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Segunda-feira, 23 de setembro de 2024 II Série-A — Número 97

XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 169 e 270/XVI/1.ª): N.º 169/XVI/1.ª — Cria o programa rede pública de creches (altera a Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro): — Alteração do título e segunda alteração do texto do projeto de lei. N.º 270/XVI/1.ª (PAN) — Pela promoção da proteção de crianças e jovens da violência da tauromaquia, interditando a assistência e a participação a menores de 16 anos.

Projetos de Resolução (n.os 302 e 303/XVI/1.ª): N.º 302/XVI/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo que proceda à elaboração e implementação de estratégia nacional de combate à endometriose e adenomiose e que crie uma bolsa de investigação da doença. N.º 303/XVI/1.ª (CH) — Pela proteção da mulher grávida nos cuidados de saúde e no trabalho.

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PROJETO DE LEI N.º 169/XVI/1.ª (*)

CRIA O PROGRAMA REDE PÚBLICA DE CRECHES (ALTERA A LEI N.º 2/2022, DE 3 DE JANEIRO)

Exposição de motivos

As respostas sociais para a infância são protagonizadas, em Portugal, pelo setor social, financiado por

acordos de cooperação com a segurança social. As creches não estão inseridas no sistema de ensino, pelo

que a oferta está essencialmente sob a gestão deste setor social (IPSS), com acordos de cooperação com o

Estado, tendo sido recentemente alargado, na sequência do programa Creche Feliz, também ao setor privado,

de forma subsidiária e depois às autarquias locais. Falta é somar a essas possibilidades uma rede pública de

creches.

O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), reportando-se aos dados da Carta Social de 2019,

salientava na altura «uma insatisfatória cobertura média das respostas e equipamentos sociais (…) para a 1.ª

infância 48,4% (creches)» – uma cobertura insatisfatória que se faz sentir de forma particularmente aguda nas

Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto. Por essa razão, o PRR incluiu no seu 6.º Pilar «Políticas para a

próxima geração, crianças e jovens, incluindo educação e habilidade» o objetivo de «[a]umentar a capacidade

de resposta em creche, fundamentalmente nos territórios que ainda têm níveis de cobertura mais baixos».

Foi criado pelo Governo o programa Creche Feliz, nos termos da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, dando um

passo muito importante e positivo no sentido de garantir o acesso a creches gratuitas para as crianças e

famílias. Este Programa já sofreu várias alterações por via da sua regulamentação numa tentativa de

aumentar a capacidade de resposta. Desde logo, em dezembro de 2022, a medida foi alargada ao setor

privado pela Portaria n.º 305/2022, de 22 de dezembro. Posteriormente, foram alterados os critérios referentes

à organização das salas que permitiu aumentar o número máximo de crianças por sala e ainda facilitar a

reconversão de espaços previamente dedicados à área de infância para salas de creche, mediante uma mera

comunicação ao Instituto da Segurança Social, nos termos da Portaria n.º 190-A/2023, de 5 de julho.

Em dezembro de 2023, o Governo do Partido Socialista aprovou e publicou a Portaria n.º 426/2023, de 11

de dezembro, que estendeu o programa Creche Feliz às autarquias locais, instituições de ensino superior

público ou de outras pessoas coletivas de natureza pública, designadamente as creches pertencentes a

empresas públicas, a sociedades anónimas de capitais públicos, institutos públicos ou outros organismos de

idêntica natureza. Esta era uma das medidas defendidas pelo Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda que

apresentou iniciativas para tornar possível que entidades públicas, como as instituições de ensino público e as

autarquias locais, pudessem celebrar acordos de cooperação para o desenvolvimento de respostas sociais

(PROCOOP) na valência de creche.

No seu programa eleitoral o Bloco de Esquerda assumiu o compromisso de lutar pela criação de uma rede

pública de creches com cobertura universal, incluída no sistema educativo. Esse compromisso inclui o

recrutamento de mais profissionais e a contabilização do tempo de serviço dos educadores de infância afetos

às creches para todos os efeitos do Estatuto da Carreira Docente.

A Recomendação n.º 3/2011, do Conselho Nacional de Educação, sobre «A educação dos 0 aos 3 anos»

considera que a concretização do direito das crianças à creche é «um fator de igualdade de oportunidades, de

inclusão e coesão social». O mesmo documento sustenta que a responsabilização primeira pela educação dos

0 aos 3 anos pertence às famílias, não devendo a frequência da creche ser obrigatória, mas devendo «ser

universal, de modo que as famílias disponham de serviços de alta qualidade a quem entregar os seus filhos,

serviços esses que devem estar geograficamente próximos da respetiva residência ou local de trabalho». E,

no mesmo sentido, defende que «o Ministério da Educação deve assumir progressivamente uma

responsabilização pela tutela da educação da faixa etária dos 0-3».

A criação de uma rede pública de creches permitirá responder a essa debilidade social do País e

concretizar o direito à creche como parte dos direitos constitucionais das crianças ao desenvolvimento integral

(artigo 69.º) e à educação (artigo 73.º). Para além do levantamento das necessidades e do reforço da oferta,

esse programa terá como objetivo garantir a gratuitidade de frequência de creche a todas as crianças, tendo

em conta que hoje faltam ainda dezenas de milhares de vagas para se cumprir o direito à creche gratuita para

todos.

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Assim, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, as Deputadas e os Deputados do Bloco de

Esquerda apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei cria o programa Rede de Creches Públicas e altera a Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro

São alterados os artigos 1.º e 2.º da Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, que passam a ter a seguinte redação:

«Artigo 1.º

[…]

A presente lei alarga progressivamente a gratuitidade da frequência de creche do sistema de cooperação e

das amas do Instituto da Segurança Social, IP (ISS, IP), e cria o programa Rede de Creches Públicas.

Artigo 2.º

[…]

1 – […]

a) […]

b) […]

c) […]

2 - […]

3 – Em 2025 tem início o programa que visa alargar a gratuitidade das creches através de uma rede

pública de creches, nos termos do artigo seguinte.»

Artigo 3.º

Aditamento à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro

É aditado à Lei n.º 2/2022, de 3 de janeiro, o artigo 2.º-A, com a seguinte redação:

«Artigo 2.º-A

Programa Rede de Creches Públicas

1 – O programa Rede de Creches Públicas tem como objetivo promover o acesso à creche gratuita,

assegurando o direito das crianças à educação e ao seu desenvolvimento integral.

2 – No primeiro trimestre de 2025, de acordo com dados mais atualizados e disponibilizados pela Carta

Social, o Governo apresenta os números de vagas necessárias em creches públicas e em educação pré-

escolar, de acordo com os rácios de cobertura para estas valências, bem como, em função destes dados,

procede ao levantamento dos concursos ou bolsas de recrutamento necessários para suprir as necessidades

de recursos humanos associadas.

3 – Até ao fim de 2025, o Governo dá início à requalificação/reabilitação de espaços já existentes e/ou à

construção de novas creches para garantir o acesso universal e gratuito à creche a todas as crianças até aos

três anos, independentemente do escalão de rendimento.

4 – A requalificação/reabilitação referida no número anterior pode ser feita em parceria com as autarquias

locais, nomeadamente no caso em que estas manifestem interesse na gestão da resposta.

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5 – A manutenção, qualificação e alargamento da oferta pública é acompanhada por uma equipa de

monitorização sob a tutela conjunta do Ministério da Educação e do Ministério do Trabalho e Segurança

Social.»

Artigo 4.º

Regulamentação

O Governo procede à regulamentação necessária da presente lei no prazo de dois meses a contar da sua

entrada em vigor.

Artigo 5.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte à sua publicação e produz efeitos a partir do Orçamento do

Estado subsequente.

Assembleia da República, 4 de junho de 2024.

As Deputadas e os Deputados do Bloco de Esquerda: José Moura Soeiro — Joana Mortágua — Fabian

Figueiredo — Marisa Matias — Mariana Mortágua.

(*) O título e o texto iniciais da iniciativa foram publicados no DAR II Série-A n.º 39 (2024.06.04) e substituídos, a pedido do autor, o

texto em 7 de junho de 2024 [DAR II Série-A n.º 42 (2024.06.07)] e o título e o texto em 23 de setembro de 2024.

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PROJETO DE LEI N.º 270/XVI/1.ª

PELA PROMOÇÃO DA PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS DA VIOLÊNCIA DA TAUROMAQUIA,

INTERDITANDO A ASSISTÊNCIA E A PARTICIPAÇÃO A MENORES DE 16 ANOS

Exposição de motivos

Em Portugal, apesar de constituírem uma exceção ao princípio de não causar sofrimento aos animais,

estabelecido na Lei de Proteção aos Animais, Lei n.º 92/95, de 12 de setembro, na sua atual redação, é

incompreensível e incoerentemente, permitida a realização de touradas.

Apesar dos golpes que são desferidos contra o animal, cujo sofrimento, exaustão e feridas são visíveis, o

Estado português continua a permitir a exposição de crianças e jovens à violência da tauromaquia, a quem é

permitida a assistência, e, por vezes, a participação nesta atividade. Acresce que são inúmeros os acidentes,

até com consequências mortais para humanos ou não humanos que os mesmos presenciam ainda.

Precisamente por causa do impacto que a violência da tauromaquia tem em crianças e jovens, o Comité

dos Direitos da Criança das Nações Unidas pronunciou-se já por duas vezes, instando o Estado português a

afastar as crianças e jovens destas atividades.

Em fevereiro de 2014, o Comité dos Direitos da Criança da ONU pronunciou-se pela primeira vez sobre a

exposição de crianças e jovens à violência das touradas em Portugal, advertindo o nosso País a afastar as

mesmas da violência da tauromaquia.

Quatro anos depois deste pronunciamento, perante a inoperância das autoridades portuguesas e as

evidências de novos episódios de crianças expostas a este tipo de violência, toureando animais de raça brava

e presenciando acidentes de violência extrema, a violência da tauromaquia voltou a ser incluída no relatório de

avaliação de Portugal emitido pelo Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas, a 27 de setembro de

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2019, no capítulo «Violência contra crianças» [artigos 19, 24 (3), 28 (2), 34, 37 (a) e 39 da Convenção], a par

dos castigos corporais, abuso e negligência.

O pronunciamento dos peritos do Comité dos Direitos da Criança é claro, referindo expressamente, no

parágrafo 27 do referido relatório, que:

«O Comité recomenda que o Estado Parte estabeleça a idade mínima para participação e assistência em

touradas e largadas de touros, inclusive em escolas de toureio, em 18 anos, sem exceção, e sensibilize os

funcionários do Estado, a imprensa e a população em geral sobre efeitos negativos nas crianças, inclusive

como espectadores, da violência associada às touradas e largadas» (sublinhado nosso).

Demonstrativa da extrema violência a que as crianças assistem ou que são vítimas, são os inúmeros

acidentes, por vezes mortais, que daí resultam. Elencamos alguns exemplos:

– Agosto 2017 (Arruda dos Vinhos): um touro fugiu da zona onde decorria uma largada e andou solto

pelas ruas da vila, tendo colhido algumas pessoas, incluindo um bebé e uma mulher grávida;

– Setembro 2017 (Cuba): o forcado Pedro Primo morreu após uma violenta colhida de um touro na praça

de touros de Cuba, perante dezenas de crianças;

– Setembro de 2017 (Moita): o forcado Fernando Quintela morreu na sequência de uma violenta colhida

por um touro na praça de touros da Moita do Ribatejo;

– Agosto de 2018 (Arruda dos Vinhos): um forcado ficou com uma bandarilha cravada no peito, tendo sido

retirado da arena perante os olhares horrorizados do público, onde se incluíam várias crianças;

– Maio de 2019 (Moura): um forcado foi colhido com violência e arrastado durante 3 metros, embatendo

de forma violenta na barreira, tendo sofrido um esmagamento que afetou o fígado, provocando-lhe uma forte

hemorragia. O forcado foi internado no Hospital Curry Cabral em estado grave;

– Julho de 2019 (Coruche): o cavalo de João Moura Júnior foi brutalmente colhido na praça de touros de

Coruche, acidente que resultou em diversos ferimentos no cavaleiro, que teve que ser suturado na cara e

posterior abate do cavalo. Na mesma corrida de touros, a cavaleira Ana Batista também sofreu uma forte

colhida e caiu do cavalo, sendo transportada para o Hospital de Santarém. Dois forcados tiveram de ser

assistidos depois de acidentes violentos. Um dos forcados perdeu os sentidos na arena e outro sofreu uma

fratura no maxilar e teve de ser transportado de helicóptero para o Hospital de São José, em Lisboa;

– Agosto de 2019 (Nazaré): oito forcados feridos, dois em estado grave, na sequência de acidentes

graves numa corrida de touros na praça de touros da Nazaré. Um dos forcados foi projetado contra as tábuas,

perdeu os sentidos e teve de ser transportado para o Centro Hospitalar de Leiria. Outro sofreu diversos

ferimentos graves, e por suspeitas de fratura da tíbia e perónio foi transportado ao hospital;

– Outubro de 2019 (Moita): um fotógrafo que se encontrava na trincheira da praça de touros foi colhido por

um touro que lhe arrancou o escalpe. O acidente de extrema violência foi presenciado por várias crianças que

se encontravam a escassos metros da vítima;

– Novembro de 2019 (Redondo): colhida violenta do forcado Luís Feiteirona com fratura exposta da perna.

Foi retirado de maca da arena e transportado ao hospital num ambiente de tensão e pânico na praça;

– Maio de 2022 (Moita): um jovem menor de idade (de apenas 15 anos) morreu numa largada de touros

organizada pela Câmara Municipal da Moita. O jovem foi colhido pelo touro e perfurado na garganta, não

resistindo à violência das colhidas. O episódio violento foi testemunhado por centenas de pessoas, incluindo

crianças;

– Agosto de 2024 (Coruche): uma criança de apenas 10 anos foi violentamente colhida numa largada de

touros organizada pela Câmara de Coruche, que originou mais alguns feridos graves, onde se incluía uma

jovem de 20 anos. O caso foi noticiado 5 dias depois num jornal local, com imagens impressionantes e

chocantes da violência do evento e do pânico causado no público que assistia nas ruas de Coruche. O jornal

Mais Ribatejo adianta que se registaram 34 feridos nestas largadas em Coruche e que, segundo os dados dos

Bombeiros de Coruche, 30% dos feridos são menores de idade;

– Agosto de 2024 (Évora): um homem de 51 anos morreu depois de ser brutalmente colhido por um touro

numa largada em Évora;

– Agosto de 2024, é possível ver um bebé de colo ao lado do touro, nas touradas de morte em Monsaraz,

o que representa um grave risco para a integridade física da criança, que, atenta a sua tenda idade,

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dificilmente teria qualquer hipótese de sobreviver se fosse colhida pelo animal.

Em junho de 2016, a Ordem dos Psicólogos Portugueses pronunciou-se sobre o impacto psicológico da

exposição de crianças a espetáculos tauromáquicos através de um parecer enviado à Assembleia da

República no âmbito de um projeto apresentado pelo Pessoas-Animais-Natureza, considerando que a

exposição das crianças à violência «não é benéfica para as crianças ou para o seu desenvolvimento saudável,

podendo inclusivamente potenciar o aparecimento de problemas de saúde psicológica».

Referem ainda no respetivo parecer que «as crianças experienciam consequências negativas pela

observação de violência contra os animais, com efeitos semelhantes à observação de violência contra

pessoas. Segundo os estudos (…) as crianças que testemunham abuso animal têm maior probabilidade de

desenvolver problemas comportamentais, dificuldades académicas, comportamento delinquente e correm

maior risco de abusar de substâncias.»

Acrescentam que «Lockwood (2007) identificou seis resultados adversos da exposição das crianças à

crueldade para com animais: 1) promove a dessensibilização e prejudica a capacidade da criança para a

empatia; 2) cria a ideia de que as crianças, tal como os animais, são dispensáveis; 3) prejudica o sentido de

segurança e confiança na capacidade dos adultos para as protegerem do perigo; 4) conduz à aceitação da

violência física em relações interpessoais; 5) faz com que as crianças possam procurar uma sensação de

empowerment infligindo dor e sofrimento; 6) leva à imitação de comportamentos abusivos».

Por referência ao mesmo autor, refere ainda que «as crianças expostas ao abuso de animais podem

apresentar comportamentos de “abuso reactivo”, ou seja, as crianças podem reencenar com animais os

comportamentos que testemunharam. É preciso não esquecer que os seres humanos desenvolveram uma

forma muito poderosa de aprendizagem – a imitação, ou seja, a capacidade aprender comportamentos através

da observação das acções dos outros. E que este tipo de aprendizagem é fundamental na infância. E as

crianças imitam o comportamento dos adultos mesmo quando este não é apresentado, deliberadamente, para

as ensinar (Meltzoff, A., 1999). A observação de comportamentos agressivos aumenta a probabilidade de as

crianças terem comportamentos semelhantes (Huesmann et al., 2003)».

No livro The Link Between Animal Abuse and Human Violence (Linzey, 2009) os autores sublinham o papel

da dessensibilização da violência animal. Esta dessensibilização (que habitua as crianças a situações de

violência, tornando-as passivas e reduzindo a sua capacidade de reagir face a atos violentos) opõe-se

diretamente ao desenvolvimento da empatia na infância. A observação de cenas violentas aumenta a

tolerância a demonstrações de agressão e ensina as crianças a aumentar os seus níveis daquilo que é

agressividade aceitável. Para além disso, alguns estudos documentam que a dessensibilização à violência

leva a que as crianças esperem mais tempo para chamar um adulto a intervir numa altercação física entre

pares e conduz a uma redução na simpatia para com as vítimas de violência doméstica. Uma outra

consequência da observação de violência é o aumento de sentimentos hostis que, por sua vez, interfere na

capacidade de interagir em contextos interpessoais (Cantor, J. s.d.).

E aqui importa sublinhar, como suprarreferido pelos exemplos elencados, que as crianças não estão

apenas expostas a violência contra animais, que é o cerne da atividade tauromáquica, como a violência contra

humanos.

A exposição de crianças e jovens à violência das touradas em Portugal motivou ainda um parecer da

Amnistia Internacional, dirigido à Assembleia da República durante a discussão da Proposta de Lei n.º 209/XII

(3.ª) do Governo, que estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de artista tauromáquico e de

auxiliar de espetáculo tauromáquico, abrindo a exceção para crianças que atuam como artistas «amadores».

A Amnistia Internacional considera que as crianças e jovens não podem participar em touradas por se tratar

de uma atividade violenta e que coloca em risco a sua segurança e saúde, advertindo a Assembleia da

República e os seus constituintes para que «considerem e fundamentem sempre o superior interesse da

criança nos documentos que a estas digam respeito e que façam cumprir tratados e convenções internacionais

assinados pelo Governo da República e ratificados por esta Assembleia».

Também a Comissão Nacional de Proteção das Crianças e Jovens em Risco refere, em parecer emitido a

14 de Julho de 2009, na sequência de pedidos de autorização de crianças menores de 16 anos em

espetáculos tauromáquicos, que «as referidas normas expressam o objectivo de garantir que a participação de

crianças e jovens em espectáculos ou outras actividades aí previstas, se compatibilizem com os direitos das

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crianças e jovens na óptica do seu superior interesse, tendo em conta a sua segurança, saúde, formação,

educação e desenvolvimento integral», acrescentando que os animais utilizados na atividade em apreço

«independentemente do seu peso, apresentam as referidas características de ferocidade/agressividade,

inerentes à natureza do espetáculo, que podem colocar em perigo crianças ou jovens, em função da

desproporcionalidade entre aquelas características e as limitações resultantes do seu estado de

desenvolvimento».

A Convenção dos Direitos da Criança estabelece no seu artigo 19.º que «os Estados Partes tomam todas

as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas adequadas à protecção da criança contra todas

as formas de violência física ou mental, dano ou sevícia, abandono ou tratamento negligente, maus-tratos ou

exploração, incluindo a violência sexual, enquanto se encontrar sob a guarda de seus pais ou de um deles,

dos representantes legais ou de qualquer outra pessoa a cuja guarda haja sido confiada».

Por sua vez, a Constituição da República Portuguesa determina no n.º 1 do artigo 69.º que «as crianças

têm direito à proteção da sociedade e do Estado, com vista ao seu desenvolvimento integral, especialmente

contra todas as formas de abandono, de discriminação e de opressão e contra o exercício abusivo da

autoridade na família e nas demais instituições».

Neste sentido, ao Estado português caberá assegurar o cumprimento da Convenção dos Direitos da

Criança e a proteção das nossas crianças e jovens, retificando a atual legislação que permite que crianças

maiores de 3 anos possam assistir a espetáculos tauromáquicos, desde que acompanhadas por um adulto,

presenciando imagens de grande violência e acidentes graves com feridos e até mortes.

Para além disso, continuam a funcionar em Portugal várias «escolas de toureio» frequentadas por crianças

de todas as idades, sem qualquer tipo de legislação específica ou regulamento que garanta a salvaguarda da

integridade física das crianças e o seu bem-estar, que ministram aulas práticas com animais de raça brava e

participam em demonstrações de toureio que envolvem o contato com animais de raça brava ou de lide e a

utilização de instrumentos letais.

A atual legislação estabelece a idade mínima de 16 anos para a participação em espetáculos

tauromáquicos, concedendo uma exceção para as categorias de artistas amadores, como é o caso dos

forcados (que é a categoria de risco mais elevado e onde têm ocorrido os acidentes de maior gravidade, como

os sucedidos em 2017 quando morreram dois jovens forcados nas praças de touros da Moita e de Cuba).

A exceção na Lei n.º 31/2015 de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício da atividade de

artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico, permite que crianças menores de 16 anos

possam participar em espetáculos tauromáquicos mediante uma autorização especial concedida pela

Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (n.º 4 do artigo 3.º da referida

lei), que na prática constitui uma autorização especial para que as crianças coloquem em risco a sua vida.

Neste sentido, importa clarificar a legislação e garantir uma efetiva proteção das nossas crianças e jovens

deste tipo de violência em harmonia com o que está estipulado na Convenção dos Direitos da Criança

subscrita pelo nosso País.

Esta alteração já deveria estar em vigor, na medida em que o Conselho de Ministros, a 14 de outubro de

2021, aprovou o decreto-lei que alteraria a classificação etária para assistir a espetáculos tauromáquicos,

fixando-a nos maiores de 16 anos, à semelhança do que acontece para o acesso e exercício das atividades de

artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico. Esse decreto-lei seria o resultado das

negociações com o Pessoas-Animais-Natureza para o Orçamento do Estado para 2021. Todavia, o respetivo

diploma nunca chegou a ser publicado, considerando a incompreensível devolução do Presidente da

República ao anterior Governo, mostrando não só que os compromissos firmados não foram cumpridos, bem

como que a promoção da segurança, o desenvolvimento saudável e a vida das crianças, em cumprimento da

Convenção dos Direitos da Criança e da Constituição da República Portuguesa, não foram uma prioridade.

Na presente data o PAN apresenta igualmente uma proposta de referendo que pugna pela auscultação da

população, com vista à abolição desta atividade violenta, que põe em causa o bem-estar animal, de forma

cruel e inaceitável à luz de uma sociedade ética e progressista. Mas enquanto não forem abolidas as touradas,

largadas ou outras manifestações similares, deve o Estado português garantir a proteção de crianças e jovens,

afastando-as da violência da tauromaquia.

Pelo exposto, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a abaixo assinada

Deputada única representante do partido do Pessoas-Animais-Natureza apresenta o seguinte projeto de lei:

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Artigo 1.º

Objeto

A presente lei altera a classificação etária para permitir a assistência e participação em espetáculos

tauromáquicos, interditando-a a menores de 16 anos, procedendo, para o efeito:

a) À segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro, que aprova o regime de

funcionamento dos espetáculos de natureza artística e de instalação e fiscalização dos recintos fixos

destinados à sua realização, bem como o regime de classificação de espetáculos de natureza artística e de

divertimentos públicos, conformando-o com a disciplina do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que

transpôs a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa

aos serviços no mercado interno;

b) À primeira alteração à Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício da

atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico;

c) À primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 89/2014, de 11 de junho, que aprova o Regulamento do

Espetáculo Tauromáquico.

Artigo 2.º

Alteração ao Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro

É alterado o artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 27.º

Classificações especiais

1 – […]

a) […]

b) […]

c) (Revogado.)

d) Para maiores de 16 anos, espetáculos tauromáquicos e a frequência de discotecas e similares.

2 – […]

3 – […]

4 – As classificações previstas no presente artigo, com exceção dos espetáculos tauromáquicos, podem

ser alteradas para escalão diverso quando, por iniciativa da comissão de classificação ou por requerimento

fundamentado do promotor ou ainda das autoridades policiais ou administrativas locais, se conclua que as

características do espetáculo, do recinto ou do local o aconselham.

5 – [Novo] A classificação prevista na alínea d) do n.º 1 do presente artigo interdita o acesso de crianças e

jovens menores de 16 anos a espetáculos tauromáquicos.

Artigo 3.º

Alteração à Lei n.º 31/2015, de 23 de abril

É alterado o artigo 3.º da Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que passa a ter a seguinte redação:

«Artigo 3.º

Categorias

1 – […]

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a) […]

b) […]

c) […]

d) […]

e) […]

f) […]

g) […]

h) […]

i) […]

2 – […]

a) […]

b) […]

c) […]

3 – Os artistas tauromáquicos, auxiliares e forcados devem ter a idade mínima de 16 anos.

4 – (Revogado.)»

Artigo 4.º

Aditamento ao Decreto-lei 89/2014, de 11 de junho

É aditado o artigo 25.º-A ao Decreto-Lei n.º 89/2014, de 11 de junho, com a seguinte redação:

«Artigo 25.º-A

Idade mínima dos espectadores

É interdita a assistência a todos e quaisquer espetáculos tauromáquicos a menores de 16 anos.»

Artigo 5.º

Norma revogatória

São revogados:

a) A alínea c) do n.º 1 do artigo 27.º do Decreto-Lei n.º 23/2014, de 14 de fevereiro, que aprova o regime

de funcionamento dos espetáculos de natureza artística e de instalação e fiscalização dos recintos fixos

destinados à sua realização, bem como o regime de classificação de espetáculos de natureza artística e de

divertimentos públicos, conformando-o com a disciplina do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26 de julho, que

transpôs a Diretiva 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa

aos serviços no mercado interno;

b) O n.º 4 do artigo 3.º da Lei n.º 31/2015, de 23 de abril, que estabelece o regime de acesso e exercício

da atividade de artista tauromáquico e de auxiliar de espetáculo tauromáquico.

Artigo 6.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.

Palácio de São Bento, 28 de agosto de 2024.

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A Deputada do PAN: Inês Sousa Real.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 302/XVI/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PROCEDA À ELABORAÇÃO E IMPLEMENTAÇÃO DE

ESTRATÉGIA NACIONAL DE COMBATE À ENDOMETRIOSE E ADENOMIOSE E QUE CRIE UMA BOLSA

DE INVESTIGAÇÃO DA DOENÇA

Exposição de motivos

A endometriose uma doença crónica, inflamatória, autoimune e estrogénio-dependente em que se

desenvolve tecido semelhante ao do revestimento do útero, mas fora deste. Ou seja, o endométrio (tecido de

revestimento do útero) «desenvolve-se em localização variável fora do útero, formando massas de

características benignas, com maior ou menor extensão. Nas várias localizações extrauterinas, esse tecido

sofre transformações semelhantes às que ocorrem no útero durante o ciclo menstrual, que se traduzem, mais

frequentemente, em dor e infertilidade.»1

Estima-se que a incidência de endometriose em Portugal seja de cerca de 700 000 casos2, afetando 1 em

cada 10 mulheres em idade reprodutiva3. Segundo os especialistas, dos 60% de mulheres com infertilidade, a

causa que está por base é a endometriose4, tendo em conta que os órgãos mais afetados pela endometriose

são precisamente os do aparelho reprodutor feminino – a vagina, os ovários e as trompas.

Desde os primeiros sintomas até ao diagnóstico final podem passar vários anos (estima-se ente 8 a 10

anos)5, e para grande parte das mulheres que sofrem desta doença as dores tornam-se gravemente

incapacitantes, devido às hemorragias internas e reações inflamatórias, o que, ao longo do tempo, vai

causando sobretudo dor associada à menstruação (dismenorreia), à relação sexual (dispareunia) e dor pélvica

crónica.

Os sintomas e a intensidade dos mesmos variam de mulher para mulher e podem variar também

consoante os órgãos afetados. A dor forte as hemorragias intensas são praticamente transversais, mas podem

ocorrer: cansaço, astenia, dispepsia, depressão, entre muitos outros.6

É também durante o período menstrual que a dor se agudiza e são também característicos sintomas como

vómito, cansaço extremo, diarreia, infeção urinária e inchaço abdominal.

Pelo exposto facilmente se percebe o quão incapacitante é esta doença. A endometriose limita as

atividades diárias das suas portadoras levando ao absentismo no trabalho e na escola. Devido às constantes

faltas, provocadas não só pela sintomatologia da doença, que muitas vezes impede as portadoras até de

caminhar, mas também pela necessidade constante de recorrer a consultas médicas e da realização de

exames, o que resulta em muitos os casos em perdas de emprego e insucesso escolar.7

Para além de afetar a qualidade de vida e da saúde da mulher, altera ainda a dinâmica familiar e devido

aos elevados custos dos tratamentos e da medicação, altera também em termos financeiros a vida familiar.

Segundo a Associação Portuguesa de Apoio a Mulheres com Endometriose, «até à data não existem, em

Portugal, estudos que permitam quantificar os impactos económicos e financeiros que a endometriose tem no

orçamento familiar e na sociedade em geral. No entanto, um estudo realizado com 909 mulheres com

endometriose de 10 países concluiu que a média de custos anuais totais por mulher com endometriose é de

1 https://www.hospitaldaluz.pt/pt/dicionario-de-saude/endometriose-sintomastratamentos#:~:text=Estima-se%20que%20a%20incid%C3%AAncia%20de%20endometriose%20em%20Portugal,pode%20ocorrer%3A%20Durante%20a%20mic%C3%A7%C3%A3o%20ou%20a%20defeca%C3%A7%C3%A3o 2 www.hospitaldaluz.pt/pt/guia-de-saude/dicionario-de-saude/endometriose-sinto 3 https://www.cuf.pt/mais-saude/endometriose-o-que-e-sintomas-e-tratamentos 4 https://www.cuf.pt/mais-saude/endometriose-o-que-e-sintomas-e-tratamentos 5 https://mulherendo.pt/endometriose-impacto-economico-na-familia-e-na-sociedade/ 6 https://www.cuf.pt/mais-saude/endometriose-o-que-e-sintomas-e-tratamentos 7 https://mulherendo.pt/endometriose-impacto-economico-na-familia-e-na-sociedade/

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9579 €, sendo 6298 € de custos indiretos e 3281 € de custos diretos, dos quais cerca de 95 % (3117 €) dizem

respeito a cuidados com a saúde. Neste estudo, as parcelas mais importantes dos custos com cuidados de

saúde referem-se a cirurgia, 29 % (904 €), exames de diagnóstico 19 % (592 €) e consultas médicas 16 %

(499 €). Os gastos com medicação representaram 10 % (312 €) daqueles custos»8.

A adenomiose é considerada um tipo de endometriose, pois corresponde ao crescimento do tecido

endometrial dentro do músculo do útero. Pode ser focal, quando se localiza numa determinada região do

útero, ou difusa, quando se espalha por toda a parede do útero, deixando-o mais pesado e volumoso.

Os primeiros sintomas de adenomiose podem surgir 2 a 3 anos após o parto, mesmo nos casos em que a

mulher já tem adenomiose desde a infância, e geralmente deixam de surgir após a menopausa, quando o ciclo

menstrual deixa de acontecer. Provoca igualmente sintomas incapacitantes como dor, sangramento intenso ou

cólicas fortes, especialmente durante a menstruação. A adenomiose tem cura através da histerectomia,

contudo, esta cirurgia só acontece quando os sintomas não conseguem ser controlados com medicamentos

anti-inflamatórios ou hormonais.

O Chega considera assim que é de elevada importância que exista uma maior divulgação e

consciencialização destas patologias, por forma a que se verifique consequentemente uma maior

compreensão da doença e dos seus impactos na qualidade de vida das mulheres que delas sofrem. Ao alertar

e divulgar esta patologia, ou seja, consciencializar a sociedade para a endometriose e a adenomiose,

prendemos a atenção na identificação precoce dos sintomas, bem como no tratamento mais adequado para

minimizar o impacto dos sintomas na vida destas mulheres.

Em França, por exemplo, em janeiro de 2022, foi apresentada uma estratégia nacional com o objetivo de

gerir, divulgar e diagnosticar a endometriose, onde se salientou que a doença, que atinge uma em cada dez

mulheres, não é apenas um problema feminino, é um problema social e que exige a criação de redes regionais

com o objetivo de garantir atendimento integral, personalizado e transversal em todo o País, fortalecendo a

formação dos profissionais de saúde e a necessidade de investir em estudos científicos para avançar no

conhecimento da doença.9

Portugal tem atualmente uma Secretaria de Estado específica para a promoção da saúde e a endometriose

deverá sem dúvida ser uma prioridade, para além de na XIV Legislatura ter sido aprovada a Resolução da

Assembleia da República n.º 312/2021, que previa, entre outras coisas, que fosse desenvolvido um programa

de literacia menstrual, bem como campanhas de sensibilização, o que, até à data, não aconteceu.

Assim, e ao abrigo das disposições constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do partido Chega recomendam ao Governo que:

1 – Proceda à elaboração e implementação da estratégia nacional de combate à endometriose e

adenomiose, nomeadamente com a promoção de projetos de carácter informativo, dinamizados ao nível local

e nacional, com o objetivo de desenvolver a consciencialização junto da comunidade e nas escolas de forma a

alertar para esta patologia e as melhores formas de minimizar os seus impactos.

2 – Seja criada uma de bolsa de financiamento para investigação, durante o ano de 2025, com o objetivo

de se aprofundar o conhecimento sobre a génese e tratamento desta patologia, estudada há mais de 100

anos, mas sem consenso sobre a sua origem.

3 – Seja efetuado um inquérito nacional de rastreio sobre endometriose e adenomiose a jovens em idade

escolar e universitária, e posteriormente tornados públicos os resultados, para efeitos de adequação das

políticas públicas neste âmbito.

4 – Promova programas de literacia menstrual por forma a acabar com o estigma associado à

menstruação, uma melhor compreensão da condição menstrual e dos impactos que tem a nível da saúde

feminina, nomeadamente junto da comunidade estudantil.

Palácio de São Bento, 23 de setembro de 2024.

Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Marta Martins da Silva — Rui Cristina — Felicidade Vital — Sandra

8 https://mulherendo.pt/mulherendo/ 9 https://www.womens.es/pt/endometriose-fran%C3%A7a-anuncia-estrat%C3%A9gia-nacional-para-combater-a-doen%C3%A7a/

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II SÉRIE-97 — NÚMERO A

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Ribeiro — Cristina Rodrigues — Diva Ribeiro — Luísa Areosa — Madalena Cordeiro — Manuela Tender —

Maria José Aguiar — Patrícia Carvalho — Rita Matias — Sónia Monteiro — Vanessa Barata.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 303/XVI/1.ª

PELA PROTEÇÃO DA MULHER GRÁVIDA NOS CUIDADOS DE SAÚDE E NO TRABALHO

Exposição de motivos

O desejo de ter um filho é inerente e partilhado por grande parte das pessoas. Muitos casais planeiam a

sua vida em redor deste objetivo de vida comum. Um filho significa alcançar a plenitude da vida e a gravidez

assume-se como um dos acontecimentos mais esperados na vida de um casal. Infelizmente, sabe-se que, por

interrupção médica da gravidez ou por morte espontânea em média, uma gravidez em cada quatro não passa

das 12 semanas, mas os riscos não terminam nessa altura. Podem ocorrer complicações mais tarde que

inviabilizam a gestação.

Portugal foi um caso de sucesso na melhoria dos indicadores de saúde materna e mortalidade infantil no

final do século XX. Para isso contribuíram as melhores condições de vida e o acesso cuidados de saúde – o

SNS investiu nessa área com os médicos dos cuidados de saúde primários treinados em acompanhamento de

grávidas de baixo risco e na vigilância de saúde infantil com um Programa Nacional de Vacinação robusto,

com acesso a consultas de obstetrícia e partos em maternidades com profissionais treinados. Se por um lado

se verificou uma descida abrupta das taxas de mortalidade fetal1 e perinatal2 a partir de 1960, também é

verdade que essas taxas estão praticamente estagnadas desde 20103, facto que se mantém real nas

maternidades e que inverte a sequência lógica do ciclo vital, salientando-se que muitas das perdas ocorrem de

uma gravidez considerada de baixo risco, ou seja sem qualquer patologia, intercorrência ou sinal prévio

associado.

Acresce referir que o desconhecimento ou a ausência de causas para a morte gestacional pode fazer com

que os pais sintam receio de engravidar novamente e, de alguma forma, a demora ou ausência de respostas

condicionam ou adiam o planeamento de uma nova gravidez.

As estatísticas indicam que partir das 24 semanas, 6 meses de gravidez, 1 em cada 200 casos termina em

morte fetal4, na maioria das vezes sem causa identificada. É essencial perceber a realidade da perda

gestacional e de que o forma o Estado pode diligenciar no sentido de promover a sua prevenção.

A tendência dos partos em casa, sem recurso a medicamentos e intervenções excessivas, está em

crescendo mas estes não estão isentos de riscos, as maternidades em alguns hospitais encerraram5, há muita

população imigrante que não usufrui de cuidados apesar de o SNS os garantir, sendo essa uma tendência já

reconhecida na comunidade africana6, sendo que muitas vezes essas mulheres tiveram nos seus países de

origem um desadequado ou inexistente acompanhamento da gravidez, todos estes fatores podem ajudar a

explicar os números relativos às perdas gestacionais, mas importa um olhar atento sobre o assunto.

É também de assinalar que as mulheres optam por ter filhos cada vez mais tarde7. No período entre 2011 e

2019, houve uma diminuição, de 3,8 % para 2,4 %, da proporção de nascimentos em mulheres com idade

inferior a 20 anos. Em contrapartida, no mesmo período observou-se um aumento assinalável, de 23,9 % para

1 Mortalidade fetal: precoce– corresponde ao número de óbitos in útero, em fetos até às 22 semanas de gestação ou intermédia quando ocorre entre as 22 e 28 semanas, ou tardia quando ocorre após as 28 semanas de gestação. 2 Mortalidade perinatal – corresponde à ocorrência de óbitos in útero, em fetos com 28 ou mais semanas de gestação, e de óbitos de crianças recém-nascidas com menos de 7 dias de idade. Engloba a mortalidade neonatal precoce com a fetal tardia 3 https://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+de+mortalidade+perinatal+e+neonatal-529 4 https://www.spommf.pt/wp-content/uploads/2018/11/Estudo-das-Situa%C3%A7%C3%B5es-de-Morte-Fetal-ap%C3%B3s-as-24-Semanas.pdf 5 https://www.mdm.org.pt/28-de-maio-2019-saude-da-mulher-um-direito-inalienavel-e-de-progresso-2/ 6 https://repositorio.iscte-iul.pt/bitstream/10071/5910/1/Tese%20Completa_Set.08.pdf, pág. 33. 7 https://www.pordata.pt/Portugal/Idade+m%c3%a9dia+da+m%c3%a3e+ao+nascimento+do+primeiro+filho-805

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33,3 %, da proporção de nascimentos em mulheres com idade igual ou superior a 35 anos8.

Cumulativamente, torna-se crucial avaliar os direitos previstos e exclusivos da trabalhadora grávida, e

garantir que estes sejam cumpridos.

Acresce referir que continuam a ocorrer gravidezes não planeadas que resultam, muitas vezes, em início

tardio ou mesmo ausência da vigilância pré-natal e em comportamentos de risco nas primeiras semanas da

gestação, com graves consequências para o feto.

Os sobressaltos demográficos sentidos nos últimos anos também não podem ser ignorados. A população é

mais idosa. Há menos jovens. A natalidade baixa perigosamente. As mães têm menos filhos e em idades mais

avançadas. A renovação das gerações está comprometida. A complexidade dos fatores determinantes destes

fenómenos impõem reflexão atenta.

Assim, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, os Deputados do Grupo

Parlamentar do Chega recomendam ao Governo que:

1) Promova um estudo com uma abordagem que deve ser multidisciplinar e onde sejam consideradas

como áreas de atuação prioritária a compreensão e identificação das causas de perda gestacional e fatores

associados, através da aplicação de protocolos de investigação atualizados.

2) No seguimento do referido estudo seja elaborado um relatório e este apresentado à Assembleia da

República.

3) Proceda ao reforço das atividades de promoção da saúde e dos cuidados antecipatórios dirigidos para o

período antes da conceção com vista a alertar os cidadãos, em particular os mais jovens e as mulheres em

idade reprodutiva, tendo em vista a serem alcançadas gravidezes saudáveis.

4) Garanta que todas as mulheres em idade fértil devem dispor de informação suficiente, em particular,

sobre a importância das primeiras semanas de gravidez, de modo que possam fazer escolhas esclarecidas

acerca do seu futuro reprodutivo.

5) No âmbito dos serviços de planeamento familiar, promover o aconselhamento especializado a casais

com história familiar de anomalias congénitas que pretendam esse aconselhamento, devendo ser-lhes

assegurada informação sobre os apoios disponíveis e melhores práticas nos cuidados infantojuvenis conforme

a situação específica.

6) Inclua na prestação de cuidados de saúde perinatais e pós-parto ações de preparação para o parto e

ações formativas pós-parto que assegurem a continuidade de cuidados.

Palácio de São Bento, 23 de setembro 2024.

Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Marta Martins da Silva — Rui Cristina — Felicidade Vital — Sandra

Ribeiro — Cristina Rodrigues — Diva Ribeiro — Luísa Areosa — Madalena Cordeiro — Manuela Tender —

Maria José Aguiar — Patrícia Carvalho — Rita Matias — Sónia Monteiro — Vanessa Barata.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

8 Fonte: Instituto Nacional de Estatística, IP - Portugal

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