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CAMARA DOS DIGNOS PARES.

Tendo-se na sessão de 28 de Fevereiro publicado por extracto no Diario n. 60, de 12 do corrente, a pag. 277, col. 1.ª, o seguinte discurso por não se ter recebido o original a tempo de entrar no prelo, se publica agora na sua integra. O Sr. Ministro da Marinha e Ultramar — A Camara permittirá que eu, respondendo ao digno Par, siga o methodo que me parece mais conveniente, e assim irei lendo successivamente as perguntas que S. Ex.ª me dirigiu, para satisfazer a cada uma de per si, segundo a ordem em que estão formuladas.

«1.° Se já sujeitou á sancção das Côrtes os actos com força de Lei arbitrariamente adoptados pelo Visconde do Pinheiro?

«Não se tendo sujeitado, qual o motivo? Estes actos de que S. Ex.ª falla ainda não foram apresentados ás Côrtes, porque, segundo a pratica, para virem aqui as medidas tomadas pelos Governadores das provincias ultramarinas, é necessario que sejam acompanhadas com a opinião do Governo, e este só a poda formular depois da consulta do Conselho ultramarino, tudo em conformidade com o Acto addicional, passando a responsabilidade para o Governo quando este haja de approvar.

«2.° Se julga irreprehensivel e legal o comportamento de qualquer Governador geral ou Authoridade no Ultramar, que por si ou pelos agentes promover, ou consentir que se promova subscripção pecuniaria entre os seus administrados, applicando a usos proprios o producto de tal subscripção?»

Desde o momento em que um cidadão qualquer é accusado, logo que se lhe instaura o processo, o Governo não pode nem deve emittir opinião, por isso mesmo que lhe não é permittido influir de qualquer modo que seja, tanto para aquelles que hão-de depor, como para os Juizes que hão-de julgar.

«3.° Se o Governo approvou, e reconheceu o governo provisorio illegalmente nomeado pelo Visconde do Pinheiro para governar a provincia durante a sua ausencia?»

De facto o Governo não reconheceu, porque effectivamente nenhuma correspondencia teve cora elle, e já tinha sido mandado um Decreto de nomeação para um official que se achava tambem exercendo um similhante governo, que posteriormente foi elevado á effectividade; mas o adverbio illegalmente de que o digno Par se serve para classificar esse Governo provisorio não me parece que seja bem applicado em vista do Acto addicional, cujas authorisações são expressas em casos urgentes, segundo o 2.° do artigo 16.°, ouvindo os Governadores o seu conselho.

«4.° Se tem conhecimento de uma carregação de escravos a bordo de navios do Governo saídos de Angola para S. Thomé?»

Recebi todas as informações; é um processo em que estou bem certo, porque não só o Governo deu ordens para Angola a este respeito, mas tambem tem havido sobre esta materia correspondencias entre o Governo e o Ministro de uma potencia estrangeira.

A pratica seguida em Angola geralmente era não admittir a bordo de qualquer navio de guerra, ou mercante, mais do que dez escravos por colono, bone fide. Assim é que se admitte a passagem de umas para outras das nossas provincias ultramarinas. Aconteceu que n'um navio, que está ás ordens do governo de Angola, e que é commandado por officiaes da nossa Marinha, foi permittido irem mais de dez escravos, mas pertencendo cada vez a um colono — creio que foram nos navios trindade ou Esperança; alterada assim a pratica, o Governo julgou não dever approvar esta procedimento do governo provisorio, e assim o mandou participar ao Governador interino, para quem como disse já tinha mandado a nomeação.

Esses escravos porém logo que desembarcaram em S. Thomé, seja dito em honra do Governador que alli se acha, e que tambem agora está em syndicancia, foram logo todos elles mandados para um forte daquella ilha, e o mesmo Governador tractou de examinar, se todos iam acompanhados de documento que legalisasse o seu transporte, entregando-os aos colonos só depois de feitas essas averiguações.

«8.° Se tem conhecimento de haver sido retirado o retrato do Senhor D. João VI da saia do palacio do Governo para lhe ser substituido o do Visconde do Pinheiro?

Esta justamente era a pergunta que me fez hesitar para não responder no outro dia ao digno Par.

O Governo não tem tal informação, e creio que só o digno Par é que teve essa noticia, pois aquillo de que o Governo tem conhecimento a tal respeito é, que em Novembro se collocou o retrato do ex-Governador n'uma das salas do palacio do governo da provincia, isto consta por um boletim; fora disto nada se sabe, e isso mesmo verifiquei ha pouco, porque lendo eu todos os boletins, como devo, não tinha feito reparo nessa circumstancia. Não sei se o facto se daria assim, mas -parece-me que a informação que o digno Par teve, sendo exacta quanto ao facto, não o é talvez quanto ao modo. Consta, mas não de modo official, e eu não respondo pela exactidão do que vou dizer, que uma faísca electrica, na occasião de uma tempestade que por esse tempo houve em Angola, cahira justamente na sala onde estava o retrato do Senhor D. João VI, e bem assim os de dois antigos Governadores; desse acontecimento parece que resultou o estrago do primeiro retrato, e que só depois fora na mesma sala collocado o do Sr. Visconde do Pinheiro.

Agora o que me será permittido observar ao digno Par é, que na minha opinião o retrato ultimamente feito ficava mais honrado se fosse collocado proximo do logar onde estava o do Senhor D. João VI, e por consequencia isso prova que este não foi tirado de proposito para o substituir pelo outro, como parece se quer fazer acreditar.

Torno porém a repetir, que o Governo não tem informação alguma pela qual possa satisfazer a esta pergunta tão terminantemente como o digno Par deseja.

«Se tem conhecimento do modo barbaro porque são castigados os escravos em Angola, e se tem providenciado a tal respeito?»

Neste ponto devo confessar que o Governo tem informações, mas dellas colhe que os escravos são hoje castigados em Angola por um modo mais suave.

Desde que o Almirante Noronha governou aquella provincia, elle e os mais que lhe succederam intenderam que deviam examinar bem, e conhecer sempre do modo porque eram castigados os escravos por quaesquer faltas commettidas em casa de seus senhores.

A historia dos castigos que a maior parte desses senhores applicavam áquella porção da humanidade — chamados seus escravos, é por certo uma historia horrorosa: um dos ultimos Governadores de Angola que foi homem distincto, a quem a provincia tem feito as maiores honras e que foi bom servidor do Estado, já na defeza do Throno legitimo, já nesse logar de que foi incumbido, fallo do Sr. Pedro Alexandrino (O Sr. Conde de Thomar — Apoiado). Intendeu que devia do algum modo oppôr-se ao arbitrio com que eram castigados os escravos, e resolveu, mas sem o fazer publico, intimar a todos os donos do escravos, que desde que lhe constasse que elles applicavam algum castigo aos escravos elle os mandaria metter na cadea; isto de modo talvez um pouco ríspido, e não por certo o mais regular, mas que nem por isso podia deixar de ser louvavel. Effectivamente os senhores de escravos quando queriam (na phrase que alli se diz) dar alguma surra faziam um requerimento ao Governador, o qual mandava uma especie de regedor assistir a esse castigo. Agora o ex-Governador de que se tracta o que fez foi publicar um regulamento do modo como haviam de ser dados os açoites, e o que eu vejo é que essa sua Ordenança ou Portaria mereceu os elogios de um Governo philantropico, e que é certamente aquelle que em toda a parte mostra mais desejos de proteger a classe desvalida dos escravos.

Em quanto a nós Governo, não se póde duvidar de que temos seguido as pisadas de todos os Governos que nos precederam em Portugal, não ficando atrás de nenhum no sentido do melhorar a sorte dos escravos nos dominios portuguezes, haja vista ainda ao Decreto de 14 de Dezembro ultimo.

«6.° Se approvou as demissões o substituições dos empregados, dadas e feitas pelo Visconde do Pinheiro?»

«7.° O mesmo a respeito do governo provisorio intruso?»

As demissões dadas pelo ex-Governador de Angola foram de duas naturezas, isto é, dividem-se em duas classes, umas são aquellas para que estava authorisado, e outras são aquellas que, por terem a assignatura regia, elle não as podia dar: estas foram immediatamente mandadas annullar, communicando-se que só 6 permittida nesses casos a suspensão quando esta se julgue necessaria a bem do serviço.

Emquanto ás nomeações feitas, algumas dellas não foram approvadas.

«8.° Se approvou as promoções feitas tanto pelo Visconde do Pinheiro, como pelo dito governo provisorio?»

Os Governadores do Ultramar não estão authorisados para fazerem promoções, e só em caso de guerra podem dar commissão a alguns officiaes, mas essa commissão cessa acabada a guerra. Já se vê que o Governo não podia approvar como promoção aquillo que nesse sentido foi feito pelo ex-Governador. Este modo de intender a lei era claro, mas entretanto o Governo dirigio-se ao Conselho ultramarino, e este opinou no mesmo sentido. Ao Governador actual foram por consequencia ordens, para que, exigindo-o o serviço, se assim o julgasse conveniente fizesse a devida proposta para ser attendido, tendo em vista a promoção que se havia feito.

Devo, porém dizer, que todos estes actos, publicados pelo ex-Governador geral acabam sempre dizendo, que tudo fica dependente da approvação do Governo da metropole.

Parecendo-me ter assim respondido a todas as perguntas que o digno Par fez, devolvo-as para as mãos de S. Ex.ª como me parece que cumpre fazer.

Rectificação. — No extracto da sessão de 28 de Fevereiro ultimo, publicado no Diario n.° 60 de 12 do corrente, no segundo discurso do Sr. Ministro dos Negocios da Marinha, a pag. 280, col. 1.ª, lin. 85 e 86; em logar de = avaliação, ou julgamento, como ahi se 16 = deve ler-se = avaliação no julgamento.