessidade da contratação de trabalhadores estrangeiros para que a economia nacional se
possa desenvolver é um dado objetivo que não oferece discussão, demonstrado aliás pelo impacto positivo que
os descontos efetuados por trabalhadores estrangeiros têm vindo a ter para o equilíbrio da segurança social em
Portugal.
Neste quadro, a legalidade das migrações e a situação regular dos trabalhadores estrangeiros e das suas
famílias em Portugal, são questões decisivas.
A imigração só será um problema se os trabalhadores imigrantes ficarem nas mãos de associações
criminosas que se dedicam ao tráfico de seres humanos para exploração laboral ou sexual (que devem ser firme
e intransigentemente combatidas) ou se a situação irregular dos imigrantes for aproveitada pelo patronato para
aumentar a precariedade laboral e/ou esmagar os salários dos trabalhadores.
Poucas dúvidas restarão sobre o impacto negativo que a revogação da possibilidade de obtenção de
autorização de residência para trabalhar em Portugal por via das manifestações de interesse virá a produzir.
Num quadro em que a imigração se afigura objetivamente como necessária, a adoção de políticas supostamente
de «portas fechadas» não reduzem a imigração, mas contribuem seguramente para o aumento da imigração
ilegal.
Nestas circunstâncias, o PCP propõe a reposição legal dos procedimentos de autorização de residência
assentes em manifestações de interesse para o exercício de uma atividade profissional subordinada ou
independente que foram revogados pelo Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de junho.
Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do
Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte projeto de lei:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei repõe os procedimentos de autorização de residência assentes em manifestações de interesse,
procedendo à décima sexta alteração à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho, na sua redação atual, que estabelece as
condições e procedimentos de entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros do território
português, bem como o estatuto de residente de longa duração e revoga o Decreto-Lei n.º 37-A/2024, de 3 de
junho.
Artigo 2.º
Alterações à Lei n.º 23/2007, de 4 de julho
Os n.os 6 e 7 do artigo 81.º, os n.os 2 e 6 do artigo 88.º e os n.os 2, 4 e 5 do artigo 89.º da Lei n.º 23/2007, de
4 de julho, na sua redação atual, passam a ter a seguinte redação:
«Artigo 81.º
Pedido de autorização de residência
1 – […]
2 – […]
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – Quando o requerimento simultâneo referido no número anterior ocorrer no âmbito da submissão de
manifestação de interesse para concessão de autorização de residência para o exercício de uma atividade
profissional, nos termos do disposto nos n.os 2 dos artigos 88.º e 89.º, o requerente pode identificar os membros
da família que se encontrem em território nacional, os quais beneficiam da presunção de entrada legal do
requerente, se aplicável, nos termos do n.º 6 do artigo 88.º e do n.º 5 do artigo 89.º.
7 – Para os efeitos do disposto no número anterior, têm preferência na apresentação de pedidos de
autorização de residência os requerentes cujo agregado familiar integre menores em idade escolar ou filhos
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maiores a cargo, em ambos os casos a frequentar estabelecimento de ensino em território nacional.
Artigo 88.º
Pedido de autorização de residência
1 – […]
2 – Mediante manifestação de interesse apresentada através da AIMA na internet ou diretamente numa das
suas delegações, é dispensado o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 77.º, desde que o cidadão
estrangeiro, além das demais condições gerais previstas naquela disposição, preencha as seguintes condições:
a) Possua um contrato de trabalho ou promessa de contrato de trabalho ou tenha uma relação laboral
comprovada por sindicato, por um representante de comunidades migrantes com assento no Conselho Nacional
para as Migrações e Asilo ou pela Autoridade para as Condições de Trabalho;
b) Tenha entrado legalmente em território nacional;
c) Esteja inscrito na segurança social.
3 – […]
4 – […]
5 – […]
6 – Presume-se a entrada legal prevista na alínea b) do n.º 2 sempre que o requerente trabalhe em território
nacional e tenha a sua situação regularizada perante a segurança social há pelo menos 12 meses.
7 – […]
Artigo 89.º
Autorização de residência para exercício de atividade profissional independente ou para imigrantes
empreendedores
1 – […]
2 – Mediante manifestação de interesse apresentada através do sítio da AIMA na internet ou diretamente
numa das suas delegações, é dispensado o requisito previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 77.º, desde que o
cidadão estrangeiro tenha entrado legalmente em território nacional.
3 – […]
4 – É concedida autorização de residência ao nacional de Estado terceiro que desenvolva projeto
empreendedor, incluindo a criação de empresa de base inovadora, integrado em incubadora certificada nos
termos definidos por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas da administração interna e da
economia, desde que preencha os requisitos gerais do artigo 77.º, com dispensa do estabelecido na alínea a)
do seu n.º 1.
5 – Presume-se a entrada legal prevista no n.º 2 sempre que o requerente tenha vigente um contrato de
prestação de serviços ou atividade profissional independente em território nacional e tenha a sua situação
regularizada perante a segurança social, num caso e noutro há pelo menos 12 meses.
Artigo 3.º
Norma revogatória
É revogado o Decreto-Lei n.º 37-A/2004, de 3 de junho.
Artigo 4.º
Entrada em vigor e produção de efeitos
A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação e produz efeitos retroativos a 4 de junho
de 2024.
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Assembleia da República, 17 de setembro de 2024.
Os Deputados do PCP: António Filipe — Paula Santos — Paulo Raimundo — Alfredo Maia
———
PROPOSTA DE LEI N.º 20/XVI/1.ª (*)
(PROCEDE À SEGUNDA ALTERAÇÃO À LEI N.º 30/2021, DE 21 DE MAIO, QUE APROVA MEDIDAS
ESPECIAIS DE CONTRATAÇÃO PÚBLICA)
Exposição de motivos
O plano de recuperação e resiliência (PRR) é um programa de âmbito nacional, com um período de execução
até 2026, que visa implementar um conjunto de reformas e de investimentos destinados a impulsionar o país no
caminho da retoma, do crescimento económico sustentado e da convergência com a Europa ao longo da
próxima década.
Na sequência da assinatura dos acordos de financiamento do Mecanismo de Recuperação e Resiliência, a
Administração Pública portuguesa é diariamente confrontada com a contínua urgência na execução dos fundos
europeus, sob pena da sua perda.
Atenta esta realidade, é possível identificar duas áreas nucleares que, pelo seu impacto direto na execução
do PRR, exigem uma revisão do quadro legal em vigor: a fiscalização dos atos e contratos associados à
execução de projetos no âmbito do PRR; e as ações de contencioso pré-contratual que têm por objeto a
impugnação de atos de adjudicação relativos a procedimentos que se destinem à execução de projetos no
âmbito do PRR.
Nesta sequência, a presente lei procede à segunda alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, que aprova
medidas especiais de contratação pública, no sentido de consagrar: (i) um regime de fiscalização preventiva
especial pelo Tribunal de Contas dos atos e contratos que se destinem à execução de projetos financiados ou
cofinanciados no âmbito do PRR; (ii) um regime excecional aplicável às ações administrativas urgentes de
contencioso pré-contratual que tenham por objeto a impugnação de atos de adjudicação relativos a
procedimentos de formação de contatos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados
pelo PRR; e (iii) um regime de recurso à arbitragem nos contratos de empreitada de obra pública ou de
fornecimento de bens ou serviços públicos que sejam financiados ou cofinanciados por fundos europeus,
designadamente pelo PRR.
Em primeiro lugar, no que respeita à fiscalização dos atos e contratos associados à execução de projetos no
âmbito do PRR, verifica-se que a sua generalidade recai no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência
recaem no âmbito de incidência da fiscalização prévia do Tribunal de Contas e, assim, da exigência da aposição
de visto prévio para a sua execução ou pagamento, nos termos do disposto nos artigos 46.º e seguintes da Lei
n.º 98/97, de 26 de agosto, na sua redação atual.
Ora, a circunstância excecional de atribuição de fundos extraordinários da União Europeia, provenientes do
PRR, impõe a adoção de soluções legislativas que assegurem a execução tempestiva dos fundos, sem
prejudicar a imperativa fiscalização da legalidade das despesas públicas, cometida ao Tribunal de Contas.
Assim, através da presente proposta de lei, estabelece-se, em primeiro lugar, que os atos e contratos que se
destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados no âmbito do PRR estão sujeitos a um regime
de fiscalização preventiva especial pelo Tribunal de Contas.
O regime ora proposto, através da alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, possibilita a execução dos
atos e contratos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados no âmbito do PRR, sem
que isso obste à feitura de um juízo de conformidade com a ordem jurídica emanado pelo Tribunal de Contas.
Verificando-se a existência de desconformidades legais daqueles atos e contratos, permite-se que o Tribunal
de Contas decida sobre a transição do processo para fiscalização concomitante e eventual apuramento de
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responsabilidades financeiras, nos termos gerais, sem que isso obste à execução do ato ou contrato em causa.
Esta forma de fiscalização preventiva especial assegura plenamente o exercício da missão
constitucionalmente atribuída ao Tribunal de Contas, em conformidade com a necessária celeridade associada
à prática de atos e celebração de contratos de interesse público, nomeadamente os que se encontram sujeitos
a financiamento da União Europeia, como os do PRR, com prazos de execução extremamente exigentes.
Em segundo lugar, no que concerne às ações de contencioso pré-contratual que tenham por objeto a
impugnação de atos de adjudicação relativos a procedimentos que se destinem à execução de projetos no
âmbito do pelo PRR, é notório que algumas regras processuais em vigor não se mostram compatíveis com os
prazos de execução previstos nos acordos assinados pela República Portuguesa, gerando o incumprimento dos
mesmos por impossibilidade de, em tempo útil, findarem as ações em que são impugnados atos adjudicatórios.
Ao que acresce a necessidade de dar resposta a uma nova tendência de impugnação, com efeitos meramente
dilatórios, de atos procedimentais por interessados que podem não ter a expetativa de vir a obter uma decisão
judicial favorável, paralisando o procedimento contratual e a própria celebração e execução do contrato, através
da instauração de um processo judicial.
Sem prejuízo dos direitos legítimos dos interessados lesados por eventuais ilegalidades procedimentais de
reagir administrativa e judicialmente contra a adjudicação, a utilização excessiva de meios processuais por
interessados que procuram protelar a celebração do contrato com o adjudicatário produz, no contexto atual,
graves consequências na lesão do interesse público nacional.
A permanente paralisação dos procedimentos de formação dos contratos que se destinam à execução de
projetos aprovados no âmbito do PRR tem o efeito de gerar uma situação de facto consumado para as entidades
adjudicantes, inutilizando a celebração do contrato, mesmo que sobrevenha uma apreciação judicial que
verifique o cumprimento integral da legalidade. Nos procedimentos desta dimensão, o atraso imposto à
prossecução do interesse público constitui um facto irreversível, por decurso do tempo, ainda que o Tribunal
conclua pela natureza infundada do pedido do impugnante.
O comprometimento dos financiamentos de diversos projetos associados e a consequente destruição do seu
valor económico e social exigem uma ação imediata do poder legislativo.
Neste contexto, verifica-se que o prazo dos últimos projetos aprovados no âmbito do PRR é 31 de dezembro
de 2026. Há, no entanto, vários outros prazos intercalares que reclamam a máxima urgência na sua execução,
sob pena de incumprimento do PRR e consequente perda de fundos.
Nesta sequência, a presente lei consagra, também, um regime processual especial – excecional e temporário
– aplicável aos contratos que se destinem à execução de projetos aprovados no âmbito do PRR, e que vigora
até 31 de dezembro de 2026.
Mais concretamente, prevê-se que, nas ações de contencioso pré-contratual que tenham por objeto a
impugnação de atos de adjudicação relativos a procedimentos que se destinem à execução de projetos
financiados ou cofinanciados pelo PRR, se proceda ao levantamento do efeito suspensivo automático mediante
uma decisão sumária do juiz. Perante o risco de perda de fundos essenciais para a execução do contrato, que
não estão na disponibilidade das entidades adjudicantes, impõe-se a previsão de um incidente processual,
célere e expedito, passível de evitar situações – irreversíveis e desproporcionais – em que a manutenção do
efeito suspensivo equivale à perda do contrato.
O regime ora consagrado procura equilibrar o interesse público na celeridade da atividade contratual da
Administração e os interesses públicos e privados de proteção da legalidade procedimental, garantindo as
exigências de tutela dos impugnantes formuladas pelo sistema contratual europeu de contratos públicos.
Em concreto, a perda de financiamento através dos fundos do PRR prejudicará não apenas o interesse
público, mas também os vários interesses privados em presença, na medida em que tal perda, causada pelo
incumprimento de um prazo de execução, impedirá a entidade adjudicante de celebrar o contrato com qualquer
dos concorrentes, incluindo o próprio impugnante, caso a ação seja julgada procedente. Esta diferença
fundamental relativamente às circunstâncias normais da contratação pública justifica que seja dada uma
relevância acrescida à perda de financiamento, enquanto critério de levantamento provisório do efeito
suspensivo automático do ato impugnado ou da execução do contrato.
Por fim, através de outro aditamento à Lei n.º 30/2021, prevê-se, de forma expressa, a possibilidade de
através de compromisso arbitral as partes recorrerem à arbitragem nos contratos de empreitada de obra pública
ou de fornecimento de bens ou prestação de serviços que sejam financiados ou cofinanciados por fundos
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europeus, nomeadamente pelo PRR, e nos quais, em fase de execução, se suscitem litígios que pela sua
relevância possam colocar em risco o cumprimento dos prazos contratuais ou a perda de fundos.
Atenta a matéria, em sede de processo legislativo a decorrer na Assembleia da República, podem ser ouvidos
os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, a Associação Nacional de Municípios Portugueses, o
Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Conselho Superior da Magistratura, o Conselho
Superior do Ministério Público e o Tribunal de Contas.
Assim:
Nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 197.º da Constituição, o Governo apresenta à Assembleia da
República a seguinte proposta de lei, com pedido de prioridade e urgência:
Artigo 1.º
Objeto
A presente lei procede à segunda alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, alterada pelo Decreto-Lei
n.º 78/2022, de 7 de novembro, que aprova medidas especiais de contratação pública.
Artigo 2.º
Alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio
O artigo 1.º da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, na sua redação atual, passa a ter a seguinte redação:
«Artigo 1.º
[…]
1 – […]
a) […]
b) […]
c) […]
d) […]
e) Aprovação do regime de fiscalização preventiva especial pelo Tribunal de Contas dos atos e contratos
que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados no âmbito do PRR;
f) Aprovação de um regime excecional aplicável às ações administrativas urgentes de contencioso pré-
contratual que tenham por objeto a impugnação de atos de adjudicação relativos a procedimentos de formação
de contatos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados pelo PRR;
g) Aprovação de um regime de recurso à arbitragem nos contratos de empreitada de obra pública ou de
fornecimento de bens ou serviços públicos que sejam financiados ou cofinanciados por fundos europeus.»
Artigo 3.º
Aditamento à Lei n.º 30/2021, de 21de maio
São aditados os artigos 17.º-A, 25.º-A e 25.º-B à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, na sua redação atual, com
a seguinte redação:
«Artigo 17.º-A
Fiscalização pelo Tribunal de Contas dos atos e contratos no âmbito do Plano de Recuperação e
Resiliência
1 – Os atos e contratos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados no âmbito do
PRR estão sujeitos a fiscalização preventiva especial pelo Tribunal de Contas, que se rege pela Lei n.º 98/97,
de 26 de agosto, e pelo Decreto-Lei n.º 66/96, de 31 de maio, ambos na sua redação atual, com as
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especificidades previstas nos números seguintes.
2 – Os atos e contratos referidos no número anterior são eficazes e podem produzir todos os seus efeitos
antes da decisão do Tribunal de Contas, nos termos do número seguinte, não sendo aplicável o disposto no
artigo 45.º da Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, na sua redação atual.
3 – Quando, no decurso da análise, os atos e contratos estejam conformes às leis em vigor, o Tribunal de
Contas emite uma decisão de conformidade, podendo essa decisão ser acompanhada de recomendações,
quando se verifiquem as situações previstas na alínea c) do n.º 3 do artigo 44.º da Lei n.º 98/97, de 26 de agosto,
na sua redação atual, sem que isso obste à execução do ato ou contrato em causa.
4 – Caso se verifiquem indícios de desconformidade legal, o Tribunal de Contas remete o processo para
fiscalização concomitante e eventual apuramento de responsabilidades financeiras, nos termos gerais, sem que
isso obste à execução do ato ou contrato em causa, sem prejuízo do disposto no número seguinte.
5 – Nos casos em que se verifique a preterição total de procedimento de formação do contrato ou a assunção
de encargos sem cabimento em verba orçamental própria, o Tribunal emite decisão de desconformidade, da
qual resulta a imediata cessação dos efeitos dos atos ou contratos objeto da decisão.
6 – Das decisões referidas nos números anteriores cabe recurso, nos termos do artigo 96.º e seguintes da
Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, na sua redação atual, cabendo ainda recurso pela entidade adjudicatária do
contrato sobre o qual foi emitida decisão de desconformidade.
7 – O presente regime aplica-se aos contratos formados ao abrigo do regime procedimental previsto na
presente lei e no regime procedimental que resulta do Código dos Contratos Públicos.
Artigo 25.º-A
Regime Excecional da Ação Urgente de Contencioso Pré-Contratual
1 – As ações de contencioso pré-contratual que tenham por objeto a impugnação de atos de adjudicação
relativos a procedimentos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados pelo PRR e
aos quais é aplicável o disposto no n.º 3 do artigo 95.º ou na alínea a) do n.º 1 do artigo 104.º do Código dos
Contratos Públicos, e desde que propostas no prazo de 10 dias úteis contados desde a notificação da
adjudicação a todos os concorrentes, fazem suspender automaticamente os efeitos do ato impugnado.
2 – Após o decurso de 10 dias úteis contados desde a notificação da adjudicação a todos os concorrentes,
a entidade demandada pode solicitar que o Tribunal, sem a prévia audição da parte contrária, proceda ao
levantamento provisório do efeito suspensivo automático, juntando prova documental sumária.
3 – O efeito suspensivo automático será provisoriamente levantado quando o Tribunal verifique,
sumariamente, no prazo máximo de 48 horas, o preenchimento dos seguintes requisitos cumulativos:
a) Decurso do prazo de 10 dias úteis contados desde a notificação da decisão de adjudicação a todos os
concorrentes;
b) Risco de perda de financiamento em contrato que se destine à execução de projeto do PRR.
4 – Para efeitos da alínea b) do número anterior, presume-se haver risco de perda de financiamento, quando
haja uma conexão do objeto do contrato com a execução de projetos financiados ou cofinanciados pelo PRR,
bastando, para o efeito, a junção pelo requerente de documento que comprove a decisão de financiar o projeto
do PRR no qual o contrato se integre.
5 – Caso seja provisoriamente levantado o efeito suspensivo, o autor é notificado de imediato e dispõe do
prazo de cinco dias para, fundamentadamente, requerer a manutenção do efeito suspensivo automático na
pendência do incidente por não se verificarem os pressupostos a que se refere o número anterior.
6 – Se o autor requerer a manutenção do efeito suspensivo automático, a entidade demandada é notificada
para, no prazo de sete dias, ampliar os fundamentos do pedido já deduzido nos termos do n.º 2, de modo a nele
incluir a ponderação dos interesses públicos e privados em presença e os prejuízos que resultariam da
manutenção do efeito suspensivo.
7 – O autor dispõe de sete dias para responder ao pedido de levantamento previsto no número anterior,
seguindo-se, sem mais articulados e no prazo máximo de sete dias após a realização das diligências instrutórias
absolutamente indispensáveis, a decisão do incidente pelo juiz.
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8 – O efeito suspensivo é levantado quando, devidamente ponderados todos os interesses públicos e
privados em presença, os prejuízos que resultariam da sua manutenção se mostrem superiores aos que podem
resultar do seu levantamento.
9 – O presente regime aplica-se aos contratos formados ao abrigo do regime procedimental previsto na
presente lei e no regime procedimental que resulta do Código dos Contratos Públicos.
10 – Em tudo o que não esteja previsto nos números anteriores aplicam-se os artigos 100.º a 103.º-B do
CPTA.
Artigo 25.º-B
Recurso à arbitragem
1 – Os contratos de empreitada de obra pública ou de fornecimento de bens ou de prestação de serviços
que sejam financiados ou cofinanciados por fundos europeus, designadamente pelo PRR, em que, durante a
respetiva execução, se suscitem litígios que pela sua relevância possam colocar em risco o cumprimento dos
prazos contratuais ou a perda de fundos, podem ser sujeitos a arbitragem, independentemente de se encontrar
previsto em tais contratos que o litígio deva ser dirimido pelos tribunais administrativos.
2 – Qualquer das partes pode propor a celebração do compromisso arbitral e a consequente modificação da
cláusula contratual que defina o foro competente, sendo aplicável, com as necessárias adaptações, o regime
previsto no artigo 476.º do Código dos Contratos Públicos e devendo ser privilegiada a opção pela arbitragem
por intermédio de um centro de arbitragem institucionalizada.
3 – Estando pendente uma ação num tribunal administrativo:
a) As pretensões a submeter aos tribunais arbitrais devem coincidir com o pedido e a causa de pedir do
processo a extinguir, apenas se admitindo a redução do pedido;
b) O pedido de constituição de tribunal arbitral é necessariamente acompanhado de certidão judicial
eletrónica do requerimento apresentado para a extinção da instância judicial nos termos do presente artigo.
4 – Previamente ao início da arbitragem, pode qualquer das partes propor uma tentativa de conciliação
extrajudicial perante uma comissão composta por um representante de cada uma das partes e presidida pelo
presidente do IMPIC, IP, ou por um membro qualificado do mesmo instituto que aquele, para o efeito, designar.»
Artigo 4.º
Prevalência
O disposto no artigo 17.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, na redação dada pela presente lei, prevalece
sobre o disposto na demais legislação, incluindo o disposto na Lei n.º 98/97, de 26 de agosto, na sua redação
atual.
Artigo 5.º
Disposição transitória
1 – O disposto no artigo 17.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, com a redação dada pela presente lei,
aplica-se aos atos e contratos que se destinem à execução de projetos financiados ou cofinanciados no âmbito
do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), incluindo os que se encontrem pendentes de decisão do Tribunal
de Contas na data da sua entrada em vigor.
2 – O disposto no artigo 17.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, com a redação dada pela presente lei,
aplica-se ainda aos atos e contratos que tenham por objeto a locação ou aquisição de bens móveis, a aquisição
de serviços ou a realização de empreitadas de obras públicas no edifício do Campus XXI, previsto no artigo 16.º
do Decreto-Lei n.º 43-B/2024, de 2 de julho, dada a sua conexão com a execução das reformas previstas no
PRR.
3 – O disposto no artigo 25.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, com a redação dada pela presente lei, é
aplicável às ações administrativas urgentes de contencioso pré-contratual que estejam pendentes, assim como
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aquelas que sejam intentadas após a data de entrada em vigor da presente lei.
4 – O disposto no artigo 25.º-B da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, com a redação dada pela lei, aplica-se
aos contratos em execução, assim como aqueles que venham a ser celebrados após a data de entrada em vigor
da presente lei.
Artigo 6.º
Entrada em vigor
1 – A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
2 – O disposto no artigo 25.º-A da Lei n.º 30/2021, de 21 de maio, com a redação dada pela presente lei,
vigora até 31 de dezembro de 2026.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 5 de setembro de 2024.
O Primeiro-Ministro, Luís Filipe Montenegro Cardoso de Morais Esteves — O Ministro Adjunto e da Coesão
Territorial, Manuel Castro Almeida — O Ministro dos Assuntos Parlamentares, Pedro Miguel de Azeredo Duarte.
(*) O texto inicial da proposta de lei foi publicado no DAR II Série-A n.º 87 (2024.09.09) e substituído, a pedido do autor, em 17 de
setembro de 2024.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 296/XVI/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE DENUNCIE AO TRIBUNAL PENAL INTERNACIONAL COMO
CRIME CONTRA A HUMANIDADE O ATAQUE AOS DIREITOS DAS MULHERES NO AFEGANISTÃO
Após o regresso do regime talibã ao poder no Afeganistão, com a tomada da sua capital, Cabul, em 15 de
agosto de 2021, além da imposição de restrições aos direitos fundamentais que atingem todos os cidadãos, a
discriminação e a perseguição das mulheres, raparigas e meninas afegãs tem vindo a agravar-se de forma
insuportável.
O Governo talibã dizimou os direitos das mulheres: foram privadas do direito à educação, ao trabalho, à
liberdade, sujeitas a violências indizíveis, a detenções, tortura e morte, como reporta o relatório da Amnistia
Internacional publicado em julho 2022.
Apesar da crescente dificuldade de recolha de dados, agravada pela proibição de as mulheres trabalharem
nas organizações não governamentais e para a própria Organização das Nações Unidas (ONU), o ignóbil
desrespeito pelos direitos das mulheres afegãs está retratado no Perfil de Género do Afeganistão de 2024,
desenvolvido pela ONU Mulheres e financiado pela União Europeia.
Logo em 2021, as mulheres foram banidas da prática desportiva; foi dissolvido o Ministério dos Assuntos da
Mulher, substituído pelo denominado Ministério da Promoção da Virtude e da Prevenção do Vício; as
funcionárias governamentais foram dispensadas; as jornalistas foram proibidas de aparecer na televisão sem o
rosto integralmente tapado e as mulheres passaram a estar obrigadas a estarem acompanhadas por um familiar
homem em deslocações de mais de 77 quilómetros.
Em 2022 as raparigas foram afastadas do ensino a partir do sexto ano de escolaridade, as mulheres voltaram
a estar obrigadas ao cumprimento de um rigoroso código de vestuário e privadas de liberdade, bem como de
estar em vários locais públicos (banhos públicos, parques públicos, ginásios, clubes desportivos e parques de
diversões); e proibidas de trabalhar em várias profissões, designadamente para organização não
governamentais, incluindo a ONU.
Mas, já neste ano de 2024, a situação passou para um nível ainda mais infame: nova legislação veio
estabelecer a proibição de as mulheres falarem em público e de, mesmo dentro das suas casas, cantarem ou
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lerem em voz alta. Foi também determinada a proibição de as mulheres olharem para qualquer homem que não
seja seu familiar e avolumadas as restrições à sua circulação.
Esta legislação, que já mereceu a condenação da maioria dos membros do Conselho de Segurança da ONU,
visa privar as mulheres, raparigas e meninas de qualquer participação e presença no espaço público, marcando
a tentativa de as aniquilar como cidadãs e até como pessoas.
Note-se que tudo isto é operado de várias formas, seja através de preceitos legais escritos e orais, seja de
práticas por estes legitimadas e que alargam o seu próprio alcance e que, naturalmente, instigam e propagam
um ambiente social, tanto no plano público quanto no familiar, de subjugação das mulheres e das raparigas a
ditames que as atacam e menorizam, naquilo a que a ONU chama «apartheid de género».
Atualmente, no Afeganistão, a ausência das mulheres e das raparigas da vida pública é quase absoluta,
sendo-lhes sonegada a participação política, associativa ou pública em geral. A sua liberdade de movimentos
encontra-se enormemente reduzida, o exercício de um vasto conjunto de profissões e atividades está proibido
e o acesso ao sistema universitário, tanto de cariz público quanto privado, foi-lhes barrado.
A ONU e a Amnistia Internacional têm denunciado a situação, sem sucesso. A comunidade internacional não
pode continuar a assistir passiva. Vários são os textos de direito internacional violados: a Declaração Universal
dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, o Pacto Internacional sobre os
Direitos Económicos, Sociais e Culturais e a Convenção sobre a eliminação de todas as Formas de
Discriminação contra as Mulheres e da Convenção sobre os Direitos da Criança.
Mas mais do que isso, a discriminação e a violência a que as mulheres, as raparigas e as meninas afegãs
são sujeitas é passível de constituir um crime contra a humanidade nos termos do artigo 7.º do Estatuto de Roma
do Tribunal Penal Internacional (TPI).
Efetivamente, o tratamento das mulheres, raparigas e meninas no Afeganistão inclui vários atos – privação
de liberdade, tortura, violência sexual, perseguição coletiva em razão do sexo, apartheid e outros atos
desumanos causadores de grande sofrimento e lesão à saúde física e mental – que estão elencados no n.º 2
do artigo 7.º e que, de acordo com o disposto no n.º 1 do mesmo preceito, consubstanciam crimes contra a
Humanidade quando estes atos são cometidos no quadro de um ataque, generalizado ou sistemático, contra
qualquer população civil, havendo conhecimento desse ataque.
Ora, o que se verifica no Afeganistão é um ataque contra um grupo de pessoas identificado por motivos
associados ao sexo a que pertencem, não restando dúvidas de que se encontra preenchido o tipo penal previsto
no artigo 7.º do Estatuto do TPI.
O TPI tem jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes e pode exercer a sua jurisdição em relação
a qualquer um dos crimes previsto no respetivo estatuto se um Estado parte denunciar ao procurador qualquer
situação em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários desses crimes (artigos 1.º e 13.º do
Estatuto).
Por sua vez, o artigo 14.º estabelece que «qualquer Estado poderá denunciar ao procurador uma situação
em que haja indícios de ter ocorrido a prática de um ou vários crimes da competência do Tribunal e solicitar ao
procurador que a investigue, com vista a determinar se uma ou mais pessoas identificadas deverão ser acusadas
da prática desses crimes.»
Portugal é parte no Estatuto do TPI e pode – e deve – por isso proceder a esta denúncia, quebrando a
passividade da comunidade internacional perante a situação inaceitável das mulheres afegãs e seguindo os
apelos da ONU e da Amnistia Internacional.
Assim, ao abrigo das disposições legais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do
Partido Socialista apresentam o seguinte projeto de resolução:
A Assembleia da República resolve, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República
Portuguesa:
a) Condenar veementemente a discriminação de género e a violência contra as mulheres, raparigas e
meninas no Afeganistão.
b) Exprimir a sua solidariedade com as mulheres, raparigas e meninas afegãs.
c) Saudar todos os que, no próprio Afeganistão e no resto do mundo, se manifestam ativamente contra a
violação dos direitos das mulheres, raparigas e meninas pelo regime talibã.
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d) Recomendar ao Governo que, ao abrigo do artigo 14.º do Estatuto de Roma do Tribunal Penal
Internacional, denuncie como crime contra a humanidade, previsto no artigo 7.º do mesmo Estatuto, os atos
praticados pelo regime talibã do Afeganistão contra as mulheres, as raparigas e as meninas.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
As Deputadas e os Deputados do PS: Alexandra Leitão — Ana Bernardo — Ana Sofia Antunes — André Rijo
— Edite Estrela — Elza Pais — Eurídice Pereira — Filipe Neto Brandão — Gilberto Anjos — Hugo Costa —
Isabel Alves Moreira — Isabel Ferreira — João Paulo Rebelo — João Torres — José Luís Carneiro — Luís Graça
— Mara Lagriminha Coelho — Maria Begonha — Mariana Vieira da Silva — Marina Gonçalves — Miguel Matos
— Patrícia Faro — Paulo Pisco — Pedro Delgado Alves — Pedro Sousa — Pedro Vaz — Ricardo Lima — Tiago
Barbosa Ribeiro.
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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 297/XVI/1.ª
RECOMENDA AO GOVERNO QUE DEFENDA, JUNTO DO IRÃO E DA COMUNIDADE
INTERNACIONAL, OS DIREITOS DAS MULHERES IRANIANAS
Exposição de motivos
Desde o triunfo da Revolução Islâmica e a deposição da monarquia constitucional encabeçada pela Casa de
Pahlavi, em 1979, o regime iraniano tornou-se sinónimo de apoio ao terrorismo internacional e de repressão
política violenta. Face do ressurgimento islamista que, desde há várias décadas a esta parte, vem lançando boa
parte do mundo muçulmano no obscurantismo e no caos, a República Islâmica reverteu o processo de
emancipação das mulheres iniciado sob o governo de Reza Xá e prosseguido pelo seu filho, Mohammad Reza
Xá. De exemplo inspirador da valorização da igualdade entre sexos no espaço islâmico, o Irão, pois, vem-se
fazendo exemplo trágico de perseguição de mulheres e raparigas. Trata-se de um movimento de retrocesso
civilizacional que nem Portugal nem o mundo desenvolvido podem encarar com indiferença.
Os desafios vividos pelas mulheres iranianas conheceram um agravamento visível nos últimos anos. A
eleição do candidato fundamentalista Ebrahim Raisi, em 2021, coincidiu com a radicalização geral da repressão.
Exemplo especialmente grave é o cerceamento das liberdades femininas. Se o hijab – o véu islâmico – é
vestimenta obrigatória de todas as mulheres desde 1979, o grau de vigilância com que o regime impõe o seu
uso tem vindo a ser reforçado. A morte de Mahsa Amini, jovem de 22 anos assassinada em 2022 por não fazer
uso do véu, despoletou uma das maiores ondas de comoção e mobilização sociais pela dignidade das mulheres
desde a Revolução. A resposta do regime, coordenada pelo Supremo Líder Ali Khamenei e pelo então
Presidente Raisi, foi previsivelmente sangrenta. Estimam-se em mais de quinhentas as mortes entre
manifestantes, de ambos os sexos e todas as proveniências sociais, devido à ação da polícia religiosa.
Além das prisões em massa e do assassínio extralegal de tantas iranianas e iranianos de coragem, o regime
tem endurecido, também, a perseguição oficial a mulheres em função da indumentária que escolhem usar. Em
setembro de 2023, por exemplo, o Majlis – o parlamento do país – fez aprovar1 por larga maioria uma «Lei para
apoiar a cultura da castidade e o hijab». A nova legislação define «indumentária inaceitável» como sendo
«reveladora ou justa, ou roupas que mostrem partes do corpo abaixo do pescoço ou acima dos tornozelos e
antebraços». Para as mulheres dadas como culpadas, as penas podem ir do pagamento de avultadas multas à
prisão. Empresas, organizações e seus responsáveis podem ver-se impossibilitados de abandonar o país por
«propagação de nudez, insuficiente castidade ou cobertura deficiente». Numa análise detalhada da legislação
produzida pela Organização das Nações Unidas, as novas medidas foram descritas como «uma forma de
1https://www.aljazeera.com/news/2023/9/20/irans-parliament-approves-hijab-bill-harsh-punishments-for-violations
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apartheid de género».
Já em abril deste ano, o Supremo Líder do país, Aiatolá Ali Khamenei, reiterou o rumo definido pelo regime
numa proclamação em que define o hijab como «um dever religioso e uma obrigação para as mulheres».
Denunciando as mulheres que recusam cobrir-se como ferramentas ao serviço da «interferência externa», o
líder sancionou a iniciativa do Majlis e anunciou o endurecimento do terror. Com efeito, foi poucos dias depois,
a 13 de abril, que o comandante da polícia de Teerão, Abbas Ali Mohammadian, fez saber que «de hoje em
diante, a polícia de Teerão e outras províncias confrontará os indivíduos que colaborem com anormalidades
sociais como a recusa do véu». A «operação Noor», entretanto posta em marcha, tem lançado incontáveis
mulheres nos calabouços da República Islâmica pelo crime de decidirem como preferem vestir-se.
As mulheres iranianas têm procurado reagir a estas medidas draconianas pelo protesto pacífico e a
desobediência civil. Nos últimos anos, têm sido cada vez mais numerosos os casos de cidadãs que, em público
ou nas redes sociais, rejeitam o hijab. Por sua vez, a amplitude dos protestos ocasionados pela morte de Amini
resultou num alívio – episódico e oportunista – da ação da polícia religiosa. Por vários meses, no seu rescaldo,
o regime procurou desarmar o clamor das ruas pela diminuição do afã punitivo. Foi de pouca duração, todavia,
este estado de coisas. Sentindo estabilizada a situação interna, logo o governo regressou à receita de sempre,
que tornou a aplicar com ainda maior rigor: o regime tem apostado no reforço da capacidade coerciva através,
por exemplo, da generalização de câmaras de vigilância facilitadoras da identificação, e logo punição, das
refratárias2.
A dureza e a violência com que o regime islâmico iraniano oprime as suas mulheres têm sido atentamente
acompanhadas pela Amnistia Internacional, que descreve a situação como uma «guerra contra as mulheres».
Em maio, a organização redigiu uma carta aberta ao então chefe do governo, Presidente Raisi, sublinhando o
forte aumento de «patrulhas de vigilância a pé, de mota, de carro e com carrinhas policiais em espaços públicos»
para «vigilância do cabelo, corpo e vestes» das mulheres. A campanha tem sido abundantemente documentada
através de fotografias e vídeos que atestam a brutalidade das autoridades e mostram espancamentos públicos,
raptos, tortura e o confisco de veículos a mulheres incumpridoras.
Perante a barbárie que o mundo tem observado, tem Portugal o dever de consciência de exercer, no limite
da soberania dos Estados e em acordo com o direito internacional, a sua influência em defesa das mulheres do
Irão. Os graves abusos de direitos humanos que regularmente são perpetrados pela República Islâmica devem
ser fator a levar em conta pela diplomacia portuguesa: bilateralmente, nos contactos diretos mantidos entre
Lisboa e Teerão, e multilateralmente, nos fóruns internacionais de que Portugal faz parte.
Perante o exposto, pois, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, recomendam
os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega ao Governo que:
— O Estado português manifeste junto do governo da República Islâmica do Irão, e de todos os fóruns
internacionais em que participamos – nomeadamente a União Europeia e a Organização das Nações
Unidas – a indignação do povo português perante a maré de repressões violentas de que são vítimas as
mulheres iranianas;
— Exorte a República Islâmica do Irão a pôr fim imediato a toda a forma de discriminação e/ou perseguição
baseada no sexo, a respeitar em plenitude os direitos humanos – e, por isso, universais – das mulheres
iranianas e a abandonar, com efeitos imediatos, a «Operação Noor»;
— Informe Teerão das consequências inevitavelmente deletérias, para a relação luso-iraniana, das medidas
discriminatórias impostas pela República Islâmica às mulheres do Irão.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Cristina Rodrigues — Ricardo Dias Pinto — Diogo Pacheco de Amorim
— Manuel Magno — José Dias Fernandes — Rita Matias — Marta Martins da Silva — Felicidade Vital —
Vanessa Barata — Sónia Monteiro — Madalena Cordeiro — Maria José Aguiar — Manuela Tender — Luísa
Areosa — Patrícia Carvalho — Sandra Ribeiro — Diva Ribeiro — João Tilly — Henrique Rocha de Freitas —
2 https://www.aljazeera.com/news/2023/4/8/iran-to-use-cameras-to-identify-unveiled-women
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Pedro Correia — Pedro Pessanha.
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PROJETO DE DELIBERAÇÃO N.º 11/XVI/1.ª
CONCESSÃO DE PROCESSO DE URGÊNCIA
Considerando o pedido de urgência formulado pelo Governo, em ofício datado de 17 de setembro de 2024,
relativamente à Proposta de Lei n.º 20/XVI/1.ª – Procede à segunda alteração à Lei n.º 30/2021, de 21 de maio,
que aprova medidas especiais de contratação pública –, cabe ao Presidente, nos termos do n.º 3 do artigo 128.º-
A do Regimento, submeter à votação, na primeira reunião plenária subsequente, um projeto de deliberação
sobre a concessão de urgência.
Assim, apresento ao Plenário da Assembleia da República o seguinte projeto de deliberação:
A discussão e votação da proposta lei acima identificada terá lugar nas três fases – generalidade,
especialidade e votação final global.
Palácio de São Bento, 17 de setembro de 2024.
O Presidente da Assembleia da República, José Pedro Aguiar-Branco.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.