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certas circumstancias aproveitar esta occasião para pedir explicações ao governo, nem ha outra occasião de lh'as pedir facilmente; porque annunciam-se interpellações, essas interpellações ficam para quando os srs. ministros se habilitem; amontoam-se, accumulam-se umas sobre as outras, e poucas vezes se verificam, pelo menos não se responde á maior parte dellas.

Eu disse na sessão passada (e peço a attenção do sr. ministro das obras publicas), que havia de pedir contas ao governo sobre despezas e desprezas talvez de centenares de contos de réis, que se fizessem sem auctorisação legal.

A reforma que se fez da repartição das obras publicas (segundo o que se diz, porque eu apenas tenho lido alguma cousa e ainda não estudei a reforma) elevou a despeza a 200:000$000, 300:000$000 ou 400:000$000 réis. Esta reforma não foi confirmada pelas côrtes, como era necessario que o fosse... (Uma voz: — Mas paga se.) Era isso que eu desejava saber, isto é, se o sr. ministro manda fazer o pagamento das gratificações pelo modo por que anteriormente estavam estabelecidas, ou como as estabelece a reforma ultimamente feita.

Nós vemos uma portaria de um sr. ministro, dirigida a um seu empregado subalterno, recommendando-lhe que proponha para um logar vago um dos empregados que estavam fóra do quadro. Isto é justo, é effectivamente uma economia, mas é uma economia de 300$000 ou 400$000 réis; e se por outro lado fecharmos os olhos a despezas de centos de centos de contos que se fazem sem auctorisação legal, perdoe-me a camara a expressão, mas representâmos uma farça.

Queria que o sr. ministro das obras publicas nos desse informações exactas a este respeito, porque as côrtes servem justamente para fiscalisar os dinheiros publicos e a sua legal applicação (apoiados do banco dos srs. ministros). Apoiado! Quando se tratar do contrato do caminho de ferro veremos «se lá vem alguma condiçãosinha pela qual se possam estender os kilometros; veremos isso (riso).

Não quero demorar a discussão. (Uma voz: — Já deu a hora.) Tambem não quero levar a palavra para casa, mas peço ao sr. ministro das obras publicas que nos, dê informações exactas relativamente ás despezas que se estão fazendo com o corpo de engenheiros civis, architectos, conductores, etc... porque comquanto a creação no ministerio das obras publicas fosse muito bem entendida e muito util, é voz publica que ali se fazem despezas e se consome dinheiro immenso sem auctorisação legal. Não sei se isto é assim; o sr. ministro das obras publicas é que nos pôde e deve dar informações, e nós devemos pedir contas a esse respeito, e contas estreitas, porque, já disse, o nosso principal dever é fiscalisar os dinheiros publicos, e ver se têem a applicação legal.

Não quero abusar da paciencia da camara, e agradeço-lhe a bondade com que me escutou.

O sr. Presidente: — A hora deu.

O sr. Ministro da Fazenda: — Eu pedia a v. ex.ª e á camara que me permittissem dizer algumas palavras...

O sr. Faria de Carvalho: — Sendo preciso, eu requeria que se prorogasse a sessão...

Vozes: — Não pôde ser.

O sr. Ministro da Fazenda: — Já não tenho empenho de fallar. O negocio e tão grave que eu peço que me fique reservada a palavra para segunda feira. Não quero contrariar os illustres deputados.

O sr. Presidente: — A ordem do dia para segunda feira é a continuação da que está dada, mais o parecer n.° 10; e se houver tempo entraremos na discussão do projecto n.° 8, sobre a novação do contrato do caminho de ferro do sueste. Está levantada a sessão.

Eram quatro horas da tarde.

Em cumprimento de resolução da camara dos senhores deputados publica-se o seguinte relatorio e proposta de lei

Senhores. — A instituição do jury, que incontestavelmente é uma garantia de acerto nas decisões judiciaes, e que foi um grande melhoramento na administração da justiça, carece, para não desmentir na pratica o seu benefico e civilisador influxo, nem dar rasão ás reiteradas arguições dos seus contradictores, de ser progressivamente melhorada e solicitamente corrigida na sua organisação.

Esta é como todas as humanas instituições. Obedece á lei commum. Não escapa á invasão dos abusos, nem á lenta, mas inevitavel corrupção dos annos. O que de principio fôra acertada innovação e auspicioso melhoramento, descae mais tarde e requer immediato correctivo e saudavel concerto.

Assim é que o jury muitas vezes tem accusado nas suas decisões os defeitos da sua actual organisação. Nem sempre a justiça ha presidido aos seus julgamentos. Fogem por vezes os homens illustrados a fazer parte d'esta magistratura popular, que por gratuita e sujeita a pesado serviço não convida ao seu exercicio, nem attrahe ao desempenho das suas elevadas funcções, e vem o onus de tal encargo a vexar e affligir quasi exclusivamente os cidadãos menos aptos, que na ausencia de escusa legal não podem subtrahir-se á acção das leis.

Daqui provém a defeituosa constituição do jury, e d'esta o erro e desacerto das suas deliberações.

O methodo seguido actualmente no recenseamento do jury é, em meu parecer, uma senão a principal causa da sua defectiva e viciosa organisação.

Segundo a lei de 21 de julho de 1855 ha de o jury ser

composto conjunctamente dos que reunem habilitações litterarias e dos que pagam uma certa contribuição. Esta disposição facilita e promove os inconvenientes que deixo indicados, e que estão reclamando urgente remedio.

Para o exercicio de tão levantadas funcções requer-se principalmente capacidade e illustração. Não é que a probidade e independencia não sejam tambem essenciaes condições para o arduo officio de julgar; mas essas nem sempre andam a par da riqueza, nem dispensam a illustração que allumia o entendimento e ensina á consciencia o caminho da justiça e da verdade.

Por isso na proposta que submetto á vossa consideração se dispõe que o jury seja escolhido com preferencia d'entre aquelles que reunem habilitações litterarias, preenchendo-se o recenseamento da falta d'estes com os que tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, e não chegando ainda a completar se o numero total, com os contribuintes immediatamente inferiores por sua ordem.

Assim o censo só será chamado subsidiariamente ás habilitações litterarias e scientificas.

Exceptua-se d'esta disposição Lisboa, Porto e Coimbra, para não fazer pesar exclusivamente o serviço do jury n'estas cidades sobre os que têem habilitações scientificas e litterarias com grave damno das obrigações e deveres públicos que muitas vezes lhes estão commettidos.

Proponho tambem que em cada comarca haja só um circulo de jurados, e que o recenseamento d'estes seja confiado a uma commissão especial.

Ambas estas disposições devem ser de incontestavel utilidade. Se o maior achaque de que padece actualmente o jury é a falta de illustração e capacidade dos que são chamados a compo-lo, e a difficuldade de conseguir em cada comarca um recenseamento de homens idoneos para exercer as difficeis funcções de julgar, certo é que, havendo em cada comarca mais do que um circulo de jurados, hão de na mesma rasão multiplicar-se as difficuldades e crescer os impedimentos. Por isso a reducção dos circulos de jurados alargando a area da escolha, facilitará o seu recenseamento e contribuirá efficazmente para que em cada comarca sejam chamados ao serviço do jury os mais idoneos e competentes cidadãos. Evita-se assim tambem o mal da impunidade, que será, por muitas vezes, resultante da influencia e affectos que implicam mais estreitas relações locaes.

A idéa de entregar o recenseamento a uma commissão especial, tem por fito evitar qualquer negligencia e desleixo que possa arguir-se na fórma do actual recenseamento. N'esta commissão tomam parte as auctoridades mais directamente empenhadas no cumprimento das leis e na boa constituição do jury.

Igualmente proponho que a pauta seja só de trinta e seis jurados, e que o jury seja composto de nove membros.

Assim reduzida a pauta e o jury, será mais facil o recenseamento e a escolha de pessoas competentes, sem comtudo se prejudicar a acção da justiça, que terá tantas garantias nos julgamentos com nove jurados como até agora tinha nos de doze.

E assim se pouparão a muitos cidadãos inuteis incommodos, e se reduzirão as difficuldades que ora impedem que o jury seja constituido como o requerem os interesses da sociedade e da justiça.

Por outra disposição da proposta, são reduzidas ao numero de tres as recusas sem causa justificada.

Todos sabem quanto no fôro se ha abusado d'esta amplissima faculdade, que de ordinario só serve para escusar os que não poderão obter isenção nem escusa legal, ou para arredar das cadeiras do jury os que ali melhor e mais proficuos serviços poderão prestar.

Por esta providencia será atalhado o abuso sem prejuizo dos justos direitos da accusação e da defeza, que ficam devidamente garantidos.

Outras providencias auxiliares são ainda propostas sobre as escusas e impedimentos dos jurados, com o intuito de evitar a relaxação no cumprimento da lei, e de fazer que a todos alcance igualmente o onus d'este encargo publico. A necessidade d'estas disposições é infelizmente abonada pela frequencia e diuturnidade dos abusos. Com parecerem severas não deixam de ser urgentes. Appello para o testemunho dos factos.

Uma outra providencia, que tenho por de grande conveniencia, vae ainda incluida n'esta proposta de lei. E a que, em casos excepcionaes, sob proposta do juiz de direito e delegado, auctorisa o supremo tribunal de justiça, depois de previa informação dos respectivos presidentes das relações, a determinar que a pauta do jury seja formada dos jurados da comarca onde tem de julgar-se o crime, e dos pertencentes ás duas mais vizinhas.

Esta medida pôde excepcionalmente ser reclamada por ponderosas considerações de interesse publico. Criminosos ha que, pela sua influencia e poder n'uma comarca, podem fazer violencia no animo dos jurados e enfraquecer assim a acção da justiça pela corrupção ou pelo terror. Dilatada a area do jury na extensão de tres comarcas, attenuar-se-hão pelo menos, se de todo não forem reduzidos, esses inconvenientes.

Com este complexo de providencias que todas se coadunam e accordam no mesmo intuito, parece-me que a administração da justiça penal auferirá grandes melhoramentos, e será pelo decorrer do tempo vantajosamente transformada no commum interesse da civilisação e da sociedade.

Tenho fé que não virá o desengano desilludir as esperanças que me animam ao apresentar-vos a seguinte

PROPOSTA DE LEI

Artigo 1.° Em cada comarca haverá sómente um circulo de jurados.

§ 1.° A pauta constará de trinta e seis jurados, e o jury para cada causa se comporá de nove jurados e um substituto, que sómente votará quando durante a discussão se impossibilitar algum dos nove primeiro sorteados.

§ 2.º Sem causa justificada só podem ser recusados tres jurados pela accusação e tres pela defeza.

Art. 2.° Serão recenseados para jurados todos os que tiverem as habilitações litterarias que dispensam a prova do censo nos termos da legislação actual.

§ 1. Quando os jurados assim recenseados não chegarem a cento e vinte, se completará este numero com os que, segundo o artigo 1.° da lei de 21 de julho de 1855, tiverem de renda liquida annual 400$000 réis, e não chegando ainda assim os recenseados a completar a lista, se recensearão os contribuintes immediatos por sua ordem.

§ 2.° Nas comarcas de Lisboa, Porto e Coimbra sessenta jurados serão recenseados dos que tiverem as habilitações litterarias que dispensam do provado censo, e os outros sessenta dos contribuintes na fórma prescripta.

§ 3.° Nas comarcas mencionadas no paragrapho anterior a pauta se formará lançando n'uma uma os nomes dos recenseados com as habilitações litterarias e na outra os dos que o foram como contribuintes; e de cada uma dellas se sortearão dezoito nomes.

Art. 3.° O recenseamento dos jurados será feito por uma commissão a que presidirá o juiz de direito da comarca, e será composta do presidente e vice presidente da commissão de recenseamento do concelho que for sede da comarca, presidente da camara municipal e administrador do concelho.

§ 1.º O recenseamento será notificado a cada um dos jurados nos termos do artigo 8.° da lei de 21 de julho da 1855, e os jurados recenseados allegarão as escusas legaes no praso de oito dias perante a mesma commissão.

A lista geral do recenseamento será publicada nos termos da legislação em vigor, admittindo-se no mesmo praso as reclamações pela exclusão dos individuos que, segundo a presente lei, devem ser recenseados.

§ 2.° Quando algum dos recenseados pretender isentar-se com fundamento no n.° 22.° do artigo 2.° da lei de 21 do julho de 1855, se procederá officiosamente a exame de peritos com assistencia do juiz de direito e delegado do procurador regio, e verificando-se ser falsa a escusa allegada, será condemnado o que a allegou na multa de 10$000 a 50$000 réis, que será cobrada como aquellas que são impostas por falta de comparecimento no jury.

§ 3.° O que allegar a escusa mencionada no paragrapho antecedente, fóra do praso fixado no § 1.°, será condemnado na mesma multa.

§ 4.° Quando algum dos jurados sorteados allegar molestia que o impossibilite de comparecer a todas ou a algumas das assentadas do jury, se procederá do modo prescripto no § 2.°, sempre que for compativel com o serviço do tribunal.

Art. 4.° Se em qualquer comarca, com relação a todos ou algum dos processos crimes a julgar, occorrerem circumstancias que persuadam o juiz de direito e delegado da conveniencia de se formar a pauta do jury de jurados da comarca e dos das duas mais vizinhas, assim o representarão ao presidente do supremo tribunal de justiça, que, depois de ouvir o respectivo presidente da relação, convocará com urgencia o mesmo tribunal em secções reunidas para resolver immediatamente sobre o objecto da representação.

§ 1.º Tendo sido attendida aquella representação, o juiz de direito requisitará das duas comarcas mais proximas os nomes dos doze jurados primeiro sorteados, e estes com os doze primeiro sorteados na comarca onde penderem o processo ou processos a que se refere a mesma auctorisação, formarão a pauta do jury.

§ 2.º Se, passados trinta dias depois que a representação de que trata este artigo tiver sido recebida pelo presidente do supremo tribunal de justiça, não houver sido communicada ao respectivo juiz de direito da comarca resolução sobre o seu objecto, deverá o processo seguir nos termos regulares, segundo a legislação commum.

Art. 5.° Fica revogada a legislação em contrario.

Secretaria d'estado dos negocios ecclesiasticos e de justiça, em 23 de novembro de 1865. = Augusto Cesar Barjona de Freitas.