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Terça-feira, 23 de Maio de 1989 II Série - Número 109-RC
DIÁRIO da Assembleia da República
V LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1988-1989)
II REVISÃO CONSTITUCIONAL
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
ACTA N.° 107
Reunião do dia 28 de Março de 1989
SUMÁRIO
Iniciou-se a nova discussão e a votação do artigo 108. ° e respectivas propostas de alteração e de substituição.
Procedeu-se à discussão e votação da proposta de relatório da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional, apresentada pela mesa da Comissão.
Intervieram no debate, a diverso título, para além do presidente, Rui Machete, pela ordem indicada, os Srs. Deputados Mário Maciel (PSD), Guilherme da Silva (PSD), António Vitorino (PS), José Magalhães (PCP) e Jorge Pereira (PSD).
Submetida à votação, a proposta de relatório da CERC, apresentada pela mesa, foi aprovada, com os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID.
Em anexo à presente acta, são publicadas propostas de substituição dos artigos 108. °, 219. ° (PSD) e 90. °-A (deputados Guilherme da Silva, Mário Maciel e Jorge Pereira, do PSD).
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O Sr. Presidente (Rui Machete) - Srs. Deputados, temos quorum, pelo que declaro aberta a reunião.
Eram 18 horas e 55 minutos.
Temos hoje alguns artigos que não houve oportunidade de votar na última reunião. Temos também para aprovar o esquema metodológico do relatório, visto que não está ainda sancionado, embora já exista um esqueleto em relação ao qual a Comissão chegou a acordo, mas poderá haver ainda algumas sugestões. Portanto, aprovaríamos a metodologia e a distribuição de trabalhos, para a elaboração do texto final.
Como VV. Exas. sabem, tínhamos pendentes o artigo 108.°, relativo ao Orçamento, o artigo 219.°, relativo ao Tribunal de Contas, o artigo relativo ao problema da existência ou não se uma comissão permanente do Conselho Superior da Magistratura e ainda o artigo relativo à questão da adaptação do sistema fiscal nas regiões autónomas.
Em relação ao artigo 108.°, existe uma proposta de substituição, formulada pelo PSD, que teve em conta as trocas de impressões havidas entre especialistas nesta matéria e sobre as quais há, do nosso lado, um ponto que nos parece claro e uma questão que gostaríamos de esclarecer. A nossa ideia é a de que seria importante incluir nesta matéria do Orçamento a noção da aprovação dos programas orçamentais; parece-nos que, em termos de reforma da contabilidade pública, isso seria extremamente importante.
Por outro lado, parece-nos que nas propostas apresentadas, designadamente na proposta apresentada pelo PS, no que diz respeito aos relatórios que devem instruir a proposta de Orçamento, não se justifica um relatório sobre a situação do Serviço Nacional de Saúde, porque o serviço, qua tale não tem uma identidade orçamental - existem instituições, institutos ou serviços autónomos relacionados com o Serviço Nacional de Saúde, e esses estarão, naturalmente, cobertos; existem também as verbas próprias, quer do orçamento da Segurança Social, quer do Ministério da Saúde, relacionadas com estes problemas e que, naturalmente, também têm de estar no Orçamento.
Depois, também temos algumas dúvidas, embora o tenhamos mantido na nossa proposta de substituição, no que diz respeito às relações orçamentais com as regiões autónomas. A nossa ideia é de que pode ser razoável - depende da interpretação a dar - a incidência no Orçamento do Estado das transferências para as regiões autónomas, mas não vamos discutir no Orçamento do Estado os orçamentos das regiões autónomas. A ideia base, que se nos afigura não necessária, mas que, em todo o caso, podemos aceitar como possível, é a de dizer: se há transferências mencionadas no Orçamento para as regiões autónomas, tal como há transferências para a Segurança Social, naturalmente que elas terão de constar do Orçamento e pode haver um relatório específico sobre essa matéria. A discussão daquilo que é o orçamento, propriamente dito, das regiões autónomas cabe aos órgãos próprios, constitucionalmente previstos para tal, que são os órgãos das regiões autónomas. Este é um ponto importante.
Aliás, gostaria de fazer uma especial solicitação, em relação aos nossos colegas que são deputados eleitos pelos círculos da Madeira e dos Açores, sobre a redacção aqui proposta, porque, porventura, poderá ser mais explícito redigir algo do tipo: "transferências orçamentais para as regiões autónomas". Isto envolve uma ideia mais clara, do ponto de vista da reelaboração da nossa proposta; claro que não queremos discutir, a propósito do Orçamento do Estado, o orçamento das regiões autónomas, porque isso não tem sentido, mas valerá a pena, cautelarmente, explicitá-lo por forma inequívoca.
Estas são fundamentalmente as inovações da proposta que, com o propósito de encontrarmos uma fórmula compromissória, apresentámos. Gostaria de ouvir a sensibilidade dos nossos colegas da Madeira e dos Açores, mas preferiria substituir "sobre as relações orçamentais" por "transferências orçamentais", porque é indubitável que as transferências têm de constar do Orçamento - e constam. Devo dizer, com toda a franqueza, que a minha ideia é esta: acho que é razoável e perfeitamente aceitável que haja uma ideia clara acerca de quais são as consequências, do ponto de vista do Orçamento do Estado, daquilo que podem ser tranferências orçamentais para as regiões autónomas; não seria razoável discutir, a esse propósito e a propósito do relatório, o orçamento das regiões autónomas. É esta, em síntese, a nossa ideia.
Porventura, gostaria de saber se VV. Exas. não entenderiam preferível - e nós alteraríamos a nossa proposta nesse sentido -, em vez de "sobre as relações orçamentais com as regiões autónomas", pôr qualquer coisa do tipo "sobre as transferências orçamentais para as regiões autónomas". Isso é importante, na medida em que, para completar o pensamento, a proposta do PS era no sentido de haver um relatório sobre a situação financeira das regiões autónomas; a nós afigura-se-nos que isso é menos apropriado, em relação à discussão de uma proposta do Orçamento do Estado, que é um orçamento geral do Estado.
Tem a palavra o Sr. Deputado Mário Maciel.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Gostaria de indagar da necessidade de inscrever no futuro texto constitucional esta norma, quando é sabido que, até agora, o texto actual não continha nada sobre esta matéria. É certo que o Orçamento do Estado tem a sua transferência para as regiões autónomas, que agora é canalizada através do gabinete do Ministro da República, mas também em matéria de orçamento sempre se fez uma discussão aberta sobre o assunto, a opinião pública portuguesa sempre ficou informada sobre os montantes que eram transferidos para as regiões autónomas e as próprias regiões, através dos deputados eleitos pelos respectivos círculos, sempre fizeram ouvir também a sua opinião sobre essa matéria. Digamos que, em termos de canalização institucional de opinião, tudo funcionou até agora. Ó próprio governo regional acompanha o processo de elaboração do Orçamento do Estado.
Temo que - e acompanho a preocupação do Sr. Presidente - a ambiguidade das expressões, tanto da proposta do PS como da proposta do PSD, possa levar a que, em sede de discussão do Orçamento do Estado, essa discussão alastre para áreas que obviamente têm de ser discutidas no âmbito da assembleia regional, porque os Governos Regionais dos Açores e da Madeira apresentam os seus orçamentos nas Assembleias Regionais e é aí que prestam contas. Seria totalmente inadmissível que o debate da situação financeira em sede de Assembleia da República se pudesse con-
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verter num total desrespeito pelas competências, que são óbvias, das assembleias regionais. Se se trata de dar conhecimento à Assembleia do montante das transferências, das razões que estão na base desses montantes e dos critérios que foram tidos em conta para as fazer, penso que isso está garantido, mesmo sem necessidade destas normas extratexto actual da Constituição. Isto é uma opinião pessoal.
O Sr. Presidente: - Foi isso mesmo o que eu pedi, porque me parece que isto é uma matéria, por um lado, importante e, por outro lado, sensível. Suponho que ninguém discute a necessidade da transparência do Orçamento, mas é preciso que essa transparência não tenha efeitos de outro tipo, que não são os queridos por ninguém aqui, portanto, gostaríamos de evitar que acontecessem.
Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme da Silva.
O Sr. Guilherme da Silva (PSD): - Queria subscrever inteiramente as palavras do Sr. Deputado Mário Maciel e acrescentar o seguinte: na nota preambular e justificativa do Orçamento é usual haver uma referência específica às regiões autónomas. Penso que, sem necessidade desta disposição constitucional expressa, já no Orçamento do Estado, normalmente, por força do princípio que inspira uma proposta de lei como a do Orçamento, há notas explicativas dos vários capítulos orçamentais e, como não podia deixar de ser, vem também uma parte específica das regiões autónomas, onde se dá alguma conta e alguma explicação sobre as transferências e a política que o Governo, em matéria orçamental, vem sucessivamente adoptando nesse capítulo específico de inscrições orçamentais de verbas destinadas às regiões autónomas.
Parece-nos, portanto, que neste contexto, que é o actual, aquilo que se pretende ver assegurado por via de dispositivo constitucional já está efectivamente assegurado. O receio é aquele a que o Sr. Deputado Mário Maciel aludiu, o de, eventualmente, por uma inserção constitucional deste tipo, podermos obter um efeito perverso de trazer para o âmbito da Assembleia da República um debate que é, por competências hoje definidas, exclusivamente da competência da assembleia regional.
A proposta que o Sr. Presidente fez, no sentido de se substituir a redacção que está na alínea f) desta proposta n.° 196, respeitante ao artigo 108.°, por "transferências para as regiões autónomas" é um pouco clarificadora. Mas nós pensamos que teria sido mais útil aprovar - do ponto de vista do interesse das regiões e, concomitantemente, do interesse nacional - a nossa proposta de redacção do n.° 2 do artigo 231.°, que deixava claro que o Orçamento do Estado deveria conter as inscrições orçamentais necessárias a que esse mesmo Orçamento, numa perspectiva de solidariedade nacional, suportasse os custos financeiros derivados da situação insular das regiões autónomas.
Talvez que, se aprovássemos essa disposição, pudéssemos encontrar algum reflexo justificativo desta preocupação agora expressa nesta proposta relativa ao artigo 108.°, ou seja, se tivesse sido acolhida esta preocupação, poderíamos perceber que houvesse necessidade de, através de um relatório, se explicar as razões de concretização deste outro dispositivo por nós proposto e da inscrição de determinadas verbas na parte das regiões autónomas, com vista à satisfação deste preceito constitucional. Dado que esse preceito foi prejudicado, não se vê que haja razão especial para ter uma preocupação formal nesta sede relativamente às regiões autónomas, para além daquilo que já é prática usual dos orçamentos do Estado e da sua nota justificativa.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Nem a proposta do Partido Socialista nem a proposta que ora é apresentada pelo PSD poderiam directa ou indirectamente ter como consequência usurpar uma competência que é constitucionalmente conferida às regiões autónomas e aprovarem o orçamento regional. Não se trata aqui de fazer um debate sobre os orçamentos das regiões autónomas, mas sim de aditar um relatório sobre as relações orçamentais da República com as regiões autónomas somente na precisa medida em que se trata do Orçamento da República, o qual tem uma componente destinada às regiões autónomas. Não creio, aliás, que seja útil que façamos aqui um debate na lógica da desconfiança, no sentido de que o que se está aqui a pretender é aditar elementos por qualquer razão de suspeição em relação aos seus destinatários. Porque, sob esse ponto de vista, o que aqui se adita de novo no n.° 4 seria bastante mais suspeitoso para com o Governo da República do que propriamente para com as regiões autónomas, na medida em que toda uma série de relatórios que aqui vêm referidos são relatórios relativos ao Governo da República e apenas uma alínea contempla as transferências ou relações orçamentais com as regiões autónomas.
A nossa intenção, quando fizemos a proposta indiciaria. Se admitimos abertura para votar favoravelmente esta proposta do PSD, seja com esta formulação seja com outra formulação que se venha a adoptar, foi e é no sentido de que este conjunto de relatórios visa no essencial justificar decisões que a Assembleia da República teve de tomar no âmbito da sua esfera de competências próprias em sede orçamental. Essas decisões têm a ver com o Governo, como seja em matéria de apreciar a previsão das receitas e das despesas, como seja em avaliar a gestão da dívida pública, as operações de tesouraria praticadas e o montante máximo de operações de tesouraria a praticar no ano subsequente, ou as próprias contas do Tesouro, como seja sobre a situação financeira dos fundos e dos serviços autónomos, como seja sobre a relação financeira existente entre Portugal e o exterior, como seja sobre os benefícios fiscais e as suas consequências orçamentais e também, naturalmente, sobre as relações orçamentais com as regiões autónomas, na medida em que essas relações têm relevância para a decisão que cabe à Assembleia da República de votar verbas de transferências do Orçamento do Estado para as regiões autónomas.
Naturalmente que o que está aqui em causa não é decidir o que quer que seja em matéria de gestão interna do orçamento das regiões autónomas, porque isso sempre escaparia à competência legislativa da Assembleia da República. Também me parece que não faz sentido que, aditando-se seis alíneas em relação a elementos importantes da estrutura do Orçamento refe-
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rentes ao Governo, não se adite também uma referência às regiões autónomas. Tanto mais que, se houver desta revisão constitucional o desiderato de flexibilizar, de alguma maneira, a possibilidade de adaptação do sistema fiscal nacional às regiões autónomas, este tipo de relatório torna-se ainda mais importante. Sem ele é que se torna totalmente impossível aquilatar qualquer proposta de lei quadro de adaptação do sistema fiscal às regiões autónomas, na medida em que não estaremos de posse dos elementos que nos permitam, eventualmente, se essa proposta vier a fazer vencimento, decidir que a adaptação do imposto x às regiões autónomas tem uma variabilidade entre 2 % e 3 % ou tem uma variabilidade entre 4% e 5%. Parece-me que estes são elementos informativos imprescindíveis para a formação da vontade da Assembleia da República naquilo que é a sua esfera de competência própria, aliás indelegável, irrecusável e irrestringível, nos termos da Constituição.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme da Silva.
O Sr. Guilherme da Silva (PSD): - Sr. Deputado António Vitorino, falaria também no sentido da intervenção do Sr. Deputado Mário Maciel e gostaria de dizer que penso que nenhum de nós quis levantar qualquer questão de suspeição em relação às regiões autónomas. Se tivéssemos essa ideia seria mais adequado levantá-la relativamente à redacção que o projecto do Partido Socialista continha. Portanto, a nossa intervenção não tem nada a ver com suspeições. Tem a ver, sim, como referimos, com problemas de competência. É que o lugar próprio para o Governo responder em matéria orçamental é a Assembleia da República, mas em matéria de orçamentos das regiões autónomas, ou seja, as questões directamente ligadas com aspectos orçamentais das regiões autónomas, são exclusivamente da competência da assembleia regional. Portanto, isso não tinha nada a ver...
O Sr. António Vitorino (PS): - Sr. Deputado, permita-me que o interrompa. Falei de suspeição apenas para responder ao argumento de que se hoje não está na Constituição então para que é que se vai acrescentar? Chamei apenas a atenção de que se vai acrescentar porque se acrescenta a referência a outros relatórios em relação ao Governo da República. Não há nenhuma suspeição nem nenhuma preocupação específica em relação às regiões autónomas. É uma alínea referente às regiões autónomas num conjunto de outras alíneas referentes ao Governo da República, sem suspeição seja em relação a quem for.
O Sr. Guilherme da Silva (PSD): - De qualquer forma, penso que esta troca de impressões está a ser útil, porquanto estamos todos a esclarecer que o objectivo desta alínea é tornar mais clara a posição do Governo em matéria orçamental relativamente às regiões autónomas, designadamente levando-o a justificar o porquê de eventuais insuficiências orçamentais relativamente às regiões autónomas, ou levá-lo eventualmente a reforçar verbas para as regiões autónomas. Enfim, uma ponderação mais cuidada no que diz respeito às regiões autónomas em matéria orçamental.
Se o objectivo é este, e parece que está a ficar claro que é este, temos de louvar essa intenção, e nada teremos a opor a que assim seja. Portanto, considera-se, de certo modo, insuficiente aquilo que é prática hoje em notas justificativas da proposta de lei do Orçamento, e quer-se ir mais longe e exigir mesmo ao Governo um relatório detalhado sobre essa matéria. Dentro deste âmbito parece que é perfeitamente louvável e aceitável esta proposta.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, se me permite um comentário, gostaria de dizer o seguinte: não tem sido o melhor processo de discutir os problemas orçamentais, sobretudo problemas de transferências entre o Orçamento da República e as regiões autónomas, a forma como habitualmente as coisas se têm processado. Tenho alguma experiência nessa matéria e infelizmente sei que as coisas se têm processado com alguma precipitação na discussão do Orçamento, e embora as justificações existam, nem sempre elas têm sido dadas com a suficiência do tempo que a importância das matéria justifica.
De facto, não penso que esta disposição possa ser encarada, sobretudo na formulação que aqui é dada (mas naturalmente não teria sido outra a intenção de outras formulações apresentadas), como uma ideia de ser contra as regiões autónomas. O que eu disse é que tínhamos de esclarecer isto com clareza, para evitar que a disposição ficasse inquinada de uma suspeita que não deveria ter. É o que me parece importante ressalvar. Portanto, não haveria aqui o propósito, de uma forma enviesada, ou mesmo ínvia, de discutir alguma coisa que não é da competência da Assembleia da República. Agora é da sua competência discutir aquilo que são os dinheiros da República, e também os que são transferidos para as regiões autónomas, ou tem de se analisar o equilíbrio das transferências num âmbito que envolve os problemas do sistema fiscal, e até dos problemas da dívida actualmente existentes no caso da Madeira e dos que porventura existirão no que diz respeito à Região Autónoma dos Açores. Ora estes problemas não podem ser vistos na perspectiva estritamente política como muitas vezes são encarados, dizendo "gastou-se de mais ou não se gastou, ou faz-se isto ou aquilo". Eles têm de ser considerados no âmbito de uma experiência nova, em que existem transferências de serviços, em que existem situações económicas que são realidades complexas e que não podem ser analisadas e perspectivadas da maneira por vezes simplista e apressada como, por uma razão ou por outra, são vistos.
Assim, é dentro desse espírito que apresentámos uma proposta que vai ao encontro de garantir cada vez mais que o Orçamento tenha a transparência necessária, mas em que nos pareceu também igualmente curial acautelar as consequências negativas desnecessárias. Daí o meu desafio a sentir a sensibilidade dos Srs. Deputados dos Açores e da Madeira, chamando-lhes a atenção para este problema.
Gostaria de sublinhar esse ponto, porque é importante: isto não pode ser visto numa perspectiva de ataque à autonomia. Não é nada esse o caso. Penso que só temos a ganhar se as coisas forem vistas com serenidade, em esclarecer os problemas e em saber qual é a situação existente, e até em que é que se deve traduzir o dever de solidariedade de todo o espaço portu-
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guês. Essa foi a intenção, e penso que isso está aqui expresso. Mas pode ser expresso eventualmente de uma outra maneira, de modo a retirar os tais aspectos negativos indesejáveis, e daí eu admitir uma reformulação. Por exemplo, e referi-o a título de sugestão, em vez de relações orçamentais, ficaria redigido "transferências orçamentais". Esta seria uma outra hipótese. Suponho que esta discussão nesse aspecto é extremamente útil, porque pode justamente fixar com nitidez a intenção e saber-se se ela está suficientemente consignada no texto e, portanto, se tem uma suficiente cobertura na norma que vier a ser eventualmente aprovada.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, quero esclarecer que não estou numa base de desconfiança e de suspeição. Estou numa base de acautelamento.
O Sr. Presidente: - Eu sei, Sr. Deputado. A minha cautela inicial, e que se mantém, é no sentido de que se nós formos prudentes evitaremos suspeições ulteriores. Não estou a dizer que neste momento elas existem.
O Sr. Mário Maciel (PSD): - Sr. Presidente, é certo que as transferências para as regiões autónomas decorrem em sede de discussão do Orçamento do Estado e que são dinheiros da República. Mas também é certo que a Câmara, devido a inclinações políticas que tem, pode fazer inclinar essa discussão em termos menos serenos e menos respeitáveis dos que nós aqui, piedosamente, queremos fazer crer. Então, o que é que pode impedir a Assembleia da República, ao restringir ou ao aumentar a dotação orçamental a transferir, de intervir indirectamente na feitura do orçamento regional, nomeadamente em toda uma série de elementos, como relatórios de execução, como critérios de investimentos, como despesas de empresas públicas, para em análise da Comissão de Economia, Finanças e Plano ponderar as suas opiniões?
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mário Maciel, a minha resposta é de que este texto constitucional não resolve esse problema, porque sempre que haja uma transferência, se for essa a intenção eventualmente instrumentalizada da Assembleia da República, já hoje isso pode acontecer. Aqui não se trata senão de uma forma de instruir a proposta, mas é evidente que numa transferência de verba (já hoje isso existe) é natural e normal que se solicite a sua fundamentação. Isso é uma coisa. A outra é, a meu ver, com uma alteração daquilo que é correcto e daquilo que é a competência da Assembleia da República, ir ao ponto de se imiscuir na lógica própria do orçamento das regiões autónomas.
Mas é evidente que é uma questão de bom senso e de proporção: quando existe uma transferência orçamental, quem transfere tem naturalmente o direito e o dever de, por um lado, saber para que é que transfere, por que razões transfere, e, por outro, quais as justificações por que o faz.
O Governo não pode proceder a transferências sem autorização da Assembleia da República e sem dar as necessárias explicações. Isto só hoje é assim pela simples lógica de que são verbas que são transferidas do orçamento nacional.
Nós estamos agora aqui a tratar de um problema diverso, que é o problema da instrução. O que acontece frequentes vezes é que essas justificações não têm sido claras, porque não são objecto de uma suficiente preparação prévia ou, pelo menos, de um conhecimento suficiente dessa preparação, e por isso têm surgido alguns problemas. Não vejo que se possa, se as coisas forem feitas com recta intenção, obstar a esta ideia de tornar as coisas mais e mais aprofundadas e transparentes, em termos de instrução.
O problema de obviar ao desvio, à utilização abusiva já existe. Em todos os casos há sempre a hipótese de abusar. Nós não estamos a regular o problema das transferências e da sua fiscalização, esses mecanismos já existem, é só um problema de instrução. Aliás, nada obstaria a que puséssemos, se porventura isso vos tranquilizasse de um ponto de vista da claríssima intenção da nossa proposta, as transferências para as autarquias também, porquanto é o mesmo tipo de problema.
Quando há um problema de transferências para as autarquias, nós não estamos a discutir em concreto o orçamento das autarquias, mas estamos a dizer por que é que transferimos. Para além das verbas próprias, podem-se sempre pôr problemas desse tipo.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que o texto que agora foi apresentado incorpora alguns dos resultados do debate que travámos na primeira leitura e algumas das propostas apresentadas por diversos partidos, incluindo o PCP, com o que, evidentemente, só nos podemos congratular. Sucede, no entanto, que o texto tem, em primeiro lugar, algumas gralhas, em segundo lugar, gostaria de salientar as principais novidades que nos traz e, em terceiro lugar, de alertar para alguns aspectos que, por deliberada opção ou por lapso, eventualmente, não foram contemplados no articulado.
Começando pelo mais simples, as gralhas, alerto para o facto de na alínea a) do n.° 1 do artigo 108.° da nova proposta do PSD se referir a "discriminação de receitas", quando seguramente se quer referir, como no texto constitucional actual, "a discriminação das receitas e despesas do Estado, incluindo as dos fundos e serviços autónomos".
A segunda gralha consta do n.° 2, que é, de resto, idêntico ao texto vigente. A alteração será decorrente das opções atrás praticadas quanto ao plano e, portanto, o plano estará em minúscula e deverá referir-se plano anual, o que suponho, de resto, que já tinha sido objecto de menção por um dos proponentes.
O Sr. Presidente: - Está em minúscula.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Esta precisão tem a vantagem de clarificar a vexata quaestio da anualidade do Orçamento e será especialmente saudada pelo Dr. Guilherme Oliveira Martins, que para ela publicamente alertou. Com êxito!
A terceira gralha diz respeito à alínea b) do n.° 4, onde, por lapso de transcrição, se refere "justificativos das variações de previsões e despesas", quando a redacção correcta é "justificativos das variações de previsões das receitas e despesas". Essa gralha já constava do projecto do PS e provavelmente foi daí, de resto, que foi transposta.
Pausa.
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O texto já tem corrigida, creio eu, a outra gralha, da alínea g) do n.° 4, que referia "a estimativa da perda de receita emergente". Deve fazer-se menção à "receita cessante". Já está corrigido, suponho eu.
O Sr. Presidente: - Está.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, com esta redacção, o texto incorpora de facto algumas inovações, para as quais procurámos igualmente contribuir, a começar certamente pela solução que se propõe para o regime jurídico dos fundo e serviços autónomos. Trata-se do mais árduo problema com o qual a elaboração orçamental, mesmo depois da revisão constitucional de 1982, se vem defrontando, com vicissitudes e inêxitos que cumpre sempre sublinhar. Creio que a solução encontrada e que transparece da alínea a) do n.° 1 e do n.° 3 (mas também do n.° 8, porque ainda que esse n.° 8 não tenha sofrido jurídico-formalmente nenhuma alteração, adquire um conteúdo novo por força do disposto na alínea a) do n.° 1 e no n.° 3) só pode ser saudada como positiva. É extremamente relevante para que a prática orçamental corresponda às exigências basilares do Estado de direito democrático que se explicite constitucionalmente aquilo que a jurisprudência constitucional veio, entre dificuldades, elaborando ao longo destes anos e por último no acórdão respeitante ao Orçamento do Estado de 1988.
Creio que da conjugação entre o disposto na alínea a) do n.° 1 e o disposto no n.° 3 resulta uma clarificação útil e positiva das prerrogativas orçamentais inalienáveis da Assembleia da República em relação aos fundos e serviços autónomos. Evidentemente, caberá ulteriormente ao legislador, através da Lei de Enquadramento, definir o regime atinente à elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos. Aquilo que a este propósito o Tribunal Constitucional teve ocasião de sublinhar no último acórdão que emitiu em matéria orçamental tem aqui pleno cabimento e encontra aqui equilibrada execução. Permitam-me ainda que sublinhe de novo, que o facto de se sublinhar que cabe à Assembleia da República aprovar as receitas e despesas dos próprios fundos e serviços autónomos e de se determinar no n.° 8 aquilo que dele consta implica que a fiscalização pelo Tribunal de Contas e pela própria Assembleia da República da Conta Geral do Estado passe a abranger uma Conta Geral do Estado ela própria renovada, dizendo respeito também aos fundos e serviços autónomos, como é inevitável e como decorre da interpretação integrada de todas as disposições que sublinhei, embora não ocorra alteração literal do disposto no n.° 8.
A segunda inovação diz respeito à introdução do conceito de orçamento programa nos termos previstos na parte final do n.° 5.
É um elemento de racionalização, que introduz uma componente adicional nova à nossa experiência orçamental.
No quadro da elaboração orçamental integrada e relacionada com os processos atinentes às Comunidades Europeias é um campo em que a Lei de Enquadramento deverá definir que passos deverão ser dados, de que forma deverão ser dados e com que limites deverão ser dados, uma vez que o Estado Português não está em condições, tanto quanto é do nosso conhecimento, de fazer uma elaboração total por orçamentos programas de tudo aquilo que hoje consta do Orçamento, que de qualquer das formas terá de continuar a ser unitário, com todas as consequências. A elaboração de orçamentos programas em nada deverá afectar os poderes que nessa matéria cabem à Assembleia da República, não deve ser pretexto para a governamentalização, sob qualquer forma.
A terceira inovação diz respeito à explicitação de alguns dos deveres de fundamentação da proposta de lei do Orçamento do Estado, que, nos termos do n.° 4 hoje definido, deve ser acompanhado de uma pluralidade de elementos. Como sabemos, na nossa prática e no desenvolvimento da própria Lei de Enquadramento, o elenco desses relatórios tem vindo a ser alargado através, designadamente, da produção de diversos anexos informativos à proposta de lei do Orçamento do Estado, acompanhados depois de outros elementos informativos avulsamente enviados em função das solicitações das comissões. Pela nossa parte, consideramos útil e necessário que se explicite algum do conteúdo dos relatórios quê devem acompanhar a proposta de orçamento e cujo elenco constitucional não tolhe o alargamento legal e prático.
Em relação ao conteúdo dos relatórios, à especificação do seu conteúdo, é óbvio que aquilo que consta das alíneas b) e d) é a reprodução de conteúdos actuais. A inovação está na alínea a), no segmento intermédio da alínea c) - a referência às operações de tesouraria - e nas alíneas é), f) e g). Estamos obviamente de acordo com o que se dispõe nas alíneas f) e g) e na própria alínea a). Nós próprios apontávamos para que a lei especificasse algumas das coisas para que aqui se aponta.
Sobre a questão do significado de um relatório sobre as relações orçamentais com as regiões autónomas, pela minha parte também gostaria de manifestar alguma estupefacção. Julguei que esta matéria tivesse sido discutida entre os Srs. Deputados do PSD e que essa discussão interna tivesse dissipado quaisquer dúvidas como aquelas que aqui foram suscitadas e que devo dizer me parecem inconsistentes e até mesmo um tanto surpreendentes.
Creio que um dos debates mais interessantes que fizemos na primeira leitura foi precisamente sobre a problemática dos orçamentos regionais e das relações financeiras não só República regiões como até Comunidades (e em geral estrangeiro) regiões. Se alguma coisa nos deve despertar a atenção é precisamente a falta de um instrumento em que se faça uma apreciação relatorial (é um relatório, não tem outro carácter que não esse) de todos os aspectos relacionados com as finanças regionais, na parte em que isso é relevante para a discussão do Orçamento do Estado. É óbvio que o Orçamento não pode ser alheio a essa realidade, sendo como é Orçamento do Estado e respondendo o Estado inevitavelmente pela própria situação financeira das regiões e sendo, por outro lado, o Estado o depositário e o titular de receitas que lhe são transferidas e atribuídas, incluindo as receitas vindas do exterior. Sendo o Orçamento do Estado coisa de todo o Estado, não pode ignorar uma das suas componentes que tem de ser tida em conta quando ponderamos qual a situação do País. Mais: até pode acontecer que num outro
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quadro em que as relações financeiras melhorem as regiões contribuam em rubrica própria para as despesas da República.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Sempre contribuímos!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Mas não com uma
verba específica. As regiões não estão condenadas, de facto, a encararem-se unicamente como receptáculos de fluxos de cá para lá.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Aconselho-lhe vivamente a leitura da história e a verdadeira análise histórica do sentido dos fluxos financeiros!
O Sr. José Magalhães (PCP): - Em aparte, um dos Srs. Deputados está a suscitar a questão do que vem para cá e do que vai para lá. É uma relevantíssima questão sobre a qual, como sabem, não há dados com projecções verificadas e verificáveis. Tenho assistido e participado em muitos debates do Orçamento do Estado em que a questão é aventada e em que são lançados para o próprio debate alguns dados, algumas contas feitas, sem que, todavia, nunca a Comissão de Economia, Finanças e Plano tenha podido dispor de instrumentos que permitam travar sobre a matéria uma discussão com dados quantitativos fiáveis, que sejam susceptíveis de serem usados, designadamente, para a futura elaboração de uma lei quadro das relações financeiras com as regiões autónomas, que é um instrumento útil, desejável, clarificador. Agora, reparem: se nós viermos a fazer algum dia (como creio é esperável e desejável) uma lei quadro sobre o relacionamento entre a República e as regiões no plano financeiro - que deve contemplar não um, mas vários aspectos desse relacionamento, que deve desejavelmente estabelecer regras que, sem um carácter oscilatório e incerto, permitam saber o que é que cada um deve esperar e o que é que cada um não deve esperar em matéria financeira - pergunto-vos por que é que não deve haver (como é que é possível pensar que não haja) um instrumento jurídico que cada ano (porque é de um princípio anual que se trata) permita fazer o ponto da situação? Importa ou não que saibamos, por um lado, que carências é que há, por outro lado, que disponibilidades é que há, que dificuldades é que há, e que essas dificuldades sejam seriadas, estabelecidas, discutidas e quantificadas num bom relatório? Repare-se: isto nada tem a ver com as prerrogativas próprias dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas. É inteiramente óbvio que às assembleias regionais continuará a caber aprovar os orçamentos - e, de resto, só às assembleias regionais, coisa que, como sabem, foi litigiosa e originou durante muito tempo situações anómalas tanto na Região Autónoma dos Açores como na da Madeira, nesta última, aliás, ainda com distorções, como prova o último orçamento publicado agora no Diário da República. É, pelo menos, um receio infundado ver nesta alusão uma qualquer forma de semear um alastrar na Assembleia da República de um debate para áreas que são da competência própria dos órgãos de governo das regiões autónomas.
Creio que, pelo contrário, num momento em que as regiões autónomas foram atingidas, designadamente, pelas consequências da adesão no que diz respeito às suas próprias receitas fiscais, num momento em que o processo de harmonização fiscal no quadro das Comunidades pode conduzir não só à restrição das competências da Assembleia da República nessa matéria (e isso, como sabem, pode acontecer) como à própria restrição do espaço de decisão própria, "autónoma", dos órgãos do governo próprio das regiões, num momento desses é especialmente útil que se caminhe para a elaboração de um instrumento como o agora proposto. Reparem: não se desenha a configuração deste relatório. Os textos que conheço elaborados em orçamentos anteriores, nos relatórios das propostas de lei do Orçamento do Estado, atinentes às situações das regiões autónomas, são de uma extrema sumaridade, deixam-nos imensas dúvidas. Isso, porém, não nos cabe aqui dirimir, em sede de revisão constitucional. É uma questão a dirimir em sede de Lei de Enquadramento. Devo dizer que a actual Lei de Enquadramento já prevê, Srs. Deputados, a existência de elementos desse tipo e nunca nenhum dos Srs. Deputados viu nisso qualquer factor preocupante. Creio, até, que a maior vantagem da existência de um tal instrumento é permitir que certas discussões, que surgem concentradas no momento mágico da discussão das transferências, possam ser feitas na sede e no momento próprios, que é no trabalho preparatório e, em seu tempo, no Plenário. Discussões feitas com carácter global e não circunscritas, por exemplo (como aconteceu num dos orçamentos passados), à reflexão sobre se o melhor sistema é canalisar as transferências através do orçamento do ministro da República, ou se não (como sabe não é obrigatório que seja via Ministro da República, até poderia ser nos encargos gerais da Nação).
De nada disso se trata aqui. Espero, de resto, que a evolução do debate vos tenha persuadido de que o vosso receio é um sintoma de falta de boa discussão interna, que eu tinha pressuposto que teria existido e que visivelmente não houve da vossa parte. Percebemos a vossa inquietação, mas ela não tem suportes razoáveis em que se fundamente uma reclamação. Devo dizer, aliás, que a própria expressão "relações orçamentais com as regiões autónomas" é correcta. Não é só a questão das transferências que está em causa, porque, como um dos Srs. Deputados em aparte sublinhava, há outros aspectos relevantes nas relações orçamentais. Por exemplo, se algum dia se quiser discutir a famosa questão das receitas perdidas, ou das receitas enviadas e não percebidas, em algum sítio há-de haver uma inventariação, uma quantificação do campo problemático que assim se designa. Suponho que o bom sítio é este. Creio, pois, que a boa redacção, apesar de tudo, será alguma que se aproxime mais da que está aí em primeira mão.
As soluções que foram alvitradas em segundo lugar parecem-me piores.
A última observação, Sr. Presidente, diz respeito à questão das classificações. Como se sabe, propúnhamos no nosso texto, e cremos que é uma proposta justa, que a Constituição passasse a especificar a obrigatoriedade de classificar as despesas segundo a classificação orgânica e funcional, mas também segundo a classificação económica. Devo dizer que, francamente, não percebo por que é que isso, que julgávamos tinha um consenso alargado, não consta do vosso texto. E gostaria de perguntar se é assim, de facto, ou se estão disponíveis para corrigir esse aspecto.
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Gostaria ainda, Sr. Presidente, de alertar para os graves problemas decorrentes da alteração proposta para o n.° 6, ao qual foi aditado um segundo segmento sobre o regime de alteração ao Orçamento. Esta, como se sabe, foi uma das matérias mais polémicas após a revisão constitucional de 1982 e é justo reconhecer que no processo de elaboração de orçamentos do Estado segundo o modelo aprovado na primeira revisão constitucional a oscilação sobre este ponto foi grande. Não por acaso, a jurisprudência constitucional teve de intervir diversas vezes num sentido correctivo, declarando inconstitucionais disposições que davam ao Governo poderes que ele não pode ter, face ao modelo constitucional, no que diz respeito à alteração orçamental. Gostaria que o Sr. Presidente precisasse o alcance da vossa proposta. Ela suscita-me fundas apreensões.
Finalmente, lamentamos muito, Sr. Presidente, que se seja tão tímido na aprovação de alterações; consideramos lamentável que não estejam disponíveis para acolher a nossa proposta de n.° 7-A, o qual prevê a publicação da versão integral dos orçamentos desagregados de todos os serviços. O Governo, sabemo-lo, organiza-a, mas essa publicação ocorre sempre muito tardiamente e em condições que nos parecem tornar pouco operacional o trabalho de fiscalização e de acompanhamento da execução orçamental, que é uma da funções importantes da Assembleia da República, embora mal e pouco exercida na prática.
Evidentemente, não verteremos lágrimas em relação àquilo que, não tendo sido explicitado, no entanto está consumido. Consideramos consumida a proposta do PCP de que sejam inscritos do Orçamento do Estado "as contribuições do Estado Português para as organizações internacionais de que faça parte, bem como os financiamentos delas provenientes" e "os montantes recebidos a título de assistência ou cooperação de qualquer outro país, bem como os montantes a conceder". Hão-de ter projecção orçamental, por um lado, nas receitas e, por outro, nas despesas. Isto acontece também em relação a algumas das propostas do PS que, embora não tendo uma expressa, explícita e desenvolvidíssima consagração, estão, no entanto, recobertas pela benfeitoria introduzida designadamente no n.° 1-A deste artigo, o que é positivo.
O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado António Vitorino.
O Sr. António Vitorino (PS): - Era só para dizer, muito sucintamente (até porque nos aproximamos do termo desta reunião), que nos congratulamos pelo esforço que foi feito pelo PSD na apresentação desta proposta. Pensamos que ele resulta do debate que tem vindo a ser travado, é também o adquirido consolidado de uma prática que tem vindo a ser alargada e de jurisprudência constitucional emitida a este propósito. Achamos que esse esforço contempla o essencial das nossas preocupações e das propostas que nós próprios tínhamos avançado no nosso projecto inicial de revisão constitucional e que há homologia em múltiplos aspectos entre a proposta que ora é apresentada e a nossa própria proposta originária, pelo que retiraremos a nossa proposta em benefício da votação da proposta ora apresentada pelo PSD.
O Sr. Presidente: - No que se refere às perguntas feitas, as respostas, muito sucintas, são as seguintes: no que diz respeito à ideia de incluir a classificação económica, não pensamos, obviamente, que o Governo na sua proposta não faça as classificações económicas, só que elas são muito variáveis e, portanto, não nos pareceu merecer a dignidade de referência constitucional, muito embora várias classificações económicas devam ser feitas, e estão a sê-lo, em relação às várias rubricas orçamentais.
Quanto ao segundo ponto, o n.° 6, é isso que o Sr. Deputado José Magalhães referiu, mas é também a ideia de que no novo regime da contabilidade pública é importante preservar a hipótese das obrigações de resultado e, em particular, a ideia de que a Assembleia deve aprovar os programas orçamentais em termos claramente bem definidos e, dentro dos programas definidos, deve haver a possibilidade da variação dentro do programa.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sim, mas não funcional! Portanto, sem alteração da classificação funcional das despesas. Mas importaria medir melhor os termos e implicações...
O Sr. Presidente: - Sim, dentro do programa, mas sem alteração da classificação funcional.
O Sr. José Magalhães (PCP): - E quanto aos relatórios?
O Sr. Presidente: - Julgo que aquilo que está apresentado revela um esforço muito grande de aproximação e não pensamos que seja útil neste momento ir mais além. É evidente que a fundamentação é um dever geral em relação a todas as propostas; não digo que seja um dever estritamente jurídico, mas é um dever até para tornar as propostas inteligíveis. Em todo o caso, uma coisa é uma fundamentação sucinta e outra, obviamente, é ser acompanhada de um relatório que é mais desenvolvido e que explicita de uma maneira mais ampla alguns pontos.
No que respeita ao problema do Serviço Nacional de Saúde, entendemos que, como há pouco já tive ocasião de referir, não existe uma entidade orçamental que se chame Serviço Nacional de Saúde; existem sim, quer no que respeita ao orçamento da Segurança Social, o sector relativo ao Serviço Nacional de Saúde, quer no que respeita às entidades que, no âmbito do Ministério da Saúde, têm autonomia (são serviços autónomos) e estão naturalmente abrangidos pela disposição inicial do n.° 1, alíneas a) e b).
Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Pereira.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Sr. Presidente, não cheguei a perceber exactamente qual era o texto final da alínea f): se seriam "transferências" ou "relações orçamentais".
O Sr. Presidente: - Diria que, na minha perspectiva, elas têm sinonímia, mas pode haver alguma preferência em termos da primeira impressão e, portanto, pessoalmente estaria disposto a referir ou as transferências ou as relações, porque em qualquer das perspectivas o objectivo é o mesmo.
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O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Eu preferiria "transferências" e com o preciso significado das palavras em causa!
O Sr. Presidente: - Se não se importam, então substituiríamos "sobre as relações orçamentais" por "sobre as transferências orçamentais entre a República e as regiões autónomas".
O Sr. José Magalhães (PCP): - É redutor, porque não são relevantes só as transferências entre a República e as regiões autónomas. Não querem também um relatório para saberem pelo menos quais são as transferências que (não) obtém das Comunidades?
É isso que não percebo neste debate.
Vozes.
O Sr. Guilherme da Silva (PSD): - As regiões recebem directamente as verbas das Comunidades.
O Sr. José Magalhães (PCP): - É que num momento em que tinham a possibilidade de consagrar o direito de informação acrescida cortam-no por uma razão imponderável. Não percebo. Chama-se a isso ficar aquém do pedido e perder uma boa ocasião.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Presumo que o Sr. Deputado José Magalhães sabe que o Orçamento do Estado tem uma nota introdutória que explica e justifica as verbas nele especificadas.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Onde é que tem a nota justificativa?
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Está usualmente no preâmbulo ou em nota final da lei do Orçamento.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Onde? É isso que estamos a definir. Nós estamos a definir a receita para a elaboração da nota justificativa.
O Sr. Jorge Pereira (PSD): - Essa necessidade decorre já da lei de enquadramento orçamental.
O Sr. Presidente: - Desculparão, mas além disso temos de votar o problema do relatório e distribuição do trabalho. Já não faremos, portanto, a votação do artigo 219.°
A questão que ponho a VV. Exas. é a seguinte: suponho que a discussão foi clara no sentido de qual é o objectivo da proposta e, salvo o devido respeito, não me pareceu que tenham sido produzidos argumentos suficientes no sentido de dizer que a proposta seja negativa. A única questão a acautelar é que não houvesse uma discussão, que seria indevida, acerca dos orçamentos das regiões autónomas, porque estamos a falar de transferências. Que a questão tem de ser justificada, é um facto que tem, porque é do Orçamento dó Estado e não há hipótese nenhuma de se recusar uma discussão desse tipo, como é óbvio.
Uma voz: - Sempre foi!
O Sr. Presidente: - Outras coisas sempre foram. O problema é de instrução e de esclarecer como é que a instrução é feita. Há pouco disse e estou aberto a considerar todas as hipóteses, incluindo a supressão da alínea se houvesse uma argumentação que levasse a essa conclusão. Há ainda hipótese de alteração de redacção e gostaria, se tiverem uma sugestão de redacção diferente, que pensassem nela enquanto votamos as outras alíneas, e de seguida ponderaremos o seu conteúdo. Chamaria a vossa atenção - insisto nisso - que a discussão revelou de uma maneira clara, penso que isso é importante, que não é um problema de fiscalização, de discussão do orçamento das regiões autónomas que está em jogo, mas é sim um problema de fiscalização do Orçamento do Estado. E não há dúvida que temos neste artigo, nesta sede, toda a legitimidade de o regular, em termos razoáveis.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, permita-me uma sugestão de que não se submeta à votação essa alínea, que se permita o compasso de espera...
O Sr. Presidente: - O ficar em aberto significa ficar em aberto.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Ficar em aberto tem apenas o significado de permitir sedimentar, clarificar e facultar uma pausa, de menos de vinte e quatro horas, para que isso se resolva positivamente.
O Sr. Presidente: - Isso pode ficar para amanhã.
Queria, em todo o caso, perguntar a V. Exa. o seguinte: tiveram oportunidade de ver a proposta do relatório? Estão de acordo com a metodologia que aqui está proposta?
Pausa.
Vamos então votar a proposta de relatório da CERC elaborada pela mesa.
Submetida à votação, foi aprovada, com os votos a favor do PSD, do PS, do PCP e da ID.
É a seguinte:
Relatório da Comissão Eventual para a Revisão Constitucional
1 - A Comissão Eventual para a Revisão Constitucional (CERC) foi constituída por deliberação do Plenário da Assembleia da República em .../...788, sendo composta pelos seguintes Sr s. Deputados:...
2 - No decurso dos trabalhos da CERC foram substituídos os seguintes Srs. Deputados:...
3 - A mesa da CERC foi eleita na sua reunião de .../.../88 e ficou com a seguinte composição:...
4 - A CERC procedeu à elaboração do seu regimento interno, que foi aprovado na sessão de .../... 788 e cujo texto se integra no presente relatório para os devidos efeitos (anexo I).
5 - A CERC constituiu uma subcomissão destinada a proceder a uma análise comparativa dos diferentes projectos de revisão constitucional apre-
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sentados na Mesa da Assembleia da República, subcomissão essa que apresentou ao plenário da Comissão... relatórios e que teve a seguinte composição:...
6 - A CERC realizou... sessões de trabalho, onde procedeu a duas leituras de todos os projectos de revisão constitucional, bem como das propostas de substituição apresentadas pelos membros da Comissão no decurso dos respectivos debates, cujo registo integral consta das actas publicadas em série especial do Diário da Assembleia da República, 2.ª série.
7 - A CERC, no decurso dos seus trabalhos, recebeu a correspondência de que se apresenta uma súmula no anexo II deste relatório.
8 - De igual forma a CERC concedeu audiências a todas as entidades que as solicitaram, no âmbito de uma subcomissão especialmente criada para o efeito e cujo relatório consta do anexo III.
9 - No anexo IV integra-se um texto do qual constam as propostas de alteração à Constituição e os textos de substituição cuja aprovação pelo Plenário da Assembleia da República é sugerida pela CERC em virtude de terem merecido o voto favorável de, pelo menos, dois terços dos deputados que compõem esta Comissão.
10 - Do anexo V consta a lista das propostas de alteração constantes dos projectos de revisão constitucional que no decurso dos trabalhos da CERC foram retiradas pelos respectivos proponentes.
11 - O anexo VI é composto pelo mapa das posições de voto de cada partido em relação às propostas apresentadas, constituindo a confirmação das votações efectuadas no decurso da segunda leitura na CERC, formalizada em reunião especialmente convocada para o efeito.
12 - Finalmente, do anexo VII constam as comunicações dos diferentes grupos parlamentares e dos demais deputados subscritores de projectos de revisão constitucional contendo a indicação das propostas que declaram retirar.
Palácio de São Bento. - O Presidente da Comissão ...
Vamos ainda ter de distribuir as tarefas no que respeita aos problemas de redacção. Há alguma proposta concreta em matéria de distribuição de redacção?
O Sr. António Vitorino (PS): - Penso que a orgânica do relatório pressupõe o seguinte: quanto ao n.° 1, pedir aos serviços de apoio que o preencham; n.ºs 2 e 3, idem; n.° 4 (integração do regimento da Comissão no relatório), basta os serviços poderem preencher a sessão em que foi aprovada; n.ºs 5 e 6, os serviços podem preenchê-los; n.° 7 (sobre correspondência), sugeria que fosse elaborada a lista das entradas de correspondência, o que os serviços também podem fazer; n.° 8, a subcomissão de audiências deveria apresentar a lista das audiências que foram concedidas, das quais, ao que parece, existem relatórios.
O Sr. Presidente: - Exacto, há relatórios, mas não vale a pena publicá-los, basta uma listagem.
O Sr. António Vitorino (PS): - Para não sobrecarregar muito este relatório, penso que se poderiam publicar em apêndice os relatórios.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Exacto. O Sr. Presidente: - Sim, sim.
O Sr. António Vitorino (PS): - O relatório não estava dependente da aprovação dos relatórios das audiências. No anexo apenas se publicava a lista e em apêndice ao relatório seriam publicados os relatórios da subcomissão.
O anexo IV é o texto articulado. Iria fazer entrega de um exemplar dactilografado das propostas que tiveram a votação de dois terços. É um texto muito extenso - tem 109 páginas dactilografadas -, sugeria que fossem tiradas fotocópias, que seriam posteriormente distribuídas, porque este texto é uma síntese do que foi sendo recolhido por nós, mas pode ter eventuais falhas.
O anexo V é a lista das propostas que foram sendo retiradas ao longo dos debates da segunda leitura e pode ser elaborado pelos serviços.
Os anexos VI e VII dependem das posições dos partidos políticos, as quais só podem ser definidas uma vez estabelecido o texto base articulado do anexo IV. O que os serviços poderiam fazer é a lista das votações que foram sendo feitas durante a segunda leitura - aliás, já o estão fazendo - por forma que os partidos, no prazo que a Comissão fixasse, pudessem preencher, confirmando ou não, o sentido de voto que foi feito ao longo da segunda leitura.
O Sr. Presidente: - A ideia aprovada é a de haver um mapa onde constem as declarações de voto dos diferentes partidos políticos e que, para que a reunião ganhe eficácia, serão distribuídos e estudados no sentido de numa reunião posterior os partidos se pronunciaram, confirmando ou não a votação, e até mesmo votá-los pela primeira vez.
O Sr. José Magalhães (PCP): - O Sr. Deputado António Vitorino teve o cuidado de nos permitir a todos medir o grau de dificuldade da tarefa que empreendemos, que é a elaboração do relatório. A subcomissão, tendo visto aprovado este esquema de trabalho, não terá, suponho eu, grandes dificuldades em se desempenhar dele, salvo em três aspectos.
O primeiro aspecto é o anexo IV, o articulado. Esse articulado, como fomos vendo ao longo dos debates, ficou sujeito a acertos de redacção, a algumas precisões e clarificações, e será importante que nessa matéria haja algum trabalho colegial da subcomissão. Suponho que a base do trabalho que o Sr. Deputado António Vitorino tornou disponível a todos os grupos parlamentares e a todos os membros da Comissão terá de ser objecto desse afeiçoamento e dessa troca de impressões, por forma que o anexo, como tal, possa obter a menção de aprovado. Teríamos de estabelecer a metodologia necessária para fazer esse trabalho de "acertamento" dos articulados.
O segundo problema diz respeito ao anexo III. O Sr. Deputado Licínio Moreira foi elaborando diversos relatórios sobre as audiências concedidas. Suponho que VV. Exas. apontam para a elaboração de um mapa
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das audiências no qual haja um mínimo de especificação do objecto da audiência. Esse mapa não prejudicará relatórios desenvolvidos que sei o Sr. Deputado Licínio Moreira já elaborou, mas que também têm de ser aprovados e devidamente formalizados, o que não ocorre até à data. Teríamos de ver como é que esse trabalho pode ser feito, quando e como.
Finalmente, o mapa tipo das votações, que será o anexo vi. É evidente que os serviços têm vindo a proceder à sua elaboração. Seria relevante sabermos quando estará terminado esse mapa, que é de complexa confecção, mas de grande utilidade para que os grupos parlamentares e outras forças políticas empenhadas no processo de revisão constitucional possam exprimir, querendo, o seu sentido de voto dentro do prazo que for estabelecido, de acordo com os nossos trabalhos.
Vê-se, pois, Sr. Presidente, que neste relatório muitos são os anexos e escassos os textos e alguns deles bem simples. O problema não está no relatório, está no seu conteúdo, mas disso trataremos no Plenário.
O Sr. Presidente: - Em termos dos nossos trabalhos, proponho o seguinte: reuniríamos amanhã às 15 horas para ultimarmos as votações que hoje não houve oportunidade de fazer. Por outro lado, a subcomissão poderia reunir na sexta-feira de manhã para efeitos de apreciar os trabalhos dos anexos que já estão elaborados, designadamente o texto do anexo IV, do qual já há um documento de trabalho, que será distribuído amanhã aos Srs. Deputados, com preferência para os membros da subcomissão.
O Sr. António Vitorino (PS): - Penso que o que tem de constar do anexo IV é o que foi objecto de votação na Comissão, não é ainda o trabalho final da comissão de redacção, porque não sabemos se aquilo que está indiciariamente votado acolherá o voto favorável da maioria constitucionalmente necessária.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Folgo muito por ver o Sr. Deputado António Vitorino fazer essa observação.
O Sr. António Vitorino (PS): - Como esta manhã acordei com uma declaração do Sr. Deputado José Magalhães a dizer que está tudo por corrigir, lembrei-me da história entre o optimista e o pessimista. É a história de dois sapos que um dia caíram numa selha de leite. O sapo pessimista começou a gritar "ai, que me vou afogar", e naturalmente afogou-se. O sapo optimista, que não conseguia nadar, porque o leite é mais denso que a água, foi esbracejando lentamente até que formou um pequeno quadradinho de manteiga sobre o qual conseguiu atravessar a selha de leite, salvando-se. Não sei bem qual é o estatuto do Sr. Deputado José Magalhães entre os dois sapos.
O Sr. José Magalhães (PCP): - Acabei de perceber a filosofia ao abrigo da qual V. Exa. celebrou o acordo PS/PSD!
O Sr. António Vitorino (PS): - Seja como for...
O Sr. José Magalhães (PCP): - O problema é que o balde é laranja, Sr. Deputado, e o leite coalha!
Risos.
O Sr. António Vitorino (PS): - Não há dúvida de que o Sr. Deputado José Magalhães tem um estômago sensível a certos citrinos. É por isso que quando o ouço falar me sabe mais a limão que a laranja.
Concluindo, diria que não é um trabalho de aprimoramento de redacção da versão final, é, sim, um trabalho de verificar se o articulado que está incluído no anexo IV é, de facto, o correspondente àquilo que foi efectivamente votado na CERC. O trabalho de aprimoramento da redacção será deixado para depois da votação no Plenário, com as tais correcções em que o Sr. Deputado José Magalhães manifesta tamanha confiança.
O Sr. Presidente: - Sr. Deputado António Vitorino, tem toda a razão em fazer essa observação, que é extremamente pertinente, porque é nessa suposição que nós admitimos que na sexta-feira se faça essa leitura, porque se fosse a redacção final, obviamente, ela careceria de mais tempo.
Amanhã reuniremos às 15 horas.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 20 horas e 12 minutos.
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional
Reunião do dia 28 de Março de 1989
Relação das presenças dos Srs. Deputados
Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD).
José Augusto Ferreira de Campos (PSD).
Licínio Moreira da Silva (PSD).
Manuel da Costa Andrade (PSD).
Maria da Assunção Andrade Esteves (PSD).
Pedro Manuel da Cruz Roseta (PSD).
Luís Filipe Garrido Pais de Sousa (PSD).
Mário Jorge Belo Maciel (PSD).
António Jorge Pereira (PSD).
Cecília Pita Catarino (PSD).
Guilherme Henrique Valente Rodrigues da Silva (PSD).
Manuel António de Sá Fernandes (PSD).
Carlos Lélis da Câmara Gonçalves (PSD).
José Luís Bonifácio Ramos (PSD).
António de Almeida Santos (PS).
António Manuel de Carvalho Ferreira Vitorino (PS).
José Manuel dos Santos Magalhães (PCP).
António Alves Marques Júnior (PRD).
Rui Fernandes de Morais e Castro (ID).
ANEXO
Proposta
Artigo 108.°
Orçamento
1 - O Orçamento de Estado contém:
a) A discriminação de receitas e despesas do Estado, incluindo as dos fundos e serviços autónomos;
b) O orçamento da Segurança Social.
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2 - O Orçamento é elaborado de harmonia com as opções do plano anual e tendo em conta as obrigações decorrentes de lei ou de contrato.
3 - A lei do Orçamento é elaborada, organizada, votada e executada de acordo com a respectiva Lei de Enquadramento, que incluirá o regime atinente à elaboração e execução dos orçamentos dos fundos e serviços autónomos.
4 - A proposta de orçamento é acompanhada de relatórios:
a) Provisionais da evolução dos principais agregados macroeconómicos com influência no Orçamento, bem como da evolução da massa monetária e suas contrapartidas;
b) Justificativos das variações de previsões e despesas relativamente ao Orçamento anterior;
c) Sobre a dívida pública, as operações de tesouraria e as contas do Tesouro;
d) Sobre a situação dos fundos e serviços autónomos;
e) Sobre as relações orçamentais com as regiões autónomas;
f) Sobre as transferências financeiras entre Portugal e o exterior, com incidência na proposta de orçamento;
g) Sobre os benefícios fiscais e a estimativa da receita cessante.
5 - O Orçamento é unitário e especifica as despesas segundo a respectiva classificação orgânica e funcional, de modo a impedir a existência de dotações e fundos secretos, podendo ainda ser estruturado por programas.
6 - O Orçamento deve prever as receitas necessárias para cobrir as despesas, definindo a lei as regras da sua execução, as condições a que deverá obedecer o recurso ao crédito público e os critérios que deverão presidir às alterações que durante a execução poderão ser introduzidas pelo Governo nas rubricas de classificação orgânica a que se refere o número anterior, tendo em vista a plena realização dos programas orçamentais aprovados pela Assembleia.
7 - A proposta de orçamento é apresentada e votada nos prazos fixados na lei, a qual prevê os procedimentos a adoptar quando aqueles não puderem ser cumpridos.
8 - A execução do Orçamento é fiscalizada pelo Tribunal de Contas e pela Assembleia da República, que, precedendo parecer daquele Tribunal, aprecia e aprova a Conta Geral do Estado, incluindo a da Segurança Social.
Os Deputados do PSD: Rui Manchete - Maria da Assunção Esteves - Pedro Roseta - José Luís Ramos - Pais de Sousa.
Proposta
Artigo 219.° Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas é o órgão jurisdicional de fiscalização da execução orçamental e da legalidade das despesas públicas, competindo-lhe:
a) Dar parecer sobre a Conta Geral do Estado, incluindo a da Segurança Social e das regiões autónomas;
b) Julgar e apreciar as contas que a lei mandar submeter-lhe;
c) Efectivar a responsabilidade por infracções financeiras, nos termos da lei;
d) Exercer as demais competências que lhe forem atribuídas por lei.
Os Deputados do PSD: Rui Manchete - Maria da Assunção Esteves - Mário Maciel - Pedro Roseta.
Proposta
Artigo 90-A.º
1 - ....................
2 - O domínio público das regiões autónomas é definido nos estatutos político-administrativos das respectivas regiões,
3 - A lei estabelece a extensão e os limites do domínio público do Estado e das regiões autónomas referidos nos números anteriores, bem como o elenco e a extensão dos bens do domínio público das autarquias locais.
4 - A lei define também o regime dos bens do domínio público do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, fixando os termos da sua gestão e utilização por entidades públicas e da sua utilização por entidades privadas.
Os Deputados do PSD: Guilherme da Silva - Mário Maciel - Jorge Pereira.