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29 DE JUNHO DE 1988 577

Este conceito é, portanto, rico em termos democráticos e de garantia da democracia sindical. Não é um conceito redutor e a sua eliminação poderia trazer consequências complexas ao nível do funcionamento da própria estrutura sindical, do funcionamento democrático das associações representativas dos trabalhadores.

Quanto à segunda questão, isto é, quanto ao problema de a lei não poder limitar o âmbito da greve, a eliminação proposta pelo PSD amplia, ipso facto, o campo de subjectivismo adjectivante das finalidades das greves. E, se é verdade que nestes debates, quer na Assembleia Constituinte, quer na revisão constitucional, se agita sempre o fantasma das greves políticas insurreccionais e depois, numa versão mais moderada, fala-se apenas de greves políticas, já não insurreccionais, a verdade é que alguns exemplos recentes, lamentavelmente vividos em Portugal, indiciam interpretações restritivas inadmissíveis do significado dos limites do exercício do direito à greve. Todas as greves gerais serão sempre greves políticas - vimos recentemente defender essa tese com relativa descontracção - e inclusivamente greves sectoriais em sectores estratégicos são pérfidas cabalas com intentos de natureza política, sintetizadas na súmula: "Faço greve, logo, privatizam-me." Esta situação desaconselha vivamente que possamos ignorar algumas das consequências possíveis que a eliminação do n.° 2 do artigo 58.° pode acarretar para a consagração de um direito tão relevante como é o direito à greve. Inclusivamente, penso que o exemplo das Comunidades Europeias desaconselha a que sigamos esse caminho. Nesta matéria, até me sinto bastante "thatcheriano". E o exemplo acabado de greve extremamente relevante, Thatcher versus Arthur Scargil em Inglaterra, demonstra claramente que o problema da limitação do exercício do direito à greve não é um problema burocrático-administrativo, não é um problema que se resolva pela obsessão repressivo-limitativa da lei sobre o exercício do direito à greve, mas essencialmente um problema de natureza política - e aqui não tenho medo nenhum de utilizar o nome. E a táctica seguida pelo governo da Sra. Thatcher na greve dos mineiros demonstrou clara e inequivocamente que, enquanto se tratou de uma greve com fundamentos sindicais, teve um largo apoio dos trabalhadores, mas, quando o Governo, através da táctica seguida na desarticulação da greve, a reduziu a uma greve política - onde ficou claramente demonstrado que era um preço grave e alto a pagar pela instrumentalização política e partidária do movimento sindical -, a base social de apoio, isto é, o tal âmbito da greve definido pelos trabalhadores foi drasticamente reduzido e os sindicatos averbaram uma gravíssima derrota política sem que a Sra. Thatcher tivesse tido necessidade de ir à Câmara dos Comuns pedir uma lei burocrática de redução unilateral do direito à greve.

Naturalmente, esta questão da tentação de qualificação das greves políticas ou de solidariedade como greves ilegítimas parece-me estar mais próxima das concepções que tem do direito à greve, por exemplo, o general Jaruzelsky do que propriamente a Sra. Thatcher. Na minha óptica, não é possível defender e apoiar as greves de solidariedade e até as greves políticas - por que não dizê-lo? - que o Solidariedade promove na Polónia e ser-se contra essas greves no Ocidente. Tal como também não é possível ser em Portugal a favor de greves de solidariedade e de greves políticas, mas, quando se trata de analisar o caso concreto da luta do Solidariedade na Polónia, ser contra essas greves de solidariedade e greves políticas no Estado polaco.

Consequentemente, penso que esta matéria abre uma porta perigosa para um vazio cujo preenchimento não me parece reforçar o dinamismo da sociedade civil na resolução dos conflitos sociais, sendo uma vez mais tributário de um certo atavismo de proteccionismo corporativo que, segundo creio, temos todos a obrigação de arredar do plano nacional, porque essa é, aliás, a óptica de que todos nós comungamos no tratamento dos direitos económicos, sociais e culturais dos trabalhadores portugueses.

O Sr. Presidente: - Estão inscritos para intervir o Sr. Deputado Pacheco Pereira, eu próprio e os Srs. Deputados José Luís Ramos e Costa Andrade.

Vozes.

Os Srs. Deputados José Luís Ramos e José Magalhães pretendem colocar perguntas ao Sr. Deputado António Vitorino. Desde que as perguntas não sejam usadas também utilizando o direito de o deputado definir o âmbito da pergunta em termos tais que se se substitua à intervenção e por esse facto alterem a ordem das inscrições, vou satisfazer os pedidos de palavra.

Faça favor, Sr. Deputado José Luís Ramos.

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Pretendia formular duas perguntas muito sintéticas ao Sr. Deputado António Vitorino.

Em primeiro lugar, o Sr. Deputado referiu que, sendo suprimida a primeira parte do n.° 2 do artigo 58.°, haveria uma redução dos direitos dos trabalhadores e, se bem percebi, que nos próprios estatutos das associações sindicais e dos sindicatos se prevê frequentemente o recurso ao referendo e a outras formas que permitam saber se os trabalhadores devem ou não, naquele meio e naquele momento concreto, exercer o direito à greve. Pergunto-lhe, Sr. Deputado, se e de que forma são os direitos dos trabalhadores, eles próprios, restringidos no caso de se retirar esta primeira parte do n.° 2 do artigo 58.° Os estatutos das associações sindicais não terão que ser mudados por isso. Bem pelo contrário, os direitos dos trabalhadores continuam a ser exercidos na sua absoluta liberdade sem qualquer restrição, nesse ou noutro aspecto, e não vejo como é que a referida supressão pode ter alguma relação com isso. Bem pelo contrário. Aliás, se nos próprios estatutos das associações sindicais e de quaisquer outras estruturas dos trabalhadores, esses próprios mecanismos estão previstos, nomeadamente o referendo, que é um mecanismo absolutamente democrático, porquê então ter medo desta supressão, dizendo que há uma restrição aos direitos dos trabalhadores? Pelo contrário.

Quanto à segunda parte do n.° 2 do artigo 58. °, pretendia dizer-lhe, Sr. Deputado António Vitorino, que estou absolutamente de acordo com o que acabou de referir. Em meu entender, colocou muito bem a questão e eu estaria, deste lado, absolutamente disponível para aplaudir. Mas, a meu ver, a questão é outra. Se concatenar a segunda parte do n.° 2 do artigo 58.° com a primeira, deve concluir que: uma leitura exegética do n.° 2 do artigo 58.° é a de que o direito à greve, tal como está consagrado constitucionalmente - é óbvio