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3526 I SÉRIE - NÚMERO 96

O Sr. Jorge Roque Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na discussão, realizada na Comissão para a Revisão Constitucional, do artigo 64.º sobre a saúde, o Partido Socialista manteve uma atitude fechada e minimalista, aliás consequente com a circunstância de não apresentar no seu projecto de revisão qualquer proposta de alteração para este artigo.
Mantendo os traços estatizantes que, nas sucessivas revisões da Constituição de 1976, não foi possível adequar à realidade, neste artigo vemos, de facto, os Srs. Deputados do Partido Comunista com alegria estampada no rosto.
Perdeu-se, assim, mais uma oportunidade para, na revisão da Constituição, adequar a área da saúde à segunda década da democracia em que, para responder às necessidades dos cidadãos, temos como certo ser necessária maior flexibilidade.
Mas atenção, Srs. Deputados do Partido Socialista: com esta atitude deixarão de poder utilizar o alibi da Constituição para a inércia que têm revelado na reforma do sistema de saúde.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Na sua proposta de revisão constitucional, o PSD pretendeu consagrar a liberdade de acesso e de escolha dos cidadãos aos cuidados de saúde - quando quisessem escolher o serviço nacional de saúde, escolheriam, quando tivessem alternativas melhores, também poderiam escolhê-las -, ao clarificar o entendimento do "sistema de saúde" que integra as entidades públicas e privadas, introduzindo, ainda, uma referência expressa às instituições de solidariedade social como peças fundamentais na prestação de cuidados. Ao invés da formulação actual estatizante, que se mantém na Constituição, ao afirmar que o direito à protecção da saúde é feito exclusivamente através do serviço nacional de saúde, esquecendo o papel dos subsistemas, dos seguros de saúde e das instituições privadas de solidariedade social.
Na nossa proposta mantinha-se o serviço nacional de saúde como peça central fundamental da prestação de cuidados de saúde em que as regras de utilização teriam em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos. Dizermos isto, Sr. Deputado João Rui de Almeida, é um pouco diferente de dizer que estamos completamente satisfeitos com a qualidade do actual serviço nacional de saúde e que este, só por si, deu resposta a todos os problemas de saúde no nosso país. É esta a grande diferença que estamos a analisar aqui hoje. Pretendíamos também terminar com a miragem de que a saúde é tendencialmente gratuita.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Prevíamos ainda que se desse enquadramento a uma garantia de que as famílias de menores recursos vissem a sua saúde mais apoiada, tivessem uma maior comparticipação nas suas despesas com a saúde.
Criava-se também a possibilidade de se alterar a situação actual em que o financiamento não seria canalizado para as instituições mas, sim, para os cidadãos, criando condições mais objectivas para atingir o objectivo profusamente proclamado no discurso governamental, de condições para o sector privado lucrativo ou não lucrativo poder desenvolver-se.

Vozes do PSD: - Muito bem!

O Orador: - Pretendíamos também, em termos constitucionais, não cingir ao privado a necessidade de controle e fiscalização.
Pretendíamos, ainda, fazer uma adequação terminológica aos novos conceitos da saúde, como a promoção de saúde, o direito à informação, as práticas saudáveis e retirar a consagração constitucional 'de expressões como, por exemplo, "socialização dos custos dos cuidados médicos e medicamentosos" e "educação sanitária do povo".
Valha a verdade dizer que, depois de grande discussão, conseguiu-se estender a fiscalização e a disciplina também ao sector público e não exclusivamente ao privado. Conseguiu-se, ainda, a obrigatoriedade de estabelecimento de uma política de prevenção e tratamento de toxicodependentes.
Mas, Srs. Deputados, o Partido Socialista deixa de poder queixar-se pelo facto de ser difícil ao sistema nacional de saúde cobrar o que é devido pelos subsistemas e responsabilizar esse facto pelo descontrole financeiro do sistema de saúde.
O PS e o Governo terão muita dificuldade em alterar o financiamento do sistema de saúde que todos os dias dá sinais de descontrole, mas não poderá utilizar o argumento constitucional para a falta de iniciativa que também tem tido nesta área.
O PS e o Governo terão muito maior dificuldade em dar credibilidade ao seu discurso quando falar da importância das instituições privadas' de solidariedade social, da sociedade civil, do mercado na saúde já que não teve consagração constitucional.
O PS e o Governo terão também muita dificuldade em fazer o discurso de delegar nos cidadãos o que são as responsabilidades da Administração, já que continua a ser o Estado todo poderoso a financiar, a prestar, a avaliar e a garantir a qualidade dos cuidados de saúde.
Termino, repetindo, pois, que o Partido Socialista não vai poder usar o alibi da inadequação do texto constitucional aos ventos da reforma da política de saúde. Pensamos que os cidadãos, com o artigo 64.º, perdem com esta atitude do PS, nomeadamente quanto ao seu direito e liberdade de escolha que, nesta matéria, não pode deixar de caber-lhes. E é pena, num acordo que, em termos globais, é positivo para o país, que, neste artigo, tenhamos de aguardar mais alguns anos para que o Partido Socialista se encontre com a realidade.

Aplausos do PSD.

Entretanto, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente Mota Amaral.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Alberto Marques.

O Sr. Alberto Marques (PS): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Discutirmos a revisão do artigo 64.º da nossa Constituição é uma grande responsabilidade para todos nós. É que se há bem que todos preservamos é a saúde e se há problema que desperta a mobilização de todos os cidadãos é, efectivamente, a saúde.
Começo a minha intervenção justamente perguntando qual o conceito de saúde que Portugal defende com o artigo 64.º tal qual ele existe na nossa Constituição. É um conceito de saúde que tem a ver com a ausência de doença ou é um conceito de saúde que tem a ver com o bem-estar físico, psíquico e social de cada cidadão?