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Sexta-feira, 25 de Outubro de 1996 II Série - RC - Número 45

VII LEGISLATURA 2.ª SESSÃO LEGISLATIVA (1996-1997)

IV REVISÃO CONSTITUCIONAL

COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL

Reunião de 24 de Outubro de 1996

S U M Á R I O


O Sr. Presidente (Vital Moreira) deu início à reunião às 21 horas e 50 minutos.
Procedeu-se à discussão de propostas de alteração aos artigos 166.º e 167.º constantes dos diversos projectos de revisão constitucional.
Usaram da palavra, a diverso título, além do Sr. Presidente, os Srs. Deputados José Magalhães (PS), Luís Marques Guedes e Barbosa de Melo (PSD), Luís Sá (PCP), Osvaldo Castro (PS), João Amaral (PCP) e Mota Amaral (PSD).
O Sr. Presidente encerrou a reunião eram 00 horas e 20 minutos.

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O Sr. Presidente (Vital Moreira): Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a reunião.

Eram 21 horas e 50 minutos.

Quanto ao artigo 166.º, tinha ficado por discutir uma proposta do PCP, de aditamento de uma alínea i), relativa à eleição pela Assembleia da República de membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República Portuguesa. Os proponentes não estão aqui, mas adopto a proposta para efeitos de discussão.
Como sabem, a alínea não se refere só a isso, refere-se também à Comissão para a Comunicação Social, mas como já vimos isso noutra sede, não vale a pena retomarmos essa discussão. O que há de novo aqui é a previsão de um Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações, que, aliás, não está previsto na Constituição noutro lado. Suponho que isto é a constitucionalização do que está na lei.

O Sr. José Magalhães (PS): Sim, Sr. Presidente, de facto propõe-se a constitucionalização do Conselho existente na lei.

O Sr. Presidente: Trata-se, portanto, da constitucionalização do que está na lei do sistema de informações.

Pausa.

Saliento, portanto, que se trata aqui de constitucionalizar aquilo que está na lei, ou seja, o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações, bem como o modo de designação de quatro dos seus membros.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, trata-se aqui de uma operação jurídica bastante complexa, da qual o aspecto que fez avultar é, obviamente, crucial, mas que tem outras componentes.
Por um lado, não se trata da mera transposição da solução legalmente consagrada, uma vez que esta se traduz num outro método de representação. A filosofia que preside ao Conselho implica uma eleição por maioria qualificada de 2/3 e busca um consenso alargado e distinto da eleição de candidatos indicados pelo conjunto dos principais partidos com assento na Assembleia da República. Não se trata, portanto, na filosofia da representação que está hoje consagrada, de uma representação com essa característica, mas de outra.
Por outro lado, a proposta tem uma outra componente, a de fixar uma mancha de competências ou, pelo menos, em matéria de poderes do Conselho, a de configurar, embora em sede de uma norma de competências da Assembleia, os poderes deste Conselho, numa reinterpretação ou numa versão reinterpretada daquilo que discutimos bastante longamente em sede de lei ordinária.
Como dissemos também no debate dessa lei, não nos reconhecemos nesse sistema; acabámos de aprovar a renovação do sistema anterior e, nesse sentido, não daremos consenso à proposta.

O Sr. Presidente: Visto que os Srs. Deputados do PCP acabaram de entrar na sala, tenho de lhes comunicar que, tendo começado a reunião, pus à discussão uma proposta da sua autoria, sendo que, para efeitos de discussão, eu próprio a adoptei. Refiro-me à proposta de aditamento de uma alínea i) ao artigo 166.º, na parte que até agora não estava prejudicada, ou seja, na parte respeitante à eleição de quatro membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações com poderes de inspecção directa. Discutimos apenas esta parte, já que o que respeita à Comissão para a Comunicação Social já tinha sido discutido e já estava, como tal, prejudicado.
O Sr. Deputado José Magalhães já interveio, manifestando o não acolhimento da proposta por parte do PS. De todo o modo, se quiserem apresentá-la ainda antes da intervenção dos Deputados do PSD, podem fazê-lo agora.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - (Por não ter falado ao microfone, não foi possível reproduzir as palavras do orador.)

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Deputado Luís Marques Guedes, creio que o alcance exacto da proposta resulta da própria prática, isto é, de relatórios do actual Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações que apontam para a sua própria impotência e para a sua carência de poderes. Isto para além de entendermos, naturalmente, que o Conselho de Fiscalização, com a participação dos quatro partidos mais representados na Assembleia da República, poderia ter uma pluralidade de perspectivas e uma eficácia que actualmente não tem.
A alusão que fazemos, por outro lado, aos poderes de inspecção directa resulta do próprio facto de os relatórios do actual Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações terem vindo, a propósito das questões que foram referidas na imprensa, a apontar a sua carência de poderes neste domínio.
Cremos, portanto, que, de algum modo, é uma proposta que emerge da própria prática nesta matéria, da aberta e confessada impotência dos serviços de fiscalização para intervirem neste domínio, e simultaneamente do facto de aquilo que tem vindo a público revelar que se impõe, em nome dos direitos fundamentais, uma fiscalização mais eficaz do que aquela que se tem verificado, que, na realidade, é pouco menos que nula, como mostram os próprios relatórios.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, de facto, a explicitação acabada de dar pelo Partido Comunista, como o Sr. Deputado Luís Sá teve ocasião de afirmar, não diverge significativamente da posição que o PCP tem mantido nesta matéria e que manifestou no debate que houve já nesta Legislatura, na Sessão Legislativa anterior, aquando da discussão de uma proposta de alteração da lei-quadro do Sistema de Informações. Também na altura o Partido Comunista, a propósito deste órgão que é o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações, defendeu uma alteração, não sei se nestes exactos termos mas seguramente no mesmo sentido daquele que foi agora explicitado pelo Sr. Deputado Luís Sá como sendo o objectivo desta proposta do PCP.
Quanto à alteração em causa, o Partido Social Democrata mantém a posição anteriormente expressa sobre esta matéria. Entendemos que o regime actualmente em vigor é perfeitamente adequado, desde logo em termos da composição

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do Conselho. De resto, este é um debate que tem vindo a ser travado na sociedade portuguesa e na Assembleia da República há vários anos e no qual o PSD, em posições diferentes - em determinada altura como partido do poder e neste momento como partido da oposição -, sempre tem defendido, chamando mesmo à colação aquilo que existe em termos de direito comparado, que o modelo que actualmente existe na lei-quadro do Sistema de Informações da República é o mais correcto.
Mesmo tendo em consideração as soluções existentes em outros países, como várias vezes o PSD já demonstrou e é do conhecimento público, o regime actualmente existente na legislação nacional sobre o Sistema de Informações e os órgãos de fiscalização prevê uma intervenção bem mais completa, presente e efectiva da parte do Parlamento do que aquela a que assistimos em países com os quais nos relacionamos de perto e que connosco partilham organizações internacionais com significado particular em áreas como a da segurança.
Como tal, a nossa posição é a de que a legislação ordinária está bem como está. Em qualquer circunstância, é de relevar um aspecto que não sei se o Sr. Presidente referiu quando introduziu a discussão, já que o Partido Comunista começa por constitucionalizar algo que actualmente não está na Constituição.
Actualmente, a Constituição da República, apenas pela norma residual da parte final da alínea i) do artigo 166.º, regulamenta uma eleição deste tipo e o PCP começa logo por solicitar a constitucionalização específica da nomeação para este Conselho de Fiscalização, o que coarcta também a actual liberdade do legislador ordinário para regulamentar esta situação.
Em conclusão, o PSD não vê a existência de quaisquer dados novos que alterem aquela que, ao longo do tempo, tem vindo a ser a sua posição. Digo-o com particular à-vontade, porque esta já era a nossa posição quando éramos partido do poder e continua a sê-lo agora que estamos na oposição. Temos opinião firmada sobre esta matéria há muito tempo e não vemos razão nenhuma para alterar, já que não nos parece que haja qualquer razão objectiva que aconselhe à constitucionalização da competência da Assembleia da República para a eleição dos membros do Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Presidente, nós não ouvimos a argumentação do PS, mas certamente não é substancialmente diferente da que acaba de ser produzida pelo PSD. O que podemos dizer nesta matéria é que a fiscalização é tão eficiente que não há Conselho de Fiscalização há um ano! A impotência do Conselho tem sido repetidas vezes confessada e inteiramente assumida e a verdade é que o próprio Conselho tem afirmado que sem poderes de inspecção directa não há verdadeira inspecção nem há verdadeira fiscalização; há, pura e simplesmente, impotência.
Aquilo a que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes chama de "liberdade do legislador estabelecer o regime que entender", tem sido, na realidade, a liberdade de criar uma situação em que a fiscalização não funciona. E creio que estaremos todos de acordo, pelo menos no que respeita a uma questão: é que este problema é fundamental para a defesa das liberdades públicas, para a defesa dos direitos, liberdades e garantias e para assegurar os direitos fundamentais. Ora, se se mantém uma situação que leva a que, por exemplo, não haja Conselho há um ano, estamos a criar um quadro que permite a existência de situações que não são certamente saudáveis para os direitos públicos, para os direitos dos cidadãos.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, de facto, não fazia tenção de voltar intervir sobre esta matéria, mas, face a esta nova intervenção do Sr. Deputado Luís Sá, penso que há aqui, até por uma questão elementar de justiça, algumas verdades que carecem de ser repostas.
Em primeiro lugar, quero esclarecer que o Sistema de Informações está em exercício de funções em Portugal praticamente há 10 anos. Depois, cumpre dizer que, para além desse Conselho de Fiscalização que aqui é citado, este sistema comporta também, de acordo com a sua lei-quadro, um outro órgão fiscalizador, a Comissão de Fiscalização, que é exclusivamente integrada por magistrados do Ministério Público. Estes magistrados, indicados pela estrutura da magistratura sem qualquer tipo de interferência dos partidos políticos, também velam sobre aspectos relevantes da actuação, em termos fiscalizadores, do Sistema de Informações. Mas é preciso dizer-se que ao longo destes 10 anos não houve nunca, da parte de nenhum dos órgãos de fiscalização, nem do Conselho de Fiscalização nem da Comissão de Fiscalização nem da parte da Assembleia da República - e isto também tem de ser dito porque a actuação e os relatórios destas comissões fiscalizadoras são submetidos à apreciação anual da Assembleia da República -, qualquer apontamento a actuações do Sistema de Informações fora da normalidade constitucional a que estão obrigados.
As situações que são do conhecimento público e que foram detectadas são estritamente pontuais e decorreram de inspecções próprias feitas aos serviços, não podendo de nenhuma forma ser confundidas, e isso ficou perfeitamente claro aquando da sua ocorrência, com orientações deliberadas da parte dos responsáveis dos serviços para que estes extravasassem as suas atribuições e competências legais e actuassem fora do objecto para que estão constitucionalmente e legalmente criados.
Penso que é profundamente injusto pôr em causa o Sistema de Informações, transmitindo-se a ideia que não é verdadeira de que estes actuam à margem do controle de legalidade democrática que existe no nosso Estado de direito e de que são, quiçá, um estado dentro do Estado, actuando e prevaricando a torto e a direito. Isso não corresponde minimamente à verdade e não quis deixar de intervir para deixar aqui bem expressa a verdade das coisas.
A verdade é que existem órgãos de fiscalização e se neste momento o Conselho de Fiscalização não está em funções - todos o sabemos e não vale a pena dizermos meias verdades - é porque a sua criação correspondeu a um processo marcado por motivações de política conjuntural, estando neste momento perfeitamente ultrapassado. Como tal, só não existe Conselho de Fiscalização porque existe uma necessidade de uma maioria de 2/3 e essas

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maiorias de 2/3 têm de ser conseguidas através de uma negociação política que, tanto quanto sei, está a decorrer.
Para além do mais, o facto de esta negociação não estar resolvida no caso do Tribunal Constitucional não leva seguramente ao entendimento de que o Tribunal Constitucional deve funcionar à margem da lei.
As situações são o que são e quando há razões políticas que as justificam não me parece adequado nem sério refugiarmo-nos nelas para lançar insinuações de menor cumprimento da legalidade e, neste caso, o que ainda é mais grave, de menor cumprimento de direitos e liberdades fundamentais, como são as questões que podem ser postas em causa pela actividade de serviços tão sensíveis como os que compõem o Sistema de Informações.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): Sr. Presidente, quero fazer apenas uma curta observação para tentar distinguir o plano em que estamos a fazer esta discussão.
É preciso dizer que não estamos a discutir a lei ordinária e menos ainda a fazer uma auditoria ao funcionamento histórico do Sistema de Informações. Estamos a considerar uma proposta do PCP cujas características ficaram há pouco assinaladas e constatámos que estas características implicam uma mudança de filosofia quanto à origem dos membros do Conselho de Fiscalização. Para mais, estas características têm como efeito a constitucionalização do Sistema de Informações, ou seja, esta é uma forma implícita de constitucionalizar a existência do Sistema de Informações, a propósito da regulação do seu Conselho. Esta seria, de resto, a única menção feita na Constituição ao Sistema de Informações…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Isso já existe!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não! Refiro-me apenas a estes termos! É certo que na área da competência da Assembleia da República encontramos esse enquadramento, que foi introduzido na revisão constitucional de 1989, não tendo sido, na altura, proposto pelo PCP. Agora é proposto por esse partido e, nesse sentido, é um passo que também assinalamos.
Mas agora não estamos a discutir o funcionamento da lei ordinária. A lei ordinária foi alterada, como todos sabemos, em Abril deste ano e esta alteração insere-se num processo de reforma que consta, de resto, do Programa do Governo, tendo-se traduzido, por um lado, num reforço de poder significativo, designadamente no sentido de assegurar o colmatar de brechas que tinham vindo a ser assinaladas no juízo corrente e tinham suscitado inquietação pública, e, por outro lado, no sentido de criar um novo mecanismo de audição parlamentar sobre a designação dos directores do Sistema de Informações. Isso foi consagrado e será oportunamente aplicado no quadro de um calendário a que o Governo tem vindo a fazer referência e que não está aqui em questão, a esta hora e nesta sede.
Do que se trata aqui é tão-só de saber, em primeiro lugar, se se deve mudar a filosofia orientadora, no sentido de substituir o actual sistema de designação complexa por maioria alargada de 2/3 por um outro sistema de representação pluripartidária, neste caso quadripartidária, com candidatos indicados em lista nominativa elaborada por cada um dos quatro partidos mais representados. Em segundo lugar, trata-se de saber se na Constituição deve haver uma menção expressa ao Conselho de Fiscalização, e, em terceiro lugar, de saber se deve haver uma fixação de parte dos seus poderes, aludindo-se à expressão "inspecção directa", que foi muito discutida por nós na altura em que elaborámos e revimos a lei ordinária. Pela nossa parte e de acordo com a fundamentação que então foi expendida, não a subscrevemos, mas dessa lei, como sabem, constam significativas ampliações da possibilidade de conhecimento por parte do Conselho daquilo que for oportuno.
Por outro lado, também não esquecemos - o Sr. Deputado Luís Marques Guedes, pertinentemente, teve ocasião de o sublinhar - que este Conselho funciona no quadro de um sistema muito complexo no qual estão, além da Comissão de Fiscalização de Dados, o Ministério Público, a magistratura judicial, a própria Assembleia da República, noutras vertentes, uma vez que este Conselho não prejudica o normal funcionamento do Parlamento, e o Presidente da República, dentro da sua esfera própria de actuação. Pela nossa parte, apenas dissemos que, por estas razões e não por outras, não acolheremos esta proposta.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): Se me desse a palavra só para…

O Sr. Presidente: Talvez seja vantajoso dar a palavra, em primeiro lugar, ao Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): Mas, se me der a palavra, o Sr. Deputado Luís Sá poderá responder a esta pergunta, que, no fundo, me faço a mim próprio depois de ouvir esta discussão toda. E o que pergunto é o seguinte: se o Conselho de Fiscalização do Sistema de Informações da República não funciona há um ano e tal, o que é que faz com que ele passe a funcionar estando na Constituição?! Não entendi! Não entendo o nexo de causalidade entre pôr algo na Constituição e fazê-lo funcionar, sobretudo quando se trata de um serviço que está previsto na lei e que não funciona porque as forças políticas não se entenderam para o efeito! O que é que adianta, para que algo funcione, pô-lo na Constituição?! Não entendo esta relação!

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá, a quem peço que seja breve, visto que irá intervir pela terceira vez.

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Deputado Barbosa de Melo, muito obrigado pela sua pergunta, que creio ser bastante esclarecedora num aspecto. Na verdade, a sua pergunta permite sublinhar aquilo que para nós é verdadeiramente fundamental. É que quando nós propomos um compromisso constitucional em torno da fiscalização, estamos a propor também, implicitamente, um compromisso constitucional em torno de uma actuação dos vários partidos que permita ao poder político passar a fiscalizar o Sistema de Informações, no sentido de garantir os direitos fundamentais eventualmente ameaçados. Esta é, portanto, a proposta de um

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compromisso constitucional e de um compromisso político decorrente do compromisso constitucional.
Naturalmente, partimos do princípio de que, se esta proposta viesse a ser aceite, viria a ser aceite também uma comissão de fiscalização pluripartidária, composta pelos quatro partidos, e dotada de poderes para, quando voltasse a ser dito que o Sistema de Informações se entregava a intervir em actividades estudantis, sindicais, partidárias ou quaisquer actividades ilegais deste tipo, houvesse a possibilidade de averiguar no concreto aquilo que se passava. Assim, permitiríamos inclusive que o Parlamento ficasse dotado de meios para averiguar até ao fim aquilo que verdadeiramente se passava, não ficando limitado às intervenções que repetidas vezes foram feitas sobre esta matéria.
Apenas compreendo que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes tenha aludido ao facto de não ter havido intervenção da Assembleia da República nesta questão porque ele, na altura, estava na Presidência do Conselho de Ministros e não na Assembleia, porque a verdade é que esta questão foi discutida ao ponto de Deputados que integram a Comissão de Fiscalização se terem demitido por entenderem que não tinham quaisquer meios para funcionar. É evidente que se pode dizer que essa foi uma manobra política, mas o que é verdade é que a situação permanece inalterada, a Comissão continua a não funcionar e continua a não estar dotada dos correspondentes meios. Julgamos que o facto de estarem lá representantes de vários partidos - de todos os partidos que aqui estão presentes e do PP - permitiria inclusive ao cidadão ter uma confiança na fiscalização do Sistema de Informações e na possibilidade de este respeitar os direitos fundamentais que de outra forma não teria.
Passaria agora à alusão que o Sr. Deputado José Magalhães fez à ideia de que estamos a constitucionalizar o Sistema de Informações para dizer que, na realidade, como o Sr. Deputado certamente bem sabe, o artigo 168.º, n.º 1, alínea r) estabelece como matéria da competência de reserva relativa da Assembleia da República o regime do Sistema de Informações e, portanto, isto corresponde…

O Sr. José Magalhães (PS): Peço desculpa! Provavelmente foi equívoco, porque o que eu queria dizer é que esta é uma proposta do PCP na qual, implicitamente, se constitucionaliza o Sistema de Informações. Naturalmente, a maioria parlamentar de 2/3, anteriormente, em 1989, consagrou…

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Deputado, em primeiro lugar, limitamo-nos a dizer aquilo que a Constituição já refere; em segundo lugar, referimos…

O Sr. José Magalhães (PS): Mas é positiva a vossa adesão a posteriori!

O Sr. Luís Sá (PCP): Não é, Sr. Deputado, não é! A realidade é que o PCP quer constitucionalizar o controlo do Sistema de Informações, sistema que já estava constitucionalizado desde 1989. De resto, Sr. Deputado, a proposta do PS relativa à audição parlamentar dos directores de serviços do sistema de informações reforçaria esta constitucionalização. Como tal, o problema,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Para o PS, não há problema algum!

O Sr. Luís Sá (PCP): - … uma vez que este sistema existe na realidade e que está na Constituição, é o de saber se se constitucionaliza a fiscalização, para que não haja um estado dentro do Estado e para que não haja uma ameaça aos direitos fundamentais. É esta a questão que está colocada e é este o problema que está em cima da mesa!
Para terminar e porque creio que a questão, embora importante, já vai longa, só queria dizer o seguinte: não gostaria de interpretar a intervenção do PSD como querendo significar que a existência de uma comissão de fiscalização de dados dispensa uma fiscalização dos serviços de informações como tal, porque fiscalizar dados não é fiscalizar serviços e actuação de serviços. E se houver qualquer possibilidade de confusão nesta matéria, que julgo que não é do Sr. Deputado Luís Marques Guedes e bem gostaria que não fosse, creio, então, que essa é uma concepção bastante grave, porque, pela nossa parte, entendemos que faz parte da garantia dos direitos fundamentais, no quadro que está criado, assegurar uma fiscalização adequada dos serviços de informações.
De resto, julgo que a experiência existente nesta matéria, designadamente em termos de direito comparado, mostra bem que é importante e útil uma fiscalização dos serviços de informações.
Repare que nós, para alegria do Sr. Deputado José Magalhães, não estamos a propor a extinção dos serviços na Constituição, mas apenas que estes sejam fiscalizados - queria que este aspecto ficasse bem sublinhado! Por isso, creio que esta é um proposta equilibrada, de sentido democrático, plural e que teria toda a vantagem para as liberdades públicas e os direitos fundamentais.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, a proposta não se mostra viável, pelo que vamos passar ao artigo 167.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, as propostas do PSD ficam para ser discutidas quando discutirmos a questão dos tribunais?

O Sr. Presidente: Quais propostas do PSD?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): O PSD tem propostas para a alínea h) e alínea i) do artigo 166.º.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, tanto a alínea h) como a alínea i) são relativas a órgãos e, como já tinha dito, tudo aquilo que se refira a órgãos será discutido noutra sede que não esta. Se alterarmos o método de designação dos juizes do Tribunal Constitucional e do Conselho da Procuradoria-Geral da República, voltaremos aqui para harmonizar este texto com o apuramento que fizermos no local próprio. Não se trata de não considerar essas propostas, trata-se apenas de não repetir aqui discussões que teremos de ter na altura própria.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, se quanto aos juízes do Tribunal Constitucional estou perfeitamente de acordo com a metodologia, quanto aos membros do Conselho Superior do Ministério Público parece-me que lá à frente nada é alterado. O PSD, de resto, lá à frente não tem proposta nenhuma.

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O Sr. Presidente: Mas há uma proposta de alteração de outro partido.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Ah! Está bem!

O Sr. Presidente: Já tomei nota de que há uma proposta do PSD que vai ser discutida noutra sede. Comigo todas as propostas serão discutidas, Sr. Deputado!

O Sr. Osvaldo Castro (PS): Sr. Presidente, peço desculpa mas não se trata do Conselho Superior do Ministério Público! O PSD não falou nisso!

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Osvaldo Castro, já assentámos que isso será discutido noutra altura.
Passando ao artigo 167.º, verificamos que para a alínea a) não existe qualquer proposta e que para a alínea b) existe uma proposta do Deputado António Trindade, se bem que seja relativa aos referendos regionais. Este Sr. Deputado propõe que aditemos o referendo regional, pelo que penso que podemos adiar a discussão desta proposta para a altura em que decidirmos consagrar ou não essa figura.
Já para a alínea j) existem propostas de alteração praticamente idênticas do PSD e do Deputado Guilherme Silva. Na realidade, ambas as propostas pretendem substituir a expressão "Eleições dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas" pela expressão "Eleições dos Deputados às Assembleias Legislativas Regionais", sendo que a proposta do PSD acrescenta, logo a seguir, a expressão "dos Açores e da Madeira".
Para o caso de quererem acrescentar algo ao mérito literário da proposta, têm a palavra os proponentes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Peço desculpa, Sr. Presidente, mas pensava que as matérias que têm que ver com as regiões autónomas seriam discutidas noutra sede.

O Sr. Presidente: Sim, mas esta aqui, a meu ver, é independente, porque se trata de harmonizar aquilo que é uma…

O Sr. José Magalhães (PS): Trata-se de uma correcção técnica, já que, ao contrário do que diz actualmente o artigo 167.º, alínea j), da Constituição, não há eleições dos membros do governo!

O Sr. Presidente: Exactamente, a proposta parece querer apenas fazer uma pura correcção técnica, já que, de facto, não há eleições dos membros do governo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas é só mesmo essa a função desta proposta!

O Sr. José Magalhães (PS): - É o único alcance e, desse ponto de vista, não merece objecção. É uma correcção técnica, pura e simplesmente.

O Sr. Presidente: - É por isso que penso que podíamos "arrumar" já esta proposta.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - É só esse o objectivo!

O Sr. Presidente: -Srs. Deputados, a proposta do PSD é no sentido de substituir na alínea j) a expressão "eleições dos titulares dos órgãos de governo próprio das regiões autónomas", pela expressão "eleições dos Deputados às Assembleias Legislativas Regionais dos Açores e da Madeira".

O Sr. José Magalhães (PS): - Uma objecção, Sr. Presidente: a proposta utiliza uma grafia diferente.

O Sr. Presidente: - Claro que as palavras "deputados" e "assembleias legislativas regionais" é com minúscula, de acordo com o léxico constitucional, mas isso veremos no final. Não vale a pena preocuparmo-nos com questões de maiúsculas ou minúsculas nesta sede.
Fica adoptada a proposta.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, é preciso uma maioria de 2/3 para fazer alterações deste género.

O Sr. Presidente: - O PS e o PCP estão a favor, pelo que a proposta é adoptada.

O Sr. José Magalhães (PS): - Até a vírgula carece de 2/3!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, para a alínea m) existem propostas do PS, do PCP e do Sr. Deputado João Corregedor da Fonseca, que defendem a eliminação desta alínea. Veremos na altura própria, ou seja, voltaremos aqui se os tribunais militares forem extintos.
Para a alínea n) existe uma proposta do PS que propõe alterar "regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais" por "criação, extinção e modificação das autarquias locais e respectivo regime".

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto! Elimina-se a palavra "territorial", Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Mas não é só! Na proposta do PS o problema fundamental não é esse. É atribuir à Assembleia da República…

O Sr. José Magalhães (PS): - São duas coisas: a eliminação da palavra "territorial" e a inclusão da expressão "respectivo regime".

O Sr. Presidente: - Não é, Sr. Deputado José Magalhães.
Hoje, a Constituição atribui à Assembleia da República a competência exclusiva para definir o "regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais". E, se leio bem a proposta, o PS acrescenta a essa competência a de criar individualmente cada uma das autarquias. Concordo com a proposta de alteração, mas assumamos o seu sentido.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é isso, rigorosamente. Só estava a anotar que a segunda alteração - que, de facto, não é a primeira, em termos de relevo - é a que consiste em suprimir a limitação territorial, hoje constante do texto. O aspecto principal é aquele que referiu.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, está em discussão a proposta do PS para alterar a alínea n) do artigo 167.º.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria saber se o Partido Socialista poderia explicitar melhor o verdadeiro alcance da alteração, porque actualmente, como o Sr. Presidente já deixou antever na sua chamada de atenção, estão divididas entre o artigo 167.º e o artigo 168.º as competências da Assembleia da República - umas são reserva absoluta e outras são reserva relativa - quanto às autarquias locais. A saber: no actual artigo 167.º está o que está, como o Sr. Presidente acabou de assinalar; e no artigo 168.º temos, na alínea s), o "estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais".

O Sr. Presidente: - Não tem nada a ver uma coisa com a outra!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Por isso é que estou a formular este pedido de esclarecimento.
Queria saber qual é o exacto alcance da modificação pretendida pelo Partido Socialista ao formular esta proposta. Muito concretamente, queria saber se, desde logo, pretende ou não alterar o actual âmbito da reserva absoluta e, em caso afirmativo, em que sentido e com que alcance.
Por outro lado, como agora se acrescenta no fim, o que não acontece no texto actual, "e respectivo regime", queria saber se isto tem algum conteúdo útil ou se é apenas uma forma considerada mais elegante literariamente, ou seja, se tem ou não tem algum significado material.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder, o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, Sr. Deputado Luís Marques Guedes, tem porque para fazer a interpretação correcta do artigo 167.º, em conjugação com o que se expõe no artigo 168.º, é necessário fazer uma visita guiada a outras disposições constitucionais, designadamente as que dizem que a criação administrativa do território é estabelecida por lei, o artigo 249.º que diz que "a criação ou a extinção de municípios, bem como a alteração da respectiva área, é efectuada por lei", etc., etc.
Ou seja, nessa matéria, da lei não se pode fugir, o que é positivo. A questão é saber que lei: lei elaborada ao abrigo da norma que institui e define a reserva absoluta de competência legislativa ou o artigo 168.º, que é aquele que é aplicável na falta de inclusão específica no artigo 167.º.
Portanto, a proposta do Partido Socialista, como no início o Sr. Presidente sublinhou, tem como característica, por um lado, o facto de inequivocamente estatuir que o acto de criação - que é obrigatório que seja feito por lei, nos termos do artigo 249.º e outros - deve ser um acto indelegável, ou seja, insusceptível de ser praticado por outrem que não pela Assembleia da República, o que aliás, se bem me lembro, nunca aconteceu na experiência constitucional portuguesa. Sempre a Assembleia da República se recusou a conceder autorizações legislativas, embora o pudesse fazer neste domínio, e sempre criou ela própria o que teve de criar neste aspecto, com prudência e no quadro de um debate que não vou trazer para aqui, mas um debate bastante interessante sobre a questão da divisão territorial.
A nossa alteração é, portanto, dupla: clarificação e alargamento da reserva absoluta de competência legislativa.
Quanto ao regime de criação, apenas se clarifica que o regime de criação, extinção e modificação territorial deve abranger também todos os aspectos de alteração das autarquias locais, porque eliminamos o inciso territorial.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta do PS, de facto, vai no sentido de acrescentar à actual reserva absoluta da Assembleia da República quanto ao regime de criação o próprio acto individual de criação de cada autarquia local.
Penso que é uma proposta positiva. Só que, quanto ao segundo aspecto, isto é, quanto à criação, deve ressalvar-se o artigo 229.º, porque a Constituição atribuí às assembleias das regiões autónomas o poder para criar ou modificar autarquias locais nas regiões autónomas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - O que se pretendia aqui era atribuir à Assembleia da República uma competência que nas regiões autónomas pertence às assembleias regionais, não permitindo que um município ou uma freguesia seja criado pelo decreto-lei governamental, mas seja sempre criado por lei da Assembleia da República, no respeitante ao continente, ou por decreto legislativo regional no que respeita às regiões autónomas, o que já está consagrado. Portanto, haveria, na proposta do PS, que ressalvar o artigo 229.º, na parte respeitante à criação. Já quanto à lei-quadro de criação, essa é da competência da Assembleia da República.

O Sr. José Magalhães (PS): - De facto, não pretendemos alterar em nada os poderes das assembleias legislativas regionais.

O Sr. Presidente: - Creio que sim, porque não propuseram a alteração do artigo 229.º nessa área.
Srs. Deputados, está em discussão esta proposta com este sentido.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que esta proposta, de algum modo, vem dar cobertura constitucional àquilo que tem vindo a ser a prática, inclusive àquilo que é a lei ordinária, colocando, aliás, um facto bastante curioso, que é o de atribuir exclusivamente à Assembleia da República uma competência que é duvidoso que, atendendo à Constituição tal como está, lhe caiba exclusivamente. O regime que está actualmente em vigor aponta para a exclusividade de competência parlamentar numa matéria que, se calhar, do ponto de vista constitucional, é matéria de competência concorrencial.
Parece-nos que, do ponto de vista político,…

O Sr. Presidente: - Eu não subscrevo esse ponto de vista!

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu também não, aliás!

O Sr. Presidente: - Penso que esta proposta se limita a esclarecer um ponto que é perfeitamente comportável com

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o actual texto constitucional. Sou menos complacente que o Sr. Deputado Luís Sá, mas prossiga.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Melhor ainda, Sr. Presidente! Creio que esse entendimento reforça, em todo o caso, a necessidade de um esclarecimento que se justifica plenamente.
Do ponto de vista político, parece-nos inteiramente justificado que seja o Parlamento a criar, extinguir ou modificar as autarquias locais e que não seja o governo, que pode, inclusive - estou pensar, designadamente, num período pré-eleitoral -, utilizar o acto para efeitos estritamente demagógicos, sem ter em conta quaisquer propósitos de reorganização territorial, administrativa ou de qualquer tipo.
Era referido, de resto, o facto de o governo de Marcelo Caetano, por exemplo, ter promovido Almada ou Espinho a cidade com óbvios objectivos demagógicos, que são conhecidos.

O Sr. José Magalhães (PS): - É certo que ao abrigo da Constituição 1933, se bem me lembro.

O Sr. Luís Sá (PCP): - É certo que ao abrigo da Constituição 1933, mas creio que, em todo o caso, este facto só reforça a necessidade e a vantagem da proposta que é apresentada.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Barbosa de Melo.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Estou um pouco perplexo pela discussão que tenho estado a assistir.

O Sr. Presidente: - Explique-nos porquê, Sr. Deputado.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Sr. Presidente, a Constituição inclui na reserva absoluta da competência da Assembleia da República o regime de criação, extinção e modificação territorial das autarquias locais. Na minha opinião, devemos considerar a modificação territorial como um elemento do regime, visto que estamos a tratar de pessoas colectivas, como diziam os civilistas de antanho, de população e território, ou seja, o território faz parte integrante da pessoa colectiva, é um elemento essencial dela.
A alínea n) do artigo 167.º estabelece uma reserva absoluta sobre aquilo que o PS propõe agora. Não sei se modifica alguma coisa...

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, Sr. Deputado. Reserva absoluta em relação ao regime e não em relação ao acto de criação concreta. Mas isso tem sido líquido, Sr. Deputado Barbosa de Melo, entre nós. Não tem suscitado dúvidas.

O Sr. Presidente: - Penso que há um equívoco do Sr. Deputado Barbosa de Melo.
Há uma lei-quadro de criação, que estabelece em que condições é que se podem criar freguesias, municípios, etc.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Certíssimo! Isso é da reserva absoluta de competência da Assembleia da República.

O Sr. Presidente: - Exacto! Isso é da reserva absoluta. Mas a Constituição, hoje, não reserva para a Assembleia da República a lei de criação. Portanto, o que o PS propõe é que o acto de criação seja também da Assembleia da República.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Mas isso é que me parece desnecessário como reserva absoluta. Se a Assembleia da República o quiser fazer, fixa isso.

O Sr. Presidente: - O PSD entende que podem ser criados pelo governo.

O Sr José Magalhães (PS): - Mediante autorização legislativa.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Depende do regime legal.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - E as regiões, Sr. Presidente?

O Sr. José Magalhães (PS): - As regiões estão no artigo 229.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não estão!

O Sr. José Magalhães (PS): - Está a falar das regiões administrativas?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Pois!

O Sr. Presidente: - Essas, como têm um regime especial, não cabem aqui!

O Sr. José Magalhães (PS): - Essas têm um regime especialíssimo!

O Sr. Presidente: - Não crie problemas, Sr. Deputado!

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Desculpem, mas não me faz sentido!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O Sr. Presidente perguntou se entendia que o governo não pode criar. E eu pergunto: e as regiões? Por que não as regiões?

O Sr. Presidente: - Quais regiões, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, porque é que a lei-quadro não há-de poder, constitucionalmente, por hipótese, se vier a haver regiões, remeter para as regiões a competência para criarem…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, nunca! Falemos sério!

O Sr. José Magalhães (PS): - Criar novas autarquias?!
A região administrativa criar mais municípios?! Nunca ninguém aventou, mas num concurso de originalidade ganha!

O Sr. Presidente: - Não estamos a fazer campeonatos de originalidade!

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Essa mania de atribuir sempre os males ao governo…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, por favor, a questão é simples: um município deve ter uma carta de criação da Assembleia da República ou deve ter uma carta de criação por decreto-lei do Governo? É esta a questão!
Se o PSD entende que deve continuar assim, diga que vota contra e assuma os custos políticos disso. O PS propôs e propôs bem...

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - A constitucionalização do acto constitutivo tem de ser lei da Assembleia da República! Não é preciso explicar muito o que é evidente, percebe-se logo!

O Sr. Presidente: - Está bem! Mas pareceu-me que não estava claro!
Portanto, o PSD opõe-se.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Penso que isto é uma inutilidade. Obriga, depois, a mudar o artigo 229.º e a fazer aqui engenharias várias.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não obriga, não!

O Sr. Presidente: - Não obriga nada! O artigo 229.º está de acordo com isto!

O Sr. José Magalhães (PS): - No artigo 229.º já é assim!

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, só queria dizer que há duas dificuldades aqui: uma é a de considerar que a Constituição implicitamente já atribui esta competência…

O Sr. Presidente: - Não atribui! O que permite é que a lei-quadro atribua. Portanto, quando a lei-quadro atribui à Assembleia da República está correcta, não é inconstitucional. Agora, não impõe!

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, deixe-me levar o meu raciocínio até ao fim, porque é relativamente simples. Havia essa hipótese, embora o Sr. Presidente diga que não. No fundo, tem havido um entendimento desse tipo e vou explicar porquê. De facto, as leis que definem o regime de criação e o atribuem à Assembleia da República - é por isto que falo directamente ao PSD -, até aqui, têm sido consideradas um património tão seguro, tão seguro que deve ser a Assembleia que não se entende por que é que não deve figurar, então, na Constituição de forma clara e explícita.

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Não é necessário!

O Sr. João Amaral (PCP): - O Sr. Deputado Barbosa de Melo pertence a um partido que teve durante 8 anos de maioria absoluta no Parlamento. Passaram pela cabeça do seu partido várias coisas, e executou várias, mas essa não passou pela cabeça do Sr. Deputado nem ninguém do partido quis fazer isso, porque assumem que deve ser a Assembleia. E, então, pergunto: se entendemos todos que deve ser sempre a Assembleia, por que é que uma proposta tão simples, tão clara e tão fácil, como é a do Partido Socialista em relação a isto, não deve ser aceite?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - É só por uma questão de utilidade da reforma, Sr. Deputado! Para quê?

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Deputado Barbosa de Melo, se a proposta é útil, porquê esse entendimento?

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Se V. Ex.ª atribui todos os males a essa tal maioria, que nem sequer esse malefício quis fazer, qual é a utilidade da proposta?

O Sr. João Amaral (PCP): - Eu, que atribuo tantos males ao PSD, não lhe atribuí esse. Portanto,…

O Sr. Barbosa de Melo (PSD): - Portanto, é porque isso não é necessário!

O Sr. João Amaral (PCP): - Portanto, tem de considerar que pode aparecer, algum dia, alguém que perversamente entenda isso. Assim, era útil que este entendimento democrático que todos temos aqui seja consagrado.
Se há situações em que não se entende bem por que é que não se há-de consagrar uma coisa, quando estamos todos tão empenhados e de acordo, é esta! E é por isso que apelo, muito concretamente, para que este entendimento fique clarificado, até para que ninguém, depois, tire de uma discussão como esta interpretações perversas.
A melhor forma de resolver esta questão é, de facto, assumir a proposta do PS, que me parece uma proposta razoável, sensata e que não levanta nenhum problema.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, a questão, da parte do PSD, merece, como já aqui foi expresso pelos Srs. Deputados Barbosa de Melo e Luís Marques Guedes, alguma oposição, apesar de poder ser também objecto de reconsideração. Em todo o caso, se porventura se viesse a encontrar o consenso indispensável para a alteração do artigo em causa, conforme a proposta que apresenta o Partido Socialista, seria preciso salvaguardar de forma muito cautelosa…

O Sr. Presidente: - Foi eu que o disse, Sr. Deputado Mota Amaral!

O Sr. Mota Amaral (PSD): - O Sr. Presidente teve muita cautela em fazer isso e fez muito bem, porque o Partido Socialista não tinha feito essa salvaguarda!

O Sr. Presidente: - Não é preciso! Como sabe, o princípio regra/excepção não é preciso ser estabelecido.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Não, Sr. Presidente. O senhor é um hábil constitucionalista, mas…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mota Amaral, não lhe concedo essa…

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Não, mas é extremamente importante. Porque, então, para ser correcto, seria preciso dizer aqui - e desafio o Partido Socialista a escrever

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dessa maneira - que a reserva da competência atribuída à Assembleia da República seria fazer…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mota Amaral, fui eu que propus…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sem prejuízo do disposto no artigo 229.º da Constituição.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Mas não está aqui posto!

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas passa a estar, Sr. Deputado!

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mota Amaral, não invente fantasmas, por favor. Fui eu próprio que aditei isto!

O Sr. José Magalhães (PS): - Alertou!

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Não me consta que o Sr. Deputado Vital Moreira fale em nome do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Não! Quando falo ou intervenho na matéria de fundo não é como Presidente mas, obviamente, como subscritor do projecto do Partido Socialista.

O Sr. José Magalhães (PS): - Como parte!

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Mas a redacção teria de dizer que a Assembleia da República ficaria com a competência superior para criar as autarquias locais no continente.

O Sr. Presidente: - Sem prejuízo da tal alínea do artigo 229.º

O Sr. Mota Amaral (PSD): - O que não estava aqui escrito!

O Sr. Presidente: - Mas foi explicitado.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado Mota Amaral, de boa-fé e de forma espontânea, foi declarado, bem antes do Sr. Deputado ter atentado na proposta, que era esse o seu alcance único.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Deputado José Magalhães, a minha primeira reacção, ao abrir-se esta discussão, foi ir procurar o artigo 229.º, porque quando esta questão foi debatida em anterior revisão constitucional (creio que logo na de 1982) a redacção foi assim feita para salvaguardar uma pretensão que as regiões autónomas, com todo o rigor, fizeram na altura e que levou à inclusão dessa alínea j) no artigo 229.º, que não constava da redacção inicial.

O Sr. José Magalhães (PS): - Claro que sim, Sr. Deputado! Por consenso alargado e, aliás, unânime!

O Sr. Mota Amaral: - Não me lembro se nessa altura terá sido unânime.

O Sr. Presidente: - Foi unânime, Sr. Deputado!

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Tem a certeza?

O Sr. Presidente: - Foi! Tenho a certeza! Até o PCP!
Sobre isso não vale a pena levantar questões.

O Sr. José Magalhães (PS): - Portanto, não há aí guerra nenhuma!

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, por favor! Penso que não vamos prolongar esta discussão. A questão é simples, está clarificada, é questão de dizer sim ou não.

O Sr. José Magalhães (PS): - Fica para maturação!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto à questão da extinção da territorialidade, com franqueza, não vejo que outro tipo de modificação é que pode existir relativamente às autarquias locais, porque, como é evidente, ou se cria, ou se extingue ou se modifica territorialmente. Não vejo por que é que se tira a palavra "territorial". O único sentido útil é para permitir outro tipo de modificações que não apenas as territoriais, mas não vi ainda explicitado que modificações nem estou a ver muito bem quais é que podem ser.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se uma determinada autarquia com o digno nome de x vir algum dia alterado o seu digno nome de x para o digno nome de y, isso carece de decisão, não tenho dúvida nenhuma. Até isso!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Isso é uma modificação?

O Sr. José Magalhães (PS): - É! É uma denominação e uma denominação significativa! E não é preciso ter a imaginação do Herman José para imaginar algumas alterações possíveis. Em termos de modificações, podemos imaginar muitas, tais como as designações, e há outras modificações que podem ser relevantes e inseridas na competência da Assembleia.
Sr. Deputado, não é mais do que uma questão de direito administrativo. Todos poderemos mergulhar os olhos no terreno das modificações possíveis.
Creio que não se perderia nada com isso, ganhar-se-ia seguramente, até porque de contrário gerar-se-ia uma discrepância: de um lado a Assembleia fá-lo-ia; do outro lado, presumo, outra entidade poderia fazê-lo, com autorização ou, numa interpretação mais generosa, sem autorização.
Não regressemos a Marcelo Caetano. Não vale a pena!

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se a explicação que o Partido Socialista acabou de dar é correcta, porque é que na tal alínea do artigo 229.º, em que não se fala em territorial mas na respectiva área -

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"modificar na respectiva área" -, não sentiu necessidade de retirar e aqui sente?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, se me permitir, vou explicar.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, sinceramente, começo a ficar enfastiado com esta discussão. É que isto não vale 5 minutos, quanto mais meia hora!...
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta interrogação do Sr. Deputado Luís Marques Guedes merece-me respeito mas não merece que nos tardemos muito nessa questão.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O seu argumento é que não me convenceu!

O Sr. José Magalhães (PS): - Estou disponível, Sr. Deputado, para maturar também a sua interrogação e procurar uma resposta melhor durante a noite e na próxima semana trocaremos impressões.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta não tem acolhimento por parte do PSD. Passamos à frente.
A proposta do CDS-PP fica prejudicada, porque tem a ver também com os referendos regionais.
Vamos passar à alínea p), para a qual há uma proposta do PS, mas suponho que tem a ver com uma proposta mais à frente…

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem a ver com a mesma coisa. É uma transferência de matéria hoje incluída na reserva relativa, por razões que são inteiramente óbvias.

O Sr. Presidente: - Não, não é isso, Sr. Deputado José Magalhães.
Acrescenta à alínea p) do artigo 167.º a expressão "bem como por agentes das força de segurança". Penso que esse acrescento tem a ver com uma proposta feita mais à frente…

O Sr. José Magalhães (PS): - Tem razão, Sr. Presidente. Peço desculpa! Não é uma reinserção, é o aditamento do inciso. Estava a analisar a proposta seguinte, que é a alínea q).

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, discuti-la-emos na altura própria. Quando discutirmos o artigo 270.º, voltaremos à proposta do PS para o artigo 167.º, alínea p).
Srs. Deputados, vamos passar às propostas que aditam ao artigo 167.º um conjunto de outras matérias que passariam a ser de reserva absoluta de competência da Assembleia da República.
Assim, o CDS-PP propõe o aditamento das seguintes matérias: "regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais", que vem do artigo 168.º.

O Sr. José Magalhães (PS): - Como o PS, na alínea s).

O Sr. Presidente: - Existe igual proposta por parte do PS e do PCP.
Srs. Deputados, estão em discussão as propostas do CDS-PP, do PS e do PCP de transferir da competência relativa para a competência absoluta da Assembleia da República o "regime geral de elaboração e organização dos orçamentos de Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais", que hoje está no artigo 168.º, alínea p), e passaria para o artigo 167.º.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, a proposta auto-explica-se. Parece-nos importante que seja da exclusiva competência da Assembleia legislar sobre matéria tão importante e, aliás, dificilmente é concebível que seja o governo a definir o enquadramento da elaboração do orçamento, tanto do orçamento de Estado como dos orçamentos a que se referem os incisos seguintes desta norma.
Creio que não é por acaso que esta proposta surge partilhada por um espectro significativo de proponentes.

O Sr. Presidente: - A que falta a adesão do PSD.
O PCP quer acrescentar alguma coisa à proposta?
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Não, Sr. Presidente. Creio que a proposta se justifica por si mesma. Creio que um poder fundamental dos parlamentos é, exactamente, o poder orçamental e que, nesse sentido, a proposta tem ampla justificação.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, não quero ser desmancha prazeres, mas, por exemplo, o argumento…

O Sr. Presidente: - Claramente, hoje traz o recado do "não"!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, não estou enfastiado, Sr. Presidente.
Mas comentando, por exemplo, o argumento que acabou de ser dado pelo Sr. Deputado Luís Sá, é evidente que isto é competência da Assembleia da República, e já está no artigo 168.º. Está fora de causa que é evidente que é competência da Assembleia.
O que está por provar, e nem o PS nem o PCP fizeram aqui qualquer argumentação sobre isso, e convinha que fizessem, é por que é que não pode ser feito por autorização legislativa o que quer que seja. Convinha que dissessem qualquer coisa sobre isso, ninguém disse e é isso que está aqui em causa. Porque já é competência da Assembleia, com certeza, e ninguém propõe que deixe de ser.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, sendo o orçamento elaborado pelo governo e sendo a lei-quadro do orçamento para vincular o governo, não lhe parece razoável que haja aí uma distinção obrigatória e que a lei-quadro do orçamento seja sempre elaborada pela Assembleia e não pelo próprio governo? Não lhe parece que isso é argumento bastante?
Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.

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O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sr. Presidente, permita-me uma observação. Não sei se será muito curial que, no caso do artigo 168.º, o Sr. Presidente intervenha simultaneamente como Presidente e como porta-voz do Partido Socialista.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mota Amaral, por favor! Não vá agora retirar-me o direito de intervir na discussão de fundo das propostas.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Sendo Presidente da Comissão, devia de situar-se a um nível de imparcialidade!

O Sr. Presidente: - Não violo as regras de inscrição e de liberdade de debate.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - Bom, quanto a isso, também temos de discutir, não é? Não está muito claro.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Mota Amaral, admito-lhe todas as reclamações, quando se sentir preterido. Retirar-me o direito de intervir na discussão de fundo... é coisa que, obviamente, não prescindo.

O Sr. Mota Amaral (PSD): - De qualquer maneira, não deixo de colocar aqui a minha opinião sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado reclamará. Fica registada a sua opinião.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, respondo com toda a franqueza à questão que me coloca.
É evidente que não me parece, porque, para me parecer isso relativamente ao actual regime de elaboração e organização do Orçamento do Estado, a alínea p)… Posso referir-lhe uma série de outras situações, previstas nas alíneas anteriores, por exemplo a criação de impostos e o sistema fiscal, que obviamente também têm de ser competência da Assembleia, já constam do artigo 168.º, mas em que se continua a permitir a autorização legislativa!
Assim, quanto a esse argumento de o enquadramento orçamental ter de ser uma matéria da competência da Assembleia da República, estamos de acordo; já quanto a ter de ser reserva absoluta… É que pelo menos algumas das 10 alíneas anteriores deste artigo 168.º podem ser objecto do mesmo tipo de argumentação no sentido de deverem ser matérias de reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia.
Expliquem porquê, não basta dizer que é por se tratar do Orçamento! Então, os impostos e o sistema fiscal não são também algo importantíssimo?! E, no entanto, o PS não propõe que essa matéria saia do 168.º e passe para o 167.º! Como tal, esse argumento não me parece suficiente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, o argumento de que por ser competência da Assembleia já está incluído no artigo 168.º é francamente insuficiente. O Sr. Deputado sabe bem que está prevista no artigo 171.º e noutros, bem como no Regimento, uma forma especial de discussão e votação para os diplomas que versam sobre matéria de reserva absoluta de competência, o que garante que estes diplomas são objecto de um exame pormenorizado e do princípio do contraditório, artigo a artigo, o que, obviamente, pode não se verificar quando se trata de reserva relativa de competência.
Como tal, quando propomos a transferência de uma matéria da reserva relativa para a reserva absoluta, fazêmo-lo por entendermos que a mesma é suficientemente relevante para merecer o exame com garantias de processo, de procedimento e de votação que correspondam à importância que damos a essa matéria e que quando se trata de reserva relativa de competência pode não se verificar, exactamente porque, como é sabido, uma vez conseguida a autorização, o governo pode aprovar o correspondente diploma, não havendo as mesmas garantias que existem no procedimento e na votação de uma matéria de reserva absoluta.
Ora, pela sua importância política, entendemos que esta matéria merece a inclusão na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República.
Efectivamente, a questão é a de que não existem as mesmas garantias em matéria de procedimento e de votação no que toca à profundidade do debate e à profundidade das garantias do contraditório. Creio que este aspecto é fundamental.
Ligado a esta questão está o problema do acompanhamento, da participação da opinião pública. De resto, o Sr. Deputado conhece a importância que tem assumido, em todo o direito público, a preocupação com o procedimento, com o carácter democrático do procedimento, que tanta gente considera ser pelo menos quase tão importante como aquilo que acaba por ser finalmente aprovado para o funcionamento de uma democracia, designadamente para garantia de princípios como o da democracia participativa, que tem ampla consagração na Constituição e que tem de ter também ampla consagração na prática.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, creio que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes nos merece todo o respeito e que é legítimo o pedido de justificação da proposta, ao qual não gostaríamos de deixar de corresponder.
Verdadeiramente, há alguma coisa que nunca passou, na nossa experiência constitucional, pelos projectos políticos de governo nenhum, qual fosse o de pedir uma autorização legislativa para fazer a lei de enquadramento para o Orçamento do Estado, ou algum dos outros diplomas referidos. Tal nunca aconteceu e seguramente que não é por acaso.
É bem verdade que a proposta que apresentamos, de reinserção sistemática, com o significado que já ficou sublinhado, não resolve todos os problemas, designadamente o de delimitação rigorosa daquilo que fica na esfera do governo e daquilo que ainda deve ficar na esfera da Assembleia da República.
Depois da revisão constitucional de 1982, que operou a grande, grande mudança nesta matéria, ao cometer à Assembleia da República o poder, a competência para aprovar, ela própria, o Orçamento, fizemos um esforço de elaboração que conduziu, de resto, a uma separação e distinção desses momentos de intervenção e elaboração, no

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sentido da restrição da intervenção governamental mesmo na esfera onde ela é legítima. Ou seja, depois de definido pela Assembleia da República o regime geral de elaboração e organização orçamental, ainda cabe ao governo uma vasta margem de matéria, por um lado, no desenvolvimento, por outro lado, no cumprimento daquilo que decorra da lei, e, por outro lado ainda, no regime de execução do Orçamento.
No entanto, mesmo nessa matéria, todos os anos os governos, sem interrupção e sem variação, têm vindo a incluir no próprio seio do orçamento normas de enquadramento do regime de execução do mesmo, sem prejuízo de depois o decreto orçamental vir a incluir ainda disposições adicionais de intervenção organizatória do regime de execução. Isso é muito importante e faz parte da capacidade de gestão orçamental governamental que deve ser preservada.
O que gostaria de sublinhar, e é essa a razão pela qual faço este excurso, é que não pretendemos alterar a margem de liberdade governamental neste ponto, que é crucial.
Agora, quanto ao enquadramento, quanto ao regime geral, como a Constituição lhe chama, de elaboração e organização do orçamento, suponho que não há nenhuma vantagem em deixar de consagrar aquela que tem sido a prática uniforme ao longo das décadas de funcionamento da Constituição, antes creio ser vantajoso que o façamos.
Em relação às autarquias locais, pode colocar-se a questão de saber se não vamos longe de mais, ou seja, se em relação a aspectos de organização e de elaboração dos orçamentos, a legislação, por exemplo de enquadramento do recente funcionamento das autarquias locais e seus órgãos, não pode incluir uma zona eventualmente delegável ao governo em que esta matéria seja razoavelmente susceptível de normação não parlamentar, embora sob autorização limitada e condicionada nos termos que todos sabemos.
Francamente, embora a dúvida seja colocável em abstracto, não nos pareceu valer a pena fazer uma distinção e também não creio que na prática constitucional portuguesa a questão se tenha colocado em termos sensíveis de uma reivindicação governamental de necessidades, de oportunidade, de legislação delegada, autorizada para definir aspectos de organização dos orçamentos autárquicos.
Tudo dito, francamente, esta é uma operação vantajosa para clarificações, "consistentizações" de prática, se a expressão me é permitida, na qual não tem havido variações significativas nas mais diversas situações, inclusivamente as geradas pela alternância política.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, agradeço esta exposição do PS e quero expressar aqui a posição do PSD, porque, aparentemente, face à explicação clara e, diga-se em abono da verdade, sensata do Sr. Deputado José Magalhães, há de facto algumas zonas onde a questão se pode colocar.
Na visão do PSD, o instituto da reserva relativa de competência, por contraposição ao da reserva absoluta, radica fundamentalmente em preocupações de mera operacionalidade e não de maior segurança ou certeza jurídicas. Com franqueza, e é com toda a tranquilidade que o dizemos, não temos essa visão do instituto da reserva relativa de competência da Assembleia. Aliás, por isso é que existem as cautelas dos n.os 2 e 3 do 168.º e o instituto da ratificação poderá ter lugar não só nestes casos mas também nestas circunstâncias, obviamente. Não temos do instituto da reserva relativa de competência a visão de que ele possa, de algum modo, diminuir a segurança, ou tão-pouco a dignidade jurídica, e a certeza atinente às matérias em causa.
De facto, temos deste instituto uma visão de operacionalidade do exercício das competências legislativas, do processo legislativo. Parece-nos que o instituto da reserva relativa está já suficientemente escorado, em termos de segurança e certeza jurídica e de dignidade das matérias em causa, pelas regras constitucionais de utilização das autorizações legislativas.
Face a este entendimento, confesso que o PSD tem alguma dificuldade em compreender propostas que se limitem meramente a transportar matérias da reserva relativa para a reserva absoluta sem alterações qualificativas de monta, só porque aparentemente parece que se pretende - desculpem a expressão, mas penso que entenderão o que quero dizer - medalhar ou dar um valor ou uma importância acrescida a um determinado instituto.
De facto, não é essa a visão que temos da contraposição reserva absoluta/reserva relativa, mas apenas uma lógica de operacionalidade. Assim sendo, não nos parece minimamente que haja qualquer diminuição da segurança, da certeza, das garantias relativamente às matérias que aqui estão em causa.
O PCP, por exemplo, cita como eu tinha dito, mas o PS não o faz. Também altera a transposição da criação de impostos, que, digo com franqueza, parece…

O Sr. Presidente: - Lá chegaremos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!
Como dizia, com toda a franqueza, aquela parece-me ser claramente, no elenco das alíneas do 168.º, uma matéria onde o cuidado a ter deve ser superior à mera lei do enquadramento.
Agora, em abstracto, digo com toda a tranquilidade que o PSD tem esta visão diferenciada, e por isso não entendemos muito bem - a não ser que haja uma qualquer razão palpável, objectiva, muito significativa para justificar que estas matérias tenham de passar a ser exclusivamente da competência legislativa da Assembleia da República e em nenhuma circunstância possam ser delegadas, através de autorização legislativa, noutro órgão de soberania.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, face à objecção do PSD, esta proposta não tem viabilidade.
Vamos passar à proposta do CDS-PP relativa à alínea r) do artigo 167.º, que é do seguinte teor: "Princípios fundamentais do sistema fiscal". Visto que os proponentes não estão cá, adopto-a, para efeitos de discussão, entendendo que o que se pretende com esta proposta é uma espécie de lei-quadro do sistema fiscal.
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, creio que é exactamente disso que se trata.
Tivemos ocasião de discutir essa matéria quando, na sede própria, no sistema fiscal, apreciámos uma proposta do PP que visa impor a existência desse instrumento de

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clarificação e de definição principológica cujo alcance, na altura, nos mereceu interrogações e reticências e não concluímos por um liquet quanto à pertinência da imposição de existência na ordem jurídica dessa camada normativa principológica.
Em consonância, transpomos essa posição também para esta sede.

O Sr. Presidente: - Tem razão, Sr. Deputado. De facto, esta proposta do PP tem a ver com a proposta que eles tinham feito para o artigo 106.º, n.º 3, do seguinte teor: "Os princípios estruturantes do sistema fiscal serão definidos por uma lei geral tributária". Essa proposta foi rejeitada no momento próprio, pelo que está prejudicada e passamos à frente.
A alínea s) do projecto do CDS-PP, "Regime geral das relações financeiras entre o Estado e as regiões autónomas", tem equivalência numa proposta do PCP, a alínea m.B), que é do seguinte teor: "Regime financeiro das regiões autónomas".
Para apresentar a respectiva proposta, começo por dar a palavra aos Srs. Deputados do PCP.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente e Srs. Deputados, esta proposta é coerente com outras, designadamente a da alínea m.C) do nosso projecto, na qual se entende igualmente dever ser da reserva de competência da Assembleia da República o regime das finanças locais. Julgamos…

O Sr. Presidente: - Está a colocar as duas à discussão em conjunto, Sr. Deputado?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Não necessariamente, Sr. Presidente, porque, como é sabido, trata-se de instituições diferentes, com poderes profundamente diferentes.
Nesta matéria, entendemos, em primeiro lugar, que é importante haver um enquadramento financeiro das regiões autónomas que não esteja dependente das flutuações políticas de cada ano, como tem acontecido. Por outro lado, julgamos que, tratando-se de instituições fundamentais do sistema político democrático, tratando-se de instituições no seio das quais existe uma pluralidade de representação política, é natural que esta questão não fique enquadrada na reserva relativa de competência e, portanto, em última instância, dependente da aprovação do governo, mas que tenha a dignidade da reserva absoluta de competência legislativa.
Já que o regime de finanças locais também está em causa, quero chamar a atenção para o facto de que quer a Lei n.º 1/79 quer a Lei n.º 1/87 terem sido aprovadas pela Assembleia da República em termos que, aliás, mereceram a unanimidade e uma negociação, um compromisso, quer entre forças políticas, quer entre estruturas representativas das autarquias locais, sendo que, pelo contrário, o regime das finanças locais, aprovado pelo governo em 1984, foi extremamente polémico e mereceu uma oposição bastante generalizada.
Isto significa que, a nosso ver, há todas as razões para que regimes legais deste tipo caibam à Assembleia da República e sejam objecto de um esforço negocial, inclusive de consenso, e de uma intervenção da Assembleia da República que assegure o máximo de protecção quer das regiões autónomas quer das autarquias locais.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, estão em discussão as propostas do PCP e do PP de aditamento à reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República do regime de finanças das regiões autónomas e do regime das finanças locais.
A este propósito, ocorre-me lembrar que o Professor Jorge Miranda, no projecto apresentado à Assembleia da República, inclui o regime de finanças das regiões autónomas exactamente neste artigo 167.º, como, aliás, incluía também o regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais, ou seja, a questão que há pouco discutimos.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, penso que estamos em face de duas questões distintas, como, de resto, me apercebi claramente ao ouvir o Sr. Deputado Luís Sá. Ou seja, desde logo, temos o problema do relacionamento entre as autoridades financeiras nacionais e as regiões autónomas, nomeadamente naquele que é (penso que foi a isso que o Sr. Deputado se referiu) o fluxo das transferências financeiras existentes entre o governo da República e as regiões autónomas e que tem sido, ao longo dos anos, como é sabido, fonte de alguma indefinição, pelo menos em termos de um enquadramento legal preciso, o que tem suscitado algumas questões.
Outra questão, porque me parece que o texto do PCP é mais amplo que isso, é a do regime financeiro das regiões tout court - passo a expressão. Penso que a formulação que o PCP propõe não se esgota no problema das transferências financeiras do governo da República para as regiões autónomas.
Ao falar-se do regime financeiro das regiões autónomas pretende-se, porventura, dizer algo mais, e penso que esse algo mais tem que ver já não com o relacionamento dos órgãos da República com os órgãos das regiões autónomas mas com o próprio estatuto autonómico e matérias que actualmente possam estar incluídas no mesmo. Nesse sentido, não sei se essa discussão é para se ter agora, pelo menos nessa parte, porque, se está em causa apenas o problema das transparências, esse é claramente um problema de competências da República relativamente às regiões autónomas.
No entanto, chamo a atenção para o facto de que, tanto quanto sei, embora não seja defensor dos projectos de lei em análise, existem projectos de alguns Deputados que não estão a ser discutidos nesta fase porque o Sr. Presidente propôs a metodologia de remetermos tudo quanto tenha que ver com o problema das regiões autónomas para um outro momento. Ora, de certa forma, este relacionamento financeiro com a República é também um problema central das regiões autónomas, pelo que penso que haveria vantagem em discutir essa matéria em conjunto com os Srs. Deputados que têm propostas concretas sobre esta questão.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, concorda que discutamos esta matéria em sede de regiões autónomas?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, não tenho nenhuma objecção de fundo a que discutamos esta matéria em sede de regiões autónomas, mas há um aspecto que gostaria de clarificar: é que as regiões autónomas têm poder tributário próprio, nos termos da alínea i) do n.º 1 do artigo 229.º,

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o que não pomos em causa, como é evidente e, portanto, quando se refere, na proposta que apresentamos para o artigo 167.º, "O regime financeiro das regiões autónomas", trata-se de definir critérios gerais que permitam, acima de tudo, assegurar o regime de transferências do Estado para as regiões autónomas, bem como outros aspectos, e não propriamente colidir com nada que tenha a ver com o artigo 229.º, que está amplamente assegurado nesta matéria. De resto, as propostas que existem nesse plano são no sentido de ampliar esse poder e não propriamente de qualquer restrição, que ninguém propõe.
Em todo o caso, não temos qualquer objecção de fundo a que a questão seja discutida depois, embora, em rigor, o que está aqui em causa não seja o regime da autonomia regional mas, sim, saber se esta matéria é de competência relativa ou absoluta, o que não tem necessariamente a ver com a questão do regime constitucional das regiões autónomas.
Assim, se houver consenso nessa matéria, não é por nós que o problema deixa de ser discutido noutra sede.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de partir desta última observação, que é uma clarificação útil e importante. Suponho que a dificuldade de operar uma consagração deste tipo reside no facto de, em matéria de definição daquilo a que se chama, nesta proposta, "regime financeiro das regiões autónomas" e, na sugestão legislativa do Professor Jorge Miranda, "regime das finanças das regiões autónomas", esse regime ser, no nosso sistema constitucional, um produto complexo e que tem de respeitar, por um lado, as autonomias regionais e a margem de intervenção própria decorrente do artigo 229.º, e não só para os órgãos de governo próprio das regiões autónomas, e, por outro lado, alguma margem de intervenção razoável do próprio governo da República como tal.
Não emito nenhum juízo sobre uma determinada prática, de um momento histórico, de celebração de protocolos de intervenção financeira nas finanças regionais, apenas alerto para as camadas normativas de intervenção que pode ser necessário gerar para criar aquilo a que chamaríamos "o regime". É que estamos aqui a discutir uma lei-quadro (que todos sabemos o que é), da qual poderão constar conteúdos vários cuja génese e cuja fabricação ou produção tem as dificuldades que acabei de enunciar, e talvez seja essa uma das razões pela quais foi difícil, no passado, criar esses instrumentos.
Por isso mesmo, Sr. Presidente, creio que talvez seja vantajoso regressar a este debate quando tivermos feito o debate do artigo 231.º, no qual o Grupo Parlamentar do PS, por exemplo, pretende solidificar a ideia de que deve haver uma contribuição através de transferências do Orçamento do Estado, nos termos da lei, para a realização dos objectivos do artigo 231.º e outras disposições sobre esta matéria.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, estamos de acordo. A alínea n.B) do projecto de lei do PCP será discutida na altura própria, ficando em aberto o tipo de competência em que será incluída.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, peço a palavra para uma interpelação, para pedir a sua ajuda.

O Sr. Presidente: - Faça favor, Sr. Deputado.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, em abstracto, quanto a esta questão do regime financeiro das regiões autónomas, sabendo-se que nos estatutos político-administrativos há sempre um capítulo relativo ao regime financeiro, não se deve entender que a matéria…

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas é por isso mesmo, Sr. Deputado!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Deixe-me terminar.

O Sr. José Magalhães (PS): - Peço desculpa, mas é que é por isso mesmo!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Como dizia, não se deve entender que o regime financeiro das regiões autónomas está já contido na alínea b) do artigo 164.º,…

O Sr. José Magalhães (PS): - Em parte.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - … no sentido de que é competência óbvia da Assembleia, por força do referido artigo 164.º, a aprovação dos estatutos político-administrativos?
Do meu ponto de vista, a única questão que fica, de facto, por resolver, e que os Srs. Deputados Luís Sá e José Magalhães referiram, é o problema das transferências, do relacionamento financeiro entre as regiões autónomas e as instâncias da República. É esta a questão que coloco ao Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, neste momento, há disponibilidade para transferir esta questão para a altura própria, e é isso que proponho.
Srs. Deputados, resta-nos discutir o regime das finanças locais.
Peço então aos Srs. Deputados que se pronunciem sobre a proposta do PCP para incluir na reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia da República o regime das finanças locais e, já agora, o estatuto das autarquias locais, matéria em que há a afinidade nas propostas.
O Professor Jorge Miranda também acrescenta as atribuições e competências dos órgãos das autarquias locais, o que, sendo menos, é claramente uma parte daquilo que o PCP propõe. O PP propõe a mesma coisa na alínea t) do seu projecto: "Estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais".
Estão, pois, em discussão as propostas do PP e do PCP para transferir para competência exclusiva da Assembleia da República o estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que o estatuto das autarquias locais é uma das matérias estruturantes do sistema político democrático e que nesta matéria tem havido, em geral, uma prática que vai no sentido de esta matéria caber predominantemente à Assembleia da República, sendo a Assembleia da República a legislar neste domínio. Julgo haver toda a vantagem em que esta prática seja consagrada como obrigatória e penso igualmente

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que incluir as atribuições e competências na matéria da reserva absoluta já seria vantajoso, mas creio também que há aspectos do estatuto das autarquias locais que vão para além das atribuições e competências e que são igualmente muito importantes - como o número de membros de cada órgão autárquico, para dar um exemplo entre outros que poderiam igualmente ser referidos.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, para não tomar mais tempo, quero só dizer que reconduzo esta, como todas as propostas que se limitam a fazer o mesmo (embora dividida em duas alíneas, esta proposta limita-se a transcrever o que consta da alínea s) do artigo 168.º), à argumentação que já expendi a propósito da lógica abstracta de se limitar a transferir, sem alterações qualitativas, matérias do artigo 168.º para o 167.º.
A posição do PSD já aqui foi expressa e, a menos que haja algum aspecto particular relativamente a algumas das várias propostas existentes neste sentido, penso que não vale a pena fazer os Srs. Deputados perderem tempo.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, o artigo 167.º começou por não existir - na primeira versão da Constituição, não havia competências exclusivas reservadas -, tendo sido criado a partir de transferências do artigo 168.º. Todo o artigo 167.º é produto de transferências, o que significa que, se o Sr. Deputado Luís Marques Guedes estivesse estado nas revisões anteriores, o artigo 167.º não existiria!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Não, Sr. Presidente, quer dizer apenas que creio que, se houve a necessidade de cometer reservas absolutas à Assembleia da República, tal já está manifestamente preenchido e, hoje em dia, a posição do PSD é a de que não há razão para se reduzir mais.
No fundo, como referi há pouco, trata-se de um problema de operacionalidade e não vemos razão para reduzir mais a operacionalidade do processo legislativo, a não ser que haja qualquer argumento muito forte, que até agora ainda não foi expendido, do nosso ponto de vista.

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado Luís Sá pediu a palavra, mas pergunto-lhe se não quer ouvir primeiro o que o Sr. Deputado José Magalhães tem para dizer.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Não, Sr. Presidente.
Há uma experiência útil que talvez ajudasse à reflexão - e até convidava o Sr. Deputado João Amaral a referi-la aqui - que é a da elaboração da Lei n.º 1/87, a Lei de Finanças Locais. A lei anterior foi elaborada pelo governo num contexto de grande controvérsia e de grande polémica com as autarquias locais, a Lei n.º 1/87, pelo contrário, foi elaborada numa altura em que o PSD estava no governo numa situação de minoria.
No quadro da Comissão de Poder Local, de que o Sr. Deputado João Amaral era presidente na altura, o Fundo de Equilíbrio Financeiro foi negociado, artigo a artigo e percentagem a percentagem, entre todos os partidos, com uma presença constante de representantes dos municípios, tendo sido feitos vários ensaios e com toda a transparência.
É evidente que isto é possível com a garantia de que se trata de matéria reservada da Assembleia, não é possível se a Assembleia se limitar a dar uma autorização ao governo e este, ulteriormente, legislar como entender. Isto é igualmente o que se passa neste momento no que se refere às atribuições e competências das freguesias.
Na verdade, esta é uma questão em relação à qual já estão aprovados dois projectos de lei, um do PS e outro do PCP, que podem ser tratados na respectiva comissão, artigo a artigo, em estreita articulação com a ANAFRE, e, ulteriormente, discutidos, artigo a artigo, em Plenário ou, pelo contrário, o governo obtém uma autorização legislativa e faz o que bem entende. Naturalmente, depois, pode requerer-se a ratificação do diploma resultante - pois pode! -, simplesmente são duas formas completamente diferentes de encarar a produção de diplomas fundamentais e estruturadores do sistema político democrático. Uma das formas aponta para a possibilidade de o diploma ser elaborado em segredo, de forma reservada, enquanto a outra aponta para a possibilidade de a elaboração do diploma decorrer de forma negociada, com contraditório.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, gostaria de tomar a proposta pelo que ela propõe e não por pressupor um paradigma de actuação legislativa, quer do Parlamento quer do governo,…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Exactamente!

O Sr. José Magalhães (PS): - … que não é obrigatório, está ligado a uma determinada época histórica que seguramente nos marcou a todos,…

O Sr. Presidente: - Essa é boa!

O Sr. José Magalhães (PS): - … mas que não pretendemos que seja um paradigma de ninguém. Ou seja, não é obrigatório que o governo legisle de forma secreta e reservada, etc.

O Sr. Presidente: - As reuniões do Conselho de Ministros…

O Sr. José Magalhães (PS): - As reuniões do Conselho de Ministros não são seguramente públicas mas, obviamente, não é obrigatório que haja secretismo no processo de elaboração…

O Sr. Luís Sá (PCP): - Mas é o problema de poder ser!

O Sr. José Magalhães (PS): - Naturalmente! E nós também podemos morrer daqui a bocado!
Em relação à proposta tal qual está, ela coloca dificuldades técnicas importantes. É preciso ter isso presente e, aliás, porque não temos o princípio filosófico que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem vindo a enunciar, foi isso que nos levou a não adiantar esta proposta da chamada proibição de alargamento da reserva absoluta no artigo 167.º. Não temos esse princípio filosófico, esse princípio de actuação, essa auto-limitação, não temos um muss sein que diga…

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O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Anuncie o oposto. Ficava-lhe bem…

O Sr. José Magalhães (PS): - Como dizia, não temos um muss sein que diz que o 167.º é o 167.º, aliás, como se prova pelas nossas propostas.
Portanto, foi após termos ponderado, caso a caso, o que deveríamos propor que não incluímos esta proposta e, designadamente, não a incluímos nesta formulação. É que aludir-se ao regime de finanças locais em geral implica que todo o regime de finanças locais deve ser elaborado e só pode ser elaborado pela Assembleia da República. Ou seja, não há nenhuma margem de normação que, de forma controlada e delegada, possa caber ao governo em relação a todos os aspectos, a todas as autarquias locais, em relação a todos os aspectos de todo o regime financeiro das autarquias locais, o que parece uma reivindicação significativa e coloca um problema que é significativo e tem de ser discutido.
Portanto, não podemos dizer "não há problema nenhum; é bom, é excelente…" e menos ainda podemos fazer esse juízo a partir da apreciação de um dos aspectos do regime das finanças locais, a chamada Lei das Finanças Locais, que, como sabemos, não inclui todo o regime financeiro das finanças locais, embora inclua "o corpo e o coração", ou "a barriga", consoante quiserem.
Nesta matéria, há uma outra questão importante na proposta apresentada pelo PCP, que é respeitante ao estatuto das autarquias locais.
Há pouco, o Sr. Presidente citou a proposta do Sr. Prof. Jorge Miranda, a qual utiliza uma outra formulação e, não por acaso, alude estrita e concretamente a "atribuições e competências". É, de facto, uma proposta interessante, embora não estejamos em condições de a subscrever neste exacto momento e nestas condições, o que não significa que enjeitemos considerar a questão, mas distingue-se muito da alusão contida no projecto do PCP.
É que, em bom rigor, alguns aspectos, aquilo a que se chama o estatuto das autarquias locais, constam já da reserva absoluta, como, por exemplo, as questões de orgânica que têm a ver com as eleições ou outras que, desde que existe o artigo 167.º, sempre foram incluídas na alínea respectiva.
Quanto a outros aspectos que o Sr. Deputado Luís Sá referiu, não creio que seja inteiramente líquido que sempre tenham de ser objecto de normação pela Assembleia da República de forma directa e que não haja alguma margem de normação atribuível ao governo.
Foi por isso mesmo, Sr. Presidente, que não adiantámos a proposta, menos ainda com esta formulação por mera transposição e reinserção do conteúdo actual do artigo 168.º.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, se bem entendi, sobre as atribuições e competências, o PS já podia ponderar a possibilidade de adoptar uma norma deste tipo.
Assim, pergunto se, no que toca ao regime financeiro, uma formulação que referisse o regime de receitas das autarquias e a sua distribuição também seria analisável pelo PS, com o mesmo espírito. Isto é, pergunto se, mais tarde, poderíamos voltar a isto com uma formulação… Não compreendo o que quer dizer quando afirma que a expressão "regime de finanças locais" pode ser excessiva, pelo que pergunto se não haveria uma fórmula…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, registei cuidadosamente a expressão "regime financeiro de receitas e sua distribuição" que foi sugerida. É a primeira vez que tomo contacto com ela e, obviamente, temos de discuti-la rigorosamente e procurar firmar o seu alcance para podermos ter uma opinião colegial sobre a matéria.

O Sr. Presidente: - Regista-se a disponibilidade do PCP para refrasear a sua proposta e a abertura do PS, mas não vale a pena, porque o PSD opõe-se e, portanto, é trabalho perdido.
Vamos passar adiante.
Temos uma proposta, apresentada pelo PP, de aditamento de uma nova alínea u) - "Organização e funcionamento do Banco de Portugal". Não está presente ninguém do PP e não acolho a proposta para discussão. De resto, há uma proposta do PS relativa ao artigo 168.º, cujo conteúdo é o mesmo, e discuti-la-emos a propósito da reserva de competência relativa à Assembleia da República.
Passamos a uma outra proposta do PP, de aditamento de uma nova alínea v), sobre o "Regime de designação dos membros em órgãos próprios da União Europeia a indicar pelo Estado Português sempre que tal regime não decorra directamente do direito comunitário". Relativamente a esta matéria, há uma proposta idêntica apresentada pelo PS, no caso, de aditamento de uma nova alínea q), a qual vai ser posta à discussão.
Vou, pois, dar a palavra aos Srs. Deputados do Partido Socialista, para apresentação da proposta do PS, de aditamento de uma nova alínea q), proposta esta que, repito, é equivalente à proposta do PP, de aditamento de uma nova alínea v), e cujo teor é o seguinte: "Regime de designação dos membros de órgãos institucionais da União Europeia a indicar pelo Estado português, quando ou na parte em que tal regime não decorra directamente do direito comunitário".
Tem, então, a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, esta proposta tem, para nós, alguma importância e insere-se naquelas que consideramos pretenderem um objectivo positivo de reforço da intervenção do Parlamento em todo o processo de construção europeia.
Esta questão dividiu-nos historicamente numa determinada altura e é, de resto, uma proposta reincidente, uma proposta que não obteve consagração em sede de revisão constitucional de 1992, e, francamente, faço votos de que o quadro então gerado tenha sido ultrapassado.
Trata-se, por um lado, de clarificar que deve ser o Parlamento a definir o regime - repare-se que não propomos outra coisa que não a definição do regime - na parte em que essa definição seja livre, uma vez que, como sabem, os tratados, nomeadamente o Tratado de Maastricht, tem nessa parte implicações claras que, evidentemente, devem produzir efeitos no nosso Direito interno, nos termos do respectivo artigo da Constituição.
Penso que seria um contributo positivo para o reforço da intervenção parlamentar numa componente que é a da arquitectura institucional das nossas realidades europeias.

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O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, devo dizer-vos que o Prof. Jorge Miranda apresentou uma proposta - alínea s) do artigo 167.º - rigorosamente igual à do PS, a somar às propostas do PS e do PP.
Está à discussão esta proposta.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, julgamos esta proposta perfeitamente justificada e cremos que corresponderia a uma preocupação, que, aliás, perpassa por todo o nosso projecto de revisão constitucional, que é exactamente a de preservar e alargar os poderes do Parlamento no quadro que está criado de integração comunitária.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, queria pedir um esclarecimento ao PS.
Gostaria de saber qual é o conteúdo útil que, em termos práticos, o PS entende que teria esta expressão "regime de designação".
É que ficou claro que a expressão "regime de designação" não é a indigitação…

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Deputado Luís Marques Guedes, como é que são eleitos os representantes em relação à indicação de titulares de órgãos cujo regime concreto o Tratado indica…

O Sr. Presidente: - Já consta dos tratados!

O Sr. José Magalhães (PS): - Temos algumas limitações, mas…

O Sr. Presidente: - Não está expressamente no artigo!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exactamente! E nós aceitamos. Aliás, temos de aceitar essas limitações.
Tem havido um debate bastante interessante sobre quais são, concretamente, os limites à comunicação entre a orgânica comunitária e a orgânica política de cada um dos Estados-membros, não sendo obviamente vedado aos comissários europeus algum relacionamento com os parlamentos, mas não numa relação, digamos, bi-unívoca e por interesse ou controlo dos Estados de que são oriundos por uma qualquer razão.
Quanto à questão concreta, por exemplo, do regime de nomeação dos membros do Comité das Regiões, instituído pelo Tratado, ou de outros órgãos cuja criação, em sede de direito comunitário, seja propiciada ou relevante, é preciso definir esse regime. Quem deve definir esse regime? A Assembleia da República ou o governo? E, sendo a Assembleia da República, em qual das áreas de reserva de competência deve inserir-se esta competência? Parece-me francamente que deverá ser na área prevista no artigo 167.º.
Portanto, não se trata de algo cuja operatividade seja despicienda e, pela nossa parte, não queremos dar a esta proposta menor significado do que aquele que ela tem.

O Sr. Presidente: - Continua a discussão.
Srs. Deputados do PSD, ainda não se manifestaram quanto a esta proposta.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, se me dá a palavra…

O Sr. Presidente: - Faça favor.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, face a esta explicitação que é dada pelo PS - de resto, esta é uma das vantagens desta primeira leitura -, deixo para reflexão uma sugestão da parte do PSD, sendo certo que a reflexão parte das balizas, penso que claramente definidas pelo Sr. Deputado José Magalhães, de que, do ponto de vista dos proponentes, não está em causa a nomeação das pessoas em concreto. É que, do ponto de vista do PSD, tal seria errado porque seria uma incursão não desejável nas competências em matéria de definição da política externa. Embora possa haver opiniões divergentes, para nós, é evidente que se trata de uma questão que releva de uma forma muito significativa para a condução da política externa.
Face à explicação dada pelo PS, cujo exacto alcance penso que compreendi, o PSD reserva a sua posição, não no sentido de ter reservas, mas no de poder ponderar e fazer alguma discussão interna. O problema é que, pela simples leitura da proposta, não tínhamos apreendido a exacta intenção do proponente e, portanto, é uma matéria que tinha ficado por esclarecer através do contacto com os proponentes, o que aconteceu agora.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, em todo o caso, a proposta ocorreu a outros proponentes. Fica registado que o PCP está a favor e o PSD reserva a sua posição para momento ulterior.
Vamos passar às propostas do PS ainda não consideradas: aditamento de uma nova alínea r), "Regime do Sistema de Informações da República do segredo de Estado", a qual, aliás, é equivalente às propostas apresentadas pelo PCP para as alíneas o.A) e o.B) respectivamente, "Regime dos serviços de informações" e "Definição dos critérios de classificação dos documentos ou informações oficiais de difusão reservada ou interdita".
Têm a palavra o PS e o PCP, por esta ordem, para apresentarem as propostas indicadas.
Sr. Deputado José Magalhães, faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): -Sr. Presidente, a proposta do PS é de reinserção sistemática, com o alcance óbvio.
Esta matéria parece-nos bastante importante e creio que se a formulação puder merecer algum retoque no sentido de precisar que se trata do núcleo central do sistema, do regime que se quer aqui acautelar, ou se há outras sugestões para flexibilizar esta redacção, confesso francamente que isso não nos merecerá reparo. No entanto, parece-nos vantajosa esta clarificação, tanto em relação ao chamado Sistema de Informações da República como em relação ao segredo de Estado.
Não sei se, "a talhe de foice", não valeria a pena comentar desde já a proposta do PCP, só em parte homóloga.

O Sr. Presidente: - Pode fazê-lo, Sr. Deputado. Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - A proposta de aditamento de uma nova alínea o.B), apresentada pelo PCP, tem

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um alcance bastante mais vasto porque não alude, concreta e precisamente, ao conceito de segredo de Estado.
Como sabem, as razões pelas quais determinadas informações podem ter a sua circulação limitada, embora não de facto interdita - porque, no Estado Português, nunca há um difusão interdita em termos absolutos, uma vez que, pelo menos, há sempre a possibilidade de interpenetração entre órgãos de soberania, desde logo, o Presidente da República em concertação com outro, no sentido de penetração nessa informação -, colocam um problema de extensão por fronteiras que são quase totais, impedindo qualquer margem de normação não exclusivamente parlamentar em tudo o que diga respeito aos critérios de classificação de documentos.
Ora, sucede que isto sugere uma mistura, que, francamente, me tem preocupado, até do ponto de vista científico e pessoal, entre aquilo que é segredo de Estado e aquilo que é a normal e regular classificação, aliás, podendo inculcar que há formas outras de classificação e segredos outros no Estado que não o segredo de Estado, o que devo dizer que pode gerar algumas complexas confusões.
Mas percebemos, obviamente, a ideia. Parece-nos que, na sua vastidão e inconcretude, a fórmula, além de fazer a transposição que é pretendida, reinterpreta o conceito hoje constante do artigo 168.º, estende-o, amplifica-o, torna-o mais impreciso e indefinido e, nesse sentido, reordena as relações Parlamento/governo e até, em certo sentido, curiosamente, as relações com outros órgãos que têm poder classificatório, inclusivamente órgãos próprios de governo das regiões autónomas, o que suponho que, provavelmente, é indesejável.

O Sr. Presidente: - Têm a palavra os Srs. Deputados do PCP.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, posso fazer uma pergunta?

O Sr. Presidente: -Faça favor, Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - O PS, aparentemente, não revoga a alínea r) do 168.º, pois não?

O Sr. José Magalhães (PS): - Sim. Ou seja, não repetimos o mesmo conteúdo normativo no artigo 167.º e no artigo 168.º.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, é que…

O Sr. José Magalhães (PS): - Há aí um papel do PS, algures…

O Sr. Presidente: -É uma das correcções introduzidas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Há aí um papel com gralhas, lacunas e outros erros tipográficos. Mas peço desculpa, naturalmente,

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que as propostas do PCP explicam-se em grande medida por si próprias.
Aliás, o Sr. Deputado José Magalhães acaba de dar uma contribuição adicional para a respectiva explicação que aponta para uma vantagem que, a nosso ver, a redacção proposta para a alínea o.B) - e estaríamos abertos à reconsideração - pode conter.
É que a preocupação que está subjacente a esta redacção é exactamente a de que, através da definição de critérios de classificação, se acabe por estabelecer regimes à margem do regime do segredo de Estado que, na realidade, subtraiam documentos ao cidadão e à fiscalização normal de outros órgãos do controlo do poder e que, por essa via, venham a limitar aquilo que deve ser a regra, que é o princípio da Administração aberta.
Sem dúvida nenhuma, poderão colocar-se questões nesta matéria, isto é, as de saber quais são os limites do segredo de Estado, quais são os limites de outros documentos classificados. Mas é exactamente para isso que, a nosso ver, se justificaria, por um lado, uma lei e, por outro lado, que essa lei fosse reserva absoluta de competência da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado José Magalhães, pediu a palavra? Faça favor.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, é só para uma pequena observação.
É que o alcance da proposta do PCP não é esse. O alcance da proposta do PCP é fazer com que tudo o que diga respeito a classificação de documentos ou informações oficiais ditas de difusão restrita ou reservada, categoria criada inovatoriamente em sede constitucional para esta forma, teriam de ser objecto de legislação integral e exclusivamente emanada da Assembleia da República.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Ao abrigo do princípio da Administração aberta.

O Sr. José Magalhães (PS): - Não, com confusão manifesta com o que decorre do artigo 268.º. É porque o artigo 268.º, n.º 2, não implica, primeiro, que isso decorra de um único instrumento, pode decorrer do Código Penal, do Código do Processo Penal, da Lei de Segurança Interna, de legislação ad hoc específica, da Lei do Segredo de Estado, da própria lei da Administração aberta. É que em sítio nenhum está escrito que esta última tenha de ter o conteúdo que hoje tem e menos ainda está escrito que a lei do procedimento administrativo tenha de ter o conteúdo que hoje tem - embora diga francamente que não estamos em discordância com o conteúdo dela, pelo contrário, e louvámos a sua produção na altura própria e, em particular, o empenho que o Prof. Freitas do Amaral revelou na consagração de diversos aspectos de Administração aberta.
Ora, essa pluralidade de fontes e a pluralidade de normações e de origens normativas dos conteúdos e até de conteúdos secundários que podem resultar, por exemplo, de regimes como o regime de classificação para efeitos de carácter histórico e outros, que, como sabem, hoje consta de um decreto-lei em boa hora autorizado, essa pluralidade não é em si mesma nefasta, desde que, obviamente, se cumpra o artigo da Constituição, material, as disposições materiais que proscrevem o secretismo e o expurgaram da

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orgânica do Estado como princípio organizador sobreponível à Administração aberta.
Portanto, é uma questão de rigor e de não gerarmos uma espécie de "lei de bronze" que tolha, contra o que tem sido proposto por todos os partidos, o que é o fluxo normal de patamares vários e procedências várias para a regulação da questão.
A mistura entre o segredo em geral e o segredo de Estado especificamente é também, quanto a mim, uma confusão pouco útil.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, começo pela proposta do PS.
A proposta do PS tem uma parte relativamente à qual não me alongaria muito mais, porque penso que, claramente, é uma matéria sobre a qual o PSD não tem rebuço nenhum em manifestar alguma abertura para reflectir e ponderar, isto é, a matéria que tem que ver com o segredo de Estado.
É que, embora não tenha havido uma explicitação por aí além, já entendemos, quanto à matéria relativa ao segredo de Estado, que, claramente, pode-se defender que, em termos de operacionalidade do processo legislativo, não haja vantagem absolutamente nenhuma em permitir autorizações legislativas.
Portanto, à primeira vista, embora, obviamente, seja uma matéria a ponderar, a reflectir, com vista à tomada de uma posição definitiva, quanto a essa parte, deixo desde já a nossa posição.
Quanto à segunda parte, separaria duas questões. Por uma questão de lealdade parlamentar a que, obviamente, todos nós estamos necessariamente vinculados, chamo a atenção para um aspecto que não nos pareceu relevado pelo PCP e que estabelece uma diferença qualitativa, e muito importante, entre a proposta do PS e a do PCP.
O que o PS está a propor, no que se refere à primeira parte - e o Dr. José Magalhães disse-o -, é, claramente, um recuo relativamente a uma alteração que foi feita na revisão constitucional de 1989 (e, do ponto de vista do PSD, foi erradamente feita), pela qual se passou do regime geral do Sistema de Informações da República como reserva legislativa para o regime dos serviços, o que teve como consequência, ao contrário do que tinha acontecido em 1985, aquando da criação dos serviços de informações, em que a respectiva lei de bases, a lei-quadro, apenas foi aprovada por ser reserva da Assembleia, tendo havido, depois, um desenvolvimento legislativo através de decreto-lei, feito pelo então governo do Dr. Mário Soares, já o mesmo não pôde acontecer quando os governos de maioria do PSD entenderam necessário mexer na orgânica dos serviços de informações e, confrontados com esta redacção da alínea r) do artigo 168.º, verificaram que a competência para introduzir alterações na orgânica passou a ser da Assembleia, inequivocamente.
Ora, uma vez que, após a minha pergunta ao Sr. Deputado José Magalhães, ficou claro que o PS propõe a revogação da alínea r) do artigo 168.º, o que resulta claramente desta proposta do PS é um recuo para a situação anterior, permitindo que, na prática, as leis orgânicas dos serviços de informações, passem a ser de competência "concorrencial". Ou seja, o PS propõe que, à semelhança do que acontece, por exemplo, no caso da lei orgânica da Direcção-Geral de Agricultura ou da Direcção-Geral de Florestas, o governo também possa mexer na orgânica do SIS e na do SIEDM (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares). Isto é uma consequência clara, face à resposta que obtive ao que perguntei ao PS acerca da sua proposta.
Devo dizer que, da parte do PSD, não vemos grande objecção, com toda a franqueza. No entanto, com lealdade e porque o Sr. Presidente pôs à discussão duas propostas ao mesmo tempo, devo chamar a atenção de que a proposta do PCP é claramente uma com a qual eu não concordo. É que se o PSD já não concordava que se tivesse posto como reserva relativa as orgânicas dos serviços em concreto e não a lei-quadro do Sistema de Informações da República, obviamente que a sua transposição simples do artigo 168.º para o artigo 167.º inscreve-se naquela lógica de que falava há pouco e que, para o PSD, não faz grande sentido.
Já a proposta do PS é qualitativamente diferente - e que isto fique claro e deixo-o aqui expresso -, pois, como já disse, quanto ao segredo de Estado, aí não me pareceu haver qualquer diferença entre as propostas do PS e do PCP, até porque o PCP não tem nenhuma proposta especificamente sobre esta matéria.
Portanto, sobre a alínea r) proposta pelo PS, a posição do PSD é de abertura, mas reservando-se para uma posição definitiva. É, pois, algo que ponderaremos e relativamente ao que não temos uma objecção liminar.
Passo às propostas do PCP que o Sr. Presidente pôs à discussão em paralelo.
Quanto à proposta de aditamento de uma nova alínea o.A), pelas razões que acabei de explicitar, o PSD não concorda; quanto ao aditamento de uma nova alínea o.B), no fundo, parece-me que o que foi dito pelo Sr. Deputado José Magalhães é o que o PSD pensa, de uma forma genérica.
O Sr. Deputado José Magalhães sabe, com certeza melhor do que eu, que actualmente já existe legislação que tem que ver com a CADA, e por aí fora, onde matérias como a classificação de documentos e outras são tratadas em termos legislativos e não me parece que haja nenhum ganho, nenhuma vantagem significativa em transportar toda esta matéria, que é bastante complexa e que vai bastante longe, para a reserva absoluta de competência legislativa da Assembleia.
Como tal, a alínea o.B) do projecto do PCP não colhe abertura da parte do PSD, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, com a alínea o.B), o que propomos é que a Assembleia reserve para si, de forma absoluta, a competência para definir critérios de classificação.
Passo a dar um exemplo: porque a Assembleia reserva para si, de forma relativa, a definição de crimes e penas, sucede que frequentemente há necessidade de pedir uma autorização legislativa à Assembleia para regulação de matérias da competência do governo, como as relativas à saúde ou a variadíssimas outras questões, só para se introduzir uma disposição penal.
Aqui até propomos mais do que uma autorização legislativa, propomos que seja a própria Assembleia a definir os critérios; isto é, há muitas coisas que se regulam por

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aí, mas, quando se trata de definir critérios de classificação de documentos, a competência é da Assembleia.
Não sei qual é o inconveniente que o Sr. Deputado vê nisto, não consigo perceber, porque só pode haver inconveniente se também se quiser conservar em segredo os critérios de classificação! Gostaríamos que isso não ficasse em segredo em nenhuma circunstância, e particularmente não gostaríamos - não gostaríamos mesmo nada! - que ficasse em segredo que há certos documentos que são classificados de acordo com critérios que ninguém sabe quais são.
Desta forma, a introdução destas alíneas não só evitaria a existência de casos de critérios secretos de classificação, como também de casos de classificação de documentos que, por não haver nada na Constituição que obrigue a tornar transparente a existência dessa zona de documentos classificados, permanecem secretamente classificados sem que ninguém o saiba.
O Sr. Deputado José Magalhães, que é uma pessoa que gosta muito desta questão, quase de certeza seria capaz de dar exemplos vivos daquilo que estou dizer, mas não o vai fazer, porque, se o fizesse, a existência dessas coisas tão secretas deixava de ter graça - ainda por cima não havendo um gravador secreto como o do jornalista do Record, pois esta é uma reunião aberta!

Risos.

Esta proposta justifica-se por si, mas é evidente que as propostas fazem-se para serem discutidas; ninguém apresenta propostas para as impor aos outros mas, sim, para as submeter a uma discussão e chegar a uma determinada conclusão. Nós temos esta ideia, consideramos que isto é útil e temos boas razões para isso.
Quanto à outra questão, a dos serviços de informações, admitimos que o Sr. Deputado Luís Marques Guedes tem razão na observação que fez e penso que há uma diferença de conteúdo entre a fórmula que hoje consta do artigo 168.º e a fórmula proposta pelo PS para o artigo 167.º.
Admitimos que haja uma diferença, embora a expressão "regime do sistema de informações da República" deva cobrir aquilo que é essencial. Aliás, acabámos de ter uma discussão sobre o significado do regime financeiro, em que se chegou à conclusão de que podia significar regime financeiro das regiões autónomas, e outra sobre o que significa regime de finanças locais, das autarquias locais, e chegou-se à conclusão que tinha de cobrir tudo. Então, por que é que a expressão "regime do sistema de informações da República" não há-de cobrir tudo?
Em todo o caso, admito que a sequência histórica levante, com muita justeza, essas razões, pelo que, se assim for, pergunto ao PS se efectivamente procura transpor para a reserva absoluta menos do que hoje consta da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, antes de dar a palavra ao Sr. Deputado José Magalhães, quero lembrar que nos aproximarmos da meia-noite, mas gostaria, em todo o caso, de terminar o artigo 167.º. Como ainda faltam duas ou três alíneas, peço a todos economia de tempo nas intervenções.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sr. Presidente, se me permite, gostaria de dizer que agradeço a observação, mas muitas vezes somos obrigados a falar, quando as coisas são postas de determinada maneira!

O Sr. Presidente: - Claro, Sr. Deputado! Aliás, faço este pedido em geral e não em particular!
Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, muito economicamente também, e porque as coisas foram postas de certa forma, gostaria de dizer que a alínea o.B) tem a redacção que tem, e a redacção que tem acarreta consequências inaceitáveis, como demonstrei cabalmente.
Sou, de facto, o Deputado membro da Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos e participei na elaboração da lei da administração aberta, com muito gosto, bem como na revisão do artigo 268.º e tenho dedicado algum interesse a essa matéria. Como tal, agradeço as palavras que me foram dirigidas, as quais são elogiosas, mas também injustas, seguramente, no apreço.
Quanto à proposta em si mesma, ela tem consequências que me parecem excessivas. Em primeiro lugar, não vamos discutir aqui regimes materiais, pois esta é uma norma de competência. Só estamos a discutir se deve ser a Assembleia da República, e apenas a Assembleia da República, a definir os critérios, todos os critérios, de todos os documentos, de todas as informações oficiais, daquela a que o legislador ou candidato a legislador chamaria "difusão reservada ou interdita".

O Sr. João Amaral (PCP): - Nós entendemos que sim!

O Sr. José Magalhães (PS): - Exacto!
Sendo competência apenas da Assembleia da República, tal significaria que teríamos critérios NATO, e outros, aprovados pela Assembleia da República, presumo…

O Sr. João Amaral (PCP): - Que escândalo!

O Sr. José Magalhães (PS): - Não é um escândalo, mas seria verdadeiramente um "galo de Barcelos" no contexto internacional e, digamos até, um pouco ridículo, pelo que o Estado português nunca o fará. Sobre este ponto, não tenho dúvida literalmente nenhuma.
Em relação ao conteúdo da norma, é preciso fazer distinções subtis, que não são compatíveis com retratos a traço grosso e, por isso mesmo, propomos segredo de Estado com o significado estrito e rigoroso que isso tem e que não se mistura com outras modalidades de segredo, inclusivamente o partidário ou de estruturas de outra natureza. Trata-se, pois, de uma questão de rigor.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, quanto à proposta do PS, o PCP não chegou a tomar uma posição rigorosa, não é verdade?

O Sr. João Amaral (PCP): - Não, eu pedi um esclarecimento ao Sr. Deputado.

O Sr. Presidente: - Que acaba de ser dado!

O Sr. João Amaral (PCP): - Então, peço desculpa, mas deve ter sido tão rápido que não ouvi. Foi a última fórmula? Não se importa só de esclarecer, Sr. Deputado?

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O Sr. José Magalhães (PS): - Foi a última fórmula.

O Sr. João Amaral (PCP): - Sobre o serviço de informações?

O Sr. Presidente: - O Sr. Deputado João Amaral tinha perguntado se a diferente redacção da alínea r), em relação ao que consta do artigo 168.º…

O Sr. João Amaral (PCP): - Não é se é diferente, mas sim se é intencionalmente diferente para restringir o âmbito!

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, comecei por sublinhar o reajustamento que isso implicava e fundamentei esse reajustamento, até porque creio que seria uma fixação levar ao extremo uma norma impositiva de uma plenitude, exclusividade, totalidade que furtasse por completo alguma margem de normação operativa e operacional de carácter infralegal!

O Sr. Presidente: - Qual é a posição dos Srs. Deputados do PCP?

O Sr. João Amaral (PCP): - Preferimos a nossa proposta, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, o PCP não adere à proposta do PS e o PSD manifesta abertura, mas com reservas, relativamente à mesma. Por outro lado, as propostas do PCP não têm o apoio do PS nem do PSD.

O Sr. João Amaral (PCP): - Mas nós apoiamos a proposta relativa ao segredo de Estado, nessa parte.

O Sr. Presidente: - Muito bem.
Srs. Deputados, vamos passar à proposta do PS no sentido de atribuir à Assembleia da República a competência exclusiva para definir o regime jurídico dos símbolos nacionais, que é semelhante à alínea o.C) do projecto PCP - uma refere-se a regimes jurídicos dos símbolos nacionais e a outra à definição e regime de utilização dos símbolos nacionais.
Para apresentar a proposta do seu partido, tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, o regime jurídico dos símbolos nacionais continua a reger-se por muita e diversa legislação, alguma bem vetusta, datando da I República, entre a qual se encontra o Código Penal, que, sendo da competência do Parlamento, é relevante mas não é exclusivo.
Tudo aconselha a que nada nessa matéria deixe de ser da competência da Assembleia da República. Curiosamente, uma das experiências que tivemos, na História relativamente recente, neste domínio resultou singularmente de uma norma introduzida pela Assembleia da República no Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, coisa que, como sabemos, foi harmoniosamente superada na parte final.
Em todo o caso, à cautela, creio que seria de incluir, de forma inequívoca, uma norma do tipo daquela que propomos.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta está em discussão.
Os Srs. Deputados do PCP desejam acrescentar alguma coisa?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, como o Sr. Deputado José Magalhães teve ocasião de assinalar oportunamente, a introdução de uma definição constitucional da bandeira nacional no artigo 11.º decorreu de uma proposta do PCP na anterior revisão constitucional. É evidente que cabe ao legislador ordinário definir este regime, e também é evidente que esta situação já foi polémica, em alguns momentos.
Julgamos que o respeito pela autonomia regional deve coexistir com o respeito pela unidade Estado e que, nesse sentido, se justifica…

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, peço desculpa por o interromper, mas não percebi uma observação que fez. A proposta do artigo 11.º derivou de quê?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Disse que a introdução da definição constitucional da bandeira nacional, como símbolo da soberania da República, da independência nacional e da integridade do Estado…

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, está a falar do…

O Sr. Luís Sá (PCP): - Estou a falar da última revisão constitucional - aliás, da penúltima, excluindo, portanto, a extraordinária.
Sr. Deputado, estou a falar do facto de no artigo 11.º ter sido incluída entre vírgulas a expressão "símbolo da soberania da República, da independência, unidade e integridade de Portugal" e de isto ter sido feito na revisão constitucional de 1989.

O Sr. José Magalhães (PS): - Ah, está bem! Não estava a perceber porque julguei que estava a falar do artigo 167.º.

O Sr. Luís Sá (PCP): - Estava igualmente a referir que houve esta preocupação no sentido de sublinhar devidamente o significado da bandeira nacional e dos símbolos nacionais, com este valor simbólico, e, ao mesmo tempo, coexistindo com o facto de deverem ser respeitados outros símbolos, como os das autonomias regionais.
A partir do momento em que esta questão está definida e que tem a importância que constitucionalmente foi devidamente sublinhada na última revisão constitucional, como é sabido, julgamos que se justifica inteiramente que seja da competência reservada da Assembleia da República.

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O Sr. Presidente: -Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Sr. Presidente, quanto a esta matéria, a única dúvida que aparentemente tenho diz respeito à formulação e à inserção sistemática.
Quanto à formulação, há aqui duas questões diferentes: a proposta do Partido Comunista fala em "regime de utilização"; a do Partido Socialista fala em "regime jurídico dos símbolos nacionais". Não sei se "regime jurídico" é a formulação adequada. De resto, a forma mais utilizada ao longo dos artigos 167.º e 168.º, normalmente, é apenas "regime de" qualquer coisa.
Com esta outra redacção, deixo aqui a abertura da parte do PSD para a inclusão numa sistematização também a ponderar. Não temos nenhum obstáculo de princípio.

O Sr. Presidente: - O PCP tem disponibilidade para aderir a esta forma mais económica de "regime dos símbolos nacionais"?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Naturalmente que sim, Sr. Presidente, tendo em conta que o que está em causa é a utilização dos símbolos. Mas creio que isso está compreendido na fórmula utilizada pelo PS.

O Sr. Presidente: - Era apenas uma forma económica de dizer o que todos queremos dizer.

O Sr. José Magalhães (PS): - A Constituição define-os: no que diz respeito à bandeira, de maneira inequívoca, e quanto ao hino também, visto que é a Portuguesa. Portanto, há uma normalização integral e não há nenhuma margem de inovação legal.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, a proposta do PS tem o apoio do PCP, cuja proposta é convergente, e a abertura da parte do PSD.
Quanto à inserção sistemática, veremos depois. Ela foi colocada aqui em último lugar, mas poderá perfeitamente passar, por exemplo, para primeiro lugar. Logo se verá.
Quanto a propostas novas, há ainda a considerar, de todas as que foram feitas, a do PCP de uma alínea m.A), "Criação de impostos, regime das taxas e sistema fiscal". Srs. Deputados do PCP, não consideram que é um exagero?

O Sr. João Amaral (PCP): - Isso está no artigo 168.º!

O Sr. José Magalhães (PS): - Está no artigo 167.º!

O Sr. Presidente: - Não é isso! É que, mesmo estando, não consideram que é um exagero?
Sr. Deputado Luís Sá, quer explicar a proposta?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Sr. Presidente, creio que a proposta se explica a si mesma, à luz de uma ideia que nela está presente, que é a de fortalecer a intervenção parlamentar e igualmente o princípio do debate com projecção pública de matérias que têm uma particular incidência no quotidiano das populações.

O Sr. João Amaral (PCP): - E no bolso dos contribuintes!

O Sr. Luís Sá (PCP): - E no bolso dos contribuintes.
Como é sabido, esta alínea está actualmente no artigo 168.º. Aludindo aos impostos e ao sistema fiscal, referimos também o regime de taxas. Quando, naturalmente, falamos do regime de taxas, não estamos a falar de regulamentos, por exemplo, como aqueles que existem ou outros elaborados por cada autarquia. Estamos a partir do princípio que o regime geral deve ser fixado na lei e que as autarquias devem estar devidamente habilitadas por lei, como de resto qualquer órgão da Administração Pública, para criar taxas, de acordo com princípios gerais devidamente definidos.
Em todo o caso, quanto a esta matéria, estaremos disponíveis para analisar a criação de impostos e o sistema fiscal, por um lado - é aquilo que está actualmente no artigo 168.º -, e o regime de taxas, que é, sem dúvida, uma matéria com uma menor incidência do que as restantes.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Luís Sá, permita-me uma pergunta. A doutrina hoje articula a alínea i) do artigo 168.º com o artigo 106.º da Constituição e diz que criar impostos é alterar-lhe os elementos essenciais e que tudo isso é do domínio da lei.
O PCP quer que tudo isso seja feito por lei da Assembleia da República, obrigatoriamente, acabando com qualquer decreto-lei governamental nessa matéria, o que acabaria, desde logo, com as autorizações orçamentais, que são centenas em matéria fiscal?

O Sr. Luís Sá (PCP): - Não necessariamente, Sr. Presidente, porque…

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): - Chamo aqui a atenção para uma outra coisa, Sr. Presidente.

O Sr. José Magalhães (PS): - O PCP não elimina, aliás, curiosamente, o n.º 5 do artigo 168.º.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, quando discutimos o artigo 106.º, o Partido Comunista fez uma proposta que, se bem me recordo, recebeu da parte quer do Partido Socialista quer do Partido Social Democrata abertura - pelo menos da parte do PSD reitero aqui uma posição de abertura, embora numa formulação diferente, porque na altura vimos alguns inconvenientes na formulação do Partido Comunista. Ou seja, face à explicação que o Partido Comunista deu na altura, ficou uma posição de abertura quanto à possibilidade de inserção na Constituição, numa outra formulação que ficou de ser equacionada, da matéria referente às taxas, mas, como diz o

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Sr. Presidente aqui e bem, remetendo para a lei. Acrescentar essa proposta com a proposta de reserva absoluta, de facto, é um bocado diferente.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá, para responder a estas interpelações ou objecções.

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Presidente, como tive oportunidade de referir, estas são matérias que, sem dúvida nenhuma, têm uma incidência diferente. Estamos inteiramente abertos a que seja considerada, por um lado, a possibilidade de separação e, por outro lado, uma redacção em que fique inteiramente claro que se pretende definir obrigatoriamente uma habilitação por lei para criar as taxas e não propriamente transformar a Assembleia da República num órgão regulamentar nesta matéria.

O Sr. Presidente: E quanto à questão dos impostos?

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Presidente, quanto à questão dos impostos, aquilo que está fundamentalmente em causa é encontrar uma formulação da qual decorra com clareza que aquilo que se pretende é a inovação fiscal e não propriamente o estabelecimento de aspectos relativamente de pormenor.
E, sobre este aspecto, quero chamar a atenção, em particular, para o artigo 106.º, n.º 2, que estabelece que "os impostos são criados por lei, que determina a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes".

O Sr. Presidente: Foi isso que eu disse!

O Sr. Luís Sá (PCP): Creio que há aqui uma distinção, que decorre da própria Constituição, entre, por um lado, a criação da lei e, por outro lado, outros aspectos que podem não estar todos e cada um deles incluídos na competência tal como a propomos.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Luís Sá, felizmente, a interpretação doutrinal e jurisprudencial não é essa!

O Sr. José Magalhães (PS): - Felizmente, ninguém faz tal interpretação, até agora!

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PS): - Sr. Presidente, estou um pouco perplexo e creio que deveríamos ponderar esta matéria.
Porque, repare: tínhamos admitido, de boa-fé, que esta proposta estava insuficientemente fundamentada. É um facto que o PCP não propõe a eliminação do artigo 168.º, n.º 5. De facto, não propõe. Mas é muito difícil compatibilizar uma norma como a do artigo 167.º, m.A), em que terminantemente se diz "criação de impostos" - com o significado que isso tem constitucionalmente e que resulta claro daquilo que o Sr. Deputado Luís Sá acabou de dizer -, e simultaneamente aquilo que seria uma admissão de que autorizações pudessem ser concedidas e, incidindo sobre matéria fiscal, só caducarem no termo do ano económico a que dizem respeito.
Essa solução faz perfeito sentido face ao texto actual da Constituição, o que não implica um reordenamento e refundação do regime de produção do orçamento do Estado em Portugal. Não implica, de facto! Este regime permite várias formas de gerir o orçamento e de o compatibilizar com a criação de impostos ou a alteração de matérias que são criação fiscal no sentido constitucional, ou seja, não é obrigatório fazer a reforma fiscal no bojo do orçamento, muito obviamente, e nem isso, aliás, é aconselhável e desejável.
Agora, também não é obrigatório, de cada vez que é necessário de criar um imposto no sentido constitucional - a expressão tem um sentido específico -, que seja o Parlamento, e ele apenas, não podendo autorizar o governo a fazê-lo, ou em conjunto com outras autorizações ou por acto isolado. E isso é uma margem de flexibilidade que respeita, todavia, as garantias dos contribuintes.
A fórmula é muito rígida, a não ser que seja desnaturado o sentido da expressão "criação", o que é perigoso e seria um precedente indesejável que suponho que nenhum de nós quer criar.
Portanto, Sr. Presidente, esta reconfiguração do modus agendi na criação fiscal e, designadamente, as suas implicações na elaboração orçamental não nos parecem comportáveis e não podemos contestá-las.

O Sr. Presidente: Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): Sr. Presidente, quero apenas dizer uma coisa muito simples. A minha opinião é que uma lei que defina "a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes" em relação a determinado imposto, isto é, que defina um imposto a partir desses elementos é a lei que é e deve ser aprovada pela Assembleia.

O Sr. Presidente: É isso que o PCP declara.

O Sr. João Amaral (PCP): É isso exacta e claramente!

O Sr. Presidente: - Mas não era isso que resultava da interpretação do Sr. Deputado Luís Sá, que estabeleceu uma distinção.

O Sr. João Amaral (PCP): Não! Foi isso exactamente que ele disse agora!
O Sr. Deputado José Magalhães tem toda a razão: devia ter sido alterado em conformidade o n.º 5 do artigo 168.º.

O Sr. José Magalhães (PS): Eliminado nesse ponto!

O Sr. João Amaral (PCP): Devia ter sido esclarecido.

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No entanto, creio, Sr. Deputado, que quando se apresenta um projecto de revisão constitucional fazem-se as articulações que são indispensáveis. Ninguém vai fazer justamente os artigos até ao infinito. Isto é, o PSD propõe a eliminação de uma série de artigos à regionalização,…

O Sr. Presidente: Sr. Deputado João Amaral, tem toda a razão!

O Sr. João Amaral (PCP): … mas não vai propor a alteração dos números seguintes. E, portanto, isso torna uma discussão como esta numa discussão ridícula!

O Sr. Presidente: Sr. Deputado João Amaral, na primeira parte, antes da última frase, tinha toda a razão.

O Sr. João Amaral (PCP): Sr. Presidente, tenho sempre razão e tenho todo o direito de me exprimir como quiser!

O Sr. Presidente: É óbvio que tem!

O Sr. João Amaral (PCP): Quando considerar que ultrapassei as marcas, o Sr. Presidente exerce os poderes regimentais que tem, tira-me a palavra e faz o que entender.

O Sr. Presidente: Não, Sr. Deputado! Não lhe tirei a palavra! Estava a dar-lhe razão e a dizer que nenhum dos projectos faz essas articulações. Portanto, esse pecado descoberto agora no projecto do PCP nem sequer é um pecado privativo do PCP.

O Sr. José Magalhães (PS): - O que fez foi suscitar dúvidas aos próprios proponentes.

O Sr. Luís Sá (PCP): Há aqui uma questão que queria deixar inteiramente clara: quando citei aqui o artigo 106.º, n.º 2, foi exactamente para deixar claro que a criação por lei implica incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos contribuintes.

O Sr. Presidente: Está certo!

O Sr. Luís Sá (PCP): Só queria acrescentar que o seguinte: creio que é uma prática perversa o facto de a lei de orçamento do Estado conter, efectivamente, centenas de autorizações legislativas, muitas delas em matéria de grande incidência nas condições de vida dos cidadãos e sem que isto implique a devida análise por parte da Assembleia da República.
Portanto, há aqui uma proposta de alterar a prática existente nesta matéria valorizando a actividade parlamentar, que é uma preocupação que está subjacente a todas as propostas relativas a este artigo.

O Sr. Presidente: Sr. Deputado Luís Sá, está esclarecido o alcance da proposta do PCP. O PS já manifestou a sua oposição.
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, não pedi a palavra apenas porque pensava que já tinha explicitado a posição do PSD quando discutimos outras propostas que tinham que ver com a transposição simples de alíneas do artigo 168.º para o artigo 167.º.
Apenas registava, aproveitando a palavra que me dá, que o PS, na sua intervenção final e a propósito desta alínea, ter feito seus os argumentos que o PSD tinha expendido a propósito da mesma alínea.

O Sr. José Magalhães (PS): - Essa é boa!

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, há ainda uma alínea que gostaria de pôr à vossa consideração, se bem que, obviamente, não implique consenso de todos os partidos. Refiro-me à proposta do ex-Deputado Jorge Miranda, que pretende acrescentar a este artigo o regime de publicação dos actos dos órgãos de soberania. Faço minha esta sugestão e apresento-a à Comissão, para o caso de querer adoptar esta proposta.
Lembro que a proposta se refere ao regime de publicação dos actos dos órgãos de soberania, que, como sabemos, consta de um decreto-lei governamental. Ora, a proposta do Professor Jorge Miranda é que isso passe a constar necessariamente de uma lei da Assembleia da República. Penso que a homenagem mínima que devemos prestar é elaborar uma lei adequada dessa natureza. Por isso faço a proposta e peço a consideração dos Srs. Deputados.

O Sr. José Magalhães (PS): - Mas o Sr. Presidente refere-se a uma lei que seria obrigatória e necessariamente incluída em sede do artigo 167.º?

O Sr. Presidente: Tratando-se de actos de reserva absoluta da competência da Assembleia, é obviamente ao artigo 167.º que me refiro.
Aproveito para esclarecer que penso que, com a expressão "publicação", o Professor Jorge Miranda deve querer referir-se à publicação dos actos normativos dos órgãos de soberania, aqueles que estão previstos…

Aparte inaudível na gravação.

O Sr. Presidente: Não! A todos! Porque não?! A todos aqueles que são publicados!
Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Marques Guedes.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Sr. Presidente, tenho grandes dúvidas…

O Sr. Presidente: O Sr. Deputado Luís Marques Guedes, como fez o último decreto, não quer ser privado desse feito!

Risos.

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Não se trata disso, Sr. Presidente! Eu explico, dando um argumento, porque esta é uma questão nova. Tenho as minhas sérias dúvidas de que esta seja uma boa solução, visto que a

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proposta não se refere apenas a actos legislativos mas, sim, a todo o tipo de actos dos órgãos de soberania. É evidente, no entanto, que há actos, nomeadamente de natureza administrativa, que, seguindo a lógica de separação de poderes, se inscrevem claramente na esfera de competências próprias do governo. É evidente também que não está aqui em causa a necessidade da publicitação dos actos, porque isso também decorre de outras normas constitucionais. Assim sendo, reservar para a Assembleia da República em exclusivo o regime de publicação de todo e qualquer tipo de acto, nomeadamente de actos de natureza administrativa ou outros praticados por órgãos de soberania que não sejam a Assembleia da República, como os actos do Presidente da República, do governo ou mesmo dos tribunais, sinceramente, não me parece que seja…

O Sr. Presidente: Porque não? Regularam o regime de publicação dos assentos!

O Sr. Luís Marques Guedes (PSD): Penso que o princípio de publicação obrigatória é evidente e já está contemplado na Constituição. Quanto ao regime de publicação estendido a todo e qualquer tipo de actos dos órgãos de soberania, parece-nos, de facto algum exagero.

O Sr. Presidente: É certo que basta a objecção de um partido para esta proposta não poder ser considerada, mas, de qualquer modo, tem a palavra o Sr. Deputado Luís Sá.

O Sr. Luís Sá (PCP): Sr. Presidente, queremos declarar, apesar de tudo, que esta proposta merece o nosso apoio.

O Sr. Presidente: E o que pensa o Partido Socialista?

O Sr. José Magalhães (PS): Sr. Presidente, vamos ponderar, mas mesmo as objecções formuladas nos termos em que o foram pelo Sr. Deputado Luís Marques Guedes não me pareceram excluir alguma margem de definição e de limitação. Gostaríamos de explorar mais e melhor essa margem possível.

O Sr. Presidente: Srs. Deputados, já fiz o que tinha a fazer nesta matéria, pelo que não vou insistir.
Assim sendo, passaremos para o artigo 168.º na próxima reunião, que será realizada na terça-feira.
Tem a palavra o Sr. Deputado João Amaral.

O Sr. João Amaral (PCP): Queria só perguntar ao Sr. Presidente o que é que ficou pendente do artigo 168.º? Ficou alguma coisa?

O Sr. Presidente: Do artigo 168.º?!

O Sr. João Amaral (PCP): Perdão, referia-me ao artigo 167.º, ou seja, aquele que acabámos de discutir.

O Sr. Presidente: Do artigo 167.º foram rejeitadas todas as propostas, excepto as seguintes: a proposta relativa à alínea q), do PS, tendo o PSD reservado para mais tarde a sua tomada de posição; a proposta relativa à alínea r), também do PS, em relação à qual o PSD manifestou abertura mas reservando para mais tarde a sua tomada posição, e a proposta relativa à alínea t), ainda do PS, em relação à qual o PSD manifestou abertura.

O Sr. José Magalhães (PS): E a proposta em relação à parte final da alínea p), que foi adiada, Sr. Presidente.

O Sr. Presidente: De facto, essa foi adiada, mas estou a referir-me às que não foram rejeitadas.

O Sr. José Magalhães (PS): - Eu penso que essa nossa proposta ficou em aberto!

O Sr. Presidente: As que não foram adiadas foram, portanto, rejeitadas, excepto aquelas três que indiquei agora, que são do PS e que, suponho eu, contam com a abertura do PCP e uma reserva de posição ou simples abertura por parte do PSD.

O Sr. José Magalhães (PS): - Quanto aos símbolos nacionais houve adesão.

O Sr. Presidente: Foi o que eu disse! Quanto aos símbolos nacionais, o PSD demonstrou abertura.

O Sr. José Magalhães (PS): - Muito bem! Era a isso que correspondiam as nossas notas!

O Sr. Presidente: Assim sendo, como percebem, o artigo 167.º não sofrerá grande alteração.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.

Eram 00 horas e 20 minutos.

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