O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

876

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

O espirito contradictorio das accusações foi ainda mais longe. O sr. Alcantara disse: «A commissão destruiu tudo»; e em seguida acrescentou: «As economias são todas ficticias». De maneira que destruimos tudo e não tocámos em nada! (Apoiados.)

O sr. Barros e Cunha disse tambem: «A commissão quiz destruir tudo»; e em seguida: «A commissão não economisou nada, antes a despeza é ainda de mais 200$000 réis»! Esta argumentação é de tal ordem, apresenta-se já tão desfeita, que me parece que não é necessario dizer uma só palavra, attento o seu miserando estado.

Sr. presidente, quando ha pouco fallei da marcha politica do governo, esqueci-me de apresentar alguns factos que podem continuar a indicar-nos a grandeza da iniciativa do poder executivo.

Tem-se dito n'esta camara que o poder legislativo em Portugal está abatido, e infelizmente é verdade. Desejava que o parlamento podesse tirar-se d'esta molleza que não o illustra, e que elle mesmo tomasse a iniciativa de medidas importantes (apoiados); comtudo hei notado que as propostas da iniciativa de qualquer deputado não vão tão rapidamente pelos tramites, que necessitam atravessar para serem convertidas em lei, como correm as propostas apresentadas pelo governo (apoiados).

Vejamos, porém, como o gabinete, alem dos factos que ha pouco referi, tem satisfeito á sua promessa de grande iniciativa.

Uma das obrigações de todos os ministerios é trazer a esta casa as contas de gerencia e exercicio, mas até agora não as tenho recebido, e creio que o mesmo tem acontecido aos meus collegas.

(Interrupção que não se percebeu.)

Não têem vindo todas, e esses documentos são importantissimos, não só porque a sua apresentação correspondia a uma das mais serias obrigações dos srs. ministros, mas tambem porque nos forneceriam de muitos esclarecimentos, que haviam de ser assas uteis para a boa analyse do orçamento do estado.

As propostas do sr. ministro da fazenda vieram aqui tão carecidas de instructivos relatorios, e tão descuidadamente feitas, que a commissão de fazenda (a qual n'esta casa tem sido tantas vezes accusada de retardar os trabalhos parlamentares) careceu de estudar maduramente o assumpto, e de pedir numerosissimos esclarecimentos a s. ex.ª; d'aqui veiu a tardança.

Exemplo notavel da falta de informações sobre negocios graves é o seguinte, que peço licença de recordar á camara.

Na ultima sessão legislativa foi apresentada pelo governo uma proposta de reforma das pautas, a qual continha cento setenta e tantos artigos, e o sr. ministro da fazenda, nem nos dizia quaes seriam os resultados financeiros d'essa proposta de lei, nem nos fornecia de esclarecimentos indispensaveis para comprehendermos e avaliarmos devidamente a influencia de tal reforma sobre tantos ramos de industria, que não podiam deixar de ser mais ou menos impressionados pela execução da proposta.

Continuo n'esta ordem de considerações, porque, como já disse, convem que todos saibam qual é a responsabilidade de cada um dos dois poderes, executivo e legislativo.

No principio d'esta sessão dizia-se que havia importantes trabalhos de fazenda a discutir, e que era até indispensavel acrescentar seis membros á commissão de fazenda, a fim de que podesse occupar-se d'esses trabalhos e trazer com brevidade á camara o resultado dos seus estudos.

Cuidaria alguem que não podia este acrescentamento considerar-se uma questão politica; certo é porém que no dia seguinte, a pressa de discutir o orçamento e as propostas de fazenda traduzia-se n'um adiamento da camara! Modo estranho de resolver as questões!! Modo estranho de provar ao paiz que a questão de fazenda era a primeira que o governo desejava resolver.

Ainda que, mais tarde, o sr. ministro do reino apresentou propostas de lei ácerca de assumptos verdadeiramente valiosos, como, por exemplo, a reforma administrativa e a reforma da instrucção primaria e secundaria (negocios estes que parecem ter perdido já hoje toda a sua importancia), muito tempo se perdeu. Se houvessemos começado logo a discutir a questão de fazenda (a qual encaro por modo differente d'aquelle por que geralmente é vista n'esta casa), quando chegassemos a esta epocha teriamos já votado os meios precisos para attenuar o deficit, e outras medidas que satisfizessem as justas exigencias do paiz. Mas, como disse, a camara foi adiada, e só ha poucos dias podemos começar a discutir o orçamento do ministerio da marinha.

Eu sei que o sr. presidente do conselho considera a sua iniciativa tão rasgada e tão importante, que os proprios titulos de divida publica tem subido de preço, graças á actual gerencia financeira, em que o nobre presidente creio que influe muito.

Na resposta que s. ex.ª deu ao sr. Osorio de Vasconcellos, disse o nobre marquez d'Avila que frequentemente recommendava ao sr. ministro da fazenda que não fizesse por emquanto operação nenhuma sobre os titulos que ha para emittir do ultimo emprestimo.

S. ex.ª parece que n'este ponto discordava um pouco da opinião do sr. ministro da fazenda; era sobre ponto insignificante, dirão alguns, mas o sr. presidente do conselho reputo-o tão valioso que affirmou o ter d'ahi principalmente resultado a elevação do preço dos nossos titulos de divida publica.

Respeito as qualidades do sr. presidente do conselho; e julgo que quem dissesse que s. ex.ª não tem feito serviços a este paiz, e que não é digno de todas as honras que tem recebido de tantas nações da Europa, faltaria á verdade; mas quando vejo que o sr. presidente do conselho se apresenta como aquelle individuo que póde reger de tal modo os mercados monetarios, que as inscripções á sua vos sobem de preço, fico humildemente pensando que ha n'isto grande exageração. E quando de si proprio nos falla, não é raro illudir-se.

Por exemplo: s. ex.ª diz-nos que não ha ninguem que possa dar maior fiança do que s. ex.ª de que o ministerio ha de operar grandes economias; apesar d'isto, quando investigámos qual é n'este particular a iniciativa do governo, acontece-nos como já succedeu com a iniciativa de s. ex.ª, nas reformas feitas no ministerio da marinha.

Parece me que tal infeliz asserção póde ser comparada com aquella que tambem s. ex.ª apresentava o anno passado; assegurava que não havia quem podesse dar maior garantia contra as dictaduras do que elle; comtudo s. ex.ª como procedeu perante os actos praticados depois da revolução de 19 de maio? Não hesitou em propor a esta camara um bill de indemnidade e a approvação de muitos actos dictatorios!

S. ex.ª quando presidiu ao gabinete de janeiro de 1868, o qual não tirou proveito da excellente occasião que se lhe deparava para effectuar reformas, começou a sua alta missão, suspendendo ou abolindo algumas leis importantes, por exemplo a de administração civil, sem que ao trabalho distruidor seguisse a tarefa edificadora. E creio que uma das leis mais importantes votadas n'esta casa em 1867 era a da reforma da administração civil (apoiados).

Felicito-me de não a haver combatido, como jornalista; havia o ministerio praticado muitos actos, que me desagradavam; mas a reforma administrativa não a combati; porque, apesar de seus defeitos, continha prescripções importantes, das quaes derivariam grandes bens para este paiz; infelizmente, não só essa lei foi abolida, mas tambem os parlamentos que se succederam ao de 1867 não tiveram a força necessaria para dotar este paiz com uma das reformas que mais necessita.

Como uma parte da minha moção falla da descentralisação administrativa, direi d'ella algumas palavras.