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Terça-feira, 20 de Dezembro de 1988 II Série - Número 63-RC

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

II REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

ACTA N.° 61

Reunião do dia 9 de Novembro de 1988

SUMÁRIO

Procedeu-se à discussão da proposta de regulamentação da segunda leitura e da votação a fazer na CERC publicada em anexo à acta da reunião de 8 de Novembro de 1988.

Deu-se continuação à discussão do artigo 290.º e respectivas propostas de alteração.

Durante o debate intervieram, a diverso titulo, para além do presidente, Rui Machete, pela ordem indicada, os Srs. Deputados Almeida Santos (PS), Costa Andrade (PSD), José Magalhães (PCP), Raul Castro (ID), Miguel Macedo e Silva (PSD), Pedro Roseta (PSD), Alberto Martins (PS), Narana Coissoró (CDS), Maria da Assunção Esteves (PSD) e Jorge Lacão (PS).

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O Sr. Presidente (Rui Machete): - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 16 horas e 20 minutos.

Srs. Deputados, antes de continuarmos a discussão, a propósito do artigo 290.°, que iniciámos e na qual já aprofundámos uma pane importante do seu conteúdo na sessão anterior, proponho-vos que discutamos e cheguemos a uma conclusão em relação a esta proposta de regulamentação, para a segunda leitura, que ontem apresentei e fiz distribuir a VV. Exas. Combinámos, então, que hoje iríamos apreciá-la. Consoante já tive oportunidade de referir, a minha ideia fundamental, ao apresentar esta proposta, é a de evitar que voltemos a repetir a discussão que fizemos durante a primeira leitura, porque isso seria pouco útil, não teria novidade, mas, justamente ao fazer incidir a nossa atenção sobre, primacialmente, propostas de alteração que tenham sido apresentadas e que hão-de ter certamente encontro de resultados da primeira discussão, tornarmos os nossos trabalhos mais úteis e aproveitarmos melhor o tempo. Considerando, por outro lado, que, nalguns casos, os proponentes de propostas de projectos de revisão constitucional não tiveram oportunidade de expressar os seus pontos de vista, não porque a programação dos trabalhos da Comissão o impedisse, mas por motivos de ordem pessoal, também me pareceu útil que se evitasse precludir essa faculdade, e por isso há uma referência expressa a essa possibilidade. É evidente que isto não significa que, quando, no decorrer normal da discussão, se tiver que referir alguns aspectos do articulado já considerados, mas sem que haja perspectivas novas, o não possamos fazer. Trata-se, basicamente, de uma orientação que, como todas as normas, tem de ser aplicada com bom senso e com elasticidade para que os trabalhos cheguem a bom termo.

Por outra parte existe um propósito de impor uma certa disciplina no que respeita à apresentação de propostas de alteração. A ideia é que nós não tenhamos de ser confrontados com propostas que sejam apresentadas de supetão, embora também aqui pareça que se não deva impedir que se, durante a discussão, surgir, como decorrência normal daquilo que foi dito, a necessidade de introduzir algumas alterações nos textos que estão em discussão, evidentemente que se poderá fazer. De resto isso é a prática habitual na Comissão. Agora para que haja possibilidade de levar a bom termo, com alguma celeridade, os trabalhos em relação a projectos e propostas de alteração que foram objecto de reflexão, que tomaram em conta as discussões anteriores e, portanto, necessariamente foram pensados com relativa anterioridade em relação ao momento em que são discutidos, é da máxima conveniência que eles sejam apresentados por forma que todos os Srs. Deputados possam dispor deles antes do início da reunião em que vão ser analisados. Daí um preceito que expressamente prevê que as propostas devam ser apresentadas, por escrito, anteriormente, até pelo menos à última sessão anterior à data em que sejam agendados.

Por outra parte, há também uma preocupação de fixarmos um tempo máximo de discussão em relação a cada artigo. É evidente que estas discussões têm de ser feitas com uma referência aos artigos actuais. Pode haver um ou outro caso em que isto se torne difícil, mas na esmagadora maioria dos casos as propostas são de alteração, de aditamento ou supressão em relação a artigos que neste momento existem. E mesmo quando se formulam sob a fornia de um artigo novo, a verdade é que no texto do projecto aparece o local da sua inserção e portanto não é difícil situá-lo no texto constitucional, sem prejuízo de mais tarde podermos vir a arrumá-lo, se assim for o entendimento maioritário, noutro sítio. Portanto, haveria, repito, a necessidade de nos impormos, aí também, alguma disciplina em termos de fixar um tempo máximo, que será fixado com um grau de razoabilidade.

Na minha proposta, como opinião pessoal, que só a mim me vincula, admitiria que não se seguisse rigorosamente a disciplina de distribuir o tempo proporcionalmente à representatividade dos grupos parlamentares, mas que houvesse um limite máximo de tempo a ser dividido, igualmente, por todos os partidos. Isto representa uma concessão importante para garantir a flexibilização da discussão, mas o que me parece pouco razoável é que não fixemos um certo prazo para concluir a discussão - que terá de ser medido em tempo, horas; minutos - de cada secção ou de cada capítulo.

Por último dei acolhimento a uma sugestão, que me pareceu muito pertinente, do Sr. Deputado Almeida Santos, no sentido de admitir que feita uma primeira votação, feita uma primeira indicação do sentido de voto na Comissão, que é feita artigo a artigo ainda sem ter uma visão global de como é que fica o texto na perspectiva de cada partido, seja possível fazer-se uma rápida revisão das votações em termos de cada partido já ter em consideração como é a economia global das votações e a economia global do texto, e nestas circunstâncias seja possível fazer alguma rectificação. É evidente que esta proposta não altera o regimento desta Comissão e, portanto, as votações que iremos aqui fazer são votações indicativas, não obrigam em termos de dispensar a votação em Plenário, embora ela possa fazer-se de várias maneiras. Trata-se, todavia, de uma indicação preciosa para guiar os trabalhos no Plenário e para permitir, naturalmente, a feitura do relatório que há-de ser entregue, como final da primeira parte do mandato que nos foi cometido, ao Plenário.

Em síntese, esta é a substância da proposta que vos apresentei e sobre a qual gostava de ouvir a opinião de VV. Exas. e poder beneficiar dos vossos comentários e críticas.

Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Gostaria de introduzir um problema prévio que é o seguinte. Por razões que são bem compreensíveis, nós precisaríamos de que, entre o termo desta segunda leitura e o início da votação nesta Comissão, houvesse um período razoável - não é preciso que seja longo - e penso que os outros partidos também terão a mesma necessidade, para encontrar nos seus grupos parlamentares ou na direcção dos seus partidos a "rede" necessária para começarmos a votar. Uma coisa é termos a liberdade - de que usamos e abusamos - de emitir opiniões em nome do partido, sem ouvir praticamente ninguém, o que faço sempre com grande desenvoltura - mas a verdade é que também não devo abusar.

O Sr. Presidente: - Abusamos não direi, mas usamos!

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O Sr. Almeida Santos (PS): - Outra coisa é votar, digamos, em princípio e não já vincular, mas criar uma espécie de compromisso do meu grupo parlamentar para que mais tarde venham a ratificar as votações que anunciarmos aqui. Precisaremos de, primeiro, elaborar as propostas de alteração correspondentes ao acordo PS-PSD, porque os dois partidos ainda não completaram o trabalho de elaboração das propostas correspondentes, que se traduzirão em propostas de alteração ou de substituição, e cada partido precisará, com algum avanço, de arranjar...

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Só para meu esclarecimento: é entre a primeira leitura...

O Sr. Almeida Santos (PS): - É entre o dia de hoje e o dia em que começarmos a votar.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Pensei que seria entre a primeira e a segunda votações.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Entre o dia de hoje e aquele em que começarmos a votar. Vamos fazendo o balanço das votações e no fim é apenas reduzir a escrito as votações e mandar para aqui um texto difinitivo, que há-de ser transcrito na acta. Penso que os outros partidos também vão necessitar desse prazo. Nós precisamos talvez de mais, atendendo a que "abusámos" do direito de formular propostas. Acho que seria boa a regra da apresentação, por escrito, das propostas de alteração ou de substituição até à véspera da sua discussão e votação. Para isso temos de preparadas e apresentá-las com algum avanço relativamente ao dia em que começarmos a votá-las.

Minha proposta: entre o dia de hoje e o dia em que começarmos a votar decorra um período, diria que o normal seria entre duas e três semanas, sem prejuízo de continuarmos empenhados na aceleração dos trabalhos. Penso que também os outros partidos precisarão desse período.

Quanto a esta proposta do Sr. Presidente, há algumas coisas que precisariam de ser consideradas. Primeiro: no n.° 1 deveria falar-se em propostas de substituição e não de alteração. Quanto ao n.° 2, a mesma coisa, também deve falar-se em propostas de substituição e não de alteração...

O Sr. Presidente: - É mais no n.° 2 do que o n.° 1.

O Sr. Almeida Santos (PS): - É nos dois.

O Sr. Presidente: - Não. No n.° 1 são os projectos, não são de substituição. No n.° 2 é que será.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Então será no n.° 2. Quanto a esse n.° 2 - "que, para os efeitos do número anterior, as propostas de alteração que nesta segunda leitura os deputados membros ..." - requer-se que "sejam presentes até ao fim ...". É isso, são propostas de substituição.

Quanto ao n.° 3 - "que, na apreciação dos projectos e propostas na segunda leitura, sejam, em princípio, apenas discutidas as propostas de alteração apresentadas após a primeira leitura e os restantes artigos dos projectos que ainda não foram objecto de discussão". Ora bem, o que é que isto quer dizer? Quais são "os artigos dos projectos que ainda não foram objecto de discussão"?

O Sr. Presidente: - A minha ideia, admito que a formulação seja um pouco...

O Sr. Almeida Santos (PS): - A ideia com que fiquei é que não havia discussão do que não foi discutido. Dava-se apenas aos partidos que não estiveram presentes na data da discussão a possibilidade de defenderem as suas propostas, sem entrar na discussão delas. É que houve muitos partidos que não estiveram presentes na discussão da quase totalidade das suas propostas. Iríamos reiniciar um segundo momento que iria demorar muito. Portanto, por um lado, peço uma dilação, mas, por outro, já estaria aqui a dar uma compensação, em tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, estou de acordo consigo, mas há aqui um problema que, por uma questão de realismo, temos de ver com muita nitidez. O que tinha em mente era, no fundo, o seguinte: houve vários artigos de projectos, designadamente do CDS, da ID, dos deputados do PSD, da deputada independente Helena Roseta e do deputado Sottomayor Cárdia, que não foram objecto, porque eles não estavam presentes na altura, de nenhuma explicação por parte deles. É evidente que poderíamos tomar a atitude de dizer: bem, tiveram todas as possibilidades porque conheciam o andamento dos trabalhos, foram sempre notificados para as sessões, precludiu a sua faculdade. Mas pareceu-me que poderíamos ser um pouco menos rigorosos e admitir que eles fizessem a justificação. O meu intuito é que eles fizessem a justificação, mas não iríamos renovar a discussão.

Todavia, há aqui um problema para o qual eu gostaria de vos ouvir, para fixarmos o entendimento e depois, enfim, a redacção que entendessem mais correcta. É muito difícil aceitar que, após uma justificação, não haja a possibilidade de algumas perguntas. O que me parecia importante era tentar traçar, com relativa clareza e bona fide, a fronteira entre aquilo que são preguntas ou intervenções para esclarecer as explicitações, as justificações que foram dadas, e o abrir a discussão. Porque já uma vez, recordo-me a propósito do PRD, demos-lhe uma faculdade de justificação, depois não foi utilizada porque o Dr. Miguel Galvão Teles, sabiamente, acabou por renunciar a isso, mas a questão foi suscitada. Portanto, gostaria de ter aqui uma noção muito clara.

Do meu ponto de vista, o que pretenderia era ouvir-vos sobre isto. Primeiro lugar: concordam em que os projectos, as propostas constantes dos projectos que não foram objecto de nenhuma justificação possam os seus autores, querendo, não é uma injunção, é uma última oportunidade, fazer uma curta explicação? Em segundo lugar: como é que essa explicitação e a discussão que a propósito acorra serão feitas? Estou inteiramente de acordo em que não se repita a discussão, senão estamos a penalizar os que estiveram aqui e que, portanto, compareceram, e estamos a perder tempo, o que é inaceitável. Temos de encontrar aqui alguma justa medida, porque se abrimos a possibilidade

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de eles justificarem o seu projecto também será praticamente impossível impedir que alguém faça perguntas ou que conteste afirmações feitas.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Penso que falta aqui um artigo 6.° que dê à mesa alguma flexibilidade, quando se justifique, para que estas regras não sejam aplicadas de forma estrita. Poria isso em termos gerais. Claro que aqui falaria em justificação. Se quiser ponha: "eventualmente seguido de uma curta discussão, se julgada necessária". Mas no fim tem de haver uma regra de flexibilidade, porque os artigos não são todos iguais e se surge uma questão nova não vamos impedir a sua dilucidação. Esses aspectos remetia-os para uma norma genérica final em que era cometida a quem presidisse aos trabalhos uma certa flexibilidade em cada caso. Tem de ser genérico e não específico só em relação a isto, era isso que ia propor no fim.

O Sr. Presidente: - Daria agora a palavra ao Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Desculpe; Sr. Presidente, vamos discutir isto até ao fim, ou posso completar os meus pontos de vista?

O Sr. Presidente: - Sim, é preferível que conclua, Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Então concluo.

Diria já que quanto ao artigo 4.° do regulamento não concordo que haja uma distribuição de tempo em relação a cada artigo. Não posso concordar com isso porque me parece que os artigos não são todos iguais nem na extensão, nem na complexidade, nem no número de propostas apresentadas. Se um artigo em relação ao qual há mudança de uma vírgula tivesse o mesmo tempo de outro em relação ao qual há cinco propostas, todas elas enormes, não me pareceria correcto.

O Sr. Presidente: - Não, mas não era essa a minha ideia, desculpe...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Está cá, cada artigo...

O Sr. Presidente: - Mas não está a dizer que é o mesmo tempo. Há uma pequena diferença.

A ideia que tenho é justamente essa. Era que fosse dada alguma flexibilidade à mesa, podia pôr "em relação a cada capítulo", por exemplo. Deveria haver uma certa flexibilidade e naturalmente seria anunciado o critério com um grau de razoabilidade. É evidente que, se a decisão da mesa fosse considerada menos aceitável, não seria vinculativa, pois o plenário da Comissão tem sempre a possibilidade de a rever. Necessário era que as pessoas soubessem de antemão o tempo de que dispunham para discutir os artigos. Poria isso onde?

O Sr. Almeida Santos (PS): - No artigo final da flexibilidade e do controlo da mesa. temos de nos disciplinar e aceitar o controlo da mesa. Enquanto na primeira parte dos trabalhos o critério foi amplo, quem quis falar falou durante o tempo que quis, não se retirou a palavra a ninguém, nesta segunda fase a mesa teria de ter algum controlo temporal. Se vamos enveredar por regras temporais rígidas não vai funcionar.

O Sr. Presidente: - V. Exa. deixava isso à discricionariedade da mesa, o que significa que a antipatia da disciplina passaria...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, eu também de vez em quando, nas suas ausências, presido.

O Sr. Presidente: - Não, não disse que era para mim, disse que era para a mesa...

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não estou também a alijar totalmente a antipatia. O que digo é o seguinte: não vejo que isto funcione com tempos fixados por artigo. Nem a mesa no momento em que inicia a discussão sabe que discussão vai surgir!...

O Sr. Presidente: - Passa-se adiante. Não é obrigado a esgotar.

O Sr. Almeida Santos (PS): - De qualquer modo, penso que, em relação a cada artigo, é difícil estipular um tempo, cronometrá-lo. É uma regra que não vai funcionar.

O Sr. Presidente: - Concordo com a flexibilidade. Ter alguma ideia do tempo não me parecia mal de todo. Embora, flexível.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Mas é que a mesa no seu critério de flexibilidade e direcção dos trabalhos vai fazê-lo! Até podíamos, nesse artigo, dizer: "incluindo o direito de fixação em princípio de um tempo de discussão para cada artigo." Mas sempre como regras muito pouco partilhadas.

O Sr. Presidente: - Sabe, Sr. Deputado Almeida Santos, compreendo as suas dificuldades porque também as sinto. Mas a questão é esta: é útil para os intervenientes, como se revela nas discussões em plenário, saber que têm um certo espaço de tempo e depois podem geri-lo um pouco como melhor entenderem. Se não sabem de antemão, se o critério só está in mente relenta de quem está a presidir aos trabalhos, bem, eles não podem ajuizar e gerir melhor o seu tempo. Reconheço que a necessidade da flexibilidade é um facto, a necessidade inclusivamente de dar maior autoridade a quem dirige os trabalhos, uma autoridade consentida, e que naturalmente terá de ser também exercida com bom senso, é importante, tal como algum tipo de critério, muito embora admitindo evidentemente adaptações e acomodações em função das situações concretas. Supúnhamos que se esgotou o tempo e há uma questão muito importante e que não está completamente esclarecida, bem, não há outro remédio senão prolongar o debate. Agora haver uma regra que em princípio será cumprida e que as pessoas tenham uma certa noção do tempo de que dispõem é importante. Aliás, devo dizer-vos que se percorrermos estas nossas actas, e de uma maneira mais clara para quem dirigiu estes trabalhos, sabe como isso teria sido importante. Quer dizer, se tivesse havido alguma ideia do tempo

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gasto e do equilíbrio, provavelmente nós poderíamos, sem prejuízo da qualidade do trabalho produzido, ter sido um pouco mais céleres.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Preferia que na regra final que propus da flexibilidade se incluísse o direito a...

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado tem uma resposta escrita sobre isso?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, são apenas ideias! Escrever é sempre fácil desde que se esteja de acordo.

O último ponto que levantaria é o seguinte: quando no artigo 5.° se fala em segunda votação, eu diria "por escrito", como é óbvio.

O Sr. Presidente: - As duas são por escrito?

O Sr. Almeida Santos (PS): - Não.

O Sr. Presidente: - Só a segunda? Está bem.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Só a segunda. Quanto à primeira, tomamos nota, consta da acta, não há necessidade. A segunda é que fixa, não é?!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, quero dar a nossa concordância à proposta que V. Exa. apresentou.

De todo o modo, na sequência da preocupação que manifestámos na última reunião em que tratámos deste assunto, e de acordo com a preocupação sobre a mesma matéria manifestada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, entendemos também que a primeira volta está feita e, portanto, há uma situação jurídica nova criada com o esgotamento da primeira volta. O que significa que, do nosso ponto de vista, não se pode repristinar em absoluto mesmo para as forças políticas que não estiveram aqui presentes, pois para elas a primeira volta também se esgotou. Mas todos estes aspectos estão interligados e muitas vezes é do próprio interesse da Comissão, e não apenas direito das outras forças políticas, esclarecer, conhecer e aprofundar algumas das propostas dos partidos que não intervieram na primeira leitura. Também concordamos que seja aberta a possibilidade de apresentação e fundamentação de propostas que antes não tenham sido apresentadas e discutidas. Todos nós temos consciência das limitações das normas em relação aos factos. Deve, contudo, ficar a ideia de que se tratava de uma apresentação e fundamentação, o que é diferente da discussão. A discussão como tal está precludida para todos, quer para aqueles que deveriam ter estado presentes e não estiveram, quer, sobretudo, para aqueles que lá fora diziam que a revisão estava a andar muito devagar mas que não apareciam cá.

Entendemos de igual modo que é conveniente a fixação de um prazo, embora com a salvaguarda que o Sr. Deputado Almeida Santos fez. É pressuposto a flexibilização destas coisas, fiquem ou não escritas.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Bom é que fique escrito!

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Exacto, não nos opomos a que fique escrito. Mas achamos conveniente, pelo menos com carácter indicativo, a fixação de um prazo.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, este texto que V. Exa. adiantou a título pessoal, com a designação "Proposta de regulamentação da segunda leitura e da votação a fazer na CERC", não foi objecto de ponderação na mesa da Comissão. Em bom rigor não teria de o ser. Isso implica, portanto, que teremos de fazer a apreciação das propostas agora e a sua votação na sequência daquilo que venham a ser as deliberações dos respectivos grupos parlamentares.

Por mim gostaria desde já de adiantar que não poderei passar de uma primeira leitura do texto, tal qual foi sugerido pelo Sr. Presidente, dado que não considerámos ainda na direcção do meu grupo parlamentar e do meu partido as diversas implicações da proposta de regulamentação adiantada.

Registamos, por outro lado, a proposta apresentada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, que parece sensata quanto à questão da fixação de um período intermédio a encetar imediatamente após o fim da primeira leitura, surgindo a separar a primeira leitura da segunda, por todas as razões que teve ocasião de expor. Creio que é uma questão nova a aditar àquela que o Sr. Presidente equacionou e aqui nos trouxe.

Em relação a essa proposta, gostaria de adiantar alguns comentários estruturados em torno dos quatro tópicos básicos que nesta matéria se suscitam: a natureza da segunda leitura, o regime dos debates, em terceiro lugar o regime das propostas derivadas e finalmente o regime das votações.

Em relação à questão da natureza da segunda leitura e à filosofia geral que deve presidir à sua realização, creio que teremos todos de convir dever tratar-se do apuramento de opiniões, de escolhas. Há, portanto, que exigir um mais em relação à primeira leitura e uma maior aproximação à definitividade das opiniões e posições que só será lograda no Plenário da Assembleia da República, como se sabe. Em todo o caso, penso que neste apuramento de opiniões e de posições não deveria ser descurada a necessidade de ponderação de novos argumentos, para além obviamente daquilo que decorre da ponderação de novos textos, ou melhor, de textos reformulados, que assim deverão ser em rigor qualificados. Por outro lado, importa não esquecer que a Comissão vai levar a cabo, e segundo os serviços me informaram dentro de um calendário bastante apertado, um vasto conjunto de audiências, muitas das quais poderão ter algum relevo para trazer contributos que devam ser tidos em consideração nos debates a ter lugar aqui na Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Isto abrange tanto os debates de posições ou argumentos trazidos por cidadãos individualmente considerados, ou por estruturas representativas de interesses colectivos, designadamente dos trabalhadores, ou mesmo por órgãos como o Conselho de Imprensa, ou

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o Conselho de Comunicação Social, cuja releitura da nossa leitura (primeira) seguramente nos pode ser de alguma utilidade.

Compreendo que pese em todo este debate que estamos a travar um outro debate que foi travado entre o PS e o PSD! Rejeitamos naturalmente os pressupostos em que se filiaram. Não vou retomar tudo aquilo que dissemos e diremos sobre a matéria, dou por reproduzidas essas considerações - são o pano de fundo de tudo aquilo que estou a dizer. Em todo o caso, quanto à filosofia geral que deve presidir à segunda leitura, gostaria de sumarizar a nossa: não entendemos que o trabalho da segunda leitura deva ser puramente a consumação cartorial do acordo celebrado entre o PS e o PSD no dia 14 de Outubro. Como o Sr. Deputado Almeida Santos teve ocasião de dizer na primeira reunião desta Comissão posterior a esse acordo político de revisão constitucional, nem o mais atento e esforçado leitor das actas da CERC conseguirá lobrigar o sentido em que se inclinam alguns dos partidos quanto a muitas e muitas das propostas em apreciação. E esse trabalho de apuramento, esse trabalho de ponderação,

nesta sede.

Posso agora considerar com maior rapidez a segunda questão, a questão do regime dos debates. Tem de haver nesses debates espaço para algo que seja a introdução de argumentos. É evidente que a reprodução ipsis verbis, argumento a argumento, palavra a palavra, do que foi dito na primeira leitura não teria sentido como tal! É óbvio! Em todo o caso, as reformulações só por si (mas não só) suscitarão muitas questões que não poderão reclamar-se da pura novidade.

O CDS aparece - imaginemos - com uma segunda versão da sua proposta em relação à liberalização dos despedimentos: seguramente não nos poderá ser proibida a nenhum de nós a reavaliação das implicações que isso tem, tendo em conta a arquitectura da constituição laboral e designadamente o papel que nela desempenha o direito à segurança no emprego. Creio que é impossível deixar de admitir isto, fazendo as devidas destrinças. Mas sei que isso exige um superiot critério e uma sensibilidade sensata por parte de quem dirija os trabalhos na circunstância.

Não é possível estabelecer uma guilhotina, uma bitola dirimente, peremptória, total, nessa matéria. Aliás, quem a estabelecesse provavelmente teria necessidade de a romper na terceira ou quarta esquina da história em função da sua conveniência, e penso que isto desde logo ocorreria com o próprio PSD. Também penso que é extremamente fácil obrigar a isso, no sentido exacto de que não é difícil (face às regras regimentais a que estamos vinculados) propiciar, da parte do PSD ou de quem quer que seja, que enverede por aí a necessidade de explicitação, marcação, clarificação, expressão (defesa até, porventura), suscitada por uma postura desse tipo.

Portanto, creio que não vale a pena forcar para além de determinados limites os próprios parâmetros da discussão. Nesse sentido creio que é sensato preservar ou não fazer precludir direitos de apresentação, confiar um pouco na sensibilidade que é o que me parece faltar a algumas das observações que foram feitas, e sobretudo preparar um pouco as reuniões. Nesse sentido a mesa poderia ter um papel activo e a Subcomissão de Redacção deveria ter algum papel. Compreendo que

isso seja perturbador para quem veja o processo de revisão constitucional como um processo bipolar - o papel de uma subcomissão pode, porém, não ser despiciendo para certos afinamentos e sobretudo para a ponderação de certas opções que são extremamente melindrosas, até do ponto de vista técnico, e em que complexíssima discussão tem de ser travada. Por exemplo, não podemos renunciar a discutir intensamente com a Associação Portuguesa de Informática (API) alguns dos aspectos suscitados pelas propostas respeitantes ao artigo 35.° Devo dizer que não estou absolutamente satisfeito com a primeira leitura nessa matéria. Cremos que alguns dos aspectos nela suscitados exigiriam bastante mais atenção colectiva (não estou a abonar-me de nenhuma pretensão sectária nessa matéria). Citei este tema porque pode ser congregador de mais consensos que outros, que deveriam igualmente ser objecto de consideração especializada a latere. Perguntarão os Srs. Deputados do PSD: "Mas então querem gastar seis reuniões a discutir com a API os pormenores da 'confecção' do artigo 35.°?" Resposta: "Não, não queremos." Queremos é que sejam activados os mecanismos adequados primeiro. Para que a matéria seja ponderada não numa audiência "despachante", em que por dever de ofício se recolham umas tantas observações, mas num diálogo em que possamos por qualquer das maneiras apreender também alguns dos contributos que nos serão seguramente trazidos. Deveríamos estar abertos a isso e activar nesse sentido mecanismos instrumentais de que dispomos.

Quanto à questão do regime dos debates eram estas as observações fundamentais. É evidente que não pode ser intenção de ninguém "premiar as ausências", mas também não poderá estar latente a opção de tolher direitos de expressão que não podem senão ser reconhecidos.

Quanto à questão do regime das propostas derivadas, creio que várias coisas que ficarem esboçadas no nosso primeiro debate sobre esta matéria não deveriam ser perdidas. Em primeiro lugar, é evidente que toda a gente tem direito de retirar propostas, toda a gente tem direito de renovar as propostas que retirou, se necessário, toda a gente tem direito de reformular propostas. Evidente também é que esse direito de reformular propostas deve ser suficientemente sensato para não nos colocar, de chofre, perante a necessidade de considerar propostas que não sejam objecto de algum conhecimento antecipado. Mas isso não deve impedir propostas in itinere decorrentes do próprio fluxo da discussão. Por outro lado, o chamado direito a não ser confrontado irreversivelmente e de surpresa com pror postas - que é verdadeiramente um direito postetativo basilar na estrutura dos direitos dos partidos nos parlamentos - deve ser mantido. Pode acontecer que face a uma proposta apresentada pelo PCP o PSD (ou vice-versa) entenda não estar em condições de nesse dia se pronunciar, mesmo em primeira fase da segunda leitura. Pode acontecer! Até porque as propostas poderão ser de conteúdo extremamente complexo ou polémico... Quanto ao regime de apresentação de propostas, creio, por tudo isto, que é de ter todas estas cautelas.

Quanto à ordem de votação das propostas, penso que podemos ter em conta os critérios gerais, regimentalmente consagrados.

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Quanto ao regime das votações, gostaria de dizer o seguinte: é evidente que o valor das votações é aquele que decorre do estatuto desta Comissão e não outro. E sensato o alvitre dado pelo Sr. Deputado Almeida Santos: na primeira fase da segunda leitura é dispensável um firmar, por escrito, das inclinações de cada partido. É que essas inclinações podem ser matizadas e estar dependentes da aquiescência de tal ou tal alteração, de tal ou tal afinamento, de tal ou tal supressão, de tal ou tal ajustamento...

Em conclusão, Sr. Presidente, gostaria de dizer que transmitirei à direcção do meu grupo parlamentar não só o conteúdo da proposta mas também o conjunto de observações que foram feitas nesta reunião. Em qualquer caso, seria útil que o PSD clarificasse um último aspecto e que é o seguinte: é intenção do PSD submeter a votação este texto? É que no caso de ser intenção do PSD submeter a votação um texto destes, portanto não estabelecer uma espécie de código de conduta, pactuado com uma base escrita, mas sem uma formalização última, então, seria necessário submeter propostas a debate e votar o dito texto. Por outro lado, para esse efeito seria necessário abrir aquilo que é da praxe e da regra em termos regimentais, isto é, o direito de apresentação de propostas de alteração, individual ou conjuntamente. Deixo-vos, também, estas interrogações.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, daquilo que V. Exa. apresentou como justificação há naturalmente algumas ideias que têm a nossa concordância. O Sr. Presidente disse aqui que este texto foi elaborado com intenção de evitar a repetição do que já foi dito e de aproveitar o melhor possível o tempo e que a segunda votação só seria feita após uma visão de conjunto. Estas três ideias parecem-me razoáveis e têm a nossa concordância.

Daqui para a frente colocam-se-nos outros problemas. E que todo este projecto de regulamentação acaba por ser um espartilho, que depois é muito difícil de cumprir. Nesta primeira volta a Comissão tem funcionado sem um espartilho como este. Assim, penso que ele também não seria necessário para a segunda volta. Como é natural, o Sr. Presidente alerta-nos para as repetições, para aquilo que já foi dito. Por outro lado, há realmente uma série de aspectos, que a prática virá a pôr em destaque, que não se coadunam com regras fixas, a que depois se estaria forçosamente vinculado. Alguns exemplos disso já foram aqui apresentados, designadamente pelos Srs. Deputados Almeida Santos e José Magalhães. É que seria necessário que houvesse um intervalo, um espaço de tempo entre o dia em que fosse aprovado e o dia das primeiras votações, que poderia ser de algumas semanas.

Para além disso, penso que das intervenções havidas, especialmente destas duas, a conclusão vem ao encontro da ideia que tinha. É que realmente é muito difícil apresentar aqui regras mais ou menos fixas. Nós deveríamos continuar a orientar-nos pelo mesmo método, que até agora conduziu a resultados que me parecem positivos. Não acredito que haja alguém desta Comissão que diga que o tempo não foi até agora bem aproveitado.

Para lá de tudo aquilo que se possa dar como exemplo, numa revisão constitucional não é possível aceitar que, pelo facto de não terem estado aqui presentes representantes de forças políticas que tinham propostas mas que na altura não as defenderam, as mesmas não as possam vir agora, ou seja, na segunda volta, apresentar. Muito menos se compreenderia que não se pudesse responder àquilo que é uma primeira apresentação dessas propostas.

Penso que haveria que pensar num certo equilíbrio de modo a não introduzir aqui regras fixas, que iriam funcionar ao contrário. Elas iriam criar diariamente problemas de interpretação, que atrasariam, com certeza, o andamento dos trabalhos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.

O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Sr. Presidente, no seguimento da posição que o PSD já expressou em relação a esta matéria gostaria de dizer o seguinte:

Em primeiro lugar, nós não achamos nada estranho que nesta fase dos trabalhos, ou seja, no fim da primeira leitura dos projectos de revisão constitucional apresentados, o Sr. Presidente tenha proposto um texto, que está a ser discutido neste momento, que faz a adaptação de algumas das normas que nós aprovámos no início dos nossos trabalhos. Atendendo à especificidade do debate que a seguir se vai travar, nomeadamente aquele que se prende com a segunda leitura e com as votações indicativas que se farão em relação aos artigos em discussão, não nos parece que seja gravoso, para qualquer dos partidos ou para qualquer dos Srs. Deputados que apresentaram propostas, que sejam fixadas regras que atentem especialmente nas condições em que a partir de agora vamos ter funcionar.

Em segundo lugar, gostaria de dizer que não se pode introduzir uma rigidez muito grande nos debates da CERC - aliás, esta proposta não o faz -, mas também não se pode tentar obter, através do regulamento que consensualmente aqui façamos, a perpetuação dos nossos trabalhos. Há um limite político para os trabalhos desta Comissão, limite esse que nos impõe algumas regras de funcionamento, sem prejuízo da capacidade e da liberdade de expressão de todos os deputados intervenientes nesta Comissão. Acresce que isso nem sequer é um processo estranho, esquisito, especial ou excepcional desta Comissão. Qualquer comissão da Assembleia da República tem um regimento, um regulamento interno que aprova e em relação ao qual todos os deputados das respectivas comissões se submetem. Portanto, julgo que também nesta matéria todos os Srs. Deputados - e é este o apelo do PSD - devem fazer um esforço no sentido de acompanharem o bom senso do presidente desta Comissão e de dotarem a CERC das regras que permitam avançar de forma consequente, tendo em vista o objectivo último da Comissão, que é o de apresentar um trabalho válido, o mais exaustivo possível, ao Plenário.

Era esta a posição que aqui queríamos deixar.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Muito bem!

O Sr. Raul Castro (ID): - Apoiado!

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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.

É evidente que a segunda leitura é a segunda leitura e não é a primeira. La Palice não diria melhor! O problema que o Sr. Deputado equacionou na parte final da sua intervenção é que me parece merecedor de alguma atenção adicional. As comissões têm regimentos, que são para cumprir. Essa é uma verdade apodíctica. A diferença é que esta Comissão, que também tem o seu próprio regimento, muitas de cujas disposições, de resto, nós aprovámos, é um pouco diferente das outras comissões. É, desde logo, diferente porque indicia (ou não) consensos que exigem maioria qualificada, coisa que não acontece, por via de regra, nas outras comissões. A questão está em saber se há da parte do PSD alguma aspiração a fazer com que o processo de revisão constitucional não se circunscreva aos três grandes grupos de questões equacionadas no acordo político de revisão constitucional celebrado com o PS e se, portanto, está interessado em discutir as propostas de alteração pendentes ou se entende pronunciar-se sobre elas expedita e expeditivamente, despachando tudo aquilo que é proposto por outrem que não os subscritores do pacto de revisão constitucional. Essa é que é a questão!

A intervenção do Sr. Deputado deixa-me exactamente como estava antes de o ouvir ou deixa no ar uma ideia restritiva, que me parece não ter bem em conta que o terreno que estamos a debater é o da revisão constitucional. Sucede que aqui V. Exa. não pode coagir ninguém a consenso nenhum. A máxima coisa que pode fazer é declarar: "Nós não estamos dispostos a qualquer consenso, agarramos nas vossas belas propostas sobre direitos, liberdades e garantias e vamos deitá-las no caixote do lixo. Não votam a propriedade privada como direito sagrado, fundamental e primordial? Pois, nós também não votamos as vossas. Vamos a votos!" Tal conduta criaria, porém, nesta Comissão um clima de ferro e fogo, que seria de todo indesejável.

A minha pergunta ao Sr. Deputado é, pois, a seguinte: V. Exa. não está ciente de que se exige aqui uma certa flexibilidade? Todos nós estamos cientes de que a Casa tem Regimento e regimentos, mas nesta matéria não haverá limites especiais de revisão que devem ser respeitados?

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Macedo e Silva.

O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, os limites que existem não são só para o PSD, mas também para os outros partidos. Nós respeitamos esses limites!

Em relação à questão de nós pretendermos, alegadamente, pôr a ferro e fogo os trabalhos desta Comissão, permitia-me só oferecer o mérito do trabalho que a mesma desenvolveu ao longo dos meses, sem que alguém em algum momento...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Não estou a falar do passado, Sr. Deputado. Refiro-me ao futuro.

O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - Sr. Deputado, nós só podemos oferecer como garantia daquilo que queremos para o andamento futuro dos trabalhos desta Comissão aquilo que fizemos até agora. Portanto, é na nossa maior boa fé que subscrevemos as propostas apresentadas pelo presidente desta Comissão.

Só gostaria de reforçar o seguinte: como é óbvio, nós não queremos constranger quem quer que seja, muito menos o Partido Comunista Português e o Sr. Deputado José Magalhães, a um consenso em relação a esta matéria. O que fiz foi um apelo ao bom senso, no sentido de nos entendermos em relação às regras mínimas de funcionamento desta Comissão, com a flexibilidade que não deixei de apontar relativamente aos trabalhos desta revisão constitucional. Portanto, não pretendi constrangir quem quer que fosse, nem pretendi limitar a liberdade de opinião e de intervenção dos deputados desta Comissão. Não é isso que está em causa! O que está em causa é conseguirmos chegar a um acordo, tanto quanto possível alargado, em relação às regras mínimas de funcionamento desta Comissão. Isso é importante, sob pena de perpetuarmos os trabalhos e atingirmos o tal limite político a que me referi no início da minha intervenção. Creio que é bom para todos que esse limite não seja atingido.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de começar por lembrar que apresentei esta proposta no cumprimento do mandato que me foi solicitado e dado pela Comissão. Cumpri-o e não fiz mais do que isso!

Este debate evidencia a necessidade de nesta fase dos trabalhos nos pormos de acordo. Compreendo que haja uma necessidade de discutir e de aprofundar as matérias porque elas são extremamente importantes.

Por outro lado, este processo de revisão tem de acabar num determinado momento. A grande vantagem dos prazos peremptórios é que num determinado momento as coisas têm de acabar. Se os advogados tivessem mais duas ou três semanas para fazerem as suas alegações, eles poderiam produzir melhores argumentos. Não sei se a justiça sairia beneficiada com tais delongas. Em todo o caso, os prazos peremptórios servem justamente para isso. Neste caso não temos prazos peremptórios rigorosos, mas, sim, um prazo político, que tem de ser interpretado em termos razoáveis.

Não posso deixar de referir que para mim constitui um pouco uma surpresa a circunstância de depois de termos feito os debates que fizemos o Sr. Deputado José Magalhães ter sentido, em todo o caso, a necessidade política de fazer as observações que fez. Registo isso! Não deixa de ser algo assinalável, apesar de perceber as razões por que as fez.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Quais delas, Sr. Presidente?

O Sr. Presidente: - As que se referem ao problema de os diversos intervenientes não serem coagidos na liberdade de expressão das suas opiniões e de, portanto, poder haver uma limitação intolerável à maneira como os debates devem ser aqui realizados. Interpretando um desejo manifestado pela Comissão, o que sinto é que nesta segunda fase não devemos repetir exactamente aquilo que fizemos na primeira. Sobre esse aspecto suponho que ninguém produziu afirmações em contrário.

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Só que é muito fácil enunciar este critério em termos genéricos e depois é relativamente simples desrespeitá-lo. Assim, torna-se mais complicado aplicá-lo.

Se VV. Exas. entendem que necessitam de consultar as direcções dos vossos grupos parlamentares, acho que o devem fazer. Vou tomar em consideração aquilo que foi aqui referido, designadamente pelo Sr. Deputado Almeida Santos.

Insisto que me parece importante ter algumas linhas directrizes sobre as quais a Comissão esteja de acordo, por unanimidade ou por maioria, em relação à forma como os trabalhos devem ser conduzidos. Não penso que se deva ir para fórmulas estritas, que levem as pessoas a sentirem-se coagidas ou coarctadas na sua liberdade de expressão. Não é disso que se trata! Tem de haver flexibilidade. Não me parece que possa ser acusado de ser inflexível na condução dos trabalhos. Se alguma critica ouvi, aqui dentro ou lá fora, foi a de ser um pouco laxista na maneira como conduzo os trabalhos. Mas tem-se ganho no clima e clareza das discussões. Parece-me ser legítimo aspirar a que tenha algum apoio, em termos de orientação global da Comissão, quanto aos critérios que vão ser aplicados na segunda leitura. Caso contrário, torna-se extremamente difícil que as coisas cheguem a bom termo dentro de prazos razoáveis. Portanto, o que sugiro é que VV. Exas. consultem os vossos grupos parlamentares e que apresentem, se quiserem, as propostas de alteração que entenderem. Se terminássemos hoje...

Vozes.

O Sr. Presidente: - Poderíamos fazê-lo, por exemplo, na próxima terça-feira. É um prazo razoável.

Todos os grupos parlamentares tomarão certamente em conta as propostas que sejam sensatas e prudentes, mas desde que não seja descortinável, em termos objectivos, uma hipótese de protelamento injustificado dos trabalhos. Tudo aquilo que possa conduzir, em termos de razoabilidade, a um melhor aprofundamento, a uma melhor discussão, deverá ser atendido. No entanto, há uma coisa que é clara: não podemos ignorar que temos um determinado tempo político, que não é absolutamente rigoroso, mas que, por exemplo, não é compatível com voltar a ter nesta segunda leitura o mesmo tempo de discussão que tivemos na primeira.

Compreendo que quem pense que, a não ser pequenos aperfeiçoamentos técnicos, a revisão da Constituição é um mal e prefira a manutenção do texto actual, não esteja tão interessado na aceleração do processo como aqueles que entendem que é bom um texto saído da televisão.

Todavia, teremos de encontrar a fórmula, os tempos adequados e dar as oportunidades razoáveis para que todos possam defender as suas perspectivas, sobretudo aquelas novas que não tiveram ocasião de longamente ser expostas. Nesse sentido, penso que não é prudente continuarmos a discutir, neste momento, esta matéria, razão pela qual vos propunha que na próxima terça-feira discutíssemos as novas propostas (caso as haja), agradecendo a sua apresentação, se possível, antes da sessão, a fim de permitir a facilitação dos trabalhos e a conduta correcta do ponto de vista processual, que todos nós nos orgulhamos de ter vindo a assumir até aqui. Assim, na terça-feira, chegaríamos a uma conclusão, dando aos Srs. Deputados que tenham necessidade de o fazer a oportunidade de consultar as direcções dos vossos grupos parlamentares. Nessa altura, penso ser razoável que cada grupo parlamentar consulte igualmente as suas respectivas direcções sobre uma proposta nova que foi aqui apresentada pelo Sr. Deputado Almeida Santos, em nome do PS, no sentido de se introduzir um intervalo nos trabalhos da CERC. Compreendo as razões que ditaram essa proposta, mas penso que o problema é suficientemente importante para também nessa altura ser objecto de consideração.

Se estivessem de acordo, iríamos retomar a discussão do artigo 290.° Salvo erro, tinham a palavra reservada, por um lado, de certo modo para uma intervenção na sequência daquilo que tinha sido dito pelo Sr. Deputado António Vitorino, o Sr. Deputado José Magalhães e, para intervenções, os Srs. Deputados Pedro Roseta e Maria da Assunção Esteves.

Não sei se o Sr. Deputado José Magalhães pretende intervir agora ou se, uma vez que já teve oportunidade de se pronunciar, usará da palavra depois de ouvirmos os Srs. Deputados Pedro Roseta e Maria da Assunção Esteves.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que é razoável, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pretendia começar por sublinhar - como tem sido afirmado por" alguns Srs. Deputados membros desta Comissão, entre os quais me incluo - o facto de nos encontrarmos numa assembleia política e não numa academia jurídica ou numa escola de Direito. No entanto, a verdade é que alguns dos Srs. Deputados se têm perdido em longuíssimos discursos que, parece-me, caberiam melhor nessas sedes. Certos tipos de argumentação são também "eternos" (como alguns pretendem que seja o artigo 290.°) e, na sequência da discussão que acabámos de ter, começo a interrogar-me se não será mais difícil rever a Constituição do que faze-la. A continuarmos por este caminho, corremos o risco de levar muito mais tempo a rever a Constituição - apesar de se tratar já de uma segunda revisão - do que os deputados constituintes, entre os quais tive a honra de me incluir, levaram a faze-la.

De um ponto de vista político (em meu entender, fundamental) importa começar por salientar que foram apresentados três projectos que pela primeira vez estão de acordo em rever o artigo 290.° da Constituição da República.

Lamento que os Srs. Deputados Almeida Santos e António Vitorino não estejam presentes, mas o Sr. Deputado Alberto Martins certamente lhes transmitirá as minhas palavras.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, poderemos suspender um bocadinho, em homenagem ao Sr. Deputado Almeida Santos, que, suponho, é o respondente, com a responsabilidade política decorrente da intervenção de ontem. Refiro-me às suas responsabilidades específicas em função do que ditou e não às suas responsabilidades gerais, já que, como é óbvio,

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o Sr. Deputado Alberto Martins certamente partilhará, honradamente, todas as responsabilidades possíveis e imaginárias pelo que está no projecto do PS e o mais que se sabe. Claro que tudo depende um pouco do gosto e do estão do orador nessas matérias...

O Sr. Presidente: - Penso que não devemos sustar os trabalhos por essa circunstância...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Terei o prazer de transmitir o meu pensamento de viva voz ao Sr. Deputado Almeida Santos, para além do que vier nas actas.

Vozes.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Como dizia, de um ponto de vista político, parece-me fundamental que exista acordo entre três partidos (o PS, o PSD e o CDS) para rever o artigo 290.°, e não podia deixar de me congratular vivamente pelo facto de, no seu projecto, o PS vir assim reconhecer que não há disposições eternas na Constituição que possam sobrepor-se à vontade popular e, muito menos, que espartilhem as novas gerações. Trata-se de uma alteração da concepção fixista das sociedades, que esteve em moda em tempos passados, mas que hoje está em absoluto ultrapassada - como já o referi em intervenções que dou por reproduzidas, desde que, com muita honra, comecei a participar nos trabalhos desta Comissão. São concepções que repudio vivamente, pois nada têm a ver com o fluir das sociedades modernas, põem inclusivamente em causa o respeito pela vontade popular e acabam, a longo prazo, por tornar-se obsoletas e até ridículas. Esta é a primeira consideração política essencial. Foi dado um passo e devem ser destacados os seus aspectos positivos.

A segunda consideração política que julgo essencial é a seguinte: o povo, em sucessivos, repetidos e quase diria inúmeros, ou, pelo menos, em grande número de actos eleitorais, rejeitou maioritariamente um caminho inscrito na Constituição que, segundo alguns, faria parte dos princípios essenciais: o caminho socialista, com uma conotação marxista muito forte, que alguns quiseram transformar num princípio com uma dignidade semelhante à do princípio democrático, à do princípio da unidade do Estado, etc..

O próprio Sr. Deputado Almeida Santos salientou ontem, e muito bem, que houve normas do artigo 290.° de que o povo já se afastou, tendo citado o caso da alínea f), por exemplo. Aqui introduziria a primeira discrepância: se se admite que houve já uma norma da qual o povo se afastou em sucessivos actos eleitorais, por que não admitir que relativamente a outras normas aconteceu o mesmo? Retomo a argumentação do Sr. Presidente na sua intervenção inicial, não só no que diz respeito às organizações populares de base, à planificação da economia, mas também no que concerne a uma outra norma que se me afigura completamente caída em desuso, ou que nunca foi sequer utilizada desde a revisão de 1982: trata-se da norma constante da alínea m), ou seja, a fiscalização da constitucionalidade por omissão de normas jurídicas. Quantos casos conhecem de fiscalização por omissão de normas jurídicas? Julgo que, até 1982, houve alguns casos, me-

nos do que os dedos de uma mão, mas, depois de 1982, salvo erro, não houve nenhum. Estive longe, mas poder-me-ão confirmar...

Vozes.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Está a confirmar? Zero?

O Sr. José Magalhães (PCP): - É verdade que para além da escassez de espécimes jurisprudenciais não há um só caso de processo declarativo findo desde 1982.

O Sr. Deputado entende que o respectivo limite material caducou, portanto?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Estou a citar outros casos, para além da alínea referida pelo Sr. Deputado Almeida Santos. Houve normas que não tiveram utilidade e houve outras, como foi o caso da alínea y), em que o povo, repetidamente, no uso da sua soberania, através do sufrágio universal, repudiou o caminho que elas lhe queriam impor.

Estamos chegados ao momento de colocar ã questão política fundamental de saber se a Constituição é para o povo ou se o povo é para a Constituição. Se o povo, repetidamente, não está de acordo com princípios constitucionais ditos imutáveis, como é o caso da alínea f) (que me parece o caso mais grave), como em maioria tem demonstrado não estar...

Vozes.

O Sr. Presidente: - Mas também está a explicitação da fiscalização da constitucionalidade...

Vozes.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E isso é coisa diferente de eliminar a norma.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas o PSD elimina tudo. Portanto...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Devo dizer, a título, pessoal, que teria eliminado também a fiscalização da inconstitucionalidade por omissão, mesmo no texto da Constituição.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É um texto "enxuto", no sentido de mutilado: faltam-lhe componentes vitais!

O Sr. Miguel Macedo e Silva (PSD): - No preciso sentido da expressão!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - No sentido preciso, e no de eliminar as inutilidades, sobretudo aquilo que não é utilizado.

Portanto, a questão fundamental que se coloca consiste em saber se queremos que a Constituição seja para o povo ou que o povo seja para a Constituição. E, se o povo, mesmo num período dilatado de tempo, como aliás disse o Sr. Presidente ontem, manifestar o seu desacordo, nomeadamente pelo acto positivo do sufrágio

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por largas maiorias, não sei se, parafraseando alguém, não querem alguns dissolver o povo para salvar a Constituição. Portanto, no seu todo, a Constituição tem de ser adequada à vontade popular, sob pena de a alternância democrática se transformar numa frustração e a democracia numa palavra vazia.

Depois destas considerações iniciais, gostaria de relembrar - e aqui trata-se, se quiserem, de um aspecto jurídico-político - que nenhuma constituição do mundo tem um elenco de limites materiais que se assemelhe, nem de longe, ao da Constituição portuguesa. Muito menos as constituições de índole programática.

Como sabem, em geral, os limites materiais reduzem-se à forma republicana ou monárquica do Estado, aos direitos fundamentais da pessoa humana, ao carácter federal ou unitário do Estado, e pouco mais; nunca contêm um elenco tão grande de alíneas que, indo até à alínea p), quase esgotam o alfabeto. Eis uma das contradições essenciais da nossa Constituição - e eu pedia a atenção do Sr. Deputado José Magalhães para este facto. Foram ontem aqui aduzidos argumentos que não podem de modo algum colher: a contradição da posição do PCP reside no facto de que, sendo a nossa Constituição de natureza programática, ela tem de ser por natureza flexível e não pode conter limites materiais tão vastos como é o caso de constituições rígidas não programáticas. Refira-se que as constituições dos países da Europa de Leste não contêm, que eu saiba, limites materiais, exactamente pelo facto de serem constituições programáticas. O absurdo, certamente único no mundo, está em querer que uma constituição programática possa ser rígida quando a Constituição ou é programática, caso em que é flexível, ou é rígida, e, então, não pode ser programática.

O que é politicamente absurdo é querer manter esta contradição, é querer esta quadratura do círculo, é querer juntar no mesmo saco a água e o fogo: é uma Constituição altamente programática ser ultra-rígida, quando os programas são por essência mutáveis: à medida que forem cumpridos e que as circunstâncias mudarem, a evolução da sociedade impõe, por natureza, a sua alteração, a não ser que se trate de programas mumificados, de museu. Ninguém pode pedir a um partido ou a outra instituição qualquer, mesmo fora da vida política, que mantenha eternamente o mesmo programa. O facto de uma constituição programática, com um elenco destes, absolutamente anormal - e não vejam nesta palavra nenhuma intenção insultuosa, pois utilizo a expressão apenas no sentido de que sai da normalidade das constituições do mundo -, ser simultaneamente rígida é o que posso considerar uma última originalidade do nosso processo político. Em meu entender, aquilo que é permanente, a identidade secular do povo português, nada tem a ver com isto.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Roseta, V. Exa. dá-me licença que faça uma pequena interrupção?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Faça favor, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Esta ideia é muito interessante, sobretudo se a cotejarmos com um preceito que, na versão original da Constituição de 1976, referia esta fase transitória, a caminho do socialismo. É um apoio à tese que está a apresentar literal, e não só, extremamente interessante.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Pedro Roseta, permita-me que também eu o ajude, na sequência, aliás, do esforço profiláctico e filantrópico do Sr. Deputado Rui Machete. Se possível, tenha em consideração, na elucubração que está a desenvolver, que a Constituição em 1982 foi alterada no dispositivo que o Sr. Presidente citou, mas não foi alterada no artigo 290.° Talvez fosse possível tentar articular as duas opções tomadas: é que elas foram articuladas...

O Sr. Presidente: - E, já agora, o exercício do poder pelas classes trabalhadoras, que também foi objecto de poda.

O Sr. José Magalhães (PCP): - E mesmo os outros aspectos expurgados no articulado que não no artigo 290.°!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente e Sr. Deputado, já lá iremos. Ainda estou em 1974 e já querem que eu chegue a 1982!

Risos.

Tem-se falado da identidade da Constituição mas, Sr. Presidente e Srs. Deputados, essa identidade consta do projecto do PSD, que recolhe o essencial daquilo que identifica a Constituição, ou seja: a democracia, o princípio da independência e da unidade do Estado, os direitos fundamentais do cidadão, a forma republicana de Governo, o Estado de direito democrático, o equilíbrio e a divisão de poderes, a autonomia político administrativa das regiões autónomas e a autonomia das autarquias locais.

Curiosamente, e isso não tem sido sublinhado, o PSD introduz princípios que não constavam do artigo 290.°, por exemplo, a consagração do Estado de direito democrático e da divisão e equilíbrio dos poderes. A nosso ver, se existem limites cuja alteração significaria a mudança de Constituição, seriam estes, na medida em que, sem eles, o regime deixaria de ser democrático.

Tenho ouvido também utilizar como argumento a vontade dos constituintes de 1975-1976. E, aqui, volto a dirigir-me ao Sr. Deputado Almeida Santos para lhe dizer que, segundo creio, dos presentes apenas o Sr. Deputado Costa Andrade e eu fomos constituintes, e podemos precisar que, como membros do grupo parlamentar do então PPD, votámos o artigo 290.° na sequência do circunstancialismo dos pactos entre o MFA e os partidos, pactos esses que impunham um certo modelo, que julgávamos válido apenas no período de transição. Repetindo um pouco o que já afirmou é Sr. Deputado Rui Machete, nosso estimado presidente - e isto talvez retire base ao argumento ontem invocado pelo Sr. Deputado Almeida Santos -, nós votámo-la (eu, pelo menos) no entendimento de que o artigo 290.° era revisível, de que se tratava, numa Constituição de transição, de mero fruto de um circunstancialismo determinado, e isto, pelo menos para os constituintes, parecia óbvio. Citaria agora um estudo interessantíssimo do nosso presidente, "Os princípios estruturais da Constituição de 1976 e a próxima revi-

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são constitucional", publicado há tempos na Revista de Direito e de Estudos Sociais, em que, referindo que cada constituição é condicionada por forma determinante pelo momento histórico em que nasceu e pela ambiência que envolve o seu desenvolvimento, afirma que não é possível compreender nem valorar cabalmente o normativo constitucional sem ter em conta os dados de natureza económica, social, cultural e políticos da situação em que foi elaborada. Mais adiante, cito: "A força normativa da Constituição, a sua capacidade para conformar a realidade, de acordo com o dever ser que é expresso, encontra as suas possibilidades e limites nas estruturas fácticas que pressupõe e de que incide."

Todos sabemos como decorreram os trabalhos no período revolucionário, já não falo no primeiro pacto MFA/Partidos, mas relembro o segundo pacto que foi, quer se queira quer não, uma limitação da liberdade dos constituintes que assim votaram a Constituição, considerando-a transitória. E mais: alguns dos preceitos tinham já sido aprovados na fase revolucionária anterior ao 25 de Novembro e permaneceram intocados depois, com uma carga de uma ideologia muito própria. A Constituição de 1976 acabou por ter um carácter compromissório, resultante de um equilíbrio durante o período de transição até à primeira revisão - vou continuar a citar o Sr. Deputado Rui Machete - entre a concepção democrático-pluralista de cunho ocidental e uma concepção de índole marxista, como temos afirmado repetidamente. Claro que levar-nos-ia longe querer aqui - remeto para o referido estudo do Sr. Deputado Rui Machete - examinar a estrutura da Constituição e os seus princípios fundamentais e apurar em que medida o ambiente e os termos em que o poder constituinte se exercitou, emprestam ao normativo constitucional uma especificidade própria que a faz distinguir das suas congéneres dos países de democracia pluralista ocidental.

É, realmente, esta originalidade (julgo que o Sr. Deputado Almeida Santos não estava há pouco, por isso julgo ser essencial repetir) - aquilo que eu classifiquei como a última originalidade do processo político ou, se se quiser, político-constitucional português - que foi esta contradição, de termos uma Constituição programática, elaborada em determinado momento histórico, e que é ultra-rígida, quando, por essência, as constituições que são programáticas são, forçosamente, mais flexíveis. As constituições mais rígidas, dentro do modelo de democracia pluralista ocidental são, exactamente, aquelas que são menos programáticas. Eu diria mais: quanto menos programática é uma constituição, mais rígida ela pode ser; quanto mais programática ela é, mais flexível ela tem de ser.

Respondo agora ao Sr. Deputado José Magalhães, insistindo que nós votámos o texto no entendimento de que era revisível sempre, como qualquer outra norma e de que se tratava (como já tem sido dito por alguns deputados - julgo que o Sr. Deputado Jorge Miranda afirmou isto em 1982) de uma norma de garantia ou declarativa, como alguns lhe chamam; como há outras normas de garantia, por exemplo, as que se ocupam da estrutura do Tribunal Constitucional, e que podem, obviamente, ser revistas como esta.

Para os deputados do PSD na Assembleia Constituinte, importa recordá-lo também, já na altura não havia diferença de raiz entre o poder constituinte originário e derivado. Nós no PSD entendemos que ambos os poderes constituintes são expressão da soberania do Estado, exercidos por representantes eleitos do povo, e que entre normas constitucionais originárias e supervenientes não pode haver uma diferença abissal, como alguns querem; trata-se de matérias constitucionais que têm todas a mesma dignidade, o mesmo valor, e que estão inseridas na mesma constituição formal. O poder constituinte de um certo momento não pode ser superior ao de um momento posterior, e tem de ser aplicável a regra geral da revogabilidade de normas anteriores por normas subsequentes. Não é concebível para o PSD, nem nunca foi - e devo dizer que, aqui, transmito o que era também o pensamento, no momento, do então secretário-geral, Dr. Francisco Sá Carneiro -, não é concebível, repito, uma autolimitação definitiva da vontade nacional. Os "pais" da democracia moderna, sem referir em sentido idêntico alguns filósofos da antiguidade, consubstanciaram numa das primeiras constituições escritas, a Constituição francesa de 1793, no artigo 23.°, que um povo tem sempre o direito de rever, de reformar, de modificar a sua Constituição e nenhuma geração pode sujeitar as futuras à sua lei (ou à sua vontade, acrescento eu). Acresce ainda que os artigos da Constituição, em 1976, foram aprovados por maioria simples; posteriormente exige-se uma maioria qualificada de dois terços, o que já é uma garantia de estabilidade que é, a nosso ver, suficiente.

Devo dizer, depois de tudo isto, que mesmo apesar deste entendimento (aliás, o que vou dizer não é novidade, já veio na imprensa há uns anos atrás) não queria deixar de sublinhar que no seio do grupo parlamentar do então PPD houve posições diversas. O Dr. Francisco Sá Carneiro, secretário-geral do PPD, embora não tivesse podido exercer o seu mandato constituinte devido a doença, sustentou que o partido se deveria abster na votação final da Constituição; tese que eu próprio defendi também no grupo parlamentar, com outros deputados e que não obteve maioria, como sabem, e um dos motivos foi, exactamente, por haver esta contradição entre o caracter programático da Constituição e a sua rigidez. Mas desde logo, e passado pouco tempo, o Dr. Sá Carneiro sustentou a revisibilidade de toda a Constituição, como se recordam.

No projecto de revisão da Aliança Democrática ainda se foi mais longe; todos se recordarão que em 1982 o Sr. Deputado Costa Andrade defendeu, julgo que em Plenário e na Comissão, que a estabilidade de uma constituição deveria ser reservada àqueles elementos, àqueles valores, àquelas normas que pudessem, com relativa segurança, considerar-se verdadeiro património cultural e político da nossa democracia, e que não deveriam converter-se certas concepções ideológicas em preceitos constitucionais para a geração seguinte. O Sr. Deputado Jorge Miranda, que já não pertencia ao meu partido, alegou em 1982 que o artigo 290.° podia ser revisto - infelizmente não o foi, mas essa é outra questão. Mas, já nessa altura, o Sr. Deputado Jorge Miranda alegava que o artigo 290.° não era uma norma substantiva, mas sim uma norma de garantia, e que a identidade e continuidade da Constituição não estariam aqui expressas, mas sim no resto da Constituição. Isto é, os princípios resultariam de todo o ordenamento constitucional e não do artigo 290.°; para ele, este artigo não tem nenhum cunho especial de rigidez, é ape-

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nas uma norma de garantia, como já disse. Portanto, a sua posição actual de constitucionalista emérito e respeitado é de que este artigo é revisível.

Pedindo desculpa pela repetição, volto a dizer que o facto político que me parece essencial, e com o qual me congratulei vivamente (não sei se o Sr. Deputado Alberto Martins já transmitiu esta minha posição ao Sr. Deputado Almeida Santos), é a existência pela primeira vez de três projectos que admitem a revisão deste artigo; isto é, que deixam de consagrar para a eternidade - que há outros que ainda ai não chegaram - a impossibilidade de rever o artigo 290.° e os princípios a que ele se refere. Julgo que a Sra. Deputada Assunção Esteves depois desenvolverá este tema, mas eu não posso deixar de dizer, em relação à teoria da dupla revisão diferida defendida ontem pelo Sr. Deputado Almeida Santos, que me parece, obviamente, uma teoria respeitável, como outra qualquer. Mas eu queria frisar o seguinte: não me venha dizer, por favor, que os deputados constituintes quiseram consagrar a dupla revisão diferida, com os dez anos de intervalo, com aquela explicação que, ontem, teve a gentileza de nos dar. Não quiseram coisa nenhuma! Nessa altura, ninguém falava sequer em teoria da dupla revisão! Ela apenas surgiu em 1978, julgo eu os "pais" desta teoria no nosso país são os Profs. Jorge Miranda e Gomes Canotilho, por volta de 1978, salvo erro.

O Sr. Presidente: - Foram os Italianos

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas, em Portugal, são os "pais adoptivos". Obviamente, no que respeita à Assembleia Constituinte foi teoria que nunca foi falada no decorrer dos trabalhos. Aliás, o introdutor em Portugal desta tese, o Prof. Jorge Miranda, aceita a revisibilidade do artigo. Hoje é uma teoria... não é assim?

Voz.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não acabei. Ainda queria dizer uma palavra sobre a posição do PCP. Na prática, e ao contrário do que agora diz o Sr. Deputado José Magalhães, a relevância absoluta dos limites materiais parece ser a tese consagrada e, embora ontem tenha declarado que não era, na prática ficámos todos - e eu tive ocasião de falar com outros colegas da minha bancada - com a convicção de que assim era. No fundo, o PCP quer o imobilismo, quer manter o artigo 290.° como está, e luta contra este facto político, que me parece essencial, de haver hoje três partidos que têm mais que dois terços da Assembleia, portanto têm uma maioria qualificada, que querem rever o artigo e que põem em causa aquele imobilismo. Não vejo como é que o Sr. Deputado pode demonstrar-nos, depois de toda a sua argumentação de ontem, que não quer manter o artigo eternamente como esta. Já falei da contradição entre uma constituição programática e ultra-rígida, que politicamente é insustentável perante a repetição do sufrágio universal, e parece-me que o PCP. quer manter ad eternum certos princípios, por via desta rigidez, porque não consegue, ao nível eleitoral, fazer triunfar certas opções. Portanto, vai buscar aquilo que eu chamaria o seu arcaísmo para defender uma constituição, já não diria eterna, mas tendencialmente eterna.

Queria dizer que considero este facto uma afloração de uma tendência muito antiga que os homens têm de querer construir para a eternidade. Todos os detentores do poder político são tentados a isso, e o PCP, como lhe resta este pequeno resto de poder político - não falo, obviamente, do poder que tem ao nível das autarquias, mas ao nível do poder central do Estado -, tem ainda uma fatiazinha e, portanto, quer preservá-la para a eternidade. É natural, todos sabemos o que são os mitos em certas sociedades de Leste, que também são pseudo-eternos; também conhecemos isso no "Portugal eternamente uno". No fundo, é o que eu chamaria "o complexo de faraó" que orgulhosamente quer construir a sua pirâmide de modo que nunca nenhuma das futuras gerações a consiga destruir. Considero também esta atitude uma tentativa, um pouco ingénua, como a de Prometeu, de roubar o fogo aos deuses. A eternidade, Sr. Deputado, ainda que seja tendencial, segundo o seu aditamento de ontem, é uma noção que é completamente alheia ao domínio da política, é uma noção religiosa que uns têm e outros não, que não tem nada a ver com a estruturação e a evolução das sociedades, que são, como tenho tido ocasião de dizer, por essência, mutáveis. Cada geração tem a sua vontade, uma geração pode mudar, todas as gerações mudam.

Queria dizer-lhe que me parece uma manifestação de um certo orgulho insensato e que muito se rirão no futuro os membros das gerações que se derem ao trabalho (e serão poucos, obviamente) de ler estas actas e outros documentos e assim constatar que houve um conjunto de Srs. Deputados (felizmente não é o caso dos Srs. Deputados socialistas) que lhes quiseram impor determinados modelos de sociedade e certas ideologias que a vontade popular já no seu tempo tinha repudiado em sucessivos actos eleitorais! A geração que aí está - não falo já das gerações futuras, mas da que estava na escola quando nós fizemos a Constituição - não aceita obviamente que outra lhe queira impor uma frustração democrática e um modelo de sociedade e de Estado que não são os que deseja. A posição do PCP é, efectivamente, ridícula, pois é evidente que ninguém pode tentar evitar o fluir da vontade de cada povo. Já Bernstein dizia (gosto de citações, embora o Sr. Deputado António Vitorino não goste), ele que foi o homem do movimento: não há cristalizações possíveis, o objectivo é nada, o movimento é tudo.

Se me permitem ainda, uma vez que se trata do último artigo nesta primeira leitura, e na segunda serei muito mais breve, gostaria de referir, para além de todos os pensadores social-democratas, desde Bernstein para cá e sem estar a mencionar nomes, uma outra corrente de pensamento que me é muito cara e que está consubstanciada naquilo que o papa João Paulo II disse há poucos dias, em Estrasburgo, perante o Parlamento Europeu: o Estado, o poder político, a sociedade, pertencem ao quadro mutável e sempre perfectível deste mundo; nenhum projecto de sociedade pode atingir aquilo que ele chamou a perfeição escatológica sobre a Terra - os messianismos políticos desembocam quase sempre nas piores tiranias; e acrescentou ainda que "as estruturas que as sociedades se dão não podem valer de uma forma definitiva", acrescentando mesmo: não valem, nunca, de uma forma definitiva - elas não podem dar, por elas mesmas, todos os bens

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a que o homem aspira e não subsistem e não se podem substituir à consciência do homem nem à sua eterna procura da verdade e do absoluto.

Em conclusão, é perfeitamente absurdo tentar manter esta rigidez que politicamente o povo vem desmentindo em cada acto eleitoral e vai continuar a fazê-lo. Portanto, aquilo que os Srs. Deputados do PCP queriam era, a não ser que queiram ser mumificados...

O Sr. José Magalhães (PCP): - É a nova edição do Tutankhamon, já percebi. Não diga mais!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas se não quiserem ser mumificados em vida...

O Sr. José Magalhães (PCP): - É a praga de Ramsés II!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): -... têm de aceitar que para as sociedades do nosso tempo aquele é um espartilho insuportável e que tem de ser eliminado o mais rapidamente possível.

O Sr. Presidente: - Havia duas ou três inscrições para perguntas...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Os Srs. Deputados Raul Castro, Almeida Santos e eu próprio. Tudo o resto é perfeitamente intercambiável.

Vozes.

O Sr. Presidente: - Em todo o caso, ainda não tinha visto o Sr. Deputado Raul Castro, mas tenho muito prazer em registar a sua presença. Dou a palavra ao Sr. Deputado Almeida Santos, depois ao Sr. Deputado Raul Castro e por fim ao Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Reconheço que esta Constituição teve um carácter, em parte, compromissório. Mas eu perguntava a V. Exa. se concorda ou não em que este foi o artigo menos compromissório de toda a Constituição. Se bem juízo, este artigo nasceu de, num belo dia, ter entrado no local onde estava a ser redigida a Constituição o deputado Jorge Miranda que disse: "Esquecemo-nos dos limites materiais!" E trazia uma proposta de artigo sobre os limites materiais. Não estou a ver no Jorge Miranda um espírito castrense! Não estou a vê-lo vinculado a compromissos com o MFA. Dá-me, pois, a impressão de que este artigo não teve mesmo natureza compromissória! O resto, em parte, teve, mas este não. Pergunto se isto é ou não exacto.

Segundo: também não vejo bem como é que concilia a sua convicção de que votou no pressuposto da revisibilidade, sobretudo se for uma revisibilidade como me parece entendê-la. Não ouvi a primeira parte da sua intervenção, mas ouvi-o ontem. Diz-se: "As leis de revisão terão de respeitar." Ora, isto tem de ter um significado qualquer. Quem redige um texto, quem o aceita e quem o vota tem de extrair dele um concreto entendimento.

Que não se interprete este artigo no sentido da sua eterna imutabilidade, estou de acordo. No entanto, o que também é verdade é que não puseram cá "cada lei de revisão", mas, sim, "as leis de revisão". O melhor entendimento gramatical é "todas as leis terão de respeitar". É evidente que a imutabilidade seria absurda. Se, de repente, a vida mudasse - e ela muda sempre! -, a Constituição ficaria em desacordo com ela. Nessa altura teria de vir o tal pelotão de soldados, onde os juristas baixassem os braços.

O que gostaria de lhe dizer era o seguinte: estou de acordo em que, em teoria e em tese, quanto mais programática for uma constituição menos rígida deverá ela ser. No entanto, suponha que, como a nossa, ela é, simultaneamente, programática e rígida. Quid júris? Se esse erro está consagrado no texto constitucional, o que é que o Sr. Deputado sobrepõe? Sobrepõe o programatismo ou a rigidez?

Por outro lado, não podemos falar em ultra-rigidez. Esta é uma constituição manifestamente semi rígida. Não me diga que cinco anos é uma rigidez inultrapassável. Isso é normal!

Vozes.

O Sr. Almeida Santos (PS): - É semi rígida. Mas suponha que ela é rígida. Não quero estar agora a ajustar o adjectivo. O problema que lhe coloco é o seguinte: suponha que, por erro, por falta lógica, por inadequação, a Constituição é, na verdade, as duas coisas. Quid júris? Vamos dizer "este artigo está aqui; teríamos, em princípio, de o respeitar; mas como entendemos que a Constituição é programática não teremos de o respeitar coisa nenhuma"? É evidente que o artigo 290.° é revisível. Já assim o entendíamos na última revisão. Mas, na altura, não havia uma aproximação de ruptura com a realidade. Só que agora o caso é diferente.

Não há dúvida de que o artigo 290.° tinha de ter um conteúdo no vosso espírito, como o teve no espírito do Jorge Miranda. Não sei quem é que foi o autor da introdução das "organizações populares de base", mas penso que não foi o Prof. Jorge Miranda. O que não passa pela cabeça de ninguém é que os legisladores constituintes tenham considerado estruturantes as organizações que estavam definidas no texto como simples associações de moradores.

É evidente que essas matérias são revisíveis. A revisibilidade significa que é um artigo igual aos outros e que pode ser revisto no decurso do mesmo processo de revisão? Então, como é que leu, como é que interpretou, na altura, a expressão "as leis de revisão terão de respeitar"? Respeitar o quê? Não terão de respeitar nada, porque, afinal, são normas iguais às outras? O que está aqui é como se não estivesse? As leis de revisão constitucional não terão de respeitar nada? É isso que cá está? Penso que é assim que o Sr. Deputado interpreta este artigo. Se lê a expressão como a gramática manda, então tem de haver uma qualquer margem de respeito. Qual é? É no mesmo processo de revisão alterar este como se podem alterar os outros? Não pode ser!

Tudo isto vem legitimar a nossa tese da dupla revisão.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

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O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, desejaria formular algumas perguntas ao Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Deputado insistiu muito - o que é compreensível - em atrelar o projecto do PSD ao do PS e afirmou que o Partido Socialista também não defende os limites materiais de revisão. Pergunto-lhe se tem presente uma passagem do preâmbulo do projecto do PS que diz: "respeitam-se, sem complexos, os limites materiais de revisão."

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Sr. Raul Castro (ID): - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não disse nada disso, Sr. Deputado. O que disse foi que o projecto do Partido Socialista propunha-se, pela primeira vez, rever o artigo 290.°, o que é diferente.

O Sr. Raul Castro (ID): - O artigo 290.° é o que estabelece os limites materiais de revisão. Ora, é a propósito do artigo 290.° que estamos aqui a travar esta discussão.

O Sr. Deputado congratulou-se com o facto de haver três projectos, o do PS, o do PSD e o do CDS, que não respeitavam esses limites.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não, Sr. Deputado. O que disse foi que, pela primeira vez, havia três projectos a propor a revisão do artigo 290.°

O Sr. Raul Castro (ID): - Não é isso, Sr. Deputado. Há uma diferença entre os três projectos. O projecto do PS defende expressamente a teoria da dupla revisão. Portanto, segundo esse projecto, só numa futura revisão é que se poderiam alterar alguns dos limites. Os outros dois projectos alteram, desde já, os limites. Portanto, há realmente uma diferença. Embora o esforço do Sr. Deputado seja nesse sentido, não se pode incluir no mesmo rol os três projectos.

O Sr. Deputado também falou aqui da vontade do povo e da Constituição. Gostaria que me explicasse o seguinte: falando tanto o Sr. Deputado no povo, por que é que no projecto do PSD essa palavra é eliminada, como, por exemplo, na alínea c) do artigo 9.° e no n.° 1 do artigo 10.°, e substituída pela expressão "cidadãos"? Como o Sr. Deputado se mostra tão preocupado e tão amigo do povo português, tenho dificuldade em compreender a razão de ser desta modificação.

O Sr. Deputado também disse que o projecto do PSD representa um compromisso com o pluralismo político. Ora, a verdade é que o PSD elimina de entre os limites materiais de revisão o da alínea O do artigo 290.°, que é exactamente o que consagra o pluralismo da expressão política. Portanto, esse limite não se encontra na disposição relativa aos limites materiais da revisão do projecto do PSD. Ele foi eliminado pelo PSD. Tenho dificuldade em perceber como é que o Sr. Deputado se mostra tão enérgico defensor do pluralismo político e depois o elimina como limite material de revisão.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente, Almeida Santos.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Pedro Roseta trouxe aqui uma grande novidade, ou seja, a revelação de um facto secreto. Quanto ao mais, ofereceu o mérito da história, o mérito dos autos, o que é uma coisa sempre legítima e, seguramente, de variável utilidade. Em todo o caso, a grande revelação que nos trouxe foi a de que o acordo de revisão constitucional tinha nesta matéria, afinal de contas, um terceiro parceiro oculto, o CDS! E nós não suspeitávamos disso!

Risos.

Aliás, foi antes da aparição do Sr. Deputado Narana Coissoró nesta reunião. Este evento foi anterior a isso.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - A revelação deixou-me um tanto estupefacto porque, tanto quanto pude estudar, o acordo de revisão constitucional não abrange este artigo. É uma das suas características. O acordo não abrange nos seus diversos preceitos, nos seus diversos parágrafos, nas suas diversas orações, nas suas diversas asserções a questão dos limites materiais de revisão. Suponho que, descontada a parte em que o Sr. Deputado Pedro Roseta quis fazer um pouco de vantagem do impacte desta revelação que nos fazia, aquilo que terá querido sublinhar foi tão-só que o Partido Socialista, ao contrário do que ocorreu em 1982, aceitava alterar o artigo 290.° e que o CDS propunha o que propunha em relação aos limites materiais de revisão. Notável constatação!

Risos.

Ditas as coisas assim, o grau de inovação é nulo. Sucede, porém, que o significado da proposta do Partido Socialista é extremamente relevante. Sobre isso não me pronunciaria agora. Reservaria o debate sobre essa matéria para outro momento e suspendo algumas interrogações que gostaria de deixar em relação àquilo que ontem foi dito pelo Sr. Deputado António Vitorino e àquilo que hoje seguramente será dito ainda pelo Sr. Deputado Almeida Santos.

Perguntar-se-á então o que é que resta perguntar se dito está o que ficou dito. Se o Sr. Deputado Pedro Roseta disse, em conteúdo inovatório, aquilo que eu acabei de resumir, o que é que há a perguntar?

Apesar de tudo, há alguma coisa a perguntar porque, creio, o Sr. Deputado foi longe de mais. Vou deixar inteiramente de lado aqueles aspectos que poderíamos considerar mais fulgurantes ou, realmente, mais artificiais. É o caso daquilo a que poderíamos chamar "a lei de Roseta", que se enuncia assim: "Quem quer programa flexibiliza, quem rigidifica renuncia a programar." Parece-me que é uma afirmação absoluta, não apodítica, exagerada, fruto mais da paixão, da conjunturalidade e de um certo vezo à Constituição do que uma elucubração científica que mereça o nome de uma "lei de". Não será alguma coisa que se assemelhe, por exemplo, à lei de Newton! Soa a oco esta tentativa de dizer afinal: "Uma constituição programática não pode

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ter limites materiais de revisão." O Sr. Deputado há-de admitir que as constituições não nascem para morrer, ao contrário dos homens - e mesmo em relação a esses a questão é bastante discutida!

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Têm uma certa aspiração à não destruição, à sobrevivência.

Vozes.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, V. Exa. estranha esta aspiração? Ela é perfeitamente normal. V. Exa. ignora certamente a aspiração expressa pelo Prof. Cavaco Silva de transformar o pico em planalto? É uma declaração feita após umas eleições conjunturais e num momento histórico alto da vida do PSD. Só isso! Sr. Deputado, pense então no que é uma constituição, instrumento reitor das sociedades e dos Estados, tendendo a exprimir determinados princípios, a plasmar determinadas opções e a dirigir a própria evolução das sociedades. Essa aspiração a uma normalização, a uma aplicação, a um não suicídio é alguma coisa que a vida dos povos e a história das constituições demonstra ser recomendável, a não ser que as leis fundamentais se assumam como realidades para destruição ou para não serem cumpridas (é o caso do programa do PSD!).

O que me surpreendeu mais na sua intervenção foi que o Sr. Deputado sentiu necessidade de dizer esta coisa espantosa: "A identidade desta Constituição é a que está no projecto do PSD. O PSD condensa no seu articulado aquilo que é a identidade da Constituição."

Desafio o Sr. Deputado Pedro Roseta a encontrar nesta sala consenso maioritário para essa sua afirmação! O Sr. Deputado começou o seu discurso com um sorriso larguíssimo, que encheu a sala de lês a lês, e afirmou que havia no projecto de revisão constitucional do PS o que há no projecto do CDS o que também lá se lê e no projecto do PSD o que também se topa lendo-o. Em todo o caso, desafio-o a encontrar nesses projectos a coonestação ou a corroboração da sua afirmação de que a identidade está na redacção proposta pelo PSD para o artigo 290.°!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas é a minha opinião, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É, seguramente, uma opinião "qualificada" e "responsável", o que me leva a fazer a seguinte pergunta: aonde é que V. Exa. encontra nesta sala os sins que corroborem essa afirmação?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E onde é que V. Exa. encontra consenso para as suas afirmações? V. Exa. não consegue nenhuma maioria!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, encontro, desde logo, esse consenso no seguinte:

d) Ó meu grupo parlamentar repudiou essa teoria, essa posição;

b) O Grupo Parlamentar do Partido Socialista disse em relação à vossa proposta do artigo 290.° aquilo que o diabético não diz da glicemia;

Risos.

c) O CDS tem em relação à vossa proposta do artigo 290.° algumas reservas, que ainda pode enunciar. Tenha esperança, Sr. Deputado! Não lhe parece bastante?!

Vozes.

O Sr. José de Magalhães (PCP): - Segundo aspecto: o Sr. Deputado Pedro Roseta introduz não uma "lei de Roseta", mas, sim, uma "lei de distinções", que é extremamente curiosa. O Sr. Deputado agarrou nas normas do artigo 290.°, correu-as na passerelle e começou a dizer: "esta não", "esta está demasiado usada", "esta não está usada", "esta pode ser", "aquela sai", "aquela está nua, fora", etc..

Risos.

Não encontro legitimidade para o Sr. Deputado Pedro Roseta estabelecer essa triagem de manequins nas várias alíneas do artigo 290.° Gostaria de lhe perguntar qual é o seu critério. Por que é que o PSD - deixo de lado a questão da fiscalização da inconstitucionalidade por omissão - considera que são normas que não devem figurar nos limites materiais de revisão e suprime, tira certas alíneas do seu articulado? O PSD suprime a independência dos tribunais; o PSD suprime a fiscalização da constitucionalidade, por acção ou por omissão, de normas jurídicas; o PSD suprime as normas sobre o pluralismo de expressão e organização política, incluindo partidos políticos e direito de oposição democrática; o PSD suprime o sufrágio universal, directo, secreto e periódico na designação dos titulares electivos dos órgãos de soberania e das regiões autónomas e do poder local, bem como o sistema de representação proporcional; o PSD suprime a planificação democrática da economia; o PSD suprime o princípio da apropriação colectiva; o PSD suprime o direito dos trabalhadores das CTs e das associações sindicais; o PSD suprime os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, que são reduzidos a direitos fundamentais como tais. Face a isso, o PSD pode, talvez, dizer: "Então os senhores não repararam que há uma expressão riquíssima contida no articulado do nosso projecto, que reza os princípios essenciais da democracia e do Estado de direito democrático, expressão que condensa em si tudo o que está e não está no artigo 290.° e que tem a vantagem de dizer, simultaneamente, é que está e não está no actual artigo?"

Sr. Deputado Pedro Roseta, estamos a fazer hermenêuticas e o PSD substitui um conceito expresso, um conjunto de normas expressas, minuciosas e desenvolvidas por uma noção genérica e um conceito relativamente indeterminado. As normas que suprimem dizem respeito a coisas tão fundamentais, como, por exemplo, ao pluralismo de expressão e organização política, incluindo a questão do direito de oposição democrática, à representação proporcional, etc.. Fazem um carrossel de mutilações e entendem que o vosso amputado define rigorosa e identitariamente a Constituição da República, que não é beliscada, que não há uma ruptura?! Gostaríamos de perceber o critério. Como é óbvio, não aceitamos a vossa conclusão.

Em relação à questão de saber se esta é "a última originalidade" da Constituição da República Portuguesa ou se ainda há mais, eu alerto o Sr. Deputado Pedro Roseta para as declarações feitas pelo Sr. Presidente do

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Governo Regional da Madeira e pelos seus colegas de bancada. Esses encontram na Constituição dezenas e dezenas, legiões de originalidades, que é necessário matar. V. Exa., se calhar, está recuado. Daqui a cinco anos talvez venha dizer o contrário!

Por último, gostaria de o tranquilizar quanto às nossas pretensões "faraónicas", "tutankhamónicas", "ramsézicas" ou o que V. Exa. entender. Não as temos! Apenas nos recusamos a corroborar, a coonestar ou a facilitar um constituicídio. Distinguimos bem uma revisão constitucional de um constituicídio. Que V. Exa. não distinga é apenas evidenciador do projecto político do PSD!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, gostaria, desde já, de me demarcar das diversas vocações de eternidade que foram enunciadas.

Na sequência da intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos, gostaria de dizer que não me parece haver qualquer dissonância entre as normas programáticas e a rigidez constitucional, que não é de normas mas, sim, de princípios. A Constituição, como um todo, é uma norma programática ou é uma norma programática integrada, também, por normas programáticas, na medida em que estas são "normas de aplicação diferida, imediata, que se dirigem ao legislador ordinário, na dependência do qual fica o exercício de regras de concretização". Portanto, o facto de ser programática significa que há regras de concretização que supõem aplicação, o que não tem rigorosamente nada a ver com os princípios. Os princípios, enquanto existirem, devem ser cumpridos. O Sr. Deputado Pedro Roseta citou o Prof. Jorge Miranda. Dele também valeria a pena lembrar que as normas do artigo 290.° - e é essa a perspectiva que o PS adoptou - podem ser alteradas por aditamento, emenda ou diminuição de qualquer alínea e podem até ser suprimidas. Só que, se as normas materiais correspondentes não sofrerem, por seu turno, alteração, nem por isso se quebram os princípios constitucionais. Isto é, os princípios enquanto existem valem, são lei, e a lei enquanto existe é para se cumprir. Aliás, recordava que o artigo 290.° foi votado pelo poder constituinte originário - que V. Exa., como membro personalizado, integrou - por unanimidade, salvo duas alíneas que foram votadas contra, uma delas com abstenção e outra com o voto contra do CDS.

Na altura, em termos que me parecem não ser irrelevantes, dois deputados do PS propuseram uma alteração que, aliás, enuncia, de forma absolutamente clarificadora, o sentido desse preceito. Foram os deputados António Esteves e José Luís Nunes, tendo o primeiro proposto que ficasse a seguinte redacção no pórtico do artigo 290.°: "As leis de revisão não poderão afectar os seguintes princípios: [...]" E sublinho: "As leis de revisão não poderão afectar." O deputado José Luís Nunes continua este sentido, dizendo: "As leis de revisão não poderão afectar os seguintes princípios e matérias [...]" No entanto, digamos que o sentido interpretativo e autêntico dessa norma parece distanciar-se - e daí o pedido de clarificação ao Sr. Deputado - do entendimento que acabou por produzir na sua intervenção de há pouco.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Sr. Presidente, devo dizer que não ouvi a intervenção do Sr. Deputado Pedro Roseta mas que, certamente, não posso aceitar que tenha dito aquilo que aqui ouvi depois. Conheço-o de velha data, tenho por ele uma grande estima e admiração, sei o que diz e o que nunca dirá e, naturalmente, não posso aceitar aquilo que ouvi como tendo sido dito por ele, pelo menos até prova em contrário.

No entanto, devo dizer, quanto à afirmação do Sr. Deputado Raul Castro, que o CDS não é contra a dupla revisão do artigo 290.° O grande propósito que tivemos ao apresentar a nossa proposta foi o de respeitar a dupla revisão porque, se não a respeitássemos, o nosso projecto seria completamente diferente do que foi apresentado. Para nós, a dupla revisão ou os chamados limites materiais não são um muro intransponível do que está estabelecido, no sentido de os preceitos não poderem ser tocados e de que aquilo que está estabelecido o está para toda a eternidade. Ouvi nesta Assembleia dizer que a Constituição é como as pirâmides do Egipto, que duram para todos os séculos. Quem o disse foi o Sr. Deputado Vasco da Gama Fernandes, nos momentos de maior entusiasmo, em 1976. E foi por isso que, quando agora falaram de faraónicos e "tutankhamónicos", me recordei desta afirmação de que a Constituição de 1976 era como uma pirâmide do Egipto. O facto é que não o é, pois tem muitos caminhos por onde ir, não estando no meio do deserto. Para nós, o princípio da dupla revisão é de respeitar, mas de respeitar inteligentemente. Isto é: desde que seja mantido aquilo que consideramos ser o conteúdo essencial que não pode ser afastado nesta revisão, tudo pode ser modificado.

No entanto, pode perguntar-se: qual é para nós o núcleo essencial? Poderemos fazer um debate no sentido de saber qual é o núcleo essencial das normas que não podem ser modificadas nesta revisão; pode essa questão ser sujeita a debate. A afirmação, tout court, que o Sr. Deputado Raul Castro fez, de que o CDS desrespeita o artigo 290.°, é que é manifestamente errada e parte de quem não leu o nosso projecto (e acredito que não o tenha feito só pelo facto de ser o do CDS). Se V. Exa. tivesse o cuidado de ler o nosso projecto, não faria tal afirmação - e rendo homenagem ao seu espírito de jurista e de inteligência, pois também sabe distinguir o trigo do joio.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (ID): - Sr. Presidente, em face do que acaba de ser afirmado, penso que nem sequer é preciso utilizar o direito de defesa para ter o direito de dizer alguma coisa. É evidente que não está em causa ter lido ou não o projecto do CDS e só por graça - em que o Sr. Deputado, de facto, é fértil - é que posso admitir que tenha dito isso. O que eu disse e continuo a dizer é o seguinte: não há identidade entre as posições do CDS e do PSD, por um lado, e a do PS, por outro, quanto à dupla revisão, pelo menos naquilo que o PS diz que é a sua intenção. E porquê? Porque, para lá de alterar limites materiais de revisão, o CDS

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no texto do seu projecto insere propostas de alteração que são contrárias a limites materiais de revisão. Isto não é dupla revisão! É revisão imediata, passando por cima dos limites materiais, o mesmo acontecendo com o projecto do PSD.

Para mim é isso que está em causa. O projecto do PS diz: nós defendemos a dupla revisão e, consequentemente, agora, alteramos limites materiais para, numa futura revisão, virmos com normas de fundo nesse sentido. Os projectos do CDS e do PSD, além de alterarem, e alterarem abundantemente, suprimindo limites materiais, introduzem propostas de alteração de fundo que vão, desde já, contra os limites materiais. Ora, isso não é, de resto, para mim - e penso que para ninguém - a dupla revisão.

O Sr. Presidente: - Em todo o caso, é uma questão de grau. Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Julgo que houve aqui alguns enganos, parece que cenas pessoas não perceberam a minha intervenção e daí este quiproquó sobre o CDS, que não vinha a propósito. Se o Sr. Presidente me permite, resolvo já esta questão antes de passar às respostas.

Eu não disse, de modo algum, que havia uma coincidência - e o Sr. Deputado Raul Castro deve ter percebido mal - entre a nossa proposta e a do PS ou mesmo a do CDS. O que aconteceu é que me congratulei somente com este facto político essencial de haver três projectos que querem rever o artigo 290.° Nós estamos numa assembleia política e não numa academia jurídica a discutir teorias como a da dupla revisão. Temos um mandato político. Os meus eleitores deram-me este mandato e eu, no uso dele, constato este facto: pela primeira vez há três projectos que propõem alterações a este artigo. Por consequência, aquilo com que me congratulei foi com a possibilidade de, pela primeira vez, ser revisto este artigo. Mais nada!

Devo dizer ainda que não acrescentei que o PS ia mais ou menos longe do que nós. Ou que nós revíamos já princípios e o PS não. Foi imaginação sua e também do Sr. Deputado José Magalhães. Se o Sr. Deputado entende que, tirado isso, eu disse pouco, tenho-lhe a dizer que disse aquilo que entendi dever dizer. Houve até alguém que disse que eu teria falado muito! Por amor de Deus! Comparado com o que o Sr. Deputado José Magalhães aqui tem falado, devo ter falado pouquíssimo!

Parece-me realmente ultrapassar os limites da decência dizer que só eu é que falei muito! São afirmações que não se podem levar a sério, sobretudo quando temos aqui um recordista que só pede meças ao Sr. Deputado João Camoesas!

Mas, esclarecido este ponto e sossegados todos os partidos, inclusivamente o Sr. Deputado Narana Coissoró, que nem sequer foi tocado pela minha intervenção, julgo ser possível passar adiante.

Para concluir, e quanto às duas outras questões do Sr. Deputado Raul Castro, lamento muito dizer-lhe que se encontram já respondidas no debate e que não vale a pena tornar a responder. O Sr. Deputado leia as actas. Lamento muito que o Sr. Deputado não tenha cá vindo, mas é óbvio que, de modo algum, posso estar agora a transcrever as actas que se encontram em vias de publicação. O Sr. Deputado fará o favor de as ler, porque é óbvio que são questões que já estão respondidas. Por exemplo, no que diz respeito ao conceito de povo, ainda ontem, salvo erro, deputados do PSD - eu próprio e outros - longamente trataram dessa matéria e o Sr. Deputado não nos vai pedir agora que expliquemos outra vez por que é que substituímos "povo" por "cidadãos" naquele artigo. Faça favor, portanto, de reler as actas.

O Sr. Raul Castro (ID): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Pois, mas não pode ignorar aquilo que se passou ontem. Caso contrário, estaremos eternamente a recomeçar, à medida que os deputados faltam ou vêm cá, multiplicando intervenções e transformando esta revisão numa revisão constitucional que leva muito mais tempo que a Constituição levou a fazer. Parece que se quer demonstrar que o poder constituinte derivado tem quase uma dignidade superior ao poder constituinte originário...

Quanto ao Sr. Deputado Almeida Santos - e depois já vamos às pirâmides do Egipto para verificarmos que, efectivamente, não fui eu que tive a paternidade dessa imagem, e não julgue o Sr. Deputado José Magalhães que escapa a mais considerações nessa matéria... -, devo dizer que me congratulei com a posição do PS. Tenho pena de que não tenha ouvido o que eu disse, mas parece-me ter sido este um enorme avanço relativamente a 1982. Em 1982 não foi feito aquilo que devia ter sido - e talvez também eu não possa falar porque me retirei e fui exercer outras funções - e os deputados não conseguiram, apesar da vontade dos meus companheiros do PSD nesse sentido, pôr fim cabalmente ao período transitório e fazerem a constatação de que, se o princípio socialista (como disse aqui mesmo ontem o Sr. Deputado Rui Machete) deixar de ser gerido e animado pela vontade popular, caduca e morre. Ora, os Srs. Deputados não constataram então que o princípio morreu e caducou.

Para nós - e o Sr. Deputado Rui Machete ontem já explicou isso à saciedade e não vão querer que eu repita o que ele disse até porque não tenho a autoridade que ele tem - este artigo é uma norma declarativa que protege princípios e não normas. Não protege as normas da Constituição e, consequentemente, acontece que podemos sustentar que todas as outras normas são revisíveis. A não ser que se entre num critério puramente subjectivo. Mas cada Sr. Deputado viria dizer que é nesta ou naquela norma que se contém o princípio que não se pode tocar. Só que, nesse caso, poderei dizer, com a mesma legitimidade, que não é essa a norma, mas outra ou outras que estão ao lado.

Deste modo, sustento é que todas as normas são revisíveis porque os princípios estão difusos em toda a Constituição. E é aqui que estamos a tocar no essencial. Eu sustento, com legitimidade, que todas as normas são revisíveis porque aquilo que esta norma protege são princípios! Esta norma é uma norma declarativa que protege princípios e, portanto, com base nela, VV. Exas. não podem, de modo nenhum, vir sustentar que o artigo tal, tal e tal não é revisível.

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O Sr. Presidente: - O que dizemos é que não são revogáveis. É a diferença entre revogabilidade e revisibilidade.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - A nosso ver, esta norma refere-se a princípios e não protege nenhuma norma em especial da Constituição. Cada uma por si pode ser revista ou revogada.

Mas gostaria ainda de dizer a todos os Srs. Deputados que me interpelaram sobre essa matéria que entendo ser tão legítimo defender a teoria da dupla revisão diferida, como o Sr. Deputado Almeida Santos, como a chamada dupla revisão simultânea. Esta última é perfeitamente sustentável e certos autores têm-na sustentado.

Queria dizer também que a declaração - e aqui respondo concretamente à sua pergunta - de intangibilidade de um regime ou de um princípio não é senão, uma vez que não se refere a uma norma concreta, um simples voto político sem força jurídica obrigatória.

É tão possível defender esta alternativa como a sua, e peco-lhe que respeite a minha posição como respeito a sua. Tem, evidentemente, um significado político; trata-se de uma norma que é tão revisível como outra e que protege princípios.

E, já agora, volto àquilo que disse há pouco, no que diz respeito ao princípio socialista. Este princípio - e não irei ler o trabalho do Sr. Deputado Rui Machete que citei há pouco - deixou de ser animado pela vontade popular, mesmo durante os governos que tiveram como base o PS. Alguns governos foram de coligação com o CDS ou com o PSD, mas um deles até não foi. Por consequência, desde a entrada em vigor da Constituição, este princípio, que não teve animação, é um princípio que caducou. Assim, posso sustentar, com o Sr. Deputado Rui Machete, que houve um caso de caducidade.

Julgo ter respondido ao Sr. Deputado Almeida Santos. Mas há ainda um ponto sobre o qual lhe queria dizer mais alguma coisa: é evidente que este artigo foi também um artigo compromissório. É muito simples dizer porquê, ou seja, por que é que houve esta preocupação de todos os deputados em consagrar estas normas e não outras. Porque, efectivamente, estávamos ainda na ressaca - depois do 25 de Novembro - de um determinado período, pelo que, pelo menos no período transitório, havia que dar uma certa ênfase a um determinado número de normas. Foi só isto! E foi por isso que cada um lá meteu aquilo que lhe parecia mais essencial.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Reconheceram, pois, que o artigo 290.° servia para garantir qualquer coisa que não podia ser revisto por esses eventuais (ou então não teria utilidade nenhuma)...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas eu não concordo com a suprapositividade e já lá vou.

Portanto, este foi o entendimento que houve na altura.

O Sr. Presidente: - O que me disseram é que era provisório.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, nunca dizem outra coisa! Agora, no acordo, também não dirão! Pode V. Exa. estar descansado!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Já o era. Agora, gostaria de referir, quanto aos princípios, que houve princípios que caducaram e que o PSD recolheu aqueles que valem, não como normas em si, mas porque são aquilo que considerou até princípios do direito natural, de acordo com as doutrinas jusnaturalistas. São princípios sem os quais a Constituição deixará de ser democrática.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Por exemplo a representação proporcional.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Por favor não seja provocatório, que não tem interesse.

Portanto, esta é a nossa concepção. Voltando ao Sr. Deputado José Magalhães e depois ao Sr. Deputado Alberto Martins. Aquele Sr. Deputado não conseguiu demonstrar que não quer eternizar a Constituição, por isso vale tudo o que disse e, como o Sr. Deputado Narana Coissoró fez o favor de recordar, não foi eu que inventei esse carácter piramidal e "eterno" da Constituição. Foram deputados que aqui passaram, não foi só o Sr. Deputado Vasco da Gama Fernandes, os deputados do seu partido têm-no afirmado por uma forma peremptória, categórica, ao longo dos anos. Quem deu este ar faraónico à Constituição, que hoje é ridículo perante as novas gerações - é por isso que V. Exa., ontem, se sentiu na obrigação de vir fazer uma ligeira, uma tendencial correcção -, foram os deputados do PCP, e alguns outros, de outros partidos. Foi isso que quis sublinhar porque não fiquei convencido, apesar de toda a sua argumentação na tarde de ontem, de uma mudança "perestroikisante", digamos assim, também neste campo. Portanto, tenho toda a legitimidade para criticar as posições do PCP e de outros deputados de vários partidos, que aqui têm passado, que tiveram uma concepção perfeitamente faraónica da Constituição e que pensavam, substituindo-se aos deuses, comandar para sempre a evolução da sociedade portuguesa e a vontade do povo português, impor-lhe "eternamente" umas determinadas cláusulas, votadas num determinado momento histórico, contra a opinião daqueles que pensam que o poder constituinte derivado tem a mesma dignidade e a mesma força que o poder constituinte originário. E sublinho que o poder constituinte derivado é um poder que é exercido por dois terços, quando aquele foi exercido, em circunstâncias peculiares de grande agitação política e ainda por cima por maioria simples, e levou a esta situação absurda de uma maioria simples conjuntural querer cristalizar a evolução de uma sociedade. Esta concepção não tem apoio em qualquer doutrina sociológica ou qualquer teoria sobre a evolução das sociedades modernas e é desmentida no quotidiano.

Quanto ao facto de dizer que nós concentrámos algumas alíneas, pois isso também já foi explicado, e é mais grave o seu caso do que o caso do Sr. Deputado Raul Castro, pois V. Exa. esteve cá e ouviu colegas da minha bancada dizerem que nós não suprimimos, obviamente, a independência dos tribunais, nem o pluralismo da expressão política porque entendemos que...

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O Sr. José Magalhães (PCP): - Suprimem.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não suprimos nada.

Estão ínsitas em outras alíneas. Nós até aditamos outra alínea, que refere: "Os princípios essenciais do Estado de direito democrático, a divisão e equilíbrio do poder." Dentro destes princípios essenciais não me venha dizer, Sr. Deputado, que as outras alíneas (tirando aquelas socialistas e outras, que eliminámos) não cabem dentro destas que nós aditámos; que não cabem dentro deste fraseado "os direitos fundamentais dos cidadãos, os princípios essenciais da democracia e do Estado de direito democrático, a divisão e equilíbrio de poderes". Portanto, nós nesses princípios não tocámos, mas fomos foi constatar a caducidade de alguns princípios, como o princípio socialista.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Independentemente dos demais?

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E no fundo por isso é que digo que há aqui uma versão diferente, mas que a nossa aproximação do PS, excepto nos casos em que constatamos a caducidade dos princípios, como o Sr. Deputado Rui Machete demonstrou, é grande. Aqui, neste caso, o que constatamos é que os doze anos que passaram levaram à caducidade de alguns princípios e não de outros. Essa é que é a grande diferença entre nós e mais nenhuma.

O Sr. Presidente: - Qual o conteúdo da expressão "terão de respeitar"? Não me disse. E uma vez mais leio "as leis de revisão constitucional [...]"

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Terão de respeitar princípios que as nossas respeitam, que a nossa revisão respeita.

O Sr. Presidente: - Mas agora caducaram...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Excepto aqueles que, como demonstrou o...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Também hão-de respeitar os que não caducarem.

O Sr. Presidente: - Resolve-se desta maneira. A Constituição diz "terão que respeitar princípios", mas o Dr. Rui Machete diz...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas, Sr. Deputado, diga-me que norma é que não pode ser tocada, que normas da Constituição, não podem ser tocadas...

O Sr. Presidente: - Todas podem ser tocadas. Tocámos em todas, todas as que estão tocámos, só que respeitando os princípios. É o que VV. Exas. não fazem.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Essa agora!

O Sr. Presidente: - O Dr. Machete redemonstrou, mas redemonstrou o quê? Defendeu uma tese, brilhantemente como sempre e respeito a defesa dele...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - E estou a louvar-me dessa tese.

O Sr. Presidente: - E eu pergunto: quem é o juiz da caducidade? Qual é o prazo da caducidade? E não me respondem. Se é assim tão fácil...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Eu respondo-lhe. No que diz respeito ao princípio socialista que é aquele que caducou, temos um ponto muito importante de plataforma de entendimento. É que estamos de acordo, excepto nesse ponto. Mas eu disse há pouco que o princípio socialista da alínea y) caducou porque deixou de estar animado pela vontade popular. Foi o povo o juiz, meus senhores, foi a vontade popular, repetidamente. Esse é que é o vosso problema.

O Sr. Presidente: - Está a dizer a mesma coisa doutra maneira, por incrível que pareça.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não, estou a dizer da mesma maneira. É que, enquanto os outros princípios, excepto aquele ...

O Sr. Presidente: - Peço desculpa por interromper...

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não costumo perturbar as intervenções de V. Exa., Sr. Presidente. Quanto aos outros princípios por nós respeitados, embora entendamos que não estão consubstanciados em nenhuma norma específica, fico contente por ter obtido de V. Exa. a declaração de que todas as normas da Constituição podem ser revistas...

O Sr. Presidente: - Não foi isso...

O Sr. Pedro Roseta. (PSD): - Não me interrompa por favor! Deixe-me continuar. Estou a usar da palavra.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas não é caso para descambar.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas a diferença está no que diz respeito à caducidade de um princípio. Esse princípio caducou, tendo o povo sucessivamente demonstrado a sua caducidade pela sua rejeição. Isso para nós é eminentemente democrático, e o que é mais importante é que aí está o problema da essência da democracia ou do formalismo, Sr. Deputado Almeida Santos. Ainda bem que estamos a ter esta discussão e que vai ficar nas actas. É que o Sr. Deputado está a apegar-se à letra da lei - foi por isso que perguntei: mas o povo é para a lei ou a lei para o povo? O povo é para a Constituição ou a Constituição é para o povo? V. Exa. avança um argumento permanente formal. Mas eu respondo-lhe com um argumento político substancial: o princípio socialista caducou porque o povo o fez caducar ao fim de doze anos. Esta é que é a grande diferença. O juiz foi o povo, que através de eleições sucessivas e repetidas...

O Sr. Presidente: - Para que o vai consultar em eleições?

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O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Se V. Exa. me diz que não caducou chegamos a este absurdo. O Sr. Deputado não o quer rever, o princípio socialista ficará eternamente na Constituição, como as pirâmides, e o povo continuará, sistematicamente, a votar contra a Constituição. Isto não tem efeito de caducidade? A vontade popular não é mais importante que um argumento formal, um argumento de técnica jurídica? Aqui é que está a única diferença entre nós.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Pedro Roseta, não lhe reconheço o direito de ser o intérprete exclusivo de vontade popular.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Mas é a minha opinião.

O Sr. Presidente: - Isto, que aqui está, é tudo vontade popular. Este calhamaço, que aqui está, é a Constituição formalizada. Não se pode deitar fora a fórmula. V. Exa. está a voltar à Constituição material e a dizer: eu sou o intérprete dela, eu digo qual é ela!

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - De maneira nenhuma, eu apenas disse que esta era a minha opinião, obviamente respeito a sua opinião também, como espero que V. Exa. respeite a minha.

Finalmente, no que diz respeito ao Sr. Deputado Alberto Martins, ficou por responder a sua segunda questão. Aqui não há problemas de opiniões, mas um problema de interpretação autêntica, que é diversa da do Sr. Deputado e meu colega constituinte José Luís Nunes. É tão-só como isso. É uma resposta semelhante à que dou ao Sr. Deputado Almeida Santos. Essa poderá ser a opinião, ao tempo, dos representantes, aliás doutos, do PS, mas obviamente não era, de modo algum, a minha opinião como deputado constituinte.

O Sr. Alberto Martins (PS): - Não foi contestada, na altura.

O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Ah! Ah! O silêncio vale! Devo dizer que talvez não tenha sido contestada neste hemiciclo, mas lá fora foi-o abundantissimamente. Para si só valem as contestações feitas nas paredes desta Casa? Não creio. A contestação do Sr. Deputado Sá Carneiro, na altura, a minha própria em sede de reuniões partidárias, com alguma repercussão na imprensa da altura, foi perfeitamente conhecida. Portanto, de modo nenhum, pelo facto de eu na altura não me ter levantado e dito "não concordo com esse ponto" não significa, obviamente, que concordasse com essa interpretação.

Em conclusão, o essencial é que houve um passo muito positivo aqui, que foi a admissão da revisibilidade do artigo. E com isso todos nos congratulamos e no fundo o problema que se põe é: houve ou não um princípio que caducou? Para nós houve, para vós não. A teoria da dupla revisão, que parece ter uma aceitação generalizada, tem que ser diferida de cinco anos. Não era esse o meu espírito como constituinte. Para VV. Exas. sim. No fundo são as duas questões que permanecem, Esta minha intervenção teve a intenção de reduzir as divergências a essas duas únicas questões. São essas as duas únicas questões que nos separam. Pode crer que respeito, obviamente, a sua posição como o Sr. Deputado respeitará a minha.

O Sr. Presidente: - Isso nunca esteve em causa. Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves, tenho o grande prazer de lhe dar a palavra.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quase me dispensaria de dizer alguma coisa sobre o artigo 290.°, visto que já vai discutido e rediscutido, mas por uma razão de princípio não me eximirei de o fazer. Em primeiro lugar porque entendo que, se há momento em que os problemas éticos andem de braço dado com os jurídicos, é o momento da elaboração da Constituição ou o momento da revisão da Constituição. E, se há momento em que esse entrelaçar da ética e do Direito nos merece alguma reflexão, é exactamente o momento da análise dos problemas dos limites da revisão. Já que estamos na maré das citações, não prescindirei de fazer aqui uma citação fundamental de um autor, que me é particularmente caro, sobre o problema da imposição, de gerações anteriores às gerações futuras, de um certo modo de estar e de um certo modo de agir. Quando em 1784 perguntaram a Kant o que era o iluminismo, Kant respondeu que o iluminismo era a saída do homem da menoridade de que ele próprio era culpado. E dizia que para impedir essa menoridade "uma época não pode coligar-se e conjurar para colocar a seguinte num estado em que se deve tornar impossível a ampliação dos seus conhecimentos, a purificação dos erros e em geral o avanço progressivo na ilustração", isto - diz Kant - "seria um crime contra a natureza humana, cuja determinação original consiste, justamente, nesse avanço". Este homem, que acabo de citar, conjugava um máximo de liberdade, a conjugação de arbítrios com o imperativo categórico, fazia a apologia da liberdade de agir e ditava os critérios morais da mesma liberdade.

Parece-me que face ao artigo 290.° (e aqui, contrariamente à expectativa do meu colega de bancada Pedro Roseta, não vou perder-me em muitas considerações técnicas) é importante fazer algumas considerações éticas e dar um contributo pessoal e partidário para esta discussão. Acho que o que é importante aqui é exactamente distinguir aquilo que não pode ser imposto às gerações futuras, isto é, aquilo que é contingente e mutável, aquilo que depende das conjunturas várias, daquilo que pode constituir uma ruptura com o discurso democrático.

Assim sendo, passaria a dizer o que entendo sobre a questão. Pode-se pôr o problema de saber qual era a intenção do poder constituinte originário, se essa intenção deve ser inteiramente respeitada e se não em que metida ela deve ser respeitada e em que medida ela deve ser modificada. Essa questão prende-se com a questão de saber, neste caso, o que é que desvirtua e o que não desvirtua o essencial da nossa Constituição. Na verdade, a nossa Constituição, como todas, corresponde a uma vontade histórica determinada. Põe-se o problema de saber se a revisão implica ou não uma revolução.

O Sr. Deputado Almeida Santos, ontem, na intervenção que fez, expôs a posição do PS. Teve, no meu entender, algum medo, que eu aqui não manifestarei

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relativamente à rigidez e à força veiculada nos limites impostos pelo artigo 290.° Dizia: "nesta revisão os limites devem ser respeitados, mas fixam-se outros limites para depois ...". A questão que ponho é: como se respeitam? O Sr. Deputado Almeida Santos explica como é que o PS respeita esses limites (aqui corro o risco de me colar à argumentação do PCP, mas direi, à frente, como é que me demarco dela). Questão prévia é a de saber se o artigo 290.° impõe à próxima revisão estes limites ou se os impõe a todas as revisões subsequentes ao texto original da Constituição. Aí o Sr. Deputado Almeida Santos não avançou nada. Mas, relativamente ao modo como o PS defendeu o esquema da dupla revisão diferida, referiu ainda que havia o respeito, presente na actual revisão, dos limites impostos no texto que temos. Dizia: "a expropriação e a nacionalização deixam de ser imperativas e passam a ser facultativas, mas ficam lá". Acho que há aqui uma alteração de qualidade, que há aqui uma verdadeira revisão. Dizia também que "a planificação económica agora já não está em toda a parte". Eu digo: se a planificação económica, do ponto de vista do PS, não está em toda a parte, então está só em qualquer parte? Está em nenhures? Há aqui uma verdadeira alteração. Dizia o Sr. Deputado Almeida Santos que "as alterações não se podem verificar por imperativo do artigo 290.°". Mas a alinea y) desaparece? Isto é, cria aqui um precedente, até do ponto de vista moral, para a alteração de todas as alíneas possíveis do artigo 290.° Dizia eu "aqui corro, de facto, o risco de me colar à argumentação do PCP". Exactamente quero prevenir que não. Se eu, neste momento, faço uma alusão à intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos, é para dizer que, da parte do PSD, não há esses medos. Isto é, não temos medo de dizer que no artigo 290.° há alguma coisa que deve ser alterada e que vamos alterá-la já.

Então qual é a nossa perspectiva do ponto de vista desta alteração? A nossa perspectiva é, antes de mais, uma perspectiva de análise da intenção do poder constituinte, mas não é uma análise meramente constitutiva da intenção do poder constituinte originário. É uma análise crítica do ponto de vista da intenção do poder constituinte originário e da sua relação com o discurso democrático. Devemos nós conformar-nos com uma vontade lotalizante do poder constituinte originário? Isto é, com uma vontade que pretenda veicular, no artigo 290.°, uma imposição à geração futura, da democracia e, mais do que isso, injustificadamente, uma imposição do modo como havemos de viver a democracia? Creio que, aqui, este critério do que deve ser entendido pela intenção originária do poder constituinte se circunscreve apenas ao discurso legitimador da própria democracia, deixando-se a liberdade de alterar aquilo que é contingente. Não podemos, do ponto de vista de um critério racional, de avaliação da matriz democrática, entender ou admitir que possa ter havido um poder constituinte originário de tal modo to-talizante que nos imponha modos de viver. Isto é, critérios contingentes que se transformem em critérios absolutos e insusceptíveis de ser alterados.

O que nos parece é que há, aqui, que ver uma questão fundamental que é esta: há uma vontade democrática ínsita nesta tarefa da revisão. Mas a questão que se põe é esta: essa vontade democrática tem ela que se sujeitar a ditames, a contingentes, impostos anteriormente? Parece-me que há aqui dois momentos fundamentais de análise da questão: aquilo que a vontade democrática pode e deve alterar e aquilo a que a própria vontade democrática tem que se sujeitar. Nesse sentido, devo dizer: parece-me indiferente a qualificação técnica de caducidade ou revogação; diria mesmo que eu assumiria sozinha a coragem de dizer que, em vez de caducidade, se poderia falar de revogação. Mas revogação de quê? Houve um acto voluntário plasmado na alternância democrática verificada em eleições prévias a esta revisão. Esse acto voluntário tem efectivamente um sentido alterante de determinadas coisas que foram e agora são escolhidas de modo diferente. Isto é, eu diria, para seguir o ponto que atrás tomei, uma vontade alterante do modo de viver a democracia, quer no plano económico, quer noutros planos da vida da sociedade política. Mas essa vontade democrática não pode alterar -e aqui o PSD assume claramente também a ideia de que há um vector fundamental de intangibilidade - os princípios a que ela própria se ordena. É que a alternância democrática ordena-se ao princípio da igualdade de participação política e às condições de liberdade em que se exerce essa participação política. Isto é, a vontade democrática como um acto voluntário (passe a tautologia) tem o dever moral de fazer uma leitura do poder constituinte originário não totalizante, isto é, não impositiva de critérios de democracia, do modo de a viver, mas não pode ela transbordar no sentido do seu auto-aniquilamento, isto é, transbordar no sentido da sua própria injustificação - tem que se subordinar à matriz liberdade/igualdade. Não vou aqui perder-me na tentação que alguns deputados têm, e que no fundo é útil, de me referir a fundamentos filosóficos para a minha exposição; eu diria que a intenção com que a faço mereceria mesmo a chamada aqui de certas tomadas de posição de princípio: são as condições de liberdade e igualdade (ou, num plano mais filosófico, seriam as condições da posição original em John Rawls, as condições do discurso racional em Habermass ou do discurso moral em Kant) que, essas sim, estão acima do próprio acto voluntário veiculado pelas eleições e resultando na alternância democrática. A questão é esta. O que se deve alterar, ou não, é fundamental mais de um ponto de vista ético do que de um ponto de vista técnico-jurídico. É indiferente a classificação de caducidade ou revogação, e é exactamente no problema da escolha da democracia, isto é, no plano da justificação, e na rejeição da imposição de modos de ler a democracia, isto é, na refutação da injustificação, que reside a incumbência fundamental do revisor da Constituição, ou seja, estabelecer aquilo que é a diferença entre o que se altera e o que se não altera - essa é a grande incumbência ética do legislador constituinte ou do legislador de revisão, e é para ela que chamo a atenção de todos os Srs. Deputados, independentemente da coloração que nos divide e com o propósito de contributo efectivo para esta discussão.

O Sr. Presidente: - Sra. Deputada, há quatro pessoas para lhe fazer perguntas, uma das quais sou eu, e faço-as já. Relativamente ao que me diz respeito, a Sra. Deputada Assunção Esteves pôs a questão em termos de que o PS e eu próprio teríamos tido medo de ir além de um certo ponto, enquanto o PSD teria sido

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muito mais corajoso. Nós não teríamos tido a coragem de revogar, o PSD acha que isso é perfeitamente revogável. Faço-lhe duas perguntas muito simples: acha que nós devemos entusiasmar os juizes a dizer que não aplicam, uma lei porque ela caducou, porque não é aplicada há 30 anos? "Há 30 anos que não tenho conhecimento da aplicabilidade desta lei, portanto é uma lei sem conteúdo, não a aplico, 'passem muito bem', absolvo este criminoso porque há 30 anos que não se comete um crime destes". Acha que devemos fazer isso? Primeira pergunta. E acha que é mesmo medo respeitar uma Constituição democrática? Devo dizer que não tive medo de não respeitar a Constituição do último regime, que não era democrática. Violei-a o mais que pude, sei lá o que eu combati contra ela! Mas tenho muito medo da violação de uma Constituição democrática, do não respeito de uma Constituição democrática. E o que VV. Exas. estão a fazer é não respeitar uma Constituição democrática numa das suas normas. E não me explicaram ainda, nem o Sr. Deputado Pedro Roseta, nem ninguém, porque é que esta norma é uma norma que não deve ser respeitada enquanto todas as outras devem. Porquê esta exclusão? Esta é a única que não merece respeito? Muito bem, digam porquê, expliquem-me! Mas não me digam: "esta deve ser revogada por acto de coragem". Porquê?

Eu perguntei há bocado ao Sr. Deputado Pedro Roseta, mas ele não me respondeu, se a leitura é "terão de não respeitar", "podem não respeitar". É isso? Mas porquê? As palavras não valem todas o mesmo no texto constitucional? Estas são gafadas? Estas, com um golpe de coragem, põem-se no cesto dos papéis e as outras não? Têm de me explicar isto, para ver se eu entendo.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

Pedia-lhe que fosse rápido, como eu tentei ser, para ver se conseguíamos ir embora. Se não terei de delegar em si a liderança dos trabalhos.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que isso será praticamente inevitável, uma vez que estão ainda em aberto as questões suscitadas pela intervenção do Sr. Deputado António Vitorino e pela própria intervenção do Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Presidente: - Não! Não vamos acabar hoje. Penso que, no próximo dia em que discutirmos os aspectos regimentais, continuaremos a discussão. Eu é que não posso levá-la para além de dez minutos, quinze minutos no máximo.

Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sra. Deputada Assunção Esteves: Gostaria de manifestar o acordo e o desacordo em relação à intervenção que produziu. E isto porque a Sra. Deputada, receando colar-se ao PCP, limitou-se a dizer alguma coisa que alguém, colado ou descolado ao PCP, sempre constatará lendo o projecto de revisão constitucional do PS, ou seja, que o PS é contraditório. E é contraditório em todos aqueles pontos que a Sra. Deputada enunciou. Portanto, o Sr. Deputado Pedro Roseta tem razão parcial em soltar gritarias de júbilo, como fez, pelo facto de o PS decair da sua posição de 1982. É que o PS decai mesmo da sua posição de 1982...

O Sr. Presidente: - Não! Muda de posição, altera-a.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Muda de posição em relação à sua posição de 1982 e muda de posição em termos de deixar em aberto o que outrem deixava fechado. Mas isso é todo um outro capítulo. Esta é a parte em que eu estou de acordo. Congratulo-me por V. Exa. estar de acordo comigo quando sublinha aquilo que é evidente na posição contraditória do PS.

A parte em que não concordo é tudo o mais. E tudo o mais é o essencial. A Sra. Deputada Assunção Esteves, na parte em que não reproduz aquilo que disse o Sr. Deputado Pedro Roseta, de outra forma, e trazendo à colação, em nome das gerações novas, Kant - o que é, pelo menos, curioso e é interessante (fico interessado por esse apelo à releitura de Kant) - fá-lo em condições que me deixam alguma perplexidade. Se bem percebi, a Sra. Deputada sustentou primeiro que, do acto voluntário do 19 de Julho, teria decorrido uma espécie de "efeito superplebiscitário" do regime constitucional do qual resultaria a legitimação de uma proposta tão derroidora como aquela que o PSD apresenta em relação ao artigo 290.° Se pudesse brotar do sufrágio a legitimação daquilo, isso seria verdadeiramente dar ao acto de 19 de Julho um carácter referendário que nem o Sr. Primeiro-Ministro, que a todos nos contempla do alto da pirâmide faraónica, ousou até hoje situar! V. Exa. fá-lo em primeira mão, mas, ou entendi mal, ou fá-lo para além de qualquer fundamento jurídico. Poderá invocar, como o Sr. Deputado Pedro Roseta, que está aqui na qualidade de deputado eleito, aliás como todos nós, e que tem um mandato político, mas deveria invocar antes três ou quatro razões jurídicas, de porte médio que sejam, para fundamentar uma tão gr anda enormidade!

Segundo aspecto: qual é o limite, Sra. Deputada Assunção Esteves? Se o limite é o fixado pela vontade do partido majoritário, de preferência mediante um acordo interpartidário que lhe dê dois terços que lhe faltem, tudo iluminado pela vontade do chefe, então a Constituição material dissolve-se numa espécie de decisionismo concreto resultante das contingências, mutações e correlações de forças e então a própria ideia de Constituição é suprimida. E, nesse caso, confesse o PSD, e confesse a Sra. Deputada, que para vós a ideia de Constituição é uma coisa perimida - a Constituição é a "vontade nossa de cada dia do chefe que haja", tal qual ele interprete a grandíssima "matriz, da liberdade e igualdade" que pode ser sempre interpretada como o PSD, por exemplo, a interpreta no seu projecto de revisão constitucional: cilindramento dos direitos dos trabalhadores, redução das liberdades, regime de excepção em relação aos direitos, liberdades e garantias, hossana à propriedade privada (direito estelar, polar e primeiro de todos os direitos, matriz de toda a panóplia dos direitos fundamentais da Constituição), liquidação da reforma agrária, nacionalizações zero, etc..! Eis em que se dissolve a "matriz da liberdade e da igualdade", tal qual é filtrada e crivada pelo espírito iluminado e provavelmente kantiano e provavelmente recheado de "imperativos categóricos" (sobretudo o da destruição de aspectos vitais da democracia tal qual foi construída em Portugal), que é imaginada pelo PSD.

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Pergunto-lhe se isso tem alguma coisa a ver com um regime constitucionalmente estruturado, em que haja uma constituição como texto normativo e como realidade abrangente, não apenas da organização do Estado, mas da própria vida social.

Último aspecto: citação merece citação. O Sr. Deputado Almeida Santos perguntou (e aí creio que pertinentemente, descontada a contradição interna do espírito do PS) qual era o significado para o PSD da famosa alusão "as leis de revisão constitucional terão de respeitar" constante do artigo 290.° É que o PSD sobre essa matéria não se define. Ou melhor, define-se mal: "terão de respeitar se possível", "respeitarão aqui e, por acaso, não ali ou acolá", "respeitarão quando possível". A citação é a seguinte:

"É evidente que uma Constituição escrita, embora pretenda ser um catalisador normativo regulador do processo político, não pode ter a pretensão de evitar facticamente uma revolução. Mas o que uma Constituição materialmente entendida exige de si própria é evitar que, a partir de um poder nela instituído como é o poder de revisão, se opere uma revolução, ou melhor, um golpe de Estado constitucional. Os limites expressos da revisão não evitam qualquer revolução, mas uma revolução legal. Isto só confirma a ideia, já salientada, de que as cláusulas de proibição de revisão pretendem assegurar a identidade histórico concreta de uma constituição através da inalterabilidade do seu conteúdo essencial e exigir, ao mesmo tempo, que um órgão derivado como é o poder de revisão esteja solidário com o regime estabelecido na Constituição. Certo ainda que as disposições de intangibilidade são uma luz vermelha frente a maiorias parlamentares desejosas de alterações constitucionais só em épocas de evolução política normal e se reduzem a pedaços de papel varridos pelos ventos da realidade política em épocas de crise. Só que, nestes casos, temos rupturas constitucionais em todas as consequências políticas mas não o auto-suicídio da ordem constitucional sob a máscara da legalidade."

Citei o Prof. Gomes Canotilho no seu conhecido estudo "O problema da dupla revisão da Constituição Portuguesa", que, sem dúvida, mantém plena actualidade.

Pergunto-lhe, por fim, Sra. Deputada, que nos apelou a todos "que nos perdêssemos em considerações éticas", qual é a ética do PSD, que aqui confessou, há dez minutos, pela boca do Sr. Deputado Pedro Roseta, que aprovou a Constituição e a aceitou com reserva mental, sonhando poder apunhalá-la quanto ao artigo 290.° na primeira esquina da história, e que acaba de celebrar um acordo, provavelmente com o mesmo espírito, com o PS em 14 de Outubro?!

O Sr. Presidente: - Pedia ao Sr. Deputado José Magalhães que continuasse a dirigir os trabalhos.

Estão inscritos para perguntas os Srs. Deputados Alberto Martins, Narana Coissoró e Jorge Lacão.

Sugeria que depois se desse a palavra à Sra. Deputada Assunção Esteves para responder, e não sei se quererão ir mais adiante.

Estão inscritos para o próximo dia, terça-feira, às 15 horas e 30 minutos, para fazer intervenções, não perguntas, os Srs. Deputados Alberto Martins, Raul Castro, José Magalhães e Nogueira de Brito.

Neste momento assumiu a presidência o Sr. Secretário José Magalhães.

O Sr. Presidente (José Magalhães): - O Sr. Deputado Alberto Martins manifesta a intenção de usar a palavra. Para que efeito?

O Sr. Alberto Martins (PS): - Para fazer uma pergunta à Sra. Deputada Assunção Esteves.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): - A minha pergunta é breve e, nalguma medida, está referenciada pela intervenção anterior do Sr. Deputado José Magalhães, com a qual estou, na parte final, de acordo. E é a seguinte: a Sra. Deputada Assunção Esteves citou Kant, mas efectivamente aderiu a Lassalle. Isto é, a Constituição é "uma folha de papel" e, segundo a nova concepção, é até uma folha de papel precário que pode ser liquidado e destruído facilmente com a primeira revoada de vento, agora chamada "costume", animado pela "nova" teoria de caducidade. Por isso, eu estaria tentado, face a este desprezo pela normatividade e pela legalidade, ainda que constitucional, â fazer uma brevíssima citação do filósofo, que fará bom proveito por certo aos cidadãos portugueses em geral, que diz o seguinte: "Na luta entre o forte e o fraco, é a liberdade que oprime e lei que protege." Neste caso, é a lei constitucional que protege os cidadãos e os fracos em geral às alterações de conjuntura que fazem da Constituição uma não Constituição. Isto é, onde é que está o texto fundador? O texto fundador pode ser, a todo o tempo, alterado por maiorias conjunturais? A Constituição é apenas uma expressão e uma decorrência de alternativas eleitorais que surjam a todo o tempo? O que é uma constituição?

Devo dizer que o seu discurso, para além dos seus aspectos e das suas formulações literárias sedutoras, é um discurso anticonstitucionalismo, anticonstituição, antinormatividade superior - daí a minha pergunta. Deixando para outro momento as questões da caducidade que foram colocadas pelo Sr. Deputado Rui Machete, relativamente ao qual tenho algumas perguntas a fazer, como já lhe disse, mas oportunamente as apresentarei.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Não é a primeira vez que os deputados do PSD invocam a alternância e o sufrágio de 19 de Julho para fundamentar as suas teorias políticas (não digo jurídicas, porque nunca teriam fundamento para serem teorias jurídicas) ou coonestar as suas propostas de revisão constitucional. Desde logo isto transtorna (para usar uma palavra simples) porque, durante a campanha eleitoral, o único partido que constantemente pediu publicamente ao PSD que definisse claramente as suas ideias sobre a revisão constitucional foi o CDS. E o PSD, através do seu líder e dos seus dirigentes, que tomaram parte na campanha eleitoral de 19 de Julho e fizeram milhares de intervenções por todo o país, jamais pronunciou uma única palavra sobre a revisão constitucional, sobre quais as suas ideias acerca da revisão constitucional e qual o quadro que iriam propor à Assembleia, que se sabia constituinte. Desafio todos aqueles que me ouvem a

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apontarem, nos discursos proferidos tanto pelo Prof. Cavaco Silva como pelas pessoas que o acompanharam durante a campanha eleitoral, uma única palavra dita sobre a revisão constitucional. Foi o CDS que constantemente pediu, através do Prof. Adriano Moreira e de outros dirigentes, que o PSD definisse claramente o que pretendia no âmbito da revisão constitucional. O único partido que no seu manifesto eleitoral dedicou uma página inteira às ideias sobre a revisão constitucional foi o CDS. No seu manifesto eleitoral o PSD não desenvolveu qualquer ideia sobre o quadro geral em que iria propor a revisão constitucional. O manifesto eleitoral do PSD está publicado, e nele pode ver-se o que o PSD pediu ao povo português sobre a revisão constitucional: nada! O argumento de que o povo português sufragou em 19 de Julho a ideia do projecto de revisão constitucional do PSD é, pois, uma rematada mistificação.

Em segundo lugar, não podemos aceitar quer a tese da caducidade, quer a da revogação. Por uma razão muito simples, que se traduz nas seguintes questões: o que é que leva a dizer que houve a revogação? Quem é que fez a revogação? Foi a frase "Vamos meter o socialismo na gaveta"? Qual foi o acto político do povo que operou a revogação de qualquer preceito da Constituição? E, então, pergunto: porquê afirmar que no artigo 290.° se operou a revogação ou a caducidade (de acordo, respectivamente, com a Sra. Deputada Assunção Esteves ou com o Sr. Deputado Rui Machete) e não percorrer todos os preceitos da Constituição e averiguar quais os artigos que nunca entraram em vigor, quais os que nunca se mostraram fortes e, consequentemente, quais os que caducaram? Por que não fazer uma lista dos preceitos que estejam revogados por vontade do PSD? Coloco estas questões para esclarecer, de uma vez por todas, de onde é que vem esta vontade do povo de, em 19 de Julho, sufragar o projecto de revisão constitucional do PSD e não o do CDS, por exemplo. De facto, o PSD não pediu o voto popular, em 19 de Julho, para mudar a Constituição nos termos do projecto que aqui apresentou, visto que só após ter alcançado a vitória é que apresentou um projecto, que afirma corresponder à sua vitória nas eleições. E isso que está em causa. Por que é que não o apresentou antes? Por que é que não definiu as linhas gerais do seu projecto? Por que é que não indicaram, antes das eleições, as linhas gerais da revisão constitucional pretendida como fez o CDS (pelo menos tinham um exemplo - o nosso - para seguir)? Embora instado a fazê-lo, o PSD não quis tomar uma posição clara sobre a revisão constitucional. E tanto assim que o PSD nem sequer tinha um projecto pronto; teve que o apresentar (depois de nós o termos apresentado) porque estava a correr o prazo para tal, e é sabido que o PSD não morria de amores pela revisão constitucional.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais do orador)... em defesa da honra do meu partido, se me é permitido.

Vozes

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado entende fazer uso do direito de defesa, neste momento?

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, foram ditas algumas coisas - e independentemente da intervenção da minha colega Assunção Esteves, que versa mais sobre matéria de fundo - que, sendo importante clarificar, merecem desde já a minha intervenção, que teria maior utilidade nesta fase.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Costa Andrade, de maneira nenhuma lhe denegaria esse direito, embora, seguramente, V. Exa. esteja ciente de que tal origina o direito a dar explicações por parte do Sr. Deputado Narana Coissoró.

Tem a palavra, o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas clarificar alguns pontos.

De facto, não é verdade que o PSD se tenha apresentado às eleições sem ter colocado nos seus documentos de campanha e propaganda eleitoral a questão da revisão constitucional. A revisão constitucional foi tema permanente e eu próprio intervim em dezenas de sessões sobre o tema, com tópicos tão importantes como as privatizações e a irreversibilidade das nacionalizações. Este tópico foi esgotado na nossa campanha e é um problema de revisão constitucional.

Também não é verdade que o PSD não tivesse um projecto de revisão constitucional e o tivesse arranjado mal o CDS apresentou o seu. Muito antes das eleições a direcção do PSD empossou uma comissão para preparar um projecto de revisão constitucional. Esta comissão, a qual pertenciam o Dr. Rui Machete, o Prof. Barbosa de Melo, a Dr.a Margarida Salema e eu próprio, foi elaborando os seus trabalhos completamente à margem daquilo que se passava no CDS. Tínhamos as nossas ideias, as quais fomos amadurecendo, e preparámos o nosso projecto.

É esta a verdade que, por ser verdade, não podia deixar de referir nesta altura.

O Sr. Presidente: - Para dar explicações, concedo a palavra ao Sr. Deputado Narana Coissoró.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Naturalmente, não assisti, como nunca assistirei, às sessões de esclarecimento que o Sr. Deputado Costa Andrade fez, mas assisti àquilo que a imprensa e a televisão transmitiram, àquilo que vale para a opinião pública. O Sr. Prof. Cavaco Silva nunca quis fazer um debate, como sucede em qualquer outra democracia. Tínhamos, pois, de atentar apenas no que dizia nas curtas intervenções que fazia, através das notícias dadas pela comunicação social, e nunca ouvi qualquer referência do Prof. Cavaco Silva à ideia geral do PSD sobre a revisão constitucional.

Quanto ao manifesto eleitoral do PSD, na medida em que está publicado e que circula por todo o lado, qualquer leitor, mesmo distraído, poderá através dele aperceber-se de quais eram as ideias do Prof. Cavaco Silva e da sua campanha sobre a revisão constitucional, qual o voto que foi pedido e os termos em que o foi para a fazer. Mas isto não significa que o PSD não apresente o projecto que quiser e tenha toda a legitimidade para o apresentar, para o fazer vencer com a força do seu voto, através dos acordos, através de negociações, através de tudo aquilo a que possa lançar mão, porque a revisão constitucional não está ba-

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seada na propaganda ou na campanha eleitoral de 19 de Julho. Mas não quero, nem posso, admitir que o fundamento do projecto de revisão constitucional do PSD se baseie no manifesto eleitoral de 19 de Julho, por não ser verdade, mas, sim, mistificação.

O Sr. Presidente: - Para formular perguntas, tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Pretendia colocar algumas questões à Sra. Deputada Assunção Esteves e confessar, à partida, o meu embaraço. Na verdade, não sei se me hei-de dirigiria Sra. Deputada Assunção Esteves na sua qualidade de jurista porque da sua intervenção resultou, a meu ver, um verdadeiro estilhaçar dos próprios princípios essenciais do Estado de direito; provavelmente, dever-me-ia dirigir à Sra. Deputada Assunção Esteves na sua qualidade de discípula de Kant, mas então entraríamos para uma outra área de discussão, seguramente, extremamente agradável no domínio filosófico mas pouco consequente no plano de acção política - e c essa que nos move. Assim, acabarei, inevitavelmente, por procurar dirigir-lhe as minhas questões na sua qualidade de deputada do PSD, o que, suponho, para além de a responsabilizar a si própria, não excluirá que, das suas afirmações, se responsabilize igualmente o partido que aqui representa.

Verifiquei que a Sra. Deputada Assunção Esteves, em matéria de Constituição, tem uma concepção - de resto, já não pela primeira vez enunciada - de que a normatividade material vale claramente acima de qualquer plano de legalidade normativa. E partindo deste pressuposto, aplica-o no momento de revisão constitucional, nos exactos termos em que o poderia aplicar no momento originário de celebração de uma Constituição. Ou seja, o que interessa é a adesão ética ou axiológica a uma certa ideia de Direito, e tudo se actualiza nesse momento existencial: a ideia de Direito prevalecente num certo momento é aquela que deve ser plasmada na Constituição. Só que esta concepção implica desbaratar completamente tudo aquilo que sejam requisitos formais de revisão constitucional e dar como não tendo nenhum alcance tudo aquilo que sejam limites materiais de revisão constitucional - são requisitos e limites que não existem na concepção que aqui nos foi referida pela Sra. Deputada Assunção Esteves. Porquê? Porque, afinal de contas, do ponto de vista da Sra. Deputada, a questão já nem sequer é política, mas, sim, do domínio da ética, do domínio da adesão a valores.

A questão curiosa consiste em procurar depois perceber como é que a Sra. Deputada Assunção Esteves plasma essa tradução ética, concretiza esses valores. Deu-nos a explicação: através, afinal de contas, desse milagre que foi o 19 de Julho, onde se plasmou uma determinada vontade política, que actualizou em termos expressivos uma certa vontade popular, dela resultando a revogação, pura e simples, de tudo aquilo que estiver em contrário à sua manifestação existencial. E, como disse há pouco - e, a meu ver, bem - o Sr. Deputado Alberto Martins, passou, rapidamente, da concepção kantiana para a conceição de Lassalle, ou seja, a da Constituição não já na lógica do imperativo ético mas na lógica da correlação de forças. Afinal de contas, mesmo que a Sra. Deputada Assunção Esteves custe reconhecê-lo, a ética traduz-se numa simples lógica de correlação de forças que, em termos políticos, significa saber quem tem a maioria para impor a tal normatividade à qual tão brilhantemente se referiu. Só que este princípio leva a que dele se tenha de retirar todas as consequências.

E uma das consequências possíveis é aquela que, de de seguida, lhe passo a referir: imagine que, em 19 de Julho, a "actualização da vontade popular" - a expressão é sua - se tinha verificado no sentido trans-personalista das concepções sociais e, portanto, também das concepções políticas. Neste momento, teria, por hipótese, uma determinada maioria, sem atenção aos requisitos formais e aos limites materiais, a produzir exactamente o seu discurso sobre a ética e a construir uma revisão constitucional que violasse por inteiro os princípios com os quais a Sra. Deputada concorda, mas que poderiam ser totalmente outros. Imagine que esta hipótese se verificava e que a Sra. Deputada era juiz do Tribunal Constitucional. Se visse vertida toda uma concepção transpersonalista, em nome de imperativos éticos (porventura outros que não os seus, mas tinia lógica idêntica àquela que aqui referiu), em nome de que valores jurídicos é que a Sra. Deputada poderia vir a decretar, em fiscalização sucessiva, a inconstitucionalidade desse texto de revisão constitucional?

Digo-lhe francamente: ou me responde sem margem para dúvidas a esta pergunta, ou toda a sua construção, por mais brilhante que seja, constitui o maior contributo para qualquer concepção totalitária que, em matéria de entendimento de Constituição, possa emergir neste ou noutro momento qualquer.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Afigura-se-me razoável dar uma resposta global às questões que me foram formuladas, deixando espaço para a reivindicação de respostas mais concretas às pessoas que não se sentirem "respondidas".

De facto, a grande inquietação comum a todas as perguntas prende-se com o ponto fundamental da minha intervenção de há pouco e a minha intenção é esclarecê-lo de imediato. Farei referência pontual a certas observações que me foram feitas por alguns deputados, para efeito de ilustração desta tese fundamental que tentarei, novamente, esclarecer.

Na minha intervenção, de modo nenhum pretendi defender, como o entenderam, por exemplo, os Srs. Deputados Narana Coissoró, Alberto Martins, Jorge Lacão e José Magalhães, a superioridade da chamada vontade democrática pontual. Pelo contrário, o que pretendi estabelecer na minha exposição foi uma distinção clara entre o domínio das alterações justificadas e o domínio das alterações não justificadas. Tentei demonstrar que existe de facto um acto voluntário, cifrado em eleições democráticas, com poderes de alteração, mas que a própria vontade manifesta nesse acto se subordina a determinados princípios, ou seja, que há limites que podem ser ultrapassados e limites aos quais se ordena o próprio "limitador" - foi exactamente nesse sentido que tentei fazer a minha exposição.

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E o Sr. Deputado Jorge Lacão conceder-me-á que, se existe momento de alguma liberdade de actuação, esse momento é o da elaboração da revisão do texto constitucional, na medida em que é a partir daqui que surge toda uma cadeia de vinculações; e temos de ter alguma liberdade. "Obviamente" - diz-me o Sr. Deputado - "deslocou a sua questão para problemas éticos". Mas eu não a desloquei, apenas disse que este acto de criação jurídica tem de estar imbuído de preocupações éticas, tem de ter um critério segundo o qual se determine aquilo que é e aquilo que não é alterável. E, Sr. Deputado, eu dei esse critério: é o da matriz liberdade/igualdade. Obviamente, essa matriz não se queda por meras considerações abstraccionistas e tem uma correlação institucional. Quando o PSD, no artigo 290.°, fala em todo um conjunto de limites, refere-se à divisão e equilíbrio de poderes, ao respeito pelos direitos fundamentais, etc.., aponta para as condições institucionais de realização dessa matriz imutável, que é a liberdade/igualdade. Estamos ambos sujeitos a essa matriz, Sr. Deputado.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Permita-me que lhe ponha uma questão, que é a tradução concreta daquela que há pouco coloquei. Faça todo o seu discurso com essa coerência, mas, em vez de dizer que, para si, a matriz imutável é a liberdade/igualdade, admita que alguém a substitui pelo binómio homem/nação, por exemplo, e continue a fazer o seu discurso.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Continuo a fazer o meu discurso, mas direi desde já ao Sr. Deputado que, a retirar-se a matriz liberdade/igualdade, inibir-se-ia a própria possibilidade de alternância democrática e de participação política de todos... Repito: aquela matriz aproveita a ambos, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Quem o diz, Sra. Deputada? Quem o garante?

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Consequentemente, não é possível retirá-la. É essa a matriz que mantemos, é essa a matriz identificadora do texto constitucional que temos (pois que é um texto democrático) e é essa a matriz pela qual vamos fazer uma leitura -e essa leitura não pode ser meramente constatativa, mas também crítica- que não admita, da parte do poder constituinte originário, uma intenção "voraz" que nos imponha não só a democracia mas também o modo como havemos de vivê-la. É essa distinção que, em meu entender, é fundamental estabelecer, razão pela qual disse ao Sr. Deputado que não era demais fazer considerações éticas no momento fundamental em que o jurídico há-de plasmar, como é óbvio, um discurso ético que, esse sim, se cifrará exactamente no binómio liberdade/igualdade.

Por outro lado, foram-me colocadas outras questões mais concretas, às quais eu não deixaria de responder. Por exemplo, o Sr. Deputado José Magalhães "atirou-me" com uma conclusão de uma obra do Prof. Gomes Canotilho sobre o problema da dupla revisão da Constituição; e eu "atiro" ao Sr. Deputado não com a conclusão do livro mas com o livro todo. De facto, o Sr. Deputado verificará que, antes de chegar à conclusão, o Prof. Gomes Canotilho, apesar de assumir claramente uma posição, revela, da primeira até à última página - e tenho claro o teor de todo o livro -, profundas preocupações "existenciais", sendo certas passagens um vaivém de palpites, em que o próprio autor tem dificuldades em chegar a essa conclusão. Podemos, até, verificar pontos do livro em que eu posso confirmar aquilo que acabo de referir.

O Sr. Presidente: - Sra. Deputada, o Prof. Gomes Canotilho seguramente ficará deliciado com o resumo que V. Exa. acaba de fazer da obra em questão...

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - A obra é óptima... exactamente por isso!

Risos.

O Sr. Presidente: - Em todo o caso, gostaria apenas que a Sra. Deputada pudesse pontuar a afirmação peremptória que fez. Justificar-se-ia que se "descolasse" em relação ao Prof. Gomes Canotilho nessa matéria, porque as posições de ambos são antitéticas. De facto, V. Exa. tem uma posição puramente decisionística, dissolve por completo a própria ideia da Constituição e, que eu saiba, que tenha percebido, que tenhamos todos entendido, o pressuposto básico subjacente às posições do autor que citou é precisamente o oposto!

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - A conclusão do autor é essa, mas o caminho que percorre é cheio de indecisões e inquietações, o que revela, Sr. Deputado, que o problema não é unívoco - contém ingredientes que estão muito para além do jurídico, ingredientes políticos, ingredientes éticos - e a sua solução é altamente difícil de encontrar. Consequentemente, não é com a simplicidade, que me relatou que o Prof. Gomes Canotilho chega a essa conclusão - era apenas isto que pretendia dizer.

O Sr. Presidente: - Sra. Deputada, V. Exa. não teve a gentileza de nos transcrever o pensamento do grande Kant; trouxe-nos uma mera citação e eu não a critiquei pelo facto de nos trazer Kant em condensado, em pílula; limitei-me a dar-lhe o benefício de ter lido Kant, ou, pelo menos, a sinopse, e a nós o benefício de percebermos minimamente o que V. Exa. disse.

Admito também que, em relação ao que o Prof. Gomes Canotilho escreveu, ocorra o mesmo - todos estamos cientes do que foi dito e do que está escrito. Aliás, teremos ocasião de continuar a discutir este ponto. Apenas me preocupou que fosse perigosamente simplificado aquilo que é, realmente, complexo. Nesse sentido, estou de acordo com a Sra. Deputada: não se deve simplificar aquilo que é complexo. Desejaria tão-só que praticasse essa bela máxima. Também não se deve pôr na boca das pessoas precisamente o contrário daquilo que elas dizem. É uma questão de ética elementar!

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Também não disse o contrário.

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O Sr. Presidente: - Faça favor, Sra. Deputada.

A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Para terminar, gostaria apenas de dizer que, diferentemente daquilo que decorreu de um certo baralhanço de algumas perguntas, a minha preocupação não foi mostrar a ilimitação do acto voluntário decorrente de eleições pontuais. De facto, foi exactamente demonstrar que esse acto é limitado, mas obviamente com poderes de adaptação e de criação de novas soluções (senão, qual seria o sentido de toda a revisão?), desde que seja respeitado aquilo que realmente não pode mudar, sob pena de se pôr em causa a própria razão de ser dessa vontade nova que se cria.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, continuaremos este debate na próxima terça-feira, às 15 horas e 30 minutos, numa reunião plenária que tem agendada como primeiro ponto o debate da questão do regulamento que há-de presidir à segunda leitura que vamos encetar em breve.

Está encerrada a reunião.

Eram 19 horas e 40 minutos.

Comissão Eventual para a Revisão Constitucional

Reunião do dia 9 de Novembro de 1988

Relação das presenças dos Srs. Deputados

Rui Manuel P. Chancerelle de Machete (PSD).
José Augusto Ferreira de Campos (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
Miguel Bento M. da Costa de Macedo e Silva (PSD).
Pedro Manuel da Cruz Roseta (PSD).
Carlos Manuel Oliveira da Silva (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
Alberto de Sousa Martins (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
Narana Sinai Coissoró (CDS).
Raul Fernandes de Morais e Castro (ID).

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I Série - Número 63

Sexta-feira, 14 de Abril de 1989

DIÁRIO da Assembleia da República

V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)

II REVISÃO CONSTITUCIONAL

REUNIÃO PLENÁRIA DE 13 DE ABRIL DE 1989

Presidente: Exmo. Sr. Vítor Pereira Crespo

Secretários: Exmos. Srs. Reinaldo Alberto Ramos Gomes
José Carlos Pinto Basto da Mota Torres
Apolónia Maria Pereira Teixeira
João Domingos F. de Abreu Salgado

SUMÁRIO

O Sr. Presidente declarou aberta a sessão às 15 horas e 25 minutos.
Deu-se conta dos diplomas entrados na Mesa.
A Câmara aprovou um voto de pesar, subscrito por todos os partidos, pelo falecimento de D. António Ferreira Gomes, ex-Bispo do Porto, tendo intervindo os Srs. Deputados Montalvão Machado (PSD), Raul Rego (PS), José Manuel Mendes (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Marques Júnior (PRD), Herculano Pombo (Os Verdes) e Raul Castro (Indep.).
Concluiu-se a votação do projecto de resolução para fixação de regras para o processo especial de apreciação e votação da revisão constitucional (n. º l do artigo 13. º), o qual foi ainda aprovado em votação final global. Produziram intervenções, a diverso título, incluindo declarações de voto, os Srs. Deputados José Manuel Mendes (PCP), Raul Castro (Indep.), António Vitorino (PS), Nogueira de Brito (CDS), Rui Macheie (PSD), Marques Júnior (PRD) e Herculano Pombo (Os Verdes).
Após leitura do relatório da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional sobre os seus trabalhos, iniciou-se o debate da revisão constitucional, tendo feito intervenções, a diverso titulo, os Srs. Deputados Marques Júnior (PRD), Costa Andrade e Rui Macheie (PSD), António Vitorino (PS), Assunção Esteves (PSD), Nogueira de Brito (CDS), Jerónimo de Sousa (PCP), Almeida Santos (PS) e Raul Castro (Indep.).
O Sr. Presidente encerrou a sessão eram 19 horas e 30 minutos.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a sessão.

Eram 15 horas e 25 minutos.

Estavam presentes os seguintes Srs. Deputados: Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Abílio de Mesquita Araújo Guedes.
Adérito Manuel Soares Campos.
Adriano Silva Pinto.
Alberto Monteiro de Araújo.
Alexandre Azevedo Monteiro.
Amândio dos Anjos Gomes.
Amândio Santa Cruz D. Basto Oliveira.
António Abílio Costa.
António de Carvalho Martins.
António Costa de A. Sousa Lara.
António Fernandes Ribeiro.
António Joaquim Correia Vairinhos.
António Jorge Santos Pereira.
António José de Carvalho.
António Manuel Lopes Tavares.
António Maria Oliveira de Matos.
António Maria Ourique Mendes.
António Maria Pereira.
António Mário Santos Coimbra.
António Paulo Martins Pereira Coelho.
António Roleira Marinho.
António Sérgio Barbosa de Azevedo.
António da Silva Bacelar.
Arlindo da Silva André Moreira.
Arménio dos Santos.
Arnaldo Angelo Brito Lhamas.
Belarmino Henriques Correia.
Carlos Alberto Pinto.
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves.
Carlos Manuel Duarte Oliveira.
Carlos Manuel Oliveira da Silva.
Carlos Manuel Pereira Batista.
Carlos Manuel Sousa Encarnação.
Carlos Miguel M. de Almeida Coelho.
Carlos Sacramento Esmeraldo.
Casimiro Gomes Pereira.
Cecília Pita Catarino.
César da Costa Santos.
Cristóvão Guerreiro Norte.
Daniel Abílio Ferreira Bastos.
Dinah Serrão Alhandra.
Domingos Duarte Lima.
Domingos da Silva e Sousa.
Eduardo Alfredo de Carvalho P. da Silva.
Ercília Domingos M. P. Ribeiro da Silva.
Evaristo de Almeida Guerra de Oliveira.
Fernando José Antunes Gomes Pereira.
Fernando José R. Roque Correia Afonso.
Filipe Manuel Silva Abreu.
Francisco Antunes da Silva.
Francisco João Bernardino da Silva.
Francisco Mendes Costa.
Germano Silva Domingos.
Guido Orlando de Freitas Rodrigues.
Guilherme Henrique V. Rodrigues da Silva.
Hilário Torres Azevedo Marques.
Jaime Gomes Milhomens.
João Álvaro Poças Santos.
João Costa da Silva.
João Domingos F. de Abreu Salgado.
João Granja Rodrigues da Fonseca.
João José Pedreira de Matos.
João Maria Ferreira Teixeira.
João Soares Pinto Montenegro.
Joaquim Fernandes Marques.
Joaquim Vilela de Araújo.
José Alberto Puig dos Santos Costa.
José Assunção Marques.
José Augusto Ferreira de Campos.
José Francisco Amaral.
José Guilherme Pereira Coelho dos Reis.
José Júlio Vieira Mesquita.
José Lapa Pessoa Paiva.
José Leite Machado.
José Luís Bonifácio Ramos.
José Luís Campos Vieira de Castro.
José Luís de Carvalho Lalanda Ribeiro.
José Mário Lemos Damião.
José Mendes Bota.
José de Vargas Bulcão.
Leonardo Eugênio Ribeiro de Almeida.
Licínio Moreira da Silva.
Luís António Damásio Capou Ias.
Luís António Martins.
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa.
Luís Filipe Menezes Lopes.
Luís Manuel Costa Geraldes.
Luís Manuel Neves Rodrigues.
Luís da Silva Carvalho.
Manuel Albino Casimiro de Almeida.
Manuel António Sá Fernandes.
Manuel Coelho dos Santos.
Manuel da Costa Andrade.
Manuel Ferreira Martins.
Manuel Joaquim Batista Cardoso.
Manuel Joaquim Dias Loureiro.
Manuel Maria Moreira.
Margarida Borges de Carvalho.
Maria Assunção Andrade Esteves.
Maria da Conceição U. de Castro Pereira.
Maria Manuela Aguiar Moreira.
Mário Ferreira Bastos Raposo.
Mário Jorge Belo Maciel.
Mário Júlio Montalvão Machado.
Mário de Oliveira Mendes dos Santos.
Mateus Manuel Lopes de Brito.
Miguel Fernando C. de Miranda Relvas.
Nuno Francisco F. Delerue Alvim de Matos.
Nuno Miguel S. Ferreira Silvestre.
Pedro Manuel Cruz Roseta.
Pedro Domingos de S. e Holstein Campilho.
Reinaldo Alberto Ramos Gomes.
Rui Gomes da Silva.
Rui Manuel Almeida Mendes.
Rui Manuel P. Chencerelle de Machete.
Valdemar Cardoso Alves.
Vasco Francisco Aguiar Miguel.
Virgílio de Oliveira Carneiro.

ítor Pereira Crespo.

Partido Socialista (PS):

Alberto Arons Braga de Carvalho.
Alberto Manuel Avelino.
Alberto Marques de Oliveira e Silva.
Alberto de Sousa Martins.

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António de Almeida Santos.
António Carlos Ribeiro Campos.
António Domingues de Azevedo.
António José Sanches Esteves.
António Magalhães da Silva.
António Manuel C. Ferreira Vitorino.
António Manuel Oliveira Guterres.
António Poppe Lopes Cardoso.
Armando António Martins Vara.
Carlos Cardoso Lage.
Carlos Manuel Martins do Vale César.
Edite Fátima Marreiros Estrela.
Edmundo Pedro.
Eduardo Ribeiro Pereira.
Elisa Maria Ramos Damião Vieira.
Francisco Fernando Osório Gomes.
Hélder Oliveira dos Santos Filipe.
Helena de Melo Torres Marques.
Jaime José Matos da Gama.
João Barroso Soares.
João Cardona Gomes Cravinho.
João Eduardo Coelho Ferraz de Abreu.
João Rosado Correia.
João Rui Gaspar de Almeida.
Jorge Lacão Costa.
Jorge Luís Costa Catarino.
José Barbosa Mota.
José Carlos P. Basto da Mota Torres.
José Ernesto Figueira dos Reis.
José Florêncio B. Castel Branco.
José Manuel Lello Ribeiro de Almeida.
José Manuel Oliveira Gameiro dos Santos.
José Manuel Torres Couto.
José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Júlio Francisco Miranda Calha.
Leonor Coutinho Pereira Santos.
Luís Geordano dos Santos Covas.
Manuel Alegre de Melo Duarte.

anuel António dos Santos.
Maria do Céu F. Oliveira Esteves.
Maria Julieta Ferreira B. Sampaio.
Maria Teresa Santa Clara Gomes.
Mário Augusto Sottomayor Leal Cárdia.
Mário Manuel Cal Brandão.
Raul d'Assunção Pimenta Rego.
Raul Fernando Sousela da Costa Brito.
Rui do Nascimento Rabaça Vieira.
Vítor Manuel Caio Roque.

Partido Comunista Português (PCP):

Álvaro Favas Brasileiro.
António Filipe Gaião Rodrigues.
António da Silva Mota.
Apolónia Maria Pereira Teixeira.
Carlos Alfredo do Vale Gomes Carvalhas.
Cláudio José dos Santos Percheiro.
Domingos Abrantes Ferreira.
Fernando Manuel Conceição Gomes.
Jerónimo Carvalho de Sousa.
João António Gonçalves do Amaral.
José Manuel Antunes Mendes.
José Manuel Maia Nunes de Almeida.
José Manuel Santos Magalhães.
Luís Manuel Loureiro Roque.
Manuel Anastácio Filipe.
Manuel Rogério de Sousa Brito.
Maria lida Costa Figueiredo.
Maria Luísa Amorim.
Maria Odete Santos.
Octávio Augusto Teixeira.

Partido Renovador Democrático (PRD):

António Alves Marques Júnior.
Hermínio Paiva Fernandes Martinho.
Isabel Maria Ferreira Espada.
Natália de Oliveira Correia.
Rui dos Santos Silva.

Centro Democrático Social (CDS):

Adriano José Alves Moreira.
Basílio Adolfo de M. Horta de Franca.
José Luís Nogueira de Brito.
Narana Sinai Coissoró.

Partido Ecologista Os Verdes (MEP/PV):

Herculano da Silva P. Marques Sequeira.
Maria Amélia do Carmo Mota Santos.

Deputados Independentes:

João Cerveira Corregedor da Fonseca.
Maria Helena do R. da C. Salema Roseta.
Raul Fernandes de Morais e Castro.

O Sr. Secretário (Reinaldo Gomes): - Deram entrada na Mesa os seguintes diplomas: projecto de lei n.º 386/V, da iniciativa do Sr. Deputado Oliveira e Silva (PS), propondo a criação da freguesia de Cortes, no concelho de Monção, que foi admitido baixando à 6.ª Comissão; proposta de lei n.º 91/V, que concede ao Governo autorização legislativa para aprovar o regime jurídico das infracções fiscais, que foi admitida baixando à 7.ª Comissão; proposta de resolução n.º 16/V, que aprova para ratificação a convenção sobre a Protecção Física dos Materiais Nucleares concluída em Viena, em 26 de Outubro de 1979; e a ratificação n.º 66/V, apresentada pela Sr.ª Deputada Elisa Damião e outros, do PS, que diz respeito ao Decreto--Lei n.º 87/89, de 23 de Março, que altera a disposição do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro, sobre a negociação colectiva das relações no trabalho, que foi admitida.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, peço a palavra para invocar o Regimento.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, ao abrigo do artigo n.º 5, alínea 1), constituem poderes dos deputados requerer e obter do Governo ou dos órgãos de qualquer entidade pública os elementos e as informações que considerem úteis para o exercício do seu mandato. Também ao abrigo do artigo n.º 16, alínea b), compete ao presidente quanto aos trabalhos da Assembleia da República assegurar o cumprimento do Regimento.

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Sr. Presidente, já em 8 de Março, através de um deputado da bancada do Partido Socialista foram solicitados ao Governo documentos extremamente úteis ao nosso trabalho - refiro-me concretamente ao inquérito da Inspecção-Geral de Finanças ao Ministério da Saúde.
Dada a importância deste requerimento, solicitava a V. Ex.ª a resposta às seguintes questões: se já chegou à Assembleia da República o referido inquérito da Inspecção-Geral de Finanças, quais as démarches que V. Ex.ª tomou no sentido de assegurar o cumprimento do Regimento e caso até agora não tenha tido resposta positiva saber qual é a resposta que o Governo deu às solicitações até agora empreendidas.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado João Rui de Almeida, o Partido Socialista apresentou um requerimento em condições normais, regimentais e formais. Como é meu hábito, e de acordo com o Regimento, enviei o requerimento ao Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares como determina o artigo 109.º do Regimento.
Tive ocasião de falar com o Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares, pelo menos uma vez, na presença dos dirigentes dos grupos parlamentares na conferência de líderes. Outras démarches da mesma natureza não tenho necessariamente de as revelar à Câmara.
Faço os esforços necessários para que o Regimento se cumpra e logo que receba a resposta ao requerimento far-lha-ei chegar no mais curto espaço de tempo possível.

O Sr. João Rui de Almeida (PS): - Sr. Presidente, certamente por lapso, não disse qual foi a resposta que o Governo deu às démarches que o Sr. Presidente entretanto fez.

O Sr. Presidente: - Desculpe, Sr. Deputado, mas eu disse-lhe que logo que tivesse resposta ao requerimento que foi apresentado pelo Partido Socialista far-lha-ia chegar no mais curto intervalo de tempo possível.
Para uma interpelação à Mesa, tem a palavra o Sr. Deputado Montalvão Machado. Como já percebi qual é o assunto, tenho pena de não poder estar na posição do Sr. Deputado Montalvão Machado.

O Sr. Montalvão Machado (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Morreu D. António Ferreira Gomes.
Notabilíssima figura da Igreja Católica, soube compreender, como poucos, a sua indispensável projecção para fora dela.
D. António Ferreira Gomes lutou durante toda a sua vida pela liberdade. Teve a coragem, que o País e o Mundo reconheceram, de enfrentar, sem medo, a ditadura que oprimia os homens e as mulheres deste nosso Portugal. Fê-lo sem medo com uma nobreza de carácter que o engrandeceu aos olhos de todos. Preocupado com os problemas sociais não hesitou em trazê-los à luz do dia em época que poucos eram capazes de o fazer.
Acusou com razão e defendeu-se também com razão. Foi um exemplo que não podemos esquecer.
Aqueles que com ele conviveram e dele foram amigos, como eu, por exemplo, ficámos mais pobres com a sua morte. Desapareceu do nosso horizonte de amigos aquele que sempre teve uma palavra certa, adequada, sensata, corajosa para as questões e as ajudas que lhe solicitávamos.
Inesquecível no trato, com palavra honesta, quer quando de acordo, quer quando em desacordo. Era respeitado e nobremente respeitável. A democracia portuguesa fica a dever-lhe muito, por ela lutou uma vida inteira.
Doente há muito, quase cego há anos, não deixou nunca de acompanhar o processo democrático português.
Homem simples, sacerdote notável, inteligência viva, carácter e qualidade intelectual fora de série, D. António Ferreira Gomes nunca se aproveitou dessas suas indiscutíveis qualidades para obter fosse o que fosse, para além da conquista da liberdade e da instauração de um democrático clima de paz e de prosperidade.
Aqui lhe deixo, Sr. Presidente, Srs. Deputados, a nossa eterna saudade e a certeza de que Portugal não esquece. Paz à sua alma!

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quero informar a Câmara, e penitencio-me por só agora o fazer, porque só agora é que tive conhecimento do assunto, que deu entrada na Mesa, às 15 horas e 15 minutos, um voto de pesar subscrito pelos deputados do Partido Socialista que está inserido no contexto das palavras que acabou de pronunciar o Sr. Deputado Montalvão Machado.
O Sr. Deputado Carlos Encarnação pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, é para interpelar a Mesa.
De uma maneira muito simples, muito singela e muita rápida, pedíamos licença ao Partido Socialista para subscrevermos o voto de pesar que acabaram de entregar na Mesa e para que ela seja transformado num voto de pesar de toda a Câmara.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Guterres.

O Sr. António Guterres (PS): - Sr. Presidente, é para dizer ao Sr. Deputado Carlos Encarnação que o fazemos com todo o gosto.

O Sr. Presidente: - Julgo que agora se seguem um conjunto de declarações sobre a morte de D. António Ferreira Gomes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Srs. Deputados, queria antes de tudo dar-vos conhecimento do conteúdo do voto de pesar.
Teve esta Assembleia ocasião de prestar, em Abril de 1982, uma digna homenagem a D. António Ferreira Gomes, por ocasião da sua resignação de Bispo do Porto.
Ao tomar conhecimento, hoje, da notícia da morte de uma tão prestigiosa figura da Igreja e da sociedade portuguesas, a Assembleia da República renova a expressão do seu muito respeito e administração pelo perfil moral e cívico de D. António Ferreira Gomes e manifesta o seu pesar pelo desaparecimento de uma personalidade que, como o ex-Bispo do Porto, representou para

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muitos portugueses - cristãos e não cristãos - um símbolo nacional, de luta pela liberdade.

Sr. Presidente, sindo ao vivo a morte de D. António Ferreira Gomes. Lembro o seu exílio e lembro que ele pode ser tomado com o exemplo daqueles que nunca se conformaram com a falta de liberdade de 40 anos em Portugal.
A ditadura foi implacável para bispos e patriarcas, para civis e eclesiásticos. D. António Ferreira Gomes pode ficar como símbolo dos resistentes a toda a ditadura, a todo o monolitismo de um regime sem alma e sem dignidade, que, não sentia a dignidade própria porque não sentia também a das opiniões alheias.
Conheci D. António Ferreira Gomes em Alba de Tormes no exílio, quando como jornalista resolvi afrontar a censura, afrontar as barreiras e fui entrevistá-lo ao Hotel Beneditino de Alba de Tormes. A censura cortou tudo. O presidente do conselho recebeu no dia seguinte os cortes mandados por mim e um mês depois D. António Ferreira Gomes entrava em Portugal por intervenção de um jornalista sem fé, mas com a crença na dignidade do Homem, protestando como nunca protestara a Igreja e o episcopado de que ele fazia parte.
D. António Ferreira Gomes entrou em Portugal um mês depois dessa entrevista, quando me avistei com ele e, ao mesmo tempo, com o actual Presidente da República que se achava também exilado. É que os dois exilados podem servir, de facto, de exemplo do que é um regime totalitário, para o qual apenas os que dizem amen contam. O resto, sejam religiosos seja agnósticos, são varridos para o exílio senão para a morte.
Diante da morte de D. António Ferreira Gomes sinto-me solidário com todos aqueles que foram vítimas do regime fascista, tenham as crenças que tiverem, seja porque motivo for. Foram vítimas do seu combate em prol da liberdade, em prol da liberdade de expressão e é isso que sinto hoje na morte do D. António Ferreira Gomes.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O meu partido teve já oportunidade, através dos seus órgãos responsáveis, de exprimir os seus sentimentos de pesar pela morte de D. António Ferreira Gomes. Nessa sequência, cabe-me agora dizer com clareza que nos associamos ao voto que a Câmara haverá de votar e que traduz, na sua singeleza, aquele que é, seguramente, um modo rigoroso de olhar o perfil de um homem que assumiu o seu tempo no combate contra a ditadura e as suas vicissitudes.
D. António Ferreira Gomes, para além de bispo inconformado, de autor de uma certa pastoral da solidariedade, sejam quais forem as divergências de leitura do mundo que entre nós e ele hajam ocorrido no passado ou se estabeleçam no plano dos princípios, constituiu uma personalidade admirável pela coragem, pela tenacidade com que foi capaz de erguer a voz e de combater.
Por isso, Sr. Presidente e Srs. Deputados, entendemos neste momento que importa lê-lo, conhecê-lo, bem como a todos quantos souberam travar no período das trevas, a luta indispensável para que Portugal fosse o que hoje começa a ser e que provavelmente muitos de nós desejamos tornar mais fecundo ainda.
Curvamo-nos, pois, respeitosamente, diante da memória honrada de D. António Ferreira Gomes, Bispo do Porto, resistente antifascista, que bem mereceu Abril e a liberdade.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em relação à informação que há pouco dei, quero aditar que o voto de pesar apresentado está agora subscrito por todos os grupos parlamentares e também pelos Srs. Deputados Independentes.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Fomos surpreendidos, tristemente surpreendidos, com a notícia que recebemos aqui mesmo no Plenário do falecimento do Sr. D. António Ferreira Gomes.
Também nos associamos ao voto de pesar que foi apresentado à Assembleia, e também não queremos calar a nossa voz nesta hora de homenagem a um Bispo da Igreja Católica que merece o consenso de todas as forças políticas representadas no Parlamento.
Entendemos neste momento ser de realçar a dimensão humana, a dimensão do Sr. D. António Ferreira Gomes como defensor da dignidade da pessoa humana na sua projecção social e política e, também, a sua dimensão como homem da cultura que soube associar um conhecimento perfeito da teologia com a ambientação, também perfeita, com a cultura do seu tempo e da sua idade.
Queremos ainda sublinhar a sua dimensão em defesa da solidariedade humana e da projecção social de todos e de cada um de nós, assim como a dimensão alcançada pelo respeito que votou sempre à sua função na Igreja Católica e a defesa que fez da dignidade não apenas da sua Igreja do Porto, mas também da Igreja Portuguesa.
São estas as dimensões e as características de grande homem e de grande português que neste momento queríamos realçar em relação a esse ilustre morto que é neste momento o Sr. D. António Ferreira Gomes.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: O PRD associa-se, naturalmente, ao voto de pesar, apresentado pelo Partido Socialista e subscrito por todos os grupos parlamentares, relativamente, à morte de D. António Ferreira Gomes.
O PRD, como refere o voto de pesar, reconhece em D. António Ferreira Gomes, para além de uma prestigiosa figura da Igreja, uma personalidade que foi um exemplo e a quem o regime democrático muito deve. Ele foi também, poderemos dizê-lo, um dos grandes precursores do 25 de Abril. Foi, como refere ainda o voto de pesar, um símbolo nacional da luta pela liberdade.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

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O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Com a máxima singeleza, também queremos associar-nos à homenagem que é prestada a um homem simples cuja única virtude foi, talvez, a de ter mantido uma íntegra coerência com a verdade dos evangelhos que anunciava.
Esta sua coerência e singeleza e o facto de ter sido um homem livre, de ter morrido livre e de ter trabalhado para que fosse livre, assim como todos os seus, que considerava seu rebanho, pensamos serem razões suficientes para nos associarmos a esta homenagem.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Subscrevemos o voto de pesar apresentado pelo Partido Socialista, porque representa, a nosso ver, um acto de justiça como derradeira homenagem prestada a D. António Ferreira Gomes.
Se outras figuras da Igreja Católica se distinguiram no nosso país na luta pela liberdade, na luta contra o regime fascista, - naturalmente que nos ocorre, por exemplo, o nome do Padre Alves Correira e de outros, - a verdade é que o antigo Bispo do Porto, D. António Ferreira Gomes, viria a transformar-se, como efeito, nomeadamente através da carta que dirigiu ao então Primeiro-Ministro, Dr. Oliveira Salazar, numa grande figura de lutador pela liberdade. Isso lhe valeu o exílio, o afastamento do País, a perseguição sistemática pelo anterior regime.
É por isso perfeitamente justo, e a ele nos associamos, o voto aqui apresentado por iniciativa do Partido Socialista e subscrito por todas as bancadas, à memória de D. António Ferreira Gomes.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de pôr à votação o voto subscrito por todos os grupos parlamentares e pelos Srs. Deputados Independentes, desejava informar a Câmara que a Mesa, reverentemente, se associa ao voto e às palavras aqui pronunciadas e que vai solicitar, no termo da votação do voto de pesar, a observação de um minuto de silêncio.
Vamos, portanto, passar à votação.

Submetido a votação, foi aprovado por unanimidade.

O Sr. Presidente: - Peço, agora, aos Srs. Deputados que observem um minuto de silêncio.

A Câmara aguardou de pé um minuto de silêncio.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, como tiveram ocasião de verificar, houve um problema com o fornecimento da energia eléctrica e os projectores têm alguma dificuldade em dar a intensidade adequada.
Em seguimento dos nossos trabalhos de ontem, vamos recomeçar pela votação com o n.º l do artigo 13.º do Regimento, relativo ao processo especial de discussão da Revisão Constitucional.
Depois da discussão e da votação deste número, passaremos à votação final global do Regimento.
Srs. Deputados, gostava de informar que não dispomos da folha de ontem com os tempos remanescentes, mas, de acordo com a memória colectiva da Mesa, os tempos que julgamos existirem - e gostaríamos de saber se há alguma objecção - são os seguintes: PSD, vinte e dois minutos; PS, dois minutos; PCP, dois minutos; PRD, 4 minutos; CDS, quatro minutos; Os Verdes, quatro minutos; e Deputados Independentes Raul Castro e João Corregedor da Fonseca, oito minutos.
Srs. Deputados, tenho o gosto de informar a presença de grupos de alunos da Escola Secundária D. Filipa de Lencastre, de Lisboa, e da Escola Secundária do Pombal, a quem cumprimentamos e saudamos.

Aplausos gerais.

Pausa.

Srs. Deputados, como continua a verificar-se uma baixa na intensidade da luz eléctrica na Sala, o que dificulta a leitura, vou procurar saber o que se passa e, portanto, interrompia a sessão por alguns momentos.
Está suspensa a sessão.

Eram 15 horas e 50 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, declaro reaberta a sessão.

Eram 15 horas e 55 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não temos inscrições para a discussão na especialidade do n.º l do artigo 13.º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado José Manuel Mendes.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Resulta das votações que ontem tiveram lugar nesta Câmara que o Regimento consagra já algumas soluções que reputámos más: votações amalgamadas, ao fim da tarde, o que permite o absentismo, por um lado, e o indescernimento, por outro, por parte de quem tem que optar; a votação final global, que consideramos, do ponto de vista técnico-jurídico, perfeitamente aberrante e constitui apenas uma forma de o PS e o PSD, entre si, se vigiarem no cumprimento do acordo que celebraram; as declarações de voto por contingente. Faltava a redução drástica de tempos para tornar o debate verdadeiramente inqualificado e, sobretudo, intrasparente.
Que ninguém tenha dúvidas: com este sistema espartilhante, bem mais do que algumas vez seria conjecturável, o PSD e o PS vão por um caminho que entendemos penumbroso - de maior penumbra do que aquela que era ambiente desta Sala antes da reparação das luzes.
Consideramos, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que foi mau que o Partido Socialista, sobretudo, no decurso das últimas 72 horas, não tivesse tido possibilidades de atender, com efectiva abertura e com senso de responsabilidade, as múltiplas diligências encetadas pelo PCP, no sentido de encontrar um quadro equilibrado de propostas concretas que viabilizassem uma discussão activa, tecnicamente frutuosa e politicamente responsabilizadora.
Pela nossa parte, iremos bater-nos, até ao fim, para que os tempos que propomos - ou qualquer coisa semelhante a eles - venham a ser aprovados. Se o não

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forem, mesmo no quadro espartilhante que se preparam para aprovar, manteremos indeclinavelmente a luta que vamos travar contra o Acordo de Revisão Constitucional lavrado entre o PS e o PSD.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo mais inscrições, dentro de momentos, vamos votar.
Solicito aos Srs. Deputados que se afastaram por interrupção dos trabalhos por falta de luz, a sua presença no Planário, uma vez que já há condições de trabalho. Peço, igualmente, aos Srs. Deputados que, porventura, estejam em reunião nas comissões, o favor de virem para o Hemiciclo.

O Sr. Deputado Raul Castro pediu a palavra para que efeito?

O Sr. Raul Castro (Indep): - Para uma intervenção, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, o Sr. Deputado.

O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativamente ao n.º 1 do artigo 13.º, estão em causa duas propostas, a que foi apresentada na conferência de lideres pelo PS e PSD, com os tempos aí atribuídos, e a proposta de alteração para o artigo 13.º, apresentada pelo Grupo Parlamentar do PCP e que é, naturalmente, uma proposta diferente daquela.
Confrontando as duas propostas, é naturalmente lícito concluir, em primeiro lugar, que há na segunda proposta mais tempo de intervenção para cada uma das forças e deputados com direito a intervir, mas é também de salientar que isso não significa que não deixe de ser respeitada a força representativa por número de deputados que tem cada um dos partidos, ou seja, cada um dos grupos parlamentares.
Com efeito, se, por, exemplo, na proposta inicial, o PSD dispõe de 16 horas e 40 minutos, na proposta que agora o PCP apresenta, passaria a dispor de cerca do dobro, ou seja, 30 horas.
Naturalmente que os exemplos podiam multiplicar--se, porque toda esta proposta, agora submetida à discussão, contempla, efectivamente, e como é natural, também o Partido Socialista que passaria de 11 horas e 40 minutos para 21 horas no debate, portanto, com um tempo muito superior.
Mas o problema assume significado especial no que diz respeito às forças partidárias mais pequenas, cujos tempos de intervenção, a vingar a proposta apresentada pelo PS/PSD, são muito limitados e que passariam a ter, também aumentos significativos através da outra proposta.
Por isso, naturalmente, iremos votar a alteração apresentada pelo PCP e fazemo-lo com este sentido: em primeiro lugar, por não deixar de respeitar a proporcionalidade que corresponde a cada grupo parlamentar e a cada um dos deputados que apresentaram projectos; por outro lado, tendo em atenção a grande importância de que se reveste este debate, porque é, digamos, o debate mais importante da presente legislatura, é o debate da Revisão Constitucional, é, em suma, o debate da lei fundamental do País e isso bem merece, julgamos nós, não só a maior clareza e transparência como a profundidade necessária, que não se compadece com tempos restritos como aqueles que constam da proposta inicial.

Aplausos do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca e do PCP.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, permito-me assinalar a presença nas galerias de grupos de alunos das Escolas Secundárias de Carnide e D. Filipa de Len-castre, de Lisboa, e ainda da Escola Secundária de Pombal, bem como os respectivos professores, a quem cumprimentamos e saudamos.

Aplausos gerais.

Srs. Deputados, a Mesa tem conhecimento de que está reunida, pelo menos, uma comissão. Solicito aos serviços que avisem os Srs. Deputados para virem para o Hemiciclo porque está próxima a votação, dado que já foi discutido na especialidade o n.º 1 do artigo 13.º
Srs. Deputados, vamos passar à votação, votando, em primeiro lugar, a proposta de substituição do n.º 1, apresentada pelo PCP. Foi distribuída pelo que é do conhecimento de toda a Câmara.
Vamos, portanto, votar, Srs. Deputados.

Submetida a votação, foi rejeitada» com o votos contra do PSD e do PS e votos a favor do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e do Deputado Independente Raul Castro

Era a seguinte:

1 - Para os efeitos previstos no presente regimento especial, os grupos parlamentares e deputados disporão de um tempo global de 92 horas e 42 minutos, assim distribuído:
PSD - 30 horas; PS - 21 horas; PCP - 15 horas; PRD - 10 horas e 30 minutos; CDS - 9 horas; Os Verdes - 3 horas; deputado Sotto-Mayor Cárdia - 36 minutos; deputada Helena Roseta - 36 minutos deputados; PSD/Madeira - l hora e 12 minutos; deputados da ID - l hora e 48 minutos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos votar o n.º l do artigo 13.º, da proposta apresentada pela Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.

Submetido a votação, foi aprovado, com o votos a favor do PSD e do PS e votos a contra do PCP, do PRD, do CDS, de Os Verdes e do Deputado Independente Raul Castro.

Era a seguinte:

1 - Para todos os efeitos previstos no presente Regimento especial os grupos parlamentares disporão dos tempos de intervenção fixados na conferência dos representantes dos grupos parlamentares, que decidirá igualmente das demais regras de organização do debate.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos passar à votação final global do Regimento relativo ao processo especial de apreciação e votação da Revisão Constitucional.

Submetido a votação, foi aprovado, com o votos a favor do PSD, do PS e do CDS e votos a contra do PCP, do PRD, de Os Verdes e do Deputado Independente Raul Castro.

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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria de formular a seguinte pergunta à Mesa: é entendimento da Mesa que há lugar a declarações de voto?

O Sr. Presidente: - Esse assunto não foi expressamente discutido, Sr. Deputado. Trata-se, porém, de uma votação final global, de acordo com o Regimento da Assembleia, é entendimento da Mesa de que neste caso há efectivamente lugar a declarações de voto.
O Sr. Deputado José Manuel Mendes pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Para uma declaração de voto, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Entendemos que acaba de consumar--se uma má obra preliminar a um processo de Revisão Constitucional que também merece um qualificativo negativo.
Sabemos que há partidos políticos com assento na Câmara que desejariam um tempo ainda menor do que aquele que acaba de ser consagrado para, se possível, se fazer apenas a votação final global ou, se possível, prescrever a ausência total de debate ou, ainda, se possível, reiterar a celebração pública de eventos preteritamente assumidos em comissão e apenas isso.
Pela nossa parte, tivemos oportunidade de nos bater, em comissão e aqui, no Plenário, por soluções que evitassem o engarrafamento de votações, ao final da tarde, por parte de deputados inteiramente alheios e até revéis ao problema geral e às soluções pontuais da revisão Constitucional; que evitassem que viesse a proceder-se, apenas, a declarações de voto por mero contingente, sem um nexo de pertinência, de ligação imediata, com a matéria que tivesse vindo a ser suscitada e apreciada; que impedissem que houvesse de recorrer-se a uma votação final global da Lei de Revisão Constitucional, que não é mais do que um expediente político, politicamente malsão.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Batemo-nos, além disso, para que, de um ponto de vista meramente adjectivo e instrumental, se tivesse chegado a opções que viabilizassem uma discussão no Hemiciclo que fosse séria, ponderada e não inteiramente manietada pela rede extremamente apertada do tempo que o PSD e o PS puderam aprovar.
Diligências fizemos num sentido inteiramente adverso ao que acaba de consumar-se. Fizemo-las e não nos arrependemos do facto. Outras faremos, no futuro, sempre que, em benefício da Constituição da República, do aprimoramento do seu texto, mas nunca da sua degradação, se coloque a necessidade de um pensar institucional acima dos interesses de mera conjuntura, porque aí está o PCP, hoje como no passado e no futuro. Isto é: coerentemente, defendendo interesses que não são apenas os mesquinhos interesses de um grupo, mas de vastas camadas do povo português.
Este é o início de um debate que dá verdadeiramente o sinal das grandes questões em que todos estaremos separados, independentemente daquelas muitas em que, por razões técnicas ou mesmo de natureza política, pudermos votar conjuntamente.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta declaração de voto não é, como alguém inadvertidamente poderia pensar, um grito de alma. É ainda um alerta. A Revisão Constitucional não está consumada. Pensamos que é ainda possível obstar a que decisões muitos más que estão ensejadas venham a parturejar-se tal qual se definem. Por isso nos bateremos.

Aplausos do PCP.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos favoravelmente em sede de votação final global o projecto de regimento especial de debate da Revisão Constitucional, porque, tal como em 1982, reconhecemos a necessidade de adoptar regras específicas que permitam proceder à análise séria e ponderada das propostas de alteração à Constituição.
Nunca entendemos que a seriedade e a profundidade dos debates fossem obra de referenciais fetichistas a proporcionalidades de tempo ou a espaços de tempo. Estamos em crer que, tal como em 1982, também agora em 1989, o empenhamento de todos os deputados vai demonstrar que é possível, dentro destas balizas que acabaram de ser fixadas, proceder a um debate aprofundado e exausivo das alterações à Constituição.

liás, ao contrário da acusação que nos foi dirigida, demos sucessivas provas de disponibilidade de diálogo e a própria metodologia do debate foi, por diversas vezes, alterada por sugestões de vários partidos representados na Câmara. Inclusivamente, a solução adoptada quanto aos tempos é bastante diferente daquela que resultaria da aplicação ao actual quadro parlamentar da grelha de tempos adoptada em 1982.
A solução que acaba por vigorar é uma solução que se afasta dum conceito de proporcionalidade pura; é uma solução que prejudica em termos de tempo global os maiores partidos, designadamente o PSD e o PS, e que beneficia os partidos de pequena e média dimensão, como é o caso do PCP, do CDS e do PRD.
Não temos, por isso, qualquer problema de consciência quanto à lisura do debate da Revisão Constitucional e quanto à necessidade de ser feito. O Regimento contempla essas duas preocupações: lisura de métodos e necessidade de eficácia para que a revisão se faça.

Aplausos do PS e do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A nossa votação carecerá porventura, de alguma explicação.
Com efeito, votámos a favor na votação final global, embora também tenhamos votado favoravelmente a proposta de substituição que o PCP apresentou para o n.º 1 do artigo 13.º
A nossa posição é muito simplesmente explicável.
Conforme resultou, já ontem, das nossas intervenções, consideramos que no seu conjunto o Regimento

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que foi aprovado para a discussão em Plenário da revisão da Constituição respeita os direitos fundamentais dos deputados, e é o que mais se compagina com um tema que foi tão abundante e profundamente discutido em comissão parlamentar.
No entanto, não deixamos de dar razão àqueles que pretendiam alargar um pouco mais o tempo à disposição de todos os partidos, muito embora tenhamos presente no nosso espírito a argumentação do Sr. Deputado António Vitorino e o lugar paralelo a que essa argumentação se reconduziu com as soluções da Revisão de 1982. Um pouco mais de tempo, apesar de tudo, na escassez global do tempo à disposição dos pequenos e médios partidos - como lhe chamou o Sr. Deputado António Vitorino -, não seria exagerado.
No entanto, isso não era suficiente para, no conjunto, modificar a intenção e o sentido do nosso voto. Por isso, voltámos a votar favoravelmente na votação final global.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Uma breve declaração de voto, para sublinhar que aprovámos este Regimento por nos parecer que ele traduz uma medida equilibrada de regular os trabalhos no Plenário.
Importa, efectivamente, não esquecer que já houve um debate muito longo em sede de Comissão de Revisão Constitucional, feito com toda a abertura e sem quaisquer limitações de tempo. Além disso, manifestámo-nos abertos a introduzir na nossa proposta inicial de regimento todas as modificações que nos pareceram razoáveis.
Parece-nos que a solução a que se chegou é uma boa solução, a qual, sobretudo, se cotejarmos com os tempos que foram atribuídos em 1982, revela um claro favorecimento - para usar a expressão que há pouco foi mencionada pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito - dos pequenos e médios partidos e que dá amplas possibilidades de os partidos políticos expressarem, claramente e com suficiente tempo, as suas posições.
Por outro lado, parece-nos ser de acentuar que não deixa de ser significativo que quem votou contra tenha sido apenas o Partido Comunista que tem estado sempre empenhado em que, para além da discussão, importa que ela seja extremamente longa. Não podemos também deixar de estranhar que tenha sido acompanhado nesta votação pelo PRD.
Nestes termos, parece-nos que temos um bom instrumento de trabalho e que, finalmente, vamos poder começar a discutir no Plenário a Revisão Constitucional em condições favoráveis.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Votámos contra este Regimento sem prejuízo de considerarmos que o debate de Revisão Constitucional tem de ter regras específicas e até cuidamos que não é isso que está em causa, nem ninguém aqui põe em causa esse aspecto. O que está em causa são as regras específicas para este debate.
Na verdade, este Regimento, que acaba de ser aprovado em votação final global, traduz um propósito de efectuar uma revisão de afogadilho, à pressa, com objectivos que são obscuros quanto aquilo que se pretende atingir.
No horizonte perfilam-se as eleições para o Parlamento Europeu, que terão lugar no dia 18 de Junho, e, possivelmente, será esta a ligação que se pode encontrar quanto ao propósito de terminar a Revisão Constitucional antes do início do respectivo período de campanha eleitoral.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Ora aí está!

O Orador: - Mas isso não pode ser justificação para deixar de aplicar, nesta Assembleia, métodos que traduzam a intenção de efectuar um debate, necessariamente aprofundado em sede de Plenário, nem pode ser argumento contrário o facto de já ter havido um debate aprofundado na Comissão de Revisão. Trata-se agora de um outro debate, que é soberano e que vai ter lugar no Plenário da Assembleia da República. É para esse que a existência de regras, nomeadamente, as dos artigos 6.º e 13.º constituem graves travões que alteram e prejudicam a profundidade do debate. Por isso, votámos contra este Regimento.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Gostaria de fazer uma declaração de voto muito curta para justificar o nosso voto contra este Regimento.
Assim, começaria por dizer que o Sr. Deputado Rui Machete não me vai condicionar na minha intervenção, pelo facto de dizer que o PRD, conjunturalmente, está ao lado seja de que partido for, à esquerda ou à direita.
O PRD votou, na especialidade, contra três artigos deste regimento e isso foi suficiente para votar globalmente contra ele, porque entende que esses artigos são fulcrais, fundamentais.
É evidente que o PRD reconhece que, nomeadamente quanto aos tempos, se o critério alternativo fosse, face ao proposto no Regimento, o critério vigente em 1982, o PRD seria prejudicado. Assim, desse ponto de vista é beneficiado.
Mas o problema não é só um problema do tempo do PRD, é também um problema do tempo global para a discussão da revisão da Constituição.
Votámos muitos outros artigos deste Regimento, porque também entendemos que é necessário, é ajustado que, efectivamente, haja um regimento especial para o debate da revisão da Constituição e, nomeadamente, até votámos a favor de um artigo que tem em vista acelerar os trabalhos da revisão.
Não estamos contra este processo. Estamos contra um ou outro aspecto, já referenciados na nossa intervenção de ontem e sublinhados agora na minha declaração de voto, como, por exemplo, os que têm a ver com os tempos globais de debate e, fundamentalmente, os relativos à realização das votações a uma hora certa, conforme está previsto no Regimento.
São estes os pontos fundamentais que nos levaram a votar contra na votação final global.

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O Sr. Presidente: - Para uma declaração de voto, tem a palavra o Sr. Deputado Herculano Pombo.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ontem, na votação na generalidade desta proposta de Regimento, tivemos ocasião de nos abster, porque, apesar de tudo, quisemos acreditar que o bom senso bateria à posta de alguns e que algumas portas se abririam, no sentido de corrigirmos aquilo que era uma proposta perfeitamente descabida e que agora se veio a verificar que é a proposta que é aceite pela maioria desta Casa e que, portanto, vai condicionar a verdade dos debates que aqui vão produzir-se.
Santa ingenuidade a nossa! Por isso, tivemos que nos penitenciar votando agora contra em votação final global.
Gostaria ainda de fazer uma pequena referência a expressões que aqui têm sido usadas, no sentido de que os pequenos e médios partidos deveriam, de algum modo, contentar-se com a esmola que lhes é feita de mais alguns minutos para participar neste debate.
Pela minha parte, como representante do mais pequeno grupo parlamentar que tem assento nesta Casa, gostaria de afirmar que não aceito este tipo de dimensionamento em pequenos e médios partidos, porque o que aqui há são grandes ideias, grandes vontades de construir um texto constitucional que sirva para que o País possa viver livre, com dignidade e em equilíbrio.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, gostaria de assinalar à Câmara a presença nas galerias de um grupo de 20 Auditores de Justiça do 7.º Curso do Centro de Estudos Judiciários, a quem cumprimentamos e saudamos.

Aplausos gerais.

O Sr. Deputado José Magalhães, pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Para fazer uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio, que será intenção da Mesa dar cumprimento, nesta matéria e em relação a este Regimento especial, ao que decorre da. alínea f) do n.º l do artigo 122.º da Constituição. Como V. Ex." compreenderá, isso implica, evidentemente, que este Regimento não entrará em vigor antes da sua publicação no Diário da República, o que, segundo creio, sucederá oportunamente.
De qualquer modo, como é óbvio, isso não exclui que o debate se faça ao abrigo do Regimento, pois a Casa não está sem Regimento. Aliás, o Regimento até é, particularmente, construtivo, o que, segundo creio, agradará a alguns dos que aprovaram este texto.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Vitorino (PS): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: A questão suscitada pelo Sr. Deputado José Magalhães não é nova. Ela já foi suscitada na conferência de líderes e, fazendo jus à verdade, eu, antecipadamente, suscitei esta questão na referida conferência, porque, apesar de tudo, até a imaginação do Sr. Deputado José Magalhães já se vai tornando previsível.

Risos.

Como então fiz, gostaria de dizer a V. Ex.ª, Sr. Deputado José Magalhães, que a entrada em vigor da resolução que aprova o Regimento especial de debate da Revisão Constitucional não está dependente da publicação no Diário da República. Trata-se de uma norma interna cor por is, de uma norma de incidência meramente interna, cujo efeito de publicação no Diário da República é de publicidade.
Em 1982, o Partido Comunista também levantou, exactamente, esta mesma questão - pelo menos, ainda há coerência - e também nessa altura lhe demos a mesma resposta que lhe estamos a dar neste momento - neste aspecto assistimos a coerência do Partido Comunista -, ou seja, no sentido de que não é necessário que se proceda à publicação no Diário da República para que a resolução produza os seus efeitos.
Recordo que o debate da resolução do processo especial de Revisão Constitucional, no Plenário da Assembleia da República, foi travado em 7 e 8 de Junho de 1982 e que no dia 9 de Junho de 1982 o Plenário da Assembleia da República iniciou o debate das alterações à Constituição, com base no regimento que havia acabado de ser aprovado e, independentemente, de publicação no Diário da República.
Mas se se entender o rigorismo das coisas a um ponto tal, sempre se poderá dizer que nada obsta, decerto, a que V. Ex.ª, Sr. Presidente, faça as diligências necessárias para que o Diário da República de hoje publique em suplemento o texto do Regimento especial da Revisão Constitucional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, pede a palavra para que efeito?

O Sr. José Magalhães (PCP): - Para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a este propósito, gostaria de recordar à Mesa que em 7 e 8 de Junho de 1982, a alínea J), do n.º l, do artigo 122.º da Constituição não tinha a redacção que tem hoje. Sei que mesmo nos espíritos mais lúcidos a amnésia por vezes sobrevem.
Contudo, no caso do Sr. Deputado António Vitorino não tem qualquer desculpa, porque era deputado na altura e, além do mais, estudou a Constituição. Portanto, pode prever muito facilmente aquilo que qualquer um de nós lê na Constituição todos os dias, de manhã, à tarde ou à noite.

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Neste caso concreto, Sr. Presidente, a Constituição hoje, ao contrário do que acontecia em 1982, prevê, expressamente, a obrigação de publicação das normas regimentais da Assembleia da República, ou seja, de iodas as normas regimentais da Assembleia da República e não só de algumas.
Na verdade, esta norma implica uma entorse em relação ao Regimento geral, é uma excepção em relação a ele e, portanto, tal como o Regimento tem de ser publicado.
Em 1982, o Regimento geral era liberal. Hoje, desgraçadamente, é um Regimento «rolha» aprovado pelo PSD. Neste caso, tem o aplauso do Partido Socialista, mas isso é apenas um aspecto triste.
Do ponto de vista jurídico-constitucional, Sr. Presidente, creio é insuperável a necessidade de publicação.
Quanto ao debate, vamos a ele!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, os seus alunos vão chumbá-lo!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, pede a palavra para interpelar a Mesa?

O Sr. António Vitorino (PS): - É sim, Sr. Presidente!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Gostaria apenas de salientar que o que o Sr. Deputado José Magalhães diz é verdade, isto é, a...

Risos do PCP.

Também diz verdades!

Risos do PCP.

Contudo, embora dizendo uma verdade não tem razão, e aqui reside a diferença.
De facto, enquanto, a redacção originária da Constituição de 1976 não previa na alínea f) a publicação do Regimento da Assembleia da República mas previa, clara e inequivocamente, na alínea e), do n.º 1, do artigo 122.º (redacção originária) a publicação das leis e resoluções da Assembleia da República, isto é, estava contemplada a previsão constitucional da publicação de resoluções da Assembleia da República, o Regimento especial da Revisão Constitucional de 1982 foi aprovado sob a forma de resolução e começou a ser aplicado na Assembleia da República, independentemente de publicação no Diário da República.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mal!

O Orador: - Mal, mas de verdade e sem que, em meu entender, se possa suscitar qualquer tipo de entorse à Constituição.
Portanto, em 1982, cumpriu-se a Constituição, pelo que só pedimos ao Sr. Presidente que aplique agora o mesmo critério utilizado em 1982.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, reafirmando o que já disse em outro momento, gostaria apenas de salientar que a resolução aprovada vais ser publicada em suplemento do Diário da República de hoje.
Devo notar que já abordámos esta questão em outras ocasiões e, ainda ontem, aprovámos uma proposta, no sentido de se proceder à elaboração de um boletim informativo especial, o que já foi feito. Ele contém uma cópia do Regimento, onde estão incluídos todos os artigos à excepção do n.º l, do artigo 13.º, porque só hoje foi votado. Portanto, todos os Srs. Deputados já estão na posse do Regimento.
Assim, e parafraseando as palavras do Sr. Deputado José Magalhães: quanto ao debate, vamos a ele!
No entanto, antes de entrarmos no debate, gostaria ainda de referir que foi distribuído pelos grupos parlamentares e pela Mesa uma nota informativa sobre os nossos trabalhos de hoje, que não colheu qualquer reacção negativa. Basicamente, a nota informativa diz que acabamos hoje os nossos trabalhos entre as 19 horas e 30 minutos e as 20 horas, o que está previsto pelo Regimento, o que quer dizer que não vamos ser rigorosos no cumprimento deste horário se estiver algum orador no uso da palavra.
Saliento ainda que amanhã a sessão tem início às 10 horas, estando prevista a sua conclusão pelas 13 horas.
A Mesa tem a seu cargo a contabilização global dos tempos, vai elaborar uma grelha apenas para uma orientação interna, como, aliás, vem expresso no boletim informativo que há pouco referi, e os Srs. Deputados quando virem acender a luz vermelha já sabem o tempo que utilizaram. Entretanto, a Mesa vai fazer a contabilização de todos os tempos, nos termos do Regimento.
No seguimento do anúncio feito ontem, vamos iniciar o debate da Revisão Constitucional com a discussão do artigo 12.º
O Sr. Deputado Raul Castro pede a palavra para que efeito?

O Sr. Raul Castro (Indep): É para uma interpelação à Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se é para saber por que razão V. Ex.ª não recebeu o boletim informativo, penso que isso se deve a qualquer dificuldade dos serviços.

O Sr. Raul Castro (Indep): - É exactamente por isso, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se apenas de um nota suplementar, mas vou diligenciar para que lhe ela seja distribuída.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, deseja interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, tenho em meu poder o Relatório da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. É este branco tijolo com algumas inscrições a cinza, certas das quais bem negras, de resto.

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Não vou cometer a indelicadeza nem o facto insensato de pedir à Mesa que mande proceder à leitura do anafado material, tal qual aqui está exibível perante todos os Srs. Deputados, que, na esmagadora maioria, não o possuem. É farto e é bonito!
Mas pediria à Mesa o favor de ler o relatório, não os anexos, uma vez que penso ser elementar que os Srs. Deputados conheçam, pelo menos, as singelas prosas de abertura, que dão sinal do que foi o percurso deste longo ano de debates em sede de comissão.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o relatório foi distribuído com toda a urgência e falámos várias vezes nesta matéria.
Sr. Deputado Carlos Encarnação, pede a palavra para que efeito?

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - É para interpelar a Mesa, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Carlos Encarnação (PSD): - Sr. Presidente, gostaria de solicitar à Mesa que considerasse a hipótese de esta sugestão do Partido Comunista Português não ser acatada, pura e simplesmente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Manuel Mendes, pede a palavra para interpelar a Mesa?

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - É sim, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr. Presidente, a leitura do relatório é obrigatória. Além disso, o meu grupo parlamentar tem apenas um exemplar, de duas ou três páginas, e os deputados da minha bancada gostaria de conhecer o seu conteúdo. Vamos perder mais tempo a discutir adjectivamente questão do que aquele que resultaria da leitura correcta, pelo Sr. Secretário Reinaldo Gomes, do conteúdo do relatório.

O Sr. José Magalhães (PCP): - É tão simples como isto!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, V. Ex.ª tem razão, mas não se ganha nem se perde nada com a leitura do relatório.
Gostaria apenas de esclarecer que o relatório foi distribuído com urgência pelos grupos parlamentares, além de que era conhecido pelos elementos da CERC, desde há já algum tempo.
Srs. Deputados vai proceder-se à leitura do relatório da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.

Foi lido. É o seguinte:

Comissão Eventual para a Revisto Constitucional

Relatório

A Comissão Eventual de Revisão Constitucional (CERC) foi constituída por deliberação do Plenário da Assembleia da República em 19 de Janeiro de 1988, sendo composta pelos seguintes Srs. Deputados:
Do Partido Social-Democrata: Carlos Manuel de Sousa Encarnação, Domingos Duarte Lima, Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira, José Álvaro Machado Pacheco Pereira, José Augusto Santos da Silva Marques, Licínio Moreira da Silva, Luís Filipe Garrido Pais de Sousa, Luís Filipe Menezes Lopes, Manuel da Costa Andrade, Maria Assunção Andrade Esteves, Mário Ferreira Bastos Raposo, Mário Jorge Belo Maciel, Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva, Rui Alberto Limpo Salvada, Rui Manuel Lobo Gomes da Silva, Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete;
Do Partido Socialista: Alberto de Sousa Martins, António de Almeida Santos, António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino, António, Poppe Lopes Cardoso, Carlos Manuel Natividade da Costa Candal, João Cardona Gomes Cravinho, Jorge Lacão Costa;
Do Partido Comunista Português: Carlos Alfredo de Brito, José Manuel dos Santos de Magalhães;
Do Partido Renovador Democrático: António Alves Marques Júnior;
Do Partido do Centro Democrático Social: Adriano José Alves Moreira;
Do Partido Ecologista Os Verdes: Herculano da Silva Pombo Marques Sequeira;
Da Intervenção Democrática: Raul Fernandes de Morais e Castro.

No decurso dos trabalhos da CERC foram substituídos os seguintes Srs. Deputados:

Do Partido Social-Democrata, Domingos Duarte Lima por António Costa de Albuquerque de Sousa Lara; José Augusto Santos da Silva Marques por José Luís Bonifácio Ramos; Luís Filipe Menezes Lopes por José Augusto Ferreira de Campos; José Álvaro Machado Pacheco Pereira por Pedro Manuel Cruz Roseta.
Do Partido Socialista, António Poppe Lopes Cardoso por José Eduardo Vera da Cruz Jardim.
Do Partido do Centro Democrático Social, Adriano José Alves Moreira por José Luís Nogueira de Brito.

A Mesa da CERC foi eleita na sua reunião de 9 de Março de 1988 e ficou com a seguinte composição:

Presidente - Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD); Vice-Presidente - António de Almeida Santos (PS); Secretário - José Manuel dos Santos de Magalhães (PCP); Secretário - Carlos Manuel de Sousa Encarnação (PSD).

A CERC procedeu à elaboração do seu regimento interno que foi aprovado na sessão de 2 de

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Março de 1988 e cujo texto se integra no presente relatório para os devidos efeitos (Anexo I).
A CERC constituiu uma subcomissão destinada a proceder a uma análise comparativa dos diferentes projectos de Revisão Constitucional apresentados na Mesa da Assembleia da República, subcomissão essa que teve a seguinte composição:

José Luís Bonifácio Ramos (PSD); Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD); Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD); Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva (PSD); Rui Manuel Lobo Gomes da Silva (PSD); Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD); António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (PS); Jorge Lacão Costa (PS); José Eduardo Vera Cruz jardim (PS); José Manuel Santos Magalhães (PCP).

A CERC realizou 119 sessões de trabalho onde procedeu a duas leituras de todos os projectos de Revisão Constitucional, bem como das propostas de substituição apresentadas pelos membros da comissão no decurso dos respectivos debates, cujo registo integral consta das actas publicadas em série especial do Diário da Assembleia da República, II Série.
A CERC, no decurso dos seus trabalhos, recebeu a correspondência de que se apresenta uma súmula no Anexo II deste relatório.
De igual forma CERC concedeu audiências a todas as entidades que as solicitaram no âmbito de uma subcomissão especialmente criada para o efeito e cuja relação consta do Anexo III.
No Anexo IV integra-se um texto do qual constam as propostas de alteração à Constituição e os textos de substituição, cuja aprovação pelo Plenário da Assembleia da República é sugerida pela CERC, em virtude de terem merecido o voto favorável de, pelo menos, dois terços dos deputados que compõem esta comissão.
O Anexo V é composto pelo mapa das posições de voto de cada partido em relação às propostas apresentadas, constituindo a confirmação das votações efectuadas no decurso da segunda leitura na CERC, formalizada em reunião especialmente convocada para o efeito, bem como pela lista das propostas de alteração constantes dos projectos de Revisão Constitucional que no decurso dos trabalhos da CERC foram retiradas pelos respectivos proponentes.
Do Anexo VI constam todas as propostas de substituição entregues à CERC no decurso dos respectivos trabalhos.
Finalmente, no Anexo VII constam as comunicações finais dos diferentes grupos parlamentares sobre as respectivas propostas e votações.
Pelo presidente da comissão assinou o Sr. Deputado António de Almeida Santos.

Entretanto, assumiu a presidência a Sr.ª Vice-Presidente, Manuela Aguiar.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, pede a palavra para que efeito?

O Sr. António Vitorino (PS): - É para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr.ª Presidente, creio que da leitura do relatório ficou claro haver, no mínimo, dois instrumentos imprescindíveis para o acompanhamento do debate no Plenário: os textos dos projectos iniciais de Revisão Constitucional, que constam do Diário da Assembleia da República e de uma brochura especialo e o texto do Anexo IV, onde se incluem os artigos que mereceram a aprovação da maioria qualificada de dois terços em sede da CERC.
Assim, solicitava à Mesa que envidasse todos os esforços no sentido de que a cópia dos projectos iniciais de Revisão Constitucional e do Anexo IV fossem distribuídas à bancada da imprensa, por forma a que os jornalistas e profissionais da comunicação social pudessem acompanhar detalhadamente o debate desta matéria em Plenário.
Haverá, naturalmente, também outras propostas de substituição avulsas, suponho que essas serão distribuídas aqui no Plenário à medida que forem sendo apresentadas e dessas também será produzida à comunicação social informação adequada.
Desta forma, se contempla a necessidade da transparência, da clareza e da informação devida ao povo português acerca dos debates que travaremos nesta Câmara.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa toma em consideração o que acaba de dizer e vai dar instruções aos serviços para proceder consequentemente.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Presidente, ouvimos a intervenção do Sr. Deputado António Vitorino como uma autocrítica tardia...

O Sr. António Vitorino (PS): - Essa é deselegante!

O Orador: - ... àquele que é o parturejamento do processo de apreciação da Revisão Constitucional que, bem o dizíamos, se arrisca a ser completamente mal organizado e com a grande parte dos protagonistas parlamentares e verem-se em bolandas para conseguirem o mínimo dos mínimos de informação.
De qualquer forma, subjaz à proposta do Sr. Deputado António Vitorino uma boa ideia, a qual, de resto, fizéramos aflorar, ontem, no decurso dos debates que aqui tiveram lugar, ideia essa que é a de que todos os Srs. Deputados devem ter o material indispensável para que possam tomar parte nos debates ou a eles assistir num limiar básico de qualificação, e, com eles, naturalmente, a bancada dos profissionais da comunicação social, bem como todos aqueles que nesta Casa, em diferentes funções, podem intervir na matéria.
Entendemos que a Mesa, e é esse o sentido útil desta intervenção, Sr.ª Presidente, deveria providenciar, designadamente em termos de tempo, para que o debate não começasse sem que esta diligência minimalista, enunciada e sugerida pelo Sr. Deputado António Vitorino, pudesse efectivar-se e não ser apenas uma figura interessante de retórica.

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Para tal são precisos alguns minutos e a minha bancada está na disponibilidade de recorrer a um meio expedito, se for caso disso. Pensamos, porém, que a Mesa, institucionalmente, deverá proceder a uma suspensão, pelos menos, de meia hora.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, a Mesa entende que os trabalhos podem começar de imediato e dará instruções para que a distribuição seja feita a todos os Srs. Deputados, assim como à bancada da comunicação social.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor.

O Sr. José Manuel Mendes (PCP): - Sr.ª Presidente, reenfatizaremos tudo aquilo que reiterámos e tudo aquilo que viermos a dizer sobre esta matéria.
Mas peço a palavra para anunciar que propiciaremos toda a marcha de trabalhos técnicos indispensáveis que a Mesa deverá levar a cabo, para que a bancada da comunicação social e os Srs. Deputados, mais directamente protagonistas nas discussões da Revisão Constitucional, disponham dos materiais que aqui foram referenciados.
Assim, nos termos regimentais, pedimos meia hora de suspensão dos trabalhos.

O Sr. António Vitorino (PS): - A isso chama-se obstrucionismo!

A Sr.ª Presidente: - É regimental. Está suspensa a sessão e retomaremos os nossos trabalhos às 17 horas e 35 minutos.

Eram 17 horas e 5 minutos.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, está reaberta a sessão.

Eram 17 horas e 50 minutos

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos dar início à discussão do artigo 12.º

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra para interpelar a Mesa, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Tem a palavra.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Presidente, talvez com utilidade, peço a palavra para esclarecer que a única alteração proposta ao artigo 12.º é a do n.º 2, apresentada pelo CDS, e que a retiramos.

A Sr.ª Presidente: - Muito obrigado, Sr. Deputado, a Mesa anota a informação.
Srs. Deputados, a Mesa informa que se encontram inscritos, para produzirem intervenções, os Srs. Deputados Marques Júnior, Jerónimo de Sousa e Costa Andrade.
Sr. Deputado Marques Júnior, a Mesa gostaria de saber sobre que artigo versa a sua intervenção.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, inscrevi-me para produzir uma intervenção aquando da abertura do debate, que não tem necessariamente a ver com o artigo A, B, C ou D, mas efectivamente para fazer uma intervenção assim que se comece a discutir a revisão da Constituição.
Portanto, se acontecer como agora, que o CDS retirou a proposta de alteração do artigo 12.º, ficarei inscrito para o debate do artigo 13.º, mas se também não houver discussão desse artigo ficarei inscrito para o artigo 14.º

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Peço a palavra, Sr.ª Presidente.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr.ª Presidente, gostaria de dizer que o CDS apresentou uma proposta de alteração do artigo 13.º, que mantém.
Por isso, pedimos a palavra para justificar a proposta de alteração, mas, no entanto, tenho muito gosto em ser antecidido no uso da palavra pelo Sr. Deputado Marques Júnior, que, em conformidade, já a tinha requerido a V. Ex.a
A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, vamos então dar início à discussão do artigo 13.º
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: No início da discussão em Plenário da revisão da Constituição gostaria de apresentar, em primeiro lugar, a minha saudação a todos os colegas deputados, de todos os grupos parlamentares.
Depois de um período de discussão em sede de Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, vai agora ter início o debate em Plenário daquilo que poderemos considerar um dos pontos mais relevantes desta sessão legislativa e da própria legislatura.
Durante todo este período foram muitas as declarações e as tomadas de posição, quer dos intervenientes directos neste processo, quer também de variadas organizações e personalidades a propósito da Revisão Constitucional, podendo dizer-se que foi possível uma razoável mobilização geral para o problema da Revisão Constitucional, embora também se possa dizer que nem todos terão presente o que está verdadeiramente em jogo em todo este processo.
Por um lado, cada partido ou força política tem apresentado a questão do seu ponto de vista tentando valorizar o que entende ser relevante, quer no aspecto positivo quer no aspecto negativo, e, por outro, os debates que se fizeram na comissão e que foram publicitados nas respectivas actas, não têm tido um tratamento de divulgação.
É pois legítimo concluir-se que, principalmente para o grande público, não há um grande conhecimento de quais os sectores fundamentais da revisão em curso, o que é que ela representa ou pode representar, em termos de futuro para Portugal, para além da informação avulsa que tem sido veiculada. Uma grande maioria (e não sei se será mesmo uma grande maioria) terá o conhecimento genérico de que a Assembleia da República está a rever a Constituição e isso é um acontecimento político com alguma importância.

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Interessará pois que o debate em Plenário possa com a colaboração indispensável da comunicação social, levar junto da população em geral as questões mais relevantes que, por certo, vai proporcionar. Neste sentido, será legítimo esperar que os deputados, todos os deputados, participem neste debate enriquecendo-o com a suas intervenções, que não devem ficar só para os especialistas, e o dignifiquem com a sua presença.
Importa, por outro lado, e será essa a nossa postura, que todos os intervenientes procurem no calor das suas intervenções e na manifestação das discordâncias e consensos ter como objectivo principal as melhores soluções dentro, naturalmente, daquilo que são os seus pontos de vista, que, repito, não deve dispensar a procura das melhores soluções.
Do nosso ponto de vista, é importante reter este facto, porque é o nosso entendimento que, pelo facto de estar desde já indiciado o texto de revisão, isso não pode significar que o que se vai agora passar é pura e simplesmente o espectáculo habitual, com tudo praticamente decidido, porque isso implicaria por razões de dignidade que a lógica deste debate fosse outra. Bem sei que tudo isto pode ser entendido como uma grande utopia e idealismo, mas é difícil encontrar outra explicação para o contrário.
Quererá isto dizer que não teve qualquer valor o trabalho da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional? Não, antes pelo contrário. O trabalho da comissão foi fundamental para que desde logo se indiciassem as várias soluções apresentadas pelos grupos parlamentares e deputados, se procurassem os consensos e se compreendessem melhor as razões dos dissensos. Foi um trabalho que provavelmente nem todos compreenderão, mas que o próprio volume das actas, para além dos seu riquíssimo conteúdo, atesta de forma indesmentível.
O PRD está particularmente à vontade para se referir, nestes termos, ao trabalho da comissão porque, pelo facto de ser um grupo parlamentar com reduzida expressão e de ter necessidade de participar em simultâneo, em várias actividades parlamentares, teve uma participação aquém daquilo que era seu desejo. No entanto, reconhece a grande importância para o debate, que hoje se inicia em Plenário, o que representou o trabalho em comissão.
Para todos os colegas da comissão e também para os funcionários que a secretariaram, pelo seu trabalho que está bem presente nos documentos produzidos, o nosso reconhecimento.
Nesta nossa primeira intervenção, não queremos deixai de nos referir ao enquadramento geral dos trabalhos hoje presentes ao Plenário, nem ignorar os factores políticos relevantes, condicionantes desse mesmo trabalho. Refiro-me, naturalmente, ao Acordo de Revisão Constitucional de que foram subscritores só o PSD e o PS.
É conhecida a posição que o PRD tem manifestado relativamente ao acordo e aquilo que ele representa na Revisão Constitucional.
Em primeiro lugar, a «forma» como foi elaborado, à margem da CERC, embora com alguma informação episodicamente fornecida pelo PS. Porém, convém aqui acentuar a postura diferente do PS e do PSD. Enquanto PS procurou veicular alguma informação por todos os outros partidos, o PSD actuou como se a Revisão
Constitucional fosse um simples negócio a dois, procurando manter as coisas no máximo segredo, provavelmente «apoiado» no ditado popular de que «o segredo é a alma do negócio».
Podemos pois dizer que o comportamento político do PS e do PSD foram diferentes, não deixando de indiciar diferenças assinaláveis não só conceitos, mas também - e perdoe-me o Partido Social-Democrata - naquilo que representa e deve representar uma prática democrática. Não negamos, no entanto, que não possa haver entendimento e procura de soluções entre dois partidos que, por força dos votos, têm os dois terços necessários a essa revisão.
Aliás, será justo reconhecer que, do ponto de vista político, o PS tinha neste processo uma particular responsabilidade, que resulta da ideia lançada, que contestámos, de que não era possível qualquer desenvolvimento no País sem ser feita a Revisão Constitucional. Depois de o obstáculo ser sucessivamente o Conselho da Revolução, a Constituição de 1976, a Constituição revista em 1982, o Presidente da República, depois outra vez a Constituição, a Oposição e, agora, talvez a maioria, estava, pois, o Partido Socialista em situação política particularmente difícil. Porque se não fizesse a revisão, seria ele o principal responsável por tudo o que de mal acontecesse em Portugal, e seria o alibi perfeito para a incapacidade e incompetência que tem sido demonstrada pelo Governo, se a fizesse sempre se poderia questionar, e pode, em que revisão alinhou o PS, quando é certo que desejando-a o seu projecto apontava decididamente para o outro tipo de revisão. Não era pois uma situação fácil para o Partido Socialista.
Poderia o acordo PSD/PS ter uma solução diferente? Pensamos que seria desejável que tivesse tido, aferindo mesmo o nosso pensamento por aquilo que é o projecto de Revisão Constitucional apresentado pelo Partido Socialista, em que, em alguns casos, existem soluções semelhantes com o nosso projecto e, em outros, apesar de não haver propostas do PRD, não temos dúvida em subscrever algumas das propostas do Partido Socialista.
Falámos do ponto de vista formal e do contexto político em que situa o acordo PSD/PS. Não nos queremos inibir de, neste primeiro dia de debate, fazer algumas considerações sobre aquilo que o acordo parece representar como solução para a Revisão Constitucional. Ao fazê-lo não queremos alimentar desde já uma polémica, mas tão - só enquadrar a nossa própria conduta no que diz respeito ao tão celebrado acordo que vai marcar, por certo, este processo de Revisão Constitucional.
Temos afirmado, repetidamente, que as soluções encontradas para o problema da comunicação social, das privatizações, do controlo legislativo e fiscalização do Governo pela Assembleia da República, da saúde, da regionalização, só pare falar em alguns, são soluções que nos merecem as maiores dúvidas e em que não estamos de acordo. Penso que neste momento não é adequado tecer outro tipo de considerações e fazer juízos de valor que podem, de qualquer modo, ser considerados desajustados quando admitimos, como já afirmei, ao menos no campo dos princípios, que a Revisão Constitucional não está feita.
Não ignoramos que a ideia que mais se vai ouvir durante este debate e aquela que vai marcar de forma

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indiscutível esta Revisão Constitucional, será a do acordo PSD/PS. Pelo nosso lado, as referências a este acordo serão feitas só na medida do necessário para se compreender ou localizar as nossas próprias intervenções. Não esperamos fazer deste acordo o «manto» que procura esconder as soluções encontradas, pois será sobre estas e a seu propósito que vamos procurar demonstrar a validade ou não das soluções, no sentido de todos sabermos - e repito, de todos sabermos -, sem qualquer subterfúgio, o que vamos aprovar, o que vamos - rejeitar, e as verdadeiras razões de uma e outra posição.
Só mais uma nota que peço que seja tomada a título pessoal.
A Constituição da República, a Constituição de 1976, substitui a de 1973 como resultado do 25 de Abril e teve então o apoio de mais de 90% dos constituintes, ficando unicamente de fora o CDS. O CDS entendia que não podia subscrever o texto constitucional. Em 1982, aquando da primeira revisão, o CDS que tinha votado contra em 1976, votou a favor e o PCP que tinha votado a favor votou nessa altura contra.
Destes factos é possível tirar a seguinte reflexão: O PS e o PSD têm sido e vão continuar a ser os principais responsáveis pela feitura da Constituição e também os seus revisores fundamentais - não se entenda aqui revisores no sentido pejorativo -, e, nesse sentido, as disposições principais da Constituição e as alterações que tem sofrido têm tido o apoio do PS e do PSD.
Também se compreendem as razões pelas quais o PCP esteve contra e o CDS tem estado agora a favor. Aliás, tem sido curioso observar, a par de uma certa discrição do PSD, a grande satisfação do CDS por esta revisão, apesar de afirmar não ser, ainda, a sua revisão.
Com a responsabilidade que tem na esquerda democrática esta situação não preocupa o PS? Não preocupa o PS o facto de as revisões sucessivas da Constituição da República terem, cada vez mais, o apoio da direita e lançar, cada vez mais a dúvida na esquerda?

Vozes do CDS: - E o acordo? Isso está previsto no acordo?

O Orador: - Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: Mas afinal o que é que mudou de então para cá?
Do ponto de vista político, a extinção do Conselho da Resolução e algumas alterações na organização política compreendem-se e eram uma exigência e um compromisso assumido. Foi a revisão da organização política. Aperfeiçoou-se também a parte económica da Constituição. Mas agora o que é que justifica a revisão profunda, e sublinho profunda, da organização económica que não se justificou em 1982? O projecto de sociedade previsto e defendido pelo PS e pelo PSD hoje é diferente do de 1982? Hoje, é uma questão de filosofia política que não era em 1982? É uma exigência da entrada na CEE? Ou muito mais simplesmente, é uma adaptação pragmática, em função de uma experiência que não deu os resultados esperados? Será isto uma nova experiência? Será justo «punir» o texto constitucional porque os agentes da sua implementação foram incapazes?
Sr.ª Presidente, Srs. Deputados: A nota pessoal que queria deixar é esta.
Estamos em véspera do 15.º Aniversário do 25 de Abril e está em curso a revisão da Constituição, símbolo primeiro da liberdade e da democracia implantada em Portugal nesse dia. Nesta revisão são questionados pontos fundamentais, muitos deles historicamente identificados como conquistas do 25 de Abril. É pois, para mim, um momento particular este que estamos a viver. Com esta revisão continua salvaguardado um aspecto essencial da Resolução, talvez o mais importante: a democracia política. Mas também acreditamos que, sendo este aspecto importante e fundamental, ficará incompleto se em paralelo não houver, ou forem diminuídos, outras componentes complementares, como sejam a democracia cultural, económica e social, vectores indissociáveis dos grandes objectivos do 25 de Abril.

Aplausos do PRD, de Os Verdes e do Deputado Independente Raul Castro.

A Sr.ª Presidente: - Srs. Deputados, a Mesa informa de que se encontram inscritos para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Costa Andrade, Rui Machete, António Vitorino e Assunção Esteves.

Tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, a intervenção que acaba de produzir é, na generalidade, contra certas expectativas que estavam criadas, porque pensávamos que iríamos de imediato à discussão de artigo a artigo, mas, no uso legítimo dos seus direitos regimentais, o Sr. Deputado, em nome do PRD, fez uma intervenção de carácter geral. Uma intervenção que tem algumas afirmações que, do nosso ponto de vista, não podem deixar de merecer uma censura, naturalmente amistosa e democrática, mas muito firme.
Não podemos deixar passar em claro a censura que nos foi feita no que toca à nossa prática política durante todo este processo de Revisão Constitucional e, sobretudo quando vem na perspectiva do secretismo que terá havido da nossa parte. Não podemos aceitar esta censura, tanto mais vindo como vem de um deputado que, representando um partido, representa também um grupo ou uma força que num momento também significativo, em que se tratava de dotar o País de um texto constitucional, impôs com legitimidade democrática muito questionável ou mesmo nula uma conformação da Constituição que os partidos foram, por contingências próprias de momento e sem condições de liberdade, coagidos a aceitar.
Também não me parece que seja adequado levantar neste Hemiciclo expressões como «punir» a Constituição, porque não é isso que aqui estamos a fazer. Somos legisladores constituintes e como tal problematizamos todas as soluções que aí estão, em nome de referentes últimos que estão para além das fórmulas positivadas no Direito Constitucional. Portanto, reformulamos, emendamos, corrigimos, não punimos, mas, sim, aprefeiçoamos. É a vontade constituinte do povo português que, através da nossa acção, se actualiza, pelo que isto nunca pode ser visto como a punição da Constituição, acto que, naturalmente, tem conotações negativas, que também não podemos aceitar.

Aplausos do PSD.

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O Sr. Deputado também invoca, e bem, a experiência e o projecto do 25 de Abril. Permito-me recordar esta coisa singela: se alguma vez, no plano do ordenamento constitucional, se está a fazer algo próximo de Abril é o que está agora a acontecer. Porque Abril - pondo entre parêntesis os atropelos ilegítimos - fez-se em nome de duas coisas.
Em primeiro lugar, em nome da ideia de instituições plenamente democráticas que só agora, a partir desta revisão da Constituição, é que o poder político, democraticamente legitimado, vai ter expressão plena.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa é a piada do dia!

O Orador: - Em segundo lugar, Abril fez-se em nome de transformações profundas da sociedade portuguesa que haviam de ser legitimadas pela prévia intervenção de um legislador constituinte, o que não se deu, como é do conhecimento do público. As grandes transformações foram feitas preter poder constituinte. Mais, contra o poder constituinte.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Faltava o Professor Aníbal!

A Sr.ª Presidente: - Queira terminar, Sr. Deputado.

O Orador: - Termino já, Sr.ª Presidente.

Diz o Sr. Deputado que não pode estar de acordo com as soluções encontradas em matéria de privatizações. sabendo-se esta coisa tão comezinha, que haverá privatizações e nacionalizações, pergunto qual a razão da discordância do Sr. Deputado e do partido que representa, porque o quando e como não estão definidos na Constituição. Em relação ao quando e ao como, o poder legítimo, em cada momento, poderá defini-los, se quiser. A partir de agora, à semelhança do que acontece em qualquer país democrático, poderá nacionalizar-se e desnacionalizar-se. É apenas para isto que apontam os textos que indiciariamente colherão a maioria de dois terços desta Assembleia.
Pergunto-lhe, Sr. Deputado: é contra isto que está? É contra a possibilidade de ao ritmo da...

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, peco-lhe que termine.

O Orador: - Sr.ª Presidente, peço que o tempo seja descontado de acordo com o Regimento.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, com certeza que os tempos serão descontados, mas penso que se deixarmos que cada deputado, a título de pedido de esclarecimento, faça uma intervenção estamos complemente a deturpar a lógica das figuras regimentais.

O Orador: - Com certeza, Sr.ª Presidente. Sendo assim, termino de imediato com a formulação da pergunta.
É contra isto, Sr. Deputado, que é já monopólio de todos os Estados democráticos há muitas e muitas décadas, que o PRD está?

ermito-me recordar que esta Assembleia, na medida em que tem poderes constituintes, não faz qualquer privatização. Portanto, não estamos aqui a fazer privatizações nem nacionalizações, mas apenas e tão só a dar
ao poder legítimo do momento a possibilidade de as fazer se o povo para tanto o legitimar. É contra isto que está o PRD?

Aplausos do PSD.

A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado Marques Júnior, deseja responder já ou no fim?

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, se me for permitido respondo de imediato, para dar sentido útil a este pedido de esclarecimentos.

A Sr.ª Presidente: - Faça favor.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr.ª Presidente, já agora aproveito para dizer que o tempo que eu utilizar a mais deverá ser naturalmente descontado no tempo disponível do meu grupo parlamentar, para ver se consigo explicar o meu raciocínio relativamente às questões colocadas pelo Sr. Deputado Costa Andrade, pois penso que isto é importante.
Sr. Deputado Costa Andrade, vou procurar responder ponto por ponto às questões por si colocadas.
É evidente que quando referi, relativamente ao acordo PSD/PS, que a prática política era diferente, foi, pura e simplesmente, uma constatação.
Enquanto decorriam as conversas com o PSD, o Partido Socialista teve o cuidado de ir pondo a par os outros partidos da Oposição do teor dessas conversas, mas nunca fomos solicitados pelo PSD para nos dar as suas explicações - não são explicações no sentido de explicar o que se estava a dizer, mas no sentido de eventualmente colher, da nossa parte, também uma ou outra sugestão no campo dos princípios. É uma possibilidade que existe sempre e provavelmente seria útil este tipo de conversas, como penso que, apesar de tudo, não terão sido desnecessárias as próprias conversas que tivemos com o Partido Socialista. Portanto, o secretismo é entendido neste sentido e não noutro.
Quanto à prática política a que me referi, devo dizer que não estava a falar de uma prática não democrática do Partido Social-Democrata, relativamente ao seu comportamento, mas sim, exclusivamente, a este acto concreto, a este preciso ponto, que acabei de referir.
Quando o Sr. Deputado refere que os partidos que elaboram a Constituição de 1976 foram coagidos a aceitar um pacto - não disse qual era, mas naturalmente referia-se ao chamado Pacto MFA/Partidos -, devo esclarecê-lo, e sabe-o tão bem como eu, que se efectivamente quiser enveredar por explicitar e por carrear para esta discussão toda essa problemática, tenho de facto muito gosto em discutir isso. Porém, diria simplesmente: é que nem todos os partidos assinaram este pacto. O Pacto MFA/Partidos, localizado no momento histórico em que se viveu foi uma necessidade particular sentida pelos próprios partidos.

Vozes do PSD: - Não!...

O Orador: - O Sr. Deputado Costa Andrade sabe perfeitamente que houve um segundo Pacto MFA/Partidos, porque o próprio MFA sentia que havia restrições à actividade política desenvolvida pelos partidos. Porém, este segundo pacto foi da iniciativa do próprio MFA, enquanto que o primeiro foi da iniciativa dos partidos. O MFA considerou que havia restrições à

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liberdade dos próprios partidos, o que era, de facto, uma necessidade sentida por eles em função do momento histórico que se vivia, pelo que o segundo pacto acabou ou limitou muitas destas restrições.
O Sr. Deputado apresentou uma outra questão que merece de facto uma explicação, porque, entendida como a referiu, era, de facto passível de crítica ao PRD: o problema de «punir» a Constituição.
A Sr.ª Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa de o interromper, mas queria comunicar-lhe que, neste momento, dispõe de três minutos do tempo global.

O Orador: - Sr.ª Presidente, recordo à Mesa que, relativamente ao que foi decidido em conferência de líderes para este debate, podemos antecipar o tempo do dia seguinte. Não podemos é deixar tempo de uma semana para outra.
Estava eu a referir-me ao problema de punir a Constituição. Admito que essa não seja a espressão mais feliz, mas do meu ponto de vista, este punir, entre aspas, seria um aperfeiçoamento ou uma revisão em sentido negativo. Isto, claro está, no seu conceito, pois, no conceito do Sr. Deputado, seria um aperfeiçoamento como o que acabou de referir.
O Sr. Deputado assinalou o facto de esta Revisão Constitucional estar a ser discutida próximo do 25 de Abril. Não quero em dúvida - reconheço que não tenho legitimidade para tal - que seja essa a ideia do Sr. Deputado Costa Andrade no que se refere à revisão da Constituição, no sentido que entende dever ser o processo de revisão do nosso texto constitucional para melhor cumprir o que para o Sr. Deputado entende serem os ideais do 25 de Abril.
No que respeita aos objectivos a atingir até admito que possamos não ter grandes divergências - nunca discuti isso com o Sr. Deputado - mas, no que se refere à concretização desses objectivos e aos caminhos que é necessário trilhar para os atingir distancio-me do Sr. Deputado porque penso que a revisão da Constituição, tal como vem sendo feita, não conduz a esses objectivos, antes pelo contrário. Os objectivos podem não ser diferentes, os processos de os alcançar é que não convergem pois tenho, sobre esse assunto, uma ideia completamente diferente da do Sr. Deputado.
Quanto à privatizações, Sr. Deputado Costa Andrade, sempre dissemos - e reafirmo-o aqui - que não somos contra as privatizações. No nosso projecto de Revisão Constitucional também alterámos o artigo 83.º da Constituição porque entendemos que esse artigo devia ser alterado.
Gostaria de sublinhar, Sr. Deputado que o PRD não teve, em 1982, qualquer responsabilidade na Revisão Constitucional que consignou este preceito. Está, portanto, relativamente à vontade tanto quanto a este ponto como quanto a outros. Alguns haverá em que não estará tão à vontade mas, neste está-o.
Devo ainda dizer-lhe, Sr. Deputado, como homem também de Abril, se me permite essa expressão, que não tenho nada contra as privatizações de parte das empresas públicas ou até da totalidade de algumas empresas públicas mas tenho muitas dúvidas relativamente aquilo que está indiciado como referencial para as privatizações. Aí, de facto, penso que não estão salvaguardadas as condições mínimas na manutenção da propriedade pública que, do meu ponto de vista, deveria ser mantida e que consideramos importante.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Rui Machete.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, a consideração e estima que V. Ex.ª me merece levam-me a formular-lhe uma pergunta fundamental que a sua intervenção me suscitou.
Penso que essa intervenção foi bastante contraditória. E foi-o porque V. Ex.a, em várias ocasiões, mencionou a circustância de os momentos históricos concretos terem apontado em determinadas direcções. Foi até ao ponto de dizer - e eu acompanho-o nessa sua consideração - que o MFA condicionou o exercício do poder constituinte futuro no primeiro pacto e pela evolução histórica reconheceu que esse condicionamento era exagerado. Por isso tomou a iniciativa de um segundo pacto o que significa, obviamente, que entendia que o primeiro pacto condicionava o poder constituinte e que achou que, nesse momento, isso não era legítimo.
Digo-lhe isto para que lhe referir a minha incompreensão para a insensibilidade histórica que V. Ex.ª revelou ao achar que a Constituição se deveria manter imutável e inalterável, agora que as condições históricas da sociedade portuguesa estão a evoluir. Não percebo porque é que é sensível às considerações históricas de um momento e, no outro, já revela essa insensibilidade.
A explicação da nossa posição é muito simples. Em termos populares diria que queremos que a Constituição reafirme e reforce o 25 de Abril e enterre aquilo que, na imagem popular, está ligado ao 11 de Março.
Dizendo as coisas de uma outra maneira, entendemos que a Constituição de 1976 é um claro compromisso entre um princípio democrático - que, agora, vai sair reforçado desta revisão - e um princípio de carácter colectivista, ideologicamente marcado pelo marxismo-leninismo e que, agora, vai sair definitivamente infirmado desta revisão.
Nestas circunstâncias - e porque a mim isso me chocou na sua intervenção - quero colocar-lhe a seguinte pergunta, dando-lhe, assim, azo a que me esclareça e a que nos esclareça: Acha V. Ex.ª legítimo que uma Constituição tão claramente compromissória - e nesse sentido foi votada pelo meu partido - não possa ser sensível às forças políticas que neste momento, têm o poder de Revisão Constitucional e também à evolução histórica? Quer V. Ex.ª agarrar esta geração e as gerações futuras àquilo que foi um determinado e muito especial momento histórico?
É isso que eu não entendo, Sr. Deputado, tanto mais que compreendemos que a Constituição deverá ser algo que una os portugueses, algo que seja objecto de consenso e que consigne os valores fundamentais que nos devem unir todos nós. Nesse sentido, parece-nos que esta revisão pode dar um passo absolutamente decisivo. Acabar-se-ão as clivagens e acabar-se-ão, também de algum modo, certos aspectos ideológicos que dividiam os portugueses e que não representavam mais do que

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a predominância efémera de uma determinada maioria, se não na Assembleia Constituinte pelo menos nas forças dominantes do País.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Marques Júnior responde já ou no termo de todos os pedidos de esclarecimento que ainda pretendem dirigir-lhe?

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, iniciei o processo de respostas pelo principio de responder de imediato. Creio, no entanto, que vou alterá-lo para não exagerar na utilização do tempo, com prejuízo para outras bancadas e para outros colegas. Responderei, portanto, no fim, se os colegas que me fizeram perguntas não ficarem, eventualmente, aborrecidos, pelo facto de terem um tratamento diferente.

O Sr. Presidente: - Para sua orientação, Sr. Deputado, já gastou dezanove minutos.
Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.

O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, no sentido rigoroso do termo, a minha intervenção não é um pedido de esclarecimento. Pretendo apenas dar explicações a um pedido de esclarecimento que o Sr. Deputado Marques Júnior solicitou na sua intervenção.
Gostaria, em primeiro lugar, de agradecer a referência simpática que o Sr. Deputado fez à CERC e a referência justa que fez - permita-me a imodéstia - ao espírito de diálogo do PS com o PRD, com o CDS e com o PCP, no decurso das negociações que ia tendo com o PSD sobre a Revisão Constitucional.
Foi um facto que nos honrou e conforta-nos ver o seu reconhecimento público.
Permita-me, também, que sublinhe a dignidade das considerações que V. Ex.ª fez sobre o acordo PS/PSD porque é uma dignidade que advém de uma pessoa, representante de um partido, que quer a Revisão Constitucional embora discorde de alguns dos seus aspectos concretos. Assim sabemos dialogar!... Assim estamos dispostos a ouvir, detalhadamente, as razões que lhe assistem nessa postura política.
Às questões em concreto voltaremos no devido momento; teremos, então, ocasião de analisá-las em detalhe.
Queria dizer-lhe, Sr. Deputado Marques Júnior, relativamente à questão fundamental que colocou sobre a existência de maiorias cruzadas de aprovação da Constituição originária e da votação das revisões constitucionais - uma já verificada e outra em curso - que, para o PS, o ponto de honra fundamental deste processo é que ninguém fica excluído do arco constitucional, isto é, a Constituição da República, como lei fundamental da democracia política, económica, social e cultural de Portugal, consente a aplicação dos programas políticos e dos programas partidários. Todos eles encontrarão base constitucional, todos eles encontrarão a âncora desde que legitimados pela vontade maioritária do povo português.
As especiais responsabilidades do PS e do PSD resultam apenas da repartição parlamentar percentual ditada pela vontade popular mas, acima de tudo, o que a
Constituição continua a ser é um texto compromissório. Não é a Constituição de metade dos portugueses contra a outra metade dos portugueses; é uma constituição de traço de união entre todos os Portugueses. Uns revêm-se mais em alguns aspectos da Constituição, outros revêm-se mais noutros, mas com esta revisão acaba qualquer hipótese de contestação em bloco da sua legitimidade ou da legitimidade de qualquer das suas partes constitutivas.
Quanto aos votos diferenciados do PCP e do CDS são uma evolução política histórica que não me angustia e que, com sinceridade, sintetizaria desta forma: a directa, em Portugal, resigna-se à revisão parlamentar e compromissória da Constituição abdicando da ruptura referendaria e da tese do «pecado original» da Constituição de 1976, o que é também uma homenagem ao capitães de Abril. Só a esquerda imobilista não acompanha as revisões. Mas, mesmo assim, fá-lo mais por preconceito ideológico ou por razões de sobrevivência partidária, sem contudo ter a coragem, nem no passado nem no futuro, de se excluir do arco constitucional.

Aplausos do PS.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Quem fala assim não é gago!...

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Assunção Esteves.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Sr. Deputado Marques Júnior, refiro-me à sua intervenção para me permitir aplaudir algumas das suas afirmações e discordar inteiramente de outras.
Aplaudo as suas afirmações quando, no testemunho efectivo e emocional de um militar de Abril, o Sr. Deputado presta uma homenagem à revolução que permitiu o debate salutar que, neste momento, estamos levando a cabo.
É verdade que foi o 25 de Abril que permitiu que aqui estivéssemos, com projectos diferentes, a contribuir para a melhoria do texto da Constituição.
Mas não concordo, Sr. Deputado, quando diz que da revolução de Abril ficou ainda na Constituição a democracia política. É que, no imediato do 25 de Abril, não se criou propriamente a democracia política. No imediato do 25 de Abril houve um aproveitamento pungente de uma vontade colectiva de caminhar para a democracia que não se cristalizou a cem por cento no texto originário da Constituição.
Exemplo disso é - e o Sr. Deputado sabe-o - o poder que o Concelho da Revolução tinha de controlar a constitucionalidade das leis. Isso seria um absurdo - e era-o - em termos de Estado de Direito e em termos de democracia política.
A democracia política conseguiu-se não no imediato do 25 de Abril mas, sim, com a Revisão de 1982, para a qual o PRD não existia.
A demarcação que o Sr. Deputado fez desta revisão, na sua intervenção, com uma certa colagem ou sobreposição aos argumentos do PCP, deixa-me algumas preocupações fundamentais e leva-me a pôr-lhe algumas perguntas. Assim pergunto-lhe, concretamente: entende o Sr. Deputado que uma Constituição democrática, que nasce de uma revolução com vocação para a liberdade, tem o direito de nos dar um atestado de

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menoridade que nos iniba de transformar, dentro da lógica e da matriz da democracia, aquilo que é necessário transformar?
Lembro, Sr. Deputado, que uma vez tive ocasião de dizer na Comissão de Revisão Constitucional, que quando um dia perguntaram a Kant o que era o iluminismo ele respondeu que era a saída da menoridade a que a humanidade vinha sendo votada. Quando lhe perguntaram quais eram os ingredientes dessa menoridade, Kant respondeu que um deles era impor às gerações futuras a impossibilidade de mudar.
Sr. Deputado, nós, PSD, não admitimos que qualquer revolução, em nome de nada, nos passe um tal atestado de menoridade.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Marques Júnior, ouvi V. Ex.ª com a atenção e com respeito que a sua postura nesta Casa tem vindo a granjear - suponho que por parte de todos os deputados.

O Sr. Rui Machete (PSD): - Muito bem!

O Orador: - Consideramos mesmo V. Ex.ª - e emprego este plural porque sei que estou certo - um símbolo vivo da subordinação do poder revolucionário militar ao poder civil. Intervindo honestamente nesta Assembleia, com grande objectividade, integrado num grupo parlamentar minoritário, presidindo com grande isenção aos trabalhos, V. Ex." é bem esse símbolo vivo.

Vozes do PSD e do PS: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Marques Júnior, a sua intervenção deixou-me, no entanto, alguma perplexidade.
Considera V. Ex.ª que estamos satisfeitos. Não entendeu talvez bem a nossa satisfação. Estamos satisfeitos com a revisão que agora se está a fazer...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas não chega!...

O Orador: - ... e estamos satisfeitos com a revisão que se fez em 1982...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas não chega!...

O Orador: - .... na medida em que consideramos ambas um caminho para libertar a Constituição da subordinação à conjuntura política e a programas políticos determinados.
Não entende o Sr. Deputado Marques Júnior, revolucionário de Abril, do mesmo modo as revisões a que temos vindo a proceder?
Sr. Deputado, mais uma pergunta: cedendo a uma terminologia que empregou e que considero ultrapassada, queria V. Ex.ª uma Constituição perpetuamente propriedade da esquerda contra um voto porventura de direita manifestado pelo povo português?
São estas as questões que queria colocar-lhe.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Marques Júnior.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, Sr s. Deputados: Começo agradecendo aos Srs. Deputados as perguntas que me fizeram e às quais procurarei responder de forma ordenada. Assim sendo, ao Sr. Deputado Rui Machete, que referiu a minha intervenção como uma intervenção contraditória, gostaria de dizer que não é verdade que o MFA tenha condicionado os partidos do ponto de vista daquilo que eles entendiam ser, no curto prazo, o processo a desenvolver em Portugal. Como disse há pouco foram os partidos que tomaram a iniciativa de solicitar ao MFA um acordo deste tipo, porque não é possível, não é correcto, não é «sério» que se discutam todos estes problemas como se estivéssemos só agora a discutir o que se passou em 1974 e em 1975.
O Sr. Deputado Rui Machete sabe tão bem como eu - creio até que também esteve presente na assinatura dos pactos e que os conhece perfeitamente - qual era situação política que então se vivia. Seria, portanto, injusto e ilegítimo imputar ao MFA a situação de dificuldade que se vivia na altura. Isso seria reconhecer a ilegitimidade do MFA para ter feito o que fez, ou seja, o 25 de Abril.
É evidente que o processo que se desenvolveu foi um processo do qual - temos de reconhecê-lo! - ninguém tem o exclusivo da responsabilidade, mas de que também ninguém está completamente isento de culpa.
A propósito do célebre 11 de Março, gostaria de recordar ao Sr. Deputado Rui Machete - se o não tiver à mão posso arranjar-lhe - o comunicado sobre o acontecimento que o PSD emitiu nesse dia.
Aquilo a que o Sr. Deputado se quer referir é, provavelmente, ao 14 de Março e não ao 11 de Março.
O que aconteceu no dia 11 de Março, Sr. Deputado Rui Machete, foi o desencadear de acções que atentaram objectivamente, sem se saber ainda de uma forma clara quais eram os seus fins, contra o que era uma tentativa de encontrar soluções para a democratização em Portugal.
Devo recordar-lhe, Sr. Deputado Rui Machete, que essa tentativa ocorreu no dia 11 de Março, cerca de um mês e pouco antes das anunciados primeiras eleições livres em Portugal, provavelmente - e é legítimo especular-se sobre isso - na tentativa e como objectivo de impedir essas eleições, que, apesar de tudo e com grande esforço, por ser um compromisso de honra que constava do seu programa, o MFA conseguiu implementar e desenvolver, embora lutando contra muita coisa... Como sabe, um ano depois do 25 de Abril de 1974, realizaram-se as primeiras eleições livres em Portugal.
O Sr. Deputado pretende reforçar o 25 de Abril enterrando o 11 de Março. Não lhe nego essa legitimidade, não posso fazer esse juízo de valores. Sobre isso dir-lhe-ei, pura e simplesmente, Sr. Deputado Rui Machete, que fui - e tenho muito orgulho em ter sido - um dos fautores do 25 de Abril, mas que não tenho nada a ver com o 11 de Março.
A minha responsabilidade política nas acções que se seguiram, em 14 e 15 de Março, assumo-a de uma forma institucional e mesmo para além daquilo que é institucional. Mas essa é uma discussão que, provavelmente ainda neste Plenário e a propósito da Revisão Constitucional, iremos ter oportunidade de aprofundar.

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Concordo, Sr. Deputado Rui Macheie, que a Constituição deve ser, de facto, para todos os Portugueses e que todos os Portugueses nela se devem sentir inseridos. Não queira, no entanto, Sr. Deputado, a propósito daquilo que V. Ex.ª entende que é a revisão correcta, criar agora, relativamente à Constituição, uma unicidade de pensamento quanto àquilo que o Sr. Deputado entende que são as transformações mais adequadas.
Tem, naturalmente, de dar aos outros partidos políticos e aos outros intervenientes o direito de entenderem que a revisão que o PSD propõe não é a mais adequada e que a revisão que cada um deles propõe é, no contexto de cada um, a mais correcta.

O Sr. Rui Macheie (PSD): - Sr. Deputado, posso interrompê-lo?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Rui Macheie (PSD): - É só para lhe dizer duas coisas, Sr. Deputado.
Em primeiro lugar, quero esclarecer que não estou a fazer julgamentos históricos de ninguém. Isso pertence a outras ideologias políticas.
Em segundo lugar, tenho por V. Ex.ª grande admiração e até amizade.
Quando mencionei o 11 de Março...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - É a vulgata do PSD!...

O Sr. Rui Machete (PSD): - ... fi-lo na expressão popular do termo.
Quanto à unicidade, essa unicidade significa que nós devemos deixar às forçar políticas sufragadas pelo voto a escolha das soluções concretas. É isso apenas o que pretendo.

O Orador: - Relativamente a esse pensamento profundo, não tenho qualquer objecção a fazer e comungo com o que o Sr. Deputado acaba de afirmar sobre o que é esse sentimento constitucional.
O Sr. Deputado perguntou-me ainda se eu entendia que a Constituição deveria manter-se imutável. É evidente que a minha resposta é «não!»
Queria deixar claro que, pessoalmente, sou dos que entendem que, ao contrário do que se afirma frequentemente, a actual Constituição não impede o desenvolvimento. No entanto, não excluo a ideia de que, em cada momento, a Constituição possa ser revista, aperfeiçoada e melhorada.
Igualmente não contesto que a evolução natural da sociedade possa interferir para se verificar essa melhoria e essa revisão. O que contesto são os objectivos prosseguidos, isto é, o facto de a revisão ser conduzida em determinado sentido para se alcançar determinado tipo de objectivos com os quais não estou de acordo.
Sr. Deputado António Vitorino, quero agradecer-lhe as referências iniciais e dizer-lhe que concordamos que ninguém deve ficar excluído do arco constitucional. Não concordamos com as suas palavras, embora possamos estar do acordo com a ideia que lhes está subjacente.
Pessoalmente e ao contrário do que o Sr. Deputado ontem afirmou, não concordo com a ideia de que, com esta Revisão Constitucional, se vai acabar a «querela constitucional». É que, provavelmente, esse também terá sido o propósito do Partido Socialista, aquando da revisão em 1982, e a «querela» não terminou. Atendendo ao dinamismo e à evolução defendidos pelo Sr. Deputado, é natural que admita - hoje e em futuras revisões - que a Constituição venha a sofrer melhorias e aperfeiçoamentos.
Agradeço a sua explicação sobre os votos diferenciados relativamente ao PCP e ao CDS e uma outra - embora não me tenha parecido suficientemente clara - relativamente ao que é a postura do Partido Socialista, que, acho, lhe cabe por direito, na liderança da esquerda democrática como alternativa ao PSD (mas não alternância, como o Sr. Deputado ontem afirmou, certamente por lapso). É que, pessoalmente, preferiria que o PS constituísse uma alternativa e não uma alternância.
Quanto à Sr.ª Deputada Assunção Esteves, gostaria de abordar mais uma vez a questão do que foi o 25 de Abril e das suas implicações relativamente ao texto constitucional e também o facto de a Sr.ª Deputada ter referido que, em 1976, o texto da Constituição não consubstanciava uma democracia política.
Se me permite, gostaria de fazer-lhe uma observação: é que a Sr.ª Deputada é ainda muito jovem e, provavelmente, viveu o período pós-25 de Abril de uma forma diferente da que foi vivida por outros colegas seus e até meus.
Ora, a verdade é que para que a democracia se implante é preciso dar um primeiro passo. E o primeiro passo foi dado. A verdade, que todos reconhecemos e que julgo não ser um mal mas uma inevitabilidade, é que, no dia seguinte, em Portugal, apareceu a democracia política e pluralista e a Constituição, o que não aconteceu por «obra e graça do Espírito Santo». Portanto, houve passos difíceis que tiveram de ser dados.
Ainda a propósito da sua intervenção, penso que não será contraditório que eu preste aqui uma homenagem muito sincera a todas as pessoas, particularmente aos trabalhadores, que, de uma forma muito viva, «agarraram» a ideia de liberdade que o 25 de Abril lhes deu, que lutaram por essa ideia, que fizeram coisas boas, embora também algumas más - sobretudo se vistas através dos olhos dos que estão a rever a Constituição em 1989 -, convencidos de que estavam a trabalhar no sentido de um Portugal democrático. E acredito neles por ter vivido aquele período de uma forma muito sincera e muito viva.
Sr.ª Deputada Assunção Esteves, naturalmente que concordamos que nada há que deva legitimar nem ser condicionante das reais transformações da sociedade portuguesa, a não ser os parâmetros fundamentais que tenham a ver com a liberdade e com a democracia.

Vozes do PSD: - Muito bem!

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor, Sr.ª Deputada.

A Sr.ª Assunção Esteves (PSD): - Muito obrigada.

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Sr. Deputado, é só para me associar à sentida homenagem que acaba de prestar aos que fizeram o 25 de Abril com a vontade de liberdade que todos sentimos.
No entanto, devo dizer-lhe que o meu argumento era no sentido de afirmar que essa vontade de liberdade não podia ser limitada pela impossibilidade do melhoramento das condições da vida através de medidas legislativas que não sejam as revisões da Constituição, naturalmente, obedecendo à matriz da democracia e tendo em conta o seu aperfeiçoamento.
Também não neguei que existisse democracia política por contraposição ao regime anterior ao 25 de Abril. No entanto, como o Sr. Deputado sabe, em 1976, não havia uma democracia política inteiramente conseguida.
Não obstante, adiro sentidamente à sua homenagem aos que fizeram o 25 de Abril.

O Orador: - Na sequência de uma observação do Sr. Deputado Rui Machete, gostaria de me referir a uma outra feita pela Sr.ª Deputada - julgo que «ao correr da pena» - e que é a de que quando os adversários políticos utilizam determinado tipo de argumentos, há uma tendência para «colá-los» ao partido A, B ou C.
Assim, reafirmo mais uma vez que esse tipo de observações - ser «colado» hoje ao PCP ou, amanhã, ao CDS - não me afectam absolutamente nada. No entanto, penso que esse tipo de intervenções são ou pretendem ser inibidoras do que deve constituir o comportamento correctamente assumido por cada deputado e por cada partido e rebelo-me contra essa atitude.
Ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, agradeço as referências que fez e, respondendo concretamente às questões que pôs, digo-lhe que é evidente que não entendemos do mesmo modo a revisão da Constituição, embora não no sentido formal - o dos parâmetros a que deve obedecer a revisão e o das regras impostas pela própria Constituição que, apesar de tudo, devem ser cumpridas.
O Sr. Deputado concordará que o problema não é esse. O problema coloca-se relativamente às soluções previstas - aí discordamos do CDS - em cada fase da revisão e ao que se pretende obter com esta.
Portanto, nesse contexto respondo à sua segunda questão, dizendo que não pretendemos que a Constituição perpetue a esquerda mas também não entendemos que a Constituição deva ser orientada no sentido de ser só a direita a rever-se no texto constitucional.

Aplausos do PRD, do PCP e do Sr. Deputado Ferraz de Abreu (PS).

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Começamos agora, com a apreciação do artigo 13.º, a fase decisiva e decisória do processo de revisão constitucional.
Mas começamos mal e não é por causa do artigo 13.º e seguintes.
Começamos sem o conhecimento prévio do relatório da CERC, com a própria Mesa da Assembleia impreparada, com os jornalistas parlamentares a terem de recorrer a toda a sua inteligência, intuição e experiência para perceber o que se passa e o que se discute, de forma improvisada e atabalhoada.
A discussão e aprovação do regimento redutor agora aprovado veio comprovar a tese aqui recentemente desenvolvida em declaração política proferida pelo meu camarada José Magalhães em nome da minha bancada, da existência de um triplo pacto entre o PS e o PSD onde constava o acordo para a aceleração dos trabalhos.
Os magros tempos para discussão, o engarrafamento de centenas de votações que se vão processar em quatro tardes das próximas quintas-feiras a perspectiva de arrumar, rapidamente e em força, o processo de revisão até meados de Maio para o separar, no tempo, das eleições para o Parlamento Europeu, resultará inevitavelmente em prejuízos irremediáveis para a transparência, a dignidade e a democracidade dos debates. A pressa do PSD e a intranquilidade de consciência do PS podem conduzir a que este Hemiciclo se transforme num palco onde exista um número reduzido de protagonistas e uma esmagadora maioria de deputados transformados em espectadores a quem se reclama tão só o aplauso, o voto e a presença à quinta-feira.
Com esta grelha de partida, neste reinado de pressa e confusão, num acto de que tem muito de transcendente para o regime democrático, o PS e o PSD preferem o «tudo ao molho; fé na fila da frente e às quintas logo se vê!» ...!
Contra isto se bateu o PCP, usando os seus direitos regimentais, contactando, dialogando e tentando o encontrar de soluções acertadas com outros grupos parlamentares, não calando à opinião pública as críticas justas que têm de ser feitas ao PS face ao «regimento-espartilho» que se aprovou com o PSD.
E confundir a nossa tenacidade e determinação, por exigência da democraticidade e transparência dos debates, com o fermento e alimento de querelas e afrontamentos entre a esquerda é distorcer e fugir às questões centrais que objectivamente colocámos, tanto no plano processual como na substância das soluções indiciadas.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao começarmos hoje o debate da Revisão Constitucional nesta Casa soberana e decisória, queremos reafirmar as nossas fundas preocupações perante os acordos estabelecidos entre o PS e o PSD e que indiciam uma revisão globalmente negativa.
Demonstraremos que não tem razão quem nos acusa de um posicionamento de residência destrutiva, acusação que deixa de ser credibilidade à luz da avaliação objectiva do nosso trabalho na CERC onde procurámos aperfeiçoamentos, os consensos, o debate das ideias e soluções mais justas. O que não fazemos nem faremos é assumir silêncios e a passividade perante as questões centrais onde o PS indicia claudicação e graves cedências aos desígnios do PSD.
Com frontalidade e persistência tentaremos que o PS não conceda ao PSD o poder de definir o modelo futuro da comunicação social, a privatização de todos os jornais e o leilão das rádios públicas, a extinção do Conselho da Comunicação Social e o regime da TV privada.

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Com determinação bater-nos-emos para que o PS não conceda ao Governo poderes incomensuráveis para desnacionalizar empresas e sectores, fomentar negócios perante a dispensa de concurso público, permitir a invasão e o abocanhar pelos estrangeiros no nosso património empresarial e atingir indirectamente direitos fundamentais dos trabalhadores.
Não pouparemos esforços nem faremos silêncios às cedências indicadas pelo PS à direita quanto à restrição dos direitos dos agricultores e à supressão da referência constitucional à reforma agrária.
Reclamaremos do PS as suas responsabilidades originais na defesa do Serviço Nacional de Saúde, universal, geral e gratuito, e que torna incomportável o seu novo posicionamento quanto ao princípio.
Denunciaremos todas e quaisquer propostas que tendam à construção, por via eleitoral, da bipolarização, através da redução do número de deputados, aleijando assim o princípio da proporcionalidade.
Usaremos os argumentos do PS para impedir que seja o próprio PS a abdicar de mecanismos de fiscalização parlamentar ao Governo, nomeadamente através da liquidação da figura da ratificação.
Questionaremos e lutaremos para que não se concretize o entendimento negativo do PS e do PSD para bloquear e adiar sem horizonte a criação das regiões administrativas.
São estas, para nós, as questões centrais que estão colocadas nesta revisão; questões que nos preocupam quando relacionadas com as coisas concretas e a vida concreta, relacionadas com a política que está a ser praticada pelo Governo: os tentáculos laranjas que se entendem pelo Estado, as privatizações, a tentativa de liquidação da reforma agrária, o pacote laborai, a política desgraçada no sector da saúde ou a forma como este órgão de soberania é tratado pelo Governo.
É disto que se trata! É disto que falamos!
É isto que nos preocupa!

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A concretização destas motivações ao texto constitucional constituiria uma delibitação das fronteiras de defesa da democracia, concedendo ao PSD instrumentos para provocar danos sérios para todos os trabalhadores e para o povo português, estreitando-se as alamedas do nosso devir colectivo.
Pela nossa parte, entendemos que um objectivo justo não deixa de ser justo quando encontra oposição dos defensores de privilégios e injustiças. Os trabalhos na CERC, aliados às reclamações e aspirações que nos chegam do movimento popular, provaram, e provam agora, que nos aproximamos do limiar do décimo sexto ano da revolução libertadora, que vale a pena continuar a defender esta Constituição que é e será de Abril.

Aplausos do PCP, de Os Verdes e do Sr. Deputado Independente Raul Castro.

O Sr. Presidente: - Para pedir esclarecimentos, tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado Jerónimo de Sousa, tenho demasiada consideração por si para deixar de colocar-lhe algumas questões.
A minha tendência era - espero que possa tornar a ser - no sentido de privilegiar o trabalho útil de aperfeiçoamento da Constituição em, detrimento de afirmações espectaculares de carácter ideológico, ataques de partidos e bosquejos históricos do que fomos e havemos de ser. A minha visão, um pouco pragmática, é a de que a Constituição espera de nós um trabalho útil para a melhorarmos.
Evidentemente que se o PCP e outros partidos quiserem enveredar pelas afirmações proclamatórias, diremos o necessário para que não possa afirmar-se a «intranquilidade a nossa consciência», tal como lhe chamou há pouco o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.
O Sr. Deputado afirmou que tínhamos «intranquilidade de consciência». Porquê? Porque não concordamos com o PCP? Porque não concordámos com muitas das propostas do PSD, do CDS e de outros partidos?
Ora, tínhamos a nossa própria proposta, lutámos pelas nossas próprias soluções, mas sempre condicionados pela exigência constitucional de uma maioria de dois terços, coisa que o PCP nunca quis entender. Até parece que poderíamos fazer a Constituição que quiséssemos e que poderíamos ter chegado à Comissão de Revisão Constitucional e ter dito: «Ou aprovam a nossa proposta ou nada!» O PCP teria ficado felicíssimo porque a sua é uma postura imobilista!
É que dizem que lutariam e que vão lutar pela reforma agrária, pela irreversibilidade das nacionalizações, pela apropriação colectiva de todos os meios de produção...

O Sr. José Magalhães (PCP): - Todos?

O Orador: - Desculpe, mas foi essa a vossa posição em sede de Comissão de Revisão Constitucional! Não foi outra e está registada nas Actas!
Protestos do Sr. Deputado José Magalhães (PCP).
Sr. Deputado, não me interrompa porque eu próprio também não o fiz, mesmo quando tentou provocar-me, portanto, peco-lhe o favor de me respeitar quando estou a refutar os vossos argumentos!
Como lhe disse, consta das Actas!
Ora, a nossa posição é diferente da do vosso partido porque, muito elementarmente, entendemos que, assim como 1982 não era 1976, também 1989 não é 1982! O mundo rodou, a terra moveu-se! Moveu-se o universo físico e também o universo civilizacional que, hoje, não é o mesmo e os senhores tinham uma obrigação especial de saber isso!

Aplausos do PSD.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Muito bem!

O Orador: - Assim, pedimo-vos: discordem no que quiserem, digam que errámos - é um direito vosso -, mas não nos venham falar na «intranquilidade da nossa consciência»! É que, em consciência, decidimos pelo que entendemos que era melhor e se não conseguimos fazer valer todos os nossos pontos de vista foi porque não tínhamos uma maioria de dois terços para o atingir! E, como sabem, a Constituição exige a aprovação de alterações por uma maioria de dois terços de votos!
Vejamos dois exemplos.
O PSD dizia-nos: «... se não for encontrada uma solução de acordo no que toca à irreversibilidade das

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nacionalizações, então, fica o que está e o vosso partido tem que assumir a responsabilidade perante o País!» Ora, hoje em dia, com Portugal integrado na Europa, com uma economia de mercado, acham que o PS poderia ter tomado uma atitude dessas? Claro que não!
Este é um exemplo que poderia repetir a propósito de outras propostas de alteração. Aliás, oportunamente, veremos que assim é.
Portanto, o PCP tem o direito de considerar a revisão globalmente negativa, mas quero afirmar que, embora não tendo podido ser a «nossa», esta é uma Revisão Constitucional de «compromisso» e, apesar disso, é globalmente positiva. Assumimo-la como tal, sem nenhuma espécie de complexos, inclusivamente, dando a camaradas nossos - e não só ao PCP - o direito de discordarem de soluções pontuais que votámos favoravelmente em sede de comissão. Isto é normal num partido aberto como o nosso.
Acontece que, dentro do nosso partido, se formou uma maioria no sentido de alguns votos favoráveis, de outros desfavoráveis, de abstenções ... Ora, tudo isto e natural.
Então, para quê estas afirmações proclamatórias de que somos uns criminosos natos, lombrosianos, que estamos a destruir a Constituição de Abril, etc?
É que se não tivesse sido o nosso partido ainda hoje teríamos um Conselho da Revolução! Se não tivéssemos actuado, o País ainda hoje teria o poder político sujeira ao poder militar!
O essencial da Constituição de Abril ainda permanece! Não se tocou num único direito dos trabalhadores porque não o permitimos, embora tivesse havido propostas nesse sentido. Credite-nos o PCP isso, ao menos!
Tentámos condicionar - e conseguimo-lo - a forma pela qual se vai processar a reprivatização dos bens nacionalizados em 1974.
É evidente que, em termos de comunicações social, não conseguimos obter soluções ideais, mas quando chegar a altura, provaremos que, globalmente considerada, a solução encontrada não é pior do que a situação actual. Prová-lo-emos sem nenhuma espécie de complexo ou de «intranquilidade de consciência»!
Portanto, sugiro que, de algum modo, tentemos conseguir arranjar um estilo para a discussão destas matérias em que não nos ofendamos mutuamente, em que cada um respeite os pontos de vistas dos seus colegas nesta Assembleia.
Discordem no que puderem e até vos digo que, nalguns casos, vos saúdo e acho importante o papel da vossa discordância! Já o disse e di-lo-ei sempre: é bom que haja várias perspectivas em relação a cada problema. Mas respeitem o nosso ponto de vista! E não digam que estamos «intranquilos», que «assassinámos» as regiões administrativas .... como se pudéssemos ser acusados disso! Pessoalmente, poderei se acusado disso e aceito essa acusação, mas o meu partido não! O PS é o mais «regionalizador» possível!
Ora, como é óbvio, não posso ouvir acusações destas! Além disso, mais tarde, ver-se-á se, efectivamente, a solução encontrada facilita ou não a regionalização...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, já esgotou o seu tempo pelo que lhe solicito que conclua o seu pedido de esclarecimentos.

O Orador: - Sr. Presidente, não fui eu o iniciador da prática de fazer intervenções na generalidade. Aliás, julgava que iríamos passar à discussão do artigo 13.º...

O Sr. Presidente: - Não é essa a questão, Sr. Deputado...

O Orador: - Sr. Presidente, não posso é deixar de dizer isto.

Parece que é possível descontar no tempo do meu partido e, aliás, vou terminar. Portanto, Sr. Presidente, peco-lhe que faça de conta que pedi a palavra para uma intervenção...
Repito que vou terminar e que não farei muitas intervenções do género desta: serei pragmático, serei positivo e realista na discussão dos problemas.
Assim, faço um apelo para que púnhamos um pouco de ordem e de disciplina nas nossas discussões: se pudermos, discordemos sem nos ofendermos e sem discursos desta ordem, que, na verdade, não conduzem a uma Revisão Constitucional equilibrada, positiva e consensual que é o que é necessário que aconteça!

Aplausos do PS, do CDS e de alguns deputados do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Maia Nunes de Almeida.

O Sr. Presidente: - Para responder, tem a palavra o Sr. Deputado Jerónimo de Sousa.

O Sr. Jerónimo de Sousa (PCP): - Sr. Deputado Almeida Santos, respondo-lhe com o mesmo nível de consideração e tendo em conta que este debate não se faz no plano pessoal.
Aliás, esta Câmara não pode ser comparada a uma aula de meninos da 1.ª classe. É evidente que estamos aqui a fazer política e a discutir ideias e soluções diferentes e é neste quadro que nos colocamos. Mesmo quando falamos em «intranquilidade de consciência», fazemo-lo no plano político, não estando a fazer qualquer ataque pessoal e gostaria que este aspecto ficasse bem sublinhado.
O Sr. Deputado Almeida Santos afirmou que «fazemos proclamações», ora fundamentalmente, o que fizemos foi expor preocupações a que o senhor não respondeu, tendo distorcido o sentido de algumas!
O Sr. Deputado disse que eu tinha afirmado que «o PS quer assassinar». Ora, posso dar-lhe uma cópia do texto da minha intervenção onde poderá encontrar uma dessas expressões.
Mas o Sr. Deputado não pode esperar que o Partido Comunista Português silencie as questões centrais da Revisão Constitucional sobre as quais está em desacordo face ao acordo PS/PSD... Certamente, o Sr. Deputado respeitará esta nossa opinião. Esta é que é a questão central que se coloca.
Quando falei das desnacionalizações, da regionalização - questões centrais que se colocam a nós, PCP -, é evidente que procurava influenciar o debate ao nível das ideias.
E quanto a estas questões concretas, o Sr. Deputado não respondeu!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto!

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O Orador: - É certo que responderá depois Sr. Deputado Almeida Santos...! Agora, não faça uma tresleitura daquilo que eu disse, já que o que afirmei não foi nem mais nem menos do que o que está escrito e não seremos nós - eu afirmei isto - a tentar provocar qualquer querela ou afrontamento à esquerda. O que procuramos é denunciar o conteúdo objectivo deste acordo PS/PSD...

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - ..., apontando o dedo acusador fundamentalmente para aquela bancada - aliás, como o Sr. Deputado fez recentemente numa declaração política. É que, como referi aqui, não desligamos esta Revisão Constitucional da vida, das coisas concretas.
Na verdade, falei no pacote laborai - questão com que o seu partido também estará em desacordo -, nas desnacionalizações que estão a ser feitas a trouxe-mouxe, na política de assalto à reforma agrária e de destruição das unidades colectivas de produção, na política desgraçada da saúde. E são este Governo e este PSD concretos que querem esta revisão, para ganhar na parte económica o que os senhores cederam e no pacote laborai aquilo que os senhores não cederam.
É contra isto que nos bateremos com a nossa voz firme, tenaz, sem querelas, mas com a polémica e a firmeza que o Sr. Deputado nos conhece.
Com toda a elevada consideração que tenho por V. Ex.ª, esteja descansado, Sr. Deputado Almeida Santos, de que, apesar desta concepção e deste respeito, seremos, de facto, firmes defensores dos princípios da Constituição de Abril!

Aplausos do PCP.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado, com todo o respeito, gostaria apenas de dizer-lhe que não temos da revisão de Constituição a noção e a concepção de um combate a qualquer Governo que esteja; não é isso! Nós estamos a fazer uma Constituição para o País do ponto de vista dos seus interesses.
Porém, se acontecer que a Constituição que consideramos melhor para o País facilitar momentânea e transitoriamente a vida do Governo que está, nem por isso deixaremos de fazê-la.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Sr. Deputado Almeida Santos, pode não ser essa a concepção do PS. No entanto, já não digo o mesmo do Governo e do PSD.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Costa Andrade.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Também era no plano da representação das coisas que começaríamos hoje a discussão directa do artigo 13.º da Constituição.
De todo o modo, já ontem a propósito do Regimento especial que irá regular os nossos trabalhos neste processo, e hoje, sobretudo pela voz do PRD e do PCP, se introduziu aqui um debate que transcende em muito a discussão do artigo 13.º

O Sr. João Corregedor da Fonseca (Indep): - É um debate desconfortável!

O Orador: - Não é não, Sr. Deputado. É até muito agradável. Não vejo onde esteja o desconforto...!
Entendíamos nós, Sr. Presidente e Srs. Deputados, que o sentido da nossa impostação geral em matéria de Revisão Constitucional decorreria, por via indutiva, das votações que, passo a passo, fossemos tomando e das explicações que fossemos dando à Câmara e ao país através dos órgãos da comunicação social. Isto sendo certo que essa via contava já com um confortável horizonte de compreensão, consubstanciado em todas as nossas posições gerais em matéria de Revisão Constitucional.
Não aconteceu assim e, por outro lado, concedendo um pouco à imediação do diálogo, deixaremos aqui duas notas muito sucintas sobre a nossa impostação geral em termos de Revisão Constitucional.
A primeira vai no sentido de salientar que, como é óbvio, estamos aqui num processo de Revisão Constitucional. Portanto, assumimos aqui, de pleno direito e com todas as implicações, o papel, o estatuto e a legitimidade de legislador constituinte.
As normas constitucionais que recebemos estão, do nosso ponto de vista, problematizadas, tanto no que respeita à sua adequação como à sua justeza e idoneidade, para o regular funcionamento das instituições democráticas.
Não somos daqueles que, por um vício qualquer, cristalizamos e convertemos em novas antologias as normas que ontem foram aí postas por outro legislador constituinte.
Não se acredita hoje nas virtualidades do Direito natural. O Direito não se lê nas estrelas ou na natureza das coisas. O Direito é obra do Homem; é o Homem que vai fazendo o Direito.
É nesta postura que nos colocamos: não há Direito natural ou, pelo menos, não temos a ele acesso, nem ao Direito natural de raiz medieval, nem aos outros Direitos naturais (ou chamados assim) que se foram fazendo a partir do espanto que um ou outro homem teve.

O Sr. Herculano Pombo (Os Verdes): - Dos «Dez Mandamentos»!

O Orador: - São já decorridas muitas décadas sobre o espectáculo da sociedade inglesa no período da industrialização, quando, com alguma arrogância, os homens tentaram prever e captar o futuro.
A nossa postura não. é esta, mas a de que o Direito vai sendo feito. E estamos aqui a fazer Direito constitucional com a certeza e com a convicção da contingência da coisas.
Não temos contudo a certeza de que as gerações futuras se venham a rever plenamente nessas soluções. A História está cheia de escárnio em relação aos narcisismos de períodos históricos que pensaram ter, de uma vez por todas, encontrado a solução. No entanto, aqueles que nos sucederem terão de nós pelo menos a

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imagem de que não hipostasiámos, de que não idolatrámos os mitos que fomos criando. Trata-se de normas de Direito como quaisquer outras; foram postas mas não impostas às gerações futuras.
Em segundo lugar, a nossa postura não é a de um partido que apoia maioritariamente um Governo de conjuntura. Aqui somos mais do que isso; aqui somos um legislador constituinte para este e para todos os governos que se forem sucedendo.
Penso assim que, por exemplo, o PCP presta um péssimo serviço à democracia quando, como acabou de fazer há pouco, referencia todas as soluções em relação a este Governo. É que isto representa um perigo terrível, já que pode ter o efeito de profecia que se cumpre a si mesma. Com efeito, à força de se identificar este Governo com um qualquer governo conjuntural, corremos o risco de o governo ser inevitavelmente sempre esse. E isso, que para nos seria de certa maneira reconfortante...

Vozes do PCP: - Ah!

O Orador: - ..., de outro ponto de vista, teria também um certo sabor amargo. É que se retiraria assim a alia do jogo político, e a alia - dizem os sociólogos modernos - é o que dá gozo e legitimação à vida política. Com efeito, sem alia a vida política não tem gozo e nós gostamos do gozo político!

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Estou a ver que lhe dá muito gozo!...

Risos.

O Orador: - De resto, nesta postura de uma certa transcendência, de uma certa metapolítica, não estamos felizmente sós. Com efeito, acompanham-nos os partidos que sabem, como nós, distinguir os planos; partidos cuja oposição a este Governo é evidente, mas que como nós também fizeram este esforço de transcendentalização em relação ao momento, a fim de discutirmos direito constitucional.

Aplausos do PSD.

Não posso deixar de, neste momento, louvar a atitude do PS, que connosco comunga neste plano, afastando-se de nós - por vezes com que exagero... - no outro plano. Portanto, não posso deixar de o elogiar neste ponto.
Não posso também deixar de, pelas mesmas razões, dirigir a minha saudação ao CDS, partido que se coloca na mesma postura.
Lamento, porém, que o PCP se auto-exclua deste âmbito e continue aqui sem perceber que o que está em jogo, nestes dias em que discutimos a Revisão Constitucional, não é este Governo mas todos os governos possíveis; os governos no universal.
Por último, Sr. Presidente e Srs. Deputados, como representante, aqui e agora, do partido maioritário - partido com algumas responsabilidades, pelo menos na gestão das coisas que tornaram possível a nossa presença aqui com o trabalho da comissão devidamente concluído -, não posso deixar de dirigir, em nome do PSD e em nome (na pane em que o representamos) do País, os nossos sinceros agradecimentos ao presidente da Comissão Eventual de Revisão Constitucional, Sr. Deputado Rui Machete, pela dignidade, tolerância até ao limite, eficácia, inteligência, patriotismo e denodo que impôs a sua acção à frente da comissão.

Aplausos do PSD e do CDS.

Expresso também o nosso agradecimento a todos os colegas de outras bancadas, sobretudo àqueles que, pela sua persistência e acutilância, mais nos estimularam e foram um acicato para o nosso trabalho.
Gostaria de dar também um agradecimento - the last but not the least - aos funcionários que mais directamente colaboraram com a comissão e que, numa matéria com tanta complexidade, deram uma óptima conta de si. Também a eles estamos todos gratos.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: É com esta atitude de espírito que desde já nos dispomos a dizer que votaremos favoravelmente o artigo 13.º tal como vem proposto da comissão, que, se me não engano, manteve a versão actual.

Aplausos do PSD.

Entretanto reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Vítor Crespo.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, peço a palavra para interpelar a Mesa.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Marques Júnior (PRD): - Sr. Presidente, pareceu-me que o Sr. Deputado Costa Andrade teria referido, na sua intervenção, o PRD como estando a obstruir de certo modo o processo de revisão.
Assim, queria saber se, efectivamente, em relação à intervenção que produzi, em que apesar de não ter referido concretamente o artigo 13.º afirmei que já tinha-mos passado pelo 12.º - hoje objecto de discussão -, cometi alguma gaffe. É que não quero criar qualquer obstrução aos trabalhos de revisão, embora se possa deduzir da intervenção do Sr. Deputado Costa Andrade ter sido essa a intenção do PRD.

O Sr. Presidente: - A única coisa que o Sr. Deputado fez foi gastar 32 minutos do tempo do PRD, aliás legitimamente e dentro do sistema estabelecido, ficando com menos tempo para o resto. Portanto, presumo que ninguém tem qualquer reparo a fazer e até que não houve nenhuma intenção nesse sentido.
Contudo, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado Nogueira de Brito, dou a palavra ao Sr. Deputado Costa Andrade, uma vez que penso que quererá dar alguns esclarecimentos sobre este ponto.

O Sr. Costa Andrade (PSD): - Obviamente, Sr. Deputado Marques Júnior, nada na minha intervenção permite concluir uma referência de censura à intervenção de V. Ex.ª Pelo contrário, o que fiz foi louvar-me da sua atitude e do partido que representa, tal como até do PCP. Portanto, louvei-me para legitimar esta nossa intervenção, que não tínhamos programado, como de resto se notou pelo seu carácter de improviso.
Assim, a referência que fizemos à intervenção do Sr. Deputado Marques Júnior foi apenas no sentido de dizer: «ou há moralidade ou comem todos». Já que outros o fizeram, também queríamos dizer alguma

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coisa. Por conseguinte, se de censura se tratasse, também incorreríamos nela.
De resto, também aproveito para dizer, respondendo a um aparte do Sr. Deputado Marques Júnior, que a nossa referência ao PS e ao CDS foi porque, em sede de intervenções, estes partidos fizeram um expresso apelo àquela postura metodológica que referenciei, no sentido de separarmos as águas em relação ao plano da conjuntura governamental e discutirmos a Constituição. O PS e o CDS fizeram também expressamente esta referência e só por isso é que os referi.
Eu não tinha um sinal do PRD neste sentido, pelo que seria abusivo da minha parte e eu próprio podia sujeitar-me à censura. Quem me legitimou a ser intérprete do pensamento do PRD? É só esta a explicação.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, peço a palavra para perguntar se entramos, finalmente, na discussão do artigo 13.º

De qualquer maneira, Sr. Presidente, gostaria...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, de acordo com as nossas notas, estão inscritos os Srs. Deputados Nogueira de Brito e Raul Castro, este último para pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Costa Andrade.
Pergunto se, neste momento, também pretende fazer um pedido de esclarecimento ou uma intervenção.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, faço uma intervenção, começando por propor a seguinte questão metodológica: Hoje, todos aceitámos ...

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, embora os tempos estejam sempre a contar, temos de pôr um pouco de ordem nos nossos trabalhos.
Pergunto, pois, ao Sr. Deputado se quer pedir esclarecimentos ao Sr. Deputado Costa Andrade, se fazer uma pergunta à Mesa ou fazer uma intervenção.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, quero fazer uma intervenção, se V. Ex.ª me der licença.

O Sr. Presidente: - Tem, então, a palavra para uma intervenção e informo-o de que o tempo de que o seu partido dispõe começa a contar.

O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, com a intervenção que vou fazer queria iniciar a discussão da Revisão Constitucional, efectivamente.

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Muito bem!

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, antes dessa intervenção, há outros deputados inscritos.

O Orador: - Consumindo embora o tempo semanal que está confiado ao meu partido nesta Revisão Constitucional, começarei por colocar a seguinte questão metodológica: efectivamente, todos nós consentimos que hoje houvesse, por parte de todos os partidos, uma intervenção preambular, mas, por uma questão de método, proponho a V. Ex.ª que, a partir de hoje, sejam consideradas, em primeiro lugar, as intervenções dos autores das propostas pela sua ordem de apresentação.
Daí que - e peço desculpa ao Sr. Deputado Raul Castro, uma vez que também se inscreveu, eu me tenha reclamado do direito de intervir - aliás, eu estava inscrito.
Em relação ao artigo 12.º, apresentámos uma proposta, da qual desistimos, mas, em relação ao artigo 13.º, apresentámos uma proposta de alteração dos n." l e 2 que mantemos. Por isso, pedi a palavra para defendê-la.

O Sr. Raul Castro (Indep.): - O meu pedido de palavra não é sobre essa questão.

O Orador: - Nesse caso, Sr. Presidente, talvez seja melhor que o Sr. Deputado Raul Castro faça a sua intervenção, para não interferir com a matéria do dia, digamos assim.

O Sr. Presidente: - Desculpe interrompê-lo, Sr. Deputado, mas terei de dizer-lhe o seguinte: em conferência de líderes, começámos por colocar a hipótese de haver um período inicial de apresentação, que foi fixado em 20 minutos, e um período final de intervenção, também fixado em 20 minutos. Ficou estabelecido, em conferência de líderes, que o período inicial não teria lugar e ontem foi afirmado que começaríamos a discussão da Revisão Constitucional pelo artigo 12.º
Acontece, porém, que a proposta de alteração ao artigo 12.º foi retirada pelo Grupo Parlamentar do CDS, pelo que já entrámos, efectivamente, no período de discussão da Revisão Constitucional. Agora, não é a Mesa que vai dizer para os Srs. Deputados fazerem intervenções neste ou naquele tom. Cada partido consumirá o tempo que lhes está atribuído, conforme desejar.
Assim, estamos a discutir a Revisão Constitucional, começando pelo artigo 12.º, que não foi objecto de discussão, uma vez que foi retirada a proposta de alteração apresentada pelo CDS, estando nós agora na discussão do artigo 13.º
Portanto, faça favor de continuar a sua intervenção, Sr. Deputado Nogueira de Brito. Só depois de V. Ex.ª a ter terminado é que darei a palavra ao Sr. Deputado Raul Castro.

O Orador: - Sr. Presidente, com prejuízo da contabilidade do tempo que foi atribuído ao meu partido, uma vez que sei que o Sr. Deputado Raul Castro não vai intervir em relação ao artigo 13.º, termino a minha intervenção para que V. Ex.ª possa dar a palavra ao Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado terminará a sua intervenção quando muito bem entender.

O Orador: - Muito bem, Sr. Presidente, e desde já me inscrevo para uma intervenção, quando iniciarmos a discussão da Revisão Constitucional.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, só discuto um ponto: é que já iniciámos a discussão da Revisão Constitucional.
Sr. Deputado Raul Castro, tem a palavra.

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O Sr. Raul Castro (Indep): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que, mais do que uma vez, tem sido afirmado tanto pelo Sr. Primeiro-Ministro, nomeadamente no programa «Primeira Página», em Julho do ano passado, como por uma locutora, como ainda ontem aconteceu no «Telejornal», não estamos aqui para fazer uma nova Constituição.
Também, ao contrário do que aqui afirmou o Sr. Deputado Costa Andrade, não se trata de estarmos numa Assembleia Constituinte nem somos deputados constituintes; somos, isso sim, deputados com mandato para rever a Constituição e não para fazer a Constituição.
É, contudo, um acto de tal importância que entendemos bem justificar-se que aqui deixemos, embora rapidamente, a nossa posição.
Rever a Constituição, Sr. Presidente e Srs. Deputados, para nós e para outras forças políticas, nomeadamente para o PCP - que não está sozinho, ao contrário do que se pretende fazer crer -, é melhorar a Constituição e não, obviamente, desfigurá-la.
É o próprio sentido da Revisão Constitucional da Constituição de Abril, como expressão da revolução libertadora do 25 de Abril, que vai estar em causa com esta revisão, que não é apenas política mas também económica, social e cultural.
Para nós, é confrangedor que o PSD - que votou a Constituição de 1976 - diga agora que em 1976 não havia liberdade. Perguntamos: então, se não havia liberdade, como pôde o CDS votar contra? Só não havia liberdade para o PSD votar? Que estranha falta de liberdade teria sido esta!...
Estamos a assistir a um fenómeno curioso: pretende-se, agora, fazer uma Constituição sem ideologia. Como se fosse possível alguma Constituição não ter qualquer ideologia, nem que seja a ideologia neoliberal ou a ideologia do liberalismo autoritário!...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Ou a do marxismo autoritário!

O Orador: - Em nome deste princípio, refira-se o que a Constituição diz quanto ao estabelecimento do caminho da sociedade portuguesa no sentido de ser abolida a existência de exploradores e explorados, o que significa, obviamente, que retirar esta expressão, que marca uma tendência de desenvolvimento, é, afinal de contas, pretender assegurar a sua perpetuação.
Inicia-se esta revisão sob a égide de um acordo prévio entre o PS e o PSD. Em 6 de Agosto de 1988, o insuspeito semanário «Expresso» comentava o acordo, que então se adivinhava, nestes termos: «Na verdade, a não serem abolidos da Constituição certos preceitos, como o da irreversibilidade das nacionalizações, o actual executivo perderia todo o sentido e a sua permanência no poder tornar-se-ia insustentável. Viabilizando a Revisão Constitucional, o PS viabilizou, pois, de certa forma, o Governo de Cavaco Silva.» Esta citação, publicada com as iniciais AJS...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Quem é?

O Orador: - ... - que tanto eu com os Srs. Deputados calculamos quem seja...

O Sr. Narana Coissoró (CDS): - Eu não!

O Orador: - ... - mostra já um dos malefícios deste acordo.
Além da gravidade, a nosso ver, indiscutível deste malefício, o acordo inclui muitos outros em matérias tão essenciais, com a económica, a dos direitos sociais, nomeadamente o respeitante ao direito social, à saúde e à organização do Estado democrático.
É, pois, Sr. Presidente e Srs. Deputados, com um duplo propósito que vamos participar nesta revisão da Constituição. Múltiplas disposições da actual revisão contam com o nosso voto e a nossa concordância, já que contribuem para tornar melhor o texto constitucional, mas aqui exprimimos a esperança de que ao PS possa ainda ser possível não manter disposições que não melhoram mas contribuem para desfigurar a lei fundamental do País: a Constituição de Abril.

Aplausos do PCP e do Deputado Independente João Corregedor da Fonseca.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, exceptuando a inscrição do Sr. Deputado Nogueira de Brito, na Mesa não há qualquer outra.
São 19 horas e 29 minutos e uma vez que sessão termina às 19 horas e 30 minutos e que a característica do debate de hoje foi particular, sugiro que terminemos já os trabalhos e que, tal como está previsto, a sessão de amanhã comece às 10 horas e vá até às 13 horas, com a discussão dos artigos 13.º, 15.º, 16.º, 16.º- A e 17.º Presumo que é um leque suficientemente alargado para trabalharmos.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Peço a palavra, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.

O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, desde que há um congelamento de tempo vinculado a um agendamento, acho que seria errado fixar um número estrito de artigos, correndo o risco de amanhã nos sobrar tempo para discutir os artigos seguintes.
Penso que o carácter indicativo que consta do Regimento é para uma zona de artigos e não para um número limitado de artigos. Portanto, penso que poderíamos dizer «artigo 13.º e seguintes». É evidente que não vamos ultrapassar um certo número de artigos, mas também não me parece que haja qualquer vantagem em estabelecer uma fronteira, podendo ela representar desperdício de tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, quando enunciei estes artigos não tinha qualquer ideia de que seria essa a fronteira. Fiz apenas uma sugestão a título indicativo, pelo que a expressão «artigo 13.º e seguintes» tem a concordância da Mesa.
Srs. Deputados, antes de dar por encerrada a sessão, gostaria de dizer que os tempos gastos hoje serão publicitados amanhã.
Está encerrada a sessão.

Eram 19 horas e 30 minutos.

Entraram durante a sessão os seguintes Sr. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

António José Caeiro da Motta Veiga.
Fernando Manuel Alves Cardoso Ferreira.

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Henrique Nascimento Rodrigues.
João José da Silva Maçãs.
Joaquim Eduardo Gomes.
Jorge Paulo Seabra Roque da Cunha.
José Angelo Ferreira Correia.
José Manuel Rodrigues Casqueiro.
Manuel José Dias Soares Costa.
Rui Alberto Limpo Salvada.

Partido Socialista (PS):

Carlos Manuel Natividade Costa Candal.
Jorge Fernando Branco Sampaio.
José Apolinário Nunes Portada

Partido Comunista Português (PCP):

Carlos Campos Rodrigues Costa.
Lino António Marques de Carvalho.

Faltaram à sessão os seguintes Srs. Deputados:

Partido Social-Democrata (PPD/PSD):

Alberto Cerqueira de Oliveira.
Aristides Alves do Nascimento Teixeira.
Carla Tato Diogo.
Fernando Dias de Carvalho Conceição.
Fernando Monteiro do Amaral.
Flausino José Pereira da Silva.
Gilberto Parca Madaíl.
Humberto Pires Lopes.
José de Almeida Césario.
José Álvaro Machado Pacheco Pereira.
José Augusto Santos Silva Marques.
José Manuel da Silva Torres.
José Pereira Lopes.
Manuel João Vaz Freixo.
Maria Luísa Lourenço Ferreira.
Mary Patrícia Pinheiro e Lança.
Miguel Bento M. da C. de Macedo e Silva.

Partido Socialista (PS):

Afonso Sequeira Abrantes.
António Fernandes Silva Braga.
António Miguel de Morais Barreto.
José Luís do Amaral Nunes.

artido Comunista Português (PCP):

António José Monteiro Vidigal Amaro.
Carlos Alfredo Brito.
Jorge Manuel Abreu Lemos.
Maria de Lourdes Hespanhol.

Partido Renovador Democrático (PRD):

Francisco Barbosa da Costa.
José Carlos Pereira Lilaia.

Deputados Independentes:

Carlos Mattos Chaves de Macedo.

Rectificação ao n.º 56, de 31 de Março de 1989

Na p. 1969, col. 2.a, onde se lê «favor do PSD, do PS, do PRD, do CDS», deve ler-se «favor do PSD, do PRD, do CDS».

Os REDACTORES: José Diogo - Maria Leonor Ferreira.

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