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Sexta-felra, 14 de Outubro de 1994 II Série — NUrnero 8— RC

6IARIOda Assembleia da RepUblica

VI LEG IS.LATU RA 4A SESSAO LEGISLATIVA (1994-1995)

IV REVISAO CONSTITUCIONALCOMISSA0 EVENTUAL PARA A REVISAO CONSTITUCIONAL

ACTA N.2 8

Reunião do dia 13 de Outubro de 1994

SUMARI.O

o Sr. Presidente (Almeida Santos) deu in(cio a reuniöo as 10horas e 30 minutos.

Foram apreciadas as propostas de alteracJo, apresentadas peloPS, Deputado Pedro Passos Coelho e outros do PSD, PCP,Deputado do PSD Pedro Roseta, PSD, Deputado independenteRaul Castro, Deputado do PSD Cardoso Martins, Os Verdes, CDS-PP e Depurado independente Luls Fazenda, relativas aos artigos22.”, 23.” 23.”-A, 24.”, 25.”, 26.° 27.’ 2&’ 34.” e 35.”

Intervieram no debate, a diverso iftulo, alm do Sr. Presidente,os Srs. Deputados Alberto Martins (PS), Pedro Passos Coelho(PSD), Odete Santos (PCP), Margarida Silva Pereira (PSD), JoséVera Jardira (PS). Anidnia Marques Mendes (PSD), Lids Sd (PCP),Raul Castro (Indep.), Cardoso Martins e Miguel Macedo (PSD),Antonio Filipe (PCP), José MagalhJes (PS), Isabel Castro (OsVerdes). Lids Fazenda (Indep.), Fernando Amaral (PSD) e Joc7oAmaral (PCP).

0 Sr. Presidente encerrou a reuni&i eram 18 horas e 30 minutos.

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o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,temos quorum, pelo que declaro aberta a sessäo.

Eram 10 horas e 30 minulos.

Srs. Deputados, vamos dar inIcio aos nossos trabaihos.

Tfnhamos acabado o artigo 20.° e vamos entrar hoje na

discussão do artigo 22.°

o Sr. Luls SI (PCP): — Sr. Presidente, hI urn lapso dosserviços, jI apontado em devido tempo, que se prende corn

o facto de não terem incluIdo na altura prOpria os adita

mentos.Concretamente, existern propostas de urn artigo 20.°-A,

quer do PS quer do PCP, corn a epIgrafe, respectivamen

te, > e <

fesa>>. Independenternente deste lapso, creio que era inte

ressante e importante discutir estes artigos, ate porque têm

algum parentesco ou proximidade corn a questAo do aces

so ao direito e em geral corn o problema da protecçao

processual dos direitos, liberdades e garantias.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — A que artigo éque acha que deverfanios fazer a associaco?

o Sr. Luls SI PP): — Creio que era de discutir deseguida, pois a seguir ao artigo 20.° vem o 20.°-A.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,porque nao constam dos nossos instrumentos de trabaiho,

you ler as duas propostas.E a seguinte a proposta do PS para o artigo 20.°-A:

Artigo 20.°-A

Recurso de ainparo

HI recurso de amparo corn carácter cia prioridadee celeridade, junto do Tribunal Constitucional:

a) Contra actos ou ornissOes de entidadesptiblicas de que decorra 1eso directa dedireitos, liberdades e garantias, insusceptIveis de impugnacão junto dos demais tnbunais;

b) Contra actos ou ornissöes dos tribunais decarácter processual que, de forma autdnorna,violem direitos, liberdades e garantias, apOsesgotamento dos recursos ordinIrios.

A proposta do PCP d a seguinte:

Artigo 20.°-A

Acçao constitucional de defesa

1 — HI acçAo constitucional de defesa junto doTribunal Constitucional contra quaisquer actos ouornissöes dos poderes pdblicos que lesemdirectarnente direitos, liberdades e garantias, quandoeles não sejam susceptfveis de impugnacao junto dosdernais tribunais.

2— HI tamblm recurso constitucional de defesaparao Tribunal Constitucional dos actos ou omissöesdos tribunals, de natureza processual que, de formaautdnoma, violem clireitos, Jiberdades a garantias,desde qua tenham sido esgotados os recursosordinInios competentes.

3 — A 1e1 regula as accOes e recursos previstosnos nOmeros anteriores, garantindo-Ihes carIcter deprionidade e celeridade.

Os dernais partidos estão em condiçöes de discutir as-las propostas apesar de elas nao constarem do resumodistribuldo?

Pausa.

Visto existirern algumas objecçöes, a sua discussäo ficapara a proxima reuniäo.

O Sr. Luls SI PCP): — Sr. Presidente, seria de todoconveniente que Os servicos reparassern 0 lapso.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Darei instruçoesaos serviços nesse sentido.

Tern a palavra, para apresentar a proposta do PS parao artigo 22.°, o Sr. Deputado Alberto Martins.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, o acres-canto do Partido Socialista explica-se por si próprio na suaobjectividade, isto I, este artigo consagra urn princfpioparticular do Estado de direito.

Depois da consagração anterior do princfpio cia legalidade e do princfpio da judicialidade, aqui hI consagraçâodo princfpio da responsabilidade do Estado, a qual abrange a responsabilidade directa das entidades, drgaos e funcionrios, como diz o exposto constitucional, pelos actoslegislativos ou jurisdicionais.

Assim, corn a nossa proposta, visamos precisar e consagrar (nalgurnas leituras jI o estI neste texto mas noutras não e a nossa interpretaçao é qua tal jI estI consagrado) urn carIcter normativo mais preciso no sentido dea responsabffidade do Estado ser uma responsabilidade objectiva por actos licitos a, portanto, a consagraçAo nestedomInio constitucional da responsabilidade palo risco, etAo-sd.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Portanto, por seentender que a actual redacçao sugere que sO se reporta aresponsabilidade por culpa, na medida em que fala emsolidInia. B isso?

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sim. HI quem entenda qua no prdpnio texto constitucional jI hI responsabilidade pelo risco, mas quisemos consagrar a precisar essainterpretaçao.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr. DeputadoPedro Passos Coelho, quer apnesentar a sua proposta?

o Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): — Sr. Presidente,tenho pena de nAo ten presenciado a defesa qua o Deputado Pedro Roseta aqui fez ontem da sua proposta, namedida em qua ela tern que yen corn esta matlnia, e penitencio-me par não tar ouvido par inteiro a alegaçAo feitapalo Partido Socialista. Em qualquer caso, a proposta queaqui apresentarnos visa dois objectivos, sendo o pnimeiroo de clarificar meihor, no texto constitucional, o que I quese entende par responsabilidade civil do Estado atravds dassuas diversas funçöes.

E certo que I entendimento comum que esta normaabrange corn ciareza quer a funco junisdicional quer afunçAo legislativa. De resto, hI outros artigos na Consti

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tuiçäo que acabarn por, de forma expressa, caracterizaralgumas dessas formas do responsabilidade, nomeadamenteao fixar expressamente, por exempto, os dircitos de indemnização por expropriacao, o que inclui claramente actoslegislativos e uma funçâo do Estado atravds de actos lIcitos e, de outra parte, tambdm ao prevenir a possibilidadede indemnizacão para todos aqueles que sejam injustamente condenados, o que abrange claraniente a funçao jurisdicional.

0 primeiro objectivo da proposta é, assim, o de tentardeixar mais claro neste artigo o exercfcio da funço pelaqual o Estado responde, em termos de responsabilidade.

Em segundo lugar, visa, de certa maneira, dar infcio aurn conjunto. cle discussôes que se prendem corn a imputacäo aos titulares dos drgos, aos agentes oti aos funcionérios que por actos ou omissôes possam ser tambdrnculpabilizados ou imputáveis civilmente pelo exercfciodessas funçôes.

Como sabem, isto abrange uma panóplia de casos corn-•plexos, na medida em que a prdpria Constituição definedistinçöes entre aqueles que pertencem a drgãos de soberania e aqueles que não pertencem, e näo tern sido rnuitofácil, nos aims mais recentes, dar consequência objectivaao nfvel da responsabilidade do Estado na sua funçâo Icgislativa. Pordm, ha diversos artigos que apontam mesmono âmbito jurisdicional para a inimputabilidade e, portanto, se quiserern, para a irresponsabilidade dos magistrados.

Julgamos que essa discussão se deve fazer imu1tanea-mente corn este artigo, na medida em que, embora issotenha pouco que ver estritamente corn o artigo 22.°, defendernos que deve existir algurn nfvel de responsabiidadecivil, ate nos magistrados, sobretudo se estiver em causamatdria que cause dano, prejuizo ou injustiça grave parao cidadão, mas farernos essa discussão em tempo oportuno.

• Alias, entendemos que esta norma constitucional visagarantir os direitos dos particulares mas nem por isso deveesconder ou, se quiserem, garantir a impunidade daquelesque os praticam e, nessa medida, o aclaramento deste artigo poderá Irazer urna mais-valia para, quando chegarmosa outros artigos mais a frente e pudermos avaliar da forinade conformar a responsabilidade civil dos titutares em sidas diversas funçoes, aproveitannos, naturalmente, parafazer algumas clarificaçôes, se isso for possfvel, nomeadamente no âmbito da funçao legislativa e, portanto, daresponsabilidade poiftica dos titutares de cargos politicos.

E tudo, Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada Odete Santos, para apresentar a propostado PCP.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Srs. Deputados, esteartigo da Constituiçao d o que doutrinéria e jurisprudencialmente tern causado mais discussôes, havendo rnesmoautores, como, por exemplo, o saudoso e falecidoProf. Castro Mendes, que referia que não se aventuravana anélise deste artigo dado que sentia estar a mover-senum terreno movedico.

Assim, a maioria da doutrina tern entendido que o artigo 22.° ja contempla os casos de responsabilidade ohjectiva, portanto, tambérn a responsabilizaçao do Estadocorn base em factos lIcitos e nAo so na culpa. Mas aquestão não está clara, pois o prOprio TribunalConstitucional, num acdrdão de 1990, não define

exactamente o que pensa, colocaudo como possibilidadeque este artigo possa tamhérn referir-se e prever umaresponsabilidade por factos IIcitos.

Já tinhamos apresentado, no âmbito da revisão de 1989,propostas em relacao a este artigo 22.° e o n.° 2 que propomos tern sido mais ou menos admitido, embora tambérnhaja discussão em relaçao a isto, on seja, a responsahilidade do Estado abrange também as omissôes ou acçôesno exercfcio das funcöes administrativa, polItica, jurisdicional e legislativa, nAo sendo, no entanto, de sufragar urnparecer da Procuradoria-Geral da Repiiblica, de 1976, querefere que o artigo 22.° sO diz respeito a responsabilidadeno exercicio da funçAo administrativa.

Por isso, embora haja bastos argumentos que justificamque. o artigo hoje já inclua a responsabilizacao por oulrasfunçöes, mesmo assim, preferfamos que isso ficasse clanficado a nivel da Constituiçao da Repablica.

0 Sr. Deputado Pedro Roseta, que hoje não pode esterpresente, referiu na apresentação do seu projecto — e eupenso que é a partir dal que tern de se analisar este artigoe as propostas a incluir — que não tinha incluldo na suaproposta para o artigo 22.° a funçao poiftica, urna vez queconsiderava que era rnuito mau que, por exemplo, OsDeputados pudessern ser responsabilizados pelas suas opiniöes e por aquilo que faziam no exercfcio da sua funçao.

Ora, esta afirmacâo parte de urn pressuposto: que oartigo 22.° contemplará sempre uma responsabiliadadesolidéria do Estado corn os titulares do OrgAo, corn osagentes. Sendo embora uma questão muito discutida, entendemos que a methor interpretação do artigo 22.° — eisto tambérn tern a ver corn a responsabffidade dos jufzes — e que, em princfpio, ha uma responsabilidade solidana do Estado corn o titular do Orgão e por isso mesrno0 que, a partir daqui, hO quem defenda que o artigo 22.°sO diz respeito a responsabilidade por factos ilfcitos, havendo casos em que, corn carOcter excepcional, essa responsabilidade não é solidOria, 0 exciusiva por parte doEstado.

Esses säo aqueles casos em que a Consfituição afasta aresponsabilidade, são os casos dos Deputados e são, cornalgumas excepcoes, os casos dos rnagistrados judiciais,porque a responsabilidade destes jO estO referida na Constituiçao, remete para a lei e 0 afenida nos estnitos termosem que a lei estabelece essa responsabiidade. E que entenderfamos que era muito mau que se fosse caminhar pordeterminados caminhos,. cdrno aconteceu em ItOlia, queiniam causar graves problemas a funçao de julgar.

Portanto, para nOs, o artigo 22.° quer exactamente dizer que hO, em pnincIpio, responsabilidade solidOria, porque isso se destina a um reforço dan garantias do lesado,mas hi casos excepcionais em que a responsabffidade doEstado 0 urna responsabilidade exciusiva. E quais serãoesses casos? P&m-se, e isto tern a ver corn a nossa proposta, algumas questoes a nfvel dessa responsabilidadeexciusiva, por não estar clanificado o artigo 22.°

JO tern sido decidido que existe responsabiidade porfalta de serviço, que é, e continua a ser, uma responsabilidade baseada na culpa, embora nao possa determinar-sea culpa de uma determinada pessoa man do Orgao, do entepiiblico em si. Nesse caso, a responsabilidade por falta deserviço — aliOs, consagrada no direito frances, no alemão,no espanhol, suponho, e no italiano —0 exclusiva e ternde ser admitida porque não pode determinar-se urn mdivfduo como responsivel e, assirn, não hi, efectivamente,responsabilidade solidiria.

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A responsabilidade exciusiva existe também naquelescasos em que a própria Iei exclui a responsabilidade dotitular do cargo.

Propomos para o n.° 3 do artigo 22.° a consagraçäo naConstituiçAo da responsabilizaçao do Estado e das demaisentidades piiblicas pelos prejufzos causados a outrem porfalta de servico a tal falta de serviço que a jurisprudência já ádmitiu estar consagrada no actual artigo 22.° — etanibém por deficiente funcionarnento dos seus servicos.E aqui, como é óbvio, entra a veiha questao da morosidade da justica. em que os prejuIzos causados não podemser assacados aos juizes — quando podern, estAo cobertospela lei, porque são aqueles casos de negligência gravfssima, dolo, etc., etc., mas isso está consagrado.

Propomos também que se consagre a responsabilidadedo Estado pelo risco criado pela süa actividade e aqui,como é dbvio, Srs. Deputados, compreenderão que a cansa mais próxima desta proposta está na veiha questão dosangue contaminado e entendemos que isto deve ser consagrado na Constituição.

E tudo, Sr. Presdidente.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Lembro que aV proposta do Sr. Deputado Pedro Roseta foi apresentada

ontem.Tern a palavra a Sr.a Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.a Margarida Silva Perefra (PSD): — Srs. Deputados, penso que a exegese deste artigo 22.° está exausti

V vamente feita pelos diversos Deputados subscritores dasdiferentes propostas em apreciação e sintetizaria aquilo queme parece mais liquido nesta questao, ou seja, o facto deo artigo 22.° parecer referir-se mais concretamente, maisincidentemente, a responsabilidade por factos ilfcitos, porquanto refere o regime da soljdaliedade, mas não excluiurn princfpio geral do Estado de direito, alias; decorrentedo próprio artigo 2.°, já aqui sobejamente referido, querpela Sr. Deputada Odete Santos quer pelo Sr. DeputadoAlberto Martins, princfpio esse segundo o qual o Estadoe responsável pelos prejuizos causados ans cidadãos. V

A pergunta que you fazer está, concretamente, na sequência da intervencão do Sr. Deputado Alberto Martins,que apresentou a propósta do PS.

Esta proposta rernete para a iei Os CSOS e termos. daresponsabiidade objectiva do Estado e demais entidadespdblicas e nós sabemos que muita da doutrina que, emPortugal, e bern — falo a tftulo pessoal e do meu pontode vista—, tern sustentadoa existéncia de uma responsabilidade objectiva do Estado considera, apesar de tudo, umadelimitaçao de critdrios para a responsabilidade objectivado Estado, ou seja, diz que essa responsabilidade existeonde os actos provoquem, por hipdtese, urn dano sensivelou onde a sua relevância seja também, cia própria, manifesta. V V

V

V Assim, gostaria de saber por que remetem para a ieiordinéria a explicitaçäo deste critério e se, por outro lado,é vosso entendimento que, nos termos do texto constitucional, da economia, digamos assim, principiológica daConstituiçAo, resulta que a responsabilidade do Estado estáapertada ou espartilhada por critérios que, alias, são ad-

V

mitidos por urn autor tAo atento a esta questAo corno é ocaso do Prof. Gomes Canotilho.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Pedro Passos Coetho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): — Sr. Presidente,muito rapidamente e para major clarificacAo, gostaria deacrescentar is fundamentacao que fiz inicialmente que entendo — modestaxnente, como nAo pode deixar de ser —que a responsabilidade por factos lIcitos já está de certamaneira prevista constitucionalmente, na medida

V

em quese prevê, como jé o disse, o direito a indemnizar, por partedo Estado, por exemplo no caso de expropriaçoes. Portanto, estamos a falar de factos licitos e nAo de uma responsabilidade mais difusa de urna entidade ptiblica ou deurn drgao ptiblico; alias, dado o espfrito conformador danorma constitucional, dificilmente dc nAo caberia aquitambém no espfrito do artigo 22.°

Em segundo lugar, e ao conträrio do que disse aSr. Deputada do PCP, penso que seria desejável se nAose caminhar nesses termos, pelo menos, ponderar bern oque levou a Itélia, em 1988, a prever alguns nfveis dëimputabilidade aos jufzes.

V

Corn certeza que essa é urna discussAo que faremosmais a frente e nAo vale a pena estar a antecipá-la muito,rnas nao admito, em teoria, que uma norma constitucionalque visa proteger os interesses dos particulares constituaurn travAo para a imputabiiidade de responsabilidades solidérias — mas nAo necessariamente e apenas solidárias —relativamente aos titulares ou aos agentes que provocamtais danos.

Nessa medida, sustentaria, nesta fase, que me parecerazoávei não criar urn nfvei de responsabilidade tAo objectiva e espartilhada para o exercfcio da funcAo jmisdicional que ponha ern causa nôrneadamente a sua independência, mas del a considerar que — e estamos apenas afalar em sede de responsabilidade civil e nAo penal ondisciplinar — actos ou ornissöes que acabam por

V

se revelar gravemente danosos ao cidadãos, criando uma situacão de injustiça, não permitarn a imputabilidade e a culpado titular desse actos, vai urn grande passo.

Ora, isto significa, portanto, que parece ter toda a pertinência manter esta discussão em aberto pam esses artigos, o que, de resto, necessariamente, ter-se-á de fazer namedida em que o próprio PCP traz is colaçao uma funçãopoiftica. do Estado que entronca, desde logo, corn a definição que o nosso texto constitucional tambdm consagra,por exemplo, pam as imunidades parlamentares, e por. affora. Nesse sentido, penso que valia a pena manter <> para esta discussão, mais is frente, na ConstituicAo.

Para terminar, quero dizer apenas que nao entendo cornmuita clareza o que é que o PS pretende corn este. n.° 2,na rnedida em que seria sempre de prever que a lei pudesse estabelecer Os termos da responsabilidade do Estado ou a consequência dessa responsabilidade. Não vejo quese acrescente alguma coisa de substaicial àquilo que oactual artigo 22.° já poderia permitir, mas admito que possatrazer alguma outra clarificaçAo que, em qualquer caso, naoestou a vislumbrar. Portanto, de certa maneira, a fechar aminha intervençAo, gostaria de instigar o PS a esciarecerurn pouco melhor o alcance desta proposta.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.’ Deputada Odete Santos.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, muitobrevemente, gostaria de clarificar uma aflrmaçAo que, secaihar, nAo resultou clara da minha exposicAo.

Entendernos — e não somos s6 ntis, pois ha a doutrinaque o defende e ate jurisprudência —, no caso da falta de

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serviço, quo o artigo 22.°, estabelecendo como princIpiouma responsabilidade solidária, admite a responsabibdadeexciusiva do Estado e essa responsabilidade coloca-se sobremaneira em relacao a funcâo legislativa, poiftica e jurisclicional.

Em relação a questAo da responsabilidade no âmbitó dosactos politicos pode conceber-se que esses prejuizos exisEarn e ate vem consagrada urna responsabilidade especialnum artigo anterior, relativo a declaraçao do estado de sftioe estado de emergência.

Relativamente a responsabilizaçao dos juIzes, o artigo218.° da Constituiçao já contém, em nosso entender, eremetendo para a lei, as excepçoes perante as quais osjuIzes podem ser responsabilizados. Mas a regra tern deser aquela que g4rante a independência dan magistraturas,pois os juIzes nao podem ser responsabilizados pelas suasdecisöes.

Aqui, o cidadão — e pedi a palavra para referir estaquestão mais expressamente — näo fica nunca prejudicado porque o artigo 22.° admite, embora como casos cxcepcionais, urna responsabilidade exciusiva do Estado;assirn, o facto de o princIpio ser a irresponsabilização dosjuIzes pelas suas decisöes näo traz, de facto, nenhum prejufzo para o cidadâo e as nossas propostas so por forniaa clarificar que o cidadäo näo pode ser prejudicado pelaomissão do Estado, no sentido de dar os rneios necessários para que a justiça seja cClere, expedita e pronta.

o Sr. Presidente (Alineida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado José Vera Jardim.

o Sr. José Vera Jardim (PS): Sr. Presidente, Srs. Deputados: Em complemento da explicacao já dada peloSr. Deputado Alberto Martins, gostaria de acrescentar— tanto mais que isso nos foi solicitado — algo sobre oque justificou o nosso acrescento do n.° 2 a este artigo.

Sendo certo que, como já fói dito por vários Srs. Deputados — e excusamo-nos de estar a alongar muito estamatéria —, a generalidade da doutrina entende que o facto dc vir consagrada no actual artigo 22.° a responsabilidade solidária corn os titulares dos órgâos, funcionérios ouagentes no exclui tambCm a responsabilidade ilnica doEstado, no entanto, pareceu-nos iltil clarificar esta situaçäo no texto constitucional.

Embora eu nao conheça — mas talvez possa haver —doutrina que limite o artigo 22.° a uina responsabilidadepor culpa, em todo o caso a redacção do n.° 1, que é correcta, a nosso ver, poderia levantar a dévida sobre a possibilidade de o Estado ser so dc o responsável e se-b semculpa.

Daf que nos tenha parecido importante, apesar de tudo,estabelecer nurn n.° 2 urn princfpio da responsabilidadeobjectiva do Estado. Não se quis avançar rnais na qualificacAo ou 1105 pressupostos, nos casos em que existe responsabilidade objectiva do Estado, pois entendemos quedeve ser a lei a tratar disso.

Por outro lado, a doutrina jé vem adiantando, cornodisse a Sr.a Deputada Margarida Silva Pereira, alguns qualificativos no sentido de, de algurn modo, restringir estaresponsabilidade objectiva aos casos graves de dano considerável para o cidadAo e deve ser nesse sentido que alei se ira orientar, se houver urna diploma regulador destamatéria, no futuro, e esperamos que venha a haver!

0 nosso objectivo foi tAo-somente o de que na Constituiçao se consagrasse expressaniente a existência de urna

possibilidade do responsabilidade objectiva do Estado,deixando para a Iei, para a jurisprudCncia e para a doutrina o tratamento e a densificacao dos casos e dos pressupostos em que esta responsabiidade objectiva deve terlugar, sendo certo que ha, corn certeza, urn largo consenso no sentido dc que esta responsabilidade objectiva nAodeve ser admitida em termos tAo ainpbos que o Estado sejaresponsável por todas as minudências que possarn acontecer ao cidadAo, pois nAo 0 isso que está em causa.

o que está em causa, isso sim, são casos jé aqui chamados a colacao e que nos dltirnos anos tern dado muitoque falar e que escrever e relativamente aos quais os tnbunais estão a debruçar-se, nao sO em Portugal corno tambern noutros paIses europeus, polo que nos pareceu mmportante que se visassem estes casos corn essespressupostos e não outros.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Pedro Passos Coetho.

o Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): — Sr. Presidente,gostaria de agradecer o esciarecirnento que foi adiantadopolo PS.

Penso que nAo ha ddvidas quanto ao consenso de quenão podemos, sob este , atirar para a responsabilidade objecdva do Estado rnatOnias que dificilniente ihepoderAo caber.

No entanto, mantenho e reafirrno a ideia que me pare-cc urna interpretaçAo dernasiado afunilada do prOprio artigo 22.° ápontar apenas para uma responsabilizaçAo objectiva do Estado em forma solidéria, nAo permitindo aquiqualquer abertura que, no entanto, parece ser reconhecidapor alguma doutrina quanto a imputabilidade directa dosagentes que são titulares dos OrgAos.

Isso parece-me extraordinaniamente importante, narnedida em que, quando colocarmos as questôes de saber,em termos polIticos, junisdicionais e administrativos, comoé que essa responsabilidade objectiva tern consequência,norneadamente para Os titubares dos cargos, corno 0que, por exernpbo, na funcAo junisdicional e legislativa ebapode materializar-se, entAo, 0 mais difIcil encontrar urnconsenso em bei ordinária do que em sede de leifundamental.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada ‘Odete Santos.

A Sr.a Odete Santos (PCP): —0 Sr. Deputado JoséVera Jardim disse que nAo conhecia doutrina que referisse que o artigo 22.° apenas dizia respeito a responsabilidade por factos ilIcitos. Ora, eu gostaria de referir que estaquestao tern sido muito discutida e as soluçöes iiao sãocoincidentes. Alias, a referCncia que a Sr.a Deputada Margarida Silva Pereira fez para os princfpios do Estado dedireito...

0 Sr. Alberto Martins (PS): — NOs dissernos o con-trério...

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Ah!...

0 Sr. Alberto Martins (PS): — Referirnos a reponsabilidade per factos Ilcitos... Consideramos, de facto; queo texto constitucional jé abre essa possibilidade, já per-mite essa leitura.

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A Sr.u Odete Santos (PCP): — E que ha doutrina queno entende assirn e Cu gostaria de a referir, porque oSr. Deputado José Vera Jaidim disse que não a conhecia.

De tacto, a questao nao assirn Lao clara e aproveitopara referir-ihe as posiçöes de Fausto Quadros, para quem,

a celia akin-a, era claro que isto já inclufa a responsabilidade por factos lIcitos mas, em 1989, mudou de opiniao edisse que <>.

Gostava tambérn de referir o conseiheiro Dimas deLacerda, que defende que isto não inclui a responsabiidade por factos licitos e, por ditimo, uma tese de mestrado do Dr. Rui Medeiros, sobre a questAo da responsabilidade civil do Estado, em que defende que o artigo 22.° sórespeita a responsabilidade por factos ilIcitos, apresentando uma grande profusão de argurnentos.

Portanto, ha uma sdrie de divergências quanto a interpretacAo deste artigo.

o Sr. Luis Sd (PCP): —Logo, temos de alterá-lo!

o Sr. Presidente (Almeicla Santos): Born, aproveitoeste hiato nos pedidos de palavra para dizer que temos deter consciência que estamos perante ama das matérias maiscomplicadas do direito näo sO português mas do direitotout court.

Creio quo nnguém se pode considerar suficienternenteespecialista em matéria da responsabilidade objectiva, quefoi sempre deiicadfssima, superdelicada, e a matdria daresponsabilidade do Estado reflecte todas estas deicadezas e mais algumas.

Devo dizer que, em meu entender, a expressäo que estdno artigo 22.°, , quer por acção quer porornissAo, dispensaria, provavelmente, toda esta discriininaçäo da responsabilizacAo legislativa, jurisdicional, administrativa e polt’tica.

Porérn, a teoria dos actos polIticos tern também Os seusmelindres e tenho receio que, começando nOs a discrixninar demasiado, sobretudo sern rerneter para a lei ordinána, isso tenha outras implicacôes. Alias, sempre estranheique o artigo 22.° não remetesse para a lei, pois a Constituiçao remete para a lei tudo e mais alguma coisa, masnesta matdiia tao delicada e complexa limita-se a enunciarpnincfpios vagos.

De facto, ninguém, ate hoje, foi capaz de fazer uma leisobre esta matéria, nern estou a ver que seja fad faze-b.Desaflo qualquer Deputado a tentar fazer uma lei sobreesta matéria, mas nao é fäcil sO corn esta onientaçäo — eujd o tentei, tal como o Deputado José Vera Jardim.

For outro lado. temos de reconhecer que, em matériada responsabilidade junisdicional, o artigo 218.° remete paraa lei, cria a regra da irresponsabilidade e diz <>. Aqui näo se ressalva, peloque ha, desde logo, uma contradicão.

Quanto a responsabilidade polItica, isso é muito cornplicado. Tradicionalmente, a rosponsabilidade polItica éuma responsabiidade eleitoral, perante o eleitor, e não meparece que possamos fazer facilmente urna lei a responsabilizar urn governo. E possfvel encontrar excepçöes, poractos politicos, mas. . -

A prOpria responsabilidade legislative, se não 6 circunscnita ao mbito da inconstitucionalidade, o que 6? 0 Deputado pode ser responsével por fazer urna lei que, nãosendo inconstitucional, lese os direitos de aiguém? Ou a

Id 6 retroactiva quando a Constituiçao prolbe a retroactividade, por exemplo, mas, nessa altura, viola a Constjtuiçäo, ou ela é contrária a Constituiçäo e ha mecanismosde fiscalização. Mas, entrelanto, a lei pode ter sido cum’prida e executada e, entAo, pode bayer responsabilidade,mas tern de ser a lei a dizer que 6 este o domfnio, pois deoutra forma, vejo muita dificuldade em estarmos a encomendar acrescentos, especitIcaçoes, scm termos a claraconsciCncia das consoquências do facto.

Creio, pois, quo esta matéria justifica tuna de duas coisas: que chamnemos aqui urn ou dois especialistas, roputados corno tal nesta maténia — mas, provavelmente, mesmo esses não terão ná ponta da lingua todos osesciarecimentos de que necessitamos —, ou, entAo, quo sepeça urn ou dois pareceres sobre esta matéria a urn civilista e a urn publicista, para nos basearmos neles.

Porérn, tenho a certeza quo qualquer especialista quechamemos aqui refenird as enormes dificuldades quo teremos em consagran isto no texto constitucional, sobretudoscm rernissão para a loi. Aids, so alguma coisa aqui sojustifica é quo so refira ...

Sinceramentç, creio que temos de ser inuito prudentesnesta matéria o näo estou a ver que estejamos habilitados,nenhurn do nOs — e não estou a atnibuir a nenhum dosmeus amigos nada quo näo atribua a nurn prdpnio —, ecorn condiçöes para estar aqui a introduzir estas precisôesscm termos clara consciência do alcance delas, pois, amanhä, isso poderia levar a interpretacöes terriveis.

Responsabilidade legisiativa fora da inconstitucionalidade? Onde é que estd? Como? Como é quo so pode responsabilizar urn Deputado quo fez uma lei quo besa urndireito? Mas como é quo pode lesar urn direito so a lei 6vinculativa e tom o direito de revogar a ici anterior, salvoo caso da tal rotroactividade ou da tal inconstitucionalidade no porfodo em quo cia ainda não foi declarada? Sinceramonto, nao vejo!

Quanto a rosponsabilidade poiftica, born, se não foroleitorai... Responsabilidade civil por actos politicos?...

Quanto a responsabilidade administrativa, sirn, alias, issojá estd clarificado mas, sincoramente, torço-me todo pordentro perante estas inovacöos, apesar de admitir que tai

seja eu particuiarmonte sensfvel a este assunto. Jaontom disse ao Dr. Pedro Rosota que nunca poderomosfalar om responsabilidade do Estado peranto as vItimàs decrimes. Então, comno e? Urn indfviduo comete urn crime eo Estado 6 quo 6 responsdveb perante as vitimnas? Näo! Terné de garantir-so as vftirnas o diroito a uma indernnizacaoou a urna compensação. Agora, o Estado ser responsdvelem rosultado do actos de outrorn, quo. ole nao controla, sOpor que não ha suficiente nOmero do polIcias na ma ouporquo as lois ponais deviarn son <> o säo assim?Sinceramnento, isto bole corn a minha sensibilidade juridica e corn as minhas proocupaçoes mais profundas.

Ora, assim sendo, you colocar ao Dr. Rui Machete, logoque ole cheguo, o probloma do saber se ha ou nao conveniência em se podirem dois pareceres sobro este assunto,que creio ser urn born princfpio. Mas, sincoramente, estoartigo causa-me algumas apreensöos.

Tern a palavra o Sr. Deputado AntOnio Marques Mendes.

0 Sr. António Marques Mendes (PSD): — Sr. Pre-sidento, em pnincfpio acoito ossa sugestão do ouvinnos alguém. Não soi se seria rnais vantajoso pedirmos urn parecer escrito ou...

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o Sr. Presidente (Alnieida San Los): — Creio que urnparecer escrito seria mais reflectido do que uma informaçäo verbal.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Mas talvezpudesse no abordar alguns dos aspectos que nós, aqui,na discussão, poderemos suscitar.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sim, sobretudo,porque provocamos determinados tipo de questöes... Porisso, creio que seria born chamarmos urn ou dois especialistas.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sirn, talvezseja, primeiro, de pedir urn parecer escrito resumido e,depois, perante...

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Creio que podemos começar pela informaçao verbal e se o proprio achasseque precisava de urna investigaço para pôr tudo por escrito, tudo bern.

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Acho queera urn assunto sobre o qual devfamos ponderar, ate porque esta matdria é muito complexa.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): Sim, d muitocomplexa, por isso temos de ter muito cuidado porque,caso contrário, ainanhä responsabiizam-nos por não termos meditado profunda e suficienternente nesta matdria.

Tern a palavra a Sr.R Deputada Odete Santos.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, pareceu-me antever da sua intervenção que não aceita que possahaver casos de responsabilidade exclusiva.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não, não! Nãome pronunciei em concreto sobre nada.

De facto, pode haver reponsabilidade exciusiva do Estado, isso d dbvio, pode haver responsabilidade objectivado Estado e a’ regra será a solidariedade corn a subjectiVa... Isto tudo, muito bern; agora, scm remissão para alei?! E que ninguOm a fará...

Dc qualquer forma, não me promrnciei em concretosobre isso e ate acho que pode haver responsabilidadeexciusiva, objectiva e subjectiva...

A Sr. Odete Satos (PCP): — Ernbora talvez seja urnpouco dificil descortinar aqui exemplos muito profusos deprejufzos e responsabilizacao por actos polIticos, perguntoao Sr. Deputado Almeida Santos se, por exernplo, a declaraçäo de estado de sItio ou de emergência, que ocasiona ou pode ocasionar, como é evidente, graves prejufzospam cidadAos, deve ou não dar lugar a responsabilizaçãodo Estado. Alias, essa foi a nossa proposta pam a Constituição de 1976, apesar de, de certa maneira, ter sido entendido que isso já está coberto pelo artigo 22.°, pelo quea nossa proposta era sO no sentido de clarificar isso.

o Sr. Luls SO (PCP): — Depende do acto politico e dafunçao polItica.

O Sr. Presidente (Airneida Santos): — Scm dtivida!0 problema C que também jO está previsto o abuso depoder. Os cSrgãos de soberania que intervêrn na suspensão

do exercIcio de direitos tern essa competencia, mas nãopodem abusar dela, Portanto, isso tambéni jé está pievisto.

São possIveis algwnas clarificaçoes, mas julgo que precisarnos de aprofundar esta rnatCria corn especialistas, queirão, porventura, chamar-nos a atenção para a delicadezadesta matCria.

Sobretudo, o que eu penso é que ha aqui uma falta derernissâo para a lei, a qual vai ser torrnentosarnente tentada e, porventura, nunca feita, porque ate hoje nunca nmguCrn se atreveu a faze-la, pois não C fécil. Alias, devodizer que já tentei, e não sou dos rnais tirnoratos emmatéria de arrojo legislativo, mas não me senti capaz dea fazer; precisava de mais tempo e rnesrno assim não seise o tempo chegaria...

V

Dc qualquer maneira, penso que, por agora, podemosficar por aqui; depois, podernos voltar a esta matCria, setivermos de ouvir aqui, corno espero, urn ou dois especialistas que dirâo se ha ou não tanto a recear como eujulgo. Logo veremos!

V

Srs. Deputados, creio que podemos passar a discussäodo artigo 20.°-A.

Tern a palavra o Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

0 Sr. Pedro Passos Coelho (PSD): — Sr. Presidente,gostaria de direr que, ernbora em local bern diverso, sousubscritor de uma proposta que determina tambCrn o recurso de amparo pam o Tribunal Constitucional, que e apmposta de urn artigo novo, o 28(1°-A. Portanto, julgo quese C esta a rnatCria que vamos discutir, faria todo o sentido incluir a minha proposta.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Então, esta matéria ficaré para o prOxirno dia, para permitir a distribuicão de mais este artigo.

Entretanto, creio, podemos passar a discussão do artigo23.°, sobre o Provedor de Justiça.

V

Para apresentar a proposta do PSD, tern a palavra oSr. Deputado AntOnio Marques Mendes.

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Creio que a justificaçao destaproposta é clara, pois, tal como acontece corn todos ostitulares de cargos ptiblicos, o perfodo de exercIcio defunçöes deve ester lirnitado pelo tempo que a lei deterininar.

E apenas esta a nossa sugestAo, que, creio, C evidente.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Raul Castro.

O Sr. Raid Castro (Indep.): — Sr. Presidente, Srs. Dcputados: JO que se trata da primeira proposta de alteracaoque apresentérnos, gostaria de dizer que o projecto de revisão constitucional n.° 11 C subscrito apenas por mirn, masisso não C uma realidade. Dc facto, sO IC consta o meunorne por exigências do Regimento, não se tratando de urnprojecto individual inns, sirn, colectivo, da iniciativa daIntervencao DemocrOtica.

No entanto, não seria possIvel, dado o Regimento, designO-lo corno projecto da ID e por isso figura em meunorne, apesar de, repito, não ser urn projecto individual emuito menos rneu.

Quanto as duas alteracoes propostas, quero dizer queelan estão ligadas entre si, porque tern urn denominador

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166ii sEui — NUMERO H — RC

comurn, no sentido de fortalecer os poderes do Provedor

de Justiça.o que é fundamental na designacao do praio do man

dato por urn perlodo de sete anos — ou seis, ou cinco, isso

para nds pode ser objecto de discussão — é que seja urn

prazo suficientemente largo para permitir urna certa esta

bilidade no exerclcio das funçoes. Alias, no projecto do

PSD a questao do prazo 6 remetida para a lei, mas nds

fomos mais longe, estabelecendo ma Constituição o prazo

efectivo de duraçao do mandato do Provedor de Justiça.

Por outro lado, no n.° 4, trata-se de ir ao encontro de

urna aspiração repetidamente expressa pelo prdprio Pro

vedor, no sentido de as suas recomendaçOes nâo ficarem

corno letra morta e de ele poder saber, através da obriga

ção constitucional, quai as medidas que foram adoptadas

no seguiniento das suas recomendaçöes.Trata-se, por isso, corno 6 evidente, de urn meio de

fortalecer o papel e as funçoes do Provedor de Justiça, que,

repito, está também ligado ao prazo de duraçäo do man

dato, tudo no sentido de fortalecer uma entidade que tern

tido urna actuação, como 6 geralmente reconhecido entre

nds, altaniente meritdria.

o Sr. Presidente (Airneida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Cardoso Martins.

o Sr. Cardoso Martins (PSD): — Sr. Presidente, apresento apenas uma proposta de alteraçao dos n.° 2 e 3, pas

sando o n.° 3 para n.° 2 e o n.° 2 para n.° 3, corn o funda

mento que, do men ponto de vista, 6 simples e linear.

A Constituição tern a sua estrutura interna como urn

ediffcio, seguindo urn método e nina ldgica cornumniente

aceites, evoluindo o seu articulado do mais geral pam o

menos geral, do mais importante pam o menos importan

te, da definiço para o concreto, do primeiro para o se

gundo, e assirn por diante.Ora, do meu ponto de vista, também em relaçâo as

partes, aos capftulos e aos artigos deve seguir-se a mesma

tdcnica; per isso, entendo que o n.° 3 deveré passar para

n.° 2 e este para n.° 3, porque primeiro define-se o órgäo,

Provedor de Justica, e depois qualifica-se e caracteriza-se

a sua actividáde.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Alberto Martins.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, quantoa proposta do PSD, devo dizer que isso jA 6 necessariarnente assim; alias, o Estatuto do Provedor 6 matéria dereserva absoluta da Assembleia da Repiiblica, havendo, per

isso, uma exigência .de lei, quer formal quer material, e

aqui ate se poderia entender que nao seria ate corn esta

exigência de reserva absoluta, pelo que este acrescento näo

traz nada de novo e creio que é dispensável.

Quanto a proposta do Sr. Deputado Raul Castro de queo mandato do Provedor seja de sete anos, devo dizer que

ele actualmente 6 de quatro, podendo apenas ser reeleito

nina vez. Assim, a lógica deste. perfodo 6 de consonncia

corn o tempo de legislativo e não se ye que, sendo oProvedor urn drgão dependénte da Assernbleia, não tenha

urn perfodo de vigCncia correspondente ao perfodo do

órgäo que the dá origem.Quanto ao dever de informar o Provedor das medidas

tomadas no seguirnento das recornendaçöes que Ihes fo

rem dirigidas>>, creio que essa é uma das crfticas regular-

mente feitas, ou seja, de que no ha injuntividade nasrecomendaçöes do Provedor. No enlanto, já hoje, na lelordinária, no dever de cooperaçäo, o Provedor tern o direito de pedir informacao e, mais, este direito de pedirinforrnaço está legalmente sancionado.

Portanto, digamos, que já ha urn hoje no textolegal quanto a este dever de cooperacao. Alias, na lei ordinaria, o dever de cooperaçäo implica responsabilidadecriminal e disciplinar.

Assim, julgo que também esta proposta não traria nadade novo relativamente a lei ordinéria e ao que emana dotexto constitucional.

Relativamente a proposta do Sr. Deputado CardosoMartins, devo dizer que ela 6 interessante, porque, de facto, o Provedor é inserido aqui como órgão de garantia dosdireitos fundarnentais, de garantia da Constituiçao, definindo o n.° 2 a actividade e o n.° 3 o que é o Provedor. Portanto, a alteração proposta parece-me Idgica, correàta eadequada. pois primeiro deve dizer-se o que 6 e depoisque funçao desempenha.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Miguel Mkcedd.

o Sr. Miguel Macedo (PSD): — Sr. Presidente, rnuitobrevemente, gostaria de dizer que discordo do Sr. DeputadoAlberto Martins e tentar realçar aquilo que 6 o contetidoiltil da nossa proposta de alteraçäo.

Julgo que, ao contrário daquilo que o Sr. DeputadoAlberto Martins disse, näo C assim flecessariamente, poismao está na lei a proposta que fazernos de alteracao aoart.igo 23.°De facto, hoje, nada impede que o Provedor de Justica,

nâo tendo esta lirnitação constitucional de flxaçao de urnprazo para o seu mandato, näo tenha mandato no exercicio das suas funcöes. E dare que, dir-me-ão, não 6 assim,nina vez que a lei fixa o mandato por urn perfodo dequatro amos para o Provedor de Justiça. Assim 6 em rigormas, näo havendo esta determinaçäo constitucional, o queC verdade C que nada impede que seja o contrário e o quequeremos assegurar 6 que, de facto, nos termOs constitucionais, o Provedor de Justica tenha urn mandato, qualquerque ele seja, naturalmente de acordo corn aquele queactualmente vigora na lei aprovada em 1991.

Já agora, aproveito para dizer que estou de acordo corno reparo que o Sr. Deputado Alberto Martins fez em relação ao projecto de revisao constitucional n.° 1 1/VI, doSr. Deputado Raul Castro, na rnedida em que a lei de 1991,que determina as competências do Provedor de Justiça, fixacorn clareza quais as obrigaçoes dos drgaos e agentes daAdministração Piiblica, bern corno os crimes e procedirnentos disciplinares em que incorrern, quaisquer que eles Se-jam, no caso de incumprimento das disposiçoes legaisprevistas.

Portanto, julgo que, aqui sim, 6 excessive o acrescento queC proposto no projecto de revisão constitucional n.° 111W.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado António Fiipe.

O Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, ao contrCrio das ültinias intervençöes que foram feitas, peco apalavra para exprimir a nossa sirnpatia relativarnente aalgumas propostas que são feitas, designadamente no projecto de revisäo constitucional apresentado pelo Deputadodi ex-Intervenção Democrática.

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Actualmente, o mandato do Provedor de Justiça d definido através da lei ordinária, que estabelece urn mandatode quatro anos, renovével pot urna vez, e nan vernos qualquer objeccäo, antes pelo contrério, que seja a propriaConstituiçäo a estabelecer o mandato, ate pelas razöes queo Sr Deputado Miguel Macedo, h pouco, referiu.

Dc facto, a lei estabelece o mandato, corno poderá nãoo fazer porque a Constkuicäo não o determina e, portanto, nao haverá meihor soluçâo para resolver esse problema que não seja a ConstituiçAo determinar, ela própria,como faz em relaçao a outros drgaos do Estado, a duração do mandato do Provedor de Justiça.

Tambdm vemos corn alguma simpatia a possibilidadedo mandato tinico, näo renovável, embora de duraçAo superior aquela que existe actualmente. Devo dizer, quasecomo preâmbulo a- todas as outras consideraçoes que faço,que entendo que a funçao do Provedor de Justiça tern sidodignificada pelos vários titulares deste drgäo, ao longo dosiMtimos anos. Ternos tido exemplos de intervençöes mentórias dos Provedores de Justiça no exercfcio das suasfunçöes, isto é, de uma independência que podemos considerar exemplar.

Pensamos, também, que aão tern contribuldo muitoparaa dignificação do Estatuto do Provedôr de Justiça outrosdrgaos do Estado, nina vez que .não tern correspondido,designadamente, a recomendaçöes on a pedidos de inforrnaçäo que säo feitos pelo Provedor de Justiça e que väoficando, em muitos casos, incumpridos.

• Mas, posto isto, a vantagem e a simpatia corn que yemos esta hipótese de urn mandato ilnico tern a ver corn ofacto de esta fOrmula permitir afastar qualquer suspeicãoque pudesse existir de que urn qualquer Provedor de Justiça se detenninasse, ao longo do seu pnimeiro mandato,o objectivo de assegurar a sua reeleicao. Portanto, pelomenos em pnincfpio, este aspecto da reeleiçao podenia levar a interpretaçöes desse tipo.

Assirn sendo, a fixacäo de urn mandato tinico näo renovável cortaria pela raiz essa possibilidade, na medida emque o Provedor de Justica não teria qualquer hipOtese dereeleicao e, portanto, desempenharia as suas funçoes corntotal independCncia e sem ter qualquer possibilidade delimitar ou autodeterminar a sua actuacão por qualquerobjectivo de manutenção des suas funçOes. Parece-nos,pois, que esta seria urna grande vantagein da adopçäo destaproposta.

Por outro lado, näo considerarnos que exista qualquerproblema relativamente a coincidência corn a legislatura.De facto, o mandato C de quatro anos e, por isso, emprincIpio, coincidirá corn a legislatura da Assembleia daReptiblica, que C o Orgão que o designa, mas, sendo oProvedor de Justica urn Orgâo independente, nada obrigaa que assim seja e, portanto, nao haveria qualquerinconveniente em haver coinidência entre a legislatura daAssembleia da Repiiblica e o mandato do Provedor deJustica.

Sr. Presidente, pam não - tar de pedir de novo a palavma,tecia ainda uma outra consideraçäo, que me estava a escapar. Creio que C bastante pertinente a proposta de consagrar explicitamente o dever de informação ao Provedorde Justiça das medidas tomadas no seguimento das recornendaçöes que ihes forern dirigidas

Já não C a primeira vez que esse assuntô se discute etern sido dito que esse dever de informação resultarC dodever de cooperacão corn o Provedor de Justica, já estabelecido no n.° 4 do artigo 23.° da Constituicao; Contudo,

parece-nos que a prética tern demonstrado que este deverde cooperação nan tern sido entendido por outros drgäosdo Estado, designadarnente pelos Organs e agentes daAdministração Piiblica, como traduzindo-se neste dever deinformacão.

Entèndemos que, de facto, esse dever de informação ternestado incumprido. Ha urn exemplo recentissimo de urnpedido de esciarecimento formulado pelo Provedor deJustiça ao Ministdrio da Educaçao, acerca do problema dosfuncionários não docentes nas escolas, em que C invOcadoo prazo de 15 dias para a resposta, isto é, para urna informaçäo sobre as medidas a tomar na sequência daquela•diligência do Provedor de Justiça. Todavia, já passaram,vilrias vezes 15 dias sem que esse dever de inforrnacaotenha sido cumprido!

Exemplos destes näo faltam, razão pela qual nos pare-cc que teria toda a pertinência que este explfcito dever deinformação pudesse constar do texto constitucional.

o Sr. Presidente (Alnieida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Raul Castro.

o Sr. Raul Castro (Indep.): — Sr. Presidente, pretendoresponder a algumas crfticas que me foram feitas, mandepois da intervenção do Sr. Deputado AntOnio Filipemuito do que tencionava dizer já está dito.

Simplesmente, ainda queria acentuar, relativamente ann.° 4 do artigo 23.°, que o que estil aqui nada tern a yencorn o facto de o Provedor poder insistir em solicitar inforrnação sobre as medidas, pelo contrario, estabelece urnacoisa diferente: o dever de os Orgaos e agentes da Adrninistracao Ptiblica informarern o Provedor dan medidas quetomararn. £ uma coisa totalmente diferente do que já existena id e, per isso, afigura-se-nos que as duas medidas propostas, quer o mandato Cnico, quer a inforrnação sobre asmedidas, são realmente novas, inexistentes actualmente eque teniam interesse pam fortalecer a autoridade e a eficácia do Provedor de Justica.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado José Magalhâes.

o Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, a densificaçao da norma que foi aditada na Citinia revisão constitucional, sendo din Si mesma nina iniciativa virtuosa,coloca dois problemas, o maior dos quais C, para rnirn, amedida exacta ou o cuidado para não deixar de fora algoque seja muito significativo. Qualquer aditamente tende aser urn reforco e nina consolidaçao do estatuto constitucional do Provedor de Justiça e, por isso, houve consenso,na ilitima revisão, em torno do que se estatuiu quanto aodever de cooperação.

Neste ponto, creio que o problerna C o de que este deverde cooperação tern muitas dimensöes, sendo, provavelmente, uma dan mais importantes o dever de prestaçao. expedita, fiel, pronta, nigorosa e total de documentos, no momento em que qualquer processo se abra, bern como o decooperacão quando haja, per exemplo, ama inspecçäo, quetern regras prOprias, as quais mmplicam uma prontidAo enina fidelidade na aquiescência a quaisquer pedidos doProvedor. Todos estes deveres já cabem no actual quadroconstitucional, isto C nao concebo que alguérn possa icr,no actual quadro constitucional, por parte da burocraciaadministrativa, qualquer fundamento para recusar tudo oque refeni ate agora.

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168 II SEKEE — NUMERO 8— RC

A niesma coisa se apJica a urn outro poder extraordi

nararneiite importante, que é o de ordenar a comparência

dei1ualquer hurocrata nos servicos do Provedor de Justiça, virtualmente em qualquer ponto do territOrio nacio

nal, nao apenas para trazer documentos mas tambdm paraprestar depoimentos orais. 0 Provedor de Justiça tern essepoder, nos termos da Iei.

0 Sr. Deputado Miguel Macedo está surpreendido, mas

é verdade! A lei de 1991 consagra isso e ainda mais: emcaso de incumprimento, a sancã.o prevista, legalmente, d

maxima, ou seja, crime de desobediancia e processo dis

ciplinar.Portanto, a quest& está em que essas outras dimensöes,

designadarnente quanto ao poder de intimacão para cornparência e quanto ao segundo poder que referi, são, pelomenos, tao importantes — se caihar, porventura, ate

mais — como aquilo que poderiamos chamar follow up, ou

seja, o acompanhamento das medidas que tenham sidotornadas no seguimento de recomendaçoes.

E que, antes do nascimento ha o parto e, antes do par-to, a concepção. Ora, é corn a concepcao que estou preocupado, neste caso —- passe a metéfora bioldgica —, e nãoapenas corn o cumprimento das recomendaçöes. Seria,pois, de ponderar uma fdrmula que tivesse em conta este

ciclo biológico.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): Tern a palavrao Sr. Deputado Alberto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, queriaapenas fazer algumas ligeiras precisOes, que decorrem dasrespostas que foram dadas, nalguns casos, a intervençãoque fiz anteriormente.

Começaria pela questAo do inciso >, proposto no projeto de revisão constitucional do PSD. Penso que já é assim — e esta não d urnaquestAo muito importante —, uma vez que o artigo 167.°da Constituição refere: <

nia e do poder local, bern como dos restantes drgãosconstitucionais ou eleitos por sufrágio directo e universal.>>

A Assembleia da Repiiblica legisla sobre o estatuto dosdrgaos constitucionais sem quaisquer lintites e, portanto,pode fixar o tempo que entender para este drgao constitucional. Este ponto C, por isso, dispensavel.

Quanto a questão, levantada pela proposta de revisãoconstitucional do Sr. Deputado Raul Castro, de a Provedor de Justiça ter urn dnico mandato de sete anos, evidentemente que C uma opção lixar na Constituicao o tem

po do mandato; C uma opção legftima corno outra qualquere pode ter alguma utilidade.

No entanto, de acordo .com a soluçäo que existe hoje,

o mandato C de quatro anos e o Provedor de Justiça podeser reeleito uma vez, por igual perfodo. Assim, a legitimação do Provedor faz-se de quatro em quatro anos e dcnão pode ter uma aetuação tendo em vista urna eventual

reeleicao, porque está sujeito a nina maioria de dois terços. Segundo a alfnea i) do artigo 166.c da Constituiçao,

a Assembleia elege-o por maioria de dois tercos dos Dcputados presentes, desde que superior a niaioria absoluta.Portanto, ha uma legitimação que é acrescida e maior doque a soluçao que é aqui apresentada.

A ideia. de apresentar urn rnandato delco, por urn periodo de sete anos, pode ser considerada alternativa, mas

não corn o argumento do acrdscirno de legitimaçno, porque este existe de quatro em qualm anos. 0 Provedor Creeleito urna vez, ou seja, tern de ser reeleito, näo passan-.do automaticamente para o segundo mandato,

Quanto a questAo do dever de infonnar, diria que nãotenho nada a acrescentar a intervenção do meu colega JoseMagalhaes; limito-me a lembrar que se varnos elencartodas as regras do clever de cooperaçao — o artigo 29.° ternseis ndrneros quanto ao clever de cooperaçao, face ao Provedor, dos outros drgaos —, entäo, as drgãos e agentes dasentidades pdblicas tern os deveres de esciarecimento, deinforrnaçao, colaboração, abrir-se a inspecçöes, enviardocumentos, cumprir restriçöes legais, responder em prazos por escrito, comparecer na Provedoria. 0 incumprirnento injustificado destes deveres envolve medidas denatureza criminal e legal.

Portanto, se so vamos salientar este dever de cooperacäo, isto em vez de ser urn mais, como pretende oSr. Deputado Raul Castro — a intençAo percebe-se e Cadequada —, pode vir a ser urn menos. Teria, pois, de serencontrada uma solucao que envolvesse todos os aspectosdo dever de cooperação e não apenas este.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,damos por discutido este artigo, pelo que varnos passarao artigo 23.°-A (provedor ecoldgico).

Para o apresentar, tern a palavra a Sr.a Deputada IsabelCastro.

A Sr. Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente,Srs. Deputados A nossa proposta de apresentaçAo de urnnova artigo, criando a figura do provedor ecológico, retoma antigas propostas nossas, no ârnbito da revisão constitucional de 1987, e projectos de lei que apresentCmos nanIV, V e VI Legislaturas, em 1985, 1988 e 1992, respectivarnente.

Por que razão insistirnos na apresentação deste projecto, que, alias, nunca conseguimos ver passar na Assembleia da ReptIblica? Precisarnente, porque e nosso entendimento que a figura do provedor, enquanto defensor dosdireitos dos cidadãos junta dos Orgäos detentores dos poderes pdblicos, tern toda a sua validade e está instituIdana maior parte dos pafses europeus.

Em nossa opiniäo, essa figura pode e deve — C isso quetentarei defender — ter contornos diferenciados nos diver-sos paises, sendo possfvel a sectorização da sua intervenção. AliCs, ela nasceu nos pafses nOrdicos e, inicialmente,esteve associada as questöes militares. Pensamos, pois, quea sua sectorização se justifica plenainente, porque o direito a urn ambiente de vida sadio e ecologicamente equilibrado C, nos termos da Constituiçãa da Repdblica Porteguesä, urn direito fundamental — se nao o. C noutrasconstituicöes,. na nossá é!

Hoje, e este não C sO o entençlimento dos >, felizrnente, o ambiente C urn factor estruturantede todo a desenvolvirnento social. Ele tern a ver corn asegurança, corn a sadde e corn o prOrio direito a vida edaf que, em nossa opiniao, haja Lode a vantagem em autonomizar esta figura. Corn isto não queremos dizer queestarnos a banalizar a figura dos provedores. AliCs, algunspartidos tern, tarnbCrn, defendido muitos outros provedores para diferentes Créas, embora, curiasamente, não notexto constitucional.

Mantemos que o provedor do ambiente — au, como Cpor nOs designado, o provedor ecológico — tern todo o

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cabimento. Tal não significa esvaziar de conteudo o Provedor de Justiça. No fundo, constatando a multiplicaçäo dos problernas ambientais e a sua complexificacao,entendemos que se justifica plenamente que haja urnacompanhamento especffico para estas questöes. Alias,se observarmos Os relatórios do Provedor de Justica, yerificamos que, no nilmero de processos entrados, asquestöes ambientais surgem corn muita frequência, constituindo parte significativa na classificaçao dos procesSOS dos direitos fundamentais alvo de queixas dos cidados.

Lembro, por exemplo, que em 1992, no âmbito do direito ao ensino, deram entrada 3 queixas; quanto ao direito a informaçao tambdm 3 e 1 quanto aos direitos politicos; em questöes de direitos fundamentais, dureito aoambiente e qualidade de vida, elas constitufam 96 procesSOS.

Posto isto, particularmente num pals como o nosso,onde como se sabe e infelizmente — a lei não é cumprida e o Estado, ele próprio, se permite ser o primeiroviolador da legalidade e o poluidor por exceiência, entendemos que faz todo o sentido que se crie o provedor ecológico.

Lembraria ainda que a responsabilidade civil, emboraobrigatória, nao d real, bern como o facto de estar porregulamentar, embora estando previsto no artigo 46.° daLei de Bases, o crime ecoldgico para Os atentados que,pelo seu especial relevo dtico, o justifiquem.

Tambdm o Cddigo Penal, apesar das mdltipias ilusöesque lançou, no fundo, nao semeia modificaçoes significativas em termos das questöes ambientais. Recordo que odireito do ambiente, como disciplina jurfdica autdnoma, dainda insipiente no nosso pals.

A justiça, pela sua morosidade e ientidäo — alias, játivemos oportunidade de abordar esta questAo a propósitode outros artigos —, é consensualmente assumida comofortemente limitadora do acesso dos cidadãos e, em Portugal, embora haja uma directiva comunitéria, cujo limitede transposiçAo tambdm já passou, o acesso dos cidadãosaos dados sobre ambiente ainda no existe.

Em conclusâo, pensamos que esta proposta de criaçAode urn provedor do ambiente, que, alias, em 1989, foidefendida pelas duas coligaçôes distintas que concorreramem Lisboa, nurn planeta onde, em nosso entendimento, näoherdárnos a terra dos nossos avds, antes a pedixños emprestada aos nossos Iilhos, faz todo o sentido, e cada vezmais, a criacao cia figura do provedor ecológico.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado José Vera Jardim.

o Sr. José Vera Jardini (PS): — Sr. Presidente, esta durna questao recorrente e tern-me cabido a mirn falar sobre cia. Certamente por acaso!

Risos.

Se VV. Ex. lerern as actas da pendltima revisão constitucional, contando a tiltima, chamada cceuropeia>>, constataram que ji af se discutiu largamente esta questao doprovedor ecológico. Trata-se, portanto, repito, de urna questAo recorrente.

Creio que esta questAo tern várias canibiantes mas classificava-a, urn pouco, corno urna tentaçAo de fuga pam afrente que, em matéria de Constituiçäo, nAo devemos terou, pèio menos, devemos ter cuidado corn cia.

Nesta matéria, o ponto fundamental está, creio, no reforço dos meios e dos poderes do Provedor de Iustiça.

Corn efeito, de acordo corn o seu estatuto, etc já ternhoje a seu cargo as questOes ecológicas. E por isso quedigo que ha aqui uma tentacão de fuga para a frente. Dcfacto, as questôes do ambiente — e, neste aspecto, dou,obviamente, toda a razäo a intervençAo da Sr.a DeputadaIsabel Castro — estAo, entre nós, e ainda que ao nIvel dostextos iegais algurna coisa se ten avançado nos ditimosanos, numa fase em que é e’vidente urn enorme ddfice notratarnento dessas questöes, aos mais variados nIveis.

Mas será corn a criacao de urn provedor ecoidgico quevarnos resolver o problerna? E que, logo a seguir, cob-cam-se outros problernas: por que não o provedor dosconsuntidores? Por que nâo o provedor das muiheres? Porque nao. o provedor disto ou daquilo?! Sim, jé se faloutambém de urn provedor dos dreitos das muiheres!

o Sr: Presidente (Almeida Santos): — Seria oprovedor, é clam!

• Risos.

o Sr. José Vera Jardirn (PS): — Sr. Presidente, juigoque devernos ten cauteia nesta matéria, sobretudo porqueestamos a tratar da Constituiçao. Pode ser que a experiência nos venha a dernonstrar, dentro de algum tempo, queuma divisão, dentro da orgânica da Provedonia de Justica,pode trazer vantagens, alias, como existe nalguns palsésque tern uma expeniCncia de provedores longufssima e umaenorme tradiçao de tratamento dessas questöes, que nósainda não temos. A nossa experiCncia é boa, mas podemos dizer que ainda estarnos numa fase que nao se cornpara corn a dos paises nórdicos nesta matdria.

Portanto, hI outras formas de encarar o problema, formas essas que residem não naquilo que a Sr.a DeputadaIsabel Castro disse, ou seja, que näo contnibuiria para urnabaixainento do estatuto do Provedor de Justiça. Entendoque a proliferacAo de provedores pode, efectivamente, tercomo efeito nocivo que a figura do Provedor de Justiça,constitucionairnente consagrada, corn o seu estatuto, direitos e deveres, venha a perder algurn peso e algum estatuto.

Portanto, dirfarnos que é preciso prestar atençao a estaactividade do Provedor, as suas necessidades e, eventualrnente, no futuro — nAo dirernos que nao —, pode vir adernonstrar-se titil urn desdobramento de provedores. MasconsagrI-lo ji na Constituiçao, de imediato, criar urnnovo provedor quando este ainda se defronta corn faitade rneios, ji nAo corn falta de rneios legais, visto que,no estatuto de 1991, des foram amplarnente consagrados, alias, na sequCncia de pedidos variados dos provedores no sentido de verem reforçados os seus meios deactuacao, mas de meios materials, pessoais, etc., nâo meparece...

Penso, portanto, que nAo estanI aqui — d uma ilusão —alguma coisa que vá resolver profundarnente os proble

rnas ecoldgicos. Façamos, isso sim, aquilo que ainda nãoestI feito, como seja, por exernplo, regularnentar a acçãopopular. Esse, sim, parece-me que podera sen o insinunentomais importante em toda a maténia de defesa dos direitosambientais dos cidadAos. Agora, irmos c> cornmais urn provedor, parece-rne que senia urna ilusão que, acurto prazo, verfamos que podenia ten sido errada e, sobretudo, a sua consagraçao constitucional imediata pare-ce-me rnanifestarnente precipitada.

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170ii sERw — NuMiRO K — RC

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr. Deputada Margarida Silva Pereira,

A Sr.a Margarida Silva Pereira (PSD): — Sr. Presi

dente, depois das alirmaçöes que o Sr. Deputado José VeraJardim acaba de fazer quanto a pouca ou nenhuma eficácia prética da proliferacao dos provedores, pouco mais

tenho a acrescentar sobre esta matéria.Gostava. no entanto, de referir dois aspectos, tendo o

prirneiro a ver corn o perigo que me parece advir de urna

seriacao de provedores e, neste caso concreto, da apresen

taçao de urn dnico provedor sectorial no texto constitu

cional. Ternos outros problernas igualniente carentes de re

soluçao e estou a pensar na questAo das crianças em riscoe, também, no problema dos deficientes, seguramente que

não no das muiheres, Deus me livre! As muiheres não

precisam de provedor nenhum e, permitam-me que apresente o rneu mais veemente protesto...

o Sr. José Vera Jardim (PS): — Houve quern o tivesse mencionado!

A Sr.a Margarida Silva Pereira (PSD): — Não o men

cionel, Sr. Deputado. Sei que jarnais o faria!

o Sr. José Magalhães (PS): — Quanto muito uma promotora, Sr. Deputada..

A Sr.a Margarida Silva Pereira (PSD): — Pior ainda,Sr. Deputado! Essa, entAo, d uma concepcäo do maior

machismo que existe ao cimo da terra!

o Sr. José Maga1hes (PS): — Não a sustentei,Sr. Deputada!

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Foi ama graçaminha, mas não passou disso!

A Sr.a Margarida Silva Pereira (PSD): — E nós rimos!

Risos.

Sd que as actas näo sublinhavam bern...

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Gosto delevado a sério, mas nao sempre! V

A Sr.a.Margarida Silva Pereira (PSD): — Sr. Presidente, as actas podiam näo sublinhar bern aquilo que e,realmente, este ambiente dptimo que estarnos a ter aqui.

o problema, para além da questAo de fIrndo da proliferação dos provedores ‘e da sua vantagern dentro da economia do texto constitucional, e, de facto, a inversäo de umafilosofia de base que nos preside, relativamente a estamatdria.

Ha preocupaçöes humanisticas na Constituicao: ela baseia-se no princfpio da dignidade da pessoa hurnana e, pormais e maor que seja 0. respeito que nos merecem asquestöes do ambiente — e todos estarnos, seguramente,muito mais atentos a elas do que estávarnos há UflS anosatrés —, ha outras questôes hurnanas que tangern a dignidade, o estatuto e o livre desenvolvirnento da personalidade de cada urn ou, pelo menos, as possibilidades desselivre desenvolvirnento e tenho muito receio que a introducäo de urn proveddr do ambiente pudesse ser tomadacomo ama inversao desses valores que estão em causa.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Pedro Passos Coelho.

O Sr. Pedro Passos Coelho (PSD: — Sr. Presidente,queria apenas dizer que tenho simpatia pela ideia. Dc resto, faço também urn certo acto de contriçao, pois a JSDjá defendeu, embora sern proposta material de revisãoconstitucional, a criacao da figura do provedor de justiçamilitar e damos a > no sentido de queacabámos por ficar convencidos de que o que pretendfarnos assegurar ou garantir, de facto, iria ficar menos salvaguardado, não apenas por urn estatuto de excepção que,no que respeita a prdpria instituicao niilitar, näo seriadesejável, mas, sobretudo, na medida em que a banalizaçao constitucional da figura do provedor, corn certeza, deixaria c.cbe1iscada. a sua forma de intervençao, que nAo éjurisdicional.

Portanto, quero apenas dizer que, se bern que todo odireito de peticao, em termos constitucionais, deva seroptiniizado, scm qualquer .limite — não faz sentido que,constitucionalmente, haja qualquer restriçäo aos direitos depetição —, a verdade é que estar a criar, em Iei, outrasfiguras de menor peso ou dignidade constitucional on,então, banalizar constitucionalmente essas figuras, acabana por retirar algum efeito ao prdpnio\direito de petiçao.

Nessa medida, era capaz de ser mais razoAvel que aprdpnia Provedbnia de Justiça, na sua organização interna,cniasse a especializacao que a realidade impöe e ate, eventualmente, por que não, urn provedor-adjunto para a éreado ambiente, que é perfeitamente legitimo e a matéria esuficientemente importante para o justiflcar.

EnIlm, ha solucöes, no âmbito daquilo que constitucionalmente já está consagrado e na figura do Provedor, quepermitem atender meihor as preocupac&s aqui expendidas.

0 Sr. Presidente (Airneida Santos): — Tern a palavraa Sr.’ Deputada Isabel Castro.

A Sr.’ Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente,Sm. Deputados: Quero fazer alguns breves comenténios relativamente a esta proposta, que, alias, nao é nova, comoo não SãO Os argurnentos que a contrariam.

Diria, tao-sd, que a banalizaçao da figura do Provedor,em verdade, pelo rnenos por nós, não é constitucionalmentedefendida. Talvez o seja eleitoralmente, man são outrospartidos que tern defendido a proliferaçäo de provedonias,designadamente as do idoso, da criança, da muffler e dosprdprios deficientes.

Portanto, parece-me que essa critica não d pertinenterelativamente ao Partido Ecologista Os Verdes, porque,efectivamente, sustentarnos e defendemos urn provedor doambiente desde 1985. E porquC . este e sd este e nuncaoutro? Jé tentei explicar isso, man, repito: de facto, o direito do arnbiente, corno disciplina juridica autdnoma, ternurn percurso ainda muito curto e parece-nos que a fragilizacao, digarnos, das questöes ambientais, comparativarnente corn muitas outran areas, d dbvia.

Por seu lado, os direitos de petiçao e de acção popular,como é evidente, são importantes, man, em nossa opiñiao,complementam esta proposta, não a excluem nem a contradizm.

Quanto a questao de saber• porque o ambiente e se odireito ao ambiente C mais valonizado do que outros,quero dizer que nos repontamos ao ambiente por outras ra

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14 I)E OUTtJHR() LW 1994 171

z&s, nomeadamente porque o direito ao ambiente tern aver corn o direito a vida e parece-nos que o direito a vidaé, pot si so, suficientemente importante e tern urn valorético passIvel de Ihe ser atribulda outra valoraçäo.

De qualquer modo, os argumentos da cctradição longas.,que já forarn invocados a propdsito de outros artigos, designadamente dos que tinham a ver corn a discrlminacaodas muiheres, parecem-nos ser argurnentos perversos, porque fazem-nos cair, muito facilmente, no ixnobilismo, noacomodar e na permanente cristalizaçao de opinioes. Porisso mesmo, fläo permitem aquilo que, em nossa opiniao,era suposto esta revisão constitucional permitir, ou seja,O aprofundainento dos direitos dos cidadAos, a consagração de urna noya geração de direitos que manifestamentecontinuam a encontrar grandes obstáculos, os quais, maisdo que politicos, parecern-nos ser culturais e de mentalidade.

Ainda em relaçao ao Provedor de Justica, e para terniinar, como já dissemos, é evidente que tern tido urna acção extremamente importante. 0 facto de ter recebido tantos processos nesta area — e já referi os mimeros —sign±fica, por urn lado, que os problemas se multiplicarne, por outro, que a Provedoria tern atenção em relaçao aeles.

No entanto, a menos que queiramos fazer de conta quea realidade não é o que é, ha constrangimentos orçamentais e no staff do prdprio Provedor de Justiça que, obviamente, numa area que exige uma resposta tdcnica altamentecomplexa, tornarn a Provedoria de Justiça, corn as lirnitaçöes que tern, incapaz de responder cabalmente àquilo que,em nossa opinião, se mantdm em aberto.

O Sr..Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Raul Castro.

o Sr. Raul Castro (Indep.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta proposta do Partido Ecologista Os Verdesmereceu algurnas criticas, norneadarnente a de se invocara proliferaçäo de provedores.

Ora, näo nos parece que essa crItica seja fundada, porque no projecto de revisâo constitucional, segundo cremos,näo aparece mais nenhuma proposta de criaçâo de qualquer outro provedor.

Por outro lado, quando Os prdprioS crfticos da proposta.referem que seria preferivel que, dentro da Provedoria deJtistiça, se criasse urna secçao especializada que pudessetratar dos problemas ecoldgicos, parece-me que estão, cornisso, a reconhecer que, efectivamente, isso näo existe e,portanto, o provedor ecoldgico teria razão de ser.

Pela nossa parte, sugerfarnos apenas a Sr. DeputadaIsabel Castro que trocasse a ordem dos ndrneros constantes do artigo 23.°-A, isto é, que o n.° 2 passasse a n.° I eo n.° 1 a n.° 2, pois parece-nos uma ordem muito maisprdpria do que aquela que aqui está. De resto, a propostaapresentada pelo Partido Ecologista Os Verdes tern a nossa concordância. V

0 Sr. Presidente (Airneida Santos): —Born, Srs. Dcputados, parece-me que a provedor do ambiente, antes decomeçar a resolver os problemas do ambiente, tern deresolver as suas próprias dfficuldades, porque, de urn modo

V

geral, a orientacao parece ser a seguinte: urn provedor doambiente poderia ser encarado corn alguina simpatia — euprdprio, devo dizê-lo, o encaro desse modo —, rnas naoao nivel da sua constitucionalizaçao.

Pessoalmente, sou sensivel a essa posiçäo, porque, enquanto a constitucionalizaçao da figura do provedor Secingir a urn provedor da justiça em geral, isso não constitui obstáculo a que existam outros provedores na lei ordinéria e jé forarn propostos o provedor do ambiente, odos idosos, o da criança e nâo. sei se niais alguns. Mas,na medida em que consagréssemos urn provedor sectorial,aI, sirn, poderia perguntar-se. por que não Os outros. EntAo, pareceria que o legislador constituinte sO teria querido urn provedor gendrico e, depois, urn provedor sectorial.

Portanto, o problerna que se coloca d o da constitucionalizacAo, rnas parece-me que, ao nfvel da Iei ordinéria,seria bastante iltil urn provedor do arnbiente. Esta é aminha posiçAo pessoal e nao prejudica a de mais ningudrn,rnesmo que seja do rneu partido.

De facto, julgo que a constitucionalizaçAo sucessiva devários provedores poderia ser negativa, sobretudo tendo nosurna experiência tAo restrita ou tao liniitada como temosainda relativarnente a Provedoria de Justiça em geral.

Vamos, agora, proceder a apreciaçAo do artigo 24.°O CDS-PP non est hic e, corno tal, nAo pode apresentar asua proposta, mas ela é de urna clareza transparente.

A Constituicao, no n.° 1 do artigo 24.°, refere que a vidahurnana d inviolável e o CDS-PP propöe que se aërescente <>, ou seja, no fundo,pretende que concordemos corn a proibiçAo constitucionaldo aborto.

Esta matéria foi mais do que discutida, mas, em todo ocaso, darei a palavra a quern pretender intervir a este propdsito.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, permite-me...

0 Sr. Presidente (Alrneida Santos): — Tern a palavra,Sr.’ Deputada.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, añtes defazer a minha intervencAo, e d claro que corn o CDS-PPpresente isto seria rnais ifiteressante, pois, rnuito possivelmente, poderfarnos fazer urna reediAo breve da Conferência do Cairo...

Risos.

mas, antes de intervir, gostaria de saber se nAo Sena pâssfvel charnar o Sr. Deputado Luls Fazenda, que jáesteve aqui, pois ele tern uma proposta para o artigo 26.°,n.° 4, correlacionada corn esta questAo rnas precisarnentecorn a perspectiva oposta, ou seja, a constitucionalizaçaoda interrupçao voluntéria da gravidez. Isto é, gostava desaber se nAo consideram que estas propostas podeniarn sendiscutidas em conjunto.

0 Sr. Presidente (Ahneida Santos): — NAo, Sr.’ Deputada, parece-me que nAo. Elas tern alguma atinência masnão tanta que justifique a sua fusAo. Depois discutiremosa outra proposta. V

Tern a palavra a Sr.’ Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.’ Margarida Silva Perefra (PSD): — Sr. Presidente, parece-me que não vem a caihar ester aqui a espraiar abundantemente esta rnatéria e, naturairnente, represento aqui urn dos partidos que votararn jé aspossibilidades de interrupçao voluntaria da gravidez em

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172ii sEiiw — NUMERO 8— RC

sede de legislacão penal e, portanto, é muito claro o que

pensamos sobre esla inatéria.De qualquer modo, parece-me que ha uma grande van

tagem a urn grande mdrito interpretativo nesta propost

relaliva ao artigo 24.°: é que 0 CDS-PP torna clam, de

ma vez por todas, qua, afinal de contas, näo é absoluta

mente nada liquido — pelos vistos, nem sequer na sua

prdpriä concepcão — que possa retirar-se do texto consti

tucional a inconstitucionalidade do aborto. 0 simples fac

to de terem chegado a conclusäo de que é preciso istosignifica que, afinal de contas, entenderam que o grande

lastro doutrinário e jurfdico no direito português ti consi

derar que o entendimento legislativo sobre a vida humana

näo coloca em pratos idênticos da balanca a vida depois

do nascimento completo e corn vida e a vida intra-uteri

na, por malor qua seja o respeito jurfdico, independente

mente do respeito ético, como d óbvio, que ela nos possa

merecer.Portanto, gostava muito de sublinhar o mornento histó

rico-constitucional que representa a inclusão esta proposta

para o artigo 24.° 0 CDS-PP, definitivamente, vern dei

xar de considerar que as normas sobre o aborto säo nor

mas inconstitucionais.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada Odete Santos, einbora seja a segunda vez

que fala sobre o assunto.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Näo, nao, Sr. Presidente,

a minha primeira intervençAo tinha a ver corn uma ques

tao de metodologia.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Eu percebi,Sr.a Deputada. Era apenas uma graça.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Dc qualquer modo,

Sr. Presidente e Srs. Deputados, parece-me que näo é ne

cessdrio fazer aqui tuna reedicão de outras discussöes.

Quero apenas assinalar que, de facto, depois do acer

dão do Tribunal Constitucional, no âmbito da fiscalizaçao

preventiva da constitucionalidade do diploma da Assem

bleia da Repiiblica sobre interrupcão voluntária da gravi

dez, considero que ficou claro que, na verdade, a Consti

tuicao da Reptiblica Portuguesa protege a vida intra-uterina,

independentemente de isso se discutir. Alias, o Tribunal

Constitucional, por maioria, decidiu que sim, isto ci, que o

preceito da ConstituicAo da Repdblica Portuguesa protege

a vida intra-uterina, mas entendeu que o nivel dessa pro

tecçao teria de ser deixado para o legislador ordincirio.

Portanto, daf nao decorria automaticamente que a lei da

interrupção voluntciria da gravidez fosse inconstitucional.

Parece-me que o CDS-PP também näo se quis aqui

debruçar sobre questôes de ciência mcidica e sobre se, de

facto, já existe vida, em sentido medico, nesse momento,

pois para o direito a questAo é muito diferente. Efectiva

mente, o objectivo do CDS-PP foi apenas urn: concluir, a

partir daqui, pela inconstitucionalizaçäo da lei da interrup

çäo voluntciria da gravidez.Alias, a este nIvel, convém referir que, pela Europa, estd

a assistir-se a algumas convulsöes — umas, em nosso en-

tender, em sentido positivo, como é o caso recente da

Espanha, outras, em outros paIses, em sentido negativo —

e é sintomático que isto se tenha centrado tudo na Confe

rência do Cairo, que, penso, não teve por finalidade pre

ver o aborto como meio de controlo dos nascimentos.

Não foi essa a sua finalidade, mas, efectivamente, os

representantes da Igreja Catdlica conseguiram desviar uma

discussäo que seria muito interessante e deveria ser feita

sobre os problemas da superpopulaçao do mundo. Lamen

tavehnente, em minha opiniao, tudo foi desviado para

aquela questAo.Corn esta proposta pretendia passar-se para aquilo que

ci rejeitado pelos mais ilustres penalistas, que e o seguinte:ainda que, na sequência do acórdAo do Tribunal Consti

tucional, se considere que o actual artigo 24.° cia Constitui

çao jé dispöe sobre protecção cia vida intra-uterina, ainda assim, Os pnncfpios por que se regula o direito penal — os

princIpios da subsidiariedade e da proporcionalidade — re

jeitarn, em definitivo, que a questao da interrupção volun

téria da gravidez tenha uma protecção penal como o CDS

-PP exige. A prtipria vida hurnana e a integridade ffsica,

segundo estabelece a Constituiçao, säo invioláveis e, no

entanto, o direito penal tambcim contcim exclusôes da ffi

citude, em certos casos de violaçao cia vida huinana, mes

mo depois do parto.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): —. Born, Srs. Dc

putados, tudo indica qua näo vamos ter urn caso de in

constitucionalidade superveniente, pelo que varnos passar

ao artigo seguinte.Peço ao PCP qua proceda a apresentacAo da sua pro

posta de alteraçäo para o artigo 25.°

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, peço des

culpa, mas, relacionada corn este artigo, temos támbém a

proposta jé apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Roseta.

o Sr. Presidente (Aimeida Santos): — Exacto,discuti-la em seguida. Não sd se a deveremos discutir na

ausência do Deputado Pedro Roseta, mas se varnos rca

peitar as ausências, nunca mais andarnos para a frente.

Tern a palavra o Sr. Deputado Antonio Marques Mendes.

0 Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presi

dente, pretendia apenas urn esciarecirnento relacionado corn

a proposta do Sr. Deputado Pedro Roseta. Creio que esta

matciria se refere a ama proposta que jci foi apresentada.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): —0 Sr. Deputado Pedro

Roseta apresentou-a, dizendo qua não poderia estar pre

sente hoje.

0 Sr. Luls Sá (PCP): — Foi a proposta relativa no ar

tigo 22.°

0 Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): —0 artigo 22.°

tern uma parte que foi relegada para discussão conjunta

corn este artigo 25.°

O Sr. Presidente (Airneida Santos):— 0 artigo 22.°?!

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sirn,Sr. Presidente.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos) — 0 artigo 22.° jáfoi discutido.

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Mas haviaurn aspecto, que era precisamente o da indemnizaçäo as

vItimas.

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14 DE 0[JTLJflR() 1W J994 ‘73

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs, Deputados,como, pot razôes óbvias, nan respeitámos a ausência doCDS-PP, tambéni me custa muito abrir uma excepção parao Deputado Pedro Roseta, porque o tratamento tern de setigual.

o Sr. Luifs Sá (PCP): — Mas ele já apresentou a proposta!

o Sr. Presidente (Almeida Sautos): — Ele já apresentou esta proposta?

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Já, já, eu ate fiz urn...

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Creio quenao.

o Sr. Luls Sá (PCP): — 3d, jd, Sr. Presidente. Apresentou-a como n.° 2 do artigo 22.°

o Sr. Presidente (Aimeida Santos): — Nos biodireitosdeu-a por apresentada...

Vozes:—Não, nao!

o Sr. Luls SO (PCP): — Foi uma proposta de urn n.° 2para o artigo 22.°

o Sr. Presidente (Almeida Santos): —Alit No artigo 22.°A Sr.8 Odete Santos (PCP): — Eu atd Ihe pedi urn es

clarecirnento.

o Sr. Presidente (Almáida Santos): — Estd bern!

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — A propostapara o artigo 22.° tern urn ntImero que se prende exactamente corn esta matéria do artigo 25.° E não d o artigo 25.°-A nem o artigo 25.°-B, porque os aditamentossão outra questAo a que depois quero referir-me.

Portanto, a proposta sobre indemnizacão e proteccao dasvftirnas jd foi apresentada pelo Sr. Deputado Pedro Roseta, mas ficou de set cliscutida depois, conjuntamente corno artigo 25.°

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Muito bern, sese quiserem pronunciar também sobre isso, façam favor.

Para apresentar a proposta de alteraçao do a.° 3 do attigo 25.°, cia autoria do PCP, tern a palavra a Sr.8 DeputadaOdete Santos.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a nossa proposta C extremamente singela, facilmente perceptfvel e vai no sentido de constitucionalizaraquilo a que, a nfvel de politica criminal, tern vindo a serdada, cada vez rnais, uma major relevância, salvo erro, apartir da 2.’ Grande Guerra, ou seja, a protecção das vftimas de crimes.

A nova politica criminal e o COdigo Penal também vãono sentido de, mesmo em relaçao a determinadas reacçöespunitivas, preferir que a punicao seja estabelecida atravdsdo pagarnento de urna indemnizacAo, a qual so sobrep5e,assim, a sancao penal normal, isto é, a multa e a prisao.

Esta tendência da poiltica criminal tern vindo a alargar-se e ha, alias, variadfssirnas resoluçoes do Conselhoda Europa, jd desde 1977, que se tern debruçado sobre esta

questAo da indemnizaçao as vftimas de crimes e tern recomendado aos paIses uma deterininada poiltica relativamente as vftimas, no sentido ate de o Estado, subsidiariamente e em determinados crimes, como C Obvio, pagar aindemnizacão, quando ela não puder ser recebida ou hajadiflculdades em recebê-Ia do agressor.

A Assembleia Geral das Naçes Unidas tambdm ternuma resoluçao neste sentido e, a nIvel dos chamados <>, contCm ate urn item sobre a criaçaode urn fundo internacional para pagamento de indemnizaçöes as vitimas desses crimes.

Na nossa legislacAo ordindria, de qualquer forma, eernbora se note essa preocupação no âmbito do CodigoPenal, creio que, não obstante o diploma que prevê oadiantamento cia indemnizaçao, por parte do Estado, asvItirnas de crimes violentos — veremos, a nfvel de discussao do ‘t)rçamento do Estado, qual foi, em termosreals, a repercussão desse diploma, mas, por alguma coisaque conheço, dO-me ideia de que a sua aplicaçao não ternsido muito grande —, a nfvel do prdprio CCdigo Penalhouve urn retrocesso relativamente a urn dos artigos doanterior Ccidigo ou, rnelhor, haverd urn retrocesso, porquefoi publicada a autorizaçAo legislativa, na medida em quese substituiu, salvo erro, o artigo 127.°, que ate apontavapara a implementação de urn seguro, apenas pela consagração daquilo que vern referido nessa lei sobre o adiantamento de indemnizaçöes as vItimas de crimes violentos.

Portanto, considero que hO urn retrocesso a nlvel delegislaçeo penal e de efectivação prdtica dos direitos dasvftimas.

TambCm C de salientar quo, estando em vigor no nossoordenamento juridico, desde 1991, uma lei desta Assembleia sobre protecção as mulheres vltirnas de crimes violentos, que consagra urna disposição que refere que seráregulada em diploma a forrna de garantir a indemnizaçaoa essas muihores, atravCs de adiantamento por parte doEstado, essa lei, desde 1991, nao teve qualquer regularnentaçao, configurando-se aqui uma ornissao legislativa quepoderia dat origem a responsabilização do Estado, no casodo artigo 22.°, que, hO pouco, discutirnos.

A nossa proposta não diz apenas respeito a questAo daindeninizacao, porque hO rnais para alCrn disso, conformeconsta dan resoluçoes do Conseiho cia Europa e cia Assombleia dan Naçöos Unidas, refere-se também a criaçaode servicos adequados a informacao e a urn acoihimentoprdprio cia vftima, atendendo ao tipo de crime.

0 diploma de 1991, que acabei de roferir, relativo asmuiheres, tambCm prove a criacao de serviços propriosjunto das esquadras cia PSP, corn pessoal adequado a fazer o acolhimento das mulheres e, efectivamente, isso naoestd iniplernentado, polo quo não hO execucAo desse diploma.

Deste modo, no seguimento das resolucoes do Consetho cia Europa e da deliberaçao da Assembleia Geral dasNaçães Unidas, quo falam em sorvicos prciprios para acothimento das vitimas, entendemos que isto devo ser constitucionalizado.

Na verdade, nan esquadras da PSP, pot muito boa vontade quo haja por parto dos agentes policiais, eles ainda nAoestAo municiados dos conhecimentos necessOrios para oencaminhamento dan vftirnas, nomeadamente das vItiniasdo alguns crimes como Os Crimes sexuais.

Assim, pode dizer-se quo, na prOtica, no nosso pals, asvitimas de crimes näo tCm ama adequada protecção eminguam os instrumentos e as politicas necessCrias a realizacäo dos direitos das vftimas.

Página 174

174n SESUE — NVMERO S — RC

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavra

o Sr. Deputado Raul Castro.

o Sr. Raid Castro (Indep.): — A proposta apresentada

pela ID, embora corn outra redacçäo, é em tudo idêntica

a proposta do PCP. Simplesmente, alude-se aqui, na nos

sa proposta, a crimes péblicos e trata-se de urn lapso, pelo

que o adjectivo .cpüblicos> deve ser eliminado. 0 Estado

protege e apoia as vftirnas de crimes que tern direito a

indemnizaçao, nos termos da lei.As razöes deste aditamento, naturalmente, säo dbvias,

e acabam de ser desenvolvidas pela Sr.’ Deputada Odete

Santos, pelo que não tenho nada de novo a acrescentar.

Parece-me que este aditamento é importanto, a consa

gracäo constitucional do apoio e protecçäo do Estado as

vftirnas de crimes que tern direito a indemnização, pare

ce-nos ser urna matdria importante. Por isso propomos

e esperamos quo venha a ter o consenso dos Srs. Depu

tados.

o Sr. Presiclente (Almeida Santos): — Tern a palavra

o Sr. Deputado José Magalhãos.

o Sr. José Magalhäes (PS): — Sr. Presidente, ontem, a

prop6sito de tuna proposta aprosentada pelo Sr. Doputado

Pedro Roseta, five ocasião do formular uma sugostao quan

to a insorção sistemática do uma solucäo quo introduzisse

urn aporfoiçoamonto constitucional no tocante a garantia

constitucional dos direitos das vftimas do crimes. Sugeri,

enteo, que seria o artigo 29.° a sode mais apropriada para

introduzir essa bonfeitoria, pois o artigo 29.° enquadra o

define normas sobre a aplicacão da lei criminal.

Quanto a formulacâo, o Sr. Deputado Raul Castro aca

ba do clarificar o sentido da sua proposta, pelo que, croio

eu, estão adiantados os subsithos bastantes para se chogar

a uma norma razoável e de apreciável significado.

A protecção constitucional das vftimas de crimes e, em

geral, a questao da protecçäo das vftimas de crimes

derarn origern, na nossa oxporiéncia recento, a infindáveis

exercfcios de retórica — corn carácter propagandfstico,

alias — por parte daquoles que foram responsáveis pela jus

tiça, pam graca e desgraça, sobretudo desgraça, nos ulii

mos anos. Mas essa retdrica, infelizmente, não se tern tra

duzido em soluçöes legais consistentes e, na parto em que

se traduziu em soluçoes logais consistentes, foi contra a

vontade do Ministro da Justiça actual e de tal forma que

a vontade do Ministro .da Justiça actual prevaleceu sobre

a lei da Assembleia da Repiiblica.E isso, e so isso, quo explica que a lei a que a

Sr.’ Deputada Odete Santos aludiu näo esteja, ainda hoje,

no que creio ser urn dos escândalos maioros em matéria

do incumprimentos da lei e do Estado fora da lei, em

Poitugal, a ser cumprida. 0 Ministro sabe quo essa lei foi

aprovada, alias, por larguIssiiño consenso na Assembleia

da ReptIblica, e não foi tomada uma sO medida para quo

a garantia da proteccão das muiheres vftimas de crimes

fosse levada a pratica.Trata-se de unia lei razoável que imita, que copia, que

se inspira num excelento exemplo e numa interessantfs

sima prática do protecçäo das vftimas, inclusivamente corn

a preocupaçAo do as tratar, do as acoiher, de as proteger

no momento de agressäo méxima ou, meihor, no momento

posterior a agressão maxima, em que o traumatismo

exige urn especial cuidado, e essa lei,- para oscândalo

geral, não é cumprida.

1% clara que o COdigo Penal sofreu o ziguezague, alias

mal discutido nesta Câmara, que conduziu a uma soluçaoestranha, bizarra, cujos contornos definitivos ainda nAoestAo definidos porque o decreto-lei autorizado ainda naofoi anunciado, revelado e menos ainda promulgado.

Portanto, he urn retrocesso em relacao ao regime geral,as lois ospecfflcas, como osta sabre as muiheres vftimasde crimes, estäo congoladas, ha disposiçôes oxtraordinári

as, aprovadas ad hoc, para a proteccäo de determinadasvftirnas de crimes ou dos seus descendentes, como 0 o casodos regimes excepcionais quo tern vindo a tutelar os pollcias assassinados, designadamente por forca de actos debanditismo e do terrorismo. Pam osses houve — e issocolhou consenso, scm excepcöos — regimes excepcionais,

mas verifique-se a aberraçAo: he regimes especiais parincumprir he regimes especiais supefl,rotectores em cuniprimento na soquência do sangue, o quo é respeitávol mas

que näo pode ser o Onico critOrio a reger a aprovaçâo delegislaçâo, e ha urn marasmo geral em relacAo aos niecanismos que, banalmente, devoriam garantir a protecçäo.

Assim, uma norma constitucional, coma born so sabe,

nao terO a virtude mágica de alterar, do uma ponada, acasmurrice ou a obstrucAo do Ministro da Justiça, que,

nesta parte, 0 especialmente inepto, insensivel, frio e desrespeitador da lei, mas terá a virtudé do reforcar o patrimOnio constitucional contra a aberraçäo da ‘governação.

E como essa nâo sorá oterna, ao que se espera, a quostAo

serO soluvol.

0 Sr. Presidente (Almeida. Santos): — Para uma intervençäo, tern a palavra a Sr.’ Deputada Odete Santos.

A Sr.’ Odete Santos .(PCP): — Sr. Presidente, quero

referir-me a proposta do Sr. Deputado Pedro Roseta, ateporque ontem foi aqui criticado o seu n.° 2 e tivç a ocasio de formular urn pedido de esclarecirnento para quedo clarificasse o sentido da sua proposta.

Dc facto, penso quo as palavras atraicoaram a ideia do.Sr. Deputado Pedro Roseta, porque a sua intoncäo era ade estabelecer urn regime de responsabilidade subsidiária

do Estado nos casos em quo as vitimas — e ole referiu quo

nao seria em todos os casos — não recebessem a dovida

indemnizaçao por parte do agressor.Ora, isso estd consagrado em numerosos instrumentos

internacionais, como ja referi, e menciono, mais expressa

mente, quo foi uma declaracão da Organizaçäo das Na

çoes Unidas que, em 1985, estabeleceu, nos seus princI

pios, essa responsabilidado subsidiária do Estado. A isto

terão de juntar-se as resolucoes do Conseiho da Europa, e

cito mesmo o item que diz:

satisfaçâo efectiva junto do agressor ou por outros meios,

impöe-se a intervenção subsidiária do Estado.>>Creio quo tore sido esse a sentido da proposta do

Sr. Deputado Pedro Roseta.A nossa proposta deixa ossa definicao para a loi, mas

advogamos a inclusäo dessa responsabilidade subsidialia

num leque do casos que a legislador ordinOrio terO dedeterminar.

Par outro lado, ainda rolativamente a desprotocco dasvItimas, quero chamar a atoncäo para o facto do que aconstitucionalizaçao do uma proposta cômo a nossa obri

garia a reformular determinadas disposiçöes, quo tern do

ser reformuladas seja isto constitucionalizado ou não, noârnbitO de urn dos fins do poiftica criminal, o do repara

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14 DE OUTUBRO DE 1994175

çäo as vIlimas, na medida em que o sisiema consagradono Código de Processo Penal para a indemnização deixahoje, no nosso pals, muitas vItimas scm reparacäo.

Tal ocorre porque se consagrou quase em absoluto oprincfpio de que era no processo penal que se devia pedira indemnizacao, tendo-se inviabilizado o recurso ao tribunal cIvel para o pedido de indemnizaçao e a inforniacäoas vftimas sobre esta clisposicao legal d feita através dasesquadras da PSP, que ihes entrega urn papel comunicando que tern urn prazo de 15 dias pam apresentarem urndocumento ao Ministério Ptiblico a dizer que nâo ternpossibilidades de arranjarem advogado. As pessoas não sãoinformadas que se nao exercerem esse direito no processopenal jé nao podem exercé-lo no tribunal dye! e o quetern acontecido — d isso tern vindo a verificar-se — acabarem por ficar, em muitos casos, seni indemnização.Assim, este sisterna tern, urgentemente, de ser revisto.Neste aspecto, o texto do antigo Cddigo era muito nielhordo que o do actual.

Para alérn disso, chamo também a atencão pam o factode as recomendacöes internacionais terem valor. Por exemplo, em 1991 o Conseiho da Europa aprovou urna recornendaçäo relativa a exploraçAo sexual, poruografi, prostituiçao, tráfico de crianças e de jovens adultos, onderefere, entre outras necessidades, a da existCncia de servicos ptiblicos ou privados a nfvel local, funcionando vintee quatro horas por dia, que prestem apoio medico, psicológio, social ou juridico as crianças ou aos jo’ens em risco e as vftimas de exploraçao sexual.

Isto d só urn exemplo, mas, de facto, nós não ternosprotecçao nem uma hora por dia, porque o apoio nas esquadras da PSP — na GNR d ate bern pior — näo é, efectivarnente, nenhum.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.’ Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.’ Margarida Silva Pereira (PSD): — Sr. Presidente, quero apenas, muito rapidamente, pedir urn esclarecimento ao Sr. Deputado José Magalhäes.

Não percebi exactamente — e pedia-Ihe qile concretizasse, se quiser fazer-me esse favor — quais são as situaçes de normas aberrantes que encontra no Cddigo Penalrelativarnente a problernática. Se bern entendi, referia-se asituacão das muiheres vftirnas de crimes. Era isso?

o Sr. José Magalhâes (PS): — Não, não,.referia-rne aoregime geral que foi aprovado no Código Penal e cujoscoñtornos s6 parcialmente discutimos na comissäo.

A Sr.’ Margarida Silva Pereira (PSD): — Mas o regime geral de quC?

o Sr. José Magalhães (PS): — Da protecçao das vItimas de crimes, do regime de indemnização.

A Sr.’ Margarida Silva Pereira (PSD): Ah!... Refena-se tao-sd as vitirnas de crimes e não as normas menminadoras? Muito obrigada., era isso o que eu queria sa- -ber.

o Sr. José Magalhães (PS): — Nao, não. 0 que sublinhei corn especial indignacão, porque deveras a sinto, foio facto de o Estado estar fora da lei no que diz respeitoespecificamente a protecção das vftimas de crimes. Se o

PSD não quenia aprovar a tel, não a aprovava! Aprovou-a,mas, como não está em vigor, é congelada. E urna situação absurda! Entao, revoguem-na e assumain o onus dessaatitude! Como a Iei não d revogada nem d activada, d urnasituação absurda.

0 Sr. Presidente (Airneida Santos): — Parece ter resultado desta discussão, que foi enriquecedora, uma certasimpatia pela consagração constitucional do direito dasvitimas de crimes a proteccão, ao apoio e ate a urna indemnização.

Parece tarnbém ter ficado claro que não deve abusar-seda referência ao conceito de responsabilidade do Estado,na medida em que voltávamos as dificuldades de hapouco. A prdpria Dr.’ Odete Santos, quando fez a sua citaçAo esciarecedora, mudou a palavra responsabilidade porintervenção subsidiária do Estado. Uma coisa é intervenção subsidiánia do Estado e outra coisa é a responsabilidade subsidiánia do Estado. Se não, voltávamos as dillculdades de ha pouco, andávamos perdidos nessa selva dodireito de responsabilidade.

Portanto, penso, corn certeza, que encontraremos umaformulaçao, ou nos moldes da proposta do PCP ou emmoldes parecidos.

A rernissäo pare a lei C absolutarnente necessCria e aredacçáo do Sr. Deputado Raul Castro, na hipdtese de ira ser a escoihida, teria de ter ainda mais urn toque porquediz assiin: <<0 Estado protege e apoia as vitirnas de cr1-mes>> (desapareceu a palavra <.cpiiblicos>>) <> Sei que este > significa <>,mas falta aqui uma vfrgula; se näo, parece que seriam sOas que tern direito e o que queremos é que elas tenhamdireito. Mas, tirando isso, esté tudo muito bern e vamospassar ao artigo 25.°-A.

Para o apresentar, tern a palavra o Sr. Deputado AntOnio Marques Mendes.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, quenia, pninieiro, suscitar uma questAo a propOsitodos artigos 25.°-A .e 25.°-B.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Pretende discutiresta maténia na presença do Sr. Deputado Pedro Roseta?

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Exacto, masquenia avançar mais qualquer coisa, Sr. Presidente.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Faça o favor,Sr. Deputado.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Tnata-seapenas de uma sugestAo, Sr. Presidente.

o texto destes artigos C uma matéria muito complexa,tal como ha pouco o Sr. Presidente refeniu, e tenho a impressão que muitos de ads mao se sentiriam muito habilitados a entrar nuni debate profundo. sobre estas questães.Assirn, a ntinha sugestAo era no sentido de saber se poderfamos adiar a sua discussão, porque, penso eu, a presença do Dr. Pedro Roseta C extremamente importante paraabordarmos esta matCria.

Gostava tarnbCm de saber se seria de encarar a hipOtese de ouvir alguérn cientificarnente qualiuicado, para dan-nos algurnas achegas.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Haveré cá alguCm ou terernos de > ao estrangeiro?

1”

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17WRW — NUJ%4ERO I — ftC

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSI)): — I3ssa é umaoutra questao, Sr. Presdente.

o que eu pedia era que discutissemos estes artigos emconjunto, quando estivesse presente o Sr. Deputado Pedro

Roseta.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): —0 Dr. AlbertoIvlartins tanibém é muito entendido nesta matéria, mas, de

facto, ti urn bocado dificil haver alguOm corn a pretens5o

de que domina os aspectos cientfficos desta questAo.

o Sr. José Magalhães (PS): — Posso fazer uma sugestao, Sr. Presidente?

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Faça favor,Sr. Deputado.

o Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, talveznão fosse abstruso que, tendo nós criado uma realidade

chamada

Vida>>, esse Conseiho fosse chamado a gastar urn poucà

• dos seus neurónios na producäo de algum parecer sobre

esta inatéria, sobre a qual fossem ouvidos todos os entes

que este entenda oportunos. Se, neste sentido, the diii

gIssemos urn offcio corn urn pedido formal de urn parecer

sobre este conjunto de normas, o Consetho poderia douta

mente ajudar-nos e, em momento ulterior, poderfamos,

eventualmente, fazer trocas de irnpress&s directas e ao

vivo corn membros do Conseiho, todos ou alguns, por

exemplo, o seu presidente, outros membros...

o Sr. Presidente (Almeicla Santos): — Sirn senhor,rno ver qual será a modalidade.

Tern a palavra o Sr. Deputado Alberto Martins.

• 0 Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, ainda na

sequência desta sugestAo quanto aos trabaihos, para alérn

do Conseiho Nacional para a Etica das Ciências da Vida,

poderfamos também convidar a depor na nossa Cornissão

o tinico português que faz parte do Comité de Etica, oV Prof. Daniel Serrao, que trabalhou na Convençâo de Bioé

tica, de onde foram extrafdas algumas destas propostas.

V 0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não ha qualquer

problerna, Sr. Deputado. V V

Vamos passar ao artigo 26.°, relativamente ao qual haV urna proposta do PS. Para a apresentar, tern a palavra o

Sr. Deputado José Vera Jardim. V

0 Sr. José Vera Jardim (PS): — Sr. Presidente, von

referir-me, sobretudo, ao n.° 1 da nossa proposta, em que

introduzirnos urn novo direito, de tipo diferente dos que

estão já consagrados na nossa Constituiçäo, mais V abran

gente, porventura de contornos menos definidos, bertamen

te de contornos menos bern definidos, mas ao qual nem

por isso falta virtualidade, e muita, no quadro dos direitos

constitucionalmente a consagrar.

E, alias, uma formula que está já consagrada nas cons

tituiçoes de alguns paises, designadarnente na Constitui

cao de Bona e na .Constituiçao espanhola, e que vern con

sagrar o direito ao livre desenvolvimento da personalidade.

Este direito tern a ver, naturalinente, corn alguns outros

que já estAo consagrados na ConstituiçAo, designadamente

no próprio artigo 26.°, mas vai para além deles e tern ra

tOes histOricas profundas, que. ainda hoje, continuam a teractualidade.

0 Iivre desenvolvimento da personalidade e urn plus quese acrescenta ao direito a idenlidade, a cidadania, a honra, ao born norne e a reputação e coihe também no seuseio noçOes que já foram levantadas na tiltirna revisãoconsthucional ordinéria, e continuam a se-b, designada

mente na proposta do Sr. Deputado Pedro Roseta, que

mantérn no seu texto o direito a diferença.Mas o direito ao livre desenvolvimento da persônalida

cle é muito mais abrangente, muito mais amplo do que o

simples direito a diferença de personalidades, a diferençade qualidades da pessoa.

Ele significou — e continua ainda a significar, designa

damente na jurisprudência das constituiçoes que o consa

• graram, sobretudo na Constituição de Bona, a Constitui

çao aleinä — o direito que tern conseguido fazer vingar

muitas decisOes que defendem os cidadãos contra o de

senvolvirnento, pelo Estado, de concepçOes porventura

rnaioritárias em detenninado mornento social mas que não

podem evitar a individualidade de cada pessoa e o direitoque ela tern não sO a desenvolver-se mas tambérn a desenvolver a sua personalidade, para alérn das concepçOes

dominantes em determinada sociedade.Este direito teve, naturairnente, razOes histOricas e é,

porventura, o fecho, a cilpula de todos os direitos que

aflrmam o indivfduo perante o Estado e perante que Estado, raz6es que são bern compreensIveis no caso concreto

da Constituiçao de Bona.Penso que a nossa Constituicão ganharia em reconhe

cer este direito ao livre desenvolvimento da personalidade,

precisamente para poder integrar, de alguma maneira, no

vos enfoques — o direito a diferenca, por exemplo — denovos direitos ou de novas rnanifestaçOes de direitos que

se vCm desenvolvendo actualmente.Naturalmente que, tratando-se de urn direito corn con

tornos especIficos, como já five a ocasião de referir, ha

que salvaguardar — e tivemos o cuidado de o fazer —,

desde logo, o problema de uma eventual colisão deste

direito do livre desenvolvimento da personalidade corn

outros direitos, direitos de outrem, ou corn outros valores

constitucionalmente protegidos.Como é óbvio, isto nAo se passa sO neste direito, pas

sa-se corn qualquer urn, mas direi que, sobretudo nurna

fase que dC contornos — e se alguma vez af pudermos

chegar fora de urn quadro jurisprudencial rico, que é o que

já existe em alguns pafses — mais definidos a este direito

de Iivre desenvolvirnento da personalidade, ha que acau

telar fronteiras estabelecidas no quadro constitucional, para

que fique claro que, näo sendo urn direito de segunda, pois

nao é disso que se trata, é urn direito que, pela sua prO

pria estrutura essencial, requer que se salvaguarde, desde

logo, a sua eventual colisão corn direitos dos outros mem

bros da comunidade. Daf que tenhamos tido o cuidado,

especialmente aqui, de salvaguardar a possibilidade de

colisão de direitos, limitando este, o que não é urna técni

ca constitucionalmente usada para muitos outros em que

também pode haver colisAo de direitos.

Penso, portanto, que, quanto ao n.° 1 do artigo 26.°...

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Posso fazer nina

pergunta, Sr. Deputado?

0 Sr. José Vera Jardim (PS): — Faça 0 favor, Sr. Pre

sidente.

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14 LW ()UTTifilO L)E 177

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — 13 uma perguntaa inim práprio, na medida em que tambám colaborel naredaccao do n.° 1 do artigo 26,°, e que é a seguinte: incluImos aqui a frase .c>. Não estAo em causa Os va1ores constituclo.nalmente>>, mas os ‘>, ou a hierarquia,no caso da colisão. Por que d que os direitos de outrem,quaisquer que des sejarn, prevalecein sobre o livre deenvolvimento da personalidade?

Estou apenas a reflectir, porque também sou responsá-vel pelo que aqui esté escrito.

o Sr. José Vera Jardim (PS): — Não são todos osdireitos de outrem, porque haverá direitos de outrem quetern, apesar de tudo, urn nivel inferior.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Valerá a penaacrescentar valores constitucionalmente protegidos mais osde outrem, quando, no fundo os de outreni SAO os que estãoconstitucionalmente protegidos?

o Sr. José Vera Jardim (PS): — E uma düvida quetern toda a razã de ser. Podemos pensar nessa formulado direito...

O Sr. Presidente (Airneida Santos): — Era so isso o queeu, -agora, estava corn tendência para e1iminar-

O Sr. José Vera Jardim (PS): — Penso que, aliés, é afOrmula... (Por nao terfalado ao microfone, nao é possIvel reproduzir as palavras finais do Orador.)

O Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): —0 PSD ternuma proposta que é igual a redacçAo actual.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não percebihem...

O Sr. José Vera Jardun (PS): — Sr. Presidente, apresentei apenas o n.° 1. Quero apresentar agora...

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, permita-me apenas uma nota para lembrar quere1ativarnente aeste Oltimo ponto, a prOpria Constituicão espanhola ternesse problema, resolvendo-o de forma sirniliar a Constituição alemã, que é a segunite: a dignidade da pessoahumana, os direitos invioléveis que the são inerentes, olivre desenvolvimento da personalidade, o respeito da leie dos direitos de outrem, são o fundamento da ordem p0-iltica e da paz social.

Ha aqui urna dificuldade evidente em estabelecer umahierarquia, mas digamos que existe a tentativa de consagrar o princfpio da autonomia, isto é, a garantia de todosos indivIduos...

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Mas desde quefalemos dos <>; se vamospara aldm, o direito ao livre desenvolvimento da personalidade fica reduzido a nada.

O Sr. Alberto Martins (PS): —0 problema, no fundo,é permitir a cada urn que eleja o seu modo de vida, desdeque não cause prejuIzo a terceiros.

o Sr. Presidente (A!rneida Santos): — Bern, levamou-Se este pequeno embaraço porque imitarmos toda a vidaos alemaes rambém é demais.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Preidente, perrnite-me justiticar o ti.0 4 da nossa proposta para o artigo 26.°?

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Faça o favor,Sr. Deputado.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, a nossaproposta é uma decorrCncia do princfpio da inviolabilidade; anteriormente, era uma decorréncia do princfpio daautonomia, o qual proIbe a imposição de sacriffcios a quernquer que seja contra a sua vontade e sempre qtie essesacriffcio não redunde no beneffcio do prOprio.

Diz urn importante imperativo kantiano, que é normalrnente rçferido na doutrina em relaçao a esta matdria:<>. V

Esta ideia de que urn indivfduo é urn tim em si mesrnoe tomando em consideraçao os seus prOprios fins tern umaimportâxcia decisiva ao nivel dos novos direitos, que sãoo que pretendemos tratar - neste nosso acrescento. Estesnovos direitos tern a ver, sobretudo, corn os novos direitos decorrentes dos répidos desenvolvimentos da biologiae da medicina e corn a necessidade de respeitar o serhurnano como indivfduo pertencendo ao género huniano,corn o que isso tern de defesa da sua identidade e dogdnero humano, bern como corn a necessidade de pOr urntravão, dentro de certos limites, que não contrarie a investigaçao cientffica a investigação biolOgica e médicaindiscriminada, pretendendo-se que os beneffcios da investigaçao cientiflca protejam as geraces futuras e não descaracterizern, no lirnite, ate o prOprio género humano.E tudo isto ern obediência àquela regra segundo a qualtemos de ser acautelados e não .ccfazer tudo o que podeser feito>>.

A nossa proposta, nesse sentido, tern urn objectivo preciso e, em grande medida, reporta-se ao pOrtico referencial da Convencao de Bioética, que esta em vias de seraprovada pelo Consetho da Europa e cujos valores que sepretendern salvaguardar se referern logo no capftulo micial: <>

Portanto, para alérn da salvaguarda dos direitos que jáexistem, pretende-se o respeito pelos principios da dignidade, da identidade e da integridade.

0 Sr. Deputado Pedro Roseta, na sua proposta, tarnbérnalude a este referencial da nossa proposta de projecto derevisão neste ponto e desdobra-o, explicando. Porérn, nOsusamos uma técuica diferente, uma vez que não desdobramos os conceitos dc integridade, de identidade e dedignidade nas aplicaçöes biolOgicas e médicas.

E certo que esta divisão poderia ser feita, desde logorecolhendo o trabalho da ComissAo, que diz que o interesse do ser humano deve prevalecer sobre o interesse dasociedade e da ciência (e uma referência muito importante),salvaguarda o princfpio de uma intervenção sempre ser

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178 ft SEIUE NUMERO K — RC

feita corn consentimento Iivre e esciarecido (o que mc

parece também uma questão fundamental) e salvaguarda

o princIpio da adequada superaçäo do consentimento dos

incapazes e das regras de intervençao mddica de urgên

cia, no sentido de ela nao poder conduzir a excessos.

Por outro lado — e nds jé temos esta salvaguarda emalgumas das nossas exposicöes legais —, considera que o

corpo hurnano e as suas partes, em nenhuma circunstn

cia, podem ser objecto ou fonte de lucro (isso é decisivo,

neste dominio) e tern ainda urn valor muito importante,

conexo corn todos estes, que d o do respeito pela vida

privada no dommnio cia sadde, que tern a ver corn o facto

de Os dados medicos que sej am recoihidos por qualquer

instituicao hospitalar, ou medico, sd possam ser mostra

dos a quem dizem respeito e, mesmo esse, tern o direito

de nAo querer saber alguns dos dados que ihe respeitam.

Surnariando rapidamente como estes princfpios se tra

duzem, a utilizacão de qualquer parte do corpo humano,

na sequência de urna intervençäo, deve ser feita corn cui

dados muito precisos, a investigaçAo cientIfica nao pode

ter como objecto a intervençao sobre o genoma humano

e, sobretudo, tern de ser feita por razöes preventivas, tera

peuticas e de diagndstico e nunca corn o fim de alterar a

identidade genética e he soluçöes e testes preditivos que

são possIveis apenas para irradicar qualquer doença.Enfim, ha urn conjunto de medidas, relativamente as

quais são aludidas sançes adequadas, no sentido de que

a identidade, a dignidade, a integridade do gdnero huma

no e ate a defesa do corpo hurnano, como ja ouvi, tenhamurna salvagurada bastante significativa.

Creio que a introdução desta rnatéria na Constituição

portuguesa d urn lraco de grande modernidade, que cor

responde a necessidades que comecam a ser sentidas,

embora algumas destas necessidades estejam já respondi

das nas raras leis que ternos sobre este doinfnio. Pordrn,

ao mesmo tempo, creio estarmos a ser devidamente pm

dentes, porque tudo o que tern a ver corn a investigaçao

cientifica não pode ser .demasiado c> pelodireito, mas alguns princfpios tern toda a razão de ser como

princfpios e referCncias que balizam as questöes decisivas

da biodtica.

o Sr. Presidente (Airneida Santos): — Peco ao PSDfavor de justificar a eclosao cia obra.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, creio que a justificação é fácil porque, como é sa

bido, a honra d urn conceito que tern, inclusivamente, ama

tradução jurfdica portuguesa e que não se confunde, ao

contrérlo do que, por vezes, poderé pensar-se, apenas corn

o born nome e a reputacão. Trata-se de algo que tern uma

certa diferença, que tern traducão, e que, por isso, que

riamos ver consagrado expressarnente.Ainda he bocado achei curioso ouvir o Sr. Deputado

José Vera Jardim, ao referir-se a vérios direitos, falar em

honra, born nome e reputacao. Como esses conceitos sãoalgo que está na nossa mente, entendernos que devem fi

car consagrados.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Para uma inter

vençao, tern a palavra a Sr.’ Deputada Isabel Castro.

A Sr.’ Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, onosso projecto visa, fundamentalrnente, introduzir, no

âmbito dos direitos e deveres fundamentais, uma nova

geração de direitos. Fiiémo-Io em relacao a alguns direilos sociais — o ambiente e urn deles — e entendemos queo reconhecimento do direito do pleno desenvolvimento ciapersonalidade de cada individuo (artigo 26.°, n.° 1) é ouIto direito pessoal.

Mas, mais do que o simples reconhecimento de urndireito pessoal, individual, procurainos assegurar o reconhecimento da livre expressao desse direito. Nessa medida,o nosso projecto, coincidindo nas preocupaçöes corn aquiloque e proposto pelo Partido Socialista, vai mais alérn, ouseja, reconhece urn direito e o direito a sua expressao, querdo ponto de vista individial, quer do ponto de vista dogrupo, constitucionalizando — é esse o nosso objectivo —os direitos das minorias.

O n.° 2 do artigo 26.° por nds subscrito decorre do primeiro e procura constitucionalizar a garantia que o Estado deve assegurar aos cidadãos, individualinente considerados e enquanto grupo, contra quaisquer formas dediscriminaçao e perseguicão.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr.’ Deputada,dá-me licença que a intenornpa?

A Sr.’ Isabel Castro (Os Verdes): — Faca favor,Sr. Presidente.

O Sr. Presidente (Airneida Santos): — Sr.’ DeputadaIsabel Castro, acho as suas proposta muito radicais, poisa prirneira diz respeito a inscrição de todas as diferenças.De todas mesmo, pergunto? Ate das negativas? Por outrolado, de quaisquer formas de discriminaçao? Mesmo aspositivas?

Gostava que esciarecesse o sentido destaá duas palavras:nurn caso, são todas as diferenças; no outro, são todas asdiscrirninacoes, mesmo as positivas; num caso, são diferenças negativas, no outro, discriminacöes positivas queestAo em causa.

A Sr.’ Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente, oque suporta a nossa proposta — a <> — tern como tinico limite aquio queconstitucionalmente possa constituir tuna barreira.

Concretamente, a livre expressao das diferenças é entendida no piano pessoal e de grupó. Poderemos falar deminorias Ctnicas, de minorias religiosas, de minorias Sexuais e so entendemos a existência de barreiras a limitaçAo cia livre expressão das diferenças quando conflitue corna liberdade dos outros indivfduos. Essa seria urna barreiraque não cabe neste âinbito e que poderia fazer sentidonoutro artigo da Constituiçao, par exemplo, quando sereferem as organizaçöes poifticas de cariz racista ou fascista.

Pensamos que essas minorias polfticas, a existirem, teriam corno limite da sua prOpria expressao o facto decolidirem e impedirem a liberdade de outrem. Näo nosparece, pois, que a questao se coloque nesse sentido.

Se se defende assegurar, individual ou colectivamente,direitos das minorias, a perseguiçAo e a discriminaçao, nosentido em que estao associadas — e estão-no —, tern amacarga negativa. Não estamos a falar, seguramente, de discrirninacôes positivas que permitam corrigir diferenças,porque aquilo que se procura neste artigo — e claramenteé esse o seu âmbito — é assegurar o reconhecimento dedireitos. Portanto, é óbvio que, no que toca ao tratar desiguahnente, de forma a garantir que a situação de desigualdade se esbata, não esté no espfrito desta proposta.

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14 DE OLITUBRO LW 1994 179

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palaviao Sr. Deputado Antonio Filipe.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Relativarnente a proposta de aditarnento ao, n.° 1 dapalavra <, apesar da explicacão dada, continuo cornalgurna dificuldade em ver, concretamente, do ponto devista da tutela desse direito, o que nao está, neste momento, coberto pela defesa do born nome e da reputaçãoe pudesse vir a estar corn a inclusâo da referência a honra.Creio que valia a pena que a questao fosse melhor explicitada para percebermos exactarnente o alcance concretodeste inciso e deste aditamento. V

Urn outro aspecto a que gostava ai.nda de referir-me terna ver corn a proposta de alteracäo ao n.° 4, apresentadapelo Partido Socialista, e que, de alguma forma, na suatemática, tern a ver corn a proposta de dois novos artigos,o 25.°-A e o 25.°-B, apresentados pelo Sr. Deputado Pedro Roseta. Parece ser uma discussao extraordiiariamenteinteressante, na medida em que esta matéria da defesa dadignidade e da integridade dos cidadãos face as possibili

• dades tecnoldgicas a nIvel genético terá a major pertinência. Isto é, näo tern ainda consagracão constitucional entre ads e é de toda a pertinência, dado o avanço datecnologia a este nivel, discutir esta matéria, o seu enquadramento juridico, legislativo e também, evidentemente,constitucional.

Sendo inequfvoco que 0 extraordinariarnente vantajoso,do ponto de vista do bem-estar dOS cidadãos e da saildepiiblica, o avanço, o progresso da tecnologia deste domInio, a questAo 0 a de circunscrever, tambOm juridicarnente,a utilização dos conhecimentos e das tdcnicas adquiridasprecisamente ao objectivo exciusivo de garantir o bern-estere a satide dos cidadãos e nâo outros. V

E hoje do conhecirnento geral — e tern sido feita vastareflexão sobre essa matdria — que esses conhecimentos

• podern ser utilizados corn outros objectivos menos meritOrios do que esses. Neste caso, de facto, o legislador ternurna responsabifidade extraordinéria. Isto é, será lIcito que,por exemplo, urna companhia de seguros possa recorrer aconhecimentos adquiridos atravOs da gendtica para salvaguardar os seus interesses perante os cidadãos segurados?

Será lfcito a uma empresa tar acesso a dados genOticossobre os cidadãos como forma de recrutamento dos trabaIhadores ao seu serviço? Não será esta, como outras, urnautilizaçao abusiva de conhecirnentos adquiridos através doavanço da tecnologia genOtica? Não poderão estes alterarsubstancialmente a própria convivência social e o relacionamento entre os cidadãos? Não poderão servir para controlar e estabelecer formas de discriminaçao social?

Parece-nos que considerar constitucionalmente estamatdria é de grande importância. AliOs, tern havido daparte de vOrias instáncias europeias, quer do Conselho daEuropa quer da prdpria Comunidade Europeia, vasta reflexão sobre ela, sobretudo ern relaçao a salvaguarda doconsentimento dos cidadãos sobre os quais possam incidirmdtodos de terapia genOtica, corn o seu esciarecirnentototal relativarnente a utilizaçao, sobre si prdprios, destesmOtodos terapêuticos e, de urn ponto de vista mais vasto,corn uma avaliaçao correcta, a nfvel social, de quais sãoos reais beneffcios destas terapêuticas e, tambérn, os reaisperigos sociais e humanos implicados.

Portanto, parece-nos interessante que, através destaspropostas, esta reflexão seja aqui suscitada.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Para urna intervcnçAo, tern a palavra o Sr. Deputado José Magalhaes.

o Sr. José Magalhäes (PS): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: No fundo, gostaria de corroborar o apelo para queo Sr. Deputado AntOnio Marques Mendes, ou outro, dabancada do PSD, pudesse ser urn pouco rnais especfficoem relacao ao sentido e alcance da consagração, nos termos em que o PSD propôe, da inclusão do direito a lionra corno tal, porque precisamos de apurar corn rigor qualé a mais-valia acrescentada.

Repare-se: no saber cornum, o hornern desonrado ou,na expressão pitoresta e tao <>, a muIher desonrada — < —, tern outeve, no direito penal português, consagraçöes sucessivascorn nina feiçAo que importa não esquecer. No actualCddigo Penal ou no Cddigo Penal em gestaçao aos tram-bolh&s por af, também tern urna feiçao especffica e gostava de ter a certeza sobre a feiçao desta inclusão ou, ate,se a sua ambiguidade näo permite cobrir feiçoes vOrias.

Algumas dessas feiçöes são francamente horrendas,desactualizadas, perigosas e podem, em vez de introduziruma mais-valia, introduzir uma grande confusão, scm prejufzo de sermos todos gente honrada e de prezarmos ahonra como tal. Agora, quándo a introduzirmos constitucionalinente, ternos de saber exactamente corn que alcance.Era isso que esperOvamos do PSD.

o Sr. Presidente (Alineida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada Odete Santos.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: 0 Deputado AntOnio Filipe jO se referiu a esteaspecto mas quero reiterar que não deve dar-se por conclufdo o debate sobre este artigo scm que haja uma explicitação mais completa desta questAo do direito a honra.0 que é este direito a honra que não 0 direito ao bornnome e a reputacão? Ainda näo ouvi essa explicitaçao e,corno não somos pacdvios e 0 possivel fazer-se logo umacorrelação entre este aspecto e o que consta da autorizacao legislativa em relação a reserva da vida privada, queremos saber o que pretendem os Srs. Deputados do PSDcorn isto. Ponhain as cartas na mesa!

o Sr. Presidente (Alineida Santos): — Srs. Deputados,vamos interromper os nossos trabai.hos, que retornaremosapds o ahnoco, as 15 horas e 30 minutos.

EstO suspensa a reunião.

Eram 13 horas e 5 minutos.

ApOs o intervalo, assumiu a presidência o Sr. DeputadoFernando Amaral.

o Sr. Presidente (Fernando Amaral): — Srs. Deputados,declaro reaberta a reunião.

Eram 16 horas e 5 minutos.

Para urna intervençao, tern a palavra o Sr. DeputadoAntOnio Marques MendOs.

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Na apresentaçao da proposta dealteraçäo ao artigo 26.°, da autoria do PSD, referi que 0sustentOvel — e tern sido sustentado — que o conceito de

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I 8()II SE1UENUMERo 8—ftC

direito a honra, hoje, nib lerá autonomização face ao bornnonie, a ieputacão, ale. Salientei, no entanto, qua se tratade urna tradiçäo, a ate invoquei a expressibo que oSr. Deputado José Vera Jardirn, na exposição que fez, re

feriu — honra, born norne e consideraçao —, uma termi

nologia inais antiga. São conceitos que, não sendo auto

nomos, estibo ligados e é a consagração desse conceito que

pretendemos; alias, a nossa legislacâo ordinéria, designa

damente o COdigo Penal, continua a usa-b.Se o Sr. Deputado José Magalhães, ou quem quer que

seja, ye nisto qualquer outra razão que aqui não esté, te

nho a dizer-Ihe que cada mu é livre de tirar as conclusöes

que quiser sobre esta e todas as outras questoes. No en

tanto, não ha qualquer razão especial ou reserva mental

na proposta de aditamento deste conceito, que, alias, taut

bern consta do projecto do colega Pedro Roseta como a

manifestacao, apenas, de uma tradiçao que pode, tecnica

mente, ser discutivel mas que é urn conceito adquirido pela

sociedade. Honra, born nome e reputação são valores que

a prdpria sociedade retém, atribuindo-ihes o seu signifi

cado,Para além da questão tdcnica relativa ao rigor do con

ceito, importa tambdm que fique expresso aquibo que a

prOpria sociedade e comunidade sentem sobre esta maté

na. Era esta a ideia que pretendia deixar expressa, que me

parece suficiente, a menos que algum colega queira trazer

mais algumas achegas, se entender serern necessérias.

o Sr. Presidente (Fernando Amaral): — Para pedir esciarecirnenos, tern a palavra o Sr. Deputado José Maga

lhAes. -

o Sr. José Magalbâes (PS): — Sr. Presidente, Sr. Deputado AntOnio Marques Mendes, gostarmamos de indagar, a

heneffcio da biquidez do debate, qual era o grau de novi

dade introduzido. 0 conteddo do direito ao born nome e

reputacäo d definido, na definiçao cléssica que Gomes

Canotiho e Vital Moreira, aliés, vazam para a sua Consti

tuição Anotada, como

lesado na sua honra, dignidade ou consideracao social

mediante imputação feita por outrern, bern como o direito

a defender-se dessa ofensa e obter a competente repara

ção>>, o que é tutelado palo Codigo Penal em termos que

variararn histonicainente.o problema do aditamento de urn conceito de houra

autOnomo teria como consequCncia sabermos se esse con

ceito inovava em relação ao niicleo de vabores que estão

associados a ideia de born norne e de reputaçâo. Porquê?Ponque, como sabe, o conceito de honra é, por urn lado,

mutável historicamente e, por outro, mutável ate regional

mente — determinacbos comportarnentos, que são conside

rados desonrosos em determinados meios geográficos e

sociais, são considerados inteiramente normals, não sus

ceptfveis de serem considerados ofensivos a qualquer if

tub. Por outro lado ainda, ele 0 ate variável em funçAo

de critérios de pertença a cornunidades especfficas, ou seja,

aquilo que para a comunidade hindu de Lisboa pode serurn comportamento ferozrnente ofensivo, não o será para

outras comunidades.No passado, como sabemos, urn detenininado conceito

de honra possibilitou enigir urn direito penal de agressão

que permitia, por exemplo, ao manido desonrado matar a

tire a rnulher adtiltera e o respective perpetrador da cfa

cada>> no matrimOnio. Esse conceito está abolido histoni

camente, 0 que também aconteceu entre ads, e ha, nessa

matéria, necessidade de fixar urn nticleo, urn padräo, parasabennos que outro valor posso invocar quando you a tribunal e digo: > 0 que é esse conceito autOnomo? <> Parece-me que isto não foi, ateagora, evidenciado pebo Sr. Deputado AntOnio MarquesMendes e palo PSD, justificando e legitimando urn aditamento.

o Sn. Presidente (Fernando Amaral): — Para responder,tern a palavra o Sn. Deputado AntOnio Marques Mendes.

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, Sr. Deputado José Magalhaes, creio que ja expliquei a razão desse aditamento, que é, do meu ponto devista, devido a tradição juridica destes conceitos que estAo intimamente ligados.

0 Sr. Deputado José Magalhães citou exemplos de ccmunidades em que o conceito de honra nao é igual, maspoe-se a rnesma questão em relacao ao born nome e areputacão, ou seja, pode haver comunidades, de onigemdiferente, em que o nosso conceito de reputação não sejanigorosamente coincidente.

Como sabe, são conceitos que estão intirnamente ligados a dignidide da pessoa, pebo que, por vezes, é difIdilestabelecer banreiras, como também 0 muito diffcil estabelecer barreinas segunas entre born nome e reputação

0 Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Deputado, you danurn exempbo: a pessoa A dirige a palavraa pessoa B. A eurn cavaiheiro de honra, uma pessoa corn sOlidas convicçOes e grande porte; B, em vez de responder a A, não oinsulta, näo o ofende, não o atinge na dignidade, pura esimplesmente vira-Ihe as costas, sal pela pona fora. Estecomportarnento que ofende a honra, que desonra, merecealgurna tutela jurfdica, menece alguma sançAo?

0 Sn. Antonio Marques Mendes (PSD): — Em centoscases, ate pode rnerecer.

o Sn. José Magalhàes (PS): — Uma sançao penal?A atira urn cope de água a B durante urn debate televisivo....

0 Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Mas,Sr. Deputado, estes direitos não tern apenas proteccão penal.

0 Sr. José Magalhâes (PS): — Entao, em que é que setraduzern?. No direito a indemnizacao por meios cfveis?

o Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Por examplo. Por que não?

0 Sr. Jose MagalhIes (PS): — V. Ex.a vinou-me ascostas; peço urna indemnizaçäo de 2000 contos, jogandopor baixo.

0 Sr. Presidente (Fernando Arnaral): — Não 0 nadamodesto!

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14 DE OLJTI1BRO DE 1994 181

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Não d nadamodesto, sd pot the virar as costas.

o Sr. Presidente (Fernando Amaral): — Para uma intervencão, tern a palavra o Sr. Deputado LuIs Fazenda.

o Sr. Lus Fazenda (Indep.): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Penitenciando-me, desde jd, por nâo tar acompanhado este nosso <> da revisão constitucional e ter chegado tardiamente ao artigo 26.°, gostaria agora de fazerurna simples apresentação cia proposta de aditarnento deurn novo n.° 4 ao artigo 26.°, que se prende corn a constituciona]izacão do direito a interrupçAo voluntária cia gravidez, considerando, desde logo, que me afasto de discussôes de carácter religioso ou moralista.

Feizniente, a nossa sociedade não é traçada por essafeiçao mas pela evolucão das relaçöes sociais, pelo modomaterial do ser, pela consciência predominante em cadaépoca, não tendo urna determinaçAo religiosa ou moralfstica, razão pela qual tambdtu me absteria de consideraçoessobre outro tipo de direitos de fndole doutrinéria acercado direito ao corpo, etc., que são matérias comummenteconhecidas e polemizadas. Atenderia, tao-sd e centralmente, a questao de, na nossa sociedade, em Portugal, seestimar que, anualinente, são realizados 16 000 abortosclandestinos, sem seguranca para a muffler que Os realizae corn graves irnplicacöes do ponto de vista ffsico e psiquico, realidade a qual nAo devemos fechar Os othos.

Numa dptica de aproximacao da Constituiçao aos cidadäos e aos seus problemas, procurando, a coberto da leifundamental, imprirnir urn quadro nomiativo mais dinâxniCo e aberto que possa pôr cobro a este flagelo do abortoclandestino, do aborto nâo legal, considera a UDP, e aquipropöe, que seria passIve! de constitucionalizaçao o direito a interrupçao voluntéria da gravidez como forma de, apedido da muflier, a realizar em condicoes de segurança.Diga-se de passagem que esta matOria nAo ci exclusivamente nacional, ci bern mais ampla e ainda em 1990 se realizou uma conferência europeia sobre o aborto e a contracepção, corn o alto patroclnio cia Organizacao Mundial deSatide, tendo sido considerado urn dos maiores problemasde sailde ptiblica na Europa.

Afastando as hipocrisias, ha que reconhecer e enfrentaruxna realidade, independenteinente das objecçöes de consciência e das posiçöes religiosas ou doutrincirias que vários sectores da sociedade tenham sobre esta matdria. Nessesentido e corn esta simplicidade, propomos a sua constitucionaiizaçao dentro do quadro normativo existente, o qualse revelou bern pouco eficaz. E de ter em consideracaoque, entre a aprovacão cia lei de interrupçao voluntária ciagravidez, em 1984, ate 1990, segundo dados de que disponho, cia Associacao para o Planearnento da Famflia,recolhidos de instituiçöes oficiais, realizaram-se apenascerca de 400 interrupcöes voluntárias de gravidez, que ciurn nilmero bern desfasado daquele que se estirna em cerca cia 16 000 por ano, mais adaptado a realidade.

Independentemente de uma discussao que se faça sobre essa matéria — a actual lei terá de ser revista, porquanto, hoje, é pacIfico, entre Os especialistas de vcirias cireas,que os prazos pam a verificação da malformaçao do fetoou para a verificação e reconhecimento de situac&s deviolaçao, que ja estão a coberto da actual lei, são extrarnarnente curtos —, acrescentamos aqui e apenas situac&scomprovadamente de carcicter econdmico-social, ou seja,a pobreza endérnica, qua ci, na generalidade dos casos, por

muito que nos custe, a razão principal do recurso de muitas muiheres a interrupção voluntária da gravidez semsegurança nem garantias para quern a pratica fora da Iagalidade.

Finairnente, ainda em abono da proposta, gostaria dedizer que, em minha opiniao, eventualmente, esta nAodeveria ser matéria constitucional. Porérn, a sociedade ci oque ci, tern sido o qua tern sido — sobre isso, não emitoqualquer jufzo de valor — a a verdade é que, constitucionalizandà esta matciria, haveria provavelmente outra forçae capacidade pare alterar cornportamentos e atitudes dospoderes ptiblicos. E nessa matriz que me situo, que apeloa reflexão a a remoção de uma grande hipocrisia axistentena sociedade portuguesa sobre esta matéria a a urn enfrentaniento correcto, virtual e objectivo de aigo que, recordo,ci urn dos maiores problemas de satide pliblica, qua nãotern berco na nossa lei fundamental quando tudo indicaque deveria passar a tar.

0 Sr. Presidente (Fernando Amaral): — Para uma intervenção, tern a palavra a Sr.’ Deputada Odete Santos.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, Sm. Deputados: manha jci abordcimos a questão da interrupçãovoluntciria da gravidez a propdsito cia proposta do CDS-PP para o artigo 24.°, que ia no sentido de inconstitucionalizar a actual lei da interrupção voluntciria da gravidez.Alias, quero registar qua muito me congratulo corn a intervenção da Sr.’ Deputada Margarida Silva Pereira, quefoi brilhante quando disse que a proposta do CDS-PP eraa confissão de qua a Constituição nao vedava uma lei ciai.nterrupcão voluntéria da gravidez.

Registo essas palavras porque pressuponho qua o PSDterá alterado a sua posição, já que, na altura, votou contraa lei da interrupção voluntéria da gravidez.

Em relação ao conteddo cia proposta do Sr. DeputadoLuis Fazenda, estamos inteiramante de acordo. Alicis, tivemos ocasião de, em sede de autorização legislativa parao Cddigo Penal, propor alteraçoes significativas qua iamno sentido de, nas prirneiras ‘12 semanas, ser possivel ainterrupcão voluntciria da gravidez, rnesrno sam qualqueroutra razão qua não fossem as condicöes econdmicas asocials.

Todavia, considero que a constitucionalizaçao destarnatcir.ia já constitui urn problema diferente. De facto, tenho algumas reservas, apesar de estar de acordo corn oconteddo, em relaçao a sua constitucionalizaçao. Panso,alicis, que a actual ConstituiçAo, na medilda am qua protege a integridada fisica, já aponta pam qua o legisladorordinário preveja, designadamente nos casos de abortoeugcinico ou terapêutico, a inteitupcão voluntéria da gravidez.

Recordo, por exemplo, qua o Tribunal Constitucional,suponho qua em Itciuia ou na Alamanha, declarou inconstitucional uma disposição que proibia a interrupção voluntária cia gravidez nos casos da aborto eugénico, precisamente corn fundamento na questao do direito a integridadafisica e do diraito a vida.

São estas, pois, as reservas que queria aqui deixar amrelação a constitucionalizaçao desta matéria, embora esteja de acordo corn ela a entenda que o seu contaüdo deve-.na ser acoihido em sede de lai ordinciria.

Não astive presente aquando cia discussão sobra a questao do direito a honra, no entanto queria referir o seguinte: o taxto constitucional não colocou quaisquar dificulda

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1$2U SERIE—NUMLRO H—RC

des na aplicacao deste artigo por näo estar inclufdo nele o

direito a honra; creio mesmo que o direito a honra terntraduço social e vai resolver-se no born norne e na repu

tacao.Além do mais, penso que será bastante difIcil para os

proponentes explicarem a diferença entre a honra e o born

nome e reputacAo. Mesmo a nivel de legislaçAo penal, nos

crimes contra a honra, fala-se sempre na honra e conside

racao social. Por isso mesmo, entendo que esse acrescen

to do direito a honra terá qualquer outro motivo na suabase que, eventualmente, ainda näo foi explicado.

0 Sr. Presidente (Fernando Amaral): — Tern a palavra

a Sr.’ Deputada Margarida Silva Pereira.

A Sr.’ Margarida Silva Pereira (PSD): — Sr. Presi

dente, começaria por dizer que me quero pronunciar a if

tub estritamente pessoal, uma vez que estamos ainda, no

âmbito desta ComissAo, num ponto de grande reflexão e

de grande discussão e, portanto, nenhuma questao est

fechada.E pdblico e notdrio que, ha bern pouco tempo, passou

pela Assembleia da Repi.iblica uma proposta de reforma

da Cddigo Penal, tal como é pdblico e notório que essa

proposta foi aprovada em termos que em nada alteram o

que o C6digo Penal estabelecera em 1982 sobre a inter

rupção voluntária da gravidez.Infelizmente, perante a assuncão poiftica desta questao,

nâo posso ter aqui a vaidade de me arrogar uma posiço

autcinoma relativamente ao meu partido. De facto, a pro

posta saiu da Assembleia cia Repdblica como saiu, isto é,

manteve-se intocada a possibiidade de existência de cau

sas de desculpa para a interrupço voluntaria da gravidez.

Dei esta expiicação, apenas para responder ao comen

tário da Sr.’ Deputada Odete Santos.Considero, repito, que esta d uma questão de consciên

cia e uma questAo complicada. Ha aqui duas mais-valias

ou, pelo menos,...

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Se me permite, Sr.’ Depu

tada, referi-me a posicão adoptada pelo PSD durante avotaço da Lei cia Interrupcão Voiuntária cia Gravidez e

näo em relacao ao Cddigo Penal.

A Sr.’ Margarida Silva Pereira (PSD): — B era a esse

diploma que me referia, hoje de manhä, quando afirrnei

que o meu partido, naturalmente, aceitou a exp1icitaco

poiftica de situaçôes de interrupção voluntária da gravidez.

Na proposta apresentada pebo Sr. Deputado Luis Fa

zenda existem duas alteraçöes qualitativas, sendo a pri

meira a de que interrupção voluntária da gravidez passa

na a ocorrer näo apenas quando cia surgisse como causa

de exclusAo da culpa, ou seja, nAo teria de decorrer de si

tuaçöes de especial perturbacao cia muiher, mas em cir

cunstáncias gerais.Em segundo lugar, ha, de facto, a inclusão daquelas

situaçoes — tAo discutidas na altura e, depois, eliminadas

pebo Código Penal — de interrupção cia gravidez por ra

zöes econdmicas e sociais. NAo vale a pena e esta no é,

corn certeza, a sede prdpria para sabermos se no Código

Penal estas situaçöes já estAo, de alguma forma, contidas.Pessoa]mente, ate considero que sim, mas reconheço que

isto é altamente discutfvel e, seguramente, não está muito

explicitado.

Tomo as palavras cia Sr.’ Deputada Odete Santos quando dir que, de facto, é difIcil imaginar que a Constituiçaoseja a sede mais cathada para esta matéria, E, sobretudo,patece-me bastante dificil imaginar, neste Inomento, umaalteraçäo cia iei nestes termos, uma vez que podemos dispor de alternativas que ate permitam urn debate social maisprofIcuo. Alias, todas as grandes abteraçoes que se fizeram a lei, nesta matCnia, foram socialmente importantesporque permitiram o debate social.

Para terminar, gostava de responder a Sr.’ DeputadaOdete Santos a propdsito da questao cia honra, born nomee reputaçao. Naturalmente, o meu colega de partido, Dcputado Antonio Marques Mendes, ja disse aqui mais doque o essencial — disse tudo! —, sobre esta matéria. Dcfacto, não se trata de uma alteraçao substancial, pois nAopretendemos provocar outros efeitos juridicos, pela inclu

säo da palavra honra, para aldrn do born nome e consideraçAo.

Chamo, todavia, .a atençao para o seguinte: a doutninapenal, cada vez mais, vem apresentar a nocAo de que,independentemente do born nome e cia reputaçao, ha qualquer coisa de dignidade, a1go muito profundo, ligado ahonra. Assim, urn inimputáveb ou deinquente reconhecido

e habitual pode, de facto, ester ferido por sentimentos derepulsa social e, portanto, nAo ter born norne nem boa

reputaçAo, mas, todavia, ten honra, porqüe essa honra advém do princfpio da dignidade. E a explicitaçao disto, ouseja, a ligaçao cia honra a dignidade, diferente do conceitode born nome e reputacAo, que aqui pretendemos introduran.

Entretanto, reassumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente

Aimeida Santos.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavra

a Sr.’ Deputada Isabel Castro.

A Sr.’ Isabel Castro (Os Verdes): — Sr. Presidente,

gostava de me pronunciar, em nome de Os Verdes, rela

tivamente a proposta apresentada pelo Sr. Deputado LuisFazenda, no que respeita ao artigo 26.°

E nossa opiniao que as preocupacoes que esta propostatraduz tern todo. o cabimento. Vivemos, como, alias, o

Sr. Deputado LuIs Fazenda referiu na sua exposicAo, numa

situacao extremamente preocupante: por urn lado, temos

urna legisiacAo que parece desajustada a realidade e, poroutro, ela acm sequer C cumprida, uma vez que encontra

obstáculos na sua prdpria apiicacao, . designadannente por

parte da cornunidade mCdica. Continuamos, portanto, a

viver tuna situaçao de profunda bipocrisia, em que milha

nes e milhares de mulhenes portuguesas recorrem, em con

dicöes sub-hurnanas, a interrupçao voluntéria cia gravidez.Partilhamos, pois, da opiniao de que as razöes de ca

rácter sdcio-econdmico devem, tambCrn, sen motivo pon

derado para a interrupção vobunténia da gravidez.Rebativamente a sua constitucionalizaçao, parece-nos

muito deicado — considerando as caractenisticas que a esta

revisão estAo a ser dadas, no sentido de acelerar trabaihos,

de forma a prejudicar urn ampbo debate pdblico, na so

ciedade civil, do que aqui está a sen discutido — e corn

plexo que uma maténia destas possa ser, em sede de revi

são constitucional e nos moldes em que cia está a ser feita,

tnaduzida para urn texto constitucional, repito, scm passar

por uma grande discussão ptlblica, que, manifestamente,

me parece urgente fazer-se.

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14 liE OUTUBRO I)E 1994 183

o Sr. Presidente (Alineida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Raul Castro.

o Sr. Raid Castro (Indep.): — Sr. Presidente, relativamente ao aditamento, no artigo 26.°, da palavra .c>,proposto tanto pelo PSD como pelo Sr. Deputado PedroRoseta, e apesar das explicaçöes dadas pela Sr.a DeputadaMargarida Silva Pereira, parece-me urn pouco exotéricoconciliar o exemplo que deu corn a necessidade de aquiter cabimento a palavra >.

• Não me parece, efectivamente, para lá das expresses> e ccreputacäo>> contidas no texto da ConstituicAo, que seja necessário aditar a palavra >, umavez que ela já está absorvida pelas expressöes que cons-tarn do texto constitucional.

Por outro lado, a proposta do Sr. Deputado Luls Fazendamerece a nossa concordância nos termos em que está feita, isto e, corn justificacäo das condicöes em que d possfvel a interrupçao voluntária da gravidez, a pedido damuiher. Essas condiçöes justificam, efectivamente, quepossa haver interrupçAo volunt&ia da gravidez num quadro social que é de alarme, se tivermos presente o mimero de abortos que, na realidade, se praticam e aqueles quesão feitos nas condiçoes médico-legais.

Realmente, seria desejável uma reforma deste institutona sociedade portuguesa,, de tal forma que a interrupçãoda gravidez possa corresponder àqueles casos em que, naprática, cia é feita scm quaisquer cuidados ou precauçöese corn grandes riscos.

Finalrnente, o projecto de revisão de Os Verdes — alias,também no projecto do Sr. Deputado Pedro Roseta se aludea diferença — alude a livre expressão de todas as diferenças. Se a expressão da diferença nos parece aceitável, talvez no projecto de Os Verdes baja algum radicalismoquando se fala em todas as diferenças, pois existem algumas em relaçao as quais não me parece que deva ser reconhecido o direito a sua livre expressão.

Penso, pois, que seria mais ajustada a expressão > que a expressão <>.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, tomo apalavra apenas para me pronunciar sobre a questao doaborto, tal qual resulta das propostas apresentadas por doispartidos em sentido contraditdrio.

o CDS-PP está ausente e, por isso, não tivemos o beneffcio de discutir corn qualquer Deputado desse partidoas razöes da proposta que apresentaram ou, sequer, o seualcance exacto, porém, subscrevo, por inteiro, o que aquifoi dito, esta rnanhã, pela Sr. Deputada Margarida SilvaPereira quanto ao alcance do artigo 25.° e quanto ao factode ser completamente ilegftimo sustentar qualquer outratese, em rnatdria hermenêutica, neste ponto.

Ou seja, o CDS-PP reconhece, implicitamente, que oactual conteédo constitucional não é aquilo que .pretendiae, ao reconhecé-lo — o que me apraz sublinhar —, ajudaa reforçar a ideia de que este quadro, não deixando deconceder urn certo grau de protecção a vida intra-uterina,näo acarreta, em Si, qualquer obrigaçao de proibiçao doaborto ou qualquer outra postura legal que viesse ferir osdireitos da muffler e, designadamente, a sua liberdade deescoiha.

Não gostaria, todavia, Sr. Presidente, que a eventual nayaceitação da proposta do Sr Deputado Lufs Fazenda/UDPpudesse estabelecer urna espécie de contrapeso ou balançoque perniitisse alguém direr que foram apresentadas, emsede de revisão constitucional, dois tipos de propostas, urnaproibicionista, outra garantidora, tendo sido rejeitada aproibicionista, bern como a garantidora, ergo, o patrimd..nb consthucional, nesta matéria, não defende os direitosda muffler. Não é assim!

0 alcance nAo sé do artigo 25.°, tal qual está redigido,como de numerosas outras disposiçOes que tutelam osdireitos da muffler nAo permite, em momento algum, sustentar qualquer tese proibicionista ou de retrocesso no quediz respeito a garantia da liberdade de escoiha, designadamente no tocante ao planeamento familiar ou em relaçao a interrupção voluntária da gravidez, tal como nãopermite ao legislador dar cobertura a situaçöes das quaispudesses decorrer perigo para a vida e segurança da muIher, pelo facto de ter exercido o seu direito de interrupção voluntária da gravidez.

A eventual não aceitacao da consagracão juridico-formal, nos terrnos exactos em que está formulada no projecto do Deputado LuIs Fazenda/UDP, de urn direito comoaquele aqui aludido (direito que a UDP, curiosarnente, nãoconsagra, pois, corn efeito, nao diz que a muiher tern odireito de interromper voluntariamente a gravidez se severificarem estas condiçoes, optando antes por uma formulacao de criaçäo de urn comando legal tendente a yincular o legislador ordinário a definir uma soluçao quegaranta aquilo que o preceito ou a redaccao afirma e queme dispenso de sublinhar), tratando-se de urn comando de2.° grau ou indirecto (do qual não flui qualquer direitofundamental de forrna autónoma mas, sirn, urn dever doEstado, do legislador ordinário ou urn dever infraconstitucional a ser materializado e, eventualrnente, sancionávelpelos mecanismos da inconstitucionalidade por omissäo,corn a sua natureza, que, alias, é limitada), dizia eu que anão aceitaçäo de uma norma destas, eventualinente porfalta de consenso, em nada atinge a aplicação esirita dasnormas constitucionais, das quais decorre que, no presente quadro — tal corno, de resto, urn aresto douto do Tribunal Constitucional veio sublinhar —, as muiheres tern apossibilidade de interromper voluntariamente a gravidez,devendo faze-b em condiçoes que salvaguardern devidamente a sua segurança, a sua liberdade de escolha e, simultaneamente, equilibrem outros vabores, designadarnenteaqueles que podem ser reconhecidos a vida intra-uterina.

Gostaria, pois, de sublinhar o carácter imprejudicado dasoluçao constitucional. Não ha aqui uma proposta de sentido positivo e outra de sentido negativo que se equilibrammas, sum, nina proposta clarificadora e, além do mais, nãoacrescentadora do valor substancial, e uma outra proibi’.cionista, que vai ser derrotada e, ao se-b, sublinha bern ocarácter de liberdade de escoiha que a Constituiçao consagra.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada Odete Santos.

A Sr. Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, em relação a esta matéria, gostaria de acrescentar o seguinte: defacto, entendemos que ate a nfvel da legislaçao ordinéria,nomeadamente do Cddigo Penal, jd se impoe, em obediência a Constituiçao — mesmo que não existisse nada nalegislação penal sobre aborto terapeutico ou eugénico e não

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184LI SER1E—.NUMER() 8—RC

existindo nada sobre a interrupcäo voluntária da gravidez

motivada por questöes econémicas e socials —, que a le

gislaçao penal venha a acoiher, e os tribunais assirn p0-

dem decidir, que, mesmo nos casos das dificeis condiçöes

econtimico-sociais, nao deverá haver penalizaço, nem que

seja atravds do recurso ao conflito de deveres, ao estado

de necessidade desculpante on as demais disposiçöes da

parte geral do Cédigo Penal.Gostava, pois, de deixar esta questo bern expressa neste

debate, jd que não se sabe qual ‘jai ser a sorte da propos

ta do Sr. Deputado Luis Fazenda.Para além disso e voltando ainda a questAo do direito

a honra, queria, muito sinteticarnente, dizer o seguinte: ésabido que esta questao do direito ao born nome e a reputaçao constitui limitacoes a alguns direitos importantes,

como o direito a informar cu a liberdade de imprensa.

o que o PSD quer acrescentar (e a Sr.’ DeputadaMargarida Silva Pereira referlu aqui o seu sentido vago)

significaria criar novos problemas, ainda sem contornos

bern definidos — porque so na prática. quando se colocam

casos concretos, d que se vai verificar o quAo longe se

foi —, que iriam causar novos perigos para a liberdade de

infonnaçao.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavra

o Sr. Deputado Lufs Fazenda.

o Sr. Luls Fazenda (Indep.): — Sr. Presidente, desdeinfcio, sempre pensei que nina formulaçAo deste tipo não

teria, em sede constitucional, a methor guarda. No entan

to, numa sociedade como a nossa, onde a democracia, em

algumas areas, colide corn grandes constriçöes de ordem

religiosa, face a ineficácia do legislador ordinário e malgrado todo o avanco que se fez, de ha 10 anos a esta

parte — os nilmeros estâo af para comprovar a absoluta

ineficácia de tudo quanto se avançou pela legislaçao ordi

nária —, seria importante provocar o debate acerca de nina

formulaçao desta ordern na Constituicao.

Por outro lado, congratulo-me corn a intervençao do

Sr. Deputado José Magalhäes, que veio restabelecer toda

a interpretaçäo já existente. Do ponto de vista polItico, näo

sustentaria, sequer, esta proposta em contraposiçäo a qual

quer outra, embora a defenda como o aprofundamento

daquio que me parecia legftimo e necessário, do ponto

de vista da lei fundamental e da directriz fundamental,

emanar para o legislador ordinário.A sorte continua lançada, nias a realidade existe, inde

pendentemente daquilo que, em matéria de legislacao or

dindria, se fará ou não nos prOximos tempos.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): —. Srs. Deputados,como näo ha mais oradores inscritos, dou por discutida

esta matéria.Vaiuos, então, passar a discussao do artigo 27.°, em

relação ao qual existe uma ilnica proposta, apresentada pelo

PSD.Para fazer a sua apresentacäo, tern a palavra o Sr. Depu

tado AntOnio Marques Mendes.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, von fazer a sua apresentação de uma forma muito

breve porque, como sabe, nâo sou especialista nesta ma

tdria — ela é da especialidade do rneu colega Costa An

drade.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Todos nOs somos

ttcnicos de ideias gerais!

O Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Pelo me

nos, somos >, nâo e?

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Somos tdcnjcos

de ideias gerais!

Risos.

O Sr. AntOnio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, a nossa proposta consiste na alteraçao da redacçAo

de duas das alineas do n.° 3 do texto actual do artigo 27.°da Constituiçao.

Assiin, propomos acrescentar, na almnea b), a expressaoc>. Quer dizer, não sO a prisãoou detençäo devern ser tidas em conta, corno tambdm

qualquer outra medida privativa de liberdade, inclusivamente •a mais suave que so possa aplicar.

Em relação a aimnea c), propomos acrescentar a prisãodisciplinar imposta a rnilitares e, portanto, a expressão

agentes militarizados*, que sempre tm tido urn tratamento

semeihante no nosso ordenainento jurfdico e, portanto,

tambérn aqui thes deve ser aplicada a mesrna excepção.

Creio que estas alteraçöes não contêm, em si, grandes

dificuldades.

O Sr. Presidente (Alineida Santos): — Tern a palavra

o Sr. Deputado José Magalhaes.

O Sr. José Magaihies (PS): — Sr. Presidente, gostaria

apenas do considerar, brevemente, a primeira das propos

tas, jé que a segunda será analisada pelo Sr. DeputadoAlberto Martins.

A primeira proposta, Sr. Presidente, por urn lado, sur

preende-me, por outro, nern tanto! Corn efeito, tivernos

ocasião de discutir, abundantemente, na Assembleia da

Reptiblica, a legislacao que o Governo subrneteu ao Par

lamento em matéria de entrada, permanéncia e safda de

estrangeiros e, no quadro da polftica xenOfoba, conduzida

directamente polo Ministro Dias Loureiro, a Lei dos Estrangeiros incluiu medidas de carácter coactivo relativamonte a pessoas que são havidas por terem penetrado ir

regularmente em territOrio nacional, medidas essas que nao

tern cobertura constitucional.Ulteriormente, o Governo, perante processos desenca

deados junto do Tribunal Constitucional — fiscalizaçaosucessiva abstracta —, tomou uma medida de carticter

pseudocorrectivo, corrigindo vérios aspectos mas deixan

do de fora urn aspecto crucial, que tern a ver corn o pro

cesso atravOs do qual determinadas pessoas são levadas ecolocadas em campos de concentraçäo, isto 0, em centrosdo instalaçäo temporaria, e submetidas, apOs a sua entra

da em territOrio nacional, a verbs tratos de pole, os quaisnäo têm rigorosa tipificacao, constituindo urn reino de

névoa, de arbftrio e, acirna de tudo — que é o que agora

nos interessa —, sern cobertura constitucional.

Esta proposta do PSD 0 feliz, porque nos pennite re

jeitá-la e, ao faze-b, clarificar que a Constituiçäo não

consente senão duas figuras tIpicas claras: a prisao e a

detencao, sendo a prisão urn conceito juridicaniente cia

borado e jurisprudencialmente firmado, tal corno a deten

çäo 0 urn conceito devidamente plasmado. Näo be terti

mus generus!

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14 DE OUTLIHR() DE 1994

Portanto, as figuras que podem ser cobertas sob a designacão outras medidas coactivas>, de carácter nan especificado, nehulosas e indeterminadas, sAo, pura e simplesmente, inconstitucionais, porque este é o reino datipieidade e não o reino das providências avulsas, nãodelimitadas e nâo tipificadas!

o PSD, ao adiantar este subsfdio incorporador devalor. e aditador de urn novo c>, veio permitir-nosdizer que esse <> nâo existe, nao deve existir, porvárias razöes, e, seguramente, corn o nosso voto não existirá, razão pela qual esta d uma jogada talvez de clarificaçao <> mas de insucesso garantido a particla.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Alberto Martins.

o Sr. Aiberto Martins (PS): — Sr. Presidente, a propósito da proposta do PSD sobre a extensão da prisäo disciplinar imposta a agentes militarizaclos, devo dizer quetemos grandes ddvidas se devemos ou não discutir este assunto, porque parece-nos corresponder a uma dirninuicaode direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, violando,portanto, a alfnea d) do artigo 288.° da Constituiçao.

Acresce que a propria reserva que Portugal fez, em 9de Novembro de 1978, a ConvençAo Europeia dos Direitos do Homem — e não estou seguro se essa reserva jáfoi retirada —, relativamente ao artigo 5.°, refere que aConvenção nâo será aplicada nos lirnites dos artigos 27,°e 28.° do Regulamento de Disciplina Militar, que prevêas prisöes para os militares. Portanto, so em relaço aosiiilitares — a sua prisäo — é que tinhamos essa reserva.

Ha, pois, violaçao do direito internacional, bern como doslimites materiais de revisäo constitucional. Creio que odestino desta norma também está traçado, corno e dbvio.

o Sr. Presidente (Almeida Santos):— Tern a palavrao Sr. AntOnio Filipe.

O Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, para já,you referir-me a nova alfnea b), proposta pelo PSD, paratecer, fundamentaiinente, duas consideracöes.

Em primeiro lugar, chega a ser relativamente chocantea forma como esta proposta é apresentada, na medicla emque se trata de uma disposição excepcional, isto é, o artigo refere-se ao direito a liberdade e a segurança e, depois, no a.° 3, exceptua deste princfpio <>, o que significa que se trata de Ca-sos excepcionais.

o que o PSD propOe 6 qe se adopte aqui uma formulação abefta pam situaçOes excepcionais e, portanto, já nan seiiasO a prisão e a detençAo, nina outra medida coactiva,...

o Sr. João Amaral (PCP): — Qualquer outra!

o Sr. AntOnio Filipe (PCP): — .. qualquer outra, dcixando ao legislador a imaginação de encontrar outras formas de coacçao, o que subverteria completamente a cxcepcionalidade da norma.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — E a sua imaginação o que 6 que dita a cste respeito?

o Sr. Antonio Fifipe (PCP): — Creio que, de qualquerforma, o PSD já imaginou algumas coisas.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): —- Tanbenjperguntar an PSD.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — E aquilo que itnaginou,para jé, foram os tais centros de instalacao temporéria,sendo mais do que evidente que esta outra medida coactiva esté aqui, referindo-se claramente aos centros de instalaçao temporária e isto tern urn alcance importante, onseja, não deixa dilvidas sobre a inconstitucionalidade dacriaçao dos referidos centros, na medida em que o PSD,ao apresentar esta proposta, reconhece que eles, dc facto,nAo tern cabiinento no texto constitucional que, felizmen.te, está em vigor.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): -— Mas isso nãocaberá na detençao?

O Sr. AntOnio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, de facto, essa questão esteve no centro do debate que aqui fizemos sobre os centros de instalaçäo temporária e estd tarnbern no centro do pedido de inconstitucionalidade que foifeito pela Procuradoria-Geral da Reptiblica relativamentea formulação adoptada pelo decreto-lei sobre entrada, permanência, saIda e expulsao de estrangeiros do territOricnacional.

Na verdade, os ôentros de instalaçao temporária paraestrangeiros representam uma medida de coacçäo pare alémdaquelas que se encontram, já hoje, constitucionalmenteprevistas e que são a prisao e a detençAo, as quais, comofoi aqui dito, estão devidamente tipificadas.

Portanto, não 6 alheio a toda essa discussäo e a consideraçao que tern sido feita sobre a inconstitucionalidadedesses centros que o PSD aparece corn uma proposta deoutra medida coactiva, proposta, essa, que, a ser consagrada, poderia permitir constitucionalizar a existência desses centros.

• Posto isto, não temos qualquer ddvida em recusar frontalmente esta proposta.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a pala’vrao Sr. Deputado Joan Amaral.

O Sr. Joäo Amaral (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero dizer algurna coisa acerca da proposta paraa norma referente a alinea c) do a.° 3 do artigo 27.° daConstituição, relativa a prisao disciplinar imposta a miiitares ou agentes militarizados, mais concretarnente ao aditamento da expressão .ccagentes militarizados>>.

Creio que, apesar de tudo, esta proposta do PSD vaiter urn mérito histOrico importante, que 6 o de deixar ciarificado que, neste momento, nâo ha prisão disciplinarimposta a agentes militarizados. Isso é muito importantee nâo podemos deixar de louvar o PSD por ter clarificadoesse ponto.

Entretanto, também nAo podemos deixar de registar aquio espfrito corn que esta proposta 6 feita e Os seus clarosdestinatários. Trata-se de uma norma que corresponde aurn espfrito de inilitarizacao tins estruturas e forças queandam em torno da formulaçao militar, cuja ciassificaçAo,alias, 6 muito duvidosa, espinto de militarizacao, esse, quese estende a numerosas forças, as quais não quero nomear,e que, em relação a urna delas — e sublinho este ponto —,utilizou urn artiffcio, urn mero artiffcio formal, que corresponde, na sua aplicaçao, a uma fraude a Constituiçao,na medida em que classifica como militares agentes da

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186ii sEmic—NUMERO 8—RC

Administraço Pdbhca que o nao säo, isto ci, para aplicar

urn deterrninado regime a determinados agentes de urna

determinada forca, a forma utilizada foi a de Ihes atribuir

uma classificacão de militar que não tern nern podem ter.

Não queria deixar de fazer aqui este registo, porque

trata-se de uma farina especffica de defraudar esta previ

são do artigo 27.° e outras que existem na Constituiçao

relativas a esta matciria.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): —0 artigo 27.° estádiscutido, sern prejuizo de, na altura cia votacAo, carla urn

poder apresentar as propostas de alteração que entender,

como é óbvio. Esta discussao tern o conteildo ütil de ver

o que se considera adquirido, nAo adquirido ou possivel

mente adquirido, para que possa ser objecto de propostas

especIficas.Vainos passar a ancilise do artigo 28.° da Constituicäo.Para proceder a apresentticao cia propósta do Partido

Socialista para este artigo, tern a palavra o Sr. Deputado

Alberta Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, Srs. Depu

tados: A nossa proposta vale, em grande medida, por Si,

pois é suficientemente clara na sua explicitacao literal. ETa

pretende apenas reforçar a ideia de que a prisão preven

tiva tern urn carácter excepcional. E vai ao encontro de

tocla a literatura, de todas as opçöes recentes, nomeada

mente do Conseiho da Europa, quando considera que a

prisao preventiva, nas diversas legislaçoes nacionais, ci uma

medida aplicada a quem se presume inocente e, por isso,

deve haver uma particular atençao quanta aos seus efeitos

prciticos.A prisAo preventiva atinge, muitas vezes, a honorabili

dade daquele que e visado e ate dos seus prdximos, nuplica a honra da pessoa, que ci, priinariamente, pasta em

causa, o seu born name e reputacão e atinge, rnuitas ye

zes, de forma que se vem a provar, posteriormente, ma

dequada, as prdprias ligacöes familiares daquele que ci

detido provisoriamente, a perth do trabaiho, a rufna das

suas empresas, a perturbacao da carreira e ate, no limite,

a equillbrio ffsico, psfquico e mental daqueie que ci de

tido. E isto ci, sobretudo, mais grave, quando se vem a pro-

var, posteriormente, que o sujeito era.inocente, e em grande

parte dos casos d-o, e deveria ser presumido inocente para

todos as efeitos.Esta situacAo atingiu grande gravidade nos diversos

pafses da Europa, uma vez que, em alguns desses paises,

50% dos detidos são presos preventivos.

Em Portugal, não fazendo urna referência, em termos

de ncirneros, corn a precisão da actualidade, as estatIsticas

recentes QU Os ilitimos nilmeros que 0 Ministro da Justiça

nos deu apontavam para presos preventivos na ordem dos

35% da popuiação das cadeias portuguesas.For isso e nesse sentido, a prdprio Conseiho de Minis

tros do Conseiho da Europa fez uma recomendacão — e

Portugal, coma sabemos, ci parte desse Conseiho de Mi

nistros —, onde se consagrarn, expressarnente, as princi

pios que you resurnir rapidarnente e que estäo contidos na

nossa proposta: a detenção preventiva deve ser sempre

facultativa e excepcional e não deve ser aplicada senão

desde que haja urna pena mInima em que o suspeito, aque

Ic que ci preso, possa vir a incorter; a detencao nunca deve

ser aplicada a menores, a não ser em caso de necessidade

absoluta; deve ser sempre organizado urn debate contradi

tdrio wide se verifique urn juIzo/processo equitativo; nao

deve haver discriminacao a näo residentes OU estrangei.

ros. Outro princIpio desta recomendaçao, que Portugal

tambcim não tern cumprido, e o de que as prisOes dospresos preventivos devem ser feitas em lugares diferentes

das dos presos condenados definitivarnente.

Portanto, esta nossa chamada de atenção vern, digamos,ao encontro da mais moderna teoria penalista e das opçöes poifticas de que Portugal ci pane e corresponde a ninachamada de atenção que está na ordern do cia.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Estarnos todos de

acordo corn esta proposta ou algucim pretende usar dapalavra para se referir a ela?

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Se me permite, Sr. Pre

sidente, gostava de faiar sabre cia.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavra,

Sr.’ Deputada Odete Santos.

A Sr.’ Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Dc

putados: No fundamental, parece-me que a proposta do PS

merecer ser aprovada.A prisäo preventiva, em minha opinião, já hoje, a face

do texto cia Constituição, deve set sempre excepcional, mas

não resuita mal nenhum, antes pelo contrcirio, que se yin

que esse carácter de excepcionalidade no texto da Consti

tuição.No entanto, tambcim ci born que tenhamos em conside

ração que o carácter excepcional da piisão preventiva, jcihoje existente, so par si, nâo vai dar origem a que dhni

nuam Os presos preventivos, porque para isso será preciso

uma outra polftica no campo social. E a verdade ci que, se

verificarmos as prisoes preventivas e as presos que temos,

vernos que he uma elevada taxa de reincidência, reinci

dência entre aspas, talvez näo no sentido tdcnico-jurfdico

mas no sentido de pessoas que tornarn a cometer crimes,

e ci fundamentalmente das condiçôes degradadas em que

vive uma grande pane da sociedade portuguesa que resul

ta uma elevada taxa de prisäo preventiva.Relativamente a questAo dos menores, realinente, pa

rece-me que os menores de 21 anos jci tern urn regime especial, mas no campo da prisao preventiva, então, aindadeve ser reforçada a excepcionalidade, sendo certo que,

de qualquer fomia, talvez nao o devesse ser no texto cons

titucional.Em todo 0 caso, ate poderia alargar-se a texto consti

tucional a outras. imposiçöes no que toca a prisöes de

menores, já näo no aspecto cia prisao preventiva mas daexecuçao cia pena de prisao. Tal seria o caso, par exem

plo, de tornar possfvel a urn menor que frequentava urn

estabelecimento de ensino continuar a frequentar o mes

mo estabelecimento, embora submetido a prisão, excepto

quando especiais razöes de segurança determinassem ou

tro procedimento, e outras situaçoes que o Sr. Deputado

Alberto Martins referiu, e eu aplaudo, tal como a de os

menores não estarem em contacto corn outros presos jáadultos, corn quem aprendern, de facto, a ingressar no

mundo do crime.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr. Deputado AntOnio Marques Mendes.

0 Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sr. Presidente, quero apenas requerer que toda esta matciria sobre

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14 I)E OUTUJIRO DE 199487

questOes de direito criminal seja adiada para a prOxirnareunio, porque gostaria de contar corn a presença e odebate esciarecedor do meu colega Costa Andrade, dadoque esta matéria é a sua especialidade.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Toda a matériacriminal?

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Sim, todaa que tern a ver corn o direito criminal ou processual ciiminal.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs Deputados,estão todos de acordo corn o que acaba de ser requerido?

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, pela minha pane, também gostaria de cá estar, mas, na próximaterça-feira, é-me, de todo, impossfvel.

O Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Mas podeser na quarta-feira.

V

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Quarta-feira de manhä,por mim, já pode ser.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Quarta-feira demanhA, em principio, pode ser, mas a tarde näo, porqueha reunião plenaria.

o Sr. Antonio Marques Mendes (PSD): — Entâo, podeser quarta-feira de rnanhã, Sr. Presidente.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Varnos ver. Parajá, fica, entäo, adiada a reuniäo de terça-feira, emiSora mepareça que também poderfamos reunir na terça-feira a tarde e não discutirmos estes artigos.

Born, vamos passar a apreciacao do artigo 34.° da Constituiçâo.

Para proceder a apresentação da proposta subscrita peloPartido Socialista, tern a palavra o Sr. Deputado JoséMagalhäes.

o Sr. Jose Magalhäes (PS): — Sr. Presidente, näo seise este artigo não incorrerá no mesmo problema que leyou o PSD a requerer o adiamento, uma vez que se discute aqui a inviolabilidade do domicflio e da correspondência na area alargada das novas tecnologias e...

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr. DeputadoJosé Magalhäes, nao aceito esse adiamento corn tanta elasticidade.

V

Está bern que esperemos pelo Deputado Costa Andrade,porque é urn especialista e todos ternos interesse nisso, masse cada urn de V nds vai fligir a discussäo das propostas,porque nao está cá uipa alta autoridade sobre esta maténa, sinceramente... Cada urn que procure informar-se amesde votar.

Tenham paciência, Srs. Deputados, mas vamos ter dediscutir corn a .ccprata da casa>>. B que näo me ocorre outra forrna.. A näo ser que façarnos aqui urn <> e nós vamos para o Plenário. V

o Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, näo coloco qualquer objeccão a apresentaçao imediata da proposta.

o Sr. Presidenle (Almeida Santos): — Então, façafavor de a apresentar, Sr. Deputado José Magathaes.

O Sr. José MagalMes (PS): Fá-lo-ei sucintamente,Sr. Presidente, scm prejufzo de perguntas ulteniores.

o proptisito dos aditamentos apresentados pelo GrupoParlarnentar do PS é, na minha opinio, altamente positivo e necessário.

o primeiro aditamento traduz-se em deixar inteiramenteclaro que as normas constitucionais que prolbern a ingerência, ou seja, a intervençao abusiva das autoridades ptiblicas na correspondência e nas telecomunicaçoes, na erade hoje, corn o novo quadro de comunicacöes tecnologicamente possfvel, devem ter-se por aplicáveis ou são necessariamente apliëáveis a todos os demais meios de comunicacão privada. Alguns desses rneios excedem,largarnente, aquilo que, na altura da aprovaçao oniginériada Constituiçao, era sequer concebIvel, facultam novas,féceis e simples, mas também muito vulnerOveis, formasde comunicacao, incluem alguns meios que utilizam novas possibilidades de meios cléssicos e outros que utilizam, pura e simplesmente, possibilidades inteiramentenovas e, portanto, as transmissöes de dados, por exemplo — näo por via da telecomunicacao clássica mas poralgunias formas novas, como a transmissão por satdlite eas transmissöes em banda larga ou banda estreita —, qualquer que seja a forma utilizada para a obtençäo desse resultado, estão protegidas constitucionalinente.

Entre ntis, não pode dizer-se, como em outros regimese sistemas constitucionais, que a correspondên.cia esta protegida, os telefonemas em rede fixa estAo protegidos, masquanto aos demais são reino alodial, liberto de intercepçao por parte de autoridades pilbilcas e privadas. Isto, entrentis, nAo pode ser dito. 0 nosso quadro constitucional ésuflcientemente pléstico e, sobretudo, suficientemente ciaro na proibiçao de ingerências para que essa leitura, mesmo scm o aditamento proposto pelo PS, seja abertamenteinconstitucional.

Por isso mesmo, o nosso aditamento d uma cautela, urn Venriquecimento ou uma actualizacão da Constituicäo e urnaabertura da mesma ao novo panorama tecnoitigico no domfnio das comunicaçOes e dos rneios de comunicaçao pnivados. V

0 segundo aditamento 6 atinente a definiçao dos termos em que as ingerências podem ser autorizadas, noscasos em que a lei possa autorizar ingerências das autoridades ptiblicas na correspondência, nas telecornunicaçoese em outros meios de cornunicaçao Vpnivada.

Neste dommnio, tainbém propomos a utilização dessestrês princfpios tAo Oteis para a delimitaçAo das actuaçOesdas entidades ptiblicas: necessidade, proporcionalidade eadequaçAo. Ou seja, todas as iugerências desnecessénias,porque ems devem sen estritamente necessánias, nAo sAoconsentidas. NAo é preciso que sejam, porventura, titeis ouinteressantes, 6 preciso que sejam concreta e delimitadamente necessénias.

Por outro lado, essas ingerências devem ser introduzidas apenas na medida em que o flm a atingir e a circunstância concretamente deliinitada os justiflque, ou seja, naoé possIvel colocar a rede de comunicaçöes de tuna pessoapermanentemente sob escuta ou vigilância unicamenteporque pode acontecer que essa pessoa incorra nama conduta iifciita ou, pura e simplesmente, inconveniente.

Por outro ladoV ainda, 6 preciso que essa medida seja aadequada, isto 6, uma solucao pode ter-se por não desnecesséna e nAo desproporcionada mas ser inadequada.

Página 188

U SRW—IU1tR) 8—RC

Efn enec o iesta principologia temos am facto sO

é que, entic nds, ha uma tradição doutrindria, juris

prudenciaJ e dogmátiea, em geral, extremamente rica na

deflnicäo do alcance e sentido destes princfpios e, portan

to. creio que poderemos estar tranquilos quanto ao facto

e que es seio bern usados pelos jufzes.

AIit. so shlinhar que sO os jufzes podem de

teri:&: as :riec.idas, ama vez que, em Portugal, não

he escutas determinadas por burocratas, no he escutas

determinadas peo Servico de Inforrnacöes de Segurança

ou por qualquer outro serviço de informaçôes, que, corno

se sabe, estäo, pura e simplesmente, legalmente proibidos

de fazer quaisquer, embora estivessern sempre exciuldos

desse leque e. designadamente, da decisão quanto a eventui irigerência nas cornunicaçöes.

Portanto, a benfeitoria que aqui propomos 0, ela prO

pria, necesséria, proporcional e adequada, segundo a lei

tura que fazemos desta questAo. E mais não diria,

Sr. Presidente, em abono da proposta apresentada pelo

Grupo Parlamentar do PS.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Fernando Amaral.

o Sr. Fernando Amaral (PSD): — Sr. Presidente,Srs. Deputados, gostaria, tao-sd, de lançar algumas ques

toes, embora, em princfpio, esteja de acordo corn a expla

naçAo que o Sr. Deputado José Magalhaes acabou de fa

zer.Em primeiro higar, gostava que o Sr. .Deputado tivesse

a bondade de me esciarecer acerca de algumas ddvidas que

me suscita o texto proposto pelo PS para o artigo 34.° da

ConstituiçAo.Estou de acordo que, mercê do desenvolvimento tec

nolOgico, existem hoje rneios de comunicacão privados

para alOm daqueles que estavam inicialmente previstos no

artigo 34.°, os quais precisam de ser prevenidos. No en

tanto, tenho algum receio de que essa ingerncia vá ao

ponto de nao ser possIvel controlar determinados rneios

do comunicação privados que, porventura, venham pôr em

causa a rede e tecido de cornunicaçoes que já existe, como0 o caso, por exemplo, das radios particulares, as quais

vAo, porvenmra, invadir zonas que, de algum modo, estAo

prevenidas, condicionadas e ate constitucionadas. 0 meu

receio 0 o de que esta proibicão seja de tal modo genera

lizada que vá permitir situaçOes desse tipo.

Por outro lado, relativamente aos princípios, corn os

quais estou de acordo — alias, sei e sinto que, na genera

lidade das situacOes, Os principios que enunciou SO Os

mais correctos —, parece-me que não seria necessário

abordá-los na Constituiçao porque, nos processos de apre

ciacäo judicial, os juizes não deixaräo de prevenir essas

situaçOes, não sendo, por isso, necessOria uma cobertura

tutelar e de caräcter constitucional, corn a funçao vincula

tiva que sempre tern, necessariamente, os preceitos consti

tucionais, dado que, nas responsabilidades do prOprio

métier e nas funçOes de julgador, estes princfpios tern de

estar forcosamente presentes.Julgo, pois, ser, porventura, desnecessOria a tutela cons

titucional para esse efeito, porque couflo nos processos de

quem julga para tomar em consideraçAo esses factos, mercê

da sua preparacäo e das suas responsabilidades.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Para responder,

tern a palavra o Sr. Deputado José Magalhaes.

o Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, Sr. Depulado Fernando Amaral, começo por responder Ohimaquestao que me colocou.

o aditarnento de principologia para a decisão judicial,nurna matéria LAo melindrosa, pareceu-nos virtuoso, na

reflexão que fizemos sobre esta matOria. 0 Sr. Deputado

tern toda a razäo quando diz que näo 0 estritamente indis

pensável. Alias, nem sequer nos passa pela cabeça que as

decisöes dos magistrados portugueses, nesta matOria, possam caracterizar-se por desnecessidade, desproporçao e

inadequação.No entanto, como já referi, o valor acrescentado que

se pode obter corn este aditamento não é despiciendo pelo

seguinte: por urn lado, porque essa reforçada clareza do

quadro constitucional dá-nos um conforto adicional face airnperfeiçao humana, não idolatrando nenhuma classe sO

cio-profissional nem nenhum segmento da burocracia ilu

minada do Estado; por outro, porque a Constituiçao, em

outros lugares paralelos, tern o cuidado de, ela prdpria,

chegar a esse requinte definidor.Nao foi por acaso que, por exemplo, erigimos como

princfpio fundamental da Administraçao POblica, no arti

go 266.° da Constituicao, a subordinação de tódos os Or

gãos e agentes administrativos — e repare que não abran

ge sO o braço judicial — a Constituiçäo e a lei e o deverde actuarem, no exercfcio das suas- funçoes, corn o res

peito pelos princfpios da igualdade, da proporcionalidade,

da justiça e da imparcialidade. E dir-se-a que nenhurn de

nOs lança, em geral, sobre a burocracia, a suspeiçäo da

parcialidade, da desproporcionalidade, da injustiça e da

falta de lisura nos métodos.Trata-se, pois, de urna cautela constitucional e de urn

princfpio saudável de delimitaçao. Poderá o Sr. Deputado

entender que o recorte exacto da principologia merece esta

ou aquela correcçao, mas, digamos, a virtude da sua in

troducão parece-me razoavelmente fácil de provar.

Em relacao ao primeiro aspecto, creio que a preocupa

cão do Sr. Deputado Fernando Amaral poderá ser, prima

facie, legftirna, rnas nao se cornprova.

0 facto de querermos garantir, em processo criminal,

que a protecção constitucional ja atribufda a correspondência e a certo tipo de telecomunicaçOes abranja todos os

meios de cornunicaçao privada que hoje são possfveis, por

virtude de novas tecnologias, é urn passo natural. Demo-b,

ate agora, no âmbito do COdigo Penal, na autorizaçao le

gislativa que está em vias de ser usada, äo alargar a pro

teccao criminal contra a ingerCncia indObita em comuni

caçôes do ditimo tipo que referi, ou seja, adiantámos

alguma coisa desse ponto de vista. Mas o facto de o fa

zermos não tern nada a ver corn a manutenção das prerro

gativas do Estado, da Adminislraçao Pdblica e do Governo,

quiçá, no licenciamento dos operadores de telecornuniçöes

e de outros meios, designadamente dos ineios de radio

difusAo. Isso, na sequCncia do que dispoe o artigo 38.°,

rege-se, quanto as televisOes e as radios, pelos princfpios

que esse mesmo artigo define e, quanto as telecomunica

çöes, rnantêm-se imprejudicados os princfpios que permi

tern áo Estado regular as regras do <

pode e näo pode ser operador privado de telecomunica

çOes.Aquilo de que estamos a tratar nAo é do licenciamento

mas da legitimidade para agir nesse terreno, do que pode

mos ver garantido como utentes e consumidores de todos

os serviços. de comunicação privada que hoje nos estAo

acessfveis, qualquer que seja o operador e como quer que

seja o iter pam se ser operador.

Página 189

4 DE t)JTtHRO lW )994

Quando estarnos a fazer uma comunicação privada,qualquer que seja o melo que usemos... Por exemplo, nãohci nenhuma razão para tar menos protecção a carla quemando ao Dr. Almeida Santos do que a comunicacao electrdnica através da qual ele me responde, ou o contrcirio.

o Sr. Presideute (Almeida Santos): — Ainda nãobi nada!

Risos.

o Sr. José Maga1hes (PS): — Portanto, ainda que estahipótese seja ficcionada, não he nenhuma razão para atratar mais desfavoravelmente e em relação a nossa comunicaçAo celular, essa entAo, creio que, mesmo a iuz dotexto actual, nenhuma ddvida se poe que estaria protegida,pois trata-se de telecomunicaçAo no sentido moderno masque jci está abrangido. Não ha, portanto, qualquer razãopara uma desigualdade de tratamento em relacão a estesmeios, que claramente estâo inclufdos, e aos rneios novos,que em 1976 não o estavam porque, pura e simplesmente,não existiam, e não vejo que o receio do Sr. Deputado,que compreendo, tenha substância bastante para legitimara recusa deste alargamento ou desta plariflcação, porquenAo passa disso mesmo.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavraa Sr.a Deputada Odete Santos.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, farei urnabreve intervençao na sequência do que foi dito peloSr. Deputado Fernando Arnaral, que, creio, colocou algumas questOes em relacao a parte final dos princfpios danecessidade da proporcionalidade e da adequaçao.

Julgo que, em rnatéria tao delicada como esta da inviolabilidade cia correspondência, nâo haverci rnal nenhumem a Constituiçao consagrar expressarnente esses princfpios, embora pense que, na opiniao de todos, essa ci amainterpretaçAo que não conhece excepçOes, pois eles já seaplicam nesta matciria e são decorrentes do artigo 18.° daContituiçao. Dc. facto, so pode permitir-se esta devassaem processo criminal, desde que se respeitem os princfpios da necessidade da proporcionalidade e da adequacao.

No entanto, quando assistimos a coisas chocantes, comoci o caso de urn deterininado manifestante que ci filmadopelo SIS, num momento em que a prática ci a da ameacaa determinados direitos, liberdades e garantias, creio quenao haverá mal nenhum que aqui, em matciria de tantomelindre, isto venha enfatizado.

Quero apenas deixar a seguinte ñota final: quando vejo,na televisão, determinado agente policial a filmar algucimmanifestando-se — corno tern sido visto, nomeadamente nocaso da ponte sobre o Tejo —, nunca esqueço aquilo queli, ha tempos, numa revista de ciência criminal sobre amadecisão do Suprerno Tribunal alemäo que entendeu ilegaisfilmagens feitas por mandato do Ministcirio Pdblico emrelaçao a detenninada pessoa, considerando que essas flumagens — estava a investigar-se urn crime — cram ilegaisporque se estava a violar o direito a autodeterminaçaosobre a informacao. Ora, oiço tantas vezes invocar a legislação, a doutrina e a jurisprudência alemãs nestas discussOes sobre a Constituição ou-sobre a lei ordináiia, e,afinal de contas, constatamos que, em matcirias de tantomeindre, estarnos no pOlo oposto.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Raul Castro.

o Sr. Raul Castro (Indep.): Sr. Presidente, ojecto do PS apresenta duas alteraçoes: a primeira, aoreferir os melos de comunicacäo privada e, a segunda,ao estabelecer a sa!vaguarda dos princfpios cia necessidade da proporcionalidade e da adequaçAo. B urn projecto que merece a nossa concordância quanto a primeira alteração, sobretudo em funçAo do grandedesenvolvimento que, como ci sabido, têm tido os meiosde comunicaçao privada, nomeadamente atravcis das privatizaçOes dos meios ptlblicos de cornunicaçao, e, quanto a segunda, em funçao da necessidade de condicionara interferência nos meios de cornunicação corn os princfpios que aqul são estabel.ecidos.

Por isso, pela nossa parte, apraz-nos manifestar a nossaconcordância corn esta proposta apresentada pelo PS.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não havendomais inscriçoes, dou o artigo 34.° por discutido e passamos ao artigo 350

O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, pedia-ihe que os trabaihos da Comissão fossem suspensos por10 minutos, para podermos reunir.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Corn certeza,Sr. Deputado.

A Sr.a Odete Santos (PCP): — Sr. Presidente, precisava de saber exactarnente a que horas terminaremos osnossos Irabaihos, pois tenho uma reunião marcada para estanoite.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr.a Deputada, aminha ideia seria terminarmos as 19 horas. No entanto, aComissão ci soberana sobre esta matdria.

o Sr. Raid Castro (Indep): — Sr. Presidente, aproveitava para dizer o seguinte: não poderei estar aqui presenteate as 19 horas e pedia que fossem adiados para terça-feira dois artigos que se referem a comunicaçäo social.

o Sr. Présidente (Airneida Santos): — Sr. Deputado,preferia dar-Ihe a palavra para os apresentar.

o Sr. Raid Castro (Indep): — Mas a minha ideia nãoera essa, Sr. Presidente. Na prOxirna terca-feira serei substitufdo pelo Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, queci a pessoa indicada para se pronunciar sobre estes artigos.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr. Deputado,corn esse tipo de razOes, nunca mais nos entendemos, poishaverci sempre algucim que não estci preparado, que ternde sair, etc.

o Sr. Raid Castro (Indep): — Sr. Presidente, são apenas dois artigos.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Eu sei, Sr. Deputado, rnas jci saltcimos quatro ou cinco artigos por falta deum especialista, agora saltávanios outros por falta deoutro especialista e penso que este ci urn rnau critério.Tenho pena de ter concordado ha pouco com o salto quedemos e penso que o Sr. Deputado tainbcim ci versado emmatciria de comunicaçao social. Quem o nao ci?!

Página 190

190H SERW—NUMMU) 8—IC

o Sr. Raul Castro (Indep): — 0 mais versado é mesmo o jornalista.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Mas ha all urnespecialista sentado na bancada da cornunicaçao social e

se for preciso ele dá-nos umas achegas!

Risos.

O Sr. Raul Castro (Indep): — Sr. Presidente, o Depu

tado que me substitui d urn jornalista. Ningudm mais ver

sado do que ele.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Eu sei, Sr. Deputado, mas näo sei se o ponto de vista dos jornalistas é o

melbor para os interesses do Estado no que se refere a

des prdprios.

o Sr. Ran) Castro (Indep): — Penso que sirn, Sr. Presidente, e foi por isso que Ihe flz este pedido.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Quais SO OSartigos, Sr. Deputado?

o Sr. Raid Castro (Indep): — S.o Os artigos 38.° e 39.°

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não sei se léchegarernos hoje, rnas flea adiada para terça-feira a dis

cussao destes dois artigos.

Srs. Deputados, vamos entAo interrornper Os flOSSOS tra

baihos por 10 minutos..

Eram 17 horas e 25 minutos.

Srs. Deputados, vamos reiniciar a reuniäo.

Eram 17 horas e 55 minutos.

Para fazer a apresentacao da proposta do PS relativa

ao artigo 35.°, tern a palavra o Sr. Deputado Aiberto Mar

tins.

0 Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, a pro

posta que apresentámos quanto a este artigo 35.° tern uma

componente essencialmente herrnenêutica e visa, por isso,

clarificar, no piano interpretativo, algo que esté já contidono n.° 2 do artigo 13.° da Constituicäo quanto ao princf

pio da igualdade, no sentido de evitar a existência de dis

criminacöes de origem titnica.

Por outro lado, tenta dar expressAo substantiva directa

ao princIpio da autodeterminacäo informacional, que ra

dica na ideia do consentimento. Isto é, as pessoas devern

ser tratadas de acordo corn as suas intençöes e corn o seu

consentimento, näo devendo haver factores que não este

jam sujeitos a vontade delas rnesrnas. Isto visa clarificaralgurnas dtividas que surgirarn, sobretudo na doutrina,

quanto a informatização e ao tratamento de dados de associaçöes cfvicas em geral, associaçöes culturais e associ

açöes sindicais. Houve algum entendimnto de que urna

leitura restritiva da Consituição podena ilegalizar esses

ficheiros, mas essa leitura foi recusada no sentido de pri

vilegiar o princIpio da autodeterminaçao informacional, que

se baseia no consentimento.Por isso e neste aspecto, no nosso entender, o artigo

35.° da Constituiçao, respeitante a utilização dos dados

pessoais informatizados, por urn lado, nao pode servir dis

criminaçöes na base da raça, do sexo e das opçöes ideo

IOgicas, culturais, religiosas e outras, decorrentes do prin

cfpio cia igualdade, e, por outro lado, poderäo ser utilizados

dados relativamente reservados, se a pessoa a quem os

dados respeitam der consentimento para a sua utilizaçao,

dentro de certos limites. Foi isso o que pretendemos e o

meu colega José Magathães explicitará é a questão dos fi

cheiros rnanuais, que d uma questão importante.

O Sr. Presidente (Ahneida Santos): — Tern a palavra

o Sr. Deputado José Magalhaes.

O Sr. José Magalhàes (PS): — Sr. Presidente, a refle

xao que ternos vindo a fazer no ârnbito do balanco da

aplicacão da Lei n.° 10/9 1 conduziu-nos, recentemente, aaprovação, aqui, na Assernbleia da Reptiblica, de uma

pequena lei correctiva. Essa lei correctiva, publicada, creio,

durante o rnês de Agosto, aduzindo uma informaçao adi

cional àquilo que o Sr. Deputado Alberto Martins acaba

de vazar em acta, veio acrescentar ao elenco dos dados

proibidos, no que diz respeito a utilização da informtitica,os dados sobre a origem étnica.

Portanto, esta opçAo que propomos consagrar constitu

cionairnente e que a data cia feitura deste projecto de revisão constitucional nAo estava tomada no piano legal, hoje

em dia, está tornada nesse piano e, assirn, o projecto de

revisäo constitucional apresentado pelo PS veio a ser an

tecipado por urn consenso quanto a consagração legal dasoiuçAo que aqui propornos, 0 que é curioso e interessante.

Agora o que não resolvernos em sede dessa iei — dei

xámo-lo em aberto propositadamente e tivemos em conta

que ia haver ou que ia abrir-se urn processo de uma revi

são constitucional —6 a situaçao que se coloca no que diz

respeito aos ficheiros rnanuais.

Creio que, em sede de boa interpretacão do artigo 35.°

da Constituiçao, seria, no minirno, fraude a Constituiçaoque alguérn, para iludir as previsoes constitucionais no

tocante ao tratamento de certo dados, criasse urn ficheiro

automatizado de remissão e, ao lado, urn ficheiro manual

corn os dados proibidos no que diz respeito ao tratamento

automatizado. Ou seja, sobre o banco de dados dos agita

dores politicos terfamos, no Serviço de Informaç&s de

Segurança, Os agitadores propriamente ditos em ficheiro

manual e, em remissão, em ficheiro automatizado, Os da

dos sem carácter especfflco no que diz respeito a activi

dades de carécter polItico, partidário ou de qualquer outra

natureza.Esta decoupage entre, de urn lado, a ficha electrónica

c e, do outro lado, a ficha manual conspurcada, mas

corn urna remissão na ficha eiëctrónica, seria uma intole

ravel violaçao ou dma fraude a Constituicao e a lei. Portanto, essas práticas são inconstitucionais já hoje.

A elaboração da directiva europeia sobre protecção de

dados pessoais alertou-nos especialrnente para a necessi

dade de consagrar, também a nivel constitucional, uma

regra corno aquela que para aqui se aponta, regra que está

indicada em termos extraordinariamente econdniicos e,

corno evidenternente teria de ser, remete em larga medida

pam a iei, nos termos da lei.0 princfpio fundamental de tratamento paritário pare

ce-nos absolutamente razoével, necessário e praticamente

inevittivel, pelo que propomos, Sr. Presidente e Srs. De

putados, que seja consagrado expressamente.

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14 DE OIJTUBItO IM. 1994191

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Para fazer aapresentacao da proposta do PCP relativamente ao artigo 35.°, tern a palavra o Sr. Deputado AntOnio Filipe.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, irei apresentar a nossa proposta, sem prejufzo de, posteriormente,vir a tecer algumas considerac&s sobre outras propostasrelativas a este artigo.

A proposta que fazernos prevê que seja conferido aocidadão o direito a obter urn mandato judicial de acessoaos dados informáticos que existarn a seu respeito, casoesse acesso the seja recusado. Escusado será referir aimportância do tratarnento constitucional que toda estamatdria relativa a informética tern nos tempos que correm,em que o recurso a informdtica d cada vez rnaior e se vaigeneralizando e em que, corn a evolução da tecnologia aodispor dos meios informáticos, crescem os perigos relativos aos direitos dos cidadAos e os de tuna acrescida utilização inconstitucional de dados pessoais infonnatizados.

Já por vérias vezes nesta Assembleia, a propOsito dediversos diplomas e diversas matérias, temos discutido esteproblerna do acesso dos cidadãos aos dados que lhes dizern respeito — alias, esse princfpio constà já da Constituiçao. Agora aquilo que ainda näo existe é urna formaexpedita de assegurar os direitos do cidadão a quern esseacesso d negado, sendo essa urna matéria que nos ternvindo a preocupar.

Já aquando da revisão constitucional de 1989 nos preocuparnos corn ela e, de facto, insistirnos na necessidadede ser encontrado urn processo judicial expedito de aces-so dos cidadãos aos dados informáticos, caso o acessosolicitado a qualquer entidade seja recusado. São situaçöesfacilmente previsiveis, dado o uso e abuso de dados pessoais informatizados, e a ideia que ternos é que, nestemornento, ainda não estao. assegurados os meios que permitam ao cidadão exigir que Ihe seja facultado o acessoaos dadós pessoais que a seu respeito constem em quaisquer ficheiros.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Não ha’vendoninguérn inscrito, farei a seguinte pergunta ao Sr. DeputadoAntOnio Filipe: quando o Sr. Deputado cliz ser recusado>>quer dizér ser ilegal ou injustificadamente recusado? E quehe recusas legftimas e recusas ilegitimas e, em meu entender, falta aqui urn advdrbio qualquer.

o Sr. Antonio Fiipe (PCP): — Sr. Presidente, os cidadãos tern sempre direito a obter, nos termos constitucionais e legais, acesso aos dados pessoais e, portanto, tendosempre esse direito, a recusa desse acesso é sempre ilegitima.

O Sr. Presidente (Alineida Santos): — Por outro lado,corn ccmandado judicial>> é, digarnos, a pequena > dos rneios possiveis. Não seria possivel referir-se qualquer coisa antes de o <>, qualquer coisa corno <>,porque parece que o mandado judicial é o extrerno recurso? Pam ser franco, não estou a ver o quê, mas dá ideiade que varnos logo para o extremo.

Tern a palavra o Sr. Deputado José Magalhaes.

O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, queriaapenas alertar para dois aspectos.

Por urn lado, ha propostas pendentes, no que diz respeito ao artigo 20°, no sentido de se consagrar corno regra corn carácter genérico que, > — estou a citar a formulacão do Grupo Parlamentar do PS para o n.° 4 do artigo 20.°

A existência de urea norma deste tipo aplicar-se-a, naturairnente, a todos os direitos, inclusive aos direitos dohomem perante abusos da informética ou perante a retencao injustificada de informaçoes ou o linpediinento doacesso a informaçoes contidas em ficheiros electrOnicos e,portanto, provavelmente, a consagração de. urna normageral deste tipo tornaria sobreabundante a existência deespecfflcaçoes artigo a artigo, direito a direito. Ou seja, éevidente que, a propOsito de outros direitos, por exemplodo direito de reuniäo, poderfamos dizer da utilidade dehaver mandadös judiciais a brasileira ou writs, segundo aregra anglo-saxdnica, ou a prOpOsito da rnanifestaçao ouda expressão... a propOsito de praticamente todos os direitos fundamentais deste tipo.

A segunda reflexão a fazer diz respeito aos meios queos cidadOos poclem accionar quando, de alguma maneira,Os direitos previstos no artigo 35.° sejam postos. em causa.

A Lei n.° 10/91 veio criar urea Comissão Nacional deProtecção de Dados Informatizados (CNPDI), cuja funcãoé, precisamente, apreciar, em sede reclamatOria e comoinstncia de mediação como autoridade adreinistrativa independente, queixas de cidadãos cujos direitos tenharn sidoviolados, incluindo aqueles que tenham visto denegado oacesso. Portanto, essa instância que se questionava existirou näo, cia facto, existe e não carece, naturalmente, de umamençao e cobertura expressa no articulado do artigo 350..__devo dizer que tambCm nao the ficaria maL

• Mas a miiiha dUvida principal nao se situa tanto nestasede como em relação ao mérito rnaior comparativo de seconsagrar no artigo 20.°, como é proposto pelo PS e,alias, também pelo PCP, uma cláusula geral que aluda autilidade e necessidade de providéncias ou de procediinentos judiciais céleres e prioritários para acorrer a situaçãoem causa — é urea espdcie de SOS dos direitos fundamentais —, podendo o legislador constitucional exemplificarou flão Os direitos cuja especial proteccao era assirn divisada.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — E uma daquelasprovidências cautelares e urgentes.

Tern a palavra o Sr. Deputado AntOnio Filipe.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, sobre estamatOria, o que existe actualmente como forma de defesados direitos dos cidaclãos face aos dados pessoais informatizados resulta, salvo erro, cia Lei n.° 10/91, que aquifoi aprovada e aperfeiçoada recentemente: a ComissãoNacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizados.

No entanto, creio que, quanto a este aspecto particular,- ela não resolve a questao, porque — e esta foi urea maté

na discutida longamente — nem sequer a Cornissão Nacional para a Protecção de Dados Pessoais Informatizadostern esse direito de acessodirecto a quaisquer dados concretos, a não ser apos decisão judicial nesse sentido.

Temos, portanto, o receio — que nos parece fttndado —de que o reçurso a essa Comissão não seja uma tutela

Página 192

192ii SERw—NuMERO 8—RC

suficiente para assegurar, pelo menos em tempo dtii, o

direito do cidadão a ter acesso imediato ou coin a celeri

dade que for possivel aos dados pessoais que constem a

seu respeito em qualquer ficheiro.Alias, este direito que aqui propomos e que tern vindo

a ser conhecido como habeas data nos debates que se tm

realizado, tern, para nds, a irnportância de assegurar que,

num meio tAo especifico e de circulaçao de informacAo

tAo rápido como é a informática, seja também assegurado

ao cidadAo urn meio de defesa que seja tanto quanto pos

sfvel rápido, para que a desproporçAo entre as possibilida

des de ofensa de direitos e as possibilidades de defesa

desses mesmos direitos pelos lesados nAo seja tao dese

quilibrada.Daf que, em nosso entender, seria urn passo muito

importante de tutela dos direitos dos cidadAos que este

especifico rneio de defesa fosse consagrado em sede cons

titucional, no artigo que se refere a utilizaçao da informática e nAo noutro, sem prejufzo, naturalmente, do aperfei

çoamento de mecanismos e de meios de defesa gerais dos

cidadãos contra a lesAo dos seus direitos.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Muito obrigado,Sr. Deputado.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — Sr. Presidente, se nao hainscricoes sobre a proposta do PS, queria referir-me a ela.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr. Deputado,estava no uso da palavra, poderia tê-lo feito. Tern a pa.

lavra.

o Sr. AntOnio Fiipe (PCP): — Sr. Presidente, o PSpropöe que a proibiçAo absolute que existe actualmente em

relacao ao tratamento de dados referentes a conviccoes

filosOficas ou polfticas, flliação partidária ou sindical, fé

religiosa e vida pr.ivada — a que se propöe aditar-se, a

nosso ver justificadamente, a <> — deixe de

ser urna proibiçAo absolute, passando a haver a possibii.

dade de esse tratamento de dados ser feito, desde que corn

consentirnento pessoal expresso daqueles a quem os da

dos respeitam.A nosso ver, seria preocupante que esta proposta fosse

consagrada, na medida em que prevemos situacöes em que

o consentirnento dos cidadios nao serO tAo livre quanto aprimeira vista possa parecer. Estarnos, por exemplo, a

imaginar a situaçAo de uma empresa que diz a uma pes

soa o senhor é admitido nos nossos quadros, mas ntis

gostarnos de conhecer as pessoas que cá estAo e, portanto,

gostarfarnos que nos desse o seu consentimento expresso

para que obtenharnos determinadas informacoes a seu res

peito — nurn caso como este, estamos a ver como muito

condicionado o consentiinento expresso do cidadAo. E

evidente que este dana o seu consentirnento e assinaria

provavelmente urna declaracao consentindo que a empre

sa tratasse a seu respeito dados relativos, por exemplo, asua filiaçAo sindical, e a empresa poderia, a todo o mo

rnento, invocar: ccNtis fazemos isto corn toda a cobertura

constitucional, na medida em que temos aqui urna decla.

raçAo corn o consentirnento expresso desse indivfduo.>>

Parece-nos, portanto, que isto senia >

de consequências muito perigosas e ate irnprevisIveis, eli

minando a proibicao absolute do trataniento de dados pes

soais de determinada Indole, corno são aqueles que cons

tam da Constituiçao ate ao momento.

o Sr. Presidente (Alineida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado José Magalhães.

o Sr. José MagalhAes (PS): — Sr. Presidente, a intervençAo do Sr. Deputado AntOnio Filipe coloca urn proble

ma relativamente melindroso, qual seja o de saber qua] a

leitura que o Sr. Deputado faz da actual legislaçao sobre

esta matéria na redacçao que fluiu da Lei n.° 10/91 e,

sobretudo, da sua correccAo feita por unanimidade, hO dias,

aqui na Assernbleia da Reptiblica. Porque se esta leitura

que o Sr. Deputado agora aqui fez fosse a que fez na al

tura em que debatemos a lei, teria de ter votado contraela.

Aquilo que nessa lei fizemos foi precisamente viabili

zar certas situaçoes em que, corn o consentirnento dos

gizados, certas informaçoes de carécter reservado fossernobjecto de tratarnento automatizado. Mais ainda: a prirneira

vez que, em Portugal, se colocou e testou verdadeiramente

o alcance desta norma foi quando determinadas associa

çöes sindicais quiseram ver processados os vencirnentosou remuneraçöes ou outras regalias de filiados seus e al

guém ihes disse: ccNAo, ntis nAo o podemos fazer, porque

isso violania o princfpio segundo o qual nao hO tratarnen

to automatizado deste tipo de informac6es.>

Ora, como sabe, isso foi superado por hennenêutica

virtuosa feita pelo Conseiho Consultivo do Procurador

-Geral da Reptiblica, devidarnente homologado e, depois,

incorporado corn urna interpretaçAo dominante — não conheco outra — e e, no fundo, essa interpretação que jul.gamos ser avisado e prudente vazar para o texto.

o Sr. Deputado Alberto Martins justiflcarO o porquê danossa soluçao, mas o que gostava de ihe perguntar era seconsidera que o facto de urn partido politico ter urn fi.

cheiro dos seus inilitantes isso é inconstitucional face ao

artigo 35•0 da Constituicao.Portanto, pergunto-Ihe se o facto de urn partido poli

tico registar em ficheiro electrtinico actividades de carOc

ter politico isso 0 ou nAo inconstitucional, ou seja, todos

os partidos politicos portugueses estão em postura de de

saflo a ConstituiçAo ao genirem, corn métodos modernos,os seus ficheiros de militantes e as suas actividades de in

formaçAo correntes e corriqueiras?Por mini, entendo que nAo, mas se o Sr. Deputado en

tende que sirn, 0 methor que o diga depressa para que

saibamos porquê e corn que fundarnentos, poue podere

mos ter uma bomba a fazer tique-taque sem nos aperce

berinos disso.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Para responder,

tern a palavra o Sr. Deputado AntOnio Filipe.

o Sr. Antonio Filipe (PCP): — Aquilo que foi aprovado,por unanimidade, aquando cia alteraçAo cia Lei n.° 10/91,

não foi a permissAo do tratarnento informatizado de

dados cujo tratarnento estava e estO constitucionalmente

proibido, pois, nesse caso, a lei seria inconstitucional e toda

a gente venia isso.Portanto, não houve af nenhurn afastarnento cia norma

constitucional proibitiva que estd em vigor. A questAo que

se colocou foi diferente: era a de saber quando 0 que a

Comissão Nacional de Protecçao de Dados Informatizados

pode ter acesso directo a deterininados ficheiros sobre

dados pessoais que não estes, porque estes são proibidos,

e aquilo que foi decidido, por unaniniidade, foi que, ha

vendo o consentimento expresso de urn titular dos dados,

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é evidente que a Coinissão lena acesso directo, scm dependência de mandato judicial, ao tratarnento de dadosinformatizados

Trata-se, pois, de uma questão completamente diferentee nao houve a intençao de, por parte de ningudm — mesmoque houvesse, isso seria inconstitucional —, afastar a disposicao constitucional proibitiva. Alias, se alguérn tivesseessa intenção, terfamos discordado dela, porque pensamosque esta proibicao, como ha pouco disse, deve ser intocadadevido a porta extraordinariamente perigosa que iria abrir.

o Sr. José Magalhàes (PS): — Portanto, os ficheirospartidarios são inconstitucionais, se bern percebi.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Alberto Martins.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, quantoa este ponto, a nossa proposta resultou de uma dificuldadedoutrinal e jurisprudencial rnuito tratada já na doutrina ena jurisprudência em Portugal e perante a qual o Ministdrio Péblico se debateu corn grándes dificuldades aquandoda discussao sobre se Os ficheiros informatizados das associacöes sindicais, para efeitos de paganiento de quotas ououtros, deveriam ou não ser ilegalizados.

Foi, digamos, numa interpretaçAo actualista, corn urnsentido de liberdade relacional, que se chegou a conclusão de que Os ficheiros quer dos partidos quer das associaçöes sindicais nao deveriani ser inconstitucionalizados.Numa leitura como aquela que acaba de ser expressa, istoe, numa leitura restñtiva e literal, está tudo na ilegalidade, mas não foi essa, felizrnente, a leitura cia Procuradoria-Geral da Reptiblica e do seu Conseiho Consultivo.

Nesse sentido, pretendernos clarificar este ponto, dizendo que o consentimento é urn elemènto que permite autilizaçao de dados pessoais informatizados mesmo sobreestas rnatérias, dentro de limites que não colidarn corn osdireitos fundamentals tratados noutro ponto da Constituicäo.

Portanto, naturalmente, a ideia do consentimento naopode entender-se para permitir a violaçao de direitos fundamentais que estão já salvaguardados noutro ponto dotexto constitucional, nomeadamente no n.° 2 do artigo 13.°,como citei.

Assim, o consentirnento tern de ser livre e expresso— alias, de acordo ate corn directiva cornunitéria —, e naopode violar os direitos fundamentals. Portanto, não d ilimitado, mas nao permite a sua utilizaçao para discrirninaçöes de natureza ética on outras, salvaguardando urn princfpio de liberdade relacional e não ilegalizando, como outraleitura poderia conduzir, os ficheiros que são utilizados nasassociacöes sinclicais, partidarias e outras. Alias, a questAo, corno o rneu colega José Magalhaes já referiu, nasceu de urn problema prático de pagamento de salérios equotas das associacöes sindicais.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Então, Os senhores nAo se oporiam a que onde esté <> cotistassetarnbérn a expressao <.clivre>>.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Claro! >

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. JoAo Amaral (PCP): — Então, Sr. Depulado Alberto Martins, quer dizer que seria livre e expresso o consentimento dado nos seguintes termos: a Auto-Europacontrata 5000 trabalhadores na zona de Setübal para asactividades que vai desenvolver. No contrato de trabaihOha uma clausula que diz expressarnente que o trabathadoraceita isto assirn, assim... .Ora, como estes contratos sãolivres, assinados, será que isto corresponde a urna expressão livre e expressa do consentirnento?

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — E que este problema tambdm se coloca para o próprio contrato de trabaIho...

O Sr. Alberto Martins (PS): — Logo que nao viole osdireitos fundamentals.

O Sr. Joäo Arnaral (PCP) — E que a alternativa d odesemprego. Esta liberdade charna-se a liberdade de nAoter emprego...

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Deputado, logo quenAo viole direitos fundamentals...

o Sr. Joäo Amaral (PCP): — Sei que esta questAo secoloca para quase todas as coisas, so que estanios a acrescentar...

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Deputado, o consentirnento nAo pode ser dado violando outros direitos fundarnentais, mas apenas no limite da salvaguardada de outrosdireitos fundamentais que já estAo consagrados na Constituiçao.

O Sr. Presidente (Almeida ,Santos): — E uma alteraçAoque tern conteildo em rnuitos outros casos.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Alias, devo dizer queesta norma é de uma convençao que está em vigor.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Significa que haqui dois valores conflituais. Vamos pôr ali urn livro paraque aquele que foi violado possa dizer se deu esse consentirnento em condicoes que não preenchem o requisitoconstitucional...

O Sr. José Magalhäes (PS): — Sr. Presidente, permita-me sO uma apostllha de reflexão em nome dos valores, urn dos quais é o da razoabilidade e da sensatez.Se alguOrn absolutizasse, como o Sr. Deputado JoAoAmaral parece estar a fazer, a alusAo constitucional aproibicAo do tratamento autornatizado de inforrnaçao sobre a vida privada, corno ele fez, todo o nosso sistemabancário ruiria, porque, que eu saiba, a minha vida financeira é privada e a interpretaçAo tabular do n.° 3 doartigo 350 conduz a conclusAo de que o facto de o meubanco utilizar a maquineta chaniada computador paratratar a niinha inforrnaçao privada seria urn acto inconstitucional...

O Sr. João Amaral (PCP): — 0 Sr. Deputado sabeperfeitamente que essa parte da sua vida que tern tratamento inforrnático 0 aquela em que o senhor tern relaçoescorn esse banco e sO essa e nos termos em que o sethorquer, corn alternativas...

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194 IISERIE—NUMERO 8—HC

o Sr. José Magalhães (PCP); — NãoI Eu não tenho urncontrato de adesão; ele é-me posto a frente.,.

o Sr. João Amaral (PCP): — Sim, como alternativa,tern urn colchão onde pode guardar o dinheiro ou p8-Jono bolso, em akernativa...

Agora, coloquel esta questAo pai-a vos chamar a atençao particularinente...

o Sr. José Magalhäes (PS): — E chama enormemente!

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,vamos ver se conciliamos as duas preocupacöes.

o Sr. José Magalhães (PS): — E que o mesmo problema se coloca aos partidos politicos. A interpretaçäo absoluta desta norma significaria que a utilizacão da inforrnática para o tratarnento de aspectos relacionados corn avida fntirna dos partidos, que tern a ver corn a maiha dasconvicçöes politicas e partidérias, por exemplo, para classificar os militantes, para triá-los, identificá-los, graduá-los, era inconstitucional...

o Sr. Joo Amaral (PCP): — Eu não estou a falar departidos polIticos...

O Sr. José Magalhães (PS): — Estou eu!

o Sr. João Amaral (PCP): — Estóu a falar de relacOesde trabaiho.

o Sr. José Magalhães (PS): — Também, mas a normaaplica-se a tudo.

o Sr. João Amaral (PCP): — E que as pessoas atepodem sair dos partidos, mas relaçoes de trabaiho tern doter!

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Alberto Martins.

o Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Presidente, os direitos fundamentais, sendo direitos universais, não tern valorabsoluto; não ha nenhum direito, mesmo o direito a vida,quo tenha urn valor absoluto. São valores relacionais e têmde ser interpretados no limite do outros direitos. Se Vamos fazer a leitura do urn direito fundamental corn urnvalor absoluto, entAo, nao saimos daqui, pois entrarnos nodornfnio da ética e não no do direito.

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,ficárnos sensibilizados pam a dupla preocupacäo e vamosver se as conciliamos.

Creio que não vale a pena entrarmos no artigo relativoa farnflia, casarnento e filiação, que é complicado. Assim,talvez pudessemos suspender aqui os trabalhos e recomeçá-los na terça-feira, as 15 horas.

Tern a palavra o Sr. Deputado Fernando Amaral.

o Sr. Fernando Aniaral (PSD): — Sr. Presidente, creioque o Sr. Deputado Fernando Condesso pediu a V. Ex.que determinada rnatCria so fosse tratada quando viesse oSr. Deputado Costa Andrade...

o Sr. Presidente (Almeida Santos): — Sr. Deputado, jásakámos sobre essa matOria penal e processual penal, mas

se na prOxirna reunião estiver presente o Sr. Deputado CostaAndrade começarernos por af.

Segundo me recordo, he também urn pedido para seadiarern as matérias relativas a comunicaçAo social, queforarn objecto de propostas por parte do Sr. Deputackj RaulCastro.

o Sr. Antonio Fiipe (PCP): — Sr. Presidente, tenhoainda uma observaçao relativamente a matOria hoje emapreço.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Faça favor,Sr. Deputado.

O Sr. Antonio Filipe (PCP): —0 Sr. Deputado AlbertoMartins referiu-se a uma jurisprudência constitucional, quoexistiria, quanto a correcta interpretaçao da proibiçao detratamento de dados, que, na sua opinião, colocamia asquestöes de urna forma correcta, mas isso é urn argurnentoa favor da nossa posição.

Isto é, se as coisas estão corroctamente colocadas, emterrnos de intorpretação cônstitucional e de jurisprudCnciaconstitucional, entAo, por quo não deixarnos as coisas assirn? Se elas estão correctas, por quo razão haveromos deintroduzir aditamentos quo podorn vir a perturbar osseentendimento e levar a ideia de que havorá algo de novoquo podorá ser perversarnente utilizado?

Daf que nos pareca do elernentar bom-senso nao avancar corn este arlitarnento.

O Sr. Presidente (Almeida Santos): — Tern a palavrao Sr. Deputado Alborto Martins.

O Sr. Alberto Martins (PS): — Sr. Doputado, o nossoaditamento vai. ao oncontro, em termos literais, da soluçao apontada na directiva europeia sobre esta matOria.E apenas uma precisào relativarnente ao quo ostá colocado no texto constitucional.

Croio que a oste propOsito valoria apenas refemir o quediz a Constituiçao Anotada, de Gornes Canotilho e VitalMoreira quando rossalta que não C isenta de dificuldadesa questAo de saber so corn o consentimonto da pessoa sorCou não possfvel organizar ficheiros, bancos de dados ouregistos infommaticos corn dados pessoais, caso em que aautorizacão pessoal excluirá a ilicitude do complementoresponsCvel do ficheiro. Todavia, he que ponderar se nOsestamos perante a renimncia global a urn direito fundamental, dado quo muitas vezos o cidadAo não tern qualqueralternativa.

Estas forarn as questôes quo colocCmos, daf a vantagem dossa clariflcacão doutrinCria.

0 Sr. Presidente (Almeida Santos): — Srs. Deputados,nao havendo mais inscriçöes, dou por encerrada esta reuniâo. Reuniremos na prdxima terça-feira, as 15 horas.

Eram 18 horns e 30 minutos.

Estiveram presentes os seguintes Srs. Deputados:

Adão José Fonseca Silva (PSD).AntOnio Joaquim Bastos Marques Mendes (PSD).Fernando dos Reis Condesso (PSD).Fernando Moñtoiro do Amaral (PSD).Guilherme Henrique Valente Rodriguos da Silva (PSD).

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Joaquim Cardoso Martins (PSD).Jorge Avelino Braga de Macedo (PSD).José Lufs Campos Vieira de Castro (PSD).José Mendes Bota (PSD).Luls Filipe Garrido Pals de Sousa (PSD).Maria Margarida da C. e Silva Pereira Taveira de

Sousa (PSD).Miguel Bento Martins da Costa de Macedo e Silva (PSD).Pedro Manuel Mamede Passos Coelho (PSD).Rul Manuel Lobo Gomes da Silva (PSD).Rui Manuel Parente Chancerelle de Machete (PSD).Alberto de Sousa Martins (PS). -

Antonio de Almeida Santos (PS).José Alberto Rebelo dos Reis Lamego (PS).José Eduardo Vera Cruz Jardim (PS).José Manuel Santos de Magalhàes (PS).Luls Filipe Marques Amado (PS).Luls Manuel da Silva Viana de Sá (PCP).Maria Odete dos Santos (PCP).Isabel Maria de Almeida e Castro (Os Verdes).Luls Emfdio Lopes Mateus Fazenda (Indep.).Raid Fernandes Morals e Castro (Indep.).

A DivisAo DE REDAccA0 E Aoio AuDiovisuAL.

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196 II SERIE—NUMERO —RC

IDIARlO

a Assenibleia a RepthIica

I — Preco de pãgina para venda avulso, 9$OO (IVA inólufdo).

2— Para Os flOVOS assinantes do Didrio da Assembleia daRep1blica, o periodo da assinatura serã compreendido deJanefro a Dezembro de cada ano. Os nümeros publicadosem Outubro, Novembro e Dezembro do ano anterior quecompletam a legislatura serão adquiridos ao preco decapa.

Dep6sito legal .o.” 8819/85

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dcii er dirigidaaadniiuistraçdo (Ia Iiiiprcii’a Nacioiial—( a%a da ‘iloida F. I’.. I?ua ilc I). Francisco ‘ilanuel di \lclii. 5 —H11J2 1isliiia (iidi