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0269 | I Série - Número 09 | 06 de Outubro de 2001

 

humanidade de acordo com critérios de justiça, de igualdade e de imparcialidade. Ora, o que decorre do Estatuto de Roma é a criação de um tribunal de alguma forma dependente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, o qual pode definir que uma determinada acusação não prossiga. E, nesta ordem internacional, é fácil perceber como tudo funciona em função das necessidades estratégicas de algumas potências e como os aliados depressa se submetem a todas as determinações da potência, pelo que os dois pesos e as duas medidas são uma séria ameaça.
É que não basta invocar, como fez o Sr. Deputado Pedro Roseta, que é preciso ratificar o Estatuto para assegurar o direito à vida no mundo, no fundo em defesa da humanidade. Será que quem pensa assim também entende que o fabrico de armas que têm capacidade para destruir vezes sem conta o planeta constitui um crime contra a humanidade? E quem pensa assim também terá a noção de que a aposta no nuclear a todo o pretexto constitui uma verdadeira ameaça para a humanidade? Se tem essa noção, então, deve entender que existem sérias lacunas na capacidade de julgamento deste Tribunal Penal Internacional, porque isso de crimes contra a humanidade, que julgamos que devem ser imparcialmente julgados, não pode ser só o que convém e para quem convém.
Os Verdes não podem igualmente aderir à aceitação na ordem penal da prisão perpétua como pena a aplicar, como implica a ratificação incondicional do Tribunal Penal Internacional. Mesmo que isso não significasse introduzir directamente no sistema penal português a prisão perpétua, seria sempre aceitar internacionalmente uma medida coerciva da liberdade eterna. É aceitar o princípio e a medida. Será este um primeiro passo para voltar a adoptá-lo entre nós, retrocedendo um século nos valores e princípios que construímos?
Esta, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é a leitura de Os Verdes, que nos leva, evidentemente, a votar contra esta proposta que é feita. Permitam-me referir mais uma vez que, na nossa perspectiva, esta revisão da Constituição representa, em muitos aspectos, um verdadeiro recuo em relação à Constituição que Abril criou.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Pronunciar-me-ei também sobre esta proposta relativa ao Tribunal Penal Internacional, que constitui um aspecto fundamental deste processo de revisão constitucional. Faço-o após a intervenção que há pouco ouvimos, do Sr. Deputado Pedro Roseta, para dizer que a nossa divergência relativamente a esta proposta não tem que ver com discordâncias sobre os princípios que são invocados para a criação de um tribunal penal internacional. A nossa discordância não surge quanto à bondade desses princípios mas, sim, quanto à concretização que nos é proposta desses princípios.
Digo isto porque a criação de uma instituição judiciária internacional que julgue crimes contra a humanidade segundo critérios de justiça e imparcialidade é um propósito que acolhemos e consideramos meritório. Nós consideramos fundamental que se acabe com a impunidade dos autores de crimes que ofendem a consciência universal e consideraríamos meritória a criação de mecanismos de aplicação de Direito Internacional que pudessem escapar à lógica de uma justiça exercida pelos vencedores, lógica que é inerente aos tribunais ad-hoc, já hoje, aqui, criticados por outros Srs. Deputados. De facto, como dizia, consideramos que estes propósitos são meritórios e revemo-nos neles.
A questão que se coloca, todavia, é a de saber se este Estatuto do Tribunal Penal Internacional, que foi aprovado em Roma e cuja ratificação nos é proposta, representa uma consagração adequada ou aceitável desses princípios. É esse, precisamente, o nosso problema, é aí que está a nossa divergência e é isso que nos leva a não aceitar esta alteração da Constituição, por forma a permitir ratificar o Estatuto do TPI.
Em primeiro lugar, porque este Estatuto consagra alguma dependência do TPI relativamente ao Conselho de Segurança das Nações Unidas quanto ao seu funcionamento. Mas não é esse o único aspecto negativo. O facto de não ter sido feita ainda a qualificação jurídica do crime de agressão, passando para negociação intergovernamental, a exemplo do que acontece com a definição dos elementos constitutivos dos crimes, também é um defeito. Isto é, este TPI está, à partida, dependente da negociação internacional quanto a aspectos fundamentais do seu funcionamento, o que, convenhamos, é um mau sinal de partida quanto à imparcialidade deste Tribunal na sua actuação.
Por tudo isto, cremos que concretizado desta forma, com este TPI, o meritório princípio da aplicação de uma justiça internacional continuaria a ficar sujeito à imposição e legitimação da justiça do mais forte.
Mas há uma outra questão, que, para nós, não é de somenos, relacionada com a relevância da pena de prisão perpétua e com a sua proibição na ordem jurídica portuguesa. É inequívoco que, embora por via indirecta, se procede a uma recepção da pena de prisão perpétua na ordem jurídica portuguesa, o que, do nosso ponto de vista, corresponde a um enorme retrocesso. E não se diga que não é isso que está em causa, porque se não fosse isso que estivesse em causa nem sequer era necessário proceder à revisão do texto constitucional. Manifestamente, é isso que está em causa e o que se vai permitir é que a ordem jurídica portuguesa acolha uma sanção penal que a Constituição inequivocamente proíbe e que se encontra banida entre nós desde finais do século XIX.
Repito que o que está em causa, para nós, não é o conteúdo, pois consideramos que todos os crimes que são previstos e punidos no Estatuto do Tribunal Penal Internacional são bem previstos e bem punidos. Pensamos, no entanto, que é possível acolher todas essas punições na ordem jurídica portuguesa directamente, dispensando, assim, a ratificação do Estatuto do Tribunal Penal Internacional e recusando, deste modo, esta indirecta reintrodução da pena de prisão perpétua na ordem jurídica portuguesa.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): - Muito bem!

O Orador: - E foi isso, aliás, que propusemos quando apresentámos nesta Assembleia um projecto de lei do qual