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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

SESSÃO DE 8 DE FEVEREIRO DE 1848.

Presidiu — O Em.mo e R.mo Sr. Cardeal Patriarcha.

Secretarios, os Srs. Pimentel Freire.

Margiochi.

Aberta a Sessão pela uma hora e um quarto, estando presentes 31 D Pares, foi lida e approvada a Acta da ultima Sessão. — Concorreu o Ministerio todo. Mencionou-se a seguinte

CORRESPONDENCIA.

1.º Um Officio do Ministerio da Marinha e Ultramar, enviando os quesitos, a que por elle competia satisfazer, dos n.ºs 20 a 22, incluidos no requerimento do D. Par Visconde de Fonte Arcada, feito em 31 de Janeiro. (Vid. pag. 112, col. 3.ª)

2.º Outro Officio do Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos e de Justiça, enviando os quesitos 3.°, 10.°, e 18.º, a que tambem lhe competia satisfazer aquelle Requerimento.

O Sr. V. de Fonte Arcada — Eu desejava que o Sr. Secretario me dissesse, se nesses papeis vem o Officio do Commandante do Brigue Audaz, Rodovalho.

O Sr. Secretario Pimentel Freire — Só poderei responder ao D. Par depois de examinar os documentos.

O Sr. V. de Fonte Arcada — Bem: eu não quero tomar o tempo á Camara, e então os examinarei quando puder.

O Sr. Secretario Pimentel Freire — Elles vão para a Secretaria. Agora tenho a participar á Camara, que o Sr. Bispo de Beja, depois de se retirar hontem da Sessão, encarregou-me de eu fazer saber, que o seu máo estado de saude o obrigara a não puder continuar a assistir á mesma Sessão, bem como o não poderei a mais algumas.

Passaram aquelles Officios á Secretaria.

ORDEM DO DIA.

Resposta (1) ao Discurso da Corôa, começada a pag. 112, col. 4.ª, e seguida a pag. 117, col. 4.ª, pag. 128, col. 4.ª, pag. 141, col. 4.ª e 151, col. 2.ª

O Sr. Fonseca Magalhães.... (2)

O Sr. C. do Tojal — Sr. Presidente, eu não tomarei muito tempo á Camara, depois do eloquente discurso que o meu nobre amigo e D. Par Gomes de Castro fez, principalmente sobre materia de finanças, e porque seria abusar muito da paciencia da Camara.

O D. Par que me precedeu, tornou a repetir as mesmas accusações que já se tinham proferido contra o Ministerio, de que eu fiz parte, relativamente o ter-se onerado o Thesouro Publico com antecipações na importancia de 7.000:000$000. Sr. Presidente, é muito instar, é muito repetir sobre uma circumstancia, que tanto a mim, como ao meu nobre amigo e collega o Sr. Gomes de Castro, nos pareceu tinhamos dado cabaes explicações; mas a Camara não ha de permittir, que estas impressões, que ficam no espirito do publico que as ouve, deixem de ter nova explicação, a fim de destruir todas essas inculcadas malversações.

Sr. Presidente, triste é a sorte de um Ministro da Fazenda em Portugal! elle é victima expiatoria de todas as Administrações, de todos os inconvenientes, e de todas as desvantagens que resultam, ainda que apparentemente, á sociedade! Se elle não paga é um sendeiro, um mero procurador, e administrador que reparte aquillo que recebe, não tendo um pensamento, um recurso financeiro, finalmente que não presta para nada! se paga é um dessipador, antecipador, um estravagante, e que destroe os rendimentos do Estado, e tambem não presta para nada: difficil é, Sr. Presidente, achar um que se diga — presta. Eu sinto immenso ter sido Ministro da Fazenda em Portugal, onde trabalhei sempre com o maior desejo e assiduidade, abandonando até os meus proprios negocios, e sempre em scena com o fim de poder melhorar o estado da nossa Fazenda Publica, porque lisongeio-me de estar perfeitamente identificado com o bem, e prosperidade do meu paiz.

Disse-se que o Governo deixára 6 mezes de atraso, e eu vou explicar este ponto de accusação em poucas palavras. O Governo, de que eu fiz parte, entrou em 20 de Fevereiro de 1842, e sahiu em 20 de Maio de 1846: quantos mezes comprehende este periodo? 51 mezes; e quantos mezes destes 51 pagou o Governo? Eu appello para a honra do D. Par, que veja pela sua conta, que como membro do Conselho de Estado havia receber 48, o que encontrará nos seus assentos. (O Sr. Fonseca Magalhães — Não tenho.) Não tem? Pois deve ter um livro de caixa. Ora, o Governo apenas deixou de pagar 3 mezes, que foram Maio a Julho de 1844, e o ultimo mez da sua sahida, e pagou sempre um mez em cada 30 dias.

Mas, Sr. Presidente, aqui estava agora o Sr. Avila, que acaba de se retirar, o qual ha de estar lembrado, de quando em 1844 se ponderou na Camara dos Srs. Deputados, que era muito improprio que a Junta do Credito Publico administrasse rendimentos, isto é, que a sua dotação se compozesse de rendimentos administrativos. O Sr. Deputado dirigiu-se a mim, allegando a necessidade que havia, de transferir para a Junta do Credito Publico, em troca dessa sua dotação, o producto de rendimentos directos, porque a Junta do Credito ganharia com isso, e não andariam os seus dividendos como andavam, 6 mezes atrasados; mas eu, como reconhecesse a grande importancia do credito annuí, e annuí contra a opinião de alguns dos meus collegas, e por essa transição cedeu-se á Junta do Credito Publico 5:300$000 réis por dia, dos rendimentos das Alfandegas, e todo o rendimento do Contracto do Tabaco, á excepção de muito pouco, e transferindo-se para o Governo todos os rendimentos directos; e daqui veio a necessidade do Governo augmentar a cifra das contribuições directas, por isso que lhe não ficavam mais, do que uns mesquinhos sobejos das Alfandegas, e as mal lançadas, e mal arrecadadas contribuições directas. Sr. Presidente, é facil fazer accusações; mas eu desejava que esses que as fazem, passassem pela fieira pela qual passa um Ministro da Fazenda. Ora, além da dotação da Junta do Credito Publico na importancia de 3:200$000, deve contemplar-se a despeza mensal que se faz com quantia inferior a 600:000$000, isto é, 7:200$ a 7:500$000 pelo que temos que em 4 annos e 3 mezes que aquelle Governo durou, pagou pelo menos 32,000:000$, não comprehendendo o que se pagou pela mesma Junta aos compradores da divida publica, o que tudo foi neste periodo satisfeito em moeda forte.

Mas, Sr. Presidente, fallando dos 7.000:000$ de anticipações, já aqui se disse, que o Governo foi em 1844 authorisado pelas Côrtes, a levantar 2.000:000$000, e que podia ter levantado quaesquer emprestimos de outra maneira, que não fossem dependentes dos rendimentos publicos. O Governo porém não quiz levantar esses emprestimos extraordinariamente; e comtudo ahi estão ainda 2.000:000$000 desses 7.000:000$000. Levantou um emprestimo, como muito bem disse o D. Par o Sr. Gomes de Castro, de 4.000:000$ do Contracto do Tabaco, com condições inherentes nessa transacção, contracto que andou em praça: por consequencia, tambem esses 4.000:000$ não foram levantados sobre os rendimentos publicos, tiraram-se pelo Contracto por espaço de doze annos, para fazer face aos quaes se creou uma receita extraordinaria, de maneira, que todas essas anticipações de 7.000:000$000 de réis se reduzem a 1.000:000$000 dos rendimentos publicos: parece-me, por tanto, que o Governo ainda foi muito economico. O Governo recebia os orçamentos das Côrtes, e estas diziam-lhe — ahi tendes para pagar, tanto, e hasde fazer face á despeza com estas cifras — porém o Ministerio não tem além do que é permanente, e a lei da necessidade apparece diante de si por muitas vezes para o extraordinario, sem o pensar, ou então ha de ser brucho. Se o não é, e os meios não chegam para essas eventualidades, com que meios ha de satisfazer á sua carencia? O Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães hade-se lembrar, de que em 1841 veio a esta Casa, então Camara de Senadores, propôr meios de satisfazer ás reclamações inglezas; e ha de lembrar-se tambem da linguagem, que empregou para significar, que precisava de um saco de ouro. Pois esse saco apresentámo-lo nós, porque as letras acceitas pela sua administração venceram-se todas no anno seguinte de 1842, e o D. Par hade-se convencer, de que foi ainda para cima de 800:000$000. (O Sr. Fonseca Magalhães — Eu convenço-me de tudo). Bem sei; mas isto é explicar, para que não fique a nodoa sobre nós, porque entrámos para o Ministerio em 2 de Fevereiro de 1842, e foi logo preciso negociar para o pagamento dos dividendos da divida externa, para o que tambem se levantou dinheiro, o qual está comprehendido na chamada anticipação; contractou-se com o Banco; pagaram-se esses dividendos, e foram-se continuando a pagar regularissimamente os que se seguiram. Pois o Governo tocou em um real só, que fosse do patrimonio publico, que não estivesse consignado nas verbas do orçamento? O Governo desse tempo, Sr. Presidente, emprehendeu e effectuou tambem a compra de tres barcos de vapor (que nem um havia para vergonha nossa); fez a remonta para o Exercito, para o que foi preciso mandar vir de Inglaterra 300 cavallos; pagou os prets em dia, do que havia 234:000$ de atrazo; e então foi dissipador este Governo?! Pois o que é um Governo? O Governo deve ser o avaliador prudente para remir a todas as necessidades do Estado; e então não se venha aqui dizer, que o Governo dissipou, e gastou sem a authoridade da lei. Não foi assim: o Governo nunca satisfez somma alguma impropria das despezas de anno corrente.

Não cançarei mais a Camara: entretanto sempre farei uma observação para mostrar, que nas Nações que gozam do systema representativo, ha muito mais tempo do que nós, e os governos teem outros recursos que nós não temos, acontece o que se póde vêr deste jornal vindo pelo ultimo paquete: é um discurso de Mr. Lastery, pronunciado no dia 25 do mez passado na Camara dos Pares em França; e como este é um dos paizes orthodoxos da liberdade legal, é bom lêr isto, para que se veja o que por lá vai (leu o alludido discurso). Ora, Sr. Presidente, á vista disto, a nossa conducta está tão clara como a luz, — nós nada gastamos que não fosse votado pelo orçamento, e sanccionado pelas Camaras; pagou-se ás classes inactivas depois de reduzidas á metade, e até alli não se lhes pagava cousa alguma: importava essa despeza em 1.300:000$000, os seus recibos tinham ido parar todos aos rebatedores, e foi então que o Governo lhes deu titulos de renda vitalicia por metade de seus vencimentos: estes titulos apresentavam-se todos os mezes regularmente, e eram logo pagos. O Corpo Diplomatico estava atrazado, pagou-se em dia aos Empregados, preencheram-se os arsenaes de materiaes necessarios, etc.: por consequencia todas as accusações que se tem feito ao Governo, parecem-mo injustas e faltas de fundamento, porque elle desempenhou com zêlo bastante os seus deveres.

Em quanto ao individuo de quem o Sr. Rodrigo da Fonseca Magalhães acaba de fallar, é um individuo muito distincto, tenho por elle a maior estima, sinto que o seu estado de saude seja tão precario; reconheço-lhe lettras, um caracter superior e incorruptível, digno de todo o elogio: devo por tanto dizer, que a respeito do negocio de que se tracta, elle se portou com toda a imparcialidade; mas não foi assim como S. Ex.ª disse, porque elle não recebeu, nem era capaz de receber, somma alguma. Este individuo esteva em Londres em 1846, foi ter com a Agencia Financial, teve uma entrevista com o seu presidente sobre o negocio, e o Governo nada dispendeu com elle: não fez senão ficar por qualquer prejuizo, que podesse haver na compra dos fundos. Não tenho mais nada a dizer.

O Sr. C. de Lavradio — Sr. Presidente, eu sinto profundamente (e as pessoas que me conhecem me farão justiça) que os meus verdadeiros sentimentos, e as palavras que proferi nesta Camara, podessem ir ferir um homem estimavel, e que, além disso, está doente: declaro, que tive tal delicadeza quando tractei daquelle negocio, que não podia deixar de tractar pela defeza da Administração a que tinha pertencido, que tive o cuidado de omittir o nome do sujeito (apoiados), que é um nome respeitavel; e é tal a reputação em que o tenho, que não posso de maneira nenhuma retirar a referencia ás Portarias que em outra Sessão apresentei, porque por ellas se vê, que são verdadeiras, e extrahidas do registo da Secretaria da Fazenda.

O Sr. Conde do Tojal quiz defender o seu amigo; mas eu ámanhã apresentarei um Documento, que faz honra a esse individuo, que acceitou a transacção que se lhe propoz em boa fé, e na qual observou que se não deixava corromper: é uma carta do mesmo individuo, em consequencia de uma Portaria do Sr. Duque de Palmella, dirigida á Agencia de Londres. Diz elle nessa carta — e tanto eu estava innocente, e fugia da corrupção, que offerecendo-me o Sr. Conde de Thomar, dinheiro, e uma Commenda da Ordem de Christo, eu recusei, porque a minha honra repellia tudo isso: eu ámanhã me comprometto a apresentar a carta. (O Sr. Conde do Tojal: — Peço a palavra. — O Sr. Conde de Thomar: — Carta!) Carta, sim, Sr. Eis-aqui, Sr. Presidente, como se tractam as honras! Ámanhã verá a Camara, por essa mesma carta, que daquella transacção (a não ser a Portaria do Sr. Duque do Palmella que a mandou anullar) não resultava menos de um prejuizo de 1:500 libras. Reservo-me a mostra-lo, e peço a V. Em.ª me conceda ámanhã a palavra, no principio da Sessão, para lêr esse documento.

O Sr. C. de Tojal — Eu só direi, que nunca se offereceu dinheiro aquelle individuo, e que quando se lhe fallou, elle disse, que havia de ser o mais imparcial possivel, e que dinheiro não acceitava; isto sem que se lhe tivesse offerecido cousa alguma.

O Sr. C. de Thomar — Eu sinto ter que entrar nesta materia, e mais ainda por ter ella relação a um homem que se diz estar no leito da morto; e sinto tambem vêr, que aquelles que se dizem seus defensores, lhe estejam cravando o punhal no peito. Sr. Presidente, eu não offereci nunca a Mr. Hughs nem dinheiro, nem Commendas; eu fui sempre atacado nas columnas do Times; e quando o meu collega o D. Par C. de Tojal era elogiado naquelle jornal, e justamente, pelo bom andamento que dava aos negocios da fazenda publica a seu cargo, nessa mesma occasião eu era esmagado naquelle jornal. Sr. Presidente, eu podia até apresentar um documento desse individuo, em que se me pedia certa cousa, dizendo-se que se eu a fizesse, as columnas do Times se punham ás minhas ordens. Eu hei de fallar sobre esta questão, e então mostrarei que os meus inimigos falseiam os factos; e hei de confundi-los.

O Sr. Presidente — Ámanhã prosegue por Ordem do dia este mesmo assumpto. Está fechada a Sessão.

Eram mais de quatro horas.

(1) Vid. Diario do Gov. N.º 23 pag. 92.

(2) Este discurso não póde publicar-se, pela mesma razão indicada no Diario, pag. 151, col. 2.ª