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Quinta-feira, 17 de dezembro de 2020 II Série-D — Número 4
XIV LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2020-2021)
S U M Á R I O
Delegações da Assembleia da República:
Relatório da participação da Comissão Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias na Reunião Interparlamentar organizada pela Comissão das Liberdades Cívicas, Justiça e Assuntos Internos (LIBE) – The first Annual Rule of Law Report by the Commission and the role of national Parliaments, que decorreu no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no dia 10 de novembro de 2020.
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DELEGAÇÕES DA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA
RELATÓRIO DA PARTICIPAÇÃO DA COMISSÃO ASSUNTOS CONSTITUCIONAIS, DIREITOS,
LIBERDADES E GARANTIAS NA REUNIÃO INTERPARLAMENTAR ORGANIZADA PELA COMISSÃO
DAS LIBERDADES CÍVICAS, JUSTIÇA E ASSUNTOS INTERNOS (LIBE) – THE FIRST ANNUAL RULE OF
LAW REPORT BY THE COMMISSION AND THE ROLE OF NATIONAL PARLIAMENTS1, QUE DECORREU
NO PARLAMENTO EUROPEU, EM BRUXELAS, NO DIA 10 DE NOVEMBRO DE 2020
Composição da Delegação
A Delegação da Assembleia da República foi composta pelas Senhoras Deputadas Isabel Rodrigues (PS) e
Márcia Passos (PSD), em representação da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e
Garantias.
A assessoria foi prestada pelo Representante Permanente da Assembleia da República junto da União
Europeia, Bruno Dias Pinheiro, e pela assessora parlamentar da Comissão de Assuntos Constitucionais,
Direitos, Liberdades e Garantias, Vanessa Louro.
Síntese: O relatório objeto de apreciação na presente reunião – Relatório Anual sobre o Estado de Direito
– apresenta-se como uma das ferramentas do mecanismo europeu para o Estado de direito, que prevê um
processo de diálogo anual entre a Comissão, o Conselho e o Parlamento Europeu, juntamente com os
Estados-Membros, os Parlamentos nacionais, a sociedade civil e outras partes interessadas no Estado de
direito, sendo o relatório, precisamente, o ponto de partida deste diálogo.
O referido relatório, publicado a 30 de setembro de 2020, centra a sua análise em quatro pilares: o sistema
judicial, o quadro de luta contra a corrupção, o pluralismo dos meios de comunicação social e outras questões
institucionais relacionadas com o sistema de equilíbrio de poderes, e integra 27 capítulos por país que
apresentam as avaliações específicas de cada Estado-Membro.
Foi neste contexto que o Parlamento Europeu, através da Comissão LIBE, promoveu a presente reunião
com a vista à discussão do relatório pelos Parlamentos nacionais e outras partes interessadas, revelando-se
uma excelente oportunidade para a troca de pontos de vistas sobre a matéria e partilha de boas práticas. A
reunião incluiu ainda uma sessão dedicada ao impacto da pandemia da COVID-19 na democracia, no Estado
de direito e nos direitos fundamentais, na qual foi possível debater as implicações das medidas adotadas pelos
Estados-Membros na atual conjuntura e a necessidade de encontrar um equilíbrio entre o combate à
pandemia e a salvaguarda dos direitos fundamentais dos cidadãos Europeus.
Abertura
A reunião teve início com uma pequena introdução por parte do Presidente da Comissão LIBE, o Deputado
espanhol ao Parlamento Europeu (MEP) Juan Fernando López Aguilar (S&D), que deu as boas-vindas aos
participantes, referindo que participavam na reunião 50 membros dos Parlamentos nacionais, provenientes de
23 Estados-Membros, e que considerava tal ampla participação reveladora da importância do tema em debate.
Sublinhou o carácter de cooperação interinstitucional inerente à agenda daquele encontro, reiterando o
objetivo de promover a troca de impressões entre o PE e os Parlamentos nacionais.
Recordou que, desde 2016, o Parlamento Europeu (PE) tem apelado à existência de um mecanismo mais
abrangente e exaustivo em matéria de Estado de direito, assinalando a adoção por aquele órgão, em outubro
1 Programa, lista de participantes e documentação da reunião disponível em:
https://www.europarl.europa.eu/relnatparl/en/interparliamentary-meetings.html Gravação vídeo da reunião disponível em: I parte (13h45 - 15h45) – https://multimedia.europarl.europa.eu/pt/committee-on-civil-liberties-justice-and-home-affairs_20201110-1345-COMMITTEE-LIBE-1_vd II parte (16h45-18h45) – https://multimedia.europarl.europa.eu/pt/committee-on-civil-liberties-justice-and-home-affairs_20201110-1645-COMMITTEE-LIBE-1_vd
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de 2020, de uma resolução no sentido de criar um mecanismo da UE para a democracia, o Estado de direito e
os direitos fundamentais.
Terminou a sua alocução fazendo uma breve antevisão dos dois painéis previstos para a reunião em curso
e cumprimentando e apresentando os oradores da primeira sessão.
Sessão I: Troca de pontos de vista sobre o Relatório Anual da Comissão sobre o Estado de Direito e
passos futuros para um mecanismo sobre Democracia, Estado de Direito e Direitos Fundamentais
A sessão foi presidida pelo Presidente da Comissão LIBE, (MEP) Juan Fernando López Aguilar (S&D), e,
após intervenção de abertura pela Vice-Presidente do PE, Katarina Barley, participaram no painel os
seguintes oradores:
Michael Roth, em representação da Presidência do Conselho da União Europeia;
Didier Reynders, Comissário para a Justiça;
Michal Šimečka, relator do relatório do PE sobre a Criação de um mecanismo da UE para a
democracia, o Estado de direito e os direitos fundamentais;
Isabel Rodrigues, Assembleia da República Portuguesa;
Heribert Hirte, Bundestag;
Claus Christian Claussen, Bundestag.
No discurso de abertura, Katarina Barley, Vice-Presidente do PE, salientou a importância para o PE da
defesa do Estado de direito enquanto princípio fundador da UE, tal como consagrado no artigo 2.º do Tratado
da União Europeia (TUE). Saudou a Comissão pela apresentação do relatório anual sobre o Estado de direito,
frisando que o PE já havia defendido há algum tempo a criação daquele mecanismo e sublinhou a importância
do papel dos Parlamentos nacionais na defesa dos direitos fundamentais. Declarou que o PE pretende
alcançar um mecanismo tão abrangente quanto possível que faça um acompanhamento da democracia e dos
direitos fundamentais, valores que não podem ser dissociados do Estado de direito. Fez ainda referência ao
impacto da pandemia da COVID-19 nas democracias dos Estados-Membros, reforçando a necessidade de
encontrar um equilíbrio entre as medidas de combate à pandemia, que devem ser proporcionais e limitadas no
tempo, e a salvaguarda do Estado de direito. Recordou que, em 2018, o PE iniciou, ao abrigo do artigo 7.º do
TUE, um procedimento com vista a verificação do Estado de direito na Hungria, tendo ainda apoiado diversas
iniciativas da Comissão com idêntico escopo em relação à Polónia. A este propósito, mencionou a resolução
adotada pelo PE, em janeiro de 2020, na qual se conclui que os procedimentos levados a cabo se revelaram
insuficientes para alcançar os resultados esperados. Aludiu ao acordo alcançado entre o PE e a Presidência
do Conselho da UE relativo à criação de um procedimento de condicionalidade orçamental quando se verifique
o desrespeito do Estado de direito por parte de um Estado-Membro. Reiterou a importância do Estado de
direito para a UE e a necessidade de existência de mecanismos que sancionem o seu incumprimento.
Concluiu afirmando que contava com a colaboração de todos na defesa daquele princípio.
Seguiu-se a intervenção de Michael Roth, em representação da Presidência do Conselho da União
Europeia, que começou por frisar a importância para a defesa do Estado de direito de um diálogo
interinstitucional, realçando a necessidade de cooperação entre as diversas instituições ali representadas.
Declarou que a Presidência Alemã tem encarado a proteção do Estado de direito como uma prioridade e
aludiu à criação do supramencionado mecanismo de condicionalidade orçamental. Saudou o relatório em
apreciação que considerou como um instrumento preventivo e bastante participado, tendo sido convocadas
diversas entidades e organismos. Anunciou que o Conselho da UE decidiu encetar um mecanismo de diálogo
focado no combate à corrupção, na independência da justiça e na separação dos poderes e que, para esse
efeito, irá convocar Estados-Membros em particular por semestre. Por último referiu ser conhecido que a
Presidência futura, que caberá a Portugal, irá dar continuidade ao trabalho naquela matéria.
O orador seguinte, Didier Reynders, Comissário para a Justiça, declarou a intenção da Comissão de
apresentar o relatório junto de cada um dos parlamentos nacionais visados nos 27 capítulos referentes aos
Estado-Membros. Sublinhou a relevância dos Parlamentos nacionais na salvaguarda do Estado de direito bem
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como da mobilização de diferentes interlocutores, tendo, para esse efeito, instado os Estados-Membros para a
criação de uma rede europeia de contactos. Deu conta da realização de visitas virtuais aos Estados-Membros
e de encontros com diversas entidades e autoridades nacionais, reforçando o carácter participado do relatório.
Aludiu também aos quatro vetores em que se centra a avaliação do relatório, destacando, no que aos sistemas
judiciais respeita, a importância da digitalização da justiça face à situação pandémica atual, congratulando os
Estados-Membros pela adoção de estratégias nacionais de combate à corrupção, dando nota de algumas
preocupações no que concerne ao pluralismo nos media, em particular, a falta de transparência quanto à
propriedade dos órgãos de comunicação social e enfatizando o papel de escrutínio dos parlamentos nacionais
e da própria sociedade civil relativamente à defesa do Estado de direito e, na presente conjuntura, ao controlo
de medidas adotadas em contexto de decretamento de estado de emergência. Manifestou a intenção da
Comissão de dar continuidade ao trabalho realizado neste âmbito com as presidências do Conselho da UE
que se seguem, nomeadamente, a Presidência Portuguesa e a Presidência Eslovena. Terminou reiterando a
necessidade de debater o relatório com as várias partes interessadas e declarando a intenção de fazer seguir
procedimentos ao abrigo dos vários mecanismos existentes para a salvaguarda do Estado do direito, como
sejam, o procedimento previsto no artigo 7.º do TUE ou novo mecanismo de condicionalidade orçamental.
De seguida usou da palavra o MEP Michal Šimečka (Renew), relator do relatório do PE sobre a criação de
um mecanismo da UE para a democracia, o Estado de direito e os direitos fundamentais, que agradeceu quer
à Comissão quer ao Conselho da UE pela discussão levada a cabo sobre o tema e sublinhou a importância de
envolver no debate não só as diversas instituições europeias, mas também os parlamentos nacionais. Fez
referência ao mecanismo de condicionalidade orçamental e afirmou a necessidade de fazer refletir o relatório
no regulamento a aprovar relativo à proteção do orçamento da União em caso de deficiências generalizadas a
nível do Estado de direito. Frisou a importância do acompanhamento e monotorização junto dos Estados-
Membros, dando como exemplo os protestos ocorridos na Polónia devido à proibição de 90% das
manifestações e terminou reiterando a relevância da cooperação interinstitucional na defesa dos direitos
fundamentais.
Seguiu-se a alocução da Deputada à Assembleia da República Portuguesa, Isabel Rodrigues, que
manifestou a sua concordância com a criação do mecanismo de condicionalidade orçamental e destacou a
corrupção e a desinformação como ameaças ao Estado de direito, correspondendo a sua intervenção, em
termos genéricos, ao texto em anexo.
Na sua intervenção, Heribert Hirte, do Bundestag, congratulou a informação produzida no relatório,
observando, contudo, a existência de lacunas relativamente a alguns Estados-Membros. No âmbito da
independência do Ministério Público, recordou que a Alemanha já foi objeto de decisões do Tribunal de Justiça
da União Europeia (TJUE) e deu conta da existência de um amplo debate nacional relativamente ao sistema
judicial. Terminou fazendo uma breve alusão à liberdade de imprensa, alertando para o risco de influência dos
órgãos de comunicação social.
Como último orador do painel, usou da palavra Claus Christian Claussen, do Bundestag, dizendo que
considerava que devia existir na UE um diálogo aprofundado sobre o Estado de direito que conduzisse a um
princípio tão uniforme quanto possível, atendendo às naturais diferenças entre os Estados-Membros. Tal como
alguns que o antecederam, destacou a importância da digitalização da justiça e manifestou o seu agrado com
o mecanismo de diálogo que será encetado pelo Conselho da UE, referindo que o Senado Alemão teria
aprovado um parecer que esperava ser relevante para a discussão daquela matéria, no qual se abordava a
importância da UE fazer uso dos mecanismos disponíveis para a salvaguarda do Estado de direito. A este
propósito, aludiu ao procedimento previsto no artigo 7.º do TUE e ao mecanismo da condicionalidade
orçamental, declarando, quanto a este último, que deveria o mesmo ser utilizado em caso de abuso na gestão
dos fundos europeus.
Seguiu-se uma fase de debate que contou com as seguintes intervenções:
Vicent Bru, da Assembleia Nacional Francesa2, frisou a relevância do futuro mecanismo da
condicionalidade orçamental, observando que, apesar do instrumento não resolver tudo, era um importante
passo para a afirmação do Estado de direito na UE. A este propósito, manifestou a sua preocupação com a
independência das universidades na Hungria, com a situação dos jornalistas no mesmo país e também na
2 Através de um assessor por problemas de conectividade.
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Polónia, que se debatem com condições pouco favoráveis ao trabalho de investigação e, ainda na Hungria,
com a posição dos juízes e os direitos das pessoas LGBTI.
Demetris Demetriou, representante do Chipre, salientou a importância da aplicação uniforme do princípio
do Estado de direito na UE, enquanto valor fundador da sua identidade, bem como da monotorização do
cumprimento daquele princípio, exercício para o qual considerava que o relatório muito havia contribuído.
O MEP Vladimír Bilčík (PPE) apontou para a necessidade de criação de um mecanismo de
acompanhamento do Estado de direito vinculativo, questionando ao representante do Conselho da UE quais
as perspetivas para isso suceda.
Francesco Berti, da Câmara de Deputados Italiana, começou por referir o mérito do relatório na análise
dos progressos alcançados pelo seu país no combate à corrupção, salientando, a este propósito, a
importância do investimento na modernização da administração pública. Afirmou que não era possível impor
princípios através de incentivos económicos, pelo que, da sua perspetiva, a afirmação do Estado de Direito
passava também por uma questão cultural.
Vita Terauda, Deputada da Letónia, congratulou o relatório afirmando, contudo, que o mesmo demonstra
que alguns dos esforços envidados não alcançaram as melhorias esperadas, desde logo, os procedimentos
encetados ao abrigo do artigo 7.º do TUE que considerou não terem obtido grande impacto. Manifestou a sua
preocupação quanto à eventual demora do diálogo que o Conselho da UE irá promover, alertando para o risco
de se tornar um instrumento que se arrasta no tempo sem consequências práticas. Saudou ainda a criação do
mecanismo da condicionalidade orçamental, apesar de considerar que deveria ser mais abrangente.
A MEP Elena Yoncheva (S&D) criticou o relatório por não nomear especificamente quais os Estado-
Membros que precisam urgentemente de adotar reformas no âmbito do cumprimento do Estado de direito,
referindo, a este propósito, que o Primeiro-Ministro Búlgaro não teceu comentários sobre o relatório. Afirmou
que, na última década, pouco foi feito na UE no que concerne ao combate à corrupção e indagou se não seria
o momento de atualizar da legislação naquela matéria. Por último, questionou o Conselho UE quanto a
medidas concretas a tomar no domínio do tema em debate.
Sofia Voultepsi, do Parlamento Helénico, salientou a aprovação na Grécia de um pacote de medidas de
combate à corrupção muito ambicioso, notando que tal fora reconhecido pelo relatório.
Therese Cachia, do Parlamento de Malta, manifestou o seu apreço pelo trabalho desenvolvido pelo PE e
pela Comissão na defesa do Estado de direito e salientou a importância de os Parlamentos nacionais
prosseguirem o mesmo trabalho. Lamentou, quanto ao relatório, que não exista referência à situação dos
jornalistas em Malta e às ameaças que sobre aqueles impendem.
A MEP Sophia in 't Veld (Renew) sublinhou que o relatório anual era uma ferramenta muito meritória mas
carecia de ser alargado. Fez ainda referência à existência de outros instrumentos de monitorização do Estado
de Direito, desde logo o mecanismo de condicionalidade orçamental, que entendia ser de aplicar já no início
do próximo período de discussão orçamental.
Nathalie Gilson, da Câmara de Representantes Belga, expressou o seu apreço pela partilha de boas
práticas entre Estados-Membros em relação a esta matéria. No que respeita à Bélgica, referiu que o novo
Governo havia apresentado a sua ordem de prioridades políticas, afirmando a necessidade reforçar os meios
da justiça, incluindo a digitalização daquele sector. Quanto a este último ponto, manifestou algumas dúvidas,
declarando que a justiça deveria conservar uma vertente humana e alertou para a existência de uma «fratura
digital».
A MEP Gwendoline Delbos-corfield (Verdes/ALE) salientou a importância da discussão do Estado de
direito e de trazer o debate sobre o tema aos parlamentos nacionais. Destacou o papel das diversas
associações nacionais que atuam na área da defesa do Estado de direito e cujos contributos para o relatório
foram da maior relevância, apelando a uma maior proteção das mesmas. Terminou frisando que o relatório
não é a única ferramenta disponível e que não pretende substituir o procedimento ao abrigo do artigo 7.º.,
alertando, a propósito deste último, que o procedimento não estava a ser plenamente empregue na Hungria e
na Polónia.
A MEP Sira Rego (GUE/NGL) questionou se a Comissão via como possível e oportuno o alargamento
daquele tipo de ferramentas (defesa do Estado de direito) a agências como a FRONTEX e outras de escopo
idêntico.
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Michael Roth retomou o uso da palavra, afirmando que da análise das intervenções ficava patente a
unanimidade quanto à importância do relatório e do mecanismo de defesa do Estado de Direito inerente ao
mesmo. Recordou que, até à data, só dispunham de um instrumento – o procedimento ao abrigo do artigo 7.º
do TUE – mas, com as negociações entre o PE, a Comissão e o Conselho UE, se haviam encontrado outras
ferramentas. No que respeita ao diálogo entre as instituições europeias e os parlamentos nacionais, realçou o
seu carácter preventivo e apelou a que todas as partes interessadas retirassem o melhor proveito do relatório.
Didier Reynders agradeceu ao PE todo o apoio prestado para a elaboração do relatório e declarou que
estão pensados outros relatórios dentro do âmbito da defesa do Estado de direito. Respondendo à questão da
MEP Elena Yoncheva (S&D), recordou a abertura de procedimentos, ao abrigo do artigo 7.º do TUE, em
relação à Hungria e à Polónia, reiterou a criação do novo mecanismo de condicionalidade orçamental e
anunciou outros instrumentos pensados pela Comissão. Alertou também para o problema atual da
desinformação, que havia sido referido na intervenção da Deputada da Assembleia da República Portuguesa,
Isabel Rodrigues, sublinhando a necessidade de regulamentação. Sobre o tema da independência dos
media, salientou que no capítulo referente a Malta, a Comissão tinha expressado a sua preocupação com a
situação dos jornalistas. Terminou reforçando a relevância do diálogo interinstitucional e com os Parlamentos
nacionais sobre o tema em debate.
O MEP Michal Šimečka (Renew) destacou a importância da partilha das várias perspetivas nacionais e
congratulou a intenção da Comissão de apresentar o relatório junto de cada Estado-Membro. Afirmou ainda
que as diferenças entre os vários ordenamentos jurídicos não podem escusar os Estados-Membros a
cumprirem regras básicas do Estado de direito, frisando que existem valores que não são negociáveis e que
as instituições europeias dispõem de mandato para aplicar sanções quando se verifique incumprimento.
Isabel Rodrigues, da Assembleia da República Portuguesa, manifestou seu apreço em saber que a
Comissão se encontra trabalhar no combate à desinformação e alertou para a necessidade de apoiar os
órgãos de comunicação social de menor dimensão.
Após pausa para os intérpretes e ainda sob a presidência do MEP Juan Fernando López Aguilar (S&D),
Presidente da Comissão LIBE, o primeiro painel foi retomado e contou com a participação dos seguintes
oradores:
Professor Laurent Pech, Middlesex University;
Filippo Donati, Presidente da Rede Europeia de Conselhos de Magistratura.
Na sua intervenção, o Professor Laurent Pech, da Middlesex University, começou por afirmar a
insuficiência do relatório, frisando a necessidade de introdução de melhorias para que possa cumprir o seu
propósito: a superação das fragilidades do Estado de direito na UE. Declarou que, no seu entendimento, os
capítulos referentes a cada Estado-Membro não teriam tido grande vantagem, embora conseguisse vislumbrar
eventuais consequências positivas como a promoção de debates em torno do Estado de direito. De seguida,
elencou um conjunto de aspetos atinentes ao relatório que considerou prejudicarem seu impacto:
O facto de não ser possível retirar uma imagem global por não existir uma avaliação transversal que
conduza a uma visão geral da evolução do Estado de direito na UE;
A utilização de uma linguagem diplomática que permite a normalização de violações flagrantes do
Estado de direito;
A dificuldade em reconhecer violações deliberadas e sistemáticas em determinados Estados-Membros;
A existência de padrões duplos na avaliação;
O carácter não vinculativo do relatório que se revela insuficiente para dissuadir os Estados autoritários,
realçando que não pode considerar-se um instrumento preventivo pois não estabelece
recomendações/metas, definindo prazos para o seu cumprimento.
Concluiu afirmando a necessidade de redescoberta por parte da Comissão do seu papel de guardiã dos
valores consagrados nos tratados, ao invés de posicionar como uma instituição que simplesmente acompanha
o seu cumprimento. Disse ainda serem precisas ações jurídicas concretas e sanções financeiras quando se
verifiquem casos de incumprimento.
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Filippo Donati, Presidente da Rede Europeia de Conselhos de Magistratura, iniciou a sua intervenção por
esclarecer que a Rede a que preside não se trata de uma associação de juízes, mas de uma rede institucional
que representa as associações nacionais e visa garantir a independência da magistratura e dos tribunais,
tendo como objetivo a melhoria dos sistemas judiciais em benefício dos cidadãos. Assinalou que desde 2014
que a Rede colabora com a Comissão, destacando, em particular, o trabalho desenvolvido quanto ao tema da
criação e composição dos Conselhos de Magistratura. Salientou o contributo da rede para o relatório em
apreciação, em concreto, com o levantamento dos enquadramentos jurídicos em que operam os Conselhos de
Magistratura nacionais, bem como dos recursos de que dispõem. Afirmou a importância da independência
judicial enquanto premissa da proteção judicial efetiva e, nesse quadro, instou ao reconhecimento por parte
das Instituições Europeias da relevância do papel da magistratura na defesa do Estado de direito. Alertou para
a necessidade de formalização de um estatuto para as redes europeias enquanto representantes da
magistratura europeia. Terminou declarando que a defesa do Estado de direito passa pela utilização efetiva de
todos os mecanismos disponíveis para o efeito, sublinhando igualmente o papel dos parlamentos nacionais.
Na fase de debate, tiveram lugar as seguintes intervenções:
Ian Castraldi Paris, do Parlamento de Malta, saudou a criação do mecanismo europeu para o Estado de
direito bem como a elaboração do relatório em apreciação, destacando, quanto a este último, o capítulo
referente ao seu país, sobre o qual salientou o reconhecimento das melhorias aí verificadas. Garantiu que o
Governo estava empenhado em assegurar a defesa do Estado de direito e agradeceu à Comissão e à
Comissão de Veneza pelo apoio prestado.
O MEP Kris Peeters (PPE) questionou de que forma poder ser estimulado o jornalismo de investigação na
Europa, afirmando, a este propósito, o papel crucial da liberdade de imprensa e a importância da utilização de
uma linguagem assertiva no que respeita à proteção dos jornalistas. Questionou quais as salvaguardas
constitucionais existentes para a defesa dos jornalistas e que outras podiam ser criadas. Por último, indagou
como poderia ser restaurada a confiança e como podia ser feita a consciencialização da relevância do primado
do direito.
O MEP Petar Vitanov (S&D) frisou a importância de preservar o Estado de direito e de envolver os
Parlamentos nacionais no debate, sobretudo na atual conjuntura, na qual algumas liberdades se encontram
suprimidas. Assinalou também a relevância do novo mecanismo da condicionalidade orçamental.
A MEP Sophia in 't Veld (Renew) começou por referir que concordava que existiam críticas ao relatório
que se justificavam, porém, entendia não ser possível considerá-lo como negativo. Por outro lado, reforçou
que a ideia do relatório não seria a de penalizar mas, sim, de atuar como uma ferramenta preventiva. Afirmou
que, para futuro, o relatório deveria ser mais abrangente, abarcando todo o escopo do artigo 2.º do TUE. No
que concerne ao mecanismo da condicionalidade orçamental, declarou que não o vê também como um
instrumento penalizador mas, sim, como o próprio nome indica, como uma condicionante, isto é, cada despesa
deverá ser avaliada em relação à sua compatibilidade com o Estado de direito. Terminou salientando a
necessidade de a Comissão ser rigorosa quanto a este tema.
A MEP Gwendoline Delbos-corfield (Verdes/ALE) questionou que ferramentas poderiam ser adotadas
pelos Parlamentos nacionais para impulsionar os próprios governos a atuar a nível europeu, em concreto,
dentro do Conselho da UE, em relação os Estados-Membros onde se verifica incumprimento do Estado de
direito.
O MEP Konstantinos Arvanitis (GUE/NGL) destacou a importância para a Grécia da análise de tópicos
como a violação da independência judicial e os ataques a jornalistas, questionando a omissão do relatório em
relação aquelas situações que, de acordo com o que afirmou, são no seu país acontecimentos que ocorrem de
forma sistemática. Terminou indagando se as ameaças a juízes e procuradores seriam um fenómeno
exclusivamente grego.
Hajnalka Juhász, da Assembleia Nacional Húngara, questionou a objetividade quanto à escolha de fontes
de informação para o relatório e, sobre este ponto, recordou que ao longo do ano, a Hungria forneceu à
Comissão análises detalhadas que não foram tidas em conta. Identificou alguns elementos que constam do
capítulo referente à Hungria e que não são utilizados na avaliação de outros Estados-Membros, como o
relatório do OLAF. Concluiu afirmando que o relatório não dava grandes provas de confiança mútua.
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Devolvida a palavra aos oradores, teve lugar nova intervenção do ProfessorLaurent Pech, que declarou
que o objetivo do relatório não era restaurar a confiança e que a defesa do Estado de direito era uma tarefa
que cabia a todos. Reiterou que o relatório não permitia perceber o que se passava em concreto em
determinados Estados-Membros, como era o caso da Hungria. Formulou o desejo de que a futura versão do
relatório contemplasse uma avaliação mais completa que reportasse a um período de tempo mais
representativo e que fosse superada a deficiência, no seu entendimento, mais óbvia, que era a de não refletir
as violações de caráter sistémico.
Filippo Donati retomou o uso da palavra chamando a atenção para a dificuldade de colocar em prática
determinadas ações tendo em conta a soberania nacional de cada Estado-Membro. A título exemplificativo,
aludiu à designação de membros no Conselho de Magistratura da Polónia que não terá seguido as normas,
em concreto, a Carta de Direitos Fundamentais, tendo existido quem entendesse que o TJUE não tinha
competência para se imiscuir na organização judiciária dos Estados-Membros. Concluiu afirmando que o
relatório era um primeiro passo e que o mecanismo de condicionalidade orçamental poderia ter uma utilidade
real, conclusões que lhe permitiam ter alguma esperança no futuro.
Sessão II: Troca de impressões sobre o impacto da Pandemia da COVID-19 na Democracia, no
Estado de Direito e nos Direitos Fundamentais
Tal como a anterior, a segunda sessão foi presidida pelo Presidente da Comissão LIBE, (MEP) Juan
Fernando López Aguilar (S&D), e nela participaram os seguintes oradores:
Michael O’flaherty, Diretor da Agência Europeia para os Direitos Fundamentais;
Gianni Buquicchio, Presidente da Comissão de Veneza do Conselho da Europa;
Meaghan Fitzgerald, do Gabinete para as Instituições Demcráticas e os Direitos Humanos da
Organização para a Segurança e Cooperação na Europa;
Alexis Deswaef, Vice-Presidente da Federação Internacional para os Direitos Humanos;
Vicent Bru, Assembleia Nacional Francesa;
Jean-Yves Leconte, Senado Francês;
Fernando Adolfo Gutiérrez Díaz de Otaz, Congresso Espanhol.
Michael O’flaherty, Diretor da Agência Europeia para os Direitos Fundamentais, deu início à sua alocução
referindo que a crise gerada pela pandemia da COVID-19 era um enorme desafio em matéria de direitos
fundamentais, desde logo porque ao tentar proteger a vida e a saúde dos seus cidadãos, os Estados eram
obrigados a restringir direitos. Sobre estas restrições, declarou que a abordagem dos Estados não poderia ser
injusta e as limitações não poderiam ser arbitrárias, devendo ser preservada a legalidade e garantida a
proporcionalidade. Alertou para o facto de, em muitos Estados-Membros, algumas das medidas adotadas
serem exageradas, dando o exemplo da violação da privacidade dos indivíduos com a gestão que havia sido
feita dos seus dados. Chamou a atenção para o especial impacto sobre grupos particularmente vulneráveis, a
saber: os idosos em estabelecimentos de cuidados, as pessoas portadoras de deficiência, os sem-abrigo, os
reclusos e os membros de minorias, para quem aquelas medidas representaram verdadeiras supressões de
direitos fundamentais. Salientou o papel dos Parlamentos nacionais no escrutínio das restrições impostas
pelos poderes executivos e, inclusive, na suspensão de algumas dessas restrições. Aludiu ainda ao
acompanhamento por parte dos organismos de supervisão, encarregues de seguir de perto a execução das
medidas e terminou exortando os Parlamentos nacionais a que continuassem a exercer a sua função de
fiscalização.
O orador seguinte, Gianni Buquicchio, Presidente da Comissão de Veneza do Conselho da Europa,
começou por afirmar a necessidade de os países combaterem a pandemia sem descurarem a democracia e
os direitos fundamentais, admitindo que não era fácil para os Governos encontrarem o ponto de equilibro entre
a proteção da saúde das suas populações e a manutenção das atividades sociais e económicas, que são
condições da efetiva concretização dos direitos fundamentais. Notou com agrado que o Relatório Intercalar
sobre as medidas tomadas nos Estados-Membros da UE em resultado da crise da COVID-19 e o seu impacto
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na democracia, no Estado de Direito e nos Direitos Fundamentais foi tido em consideração pelo PE. Declarou
que a Comissão a que preside é a favorável ao decretamento de estados de emergência, pois entende que
essa declaração formal concede mais garantias em matéria de Estado de direito, sem prejuízo de considerar
necessário que, quer o decretamento quer a decisão de prolongamento do estado de emergência, sejam alvo
de escrutínio parlamentar e judicial. Manifestou a sua preocupação com a compatibilização da realização de
eleições com as restrições atuais, afirmando que a decisão de adiar eleições deve caber aos Parlamentos e
frisando a necessidade de encontrar alternativas que permitam o exercício de direitos políticos sem pôr em
causa a saúde pública. Terminou informando que seria apresentada uma versão final do relatório
suprarreferido.
Seguiu-se a intervenção de Meaghan Fitzgerald, do Gabinete para as Instituições Democráticas e os
Direitos Humanos da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, reportando-se à monitorização
levada a cabo pela entidade que representa sobre o impacto das medidas adotadas em virtude da pandemia
em alguns aspetos, como o funcionamento dos tribunais, a realização de eleições, a capacidade do Estados
protegerem as liberdades individuais e a proteção de grupos especialmente vulneráveis. Não obstante
concordar que a declaração formal de um estado de emergência garantia maior segurança em termos de
defesa dos direitos fundamentais, declarou ser crucial garantir que as medidas adotadas são proporcionais e
limitadas no tempo. Disse ser do seu conhecimento que algumas medidas foram introduzidas fora do estado
de emergência e, portanto, poupadas ao devido escrutínio parlamentar, escrutínio esse também afetado pela
suspensão da atividade em determinados Parlamentos. Por outro lado, indicou o encerramento de tribunais
como condicionante no acesso a vias de recurso das medidas implementadas. Alertou para a falta de
transparência, em certos Estados-Membros, do processo legislativo inerente à entrada em vigor de normas de
emergência, referindo que se tratavam de processos tramitados num curto espaço de tempo sem que
houvesse lugar a debate público, afetando, por conseguinte, a sua compreensão por parte dos cidadãos.
Elencou um conjunto de recomendações a ter consideração pelos Estados-Membros, desde logo que devem
ser declarados os estados de emergência se a legislação for clara e se existir, também de forma clara,
separação de poderes, sendo concluídos logo que seja possível, que deve ser revista a viabilidade e
proporcionalidade das medidas adotadas e que deve ser evitada a aprovação de legislação de forma urgente,
apelando a um processo legislativo mais participado.
Na intervenção seguinte, usou da palavra Alexis Deswaef, Vice-Presidente da Federação Internacional
para os Direitos Humanos, que começou por enfatizar a ligação entre o Estado de direito e o princípio da
separação de poderes, chamando a atenção para o risco de instrumentalização da crise pelos executivos,
tendo em conta que têm governado por decreto e através de medidas execionais potencialmente violadoras de
direitos fundamentais. Sobre este perigo, salientou a importância do papel dos parlamentos nacionais face à
existência de medidas que colocam em causa o direito constitucional, mas também do acompanhamento por
parte do PE. A este propósito, disse ser preciso reforçar os poderes de fiscalização e recordou a faculdade de
utilização do procedimento previsto no artigo 7.º do TUE. Referindo-se à necessidade de proteger os grupos
mais frágeis, destacou a situação dos idosos, dos sem-abrigo e dos migrantes, afirmando que deveriam existir
mecanismos de controlo externo. Terminou apelando a uma reflexão sobre o futuro que inclua as seguintes
ideias: realocação, reconversão, reinvestimento nos aspetos humanos com mais solidariedade entre cidadãos
e maior justiça fiscal com refinanciamento da saúde.
Vicent Bru, da Assembleia Nacional Francesa, assinalou, reportando-se ao relatório da Comissão de
Veneza já aqui mencionado, a adoção por todos os Estados-Membros de medidas de combate à pandemia
fortemente restritivas e que tiveram, necessariamente, impacto sobre o Estado de direito, notando, contudo,
que nem todos os países declararam o estado de emergência. Afirmou que os parlamentares deveriam estar
especialmente atentos ao cumprimento do critério da proporcionalidade nas medidas adotadas e aludiu ao
tema das eleições, referindo que França já havia debatido o adiamento de eleições locais, sendo necessário
contrabalançar os riscos da saúde com a limitação a um sufrágio universal. Chamou a atenção para o facto de,
em alguns Estados, o papel dos parlamentos ter sido relegado, colocando em causa a execução de um
escrutínio que considera essencial. Declarou que ataques efetivos ao Estado de direito não podiam passar
impunes, tais como a declaração de estados de emergência sem limite temporal ou a imposição de limites à
liberdade de imprensa e à liberdade de expressão, sob pena de colocar em perigo uma das especificidades da
UE, que é a defesa do Estado de direito.
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Fernando Adolfo Gutiérrez Díaz de Otaz, do Congresso Espanhol, aludiu à situação espanhola, referindo
que a oposição apoiou sempre a prorrogação do estado de emergência, mas, no que respeita à última
declaração, que prevê a duração do referido estado por seis meses, a oposição considera que foi excessiva,
tendo manifestado as suas dúvidas quanto à conformidade daquela solução com o Estado de direito. Fez
ainda referência à criação pelo Governo de uma comissão permanente contra a desinformação, anunciando
como um dos objetivos a promoção da liberdade de expressão. Em relação a esta medida, expressou as suas
dúvidas e indagou se caberia ao governo controlar aquele tipo de questões.
Como último orador do painel, usou da palavra Jean-Yves Leconte, do Senado Francês, que começou por
referir, a par das intervenções que o antecederam, que a crise de saúde podia implicar restrições às liberdades
individuais, nomeadamente com a utilização de dados pessoais, mas também no acesso à justiça, no direito
de defesa e no controlo da legalidade, podendo ainda levantar questões de constitucionalidade. Desse ponto
de vista, declarou considerar essencial o papel dos Parlamentos nacionais e a existência de debates sobre as
medidas. Manifestou a sua consternação com a implementação de limitações à circulação, medidas que diz
terem sido adotadas sem qualquer intervenção das Instituições Europeias. Relativamente à situação em
França, afirmou que o poder tem sido exercido de forma pessoal pelo Presidente, com anúncio de medidas
que diferem das propostas pelo Governo perante o Parlamento. Informou que existe um amplo debate
nacional sobre os poderes do parlamento e sobre a duração do estado de emergência. Aludiu à utilização de
drones, por parte do Executivo, para efeito de controlo das medidas de confinamento, informando que o
Conselho de Estado teria posto fim à medida posteriormente. Deu ainda como exemplos algumas situações na
Hungria e na Polónia, concluindo pela necessidade de os parlamentos controlarem as medidas adotadas pelos
governos na conjuntura atual.
Terminadas as intervenções, seguiu-se mais uma fase de debate, que se iniciou com a intervenção de
Márcia Passos, Deputada à Assembleia da República Portuguesa, alertando para a necessidade de ação por
parte da Comissão Europeia do Direitos Humanos, conforme anexo, e prosseguiu com as seguintes
alocuções:
Sofia Voultepsi, do Parlamento helénico, lamentou as críticas tecidas pelo MEP Konstantinos Arvanitis
(GUE/NGL) ao sistema judiciário grego. Reforçou a necessidade de garantir a proporcionalidade das medidas
adotadas no contexto da pandemia e referiu que estas devem ser previamente apresentadas e aprovadas pelo
PE. Por último, informou que o Parlamento que representa nunca suspendeu a sua atividade e que as
medidas implementadas tiveram sempre por base o conhecimento da comunidade científica, o que contribuiu
para a sua aceitação por parte dos cidadãos.
A MEP Sophia in 't Veld (Renew) congratulou a existência de debates a nível nacional sobre o impacto
das medidas de combate à pandemia nos direitos fundamentais e na democracia, realçando a importância da
demonstração de espirito crítico em tempos de crise e da existência de discussão sobre a necessidade e a
proporcionalidade das medidas. Afirmou que esse debate tem um papel fundamental na prevenção de
comportamentos abusivos por parte dos governos e declarou que o próprio PE deveria discutir mais as
medidas que são tomadas no seu seio.
O MEP Nicola Procaccini (ECR) disse que a atual situação era a pior tragédia que aconteceu à Europa e
ao mundo no pós-guerra, mas encontrava, ainda assim, uma vantagem que era a da revelação da
instrumentalização da expressão «violação do Estado de Direito», referindo-se a alguns casos de governos
que adotaram medidas ignorando os respetivos parlamentos. A esse propósito, questionou por que razão as
Instituições Europeias não obrigavam os governos a envolverem os parlamentos nacionais no processo
decisório daquele tipo de medidas.
A MEP Malin Björk (GUE/NGL) salientou a importância do sistema judicial no tema em debate e do
respeito pela proporcionalidade nas medidas adotadas, considerando que algumas dessas medidas teriam ido
demasiado longe face ao que era necessário para proteger a saúde. Aludiu, a título exemplificativo, à situação
na Polónia e em Lesbos, questionando a resposta que tem sido dada e alertando para necessidade de
reinstituir os direitos fundamentais, estabelecendo metas para tal.
A MEP Caterina Chinnici (S&D), referindo-se à intervenção de Michael O’flaherty, aludiu à importância
de proteger os grupos mais vulneráveis, destacando particularmente os reclusos e as crianças. No que às
crianças respeita, chamou a atenção da dificuldade de muitos alunos em aceder ao ensino, devido à carência
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de meios digitais que permitam a sua realização à distância, prejudicando, por isso, o seu direito fundamental
à educação. Apelou ainda à Agência Europeia para os Direitos Fundamentais que continue a acompanhar de
perto a situação das pessoas mais frágeis.
O MEP Balázs Hidvéghi (PPE) salientou que a situação extraordinária em que nos encontramos requer a
imposição de restrições devendo, contudo, ser garantida a proporcionalidade das medidas adotadas e o
respeito pelas constituições nacionais. Afirmou ainda que a Hungria tinha sido alvo de críticas que depois se
revelaram despropositadas e que a pandemia não devia ser utilizada para atacar ideologicamente outros
países.
Michael O’flaherty retomou o uso da palavra informando que a monitorização por parte Agência Europeia
para os Direitos Fundamentais existia e dava lugar à emissão de boletins periódicos cuja avaliação se
centrava no impacto das medidas de combate à pandemia nos direitos fundamentais, sobretudo no que
concerne aos grupos mais vulneráveis. Quanto a questões ideológicas, afirmou a necessidade de defender os
direitos fundamentais mesmo daqueles com os quais não concordavam, destacando a importância da
proteção das liberdades de associação e de expressão, bem como o papel dos parlamentos nacionais na
prossecução daquele propósito.
Gianni Buquicchio salientou que, embora a crise ainda estivesse longe de terminar, era necessário
pensar a fase pós-COVID, fazendo um esforço para perceber o que pode ser feito de maneira diferente.
Referiu que a Comissão de Veneza criou um observatório para monitorizar as medidas adotadas pelos
Estados-Membros para combater a crise, à semelhança dos boletins periódicos emitidos pela Agência
Europeia para os Direitos Fundamentais. Apelou a um trabalho conjunto entre as entidades que participaram
naquela reunião no sentido de encontrar critérios comuns para proteção do Estado de direito e dos direitos
fundamentais que permitam preparar melhor qualquer crise que possa ocorrer no futuro.
Meaghan Fitzgerald reforçou a intenção do Gabinete da OSCE para as Instituições Democráticas e os
Direitos Humanos de realização efetiva de um acompanhamento das medidas, especialmente junto dos
grupos mais vulneráveis. Manifestou a sua concordância com as posições que a antecederam que
defenderam que a crise abriu uma oportunidade, desde logo para revisitar os quadros normativos e melhorá-
los. Afirmou ainda que, apesar da pandemia ter dado visibilidade às falhas existentes nos sistemas, existiram
avanços e sublinhou o papel dos parlamentos nacionais.
Encerrando a fase de debate, teve lugar a intervenção de Alexis Deswaef que começou por frisar a falta
de transparência de alguns processos legislativos inerentes à aprovação de medidas de emergências em
determinados Estados-Membros. Sobre este aspeto, reiterou a importância dos parlamentos nacionais no
reforço da perceção da legitimidade das medidas perante os cidadãos. Reconheceu que as medidas de
combate à pandemia têm subjacente um processo decisório que não é fácil, mas resulta de escolhas políticas,
que devem ter sempre em consideração o Estado de direito e os princípios da legalidade e da
proporcionalidade. Discordou da posição assumida pelo MEP Balázs Hidvéghi (PPE) quando se referiu à
utilização da crise para promover um ataque ideológico a alguns países, sublinhando que o que norteava a
ação dos diversos intervenientes daquela reunião era o respeito pelos Direitos Humanos e que pretendiam ver
o processo participativo reforçado assim como o escrutínio parlamentar.
Comentários Finais
Antes de encerrar a reunião, o Presidente da Comissão LIBE, (MEP) Juan Fernando López Aguilar
(S&D), agradeceu a todos os participantes e oradores, sublinhando que os seus contributos enriqueceram
bastante o debate. Declarou a intenção de manter a tradição do debate interparlamentar, apesar das
condições atuais trazerem algumas dificuldades em termos de logística. Agradeceu a todos pelo interesse
demonstrado pelos temas do Estado de direito, da democracia e dos direitos fundamentais e referiu o
tratamento de diversas propostas legislativas no âmbito desses temas, destacando o novo mecanismo de
condicionalidade orçamental. Despediu-se afirmando a sua certeza quanto à importância da presente reunião
que considerou ser um marco na cooperação futura.
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Anexos: Intervenção da Senhora Deputada Isabel Rodrigues (PS), enquanto oradora, no primeiro painel e
intervenção da Senhora Deputada Márcia Passos (PSD) no momento de debate previsto no segundo painel.
Assembleia da República, 10 de novembro de 2020.
As Deputadas da Assembleia da República: Isabel Rodrigues —Márcia Passos.
A DIVISÃO DE REDAÇÃO.