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578 II SÉRIE - NÚMERO 20-RC

que muitas das intervenções têm vindo dizer o contrário -, é um direito absoluto ou pode vier a sê-lo na estrita consequência de que são os trabalhadores que têm que definir o seu âmbito. Qualquer greve pode ter um âmbito vasto. Mas a questão que se coloca é saber, caso não se retire este n.° 2 do artigo 58.°, na segunda parte quem define o âmbito da greve. Retirar a segunda parte deste preceito pode não constituir obviamente uma tentativa de qualificação da greve, mas, ao manter-se esta norma tal como está -e esta é a segunda questão -, o direito à greve não é ou não pode vir a ser interpretado não como direito relativo, mas como direito absoluto?

Vozes.

O Sr. Presidente: - Tenho a sensação de que alguns Srs. Deputados talvez queiram convocar os seus pedidos de intervenção para perguntas.

Risos.

O Sr. António Vitorino (PS): - Eu não faço questão de responder ...

O Sr. José Luís Ramos (PSD): - Eu fiz uma verdadeira pergunta.

O Sr. Presidente: - Ao fim de alguns minutos de considerandos, fez duas perguntas, Sr. Deputado. Tem a palavra o Sr. Deputado José Magalhães.

O Sr. José Magalhães (PCP): - Sr. Presidente, creio que qualquer um de nós que, ao fazer uma pergunta, não fizesse uma verdadeira pergunta, não julgasse fazer uma verdadeira pergunta, era pelo menos distraído ou imprudente. Creio, portanto, que todos nós faremos as perguntas que pudermos e de que formos capazes. O Sr. Deputado António Vitorino seguramente dará as respostas. E é isso que neste momento me preocupa: porque um dos aspectos mais característicos deste sistema, tal qual está gizado, é uma certa prudência conceptual. E a Constituição não tem alta densidade na definição de greve, com o Sr. Deputado António Vitorino fácil e seguramente reconhecerá. A própria Lei n.° 65/77 não define "greve" e não é por acaso que não o faz - creio que o Sr. Deputado António Vitorino estará de acordo com isto - porque se teve essa prudência, dada a diversidade de situações e dada a experiência bastante rica que sucedeu aos tais tantos anos de greve proibida, perseguida e reprimida.

A noção constitucionalmente comportável é bastante rica e aquilo que me pareceu desgarrar-se das palavras do Sr. Deputado António Vitorino foi uma certa apreensão, embora não materializada em nenhuma proposta de alteração - tanto quanto eu percebi - e em nenhuma inclinação favorável em relação a qualquer proposta de alteração quanto às realidades comportáveis no conceito constitucional de greve.

De facto, creio que tem uma certa renitência em relação à cobertura constitucional de certas situações, sobretudo daquilo que podemos entender como greves com um cunho mais político (mais político porque, na verdade, greves inteiramente a políticas é difícil que existam). Por exemplo, a hipótese de uma greve como a que em Itália foi desencadeada na altura do rapto de Aldo Moro - claramente uma greve de protesto político, com objectivos políticos- é entre nós perfeitamente comportável constitucionalmente. Creio que nada disto se confunde com o problema que mais o apoquenta, e que, aliás, é um problema compreensível, ou seja, o da possibilidade de instrumentalização, questão totalmente diferente. Gostaria que, neste ponto, procurasse precisar entendimentos. Porque, sendo tudo, virtualmente tudo, mesmo as coisas puras, mais honestas, mais simples, mais cristalinas, "instrumentalizável" (no sentido de uma perversão de finalidades, no sentido de uma contra-interpretação, no sentido de uma campanha intoxicante, etc.) e sendo certo que as perversões de finalidades são sempre pagas, há em tais casos uma factura inequívoca, a saldar, pelo que uma greve assim conduzida ou uma greve com objectivos incorrectamente definidos não pode atingi-los, não os atinge e, em regra, pode produzir penalizações extremamente graves. Sendo tudo isto do mundo dos factos, qual é a ilação que tira para o mundo do direito e, em particular, para o mundo do direito constitucional? Segundo aspecto: é evidente que os eventuais membros do famoso "clube SOREL" que entre nós se contem têm pouca saída neste momento. Quer dizer, não conheço ninguém na circunstância política portuguesa que preconize a transformação social por via da grande explosão grevista. Isto é um pouco o que atormenta os pesadelos do Sr. Primeiro-Ministro Cavaco Silva, ou seja, a ideia de que uma greve, uma greve geral como a do dia 28, pudesse talvez produzir outros efeitos que não aqueles que os trabalhadores aventavam. Não foi o Primeiro-Ministro tão longe quanto as partes deliquescentes da "greve dos pregos" ou da "insurreição dos pregos", mas ouvimos coisas que se aproximam muito, muito desse estilo célebre. Ora isso só pode resultar de uma forma de intervenção política tendente a inibir os trabalhadores e a pôr-lhes na boca aquilo que na boca deles não está. Seria estranho que essa tese estivesse na boca do PS e creio que o Sr. Deputado de forma alguma o pretende inculcar. Aquilo que pretende inculcar é certamente uma coisa diferente. Curiosamente estabeleceu uma confusão entre a postura face ao regime do direito à greve e a questão da filosofia e da atitude geral perante a greve, como que dizendo: "és pela greve no Burundi, deves ser pela greve no 'Rococó', ou também na Polónia, ou também em Portugal, em Trás-os-Montes, na Madeira", em qualquer parte do território nacional, portanto. Compreendo esse seu problema, que realmente pode ser relevante, isto é, o de saber se se é pela greve numa perspectiva territorial ou numa perspectiva geral, se se tem uma postura globalizante ou se se tem uma postura restritiva, ou seja, se se é coerente ou se se é incoerente, que é, se bem percebi, no fundo, a questão que mais o atormentava.

Se me quer perguntar qual é a minha posição, o meu juízo concreto sobre uma greve em concreto, num momento histórico concreto, num sistema político concreto e numa ordem jurídica concreta, diga e eu respondo. Mas neste momento, Sr. Deputado António Vitorino, sendo a discussão sobre o direito à greve na Constituição Portuguesa, a pergunta que mais pode inquietar os trabalhadores é, finalmente, esta: está o PS na disponibilidade de não alterar em que quer que seja o actual dispositivo ou está o PS na disposição