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Quarta-feira, 22 de outubro de 2014 II Série-RC — Número 3
XII LEGISLATURA 4.ª SESSÃO LEGISLATIVA (2014-2015)
REVISÃO CONSTITUCIONAL (não concluída)
Processo n.º 10
COMISSÃO EVENTUAL PARA A REVISÃO CONSTITUCIONAL
Reunião de 21 de outubro de 2014
S U M Á R I O
O Presidente (José de Matos Correia) deu início à reunião às 16 horas e 10 minutos.
Procedeu-se à apresentação dos projetos de revisão constitucional n.os 1/XII (3.ª) — Autonomia Século XXI (Renovar Abril) (Deputados do PSD Guilherme Silva, Cláudia Monteiro de Aguiar, Correia de Jesus e Hugo Velosa) e 2/XII (3.ª) — Mais Autonomia — Melhor Democracia (Deputado do
CDS-PP Rui Barreto), tendo usado da palavra os Deputados Guilherme Silva (PSD), Rui Barreto (CDS-PP), Jacinto Serrão (PS), Hugo Velosa (PSD), Luís Fazenda (BE), Isabel Alves Moreira (PS), António Filipe (PCP), Artur Rêgo (CDS-PP) e Paulo Mota Pinto (PSD).
De seguida, o Deputado Paulo Mota Pinto (PSD) apresentou uma proposta no sentido de se passar de
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imediato à votação dos projetos de revisão constitucional, que foi aceite. Pronunciaram-se a esse respeito, além do Presidente, os Deputados Isabel Alves Moreira (PS), Artur Rêgo (CDS-PP), Mota Amaral (PSD), Guilherme Silva (PSD), José Magalhães (PS), Rui Barreto (CDS-PP) e António Filipe
(PCP). Foram, depois, votados os projetos de revisão
constitucional, que foram rejeitados. O Presidente encerrou a reunião eram 18 horas e 29
minutos.
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O Sr. Presidente (José de Matos Correia): — Srs. Deputados, temos quórum, pelo que declaro aberta a
reunião.
Eram 16 horas e 10 minutos.
Srs. Deputados, antes de começarmos os nossos trabalhos, há uma questão que tenho de colocar à
consideração da Comissão.
Os Deputados do PSD Madeira desejam fazer a apresentação do seu projeto de revisão constitucional pela
voz do Sr. Deputado Guilherme Silva. Ora, o Sr. Hugo Velosa informou-me que o Sr. Deputado Guilherme Silva
chegou há pouco da Madeira e que daqui a cerca de 10 minutos chegará à Assembleia.
Assim sendo, se não vissem inconveniente, esperávamos pela chegada do Sr. Deputado, porque penso que
não fará grande sentido o Sr. Deputado Hugo Velosa começar a apresentação e daqui a 10 minutos chegar o
Sr. Deputado Guilherme Silva.
Sr. Deputado Hugo Velosa, tem a palavra.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, embora eu já tenha percebido que o Sr. Deputado José
Magalhães preferia que eu começasse a fazer a apresentação…
O Sr. José Magalhães (PS): — Não!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Não? Então, percebi mal…
Sr. Presidente, eu gostaria de pedir aos colegas, perante esta situação muito concreta, aliás, tem havido
alguns problemas com os voos, o que tem a ver com os custos da insularidade…
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Eu já cheguei!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — O Sr. Deputado Jacinto Serrão diz «eu já cheguei». Bom, depende do voo!…
Eu tive agora conhecimento de que o Sr. Deputado Guilherme Silva vem a caminho, mas quero dizer aos
colegas que não fujo a apresentar o nosso projeto de revisão constitucional e se a Comissão assim o entender
apresentá-lo-ei, porque não quero complicar a vida a ninguém. No entanto, gostaria que fosse o Sr. Deputado
Guilherme Silva, enquanto primeiro subscritor do projeto, a fazer a apresentação.
Desta forma, pedia aos colegas que pudéssemos fazer um intervalo nos trabalhos até à chegada do Sr.
Deputado Guilherme Silva, pelas razões que invoquei; penso que dentro de 10 ou 15 minutos ele estará cá, pois
já me foi dito que vem a caminho.
O Sr. Presidente: — Então, Srs. Deputados, não havendo inconveniente, vamos interromper os nossos
trabalhos e aguardar alguns minutos pela chegada do Sr. Deputado Guilherme Silva.
Eram 16 horas e 12 minutos.
Srs. Deputados, está reaberta a reunião.
Eram 16 horas e 28 minutos.
Srs. Deputados, já temos connosco o Sr. Deputado Guilherme Silva, que, em nome dos Deputados do PSD
Madeira, vai fazer a apresentação do projeto de revisão constitucional n.º 1/XII (3.ª) — Autonomia Século XXI
(Renovar Abril) (Deputados do PSD Guilherme Silva, Cláudia Monteiro de Aguiar, Correia de Jesus e Hugo
Velosa).
Como ficou estabelecido na reunião da semana passada, os trabalhos da Comissão iniciar-se-ão com uma
apresentação em termos genéricos dos dois projetos de revisão constitucional, pela ordem em que os mesmos
foram apresentados, portanto, primeiro o projeto dos Deputados do PSD Madeira e, depois, o projeto do
Deputado do CDS-PP.
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Assim, para esse efeito, tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, antes de mais, queria agradecer a
disponibilidade da Comissão para iniciar os seus trabalhos mais tarde, tendo em consideração que acabei de
chegar da Madeira.
Em primeiro lugar, queria referir-me à ordem do dia da reunião de hoje: «Apresentação, discussão e votação
dos projetos de revisão constitucional». Bom, não tenho memória de uma revisão constitucional em que logo de
uma assentada tenhamos feito tudo isto, ou seja, a apresentação, a discussão e a votação numa só reunião.
Este facto preocupa-me do ponto de vista do funcionamento da Assembleia da República, da sua dignidade e
do cumprimento das regras regimentais e constitucionais numa matéria tão delicada e tão relevante quanto é a
da análise de projetos de revisão constitucional.
Em segundo lugar, queria fazer aqui o registo doloroso, digamos assim, pois estamos na segunda Legislatura
em que a Assembleia assume poderes constituintes num momento particularmente difícil da sociedade
portuguesa, da Europa e do mundo em geral, em que se anseia por mudanças e por reformas e em que se
reclama muito a reforma do Estado.
A Constituição, é certo, foi já sujeita a anteriores processos de revisão constitucional e, portanto, não está
cristalizada no texto inicial de 1976, mas a verdade é que as mudanças que a própria Constituição e o regime
constitucional instituído a partir dela trouxeram ao País são tão profundas que o respeito por esse trabalho e por
essa circunstância que a Constituição gerou, no meu entender, imporia aos Deputados deste Parlamento com
poderes constituintes uma profunda reflexão para a sua revisão, de forma a adaptá-la às exigências e aos
desafios deste século, tão apressado, considerando a velocidade a que o mundo hoje evolui. As mudanças do
País e as mudanças do mundo exigiam que fizéssemos aqui uma reflexão aprofundada.
O meu lamento prende-se, então, com o facto de, por parte de outros Deputados, salvo o Deputado do CDS-
PP Rui Barreto, e dos partidos que têm assento parlamentar, não terem sido apresentadas iniciativas de revisão
constitucional — aliás, na exposição de motivos do projeto que apresentámos deixámos esse desafio.
A verdade é que essa apresentação não ocorreu, o que significa que há um conservadorismo constitucional
e parece que todos consideram que não há razão para se fazerem alterações na Constituição e que está tudo
bem: está tudo bem no sistema político português; está tudo bem na forma como o sistema está enquadrado
constitucionalmente; não há uma crise dos partidos; não há um afastamento dos portugueses e dos cidadãos
em geral das instituições, dos partidos, dos políticos e da política. Portanto, está tudo bem e não é preciso mexer
uma vírgula que seja na Constituição.
O País há de constatar que uns aventureiros tiveram essa ideia, mas que essa é uma ideia reacionária, não
tem nenhum sentido e que o progresso e a mudança do País vão fazer-se completamente à margem desse
propósito.
Reformar um Estado sem repensar as funções do Estado em sede de revisão constitucional é começar a
casa pelo telhado. Esta é uma oportunidade perdida — e é bom que todos tenhamos essa noção — para mudar
o País e mudar o seu enquadramento constitucional, sem prejuízo da conservação de valores essenciais da
democracia e do Estado de direito que a Constituição consagra e que, naturalmente, pretendemos que se
mantenham e até que se aprofundem.
Uma outra questão que eu queria colocar tem a ver com a seguinte circunstância: uma das acusações que,
sistematicamente, se fazem aos políticos, aos partidos, aos responsáveis pela atividade política e que se
apresentam ao eleitorado com um conjunto de promessas, é a de que se fazem promessas, mas não se
cumprem. Esta é uma acusação sistemática e, em muitos casos, com todo o sentido — aliás, esta é também
uma das linhas de descrédito em que a política e os políticos têm sistematicamente caído.
Pois bem, quero dizer-vos que esta iniciativa de revisão constitucional dos Deputados do PSD eleitos pelo
círculo eleitoral da Madeira representa uma promessa dos Deputados aos cidadãos eleitores da Madeira.
Este projeto foi divulgado na imprensa e foi debatido em vários fóruns antes e durante o período de campanha
eleitoral. Portanto, esse compromisso foi assumido, foi cumprido e foi-o sem nenhuma hesitação ou limitação
relativamente às posições das cúpulas partidárias, designadamente do PSD, porque os compromissos
assumidos com o eleitorado são sagrados e, nessa perspetiva, não podíamos deixar de apresentar este projeto.
Tivemos, no entanto, uma cautela: não faria sentido que, estando o País submetido a uma intervenção
externa, decorrente da presença da troica e do Memorando que todo o País, com grande sacrifício, teve de
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cumprir, atravessássemos, nessa pendência, o projeto de revisão constitucional e que tentássemos desviar a
atenção do País de algo que era necessariamente prioritário, ou seja, o cumprimento dos compromissos
decorrentes do Memorando.
Tivemos, efetivamente, a cautela de só apresentar o projeto de revisão constitucional findo o período de
cumprimento do Memorando e de intervenção da troica, pelo que tivemos preocupações patrióticas e cuidados
relativamente à situação política do País. E estivemos na ilusão de que, ultrapassado esse período, se sentisse
que, da parte dos Deputados e dos vários grupos parlamentares, haveria agora um espaço para este debate,
para fazermos este trabalho a sério.
Naturalmente, todas as propostas, em todas as matérias e na revisão constitucional também, são suscetíveis
de crítica, são suscetíveis de serem aperfeiçoadas, são suscetíveis de serem alteradas, são suscetíveis de
gerarem e criarem aproximações para soluções. De resto, no nosso sistema constitucional é necessária uma
aprovação por maioria de dois terços, pelo que, naturalmente, a nossa postura é de abertura para essa
aproximação, mais que não seja por princípios elementares de pragmatismo, uma vez que não será possível
fazer a revisão constitucional sem o arco dos dois terços que são indispensáveis para a sua aprovação, mas
essa é uma outra questão.
Naturalmente, sem alternativas, sem propostas de outros partidos, tirando a do Deputado Rui Barreto, não
me parece que haja espaço para esse debate. Em todo o caso, eu gostaria que este processo tivesse subjacente
a uma ideia de respeito recíproco, ou seja, naturalmente, respeitámos que os Deputados e os demais grupos
parlamentares, inclusive o próprio Grupo Parlamentar do PSD, tenham entendido não apresentar nenhuma
iniciativa de projeto de revisão constitucional, mas, agora, em reciprocidade, gostaríamos de poder discutir estes
projetos de revisão com a mesma profundidade, com a mesma tramitação, artigo a artigo, como se fez nas
anteriores revisões constitucionais.
Quero, aqui, deixar expresso que a ordem do dia, tal qual está apresentada, aparece com um golpe no
sentido de matar à nascença a discussão destes projetos. E refiro-o não pelos projetos em si, não pelos
Deputados que os subscrevem, mas, sim, pelo princípio da dignidade da Assembleia da República e das suas
comissões, designadamente desta Comissão. Acho que este não é um caminho dignificante das instituições e
eu não podia deixar de consignar aqui esta nota e este lamento.
Pode ser que esta questão seja corrigida e que eu esteja a ler mal a ordem do dia da reunião de hoje, mas
se o propósito é, efetivamente, o de esgotar nesta reunião a apresentação dos projetos e a sua votação e,
depois, o Sr. Presidente dizer-nos que os trabalhos encerraram, lamento profundamente que isso possa
acontecer, porque a Assembleia da República tem uma história, tem, particularmente, uma história criada por
esta Constituição, que nos obriga a alguma cautela na forma como procedemos, independentemente de termos
ou não iniciativas e de termos ou não projetos de revisão constitucional.
Passaria, agora, à apresentação do projeto de revisão constitucional n.º 1/XII (3.ª), da autoria dos Deputados
do PSD Madeira.
Srs. Deputados, propomos uma alteração ao n.º 1 do artigo 6.º da Constituição da República Portuguesa,
que tem em vista acabar com a referência ao Estado unitário.
Como sabem, há uma controvérsia…
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Guilherme Silva, dá-me licença?
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Claro, Sr. Presidente.
O Sr. Presidente: — Muito obrigado, Sr. Deputado.
Pelo que posso intuir do início da sua intervenção, V. Ex.ª prepara-se para fazer uma apresentação artigo a
artigo das propostas.
Ora, o que foi decidido na reunião passada foi que, num primeiro momento, os proponentes procederiam à
apresentação, em termos genéricos, das linhas gerais dos projetos de revisão constitucional e, num momento
posterior, se fosse esse o caso, passar-se-ia à apreciação, na especialidade, de cada uma das propostas.
Portanto, agradecia que o Sr. Deputado Guilherme Silva, que, seguramente há de ter sido informado desse
facto pelo Sr. Deputado Hugo Velosa, procedesse dessa forma, porque foi a que ficou definida.
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Já agora, dir-lhe-ei, a propósito da ordem do dia, que ela foi marcada nestes termos não para coartar o que
quer que fosse, mas porque foi entendimento da Comissão que todas as reuniões teriam a mesma ordem do
dia para deixar que a própria reunião flexibilizasse a sua ordem de trabalhos.
Portanto, seja hoje, seja na próxima semana, seja daqui a 15 semanas, se ainda houver trabalhos da revisão
constitucional — o que depende da Comissão e não de mim —, a ordem do dia será sempre a mesma.
Sr. Deputado Hugo Velosa, tem a palavra.
O Sr. HugoVelosa (PSD): — Sr. Presidente, só porque fui citado, gostaria de dizer que não foi aqui
decidido… Aliás, discutimos essa matéria e, embora tenha sido consensualizada nestes termos esta ordem de
trabalhos, não foi decidido, porque isso levantava questões, saber se se deveria ou não proceder a uma votação
na generalidade, digamos assim, coisa que nunca aconteceu numa revisão constitucional.
Portanto, não se pode dizer que isso foi consensualizado, porque eu próprio tomei uma posição contrária e
penso que não fui o único,…
O Sr. Presidente: — Eu não disse isso!
O Sr. HugoVelosa (PSD): — … pois houve intervenções no sentido de dizer que a questão da votação na
generalidade nunca foi posta em anteriores revisões constitucionais e, portanto, a questão não se punha.
É verdade que foi consensualizada a apresentação dos projetos e, após a sua apresentação, dentro daquilo
que está na ordem de trabalhos, a Comissão iria andando com os seus trabalhos de acordo com a forma como
decidisse que deveria andar. É só para dar esta nota.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Hugo Velosa, agradeço-lhe a nota, mas nada vai contra o que eu disse.
Não falei em nenhuma votação; eu disse, apenas, que tinha ficado consensualizado que havia uma
apresentação na generalidade e que tinha também ficado consensualizado, por proposta minha, para que não
houvesse nenhuma dúvida de ninguém, que todas as ordens de trabalho ficariam exatamente iguais, fosse qual
fosse a reunião, precisamente para permitir à Comissão gerir como entendesse a evolução dos trabalhos.
O que ficou claro, e por isso é que pedi ao Sr. Deputado Guilherme Silva que, nesta primeira fase, interviesse
com esse objetivo, foi que a primeira intervenção do PSD Madeira e do Deputado do CDS da Madeira seria para
apresentar, em termos gerais, as linhas orientadoras do projeto de revisão constitucional de cada um deles e
não a passagem imediata para a análise, ou para a apresentação na especialidade de cada uma das propostas.
Tem a palavra, Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Sr. Presidente, percebo a sua preocupação, mas, apesar de discordar
dessa orientação, quero tranquilizá-lo, dizendo-lhe que não era meu propósito apresentar artigo a artigo.
O Sr. Presidente: — Mas pareceu-me!
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Mas tinha de começar por um artigo, tinha de começar e entendi começar…
O Sr. Presidente: — Para uma apresentação na generalidade, não é preciso começar por um artigo!
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Sr. Deputado José de Matos Correia, com toda a consideração e amizade
que tenho por si,…
O Sr. Presidente: — Se fui eu que me antecipei, peço desculpa, Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — … compreendo que V. Ex.ª esteja preocupado em evitar a discussão artigo
a artigo,…
O Sr. Presidente: — Não, não estou!
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O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — … mas já não vejo que possa ter a preocupação de coartar a forma como
eu entendo apresentar…
O Sr. Presidente: — Se foi isso que dei a entender, peço-lhe desculpa, mas não foi nem é minha intenção
coartar nada. A minha intenção é apenas a de manter o cumprimento das deliberações da Comissão.
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Pronto, muito bem!
Estava, apenas, a referir que há uma grande controvérsia, há muito tempo, desde o início da Constituição,
pela forma como a Constituição no seu artigo 6.º define o Estado como Estado unitário.
É sabido e há constitucionalistas que, sistematicamente, chamam a atenção para esta anomalia, digamos
assim, da Constituição, na medida em que, prevendo a própria Constituição duas regiões autónomas com
autonomia política, deveria assumir-se o Estado português como Estado também regional.
É, aliás, de uma proposta do Prof. Jorge Miranda no sentido de que o Estado português se designasse por
Estado unitário regional e a circunstância de essa proposta nunca ter sido aceite, que já foi por nós apresentada
também em revisões anteriores, levou à proposta que está sobre a mesa, em que é eliminada esta referência
ao Estado unitário, porque ele, efetivamente — e a Constituição devia ter um princípio de autenticidade e de
verdade, que neste artigo não tem —, não contempla a natureza do Estado português tal e qual a própria
Constituição a consagra e estabelece.
Portanto, esta é uma preocupação de verdade constitucional e ficaria bem que a própria Constituição a
tivesse aqui estabelecida.
Não passando a fazer a análise artigo a artigo mas, sim, à apresentação genérica das linhas gerais do projeto,
que subscrevi com outros Deputados do PSD eleitos pelo círculo eleitoral da Madeira, direi que propomos a
possibilidade da existência de partidos regionais.
Nas anteriores revisões da Constituição tem sido feito um percurso importante de aprofundamento da
democracia, designadamente, apesar de ter havido uma grande oposição durante muito tempo por parte de
algumas forças políticas, quanto ao referendo. A figura do referendo foi difícil de introduzir, porque houve,
realmente, grandes resistências de vários partidos à sua consagração constitucional, mas temos hoje a figura
do referendo, que é um passo importante no aprofundamento de uma democracia. Por isso, entendemos
também que a existência de partidos regionais seria, igualmente, uma vertente de aprofundamento da
democracia e de aperfeiçoamento do seu funcionamento.
Propomos, ainda, a redução do número de Deputados, dentro do quadro constitucionalmente estabelecido,
para 181 Deputados; prevemos a abertura à apresentação de candidaturas subscritas por cidadãos, para além
dos partidos, para a Assembleia da República e para Assembleias Legislativas Regionais; propomos a
eliminação da figura das autorizações legislativas no que diz respeito às Assembleias Legislativas Regionais,
que, pelo seu modelo, nunca teve nenhum funcionamento, pois não há memória de uma iniciativa desse âmbito
por parte de nenhuma das Assembleias Legislativas, seja a dos Açores seja a da Madeira.
Propomos a criação de um conselho superior de justiça que integre os conselhos atualmente existentes, o
Ministério Público, o Conselho Superior da Magistratura e também o Conselho Superior dos Tribunais
Administrativos e Fiscais.
Propomos, igualmente, um mandato único para o Presidente da República; a redução de seis para três anos
do mandato do Procurador-Geral da República; a substituição do Tribunal Constitucional por uma secção própria
do Supremo Tribunal de Justiça, solução que é acompanhada, designadamente pelo anterior Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça que também a defende.
Seguidamente, temos alterações de natureza formal, designadamente a substituição dos decretos
legislativos regionais por leis regionais; o aprofundamento das competências das Assembleias Legislativas
numa perspetiva mais clarificadora, reservando à Assembleia da República, no fundo, os atributos de soberania,
em matéria de direitos, liberdades e garantias, de defesa nacional, de segurança interna, de política externa, de
tribunais de recurso, de sistema de segurança social, e todas as demais matérias de âmbito regional poderem
caber às Assembleias Legislativas.
Qual é a vantagem desta proposta? Estamos no quadro de um único País, subordinado a uma só
Constituição, mas deixa-se às Assembleias Legislativas um espaço em tudo o que não tenha a ver com atributos
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de soberania do Estado, que, esses, sim, têm, naturalmente, de caber exclusivamente aos órgãos de soberania,
designadamente à Assembleia da República.
Com esta solução, pretendem-se, fundamentalmente, dois objetivos: um, pôr termo a toda uma
conflitualidade e zona de dúvidas que tem, sistematicamente, levado a chumbar, por inconstitucionalidade,
diplomas regionais de ambas as Assembleias Legislativas, numa catadupa excessiva que não dignifica esses
órgãos de Governo próprio e que resulta, exclusivamente, destas zonas cinzentas que a não clarificação desta
divisão de competências importa.
Nessa medida, ao eliminar-se essa conflitualidade, acho que estamos também a reforçar o melhor
funcionamento das instituições e a própria unidade nacional.
O outro desiderato, que se pretende obter com este alargamento das competências legislativas das
Assembleias Legislativas Regionais, é, obviamente, o de permitir que elas próprias criem os sistemas de
intervenção nas várias áreas da vida regional em função das suas especificidades, que não são sempre
coincidentes nos dois arquipélagos, para que possam encontrar as soluções legislativas mais adequadas ao seu
desenvolvimento.
A ideia é que haja uma legislação amiga da economia, que haja uma legislação simplificadora da vida dos
cidadãos e que, por essa via, as margens de autossuficiência das comunidades insulares se tornem mais
consistentes e, consequentemente, a desoneração do Estado na sua solidariedade, designadamente financeira,
se alivie.
Parece-me um propósito relativamente ao qual todos devíamos convergir, penso eu, e que ninguém tem
nada a perder pelo facto de, por exemplo, o arrendamento ter uma regulamentação diversa na Madeira ou nos
Açores e de determinados institutos poderem ser diferenciados daquela que é a legislação nacional,
salvaguardado que está o teto constitucional para as questões fundamentais.
Altera-se, também, o sistema do referendo regional com um maior alargamento e intervenção dos órgãos de
Governo próprio; faz-se uma redução do número de Deputados à Assembleia Legislativa para 31 Deputados; o
Presidente do Governo Regional passa a ser eleito diretamente pela Assembleia Legislativa, cabendo ao
Presidente da Assembleia dar-lhe posse, nomeá-lo e nomear os demais Membros do Governo por sua proposta.
Dentro da parte constitucional propõe-se a eliminação do instituto da fiscalização preventiva da
constitucionalidade, relativamente ao qual se entende que tem consequências, às quais todos temos assistido,
de arrastar para o Tribunal Constitucional toda a controvérsia do debate legislativo que aqui se regista, na
Assembleia, com todas aquelas cenas a que temos assistido de se perguntar como é que vai acabar este
diferendo, que sentido vai ter este acórdão, quantos juízes estão do PSD, quantos juízes estão do PS… Parece-
nos que não é, efetivamente, um percurso dignificador do Tribunal Constitucional e que teríamos a ganhar com
esta questão.
Propomos a extinção da Entidade Reguladora para a Comunicação Social. Parece-nos que, no estado atual
de maturidade da nossa democracia, a sua história revela bem a sua desnecessidade. Entendemos que as
questões relativas à liberdade de expressão e de funcionamento, para além da própria autorregulação, têm um
campo próprio nos tribunais. O que é preciso é acelerar este tipo de processos, que já têm a designação de
«urgentes», mas nem sempre têm a urgência que nós desejaríamos. E, num momento em que estamos todos
a fazer um esforço de redução de despesa pública, extinguir entidades como esta parece-me, também, que
seria importante, nessa linha, nessa senda e nessa preocupação.
Propomos, também, o aprofundamento das competências fiscais das regiões autónomas, designadamente
a possibilidade de criação de impostos e de regulação das suas taxas, em função da realidade económica e
social de cada uma das regiões.
Prevemos, ainda, que o Orçamento do Estado passe a fixar, no início da Legislatura, os limites do défice para
os quatro exercícios subsequentes — no fundo, há aqui a velha discussão da regra de ouro, que há quem
entenda que deva estar na Constituição. Segundo a nossa proposta, faríamos este exercício de regulamentá-lo
no Orçamento do Estado, no início de cada Legislatura para os quatro anos subsequentes.
Clarifica-se — esta é também uma questão que tem gerado alguma controvérsia jurisprudencial — o reforço
da superioridade hierárquica dos estatutos político-administrativos em relação aos demais atos legislativos.
Admitem-se, também, alterações ao regime do referendo nacional; elimina-se o instituto da referenda, que é
algo que já tem outros proponentes no domínio da doutrina sobre esta matéria; extingue-se a figura do
Representante da República.
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Subordina-se a aprovação dos estatutos e das leis eleitorais regionais a uma maioria de dois terços, portanto,
dá-se aqui uma atenção particular e um reforço à própria Assembleia da República, que, perante estes
instrumentos, deve ter uma maioria especial a aprová-los.
Admite-se que seja a própria região a criar os tribunais de primeira instância.
Propõe-se, também, na linha de propostas que têm sido apresentadas e debatidas a nível nacional, a
parlamentarização do sistema de governo das autarquias.
Conforma-se o artigo 273.º com o atual conceito estratégico de Defesa Nacional.
Introduz-se a figura do recurso de amparo, que já foi, aliás, proposto em anteriores revisões constitucionais
pelos Deputados do PSD Madeira, e também a consagração do direito à diferença, como reverso do princípio
da igualdade, que tem hoje consagração em textos constitucionais no domínio do direito comparado.
Em síntese, são estas as nossas propostas. Como viram, não se trata de um projeto acantonado nas
questões regionais ou de autonomia; trata-se de um projeto que tem uma visão para o País e uma preocupação
relativamente ao sistema político e ao seu aperfeiçoamento. E é também por essa circunstância que se lamenta
ainda mais que não sejamos acompanhados por nenhum grupo parlamentar e nenhum dos outros Deputados,
que parece que entendem que a circunstância de a Constituição conferir a esta Assembleia da República, nesta
ocasião, poderes constituintes é, de todo, irrelevante.
O Sr. Presidente: — Passamos, agora, à apresentação do projeto de revisão constitucional n.º 2/XII (3.ª) —
Mais autonomia — Melhor democracia (Deputado do CDS-PP Rui Barreto).
Sr. Deputado Rui Barreto, tem a palavra.
O Sr. Rui Barreto (CDS-PP): — Sr. Presidente, cumprimento, também, todos os Deputados presentes nesta
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional.
O projeto de revisão constitucional por mim subscrito, e que apresento nesta Comissão, intitula-se «Mais
autonomia — Melhor democracia». Antes de mais, gostaria de dizer o porquê da apresentação do projeto e, se
calhar, justificar o momento da sua apresentação.
Em primeiro lugar, estamos numa Comissão de revisão constitucional. Assim, de acordo com o n.º 1 do artigo
285.º da Constituição, sobre a iniciativa da revisão, refere-se que «A iniciativa da revisão compete aos
Deputados» e no n.º 2 refere-se que «Apresentado um projeto de revisão constitucional, quaisquer outros terão
de ser apresentados no prazo de 30 dias». Portanto, julgo que, utilizando este direito e esta prerrogativa, fica
justificado o porquê da apresentação do projeto de revisão constitucional.
Porquê este momento em particular? Estamos no último ano da Legislatura na Assembleia da República e
também na Região Autónoma da Madeira. Por isso, considero que, passados 40 anos, feitas algumas revisões
constitucionais, estando o mundo em permanente mutação, havendo hoje novos desafios, havendo uma
tendência, que se vai consensualizando na sociedade, de que é preciso proceder a reformas, fazer pactos, unir
esforços, encontrar soluções, repensar o papel do Estado, encontrar soluções que possam enquadrar o texto
constitucional — no fundo, aquilo que são os desafios do século XXI — justifica-se a prerrogativa de
apresentação do projeto de revisão e julgo que qualquer grupo parlamentar, qualquer partido, ou qualquer
Deputado não deve recear a oportunidade de rever o texto constitucional, de discutir o momento, as
circunstâncias em que estamos, a mutação da sociedade e os seus constantes desafios, por forma a
verificarmos se o texto constitucional está ou não em conformidade com isso. Se acharmos que não, vamos
assumir as nossas responsabilidades por tal decisão; se acharmos que sim, não percebo o receio de discutirmos
um projeto de revisão constitucional.
Tem-se falado muito na necessidade, repito, de fazer reformas, de encontrar soluções e este é, efetivamente,
no quadro da Lei Fundamental, o local próprio para o fazermos.
Relativamente ao conteúdo do projeto de revisão constitucional que subscrevo, o qual, tendo aspetos
nacionais, cinge-se com alguma particularidade à questão das autonomias, gostava de dizer que, em particular,
a consagração das autonomias na Lei Fundamental de 1976 veio a revelar-se uma das inovações mais
profundas e bem-sucedidas da estrutura do Estado democrático instituído pela Constituição. De facto, a
autonomia possibilitou um novo desenvolvimento económico e social e a valorização das ilhas no quadro na
Nação portuguesa.
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Pese embora todos os resultados positivos alcançados e os aperfeiçoamentos do sistema autonómico nas
sucessivas revisões constitucionais, subsistem, ainda hoje, acrescidas razões para que se reflita sobre a
necessidade de se reformar o quadro de autonomia constitucional.
A última revisão constitucional, cingida ao capítulo das autonomias, foi encarada como uma oportunidade
para ampliar os poderes legislativos regionais. Assim, pôs-se fim aos conceitos de interesse específico e de lei
geral da República e introduziu-se a ideia de competência legislativa de âmbito regional.
Na altura, a intenção do legislador foi a de alargar os poderes dos parlamentos insulares, estipulando que «A
autonomia legislativa das regiões autónomas incide sobre matérias enunciadas no respetivo estatuto político-
administrativo que não estejam reservadas aos órgãos de soberania» — n.º 1 do artigo 228.º da Constituição
da República Portuguesa.
A verdade é que a referência a «legislar no âmbito regional em matérias enunciadas no respetivo estatuto
político-administrativo e que não estejam reservadas aos órgãos de soberania», constante da alínea a), do n.º
1 do artigo 227.º da Constituição, veio a revelar-se, na prática, limitadora da capacidade legislativa das regiões,
em virtude da jurisprudência restritiva que sobre a matéria foi produzida pelos órgãos de soberania, em particular
pelo Tribunal Constitucional. De facto, o objetivo de aumentar a competência legislativa regional não foi
cumprido, em parte, porque não se procedeu de forma clara, na Constituição e nos estatutos, a uma repartição
de poderes entre o Estado e as regiões autónomas.
Assim, considero que importa que nesta revisão constitucional se clarifiquem os poderes legislativos das
regiões autónomas e a sua articulação com as matérias reservadas aos órgãos de soberania, por forma a evitar
permanente conflitualidade em torno desta questão e a atingir os objetivos pretendidos com a revisão de 2004
de alargar as competências da Madeira e dos Açores.
Aliás, a ótica fundamental deve ser a despesa e não tanto a receita, no quadro de serviços que o Estado
presta. Nesse sentido, procurou-se introduzir fatores de correção e de responsabilização, que vão no sentido de
obter um quadro financeiro mais equilibrado e equitativo para as tarefas que as regiões autónomas assumem
em nome e em vez do Estado.
Gostaria de, brevemente, e respeitando as regras propostas, anunciar as 10 grandes alterações que
proponho no projeto de revisão constitucional que ora apresento.
Em primeiro lugar, proponho a extinção do Representante da República. Ou seja, no tocante à representação
do Estado na região e à regulação do processo legislativo regional, propõe-se a extinção do cargo de
Representante da República e atribuem-se os poderes de fiscalização da constitucionalidade e da legalidade da
legislação regional ao Sr. Presidente da República. Julgo que esta solução valorizaria as Assembleias
Legislativas Regionais e, também, as autonomias, quer da Região Autónoma da Madeira quer da Região
Autónoma dos Açores.
Defendo, também, um aumento dos poderes legislativos e, quanto a isso, propõe-se uma repartição clara
das competências dos órgãos de soberania das regiões autónomas, estipulando-se que às Assembleias
Legislativas estará apenas vedado o poder de legislar sobre matérias que façam parte da reserva absoluta da
Assembleia da República e da competência exclusiva do Governo da República e ainda outras que fiquem
plasmadas na Lei Fundamental, introduzindo-se, também, o conceito de lei regional em substituição de decreto
legislativo.
Uma terceira questão para a qual chamo a vossa atenção é a do alargamento das competências em matéria
fiscal. Está previsto no estatuto político-administrativo das regiões autónomas uma autonomia fiscal
relativamente a determinadas matérias, nomeadamente ao diferencial fiscal, que era de 30% e que, por força
do contrato feito, e que findou a 17 de maio, entre a República portuguesa e a três entidades chamadas troica,
foi reduzido para 20%.
Ora, nós consideramos que deve ser feito um aprofundamento dessas matérias, chamando a atenção para
uma questão em particular: os madeirenses estão a passar por uma situação dificílima, que decorre do facto de
estarem a ser implementadas na Região Autónoma da Madeira medidas decorrentes da assinatura do PAEF
(Programa de Assistência Económica e Financeira), celebrado entre a República portuguesa e a troica, e que
ainda, de certa forma, vigoram, e aquelas que tiveram lugar com a assinatura do Programa de Ajustamento
Económico e Financeiro entre a Região Autónoma da Madeira e o Governo português. Assim, os portugueses
madeirenses serão, de certeza, aqueles que, hoje, em Portugal, vivem pior, pelo facto de terem uma dupla
tributação e um duplo agravamento.
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Por isso, também queremos não só um aprofundamento das competências em matéria fiscal, mas também
a recuperação do diferencial fiscal de 30%, que existia até à assinatura do contrato, em janeiro de 2011. Este
diferencial fiscal protegia os residentes na Madeira ou dava prerrogativas ao Governo Regional da Madeira em
matérias como o IRS, o IRC, o imposto sobre os combustíveis e outras taxas que vieram a ser agravadas.
O quarto aspeto refere-se à necessidade de os estatutos político-administrativos, a lei das finanças regionais
e as leis eleitorais dos Açores e da Madeira terem de ser aprovados por dois terços dos Deputados nas
respetivas Assembleias Legislativas e na Assembleia da República.
O quinto aspeto diz respeito à extensão do regime de incompatibilidades e impedimentos dos Deputados e
do Governo da República aos Deputados regionais e membros dos Governos das regiões autónomas, ou seja,
uma extensão daquele regime que já vigora aqui na República. Julgamos que isso promoveria maior
transparência e a tão propalada confiança dos cidadãos.
Defendemos também, em sexto lugar, o limite de três mandatos para todos os cargos políticos executivos,
eleitos ou nomeados. Achamos que esta norma poderia permitir uma maior responsabilização e também uma
maior rotatividade no exercício dos cargos públicos.
Em sétimo lugar, defendemos a possibilidade de os açorianos e os madeirenses residentes fora das regiões
votarem e serem eleitos para as Assembleias Legislativas.
Em oitavo lugar, propomos a consagração de um novo princípio de garantia às regiões autónomas dos meios
financeiros necessários a assegurar aos cidadãos nelas residentes as mesmas prestações e serviços que o
Estado assegura no restante território nacional, em especial no domínio da educação, da saúde e da segurança
social, assegurado por um fundo de garantia de serviços públicos fundamentais.
Em nono lugar, propomos a alteração da designação dos juízes do Tribunal Constitucional, dividindo essa
responsabilidade pelo Presidente da República e pela Assembleia da República, devendo a escolha recair em
juízes ou juristas de reconhecido mérito e saber. A proposta define que, dos 13 juízes do Tribunal Constitucional,
cinco seriam escolhidos pela Assembleia da República, cinco pelo Presidente da República e três seriam
cooptados pelos juízes eleitos.
Em décimo lugar, devo referir a introdução da apreciação preventiva de normas pelo Tribunal Constitucional
poder incidir sobre a conformidade com os tratados da União Europeia e da União Económica e Monetária.
São estas, em traços gerais, as 10 alterações que defendo neste projeto de revisão constitucional.
Para finalizar, Sr. Presidente e Srs. Deputados, queria dizer o seguinte: poderá, eventualmente, esta
Comissão Eventual para a Revisão Constitucional não prosseguir o objetivo para o qual foi empossada, que é
verdadeiramente trabalharmos sobre o texto e, perante um quadro de dificuldades, encontrarmos soluções que
nos permitam resolver muitos dos problemas com que somos hoje confrontados, mas quero também deixar aqui
uma mensagem.
Considero que hoje há uma enorme desconfiança de portugueses que vivem no território continental em
relação a portugueses que vivem nas regiões autónomas e não quero com isto assacar responsabilidades,
porque essas responsabilidades são tanto regionais como nacionais, pelo que considero que dever-se-ia encetar
um novo quadro de relacionamento institucional com as regiões autónomas e, em particular, com aquela de
onde provenho, que é a Região Autónoma da Madeira, que permita um relacionamento institucional, mantendo
autonomia, mas fazendo parte deste território que honramos, um relacionamento que seja profícuo, de enorme
responsabilidade, de transparência, de compromisso, mas que permita, dentro do âmbito das aspirações do
povo insular, e, em particular, da Região Autónoma da Madeira, aspirar a uma vida melhor e mais digna para
todos.
O Sr. Presidente: — Feita a apresentação, em termos gerais, de ambas os projetos, passamos agora à
intervenção dos grupos parlamentares.
Tem a palavra o Sr. Deputado Jacinto Serrão.
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr. Presidente, em primeiro lugar, quero cumprimentar os meus colegas
Deputados da Região Autónoma da Madeira que acabaram de apresentar estas iniciativas e também tecer
algumas considerações, até porque grande parte daquilo que aqui disseram já foi dito por mim, há muitos anos,
uma vez que defendi muitas das ideias que estão agora plasmadas no discurso dos ilustres colegas Deputados
quer do CDS quer do PSD.
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Gostaria de contextualizar estas iniciativas, atendendo a toda esta situação neste quadro de revisão
constitucional, e dizer que «aquilo que nasce torto, tarde ou nunca se endireita».
Já participei, no âmbito do meu partido, na revisão constitucional de 2004, uma revisão com êxito para as
regiões autónomas, pois, como todos nós sabemos, essa revisão, essa sim, introduziu alterações profundas,
mereceu a maioria dos ditos dois terços dos Deputados da Assembleia da República e reverteu num ganho
substancial para a dignificação do processo autonómico, um processo que, pela sua própria natureza, é
inesgotável e é um processo de aperfeiçoamento continuado ao longo do tempo.
Gostaria de dizer que a revisão constitucional, tal como se fez em tempos passados, faz-se com cabeça,
tronco e membros. Neste pressuposto, devemos procurar, quando nos abalançamos a um projeto desta
envergadura, colher o maior número de sensibilidades e fazer uma reflexão consensualizante a nível regional e
a nível nacional — o que não foi o caso das iniciativas em discussão, neste momento —, caso contrário a revisão
constitucional nunca terá êxito, como é óbvio.
Isto para dizer, Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, que existem até boas ideias nestas iniciativas. Como
referi logo no início, eu próprio, já há 10 anos que tenho uma intervenção mais atuante, do ponto de vista político-
partidário, no âmbito das minhas responsabilidades no Partido Socialista e até das minhas responsabilidades
institucionais, quer na região autónoma quer na República, e tenho vindo a defender algumas dessas ideias, e
até o meu partido, mas, infelizmente, até hoje, as mesmas não tiveram o tal acolhimento para podermos criar
as condições e fazer com que essas ideias fiquem plasmadas na Constituição da República Portuguesa.
Posto isto, quero dizer que iniciativas tomadas assim, sem reunirem estas condições, tal como o foram, são
iniciativas que acabam por ser queimadas. E lamento que, de facto, os proponentes destas iniciativas não
tivessem tido o cuidado de, primeiro, reunir as condições nacionais para que a revisão constitucional se
consumasse com o êxito que todos nós desejaríamos.
Não o fizeram; apenas fizeram estes números de natureza mediática, sabendo de antemão — e a avaliar
pelos discursos que foram feitos a priori, não pelos meus ilustres Colegas que agora aqui apresentaram
brilhantemente as suas iniciativas, mas pelos líderes regionais nas regiões autónomas, trata-se, de facto, de
números mediáticos…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Números mediáticos?!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — … que, em torno desse discurso feito pelas lideranças regionais, até não
ajudam nada o processo de dignificação das autonomias, em sede de revisão constitucional. Mas essa é uma
outra discussão que temos a nível da Região Autónoma da Madeira que não deve ser trazida para aqui.
Em relação àquilo que foi dito pelos meus ilustres Colegas, a propósito das suas iniciativas, apetece-me
dizer, tanto a um como a outro, que «bem prega Frei Tomás, faz o que ele diz não faças o que ele faz!».
Sr. Deputado Guilherme Silva, começo por si. O Sr. Deputado, como pessoa entendedora nestas matérias
constitucionais e de direito, sabe perfeitamente que a revisão constitucional de 2004, na qual participou, veio
introduzir um conjunto de alterações significativas no âmbito das autonomias, que nos conferiram ampliação de
poderes e dignificação do processo autonómico, mas, até hoje, passados quase 10 anos, o estatuto político-
administrativo, que é a dita, entre aspas, Constituição das regiões autónomas, não foi tocado. Isto, apesar das
inúmeras iniciativas que os partidos da oposição apresentaram — todos eles, penso, mas, pelo menos, o Partido
Socialista Madeira fê-lo — para que a revisão do estatuto político-administrativo se fizesse de maneira a poder
beber, absorver o resultado de uma revisão constitucional que se fez em 2004.
E o que pretendíamos, de facto, era muito daquilo que já foi dito aqui até pelo Sr. Deputado Rui Barreto,
matéria sobre a qual até tenho dúvidas se deveria estar na Constituição da República e não no estatuto político-
administrativo, de maneira a podermos dignificar o regime democrático que vigora na Região Autónoma da
Madeira, que não está dignificado, como todos nós sabemos, quer pelos inúmeros exemplos que são relatados
pela comunicação social quer pelos inúmeros exemplos de atos executivos e legislativos que acontecem no
âmbito dos órgãos de governo próprio, quer a Assembleia Legislativa quer o Governo Regional. Aliás, se
quiserem que os elenque, posso elencar alguns casos, mas são inúmeros os que todos os Srs. Deputados a
nível nacional têm constatado.
E dou alguns exemplos que envergonham a Região Autónoma da Madeira, até porque foi dito aqui que a
Madeira está sob uma dupla austeridade, que nos é conferida não só pela austeridade da troica, internacional,
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mas também por um plano de resgate feito só para a Região Autónoma da Madeira, fruto de uma dívida oculta
que aconteceu, também do executivo do PSD a nível regional, e que viola a lei, com uma série de ilegalidades,
como se pode verificar no parecer recentemente lançado pelo Ministério Público acerca desse processo. Mas
também não vamos falar acerca dessa matéria…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Foi o contrário!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Tenho aqui o processo, Sr. Deputado. Se quiser, talvez possamos falar dele.
Não sei se o Sr. Presidente nos dará essa oportunidade, mas terei muito gosto em fazê-lo.
O Sr. Presidente: — Não, não darei!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Não dá.
Então, gostaria só de dizer, para concluir este meu raciocínio em relação à intervenção do Sr. Deputado
Guilherme Silva, que, por exemplo, sobre os direitos de cidadania, concebo a cidadania como um direito igual
para todo o cidadão, e um cidadão é um cidadão português. Não há uma cidadania regional. Nós temos um
povo e até acho que não devemos lutar pela identidade a nível regionalizante, a nível local, porque isso acarreta
um conjunto de questões de natureza cultural, ética, moral ou até mesmo religiosa, se quiserem. Essa identidade
existe, mas a cidadania que nos é conferida pelo Estado de direito democrático é una e é igual para todo o
cidadão.
Por isso, temos de pensar muito bem se as alterações de natureza constitucional que fazemos não vão
introduzir distorções a este princípio fundamental, que é o de uma cidadania que deve ser aplicada de igual ao
modo a todo o cidadão, quer viva numa ilha quer viva num território continental.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Ou até fora!
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Ou até fora dele!
Isto para dizer que há distorções a este direito fundamental da cidadania, porque a revisão do estatuto
político-administrativo não se fez e dou alguns exemplos, Sr. Deputado Guilherme Silva: a lei determina que
nem sequer o Sr. Presidente da República tem direito a este direito, que, de facto, ainda existe para o cidadão
titular de cargo público a nível regional, que é o da acumulação do vendimento e da reforma.
Na verdade, na Região Autónoma da Madeira este direito para o titular de cargo público continua a ser
permitido, enquanto que a nível nacional, mais nenhum titular de cargo público, quer na Madeira, quer nos
Açores, quer no continente, pode beneficiar desta regalia.
Outra coisa tem a ver com o regime de incompatibilidades que põe em causa o funcionamento justo e isento
dos titulares de cargos públicos na Região Autónoma da Madeira, que já está a vigorar a nível nacional com
uma série de alterações que foram acontecendo, mas que na Madeira continua bloqueado, porque o estatuto
político-administrativo não deixa que haja uma melhoria deste regime de incompatibilidades de maneira a
aperfeiçoar e a introduzir critérios de justiça e de transparência na gestão da coisa pública na Região Autónoma
da Madeira.
Outra questão tem a ver com as subvenções vitalícias. Os Srs. Deputados sabem que, já há muitos anos, a
nível nacional, nenhum titular de cargo público, como, por exemplo, Deputados, pode beneficiar dela. Não é um
direito que nos assiste, mas, na Região Autónoma da Madeira, o titular de cargo público, o Deputado, ou titular
de altos cargos públicos, pode beneficiar de uma subvenção vitalícia. E ainda mais: pode beneficiar do subsídio
de reintegração, coisa que também já está vedada a todo o cidadão a nível nacional e a nível da Região
Autónoma dos Açores.
Não deixa de ser ridículo que se diga que a Madeira está numa situação confrangedora, porque está sob um
duplo plano de resgate, quando os titulares de cargos políticos gozam destas mordomias, que já estão vedadas
aos demais cidadãos a nível nacional.
Para terminar, refiro outra questão: o PS Madeira — isto porque estamos a falar também de dirigentes
políticos das estruturas regionais dos partidos —, entende que a prioridade das prioridades é acudir aos
problemas mais prementes da Região Autónoma da Madeira e que o estatuto político-administrativo é a
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prioridade das prioridades para ser revisto, tal como o plano de resgate e a lei de finanças das regiões
autónomas.
É que, como todos sabemos, com estas novas alterações, a Madeira, que antes tinha um PIB empolado,
rico, e um poder de compra pobre — sempre teve e tenho dito isto há mais de 10 anos, mas nunca ninguém
quis acreditar —, agora, com estas novas redefinições do PIB, tem um poder de compra pobre, como sempre
foi demonstrado estatisticamente, mas tem um PIB pobre, de acordo com o poder de compra das pessoas, coisa
que não existia até agora, fruto de uma manipulação estatística que sempre aconteceu para passar uma imagem
de riqueza e de fausto, que nunca existiu na Região Autónoma da Madeira.
O Sr. Deputado Rui Barreto — e vou ser rápido, até porque há outras questões — falou do diferencial fiscal.
Se o número 30% tem de estar na Constituição da República, tenho dúvidas… Defendo é que também devemos
rever a matéria das competências fiscais, mas essa é uma discussão para ter a nível nacional, porque, como já
disse, para ter êxito, tem de haver uma consensualização muito maior.
O Sr. Deputado falou de um problema que tem a ver com a anulação do diferencial fiscal. Ora, o diferencial
fiscal não foi anulado, porque a Constituição da República não nos protege! Não! O diferencial fiscal de 30% é
para fazer face aos custos de insularidade e, aí, sim, existe um princípio na Constituição da República que refere
que temos de introduzir fatores discriminatórios de maneira a que o cidadão que vive na Região Autónoma da
Madeira não seja onerado, existindo, por isso, a possibilidade de, por viver numa região autónoma, um
deferencial fiscal, que, depois, é acompanhado pelas leis, pois o Estado tem obrigação de fazer cumprir este
princípio que está na Constituição da República.
O diferencial fiscal tem de estar na lei de finanças das regiões autónomas — e está lá —, mas o Governo do
PSD e do CDS aprovou um plano de resgate para a Madeira que anulou este princípio constitucional. Ou seja,
o Plano de Assistência Económica e Financeira para a Região Autónoma da Madeira não está na Constituição
da República; é uma vontade política dos Executivos, quer a nível regional da Madeira, quer a nível nacional.
O Sr. Deputado Rui Barreto, que pertence ao CDS, partido que dá sustentáculo ao Governo, poderia
perfeitamente ter sensibilizado o seu Governo, o seu partido, o seu líder partidário para não introduzir esta
anulação do diferencial fiscal, de maneira a não violar o princípio constitucional, que está consagrado e que não
precisa de ser alterado, para que os Governos honrem, de facto, este princípio com um conjunto de legislação,
ao nível financeiro ou de outro tipo, de maneira a que o cidadão que viva uma região autónoma, numa ilha, não
seja onerado pelo facto de viver em descontinuidade.
Isto está na Constituição da República e chama-se princípio da continuidade territorial e deve ser respeitado
por todos os Executivos e as leis que são emanadas quer da Assembleia República, ou outros normativos legais
dos Executivos, quer a nível regional quer nacional, devem respeitar os princípios constitucionais.
Sr. Presidente, termino, dizendo, mais uma vez, que o que «nasce torto, tarde ou nunca se endireita!».
Lamento que as iniciativas, para efeitos mediáticos, que foram aqui apresentadas, tenham queimado excelentes
ideias.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Hugo Velosa.
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, não queria, até por uma questão de respeito
e do tempo que é fundamental para nós, regionalizar, digamos assim, esta revisão constitucional que foi aquilo
que o Deputado Jacinto Serrão aqui quis fazer.
O Sr. Deputado falou muito em «números mediáticos» — e já refiro três notas para lhe demonstrar o que
digo —, mas ele é que acabou por fazer um «número mediático» para a região…
Protestos do Deputado do PS Jacinto Serrão.
Já, agora, oiça, porque também tive de o ouvir com muita atenção. Aliás, sabemos que o «número» é
mediático e já sabemos o que é que, amanhã, vai sair na comunicação social afeta a V. Ex.ª na região…!
Isto é uma coisa muito simples e vamos falar com seriedade: esta é uma revisão constitucional para Portugal.
É isso que nós estamos a fazer! E não admitimos que alguém venha aqui dizer…
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Está zangado comigo?
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O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Estou, estou! Porque, obviamente, quando se vem acusar, quem faz projetos
de revisão destes, de querer colher, sei lá o quê… efeitos mediáticos, está a enganar-se a si próprio, porque
isso aplica-se só ao próprio que está a invocar esse facto.
Portanto, a invocação que o Deputado Jacinto Serrão fez é falsa, não tem a ver com a realidade e fica aqui
o convite: venha discutir as questões, em vez de fazer esses «números mediáticos».
Protestos do Deputado do PS Jacinto Serrão.
Não vale a pena o Deputado Jacinto Serrão querer falar ao coração dos portugueses residentes na Madeira,
que estão com problemas de empobrecimento e com problemas reais, esquecendo os milhões de euros que o
Partido Socialista, quando o Eng.º Sócrates era Primeiro-Ministro, retirou à região, numa lei de finanças
regionais, relativamente à qual eu não vi o Deputado Jacinto Serrão defender a população da Região Autónoma
da Madeira. Portanto, nessa altura, é que devia ter feito isso!
Protestos do PS.
Vou já ao assunto e o assunto, com seriedade, é este: houve duas coisas que não percebi naquilo que disse
o Deputado Jacinto Serrão, embora sejamos da mesma região.
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Eu explico!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Primeira coisa: vai ou não votar a favor? Disse que há tantas ideias boas…!
Queremos saber se vai votar a favor de algumas das propostas apresentadas pelos Deputados do PSD Madeira,
pelo menos, a favor daquelas com as quais esteja de acordo. Deixo-lhe este desafio.
Em segundo lugar, e este é o aspeto fundamental: o senhor falou aqui muito do estatuto político-
administrativo da região. Então, essa proposta é que tem de votar mesmo a favor, porque, do ponto de vista
destes Deputados, o problema do estatuto político-administrativo da região resolver-se-á no momento em que
esta norma que propomos for aprovada, porque o estatuto político-administrativo da região não tem a dignidade
constitucional que devia ter.
De facto, nós nunca aceitámos essa falta de dignidade constitucional do estatuto da região e, portanto,
fazemos esta proposta séria e desafiamos o Deputado Jacinto Serrão a aceitar que os estatutos político-
administrativos não sejam considerados uma lei como qualquer outra, do ponto de vista constitucional, mas
tenham o valor de lei…
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — É uma lei reforçada!
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Sr.ª Deputada, não é só o facto de ser lei reforçada; é que os estatutos político-
administrativos, em muitas circunstâncias, têm sido postos em segundo plano por outras leis, leis essas que têm
um valor superior ao estatuto político-administrativo — e podemos discutir isso — e aquilo que queremos e que
vem na nossa proposta é que os estatutos político-administrativos tenham uma dignidade de lei para-
constitucional.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Luís Fazenda.
O Sr. Luís Fazenda (BE): — Sr. Presidente, Sr.as Deputadas, Srs. Deputados, vou fazer uma breve
declaração em nome do Grupo Parlamentar do Bloco de Esquerda.
A iniciativa de revisão constitucional, aqui trazida pelo PSD Madeira, pelos Deputados da República, é uma
iniciativa política legítima. Contudo creio — e não ficarei isolado nessa apreciação — que é um ato fortuito,
provavelmente politicamente enquadrado, que deve muito a uma certa visão de testamento político do
Presidente do Governo Regional da Madeira e, nessa medida, terá a valia que tiver.
O projeto de revisão constitucional do PSD é um projeto mais para a República do que para as autonomias
regionais e, nessa medida, deve ser confrontado e fá-lo-emos em tempo próprio.
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Contudo, há problemas, em sede constitucional, acerca das autonomias regionais e, no caso da Madeira,
isso é duplamente complexo, em primeiro lugar, porque a Madeira não elaborou o seu estatuto político-
administrativo em linha com a revisão constitucional de 2004 e, portanto, tem perdido essa capacidade legislativa
própria que a Constituição lhe abriu…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Qual quê?! Leia a Constituição e verá que isso não é assim!
O Sr. Luís Fazenda (BE): — No entanto, verificamos pela prática que, tendo a Região Autónoma dos Açores
atualizado o seu estatuto político-administrativo em linha com a revisão constitucional de 2004, tem problemas
de capacidade legislativa e fronteiras indefinidas e percebemos que há problemas que não estão inteiramente
resolvidos.
No entanto, talvez, se houvesse um consenso político acerca disso, fosse importante para as regiões
autónomas que melhor se definissem algumas das fronteiras da capacidade legislativa, não exatamente nos
termos dos projetos que aqui foram apresentados.
Mas a Região Autónoma da Madeira está especialmente desabilitada para enfrentar essa tarefa, não só
porque não atualizou o estatuto político-administrativo, mas também porque me parece estar bastante atrasada
em relação à objetividade dos problemas de foro constitucional que tem enfrentado a Assembleia Legislativa
Regional dos Açores.
Portanto, creio que talvez isso seja inspirador, porque é real, é objetivo, de um outro debate e não exatamente
deste que estamos a tratar aqui nesta sede.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, queria, serenamente, dizer algumas palavras e não
trazer ex-primeiros-ministros para esta discussão.
Queria dizer ao Sr. Deputado Hugo Velosa que, de facto, os estatutos regionais, como aprendemos nas
universidades, são mesmo as leis mais reforçadas das leis reforçadas. Não existe nenhuma lei, exceto a
Constituição, com um valor mais forte do que os estatutos regionais, como sabe.
Portanto, entendo que as iniciativas que aqui foram apresentadas — agradeço aos dois Srs. Deputados a
exposição que fizeram — são absolutamente legítimas, mas já considero ilegítimo terem a atitude de rejeição
das mesmas como uma atitude que só pode ser lida como de receio.
Devo dizer que não me revejo nas propostas desta revisão constitucional, não por receio ou por cobardia,
mas porque substancialmente não concordo com elas.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Está no seu direito!
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — É um direito meu. Respeito a iniciativa e, no exercício do meu direito,
posso, desde logo, dizer, por exemplo, que a ideia de que a causa do descrédito da população relativamente
aos atores políticos reside na Constituição é, do meu ponto de vista, extremamente errada. Isso tem sido objeto
de vários estudos na Europa e fora dela e, por isso, está largamente demonstrado.
A nossa Constituição é igual às que nos rodeiam. É uma Constituição que resulta do binómio, que vem desde
o século XVIII, direitos fundamentais/separação de poderes, e tem sido sujeito a uma interpretação evolutiva.
Basta ver, por exemplo, a jurisprudência sobre o Direito do Trabalho ou sobre outras matérias, desde 1982 até
agora, para se verificar isso mesmo.
Portanto, não é aí que residem os problemas que legitimamente querem solucionar, e eu também gostaria
muito de os solucionar. As revisões constitucionais são bem-vindas — há quem diga que tivemos de mais, mas
não sei se tivemos de mais ou de menos… —, mas estas revisões constitucionais parecem-me erradas do ponto
de vista do conteúdo e do ponto de vista da oportunidade.
Claramente, parece-me que se aproveitam de um momento — sobretudo, o primeiro projeto que foi
apresentado — especial e muito circunscrito que vivemos, de acórdãos que foram muito mediáticos e que
chumbaram medidas da maioria, para se pôr em causa o papel do Tribunal Constitucional, que é um papel
absolutamente consensualizado, quer na sociedade portuguesa, quer na maioria dos países que nos rodeia.
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O Tribunal Constitucional não tem mostrado, de modo algum, e já há três teses de mestrado a revelarem
isso mesmo, quaisquer tendências políticas para o lado a ou para o lado b; pelo contrário, o que se tem
demonstrado é que caso se atribuísse a competência do Tribunal Constitucional a uma secção do Supremo
Tribunal Administrativo aí, sim, o perigo da politização seria muito maior do que o que temos agora, em que
podemos fazer o escrutínio através do sistema alargado de votação que temos.
Por estas e muitas outras razões, não tirando, obviamente, legitimidade às iniciativas que os Srs. Deputados
apresentaram, sem receio mas com enorme convicção, não me revejo nesses projetos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, este processo de revisão constitucional tem
uma característica original, e não pelo conteúdo dos projetos apresentados, porque, estes, nada têm de original,
nem são bons.
Já estamos habituados a que, nos processos ordinários de revisão constitucional, apareçam projetos de
revisão excêntricos, e digo excêntricos no sentido de não pertencerem aos partidos, à centralidade da revisão
constitucional. O Grupo Parlamentar do PSD costuma sempre brindar-nos com vários projetos excêntricos —
projetos apresentados por Deputados da JSD, projetos apresentados por Deputados do PSD Madeira, projetos
apresentados por…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Isso era impossível no Partido Comunista!
O Sr. António Filipe (PCP): — Por acaso está enganado, Sr. Deputado!… Está enganado!… Há uns anos,
o Deputado João Corregedor da Fonseca apresentou um projeto de lei a título individual,…
O Sr. Hugo Velosa (PSD): — Bem-haja!
O Sr. António Filipe (PCP): — … integrando, nessa altura, o Grupo Parlamentar do PCP.
Voltando à centralidade da questão, depois deste aparte do Sr. Deputado Hugo Velosa, queria dizer que, de
facto, houve sempre outros projetos apresentados por Deputados do PSD, portanto, costuma sempre haver
projetos excêntricos à centralidade. Depois, costuma haver um projeto de revisão do PSD e nesse, enfim, o PSD
revê-se, normalmente. Ao longo do processo, os Deputados vêm apresentar esses projetos, que são
normalmente rejeitados e ficam pelo caminho.
Ora bem, a originalidade deste processo de revisão constitucional é que ele foi capturado pela excentricidade.
Os grupos parlamentares enquanto tal não apresentaram projetos de revisão constitucional, apenas apareceu
um projeto de revisão constitucional dos Deputados do PSD Madeira, que ficariam a falar sozinhos se no último
dia do prazo não tivesse aparecido o projeto de revisão do Sr. Deputado Rui Barreto.
Naturalmente, os Srs. Deputados têm toda a legitimidade para apresentar os projetos de revisão
constitucional e para desencadear o processo, mas este projeto de revisão do PSD Madeira resulta da agenda
política regional, da agenda política de uma direção do PSD Madeira em fim de ciclo — isso é do conhecimento
geral — e significa uma espécie de fuga para a frente, com que, provavelmente, nem sequer grande parte do
PSD Madeira se identificará.
Obviamente que, com toda a legitimidade, os Deputados do PSD Madeira capturaram os trabalhos da
Assembleia da República, obrigando-a a constituir esta Comissão Eventual para a Revisão Constitucional. Não
ponho em causa, como é óbvio, a legitimidade constitucional, regimental de o fazerem, mas politicamente este
processo vale o que vale.
Quanto a nós, trata-se, de facto, de uma manobra de diversão de âmbito regional que não alimentaremos
politicamente. Portanto, os Srs. Deputados ficarão, praticamente, a falar sozinhos do que de nós depender. Não
daremos assentimento político a este processo de revisão constitucional, nem quanto à oportunidade do
processo, nem quanto ao conteúdo das propostas apresentadas.
Sr. Presidente, da nossa parte, queria apenas declarar que estamos em condições de votar as propostas
apresentadas pela metodologia que se entender. Estamos em condições de o fazer, não tencionamos alimentar
esta discussão e, obviamente, que votaremos contra. Portanto, repito, estamos em condições de, a qualquer
momento, proceder à votação.
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O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, em nome do CDS-PP, não poderia deixar de intervir.
Primeiro, começaria por me congratular por, na reunião de hoje, se ter assistido à apresentação dos dois
projetos, assinados, um deles, pelos Srs. Deputados do PSD e, o outro, pelo Sr. Deputado Rui Barreto. No
fundo, foi aquilo que nós pedimos.
Independentemente do que cada um pense sobre o destino a dar a estas iniciativas, elas merecem a
dignidade que é necessária, principalmente tratando-se de iniciativas de revisão de um texto constitucional. E
se é um direito legítimo dos Deputados apresentá-las, mais legítimo ainda é o direito de as apresentarem
formalmente na própria Comissão e suscitarem o debate à volta delas. Tê-las recusado sem que se cumprisse
esse direito seria uma falta de consideração e de respeito.
Portanto, a primeira nota é para me congratular com o que aqui se passou até agora.
A segunda nota é para dizer que, realmente, o CDS não se revê em nenhuma destas iniciativas, nem quanto
ao tempo, porque estamos em fim de Legislatura e não existe nenhum acordo prévio entre as grandes forças
partidárias que justificasse ou aconselhasse a apresentação destas iniciativas agora, nem quanto ao conteúdo,
que está desenquadrado e é um conteúdo truncado naquilo que deve ser um verdadeiro propósito de revisão
da Constituição. Tem de se ter uma visão global, uma visão de fundo, uma visão quanto aos princípios e às
matérias fundamentais, e só depois é que se pode ir, então, à parte parcelar dos artigos e das secções da
Constituição a alterar mais especificamente.
Esse acordo e esse debate não foram feitos e, portanto, estas iniciativas aparecem-nos como iniciativas
desgarradas e desenquadradas. Nesse sentido, sabendo, ainda para mais, que estas iniciativas, à partida, estão
condenadas ao fracasso, porque já foi anunciado antecipadamente que mutatis mutandis, e por estas ou outras
razões, não reúnem o consenso que seria necessário, a maioria de dois terços, para terem viabilidade,
obviamente que o CDS irá votar contra.
Não terminaria a minha intervenção sem fazer uma pequena nota crítica pessoal à intervenção do Sr.
Deputado Jacinto Serrão.
Sr. Deputado, há legitimidade para apresentar as propostas, há legitimidade para discordar das mesmas e
do seu conteúdo. Mas a intervenção que o Sr. Deputado proferiu, dizendo que há 10 anos que anda a falar
destas matérias, faz-me lembrar aquele ponta de lança que é um grande comentador de televisão e que vai para
o campo e nem à baliza remata, quanto mais marcar golos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra, Sr. Deputado Jacinto Serrão.
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Sr. Presidente, permita-me que use da palavra, uma vez que fui citado agora.
O Sr. Deputado Artur Rêgo, do CDS-PP, não conhece o meu currículo político certamente. Se for ver o meu
currículo, perceberá que tenho responsabilidades políticas de natureza partidária há quase 20 anos e de
natureza institucional, quer nos órgãos da Assembleia da República, quer a nível regional, na Assembleia
Legislativa da Madeira, há mais de 10 anos.
Venho clamando estas matérias nas mais diversas intervenções que fiz, e foram muitas. Naturalmente, a
maioria delas foi feita na Região Autónoma da Madeira, que V. Ex.ª não acompanhou, mas estão registadas em
ata e nos diversos órgãos da comunicação social que difundiram essa informação.
Se o Sr. Deputado tiver oportunidade, verá que há mais de 10 anos que o faço, tal como participei de forma
ativa, no âmbito do grupo de trabalho que o Partido Socialista organizou, na Revisão Constitucional de 2004,
em que algumas destas iniciativas e boas ideias, como disse, não passaram, porque não reuniram o consenso
que V. Ex.ª acabou de falar, nem reuniram as condições.
Falei disso nessa altura e, daí para cá, tenho vindo, na Assembleia Legislativa da Madeira e noutros fóruns
de intervenção,…
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — A falar!…
O Sr. Jacinto Serrão (PS): — … a discutir, a lutar e a defender revisões do estatuto político-administrativo,
para que muitas destas ideias que foram apresentadas pelos Srs. Deputados fossem concretizadas na Região
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Autónoma da Madeira por via da alteração do estatuto político-administrativo, e que não é necessário, de facto,
uma revisão constitucional para o efeito.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados, a revisão constitucional, como comecei
por dizer na intervenção que fiz na reunião passada, é um tema importante e que deve ser tratado com dignidade.
Nesse sentido, quero subscrever a afirmação que aqui foi feita pelo Sr. Deputado Artur Rêgo e também quero
congratular-me pela apresentação dos projetos a que assistimos hoje.
Não partilho, porém — e com isto entro no primeiro argumento sobre a oportunidade do processo —, do
argumento de que o facto de, eventualmente, este processo não avançar significa que a Assembleia da
República considera que, por ter poderes constituintes, isso nada significa.
Sabemos que esta Legislatura e esta sessão legislativa estão a decorrer após cinco anos desde a última
revisão constitucional, e é isso que a Constituição diz, ou seja, que decorridos cinco anos sobre a última lei de
revisão desce o limiar necessário para aprovar uma revisão constitucional. Esta é uma característica do nosso
sistema de revisão constitucional, que não dispensa nem a oportunidade política, nem a precisão da
necessidade e da conveniência do momento de se avançar para um processo de revisão constitucional. Aliás,
até há quem diga — é uma crítica recorrente — que este sistema faz entrar periodicamente na agenda política
a questão da revisão constitucional, justamente por baixar ao fim de cinco anos esse limiar para a revisão.
Até sabemos por que é que este sistema foi aprovado. Havia a consciência, logo depois de 1976 e, em certa
medida, depois do fim do período de transição de 1982, de que partes muito significativas da Constituição que
tinham acabado de ser aprovadas não correspondiam à vontade real dos partidos que tinham o apoio da
esmagadora maioria do povo português. Por isso, entendeu-se que devia haver um prazo a partir do qual o
limiar para a revisão baixaria e que podia ser feita não por quatro quintos, mas por dois terços. É essa a
explicação histórica.
Portanto, não partilho o argumento de que o facto de o processo ser considerado inoportuno ou não avançar
significa que a Assembleia da República está a desprezar os seus poderes constituintes. A ser assim, estaria a
fazê-lo em todas as sessões legislativas, em todas as Legislaturas, desde 2010, e em todas as sessões
legislativas para futuro em que não se avançasse com um processo destes, depois de decorridos cinco anos
desde a última revisão constitucional. Enfim, não é por se poder fazer a revisão constitucional, só com dois
terços, decorridos cinco anos da última, que temos de andar sempre a rever a Constituição. Este ponto é, a meu
ver, importante.
Em segundo lugar, gostava de dizer que alguns dos temas que aqui foram referidos merecem ser discutidos
e são temas relevantes. E não é o facto de serem apresentados por Deputados eleitos pelos círculos das regiões
autónomas que faz com que os temas não sejam relevantes. Evidentemente, não partilho a acusação de
excentricidade, mesmo naquele sentido mitigado que o Sr. Deputado António Filipe referiu.
Acho que este processo não é excêntrico nem estamos aqui a falar de propostas, todas elas, excêntricas,
embora, enfim, seja verdade que o PSD é um partido muito grande, bastante amplo, onde as decisões não são
todas tomadas a partir de um centralismo, são tomadas, em muitos casos, descentralizadamente e, portanto, é
natural que surjam projetos diversificados, variados. Aliás, penso que devíamos congratular-nos com isso e não
censurar ou qualificar como excêntricas essas propostas.
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Muito bem!
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Em terceiro lugar, também quero dizer aqui que não é que seja
incompatível, mas não é o que mais se coaduna com a dignidade deste processo, a sua instrumentalização ou
a sua utilização, por vezes até com alguns laivos de demagogia, para um debate puramente regional, o que é
algo que me parece que deveríamos evitar. Trata-se de um dos desvios deste processo, mas reconheço que
várias destas propostas são, aliás, não especificamente regionais, mas para o País.
Quero também dizer que o PSD tem defendido a conveniência e a utilidade, em alguns aspetos, de uma
revisão constitucional, designadamente no que tem a ver com assegurar ou consolidar algumas condições de
sustentabilidade da nossa realidade, por exemplo, em termos económicos e financeiros.
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Infelizmente, sabemos que essa revisão constitucional tem sido sempre inviabilizada, mesmo nestes aspetos,
porque o partido com o qual é sempre necessário fazer acordo para a revisão constitucional — esta é uma
realidade incontornável do sistema português — foge sistematicamente a qualquer acordo, desde há dois ou
três anos, e não só no plano constitucional. Nega-o, sistematicamente, com pequenas referências, aqui e ali,
em sentido contrário, mas tem fugido, normalmente, a acordos também no plano constitucional.
Portanto, não há condições políticas para uma revisão constitucional neste momento — isto parece claro —
, porque não há apoio do Partido Socialista e eu diria também, porque, em verdade, que estamos em fim de
Legislatura…
O Sr. José Magalhães (PS): — E se houvesse acordo?
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Já lá irei, Sr. Deputado, mas ainda bem que se antecipa, porque o facto
é que não há e o Sr. Deputado está a confirmar a minha afirmação.
De todo o modo, gostava de dizer que não há condições políticas, tal como não tem havido condições
políticas para qualquer acordo noutras áreas, infelizmente, o que me parece que tem sido bastante prejudicial
ao País, mas, independentemente disso, é verdade que estamos em fim de Legislatura, este processo avançou
sem um acordo prévio — isto também é verdade —, o que, só por si, mesmo que houvesse, por hipótese, essa
disponibilidade, que, na prática, não se verifica, inviabilizava à partida, a meu ver, as condições para este
processo poder avançar. Aliás, o momento nacional também não me parece o mais propício, uma vez que
estamos numa fase de recuperação, de saída de um processo que, enfim, foi um processo delicado de
ajustamento e que se refletiu também nas regiões autónomas, evidentemente, como não poderia deixar de ser.
Por último, gostava de dizer que concordo com uma última afirmação que foi aqui feita, que é a de que, no
atual quadro constitucional, a autonomia regional foi, sem dúvida, uma realidade bastante bem-sucedida. Penso
que, sobre isto, muitos poderemos estar de acordo, ou seja, não é a atual Constituição que, a meu ver, tem
impedido, pelo menos até agora, as regiões autónomas de se desenvolverem.
Podemos divergir quanto à questão de saber se estão esgotadas todas as potencialidades do atual quadro
constitucional, mas a constatação de que foi no atual quadro constitucional ou até em quadros mais restritivos
que a autonomia regional se aprofundou, porque a história das revisões constitucionais tem sido sempre, no que
toca à autonomia regional, a história do seu aprofundamento, é a verdade…
O Sr. Mota Amaral (PSD): — Aprofundamento e ampliação!
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Exatamente, aprofundamento e ampliação da autonomia. Aliás, a
generalidade destas propostas vai também nesse sentido, talvez haja uma ou outra que não vá. Por exemplo,
tenho dúvidas de que a proposta do Sr. Deputado Rui Barreto, de eliminação do Representante da República e
de transferência dos poderes para o Presidente da República seja uma proposta de ampliação da autonomia
regional e não uma proposta de redução, mas esta era uma questão que debateríamos se fôssemos analisar
ponto por ponto.
Seja como for, parece clara a inoportunidade, a falta de condições políticas para avançar com um processo
deste tipo neste momento e, por isso penso que já não há dúvidas, está pré-anunciado, que a posição do PSD
terá de ser a de não aprovar o avanço deste processo.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, antes de mais, quero agradecer as várias intervenções. Ao
fim e ao cabo, sempre houve algum interesse, mesmo que fosse para discordar quer do momento, quer do
conteúdo.
Quero aqui deixar duas ou três notas. O Sr. Deputado Jacinto Serrão fez um grande desenvolvimento de
enfoque regional, como o segundo partido da oposição na região — já foi o primeiro, mas deixou esse espaço
para o CDS e está a tentar recuperar, por via destes «números» a que o Sr. Deputado Jacinto Serrão já nos
habituou —, mas quero dizer-lhe que se esperava que 10 anos de reflexão tivessem produzido um projeto de
revisão constitucional de defesa da autonomia e, infelizmente, estou a ver que vamos ter de esperar mais 10
anos para, da sua parte, haver esse contributo.
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O Sr. Jacinto Serrão (PS): — Está escrito!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Deputado Luís Fazenda, quero também dizer-lhe que não há
absolutamente nada no estatuto político-administrativo que esteja em falta para que a Assembleia Legislativa
da Região Autónoma da Madeira exerça plenamente todas as prerrogativas constitucionais decorrentes,
designadamente, da última revisão constitucional. Há uma norma transitória que lhe assegura o exercício pleno
dessas competências.
Pode haver outras razões políticas relevantes para a revisão do estatuto, mas não essa, porque, por essa,
não há, de facto, absolutamente nenhum cerceamento das competências constitucionais nesta ocasião por falta
de alterações ao estatuto.
Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, não tem qualquer sentido, e já a vi escrita por pessoas da sua área, essa
tese de que este projeto, ao propor a extinção do Tribunal Constitucional e a criação de uma secção dessa área
no Supremo Tribunal de Justiça, significa também uma guerra contra o Tribunal Constitucional, mercê da sua
jurisprudência mais recente. É uma distração sua, porque esta proposta está no projeto que apresentámos em
2010 e, nessa altura, estávamos longe desta jurisprudência.
Portanto, não tem nada, absolutamente nada, a ver uma coisa com a outra, é um sentido, uma opção de
fundo que temos nessa matéria. Temos a maior consideração pela maioria dos juízes do Tribunal Constitucional,
senão por todos, independentemente das suas opções, reconhecemos uma qualidade excecional na
jurisprudência constitucional — isto é indiscutível —, o que temos é uma opção diferente para a apreciação da
constitucionalidade.
Que fique claro que a circunstância de estar num projeto de 2010 e agora reproduzida neste é mais do que
elucidativa, nada tem a ver com o que a Sr.ª Deputada disse. Aliás, como calcula, e isto resulta da intervenção
do Sr. Deputado Mota Pinto, não há uma identificação da direção do Partido Social Democrata e da direção do
Grupo Parlamentar do Partido Social Democrata em relação a este projeto e, portanto, ele não é portador de
nenhum recado da direção nacional relativamente ao Tribunal Constitucional.
Quanto ao que foi dito pelo Deputado António Filipe em matéria de excentricidade constitucional, não
conheço maior excentricidade do que a de o Partido Comunista estar contra a Constituição de 1976, quando ela
estava a ser elaborada, fazendo um cerco à Constituinte, e agora «agarrar-se com unhas e dentes» a algumas
coisas que lhe agradam e que nela conseguiu inserir. Excentricidade maior não conheço!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, quero apenas fazer uma breve correção histórica: o PCP
votou a favor da Constituição de 1976,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Claro! Não teve outro remédio!…
O Sr. António Filipe (PCP): — … o único partido que votou contra foi o CDS, o que, aliás, assume, e o PSD
procurou impedir a entrada em vigor da Constituição de 1976, inventando a possibilidade de haver um referendo
posterior à aprovação pela Assembleia Constituinte.
Portanto, não vale a pena estarmos a distorcer a história. A história está feita e é conhecida.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — E deve ser completa!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, assistimos aqui à tomada de posição de todos os grupos
parlamentares e pareceu-me que haveria condições para se poder deliberar e passar à votação.
Portanto, quero colocar à consideração essa sugestão, ou fazer a proposta formal, se for necessário, de,
realmente, se votarem indiciariamente estes projetos.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra a Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.
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A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, em nome do Grupo Parlamentar do Partido Socialista,
quero dizer que seguimos esta proposta.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Artur Rêgo.
O Sr. Artur Rêgo (CDS-PP): — Sr. Presidente, no mesmo sentido, secundamos a proposta.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, peço desculpa, mas o Sr. Deputado Mota Amaral havia pedido a
palavra e esqueci-me de lha conceder.
Tem a palavra, Sr. Deputado Mota Amaral.
O Sr. Mota Amaral (PSD): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: Quero apenas fazer aqui duas observações,
uma à intervenção do Sr. Deputado Mota Pinto, outra à intervenção da Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira.
Sr. Deputado Mota Pinto, julgo que aquilo que diz a Constituição é que a Assembleia da República pode
rever a Constituição passados cinco anos após a última revisão constitucional e a regra para a revisão é a da
maioria de dois terços.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Para aprovação!
O Sr. Mota Amaral (PSD): — Para a aprovação da revisão constitucional.
A maioria de quatro quintos é exigida para se rever a Constituição fora desse prazo, como já aconteceu,
quando se reviu a Constituição para permitir fazer um referendo ao Tratado Constitucional, mas acabou por não
se fazer nada, mas, enfim, essa é outra história.
Sobre a intervenção da Sr.ª Deputada Isabel Alves Moreira, compreendo muito bem várias das propostas
contidas nos projetos de revisão constitucional apresentados pelos Srs. Deputados do PSD Madeira e do Sr.
Deputado Rui Barreto, do CDS Madeira, por conhecer profundamente este problema e pela experiência da
aplicação dos preceitos constitucionais e seus detalhes.
Quando se reclama que a Constituição defina elementos sobre o próprio conteúdo que deve ter o estatuto
político-administrativo de cada uma das regiões, estamos a ter em conta que a jurisprudência do Tribunal
Constitucional considera que o estatuto é apenas um diploma orgânico, ou seja, uma espécie de Constituição
sem programa, coisa que, de resto, é reclamada por algumas correntes políticas que gostariam de tirar da
Constituição de 1976 todo o seu conteúdo programático e deixar esta matéria à discrição dos Governos, de cada
vez que há eleições.
Ora bem, um dos aspetos cruciais do estatuto é toda a questão financeira, que, de resto, dele consta — já
saiu do estatuto dos Açores, foi removida na última versão, mas constou em tempos.
Simplesmente, é entendido que isto é matéria da lei de finanças regionais. De maneira que a lei de finanças
regionais foi uma iniciativa propugnada com muito vigor desde logo pelo Partido Socialista, e até por um velho
amigo meu, infelizmente, já falecido — o José Medeiros Ferreira —, mas falou-se como sendo um presente
envenenado: sim, senhor, ficamos com as leis de finanças regionais, mas perdemos todas as garantias de
natureza financeira que constavam nos autos do nosso estatuto, que caíram imediatamente.
Bom, no seguimento dessa minha intervenção, tinha a intenção de apresentar um requerimento à mesa, mas,
como me atrasei, esse requerimento…
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Não, não! Eu é que me atrasei!
O Sr. Mota Amaral (PSD): — … já foi apresentado pelo Sr. Deputado Mota Pinto, que vem, afinal, repetir o
requerimento que eu fiz na primeira reunião da nossa Comissão.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, só um esclarecimento.
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Relativamente ao procedimento vejo aqui no nosso Regulamento, que «Compete à Comissão Eventual para
a Revisão Constitucional (…) proceder à sistematização das propostas de alteração à Constituição, constantes
dos projetos de revisão apresentados, com vista à sua discussão e votação no Plenário». Compete também à
Comissão «Apreciar as propostas de alteração à Constituição e submeter ao Plenário a aprovação de qualquer
delas ou de textos de substituição». Este é o nosso trabalho nesta fase, se bem entendo o Regulamento.
Depois, se houver uma segunda fase, «Proceder à redação final das alterações à Constituição aprovadas
pelo Plenário da Assembleia» e ainda «Reunir num único decreto de revisão as alterações aprovadas e inseri-
las nos lugares próprios da Constituição, mediante as substituições, as supressões e os aditamentos
necessários.»
Estamos, portanto, nesta primeira fase. Não estou a entender como é compaginável, com esta primeira fase,
aquilo que se propõe, que é uma votação. É que parece que está proposta uma votação…
Ora, eu queria uma explicação sobre a tramitação que o Regulamento prevê e aquilo que está proposto.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, o que foi discutido na primeira reunião e julgo que o Sr.
Deputado Guilherme Silva não estava presente,…
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Na segunda reunião!
O Sr. José Magalhães (PS): — … ou, na segunda reunião, foi dispensar, neste momento, a sistematização
de propostas, que, normalmente é feita antes do início da sua apresentação e discussão, uma vez que, de
qualquer das maneiras, vai ser necessário submeter estas questões a Plenário, que para deliberar tem de ter
as propostas devidamente sistematizadas.
Mas, por nós, no que diz respeito ao nosso trabalho, tratar-se-ia de fazer a apresentação dos projetos, a sua
discussão, sendo caso disso, e, depois, concluir esse processo com a votação indiciária, que é necessária para
averiguar se cada uma das propostas — porque tem de ser cada uma das propostas — tem viabilidade ou se
se indicia a inviabilidade, uma vez que só o Plenário é competente para fazer essa deliberação.
O momento de fazer isso pode ser já ou mais tarde, consoante Comissão o delibere, e pode ser feito por
blocos ou de uma só vez, se não houver separação de votos. Portanto, ou há uma votação em bloco — uma só!
— ou, se algum Deputado ou Deputada pedir a votação separada de alguma ou de algumas propostas, será
necessário fazer essa votação separada, uma vez que esse é um direito individual que não pode ser postergado.
Portanto, julgo que era este o entendimento que todos tínhamos perfilhado, sem nenhuma exceção, sobre
esta matéria e propunha, Sr. Presidente, que fizéssemos isso, ou seja, que apurássemos, por blocos, de uma
só vez ou várias, a viabilidade indiciária das propostas apresentadas pelos Srs. Deputados, conforme está
previsto no nosso Regulamento e, portanto, não podemos fugir a isso.
Agora, não sei se mais alguém tem mais alguma pergunta, mas essa é uma questão que o Sr. Presidente
apurará.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, queria corroborar esta intervenção do Sr. Deputado José
Magalhães, pois foi mesmo esse o sentido da discussão que tivemos sobre o nosso Regulamento.
Gostaria de dizer também que se ponderou, na altura, que sempre será necessário fazer um guião de
votações no Plenário, portanto, isso, de certa forma, substitui a sistematização quando são só dois projetos.
Todavia, penso que o importante é saber se, em relação a alguns artigos, ou a algum artigo de algum dos
projetos, vai haver sentidos de voto diferenciados, porque se assim for esse artigo terá de ser destacado, sendo
que todos os outros deverão — enfim, por uma questão de economia, é evidente! — ser votados em bloco.
Portanto, queria explicitar que o sentido da minha proposta é o de que se passe à apreciação com votação
em bloco, salvo em relação àqueles pontos em relação aos quais haja um sentido de voto diferenciado por algum
Deputado.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
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O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Confesso que tenho muita dificuldade, pela diferenciação que cada artigo
tem nas soluções que veicula, em fazer votações em bloco, porque isto é «misturar alhos com bugalhos», e eu
gostaria, como é óbvio, numa matéria como esta, de ver a posição individualizada relativamente a cada uma
das soluções que é veiculada por cada artigo e, por vezes, dentro dos artigos com diferenciações em vários
parágrafos.
Portanto, a minha proposta é no sentido de que seja feita a votação artigo a artigo e, eventualmente, dentro
dos artigos, haver até votações discriminadas, porque senão isto, realmente, é uma confusão…! É uma
confusão! Aliás, para os proponentes é importante o registo da posição de cada Deputado, de cada partido em
particular, de cada grupo parlamentar, de forma mais individualizada.
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado Guilherme Silva, não me compete a mim, evidentemente, decidir, mas se
os grupos parlamentares votarem todos contra todas as propostas, está claramente identificado o sentido de
voto relativamente a cada uma. Parece-me óbvio!
Sr. Deputado Paulo Mota Pinto, faça favor.
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Era apenas isso que eu queria dizer.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Barreto.
O Sr. Rui Barreto (CDS-PP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, gostaria de dizer o seguinte: lamento que
não se prossiga uma discussão que, acho, poderia ser profícua e interessante nesta Comissão Eventual para a
Revisão Constitucional.
Mas há uma questão que ficou aqui clara: nem sequer há disponibilidade dos diversos partidos representados
aqui, nesta Comissão, para discutir esta matéria na generalidade.
Portanto, o que tenho a dizer é que percebo o bloqueio e, por isso, a minha proposta poderá ser votada em
bloco…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Por ser bloqueio, é «em bloco»!
Risos.
O Sr. Presidente: — Bem, daqui a pouco temos o Sr. Deputado Luís Fazenda a protestar contra a utilização
abusiva da expressão «bloco»!…
Risos.
O Sr. Rui Barreto (CDS-PP): — Sim, a votação será em bloco!
O Sr. Presidente: — Sr. Deputado José Magalhães, faça favor.
O Sr. José Magalhães (PS): — Sr. Presidente, só para dizer que, no debate do Regulamento, já tínhamos
esclarecido que, em sede de revisão constitucional, não há discussão na generalidade. Aliás, por definição, toda
a discussão é de especialidade, o que não podermos evitar é que, não havendo perguntas, ou minidebates, ou
microdebates de artigos, dada a discussão, ela própria, passar ao momento da averiguação da viabilidade
indiciária.
Portanto, não é bloqueio, é, digamos: «2 e 2 são 4!». É só isto!
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Rui Barreto.
O Sr. Rui Barreto (CDS-PP): — Sr. Presidente, o que eu queria referir, não usando uma linguagem jurídica,
porque essa não é a minha área de formação académica, é que não havia disponibilidade para uma discussão,
para uma votação e para uma aprovação nos aspetos gerais dos projetos aqui apresentados.
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O Sr. José Magalhães (PS): — Não existe constitucionalmente essa disponibilidade!
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, no que diz respeito, especificamente, ao projeto de revisão
constitucional do Sr. Deputado Rui Barreto, o proponente já deu a sua anuência à votação em bloco…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Mas eu não dei! Não dei e adianto que não dou!
O Sr. Presidente: — Ó Sr. Deputado Guilherme Silva, mas eu ainda não acabei…
Se me dá licença, eu não falei na proposta do PSD Madeira; estava apenas a dizer que o Sr. Deputado Rui
Barreto deu a sua anuência à votação indiciária, em termos gerais, de toda a sua proposta.
No que diz respeito — e passo à segunda parte da minha intervenção — ao projeto de revisão constitucional
do PSD Madeira, os Deputados proponentes opõem-se à votação indiciária em bloco.
Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente, vamos lá ver: não há uma exigência de votação em bloco em
abstrato, ou seja, não há uma oposição à votação em bloco, em abstrato.
Portanto, os Srs. Deputados que pretenderem desagregar as votações, terão de nos dizer o que é que
querem votar separadamente, que artigos pretendem votar separadamente.
O Sr. José Magalhães (PS): — Todos! Cada um deles!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Para mim, é votar um a um. Não sei onde é que está a dificuldade? É uma
votação artigo a artigo, ou em conjunto, ou todos…
O Sr. José Magalhães (PS): — Comparado com o Orçamento, é um problema simples!
Risos.
O Sr. Presidente: — Os Srs. Deputados vão desculpar-me, mas não vou fazer aqui esse exercício de votar
um a um.
Nada impede os diferentes grupos parlamentares, que já manifestaram o seu interesse de votarem contra,
de, antecipadamente declararem que, em todas as votações, o seu sentido de voto será esse!
Vozes do PS e do PCP: — Claro! Exatamente!
O Sr. Presidente: — Portanto, eu não vou repetir mais de 40 votações, quando se sabe, à partida, qual é o
sentido de voto de todos os Deputados. Santa Paciência!
Sr. Deputado Guilherme Silva, queira prosseguir.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — O Sr. Presidente fará como entender. A minha posição e a dos restantes
Deputados subscritores do projeto é no sentido de pedir a votação artigo a artigo, mas a Comissão seguirá o
que entender…
Eu acho que isto é um direito individual de cada Deputado, como, aliás, reconheceu, há pouco, o Sr.
Deputado José Magalhães, que não pode ser, digamos, atropelado por uma máquina compressora de uma
maioria conjuntural, que está contra a totalidade do projeto, mas V. Ex.ª é que é o Presidente, a Comissão é a
Comissão, e eu farei o registo e, depois, apresentarei uma declaração de voto escrita em que essa matéria será
também abordada.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Paulo Mota Pinto.
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O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Sr. Presidente, eu só queria submeter o seguinte à consideração da
Comissão: esta votação não é disciplinada, digamos, especificamente, pelo Regulamento; é uma votação
indiciária, porque tudo o que se diz no nosso Regulamento é apreciar os projetos,…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Então, eu acho que não se devia fazer votação nenhuma, mas…
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — … e apreciá-los é deliberar sobre ele, é votar, numa assembleia
parlamentar, e, diz-se, submetê-los à aprovação. É isso que significa a votação indiciária e é isso que, em
qualquer comissão que tenha trabalho legislativo, se faz no cumprimento de uma verdadeira praxe parlamentar.
Agora, a questão de saber o que é que se pode agregar e desagregar é um problema de condução dos
trabalhos de votação, que é ditado por razões de economia de votação. É assim que as coisas se fazem,
normalmente, no Parlamento, e, por maioria de razão, se deverão fazer quando a votação é meramente indiciária
— aliás, faz-se também na votação na especialidade, que é uma votação regulada na Constituição e no
Regimento.
Agora, por maioria de razão, quando não é uma mera votação indiciária ou há sentidos de votos diferentes,
que obrigam à desagregação, ou, então, não há razão nenhuma para desagregar um a um, quando se sabe
qual é o sentido de voto de cada Deputado sobre todas as alíneas, sobre todas as palavras, sobre todos os
artigos! A não ser que o Sr. Deputado Guilherme Silva me queira dizer que vai votar, diferenciadamente, alguma
alínea ou algum artigo…!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Não, não…!
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Se for o caso, muito bem, mas…!
O Sr. GuilhermeSilva (PSD): — Até pode acontecer! Não há nada que o impeça…
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Por isso é que eu…
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Uma coisa é votar totalmente, com uma adesão de 100%, outra é…
O Sr. Paulo Mota Pinto (PSD): — Portanto, salvo se algum Deputado anunciar que vai votar
diferenciadamente um artigo, uma alínea, uma palavra ou seja o que for o objeto da votação, penso que, por
razões de economia, é isso que se faz sempre, se deve votar agregadamente.
O Sr. Presidente: — Tem a palavra o Sr. Deputado Guilherme Silva.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Sr. Presidente, o que eu acho é que se está a criar aqui uma discussão
desnecessária, por uma razão muito simples: o que está aqui errado é haver uma votação indiciária, que não
está prevista em lado nenhum! Esta é que é a questão!
O Sr. José Magalhães (PS): — Sempre se fez!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Ó Sr. Deputado, essa votação pode fazer-se por haver consenso para se
fazer, mas não há nenhuma previsão regimental, quer do Regulamento da Comissão, quer do Regimento, quer
da Constituição, a exigir esta votação indiciária; é um exercício que não tem nenhum acolhimento regimental e
constitucional.
Agora, por que é que se faz a votação indiciária? Por que é que tradicionalmente as comissões de revisão
constitucional têm feito uma votação indiciária? Para facilitar o trabalho do Plenário, em relação às propostas
que vão ou não ter viabilidade. Não é?
O Sr. Presidente: — Precisamente!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Ora, sobre essa matéria, já se sabe que há uma inviabilidade total!
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O Sr. José Magalhães (PS): — Claro!
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Ora, numa inviabilidade total não é necessário fazer nenhuma votação
indiciária! É mandar isto para o Plenário, dizendo que todos os partidos tomaram posição «assim, assim, assim»
e declararam para a ata que estão contra todas as disposições, e ponto final.
A votação indiciária é um ato inútil, é um exercício que se vai fazer aqui, totalmente inútil e não tem
acolhimento regimental nem constitucional. É esse o sentido!
Compreendo que, em circunstâncias normais, ela possa ter alguma razão de ser e que facilite o trabalho do
Plenário, mas, neste caso, acho o exercício absolutamente inútil.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, acho que a praxe parlamentar, embora não seja fonte de Direito em
Portugal, como acontece noutros países, existe por alguma razão e deve ser seguida por alguma razão.
Não há memória de uma revisão constitucional em que não tenha havido votações indiciárias, precisamente
para ficar apurado, ao nível da Comissão, de forma clara e solene, até para efeitos da sua comunicação e
informação ao Plenário, o que se passou.
Portanto, não há nenhuma razão e eu, enquanto Presidente da Comissão Eventual para a Revisão
Constitucional, não entendo como é que pode não haver uma votação indiciária, que seria a interrupção de uma
prática que a Assembleia sempre seguiu e que é uma prática adequada, tendo em conta a relação que se
estabelece entre a Comissão Eventual para a Revisão Constitucional e o Plenário em sede de revisão
constitucional.
Portanto, para mim, está entendido que deve haver uma votação indiciária.
O Sr. José Magalhães (PS): — E também face ao Regimento!
O Sr. Presidente: — Em segundo lugar, temos, como eu dizia há pouco, resolvido o problema, por indicação
do próprio proponente, do projeto de revisão constitucional apresentado pelo Sr. Deputado Rui Barreto.
No que respeita ao projeto de revisão constitucional apresentado por Deputados do PSD Madeira, até pelo
facto de se tratar de votação indiciária e não de uma votação na generalidade, não vejo sequer razão para se
aplicar o mesmo critério que se aplica na votação na generalidade.
Na votação na generalidade, aí sim, é que há regras específicas que podem permitir a cada Deputado exigir
uma determinada separação, separação essa que, neste caso, nem sequer faz sentido, porque está apurado
que o voto de todos os grupos parlamentares será contra e que o voto dos proponentes será a favor, mas, ainda
que ela fosse solicitada, isso seria reconduzir a votação indiciária à votação na especialidade, que não é a
mesma coisa.
Portanto, não há nenhuma razão para que, do ponto de vista jurídico-constitucional ou jurídico-regimental,
se atue no sentido pretendido pelos proponentes da iniciativa do PSD Madeira.
Portanto, assim sendo, iremos proceder à votação indiciária, em bloco, de todas e cada uma das normas
constantes do projeto de revisão constitucional n.º 1/XII (3.ª) — Autonomia Século XXI (Renovar Abril)
(Deputados do PSD Guilherme Silva, Cláudia Monteiro de Aguiar, Correia de Jesus e Hugo Velosa).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e do BE, votos a
favor do Deputado Guilherme Silva, do PSD, e abstenções dos Deputados Mota Amaral, do PSD, Jacinto Serrão,
do PS, e Rui Barreto, do CDS-PP.
Srs. Deputados, está assim apurada a votação indiciária que será comunicada ao Plenário.
Srs. Deputados, vamos votar, em bloco, todas e cada uma das normas constantes do projeto de revisão
constitucional n.º 2/XII (3.ª) — Mais autonomia — Melhor democracia (Deputado do CDS-PP Rui Barreto).
Submetido à votação, foi rejeitado, com votos contra do PSD, do PS, do CDS-PP, do PCP e do BE, votos a
favor do Deputado Rui Barreto, do CDS-PP, e abstenções dos Deputados Guilherme Silva e Mota Amaral, do
PSD, e Jacinto Serrão, do PS.
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Tem a palavra o Sr. Deputado Mota Amaral.
O Sr. Mota Amaral (PSD): — Sr. Presidente, gostaria de comunicar que enviarei uma declaração de voto
sobre os preceitos que, concretamente, apoio no projeto de revisão constitucional dos Deputados do PSD
Madeira, alguns relativos à ampliação da autonomia regional, que, manifestamente, merecem o meu apoio.
O Sr. Presidente: — Srs. Deputados, de acordo com o Regulamento da Comissão, e como, aliás, é prática,
será elaborado pelos Serviços um relatório, eu convocarei uma reunião para aprovarmos esse relatório e, em
função disso, daremos por terminados os trabalhos desta Comissão.
Srs. Deputados, está encerrada a reunião.
Eram 18 horas e 29 minutos.
Declaração de voto enviada à Mesa, para publicação, relativa aos projetos de revisão constitucional n.os
1/XII (3.ª) e 2/XII (3.ª):
«No início dos trabalhos da CERC sugeri que fosse votada a questão prévia da conveniência e oportunidade
da revisão constitucional. Verificada a indisponibilidade declarada de todos os partidos parlamentares para
aprovarem os dois projetos de revisão constitucional, apresentados pelos Srs. Deputados do PSD Madeira e
pelo Sr. Deputado do CDS Madeira, a votação da questão prévia impunha-se, em meu entender, para evitar
realizar atos inúteis, que seriam, afinal, todos os referentes ao procedimento regimental. Ora, é norma geral que
no processo não devem ser realizados atos inúteis…
A minha tomada de posição não recebeu qualquer apoio.
Feita, na reunião seguinte da CERC, a apresentação dos projetos pelos respetivos primeiros signatários, foi
deliberado votar em bloco as propostas de alteração neles contidas, com argumentos que se reduzem afinal às
questões da conveniência e oportunidade da revisão constitucional, muito mais do que a um juízo sobre cada
uma de tais propostas — isto apesar de ter sido declarado, por vários intervenientes, que na revisão
constitucional não há votações na generalidade, pois tal procedimento é por excelência do domínio da
especialidade.
Ora, numa votação em bloco sobre todas as propostas de alteração contidas nos dois projetos de revisão
constitucional não pude acompanhar o voto negativo dos Deputados do Grupo Parlamentar do PSD, aliás, igual
aos dos outros grupos parlamentares. Fiquei-me, por isso, por um voto de abstenção. E isso porque, a ter havido
votação na especialidade, artigo a artigo, a minha intenção era votar favoravelmente todos os que, nos dois
projetos de revisão constitucional, a meu juízo, ampliam e aprofundam a autonomia constitucional dos Açores e
da Madeira.
Votaria também favoravelmente a proposta de admissão de listas apoiadas por grupos de cidadãos às
eleições parlamentares, nacionais e regionais, constante do projeto do PSD Madeira e a abolição da proibição
de partidos regionais, presente também no projeto do CDS Madeira.
O Deputado do PSD, Mota Amaral.»
A DIVISÃO DE REDAÇÃO E APOIO AUDIOVISUAL.