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Quarta-feira, 14 de Novembro de 2007 II Série-OE — Número 5
X LEGISLATURA 3.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2007-2008)
COMISSÃO DE ORÇAMENTO E FINANÇAS
Reunião de 13 de Novembro de 2007
SUMÁRIO O Sr. Presidente (Jorge Neto) declarou aberta a reunião às 10 horas e 15 minutos.
Prosseguiu a discussão, na especialidade, da proposta de lei n.º 162/X — Orçamento do Estado para 2008, tendo o Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia) apresentado à Comissão o orçamento respeitante à sua área.
Usaram da palavra, além do Sr. Ministro e dos Srs. Secretários de Estado do Ambiente (Humberto Rosa), do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão) e do Desenvolvimento Regional (Rui Nuno Baleiras), os Srs. Deputados José Eduardo Martins (PSD), Renato Sampaio e Jovita Ladeira (PS), Eugénio Rosa e Miguel Tiago (PCP), António Carlos Monteiro (CDS-PP), Alda Macedo (BE), Heloísa Apolónia (Os Verdes), Luís Vaz (PS) e José Soeiro (PCP).
Sobre o orçamento do Ministério da Cultura pronunciaramse, além da Sr.ª Ministra (Isabel Pires de Lima) e do Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho), os Srs. Deputados Feliciano Barreiras Duarte (PSD), Teresa Portugal (PS), João Oliveira (PCP), Teresa Caeiro (CDS-PP), Ana Drago (BE), Nuno da Câmara Pereira (PSD) e Manuela Melo (PS).
Por último, relativamente ao orçamento do Ministério da Administração Interna, usaram da palavra, além do Sr. Ministro (Rui Pereira) e do Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (Osvaldo Castro), os Srs. Deputados Fernando Negrão (PSD), João Serrano (PS), António Filipe (PCP), Nuno Magalhães (CDSPP) e Helena Pinto (BE).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 19 horas e 50 minutos.
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O Sr. Presidente (Jorge Neto): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 10 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados, permitam-me, antes de mais, que agradeça ao Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e aos Srs. Secretários de Estado a sua presença nesta Comissão.
Com sabem, esta audição é realizada no âmbito do que prevê a Constituição, em sede de discussão do Orçamento na especialidade, pelo que todos aguardamos a apresentação que o Sr. Ministro irá fazer com vista aos pedidos de esclarecimento e ao debate que deve ter lugar nesta sede relativamente às matérias concretas que estão sob a tutela do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
Em traços muito gerais, irão ser tratadas questões atinentes ao ambiente, sendo que quando se fala de ambiente hoje fala-se incontornavelmente de alterações climáticas e fala-se também da questão da água, que é uma das matérias inscritas no Orçamento, concretamente, no Plano Nacional da Água.
Falaremos também, obviamente, do Ordenamento do Território, matéria em que a proposta de lei do Orçamento do Estado também contempla algumas iniciativas relativamente às quais o Sr. Ministro não deixará de dilucidar os Srs. Deputados, designadamente no que se refere ao Programa Polis.
Por último, falar-se-á do Desenvolvimento Regional e de uma matéria de relevante importância nos tempos hodiernos, que é a transição do Quadro Comunitário de Apoio (QCA) 2000-2006 para o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) 2007-2013.
Além desta transição, falar-se-á também, e fundamentalmente, da articulação dos Programas Operacionais (PO), no âmbito da implementação do QREN, matéria igualmente sob a tutela deste Ministério, pelo que o Sr.
Ministro não deixará de abordar, com alguma profundidade, as linhas de força enformadoras do QREN e o que está previsto em termos de concretização desses Planos Operacionais, sabido como é que este é um programa decisivo em termos de desenvolvimento económico do País com vista ao reforço da sua coesão social e territorial.
Vou dar a palavra ao Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional para uma primeira apresentação, recordando que o Sr. Ministro dispõe de 15 minutos para a fazer.
A essa intervenção seguir-se-á — e este é o modus operandi desta reunião, na esteira do que tem ocorrido nas reuniões anteriores — uma primeira ronda de perguntas em que cada grupo parlamentar poderá usar da palavra durante sete minutos, tempo que poderá ser gerido a bel-prazer de cada um, com intervenções de vários Srs. Deputados, após o que o Sr. Ministro responderá directamente a cada um dos grupos parlamentares.
Haverá depois uma segunda ronda de perguntas, dispondo cada grupo parlamentar de três minutos para o efeito. Nessa altura, procurarei agrupar três perguntas de cada vez, às quais o Sr. Ministro responderá em bloco de seguida.
Para uma intervenção, tem então a palavra ao Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional (Francisco Nunes Correia): — Sr. Presidente, Srs. Presidentes das Comissões, Srs. Deputados, como todos sabem, é muito diversificada e muito transversal a área de actuação do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional. O Sr. Presidente acabou de o enunciar e, justamente, com os exemplos que deu, mostrou esse naipe muito alargado de intervenções.
Pois bem, num conjunto tão diversificado de áreas de intervenção — felizmente, todas de grande relevância para os portugueses —, tive de optar por referir-me a três matérias nesta intervenção inicial, matérias essas que me parecem particularmente expressivas no momento que estamos a viver em Portugal.
Escolhi um ponto de cada uma das três áreas do nosso Ministério, portanto, começarei por falar do QREN, na área do desenvolvimento regional, falarei depois da reabilitação urbana e da política de cidades, na área do ordenamento do território e cidades e por fim referir-me-ei à questão da gestão da água, na área do ambiente, temas, aliás, referidos pelo Sr. Presidente, o que sublinha a relevância que efectivamente têm.
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Comecemos então com o Quadro de Referência Estratégico Nacional. Devo dizer que esta é uma área de grande sentido de realização e de grande satisfação por parte do Governo. Quero aqui anunciar que é já na quinta-feira, dia 15 de Novembro, ou seja, depois de amanhã,»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Três meses depois!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » que vão estar publicados os primeiros editais apelando à apresentação de candidaturas.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Que tristeza! Que miséria!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Quero aqui sublinhar que Portugal é um dos primeiros países na Europa a fazê-lo! Quais são esses editais? Sobre que áreas incidem? Sobre áreas que desde o início foram consideradas prioritárias no QREN, por razões que todos compreenderão»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Que falta de consideração!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » os apoios, os estímulos, os incentivos ao tecido empresarial português, visando criar emprego (emprego de qualidade), numa lógica de inovação das empresas, na lógica da sua internacionalização.
Concretamente estão em causa três sistemas de incentivos às empresas: a qualificação de pequenas e médias empresas, a inovação nas empresas e a investigação e o desenvolvimento nas empresas, três sistemas de incentivos que estão regulamentados por portarias, que tive o gosto de assinar com o Sr. Ministro da Economia e da Inovação, no passado dia 2 de Novembro.
Repito, Portugal foi dos primeiros países a lançar a execução do QREN na Europa.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Ah!»
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Isto resulta de um trabalho sistemático, metódico, que foi possível fazer de uma maneira mais participada do que alguma vez ocorreu no passado.
Recordo que viemos, pelo menos, quatro vezes à Assembleia da República prestar contas e dar esclarecimentos sobre toda a estruturação do QREN. Relembrando um marco importante: no dia 17 de Outubro foram assinados os Programas Operacionais (PO), na presença do Presidente da Comissão Europeia, da Comissária Danuta Hübner, responsável pelo Fundo de Coesão e pelo FEDER e pelas políticas regionais, e do Comissário responsável pelo Fundo Social Europeu.
Portugal esteve no primeiro grupo, no primeiro terço dos PO aprovados em toda a Europa — neste momento, metade ou porventura mais de metade dos países europeus não tem os seus PO aprovados e muito menos lançados. Aliás, isso foi objecto de comentários elogiosos por parte do Presidente da Comissão Europeia e dos dois comissários presentes em Lisboa nessa sessão. Quem diz o contrário «rema contra a maré», procura fazer política com argumentos fáceis, procura ter razão à custa da repetição, quando os próprios responsáveis comunitários dizem o contrário.
O trabalho feito para chegarmos aqui e para sermos dos primeiros obrigou a uma grande disciplina de trabalho. Recordo que o QREN foi aprovado em acto formal que teve lugar no primeiro dia útil da Presidência portuguesa, no dia 2 de Julho, no Porto, com a presença do Presidente da Comissão Europeia e dos comissários relevantes para o QREN.
A apresentação do QREN à Comissão Europeia foi feita, em mão, no dia 18 de Janeiro do corrente ano e a apresentação dos PO no dia 27 de Fevereiro também deste ano. E todos têm a obrigação de saber por que não foi antes: entre outras coisas, porque o próprio processo europeu teve derrogações e uma lentidão que não era esperada. Basta dizer que regulamentos europeus esperados em Março de 2006 acabaram por surgir em Setembro ou Outubro de 2006, condicionando, portanto, o processo de preparação.
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Portugal manteve sempre uma estreita relação com a Comissão Europeia, que lhe permitiu, uma vez abertos os processos formais de apresentação e estabelecidos os prazos de apresentação, ser dos primeiros e sempre antes do prazo previsto. Pelo que, depois, com grande rapidez, pôde levar a cabo a fase final da negociação.
Mas o QREN não é só a negociação com Bruxelas, o QREN não é só a assinatura do QREN e dos PO, o QREN é também montar em Portugal uma estrutura de uma grande complexidade! Recordo que o decreto-lei da governação do QREN foi publicado em Setembro e que estão nomeados gestores para todos os Programas Operacionais. Recordo ainda que estão criadas e a funcionar todas as comissões ministeriais de coordenação de todos os PO, tratando da orientação e do enquadramento político do QREN. Quase todas as reuniões das comissões de acompanhamento já tiveram lugar, prevendo-se a sua conclusão dentro de uma semana. E estão constituídas as comissões de aconselhamento estratégico a nível regional, que vão ter um papel importante na orientação e aferição dos Programas Operacionais Regionais, com uma representação da sociedade civil, que está estabelecida e consolidada.
Os regulamentos estão praticamente todos aprovados. Aqueles que é necessário lançar de imediato estão integralmente aprovados e podem ser consultados, para quem tenha dúvidas, para quem goste de se fazer de céptico, em www.qren.pt. Isto é o que tenho a dizer relativamente ao QREN.
Refiro-me agora à política de cidades, que é outra componente da maior importância na área do ordenamento do território e cidades.
Este Orçamento para 2008 tem disposições para a reabilitação urbana como jamais existiram em Portugal.
Diria que a verdadeira política de reabilitação e regeneração das cidades enquanto programa generalizado, com apelo a uma relação entre públicos e privados, entre Estado e investidores, começa verdadeiramente em 2008, com este pacote de medidas que o nosso Ministério negociou e trabalhou tecnicamente com o Ministério das Finanças para conseguir pôr de pé este projecto, na parte de diz respeito ao pacote fiscal, porque as actividades neste domínio ultrapassam evidentemente o pacote fiscal.
Recapitulando brevemente o pacote fiscal para a reabilitação urbana, em primeiro lugar, para todas as obras que tenham início até ao final de 2010 e que sejam executadas até ao final de 2012, existe isenção do IMI e benefícios no âmbito do IRC, incidindo sobre os Fundos de Investimento Imobiliário, para qualquer edifício, em qualquer ponto do país que esteja abrangido pelo novo Regime do Arrendamento Urbano (RAU), em processo de actualização de rendas. Esta é uma medida que, além de dar um contributo decisivo para a reabilitação urbana, vai dar ímpeto à aplicação do novo Regime de Arrendamento Urbano (RAU).
Para além desta medida, que se aplica a todos os edifícios abrangidos por esta disposição do chamado RAU, há uma figura nova, a das áreas de reabilitação urbana, que podem ser definidas pelas câmaras municipais em que qualquer obra de requalificação, que permita melhorar em dois graus (uma vez que o estado de conservação dos edifícios passa a obedecer a uma escala de classificação), ou dois níveis, e que passam a ter também isenção total de IMI e benefícios no IRC sobre Fundos de Investimento Imobiliário que participem nesse processo.
Uma outra disposição de grande alcance é a redução do IVA para 5% em todas estas obras. Portanto, este pacote fiscal incide em três frentes: IMI, IRC e IVA, trazendo efectivamente um impulso muito grande e um apelo forte a intervenções por parte de particulares nesta matéria.
Mas o pacote para a reabilitação urbana não fica por aqui. Devo dizer que no orçamento do Ministério estão previstas, em 2008, intervenções de grande dimensão, que aumentam, aliás, relativamente ao que ocorreu nos anos anteriores, com projectos de reabilitação urbana. Prevê-se qualquer coisa na ordem dos 118 milhões de euros de investimento do Ministério nesta frente de trabalho. Isto incide sobre projectos em áreas críticas, nomeadamente no Rabo de Peixe, Alagoas, os chamados projectos do Fundo EFTA; incide na reabilitação de bairros sociais que eram pertença do IGAPHE, hoje transferidos para o IHRU, como sabem; incide no apoio dado às Sociedades de Reabilitação Urbana (SRU); e incide sobre o Polis, que praticamente ficará concluído até 2008, excepto um ou dois casos que, pela sua dimensão, se prolongarão um pouco mais, enfim, por razões que são conhecidas. Mas a generalidade do Polis deverá ficar concluída em 2008, havendo 118 milhões de euros para esse fim.
Mas não ficamos ainda por aqui. Quero destacar a forma como a política de cidades é destacada no QREN.
Apesar da natureza competitiva do QREN, que lhe dá uma maior incerteza no que respeita a previsões exactas de números, há grande segurança relativamente a poder, até 2013, gastar 1000 milhões de euros de fundos comunitários para a aplicação da política Polis XXI. Esta política tem, essencialmente, três linhas de actuação:
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parcerias para a regeneração urbana, parcerias para a competitividade e inovação e soluções inovadoras para problemas urbanos. Estão concluídos os regulamentos relativos a estas matérias e prevê-se que, na frente das parcerias para a regeneração urbana, sejam abertos editais para a apresentação de candidaturas ainda em 2007 e que em 2008, seguramente, 30 milhões de euros pelo menos sejam utilizados nesta área.
Recordo que aqui, como noutras áreas, o nosso Ministério é um organizador das políticas, mas que essas políticas nem sempre se reflectem no Orçamento. Por exemplo, estas parcerias urbanas são iniciativa do nosso Ministério, mas, naturalmente, a comparticipação nacional e o próprio exercício de apresentação das candidaturas são feitos de forma dispersa pela sociedade e não necessariamente por iniciativa do nosso Ministério.
Iniciativa do nosso Ministério são os 118 milhões de euros que já referi.
Quero ainda sublinhar um aspecto, que é o seguinte: em todos estes programas existe uma discriminação positiva para estímulo à construção sustentável. Naturalmente, daremos mais pormenores se, no debate, isso for oportuno.
Finalmente, passarei à gestão da água. O que quero aqui sublinhar é a possibilidade de, de imediato, poder começar a aplicar o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR) e a Estratégia Nacional para os Efluentes Agro-Pecuários e Agro-Industriais, que foram atempadamente preparadas por este Governo. Como sabem, uma das nossas primeiras prioridades foi a de preparar o PEAASAR, além de outros programas relevantes para as políticas de ambiente no quadro do QREN. Todavia, na matéria que aqui estou a tratar, o PEAASAR e a ENEAPAI, documentos bem conhecidos que podem ser consultados na página electrónica do Ministério e que julgo que foram distribuídos aos Srs. Deputados a seu tempo, dão-nos uma linha de rumo segura para poder utilizar com grande eficácia os fundos do QREN. É assim que se deve trabalhar: fazendo o planeamento estratégico quando ele deve ser feito para que esteja pronto quando existe a disponibilidade para utilizar esses fundos.
Devo referir que 2008 e 2009 serão, provavelmente, os anos de maior investimento neste sector, para o que contribuem vários factores. Em primeiro lugar, o QCA III ainda está em execução e recordo que para o Fundo de Coesão essa execução prolonga-se até 2010, enquanto para o FEDER se conclui em 2008. Há, portanto, um phasing out do QCA III, mas em áreas como estas ainda com volumes de investimento muito significativos.
Por outro lado, estamos no phasing in do QREN e, portanto, sobrepõem-se estas duas linhas que fazem com que haja volumes de investimento significativos.
Mas mais: em conjugação com o Ministério da Agricultura e utilizando também fundos do FEADER e do FEDER, poderemos finalmente resolver aquele que considero ser dos problemas mais sérios de poluição no nosso país — os efluentes da agro-pecuária e da agro-indústria. Tudo isso está previsto e caracterizado e estão identificadas as prioridades nesse documento de planeamento estratégico que é o ENEAPAI.
Sublinho o facto de termos preparado atempadamente esses programas, porque encontro aí motivo de particular satisfação. Em todas as grandes áreas de investimento do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, nós, durante os primeiros dois anos de exercício governativo, pudemos preparar documentos que hoje estão prontos para potenciar o QREN: o PEAASAR e a ENEAPAI, mas também o PERSU, o Litoral 2007/2013 e o Polis XXI. Como tal, as principais áreas de intervenção têm documentos de orientação estratégica que são dirigidos ao período de 2007/2013.
Mas a gestão dos recursos hídricos não passa só pelo abastecimento de águas e pelo saneamento de águas residuais ou pelo tratamento de efluentes da agro-pecuária, embora estes sejam temas de grande relevância. Este aspecto passa também pelo modelo de gestão institucional de gestão dos recursos hídricos.
Recordo que as Administrações de Região Hidrográfica, as ARH, estão em processo de instalação — dei posse em 24 de Setembro às comissões instaladoras das ARH –, que decorre até ao final do ano, e que 2008 é o ano de início de exercício das ARH.
Os planos de gestão de bacia hidrográfica estão a começar a ser preparados. Eles decorrem de uma exigência da directiva-quadro da água e deverão estar concluídos até 2009, pelo que 2008 vai ser o ano essencial de preparação e de apresentação à discussão pública desses planos.
Prossegue a actividade de ordenamento, nomeadamente nas albufeiras, para além da revisão dos POOC (Planos de Ordenamento da Orla Costeira), que entram na dimensão litoral e que, por isso, não estou aqui a sublinhar, devendo ainda ser feitos os planos de estuários. Todavia, os planos de ordenamento de albufeiras vão continuar.
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Por outro lado, a montagem de um sistema institucional à escala nacional obriga a dispor de sistemas de informação e monitorização (estes últimos decorrem, aliás, das obrigações da directiva-quadro) que estão a ser implementados e que, naturalmente, se reflectem no Orçamento para 2008.
Não quero, contudo, deixar de referir um outro caso exemplar: o Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico. Este é tipicamente um caso em que o nosso Ministério é um organizador, um estruturador, um desencadeador de políticas, em que outros, designadamente investidores privados, num quadro de governação pública, por via da figura da concessão, poderão participar e actuar. Esperam-se, aliás, investimentos significativos já em 2008 neste quadro que também não se reflectem no orçamento do Ministério, mas que não deixam de ser de uma dimensão extremamente importante da sua actividade e protagonismo na sociedade portuguesa.
Srs. Presidentes, esgotei o meu tempo. Naturalmente, há muitos temas relevantes neste Ministério e, com certeza, o debate que se vai seguir permitirá desenvolver alguns deles e outros que já abordei com um pouco mais de pormenor.
O Sr. Presidente: — Para colocar o primeiro feixe de questões, tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins, do PSD.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, serei mais escrupuloso com o tempo do que o Sr.
Ministro, mas não posso deixar de, para começar, cumprimentando todos, reiterar a esperança de que este debate possa tratar do Orçamento do Estado para 2008. O Sr. Ministro falou durante 15 minutos do debate do Orçamento do Estado sem se referir a um único número e deve ser a primeira vez que um Ministro consegue fazer isto na Assembleia.
Mas, no fundo, isto é sinónimo de outra coisa: o Ministro do Ambiente esteve durante 15 minutos a esforçarse para nos convencer de que passou três anos a fazer uns «livrinhos» (que envolveram o abate de muitas árvores, porque temos todos a versão online, a versão em CD e a versão em livro), ou seja, que houve muitas lombadas distribuídas aos Deputados, muitas estratégias, mas «zero» concretizações! E estas «zero» concretizações, repare, Sr. Presidente, têm estado à espera que o Governo aprove o QREN, porque agora, aprovado o QREN depois de três anos a fazer estratégias, vamos poder executar alguma coisa. Delicioso raciocínio que não resiste, porém, à necessidade de escalpelizarmos agora o que são verdadeiramente os números do ano em que o Governo decidiu começar a trabalhar, depois de três anos a fazer estratégias.
A primeira coisa que é preciso fazer, apesar de o Sr. Ministro não ter referido um único número, é dar-lhe os parabéns pelos 3% do défice. O Sr. Ministro decidiu gastar os 5 primeiros minutos da sua intervenção a falar do Quadro de Referência Estratégico Nacional. Vamos, então, trocar isso por miúdos e por números. vamos esquecer que o senhor tinha feito uma resolução a dizer que o entregava em Bruxelas no fim do ano; vamos imaginar que somos todos ignorantes e que pensamos que o atraso nos regulamentos condicionava, de alguma forma, a elaboração do nosso quadro estratégico; vamos fazer de conta que a nenhum de nós bastava ir à Internet para aceder ao site da política regional e perceber se o que esteve a dizer sobre os países que apresentaram os seus quadros de referência e em que altura os viram aprovados é verdade; vamos fazer de conta que Portugal, apesar de ter tido a Presidência este ano, não está na segunda metade da tabela; e vamos, então, falar dos números do QREN. Vamos fazer de conta que o Sr. Ministro não tinha prometido «guichet aberto» em Setembro e que em Novembro ninguém pode apresentar candidaturas.
De todo o modo, como o Sr. Ministro passa a vida a dizer que o dinheiro está disponível em 2007, porque os regulamentos permitem apresentar despesas se foram negociados os programas retroactivamente a 1 de Janeiro de 2007, tem de ter uma ideia — se não tiver, não está a exercer bem as suas funções — de qual é, então, o volume de comparticipação nacional necessário.
Peço ao Sr. Ministro, na expectativa de que este debate sirva para responder aos Deputados, coisa para que o debate do Orçamento ainda não serviu, que tome atenção! A pergunta que quero fazer é a seguinte: em relação ao QREN de 2007, que parte da comparticipação nacional vai ser necessário gastar para as candidaturas que vão aparecer agora em Novembro e cuja despesa retroage a 1 de Janeiro de 2007? Ou isso é verdade ou não é! Se o Sr. Ministro tem ideia de quanto isso custa e de qual o efeito que isto tem sobre o défice, os 5 primeiros minutos da sua intervenção têm justificação. Se não, foram uma perda de tempo desta Comissão e do nosso debate!
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A segunda coisa que há para dizer sobre o QREN e o desenvolvimento regional é que sobre este último as intenções do Governo estão «clarinhas» no Relatório do Orçamento do Estado, pág. 221. Este Governo escreveu no Orçamento para 2008 (este «orçamento do Conde de Abranhos«», que quer gastar todo o PIDDAC na região de Lisboa e do Porto, prova de que este é o Governo mais centralista e menos promotor da coesão regional e social) dois parágrafos! O Governo escreveu dois parágrafos no Orçamento do Estado sobre desenvolvimento regional! Dois, Sr. Presidente! Um deles é um parágrafo completamente bacoco com umas generalidades sobre o facto de a política de desenvolvimento regional «se traduzir na procura de um desenvolvimento sustentado e sustentável nas regiões portuguesas, assente nos factores endógenos e inimitáveis deste território»! Santa paciência, Sr. Presidente! Nem vale a pena ler com a pontuação correcta, porque isto nem merece ser lido! O segundo parágrafo diz que a grande área de intervenção política do ano de 2008 vai ser a preparação e o acompanhamento da actual fase de transição do QCA III para o QREN. Mas isto é o contrário daquilo que o Sr.
Ministro esteve aqui a dizer! Não nos disse nada sobre transição ou preparação, mas, sim, do QREN e da sua execução em 2008.
E, sobre o QREN e a sua execução, voltemos aos números, porque este é um debate sobre o Orçamento, Sr. Ministro! Qual é a percentagem de QREN que vai usar e quais são os fundos nacionais que vão ser usados para executar a sua terceira nota de intervenção, o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais? De facto, o atraso na execução do QREN significa um atraso no crescimento do sector económico, um atraso no uso dessa alavanca, o que quer dizer que fazem a consolidação orçamental da pior forma, através da subida dos impostos e não do crescimento da economia, para a qual os senhores não contribuíram um milímetro! Foi só pela pressão fiscal e pela redução da despesa de investimento em fundos estruturais que o défice é o que é e que os parabéns lhe são devidos.
Mas o Sr. Ministro também é o «campeão» da desorçamentação. Temos falado muito, ao longo deste Orçamento, do exemplo da Estradas de Portugal, mas o caso da Águas de Portugal é tão ou mais flagrante do que o primeiro. Trata-se de uma função que, na definição que o senhor faz do plano estratégico, é do Estado, mas exercida por uma empresa que está fora do Orçamento, se bem que sob sua tutela. O que perguntamos hoje deve, contudo, reflectir-se em números e não em palavras. O Sr. Ministro é muito pródigo em palavras, mas muito parco em realizações. Nós queremos saber é das realizações! Ora, a pergunta muito simples é esta: qual é o volume financeiro que destina à execução do PEAASAR em 2008? É uma pergunta! Não é uma consideração e, por isso, não deve elaborar nem dizer «vamos agora começar a fazer»! Vai agora começar a fazer o quê, Sr. Ministro?! É para isto que vem à Assembleia da República responder! Sobre o Relatório do Orçamento do Estado e sobre as políticas de ambiente, o Sr. Ministro começou por dizer que o seu Ministério era muito vasto e, depois, falou do QREN e do programa que vai ser coordenado pelo Ministro da Economia, falou de reabilitação urbana para nos dizer que talvez em 2008 acabe o Polis e falou, no que respeita ao ambiente, apenas sobre a água e sobre essa execução do PEAASAR, a respeito da qual já lhe coloquei uma questão.
Mas o Relatório do Orçamento do Estado, à míngua de política de ambiente, tem um conjunto de proclamações das quais eu gostava de conhecer a tradução orçamental. Porque olha-se hoje para o que é distribuído e, com esta nova lógica de compartimentação das verbas por programas, é-nos retirada muita capacidade de ir à letra fina e perceber o que é que o Sr. Ministro, para lá das palavras, em que, repito, é sempre muito pródigo, quer efectivamente fazer. E, portanto, vou ter de lhe perguntar. E começo pela pág. 219 do relatório.
Diz o Sr. Ministro: «Com vista à integração de critérios ambientais nas política sectoriais implementar-se-á o diploma de transposição da directiva relativa à avaliação dos efeitos de planos e programas do ambiente.» Sr. Ministro, em termos orçamentais, qual é o peso da transposição da directiva da avaliação ambiental estratégica e o que é que o Sr. Ministro vai fazer para gastar dinheiro do orçamento com isto? Gostávamos de saber. Vai reforçar a Agência Portuguesa do Ambiente na avaliação de impacto ambiental? O que é que vai fazer? Depois, disse o Sr. Ministro: «No domínio da gestão de resíduos, em 2008 será normalizada a coincineração regular de resíduos industriais perigosos em cimenteiras, entrarão em funcionamento os dois Centros Integrados de Recuperação, Valorização e Eliminação de Resíduos Perigosos (CIRVER), serão promovidas a instalação e a entrada em funcionamento do Mercado Organizado dos Resíduos e será elaborado o Pla-
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no Estratégico de Resíduos Industriais». A menos que tenhamos aqui mais uma das faraónicas verbas de consultoria do Ministério, eu gostava de saber qual é o custo efectivo, em termos orçamentais, deste parágrafo a que o senhor dá destaque na primeira página do Relatório do Orçamento do Estado!? Sr. Presidente, volto a repetir que estou a fazer as perguntas da forma mais concreta possível, para que, face à «desigualdade de armas» de um Governo, que deve ser questionado pelo Parlamento, falar 15 minutos, e nós menos de metade, ainda assim possa resultar disto algum esclarecimento do Sr. Ministro.
Depois, diz o Sr. Ministro, sobre os sólidos urbanos, que vai ser começado a implementar o PERSU (II Plano Estratégico de Resíduos Sólidos Urbanos), através da implementação das unidades de tratamento mecânico e biológico, digestão anaeróbia e compostagem. Muito bem. Qual é, mais uma vez, a tradução financeira, em termos de comparticipação nacional e fundos comunitários, para esta medida? Por último, e a terminar esta primeira ronda de perguntas: o Sr. Presidente, começou, e bem, por dizer que falar, hoje, de ambiente é falar de alterações climáticas. Efectivamente, assim é. E, à partida, para um conjunto de reuniões internacionais, quando se tem a Presidência da Comissão Europeia, é preciso a moral política de poder «bater com a mão no peito» e não ser acusado de «ser Frei Tomás».
A verdade é que, no dia 18 de Outubro de 2007, Sr. Presidente — não foi no ano passado, nem há seis meses, foi na mesma semana! —, a Presidência portuguesa — e bem! — dinamizou um acordo sobre emissões de carbono com alguns dos mercados entre a União Europeia e alguns dos mercados voluntários dos Estados Unidos da América. Ora, no dia 18 de Outubro de 2007, nessa mesma semana, a Comissão Europeia tomou uma decisão sobre o Plano Nacional de Alocação de Licenças de Emissões (PNALE) português, Sr.
Presidente! E disse, entre outras coisas, com todas as letras, que o Estado português não tinha suporte, nem fundamento, para boa parte das medidas de redução de emissões que previa no seu programa nacional de alterações climáticas (Plano Nacional de Alterações Climáticas) e que, não estando fundamentados os recursos aos mecanismos de mercado e a capacidade interna de fazer políticas de redução de emissões — é o que diz a decisão da Comissão Europeia, Sr. Ministro, presumo que a conheça», mas se não a conhece tenho-a aqui e posso distribui-la também aos restantes grupos parlamentares. Mas, dizia eu que, não estando reunidas essas condições, a Comissão Europeia tinha de penalizar Portugal, retirando um conjunto de licenças de emissão à indústria portuguesa.
A visão transversal que este Governo tem dos problemas do ambiente é «tão notável» que o Sr. Ministro, que está sentado ao seu lado, Sr. Presidente, deu na semana passada uma entrevista «notável» a dizer: «Esse é um problema do Ministro da Economia, é um problema da economia». Repare-se: «Isso é um problema da economia«»! Este é um problema nosso! Mas o Sr. Ministro diz que não é um problema de Portugal, não é um problema de ambiente, não é um problema da indústria portuguesa, não é um problema da nossa emissão de carbono: «é um problema da economia»!...
Pois muito bem, isso até pode ser um problema da economia, mas o problema do Sr. Ministro é que é confrontado, há menos de um mês, com uma decisão da Comissão que lhe diz que um desses «fantásticos» planos que ele andou a fazer para, depois um dia mais tarde, executar, não só não está a ser executado como não está a ser executado a tempo de dar resposta.
Uma das coisas que no ano passado o Orçamento do Estado tinha previsto, e para este ano também, é o Fundo Português de Carbono. E a obrigação do Sr. Ministro, mais uma vez, é a de nos explicar em números — pode ser que, pela primeira vez, o Sr. Ministro traga um número à discussão do Orçamento do Estado — qual é efectivamente o plano de aquisição de licenças que vai ter o Fundo Português de Carbono no primeiro ano do cumprimento do Protocolo de Quioto.
Sr. Ministro, Sr. Presidente, devo dizer que a expectativa é a de sempre, mas não desistirei de procurar ouvir algumas respostas do Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, o Sr. Deputado José Eduardo Martins quer respostas e vai tê-las, quer respostas concretas com números e vai tê-los!
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Mas, em primeiro lugar, quero começar por referir que esse ar, algo desdenhoso, com que diz que se levaram três anos a fazer estratégia — e, já agora, obrigado pelos três anos, que ainda não são mas, de facto, para lá caminham — são absolutamente decisivos. E o Sr. Deputado tem obrigação de saber que documentos como estes transcendem até a relevância de um governo, porque o Sr. Deputado, quando esteve no governo aplicou — e muito bem e merece ser elogiado por isso — justamente o PEAASAR 2000-2006, que tinha sido preparado pelo governo anterior.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Mal!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Aplicou mal, aplicou com entorses, pegou no Polis de forma torta, canhestra, quase fez «borregar» esse importante Programa, mas a verdade é que pegaram nele e honraram-no e, pelo menos, no discurso político mantiveram-no.
Mas vamos, então, aos números que o Sr. Deputado quer.
Eu tenho dito, de facto, que, ainda em 2007, se vão mobilizar verbas dos fundos comunitários do QREN.
Para que o Sr. Deputado fique informado: neste momento estão já transferidos para Portugal 470 milhões de euros do QREN, que estão disponíveis para utilização e que já estão distribuídos pelas várias autoridades de gestão,»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Mas eu não perguntei isso!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » porque, como eu disse, o sistema está montado para começar a trabalhar. Mas como eu também sempre disse, e o Sr. Deputado procura contrariar»Aliás, o Sr. Deputado defendeu de tal modo outrance»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — É o senhor, não sou eu!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » a ideia de que havia atraso, que agora, apesar de toda a gente dizer o contrário, apesar de os comissários dizerem o contrário, de o Presidente da Comissão Europeia dizer o contrário, o Sr. Deputado, para não «perder a face» continua a dizer que há atraso.
Portugal ç dos primeiros países a operacionalizar o seu QREN» O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Não é nada!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » e o Sr. Deputado continua a dizer que há atrasos!
Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins.
Pois bem! Candidaturas aprovadas em 2007 — e vamos tê-las! —, podem apresentar despesas desde Janeiro de 2007. Isso é verdade!
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — E quais são?
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Em 2008, julgamos que será utilizado aproximadamente 10% do QREN. Esta é a previsão feita.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Qual é o calendário?
A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — Oiça!!
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O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — O Sr. Deputado diz também: Mas como é que isto se reflecte no orçamento?» Bom, só uma leitura desatenta do orçamento pode levar a uma pergunta desse género, porque é a própria estrutura do Orçamento do Estado que reflecte, pela primeira vez, de uma forma que me parece exemplar, a realidade do QREN.
Recordo que foram criados novos programas no PIDDAC, do programa 30 ao programa 40, portanto 11 novos programas, que cobrem, exactamente, todos os programas operacionais. A partir do acompanhamento desses programas, pode ter-se uma noção clara da forma como o QREN está a ser utilizado.
E mais: existem disposições da proposta de lei do Orçamento — algures perdidas naquele calhamaço grande, que, se o Sr. Deputado se tivesse dado ao trabalho de ler, uma vez que está interessado nestas áreas, —»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Eu li todos! O senhor é que não sabe do que está a falar!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » com certeza as teria encontrado, que são mecanismos de flexibilidade para a utilização dos dinheiros comunitários, especialmente dirigidos a esses 11 programas, 30 a 40, que estão previstos e que vão ser geridos com um enquadramento próprio de grande flexibilidade.
Mas o Sr. Deputado quer ainda mais números e nós mais números lhe damos.
O Sr. Deputado queria saber quanto de fundos comunitários,»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — O PEAASAR!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » ç que o PEAASAR vai utilizar.
Pois bem, é exactamente isso que eu, logo que localize a nota, lhe digo. É muito fácil: na ordem dos 700 milhões de euros de investimento total no quadro do Grupo Águas de Portugal (AdP), porque há investimentos nas inter-municipais e nas municipais: 600 milhões de euros, na generalidade dos sistemas, 59 milhões de euros na EPAL e 23 milhões de euros na Recilis e na Trevoeste, justamente no quadro do ENEAPAI (Estratégia Nacional para os Efluentes Agro-Pecuários e Agro-Industriais). E, já agora, a isto juntam-se 122 no quadro dos resíduos, já que veio à baila na EGF (Empresa Geral do Fomento, SA, sub-holding da AdP) e portanto, tambçm despesa das Águas de Portugal,»
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Ministro, desculpe-me mas não ouvi os números todos!
Protestos do PS.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » num total de 800 milhões de euros.
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, é só repetir os números!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Ah, os nõmeros!»
Protestos do PS.
O Sr. Presidente: — Sr.as e Srs. Deputados, peço silêncio! Peço, naturalmente, que quando alguém estiver a usar da palavra que não seja interrompido, trate-se do Sr.
Ministro ou de qualquer Sr. Deputado. E o Sr. Ministro vai responder e vai novamente replicar com os números concretos que o Sr. Deputado solicitou.
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O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — No total o Grupo Águas de Portugal vai utilizar na ordem dos 800 milhões de euros, não de fundos mas de despesa total, sendo que 680 são na área das águas e águas residuais e na ordem dos 120 na área dos resíduos.
Depois, o Sr. Deputado encontra espaço para afirmações que, desculpe que lhe diga, me parecem totalmente demagógicas, perguntando: «a avaliação ambiental estratégica, importantíssima, onde está o dinheiro para isso?» Bom, isso cita um conjunto de outras áreas.
Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins e contra-protestos do PS.
Bom, o Sr. Deputado sabe tão bem ou melhor do que eu que muitas destas tarefas, que são tarefas de magna importância no Ministério do Ambiente, são tarefas de natureza «regulatória», de natureza ordenadora e, portanto, é a estrutura da casa que as faz. O orçamento de funcionamento é normalmente quem cobre isso.
Pois bem, o orçamento de funcionamento do Ministério, total, é na ordem dos 430 milhões de euros.
Aliás, manteve-se relativamente estável, em relação a 2007, com uma grande diferença: é que, com este orçamento, apesar de ele ser estável estamos a fazer mais. E uma das coisas que estamos a fazer mais — e isto diz-lhe directamente respeito — é a saldar a dívida que encontrámos à Caixa Geral de Aposentações por parte de vários organismos deste Ministério.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Em 2005, a dívida à Caixa Geral de Aposentações era na ordem dos 10 milhões de euros, nomeadamente por parte das CCDR e do Instituto da Conservação da Natureza.
Porquê? Porque há uma lei, de 2003, que diz que esses organismos devem fazer transferências para a CGA. Qual foi a prática do governo? Fazer a lei, mas não a aplicar. Qual é a nossa prática? Aplicar, pagando as dívidas que recebemos, amortizando o passivo que recebemos de governos anteriores.
Vozes do PS: — Muito bem!
Risos do PSD.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Pela primeira vez, este ano, estão inscritas verbas para esse fim e temos vindo a fazer um esforço, num quadro que, todos sabemos, é de grande contenção, para amortizar esse passivo que nos foi legado. Está em vias de ser amortizado e este ano, pela primeira vez, há qualquer coisa como 5,4 milhões de euros inscritos para isso — além de que não existe qualquer défice nas remunerações certas e permanentes.
Quando o Sr. Deputado pergunta «Como são conduzidas essas políticas e qual a sua incidência orçamental?», pois bem, tem aqui a resposta: é com grande eficácia, através do funcionamento do Ministério, especialmente neste caso, através do seu orçamento de funcionamento.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — É demagogia!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Alterações climáticas, Sr. Deputado: ainda bem que fala dessa área,...
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Recorde-se da pergunta, Sr. Ministro!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » porque se há uma área onde este Governo se regozija pelas realizações que tem conseguido, no plano nacional e no europeu — e hoje temos pesadas responsabilidades no quadro europeu —, é precisamente a área das alterações climáticas.
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O envolvimento de Portugal no processo negocial da Conferência de Bali é intensíssimo.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — E o Orçamento do Estado de 2007?
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Fizemos aprovar, no último Conselho de Ministros do Ambiente da União Europeia, as conclusões do Conselho, dando à Presidência do Conselho da EU um mandato claro para Bali. Lançámos iniciativas novas e inovadoras como o ICAP (International Carbon Action Partnership), com relevància,»
Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins. » aliás, que ultrapassa a União Europeia, embora ponham a União Europeia na vanguarda desse processo, que foi uma realização de primeira importància, onde estiveram presentes vários ministros europeus»
Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins. Sr. Deputado, desculpe: sou eu que estou no uso da palavra ou é o Sr. Deputado? Qual de nós é que está no uso da palavra?
O Sr. Presidente: — O Sr. Ministro é que está no uso da palavra. Sr. Deputado, peço-lhe que não interrompa.
Sr. Ministro, queira prosseguir, por favor!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Muito bem, Sr. Presidente, vou então continuar.
O ICAP trouxe a Portugal governadores dos EU, governadores do Canadá, políticos da Nova Zelândia, políticos de países europeus não comunitários para lançar as bases do mercado global de carbono. Mas, em casa, também estamos a fazer o trabalho de casa. Em casa, aprovámos um PNAC (Programa Nacional para as Alterações Climáticas) revisto, e em 2008 isso vai ser aprofundado, estamos a rever e a reforçar os mecanismos de monitorização, o PNALE (Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão de CO2), que o Sr. Deputado referiu, foi aprovado pela Comissão Europeia, embora sujeito a um corte de 3%. E, já agora, dá-me a oportunidade, e agradeço-lhe por isso, de esclarecer as minhas palavras, quando digo que a questão é da Economia. O que quero dizer é que isso tem de ser discutido e visto, como é óbvio, também com a Economia.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Ah, «tambçm«»!?
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Naturalmente! E porquê? Porque, de um ponto de vista ambiental, 1 t de carbono é 1 t de carbono! Como é que se gere a repartição da carga pelos vários sectores da economia? Não tenho dúvida alguma em afirmar que o Ministério da Economia tem uma palavra a dizer. Não temos um conceito de Ministério do Ambiente prepotente, querendo como que substituir-se a um Conselho de Ministros e ditando as regras para todos. Nós harmonizamos, com cada um dos sectores, as medidas a tomar e, portanto, quando se trata de fazer cortes nas licenças de emissão e esses cortes incidem sobre o tecido produtivo é com o Ministério da Economia que o fazemos, e que o fizemos.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Nós sabemos como se faz, Sr. Ministro!»
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Está para ir a Conselho de Ministros, pelo que, a muito curto prazo, isso será clarificado.
Penso que já ultrapassei o tempo de que dispunha»
O Sr. Presidente: — E quer dizer mais alguma coisa, Sr. Ministro?
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O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Há áreas onde os Secretários de Estado me poderiam complementar, mas vou esperar, então,»
O Sr. Presidente: — Uma próxima oportunidade»
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Exactamente! Vou esperar que o assunto reapareça.
O Sr. Presidente: — Faço um apelo, neste momento, aos Srs. Deputados, para respeitarem o orador que estiver, de facto, a intervir, caso contrário instala-se a confusão e ninguém se entende. Compreendo que haja alguma emotividade, algum calor no debate, aliás, isso é saudável, mas, naturalmente, é preciso respeitar quem está no uso da palavra, de outro modo, ninguém se entende.
Como tal, solicito que doravante haja um escrupuloso respeito da organização dos trabalhos, respeitando, concretamente, quem está, de facto, a intervir.
Vamos, então, dar seguimento ao debate, para o que tem a palavra o Sr. Deputado Renato Sampaio.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — Sr. Presidente, antes de mais, quero cumprimentar os Srs. Presidentes e os Srs. Membros do Governo e dizer ao Sr. Presidente que procuraremos ser escrupulosos no uso do tempo de que dispomos e dividiremos a intervenção, por parte do Partido Socialista, em duas partes, a minha e a da Deputada Jovita Ladeira.
Começo por dizer o seguinte: o Sr. Deputado José Eduardo Martins sobre o Orçamento disse zero, limitouse a ler algumas partes do Relatório e até a invocar alguns atrasos nalgumas situações. Nós percebemos bem a invocação desses atrasos: é exactamente para encobrir a paralisia em que deixaram o Ministério do Ambiente, do qual ele era o próprio responsável, quando saíram do Governo, e inclusive o próprio QREN. A paralisia foi total e, portanto, agora, para tentar encobrir essa paralisia, o Sr. Deputado invoca permanentemente os atrasos.
Sr. Ministro, gostaria que concretizasse melhor algumas das áreas que vou abordar.
Nós percebemos que, hoje, o Ministério do Ambiente é transversal a várias políticas que têm a ver com outros Ministérios. E o que se verifica é que o bom diálogo, a boa relação que existe entre todo o Governo permite ao Ministério do Ambiente implementar um conjunto de políticas em simultâneo com outros Ministérios, nomeadamente o Ministério da Economia, o Ministério da Agricultura e o Ministério das Obras Públicas. Isto demonstra bem a transversalidade da função deste Ministério, o que, muitas vezes, não se reflecte, com clareza, nem se pode reflectir, em números, no Orçamento do Estado, porque estão políticas e não, exclusivamente, números.
Isto tem a ver, obviamente, com uma outra área, que é a do modelo para implementar um conjunto de políticas, nomeadamente o PEAASAR (Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais), através do modelo da Águas de Portugal. E por isso é que, hoje, apesar de tudo, apesar da paralisia a que, nos governos anteriores, o Ministério do Ambiente votou este programa, temos melhores índices quer no abastecimento público de água, e de água com qualidade, quer no próprio tratamento das águas residuais. Isto deve-se exactamente ao modelo da Águas de Portugal, que conseguiu implementar este projecto no terreno.
Mas há outras áreas, Sr. Ministro, como a da reabilitação urbana. Hoje percebo que a política deste Governo não é a política do subsídio, como sucedia no passado, é mais a política do incentivo a que a reabilitação urbana seja feita.
No domínio da reabilitação urbana, o Programa Polis está praticamente no fim, felizmente, conseguimos ainda, apesar de tudo, recuperar aquilo que outros paralisaram, no âmbito deste Programa, mas gostava que o Sr. Ministro abordasse a questão das sociedades de reabilitação urbana (SRU) e dos bairros críticos. E a política em relação aos bairros críticos tem também a ver com a vertente social deste Governo, que, para nós, é fundamental não só no combate à própria exclusão social mas ainda na reabilitação urbana.
Também gostaria que o Sr. Ministro nos dissesse quais são, na totalidade, os instrumentos orçamentais que o Ministério tem, nesta área da reabilitação urbana, e que são complementares à Lei das Finanças Locais, e que concretizasse melhor a questão dos incentivos.
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Como não quero ultrapassar o tempo de que dispomos, fico-me por aqui e, se o Sr. Presidente autorizar, a Deputada Jovita Ladeira colocará também uma questão ao Sr. Ministro.
O Sr. Presidente: — Tem, então, a palavra a Sr.ª Deputada Jovita Ladeira.
A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — Sr. Presidente, antes de mais, quero cumprimentar todos os presentes e centrar a minha intervenção, fundamentalmente, nas questões relacionadas com a zona costeira.
A zona costeira, por ser um recurso excepcional e precioso para o desenvolvimento do País, merece uma atenção especial.
O desafio para a zona costeira centra-se, nomeadamente, na implementação de uma gestão integrada para o litoral que consiga compatibilizar preocupações ambientais, económicas, sociais e culturais. Este Governo tem vindo a desenvolver um conjunto de instrumentos de ordenamento do território na área da zona costeira, designadamente os POOC, que revelam exactamente este caminho e esta postura, por parte deste Governo, o que não aconteceu no tempo do Governo do PSD.
Sejamos claros! O Sr. Deputado José Eduardo Martins parece já se ter ausentado da Sala — não sei se é ou não assim —, mas gostaria de sublinhar a atitude do governo do PSD, na qual ele teve responsabilidades directas: o trabalho de implementação dos POOC, que eram estratégicos para a gestão da zona costeira, foi desenvolvido até ao ano de 2002, Sr. Deputado José Eduardo Martins, mas foi interrompido, porque não houve capacidade, por parte do Programa FINISTERRA, para dar continuidade a essa tarefa, o que veio agravar, naturalmente, os problemas gravíssimos que já tínhamos na zona costeira. Isto demonstra que, efectivamente, havia muitas palavras mas poucas acções; hoje, há, porventura, menos palavras mas mais acções.
Por isso, quero sublinhar positivamente que Portugal, neste momento, conta com um conjunto de instrumentos de ordenamento do território que permite que aqui não aconteça aquilo que está a acontecer, recentemente, em Espanha. Em Espanha, e todos os que estamos aqui seguimos com atenção a problemática da zona costeira espanhola, no plano de intervenção para a zona costeira, vem referido um conjunto de intervenções e de demolições que é necessário fazer. Ora, Portugal já está mais avançado, porque tem instrumentos de ordenamento do território que não permitem a construção até 200 m da linha de costa e, mais, proíbem construções residenciais na faixa dos 500 m da linha de costa, de que, aliás, o PROT Algarve é exemplo.
Portanto, penso que este Governo e a sua política merecem um sublinhado extremamente positivo, naquilo que se refere, precisamente, à gestão criteriosa mas, acima de tudo, responsável do litoral.
Sr. Ministro, quero também dizer-lhe que foi com agrado que verifiquei que, das oito prioridades políticas para concretizar em 2008, o litoral é a primeira, com 21,4 milhões de euros. A este respeito, aproveito para lhe colocar a primeira questão, que tem a ver com o Quadro de Referência Estratégico. Naturalmente, a possibilidade de intervenção no litoral ganha um novo impulso com o Quadro de Referência Estratégico, pelo que gostaria de saber quais são os valores para o litoral que o Quadro de Referência Estratégico pode aportar.
Neste âmbito, há também um recado para o Sr. Deputado José Eduardo Martins: tenho aqui uma notícia de jornal, de 17 de Outubro, de que peço aos Serviços de Apoio às Comissões para tirarem cópia, onde se refere que a Espanha está bem mais atrasada relativamente ao QREN e que, no Porto, em Junho, Durão Barroso fez questão de saudar o País, que, pelos vistos, é Portugal, pelo facto de o QREN ter sido dos primeiros a ser aprovado, contrariando algumas vozes no seio do seu próprio partido, que é o PSD. Portanto, agradeço que seja feita uma cópia desta notícia e que a mesma seja entregue ao Sr. Deputado José Eduardo Martins.
Em segundo lugar, e porque o tempo já vai longo, gostava ainda que o Sr. Ministro falasse um pouco nos projectos integrados previstos para a zona costeira portuguesa, que conseguem compatibilizar a defesa dos valores naturais com as actividades económicas e a qualificação das frentes ribeirinhas. É que isto é determinante como «alavancador» da nossa economia.
A terceira e última pergunta, Sr. Ministro: qual é o seu pensamento sobre a possibilidade de integrar as zonas de administração portuária, militar e dos sistemas lagunares e dos estuários na gestão integrada das zonas costeiras? Qual é o seu pensamento nesta área específica?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
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O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, Srs. Deputados, agradeço as vossas questões, pois dão-me oportunidade de mencionar alguns aspectos que são particularmente importantes na leitura que se pode fazer do Orçamento do Estado para 2008 e da relevância da actividade do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Deputado Renato Sampaio pôs em evidência a natureza muito transversal que este Ministério tem e o facto de a sua política nem sempre ser uma política assumida numa perspectiva sectorial, digamos assim, de Ministério, isoladamente, e cuja consecução se reflecte, necessariamente, na articulação que faz com muitos ministérios ou, no limite, até me atreveria a dizer praticamente com todos os ministérios mas, seguramente, mais com aqueles que estão mais ligados às actividades produtivas, como a economia, a agricultura, os transportes e, naturalmente, a energia.
Bom! Esse é um dado importante, porque uma leitura transversal do Orçamento deveria ter em conta aquilo que esses ministérios também carreiam, trazem para o sector do ambiente, em termos globais. É claro que este é um exercício muito complexo, seguramente, difícil de fazer, mas que, em alguns casos, pode ser feito, nomeadamente no caso do QREN. E, para lhe dar um exemplo que me parece expressivo, o QREN obriga-nos a fazer o chamado exercício de earmarking, ou seja, todas as despesas previstas no QREN têm de estar, por assim dizer, carimbadas, se, de alguma forma, contribuem para a Estratégia de Lisboa revista, que contempla amplamente as áreas do ambiente.
Pois bem! Para lhe dar uma ordem de grandeza, em 2008, no quadro do QREN, aquilo que está previsto, de despesa total, com relevância directa para as questões do ambiente, é qualquer coisa na ordem dos 400 milhões de euros, dos quais cerca de 284 milhões de euros correspondem a FEDER (Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional). E como é que isto se distribui? Bom! Distribui-se de norte a sul do País, e por todos os ministérios, só que, aqui, o dinheiro leva como que uma espécie de carimbo, o tal earmarking, sendo, portanto, possível fazer esta leitura transversal das verbas envolvidas.
Mas há muitas outras verbas relevantes para a política do ambiente que não passam necessariamente pelo Ministério Ambiente. Para dar um exemplo eloquente, que, aliás, referi de passagem, menciono o Programa Nacional de Barragens com Elevado Potencial Hidroeléctrico. Pois bem, aqui, o Ministério do Ambiente tem um papel decisivo, porque enquanto autoridade da água, no caso concreto o Instituto da Água (INAG), tem a responsabilidade das concessões, do acompanhamento de todo o processo e da abertura dos concursos. Prevêem-se, no quadro desse Programa Nacional, investimentos entre 1000 a 2000 milhões de euros: são investimentos extraordinariamente significativos. Qual é o reflexo que têm no orçamento? Bom, reflecte-se um pouco no orçamento de funcionamento do INAG, mas não mais do que isto.
É este papel catalisador que a Administração Pública, que os serviços centrais devem ter na economia e na sociedade, que aparece aqui expresso de uma forma extraordinariamente eloquente. É a iniciativa, é o ordenamento dos mercados, dos sectores que permite, depois, a atracção de investimento privado ao serviço, naturalmente, de desígnios públicos.
Contudo, podia dar-lhe outros exemplos.
Há bocado, falei nas actividades concretas do Grupo Águas de Portugal, que prevê uma despesa total da ordem dos 800 milhões de euros, mas podia ainda falar — o Sr. Deputado pediu alguns dados — sobre as sociedades de reabilitação urbana (SRU). Pois bem, no orçamento para 2008 estão previstos 47 milhões de euros de apoio às sociedades de reabilitação urbana a ainda 27 milhões de euros para a reabilitação de bairros críticos.
Mais uma vez aqui, e nesta área, o Ministério procura ter um papel catalisador.
Devo dizer que, há alguns meses atrás, foi assinado com o Banco Europeu de Investimentos um contrato de empréstimo de 200 milhões de euros ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU), que eu próprio e o Ministro de Estado e das Finanças tivemos oportunidade de homologar, sendo que essas verbas servem para potenciar, sobretudo, a actividades das SRU. Elas servem também para a reabilitação de bairros sociais do Instituto de Gestão e Alienação do Património Habitacional do Estado (IGAPHE), mas sobretudo para potenciar a acção das SRU, porque esses empréstimos em condições absolutamente inultrapassáveis do ponto vista do seu regime financeiro podem ser passados para as SRU, para as câmaras municipais ou mesmo para investidores que façam ou que apresentem projectos relevantes nesta área.
Portanto, aqui está o Ministério a funcionar como um «pivô» que desencadeia, depois, a acção da sociedade.
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A Sr.ª Deputada Jovita Ladeira dá-me a oportunidade de me referir a uma área de grande prioridade, como, aliás, disse e bem, para o nosso Ministério, que é a área do litoral.
A Sr.ª Deputada mencionou, desde logo, alguns dos elementos mais importantes da política que prosseguimos.
Devo recordar que aí também temos um documento estratégico, que foi apresentado em finais de Dezembro de 2006, se a memória não me falha, denominado Prioridades para o Litoral 2007-2013, que é o nosso guia de orientação.
Pois bem, em primeiro lugar, referiu a implementação dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira (POOC). Atribuímos-lhes grande importância, e cada vez mais, sendo que o caso que referiu de Espanha é absolutamente eloquente. Se há uma diferença de que nos devemos regozijar é do facto de Portugal dispor de instrumentos de gestão do território, nomeadamente dos Planos de Ordenamento da Orla Costeira, que hoje, para um observador atento e imparcial, já fazem a diferença.
A nossa costa, o nosso litoral, no que diz respeito ao ordenamento das praias, aos acessos, aos equipamentos, deu passos extraordinariamente significativos. Isso foi feito em articulação com as câmaras municipais, como deve ser, mas são os POOC que organizam esse processo de requalificação do litoral.
Infelizmente, o nosso País é pródigo em fazer planos e menos pródigo em executá-los, portanto a nossa preocupação tem sido exactamente a execução, e é por aí que nos temos regido.
Falou — e bem! — em 21,4 milhões de euros de investimento previsto directamente no orçamento para intervenções na área do litoral.
Em primeiro lugar está a implementação dos POOC, dando naturalmente prioridade às situações de maior gravidade e exigência.
Na semana passada, estivemos em Ovar, onde justamente anunciámos aquilo que será já uma candidatura ao Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) para 2007. É pena que o Sr. Deputado José Eduardo Martins já não esteja presente na sala, porque esse ç o exemplo de uma candidatura já para 2007,» A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — O Sr. Deputado José Eduardo Martins gosta de fazer perguntas, mas depois não gosta de ouvir que o QREN vai ser utilizado.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » (com certeza), que vai ser utilizada para a protecção de toda a zona de Esmoriz, nomeadamente da Lagoa de Paramos ou Barrinha de Esmoriz até Sul, isto é, até à praia do Furadouro e da Cortegaça. Toda essa frente de praia vai ser reforçada com um programa já previsto no QREN.
O QREN é, de facto (atrever-me-ia a usar a expressão), generoso em termos de litoral, como não podia deixar de ser. No ambiente essa é uma área prioritária, por isso também aí fizemos um exercício de planeamento estratégico importante.
O Fundo de Coesão prevê um montante de 220 milhões de euros para utilizar na defesa da costa, a que se somam verbas do FEDER nos vários planos de ordenamento (PO) regionais, que no seu conjunto andam perto dos 300 milhões de euros de fundos comunitários, correspondendo a qualquer coisa entre 300 e 400 milhões de euros de investimento total a realizar no litoral no quadro do QREN, e a começar já em 2007, como disse, com esse caso pioneiro, no sentido de que é o primeiro, para a área de Ovar.
A Sr.ª Deputada referiu o caso de Espanha e têm vindo a lume notícias muito interessantes sobre o que aí está a acontecer. Para nós, são grandes lições,»
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Ah, pois são!...
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » porque são, mais uma vez, a confirmação de que «é melhor prevenir do que remediar».
Hoje, a Espanha prevê 5000 milhões de euros, para quê? Para demolir edifícios. Que estão onde? Isto é de abismar: estão nas praias, a menos de 100 m de linha de preia-mar.
Em Portugal, felizmente, não temos situações dessa gravidade e mesmo assim estamos empenhados em melhorar essa situação.
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Os POOC, que já referi, desempenham um papel essencial, mas atenção aos Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT). O PROT do Algarve contém, de forma muito afirmativa, a proibição da construção a menos de 500 m do litoral. Aliás, o POOC de Burgau-Vilamoura será revisto justamente para contemplar, entre outras, essa disposição do PROT.
E mais: como sabem, estão em preparação os PROT de praticamente todo o País, excepto da Área Metropolitana de Lisboa, e, naturalmente, a questão do litoral também será aí reflectida e serão aí incluídas disposições que contenham as regras de construção junto ao litoral.
Entendemos que o litoral é igualmente importante para o nosso País em termos da protecção, da conservação da natureza.
Recordo a propósito que está em curso o lançamento de áreas protegidas marinhas. Temos-lhe dado um grande impulso e constitui uma das prioridades da política de conservação da natureza. Esse é um valor ecológico, ambiental do litoral e igualmente paisagístico que não é de somenos importância.
Mas o litoral é ainda extraordinariamente importante de um ponto de vista económico (ninguém se atreveria a negá-lo), por isso existem tantas pressões sobre o litoral e é tão grande a complexidade da sua gestão.
Pois bem, entendemos lançar três grandes projectos de gestão integrada de grandes zonas do litoral (considerámos que, para já, deveriam ser três, sublinhando justamente a sua natureza, a relevância dos seus problemas, a sua exemplaridade), a que chamámos, talvez um pouco abusivamente, os «Polis do litoral».
Há três projectos em diferentes estados de desenvolvimento: em primeiro lugar, o da Ria Formosa, no Algarve — ninguém nega a importância dessa extraordinária zona, nomeadamente a importância ecológica, aliás, é um Parque Natural com tudo o que isso significa, mas também o facto de estar no centro de uma das principais zonas turísticas do País, se não a principal, no continente é seguramente a principal; em segundo lugar, o da Ria de Aveiro; em terceiro lugar, o do litoral Norte de Esposende até Caminha.
No primeiro caso, temos um plano estratégico de intervenção praticamente concluído, sendo que falta fechar o acordo com as câmaras municipais, que participaram muito no seu processo de elaboração, e partir para a acção.
No caso do litoral Norte, de Esposende até Caminha, foi uma associação de municípios que teve a iniciativa (aliás, foi estimulada por mim para o fazer) de preparar e apresentar um plano de intervenção para toda essa zona.
Há aproximadamente duas, três semanas estivemos em Viana do Castelo numa discussão informal, numa reunião de trabalho, diria assim, com as câmaras municipais, na qual se discutiu a primeira versão desse plano de intervenção para o litoral Norte.
Finalmente, no que respeita à Ria de Aveiro, está a ser a elaborado o despacho, que devo assinar hoje ou amanhã, que precederá o lançamento da preparação do plano de intervenção para a Ria de Aveiro, onde também terá lugar um desses «Polis», isto é, um desses projectos integrados para a reabilitação urbana.
O Sr. Presidente: — Agora, tem a palavra o Sr. Deputado Eugénio Rosa, que repartirá o tempo com o Sr. Deputado Miguel Tiago, do PCP.
O Sr. Eugénio Rosa (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, vou tentar entrar já nas perguntas que gostaria de colocar-lhe, mas também lhe faço um apelo para que responda concretamente.
Gostaria de colocar-lhe questões relativamente ao desenvolvimento regional, que na sua intervenção, a meu ver, mereceu pouca atenção, e ao QREN, que é o assunto a que dedicou mais tempo.
No que respeita ao desenvolvimento regional, tenho alguns dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) que me parecem extremamente importantes para esta questão, que dizem respeito ao poder de compra concelhio e uma das coisas que constato é que continuam a existir grandes desigualdades em Portugal. Por exemplo, na região mais desenvolvida e com mais poder de compra, que é naturalmente Lisboa, o poder de compra por habitante é duas vezes e meia superior ao poder de compra concelhio. Portanto, continuam a existir graves desigualdades, no que respeita às condições de vida, entre os portugueses de acordo com as regiões em que vivem.
Se cruzarmos esta informação com uma outra, que me parece que já diz respeito ao Orçamento, que é a distribuição do PIDDAC por distritos, constatamos que é precisamente nos distritos menos desenvolvidos que se verificam quebras maiores no PIDDAC. Basta dizer que entre 2005 e 2008, anos em que o orçamento foi
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apresentado pelo Governo a que o Sr. Ministro pertence, Aveiro teve uma quebra de 75%, Braga teve uma quebra de 66%, etc. Logo, nota-se que os distritos do interior, aqueles em que o poder de compra da população é mais baixo, são precisamente aqueles que merecem menor atenção da parte do Governo.
Mesmo que deixemos essa comparação e passemos a analisar a evolução da estrutura, ou seja, como é que se reparte dentro do PIDDAC, porque a outra análise poderá enfermar de algumas incorrecções, constatamos, por exemplo, que o distrito de Braga, que em 2002 recebia cerca de 6% do PIDDAC, em 2008 vai receber apenas 1,7% do PIDDAC.
Portanto, perante estes dados, a primeira conclusão que se tira é precisamente a seguinte: parece que o Governo não tem qualquer plano ou qualquer política de desenvolvimento regional com o objectivo de aproximar as condições de vida das diferentes regiões. São os números que o dizem, e as palavras não são suficientes para o desmentir.
Gostava de passar agora ao QREN, porque também em relação a ele se colocam alguns perigos de agravamento desta situação.
Como o Sr. Ministro sabe, no QREN existem três Programas Operacionais Temáticos (Factores de Competitividade, Potencial Humano e Valorização do Território), que concentram grande parte dos fundos — basta dizer que estes três grandes programas concentram cerca de 65% de todos os fundos comunitários e 72% dos fundos totais, quer nacionais quer comunitários, estando descentralizados ou regionalizados, nos cinco programas regionais, apenas 27% dos fundos comunitários.
Sr. Ministro, por um lado, em relação à maior parte dos fundos que se encontram concentrados nos programas operacionais temáticos, vai haver uma gestão centralizada — onde há descentralização, de facto, é a nível dos programas operacionais regionais — e, por outro lado, contrariamente ao que se afirma no Relatório do Orçamento, se olharmos para os objectivos estratégicos que foram definidos para esses fundos temáticos, que é onde está o «bolo» maior do QREN, constatamos que esses objectivos são: concentração de apoios, selectividade nos investimentos e sustentabilidade financeira das actuações.
Ora, a primeira questão que quero colocar-lhe, Sr. Ministro, é a seguinte: sabendo que, na estrutura empresarial portuguesa, 99,3% das empresas têm menos de 49 trabalhadores e sabendo que, de acordo com a informação que temos, os programas temáticos vão, fundamentalmente, apoiar as médias e grandes empresas e os programas regionais as micro e pequenas empresas, como é que se afirma no Relatório que 60% de todos os apoios se destinam, possivelmente, a este ramo mais numeroso das empresas? A segunda questão que lhe coloco prende-se com o facto de, muitas vezes, ter ouvido representantes do Governo dizerem que iam acabar com aquilo a que chamavam, até de forma algo acintosa, a «política do regador» — a «política do regador» é a multiplicação de pequenos apoios —, porque diziam que não era sustentável, não tinha resultados. Como é que se articula isto (o que está definido nos objectivos estratégicos) com a estrutura empresarial portuguesa? Isto não vai agravar ainda mais as desigualdades entre pequenas e grandes empresas? Não vai agravar as desigualdades entre as diferentes regiões do País? Para terminar, Sr. Ministro, gostava de dar-lhe nota de algo que é um bocado diferente da afirmação que fez. O papel das comissões de acompanhamento (quando estou fora da Assembleia da República, pertenço a uma delas, a que faz o acompanhamento do Programa Operacional de Valorização do Potencial Humano) está a ser tremendamente subvalorizado.
Vou dar-lhe um exemplo: como é que uma comissão de acompanhamento pode fazer qualquer acompanhamento através de uma reunião de três horas por ano? No regulamento interno da que faz o acompanhamento do Programa Operacional de Valorização do Potencial Humano, temos apenas prevista uma reunião por ano com a duração de três horas!!... Como é que se pode fazer assim qualquer acompanhamento?! Penso que esta foi uma orientação dada a todas as comissões de acompanhamento.
Relativamente à execução, Sr. Ministro, recordo-lhe o seguinte: o cronograma enviado para Bruxelas sobre a repartição da aplicação dos fundos comunitários pelos vários anos dava uma média de 2700 milhões de euros/ano. Em 2007, de acordo com os dados do Sr. Ministro, apenas vão ser utilizados 470 milhões de euros e, em 2008, disse o Sr. Ministro que se iria utilizar apenas 10% daquele montante. Ora, 10% corresponde a 2150 milhões de euros e está prevista uma verba de 2716 milhões de euros.
Portanto, à partida, quando ainda nem entrámos em 2008, o Sr. Ministro está a dizer que 600 milhões de euros que faziam parte do programa não vão ser utilizados. Gostava de ouvir uma resposta sua a esta questão, Sr. Ministro.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Tiago.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Sr. Presidente, tentarei ser breve.
Antes de mais, queria cumprimentar os Srs. Membros do Governo e os Deputados presentes.
Sr. Ministro, há uma questão que não podemos deixar passar em claro e que se prende com as suas últimas declarações à comunicação social — já deve estar a calcular que me refiro à privatização dos serviços de água. O Sr. Ministro anunciou várias vezes que não privatizaria uma gota de água; depois já dizia que, de baixo para cima, acabaria por privatizá-la toda; e agora começa, de facto, o ciclo das privatizações com a venda da Aquapor, na sua totalidade, a uma empresa privada.
De qualquer modo, relativamente à matéria das águas, queria deixar a seguinte questão: após ter entrado no controlo de um conjunto de sistemas, através da Águas de Portugal, sempre sob a salvaguarda de que, sendo o Estado o detentor da Águas de Portugal (da holding), não haveria a intromissão dos privados, como vai agora responder a estas autarquias, a estes sistemas quando anuncia, ao mesmo tempo, a privatização da Aquapor e a dispersão em Bolsa, para um futuro próximo, da Águas de Portugal? Aliás, o Presidente da Águas de Portugal já anunciou essa decisão do Governo, mas o Sr. Ministro diz que não é para esta Legislatura, que será, provavelmente para a próxima. Mas o PEAASAR também é bastante claro quanto à entrega do abastecimento aos privados.
Portanto, a estratégia é muito clara: é a de privatizar de baixo para cima, como dizia o Sr. Ministro, até chegar à totalidade da Águas de Portugal.
Sobre as questões da conservação e preservação da natureza, registamos que escassas ou nenhumas foram as palavras na sua intervenção inicial sobre estas matérias, apesar de esta ser uma área que o Governo também reputa de bastante importante. Contudo, o que verificamos é que, se acumularmos os cortes, nomeadamente do ICN — agora ICNB —, desde 2006 até hoje, atingimos já um total de cortes acima dos 20% no orçamento do ICNB.
A pergunta que lhe formulo, Sr. Ministro, é simples: como conciliar as necessidades e a missão do ICNB, nomeadamente no quadro da sua reestruturação, com estes cortes orçamentais e com a incapacidade manifesta e conhecida do ICNB, inclusivamente, de levar a cabo as suas tarefas mais básicas, como as do conhecimento do território, designadamente na área da cartografia? Por exemplo, continua a ser exigido às autarquias que façam a cartografia da Rede Natura 2000.
Portanto, já na altura, quando o confrontámos pela primeira vez com esta realidade, o Sr. Ministro disse que essa era uma tarefa das autarquias. Verificámos então que não é uma tarefa do ICNB a cartografia da Rede Natura 2000, que continua por fazer, tal como outra parte do cadastro nacional que é necessário para o conhecimento mínimo do território.
Para terminar, embora houvesse muito mais questões a colocar, há uma que não pode passar em claro, Sr.
Ministro: a questão do incentivo ao arrendamento por jovens, extinto pelo seu Governo — orgulhosamente extinto, ao que parece! — e substituído por um tal «Porta 65 Jovem»... A questão central é que neste momento, que medeia a entrada em vigor do Programa Porta 65 Jovem e a extinção do incentivo ao arrendamento por jovens, nada há, nada! Portanto, por agora os jovens não têm forma de candidatar-se a qualquer destes apoios, um porque foi extinto e outro porque não está em vigor.
Esta é apenas uma das questões, mas a questão maior é mesmo a do financiamento e a do valor dos apoios.
Em 2005 e em 2006, através do Ministério das Finanças, o INH dispunha de mais de 50 milhões de euros para o incentivo ao arrendamento por jovens; actualmente, está prevista uma verba de 32 milhões de euros para todas as missões do «Porta 65 Jovem», que, como sabe, não é um apoio exclusivamente para jovens, uma vez que, segundo o Governo, também terá um papel no apoio ao arrendamento urbano para outras camadas da população.
Portanto, como é que um apoio (que era de 5 anos, é certo, e agora passa para 3 anos, de forma decrescente), que contava com 52 milhões de euros só para jovens, dispõe agora de apenas 32 milhões de euros para todas as áreas que deve cobrir? Sr. Ministro, seria bom que explicasse qual vai ser, objectivamente, a diminuição concreta em cada apoio, para cada jovem. Se antes um jovem tinha direito a usufruir 250 € de apoio do Estado para o arrendamento, quanto vai ter agora? Antes esse apoio era concedido durante 5 anos, agora por quanto tempo vai ser?
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Mais até do que justificar os 52 milhões de euros ou os 32 milhões de euros, estas são as respostas que importa conhecermos.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, vou responder ao Sr. Deputado Eugénio Rosa em primeiro lugar, a quem começo por dizer que, naturalmente, partilhamos preocupações relativamente a assimetrias, assimetrias que se exprimem nos indicadores de desenvolvimento mas que, infelizmente — julgo que todos o reconheceremos —, começam na capacidade de gerar riqueza das regiões, na competitividade das regiões.
Sabe que, em toda a preparação do QREN (e eu próprio tenho participado em muitos debates, em muitas discussões onde essa questão tem sido tratada), existe uma aparente contradição, uma certa tensão entre dois desígnios muito importantes: o desígnio da competitividade e o desígnio da coesão. A nossa resposta a isso é que eles não são contraditórios. Isto é, na sociedade portuguesa actual é preciso melhorar os indicadores de coesão a partir dos indicadores de competitividade.
Quando olhamos para os 20 anos de fundos comunitários, constatamos — e julgo que todos nos devemos regozijar com isso — passos muito grandes, muito significativos nos indicadores de coesão: equipamentos, infra-estruturas, acessibilidades, banda larga em todo o território e por aí fora»
(Aparte da Deputada de Os Verdes Heloísa Apolónia inaudível na gravação).
Naqueles que são internacionalmente considerados indicadores de coesão, o País deu passos em frente — mau governo, ou excessivamente mau governo, teríamos tido se não o tivéssemos conseguido! Mas conseguimos, e devemos regozijar-nos com isso.
Qual é agora o grande estrangulamento em Portugal? É a competitividade. Mais: para progredir nos indicadores de coesão, temos de desencravar certos indicadores de competitividade.
Assim como no passado as acessibilidades foram importantíssimas para desencravar certas regiões do País, hoje a inovação, a competitividade nas empresas, a participação destas nos mercados globais e a criação não de subemprego artificial mas de emprego de qualidade, sólido, verdadeiro, competitivo são absolutamente essenciais. Ou damos estes passos de forma tão decidida quanto rasgámos auto-estradas, estradas e comunicações, fibra óptica por todo o País, ou damos passos igualmente arrojados nessas frentes, ou o nosso país não consegue ultrapassar este «gargalo»! Portanto, a competitividade é importante em si mesma no mundo de hoje, mas a competitividade é hoje também, nas condições específicas de Portugal, o grande estrangulamento para o desenvolvimento.
Dito isto, Sr. Deputado, ou, melhor, concordando consigo na preocupação, porque a partilho, as nossas diferenças começam um pouco já em termos de diagnóstico, mas aí os números são os números e, com certeza, concordaríamos muito.
Provavelmente, as nossas opiniões começarão a divergir, sim, relativamente às terapias, porque eu ponho a competitividade no centro da resolução dos problemas da coesão. Mas — atenção! — isso não significa, como em qualquer política, que ela seja absolutamente exclusiva. O que eu quero dizer é que uma política é e deve ser um conjunto equilibrado de medidas. Por isso, é que em regiões menos desenvolvidas — eu ia dizer do interior, mas a expressão é muito perigosa, muito traiçoeira, nos tempos de hoje, porque já não sabemos bem o que é o interior — ou com indicadores de desenvolvimento menores, há estímulos específicos. Este Governo tem-se empenhado em criá-los, e, seguramente, tem-nos criado, e este ministério tem procurado dar um contributo nessa frente.
Há pouco referi os sistemas de incentivos para as empresas. Os editais estarão cá fora quinta-feira. Estas são as primeiras medidas do QREN a serem operacionalizadas. Pois bem, nas candidaturas, é pesado o contributo de cada uma para a competitividade regional e para a coesão económica e social dos territórios. Portanto, estes são factores que dão prioridade, majoração e uma discriminação positiva a propostas que, dirigidas à competitividade, têm também impacto relevante directo — porque indirecto sempre terão — nestas vertentes que referi.
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Como vê, esta medida que vai agora entrar em vigor, e que é a primeira do QREN a entrar em vigor, reflecte essa preocupação.
Existem outras medidas importantes — estas, enfim, muito conduzidas, como é óbvio, pelo Ministério das Finanças — que não posso deixar de trazer a este debate.
Como sabe, hoje o IRC tem uma modulação regional, tendo condições favoráveis para regiões com indicadores de desenvolvimento menores. A taxa normal do IRC é de 20%, mas, para a fixação de novas empresas, a sua taxa é de 10%, existindo, portanto, um desconto de 50% no IRC, e para empresas já existentes nessas regiões é de menos 5%, ou seja, têm uma taxa de 15%, o que significa uma diminuição de 25% no IRC. Estas são medidas com significado e os empresários aderirão a elas.
Mas vou mais longe: o nosso ministério põe um empenho particularmente grande num programa, que já várias vezes referimos nesta Câmara, chamado Programa de Valorização Económica de Recursos Endógenos (PROVERE), que é dirigido a regiões de baixa densidade populacional e económica, que dispõem de valores próprios, valores característicos dessa região, em torno dos quais se podem desenvolver actividades económicas. Não são programas concedidos numa lógica assistencialista, meramente transferindo recursos para essas regiões, para mitigar problemas, são programas dirigidos ao desenvolvimento da economia, de uma economia que tem de ser competitiva em todas as parcelas do território, mas cujo conceito de competitividade tem de ser regionalmente diferenciado.
A competitividade das regiões interiores de Bragança não pode ser comparada com a competitividade das regiões da Grande Lisboa, mas ambas têm de ser competitivas, e é isso que esse programa procura reequilibrar.
Mas dou-lhe mais medidas. No QREN, 65% do FEDER está nos programas operacionais regionais, e jamais esse valor foi tão elevado. O FEDER, nos programas operacionais regionais das regiões de convergência, designadamente Norte, Centro e Alentejo, subiu 10%. O Programa Operacional de Lisboa e Vale do Tejo absorve apenas 2,7% dos fundos comunitários, quando no quadro comunitário anterior absorvia 15%.
Portanto, Sr. Deputado, estas são medidas que, no seu conjunto, configuram uma política de incentivo, de estímulo ao desenvolvimento, por via do aumento da competitividade e do desenvolvimento das actividades económicas destas regiões hoje menos desenvolvidas.
O Sr. Deputado criticou também a concentração dos fundos nos programas operacionais temáticos. Sr. Deputado, isso é uma leitura que acho muito simples, directa e imediata dos números, porque, repare, o que temos basicamente são três agendas nacionais: a agenda da valorização do território, a agenda dos factores de competitividade e a agenda do potencial humano. Ora, essas três agendas, que prosseguem grandes objectivos de todo o País, de todas as regiões, reflectem-se ou projectam-se nos programas operacionais temáticos e nos programas operacionais regionais, havendo uma articulação estreita entre os dois. E é tão estreita que, por exemplo, voltando ao caso dos sistemas de incentivos às empresas, que já hoje abundantemente referi, a sua gestão é feita conjuntamente pelas autoridades de gestão do programa operacional temático e dos programas operacionais regionais. É feita conjuntamente, há uma articulação, conforme a localização da empresa e uma inserção na realidade regional.
Por aqui se vê que não se pode fazer essa leitura simples, como se os programas temáticos fossem para ser utilizados pelo Governo e os regionais fossem para ser utilizados não sei bem por quem, se calhar pelas autarquias ou geridos pelas CCDR. Não é, de todo, essa a lógica e, portanto, essa leitura não pode ser feita.
Aliás, devo dizer-lhe que os programas dirigidos à competitividade das empresas são um caso típico, aparecem tanto nos regionais como no temático «factores de coesão», claramente as micro e pequenas empresas assumidamente nos regionais e as restantes, como é normal, no temático, portanto de maior amplidão.
O Sr. Deputado criticou o modelo centralista de gestão do QREN. Essa crítica é antiga e já lhe respondi várias vezes. Dá como exemplo o facto de as reuniões de acompanhamento serem — nas suas palavras — apenas uma vez por ano e de três horas. Sr. Deputado, há uma diferença entre reuniões ordinárias e reuniões extraordinárias. E se essa cláusula está escrita nos regulamentos é porque se quer que, obrigatoriamente, elas reúnam, pelo menos, uma vez por ano. Porque, a pedido, de acordo com os regulamentos estabelecidos em cada uma delas, elas podem e, naturalmente, devem reunir mais vezes, devem reunir sempre que necessário, mas, obrigatoriamente, terão de fazer um balanço anual. Obrigatoriamente! Tudo o resto é ao critério dos participantes nessas comissões de acompanhamento. Não tenha a mais pequena dúvida.
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Mas — atenção! — o acompanhamento, o envolvimento e a participação dos vários agentes económicos, da sociedade civil e, em particular, das autarquias locais não se limita, nem de longe nem de perto, a essas comissões de acompanhamento.
Recordo-lhe as comissões de aconselhamento estratégico criadas em cada uma das cinco regiões do continente, onde há participação das associações de municípios, das centrais sindicais, das associações empresariais e do mundo universitário, que são uma câmara relativamente limitada em número, para ser operacional, mas muito diversificada na sua representação, que acompanha a par e passo e tem um papel importante em vários momentos. Nomeadamente em quê? Na aprovação da contratualização.
E a contratualização é uma outra medida descentralizadora que permite às associações de municípios assumirem a gestão de fatias, de parcelas importantes dos fundos comunitários ao serviço de um projecto coeso de âmbito supra-municipal para aplicação desses fundos.
Portanto, não há centralismo, como o Sr. Deputado sugeriu, o que há é uma visão descentralizadora de natureza diferente da que vinha de trás. O que vinha de trás era uma abundante participação dos municípios em todas as decisões, com um desvio que infelizmente ocorreu (acho que todos temos de o reconhecer), a que se chamou — todos o dizem, não fui eu que o inventei — a «FEFização», em que as verbas eram distribuídas pelos municípios em função de alguns rácios e, com isso, conseguia-se a total paz social, porque não zaragateavam (desculpem-me a expressão) uns com os outros. Cada um sabia o que lhe cabia e uns construíam polidesportivos, outros rotundas, outros o que lhes apetecia, cada um era «dono» dos seus dinheiros.
Não é essa, assumidamente, a lógica do QREN.
Mas temos municípios, e temo-los com abundância. Temo-los, desde logo, nas autoridades de gestão dos regionais, onde dois dos vogais já foram indigitados pelos municípios; temo-los nas comissões de acompanhamento estratégico, onde há, pelo menos, três representantes dos municípios; temos o Presidente da Associação Nacional de Municípios a participar na Comissão Ministerial de Coordenação do QREN, que é a estrutura de topo de orientação política do QREN, onde, aliás, já participou numa reunião que teve lugar a semana passada; e temos os municípios activos na contratualização.
Portanto, temos uma grande intervenção dos municípios, ela é de tipo novo e apela sobretudo à participação a um nível supra-municipal. Por isso, essa participação, ela própria, incide sobretudo sobre as associações de municípios, constituídas no âmbito das NUTS III, com o objectivo de ir consolidando uma malha territorial estável, que é coisa que tem faltado, todos o sabemos, ao País.
Peço desculpa, Sr. Presidente, de estar a aproveitar a excelente oportunidade que o Sr. Deputado Miguel Tiago me dá para falar de alguns assuntos que me são tão caros.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A nós é que nos vão sair caros!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Quanto à privatização da água, o Sr. Deputado diz que eu disse que nem uma gota de água seria privatizada. Disse e continuo a dizer: nem uma gota de água será privatizada. Só que os senhores, desde o princípio, obstinamse — desculpe a expressão um bocadinho veemente — em fazer uma confusão entre privatizar a água e privatizar empresas que prestam serviços no domínio do abastecimento de água.
Vozes do PCP: — Ah!»
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Não é a mesma coisa! Que lamentável confusão conceptual! O domínio hídrico em Portugal é público e esse é um dos méritos da nossa legislação centenária. Tirando algumas raras excepções para águas subterrâneas ou para águas de nascente, que é menos de 1% do que está em causa, as águas, em Portugal, são públicas. E isso é assim desde o Código de 1892, para não dizer desde 1867. A lei da água de 1919 reforçou isso e eu tenho muito orgulho que a Lei da Água de 2005 e a lei da titularidade dos recursos hídricos de 2005 tenham trazido para a modernidade esse riquíssimo know-how e esse riquíssimo acervo legislativo muito próprio de Portugal.
As águas são públicas e continuarão a ser públicas; os serviços de água podem, por concessão, ser entregues a empresas privadas.
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Portanto, o que é que temos aqui em causa? Temos, de facto, a Águas de Portugal a dar um passo em frente, que julgo que deveria ser do vosso agrado, que é, justamente, passar a ocupar-se mais dos sistemas em baixa e, sobretudo, da articulação dos sistemas em alta com os sistemas em baixa. Isso obriga a novas parcerias com os municípios. O cor business da Águas de Portugal é estruturar os sistemas, fazendo parcerias entre estes dois níveis de poder, que é o poder central e o poder local. As nossas ideias são claríssimas nesta matéria e o PEAASAR reflecte-as, julgo eu, com meridiana clareza.
As águas de Portugal são públicas, não por qualquer espécie de razão algo mística, mas apenas porque são um braço empresarial da política do Governo. E isso continua a fazer sentido enquanto tal. Há muito a estruturar ainda nos sistemas em alta e na articulação entre a alta e a baixa, e a Águas de Portugal tem isso como cor business.
Neste quadro, a Águas de Portugal vai sair do mercado onde está em concorrência directa com os privados, mercado esse que vai ser alargado — digo e repito —, que é o mercado das concessões para a exploração dos sistemas. O PEAASAR prevê a possibilidade alargada de os sistemas serem entregues por concessão a privados.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A questão é nunca poderem ser públicos!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — A Aquapor e a Luságua vão ser vendidas neste quadro de política.
Portanto, há realmente uma saída desse mercado, mas há uma concentração no seu papel, que é a reestruturação dos sistemas.
Quanto à Águas de Portugal, é completamente abusivo dizer que vai haver distribuição em bolsa ou que vai haver privatização.
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Sr. Ministro é que disse que ia privatizar!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Eu não disse isso! Desculpe! Eu sei perfeitamente o que disse! O que eu disse foi que, em 2008, deveria haver um aumento de capital na Águas de Portugal, mas há muitas maneiras de o fazer. O que eu disse foi que este Governo não considerava a entrada de privados na Águas de Portugal. De facto, o Presidente da Águas de Portugal, falando sobre estas questões, disse que havia vários modelos para esse aumento de capital, sendo que um deles é o reforço dos accionistas existentes, que, recordo, são a Caixa Geral de Depósitos, a Parpública e o Tesouro; um outro seria a dispersão em Bolsa e um terceiro a busca de um parceiro privado. Estes são os modelos – a, b e c – conceptualmente possíveis para o aumento de capital da Águas de Portugal.
Isto é a lógica, vem nos livros! Porém, o que eu disse foi que este Governo não considera a entrada de privados na Águas de Portugal, embora considere o aumento do seu capital, provavelmente em 2008, o mais tardar em princípios de 2009, e isso está associado ao PEASAAR e à possibilidade de dar-lhe capacidade acrescida.
Falta responder às questões sobre a conservação da natureza e o programa Porta 65 – Jovem e estava tentado a passar a palavra ao Prof. Humberto Rosa, Secretário de Estado do Ambiente e, depois, ao Prof. João Ferrão, pedindo desculpa por esta retirada.
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente (Humberto Rosa): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, quero referir alguns aspectos sobre conservação da natureza.
Primeiro, quanto ao orçamento do ICN, entre 2001 e 2005, baixou de 11,9 milhões de euros para 8,4 milhões de euros; de 2005 a 2008 subiu de 8,4 milhões de euros para 14,4 milhões de euros. Estou a falar do orçamento total. Em particular é a primeira vez que estamos perante um orçamento de funcionamento que corresponde aos gastos efectivos e que, como o Sr. Ministro já referiu, supre a dívidas à Caixa Geral de Aposentações.
Relativamente ao que o Sr. Deputado disse sobre reestruturação, o nosso ponto de vista é que esta é um passo fundamental para poder suprir as dificuldades de funcionamento que referiu. Temos em vista esse suprimento e, por isso mesmo, e para dar-lhe um exemplo, encontrará no orçamento do ICNB para o ano que
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entra um investimento significativo, de cerca de 450 000 euros, na modernização dos sistemas de informação interna, que é vital perante uma nova estrutura organizativa para se poder chegar ao efeito. Portanto, sabemos que a reestruturação em si não supriu todas as carências mas dá efectivamente um contributo relevante.
Se o Sr. Presidente me permite, gostaria de acrescentar algo sobre alterações climáticas, apesar de já não ser em resposta à última intervenção.
Face à premência que a matéria efectivamente tem hoje quero só referir que encontrámos um Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão de CO2 (PNALE I) com licenças a mais, dando mais às indústrias do que elas necessitavam; encontrámos um Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC 2004) com um défice de 7,4 milhões de toneladas. Revimo-lo e baixámos o défice para 3,7 milhões de toneladas, e com as novas medidas que o Primeiro-Ministro anunciou nesta Casa em Janeiro de 2007 reduzimos ainda mais cerca de 1 megatonelada. Portanto, não temos hoje um défice nulo, mas quanto a mecanismos de flexibilidade encontrámos, aí, sim, o zero.
Encontrámos a falta da autoridade nacional designada para o efeito. Não havia qualquer fundo português de carbono e hoje temos um Fundo Português de Carbono, com 250 milhões de euros. Portanto, se há algo em que estamos muito confortáveis é em estar a presidir à União Europeia no momento da Conferência de Bali.
Sentimo-nos particularmente robustos para esse efeito e o exemplo da nossa política em energias renováveis e na ambição dessas metas é, aliás, reconhecido e referido. Queria referir isto face à importância que tem a matéria no momento actual.
O Sr. Presidente: — Tem agora a palavra o Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades, a quem peço brevidade na resposta.
O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades (João Ferrão): — Serei rapidíssimo, Sr. Presidente.
Sobre o Porta 65 — Jovem gostaria de dar quatro informações.
Em primeiro lugar, a respectiva portaria está para publicação no Diário da República; em segundo lugar, o portal do IRHU está pronto e o respectivo formulário será publicado no mesmo número do Diário da República; em terceiro lugar, no dia 3 de Dezembro abrirão as candidaturas para o Porta 65; e, finalmente, gostaria de dizer que no Orçamento do Estado para 2008 está inscrita uma verba de 38,8 milhões de euros que servirá de base ao Porta 65 — Jovem.
Como sabe o Sr. Deputado, tivemos ocasião de discutir isso na Assembleia, em Plenário, e também em comissão. O programa de Incentivo ao Arrendamento Jovem (IAJ), tal como estava configurado, tinha alguns aspectos negativos, errados do ponto de vista da gestão e do ponto de vista do universo de apoio e, portanto, cremos que este programa é mais justo, mais selectivo e mais focalizado, o que significa que esta verba é suficiente para cumprir a sua missão.
Sr. Deputado, a comparação profunda entre o que significa o Porta 65 e o IAJ demora algum tempo, mas estamos totalmente disponíveis para vir aqui explicar qual é a nossa visão, qual é a nossa perspectiva, o que significa esta mudança e o que esperamos dela.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro, do CDS-PP, para colocar as suas questões.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, este Orçamento do Estado para 2008 é fundamental. Estamos a mais de metade do mandato e este instrumento permite fazer um balanço quer da execução, até ao momento, por parte do Governo quer daquilo que se perspectiva para o futuro.
Sabemos que, em relação ao Ministério do Ambiente, devemos estar sempre preocupados com prazos e com a execução do orçamento. Vemos muitas vezes a expressão, no Relatório do Orçamento e nos documentos de apresentação, de criação de mais observatórios, de reprogramações e de derrapagens que vão sucedendo neste Ministério. Por isso, estamos preocupados com o estado do ambiente e com o funcionamento do Ministério do Ambiente.
Há um aspecto que também nos deixa particularmente intrigados. É que este orçamento do Ministério do Ambiente é um documento muito opaco.
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O documento de apresentação que o Sr. Ministro fez questão de nos distribuir, de acordo com aquilo a que é obrigado, ao contrário de esclarecer-nos, acaba, muitas vezes, por deixar-nos exactamente na mesma, na medida em que o Orçamento do Estado em matéria de ambiente não traduz a realidade daquilo que se passa em termos do trabalho que deve ser feito nesta área. Isto porque hoje já percebemos que há não sei quantos milhões de euros para o grupo das empresas que estão na dependência da tutela do Sr. Ministro e achamos sempre que essa informação — e já em discussões de Orçamentos anteriores eu tinha dito isto — deve ser disponibilizada por V. Ex.ª juntamente com o documento de apresentação. Não fazendo parte do Orçamento do Estado, pelo menos com o documento de apresentação deveria ser dada essa informação aos grupos parlamentares.
Mas, das informações disponíveis, aquilo que nos leva logo a ficarmos preocupados é um documento resultado da análise da Unidade Técnica de Apoio Orçamental ao orçamento do Ministério do Ambiente, que nos revela que este Ministério tem a mais baixa taxa de execução do Governo, estando cinco pontos percentuais abaixo do ministério a seguir ao Ministério do Ambiente, que tem uma taxa de execução de pouco mais de 50%. Ou seja, o Sr. Ministro pode ter retirado o casaco, pode ter ficado em mangas de camisa, mas não foi pelo trabalho realizado. No fundo, o Ministério do Ambiente apenas trabalhou pouco mais de seis meses no ano de 2007, e é isso que este documento acaba por revelar. Estamos a falar, ao terceiro trimestre de 2007, de uma taxa de execução de pouco mais de 50%.
Por outro lado, aquilo que constatamos é que, entre 2007 e 2008, o Ministério do Ambiente tem um corte no investimento de mais de 13%. E estamos a falar de um corte na actividade mais importante na matéria de ambiente, que é o investimento. Isto também consta da análise preliminar feita pela Unidade Técnica de Apoio Orçamental. Ou seja, temos um corte de investimento e temos um aumento de 24,6% nas despesas de funcionamento. Sabemos que, em relação às despesas de funcionamento, tal se deve à incorporação do Fundo Português de Carbono, sendo certo que aqui há uma matéria que me deixa também intrigado, Sr. Ministro.
O Fundo Português de Carbono, como é dito no relatório do Orçamento do Estado para 2008, traduz-se no valor global de 26 milhões de euros. E diz-se ainda que também se incluiu o comité executivo da Comissão para as Alterações Climáticas, no valor de 0,4 milhões de euros, o que, somando, dá 26,4 milhões de euros.
Ora, o aumento da despesa com o funcionamento normal, de 2007 para 2008, e comparando o quadro que consta do Relatório do Orçamento do Estado, é de 22,8. Significa isto que estamos também a falar de uma diminuição com as despesas de funcionamento, o que é de saudar; porém, resta saber em que é que isso vai afectar a eficiência do Ministério do Ambiente, que tem vindo a sofrer cortes atrás de cortes ao longo dos últimos anos.
Por outro lado, não deixo de ficar intrigado também, olhando para a mesma página do Relatório do Orçamento do Estado, a pág. 223, terceiro parágrafo, que se diga que se distinguem no âmbito do orçamento do Ministério do Ambiente os valores adstritos ao Programa 19 – Ambiente e Ordenamento do Território, cujo valor global é de 128,3 milhões de euros. E dentro deste programa destaca-se a Medida 10, relativa ao ambiente e recursos naturais, com um montante de 46,1 milhões de euros.
Ora, estive a consultar o PIDDAC e constatei, em relação à taxa de execução, que no ambiente e recursos naturais temos uma taxa de execução de apenas 43,91% relativamente ao ano de 2003, e que no ordenamento do território estamos a falar de 4,36% de taxa de execução até este momento, sendo certo que, no que diz respeito ao ambiente e recursos naturais, Medida 10 do PIDDAC, o que consta lá é uma verba de 5,571 milhões de euros.
Portanto, Sr. Ministro, quando digo que este orçamento é opaco é porque, muitas vezes, é incompreensível.
É que quando o Relatório nos diz que estão 46,1 milhões de euros, na Medida 10 — e admito que existam verbas relativamente ao QREN repartidas pelas novas medidas, pelas Medidas 30, 31, 32, 33, até 39 e 40, portanto, admito que estejam aí verbas relativamente ao ambiente e recursos naturais — não estão 46 milhões de euros mas, sim, 5 milhões de euros. E, portanto, convém que, pelo menos, o Relatório jogue certo com aquilo que depois consta do PIDDAC. Sr. Ministro, penso que isto merece uma explicação.
Por outro lado, no que diz respeito às questões do litoral, Sr. Ministro, é um pouco cansativo, documento após documento de explicação em relação ao orçamento, lermos as mesmas frases.
Chamo a atenção para o segundo parágrafo da pág. 5 deste documento, que diz que «durante o ano de 2007 os investimentos foram executados em cumprimento desta decisão, tendo sido canalizados para as intervenções consideradas prioritárias, sem prejuízo de se terem atendido a situações de emergência». Mas, Sr.
Ministro, no parágrafo anterior, aquilo que se admite é que no âmbito deste trabalho foram identificadas priori-
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dades de actuação, o que implicou a reprogramação dos planos de execução dos planos de ordenamento da orla costeira (POOC). Portanto, continuamos a ter os planos de execução, os planos de ordenamento da orla costeira atrasados, com a expressão de «reprogramação» que consta, ano após ano, nos documentos de apresentação do seu ministério.
Por outro lado, falámos daquilo que são as competências do Ministério mas importava que o Sr. Ministro trouxesse aqui aquilo que é o investimento do Grupo Águas de Portugal, porque achamos que é importante que seja explicitado nesta Assembleia, conforme eu disse. Mas o que é um facto, Sr. Ministro, é que a internacionalização desse grupo trouxe um prejuízo de quase 54 milhões de euros, no ano de 2006. E no total do grupo estamos a falar em prejuízos de quase 33 milhões de euros. É por isso que, neste momento, se fala em subidas do preço da água de cerca de 8%.
Em relação aos resíduos, Sr. Ministro, olhando mais uma vez para o PIDDAC, estamos a falar numa execução da ordem dos 60%, sendo-nos dito que vamos finalmente saber quanto é que vai ser o pagamento de resíduos. Sr. Ministro, no âmbito do Orçamento do Estado, era importante que algo nos fosse dito sobre esta matéria, sob pena de continuarmos com a opacidade e a desorçamentação neste Ministério e não conseguirmos discutir política de ambiente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Ministro, para responder.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, o Sr. Deputado António Carlos Monteiro leva-nos ao mundo dos números puros e duros do Orçamento. E ainda bem, porque isso é importante numa discussão deste tipo.
Mas o que evidentemente nos causa surpresa são os números que cita e a forma como o faz, a forma como os apresenta.
O Sr. Deputado faz muitas considerações sobre a taxa de execução e diz que ela é a mais baixa, com uma diferença de 5 pontos para a seguinte.
Pois bem, Sr. Deputado, essa taxa de execução do PIDDAC prevista para 2007 é de 77,5%. Mas chamolhe a atenção para que a execução em receitas gerais, que é aquilo que mais depende da boa gestão, porque relativamente às outras componentes há uma volatilidade muito grande – relativamente ao desenvolvimento de projectos comunitários, ao prosseguimento das candidaturas, ou a outros projectos que resultam de outras fontes financeiras, pelo que são as dotações directas do Orçamento do Estado, as receitas gerais que são relevantes –, em 2007, tem uma realização de 99,62%. Se está 5% a baixo quer dizer que os outros terão uma execução de 104, o que não é impossível mas duvido que seja o caso.
Em 2006, esse valor foi de 62,4 %, no PIDDAC global, portanto, aumentou de 62,4 para 77,5%, e em receitas gerias aumentou de 86,8 para 99,62%.
Estamos, portanto, a andar no bom caminho. Estes são os números oficiais do Governo. Aliás, sabe que as taxas de execução dependem do facto de os seus números serem de Junho ou de Setembro, ou se são previsão para Dezembro, dependendo ainda se é em relação à dotação inicial ou considerando cativações. Há mil maneiras de fazer as contas, mas a única forma correcta de as fazer é esta que lhe disse.
A previsão do orçamento de funcionamento, em receitas gerais, em 2007, é de 100%, e estamos nesse caminho. Aí não é de 105% ou 120% porque, infelizmente não dispomos desse dinheiro. Relativamente a outras fontes é de 98%.
Portanto, o tema que traz é importante mas, francamente, os seus números merecem-me as maiores dúvidas. Devem reportar-se a momentos ou a forma de fazer as contas seguramente menos correctos.
Mas há outros indicadores importantes e positivos. Recordo, por exemplo, que uma das estratégias do ministério para assegurar a sua sustentabilidade a longo prazo é o aumento da cobertura por receitas próprias: os serviços integrados aumentaram 16,7% a cobertura por receitas próprias e os fundos e serviços autónomos aumentaram 14% a sua cobertura por receitas próprias.
Uma componente que costuma preocupar muito os Srs. Deputados do sector à direita deste Parlamento é a das despesas com pessoal. Pois bem, as despesas com pessoal eram 20,9 % da despesa total consolidada e no orçamento para 2008 passam para 19,8%. Portanto, há uma redução das despesas com pessoal, apesar das responsabilidades e das tarefas do perímetro de actuação do Ministério serem cada vez maiores.
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O Sr. Deputado faz também considerações lastimando que a informação sobre os orçamentos das empresas não esteja aqui. Sr. Deputado, em qualquer país da Europa e do mundo, evidentemente, existe um sector administrativo do Estado e um sector empresarial que não faz parte da lógica do orçamento. A nossa disponibilidade é total, diria até que teremos gosto em vir aqui trocar impressões sobre os planos de investimento e os orçamentos da Águas de Portugal, da EGF, da Parque Expo e os seus sucessos no mercado internacional, nomeadamente. Temos muito gosto em vir discutir isso aqui, mas tal não faz parte desta discussão e, portanto, rouba-nos tempo à nossa agenda.
Finalmente, quando o Sr. Deputado desce dos números, que por sua vez já me parecem controversos, para questões de política de ambiente fico um pouco perplexo.
Ainda a propósito das empresas, refere os prejuízos da internacionalização. O que é que estamos a fazer? Estamos justamente a rever a estratégia de internacionalização. Fala em grandes perdas, de milhões de euros.
Em que anos é que elas ocorreram? Sabe quando foram as maiores perdas que referiu? Foram nos governos onde o seu partido esteve integrado! Devia corar de vergonha ao referir esses números! Protestos do Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
A situação da Electra, que se agravou drasticamente entre 2002 e 2005, foi agora resolvida com muito esforço e muita diplomacia. A presença da Águas de Portugal no Brasil, que agravou muitíssimo o seu défice nos anos que referiu, está agora em vias de resolução. Estamos a rever esses sectores e são grandes sucessos da política deste Governo.
Risos do PSD e do CDS-PP.
Isto só mostra que se impõe um debate sobre esse tema. Há falta de conhecimento e, portanto, impõe-se um debate sobre este tema.
Sr. Presidente, em nome da economia do tempo, fico por aqui.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo, do BE.
Solicito aos Srs. Deputados alguma contenção nas reacções porque a falta de serenidade naturalmente que perturba o discernimento e a eficácia do debate.
Tem a palavra, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: Sr. Ministro, deixeme começar por dizer que está há mais de 2 anos em exercício e isso significa que tudo o que são argumentos de justificação com os erros e com a inoperância do governo das direitas hoje já não serve de desculpa para aquilo que é algum jogo de enganos e ocultação que se tem vindo a tentar fazer ao longo deste debate.
Portanto, vamos clarificar as coisas e vamos tratar daquilo que são os problemas tal como eles se apresentam.
O Sr. Secretário de Estado Humberto Rosa falou aqui daquilo que têm sido as dotações orçamentais para o Instituto de Conservação da Natureza e não sei se o Sr. Secretário de Estado, eventualmente, quererá trocar de óculos comigo. Se calhar, valeria a pena! Na verdade, onde o Sr. Secretário de Estado vê aumentos, devo dizer-lhe que vejo diminuição! Quando o Orçamento de Estado para 2008 contempla o ICNB com um aumento de 1,4%, face a 2007, e o mesmo Orçamento prevê uma taxa de inflação que é o dobro, deixe-me dizer que aumentar a dotação do Instituto em cerca de metade daquela que é a taxa de inflação não é um aumento, é uma diminuição. Sejamos claros em relação às matérias.
Da mesma maneira, em relação à resposta do Sr. Secretário de estado João Ferrão, lamento muito mas não se pode refugiar nos 38,8 milhões de euros que neste Orçamento são destinados ao arrendamento, porque estes 38,8 milhões de euros são para dois níveis de intervenção: os subsídios do NRAU e o Porta 65.
Portanto, não pode dizer que estes 38,8 milhões de euros são para o incentivo ao arrendamento jovem, porque não são. São para o arrendamento jovem e são para o NRAU, sendo que hoje podemos fazer a avaliação – aliás, isso sobressai das vossas intervenções – e verificar que aquilo que o Governo prometia como a grande solução para o relançamento do mercado do arrendamento não é verdade.
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O NRAU foi um falhanço absoluto, não correspondeu às necessidades de incentivo ao arrendamento. Aliás, não é por acaso que com aquilo que está previsto na proposta de lei do Orçamento de Estado para o incentivo à reabilitação urbana se tenta mais uma vez dar alguma dinâmica ao arrendamento, ao NRAU.
Mas, na verdade, aquilo que acontece é que o valor das rendas, hoje, é altamente desadequado em relação à capacidade das pessoas, sejam elas jovens ou não, para resolverem os seus problemas de habitação no mercado do arrendamento.
Portanto, aqui coloca-se um problema e uma questão a que o Sr. Ministro tem de dar resposta: como é que vai conseguir produzir incentivos aos proprietários no sentido de obter uma maior dinâmica e um abaixamento da especulação com o valor das rendas? Sr. Ministro, só quem estiver cego é que não vê o que é a especulação que se faz com imóveis nos centros urbanos de todo o país, com valores de rendas absolutamente desajustados e escandalosos face àquele que é o rendimento médio dos agregados familiares.
Assim, o Governo, o Estado tem de ter aqui uma intervenção ao nível da contenção deste valor das rendas máximas. Aliás, o decreto-lei que se destina justamente à regulamentação do Porta 65 apresenta como uma das condições o valor da renda máxima admitida. Só que, Sr. Secretário de Estado, como é que se vai obter esta ideia do que é a renda máxima admitida e que incentivos é que o Governo prevê neste campo? Não existe uma única ideia.
O BE vai apresentar propostas neste campo que têm a ver como um maior agravamento do IMI para os prédios devolutos – mais do que já contemplado, porque aquilo que está contemplado de agravamento em sede de IMI provou ser totalmente ineficaz – e prevendo incentivos ao nível daqueles que são os impostos directos para os proprietários que admitam baixar as suas rendas para valores abaixo dos valores de mercado.
Gostaria que o Governo se pronunciasse sobre estas propostas porque elas são centrais ao nível da necessidade de resolver o problema do alojamento, que é um dos maiores problemas para a população do nosso país.
Depois, sobre as questões relativas à água, devo dizer que tenho na minha mão o último relatório do IRAR, no qual se chega à conclusão que em 120 concelhos de Portugal continental e da Região Autónoma dos Açores se registaram percentagens de incumprimento dos valores paramétricos superiores à média nacional. A conclusão que se retira daqui é que a qualidade da água que está a ser abastecida para consumo doméstico fica abaixo daqueles que são os valores de qualidade exigidos pela legislação europeia e pela legislação nacional. E este, Sr. Ministro, é o resultado da sua política.
O Sr. Ministro, com a sua extraordinária candura, diz: «mas a água é património público, são as empresas que são concessionadas a privados», como se isto não tivesse a menor importância! Sr. Ministro, entre a água e o ar existe uma diferença central. Em relação ao ar, o Sr. Ministro expande os seus pulmões e respira livremente o ar com a qualidade que lhe for oferecida. Porém, quanto à água, é necessário ter uma empresa, ter uma recolha, ter canalizações e tratar essa água. Portanto, falar da água enquanto património público e distinguir isto do que é a concessão a uma empresa é brincar com as pessoas – e não vale brincar com as pessoas.
O resultado da privatização é que a água fornecida apresenta parâmetros de má qualidade, como, aliás, as nossas bacias hidrográficas apresentam também má qualidade.
Nesse sentido, Sr. Ministro, gostaria que fosse muito claro em relação ao que está previsto no Orçamento do Estado para a despoluição dos nossos rios. O IRAR justifica-se com o facto de a água ser recolhida em águas superficiais e com a má qualidade da água disponível nas nossas bacias hidrográficas e nas albufeiras, pelo que há que ter um programa exaustivo de despoluição das bacias hidrográficas neste país. Não o encontramos no Orçamento do Estado.
Na verdade, rios que são vitais e que se situam em zonas estratégicas, do ponto de vista da disponibilidade de recurso à água no nosso país, apresentam indicadores de poluição muito elevados. Falo-lhe da bacia hidrográfica do Douro, da bacia hidrográfica do Ave, da bacia hidrográfica do Cávado. Não existe um projecto, neste plano de investimentos do Estado, para a despoluição destas bacias hidrográficas, Sr. Ministro. Gostaria que me respondesse muito claramente sobre esta matéria.
Finalmente, quanto ao QREN, há uma questão sobre a qual o Sr. Ministro deve ser muito claro. Já foram aqui colocadas as matérias que têm a ver com a necessidade de contrariar este processo de diferenciação de desenvolvimento regional no nosso país. Na verdade, neste Orçamento do Estado, a forma do Governo contrariar as desigualdades de desenvolvimento regional é através de sistemas de incentivos às empresas. O Sr.
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Ministro já o reiterou aqui, hoje, e é isso mesmo! É verdade! É o que está no Orçamento do Estado! Simplesmente, esse não é o papel do Governo: um governo que se limita a transferir para a capacidade dinâmica das empresas a resolução dos problemas de carência de desenvolvimento nas regiões mais pobres do País está a demitir-se da sua função.
O Sr. Ministro tem na sua mão um instrumento político central, recentemente aprovado: o Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT). Um dos objectivos deste programa releva para uma das matérias que é central para a promoção do desenvolvimento regional. Trata-se, de acordo com o PNPOT, de «concluir e executar o Plano Director da Rede Ferroviária Nacional, articulando as soluções de alta velocidade nas deslocações internacionais com a concretização de um plano para a rede convencional, reforçando a interoperabilidade, segundo padrões europeus, com destaque para a migração de bitola, eliminando os estrangulamentos à circulação».
Este é o caminho, Sr. Ministro. Sabe tão bem com eu que promover o desenvolvimento económico das regiões do interior significa resolver dois problemas: o problema da energia e o problema dos transportes e das acessibilidades.
No entanto, Sr. Ministro, quando olhamos para o Programa 31, que é o Programa Operacional Temático Valorização do Território, verificamos que a Medida 1, que se destina às redes e equipamentos estruturantes nacionais, está a zero, não tem uma única proposta. Pergunto-lhe: como é que vive um Ministro que é responsável por um Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território com a ausência absoluta, do ponto de vista da previsão orçamental, numa área da sua responsabilidade, o QREN, de uma das prioridades nessa matéria? Temos outras questões para lhe colocar, mas podem ficar para uma segunda ronda de perguntas.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, Sr.ª Deputada Alda Macedo, como é evidente, algumas das questões colocadas já foram, de certo modo, tratadas ou abordadas antes e, portanto, vou procurar ser bastante sintético.
Em relação às medidas que a Sr.ª Deputada refere para melhorar os processos de requalificação, consideramos que o problema da requalificação urbana é de primeira importância. Temos uma visão da requalificação urbana que não se limita a uma mera dimensão física da qualificação dos edifícios, do edificado, mas engloba também a revitalização das cidades, a regeneração do tecido económico, a vivência social das cidades e, portanto, todas as propostas que queira apresentar serão por nós vistas com muita atenção.
Chamo-lhe a atenção, no entanto, que o IMI é uma receita municipal, é um imposto cobrado pelos municípios e, portanto, é preciso ser muito prudente quando se mexe no IMI, porque a incidência que isso tem ultrapassa muito o sector a que se aplicam essas modulações ou essas alterações. Vai agravar as taxas ou vai beneficiar as taxas? Atenção que isso pode ter implicações muito grandes na receita municipal.
É claro que não partilho de algumas das suas observações relativamente à execução da lei das rendas e, especialmente, ao impulso que este pacote de reabilitação urbana pode trazer à dinamização do processo de actualização das rendas e de requalificação dos edifícios.
Passando, agora, ao tema da qualidade de água, a forma como a Sr.ª Deputada lê o relatório do IRAR é absolutamente extraordinária, é absolutamente surpreendente!
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — É o que está escrito!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Está escrito isso e está escrito muito mais, mas aquilo que a Sr.ª Deputada selecciona é absolutamente espantoso! E devo dizer-lhe que não é a primeira a fazê-lo, porque a comunicação social e algumas associações de defesa do ambiente fizeram disso uma leitura que considerei espantosa. Há aquela velha rábula do copo meio cheio e do copo meio vazio. Pois bem, agora inventou-se o copo 98% cheio ou 2% vazio. E «cai o Carmo e a Trindade», porque o copo está 2% vazio — é nesse registo que esse tipo de posições estão.
A Sr.ª Deputada diz que 120 concelhos têm percentagens superiores à média nacional. E qual é a média nacional? A média nacional é muito razoável, jamais foi tão boa. Desceu muito ligeiramente, julgo que na
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ordem das duas ou três décimas relativamente ao Censo anterior, ao relatório anterior. E porquê? Porque se alargou a cobertura a todo o território nacional, cumprindo as directivas sobre qualidade da água. Fez-se aquilo que cabe fazer, que é cobrir todo o território nacional, incluindo os pequenos sistemas. Ora, os pequenos sistemas, os que servem 500 habitantes, 100 habitantes,»
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Têm todo o direito à qualidade da água!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Têm todo o direito! Esse é o nosso projecto. É um grande projecto de coesão nacional, em termos de qualidade de água. Tenho-o dito muitas vezes. Mas, como sabe, é inegável, esses são os sistemas que têm maior precariedade, que têm menos condições, que tradicionalmente são mais incipientes nos seus procedimentos. Portanto, o alargamento a esses pequenos sistemas, aumentando a cobertura nacional, fez descer a média nacional em duas décimas.
Quando diz que 120 concelhos têm percentagens de incumprimento superiores à média e estamos a falar de 278, quer dizer que 158 concelhos têm valores melhores que a média. Regozijo-me disso, porque, mesmo os que estão acima da média não quer dizer que estejam em situação de infracção. É por isso que essa leitura que faz é surpreendente: o copo está 99,8% cheio, mas a Sr.ª Deputada está preocupada, porque ele está 0,2% vazio. Olhe, eu quero fazer melhor, mas estou satisfeito.
Referiu a má qualidade da água nas bacias e nas albufeiras. Sim, é verdade, o País tem problemas acumulados ao longo do tempo de poluição dos seus rios. As situações têm vindo a ser melhoradas, os investimentos que se fazem, nomeadamente no tratamento das águas residuais, têm tido um impacto muito grande e muito forte. O número muito alto de bandeiras azuis que o litoral português tem reflecte, precisamente, as melhorias no tratamento das águas residuais.
Neste momento, há zonas que ainda não estão cobertas, há sistemas em baixa que não estão a funcionar como devem. Daí o Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais (PEAASAR) colocar a prioridade na articulação dos sistemas em baixa com os sistemas em alta.
Uma componente à qual atribuo, e sempre atribuí, grande importância é a dos efluentes da agro-pecuária e da agro-indústria que, neste momento, são os que estão menos contemplados, menos circunscritos (para usar a linguagem dos incêndios) do que os outros problemas de poluição ambiental. A dimensão municipal, doméstica, urbana está em grande progresso, como todos temos de reconhecer. Nos últimos anos, os níveis de atendimento melhoraram muitíssimo. É um grande êxito nacional, atravessa vários governos, regozijemo-nos disso.
No que diz respeito à componente industrial, há hoje uma malha de licenciamento e de fiscalização que precisa de ser muito melhorada, mas tem vindo, de facto, a melhorar. A implementação da Directiva PCIP (Prevenção e Controlo Integrado da Poluição) vai trazer valor acrescentado para os grandes estabelecimentos industriais e para os outros, a instalação das ARH (administrações de recursos hídricos) vai trazer uma malha de jurisdição sobre as empresas industriais, que julgo que está a melhorar. Portanto, a derivada é positiva.
Onde é que a derivada não tem sido positiva? Nas suiniculturas, nas vacarias, nos lagares de azeite, nessa vertente agro-industrial e agro-pecuária que está mais desacompanhada e onde se impõe definir linhas de rumo.
Por isso, a Estratégia Nacional para os Efluentes Agro-Pecuários e Agro-Industriais (ENEAPAI), os tais documentos estratégicos que alguns tanto desprezam, dá-nos uma visão clara do País e diz-nos o que devemos fazer no QREN. Há verbas para isso. Vamos lançar mãos à obra já em 2008, como há bocado acabei de dizer.
A propósito, recordo que os Planos de Gestão de Bacia Hidrográfica estão a iniciar a sua elaboração. Eles são um requisito da Directiva Quadro da Água. Para Portugal, funcionam como a segunda geração de planos de bacia, agora na malha estabelecida pela directiva comunitária. E encontra-se dinheiro no Orçamento para isso, nomeadamente no orçamento do INAG e nos orçamentos das CCDR (comissões de coordenação e desenvolvimento regional). Parte desse dinheiro será transferido para as ARH, durante o ano de 2008, o que também previsto.
O grande erro da Sr.ª Deputada é quando diz que o Governo se limita a transferir para as empresas uma estratégia de desenvolvimento regional. Se tirar a palavra «limita», a frase fica menos errada.
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De facto, as empresas têm um papel importante. Portugal, todos o dizem, precisa de criar emprego. Há emprego e emprego e há um elemento muito importante que é a qualidade do emprego. Assim, Portugal precisa de criar emprego de qualidade e as empresas são insubstituíveis nesse processo. As empresas são insubstituíveis nos processos de convergência, de coesão, de desenvolvimento económico e social.
A competitividade das empresas e das regiões é essencial, tem de ser alargada a todo o País. Pensar de outra maneira é ter uma visão assistencial do desenvolvimento regional, que esperava que, em 2007, o Bloco de Esquerda, que se arroga de ser uma esquerda moderna, já não tivesse. Mostra-se, assim, menos moderno que o próprio PCP, que, talvez por ter os pés mais assentes na terra por via da sua representação autárquica, ou, quem sabe, sindical, tem uma visão mais pragmática dos problemas e sabe que é pelo desenvolvimento económico, pelo reforço do tecido empresarial que se criam condições de suporte ao desenvolvimento.
O Sr. Presidente: — Para uma última pergunta nesta primeira ronda, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, quero, em nome do Grupo Parlamentar «Os Verdes», cumprimentar o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado.
Tenho ouvido as questões que foram colocadas e as respostas que o Sr. Ministro tem dado. Algumas, provavelmente, não vale a pena repetir. Vou, por isso, fazer uma leitura das respostas que o Sr. Ministro aqui tem dado, designadamente pegando numa expressão utilizada pelo Grupo Parlamentar do PS apelidando o Ministério do Ambiente de um ministério transversal. Permito-me discordar completamente desse rótulo e classificar este Ministério como um ministério verdadeiramente rendido, utilizando dois exemplos já hoje focados, um dos quais muito referido pelo Sr. Ministro do Ambiente que tem a ver com a questão do plano nacional de barragens.
Quando vemos o Ministro do Ambiente aplaudir claramente o que nos é proposto no plano nacional de barragens, quando o próprio deveria ser a primeira voz, em Portugal, a valorizar património natural único e a compatibilização de interesses nacionais com a conservação da natureza, é evidente que devemos ficar preocupados com esta rendição do Ministério do Ambiente aos objectivos que, provavelmente, deveriam cair na tutela do Ministério da Economia.
Quando olhamos para a matéria das alterações climáticas, aqui já focada hoje por outro Sr. Deputado, e percebemos que o Sr. Ministro do Ambiente «chuta» a matéria para o Ministério da Economia em termos de responsabilização de sectores nesta área, também isto deve preocupar-nos.
Portanto, devemos questionar-nos acerca do papel que o Ministério do Ambiente representa em termos dos objectivos que deveria prosseguir a nível governamental.
Pegando na matéria das alterações climáticas, para além de outras questões que já foram respondidas a outros Srs. Deputados, talvez importasse pormenorizar mais algum conhecimento sobre o Fundo de Carbono.
Já temos conhecimento da aplicação dos 6 milhões de euros previstos no Fundo Português de Carbono para 2006. Percebemos que metade dessa verba foi direitinha para o Fundo de Carbono privado do BANIF, mas resta-nos perceber a aplicação concreta dos 78 milhões de euros, previstos para o Fundo Português de Carbono no Orçamento do Estado para 2007, designadamente atendendo ao facto de o Comité Executivo da Comissão para as Alterações Climáticas ter estado a trabalhar, este ano, para que uma parte das verbas consignadas ao Fundo Português de Carbono fosse aplicada em medidas internas.
Queremos saber exactamente qual foi o destino desses 78 milhões de euros, atendendo também ao facto de que o Orçamento do Estado para 2008 prevê 26 milhões de euros para o Fundo de Carbono. É a primeira vez que o Orçamento do Estado vincula expressamente uma parte dessa verba exclusivamente à aquisição de unidades de emissões, nada mais nada menos do que mais de 70% da verba. Sobram 7,6 milhões de euros.
Para medidas internas, Sr. Ministro? Era importante clarificar, dado que, relativamente aos 70 milhões de euros previstos no Orçamento do Estado para 2007, houve muitas perguntas da nossa parte sobre a sua aplicação e houve muitas respostas contraditórias, designadamente por parte do Sr. Ministro do Ambiente e do Sr. Primeiro-Ministro.
Ao que parece, este Ministério é também o «ministério da competitividade» — e verifico que o Sr. Ministro acena com a cabeça e diz que sim! É este o grande objectivo do Ministério do Ambiente.
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Aliás, olhando para o Plano Nacional de Ordenamento do Território, isso já era visível; olhando para o Plano Nacional de Desenvolvimento Rural, ficou ainda mais visível. Sei que este último não é vosso, mas a voz do Ministério do Ambiente poderia ter-se feito ouvir de alguma maneira relativamente a essas opções.
Caímos, pois, na lógica da competitividade — e digo «competitividade» porque estou a referir-me à resposta que o Sr. Ministro deu relativamente à matéria das assimetrias regionais.
Dizemos isto inúmeras vezes porque consideramos que esta falta de coesão territorial é talvez dos factores que mais contribuem para fortes problemas sociais e ambientais.
Todos o sabemos mas, infelizmente, percebemos que, dos inúmeros planos e das inúmeras estratégias que vão saindo, o que resulta é um conformismo muito grande com esta realidade nacional e uma muito vincada falta de vontade política de não inverter esta realidade. Vai-se pondo um «penso» aqui, um «penso» ali, mas não existe a vontade de alterar estruturalmente esta realidade. É evidente que isto não se muda de um ano para o outro, mas esse sinal não nunca é dado.
Olhamos para o Orçamento do Estado para 2008 e percebemos que, em termos de distribuição do investimento público resultante do PIDDAC, é claramente conformador com esta realidade assimétrica ao nível regional.
Olhamos para os PO regionais (planos regionais de ordenamento do território) e, ao contrário do que disse o Sr. Ministro, percebemos que vão vincar mais essa falta de coesão territorial.
Olhamos para a distribuição das CCDR e vamos perceber justamente o mesmo.
A que se agarra o Governo? O Governo agarra-se àquela célebre medida, que já hoje existe, relativamente à redução de IRC para empresas instaladas ou que venham a instalar-se no interior do País, e o que faz, face ao regime bonificado que já existe hoje, é reduzir em mais 5% a componente de cada uma delas. Mas, até hoje, o Governo nunca conseguiu dizer, face ao regime bonificado já existente, o que é que resultou em termos de instalação de empresas no interior do País.
Faço aqui um parêntesis para dizer ao Sr. Presidente que estou a terminar, mas creio que ainda falta um pouco para acabar o meu tempo, não é verdade?
O Sr. Presidente: — Não falta muito, Sr.ª Deputada, mas ainda tem 2 ou 3 minutos.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Então, vou procurar ser mais rápida.
Em termos de conservação da natureza, talvez importe perceber também que os números que o Ministério apresenta não são os que nos são dados em sede do Orçamento do Estado.
No que se refere ao ICNB, faço uma leitura contrária porque não gosto muito de comparar o que está previsto para 2008 com a expectativa de execução em 2007.
É que criou-se uma expectativa de execução ou de investimento, digamos, quando, em 2007, houve uma previsão para o ICNB. Face a essa previsão, de 2007, e à previsão para 2008, o que verificamos é que há uma diminuição real de 1,8% para o ICNB. Se fizermos a comparação com o ano 2006, verificamos que há um decréscimo de cerca de 20%.
Olhamos para as medidas, relativamente às áreas protegidas, do programa para o ambiente no PIDDAC e vemos um decréscimo de quase 50%, comparando 2008 com 2006.
Sr. Ministro do Ambiente, gostava de lhe fazer uma pergunta concreta também em relação à conservação da natureza que tem a ver com aquele projecto de vigilância das áreas protegidas, constante da Medida Áreas Protegidas no Programa Ambiente e Ordenamento do Território, que tem inscrita uma verba de 126 000 €. Ora, conhecendo os números necessários para regularizar o regime de videovigilância na Arrábida e sabendo que a regularização desse sistema de videovigilância, quer quanto à sua recuperação quer quanto à sua ligação ao CDOS, dariam tal valor, queria perceber se o mesmo está direccionado para esse sistema em concreto ou para o que é que está direccionado.
Lamentamos também, Sr. Ministro, que, ao nível da co-incineração, o Orçamento do Estado, designadamente o respectivo Relatório, tenha posto um bocadinho «o carro à frente dos bois», afirmando logo, de uma forma peremptória, que a co-incineração é para avançar no ano 2008, quando sabemos dos processos que ainda estão a decorrer em tribunal.
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O Sr. Ministro do Ambiente apressou-se a responder que era necessário afirmá-lo porque era preciso fazer uma previsão orçamental para resolver um grave passivo ambiental relacionado com a matéria da coincineração. Então, como é que isto se traduz em termos orçamentais? Quer dizer-nos, Sr. Ministro? As restantes questões que tinha para colocar deixo para a segunda ronda.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, Sr.ª Deputada, lamento informá-la mas talvez vá desiludi-la ainda mais do que já a desiludi, porque, em relação ao Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico, não me limitei a aplaudir, contribui para o promover. Endosso completamente esse Programa, feito, aliás, sob a minha orientação através do Instituto da Água, embora em conjunto com a Direcção-Geral de Geologia e Energia.
Acho, e sempre achei, que a Sr.ª Deputada é, tipicamente, uma daquelas pessoas que querem «o sol na eira e a chuva no nabal» — talvez esteja numa posição que facilite isso em termos políticos —, ou seja, quer uma coisa e o seu contrário.
Sabe, quem tem responsabilidades efectivas de governação não se pode dar a esse luxo, tem de fazer opções, tem de encontrar soluções, tem de encontrar linhas de rumo e, ao mesmo tempo, tem de manter um certo equilíbrio e um sopesar do conjunto de valores em presença.
Pois bem, se queremos, de facto, trazer fiabilidade ao nosso sistema energético, se queremos potenciar a enorme aposta que estamos a fazer no eólico, se queremos arredar do nosso horizonte, como queremos, a opção nuclear, uma das formas credíveis para o fazer é, seguramente, a aposta no potencial hídrico que o País tem e que desenvolveu muito menos do que a generalidade dos países europeus.
Como é que fizemos isso? À moda antiga, olhando apenas para o potencial hidroeléctrico, olhando apenas para considerandos de natureza económica? Nada disso! Fizemo-lo com base num instrumento — aliás, foi referido há pouco por uma outra bancada, e com razão, por ser muito importante — que é a avaliação ambiental estratégica.
Já houve outros casos em que se fez avaliação ambiental estratégica, desde logo, relativamente aos programas operacionais do QREN, mas penso que esta é, genuinamente, a primeira verdadeira aplicação da avaliação ambiental estratégica, na medida em que as considerações ambientais são trazidas, de uma forma absolutamente explícita, ao processo de decisão preliminar.
Portanto, consideramos que estas decisões são de tipo novo e as barragens que se farão em resultado deste plano serão feitas com a consideração das questões ambientais, como jamais ocorreu no passado.
Portanto, esse «fantasma» de que as barragens vão ser terríveis para a biodiversidade, para já, rejeito-o, mesmo em relação ao passado, e, por maioria de razão, rejeito-o em relação a todo o exercício que está a ser conduzido sob a nossa orientação — não é com o nosso aplauso, é mais do que isso, é com a nossa orientação.
Rejeito esse «fantasma» mesmo relativamente ao passado porque, como a Sr.ª Deputada sabe, foram adoptadas medidas de mitigação e de compensação extraordinariamente expressivas que, na minha opinião, permitem ultrapassar, superar a perda de biodiversidade que essas próprias barragens implicam. É o caso de Odelouca e do Baixo Sabor, em que nos empenhámos, e do lado do ambiente.
A Sr.ª Deputada diz que este é um Ministério rendido. Pois fique sabendo que não me rendo àqueles que querem meter o ambiente num redil»
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Isso é o que o Governo quer fazer!
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — » e fazer dele um antagonista ao desenvolvimento económico e social do País. Não é para isso que o ambiente serve.
A Sr.ª Deputada diz, com ironia, que «é o ministério da competitividade» e eu acenei «sim». Porquê? Porque a visão moderna — e sublinho a visão moderna — das questões ambientais é compreender que as exigências ambientais contribuem decisivamente para a inovação, nomeadamente no seio das empresas, e, por via da inovação, contribuem decisivamente para a competitividade das empresas.
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O tecido empresarial competitivo que queremos construir em Portugal tem de estar absolutamente ciente das suas obrigações e das suas responsabilidades em matéria de ambiente e tem de fazer face a essas obrigações ambientais, relativamente às quais sempre fomos exigentes.
Aponte-me a lei ambiental cuja infracção foi tolerada pelo nosso Ministério! Alguns dizem que «os PIN servem para passar por cima da legislação ambiental». Felizmente, esse discurso já acabou, porque já se provou à saciedade que não é assim, que a legislação ambiental é integralmente cumprida.
Pois bem, é por via desse cumprimento que as empresas são chamadas à modernização dos seus processos produtivos.
Ambiente implica inovação, inovação implica competitividade das empresas.
Nesse sentido, sim, entendemos que damos um contributo para a competitividade do tecido empresarial português.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Vamos, então, entrar na segunda, e última, ronda de perguntas.
Em jeito de «last shot» — em sentido figurado, obviamente —, tenho seis inscrições para esta segunda ronda. Cada grupo parlamentar dispõe de 3 minutos e vou ser draconiano no escrupuloso respeito pelo tempo, dado o adiantado da hora. O Sr. Ministro responderá no fim, em bloco.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Eduardo Martins, do Grupo Parlamentar do PSD.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, vou cumprir o tempo que anunciou, seguramente, até porque não resulta de grande esforço resistir à tentação de comentar a intervenção do Sr. Ministro em resposta à primeira intervenção do PSD. Mas há uma ou duas coisas curiosas que não devem passar sem referência.
Diz o Sr. Ministro que eu sei, devia saber, tinha obrigação de saber que acções como a primeira das prioridades que o Ministério do Ambiente inscreve no relatório, a transposição da directiva da avaliação ambiental estratégica, tem uma tradução em termos do orçamento de funcionamento e, portanto, não tem uma expressão nos números do orçamento. Estranha resposta, Sr. Ministro! Se não tem uma expressão em termos de orçamento, por que é que é a primeira das linhas do relatório do orçamento do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional? Inculca-se, aqui, nem que seja pela lógica da escrita, uma prioridade e o Sr. Ministro podia ter-me respondido: «Traduz-se num funcionamento diferente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Vamos dar à avaliação de impacte ambiental os meios de que ela precisa e não tem». Mas, pelos vistos, se foi esta a resposta em relação a esta linha do relatório, pode acontecer o mesmo em relação a tudo o resto. Palavras, palavras, palavras» Sobre o Quadro de Referência Estratégico Nacional, numa atitude claramente respeitadora do ambiente e de relação saudável com o uso dos recursos naturais, recebi quatro fotocópias de um recorte de jornal quando saí por uma necessidade pessoal urgente, a qual, pelos vistos, o Partido Socialista gostava de impedir. Que indigência intelectual! E que diz esse artigo de jornal nestas quatro fotocópias que recebi (não sei quantas árvores se abateram para que o PS fizesse este «disparatezinho« deste «nõmero político«»)? Diz que Portugal teve muita pressa em concluir o processo e que está no meio da tabela – é o que diz a notícia que distribuíram todos contentes» Esta ç a medida da ambição do PS: o PS distribui quatro fotocópias a dizer que Portugal está no meio da tabela em relação aos fundos estruturais! Sobre isto, gostava que o Sr. Ministro respondesse em números. Perguntei ao Sr. Ministro quanto é que iria executar do QREN, em 2007 e 2008, e o Sr. Ministro respondeu que, em 2008, iria executar para aí uns 10%» Assim um número tipo «manteiga em nariz de cão», tipo número de «merceeiro«» Pois, olhe, Sr. Ministro, só não registamos isto com mais atenção porque o senhor se desdisse tantas vezes no que diz respeito ao QREN. Foi o senhor que deu dúzias de entrevistas a dizer que tinha guichets abertos em Setembro, não fui eu! A culpa destes atrasos não é minha, é do senhor, que anuncia e que não cumpre sucessivamente sobre a mesma matéria! É espantoso que não haja no PS quem vá além de um recorte do jornal e se dedique a ir ao site da União Europeia e verifique in loco, nos documentos oficiais, quem entregou e quem está a executar o quê! O Sr. Ministro andou dois anos a dizer. «Não se preocupem porque as despesas retroagem a 1 de Janeiro de 2007». Ora, pergunto: qual é a previsão deste Governo para o que vai executar do QREN em 2007? Em
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2008, já sabemos que é assim um número tipo «manteiga em nariz de cão» de 10%. Vamos lá ver, talvez seja, talvez não, logo veremos no fim, «prognósticos no fim do jogo«» Mas 2007 acaba no mês que vem e, por isso, pergunto: qual é o volume de gastos do QREN em 2007, já que o Ministro repetiu 10 vezes que as despesas seriam apresentadas a 1 de Janeiro de 2007? Foi esta a pergunta a que não respondeu e que volto a fazer agora.
A segunda nota tem a ver com as alterações climáticas.
O Sr. Secretário de Estado Humberto Rosa disse que tinha encontrado um Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão de CO (PNALE) de 2001 com licenças a mais atribuídas às empresas. Pois claro! Por isso é que se chamava período experimental e as licenças eram gratuitas, para, se o segundo tivesse sido feito a tempo, corrigir o que estivesse mal. Sobre esta correcção feita por este Governo já se pronunciou a União Europeia — não vou distribuir esta decisão gastando papel em coisas que os senhores têm obrigação de conhecer nos sites oficiais, pois não é esta a minha relação com os recursos naturais. Há bocado dispenseime de o fazer, mas agora vou ler-lhe o que diz a Comissão Europeia.
Disse-nos o Sr. Ministro e também o Sr. Secretário de Estado: «Encontrámos um Plano Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC) de 2004 que estava feito, mas não executámos. Revimos e fizemos o de 2006 e a justificação de 2006 é a de que revimos os cenários macroeconómicos em baixa».
Sr. Secretário de Estado, alguma coisa me falha! Sei que o senhor é uma pessoa honesta, empenhada nestas matérias e com vontade de que as coisas aconteçam — não tenho nenhuma dúvida sobre isso, Sr. Secretário de Estado! Mas entre a vontade e o facto de elas acontecerem vai a distância que o comentário da União Europeia justifica.
Disse a Comissão Europeia, há menos de mês, que «o plano nacional de atribuição de licenças» — o que sucedeu ao mau que tinha sido feito antes e que os senhores fizeram bem — «infringe o critério 1 do Anexo 3.º da Directiva, dado que a quantidade total de licenças a atribuir, de acordo com o mesmo, não é compatível com a realização do compromisso de Quioto por parte de Portugal». Considera-se que «a quantidade de licenças é superior ao que deverá ser necessário, uma vez que o recurso previsto por Portugal a outras políticas e medidas» — o PNAC de 2006 de que o Sr. Ministro se orgulha» — «em sectores não abrangidos pela directiva não se encontra fundamentado». Não se trata de uma apreciação sobre o PNAC de 2004, mas sobre o de 2006, que substituiu o de 2004.
Portanto, como o Sr. Ministro já ia em Bali, quero trazê-lo e volta a Lisboa e ao Orçamento do Estado que não quis discutir, e sobre ele gostava de repetir a pergunta feita pela Deputada Heloísa Apolónia e à qual o Sr.
Ministro não respondeu: o que é que fez com os 78 milhões de euros que o Fundo de Carbono tinha em 2007? Quais são as acções que tem previstas para o Fundo de Carbono para 2008? São perguntas que lhe fizeram Os Verdes, são perguntas que o PSD já lhe tinha feito e são perguntas que lhe repito. Venha do avião de volta de Bali e explique-nos o que é que vai fazer em Portugal!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Vaz.
O Sr. Luís Vaz (PS): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em nome da bancada do PS, começo por felicitar o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional pela acção que vem desenvolvendo globalmente e quero fazer uma especial referência à política de cidades e de habitação, que, aliás, vem no sentido desse grande esforço nacional tem vindo a ser desenvolvido ao longo das últimas duas décadas no sentido de melhorar as condições de habitação dos portugueses e de livrar este País da praga que eram os bairros de lata e os bairros de barracas. Devemos orgulhar-nos desse esforço e estar satisfeitos com o trabalho desenvolvido.
É certo que há pessoas que já nasceram zangadas com o mundo e que jamais serão capazes de reconhecer qualquer boa acção do actual Governo e até é possível que esta questão se agrave com a nova estratégia guerrilheira do «dispara e foge» que vem sendo utilizada pelo PSD.
Continuando a minha intervenção relativamente às questões que têm a ver com o orçamento para esta área da governação, gostaria de tecer algumas considerações ao nível da conservação da natureza e das acções que está previsto serem desenvolvidas neste Ministério, nomeadamente a continuação das acções de gestão e valorização das espécies e dos habitats, a disponibilização de cartografia ao longo do território, com a indicação das espécies e das áreas protegidas, a conclusão dos planos de ordenamento das áreas protegidas, os planos de prevenção e mitigação dos fogos florestais, a recuperação das áreas ardidas, a potenciação das
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sinergias entre actividades empresariais e a biodiversidade e a elaboração dos planos zonais para a Rede Natura 2000.
Tudo isto são intenções do Governo que estão plasmadas no orçamento em discussão e que têm de ser encaradas na perspectiva — a qual, aliás, já foi abordada nesta Comissão noutras ocasiões — do autofinanciamento dos parques naturais e das áreas protegidas, nomeadamente através do concessionamento de determinados nichos dentro das áreas naturais, dando a possibilidade de os privados actuarem nesta área, indo até mais além da imagem idílica utilizada há tempos pela Deputada Alda Macedo quando se referia à questão do jovem casal de biólogos que, com três ou quatro auxiliares, geriam uma área protegida. É evidente que é fundamental desenvolver estas pequenas acções, para além de outras, de auto-financiamento directo dos próprios parques naturais, mas trata-se de um vasto programa, que exige, obviamente, para além dos meios técnicos e humanos, meios financeiros para a sua concretização.
Nesta óptica, pergunto qual o montante global disponibilizado para estas acções ao nível do ICN e que medidas irão ser tomadas no sentido do aumento do auto-financiamento nas áreas protegidas e parques naturais, não só através de acções directas do próprio ICN como da política de concessão a privados que o Ministério tem anunciado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Soeiro.
O Sr. José Soeiro (PCP): — Sr. Presidente. Sr. Ministro, este é o terceiro debate do Orçamento do Estado em que o Sr. Ministro participa. Se fosse o primeiro, eu saía daqui convencido de que os problemas do ambiente, do ordenamento do território, do desenvolvimento regional iriam todos ser resolvidos, porque as palavras do Sr. Ministro, de facto, repetem-se e, sob o ponto de vista da retórica, na verdade, as coisas deviam ter tido uma prática correspondente. Este é que é o problema.
Na verdade, verificamos que no ambiente continua a haver desmandos um pouco por todo o lado, a exemplo do que se tem vindo a denunciar, por exemplo, na ria de Alvor, e que continuam! Vemos a REN a impor corredores por esse País fora contra os habitantes, contra a vontade das populações. O Sr. Ministro diz-nos, em termos teóricos, que primeiro estão as pessoas, mas a verdade é que aquilo que vamos vendo não é esta a realidade. Ainda hoje temos, em Lisboa, pessoas de Sintra e de Vale Fuzeiros, em Silves, a protestar contra a tentativa da REN lhes impor soluções claramente erradas, que não têm em conta as pessoas! O Sr. Ministro diz: «Bom, hoje, se calhar, não se é capaz de destrinçar o litoral do interior». Mas não é verdade, Sr. Ministro! O Deputado Eugénio Rosas deu exemplos bem precisos, quantificados, das disparidades regionais, que são cada vez mais acentuadas, entre o litoral e o interior e temos, nesta matéria, uma política de continuidade que vai agravar essas assimetrias, pois não tem em conta estas realidades! Basta pensar no Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território (PNPOT) que foi aprovado e que, possivelmente, o Governo amanhã vai invocar para justificar a continuidade de uma política errada, que faz de Lisboa e do Porto o País, e o País não é isto, o País é muito mais do que isto, Sr. Ministro! Este é um Orçamento de continuidade de uma política errada que tem conduzido a esta realidade que está testemunhada por números, por realidades que não é difícil constatar. Basta sair de Lisboa e ir por esse País fora, começando na serra algarvia até Trás-os-Montes, para ver o que é este País em termos de discriminação do interior, que continua a existir.
O Sr. Ministro não pode, como fez há pouco, para dar uma prova de que tem havido uma evolução positiva no combate às assimetrias, invocar o trabalho do poder local. De facto, há uma melhoria real na qualidade de vida dos portugueses. Só lhes falta aquilo que o Governo não lhes deu, as condições para poderem continuar a viver nas suas terras, sendo obrigados a abandoná-las e a ir para o estrangeiro, a estar no desemprego ou a ter de vir para o tal Portugal litoral, que este orçamento mais uma vez não consagra.
A seguir diz-se que é preciso desgovernamentalizar os fundos, é preciso confiar mais às autarquias. Neste caso, o Sr. Ministro faz o discurso exactamente inverso, dizendo que temos de contrariar a «FEFização», isto é, a tal «FEFização» que contribuiu para combater as assimetrias regionais. Esta é que é a realidade, porque naquilo que diz respeito à utilização dos fundos por parte do poder central, tem havido um desbarato de milhões e milhões de euros ao longo de três quadros comunitários de apoio.
Estamos preparados para ter, de facto, um QREN governamentalizado por um Governo que, até hoje, não deu provas de saber gerir convenientemente os fundos que tem à sua disposição. O que temos tido é desin-
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vestimentos, é desorçamentações, é malabarismos de palavras, mas a realidade, Sr. Ministro, não se compadece com esta situação.
Para não fazer apenas uma avaliação política, vou colocar duas questões, que gostava de perceber.
Penso que, pelo menos em termos de despesas e de receitas, os números deveriam ser idênticos. É aquilo que encontro um pouco por todos os ministérios, até na generalidade dos serviços e fundos autónomos do Estado. Mas olhando para o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional não compreendo, por exemplo, por que é que no Instituto Nacional de Habitação há uma diferença de 11 milhões de euros. Como é que se explica esta disparidade? Por que é que na Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro «não bate a bota com a perdigota»?! Admitindo que haverá sucesso na política que foi apontada em termos de apoio ao combate à degradação urbana, que todos reconhecemos que existe e que necessita de uma resposta, há uma verba que o Sr. Ministro utiliza como incentivo, que é do poder local, que é o IMI.
Ora, gostaria que o Sr. Ministro me desse uma ideia de quanto é que representa o valor de IMI que as câmaras vão deixar de receber por esta decisão do poder central.
Gostaria ainda que me dissesse se há alguma verba que compense as autarquias por esta retirada de verbas. É que, caso não haja, Sr. Ministro, estamos como aquele que calça as botas do pai e diz «assim até pareço um homem». Não pode ser! Tem de haver uma compensação às autarquias pelas verbas que qualquer dos ministérios procure utilizar como incentivo para resolver qualquer um dos problemas que estão em cima da mesa.
Com isto, terminei, agradecendo-lhe, Sr. Presidente, a sua compreensão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Carlos Monteiro.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, infelizmente, as suas respostas às perguntas feitas pelo CDS-PP confirmaram a minha preocupação. Temos um orçamento que não orçamenta, uma informação que não informa e respostas que não respondem. O Sr. Ministro ou não tem respondido ou tem respondido a «alhos com bugalhos».
Sr. Ministro, os serviços técnicos da Assembleia da República, bem como o CDS, fizeram uma análise detalhada do Orçamento. Mas fizemo-la com a informação que nos foi fornecida pelo Governo. Portanto, o Governo só pode queixar-se dele próprio, porque ou ocultou informação ou a informação é tão opaca que é impossível compreendê-la.
Sr. Ministro, já fiz distribuir o documento que foi elaborado pelos serviços da Assembleia, que demonstram que a taxa de execução dos serviços integrados no Ministério é de 53%, ou seja, 5% abaixo de todos os outros ministérios.
Em relação ao PIDDAC, falei especificamente de duas medidas: a Medida 11 e a Medida 10. Na Medida 11, a execução que temos analisada dá-nos 4% e um corte de 94% para o ano de 2008, que admito que seja relativo à criação das Medidas 30 a 40.
Mas a isso o Sr. Ministro disse nada, não respondeu! Por que é que a execução, na Medida 11, é apenas de 4%, na informação que nos é fornecida no âmbito do PIDDAC? Na Medida 10 a execução é de 43% e do orçamento para o ano de 2008, no âmbito do PIDDAC, consta apenas a verba de 5,571 milhões de euros, cerca de 5,6 milhões de euros. Mas, no Relatório, é dito que são 46 milhões de euros. Qual é a explicação para isto, Sr. Ministro? Tem também a ver com a criação das Medidas 30 a 40? Sr. Ministro, perguntámos, relativamente à política de tarifas de resíduos e da água, o que é que o Governo tencionava fazer. O Sr. Ministro não respondeu! Quais são os critérios? Vai significar um aumento de preços para o consumidor, que, pelas notícias que temos lido nos jornais, já começámos a antecipar e que se situará entre 8% e 8,8%? Sr. Ministro, qual é a sua resposta em relação a esta matéria? E — é preciso ter algum pudor, Sr. Ministro! — quem decidiu a internacionalização do Grupo Águas de Portugal foi o Partido Socialista, foi o Eng.º José Sócrates! Portanto, o Sr. Ministro está a resolver um problema criado pelo próprio Partido Socialista. Dizer que a responsabilidade é do anterior governo é não ter qualquer pudor em relação àquilo que foi uma estratégia errada, decidida pelo Partido Socialista, para o Grupo Águas de Portugal.
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Quanto às empresas, temos insistido todos os anos em discutir a estratégia em relação aos grupos empresariais que dependem do Ministério do Ambiente. Consideramos isso fundamental, porque acaba por ser no orçamento das empresas que se está a executar a política de ambiente sem o controlo da Assembleia da República.
Não digo que esta informação tenha de estar inscrita no Orçamento do Estado. Mas se o Governo elabora um documento informativo, a propósito do Orçamento do Estado, para esta Assembleia, seria importante — e temo-lo dito ao longo dos debates do Orçamento — que essa informação também fosse fornecida. É que esta actividade é exercida sem qualquer controlo por parte da Assembleia.
Sr. Ministro, o orçamento de funcionamento aumenta apenas 22,8 milhões de euros. O Fundo Português de Carbono — é dito no Relatório do Orçamento do Estado — tem uma verba de 26 milhões de euros, o que significa um corte no funcionamento. Mas, por outro lado, no documento informativo é-nos dito que são 18,4 milhões de euros. Em que é que ficamos? São 26 milhões de euros ou 18,4 milhões de euros? Isto exige uma explicação, que o Sr. Ministro não deu na resposta.
O corte no investimento é de 13,1% — é o resultado da análise dos serviços técnicos da Assembleia, não foi sequer o CDS que a fez. Sr. Ministro, qual é a explicação? Sr. Ministro, no fundo, a pergunta que se coloca é a seguinte: o Ministério do Ambiente e o Sr. Ministro servem para quê?
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Alda Macedo.
A Sr.ª Alda Macedo (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, em relação às questões que lhe coloquei em relação ao orçamento as respostas foram nulas.
Perguntei-lhe como é que se repartiam os 38,8 milhões de euros para o arrendamento entre o NRAU e o Porta 65 — Jovem e a resposta foi zero.
Perguntei-lhe como é que conseguia garantir as responsabilidades do Instituto de Conservação da Natureza numa área que o Sr. Ministro declarou aqui ser-lhe muito cara, havendo, no entanto, uma diminuição da capacidade do ICNB para fazer face às suas responsabilidades no âmbito da conservação da natureza. A isso o Sr.
Ministro respondeu zero.
Perguntei-lhe como é que justificava esta ausência de dotação no sentido de dar resposta a uma das prioridades do PNPOT no âmbito da valorização do território e o Sr. Ministro não teve outra resposta que não fosse a fuga para a generalidade.
Lamento, mas este é um debate muito pouco esclarecedor. Veremos se, sobre as matérias que têm a ver com o litoral, o Sr. Ministro será capaz de responder com um pouco mais de clareza.
Já nos falou aqui hoje do que são os projectos integrados para a reabilitação do litoral em algumas áreas da zona costeira. O que consta do orçamento é um investimento global de 21,4 milhões de euros para um problema que é muito grave.
Aliás, se me for permitido, Sr. Presidente, aproveito para convidar a Deputada Jovita Ladeira a deslocar-se à península de Tróia para visitar um empreendimento, chamado Tróia Resort, cuja construção, que recebeu a bênção e o acarinhamento do Primeiro-Ministro, não se situa nem a 100 m nem a 50 m da linha de praia, situase na linha de praia! É bom que vá lá ver para, depois, vir aqui explicar como é que a Espanha teve a coragem de começar a implementar um programa no sentido de fazer recuar a construção junto à orla costeira e como é que Portugal tem um Primeiro-Ministro que apadrinha os negócios imobiliários em cima da costa, quando o País vive na iminência de uma catástrofe ecológica com a subida do nível do mar. Sabe o que vai acontecer depois, Sr.ª Deputada? Vai ter de ser o Orçamento do Estado, com os recursos que são de todos nós, a investir na estabilização de uma costa que está ameaçada pela subida do nível do mar. Este é que é o problema.
Face a este problema, Sr. Ministro, o que é preciso fazer? Sabemos como é que estes 21,4 milhões de euros estão distribuídos pelo ICNB e pelas CCDR, porque isso consta dos documentos que foram fornecidos.
Mas não sabemos quais vão ser as prioridades. Do que o Sr. Ministro fala nos seus discursos é dos apoios de praia. Ó Sr. Ministro, esqueça os apoios de praia! Neste momento, o que é preciso é começar a renaturalizar a orla costeira; o que é preciso é negociar com as autarquias, no sentido de introduzir alterações aos PDM para evitar a continuação de licenciamentos em cima da linha de praia e da orla costeira. E é preciso que se expli-
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que como é que estes 21,4 milhões de euros, do ponto de vista das prioridades de políticas para a defesa da orla costeira, vão ser distribuídos prioritariamente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr. Presidente, Sr. Ministro, quanto ao Programa Nacional de Barragens, seguramente teremos oportunidade de voltar a discuti-lo nesta Casa. Mas para que não haja dúvidas sobre incompatibilidades, sobre contrariedade de discursos, não é este o Governo que, em termos discursivos, considera que tem de apostar verdadeiramente no sector ferroviário, designadamente para o cumprimento dos seus objectivos no que se refere ao Protocolo de Quioto? O Sr. Ministro conhece a linha do Tua, conhece a incompatibilidade decorrente do projecto de barragem para o Tua com esta linha? O que é mais importante? Pois é evidente que é importante compatibilizar valores. Mas sobre o Programa Nacional de Barragens, havemos de conversar depois, Sr. Ministro.
Já percebi que o Sr. Ministro vem com muita vontade de falar sobre isso mas com pouca vontade de falar sobre o orçamento, porque, relativamente às outras perguntas que lhe fiz, não obtive qualquer resposta. No entanto, como esta é a única reunião que vamos ter relativa ao orçamento, quero obter respostas às questões que coloquei sobre o seguinte: o Fundo Português de Carbono; a diminuição de verbas para o Instituto de Conservação da Natureza e da Biodiversidade e o que daí pode decorrer; a questão da co-incineração e a sua tradução orçamental; e a leitura que estou a fazer da questão das assimetrias regionais.
Sr. Ministro, em política, fazemos opções, mas é preciso assumir essas opções. Não se trata de, em termos discursivos, dizermos uma coisa e, depois, quando essas intenções são traduzidas num plano financeiro, daí resultar exactamente o contrário. Então, vamos assumir-nos exactamente como somos e com aquilo que defendemos — é isso que penso ser importante ao nível deste Ministério.
Quero também deixar aqui uma palavra de grande preocupação relativamente às sucessivas desorçamentações que verificamos no Orçamento do Estado em diversas áreas de diversos ministérios — Estradas de Portugal, REFER, hospitais, Águas de Portugal» Quer dizer, isto ç de uma total falta de transparência e de uma total falta de dados. De tal maneira que nos leva a ficar completamente coxos ao nível da discussão do instrumento financeiro para um determinado ano e que reflecte as opções políticas do Governo. Andamos completamente coxos nas discussões do Orçamento do Estado face a esta falta de transparência.
O Sr. Ministro já afirmou publicamente que, com a privatização da Aquapor, fará um encaixe financeiro da ordem dos 50 milhões de euros — e este é exactamente o mesmo discurso que é feito relativamente à Estradas de Portugal —, mas, depois, também diz o seguinte: «A privatização da Águas de Portugal (AdP) no nosso mandato não, mas, a médio prazo, ela poderá ser uma realidade».
Por isso, quero deixar aqui uma palavra de preocupação relativamente a esta matéria.
Quanto às prioridades para o Litoral 2007-2013, a previsão do Orçamento do Estado era de 24,7 milhões de euros e, agora, passou a ser de 21,4 milhões de euros. Quero saber em que é que se vai traduzir exactamente esta diminuição de 13,4% para o nosso litoral em termos de investimento, quando sabemos o estado em que ele se encontra e a necessária e urgente intervenção que aí é preciso fomentar.
Termino, Sr. Presidente, pedindo uma explicação ao Sr. Ministro do Ambiente relativamente aos números do PIDDAC. De 2007 para 2008, temos uma diminuição de 10,4% no investimento, em PIDDAC, do Ministério do Ambiente e, de 2006 para 2008, uma diminuição de 29,6%. Sr. Ministro, é este o contributo que o Ministério do Ambiente vai dar para se chegar a um défice de 2,4%, em 2008?
O Sr. Presidente: — Vou agora dar a palavra, para responder, ao Sr. Ministro, que poderá naturalmente delegar, se assim o entender, nos Srs. Secretários de Estado.
Tem a palavra, Sr. Ministro.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Sr.
Presidente, naturalmente vamos procurar responder cabalmente, mas com brevidade.
Começo por pedir aos Srs. Secretários de Estado para darem respostas tão globais, embora breves, quanto possível e reservar-me-ei para, no fim, fazer um fecho, se considerar necessário.
Com a sua permissão, Sr. Presidente, pediria, então, ao Sr. Secretário de Estado do Ambiente que desse as primeiras respostas.
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O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Sr. Presidente, Sr. Ministro, gostaria de comentar três tópicos: o da conservação da natureza, o das alterações climáticas e o das linhas de alta tensão, suscitadas pelo Sr. Deputado José Soeiro.
Quanto à troca de óculos, de que a Sr.ª Deputada Alda Macedo falou, acho que não é necessário, porque realmente não me exprimi com clareza e por tal peço-lhe desculpa. O que referi há pouco, e mantenho, é que o orçamento de funcionamento do ICN, de 2001 a 2005, decaiu de 11,9 para 8,4, enquanto que, de 2005 a 2008, aumentou de 8,4 para 14,4. Não quero ocultar que o orçamento de PIDDAC decaiu, acompanhando a contenção orçamental agora referida. Decaiu, efectivamente, e há muitas formas de o abordar. Chamo a atenção para uma delas, que é positiva, que é a evolução da taxa de execução em projectos que em 2005 era de 51,4%, em 2006 foi de 60,7% e em 2007 será de 67,9%.
Gostaria também de referir um projecto que o Sr. Deputado Luís Vaz mencionou e sobre o qual o Deputado Miguel Tiago tinha perguntado, que é o projecto de cartografia que consiste em disponibilizar ao País cartografia à escala adequada de habitats e espécies protegidas para que municípios, empresas e cidadãos deles possam usufruir, projecto que tem acolhimento na medida sobre inventariação, caracterização e monitorização do património natural do ICN, que está orçado em 2 750 000 €, valor que actualmente tem encaixe no QREN.
Perguntou também o Sr. Deputado Luís Vaz em que medida o auto-financiamento é de alguma forma abordado. Em relação a esta matéria, Sr. Deputado, gostaria de dizer que uma das nossas linhas estratégicas consiste na visitação em áreas protegidas, sendo que temos uma verba de 2 450 000 € para infra-estruturas de visitação e interpretação em áreas protegidas.
O que buscamos é criar infra-estruturas que não dêem apenas despesa, mas que possam gerar negócio.
Ou seja, desejamos ter uma linha com promotores locais, com empresas e com populações locais, em que essas infra-estruturas possam servir para gerar um negócio baseado na visitação que tenha rendimento para as áreas protegidas. Chamo, aliás, a vossa atenção para a iniciativa que está em curso na Fundação Gulbenkian, enquadrada na nossa Presidência, que visa precisamente uma parceria acrescida entre empresas e biodiversidade.
Quanto à pergunta colocada pela Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, sobre vigilância versus videovigilância, gostaria de dizer que, efectivamente, a verba da vigilância não é para a videovigilância.
Na verdade, as verbas que tenham a ver com a floresta têm acolhimento no projecto gestão e conservação de áreas florestais e áreas protegidas, com 570 000 €, e em dois novos projectos que o ICN tem também nesta matéria que dizem respeito à prevenção de risco em áreas protegidas e à beneficiação de áreas florestais em áreas protegidas com cerca de 600 000 €. Portanto, essa cobertura vai depender da avaliação em curso da videovigilância como método eficaz versus os seus custos. Sobre conservação, espero não ter esquecido nada de relevante.
Passo, agora, à questão das alterações climáticas, que é um tema importante e sobre o qual os Srs. Deputados merecem um cabal esclarecimento.
O Sr. Deputado José Eduardo Martins referiu-se ao PNAC 2006, em que os cenários foram revistos em baixa — efectivamente, porque era o cenário realista —, mas também há novas medidas. Portanto, é verdade que com estas duas frentes reduzimos a expectativa de défice de 7,4 para 3,7.
O que nos diz a Comissão Europeia é algo que o PNAC 2004 já dizia, embora sem quantificar da mesma maneira, ou seja, que há risco nalgumas medidas. Concretamente, a Comissão diz que há risco em medidas de florestação e em resíduos, como as embalagens.
Ora bem, como é que queremos acomodar isto? Não estamos a desistir destas medidas. Queremos mantêlas com o risco, mas ter, no Fundo Português de Carbono, a possibilidade de encaixe para o caso de esse risco se concretizar.
Portanto, o que temos de concreto é que 4 em 27 Estados-membros tiveram os seus projectos de PNALE aprovados à primeira. Portugal faz parte do grupo de 23 Estados-membros cujos projectos não foram aprovados à primeira.
O facto é que, com a redução que pudemos fazer com as novas medidas de 2007, que o Primeiro-Ministro anunciou este ano, temos um corte de mais de 3%, e vamos acomodá-lo em cortes à indústria e ao sector electroprodutor — em particular, a este último —, podendo manter uma reserva confortável que nos permita renovar a nossa economia, inclusive em sectores que emitem CO2. De qualquer forma, recordo que, se este
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factor de reserva não for aplicado em novos projectos, em novas indústrias, são emissões que não se atribuem, portanto, tem uma vantagem também, porque, de uma forma ou de outra, ganharemos sempre, ou economicamente ou com menos emissões.
Quanto ao Fundo Português de Carbono, os Srs. Deputados merecem saber que, das verbas disponíveis até ao momento, já foi aplicada uma parte, como referiu a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia, no único fundo de carbono português, o Luso Carbon Fund, e também noutros fundos como o Fundo do Banco Mundial, aguardando ainda homologação a aplicação no fundo do Banco Asiático.
No entanto, gostaria de deixar claro o seguinte: já sabemos hoje que não teremos um encaixe de 78 milhões de euros no Fundo Português de Carbono de 2007, porque as taxas que o abastecem não renderam o esperado, nomeadamente a taxa sobre lâmpadas, que não foi operacionalizada. O que temos de encaixe, isso sim, é a transferência de 19,1 milhões de euros em activos do Estado, mais o rendimento, pelo que a minha estimativa mais genuína (que não é ainda certa neste momento) é que temos cerca de metade dos 78 milhões de euros previstos.
Já irei às medidas internas, mas quero dar um esclarecimento relativamente a 2008, uma vez que há também pouca clareza nesta matéria.
Em 2008 teremos os mesmos três tipos de medidas que em 2007, a saber: a taxa que equipara o gasóleo de aquecimento ao rodoviário; a taxa de lâmpadas ineficientes, que já estará a funcionar em 2008; e 26 milhões de euros de activos do Estado, que serão transferidos. Portanto, há 18,4 milhões de euros, a que serão acrescidos 6,6 milhões de euros num crédito especial ao Ministério do Ambiente para chegar aos 26 milhões de euros. Mas o que gostaria de referir é que esses 26 milhões de euros são os que estão obrigados a ser gastos em créditos, porque são activos e em activos se geram para não aumentarem o défice.
Como é que isto joga com a as medidas internas? É muito atraente a ideia de ter um pacote para gastar em alterações climáticas e poder gastar nacionalmente em vez de adquirir créditos do exterior. A maior parte dos países europeus que têm de recorrer a mecanismos de flexibilidade, ainda não lançaram um pacote de medidas internas, do meu ponto de vista, por duas ordens de razões, com que também nos defrontamos: em primeiro lugar, elas têm de ser adicionais ao PNAC, o que já está previsto no PNAC não pode contar como medida adicional; em segundo lugar, têm de dar garante de ter um efeito mensurável em redução de emissões. Não pode ser uma medida que aparentemente renda em redução, mas que depois não se possa tentar detectar no nosso inventário. Além disso, tem ainda de render um preço por tonelada competitivo com o preço dos créditos de redução. Ora, este figurino não está ainda «maduro» para podermos dizer: «venham medidas internas». No entanto, não estamos obviamente inibidos de gastar aquilo que não vem de activos do Estado (o que vem das taxas) também em medidas internas. Este é o ponto da situação mais actual que vos posso fazer sobre o Fundo Português de Carbono.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Muito obrigado. Valeu a pena. Já é uma resposta!
O Sr. Secretário de Estado do Ambiente: — Por fim, gostaria de me referir às linhas de alta tensão, porque me parece importante que os Srs. Deputados possam ter um papel nesta matéria.
Em termos de linhas de alta tensão, na nossa melhor percepção e com todos os dados disponíveis, não há decisão alguma que tomemos em sede de avaliação de impacte ambiental que ponha em risco a saúde seja de quem for. Por isso mesmo, os efeitos são avaliados com certas distâncias de implantação que nos dão garantias de não pôr em causa a saúde. Em todo o caso, no Plano de Acção «Ambiente e Saúde», que esteve em consulta pública e que estamos a ultimar, iremos avaliar mais profundamente esta questão, não vá dar-se o caso de esta matéria estar pouco clara.
Mas mostrámos a opção com clareza. O Ministério do Ambiente, como sabem, não é promotor dos traçados das linhas de alta tensão, pelo que tem plena disponibilidade para avaliar qualquer traçado que lhe aparece. Em Vale de Fuzeiro, perante uma alternativa no mesmo corredor de avaliação de impacto, já demonstrámos disponibilidade para alterar esse traçado, com benefício das pessoas e até com um ónus, no caso concreto, para a conservação da natureza.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário do Ordenamento do Território e das Cidades.
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O Sr. Secretário de Estado do Ordenamento do Território e das Cidades: — Sr. Presidente, farei três comentários, procurando responder aos Srs. Deputados Luís Vaz, José Soeiro e Alda Macedo em relação à questão que ficou em aberto há pouco.
Ao Sr. Deputado Luís Vaz, que focou a política de cidades e, mais concretamente, a iniciativa «Bairros Críticos», gostaria de dar o exemplo desta iniciativa como um caso claro, prático, não teórico, porque está no terreno, de negação daquilo de que temos sido acusados por vários Deputados: centralismo, falta de transversalidade e utilização abusiva da ideia de competitividade nas nossas políticas.
A iniciativa «Bairros Críticos», na sua concretização, mostra exactamente o contrário do que foram as críticas.
Centralismo? Não. Pelo contrário, é um exemplo de uma iniciativa onde, nos bairros onde está a ser desenvolvida, foi construído colectivamente — isto é, com Ministérios, com a administração local e com as associações locais — um programa de acção durante nove semanas.
Falta de transversalidade? Não. Estão envolvidos sete Ministérios nestas iniciativas e creio que é importante chamar a atenção para o facto de que estes Ministérios estão envolvidos não apenas ao nível da formulação das próprias políticas e dos instrumentos de política, mas também da sua execução, do seu acompanhamento e da sua avaliação.
Em relação à questão da competitividade, mesmo numa iniciativa destas, orientada para a questão dos bairros críticos, utilizamos justamente o conceito amplo de desenvolvimento sustentável, portanto a componente da qualidade ambiental, a componente da coesão territorial e também a componente da competitividade estão presentes. Não há o predomínio do conceito da competitividade ou do princípio da competitividade sobre os outros, mas também não há a evacuação da ideia de competitividade, que deve ser ponderada face a outros princípios, a outras orientações, do ponto de vista da qualidade ambiental e da coesão social.
No que toca à questão colocada pelo Sr. Deputado José Soeiro relativamente ao regime extraordinário de apoio à reabilitação e ao IMI, gostaria de dar a explicação seguinte: este esforço para estimular a reabilitação do edificado em Portugal, numa óptica de revitalização, deve ser um esforço conjunto. A sua urgência é indiscutível, o esforço tem de ser conjunto do ponto de vista da administração central e das autarquias. O que o regime extraordinário de apoio consagra, bem como o artigo referente ao IVA nesta proposta de lei do Orçamento do Estado, é justamente esse esforço. No que se refere, concretamente, ao IMI o que é identificado é a possibilidade, se as autarquias assim quiserem, de poderem recorrer (porque neste momento não podem) à isenção ao IMI, neste contexto e nas condições que são definidas.
Devo dizer que respeitamos completamente a autonomia municipal. Caberá, pois, aos municípios definir as áreas de reabilitação urbana onde se aplica este princípio e caberá aos municípios definir exactamente a configuração e a aplicação deste princípio. O que estamos a consagrar é esta possibilidade. A sua concretização dependerá da decisão do município e pressupõe a aprovação em assembleia municipal.
O Estado não se desresponsabiliza deste pacote, por isso intervém ao nível daquilo que pode intervir directamente, do IRC, do IVA. O que damos é um sinal positivo, dando condições para que as autarquias, se o quiserem e quando quiserem, possam fazer parte deste esforço conjunto.
Finalmente, respondendo à Sr.ª Deputada Alda Macedo, gostaria de dizer que tem razão quando refere que os 38,8 milhões de euros envolvem também a questão do NRAU.
Como sabemos, este Governo aposta fortemente na dinamização do mercado de arrendamento, em geral, e no mercado de arrendamento de vocação social em particular. Pergunta se as coisas estão a andar com a velocidade que gostaríamos. Não. É óbvio que não! Por isso, fazemos a avaliação e humildemente tentamos dar passos mais sólidos. Por esta razão estamos a desenvolver uma série de passos em simultâneo, quer do ponto de vista da componente fiscal, quer do ponto de vista da componente legislativa, quer do ponto de vista dos instrumentos de gestão, para que o efeito cumulativo destas três dimensões possa permitir o que todos desejamos: a dinamização do mercado do arrendamento e, sobretudo, a dinamização do mercado do arrendamento de vocação social.
Infelizmente — não para o Governo, mas para o País, para todos nós —, os efeitos do NRAU não são tão rápidos quanto gostaríamos. Isto significa que destes 38,8 milhões de euros não há uma verba pré-afectada, mas a percentagem que será afectada ao NRAU será relativamente pequena em 2008. No entanto, não é esse o nosso objectivo, uma vez que queremos poder concretizar a dinamização do mercado de arrendamento, pelo que esta actuação é fundamental, do ponto de vista da fiscalidade, da legislação, dos instrumentos de gestão.
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Para terminar, gostaria de dizer à Sr.ª Deputada Alda Macedo que estamos a trabalhar e que será publicado muito em breve o diploma relativo ao regime de arrendamento social, que tem a ver justamente com alguns dos aspectos a que a Sr.ª Deputada se referiu há pouco.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, a quem peço brevidade nos esclarecimentos que vai prestar.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional (Rui Nuno Baleiras): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Eduardo Martins, relativamente à questão dos atrasos do QREN, devo dizer que julgava que esta questão estava já encerrada. Mas como parece que as explicações dadas pelo Sr. Ministro não terão sido suficientes, vamos a factos e a informação de fontes independentes do Governo.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Só lhe fiz uma pergunta! Quanto é que gastaram do QREN em 2007?
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Não. O Sr. Deputado voltou a pôr em causa, acenando com informação da Comissão Europeia de que Portugal estava atrasado.
Ser-lhe-á distribuída uma entrevista com declarações da Sr.ª Comissária Danuta Hübner, em que ela diz «preto no branco» que, em relação aos programas operacionais, já estão mais ou menos a meio da sua aprovação e que Portugal já tem quase todos os seus programas assinados.
Quer dados objectivos? Há, na União Europeia, 455 programas operacionais para o período de 2007 a 2013. Sabe quantos estavam aprovados na véspera da assinatura dos 10 programas portugueses?! Com os 10 programas portugueses estavam aprovados 161 em 455 programas operacionais!
Aparte inaudível do Deputado do PSD José Eduardo Martins.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Desculpe, mas a observação sobre o atraso tem de ser vista em termos relativos e, em termos internacionais, estamos, como estivemos nos ciclos anteriores de programação, entre os primeiros países.
A Espanha, país com que gostamos de nos comparar, terá 45 programas operacionais. Sabe quantos programas operacionais estavam aprovados para Espanha no dia 22 de Outubro? Nenhum! A Grécia, um outro país da coesão, tem 14 programas operacionais. Sabe quantos estavam aprovados no momento em que Portugal já tinha os seus programas operacionais aprovados? Nenhum! Itália tem 52 programas operacionais e ainda lhe faltava a aprovação para 35! O Reino Unido tem 22, dos quais 15 ainda não tinham aprovação. A República Checa tem 10 programas operacionais e ainda lhe falta aprovação para esses mesmos 10 programas. Estamos, portanto, esclarecidos quanto à posição relativa de Portugal.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe que conclua, Sr. Secretário de Estado.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Com certeza.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Responda à pergunta!
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Respondo, sim! Na próxima quinta-feira, o Sr. Deputado e o País tomarão conhecimento das condições de abertura dos primeiros concursos no âmbito dos sistemas de incentivos às empresas. Serão colocados a concurso nesse momento, concurso que decorrerá desde essa altura até Janeiro de 2008, mais de 200 milhões de euros de FEDER, a que corresponderá um investimento total das empresas bem superior a 400 milhões de euros.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Não foi essa a pergunta que fiz!
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O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Sr. Deputado José Soeiro, compreendo a sua preocupação com a concentração de recursos financeiros em Lisboa.
Protestos do Deputado do PSD José Eduardo Martins.
O Sr. Deputado quer falar ou deixa-me continuar a resposta?!
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, faça o favor de concluir.
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Muito obrigado! Sr. Deputado José Soeiro, o PIDDAC é apenas um dos instrumentos de redistribuição de recursos financeiros em termos geográficos, mas não é, porventura, o mais importante. Temos as transferências do Estado para a administração local, que são eventualmente bem mais importantes, uma vez que, graças a essas transferências, que representam mais de 60% dos recursos das autarquias locais, é possível a estas autarquias realizarem cerca de 60% do investimento público em Portugal.
Depois, temos também as despesas do sector público empresarial. O Sr. Ministro referiu há pouco 800 milhões de euros de investimento do Grupo Águas de Portugal, que é feito, fundamentalmente, fora de Lisboa e fora do PIDDAC. E temos muitas transferências do sector público administrativo para parcerias públicoprivadas e muita despesa feita nas regiões pela administração central, que, como sabem, não é passível de ser regionalizada do ponto de vista contabilístico.
Mas, no que diz respeito a instrumentos financeiros que estão sob alçada directa deste Ministério, gostaria de lembrar que não só os recursos comunitários para Lisboa – o FEDER e o Fundo Social Europeu – passarão a representar apenas 2,7% do «envelope» total de fundos, contra 15% no QCA III, como ainda que no Orçamento para 2008 as CCDR vêem o seu orçamento reforçado. O Alentejo, por exemplo, terá mais 3,3% no orçamento de funcionamento e o Algarve mais 5,8%. Em termos de PIDDAC, a CCDR-Norte vai crescer 55,6%, o PIDDAC da CCDR-Centro cresce 42% e o da CCDR-Algarve cresce 24,4%.
Sr. Deputado António Carlos Monteiro, acerca da taxa de execução do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional, os números que V. Ex.ª nos fez chegar, e que agradeço, dizem respeito à execução dos vários Ministérios observada até 30 de Setembro de 2007.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Foi o que eu disse!
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Exactamente! São 53,1%!
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Mas o Sr. Ministro disse que não era!
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — Não, o Sr. Ministro referiu que a execução prevista até final de 2007 é de 77,5%. Mas deixe-me explicar que os dois números são compatíveis, porque este Ministério, devido à enorme componente de obras públicas que tem nos seus serviços, apresenta uma enorme sazonalidade ao longo do ano. Muitas intervenções de obras públicas, as mais pesadas em termos de PIDDAC, são realizadas na época de estio e, portanto, apenas têm tradução financeira no último trimestre, e é isso que explica a recuperação que iremos ter daqui até ao fim do ano.
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — E o Sr. Ministro das Obras Públicas não tem o mesmo problema?!
O Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional: — No que toca às perguntas específicas que fez sobre medidas e projectos de serviços, o Sr. Deputado teve todo o tempo do mundo para preparar essas questões tão concretas. De qualquer modo, tenho toda a disponibilidade para, se me fizer chegar por escrito essas questões, lhes dar resposta, porque, obviamente, são demasiadamente específicas para responder aqui.
O Sr. Presidente: — Sr. Ministro, para encerrar o debate, tem a palavra por 1 minuto.
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O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — Talvez nem precise de tanto, Sr. Presidente.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Sr. Presidente, não há uma terceira ronda?
O Sr. Presidente: — Não há terceira ronda, Sr. Deputado. Há apenas duas rondas de perguntas. São estas as «regras do jogo» que foram aprioristicamente definidas no início da reunião.
Esta Comissão tem de realizar mais duas audições da parte da tarde e eu tenho de ser rigoroso no controlo dos tempos, já estando a ser magnânime em relação à disponibilidade do tempo para cada um dos Srs. Deputados.
Todavia, se quiser fazer uma interpelação à mesa, tem a palavra.
O Sr. José Eduardo Martins (PSD): — Farei uma brevíssima interpelação à mesa sobre uma matéria muito simples.
Agradeço muito a intervenção do Sr. Secretário de Estado do Ambiente, que prestou vários esclarecimentos, mas confirmou o receio de que vamos ter tanta mais folga no PNALE (Plano Nacional de Atribuição de Licenças de Emissão) e no resto quanto mais investimento tivermos no Fundo de Carbono. E lembro que, apesar dos esforços do Sr. Secretário de Estado, estamos longe dos objectivos propostos. De qualquer modo, agradeço a resposta, porque fiquei esclarecido.
Esta intervenção do Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, na linha daquilo a que nos vem habituando, foi absolutamente extraordinária e merecia muitos comentários.
Todavia, vou apenas repetir a pergunta. Independentemente de o Governo se dedicar a distribuir fotocópias de jornais, o PSD fez duas vezes, nas duas rondas, uma pergunta a que o Governo não respondeu. Como tal, só queria registar junto da mesa que o Governo não sabe responder a essa pergunta.
Protestos do PS.
A pergunta é a seguinte: no âmbito do Quadro de Referência Estratégico Nacional que o Governo, ufanamente, vezes sem conta, diz que se executaria ainda em 2007, retroagindo as despesas a Janeiro de 2007, quero saber qual é o volume de comparticipação financeira nacional do Orçamento do Estado em 2007 para a execução do QREN. Trata-se de uma pergunta que fiz duas vezes. Se o Governo não responder nesta última oportunidade que tem é porque não sabe!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, queria só lembrar-lhe que nos termos regimentais – e sou muito rigoroso no cumprimento da letra e do espírito da lei – só há lugar a interpelações à mesa quando houver dúvidas sobre algum ponto da ordem do dia ou, então, se houver alguma questão relativamente à organização dos trabalhos.
Ora, a questão que colocou agora não teve a ver nem com uma nem com outra matéria. Tratou-se apenas da repristinação ou da lembrança de que há uma pergunta que não foi respondida. Mas tal não cabe, manifestamente, na alçada dessa previsão regimental, que é a interpelação à mesa.
De qualquer forma, fica registada a sua observação.
Solicito ao Sr. Deputado António Carlos Monteiro, que também solicitou a palavra, que não vá pelo mesmo caminho, ou seja, que faça uma verdadeira interpelação à mesa nos termos do que está previsto no Regimento.
Tem a palavra, Sr. Deputado
O Sr. António Carlos Monteiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, quero fazer uma interpelação à mesa sobre a condução dos trabalhos.
Pensei que estas reuniões tinham lugar para que o Governo respondesse às perguntas que aqui são feitas, mas o Sr. Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional – não sei se o Sr. Presidente o registou – disseme a mim e ao CDS que, a partir de agora, as perguntas deveriam ser feitas por escrito. Sr. Presidente, penso que esse não é o modelo adoptado para estas audições!
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Preocupa-me, contudo, que o Sr. Secretário de Estado não consiga explicar as discrepâncias entre o Relatório e o PIDDAC. Como tal, quanto às Medidas 10 e 11, Sr. Presidente, penso que era importante instar o Sr.
Secretário de Estado no sentido de lhe explicar que estas audiências servem para que o Governo preste esclarecimentos e não para que apresentemos as nossas perguntas por escrito.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, uma vez mais não se tratou de uma interpelação à mesa, mas apenas de uma observação que fica registada.
Naturalmente, estes debates destinam-se a apurar, na especialidade, as diversas linhas de força relativamente às áreas tuteladas, neste caso pelo Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional. O Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado responderam e responderão de acordo com a amplitude da informação de que dispõem. O juízo relativamente à bondade ou à falta dela das respostas compete aos Srs. Deputados e a todos os que nos ouvem. Por aqui me fico! Darei agora a palavra ao Sr. Ministro para uma õltima resposta»
A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — Peço a palavra, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Se é para uma interpelação à mesa tout-court, admito. Se não for, peço desculpa, mas, dado o adiantado da hora, teremos de prosseguir.
A Sr.ª Jovita Ladeira (PS): — Sr. Presidente, na verdadeira acepção da palavra, pretendo fazer uma interpelação à mesa.
O Grupo Parlamentar do Partido Socialista quer lavrar o seu protesto pela forma como, na parte final da reunião, foram conduzidos os trabalhos desta Comissão, tendo sido permitidas intervenções de outras bancadas parlamentares quando havia um acordo prévio no sentido de que essas intervenções seriam feitas no estrito espaço que lhes estaria destinado.
Queremos lavrar em acta este voto de protesto, porque queremos que fique bem explícita a nossa não aceitação da condução dos trabalhos da mesa no final da reunião.
O Sr. Presidente: — Fica lavrado esse protesto e desde já lhe respondo que ele não tem razão de ser, porque não admiti nenhuma intervenção adicional para além das que estavam programadas.
Foram feitas, contudo, por dois Srs. Deputados, duas supostas interpelações à mesa e eu, naturalmente, sem conhecer o âmago das mesmas, tive de as aceitar.
O assunto, Sr.ª Deputada, está encerrado por aqui! Passo, agora, a palavra ao Sr. Ministro para uma última intervenção, respondendo às questões que lhe foram colocadas.
O Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional: — É claro que a estas interpelações à mesa, que são, na realidade, perguntas à mesa, não me cabe responder, muito menos quando dizem respeito ao Orçamento de 2007 quando o que está em discussão é o Orçamento para 2008.
O que penso que temos aqui é claramente uma aposta estratégica errada feita pelo PSD, que repetiu à exaustão que havia atrasos na aprovação do QREN. Quando Portugal é um dos primeiros países a operacionalizar o seu Quadro de Referência Estratégico Nacional, quando os Comissários europeus o reconhecem, quando o Presidente da Comissão Europeia o reconhece, o PSD, embaraçado, procura atirar poeira para os olhos e insistir na mesma tecla, querendo tornar verdade, à força da repetição, aquilo que as próprias instâncias comunitárias ao mais alto nível desmentem. Compreendo o embaraço que isso causa nas contas que têm de prestar perante o País e, internamente, pelas contas que têm de prestar por terem influenciado o vosso partido nessa linha de rumo absolutamente suicida que é a forma como têm tratado a questão do QREN.
Apenas para fechar o debate, porque a hora é tardia, direi que o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional orgulha-se de conciliar um pensamento estratégico relativamente às grandes áreas de intervenção que lhe cabem com uma capacidade de execução e de intervenção real, no terreno, sobre tantas áreas que são tão relevantes para a vida dos portugueses.
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Desta conciliação de uma visão estratégica com a capacidade de intervenção são excelentes exemplos os domínios que comecei por destacar no início: o QREN — e Portugal é um dos primeiros países a operacionalizá-lo na Europa; a reabilitação urbana – e este é o pacote para a reabilitação urbana mais ousado e mais capaz de fazer a diferença alguma vez aprovado em Portugal; e a gestão da água, onde, por um lado, o PEAASAR e, por outro, as alterações institucionais criam um novo ciclo.
O Orçamento do Estado para 2008 é ainda um Orçamento de grande contenção. E este é, inevitavelmente, o nosso contributo para o sucesso da aposta política maior que é o reequilíbrio das contas públicas. É ainda um Orçamento de contenção. Não é aquele que gostaríamos que fosse. Queríamos que ele fosse muito mais folgado, porque teríamos muito mais para fazer. Mas ele é plenamente suficiente e plenamente instrumental para alcançar os objectivos a que nos propomos.
Quero terminar, agradecendo aos Srs. Deputados as questões que colocaram. Apesar de o ambiente nem sempre ter sido o mais amável, pela nossa parte procurámos responder às perguntas. Infelizmente, num debate deste tipo, há sempre um ou outro pormenor que acaba por ficar a descoberto. Lamentamos isso. O tempo é muito escasso. Em qualquer dos casos, as vossas perguntas são sempre, para nós, muito estimulantes.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro.
Permitam-me que, em nome da Comissão de Orçamento e Finanças, da Comissão de Poder Local, Ambiente e Ordenamento do Território, cujo Presidente, o Deputado António Ramos Preto, esteve presente desde o início, e ainda em nome da Comissão de Assuntos Económicos, Inovação e Desenvolvimento Regional, cujo Presidente, o Deputado Rui Vieira, também aqui esteve presente no início da reunião, agradeça ao Sr.
Ministro e ao Sr. Secretário de Estado o prestimoso contributo que deram para o esclarecimentos destas questões.
Naturalmente que, aqui e ali, o debate foi um pouco crispado, mas isso também faz parte da dialéctica parlamentar. Só quem não a conhece é que o estranha. Como eu já tenho alguma prática destas coisas, não levo a mal algum despique, algum calor e alguma intensidade, por vezes excessiva, da emoção a que, naturalmente, o debate político sempre se presta.
De qualquer forma foi, sem dúvida alguma, um debate rico e esclarecedor. Penso que todos ficámos mais bem informados sobre as linhas de força da proposta de lei do Orçamento do Estado relativas às matérias do Ministério que V. Ex.ª tutela, concretamente as áreas do ordenamento do território, do ambiente e do desenvolvimento regional.
Muito obrigado, Sr. Ministro e Sr. Secretário de Estado. Esperamos vê-los, numa próxima oportunidade, aqui, no Parlamento e nas nossas comissões.
Srs. Deputados, está interrompida a reunião.
Eram 13 horas e 50 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 15 horas e 15 minutos.
Srs. Deputados, vamos reiniciar a reunião, contando agora com a presença da Sr.ª Ministra da Cultura e do Sr. Secretário de Estado.
A Sr.ª Ministra vem cá hoje no âmbito da discussão na especialidade do Orçamento. Trata-se de uma obrigação que decorre da Constituição e do Regimento.
Naturalmente que os Srs. Deputados querem conhecer as linhas orientadoras da área da cultura ínsitas, plasmadas, na proposta de lei do Orçamento do Estado para 2008.
Sabemos como a cultura é hoje importante nas políticas públicas. Todos conhecemos igualmente a escassez de recursos e a necessidade de contenção orçamental que subjaz a qualquer política pública e também, natural e necessariamente, à cultura. Mas há alguns indicadores positivos: se a memória não me atraiçoa, trata-se de um orçamento para 2008 na casa dos 250 milhões de euros — um acréscimo de cerca de 9% relativamente ao orçamento de 2007. Isto augura sinais positivos em relação a uma aposta na cultura, sabido como é também que essa matéria tem sido uma das mais glosadas no debate político, posto que nem sempre
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o investimento na cultura tem sido o necessário e suficiente, tendo em vista a defesa dos nossos valores pátrios, designadamente no que concerne à língua e à cultura portuguesas.
É, pois, com a perspectiva de conhecermos as guidelines, as linhas orientadoras, na área da cultura que hoje temos aqui a Sr.ª Ministra da Cultura e o Sr. Secretário de Estado da Cultura, que certamente não deixarão de dilucidar todas as questões que vierem a ser colocadas pelos Srs. Deputados, com vista a um esclarecimento cabal das propostas concretas na área da cultura, ínsitas no Orçamento do Estado para 2008.
A Sr.ª Ministra da Cultura terá a palavra inicialmente para fazer uma primeira apresentação. Será uma introdução de cerca de 15 minutos, a que se seguirá uma primeira ronda de perguntas. É este o modus operandi desta reunião, na esteira e à semelhança do que tem sucedido com outros ministérios.
Na primeira ronda de perguntas, cada grupo parlamentar terá direito a 5 minutos de intervenção e a Sr.ª Ministra responderá directamente a cada grupo parlamentar; numa segunda ronda de perguntas, caberão 2 minutos a cada grupo parlamentar e eu farei um agrupamento em bloco dessas mesmas perguntas, a que a Sr.ª Ministra responderá.
Chamo a atenção para duas notas finais, que não são de somenos.
A primeira é a de que o tempo é limitado: às 17 horas, está prevista uma nova audição, com o Sr. Ministro da Administração Interna, pelo que tenho de respeitar escrupulosamente o tempo que está consignado para a realização desta reunião.
A segunda nota é a seguinte: gostava que houvesse um escrupuloso respeito do que o Regimento determina em matéria de interpelações à Mesa, que nem sempre são utilizadas com a necessária probidade e rigor que o Regimento determina. Ou seja, as interpelações a Mesa não devem ser utilizadas para colocar novas perguntas ou para fazer intervenções adicionais; devem cingir-se, exclusivamente, àquilo que está previsto no Regimento, isto é, para dilucidar algumas dúvidas que possam ter sido suscitadas ou, então, para interrogar o Presidente ou a mesa sobre a condução dos trabalhos.
Tem a palavra, Sr.ª Ministra.
A Sr.ª Ministra da Cultura (Isabel Pires de Lima): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O orçamento do Ministério da Cultura para 2008 apresenta um valor global de 246,6 milhões de euros, o que representa um crescimento de 9,2% face ao valor estimado da execução para o corrente ano e de 3,2% relativamente ao valor das receitas gerais do Orçamento do Estado de 2007.
O Ministério da Cultura é, pois, um dos quatro Ministérios cujo orçamento inicial para 2008 aumenta. Reconhecemos que ainda estamos longe da meta traçada para a Legislatura, a de atingir 1% do Orçamento do Estado para a cultura. Mas também estamos conscientes de que o mesmo se deve à prossecução do esforço de consolidação das contas públicas, com o qual o Ministério da Cultura é solidário.
No entanto, quero salientar que, desde 2005, a elevada execução orçamental do Ministério da Cultura tem revelado que estamos a trabalhar no caminho certo. Senão, vejamos: em 2002, um dos anos com maior orçamento para a cultura, 293,5 milhões de euros, foram apenas executados 232,5 milhões de euros; em 2004, o último ano de um governo do PSD, com o orçamento de 273,4 milhões de euros, foram executados, tão só, 223,8 milhões de euros, isto é, foi a pior execução desde 2000 — o orçamento subira, mas a execução desceu.
Ora, em contraposição, os anos de 2005 e 2006 correspondem às maiores execuções desde 2000: 249,2 milhões de euros em 2005 e 259,4 milhões de euros em 2006. Estamos perante percentagens de execução na ordem dos 87,4% e 97,7%, respectivamente, relativas aos anos de 2005 a 2006. Ou seja, 2005 e 2006 foram os anos em que mais dinheiro se aplicou na cultura.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, é esta linha de actuação que nos permite referir que, embora ainda longe do desejável do ponto de vista orçamental, temos trabalhado e executado de forma nunca conseguida no Ministério da Cultura, mas não nos contentamos em trabalhar só com as verbas transferidas pelo Orçamento do Estado.
Sempre disse que entendo que a cultura deve também viver de parcerias publico-privadas e que a sociedade civil tem responsabilidades nesta matéria. Precisamente por isso, temos efectuado um trabalho junto da sociedade civil de forma a conseguirmos mais mecenas para o sector cultural e, neste sentido, permitam-me referir com agrado que o índice de apoio mecenático voltou a crescer depois de alguns anos de regressão.
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Desde 2005 que esse apoio tem crescido, atingindo este ano, até ao momento, uma verba que ronda os 7,2 milhões de euros — valores nunca antes aproximados. Um exemplo concreto: em 2003, o apoio mecenático conseguido pelo Ministério da Cultura foi de 3,2 milhões de euros, menos 4 milhões do que o conseguido até ao momento no corrente ano. Repito: 4 milhões de euros a menos! Este é um trabalho que iremos continuar a desenvolver, certos de que ele é revelador da confiança da sociedade civil, nas políticas deste Governo. Tudo indica que este valor será ultrapassado ainda no ano de 2008.
Quero, nesta Assembleia, deixar uma palavra de agradecimento a todos os que têm participado numa mudança da cultura mecenática em Portugal, passando a apoiar cada vez mais projectos na área da cultura. O tecido empresarial tem vindo a compreender quanto é prestigiante para as empresas e qualificador para o País apoiar a cultura.
No tocante ao orçamento do Ministério para 2008, o esforço do Estado atingirá, no que concerne ao orçamento de funcionamento, 105,2 milhões de euros, correspondendo ao crescimento de 4% face a 2007. O financiamento comunitário crescerá 20,9%, atingindo o valor de 1,6 milhões de euros.
A variação positiva destas duas fontes de financiamento compensará a variação negativa do autofinanciamento em 2,6 milhões de euros, representando menos 4,1% face a 2007. Esta variação negativa regista-se principalmente pela perda das receitas do Palácio da Pena, que transitou agora plenamente da tutela do Ministério para a empresa pública Parques de Sintra-Monte da Lua.
No que respeita ao investimento público na área da cultura, este será impulsionado mais 1,8% face a 2007, atingindo o montante de 54,5 milhões de euros. Os fundos comunitários e o auto-financiamento registarão variações positivas de 41,4% e de 3,9% face a 2007, respectivamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados, embora este crescimento orçamental seja tímido, permite sedimentar as principais linhas de actuação do Governo na área da cultura.
Na salvaguarda e valorização do património cultural, o Governo prevê uma despesa de 106,8 milhões de euros, assegurando a continuidade dos principais projectos nesta área, dos quais destaco as intervenções no Mosteiro de São Martinho de Tibães, no Convento de Cristo e no Convento de Jesus.
Quero deter-me especialmente na vertente museológica, dado constituir uma das prioridades desta tutela, prioridade plasmada no significativo aumento do número de visitantes que, em 2006, foi da ordem de 27%, prioridade também evidenciada na ultrapassagem, há meses, de um velho problema que vinha assaltando periodicamente o funcionamento dos museus: vigilância e recepção. Posso anunciar que o Sr. Ministro das Finanças já assinou o despacho que autoriza a permanência de 90 funcionários por um período de seis meses, pondo termo à situação que eclodira no final da semana passada em alguns museus.
Assinalo, para 2008, a conclusão da construção do Museu de Arte e Arqueologia do Vale do Côa e do Museu do Douro, ambos há muitos anos prometidos mas nunca concretizados; a reabertura do Museu José Malhoa, no primeiro semestre; os Museus de Aveiro e de Évora e a primeira fase do Museu Nacional Machado de Castro, reabrirão ao público, altamente requalificados, no segundo semestre de 2008.
Também no segundo semestre de 2008, será inaugurado o novo Museu Mar da Língua Portuguesa, que é, mais exactamente, um museu que poderei apresentar como um centro temático de exposição e comunicação interactiva, denominado Mar da Língua Portuguesa, que proporcionará experiências e percursos interpretativos das explorações oceânicas portuguesas e da inerente disseminação do português, recorrendo a tecnologias audiovisuais interactivas. Será implementado no edifício em recuperação do antigo Museu de Arte Popular, encerrado há mais de 10 anos, numa perspectiva de dinamizar o pólo cultural Belém-Ajuda, estabelecendo sinergias com outros elementos culturais correlacionados, nomeadamente o Padrão dos Descobrimentos, a Torre de Belém, o Mosteiro dos Jerónimos, o Museu da Marinha e o Planetário.
O investimento total rondará os 3 milhões de euros e terá co-financiamentos comunitários de cerca de 1,63 milhões de euros. Quer isto dizer que, no próximo ano, para além dos museus requalificados que referi, o Ministério da Cultura abrirá três novos museus de raiz: o Museu de Arte e Arqueologia do Vale do Côa, o Museu do Douro e o Museu Mar da Língua Portuguesa.
O esforço financeiro que esta operação comporta, no ano de 2008, será de 13 milhões de euros.
Também no que respeita à política museológica, quero salientar a reabertura da credenciação de novos museus e consequente alargamento da Rede Portuguesa de Museus.
O apoio à criação artística e difusão cultural será contemplado, este ano, com uma dotação de 107 milhões de euros, permitindo-me destacar a manutenção dos níveis de apoio às artes, com uma despesa global de 18,6 milhões de euros, dos quais 16,5 relativos a apoios sustentados e 2,1 milhões de euros a apoios pontuais.
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Na produção cinematográfica, o Ministério da Cultura continuará a assegurar um apoio de 12 milhões de euros, aos quais acrescem 16 milhões de euros pelo novo Fundo do Cinema e do Audiovisual, destinados, em partes iguais, à produção cinematográfica e audiovisual. Quer isto dizer que o apoio ao cinema, ao cinema de autor, continuará a ser uma linha estratégica da política cultural do Ministério da Cultura, acrescida de instrumentos novos, determinantes para a qualificação do audiovisual e robustecimento das pequenas e médias empresas, no montante de 28 milhões de euros. Este é mais um exemplo que gostaria de realçar, no que respeita às parcerias público-privadas desenvolvidas pelo Ministério da Cultura. Esta parceria permitirá aumentar, em 2008, a dotação de apoio ao cinema e ao audiovisual em mais 16 milhões de euros, não incluídos no valor global do orçamento que, há pouco, referi, para 2008, de 246,6 milhões de euros.
Será prosseguida a qualificação do tecido cultural, com um financiamento previsto de 28,4 milhões de euros.
Será assegurada a continuação da construção da rede de bibliotecas públicas, sendo que serão inauguradas, em 2008, 20 novas bibliotecas, num total de 157 bibliotecas em funcionamento e de 194 contratosprograma já assinados.
Continuar-se-á também a construção da Rede Portuguesa de Museus e de arquivos. Permito-me destacar o início da construção, em 2008, do novo arquivo distrital de Viseu e assinalar, muito especialmente, o início da ampliação dos depósitos da Biblioteca Nacional de Portugal, com a construção da chamada «segunda torre».
Este é um projecto fundamental para a Biblioteca Nacional de Portugal, a qual está, há muito, carenciada de um novo espaço de depósito e verá, finalmente, esta sua necessidade imperiosa ultrapassada, ficando, enfim, concluído o projecto inicial dos anos 50, do arquitecto Pardal Monteiro.
Para 2008, a promoção e difusão internacional da cultura portuguesa será contemplada com um montante de 2,8 milhões de euros, permitindo-me destacar as «Comemorações dos 200 anos da chegada do Príncipe Regente e da família real ao Brasil: 1808-2008», a participação nas Bienais de Artes Visuais de São Paulo e de Arquitectura de Veneza, nas Feiras do Livro de Frankfurt e de Bolonha e na Bienal do Livro de São Paulo.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Orçamento para 2008 incorpora o novo desenho orgânico resultante da aplicação do PRACE no Ministério da Cultura. Embora algumas das suas implicações apenas possam ser completamente medidas a médio e longo prazo, é possível fazer um primeiro balanço das medidas já implementadas.
Procuraram-se obter ganhos de eficiência no funcionamento do Ministério da Cultura, simplificando-se as estruturas e reduzindo-se os níveis de decisão. A nível das direcções superiores, reduziram-se, de 41 para 32, os lugares existentes e, ao nível da direcção intermédia, passámos de 203 para 153 lugares.
Em termos de despesa, obteve-se uma redução anual de encargos na ordem de 2,5 milhões de euros.
A aplicação do PRACE no Ministério da Cultura conduziu a uma maior desconcentração de serviços. Ao nível dos serviços dependentes, alteraram-se as regras do seu financiamento, alargando a natureza das receitas que, doravante, revertem directamente para o seu orçamento.
Ao nível dos serviços desconcentrados de âmbito regional, procedeu-se a uma estruturação de acordo com as cinco regiões do plano, implicando a criação, desde há muito reclamada, da Direcção Regional de Cultura de Lisboa e Vale do Tejo.
Atribuíram-se mais competências em matéria de salvaguarda e gestão do património, visando-se uma maior aproximação dos centros de decisão às realidades locais. No âmbito desta reestruturação, todos os organismos de produção artística tutelados pelo Ministério da Cultura passaram a entidades públicas empresariais, designadamente nos casos concretos do Teatro Nacional D. Maria II, do Teatro Nacional de São João e com a criação da OPART, que integra o Teatro Nacional de São Carlos e a Companhia Nacional de Bailado.
Respondeu-se desta forma a um anseio de muitos anos das respectivas direcções, visando uma gestão mais adequada ao planeamento plurianual das actividades.
Com o PRACE, passou também o Ministério da Cultura a tutelar a Fundação Ricardo Espírito Santo, que se mantinha, há décadas, sob a tutela do Ministério das Finanças.
O Ministério da Cultura concluiu já os trabalhos relativos à terceira fase do PRACE, que se saldam por uma proposta de redução global de 97 postos de trabalho, mas com crescimentos reais na área dos arquivos — mais 23 lugares — e dos museus — mais 178 lugares —, visando, essencialmente, dar resposta à carência de pessoal de conservação, vigilância e recepção.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: O Ministério da Cultura está consciente das dificuldades, mas solidário, como sempre, com a política de contenção orçamental do Governo. Não quero, porém, deixar de salientar o
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seguinte: investe-se mais, melhor e de forma mais eficiente na cultura em Portugal. Os números da execução orçamental que já foram aduzidos permitem-nos afirmá-lo; o aumento de públicos na cultura também prova o que acabo de referir.
É esta forma de trabalhar que nos permite estar aqui, perante vós, com a consciência de que estamos a contribuir, de forma positiva, para o desenvolvimento e crescimento do tecido cultural português, não deixando de participar no esforço para o equilíbrio das finanças públicas. É claro que não podemos nem queremos agradar a todos, sabemos as dificuldades com que nos deparamos, mas o mais importante é que temos o rumo, temos uma política que queremos seguir e não pretendemos desviar-nos desse trajecto que — acreditamos! — leva os portugueses e Portugal a saírem com ganho das nossas opções políticas.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr.ª Ministra da Cultura, por esta sua intervenção inicial.
Para iniciar o debate, com a primeira ronda de perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte.
O Sr. Feliciano Barreiras Duarte (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, antes de mais, permitam-me que, em meu nome e em nome do Grupo Parlamentar do PSD, vos cumprimente. É com gosto que temos a oportunidade de colocar algumas questões ao Governo nesta área.
Procurando respeitar aquilo que o Sr. Presidente referiu, ao dar início a esta nossa reunião, nesta primeira ronda, tentarei ser muito concreto em algumas questões que irei colocar, para respeitar os limites de tempo.
Sr.ª Ministra da Cultura, ouvi, com muita atenção, a intervenção que V. Ex.ª aqui fez, aliás, como sabe, do ponto de vista pessoal e político, tenho respeito pela Sr.ª Ministra, e, portanto, não leve a mal que, antes de lhe colocar algumas questões, faça dois comentários.
Em primeiro lugar, não posso deixar de dizer que, hoje, em face de parte da intervenção da Sr.ª Ministra, quem não estivesse no País nos últimos tempos talvez ficasse a pensar que a cultura é uma das áreas de sucesso deste Governo. Mas, permita-me que lhe diga que, na opinião do PSD, não é assim. E não é assim por aquilo para que temos vindo, nos últimos tempos, a chamar a atenção da Sr.ª Ministra e, ao mesmo tempo, por algumas questões concretas que lhe temos vindo a colocar, não apenas em sede parlamentar.
Pego nas palavras que a Sr.ª Ministra usou, por duas vezes, quando disse, e penso que não a interpretei mal, que tem consciência de que as verbas disponíveis, os dinheiros públicos alocados para o sector da cultura não são aqueles que, em concreto, desejaria, já que gostaria de ter mais dinheiro. Mas a Sr.ª Ministra referiu que assim é, porque o Ministério da Cultura é solidário com a consolidação das nossas finanças públicas. Pois é, Sr.ª Ministra! Fica-lhe bem dizer isso, mas, se assim é, terá de reconhecer que, quando se procura ser rigoroso na aplicação dos dinheiros públicos, os critérios de aplicação desses dinheiros públicos devem ser considerados de uma outra forma. E dou-lhe o exemplo do Hermitage. Sei que é um tema de que a Sr.ª Ministra não gosta que se fale muito, mas, se calhar, nos critérios de aplicação dos dinheiros públicos, a questão do Hermitage é elucidativa daquilo que, na nossa opinião, não deve ser feito. É que a inauguração recente desta exposição, em Lisboa, acontece depois de, segundo números oficiais do seu próprio Ministério, terem sido gastos mais de 1,5 milhões de euros, aos quais se têm de acrescentar cerca de 900 000 € relativos ás obras que foi necessário realizar na Galeria D. Luís para a instalação da referida exposição, já para não somar outras verbas, nomeadamente 0,5 milhões de euros, que foram comparticipados pela Secretaria de Estado do Turismo, e já para não referir que gostaríamos de saber que despesas correntes foi necessário realizar, ao longo de todo este processo, para instalar o Hermitage em Portugal. Isto, para nós, PSD, é importante, não porque sejamos contra o Hermitage, aliás, reconhecemos, com certeza, a importância de uma exposição desta envergadura, mas porque entendemos que, neste momento, dados os parcos recursos de que o Ministério da Cultura dispõe, talvez as prioridades devessem ser outras. É neste sentido que entro directamente para a primeira questão.
Quero perguntar, de forma muito clara, se a Sr.ª Ministra e o Governo vão demitir o Director do Instituto dos Museus e da Conservação. Outra coisa não será de esperar, a fazer fé naquilo que, hoje, um respeitável órgão de comunicação social refere como sendo declarações da Sr.ª Ministra, quando «sacode a água do capote», dizendo que o problema que tem existido em Portugal, no que diz respeito ao encerramento e à falta de pessoal de alguns museus portugueses, se deve, passo a expressão, à incúria que tem existido, da parte dos responsáveis desses museus, em dar conhecimento à Ministra ou à tutela da necessidade urgente de se resolverem esses problemas. Aliás, quase que apostaria que, se hoje não tivéssemos aqui, na Assembleia da Repú-
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blica, a apresentação do orçamento do Ministério da Cultura, se calhar, a Sr.ª Ministra não divulgaria que o Sr.
Ministro das Finanças despachou, finalmente, no sentido de que 90 pessoas possam ser autorizadas, no seu conteúdo funcional, a tentar ficar mais tempo nos museus.
Portanto, não tendo sido desmentidas até ao momento — e não temos conhecimento de que o tenham sido —, estas declarações da Sr.ª Ministra, na nossa opinião, são graves, porque invertem o funcionamento da Administração Pública. Não vamos procurar explanar aqui, do ponto de vista do nosso direito constitucional e administrativo, a tutela que impende, no caso concreto da Sr.ª Ministra da Cultura, sobre o director ou os responsáveis de um instituto público, mas, como sabe, o Governo é o órgão supremo da Administração Pública e, portanto, tem a responsabilidade, ao abrigo da chamada «função executiva ou administrativa», de dar as orientações, do ponto de vista administrativo, aos seus subordinados. No entanto, por aquilo que se percebe, pelos vistos, no Ministério da Cultura, são os subordinados que, hierarquicamente inferiores na sua responsabilidade política, têm de dar as orientações para cima, ao Ministério da Cultura, porque, se não as derem, o Ministério não faz nada, não resolve os problemas.
Penso que, a ser assim, pelas declarações que a Sr.ª Ministra fez, não há outra solução que não a de a Sr.ª Ministra usar a «arma atómica» devida, que é responsabilizar, sancionando, nestes termos, aquele responsável, porque ele não foi capaz de chamar a tempo a Sr.ª Ministra da Cultura, precisamente para resolver este problema.
Nesta questão de saber se a Sr.ª Ministra vai ou não demitir o Sr. Director do Instituto dos Museus e da Conservação, porque, a fazer fé nas suas declarações, ele é o responsável pelos problemas todos que temos tido nos últimos tempos em Portugal, entronca, mais uma vez, a questão do Hermitage.
Sr.ª Ministra, a figura que estamos a fazer em relação ao Hermitage» Sei que a Sr.ª Ministra, antes de ter responsabilidades no Governo, é uma ilustre académica e é uma pessoa que não se fica por Portugal, que até gosta de perceber o que se passa noutros países. E, como a Sr.ª Ministra sabe, até muito melhor do que eu, os países que, normalmente, utilizam uma parceria como a que nós consolidámos, em Portugal, em relação ao Hermitage, são países que não têm um património histórico como o nosso. A Sr.ª Ministra sabe que isso existe noutros países, e até lhe posso dar alguns exemplos, como o inglês, que recorreu a esta situação, usando muito as parcerias com instituições privadas.
Podia dar outros exemplos, que a Sr.ª Ministra conhece muito melhor de que eu, relativos a outras partes do mundo, como é o caso da Arábia Saudita. Como todas as pessoas sabem, a Arábia Saudita e países desse tipo não têm o património que tem o nosso país e, na nossa opinião, o que neste momento acontece com esta exposição é o exemplo de que nós, portugueses, às vezes, gostamos de fazer a figura dos novos-ricos ou, passo a expressão, com o devido respeito, dos parolos: gostamos de receber este tipo de exposições para mostrarmos a algumas elites do nosso país que gostam de ver estas exposições.
Qualquer um de nós gostaria de ver essa exposição. No meu caso concreto, posso dizer-lhe com toda a sinceridade, ainda não tive oportunidade de vê-la, mas gostaria de fazê-lo. Contudo, achamos que quem tem responsabilidades públicas deveria, primeiro, resolver outros problemas do País, e a senhora sabe que isso é verdade, que ainda temos muito para resolver.
Sr.ª Ministra, gostaria também de perguntar-lhe – é só uma pergunta, não faço comentários, porque o PSD já referiu o que tinha a dizer sobre a matéria – se nos pode dizer quanto é que vai ser transferido para o Museu Colecção Berardo de Arte Moderna e Contemporânea, tendo em conta o orçamento de 2008.
Gostaria ainda que pudesse aprofundar a questão da política do livro e da promoção da leitura, que também é uma área que nos interessa.
Por último, Sr.ª Ministra, questiono-a sobre a questão das bibliotecas e dos arquivos.
Ouvimos uma notícia – um exemplo que nos agrada, não escondemos – sobre o Arquivo Distrital de Viseu.
Não nos custa felicitar o Governo, porque finalmente será possível resolver esse problema.
Mas gostaríamos, a propósito do distrito de Viseu, de perguntar à Sr.ª Ministra e ao Governo por que razão para 2008, para o co-financiamento da biblioteca municipal de Vila Nova de Paiva, a verba, que tinha sido protocolada, de cerca de 515 738 € diminuiu para aproximadamente 280 176 €.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
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A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Feliciano Barreiras Duarte, muito obrigada pelas questões que colocou, às quais responderei exactamente pela ordem em que as fez.
Antes de mais, começaria por falar um pouco sobre a exposição «Arte e Cultura do Império Russo nas Colecções do Hermitage — De Pedro, o Grande, a Nicolau II», que, ao contrário do que o Sr. Deputado referiu, não corresponde à instalação do Museu Hermitage em Portugal, mas apenas a uma exposição de três que decorrem de um protocolo de intenções assinado pelo Instituto dos Museus e da Conservação e pelo Museu Hermitage de São Petersburgo. Portanto, trata-se de um protocolo de intenções que visa, isso sim, a criação, ou a possível criação, em 2010, de um pólo do Museu Hermitage em Portugal. Esta é apenas a primeira dessas três exposições e só quando terminar a execução desse protocolo é que será decidida, ou não, a abertura desse pólo.
Queria dizer-lhe que uma das razões pelas quais este projecto da possível criação de um pólo do Museu Hermitage em Portugal foi acarinhado pelo Ministério da Cultura e posto no terreno pelo Instituto dos Museus e da Conservação foi exactamente o facto de Portugal, ao contrário do que o Sr. Deputado acaba de afirmar, ser um país rico em património imóvel mas com muitas limitações no que diz respeito ao património móvel. Isso sucede por duas razões muito simples: porque sofreu um terramoto no Século XVIII e porque sofreu as invasões francesas no início do Século XIX.
Isso faz com que não sejamos propriamente um país rico em arte antiga móvel. E pareceu-me, a mim e ao IMC, que a possibilidade de virmos a ter um pólo do Museu Hermitage em Portugal – que é só, Sr. Deputado, um dos melhores museus do mundo, provavelmente com o maior acervo de arte do mundo – seria interessante para os portugueses, que, dessa forma, teriam mais acesso a desfrutar arte, e não apenas a antiga. Reportei-me agora à arte antiga, mas podia também reportar-me à arte moderna, designadamente à arte do Século XX, em que as colecções dos museus portugueses são particularmente contidas, para não dizer uma expressão um pouco mais forte, contenção que decorre, de resto, de uma política que conhecemos, que foi muito própria do Século XX, de uma maneira geral, e muito especialmente da segunda metade do Século XX, de recusa de abertura à arte moderna e à arte contemporânea.
Portanto, parece-nos ser um enriquecimento para os portugueses poder facultar-lhes o acesso à arte internacional de uma forma próxima. Não são todos os portugueses que podem, evidentemente, ir ver exposições no exterior, embora, felizmente, seja cada vez mais possível fazê-lo particularmente na vizinha Espanha, bem como em França e na Inglaterra.
Além disso, ao contrário também do que o Sr. Deputado diz, não são países pobres em património que têm contratualizado a abertura de pólos do Museu Hermitage. Basta pensar nos casos da Inglaterra ou da Holanda, e possivelmente, num futuro próximo, no caso de Itália, para vermos à evidência que não é assim.
O que referi foi para lhe dizer das razões por que me parece interessante vir a ter um pólo do Museu Hermitage em Portugal.
Passo agora a reportar-me ao orçamento desta exposição, questão que preocupou especialmente o Sr. Deputado.
Esta exposição teve custos de financiamento perfeitamente banais, se pensarmos nas grandes exposições que se internacionalizam e que circulam na Europa. Desafio-o a ir ver o custo, por exemplo, da exposição de Paula Rego, que está no Museu Nacional Centro de Arte Reina Sofia, ou da exposição do humanismo alemão, em torno de Dürer e Cranach, que está no Museu Thyssen-Bornemisza, só para falar da vizinha Espanha.
Portanto, desafio-o a saber o orçamento dessas exposições, para comparar com o orçamento desta exposição, que é perfeitamente banal.
Este orçamento foi, como o Sr. Deputado disse, e como publicamente referimos, de 1,5 milhões de euros.
Para este orçamento o IMC e o Ministério da Cultura encontraram financiamento em apoio mecenático na ordem de 1,250 milhões de euros; mecenato que, como é óbvio, foi possível exactamente porque se trata de uma grande exposição que põe Portugal na rota das grandes exposições internacionais. E a prova de que põe é que no pouco tempo que medeia entre o dia de abertura da exposição e o domingo passado houve 27 000 visitantes. Isto significa que, obviamente, os portugueses têm expectativas relativamente à fruição de exposições deste tipo.
Queria ainda dizer-lhe que esta exposição é um projecto que o Instituto dos Museus e da Conservação acarinhou de um modo especial escolhendo-o, inclusivamente, para reabrir a Galeria D. Luís, agora requalificada.
Ela foi requalificada não especificamente para esta exposição, mas porque precisava de sê-lo, e o orçamento para esse efeito foi da ordem de 900 000 €.
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Essa requalificação vai permitir que o Instituto dos Museus e da Conservação passe a tutelar um espaço – a Galeria D. Luís – de mais de 1000 m2, com um pé direito excelente, que lhe vai permitir não apenas trazer exposições temporárias deste tipo, ou de outro, como ter espaço para exibição, em Lisboa, dos acervos dos seus museus, coisa que até ao momento não tinha.
Como sabe, o espaço do Museu Nacional de Arte Antiga é talvez o maior espaço para exposições temporárias dos museus de Lisboa, pelo que pareceu ao Ministério e ao IMC que seria uma boa forma de reabrir, de relançar a Galeria D. Luís e de voltar a levar à Ajuda visitantes como em tempos muito passados, quando o Palácio Nacional da Ajuda exibia, na Galeria D. Luís, boas exposições, como, de facto, aconteceu. Essa era uma questão que gostava de esclarecer.
A exposição do Museu Hermitage, em Lisboa, na Ajuda, qualifica a oferta cultural e também qualifica, aumenta e mostra a capacidade que o IMC tem, com técnicos seus, com recursos humanos seus, com um espaço seu, de trazer a Lisboa uma grande exposição.
Penso que estamos a qualificar a oferta cultural e considero que é de um provincianismo absolutamente atroz pensar que só se qualifica a oferta cultural mostrando o acervo dos museus nacionais ou a arte nacional.
Isso é absolutamente retrógrado, é de um nacionalismo serôdio, provinciano, absolutamente inaceitável nos dias de hoje, tanto mais inaceitável quanto Portugal faz igualmente um grande esforço na internacionalização da sua própria arte e cultura.
Outra questão que me colocou relaciona-se com o abrupto fecho, este fim-de-semana, de algumas salas de dois museus de Lisboa.
Ora, esse fecho levou-me, ontem, a fazer declarações sobre o processo que esteve por detrás desse corte, dessa ruptura abrupta, dado que até sexta-feira nada tinha acontecido, de há meses a esta parte, no que diz respeito a um nefasto quase hábito a que ao longo de anos – muitos anos mesmo – nos habituámos, que era o de tempos a tempos os museus fecharem parte das suas salas, ou mesmo fecharem portas, por falta de vigilantes e de recepcionistas.
Como certamente o Sr. Deputado saberá, esta é uma história muito longa, uma história longuíssima que tem que ver com uma mudança de carreira dos antigos guardas para os actuais recepcionistas e vigilantes, que não foi acompanhada pela abertura de quadros.
Como sabe, de há muitos anos a esta parte estão fechadas as admissões de pessoal externo à função pública. Portanto, tendo desaparecido (creio que com base num decreto-lei de 2001, mas depois poderei dizerlhe com algum rigor) a categoria de guarda, não foi aumentado o quadro, pelo que não foi aberta as categorias de vigilante e recepcionista.
Ora, normalmente, ao longo de variadíssimos governos e de vários anos, recorria-se de uma forma precária ao Instituto do Emprego e Formação Profissional, no sentido de buscar técnicos para pontualmente se irem suprindo as dificuldades de falta de recepcionistas e de vigilantes. Esta foi uma prática continuada que encontrei quando cheguei ao Governo.
Aliás, íamos buscar cada vez mais elementos ao Instituto do Emprego e Formação Profissional, porque os museus não apenas foram sendo requalificados, portanto, foram ampliadas as necessidades de vigilantes, como foram sendo criadas, ao longo dos últimos anos, lojas de museus, obrigando tudo isso a uma maior presença de recursos humanos nos museus, em Portugal.
Portanto, essa prática gerava, em muitos momentos, colapsos graves, em que os museus fechavam, por exemplo durante períodos da Páscoa ou de Verão. Ora, o que é que nós conseguimos? Conseguimos que o Ministério das Finanças autorizasse, a partir do mês de Março, no quadro de grande limitação de contratação em que nos estamos a mover, contratos de tarefa que nos permitiram trazer um grande número de contratados aos museus, o que garantiu, na Páscoa passada e durante este Verão, o funcionamento pleno, a esse nível, dos museus.
Acontece que esses contratos foram terminando, alguns terminaram, creio, na sexta-feira passada, outros estão a terminar por estes dias – não terminam todos exactamente ao mesmo tempo, senão tinham fechado vários museus e só fecharam duas alas de dois deles –, e, cumprindo orientações superiores, o Instituto dos Museus e da Conservação (IMC), como era sua obrigação, foi procurar à bolsa de emprego, isto é, ao sistema de mobilidade especial, 102 elementos.
Esta seria a solução ideal, porque estes elementos entrariam com o pacote financeiro apenso no quadro dos museus. Contudo, consultada a bolsa, o Instituto dos Museus e da Conservação só obteve 11 profissionais, pelo que ficavam a descoberto 90.
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Ora, onde é que entra aqui a questão da responsabilização do IMC? Entra neste ponto, Sr. Deputado: no dia 7 de Novembro, chegou ao gabinete da Ministra um pedido no sentido de solicitar um despacho ao Ministro das Finanças para permitir a celebração de 90 contratos de tarefa. Ou, melhor dizendo, no dia 7 de Novembro saiu do IMC essa solicitação e o meu gabinete despachou no dia 9, isto é, sexta-feira passada, para o Sr.
Ministro das Finanças.
Por que é que responsabilizei publicamente, e volto a fazê-lo neste momento, o IMC? Responsabilizei-o pelo facto de ter deixado chegar ao dia 7 de Novembro para nos solicitar um despacho do Ministro das Finanças, que, aliás, com a maior brevidade do mundo, já permitiu a realização de 90 contratos, decisão essa que nos chegou ao gabinete hoje – portanto, permitiu-a ontem.
Portanto, Sr. Deputado, evidentemente, não há aqui nenhuma questão de não cumprimento de ordens ou de não envio de orientações, ou de políticas emanadas de baixo para cima ou de cima para baixo. O Sr. Deputado leu apressadamente a notícia que um jornal publicou, porque se a tivesse lido com atenção constataria que é exactamente isto que estou a dizer que está lá plasmado! Houve, de facto, uma falta de celeridade por parte do IMC, pela qual eu responsabilizo o Instituto. Tal não significa que não continue a ter confiança no director-geral, uma vez que a direcção de um instituto não é avaliada por um acto único, Sr. Deputado.
O êxito que está a ter a Exposição do Hermitage em Lisboa é um êxito que cabe, inteiramente, ao Instituto dos Museus e da Conservação. E eu não esqueço uma coisa por causa de outra; eu avalio um dirigente pelo conjunto da sua actuação.
Portanto, Sr. Deputado, está fora de questão criar – ou ajudar a criar – um incidente desse género, além de que, como pode calcular, é o Ministério que tem de decidir, por si, se nomeia ou se retira a confiança aos seus dirigentes.
Por outro lado, o Sr. Deputado pediu-me também um esclarecimento relativamente ao orçamento para o Museu Colecção Berardo de Arte Moderna e Contemporânea, e eu agradeço que o tenha feito, porque houve um pequeno lapso que gostava de comunicar aos Srs. Deputados.
Com efeito, no orçamento por acções, que enviei aos Srs. Deputados, faço referência aos orçamentos para a Fundação de Serralves e para a Fundação Colecção Berardo, mas essa indicação orçamental está feita com base em critérios diferentes para um caso e para outro.
Está apontada uma verba de 4,6 milhões de euros para a Fundação de Serralves: 4 milhões de euros para o funcionamento e 600 000 euros para o fundo de compras – este é o esforço do Estado para a Fundação de Serralves.
Para a Fundação Colecção Berardo está indicada uma verba de 2 milhões de euros, que, na verdade, corresponde a 3,5 milhões de euros se o critério for o mesmo da Fundação de Serralves: 3 milhões de euros para o funcionamento e meio milhão de euros para o fundo de compras. Sendo que, desses 3 milhões de euros para funcionamento (como, de resto, já sucedeu este ano), 1 milhão de euros sai da Secretaria-Geral e 2 milhões de euros saem do orçamento do Centro Cultural de Belém. Portanto, estão orçamentados 3,5 milhões de euros e não os 2 milhões de euros que estão plasmados. Isto, volto a dizer, se utilizarmos um critério idêntico ao que é utilizado relativamente à Fundação de Serralves.
Penso que ficou esclarecida a questão do orçamento da Fundação Colecção Berardo, mas talvez ainda deva acrescentar o seguinte: os 2 milhões de euros, que são veiculados pelo Centro Cultural de Belém, são protocolados directamente entre a Fundação CCB e a Fundação Colecção Berardo.
Em suma, no total estão em causa 3,5 milhões de euros, tal como sucedeu este ano, distribuídos desta forma: 2+1 milhões de euros para o funcionamento e meio milhão de euros para o fundo de compras.
Relativamente à questão que me coloca referente à Biblioteca de Vila Nova de Paiva, tenho de consultar os meus elementos para, eventualmente, poder responder a essa sua questão, porque não sei responder de cor.
No que diz respeito à política da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas (DGLB), as linhas essenciais são aquelas que vêm sendo desenvolvidas de apoio à edição, de apoio a algumas feiras de livro e de apoio às bibliotecas públicas. Este apoio situa-se quer ao nível de projectos de construção de bibliotecas públicas, quer ao nível da própria oferta de programação às bibliotecas públicas, quer ao nível de diversíssimos produtos ou programas que oferecemos relacionados com o incentivo à leitura, dirigidos a públicos de várias faixas etárias, programas esses que, de resto, tiveram até uma maior expressão no âmbito do Plano Nacional de Leitura, que, como sabe, o Ministério da Cultura, juntamente com os Ministérios da Educação e dos Assuntos Parlamentares, tem vindo a desenvolver.
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Evidentemente, mantém-se a política de expansão da rede de bibliotecas públicas, com uma previsão de cerca de 20 bibliotecas públicas. Há pouco referi, mas posso referi-lo de novo, o número de bibliotecas que pensamos inaugurar no próximo ano: 14 bibliotecas públicas serão inauguradas.
Em números globais, o orçamento transferido, a comparticipação assumida na rede de bibliotecas públicas pelo Ministério da Cultura já vai na ordem dos 103,5 milhões de euros, e a previsão de inauguração, até ao final de 2008, é de 16 bibliotecas.
O Sr. Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Ministra.
Para formular uma segunda pergunta, está inscrita a Sr.ª Deputada Teresa Portugal, a quem dou de imediato a palavra, sendo que dispõe de 5 minutos para o efeito.
A Sr.ª Teresa Portugal (PS): — Sr. Presidente, vou tentar respeitar o tempo de que disponho, rigorosamente.
Sr.ª Ministra, não resisto a trazer à lembrança que a discussão deste orçamento da cultura faz-se sobre um novo pano de fundo (aliás, creio que, neste momento, todas as discussões sobre a política cultural fazem-se sobre esse novo pano de fundo), que teve uma enorme projecção mediática e já uma primeira consequência na realização daquela medida europeia que procura encontrar uma agenda europeia para a cultura.
Estou a referir-me ao estudo da União Europeia sobre a cultura, realizado em 2006, que traz para este campo da cultura um outro olhar sobre a cultura e até uma nova expressão: a de que a cultura também é economia, porque conclui que a cultura contribui mais para a economia da União Europeia do que qualquer outro daqueles sectores tradicionais e prioritários, como o sector imobiliário, os sectores alimentares, etc. Mas não é tempo de falarmos desse estudo.
Portanto, passou a ser considerado que gastar com a cultura é investir na cultura e agir a favor da vida económica. Creio que este estudo é, aliás, um somatório de muitas experiências (designadamente, das capitais europeias da cultura, de outras experiências e de outros estudos), que já tinham provado à saciedade que a cultura e as realizações culturais são capazes de multiplicar os investimentos iniciais — e isto, de certa maneira, também responde à questão da grande Exposição do Hermitage.
Em suma, diria que essa «religião moderna» – como Malraux chamava à política cultural – fez, definitivamente, uma aliança com a economia. Mas o que é certo é que, mesmo assim, o Sr. Ministro das Finanças não se deixou converter a essa «religião» e, portanto, a primeira constatação sobre este orçamento é que foi pedido também esse contributo solidário ao Ministério da Cultura – a Sr.ª Ministra já o disse – e, por isso, nós estamos ainda distanciados da meta de 1%, a que o próprio Governo e o Partido Socialista se propuseram, em financiamento e investimento na cultura.
Feita esta constatação, creio que se torna interessante neste orçamento ver as linhas caracterizadoras do exercício governativo da Cultura – e a Sr.ª Ministra, no seu discurso, fez, de certa maneira, isso mesmo –, que levam à conclusão de que não vale ter o muito, se ele é pouco executado. A Sr.ª Ministra reconhece a existência de um orçamento magro, mas cuida de o executar, creio eu, até à última gota.
Portanto, faço este convite – e a Sr.ª Ministra também o fez – para verem essa linha da execução orçamental em termos globais, que atinge o pico máximo em 2006 e em 2007.
Mas uma análise da execução em algumas áreas sectoriais vem também confirmar esta mesma tendência.
Por exemplo, a taxa de execução do património atinge, em 2006, 100% e, em 2007, quase 97%, contrastando com o exercício de 2004, em que a taxa foi de 64%. Também nas artes visuais é possível observar esta mesma tendência na taxa de execução, que no caso concreto é de 97%, e o mesmo se diga no audiovisual e no cinema, em que a taxa de execução é de 100%. E, por exemplo, nos apoios socioculturais, para não perdermos mais tempo, o nível de execução de 2003, de 49,8%, contrasta com o de 2007, que foi de mais de 90%.
Portanto, este é um exercício de mérito e, por isso, tem de ser aqui reconhecido.
O meu segundo destaque vai para o esforço que tem sido feito na busca de parcerias. O estimular-se o campo do mecenato para o financiamento da cultura não é um instrumento novo, não é uma estratégia nova na área da cultura, pois muitos outros países o têm feito. A National Gallery, de Londres, vive quase exclusivamente do mecenato, o mesmo acontecendo com a maior parte dos museus de arte americanos. E este exercício, que era tímido em Portugal, atingiu também, com este ministério, uma linha de crescimento, com um
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enorme investimento nesta área que já ultrapassa os 7 milhões de euros. Tratou-se, portanto, de um esforço muito considerável para a realização da política cultural.
O meu terceiro destaque vai para uma questão que está na base da nossa política cultural pela sua projecção e pela sua importância histórica e de futuro, que é a questão da língua portuguesa.
E começo por trazer aqui à lembrança as conclusões que foram tiradas numa conferência sobre a língua portuguesa que foi realizada este ano no Centro Cultural de Belém, em que, justamente, o Prof. Carlos Reis nos lembrou que estão um pouco esgotadas aquelas linhas tradicionais de estímulo à leitura e que é preciso que elas passem a conviver com novas aprendizagens da chamada literacia informal. Ele recomenda, de facto, o esforço na criação de novos exercícios de leitura, novos espaços e novas estratégias.
Ora, eu associo esta recomendação a outra questão muito importante, que é a do papel da língua portuguesa no campo da lusofonia, pela sua importância e pela importância do relacionamento entre os dois continentes.
Tomando estes dois itens da língua portuguesa como ponto de partida – e a língua portuguesa é particularmente importante num momento em que parece que se começa a falar da existência de um parlamento lusófono –, irei situar vários investimentos que constam deste orçamento em vários itens.
Começo, naturalmente, por citar o apoio ao Plano Nacional de Leitura, com um investimento de 400 000 euros; o projecto de ampliação da torre de depósitos da Biblioteca Nacional que, como a Sr.ª Ministra recordou, também é muito importante, com um investimento considerável de 2 milhões de euros; a criação da biblioteca nacional digital; o apoio às edições e às traduções de obras portuguesas, que considero da maior relevância; e também a participação de Portugal em feiras do livro, nomeadamente nos países de expressão portuguesa, designadamente Cabo Verde e Timor, mas também em S. Paulo. Aliás, num outro ponto da internacionalização da cultura, este orçamento ainda se refere a uma cooperação com o Brasil, que também me parece da maior importância como exercício de expansão e de estratégia da língua portuguesa no campo do relacionamento entre continentes.
Por último, mas não menos importante, a criação de um novo museu, o Museu Mar da Língua, com um investimento de 3 milhões de euros. A Sr.ª Ministra deu-nos uma pequena síntese das linhas em que este museu vai ser projectado, mas eu aproveito para lhe pedir mais informação, porque creio que é suficientemente importante.
Termino, Sr.ª Ministra, colocando uma questão sobre um investimento que é feito num outro campo, no campo das artes e dos espectáculos, que é o novo Programa Território Artes. Creio que já estamos em condições de fazer um balanço sobre este programa e, portanto, gostaria de lhe perguntar se o investimento que continua a ser feito nesse programa tem correspondido, no terreno, ao esforço que o próprio programa pressupunha.
Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente Teresa Venda.
A Sr.ª Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada, gostava de começar por agradecer-lhe o facto de ter trazido aqui a lembrança desse estudo que, em Março passado, a Comissão Europeia publicou, juntando, pela primeira vez, no jargão das políticas europeias a expressão «economia e cultura».
Esse estudo da economia, da cultura e das indústrias criativas revela, de facto, duas realidades: não apenas aquela que a Sr.ª Deputada salientou, isto é, que o sector da cultura contribui para o produto interno bruto em vários países de uma forma extremamente significativa e no cômputo geral na União com 2,6%, mas também, o que não é de menor importância, que os países que mais investem na cultura são também aqueles onde o peso da cultura na economia e no produto interno bruto é maior. O exemplo de França, em que o peso da cultura no produto interno bruto é de 3,1%, é paradigmático.
Portanto, parece claro que investir na cultura não é despesa; é um real investimento com retorno, que, muitas vezes, é imaterial.
Já sabemos que a cultura potencia todo o investimento feito em educação e em ciência. Sabemo-lo há muitos anos, mas, se não o soubéssemos, bastaria estarmos atentos ao pensamento de quem pensa o pensamento, como António Damásio, que bem tem insistido em quanto a aposta na educação artística é determinante para potenciar a educação no domínio mais cognitivo, digamos assim. O pensamento cognitivo só se
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desenvolve em plenitude se for acompanhado de uma aposta no pensamento emocional, chamemos-lhe assim para simplificar.
Centrando-me de novo na questão que me colocou, de facto, o estudo que referiu teve o grande benefício de ter feito com que a Comissão Europeia, em Maio passado, tivesse proposto ao Conselho de Ministros da Cultura da União, uma nova agenda cultural para a Europa. Isso foi uma grande sorte para Portugal, porque, neste momento, o conselho formal da União, a que presidimos, que terá lugar na próxima sexta-feira, tem uma agenda muito rica e nessa agenda está o desafio da criação de uma nova agenda cultural para a Europa, da qual faz parte uma coisa que era impensável obter-se não há 10 anos, há 5 ou há 4 mas o ano passado, que é a criação daquilo que, em linguagem europeia, em jargão europeu, se designa por método aberto de coordenação, isto é, o estabelecimento de uma coordenação entre os vários Estados-membros. Trata-se de uma coordenação voluntária, naturalmente e os Estados-membros que quiserem conjugam-se no sentido de definirem em comum políticas para a área da cultura. Isto era impensável, porque a cultura é uma área, como todos sabemos, especialmente defensiva por razões identitárias.
Assim, é muito significativo que os Estados-membros tenham entendido que era importante avançar, como avançaram na segurança social e na educação aqui há uns anos atrás, para métodos abertos de coordenação, que vão ser um desafio para os Estados-membros, porque nos vão obrigar a ter metas e a autoavaliar-nos e a avaliar-nos em conjunto de x em x tempo. Isto, Sr.ª Deputada, vai exactamente no sentido de parecer cada vez mais verdade que a cultura, como eu dizia há pouco, não é uma mera despesa é, pelo contrário, um investimento.
Isto tem sido entendido tanto pelas empresas como pelos cidadãos, porque o mecenato cruza-se com uma outra forma que emana da sociedade civil que é o voluntariado. Eu não tenho isso contabilizado, e deveria têlo, mas posso dizer que já temos muitos voluntários que trabalham na cultura, mas vamos também procurar desenvolver programas a esse nível.
Portanto, quero dizer-lhe que as empresas, de facto, apercebem-se, cada vez mais, do quanto é prestigiante para elas apoiar a cultura e de quanto isso contribui, evidentemente, para a qualificação das populações.
E, realmente, o salto que demos na obtenção de verbas através do mecenato foi absolutamente excepcional entre 2005 e 2007. Nós estávamos em níveis muito baixos. Posso dizer-lhe que, em 2004, tinha-se passado timidamente os 3 milhões de euros e estamos a meio de 2007 e já ultrapassámos os 7 milhões de euros.
Portanto, há cada vez mais uma grande sensibilidade das empresas para a cultura e para o mecenato cultural e penso que esta mudança de mentalidades, esta mudança de cultura, é muito significativa. E quando estou a falar em mecenato, quando falo neste montante, não estou aqui a incluir as verbas do Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual, que vai permitir-nos aumentar em 16 milhões de euros no próximo ano o apoio ao cinema e ao audiovisual e que vai ser importantíssimo para robustecer as pequenas e médias empresas na área do cinema.
Portanto, quando me reporto a estes números estou a referir-me a mecenato tradicional e não a outras formas de parceria que temos vindo a desenvolver e que também significam um fortalecimento do orçamento global do Ministério da Cultura.
No que diz respeito às questões relacionadas com a língua, a que a Sr.ª Deputada fez referência, como sabe, cabe ao Ministério da Cultura desenvolver algumas acções, em particular no âmbito da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas, mas indirectamente também através da Direcção-Geral das Artes e da DirecçãoGeral de Arquivos, porque, no fundo, quando estamos a trabalhar, designadamente na promoção de áreas como o teatro, estamos, como é evidente, também a trabalhar sobre a língua portuguesa.
Ainda recentemente foi criado pelo Ministério da Cultura, juntamente com a Funarte, brasileira, um prémio de teatro anual – a cuja representação tive ocasião de assistir –, que implica a produção de um original, português ou brasileiro, em língua portuguesa, o qual é representado em Portugal e no Brasil e é encenado por um artista do país oposto àquele que ganhar. No caso, ganhou Portugal com uma dramaturgia, uma peça de teatro do jovem dramaturgo Vieira Mendes, que foi encenada por uma encenadora brasileira e que já foi representada em Portugal e está agora a ser apresentada em três cidades brasileiras.
Portanto, quando fazemos isso também estamos a promover a língua portuguesa, independentemente dos apoios clássicos que continuamos a desenvolver no âmbito da edição e das bibliotecas, a que há pouco fiz referência em resposta ao Sr. Deputado.
Penso que importa estar particularmente atento à questão da lusofonia. Este ano fizemos, de facto, um esforço grande na feira de Cabo Verde. Penso que é uma obrigação importante que temos, dado que lá há
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uma apetência pelo livro – aliás, é quase comovente ver a rapidez com que os livros esgotam nas feiras do livro em Cabo Verde, dado que, para muitos, é o único momento de acesso ao livro.
Penso que o nosso esforço no espaço lusófono deve incidir sobretudo em países onde não há mercado.
Felizmente, já começa a haver mercado em Moçambique e já vai havendo em Angola. E, portanto, penso que devemos fazer um esforço relativamente aos países onde não há um mercado de livro.
No que diz respeito ao Brasil, a nossa prática tem sido outra. Foi iniciada há alguns anos, de uma forma muito tímida – e que temos ampliado muito, porque é um programa que tem tido um grande sucesso –, em 2003 ou 2004, não posso exactamente precisar, com um programa de apoio à edição de autores portugueses no Brasil, apoiando editoras locais. Isso fez com que o livro português, que era quase «inencontrável» no Brasil há seis anos, possa hoje ser encontrado com a maior das facilidades em qualquer livraria – nas grandes cidades, então, com a maior das facilidades –, exactamente porque passámos a apoiar de forma directa as editoras e, neste momento, já vamos em cerca de 200 títulos/ano. Penso que essa foi uma boa opção na área da lusofonia.
Sr.ª Deputada, gostava também de salientar o esforço que estamos a fazer – e vamos criar aí novas parcerias público-privadas – no âmbito do Plano Nacional de Leitura.
Acho que aí há muitas possibilidades de explorarmos parcerias público-privadas e acordos que, exactamente a pretexto da exposição Hermitage, o Instituto dos Museus e da Conservação fez com várias empresas ligadas ao transporte para a divulgação de actividades culturais. Penso que podemos explorar essas parcerias também no âmbito da difusão da leitura e estamos a trabalhar nesse domínio.
Gostava também de acentuar, Sr.ª Deputada – esta é uma área particularmente cara ao Sr. Secretário de Estado e, por isso, não quero deixar de a referir –, que criámos um programa, há muito reclamado pelo sector, de apoio à edição de partituras. Em 2007 editámos 17 partituras e, neste momento, estão a ser editadas 8 partituras, sendo que estamos a reportar-nos, evidentemente, a criadores portugueses. Portanto, também aqui há um esforço em que se cruza música e língua portuguesas e, por isso, gostava também de fazer referência a esse dado.
Passo, agora, a palavra ao Sr. Secretário de Estado para responder à questão que se reporta ao Programa Território Artes, a que a Sr.ª Deputada fez referência, passando por cima, neste momento, da questão sobre o projecto Mar da Língua Portuguesa, sendo que, se tiver ocasião, voltarei a ele.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura (Mário Vieira de Carvalho): — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, quanto ao Território Artes, quero dizer que trata-se de um programa desenvolvido no âmbito da Direcção-Geral das Artes que, no fundo, procura contribuir para uma dinamização da itinerância, da circulação, das produções culturais de várias naturezas por todo o País.
No programa Território Artes participam, naturalmente, entidades de criação e de programação que, em larga medida, já são apoiadas pelo Ministério da Cultura através do apoios pontuais ou dos apoios sustentados, muitas vezes até podem ser também entidades de produção artística do Ministério da Cultura, que tem alguma produção a circular. Trata-se, pois, de estimular essa dinâmica. É, digamos assim, um apoio marginal que a Direcção-Geral das Artes desenvolve para criar uma maior dinâmica no terreno.
O programa, em 2007, teve a participação de 77 autarquias, realizou 887 sessões, 336 espectáculos, 344 ateliers, 207 dias de exposições e 141 produções agendadas. Na concretização financeira representou um valor global da ordem dos 660 000 euros, dos quais 413 000 euros foram pagos pelos municípios e 174 000 euros resultaram de apoio da Direcção-Geral das Artes no âmbito deste programa. O total de espectadores foi de 72 000, em 2007.
Ora, o que é que prevemos para 2008? Prevemos a expansão do programa e, por isso, estamos a inscrever como verba de apoio para este programa, em 2008, 309 000 euros, ou seja, quase o dobro daquilo que foi executado em 2007.
De facto, trata-se de um programa que tem tido grande êxito, que, aliás, está bem documentado numa publicação que acabou de sair na Direcção-Geral das Artes e que teremos muito gosto em enviar aos Srs. Deputados, porque se trata de uma publicação muito elucidativa quanto à dinâmica de execução deste programa.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira, apelando ao seu espírito de síntese para respeitar os 5 minutos de que dispõe, pois, como sabe, temos outra audição às 17 horas.
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O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, vou fazer um esforço para cumprir os 5 minutos de que disponho.
Sr.ª Ministra, queria começar por onde V. Ex.ª começou, mas para dizer uma coisa diferente. De facto, referir um aumento de 9% no Orçamento do Estado para 2008 é batota, Sr.ª Ministra, aliás, é a senhora que acaba por revelar os termos desta batota. É que quando distingue depois – voltando as «baterias» ao PSD – o orçamento e a sua execução revela os termos da sua batota.
De facto, se compararmos o Orçamento para 2008 com o Orçamento para 2007 o aumento não é de 9% mas, sim, 3,67% e, se tivermos em conta a inflação, o aumento ainda é mais reduzido, é de 1,54%. Já nem sequer avanço aqui os cálculos tendo em conta a taxa de inflação prevista pela Comissão Europeia, ainda recentemente, porque, então, o aumento ainda seria mais reduzido.
Mas há uma outra comparação que importa fazer – a comparação dos valores absolutos do Orçamento para 2008 com os dos outros Orçamentos anteriores. É que se verifica que, de facto, só em relação ao Orçamento para 2007 há um aumento, porque, até mesmo em relação ao Orçamento para 2003, o Orçamento para 2008 continua a estar abaixo daquilo que estava previsto para os cinco anos anteriores.
Não deixa de ser curioso que o PS, quando estava na oposição, acusava o PSD e o CDS-PP, e com inteira justeza, em nossa opinião, de uma política de asfixia financeira, mas a verdade é que, agora, é o Governo do PS que prossegue e aprofunda esta política de asfixia financeira na área da cultura.
A Sr.ª Ministra refere também o objectivo de atingir na cultura 1% da despesa da Administração Central, mas a verdade é que este Orçamento prevê que esta percentagem seja de 0,4%. De facto, de 2005 para 2006 esta despesa reduziu-se. Portanto, já com este Governo do PS, o peso da despesa na cultura foi reduzida de 0,5% para 0,4%; no ano passado voltou a ser de 0,4%; e este ano volta a ser de 0,4%. Portanto, Sr.ª Ministra, a conclusão que temos de retirar daqui é que o percurso do Governo vai sendo no sentido de divergir face ao próprio objectivo que traçou.
De qualquer forma, Sr.ª Ministra, aliás, pegando numa resposta que já deu à questão colocada pela Sr.ª Deputada Teresa Portugal, relativamente ao retorno económico que tem o investimento na cultura e à avaliação que é feita ao peso deste sector comparativamente com outros sectores da economia, estamos ainda bem longe de atingir os valores propostos numa recomendação da Unesco, ou seja, de atingir 1% do PIB. Aliás, temos um nível 10 vezes inferior a este objectivo apontado pela Unesco, mais uma vez, com uma redução de 0,2% para 0,1%, com este Governo, no Orçamento para 2006.
Sr.ª Ministra, relativamente a este orçamento que nos propõe, entendemos que ele revela, de facto, a pouca importância que o Governo dá ao próprio Ministério e a pouca importância que têm, no plano das políticas governativas, as políticas culturais e o investimento na cultura, e revela também uma errada orientação que entendemos que tem sido seguida na área da cultura e que tem que ver com três linhas que, em nosso entender, são relativamente claras.
Primeira, uma redução do papel do Estado e, sobretudo, da administração central naquilo que diz respeito ao financiamento das actividades culturais; segunda, uma orientação em que, simultaneamente, se verifica o crescimento do peso da administração local no financiamento público de actividades culturais e a diminuição do peso da administração central; e, terceira, uma lógica também de concentração de meios, que põe em causa uma verdadeira democratização da cultura mas que, de facto, promove a massificação do entretenimento, o que, em nosso entender, diz bem desta errada orientação que é dada para a cultura.
Relativamente ao primeiro aspecto, a intervenção da Sr.ª Ministra e a da Sr.ª Deputada Teresa Portugal acabam por confirmar esta orientação do Partido Socialista quanto ao papel que ao Estado deve caber no que diz respeito à cultura. Nas referências que foram feitas ao mecenato, à sua importância e à perspectiva de substituição do investimento público pelo investimento privado e pelo do mecenato, que são distintos, naquilo que diz respeito, por exemplo ao PRACE, a Sr.ª Ministra não consegue esconder, na aplicação do PRACE no Ministério da Cultura, aquele que é o objectivo central deste programa: o emagrecimento do Estado, a todo o custo, que, inevitavelmente, acaba por corresponder à eliminação de serviços, de incumbências e de responsabilidades do Estado.
Aliás, o orçamento dos serviços integrados do Ministério da Cultura revela esta redução das despesas com pessoal que resultará, certamente, do desenvolvimento deste objectivo de emagrecimento do papel do Estado noutras áreas, como acaba, também, por acontecer na cultura.
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Por outro lado, Sr.ª Ministra, naquilo que diz respeito à concentração de meios, de que falava há pouco, aliás pegando apenas nos dois exemplos que a Sr.ª Ministra utilizou para corrigir os dados, não deixa de ser curioso que se preveja o financiamento de 7,5 milhões de euros para a Fundação Serralves e Museu Colecção Berardo, enquanto há, pelo País fora, dezenas, senão centenas, de companhias de teatro, de companhias de dança, de orquestras de mão estendida, sem meios para poderem produzir, para poderem criar cultura, porque estes meios não lhes são garantidos.
De facto, esta é uma lógica que, em nosso entender, não é correcta e não promove a democratização da cultura, como nós entendemos que ela deve ser produzida.
Por fim, e porque parece-me que estou a atingir os 5 minutos, gostaria de me referir a um assunto que já tivemos oportunidade de debater com a Sr.ª Ministra, ainda antes das férias, e que diz respeito à situação dos trabalhadores das artes do espectáculo.
Isto porque, Sr.ª Ministra, ouvimo-la reconhecer que, de facto, as condições de trabalho destes trabalhadores são fundamentais para o tipo de cultura que temos e para o desenvolvimento e melhoria das condições de criação e de produção de cultura. Mas a verdade é que as condições a que os trabalhadores das artes do espectáculo estão sujeitos talvez se possam sintetizar em três notas: a da precariedade, a da instabilidade e a da desprotecção social.
De facto, o Governo apresentou uma proposta de lei que visa, por um lado, legalizar a situação relativamente àqueles dois primeiros aspectos, da precariedade e instabilidade, e adiar a resolução do terceiro aspecto, da protecção social, mais para a frente, já só para 2009 e, portanto, já não será com o Orçamento do Estado para 2008, quanto muito só para 2009, é que estes trabalhadores podem ter a aspiração de ter a cobertura em termos de protecção social.
Curiosamente, apesar de ser esta a realidade, no Orçamento do Estado nem uma palavra se diz sobre esta situação e o Ministério da Cultura nem se atreve sequer a escrever uma linha sobre um aspecto que, certamente, terá repercussões orçamentais, porque, pelo menos, os aspectos da protecção social terão de ter algum reflexo.
O próprio regime de contratação a que se quer submeter estes trabalhadores terá de ter algum reflexo orçamental naquilo que diz respeito ao próprio Ministério da Cultura, mas relativamente a isto o Ministério da Cultura não diz uma palavra sobre uma questão que é fundamental, que afecta hoje cerca de 60 000 trabalhadores e que, sendo uma discussão que está em cima da mesa, teríamos todo o benefício em fazer esta discussão no âmbito do Orçamento do Estado e no âmbito da previsão que o Governo faz de afectação de meios e de recursos financeiros.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura, pedindo-lhe um pouco de contenção no tempo para ver se recuperamos.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr.ª Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, agradeço-lhe a sua intervenção e quero dizer-lhe que não posso ser mais transparente do que fui no que diz respeito a montantes. Não houve aqui qualquer preocupação de esconder nada, bem pelo contrário. Aliás, comecei a minha intervenção dizendo o seguinte: «O Orçamento para 2008 do Ministério da Cultura, apresenta um valor global de 246,6 milhões de euros, o que representa um crescimento de 9,2% face ao valor estimado da execução para o corrente ano» – estimado em baixa pelo Ministério das Finanças.
Este número foi o que veio no Orçamento do Estado e a seguir, exactamente para o clarificar, Sr. Deputado, acrescento: e de 3,2% – até nem referi isto, mas posso referi-lo agora –, correspondente a 5 milhões de euros.
É este exactamente o crescimento da receita do Orçamento do Estado este ano, relativamente ao valor das receitas gerais do Orçamento do Estado de 2007.
Portanto, não há aqui nada escondido, Sr. Deputado. Digo, com muita clareza, que o aumento relativamente às receitas gerais do Orçamento do Estado este ano é de 3,2% correspondendo a 5 milhões de euros. Repito, novamente, não há absolutamente nada escondido, está tudo muito claro: os 9% que as finanças publicaram no Orçamento do Estado, reportam-se, como lá é dito, ao valor estimado da execução que foi baixa, exactamente como eu demonstrei na minha intervenção quando fiz referência ao facto de que, e volto a repetir, nunca ter havido uma despesa pública em cultura tão grande.
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Isto porque a verdade é que não vale a pena ter orçamentos – e vou dar-lhe dois exemplos – como os de 2002 e 2004. Em 2002, tínhamos um Orçamento de 293 milhões de euros. Sabe quantos foram executados, Sr. Deputado? 232 milhões. Ora, em 2006, nós executámos 254 milhões de euros.
Sr. Deputado, objectivamente – e mostro-lhe o gráfico desde o ano 2000 – no ano de 2006, com um orçamento de 270 milhões, tivemos uma taxa de execução de 97,7% e gastámos 254 milhões, enquanto que em 2002, havia um orçamento de 293 milhões e executaram-se 230 milhões, Sr. Deputado. E se formos ao ano de 2004 temos, ainda, uma distância maior entre o orçamento inicial e a execução – temos 273 milhões para 223 milhões de euros executados.
Quer dizer: objectivamente, sem nada escondido, não há uma redução do papel do Estado, como o Sr. Deputado insiste em dizer, relativamente à cultura! Pelo contrário: o Estado gastou mais em cultura no ano de 2006 e o mesmo acontecerá no ano de 2007, executando, de facto, mais do que alguma vez se executou.
E, Sr. Deputado, ainda quanto à questão da redução do papel do Estado, o senhor disse uma coisa extraordinária: disse que eu defendia que o sector privado se substituísse ao Estado. Ora, eu nunca usei essa palavra, a palavra é sua e é ridículo falar em substituição. Ridículo, repito! Quando eu falei no mecenato de 7,5 milhões de euros, em 2007 e até ao momento, e naquilo que o Estado, entre autarquias e poder central, gasta em cultura, o Sr. Deputado, certamente, compreenderá que 7,5 milhões de euros são uma gota de água»! Aliás, eu adoraria que fosse muito mais, mas não é e, mesmo assim, já é muito relativamente ao que habitualmente conseguíamos.
Portanto, não há qualquer substituição. Nunca me ouviu defender a substituição das responsabilidades do Estado em matéria de cultura, pelos privados. Estamos, realmente, a falar uma linguagem completamente distinta.
Por outro lado, o Sr. Deputado, fez referência a um aspecto que eu gostaria de acentuar: o senhor mencionou uma concentração de meios no Ministério da Cultura, uma espécie de centralização de responsabilidades.
Ora, o PRACE foi exactamente no sentido oposto, Sr. Deputado»
O Sr. João Oliveira (PCP): — Na afectação de recursos!
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Ah, na afectação de recursos» Mas eu posso demonstrar-lhe, com muita clareza, que nós fizemos exactamente o contrário. Basta o Sr. Deputado prestar atenção aos orçamentos das direcções regionais, que evidenciam a desconcentração de competências do IGESPAR (Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico) e do IMC, mas sobretudo do IGESPAR, para as delegações regionais, e ver que temos um aumento exponencial das verbas atribuídas às direcções regionais, porque elas passam a ter, doravante, muito mais responsabilidades no sentido de desenvolver uma política de proximidade.
Por outro lado, e de seguida passo já a palavra ao Sr. Secretário de Estado para responder a uma parte das questões que o Sr. Deputado colocou, gostava, apenas, de lhe dizer o seguinte: no que diz respeito ao PRACE aquilo que eu mostrei é que não houve um emagrecimento, a todo o custo, Sr. Deputado. O que houve, sim, foi um emagrecimento de custos de suporte que nos permite ter disponíveis mais 2 milhões de euros para produção cultural do que o que tínhamos e a prova de que não é a todo o custo, Sr. Deputado, é que, enquanto em alguns ministérios – o exemplo máximo é o do Ministério da Agricultura com cerca de 1000 funcionários na mobilidade – existe um número enorme de funcionários na mobilidade o Ministério da Cultura tem só 94. Isto é, estamos muito abaixo daquilo que seria a meta desejável, exactamente porque não estamos a fazer emagrecimento a todo o custo; estamos a fazer emagrecimento em função da realidade do nosso ministério e a realidade do nosso ministério só nos permite fazer um emagrecimento deste montante.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Oliveira, em complemento ao que lhe respondeu a Sr.ª Ministra da Cultura, quero, em primeiro lugar, chamar-lhe a atenção para a sua referência sobre a Fundação Serralves e o Museu Berardo.
Temos aqui um caso em que o Sr. Deputado parece não compreender que são dois investimentos estruturantes que colocam Portugal no mapa europeu quanto à arte contemporânea e que é absolutamente indispensável que, tal como há noutros países – na vizinha Espanha, a Fundação Thyssen é prova disso – Portugal
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tenha essas instituições de referência a partir das quais se estrutura toda uma vida cultural à volta, neste caso, da arte contemporânea.
Mas isso não significa que haja um desinvestimento no apoio às entidades de criação artística, bem pelo contrário. Se considerarmos o conjunto dos apoios previstos no orçamento do Ministério da Cultura para as artes visuais e do espectáculo veremos que há um aumento de 3 milhões de euros, pois, de 2007 para 2008, passamos de 83,8 para 86,8 milhões de euros, e que no apoio ao cinema e ao audiovisual, já aqui foi dito, passámos de 12 milhões para 20 milhões de euros, através de mobilização de recursos que resultam não só do apoio às pequenas e médias empresas do sector que vem do IAPMEI, mas também do concurso de diferentes entidades ligadas ao cinema e ao audiovisual, designadamente a PT e as três televisões de canal privado que compõem esse montante final de 16 milhões de euros de apoio anual ao cinema e ao audiovisual a partir de projectos apresentados pelas pequenas e médias empresas de produção independente. Aliás, posso dizer-lhe que, neste momento, já entraram 13 candidaturas que estão a ser apreciadas, utilizando, pela primeira vez, o fundo.
Também no apoio às actividades socioculturais, em geral, há um aumento. Quanto às próprias entidades públicas empresariais, se considerarmos o conjunto, em 2008, as receitas próprias aumentam previsivelmente 1 milhão de euros e na dotação orçamental aumentam também 600 000 €.
Portanto, não há um desinvestimento na área do apoio à produção artística. Bem pelo contrário: há um reforço dos apoios concedidos pelo Ministério da Cultura.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, com toda a estima e respeito, vou utilizar as suas próprias palavras para dizer que o que me parece provinciano é este Orçamento.
A Sr.ª Ministra diz que os países que mais investem na cultura são os que têm, por sua vez, mais retorno.
Ora, não somos manifestamente um caso desses. Como aqui já foi dito, a Sr.ª Ministra pode fazer todos os malabarismos orçamentais que entender, mas a verdade é que precisamos remontar ao ano 2000 para termos um Orçamento abaixo deste.
A Sr.ª Ministra vai falar-me da execução, mas deixe-me que lhe diga que o Orçamento projectado e atribuído é um sinal que o Governo pretende dar sobre a força que quer imprimir à cultura. O que este Governo nos tem estado a dizer desde que tomou posse é que atribui à cultura um peso de 0,4% no seu orçamento e não mais do que isso, quando este Governo foi eleito e apresentou no seu programa a meta de 1% do Orçamento do Estado. O problema, é esse, Sr.ª Ministra e não vemos que este orçamento arranque dos 0,4%.
Portanto, quando a Sr.ª Ministra diz, e muito bem, que os países que mais investem na cultura são os que mais retorno têm em termos de PIB, peço-lhe o favor de transmitir isso ao Sr. Primeiro-Ministro, que, obviamente, não lhe dá mais do que 0,4%.
O que lhe pergunto é se, no Orçamento do Estado para 2009, o último deste mandato, a Sr.ª Ministra não tiver 1% no seu orçamento (que, no entender do Partido Socialista, é o único que não constitui uma asfixia que VV. Ex.as atribuíam ao Governo de coligação PSD/CDS-PP, mas que, relembro, tinha 0,6%, com tendência ascendente) que ilações políticas é que retira? Podemos dizer que 1% é um objectivo. Então, que ilações retira do não cumprimento dos seus objectivos? Ainda relativamente ao Orçamento, depois do PRACE, da OPART, de todas estas intervenções, da transferência para o quadro de mobilidade de 94 funcionários, diz a Sr.ª Ministra que, em todo o caso, tem um acréscimo de 4% em despesas de funcionamento. Queria perguntar-lhe em quê, porque a ideia do PRACE é exactamente uma redução das despesas de funcionamento. Portanto, torna-se incompreensível que, depois de tantas e tão polémicas reestruturações, como a da OPART, ainda tenham este aumento de 4%.
Queria, ainda, fazer-lhe uma pergunta que já tive oportunidade de lhe colocar através de um requerimento, que agora se chama perguntas ao Governo.
A Sr.ª Ministra dizia, em Abril, que teria 100 funcionários no quadro de mobilidade – são 94, mas, enfim, não é uma grande diferença –, pelo que gostaria de saber qual é o seu destino e por que é que não os aproveitaram, ou, pelo menos, alguns deles, para suprir as faltas em termos de vigilantes e recepcionistas nos museus.
Protestos da Ministra da Cultura.
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É uma pergunta, Sr.ª Ministra. Não pode ficar aborrecida por lhe colocarmos perguntas a propósito do Orçamento.
Como disse, o mecenato tem, e ainda bem, vindo a assumir uma proporção importante à semelhança do que acontece noutros países. No entanto, a Sr.ª Ministra dedicou tanto tempo da sua intervenção ao tão importante apoio mecenático que penso que na próxima discussão deverá vir acompanhada destes mecenas, sem os quais o Ministçrio não teria capacidade para cumprir as suas funções» A propósito dos museus e do seu encerramento, pergunto-lhe (e também já aqui foi colocada essa questão) se a Sr.ª Ministra não considera que as suas declarações de responsabilização do Instituto Português de Museus e do seu director pela falta de pessoal não são um pré-aviso de exoneração – algo a que os senhores já se têm habituado, porque a cadência de exonerações de cargos dirigentes tem sido uma constante desde a vossa tomada de posse.
Em qualquer sítio do mundo, declarações da tutela com estas características seriam uma declaração de falta de confiança política. Normalmente, a tutela – e por isso é que se chama tutela – assume as responsabilidades e não diz que a culpa ç da secretária que não atendeu o telefone» Por isso ç que a Sr.ª Ministra ç a tutela.
E também lhe digo: se o Dr. Bairrão Oleiro tiver um pouco de estima por si próprio, a primeira coisa que fará, face a estas declarações, é pedir a sua demissão. Ficaremos para ver.
Liguei hoje para o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) a saber qual era o regime de encerramento e de abertura. O que lhe pergunto, Sr.ª Ministra, é a partir de quando é que o despacho do Sr. Ministro das Finanças, oportunamente elaborado antes desta nossa reunião, terá efeito, porque o que me disseram do MNAA foi que as salas estariam encerradas amanhã, depois de amanhã à hora do almoço e durante o fim-de-semana.
Ora, manifestamente, o fim-de-semana não será a melhor altura para um museu com a envergadura do Museu Nacional de Arte Antiga, estar encerrado. Assim, pergunto, mais uma vez: por que é que alguns destes funcionários no quadro de mobilidade não foram aproveitados para vigilantes ou recepcionistas? Pergunto-lhe também se não encara como pertinente uma proposta já feita pelo CDS-PP no âmbito da discussão na generalidade do Orçamento, que é a de fazer o que se faz na Alemanha, onde existe um programa, que se chama Trabalho de Cidadão, que reconverte desempregados, em muitos casos desempregados de longa duração, em trabalhadores na área da cultura, o que se adaptaria a esta falha.
Não podemos deixar de falar da exposição do Hermitage, ainda que não valha a pena estarmos a gastar muito tempo com ela.
A Sr.ª Ministra diz que é uma mais-valia cultural para Portugal e que qualifica a nossa oferta cultural. É evidente que qualifica, mas trata-se de uma questão de equilíbrio. A Sr.ª Ministra diz que é provincianismo rejeitarse a vinda de grandes exposições» Tomáramos nós ter cá um pólo permanente da Tate, do Guggenheim, do Prado e do Louvre – todos eles em simultâneo! Mas isso não será feito, obviamente, com um orçamento de 0,4% do Orçamento do Estado. E deixe-me relembrar-lhe o que aconteceu no pólo de Londres, que foi encerrado, porque o director entendeu que não se justificava, face às despesas tão elevadas que esse pólo representava. Londres gastou 30 milhões de libras, de dinheiro público e privado.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Peço-lhe para concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr.ª Presidente, peço imensa desculpa, mas não houve qualquer cuidado com o tempo até agora e deveria ter tido esse rigor desde o início.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — O Sr. Deputado imediatamente anterior respeitou o tempo. A questão não é a do respeito do tempo, mas pelas outras audições que estão programadas.
Peço-lhe, por isso, a sua consideração, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Mas não podem ser atribuídos 5 minutos aos Srs. Deputados e meia hora á tutela para responder» Todavia, vou já concluir, atç porque ainda temos uma segunda ronda de perguntas.
Queria fazer uma rectificação aos números que foram aqui dados pela Sr.ª Ministra, quando referiu que foram gastos apenas 250 000 € do erário põblico. Não ç bem assim, porque 500 000 € vieram do turismo e,
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que eu saiba, também são erário público. Podem não ser o seu erário público, Sr.ª Ministra, mas são erário público, em todo o caso.
Obviamente que gostaríamos de ter cá pólos de todos os grandes museus internacionais. No entanto, não posso aceitar que a Sr.ª Ministra diga que o nosso património é pobre e faça declarações, como a que a fez à Lusa há um mês, dizendo que os nossos museus não são ricos em arte antiga. Não pode dizer isto, quando a Custódia e os painéis de S. Vicente são verdadeiros tesouros, quando conseguimos organizar uma Europália, apesar de ter sido foi uma exposição de arte barroca» O que me parece também provinciano (e estou a usar as suas palavras) é achar-se que de uma palavra ou um franchising que enche os ouvidos, como é o nome Hermitage, venha o que vier é bom, porque fui ver a exposição e falei com várias pessoas, certamente mais conhecedoras de arte antiga do que eu, que dizem que aquela exposição até pode encher o ouvido, mas não enche o olho»! Neste sentido, pergunto-lhe se o Ministério da Cultura colaborou, de alguma forma, na escolha das peças ou se apenas se limitou a pagar e a receber o que o Hermitage quis enviar, nomeadamente o ursinho. Se calhar, isso é que é também um pouco provinciano: receber de braços abertos o que quer que venha que tenha a palavra «Hermitage».
O estatuto dos profissionais das artes do espectáculo está agora suspenso.
Quanto a esta matéria, tenho vindo a dizer, desde que a Sr.ª Ministra e o Sr. Secretário de Estado tomaram posse, que a questão laboral e a questão da segurança social têm de ser vistas em simultâneo. E a Sr.ª Ministra tinha-se comprometido, há uns meses, que até ao fim do ano a questão da protecção social estaria resolvida. Estamos quase no fim do ano, ainda temos expectativas, mas isso deveria estar no Orçamento do Estado.
Ora, não estão cabimentados no Orçamento do Estado os encargos relativos à protecção social de que carecem os profissionais das artes do espectáculo.
Última pergunta, a propósito de lusofonia: qual é a posição do Ministério da Cultura quanto à ratificação do acordo ortográfico? Sabemos que é uma questão tripartida entre os Ministérios dos Negócios Estrangeiros, da Educação e da Cultura, mas tarda e não se houve falar na ratificação deste acordo, que é obviamente tão importante para a lusofonia.
A Sr.ª Presidente (Teresa Venda): — Tem a palavra, para responder, a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr.ª Presidente, Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, já tinha respondido a todas as questões que levantou na resposta que dei ao Sr. Deputado do PSD, excepção feita à penúltima referente à exposição do Museu Hermitage.
A exposição em causa foi totalmente construída por dois comissários: por uma comissária, cujo nome não sei dizer, da parte do Museu Hermitage e da nossa parte pelo Sr. Prof. Batista Pereira. A exposição foi expressamente construída para vir cá, com as peças que nós escolhemos, incluindo, devo dizer-lhe, Sr.ª Deputada, muitas peças da exposição permanente do Museu Hermitage.
Quanto a esta questão, é tudo o que tenho a dizer, pois quanto ao resto já respondi.
Colocou-me uma outra questão relativamente ao episódio pontual da falta de pessoal nos museus. Pergunta-me se não considero que este episódio deveria conduzir-me a demitir o Sr. Director do Instituto dos Museus e da Conservação. Digo-lhe que não considero, exactamente usando a mesma argumentação que usei para responder ao Sr. Deputado do PSD. Não me repito, portanto.
Em terceiro lugar, a Sr.ª Deputada, referindo-se ao Orçamento, caricatura a questão do mecenato e diz que eu devia trazer comigo os mecenas que apoiam o Ministério da Cultura. Acho que é grave essa caricatura que tenta fazer. Sabe porquê, Sr.ª Deputada? Porque transmite a ideia de que não é grande o esforço do Estado em termos da cultura e, sobretudo, transmite a ideia de que, porventura, não teríamos produção cultural, oferta cultural, sem o apoio mecenático. Ora, a verdade é que estamos a falar de 7,5 milhões de euros num orçamento de 254 milhões de euros.
Portanto, Sr.ª Deputada, essa sua observação é muito pouco pedagógica e conduz ao «confusionismo» junto dos portugueses. Aliás, foi esse mesmo «confusionismo» que fez com que muita gente, incluindo opinion makers, isto é, fazedores de opinião, e jornalistas, tenha pensado, por exemplo, que o Teatro Nacional de S.
Carlos funcionava com mecenato – coisa extraordinária! –, quando o esforço do Estado em termos de contribuição para aquele Teatro é cerca de 13 vezes superior à contribuição do mecenato.
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Ora, eu acho que é grave esse tipo de observação e em nada contribui para o esclarecimento público nem para a discussão do orçamento.
Já agora, Sr.ª Deputada, digo-lhe que os ganhos que conseguimos obter com o PRACE fazem com que possamos aumentar o orçamento de funcionamento.
A Sr.ª Deputada acha que o orçamento de funcionamento se destina exclusivamente a pagar as despesas ao nível de recursos humanos, mas não! Há muita coisa que se faz com o orçamento de funcionamento, designadamente em termos de empresas públicas. O orçamento das empresas públicas, excepção feita ao Teatro Nacional D. Maria II, é carreado do orçamento de funcionamento.
Portanto, Sr.ª Deputada, de facto, o aumento que se verifica no orçamento de funcionamento foi carreado para a missão substantiva do Ministério da Cultura e não para aumentos de gastos com pessoal.
Além disso, a questão, ligada a esta última, que me coloca relativamente ao PRACE revela que a Sr.ª Deputada não faz a mais pequena ideia de como funciona este Programa e, designadamente, a bolsa de emprego.
É que o PRACE não obriga os funcionários que estão disponíveis por terem sido colocados no quadro de mobilidade a aceitarem qualquer coisa. A prova é que o Instituto dos Museus e da Conservação procurou 102 funcionários para as funções de vigilância e guardaria e apenas responderam 11! Portanto, isto não se faz com uma pistola apontada aos trabalhadores» Estes respondem favoravelmente, caso queiram.
Não posso pegar em 94 funcionários, de entre os que estão disponíveis, os quais, aliás, podem ser quadros superiores, embora a maioria sejam administrativos, e dizer-lhes «os senhores vão ser guardas». Desculpe, Sr.ª Deputada, mas isso não cabe na cabeça de ninguém! Realmente, é uma falta de noção de como funcionam o PRACE e o sistema de mobilidade na Administração Pública. Proceder dessa forma seria cercear completamente a liberdade de escolha dos trabalhadores, o que, obviamente, não podemos fazer.
Os 94 funcionários do Ministério da Cultura que vão para o quadro da mobilidade, quase todos administrativos, como eu disse, com certeza vão executar tarefas da área administrativa noutros ministérios. Eles não são necessários no Ministério da Cultura, sê-lo-ão noutros ministérios. Caso contrário e como sabe, há um sistema previsto em termos da mobilidade no sentido de, mais tarde, esses funcionários encontrarem destinos distintos conforme a sua própria opção.
Portanto, Sr.ª Deputada, gostava de deixar claro que, nesta matéria, não se trata de decisão do Ministério mas dos trabalhadores em causa.
Relativamente ao Acordo Ortográfico, a posição portuguesa é de ratificação do Segundo Protocolo Modificativo, que é o que está em causa neste momento. A decisão final está nas mãos do Ministério dos Negócios Estrangeiros mas, tanto o Ministério da Cultura, como o da Educação, como, tanto quanto sei, o dos Negócios Estrangeiros, todos apoiamos a assinatura do Segundo Protocolo Modificativo, pedindo uma moratória de 10 anos para a sua aplicação.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Jorge Neto.
O Sr. Presidente: — Sr. Secretário de Estado, peço-lhe que seja breve porque já estamos um pouco fora de horas.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Vou ser brevíssimo, Sr. Presidente.
Sr.ª Deputada, em relação ao estatuto do artista, a posição do Governo é a mesma desde o início: consideramos que, primeiro, o estatuto do artista tem de ser aprovado e, uma vez definido o regime laboral do artista, trabalha-se no diploma da segurança social. Foi sempre esta a nossa posição e manter-se-á até ao fim.
Portanto, repito: a nossa posição é a de que, primeiro, é preciso aprovar o estatuto do artista e definir o regime laboral para, depois, se poder contemplar adequadamente o regime de segurança social.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra, não queria repisar muitas das questões que já lhe foram colocadas, mas que são centrais, no debate político sobre a cultura, mas a verdade é que alguma coisa tem caminhado ao longo deste debate.
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Se não vejamos: a Sr.ª Ministra chegou aqui, com um tom festivo, dizendo que o orçamento para a cultura cresce; agora, já diz que o orçamento executado vai crescendo. Bom, ficamos nesta conclusão generalizada de que o orçamento voa, mas voa baixinho, e continuamos muito longe do que tinham sido os compromissos políticos do Partido Socialista nesta matéria. De facto, um orçamento no valor de 0,1% do PIB é uma vergonha nacional em termos de políticas públicas para a cultura.
Sr.ª Ministra, uma vez que já muito foi dito sobre os valores do orçamento, gostava de lhe falar sobre a orientação política do Ministério.
Penso que, provavelmente, uma das questões mais interessantes é perceber qual é a diferença entre a política cultural de um governo das direitas, ou seja, do PSD e do CDS-PP, e a da Sr.ª Ministra que representa o Partido Socialista.
Devo dizer-lhe que, quando li o Relatório do Orçamento pensei, por um momento, que quem iria estar presente aqui não seria o Sr. Secretário de Estado mas o Eurodeputado Vasco Graça Moura, porque a escolha da orientação política do seu Ministério é tão conservadora quanto era a da direita.
O que a Sr.ª Ministra disse ao longo deste debate, o que está escrito no orçamento é sempre relativo à política do património e à política de enfatizar os grandes feitos da História nacional, no passado. A identidade portuguesa está definida, em termos de cultura, como os Descobrimentos, e não se vai muito para além disso.
Portanto, em relação a todos os objectivos que aqui foram evidenciados como prioritários, diria que falta futuro e que, essencialmente, falta presente.
A Sr.ª Ministra admite que a vertente museológica é prioritária nas políticas que está a seguir e, por isso, é com algum espanto que somos confrontados com as notícias de que não há vigilantes para os mais importantes museus da tal rede museológica que existe em Portugal.
De facto, a Sr.ª Ministra apresenta como uma vitória ter conseguido 90 funcionários, por um período de seis meses, contratados à tarefa. Perguntamos: passados seis meses o Museu Nacional de Arte Antiga ou o Museu Nacional de Arqueologia, por exemplo, voltam ou não a encerrar as portas? A Sr.ª Ministra fala-nos de uma «guerra» que tem com o Ministro das Finanças e da vitória que é ter conseguido que o Ministério das Finanças permita a celebração de contratos à tarefa, por um período de seis meses, para que haja vigilantes nas salas dos nossos museus.
Diria que a Sr.ª Ministra está muito solidária com o Sr. Ministro das Finanças no que toca à contenção dos gastos públicos, mas, claramente, o Sr. Ministro das Finanças não é muito solidário consigo, como se verifica pelas declarações da pessoa que, no Ministério das Finanças, controla, digamos assim, o Ministério da Cultura, e que disse que na cultura distribuía umas «missanguitas» pelo País. Então, as «missanguitas» são contratos de seis meses para tarefeiros tomarem conta das salas dos museus.
Pergunto, então, o que, provavelmente, os portugueses também perguntam e que é o seguinte: se são necessários vigilantes para os museus abrirem e desempenharem a sua função de mostrar o património – que é a sua escolha de investimento em termos das políticas da cultura, Sr.ª Ministra –, por que é que não contratam vigilantes? Será uma pergunta tão difícil de responder? A segunda questão que queria colocar-lhe é relativa ao apoio à criação artística – eu chamar-lhe-ia o presente e o futuro.
A este propósito, pergunto se não falta um parágrafo no Relatório do Orçamento do Estado. É que há todo um subtema relativamente ao apoio à criação artística e à difusão cultural, mas nada é dito sobre a criação artística.
Consta no texto do Orçamento o apoio à edição de obras ensaísticas e de revistas culturais, que é toda a criação artística que está nos dois parágrafos a que me refiro, porque o resto tem a ver com a edição de partituras, com a digitalização de conteúdos e com recursos culturais. Portanto, é todo um trabalho de difusão cultural, que creio que é importante, mas gostava de perceber se há algum apoio que seja dado à criação artística. Ou seja, gostava de saber se vamos ter novos repertórios, novas formas de ver a identidade cultural portuguesa, se vamos ter apoio a novas práticas culturais, apoio às artes plásticas de produção portuguesa, se temos ou não uma política que apoia os novos artistas nesta coisa que se chama criação cultural.
Pergunto-lhe mesmo mais – e esta é uma curiosidade académica que tenho –, pois gostaria de saber, ao nível dos apoios sustentados na área das artes do espectáculo, quantos são apoiados por via da regulamentação feita pelo anterior governo e quais são apoiados por via da regulamentação do deste Governo. Há uma diferença na política cultural? Gostaria de saber, em termos de percentagens e das companhias mais impor-
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tantes, quem continua a achar que a regulamentação trazida pelo governo das direitas é mais simpática do que a que foi trazida pela Sr.ª Ministra.
Em terceiro lugar, esta política das grandes exposições, sem fazer uma política de aposta na criação própria do País e de dinamização da criação artística, isto é que é provincianismo, Sr.ª Ministra – e peço-lhe desculpa! –, isto é o encantamento com tudo o que vem de fora, o que vem da Europa, até da Europa de Leste, sem termos a capacidade de ter uma produção própria.
Ou seja, um dia, poderemos ter um pólo do Hermitage, um pólo do Prado, um pólo da Fundação ThyssenBornemiza, poderemos ter um pólo da Tate. Alguma vez Portugal terá alguma capacidade de se projectar no cenário internacional das artes plásticas? Ou será que, com a Revolução Francesa e com o terramoto, já não há para mostrar nada do que é a identidade nacional? Relativamente a questões de futuro, pedia-lhe apenas alguma opinião política sobre matérias que creio serem centrais para o futuro das políticas públicas da cultura em Portugal. Sr.ª Ministra, qual é a sua opinião sobre o ensino artístico? Como sabe, o Sr. Secretário de Estado da Educação manifestou intenção de acabar com o que é o regime supletivo de ensino artístico nos conservatórios, ou seja, o que é a escolha da esmagadora maioria dos alunos que frequentam os conservatórios e que, mais tarde, virão a ser profissionais, nomeadamente da música, os quais têm este regime de formação em regime supletivo.
O referido Sr. Secretário de Estado acha que o ensino artístico não é produtivo. Há aulas individuais e personalizadas, como acontece em todo o mundo, mas o Sr. Secretário de Estado acha que não é suficientemente produtivo e, portanto, pretende estabelecer para o ensino artístico apenas o ensino integrado. Significa isto que, aos cinco anos de idade de seu filho, os pais devem decidir se aquele virá ou não a ser um grande pianista, ou um grande violoncelista, portanto, devem fazer uma aposta numa formação específica e não supletiva, como tínhamos até hoje.
Passo, agora, à segunda questão sobre o futuro, a dos intermitentes.
Gostaria de saber qual é a opinião da Sr.ª Ministra sobre as propostas que têm sido apresentadas pela bancada do Partido Socialista que visam permitir oito anos de contrato a termo certo, ou seja, estabelecem uma excepção para mais do que está previsto no Código do Trabalho e não prevêem qualquer tipo de protecção a nível de segurança social, nomeadamente subsídio de desemprego, enquanto, todos os meses, estes profissionais continuam a descontar para a segurança social.
Terceira questão, no que se refere à política cultural do audiovisual, percebi que a Sr.ª Ministra tem uma única aposta que se chama cinema. Ou seja, a cultura não estará presente no serviço público de televisão nem há qualquer outro tipo de iniciativa. Gostaria de saber se ela existe.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura, a quem solicito alguma brevidade nas respostas, dado o adiantado da hora, e ainda teremos uma segunda ronda, relativamente à qual advirto desde já os Srs. Deputados de que vou ser rigorosíssimo no controlo dos tempos.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, vou concentrar-me em duas questões que colocou. Uma delas, como disse, foi transversal a intervenções de vários Deputados e à minha intervenção inicial, quando me reportei ao facto de ter consciência de que este orçamento não é o desejável mas o possível, no quadro de um grande esforço de controlo das contas públicas desenvolvido por este Governo.
Evidentemente, a cultura participa neste esforço, que apresenta resultados que também são da cultura. Quando diminuímos o inesperado défice de 7,5% para 3%, a cultura também contribuiu também para este sucesso.
Portanto, isto significa que quando conseguirmos executar mais orçamento, e, portanto, gastar mais em cultura do que alguma vez se gastou, se compararmos, designadamente, desde 2000 (e volto aos mesmos números), e, simultaneamente, ajudarmos a controlar o défice, temos uma política de sucesso também para a cultura.
Por outro lado, relativamente à palavra depreciativa com que a Sr.ª Deputada se referiu ao apoio à produção cultural, dizendo que esta é, enfim, uma política simpática, enquanto que as políticas relativas ao património são — a Sr.ª Deputada não usou a palavra, uso-a eu agora — antipáticas, vou dizer-lhe por que é que umas são simpáticas e outras antipáticas.
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Sr.ª Deputada, as pedras não falam, e, portanto, é sempre mais populista e mais fácil fazer política de apoio à produção artística contemporânea, de presente e futuro, como a Sr.ª Deputada disse, do que de apoio ao património. Mas a Sr.ª Deputada até está enganada, e vou dizer-lhe os números do orçamento para 2008 que nos mostram exactamente que o apoio às artes é da ordem dos 132 milhões — e estamos aqui a incluir, evidentemente, tudo o que é artes, plásticas, performativas, os apoios sustentados e pontuais à produção independente, o apoio às Fundações da Música, de Serralves, Berardo e Arpad Szenes — Vieira da Silva. Reportome a tudo isto, ao apoio a espaços onde acontecem coisas que a Sr.ª Deputada depreciou na sua intervenção, quando por exemplo entende que não se produz em Portugal nada de significativo em relação às artes plásticas. Quer dizer não se produz nada em Serralves, no Museu Soares dos Reis, no Museu Nacional de Arte Antiga» É absolutamente surpreendente que diga isto! Na verdade, para o apoio às artes estão inscritos 132 milhões de euros, distribuídos (caso queira que lho refira) da seguinte forma: apoio às artes visuais e do espectáculo, 86,8 milhões; cinema, audiovisual e multimédia, 29,8 milhões, sem os tais 16 milhões a mais do Fundo de Investimento para o Cinema e Audiovisual; actividades socioculturais, onde estão incluídos os orçamentos para as Fundações de Serralves, Casa da Música e Arpad Szenes, etc., 26,8 milhões. Isto totaliza 132 milhões de euros para o apoio à produção contemporânea, sendo que o apoio para o património carreia 113 milhões de euros. Estamos a falar de 132 «contra» 113 milhões de euros, distribuídos assim: 83,1 milhões de euros para o património e 29,7 milhões de euros para os arquivos e bibliotecas. É pouco, Sr.ª Deputada! É pouco nos dois casos, e particularmente na área do património, ao contrário do que disse. E isto acontece não porque eu tenha optado por fazer uma política populista mas porque adequo as políticas que vou desenvolvendo às capacidades que o sector vai revelando, e o sector da produção cultural tem revelado capacidades para executar e eu tenho respondido a essa capacidade. Mas devo dizer que, mesmo assim, consegui — e orgulho-me disto —, por exemplo, dar início, no orçamento do próximo ano, à construção do depósito da Biblioteca Nacional e que nenhum governo, e muitos governos tiveram os tais orçamentos extraordinários, a que há pouco fiz referência, foi capaz de começar a concretizar, o que é absolutamente fundamental para a defesa do património.
Só que isto não dá páginas no jornal, Sr.ª Deputada! No que diz respeito às questões relativas ao apoio às artes, mais concretamente aos montantes dos apoios pontuais e sustentados, o Sr. Secretário de Estado fará o favor de responder.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Secretário de Estado da Cultura, a quem peço que seja breve.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Ana Drago, muito rapidamente, devo dizer que o novo regulamento do apoio às artes que entrou em vigor já permitiu sobretudo na área dos apoio pontuais, uma vez que havia compromissos a longo prazo nos apoios sustentados, corrigir muitas situações de subfinanciamento e de sobrefinanciamento que havia no apoio a entidades de criação artística e de programação.
Quando chegámos ao Ministério encontrámos uma situação caótica neste domínio, que, felizmente, já foi corrigida em 2006 e 2007, sobretudo neste último, quando entrou em vigor o novo sistema — e refiro-me principalmente aos apoios pontuais.
Em 2008, quando abrirem as candidaturas para os novos apoios sustentados, a dois e a quatro anos, então, poderemos fazer uma revisão global de todo o sistema. Mas devo dizer-lhe que esse diploma foi muito discutido com todas as entidades de criação e de programação e tem sido acolhido, na sua execução, da melhor maneira. Não temos notícias de queixas a este respeito.
Para 2008, estão previstos 18,6 milhões de euros para os apoios sustentados, que, no fundo, são compromissos que já vêm de trás, e 2,1 milhões de euros para os apoios pontuais.
Claro que há ainda os apoios às bienais de Veneza. Como sabe, um dos contributos que demos neste domínio foi o do aluguer permanente de um espaço com grande visibilidade em Veneza, que permitiu criar condições completamente diferentes para a programação das bienais de arquitectura e artes plásticas, inclusivamente rentabilizando os recursos, porque nunca se sabia onde é que a exposição portuguesa se realizava. E este é um lugar muito nobre e muito visível em Veneza.
Há também o apoio à Quadrienal de Praga, em 2007, que foi um êxito.
Portanto, continuamos com estes diferentes apoios.
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Todos sabemos os inúmeros adiamentos que existiram desde 2000 para se fazer no Teatro Nacional de São Carlos uma ópera do Emanuel Nunes, que, finalmente, irá ser feita em Janeiro. É um grande esforço financeiro, posso dizer-lhe, mas também o é porque implica uma colaboração internacional da maior qualidade para promover um artista português da modernidade. E nós estamos dispostos a fazer este esforço, mas havia quem não estivesse.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, vamos dar início à segunda e última ronda de perguntas e solicito rigor na utilização dos tempos, dispondo cada grupo parlamentar de 2 minutos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno da Câmara Pereira.
O Sr. Nuno da Câmara Pereira (PSD): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, por ocasião da apresentação do Orçamento do Estado, o Sr. Primeiro-Ministro afirmou, «Em 2008 poderemos fazer crescer claramente o orçamento da cultura (»)«. Se tivesse feito referência aos nõmeros que constam do orçamento, o Sr. Primeiro-Ministro teria antes afirmado, «Em 2008, poderemos, assim, fazer crescer em 9,2% o orçamento da cultura». Não o fez, e compreendemos as razões para tal: não convenceria ninguém do anunciado crescimento. De facto, e ao contrário do que o Governo quer fazer crer ao País, o crescimento de 9,2% não representa, de forma alguma, um crescimento radioso do orçamento da cultura para 2008. É o que nos dizem os números e, por isso mesmo, o Governo refere um crescimento de 9,2% por referência à expectativa de execução de 2007.
Ora, é preciso não esquecer que o orçamento para a cultura para o referido ano sofreu, em relação a 2006, um corte de 9,1%. Foi, aliás, um dos orçamentos mais baixos desde 1999, conforme a Sr.ª Ministra se lembra de, no ano passado, aqui termos discutido. Um crescimento de 9,2% em relação à expectativa de execução de um dos mais baixos orçamentos dos últimos anos não pode ser considerado um claro crescimento.
Também não se percebe como pode o Governo falar em fazer crescer o orçamento quando, repetindo o cenário catastrófico de 2007, a despesa consolidada continua a responder apenas e só a 0,1% do PIB e a 0,4% da despesa da administração central! Sr.ª Ministra, estes é que são os números. Os números são claros e não mostram que, no Orçamento do Estado para 2008, o Governo faça crescer claramente o orçamento para a cultura. O que os números do Orçamento nos mostram, em bom rigor, é que o Governo faz falhar a cultura.
Mais: faz falhar claramente a sua política para a cultura. É esta a principal conclusão que nos permitimos extrair do documento apresentado a esta Assembleia: o insucesso claro e manifesto da política cultural do Governo PS e, acima de tudo, do compromisso para com a cultura, assumido no seu Programa de Governo.
De resto, é pálida a rosa que a Sr.ª Ministra enverga ao seu peito. Este Orçamento não reafirma o sector da cultura como prioridade na afectação dos recursos disponíveis. Este Orçamento não afecta ao sector da cultura, nem de longe nem de perto, 1% do Orçamento do Estado. Fazendo crer uma despesa total consolidada por ministérios, o da cultura surge em último lugar, com apenas 245,5 milhões de euros, dos quais 56,1 milhões, representativos de 22,8% da despesa total, destinam-se às despesas com pessoal.
O Ministério da Cultura é, de facto, um «parente pobre» da família do Governo, o que muito nos deixa antever quanto à responsabilização deste Executivo por um sector fundamental para o bem-estar humano, equilíbrio e vigor no País.
Sr.ª Ministra, o orçamento pode até ter crescido, nas contas muito próprias que só este Governo parece saber fazer. Mas a verdade é que um crescimento, em termos de concretização, se anula em face dos números dos orçamentos anteriores. Assim, é um orçamento manifestamente desadequado das mais prementes necessidades do sector, designadamente no que respeita à valorização e recuperação do património imóvel classificado.
Portugal, como sabe, é um museu aberto, é um museu vivo e o seu património museológico, de norte a sul, está em decadência. Não obstante a crítica situação, para a salvaguarda da situação do património cultural, designadamente do património imóvel classificado, o Governo elegeu apenas 106,8 milhões de euros. Apesar do crescimento verificado em 2007, continua a ser uma quantia irrisória, que, quanto a mim, não chega para «tapa buracos».
A valorização e salvaguarda do edificado monumental e classificado, enquanto marco visível dos nossos já longos anos de história e da produção cultural, são prioritárias. Não é, contudo, prioridade deste Governo, facto que nos fará pagar um preço muito alto a curto prazo.
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Veja-se o exemplo paradigmático do antigo Convento dos Caetanos. Como é sobejamente conhecido, este edifício está em mau estado de conservação, está quase em estado de ruína, designadamente o seu salão nobre, em cujo tecto figuram pinturas de José Malhoa, e a Sr.ª Ministra terá com certeza conhecimento disto.
Este edifício do século XVIII encontra-se num dos bairros mais emblemáticos da cidade, o Bairro Alto, e é nele que se desenvolve uma parte do nosso ensino artístico. E, tal como acabámos de enunciar, o que se pode fazer com o ensino artístico num património tão depauperado e tão desgastado e, quem sabe, a ser desarticulado dentro de anos?
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado, peço-lhe que conclua.
O Sr. Nuno da Câmara Pereira (PSD): — Com certeza, Sr. Presidente.
Assim sendo, pergunto à Sr.ª Ministra o que pensa fazer com o ensino artístico especial, se pretende inclusivamente chamá-lo a si própria, na valorização e promoção da produção artística.
Questiono-a ainda sobre qual a tomada de atitude relativamente à recuperação do Convento dos Caetanos, onde exerce a Escola de Música do Conservatório Nacional.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Manuela Melo.
A Sr.ª Manuela Melo (PS): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, é muito fácil falar dos sectores do Ministério da Cultura cujas verbas sobem ou descem muito. Gostaria, porém, de falar de um sector, que, ficando inalterável do ponto de vista orçamental, tem assinaláveis alterações ao nível da política desenvolvida. Falo dos arquivos e, especificamente, da Torre do Tombo. Com o PRACE, houve um grande susto sobre o que se iria passar com o CPF (Centro Português de Fotografia). Contudo, hoje, já é possível ver que a integração do CPF nos arquivos nada trouxe de errado para o CPF; pelo contrário, o CPF, além de se ter mantido no Porto, conseguiu alargar horários, elaborar a programação, que, no próximo ano, é sobre a China, e fazer visitas guiadas.
Sobre os arquivos distritais — e já se falou aqui do de Viseu e, depois, do protocolo com o de Évora —, vão encerrar as obras em todos os arquivos distritais deste país, o que é assinalável.
Finalmente, quanto à Torre do Tombo, gostaria que a Sr.ª Ministra nos falasse de dois projectos: um deles é o RODA (Repositório de Objectos Digitais Autênticos), que é o modelo de arquivo digital para a Administração Pública e que é essencial para que o nosso presente tenha algum sentido e para que o trabalho na Torre do Tombo, que nasce sobre o espólio documental do passado, tenha um efeito fundamental em coisas do nosso quotidiano de hoje, como, por exemplo, o governo electrónico. E é curioso ver que a prioridade política para testar este projecto foi feita numa coisa que nos preocupa a todos: os arquivos da Alta Autoridade contra a Corrupção. Penso que não há melhor forma de dizer quão importante é as questões patrimoniais, as questões do contemporâneo, andarem sempre juntas e não e sentido oposto, como algumas intervenções aqui pareceram fazer supor.
Posto isto, Sr.ª Ministra, pergunto-lhe que mais nos pode dizer sobre as orientações políticas e o trabalho que, em 2008, a Torre do Tombo e os arquivos nacionais vão desenvolver.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, quando, há pouco, lhe falava na questão da concentração dos meios e das erradas (em nosso entender, é claro) opções políticas, falava-lhe precisamente daquilo que o Sr. Secretário de Estado acabou por classificar como «investimentos estruturantes» que nos põem no mapa da Europa. E não vou utilizar a expressão, já hoje aqui muito utilizada, do «provincianismo», até porque, sendo eu da província, não poderia utilizá-la de forma depreciativa, mas vou classificar esta opção política com uma terminologia agrícola, que também é própria da província, de onde venho. É que estas designações que o Partido Socialista e o Governo tanto gostam de utilizar — como «investimentos estruturantes», em alguns campos da governação, e «aposta nos centros de excelência», noutros campos — não são mais do que «política de eucalipto», a política em que se tem uma árvore que suga os recursos das restantes, em que se chega ao fim com um grande eucalipto, um eucalipto pujante, mas sem mais nada à volta.
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E quando falamos das opções políticas nestes ditos «investimentos estruturantes», a questão que lhe colocamos é esta: estas opções são ou não feitas à custa de um investimento mais global que permitiria, de facto, garantir um aspecto, para nós, fundamental no desenvolvimento cultural, que é a diversidade, a diversidade nas possibilidades de criação artística? Isto porque, quando se decide afectar — e reporto-me novamente aos dois exemplos citados pela Sr.ª Ministra — 7,5 milhões de euros a duas fundações, concretamente à Fundação de Serralves e à Fundação Berardo, faz-se esta opção de utilização dos recursos em prejuízo de uma outra opção que poderia ser feita, a de afectação destes recursos à construção de equipamentos que dessem resposta à multiplicidade de agentes culturais que não têm equipamentos onde possam desenvolver a sua actividade, ou à requalificação de outros espaços que são necessários para o desenvolvimento e aumento da produção artística.
Por outro lado, Sr.ª Ministra, não posso deixar de registar a falta de resposta à questão que lhe coloquei sobre a inexistência de uma linha sequer relativamente à situação dos trabalhadores das artes e espectáculos.
O Sr. Secretário de Estado acabou por responder à questão da segurança social, dando, aliás, uma resposta que é de registar aqui. É que, quando debatemos as iniciativas legislativas do PCP, nomeadamente em Julho, a Sr.ª Ministra disse que, até ao fim do ano, o regime da segurança social estaria aprovado, mas a verdade é que estamos a chegar ao fim do ano e não há sequer qualquer notícia de avanço relativamente a esta matéria.
Portanto, registamos aqui a resposta dada, de que, só lá para 2009, estes trabalhadores poderão ter a sua expectativa de ter um regime de protecção social concretizada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Teresa Caeiro.
A Sr.ª Teresa Caeiro (CDS-PP): — Sr. Presidente, Sr.ª Ministra da Cultura, no que se refere à ronda anterior, quero apenas salientar que o que nos disse veio, mais uma vez, demonstrar que o quadro de mobilidade serve para muito pouco.
Não obtive resposta à minha pergunta sobre se o Museu de Arte Antiga vai ou não estar encerrado amanhã e depois de amanhã, à hora do almoço, e no próximo fim-de-semana.
Sr.ª Ministra, gostaria de saber se o Ministério pondera devolver a autonomia administrativa e financeira, há muito reivindicada, aos teatros nacionais e aos museus. Isto porque a autonomia administrativa e financeira é potenciadora do mérito e de um maior impulso ao bom funcionamento das instituições. E se é verdade que alguns directores são penalizados por fazer esta reivindicação, outros há, como o Dr. Ricardo Pais, que também a faz há muito tempo relativamente ao Teatro Nacional de São João, no Porto, que vêem reforçado o seu orçamento e a sua autonomia administrativa e financeira.
Assim sendo, o que pergunto é se vai haver uma política que permita, nomeadamente, a quem negoceia e consegue apoios mecenáticos poder beneficiar deles, e não uma política que deixe ao bel-prazer da tutela a distribuição dos apoios conseguidos por quem os negociou. Isto porque, como sabemos, só criando mecanismos de incentivo ao melhor funcionamento, incentivos ao mérito e a uma maior diligência por parte dos directores, poderemos alcançar melhores resultados.
Quero ainda perguntar-lhe o que está previsto para a comemoração dos 400 anos do nascimento do Padre António Vieira e também — tema já há pouco abordado muito brevemente pela Sr.ª Ministra, mas peço-lhe que elabore um pouco mais — para a comemoração do centenário do nascimento de Vieira da Silva.
O Sr. Presidente: — Para a última intervenção nesta segunda e última ronda de perguntas, tem a palavra a Sr.ª Deputada Ana Drago.
A Sr.ª Ana Drago (BE): — Sr. Presidente, vou colocar uma série de questões à Sr.ª Ministra da Cultura e, depois, vou ter de me ausentar, pois tenho de apresentar um projecto de lei numa reunião de uma comissão parlamentar que está a decorrer — isto é o que acontece nos pequenos grupos parlamentares.
Sr.ª Ministra, começo por lembrar-lhe o passado do Partido Socialista, no que toca às políticas públicas para a cultura, quando o Partido Socialista defendia a máxima: «não colocar a cultura ao serviço do Estado, mas o Estado ao serviço da cultura». Penso que é isto que estamos hoje aqui a debater. E quando a Sr.ª Ministra me diz que «as pedras não têm voz», devo dizer-lhe que fico sensibilizada, mas, verdadeiramente, interessa-me perceber até que ponto há ou não uma diferença entra as políticas que estão a ser implementadas pelo Partido
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Socialista e as da direita. No que toca aos apoios à criação cultural, aos apoios sustentados às artes, o Sr.
Secretário de Estado acabou de admitir que, de facto, a regulamentação feita pelo governo da direita está, neste momento, a ser mantida e que, no futuro, talvez possa vir a ser alterada.
Mas houve uma série de questões às quais a Sr.ª Ministra, pura e simplesmente, não respondeu. É verdade que temos uma diferença ideológica e que teremos outros momentos para a discutir, mas gostava de perguntar-lhe: vai ou não contratar vigilantes, para além destes seis meses de tarefa, para os museus que têm necessidade, de modo a poderem manter as suas portas abertas? Sobre a questão do ensino artístico, qual é a visão da Sr.ª Ministra no que toca ao ensino artístico? Quanto à questão dos intermitentes, a Sr.ª Ministra tem uma posição política sobre este assunto que nos possa dizer? Qual é a sua apreciação das propostas apresentadas pelo Partido Socialista agora, na discussão na especialidade? Diria ainda que entender a Fundação Berardo e o projecto do Hermitage como projectos estruturantes — uma fundação em que o Estado investe e, no futuro, tem a possibilidade de comprar a respectiva colecção e as colecções do Hermitage (e diga-se que o investimento, este ano, é de 6 milhões de euros) —, revela, de facto, uma concepção diferente entre o que estrutura e o que cria cultura para o futuro.
Acima de tudo, pergunto-lhe, Sr.ª Ministra: para que são necessárias políticas públicas para a cultura?
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra a Sr.ª Ministra da Cultura.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, gostaria de fazer uma referência inicial a uma questão aqui veiculada ao longo de várias intervenções, que se reporta à posição do Ministério da Cultura relativamente ao ensino artístico.
Devo dizer que, há 15 dias, organizou-se uma grande e longamente preparada, junto das próprias estruturas nacionais de ensino artístico, conferência nacional sobre o ensino artístico, no Porto, na Casa da Música, a cuja abertura quer eu quer a Sr.ª Ministra da Educação estivemos presentes. E a posição do Ministério da Cultura, no que toca à quota-parte da sua responsabilidade, relativamente ao ensino artístico, é que ela deve ser sempre assumida em espaço não formal. O nosso entendimento é que toda a formação na área do ensino artístico em que o Ministério da Cultura se deve envolver deve ser sempre em espaço não formal de formação — de resto, já o fazemos. E o novo regulamento de apoio às artes — repito, novo regulamento de apoio às artes, Sr.ª Deputada —, que apresentámos, depois de, como o Sr. Secretário de Estado acabou de dizer, amplamente discutido, de norte a sul e de leste a oeste do País, com praticamente todas as estruturas de produção artística apoiadas pelo Ministério da Cultura (e não só as apoiadas), valoriza como um item prevalecente para a obtenção do apoio exactamente a criação de projectos que respondam à formação em exercício, designadamente workshops, ateliers, estágios de curta ou longa duração.
A nossa posição é esta, sendo que entendemos, como há pouco já tive ocasião de dizer na resposta dada à Sr.ª Deputada Teresa Portugal, que o ensino artístico é determinante para o sucesso do investimento em ensino e em ciência.
Gostava também de dizer à Sr.ª Deputada Teresa Caeiro, respondendo à sua questão acerca da autonomia administrativa nas empresas públicas, que as empresas públicas têm completa autonomia. As empresas públicas são, como o nome indica, empresas absolutamente autónomas.
Protestos da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.
A Sr.ª Deputada questionou várias vezes a possibilidade de elas poderem ou não contratar, de obterem receitas atravçs do mecenato» Sr.ª Deputada, as empresas põblicas angariam o mecenato que muito bem entenderem, contratam os trabalhadores que muito bem entenderem» Enfim, são, completa e totalmente, autónomas. Só não o são na medida em que precisam do Orçamento do Estado para o seu funcionamento, mais nada. No resto, têm total e completa autonomia.
Protestos da Deputada do CDS-PP Teresa Caeiro.
Desculpe, Sr.ª Deputada, talvez se tenha enganado, mas falou.
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De qualquer forma, quero dizer-lhe que, no âmbito do PRACE, introduzimos alterações em matéria de autonomia nos serviços. Foi o que aconteceu, por exemplo, nos museus, onde o financiamento passa a ficar retido no próprio museu. Dou um exemplo: todas as receitas dos museus, desde as receitas da bilheteira até às do mecenato, passando pelas receitas obtidas com serviços ou com o aluguer de espaços, tudo isto era carreado para o Instituto dos Museus e da Conservação (IMC); doravante, só é carreado o valor que é obtido na bilheteira. O resto — receitas mecenáticas, receitas resultantes do aluguer de espaços e todas as outras que enumerei — fica, à partida, no próprio organismo. De resto, nesta matéria fomos ao encontro de uma reivindicação que os dirigentes dos museus há muito faziam.
Portanto, Sr.ª Deputada, a nova lei orgânica plasma exactamente o que acabo de lhe dizer.
As receitas de bilheteira continuam a ser remetidas para o IMC por uma questão que nos parece que é da maior justiça, porque é preciso que estas receitas contribuam para o equilíbrio orçamental dos outros museus que, pela sua colecção, localização, etc., não podem ter as mesmas receitas, nem os mesmos públicos.
Portanto, Sr.ª Deputada, houve alterações, que estão plasmadas na lei. Se a Sr.ª Deputada fizer o favor de ler a nova lei orgânica, constatará que elas foram acolhidas.
Por outro lado, gostaria de despreocupar o Sr. Deputado João Oliveira relativamente à questão da falta de equipamentos, que foi uma matéria que trouxe aqui, a propósito de opções estruturantes, ou não, de investimento deste orçamento. Dizer que há falta de equipamentos para a produção artística é não conhecer o País real, Sr. Deputado. Neste momento, Sr. Deputado, quer goste, quer não goste, temos em alguma zonas, poucas, falta de oferta, mas na esmagadora maioria do País temos excesso de oferta. Portanto, Sr. Deputado, o nosso problema neste momento não são as infra-estruturas mas a programação desses espaços. É exactamente o contrário, Sr. Deputado, o problema é a programação desses espaços.
Protestos do Deputado do PCP João Oliveira.
Por isso mesmo é que há pouco disse à Sr.ª Deputada Ana Drago que algumas das inflexões das políticas do Ministério da Cultura, que a Sr.ª Deputada Ana Drago não vislumbra, relativamente a governos anteriores (governos do PSD e do PS), são inflexões que têm a ver também com o país real que temos hoje, que é diferente do que tínhamos há quatro ou cinco anos, no que toca a equipamentos culturais.
Hoje, é preciso incentivar a programação, porque há dificuldades na programação de muitos equipamentos que foram sendo criados pelo País, como, por exemplo, na rede de cine-teatros. As autarquias, designadamente, têm dificuldades de programação. Se até a autarquia do Porto, que é a segunda maior do País, tem dificuldade em programar o seu cine-teatro, quanto mais as autarquias de outra dimensão.
Portanto, Sr. Deputado, temos dificuldades de programação e também temos dificuldades na conquista de públicos em algumas áreas do País, porque em alguns casos temos oferta e não temos público.
Sr. Deputado, País real que temos hoje não é o de há 5 ou 10 anos. Não é! É muito diferente! Logo, as políticas para a cultura têm de ser diferentes necessariamente, e são-no.
Consequentemente, o investimento não tem de ser tanto em cimento, mas noutras áreas, como, por exemplo, na da programação, na da capacitação humana, temos de, sim, investir nestas áreas.
Sr.ª Deputada Manuela Melo, Direcção-Geral de Arquivos (DGARQ) tem sido uma das direcções-gerais do Ministério da Cultura onde mais inflexões foram feitas. Se a Sr.ª Deputada Ana Drago prestasse um bocadinho de atenção, pouquinha que fosse, ao que se faz hoje na Direcção-Geral de Arquivos, veria como estamos distantes da política do último governo, até mesmo do penúltimo e do antepenúltimo, no que diz respeito à área dos arquivos.
Na verdade, revolucionou-se a política de arquivos em Portugal e esse programa a que a Sr.ª Deputada acabou de fazer referência, o Repositório de Objectos Digitais Autênticos (RODA), é exactamente um exemplo que demonstra que estamos a investir no sentido de responder às exigências de conservação dos arquivos digitais, a longo prazo.
Se um programa deste tipo já tivesse sido implementado há alguns anos, questões como aquela que hoje vem plasmada nas páginas dos jornais, relativamente aos arquivos do Ministério da Defesa Nacional — que terão sido digitalizados e utilizados, enfim, não importa exactamente como, ou, melhor, importa, mas não aqui —, não se colocariam, exactamente porque existiriam instrumentos de regulação na área dos arquivos da Administração Pública.
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Portanto, na área dos arquivos, temos desenvolvido um trabalho inovador. E o CPF, respondendo a uma outra questão, além de manter a programação na área da fotografia contemporânea e de arquivo, conforme eu sempre disse que aconteceria, reencontrou também a sua vocação de arquivo, que também é. E é exactamente por isto que hoje o CPF está dependente da Direcção-Geral de Arquivos, porque há uma componente de arquivos que tinha sido sistematicamente desvalorizada.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura irá completar e responder a algumas outras questões, se o Sr. Presidente o permitir.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Secretário de Estado da Cultura.
O Sr. Secretário de Estado da Cultura: — Sr. Presidente, as Sr.as Deputadas Ana Drago e Teresa Caeiro e o Sr. Deputado João Oliveira, que colocaram as questões, saíram da sala, mas eu gostaria vou falar do Estatuto do Artista.
É evidente que se o diploma do Estatuto do Artista não for aprovado em breve também o diploma da segurança social não poderá sê-lo. Portanto, uma coisa depende da outra. Logo, quanto mais rápido for o calendário de aprovação do diploma de regulação do regime laboral, mais rapidamente teremos o diploma da segurança social aprovado. E foi isto que sempre foi dito pelo Governo, que uma coisa dependia da outra. Portanto, não se pode respeitar um prazo da segurança social, visivelmente até ao fim do ano, se até essa altura não estiver aprovado o regime laboral do artista.
O Sr. Presidente: — A Sr.ª Ministra da Cultura gostaria ainda de dizer algo, pelo que tem a palavra.
A Sr.ª Ministra da Cultura: — Sr. Presidente, relativamente a uma informação que foi pedida pelo Sr. Deputado Feliciano Barreira Duarte, sobre a biblioteca de Vila Nova de Paiva, devo dizer que já aqui tenho os elementos, pelo que posso dizer que é, de facto, uma biblioteca com um contrato-programa assinado em Setembro de 2005, que tem uma obra homologada quase no final de 2006. Há uma dívida da Direcção-Geral do Livro e das Bibliotecas (DGLB) de 515 000 euros e está orçamentado para o próximo ano, para o pagamento desta dívida, que, como sabem, é uma dívida que não atinge apenas a biblioteca de Vila Nova de Paiva, um montante de 75 000 euros no orçamento para 2008 para o começo de pagamento desta dívida.
Portanto, fica esta informação, que ficou suspensa há pouco.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, chegamos ao fim da discussão do orçamento do Ministério da Cultura.
Resta-me, uma vez mais, em nome da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Ética, Sociedade e Cultura, agradecer à Sr.ª Ministra da Cultura e ao Sr. Secretário de Estado da Cultura a presença aqui hoje. Penso que foi uma reunião muito produtiva, apesar de haver uma nota dominante neste debate que é a escassez de recursos para a área da cultura. Todos desejaríamos que o montante alocado a esta área fosse superior, mas não é possível. Assim, resta-me desejar que haja a necessária criatividade e proficiência na gestão desses escassos recursos públicos, a bem da cultura e a bem de Portugal.
Srs. Deputados, vamos então interromper os trabalhos.
Eram 18 horas e 5 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 18 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, vamos dar início à discussão na especialidade do orçamento do Ministério da Administração Interna, que, como sabem, trata-se de uma reunião que surge na sequência daquilo que a Constituição e o Regimento determinam.
O Ministério da Administração Interna tem alocada, nos termos da proposta de lei do Orçamento do Estado para 2008, uma verba significativa, de cerca de 1% do PIB, que, se a memória não me atraiçoa, são grosso
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modo 1600 milhões de euros. Há mesmo um acréscimo relativamente ao ano anterior, pese embora, no tocante à execução tout court, haja um ligeiro decréscimo.
Há, naturalmente, questões importantes, que os Srs. Deputados vão querer esclarecer, no âmbito da área tutelada pelo Sr. Ministro, concretamente a reestruturação das forças de segurança, que, creio, é um tema que está na agenda do debate político, mas também as atinentes à protecção civil, à cidadania e segurança e porque não, em relação à inovação plasmada na proposta de lei do Orçamento do Estado, na área da protecção civil, à aplicação de algumas verbas do QREN.
É, portanto, para esclarecermos esta plêiade de questões que temos aqui o Sr. Ministro da Administração Interna, a quem desde já agradeço a presença nesta Comissão, que irá fazer uma primeira intervenção, dispondo para o efeito de 15 minutos, apresentando as linhas gerais que enformam a proposta de lei do Orçamento do Estado no tocante à área tutelada pela Administração Interna, a que se seguirá duas rondas de perguntas.
Na primeira, cada grupo parlamentar disporá de 5 minutos para formular as perguntas, a que o Sr. Ministro responderá de imediato; na segunda ronda, cada grupo parlamentar disporá de 2 minutos e o Sr. Ministro responderá no fim, em bloco.
Solicito rigor no cumprimento dos tempos, dado o adiantado da hora, por um lado, e também rigor na aplicação das normas regimentais, maxime no tocante à invocação da célebre figura de interpelação à mesa que, muitas vezes, é utilizada, perdoem a expressão, de uma forma tutti quanti canhestra.
Assim, tem a palavra, Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna (Rui Pereira): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, começo por reafirmar que realmente a despesa consolidada do MAI (Ministério da Administração Interna) ascende, em termos gerais, a 3% da despesa da administração central e a 1% do PIB. Esta despesa consolidada sofre uma redução de 0,7% quanto à estimativa de execução para 2007 e verifica-se também uma diminuição de 3,2% do orçamento de funcionamento, cuja causa é evidentemente o PRACE e a extinção da Direcção-Geral de Viação, objecto de um processo de racionalização, de passagem de competências, na parte que respeita ao Ministério da Administração Interna, para a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.
Como pontos a destacar no âmbito da nossa discussão orçamental, começo por referir que o PIDDAC relativo às forças e serviços de segurança passa de 64 milhões de euros para 108 milhões de euros, o que representa evidentemente um aumento muito significativo de 44 milhões de euros, que se traduz num aumento de 70%.
No QREN, em que há uma novidade para este ano, dado que contempla pela primeira vez a área da protecção civil, vamos dispor de 150 milhões de euros até 2013, o que permitirá responder a vários programas no âmbito da protecção civil.
Também é justo sublinhar o aumento nos investimentos, que decorre da Lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança. Vamos proceder a investimentos na ordem dos 62,5 milhões de euros, enquanto que, no ano passado, o investimento se estimou em 38,7 milhões de euros. Houve, portanto, é bom sublinhá-lo, um aumento de 23,8 milhões de euros, correspondente a 61,5%.
Em relação a estes investimentos, convém dar uma visão analítica, sector a sector. E, neste contexto, gostaria de referir que haverá um investimento de 24 milhões de euros em quartéis, postos da GNR e esquadras da PSP, de 12,5 milhões de euros em viaturas, de 4,7 milhões de euros em meios das forças de segurança, incluindo as pistolas — e, como sabem, estão a ser adquiridas pelo menos 42 000 pistolas de 9 mm —, de 19 milhões de euros em sistemas de informação e de comunicação, como o SIVIC (Sistema Integrado de Vigilância Costeira), o SIRESP (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal), o 112 ou a Rede Nacional de Segurança Interna.
Em suma, todos estes investimentos vão certamente permitir uma modernização das forças de segurança e uma melhoria sensível da sua capacidade operacional e da sua capacidade de resposta em geral.
Recordo que as forças e serviços de segurança passam, nesta altura, por um processo de modernização, o que corresponde à linha reformista do Governo, que foi desencadeado pela aprovação da lei de programação, que passou pela aprovação das leis orgânicas, leis estas que vão permitir pôr fim a situações de descontinuidade territorial e a sobreposições indesejáveis, e que vai continuar agora com a regulamentação das leis orgânicas e a aprovação das leis de segurança interna e de organização da investigação criminal. A aprovação
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destas leis vai, seguramente, permitir um reforço da coordenação, como tem sido amplamente referido, a criação de um clima de cooperação mais estreita entre todos os serviços e forças de segurança e a troca de informação relevante, de acordo com princípios de disponibilidade, necessidade e competência.
Neste contexto, gostaria de referir a reforma dos sistemas de comunicação de forma individualizada. Na verdade, o SIRESP, cuja 1.ª fase, relativa a Lisboa e Santarém, está concluída, vai entrar na 2.ª e 3.ª fases, concluindo-se, após a extensão a todo o território continental, com a sua aplicação às Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores.
Também o 112 está em fase de reestruturação, que implicará a criação de uma réplica para evitar falhas de sistema e que incluirá os serviços do Ministério da Saúde, que está a trabalhar connosco estreitamente nesta reestruturação.
O SIVIC, o sistema de vigilância da costa, está em fase de procedimento e dele depende, naturalmente, o patrulhamento da costa e o êxito do nosso combate ao tráfico de droga.
A Rede Nacional de Segurança Interna está numa fase em que já existe o data centre e no próximo ano procederemos à ligação de todas as instalações do MAI, em banda larga, à rede.
No domínio da modernização e da simplificação das forças de segurança, gostaria de referir que continuam a ser desenvolvidos os projectos Esquadra Séc. XXI, para a PSP, e Posto Séc. XXI, para a GNR. Trata-se de criar instalações policiais mais confortáveis, mais funcionais, com maior proximidade relativamente aos cidadãos, para que eles se sintam efectivamente bem acolhidos, e que sejam inovadoras, no sentido de acolherem as novas tecnologias ao serviço das forças de segurança.
Neste mesmo domínio, gostaria de recordar que o RAPID (Reconhecimento Automático de Passageiros Identificados Documentalmente) vai continuar a ser desenvolvido no ano que vem. O RAPID é um sistema de verificação automática da identidade de passageiros em aeroportos e que surge na sequência da criação do passaporte electrónico português. O RAPID já está a funcionar nos aeroportos de Faro e de Lisboa e vai ser alargado a outros no ano que vem. Trata-se de um sistema que tem dado boas provas e que é encarado, mesmo no âmbito da União Europeia, com muito reconhecimento.
Também vamos proceder à reforma do recenseamento para que este passe a ser automático, pondo fim a uma situação completamente irracional, pois não se justifica que o recenseamento obrigatório dependa de um acto de vontade e esteja associado à aplicação de sanções, deve, sim, ser associado à posse da qualidade de cidadão que não tenha sido alvo da aplicação de penas acessórias de incapacitação eleitoral activa. Por outro lado, vamos desenvolver o voto em mobilidade, para que em qualquer lugar do País se possa votar, e o voto electrónico associado ao voto em mobilidade.
No plano da segurança comunitária e do policiamento de proximidade, que constituem vectores essenciais da política do Governo, vamos continuar a desenvolver o programa Escola Segura, que corresponde a uma ideia central da política de segurança do Governo, porque visa proteger vítimas especialmente carenciadas, que são as nossas crianças e jovens em idade escolar.
Para além disso, estamos a desenvolver outros programas, como por exemplo: Táxi Seguro, em que a utilização de novas tecnologias, a ligação a esquadras da PSP e postos da GNR e a georreferenciação são decisivas; Noite Segura, para responder a problemas de criminalidade no âmbito das grandes cidades, de Lisboa e Porto; vamos continuar a desenvolver o programa Polícia em Movimento, que implica a atribuição de computadores portáteis às forças de segurança para melhorar a sua capacidade de resposta.
No plano da protecção civil e do combate aos incêndios florestais em particular, continuaremos a desenvolver o programa das companhias especiais de bombeiros, os «Canarinhos». Como VV. Ex.as sabem, este ano foi lançada a primeira companhia com cerca de 120 bombeiros «Canarinhos», profissionalizados e altamente especializados; no próximo ano será lançada a segunda companhia, o que nos permitirá alargar de quatro para sete os distritos contemplados e considerados de maior risco. Faremos um alargamento aos distritos de Setúbal, Beja e Évora.
Também o GIPS (Grupos de Intervenção Protecção e Socorro), da GNR, verá no ano que vem o seu âmbito de aplicação ampliado, passando a actuar em Bragança e Lisboa. Continuaremos, por outro lado, a criar a equipas municipais, que são equipas de bombeiros altamente profissionalizados com apenas cinco elementos, criadas em sistemas de parcerias com as autarquias, com as câmaras municipais, havendo uma distribuição de encargos equitativa entre a administração central e a administração local. Até 2009, iremos criar, segundo as estimativas, 200 destas equipas.
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Continuaremos a apostar numa contratação antecipada de todos os meios necessários e, no ano que vem, disporemos de mais um meio aéreo do que este ano, passaremos a ter 53 em vez de 52 meios aéreos, para colmatar uma lacuna que, de certa forma, se verificou em termos de disponibilidade no ano em curso e reforçar um pouco o nosso dispositivo.
Por fim, gostaria de fazer ainda uma referência à segurança rodoviária, para dizer claramente que esta continua a ser um desígnio nacional assumido como tal pelo Governo e que deve continuar a ser defendida, porque sabemos que têm sido feitos progressos. Recordo que no último ano tivemos, pela primeira vez, um número de mortos na estrada inferior a 1000, mas isto não nos permite descansar. Sabemos que temos de continuar a trabalhar muito, porque continua a haver acidentes graves, continua a haver comportamentos de risco relacionados com o excesso de velocidade, com condutas aditivas, com deficiências no comportamento dos condutores, e, portanto, vamos continuar, por essa via, a considerá-la um desígnio nacional.
Está em curso uma pequena revisão do Código da Estrada, que, apesar de não abranger muitos artigos, é muito significativa, porque permitirá melhorar o procedimento ao nível das contra-ordenações e está associada a uma reforma informática. É preciso melhorar o procedimento sancionatório.
Também pretendemos reforçar naturalmente o patrulhamento e a fiscalização em geral, pretendemos desenvolver com parceiros tradicionais campanhas preventivas para continuar a mudar a mentalidade dos condutores, melhorar o ensino da condução e, ao nível de estrutura, uma vez que actualmente passou a haver uma Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, pretendemos proceder à sua implantação nacional num modelo que seguirá com inspiração o que se passou na Autoridade Nacional de Protecção Civil e que caminhará em parceria quer com os governos civis quer com as autarquias.
Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Presidente, estas são algumas ideias que gostaria de deixar expressas, ainda que de forma muito geral, e que poderão ser aprofundadas no debate ulterior.
O Sr. Presidente: — Vamos, então, iniciar o nosso debate.
Está inscrito, para esta primeira ronda de perguntas, o Deputado do PSD Fernando Negrão.
Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. Fernando Negrão (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Presidente da 1.ª Comissão, Sr. Ministro da Administração Interna, começo a minha intervenção com uma palavra de pesar relativamente à morte do piloto do helicóptero ao serviço da EMA — Empresa de Meios Aéreos, SA que se despenhou no combate a um incêndio na zona de Melgaço.
Sr. Ministro, acabamos de o ouvir e, naturalmente, também temos o elenco dos diversos programas inscritos na Resolução de Conselho de Ministros n.º 44/2007. São, de facto, muitos e não podemos, de maneira alguma, deixar de concordar com eles. Aliás, muito satisfeitos ficaríamos e muito melhor ficará o País se eles forem levados a cabo e concretizados.
Porém, a questão que se coloca é a de saber como concretizá-los. Ora, o que resulta da leitura dos diversos documentos é que a concretização destes programas tem por base um excerto do discurso do Sr. Primeiro-Ministro proferido nesta Assembleia da República, na reunião plenária do dia 28 de Fevereiro deste ano, no àmbito de um debate mensal, que vou passar a ler: «(») as alterações orgànicas das forças, a ‘externalização’ de funções e os serviços partilhados permitirão libertar 4800 efectivos para a actividade operacional.» e «Estas medidas (») permitem desde já ao Governo decidir a não realização, em 2008 e 2009, dos habituais concursos para novas admissões de guardas ou agentes da GNR e da PSP.» A exposição de motivos da proposta de lei n.º 142/X, que aprova a lei de programação e equipamentos das forças de segurança, concretiza o discurso do Sr. Primeiro-Ministro da seguinte forma: «(») o acrçscimo de investimento nestes cinco anos é financiado essencialmente pela alienação de património do próprio Ministério da Administração Interna e pela poupança de despesa resultante da não abertura de novos concursos para admissão de praças e agentes nos próximos dois anos.» Estamos perante um programa efectivamente ambicioso, que desejamos que se concretize, mas que tem por base duas circunstâncias: a alienação de parte do património do Ministério da Administração Interna e o congelamento da admissão de agentes e praças da Polícia de Segurança Pública e da Guarda Nacional Republicana.
Por isso, Sr. Ministro, pergunto directamente: existe — e, se existe, onde está — o plano de alienação deste património que financiará a concretização destes programas, uma vez que ele não é do nosso conhecimento?
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Estamos em finais de 2007 e, em 2008, o Sr. Ministro propõe-se concretizar diversos programas com uma verba que ronda os 60 milhões de euros, conforme consta na lei que há pouco eu referi. Se não existe para quando a sua elaboração e comunicação aos grupos parlamentares para a respectiva discussão? Estas duas perguntas têm uma razão, Sr. Ministro: todos conhecemos a dificuldade de venda do património do Estado. Todos sabemos o que se passou quando o Ministério da Defesa Nacional quis alienar parte do seu património, tendo alguns dos concursos ficado desertos. Por isso, estas perguntas prendem-se com a dificuldade que consideramos existir na obtenção de verbas para a concretização destes programas a que o Ministério chefiado por V. Ex.ª se propõe.
Como já aqui foi dito, Sr. Ministro, o Sr. Primeiro-Ministro anunciou no mesmo discurso que seriam libertados 4800 efectivos das forças de segurança para funções operacionais que, até agora, desempenhavam funções de natureza administrativa. Esta ideia é, obviamente, boa; o princípio é importante, uma vez que os agentes da PSP ou os guardas da GNR devem exercer funções de carácter operacional e não funções de carácter administrativo.
O Sr. Ministro acredita que, relativamente a um agente policial que já esteja a exercer funções de natureza administrativa há 4, 5, 6, 7 anos, seja possível voltar a pô-lo na rua a exercer funções de natureza operacional? O Sr. Ministro acredita que este número de 4800 efectivos é exequível, nos termos que acabo de referir? Não nos podemos esquecer do passar dos anos, do avançar da idade, que toca a todos e não apenas aos agentes da polícia, e as funções que desempenham são, em certos aspectos, mais exigentes física e psicologicamente do que as nossas. E, portanto, Sr. Ministro, volto a perguntar: acredita que é exequível 4800 efectivos passarem das funções administrativas para as de natureza operacional? Acreditando, Sr. Ministro, onde estão previstas as verbas para levar a cabo uma formação adequada para estes agentes policiais? Isto porque, como é óbvio, estes homens e mulheres precisam de uma reciclagem para poderem passar para as funções de natureza operacional. Faço a pergunta porque não consegui encontrar as verbas nos respectivos mapas do Orçamento do Estado.
Uma outra pergunta, Sr. Ministro, tem a ver com o financiamento das corporações de bombeiros. O Governo anunciou uma alteração na modalidade de financiamento das associações de bombeiros, mas não referiu quais os critérios que passariam a vigorar. Pergunta concreta: as associações de bombeiros passarão a ser financiadas pelo risco ou pela capitação da área de intervenção? Sr. Ministro, vou fazer-lhe, agora, uma pergunta relativamente à EMA — Empresa de Meios Aéreos, SA que tem como atribuição gerir a frota aérea do combate aos incêndios.
A real situação desta empresa, desde a sua constituição, que é recente, é de Junho de 2007, é a de que já teve três demissões por parte da sua administração. Por isso, pergunto, Sr. Ministro: é possível informar-nos se esta empresa está efectivamente em condições de continuar a funcionar? É possível confirmar a informação que hoje obtivemos através da comunicação social, designadamente do jornal Público, de que o malogrado piloto não tinha qualquer tipo de experiência na área dos incêndios, que tinha poucas horas de voo? Se assim era, por que é que esta empresa o contratou para o exercício destas funções? Sr. Presidente, não sei se estou a terminar o meu tempo, mas gostaria ainda de colocar uma outra pergunta mais geral e que se prende com o aumento da criminalidade.
Sr. Ministro, ultimamente, todos nós temos assistido ao aumento da criminalidade violenta e organizada — violenta pelos meios empregues e organizada porque todos nós vamos tendo noção de que as coisas já não acontecem casuisticamente, mas são cada vez mais de uma forma complexa e organizada.
Por isso, Sr. Ministro, pergunto se existe alguma política, por parte do Ministério da Administração Interna, de gestão dos recursos humanos, no sentido de um agente policial não dever ser encarado da mesma forma que um funcionário administrativo do Ministério. Isto é, se o Ministério da Administração Interna prevê para a gestão dos recursos humanos, no sentido de aumentar a motivação dos agentes policiais, de aumentar a capacidade operacional dos agentes policiais e a formação adequada dos agentes operacionais, programas de formação adequados, programas de progressão na carreira, programas de recursos humanos que tenham em conta as especificidades do pessoal ligado às corporações policiais, que são, óbvia e naturalmente, diferentes das carreiras da administração pública.
Por agora é tudo.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
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O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Fernando Negrão, começo por fazer uma referência à morte do piloto.
Transmiti à companheira enlutada os meus sentimentos e devo dizer que foi gratificante ver a reacção nobre que ela teve perante esta infelicidade. Gostaria de dizer que temos de tratar destas questões com sentido de Estado. Eu li, com surpresa desagradável, algumas referências que foram feitas ao piloto, a propósito da falta de experiência.
Eu, naturalmente, não sou responsável pelo recrutamento, pela formação e pela colocação em exercício efectivo de funções do Comandante José e Abreu. A Empresa de Meios Aéreos já prestou os esclarecimentos necessários através de uma nota de imprensa, e eu gostaria de recordar que a Empresa de Meios Aéreos disse, peremptoriamente, nessa nota de imprensa, que o Comandante José e Abreu foi submetido a um rigoroso processo de recrutamento, tendo-se concluído que possuía a formação e a experiência necessárias ao desempenho das funções, tinha 900 horas de voo, das quais 750 em helicóptero, que nas operações de combate a fogos já tinha efectuado 42 largadas de água, que na formação específica, quanto a combate de incêndios, executou o treino de 46 largadas com balde, apesar de a directiva do INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil) prever um treino mínimo de apenas 4 largadas.
Portanto, Srs. Deputados, o Sr. Comandante morreu de uma das formas mais nobres, que, provavelmente, hoje se pode morrer em Portugal, a combater incêndios florestais, numa missão cuja dificuldade é comparável ao esforço de guerra.
Era um homem jovem, cheio de saúde, de 42 anos. Era um homem experiente. Era um homem que recebeu toda a formação. Era uma pessoa, pelo que me disse a companheira, consciente, calma e com muito gosto pelo que fazia. A pior homenagem que lhe podemos prestar é lançar levianamente dúvidas sobre o seu processo de recrutamento, formação e o trabalho que desenvolveu.
Quanto à empresa EMA em geral, gostava de dizer o seguinte: a criação da EMA correspondeu a um projecto estratégico muito acertado do Governo, porque, em matérias de segurança e de protecção civil, não podemos esperar pela resposta do mercado sem dispor de qualquer grau de autonomia estratégica. O Governo, em matérias de segurança e de protecção civil, não é como uma pessoa singular, uma pessoa física, que está em casa a chamar um táxi, tem de dispor de um certo nível de autonomia estratégica. E, por isso, foi acertado decidir constituir uma empresa de meios aéreos, que dispusesse de meios próprios, num número mínimo — como sabem, está em curso a aquisição de 10 meios aéreos, correspondentes a helicópteros, e será lançado um concurso para a aquisição de meios pesados, provavelmente, dois —, e de um número de pilotos dedicados, recrutados com todos o rigor e seriedade, o que a empresa já dispõe.
A Empresa de Meios Aéreos não corresponde a um projecto fácil, corresponde a um projecto difícil, mas é um projecto muito válido e aliciante.
A empresa já começou a operar: durante a Cimeira de Lisboa, houve dois meios aéreos desta empresa a voar; durante a deslocação do Presidente Putin, houve dois meios aéreos desta empresa a operar, sempre para tratarem de problemas de segurança, porque a empresa pretende tratar mais amplamente questões de segurança e não apenas de protecção civil ou, ainda mais restritamente, de combate a incêndios florestais.
Em relação à empresa, existe um processo de legalização, que tem decorrido com toda a normalidade; quanto aos meios, as aquisições têm decorrido com alguns atrasos, é certo, mas nunca com prejuízo para o Estado, porque qualquer atraso na entrega de meios tem implicado, sem custos para o Estado, a disponibilização de meios de substituição para além das cláusulas penais pecuniárias. Portanto, continuamos a confiar neste projecto.
No que diz respeito às demissões, gostaria de dizer o seguinte: o Sr. Presidente do Conselho de Administração decidiu fazer cessar as suas funções por razões pessoais que não cabem a mim, naturalmente, explicitar. Mas eu já manifestei, em público, a minha gratidão pela forma dedicada com que ele iniciou este projecto.
Os dois vogais que, mais recentemente, pediram a demissão, tinham combinado — e eu já o disse por mais de uma vez — com o Dr. António Costa, que me antecedeu na pasta da Administração Interna, que, cessada a 1.ª fase de instalação, correspondente à época de maior risco de incêndios, sairiam. Eu soube-o antes e logo que entrei no Ministério.
Portanto, nada disto se traduziu num problema de divergências ou de falta de condições para funcionarem.
E a situação, hoje, é muito clara: temos um conselho de administração completo, pessoas igualmente compe-
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tentes, solidárias, que estão a desempenhar a sua tarefa de forma proficiente. Portanto, nada há, aqui, a lamentar.
Sr. Deputado Fernando Negrão, devo dizer-lhe, com toda a estima, que não concordo com o que disse sobre o aumento da criminalidade violenta e grave.
Vejamos: quanto aos números da criminalidade, o meu entendimento, como Ministro da Administração Interna, é o de que não deve haver polémicas estéreis. Peço sempre às forças de segurança e ao Gabinete Coordenador de Segurança que me digam os números com verdade e rigor! Não peço mais nada! Não temo ser desmentido naquilo que estou aqui a dizer! Apenas peço às forças de segurança e ao Gabinete Coordenador de Segurança que me transmitam, com toda a verdade, com todo o rigor, os números da criminalidade. E os números da criminalidade, se VV. Ex.as pretenderem saber, indicam que tem havido uma diminuição da criminalidade em geral e uma diminuição da criminalidade violenta e grave. Não é verdade que esteja a haver um aumento da criminalidade! As nossas sensações impressionistas não substituem a realidade.
No entanto, é verdade, e isto não pode ser escamoteado, que cada crime violento, por exemplo, um assalto à mão armada, independentemente dos números, produz uma sensação de insegurança. E esta sensação de insegurança tem de ser tida em conta, porque o direito à segurança, um direito fundamental consagrado no artigo 26.º da Constituição, comporta uma dimensão objectiva, que se relaciona com os números, mas também uma dimensão subjectiva, que se relaciona com a confiança que as pessoas sentem quando saem à rua, quando exercem os seus direitos, a começar pelo direito à liberdade! Portanto, nós estamos preocupados com todos os crimes, com os crimes violentos, com os crimes graves, com a criminalidade organizada, com a prevenção do terrorismo. E tudo faremos para continuar a preveni-los, a reprimi-los e a conduzir a uma justa punição os responsáveis por esses crimes.
O que estamos a fazer? Estamos a fazer muitas coisas, mas dou apenas um exemplo. As forças de segurança possuíam armas completamente ultrapassadas, em alguns casos, com dezenas de anos. Quem decidiu adquirir um conjunto de armas de 9 mm, entre 42 000 e 50 000, para as forças de segurança portuguesas? Quem levou a cabo este projecto absolutamente indispensável? Este Governo! Este é um ponto essencial, mas muitos outros se seguirão: o reforço das viaturas de patrulha, a substituição de instalações obsoletas, o apetrechamento com meios de comunicação informáticos, no âmbito deste programa ambicioso, e também a formação. Tenho tratado de aspectos de formação, nomeadamente relacionados com o papel das forças de segurança como órgãos de polícia criminal e com a sua capacidade de resposta a incidentes táctico-policiais, aspectos que me parecem decisivos, e estamos a trabalhar em programas para melhorar a formação das forças de segurança a todos estes níveis. Mas, independentemente disto, quero aqui reiterar uma homenagem que já prestei várias vezes, na Assembleia da República: as nossas forças de segurança são corajosas, dedicadas e respondem, de forma competente, à criminalidade. Sempre o disse, continuo a dizê-lo, acredito profundamente nisto e tudo aquilo que tenho visto, como Ministro da Administração Interna, me confirma esta ideia.
Em relação ao nosso orçamento, o Sr. Deputado Fernando Negrão disse uma coisa com a qual concordo: o nosso orçamento é ambicioso e não é fácil de executar. Concordo! É ambicioso e não é fácil de executar, mas, não sendo fácil de executar, vamos executá-lo! E o facto de ser ambicioso, obviamente, é uma virtude e não um defeito. Vejamos! Nós, no ano que vem, e estamos a falar do ano que vem, vamos admitir efectivos, vamos admitir mais 1000 homens para a PSP e 1250 homens para a GNR. Portanto, a conversa sobre a não admissão de efectivos, quando se fala do orçamento para 2008, aqui para nós, Srs. Deputados, é um bocadinho desfasada, porque, afinal, nós vamos admitir efectivos no próximo ano. Não vai suceder como sucedeu em 2004, em que, na realidade, não foram admitidos efectivos na PSP. Não, não! Nós, no ano de 2008, vamos admitir 2250 efectivos. E estes 2250, referidos a um ano, não vão repor no dispositivo apenas o número de efectivos que cessam funções, vão permitir um reforço muito concreto, pelo menos com 1000 homens. Portanto, no ano que vem, haverá um reforço, não haverá perda alguma.
Relativamente aos dois anos seguintes, é verdade que não está previsto haver cursos para novas admissões e é aqui que se coloca a conversa sobre a deslocação de polícias que exercem funções essencialmente administrativas para o domínio operacional. Nesta matéria, gostaria de dizer ao Sr. Deputado Fernando Negrão que suspeito de que tem uma visão muito restritiva sobre o que sejam funções operacionais. As funções operacionais, e o Sr. Deputado Fernando Negrão sabe disto, não são apenas funções de patrulhamento. As forças de segurança portuguesas têm funções complexas que passam pelo domínio da manutenção da paz pública,
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da prevenção da criminalidade e da investigação criminal, como órgãos de polícia criminal com competência genérica. Portanto, esses polícias que, porventura, ocupam hoje funções predominantemente administrativas não são inúteis para funções operacionais, podem, em alguns casos, não ser os mais adequados para desenvolver o patrulhamento nas ruas, mas podem responder a várias funções operacionais. E dignificar os polícias também significa, justamente, dar-lhes funções de polícias e trazer em sua substituição, para a polícia, disponíveis que venham exercer funções não policiais. A isto se referiu, e muito bem, como o Sr. Deputado Fernando Negrão sublinhou, o nosso Primeiro-Ministro. É necessário que mais polícias que exercem funções administrativas passem para o domínio operacional e sejam substituídos por disponíveis nessas funções administrativas.
Para terminar, e para não me alongar muito, em relação ao cumprimento do nosso plano de apetrechamento das forças de segurança, no âmbito dos 104 milhões de euros, apenas contamos com 12 milhões de euros no ano que vem, resultantes da venda de património, e estamos a programar cuidadosamente, criteriosamente, essa venda. Portanto, gostaria de deixar aqui bem clara a afirmação de que a maioria do investimento, dos 104 milhões de euros, não resulta de venda de património, apenas 12 desses 104 milhões se referem a venda de património.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Administração Interna.
Para dar uma informação aos Srs. Deputados, tem a palavra o Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
O Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias (Osvaldo Castro): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, para que nós, a bom entendedor, não nos percamos muito em termos de questões de criminalidade, gostava de anunciar que, na sequência de um requerimento de alguns Deputados do PSD a solicitar uma audição do Sr. Ministro da Administração Interna sobre matéria de criminalidade, e, na altura, como se recordam, restringia-se à verificada no Norte mas, conforme o entendimento da Comissão, foi alargada a todo o País, o Sr. Ministro virá cá na próxima quarta-feira, de amanhã a uma semana, entre as 11 horas e as 13 horas, para responder às questões relativas à criminalidade.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Com muito gosto.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Tem, agora, a palavra, para colocar as suas questões, o Sr. Deputado João Serrano, a quem agradeço que se cinja ao tempo de 5 minutos cometido a cada grupo parlamentar.
O Sr. João Serrano (PS): — Srs. Presidentes, Srs. Membros do Governo, realmente, como foi referido há pouco, estamos a discutir este orçamento num momento particular e era importante clarificar o entendimento que temos relativamente a esta matéria.
Todos os factos que têm ocorrido nos últimos dias e nos últimos tempos, no domínio da criminalidade violenta ou grave, devem merecer a nossa atenção e a nossa preocupação, mas todos devemos fazer um esforço para não criar um sentimento de insegurança que, por vezes, é fictício. Os dados que temos relativamente ao número de participações e ocorrências nada têm a ver com aquilo a que assistimos. E isto é mais grave, porque tem sido feito um esforço, por parte dos agentes dos serviços e forças de segurança, para, no fundo, nos servirem a todos o melhor possível. Mas também tem havido um esforço do Governo, que está plasmado neste Orçamento do Estado em várias áreas, de que gostaria de destacar.
Assim, em primeiro lugar, o incremento da capacidade de coordenação integrada no âmbito do sistema de segurança interna.
Em segundo lugar, o esforço que tem sido feito na remodelação dos meios e condições operacionais ao dispor das forças e serviços de segurança, e vai ser feita através da execução da Lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança, que é a primeira lei deste tipo no País.
Em terceiro lugar, o aumento da capacidade de coordenação institucional e operacional do sistema de protecção civil e a melhor articulação com as questões de segurança interna.
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Relativamente ao incremento da capacidade de coordenação, gostaria de sublinhar que, com as novas leis orgânicas da GNR e da PSP, há um reforço da coordenação e cooperação entre as forças e serviços de segurança e vai ser feito um esforço no sentido da reestruturação do dispositivo territorial das forças de segurança.
No âmbito deste esforço de reestruturação, pergunto ao Sr. Ministro, claramente, se iremos continuar com a racionalização dos dispositivos, evitando as situações de sobreposição e descontinuidade das forças e dos serviços de segurança. Coloco esta questão muito directamente, no fundo, face de um conjunto de notícias que são veiculadas no sentido de se ir assistir ao fecho de uma centena ou de uma série de postos das forças e serviços de segurança.
A segunda nota que quero deixar tem a ver com o esforço que tem sido feito no desenvolvimento das 2.ª e 3.ª fases da implementação do SIRESP e no apoio dos respectivos meios territoriais. Ou seja, tem sido feito um esforço no sentido da ampliação dos investimentos nas tecnologias de informação e comunicação, de que destaco o programa Polícia em Movimento, o Sistema de Informação de Bens Apreendidos e o Sistema de Informação e Gestão de Armas e Explosivos, algo que é extremamente importante e sobre o qual legislámos há pouco tempo, o sistema de leitura automática de matrículas, que me parece importante para a eficácia dos processos de contra-ordenações, e ainda o sistema de queixa electrónica às forças de segurança.
Quanto à renovação dos meios, também há um aumento do investimento no Plano, em cerca de 97%, que é preciso destacar, nomeadamente através da Lei de programação de instalações e equipamentos das forças de segurança. Ou seja, acabámos com uma fase em que havia investimentos casuísticos, permitindo-se uma economia de escala e um planeamento de investimentos a médio e longo prazo que importa destacar.
Já falámos dos investimentos em armamento, com a aquisição até 42 000 armas de 9 mm — como sabem, os agentes das forças de segurança têm, muitas vezes, armas completamente obsoletas e que não os acompanham na sua vida ou, digamos assim, a arma não os acompanha —, e também do esforço que é feito em investimento, mais do que o dobro de 2007, na aquisição de viaturas e ao nível das instalações existentes.
Relativamente ao aumento de efectivos, que foi aqui suscitado, é de realçar o esforço que tem sido feito, nomeadamente com a colocação de 2250 novos agentes. E, quanto a isto, deixo apenas uma pergunta: temos dados comparativos sobre o que foi o reforço de agentes nos anos de 2002 a 2005 e nos dois últimos anos? Realço ainda, obviamente, tudo aquilo que vai ser feito — esperemos — com a nova lei orgânica e, no fundo, com a disponibilização de 4800 agentes que estão, neste momento, em funções administrativas.
O último destaque que quero fazer tem a ver com o aumento da capacidade de coordenação institucional e operacional do sistema de protecção civil e a melhor articulação com as questões da segurança rodoviária.
Aqui também há muitas medidas importantes que eu gostaria de destacar, nomeadamente, na cidade de Lisboa, a conclusão do Plano de Risco Sísmico da Região de Lisboa, algo de que se tem vindo a falar nos últimos anos e que não foi concretizado, mas esperamos que seja concluído.
Gostava que o Sr. Ministro nos desse também alguma informação sobre o novo regime de contraordenações rodoviárias, já que permite a centralização e a eliminação de estrangulamentos graves que têm existido nesta matéria.
Por último, e também por ser um tema actual, face àquilo que ocorreu há poucos dias na cidade do Porto, gostaria que o Sr. Ministro nos desse alguma informação sobre o processo de regulação e coordenação das actividades de segurança privada, algo que urge fazer e que está previsto no Orçamento do Estado.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado João Serrano, em primeiro lugar, compartilho da sua ideia em relação aos números da criminalidade e à questão do sentimento de insegurança, e, como referi, estamos atentos a ambas as realidades, porque ambas fazem parte dessa ideia mais geral de direito à segurança.
Relativamente à racionalização do dispositivo, respondendo directamente ao Sr. Deputado, gostaria de afirmar, com muita clareza, o seguinte: o Governo não tem uma política de encerramento de postos, quartéis ou esquadras. Não têm, por isso, fundamento as notícias no sentido de que iriam ser encerradas 100 instalações policiais. Claro que pode haver o encerramento de uma instalação policial, por substituição, por deslocação, porque carece de uma obra qualquer, mas não existe nenhuma política de encerramento de instalações policiais. O Governo continua a apostar na segurança comunitária, no policiamento de proximidade e nos programas destinados a proteger vítimas especialmente carenciadas.
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Em segundo lugar, quanto às admissões dos 2250 agentes da PSP e militares da Guarda Nacional Republicana, gostaria de afirmar que este número representa um esforço muito efectivo de reforço do dispositivo, o que implicará um aumento líquido de, pelo menos, 1000 homens, e que, respondendo de forma geral à questão do Sr. Deputado, há, em média, um aumento do número de efectivos desde que este Governo assumiu funções, não se podendo dizer o mesmo entre 2002 e 2005, em que houve uma diminuição de efectivos. Eis a situação: entre 2002 e 2005, o número de efectivos diminuiu e agora está a aumentar.
Em relação à questão das contra-ordenações, gostaríamos de sublinhar que houve alguns esforços, no passado, para melhorar os procedimentos, porque se trata de um problema conhecido há muitos anos.
Numa área em que houve descriminalização, como sabem, em 1993, em que os ilícitos criminais passaram a ser contra-ordenações, é necessário que haja uma boa resposta no plano da lei, no plano dos procedimentos administrativos e também no plano informático, sem o que nada se consegue fazer.
O que iremos fazer neste ano e no próximo ano é uma reforma do procedimento contra-ordenacional em todos estes níveis para garantir uma resposta rápida, no sentido de assegurar que não haverá prescrição dos procedimentos. A certeza do sancionamento é absolutamente necessária para as pessoas se aperceberem da validade das normas que valem na estrada — isto é essencial.
Quanto à segurança privada, gostaria de referir que por razões de operacionalidade, para dar mais eficácia a procedimentos, houve uma transferência de competências da Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna para a Polícia de Segurança Pública. Esta transferência representará, certamente, um melhoramento da capacidade de resposta, ou seja, o tratamento de um problema menos numa perspectiva burocrática e administrativa e mais numa perspectiva que privilegie o plano da segurança, e estou certo de que já para o ano esta transferência dará bons frutos.
No plano da segurança privada, gostaria, ainda, de referir o seguinte: depois de alguns crimes que criaram um maior e justificado alarme nas chamadas «noite do Porto» ou «noite de Lisboa», houve acções da Polícia de Segurança Pública, em conjugação nuns casos com a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE), noutros casos com o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, que deram muito bons resultados.
Portanto, Srs. Deputados, tenham presente que as forças de segurança não estão inertes ou numa situação de anomia, elas têm respondido com muita efectividade e eficácia quer em Lisboa quer no Porto aos problemas que se têm colocado, e continuarão a fazê-lo.
No domínio contra-ordenacional relacionado com o funcionamento de estabelecimentos, há competências repartidas que, em alguns casos, envolvem os municípios. Por isso, decidi que farei, dentro em breve, uma reunião a este propósito com a Associação Nacional de Municípios Portugueses para acertar procedimentos.
Mas, repito, tudo está a ser tratado com o maior rigor a este nível e creio que as competências que são da Polícia de Segurança Pública em matéria de segurança privada permitirão dar um passo em frente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, começo por apresentar as minhas saudações aos membros do Governo presentes e aos Srs. Presidentes da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias.
Como o tempo urge, colocarei três ordens de questões.
A primeira diz respeito à administração eleitoral, que ainda aqui não referimos. Vi com interesse que no orçamento por acções que nos foi distribuído se referem dois aspectos que, creio, são muito relevantes e exigiriam alguma clarificação relativamente à administração eleitoral.
O primeiro aspecto diz respeito à entrada em funcionamento, que se anuncia, do novo sistema de recenseamento eleitoral, em articulação com a plataforma do Cartão do Cidadão, que permitirá a inscrição automática dos eleitores a partir do momento em que completem 18 anos e a alteração automática da freguesia do recenseamento. Creio que isto é interessante, porque, quando se discutiu a iniciativa legislativa do Governo que deu origem ao Cartão de Cidadão, que, se não estou em erro, está ainda em fase experimental na Região Autónoma dos Açores — dizem-me que já está também no território do continente e folgo-me muito com isso —, não se incluiu no Cartão de Cidadão o número de eleitor precisamente porque (foi a informação dada pelo Governo) isso implicaria uma alteração legislativa na Lei do Recenseamento Eleitoral, que deve ser feita, naturalmente, com um cuidado que não era considerado possível quando se aprovou a referida iniciativa legislativa.
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Portanto, isto pressupõe que o Governo apresente a esta Assembleia uma proposta de lei de alteração da Lei do Recenseamento Eleitoral, que, já agora, possa incluir o número de eleitor no Cartão de Cidadão (não temos nada contra isso), mas também que encontre forma de resolver algumas disfunções de que, do nosso ponto de vista, o recenseamento eleitoral ainda enferma, como seja o elevado número de jovens que não se recenseiam. Não sei se alguém terá dados fiáveis acerca disso, mas julgo que é visível para todos nós, designadamente para quem tem filhos em idade de se recensearem, que é o meu caso, e que sabe por testemunho directo que muitos dos seus colegas de escola não estão recenseados e não tencionam fazê-lo, o que é muito lamentável do ponto de vista do funcionamento da nossa vida cívica e da nossa democracia.
Há, ainda, uma outra disfunção, que é o elevado número de cidadãos que estão recenseados onde não residem, e vice-versa, o que também não deixa de ser disfuncional do ponto de vista do funcionamento da democracia. Designadamente em eleições locais, creio que é muito disfuncional e, por vezes, altera bastante a verdade das coisas em termos da realidade eleitoral.
Por conseguinte, creio que se justificava uma boa reflexão desta Assembleia sobre esta matéria e gostaria de saber quando é que o Governo tenciona apresentar uma proposta de alteração da Lei do Recenseamento Eleitoral, para podermos ter uma ideia dos timings.
Um segundo aspecto relaciona-se com a administração eleitoral e tem que ver com o anúncio do Governo, no orçamento, de que terá início a concretização de um sistema de votação que permita aos eleitores que se encontrem deslocados em dia de eleição ou referendo a opção por voto fora da freguesia de recenseamento, com recurso a mecanismos de caderno eleitoral e voto electrónico presencial. Creio que isto é extremamente exigente e complexo. Tem havido uma reflexão, não apenas em Portugal mas em todo o mundo, relativamente ao voto electrónico e creio que a reflexão sobre esta matéria tem de ser muito cuidada, porque também é uma questão de segurança, não de segurança física dos cidadãos mas de segurança da democracia. A confiança num sistema de operações eleitorais fiável é fundamental para o bom funcionamento da democracia, não venhamos um dia a ser confrontados com fenómenos como os que ensombraram a vida política norteamericana há meia dúzia de anos.
Logo, também gostaria de saber quais são os planos do Governo relativamente a esta matéria para o ano de 2008, uma vez que a questão é aqui anunciada em termos relativamente vagos.
A segunda ordem de questões diz respeito à reestruturação que está em curso nas forças de segurança.
Enquanto Deputado eleito pelo círculo eleitoral de Lisboa, e sendo este círculo visado particularmente com esta reestruturação devido a uma alteração do âmbito de acção territorial das várias forças de segurança, tenho procurado acompanhar no terreno, tanto quanto possível, o que está a passar-se, pelo que queria dar aqui conta de uma grande preocupação relativamente às condições que estão a ser criadas à PSP na Área Metropolitana de Lisboa. Já pudemos aperceber-nos que, em vastas áreas densamente povoadas e com problemas complexos de criminalidade — estou a falar, por exemplo, de concelhos como o de Sintra, o de Cascais e o de Oeiras —, a PSP se viu a braços com o alargamento significativo da sua área territorial e a ocupar instalações que entretanto pertenciam à GNR e que passaram para a PSP, sem que o número de agentes afectos a essas divisões e os respectivos meios, exceptuando as instalações que foram deixadas pela GNR, tenham sido significativamente reforçados.
Hoje, temos divisões, como a Divisão da PSP da Amadora, que tem uma área territorial que, neste momento, chega a Mem Martins, segundo creio, bem como a Divisão da PSP de Cascais, que tem de abranger uma área imensa que pertencia à GNR.
Consequentemente, creio que o País deve orgulhar-se dos profissionais das forças de segurança que tem, que estão a fazer um esforço enorme — e posso testemunhar isso pelas visitas que tenho efectuado recentemente a instalações policiais — para cumprir as suas funções. Mas todos temos que reconhecer — basta olhar para o mapa e conhecer o terreno em que eles actuam — que se lhes está a pedir um esforço imenso (penso que até desproporcionado) e que, se não houver um reforço significativo de efectivos e de meios para aquelas áreas, está a criar-se uma situação muito complexa e que pode vir a reflectir-se num aumento da criminalidade.
Queria deixar aqui esta preocupação e gostaria de saber como é que o Governo tenciona encarar este problema do policiamento das áreas metropolitanas de Lisboa no quadro de uma reestruturação que atribuiu à PSP responsabilidades em termos territoriais que esta força de segurança não tinha. Por exemplo, o Comando da Divisão da PSP de Cascais é uma vergonha — não tenho outra forma para qualificar o estado das instalações em que ele funciona. Julgo que, se houvesse excursões organizadas ao Comando da Divisão da PSP de
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Cascais, os cidadãos portugueses ficariam com outra ideia sobre a forma com as forças policiais são obrigadas a trabalhar no nosso país, porque são absolutamente impróprias para uma instalação policial, ainda mais quando se trata de um comando de uma divisão de um concelho como o de Cascais.
A última ordem de questões que queria colocar — e vou fazê-lo brevemente — diz respeito à lei de programação de investimentos. É muito positivo que haja uma lei de programação de investimentos, aliás, achamos que o facto de não haver uma lei de programação de investimentos pode ajudar a explicar a situação de penúria insustentável a que chegaram as forças de segurança em matéria quer de instalações quer de equipamentos, e temos vindo a defender a existência de uma lei dessas há muitos anos.
Contudo, quando foi, aqui, recentemente aprovada a lei que está em vigor, ao ser apresentada o Governo referiu que o financiamento estava condicionado a três aspectos, que sintetizou.
Um desses aspectos era a não admissão de agentes durante os dois anos seguintes a esta vaga de admissões, que o Governo agora anunciou, dos 2250 efectivos. Portanto, nos dois anos seguintes não haverá mais admissões e o Governo tenciona poupar aí para poder financiar a lei de programação.
Ora, isso significa que em 2008 o Governo não vai poupar nada, porque se anuncia que vai aumentar os efectivos com estas novas admissões essa fonte de financiamento terá de esperar por 2009, não se vai efectivar em 2008, a menos que haja um fenómeno qualquer que o Governo ainda não nos explicou ainda, que é como é que anuncia, ao mesmo tempo, que vai aumentar os efectivos e que vai poupar nos efectivos para financiar a lei de programação de investimentos. Logo, presumo que para 2008 essa fonte de financiamento ainda não se efectivará.
O Governo referiu, ainda, que vai compensar essa não admissão com a libertação de agentes para funções operacionais. Pergunto se isso está a ser equacionado, porque implica uma substituição dos agentes em funções administrativas ou em funções auxiliares por outras pessoas, por pessoal não policial. Mas, que eu saiba, ainda não está ninguém a exercer essas funções que não seja polícia, por isso pergunto se está a ser equacionada, por parte do Governo, alguma medida concreta para proceder a essa substituição, permitindo essa libertação.
Finalmente, a terceira componente de financiamento da lei de programação: as alienações de instalações desnecessárias para as forças de segurança. A este propósito, tenho de perguntar se está previsto algo ou se o Sr. Ministro da Administração Interna reconhece, como reconheceu ontem o Sr. Ministro da Defesa Nacional, que houve excessivo optimismo do Governo quando fez a Lei de Programação Militar.
O Sr. Ministro da Defesa Nacional, confrontado com idêntica questão (porque a Lei de Programação Militar também assenta, em larga medida, em alienações), veio dizer-nos que houve, de facto, um excesso de optimismo do Governo relativamente à possibilidade de alienações. Elas ainda não se verificaram, mas o Governo não quer vender as instalações a qualquer preço e, portanto, vai ter de esperar por melhores condições de mercado.
Ora, como o País é o mesmo e, creio, as condições de mercado não serão muito diferentes, pergunto se o Sr. Ministro da Administração Interna tem idêntico pessimismo ou se, pelo contrário, considera que os negociadores do seu Ministério são mais competentes do que os do Ministério da Defesa Nacional e vão conseguir alienar instalações em melhores condições. Pergunto o que está a ser tratado e o que está previsto nesta matéria.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado António Filipe, em relação à administração eleitoral, gostaria de referir que, no próximo ano, o Governo apresentará à Assembleia da República uma proposta de lei sobre recenseamento. Mas a ideia que aqui está em causa (e que, certamente, os Srs. Deputados conhecem) é a da irracionalidade do recenseamento eleitoral tal como hoje existe. Irracionalidade de que já me tinha apercebido, por exemplo, em 2001, quando fui secretário de Estado.
Com efeito, não faz sentido o recenseamento eleitoral ser obrigatório, depender de um acto de vontade e estar associado à aplicação de sanções para quem não se recenseie ou não actualize o recenseamento eleitoral. Se o recenseamento é obrigatório, deve ser automático, deve decorrer da perfeição da idade de 18 anos, a partir da qual se possui capacidade eleitoral activa. É esta a ideia.
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Não vai haver um número de eleitor mas, sim, o número decorrente da posse da qualidade de cidadão. Portanto, é a posse da qualidade de cidadão que permite exercer o direito de voto, ou seja, exercer a capacidade eleitoral activa.
Nessa perspectiva, falta tratar do problema das incapacidades eleitorais, mas isso será objecto de uma proposta de lei que, a seu tempo, será averiguada. Tudo o resto relaciona-se com a organização da administração eleitoral, ou seja, com a necessidade de fixar o local em que se exerce o direito de voto, através da referência à residência.
O que fica ao lado de todo este plano é a organização do sistema em que poderão votar pessoas deslocadas. Aí, está em causa um projecto que estamos a desenvolver para votação de deslocados, seja através de cadernos de recenseamento, seja através do voto electrónico. É disto que se trata.
Em segundo lugar, quanto às funções e âmbito de competência atribuídos à Polícia de Segurança Pública, devo dizer que todo este projecto de reforma do dispositivo tem sido desenvolvido em estreita cooperação com as forças de segurança — com a Polícia de Segurança Pública e com a Guarda Nacional Republicana.
O que se procura, como já foi referido, é evitar situações de descontinuidade absurdas — não pode haver, por exemplo, uma ponte em que a competência é repartida pelas duas forças de segurança — e situações de sobreposição. Ou seja, há que criar condições para que as forças de segurança respondam melhor aos desafios que enfrentam.
No que respeita à Polícia de Segurança Pública, a generalidade de novas responsabilidades que resultam desta reforma do dispositivo ser-lhe-á atribuída em Janeiro, quando já estará a beneficiar de um aumento de efectivos resultante desta nova incorporação de mais 1000 agentes.
Em relação à questão da poupança, que fez alguma confusão ao Sr. Deputado António Filipe, gostaria de referir o seguinte: claro que há poupança, porque se houvesse cursos a abrir em 2008, esses cursos teriam custos, e a poupança é resultante da ausência desses custos.
Relativamente ao Comando em Cascais e às condições em que o mesmo está instalado, diria apenas o seguinte: claro que o Sr. Deputado lamenta as condições em que está instalado o Comando — e nós lamentamos todos —, só que o Governo não lamenta apenas, está a construir um novo edifício. É assim que o Governo reage quando há situações de deficiência.
Sr. Deputado, estamos a construir — e não é só conversa, estamos mesmo a construir! — um novo comando em Cascais justamente para permitir à Polícia de Segurança Pública exercer com maior dignidade e com maior eficácia a sua missão.
No que diz respeito ao plano de alienações referiria, por fim, que existem condições muito favoráveis para o efectuar, porque existe uma empresa pública que faz essas alienações em nome do Estado. Essa empresa pública já tem trabalhado com o Ministério da Administração Interna, e trabalhado com muita proficiência, para fazer as alienações necessárias.
Portanto, a resposta à sua pergunta é: sim, claro, estamos confiantes em conseguir realizar, no próximo ano, os 12 milhões de euros com que contamos para perfazer o total de 104 milhões de euros.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Nuno Magalhães.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Sr. Presidente, começo por cumprimentar V. Ex.ª, bem como o Sr.
Presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias e, também, o Sr. Ministro e os Srs. Secretários de Estado.
Sr. Ministro, vamos tentar esclarecer o assunto — o Sr. Ministro já o fez, tentando explicar, a meu ver, o inexplicável — do congelamento dos cursos e dos concursos para a PSP e para a GNR.
A nossa opinião é que este Orçamento do Estado segue uma política irresponsável, que vai fazer com que Portugal, em 2009, tenha menos efectivos da GNR e da PSP do que em 2007. Vou demonstrar-lhe isso mesmo, Sr. Ministro.
Diz o Sr. Ministro que vão entrar agora mais 1000 efectivos para a PSP e, daqui a oito ou nove meses (porque só agora vai iniciar-se o curso), mais 1250 para a GNR. Foi o que respondeu, e bem, ao Sr. Deputado António Filipe. «Se é assim, então há despesas em 2008!», e eu percebo a dúvida com que ficou o Sr. Deputado. Mas não! Isto acontece porque estes cursos são de 2007 e estão atrasados — na PSP já foi concluído o curso, mas na GNR ele está francamente atrasado, como sabe, Sr. Ministro.
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Todavia, dando de barato que vão entrar 2250 militares da GNR e agentes da PSP, diria que pior do que cometer um erro é não querer emendar! E o Sr. Ministro tem obrigação de ser verdadeiro e dizer toda a verdade! Tem obrigação, designadamente, de dizer aqui, na Assembleia da República, que estes 2250 são os últimos militares da GNR e agentes da PSP que vão entrar nas forças de segurança nos próximos dois anos e meio, inclusive — final de 2007, 2008 e 2009. Não sou eu quem o diz! Quem o disse foi o Sr. Primeiro-Ministro, no debate mensal de Fevereiro: «Em sétimo lugar, quero sublinhar um ponto importantíssimo: as alterações orgànicas das forças, a ‘externalização’ de funções e os serviços partilhados permitirão libertar 4800 efectivos para a actividade operacional.» — obviamente, nem o Sr. Ministro acredita que isto seja possível! E acrescentava: «Ao mesmo tempo, 1800 postos de trabalho em funções de suporte poderão desde já ser desempenhados por funcionários civis, no quadro da mobilidade no interior da Administração Pública».
Ora, falou em 1800 para o Ministério da Administração Interna quando, neste momento, no PRACE e no quadro de mobilidade, há 1200 em todo o País e em todos os ministçrios. Isto ç o milagre da multiplicação!» Vão aparecer mais excedentários, porque só para a Administração Interna são necessários 1800, quando no País, em todos os ministérios, há apenas 1200.
Terminava o Sr. Primeiro-Ministro, dizendo: «Estas medidas (») permitem desde já ao Governo decidir a não realização, em 2008 e 2009, dos habituais concursos para novas admissões de guardas e agentes da GNR e da PSP». Estou a citar bem, Sr. Ministro! Aliás, numa entrevista que deu ao Diário Económico, o Sr. Ministro confirmou isso mesmo, quando respondeu de igual modo à pergunta «como vão contornar a não admissão de novos efectivos nas forças de segurança nos próximos dois anos?», embora, estranhamente, ao Sr. Deputado Fernando Negrão, não tenha respondido fazendo referência ao PRACE. Isto porque sabe, obviamente, que só há 1200 no País inteiro, em todos os ministérios, tendo o Sr. Primeiro-Ministro prometido 1800 só para o Ministério da Administração Interna.
Sr. Ministro, esta equação é muito simples. Se é verdade (e dando de barato, porque não é isso que está em causa) que este ano vão entrar 2250 efectivos, nós temos de fazer uma conta muito simples: temos de conjugar as entradas com as saídas.
Por diversos motivos — aposentação, disciplinares, por baixas — todos os anos saem da PSP e da GNR militares e agentes. Ora, estive a fazer as contas e posso dizer-lhe que a média de saídas dos últimos cinco anos é de 381 agentes/ano na PSP e de 1194 militares/ano na GNR.
Para concretizar, até posso adiantar o número de saídas de efectivos em cada ano. Na PSP: 584 em 2003, 400 em 2004, 444 em 2005 e 356 em 2006, ou seja, uma média de 381. Na GNR: 1077 em 2003, 969 em 2004, 1532 em 2005 e 1199 em 2006, ou seja, uma média de 1194.
Mantendo-se estas médias, ainda que o Sr. Ministro consiga fazer, através da aplicação de medidas, com que saiam ligeiramente menos efectivos do que saíram nos últimos cinco anos, e não havendo os cursos, quererá dizer que na PSP, em 2007, 2008 e 2009, vão entrar os tais 1000 agentes, mas vão sair 381, a média de saídas, vezes três, o que dá 1143 agentes, Sr. Ministro. Isto quer dizer que, nestes dois anos e meio, vão entrar 1000 mas vão sair 1143 agentes.
Na GNR a situação é mais grave: em 2007, 2008 e 2009, se se mantiver a média de saídas (1194 vezes três), significa que vão sair 3582 militares e vão entrar 1250.
Portanto, Sr. Ministro, tudo somado, entre 2007, 2008 e 2009, vão entrar 2250 militares e agentes da GNR e da PSP e vão sair 4725. Ou seja — por isso digo que é preciso dizer a verdade toda, Sr. Ministro —, em 2009 teremos menos 2475 polícias do que em 2007.
E, Sr. Ministro, repito: não me venha com os 4800 efectivos que passam para a actividade operacional, porque o Sr. Ministro sabe que há homens que, até do ponto de vista físico, seriam um perigo não só para a população como para a sua própria integridade física se fossem para serviços mais ou menos operacionais, mais ou menos de policiamento, mais ou menos de visibilidade. Também já vimos que os 1800 do PRACE constituem uma falácia, uma vez que, neste momento, em todos os ministérios, há apenas 1200.
Como consequência disto, Sr. Ministro, teremos menos polícia, o que é uma irresponsabilidade, e, sobretudo — o que é muito grave! — polícia mais velha, sem a devida renovação, com menores aptidões físicas, e isso é, a nosso ver, um erro. Não pode haver mais segurança com menos polícias.
Portanto, já que o Sr. Ministro vai ter de rectificar este erro desde já o CDS apresentará, neste Orçamento, uma proposta justamente para aumentar o orçamento do Ministério da Administração Interna — é a única pro-
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posta de aumento de despesa, juntamente com uma outra para o Ministério da Saúde —, a fim de permitir a realização destes cursos. O Sr. Ministro e o Governo estão ou não disponíveis para que isso aconteça? Já agora, Sr. Ministro, para repor a verdade, e não querendo falar do passado, gostaria de lhe dizer que não é rigoroso o que disse relativamente às saídas e entradas. Mas podemos voltar a esta questão mais tarde.
Gostava de lhe colocar uma segunda questão, a nosso ver, também importantíssima, que diz respeito à videovigilância. O Sr. Ministro veio hoje — e seja bem-vindo! — dizer que, como meio de auxílio das forças de segurança, é absolutamente favorável, em locais públicos, à videovigilância. E acrescenta que, se numa zona histórica e numa cidade existirem crimes muito frequentes, se deve recorrer à videovigilância. Sr. Ministro, o CDS, que é autor da lei que permite que tal aconteça, congratula-se com isto.
No entanto, vou recordar-lhe, Sr. Ministro, que, de acordo com o artigo 5.º da respectiva lei, a sua instalação pode ser requerida pela câmara municipal ou pode o impulso processual partir das forças de segurança e, portanto, de V. Ex.ª.
Portanto, ter ou não ter videovigilância nestes locais, nestes bairros, depende, única e exclusivamente, de uma pessoa: do Sr. Ministro. Mas o Sr. Ministro, que defende esta matéria, acaba por nada fazer. Não percebo por que razão não temos ainda videovigilância, por exemplo, na Baixa, no Bairro Alto ou na zona ribeirinha do Porto, uma zona histórica.
Aliás, é sintomático de como o Ministério tratou esta matéria o seguinte: a Câmara Municipal do Porto, com o acordo das forças de segurança, com o acordo dos cidadãos, a 16 de Janeiro de 2007, enviou ao Ministério da Administração Interna um requerimento a solicitar a instalação de videovigilância. A Comissão Nacional de Protecção de Dados, a 27 de Fevereiro de 2007, oficia o Ministério da Administração Interna solicitando o envio de esclarecimentos complementares para a emissão de parecer no prazo de 20 dias, e o Ministério nada faz! Em 26 de Junho de 2007, a Comissão Nacional de Protecção de Dados insiste nos esclarecimentos que são necessários. Em 3 Setembro de 2007, a Comissão Nacional de Protecção de Dados volta a insistir na resposta às cartas que tem enviado. Curiosamente, o Sr. Ministro teve 8 meses, repito, 8 meses, no seu gabinete uma coisa que V. Ex.ª tanto defendia!» Tambçm a título de curiosidade, curiosamente, se me permite o pleonasmo, só depois de um certo programa televisivo, em que foi instado sobre esta matéria, é que saiu o despacho da parte do seu Ministério! Já percebemos que o Sr. Ministro diz que concorda, mas não procede como tal. Por isso, vamos continuar a insistir. Quero dizer-lhe que o CDS vai apresentar um projecto de resolução — e espero que o Partido Socialista o aprove — para que haja videovigilância, como acontece em qualquer país civilizado.
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr. Deputado Nuno Magalhães, creio que o Sr. Deputado tem algum erro relativamente aos números e aos seus arquivos.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Olhe que não!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Em relação aos números, de acordo com contas sérias e rigorosas, vamos ter, nos anos que o Sr. Deputado referiu, a saída, no máximo, de 3000 a 3500 agentes da PSP e militares da Guarda Nacional Republicana. Durante esse período, vão ser admitidos de fora, no seu conjunto, 2250 e vamos transferir para funções operacionais vários agentes e militares que estão em funções administrativas.
Portanto, os seus receios sobre o dispositivo são exagerados e estão longe de se confirmar.
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — Não são dúvidas! São números!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Além disso, gostaria de referir o seguinte: temos de encarar, com toda a seriedade, a política de segurança. Se dizemos que as forças de segurança têm de ser melhor apetrechadas — em armas, em viaturas, em instalações, em redes de comunicação e meios informáticos —, temos de agir em conformidade. Não vale a pena estar sempre a falar nisso e nunca fazer nada! Aquilo que este Governo fez foi, corajosamente, apresentar uma proposta de programação e começar a fazer coisas: a adquirir armas, a trabalhar nas instalações, a trabalhar nas redes de comunicação.
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Portanto, a política deste Governo é correcta. A partir de uma relação entre polícia e número de cidadãos, que é uma relação positiva ao nível da Europa e do mundo, estamos a fazer uma grande aposta no sentido da modernização das forças de segurança. E era bom que os Srs. Deputados compreendessem este esforço, o acompanhassem e o apoiassem.
Entretanto, relativamente à videovigilância, gostaria de referir o seguinte: há, certamente, uma confusão nos seus arquivos. Este processo tem sido tratado no Gabinete do Sr. Secretário de Estado José Magalhães com toda a competência e nunca lá esteve parado esses meses. Foi enviado, já várias vezes, à Comissão Nacional de Protecção de Dados, que tem pedido esclarecimentos adicionais, porque, como certamente sabe, a Comissão Nacional de Protecção de Dados tem exigências muito rigorosas nesta matéria, e esses esclarecimentos têm sido prontamente prestados pelo Gabinete do Sr. Secretário de Estado José Magalhães. De resto, ele tem estado também em contacto com o Presidente da Câmara Municipal do Porto — eu próprio já falei com o Sr.
Dr. Rui Rio — para lhe dar todos os esclarecimentos e o processo tem sido conduzido, pela parte do Ministério da Administração Interna, com toda a urgência e com toda a atenção.
Quanto à questão da videovigilância em geral, devo dizer que o Sr. Deputado está enganado. Acha que eu comecei a pensar na videovigilância depois de algum programa de televisão?!
O Sr. Nuno Magalhães (CDS-PP): — O despacho!
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Não! Para ser franco consigo, a questão da videovigilância está inscrita no Programa do Governo, no qual eu tive o gosto e a honra de participar. Está lá inscrita a videovigilância como resposta a problemas de segurança dos nossos tempos e como resposta obrigatória em zonas problemáticas e de risco.
O que eu disse na entrevista que o Sr. Deputado teve a amabilidade de citar foi que não se pode excluir o recurso à videovigilância em zonas públicas e esse recurso — não é uma questão legal, é uma questão política — deve ser sempre implementado em concordância com as autarquias, respeitando a vontade das populações e, respeitando, obviamente, as regras da Comissão Nacional de Protecção de Dados. Foi isso que eu disse! Todos os projectos de videovigilância que estão a ser desenvolvidos serão sempre concluídos com a maior premência por parte do Ministério da Administração Interna. O que não podemos é eliminar as exigências que são colocadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados no sentido da defesa dos direitos à reserva da vida privada dos cidadãos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr. Presidente, Sr. Ministro da Administração Interna, vou tentar ser muito concreta nas questões que tenho para lhe colocar e não repetir aquelas que já aqui lhe foram postas.
Dentro desta lógica da reestruturação das forças de segurança e da sua modernização e tendo também em conta aquilo que vem espelhado no relatório do Orçamento do Estado para 2008, gostava de lhe colocar algumas questões, bem concretas, umas, e talvez não tanto, outras.
Começo pela videovigilância, uma questão que também tenho anotada para lhe colocar, embora por motivos totalmente opostos àqueles que a bancada do CDS-PP utilizou.
No relatório do Orçamento do Estado para 2008, vem referido que vão existir novas componentes no Programa Nacional de Videovigilância. Gostava que, se fosse possível, o Sr. Ministro falasse um pouco sobre quais são estas novas componentes.
Relacionada com esta questão, há uma outra, que também seria importante que o Sr. Ministro pudesse aprofundar, que tem a ver com os programas de policiamento de bairro.
Do meu ponto de vista e do ponto de vista da minha bancada, a questão do combate à criminalidade e da eficácia do policiamento não se fará somente com o aumento do número de polícias, porque, se fôssemos pôr um polícia em cada esquina, não sei o que se resolvia» A solução do problema passará muito por novas formas de policiamento e por novas formas de prevenção.
Por isso, embora estejam talvez em pólos completamente opostos, peço-lhe que nos diga quais as novas componentes da videovigilância e como desenvolver estes programas de proximidade, estes programas de
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policiamento de bairro. Talvez estejam aqui algumas estratégias de intervenção que podem permitir uma maior eficácia.
Já agora, também lhe pergunto se, em termos da renovação global das instalações da GNR e da PSP, que o Sr. Ministro também prevê no relatório — aliás, o Sr. Ministro já respondeu ao Sr. Deputado António Filipe em relação a um caso concreto —, está garantido um espaço especial de atendimento às vítimas, nomeadamente às mulheres vítimas de violência.
Depois, Sr. Ministro, uma pergunta muito concreta sobre a questão dos coletes balísticos. Já que o Sr.
Ministro quantificou as pistolas, pergunto se é possível quantificar o número de coletes. Parece-me que é também uma questão importante em termos de segurança, neste caso dos agentes. Esta questão dos coletes tem vindo sempre a ser debatida, verificamos a verba que está atribuída, mas, como quantificou o número de pistolas, talvez fosse possível quantificar também o número de coletes.
Sr. Ministro, vamos à área de segurança rodoviária.
A questão que lhe coloco, relacionada com a segurança rodoviária, é, de facto, uma das questões importantes e há até quem diga que é quase que uma «guerra» que está por ganhar.
Eu li o que vem expresso no Orçamento e, sem prejuízo de, nomeadamente, na Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária 2015 virem contempladas algumas medidas, gostava de, até para saber da sua sensibilidade, levantar uma questão, que me parece importante e que terá, talvez de ser articulada com o Ministério das Obras Públicas, e que tem a ver com os «pontos negros» nas estradas.
Gostava de saber como é que vão articular esta questão, porque, se a segurança rodoviária é, de facto, muito o excesso de velocidade, o problema do alcoolismo, as manobras perigosas, tem também a componente «construção das estradas». Ora, este problema também tem de ser encarado de frente e resolvido.
Uma outra questão — e tenho pena que ela não esteja aqui colocada em termos de prioridades — tem a ver com as medidas de protecção dos peões nas cidades e em localidades atravessadas por estradas nacionais, e isto não é só por, ultimamente, termos tido atropelamentos não apenas em Lisboa mas até, como sabe melhor do que eu, nas cidades que são atravessadas pelas estradas. São precisas políticas activas, próactivas, amigas dos peões e de defesa dos peões, que passam pelo tempo para o atravessamento, por mais passadeiras e por muitas outras questões. Gostaria de saber a sua opinião e de ter visto plasmadas nas opções políticas do Governo essas medidas.
Outra questão prende-se com a lei da imigração, que também aqui vem como uma das questões da responsabilidade do seu Ministério. Entrou em vigor a chamada regulamentação da lei da imigração e é novamente possível a apresentação de candidaturas para a regularização de imigrantes que se encontrem a trabalhar, ao abrigo dos n.os 2 e 3 do artigo 54.º do decreto regulamentar (digo isto só para situar o Sr. Ministro). Mas a decisão sobre o pedido de regularização, para além da documentação, do contrato de trabalho, da situação contributiva e fiscal das pessoas em causa, leva em consideração questões como, nomeadamente, a excepcionalidade da situação do requerente, os motivos de força maior, as razões pessoais e profissionais atendíveis.
Sr. Ministro, a questão que quero colocar-lhe é a seguinte: não considera que se trata de conceitos muito indeterminados, dependentes de interpretação? E uma norma assim tão aberta pode, de facto, levar a que sejam tomadas posições discricionárias na sua aplicação. Portanto, como é que pretende o Sr. Ministro tratar esta questão? Existem orientações no Ministério e no Serviço de Estrangeiro e Fronteiras que permitam interpretar e concretizar estas normas ou vai ficar tudo em aberto? Pretende também o Sr. Ministro, ou não, informar os imigrantes e os candidatos a esta regularização sobre a clarificação dos critérios, porque isso também fará parte da aproximação da Administração Pública e da sua clareza perante as pessoas que vão apresentar um pedido ao Estado? Portanto, também gostaria de ouvir a sua opinião sobre esta questão.
Por último — é mesmo quase uma nota de rodapé mas, Sr. Ministro, não posso deixar de a colocar —, penso que é transversal à política de todo o Governo a eliminação da linguagem sexista.
Refiro-me a uma discussão que vem desde o seu antecessor, o Dr. António Costa — a questão do Cartão de Cidadão. Aliás, o Sr. Deputado António Filipe falou sempre em Cartão de Cidadão, e muito bem.
É que não há Cartão do Cidadão, há Cartão de Cidadão, mas é recorrente, em todos os documentos escritos do seu Governo, e este é mais um, vir escrito — não é dito, é escrito! — Cartão do Cidadão.
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Quando este documento foi discutido na Assembleia foi proposto, eu própria o propus ao ministro da altura, António Costa, dizendo que «não custava nada, que era metade do cidadão e metade da cidadã». Isso era muitíssimo complicado e, então, optámos por «de cidadão».
Por isso, Sr. Ministro, vamos fazer um esforço para que ele não seja, de facto, o Cartão do Cidadão, para que, pelo menos, nos documentos escritos do Ministério venha a expressão «de Cidadão».
O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Ministro da Administração Interna.
O Sr. Ministro da Administração Interna: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada, em relação à primeira questão, sobre a videovigilância, o que entendo sobre esta matéria, de forma muito resumida, é o seguinte: o direito à intimidade e à reserva da vida privada é um direito fundamental. No entanto, esta questão da intimidade e da reserva da vida privada coloca-se por esferas diferenciadas. Há um nível de intimidade que diz respeito a actos que praticamos na solidão ou junto dos que nos são próximos, há actos respeitantes à reserva da vida privada que não são públicos e há actos que são públicos mas em que não queremos que haja uma câmara de filmar universal.
Ninguém pretende que tudo seja sujeito à videovigilância. No entanto, as sociedades modernas, perante o quadro de novas ameaças, não podem prescindir do recurso à videovigilância como forma de darem mais segurança. Se, em espaços públicos devidamente assinalados, é necessário proteger os cidadãos de forma reforçada, deve recorrer-se a critérios que tenham em conta a videovigilância. E, portanto, é essa a nossa ideia.
De que se fala no nosso orçamento? De novos sectores? Por exemplo, a propósito dos incêndios florestais e em várias outras áreas e domínios que requeiram um esforço particular. De qualquer forma, teremos sempre em conta a necessidade de preservar o direito à intimidade, o direito à reserva da vida privada, de cumprir todas as normas que sejam ditadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Em segundo lugar, quanto à renovação das instalações policiais, todas as instalações policiais que têm sido abertas — e tenho estado presente em várias inaugurações por dever de ofício — contemplam uma sala de atendimento à vítima, possibilidade de acesso a deficientes, em condições especiais, e salas para reconhecimento. Portanto, de facto, as esquadras de polícia, os postos e os quartéis da Guarda têm incluídos estas valências, que são necessárias para funcionarem em condições convenientes.
Quanto à segurança rodoviária, como a Sr.ª Deputada sabe, existe uma repartição de competências. A questão da segurança rodoviária não diz respeito apenas ao Ministério da Administração Interna, mas não tenha dúvidas nenhumas de que o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações está a desenvolver um esforço coerente, sistemático e dedicado com os seus serviços para responder a todas as questões que lhe dizem respeito, de segurança das vias, nomeadamente, que também é importante para responder a este problema.
Mas, a propósito da segurança rodoviária, permita-me que lhe responda num contexto mais amplo. A segurança rodoviária — e isto deve ser dito para melhorar a nossa auto-estima nacional — tem sido um domínio em que temos dado passos muito importantes, os quais têm sido reconhecidos, inclusivamente pela União Europeia.
Recordo aqui, mais uma vez, que em meados da década de 80 chegou a haver mais de 2500 mortos nas estradas portuguesas por ano. Apesar de o número de veículos ter crescido de cerca de 500 000, na década de 70, para mais de 5 milhões actualmente, isto é, apesar de ter sido multiplicado por 10, hoje há um progresso muitíssimo significativo em relação aos acidentes e aos mortos nas estradas.
Quando fui secretário de Estado, em 2001, registei como um grande progresso, na altura, que tivesse havido, pela primeira vez, menos de 1500 mortos. No ano passado, houve menos de 1000 mortos nas estradas portuguesas. Claro que não podemos fazer uma celebração por ter havido menos de 1000 mortos, queremos ainda melhor, mas é um progresso muito significativo em relação ao que se passava em meados da década de 80. E este progresso não surgiu por acaso, surgiu porque houve avanço na segurança das vias, na segurança dos automóveis, nos comportamentos de risco dos condutores e, sobretudo, na mentalidade dos condutores. É uma questão de mentalidade colectiva, de níveis de civismo, de capacidade de substituir condutas agressivas por condutas defensivas na condução (é verdade!). E o resultado é este.
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Temos de continuar a travar este combate, é um desígnio nacional. Conheço bem esta necessidade e vamos fazer tudo para continuar com êxito nesta matéria. De que maneira? O que é que é essencial aqui? É essencial que haja um policiamento muito visível, muito eficaz, e é essencial que haja campanhas de sensibilização permanentes e uma boa formação. Isto é o essencial para haver uma mentalidade que leve a que continue a diminuir o número de mortos e o número de acidentes nas estradas.
Quanto à lei da imigração, Sr.ª Deputada, não faça esforço excessivo para me situar, porque estou bem situado!» É o problema do artigo 88.ª da Lei e do artigo 54.ª da regulamentação.
A questão é que a regulamentação não podia ter ido mais longe, porque se fosse mais longe deixava de ser regulamentação. A Lei prevê, no artigo 88.º, que, em situações excepcionais, pode haver uma regularização da situação de imigrantes desde que preencham cumulativamente três condições: tenham entrado legalmente no nosso país; estejam a trabalhar com os correspondentes contratos, legalmente; e façam as necessárias deduções para a segurança social.
Imagine, Sr.ª Deputada, que com base neste dispositivo excepcional se dizia que todos os imigrantes que estejam nesta situação verão a sua situação regularizada amanhã. Isto significava a falência de uma política de imigração legal, porque mesmo um imigrante que tivesse entrado há 15 dias (há um mês, para haver desconto) e que estivesse nesta situação podia aspirar imediatamente, ipso facto, à regularização.
Claro que esta regularização é entendida como um mecanismo que não corresponde a um direito potestativo. Não pode corresponder a um direito potestativo para termos uma política sólida e coerente de imigração, que contemple, por um lado, a regulação da imigração legal, que é uma janela de oportunidade para os países de origem e também para o nosso país, mas que contemple, por outro lado, o combate à ajuda à imigração ilegal, que está associada a fenómenos gravíssimos de exploração do trabalho do imigrante, de exploração sexual, de tráfico de pessoas. Portanto, essa política global integrada é essencial.
O que temos previsto na regulamentação é que se trata de uma situação excepcional, em que haja uma razão de força maior e em que haja situações pessoais atendíveis. Não podíamos, sem usurpar o papel que é devido à lei de estrangeiros, ir mais longe na regulamentação. Porém, o que, naturalmente, iremos adoptar em termos de procedimentos são critérios justos, equitativos, objectivos e fáceis de compreender. Não se trata de um direito generalizado que aqui está em causa mas, sim, de uma possibilidade que o Governo saberá interpretar para fazer justiça nestas situações.
Quanto à nota de rodapé, sobre o Cartão de Cidadão, gostaria de dizer que eu também tinha simpatia, quando se começou a falar do Cartão do Cidadão, nessa solução dual de que falou a Sr.ª Deputada e que não foi possível adoptar por dificuldades, inclusivamente técnicas. Pela parte que me respeita esteja descansada que, se faz questão, vou esforçar-me por dizer sempre Cartão de Cidadão.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Ministro da Administração Interna.
Tenho a informação, que me foi veiculada, de que os Srs. Deputados dos diversos grupos parlamentares prescindiram da segunda ronda de perguntas. Foi uma espécie de gentlemen’s agreement, mais precisamente de gentlemen’s and ladies agreement, uma vez que também a Sr.ª Deputada Helena Pinto deu o seu assentimento a que se prescindisse desta segunda ronda.
Sendo assim, resta-me, em nome da Comissão de Orçamento e Finanças e da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, agradecer ao Sr. Ministro e aos Srs. Deputados a presença nesta reunião.
Penso que foi um debate vivo e profícuo sobre as questões ínsitas e plasmadas na proposta de lei do Orçamento do Estado na área que o Sr. Ministro tutela. Todos nós ficamos enriquecidos com o debate e esperamos, naturalmente, revê-lo e aos Srs. Secretários de Estado na Comissão de Orçamento e Finanças e já a breve trecho, tanto quanto sei, na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 19 horas e 50 minutos.
A DIVISÃO DE REDACÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.