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1815

DIARIO DA CAMARA DOS SENHORES DEPUTADOS

Proposta de lei apresentada pelo sr. ministro dos negocios estrangeiros em sessão de 17 de maio,

e que devia ler-se a pag. 1798

Proposta de lei n.º 126-H '

Senhores. — Teve origem na questão suscitada entre o governo portuguez e o governo britannico, a respeito dos privilegios de Surrate, a convenção que hoje venho submetter á vossa approvação.

Permitti-me que recorde em breves palavras o que foi ¦ a questão de Surrate, de que no Livro branco de 1876 dei larga conta ao parlamento e ao paiz.

Por concessão do Grão-Mogol, dada n'um firmão do principio do seculo xvIII, tinham os portuguezes o privilegio de pagarem pelas suas mercadorias na feitoria de Surrate, 21/2 por cento, quer na importação quer na exportação. Analogo privilegio gosavam hollandezes e inglezes desde o seculo anterior.

Quando em 1800 foi Surrate cedida aos inglezes pelo imperador do Delhi, o governador de Bombaim, n'um regimento pouco depois publicado, confirmou o nosso privilegio.

Entre difficuldades e embaraços de diversas ordens, o, necessario é dizel-o, com modificações importantes, manteve-se o antigo firmão até 1870.....

O sal e o opio, por exemplo, deixaram de comprehender-se nas mercadorias a que o privilegio se devia applicar, por serem mercadorias de que o governo inglez se reservou o monopolio. Attenta esta circumstancia, o governo portuguez não fez nenhuma reclamação atai respeito, apesar de ficar assim notavelmente modificado o primitivo firmão.

Em 1870 notaveis abusos tentaram acobertar-se á sombra do privilegio existente na feitoria portugueza de Surrate.

Um systema de transacções fraudulentas sé estabeleceu em Damão, principalmente sobre liquidos alcoólicos.

Negociantes inglezes depositavam mercadorias na alfandega de Damão; ahi faziam uma venda simulada a portuguezes, para depois as introduzirem no mercado inglez pela feitoria de Surrate.

O governador geral da índia, com approvação do governo, tomou promptas medidas para reprimir tão indesculpavel abuso; abuso tanto maior, quanto os liquidos alcoolicos estão na índia britannica sujeitos a um imposto elevado de excise.

Os espiritos importados pela feitoria portugueza pagavam 2 1/2 por cento ad valorem, emquanto que os importados directamente por mar em territorio britannico pagavam 3 rupias por gallão de espirito de prova. Assim eram defraudados os rendimentos publicos na índia ingleza, e prejudicado o commercio licito.

Como se vê de um documento emanado de secretaria d'estado dá índia britannica, o valor do vinho e bebidas alcoolicas importadas por Surrate em 1870-1871, foi de rupias 54,017, e a perda de direitos para o fisco inglez foi de rupias 29,432; o valor das mesmas mercadorias importadas pela feitoria em 1871-1872 foi de rupias 6,54,196, e a perda do fisco de rupias 2,83,719.

Nos tres mezes que precederam; a suspensão do privilegio da feitoria portugueza, o valor da importação attingiu a somma de rupias 7,22,586, o q desfalque dos direitos attingiu a somma de rupias 2,96,262.

Foi n'estas circumstancias que o governador dá índia britannica, por uma notificação publicada na 'Gazela official de 26 de julho de 1872, e communicada ao governador geral da índia portugueza em 30 do mesmo mez, suspendeu o firmão que concedia o privilegio da feitoria de Surrate emquanto á importação; uma resolução posterior suspendeu pára todos os fins o mesmo privilegio.

Reclamámos nós contra o acto do governador geral dá India ingleza, que nos privou do uso de um privilégio, concedido por um tirmão soberano em Surrate, e reconhecido pela auctoridade ingleza, quando adquiriu á posse d'esse territorio. Era um direito legitimo que tinhamos, e de que não podiamos ser, esbulhados por uma simples resolução da auctoridade ingleza;

Só uma, convenção internacional devia pôr termo a uni estado de cousas que tinha tal origem, e que interessava simultaneamente aos dois governos.

Verdade é que o commercio licito, pouco ou quasi nenhum proveito tinha tirado do privilegio da feitoria de Surrate, no presente seculo, havendo annos em que esse commercio subiu apenas a rupias 641, e a vantagem resultante do privilegio a rupias 12; e outros annos, os de maior actividade, em que attingiu ò commercio um valor de rupias 6,450, e a vantagem do privilegio apenas foi, em media, de rupias 475.

Não era a questão d'aquellas que devem, sequer, entibiar as relações, entre duas nações intimamente unidas por laços de velha alliança e amisade; mas era indispensavel dar-lhe uma solução regular, o desde a sua primeira reclamação, ao governo britannico, o governo portuguez propoz que se abrisse uma negociação para dar á questão uma solução, nos limites do justo e no interesse reciproco das duas nações.

Allegou o governo britannico que o privilegio da feitoria portugueza, ampliado como estava pelo uso illegitimo que d'elle se fizera, prejudicava o fisco e dava aos negociantes portuguezes. Vantagens dê que não gosavam os negociantes inglezes. Demais, o firmão, sendo uma simples concessão do imperador de Delhi, era de sua natureza revogável.

Proseguiram as negociações, como se vê pelos documentos publicados em 1876, indicando, nós sempre a conveniencia de pôr termo á questão por meio de uma combinação que salvaguardasse a nossa dignidade, e melhorasse quanto possivel as relações economicas entre os estados das duas coroas na índia.....

Esta indicação foi bem acolhida por lord Derby e pelo governo inglez; e, sem apresentar proposta alguma, por lhe parecer inopportuna, o governo de sua Magestade insinuou a conveniencia de que o governo de Sua Magestade Britannica formulasse elle a proposta que julgasse mais conciliadora e equitativa.

Dando cortez satisfação pelo procedimento das auctoridades inglezas na índia, o governo britannico declarou que desejava proceder n’esta questão com espirito franco e amigavel, é fazer quanto podesse pára promover as cordeaes relações que existem entre os dois governos, relações que não só se empenha em manter, mas tambem em ampliar.

Era 1875 lord Lytton, então ministro Ide Sua Magestade Britannica em Lisboa, e hoje vice rei na índia, exprimiu-me verbalmente o desejo do seu governo de entrar n'uma negociação a fim de regular as questões pendentes, particularmente a de Surrate, ê de harmonisar os interesses economicos e commerciaes dos dois estados nas suas respectivas possessões indianas.

Julguei opportuno manifestar-lhe o meu desejo de que uma tal negociação se realisasse, para pôr um termo á pendencia sobre a feitoria portugueza em Surrate; pára estreitar as relações commerciaes entre a índia portugueza e a índia ingleza, supprimindo as barreiras que as embaraçavam; para tornar mais intima a alliança e accordo entre 'as duas nações amigas; e, emfim, cousa da maxima importancia ha minha opinião, pára os dois governos accordarem nos meios dê unir á rede dós caminhos de ferro indo-britannicos os mercados portuguezes é principalmente o importante porto de Mormugão.

Lord Lytton deu-me n’essa occasião as mais positivas seguranças de que o governo de Sua Magestade Britannica 'tomaria1 esta negociação na mais séria attenção, e poria por sua parte todo o empenho em satisfazer os desejos do governo dê Sua Magestade Fidelissima.

Em hota de 23 de novembro de 1875 communicou-me o ministro de Inglaterra, que ia partir pára a India sir Luiz

Sessão de 19 de maio de 1879