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O Sr. Gorjão Henriques: - Sr. Presidente, parece-me muito facil a resolução da questão, que faz o objecto desta, pequena discussão. Se o Sr. Deputado propõem a sua moção, para estorvar que a discussão do parecer vá ávante, nada mais injusto; porque eu entendo, que ella deve levar-se até á sua ultima extremidade: (apoiado) se a propõem para nos lembrar os dons artigos, todos os devemos ter visto: se o fez para apresentar a sua opinião a tal respeito, não tem a palavra, e quando lhe couber então dará as suas razões, a fim de mostrar com essa providencia o que lhe parecer, e corroborar e comprovar essa mesma opinião. Por tanto a questão preliminar não é necessaria, e por isso entendo, que se deve passar á ordem do dia, na mesma marcha, que a questão até agora tem seguido.

O Sr. Costa Cabral: - O Sr. Deputado, que se, senta na extrema esquerda, quiz sustentar, que os decretos da dictadura, devem ser considerados válidos até ao dia 26 de Janeiro; esta não é a questão; e se tal se tractasse, alguem lhe responderia com os mesmos artigos da Constituição, que elle invocou, mostrando-lhe que a sua opinião neste caso não é a melhor; mas como o Sr. Deputado parece que retirou a proposta da questão preliminar, não deve continuar a discussão sobre ella.

O Sr. Presidente: - E' escusado que esta questão continue, visto que o Sr. Deputado a não propõem: basta que os outros Srs. que entrarem no debate tenham em vista a especie suscitada (apoiado).

O Sr. Silva Sanches: - Tres são as questões, que offerece o parecer em discussão. Primeira, de que maneira, e porque methodo ha de o Congresso rever os decretos do ministerio, que encerram medidas legislativas? Segunda, quaes desses decretos se devem considerar em vigor? Terceira, de que maneira, e porque methodo ha de ser suspenso algum, que suspenso deva ser?

A Commissão de legislação deu por incontestavel o direito de revisão, que o Congresso tem; não se demorou por isso a demonstra-lo, partindo d'elle como de um axioma, que não carece de demonstração. Mas ella inutilmente teria estabelecido um meio de rever, se por ventura não houvessem cousas, que revistas devessem ser, e em vão pertenderia, que nada havia a rever; porque argumento algum póde destruir a existencia dos factos, e é facto que o ministerio publicou muitos decretos com força legislativa, ou com medidas, que só por leis podiam ser tomadas. Eis aqui pois tambem a razão, porque a Commissão de legislação não examinou, o que eram, e o que são esses decretos. Podia, e deveria ter talvez examinado a legalidade d'elles. Porém cumprir o que pelo Congresso lhe havia sido determinado era seu principal dever; e o Congresso só lhe determinou, que desse o seu parecer sobre as propostas, e requerimentos que lhe foram remettidos. E como em nenhuma d'essas propostas, em nenhum desses requerimentos se tocava a questão da legalidade, ou illegalidade, julgou por isso, que não estava obrigada a entrar n'ella, e a desenvolve-la. Deixo agora á sabedoria do Congresso, e á sua imparcialidade o decidir se estas razões bastarão para a Commissão ser justificada suficientemente de qualquer omissão, que se lhe tenha notado, ou possa notar. Mas pois, que se perguntou o que eram os decretos da chamada dictadura, e que se tem investigado a sua legalidade, ou illegalidade, forçoso é, que eu entre n'essa espinhosissima questão, que pelo parecer, em que eu sou relator, se quiz de certo modo evitar; e muito mais indispensavel me é isso, depois do singularissimo discurso do Sr. ministro do reino, pronunciado na memoravel sessão de Sabbado 8 decorrente. Apesar do que elle disse, é ainda a existencia da sua decantada dictadura a primeira cousa, que eu lhe nego; e principiarei respondendo ás objecções, que a esse respeito apresentou.

Estranhou elle muito severamente, que se dissesse que só em Roma tinha havido dictadores, e que elles não podiam fazer leis, e para provar a sua asserção recorreo aos exemplos de Moysés, dos Decemviros, e do Augusto imperador de saudosa memoria. Saiba porém Sua Exca., que neta eu, nem Deputado algum, que eu ouvisse, disse puramente, que só em Roma tinha havido dictadores. - Disse eu, que verdadeiramente só em Roma as ouvera; mas o adverbio verdadeiramente significa alguma cousa, e usei d'elle para denotar, que dictadores propriamente ditos só existiram n'aquella republica, sem toda via excluir que alguns poderes iguaes aos d'elle tivessem sido conferidos, e exercitados n'outra parte. Com effeito, é certo, que a dignidade dictatorial foi pela primeira vez reconhecida em Roma, como authoridade extraordinaria do estado; foi lá que mais habitualmente se recorreo a ella guardadas sempre certas formalidades: foi a isto, que eu alludí; pois bem sei, e bem sabia, que tanto poder como em Roma se conferio aos dictadores, tem sido conferido a cidadãos d'outros estados. O que porém para mim é fóra de dúvida, é que os exemplos citados pelo Sr. ministro do reino de maneira alguma provam o que elle pertendeo mostrar. Moysés foi, ou devia ser o enviado do Senhor para libertar os Hebreus do captiveiro de Faraó, em nome d'elle lhes fallava, em nome d'elle lhes deu leis. Moysés foi por consequencia um theocrata, que recebeu, ou disse ter recebido seus poderes do Ceo, e de Deos, em quanto todos os dictadores os teem recebido dos homens. Ainda mais, os dictadores commandavam os exercitos, sempre que exercitos havia a commandar. e Moysés nem sempre com mandou os seus, porque esse era o cargo de Josué. Por conseguinte só pela mais completa confusão de dictadura com theocracia se póde chamar a Moysés dictador.

Pelo que toca aos Decemviros, esses foram especialmente encarregados pelos Romanos de lhe apresentarem um codigo de leis, que os Romanos não tinham; e foram pura isso mandados ás cidades gregas, que então passavam por ter as melhores leis do mundo. Deram-se-lhe para esse fim especial todos os poderes necessarios. Mas se os Decemviros foram por isso dictadores, mais dictador é o Congresso actual; porque não só tem poder de fazer leis ordinárias; mas tambem, de fixar uma lei fundamental, ao passo que os Decemviros não podiam tocar na Constituição Romana. Dir-se-ha, que tambem se lhe conferiram durante um anno os mais poderes do estado. Porém é preciso accrescentar logo, que elles deviam exercer, como de facto exerceram (fallo dos dez primeiros) esses poderes segundo as fórmas ordinarias. Será isto ser dictador? E' verdade, que os que succederam aos primeiros Decemviros commetteram grandes abusos, e quasi se fizeram tyrannos. Mas o abuso, e a tyrannia provam alguma cousa contra a regra geral? De certo que não: é por consequencia tambem certo, que, ou os Decemviros não foram dictadores, ou o foram especialissimos; e a excepção firma a regra.

Pelo que toca ao Sr. D. Pedro, elle deu a Carta aos portuguezes não na qualidade de dictador; mas sim na de rei de Portugal, que era; e n'essa qualidade reunia elle então com o poder executivo e o de legislar. Nenhum dos argumentos pois do Sr. Ministro do reino prova, que tivesse havido dictadores propriamente ditos antes da primeira nomeação d'elles em Roma; nem que os dictadores tenham tido o poder de legislar. Posto isto, passo á demonstração da minha proposição, visto que estão destruidas as objecções, com que se quiz destrui-la. Quem admitte uma authoridade extraordinaria ha de admittila pelo seu principio, por que d'outro modo cria entes imaginarios; e nem as consequencias, nem o principio da dictadura se deram entre nós. A dictadura de invenção romana, era uma magistratura suprema, nomeada pelo povo nas occasiões de imminente perigo, investida por elle de todos os poderes necessarios para affastar esse perigo, e limitada a mui curta duração. Esta magistratura suspendia por um momento a authoridade so-