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Sábado, 20 de Abril de 1996
II Série-C — Número 15
DIÁRIO
da Assembleia da República
VII LEGISLATURA
1.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1995-1996)
Comissão Eventual para Análise e Acompanhamento da
SUMÁRIO
Presidente da Assembleia da República:
Despachos relativos à exoneração e nomeação de membros
do seu Gabinete de Apoio 94
Conselho de Administração da Assembleia da República:
Projecto de orçamento da Assembleia da República para 1996 (o).
Comissões parlamentares:
Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas:
Relatório de actividades relativo ao mês de Março
de 1996 94
Comissão de Ética:
Parecer n.° 7/96 — Sobre' a incompatibilidade entre o exercício do mandato de Deputado e a qualidade de membro do conselho de administração de sociedade anónima de capitais maioritariamente pertencentes a sociedade anónima de capitais públicos e declaração de voto apresentada pelo Deputado do PSD Correia de Jesus 94
Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor Leste:
Regulamento da Comissão 100
Realização da 98, nomeadamente na Utilização dos Recursos Públicos de Qualquer Natureza e a Qualquer Título nela Envolvidos:
Composição da mesa da Comissão 102
Mandato de Deputado:
Declaração de renúncia ao mandato apresentada pelo Deputado do PSD Laborinho Lúcio 102
Grupos parlamentares:
Grupo Parlamentar do PS:
Avisos relativos à nomeação de membros para o Gabinete de Apoio 102
Grupo Parlamentar do PSD:
Nova composição da sua direcção 102
Aviso relativo à nomeação de uma secretária para o Gabinete de Apoio 103
Outros documentas:
Conta especial de regularização de operações de tesouraria (CEROT) — Relatório da actividade no ano de 1995 (a).
(a) Vêm publicados em suplemento a este número.
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II SÉRIE-C — NÚMERO 15
Despacho
Nos termos do artigo 9.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, exonero do cargo de secretária auxiliar do mèu Gabinete de Apoio Isabel Maria Tito de Morais Correia Pires Severim de Melo.
Lisboa, 1 de Abril de 1996. — O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.
Despacho
Nos termos do n.° 2 do artigo 8.° e do n.° 1 do artigo 10." da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, em conjugação com o artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 322/88, de 23 de Setembro, nomeio para o cargo de adjunta do meu Gabinete de Apoio Maryvone Cécile Louise Petibon de Pinho Campinos.
Lisboa, 1 de Abril de 1996. — O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.
Despacho
Nos termos do n.° 2 do artigo 8.° e do n.° 1 do artigo 10.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, em conjugação com os artigos 3.° e 4.° do Decreto-Lei n.° 322/88, de 23 de Setembro, o artigo I.° do Decreto-Lei n.° 719/74, de 18 de Dezembro, e os artigos 1.° e 2." do Decreto-Lei n.° 186/87, de 29 de Abril, nomeio Isabel Maria Tito de Morais Correia Pires Severim de Melo, em regime de requisição, pelo período da legislatura e por conveniência de serviço, para o. cargo de secretária do meu Gabinete de Apoio.
Lisboa, 1 de Abril de 1996. — O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.
Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas
Relatório de actividades relativo ao mês de Março de 1996
Nos termos do artigo 117.° do Regimento da Assembleia da República, a Comissão de Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas informa a Assembleia da República dos trabalhos desenvolvidos no decurso do mês de Março de 1996:
Reuniões
Dia 19(15 horas e 15 minutos) — reunião ordinária, com a presença de 20 Deputados.
Dia 20 (15 horas) — audiência com a FANORTE e a AJAP, com a presença dos Deputados Manuel Ginestal (PS), Carlos Duarte e António Germano Sá e Abreu (PSD) e Carlos Neto (PP), sobre problemas genéricos da agricultura portuguesa.
Dia 27 (11 horas e 45 minutos) — reunião ordinária, com a presença de 21 Deputados.
Análise de iniciativas legislativas
l — Proposta de lei n.° 19/VTJ (Define a Lei de Bases da Política Florestal Nacional):
Relator: Deputado Francisco Camilo (PS); Apreciação e votação em Comissão: reunião de 27 de Março; o relatório foi aprovado por unanimidade.
2 — Projecto de lei n.°78/W (Lei de Bases do Desenvolvimento Florestal):
Relator: Deputado Francisco Camilo (PS); Apreciação e votação em Comissão: reunião de 27 de Março; o relatório foi aprovado por unanimidade.
3 — Projecto de lei n.°91/VII (Lei do Desenvolvimento Florestal):
Relator: Deputado Carlos Neto (PP); Apreciação e votação em Comissão: reunião de 27 de Março. O relatório foi aprovado por unanimidade.
Palácio de São Bento, 2 de Abril de 1996. — O Deputado Presidente, Antunes da Silva.
Comissão de Ética
Parecer n.»7/96— Sobre incompatibilidade entre o exercício do mandato de Deputado e a qualidade de membro do conselho de administração de sociedade anónima de capitais maioritariamente pertencentes a sociedade anónima de capitais públicos.
I — Introdução
1 — Por Despacho de S. Ex.° o Presidente da Assembleia da República, foi a Comissão Parlamentar de Ética chamada a pronunciar-se sobre uma exposição enviada pelo Sr. Deputado do PSD Álvaro Barreto, solicitando que fosse analisada pelas entidades competentes a questão da compatibilidade entre o exercício do seu mandato de Deputado à Assembleia da República e do seu cargo de presidente do conselho de administração da SOPORCEL, S. A.
2 — Naquela sua exposição o Sr. Deputado Álvaro Barreto sustenta a opinião de que é compatível o exercício entre ambas as funções referidas, alegando, em síntese, que:
a) O Estado não tem participação accionista directa na SOPORCEL, não havendo qualquer dependência financeira desta do Orçamento do Estado;.
b) A SOPORCEL não está sujeita a qualquer tipo de tutela governamental, sendo as suas orientações estratégicas definidas por uma maioria qualificada dos seus accionistas, não tendo, portanto, a Caixa Geral de Depósitos, enquanto accionista maioritário, competência para defini-las só por si;
c) A escolha do presidente do conselho de administração da SOPORCEL é feita por acordo prévio entre os dois principais accionistas da empresa, nos termos de um acordo par associai estabelecido entre ambos;
d) Os gestores da SOPORCEL não são considerados gestores públicos;
e) A Lei n.° 64/93, de 26 de Agosto, nunca abrangeu a SOPORCEL, não sendo, por isso, os seus gestores considerados como titulares de cargos públicos.
3 — Juntou ainda um parecer do Prof. Doutor Marcelo Rebelo de Sousa, considerando, em síntese, mais conforme
com a Constituição da República Portuguesa a interpretação
de que a expressão «sociedade de capitais maioritária ou exclusivamente públicos», constante da Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, abarca apenas as sociedades cujos accionistas ou
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sócios sejam pessoas colectivas ou entidades públicas e já não aquelas cujo capital provenha mediatamente de entidades públicas.
4 — Posteriormente, o Sr. Deputado Alvaro Barreto compareceu em reunião da Comissão Parlamentar de Ética realizada em 29 de Fevereiro, onde teve oportunidade de exprimir os seus pontos de vista sobre a matéria, tendo enviado a esta Comissão em 5 de Março uma nota escrita, aduzindo novos argumentos, designadamente:
Que a expressão «sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos» tem sido utilizada em diversos diplomas e iniciativas legislativas para designar as empresas em que o Estado tem participação accionista directa e não aquelas em que a participação accionista é detida indirectamente;
Que, tendo o Ministério das Finanças actualizado recentemente os seus ficheiros em relação à composição e remunerações auferidas pelos corpos sociais das empresas em que o Estado é accionista, não incluiu a SOPORCEL;
Que o processo de nomeação do presidente do conselho de administração da SOPORCEL é absolutamente igual ao que ocorreria caso a Caixa Geral de
. Depósitos tivesse uma posição accionista inferior a 50%.
Vejamos, então.
II — Identificação do problema
Podemos considerar assentes os seguintes factos:
L* O Sr. Deputado Álvaro Barreto, cumulativamente com o seu mandato nesta Assembleia da República, exerce também o cargo de presidente do conselho de administração da SOPORCEL — Sociedade Portuguesa de Celulose, S. A.;
2." O capital desta Sociedade pertence hoje à Caixa Geral de Depósitos, ao grupo privado francês Anjo Wiggins, S. A., e ao público em geral, nas percentagens, respectivamente, de 50,5%, de 43,5% e de, aproximadamente, 6%; .
3." Consequentemente, o capital da mesma SOPORCEL pertence maioritariamente à Caixa Geral de Depósitos;
4.° O Estatuto dos Deputados, no seu artigo 21.°, n.° 2, alínea a), com a redacção que lhe foi introduzida pela Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, qualifica como incompatível com 0 exercício do mandato de Deputado, entre outras, a titularidade de membro de órgão de sociedades de capitais maioritária ou exclusivamente públicos.
Nestas condições, mister é saber se a SOPORCEL, pelo facto de a maioria do seu capital social pertencer à Caixa Geral de Depósitos, deve ou não considerar-se uma sociedade de capitais maioritariamente públicos, pelo menos na perspectiva daquela incompatibilidade.
m — Natureza e estatutos da Caixa Geral de Depósitos
A Caixa Geral de Depósitos, S. A., é hoje uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, nos termos dos seus estatutos aprovados pelo Decreto-Lei n.° 287/93, de 20 de Agosto.
Diversamente daquilo que aconteceu com outras empresas públicas, cuja transformação em sociedades anónimas
visou abrir caminho para a sua privatização ou pelo menos para a sua abertura ao capital privado, não foi essa a opção do legislador quanto a esta entidade.
Efectivamente, afirma-se no preâmbulo do citado decreto-lei que, «ao contrário do que se estabeleceu noutros casos, considerou-se no caso da Caixa Geral de Depósitos, dada a natureza da actividade por esta exercida, a posição e o papel que a empresa ocupa no mesmo sector, que deveria ser apenas o Estado, e não qualquer outra pessoa de direito público, o detentor do capital».
Nesse sentido, no seu artigo 4.° estabelece-se que as acções representativas do seu capital social, incluindo as que vierem a ser emitidas em futuros aumentos de capital, só poderão pertencer ao Estado e serão detidas pela Direcção--Geral do Tesouro (n.°2); que os direitos do Estado como accionista serão exercidos por representante designado por despacho do Ministro das Finanças (n.°3); e que, sempre que a lei ou os estatutos exijam deliberação da assembleia geral ou seja conveniente reuni-la, bastará que o representante do Estado exare a deliberação no livro de actas da sociedade (n.° 4).
Assim, é o representante do Ministro das Finanças, enquanto representante do Estado na assembleia geral, que exerce todos os poderes do Estado como accionista. Elege, nomeadamente, os membros do conselho de administração e procede à apreciação geral da administração e fiscalização da sociedade (artigo 12.° dos estatutos da Caixa Geral de Depósitos).
Porém, para além do controlo exercido pelo Estado enquanto accionista, existem ainda, por força directa do mesmo decreto-lei, poderes directos de controlo do Governo sobre a Caixa Geral de Depósitos, traduzidos, nomeadamente, na obrigatoriedade imposta ao conselho de administração de enviar ao Ministro das Finanças, pelo menos 30 dias antes da assembleia geral anual, o relatório de gestão, as contas de exercício e quaisquer elementos adicionais que se mostrem necessários à compreensão integral da situação económica e financeira da empresa e perspectiva da sua evolução (artigo 6.°). Por seu turno, o conselho fiscal é obrigado a enviar ao mesmo Ministério relatórios trimestrais sobre os controlos efectuados (n.° 2 do artigo 6.°).
IV — Natureza e estatutos da SOPORCEL
A SOPORCEL é indubitavelmente uma sociedade de direito privado.
Tendo embora a Caixa Geral de Depósitos como sua accionista maioritária, assenta num estatuto social e legal distinto do das empresas públicas e mesmo do das sociedades anónimas de capitais exclusivamente públicos.
As regras básicas para a sua organização e funcionamento encontram-se no Código das Sociedades Comerciais, bem como no contrato de sociedade (ou pacto social) que a constituiu; encontram-se ainda no acordo parassocial celebrado em 10 de Dezembro de 1992, em que foram outorgantes apenas a Caixa Geral de Depósitos e o Banco de Fomento e Exterior, por um lado, e a Anjo Wiggins, S. A. (francesa), por outro.
Aliás, é assim porque aquele Código expressamente admite no seu artigo 17.° a existência e validade desse tipo de acordos, para os quais fixa, no entanto, limites genéricos e efeitos específicos, nomeadamente o de não poderem ter conteúdo contra legem e o de vincularem somente as entidades neles intervenientes.
O acordo parassocial da SOPORCEL obedece, todavia, a estas condições.
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Ora, nos termos desse acordo, os accionistas privados, ainda que em posição minoritária, têm garantido o direito de se fazer representar no respectivo conselho de administração por três elementos, no total de sete, desde que tenham
uma participação de pelo menos 40% no capital social. É o que acontece com o referido grupo privado francês, accionista da empresa.
Quanto à escolha do presidente do conselho de administração, aponta-se aí, preferencialmente, para a sua designação por acordo entre a Caixa Geral de Depósitos e a Anjo Wiggins, S. A., admite-se que, na falta desse acordo, esta última poderá vetar os dois primeiros nomes que lhe forem propostos por aquela, mas já se impõe que a Anjo Wiggins, S. A., terá de aceitar o terceiro nome que a Caixa Geral de Depósitos indicar.
Nestas condições, porém, a maioria dos membros do conselho de administração da SOPORCEL, incluindo o seu presidente, serão sempre pessoas de confiança da Caixa Geral de Depósitos e por esta indicados.
Igualmente está fixado no acordo em referência que compete ainda à Caixa-Geral de Depósitos designar a maioria dos membros:
Da mesa da assembleia geral; Do conselho fiscal; Da comissão de vencimentos; e Até do conselho executivo, no caso de não ser possível nomear por acordo um administrador-delegado.
Ou seja, na constituição de todos os órgãos sociais da SOPORCEL (executivos, deliberativo e fiscalizador), afinal a Caixa Geral de Depósitos tem perfeitamente assegurado o direito de indicar representantes seus ou pessoas da sua confiança, quê formarão maioria sempre que o quiserem fazer.
Apenas em relação a algumas matérias, que são da competência exclusiva da assembleia geral da SOPORCEL, é que a maioria de que a Caixa Geral de Depósitos é titular no capital social da empresa não basta para suportar as respectivas decisões.
É o caso das decisões a tomar sobre a política de dividendos, aumentos de capital, aquisições e fusões que, nos termos do acordo parassocial e ou do pacto social, se exige sejam aprovadas pelos representantes da maioria qualificada de 60% do capital, de que a Caixa Geral de Depósitos na situação actual efectivamente não dispõe.
Sobre tais matérias terá, pois, de haver sempre acordo entre o accionista maioritário e o accionista minoritário.
V — A primeira abordagem do problema em causa
A SOPORCEL está, pois, sujeita às regras gerais contidas no Código das Sociedades Comerciais.
Consequentemente, nos termos do artigo 405.° desse Código, competirá sempre ao seu conselho de administração gerir as actividades da sociedade com autonomia e só deverá subordinar-se às deliberações dos accionistas reunidos em assembleia geral ou às intervenções do conselho fiscal apenas nos casos em que a lei ou o contrato da sociedade o determinarem.
Tem, pois, razão o Sr. Deputado Álvaro Barreto quando na sua exposição afirma que a gestão corrente da empresa é, do ponto de vista legal, da exclusiva competência-do seu conselho de administração, não podendo o Governo interferir nessa gestão.
Mas isto afinal é o que se passa em relação a todas as sociedades anónimas submetidas ao normativo do Código das Sociedades Comerciais — independentemente da natureza pública ou privada dos seus capitais.
Os respectivos conselhos de administração gerem-nas com a autonomia própria que a lei atribui a esses órgãos.
Simplesmente, como acontece com a SOPORCEL, sociedades há em que a maioria das pessoas que compõem
qualquer dos órgãos sociais são designadas para o efeito por um só e o mesmo accionista (o maioritário, que aqui é a Caixa Geral de Depósitos).
Nestas condições poderá, pois, perguntar-se se, para além daquilo que a lei estabelece, não haverá poderes de facto (que não de jure) desse accionista e de quem porventura esteja por detrás dele, que coarctem ou limitem essa autonomia, fazendo que essas pessoas, até por uma questão de defesa de interesses ou de posições pessoais, se sintam obrigadas a respeitar e ou a cumprir instruções que esse accionista, que as nomeou ou em quem confia, porventura lhes vier a transmitir.
Normalmente a resposta será afirmativa.
O Sr. Deputado Álvaro Barreto igualmente terá alguma razão quando alega que o Estado não tem participação accionista directa na empresa e que esta não tem qualquer dependência financeira do Orçamento do Estado.
Mas, quanto ao primeiro destes aspectos, não será despiciendo lembrar que nb artigo 545." daquele Código ainda se preceitua que, para os efeitos nele previstos, a Caixa Geral de Depósitos é equiparada ao Estado.
Tem ainda razão quando salienta que os gestores da SOPORCEL não são considerados gestores públicos; efectivamente, não o são, pois não se enquadram na moldura fáctica que a lei define para estes últimos (Decreto-Lei n.° 464/82, de 9 de Dezembro).
No que respeita aos membros do conselho de administração, com excepção do seu presidente, é também de aceitar que eles não são «titulares de altos cargos públicos», já que efectivamente não são designados por qualquer entidade pública [artigo 3.°, alínea b), da Lei n.° 64/93, de 26 de Agosto].
Quanto ao presidente desse órgão, porém, já a situação pode ser controversa, pois este diploma legal estatui, na alínea a) do seu artigo 3.°, que deverão sempre ser considerados «titulares de altos cargos públicos» ou equiparados, os presidentes [...] de sociedades anónimas de capitais, exclusiva ou maioritariamente, públicos, qualquer que seja o modo da sua designação.
Estamos, assim, reconduzidos ao ceme do problema: afinal a SOPORCEL é ou não é uma sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos?
Da resposta, positiva ou negativa, a esta questão dependerá pois, como é evidente, a decisão a tomar quanto à existência ou não da incompatibilidade que poderá afectar o Sr. Deputado Álvaro Barreto.
Nesta perspectiva, não se trata, portanto, de saber se a SOPORCEL é ou não uma empresa pública; também não se trata de saber se o Governo a tutela ou não, se tem poderes legais para interferir na sua gestão ou se pode impor-se na designação do presidente do seu conselho de administração.
Tão-pouco se trata de saber se os seus gestores devem ou não ser considerados «gestores públicos» ou se o seu presidente é ou não «titular de um alto cargo público» tal como estas figuras são caracterizadas nos diplomas legais específicos que as definem.
Aliás, esta última questão poderia até ter algum interesse para o caso vertente, já que, nos termos da Lei n.° 64/93, de 26 de Agosto, os titulares de altos cargos públicos em sociedades anónimas de capitais maioritariamente públicos não podem exercer outras funções remuneradas, salvo se para o
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efeito forem autorizados pelas entidades que os designaram para aqueles cargos e devendo tal autorização ser aprovada pela assembleia geral da empresa (artigo 7.°, n.M 1, 3 e 4).
Todos os factos referidos poderiam ser determinantes da decisão a tomar quanto à situação do Sr. Deputado Álvaro Barreto se a legislação sobre as incompatibilidades para o exercício do mandato de Deputado expressasse ou, no mínimo, revelasse com clareza que o seu objectivo é apenas o de garantir que, no exercício das suas. funções, os Deputados sejam totalmente independentes do Govemo, para que possam, assim, exercer a sua função fiscalizadora sobre este de modo isento e eficaz.
É este, alias, o entendimento perfilhado pelo Sr. Deputado Álvaro Barreto logo no início da sua aludida exposição — e é a partir dele que procura demonstrar a não verificação de qualquer incompatibilidade no seu caso.
Só que essa legislação faz nascer incompatibilidades das situações mais diversas, algumas das quais, até já apreciadas por esta Comissão, nem terão directamente a ver com as almejadas isenção, eficácia e sobretudo dignidade ética do exercício do mandato de Deputado.
De resto, mais do que às intenções do legislador, importará sempre atender ao texto da lei.
Como se consagra no artigo 9.°, n.°2, dq Código Civil, «não pode ser. considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso», e, a partir daí, consagrado está também que «o dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo» (artigo 8.°, n.° 2, do Código Civil).
Assim sendo, configurando a lei como incompatível com o exercício do mandato de Deputado, entre muitas outras de diversa natureza e origem, também a «titularidade de órgão de sociedades de capitais maioritariamente públicos», para o caso em apreço o que, em primeiro lugar, importa precisar é, pois, se a SOPORCEL, atendendo aos donos do seu capital e às percentagens em que neste comparticipam, deve ou não ser considerada uma sociedade de capitais maioritariamente públicos, em especial para os efeitos previstos no Estatuto dos Deputados.
VI — A natureza da maioria do capital social da SOPORCEL
Sobre este aspecto convém recordar que a participação da Caixa Geral de Depósitos no capital social da SOPORCEL tem duas origens:
a) Por um lado, resultou da absorção por aquela da antiga Sociedade Financeira Portuguesa, a qual por sua vez era titular de capital na empresa em que assentou a actual SOPORCEL, capital esse que não era outra coisa senão a conversão de uma dívida que existia para com o Banco de Portugal. Consequentemente — e fazendo o percurso inverso —, o Banco de Portugal tinha um determinado crédito, que obviamente era constituído por dinheiros públicos, o qual foi convertido em capital da empresa e que mais tarde veio a ser cedido, com todos os correspondentes direitos e obrigações, à Caixa Geral de Depósitos, ao abrigo de um acordo de accionistas (SOPORCEL) assinado em 31 de Julho de 1985 (v. g. n.° 1 do acordo parassocial em vigor).
6) Por outro lado, o actual capital social da mesma SOPORCEL resultou ainda de um aumento dos seus fundos próprios no valor de 15 milhões de contos, realizado durante 1992 e 1993 através da
subscrição das respectivas acções pela Caixa Geral de Depósitos, pelo BFE e pela Anjo Wiggins, S. A., na proporção das participações de que estas entidades já eram titulares naquele capital social (v. g. n.° 3.2 do acordo parassocial em vigor). Ou seja, resultou também da injecção maioritária de capital da Caixa Geral de Depósitos na empresa,
por esta via. Só que, desta maneira, a participação
da Caixa Geral de Depósitos no capital social da SOPORCEL envolveu sempre capitais públicos, quer numa quer noutra das referidas operações.
A esta luz logo se deverá, pois; concluir que a maioria do capital social da SOPORCEL é assim constituído por capitais públicos.
Aliás, ainda sobre o aspecto em análise não deixa de ser importante anotar que, nos termos constantes do n.° 10.2 do acordo parassocial em vigor, «nada poderá impedir a Caixa Geral de Depósitos ou o BFE, enquanto o Estado Português detiver a maioria de capital ou a propriedade destas empresas, de transferirem a totalidade ou parte das suas acções na SOPORCEL para o Estado Português ou para outras entidades ou sociedades cuja propriedade ou capital pertença maioritariamente, por forma directa ou indirecta, ao Estado Português».
E, nos termos do preceituado no n.° 11.3 (segundo parágrafo) do mesmo acordo parassocial, essa transferência será mesmo obrigatória no caso de a Caixa Geral de Depósitos ou o BFE virem a ter, directa ou indirectamente, uma influência significativa numa outra sociedade ou entidade que concorra com a SOPORCEL ou, no caso da Caixa Geral de Depósitos ou do BFE, serem eles próprios adquiridos directa ou indirectamente por uma outra sociedade concorrente ou influente na concorrência da SOPORCEL.
Ou seja: na estruturação social da SOPORCEL está expressamente admitida a hipótese de, livremente, o seu capital maioritário passar a ser detido pelo próprio Estado Português, hipótese esta que até se aponta como eventualmente obrigatória nas condições predefinidas.
Ou seja, ainda, essa transferência livre ou obrigatória das acções hoje detidas pela Caixa Geral de Depósitos para o Estado Português, ou para qualquer outra entidade ou sociedade que a esta pertença, só pode afinal significar que o capital com que foram adquiridas foi e é capital público.
VII — Alcance da expressão «capitais maioritariamente públicos» para efeitos da incompatibilidade em causa
Noutra perspectiva alguns intérpretes (e, entre estes, o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa, no seu douto parecer atrás referido) consideram que a expressão «sociedades de capitais maioritariamente públicos» contida no artigo 21.°, n.°2, alínea a), do Estatuto dos Deputados (redacção da Lei n.° 24/ 95, de 18 de Agosto), abrange apenas as sociedades em que o Estado tem somente participação directa no respectivo capital.
No entanto, esta tese fica logo fragilizada pelo seguinte: é que, se assim fosse, então não teria sentido nem seria necessária a «novidade»' introduzida no artigo 21." do Estatuto dos Deputados pela Lei n.° 24/95.
Essa situação, afinal, já estava prevista no artigo 20.°, n.° 1, alínea p), do mesmo Estatuto, datado de 1 de Março de 1993, onde expressamente se preceituava já que «os membros dos conselhos de gestão [...] das empresas de capitais públicos ou maioritariamente participadas pelo Estado [...] não podem exercer as respectivas funções enquanto
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exercerem o mandato de Deputado à Assembleia da República», configurando-se assim uma incompatibilidade entre ainbas as funções.
O legislador cometeria, pois, uma redundância se no artigo 21." quisesse referir-se precisamente à mesma situação que já estava há muito prevista no artigo 20.°
Não é admissível este juízo: o legislador quis obviamente referir-se a uma outra situação, diferente daquela que na mesma lei afinal já estava prevista.
Nesta perspectiva, só pode, pois, justificar-se a «novidade» introduzida na lei se entendermos que o legislador pretendeu alargar o âmbito das incompatibilidades.
Aliás, foi precisamente esse o sentido dominante e determinante de toda a recente legislação sobre a «transparência» da vida política e dos políticos, como é sabido e notório.
Assim sendo, quando no artigo 21.°, n.°2, alínea a), do Estatuto dos Deputados se mencionam as sociedades de capitais maioritariamente públicos, terá, portanto, de considerar-se que, em primeiro lugar, se está a invocar a natureza desses próprios capitais, a sua origem ou a sua propriedade, e que, em segundo lugar, não se está a fazer distinção alguma entre as participações directas e indirectas do Estado no capital das empresas — umas e outras estão, pois, englobadas na expressão usada na lei e cabem indiscutivelmente no seu teor literal.
Aliás, é também sabido que, onde o legislador não distingue, não pode o intérprete distinguir.
E, no caso em apreço, esta globalização é até mais evidente se considerarmos (como temos de considerar, à luz do princípio da unidade do sistema jurídico) que no citado artigo 20." o legislador, pretendendo distinguir, usou uma expressão legal suficientemente distintiva.
Se não procedeu de igual modo no artigo 21.° foi certamente porque não quis distinguir.
De resto, ainda muito recentemente (em 28 de Fevereiro de 1996) esta Assembleia da República, ao aprovar uma nova lei relativa ao âmbito da fiscalização financeira do Tribunal de Contas (proposta de lei n.° 4/VU), determinou que ficam sujeitas à fiscalização sucessiva desse Tribunal as sociedades em que a parte pública detenha a maioria do capital social, mas apenas nos casos em que essa detenção for «de forma directa».
Também por aqui se prova, pois, que o legislador, quando pretende distinguir, o faz expressamente. Logo, quando omite qualquer distinção, é porque naturalmente não quer fazê-la.
V°m — As razões éticas da incompatibilidade em causa
Mas haverá razões éticas para que o legislador tivesse querido levar tão longe as incompatibilidades que recentemente decretou, de modo a abranger nelas também os titulares de órgãos de sociedades em que o Estado só por via indirecta detenha participação social maioritária ou, no mínimo, em que a maioria do respectivo capital social só indirectamente é público?
Não esqueçamos, a este propósito, duas circunstâncias relevantes:
A primeira é a de que o espírito do legislador foi mesmo o de alargar substancialmente o elenco das incompatibilidades;
A segunda é a de que em muitos casos acolheu até o disposto em legislação estrangeira sobre a matéria, ' nomeadamente o regime em vigor em Espanha.
Ora, nesse país, a lei eleitoral aprovada pela Lei Orgânica n.°5/85, de 19 de Junho, revista em 2 de Novembro de 1992, considera expressamente incompatível com o exercício do mandato de Deputado ou de Senador a acumulação com qualquer cargo em empresa com participação pública maioritária, directa ou indirecta.
0 legislador português não mencionou expressamente esta dupla e alternativa forma de participação, mas também não era preciso, pelos motivos atrás expostos.
De qualquer modo, o legislador português terá pensado que as possibilidades reais (que não propriamente legais) de que o Governo (ou o Estado em geral) dispõe para determinar as opções fundamentais dos accionistas maioritários, que a ele estão ligados directamente, nas empresas em que nessas condições tenham participação social, seriam porventura susceptíveis de pôr em risco a isenção e a independência no exercício do mandato de Deputado por todos quantos exercerem simultaneamente e em acumulação o cargo' de membro de órgão social dessas empresas, máxime o cargo de seu presidente.
No caso da SOPORCEL, mesmo dando por adquirido que o Governo não tem poderes legais para interferir na sua gestão e que se abstém até de dar qualquer indicação quanto à nomeação do presidente do respectivo conselho de administração, deixando-a ao livre arbítrio do conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos, não devemos, todavia, abstrair do facto de que, exercendo, se quiser, os poderes de que dispõe quanto a esta instituição financeira, que tutela directamente e pertence ao Estado, o Governo, na realidade, terá sempre a possibilidade de impor as suas opções, quer quanto à nomeação do presidente do respectivo conselho de administração quer até quanto à actuação da Caixa Geral de Depósitos no exercício da posição maioritária que esta tem na SOPORCEL.
E não esqueçamos que, em última instância, o presidente do conselho de administração da SOPORCEL será sempre uma pessoa indicada pela Caixa Geral de Depósitos — ou, pelo menos, não poderá ser nunca uma pessoa com a qual esta não concorde.
Logo, se o Governo disser, informal e não legalmente, ao conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos, por si nomeado, que pretende escolher a pessoa que há-de presidir à
SOPORCEL ou que pretende que ao presidente desta não seja renovado o seu mandato, será que os membros daquele conselho se atreverão a transgredir essa indicação?
Se o fizessem, eram os seus próprios lugares que ficariam em risco.
Ora, entre nós, sendo a isenção e a independência dos Deputados, enquanto no exercício das suas funções (incluindo a fiscalização da actividade governativa), um interesse com protecção constitucional (artigo 50.°, n.° 3, da Constituição), que se efectiva designadamente através de um regime legal de incompatibilidades, não parece, pois, que seja possível interpretar restritivamente a expressão legal «sociedades de capitais maioritariamente públicos», de modo a excluir as de participação indirecta, que aquela expressão literal legal e realmente abrange.
Se fosse essa a orientação a seguir, não só se poria seriamente em risco aquela protecção como ficaria por explicar por que é que o legislador não se contentou com o que já estava estatuído no artigo 20.° do Estatuto dos Deputados.
IX — Conclusão
1 — Pelo exposto, concluímos que o exercício do cargo de presidente do conselho de administração da SOPORCEL,
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S. A., se encontra abrangido nas previsões da alínea a) do n.°2 do artigo 21.° do Estatuto dos Deputados (redacção da Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto), sendo assim incompatível com o exercício do mandato de Deputado à Assembleia da República em simultâneo, em acumulação e pela mesma pessoa.
2 — Dadas, porém, a legitimidade e a justificação das dúvidas apresentadas pelo Sr. Deputado Alvaro Barreto, deverá ser-lhe concedido o prazo de 30 dias para pôr termo a tal incompatibilidade (ou impedimento, como a lei o qualifica), pela suspensão ou renúncia ou daquele cargo ou deste mandato.
É este o meu parecer.
Palácio de São Bento, 20 de Março de 1996. — O Deputado Presidente, Mário Videira Lopes. — O Deputado Relator, António Filipe.
Declaração de voto apresentada pelo Deputado do PSD Correia de Jesus
Votei contra o parecer n.° 7/96, que declara incompatível o exercício do cargo de Deputado com o de membro do conselho de administração da SOPORCEL, S. A., por discordar das suas conclusões, bem como dos respectivos fundamentos.
Começando pelos fundamentos, verifica-se que, ao contrário do que se tentou demonstrar no referido parecer, a SOPORCEL não é uma sociedade anónima de capitais maioritariamente públicos. Com efeito, o único critério objectivo e rigoroso para qualificar os capitais de uma sociedade como públicos ou privados é o da titularidade: se os capitais são detidos pelo Estado ou por qualquer outra pes-
soa colectiva pública são públicos; se são detidos por uma sociedade privada, os capitais serão privados. Ora, a Caixa Geral de Depósitos, apesar das especialidades estatutárias que a caracterizam, é uma sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, isto é, uma sociedade que se constituiu nos termos do Código das Sociedades Comerciais e, como tal, uma sociedade de direito privado. Isto equivale a dizer que só se pode falar de capitais maioritária ou exclusivamente públicos em relação aquelas empresas em que o Estado tem participação accionista directa, ficando de fora aquelas em que a participação accionista é detida indirectamente.
À mesma conclusão se chega através da distinção entre sector público e sector privado que consta do artigo 82.° da Constituição da República, corroborada, aliás, pela douta lição do Prof. Diogo Freitas do Amaral, no seu Curso de Direito Administrativo, vol. i, pp. 563 a 565, ao debruçar-se sobre a natureza jurídica das sociedades de interesse colectivo.
Debalde, o parecer procura noutros critérios fundamento para qualificar os capitais detidos pela Caixa Geral de Depósitos na SOPORCEL como capitais públicos. O critério da origem dos capitais, por exemplo, não oferece o mínimo de rigor, além de que, para o caso em apreço, se me afigura totalmente irrelevante. Com efeito, os capitais públicos podem ter origem em capitais privados (v. g. nacionalização) e os capitais privados podem ter origem em capitais públicos (v. g. na reprivatização). A tese do parecer conduz ao absurdo de se considerarem públicos os capitais (privados) das empresas reprivatizadas ou o apport de património em que sempre se traduz o perdão fiscal.
Acresce que o parecer, ao abarcar nos capitais maioritária ou exclusivamente públicos as participações indirectas, deixa em aberto a questão de saber até onde vai a mediatividade da titularidade do capital para efeito de determinar a existência de impedimento nos termos da alínea a) do n.° 2 do artigo 21.° do Estatuto dos Deputados. Será que os titulares de órgãos das sociedades em que a SOPORCEL detém participações maioritárias também estão impedidos de exercer o mandato de Deputado e assim indefinidamente?
Pretende o parecer que a alínea a) do n.° 2 do artigo 21.° do Estatuto dos Deputados (na redacção da Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto) só terá conteúdo útil face ao disposto na alínea p) do n.° 1 do artigo 20." do mesmo Estatuto se na expressão «sociedades de capitais maioritariamente públicos» estiverem abrangidas as participações indirectas. Porém, sem razão.
É que o preceito em apreço tem um âmbito subjectivo mais amplo que o da alínea p) do n.° 1 do artigo 20.° Enquanto esta disposição compreende apenas os membros dos conselhos de gestão, a alínea á) do n.°2 do artigo 21.° aplica-se à titularidade de membro de qualquer órgão de sociedades de capitais maioritária ou exclusivamente públicos. Nestes termos, haverá impedimento também quando o Deputado seja membro da mesa da assembleia geral, do conselho geral ou do conselho fiscal de uma sociedade, para além da incompatibilidade prevista na alínea p) do n.° 1 do •artigo 20.° em relação aos membros do seu conselho de administração.
Mas a alínea a) do n.°2 do artigo 21.° tem ainda o alcance de alargar o âmbito objectivo da alínea p) do n.° 1 do artigo 20.°
É que, consistindo a incompatibilidade numa restrição de direitos fundamentais, havia quem defendesse que a palavra «Estado» aí empregue se referia apenas à chamada administração central, ficando de fora as Regiões Autónomas, as autarquias e as fundações públicas. Entendimento que era favorecido pela referência a «instituto publico autónomo» que no mesmo preceito se contém.
Para afastar tal entendimento, aliás legítimo à face do disposto na alínea p) do n.° 1 do artigo 20.°, a Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, veio estender o impedimento à titularidade de órgão de sociedades de capitais maioritária ou exclusivamente públicos, participadas não já pelo Estado (administração central), mas por Regiões Autónomas, municípios ou fundações públicas.
Este é o conteúdo precípuo da alínea a) do n.° 2 do artigo 21.° do Estatuto dos Deputados, que o parecer, a fls. 17 e 18, nega existir. E é com base nessa negação — totalmente contrária à evidência do preceito em causa — que o parecer parte para a inevitabilidade de na mesma alínea não poderem deixar de estar compreendidas as participações indirectas.
É, porém, no domínio da interpretação da lei que o parecer se me afigura totalmente insustentável, já que cita disposições que dizem o contrário daquilo que se pretende provar ou são inaplicáveis à situação concreta, atéc». de que se revela incapaz de distinguir entre interpretação declarativa e interpretação correctiva, o que, no caso em apreço, constitui uma questão essencial.
Depois de afirmar que «importará sempre atender ao texto da lei» cita, a despropósito, o disposto no n.°2 do artigo 9." do Código Civil: «não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso». Ora, o parecer, ao entender que, na alínea a) do n.°2 do artigo 21.°, estão compreendidos também os
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capitais detidos indirectamente por sociedades, está a atribuir à norma um sentido que não tem na letra da lei um rnínimo de correspondência verbal. E está, portanto, a violar o n.° 2 do artigo 9.° do Código Civil, disposição que
invocou em defesa da sua tese.
Também a referência ao n.°2 do artigo 8.° do Código
Civil (segundo o qual «o dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo») não é minimamente pertinente. O preceito em causa tem por destinatários os órgãos de aplicação do direito, máxime os tribunais. Atentas, porém, a natureza e as funções que a lei comete à Comissão Parlamentar de Ética, verifica-se que esta não exerce uma função jurisdicional, não está sujeita ao princípio da legalidade estrita, antes se guia por critérios ético-políticos. Não pode estar, portanto, entre os destinatários do n.° 2 do artigo 8." do Código Civil.
Porém, o que me parece mais grave no parecer é o recurso a uma interpretação correctiva extensiva da alínea a) do n.°2 do artigo 21." do Estatuto dos Deputados para criar uma situação de impedimento que a lei não prevê.
Numa interpretação literal ou, mais correctamente, numa interpretação declarativa, quer lata quer estrita, os sentidos que se obtêm jamais poderão ultrapassar o significado gramatical do termo que se pretende interpretar. De acordo com a letra da lei, capitais públicos são apenas os que pertencem a entes públicos de forma directa, já que as participações indirectas, obviamente, não cabem no significado gramatical da expressão em causa. Isto é, no sentido literal não podem caber o directo e o indirecto ao mesmo tempo, o sim e o não, o directo e o seu contrário. Para aí abarcar as participações indirectas teve, pois, o parecer necessidade de recorrer a uma interpretação correctiva extensiva. Só que, estando em causa direitos, liberdades e garantias (cf. artigo 50.°, n.° 3, da Constituição), as restrições a tais direitos fundamentais devem ser interpretadas restritivamente, de acordo com o disposto no artigo 18.°, n.°2, da Constituição, e só na medida do proporcional à tutela de outros direitos e interesses constitucionalmente tutelados (v. parecer da autoria do Prof. Marcelo Rebelo de Sousa).
Toma-se, assim, evidente que o parecer não podia ter feito
'— como fez — interpretação extensiva da lei para declarar impedido o Sr. Deputado Alvaro Barreto.
Do ponto de vista ético-político, também não se vislumbra a existência de qualquer impedimento. Tendo em conta
a teleología da Lei n.° 24/95, de 18 de Agosto, não se vê que o Sr. Deputado Álvaro Barreto na situação em que se encontra ponha em causa o prosseguimento de algum ou alguns dos seus fins.
O Sr. Deputado Álvaro Barreto, pelo facto de ser presidente do conselho de administração da SOPORCEL, não se encontra limitado na liberdade e isenção de que carece para o exercício das suas funções de Deputado, nomeadamente no seu poder/dever de fiscalizar a acção do Governo; não se vê que possa servir-se do seu cargo parlamentar para obter vantagem para a empresa que dirige; não lida com dinheiros públicos no exercício da sua função naquela empresa.
Nem o argumento de que o Estado ou a Caixa Geral de Depósitos podem, a todo o tempo, recuperar o capital que esta detém na SOPORCEL altera a natureza das coisas ou introduz algum factor de dependência em relação ao Governo. O Estado, por nacionalização ou expropriação, pode
sempre tomar-se dono de qualquer empresa privada, sem que isso possa significar que os respectivos órgãos estão dependentes do Governo.
A situação do Sr. Deputado Álvaro Barreto, quanto muito, poderia gerar um eventual conflito de interesses nos termos do artigo 27.°, isto é, quando no Parlamento estivessem em discussão matérias respeitantes ao sector económico
em que se integra a SOPORCEL. O Sr. Deputado Álvaro Barreto estaria, então, impedido de participar em tal discussão.
Não gera, porém, pelas razões expostas, qualquer impedimento ou incompatibilidade.
Palácio de São Bento, 27 de Março de 1996. — O Deputado do PSD Vogal da Comissão de Ética, Correia de Jesus.
Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor Leste
Regulamento
SECÇÃO I Natureza, composição e atribuições
Artigo 1.° Natureza e composição
1 — A Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor Leste é uma comissão eventual especializada da Assembleia da República. A sua composição é fixada pelo período da legislatura, nos termos regimentais, mediante indicação dos respectivos partidos ou grupos parlamentares, ou, tratando-se de Deputados independentes, pelo Presidente da Assembleia da República, ouvida a Conferência dos Representantes dos Grupos Parlamentares.
2 — Perde a qualidade de membro da Comissão o Deputado que deixe de pertencer ao grupo parlamentar pelo qual foi indicado, a solicitação deste, ou o que exceder o número de faltas as respectivas reuniões, conforme previsto
no Estatuto dos Deputados.
3 — Compete ao Presidente da Comissão apreciar a justificação das faltas dos seus membros em função de facto justificativo.
4 — Poderão constituir-se grupos de trabalho eventuais mediante proposta do Presidente da Comissão em função da especificidade da matéria e da urgência. Serão formados no mínimo por um membro de cada partido.
Artigo 2.° Atribuições
A Comissão Eventual para o Acompanhamento da Situação em Timor Leste desenvolve a sua actividade segundo os seguintes vectores:
1) Estabelecimento dos meios adequados para recolha de informações sobre a situação vigente em Timor Leste e seu tratamento e divulgação, particularmente no que respeita a:
Respeito pelos direitos humanos, pelas liberdades, pela fé, pelos valores culturais e pela integridade étnica do povo timorense;
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Fórum de participação dos Timorenses no processo do desenvolvimento económico-social com acesso aos bens culturais, ao trabalho e ao bem-estar;
2) Manter uma estreita ligação com as organizações timorenses, civis, políticas e religiosas, residentes em Portugal e com os seus legítimos delegados, para facilitar e conhecer os mecanismos de integração social da comunidade timorense entre nós residente e conhecimento das iniciativas empreendidas.
3) Fomentar o desenvolvimento de organizações parlamentares ou interparlamentares estrangeiras favoráveis à autodeterminação dos Timorenses e à garantia dos seus direitos e participar na realização de iniciativas próprias daqueles ou com eles promover iniciativas comuns tendentes a gerar forças de pressão na opinião pública que, exercendo-se sobre as respectivas formas e sob o Governo da Indonésia, vão criando as condições indispensáveis para que se encontre para o caso de Timor Leste uma solução justa e aceitável.
SECÇÃO n Funcionamento da Comissão
Artigo 3.° Mesa
1 — A mesa da Comissão é composta por um presidente, um vice-presidente e um secretário.
2 — Compete ao presidente:
a) Representar a Comissão;
b) Convocar as reuniões da Comissão, fixar as respectivas ordens do dia e dirigir os trabalhos;
c) Convocar e dirigir as reuniões da mesa;
d) Informar mensalmente a Assembleia sobre os trabalhos da Comissão, nos termos do artigo 115.° do Regimento;
e) Justificar as faltas dos membros da Comissão.
3 — Compete ao vice-presidente substituir o presidente nas suas ausências ou impedimentos.
4 — Compete ao secretário:
o) Substituir o vice-presidente nas suas ausências ou impedimentos;
b) Conferir as presenças e secretariar as reuniões;
c) Assegurar a elaboração das respectivas actas;
d) Assegurar o expediente.
Artigo 4." Relatores
1 — Sempre que qualquer assunto se destine a ser submetido ao Plenário da Assembleia da República, a mesa proporá um relator à Comissão, observando-se na designação a representatividade dos grupos parlamentares e o princípio da alternância.
2 — O relator reproduzirá os resultados da discussão.
Artigo 5.° Convocação das reuniões
I — As reuniões serão convocadas peto presidente ou pela própria Comissão.
2 — A ordem de trabalhos será fixada pelo presidente ou pela Comissão, consoante as reuniões tiverem sido marcadas por decisão daquele ou por deliberação desta.
Artigo 6.°
Quórum
1 — A Comissão só poderá funcionar com a presença de um terço e deliberar com a presença de metade dos seus membros, contando-se para o efeito os substitutos.
2 — Se até trinta minutos depois da hora marcada para o início da reunião não se verificar quórum de funcionamento, o presidente dá-la-á por encerrada, após registo das presenças.
3 — Sem prejuízo de poder o presidente fixar data diferente, o encerramento da reunião por carência de quórum implicará a sua transferência automática para as 17 horas do dia parlamentar imediato, com a mesma ordem de trabalhos.
Artigo 7.° Interrupção das reuniões
1 — Cada grupo parlamentar, através de qualquer dos seus membros, tem direito a requerer ao presidente a interrupção da reunião por período não superior a quinze minutos.
2 — O direito potestativo referido no número anterior não pode ser exercido por mais do que uma vez em cada reunião.
Artigo 8.° Discussão
1 — Não pode ser estabelecido qualquer limite ao número e duração das intervenções dos membros da Comissão.
2 — No entanto, pode o presidente propor normas de programação dos tempos de discussão, com vista ao cumprimento de prazos estabelecidos pela Assembleia.
Artigo 9.°
Deliberações
1 — Sem prejuízo do disposto no n.°2 do artigo 13.°, as deliberações da Comissão são tomadas por maioria simples
dos seus membros presentes.
2 — As deliberações só são tomadas por escrutínio secreto quando a Comissão assim entenda.
3 — Incumbe à Comissão julgar os recursos das decisões da Mesa.
Artigo 10° Publicidade das reuniões
A Comissão pode deliberar que as suas reuniões sejam públicas.
Artigo 11.'° Actas
1 — De cada reunião da Comissão é elaborada uma acta, que registará obrigatoriamente as presenças e substituições dos respectivos membros, o relato sumíúno dos assuntos tratados e o resultado das votações.
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2 — A Comissão pode deliberar atribuir carácter reservado a parte ou à totalidade de quaisquer actas.
3 — As actas são elaboradas pelo secretário ou pelo funcionário destacado para dar apoio técnico à Comissão e oportunamente submetidas a aprovação.
Artigo 12.° Audições externas
Todo o expediente relativo à colaboração ou à presença de outros Deputados e à participação de membros do Governo e de outras entidades em reuniões da Comissão deverá processar-se através da mesa.
secção m
Disposições finais
Artigo 13° Alterações
.1 — o presente Regulamento poderá ser alterado sob proposta da Mesa ou de qualquer membro da Comissão.
2 — As alterações do Regulamento exigem uma maioria de dois terços dos membros da Comissão.
Artigo 14.°
Integração de lacunas
A integração de eventuais lacunas do presente Regulamento far-se-á por recurso ao Regimento da Assembleia da República.
Palácio de São Bento, 14 de Fevereiro de 1996.— o Deputado Presidente, Nuno Abecasis.
Comissão Eventual para Análise e Acompanhamento da Realização da Expo 98, nomeadamente na Utilização dos Recursos Públicos de Qualquer Natureza e a Qualquer Título nela Envolvidos.
Composição da mesa
Para os devidos efeitos informa-se que a Comissão Eventual para Análise e Acompanhamento da Realização da Expo 98, reunida no dia 14 de Fevereiro corrente, procedeu à eleição da sua mesa, que ficou assim constituída:
Presidente — Luís Filipe Madeira (PS); Vice-Presidente — Rui Rio (PSD); Secretário — Ruben de Carvalho (PCP).
0 Gtupo Parlamentai do PÇ râo \wd\cou o seu representante para o lugar de secretário, vaga que ficou em aberto. Logo que esta se concreüze, dar-se-á conta do facto.
Palácio de São Bento, 14 de Fevereiro de 1996.— o Deputado Presidente, Luís Filipe Madeira.
Declaração
Nos termos do artigo 7.° da Lei n.° 7/93, tenho a honra de apresentar pessoalmente a S. Ex.' o Presidente da Assembleia da República declaração de renúncia ao mandato de Deputado à Assembleia da República.
Mais informo que, nos termos do n°2 do mesmo preceito, já tive ocasião de comunicar por escrito ao Ex.™0 Presidente do Grupo Parlamentar do PSD a apresentação deste pedido de renúncia.
Palácio de São Bento, 28 de Março de 1996. — o Deputado do PSD, Laborinho Lúcio.
Aviso
Por despacho de 21 de Março de 1996 do presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista:
Maria Rosa Marques Boto Nunes de Almeida — nos termos do artigo 62.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.° 59/93, de 17 de Agosto, e do artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 262/88, de 23 de Julho, é nomeada para o cargo de técnica de apoio parlamentar do quadro complementar daquele Grupo Parlamentar, com efeito a partir de 1 de Março de 1996.
Assembleia da República, 1 de Abril de 1996.— A Secretária-Geral, Adelina de Sá Carvalho.
Aviso
Por despacho de 21 de Março de 1996 do presidente do Grupo Parlamentar do Partido Socialista:
Maria Teresa Lopes Alves Pereira — nos termos do artigo 62.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, na redacção que
lhe foi dada pela Lei n.° 59/93, de 17 de Agosto, e do
artigo 6.° do Decreto-Lei n.° 262/88, de 23 de Julho, é nomeada para o cargo de técnica-coordenadora de documentação do quadro complementar daquele Grupo Parlamentar com efeito a partir de 1 de Março de 1996.
Assembleia da República, 3 de Abril de 1996. — A Secretária-Geral, Adelina de Sá Carvalho.
Comunicação
Para os devidos efeitos legais, venho informar que O Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata elegeu a sua direcção, a qual passou a ter a seguinte composição:
Presidente — Luís Marques Mendes.
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Vice-presidentes:
Carlos Coelho. Carlos Encarnação. Guilherme Silva. Luís Marques Guedes. Manuela Ferreira Leite. Pedro Passos Coelho.
Secretários:
Fernando Pereira. Paulo Pereira Coelho.
Assembleia da República, 18 de Março de 1996.— O Presidente do Grupo Parlamentar do PSD, Luís Marques Mendes.
Aviso
Por despacho de 21 de Março de 1996 do presidente do
Grupo Parlamentar do Partido Social-Democrata:
Maria Leonor Correia de Sá Pilão Franco Pico, secretária de apoio — nos termos do artigo 62.° da Lei n.° 77/88, de 1 de Julho, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.c 59/93, de 17 de Agosto, e do artigo 6." do Decreto--Lei n.° 262/88, de 23 de Julho, nomeada, com efeito a partir da data do despacho, para o Gabinete de Apoio daquele Grupo Parlamentar.
Assembleia da República, 10 de Abril de 1996.— A Secretária-Geral, Adelina de Sá Carvalho.
A Divisão de Redacção e Apoio Audiovisual.
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DIÁRIO
da Assembleia da República
Depósito legal n.° 8819/85
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