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380-P DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Antes do se darem aquelles acontecimentos, parecia que as finanças do Brazil tinham entrado n'uma epocha de grande e verdadeira prosperidade, que ia augmentando todos os dias.

Fallava-se até por aquelle tempo no grande desideratum do Brazil, desideratum que para nós tinha um grande alcance; fallava-se na substituição do curso do papel pelo curso metallico, que era para nós do uma grandissima vantagem.

Tudo isto se traduzia de certo modo na elevação dos cambios, e todos sabem a importancia que esto facto tem para as nossas praças.

Pelos grandes interesses que ligam Portugal ao Brazil, pelas grandes fortunas portuguezas que estão n'aquelle paiz, a elevação dos cambios significa uma grande corrente de dinheiro derivada para Portugal, e todos sabem qual é O grande desafogo que este facto traz às nossas praças commerciaes e indirectamente às nossas finanças.

Depois d'aquelles acontecimentos, e isto não admira nada, porque, quando ha importantes acontecimentos politicos, as finanças resentem-se logo; o que se deu immediamente foi o começo da depressão dos cambios, depressão que hoje chegou a ponto tal que aquella fonte temporaria de recursos está completamente secca;

Lá estão naturalmente os capitães das pessoas que para aqui vieram, lá estão os seus rendimentos; mas de momento está parada a corrente, o que tem inconvenientes gravissimos, porque ninguem ignora que o mal estar financeiro se reflecte na politica.

Pelo lado politico aquelles acontecimentos tambem tiveram consequencias importantes para nós.

Existe no nosso paiz uma minoria, aliás insignificantissima, numericamente fallando, que teve a louca idéa de que aquelles acontecimentos podiam aqui repetir-se; que teve a louca idéa de que podia aqui haver uma indisciplina no exercito, e de que podiam dar-se outros factos similhantes aos que se deram no Brazi.

Era louca e vã esta idéa, repito; mas só a possibilidade de que alguém podia pensar na sua realisação, chegou a intimidar, como sempre succede em casos similhantes, uma parte das classes que tinham que perder.

O unico perigo que existia era haver quem imaginasse que o perigo podia existir.

Alem d'isto a imprensa tinha chegado entre nós a um tal grau de licença e de anarchia, por falta de responsabilidade effectiva, que o governo viu se obrigado a dar um remedio a este estado de cousas.

Todos os dias se fazia propaganda da desordem, da indisciplina do exercito e da guerra às instituições. Tudo isto não tanto pelo que era em si, mas pelo que influía no animo dos mais tímidos, tinha a sua natural importancia.

Da concorrencia de todos estes variados factos resultou que poucos dias antes do dia 11 de fevereiro, era opinião talvez quasi geral de que o governo não tinha força para manter a ordem. (Apoiados da direita.}

Ora, um governo que não tem força para manter a ordem, não é governo; a sua obrigação é ir-se embora se não podo mantel-a. (Apoiados da direita.}

Manter a ordem publica é a primeira condição do governo.

Os srs. deputados são muito illustrados e sabem que tem havido publicistas ou philosophos, posto que isto já tem passado um pouco de moda, que entendem que num futuro mais ou menos longinquo, quando a instrucção publica estiver derramada por todas as classes, quando todos os interesses estiverem equilibrados, quando a iniciativa individual, que já hoje é poderosissima, for omnipotente, o governo ha de ficar reduzido á única funcção de manter, a ordem publica.

Esse facto não se dá hoje, e creio que não se dar nunca; mas a verdade é que em todo o caso a manutenção da ordem publica é a primeira funcção do governo, porque sem ella não ha progresso, nem liberdade. (Apoiados da direita.)

Era, pois, esta a primeira obrigação do governo, e não me refiro só á manutenção da ordem material no momento, porque isso não era difficil.

Eu sempre estive convencido que à questão não era só manter num dado momento a ordem, era sobretudo fazer perceber ao publico, â nação, que o governo podia, e tinha força para manter a ordem publica. (Apoiados da direita.)

Era esta persuasão que havia de trazer a tranquillidade geral, e assim foi.

Esta é a origem dos primeiros actos praticados pelo governo, e dos primeiros decretos dictatoriaes que elle publicou, os oito decretos que têem a data do dia 10 de fevereiro.

Mas dirão os illustres deputados o que têem os decretos dictatoriaes, decretos que têem principalmente por fim a defeza nacional, com a sustentação da ordem publica?

Têem muito.

A ordem publica não se mantem sómente pela força material, pelas baionetas; precisa de manter-se pela força moral; e n'aquella occasião, nas circumstancias que já descrevi á camara, era necessario responder às reclamações do espirito publico (Apoiados da direita.) e essas reclamações que se encontram nos jornaes d'aquella epocha eram no sentido de se acudir immediatamente á defeza nacional. (Muitos apoiados da direita.)

Os actos praticados pelo governo tinham este importantissimo fim de interesse publico.

Sinto muito não poder mostrar á camara as cartas particulares que recebi, que ou assevero, e espero que elle não duvide d'esta minha asserção, que não eram só de amigos politicos, mas até algumas de adversários, direi mais, de progressistas, cartas que tenho em meu poder, que applaudem as providencias tomadas pelo governo, sem excluir as que constam dos oito primeiros decretos, e de outros de que fallarei mais tarde.

E não foram só cartas; muitos individuos do partido progressista de viva voz me disseram, que julgavam que tinham sido salutares os actos praticados pelo governo.

Em todo o caso o que ninguém póde dizer é que aquelles actos tiveram um fim partidário. (Apoiados.)

Não se póde dizer isso; porque o governo teve tanta cautela que em nenhum d'esses decretos se auctorisou a crear empregos de livre nomeação.

Infelizmente no nosso paiz uma grande arma política do governo é, sobretudo nas vésperas de eleições, poder fazer favores a amigos, a indifferentes, e até a adversários. Mas nós fomos tão escrupulosos, que mesmo na creação de uma junta ou conselho de funccionarios que se fez num d'aquelles decretos declaramos que as suas funcções seriam gratuitas.

Mais tarde, quando o governo em outro decreto teve de crear uma commissão de censura litteraria facultativa, declarou que aquella commissão seria gratuita. Mas foz mais, porque quando tratou de crear o ministerio, da instrucção publica muito de propósito deixou para as camaras a auctorisação de organisar a nova secretaria, constituindo-o apenas no momento com a direcção da instrucção publica que existia no ministerio do reino.

Seguiu-se depois, na ordem chronologica das providencias extraordinarias que o governo se viu obrigado a tomar, o decreto que dissolveu a camara municipal de Lisboa.

Dizia-se, e eu tenho aqui os jornaes que o provam, corria por toda a parte, que a camara municipal de Lisboa pretendia resistir pela força ao acto do governo, que suppunha que elle praticaria, de a dissolver. (Apoiados.)

Foi espalhada na imprensa a falsidade, a calumnia de que o governo queria dissolver a camara municipal de Lisboa, porque ella tinha feito um emprestimo para a defeza nacional; e até se dizia, sobretudo para animar a