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Terça-feira, 21 de janeiro de 2025 II Série-A — Número 164

XVI LEGISLATURA 1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2024-2025)

S U M Á R I O

Projetos de Lei (n.os 108, 231 e 464/XVI/1.ª): N.º 108/XVI/1.ª (Estipula a obrigatoriedade de instalação de painéis solares na cobertura de parques de estacionamento exteriores): — Relatório da Comissão de Ambiente e Energia. N.º 231/XVI/1.ª (Altera o regime do ordenamento e gestão das praias marítimas, prevendo a possibilidade de permanência e circulação de animais de companhia): — Relatório da Comissão de Ambiente e Energia. N.º 464/XVI/1.ª (CH) — Prevê a redução da taxa de IVA aplicável às garrafas de gás butano e propano.

Projetos de Resolução (n.os 17, 586 e 587/XVI/1.ª): N.º 17/XVI/1.ª — Trazer a gestão pública das unidades de saúde EPE para o Século XXI: — Alteração do título e texto iniciais do projeto de resolução. N.º 586/XVI/1.ª (CDS-PP) — Recomenda ao Governo que pondere o aumento da restituição do IVA suportado pelas instituições particulares de solidariedade social (IPSS). N.º 587/XVI/1.ª (CH) — Recomenda ao Governo que disponibilize dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em território nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes.

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PROJETO DE LEI N.º 108/XVI/1.ª

(ESTIPULA A OBRIGATORIEDADE DE INSTALAÇÃO DE PAINÉIS SOLARES NA COBERTURA DE

PARQUES DE ESTACIONAMENTO EXTERIORES)

Relatório da Comissão de Ambiente e Energia

Índice1

Parte I – Considerandos

a) Apresentação sumária da iniciativa

b) Objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

c) Apreciação da conformidade dos requisitos constitucionais, regimentais e formais

d) Enquadramento parlamentar, consultas e contributos

Parte II – Opinião do Deputado relator

Parte III – Conclusões

Parte IV – Nota técnica e outros anexos

PARTE I – Considerandos

a) Apresentação sumária da iniciativa

A presente iniciativa visa estabelecer a obrigatoriedade de instalação de painéis solares fotovoltaicos, em

parques de estacionamento exteriores, destinados à produção de energia renovável. Propõem a instalação de

painéis solares como coberturas de parques de estacionamento que, além de energia renovável, também geram

sombra para o estacionamento.

b) Objeto, conteúdo e motivação da iniciativa

Os proponentes deste projeto de lei fundamentam-se na necessidade de promover soluções para a produção

de energia renovável, minimizando os impactos adversos sobre o ambiente. Assim, propõem a instalação de

painéis solares como coberturas em parques de estacionamento, com o objetivo de gerar energia renovável e

proporcionar sombra aos veículos estacionados.

A obrigatoriedade da instalação de painéis solares é condicionada pela dimensão dos parques de

estacionamento exteriores, sendo aplicável aos que possuem uma área superior a 1500 m2. Nestes casos,

determina-se que, no mínimo, metade da área do parque deve ser coberta com painéis solares.

O diploma prevê exceções à regra geral, aplicáveis a situações em que os parques já possuam outros

sistemas de produção de energia renovável, com capacidade equivalente à energia que seria gerada pelos

painéis fotovoltaicos, ou quando estejam equipados com árvores que ofereçam sombra em pelo menos 50 % da

sua superfície.

Adicionalmente, estabelece-se um período transitório para a implementação da medida, dividido em duas

fases: até 1 de julho de 2027, para parques com área igual ou superior a 10 000 m2, e até 1 de julho de 2029,

para aqueles com área entre 1500 e 10 000 m2. Os municípios poderão conceder prorrogações destes prazos,

até um máximo de cinco anos.

O diploma determina ainda que o Governo deverá regulamentar a sua aplicação no prazo de 90 dias a contar

da publicação.

A iniciativa organiza-se em cinco artigos, que dispõem, respetivamente, sobre o objeto do diploma, a

obrigatoriedade de instalação dos painéis solares, o período transitório, a regulamentação necessária e a data

1 Em conformidade com o disposto no artigo 139.º do Regimento.

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de entrada em vigor, estipulada para o dia seguinte à sua publicação.

c) Apreciação da conformidade dos requisitos constitucionais, regimentais e formais

Deve-se considerar a nota técnica elaborada pelos serviços, nos termos do artigo 131.º do Regimento da

Assembleia da República, cuja redação subscrevemos, reconhecendo a sua detalhada e competente descrição.

De acordo com a mesma, a iniciativa em apreço não suscita questões no âmbito da legística formal, estando

em conformidade com requisitos constitucionais e regimentais, tal como se verifica o cumprimento da lei

formulário, não obstante a possibilidade de ser objeto de aperfeiçoamento e análise mais detalhada em sede de

apreciação na especialidade ou em redação final.

d) Enquadramento parlamentar, consultas e contributos

Após consulta à base de dados Atividade Parlamentar (AP), verificou-se que não existem iniciativas

legislativas ou petições atualmente pendentes sobre matérias conexas com a presente iniciativa. Da mesma

forma, constatou-se que, no âmbito da XV Legislatura, não deram entrada na Assembleia da República

quaisquer iniciativas legislativas ou petições relacionadas com o tema em análise.

PARTE II – Opinião do Deputado relator

O Deputado relator exime-se, nesta sede, de manifestar a sua opinião política sobre o presente projeto de

lei, reservando a sua posição para o momento da discussão da iniciativa legislativa.

PARTE III – Conclusões

Perante o exposto, a Comissão de Ambiente e Energia conclui:

1 – A presente iniciativa legislativa cumpre todos os requisitos formais, constitucionais e regimentais em

vigor, reunindo, assim, todas as condições para ser agendada para debate na generalidade em Plenário;

2 – Nos termos regimentais aplicáveis, o presente relatório deverá ser remetido a S. Ex.ª o Presidente da

Assembleia da República.

PARTE IV – Nota técnica e outros anexos

Ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 139.º do Regimento da Assembleia da República anexa-se a nota

técnica e parecer da Associação Nacional de Municípios Portugueses sobre a iniciativa em apreço.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

O Deputado relator, Luís Paulo Fernandes — O Presidente da Comissão, Salvador Malheiro.

Nota: O relatório foi aprovado por unanimidade, tendo-se registado a ausência da IL, do PCP, do BE, do L e

do PAN, na reunião da Comissão do dia 21 de janeiro 2025.

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PROJETO DE LEI N.º 231/XVI/1.ª

(ALTERA O REGIME DO ORDENAMENTO E GESTÃO DAS PRAIAS MARÍTIMAS, PREVENDO A

POSSIBILIDADE DE PERMANÊNCIA E CIRCULAÇÃO DE ANIMAIS DE COMPANHIA)

Relatório da Comissão de Ambiente e Energia

Índice1

Parte I – Considerandos

I.1. Apresentação sumária da iniciativa

I.2. Análise jurídica e avaliação de pareceres e contributos

Parte II – Opiniões dos Deputados e GP

II.1. Opinião da Deputada relatora

Parte III – Conclusões

Parte IV – Nota técnica e outros anexos

PARTE I – Considerandos

I.1. Apresentação sumária da iniciativa

A presente iniciativa visa proceder à segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 159/2012, de 24 de julho, alterado

pelo Decreto-Lei n.º 132/2015, de 9 de julho, que regula a elaboração e a implementação dos planos de

ordenamento da orla costeira e estabelece o regime sancionatório aplicável às infrações praticadas na orla

costeira, no que respeita ao acesso, circulação e permanência indevidos em zonas interditas e respetiva

sinalização, prevendo a possibilidade de permanência e circulação de animais de companhia nas praias.

I.2. Análise jurídica e avaliação de pareceres e contributos

A nota técnica da iniciativa contempla uma análise jurídica exaustiva do objeto do diploma em apreço, para

a qual se remete.

Não obstante, salienta-se a seguinte observação que consta da referida nota técnica: «Segundo as regras

de legística formal, o título de um ato de alteração deve referir o ato alterado e os atos legislativos revogados,

por motivos informativos. Deste modo, sugere-se que passe a constar do título que o presente diploma altera o

Decreto-Lei n.º 159/2012, de 24 de julho.» – (cfr. página 5).

Foi recebido um parecer sobre a iniciativa em apreço, a saber:

1. Parecer desfavorável da ANMP, datado de 7 de outubro de 2024, porquanto:

«Sobre a matéria em apreço, importa referir que nas praias balneares – por força do Decreto-Lei n.º 97/2018,

de 27 de novembro –, diploma que procedeu à transferência de competências para os órgãos municipais no

domínio da gestão das praias marítimas, fluviais e lacustres integradas no domínio público hídrico do Estado –,

é competência dos municípios, designadamente, a limpeza, a recolha de resíduos urbanos, a manutenção,

conservação e gestão do abastecimento de água, as comunicações de emergência e os equipamentos,

infraestruturas e apoios de praia.

Contudo, a ANMP constata que o projeto de lei apresentado não tem em consideração as competências dos

municípios neste domínio e a articulação que se impõe com estas autarquias, por força do mencionado decreto-

lei.

1 Em conformidade com o disposto no artigo 139.º do Regimento.

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Com efeito, a adequada conciliação do preconizado na iniciativa legislativa com as competências de gestão

de praias por parte dos municípios obriga a que a decisão dependa, sempre, de opção municipal – garantindo

a sua regular utilização turística, lúdica ou desportiva, em condições de salubridade e segurança para todos.».

PARTE II – Opiniões dos Deputados e GP

II.1. Opinião da Deputada relatora

A Deputada relatora reserva a sua posição para a discussão da iniciativa legislativa em sessão plenária.

PARTE III – Conclusões

A Comissão de Ambiente e Energia conclui:

1 – A presente iniciativa legislativa cumpre os requisitos formais, constitucionais e regimentais em vigor,

reunindo todas as condições para agendamento para debate na generalidade em Plenário;

2 – Nos termos regimentais aplicáveis, o presente relatório deverá ser remetido a S. Ex.ª o Presidente da

Assembleia da República.

PARTE IV – Nota técnica e outros anexos

Nota técnica da iniciativa em apreço.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

A Deputada relatora, Raquel Ferreira — O Presidente da Comissão, Salvador Malheiro.

Nota: O relatório foi aprovado por unanimidade, tendo-se registado a ausência da IL, do PCP, do BE, do L e

do PAN, na reunião da Comissão do dia 21 de janeiro 2025.

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PROJETO DE LEI N.º 464/XVI/1.ª

PREVÊ A REDUÇÃO DA TAXA DE IVA APLICÁVEL ÀS GARRAFAS DE GÁS BUTANO E PROPANO

Exposição de motivos

O gás constitui, inegavelmente, um bem essencial para a população portuguesa, sendo fundamental na vida

quotidiana e indispensável para a garantia de uma qualidade de vida mínima e digna. A sua relevância vai muito

além do uso doméstico imediato, como a preparação de alimentos e o aquecimento de água para banhos, que

são, naturalmente, necessidades básicas. O gás é, de igual forma, imprescindível para o aquecimento das

habitações, fator essencial em períodos de maior rigor climático, onde se torna vital para a saúde pública, em

particular para a proteção dos mais vulneráveis, como os idosos e as crianças.

Todavia, apesar de o gás ser, em princípio, um bem de primeira necessidade, o acesso a este recurso

essencial não é uniformemente garantido a todos os cidadãos portugueses. Na verdade, existe uma disparidade

notória nas condições de acesso ao gás, que se traduz numa desigualdade estrutural, sobretudo em termos

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territoriais.

Esta situação deriva, fundamentalmente, da limitação da rede de gás natural, cuja cobertura não abrange a

totalidade do território nacional. Assim, enquanto as áreas urbanas, particularmente as situadas nas grandes

metrópoles e nas zonas costeiras, dispõem de uma rede alargada de gás natural, que facilita o acesso a este

recurso a preços competitivos e com comodidade, as regiões do interior, mais afastadas dos grandes centros

urbanos, permanecem amplamente excluídas desta infraestrutura.

Neste sentido, convém realçar que, atualmente, cerca de três milhões de famílias, situadas maioritariamente

em áreas rurais e em pequenas localidades, são obrigadas a recorrer ao gás de botija como única fonte de

abastecimento, devido à inexistência de uma rede de gás natural abrangente. Esta situação configura uma clara

desigualdade territorial, penalizando aqueles que, por razões geográficas, se encontram privados do acesso a

um bem essencial em condições semelhantes às de outras zonas do País.

A disparidade no acesso ao gás não se reflete apenas nas infraestruturas, mas também no regime fiscal que

incide sobre o consumo deste recurso. Nesse âmbito, o Decreto-Lei n.º 60/2019, de 13 de maio, estabelece o

quadro normativo aplicável à tributação sobre o consumo de gás, prevendo, no entanto, diferentes regimes de

IVA consoante o tipo de gás em questão.

O mesmo decreto implica, por exclusão, que o gás propano e butano de garrafa, utilizado quase

exclusivamente por famílias que não têm acesso à rede de gás natural, está sujeito a uma taxa de IVA

significativamente mais elevada, fixada em 23 %.

Esta distinção no tratamento fiscal configura uma situação de desigualdade flagrante, uma vez que as

famílias que dependem do gás de garrafa, geralmente residentes em zonas de menor densidade populacional

e em contextos socioeconómicos potencialmente mais desfavorecidos, acabam por ter um aumento do custo de

energia e correspondente impacto significativo nas finanças familiares, agravando assim as assimetrias já

existentes.

Por isso, tendo por base os princípios da equidade e da coesão territorial que deveriam nortear a política

fiscal de um Estado democrático e social de direito, é premente atender a medidas fiscais moldando e corrigindo

essas desigualdades.

Mais especificamente, não é aceitável que as famílias que, por razões alheias à sua vontade, se encontram

obrigadas a recorrer ao gás de garrafa sejam duplamente penalizadas, quer, por um lado, pela ausência de uma

infraestrutura de gás natural nas suas regiões, quer, por outro, pela aplicação de uma taxa de IVA mais elevada,

que onera ainda mais o seu orçamento familiar. Essa discriminação fiscal perpetua e aprofunda as

desigualdades territoriais, colocando em desvantagem aqueles que vivem em zonas do País mais afastadas dos

grandes centros urbanos.

Como é facilmente percetível, manter esta situação é perpetuar um sistema que não só ignora as

necessidades das populações, mas que também compromete a construção de uma democracia moderna,

madura, humanista e sensível às realidades territoriais e às necessidades dos cidadãos. Portanto, a correção

deste desequilíbrio não é apenas uma questão de justiça social, mas uma obrigação política e moral de um

Estado que se quer verdadeiramente inclusivo.

De referir ainda que, no relatório da Autoridade da Concorrência (AdC), de março de 2017, A Indústria do

Gás de Petróleo Liquefeito em Garrafa em Portugal Continental, se conclui que, «existe assim uma parte da

procura de GPL em garrafa que não pode migrar para o gás natural, seja devido a custos de mudança, seja

devido à impossibilidade de aceder a essa fonte de energia alternativa».

Ainda recentemente, foi publicado num órgão de comunicação social1 que uma «botija de gás em Portugal

custa o dobro que na nossa vizinha Espanha».

Estima-se que mais de metade das famílias portuguesas dependem desta fonte de energia.

Refira-se que, de certa forma, em Espanha o setor é moderado e ajustado pelo Estado a cada três meses.

A título de exemplo, uma garrafa de gás butano custa 16,60 € em Espanha e 32,15 € em Portugal. Uma

garrafa de gás propano custa 14,60 € em Espanha ao passo que em Portugal custa 32,29 €.

Conclui-se que esta diferença é justificada essencialmente, para além da elevada margem de lucro das

grandes distribuidoras, pela pesada carga fiscal em Portugal.

Assim, nos termos constitucionais e legalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar do Chega

1 https://sicnoticias.pt/economia/2024-12-06-video-botija-de-gas-em-portugal-custa-o-dobro-do-que-em-espanha-o-que-explica-a-diferenca--148e19d1

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apresentam o seguinte projeto de lei:

Artigo 1.º

Objeto

O presente diploma prevê a redução da taxa de IVA aplicável às garrafas de gás butano e propano para a

taxa mínima, alterando para esse efeito o Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo

Decreto-Lei n.º 394-B/84, de 26 de dezembro.

Artigo 2.º

Aditamento à Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado

É aditada a verba 2.42 à Lista I anexa ao Código do IVA:

«2.42 – Garrafas de gás butano e propano».

Artigo 3.º

Entrada em vigor

A presente lei entra em vigor com o Orçamento do Estado subsequente à sua publicação.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

Os Deputados do CH: Pedro Pinto — Eduardo Teixeira — Rui Afonso — Ricardo Dias Pinto — Marcus Santos

— Francisco Gomes — Eliseu Neves.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 17/XVI/1.ª (*)

TRAZER A GESTÃO PÚBLICA DAS UNIDADES DE SAÚDE EPE PARA O SÉCULO XXI

Exposição de motivos

O modelo de gestão e governança dos hospitais públicos portugueses tem sofrido várias alterações ao longo

dos anos, mas está ainda longe de capacitar adequadamente os gestores públicos com os instrumentos

necessários para uma gestão eficaz e eficiente destas unidades de saúde, com prejuízo para os contribuintes

e, sobretudo, para os utentes.

1. Evolução histórica da gestão hospitalar

O modelo em vigor, denominado de entidade pública empresarial (EPE), teve como esteio dotar os hospitais

públicos dos instrumentos existentes na gestão de empresas privadas. Esta reforma decorria de uma tendência

generalizada, observada em vários países ocidentais, de trazer para a Administração Pública clássica,

deliberadamente burocrática e administrativa (cf. Max Weber – Bureaucracy), alguns dos instrumentos

comummente encontrados na gestão das sociedades privadas.

O New Public Management, como assim ficou conhecido, pretendia então conferir instrumentos de gestão

mais flexíveis aos gestores da cousa pública, sem com isso comprometer os princípios subjacentes da

universalidade do serviço público. Em particular, procurava-se introduzir uma prática de monitorização e

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acompanhamento de indicadores de performance, com base na contratualização e cooperação entre agentes

do mercado, que permitisse uma gestão mais eficiente dos recursos e meios e, com isto, a prestação de mais e

melhores cuidados de saúde. É uma lógica adstrita a princípios de racionalidade económica.

Esta reforma foi uma melhoria face ao que existia anteriormente, nomeadamente face os hospitais do setor

público administrativo (SPA)1. Os hospitais SPA dispunham de ainda menos autonomia do que a hoje existente,

e seguiam o modelo de instituto público ao invés de empresa pública, desta forma limitando a capacidade de

resposta dos gestores públicos, que de gestores tinham pouco mais do que o nome.

A transformação dos hospitais SPA em EPE foi intercalada pela criação de um outro estatuto jurídico, o de

hospitais sociedade anónima (SA), detidos exclusivamente por capitais públicos, que iam muito mais além na

dotação de instrumentos de gestão dos hospitais públicos. A experiência do Hospital S. Sebastião (Santa Maria

da Feira), que funcionou de forma exemplar como hospital SA, entre 2002 e 2005, atesta este modelo, que foi

preterido, infere-se, por motivações mais políticas do que técnicas, tal como recentemente aconteceu com o

modelo PPP.

2. Limitações do modelo EPE

Tendo por base a prática gestionária ou, melhor dizendo, administrativa dos hospitais EPE, percebe-se que

o modelo EPE ainda não foi capaz de conferir os instrumentos necessários para que a gestão pública possa

garantir os mesmos resultados em termos de eficiência no uso dos recursos do que a gestão privada. A

operacionalização de princípios de racionalidade económica não é mais do que letra da lei se não estiverem

incorporados os incentivos e os instrumentos para a boa gestão.

Em específico, destaca-se, entre tantos outros pontos:

1. A contínua ingerência administrativa, por parte das várias instituições sob a tutela do Ministério da Saúde,

nomeadamente a ACSS, SPMS, DGS, mais as secretarias de Estado, no dia a dia dos hospitais, causando

assaz vezes dúvidas jurídicas sobre a sua aplicação, assim como fricções operacionais;

2. A dependência de autorizações da tutela (Ministério da Saúde e Ministério das Finanças) em decisões de

gestão, como a gestão de recursos humanos, em particular a contratualização e a cessação de vínculos laborais;

3. A falta de instrumentos de remuneração variável, com base em critérios de performance e de valor em

saúde, aliada à enorme rigidez da tabela remuneratória única, que está completamente desfasada da prática

salarial do setor privado em determinadas profissões de saúde;

4. A falta de um orçamento plurianual que confira ao hospital a autonomia para a assunção de investimentos

estratégicos que permitam reforçar a sua capacidade, causando situações-limite, como o caso do hospital

pediátrico Joãozinho, no Centro Hospitalar de São João;

5. A excessiva dependência dos trâmites da contratualização pública (Código dos Contratos Públicos), que

gera enormes ineficiências e mesmo desperdício de dinheiros públicos, a par com a fiscalização prévia do

Tribunal de Contas, que gera morosidade, constituindo não apenas um encargo financeiro latente como uma

potencial degradação dos cuidados de saúde prestados;

6. Um financiamento retrospetivo ancorado na produção (outputs), que não tem os incentivos corretos para

a gestão eficiente dos recursos e para a melhoria contínua do sistema, e que, aliás, potencia a sobreprestação

de cuidados de saúde e a execução apressada de despesa;

7. A deficiente gestão de tesouraria, por manifesta suborçamentação (em parte devida, precisamente, à

ineficiência que se observa nos hospitais EPE), e que depois se desdobra em atrasos nos pagamentos aos

fornecedores e em elevado endividamento;

8. A incapacidade de assegurar que os Conselhos de Administração (CA) são nomeados atentando única e

exclusivamente ao mérito e competência, obstante qualquer ligação partidária, levando a que muitas vezes

pessoas sem experiência e/ou competência na gestão hospitalar incorporem os CA;

9. As pendências agora criadas com a migração para o modelo ULS, que obriga à homologação dos

1 Moreira, Sara (2008). Análise da eficiência dos hospitais-empresa: uma aplicação da data envelopment analysis. Boletim Económico 2008, Banco de Portugal.

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regulamentos internos para a gestão dos EPE e, com isso, mais fricções, inoperâncias e paralisações.

Em particular, o atual processo de nomeação para os Conselhos de Administração das ULS apresenta graves

deficiências, particularmente no que diz respeito à ausência de mecanismos eficazes para evitar nomeações de

caráter político-partidário. A prática de selecionar gestores com base em proximidade política, em vez de mérito

e competência técnica, mina a eficiência e a credibilidade das instituições de saúde. Casos como os relatados

recentemente, em que ex-autarcas assumem posições de topo em ULS sem evidência de experiência relevante

no setor da saúde, exemplificam como as escolhas são frequentemente orientadas por interesses partidários,

em vez de critérios objetivos que priorizem a qualidade da gestão.

Esta realidade contribui para um enfraquecimento da governança hospitalar, gerando desconfiança pública

e, frequentemente, decisões de gestão desalinhadas com as necessidades do Serviço Nacional de Saúde

(SNS). A falta de transparência no processo de nomeação e a ausência de supervisão por entidades

independentes perpetuam estas nomeações inadequadas, comprometendo a capacidade das ULS de responder

eficazmente aos desafios do sistema de saúde. É imprescindível implementar reformas que garantam

nomeações baseadas em mérito, competência e alinhamento com os objetivos estratégicos do SNS, evitando

que interesses políticos coloquem em risco a sustentabilidade e a qualidade dos serviços prestados.

3. Uma proposta de reforma do modelo EPE

Por um lado, o colete de forças administrativo a que as unidades de saúde EPE estão sujeitas gera enormes

ineficiências e, no limite, prejudica a entrega de cuidados de saúde aos utentes. Por outro, a intromissão política

e administrativa em unidades de saúde dificulta a boa gestão das instituições, que devem estar focadas na

gestão operacional e na prestação de cuidados e não na prossecução de objetivos políticos. Ademais, não

existem de forma abrangente no sistema público de saúde os incentivos para a sua melhoria contínua, feita de

forma orgânica e voluntária, dependendo esta do brio dos profissionais de saúde. Ora, os sistemas devem ser

resilientes o suficiente para que não tenham de depender da boa vontade e da dedicação incondicional de alguns

profissionais de saúde.

Por conseguinte, tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do

Regimento da Assembleia da República, o Grupo Parlamentar da Iniciativa Liberal apresenta o seguinte projeto

de resolução, com vista à implementação de mecanismos que permitam a melhoria gradual na gestão e

governança dos hospitais públicos:

Resolução

Ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais aplicáveis, a Assembleia da República delibera

recomendar ao Governo que:

1. Constitua uma comissão independente de nomeação para os Conselhos de Administração das

unidades locais de saúde, sob a intendência da CRESAP (Comissão de Recrutamento e Seleção para a

Administração Pública) e coordenada pela DE-SNS, desta forma garantindo processos de nomeação isentos,

baseados em mérito e competências. Ademais, deve:

a. Tornar obrigatória a definição de critérios objetivos para a nomeação, incluindo qualificações profissionais,

experiência comprovada em gestão de saúde e competências específicas para o cargo;

b. Publicar e publicitar as vagas para membros dos CA em plataformas públicas acessíveis, permitindo que

todos os candidatos qualificados possam concorrer num processo transparente e competitivo;

c. Estabelecer indicadores de desempenho (KPI) claros para os membros dos CA, com base em critérios

como eficiência operacional, qualidade dos cuidados de saúde, satisfação dos utentes e gestão financeira;

d. Reportar os resultados dos CA com regularidade à DE-SNS e ao público, promovendo responsabilização

e alinhamento com os objetivos estratégicos do SNS;

e. Reformular as atribuições dos Conselhos Consultivos das ULS, conferindo-lhes a capacidade de auditar

e fiscalizar o trabalho dos CA, com um foco em desempenho, conformidade e qualidade dos serviços prestados;

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f. Instituir um modelo de reportes regulares e públicos dos CA aos Conselhos Consultivos, assegurando

transparência e permitindo que a sociedade civil e os stakeholders locais acompanhem a gestão das unidades;

g. Publicar todos os relatórios de desempenho e auditorias realizadas pelos Conselhos Consultivos em

plataformas públicas, promovendo maior confiança e escrutínio das atividades das administrações hospitalares.

2. Substituir o excesso de burocracia e regulamentação que as unidades EPE enfrentam,

particularmente no âmbito do Código dos Contratos Públicos (CCP), por um modelo de contratualização pública

mais ágil e eficiente, adaptado às especificidades do setor da saúde. A transparência será assegurada através

da publicitação obrigatória de todos os contratos numa plataforma digital centralizada, como a base.gov.pt,

complementada por dashboards públicos que exibam indicadores-chave, como eficiência contratual e

cumprimento de prazos. Adicionalmente:

a. Introduzir a fiscalização concomitante, em alternativa à fiscalização prévia do Tribunal de Contas,

permitindo supervisão em tempo real sem comprometer a agilidade;

b. Implementar um regime especial de contratação pública para a saúde, que ofereça flexibilidade em

aquisições urgentes, substituições de biossimilares e adaptação às rápidas mudanças de mercado, reduzindo

atrasos administrativos e ruturas de stock;

c. Criar um mecanismo de certificação de fornecedores baseado em critérios de qualidade, conformidade e

sustentabilidade, viabilizando uma via verde para processos simplificados com fornecedores certificados

– os SPMS deverão assumir um papel central na gestão centralizada de compras estratégicas (estendendo as

atuais competências da central de compras dos SPMS), negociando contratos em larga escala, desenvolvendo

catálogos dinâmicos de preços e fornecedores, e oferecendo suporte técnico aos hospitais para contratos

específicos;

d. Priorizar um modelo de contratação baseado em valor (value-based procurement), avaliando não apenas

o custo inicial, mas o impacto em saúde e o ciclo de vida dos bens e serviços contratados;

e. Digitalizar integralmente os processos de contratação, integrando inteligência artificial para monitorizar

conformidade e sugerir melhorias contratuais, garantindo decisões informadas e a otimização de recursos.

3. Facilitar a externalização das atividades não clínicas dos hospitais (logística e distribuição,

hospitalidade, tecnologias de informação, serviços de limpeza e gestão de infraestrutura), por meio da delegação

em operadores especializados, permitindo assim que o hospital se foque nas suas funções clínicas essenciais.

Os SPMS podem desempenhar um papel central nesse processo, assumindo a gestão centralizada de

contratos, negociando serviços em larga escala e implementando uma plataforma digital que facilite a

comunicação entre hospitais e fornecedores, inspirada no modelo do NHS Supply Chain no Reino Unido. Este

modelo permitiu obter elevados ganhos de eficiência, fruto de economias de escala e de especialização. É

também necessária a revisão do código fiscal no que à dedução do IVA diz respeito, que atualmente encarece

os serviços contratados pelos hospitais.

4. Transformar as principais valências dos hospitais em centros de responsabilidade integrada (CRI) de

2.ª geração, dotando-os de verdadeira autonomia financeira, administrativa e na gestão de recursos humanos.

Os CRI serão generalizados como modelo de governança interna, funcionando como centros de custos

independentes que contratualizam serviços e resultados com o Conselho de Administração e com outras

unidades do hospital. Em caso de quebra de contrato, o CRI poderá ser destituído ou reestruturado, promovendo

responsabilização.

Cada CRI terá autonomia para definir a sua política de gestão de recursos humanos e remuneração, alinhada

a objetivos estratégicos e a indicadores de performance, priorizando resultados em saúde (value-based

healthcare). A relação contratual será formalizada com base em métricas claras, como resultados clínicos,

eficiência no uso de recursos e satisfação dos utentes.

Os capitais do CRI serão, preferencialmente, detidos pelos próprios profissionais de saúde, fomentando uma

lógica de coesão e compromisso, e os CRI poderão operar em mais de uma unidade hospitalar, seja ela pública,

privada ou do setor social, promovendo a integração entre diferentes prestadores de saúde.

5. Criar os incentivos, através do financiamento, para a implementação de indicadores de valor em saúde,

que servirão para avaliar a atividade assistencial prestada pelo hospital como um todo (agregando o trabalho

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realizado por cada CRI — ver ponto anterior). A operacionalização desta medida implicará a implementação de

contabilidade analítica e custeio ao utente, assim como a recolha de indicadores de resultados em saúde

(outcomes) após a alta hospitalar com recurso a aplicações já disponíveis no mercado. Para que tal seja

possível, será necessário criar os incentivos financeiros, fazendo pender parte da remuneração dos hospitais na

sua implementação.

Estes pontos não esgotam as reformas necessárias, mas criam os pilares para que possa começar a

acontecer uma transformação profunda da gestão dos hospitais públicos, ficando menos dependente da

intervenção do legislador e mais dos gestores e autoridades locais. Sugere-se que as mesmas sejam

implementadas, de forma experimental, em três ULS de diferentes dimensões e que servem diferentes

populações, e que os seus resultados sejam avaliados.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

Os Deputados da IL: Mário Amorim Lopes — Bernardo Blanco — Carlos Guimarães Pinto — Joana Cordeiro

— Mariana Leitão — Patrícia Gilvaz — Rodrigo Saraiva — Rui Rocha.

(*) O título e o texto iniciais da iniciativa foram publicados no DAR II Série-A n.º 1 (2024.03.26) e substituídos, a pedido do autor, em 21

de janeiro de 2025.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 586/XVI/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE PONDERE O AUMENTO DA RESTITUIÇÃO DO IVA SUPORTADO

PELAS INSTITUIÇÕES PARTICULARES DE SOLIDARIEDADE SOCIAL (IPSS)

Desde 2001, os sujeitos passivos de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS) dispõem da

faculdade de consignar uma fração do imposto apurado em benefício de pessoas coletivas de utilidade pública

e de instituições dedicadas a fins sociais, religiosos, humanitários, assistenciais, culturais, juvenis, desportivos

ou ambientais.

Esta medida reconhece o papel imprescindível das instituições particulares de solidariedade social (IPSS)

que, pela sua experiência, abrangência territorial e proximidade às comunidades, assumem uma função de

elevado impacto social, complementando a intervenção do Estado em áreas essenciais, como a assistência

social, a educação e a saúde.

Em 11 de outubro de 2024, a Assembleia da República aprovou a Proposta de Lei n.º 2/XVI/1.ª, que prevê a

duplicação da consignação do IRS para 1 %, uma medida incluída no Programa do Governo PSD/CDS.

Ainda que esta seja uma conquista relevante, consideramos que é possível ir mais além no apoio às IPSS.

De modo a ampliar o alcance e impacto das ações das IPSS, é imperativo que o Governo seja capaz de

restituir o IVA suportado pelas mesmas no que respeita a despesas com obras de reparação dos seus edifícios,

e na construção de novos, bem como na substituição de equipamentos e viaturas de apoio.

O Decreto-Lei n.º 20/90, de 13 de janeiro, previa, justamente, a restituição do IVA às IPSS, relativo aos bens

e serviços relacionados com a construção, manutenção e conservação dos imóveis utilizados, total ou

principalmente na prossecução dos seus fins estatutários.

Por seu turno, numa tentativa de simplificação dos procedimentos de restituição do IVA, de modo a

«concretizar uma medida do Programa SIMPLEX+ 2016» do Governo do Partido Socialista, foi promulgado o

Decreto-Lei n.º 84/2017, de 21 de julho, que, além da vontade de tornar o procedimento de restituição totalmente

eletrónico e célere, acabou por atualizar os limites legalmente definidos à restituição do IVA, designadamente

quanto ao valor mínimo por fatura e aos tipos de aquisição de bens e serviços abrangidos em relação a cada

categoria de beneficiário.

Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 84/2017, de 21 de julho, foram revogados os regimes

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anteriormente previstos nos Decretos-Leis n.º 20/90, de 13 de janeiro, e n.º 113/90, de 5 de abril. Esta alteração

legislativa resultou numa redução significativa do benefício associado à restituição do IVA, impactando

negativamente a margem de atuação das IPSS.

Mais concretamente, veio a ser estipulado, no decreto-lei acima referido, a restituição de 50 % do valor

equivalente ao IVA suportado nas aquisições, quanto a um conjunto de bens e serviços.

Esta alteração comprometeu seriamente a sustentabilidade destas entidades, especialmente no que respeita

à realização de obras de reparação, construção de infraestruturas e substituição de equipamentos.

Entendemos que a conjuntura atual coloca muitas destas entidades perante um risco iminente de colapso

operacional, o que configuraria um cenário de graves repercussões para as comunidades que delas dependem

e que, em muitos casos, carecem de alternativas para a satisfação das suas necessidades essenciais.

Nestes termos, e considerando o papel imprescindível das IPSS na coesão social e na mitigação de

desigualdades, o Grupo Parlamentar do CDS-PP, ao abrigo das disposições constitucionais e regimentais

aplicáveis, propõe que a Assembleia da República recomende ao Governo que pondere um aumento da

restituição do IVA suportado pelas instituições particulares de solidariedade social (IPSS) nas despesas

relacionadas com obras de reparação e conservação dos seus edifícios, bem como na construção de novas

infraestruturas, e ainda na aquisição e substituição de equipamentos e viaturas de apoio, considerando que

muitos destes se encontram em avançado estado de degradação, comprometendo a qualidade e continuidade

dos serviços prestados por estas entidades.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

Os Deputados do CDS-PP: Paulo Núncio — João Pinho de Almeida.

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PROJETO DE RESOLUÇÃO N.º 587/XVI/1.ª

RECOMENDA AO GOVERNO QUE DISPONIBILIZE DADOS RELATIVOS À NACIONALIDADE,

NATURALIDADE, ETNIA E À PERMANÊNCIA EM TERRITÓRIO NACIONAL DE SUSPEITOS E/OU

CONDENADOS PELA PRÁTICA DE CRIMES

Exposição de motivos

De acordo com o disposto no artigo 7.º, n.º 3, da Lei de Segurança Interna (Lei n.º 53/2008, de 29 de agosto),

tem o Governo a obrigação de apresentar à Assembleia da República, até 31 de março de cada ano, um relatório

sobre a situação do País em matéria de segurança interna, bem como sobre a atividade das forças e dos serviços

de segurança desenvolvida no ano anterior.

É o Gabinete Coordenador de Segurança que procede à recolha, análise e divulgação dos elementos

respeitantes aos crimes participados e demais elementos necessários à elaboração do Relatório Anual de

Segurança Interna (RASI), tarefa essa que é da competência do Secretário-Geral do Sistema de Segurança

Interna, a quem compete igualmente submetê-lo à apreciação da Assembleia da República.

A forma como o RASI é construído e apresentado e o tipo de dados que são vertidos no mesmo não são de

molde a refletir com fidedignidade a atividade criminal que visam contabilizar, o que se deve, em particular, ao

facto de não mencionarem a nacionalidade dos suspeitos nem qual a sua situação no que toca à permanência

em território nacional.

O mesmo se passa com os dados divulgados pelas publicações de estatísticas da justiça sobre crimes

registados pelas autoridades policiais, da responsabilidade da Direção-Geral da Política de Justiça (DGPJ) e,

ainda,

De acordo com o artigo 9.º, n.º 1, do Regulamento (UE) n.º 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho,

de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados

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pessoais e à livre circulação desses dados, e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a

Proteção de Dados, ou RGPD), é proibido o tratamento dos dados pessoais que, entre outros, revelem a origem

étnica ou racial do indivíduo. Entre estes figuram, segundo cremos, os dados relativos à nacionalidade do

indivíduo e os referentes à sua permanência em território nacional.

O n.º 2 daquela disposição, porém, prevê exceções à referida proibição, designadamente, a constante da

alínea g)1: dificilmente se poderá negar que garantir a segurança pública e definir a política criminal do Estado

constituem «interesse(s) público(s) importante(s)», para os efeitos daquela disposição do RGPD.

Por outro lado, os dados que constam do RASI são todos anonimizados e a sua utilização naquele relatório

é proporcional ao objetivo visado, a saber, a descrição das práticas criminais e da sua distribuição pelo território

nacional, com o propósito de sustentar a definição de objetivos, prioridades e orientações em matéria de

prevenção da criminalidade, investigação criminal, ação penal e execução de penas e medidas de segurança.

Por outro lado, o facto de o RASI transmitir apenas um lado da realidade da criminalidade em Portugal, o das

estatísticas do sistema de justiça criminal, não permite levantar o véu que impende sobre as chamadas cifras

negras, ou seja, a criminalidade não participada.

Há mais dois instrumentos, os inquéritos de vitimização e os inquéritos de delinquência autorrevelada, que

permitem colmatar esta lacuna no conhecimento da realidade criminal.

Só com este tríptico é possível traçar o panorama fiel da criminalidade que, em cada ano, ocorre em território

nacional.

Tanto quanto se sabe, em Portugal foram realizados apenas três inquéritos de vitimação, através do Gabinete

de Estudos e Planeamento do Ministério da Justiça (GEPMJ)2:

⎯ Em 1988, na Área Metropolitana de Lisboa;

⎯ Em 1992, abrangendo o território continental; e,

⎯ Em 1994, à escala nacional.

Os inquéritos de vitimação e os inquéritos de delinquência autorrevelada poderão não ter tanto relevo para

o retrato da criminalidade anual quanto o RASI, precisamente porque, por definição, não têm periodicidade

regulada. Mas deverão ser encarados da mesma forma que aquele, no que respeita à utilização de dados sobre

a nacionalidade e a situação quanto à permanência em território nacional.

Com a presente iniciativa, o Chega propõe soluções para reduzir o conjunto substancial de crimes que ficam

fora do radar das estatísticas do sistema de justiça criminal, assim fomentando uma imagem destorcida da

criminalidade em Portugal, que tudo tem de artificial e forçada.

De igual modo, o Chega considera imperativo avaliar a dimensão daquela realidade, associada ao aumento

da imigração, que não «passa» para o RASI, ou que nele é retratada de forma a criar uma perceção diferente

da realidade, mais amenizada, para contento dos cidadãos nacionais e para funcionar como isco para turistas.

Pelo exposto, nos termos constitucionais e regimentalmente aplicáveis, os Deputados do Grupo Parlamentar

do Chega recomendam ao Governo:

1 – Que proceda à identificação dos dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em

território nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes, bem assim como das vítimas, no

Relatório Anual de Segurança Interna e nas publicações relativas a estatísticas do Ministério da Justiça sobre

crimes registados pelas autoridades policiais;

2 – Que proceda à identificação, em quaisquer inquéritos de vitimação e de delinquência autorrevelada que

venha a determinar, dos dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e à permanência em território

nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes;

3 – Que encete as diligências administrativas, regulamentares ou legislativas indispensáveis para garantir

que a recolha de dados sobre a criminalidade registada pelas forças e serviços de segurança assegure a

possibilidade de posterior tratamento individualizado dos dados relativos à nacionalidade, naturalidade, etnia e

1 «g) Se o tratamento for necessário por motivos de interesse público importante, com base no direito da União ou de um Estado-Membro, que deve ser proporcional ao objetivo visado, respeitar a essência do direito à proteção dos dados pessoais e prever medidas adequadas e específicas que salvaguardem os direitos fundamentais e os interesses do titular dos dados;» 2 É ainda de referir o inquérito de vitimação relativo ao stalking, no âmbito do projeto «Stalking em Portugal: Prevalência, Impacto e Intervenção», conduzido pela Universidade do Minho, em 2011.

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à permanência em território nacional de suspeitos e/ou condenados pela prática de crimes.

Palácio de São Bento, 21 de janeiro de 2025.

Os Deputados do CH: André Ventura — Pedro Pinto — Cristina Rodrigues — Vanessa Barata — Madalena

Cordeiro — Manuel Magno.

A DIVISÃO DE REDAÇÃO.

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