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CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

SESSÃO DE 11 DE MARÇO DE 1867

PRESIDENCIA DO SR. CESARIO AUGUSTO DE AZEVEDO PEREIRA

Secretarios os srs.

José Maria Sieuve de Menezes

Fernando Affonso Geraldes Caldeira.

Chamada — 67 srs. deputados.

Presentes á abertura da sessão—os srs. Abilio; Fevereiro, Annibal, Ayres de Gouveia, Quaresma, A. J. da Rocha, Seixas, A. R. Sampaio, Falcão da Fonseca, Pereira Garcez, Carlos Bento, Cesario, Delfim Ferreira, Domingos de Barros, Fernando Caldeira, F. J. Vieira, F. F. de Mello, Albuquerque Couto, Ignacio Lopes, F. L. Gomes, Bicudo Correia, Paula e Figueiredo, Cadabal, Medeiros, Palma, Sant'Anna e Vasconcellos, Baima de Bastos, Reis Moraes, Santos e Silva, J. A. de Sousa, Assis Pereira de Mello, Mello Soares, Sepulveda Teixeira, Calça e Pina, Fradesso da Silveira, Torres e Almeida, Osorio, Noutel, J. Pinto de Magalhães, J. A. da Gama, Infante Passanha, Correia de Oliveira, Freire Falcão, J. M. da Costa, J. M. Lobo d'Avila, Sieuve de Menezes, José Tiberio, Leandro da Costa, Levy, Alves do Rio, Macedo Souto Maior, Julio Guerra, Sousa Junior, Leite Ribeiro, Paulo de Sousa, Pereira Dias, Severo do Carvalho, S. B. Lima, Visconde da Costa e Visconde dos Olivaes.

Entraram durante a sessão — os srs. Affonso de Castro, Soares de Moraes, Teixeira de Vasconcellos, Sá Nogueira," Diniz Vieira, Gomes Brandão, Gonçalves de Freitas, Barros e Sá, Salgado, Crespo, Fontes Pereira de Mello, Pequito, Barjona, Barão de Almeirim, Barão de Magalhães; Belchior Garcez, Bento de Freitas, Pinto Coelho, Claudio Nunes, C. J. Vieira, Achioli Coutinho, Eduardo Cabral, F. da Gama, Pimentel e Mello, F. do Quental, Namorado, Francisco Costa, Lampreia, Gavicho, Sousa Brandão, F. M. da Costa, F. M. da Rocha Peixoto, Pereira de Carvalho de Abreu, Gustavo de Almeida, Corvo, J. A Vianna," Mártens Ferrão, João Chrysostomo, Costa Xavier, Alcantara, Aragão Mascarenhas, Tavares de' Almeida, Matos Correia, Proença Vieira, Ribeiro da Silva, Faria Guimarães, J. Thomás Lobo d'Avila, Maia, Costa Lemos, Sette, Dias Ferreira, Figueiredo e Queiroz, José Luciano, J. M.' da Costa e Silva, Toste, José de Moraes, José Paulino," Nogueira, Mendes Leal, Vaz de Carvalho, Julio do Carvalhal, L. A. de Carvalho, L. Bivar, Xavier do Amaral; M. B. da Rocha Peixoto, Coelho de Barbosa, Manuel Firmino; Manuel Homem, Lavado de Brito, Marquez de Monfalim, Monteiro Castello Branco, Vicente Carlos e Visconde da Praia Grande de Macau.

Não compareceram — os srs. Alves Carneiro', Fonseca Moniz, Camillo, Correia Caldeira, A. Pinto de Magalhães, Magalhães Aguiar, Faria Barbosa, Pinto Carneiro, Cesar de Almeida, Barão do Mogadouro, Barão de Santos, Barão do Vallado, Carolino Pessanha, Fausto Guedes, F. Bivar Barroso, Coelho do Amaral, Marques de Paiva, Silveira da Mota, Gomes de Castro, J. A. de Sepulveda, Albuquerque Caldeira, Joaquim Cabral, Lisboa, Coelho de Carvalho Vieira de Castro, Faria Pinho, Garrido, Alves Chaves, Oliveira Pinto, Ferraz de Albergaria, Rojão, Barros e Lima, Batalhoz, Freitas Branco, M. A. de Carvalho, Tenreiro, Sousa Feio, P. M. Gonçalves de Freitas, Placido de Abreu) Ricardo Guimarães e Thomás Ribeiro.

Abertura—A uma hora da tarde.

Acta — Approvada.

EXPEDIENTE

A QUE SE DEU DESTINO PELA MESA OFFICIOS

1.° Do ministerio do reino, remettendo o processo relativo, á eleição effeituada no circulo n.° 46 (Bragança).

A commissão de verificação de poderes.

2.° Do ministerio da fazenda, remettendo os esclarecimentos pedidos pelo sr. Affonso de Castro, relativos a um projecto de lei apresentado a esta camara pelo sr. Antonio de Serpa Pimentel, para certos melhoramentos na villa de Moimenta da Beira.

A commissão de fazenda

REPRESENTAÇÕES

1.ª Da camara municipal e cidadão? residentes no concelho do Barreiro, pedindo que não seja approvada a proposta de lei sobre administração civil, na parte em que adopta para a circumscripção dos concelhos a base de 5:000 fogos.

A commissão de administração publica.

2.ª Da camara municipal do concelho da Moita, pedindo que não seja approvada a proposta de lei sobre administração civil, na parte em que adopta para circumscripção dos concelhos a base de 5:000 fogos.

A commissão de administração publica.

3.ª Da camara municipal de Souzel, pedindo que não seja approvada a proposta de lei sobre administração civil, na, parte em que supprime o districto de Portalegre.

A commissão de administração publica, sendo publicada no Diario.

4.º De varios cidadãos residentes no concelho de Guimarães, pedindo que não sejam approvadas as medidas de fazenda, ultimamente apresentadas pelo governo.

A commissão de administração publica, sendo publicada no Diario com designação do numero de assignaturas.

5.ª De varios cidadãos do districto da Guarda, adherindo á representação já apresentada á camara por alguns cidadãos de Lisboa contra as medidas de fazenda.

A mesma commissão.

6.ª Dos empregados da repartição de fazenda do districto de Castello Branco, pedindo augmento de vencimento. A commissão de fazenda.

7.º Da junta de parochia de Aguada de Cima, districto de Vizeu, pedindo a construcção de um ramal de estrada, que principie em Oliveira do Bairro e termine em Aguada de Baixo, na estrada de Coimbra ao Porto.

Á commissão de administração publica.

8.ª Da junta de parochia da Aguada de Baixo, concelho de Agueda, pedindo a construcção de uma ponte.

A mesma commissão.

9.ª Dos segundos officiaes e aspirantes de 1.º e 2.º classe da repartição de fazenda do districto do Porto, pedindo augmento de vencimento.

A commissão de fazenda.

Leu-se na mesa o seguinte

REQUERIMENTO

Requeiro que a representação vinda de Guimarães, contra as medidas do governo, relativas ao estabelecimento de novos tributos e creação da guarda civil, seja publicada no Diario de Lisboa. = José Barbosa da Costa Lemos, deputado pelo 1.° circulo de Guimarães.

Foi approvado.

Leu-se na mesa a seguinte.

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PROPOSTA

Requeiro á camara submetta ás illustres commissões de legislação e de infracções reunidas, a seguinte proposta, a fim de dar sobre ella o seu parecer, antes de entrar em discussão a proposta de lei apresentada pelo sr. ministro dos negocios da justiça, em que propõe a extincção da relação dos Açores.

O artigo 130.° da carta constitucional diz que: na capital do reino, além da relação que deve existir, assim como nas mais provincias, haverá tambem um tribunal com a de nominação de — supremo tribunal de justiça, etc.

Requeiro e proponho á camara, invocando para tanto o § 6.° do artigo 15.° da carta constitucional, estatuindo-se a lei fundamental que haja nas provincias de 2.* instancia (principal garantia de um povo livre), e existindo de facto e de direito, desde 1832, uma relação nas ilhas dos Açores, com séde em Ponta Delgada, para conhecer por appellação dos recursos de duzentos e cincoenta mil portuguezes, afastados do continente do reino cerca de trezentas leguas de distancia; e sendo este tribunal creado em fiel execução do disposto no citado artigo 130.° da carta, por decreto do augusto principe, que outorgou a mesma carta constitucional, Sua Magestade Imperial o Senhor Duque de Bragança, então regente do reino: em taes circumstancias proponho que a camara resolva se o sr. ministro da justiça podia ou não trazer á camara a alludida proposta sem aquelle artigo ficar infringido? = O deputado, Henrique Ferreira de Paula Medeiros.

foi enviada á commissão de legislação.

DECLARAÇÃO

O sr. Faustino da Gama não tem podido comparecer ás sessões passadas, e deixará ainda por doença de comparecer a mais algumas.

Lisboa, 9 de março de 1867. = José de Moraes Pinto de Almeida.

Inteirada.

REQUERIMENTO

Requeiro que, por todos os ministerios, seja remettida a esta camara com a maior urgencia possivel uma relação nominal de todos os devedores á fazenda publica até 30 de junho de 1866, sejam quaes forem as suas proveniencias, e quaes os que estão entregues ao poder judiciario, e os que não estão e porque. = José de Moraes Pinto de Almeida = Antonio José de Seixas.

Foi remettido ao governo.

INTERPELLAÇÃO

Requeremos que seja prevenido o sr. ministro das obras publicas, de que desejâmos interpellar s. ex.ª sobre o estado da estrada em construcção da Albergaria a S. Pedro do Sul. = José de Mello Soares e Vasconcellos = Fernando Caldeira = José Correia de Oliveira.

Mandou-se fazer a devida communicação.

O sr. Sá Camello Lampreia: — Tenho a honra de mandar para a mesa dois projectos de lei, que vão assignados tambem pelo meu collega e particular amigo o sr. Freitas Branco.

Aproveito o ensejo para participar a V. ex.ª que por incommodo de saude não compareci ás ultimas sessões da camara.

O sr. Sieuve de Menezes: — Mando para a mesa, para ter,o devido destino, a representação dos aspirantes de 2.ª classe da repartição de fazenda do districto de Angra do Heroismo, pedindo augmento de vencimento.

O sr. Diniz Vieira: —Mando para a mesa uma representação da camara municipal de Ponte do Sor, e de varios habitantes daquelle concelho, pedindo a conservação do districto de Portalegre. Peço a V. ex.ª queira dar-lhe o destino conveniente, e que seja publicada no Diario.

O sr. Julio Guerra: — Mando para a mesa duas representações — uma da camara municipal de Ferreira do Zezere e outra da de Almeirim, pedindo a conservação do districto de Santarem.

Mando tambem para a mesa uma representação da camara municipal e habitantes da Barquinha, contendo 81 assignaturas, e outra dos habitantes de Almeirim, com 192 assignaturas, tanto umas como outras devidamente reconhecidas. Nas representações pede-se que esta camara não approve as medidas de fazenda apresentadas pelo sr. ministro respectivo.

Não faço agora a reproducção de argumentos que já aqui se têem apresentado em occasiões identicas a esta, limitando-me por agora a pedir á camara que tome estas representações na consideração que merecerem.

O sr. J. A. de Sepulveda: — Mando para a mesa uma representação dos habitantes de Sobreira Formosa, contra as medidas do governo administrativas e de fazenda.

Esta representação contém 107 assignaturas, e peço a j V. ex.ª que a mande á commissão respectiva.

Peço tambem a V. ex.ª que se digne mandar publicar no Diario de Lisboa o numero de assignaturas.

O sr. A. J. da Rocha: — Vou mandar para a mesa uma representação dos pescadores de Ovar, Espinho, Povoa de Varzim e Ferreira, assignada por perto de 3:000. Pedem elles ser alliviados do pesado imposto do pescado, e fazem-no humildemente.

O pedido recommenda-se por si mesmo, não sendo necessario dar tratos á imaginação para procurar rasões, a fim de combater o imposto. Basta só pensar que a materia tributada é incerta, e que para constituir a propriedade do pescador é necessario que elle arrisque, não só uma, mas muitas vezes a vida, para lucrar no fim do anno 30$000 ou 40$000 réis, que o fisco lhe vae sizando.

De modo nenhum os signatarios da representação querem esquivar-se a pagar o que for de justiça; antes concluem na representação, que o que querem é que se derrame este tributo com mais suavidade, e que a contribuição seja proporcional á que pagam os outros cidadãos.

Peço a V. ex.ª que se digne mandar esta representação á respectiva commissão, á qual daqui peço que quanto antes dê o seu parecer a este respeito. Apesar do sr. Torres e Almeida ter já feito um requerimento identico ao que faço agora, a commissão até agora ainda não deu parecer. Isto assim não póde continuar, e eu insto com a illustre commissão que attenda as rasões que estes signatarios apresentam, porque são dignas de attenção, de grande peso, e levam á convicção.

O sr. Noutel: — Começo por satisfazer ao meu amigo e collega, o sr. Antonio José da Rocha, dizendo-lhe que se tem tratado a questão do imposto a que se referiu, e que esta redigido um parecer por parte da commissão, substituindo-se o imposto actual pela contribuição pessoal e industrial, formando se gremios, como as demais classes.

Já fallei com o sr. ministro da fazenda a este respeito, e s. ex.ª combinou sobre estas bases; portanto prometto apresentar o parecer ainda esta semana.

O sr. A. J. da Rocha: — Agradeço ao illustre deputado, e nosso amigo, as explicações que acaba de me dar, e aguardo os trabalhos da commissão, de que o illustre deputado faz parte, para os apreciar depois como entender.

O sr. Noutel: — Permitta-me V. ex.ª que eu mande para a mesa uma representação da camara municipal de Silves, na qual pede que se continue a linha ferrea de Beja ao Algarve, visto que esta paralysada ha muito tempo, e se deve desenvolver quanto antes este grande melhoramento para a provincia do Algarve.

Sei que este não é o logar proprio para se apresentar esta representação, visto que o negocio pertence ao governo; e por isso peço que ella seja remettida ao governo, para que os meus constituintes não digam que não cumpri o meu dever não apresentando uma representação que elles me dirigiram.

O sr. Albuquerque Couto: — Declaro a V. ex.ª e á camara que tenho faltado a algumas sessões por motivo muito justificado; e que se estivesse presente quando se votou o projecto sobre o imposto de viação te-lo-ía rejeitado, não porque não esteja convencido da necessidade de impostos, mas porque estou persuadido que só depois de se terem feito economias é que se póde pedir sacrificios ao paiz.

O sr. Levy: — Mando para a mesa a seguinte nota de interpellação (leu).

Permitta-me V. ex.ª que eu apresente já algumas reflexões a que o assumpto se presta.

Por uma portaria, publicada no Diario de Lisboa do dia 6, foi imposta a pena de suspensão indefinida a um empregado da secretaria do reino, por appellido Côrte Real, e posteriormente a imprensa deu publicidade a uma carta do mesmo empregado, em que se queixa d'este acto do sr. ministro do reino, attribuindo-o não á falta que porventura commettesse, mas a motivos politicos. Custa-me a acreditar que motivos politicos podessem dar logar á suspensão de um empregado.

Não justifico, nem posso justificar, um empregado que falta á sua repartição sem motivos justificados. Entendo que a lei deve ser cumprida em relação aos empregados que faltam, mas imparcial, sem distincção de pessoas nem de classe.

E n'isto vou de accordo com os meus actos como funccionario publico, porque na minha posição official tenho tido occasião de informar e pedir o rigor da lei para faltas similhantes.

Mas, quando a falta deve ser punida, a lei regula o arbitrio do governo, e o decreto organico do ministerio do reino estabelece nas disposições disciplinares as penalidades de que o ministro póde usar, e são a admoestação, reprehensão e suspensão, que nunca excederá a tres mezes, e precedida de uma audiencia ao empregado.

Ora, quanto a este empregado, o caso é o seguinte: O empregado ausentou se na quinta feira, por consequencia deu tres faltas, porque a suspensão foi-lhe imposta na quarta feira. Temos portanto um empregado suspenso indefinidamente por ter dado tres faltas. Entendo que se elle abusou, se commetteu falta, deve ser punido.

Não estou verificando a interpellação, mas sim descobrindo terreno para que o sr. ministro saiba os termos em que tenho de o combater.

A suspensão é indefinida, porque a portaria do governo termina dizendo «Sua Magestade ha por bem suspende-lo do exercicio do seu logar» sem marcar o tempo.

Por consequencia entendo que isto não se podia fazer, porque a lei marca as diversas penalidades, e o maximo além do qual essa pena não se póde estender.

Parece-me que o acto envolve até certo ponto uma iniquidade, por não dizer uma injustiça.

Eu não quero suppor que o procedimento dependesse da politica, entretanto o empregado que foi suspenso atribui-o a motivos politicos em um documento publicado na imprensa; e, segundo se diz, por elle ter ido a Coimbra tratar de fazer opposição ao governo. Não creio que isto seja assim, mas é preciso que saibamos a lei em que vivemos, e se o empregado tem ou não direito de professar opiniões contrarias ao governo.

No paiz vizinho, onde ha a franqueza do systema de cada um saber as medidas que tem de tomar, o empregado que incorre no desagrado ministerial remette-se ao silencio, e se o não pratica assim, é deportado pelo menos.

Não sou mais extenso, e limito aqui as minhas observações, que, servem unicamente para esclarecerem s. ex.ª com relação ao assumpto sobre que o interpellarem

O sr. Ayres de Gouveia: — Sinto não estar presente o illustre ministro do reino, a quem tinha de dirigir as considerações que vou fazer com a minha habitual serenidade, mas como esta presente o governo, é quanto me basta.

S. ex.ª em uma das sessões passadas apreciou um documento emanado da camara municipal do Porto, com phrases pouco benevolas.

N'essa occassião não quiz eu de proposito tomar a palavra, porque, como já disse na ultima sessão, não esta no meu caracter azedar qualquer debate. Não me repugna discutir, mas não gósto de proferir phrases que possam, directa ou indirectamente, considerar-se como injurias ou affrontas. Ninguem assim se esclarece. *

Esperei que se publicassem os documentos, que apparecessem no Diario as palavras do sr. ministro do reino, e que igualmente se publicasse a representação da camara municipal, para poder confrontar as palavras que o sr. ministro do reino proferiu, com as da representação, e ver se as arguições que s. ex.ª fez á representação eram fundadas, a ponto de permittirem mais de uma phrase menos benevola e até menos digna.

Não vejo isso, e magoa-me não o ver, para poder, se fosse possivel, desculpa-lo. Analysemos. Quando a camara municipal se dirigia ao governo em phrases que não podiam taxar-se de exageradas, com a cordura que é propria de uma corporação respeitavel, á frente de um municipio dos mais respeitaveis do paiz, dizendo:

«A camara municipal da invicta cidade do Porto, constituindo-se interprete do desejo dos povos seus administrados, vem perante vós, o accedendo á supplica solemnemente manifestada por numeroso concurso de cidadãos, pedir-vos...»

Quando a camara fallava, como se vê, em nome de todos, o sr. ministro do reino lembrando talvez os dez signatarios da representação, sem ver que elles cobriam por assim dizer a representação da cidade como nós os apresentantes cobríamos até certo ponto com o nosso facto a verdade geral da representação apresentada, disse ao illustre deputado, que a apresentava, alludindo á excitação existente no Porto, o seguinte:

«Movimentos populares só têem existencia na imaginação preoccupada de tres ou quatro individuos que o propalam, porque d'isso esperam tirar utilidade.»

O que?! É a camara do Porto que espera tirar utilidade de agitações? Isto diz-se? Homens honradissimos, como são os actuaes vereadores, têem taes intuitos?

Creio que isto não se referia aos dez individuos da camara municipal do Porto. Creio-o firmemente.

O illustre deputado vinha apresentar a representação em nome da camara municipal do Porto, e o sr. ministro do reino, com uma aspereza impropria d'este logar, dizia:

«Lamento profundamente que o illustre deputado, que devia sustentar a ordem, levado de certo por instigações de aventureiros, que só lucram com a desordem, viesse aqui...»

De certo por instigações! S. ex.ª affirma isto assim, com tamanha certeza? São os dignissimos vereadores os taes aventureiros?

Eu tambem era apresentante da representação, e portanto tenho direito a perguntar quem são os aventureiros que me instigam! De certo que o sabe quem com tal certeza o affirma.

Nós viemos em tom de paz apresentar a representação, e diz-se que viemos aqui por instigações de aventureiros que lucram com a desordem! Isto não se dirige á camara municipal do Porto. E assim como estas muitas outras palavras, que eu escuso de repetir e que se lêem no discurso, pedem esclarecimento. A camara não recusava e não se recusa ao imposto, e diz claramente que aquella cidade esta prompta a fazer os sacrificios que forem necessarios, mas o que recusa n'esta occasião é o imposto de consumo, como o governo o propõe.

O que diz a camara?

Eis as proprias palavras:

«D'entre os projectos de augmento da contribuição avulta principalmente o que diz respeito ao imposto denominado do consumo, imposto que, além de exageradamente crescido, é desigual e vexatorio, porque vae caír principalmente na mais numerosa classe da sociedade, e é um ataque directo aos direitos de consumo dos municipios...»

São estas as palavras textuaes da representação, acrescentando apenas adiante n'outro periodo que = este imposto não póde por fórma alguma ser augmentado =.

E que diz o sr. ministro querendo rebater isto? Diz: «Pareceu-me absurdo, e parecerá de certo a muitos, que se diga em nome de um povo illustrado que o imposto de consumo é mau, porque é apresentado pelo governo, e que não teria esse defeito sendo estabelecido pela municipalidade...»

Isto é modo de argumentar? Pergunto. Isto é serio e digno do governo?

Onde diz a representação que o imposto de consumo era bom sendo lançado pelo municipio, e era mau sendo estabelecido pelo governo? Discute assim quem se respeita?

A representação da camara dá quatro rasões contra o, imposto de consumo: 1.ª, que é exageradamente crescido e não póde ser augmentado; 2.*, que é desigual; 3.*, que é vexatorio; e 4.ª, que é um ataque directo aos direitos de consumo dos municipios; e querendo argumentar, senão sophismando claramente, veiu o sr. ministro, não responder aos argumentos apresentados pela camara municipal, mas taxa-los de absurdos quando a camara vinha representar, não sei se em phrases perfeitas, mas pelo menos sem idéa nenhuma politica e sem principio „de offender o governo nem directa nem indirectamente. E a isto que se chama absurdo?!

Creio que esta logica com que s. ex.ª argumentou é que talvez podesse ser taxada com um nome equivalente, senão peior.

Disse eu que não quiz entrar no debate para não irritar,

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e hei de procurar conter-me agora da mesma maneira. E para isso desejava até que algumas phrases, que no correr da discussão, ouvi e não podiam deixar de offender os illustres signatarios da representação e que me magoaram, não viessem transcriptas no Diario, visto que tinham sido j pouco percebidas. S. ex.ª diz:

t Tenho o direito e tenho o dever, pelo logar que occupo, de me levantar e dizer que esses alvitres que se queriam impor eram impossiveis, porque eram absurdos, porque eram erros palpaveis apresentados para illudir.»

Impor? A camara não queria impor cousa nenhuma; ella representava, pedia, vinha trazer a sua voz perante os poderes publicos; ella não impunha nem podia impor. E eram impossiveis, porque eram absurdos, porque eram erros paipaveis apresentados para illudir.

Para illudir a quem? Quereria a camara municipal do Porto illudir os habitantes da cidade em cujo nome representava? Quereria illudir-nos a nós que apresentávamos a representação? A este corpo illustrado a que vinha dirigida? A camara municipal procedeu para illudir ou procedeu para esclarecer? Isto não é proprio de um homem, que se senta nos conselhos da corôa, o asseverar que queriam illudir.

Não desejo tomar muito tempo á camara, venho consignar, magoado, expressões que eu não esperava nunca ouvir para com um municipio que eu não posso adjectivar, porque sou filho d'elle e poderia tomar-se como lisonja qualquer expressão que eu dirigisse com relação ao Porto; mas s. ex.ª, taxando de absurda a representação da camara municipal do Porto, disse tambem ao illustre e meu honrado collega, o sr. Faria Guimarães, que esperava ver levantar o illustre deputado e dizer «risquem-se do orçamento do estado alguns, centos de contos de réis que ahi figuram em favor da municipalidade do Porto».

É esta a phrase que eu venho tambem levantar sem saber do facto, para que s. ex.ª me diga quaes são os centos de contos de réis que vem no orçamento da receita e despeza annual do estado, a favor da municipalidade do Porto; e se s. ex.ª não tiver o animo bastante desprendido para propor a reducção d'elles, estou eu aqui, eu que propugno tenazmente pelas economias.

Passei e repassei o orçamento, e o que vejo, contas redondas, é o seguinte:

Instrucção primaria e secundaria no Porto, no

districto....................... 20:000$000

Creio que não é este o favor á municipalidade.

Academia das bellas artes................ 5:000$000

Academia polytechnica................... 21:000$000

Escola medico-cirurgica..................15:000$000

Instituto industrial.................. 21:000$000

Corpo de policia..1..................... 12:000$000

Subsidios aos theatros............. 4:000$000

98:000$000

Creio que não se referem a isto os centos de contos de réis, referir-se-ha á administração do correio no norte, que despende 54:000$000 réis, mas cujo producto é muito maior? Referir-se ha á relação do Porto, aos juizes de 2.ª instancia? E isto favor á municipalidade do Porto? Despende-se n'isso 36:000$000 réis. São favores á municipalidade as obras da alfandega ou da praça do commercio?

Desejo saber o que é, quaes são estes centos de contos que vem no orçamento geral do estado em favor da municipalidade do Porto. S. ex.ª, que taxou a representação de absurda, disse-nos isto que eu devia considerar como uma verdade, como um evangelho. Pretendo saber se isto é verdade, se lá estão estes centos de contos em favor da municipalidade do Porto.

- Eu não tomo mais tempo á camara, porque espero ser satisfeito n'este pedido, porque quero auxiliar o sr. ministro nas economias que forem possiveis, fazendo reducções, e sobretudo votando contra todos os favores, contra todos os favores sobretudo. Não admitto favores, clamo por justiça, Repto-o para isso.

A representação da cidade, que tenho a honra de representar no parlamento, não falla com elegancia de phrase, não é talvez elegante de conceitos; mas eu lembro-me de Mousinho da Silveira, lembro-me de ler os relatorios d'este grande homem, d'este grande reformador portuguez, aos quaes faltava por vezes a grammatica, mas que vinham cheios de profundíssimo bom senso e de profunda politica.

Eu queria que s. ex.ª, o sr. ministro, apreciasse a representação da camara municipal, não pelas palavras que lá vem, mas pelo alcance que tem, pelas verdades que a fundamentam, pelos intuitos que a dictaram. Esse era o seu dever, não é pelas palavras que lá vem, mas pelo alcance que ellas tem. O sr. ministro do reino disse que eram só dez individuos. Pois bem; eram só dez; o Porto vae responder brevemente, não com dez, mas com milhares de individuos (apoiados). O Porto, dignamente representado pela sua camara municipal, vem mostrar que ella não estava em erro, e que eram aquellas, boas ou más, as suas doutrinas (apoiados—Vozes: — Muito bem, muito bem).

O sr. Faria Guimarães: — Mando para a mesa 111 assignaturas de varios cidadãos dos municipios de Lisboa e Almada, sendo 69 de Lisboa e 42 de Almada, que me foram entregues para serem remettidas para a mesa, a fim de, na conformidade da resolução tomada pela camara, ser publicado no Diario de Lisboa mais este appenso ao numero dos representantes, porque a representação já foi publicada.

O sr. ministro do reino na ultima sessão, tomando a palavra depois de um illustre deputado por Guimarães ter mandado para a mesa uma representação d'aquella cidade contra as medidas tributarias do' governo, fez um elogio,

merecido, ao deputado que apresentou aquella representação, pela cordura e moderação com que se houve na apreciação da representação que mandára para a mesa, e disse s. ex.ª que»quando assim se procedia mereciam os deputados toda a consideração e todo o respeito do governo =. Combinado isto com a irritação pouco natural de s. ex.ª, na occasião em que eu remetti para a mesa a representação da camara municipal do Porto, devo concluir que a irritação de s. ex.ª procedeu da inconveniencia da minha parte, proveiu do modo por que me houve quando apresentei esta representação.

Julguei portanto do meu dever dar uma explicação á camara, não só por ella, mas mesmo porque me parece que em geral se tem interpretado mal algumas expressões ou phrases que soltei n'aquella occasião, e que se reputaram como uma offensa a esta camara, ou como um acto menos cortez e menos delicado. Nem a minha educação nem a minha indole nem o meu regular procedimento me davam logar a fazer qualquer insinuação offensiva ou menos delicada a pessoa alguma em particular, e muito menos a uma corporação tão respeitavel como é, pela sua illustração, acamará dos deputados (apoiados). Peço pois que acreditem que não houve da minha parte a minima intenção de fazer offensa ou injuria a esta camara em qualquer phrase que empregasse (apoiados. — Vozes: — Muito bem.) Se me não explico mais convenientemente não é de certo pelo desejo de fazer offensa, é naturalmente por defeito da minha intelligencia ou mesmo pela minha pouca illustração. Dada esta explicação, direi alguma cousa tambem com relação ao modo por que o sr. ministro do reino apreciou naquella occasião a representação do Porto. Disse s. ex.ª que = a representação era cheia de absurdos,.e que elle duvidava que houvesse no Porto outros dez homens, além dos camaristas, que a assignassem =. Pois, senhores, posso agora assegurar a s. ex.ª que o absurdo, que a tolice mesmo, como alguem aqui classificou a representação, o absurdo e a tolice fazem progressos espantosos no Porto.

A este dito do sr. ministro do reino respondeu o Porto hontem, desde as dez horas da manhã até ás cinco horas da tarde, com 11:270 assignaturas, confirmando aquelles absurdos.

Vozes: — Ouçam, ouçam.

Na praça de D. Pedro, na praça da Batalha, junto ás estatuas de D. Pedro IV e D. Pedro V. em mesas para esse fim preparadas, se abriu uma assignatura, que se não póde dizer nem que foi solicitada pelos individuos que partilham esta ou aquella opinião politica, nem que foi mesmo solicitada como um favor individual.

Convidou-se a quem quizesse Concorrer ali a assignar a representação em que se confirmava o que tinha dito a camara municipal do Porto. Chovia, (porque hontem no Porto choveu, segundo as informações que tenho); mas, apesar d'isso, o povo concorreu de modo que até ás cinco horas da tarde tinham assignado 11:270 cidadãos de todas as classes e condições sociaes mais ou menos importantes; porque, se bem me recordo, já tenho ouvido, parece-me que até no parlamento, dizer que a importancia dos individuos é feita ou medida pela classe a que pertencem, e que a classe dos industriaes do Porto não é das mais respeitaveis.

Isto já se disse, creio que até no parlamento. Não foi o outro dia o sr. ministro do reino que o disse; inclusivamente já se disse... mas basta, não farei mais enumerações do que se tem dito para tirar a importancia ao Porto.

O Porto só tem importancia quando faz sacrificios em favor da liberdade (apoiados); fóra d'isso, não tem importancia alguma. Para ser victima da peste, da fome e da guerra, a fim de plantar de uma maneira solida n'este paiz o systema liberal, o Porto valeu alguma cousa; mas agora que os seus serviços, felizmente, já não são necessarios para isso, o Porto não tem importancia alguma. O Porto é um povo que não sabe dizer senão absurdos. Até agora era a camara municipal, eram dez individuos que os diziam, agora são milhares e milhares de individuos que vem confirmar o que disse o sr. ministro do reino; suppunha s. ex.ª que não haveria outros dez que assignassem a representação, e assignaram-a mais de dez mil!

O Porto não se recusa a sacrificio de qualquer ordem quando é indispensavel; e assim como não se recusou ao sacrificio do memoravel cerco que por mais de um anno soffreu aquella cidade, tambem não se recusa a contribuir para as despezas do estado uma vez que ellas sejam justificadas pela necessidade absoluta. Agora o que o Porto não quer é que o espesinhem com tributos para augmentar, agaloar e enfeitar uma classe aliás respeitavel, mas que na minha humilde opinião já era paga com demasiado luxo. O que o Porto não quer é ver gastar centenares de contos de réis n'um acampamento aonde se íam instruir soldados que o eram n'aquelle momento, e que apenas acabaram de se instruir íam para as suas casas; porque a reserva veiu instruir-se, acabada a instrucção foi mandada para casa; póde-se dizer que era conveniente instruir o exercito e com elle a reserva, porque de momento a momento podia tornar-se necessaria; mas a maior parte d'esta, agora mesmo que fosse chamada, não era obrigada a comparecer, porque já não pertence ao exercito, e para exercicio sómente é duvidoso se podia ser chamada a contribuir, para se gastarem estes centenares de contos de réis, ou o que é, que nem nós sabemos se são centenares, se são milhares, porque o governo ainda se não dignou trazer a esta camara as contas da despeza do campo de manobras, contas que eu creio que ha muita difficuldade em arranjar de modo que se justifiquem completamente; fazendo tudo isto na occasião em que se levantavam fundos a 16 por cento. Pretende-se assim justificar o appello á bolsa do contribuinte? Não póde ser; e de mais a mais appella-se para a bolsa do contribuinte de uma maneira desapiedada, estabelecendo impostos excessivos sobre os generos de consumo, e deixando apenas livre de impostos para o pobre povo o pão, a agua, a sardinha e o chicharro, como diz o sr. ministro da fazenda no seu relatorio. São estes quasi os unicos generos que ficam livres de impostos; e parece-me que não era quando por tal modo se applica o producto do sacrificio, que se pede ao povo, que o povo póde ou deve ser posto a pão e agua, a sardinha e chicharro.

Resta-me explicar o sentido das minhas palavras, quando n'uma sessão passada, alguem suppoz que eu tinha querido chamar o povo á revolta. Eu já disse que por mais dá uma vez fui revolucionario; sustentei até ás minhas opiniões com as armas na mão, chegando, por uma serie de postos, dados em poucos mezes, a ser tenente coronel (uma cousa que eu não sabia ser); mas não fui revolucionario por prazer, fui revolucionario, porque entendi que o devia ser, porque entendia que era aquelle o ultimo recurso de que a nação tinha a lançar mão para se salvar; mas não desejo a revolução, porque entendo que era este o peior de todos os tributos que se podem lançar ao povo. Portanto o que eu. disse não foi com animo de chamar o povo á revolta, foi com animo de prevenir a revolta, por entender que era melhor preveni-la do que combate-la.

Não alongarei mais esta palestra; creio que não se ha de fazer esperar muito uma representação do povo do Porto, representação, que não ha de ser taxada de parcial, e que ha de demonstrar que é uma representação de toda a cidade do Porto; e n'essa occasião eu direi mais alguma cousa se assim o julgar conveniente.

O sr. Bicudo Correia: — Mando para a mesa quatro requerimentos, pedindo esclarecimentos ao governo.

O sr. Belchior Garcez: — Mando para a mesa um requerimento, em que se pede justiça a esta camara.

O sr. Diniz Vieira: — Mando para a mesa duas declarações: uma da camara municipal da Ponte de Sor, e outra de 27 cidadãos da mesma villa, adherindo á representação da camara municipal de Portalegre, a fim de que não seja supprimido o districto do mesmo nome. Peço a V. ex.ª que lhe dê o destino competente, na conformidade do que foi resolvido por esta camara.

O sr. Leite Ribeiro: — Mando para a mesa seis representações da junta de parochia e mais habitantes do concelho de Coura, pedindo que não seja supprimido o districto de -Vianna do Castello. Peço a V. ex.ª que lhe dê o destino competente.

O sr. Luciano de Castro: — Peço a V. ex.ª que consulte a camara sobre se me dá a palavra para explicações pessoaes.

O sr. Presidente: — Devo advertir ao sr. deputado que o regimento manda que a palavra para explicações seja concedida em prorogação de sessão; entretanto vou consultar a camara sobre o seu requerimento (apoiados).

Vozes: — Falle, falle.

' Consultada a camara, decidiu affirmativamente.

O sr. Luciano de Castro: — Começo por agradecer á camara a benevolencia que teve para commigo em me conceder a palavra, e desde já lhe prometto não tomar muito tempo a sua attenção. I

Antes porém de tratar do assumpto para que pedi a palavra, permitta-me V. ex.ª que eu aproveite a occasião para mandar para a mesa o diploma do sr. deputado, por Porto de Moz, João Antonio de Carvalho, e uma representação da camara municipal de Vianna do Castello, contra a reforma de administração civil, apresentada pelo sr. Mártens Ferrão, e contra as medidas de fazenda.

Annuindo eu ao que n'esta representação se diz contra a reforma administrativa, não annuo comtudo no que toca ás medidas de fazenda apresentadas pelo' sr. ministro da fazenda, porque toda, a camara sabe qual é > a minha opinião a respeito d'ellas.

Eu tinha dito n'uma das sessões passadas, quando fallei sobre uma concessão, no meu modo de ver, illegalmente feita á camara municipal de Aveiro, de um edificio que tinha pertencido á mitra d'aquella cidade, que se o sr. ministro do reino tinha feito aquella concessão fôra por falta de informações, porquanto se lhe constasse que o edificio pertencia á mitra não faria a concessão.

E n'estas circumstancias objectei que, se o negocio tivesse corrido regularmente pelo ministerio da fazenda, de certo não se teria feito a concessão.

Alguns dos meus amigos disseram-me que estas palavras tinham feito má impressão, e que a alguem parecia que eu tinha querido inverter as posições do sr. ministro da fazenda e minha, dizendo que se este negocio tivesse corrido pelo ministerio da fazenda não se teria feito a concessão.

Eu preciso prevenir de que quando fallo n'esta casa não o faço como director dos proprios nacionaes, mas como deputado.

Esta distincção não é tão casuistica que não a tenha feito a lei, que não estabeleceu incompatibilidade entre a minha posição como chefe d'aquella repartição e o logar de deputado.

Tenho pois a liberdade de poder pronunciar aqui a minha opinião como qualquer outro deputado.

E em tal caso o que se devia entender era que as minhas palavras não eram proferidas como director geral dos proprios nacionaes, mas como deputado da nação. E o deputado podia aventar uma idéa ácerca do que aconteceria a este negocio se houvesse sido affecto ao ministerio da fazenda.

A minha idéa não foi inverter as posições, nem collocar-me no logar do sr. ministro da fazenda, mas sim de que a concessão fôra feita por falta de informações, e que se o sr. ministro da fazenda tivesse conhecimento d'este negocio, de certo não teria annuido a elle, por isso que é muito zeloso pelo cumprimento da lei e mantenedor dos ver

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dadeiros principios. E parece-me que, longe de fazer injuria ao nobre ministro da fazenda, eu fazia uma opposição honrosa a seu respeito, dizendo que s. ex.ª era incapaz de subscrever a isso; e que tambem fazia justiça ao sr. ministro do reino, asseverando que s. ex.ª não faria de certo a concessão se soubesse que o edificio era da mitra.

Eu podia acrescentar que era como deputado que fallava, e não como director geral dos proprios nacionaes; mas, ainda que não fosse assim, não fazia injuria nenhuma ao nobre ministro da fazenda se dissesse que ao director dos proprios nacionaes era que, pelo decreto de 10 de novembro de 1849, cumpria decidir a questão, porque o nobre ministro só quando fosse necessario recurso é que podia tomar uma deliberação a esse respeito.

.Mas declaro, e já declarei, que a minha intenção foi fazer sentir que o nobre ministro, quando soubesse a quem pertencia a propriedade do edificio, era incapaz de fazer a concessão, porque era incapaz de faltar á lei.

Dou estas explicações, porque julgo que as minhas palavras foram mal interpretadas. Parecia-me impossivel que as minhas palavras se podessem interpretar n'outro sentido que não fosse o que acabei de indicar á camara; mas quando vi que um jornal que defende a situação, e que é redigido por um amigo meu, não tinha dado ás minhas palavras a mesma interpretação, confesso que me doeu. Não ha paixão politica que possa desculpar o interpretarem se as palavras por um modo differente do que realmente se devem entender, e estranhei que essa injustiça viesse de um amigo.

Não costumo explicar na imprensa as palavras que pronuncio aqui, e por isso as explico sómente perante a camara.

Nada mais tenho a dizer.

O sr. Sampaio: — Creio que entendi as palavras do illustre deputado como toda a camara as entendeu, como as entendeu o sr. ministro do reino, e como não podiam deixar de se entender.

Entendi, embora comprehendesse mal, que as palavras do illustre deputado significavam aquillo que a maior parte dos seus amigos tinham dito que ellas significavam, e que foram interpretadas pela camara como realmente eu as interpretei.

Mas seja qualquer que for o dever da amisade, eu sinto quando o amigo se põe n'uma posição que não diz com o seu talento nem com a mesma lealdade que elle professa, e que realmente é verdadeira.

Pois eu não posso interpretar as palavras de um amigo senão como elle as interpreta?! Creio que o verdadeiro sentido das suas palavras era o que s. ex.ª explicou. Mas nós é que não podemos dar-lhes senão a significação natural.

Entendo que fiz ao illustre deputado a justiça que todos os amigos costumam fazer uns aos outros, porque a amisade não consiste em estar a occultar os defeitos. S. ex.ª não teve consideração nem com o governo nem com os membros da maioria, a quem attribuiu um ministerialismo cego, e isso seria innocente no espirito do illustre deputado, mas não podia deixar de ser para nós offensivo ou pelo menos desagradavel. É por isso que eu julgo que estou sempre no meu direito quando interpreto as palavras dos deputados que aqui fallam; e interpretando as que o illustre deputado pronunciou, parece-me que o fiz de um modo imparcial, e a amisade antiga que tenho para com S. ex.ª me livrava de toda a suspeita de parcialidade.

Nada mais tenho a dizer, porque creio que temos assumptos mais importantes a tratar.

ORDEM DO DIA

CONTINUAÇÃO DA DISCUSSÃO DO PROJECTO DE LEI N.° 24

O sr. J. T. Lobo d'Avila: —...(O sr. deputado não restituiu o seu discurso a tempo de ser publicado n'este logar.)

O orador no fim do seu discurso mandou para a mesa a seguinte

PROPOSTA

Proponho que se adie a votação de novos impostos até que pela discussão do orçamento se cheguem a fazer todas as economias de que for susceptivel a despeza publica, e a apurar o deficit a que indispensavel e impreterivelmente temos de occorrer para entrar no estado normal de equilibrio entre os redditos e os gastos publicos. = Joaquim Thomás Lobo d'Avila.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para a sessão de ámanhã é a continuação da que está dada. Esta levantada a sessão. Eram quatro horas da tarde.

Em cumprimento de resolução da camara dos senhores deputados publicam-se as seguintes representações

Senhores deputados da nação. — A camara municipal do concelho de Arronches, districto de Portalegre, lendo no Diario de Lisboa' n.° 25, de 1 do corrente, o projecto de administração civil que ante vós apresentou o ex.mo ministro dos negocios do reino, viu com profundo sentimento, em virtude das suas disposições, a suppressão do seu districto, além de outros, e com elles a suppressão de todos os seus concelhos, cuja area não comprehenda pelo menos 5:000 fogos; e como o concelho que esta camara representa os não tem, decretada esta, a titulo de economias, a sua morte politica, pela approvação do referido projecto.

Comquanto esta camara esteja assás convencida que medidas de tão alta transcendencia, como as que contém aquelle projecto, não devem ser submettidas á vossa approvação sem um maduro e reflectido estudo e accordo da maioria dos representantes do povo, tem comtudo obrigações a cumprir, não só para com os seus administrados, mas tambem para desempenho de suas proprias convicções; acha entre ellas o dever de ouvir ai queixas que todos os habitantes d'este concelho fazem, ao saberem que a autonomia do concelho e districto se acha ameaçada por aquelle projecto, e de representar perante a representação nacional a inconveniencia de taes medidas; por isso a camara municipal do concelho de Arronches, por si e em nome dos cidadãos que representa, vem ante vós pedir a conservação da autonomia d'este districto e do seu concelho; porque vivendo este na sua maior parte dos rendimentos dos bens do logradouro commum do povo, paga em dia as contribuições publicas, e nada deve nem ao estado, nem áquelles que têem vencimento pelo cofre do municipio, sem que para satisfazer seus encargos tenha de lançar mão de impostos sempre gravosos ao povo.

Senhores deputados, para que as reformas, quando apresentadas em tão larga escala, com caracter de economicas, produziram seus salutares effeitos, é mister que estas se confrontem com os sacrificios que em face d'ellas os povos podem soffrer, e se d'esses sacrificios ha vantagens emergentes que os compensem, mas no projecto que ora se vos propõe, á vossa approvação vantagens não as ha, bem pelo contrario penosos sacrificios, quando os habitantes d'este concelho forem chamados para desempenho das funcções publicas, ou para seus particulares interesses, tendo de atravessar distancias, nunca menores a 20 kilometros, sem um bocado de boa estrada, sem pontes, mas de pessimos caminhos, cortados de cautelosas ribeiras, em que mais de uma vez tem perigado a vida do cidadão; além d'isto, do projecto se conhece, que cada districto tem de satisfazer os seus encargos proprios e o povo pede que se conceba a autonomia do districto e seu concelho sujeitando-se aos onus que resultem, que rasão plausivel haverá, para lhe denegar de ferimento favoravel a seu justo pedido?

A camara municipal do concelho de Arronches faz suas as rasões apresentadas pela camara municipal de Portalegre, quando com outras d'este districto se apresentaram ao ex.mo ministro do reino, pedindo a conservação do districto, e se acham transcriptas no periodico a Nação de 7 do corrente, sob n.° 5:722; faz sua a representação que a mesma camara vos dirige, pedindo a autonomia administrativa d'este districto, e pede-vos, senhores, que conserveis este concelho, que tendo vida, e deixando de o ser, estará dentro em pouco reduzido ao miseravel estado dos que supprimidos foram, como o justificara o de Alegrete, Alpalhão, Cabeço de Vide e Veiros; sendo um acto de justiça que vós rejeiteis tal projecto que não podemos considerar economico e sim vexatorio na commodidade dos povos quando supprimidas sejam os sédes dos concelhos, como na actualidade se acha projectado.

Sala das sessões da camara municipal do concelho de Arronches, 16 de fevereiro de 1867. = O presidente, Joaquim Felizardo da Cunha Osorio = O vice presidente, Francisco de Pina Gouveia = O vereador, Francisco José Marques da Ponte = O vereador, José de Andrade = O vereador, Manuel Martins Dias Rombo = O escrivão da camara, Belchior Pereira Curvo.

Senhores deputados da nação portugueza. — A camara municipal do concelho da Moita, prevendo as desagradaveis consequencias que ao seu concelho resultariam, se por fatalidade fosse levado a effeito o projecto da circumscripção administrativa, apresentado ultimamente na vossa camara pelo ex.mo sr. ministro e secretario d'estado dos negocios do reino, publicado nas folhas officiaes do governo n.ºs 27, 28 e 29, de 4, 5 e 6 de fevereiro corrente, vem mui respeitosamente reclamar que por fórma alguma seja effectuada a referida circumscripção na parte que lhe diz respeito.

Para fundamento de tão justa pretensão ousa a camara, abaixo assignada, submetter ao vosso esclarecido juizo as seguintes considerações:

A villa da Moita, pela sua posição central, é e sempre foi considerada d'entre a maior parte das do sul do Tejo, o mais importante centro de actividade.

Unida no seu estado primitivo á antiquissima villa de Alhos Vedros, anciosa viu esta, que era séde do concelho, o desenvolvimento d'aquella, para lhe obter a separação, e faze-la per si só constituir o novo termo, que lhe foi concedido por carta regia de 14 de abril de 1693.

Sendo-lhe mais tarde reconhecida a sua importancia, obteve-se-lhe em 1759 a categoria de cabeça de comarca, com residencia ordinaria dos juizes de fóra. De então até hoje o seu desenvolvimento real e moral tem subido de ponto, porque se antes de a enriquecerem com o caminho de ferro que lhe passa pelo extremo sul era o grande centro que fazia communicar o alto e baixo Alemtejo com Lisboa, hoje, depois d'esta maravilhosa innovação, vê augmentar progressivamente o seu commercio e agricultura, porque da facilidade de communicação resulta serem transportados os generos commerciaes e agricolas, e importados os indispensaveis ao abastecimento dos seus povos.

Se é facto que os poderes publicos, menos bem informados, supprimiram por vezes a esta importante villa o seu concelho, tambem é facto que as serias reconsiderações a que o conhecimento dos maus resultados d'essas alterações os levou, fizeram com que o mesmo concelho fosse emancipado, o que se evidenceia da publicação da carta de lei de 18 de setembro de 1861.

Até á data da sua ultima suppressão e annexação ao Barreiro, que se lhe fez em outubro de 1855, tudo era vida, animação, desenvolvimento, riqueza! Da suppressão até á emancipação, tudo eram trevas, pobreza, desolação e miseria!

D'aqui veiu que a sua importancia real e moral foi extremamente abatida! Os povos tornaram-se inertes, um estado de abatimento moral lhes entorpecia admiravelmente as faculdades, o valor das propriedades foi reduzido a um;

ponto aterrador, a instrucção publica descurada, as obras publicas municipaes destruidas, e a viação publica reduzida a immundos lodaçaes!

Restituído, como se disse, o seu concelho, a grande desharmonia e descontentamento dos povos desappareceu, as obras publicas municipaes executaram se em larga escala, a policia municipal e a instrucção, foram reformadas, successivas reparações abrigaram os transeuntes de innumeros perigos, os caminhos tornaram-se accessiveis, a propriedade triplicou o seu valor, e finalmente a desolução foi substituida pelo contentamento de todos, porque viam prosperar a sua localidade sem gravames ou despeitos que de alguma fórma lhes alterasse para menos o que possuiam.

Levada a effeito a circumscripção projectada, que de horrores teriamos a observar! O quadro de desolação a que a sua execução levaria os povos seria o mais lastimoso possivel! Centenares de familias se veriam pela falta de recursos reduzidas á mais extrema e vergonhosa mendicidade; muitas terras hoje importantes, ver-se-iam rebaixadas ás condições das mais insignificantes aldeias; o tempo, esse precioso manancial de riquezas, necessariamente teria de ser por muitas vezes desperdiçado, porque milhares de pessoas teriam diariamente de percorrer longitudes consideraveis, para nas qualidades de auctoridades, louvados e testemunhas, comparecerem nas sédes dos concelhos!

O concelho da Moita, no estado em que ora Se acha, composto das freguezias de S. Lourenço de Alhos Vedros e da de Nossa Senhora da Boa Viagem, aquella com 498 fogos e esta com 1:047, total 1:545 fogos, com 4:427 almas, com 2:600$000 réis de receita obrigatoria, susceptivel de augmento, que bem chegam para todas as suas despezas e encargos, póde subsistir como concelho independente, não carecendo de nenhum auxilio estranho. Tem para si o necessario, e por isso só reclama o que é justo; não pretende arrogar a si o que é dos outros, mas tambem não póde nem deve a elles pertencer; quer para si e para os outros a liberdade que nos campos de Ourique foi pelo fundador da monarchia conquistada para todo o seu povo.

Em vista pois dos motivos acima expostos, a camara municipal do concelho da Moita, vem muito respeitosamente pedir-vos que não seja realisada a projectada circumscripção administrativa no sentido exarado no respeitabilissimo relatorio, e quando o seja, que tendo-se em consideração a disposição do artigo 6.°, capitulo 1.° do citado relatorio, se lhe conserve o seu concelho na parte municipal — Pede a V." ex.ªs se dignem attender ao que a camara na qualidade de representante dos' seus municipes, humildemente supplica — E. R. M.

Moita, em sessão de 26 de fevereiro de 1867. = = O presidente, Theodoro da Costa Affonso = Os vereadores, Antonio José de Almeida = Manuel Carvalho = Manuel Antonio Livorio = Antonio José Peraral = O escrivão, Domingos Antonio Soeiro.

Reconheço os signaes retro e supra por serem dos proprios. — Moita, 1 de março de 1867. = Em testemunho de verdade. = O tabellião, José Augusto de Antas Barbosa.

Senhores deputados da nação portugueza. — A camara municipal de Souzel, expressando a opinião e sentimento dos povos que representa, vem perante o poder legislativo unir o seu voto ao dos outros concelhos do districto de Portalegre, que com a camara do concelho capital d'elle já representaram contra a proposta de administração civil, na parte em que a julgam, pela suppressão dos municipios e districto, lesiva, inconveniente e oppressiva.

E assim procedem camaras e povos, não porque ignorem que o seu voto no parlamento é o voto do seu deputado ás côrtes, ou porque não tenham a convicta certeza de que este sabe apreciar os interesses e conveniencias dos seus constituintes e saberá defende-las e sustenta las no seio da representação nacional; mas porque vagando certas idéas de menosprezo pela opinião popular, que se tem como nulla, e manifestando-se certas tendencias de exclusiva centralisação politica, é hoje mais que nunca necessario aos povos mostrar que não são a massa inerte, molle e indifferente que os reformadores julgam poder vasar, sem escrupulos nem attenções, nos moldes de suas concepções abstractas, convencidos, á força de fallar na falta de instrucção popular, que é ella tal, que nem resta ao povo, completamente embrutecido, o bom senso natural, nem o salutar instincto da propria conservação.

Como simples, pura e permittida manifestação de voto, não carece esta representação de repetir as ponderosas rasões que o motivam, as quaes a camara e povo de Portalegre já expressaram em suas representações, e que a sabedoria dos legisladores portuguezes ha de certo justamente aquilatar.

E só acrescentará a camara, que sendo por conveniencia propria indifferente a este concelho ter por capital do districto Evora ou Portalegre, achando-se, como se acha, a igual distancia e em iguaes condições de transito, tanto de uma como de outra cidade, o seu voto é puramente filho do sentimento natural do justo, pelo conhecimento da rasão que assiste em sua pretensão aos outros concelhos do districto.

E convencida a camara de que na epocha actual os governos se fazem para os povos e não estes para aquelles, crê e espera que os legisladores nacionaes lhe relevarão e aceitarão a manifestação de voto, dando nas leis que fizerem a cada fracção de povo, o que mais lhe convenha, sem impor modificações incommodas e prejudiciaes para algumas, em nome de uma unidade de systema, que não póde ter as honras de lei suprema, e que seria ou a tyrannia dos principios ou o sacrificio inutil e dispensavel da minoria á maioria.

Souzel, sala das sessões da camara municipal, 7 de março

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de 1867. = O presidente, Antonio Calça e Pina Barreiros Godinho = O vice-presidente, José Maria do Carmo = O fiscal, José Roque = O vogal, Joaquim Francisco de Matos Zagallo = O vogal, João Dordio Paes.

Senhores deputados da nação portugueza. — Os cidadãos abaixo assignados, habitantes do concelho de Guimarães, affectados sobre modo pelas propostas de fazenda, de administração e guarda civil apresentadas á camara dos senhores deputados pelos respectivos ministros e secretarios d'estado, applaudem e espontaneamente adherem á representação que contra esses projectos fizeram os habitantes da cidade de Lisboa, pedindo-vos que os não approveis emquanto se não fizerem as necessarias reducções nas despezas inuteis que pejam o orçamento. — E. R. M.

(Seguem-se 958 assignaturas.)

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