1826
Parece-me que isto póde ir prejudicar a questão, e trazer complicações para a execução d'este projecto.
Por este modo as juntas de parochia e as camaras municipaes virão despojar de certos logradouros os povos que estão costumados a elles.
Eu queria portanto que esta disposição se realisasse só d'aquelles concelhos aonde não houvesse outros terrenos pertencentes ás camaras de que ellas podessem lançar mão.
Não me opponho á concessão, mas desejava, como digo, que nos concelhos aonde houvesse terrenos baldios, que não servissem de logradouro commum, se applicassem esses terrenos para as escolas, e não se fosse buscar para esse fim o logradouro commum.
Quando se tratar da especialidade, faço tenção de apresentar uma moção de ordem n'este sentido, para que, no caso de as juntas de parochia e camaras municipaes terem outros terrenos que não sejam logradouro commum, será o seu producto preferido para a edificação das escolas.
Tambem tenho a fazer algumas observações ao artigo 8.º, porque me parece que os vencimentos que actualmente percebem os professores de latim não é sufficiente para remunerar bons professores.
N'esta parte sou mais ministerial do que. o sr. ministro do reino. Estou persuadido de que s. ex.ª não achará professor algum que, com o ordenado de 200$000 réis, se preste a ensinar latim, inglez, francez, e ao mesmo tempo principios de administração ou qualquer das outras doutrinas de que resa o artigo 8.º E se s. ex.ª quizer impor ás camaras municipaes a responsabilidade de darem mais réis 50$000, assim mesmo convenço-me de que será muito difficil achar professores habilitados que queiram subordinar-se a tão pequena quantia.
(Interrupção.)
Essa gratificação é para outra cousa; tem outra applicação.
Não ha nenhum homem, que tenha certos conhecimentos, que queira ir ensinar latim, ou qualquer das doutrinas apontadas n'este projecto, pela quantia de 250$000 réis.
N'esta parte ainda sou mais ministerial do que o sr. ministro, porque quero que s. ex.ª fique auctorisado a augmentar os vencimentos aos professores para poderem bem ensinar.
Póde haver muito quem queira ensinar latim e principios de administração por 250$000 réis, mas quem esteja bem habilitado, de certo não. Repito, sou muito mais ministerial do que o sr. ministro, porque quero que fique auctorisado a augmentar os vencimentos como julgar conveniente.
Por agora não tenho mais reflexões a fazer. Quando se tratar da especialidade eu mandarei as propostas convenientes.
O sr. Ministro do Reino: — Direi poucas palavras em resposta a algumas observações que foram feitas pelos illustres deputados e meus amigos que encetaram o debate. Ss. ex.ªs não combateram o projecto; pelo contrario as suas reflexões foram para melhor desenvolvimento e aperfeiçoamento d'elle. Não tenho por isso que sustentar em geral o pensamento do projecto.
O pensamento d'elle é completar certa ordem de auctorisações que o governo já tem em leis vigentes, e com faculdades que são aqui concedidas para poder realisar melhoramentos e reformas na instrucção primaria, ou popular verdadeiramente, o que sem estas disposições não poderia conseguir.
O illustre deputado e meu amigo que primeiro fallou, o sr. Antonio Cabral de Sá Nogueira, teve duvidas com referencia a um artigo, mas um áparte meu fez com que desapparecessem essas duvidas.
S. ex.ª perguntou o que era que se entendia por terrenos accessorios. É claro que são os terrenos indispensaveis a uma escola; pateos, pequenos jardins, todos estes pequenos elementos que se encontram na escola-modelo para uma boa ventilação, e haver espaço para os exercicios indispensaveis ás creanças, mas isto tudo sem grande luxo de architectura.
No ministerio do reino existem plantas e modelos a esse respeito, e economicos todos, para se poder satisfazer ás indicações exigidas em escolas d'esta ordem.
Notou s. ex.ª que se não faça distincção das escolas das aldeias e villas.
Este projecto não é um projecto geral de instrucção primaria; e por consequencia aceito o que está no decreto com força de lei de 20 de julho de 1844. Ahi estão as bases em relação a essas differentes ordens de escolas. Num projecto geral de instrucção primaria, onde as disposições do decreto de 20 de julho de 1844 sejam refundidas e ampliadas, emfim postas de maneira que acompanhem o desenvolvimento que actualmente se encontra em assumpto d'esta ordem, essa materia deve ser tratada minuciosamente.
Na actualidade não se trata de reformar o que se encontra n'esse decreto.
No artigo 2.º notou s. ex.ª referindo-se á desamortisação, que se desse uma auctorisação ás juntas de parochia e municipios para venderem das inscripções, em que tiverem convertido os seus bens proprios, as sommas necessarias para a creação de escolas.
Diz s. ex.ª que seria conveniente que esta auctorisação viesse tambem na lei, mas não está expressa na lei, porque ella existe incontestavelmente no codigo administrativo, que determina que os municipios, com a approvação do conselho de districto, possam vender os seus bens proprios para os fins approvados em conselho.
Como esta lei não é uma lei organica de administração, sem que se comprehendam as disposições que se acham avulsas em outras leis, parece-me que não era necessario trazer aqui uma disposição sobre a qual não ha duvida alguma, porque todos os dias se estão praticando factos d'esta ordem.
S. ex.ª fallou tambem n'um plano geral de escolas. Effectivamente o artigo 7.º da lei refere-se a um plano geral de escolas, que o governo fica auctorisado a estabelecer, e n'essa auctorisação não poderá o governo deixar de ter em toda a consideração as reflexões feitas pelo illustre deputado, porque são todas sensatas e nascidas do profundo conhecimento que s. ex.ª tem do modo por que este serviço se costuma fazer; sendo certo comtudo que não se póde estabelecer um piano unico de edificações para todas as localidades, porque essas edificações hão de ser accommodadas ás populações, ás condições atmosphericas das diversas provincias, e emfim a qualquer ordem de condições a que seja necessario attender.
S. ex.ª entende que no artigo 8.º o governo deve ficar com uma auctorisação mais ampla do que a que pede, a fim de que se ensinem tambem em algumas das escolas os principios das sciencias physicas nas suas diversas applicações.
Eu creio que na disposição do artigo 8.º está comprehendida a parte das sciencias naturaes, que são necessarias para este assumpto, porque elle tende a ampliar o ensino dos principios geraes de administração publica, de economia politica ou de economia rural ou industrial, e n'isto estão comprehendidos os principios das sciencias physicas.
No entanto, se a camara quizer votar uma auctorisação mais ampla, mais latitude fica ao governo, devendo porém notar ao illustre deputado que, a respeito das escolas d'esta ordem, já o governo, pelo decreto de 1844, tem auctorisação para a sua creação em alguns pontos do reino.
Eu entendo que no artigo 8.º está comprehendida a faculdade para o ensino dos principios que o illustre deputado exige, e portanto não obstante não me opponho a que se torne mais claro o pensamento da lei.
E em relação ao artigo 8.º notou tambem o meu amigo o sr. Quaresma que era pequeno o vencimento de 200$000 réis para o ensino a que elle se refere.
Eu entendi que não devia, nas alturas em que está a sessão, pedir auctorisação para novas despezas, e referi-me á verba que o governo tem no orçamento, nascida do decreto de 1844.
Parece-me que 200$000 réis são sufficientes para escolas d'esta ordem, contando com o concurso dos municipios e dos districtos; concurso sem ser obrigatorio, porque eu creio que a boa direcção superior da administração ha de levar os municipios e os districtos a receberem com enthusiasmo a creação d'estas escolas e a dota-las não com mais 20$000 réis, como até aqui, mas com sommas maiores. A acção da auctoridade administrativa póde fazer muito, e eu creio que junta com ella a verba que havia é bastante para ensaiar este novo ensino.
É certo que nós carecemos de outro ponto, que é da creação de compendios elementares para este assumpto. Para isto está o governo auctorisado pelo decreto de 1844, e de passagem direi que esse decreto tem principios muito luminosos e importantes em administração a este respeito. N'esse decreto tem o governo a faculdade de dar premios aos melhores livros, que appareçam para os estudos decretados n'esse mesmo decreto com força de lei. Portanto uma das cousas que ha de prender immediatamente a attenção do governo, é a organisação dos livros elementares para o estabelecimento d'este ensino, porque o que é verdade é que não se encontram desde logo, nem os livros apropriados, nem tambem o pessoal necessario e disposto para realisar convenientemente o pensamento do governo.
Entretanto, tendo o governo esta faculdade, e tendo por outro lado á faculdade de organisar e determinar a ordem de estudos que se podem ensinar na escola normal que ternos junto a Lisboa, creio que fica tudo providenciado, porque o illustre deputado sabe que na escola normal ha 1.º e. 2.º grau de estudos, e é este 2.º grau o que trata do ensino das disciplinas necessarias para habilitar professores para o ensino determinado n'este artigo 8.º Assim tirâmos logo uma vantagem immediata, e damos importancia áquella escola que está um pouco decahida, por uma rasão independente da vontade do governo; mas o que é certo é que os professores são ali mal retribuidos, e por consequencia difficilmente se alcança que um alumno, depois de dado por prompto, queira ali ficar exercendo o magisterio: é por esta rasão que não se encontrarão desde logo professores habilitados, mas este systema deve mudar, porque aquella escola não deve servir para habilitar uma outra ordem de funccionarios.
Os governos são sempre faceis em aceitar auctorisações, e se o illustre deputado quizer tornar mais ampla esta auctorisação, e a camara approvar essa proposta, eu não tenho duvida em aceitar esta auctorisação mais ampla do que o governo a pede.
Não digo mais nada, porque o adiantado da sessão insta, e eu tenho muito a peito a votação d'este projecto, que reputo de grande importancia para a instrucção publica.
Vozes: — Muito bem.
(S. ex.ª não reviu o seu discurso.)
O sr. Bivar: — Mando para a mesa um parecer da commissão de fazenda.
O sr. Cunha de Barbosa: — Agrada-me o pensamento d'este projecto de lei, e não posso deixar de o approvar como tendente a realisar uma grande aspiração que creio que toda esta camara nutre. Com este projecto creio que conseguimos já alguns dos beneficios da grande reforma que o sr. ministro do reino nos prometteu trazer em janeiro proximo, tudo combinado com o decreto de 20 de setembro de 1844, que n'esta parte me parece um pouco deficiente. Eu não posso acrescentar cousa alguma aos dois luminosos relatorios, do sr. ministro do reino e da illustre commissão de instrucção publica, e peccando por esse lado, não quero ao menos peccar por falta de laconismo. Portanto limito-me ao que deixo dito para não abusar da paciencia da camara.
Foi approvado o projecto na generalidade.
Entrou em discussão o Artigo 1.º
O sr. Sá Nogueira: — Este artigo estabelece os meios para facilitar a construcção das escolas de ensino primario. Estamos fazendo o que fez o parlamento escocez ha cento e setenta annos, com a differença que nós apenas o imitamos em uma pequena parte, e deixâmos para mais tarde a outra se acaso se chegar a fazer.
Em 1696 o parlamento escocez determinou, e fallo da Escocia, porque é um dos paizes mais antigos em adiantamento n'este ramo; determinou, digo, que — em cada parochia houvesse uma casa de escola e um mestre, que os proprietarios fossem obrigados a construir escolas e a casa para o professor, e marcou o minimo que os proprietarios eram obrigados a pagar ao professor. Ora este principio é o que devemos adoptar, salvas algumas modificações, porque isto que a muitos parece uma descoberta da Allemanha, e que depois passou para França, não o é; é uma cousa muito mais antiga, como acabo de dizer. Aqui apenas se vae auctorisar a construcção de algumas casas para escolas de instrucção primaria, e nada mais.
Não quero demorar esta discussão, podia fallar largamente sobre este artigo; mas não o farei, porque s. ex.ª o sr. ministro do reino já deu ácerca d'elle as explicações que julgou convenientes, e com as quaes concordo. O que peço a s. ex.ª e á commissão é que tenha a bondade da tornar este artigo bem claro, para não poder haver duvida no futuro, e requeiro que se vote salva a redacção.
Emquanto ao plano das escolas nada mais direi.
O sr. Matos Correia: — Mando para a mesa dois projectos de lei por parte da commissão de fazenda.
O sr. Presidente: — Não ha mais ninguem inscripto, vae votar-se o artigo 1.º
Foi approvado.
Artigo 2.º
O sr. Luciano de Castro: — Pedi a palavra para fazer uma pergunta ao sr. ministro do reino.
Diz o artigo (leu).
Pergunto eu se em virtude da disposição este artigo, as inscripções de que elle trata podem ser vendidas só para este fim, ficando por consequencia cassada a auctorisação que as camaras municipaes já tinham para as poderem vender, como outros quaesquer bens.
Desejava que o sr. ministro me desse algumas explicações a este respeito, para que se fique entendendo qual é a intenção do governo.
O sr. Ministro do Reino: — O artigo 2.º é mais um artigo para tornar claro o pensamento da lei, do que uma nova disposição legislativa.
Effectivamente as camaras municipaes estão auctorisadas a vender os bens immoveis, e é claro que essa auctorisação deve considerar-se que fica subsistindo depois de desamortisados esses bens e convertidos em inscripções. Mas como a desamortisação é uma condição nova em relação á municipalidade, e como se podia entender que a faculdade que têem as camaras municipaes para vender bens proprios lhe provinha da difficuldade do fabrico, cultura, depreciação e outros inconvenientes que acompanham a conservação de bens immoveis em corporações desta ordem, e pôr-se em duvida, se, tirada esta difficuldade, isto é, se depois de trocados os bens immoveis por titulos de divida fundada, as camaras continuavam a ter a faculdade de vender esses titulos (a minha opinião é que continuem), para não haver duvida sobre este ponto, entendi que devia pôr isto claro, de modo que se entendesse bem que as camaras municipaes continuam a ter a mesma auctorisação para vender os titulos de divida fundada que actualmente tem.
E certo que estes titulos passam a ter o caracter de bens immoveis pela disposição da lei, porque os titulos de divida fundada não têem o caracter de bens immoveis, salvo quando a lei lhe dá esse caracter, é certo, mas estes titulos passaram a ter o caracter de bens immoveis pela disposição da lei.
Portanto para tornar mais clara a legislação é que se consignou aqui este artigo.
(S. ex.ª não reviu a sua resposta.)
O sr. Luciano de Castro: — Dou-me por satisfeito com as explicações do sr. ministro; o meu desejo era só que ficasse bem claro e expresso que as camaras municipaes não ficavam prohibidas de vender as inscripções, assim como desejava que ficasse bem expresso que ellas ficavam auctorisadas para as vender não só para este fim, mas para outros. Não tenho mais nada a dizer.
Posto á votação o artigo 2.º, foi approvado.
Art. 3.º
O sr. Sá Nogueira: — Não trato da primeira parte do artigo que concede auctorisação ás juntas de parochia para aforarem ou venderem em hasta publica, precedendo auctorisação do conselho de districto, bens proprios ou baldios de logradouro commum; não trato d'isso, apesar de me parecer que se devia declarar aqui que as camaras municipaes ficavam com igual auctorisação. As camaras municipaes, póde dizer-se que já a tem, mas fallar-se só nas jantas de parochia, póde parecer que ficam privadas as camaras municipaes da mesma auctorisação.
Parecia-me portanto conveniente que se dissesse — as juntas de parochias e as camaras municipaes.
Pedi a palavra principalmente para fallar sobre o plano geral do governo a que se refere este artigo. Eu já disse alguma cousa a este respeito quando fallei sobre a generalidade, mas como v. ex.ª já reconheceu que quando se tratasse do plano geral este fosse applicado a todas as terras do reino, nada mais direi sobre isto, porque estamos de perfeito accordo.
Não posso accusar a commissão nem o governo de ter