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21 DE JULHO DE 1988 803

A questão que se apresenta, e também isso foi aflorado, é a de que nós, PSD, fazemos uma proposta quanto ao direito de propriedade no sentido de o remeter para o catálogo dos direitos, liberdades e garantias, ou seja, para o artigo 47.°-A.

Ora, o Sr. Deputado considera, e as palavras são suas, que o n.° 2 do artigo 85.° é uma restrição à intervenção do Estado, em termos de sector privado. O que este n.° 2 diz é que "o Estado pode intervir transitoriamente na gestão das empresas privadas para assegurar o interesse geral e os direitos dos trabalhadores, nos termos a definir por lei".

Também no referido artigo se acaba por remeter tudo para a lei, e ressaltam assim duas questões do que está, neste caso, expresso na Constituição: por um lado, deve saber-se o que significa aqui a palavra "transitoriamente" e, por outro, deve procurar saber-se o que deve ser do "interesse geral".

Na nossa proposta, quando incluímos o direito de propriedade em sede de catálogo dos direitos, liberdades e garantias, é óbvio, e o Sr. Deputado sabe isso tão bem como eu, que se aplicará ipso jure o artigo 18.° E este artigo tem limitações muito mais amplas do que aquilo que está estipulado no n.° 2 do artigo 85.°

Portanto, a nossa proposta, e na altura própria discutiremos o artigo 85.°, não vai de maneira nenhuma no sentido de alargar ou deixar de conter na Constituição quaisquer restrições à intervenção do Estado, bem pelo contrário, procura arrumar as matérias em termos sistemáticos, no entendimento de que o direito de propriedade é, sem dúvida nenhuma, um dos direitos fundamentais que deve constar da Constituição Portuguesa. É esse o entendimento que fazemos desta situação.

Quanto ao mais, e também em sede de artigo 82.°, entendemos que não deve haver um movimento de intervenção estatal apenas num sentido, e daí a nossa proposta de equiparação da questão da nacionalização com a da privatização, ou seja, pode e deve haver intervenção do Estado nos dois sentidos, para mais ou para menos. Ora, relativamente a este aspecto, a situação que se prevê não pode ser, de maneira nenhuma, mais grave do que aquela que vigora actualmente.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra o Sr. Deputado Jorge Lacão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Retomo a palavra para tecer algumas considerações.

Em primeiro lugar, para verificar, pelo menos aparentemente e a avaliar pelas palavras do Sr. Deputado José Luís Ramos, que não há uma valorização da disposição que no n.° 2 do artigo 85.° admite ao Estado a faculdade de intervir, ainda que sempre transitoriamente.

À luz da nova versão do artigo 82.°, a lei determinaria os meios e as formas de intervenção, mas nem sequer transitoriamente. A lei diria como a intervenção se poderia processar e, portanto, consistiria numa prerrogativa do legislador ordinário, sem sequer essa norma restritiva de a faculdade de intervenção estar sempre limitada e condicionada pelo aspecto transitório.

Portanto, aparentemente o PSD dá de barato a regra da transitoriedade.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Jorge Lacão, segundo compreendo, V. Exa. está a fazer uma interpretação da Constituição em termos sistemáticos. Não compreendo bem a questão que coloca, porque a tal norma do artigo 85.° que V. Exa. refere é um mais, é algo que se acrescenta ao articulado. Assim, registo a sua interpretação acerca do referido preceito como muito nobre por parte de um representante do PS, mas ela não tem nenhum fundamento hermenêutico no sentido de o texto em causa ser uma limitação ao artigo 82.°, porque, de facto, ele não é uma limitação. Nunca ninguém defendeu isso e suponho que V. Exa. também não defenderá.

De maneira que não compreendo. Se o Sr. Deputado me provar que existe realmente essa limitação, então terei de repensar o problema. Caso contrário, não estou a ver a utilidade da discussão.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Sr. Presidente, agradeço a sua tentativa de correcção, mas eu continuaria firme no meu propósito.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado, trata-se apenas de uma dúvida.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - O Sr. Presidente diz-me que aquilo que referi terá sido uma tentativa muito nobre. Parecia-me que ela era muito evidente pelo seguinte: se existir uma cláusula na Constituição que confira ao legislador ordinário a competência para determinar, sem qualquer restrição constitucional, os meios e as formas de intervenção do Estado na economia - e é, no fundo, isso que o PSD propõe no artigo 82.° -, até porque ex novo o PSD não propõe nenhuma alteração de natureza restritiva, ficará ao legislador ordinário cometida a tarefa de determinar as circunstâncias, os meios e as formas de intervenção do Estado na economia.

Assim, gostaria que o Sr. Presidente me esclarecesse se essa não é a intenção real do PSD, porque, verificando a proposta social-democrata relativa ao artigo 82.°, parece que a minha interpretação se afigura válida. Mas o Sr. Presidente também me pode convencer do contrário.

O Sr. Presidente: - Não, Sr. Deputado. Estou apenas a tentar compreender o sentido da sua argumentação, porque o artigo 82.°, na sua redacção actual, diz o seguinte: "A lei determinará os meios e as formas de intervenção e de nacionalização [...]" Curiosamente, os termos "intervenção" e "nacionalização" vêm copulativamente unidos neste preceito. Este refere ainda "e socialização dos meios de produção". Portanto, este texto abrange desde a nacionalização e a socialização, que é o máximo numa dada direcção, até outras formas menores, e não há aqui nenhuma restrição expressa.

Quando V. Exa. lança depois mão do artigo 85.°, n.° 2, diz que esta possibilidade de intervenção nas empresas privadas é algo que, ao ser suprimido e ao manter-se a possibilidade de o Estado nacionalizar, cria problemas de maior estatização.

O Sr. Jorge Lacão (PS): - Nacionalizar não, Sr. Presidente, intervir.