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Segunda-feira, 6 de Fevereiro de 1989 II Série - Número 72-RC
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA
2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
II REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
ACTA N.° 70
Reunião do dia 5 de Janeiro de 1989
SUMÁRIO
Deu-se continuação à nova discussão e à votação da proposta de artigo novo - 32.°-A - apresentada pelo PCP e respectivas propostas de substituição.
Iniciou-se a nova discussão e a votação dos artigos 33.°, 35.° e 38.° e respectivas propostas de alteração e de substituição.
Durante o debate intervieram, a diverso título, para além do presidente, Rui Machete, pela ordem indicada, os Srs. Deputados José Magalhães (PCP), Nogueira de Brito (CDS), Almeida Santos (PS), António Vitorino (PS), Alberto Martins (PS), Pedro Roseta (PSD), Jorge Lacão (PS), Jorge Lemos (PCP) e Maria da Assunção Esteves (PSD).
Foram os seguintes os resultados das votações realizadas:
N.° 1 do artigo 38.º proposto pelo CDS - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PS, do PCP e da ID, os votos a favor do CDS e a abstenção do PSD;
N.° 1 do artigo 38.º proposto pelo PRD - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS e da ID e as abstenções do PCP e do CDS;
N.º 2 do artigo 38.° proposto pelo CDS - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PCP e da ID e as abstenções do PSD e do PS;
N.º 2 do artigo 38.° proposto pelo PSD - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, os votos contra do PCP e da ID e a obtenção do PS;
Proposta de substituição do n.º 2 do artigo 38.° apresentada pelo PS [n.º 2, alínea a)] - obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID;
Proposta de substituição do n.º 2 do artigo 38. ° apresentada pelo PS [n.º 2, alínea c)] - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PS, do PCP e da ID e a abstenção do PSD;
N.° 3 do artigo 38.° constante da proposta originária do PS (retomada pelo PCP, ao abrigo do artigo 133.° do Regimento da Assembleia da República) - não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD e os votos a favor do PS, do PCP e da ID.
Em anexo à presente acta, são publicadas uma proposta de substituição do artigo 35.° (PSD) e duas propostas de substituição do artigo 38.° (apresentadas, respectivamente, pelo PCP e pelo PSD).
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O Sr. Presidente (Rui Machete): - Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 16 horas.
Srs. Deputados, nós ontem acabámos a discussão do artigo 32.°-A e levantámos a hipótese de fazer uma reformulação. Não sei se ela existe ou não, mas creio que o Sr. Deputado José Magalhães poderá elucidar a Comissão a esse respeito.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, atendendo à natureza da matéria e ao conteúdo do debate, que quanto a mim foi extremamente complexo e relevante e com uma extensão adequada à importância dos temas que estiveram em apreço, nós temos necessidade de proceder a um apuramento das implicações de algumas das críticas feitas pelos Srs. Deputados. Insistiremos em chegar a uma solução que sirva os objectivos de construção de uma norma que possa ser inserida na Constituição, porventura não a título autónomo, mas utilizando algum dos artigos já existentes, e que tenha em conta as observações formuladas.
Devo dizer que a preocupação que nos rege aqui é a de que algum aperfeiçoamento é melhor do que nenhum, o que quer dizer que estamos disponíveis para considerar a hipótese de, a título exemplificativo, materializar, desde já, o que for possível em matéria de direito de mera ordenação social, como primeiro passo para a consagração explícita da ideia geral que gostaríamos de plasmar constitucionalmente. Isto mereceu, à partida, algumas reservas do Sr. Deputado Almeida Santos. No entanto, creio que, estudando-se a norma já formulada e tendo em conta a perspectivação das suas implicações e consequências, talvez seja possível estabelecer o consenso necessário para a aprovação de um texto por uma maioria alargada.
Em todo o caso, Sr. Presidente, isso só será possível no início da próxima semana, uma vez que teremos que discutir no seio da bancada do PCP o conteúdo deste debate e também os traços de uma solução que corresponda a estes parâmetros que acabei de enunciar.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, eu só gostaria de fazer uma pergunta ao Sr. Deputado José Magalhães. A questão é a seguinte: diz-se "a adopção de todas as garantias adoptáveis"...
Vozes.
O Orador: - Então, não é adoptáveis, mas, sim, "adaptáveis". Portanto, há aqui uma gralha.
Sr. Deputado José Magalhães, a minha dúvida, neste momento, é a seguinte: para o que pretende, suponho que V. Exa. vai longe de mais e a pergunta que lhe faço reconduz-se a saber se esta norma não iria descaracterizar a própria hierarquia das sanções e a própria distinção entre elas, embora pela via processual?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, compreendo que V. Exa. tenha a tentação de formular a pergunta, que, de resto, penso que é muito inteligente, mas o problema é este: nós ontem ficámos duas
horas a discutir esta matéria. Ainda por cima o Sr. Deputado José Magalhães há pouco explicitou que a vai reformular, portanto não vamos, neste momento, votar o texto. Pedir-lhe-ia que sofreasse um pouco a sua curiosidade. Nós poderíamos discutir a sua questão num outro momento. Compreendo o interesse da sua pergunta, a qual fica registada na acta. Aliás, V. Exa. pode ler a acta, que já dá alguma resposta às suas inquietações.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos agora passar ao artigo 33.° Quanto a este artigo tinha ficado por votar a proposta do PSD relativa à alteração do n.° 4.
Suponho que o Sr. Deputado Almeida Santos tinha uma proposta de substituição a apresentar.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, Sr. Presidente. Eu só gostaria de deixar aqui uma reflexão e que é a seguinte: no fundo, o que se pretendia era encontrar uma formulação em que se pudesse fugir à exigência da decisão por autoridade judicial. É que esta decisão é demorada, burocrática, complexa e, por vezes, está-se meses à espera. Quando saímos da esfera da decisão judicial caímos num novo tipo de dificuldades, ou seja, naquilo que tem a ver com a esfera administrativa, com todas as consequências que daí advêm. No fundo, o que sugeria era que se mantivesse a actual exigência de decisão judicial e que se pusesse aqui o aditamento "a lei assegurará as formas expeditivas (ou expeditas) de decisão". Desta forma abria-se um caminho para que o juiz despachasse depressa. Não há necessidade nenhuma de essa decisão ficar submetida às demoras e delongas de um processo judicial, com a abertura, o termo, o escrivão. Portanto, uma nota a dizer que isto não é uma decisão judicial, no sentido de que implica um processo, um julgamento, etc.. Não é nada disso! É uma decisão judicial, mas assegurando a lei formas expeditas de decisão. No fundo, é uma proposta que, de algum modo, mantendo a garantia do que está, ia ao encontro da nossa preocupação.
O Sr. Presidente: - Nós já tivemos oportunidade de debater esta matéria. Distinguimos o caso da extradição do caso da expulsão. Quanto à extradição não se suscitam as mesmas dificuldades. É óbvio que a extradição tem um processo...
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem um processo judicial, Sr. Deputado. O problema da expulsão é diferente, visto que aí há questões que exigem soluções mais expeditas. Aliás, V. Exa. referiu aqui o caso Triffa, que vários de nós tivemos ocasião de conhecer com algum pormenor porque no momento tínhamos responsabilidades governativas. Esse foi, efectivamente, um caso extremamente desagradável, mas outros poderão existir.
Tal como acontece para o artigo 32.°-A, talvez seja possível encontrar uma formulação que, eventualmente, satisfaça um pouco melhor este tipo de preocupações, sem criar, por outro lado, uma insegurança quanto
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àqueles interesses fundamentais que cabe salvaguardar. Deixaríamos de remissa este artigo. Temos já o artigo 32.°-A e o n.° 4 do artigo 33.° Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, gostaria de advertir que, depois desta reflexão, nós não estamos abertos a prescindir e a abrir mão da exigência de uma decisão judicial. Desde que fique assegurado que a própria Constituição aponta para uma decisão rápida, que, no fundo, equivale a uma decisão administrativa, mas que compete a uma autoridade judicial, não vemos razão para não se manter a actual exigência. Pensamos que esta solução é a melhor de todas. Assim, ficaria só "assegurando a lei formas expeditas de decisão".
Vozes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Almeida Santos, nós estamos relativamente habituados às formas expeditas da função judicial. Sabemos o que na prática infelizmente significa.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Mas na Constituição não há nenhuma chamada de atenção nestes termos. Há processos urgentes, mas não podemos encontrar em parte alguma uma fórmula destas.
O Sr. Presidente: - E quanto ao habeas corpus, Sr. Deputado?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Mas a Constituição não diz isso, Sr. Presidente. Assegura o habeas corpus. Esta seria a primeira vez que, de algum modo, se criava a figura de uma decisão judicial que teria de ter as características de uma decisão administrativa, mas que seria rápida e não implicaria um julgamento e um processo complicado. Só que teria as garantias de ser da competência de uma autoridade judicial e de respeitar o princípio da audiência prévia.
No entanto, gostaria de dizer que estamos abertos a examinar outras propostas que apareçam.
O Sr. Presidente: - Como é óbvio, há que examinar também essa proposta, que, de qualquer modo, envolve uma melhoria em relação à situação actual. Talvez fosse útil esperar mais algum tempo para que pudéssemos fazer uma reflexão um pouco mais amadurecida.
Depois temos o artigo 35.°, que é o artigo relativo às questões da informática, o qual ainda não foi votado.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, em relação ao tema anterior, que V. Exa. sustou, como é direito, e tendo em conta a observação do Sr. Deputado Almeida Santos, gostaria de dizer que nos congratulamos com o facto de ter havido uma evolução positiva entre a última vez que debatemos esta matéria e este momento. Realmente a hipótese de vir a ser admitida qualquer alteração do regime constitucional neste ponto tinha-nos preocupado bastante.
Quanto à natureza da cláusula que agora vem proposta iremos ponderar. Em todo o caso, devo dizer que seria bastante triste que o único ponto em que a Constituição apontasse para uma justiça célere fosse precisamente este. Como sabem, o PCP propõe a consagração na sede própria de diversas cláusulas, apontando casos em que é particularmente importante que a Constituição tenha esse sinal favorável à celeridade. Devo dizer que quando fizemos os debates correspondentes não encontrámos excessiva receptividade para a adopção de cláusulas desse tipo. Como ficou claro, a preocupação do PSD nesta matéria é a de administrativizar, administrativizar e administrativizar.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, não vamos discutir agora essa questão, já que não faz, salvo o devido respeito, grande sentido. V. Exa., ao formular essas observações, obriga a dar uma resposta. Estamos a discutir esta matéria sem grande utilidade porque ainda não temos os restantes textos. Pedia-lhe que V. Exa. também sustasse nas suas considerações, que terá oportunidade de fazer quando discutirmos essa matéria. Neste momento estamos a perder tempo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, estava só a sublinhar um aspecto. É que, como o Sr. Deputado Almeida Santos comunicou à Comissão uma posição nova, distinta de uma anterior, eu gostaria de alertar para o seguinte: compreendendo nós as razões que levam o Partido Socialista a anunciar o que acabou de anunciar, a introdução de uma cláusula deste tipo nesta matéria, com o carácter que o Sr. Deputado Almeida Santos sinalizou (o único caso em que a Constituição apontaria para um princípio, um critério geral de celeridade ser o caso de expulsão) seria uma discrepância susceptível de surgir como um pouco bizarra e negativa, sobretudo com a interpretação que lhe foi dada, isto é, um processo "que não seja processo" e um juiz que "quase não se comporte como um juiz". É inaceitável...
Vozes.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, mas eu também quero discutir e defender o meu ponto de vista. É que das duas uma: ou se discute, e discutimos todos, ou não se discute, e não discute ninguém. Não pode haver privilégios.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Deputado. Foi por isso mesmo que usei da palavra, tal como V. Exa. o havia feito.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, nós concordámos com o adiamento. O Sr. Deputado não pode expor os seus pontos de vista e ficar sem resposta. Os privilégios não podem manter-se! V. Exa. tem aqui o privilégio de, depois de tudo encerrado, voltar ainda a fazer críticas. Ora, isso não pode ser porque, sendo assim, eu também quero rebater o seu ponto de vista. Se não é isso que sucede, então não adiamos. É que das duas uma: ou se adia para todos ou não se adia e discutimos todos. A mesa tem de decidir se adia ou não. O Sr. Deputado está-nos a dar um sabonete e eu também lho quero dar.
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Faça favor, Sr. Deputado!
O Sr. Almeida Santos (PS): - Foi adiado, portanto não pode ser assim.
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado José Magalhães há pouco não atendeu ao sentido da minha intervenção, que foi o de evitar que entremos na matéria. V. Exa. produziu observações, dizendo que a proposta do PSD é "assim" e "assado". Ora, o Sr. Deputado estava no seu pleno direito se a estivéssemos a discutir. Como vamos adiar, não podemos entrar nessa discussão porque se não a igualdade das partes neste processo, o contraditório, fica prejudicada. Portanto, vamos adiar a discussão do n.° 4 do artigo 33.°
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, dá-me só licença que me pronuncie rapidamente sobre a questão da lisura de procedimentos?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Estamos na mesma!
O Sr. José Magalhães (PCP): - É só sobre a questão geral e abstracta, Sr. Deputado. Não aludirei ao tema.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, em termos gerais e abstractos não pode haver observações quanto à matéria.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado, mas dá-me licença de usar da palavra só em relação à questão dos "privilégios"?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
Ó Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, considero extremamente injusto que se fale em privilégio porque aquilo que aconteceu foi simplesmente o seguinte: o Sr. Presidente pronunciou-se sobre a matéria. Quando o Sr. Deputado Almeida Santos estava a pronunciar-se sobre essa matéria o Sr. Presidente interrompeu a discussão, pelo que todos os demais não se puderam pronunciar. Penso que isso é inaceitável! Se, porventura, o Sr. Deputado Almeida Santos e eu nos tivéssemos pronunciado sobre a matéria isso inibia o Sr. Presidente de o fazer? Não pode ser! Isso é que seria um privilégio absurdo de pôr ponto final em discussões incompletas! O PS e o PSD pronunciavam-se sobre a matéria, encerravam a discussão e a partir daí qualquer pessoa que interviesse sobre a matéria, ainda que para sinalizar questões tendo em vista o pró memória de uma redacção, violaria regras e poderia ser acusada de "arrogar-se" de um "privilégio". Santo Deus! É uma interpretação perfeitamente absurda.
O Sr. Almeida Santos (PS): - O Sr. Deputado queria e conseguiu recomeçar a discussão. O que V. Exa. disse não é verdade, porque só falei até ao momento em que o Sr. Presidente encerrou o debate e disse "adia-se". Respeitei a decisão da Mesa, que é o que o Sr. Deputado não quer fazer.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas ainda não tinha falado, Sr. Deputado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Também tinha mais coisas para dizer. Calei-me no momento em que a Mesa decidiu adiar. O que o Sr. Deputado quer é recomeçar o debate.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Se é essa a regra para todos, também o faremos, Sr. Deputado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - É essa a regra. É isso que temos assistido.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Penso que o Sr. Deputado José Magalhães não tem razão. E não tem razão porque eu não fiz nenhuma apreciação em termos críticos da proposta. Disse que me parecia que as coisas não estavam suficientemente amadurecidas. Não me pronunciei, não disse se era A, B ou C. É esse o ponto que é complicado, é essa a questão difícil, porque, a partir do momento em que nós começamos a fazer qualificações sobre as propostas alheias, naturalmente que temos de dar aos seus proponentes o direito de responder. Portanto, há uma distância abissal entre nós dizermos "parece que o problema não está suficientemente amadurecido" e começarmos a fazer uma apreciação qualificativa porque isso envolve imediatamente a necessidade de a outra parte reagir. Tanto é mais sintomático que até às observações feitas pelo Sr. Deputado José Magalhães ninguém sentiu a necessidade de responder.
Do meu ponto de vista, as suas observações não têm justificação. Salvo a possibilidade de recurso que VV. Exas. sempre têm, o critério que segui é correcto. Não vamos voltar a discutir este ponto a não ser no momento em que a questão voltar a ser reposta sobre a Mesa. Nessa altura, com a amplitude própria daquilo que recordámos quando foi do estabelecimento do regimento, voltaremos a discutir o problema.
Srs. Deputados, vamos passar à questão relativa à utilização da informática. Este artigo 35.° ainda não foi votado.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, o CDS tinha uma proposta de alteração para o n.° 1...
O Sr. Presidente: - E V. Exa. não teve oportunidades de a apresentar. É isso, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, Sr. Presidente. A questão que coloco é outra.
A nossa proposta traduz-se apenas no aditamento do qualificativo "pessoais" aos dados a cujo acesso teriam direito os cidadãos. Tendo, porém, em conta a discussão produzida na primeira volta da apreciação dos vários projectos, o CDS retira a sua proposta.
O Sr. Presidente: - VV. Exas. retiram a vossa proposta relativa ao n.° 1 do artigo 35.°?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exacto, Sr. Presidente.
Vozes.
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O Sr. Presidente: - É esta que está a ser discutida. É um pouco difícil retirar neste momento outra.
Portanto, neste momento temos duas outras propostas. Uma é do PCP e outra do PSD. Há uma proposta de alteração e uma outra de aditamento. A proposta de aditamento é a que o PCP apresenta para o n.° 6. Pelo menos do ponto de vista formal assim é.
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado José Magalhães tinha ficado de contactar alguém da Associação Portuguesa de Informática para tentar obter uma formulação substitutiva de todas as anteriores. Talvez tenha chegado a alguma conclusão neste domínio. Se assim fosse, seria bom que tivéssemos conhecimento dela.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é verdade que no dia 19 de Dezembro tive ocasião de ter um encontro de trabalho com elementos da direcção da Associação Portuguesa de Informática, o que me permitiu fazer uma larga troca de impressões sobre a situação actual, designadamente sobre a natureza do primeiro debate que aqui tivemos e sobre aquilo que vem acontecendo entre nós quanto ao uso da informática para os mais diversos efeitos, tanto em serviços e entidades públicas como por parte de entidades privadas.
O juízo que se obtém a partir dessa troca de impressões é de extrema preocupação em relação à quase anomia em que se vive. Em todo o caso, quanto a propostas concretas de reformulação de textos é evidente que não poderia resultar de uma troca de impressões com aquela natureza uma formulação que responsabilizasse a Associação Portuguesa de Informática, que, como sabem, tem natureza privada. Esta entidade informou-me de que pediria uma audiência a esta Comissão para manifestar os seus pontos de vista e, eventualmente, adiantar formulações.
Não estou, portanto, em condições - nem isso seria curial - de transmitir aquilo que só será transmitido pela Associação Portuguesa de Informática, se assim for entendido, e pela via própria.
Em todo o caso, gostaria de dizer que, com esse debate, se me reforçou a impressão de que é correcta a proposta que apresentámos quanto ao n.° 6 - e que, de resto, tinha colhido aqui a vossa impressão favorável, consoante provam os registos. Justifica-se perfeitamente a decomposição do actual n.° 2 em dois números, d primeiro dos quais trate do acesso de terceiros a ficheiros com dados pessoais e da interconexão de ficheiros e o segundo dos fluxos de dados transfronteiras. O tratamento do regime dos fluxos de dados transfronteiras tem de fazer-se com o uso de uma cláusula geral, similar à proposta pelo PCP, que salvaguarde a protecção dos dados pessoais e a defesa da independência nacional.
O segundo aspecto a realçar é o de que não faz sentido limitar o actual n.° 1 do artigo 35.° da forma proposta pelo PSD. As limitações legais e práticas hoje existentes em relação ao acesso aos registos informáticos que nos dizem respeito a nós cidadãos são tantas e tais que é extremamente difícil considerar-se positiva
e útil a liberalização de restrições que o PSD, no fundo, propõe no seu n.° 1. Essa impressão reforçou-se-nos face às informações que nos foram transmitidas pela Associação Portuguesa de Informática.
Em relação à ideia do PSD de fazer uma alusão à lei e a tratados internacionais, é evidente que a alusão aos tratados é desnecessária, na medida exacta em que a Constituição tem um sistema próprio, no artigo 8.°, para a vigência, na ordem interna, do direito internacional. Como é bom de ver, as normas às quais o Estado português esteja vinculado internacionalmente são vigentes na ordem interna, nos termos gerais decorrentes do artigo 8.° Seria, portanto, redundante e desnecessária a alusão que o PSD deseja.
Em relação à cláusula proposta pelo PSD quanto ao n.° 3, parece extremamente perigoso utilizar-se o critério da violação da privacidade como o único limite à não utilização da informática para tratamento de dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical e fé religiosa em particular. De facto, pode haver outros valores atingidos por uma utilização indevida. O texto do PSD seria, portanto, susceptível de legitimar formas perversas de utilização da informática num domínio que é considerado, em todos os textos de direito internacional - inclusive na Convenção do Conselho da Europa sobre tratamento automatizado de dados pessoais (que Portugal ainda não aprovou para ratificação, embora já tenha assinado) - eminentemente sensível. A norma constitucional actual é sensata, sendo susceptível de ser objecto de reinterpretações que facultem certas formas de utilização não lesiva e não contrária aos direitos do homem e, designadamente, aos interesses dos próprios trabalhadores.
Em relação ao n.° 4, gostaria de sublinhar que a proposta do PSD é positiva, embora possa ser incompleta. A distinção entre bases de dados e bancos de dados é corrente no vocabulário informático, é prevista na própria norma portuguesa de vocabulário informático que está em gestação no Instituto Português de Qualidade, na secção n, e que tem vindo a ser objecto de divulgação. Se utilizarmos, por exemplo, o dicionário de informática, editado entre nós pelas publicações D. Quixote, sobre a direcção de Pierre Morvin, verificaremos que aí se distingue banco de dados como "o conjunto de informações directamente exploráveis e geralmente estruturadas em bases de dados e cobrindo um domínio particular do conhecimento" e base de dados como "o conjunto de informação exaustiva e não redundante necessária para uma série de aplicações automatizadas e conhecidas por um sistema software que lhe assegura a gestão".
A distinção existe e talvez fosse pertinente não usar apenas a noção de base de dados, utilizando-se, também, neste preceito, a noção de banco de dados. A norma poderia dizer qualquer coisa como "a lei define o conceito de dados pessoais para efeitos de registos informáticos, bem como os termos de constituição dos bancos e bases de dados por entidades públicas e privadas e as respectivas condições de utilização e acesso".
Quanto ao n.° 5 do texto em vigor da Constituição, não há razão para alterar o seu conteúdo, havendo um problema para que fomos alertados que é o de que, provavelmente, neste momento, o número do bilhete de identidade ou mesmo o número fiscal do contri-
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buinte é já utilizado como referencial único e de identificação universal, subvertendo em larga medida aquilo que foi preocupação dos constituintes, na sequência de uma experiência bastante dolorosa durante os últimos anos do caetanismo. Consequentemente, neste momento, o problema que se coloca a este nível não é a alteração da Constituição, mas a sua aplicação a contraformas novas de reintroduzir coisas velhas e indesejáveis nesta esfera.
Em suma: o PCP pronuncia-se contra a alteração do n.° 1 nos termos propostos pelo PSD.
Quanto aos n.ºs 2, 3 e 4 estamos de acordo com a alteração, mas sugerimos que se faça o aditamento da noção de bancos de dados, além do das bases de dados, o que suponho ser uma preocupação susceptível de ser partilhada pelas diversas bancadas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nós fizemos também uma reflexão sobre esta matéria, que é uma matéria - como tivemos ocasião de discutir na primeira volta - realmente muito complexa e importante. Parece-nos que este artigo 35.°. tal como está formulado, suscita algumas dificuldade, mas, em face da discussão havida, teríamos algumas propostas de substituição a fazer.
Em relação ao n.° 1, proporíamos uma redacção diferente daquela que apresentámos inicialmente, a qual, no fundo, se destinava a salvaguardar os problemas relativos ao segredo de Estado, ao segredo de justiça e à investigação criminal. Isto é, mantendo a redacção inicial da Constituição - "Todos os cidadãos têm direito a tomar conhecimento do que constar de registos informáticos a seu respeito e do fim a que se destinam, podendo exigir a rectificação dos dados e a sua actualização" -, acrescentaríamos a expressão "sem prejuízo do disposto na lei sobre o segredo de Estado, segredo de justiça e investigação criminal", visto que estas são as zonas, consoante resultou da discussão que travámos, em que se justifica poder haver limitações ao direito de acesso dos interessados aos seus próprios dados e, se bem que a parte da investigação criminal esteja, de algum modo, contida no segredo de justiça, parece-nos haver alguma vantagem em a discriminar.
Depois, no que se refere ao n.° 2 e atendendo a alguns comentários que foram feitos, parece-nos que traduziria melhor o nosso pensamento o facto de o redigirmos do seguinte modo: "2 - É proibido o acesso a registos informáticos para conhecimento de dados pessoais e respectiva interconexão relativos a terceiros, salvo em casos excepcionais previstos na lei", ao que poderemos acrescentar, embora isso seja óbvio e sempre aconteceria, "e com ressalva do disposto no artigo 18.°".
O Sr. António Vitorino (PS): - Isso é praticamente a proposta do PCP.
O Sr. Presidente: - Com uma ligeira alteração de redacção.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, sugeria que, em vez de "dados pessoais e respectiva interconexão relativos a terceiros", se dissesse "dados pessoais relativos a terceiros e respectiva interconexão".
O Sr. Presidente: - Suponho que fica realmente melhor.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É relativo à interconexão de ficheiros?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Dos registos informáticos.
O Sr. Presidente: - Quanto ao n.° 6 que foi apresentado pelo PCP, proporíamos a seguinte redacção, que também iremos apresentar:
6 - A lei define o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras, estabelecendo formas adequadas de protecção dos dados pessoais e de outros em que o interesse nacional o justifique."
xPor consequência, a alteração faz-se na expressão "defesa da independência nacional", que é substituída pela expressão "e de outros em que o interesse nacional o justifique". Manteríamos também o proposto para o nosso n.° 4.
Quanto ao n.° 3, podemos aceitar retirar a proposta, não porque não estejamos de acordo com ela, mas porque, no fundo, nos parece poder haver alguma razão de delicadeza em estar a explicitar que a única exclusiva restrição à utilização da informática, relativa aos dados referentes a convicções filosóficas ou políticas, filiação partidária ou sindical, fé religiosa ou vida particular, seja a questão da violação da privacidade das pessoas. Isto indo ao encontro de algumas dúvidas e críticas que foram formuladas aquando da discussão.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, queria apenas fazer-lhe uma pergunta em relação ao último aspecto que focou. Depreendi que não vos foi possível ter em conta uma das observações que decorreu da reflexão de que vos dei conta há pouco. Essa reflexão é relativa à noção de base de dados e à desejabilidade de não substimarmos a problemática dos bancos de dados. É que, qualquer que seja a distinção entre uma e outra realidade, ela existe, é relevante e as massas de informação, constituída em bancos de dados, independentemente da sua característica própria, são tão relevantes para o efeito que é suposto no preceito que o PSD propôs, como a contida nas bases de dados propriamente ditas.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, percebo a sua preocupação, mas, no fundo, a ideia que tenho é de que as normas constitucionais não devem descer a especificações demasiado técnicas e, aliás, susceptíveis de evoluírem a cada passo, em particular nesta matéria onde a velocidade de mutação é muito grande. A minha ideia é a de que a matéria que diz respeito às bases e bancos de dados deve ser regulada pela lei ordinária e que a disposição constitucional deveria referir-se-lhes de uma maneira genérica. Foi nesse sentido que a expressão "base de dados" foi aqui utilizada, abrangendo, portanto, os bancos. É, digamos, uma forma particular das bases de dados. É que, se descermos a pormenores técnicos demasiado pormenorizados, correremos o risco de, rapidamente, as desactualizar e de suscitarmos dúvidas interpretativas que não me parece melhorarem a função que à Constituição cabe. Não estou a discutir o que V. Exa. referiu
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- penso que o problema dos bancos de dados é uma questão, evidentemente, importante -, mas gostaria de lhe fazer uma menção genérica na Constituição, não entrando em pormenores que, de algum modo, tecnificam a legislação constitucional.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é que sucede que o PSD já entra nesse pormenor. Se o PSD não tivesse recorrido a uma conceptologia que bebe na realidade técnico-informática, todas as observações que o Sr. Presidente fez seriam perfeitamente insindicáveis. No entanto, sucede que, tal como se recorreu já, por opção aprovada na 1.ª revisão, à noção de fluxos de dados transfronteiras - que é um conceito que tem um conteúdo bastante preciso no vocabulário informático - recorre-se agora, inovatoriamente também, no texto que o PSD propõe, à noção de bases de dados. Penetra-se, pois, de pleno no universo da informática e da terminologia informática. Base de dados, nessa terminologia, tem um significado muito específico. Distingue-se do conceito de banco de dados. São realidades diferentes, embora possam estar articuladas - normalmente estão-no. Porém, a distinção existe.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, a minha questão resume-se ao seguinte: do ponto de vista dos interesses que ao legislador constitucional se justifica serem acautelados, se acrescentarmos à Constituição a expressão "bases de dados e bancos de dados", o problema fica resolvido satisfatoriamente. Não temos nenhuma dúvida em o fazer. O que não queríamos era descer a pormenorizações técnicas de regulamentação na base de um aparelho conceptual que é muito mutável. É só isso.
V. Exa. diz-me: Bom, mas é que a expressão "base de dados" já hoje é utilizada na técnica do direito, nesta matéria informática, e é usada num sentido estrito que a distingue dos bancos de dados, podendo, portanto, colocar-nos esse problema. Penso que não teremos nenhuma dificuldade em aceitar aditar a expressão "base de dados", ficando "bases e bancos de dados". Esse problema não nos suscita nenhuma dúvida política e o objectivo é não entrarmos numa discussão técnica de informática, acautelando os interesses que se justifica serem acautelados no nível constitucional.
Srs. Deputados, consequentemente, o n.° 4 já não teria exactamente a redacção da proposta do PSD, ficando:
4 - A lei define o conceito de dados pessoais para efeitos de registo informático, bem como os termos da Constituição das bases e bancos de dados...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - V. Exa. já referiu há pouco a inutilidade da referência ao segredo de justiça e à investigação criminal. Suponho que não ficaria mal retirar a última referência porque o segredo de justiça seria suficiente.
O Sr. Presidente: - Efectivamente, a investigação criminal está abrangida no segredo de justiça.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é precisamente na investigação criminal que deve sempre ser tido em conta o segredo de justiça.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado, o problema não é esse. O texto não refere que é sobre segredo de investigação criminal mas "sobre investigação criminal". É que sendo assim não é só o segredo de justiça que está em causa.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Acerca disso peço ao Sr. Presidente e ao PSD que ponderem a conveniência de alargar às necessidades de investigação criminal para além das impostas pelo segredo de justiça, ou melhor, das que se reconhece que são impostas pelo serviço de justiça.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Mas, Sr. Deputado, o problema não é esse. É que não há investigação criminal se não houver acesso a dados e a bancos de dados. Não pode haver. Como é que poderá haver investigação criminal sem se saber qual é a estatística dos crimes do tipo A, B, C, etc.?...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não, Sr. Deputado, o problema aqui é inverso. A questão é que aqui se proíbe aos cidadãos o acesso ao que sobre eles consta nos registos, quando a lei disponha em tal sentido a propósito da investigação criminal.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, Sr. Deputado. O n.° 1 do artigo 35.° proposto pelo PSD refere o seguinte:
[...] sem prejuízo do disposto na lei sobre segredo de Estado, segredo de justiça e investigação criminal.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - É o que eu digo.
O Sr. Presidente: - Trata-se de uma restrição ao direito de acesso que os interessados têm acerca das suas próprias informações.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Claro, Sr. Presidente. Não permite aos interessados o acesso aos dados que sobre eles constam quando a lei disponha nesse sentido, o proíba em razão da investigação criminal.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Tem razão.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, há ainda uma outra coisa que gostaria de referir. Porventura, não tenho o conhecimento de VV. Exas. relativamente à discussão anterior e tenho, por isso, sempre alguma relutância em intervir. Pergunto, assim, se resultou da discussão nesta Comissão que se deveria excepcionar o disposto na lei sobre o segredo de Estado? Isso pode equivaler a deixar sair pela janela o que entrou pela porta, ou ao contrário. De qualquer modo, pode acontecer isso, porque realmente, como V. Exa. sabe, as disposições legais sobre o segredo de Estado - e o CDS está neste momento apostado em as definir no nosso país - conhecem ao longo das várias la-
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titudes, mesmo europeias, diferenças muitíssimo grandes, e algumas delas dando grandes possibilidades de definição concreta aos executivos. Assim, o que está na lei acerca do segredo de Estado poderá equivaler a uma inacessibilidade completa aos chamados dados pessoais.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Lamento, Sr. Deputado, com a pressa raciocinei ao contrário. Trata-se aqui de uma excepção exactamente ao direito de acesso, no que também se deve compreender a investigação criminal. Também estou de acordo em que se elimine esta última expressão do texto em apreço.
O Sr. Presidente: - Portanto, pretende-se a eliminação da ideia de investigação criminal.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Eram estas observações que queria fazer. Quanto ao mais, parece-me que é de louvar a alteração que o PSD propõe, que designadamente visa tornar menos restritivas as excepções que previa o n.° 1 do artigo 35.°, razão, aliás, que levou o CDS a retirar a sua proposta, a qual era também restritiva. Restringir apenas aos dados pessoais a possibilidade de acesso tinha um carácter demasiado limitativo, e por isso retirámos a nossa proposta.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é com alguma preocupação que a cláusula tem de ser encarada. Evidentemente que o texto que o PSD agora propõe é menos liberalizador do que o originariamente constante do seu projecto de revisão constitucional. Isso é um facto.
Portanto, há o acolhimento de algumas das ilações que todos pudemos tirar do debate que aqui fizemos na primeira leitura.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Este último texto apresentado pelo PSD é mais liberalizador.
O Sr. Presidente: - Depende da liberalização, do conceito em si.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Deputado. O texto originário tinha até uma formulação extraordinariamente antipática em termos de proclamação de direitos. Ele, no fundo, dizia algo como isto: "todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento, salvo quanto não tenham o direito de tomar conhecimento". Neste momento diz-se "todos os cidadãos têm o direito de tomar conhecimento. [...]", mas pode ser invocado o segredo de Estado, o segredo de justiça, para limitar (não se diz proibir) o acesso.
Este é um dos tais domínios nobres e sensíveis em que o debate feito a partir dos anos 70, realizado designadamente no âmbito dos países das Comunidades Europeias, tem apontado para a necessidade de romper com a ideia de que os dados que estão nos computadores de certos serviços públicos, nomeadamente os relacionados com a segurança, têm de ser sempre inacessíveis aos cidadãos, e que é esse mesmo o seu fim próprio - é serem secretos.
Em Portugal rompemos um pouco com essa ideia quando na Lei de Segurança Interna, nas disposições relativas ao banco de dados, mais precisamente na Lei n.° 30/84, artigo 23.°, foi previsto que a respectiva lei
orgânica e que a legislação regulamentar contivessem normas sobre o regime de organização do banco de dados do Serviço de Informações e Segurança. Mesmo entre nós, pois, na letra da lei (que não na realidade) a ideia de secretismo, sob esse ponto de vista, foi temperada.
A realização prática deste quadro legal, designadamente no que se refere à Resolução n.° 47/88, de 5 de Novembro, do Conselho de Ministros, é evidentemente algo que está muito distante dos parâmetros que tinham sido concebidos pelo legislador. Quem ler esta resolução e conseguir compreender quais são os critérios reais, as normas técnicas e as medidas indispensáveis para garantir a segurança de informações processadas necessárias ao funcionamento do centro de dados do Serviço de Informações e Segurança recebe seguramente um prémio. O regulamento é inteiramente opaco: aquilo que diz tem pouco interesse e aquilo que não diz é o interessante.
Em termos gerais é correcto dizer que a problemática das informações e dos bancos de dados e de serviços funcionando em áreas sensíveis, sendo melindrosa, tem sido abordada numa óptica democrática, em diversos países, com a preocupação de não a tornar num domínio totalmente impenetrável, tão impenetrável que não seja penetrável pelos órgãos de soberania e, em certas condições, pelos próprios cidadãos. Esses submundos informáticos incontrolados podem viciar e abalar fundamentos essenciais do Estado de direito democrático.
Quer isto dizer que a proposta do PSD agora reformulada, mesmo em relação às informações que devam ser protegidas por imperativos respeitáveis, nos parece demasiado radical. Em determinados sistemas jurídicos, designadamente no italiano e no da RFA, tem-se vindo a evoluir para sistemas em que é possível o acesso dos cidadãos a informações sensíveis, ainda que não seja directo, distinguindo-se entre aquilo que se designa de informações inteiramente reservadas e as outras que podem ser conhecidas pelos interessados.
Pode ser extremamente grave, por exemplo, que o cidadão não tenha acesso a certos dados (contidos em fichas informatizadas a seu respeito) incorrectos, inverídicos, ou captados de forma irregular, ou que não saiba sequer da sua existência, que não tenha possibilidades de o saber. Mau será, também, que, interpelando os serviços públicos sobre se esses registos existem ou não, tenha uma muralha inteiramente opaca e não tenha nenhum meio de que alguém providencie no sentido de saber se eles existem, e, nomeadamente, qual a sua natureza e se obedecem ou não à lei. Nesse caso, o cidadão fica inteiramente desamparado perante polícias ou serviços plenipotenciários.
Creio que é preciso evitar isso, tal como é necessário evitar a invocação a trouxe-mouxe do segredo de Estado para impedir o acesso, porque, de contrário - e aí estaria com o Sr. Deputado Nogueira de Brito - , uma cláusula constitucional como esta poderia ser uma verdadeira gazua. A mera invocação do segredo de Estado - palavra mágica - fecharia todas as portas, e os cidadãos, a certa altura e em muitos domínios, poderiam ser objecto de medidas de restrição, quedar-se-iam sem verdadeira defesa e haveria um esvaziamento completo do preceito constitucional.
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Neste sentido, a problemática do direito de acesso indirecto aos dados sobre segurança pública é um domínio em que é necessário inventar formas aceitáveis de acesso e não formas de proibição arbitrária e total de acesso.
Seria um recuo substancial em relação ao texto constitucional.
Relativamente à realidade prática muito teríamos que falar, porque hoje proliferam as aplicações das polícias, dos serviços de segurança. Não existem, como sabem, mecanismos absolutamente nenhuns de controlo. Portanto, a utilização por parte, por exemplo, da Polícia Judiciária de dados inocentes e não sensíveis, constantes, por exemplo, do registo automóvel ou de outros registos que estão informatizados, o seu cruzamento, a sua interconexão e o seu tratamento sensibilizado pode dar, sem qualquer controlo (como sabem, ele não existe), formas qualificadas de invasão de domínios que deveriam ser protegidos.
Por outro lado, a existência de serviços privados que, por exemplo, fazem tratamento informático de dados relacionados com o crédito ou com o uso de cheques ou de outros dados, com toda a possibilidade de assunção e de tratamento de informações inverídicas, erróneas, deturpadas, falsas, mal obtidas, mas com graves prejuízos para os cidadãos está hoje a redundar na aplicação privada de inibições de direitos (por exemplo, do uso de cheques), contra tudo o que é legislação corrente e em nome de uma segurança privada defendida por métodos privatísticos, e verdadeiramente sem equidade, segurança e controlo nenhum.
Obviamente, a proposta do PSD terá nesse domínio o mérito de não pretender meter a foice em todos os campos, mas mete a foice em três deles, extremamente sensíveis, e mete para cortar.
Creio que seria útil fazer uma ponderação bastante mais aprofunda destas alterações, tendo em conta, inclusivamente, os rumos do direito informático nos países, cujos sistemas sejam susceptíveis de comparação com o nosso.
O Sr. Presidente: - Antes de dar a palavra ao Sr. Deputado António Vitorino, e apenas por uma questão de explicação da nossa posição, gostaria de vos recordar que o n.° 2 do artigo 9.° da Convenção do Conselho da Europa, a qual ,foi há pouco mencionada pelo Sr. Deputado José Magalhães e que nós já assinámos mas que ainda não ratificámos, refere que é possível derrogar as disposições dos artigos 5.° e 6.° relativas às qualidades e categorias particulares de dados "[...] quando tal derrogação prevista pela lei da parte constituam uma medida necessária numa sociedade democrática à protecção da segurança do Estado, à segurança pública, aos interesses monetários do Estado ou à repressão das infracções penais".
Portanto, nestas ressalvas que aqui são feitas, em vez de se utilizar a expressão "segredo de Estado", usa-se a expressão "segurança do Estado"; só que eu penso que é pior.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Isso sem dúvida, Sr. Presidente!
O Sr. Presidente: - Mas cito-o por dois motivos: por um lado, porque julgo que o Conselho da Europa é um organismo insuspeito no que diz respeito à salvaguarda dos direitos fundamentais. Em segundo lugar, porque nós não seguimos a lição da referida convenção e utilizámos uma noção que é mais restritiva e que permite um conceito operacionalmente mais preciso. Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, creio que as observações que o Sr. Deputado José Magalhães proferiu têm toda a razão de ser, na medida em que denunciam uma situação fáctica que é preocupante e que deve merecer uma reflexão apurada.
Questão diferente é a de saber se o artigo 35.°, tal como hoje está redigido, não é ele próprio um artigo que se autocondena, na precisa medida em que pela leitura do n.° 1 do artigo 35.° actual concluímos que o cidadão tem acesso a todos os registos informáticos que contenham dados sobre si próprio, sem excepção e sem restrição, mas a prática da vida mostra-nos que tal não é credível, isto é, não é possível acreditarmos que numa administração moderna haja um acesso irrestrito a dados deste género por parte dos cidadãos sem excepção.
Neste sentido, penso que é precisamente uma solução algo maximalista em termos de formulação jurídica, que depois permite abusos ao nível das práticas administrativas. Como se consagra um máximo teórico incredível, na prática não há a possibilidade de estabelecer uma delimitação razoável de fronteiras que, sendo mais realista, dê ela própria maiores e reforçadas garantias ao próprio cidadão.
O que é que eu quero dizer com isto? Quero dizer que, das três propostas que o PSD faz, penso que a de investigação criminal está a mais. Trata-se de um mundo excessivamente vasto para que se possa estabelecer esta habilitação constitucional sem restrições.
Quanto ao segredo de justiça e quanto ao segredo de Estado parece-me que eles têm, pelo menos, a vantagem de constituir um contributo norteador de quais são os limites que a lei ordinária pode estabelecer. E, nesse aspecto, a expressão "segredo de Estado" é, em meu entender, preferível a "segurança do Estado", porque o conceito de segurança do Estado é um conceito que tem, até em várias latitudes do mundo, interpretações muito diferentes e muito díspares.
No entanto, quando se fala em segredo de Estado está-se a pôr o acento tónico em matéria da máxima gravidade. E aquilo que o Sr. Deputado José Magalhães aparentemente entendia ser a abertura de uma porta que constitucionalmente não está aberta é, em meu entender, pelo contrário relevante como contributo para fechar algumas portas que hoje estão abertas, porque obriga à definição de um conceito de segredo de Estado que seja, de facto, restrito às questões verdadeiramente relevantes para o Estado democrático, e só a essas e a mais nenhumas outras.
Portanto, toda a doutrina da opacidade de certos serviços cai por terra, dado que ela só pode subsistir na precisa medida em que se conforme com os limites do segredo de Estado.
Deste modo, não vejo aqui o perigo de se abrir uma porta onde tudo seja considerado segredo de Estado. Pelo contrário, há aqui, sim, a necessidade de construir doutrinária e legislativamente este conceito de segredo de Estado no sentido de distinguir claramente o que é que, cabendo no segredo de Estado, deve estar
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sujeito a esta especial protecção jurídica, e tudo aquilo que até hoje tem estado sujeito a protecções indevidas, debaixo da cobertura de um conceito de segredo de Estado ou mesmo de segurança de Estado, e que não tem neste momento a adequada tradução legislativa.
O exemplo que o Sr. Deputado José Magalhães deu é verídico, é importante e relevante, e provavelmente, se pudéssemos dispor de um instrumento legal que definisse o que é verdadeiramente o segredo de Estado, muitas das questões que o Sr. Deputado José Magalhães referiu não teriam assento constitucional, não teriam cobertura constitucional, não teriam qualquer cabimento.
Não sei se fui muito claro. De qualquer forma, a única preocupação que tinha era a de dizer que é irrealista pensar que não há que procurar fasquias neste domínio. É necessário estabelecer fasquias, estabelecer balizas e limites, e limites como estes que vêm aqui propostos, designadamente o segredo de Estado e o segredo de justiça que são limites suficientemente relevantes para chamar a atenção para o facto de que na denegação de acesso aos registos informáticos não pode valer qualquer razão, qualquer lógica secretista de funcionamento de serviços, mas apenas pode relevar matéria do mais alto interesse para a garantia do regular funcionamento das instituições democráticas.
De facto, a proposta do PSD faz apelo à construção do conceito de segredo de Estado no plano legislativo. Claro está que um conceito de segredo de Estado expansivo permitirá subverter completamente a lógica que presumo que está subjacente à própria proposta do PSD. Isso é evidente! No entanto, parece-me que do debate que já travámos sobre a matéria do segredo de Estado ressaltam algumas ideias-força que permitem dizer que não se pode pensar numa constituição e num estado democrático como o nosso e depois construir um conceito legislativo de segredo de Estado onde tudo caiba, sem limites nem restrições.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Na passada da intervenção do Deputado António Vitorino, com a qual estou inteiramente de acordo, gostaria de dizer o seguinte: se bem concluímos, a actual redacção do n.° 1 do artigo 35.° inconstitucionaliza o segredo de Estado e o segredo de justiça.
O Sr. Presidente: - Por isso é que é feita a interpretação restritiva.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, o actual n.° 1 inconstitucionaliza o segredo de Estado e o segredo de justiça, pelo menos no que se refere à aplicação da informática. Nunca mais pode haver registo criminal informatizado! Alguém diz: "diga lá o que é que está aí sobre mim?" Responde-se: "desculpe, mas está em segredo de justiça, há um processo contra si, portanto não posso dizer." Só que, nesta altura, essa pessoa pode dizer: "mas há aqui um artigo que diz que eu tenho direito de saber o que consta deste registo! Assim, ou você acaba com o registo informático ou tem de me dizer o que é que dele consta!"
Isto só para dizer que, acompanhando embora algumas das preocupações do Sr. Deputado José Magalhães, entendo que é altura de definirmos se queremos ou não constitucionalizar o segredo de Estado e o segredo de justiça. Não há segredo de Estado na Constituição Portuguesa. Não se refere em parte nenhuma e aqui proíbe-se. O problema que aqui se levanta é o de saber se queremos continuar com a actual situação, que é equívoca porque toda a gente sabe que há segredo de Estado e segredo de justiça, mas todos têm direito pela Constituição a saber o que consta a seu respeito, seja em matéria de segredo de Estado seja em matéria de segredo de justiça.
O Sr. Presidente: - Desde que informatizado, Sr. Deputado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sim, Sr. Presidente. Caso contrário, estamos a proibir a informatização do registo criminal.
Portanto, penso que, embora correndo alguns dos riscos que preocupam o Sr. Deputado José Magalhães, que, aliás; não são riscos isolados em relação a qualquer outra definição legal de aspectos igualmente importantes, deveríamos acabar com esta situação equívoca. Sempre que a Constituição remete para a lei corre um risco porque isso é um cheque em branco para o legislador, que pode fazer as asneiras que quiser por conta própria. Há segredo de Estado? Então, é este o lugar para o dizer.
O Sr. Presidente: - Só gostaria de referir que as preocupações de que fez eco o Sr. Deputado José Magalhães são as de todos nós quando nos debruçamos sobre esta matéria. A questão é que temos de encontrar fórmulas de balancear necessidades que podem ter exigências contraditórias e de encontrar uma solução correcta, que salvaguarde os interesses fundamentais em causa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.
O Sr. Alberto Martins (PS): - Sr. Presidente, creio que esta questão na sua complexidade tem de ser vista também de modo homólogo à solução que encontrarmos para o artigo 268.° Temos que atender à proposta que o Partido Socialista apresentou sobre esta matéria e que tem a ver com o acesso dos documentos da Administração, nos quais, estão incluídos os registos informáticos.
Na proposta que apresentámos admite-se uma solução que, creio, em termos de redacção, é próxima da que foi hoje adoptada pela Constituição Espanhola, que aponta para a segurança e defesa do Estado. Já vimos que a questão do segredo de Estado talvez resolva melhor esta solução. Aponta-se para a investigação criminal e intimidade das pessoas.
A solução da Constituição Espanhola não se refere a todas as matérias respeitantes à investigação criminal e à intimidade das pessoas ou à segurança e defesa do Estado. Diz "em tudo o que afecte", o que parece ser uma solução mais restritiva e resolve, eventualmente, de forma mais defensável do ponto de vista dos cidadãos, esta questão.
Como acabou de dizer o Sr. Deputado Almeida Santos, aqui, de facto, não há saída. É que das duas uma: ou se diz "os cidadãos têm acesso a todos os dados,
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salvas as restrições da lei" e depois remete-se para a solução legal, o que é calamitoso porque fica na dependência do legislador ordinário alcançar uma amplitude que não dá garantias de defesa em termos estruturantes, ou, então, tem de se definir os domínios. A solução, em termos de definição de domínios, que temos de encontrar neste artigo tem de ser homóloga da que vamos encontrar no artigo 268.° quanto aos direitos e garantias dos administrados em termos de acesso aos documentos da Administração, que, segundo alguns, são documentos escritos, fonográficos, visuais, informáticos, etc.
O Sr. Presidente: - É evidente que quando se fala em segredo de justiça, do ponto de vista da orgânica, não está abrangida naquilo que diz respeito ao acesso à Administração. A solução é que tem de ser paralela. Não é verdade, Sr. Deputado?
O Sr. Alberto Martins (PS): - Com certeza, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, eu estou ciente de que a aplicação do artigo 35.° originou entre nós uma verdadeira floresta de enganos. Aliás, já fizemos um debate na Assembleia da República na altura em que foi apresentado um projecto de lei da então ASDI sobre a matéria, que, de resto, coexistiu com uma proposta de lei governamental. O debate subsequente, bem como o debate da convenção europeia a que estamos a fazer referência, deu-nos ideia de qual a mancha de problemas existente. O que é relevante é que depois disso nada ocorreu. Penso que é isso que é impressionante!
O Sr. Presidente: - Melhor, Sr. Deputado: Muita coisa ocorreu, mas não no nível constitucional.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, Sr. Presidente. O que ocorreu foi apenas um imenso boom informático em Portugal. Como é óbvio, à nossa escala isso é quantitativamente limitado, mas, em termos percentuais, é impressionante. Esse boom conduziu a uma proliferação do uso de equipamentos informáticos por serviços públicos e por entidades privadas por forma tal que todos nós devemos estar em alguns ficheiros cerca de 200 vezes (número médio similar ao calculado, por exemplo, em França). O mailing chega-nos a casa a propósito disto e daquilo, para vender, para informar, para nos pedir o voto, etc.. Ninguém tem o mínimo controlo disso e os ficheiros são dos mais diversos tipos. Até pode acontecer a situação que agora ocorreu nos Hotéis Tivoli. Os empregados destes hotéis receberam no fim do ano uma carta simpática, que dizia o seguinte:
Informam-se os empregados que a partir do próximo dia 1 de Janeiro de 1989, inclusive, vai ser posto a funcionar um novo sistema de relógio de ponto, mais moderno e eficaz que o actual. Para tal será atribuído a cada empregado um número de código, "Confidencial", a fornecer na próxima quarta-feira, dia 28 de Dezembro de 1988, na Secção de Pessoal.
Chama-se a especial atenção dos empregados para o facto de evitarem fornecer o seu código a outro empregado, pois o computador está preparado para fazer, ao mesmo tempo, perguntas ao empregado, e se ele não souber responder, a hora de entrada ou saída não será registada. Por outro lado, e utilizando o código pessoal, terão as pessoas no futuro possibilidade de obterem através do computador informações pessoais que só ao próprio empregado dizem respeito pelo que também por esta razão, não haverá interesse em divulgar o código pessoal. Cada empregado só pode marcar o seu código.
Esta escandalosa carta conduz-nos de pleno ao tema "informática e direito de trabalho", isto é, "informática e empresa". Fiquei a pensar, quando li este texto, que diabo de informações pessoais serão estas, que só o próprio pode saber e que é ameaçador que outro saiba, mas que o computador sabe, logo o chefe sabe, a empresa sabe (e sabe-se lá o que é que sabe quem sabe! E o que faz uma vez de posse dessas informações.)
Mas podemos pensar também no escaldante tema "informática e saúde" em Portugal. (As pessoas reparam bem nele quando os jornais veiculam uma informação que não deveria ser revelada sobre a saúde de um político ou outra personalidade.) É o caso também do tema "informática e banca": quantos registos informáticos não serão utilizados, sem vestígios, para efeitos que não são confessáveis ou que são mesmo confessáveis, pelo menos em certas horas e em certos sítios.
Pense-se também no caso da informática e segurança social.
Em todos estes domínios não há meios de protecção.
Gostaria de chamar a vossa atenção apenas para um aspecto adicional. Quando se fala na necessidade de temperar o maximalismo com o princípio do real, a questão que se levanta é sempre a de situar com rigor de que maximalismo e de que real é que se está a falar. Há certos reais que são, obviamente, menos suportáveis e que são, a qualquer título, indesejáveis. Digo isto porque os Srs. Deputados do PSD omitiram qualquer alusão à disponibilidade para considerar qualquer forma de reforço dos meios judiciais ou administrativos de defesa dos cidadãos contra os abusos da informática.
O Sr. Presidente: - Essa agora! Sr. Deputado José Magalhães, então não existe o recurso em relação a todos os actos administrativos definitivos e executórios e não existem os recursos normais em relação às decisões judiciais? Penso que essa sua observação, salvo o devido respeito, não tem a mínima razão de ser.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Existem, Sr. Presidente. Só que há cerca de uma hora e trinta e cinco minutos V. Exa. exarou para a acta, a propósito da expulsão de estrangeiros, o seu juízo sobre a celeridade desses meios.
Ora, sucede que essa lentidão não é menor em relação a este tipo de situações. Sucede que para pôr em marcha, por exemplo, um sistema como aquele é ideado pela convenção que o Sr. Presidente citou é necessário ter estruturas aptas e adequadas. Por exem-
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-plo, a Comissão Nacional - Informática e Liberdade existente em França tem a seu cargo fazer algumas das destrinças, algumas das autorizações concretas e casuísticas que é necessário praticar para, face aos sistemas em concreto, dizer sim ou não à efectivação de determinados mecanismos legais. Leia-se a deliberação de 16 de Junho de 1981 sobre o tratamento de informações nominativas relativas ao tratamento automatizado dos dados de Saúde dos Serviços de Protecção Materna e Infantil ou a Decisão n.° 82/108, de 6 de Junho de 1982, sobre o tratamento automatizado de informações nominativas relativas à elaboração de estatísticas sobre a concessão de subsídios a pais isolados ou, mais importante ainda, a deliberação de 7 de Dezembro de 1982 sobre a legislação relativa ao tratamento autorizado de informações nominativas por serviços de informações em França. Elas evidenciam, só por si, a importância da existência de estruturas do tipo da Comissão Nacional - Informática e Liberdade. Porquê? É que elas permitem não só uma actividade constante de fiscalização como também a criação de um interlocutor para o cidadão que. em busca de defesa, se depare com qualquer coisa que se assemelhe a uma agressão ou a uma situação de potencial agressão.
Nada disto é previsto pelos Srs. Deputados do PSD. E o facto de não ser previsto, acompanhado da limitação de conteúdo do preceito, representa, como é óbvio, uma alteração de quadro. É evidente que não podemos deixar de alertar para o significado dessa alteração do quadro e para a ênfase que isso suporia nos meios de protecção.
A minha pergunta é, pois, a seguinte: por que é que o PSD se mantém arredio à ideia de uma cláusula, porventura mais económica do que aquela que o PCP propôs, que aluda à necessidade de previsão legal de meios expeditos de defesa de carácter judicial e administrativo para o cumprimento daquilo que se dispõe neste artigo 35.°? Seria a única solução consonante com os propósitos que aqui são enunciados.
Em relação ao segundo aspecto focado pelo Sr. Deputado António Vitorino gostaria de dizer o seguinte: é evidente que a delimitação de uma noção de segredo de Estado estrita é útil. Ó debate que fizemos no Plenário, na Comissão de Defesa Nacional e na Comissão de Direitos, Liberdades e Garantias é extremamente interessante e permite extrair algumas conclusões de grande utilidade. É evidente que a definição de uma noção estrita e tem valor reforçado se coesistir com a consagração da administração aberta - como, aliás, tudo indica que acontecerá! É evidente que nesse contexto, nesse quadro, com esse alcance, com esses limites, a alusão ao segredo de Estado não significa a inversão da actual regra constitucional ou a restauração dos velhos princípios da arcana praxis. Sem nenhuma legitimidade alguém poderia invocar isso para impor o retorno da opacidade e do Estado fechado. Falar no segredo de Estado significará tão-só aludir a qualquer coisa cuja necessidade é reconhecida generalizadamente, e que, infelizmente, pode ser objecto de interpretações deturpadas ou ampliantes, expansivas, que têm como consequência a limitação do direito dos cidadãos à transparência pública, à transparência democrática das discussões e a outros valores que são obviamente respeitáveis.
A Constituição de República, logo na redacção decorrente da sua aprovação originária, significou uma ruptura neste domínio: inconstitucionalizou, por exemplo, as disposições legais ordinárias vindas do passado que instituíam toda a espécie de entraves ao acesso dos cidadãos aos documentos da administração pública. Portanto, a consagração de uma noção estrita de segredo de Estado, coexistindo com a explícita consagração da administração aberta terá a virtude de separar águas.
A questão é saber até onde é que deve ir a abertura temperadora que assim se introduz. A nossa preocupação é a de que essa abertura não venha, por alguma via, a esvaziar de conteúdo aquilo que o artigo 35.° proclama e que deve continuar a proclamar.
Há muito a fazer, sobretudo no terreno da lei ordinária, para combater aquilo que vem proliferando contra a Constituição. Sob esse ponto de vista estou de acordo com o Sr. Deputado Almeida Santos. Já não assim, porém, em relação à visão um tanto catastrófica que revelou da "impotência" das autoridades judiciárias e das polícias nesta matéria. Devo dizer que a impotência é nenhuma! Há nesse sector total liberdade - incontrolada e incontrolável liberdade! Consideramos indispensável introduzir em Portugal, através de lei ordinária, disposições que nesse domínio salvaguardem aquilo que deve ser salvaguardado, assegurando-se, inclusivamente, a possibilidade de acesso dos cidadãos a certas informações policiais. Por exemplo, a Lei Francesa n.° 80/11, de 4 de Janeiro de 1980, instituiu normas de acesso dos cidadãos aos registos criminais, aos elementos constantes de arquivos de polícias. De resto, nos arquivos das polícias há informações de natureza muito diferente. Toda uma construção que se tem vindo a desenvolver, designadamente na doutrina da RFA, é precisamente no sentido de distinguir os diversos tipos de dados, para que não se diga: "no universo das polícias é tudo secreto". Se a polícia pode colher e tratar informações políticas e sindicais ilegalmente, mas se é tudo secreto está tudo protegido pelo segredo, então, no fundo, o segredo de justiça é degradado em segredo policial. O cidadão, esse fica inteiramente indefeso. Para lá das polícias é o segredo total! Esse princípio não é aceitável no nosso Estado democrático.
Aliás, o direito comparado é altamente desfavorável a essa imagem de que, em nome da investigação, seria necessário proibir todo o acesso do cidadão a informações policiais. Creio que foram visíveis resquícios dessa concepção numa das observações feitas pelo Sr. Deputado Almeida Santos. No nosso espírito não estava a ideia da proibição da utilização da informática para efeito de investigação. Só que, como é óbvio, é proibido o tratamento de certo tipo de dados pessoais. A Constituição é clara sobre esse aspecto. Por outro lado, nos casos em que não é proibido o recurso à informática, é sempre necessária a contrapartida de meios de defesa e é necessário garantir que aquilo que é proibido seja efectivamente proibido. É isso que não acontece entre nós neste momento.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
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O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, penso que a carta do Hotel Tivoli foi redigida por quem vendeu o computador!... não vejo que o computador tenha todas aquelas hipóteses. Mas lá que é perigoso, isso é!...
O Sr. Presidente: - Queria perguntar aos membros da Comissão se podemos passar às votações.
Pausa.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): sensível, Sr. Presidente?
O PSD não está
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, de acordo com aquilo que foi sugerido, nós alterámos a proposta e a ideia de investigação criminal foi suprimida. Acrescentámos o inciso "e bancos de dados".
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - E o segredo de Estado mantém-se?
O Sr. Presidente: - Penso que o segredo de Estado é extremamente importante.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Eliminou-se a investigação criminal, visto que a nossa ideia não era a de abranger todos os aspectos da investigação criminal, mas aquilo que está, efectivamente, no segredo de justiça.
No n.° 4 da proposta do PSD, quando se diz "a lei define o conceito de dados pessoais para efeitos de registo informático, bem como os termos da constituição das bases de dados", aditámos o inciso "e dos bancos de dados".
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Penso que fizemos algum avanço, mas talvez se justifique um certo amadurecimento até ao próximo dia. Faríamos a votação no próximo dia e cada um de nós ficaria a reflectir.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, estou de acordo com a sugestão feita.
Em relação ao n.° 2 gostaria de fazer a seguinte observação: os Srs. Deputados fizeram uma transliteração e alteração do conteúdo do n.° 2 para resolver um determinado problema, mas creio que foram longe de mais. A terminologia nesta matéria tem grandes exigências. Suprimiu-se a noção de ficheiros. Devo dizer que acho mau porque isso é desnecessário para fazer o que querem fazer.
Vozes.
O Sr. Almeida Santos (PS): - É que registo informático abrange o ficheiro, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - É essa a ideia.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não se confunda a unidade e o conjunto. Um ficheiro é um conjunto de registos informáticos devidamente organizados...
O Sr. Almeida Santos (PS): - Talvez o PSD não se importasse de escrever "acessos a ficheiros e registos informáticos" ou qualquer coisa no género.
O Sr. Presidente: - A minha única preocupação - e repito aquilo que disse há pouco a propósito do problema dos bancos de dados - é que, nesta ânsia de fazer uma aproximação à terminologia do direito informático, com grande probabilidade, daqui a dois anos, o texto da Constituição necessitaria de alguns retoques. No entanto, não temos nenhuma objecção de fundo ao facto de se acrescentar a expressão "registos" à expressão "ficheiros", embora, para dizer a verdade, eu não creia que isso se traduza em nenhuma vantagem. Mas, se VV. Exas. considerarem esse aspecto como importante, não teremos óbice.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Nesse caso, penso que seria melhor que, em vez de "ficheiros ou registos informáticos", ficasse "registos informáticos ou ficheiros", porque, senão, parece que também teriam de ser informáticos os ficheiros.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que, na leitura que viermos a fazer para a aprovação do texto, poderemos verificar se há aqui redundância pura e simples porque havendo uma relação unidade/todo obviamente a redundância é inútil. A minha preocupação não foi essa, mas que ficasse claro que era uma interconexão de ficheiros porque suponho que não se usa a expressão "interconexão dos registos informáticos". Diz-se interconexão dos sistemas e, portanto, se não fica claro exactamente que tipo de interconexão é que se quer proibir, não ganharemos obviamente com isso. Isso está claro no texto constitucional, no n.° 2 actual, e seria importante que continuasse a estar claro no texto em gestação. E este o primeiro alerta e a primeira preocupação.
O segundo alerta e a segunda preocupação é que esta cláusula final do n.° 6, proposto pelo PSD, careceria de alguma precisão. Compare-se com a cláusula proposta pelo PCP. De resto, podemos debater a questão com evocação, até, de disposições do direito internacional, tanto no âmbito da OCDE como noutros sistemas, para apurarmos melhor em que é que se traduzem estes imperativos de defesa da independência nacional. Chamaram-me a atenção, aliás, para a importância acrescida de uma disposição deste tipo (por exemplo, neste momento, consegue-se, talvez, melhores informações sobre a agricultura com base em certos bancos de dados americanos do que com base em certas estatísticas que por aí há. Mas pode suceder o contrário e importa defender o interesse nacional perante o êxodo de informações nacionais e o acesso de estrangeiros aos nossos bancos de dados). O que é que significa a cláusula que o PSD propõe?
O Sr. Presidente: - A nossa ideia é esta: os interesses nacionais não são suficientemente explicitados com base numa ideia de defesa da independência nacional. Nós não queremos que tenha de estar em causa a independência nacional para justificar uma restrição. Em suma, somos aqui mais amplexivos do que é o PCP. A não ser que o PCP tenha uma visão de independência nacional anacrónica e pense que tudo põe em causa a mesma, o que julgo não será o caso.
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Por consequência, a nossa ideia é que a noção de interesse nacional é suficientemente ampla para abranger os casos em que, obviamente, a independência nacional está em causa e outros em que o interesse nacional não é tão intenso que se entenda pôr em causa a independência nacional, mas que prejudiquem os interesses nacionais. É essa a ideia.
Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, tendo em conta esta última intervenção do Sr. Deputado José Magalhães - e como este assunto vai ficar para ponderar -, gostaria de lhe acrescentar um elemento de ponderação. Esta alteração que foi proposta pelo PSD ao n.° 1, apesar de tudo, acaba por ser menos restritiva do direito do que a implicada pela sua proposta inicial, embora com a ressalva de que o segredo de Estado pode abranger um mundo, designadamente pela forma como as matérias são, como tal, qualificadas. Assim sendo, pondero se a nossa proposta não era efectivamente menos restritiva do que a proposta do PSD, mesmo com todas as suas alterações.
Há pouco o Sr. Deputado José Magalhães dizia o seguinte: "Dos registos policiais podem constar dados de vária natureza."
O Sr. Presidente: - Mas o registo policial não tem a ver com o segredo de Estado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas tem, por exemplo, a ver com o segredo de justiça.
O Sr. Presidente: - O da PSP não tem, por exemplo.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Não sei. Há alguma fase do processo de inquérito em que tem, Sr. Presidente.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Então com o novo Código de Processo Penal é uma desgraça!
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Com o novo Código é muito complicado. E que, se, no fundo, a restrição que introduzíssemos fosse apenas a do acesso para conhecimento de dados pessoais e não excepcionássemos nenhuma matéria em conjunto - como o segredo de Estado e o segredo de justiça -, isso acabaria, porventura, por ser menos restritivo do que excepcionar matérias em conjunto.
O Sr. Presidente: - Mas, Sr. Deputado, o problema dos dados pessoais não altera a questão que há pouco se colocou. Há dados pessoais que não podem ser objecto de uma informação num determinado momento. Normalmente, não é por ser o advogado a pedir os elementos que a questão se põe. A questão põe-se porque existe uma investigação criminal coberta pelo segredo de justiça e, se aqueles que são objecto dessa investigação tiverem acesso a esses dados, podem obstacular completamente a que essa investigação se faça. Esse é que é o problema. É evidente que é uma questão delicada, que envolve um balancear entre os interesses em causa e, por outro lado, a garantia de um cidadão que se presume inocente até ao momento em que é condenado. No entanto, teremos de olhar para
a realidade das coisas e encontrar uma solução capaz, e penso que a restrição aos dados pessoais, salvo o devido respeito, não resolve o problema, pois não estamos aqui a tratar de uma questão de dados pedidos por terceiros. Não é esse o problema. Não é o problema de o exercício do pedido ser formulado por ou-trem ou de os dados serem dados que não são relativos à própria pessoa por serem relativos a coisas.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, comecei a discussão na perspectiva de se ir votar, retirando a nossa proposta por ser demasiado restritiva, mas, uma vez que, efectivamente, VV. Exas. fizeram uma alteração da vossa proposta e que se está a ponderar, gostaria de introduzir este elemento de ponderação, mantendo em aberto a nossa proposta para a votação a fazer na próxima reunião.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, V. Exa. não fez nenhuma referência à questão da eventual cláusula, meramente alusiva à questão dos meios juridiscionais e administrativos de defesa reforçada dos cidadãos como contrapeso ou como elemento situado no outro pólo desta abertura. Creio que não deveríamos afastar a questão pela via do silêncio.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, suponho que já tivemos oportunidade de discutir com alguma amplitude o problema de prevermos vias juridiscionais expeditas e a minha posição pouco receptiva a essa opção resulta da circunstância de serem tantos os casos em que se justificariam essas vias processuais expeditas que, na prática, poucas situações ficariam de fora. No fundo, o problema com que estamos confrontados é um problema de uma justiça infelizmente morosa. Houve uma altura em que tive oportunidade de referir que, a propósito da suspensão da eficácia dos actos administrativos, se consignaram as possibilidades de redução dos prazos e que a verdade é que, tanto quanto sei, isso não teve nenhuma aplicação. Pode ser que existam algumas hipóteses e admito que as encontremos quando discutirmos o problema da justiça administrativa. Suponha, por exemplo, que havia uma secção especializada no Supremo Tribunal Administrativo e dos tribunais, no caso dos tribunais administrativos - e tal vez isso fosse possível em alguns casos em tribunais comuns -, que tivesse uma especialização para conhecimento da defesa de um direito ou de um interesse legítimo, em particular, relativo a direitos fundamentais. Mesmo nessa hipótese, V. Exa. terá de ter em atenção que pode discutir-se a questão prévia de sabei se estamos perante um direito fundamental ou não, e que enviesa muito as questões.
Quanto à circunstância, que, aliás, é preconizada pelo PCP no seu n.° 7, de termos um Conselho Nacional de Informática e Liberdades, dir-lhe-ei que, em primeiro lugar, não sou contra a ideia de que a lei ordinária venha a estabelecer algum esquema deste tipo - essa é uma questão que merecerá ponderação porque suponho não estar suficientemente amadurecida para a consignarmos em termos constitucionais - e que, em segundo lugar, veria com muito maus olhos que esse conselho fosse constituído numa base essencialmente política, uma vez que os ensinamentos das experiências que temos vindo a ter não me parece terem sido favoráveis a uma solução deste tipo numa ma-
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teria de tão grande melindre, ou seja, a solução proposta de haver escolhas com base no princípio da representação proporcional.
O drama nas sociedades modernas é que, por um lado, há uma ânsia de encontrar órgãos que sejam independentes e, por outro lado, há uma grande dificuldade em resistir à partidarização desses mesmos órgãos. Isso é mau - penso eu -, mas é um dado. Penso, portanto, que não valerá a pena prolongarmos a discussão desta matéria nesta sede, mas poderemos depois, se acharem útil, discutir o problema a propósito da organização dos tribunais, embora eu o veja com muita dificuldade, porque, no fundo, estamos a ir pelo caminho de tentar obviar os inconvenientes, que são gerais, de uma justiça que é morosa. Era esse o problema que precisávamos de resolver, só que esse não se resolve com a Constituição. Resolve-se com uma organização judicial, com reformas processuais e com meios humanos e materiais.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Nós temos reunião amanhã de manhã, não é verdade?
O Sr. Presidente: - Exacto.
O Sr. Almeida Santos (PS): - É que não faz muito sentido adiar esta matéria para o dia seguinte de manhã. Não há tempo para trocarmos impressões e sugeria que este adiamento não fosse para amanhã, mas para a reunião seguinte.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, faremos, então, a votação na terça-feira, dia em que também gostaríamos de ver resolvido aquilo que ficou para trás relativo aos artigos 32.°, 32.°-A e n.° 4 do artigo 33.° Deixaríamos, portanto, esta matéria sustada até lá e passaríamos do .artigo 35.° para o artigo 38.°, visto que não votámos os artigos 38.°, 39.°, 39.°-A e 40.°
O artigo 38.° é sobre "Liberdade de imprensa e meios de comunicação social", havendo uma proposta de substituição apresentada pelo PS, uma proposta do CDS e uma proposta de alteração e de aditamento do PCP.
Esta proposta de substituição do PS substitui toda a vossa proposta anterior?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Toda.
O Sr. Presidente: - Há ainda, relativas a este artigo 38.°, propostas do PSD, do PRD, da ID e do PE V.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Não obstante, é preciso tomar em conta que o n.° 4 da proposta de substituição apresentada em último lugar é comum ao PS e ao PSD porque é objecto do acordo PS/PSD. É, no fundo, o texto do acordo sobre o n.° 7.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas, Sr. Deputado, o acordo não é susceptível de ser votado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - É só no sentido de clarificar que este n.° 4 da nossa proposta não é só nosso, sendo uma redacção comum do PS e do PSD.
O Sr. Presidente: - Eu compreendo, mas a observação do Sr. Deputado Nogueira de Brito é no sentido de o texto não estar aqui.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Já foi distribuído antes.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, penso que nesta matéria se justificava discutirmos número por número, porque senão repetir-nos-emos. É claro que a discussão número por número tem um problema complicado que é o de as numerações não serem sempre coincidentes. No entanto, vamos tentar manter a ideia de discutir aquilo que são alterações e aditamentos à actual redacção do artigo 38.° e, então, já será possível discutir número por número.
Consequentemente, em relação ao n.° 1, o que existe são duas propostas: uma do CDS, que diz "É garantida a liberdade de comunicação social, através da imprensa, rádio e televisão", e uma do PRD, que diz "É garantida a liberdade de expressão e informação pelos meios de comunicação social, com a correspondente liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, assim como a participação dos primeiros na orientação dos órgãos de informação em que trabalhem, através dos conselhos de redacção por eles eleitos."
Srs. Deputados, passaremos à votação da proposta do CDS para o n.° 1 do artigo 38.°
O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Presidente entende entrar na votação sem discussão global dos textos?
O Sr. Presidente: - Os textos já foram discutidos, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Os textos novos?! É que há textos novos, embora não no caso do CDS.
O Sr. Presidente: - O único texto novo é um texto que não tem nada a ver com o n.° 1. Tem a ver com o n.° 2.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. Isso é um facto. Pode-se utilizar a técnica de votar o que já estiver discutido e não tiver qualquer inovação e, depois de tudo isso votado, discutir aquilo que for inovador. No entanto, parece-me ser uma perda de tempo e sobretudo será pouco clarificador.
O Sr. Presidente: - Também poderemos discutir os aspectos inovadores apresentados.
De qualquer forma, penso que poderemos votar, desde já, o n.° 1. Não perderíamos tempo e depois discutiríamos os números seguintes, uma vez que vem logo a seguir a proposta inovadora do PS para o n.° 2.
Vamos então proceder à votação do n.° 1 do artigo 38.° proposto pelo CDS.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessários, tendo-se registado os votos contra do PS, do PCP e da ID, os votos a favor do CDS e a abstenção do PSD.
É o seguinte:
1 - É garantida a liberdade de comunicação social, através da imprensa, rádio e televisão.
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Srs. Deputados, vamos votar agora a proposta para o n.° 1 do artigo 38.° apresentada pelo PRD.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)
O Sr. Almeida Santos (PS): - No fundo, é o problema de saber se se deve manter tudo isto referido à liberdade de imprensa ou, em termos mais amplos, aos órgãos da comunicação social. A questão é essa e, portanto, há paralelismo entre as duas propostas.
O Sr. Presidente: - Penso que há paralelismo. Se depois VV. Exas. quiserem retomar a parte que não é paralela da proposta do PRD, podem fazê-lo.
Srs. Deputados, vamos votar o n.° 1 do artigo 38.° do proposto pelo PRD.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSD, do PS e da ID e as abstenções do PCP e do
É o seguinte:
1 - É garantida a liberdade de expressão e informação pelos meios de comunicação social, com a correspondente liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores, assim como a participação dos primeiros na orientação dos órgãos de informação em que trabalhem, através de conselhos de redacção por eles eleitos.
Srs. Deputados, vamos passar aos n.ºs 2 e seguintes do artigo 38.°, relativamente aos quais há uma proposta de substituição do Partido Socialista.
Esta proposta diz o seguinte:
A liberdade de imprensa implica:
a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial nos respectivos órgãos de comunicação social, salvo quando pertencerem ao Estado ou tiverem natureza doutrinária, confessional ou especializada;
b) O direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à protecção da independência e do sigilo profissionais;
c) O direito a elegerem conselhos de redacção com competência para emitirem parecer sobre a designação da direcção do respectivo órgão de comunicação social e sobre o respectivo estatuto editorial;
d) O direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independentemente de autorização administrativa, caução ou habilitação prévias.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, descomplexifiquemos. Já fizemos uma longuíssima discussão acerca desta matéria, mas agora há algumas alterações apresentadas e vamos, então, ver quais são as observações que elas suscitam.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, talvez houvesse vantagem numa apresentação global dessas alterações propostas. O que importa e se torna extremamente difícil de perceber é o alcance exacto do conjunto de alterações pretendidas ou admitidas pelo Partido Socialista.
De facto, os textos que conhecemos exprimem, por um lado, o acordo PS/PSD, que neste ponto tem implicações verdadeiramente graves.
Há, por outro lado, propostas que constam do projecto originário do Partido Socialista, outras são apresentadas agora e consistem em reformulações de textos que tinham sido apresentados. Não se sabe verdadeiramente o que é que se pretende que caia, designadamente quanto ao artigo 38.° que, como se sabe, tem oito números e não sete. Pretende-se que caia o n.° 8 ou não? Além do mais, é extremamente confuso!
O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado pede que os proponentes desta proposta de substituição façam uma sucinta apresentação da mesma.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Suponho que é útil Sr. Presidente. E curial! É o mínimo!
O Sr. Presidente: - Pergunto aos proponentes se acedem a esta solicitação.
Pausa.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, começaria por dizer que este n.° 2, com as respectivas alíneas a), b) e c), corresponde a um texto substitutivo dos actuais n.ºs 2, 3 e 4 do artigo 38.° Aquele número trata, portanto, de matéria abrangida até ao n.° 4 deste artigo. Está, assim, delimitado o alcance do n.° 2.
Quanto ao n.° 3, diz respeito aos actuais n.ºs 5 e 6 do artigo 38.°
Ficar-me-ia agora apenas pela nossa proposta do n.° 2.
O que ela tem de inovador quanto à alínea a) consiste no seguinte: a intervenção que é conferida aos jornalistas e colaboradores literários - neste caso apenas aos jornalistas - para participarem na orientação de jornais é agora configurada não como participação na orientação ideológica, mas, sim, na orientação editorial. Parece-nos que a referência "[...] a participação na orientação editorial [...]" corresponde àquilo que é hoje a própria prática da nossa imprensa no quadro da Lei de Imprensa e, portanto, substitui com vantagem a expressão "orientação ideológica".
Mantêm-se na nossa formulação originária, mas gostaríamos de discutir isto com toda a abertura com os Srs. Deputados, alguns princípios restritivos. O primeiro princípio restritivo, que se encontra actualmente no n.° 2 do artigo 38.°, é relativo à imprensa do sector público.
O outro princípio restritivo é agora alterado na nossa formulação, quanto ao modo de o encarar, porque na versão actual do texto constitucional a restrição se dá em função da titularidade dos órgãos de comunicação social pertencentes a partidos políticos ou a confissões religiosas.
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Ora, o que nós pretendemos é que a restrição se faça não em função da titularidade da propriedade mas em função da própria natureza do órgão, o que nos parece também corresponder de forma mais adequada à realidade das coisas. Portanto, do nosso ponto de vista a restrição far-se-á em função da natureza doutrinária ou confessional que esse órgão de comunicação social tenha. Também fazemos uma referência, como se vê, aos órgãos de informação de natureza especializada.
'Todavia, queremos dizer que estamos abertos a ponderar sobre o significado desta nossa proposta e, inclusivamente, receptivos a retirar a referência aos órgãos de informação especializada.
Digo-o em concreto, e porquê? Meditando melhor sobre este problema, constatamos que há determinado tipo de órgãos de informação especializados, nomeadamente os jornais desportivos e económicos, que não manifestam, por essa circunstância, razão suficiente para limitar aqui a prerrogativa dos jornalistas na orientação editorial. Portanto, estamos disponíveis para fazer cair a referência aos órgãos de informação de natureza especializada.
Também estamos disponíveis para fazer cair, assim conseguíssemos aqui um largo consenso sobre isso, a referência restritiva aos jornais pertencentes ao Estado. Explico melhor este ponto: até hoje o sector público da comunicação social tinha a vastidão que todos nós conhecíamos. Daqui para a frente, conjugando duas realidades em formação, a realidade que diz que no plano constitucional apenas se exige a existência de um serviço público de televisão e de rádio, e a realidade que corresponde à própria prática governativa, sem necessidade de grandes futurismos poderemos prever que o futuro da imprensa em Portugal no domínio do sector público será muito mais restritivo do que aquele que foi até hoje.
De onde que valha a pena perguntarmos se tem ainda actualidade futura esta regra restritiva de os jornalistas se manterem vedados de participação editorial relativamente à imprensa do sector público. Pela nossa parte estaríamos também disponíveis para fazer cessar esta limitação.
Relativamente à alínea a), em conclusão, devo dizer que estaríamos disponíveis, se o debate para aí se orientasse, para fazer cessar a limitação à orientação editorial por parte dos jornalistas no domínio dos órgãos estatizados, e restringiríamos essa limitação no caso da referência aos órgãos especializados, que faríamos, portanto, cessar. Quanto à alínea a) é o que se me oferece dizer.
Em relação à alínea b), realmente ela não tem nenhuma inovação significativa no que respeita àquilo que é o conteúdo actual do n.° 3.
Quanto à alínea c), o que há de inovador é a figuração em sede constitucional de que o direito dos jornalistas a elegerem conselhos de redacção confere a estes conselhos competência para emitirem pareceres sobre a designação da direcção do respectivo órgão de comunicação social e o estatuto editorial. Esta inovação constitucional não será, em todo o caso, uma inovação no ordenamento jurídico porque é a recolha de normativos já hoje existentes em sede de lei de imprensa. Tratava-se apenas de constitucionalizar algo que já hoje é direito positivo de há muitos anos a esta parte e sem qualquer contestação visível.
Portanto, estes são os pontos inovadores referentes às alíneas a) e c). Tudo o mais resulta apenas de um outro reordenamento sistemático e não contém nenhuma inovação do conteúdo.
Finalmente, falta-me referir um ponto em relação à alínea a). Nós faríamos cessar a regra que impede expressamente a qualquer grupo de trabalhadores de censurar ou impedir a livre criatividade no domínio da liberdade de imprensa. Pensamos que esta norma, que teve razão de ser na fase histórica em que a Constituição foi aprovada em 1976, à luz do ordenamento jurídico que regula hoje a matéria da liberdade de imprensa, não tem mais significado. Portanto, não direi que esta é uma norma expúria porque ela tem um valor simbólico que ninguém contestará, penso eu, mas seria hoje despida de qualquer alcance prático. Por isso também a retiramos.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, se não há inscrições para intervir, gostaria de dizer o seguinte: penso que esta nova proposta apresentada pelo Partido Socialista melhora, a nosso ver, substancialmente a proposta anteriormente apresentada, e numa parte importante dela estaremos em condições de acompanhar o Partido Socialista na sua votação.
Todavia, gostaria de referir que em relação à alínea a) do n.° 2 não percebemos bem, e não acompanhamos, a ideia agora expressa pelo Sr. Deputado Jorge Lacão de supressão da referência ao Estado, porque, no fundo, se relativamente aos órgãos de comunicação social, nomeadamente no que respeita aos jornais, é verdade que essa parece ser uma zona em regressão, e a meu ver bem, já se consigna claramente, e penso que é importante que isso seja ressalvado, que haverá um serviço público de rádio e de televisão.
Portanto, apresenta-se com toda a acuidade o problema de ressalvar esse serviço de rádio e de televisão. Consequentemente, preferimos manter a ideia da referência ao Estado, embora naturalmente compreenda as razões que levam a admitir a hipótese de supressão dessa referência ao Estado, aliás constante da proposta.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, isto teria sentido na actual redacção do n.° 2 em que se verifica haver uma referência à natureza ideológica. Por definição, um órgão de comunicação do Estado não tem natureza ideológica.
Mas, na medida em que se substitui a referência à natureza ideológica pela expressão "orientação editorial", não vemos que se mantenha a razão para não incluir os órgãos do Estado, porque esta é uma expressão que tem mais conteúdo e simultaneamente menos do quê a referência ideológica. Um órgão de comunicação social do Estado não tem, por definição, ideologia (embora nem sempre isso se verifique), mas qualquer jornal tem uma orientação editorial, como é óbvio, e aí isso já se justifica.
Isto apenas para dizer o motivo da alteração. Tem conteúdo. Podem concordar ou não, mas a razão foi esta.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, é justamente para preservar que na orientação não haja tentativas de permear uma orientação ideológica que parece útil incluir o Estado neste elenco dos partidos políticos, das confissões religiosas, embora por motivos diferentes.
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O Sr. Almeida Santos (PS): - Ninguém compreende por que é que o Estado se coloca de fora. Se quer ter jornais e acho que tem esse direito, ao contrário do que parece pensar o PSD, não tem razão para criar a seu favor este privilégio. Penso que o Estado se deve sujeitar ao mesmo regime, quando referido ao estatuto editorial.
O Sr. Presidente: - O que não se compreende, salvo o devido respeito, é que os jornalistas que trabalham na rádio ou na televisão (serviço público) possam imprimir-lhe uma orientação e pela circunstância de serem jornalistas terem uma legitimidade superior a outras entidades que igualmente tenham intervenção nesse serviço de rádio ou de televisão. Não estou a ver porque é isso que lhes há-de dar uma legitimidade particular no caso do serviço da rádio ou da televisão.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Refere-se agora "[...] respectivo órgão de comunicação social [...]", por isso mesmo abrange tudo. Também alterámos isso. Exactamente indo ao encontro da sua objecção, substituiu-se "órgãos de informação por "órgãos de comunicação social". Agora abrange tudo.
Quanto à expressão "orientação editorial" é justo que os jornalistas e colaboradores literários participem na sua definição. Não decidem, apenas intervêm. Tem perfeita justificação.
O Sr. Presidente: - A segunda observação que gostaria de fazer diz respeito à alínea c). Preferiríamos claramente limitar a redacção da alínea c) nos seguintes termos: manter-se-ia a expressão "[...] ao direito a elegerem os conselhos de redacção [...]", não especificando, contudo, porque não me parece caber isso à Constituição, o que é que vai ser a competência do conselho em particular no que diz respeito àquilo que vem aqui minuciosamente explicitado na proposta do Partido Socialista.
Suponho que quanto ao resto estamos em condições de os acompanhar. No que se refere ao n.° 7...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não percebo, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - Estamos em condições de os acompanhar, Sr. Deputado.
O n.° 7 é uma proposta conjunta, portanto não tem sentido estar agora a fazer explanações sobre isso.
Quanto à proposta apresentada pelo Partido Socialista para o n.° 3, que corresponde ao anterior n.° 5, nós gostaríamos de ver um pouco melhor explicitado o porquê do princípio da especialidade...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Dá-me licença, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, há pouco eu circunscrevi a minha alegação apenas ao n.° 2 e às suas várias alíneas, o que corresponde na actual proposta ao n.° 4, inclusive. Se o Sr. Presidente estivesse de acordo com esta metodologia que introduzi, deixaríamos a parte restante para uma segunda volta.
O Sr. Presidente: - Deixá-la-emos então, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Eu também gostaria de perguntar ao Sr. Presidente se nos acompanha naquela vossa vontade de retirarmos a referência à imprensa de natureza especializada, deixando cair esse ponto.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, eu gostaria de saber qual é a opinião dos meus colegas. Efectivamente, eu prefiro que não haja uma menção à imprensa especializada. Aliás, não são convincentes as razões aduzidas para a manter. Pelo contrário, convenceram-me as observações que V. Exa. fez no sentido de a suprimir.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, qual é que seria o conteúdo do texto normativo adiantado pelo Partido Socialista na sequência desta primeira refrega? É que não consegui perceber.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Na última linha da alínea a), os que tiverem natureza doutrinária ou confessional.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Mas V. Exa. ainda não tinha pedido a palavra, Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Já a tinha pedido há muito tempo, Sr. Presidente. V. Exa. é que utilizou um privilégio...
O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Eu, de vez em quando, tenho de me inscrever. É que, caso contrário, o meu privilégio redunda no contrário, ou seja, em discriminação.
Faça favor, Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Neste caso foi um privilégio, Sr. Presidente. Aliás, a intervenção do Sr. Presidente foi importante porque possibilitou um esclarecimento relevante da parte do Partido Socialista, particularmente do Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Deputado Almeida Santos esclareceu que na alínea a) se referiam os respectivos órgãos de comunicação social para significar que se abrangiam todos os órgãos de comunicação social e não apenas os da imprensa escrita.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Todos os que tiverem jornalistas ou colaboradores literários, Sr. Presidente.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Claro, Sr. Presidente.
Sendo assim, não entendo, então, por que é que se não aceita o princípio geral proposto pelo CDS para a redacção do n.° 1. Com efeito, no n.° 2 já não estamos apenas a tratar da imprensa escrita, mas também da liberdade de comunicação social. De qualquer forma, congratulo-me com a mudança.
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O Sr. Almeida Santos (PS): - Dá-me licença que o interrompa, Sr. Deputado?
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Faça favor, Sr. Deputado.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado, nós chegámos a considerar essa possibilidade. Se o fizéssemos seria no n.° 1. Onde se fala em liberdade de imprensa referia-se, como VV. Exas. propõem coerentemente, "liberdade de comunicação social". Só que toda a estrutura da liberdade de comunicação social está referida à liberdade de imprensa. Teríamos de fazer uma revolução no nosso sistema jurídico. É que tudo se refere à liberdade de imprensa, aos crimes da liberdade de imprensa, etc.. Toda a gente sabe que hoje a liberdade de imprensa se refere a tudo o que tem informação, seja televisão ou seja rádio. O transtorno jurídico provocado por esta mudança terminológica seria incalculável. Só não o fazemos por isso e não porque não estejamos de acordo com a vossa versão. Nós entendemos que "liberdade de imprensa" significa "liberdade de comunicação social". Só que se o Sr. Deputado fizer esta mutação formal terá que corrigir tudo. Terá de alterar o qualificativo na tipificação dos crimes, nos delitos de imprensa, etc. Tudo isso está referido à liberdade de imprensa, que é a formulação clássica que encontramos, salvo erro, em toda a Europa.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Deputado Almeida Santos, congratulo-me com a vossa mudança e com a atitude que estão a assumir perante este problema porque parece-me, de facto, muito positiva e a única consentânea com as alterações que admitiram para a televisão e para a rádio.
Nessa perspectiva, pergunto o seguinte: o que está em causa é apenas uma questão terminológica?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Só isso, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - E as suas repercussões em termos de direito positivo em muitos domínios?
O Sr. Almeida Santos (PS): - Claro, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Então, pergunto o seguinte: não seria preferível a este equívoco - que, sem dúvida, vai resultar da vossa redacção para a alínea d) com a palavra "respectivo" - entender que a redacção que vai aqui ser votada não abrange quaisquer órgãos de comunicação social, mas apenas os "respectivos", isto é, órgãos de comunicação social da imprensa?...
O Sr. Almeida Santos (PS): - Não, Sr. Deputado. O "respectivo" diz respeito ao jornalista.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas, Sr. Deputado Almeida Santos, repare no seguinte: no n.° 1 continua a ser garantida a liberdade de imprensa. O n.° 2 diz: "a liberdade de imprensa implica". Depois continua a respeitar-se a sistematização do artigo, tal como ela consta da redacção actual, deixando-se para os números finais as referências aos outros meios de comunicação social. Portanto, afigura-se-me ser natural a interpretação que aqui tenho referido.
O Sr. Almeida Santos (PS): - São normas especiais relativamente às de cima, Sr. Deputado. O artigo diz o seguinte: N.° 2 - "a liberdade de imprensa implica", n.° 3 - "a liberdade de imprensa implica" e n.° 4 - "a liberdade de imprensa implica". E ridículo usar a mesma introdução em todos os números quando são alíneas do mesmo número. Esta é a razão por que, embora vos acompanhemos substancialmente, reduzimos isto a alíneas do mesmo n.° 2.
Já dissemos que pensamos que não tem sentido a referência à orientação ideológica quando o que está em causa é a orientação editorial. Assim sendo, parece-nos que o Estado também deve submeter à mesma "inclemência" os seus jornalistas ao intervirem na orientação editorial dos jornais que lhe pertençam.
Depois temos a substituição da referência a partidos políticos e convicções religiosas, ou seja, em função do titular, que também podem ter um órgão de informação igual aos outros e não se justifica a excepção. Nós vamos para a natureza do órgão. É preciso que ele tenha natureza doutrinária ou confessional. E necessário que seja, não o titular, mas a natureza do órgão que justifica esta intervenção. No fundo, são as alterações que propomos e que não são assim tão de fundo como isso.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Só posso congratular-me com isso, Sr. Deputado.
No entanto, gostaria de ver esse princípio porventura mais claramente explicitado. Assim, proporia o seguinte: não seria possível definir liberdade de imprensa com a latitude que efectivamente o Partido Socialista lhe confere e que me parece nesse sentido correcta, isto é, a liberdade de imprensa é igual à liberdade de comunicação social tal qual a entende o CDS? A expressão ficava na mesma, Sr. Deputado. A expressão tal como consta, e que é utilizada no direito positivo, refere-se normalmente a todos os meios de comunicação social. Então, vamos esclarecê-lo na Constituição.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Mas não é preciso, Sr. Deputado. Ninguém põe em dúvida que seja assim, ninguém levanta esse problema e todos nós aceitamos que a liberdade de imprensa é uma expressão tão consagrada e tão multiplicada nos sistemas jurídicos que o melhor é mante-la. É verdade que a rádio e a televisão também têm informação mesmo sem imprensa. No fundo, é disso que se trata. Penso que não deveríamos abrir mais essa frente de combate e de dúvidas. Dizer "liberdade de imprensa" é dizer "liberdade de comunicação social".
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Aqui a "bizantinice" resulta de o intérprete estar confrontado com o processo de revisão e haver a nossa proposta e o voto de VV. Exas. contra. Isso vai ter algum peso e algum significado e teremos de resolver esse problema. Se não votarmos hoje, estou disposto a fazer tentativas para eliminar esse problema interpretativo, que irá, sem dúvida, surgir da consideração desta votação.
Vozes.
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O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Nogueira de Brito, aquilo que disse o Sr. Deputado Almeida Santos é inteiramente pacífico. A liberdade de imprensa abrange todos os meios de comunicação social. A votação em relação à proposta do CDS não foi feita para criar equivocidade, mas, sim, porque nos pareceu que era inútil e que iria acrescentar alguma complexidade a uma coisa que neste momento é pacífica.
É esse o significado e podemos dizê-lo frontal e formalmente. Do ponto de vista substantivo estou de acordo com aquilo que diz o CDS. Só que me parece que não tem sentido estar neste momento a consignar na Constituição algo que todos os intérpretes minimamente avisados, que sabem o que é a liberdade de imprensa, interpretam assim. Não há correntes divergentes quer em Portugal quer nos outros países.
Tem a palavra o Sr. Deputado Almeida Santos.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, alguém duvida de que a lei de imprensa se aplica a toda a comunicação social? Ninguém! Apesar disso, chama-se "lei de imprensa". Alguém tem dúvida de que o crime de liberdade de imprensa pode ser cometido na televisão ou na rádio? Ninguém! Não obstante, ele chama-se "crime de liberdade de imprensa" e não crime de liberdade de comunicação social.
Seria uma revolução formal, ainda que só linguística, mas terrível. Não nos vamos meter nisso, Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, gostaria de lembrar ao Sr. Deputado Nogueira de Brito que já tivemos esta mesma discussão na primeira volta. Depois de debatermos profundamente isto, chegámos à conclusão de que só teríamos a perder com a alteração conceptual. Cada ramo do direito cria a sua própria dogmática jurídica e este conceito de liberdade de imprensa é um conceito que está hoje completamente autonomizado relativamente aos meios técnicos de difusão de informação e comunicação social, pela mesma razão como o conceito de jornalista é hoje averbado a qualquer profissional da informação, independentemente da natureza tecnológica do órgão em que esteja a trabalhar. O jornalista é algo que surge nas referências originais da imprensa escrita, é o profissional da informação que trabalha num jornal, mas é hoje também, a todas as luzes, o profissional de informação que trabalha na redacção da televisão ou de uma qualquer rádio. Ninguém se lembraria de alterar estes conceitos. Pela mesma razão, ninguém do sector da comunicação social põe em dúvida que liberdade de imprensa é um conceito interpretado de forma actualística e tem uma autonomia jurídica abrangente de toda a realidade de comunicação social. Se na nossa revisão constitucional fôssemos criar conceitos novos para esta realidade abrangente, o que estaríamos, porventura, por omissão, a fazer era a deixar escapar alguns aspectos da realidade, que agora não nos podem ocorrer e que estão seguramente todos eles averbados pelo conceito genérico "liberdade de imprensa" e que amanhã, ao querer ser extensivos, segundo um conceito mais amplo, acabaríamos eventualmente por introduzir consequências restritivas, em função de realidades que agora nos escapavam.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente, Almeida Santos.
O Sr. Presidente (Almeida Santos): - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, é evidente que esta questão tem de ser vista a uma luz diferente face às alterações que foram admitidas e que, porventura, têm até a possibilidade de vir a ser consagradas.
Até aqui havia realmente um regime dualista em matéria de imprensa - e digo aqui "imprensa" adoptando o conceito abrangente. Havia uma estrutura dualista: uma para a imprensa escrita e outra para a radiotelevisão e para a rádio. Neste momento, e face às propostas que estão a surgir, esta estrutura está-se a esbater. Portanto, admito que haja as vantagens que foram apresentadas em não alterar o conceito e que possa haver inconvenientes em alterá-lo. Por isso, levanto a possibilidade de não votarmos esse artigo hoje. Seria, porventura, útil nós tomarmos alguma iniciativa nesta matéria para eliminar completamente quaisquer dúvidas que pudessem ainda vir a ser levantadas porque, de qualquer maneira, no contexto da economia do preceito, o artigo 38.° vai ficar com uma estrutura dualista.
O Sr. Presidente: - Já hoje a tem, Sr. Deputado.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Exacto, Sr. Presidente. Hoje a liberdade não é igual em todos os meios de comunicação social.
O Sr. Presidente: - Em matéria informativa é igual, Sr. Deputado. O que acontece é que os n.ºs 7 e 8 referem-se a aspectos que não estão em causa nos anteriores. Os números anteriores aplicam-se a todos os meios de comunicação social e a todos os órgãos.
Não me importo nada de adiar, Sr. Deputado. O que não creio é que seja capaz de produzir argumentação que nos convença da vantagem de substituir o uso da expressão...
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Mas não é nisso que estou a pensar, Sr. Presidente. Estou bastante convencido pela vossa argumentação.
A vantagem era a de nós alterarmos a nossa proposta em relação ao n.° 1. Não votámos agora o n.° 1, mas apenas a vossa substituição para o n.° 2.
O Sr. Presidente: - É então melhor adiar a votação, Sr. Deputado.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, compreendo a preocupação do Sr. Deputado Nogueira de Brito, mas chamo-lhe a atenção de que estas votações são meramente indiciatórias. Portanto, questões desse
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género, que não dizem apenas respeito a este artigo, mas a outros artigos da Constituição, e para evitar mal entendidos de interpretação de votações, podem sempre ser corrigidas até ao momento decisivo, esse sim, que é o da votação no Plenário da Assembleia da República. Aí é que me parece que tem cabimento a sua preocupação porque esse é, sim, o momento em que se faz doutrina sobre o significado do que se vota negativa ou positivamente ou daquilo que não se chega a votar por ser retirado pelos proponentes para evitar exactamente mal entendidos. Esse é que é o momento certo, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Nogueira de Brito.
O Sr. Nogueira de Brito (CDS): - Sr. Presidente, gostaria de colocar duas outras questões ao Sr. Deputado Jorge Lacão em relação à sua exposição.
Relativamente à ressalva do Estado, o Sr. Deputado Jorge Lacão utilizou um argumento quantitativo, que, francamente, não me convenceu. O Sr. Deputado Almeida Santos alterou esse argumento, transformou-o em qualitativo e alicerçou-o na alteração que propõem, substituindo "orientação ideológica" por "orientação editorial". Não posso, efectivamente, aceitar o argumento quantitativo. Diria até que ele prova em sentido contrário: quantos mais órgãos de informação tivesse o Estado mais se deveria garantir esta liberdade dos jornalistas.. Este argumento do Sr. Deputado Almeida Santos merece realmente ponderação. Não sei se não se verificará a dificuldade levantada pelo Sr. Presidente Rui Machete, ou seja, de a alteração não ser suficiente para evitar uma tentativa de marcar ideologicamente os órgãos que são pertença do Estado. A distinção é muito especiosa para que, efectivamente, ela possa garantir completamente que, ao abrigo desta liberdade, não se venha a imprimir uma orientação ideológica. Por outro lado, a substituição de "órgãos pertencentes", ou seja, da titularidade pela natureza em relação aos órgãos doutrinários, não é uma substituição pura e simples. A nova realidade, "órgãos doutrinários", não é a mesma que "órgãos pertencentes a partidos políticos". É mais vasta e convinha precisá-la um pouco. Há que saber se se justifica a exclusão, com toda esta vastidão. O que é que entende por órgãos doutrinários? Suponho que é uma realidade mais vasta do que "órgãos pertencentes a partidos políticos".
Finalmente, gostaria de dizer, mais uma vez, que me congratulo com as opiniões manifestadas e com a adopção da estrutura formal do CDS para a redacção do n.°2.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Nogueira de Brito, reconheço que tem razão quando diz que o meu primeiro argumento quanto à natureza quantitativa - e agora mais restritiva, assim se adivinha - no que diz respeito ao número de órgãos do sector público não é suficiente. Por isso mesmo gostaria de lhe dar um outro e que é o seguinte: na versão actual da Constituição o artigo 38.° estava em conexão directa com o artigo 39.° O artigo 39.° dizia: "Os órgãos de comunicação social pertencentes ao Estado e a outras entidades públicas, ou a entidades directa ou indirectamente sujeitas ao seu controle económico, são utilizados de modo a salvaguardar a sua independência perante o Governo [...]" Para garantir isso havia o Conselho de Comunicação Social.
Ora bem, aquilo que, em sede de artigo 38.°, era retirado aos jornalistas atribuía-se ao Conselho de Comunicação Social, como instituição exógena aos jornais, com funções complementares daquelas que os jornalistas deveriam ter, mas lhes estavam restritas nos órgãos do sector público. E o que é que vai passar-se agora? Vai passar-se a distinção de um organismo que desempenha, complementarmente, para o sector público, algumas das funções que, em genérico, são funções dos jornalistas. De onde, portanto, que, se não passarmos a ter de futuro, no esquema institucional, uma entidade que vele especificamente por um conjunto de regras no âmbito do sector público, então essas regras ficam sem garantia. E pergunto: dever-se-á, então, continuar a deixar debilitado o estatuto dos jornalistas, quando trabalhadores do sector público?
Por esta razão, o estatuto dos jornalistas deveria ganhar a sua plena normalidade, dado que vai desaparecer um órgão complementar de orientação, o Conselho de Comunicação Social. A meu ver, esta é a melhor forma de garantir a liberdade de imprensa, se bem virmos e meditarmos sobre as posições que há muito tempo têm sido expressas pelos jornalistas. Todos eles têm apontado e têm pedido ao poder constituinte para resolver definitivamente, no que diz respeito ao estatuto dos jornalistas, este problema. É que penso ser um caso único no ordenamento jurídico em toda a Europa Ocidental esta limitação de direitos dos jornalistas em função da sua presença no sector público da comunicação social. E diria que esta regra, depois do desaparecimento do Conselho de Comunicação Social, subsistirá, se tiver que subsistir, como regra anacrónica.
Pela minha parte, gostaria que se gerasse na Comissão um conceito suficiente para libertarmos este anacronismo de uma vez por todas. E era esta a explicação que lhe daria à primeira das suas dúvidas.
Quanto à segunda dúvida, limitar-me-ia a ler-lhe algo que também está hoje consagrado no ordenamento jurídico e que define o que seja um órgão de comunicação social com natureza doutrinária. Trata-se do n.° 2 do artigo 3.° da Lei da Imprensa, que diz:
As publicações doutrinárias são as que visem predominantemente divulgar qualquer doutrina, ideologia ou credo religioso, designadamente enquanto órgãos oficiais de partidos políticos, movimentos ou associações cívicas ou de igrejas ou comunidades religiosas.
Resulta da formulação deste artigo que se alguma coisa está aqui por excesso é dizer-se "natureza doutrinária ou confessional", pois, aparentemente, bastaria dizer-se "doutrinária" e estava tudo dito, uma vez que o conceito de "doutrinário" seria abrangido pelas duas realidades. Mas, para que não subsistam dúvidas no espírito de ninguém sobre o sentido abrangente da expressão "doutrinária", optou-se por manter ainda a referência à expressão "ou confessional". Em todo o caso, ela não visa acrescentar nada de novo, mas apenas evitar eventuais dúvidas de interpretação futura.
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O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, formularei sobre este artigo as observações do PCP, não centradas exclusivamente sobre o ponto que tem estado até agora em debate. Referir-me-ei ao alcance geral das diversas opções, tanto decorrentes do acordo político de revisão constitucional celebrado pelo PS e pelo PSD, como pelo texto agora adiantado pelos Srs. Deputado do PS, isoladamente considerados.
Devo sublinhar que discordamos, fortemente, radicalmente, do pano de fundo sobre o qual esta discussão se está a realizar pois ele pressupõe, desde logo, a não inviabilização constitucional do atestado de óbito que o Governo quer passar do sector público de comunicação social na parte da imprensa e uma adesão expressa, implícita, confessa ou não confessa, a uma teoria minimalista e redutora sobre o sector público que significa, obviamente, não a defesa da liberdade de informação mas a criação em Portugal de condições propícias para satisfazer a gula de determinados grupos económicos capitalistas que hoje anseiam por tomar empresas e equipamentos essenciais para garantirmos, neste país, a liberdade de expressão e o pluralismo, isenção e rigor da informação e da programação transmitidas aos cidadãos.
Este é o pano de fundo e, deste pano de fundo, obviamente, discordamos. Aliás, o Sr. Deputado Jorge Lacão não aludiu na sua exposição a dois factos óbvios: por um lado, à supressão do actual n.° 7 e, por outro lado, à supressão até do próprio n.° 8 que - sabemos lá porquê - também foi suprimido. Ou, então, é mais um lapso!
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado, já foi esclarecido que foi um equívoco. O n.° 8 mantém-se, só que tem a sua numeração alterada em função da alteração da proposta. Não se propõe a eliminação do n.° 8 do artigo 38.° da Constituição.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, muito nos satisfaz que assim não seja, embora, naturalmente, como as primeiras propostas sobre esta matéria foram apresentadas no início do passado mês de Dezembro e delas constava, expressamente, a palavra "eliminado" no n.° 8, durante todos estes dias e todas estas semanas o País julgou, enganado, isto que nós enganados julgámos!
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, é relativamente evidente que há dois portugueses que nunca se enganam: o Prof. Cavaco Silva e o Sr. Dr. José Magalhães! Está esclarecido!
O Sr. Presidente:. - Sr. Deputado José Magalhães, é que há uma explicação lógica para isto. É que o PS, efectivamente, eliminou, numa primeira formulação, esse número tendo em conta o artigo seguinte, tal como o formulámos e tal como ele existe. No entanto, como o artigo seguinte veio a ser objecto do acordo PS/PSD, naturalmente que a eliminação deixou de se justificar e nós esquecemo-nos de a repor naquela proposta. Foi só isto! Mais nada! A eliminação chegou a existir, no quadro do artigo 39.° que estava na nossa proposta. Nesse quadro, tinha perfeita justificação. Só que não vale a pena inventar falsas intenções.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, falei, precisamente, em contribuir para a reposição da verdade e não mais.
O Sr. António Vitorino (PS): - Isso já estava feito.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu considero que é interessante a explicação dada pelo Sr. Presidente. Apenas lhe falta para ser perfeita que o artigo 39.° tratasse desta matéria, o que não acontece, o que confere à tese alguma incongruência. Mas isso é secundário!
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, V. Exa. não tem razão nenhuma! Está a querer embirrar connosco, pode fazê-lo à vontade, mas a verdade é que, quando nós propúnhamos, no nosso artigo 38.°, que o licenciamento das rádios passasse a ser definido no quadro do estatuto da informação; era evidente que suprimíamos o n.° 8 actual da Constituição. Mas, como essa proposta não foi acolhida no acordo PS/PSD, foi necessário repor, no artigo 38.°, o n.° 8 originário.
E o Sr. Deputado José Magalhães pode embirrar com este facto os minutos que quiser que nós o compreendemos a título de embirração!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Seria realmente agradável e simples para o PS que uma questão política pudesse ser decomposta em birra ou qualquer outra síndroma psicológica.
O Sr. António Vitorino (PS): - Não, não é uma questão política! É uma questão de birra pura!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não! É uma questão de reconstituição exacta da maneira como as coisas acontecem! Como é óbvio, eu não conheço, nem tenho de conhecer, nem devo conhecer, nem é suposto que ninguém conheça, quais foram as peripécias, trâmites e vicissitudes e outros desgostos do acordo entre o PS e o PSD nesta matéria.
O Sr. António Vitorino (PS): - Mas tem a obrigação de saber - porque nós já dissemos nesta Comissão - que tinha sido por lapso que se tinha proposto a eliminação do n.° 8. Isso tem obrigação de saber.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Tenho, obviamente, a obrigação de tomar conhecimento das rectificações decorrentes dos vossos malogros negociais sem ser obrigado a, reverentemente, achar que os resultados estão bem.
O Sr. António Vitorino (PS): - Então acha que se devia eliminar?!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu acho aquilo que disse e o mais que vou dizer a seguir!
O Sr. António Vitorino (PS): - Não! O que disse foi apenas uma manifestação de uma birra!
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Pretendi alertar para um aspecto que agora fica clarificado: o PS aceitou que o PSD excluísse das competências próprias da alta autoridade para a comunicação social a questão do licenciamento de rádios. Isso é gravíssimo!
O Sr. António Vitorino (PS): - Aí faça o favor de dizer o que quiser.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É óbvio que digo o que quiser! Isso está fora de questão! A opção praticada significa que uma das maiores alterações, no quadro dos áudio-visuais, é feita por esta via (considerando, como é óbvio, todo o conjunto das alterações e não só o artigo 38.°).
O Sr. António Vitorino (PS): - É que não foi essa a metodologia acordada, sem a sua oposição! Por isso é que eu digo que é uma birra. É óbvio!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, se entende que a apreciação do n.° 2 do artigo 38.° é possível prescindindo da consideração do pano de fundo em que estamos a discutir, afirmo-lhe que seria um absurdo alhearmo-nos disso. Só se ocultaria o que os senhores estão a discutir e a reforçar, eventualmente, aqui ou ali, direitos dos jornalistas, que, pura e simplesmente, deixarão de estar em jornais públicos porque os jornais públicos não verão limitada a possibilidade de serem alienados. Acho que seria uma discussão alienante. Não gostaria de a transformar nisso!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas faça-a a propósito do artigo 39.° porque é agora o momento de a fazer.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não. Eu estava a fazer, obviamente, uma alusão genérica.
O Sr. Presidente: - Mas também gostará de saber que temos um arsenal de adjectivos para as vossas intenções! Se quiser que os usemos também o podemos fazer! O PCP também tem intenções, reservadas, não reservadas, reservas mentais e não mentais! E nós também temos um arsenal de qualificativos para as intenções do PCP! Só que, normalmente, somos mais comedidos a pronunciarmo-nos sobre as vossas intenções do que o PCP sobre as nossas! O problema é só este! Compreendemos isso até certo ponto! Demos a explicação de que foi um lapso e o Sr. Deputado continua a argumentar como se fosse uma intenção maléfica, terrível, uma reserva mental tremenda e, por mais que se lhe diga que foi um lapso, o Sr. Deputado insiste.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Presidente, aceitamos isso. O que não aceitamos, obviamente, e consideramos uma cedência extremamente grave, é o acordo neste ponto.
O Sr. Presidente: - Ah, bom! Assim está bem. Diga o que quiser do acordo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Digo, certamente. O primeiro grande problema está precisamente, no facto de o PS decair de propostas suas em relação a este artigo.
O Sr. Presidente: - Sabemos isso e exercemos um direito que o PCP não nos pode negar, como nós não negamos ao PCP o direito de discordar dessa nossa atitude.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O que legitima, pois, da nossa parte, a retomada, ao abrigo do artigo 133.° do Regimento da Assembleia da República, aplicável por força do regimento da Comissão, dessas propostas de que o PS decai. Fá-lo-emos nos termos que seguidamente enunciarei.
O Sr. Presidente: - Com certeza. Não vos tiramos os vossos direitos!
O Sr. António Vitorino (PS): - Sem esse mecanismo da retoma, nós não poderíamos votar a favor delas, sob pena de pôr em causa a confiança que deve existir no acordo político com o PSD. Assim, ficámos muito gratos ao PCP por nos permitir demonstrar e reafirmar a nossa posição nesse aspecto.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Eu diria mesmo: uma posição incoerente! Esse é o segundo aspecto, que nos parece grave e nefasto nesta parte do acordo entre o PS e o PSD.
Em terceiro lugar, o PS faz um recuo em ziguezague e de forma que, evidentemente, não tem primado pela clareza, como ficou inteiramente evidenciado por todo o diálogo nesta matéria e, até, pelo tem um pouco emocionado como ele decorreu, sem razão nenhuma, em meu entender, porque, da nossa parte, não poderíamos deixar de assinalar tais evidências.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, se nós lhe disséssemos 10% daquilo que o Sr. Deputado nos tem dito a nós, acredite que não tenho a menor dúvida de que o Sr. Deputado reagiria muito mais violentamente e com menos paciência do que nós temos reagido às suas críticas. Desculpe, mas tenho de lhe dizer isto.
Estamos aqui há muitos meses a aceitar e a reconhecer-lhe o direito de nos dirigir as críticas que nos tem dirigido. Reconheça, pelo menos, que temos tomado essa atitude! Podíamos não a ter tomado! Podíamos fazer-vos processos de intenção e ir à base e à raiz do que o PCP quer, das vossas oposições e do que está na sequência das vossas decisões. Também podemos fazê-lo! Também podemos fazer interpretações históricas, recuar, dizer o que foi, o que é e o que vai ser! Não temos querido fazer isso, nem o queremos fazer, mas reconheça, ao menos, que tem gozado aqui do privilégio de nos "zurzir" de alto a baixo com autêntica liberdade e que temos tido uma grande compreensão pela necessidade que o Sr. Deputado sente de dizer as coisas que tem dito. Mas, ao menos, reconheça isso! Agora, não pretenda que sejamos nós os culpados! Isso não!
Temos os nossos pontos de vista, os nossos direitos - lutámos muito por eles e ninguém no-los tira - e o PCP tem os seus, iguais aos nossos, e cada exerce os seus como entender! O PS, no sentido de, em alguns pontos, estar de acordo com o PSD; o PCP no sentido de retomar as propostas prejudicadas por esse acordo, óptimo! Não há problema nenhum, nem é pre-
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ciso anunciar isso como uma ameaça! É um exercício de um direito normal em democracia. E nós votaremos as nossas propostas retomadas por vós!...
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente, Rui Manchete.
O Sr. Presidente (Rui Manchete): - Srs. Deputados, gostaria de saber se estamos em condições de passar à votação.
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Presidente, o Sr. Deputado Nogueira de Brito pediu para haver um tempo de reflexão sobre esta matéria.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado Almeida Santos, gostaria de lhe perguntar se V. Exa. entende aplicar aqui o mesmo princípio que aplicámos às quatro horas da tarde. No caso de se entender desejável um adiamento cessa aí, de imediato e com prejuízo de inscritos, o conteúdo do debate?! Creio que isso seria um absurdo!
O Sr. Almeida Santos (PS): - Sr. Deputado José Magalhães, há uma diferença. É que a mesa ainda não suspendeu os trabalhos. Quando esta o fizer, não digo nem mais uma vírgula sobre esta matéria, que foi o que o Sr. Deputado não respeitou. Agora está no seu direito de continuar porque a mesa ainda não suspendeu os trabalhos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É essa precisamente a minha preocupação.
O Sr. Presidente: - É a chamada intervenção cautelar!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto, o que, dado o contexto e os antecedentes, é perfeitamente inevitável.
Estava a dizer, Sr. Presidente, que, além da menção ao n.° 8 e ao n.° 7 e a outros aspectos (como a supressão da primeira parte do n.° 5, a fusão da segunda parte do n.° 5 e do n.° 6, aditando-se o princípio da especialidade), em relação à alteração e desenvolvimento do n.° 2, há algumas considerações da nossa parte a fazer. Pudemos já debater, aprofundadamente, a questão dos chamados direitos internos dos jornalistas e, em relação à questão da liberdade de criação e de expressão nenhum problema se coloca, a não ser, obviamente, aquele que, indirectamente, resulta do facto de, com a supressão eventual de um sistema como aquele que hoje existe de jornais públicos, nós entendermos que, globalmente, haverá uma diminuição da própria liberdade de criação e expressão e mesmo o risco de consequências práticas de despedimento, de afastamento ou de prejuízo. Haverá em qualquer caso, uma alteração de estatuto, que não vemos como vantajosa mas como negativa, nefasta e perigosa. Não cremos que dela resulte mais liberdade de criação e de expressão para os jornalistas portugueses e entendemos e receamos que daí resulte menos liberdade de criação e de expressão para os mesmos, com a entrada em cena, em longa escala, do poder dos grupos económicos.
Não podemos deixar de citar este aspecto, que é um aspecto fulcral e extremamente negativo decorrente da opção à qual o PS aderiu.
Em segundo lugar, relativamente à outra componente dos direitos internos dos jornalistas, àquilo a que se chama o direito de intervenção na orientação ideológica, cremos que a alteração a introduzir deve ter em conta a delicadeza das alterações conceptuais num campo em que os conceitos estão estabelecidos. O Sr. Deputado Jorge Lacão, há pouco, lia o artigo 3.° da Lei de Imprensa, citava integralmente o conceito de publicações doutrinárias hoje em vigor e referia que, nesse conceito, estão abrangidas as publicações encarregadas de divulgação de qualquer doutrina, ideologia ou credo religioso. Por consequência, obviamente, a expressão "confessional" é redundante e se a preocupação dos Srs. Deputados é apenas uma explicitação clarificadora, então têm uma fórmula simples: "quando tiver natureza doutrinária e, designadamente, confessional ou partidária". Essa fórmula resolve o problema da explicitação enfatizadora, que suponho ser aquele que dominava as considerações que aqui foram feitas.
Quanto à substituição da noção de orientação ideológica pela noção de orientação editorial, no fundo, é disso que se trata. É evidente que a orientação editorial é susceptível de ser lida em função de ideologias e de outros elementos de posicionamento dos jornalistas situados a qualquer nível. Essencial é que não se entenda, - e gostaria de um esclarecimento da parte do Sr. Deputado Jorge Lacão, se possível - que a orientação editorial se esgota na aprovação do estatuto editorial.
A intervenção dos jornalistas, tal qual hoje está pressuposta constitucionalmente, não se esgota na aprovação do estatuto editorial das publicações. Há sempre um imprescindível momento inicial, na vida dos jornais, que é a aprovação do estatuto editorial - mas a intervenção dos jornalistas, designadamente através dos conselhos de redacção, vai-se verificando em relação a vários momentos da vida do órgão de comunicação social. Verifica-se no quotidiano, é um processo contínuo e não um processo que se esgote no momento inicial. Esse é um ponto absolutamente fundamental.
Suponho que não estará no vosso espírito restringir, pelo menos neste ponto, a noção que flui da Constituição no seu texto vigente.
Quanto ao terceiro aspecto suscitado pela redacção agora adiantada pelos Srs. Deputados do Partido Socialista, é evidente que a mudança de critério, tendo em conta a natureza, é aquilo que se compagina com a própria opção constitucional na sua leitura mais correcta, e não nos parece que aí haja o que quer que seja a objectar. Outros poderão pensar de maneira adversa e há práticas aberrantes por aí. Oxalá a norma venha a ajudar a inverter um quadro. Quanto à supressão do segmento final do artigo 38.°, n.° 2, que estabelece a articulação entre os direitos dos jornalistas e os direitos de outros trabalhadores, a génese da norma não teve uma contribuição activa por parte do PCP, não foi o resultado de qualquer bandeira que tenhamos erguido, bem pelo contrário.
Suponho que caminhamos para o encerramento daquilo que começou por ser um equívoco, desenvolveu-se de forma negativa e teve um apogeu mais negativo ainda. A supressão não é, a título nenhum, polémica.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sem que ninguém esqueça o que esteve na base da sua consagração!
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Sem que ninguém esqueça o que é que esteve na base da sua consagrado, como é óbvio, e sem que nós abdiquemos da leitura que fazemos dos acontecimentos a que está a fazer referência! Por outras palavras, não relemos a história à luz da releitura da História feita por quem quer que seja que não nós próprios. Mas, suponho que o facto de os senhores enterrarem o que estão a enterrar através desta norma é positivo.
Por outro lado, nos tempos que correm na República, que saiba eu, as direcções do Diário de Noticias saem por força de conselhos de gerência e de governos do PSD, com quem o PS celebrou um acordo de revisão!
O Sr. António Vitorino (PS): - Esse é um problema 1o sector público de comunicação social!
O Sr. José Magalhães (PCP): - É de facto o problema do cerco ao sector público da comunicação social escrita, o qual obtém nesta revisão constitucional, e o acordo for consumado como os senhores desejam, um impulso para que o Governo passe vários atestados de óbito com o aval do Partido Socialista.
Eram estas as considerações introdutórias que gostaria de fazer sobre esta matéria, aguardando, naturalmente, os esclarecimentos que pedi ao Sr. Deputado Jorge Lacão, e estando, evidentemente, disponível para responder à pergunta que o Sr. Deputado António Vitorino desejava formular.
O Sr. António Vitorino (PS): - É uma pergunta muito simples, Sr. Deputado José Magalhães, a que se responde com uma outra pergunta igualmente simples: qual é a garantia constitucional actual da existência de um sector público de comunicação social na imprensa?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Deputado António Vitorino, nós vamos retomar a proposta apresentada pelo Partido Socialista, visando criar uma cláusula especial de protecção de um sector público de comunicação social, pelo menos tripartido, portanto abrangendo a rádio, a televisão e a imprensa escrita...
O Sr. Presidente: - Pensei que era o privado, o cooperativo e o público, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - ... como fórmula tendente a reforçar a garantia somável àquela que decorre do artigo 83.°, que o Partido Socialista pretende rever, e do n.° 1 do artigo 39.°, que, ao prever o que prevê, inculca que haja um sector público de comunicação social e não seguramente que haja um vazio sobre o qual se erga a liberdade de expressão.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado, só gostaria de fazer duas observações. Primeiro, neste caso o PS não decaiu de nenhuma garantia constitucional existente. Pelo contrário, o Sr. Deputado José Magalhães, cedendo menos às volúpias de uma argumentação polémica e fazendo jus a um certo rigor técnico-jurídico, que também é importante nestes debates, devia ele próprio reconhecer que o PS não decai de nenhuma garantia constitucional existente. Quando muito, o que o Sr. Deputado José Magalhães poderá dizer é que o PS decaiu de uma proposta sua, no seu projecto de revisão, que pretendia estabelecer ex novo essa garantia constitucional, hoje de facto inexistente, porque o artigo 83.° é insusceptível de ser invocado, em virtude de nenhum órgão de comunicação social ter sido objecto de nacionalização directa...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Então e a rádio, Sr. Deputado? E a TV?
O Sr. António Vitorino (PS): - Mas a rádio está garantida no acordo PS/PSD, Sr. Deputado José Magalhães. Nenhum órgão de informação escrita foi objecto de nacionalização directa e expressa, protegido por isso pelo artigo 83.° da Constituição.
O Sr. José Magalhães (PCP): - A rádio está garantida não, Sr. Deputado! Está garantida hoje, mas nos termos do acordo não o está. Veja-se o que propõem quanto ao artigo 83.°!
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado, no acordo está garantido que há um serviço público de rádio.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mínimo, Sr. Deputado!
O Sr. António Vitorino (PS): - Quanto ao "mínimo" já lá vamos, Sr. Deputado. V. Exa. terá oportunidade de fazer a sua interpretação aberrante do significado do inciso "mínimo" e eu terei ocasião de esclarecer qual é a interpretação que reputo não aberrante do significado desse qualificativo "mínimo".
O Sr. José Magalhães (PCP): - Aguardo-o com curiosidade, Sr. Deputado.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, vou ser muito breve.
Antes de mais, gostaria de sublinhar que depois de algumas hesitações e dúvidas postas pelo Sr. Deputado Nogueira de Brito pudemos chegar à conclusão de que o conceito de liberdade de imprensa deve prevalecer na nossa semântica constitucional com vantagens sobre quaisquer outros para designar a mesma realidade.
Quanto às alegações do Sr. Deputado José Magalhães, o que verifiquei foi o seguinte: estava em discussão a proposta do PS, nomeadamente as várias alíneas do n.° 2 do artigo 38.° Nessa exacta matéria todas as objurgatórias do Sr. Deputado José Magalhães caíram por terra. Afinal, o que se verificou é que no essencial ele está de acordo com a proposta apresentada pelo PS. Teve muitas dificuldades em tornar esse acordo implícito procurando explicitar uma série de críticas laterais que não vinham, a meu ver, muito a propósito. O Sr. Deputado limitou-se a expressar uma única dúvida, que foi a de saber se a formulação "de natureza doutrinária ou confessional" seria preferível tal como está proposta, ou se ela deveria ser alterada para "doutrinária, designadamente confessional ou partidária".
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Pela minha parte, devo dizer que não vejo que essa alteração trouxesse benefício, e prefiro que fique redigido como está proposto. Julgo que está a resposta dada. De facto, não vi nenhuma objecção de fundo acerca destas várias alíneas e, portanto, ponho um ponto final na matéria. Se das outras bancadas não vierem explicitações de outras dúvidas, suponho que já estamos todos suficientemente esclarecidos.
O Sr. Presidente: - Não compreendi há pouco, e gostaria de perceber o que foi referido acerca da observação do Sr. Deputado Nogueira de Brito. Em princípio, não iríamos sustar as votações, salvo se elas fossem objecto de um pedido expresso, o que teria de ser considerado caso a caso.
O Sr. António Vitorino (PS): - O problema que o Sr. Deputado Nogueira de Brito levantou foi o de lhe ser ainda possível reformular a proposta que fez para o n.° l, tendo em linha de conta a interpretação que demos sobre o conceito de liberdade de imprensa. Creio que ficou aqui esclarecido que o Plenário era a ocasião propícia para fazer isso, e como o n.° 1 do CDS até já estava votado não valia a pena sustar mais nada por causa disso.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, há mais alguma inscrição ou poderemos passar à votação dos n.ºs 2, 3 e 4?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, pela sua boca tínhamos feito duas sugestões ao Partido Socialista.
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado. Uma delas não era propriamente uma sugestão. De facto, manifestámos a nossa preferência pela manutenção na alínea a) de referência ao Estado, aceitando a sugestão que o Partido Socialista fazia da parte relativa aos órgãos especializados ser suprimida.
Quanto à alínea c), e se fosse caso disso, formularíamos uma proposta nesse sentido; a nossa ideia seria a de cindir ou desdobrar essa alínea, visto que nós podemos acompanhar o Partido Socialista no que respeita à consignação constitucional do direito dos jornalistas a elegerem conselhos de redacção, mas, como tive ocasião de explicitar há pouco, não nos se afigura útil que se acrescente especificamente no preceito constitucional a competência desses conselhos. Portanto, votaríamos a primeira parte do texto da alínea c) proposta pelo PS, até à palavra "redacção", mas não a segunda parte do respectivo texto.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, tenho de confessar que não tinha presente essa questão suscitada pelo PSD e, se me permite, voltaria a ela. Se o PSD considera que não vê utilidade na constitucionalização de algumas competências do conselho de redacção, pretenderia ir um pouco mais longe quanto às explicitações das razões do PSD, porque estas competências são hoje, digamos, totalmente pacíficas no âmbito dos conselhos de redacção.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Deputado, se me permite que o interrompa, direi que isso não está em causa. Tem havido outras matérias em que se verifica um acordo larguíssimo, nalguns casos eventualmente até a unanimidade entre todas as forças políticas representadas na Assembleia.
O problema é que entendemos, tal como relativamente a outras, que essa matéria não deva ser constitucionalizada. Entendemos que qualquer Constituição lei fundamental de um país, não deve descer ao pormenor de definir competências de órgãos como os conselhos de redacção, embora haja acordo sobre ela:
Pode não haver nenhuma divergência de fundo. Mas há, sim, divergência quanto a saber se estas matéria devem ou não ser constitucionalizadas. Julgamos que não. Repare que, a não ser assim, sucedendo-se as ré visões constitucionais, qualquer dia a Constituição pode ser um monstruoso e interminável albergue espanhol.
Obviamente que a vida social vai evoluindo, vai havendo aperfeiçoamentos legislativos, tudo sobre o que há acordo se vai metendo na Constituição.
É evidente que isso não pode ser.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Deputado Pedro Roseta, na medida em que a sua intervenção consisti numa interrupção às minhas considerações, gostaria d lhe dizer o seguinte: a constitucionalização deste direito dos jornalistas a elegerem conselhos de redacção já um dado adquirido da revisão constitucional de 1982 Assim, o que há aqui de novo é procurar dar um cor teúdo mínimo à razão de ser dessa constitucionalização. Porque o que hoje acontece é que se constitucionalizou o direito à eleição de conselhos de redacção mas, não havendo um conteúdo constitucional mínimo para as funções do conselho de redacção, aparente mente esta é uma solução constitucional mitigada. D facto, o que nós procuramos, e isso já está explicitado é transferir para a Constituição algumas competência que são hoje, a meu ver, totalmente pacíficas.
Em todo o caso, se o PSD se mantiver arreigado esse propósito de não votar favoravelmente este ponte permita-se que depois haja um rearranjo em matéria de sistemática, porque numa emergência dessas as alíneas b) e c) poderiam vir a ser aglutinadas na parte restante.
O Sr. Presidente: - Nessa eventualidade tratar-se-ia aqui de uma questão de redacção.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Realmente lamento bastante que não nos possam acompanhar neste ponto.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Deputado, pode ria estar de acordo com a aglutinação, mas realmente não vos podemos acompanhar na votação do referido ponto. Acompanhar-vos-emos quanto a outros. V. Exa. pretende que façamos já a referida fusão na nossa proposta?
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não, penso que não vale a pena fazê-lo já.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, gostaria apenas de formular uma pergunta. Se bem entendo aquilo que resulta deste anúncio é que não há nenhum alteração ensejada nesta matéria. Há apenas uma cisão de um preceito constitucional vigente, e uma alteração da técnica expositiva com a respectiva alteração da primeira parte do texto.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não, Sr. Deputado, por 3arte do PS havia uma proposta de constitucionalização de...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Essa mereceria o nosso acordo, embora já representasse o decair da proposta originária do PS.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - A única coisa que verificamos é que o PSD diz que não votará favoravelmente essa inovação, e isso ultrapassa o PS.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O documento está entregue na mesa para os devidos efeitos. Aliás, não vale a pena retomarmos a proposta que está agora a ser apresentada.
Vozes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não, Sr. Deputado, eu não disse isso. Afirmei que em relação à questão do regime jurídico dos conselhos de redacção havia unicamente a cisão do preceito e a sua transposição, uma vez que o Sr. Deputado Pedro Roseta acabou de anunciar a não adesão do PSD a qualquer melhoria da Constituição neste ponto. Quanto à primeira parte, estivemos a discutir todo este tempo, embora o Sr. Deputado Jorge Lacão tenha deixado sem resposta o que deixou.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sugiro que se proceda à divisão da alínea c) em termos de votação, porque a primeira parte da alínea c) da nossa proposta, que refere "[...] o direito de elegerem conselhos de redacção [...]", já consta hoje da Constituição e não precisa de ser votada. Não é preciso votar o aditamento "[...] com competência para [...]", que previsivelmente não terá os dois terços. Portanto, a alínea c) ficaria só com este conteúdo, o qual autonomamente não faz sentido e pode ser aditado à alínea b). Mas isso é uma mera questão de redacção.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não seria melhor os senhores reformularem já isso?
O Sr. António Vitorino (PS): - Não, porque nós não decaímos da proposta. Pretendemos vê-la votada, embora pudéssemos fazê-lo para dar oportunidade ao PCP de a retomar.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Não é necessário, temos uma melhor. É aquela que dá poderes de intervenção, com carácter vinculativo aos conselhos de redacção, coisa que nos parece mais correcta.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para efeitos de facilitar a votação, gostaria de dizer que existe uma proposta do PSD que propõe o desdobramento e, portanto, que seja apenas consignado na alínea c) o direito de os jornalistas elegerem conselhos de redacção. A finalidade da proposta é exclusivamente essa.
Além desta, há também uma proposta de substituição, apresentada pelo PCP, que retoma os n.ºs 3 e 6 da proposta apresentada pelo Partido Socialista, e que também vai ser distribuída.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, pela mesma ordem de razões não vale a pena votar a alínea d) da última proposta apresentada pelo PS na medida exacta em que essa alínea não passa do actual n.° 4 do preceito em vigor.
O Sr. Presidente: - É verdade.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Portanto, não faz sentido votar agora a alínea d) proposta pelo Partí3o Socialista.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, vamos ver se agora nos orientamos em matéria de votações, visto que as matérias em apreço estão suficientemente esclarecidas. Quando chegarmos ao problema da votação da proposta de substituição apresentada pelo PS teremos ocasião de distribuir as propostas de substituição e de alteração.
Em relação ao n.° 2 do artigo 38.°, temos em mão uma proposta do CDS que refere o seguinte: "A liberdade de comunicação social implica [...]", com uma alínea á) e uma alínea d). Temos, também, uma proposta do PS, a qual foi substituída e, portanto, será votada em último lugar. Para além dessa, temos ainda uma proposta apresentada pelo PSD e outra pelo PRD.
Quanto a esta última, o respectivo n.° 2 não corresponde ao n.° 2 actual porque este consiste numa explicitação do que é o conteúdo da liberdade de imprensa. O n.° 2 actual corresponde mais ao n.° 1 da proposta do PCP, o qual já foi votado.
Srs. Deputados, se estiverem de acordo vamos votar o n.° 2 da proposta do CDS.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Não há nada de inovador, pois não?
O Sr. Presidente: - Em relação a quê?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Na alínea á) do n.° 2 do artigo 38.° proposto pelo CDS. Esta alínea limita-se a retomar o actual n.° 2; por isso não faz sentido votar o texto da Constituição.
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado. Só faz sentido votar o aditamento que corresponde à alínea b).
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Exactamente, Sr. Presidente.
O Sr. António Vitorino (PS): - O que o CDS refere no n.° 2 é a liberdade de comunicação social. É o corpo do n.° 2 que é diferente.
O Sr. Presidente: - Sim, Sr. Deputado, mas nada obsta a podermos votar em conjunto.
Vamos, então, votar a proposta relativa ao n.° 2 do artigo 38.°, apresentada pelo CDS.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PCP e da ID e as abstenções do PSD e do PS.
É a seguinte:
2 - A liberdade de comunicação social implica:
a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orien-
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tação ideológica dos órgãos de informação não pertencentes ao Estado, a partidos políticos ou a confissões religiosas, sem que nenhum outro sector ou grupo de trabalhadores possa censurar ou impedir a sua livre criatividade;
b) O direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à protecção da independência e do sigilo profissionais, bem como o direito de elegerem conselhos de redacção.
Iríamos passar, portanto, a votar a proposta do PSD para o n.° 2 do artigo 38.°
É claro que, como nós aderimos a uma parte substancial da proposta do PS, põe-se o problema de saber se não se justifica pura e simplesmente ficar prejudicada e retirá-la.
Vozes.
O SR. Pedro Roseta (PSD): - Eu devo dizer-lhe que pessoalmente prefiro a nossa, que aliás é um pouco mais sucinta, não é assim?
Risos.
O Sr. Presidente: - Mas, se V. Exa., Sr. Deputado, prefere a proposta do PSD, nada obsta a que se vote a proposta do PSD.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - O que não obsta a que posteriormente possamos votar a favor da proposta do PS.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Vamos então votar o n.° 2 do artigo 38.° proposto pelo PSD.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, 05 votos contra do PCP e da ID e a abstenção do PS.
É a seguinte:
2 - A liberdade de imprensa implica a liberdade de expressão e de criação dos jornalistas e colaboradores literários, o direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à protecção da independência e do sigilo profissionais, bem como a sua audição quanto ao estatuto editorial de órgão de informação não pertencente ao Estado, a partidos políticos ou a confissões religiosas.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Não, não. Foi votada em conjunto.
Há uma proposta do PS para o n. ° 2 do artigo 38.°, subdividida em diversas alíneas, não é verdade? Vamos votar alínea a alínea naquilo que houver novidade. Começamos pela alínea a). Mas na alínea a), gostaria de
chamar a atenção a VV. Exas. para o seguinte: o PS em termos gerais propôs a supressão da expressão "especializado" ou inciso, especializada in fine.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Eu já leio. Mas deixe-me assentar no texto antes de o ler. E no que diz respeito ao Estado o PS, embora com dúvidas, mantém a expressão "o Estado".
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Só pela razão de que isso parece ser condição indispensável para obter dois terços nesta proposta.
O Sr. Presidente: - Exacto. Vozes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, do debate não ficou para mim totalmente claro o raciocínio feito pelo Sr. Deputado Jorge Lacão quanto às competências actuais do Conselho de Comunicação Social que serão transferidas, segundo diz o acordo tal qual a gente o leu, para a Alta Autoridade. Disse o Sr. Deputado Jorge Lacão que "não são transferidas". O Sr. Deputado considera que, por isso, devem ser os jornalistas a exercer no sector público de comunicação social competências que hoje são exercidas pelo Conselho de Comunicação Social.
Entende que a supressão do Conselho de Comunicação Social exige o reforço dos poderes dos jornalistas e a sua intervenção nos órgãos de comunicação social do sector público sobejante. Isto, devo dizer, feriu-nos os tímpanos. Em todo o caso como o Sr. Deputado não se quis pronunciar sobre essa matéria, pois acabou por sumarizar o raciocínio, e comei os Srs. Deputados do PSD por sua vez revelaram aqui amor ao Estado, non liquet.
O Sr. Presidente: - Muito bem. Em todo o caso, o que liquet é que a proposta do PS para a alínea a) do artigo 38.° é a seguinte:
a) A liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orientação editorial dos respectivos Órgãos de comunicação social, salvo quando pertencerem ao Estado ou tiverem natureza doutrinária ou confessional.
E fica por aqui. Está claro?
O Sr. José Magalhães (PCP): - Está claro, Sr. Presidente, só gostaria de, antes de se passar à votação, e porque isso é relevante para o sentido do voto, formular a seguinte consideração: é óbvio que qualquer juízo sobre esta matéria para nós não é desligável do quadro geral e do pano de fundo que procurei descrever e situar na intervenção que tanto horror provocou na bancada do PS. É evidente que entendemos que está pressuposta, na leitura que o PS faz deste texto, uma opção que nós profundamente rejeitamos. O sentido que damos a este preceito, à releitura que através dele se faz, vai no sentido do revigoramento ou da clarificação, da explicitação, dos poderes dos jornalistas no sentido da definição mais exacta dos seus contornos,
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o que é em si mesmo positivo. Em suma: detestamos o pano de fundo, mas obviamente não enjeitamos o que há de positivo na clarificação.
O Sr. Presidente: - Vai proceder-se à votação da proposta da alínea a) do n. ° 2 do artigo 38.°, apresentada pelo PS, cujo texto é o que acabei de ler.
Submetida à votação, obteve a maioria de dois termos necessária, tendo-se registado os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID.
Portanto, a alínea a) da proposta do PS nos termos ultimamente formulados e, logo com a supressão da parte relativa aos órgãos especializados foi aprovada. A alínea b) não tem propriamente aspectos novos; tem - uma formulação um pouco diversa porque cinde o n.° 3 no que respeita ao direito de elegerem conselhos de redacção, não é verdade? Que fica para a alínea...
O Sr. António Vitorino (PS): - Mas isso é uma questão de redacção.
O Sr. Presidente: - Mas depois é uma questão de redacção e arrumação. Portanto, este voto é apenas um problema de ordem sistemática.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, a minha interrogação é esta: valerá realmente a pena fazer a votação? Aquilo que se está a fazer é rearranjar o texto vigente. O proémio "a liberdade de imprensa implica" está contido no actual n.° 3.
O Sr. Presidente: - É verdade, Sr. Deputado, foi o que eu disse. A dúvida que tenho é essa...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que não se justifica, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: - VV. Exas. consideram todos que ião há dúvidas de que a alínea b) mantém o texto acual da Constituição, embora haja aqui um rearranjo do ponto de vista sistemático.
Certo?
Pausa.
Muito bem. Depois, nesta proposta do PS para o n.° 2 do artigo 38.°, temos a alínea c). Para a alínea c) existe a proposta do PS e foi apresentada e já distribuída uma proposta de desdobramento da autoria do PSD. Como a primeira parte é o texto constitucional, nós, se VV. Exas. estiverem de acordo, vamos apenas votar o aditamento que o PS propõe, isto é, vamos apenas votar a parte relativa a "com competência para emitirem parecer sobre a designação [...]", porque é o aditamento e é isso que é novo.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, permite-me?
O Sr. Presidente: - Tem a palavra, Sr. Deputado.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, importa não esquecer que ao abrigo do artigo 133.° do Regimento, aplicável por força do regimento da Comissão, o PCP retomou a proposta de que o PS decaiu. Em que momento é que ela seria votada, Sr. Presidente?
O Sr. Presidente: - É verdade, mas como V. Exa. apresentou posteriormente nos termos regulamentares ela será votada, se não for prejudicada, posteriormente.
O Sr. António Vitorino (PS): - Como é evidente, sempre caberia ao PS a possibilidade de alterar esta alínea c) e de recuperar a única coisa que nela não se contém, que é a natureza vinculativa do parecer. Mas, como nós não queremos deixar de dar ao PCP a oportunidade de "fazer o número" de repegar a proposta do PS, pensamos que se deve votar agora a alínea c) nesta versão mitigada, e pode ser que os astros se conjuguem no sentido de quem recusa uma versão mitigada possa aceitar depois uma versão alargada - sabe-se lá, ele há distracções de facto - porque, no rigor das coisas, deveria considerar-se prejudicada. Mas nós não queremos impedir a possibilidade de retoma.
O Sr. Presidente: - Está esclarecido?
Vozes.
O Sr. Presidente: - Vamos votar o aditamento proposto pelo PS na sua proposta de substituição relativa à alínea c) do n.° 2, que consiste em acrescentar ao direito a elegerem conselhos de redacção a frase:
Com competência para emitirem parecer sobre a designação da direcção do respectivo órgão de comunicação social e sobre o respectivo estatuto editorial.
Submetido à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos a favor do PS, do PCP e da ID e a abstenção do PSD.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, queria chamar a atenção do PSD para o seguinte: a votação que acabamos de fazer elimina, como se viu, a possibilidade de conferir determinadas competências ao conselho de redacção. Todavia...
O Sr. Presidente: - Não elimina. Vozes.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em termos legais? É óbvio que não! A lei pode acrescentar direitos, prever poderes, atribuir regalias cuja consignação em sede constitucional tenha sido considerada inadequada...
0 Sr. Jorge Lacão (PS): - Elimina relativamente à proposta do PS. Só nesse sentido, é claro! Não estou a discutir a ordem jurídica, estou a discutir a proposta que tenho aqui à minha frente. Fica a clarificação feita, para que não haja dúvidas.
Mas o que agora verifico é o seguinte: é que na proposta há pouco votada do PSD, relativamente à qual o PS se absteve, algo ficaria pelo caminho se não recuperassemos agora um novo direito dos jornalistas que o próprio PSD está disponível para constitucionalizar
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e que é o da audição quanto ao estatuto editorial. O que é que separou o PSD da posição do PS? É que o PS remetia este direito por exercício através do conselho de redacção, enquanto o PSD não admite constitucionalizá-lo como direito genérico dos jornalistas. Ora bem, penso que neste momento em que nos recusaram a nossa proposta era o momento de recuperar a vossa, no sentido de acrescentarmos ao conjunto dos direitos dos jornalistas mais este que há pouco votaram favoravelmente, o da audição quanto ao estatuto editorial.
Vozes.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É para fazer uma pergunta ao Sr. Deputado Jorge Lacão. Nós já votamos por unanimidade a alínea á) do PS que prevê para os jornalistas a intervenção na orientação editorial. Isso é um mais do que a audição relativamente ao estatuto editorial. Seria bom clarificar a questão, porque me parece que a alínea a) já garante aos jornalistas uma intervenção. Colocarmos neste momento qualquer restrição no sentido de a circunscrever à mera audição pode criar problemas de interpretação extremamente gravosos para os direitos dos próprios jornalistas. Constitucionalmente já têm o direito de intervenção, se vamos circunscrever esse direito à mera audição é negativo. Gostava de ver este ponto clarificado por parte do PS.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - A intervenção que faço supunha que não suscitaria dúvidas, mas, se suscitar, vamos perfeitamente a tempo de a clarificar, e é a seguinte: orientação editorial supõe a existência de um dado estatuto editorial em aplicação, cujo cumprimento é conferido aos jornalistas através do direito de nele participarem. É isso a orientação editorial. Agora, estabelecer o próprio estatuto editorial pressupõe um direito originário dos jornalistas a serem ouvidos nesse momento, e este é o segundo direito que penso podemos acrescentar nas alíneas subsequentes. Um não elimina nem compromete o outro, acrescenta-lhe algo de novo - é a própria possibilidade de os jornalistas serem ouvidos no momento originário da definição do estatuto editorial.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sr. Deputado Jorge Lacão, não o acompanho na sua leitura uma vez que a orientação editorial começa com a aprovação do estatuto editorial.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Exactamente.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Não há orientação editorial sem aprovação de um estatuto. Portanto, o Sr. Deputado Jorge Lacão está a negar o que é essencial para a definição de uma orientação editorial, que é a existência de um estatuto editorial. A consagração da proposta do PSD permitiria que numa primeira fase aquando da publicação do estatuto editorial se consagrasse para os jornalistas apenas um direito de audição e que na aplicação desse estatuto editorial então eles pudessem intervir, fiscalizando se ele estava a se correcta ou incorrectamente aplicado. Creio que o que está na Constituição vai mais longe e peço a atenção do Sr. Deputado Jorge Lacão para o facto de ser impossível falar em orientação editorial sem ter em continuando é que ela começa a nascer. Sucede que ela nasce no preciso momento em que se aprova o estatuto editorial.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não...
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão penso que seria importante meditarmos nesta consideração do Sr. Deputado Jorge Lemos, porque é sem dúvida, apesar da sua arguta observação, provável que induza o intérprete em erro e diminua efectivamente sentido da intervenção que foi consignada no n.° 1
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Bem, Sr. Presidente, manifestamente não é esse o meu propósito...
O Sr. Presidente: - Eu sei.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É óbvio.
O Sr. Presidente: - Por isso mesmo é que estamos aqui a analisar qual o sentido que o intérprete destinatário retirará mais normalmente daquilo que vier a ser consagrado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - O que gostaria de ver clarificado, e por isso não quero contribuir para prejudicar aquilo que eu mesmo queria ver clarificado, era o direito dos jornalista a participarem no próprio momento de definição do estatuto editorial. Poderemos virtualmente encontrar uma fórmula melhor para alcançar esse desiderato que era, de resto, o desiderato originário do PSD?!
O Sr. Presidente: - É provável que a forma como está redigido o texto que foi agora objecto de aprovação resolva o problema em termos satisfatórios e não justifique esta perturbação, como o Sr. Deputado Jorge Lemos há pouco referiu, porque - bem vê - eu até me regozijaria pelo facto de um texto do PSD pode ser aproveitado, mas temo que neste contexto ele possa introduzir, por razões sistemáticas, alguma perturbação.
O Sr. António Vitorino (PS): - Recordo-me de na primeira leitura esta questão ter sido aflorada. Nesta altura, distinguiu-se entre definição de estatuto editorial e aplicação do estatuto - entendida a aplicação do estatuto como "orientação editorial" até se fez um esboço de tentativa de encontrar uma solução que exprimisse melhor essa interpretação e, de facto, a contraposição das duas propostas dá ideia de que são coisas distintas. Seja como for, se se entender que a orientação editorial co-envolve, por natureza, os dois momentos, isto é, o momento em que se define o estatuto e o momento em que, pós-definição, ele é aplicado, através da orientação editorial, as duas realidades estão contempladas, obviamente. Seja como for como há duas propostas, em virtude da proposta apresentada pelo PSD, é conveniente clarificar qual é o entendimento.
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O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, se quiséssemos transcrever para o normativo a interpretação autêntica que aqui estamos a procurar produzir à volta o n.° 2, alínea a), facilmente a poderíamos resolver e acrescentássemos um aditamento àquilo que já voámos, que seria: "bem como a intervenção dos primeiros na definição e na orientação editorial dos respectivos órgãos de informação". Então, não há dúvida e que aí ficaria clarificado, com uma interpretação autêntica, aquilo que agora estamos a dizer, que todos aderimos a esse sentido.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Muito bem. Nós estamos de acordo com essa sugestão.
O Sr. Presidente: - Há só um problema, que é este: estou de acordo que, quer no poder constituinte, quer o poder constituído, neste caso, deve haver uma participação dos jornalistas quando ela se justifique, isto é, quando haja jornalistas - porque bem pode acontecer que no momento em que o jornal se crie não existam. Há aqui uma questão que tem de ser interpretada m termos hábeis; aliás, estamos a retomar uma discussão que já tivemos. Quero dizer o seguinte: não resulte daqui uma coisa que é um pouco absurda, que (ter de haver necessariamente jornalistas a definirem no plural) para a criação de um jornal.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Esse problema também e punha na vossa formulação de há pouco.
O Sr. Presidente: - Pois punha! Pois põe! A ideia que eu tenho é que, havendo jornalistas, havendo modificações do estatuto do jornal, com certeza que eles devem ser ouvidos; quer no exercício dos poderes constituídos, quer quando haja uma revisão constituinte - digamos assim, para usar um símile. Mas o que não me parece já necessário é que, ab initio, na fase inicial, se o problema se não puser, porque não há jornalistas, tenhamos de andar à procura.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Pode imaginar-se a situação de o estatuto editorial preceder, cronologicamente, o recrutamento de jornalistas para um dado jornal ou um dado órgão de comunicação social. Mas o que não podemos conceber é a existência, em concreto, da informação através de um órgão de comunicação social sem a dita existência dos jornalistas. Era, esse é sempre o momento em que eles poderão ser chamados a intervir na definição, se não for pela constituição ab initio do estatuto, pelo menos pela sua rectificação. Portanto, se incluíssemos a expressão "definição" não ficaria prejudicada essa solução.
O Sr. Presidente: - A ideia que tenho é a de que isso já abrange, claramente, os dois momentos. Não tem sentido, repare, vir definir uma orientação de uma determinada maneira que obste a que, no fundo, se exerça o direito de intervir na orientação - não tem sentido!
O Sr. Jorge Lacão (PS): - A minha proposta era para dar sentido na norma àquilo que é a nossa interpretação, pelos vistos consensual.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - A consideração do direito de orientação editorial é, em si, "pano de fundo" da estrutura que o estatuto editorial há-de ter. Isto é, seja o estatuto editorial anterior ou posterior ao ingresso de jornalistas no órgão de comunicação, ele haverá sempre de consagrar a possibilidade de realização do direito de orientação editorial. Portanto, temos aqui uma fórmula genérica que abrange claramente a definição do estatuto.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sra. Deputada, eu não vou avançar com a proposta, porque não quero que ela, por votos negativos, seja susceptível de ter uma interpretação a contrario daquela que lhe está a dar agora; ficará para a história que a interpretação autêntica que lhe dá é aquela que todos queremos que se alcance.
Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Secretário José Magalhães.
O Sr. Presidente (José Magalhães): - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lemos.
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Penso que as intervenções aqui produzidas, todas elas, se encaminharam no seguinte sentido: o de entender, como há pouco frisava o Sr. Deputado António Vitorino e nós já tínhamos também frisado, que não se pode separar o momento da aplicação do estatuto editorial e o momento da orientação, da definição prévia dessa orientação. Os jornalistas devem ter direito de intervenção em qualquer dos momentos.
Creio não haver nem se poder tirar outra interpretação do debate que fizemos. Não houve nenhuma intervenção que contrariasse esta interpretação, que, aliás, é a que hoje vigora em termos da aplicação da Constituição - não há outra possível.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, foram abordados aspectos relacionados com a possibilidade de introduzir ainda um aperfeiçoamento adicional à alínea u) do n.º 2 proposto pelo PS; está, pois, esgotado, se bem entendo, o elenco das votações sobre a matéria, uma vez que a alínea d) é pura reprodução do actual n.° 4 do texto constitucional no seu artigo 38.°
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Sr. Presidente, peço para não esquecer que haverá que fazer obras do ponto de vista sistemático. Por exemplo, a alínea d) passará a alínea c).
O Sr. Presidente: - Exacto, Sr. Deputado.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Penso que valia a pena votar a proposta que o PCP retoma, referente ao n.° 3, porque, no fundo, ela é uma decorrência do facto de, neste momento, os n.ºs 2, 3 e 4 estarem consumidos por esta estrutura de alíneas.
O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, não havendo objecção das diversas bancadas, votaríamos então o texto da proposta originária do PS atinente ao reforço dos poderes dos conselhos de redacção, atribuindo-lhes competência para se pronunciarem, a título vinculativo, sobre a designação dos directores dos órgãos de comu-
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nicação social e fiscalizarem o cumprimento dos estatutos editoriais. Esta proposta do PS é retomada pelo PCP, ao abrigo do disposto no artigo 133.° do Regimento da Assembleia, aplicável por força do regimento da Comissão.
Srs. Deputados, vamos então proceder à votação da proposta originária do PS relativa ao n.° 3 do artigo 38.°, retomada, nos termos referidos, pelo PCP.
Submetida à votação, não obteve a maioria de dois terços necessária, tendo-se registado os votos contra do PSB e os votos a favor do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
Artigo 38.º
1 - ............................................................................
2 - ............................................................................
3 - A liberdade de imprensa implica o direito dos jornalistas, nos termos da lei, ao acesso às fontes de informação e à protecção da independência e do sigilo profissionais, bem como o direito de elegerem conselhos de redacção com competência para se pronunciarem a título vinculativo sobre a designação dos directores dos órgãos de comunicação social e fiscalizarem o cumprimento dos estatutos editoriais.
Srs. Deputados, seria suposto que entrássemos a seguir na apreciação do n,° 3 da proposta reformulada do PS, que corresponde ao n.° 5 da sua proposta originária, bem como dos textos correspondentes.
O Sr. António Vitorino (PS): - O CDS tem uma proposta para o n.° 3, que ainda está abrangida por esta situação, não é?
O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado António Vitorino. Embora a proposta do CDS seja a mera reformulação do n.° 4 da Constituição no seu texto vigente, talvez se possa - se houver consenso nisso - considerar que não faz sentido a votação, à semelhança do critério que utilizámos em relação a lugares similares. Isso levar-nos-ia, pois, à apreciação da proposta que, há pouco, enunciei.
Tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Roseta.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Julgo que podia passar-se à votação, uma vez que não me parece que haja lugar para um novo debate.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas há que apresentado, pois não está ainda apresentado.
O Sr. Presidente: - O texto não foi apresentado, Sr. Deputado Pedro Roseta, e o PS fez pequenas alterações.
Assim, daria a palavra para esse efeito ao Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - De facto, há pouco eu referi que deixaria para momento oportuno, e é este, a apresentação do novo n.° 5 na proposta do PS - é aquele que está no projecto. Como o Srs. Deputados repararão, é uma formulação abrangente dos actuais n.ºs 5 e 6, com algumas particularidades de redacção, a mais importante das quais é a referência ao princípio da especialidade na constituição das empresas titulares dos órgãos de comunicação social. Quero chame a atenção dos Srs. Deputados para a circunstância t na formulação actual do n.° 5 se falar na possibilidade de as publicações serem constituídas por pessoas singulares, pessoas colectivas sem fins lucrativos ou empresas jornalísticas. Era uma tentativa de dizer, por extensão, que determinado tipo de empresas não tinha direito à constituição de órgãos de informação; porque ou eram pessoas colectivas sem fins lucrativos ou tinham de ser empresas jornalísticas. Portanto, por exclusão, empresas com objectos sociais diversos deste não teriam direito, nos termos da Constituição, à constituição de órgãos de informação. Esta era, já por s a enunciação do princípio da especialidade.
Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Presidente Rui Machete.
Retomando a minha intervenção, sublinho que passámos desta formulação actual, que pretendia resolve o mesmo problema, porventura, em nosso entender, e uma maneira pouco feliz, é preferível referir a própria explicitação do princípio da especialidade, que é aquilo que já se visava alcançar. Todavia, queremos agora propor - faço-o oralmente - uma alteração à nossa proposta, tal como ela está no n.° 5. Essa alteração (peço aos Srs. Deputados o favor de a reterem) é a seguinte: onde se lê "nomeadamente impondo o princípio da especialidade das empresas titulares de órgão de comunicação social" se passasse a ler, tal como esta "impondo o princípio da especialidade das empresas titulares de órgãos de informação geral"; suprimindo-se portanto, a referência a "órgãos de comunicação social", substituída pela referência nova a "órgãos de informação geral".
Procurarei explicar a razão de ser desta alteração porque, se a não fizéssemos, ficaria submetida ao princípio de especialidade toda e qualquer empresa que tivesse um órgão de comunicação social, independentemente da natureza do órgão. Ora bem: há órgãos e natureza especializada, como há órgãos de natureza doutrinária, que, pelas razões que há pouco vimos, pela sua lógica e pela natureza das coisas, não têm minimamente de se subordinar ao princípio da especialidade; justamente porque esses órgãos servem para prosseguir as finalidades próprias dessas entidades, a natureza confessional umas, ou especializadas outras em função do objecto que prosseguem. Trata-se daqueles casos em que não se justifica a exigência do princípio da especialidade. Quando, agora, nos queremos circunscrever à exigência do princípio da especialidade e constituição de órgãos de informação geral, é apenas àqueles que, tendo esta natureza de informação múltipla, devem estar submetidos às regras genéricas de controlo que, subsequentemente, seguem na nossa proposta. É isto, portanto, o que visamos alcançar.
O Sr. Presidente (Rui Machete): - Tem a palavra a Sra. Deputada Maria da Assunção Esteves.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Já discutimos muito sobre a questão do princípio da especialidade na primeira fase dos trabalhos, mas quer aqui fazer apenas algumas observações. A primeira que eu entendo que a fórmula proposta pelo PS, no
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n.° 5, é mais inibitória, mais restritiva da liberdade de informação do que aquela que se consagra no n.° 5 da actual redacção. Em primeiro lugar, porque não se confina, tal como o n.° 5 da actual redacção, às publicações periódicas; em segundo, porque a própria formulação genérica...
O Sr. José Magalhães (PCP): - O n.° 5?
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - O n.° 51 é, mas o n.° 5 da proposta do PS não é!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Há lapso, Sra. Deputada!
O Sr. Jorge Lemos (PCP): - Sra. Deputada, leia o n.° 5 da Constituição: é periódica e não periódica.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Nesse caso, retiro esse argumento. Mas, ainda assim, a própria formulação genérica do n.° 5 é, obviamente, mais inibitória, em termos de publicações, do que aquela que se consagra na actual redacção. Não vou repetir os argumentos que aqui foram aduzidos na altura; aliás, foram aqui dados exemplos concretos de - face a esta nova formulação - impossibilidade de publicações que com a actual redacção seriam possíveis. É apenas esta a objecção que o PSD faz, perguntando ao PS se, de facto, pretende esta fórmula tão abrangente e, por essa razão, tão inibitória, como a que decorre do n.° 5 da vossa formulação.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Gostaria que o Sr. Deputado Jorge Lacão clarificasse dois aspectos: por um lado, o PS suprime (como eu já tive ocasião de sublinhar) o segmento inicial do n.° 5, funde a parte final do n.° 5 com o n.° 6, adita ao n.° 6 a ideia do princípio da especialidade. Agora reformula o texto, restringindo a incidência desse princípio da especialidade a certo tipo de empresas, definidas pelo tipo de órgão de comunicação social que elas promovem.
Não ficou, para mim, totalmente claro qual é a vantagem em se fazer esta operação a que aludi. É evidente que as empresas que editem apenas publicações especializadas são empresas, por definição, obedientes ao princípio da especialidade - por definição e sem mais! O que quer que seja que o Sr. Deputado diga, em matéria de qualificação dessas empresas, é evidente que são empresas titulares de um órgão de comunicação social; e são empresas titulares de um órgão de comunicação social especializado!
Estamos a jogar aqui com conceitos que têm níveis e naturezas operatórias bastante diferentes: um, é o conceito constante da lei de imprensa - pacífico, não estou a suscitar nenhuma dificuldade em relação a isso; do outro lado, está o conceito novo, inteiramente novo, que o PS pretende introduzir em sede de direito societário, mantendo a ideia de que o direito societário da comunicação social deve ser especial, deve ter características próprias - o que é correcto.
Em todo o caso, seria (suponho eu) desnecessário fazer essa última especificação que o Sr. Deputado se dispõe a fazer. Era bom clarificar isto.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Gostaria de começar por responder à intervenção da Sra. Deputada Assunção Esteves, quanto à acusação que nos fazia de que esta formulação era mais inibitória. Gostaria de colocar uma hipótese em concreto, à face da versão actual da Constituição: imagine uma empresa farmacêutica, por hipótese, que deseje publicar com regularidade - portanto, com a natureza de publicação periódica - uma determinada revista especializada sobre a matéria conexada com a sua actividade industrial. Se reparar na formulação que tem agora, as publicações periódicas, só podendo ser propriedade de pessoas singulares (o que não era o caso, estamos no domínio de uma empresa), de uma pessoa colectiva sem fins lucrativos (não era o caso, era uma pessoa colectiva com fins lucrativos), ou de empresa jornalística ou editorial, para cumprirmos a actual disposição da Constituição, essa empresa farmacêutica teria de constituir uma empresa com fins editoriais para poder lançar a sua revista de especialidade.
Na prática não é assim que as coisas acontecem. Isso significa que não há uma adequação entre a realidade editorial das publicações especializadas e este normativo constitucional. O que quer dizer que ele não está a ser cumprido; o que também quer dizer que ele é que é inibitório, Sra. Deputada. Não é a nossa solução que é inibitória. Esta formulação é que é inibitória. E é tão inibitória que nem se adequa à realidade da vida tal como ela nos surge.
O Sr. Presidente: - Tem que haver uma interpretação correctiva.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Ora, foi para resolver problemas como este, e porventura outros, que nós procurámos uma solução melhor para o princípio da especialidade. É claro que, na formulação originária (como tive ocasião de sublinhar), também não estávamos a resolver bem o problema. Foi por isso que, agora, propusemos esta nova alteração, porque não queremos exigir o princípio da especialidade a tudo o que for empresa a editar qualquer tipo de órgão de comunicação social. Pelo contrário, vimos agora dizer que só queremos subordinar ao princípio da especialidade aquelas empresas que editem órgãos de informação geral; aquelas que editem outro tipo de órgãos, os doutrinários, os confessionais ou os especializados, não têm que, necessariamente, subordinar-se ao princípio da especialidade, e, portanto, podem ter o seu objecto natural, próprio, e, sem prejuízo, editar as respectivas publicações. Diz-nos o Sr. Deputado José Magalhães (e é o outro lado da dúvida): "mas haverá empresas que, pela natureza dos fins que prosseguem, se constituem, elas próprias, em harmonia com o princípio da especialidade". É verdade, mas o que está aqui em causa é um dever do princípio da especialidade. Não quer dizer que, para além desta imposição de dever, outras não haja que exerçam essa faculdade. Uma empresa editorial que edite publicações não periódicas, uma editorial da nossa praça, pode, provavelmente, pela lógica do seu funcionamento, estar submetida ao princípio da especialidade, mas é pela natureza das coisas e não por uma imposição constitucional - aí não tem que ter
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uma imposição constitucional. É isto que nós queremos dilucidar bem neste nosso exemplo, e chamar mais uma vez a atenção da Sra. Deputada para a nossa solução que quer resolver problemas, mal resolvidos na formulação actual; se a deixarmos assim, continuaremos com uma contradição entre o dispositivo constitucional e a própria realidade das coisas e, por isso, fomos à procura de uma solução que resolvesse alguns meandros um pouco complexos como estes que acabei de descrever.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras iniciais da oradora)... também é um conceito que precisa de ser dilucidado caso a caso...
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Está dilucidado há mais de dez anos. Na Lei de Imprensa portuguesa ninguém o põe em causa. Se quiser eu leio-lho.
A Sra. Maria da Assunção Esteves (PSD): - Não é a definição legislativa nesse nível que vai dilucidar um conceito constitucional. É preciso esclarecê-lo na própria Constituição.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - É um conceito cuja dogmática jurídica está adquirida e assimilada; só não está constitucionalizada. Mas ninguém a põe em causa.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, Sra. Deputada Assunção Esteves, suponho que as matérias estão dilucidadas. Há, em todo o caso, uma questão que me permitia colocar: é evidente que o texto da Constituição tem de ter uma interpretação hábil, dada a própria circunstância de se aplicar a publicações não periódicas - publicação não periódica pode ser um opúsculo, puro e simples. Assim sendo, o preceito constitucional tem de ser objecto de uma interpretação correctiva, pois seria ridículo dizer que era necessário fundar uma empresa jornalística para publicar um opúsculo.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - E no caso das periódicas? Aí é que se põe o problema.
O Sr. Presidente: - No caso das periódicas é a mesma coisa. O texto aplica-se às periódicas e às não periódicas o que é ridículo para um caso pode também ser ridículo para outro (depende da situação). E o Sr. Deputado disse, e bem, que isso não era correcto. Porque, no fundo, subjaz a este n.° 5 justamente essa ideia das publicações de carácter geral, daquilo que refere, é aquilo que está subjacente. Eu preferiria ou não alterar o texto ou, eventualmente, a ter que fazer alguma alteração, introduzir-lhe uma pequena modificação do tipo dessa. Mas a verdade é esta: é que o texto, sem grandes dificuldades, tem funcionado, tem garantido que as coisas funcionem correctamente, e toda a gente fez essa interpretação correctiva que é imposta quase pela natureza das coisas. Se V. Exa. tivesse uma alternativa que não fosse isenta de dúvida... Reconheço que é muito difícil e aprecio o esforço feito - isto não envolve menor apreço pelo esforço feito, que me parece digno de toda a atenção. Mas a verdade é que o texto acaba por não ser tão claro, tão meridianamente claro, como seria desejável, embora possa ser
muito difícil uma nova versão, e tão difícil que, apesar dos progressos realizados, aos nossos olhos, ele ainda não apresente essas características.
Gostaria, pois, que V. Exa. ponderasse esta hipótese! de, no fundo, não termos, neste momento, na prática - nunca ninguém o pôs e suponho que não seria crível que o viessem a pôr - o problema de, ao publicar um opúsculo, ou como o exemplo que deu há pouco da tal empresa farmacêutica, ser inconstitucional haver um jornal dos trabalhadores de uma empresa farmacêutica (quanto digo trabalhadores estou a pensar na comissão de trabalhadores, que acaba por ser um órgão integrado dentro do ordenamento jurídico da empresa). Suponho que, rigorosamente, essa necessidade, não se tem registado. Se V. Exa. me disser que, por isso, existe aqui algum perigo sério para a liberdade de imprensa, admitirei que nós tínhamos que fazer um esforço suplementar; mas, se não é caso disso, diria que é uma interpretação correctiva, reconheço que é uma deficiência da redacção constitucional. Mas os textos constitucionais, como V. Exa. sabe, muitas vezes têm de ser objecto de um burilamento hermenêutico que ajude ã que as coisas funcionem miando não estão em causa questões essenciais, e aqui, que eu saiba, não têm estado. V. Exa. coloca mais um exemplo de escola (embora com todas as vitalidades de um exemplo de escola) do que um problema que tenha, efectivamente, afligido na prática. Repito: se pudéssemos ter uma formulação alternativa muito clara e isenta de dúvidas... mas ela, infelizmente, porque a matéria é complicada, também não o é (isenta de dúvidas). Desculpe-me a franqueza da observação, que é apenas motivada por tentar encontrar uma solução correcta, e reconhecendo o esforço feito.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, acompanho também o sentido de algumas das suas preocupações, mas queria também dizer-lhe o seguinte: todos nós, de uma maneira geral, temos militado a favor de que as normas constitucionais tenham essa dignidade justamente por terem força normativa, e não serem meramente semânticas, não estarem aqui por forma meramente emblemática. Suponho que este esforço, porventura não totalmente coroado de êxito, decorre da necessidade, confrontada com a realidade das coisas, de termos algumas normas nesta matéria que têm sido meramente semânticas. E se, perante essa constatação, nós nos acomodamos a deixá-las como estão, estamos implicitamente a reconhecer nelas não que carecem de uma correcção por via de legislação ordinária, mas que não têm a virtualidade de produzir alguma influência normativa na realidade da vida, e é este o caso. Gostaria de sublinhar, com mais algum exemplo, aquilo que me preocupa. Na versão actual do n.° 5 do artigo 38.°, depois de se delimitar, por esta forma, quais são as entidades que têm direito à constituição de publicações periódicas, assegura-se-lhes o dever de ser conhecida a forma de propriedade e dos meios de financiamento da imprensa periódica - mas não se distingue a natureza! Esta norma está aqui, supostamente, para ser cumprida. Mas, se ela fosse cumprida, implicava um dever de toda a imprensa periódica, mesmo que não tenha natureza de informação geral, a assegurar e a divulgar a estrutura da propriedade e os meios de financiamento a que tem de recorrer - não é assim à luz
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de toda a realidade! E não tem que ser para muitos aspectos da imprensa periódica! Então, se não é assim na realidade e não tem que ser justamente em função da natureza de muita dessa imprensa, por que é que haveremos de continuar a fazer uma declaração que não é que sofra de correcção mas que não tem qualquer adequação ou valor normativo?
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível registar as palavras do orador.)
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Mas nós continuamos a querer que seja exigência constitucional a divulgação da propriedade, dos meios de financiamento e de outras regras de transparência. Só não queremos é que esta declaração normativa tenha um valor meramente semântico e, para isso, queremos circunscrevê-la àquela parte da imprensa em que realmente esta exigência faz fundamento. E qual é? É justamente a que se reporta à informação de natureza geral. Isto - desculpar-me-á o Sr. Deputado Rui Machete - não é tão duvidoso como há pouco me pareceu fazer crer.
O Sr. Presidente: - É um pouco. Já lhe explico porquê, Sr. Deputado.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - E, portanto, estaremos, ou não, na disponibilidade de procurar uma solução normativa que se adeque melhor a uma preocupação como esta ou, deixando ficar tudo como está, estamos apenas a fazer subsistir normas sem efectividade na ordem jurídica.
O Sr. Presidente: - Ha uma certa indigestão constitucional nas normas. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, é evidente que nesta matéria, a prudência aconselha que - excluída a hipótese de ampliar - se altere o menos possível, para não perturbar alguma hermenêutica sedimentada, embora saibamos que, em alguns aspectos, a Constituição, e, mais ainda, a Lei de Imprensa, foram excessivamente semantizadas por vários governos de várias extracções e em várias circunstâncias, isolada e conjuntamente.
Em todo o caso, nesta matéria, por exemplo, se não se fundisse o n.° 5 e o n.° 6, estaria meio caminho andado. Segundo aspecto: se se aditasse uma cláusula muito mais económica do que aquela que o PS aqui adiantou que traduzisse aquilo que a Lei de Imprensa hoje exprime no seu artigo 7.° (a ideia de que há uma limitação do objecto das empresas que se dedicam à comunicação social), provavelmente o problema ficaria resolvido a contento geral.
Serei mais preciso: se se dissesse qualquer coisa como "as publicações periódicas e não periódicas podem ser propriedade de pessoas singulares, de pessoas colectivas sem fins lucrativos ou de empresas jornalísticas e editoriais sob forma societária, com esse exclusivo objecto, devendo a lei assegurar, com carácter genérico, a divulgação da propriedade e dos meios de financiamento da imprensa periódica", aditar-se-ia unicamente o inciso "com esse exclusivo objecto" que é o princípio da especialidade. Se o Sr. Deputado Jorge Lacão reparar o que o artigo 7.° hoje diz, no seu n.° 6, não é coisa distinta disso.
O Sr. Presidente: - É claro que, a contrario, poderia concluir-se que não poderia haver propriedade de jornais, mesmo simples folhas, de outras sociedades (as farmacêuticas é outras).
Já agora, gostaria de explicar o seguinte: quando o PSD propôs a eliminação das disposições constitucionais não o fez, ao contrário de certas interpretações malévolas, por quaisquer razões liberticidas, muito pelo contrário.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Nem do financiamento transparente?!
O Sr. Presidente: - Nem do financiamento. Foi por uma ideia diferente. Aliás, continuo a insistir (W. Exas., muitas vezes, não são sensíveis a isso em que legisladores constitucionais bastante mais parcimoniosos (como foi o legislador americano e até, curiosamente, o próprio legislador alemão da Grundgesetz) não caíram nesta situação de tanto querer regular, tanto querer regulamentar, que, se fossem levados à letra, arranjávamos um molho de bróculos a propósito desta matéria.
O Sr. António Vitorino (PS): - Já para não falar na Constituição britânica...
O Sr. Presidente: - Na Constituição britânica não falo por outros motivos. Falei, a propósito do poder constituinte, da Constituição em sentido material, da estrutura da Constituição e dos problemas da caducidade - mas isso é uma matéria a que volveremos mais tarde.
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Presidente, se não se importasse, gostaria de fazer a seguinte observação: é que este número aqui, se a Constituição fosse escrita hoje de novo, talvez não devesse cá estar nos termos em que está escrito. É bom não esquecer qual foi o caldo de cultura que esteve na base da integração deste número na Constituição. Por outro lado, a manutenção de alguns destes critérios é imprescindível, na óptica do PS, para demonstrar que a acusação que o PCP nos dirige de que "a transformação do estatuto constitucional da comunicação social visa apenas ceder à gula dos grupos económicos" (sic) é uma acusação infundada e sem razão de ser.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, eu percebo que o PS tenha necessidade disso. Nós não temos essa necessidade porque já estamos relativamente incólumes àquilo que diz o PCP...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Pudera! Com esse acordo, não têm necessidade nenhuma! É só fruí-lo!
O Sr. António Vitorino (PS): - Penso que, apesar de tudo, a fonte não é o acordo, é a relação com os grupos económicos.
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2194 II SÉRIE - NÚMERO 72-RC
O Sr. Presidente: -... pelo menos antes de o PCP sofrer o impacte da Perestroika. Mas o problema não é esse; o problema que estamos a discutir, em concreto, é encontrar aqui...
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas qual Perestroika! Isto é antiperestroika!
O Sr. Presidente: - O PCP é antiperestroika? Risos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Isto é que é antiperestroika! Se quer expressão mais completa de uma oposição total a qualquer ideia de pluralismo, de garantia do reforço das bases fundamentais e institucionais da transparência e da liberdade de informação, aí está o acordo, na parte referente à comunicação social!
Risos do PS.
O Sr. Presidente: - A única questão importante, no fundo, é esta: para além da proposta de eliminação que o PSD formulou (cujas razões já foram aqui explicitadas) e que, presumivelmente, não vai obter os dois terços, temos duas alternativas. Temos uma proposta complicada do PS, cheia de boa vontade mas que, a meu ver, não resolve o problema, e temos a manutenção do texto. E há ainda a hipótese de introduzir uma pequena alteração. Devo dizer, com toda a sinceridade, que não vejo grandes dificuldades em manter, neste momento, o texto, porque não é uma questão de semantização do texto que se suscita (nisso não estou de acordo com o Sr. Deputado Jorge Lacão). Não estamos a semantizar o texto; estamos apenas a fazer uma interpretação correctiva do texto, no sentido daquilo que o legislador realmente quis e procurou acautelar, que foi uma imprensa profissional e com relevância social suficiente para ter importância quanto ao problema da liberdade de imprensa, neste capítulo que estamos a considerar. Não digo que formular isto num texto constitucional seja impossível, mas a verdade é que, ao fim de largos meses, não chegámos lá. Perante esta situação, julgo que é capaz de ser preferível, pura e simplesmente, dizer quê temos um texto que não é uma perfeição, mas que já existe e ao qual já estamos acomodados. Já se fez a interpretação correctiva necessária e nunca (que eu saiba) se suscitou o problema da inconstitucionalidade de uma publicação qualquer apresentada por uma sociedade comercial que tivesse por objectivo a produção de tecidos ou de medicamentos ou seja lá o que for. Vamos aceitar isso. Daí não vem mal ao mundo e não vejo que minore as garantias. Preferiria, pura e simplesmente, não o pôr cá, mas VV. Exas. acham que isso é fundamental porque, suponho, valoram mais os preceitos constitucionais do que a interiorização dos valores nos comportamentos reais da vida. É, portanto, uma questão sobre a qual não vamos discutir. E, porque não vejo grande hipótese de chagar a resultados, vamos votar esta situação.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não quero nem maçá-lo a si, nem aos Srs. Deputados, com o arrastar da questão, mas gostaria de esclarecer o seguinte: qual é o núcleo de separação entre a proposta apresentada pelo PS agora e a versão actual? O núcleo de separação é onde agora se diz que "as publicações periódicas e não periódicas podem ser propriedade de pessoas singulares, de pessoas colectivas sem fins lucrativos ou de empresas jornalísticas" e, portanto, a contrario resulta que não podem ser propriedade de outras pessoas colectivas com fins lucrativos. Nós, ao reduzirmos isto ao princípio da especialidade unicamente vinculado para os titulares de órgãos de informação geral, resolvemos a contrario todos os problemas que agora não estão resolvidos. É muito mais simples, é muito mais adequado à realidade e as demais exigências subsequentes têm perfeito sentido para os órgãos de informação geral, não têm para os outros. O Sr. Presidente dir-me-á: "mas até hoje não veio daí muito mal ao mundo, nem aconteceu nenhum estrangulamento". Pois não, mas também não aconteceu a adequação que é desejável fazer-se entre os normativos constitucionais, o ordenamento jurídico ordinário e a realidade das coisas.
O Sr. Presidente: - A hermenêutica é muito útil nessas coisas.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Não logro convencê-lo.
Em matéria de comunicação social o PSD já fica onerado com esta coisa de diminuir o estatuto dos jornalistas, na parte que diz respeito aos órgãos titulados pelo Estado e corre o risco de ficar também aqui onerado com outro anacronismo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Creio que tudo recomenda que aproveitemos a noite para reflectir sobre a problemática das empresas que se dedicam a estas actividades e designadamente à reflexão sobre as considerações do Sr. Deputado Jorge Lacão.
A última formulação do PS tem implicações diferentes da primeira. E as observações do PSD, sobre esse aspecto, ou traduzem indisponibilidade para reflectir ou prolongar a reflexão ou traduzem apenas o adiantado da hora. Suponho que é o último caso. Portanto sugeria que continuássemos esta discussão amanhã de manhã.
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Eu gostaria que votássemos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É evidente que isto até se pode votar tudo sem discutir, é uma óptica de carimbo!
O Sr. Pedro Roseta (PSD): - Já foi discutido amplissimamente!
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O Sr. José Magalhães (PCP): - Como a discussão provou esta matéria pode ser encarada sob duas ópticas, tirar tudo ou não tirar nada. Qualquer delas simplifica as coisas. Nós, por exemplo, não propusemos nenhuma alteração à Constituição neste ponto. Isto quer dizer que, à partida, não víamos necessidade de alterar a Constituição. Não somos, no entanto, insensíveis ao esforço argumentativo produzido. Evidentemente que poderíamos dizer: "não percebemos, logo votamos contra". Mas essa parece-nos a posição mais distante do que deve ser um debate. Não queríamos fazer isso queríamos fazer uma reflexão adequada, para votar em consciência e face a um quadro de opções muito claro.
O Sr. Presidente: - Nós percebemos e louvamos o esforço do Sr. Deputado Jorge Lacão, mas o que digo e repito é que não vemos uma grande necessidade dessa alteração, que me parece um aperfeiçoamento louvável, mas que os interesses em causa não têm justificado.
Em segundo lugar, existe, como V. Exa. referiu, uma interpretação que tem sido clara e pacífica, tanto que, como mencionou, não sentiram nenhuma necessidade de introduzir essa alteração e sobretudo os esforços louváveis que o Sr. Deputado Jorge Lacão e o PS fizeram não nos lograram convencer de uma formulação suficientemente feliz, com o risco de pôr em causa uma interpretação pacífica. Isto não é, salvo o devido respeito, não atender aos argumentos, fecharmos à discussão, não compreender; é tomar uma opção, depois da discussão feita. É claro e V. Exa. diz-me: "Vamos tentar um derradeiro esforço."
O Sr. José Magalhães (PCP): - Nem sequer é derradeiro: podemos fazê-lo até à hora de votação em Plenário.
O Sr. Presidente: - Se é assim como é, tenho a sensação de que não vale muito a pena, neste momento, estarmos a prolongar a discussão, porque percebo as preocupações e as razões aduzidas mas, na verdade, a redacção avançada - e suponho que o Sr. Deputado Jorge Lacão, no fundo, tem consciência disso - também não é uma formulação plenamente satisfatória porque, apesar do que diz, essa ideia de informação de carácter geral falha numa coisa essencial, que é a ideia da relevância por causa do carácter profissional e da relevância do órgão, porque não é toda a informação de carácter geral pura e simplesmente. É um conceito recebido do direito ordinário, mas que ao nível constitucional poderá não ser isento de dúvidas.
Portanto, se V. Exa. insistir na ideia de fazer a votação amanhã adio-a. Se V. Exa. não insistir nessa ideia, fazemo-la hoje.
O Sr. Jorge Lacão (PS): - Se houver mais algum grupo parlamentar que considere oportuno ponderar ainda isto, naturalmente, acho que vale a pena adiar.
O Sr. Presidente: - Isto não é definitivo, como V. Exa. sabe.
De qualquer modo, não vamos conseguir votar o artigo 38.° hoje. Vamos votar amanhã às dez horas.
Sr. Deputado Jorge Lacão pedia-lhe que hoje reflectisse no problema. Se quiser apresentar uma nova proposta, certamente o Sr. Deputado António Vitorino o ajudará. Nós vamos reflectir sobre aquilo que referiu. Portanto, o problema não se vai pôr em termos de uma decisão precipitada. Não é -compreenderá - uma questão de má vontade, mas saltar a votação numa coisa desta complexidade temo que depois não se entenda bem o procedimento a seguir e que nos percamçs. Realmente não gostava que isso acontecesse. É uma razão prática.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 20 horas e 15 minutos.
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional
Reunião do dia 5 de Janeiro de 1989
Relação das presenças dos Senhores Deputados
Rui Manuel P. Chancerelle de Machete (PSD).
Carlos Manuel de Sousa Encarnação (PSD).
José Augusto Ferreira de Campos (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Luís Filipe Pais de Sousa (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Guilherme Silva (PSD).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
Miguel Bento da Costa Macedo e Silva (PSD).
Pedro Manuel da Cruz Roseta (PSD).
Manuel António de Sá Fernandes (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
Alberto de Sousa Martins (PS).
António Manuel Ferreira Vitorino (PS).
Jorge Lacão Costa (PS).
José Manuel Santos Magalhães (PCP).
Jorge Manuel Abreu de Lemos (PCP).
José Luís Nogueira de Brito (CDS).
Raul Fernandes de Morais e Castro (ID).
Artigo 35.°
1 - Todos os cidadãos têm o direito a tomar conhecimento do que constar de registos informáticos ou ficheiros a seu respeito e do fim a que se destinam, podendo exigir a rectificação dos dados e a sua actualização, sem prejuízo do disposto na lei sobre segredo de Estado e segredo de justiça
2 - É proibido o acesso a registos informáticos ou ficheiros para conhecimento de dados pessoais relativos a terceiros, e respectiva interconexão, salvo em casos excepcionais previstos na lei e com ressalva do disposto no artigo 18.°
3 - ............................................................................
4 - [A nossa proposta.]
5 - ............................................................................
6 - A lei define o regime aplicável aos fluxos de dados transfronteiras, estabelecendo formas
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adequadas de protecção dos dados pessoais e outros em que o interesse nacional o justifique.
Os Deputados do PSD: Rui Machete - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta.
Proposta de substituição
Ao abrigo do disposto no artigo 133.° do Regimento da Assembleia da República, os deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, retomam as seguintes propostas do Partido Socialista relativas ao artigo 38.°:
Ponto 3;
Ponto 6.
Assembleia da República, 5 de Janeiro de 1989. - Os Deputados do PCP: Jorge Lemos - José Magalhães.
Artigo 38.° Proposta de substituição
2 - [A redacção da proposta de substituição do PS.]
a) [A redacção da proposta de substituição do PS.]
b) [A redacção da proposta de substituição do PS.]
c) O direito a elegerem conselhos de redacção; d) [A redacção da proposta de substituição do PS.]
Os Deputados do PSD: Rui Machete - Pedro Roseta - Maria da Assunção Esteves - Ferreira de Campos.